Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
1 INTRODUÇÃO<br />
2 CONCEITO<br />
As operações de fomento mercantil, como conhecido por todos os operadores,<br />
nem sempre geram documentos com exequibilidade clara e extreme de dúvidas.<br />
Por vezes, se fazem necessárias manobras estratégicas perante o devedor, seja<br />
ele sacado ou cedente, para que possamos qualificar melhor o documento que<br />
expresse a dívida havida, sob pena de amargar o credor pela demora e dificuldade<br />
de condução de um processo de conhecimento onde, nem sempre, os institutos do<br />
fomento mercantil são de pleno conhecimento dos Julgadores.<br />
Ademais, a falta de liquidez e certeza, requisitos básicos para a formação de um<br />
título executivo extrajudicial, por vezes culminam em sucumbências altíssimas<br />
para a empresa de fomento mercantil, caso intentada a ação de execução sem a<br />
observância dos requisitos referidos acima.<br />
Cabe salientar que as alterações havidas do Código de Processo Cível, no que se<br />
refere ao processo de execução, suprimiu a garantia do Juízo “plea” via da penhora<br />
de bens, como necessidade e pré-requisito para que o devedor interponha os<br />
seus embargos.<br />
Assim, a penhora de bens, que era usada como ferramenta de cobrança e coação<br />
ao pagamento, deixa de ter a força que anteriormente possuía, posto que, repita-se,<br />
a execução pode ser embargada sem a necessidade de penhora, subtraindo esta<br />
ferramenta que, por vezes, mesmo diante de uma execução mal formada, conscientemente,<br />
era usada como elemento de pressão ao devedor. Em vista da penhora de<br />
bens, havia a possibilidade de um acordo ou pagamento da dívida.<br />
Com efeito, a assinatura de uma confissão de dívida gera no credor a expectativa<br />
de que ela venha a ser efetivamente cumprida, caso contrário não teria utilidade<br />
prática e negocial alguma.<br />
Dito isso, faz-se necessário que o empresário de fomento mercantil, e seu<br />
respectivo departamento jurídico, tenha claro que o instituto da confissão de dívida<br />
deve ser usado não só como uma forma de recebimento amigável do devido como,<br />
naqueles casos onde é flagrante que não será cumprido pelo devedor, viabilizar a<br />
qualificação do documento da dívida, gerando um título executivo extrajudicial e,<br />
como tal, evitar o ajuizamento de execuções mal documentadas, ou suprimir a<br />
etapa do processo de conhecimento, atendendo os requisitos do art. 585, I, do<br />
Código de Processo Civil.<br />
Noutras palavras: estamos falando do uso racional da confissão de dívida,<br />
afastando desde logo a expectativa de cumprimento amigável do instrumento, mas<br />
otimizando e qualificado o documento de crédito, que agora passa a ser um título<br />
executivo extrajudicial, nos termos do art. 585, I, do Código de Processo Civil.<br />
A confissão de dívida, ou comumente chamada de novação, nos termos do art.<br />
360 e seguintes do Novo Código Civil, pode ser conceituada como o ato jurídico<br />
que põe termo a uma obrigação, através de uma nova obrigação, criada especialmente<br />
para substituí-la.
Particularmente entendo pouco palatável o termo confissão de dívida,<br />
ainda mais no que se refere aos contratos de fomento mercantil, quando<br />
utilizadas para a recompra de duplicatas.<br />
Ao contrário do que a terminologia do documento expressa, o cedente, no<br />
ato da assinatura do termo, não está confessando absolutamente nada, apenas<br />
está exercendo o dever de recompra de títulos viciados ou simplesmente<br />
inadimplidos, por força de cláusula expressa no contrato de fomento mercantil,<br />
que permite e obriga a recompra.<br />
De qualquer sorte, para fins do presente texto, usaremos a expressão<br />
sedimentada, denominada de confissão de dívida.<br />
Dito isso, de forma direta e simples, para as operações de fomento<br />
mercantil a confissão de dívida nada mais é que uma forma de resolver a<br />
inadimplência do sacado-devedor, ou do cedente, quando não consegue mais<br />
realizar a recompra de todos os títulos pendentes de liquidação.<br />
Assim, a forma de adequar a situação é a regularização mediante o<br />
parcelamento do saldo devedor oriundo, no caso do cedente, de títulos não<br />
recomprados, à vista, ou mediante novas operações, ensejando a confecção<br />
da peça contratual que denominamos comumente de confissão de dívida,<br />
podendo agregar outras avenças e garantias.<br />
Inobstante ao nome dado ao instituto, cabe dizer que a confissão de<br />
dívida, ou termo de recompra parcelado ou mesmo novação:<br />
Deve ser expresso, constando em contrato formal escrito, com todas as<br />
suas cláusulas. Está errado a simples emissão de novo borderô de<br />
recompra parcelada, com a recepção de diversos cheques pós-datados,<br />
emitidos pelo cedente, por exemplo, sem documento formal que lhe dê<br />
origem. Tal prática pode ser considerada, justamente por falta de<br />
documento que a fundamente, como mútuo havido com a empresacliente.<br />
A<br />
É voluntário, ou seja, é firmado pelas partes por ato voluntário e não<br />
por obrigação legal ou contratual. Assim mesmo que o contrato de<br />
fomento mercantil tenha cláusula expressa de recompra dos títulos por<br />
simples inadimplemento, o cedente não está obrigado a firmar uma<br />
confissão de dívida. A sua obrigação é a recompra, que pode ser<br />
judicialmente compelida a realizar, mas não está obrigado a novar sua<br />
dívida, por isso que se diz: ato voluntário.<br />
A<br />
A confissão de dívida não é satisfativa, em razão de que não produz o<br />
pagamento, a satisfação direta do crédito existente pela recompra dos<br />
títulos, por exemplo, mas somente a extinção da primeira obrigação<br />
pela nova que ora surge. O credor adquire novo direito creditório ou<br />
passa a exercê-lo perante outra pessoa, em caso de substituição de<br />
devedores.<br />
A<br />
Possui caráter liberatório, embora conforme acima visto, não possua a<br />
confissão de dívida o poder de satisfação imediata do crédito, caso<br />
contrário teríamos a recompra à vista dos títulos viciados ou simplesmente<br />
inadimplidos, ela tem o condão de liberar e extinguir a dívida<br />
anterior. Um dos seus principais efeitos é a extinção da obrigação<br />
anterior, gerando, por isso, a necessidade de devolução dos títulos<br />
objeto da confissão de dívida diretamente ao cedente.
Repassados alguns efeitos da confissão de dívida, salientamos que nem sempre<br />
ela será a melhor alternativa, mesmo diante da iliquidez da dívida.<br />
E isso somente o operador de fomento mercantil treinado poderá identificar,<br />
ainda mais quando da ansiedade do cedente em firmar o termo de confissão de<br />
dívida e recuperar, o mais breve possível, os títulos viciados.<br />
Dependendo do valor e da quantidade de títulos, melhor seja retê-los, compelindo<br />
o cedente ao pagamento da recompra à vista, mesmo que não os recompre todos<br />
de uma só vez.<br />
Isso porque, conforme já verificamos, um dos efeitos da confissão de dívida é a<br />
extinção da obrigação anterior.<br />
Em muitos casos, a ansiedade pela confissão de dívida, partindo do cedente,<br />
pode ser mera artimanha para afastar o ilícito da emissão de duplicatas sem origem,<br />
por exemplo, ou mesmo do delito de estelionato.<br />
3 REQUISITOS Para uma confissão de dívida válida, faz-se necessário:<br />
3.1 A existência de uma obrigação anterior válida.<br />
Uma das grandes discussões no cenário jurídico do fomento mercantil é<br />
justamente o direito de regresso contra o cedente, em caso de inadimplemento<br />
simples do sacado-devedor.<br />
Julgados existem, totalmente equivocados, que sequer permitem o regresso<br />
quando da existência de vícios de origem.<br />
A regra trazida pelo art. 367 do Novo Código Civil pode ter interpretação perante do<br />
Judiciário de forma novamente equivocada, posto que é inválida a novação (confissão<br />
de dívida) quando a obrigação que se está novando, no caso, a recompra, for nula.<br />
Evidentemente que existe uma enorme massa de doutrinadores e de julgados que,<br />
de maneira sábia e demonstrando conhecimento do instituto do fomento mercantil,<br />
permitem a recompra em face não só a vícios de origem como também pela simples<br />
inadimplência, desde que o direito de regresso esteja devidamente contratado.<br />
Disso depreende-se outra necessidade vital para a sobrevivência da empresa de<br />
fomento mercantil: um bom contrato-mãe, moderno e periodicamente revisado.<br />
Retornando ao tema, caso o contrato usado pela empresa de fomento mercantil<br />
não contenha a cláusula de recompra por mero inadimplemento, a confissão de<br />
dívida pode ser objeto de demanda judicial anulatória, ou mesmo de embargos em<br />
sede de execução do título, alegando o devedor, em seu favor, que a recompra é<br />
nula, posto que não prevista, e como tal, não poderia ensejar a confissão de dívida.<br />
Fica a advertência, em especial pelos julgados equivocados que circulam nas<br />
petições judiciais de devedores contumazes. Verificar se o contrato de fomento<br />
mercantil usado pela sua empresa possui a cláusula de recompra, para que a<br />
posterior confissão de divida não possa ser discutida por essa invalidade.<br />
3.2 A criação de uma nova obrigação.<br />
Normalmente as empresas de fomento mercantil querem reter as duplicatas/<br />
cheques originais, até que o cedente tenha quitado integralmente a confissão de dívida.<br />
Lamentavelmente tal procedimento está equivocado, primeiro porque a relação<br />
anterior deixou de existir: o cedente não deve mais o valor de face do título<br />
negociado, mas sim o valor integral da confissão de dívida, nova obrigação, que<br />
pode ser feita de forma parcela.
4 MOTIVOS PARA<br />
A REALIZAÇÃO<br />
DA CONFISSÃO<br />
DE DÍVIDA<br />
Depois, porque pode ser alegado duplicidade de garantia ou mesmo a<br />
inviabilização, por parte da empresa de fomento mercantil, uma vez retendo<br />
os títulos originais, da cobrança dos sacados, por parte da empresa-cliente.<br />
Este novo instrumento, que libera e encerra todas as negociações<br />
anteriores, é uma nova obrigação, caso contrário, sem fosse apenas uma<br />
reprodução da primeira obrigação, não trazendo inovações, não seria uma<br />
novação, apenas uma concessão com relação a obrigação anterior.<br />
3.3 Animo de novar<br />
Em pé de igualdade com todos os atos jurídicos, a novação também exige<br />
a manifestação de vontade das partes, de forma livre e desimpedida.<br />
Ademais, note-se que não são poucos os casos de cedentes que, após<br />
emitirem duplicatas sem origem, as recompram, via confissão de dívida, para<br />
afastar os delitos já mencionados e, em sede de discussão judicial da confissão<br />
de dívida, alegam que foram coagidas a firmar o termo, sob ameaça de<br />
noticia crime perante a autoridade competente, ou mesmo o uso das<br />
duplicatas como forma de requerimento de falência do cedente.<br />
Justamente por isso que sugerimos, em confissões de valores razoáveis, o<br />
uso da presença e assinatura de advogado que acompanhe os interesses da<br />
parte contrária, como forma de atestar a livre manifestação de vontade.<br />
Na Introdução tecemos alguns breves comentários sobre os motivos que<br />
ensejam a confecção e assinatura de uma confissão de dívida.<br />
O principal, obviamente, é viabilizar o recebimento de valores devidos<br />
por força da recompra de títulos viciados ou simplesmente inadimplidos, em<br />
face da impossibilidade do cedente em faze-lo à vista ou por novas operações.<br />
Com tal ferramenta, o operador de fomento mercantil tem a razoável<br />
certeza de recebimento dos valores, nas datas aprazadas.<br />
Contudo, o objetivo do presente texto é discorrer sobre a confissão de<br />
dívida com forma de qualificar o documento de crédito nas mãos do operador<br />
de fomento mercantil.<br />
Todos os iniciados no setor já sabem das discussões sobre o direito de<br />
regresso e seu entendimento pelo Judiciário.<br />
Então, partindo do princípio que o regresso esteja efetivamente contratado<br />
no contrato de fomento mercantil, por simples inadimplemento, como o<br />
empresário resolverá o problema quando deparar-se com um ou um lote de<br />
títulos que preencham as necessidades e características para a recompra?<br />
Caso não tenha contratado com cláusula “sem protesto” ou “sem despesa”,<br />
tecnicamente terá que protestar o título, para viabilizar o regresso cambial.<br />
Mas se indicar a protesto, por exemplo, uma duplicata viciada pode:<br />
a) enfrentar uma sustação de protesto, com a eternização da demanda,<br />
inviabilizando na prática o regresso ou;<br />
b) protestado o título tido como viciado, pode responder por danos morais.<br />
O problema reside justamente na falta de exequibilidade do contrato de<br />
fomento mercantil e, por vezes, na falta de ferramentas à disposição do operador,<br />
para exigir judicialmente o seu crédito perante o cedente, pela via executiva.<br />
Então, com relação ao cedente, a confissão de dívida pode ser uma forma<br />
de ajustar o crédito do operador de fomento mercantil, às necessidades do art.<br />
585,I, do Código de Processo Civil, qualificando o documento representativo
5 A FORMAÇÃO DE UMA<br />
CONFISSÃO DE DÍVIDA<br />
do crédito que, antes, era um lote de títulos em origem, com pouca ou nenhu-ma<br />
força executiva e podendo ser contestado pelo cedente, agora é um instru-mento<br />
que preenche todos os requisitos de título executivo extrajudicial.<br />
No que se refere ao sacado-devedor, igual efeito pode ter a ferramenta, posto<br />
que, em face de duplicatas não aceitas, protestadas, mas sem a nota fiscal e<br />
comprovante de entrega e recebimento das mercadorias ou serviços, não temos<br />
título executivo extrajudicial.<br />
A experiência nos demonstra o descaso de alguns operadores de fomento<br />
mercantil com a sua consultoria jurídica, buscado profissionais mais pelo preço que<br />
efetivamente pela especialidade.<br />
Assim, diversos são os documentos que nos são trazidos para análise,<br />
totalmente imprestáveis para os fins que se lhes queriam dar as partes, e em<br />
especial, o operador de fomento mercantil.<br />
Apenas como sugestão, entendemos que a confissão de dívida deva conter:<br />
Origem clara e detalhada a dívida que está sendo confessada, discriminando<br />
todos os títulos, valor de face, data de vencimento, etc.;<br />
O motivo da confissão de dívida, se mero inadimplemento ou se os títulos<br />
restaram viciados na sua origem;<br />
A manifestação expressa de vontade do cedente em recomprar os títulos e<br />
firmar o documento;<br />
O valor atualizado da dívida, preferencialmente atualizado por juros de mora<br />
contratados, ou seja, 1% ao mês mais a variação positiva do IGP-M;<br />
Cláusula de vencimento antecipado em caso de inadimplemento de qualquer<br />
das parcelas, além da multa que sugerimos seja no máximo de 10%;<br />
Juros pelo tempo em que a confissão de divida demorará em ser paga, que sugerimos<br />
novamente seja de 1% ao mês, podendo conter a variação futura do IGP-M;<br />
A forma de pagamento, com as datas precisas de vencimento de cada parcela,<br />
que devem ser certas e liquidas;<br />
Cada parcela pode ser representada por uma nota promissória, de igual valor e<br />
vencimento. Note-se: a nota promissória não é garantia, e sim representa cada<br />
uma das parcelas;<br />
A assinatura de duas testemunhas, preferencialmente uma de cada parte.<br />
Estas são apenas sugestões para a confecção do instrumento, sendo que cada<br />
profissional tem outras peculiaridades a serem exploradas.<br />
Ademais, ainda em face a experiência de mais de 10 anos atuando para o<br />
fomento mercantil não são poucas as confissões com as quais nos deparamos, que<br />
ou escondem o valor ou origem da dívida, ou agregam juros e encargos superiores<br />
mesmo ao próprio fator de compra.<br />
Ao empresário de fomento mercantil imbuído do espírito da ganância, advertimos:<br />
se o cedente não conseguiu absorver o fator de compra, gerando a inadimplência e<br />
conseqüente confissão de divida, com mais razão ainda não terá condições de assumir<br />
encargos em patamares superiores ainda aos anteriormente contratados.<br />
Devemos estar cientes que a confissão de dívida é a exceção dos negócios de<br />
fomento mercantil, forma de tentar ajustar um negócio que foi mal entabulado, ou<br />
seja, uma forma de tentar recuperar parte do capital investido, e não um negócio<br />
normal da empresa de fomento mercantil onde se possa vislumbrar o lucro, em par<br />
de igualdade com as operações normais.
6 AS GARANTIAS NA<br />
CONFISSÃO DE DÍVIDA<br />
7 CONCLUSÃO<br />
Por oportuno, sempre que possível ,devemos colher assinatura de<br />
advogado da parte devedora, para evitarmos a contestação do instrumento de<br />
confissão de dívida por vicio de consentimento.<br />
O instrumento de confissão de divida pode agregar algumas garantias, a saber:<br />
a<br />
Aval nas notas promissórias representativas das parcelas, caso o<br />
contrato as preveja. O Aval, por ser um instituto do direito cambial,<br />
somente pode ser dado nas notas promissórias, jamais somente na<br />
confissão de dívida que, embora seja um título executivo extrajudicial,<br />
não é uma cambial;<br />
Devedor solidário, nos termos do contrato de fomento mercantil, advertindo<br />
desde logo pela ineficácia de trazer ao contrato as mesmas pessoas, ora<br />
como devedores solidários, após, como avalistas das notas promissórias;<br />
Hipoteca, desde que a confissão de dívida seja realizada por<br />
instrumento público, e levado ao competente registro imobiliário;<br />
Penhor de máquinas e veículos, observando a necessidade de CND –<br />
Certidão Negativa de Débito, do proprietário do bem, e seu registro<br />
perante os órgãos competentes;<br />
Alienação fiduciária de imóveis, onde é transferida a propriedade para a<br />
empresa credora.<br />
Vimos apenas algumas garantias que podem ser agregadas a confissão de<br />
dívida, dentre tantas outras, que dependem do caso em concreto, da necessidade<br />
e da criatividade das partes.<br />
Salientamos que qualquer garantia, seja aval ou mesmo a hipoteca, pode<br />
ser prestada por terceiros, desde que livres e desimpedidos, com capacidade<br />
para prestar a garantia.<br />
Neste sentido, advertimos para o aval prestado por pessoas jurídicas,<br />
posto que , via de regra, os contratos sociais trazem vedação de que a empresa<br />
preste tal intervenção.<br />
Por derradeiro, o presente texto nos remete a reflexão de que, no fomento<br />
mercantil, pelas suas peculiaridades, os institutos jurídicos podem ter<br />
diversas utilidades.<br />
O protesto, por exemplo, que juridicamente é um instituto criado para a<br />
proteção ou criação de direitos, também pode ser usado como uma excelente<br />
ferramenta de cobrança extrajudicial.<br />
No mesmo sentido, a confissão de dívida também pode ser usado com<br />
objetivo mediato: a criação de um título executivo extrajudicial, nos termos<br />
do art. 585, I, do Código de Processo Civil, evitando o credor o<br />
enfrentamento de um processo de conhecimento.<br />
REFERÊNCIAS<br />
CASSETARI, Alvaro Augusto. Confissão de Dívida Bancária: Novação.<br />
Curitiba: Juruá, 2001.<br />
GUILHERME, José C. D. Factoring: Teoria e Prática. São Paulo: Klarear, 2009.<br />
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. 29. ed. São Paulo:<br />
Saraiva, 1997. 5 v.
1 INTRODUÇÃO<br />
2 MODELO INTEGRADOR<br />
Na atualidade, vivemos em um mundo interdependente, com fronteiras abertas<br />
e afirmação dos blocos econômicos, indicando que cada vez mais teremos frente a<br />
frente negociadores de diferentes culturas, por outro lado, a maior integração<br />
regional possibilitará a expansão de negócios. Diferentes representantes de<br />
indústrias (comércio e serviços) passam a ter a possibilidade de vender seus<br />
produtos e serviços das mais diversas formas a um maior mercado, não mais<br />
limitado por área geográfica previamente estabelecida.<br />
Esta expansão empresarial acontece como resultado de contatos sejam eles por<br />
telefone, fax, reuniões, e-mail. Todos como a finalidade de definir e negociar<br />
condições para efetivar os negócios. Estes processos de negociação são influenciados<br />
e/ou afetados por diversos elementos, que dependem do tipo de produto ou<br />
serviço, objeto deste intercâmbio (negócio). No caso dos serviços, existe uma<br />
maior exigência das equipes de negociação, pois a personalidade, a cultura, a<br />
percepção que cada negociador possui de si e das outras partes envolvidas influenciam<br />
de forma direta os resultados. Além disto, o poder real e o poder percebido por<br />
cada uma das partes ajuda a definir o processo de negociação.<br />
Para nos aprofundarmos neste assunto, desenvolvemos um Modelo Integrador<br />
que conecta um conjunto de elementos, os quais, segundo nosso ponto de vista,<br />
apresentam significativa relevância nas negociações interculturais.<br />
2.1 Um pouco de história<br />
Há alguns anos comecei a participar em negociações de prestação de serviços<br />
internacionais, iniciando pelas atividades de pesquisador de marketing que exercia e<br />
exerço e posteriormente por opção de vida. Naquele período tive a oportunidade de estar<br />
ao lado ou a frente de destacados negociadores das mais diferentes culturas, que me<br />
permitiram conhecer diferentes estilos de negociar.<br />
Nestas experiências, comecei a identificar alguns fatores que influenciavam a negociação<br />
e mesmo assim, não eram tratados com a devida importância. Todavia, meu interesse<br />
pelo tema despertou quando busquei relatar um caso destas negociações e procurei<br />
informações teóricas para poder explicá-lo adequadamente, o que me conduziu a aprofundar<br />
conhecimentos em diferentes campos teóricos, como: Teoria das Organizações,<br />
Marketing de Serviços, Recursos Humanos, Negociação e Qualidade Total.<br />
2.2 Fundamentos da denominação<br />
A em áreas aparentemente tão diferentes, com a vantagem de não estar preso a<br />
preconceitos teóricos, me permitiram analisar as experiências vivenciadas de um<br />
angulo diferente, integrador, de todas as disciplinas que analisam o comportamento<br />
humano na produção e comercialização de bens e serviços.
Quando comecei a redigir este artigo, realizei uma integração de diversas<br />
teorias, desta forma julguei que a melhor denominação seria Modelo Integrador.<br />
2.3 Componentes do Modelo Integrador<br />
O modelo integrador busca discutir alguns dos fatores ocultos aos<br />
processos de negociação de prestação de serviços em nível internacional.<br />
Entre estes destacamos os seguintes:<br />
Personalidade e fantasias dos negociadores, assim como:<br />
Os mecanismos de Inveja inerentes aos negociadores e o grau de Cultura<br />
da Mediocridade que os mesmos podem ter;<br />
A Ideologia das organizações, bem como seus Mitos e Ritos;<br />
As diferentes etapas do Choque Cultural na qual a negociação acontece;<br />
O tipo de trabalho objeto da negociação, Rotineiro ou Novo, para as partes;<br />
O tipo de coordenação e liderança necessária para operacionalizar o serviço;<br />
O processo de desenvolvimento histórico de cada uma das partes e o<br />
momento concreto que se realiza a negociação, terá como consequência a<br />
base de poder, real ou percebido, diferentes entre eles.<br />
Os componentes deste modelo estão descritos no próximo capítulo.
