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Kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

O presente trabalho possui caráter experimental, com foco em desenvolver um conjunto de estampas a partir da junção de elementos e valores culturais indígenas, inspirados nos traços das obras da artista brasileira Tarsila do Amaral durante o movimento modernista conhecido como antropofágico.

O presente trabalho possui caráter experimental, com foco em desenvolver um conjunto de estampas a partir da junção de elementos e valores culturais indígenas, inspirados nos traços das obras da artista brasileira Tarsila do Amaral durante o movimento modernista conhecido como antropofágico.

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ANDERSON OLIVEIRA

TCC // PÓS-GRADUAÇÃO

EM DESIGN GRÁFICO

Kayapó:

manifestando a arte através

do design de superfície

CENTRO UNIVERSITÁRIO

SENAC - LAPA SCIPIÃO



CENTRO UNIVERSITÁRIO SENAC

LAPA SCIPIÃO

Anderson Jesus de Oliveira

Kayapó: manifestando a arte

através do design de superfície

Trabalho de conclusão de curso apresentado

ao Centro Universitário Senac - Lapa Scipião,

como exigência parcial para obtenção do grau

de especialista em Design Gráfico.

Orientadora: Prof.a Me Sandra Tucci

São Paulo | SP

2020



Anderson Jesus de Oliveira

Kayapó: manifestando a arte

através do design de superfície

Trabalho de conclusão de curso apresentado

ao Centro Universitário Senac - Lapa Scipião,

como exigência parcial para obtenção do grau

de especialista em Design Gráfico.

Orientadora: Prof.a Me Sandra Tucci

São Paulo | SP

2020


Oliveira, Anderson Jesus de

Kayapó: manifestando a arte através do design de superfície / Anderson Jesus de

Oliveira – São Paulo, 2020.

74 f.: il. color.

Orientadora: Prof.a Me Sandra Tucci

Trabalho de Conclusão de Curso (Pós-Graduação em Design Gráfico) – Centro

Universitário Senac - Lapa Scipião, São Paulo, 2020.

1.Design de superfície 2.Design gráfico 3.Tarsila do Amaral 4.Kayapó 5.Grafismo

indígena I. Oliveira, Anderson Jesus de (autor) II. Tucci, Sandra (Orient.) III. Título


Agradecimentos

A todos os professores que tive a honra de conhecer durante o curso

e que me proporcionaram ampliar os meus conhecimentos. A minha

orientadora Sandra Tucci, que não me deu aula neste período, mas me

guiou durante todo o processo desse projeto de forma excepcional.

Em especial a minha esposa Paula Souza pela compreensão, paciência,

companheirismo e por todo apoio que tem me proporcionado durante o

nosso casamento.

Por fim, agradeço a todos os colegas que fiz durante a pós-graduação,

sobretudo pela generosidade e troca de experiências durante noites

maravilhosas. Que o design continue transformando nossas vidas e nos

ajudando com os “problemas” do dia a dia com muita criatividade.


Resumo

O presente trabalho possui caráter experimental, com foco em desenvolver

um conjunto de estampas a partir da junção de elementos e valores

culturais indígenas, inspirados nos traços das obras da artista brasileira

Tarsila do Amaral durante o movimento modernista conhecido como

antropofágico. Através dos signos dos grafismos da cultura Kayapó,

surgem ilustrações que têm como objetivo manifestar-se no design de

superfície aplicado em vários objetos.

Palavras-chave: design de superfície, design gráfico, índio Kayapó, tribo

indígena, cultura brasileira, Tarsila do Amaral


Abstract

This work has an experimental character, with a focus on developing a set

of prints based on the combination of elements and indigenous cultural

values, which are inspired by the traces of the works of the Brazilian artist

Tarsila do Amaral during the modernist movement known as anthropophagic.

Through the signs of Kayapó culture graphics, illustrations emerge

that aim to manifest themselves in the surface design applied to various

objects.

Keywords: surface design, graphic design, Kayapó Indian, indigenous

tribe, Brazilian culture, Tarsila do Amaral


Lista de figuras

Figura 1

Figura 2

Figura 3

Figura 4

Figura 5

Figura 6

Figura 7

Figura 8

Figura 9

Figura 10

Figura 11

Figura 12

Figura 13

Figura 14

Figura 15

Figura 16

Figura 17

Figura 18

Metodologia projetual de Bruno Munari

Metodologia projetual detalhada

Pegadas de um animal

Sistema de repetição

Índios da tribo Tupi-Guarani

Aldeia Pukany

Criança pintada com tinta preta extraída do jenipapo

Chefes da tribo Mebengokre Kayapó

Mulheres indígenas usam pinturas e adornos

Índios Kayapó com adornos e pinturas corporais

Pintura “Abaporu” (1928)

Pintura “A negra” (1923)

Obras de arte da Tarsila do Amaral

Pintura “Auto-retrato” (1924)

Painel de cores CMYK

Abaixo: painel de cores do projeto de estampas

Pinturas corporais Kayapó

Adornos Kayapó

18

19

23

23

25

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27

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36-37

38-39


Figura 19

Figura 20

Figura 21

Figura 22

Figura 23

Figura 24

Figura 25

Figura 26

Figura 27

Figura 28

Figura 29

Figura 30

Figura 31

Figura 32

Figura 33

Figura 34

Figura 35

Figura 36

Figura 37

Alimentos dos Kayapó

Festa das Máscaras

Pintura facial

Pinturas sobre tecidos

Pintura corporal

Ilustrações de grafismo usados pela tribo Kayapó

Porcelana da coleção ‘Cores de Tarsila’

Coleção ‘Para Tarsila’

Conjunto de almofadas by Kamy

Kayapó illustrations

Esboços dos elementos Kayapó

Experimentação 1

Experimentação 2

Conjunto de formas abstratas

Estampa: A índia Kayapó

Estampa: Diadema

Estampa: O essencial da caça

Estampa: Festa das Máscaras

Aplicações das estampas em objetos

40

41

42

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45

45

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50

51

54-55

56

57

58

60

61

62

63

64-69


Sumário

1

1.1

1.2

1.3

Introdução

Problematização

Objetivos

Justificativa

13

14

14

15

2

2.1

2.2

2.3

2.4

2.5

2.6

2.6.1

2.7

2.8

2.8.1

2.8.2

Projeto

Metodologia e design

Definições do projeto

Design de superfície e gráfico

Introdução à cultura indígena brasileira

Um olhar sobre à cultura Kayapó

Inspiração antropofágica

Sobre Tarsila do Amaral

Extraindo cores e formas

Inspiração Kayapó

Signos no grafismo dos Kayapó

Estilo e identidade dos grafismos

17

18

20

22

24

26

30

33

34

36

42

44


3

3.1

Estudo de casos

Projetos referenciais

47

48

4

4.1

4.2

4.3

4.4

Estampas

Esboços

Experimentações

Estampas finais

Aplicações

53

54

56

59

64

5

Considerações finais

71

Referências

72



1

INTRODUÇÃO

Quando compramos um caderno, uma almofada ou até mesmo um prato

decorativo, muitas vezes é porque nos identificamos com aquela ilustração

estampada em sua superfície. Uma ilustração pode valorizar muito uma

peça, especialmente se houver conceito cultural ou se for inspirado em

um(a) grande artista, ícone da nossa cultura nacional.

Isso é o que o projeto Kayapó: manifestando a arte através do design

de superfície pretende alcançar por meio de um conjunto de estampas

elaborado a partir de uma breve pesquisa sobre a cultura indígena e

inspirado na arte da pintora modernista Tarsila do Amaral. Um conjunto de

ilustrações e grafismos desenhados com olhar focado na tribo Kayapó, sob

traços marcantes que buscam no imaginário uma brasilidade.

Como fundamentação teórica e base de estudo, uso o método do designer

italiano Bruno Munari, uma metodologia projetual que parte de um

problema e segue uma série de passos que nos leva a alcançar o projeto

final. Pesquisas no campo de design gráfico e de superfície também

sustentam esse trabalho, assim como a investigação textual e iconográfica

sobre os índios Kayapó e o período antropofágico de Tarsila do Amaral.

Como complemento, aplicam-se conceitos e técnicas do design através de

fundamentos do design e da Gestalt, na qual elementos, formas abstratas e

figurativas tendem a atribuir compreensão e percepção humana.


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

1.1

Problematização

Tarsila do Amaral foi um dos principais nomes do modernismo brasileiro e

a responsável por pintar obras de artes únicas, capazes de provocar diversos

questionamentos relacionados às nossas matrizes. Já os índios Kayapó

são conhecidos por preservarem a sua arte e possuírem uma cultura rica

de símbolos e rituais, buscando manter uma história viva e ativa para as

próximas gerações.

Pensando nisso, como seria capturar elementos e signos do costume

regional de uma tribo indígena e transformá-los em referências visuais

inspiradas num movimento artístico?

O conjunto de estampas Kayapó: manifestando a arte através do design

de superfície pretende transmitir valores culturais e afetivos, e é por meio

desse questionamento que ele se sustentará para o desenvolvimento

desse trabalho.

