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Dumplin - Julie Murphy

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— E também vai acompanhá-la no concurso. Foi tão fofo. E ele até deu um beijo no rosto dela. Foi a<br />

coisa mais ousada que eu já tinha visto.<br />

A aula continua se arrastando, e eu me pergunto o quanto sou idiota por esperar que Millie fosse<br />

humilhada. Se ela antes tivesse pedido a minha opinião, eu teria dito que a ideia era fofa, mas teria feito<br />

o possível para que não a pusesse em prática. Não por achar que ela não merece ir ao baile e ter um<br />

acompanhante, e sim por não querer que seja alvo de deboche. Nunca desejaria uma experiência dessas<br />

para ninguém. E, mesmo assim, Millie já passou por isso. Ela já serviu de exemplo de infinitas piadas.<br />

Mas lá está a garota, totalmente na dela, sem dar a mínima para o que os outros vão pensar.<br />

Quase me dói saber que ela está se aventurando de uma maneira tão corajosa. É como ver uma velha<br />

amiga de quem você se afastou e se lembrar de todas as experiências que compartilharam.<br />

A aula acaba e sou empurrada pela porta por uma enxurrada de alunos. Posso ouvir Bo conversando<br />

com José Herrera sobre trigonometria e depois sobre uma festa.<br />

No corredor, uma parede de garotas nos detém. Estão de mãos dadas, como numa partida de Red<br />

Rover.*<br />

* Jogo em que os participantes de um time devem ficar de mãos dadas (como um cordão de isolamento), enquanto um participante do time<br />

adversário tenta romper o cordão. (N.T.)<br />

— Desculpe pelo atraso — diz uma delas.<br />

— Só vai demorar um minuto — acrescenta outra.<br />

Bekah Cotter está atrás da galera, usando um shortinho jeans, sapatilhas douradas e uma T-shirt branca<br />

vários números acima do seu, com um nozinho amarrado às costas. Os dizeres em silkscreen são: Vem ao<br />

Baile da Maria Cebola comigo... Ela gira um bastão entre os dedos, esperando que o pessoal se aquiete.<br />

Amanda está atrás de mim, flexionando os dedos dos pés.<br />

— Só de olhar para esse short minha calcinha já entra na bunda.<br />

Bekah respira fundo e, sem anunciar, gira o bastão no ar, atirando-o sobre o ombro para apanhá-lo em<br />

seguida, enquanto faz uma ginástica tão brusca e rápida que mal dá para acompanhar. É o máximo, e,<br />

ainda assim, nem um décimo tão complicado como o que já a vi fazer nas partidas de futebol americano.<br />

Seu talento vai arrasar no concurso.<br />

Ela lança o bastão para o alto e faz o mesmo tipo de rotação doida, e então pousa de costas e pega o<br />

bastão no instante em que ele se encontra prestes a cair no chão. Quando seu traseiro está em pleno ar,<br />

fica claro quem ela vai convidar para o baile. Em cada um dos bolsos do shortinho jeans estão as letras B<br />

e O em glitter.<br />

Os colegas da aula de história o empurram até a frente das garotas. Ele sorri, e mal tenho coragem de<br />

olhar quando Bekah segura sua mão. Bo dá uma olhada para o lado, e eu sei que me vê. Mas não há<br />

tempo para decisão ou pensamento. Ele concorda. E agora eles são Bekah e Bo. Bo e Bekah.<br />

Empurro Amanda da minha frente e vou abrindo caminho por entre o tráfego de alunos que se dirigem<br />

ao estacionamento. Com os olhos fixos no chão, observo o mar de pés até encontrar um banheiro. Fico de<br />

joelhos e reviro a mochila, procurando uma coisa. O celular? Uma granada?<br />

No fundo da mochila, encontro um marcador permanente. Retiro a tampa, me viro para o espelho e,<br />

como a pessoa totalmente sã que eu sou, começo a escrever na minha própria testa.<br />

Eu não havia refletido sobre a logística de ir do ponto A ao ponto B enquanto estava<br />

escrevendo na testa. Só depois de me olhar no espelho é que me dou conta de que<br />

agora não tem mais volta. Mesmo que eu queira, acho que é chamado de marcador permanente por uma<br />

razão.<br />

Andando até o estacionamento o mais depressa possível, jogo os cabelos por cima do rosto, como o<br />

Primo Coisa da Família Addams, confiando na visão que me resta por entre os fios e rezando ao Menino<br />

Jesus para não ser atropelada.<br />

E lá está ele. Caminhando até o seu carro.<br />

— Mitch! — grito. — Mitch!<br />

Essa foi uma péssima ideia. Aliás, acho que é seguro dizer que todas as minhas ideias são péssimas.<br />

Ele se vira.<br />

— Will? — Seu rosto se contrai, deixando transparecer a preocupação. — Aconteceu alguma coisa?<br />

Você está bem?<br />

Quando chego a alguns passos dele, jogo os cabelos para trás, deixando que veja meu rosto.<br />

Sua preocupação se transforma em perplexidade.<br />

— alobeC airaM on somaV<br />

— Merda — murmuro. — Escrevi na frente do espelho.

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