3 MARCO TEÓRICO<br />
3.1 Negociação<br />
Definiremos a negociação como um processo que implica em passos ou etapas que<br />
necessitam identificação e ajustamento: um processo orientado a solução de problemas,<br />
resolução de conflitos, ou tomada de decisões. O elemento chave é a comunicação<br />
entre as partes, onde se busca dar a análise um aspecto normativo (Colaiacovo, 1985).<br />
O processo de negociação apresenta, normalmente, o seguinte conjunto de<br />
etapas: Preparação, Negociação Formal, Contratação e Execução do contrato. Os<br />
enfoques da negociação mais conhecidos são: Clássico ou Posicional e Princípios<br />
ou Méritos (Colaiacovo, 1991).<br />
Clássico ou Posicional - Este princípio é baseado no conceito de “jogo de<br />
soma zero”, é dizer, em sua forma mais tradicional, que a negociação deve ser<br />
encarada como uma situação de conflito de interesses entre duas ou mais partes que<br />
devem dividir o “objeto” da transação. Qualquer avanço de um lado é encarado<br />
como perda pelo outro.<br />
A principal virtude desta análise é que o mesmo se aproxima a realidade. Na<br />
prática, vemos que este é normalmente o comportamento adotado por negociadores.<br />
Esta “escola” pode-se considerar como aquela que interpreta a negociação<br />
como uma atividade competitiva.<br />
Enfocado em Principio ou Méritos - Encara o processo de negociação<br />
como uma atividade cooperativa, onde as partes em conflito de interesse buscam,<br />
em conjunto, uma solução que se apresente como mutuamente satisfatória. A<br />
essência da proposta desta “escola” passa por quatro considerações básicas:<br />
Separar as pessoas do problema;<br />
Concentrar-se nos interesses e não nas posições;<br />
Criar uma variedade de opções e possibilidades antes de decidir o que fazer;<br />
Concorrer para que o resultado seja julgado com base em padrões objetivos;<br />
3.2 Poder<br />
Um dos elementos relevantes no processo negociador é a avaliação do cli-ma e<br />
das condições gerais da negociação. Um dos fatores importantes nesta fase é a<br />
análise do poder negociador. Este pode ser avaliado em duas dimensões: Aquilo<br />
que nós percebemos e aquilo que é percebido pelos outros.<br />
O primeiro baseia-se na auto-percepção que o negociador tem de seu poder e o<br />
segundo é a percepção que a outra parte envolvida tem do negociador. Para não nos<br />
equivocarmos no diagnóstico de poder, o negociador precisa avaliar objetivamente<br />
a situação de poder relativo que vai enfrentar no processo de negociação.<br />
Por último, é importante destacar que na área de serviços, a personalidade dos<br />
negociadores exerce uma grande influência, podendo decidir a negociação.Com<br />
base em experiências do autor, ao trocarmos negociadores, modifica-se todo o<br />
processo de negociação e os resultados podem ser diferentes.<br />
3.3 Personalidade e imaginário<br />
Todo indivíduo faz parte de diferentes grupos na sociedade e com frequência<br />
cumpre nestes, diferentes funções, com papéis disímiles distintos. A pesar disto, e de<br />
muitas vezes atuar em papéis antagônicos, as pessoas manifestam um alto grau de<br />
coerência, isto mostra uma das facetas da personalidade, sua integridade.
A personalidade é um produto da atividade de cada pessoa e de seu desenvolvimento<br />
social, os processos cognitivos que um indivíduo possui, são os seguintes:<br />
sensações e percepções como reflexos imediatos dos estímulos; a memória<br />
como reflexo da realidade; a imaginação e o pensamento como reflexo<br />
das propriedades da realidade, inacessíveis ao conhecimento de forma imediata.<br />
A imaginação é a capacidade de criar novas imagens na consciência com<br />
base na transformação das impressões que temos da realidade. Muitas vezes<br />
essa imaginação permite criar modelos de conduta, principalmente quando as<br />
situações forem indefinidas (Lapierrre, 1989).<br />
Estas idefinições, quando ocorrem nas organizações, vem acompanhadas<br />
de “luta pelo poder”, quando então alguns dirigentes ou administradores<br />
expressam algumas facetas de suas personalidades, guiados por sua imaginação<br />
e com consequências para a atividade da organização.<br />
A seguir apresentamos, sob a forma de tabela, síntese de alguns dos<br />
comportamentos possíveis de um administrador. Salientando que o imaginário<br />
… “contribui para dar uma orientação, direção a uma ação, sem anular a<br />
influência de outros fatores da situação (Lapierre, 1989)”<br />
Estes aspectos da personalidade e da fantasia se anexarão àqueles<br />
vinculados a inveja gerada nos integrantes das equipes negociadoras. Isto<br />
ocorrerá a dois níveis: dentro da equipe (intraequipe) e entre as diferentes<br />
equipes (interequipes) .
4 INVEJA E MEDIOCRIDADE<br />
4.1 Inveja<br />
A inveja pode surgir em um negociador, perante seu companheiro de equipe ou pe-rante<br />
um negociador da equipe com quem se esta interagindo. Quando esta inveja se apresenta<br />
vinculada a um integrante da mesma equipe, o quadro poderá ser agravado, dependendo do<br />
desempenho/performance, real ou percebida, de cada negociador, pois isto pode levar a<br />
mudança de status na organização ao longo do processo (exemplo: Só existe a disponibilidade<br />
de cargo para promoção de um membro da equipe).<br />
A inveja quando vinculada a outra parte esta relacionada com a percepção de<br />
obtenção de resultados para cada uma das partes quando do término da negociação<br />
ou operacionalização.<br />
Segundo Melanie Klein (Citada por Tomei, 1994) a inveja é um sentimento de<br />
cólera que os indivíduos experimentam quando percebem que alguém possui<br />
algum objeto que por eles é desejável, sendo a reação uma forma de busca por<br />
apropriação ou destruição este objeto. Alguns sentimentos e emoções vinculados<br />
com inveja são os seguintes: inferioridade, vergonha, frustração, amargura, desejo<br />
e pecado (Parrot citado por Tomei, 1994).<br />
As defesas contra a inveja, desenvolvido por quem apresenta este sentimento,<br />
são as seguintes (Tomei, 1994):<br />
Desvalorização - Desvalorização das boas qualidades do objeto, o que provocará<br />
menos admiração e dependência. Nesta estratégia, os indivíduos são motivados<br />
pelo desejo de vingança. Tem necessidade de provar que podem ser tão bons<br />
quanto ou melhores dos que são objetos de inveja. Usam a malícia, as críticas<br />
negativas e a humilhação como forma de aflorar ou aliviar seus sentimentos;<br />
Negação e adulação - Dificuldade de aceitar conscientemente o sentimento de<br />
inveja. Neste caso o indivíduo tenta se tranquilizar, tomando afastamento do<br />
objeto de inveja, recorrendo a adulação como mecanismo de formação<br />
racional a fim de ocultar o sentimento de inveja.<br />
Projeção - O indivíduo se vê como uma pessoa não invejosa, rodeada de<br />
pessoas invejosas e destrutivas, ou o indivíduo se sente possuidor dos atributos<br />
admirado no objeto de inveja por identificação.<br />
Idealização - O indivíduo trata de colocar o objeto invejado fora de seu<br />
alcance. Usando este forma exagerada, platônica, o indivíduo busca diminuir<br />
a inveja, colocando o objeto de inveja acima dos mortais, como mitos, heróis.<br />
Retirada - Acontece quando o indivíduo se sente incapaz de tolerar seu<br />
próprio sentimento de inveja. O que se vê neste caso é um ser que não tenta<br />
entrar em competição, mas procura desvalorizar a si mesmo. Síndrome do<br />
“medo do sucesso” para não causar inveja.<br />
4.2 Mediocridade<br />
A mediocridade é uma forma que a inveja tem de instalar-se na cultura organizacional<br />
(Mello, 1994) a qual pode ser vinculada as leis de Parkinson, especialmente<br />
quando um chefe incapaz se rodeia de pessoas incapazes e estes por sua vez<br />
selecionam subordinados piores ainda. Esta cultura de mediocridade, trará como<br />
consequência resultados nefastos para a organização. Entre estes podemos citar os<br />
seguintes (Mello, 1994):<br />
Pouca inovação;<br />
Ambiente ameaçador, o que sentido por parte dos criativos;
5 CULTURA EMPRESARIAL:<br />
IDEOLOGIA, MITOS e RITOS<br />
Divisão entre os que seguem o chefe e os que contestam, ameaçam<br />
(amigos versus inimigos);<br />
Medo.<br />
Esta inveja e mediocridade afetará de alguma forma e em algum nível o<br />
desenvolvimento do processo de negociação. Alguns exemplos disto seriam<br />
os seguintes:<br />
Lentidão na tomada de decissões;<br />
Discussões de honorários ou custos em geral por parte do contratante ou<br />
aumento por parte dos que ofertam o serviço ou produto;<br />
Problemas frequentes.<br />
Outros elementos vinculados a estes, de índole pessoal, são aqueles que<br />
integram a cultura das organizações participantes no processo negociador.<br />
5.1 Ideologia<br />
A cultura empresarial, fundamentalmente alguns de seus componentes<br />
como, ideologia, mitos e ritos, são fatores que de uma forma ou de outra, afetam<br />
o processo de negociação. Não será razoável compararmos, uma empresa que<br />
possui uma ideologia “vencedora”, mitos que representam valores onde se<br />
destacam os “empreendedores” e ritos baseados na estrutura profissional, ao<br />
compararmos com outra organização que possui elementos contrários a estes.<br />
A ideologia empresarial se encontra unida a prática gerencial, porque o<br />
pensamento e a ação são inseparáveis e estão unidos as consequências práticas.<br />
Algumas declarações como “temos que agir, não se pode gastar tempo<br />
planejando”, deve ser compreendido, em um contexto ideológico, pois nossas<br />
percepções e experiências são regidas por ela e isto que dará significado,<br />
conotações e caráter social ao que fazemos. (Abravanel, 1992).<br />
A ideologia organizacional representa um conjunto de idéias fundamentais<br />
com suas consequências operacionais, que constitui um sistema predominante<br />
de crenças e valores que engendra com frequência contradições, mas que serve<br />
para definir e manter a organização. A ideologia deve permanecer fiel a suas<br />
crenças básicas, assim como a suas necessidades de supervivência/sobrevivência<br />
nesta realidade, quando então podem aparecer contradições.<br />
Estas contradições se expressam entre o que deveria ser feito e aquilo que se<br />
faz. Como maneira de resolver este problema surgem os mitos.<br />
As duas dimensões da ideologia são a ideologia fundamental e a ideologia<br />
operacional. A primeira, fundamental, compreende os princípios que determinam<br />
os objetivos, as metas e a concepção do que se deve fazer.<br />
A dimensão operacional (o que realmente é) compreende princípios que<br />
sustentam as políticas postas em prática e que apoiam os meios empregados<br />
para atingir objetivos imediatos; as normas de eficácia prevalecem sobre as<br />
prescrições/normas morais.<br />
O que fazem as organizações, a ideologia operacional e aquilo que fica por<br />
ser feito, se vê como a diferença entre a prática (o que se fez) e os objetivos.<br />
Essa diferença é explicada pelos mitos.<br />
A ideologia possui os seguintes componentes estruturais: descrição, análise,<br />
prescrições/normas morais e técnicas, medidas e rechazo.
5.2 Mitos Organizacionais<br />
Os mitos organizacionais surgem, como já expresso, através de uma necessidade<br />
de estabelecer uma ponte entre a ideologia fundamental e a ideologia operacional,<br />
quando entre elas existe conflito.<br />
Os mitos podem ser definidos como um meio de comunicar e estabelecer um<br />
sistema de representações e valores em uma organização ou de um grupo social,<br />
isto quer que se alguém quer pertencer ao grupo, tem que adequar-se a este mito,<br />
agindo como se este fosse seu também. (Abravenel, 1992) As categorias dos mitos<br />
podem ser as seguintes (Lemaintre, 1987):<br />
Mitos Racionalizadores - Este mitos surgem depois dos sucessos e das ações<br />
tomadas na/pela organização, estabelecem relações de causa, efeito e<br />
proporcionam efeitos de legitimação para ações futuras.<br />
Mitos de Valorização - São aqueles que introduzem elementos de ordem:<br />
Bem versus mal, conveniente versus inconvenientes, etc.<br />
Mitos de Identificação - É uma categoria particular da anterior que integra<br />
personagens, histórias e contradições como: Nós contra eles, minha contra<br />
deles, etc.<br />
Mitos de Dualidade - Estes mitos refletem as tensões geradas pela realidade<br />
da organização e os valores dos empregados.<br />
5.3 Ritos Organizacionais<br />
Os ritos podem se definir como as práticas de caráter simbólico, uma forma de<br />
adoração organizacional. Os procedimentos de desenvolvimento de produtos, de<br />
programas comerciais, financeiros, são todos exemplos de ritos coletivos.<br />
Os ritos se distinguem por quatro características (Abravanel 1992):<br />
1) O aspecto litúrgico: em sua qualidade de forma de adoração coletiva, os ritos<br />
implicam com muita frequência um compromisso pessoal e um grau de<br />
participação notável.<br />
2) O aspecto representacional: os ritos se referem aos princípios internos, tais<br />
como o espirito corporativo, que sustenta e guia a corporação.<br />
3) Uma dupla função: os ritos consolidam e animam periodicamente a identidade<br />
do grupo.
4) Um papel purificador: os ritos permitem a expressão de sentimentos,<br />
sejam bons ou maus, e facilitam a criação de bens coletivos mais<br />
profundos: princípios vivos que definem a organização.<br />
Os ritos podem ser classificados da seguinte forma (Lemaitre, 1987):<br />
Ritos Integradores - Simbolizam a comunidade, a coesão, a persistência.<br />
Ritos Diferenciadores - Simbolizam os conflitos e as diferenças sociais<br />
toleradas: Hierarquia, diferentes departamentos.<br />
Ritos de Degradação ou de Humilhação - Simbolizam os processos de<br />
afirmação da ideologia dominante.<br />
Todas pessoas que ingressam em uma empresa, sofrem, em parte, um RITO<br />
DE INTEGRAÇÃO (“direito de participar”), cujo fim é rebaixar ao indivíduo<br />
antes de admiti-lo na cultura, ensinar o respeito pela antiguidade, a experiência,<br />
mostrar que a tradição tem valor em certa cultura.<br />
Estes processos terão sua incidência, maior ou menor, segundo o tempo<br />
efetivo que dure o processo de negociação, pois isto nos leva ao choque cultural.<br />
5.4 Curva de Choque Cultural<br />
Quando pessoas de diferentes culturas negociam, existe uma curva de choque<br />
cultural (Kohls, 1979), que afetará de uma forma ou outra os participantes da<br />
negociação. As fases do choque são as seguintes: Lua de mel, Fundo, Integração.<br />
No período de transição entre a primeira e a Segunda fase, começamos a<br />
perceber a diferença, questionamos a forma como coisas são feitas (acertos),<br />
identificamosdefeitos. Entre a segunda fase e a terceira, encontramos a depressão,<br />
resignação e a aceitação.<br />
Parece evidente que nos processos de negociação que tenham como<br />
finalidade o empreendimento de negócios em conjunto, este não deva acontecer<br />
no período de transição entre a primeira e a segunda fase, pois isto complicaria<br />
qualquer proposta, agravando o quadro, se considerarmos que este<br />
choque pode acontecer em períodos diferentes, ou seja, os integrantes da<br />
equipe de negociação podem estar passando por diferentes fases em um<br />
determinado período de tempo.
Neste capítulo desenvolveremos o conceito de trabalho, buscando de esta forma<br />
situar os diversos tipos de acordos que se pode dar em um processo de negociação<br />
internacional de serviços.<br />
O Trabalho é um processo entre o indivíduo e seu meio ambiente, que tem como<br />
finalidade obter os meios necessários para a sobrevivência e traz como conseqüência<br />
a transformação do meio ambiente e do homem em si mesmo.<br />
O processo de trabalho inclui os seguintes elementos (Hiebsch e Vorwrs, 1980):<br />
g<br />
A atividade do indivíduo;<br />
Atividade do grupo a que se encontra ligado o indivíduo;<br />
Outros grupos que realizam o mesmo trabalho (concorrência);<br />
O objeto do trabalho;<br />
Os instrumentos que se utilizam.<br />
g<br />
Por outro lado, o trabalho pode classificar-se, segundo a percepção dos grupos,<br />
da seguinte forma (Hiebsch e Vorwrs, 1980):<br />
g<br />
Rotineiros;<br />
Novos, sem experiência prévia;<br />
Novos, com experiências similares.<br />
g<br />
O estudo do trabalho se realiza com a finalidade de aumentar a produtividade e<br />
esta, em um mercado de livre competitividade, está vinculada a percepção do<br />
cliente. Esta percepção se denomina de Valor (Csillag, 1986):<br />
Se considerarmos a competição existente, três possíveis situações podem<br />
acontecer entre duas organizações:<br />
A empresa que obterá maior crescimento será aquela que obtenha um valor<br />
maior para o cliente. Pelo exposto, a cooperação e a forma que a empresa adquira<br />
são determinantes de sua competitividade e sua produtividade.<br />
Podem ser duas as formas de aumentar a produtividade dos homens (Marx, 1962):<br />
g<br />
Aumento do rendimento individual;<br />
Desenvolvendo uma nova "força coletiva" de trabalho.<br />
g<br />
A primeira forma consiste do aumento da predisposição(motivação) de cada<br />
pessoa para o trabalho . A Segunda forma pode se obter mediante a coordenação da<br />
liderança, das comunicações e da estrutura grupal.<br />
6.1 Coordenação e Liderança<br />
A coordenação e a liderança terão uma importância vital na negociação de<br />
serviços. De alguma forma, os negociadores estarão vinculados à prestação do
serviço. Os diversos tipos de personalidade que eles possuam, assim como o<br />
tipo de trabalho de que se trate, afetarão as formas como se realizarão estas<br />
duas instâncias na operacionalização do serviço.<br />
COORDENAÇÃO - No processo de trabalho podem se apresentar três<br />
fases da coordenação (Hiebsch e Vorwerg, 1980):<br />
Coordenação dos objetos de trabalho;<br />
Coordenação dos esforços individuais ou dos atos de trabalho;<br />
Coordenação das informações necessárias para o cumprimento do<br />
trabalho.<br />
A partir disto, pode-se dizer que o potencial de trabalho de um grupo pode<br />
aumentar, do ponto de vista da coordenação, mediante o somatório das forças<br />
individuais, a compensação das forças individuais e a organização destas forças.<br />
A coordenação possui três situações:<br />
Instância de coordenação ou função de liderança;<br />
Meio de coordenação ou função de comunicação;<br />
Resultado da coordenação ou estrutura grupal.<br />
LIDERANÇA - A liderança aparece na literatura com três tipos de<br />
significados (Kahn e Katz, 1986):<br />
Atributos de uma posição;<br />
Característica de uma pessoa;<br />
Categoria de uma conduta.<br />
Comumente, se tem considerado o tema como o grau que tem um<br />
indivíduo de influenciar os integrantes de seu grupo, isto significa um agente<br />
influente e pessoas influenciadas.<br />
Porém, este enfoque não considerou o tipo de trabalho que realizam os<br />
grupos. A introdução desta variável nos permitiria distinguir entre a estratégia<br />
global do trabalho, direção, a tática para solucionar problemas específicos,<br />
mediação e o controle do grupo, supervisão.<br />
Esta forma de análise nos permite diferenciar três subfunções da liderança:<br />
direção, mediação e supervisão (Hiebsch e Vorweg, 1980).<br />
Direção: É a interpretação da realidade objetiva ou meio ambiente , da<br />
realidade subjetiva do grupo e das necessidades organizacionais. A esta<br />
subfunção corresponde a previsão das possíveis conseqüências e também<br />
a planificação que considere o suceder a posteriori da ação concreta.<br />
Mediação: Consiste na organização do trabalho e é utilizada quando o<br />
grupo ou organização se depara com um problema novo, isto é, quando<br />
não há experiência.<br />
Supervisão: Consiste em manter a organização concentrada na realização<br />
do trabalho, limitando as necessidades destas, reordenando os indivíduos.<br />
Através desta subfunção se mantém o controle, o conformismo grupal.<br />
As três subfunções da liderança, corresponderiam a personalidades<br />
diferentes para cumpri-las corretamente.
Isto nos indicaria possíveis conflitos que poderiam se apresentar na operacionalização<br />
do serviço, pois se o trabalho é novo para pelo menos uma das partes, a<br />
escolha das pessoas para executá-lo, considerando suas personalidades, terá uma<br />
importância fundamental.<br />
CONCLUSÃO O modelo desenvolvido procura chamar atenção para fatores que têm incidência<br />
nas negociações internacionais, porém permanecem ocultos e poucas vezes são<br />
considerados nas respectivas análises.<br />
O que fica pendente neste modelo é a aplicação dos instrumentos de diagnóstico<br />
para conhecer os níveis e categorias em que se encontram cada uma das partes<br />
negociadoras. Este instrumental se encontra desenvolvido, porém precisa ser<br />
dotado de um método adequado.<br />
BIBLIOGRAFIA<br />
ABRAVANEL, H. Carácter ideológico de la concepción estratégica. In: Cultura<br />
Organizacional, Colombia: Legis, 1992.<br />
HIEBSCH, H. E VORWRG, M. Introdução à Psicologia Social marxista. Portugal:<br />
Novo Curso Editores, 1980.<br />
CSILLAG, Mario. Analise do valor: metodologia do valor. São Paulo: Atlas, 1986.<br />
COLAIACOVO, J.L. Comercio Exterior y Negociaciones Internacionales. Río de<br />
Janeiro: Cabivieri Editorial, 1985.<br />
COLAIACOVO, J.L. Negociación & Contratación Internacional. Buenos Aires;<br />
Ediciones Macchi, 1991.<br />
KAHN, R.L. Y KATZ, O. La Psicología Social de las relaciones sociales. La Habana:<br />
Universidad Habanera, 1986.<br />
KOHLS, R. Junvival kit for overseas living. Washington: Library of Congress, 1979.<br />
LAPIERRE, I. Imaginário, Administração e Liderança. São Paulo; Revista<br />
Administração de Empresas, oct/dez, 1989.<br />
LEMAITRE, Nadine. La culture d'entrepise: facteur de performance. In: L'analyse des<br />
organisations: une anthologie sociologique; Tome II Les composantes de l'organisation.<br />
Canadá: Gaetan Morin, 1987.<br />
MARX, K. El Capital. La Habana; Ed. Nacional, 1962.<br />
MELLO, Carlos Moyano. Estrategias empresariales para el MERCOSUR.<br />
Paysandú; Anales del congreso de RRPP., 1994.<br />
TOMEI, P.A. Inveja nas organizações. São Paulo; Makron Books, 1994.
Para conseguir atingir seus objetivos, nos mais diversos níveis, a empresa é obrigada<br />
a obter recursos suficientes para suprir suas necessidades financeiras específicas,<br />
ligadas a determinadas variáveis que dimensionam o volume e a velocidade<br />
dos fluxos essenciais, bem como a continuidade das atividades operacionais.<br />
Dentre estas, o ciclo operacional - compreendendo operações de compra, produção<br />
e venda - reflete, através dos recursos requeridos para seu financiamento,<br />
algumas características básicas de um setor ou empresa, podendo um acompanhamento<br />
sistemático do mesmo através do tempo tornar-se extremamente útil<br />
para a compreensão de como certos fenômenos de origem econômica são<br />
assimilados pelas empresas.<br />
Pagar fornecedores para assegurar-se da continuidade de recebimento de<br />
matérias-primas e produtos intermediários, contratar mão de obra em número e<br />
qualificação suficiente, tornando possível o processamento e transformação de<br />
insumos em produtos finais, manter estoques permitindo a continuidade de operações,<br />
são algumas das necessidades de recursos ligadas ao ciclo operacional e,<br />
através de seus montantes, caracterizam de maneira perfeita empresas ou setores.<br />
Os exemplos contidos no parágrafo acima, mesmo em pequeno número, são<br />
suficientemente ilustrativos do tipo de despesas que serão cobertas continuamente,<br />
com o intuito de não permitir a interrupção do ciclo operacional.<br />
Além das necessidades de recursos, cujos exemplos foram anteriormente<br />
mencionados, o ciclo também gera recursos como resultado de sua dinâmica de<br />
funcionamento. Ao adquirir matérias-primas, produtos ou serviços de terceiros e<br />
ser beneficiado com a concessão de um determinado prazo para efetuar os<br />
respectivos pagamentos, a empresa passa a gozar de um período maior para seus<br />
desencaixes, utilizando então tal montante como uma fonte de financiamento de<br />
suas necessidades de recursos originadas dentro do ciclo operacional.<br />
Cabe agora a tentativa de estabelecer uma definição para o termo necessidade<br />
de capital de giro. Como se espera que os recursos cubram ao menos parte<br />
das necessidades ligadas ao ciclo operacional, a proposição que reflete os<br />
pensamentos apresentados estabelece a necessidade de capital de giro como<br />
sendo as necessidades de recursos existentes para financiar seu ciclo<br />
operacional, após haver utilizado os recursos gerados pelo próprio ciclo.<br />
Complementando o acima apresentado, a necessidade de capital de giro<br />
pode também ser entendida como o valor do capital de giro mínimo a ser<br />
mantido, a fim de que seu ciclo operacional possa apresentar-se financeiramente<br />
equilibrado.<br />
Uma das características marcantes das necessidades de recursos ligadas ao<br />
ciclo operacional é seu caráter permanente, isto é, mesmo estando composto por<br />
elementos circulantes, nos quais a liquidez existe e é esperada como tal, a cada<br />
ciclo novos valores somam-se aos já existentes ou substituem-lhes no todo,<br />
dando uma característica de constância em longo prazo.