1.2

Objetivos

Desenvolver um conjunto de quatro estampas inspirado nas obras da artista

brasileira Tarsila do Amaral, mesclando elementos da cultura dos índios Kayapó.

– Explorar a criatividade do design de superfície;

– Conhecer técnicas, histórias e linguagens visuais;

– Identificar a cultura brasileira por meio de formas visuais bidimensionais;

– Buscar referências através de artistas, cores, signos e ícones;

– Estudar o movimento artístico antropofágico e a cultura indígena;


15

1.3

Justificativa

Após meses de estudos, ao final de cada matéria entendo como o

tema design pode ser tão amplo, conceitual e útil em nossas vidas. A

cada descoberta que faço parece que um mundo se abre, e passo a

enxergar as coisas de outra forma. Penso na função de cada objeto, no

desenvolvimento de uma tipografia e até no projeto de uma cadeira. Cada

peça tem uma função, e ao aprendermos sobre ela, muda a forma como

interpretamos cada detalhe.

Pensando nisso, através de um projeto de pesquisa detalhado, desenvolvo

um conjunto de estampas usando estudos e técnicas da área do design

gráfico, aplicado no campo de superfície, de modo a projetar referências

visuais em diferentes materiais. Conceitualizando e explorando o design

de superfície e sua diversidade, no intuito de conhecer técnicas, histórias

e linguagens por meio das referências de artistas, cores, signos e ícones da

cultura brasileira.

Sendo esse projeto um conjunto de quatro estampas, formadas por

ilustrações gráficas baseadas na cultura brasileira da tribo indígena

Kayapó, uso como inspiração cinco obras da pintora Tarsila do Amaral

durante o movimento antropofágico. Procuro nele misturar elementos

capazes de transmitir conforto visual e credibilidade através de

organização e técnicas do design gráfico.



2

PROJETO

Através desse projeto de pesquisa busco, a partir de ilustrações, retratar a

cultura brasileira dos índios Kayapó, inspirado no movimento modernista

durante o período adotado como antropofágico por Tarsila do Amaral.

Na tribo Kayapó, procuro referências nos grafismos e me inspiro na

simbologia dos ritos, adornos e elementos que preservam sua cultura.

Também pelo fato de os índios serem um retrato de um Brasil histórico,

onde se mantêm fortes as tradições e as crenças que enriquecem a cultura

brasileira.

A ideia da junção desses ícones brasileiros vem após uma análise pessoal

em cima dos conteúdos ministrados nas aulas durante a Pós-graduação de

Design Gráfico. A matéria que me fez pensar em desenvolver essa experimentação

foi ‘Design Experimental’, na qual buscávamos referências artísticas

e períodos marcantes do design e desenvolvíamos experimentações

a partir dos temas abordados na sala de aula.

Esse experimento com a arte dos índios Kayapó e as obras da Tarsila envolvem

estudos de cores, signos e outros elementos dos fundamentos do

design e da pregnância da forma, como podemos ver na Gestalt (1). Pensar

em como juntar tudo isso e tornar algo conceitual e estético é o grande

desafio no desenvolvimento desse conjunto de estampas.

O projeto não tem como objetivo desenvolver um novo método de pintura

ou técnicas inovadoras no ramo gráfico, mas sim de mostrar como

podemos manter identidade e similaridade em um conjunto de estampas.

Estampas que precisam ser multifuncionais e flexíveis ao ponto que se

encaixem em diversas superfícies.

1 De acordo com a Gestalt,

a arte se funda no

princípio da pregnância

da forma. Ou seja, na

formação de imagens,

os fatores de equilíbrio,

clareza e harmonia visual

constituem para o ser

humano uma necessidade

e, por isso, considerados

indispensáveis. (Gomes

Filho, 2009, p. 17)


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

2.1

Metodologia

e design

“O método de projeto não é mais do que uma

série de operações necessárias, dispostas em

ordem lógica, ditada pela experiência. Seu

objetivo é o de atingir o melhor resultado com o

menor esforço.” (MUNARI, 2008, p. 10)

Na metodologia do designer italiano Bruno

Munari, um bom projeto deve seguir definições

que sejam capazes de resolver um problema

(Figura 1). Essas operações lógicas são descrições

curtas ou parágrafos detalhados baseados

em tópicos. Segundo o designer Bruno Munari

(2008), observar regras para chegar ao resultado

de um projeto não significa que haverá um

bloqueio na criatividade ou na personalidade de

cada pessoa. O intuito não é tirar sua liberdade

criativa, mas sim agregar técnica para que se torne

instrumento de trabalho objetivo nas mãos

do projetista criativo.

Tendo em vista que ao desenvolver um produto

e que o mesmo possa alcançar o sucesso esperado,

a interação entre produto e consumidor é

extremamente necessária. Essa interação não se

dá apenas depois do produto pronto – antes de

iniciar o seu desenvolvimento e para garantir a

sua aceitação, dados socioculturais podem vir a

ser considerados.

Ocorre em alguns casos que um produto, por

exemplo, o artesanato, é concebido considerando

o território no qual o artesão vive. Dijon

1.

PROBLEMA

7.

MATERIAIS E TECNOLOGIA

2.

DEFINIÇÃO

8.

EXPERIMENTAÇÃO

3.

COMPONENTES

9.

MODELO

Figura 1 – Metodologia

4.

COLETA DE DADOS

10.

VERIFICAÇÃO

projetual de Bruno Munari.

No item 2.2 Definição do

5.

ANÁLISE DE DADOS

11.

DESENHO DE CONSTRUÇÃO

Projeto estão descritas

cada uma dessas etapas.

6.

CRIATIVIDADE

12.

SOLUÇÃO


19

de Moraes diz que “o artesanato, na verdade, é

o resultado do convívio do homem com a sua

cultura autóctone, suas tradições, crendices e

religiosidades transformadas, no que lhe concerne,

em cultura material espontânea e popular”.

(2010, p.70)

No caso desse projeto, não irei levantar dados

demográficos que nos mostrem qual a aceitação

do público brasileiro perante a cultura indígena.

O foco nesse caso é experimentar formas e cores

de uma artista brasileira conceitualizada, aplicadas

de forma diferenciada de modo a trazer ao

público uma visão de signos, que se encontram

em uma parte do Brasil que não está estampada

no dia a dia nas prateleiras.

“O design dentro da heterogeneidade de uma

cultura múltipla e complexa é possível quando

se promove a união de diferentes elementos,

buscando-se harmonia e equilíbrio entre eles.”

(MORAES, 2010, p.72)

O design é fundamental, não apenas como caráter

estético, mas também como projeto. Seguir

uma metodologia facilita o papel do designer

no planejamento e na busca de referenciais que

se enquadrem no seu trabalho. Como Bruno

Munari (2008) diz, “no campo do design não se

deve projetar sem um método, pensar de forma

artística procurando logo a solução, sem fazer

uma pesquisa sobre o que já foi feito de semelhante

ao que se quer projetar.”

Deve se considerar nossas relações socioculturais

e nossas características de território,

tradições e manifestações culturais de um povo

formado por diversas matrizes, de misturas

indígenas, europeias e africanas, que nos conduziram

a uma estética multicultural com um

pluralismo étnico. Essa miscigenação nos trouxe

uma cultura rica em signos, dando origem a uma

sociedade com características únicas.

Sendo assim, me embaso na metodologia de

Bruno Munari, unida aos fundamentos do design,

para projetar e aplicar os conhecimentos no

conjunto de estampas desse projeto.


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

2.2

Definições

do projeto

Componentes

do problema:

Problema

Conjunto de estampas

inspirado na cultura indígena

brasileira da tribo Kayapó.

As artes devem seguir os elementos

da cultura dos índios Kayapó, como:

pinturas corporais, rituais, alimentos

e ornamentos.

Deve ser aplicável em superfícies e

materiais diferentes.

Análise de dados

Analisar os dados da pesquisa,

verificar se pode ser usado algo

como referência.

P

DP CP CD AD

C

Definição

do problema

Basear-se nas obras de arte da

pintora Tarsila do Amaral durante

o movimento conhecido como

antropofágico; deve possuir

similaridade nos traços e nas

cores das obras selecionadas.

Coleta

de dados

Pesquisar se já foi

feito algo parecido ou

se existem projetos

similares.

Criatividade

Usar traços orgânicos e usar

as cores baseando-se nas

obras de arte. Ligar cada

criação a um elemento da

cultura dos índios Kayapó.

Figura 2 – Acima: metodologia

projetual detalhada.


21

Verificação

Experimentação

Experimentar desenhos à mão livre,

cores e formas que se comuniquem

com todos designs.

Verificar se precisa refazer algo.

Comparar.

Certificar-se que funciona.

MT E M V DC S

Materiais

e tecnologia

Quais materiais serão aplicados,

qual método de aplicação, será

digital ou manual?

Podem ser aplicados em

superfícies de quais tipos?

Modelo

Definir combinações,

cores, elementos e formas

a serem usadas.

Desenho

de construção

Solução

Projeto final

Adaptar, corrigir, prototipar

em mockups digitais de

diferentes objetos.


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

2.3

Design de superfície

e gráfico

2 Renata Rubim: designer

de superfícies e

consultora de cores.

3 www.surfacedesign.org

4 Evelise Anicet Ruthschilling:

artista plástica, designer,

professora, fundadora

e coordenadora do

Núcleo de Design de

Superfície da UFRGS.

O termo design de superfície nasceu da tradução

literal do inglês Surface Design, adotado pela

gaúcha Renata Rubim (2) após voltar para o

Brasil depois de estudar nos Estados Unidos durante

os anos 80. No ano de 1989, ela se associou

ao Surface Design Association - SDA (3) junto com

Evelise Anicet Ruthschilling (4).

“Design de Superfície é uma atividade criativa

e técnica que se ocupa com a criação e desenvolvimento

de qualidades estéticas, funcionais

e estruturais, projetadas especificamente para

constituição e/ou tratamentos de superfícies,

adequadas ao contexto sóciocultural e às diferentes

necessidades e processos produtivos.”

(RUTHSCHILLING, 2008, p. 23)

Para Renata Rubim, “o design de superfície é

um precioso complemento ao Design Gráfico

quando se participa de uma ilustração, ou como

fundo de uma peça gráfica.” (2013, p. 22)

É comum ouvir dizer que o design de superfície

é design têxtil. Além do tecido, podemos pensar

em superfície como um elemento passível de

ser projetado, como papéis, objetos cerâmicos,

plásticos e muitos outros. O debate na área é

amplo no que diz respeito a sua definição, por

estar conectado a diversos nichos do design,

como têxtil, produtos, ilustração, interface e

gráfico.

Entre tantas definições, a designer e pesquisadora

brasileira Renata Freitas define design de

superfície como “uma especialidade do campo

do design, já que seus meios práticos e simbólicos

possuem relações únicas em seu processo

criativo, caracterizando os trabalhos da área.

Além disso, tem como função tratar, explorar e

ressaltar a interface comunicativa dos objetos,

unindo características funcionais e estéticas.”

(2018, p. 20)

Na tradução literal, design é projeto, e cada

nomenclatura acrescentada ao termo, como

gráfico e superfície, serve para filtrar as funções

e objetivos de cada um. Ou seja, o designer é um

projetista, seja no intuito de pensar na forma e

função, que é o caso do designer de produtos, ou

do designer de serviços que pensa no desenvolvimento

de serviços. Já o designer gráfico muitas

vezes precisa organizar informações, transmitir

uma mensagem através de uma linguagem

e/ou combinações de cores e tipografia.

Logo no início do livro “Design Gráfico, em uma

história concisa”, Richard Hollis faz uma metáfora

sobre um homem primitivo que ao sair para

caçar, avista pegadas de um animal na lama.

Essas pegadas são sinais gráficos, assim como

uma letra do alfabeto.“O designer gráfico é a arte

de criar ou escolher tais marcas, combinando-as

numa superfície qualquer para transmitir uma

ideia.” ( 2001, p. 4) (Figura 3)


23

o design gráfico lida com informações, organizando-as

de maneira competente e eficaz para

transmitir dados aos usuários. Já o design de

superfícies, por sua própria natureza, lida principalmente

com considerações de ordem estética.

O designer gráfico tem como suas principais características

saber identificar algo, de onde veio/

origem, informar e instruir, relacionando uma

coisa com outra, apresentando e promovendo,

fazendo da mensagem a qual ele quer transmitir

algo inesquecível.

Na comparação das duas áreas, Design Gráfico

x Design de Superfície, Renata Rubim diz que

Ao procurar entender mais sobre essas duas

áreas do campo de design, encontrei na internet

uma definição que faz uma junção sobre o design

gráfico e o design de superfície, do professor

Leo Peccini, na qual afirma que: (5)

“O design gráfico de superfícies consiste na

aplicação dos princípios e técnicas do Design

Gráfico na programação visual de espaços,

desenvolvendo, principalmente, padronagens,

estampas, texturas e composições visuais em

geral.” (Figura 4)

5 Leonardo Peccini: designer

e professor na Faculdade

Metropolitana de Manaus.

Figura 3 – Acima: pegadas

de um animal.

Figura 4 – Ao lado: sistema

de repetição: Técnica de

repport a partir do uso de um

módulo. Fonte: https://www.

coresetons.com.br, 2017


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

2.4

Introdução à cultura

indígena brasileira

Para muitos, o termo cultura confunde-se com

sabedoria, conhecimento e condição social.

Segundo Zucon e Braga, “cultura é um conjunto

de saberes, comportamentos, crenças e costumes

adquiridos e transmitidos por um processo

coletivo de aprendizagem” (2013, p. 12).

Desmistificar o modo de pensar e interpretar

a cultura como um privilégio de classe social é

uma das grandes missões da antropologia.

Há séculos, estudos antropológicos vêm buscando

entender os comportamentos da sociedade

brasileira, de modo a compreender os seus costumes,

relações pessoais, vínculos e heranças

herdadas desde a colonização.

“Ao conhecermos novas culturas, percebemos

que as diferenças não significam que ‘uma cultura

é melhor que a outra’, mas que são formas

distintas de ver o mundo.”

(ZUCON; BRAGA, 2013, p.15)

Sabe-se que muito antes da chegada das caravelas

portuguesas ao Brasil já existiam populações

indígenas vivendo por aqui e que, devido às diferenças

culturais entre os europeus e os índios,

houve conflitos de interesses e muito foi perdido

desde a colonização. Durante a dominação

portuguesa, os índios foram escravizados e considerados

etnocêntricos, fazendo com que os

portugueses trouxessem africanos para o Brasil,

a fim de substituir os trabalhos escravos, tarefas

que os índios, considerados como “selvagens”,

passaram a se negar a realizar.

No Brasil há diversas etnias indígenas espalhadas

em todo território nacional. Segundo o

documentário “O povo brasileiro”, do antropólogo

Darcy Ribeiro (2000), acredita-se que os tupisguaranis

são as matrizes dos povos indígenas no

Brasil e que vieram pelo norte e foram descendo

e se espalhando, chegando aos litorais e formando

braços em todo o país.

Apesar da diversidade das sociedades indígenas

no território brasileiro, há muita semelhança

cultural nesses grupos. Isso não impossibilita

diferenciar-se uma sociedade da outra, cada

uma delas possui seus traços e elementos que

as tornam únicas, assim como o modo de viver e

se organizar.

Os índios vivem em terras onde há recursos que

garantam sua sobrevivência e socialização. A

sabedoria e organização deles os tornam autossuficientes,

capazes de extrair da natureza tudo

o que é essencial para o seu desenvolvimento.

O modo de vida comunal lhes proporcionam

conhecimentos medicinais e alimentícios a

partir de plantas, e também o conhecimento

para produção das suas próprias ferramentas

de caça, e a sabedoria para produzir esteiras e

outros artefatos que ajudam na construção dos

seus lares.

As tribos indígenas mantêm muitos ritos e

crenças religiosas, formando pensamentos e

respeitando seus antepassados representados

muitas vezes por xamãs ou pajés. Muitos desses


25

“É importante tanto relativar a cultura do outro quanto entrar em

contato direto com ela, de forma a penetrar em seu contexto interno”

(ZUCON; BRAGA, 2013, p. 22)

ritos formaram lendas que enriquecem a cultura

do folclore nacional.

“Em muitas sociedades indígenas, o ritual é

o momento da inserção da humanidade no

universo mais amplo; é o lugar da confluência e

da presença concomitante do sobrenatural, da

natureza e da humanidade.”

(SILVA, 1994, p. 76)

Para os índios, os rituais servem como reafirmação

de seus laços internos, um reencontro com

seus ancestrais e origens. Segundo Aracy Lopes

da Silva, “[...] é assim que os símbolos, sentimentos,

concepções e matérias se encontram e

se mesclam no universo do mito e da cosmologia,

permeando vida e pensamento, sociedade e

natureza, dando sentido à experiência humana

no mundo” (1994, p. 76).

música, da pintura corporal e da arte plumária.

Também podem ser vistas na fabricação de

objetos para uso pessoal e comercial, como a

tecelagem e a cestaria de fibras naturais. Sua

essência possibilita contextualizar e conferir

significados, que são frutos da miscigenação de

vários grupos indígenas e uma forma de expressar

a sua cultura.

“A arte é um fenômeno universal que afeta

todas as pessoas, todas as sociedades e todas

as culturas.” (ALCINA, 1982, p. 15 apud VELTHEM,

1994, p. 83)

Outra coisa que os tornam diversos é sem dúvida

a língua. Segundo Grupioni, (1994, p. 19) são

cerca de 170 línguas e dialetos sendo falados.

Cada tribo indígena possui seu universo sociocultural,

isso faz com que cada etnia tenha seus

próprios costumes e tradições. Dentro desse

universo há uma grande riqueza cultural, onde

sinais e formas gráficas simbolicamente se integram

às artes, aos ritos e ao modo de vida.

A arte dentro dessas culturas indígenas são

representadas de diversas formas e podem ser

vistas durante os rituais, através das danças, da

Figura 5 – Índios da tribo Tupi-Guarani.