¹ O termo citado indica a ocorrência de uma rotação<br />
dos valores constituintes da necessidade de capital de<br />
giro, ou seja, novos valores substituem a outros mais<br />
antigos que foram, de alguma forma, liquidados.<br />
² IUDÍCIBUS, Sérgio de; MARTINS, Eliseu et<br />
GELBCKE, Ernesto R. Manual de contabilidade das<br />
sociedades por ações: aplicável também às demais<br />
empresas. Atlas, São Paulo, 1980. pgs 110,111.<br />
A necessidade de capital de giro existe sempre, ocorrendo apenas uma rotatividade<br />
dos valores inscritos nas contas do balanço, caracterizando o fenômeno<br />
conhecido como “revolving”¹.<br />
A abordagem do tema até aqui proposta possibilita a compreensão concreta da<br />
natureza das necessidades de recursos ligados ao ciclo operacional, sem, contudo,<br />
oferecer condições de avaliar os montantes requeridos, sobretudo, quando considerado<br />
que, dentro da empresa, os ciclos sobrepõem-se uns aos outros, não sendo<br />
obrigatório requerido que um deles alcance seu ponto final para que o seguinte<br />
inicie seu desenvolvimento.<br />
A medida dos montantes requeridos através das contas listadas no balanço<br />
patrimonial da empresa, logicamente considerando apenas os dados relativos ao<br />
ciclo compra-produção-venda, apresenta-se como a ideia demais fácil viabilização.<br />
Deve ser entendido que o perfeito acompanhamento destes montantes para<br />
um observador externo da empresa é de difícil realização, visto este dispor de<br />
apenas um, ou eventualmente dois, balanços a cada ano, fato que torna penosa a<br />
estimação da evolução dos montantes, podendo ainda sofrer distorções causadas<br />
por problemas de sazonalidade ou outros fenômenos econômicos ocorrendo<br />
em datas próximas ao fechamento do balanço da empresa.<br />
Para um analista externo, que não será responsável pela administração das<br />
necessidades de recursos ligadas ao ciclo operacional, a existência de uma série<br />
de balanços será suficiente para diagnosticar a evolução das massas, possibilitando<br />
um número de informações adequadas para a análise de saúde financeira<br />
da empresa.<br />
Buscando compreender melhor o conteúdo de cada uma das contas componentes<br />
da necessidade de capital de giro, é de vital importância o conhecimento da<br />
lógica contábil inerente ao registro dos componentes cíclicos do balanço. Assim<br />
sendo devemos estar conscientes de que os estoques são representados por:<br />
“a. itens que existem fisicamente, excluindo-se aqueles que mesmo estando em<br />
posse da empresa são propriedade de terceiros, seja por terem sido recebidos em<br />
consignação, seja para beneficiamento, armazenamento ou outro motivo qualquer;<br />
b. itens adquiridos pela empresa mas que estão em trânsito, a caminho da<br />
sociedade, na data do balanço, quando sob condição de compra FOB, ponto de<br />
embarque (fábrica ou depósito do vendedor);<br />
c. itens da empresa que foram remetidos para terceiros em consignação,<br />
normalmente em poder de prováveis fregueses ou outros consignatários, para<br />
aprovação e possível venda posterior, mas cujos direitos de propriedade permanecem<br />
com a empresa;<br />
d. itens de propriedade da empresa que estão em poder de terceiros para armazenagem,<br />
beneficiamento, embarque, etc.”²<br />
As contas de estoque são normalmente subdivididas em:<br />
Produtos acabados, representando produção da empresa disponível<br />
para venda;<br />
Mercadorias para revenda, onde são registrados os produtos adquiridos com o<br />
intuito de revenda;<br />
Produtos em elaboração, no qual as matérias-primas em processo de transfor-
³ Lei no 6.404, de 15 de dezembro de 1976.<br />
4 IUDÍCIBUS, Sérgio de; MARTINS, Eliseu et<br />
GELBCKE, Ernesto R. Manual de contabilidade das<br />
sociedades por ações: aplicável também às demais<br />
sociedades. Atlas, São Paulo, 1980. P. 115.<br />
mação, bem como os custos diretos e indiretos da parte da produção em<br />
elaboração na data de balanço são lançados;<br />
Matérias-primas, conta contendo os itens a serem utilizados em<br />
produção futura.<br />
Como critério básico de avaliação dos estoques, o item II do artigo 183 da<br />
Lei das Sociedades por Ações³ estabelece que “os direitos que tiverem por<br />
objeto mercadorias e produtos do comércio da companhia, assim como<br />
matérias-primas, produtos em fabricação e bens em almoxarifado, serão<br />
avaliados pelo custo de aquisição ou produção, deduzido de provisão para<br />
ajustá-lo ao valor de mercado quando este for inferior.<br />
O custo é base elementar da avaliação dos estoques, mas quando houver a<br />
perda de utilidade ou a redução no preço de venda ou reposição de um item<br />
que reduza seu valor recuperável, ou seja, de mercado, a um nível abaixo do<br />
custo, deve-se então assumir como base final de avaliação tal preço de<br />
mercado inferior ao custo, mediante uma provisão, mantendo-se os controles<br />
4<br />
de estoques ao valor original de custo” .<br />
A conta duplicatas a receber agrupa subcontas de clientes e empresas<br />
controladas e coligadas, reportando-se a valores resultantes de transações<br />
normais, isto é, vendas de produtos ou serviços prestados.<br />
Esta conta origina-se através da concessão de crédito a clientela, como<br />
instrumento viabilizador de vendas, caracterizando-se pela existência do<br />
direito de cobrar do comprador, formalizado pela existência de documentos<br />
legais tais como: faturas, duplicatas, contratos de compra, etc.<br />
Normalmente os registros contábeis referentes a vendas realizadas, bem<br />
como a parcela desta a ser paga a prazo, são efetuados quando da emissão de<br />
documento caracterizando a transferência do direito de propriedade sobre<br />
um bem, devendo ser escriturado quando essa preencher os requisitos<br />
essenciais à sua efetivação.<br />
Quando da existência de fornecedores estrangeiros, com os quais<br />
transações efetuam-se em moeda que não seja a nacional, os montantes<br />
devidos deverão sofrer atualização, através da utilização de taxas de<br />
câmbio oficiais em vigor nas datas do balanço, a variação cambial sendo<br />
considerada como despesa.<br />
Outros componentes do passsivo circulante, excetuando-se empréstimos<br />
ou qualquer outro tipo de financiamento obtido junto a instituições financeiras,<br />
representam, via de regra, uma pequena parcela da necessidade de capital<br />
de giro, motivo pelo qual não serão aqui detalhados.<br />
Contudo, o balanço patrimonial reflete a situação da empresa em um<br />
momento previamente estabelecido, sendo que os valores nele contidos estão<br />
em constante mutação, principalmente os relativos ao ciclo operacional que<br />
são renováveis a cada novo ciclo, sofrendo variações que podem alterar as<br />
massas patrimoniais em períodos próximos a elaboração do demonstrativo,<br />
anteriores ou posteriores a este.<br />
Isto posto, e entendido como uma limitação, torna-se oportuno lembrar<br />
que a avaliação das necessidades de recursos ligados ao ciclo operacional de<br />
uma empresa somente será válida caso faça referência as atividades por ela<br />
desenvolvidas, possibilitando adequada apreciação das origens, aplicações e<br />
eventuais mutações que venham a ocorrer nos montantes, isto representa o<br />
conhecimento do funcionamento setorial, seus problemas e soluções, bem<br />
como suas forças e fraquezas.
COMPONENTES E<br />
CÁLCULO DA<br />
NECESSIDADE DE<br />
CAPITAL DE GIRO<br />
Considerando que o cálculo da necessidade de capital de giro objetiva estabelecer<br />
as necessidades de financiamento não cobertas por recursos oriundos do próprio ciclo,<br />
o critério de seleção de seus componentes é bastante simples: tomarão parte neste<br />
cálculo apenas os elementos participantes do ciclo operacional da empresa, ou seja<br />
compra-produção-venda.<br />
A lógica regendo a consistência dos registros contábeis já sendo conhecida, torna-se<br />
importante detalhar a composição e o cálculo da necessidade de capital de giro, a fim<br />
de que possamos entender a mecânica do funcionamento deste conjunto de massas.<br />
Ao nível de recursos, composto por contas obtidas no passivo dos balanços, as<br />
fontes de financiamento da necessidade de capital de giro são: fornecedores,<br />
obrigações fiscais, salários, encargos sociais e outras obrigações e previsões.<br />
O cuidado essencial a ser rigidamente adotado para inclusão no cálculo será<br />
sempre a participação no ciclo, assim sendo quando o nível de informação disponível<br />
o permitir, uma triagem aprofundada deverá ser realizada nos itens acima<br />
mencionados, de forma a estabelecer uma possível relação dos valores registrados<br />
com o ciclo operacional da empresa.<br />
A existência de recursos a curto prazo não ligados ao ciclo cria um novo<br />
conjunto, o qual, para fins de classificação, chamaremos de acíclicos, por não se<br />
encontrarem relacionados ao ciclo operacional da empresa.<br />
Um cuidado adicional deve ser tomado quando da seleção das subdivisões dos<br />
itens acima, de maneira a evitar que possíveis componentes representando operações<br />
financeiras a curto prazo, disfarçadas sob as mais diversas formas, sejam<br />
incluídas no cálculo. Nem sempre isto será uma tarefa fácil, sobretudo quando a<br />
análise for realizada por pessoas não pertencentes ao quadro da empresa e, assim,<br />
com difícil acesso as fontes de dados.<br />
No que diz respeito as necessidades de recursos ligadas ao ciclo operacional, os<br />
registros sendo efetuados no lado esquerdo dos balanços, são representados,<br />
principalmente, pelas seguintes contas: clientes, outros créditos e estoques.<br />
Como anteriormente indicado, cuidados são necessários no sentido de eliminar<br />
possíveis distorções, cujo efeito seria de aumentar - ou diminuir quando as variações<br />
ocorrerem em sentido inverso - artificialmente o montante do financiamento<br />
requerido ao ciclo operacional.<br />
Assim, as contas clientes deverão ser depuradas dos valores cujos recebimentos<br />
tornaram-se inviáveis, deixando de representar contas a receber por parte da<br />
empresa, bem como daqueles já negociados com instituições financeiras, sendo o<br />
desconto de duplicatas uma das formas mais comumente utilizadas. Estoques<br />
deverão ser examinados com muita atenção - por representarem - frequentemente<br />
os maiores percentuais de necessidades ligadas ao ciclo a serem financiadas -<br />
devendo ser eliminada da composição do cálculo todo estoque que seja invendável,<br />
não importando o motivo, como forma de corrigir eventuais distorções impostas<br />
aos resultados.<br />
As proposições de composição e correção dos montantes em questão são de<br />
vital importância, visto que a apresentação formal desta parte do balanço, conforme<br />
estabelecido na Lei no 6.404, de 15 de dezembro de 1976, em ativo e passivo<br />
circulante não possibilita a distinção imediata dos componentes da necessidade de<br />
capital de giro (necessidade de capital de giro), de onde a necessidade de realização<br />
dos devidos ajustes nas contas existentes.<br />
Da mesma forma como existem recursos a curto prazo não ligados ao ciclo<br />
operacional, necessidades a curto prazo acíclicas também se farão presentes nas<br />
contas das empresas. O mesmo tipo de cuidado anteriormente indicado deverá ser<br />
adotado para as aplicações acíclicas.
5 e 7 Para efeitos de cálculo consideramos valores já<br />
corrigidos e depurados conforme indicações<br />
realizadas no texto.<br />
6 Onde: MP = matéria prima, PE = produtos em<br />
elaboração; PA = produtos acabados: outros = outros<br />
créditos, NCG = necessidade de capital de giro;<br />
forneced = fornecedores; OBR =outras obrigações<br />
ligadas ao ciclo operacional.<br />
8 Onde: TA = tesouraria ativa; AP = aplicações<br />
permanentes; TP = tesouraria passiva;<br />
RP = recursos permanentes.<br />
O valor das necessidades de recursos ligadas ao ciclo operacional será então:<br />
O valor das necessidades de recursos ligadas ao ciclo operacional será então:<br />
NCG = aplicações cíclicas - recursos cíclicos<br />
ou<br />
7<br />
NCG = (C + E + OC) - (F + OF + OB + P)<br />
As figura 2 e 3 apresentam a representação gráfica do esquema básico da<br />
necessidade de capital de giro.
Para uma maior compreensão do funcionamento do nível de alterações possíveis<br />
no montante das necessidades de recursos ligadas ao ciclo, bastará uma análise,<br />
dentro da equação anteriormente proposta, das mudanças acarretando aumento ou<br />
diminuição no resultado da diferença estabelecida.<br />
Logicamente, mantidos os demais fatores constantes, as variações em cada um<br />
dos itens mencionados representarão o sentido nas alterações sofridas pela necessidade<br />
de capital de giro. Contudo, outros elementos não representados na equação<br />
acima indicada apresentam forte relacionamento com o resultado final da mesma,<br />
podendo ter atuação sobre o montante indicado , mesmo sem participação direta.<br />
Sendo conhecido que as empresas operam em um mercado onde, na maior parte<br />
das vezes, a concorrência é exercida sob forma forte, o tamanho será então um indicador<br />
a ser considerado neste tipo de análise proposto. Um dos principais elementos<br />
contidos nesta referência será a possibilidade de obtenção de crédito entre<br />
empresas, bem como uma substancial forma de barganha ligada, normalmente, às<br />
quantidades e montantes movimentados, os quais podem influenciar os preços de<br />
aquisição de matérias-primas e produtos intermediários. As condições de pagamento<br />
serão também resultado deste fator e seus relacionamentos com fornecedores.<br />
Da mesma forma que para os recursos cíclicos o tamanho da empresa apresenta<br />
influência sobre as necessidades cíclicas, pois a concessão e facilidades de crédito<br />
oferecidas a seus clientes, viabilizando vendas, mas buscando recuperar os fundos<br />
o mais rapidamente possível, dependerá fundamentalmente das relações de força -<br />
entenda-se barganha - entre a empresa e seus clientes.<br />
Em geral a combinação dos efeitos acima mencionados conduz a aceitação do<br />
princípio estabelecendo que, todos os demais elementos mantidos constantes,<br />
quanto menor for a empresa maior será sua necessidade de recursos ligada ao ciclo<br />
operacional, logicamente observadas as condições de distinção das massas<br />
patrimoniais de cada empresa.<br />
Outro elemento crítico a ser considerado no estudo da evolução da necessidade<br />
de capital de giro é o setor de atividades no qual opera a empresa. É conhecido, e<br />
facilmente compreensível, que quanto maior for o número de operações a ser<br />
sofrida pela matéria-prima, dentro de seu processo de transformação em produto<br />
final, maior será a duração do ciclo de produção, fato que, evidentemente, tornará o<br />
ciclo operacional mais longo, ligando definitivamente este dimensionamento ao<br />
tipo de indústria e, dentro desta, à tecnologia em uso.<br />
Assim sendo, quanto maior a duração do ciclo operacional maiores serão as
9 Pressupondo a inexistência de estoques ociosos<br />
em montantes elevados.<br />
10 A situação descrita é típica de alguns poucos setores<br />
empresariais que apresentam como características a<br />
sistemática ocorrência de capital em giro negativo. A<br />
título de exemplificação citamos, como setores onde<br />
verifica-se tal tipo de fenômeno, os supermercados e<br />
comércio varejista. Salientamos que os setores<br />
mencionados representam apenas exemplos.<br />
11 Apesar de não ter sido especificamente mencionado<br />
no exemplo apresentado no texto os efeitos<br />
de uma diminuição das vendas deverá apresentar<br />
como reação o inverso daqueles obtidos com<br />
um aumento de vendas.<br />
participações relativas a estoques (matéria-prima, produtos em elaboração e<br />
produtos finais) no total das necessidades de recursos ligadas ao ciclo<br />
operacional. Contudo, a contrapartida de recursos financiando este mesmo<br />
ciclo, tendo como origem a conta fornecedores, nem sempre obedece ao<br />
mesmo padrão de comportamento, pois a relação entre ambos não é direta,<br />
visto a necessidade de manipulação e transformação das matérias-primas em<br />
produto final, fato que adiciona um valor suplementar aos estoques através<br />
do aumento no componente produtos.<br />
A existência de fatores de mercado gerando sazonalidade, seja no<br />
abastecimento de produtos e matérias-primas ou na colocação de produtos<br />
finais no mercado, afetam sensivelmente o ciclo operacional da empresa,<br />
pois via de regra apresentam como principal efeito o aumento de uma já<br />
existente defasagem entre desencaixes e encaixes, alterando completamente<br />
os fluxos internos da empresa de onde a necessidade de uma maior atenção<br />
quando da ocorrência de tais fenômenos.<br />
A qualidade dos serviços administrativos ligados aos elementos administrativos<br />
aqui tratados será preponderante no dimensionamento do necessidade de<br />
capital de giro, isto porque o nível dos estoques depende fundamentalmente do<br />
tipo e eficiência da estrutura adotada na área de produção, assim como a<br />
atualização e o funcionamento do setor financeiro será essencial para manutenção<br />
ordenada e cobrança contínua de valores a receber.<br />
Outro fator considerado como importante no estabelecimento das necessidades<br />
de recursos ligados ao ciclo operacional, por atuar indistintamente<br />
sobre todos os componentes diferença proposta é a alteração do nível de atividades<br />
da empresa. Um aumento no volume de vendas, exemplo da situação<br />
9<br />
acima proposta, implica, normalmente , em idêntica reação no nível de produção.<br />
Para tornar viável a execução desta última, será necessário adquirir<br />
maiores quantidades de matérias-primas e produtos intermediários, assim como<br />
incorrer em todas outras despesas ligadas ao processo produtivo, com as decorrentes<br />
alterações ocasionadas pelas mudanças mencionadas. Efeito semelhante<br />
deverá ser considerado para as necessidades de recursos, elementos do ativo.<br />
A reação em cadeia ocasionada pelo aumento do volume de vendas,<br />
atuando sobre todos os componentes da diferença proposta, deverá fazer com<br />
que esta evolua proporcionalmente a primeira, fazendo com que a empresa<br />
apresentando necessidade de capital de giro positivo - isto é, necessidades de<br />
recursos para financiar o ciclo operacional - tenham suas necessidades de<br />
recursos aumentadas proporcionalmente às vendas. No caso em que a<br />
empresa tenha necessidade de capital de giro negativo, isto é, os recursos<br />
ligados ao ciclo operacional são superiores às necessidades cíclicas - a<br />
resultante será mais negativa ainda, significando aumento dos recursos<br />
10<br />
financeiros liberados pelo ciclo .<br />
A ocorrência de tal fenômeno poderá ser o reflexo de um aumento ou<br />
11<br />
diminuição no volume de vendas, mas o fato gerador das mesmas poderá ter<br />
as mais diversas origens, tais como efeitos agindo sobre a economia como um<br />
todo ou lançamento de campanhas promocionais visando vender mais. O<br />
importante para a empresa será buscar antecipar a ocorrência de tais modificações<br />
de maneira a estar preparada quando os mesmos ocorrerem.<br />
Dentre as inúmeras ações econômicas agindo sobre a necessidade de<br />
capital de giro devemos destacar, sobretudo para o contexto brasileiro, os<br />
efeitos da inflação, cujo resultado imediato é um aumento deste último pelo<br />
simples fato do crescimento nominal dos preços, mantidas constantes as
12 Le diagnostic financier. Banque de France.<br />
quantidades produzidas e vendidas. Como consequências colaterais teremos custos<br />
de produção mais elevados, o mesmo acontecendo com os créditos concedidos a<br />
clientes - mantidos constantes os prazos.<br />
Se a empresa, por questões conjunturais e/ou setoriais, tiver a possibilidade de<br />
repassar imediatamente estes aumentos nominais para o preço de venda, estarão<br />
sendo assimilados e transferidos os efeitos inflacionários sobre a necessidade de<br />
capital de giro. Contudo nem sempre tal proposição é realizável, seja por controles<br />
governamentais, seja por fatores estruturais ligados ao setor de operações.<br />
O aumento das vendas e o consequente aumento da necessidade de capital de<br />
giro apresentam relações consideradas como clássicas, cujos resultados sobre<br />
pequenas e médias empresas são abaixo descritas:<br />
“Fase 1: ocorre um aumento do nível de vendas, seja por fatores devidos ao<br />
mercado ou internos à empresa;<br />
Fase 2: a empresa é obrigada a aumentar sua capacidade de produção - normalmente<br />
pequena devido ao tamanho da mesma - para atender a demanda. A solução é<br />
investir. Contudo a capacidade de obtenção de créditos por parte da empresa é<br />
limitada por fatores anteriormente mencionados.<br />
Fase 3: o investimento realizado absorve a essência dos recursos permanentes<br />
gerado pelas operações normais; o ciclo não disporá de recursos próprios para seu<br />
financiamento;<br />
Fase 4: as necessidades de recursos aumentam proporcionalmente ao aumento<br />
das vendas, a empresa ressente-se da necessidade de recursos permanentes para<br />
financiamento do ciclo operacional;<br />
Fase 5: a empresa é obrigada a aumentar seu capital ou realizar empréstimos a<br />
12<br />
longo prazo, não representando a melhor solução para pequenas empresas.”<br />
A situação descrita nas cinco fases acima é conhecida como fuga antecipada. O<br />
termo fuga deve-se ao fato da empresa buscar prever etapas posteriores de seu<br />
processo de desenvolvimento e, simultaneamente, eventuais soluções, contudo o<br />
resultado, conforme visto, conduz a um endividamento crescente e oneroso, com<br />
resultados, na maior parte das vezes, funestos.<br />
É importante a consideração das necessidades de recursos do ciclo operacional<br />
em situações econômicas ditas de recessão, onde algumas alternativas são possíveis:<br />
a. a empresa mantém seu nível de produção, devendo, contudo, criar expedientes<br />
capazes de aumentar o volume de vendas. Em períodos de crises persistentes e<br />
duradouras a execução de tais artifícios poderá vir a ser onerosa, diminuindo a<br />
amplitude dos recursos obtidos, da mesma forma a continuidade do esforço poderá<br />
dilapidar eventuais reservas;<br />
b. a redução do nível de produção , apresentando como efeito a estabilização dos<br />
estoques, normalmente inferiores aos iniciais, conduzindo a uma normalização dos<br />
valores a receber, equilibrando novamente o ciclo;<br />
c. a produção baixa a níveis inferiores ao das vendas, com a estrutura de
13 Como autofinanciamento entenderemos o resultado<br />
da seguinte relação:<br />
(lucro líquido do exercício - eventuais<br />
distribuições + depreciações).<br />
14 Pressupondo que os demais itens tenham<br />
mantido seus valores constantes.<br />
produção modificada a empresa busca tornar seus preços competitivos,<br />
sendo ajudada por uma limitação nas compras e utilização adequada e<br />
racional dos estoques. Determinados os montantes das necessidades de<br />
recursos ligadas ao ciclo operacional da empresa, o passo seguinte deve<br />
conduzir aos meios de financiamento das mesmas, os quais podem ser:<br />
g<br />
1. através de recursos permanentes da empresa, identificados anteriormente<br />
como capital de giro. Devemos salientar que as operações da empresa<br />
devem fornecer continuamente um saldo positivo - o qual chamaremos de<br />
13<br />
autofinanciamento - o qual será utilizado para financiar as necessidades<br />
indicadas. Em final de período, parte ou todo o autofinanciamento poderá<br />
14<br />
incorporar-se ao capital próprio, aumentando o capital de giro da empresa.<br />
Logicamente o raciocínio acima explicitado é válido somente para empresas<br />
cuja estruturação possibilite a obtenção de resultados positivos, as empresas<br />
que não se encontrarem neste grupo serão levadas a encontrar formas<br />
alternativas de financiamento do capital de giro.<br />
f<br />
2. a utilização de financiamento bancário para as necessidades de recursos<br />
ligadas ao ciclo operacional é uma das soluções possíveis, deverá ser<br />
considerado, contudo, o efeito da fuga antecipada, isto é, endividamento<br />
progressivo. Outro fator a ser ponderado é a disponibilidade de faixas de<br />
crédito por parte de instituições financeiras, bem como seus respectivos<br />
custos, os quais normalmente diminuem a já debilitada capacidade de<br />
autofinanciamento da empresa. Problemas ligados a um setor industrial<br />
poderão igualmente afetar a obtenção de te tipo de recursos.<br />
REFERÊNCIAS<br />
BAÊTA, Adelaide Maria Coelho e LEITE, João Batista Diniz. Capital de risco e<br />
desenvolvimento tecnológico. Revista de Administração de Empresas, São Paulo,<br />
abr./Jun., 1990, p. 73-78.<br />
BARICH, Howard et SRINIVASAN, V. Prioritizing marketing image goals under<br />
resource constraints. Sloan Management Review, summer 1993, p. 69-76.<br />
BETHELEM, Agrícola. O crescimento das empresas brasileiras: algumas<br />
considerações sobre causas e efeitos. Revista de Administração de Empresas, São<br />
Paulo, Vol. 35, jan./fev., 1995, p. 6-13.<br />
BETHELEM, Agrícola de S. Gerência à brasileira. McGraw-Hill, São Paulo, 1989, 322 p.<br />
BRAGA, Roberto. Fundamentos e técnicas de administração financeira. Atlas,<br />
São Paulo, 1992.<br />
CHANDLER, A. Strategy and structure: chapter in the history of the industrial<br />
enterprise. Cambridge, Mass., MIT Press, 1962, 463 p. 07. CHANDLER, A. The<br />
visible hand: the managerial revolution in America business. Cambridge, Mass.,<br />
Belknap, 1977, 607 p.<br />
ECCLES. Roberto G. The performance measurement manifesto. Harvard<br />
Business Review, jan./feb., 1991, p. 131-137.<br />
FLEURIET, Michel et KIENAST, Philippe. Analyse financière de l’entreprise:<br />
4ème partie. Documento Fl085 a 79 do CESA. Mimeo.<br />
FLEURIET, Michel et KIENAST, Philippe. Comment assurer la bonne marche<br />
financière de son entreprise. Paris, L’Usine Nouvelle, 1982.
FLEURIET, Michel, KEHDY, Ricardo et BLANC, Georges. A dinâmica financeira das<br />
empresas brasileiras: um novo método de análise, orçamento e planejamento financeiro.<br />
Belo Horizonte, Consultoria Editorial Ltda. 1980.<br />
FULLER, Joseph B., O’CONOR, James et RAWLINSON, Richard. Tailored logistics: the<br />
next advantage. Harvard Business Review, may/jun., 1993, p. 87-97.<br />
GARVIN, David A. Building a Learning organization. Harvard Business Review,<br />
jul./aug., 1993, p. 78-91.<br />
HART, Stuart et BANBURY, Catherine. How strategy-making processes can make a<br />
difference. Strategic Management Journal, Vol. 15, 1994, p. 251-269.<br />
HOPP, João Carlos et LEITE, Hélio de Paula. Onde nascem os prejuízos. Revista de<br />
Administração de Empresas, São Paulo, out/dez, 1990, p. 61-70.<br />
IUDÍCIBUS, Sérgio de; MARTINS, Eliseu et GELBCKE, Ernesto R. Manual de<br />
contabilidade das sociedades por ações: aplicável também às demais sociedades. Atlas,<br />
São Paulo, 1980.<br />
KAPLAN, Robert S. et NORTON, David P. The balanced scoreboard: measures that drive<br />
performance. Harvard Business Review, January-February 1992, p. 71-79.<br />
LEITÃO, Carlos A. de Oliveira. A abertura de capital: empresas de capital aberto e empresas<br />
fechadas. Revista de Administração, São Paulo, Vol. 26, outubro-dezembro 1991, p. 24-33.<br />
MARKS, Howard S. The value of predictions, or where’d all this rain come from?<br />
Financial Analysts Journal, nov./dec., 1993, p. 6-8.<br />
MARTINS, Eliseu et ASSAF NETO, Alexandre. Administração financeira: as finanças<br />
das empresas sob condições inflacionárias. Atlas, São Paulo, 1985.<br />
MEHTA, Dileep R. Administração do capital de giro. São Paulo, Atlas, 1974.<br />
MEYER, Christopher. How the right measures help teams excel. Harvard Business<br />
Review, may/jun., 1994, p. 95-103.<br />
NORMANN, Richard et RAMÍREZ, Rafael. From value chain to value constellation:<br />
Designing interactive strategy. Harvard Business Review, jul./aug., 1993, p. 65-77.<br />
OLIVEIRA, Ernani Tadeu de. Crescer em equilíbrio: alguns efeitos a serem considerados<br />
para os índices de crescimento e endividamento. Revista de Administração , São Paulo, v.<br />
20, no 1, jan./mar., 1985.<br />
PAINE, Lynn Sharp. Managing for organizacional integrity. Harvard Business Review,<br />
mar./apr., 1994, p. 106-117.<br />
STANCILL, James McNeill. When is there cash in flow? Harvard Business Review,<br />
mar./apr., 1987, p. 38-49.<br />
SOUZA NETO, José Deodato de et STAL, Eva. Financiamento de risco para a inovação<br />
tecnológica na empresa. Revista de Administração, São Paulo, v. 26, out./dez., 1991, p. 34-47.<br />
STEVER, James A. Technology, organizartion, freedom: the organizational theory of<br />
John Dewey. Administration & Society, v. 24, February 1993, p. 419-443.<br />
VERNIMMEN, Pierre. Finance d’entreprise: analyse et gestion. Paris, Dalloz, 1981.<br />
VERNIMMEN, Pierre. Finance d’entreprise: logique et politique. Paris, Dalloz, 1976.<br />
VIRZI, Alexandre Hansen. Planejamento financeiro. Revista de Administração de<br />
Empresas, São Paulo, abr./jun.,1990, p. 79-90.<br />
WALTER, Milton Augusto. Introdução à análise de balanços: de acordo com a nova Lei<br />
das Sociedades Anônimas - Lei 6.404 de 15 de dezembro de 1976. São Paulo, Saraiva, 1977.
1 INTRODUÇÃO<br />
A securitização, operação cujo conhecimento, até pouco tempo, era restrito a<br />
operadores desse mercado específico, está cada vez mais se tornando comum em<br />
diversos nichos de mercado, além do já mais tradicional mercado imobiliário.<br />
Note-se que institutos como o que trata o presente trabalho são objeto de<br />
constantes e relevantes mudanças. Deve-se, inclusive, a essa característica, boa<br />
parte de sua utilidade aos agentes econômicos, que necessitam de instrumentos<br />
dinâmicos e adaptáveis para revestir os negócios, especialmente no âmbito do<br />
mercado financeiro e de capitais. Com efeito, a securitização, conforme já se<br />
previa há alguns anos, tem passado por fases de evolução e amadurecimento<br />
consistentes, o que torna a operação cada vez mais adequada aos fins pretendidos<br />
por aqueles que a utilizam.<br />
Com relação aos negócios envolvendo as várias estruturas que podem ser<br />
identificadas como securitização – como os fundos de direitos creditórios e<br />
sociedades securitizadoras, houve um crescimento significativo nos últimos<br />
anos. Entre 2002 e os três primeiros trimestres de 2005, o volume de recursos<br />
envolvidos em operações de securitização aumentou mais de 1000%, conforme<br />
dados colhidos da Comissão de Valores Mobiliários e Associação Nacional de<br />
1<br />
Bancos de Investimentos pela Moody´s Investors Service . No mesmo sentido,<br />
tem-se que somente em fundos de investimentos em direitos creditórios, o<br />
2<br />
volume de recursos chegou a R$ 32.107.982.740,00 no início de 2008 , sendo<br />
que, mesmo com a crise financeira, as emissões até o final do mês de março de<br />
2009 já somavam R$ 6.404.929.537,00.<br />
Porém, mas do que os números, vê-se uma evolução no entendimento que os<br />
operadores do Direito e o próprio legislador têm da securitização. Nos últimos dois<br />
anos, alguns avanços legislativos contribuíram para fortalecer a segurança jurídica<br />
da operação, reconhecida, inclusive, pelas próprias autoridades governamentais,<br />
com tratamento tributário diferenciado para algumas espécies de securitizadoras,<br />
como importante ferramenta de financiamento a projetos de grande vulto.<br />
Uma das principais inovações, no que pese não se tratar de uma lei específica<br />
sobre o instituto, vem na nova Lei de Falências e Recuperação Judicial, que<br />
excluiu expressamente os bens cedidos em operações de securitização da massa<br />
falida. Apesar de ainda não se poder precisar o alcance que o judiciário vai dar a<br />
esse dispositivo, vê-se que uma importante dúvida acerca da viabilidade jurídica<br />
da securitização no Brasil foi assim dirimida.<br />
Além disso, tem-se considerado a securitização como alternativa de financiamento<br />
em outros segmentos de mercado. Nesse sentido, foi editada, em 2005,<br />
legislação acerca de securitização de base agrícola. No que pese ser possível a<br />
securitização de praticamente qualquer ativo, independente de legislação<br />
especial, conforme defende-se no presente trabalho, a criação de títulos específi-<br />
1 Dados disponíveis em<br />
www.moodys.com.br/brasil/pdf/Special_Co<br />
mment_Brazil_Securitization_2005_Portugu<br />
ese_pdf. Acesso em: 08 ago. 2006.<br />
2 [~]. Disponível em: .<br />
Acesso em: 23 jun. 2009.
3 Há autores que se referem à década de 30 do século<br />
passado como tendo sido o berço da securitização. A<br />
grande depressão americana teria obrigado o governo<br />
a criar novas formas de financiamento para a<br />
habitação. Porém, foi apenas na década de 70 que o<br />
mercado secundário para os títulos emitidos nesses<br />
processos floresceu e tornou-se relevante.<br />
4 Sobre o assunto, conf. BRENDSEL, Leland.<br />
Securitization´s role in housing finance. In:<br />
KENDALL, Leon T.; FISHMAN, Michael J.<br />
(Coord.). op. cit., p. 22.<br />
cos e estrutura própria demonstra o interesse das autoridades no desenvolvimento<br />
da operação e a torna mais segura.<br />
Por outro lado, a securitização de base imobiliária foi o pivô da crise na financeira<br />
mundial no segundo semestre de 2008, quando o mercado de hipotecas americano<br />
apresentou sinal de fragilidade, oriundo da oferta indiscriminada de crédito que<br />
posteriormente seria securitizado, pondo sob suspeita a capacidade da securitização<br />
efetivamente diluir riscos.<br />
O objetivo deste breve trabalho e apresentar as linhas gerais da operação de<br />
securitização, um pouco de sua história e, especialmente, a sua inserção no ordenamento<br />
jurídico brasileiro.<br />
2 ASPECTOS CONCEITUAIS A securitização tem origem recente, e, embora possa ter havido operações com<br />
3<br />
estruturas semelhantes anteriormente , o nascimento dessa operação tem sua base<br />
no mercado imobiliário dos Estados Unidos dos anos 70 do século recém findo.<br />
Naquela época, a demanda por recursos para financiamento à habitação e a pouca<br />
oferta de capitais fizeram com que o mercado encontrasse mecanismos alternativos<br />
ao financiamento imobiliário tradicional.<br />
Pode-se considerar que três fatores principais impulsionaram o progresso da<br />
securitização no financiamento imobiliário dos Estados Unidos: (i) a securitização<br />
atrai capital privado para essa parcela do mercado que geralmente é atendida pelo<br />
setor público, pois apresenta flexibilidade em sua estrutura e características para<br />
atender às necessidades do investidor; (ii) a securitização promove a competitividade<br />
entre agentes do mercado para prestação dos diversos serviços correlatos à<br />
operação, o que faz com que sejam reduzidos os custos de captação; e (iii) a<br />
securitização traz maior estabilidade ao mercado de financiamento imobiliário,<br />
4<br />
pois é um sistema apto a gerenciar melhor os riscos a ele inerentes . (BRENDSEL<br />
in KENDALL, 1996, p. 22)<br />
No Brasil, a securitização começou a ser utilizada em operações de exportação<br />
no final da década de oitenta do século vinte, mas foi nos anos noventa que ela<br />
iniciou seu desenvolvimento, especialmente no financiamento de projetos imobiliários.<br />
Diferentemente do que aconteceu nos Estados Unidos, a securitização foi<br />
introduzida entre nós por agentes privados, e apesar de também ter como alvo o<br />
mercado imobiliário, o foco foi diferente: o financiamento de projetos como centros<br />
comerciais foi a principal utilização inicial da operação. As emissões de títulos<br />
estavam lastreadas em créditos futuros, e não em dívidas já existentes.<br />
Apenas em 1997 o governo brasileiro resolveu se utilizar da securitização para<br />
tentar mitigar o problema do déficit de recursos para o financiamento habitacional,<br />
com a promulgação da Lei nº 9.514 que disciplina o Sistema Financeiro Imobiliário.<br />
Atualmente, além de movimentos de entidades privadas para o desenvolvimento<br />
da securitização de base imobiliária no Brasil, é cada vez maior a utilização da<br />
securitização com lastro em outros tipos de ativo, como créditos financeiros ou<br />
comerciais, e, mais recentemente, oriundos do agronegócio.<br />
Existem diversas estruturas que podem ser classificadas como securitização, e,<br />
por ser uma operação relativamente recente, não conta com uma construção<br />
doutrinária jurídica sólida a respeito de seus aspectos conceituais.<br />
Do ponto de vista financeiro, a securitização em sentido estrito é uma operação<br />
por meio da qual se mobilizam ativos – presentes ou futuros que, de outra maneira,<br />
não teriam a possibilidade de se autofinanciar ou gerar renda presente. A possibilidade<br />
de se emitirem títulos ou valores mobiliários a partir de uma operação de<br />
cessão ordinária é uma forma de se mobilizarem créditos gerados nas mais diversas<br />
operações, ainda que tais créditos só venham a ser realizados no futuro.
3 SECURITIZAÇÃO E O<br />
SISTEMA FINANCEIRO<br />
Com a securitização, o agente econômico que origina créditos pode diluir<br />
os riscos de sua carteira de recebíveis, mesmo que ela seja futura, e adiantar<br />
receitas a ela referentes ou financiar projetos pela emissão de títulos lastreados<br />
nessa carteira. Assim, a função econômica da securitização pode ser<br />
resumida em três aspectos: mobilizar riquezas, dispersar riscos e desintermediar<br />
o processo de financiamento.<br />
Sob a ótica jurídica, a securitização pode ser definida como a estrutura<br />
composta por um conjunto de negócios jurídicos – ou um negócio jurídico<br />
indireto, que envolve a cessão e segregação de ativos em uma sociedade ou um<br />
fundo de investimento emissor títulos garantidos pelos ativos segregados. Esses<br />
títulos são vendidos a investidores e os recursos coletados servem de contraprestação<br />
pela cessão de ativos.<br />
De acordo com Armindo Matias, a “noção genérica e ampla que nos fica da<br />
titularização é a de uma emissão de títulos negociáveis tendo por base e substrato<br />
fluxos de tesouraria gerados por activos específicos.” (MATIAS, 1998, p. 50).<br />
Dessa forma, e ainda segundo o citado autor, na operação de securitização,<br />
ativos são desvinculados do patrimônio do originador, por meio da<br />
transferência da titularidade de tais ativos, e posteriormente, pela emissão de<br />
títulos representativos desse universo.<br />
Assim, pode-se definir securitização como um conjunto de contratos que<br />
visa à emissão de títulos garantidos por um ativo específico, segregado<br />
geralmente em veículo de propósito exclusivo do patrimônio geral da<br />
sociedade beneficiária final dos recursos captados.<br />
Tendo como parâmetro a análise institucional, é difícil inserir a securitização<br />
ou os veículos que se prestam à operação, em um dos sub-sistemas do<br />
Sistema Financeiro. Apesar de ser uma operação típica do mercado de<br />
capitais, conforme se verá adiante, ela está intimamente ligada ao sistema<br />
financeiro propriamente dito. Por outro lado, nem todas as companhias<br />
securitizadoras estão sujeitas à fiscalização do Banco Central, pois são<br />
constituídas sob a forma de sociedades não financeiras, ou mesmo da CVM se<br />
a emissão de títulos e valores mobiliários se der privadamente. Todavia,<br />
colocar a securitização fora, como algo paralelo ao sistema financeiro, seria<br />
negar suas funções econômicas, ligadas primordialmente à captação de<br />
recursos e a dispersão do risco.<br />
Não obstante, uma análise diferente do Sistema Financeiro Nacional pode<br />
mostrar que a securitização está, sim, inserida em sua estrutura. O sistema<br />
financeiro também pode ser analisado sob uma perspectiva funcional ao invés<br />
de institucional, como qualquer outra atividade econômica e, sob essa ótica,<br />
pode-se perceber claramente a inserção da securitização em sua estrutura.<br />
As operações de securitização se dão, assim, dentro do sistema financeiro,<br />
e não paralelamente a ele, sendo, na verdade, uma evolução em sua estrutura,<br />
que visa torná-lo mais eficiente na captação de recursos e dispersão de risco. A<br />
securitização inova, assim, em um dos elementos caracterizadores da atividade<br />
financeira, pois enquanto a coleta e aplicação de recursos restam inalteradas, a<br />
intermediação financeira ganha um novo sentido no mercado securitizado.<br />
É certo, todavia, que aqui se trata sistema financeiro de maneira ampla,<br />
abrangendo tanto o mercado financeiro propriamente dito – intermediado,<br />
quanto o mercado de capitais. Se considerarmos essa subdivisão, resta claro<br />
que a securitização é uma operação típica do mercado de capitais. A diferença<br />
entre os mercados financeiros e de capitais reside na forma como os recursos
5 Nesse sentido, ensina Lowell Bryan, (BRYAN in<br />
KENDALL, 1996, p. 173],"The whole bundle of<br />
technology called banking is a very mature<br />
technology and is being displaced by a different one<br />
based upon securities, which is still in a rapid growth<br />
phase". (Toda a parafernalha tecnológica chamada<br />
de sistema bancário é bastante madura e está sendo<br />
deslocada para uma diferente baseada em valores<br />
mobiliários, que ainda está em uma fase<br />
de crescimento acelerado.)<br />
financeiros transitam entre aqueles que buscam formas de aplicar sua renda não<br />
consumida e aqueles que procuram financiamento para seus projetos e negócios.<br />
Assim, investimento e poupança constituem o cerne dessa distinção, por meio da<br />
qual se procura identificar mecanismos que possibilitem o aproveitamento dos<br />
fluxos de poupança e investimentos da forma mais eficiente possível.<br />
De acordo com Andrea Andrezo e Iram Lima: "o mercado financeiro é composto<br />
por um conjunto de instituições e instrumentos financeiros destinados a possibilitar<br />
a transferência de recursos dos ofertadores para os tomadores, criando condições<br />
de liquidez do mercado.” (1999, p. 3). Ainda de acordo com os autores, o mercado<br />
financeiro é o lugar onde o dinheiro é gerido, intermediado, oferecido e procurado,<br />
por meio de canais de comunicação que se entrelaçam na formação de sistemas.<br />
Esse sistema de intermediação, em que o intermediário financeiro mantém capital<br />
suficiente para absorver todos os riscos de suas operações, tem-se tornado obsoleto se<br />
comparado às modernas técnicas de engenharia financeira, nas quais os riscos envolvidos<br />
podem ser dispersados. O processo que começou sendo chamado de desintermediação,<br />
e hoje é conhecido como securitização em sentido amplo, tem início, fazendo<br />
com que os bancos, no exercício de suas funções originais, percam o monopólio e o<br />
controle da liquidez do mercado. (BRYAN in KENDALL, 1996, p. 172).<br />
O fenômeno da desintermediação pode ser analisado como um aspecto isolado,<br />
visto como o recurso cada vez mais freqüente ao mercado de capitais, tanto por<br />
investidores quanto por poupadores. Por outro lado, também pode ser agrupado com<br />
um conjunto de outras tendências, que, na verdade, fazem parte de um mesmo<br />
fenômeno, que modificou e está ainda modificando o modelo de intermediação<br />
5<br />
financeira até hoje conhecido.<br />
Com efeito, na visão de Arnold Wald, a complexidade que o mercado de crédito<br />
atingiu nos últimos anos fez com que se multiplicassem as fórmulas de financiamento,<br />
e isso modificou o papel dos bancos no mercado financeiro. De meros prestamistas,<br />
os bancos passaram a catalisadores de negócios. (1979, p.343 e seguintes).<br />
Ainda de acordo com o mesmo autor, há no Brasil uma superposição e uma<br />
interpenetração entre mercados financeiro e de capitais, não sendo possível, por<br />
razões históricas, a criação de um mercado de capitais totalmente separado e<br />
simplesmente complementar ao sistema bancário. Deve-se, apenas, delimitar as<br />
superposições e determinar as funções de cada um deles.<br />
4 NATUREZA De acordo com Ascarelli, a utilização de tradicionais institutos jurídicos com<br />
funções diversas das que usualmente exercem desenvolve o Direito, pois tais<br />
institutos, apesar de manterem a mesma forma, servem a finalidades renovadas.<br />
(2001, p. 152 e seguintes).<br />
Ainda de acordo com o citado autor, o fenômeno da utilização de antigas formas<br />
para novos fins visa conciliar exigências da vida prática com a certeza e a segurança<br />
da disciplina jurídica. Por vezes, esse fenômeno mostra-se mais adequado que a<br />
edição de legislação específica, já que os institutos utilizados tradicionalmente<br />
oferecem maior certeza e segurança que os novos institutos. Apesar de às vezes<br />
contrariar a simetria e a estética do sistema jurídico, esse tipo de absorção de novos<br />
negócios dentro de figuras jurídicas antigas traz vantagens, como a satisfação de<br />
novas exigências, sem o abandono do desenvolvimento jurídico, e a certeza<br />
decorrente da utilização de institutos já conhecidos. (2001, p. 155)<br />
Ascarelli ensina ainda que esse fenômeno pode ser denominado inércia jurídica.<br />
Afirma o autor que:<br />
[...] o direito evolui muitas vezes lentamente, mas organicamente; os novos<br />
institutos não surgem de improviso, mas desenvolvem-se pouco a pouco, no tronco
6 A confirmar essa caracterização, o próprio autor da<br />
teoria afirma que o exemplo típico de negócio<br />
indireto é o negócio fiduciário: "o fim realmente<br />
perseguido pelas partes com o negócio não<br />
corresponde ao típico negócio adoptado; o negócio é<br />
querido, e seriamente querido pelas partes, mas para<br />
um escopo diverso do seu escopo típico. A<br />
característica do negócio fiduciário deriva do fato de<br />
realizar uma transmissão de propriedade, mas de o<br />
seu efeito de direito real ser parcialmente neutralizado<br />
por uma convenção entre as partes, em virtude da<br />
qual o adquirente pode aproveitar-se da propriedade<br />
adquirida, exclusivamente para o fim especial<br />
pretendido pelas partes". (ASCARELLI, 1965, p. 13).<br />
Como já exposto, os países que adotam o sistema<br />
Anglo-saxônico mesmo alguns filiados ao sistema<br />
romano-germânico adotam o trust(fideicomisso)<br />
como veículo de securitização.<br />
7 RUBINO, Domenico. Il negozio jurídico indiretto.<br />
Milano: Giuffrè, 1937. p. 83 e ss. (, 1937, p. 83 e<br />
seguintes, tradução nossa) "Ciascuno dei singoli<br />
mezzi combinati di solito è adottato puramente e<br />
semplicemente, o per lo meno senza particolarità<br />
idonee a palesare lo scopo indiretto, che può<br />
arguirsi con sicurezza solo considerando il loro<br />
insieme, già che próprio in si ffatta combinazione<br />
risiede la caratteristica del procedimento".]<br />
(Qualquer dos meios isolados quando combinados<br />
é adotado de maneira pura e simples, ou<br />
ao menos sem particularidade idônea a revelar<br />
o escopo indireto, que se pode arguir com<br />
segurança apenas considerando o conjunto, já que<br />
exatamente na combinação é que reside a<br />
característica do procedimento.)<br />
de velhos institutos que incessantemente se renovam e desempenham<br />
novas funções. É exatamente através dessa contínua adaptação de velhos<br />
institutos a novas funções que o direito se vai desenvolvendo, não raro<br />
exibindo, na forma que permanece idêntica a despeito do renovar das<br />
funções, traços da sua história passada. (1965, p. 8).<br />
Essa utilização de formas jurídicas já consagradas com fins diversos<br />
daqueles para os quais foram criadas dá origem ao que se pode chamar de<br />
negócio indireto. Ainda no parecer de Ascarelli, [..] há, pois, um negócio<br />
indireto sempre que as partes recorrem, no caso concreto, a um negócio<br />
determinado visando a alcançar através dele, consciente e consensualmente,<br />
finalidades diversas das que, em princípio, lhe são típicas. (2001, p. 156).<br />
O conjunto formado pela estrutura contratual de uma operação de<br />
securitização poderia, de acordo com a teoria de Ascarelli, ser considerado<br />
um negócio indireto, pois, por meio de contratos já tradicionais em nosso<br />
ordenamento, buscam-se formas jurídicas para atingir a um fim específico:<br />
6<br />
qual seja, a operação de securitização.<br />
Isso porque ao se constituir o veículo de propósito exclusivo, ao se<br />
segregar os ativos que servirão de lastro e ao se emitirem os títulos, visa-se a<br />
uma estrutura única, como se cada um dos negócios jurídicos envolvidos não<br />
pudesse ser considerado isoladamente, mas em conjunto, dessem forma e<br />
conteúdo a uma estrutura determinada, qual seja, a securitização. Assim, o<br />
fim de cada um deles seria a consecução da securitização, e não a simples<br />
constituição de uma sociedade, ou cessão de contratos.<br />
Com efeito, ainda de acordo com Ascarelli, o elemento decisivo para se<br />
caracterizar diversos negócios como negócio único é a conexão dos vários fins<br />
almejados pela vontade das partes: quando as intenções econômicas das partes<br />
são estreitamente ligadas entre si, há um negócio único. (2001, p. 163-165)<br />
7<br />
No mesmo sentido, Domenico Rubino afirma que se pode falar em<br />
"combinação de negócios com escopo indireto", sempre que sejam utilizados<br />
vários "negócios-meio" para se atingir ao "negócio-fim", sendo essa combinação<br />
considerada um negócio único. (RUBINO, 1937, p. 83 e seguintes).<br />
Na securitização, negócios jurídicos tradicionais são utilizados com<br />
escopo diferente do que têm via de regra. O interesse das partes as leva a<br />
praticá-los visando uma estrutura mais complexa, e não o fim de cada<br />
negócio individualmente. Sob outro ponto de vista, poder-se-ia também<br />
afirmar que a securitização acrescenta elementos novos, não previstos na<br />
norma positiva, a institutos já consagrados, de modo a satisfazer ao interesse<br />
das partes na celebração do negócio jurídico pretendido.<br />
O principal escopo das partes em se utilizar de estruturas jurídicas para<br />
fins diferentes daqueles a que normalmente se destinam é apropriar-se da<br />
disciplina jurídica dessas estruturas, já consagradas e conhecidas, e não se<br />
afastar do terreno conhecido dos negócios nominados.<br />
4.1 A Securitização como Negócio Fiduciário<br />
Uma vez definido que a securitização pode ser caracterizada como um<br />
negócio indireto, resta determinar que tipo de negócio indireto ela seria.<br />
Dentre as espécies de negócios indiretos, aqueles mais comuns, e ao<br />
mesmo tempo, de maior utilidade na prática negocial, são os negócios fiduciários.<br />
Há autores que identificam os dois institutos, porém, a grande maioria<br />
advoga pela relação do tipo gênero-espécie entre os dois. Nesse sentido, o<br />
negócio fiduciário seria uma das modalidades de negócio indireto
(ASCARELLI, 1965, p. 20), já que possui características distintivas e constantes,<br />
diversas daquelas apresentadas por outros tipos de negócios indiretos.<br />
Segundo Luigi Cariota-Ferrara (1933), os negócios indiretos englobam os<br />
negócios fiduciários, os quais não constituem o único exemplo daqueles. No<br />
âmbito dos negócios indiretos, o traço distintivo dos negócios fiduciários está no<br />
fato de que se constituem em um negócio real, limitado por um pacto obrigacional.<br />
Apresentam, segundo o mesmo autor, um excesso do meio com relação ao objetivo.<br />
O negócio fiduciário é aquele pelo qual uma pessoa (fiduciante) transmite a<br />
propriedade de uma coisa ou a titularidade de um direito a outra (fiduciário), que se<br />
obriga a dar-lhe a destinação determinada em um instrumento à parte (pacto<br />
fiduciário), e, uma vez cumprido esse encargo, a devolver a coisa ou o direito ao<br />
fiduciante ou a um terceiro beneficiário.<br />
Nas palavras de Otto de Souza Lima o negócio fiduciário é “aquele em que se<br />
transmite uma coisa ou direito a outrem, para determinado fim, assumindo o<br />
adquirente a obrigação de usar deles segundo aquele fim e, satisfeito este, devolvêlos<br />
ao transmitente”. (LIMA, 1959).<br />
É característica do negócio fiduciário a articulação entre a transmissão da<br />
propriedade de um bem ou da titularidade de um direito, e uma convenção firmada<br />
entre as partes, com o intuito de amenizar os efeitos do direito real transmitido, uma<br />
vez que tal transmissão se faz visando tornar o fiduciário proprietário da coisa ou<br />
titular do direito transmitido, mas com a ressalva de que essa propriedade/titularidade<br />
está afetada a um fim pactuado entre as partes. (CHALHUB, 2000, p. 43 e seguintes).<br />
Na formalização do negócio fiduciário opera-se a transmissão da propriedade<br />
de um bem ou da titularidade de um direito do fiduciante ao fiduciário, e simultaneamente,<br />
verifica-se a aquisição de direitos por parte do fiduciante e de obrigações<br />
por parte do fiduciário em decorrência de outro contrato ligado a essa transmissão.<br />
Nas palavras de Ferrara, há a união de dois negócios de índole e efeitos diferentes,<br />
colocados em recíproca oposição: um contrato real positivo e um contrato obrigacional<br />
negativo. Ocorre que ambos os negócios estão ligados pela unidade de escopo,<br />
tornando-se uno e incindível. (1939, p. 53 e seguintes).<br />
Na estrutura de qualquer operação que possa ser considerada uma securitização<br />
em sentido estrito, pode-se encontrar os elementos de um negócio fiduciário: há<br />
uma cessão de bens ou direito por parte do originador (fiduciante) a um veículo de<br />
propósito exclusivo (fiduciário) em benéfico dos investidores, com um escopo<br />
determinado, que não pode ser desvirtuado pelo cessionário.<br />
É claro que na securitização, muito mais que simplesmente a fidúcia, as funções<br />
e poderes do fiduciário estão protegidas contratualmente, e mesmo pela legislação,<br />
nas hipóteses de securitização de créditos imobiliários e financeiros. Mesmo assim,<br />
a natureza fiduciária da securitização é patente, sendo ela reconhecida, ainda que<br />
indiretamente, pelo próprio legislador.<br />
Existem diversos exemplos de negócios fiduciários já presentes há algum tempo<br />
na legislação brasileira, como a alienação fiduciária em garantia e, em certa medida,<br />
os fundos de mútuos de investimento. Não obstante, foi com o desenvolvimento da<br />
securitização que o legislador brasileiro tomou iniciativas realmente inovadoras,<br />
com a instituição da propriedade fiduciária nos fundos de investimento imobiliário,<br />
o regime fiduciário e a alienação fiduciária de bens imóveis do Sistema Financeiro<br />
Imobiliário e ainda o patrimônio de afetação nas incorporações imobiliárias.<br />
Assim, o próprio legislador, reconhecendo a natureza da securitização de<br />
negócio fiduciário, procurou tornar disponíveis institutos que pudessem viabilizar<br />
sua estruturação de maneira mais segura, pelo menos no que diz respeito ao<br />
segmento imobiliário.