Fonte: https://www.gestaoeducacional.com.br/cultura-tupi-guarani


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

2.5

Um olhar sobre a

cultura Kayapó

Em pleno século XXI, em um mundo que não

se vive sem o uso da internet e onde a tecnologia

avança em uma velocidade extraordinária,

ainda há tribos indígenas vivendo da caça e da

agricultura da subsistência, seguindo os rituais

e crenças dos seus antepassados e preservando

uma cultura rica e abundante de pinturas e

simbologias espirituais.

No norte do Brasil, às margens do rio Xingu, em

um dos territórios de fauna mais abundantes do

mundo, vivem os índios da tribo Kayapó / Caiapó

(6), que se denominam como Mebêngôkre —

“gente do espaço dentro das, ou entre as águas”

(TURNER, 1992, p. 311).

Segundo o documentário Caiapó Metutire

(2004), os índios Kayapó acreditam que eles são

povos vindos do céu e que ao cair em um buraco

chegaram à terra e que hoje as estrelas são

parentes que ainda vivem por lá.

As aldeias são construídas quase sempre às margens

de rios, em forma circular, em uma grande

área descampada. No centro do círculo, entre

as moradias, há uma praça central, onde fica

a casa dos homens, território das associações

políticas masculinas, coração da organização

social e dos rituais dos índios Kayapó, como

podemos ver na imagem a seguir. (Figura 6)

6 O nome “Kayapó” é de

origem tupi (significa

literalmente “como

macaco”).(TURNER,

1992, p.311)

Figura 6 – Aldeia

Pukany. Fonte: http://

sociobiodiversidadekayapo.

blogspot.com


27

“A floresta circundante é considerada como um espaço antissocial, onde os

homens podem se transformar em animais ou em espíritos, adoecer sem

razão ou mesmo matar seus parentes; lá habitam seres meio animais, meio

gente. Quanto mais longe da aldeia, mais antissocial se torna a floresta e mais

perigos são associados a ela.” (7)

Na agricultura, as mulheres são responsáveis

pela colheita e a preparação dos alimentos. Os

homens são quem preparam a roça e o solo para

o plantio e também são responsáveis pela caça

e a pesca que os alimentam.

Para que sejam realizados alguns rituais, como o

de nominação, é necessário fazer uma expedição

com duração aproximada de um a dois

meses, para acumular cágados, peixes e outros

animais para o grande banquete realizado feito

no último dia do ritual.

em suas pinturas. Nessa jornada também se

procura o carvão di boriprà, um trabalho cansativo

e desgastante. Esse material é colhido pelos

homens e levado à tribo para que as mulheres

possam preparar as tinturas, que podem ser

feitas com os dedos ou com palitos finos. São

traços simétricos que podem demorar horas

para se concluir. (Figura 7)

A principal culinária da tribo é composta por

mandioca, cará, milho, banana e batatas. Como

proteínas, o peixe, tatu e jabutis. O peixe pode

ser preparado misturado com farinha e enrolado

na folha de bananeira e levado ao fogo.

São inúmeros rituais, cada um com sua importância,

suas danças e cantos. Nessas ocasiões, a

maior parte dos rituais ocorrem na praça central

da aldeia. A celebração envolve todos e cada um

se prepara para a festa com pinturas corporais,

adornos e com suas habilidades. A preparação

é diferente em cada uma das celebrações, como

as cerimônias de nomeação, as agrícolas e as de

passagem.

As pinturas corporais vistas nos índios Kayapó

são feitas de matérias-primas orgânicas. Os

homens percorrem grandes distâncias dentro da

mata fechada atrás da árvore do jenipapo para

extrair o fruto para produzir pigmentos usados

7 Povos Indígenas no

Brasil, São Paulo, 20 de

jul. de 2018. Disponível

em: < https://pib.

socioambiental.org/pt/>

Figura 7 – Acima: criança

pintada com tinta preta

extraída do jenipapo.

Figura 8 – Ao lado: chefes da

tribo Mebengokre Kayapó.

Fonte: Flickr do Houston

Museum of Natural Science


“A plumária Kayapó é usada essencialmente durante os grandes rituais de

nomeação e iniciação masculina, no casamento, na esteira e paramentação do

morto durante os ritos de passagem.”

(SAMPAIO e TARDIVO, 2010 )

No dia a dia, a tribo usa a pintura chamada Jacu,

conhecida como pintura d’água, e a mais grossa,

como Meibê. A pintura vermelha feita com urucum

é muito comum, sendo que nos bebês são

usadas na panturrilha e em volta da boca. Nas

mães, o vermelho é usado no rosto inteiro e o

preto do jenipapo nas coxas.

O corte de cabelo das mulheres é marcado por

uma faixa em formato triangular, partindo da

franja acima dos olhos até o topo da cabeça. As

mulheres mantêm os cabelos longos, e o corte

marcante é uma característica adotada pela tribo

Kayapó, mas isso não é um costume de seus

antepassados.

Entre os adornos usados, podemos ver pulseiras,

tornozeleiras, braceletes e cocares, entre

outros. Materiais como as contas coloridas (8),

os antepassados não possuíam e acabavam

dançando sem.

A sociedade indígena da tribo Kayapó mantêm

viva e de forma respeitosa uma cultura de

costumes e tradições a favor da natureza e da

defesa da sua história, com formas e expressões

que incorporam o grafismo pelo corpo, através

da música e dos artefatos que simbolizam e

transmitem vibrações únicas.

8 Pequenos objetos plásticos

usados no desenvolvimento

de adornos.

Figura 9 – Ao lado: mulheres

indígenas usam pinturas

e adornos. Fonte: https://

fotospublicas.com


29

A

B

C

D

Figura 10 – Índios Kayapó com

adornos e pinturas corporais.

A – Líder da tribo Kayapó

usa pintura corporal e

adorno no pescoço.

B – Exibe o conjunto de

penas usados para rito

de passagem Kayapó.

C – O cocar feito com penas

de papagaio expressa a sua

identidade como guerreiro.

D – Usa o cabelo cortado

em formato de V invertido,

uma prática ritual feminina.

Fonte: Site National

Geographic Brasil


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

2.6

Inspiração

antropofágica

Em 1928, Tarsila do Amaral pintou um quadro

para presentear o seu marido Oswald de Andrade

(9) pelo seu aniversário. Esse quadro passou

a ser chamado de ‘Abaporu’ (10) após a observação

feita por Raul Bopp (11), comparando a

imagem a ‘um homem plantado na terra’. (1928

apud AMARAL, 1975, p. 247).

A pintura do Abaporu — ‘homem que come gente’

— gera uma nova fase na carreira de Tarsila,

chamada de “antropofagia”. A repercussão dessa

obra foi tão grande que Oswald de Andrade

criou um texto intitulado “Manifesto Antropófago”,

inspirado na pintura, que se tornou símbolo

desse movimento.

9 Oswald de Andrade

(1890 - 1954) foi escritor

e dramaturgo brasileiro.

10 Segundo Aracy Amaral,

a palavra tupi-guarani:

Abaporu. Aba:homem,

poru: que come.

(AMARAL, 1975, p. 247)

11 Raul Bopp (1898-1984)

foi poeta modernista e

diplomata brasileiro.

Figura 11 – No centro:

pintura ‘Abaporu’ (1928)

Os índios pensavam que ao comer carne humana,

propriamente a dos inimigos, eles iriam

adquirir suas qualidades e habilidades. Então

a antropofagia nasce com a mesma ideia, mas

com a proposta de devorar culturas, conhecimentos

externos e com a intenção de fortalecer

a nossa cultura, mas respeitando nossas matrizes

europeias e indígenas.

Apesar de marcar o início desse movimento, o

‘Abaporu’ não seria sua primeira pintura com

tais características. Essa fase já precedia antes

com a obra ‘A Negra’ (Paris, 1923). ‘A Negra’ era

descrita pela pintora como “figura sentada com

dois robustos toros de pernas cruzadas, uma

arroba de seio pesando sobre o braço, lábios

enormes, pendentes, cabeça proporcionalmente

pequena”.


31

No ‘Abaporu’, podemos ver a brasilidade nas

cores, na imagem de um homem nu e nos elementos

da natureza brasileira, além das grandes

influências estrangeiras, como proporções e

formas exageradas, características bastante

comuns no expressionismo.

O ‘‘Abaporu’ se desenvolveu de uma forma natural,

resultante da transformação de uma artista,

do amadurecimento das formas e do uso das

cores, com uma intensidade imaginária extraordinária,

em um estilo original de Tarsila.

Anos depois de ter pintado esses quadros,

Tarsila descreveu o ‘Abaporu’ como “uma figura

solitária monstruosa, pés imensos, sentada

numa planície verde, o braço dobrado repousando

num joelho, a mão sustentando o peso-pena

da cabecinha minúscula. Em frente, um cacto

explodindo numa flor absurda”. São inspirações

extraídas do seu subconsciente, talvez vinda de

histórias contadas durante a infância (1939 apud

AMARAL, 1975, p. 249).

Figura 12 – Pintura ‘A negra’ (1923)

“Segui apenas uma inspiração sem nunca prever os seus resultados.