5 ESTRUTURA DA OPERAÇÃO<br />
8 De acordo com os autores, (; FISHMAN, 1996, p. 1<br />
tradução nossa) Securitization may be defined as a<br />
process of packaging individual loans and other debt<br />
instruments, converting the package into security or<br />
securities, and enhancing their credit status or rating<br />
to further their sale to third parties]. (A securitização<br />
pode ser definida como uma processo de<br />
empacotamento de empréstimos individuais e outros<br />
instrumentos de dívida, convertento o pacote em<br />
valor mobiliários ou valores mobiliários, e<br />
melhorando o seu estatus de crédito ou avaliação<br />
para vendê-los a terceiros.)<br />
Apesar de ter surgido há poucas décadas, a securitização já é uma operação<br />
utilizada em quase todo o mundo. Na prática, a operação de securitização<br />
consiste em que a sociedade que possui o ativo a ser securitizado - que se<br />
denomina originador - transfere esse ativo a um veículo especificamente<br />
criado para esse fim, sem atividade operacional, que pode ser uma sociedade,<br />
um fundo, um trust - denominado veículo de propósito exclusivo, ou VPE -<br />
que, por sua vez, emitirá títulos lastreados nos créditos recebidos, captando,<br />
assim, recursos que serão repassados ao originador, como pagamento pela<br />
cessão dos créditos ou de outro ativo utilizado.<br />
Em linhas gerais, nessa operação, o originador segrega de seu patrimônio<br />
geral determinado ativo em um VPE, por meio de uma cessão de crédito ou<br />
de contrato. A partir do lastro representado pelo ativo cedido, o VPE emitirá<br />
títulos a serem adquiridos por investidores, que, assim, antecipam uma<br />
receita que só no futuro seria realizada pelo originador.<br />
O ativo pode ser um fluxo de recebimentos, um bem, ou um direito de<br />
qualquer ordem, desde que possa ser cedido e gerar renda. Podem ainda ser<br />
lastro de operações de securitização as receitas futuras, desde que determináveis.<br />
O título a ele associado deve ser estruturado de acordo com os<br />
objetivos de cada operação, sendo o instrumento utilizado para transferir o<br />
resultado financeiro originado pelo ativo aos investidores.<br />
8<br />
De acordo com Kendall e Fishman , a estrutura da securitização pode<br />
ser definida como um agrupamento de empréstimos individuais e outros<br />
instrumentos de débito, seguido de sua conversão em valores mobiliários<br />
e do melhoramento de sua classificação de risco - por meio da prestação<br />
de garantias adicionais, ou posterior medição de seu risco de crédito,<br />
para que possam ser assim alcançar um preço melhor junto a investidores.<br />
Ainda de acordo com o mesmo autor, essa operação transforma os ativos<br />
iniciais, que são ilíquidos por natureza, em instrumentos que podem ser<br />
vendidos a investidores, fazendo circular a riqueza que eles representam,<br />
multiplicando-a.<br />
Diferentemente das emissões tradicionais, a garantia primeira dos<br />
investidores não recai sobre a totalidade do patrimônio do tomador dos<br />
recursos, mas apenas sobre o grupo de ativos que deu origem à emissão. Da<br />
mesma forma, o risco dos investidores restringe-se a esse ativo, em vez de<br />
englobar todo o negócio do originador.<br />
Nessa ordem de idéias, a securitização é estruturada para se autofinanciar<br />
e sustentar, não tendo o emitente outra obrigação para com os proprietários<br />
dos títulos, senão o fluxo oriundo do grupo de ativos segregados.<br />
(KENDALL; FISHMAN, 1996, p. 2).<br />
5.1 Fases da Securitização<br />
Por não haver estrutura única legalmente imposta à securitização, e pela<br />
flexibilidade que a ela é conferida por conta da diversidade de utilizações que<br />
pode ter, a securitização pode ser adaptada a diversas necessidades, ser mais<br />
complexa ou mais simples, envolver mais ou menos partes. Mesmo assim, é<br />
possível se identificarem estruturas constantes em todas as operações que,<br />
hoje em dia, podem ser consideradas securitizações em sentido estrito.<br />
De acordo com Jeffery Barrat, a estrutura de uma securitização geralmente<br />
envolve os seguintes elementos: (i) um conjunto de ativos que serão<br />
securitizados; (ii) um veículo de propósito exclusivo - companhia, fundo ou
9 [...] uma entidade não personificada, geralmente<br />
criada de acordo com as leis estaduais, por um<br />
depositante que contribui com bens para serem<br />
mantidos por um agente fiduciário, mediante um<br />
contrato por escrito de Trust, entre o depositante e o<br />
agente fiduciário. O depositante pode ser o<br />
beneficiário dos bens depositados, ou ainda pode ser<br />
apontado um terceiro como beneficiário. O agente<br />
fiduciário é responsável pela gestão dos bens em<br />
nome dos beneficiários. (" (ROSENTHAL;<br />
OCAMPO, 1988, p. 137, tradução nossa)<br />
trust; (iii) uma emissão de títulos negociáveis pelo veículo de propósito exclusivo; e<br />
(iv) uma agência de classificação de risco que deve classificar a emissão do veículo<br />
de propósito exclusivo. (1996, p. 95-105).<br />
A partir desses elementos, tem-se que uma operação padrão pode ser estruturalmente<br />
descrita da seguinte forma: uma sociedade (originador) tem bens, direitos ou<br />
expectativas de direitos que são representados por contratos ou títulos. O originador<br />
constitui uma sociedade sem atividade operacional ou um fundo (VPE), que deverá<br />
receber os ativos e emitir títulos ou valores mobiliários lastreados nesses ativos. Os<br />
investidores compram os títulos emitidos pelo VPE, que paga ao originador pela<br />
cessão dos ativos com os recursos oriundos da venda dos títulos. Podem ser apostas<br />
garantias adicionais, bem como ser contratada agência de classificação de risco<br />
para avaliar a emissão.<br />
Assim, em se agrupando as fases segundo suas características, a operação pode<br />
ser dividida nas seguintes etapas, analisadas detidamente a seguir: (i) constituição<br />
do veículo de propósito específico; (ii) segregação de ativos através de cessão de<br />
créditos ou de contratos; (iii) emissão de títulos; e (iv) classificação do risco da<br />
emissão. Cada uma dessas fases pode ser caracterizada por negócios e atos jurídicos<br />
determinados. É por meio desses instrumentos jurídicos que se analisará cada<br />
etapa da operação de securitização.<br />
5.1.1 Constituição Veículo de Propósito Exclusivo<br />
Antes de se determinar a forma de constituição dos veículos de securitização,<br />
deve-se determinar qual veículo será utilizado. Há algumas opções que devem ser<br />
consideradas, dependendo da estrutura e objetivos da operação. O veículo de<br />
propósito exclusivo é a figura jurídica constituída especialmente para a operação de<br />
securitização, e tem como único escopo aquisição de ativos a serem securitizados e<br />
a emissão dos títulos lastreados nesses ativos.<br />
5.1.1.1 Trust<br />
Nos países que adotam o sistema Anglo-Saxão, o VPE geralmente utilizado é o<br />
trust, de acordo com Rosenthal e Ocampo, pode ser definido como:<br />
"[…] an unincorporated entity generally created under state law by a<br />
depositor contributing property to be held by a trustee pursuant to a written<br />
trust agreement between the depositor and the trustee. The depositor may be<br />
the beneficial owner of the trust property, or the ownership of the property may<br />
be conveyed to third parties. The trustee is responsible for managing the trust<br />
property on behalf of the beneficial owners. " (ROSENTHAL; OCAMPO,<br />
9<br />
1988, p. 137)<br />
Com efeito, configura-se o trust pela entrega de bens pertencentes a uma pessoa<br />
(denominada settlor) outra pessoa (que se denomina trustee) para que deles “faça<br />
uso conforme determinado encargo que lhe tenha sido cometido” (NAMEN). Por<br />
meio da instituição do trust, o settlor efetivamente transfere a propriedade dos bens<br />
objeto do trust ao trustee, que assume a obrigação de administrá-los conforme as<br />
orientações recebidas em benefício de um terceiro, que seria o beneficiário do<br />
negócio. Trata-se, assim, de um típico negócio fiduciário.<br />
Ocorre porém, que a propriedade do trustee sobre os bens não é definitiva, e sim<br />
temporária e limitada à subsistência do trust. Isso torna-se possível por que, nas<br />
legislações baseadas no modelo anglo-saxão, existe a possibilidade de dicotomia da
propriedade, ou seja, de co-existência de duas propriedades sobre um mesmo<br />
bem. Assim, o trustee teria a nominal property do bem, enquanto o beneficiário<br />
do trust seria titular da equitable property.O trustee não é mero mandatário<br />
ou administrador dos bens, mas efetivamente proprietário com poderes de<br />
disposição sobre eles. Todavia, esse poder de disposição é “limitado pelo<br />
dever de administrar a coisa em proveito do instituidor ou do beneficiário”.<br />
(NAMEN).<br />
É exatamente essa dicotomia da propriedade, dividida em “propriedade<br />
de garantia” e “propriedade de fruição” que faz do trust o VPE mais adequado<br />
à securitização, vez que reúne todos os elementos necessários à segregação<br />
do patrimônio, além de tratamento tributário diferenciado (no Direito<br />
norte-americano e em outros países onde é utilizado) e total controle do<br />
patrimônio pelo seu administrador.<br />
Ocorre que é de difícil transposição do conceito de propriedade resolúvel<br />
para sistemas jurídicos de base romano-germânica, e, por isso mesmo, o trust<br />
não é um instituto previsto no Direito brasileiro, a exemplo da maioria dos<br />
sistemas jurídicos baseados nesse modelo. Assim, no Brasil, os veículos<br />
utilizados nas securitizações são sociedades anônimas ou fundos mútuos de<br />
investimento.<br />
5.1.1.2 Fundos de Investimento<br />
De acordo com Chalhub os fundos mútuos de investimento abriram a<br />
perspectiva para a assimilação, no ordenamento jurídico brasileiro, de<br />
elementos essenciais do trust, relativos a administração de patrimônios em<br />
benefício de investidores. (2000, p. 326 e seguintes).<br />
Os fundos de investimento no Brasil são constituídos sob a forma de<br />
condomínios, abertos ou fechados, a depender da possibilidade de transferência<br />
e resgate de suas quotas. Não possuem personalidade jurídica, e, portanto,<br />
o administrador, que os constitui, age em seu nome, não se confundido,<br />
porém, o seu patrimônio particular com aquele do fundo que administra. Os<br />
administradores dos fundos de investimento possuem os mais amplos<br />
poderes de gestão, incluindo a alienação do patrimônio e a compra e venda de<br />
títulos dentre outros.<br />
A estrutura jurídica dos fundos de investimento mostra-se adequada à<br />
securitização, sendo preferida em alguns países à forma societária, como é o<br />
caso da França. No Brasil, existe previsão expressa para duas espécies de VPE’s<br />
sob a forma de fundos de investimento: os fundos de investimento imobiliários<br />
e os fundos de investimento em direitos creditórios. Apesar de não ser utilizado<br />
o termo securitização nas normas que regulam esses tipos de fundos, sua<br />
estrutura é a mesma de uma securitização com veículo societário.<br />
No caso dos fundos de investimento imobiliário, o ativo subjacente à<br />
emissão de quotas são bens ou direitos de natureza imobiliária. Sua constituição<br />
e funcionamento estão disciplinados pela Lei nº 8668/93 e reguladas pela<br />
instrução CVM 205/94. Esses fundos já são bastante utilizados no mercado<br />
brasileiro e são responsáveis por algumas das mais bem sucedidas experiências<br />
de securitização no Brasil. Conforme se verá adiante, os fundos imobiliários são<br />
efetivamente negócios fiduciários, conforme definido na lei que os instituiu.<br />
Mais recentemente, o Conselho Monetário Nacional (“CMN”), por meio<br />
da Resolução 2907/01, e a Comissão de Valores Mobiliários, com a Instrução<br />
356/01, criaram os fundos de investimento em direitos creditórios ou fundos
10 A respeito das características do contrato<br />
de sociedade, Cf. SZTAJN, Rachel.<br />
Contrato de sociedade e formas<br />
societárias. São Paulo: Saraiva, 1989.<br />
de recebíveis, como ficaram conhecidos. Trata-se de uma estrutura similar à de uma<br />
securitização francesa, na qual o patrimônio do fundo de investimento é composto<br />
por direitos creditórios. A legislação sobre fundos de recebíveis pode ser considerada<br />
atualmente aquela que prevê a estrutura que mais se aproxima de uma regra geral<br />
para a securitização. Porém, o fato de ser emanada pelo Conselho Monetário<br />
Nacional limita sua aplicação às entidades sob a sua fiscalização.<br />
Em ambos os casos, os fundos que funcionam como veículos para securitização<br />
são disciplinados pelas regras aplicáveis a quaisquer fundos de investimentos,<br />
observadas as particularidades determinadas na legislação específica, conforme se<br />
verá adiante, inclusive no que diz respeito a sua constituição.<br />
5.1.1.3 Formas societárias<br />
O VPE sob forma societária, por sua vez, possui as mesmas características de<br />
qualquer sociedade, tanto no sentido material - ou seja, trata-se de um contrato de<br />
comunhão de escopo em que duas ou mais pessoas reúnem esforços para a obtenção<br />
10<br />
de um fim comum - quanto no que diz respeito a requisitos formais de constituição .<br />
Mesmo as companhias securitizadoras expressamente previstas em Lei – (companhias<br />
securitizadoras de créditos imobiliários e companhias securitizadoras de créditos<br />
financeiros) são constituídas e funcionam como sociedades anônimas comuns.<br />
O objeto da sociedade utilizada como VPE é especificamente receber o ativo<br />
utilizado como lastro da securitização e emitir os títulos lastreados nesse ativo.<br />
Como se situa no campo da licitude, o objeto da sociedade pode ser livremente<br />
estipulado entre as partes, e essa característica (objeto exclusivo) não conflita com a<br />
natureza da forma societária.<br />
No caso das companhias securitizadoras de créditos imobiliários, a Lei nº<br />
9.514/87 determina que seu objeto será a “aquisição e securitização desses créditos<br />
e a emissão e colocação, no mercado financeiro, de Certificados de Recebíveis<br />
Imobiliários, podendo emitir outros títulos de crédito, realizar negócios e prestar<br />
serviços compatíveis com suas atividades”.<br />
Apesar de parecer, pela leitura da lei, que há a possibilidade de a companhia<br />
securitizadora de créditos imobiliários ter atividade operacional (prestação de<br />
serviços), acredita-se que os únicos serviços compatíveis com a atividade de um<br />
VPE sejam aqueles ligados à própria emissão, como, por exemplo, o recebimento e<br />
monitoramento dos créditos que servem de lastro à emissão. Contrapõe-se à própria<br />
natureza do veículo e da operação na qual ele está inserido, atividades que o<br />
exponham a riscos de insolvência.<br />
Já a legislação a respeito da securitização de créditos financeiros é mais restritiva,<br />
e determina que a cessão de créditos das instituições financeiras para fins de<br />
securitização serão efetuadas somente à sociedades anônimas que tenham por<br />
objeto exclusivo a aquisição desses créditos.<br />
Além do objeto, a maior diferença entre a sociedade VPE e as constituídas fora<br />
de securitizações não está em aspectos formais, e sim no fim a ser alcançado. A<br />
constituição da sociedade, nesses casos, não exaure o objetivo do negócio; ela é<br />
parte de uma série de contratos interligados por um escopo comum, ou seja, a<br />
estruturação da securitização. Ademais, via de regra, as sociedades VPEs não<br />
possuem atividade operacional, já que isso aumentaria a exposição a dificuldades<br />
financeiras, ou mesmo insolvência e falência<br />
Geralmente, os VPEs sob forma societária são constituídos na modalidade de<br />
sociedades por ações. Isso se deve à possibilidade que as companhias têm de emitir<br />
valores mobiliários que outros tipos societários não têm. As companhias apresen-
tam, ainda, maior separação entre os bens e direitos pertencentes aos sócios<br />
em relação ao patrimônio da sociedade, bem como regime jurídico mais<br />
completo e consolidado, o que proporciona maior segurança que outras<br />
espécies societárias.<br />
A constituição de uma sociedade por ações que servirá como VPE numa<br />
securitização segue as mesmas regras especificadas na Lei 6.404/76 (Lei das<br />
Sociedades por Ações), em seu artigo 80 e seguintes, que são aplicáveis a<br />
qualquer sociedade anônima. Geralmente, os acionistas do VPE são pessoas<br />
físicas ou jurídicas ligadas ao originador. Somente quando a securitização se<br />
dá por emissão de ações é que os próprios investidores são os acionistas da<br />
companhia. Nesse caso, os investidores subscrevem as ações emitidas pela<br />
sociedade securitizadora, tornando-se seus acionistas e não credores. Apesar<br />
de não ser muito utilizada, essa estrutura é possível e apresenta algumas<br />
vantagens, como maior controle do VPE pelos investidores.<br />
5.1.2 Segregação do Ativo<br />
A característica mais marcante e, ao mesmo tempo, uma das maiores<br />
vantagens da operação de securitização é a segregação do lastro dos títulos<br />
emitidos num veículo distinto do originador dos créditos.<br />
Essa característica apresenta-se como vantagem tanto para os originadores<br />
quanto para os investidores. Para os primeiros, por permitir-lhes uma<br />
operação que não será registrada em suas demonstrações financeiras e que,<br />
por não incorporar os riscos de uma empresa operacional, poderá ter melhor<br />
classificação de risco, em comparação com próprio originador, e, por<br />
conseguinte, menor exigência de taxas por parte dos investidores e prazo<br />
mais longo para financiamento da dívida. Para os investidores, o menor risco<br />
significa maior segurança em investimentos, que, em tese, serão mais<br />
rentáveis que aqueles tradicionalmente apresentados no mercado.<br />
No que diz respeito à segregação do ativo, pode-se classificar as operações<br />
de securitização em duas espécies : operações com segregação interna e<br />
operações com segregação externa. No primeiro caso, a emissão é feita pelo<br />
próprio originador, vinculando-se ao ativo que lhe serve de lastro através de<br />
instrumentos contratuais, como, por exemplo, constituição de garantias. Já na<br />
segunda espécie, a segregação se faz através da cessão de créditos a uma<br />
outra pessoa jurídica, apartando-se efetivamente o lastro da securitização do<br />
patrimônio do originador. A emissão, nesse caso, é feita pelo veículo de<br />
propósito exclusivo. (BORGES, 2000, 257-267).<br />
Enquanto a securitização com segregação externa apresenta a típica<br />
estrutura da operação, a securitização com segregação interna pode ser<br />
considerada uma simples emissão de títulos com garantia determinada.<br />
Apesar disso, pode-se, conceitualmente, considerá-la uma verdadeira<br />
securitização, já que apresenta todos os seus requisitos materiais, mesmo que,<br />
formalmente, lhe falte um elemento estrutural. Um exemplo típico de<br />
securitização com segregação interna de lastro é a securitização de base<br />
imobiliária com constituição de patrimônio de afetação.<br />
A qualidade do ativo que servirá de lastro à emissão tem grande importância<br />
no processo de securitização, pois, em última análise, a emissão terá as<br />
mesmas características desse ativo, especialmente no que diz respeito a<br />
termo, rendimentos e resgate. Vale salientar que quanto mais homogêneos os<br />
contratos/créditos cedidos, mais fácil será seu agrupamento para posterior
securitização. É bem mais simples a cessão dos créditos ou contratos, no caso de<br />
contratos por adesão ou contratos-tipo porque não há a necessidade de análise de<br />
cada instrumento contratual individualmente para se conhecer detalhes como a<br />
possibilidade de cessão, necessidade de aprovação ou mera notificação do cedido.<br />
Também deve ser levada em conta a figura do devedor, ou seja, a pessoa contra<br />
quem os créditos cedidos foram sacados, pois, geralmente, antes de se utilizar<br />
determinada carteira de recebíveis como lastro em securitizações, são realizadas<br />
severas auditorias, especialmente se for contratada agência de classificação de risco<br />
para a emissão.<br />
Apesar de estruturalmente os devedores não serem partes tão relevantes na<br />
securitização, já que não participam dos negócios jurídicos que a compõem, a não ser<br />
eventualmente na condição de anuentes. Do ponto de vista financeiro, são eles que<br />
vão determinar a qualidade dos títulos emitidos e os investidores que irão adquiri-los.<br />
Isso porque os contratos por meio dos quais foram constituídas as dívidas são,<br />
na maioria das vezes, a única garantia dos títulos emitidos na securitização e deles<br />
depende diretamente a solvabilidade do emissor. Por essa razão, além das auditorias<br />
financeiras, são geralmente realizadas auditorias jurídicas, com a finalidade de se<br />
verificar, além da qualidade dos créditos, sua correta constituição, possibilidade e<br />
formalidades para a cessão, dentre outros aspectos.<br />
O originador é aquele que, inicialmente, detém a titularidade dos créditos<br />
que servem de lastro à operação e também pode ser responsável por serviços<br />
como o recebimento e cobrança de tais créditos e seu repasse ao VPE ou diretamente<br />
aos investidores.<br />
A natureza das atividades do originador é que vai determinar a natureza da<br />
operação de securitização e, conseqüentemente, a aplicabilidade de regras específicas<br />
disciplinadoras de cada tipo de operação. A securitização de créditos bancários<br />
é estritamente regulada pelo Conselho Monetário Nacional, por meio do Banco<br />
Central, assim como a securitização de exportações. No âmbito do Sistema<br />
Financeiro Imobiliário, a operação também possui regulamento próprio. Caso as<br />
sociedades originadoras não se enquadrem em nenhuma categoria regulada, a<br />
securitização seguirá as normas gerais de Direito Civil e Comercial, onde não há<br />
previsão específica para a operação.<br />
A situação econômico-financeira do originador não é tão importante quanto a<br />
qualidade dos créditos cedidos tendo em vista que seu patrimônio geral não<br />
responde pela solvabilidade dos títulos emitidos pelo VPE. Todavia, a cessão de<br />
créditos quando se encontra em curso processo de execução forçada ou falência do<br />
originador pode ser anulada, conforme se verá mais detalhadamente.<br />
A formalização da segregação do ativo e seus efeitos quanto ao originador e<br />
terceiros são os aspectos mais controversos na securitização. Geralmente ela se dá<br />
através de cessão de crédito ou de contrato, por meio da qual o originador transfere<br />
ao VPE uma parcela de seu patrimônio. É exatamente desse desmembramento do<br />
patrimônio do originador que se originam as maiores polêmicas a respeito da<br />
operação de securitização.<br />
De acordo com Sylvio Marcondes, é na unicidade das relações passivas e ativas<br />
do titular do patrimônio que se encontra o princípio fundamental de toda a organização<br />
do crédito, já que, como conseqüência deste, o devedor responde por suas<br />
obrigações com todos os seus ativos, sendo este, assim, garantia comum de seus<br />
credores. (MACHADO. 1977, p. 126).<br />
Por esse motivo, a efetiva transferência dos ativos que servem de lastro à<br />
securitização ao VPE tem importância singular dentro da operação. Caso essa<br />
transferência não ocorra de fato e de direito, há o risco de consolidação do patrimô-
11 A Lei 11.101/05, que disciplina a falência e a<br />
recuperação judicial, trouxe uma inovação<br />
relevante no que se refere à segurança da<br />
securitização, quando determina, no parágrafo<br />
primeiro de seu artigo 136 que “na hipótese de<br />
securitização de créditos do devedor, não será<br />
declarada a ineficácia ou revogado o ato de cessão<br />
em prejuízo dos direitos dos portadores de valores<br />
mobiliários emitidos pelo securitizador.”.<br />
nio do originador e do VPE, sendo, assim, eliminada a principal característica<br />
da operação, qual seja, a segregação do risco.<br />
O risco de consolidação refere-se à possibilidade de os ativos do VPE<br />
serem reunidos aos ativos do originador, caso os recursos deste não sejam<br />
suficientes para saldar suas dívidas. Isso ocorreria, por exemplo, na hipótese<br />
de confusão de patrimônios, com o conseqüente apelo aos ativos do VPE para<br />
saldar dívidas do originador, (KOURY, 1993, p. 145 e seguintes), ou nulidade,<br />
ou mesmo anulação do negócio jurídico através do qual se fez a transferência<br />
dos ativos do originador ao VPE. Essa última hipótese poderia ser<br />
considerada, caso o negócio fosse realizado em fraude contra credores.<br />
De acordo com Humberto Theodoro Jr. (2000) as principais sedes<br />
normativas de repressão à fraude são o Código Civil, onde está definida a<br />
fraude contra credores; a Lei de Falências, onde se regula a ação revocatória e<br />
o Código de Processo civil, onde está disciplinada a fraude à execução.<br />
O negócio com fraude contra credores é, de acordo com o Código Civil;<br />
(i) o ato de transmissão gratuita de bens, ou remissão de dívida, quando os<br />
pratique o devedor já insolvente, ou por ele reduzido à insolvência; ou (ii) o<br />
contrato oneroso do devedor insolvente, quando a insolvência for notória ou<br />
houver motivo para ser conhecida do outro contratante. Em ambos os casos,<br />
os negócios jurídicos praticados em fraude contra credores podem ser<br />
anulados. Nas hipótese apresentadas, a possibilidade de anulação do negócio<br />
jurídico não está ligada ao fato de se tratar de securitização, e sim às circunstâncias<br />
em que ocorreram .<br />
Nesse sentido, e ainda de acordo Theodoro Jr. a fraude não é vício<br />
intrínseco ao ato, e, por isso, não deveria torná-lo anulável. Deveria, sim, ser<br />
considerado ineficaz, em decorrência de lesão a terceiros, ou seja, mesmo<br />
sendo válido, não é suficiente por si só para produzir efeitos.<br />
No caso de falência, visando à proteção da massa falida, o legislador<br />
brasileiro considerou sem efeito, quanto a ela, os atos enumerados na lei<br />
falimentar, dentre os quais a constituição de direito real de garantia e as<br />
inscrições de direitos reais e as transcrições de transferências de propriedade,<br />
entre vivos, além de serem revogáveis os atos praticados com a intenção de<br />
prejudicar credores, provando-se a fraude do devedor e do terceiro que com<br />
ele contratar. Nesse caso, os atos permanecem válidos, mas ineficazes quanto<br />
à massa falida. (MACHADO, 1977).<br />
A fraude à execução constitui uma especificação da fraude contra<br />
credores (THEODORO JÚNIOR, 2000), ou seja, é o ato lesivo à credores<br />
praticado quando já está em curso um execução forçada.<br />
Theodoro Jr. ainda ensina, na mesma ocasião, que o que separa os três<br />
institutos, quais sejam, a fraude contra credores, a revocatória da falência e a<br />
fraude à execução são aspectos secundários, como o fato de haver ou não<br />
demanda contra o alienante. O fulcro, porém, dos institutos é o mesmo.<br />
Os negócios jurídicos praticados na securitização estão sujeitos à impugnação<br />
por conta de lesão a credores assim como em qualquer outra operação.<br />
O que torna esse assunto crítico em se tratando de securitização é o fato de<br />
que uma possível anulabilidade ou ineficácia da cessão dos ativos subjacen-<br />
11<br />
tes ao VPE descaracterizaria a operação.<br />
Por este fato mesmo é que a primeira fase da securitização, ou seja, a<br />
transferência do patrimônio a ser securitizado ao veículo de securitização<br />
deve estar revestida de todas as formalidades necessárias para sua existência,<br />
validade e eficácia.
12 Duas vontades, uma oferta e uma aceitação, cujo<br />
encontro produz a celebração de um negócio jurídico<br />
bilateral, como é a emissão de obrigações.<br />
5.1.3 Emissão e Subscrição dos Títulos<br />
Em qualquer processo de securitização, os investidores são os principais<br />
agentes. Eles são o alvo de todo o processo, pois se não se interessarem pelos títulos<br />
emitidos, o financiamento que se pretendia é frustrado, bem como a mobilização de<br />
riquezas e a dispersão do risco que se visava. Assim, os títulos oferecidos devem ir<br />
ao encontro de suas necessidades de investimento, no que diz respeito a taxas, prazo<br />
e natureza, sob pena de não encontrarem compradores.<br />
Quanto a esse aspecto, a securitização apresenta vantagem com relação a<br />
emissões sem segregação: pode-se escolher os ativos que darão lastro aos títulos, de<br />
forma a imprimir à emissão as características determinadas. Também é possível que<br />
se transforme qualitativamente certos ativos que têm características diversas para<br />
que adquiram o perfil desejado para a operação. Um exemplo disso é a “transformação”<br />
de créditos de curto prazo em longo prazo, através da substituição constante<br />
desses créditos por outros da mesma natureza, mas com termo de vencimento<br />
posterior. A essa técnica se dá o nome crédito rotativo ("revolving credits").<br />
A emissão dos títulos é a fase na qual efetivamente se realiza a securitização, no<br />
sentido literal. É quando o ativo que serve de lastro se transforma em títulos<br />
negociáveis, mobilizando-se. De acordo com Luis de Ângulo Rodriguez (1968, p.<br />
14) a emissão de títulos de dívidas tem duas fases relevantes: a emissão propriamente<br />
dita e a subscrição dos títulos emitidos. As emissões são, nas palavras do<br />
mesmo autor, "dos voluntades, una oferta y una aceptación, cuyo encuentro<br />
produce el perfeccionamento de um negocio jurídico bilateral, como es la opear-<br />
12<br />
ción de emision de obligaciones.”<br />
Apesar de seguirem a mesma disciplina jurídica, há algumas diferenças<br />
conceituais entre emissões tradicionais de títulos e emissões em processos de<br />
securitização, especialmente no que diz respeito ao risco e à estruturação da<br />
operação. Assim, tanto as regras aplicáveis às emissões de sociedades anônimas,<br />
contidas na Lei nº 6.404/76, quanto a regulamentação complementar emanada da<br />
Comissão de Valores Mobiliários, são aplicáveis às emissões feitas por VPE em<br />
processos de securitização.<br />
Todavia, do ponto de vista conceitual, a securitização separa o originador,<br />
beneficiário mediato dos recursos captados com a emissão, de seus investidores,<br />
utilizando um VPE . Em vez de fazer uma emissão diretamente, o originador<br />
constrói, por meio da securitização, um patrimônio segregado que garantirá o<br />
pagamento dos títulos emitidos, limitando o risco e a possibilidade de alcance dos<br />
créditos dos detentores de tais títulos.<br />
Acredita-se que a não existência de títulos específicos de securitização para<br />
todas as operações possibilite maior flexibilidade ao negócio. A debênture é um<br />
título bastante adaptável, podendo ser emitida de acordo com as necessidades de<br />
cada operação, no que diz respeito a termo, garantia e forma de remuneração. É,<br />
também, uma espécie de valor mobiliário bastante utilizada e reconhecida no<br />
mercado, criando condições mais seguras para os investidores.<br />
5.1.4 Classificação de Risco da Emissão<br />
Apesar de não ser, via de regra, obrigatória no Brasil, como o é em outros<br />
sistemas, a classificação de risco (rating) tem grande importância no processo de<br />
securitização, visto que fornece ao investidor uma noção mais segura e imparcial do<br />
risco de crédito relativo à emissão.<br />
De acordo com Neil Baron (1996, p. 81) a principal função desenvolvida por
agências de classificação de risco é assessorar os investidores nas decisões de<br />
investimento. Mediante pesquisas, análise e informações, as agências de<br />
classificação de risco protegem os investidores para que estes não assumam<br />
risco de crédito despercebidamente.<br />
Note-se que a classificação atribuída pela agência de classificação de<br />
risco a uma sociedade, ou emissão, diz respeito apenas a seu risco de crédito,<br />
ou seja, ela apenas aborda a possibilidade de pagamento de juros e o principal<br />
investido, de acordo com os termos pactuados.<br />
As agências de classificação de risco não opinam sobre outros tipos de<br />
risco, como, por exemplo, risco relativo a variação da taxas de juros, ou sobre<br />
a adequação de determinado tipo de investimento ao perfil do investidor, mas<br />
tão somente sobre a probabilidade de pagamento de acordo com as especificações<br />
da oferta.<br />
Os serviços da agência de classificação de risco são contratados e pagos<br />
pelo emissor dos títulos. Esse fato poderia levar a um conflito de interesses, já<br />
que a sociedade emissora paga à agência para que esta atribua uma nota aos<br />
títulos de sua emissão. Porém, ainda de acordo com Baron (1996, p. 82), isso<br />
não ocorre, pois o maior patrimônio de uma agência de classificação de risco<br />
é sua reputação, que advém da qualidade e confiabilidade de suas análises.<br />
Apesar de serem contratadas e pagas pelos emissores dos títulos, as notas<br />
dadas pelas agências de classificação de risco têm o objetivo de informar o<br />
investidor, e não o emissor. Dessa forma, se os investidores não têm confiança<br />
na agência contratada pelo emissor, pouco importa que ela atribua aos<br />
papéis emitidos a nota máxima, pois os investidores não confiarão na<br />
qualidade de sua opinião nem utilizarão a nota como um dado de avaliação do<br />
preço que estarão dispostos a pagar pelos títulos.<br />
Oportuno ressaltar que não é raro em operações de securitização a nota<br />
atribuída à determinada emissão ser mais alta que aquela atribuída ao<br />
originador. Esse fenômeno é facilmente explicável se considerarmos que na<br />
securitização o risco é bem mais definido, pois o conjunto de ativos que dá<br />
lastro à emissão é determinado e segregado, não se misturando com o restante<br />
do patrimônio do originador. É claro que para isso ocorrer a segregação do<br />
patrimônio tem que ser efetivada de maneira juridicamente adequada, com a<br />
efetiva cessão dos créditos e todas as formalidades eventualmente exigidas.<br />
6 SECURITIZAÇÃO NO BRASIL A securitização no Brasil encontra-se em fase de desenvolvimento, se<br />
comparada a países como os Estados Unidos ou a Inglaterra. Há ainda uma<br />
quantidade pequena de operações que se restringem a segmentos determinados.<br />
Há quem considere que a carência de regulamento sistêmico próprio é<br />
uma das razões para o tímido desenvolvimento da securitização no Brasil, já<br />
que esse fato traria à operação certo nível de incerteza, especialmente no<br />
tocante a pontos polêmicos, como a eficácia da cessão dos créditos frente a<br />
credores do originador e a natureza dos títulos emitidos. Pode-se, todavia,<br />
encarar a questão de forma diametralmente oposta: o uso de instrumentos<br />
jurídicos consagrados, com pequenos ajustes decorrentes de legislação<br />
específica, daria mais segurança à operação, já que, há bastante tempo, esses<br />
instrumentos estão consolidados no ordenamento jurídico. Esse é o ponto que<br />
se passa explorar.<br />
A securitização no Brasil é recente. As primeiras operações com a<br />
estrutura que hoje se conhece foram realizadas no final da década de oitenta<br />
do século passado. Por se tratar de operação à época considerada sofisticada,
desenvolveu-se inicialmente em nichos específicos, e por isso a regulamentação<br />
veio estratificada, sempre ligada ao ativo subjacente à operação. Assim, o foco dos<br />
normativos ligados à securitização não é a operação em si, mas sim os ativos que<br />
lhe dão lastro.<br />
Esse fato faz com que as regras jurídicas que disciplinam a securitização sejam<br />
bastante específicas para operações ligadas a determinado tipo de ativo, em sua<br />
maioria expedidas por órgãos reguladores, como o Banco Central ou a Comissão de<br />
Valores Mobiliários. Torna-se, assim, difícil a utilização de tais regras por indução<br />
em outros tipos de operação, exatamente por sua especificidade e pela limitação de<br />
alcance da competência dos órgãos que emitiram tais normas.<br />
Em geral, as regras aplicáveis à securitização de ativos diferentes daqueles<br />
amparados pelas normas específicas são as normas gerais de Direito Civil e<br />
Comercial, com todos os inconvenientes e vantagens que isso possa trazer, como<br />
analisado a seguir.<br />
O primeiro diploma legal a tratar da securitização, apesar de não utilizar essa<br />
palavra em seu texto, foi a Resolução do Conselho Monetário Nacional nº<br />
1.834/91, regulamentada pela Circular do Banco Central do Brasil nº 1.979/91, que<br />
trata da securitização de ativos oriundos de exportação.<br />
Algum tempo depois, surgiram regras sobre a securitização de base imobiliária,<br />
seguidas de legislação de vida breve sobre a securitização de ativos empresariais<br />
em geral, ativos financeiros, direitos creditórios e, finalmente, regulou-se a<br />
securitização de ativos do agronegócio.<br />
6.1 Securitização de Exportações<br />
A securitização de exportações surgiu em nosso ordenamento jurídico em 1991,<br />
através da Resolução nº 1.844 do Conselho Monetário Nacional, que dispõe a<br />
respeito do financiamento a exportações no âmbito do Programa de Financiamento<br />
às Exportações – PROEX (“Programa”). A assistência financeira de tal Programa<br />
consiste em desconto de títulos, no caso de exportação de bens, ou financiamento<br />
direto, no caso de exportação de serviços. Apesar de não mencionar expressamente<br />
o termo “securitização”, referida Resolução estabelece que as operações de<br />
financiamento a que se refere terão por objeto “títulos emitidos por exportador<br />
brasileiro, representativos de exportação de determinados bens” (BRASIL, 1991),o<br />
que já representa um esboço da estrutura da securitização de exportações.<br />
A Resolução nº 1.844/91 foi regulamentada pela Circular nº 1.979/91 do Banco<br />
Central, posteriormente revogada pela Circular nº 3.027 de 22 de fevereiro de 2001,<br />
visando a adequação dos procedimentos da operação ao Registro Declaratório Eletrônico.<br />
Essa Circular refere-se expressamente à securitização de exportações, definindo-a<br />
como captação de recursos no mercado externo, com estabelecimento de vínculo a<br />
exportações que podem ser da própria tomadora, ou de outros exportadores que não<br />
necessariamente têm que pertencer ao mesmo grupo econômico do tomador.<br />
Assim, o mecanismo de securitização de exportações consiste na emissão de<br />
títulos lastreada em ativo específico, ou seja, créditos oriundos da exportação de bens.<br />
A emissão dos títulos se dá no mercado internacional lastreada em vendas ao exterior<br />
a pagamento futuro ou mesmo expectativas de créditos. (FORTUNA, 1995, p. 200).<br />
Na prática, a subsidiária estrangeira de uma sociedade brasileira cede, em favor de<br />
um veículo de propósito exclusivo, os seus recebíveis de exportação contra os<br />
compradores/importadores. É esse VPE que emite valores mobiliários no mercado<br />
internacional, com lastro nos recebíveis adquiridos, captando, dessa forma, os<br />
recursos a serem repassados à matriz brasileira.
13 Não há que se confundir a securitização de<br />
exportações com o pré-pagamento ou pagamento<br />
antecipado de exportação. Apesar de ambos poderem<br />
ser usados como meio de financiamento à atividade,<br />
apresentam mecanismos bem distintos. O prépagamento<br />
de exportação, conforme definido pela<br />
Circular nº 2.919/99 do Banco Central, é “a aplicação<br />
de recursos em moeda estrangeira na liquidação de<br />
contratos de câmbio de exportação, anteriormente ao<br />
embarque das mercadorias”. (BRASIL, 1999) Essa<br />
antecipação, que constitui financiamento à produção<br />
de bens destinados à exportação, pode ser concedida<br />
tanto pelo importador das mercadorias no exterior,<br />
quanto por qualquer outra pessoa jurídica localizada<br />
fora do Brasil. Dentre as últimas, encontram-se<br />
geralmente empresas afiliadas à exportadora e<br />
instituições financeiras estrangeiras. Como se vê, não<br />
há, em princípio, emissão de títulos ou segregação de<br />
risco, como ocorre na securitização.<br />
Como a emissão é feita no exterior, e não há previsão sobre o tipo de<br />
estrutura a ser utilizada, o VPE nessas operações geralmente é um trust que,<br />
conforme se viu, é o veículo mais adequado à securitização.No mesmo<br />
sentido, os títulos emitidos são trust certificates que incorporam direitos a<br />
parcelas do patrimônio segregado no trust bem como aos seus eventuais<br />
seus rendimentos.<br />
Por se tratar de emissão com lastro em receitas futuras, esse mecanismo<br />
pode ser caracterizado como empréstimo externo ou financiamento à<br />
exportação. Isso porque através da emissão de títulos no exterior, o exporta-<br />
13<br />
dor antecipa receitas que só efetivaria após exportar sua produção. Porém,<br />
difere do financiamento direito pelo fato de pulverizar o risco envolvido<br />
através da emissão de títulos.<br />
As regras que disciplinam a securitização de exportações são bastante<br />
específicas, não podendo ser utilizadas subsidiariamente em processos de<br />
securitização que não aqueles especificamente descritos na regulamentação.<br />
Esse mecanismo já é bem consolidado e comum no mercado brasileiro,<br />
mas é restrito a sociedades de grande porte, em sua maioria controladas por<br />
grandes conglomerados internacionais . Não obstante, é de grande valia o<br />
exemplo bem sucedido da securitização de exportações, para se demonstrar a<br />
segurança jurídica da operação no Brasil.<br />
6.2 Securitização de Base Imobiliária<br />
A exemplo do que ocorreu nos Estados Unidos, o mercado imobiliário<br />
também pode ser considerado o berço da operação de securitização no Brasil.<br />
Apesar de não ter sido o primeiro segmento a ser regulamentado, é para esse<br />
tipo de securitização que a legislação brasileira é mais desenvolvida, havendo<br />
mesmo previsão legal para duas modalidades de securitização, uma via<br />
fundos mútuos de investimento; outra via sociedade de propósito exclusivo.<br />
Com efeito, nesse segmento, o vulto dos empreendimentos justifica captação<br />
de recursos mais elaborada e há maior interesse social no desenvolvimento de<br />
vias alternativas de captação de recursos.<br />
A Lei n° 9514, de 20 de novembro de 1997 do Sistema Financeiro<br />
Imobiliário – SFI , que disciplina a securitização imobiliária, visa justamente<br />
desafogar o sistema tradicional de financiamento à habitação, utilizando-se<br />
de recursos privados em um segmento econômico normalmente custeado<br />
pelo setor público.<br />
Os fundos imobiliários são outra opção para o financiamento de projetos<br />
imobiliários. Esses fundos, já bem consolidados no sistema jurídico brasileiro,<br />
têm sido bem sucedidos no financiamento de projetos como centros<br />
comerciais e condomínios empresariais.<br />
Ambos os institutos aplicados na securitização imobiliária trouxeram<br />
importantes inovações para o ordenamento jurídico brasileiro, visando<br />
viabilizar e tornar mais seguras as operações, especialmente no que diz respeito<br />
à segregação patrimonial e ao controle dos recursos por parte dos investidores.<br />
6.2.1 Fundos de Investimento Imobiliário<br />
O primeiro diploma legal que efetivamente previu a securitização de base<br />
imobiliária no Brasil foi a Lei nº 8.668, de 25 de junho de 1993. O artigo<br />
primeiro dessa lei define o Fundo de Investimento Imobiliário como “uma
14 Atualmente, encontram-se registrados 72 fundos de<br />
investimento dessa modalidade junto à Comissão de<br />
Valores Mobiliários, com o patrimônio líquido total<br />
de R$3.430.444.628,36.<br />
comunhão de recursos, sem personalidade jurídica, captados através do sistema de<br />
distribuição de valores mobiliários, previsto na lei nº 6.385/76, destinados a<br />
aplicação em empreendimentos imobiliários”. (BRASIL, 1993). A Lei estipula<br />
ainda, em seu artigo terceiro, que as quotas desses fundos são valores mobiliários,<br />
sujeitando-se, por conseguinte, à legislação pertinente. (BRASIL, 1993).<br />
De acordo com Rachel Sztajn, “os fundos imobiliários vieram permitir a<br />
securitização da propriedade imobiliária de modo a se chegar a um fracionamento<br />
desta, distinto daquele previsto na legislação civil e de registros públicos” .<br />
(STAJN, 1994).<br />
Os fundos de investimento imobiliário, mesmo não sendo expressamente<br />
considerados mecanismos de securitização, conceitualmente apresentam suas<br />
mesmas características, já que, como na securitização, segregam-se ativos específicos<br />
para posterior emissão de títulos neles lastreados. Assim como na securitização,<br />
de acordo com Andrezzo e Lima, “o objetivo de tais fundos é criar uma poupança<br />
estável e de longo prazo, além de propiciar liquidez a um mercado tradicionalmente<br />
ilíquido, como o imobiliário”. (ANDREZZO e LIMA, 1999, p. 236).<br />
Como os demais fundos de investimento previstos em nossa legislação, os<br />
fundos imobiliários são constituídos sob a forma de condomínios e são representados,<br />
ativa e passivamente, pela instituição que os administra. Porém, enquanto nos<br />
fundos de investimento em geral, os bens que constituem seu patrimônio são<br />
adquiridos pelo fundo em seu nome, no caso dos fundos imobiliários, os bens e<br />
direitos de natureza imobiliária são adquiridos pela própria instituição administradora<br />
do fundo, com o intuito de se evitarem questionamentos quanto à legitimidade<br />
do condomínio para a aquisição e alienação dos bens imóveis.<br />
Assim, a maior inovação trazida pela Lei nº 8.668/93 foi, na verdade, o estabelecimento<br />
da propriedade fiduciária do administrador com relação ao patrimônio do<br />
fundo. De acordo com a citada lei, os bens e direitos integrantes do patrimônio do<br />
fundo de investimento imobiliário são mantidos sob propriedade fiduciária da<br />
instituição administradora, e, assim como os frutos e rendimentos deles decorrentes,<br />
não se comunicam com o patrimônio desta, não respondendo direta ou indiretamente<br />
por obrigações da administradora, nem podendo ser dados em garantia em<br />
operações da instituição administradora. (BRASIL, 1993).<br />
Ainda no entendimento de Rachel Sztajn, os fundos de investimento imobiliário<br />
apresentariam uma estrutura própria de negócios fiduciários, aproximando-se<br />
assim dos mecanismos de securitização utilizados em países em que a operação é<br />
mais desenvolvida . (SZTAJN, 1994). Porém, não se trataria de um negócio<br />
fiduciário nos moldes anglo-saxões (trust), nem tampouco de negócio fiduciário<br />
típico do sistema de base romano-germânica.<br />
É, pois, um negócio fiduciário sui generis pela Lei nº 8.668/93, pelo qual a<br />
administradora do fundo age como se fosse proprietária dos bens, mas sem que<br />
esses se mesclem com seu patrimônio particular. É, efetivamente, uma modalidade<br />
de patrimônio separado, apta a servir aos fins de securitização.<br />
Posteriormente, a Lei veio a ser regulamentada, em suas respectivas áreas de<br />
atuação, tanto pela Comissão de Valores Mobiliários, através da Instrução nº 205, de<br />
14 de janeiro de 1994, quanto pelo Conselho Monetário Nacional com as Resoluções<br />
CMN nº 2.248 de 8 de fevereiro de 1996, e nº 2.686 de 26 de janeiro de 2000.<br />
14<br />
Apesar não serem tão numerosos , os fundos de investimento imobiliário são<br />
responsáveis por experiências bem sucedidas de securitização no Brasil, inclusive<br />
no tocante à aceitação dos títulos por parte do público investidor e até na formação<br />
de um pequeno mercado secundário para os títulos emitidos.