Aquela figura monstruosa, de pés enormes, plantados no chão

brasileiro ao lado de um cacto, sugeriu a Oswald de Andrade a ideia da

terra, do homem nativo, selvagem, atropófago...” disse Tarsila anos

depois. (1943 apud AMARAL, 1975, p. 247)


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

Apesar de ser a mais importante, o Abaporu não

é a única obra que fez de Tarsila do Amaral um

dos principais nomes do modernismo brasileiro.

Dentre suas obras, podemos ver The Egg (Figura

16), The Moon (Figura 17) e Sol Poente (Figura

18), entre muitas outras.

A

B

C

Figura 13 – Obras de arte

da Tarsila do Amaral.

A – Pintura ‘The Egg’ (1928)

B – pintura ‘The Moon’ (1928)

C – Pintura ‘Sol Poente’ (1929)


33

2.6.1 Sobre Tarsila

do Amaral

Figura 14 – Pintura

“Auto-retrato” (1924)

Tarsila do Amaral nasceu na cidade de Capivari,

interior de São Paulo, em 1886. Ela iniciou os

estudos de modelagem e escultura em 1916 com

Zadig e Mantovani e, no ano seguinte, começou

o estudo de desenho e pintura. Quatro anos

após seu contato com a arte, Tarsila foi para

Paris se aperfeiçoar e lá acaba tendo contato

com pintores cubistas, dadaístas e futurista. Em

1922, ela já tem uma tela admitida no “Salon

Officiel des Artistes Français”.

Ao voltar para o Brasil (São Paulo), se integra

com grandes nomes do modernismo, como:

a Anita Malfatti, Oswald de Andrade, Mário de

Andrade e Menotti Del Picchia, formando o

“Grupo dos Cinco”.

Os estudos de Tarsila avançam e ela pinta sua

primeira tela “antropofágica”, ‘A Negra’, na qual

podemos ver cores mais fortes, ousadas e com

pinceladas mais marcadas, caracterizadas em

seu interesse por pintar elementos tipicamente

brasileiros.

Entre idas e vindas, Brasil — Europa, Tarsila

passa por altos e baixos em toda sua vida, expõe

suas obras em galerias muito importantes

no cenário mundial, torna-se diretoraconservadora

da Pinacoteca de São Paulo, se

separa de Oswald e vive a revolução em São

Paulo em 1932, onde é presa por um mês.

Continua pintando e viajando o mundo com

suas exposições.

Em 1973, no dia 17 de janeiro, Tarsila do Amaral

falece em São Paulo.


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

2.7

Extraindo cores

e formas

As obras da Tarsila do Amaral não nos inspiram apenas pelas figuras irreais

e os temas tropicais impressos em suas telas, mas também pelas composições

por cores vibrantes e tons terrosos extraordinários. No conjunto das

cinco obras, Abaporu, A Negra, Sol Poente, The Egg e The Moon, busquei

extrair um composto de cores únicas e contrastantes, na ideia de elaborar

estampas fortemente alegres e coloridas. Já o preto e vermelho são inspirações

das pinturas Kayapó, características marcantes no dia a dia da tribo.

Além das cores, há uma forte influência nas curvas e na deformidade das figuras.

Segundo João Gomes Filho, a distorção força e dramatiza o realismo

(2009, p. 96). A distorção também gera assimetria, e para que se chegue a

um resultado harmônico é necessário o uso de muitas forças, como contrastes

de cores e formas, buscando equilíbrio entre todos os elementos.

Esse conjunto de estampas busca na semelhança das peças formar composições

e trazer uma identidade artística pensada e projetada para que se

comuniquem. Como podemos ver na Gestalt, a igualdade de forma e de cor

desperta também a tendência de se construir unidades, isto é, de estabelecer

agrupamentos de partes semelhantes. (GOMES FILHO, 2009, p. 35)

C M Y K

29 87 92 20

C M Y K

43 82 38 38

C M Y K

31 48 75 26

C M Y K

4 20 80 0

C M Y K

4 8 15 0

C M Y K

30 40 63 0

C M Y K

0 55 85 0

C M Y K

67 26 87 10

C M Y K

87 30 90 30

Figura 15 – Painel

de cores CMYK.

C M Y K C M Y K

90 41 30 5 0 0 0 95


35

Figura 16 – Abaixo: painel de

cores do projeto de estampas.


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

2.8

Inspiração

Kayapó

Esse painel é formado por elementos da cultura da tribo Kayapó, como:

pintura corporal, adornos, culinária e ritual. O projeto deve usar como

inspiração as características visuais dispostas a seguir:

Aplicada no corpo, a pintura Kayapó ressalta a importância da cultura

regional da tribo, tanto em caráter estético como social. Pinturas feitas

a partir de materiais orgânicos, do vermelho extraído da semente do

urucum e do preto do miolo do jenipapo ou do pó de carvão, esses tons

contrastam com o marrom da pele. São as formas desenhadas, muitas

vezes inspiradas na fauna e na flora regionais, que valorizam a pintura

corporal da tribo. O cabelo feminino é raspado à moda típica dos Kayapó e

penteado com óleo de babaçu, que dá o brilho e ressalta o preto dos fios.

A

B

Figura 17 – Pinturas

corporais Kayapó.


C

37

D

A – Pintura facial com

tinta à base de urucum.

Fonte: Documentário

Mê`Ôk, Nossa Pintura

B –Pintura corporal com

tinta à base de jenipapo.

Foto: Pinar Yolacan

C – Pintura corporal. Fonte:

https://fotospublicas.com

D – Pintura corporal com

tinta à base de jenipapo.

Fonte: Site National

Geographic Brasil


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

Os adornos de cabeça, também conhecidos como diademas, são usados

tanto por homens como por mulheres, e na sua maioria são feitos com

plumas de pássaros nativos, como papagaios e araras. Em alguns casos

esses ornamentos plumários são feitos para celebração de rituais ou por

referências mitológicas. Além das plumas, os Kayapó usam enfeites como

pulseiras, tornozeleiras e braceletes feitos de contas.

A

Figura 18 – Adornos Kayapó.

A – Líder da tribo Kayapó

usa adornos na cabeça

e no pescoço.

Fonte: Site National

Geographic Brasil

B – Colares e saias de

contas. Fonte: https://

fotospublicas.com

C – Adornos na cabeça, no

pescoço e nas orelhas.

Fonte: Site National

Geographic Brasil

D – Índia usando colar

de contas amarela.

Fonte: Pinterest.

Foto: Jaime Ocampo Rangel


B

39

C

D


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

Na culinária, a carne do jabuti é uma das principais proteínas da alimentação

dos índios Kayapó. É um animal que pode sobreviver dias sem se

alimentar e sem beber água. Normalmente são caçados, armazenados e

preparados enrolados nas folhas de bananeira durante as celebrações.

Os peixes e outros animais próprios da região complementam a alimentação

dos Kayapó.

A

B

C

Figura 19 – Alimentos

dos Kayapó.

A – Jabuti. Fonte: https://

commons.wikimedia.org

Foto: Bernard Dupont

B – Índio com peixe. Fonte:

Instagram Kayapoproject

Foto: @everpires

Instagram Kayapoproject

C – Ao lado: Folha de

bananeira usada no

preparo da comida. Fonte:

Instagram Kayapoproject


A

B

41

Já nos rituais cênicos, como a tradicional “Festas das máscaras” os índios

tecem a sua fantasia com palha de buriti. Para enfeitar, usam penas e outros

elementos como ornamentos, e pintam detalhes com tinta a base de

urucum. Segundo Stephanie Ferreira, as máscaras são representadas por

macacos, tamanduás-bandeira e guaribas – kukuire, Pàt e Kubù, na língua

nativa –, todas personificadas por homens da nação Kayapó.

(EBC, 2014)

C

Figura 20 – Festa das Máscaras

A e B – Máscaras de

tamanduás-bandeira

usada pelos Kayapó.

Fonte: http://www.ebc.com.br/

noticias/colaborativo/2014/07/

indios-mebengokre-kayapomantem-viva-a-tradicaocom-festa-das-mascaras

Foto: André Amorim

C – Máscaras de macaco

usado pelos Kayapó.

Foto: David Carneiro


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

2.8.1

Signos no grafismo

dos Kayapó

“Defino signo como qualquer coisa que, de um

lado, é assim determinada por um Objeto e, de

outro, assim determina uma ideia na mente de

uma pessoa, esta última determinação, que denonimo

o Iterpretante do signo, é, desse modo,

mediatamente determinada por aquele Objeto.

Um signo, assim, tem uma relação triádica com

seu Objeto e com seu Interpretante.”

(CP 8.343 apud SANTAELLA, 2000, p. 12)

Signos são bastante presentes na arte indígena,

como a representação de algo / alguma coisa

através do grafismo. Como podemos ver no livro

Grafismo Indígena, Lux Vidal afirma que esses

grafismos “possuem denominações que se referem

a algum aspecto do meio ambiente — flora,

fauna — ou a um objeto de uso cotidiano — por

exemplo, uma caixinha de fósforos.”

(2000, p. 146)

Os grafismos na arte dos Kayapó, formados por

desenhos geométricos de linhas, triângulos e

quadrados, são reproduzidos em traços paralelos.

Em caráter decorativo, é comum ver a

aplicação desses desenhos na pintura corporal,

e também em objetos — por exemplo, em adornos

como: pulseiras, colares, cestarias e tecidos,

entre outros.

Como descreve Lux Vidal, “Ao nível do sensível,

do visual, esse meio de classificação e de comunicação,

que, ao mesmo tempo aproxima e dife-

Figura 21 – Ao lado: Pintura

facial. Fonte: https://noticias.

uol.com.br/album/2017/12/07/

indios-xicrin-no-para.htm

Foto: José Cícero da

Silva/Agência Pública


43

rencia domínios culturais, categorias de pessoas

e eventos, se apresenta por meio de um sistema

de representações gráficas extremamente elaborado

e muito valorizado pelos próprios índios:

um recurso para a reafirmação constante de

uma ideia e de um ideal.” (2000, p. 144)

Para muitas pessoas, esses signos podem

ser vistos apenas como algo aparentemente

bonito e não representar nada além do ‘belo’,

mas, no momento que a pessoa / interpretante

dessa arte entenda o que aquele traço

representa, toda a arte passa a ter um sentido

representativo.

“Todo interpretante é um signo, assim como

todo signo é um interpretante. Note-se, porém,

que não há nenhuma circularidade nisso, uma

vez que aquilo que efetivamente define o processo

de representação não são os substantivos

(objeto-signo-interpretante), mas as relações

diferenciais de implicação e determinação entre

eles. Numa semiose genuína, esses três elementos

têm natureza sígnica. O primeiro chama-se

signo porque representa o objeto; o segundo se

chama objeto porque determina o signo; o terceiro

se chama interpretante porque é determinado

imediatamente pelo signo e mediatamente

pelo objeto.” (2000, p. 66).

Figura 22 – Pinturas

sobre tecidos.

Abaixo, à esquerda: Pintura

‘casco de jaboti’ em tecido .

Fonte: https://envolverde.

cartacapital.com.br/

mulheres-kayapo-geramrenda-e-ganham-mercadocom-seus-trabalhos

Abaixo, à direita: Pintura

das mulheres Kayapó da

aldeia Kubenkokre.

Fonte: https:/www.picuki.com/

media/2175095780264613389

A ideia de trazer aqui essa representação do

grafismo como um signo, nada mais é do que

buscar entender um pouco o que essas figuras

transmitem em sua simbologia.

Por fim, para entendermos um pouco mais essa

relação triádica do signo, Santaella conclui que


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

2.8.2

Estilo e identidade

dos grafismos

Provavelmente esse estilo de grafismo não nasceu

com os Kayapó, mas faz parte de uma constante

transformação e de ideais que o tempo nos

proporciona. Para entender as influências por

trás desses grafismos, Horst Bredekamp define,

“Entendo por estilo os traços comuns e reconhecíveis

de uma configuração transindividual.

Para isso devem estar presentes dois elementos:

pelo menos duas pessoas projetando e duas

obras que, apesar de terem surgido independentemente

uma da outra, são muito similares,

apresentando algumas evidentes características

em comum. Isso é uma definição do conceito de

estilo na história da arte pelo mínimo denominador

comum.”(2008 apud BONSIEPE, 2011, p. 52).

Podemos relembrar, lá no capítulo 2.4

(Introdução à cultura indígena brasileira), sobre

as matrizes tupis e se aprofundarmos mais nas

origens de cada tribo, vamos conseguir entender

melhor como um estilo nasce e quais as suas

influências.

Cada tribo, através do seu estilo, consegue ter

sua própria identidade. No estilo da pintura,

nos desenhos do grafismo ou até mesmo nos

adornos utilizados. O grupo de signos acabam

trazendo uma identidade para a tribo. Nesse

caso, quando falamos de identidade, não é a de

um logotipo, apesar de podermos pensar nessa

identidade como marca, mas uma marca que

seja transmitida pelos grafismos por meio do

modo no qual eles são usados.

Na definição de branding, Robert Paulmann diz

que identidade se define como “a soma de todas

as características que tornam uma marca [...]

inconfundível e singular.” (2005, p. 125 apud

BONSIEPE, 2011, p. 55)

Essa singularidade é fortemente presente na tribo

Kayapó, tanto que alguns grafismos possuem

denominações e estilos próprios. Na contínua

exploração do livro Grafismo Indígena, segundo

Lux Vidal, “temos uma grande variedade de

referenciais por intermédio de motivos abstratos:

peixes, aves, antas, onças, veados, plantas,

cobras e quelônios, ou mesmo de rastro destes

animais, o que remete a outro nível ele correspondências

cosmológicas, no qual os próprios

Kayapó se consideram inseridos.” (2000, p. 144)

Além desses grafismos citados no parágrafo anterior,

existem outros, sem possuir a representação

de algo, apenas por motivos decorativos,

como é o caso da variedade de grafismos em

zigue-zague e quadriculados, muito presentes

nas pinturas corporais.

Por fim, na página ao lado, podemos ver em um

conjunto de figuras alguns exemplos das estruturas

desses grafismos.


45

A

E

F

B

G

Figura 23 – Acima: pintura

corporal. Fonte: Documentário

Mê`Ôk, Nossa Pintura.

Figura 24 – Ao lado:

Ilustrações de grafismos

usados pela tribo Kayapó.

C

H

A – Casco de Jabuti

B – Casco de jabuti ou

vértebra de cobra

C – Espinho de peixe

D– Vértebra de cobra

E – Borboleta

F – Caixinha de fósforos

G – Zigue-zague

H – Palmeira tucum

D

Fonte: Livro Grafismos

Indígenas



3

ESTUDO DE CASOS

A busca por referências visuais é o que nos propõe a entender se algo parecido

já foi feito. É através dessas referências que podemos compreender

como alguns designers podem criar algo se baseando em algum artista,

movimento ou inspirando-se em alguma arte.

Como o projeto Kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

propõe a criação de estampas a partir da junção de elementos e

valores culturais indígenas, que se inspiram nos traços das obras da artista

brasileira Tarsila do Amaral, a busca é baseada em designs de superfícies

que imprimem elementos característicos a esse projeto.

Quando se trata de criação, Tarsila é uma das principais referências de arte

do modernismo brasileiro, uma mulher que viveu à frente do seu tempo e

que continua influenciando muitos ‘designers’ até hoje.

No campo de design de superfície, localizei três projetos brasileiros que

desenvolveram grandes trabalhos comerciais inspirados na obra de Tarsila,

um trabalho diferente do outro, mas nenhum que se inspirasse em sua

arte para desenvolver algo que fortalecesse a arte indígena. Dentre esses

profissionais, dois são formados em outras áreas, mas acabaram migrando

para o design de superfície. Para completar essa pesquisa, fechamos

com um conjunto de ilustrações inspiradas na tribo Kayapó, feitas por uma

designer gráfica russa.


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

3.1

Projetos

referenciais

Bárbara Penaforte é designer de moda formada em Recife, mas atua em

São Paulo no ramo de design de superfície. Possui habilidade para o desenho

de moda, na área têxtil, mas decidiu criar uma linha para o universo

das porcelanas, batizadas como coleção ‘Cores de Tarsila’.

No projeto dela, podemos ver o uso de cores vibrantes em formas abstratas

aplicadas de diferentes maneiras na porcelana. Há uma grande variedade

de objetos, como pratos, vasos, garrafas e canecas. Não está muito

claro que há uma comunicação direta com as obras da Tarsila do Amaral,

porém o traço e uso das formas são semelhantes.

Figura 25 – Porcelanas da coleção ‘Cores de Tarsila’.

Foto: arquivo pessoal / Bárbara Penaforte


49

Já a artista plástica pernambucana Dani Acioli fez um conjunto de

desenhos para a área têxtil em homenagem à pintora Tarsila do Amaral,

chamado coleção ‘Para Tarsila’. Dani se inspira em obras como o Abaporu

e usa a figura feminina como ícone principal da sua arte.

A inspiração dela é bastante diferente da designer Bárbara Penaforte, pois

usa como inspiração a figura humana, não apenas no traço, mas também

busca na semelhança conjuntural com as obras da Tarsila. São cores e

ilustrações que trazem muita similaridade com as da pintora.

Figura 26 – Acima

(esquerda, centro e direita):

Coleção ‘Para Tarsila’.

Fonte: https://www.

diariodepernambuco.com.

br/noticia/viver/2015/12/

artista-visual-pernambucanalanca-colecao-inspiradaem-tarsila-do-amar.html

Ao lado: Coleção ‘Para

Tarsila’ aplicada em roupas.

Foto: Andrea Rego Barros


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

O terceiro projeto é o da “by Kamy”, uma das

principais marcas de tapete do Brasil. A empresa

tem um time de designers que desenhou uma série

de almofadas inspiradas nas obras da artista

Tarsila do Amaral, com a curadoria da Tarsilinha

(sobrinha-neta da artista).

A

O conjunto de almofadas tem características

similares ao traço da Tarsila. Em um dos casos é

praticamente uma releitura de uma obra dela,

como se vê na almofada “A negra”, que leva o

mesmo nome de uma das principais obras da

Tarsila, de 1923. Em outros objetos também podemos

ver as formas desproporcionais aplicadas

nos desenhos.