15 A respeito da criação do SFI, Cf. Associação<br />
Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e<br />
Poupança (ABECIP) “SFI – Um Novo Modelo<br />
Habitacional”, ABECIP, 1996.<br />
16 Os Certificados de Recebíveis Imobiliários foram<br />
considerados valores mobiliários pela Resolução<br />
CMN nº 2.517/98.<br />
6.2.2 Securitização de Créditos Imobiliários<br />
Com o advento da Lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997, regulamentada<br />
pela Resolução CMN nº 2.517 de 29 de junho de 1998, foi instituído o<br />
Sistema Financeiro Imobiliário - SFI. A instituição do SFI tem por objetivo<br />
criar um mercado secundário para os créditos imobiliários através da<br />
securitização, captando recursos privados para esse segmento da economia<br />
de forma alternativa à tradicionalmente utilizada, que consistia basicamente<br />
nos recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, caderneta<br />
15<br />
de poupança ou dos próprios cofres públicos.<br />
Ainda que antes da mencionada lei fosse possível a securitização de<br />
créditos imobiliários assim como de qualquer outro ativo, a criação de<br />
mecanismos e instrumentos específicos objetivou estimular esse mercado,<br />
sem contudo, ser bem sucedida nesse intuito. A securitização de base<br />
imobiliária no Brasil é responsável por parcela ainda insignificante dos<br />
recursos necessários ao financiamento habitacional.<br />
Em seu artigo oitavo, a Lei nº 9.514/97 define a securitização de créditos<br />
imobiliários como sendo a “operação pela qual tais créditos são expressamente<br />
vinculados à emissão de uma série de títulos de crédito, mediante<br />
termo de securitização de créditos lavrado por uma companhia securitizadora”,onde<br />
constarão todas as informações a respeito da operação em tela.<br />
A operação segue a estrutura básica de securitização apresentada neste<br />
trabalho: os créditos imobiliários são cedidos ao veículo de propósito<br />
exclusivo, que emite títulos lastreados nesses créditos. A diferença desse tipo<br />
de securitização é que a própria lei prevê instrumentos para eliminar lacunas<br />
ou obstáculos impostos pela legislação geral a operações de securitização<br />
que, apesar de não inviabilizá-las, dificultam sua estruturação. Assim, a Lei<br />
nº 9.514/97 õe sobre o veículo próprio de securitização, títulos específicos,<br />
mecanismos de segregação e proteção do patrimônio lastro da emissão,<br />
garantia adicionais aos investidores e dispensa expressamente a notificação<br />
do devedor quando da cessão de créditos à companhia securitizadora.<br />
A lei prevê como veículo de securitização as sociedades securitizadoras<br />
de créditos imobiliários, que são instituições não financeiras e devem ser<br />
constituídas sob a forma de sociedades por ações. Sua função consiste em<br />
adquirir créditos, emitir e colocar no mercado de certificados os recebíveis<br />
imobiliários (CRIs).<br />
Apesar de as companhias securitizadoras serem autorizadas a emitir<br />
outros valores mobiliários, os CRIs são os títulos que, especificamente,<br />
representam os créditos imobiliários que os lastreiam. Conforme definido no<br />
artigo sexto da Lei nº 9.514/97, os CRIs são títulos de crédito nominativos, de<br />
livre negociação, lastreados em créditos imobiliários, constituem promessas<br />
de pagamento em dinheiro e somente podem ser emitidos pelas companhias<br />
16<br />
securitizadoras de créditos imobiliários.<br />
Os créditos segregados para a securitização podem ser representados por<br />
quaisquer contratos sobre ativos imobiliários que devem ser devidamente<br />
cedidos à companhia securitizadora. Há ainda a possibilidade de que tais<br />
créditos sejam representados por Cédulas de Crédito Imobiliário – CCI. Elas<br />
foram instituídas pela Medida Provisória nº 2.223 de 04 setembro de 2001,<br />
posteriormente convertida na Lei n° 10.931/04, sendo emitidas pelo credor<br />
imobiliário, independente da autorização do devedor imobiliário e poderá<br />
representar parte ou a integralidade de um crédito imobiliário.
17 Apesar de se apresentar como uma novidade,<br />
há tempos, alguns juristas já propugnavam pela<br />
introdução da alienação fiduciária de bem<br />
imóvel em nosso ordenamento como em:<br />
WALD, Arnold. Novos instrumentos para o<br />
direito imobiliário: fundos, alienação fiduciária<br />
e “leasing. In: Estudos e pareceres de direito<br />
comercial.São Paulo: Revista dos Tribunais,<br />
1972, p. 217-224. Ele propôs o instituto como<br />
solução para o problema do inadimplemento de<br />
mutuários e demora na solução de demandas do<br />
âmbito do BNH.<br />
18 Para aprofundamento do assunto confira:<br />
PEDRETTI, Maria das Graças; COSAC,<br />
Marcelo. Securitização é um meio de reduzir<br />
déficit habitacional. Gazeta Mercantil, São<br />
Paulo, 13 fev. 2001.<br />
A vantagem desse instrumento é que ele delimita e padroniza os créditos<br />
imobiliários, facilitando sua transferência ao VPE e a securitização como um todo.<br />
A cessão das CCI pode ser feita por endosso, caso sejam documentos cartulares ou<br />
por meio de central de liquidação e custódia de títulos, no caso de emissão escritural.<br />
A Medida Provisória prevê expressamente que a cessão da CCI implica<br />
automática transmissão das respectivas garantias ao cessionário, subrogando-se em<br />
todos os direitos representados pela cédula e especificamente no caso de alienação<br />
fiduciária, o cessionário se investirá na propriedade fiduciária que cabia ao cedente.<br />
No caso de securitização lastreada em CCIs, as cédulas deverão ser identificadas<br />
no respectivo termo de securitização, mediante a indicação de seu número,<br />
valor, série e instituição custodiante, mencionando o patrimônio separado a que<br />
estão afetadas. (BRASIL, 1997).<br />
Apesar de as emissões de securitizações imobiliárias já estarem bem protegidas<br />
por meio de segregação patrimonial, como se verá adiante, a Lei 9.514/97 prevê<br />
garantias adicionais que podem ser oferecidas pela companhia securitizadora, como,<br />
por exemplo, garantia flutuante sobre todo seu patrimônio, hipoteca, cessão fiduciária<br />
de direitos creditórios, caução de direitos creditórios ou aquisitivos decorrentes de<br />
contratos de venda ou promessa de venda de imóveis. Se, porém, nenhuma garantia<br />
constar expressamente do termo de securitização, os detentores de CRIs somente<br />
poderão reclamar o patrimônio separado no qual são lastreados seus créditos.<br />
A Lei nº 9.514/97 determina ainda a possibilidade de alienação fiduciária de<br />
bens imóveis, no âmbito do SFI. Assim, tem-se um mecanismo rápido e eficaz para<br />
a recuperação de crédito, trazendo maior credibilidade à emissão de CRIs e de<br />
17<br />
outros valores mobiliários porventura emitidos pela companhia securitizadora.<br />
Mais recentemente, por meio da Medida Provisória nº 2.223, de 4 de setembro<br />
de 2001, convertida, em 2004, na Lei 10.931, foi determinado que os próprios<br />
agentes financeiros podem operar a securitização, sem necessidade da companhia<br />
securitizadora, por meio da emissão das Letras de Crédito Imobiliário – LCI, títulos<br />
criados por esse diploma legal.<br />
As LCIs são títulos nominativos, podendo ser transferidos mediante endosso em<br />
preto, emitidos e negociados independentemente de efetiva tradição, ou seja,<br />
podem ser escriturais. As LCIs têm lastro em créditos imobiliários garantidos por<br />
hipoteca ou alienação fiduciária de coisa imóvel, e não podem ser emitidas com<br />
prazo superior àquele dos créditos que lhe dão lastro. Trata-se de uma estrutura<br />
diferente, pois dispensa o uso de VPE, mas assim como a securitização propriamente<br />
dita, cumpre a função de circulabilidade a ativos imobiliários.<br />
A securitização no Brasil é, como o foi nos Estados Unidos na penúltima<br />
18<br />
década, uma saída eficiente para reduzir o déficit habitacional. Contudo, para que<br />
haja uma perspectiva de desenvolvimento do SFI nos moldes que se propõe, deve<br />
haver, concomitantemente à sua implantação, estímulo ao desenvolvimento do<br />
mercado secundário dos CRIs, assim como ocorreu nos Estados Unidos. A simples<br />
edição da legislação não tem, como se tem visto, o condão de desenvolver o<br />
mercado para um tipo de operação.<br />
6.2.2.1 Segregação Patrimonial na Securitização Imobiliária<br />
Conforme já analisado, a segregação patrimonial é o ponto crítico das operações<br />
de securitização no Brasil. Por esse motivo, a legislação brasileira a respeito de<br />
securitização imobiliária preocupou-se em tratar dessa segregação em duas esferas:<br />
tanto no âmbito da incorporadora, anteriormente à estruturação da securitização,<br />
como na companhia securitizadora, após cedidos os créditos.
Assim, no final de 2001, foi introduzido no ordenamento jurídico<br />
brasileiro mais um instrumento para a segregação de patrimônio para as<br />
securitizações de base imobiliária. A Medida Provisória nº 2.221, de 4 de<br />
setembro de 2001, posteriormente convertida na Lei 10.931/04, criou a figura<br />
do patrimônio de afetação nas incorporações imobiliárias.<br />
Já na esfera do veículo de securitização, a Lei nº 9.514/93 prevê a possibilidade<br />
de instituição de regime fiduciário sobre os créditos afetados a uma<br />
emissão, de modo a segregá-los completamente do restante do patrimônio da<br />
companhia securitizadora.<br />
6.2.2.2 Patrimônio de Afetação<br />
O patrimônio de afetação permite separar o patrimônio geral da empresa<br />
incorporadora do patrimônio referente a cada empreendimento específico,<br />
visando à consecução da edificação e à entrega das unidades imobiliárias aos<br />
respectivos proprietários. Na verdade, ocorre uma segregação de cada<br />
empreendimento com relação ao risco de outros, bem como quanto ao risco<br />
da própria empresa incorporadora. Cada empreendimento passa a ser um<br />
centro de geração de receitas e despesas, que deve se auto-sustentar.<br />
Assim, cada empreendimento possui ativo e passivo próprios, formados<br />
por bens, direitos e obrigações que lhe são inerentes, bem como os adquiridos<br />
no decorrer do desenvolvimento do negócio.<br />
Com o patrimônio de afetação, o construtor obriga-se a manter em<br />
separado todos os bens e recursos relativos a determinado empreendimento,<br />
não podendo investi-lo em outras atividades ou empreendimentos diversos<br />
daquele que originou os recursos.<br />
Note-se, porém, que o patrimônio de afetação é limitado ao montante<br />
necessário para a consecução de determinado empreendimento, sendo seus<br />
recursos utilizados para pagamento ou reembolso das despesas inerentes à<br />
incorporação. Assim, caso a receita do empreendimento seja excedente ao<br />
montante estipulado para sua consecução, passará a fazer parte do patrimônio<br />
geral do incorporador e não mais do patrimônio de afetação.<br />
Ressalte-se que apesar de o patrimônio de afetação ser exclusivamente<br />
destinado à consecução do empreendimento, se porventura o incorporador<br />
vier a prejudicar esse patrimônio, responderá também com seu patrimônio<br />
geral e pessoal por este prejuízo.<br />
A constituição do patrimônio de afetação é facultativa, podendo o<br />
incorporador adotá-lo a qualquer tempo, ainda que a incorporação haja sido<br />
instituída anteriormente à Medida Provisória nº 2.221/01. O patrimônio de<br />
afetação é constituído mediante averbação, junto ao Registro de Imóveis, de<br />
termo firmado pelo incorporador ou pelos titulares de direitos reais de<br />
aquisição e está sujeito a regras bem específicas, conforme detalhado a seguir.<br />
Paralelamente à constituição do patrimônio de afetação, deverá ser<br />
instituída uma comissão de representantes, formada por titulares de direitos<br />
reais sobre o empreendimento, os quais, por sua vez, terão os poderes<br />
necessários para fiscalizar referido patrimônio, podendo, para tanto, contratar<br />
profissionais especializados. Havendo financiamento, o patrimônio de<br />
afetação poderá ser auditado por pessoa física ou jurídica nomeada pela<br />
instituição financiadora.<br />
Dentre as obrigações do incorporador, destacam-se: promover os atos<br />
necessários à boa administração da incorporação; manter separado de seu
patrimônio, em conta específica, os bens e direitos objeto de cada incorporação; e<br />
entregar à comissão de representantes, trimestralmente, demonstrativos do estado<br />
da obra, suas perspectivas, e balancete financeiro do patrimônio de afetação.<br />
No caso de falência do incorporador, esta não atingirá o patrimônio de afetação,<br />
nem mesmo constituirá crédito para a massa falida. Havendo financiamento da<br />
construção, os adquirentes serão sub-rogados nos direitos e obrigações contratuais<br />
do falido. No prazo de sessenta dias da decretação de falência do incorporador,<br />
deverá ser convocada a comissão de representantes, ou, na falta desta, um sexto dos<br />
titulares das frações ideais, para deliberar sobre os termos da construção da obra e<br />
destinação do patrimônio de afetação.<br />
6.2.2.3 Regime Fiduciário<br />
A Lei faculta a instituição de regime fiduciário sobre créditos imobiliários<br />
pela companhia securitizadora, pelo qual se segregam os ativos lastro de determinada<br />
emissão, os quais não se comunicam com o patrimônio geral da companhia<br />
securitizadora.<br />
O regime fiduciário é instituído mediante a declaração unilateral da securitizadora,<br />
no contexto do termo de securitização e implica na constituição de patrimônio<br />
separado, afetado ao fim específico de honrar os compromissos financeiros<br />
referentes a uma determinada emissão de títulos. Todavia, pode ser outorgado, no<br />
termo de securitização, o direito de os beneficiários do patrimônio separado<br />
haverem seus créditos contra o patrimônio da companhia securitizadora, no caso<br />
daquele se tornar insuficiente para aquele fim.<br />
A Lei diz ainda que o patrimônio segregado não pode ser dado em garantia, nem<br />
pode ser exigido por credores da companhia securitizadora, por mais privilegiados<br />
que sejam. Cabe à companhia securitizadora administrar cada patrimônio separado<br />
que venha a instituir, mantendo seus registros contábeis e publicando suas demonstrações<br />
financeiras de forma totalmente independente.<br />
Há ainda a necessidade de nomeação de um agente fiduciário, com poderes<br />
amplos de representação, incumbindo-lhe, em linhas gerais, zelar pelo patrimônio<br />
submetido ao regime fiduciário e pelos interesses de seus beneficiários. Note-se que<br />
se aplica ao agente fiduciário as mesmas regras impostas aos agentes fiduciário de<br />
emissões de debêntures, a que se refere a Lei 6.404/76, das Sociedades por Ações.<br />
Ressalte-se que a insuficiência de bens do patrimônio separado não deverá<br />
submetê-lo a regimes falimentares, mas caberá ao agente fiduciário reunir os<br />
beneficiários em assembléia para deliberar sobre sua administração ou liquidação.<br />
Já no caso insolvência da companhia securitizadora, o patrimônio separado não<br />
será afetado e o agente fiduciário assumirá imediatamente sua custódia e administração,<br />
devendo também convocar assembléia de beneficiários para decidir sobre<br />
sua administração.<br />
A exemplo do que ocorre com os fundos imobiliários, a Lei criou um regime<br />
fiduciário especial para operações de securitização, protegendo expressamente o<br />
patrimônio segregado para a securitização de eventuais demandas contra o originador<br />
ou mesmo contra o VPE.<br />
6.3 Securitização de Ativos Empresariais em Geral<br />
Para os fins deste estudo, consideram-se ativos empresariais não só os oriundos<br />
de operações estritamente comerciais, mas também aqueles originados em outras<br />
atividades que envolvam a criação de valores econômicos, como, por exemplo, a
prestação de serviços que, apesar de não ser atividade tradicionalmente<br />
comercial, gera fluxos de caixa passíveis de circulação. Por outro lado, apesar<br />
de os ativos bancários ou de exportação constituírem créditos eminentemente<br />
empresariais, eles não estão aqui incluídos, por terem disciplina própria<br />
relativamente à securitização. A securitização empresarial seria, por assim<br />
dizer, uma categoria residual, que abarcaria as situações não incluídas nas<br />
disciplinas específicas aqui classificadas.<br />
Tentando inaugurar uma nova etapa da securitização, em 1993, o CMN<br />
emitiu a Resolução n° 2.026, permitindo que instituições financeiras adquirissem<br />
títulos emitidos por VPEs. Nesse caso, os ativos, lastro da operação,<br />
seriam eminentemente comerciais ou oriundos de prestação de serviços, ou<br />
seja, títulos representativos de créditos originários de venda no varejo,<br />
receitas de prestação de serviços, faturas de cartão de crédito, dentre outras.<br />
Esses créditos deveriam ser segregados em VPE que emitiriam títulos neles<br />
latreados. Eram exatamente esses títulos que a citada Resolução permitia<br />
serem adquiridos por instituições financeiras.<br />
A Resolução nº 2.026/93, porém, foi revogada pela de nº 2.493/98, que,<br />
todavia, não regulou a matéria. Como adiante assinalado, essa Resolução<br />
trata da securitização de créditos bancários, tendo os bancos como originadores.<br />
A citada norma não trata da aquisição de títulos de securitização empresarial<br />
por instituições financeiras, mas sim da securitização dos créditos de<br />
instituições financeiras.<br />
Mais do que qualquer das outras modalidades, a securitização de ativos<br />
empresariais pode ser considerada hoje um negócio jurídico indireto, pois<br />
carece de qualquer disciplina legal específica que lhe dê amparo. É uma<br />
combinação de instrumentos jurídicos - basicamente a cessão de créditos e<br />
emissão de títulos - que se transforma num negócio jurídico atípico.<br />
Não há diploma legal que a discipline, pois, como visto, a regulamentação<br />
específica é determinada pelo tipo de bem que dá lastro à securitização, e, no<br />
caso da securitização empresarial, o ativo subjacente pode ser qualquer um<br />
passível de gerar renda. A falta de regulamentação, ao invés de prejudicar,<br />
pode ser considerada um ponto vantajoso, vez que lhe propicia a necessária<br />
flexibilidade para sua estruturação.<br />
Atualmente, o setor de cartões de crédito é um dos que mais se utilizam da<br />
securitização empresarial em todo o mundo. Também no Brasil as administradoras<br />
utilizam-se desse mecanismo para adiantar receitas. Setores como o<br />
automobilístico e o de aviação comercial já iniciaram a securitização de suas<br />
carteiras de contas a receber.<br />
Mais recentemente, o CMN criou, por meio da Resolução 2.907/01, um<br />
instrumento que se presta à securitização de ativos empresariais, embora<br />
também possa ser usado por outros segmentos. Trata-se do fundo de direitos<br />
creditórios - FIDCs ou fundo de recebíveis, como ficou conhecido no<br />
mercado. Esse modelo repete consideravelmente, o modelo francês dos<br />
Fonds Communs de Créance, que se mostrou eficiente naquele país.<br />
Desde sua criação, e de forma mais consistente nos últimos anos, os<br />
fundos de recebíveis têm possibilitado o acesso ao mercado de capitais a<br />
sociedades empresárias de médio porte, como forma de financiar suas<br />
atividades. Além disso, esses fundos apresentam vantagens fiscais aos<br />
investidores e originadores, se comparados às sociedades de propósitos<br />
específicos, utilizadas para a securitização de ativos empresariais.<br />
A constituição desse tipo de fundo se dá mediante a cessão de créditos do
originador ao fundo, os quais passam a compor, primordialmente, seu ativo. O<br />
rendimento das carteiras resulta da diferença entre o valor líquido antecipadamente<br />
pago aos originadores pelos créditos e os juros pagos pelos devedores no vencimento<br />
da obrigação.<br />
A regulamentação dos fundos determina que a aplicação de recursos somente deve<br />
ser feita por investidores qualificados, todavia, entende-se que essa seja uma circunstância<br />
ligada ao fato de se tratar de produto financeiro ainda não totalmente consolidado<br />
no mercado, mas que no futuro poderá ser uma opção de investimento de varejo.<br />
Com efeito, a legislação a respeito de FIDCs admite espécies diferenciadas de quotas<br />
subordinadas e seniores, sendo que essas últimas podem oferecer garantias maiores<br />
para seu resgate, podendo, assim, ser viável para investidores não qualificados.<br />
Os FIDCs têm representado um dos instrumentos de maior crescimento para a<br />
securitização, tendo a sua regulamentação evoluído consideravelmente, apesar de<br />
ainda existiriam algumas dúvidas com relação à natureza da cessão dos créditos do<br />
originador para o fundo, especialmente com relação à incidência do Imposto sobre<br />
Operações Financeiras - IOF.<br />
Até mesmo o Banco Nacional de Desenvolvimento – BNDES tem utilizado os<br />
fundos de recebíveis como instrumento de aporte de recursos e financiamento de<br />
empresas, uma vez que ele permite estruturações bastante distintas, possibilitando<br />
o investimento do BNDEs em a setores diversos.<br />
6.4 Securitização de Créditos Financeiros<br />
Por meio da Resolução CMN nº 2.493, de 07/05/1998, as autoridades monetárias<br />
regulamentaram a securitização das carteiras de recebíveis bancários e das<br />
demais instituições financeiras, como empréstimos e carteiras de arrendamento<br />
mercantil. (FAGUNDES, 1999, p. 6-13).<br />
De acordo com Andrezzo e Lima(ANDREZZO e LIMA, 1999, p. 305) por meio<br />
desse mecanismo, as instituições financeiras contempladas na citada resolução<br />
foram autorizadas a excluir de seus balanços operações que pudessem comprometer<br />
seus níveis de concentração de risco ou mesmo contratos problemáticos,<br />
cedendo-os para veículo de propósito específico que não integram o Sistema<br />
Financeiro Nacional, não se sujeitando, assim, à severa disciplina dos órgãos<br />
reguladores. Antes da promulgação da Resolução nº 2.493/98, as cessões de crédito<br />
de instituições financeiras apresentavam-se como um regime de exceção, sendo<br />
reguladas pela Resolução CMN nº 1.962/92.<br />
Com efeito, a Resolução nº 1.962/92 estabelece a cessão de crédito entre<br />
instituições financeiras, mas não a companhias securitizadoras, além de exigir uma<br />
série de formalidades para a efetivação do negócio de cessão.<br />
A Resolução CMN nº 2.493/98 dispunha, em suma, sobre autorização para<br />
cessão de créditos oriundos de determinadas operações por parte de bancos<br />
múltiplos, bancos comerciais, bancos de investimento, sociedades de crédito,<br />
financiamento e investimento, sociedades de crédito imobiliário, sociedades de<br />
arrendamento mercantil e companhias hipotecárias a sociedades anônimas de<br />
objeto exclusivo e a companhias securitizadoras de créditos financeiros.<br />
A Resolução n° 2.493/98 proibia expressamente a coobrigação da instituição<br />
cedente dos créditos ou de qualquer coligada, pelo pagamento dos créditos cedidos.<br />
Não permitia, também, a recompra de créditos anteriormente cedidos ou a aquisição,<br />
pela cedente, dos títulos emitidos com lastro nos créditos securitizados.<br />
Em 26 de janeiro de 2000, a Resolução CMN nº 2.493/98 foi revogada pela de<br />
nº 2.686, que passou a regular a securitização de créditos financeiros. O mecanismo
de securitização de créditos financeiros é o mesmo apresentado como<br />
estrutura básica de securitização nesse trabalho: as instituições financeiras<br />
cedem seus créditos às companhias securitizadoras, que emitem títulos<br />
lastreados nesses créditos.<br />
A companhia securitizadora de créditos financeiros pode emitir ações ou<br />
debêntures não conversíveis para distribuição pública ou debêntures não<br />
conversíveis subordinadas para emissão privada, no mercado local, ou ainda<br />
outros valores mobiliários para distribuição no exterior, de acordo com as leis<br />
do país de distribuição. Note-se que a emissão privada de debêntures só é<br />
permitida no caso de a instituição cedente dos créditos ser sua única adquirente.<br />
A nova resolução passa ainda a permitir expressamente a coobrigação<br />
da cedente pelo pagamento dos créditos.<br />
Da mesma forma que o Banco Central do Brasil, a maioria dos bancos<br />
centrais e agências reguladoras em todo o mundo vêem com preocupação os<br />
mecanismos de securitização de créditos de instituições financeiras.<br />
Primeiramente, porque a securitização pode ser considerada uma forma de<br />
elidir as exigências de adequação de capital impostas aos bancos e demais<br />
instituições financeiras; e, em segundo lugar, em razão de perderem parte de<br />
seu controle sobre os ativos de tais instituições e, com especialidade, sobre<br />
parte dos mecanismos de política de monetária. (ROSENTHAL e<br />
OCAMPO, 1988, p. 17).<br />
Provavelmente por essa razão, desde 1993, o Conselho Monetário<br />
Nacional vem tentando disciplinar a matéria, de modo a manter o controle<br />
estrito do Banco Central sobre as operações das instituições financeiras e, ao<br />
mesmo tempo, possibilitar o desenvolvimento da securitização como uma<br />
operação capaz de contribuir para obtenção de um mercado financeiro mais<br />
forte e estável.<br />
6.5 Securitização de ativos do Agronegócio<br />
Em 2004, por meio da Medida Provisória 221 de 01 de outubro, posteriormente<br />
convertida na Lei 11.076 de 30 de Dezembro de 2004, introduziram-se<br />
no Brasil os títulos específicos para a securitização no agronegócio. O<br />
modelo determinado pela Lei é bastante similar ao adotado para a securitização<br />
de base imobiliária, uma vez que, como nesse segmento, tem a finalidade<br />
de desenvolver investimentos e financiar as atividades ligadas a produtos<br />
agropecuários, seus derivados, subprodutos e resíduos de valor econômico.<br />
Conforme mencionada Lei, os antigos Certificados de Depósito de<br />
Mercadorias e Warrants não podem mais ser emitidos com lastro em produtos<br />
relativos ao agronegócio, tendo sido substituídos pelo CDA – Certificado de<br />
Depósito Agropecuário e WA - Warrant Agropecuário, que, assim como seus<br />
antecessores, são emitidos simultaneamente e lastreados em produtos depositados<br />
em armazéns devidamente certificados por autoridades governamentais.<br />
Foram criados os Certificados de Direitos Creditórios do Agronegócio -<br />
CDCA), Letras de Crédito do Agronegócio - LCA, que é de emissão exclusiva<br />
de instituições financeiras e ainda o Certificado de Recebíveis do<br />
Agronegócio - CRA, cuja emissão é exclusiva para sociedades de securitização<br />
de recebíveis.<br />
Os títulos específicos para o setor agropecuário já apresentam resultados,<br />
sendo que já foram utilizados em diversas emissões e, portanto, começa a<br />
cumprir com a função para a qual foram criados.