B C D

Figura 27 – Conjunto de

almofadas by Kamy.

A – Almofada Tarsila A Negra 1.

B – Almofada Tarsila Mulher.

C – Almofada Tarsila

Pau Brasil

D – Almofada Tarsila Saci

Design by Kamy

Como podemos perceber nesse trabalho e nos

outros dois mencionados aqui, não há nenhum

elemento que tenha semelhança com a arte

Kayapó, como o uso de grafismos vistos no

capítulo 2.9 O grafismo dos Kayapó. Os três são

projetos únicos, diferentes uns dos outros e

cada qual com sua característica.

Como diz Ricardo Bercht, diretor da Porcelanas

Vista Alegre do Brasil (apud RUBIM, 2004, p. 11),

o design nunca será apenas uma característica

visual, mas sim um conceito. Conceito repre-

sentado através de pesquisas de tendências

do mercado que se fundem, sempre buscando

comunicar a linguagem de um determinado

produto.

Isso me leva a pensar que cada designer tem

um olhar e que seu repertório e suas pesquisas

influenciam diretamente na criação. Mesmo que

cada arte dessas pareça ter sido projetada para

uma única superfície, não significa que a mesma

não possa ser aplicada de outra maneira ou/em

outro material.


51

Para concluir, na busca por estampas e ilustrações inspiradas na tribo

Kayapó, encontrei no Behance uma designer russa chamada Anastasia

Olendskaya, que criou uma série se ilustrações para a revista National Geographic.

Apesar de não haver semelhança com Tarsila do Amaral (característica

proposta nesse projeto), o jogo de cores e grafismos indígenas

se torna uma forte referência e se assemelha com o propósito desse Trabalho

de Conclusão de Curso.

Nesse processo, não me cabe julgar se estão corretas ou não as referências

que cada designer buscou e o resultado atingido. Como disse Lionello

Venturini, “Não existe uma ciência do belo, mas apenas a sua crítica, e

não existem belas ciências, mas apenas belas-artes.” (1984, p. 164 apud

BOMENY, 2012, p. 17).

Figura 28 – Acima: Kayapó

illustrations. Fonte:

https://www.behance.

net/anastasiaoe6ac



4

ESTAMPAS

“Eu presto muita atenção na variedade de formas e tamanhos, e posiciono

objetos de modo que as linhas e contornos criem um ritmo, conduzindo o

olhar do observador ao redor da imagem e ao ponto central.”

(FOROSTOVSKII apud LUPTON; PHILLIPS, 2008, p. 29)

Como já citado anteriormente, as pinturas de Tarsila do Amaral são muito

ricas em traços orgânicos e assimétricos, já as pinturas geométricas

usadas pelos Kayapó são simétricas, que buscam através da repetição do

traço o equilíbrio e o ritmo.

Segundo Lupton e Phillips (2008), ponto, linha e plano compõem os alicerces

do design. São diagramas construídos a partir desses elementos que

chegamos na criação de imagens, ícones, texturas e padrões visuais.

Com base nisso, as estampas a seguir mostram o equilíbrio por meio de

formas e cores, a assimetria e a deformação feita por programas com

base vetorial usando as tradicionais curvas bézier. É uma mistura de

grafismo indígena com formas abstratas, traduzidas através de imagens

que representam a riqueza da cultura e da arte dos índios Kayapó. É uma

mistura ilustrativa de personagens e grafismo, que trazem em suas características

o desequilíbrio da forma humana, forte inspiração nas pinturas

de Tarsila do Amaral.


KAYAPÓ: MANIFESTANDO A ARTE ATRAVÉS DO DESIGN DE SUPERFÍCIE

4.1

Esboços

Os esboços de desenhos feitos à mão livre tem como referência o capítulo

2.8 (Inspiração Kayapó) e as cinco obras escolhidas de Tarsila do Amaral,

presentes no capítulo 2.6 (Inspiração antropofágica). A partir dessas inspirações

cheguei a esse conjunto de esboços. Esses desenhos fazem parte

da figura central de cada estampa do projeto Kayapó: manifestando a

arte através do design de superfície.

A

B

Figura 29 – Ao lado: Esboços

dos elementos Kayapó.

A – Adornos de cabeça e pescoço

B – Pintura corporal

C – Fantasia tamanduá-bandeira

D– Jaboti

E – Folhas de bananeira

F – Máscara de macaco

G – Peixe


55

C

D

F

E

G


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

4.2

Experimentações

Nessas ilustrações, procurei o contraste de uma figura central com grafismo

aplicado sobre o fundo, e testei cores e formas que se comunicassem

com elas mesmas e com as demais ilustrações do conjunto. Na figura 53

(abaixo) existe uma mistura dos tradicionais grafismos aplicados no fundo,

o vermelho da pintura feita com urucum e o preto que busquei na referência

da tinta do jenipapo. Já na página ao lado, deixei apenas os grafismos

aplicados sobre a ilustração central e sobre os elementos da cultura

Kayapó. As figuras abstratas circulares, aplicadas em todas as ilustrações,

são uma referência ao isolamento da tribo e à forma que constroem as

suas aldeias. Nesse conjunto, experimentei aplicações mais limpas, mais

sólidas, valorizando mais as cores e as figuras centrais de cada estampa.

Figura 30 – À direita:

experimentação 1, com

grafismos aplicados no fundo.

Figura 31 – Na página ao

lado: experimentação 2, sem

grafismos aplicados no fundo.



kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

Combinações de cores, contrastes e formas

também foram experimentações feitas durante

o desenvolvimento desse projeto de estampas.

Como Munari disse, “O design visual ocupa-

-se de imagens que têm a função de dar uma

comunicação visual e uma informação visual:

signos, sinais, símbolos, significados das formas

e das cores, relações umas com as outras.”

(MUNARI, 1976, p. 24 apud BOMENY, 2012, p. 29)

O estilo se desenvolve a partir dos testes e

combinações realizados durante a fase de

criação. É claro que as influências que buscamos

durante esse processo criativo implica no

resultado lógico.

A linguagem visual faz parte da comunicação

gráfica que a estampa deve seguir. O equilíbrio

entre as formas abstratas e coloridas, as

ilustrações dos elementos da cultura Kayapó

e o grafismo da tribo é o que traz ritmo para o

conjunto de estampas.

“Em design, o equilíbrio age como uma baliza

para a forma — ele ancora e ativa elementos

no espaço. Você já percebeu seu olhar preso

num ponto específico ao observar um projeto

mal resolvido? Essa desarmonia normalmente

ocorre porque a proporção e a localização dos

elementos, em relação a si próprios e ao espaço

negativo, estão ruins — grandes demais, apertados

demais, desalinhados e assim por diante.”

(LUPTON; PHILLIPS, 2008, p. 29)

Nesse caso, o equilíbrio que procuro não é na

repetição de traços idênticos, ou na formação simétrica

de ambos os lados da peça gráfica. São

ilustrações que buscam o equilíbrio no conjunto

em geral, com uma forma sobrepondo a outra,

explorando a assimetria na composição da arte.

Figura 32 – Conjunto

de formas abstratas.


59

4.3

Estampas finais

Uma metodologia projetual serve de base para alcançarmos o melhor

resultado possível a partir de um problema. Como visto anteriormente, a

problemática principal desse projeto é a de ‘capturar elementos e signos

do costume regional de uma tribo indígena e transformá-los em referências

visuais inspiradas no movimento artístico antropofágico de Tarsila do

Amaral’. Sendo assim, esse projeto de estampas, além de representar uma

cultura regional, também representará uma artista.

Além de estético, deve ser flexível e adaptável, ao ponto de ser aplicável

em diversos formatos de superfícies, objetos redondos, quadrados, retangulares

e materiais como tecidos, cerâmicas, papéis e outros.

“A estética é apenas um dos fatores, entre muitos, com os quais o designer

de produtos trabalha, não sendo o mais importante e nem tampouco aquele

dominante. Ao lado do fator estético, existem os fatores da produção, da

engenharia, da economia e também dos aspectos simbólicos.”

(MALDONADO, 1958 apud BONSIEPE, 2011, p. 53)

Com base nos estudos e experimentações em software vetorial, as ilustrações

finais que veremos a seguir foram desenvolvidas com a ideia de

serem únicas, onde cada uma dessas estampas possue um conjunto de

grafismos, figuras, adornos e elementos do cotidiano dos Kayapó, simbologicamente

representados a partir da temática escolhida.


kayapó: manifestando a arte através do design de superfície

Figura 33 – Estampa:

A índia Kayapó.

A estampa ‘A índia Kayapó’, como já diz o nome, é uma homenagem à mulher indígena da tribo

Kayapó, que carrega consigo a criatividade e responsabilidade da pintura corporal em seu próprio

corpo e também da sua família. A figura central é uma releitura estilizada da pintura ‘A negra’ com

algumas características da pintura corporal da mulher Kayapó. Os grafismos ao fundo representam

outras pinturas usadas no dia a dia da tribo.


61

Figura 34 – Estampa:

Diadema.

‘Diadema’ é um dos objetos usados para representar os adornos utilizados nas cabeças dos indígenas.

Essa estampa representa a riqueza cultural dos utensílios usados por toda a tribo, desde os

colares de contas até as plumarias colocadas na cabeça. Os desenhos de fundo representam alguns

dos grafismos usados nesses trabalhos.


KAYAPÓ: MANIFESTANDO A ARTE ATRAVÉS DO DESIGN DE SUPERFÍCIE

Figura 35 – Estampa:

O essencial da caça.

Já sabemos que a alimentação indígena é muito saudável e que jabutis e peixes estão entre as proteínas

mais consumidas na aldeia. Além do consumo da banana na alimentação, eles também usam

a casca da bananeira para cobrir as carnes que são assadas na brasa. Os grafismos dessas estampas

são símbolos que representam espinhas de peixes e cascos de jabuti. Por isso, essa estampa ganhou

o nome de ‘O essencial da caça’.


63

Figura 36 – Estampa:

Festa das Máscaras.

Como figura central, as ilustrações das máscaras de macaco e tamanduá-bandeira representam a

tradicional ‘Festa das Máscaras’, um dos principais ritos de nominação da tribo Kayapó. Ao fundo,

grafismos circulares representam uma mistura de palhas usadas na fantasia e as tradicionais pinturas

corporais. Como podemos ver no conjunto dessas quatro estampas, o formato circular de fundo

é a representação da formação da aldeia.


KAYAPÓ: MANIFESTANDO A ARTE ATRAVÉS DO DESIGN DE SUPERFÍCIE

4.4

Aplicações

A

Figura 37 – Aplicações das

estampas em objetos.

A – Aplicação em

camiseta gola careca.

B – Aplicação em scketchbook.

C – Aplicação em poster de papel.

D – Aplicação em prato

de porcelana.

E e F – Aplicação em canecas

de porcelana.


65

C

B

D

F

E


G

H

I


K

J

L

G – Aplicação em pratos de

porcelana de parede.

H – Aplicação em camiseta

regata feminina.

I – Aplicação em bolsa de tecido.

J – Aplicação em capas de celular.

K – Aplicação em caderno espiral.

L – Aplicação em quadro

com moldura retangular.


M

N

O

M – Aplicação em quadro

com moldura quadrada.

N – Aplicação em almofada.

O – Aplicação em caneca

de porcelana.

P – Aplicação em quadro

com moldura retangular.

Q – Aplicação em prato

de porcelana.

R – Aplicação em quadro com

moldura retangular horizontal.

S – Aplicação em caneca

de porcelana.


P

Q

R

S



5

CONSIDERAÇÕES

FINAIS

Aprender algo novo é sempre um desafio, ainda mais quando se trata de

algo na área que gostamos. No campo de design, sempre fui apaixonado

por estampas e impressos em superfícies, mas nunca tive o prazer de trabalhar

com isso profissionalmente, apesar de já ter me arriscado na área

de estampas para camisetas como profissional freelancer.

Esse projeto de pesquisa, assim como o período de estudos na pós-graduação,

serviu como uma espécie de restarte na minha carreira, Devo voltar

a pensar na área de design de superfície com mais carinho e, quem sabe,

me arriscar em novos desafios profissionais.

Essa pesquisa sociocultural me trouxe uma visão ampla da cultura dos

índios Kayapó, assim como a vida e a arte da grande pintora Tarsila do

Amaral. Nesse projeto, as duas artes se transformaram e passaram a ser

vistas no formato digital, sem o uso de tintas naturais ou telas de pintura.

É uma nova forma de expressar a arte, através da tecnologia.

No início, tudo o que eu pensava era em formas orgânicas e abstratas, e

em procurar representar ambas as artes através de manchas e símbolos,

mas durante o processo de pesquisa, vi que a ilustração seria a melhor

forma de apresentar um conjunto de estampas que trouxesse em sua

essência os elementos escolhidos durante a pesquisa. Espero que, assim

como eu, outras pessoas possam ver e entender essa simbologia em cada

design elaborado nesse trabalho de conclusão.


Referências

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tempo. Vol. 1. São Paulo: Editora Perspectiva,

1975.

MORAES, Dijon de. Metaprojeto: o design do

design. São Paulo: Blücher, 2010.

BOMENY, M. H. W. O panorama do design gráfico

contemporâneo: a construção, a desconstrução

e a nova ordem. São Paulo: Senac, 2012.

BONSIEPE, Gui. Design, cultura e sociedade. São

Paulo: Blucher, 2011.

FREITAS, Renata Oliveira Teixeira de. Design de

superfície: ações comunicacionais táteis nos

processos de criação. 2. ed. São Paulo: Blucher,

2018.

GOMES FILHO, João. Gestalt do Objeto: Sistema

de leitura visual da forma. 9. ed. São Paulo:

Escritura Editora, 2009.

HOLLIS, Richard. Design Gráfico: Uma história

concisa. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

LUPTON, Ellen; PHILLIPS, Jennifer Cole. Novos

fundamentos do design. Trad.: Cristian Borges.

São Paulo: Cosac Naify, 2008.

MUNARI, Bruno. Das Coisas Nascem Coisas. 2.

ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008.

RUBIM, Renata. Desenhando a superfície. 3. ed.

rev. ampl. São Paulo: Rosari, 2013.

RÜTHSCHILLING, Evelise Anicet. Design de

superfície. Porto Alegre: UFRGS, 2008.

SAMPAIO, Luis Carlos da Silva; TARDIVO, Veruska

P. Kayapó Kukrãdjà: Manifestações culturais dos

povos indígenas. Revista Científica ANAP Brasil,

São Paulo, v. 3, n. 3, p. 11-26, jul. 2010.

SANTAELLA, L. A teoria geral dos signos: como

as linguagens significam as coisas. São Paulo:

Pioneira Thomson Learning, 2000.

SILVA, Aracy Lopes da; VELTHEM, Lúcia Hussak

uan. Índios no Brasil: organizado por Luís

Donisete Benzi Grupioni. 2. edição. Brasília:

Ministério da Educação e do Desporto, 1994.


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história e mudança social, de comunidades

autônomas para a coexistência interétnica .

In. Manuela Carneiro da Cunha (org.). História

dos índios no Brasil. São Paulo: Fapesp/SMC/

Companhia das Letras. 1992. pp. 311-338.

VIDAL, Lux. Grafismo indígena: estudos de

antropologia estética. 2. ed. FAPESP: Editora da

Universidade de São Paulo, 2000.

CAIAPÓ Metutire. Direção: Vito D’Alessio.

Dialeto / TV Cultura. 2004, 26 min, color.

Disponível em: <https://www.youtube.com/

watch?v=BPiL1qUL6ho&t>. Acesso em: 9 jan. 2020.

CIÊNCIA dos Índios Kaiapó. Direção: Ricardo

Monte Rosa. CPCE Universidade de Brasília.

1988, 25 min, color. Disponível em: <https://

www.youtube.com/watch?v=ysEKi8pD1C0&t>.

Acesso em: 9 jan. 2020.

ZUCON, Otávio; BRAGA, Geslline Giovana.

Introdução às culturas populares no Brasil.

InterSaberes, 2013.

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Kayapó mantêm viva a tradição com Festa das

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www.ebc.com.br/noticias/colaborativo/2014/07/

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LINS, Larissa. Artista visual pernambucana lança

coleção inspirada em Tarsila do Amaral. Diário

de Pernambuco, 2015. Disponível em: https://

www.diariodepernambuco.com.br/noticia/

viver/2015/12/artista-visual-pernambucanalanca-colecao-inspirada-em-tarsila-do-amar.

html. Acesso em: 01 mar. 2020.


MENEZES, Brunella. Designer fala da paixão por

estampas e afirma: “Não se limita a um produto

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https://archtrends.com/blog/designer-defende-

o-uso-de-estampas-e-garante-nao-se-limita-

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MEBÊNGÔKRE (Kayapó). Povos

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(Kayap%C3%B3). Acesso em: 08 de jan. de 2020.

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PECCINI, Leo. Design Gráfico (atuação).

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MÊ’ÔK. Direção: Thiago Oliveira e Fábio

Nascimento. Fotografia: Fábio Nascimento. 2014,

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BR>. Acesso em: 9 jan. 2020.

O POVO brasileiro: a formação e o sentido do

Brasil. Direção: Darcy Ribeiro e Isa Grinspum

Ferraz. Capítulo 1, Matriz Tupi. 26 min, color.

Disponível em: https://www.youtube.com/

watch?v=rQOPdiEdX24. Acesso em: 09 nov. 2001.



‘Kayapó: manifestando a arte através do design

de superfície’ é um projeto de conclusão de curso,

exigido para obtenção do grau de especialista em

Design Gráfico.

Sob orientação da prof.a Me Sandra Tucci, o

designer gráfico Anderson Oliveira desenvolveu

um conjunto de estampas após uma breve

pesquisa sobre a tribo indígena Kayapó. Além

da tribo, o autor buscou inspirações em algumas

das famosas obras da artista brasileira Tarsila do

Amaral, explorando os traços, cores e signos e

transformando-os em design de superfície.

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