Com efeito, de acordo com a exposição de motivos da Medida Provisória 221 de<br />
01 de setembro de 2004, ela<br />
visa criar um estímulo para que os próprios agentes de mercado lancem opções<br />
de produtos agropecuários, o que contribuiria para o desenvolvimento do<br />
mercado de capitais com referência em produtos do agronegócio, com nítidos<br />
benefícios para ambas as partes, em especial para o auto-financiamento do<br />
setor no médio e longo prazos. Por outro lado, tal medida representaria uma<br />
forma mais eficiente e de maior potencial de implementação da política de<br />
preços mínimos.<br />
Conforme a mencionada Lei, em seu artigo 40,<br />
a securitização de direitos creditórios do agronegócio é a operação pela qual<br />
tais direitos são expressamente vinculados à emissão de uma série de títulos de<br />
crédito, mediante Termo de Securitização de Direitos Creditórios, emitido por<br />
uma companhia securitizadora, do qual constarão os seguintes elementos:<br />
I - identificação do devedor;<br />
II - valor nominal e o vencimento de cada direito creditório a ele vinculado;<br />
III - identificação dos títulos emitidos;<br />
IV - indicação de outras garantias de resgate dos títulos da série emitida,<br />
quando constituídas..<br />
Em consonância com o que se defende acerca da natureza jurídica da securitização,<br />
acredita-se que mesmo antes da edição da legislação específica sobre os títulos<br />
do agronegócio já seria possível lastrear emissão de títulos, como debêntures ou<br />
quotas de fundo com ativos dessa natureza. Porém, a criação de instrumentos<br />
específicos demonstra intenção política no desenvolvimento do agronegócio com<br />
base no mercado de capitais.<br />
7 CONCLUSÃO Consoante já comentado, não há legislação geral sobre securitização no Brasil,<br />
ao contrário de alguns países de sistema romano-germânico, como Portugal, Itália,<br />
França e Argentina. Há, sim, legislação e regulamentação sobre a securitização de<br />
determinados tipos de ativo, conforme sua especificidade ou interesse do estado em<br />
promover seu desenvolvimento.<br />
Esse tipo de tratamento jurídico, aberto e sem diretrizes estabelecidas, faz com<br />
que a securitização seja flexível - e assim deve ser - já que ainda se encontra em<br />
desenvolvimento no Brasil, podendo vir a ser utilizada para os mais diversos fins.<br />
Apenas após a operação estar plenamente caracterizada em nossa sociedade, no que<br />
diz respeito a estrutura e função econômica, poder-se-ia criar legislação ampla, para<br />
consolidar o uso que já vem sendo observado, de modo a incorporá-la definitivamente<br />
a nosso ordenamento jurídico.<br />
Ademais, não há no ordenamento jurídico pátrio entraves que impeçam a<br />
realização da operação com base na estrutura descrita neste trabalho. As regras de<br />
direito privado podem e devem ser utilizadas para novos fins, de acordo com as<br />
necessidades da sociedade.<br />
Já a regulação específica tem grande importância, por diferentes razões: no caso<br />
do financiamento imobiliário, a legislação tem o mérito de contribuir para o<br />
desenvolvimento do mercado e criação de negociação secundária para os títulos<br />
emitidos nesses processos, mesmo não sendo suficiente para atingir esse objetivo<br />
isoladamente. Já no caso da securitização bancária, a legislação visa não ao<br />
desenvolvimento, mas sim ao controle da utilização da operação.<br />
É importante ressaltar, todavia, que o regramento jurídico deve disciplinar sem<br />
engessar o desenvolvimento da operação em outras áreas, mas sim contribuir para
seu desenvolvimento responsável. Os nichos de regulação devem continuar<br />
específicos e com objetivos claramente definidos para cada um deles.<br />
O que também se pode perceber da experiência no Direito estrangeiro, é<br />
que o desenvolvimento da securitização em cada país depende menos da<br />
legislação que regula a operação internamente e mais do grau de desenvolvimento<br />
do seu mercado de capitais. Assim, nota-se que na França, o instituto<br />
mostra-se bem mais desenvolvido do que na Itália e em Portugal, sendo que<br />
todos possuem legislação geral sobre securitização.<br />
O desenvolvimento do mercado de capitais, por sua vez, depende de<br />
medidas bem mais abrangentes no campo do Direito. Tais medidas dizem<br />
respeito muito mais à forma na qual são utilizados os mecanismos disponíveis<br />
no Direito societário e mobiliário, do que à criação de novos institutos. É o<br />
que se passa a analisar.<br />
No que se refere à crise de crédito, instaurada no mercado imobiliário<br />
americano e que se alastrou por todo mundo, não se trata de um problema<br />
oriundo da securitização em si, mas sim de análise e concessão de crédito,<br />
assuntos que fogem ao escopo deste trabalho.<br />
REFERÊNCIAS<br />
ANDREZZO, Andrea Fernandes; LIMA, Iran Siqueira. Mercado financeiro:<br />
aspectos históricos e conceituais. São Paulo: Pioneira, 1999.<br />
ASCARELLI, Tullio. Negócio jurídico indirecto. Lisboa: Jornal do Fôro, 1965.<br />
________. Problemas das sociedades anônimas e direito comparado. Campinas:<br />
Bookseller, 2001.<br />
BARON, Neil. The role of rating agencies in the securitization process. In:<br />
KENDALL, Leon T.; FISHMAN, Michael J. (Coord.). A primer on securitization.<br />
Cambridge: MIT Press, 1996.<br />
BARRATT, Jeffery. Financing projects through the capital markets: a South East<br />
Asia Perspective. In: The future for the global securities market: legal and regulatory<br />
aspects. : Clarendon Press, 1996.<br />
BORGES, Luis Ferreira Xavier Borges. Securitização como parte da segregação<br />
do risco empresarial. Revista do Direito Bancário, do Mercado de Capitais e da<br />
Arbitragem, São Paulo, v. 10, out./dez. 2000.<br />
BRASIL, Resolução nº 1.844 do Conselho Monetário Nacional, de 31 de julho de<br />
1991. Disponível em: . Último acesso em: 22 jun. 2009.<br />
BRASIL, Circular nº 3027 do Banco Central do Brasil, de 22 de fevereiro de 2001.<br />
Disponível em: . Último acesso em: 22 jun. 2009.<br />
BRASIL, Circular nº 2919 do Banco Central do Brasil, de 18 de agosto de 1999.<br />
Disponível em: . Último acesso em: 22 jun. 2009.<br />
BRASIL Lei nº 8.668, de 25 de junho de 1993. Disponível em: Último acesso em: 22 jun. 2009.<br />
BRASIL Lei 10.931, de 02 de agosto de 2004. Disponível em: http://www.planalto.<br />
gov.br/CCIVIL/_Ato2004-2006/2004/Lei/L10.931.htm. Último acesso em: 22 jun. 2009.
BRYAN, Lowell. The risks, potential, and promise of securitization. In: KENDALL,<br />
Leon T.; FISHMAN, Michael J. (Coord.). A primer on securitization. : MIT Press, 1996.<br />
CARIOTA-FERRARA, Luigi. I negozi fiduciari. Padova: CEDAM, 1933.<br />
CHALHUB, Melhin Namen. A fidúcia no sistema de garantias reais do direito<br />
brasileiro. Felsberg e Associados. Disponível em: . Último acesso em: [~]<br />
________. Negócio fiduciário. Rio de Janeiro; São Paulo: Renovar, 2000.<br />
FAGUNDES, Carlos. Securitização: inovação na gestão de créditos bancários. Tecnologia<br />
de Crédito, v. 2, n. 11, mar. 1999.<br />
FERRARA, Francesco. Simulação nos negócios jurídicos. São Paulo: Saraiva, 1939.<br />
FORTUNA, Eduardo. Mercado financeiro: produtos e serviços. 7. ed. Rio de Janeiro:<br />
Qualitymark, 1995.<br />
KENDALL, Leon T.; FISHMAN, Michael J. (Coord.). A primer on securitization.<br />
Cambridge: MIT Press, 1996.<br />
KOURY, Susy Elizabeth Cavalcante. A desconsideração da personalidade jurídica<br />
(disregard doctrine) e os grupos de empresas. Rio de Janeiro: Forense, 1993.<br />
LIMA, Otto de Souza. Negócio fiduciário. 1959. Tese (Cátedra de Direito Civil) —<br />
Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1959.<br />
MACHADO, Sylvio Marcondes. Da fraude contra credores: falência e alienação do<br />
estabelecimento. In: Questões de direito mercantil. São Paulo:Saraiva, 1977.<br />
MATIAS, Armindo Saraiva. Titularização: um novo instrumento financeiro. Revista de<br />
Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, São Paulo, n. 112, out./dez. 1998.<br />
NAMEN, Chalhub Melhin. A fidúcia no sistema de garantias reais do direito brasileiro.<br />
Disponível em: . Último acesso<br />
em: 25 set 2003.<br />
NAMEN, Chalhub Melhin. Negócio fiduciário. Rio de Janeiro; São Paulo: Renovar, 2000.<br />
PEDRETTI, Maria das Graças; COSAC, Marcelo. Securitização é um meio de reduzir<br />
déficit habitacional. Gazeta Mercantil, São Paulo, 13 fev. 2001.<br />
RODRIGUEZ, Luis Ângulo. La financiacíon de empresas mediante tipos especiales de<br />
obligaciones. Bolonha: Publicaciones del Real Colegio España en Bologna, 1968.<br />
ROSENTHAL, James; OCAMPO, Juan. Securitization of credit: inside the new<br />
technology of finance. York: Wiley, 1988.<br />
RUBINO, Domenico. Il negozio jurídico indiretto. Milano: Giuffrè, 1937.<br />
SZTAJN, Quotas de fundos de investimento imobiliário: novo valor mobiliário. Revista<br />
de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, São Paulo, n. 93, jan./mar. 1994.<br />
THEODORO JR., Humberto. Fraude contra credores e fraude à execução. Revista dos<br />
Tribunais, São Paulo, v. 776, jun 2000.<br />
WALD, Arnoldo. O banco como catalizador de negócios. In: Estudos e pareceres de<br />
direito comercial.São Paulo: Revista dos Tribunais, 1979.
1 INTRODUÇÃO<br />
2 A IMPORTÂNCIA E A<br />
ESPECIFICIDADE DAS<br />
PESSOAS COMO RECURSO<br />
CRÍTICO PARA AS<br />
ORGANIZAÇÕES OBTEREM<br />
VANTAGEM COMPETITIVA<br />
DURADORA<br />
Na atual realidade do mercado, a seleção e gestão das pessoas contratadas pelas<br />
empresas estão diretamente ligadas ao retorno esperado em longo prazo. Sabe-se<br />
que a valorização dos funcionários, investindo em sua capacitação profissional e<br />
desenvolvimento de aptidões tende a promover um crescimento profissional com a<br />
consequente satisfação profissional do empregado.<br />
A adoção de novas abordagens de incentivo e desenvolvimento dos funcionários,<br />
por vezes, entra em conflito com o modelo adotado pelas gerações anteriores,<br />
que utilizavam a hierarquia e a exigência de ordens não fundamentadas. É<br />
preciso adaptar as técnicas de seleção e gestão de pessoas à nova geração que está<br />
ingressando no mercado.<br />
Todas estas questões serão devidamente ponderadas ao longo deste estudo,<br />
levantando questões acerca das práticas usuais de gestão de pessoas adotadas pelas<br />
empresas e explicar o que deve ser mudado para assegurar a vantagem competitiva<br />
destas no mercado.<br />
2.1 Mudanças no ambiente de trabalho<br />
Nos últimos anos ocorreram drásticas mudanças na realidade do mercado<br />
brasileiro e as organizações se obrigaram a adotar modificações para acompanhar<br />
este cenário. Com a abertura do mercado brasileiro e a era da globalização se tornou<br />
imperiosa a necessidade de transformações na estrutura das empresas, a fim de que<br />
estas permanecessem competitivas.<br />
Fatores como a alteração no poder de compra da população e as novas exigências<br />
do consumidor em relação a produtos e serviços obrigam a adoção de novas<br />
técnicas de produção e gestão de negócios. Em função do acelerado ritmo das<br />
mudanças externas, o gestor de pessoas não pode perder seu foco, sob o risco de<br />
perder a visão global de longo de sua empresa.<br />
A maior barreira enfrentada para alterar o modelo de gestão adotado pelas<br />
organizações são as pessoas. Os indivíduos são naturalmente resistentes à mudança,<br />
uma vez que ao modificarem um comportamento são obrigadas a mudar o<br />
modelo mental criado ao longo de muitos anos ou de uma vida inteira.<br />
A força de trabalho exigida nas empresas é cada vez mais específica e qualificada,<br />
surgindo um novo perfil de trabalhador, cada vez mais especializado em suas<br />
tarefas. Estes novos empregados, por sua vez, são mais escolados e não aceitam<br />
simplesmente obedecer a regras sem entender o porquê.<br />
2.2 Sistema de gestão de pessoas<br />
O sistema de gestão de pessoas a ser adotado por uma determinada organização<br />
deve ser pautado por valores e não por regras, visando o aprendizado e aperfeiçoa-
2 CANDELORO, Raúl. 20 Lições<br />
de Jack Welch. Disponível em:<br />
.<br />
Acesso em: 07 jun. 2011.<br />
mento das capacidades pessoais dos empregados. Para tanto, as empresas<br />
devem assimilar os conceitos de sistemas flexíveis e procedimentos adaptativos,<br />
ampla delegação no processo da tomada de decisões, entre outros.<br />
Estes novos conceitos substituirão aqueles utilizados largamente até<br />
então, tais como a especialização funcional única, a linha de comando e a<br />
comunicação vertical, de cima para baixo. Os novos conceitos a serem<br />
adotados devem considerar o papel da pessoa dentro da organização como<br />
parte de um ativo intangível composto do conhecimento e experiências<br />
pessoais de cada funcionário.<br />
Com esta valorização profissional, natural que as organizações invistam<br />
mais em educação e programas de aperfeiçoamento de seus empregados, o<br />
que além de servir como estímulo para que o funcionário permaneça trabalhando<br />
na empresa, serve para promover melhorias em seus produtos e<br />
serviços. Assim, a organização tende a acompanhar as tendências do mercado<br />
e os padrões de exigência de seus consumidores.<br />
2.3 Processo de captação de pessoas<br />
A adoção de novos padrões de gestão e a utilização de novas tecnologias<br />
exige um novo perfil de funcionário a ser contratado pelas organizações. O<br />
processo de seleção destes funcionários deve revelar de forma clara a missão da<br />
empresa, a fim de evitar qualquer tipo de frustração no empregado contratado.<br />
É preciso buscar ao longo do processo seletivo o candidato que apresenta<br />
maior afinidade com os valores da empresa, verificando o nível de interesse<br />
deste em participar da empresa. Para tanto, os testes elaborados por especialistas<br />
em ambientes educacionais e clínicos não se mostram eficazes para a<br />
utilização em ambiente empresarial, como outrora ocorria.<br />
Esta identificação de perfil do candidato com os valores da empresa é que<br />
vai fazer com que este funcionário permaneça trabalhando junto à organização<br />
e buscando, cada vez mais, fazer com que esta se consolide no mercado. A<br />
busca por profissionais ambiciosos e atualizados nem sempre atinge a finalidade<br />
do processo de seleção, eis que o conflito entre tais exigências leva a<br />
controvérsias em curto prazo, visto que pessoas com este perfil não estão dispostas<br />
a esperar por uma promoção ou aceitar tarefas rotineiras e sem desafios.<br />
2.4 Gestão de desempenho<br />
Um dos pioneiros na adoção de gestão de desempenho foi Jack Welch,<br />
devido a suas inovadoras técnicas de gestão implementadas com muito<br />
sucesso em uma das maiores e mais respeitadas empresas do mundo, a<br />
General Eletric (GE). Uma das lições aplicadas e difundidas por Welch é a de<br />
que uma liderança excelente vem da qualidade da visão e da habilidade de<br />
2<br />
incentivar os outros para uma performance extraordinária .<br />
O grande erro das organizações e subestimar o potencial do seu próprio<br />
pessoal. O profissional de recursos humanos tem a tarefa de redefinir o<br />
relacionamento da empresa com seus empregados, tendo como objetivo criar<br />
um ambiente onde as pessoas se sintam livres para criar e desenvolver suas<br />
capacidades, propiciando a realização profissional.<br />
O desenvolvimento do potencial criativo dos funcionários gera uma<br />
vantagem competitiva muito mais significativa do que aquela criada pela
homogeneidade e conformidade de comportamento. Ao invés de impor aos<br />
empregados um sistema empresarial definido por políticas de restrições, os novos<br />
lideres perceberam que é preciso construir um ambiente flexível, capaz de explorar<br />
os conhecimentos e aptidões únicos de cada um de seus funcionários, modelo que<br />
foi denominado de "Empresa Individualizada".<br />
2.5 Desenvolvimento de pessoas<br />
Uma organização não se desenvolve sozinha, ela precisa de pessoas, que por sua<br />
vez estão em constante desenvolvimento. É o conhecimento humano a base da<br />
criação do conhecimento organizacional.<br />
A empresa deve desenvolver fontes de aprendizagem, através de políticas de<br />
desenvolvimento pessoal. Ao incentivar um funcionário a buscar aperfeiçoamento,<br />
a empresa deve promover condições para esta pessoa consiga obter o maior<br />
proveito possível da oportunidade.<br />
Custear programas de treinamento, palestras, seminários e cursos de extensão<br />
são formas de fomentar o conhecimento para um maior número de pessoas dentro<br />
de uma organização. Incentivar um único funcionário a realizar determinado curso<br />
e, em contrapartida, pedir que este faça uma exposição das lições aprendidas<br />
também é uma forma de desenvolvimento pessoas.<br />
Escutar o que os familiares dos funcionários têm a dizer sobre a empresa é uma<br />
forma de tentar atender as demandas pessoais dos empregados, promovendo um<br />
ambiente de trabalho mais agradável e propício para a busca de crescimento<br />
profissional. Pesquisas de mercado também são alternativas para estudar a estima<br />
da empresa junto a seus consumidores finais.<br />
Uma organização efetiva requer motivação de seus funcionários, trabalho em<br />
equipe, senso de compromisso e mais desenvolvida em suas tarefas. O trabalho<br />
rotativo em empresas multinacionais é um exemplo claro, que demonstra a valia da<br />
experiência da troca de filial ou setores da empresa, por certo período de tempo, o<br />
que permite aos empregados que assumiram novos postos conhecer a dificuldade<br />
do outro setor e identifica-las em seu próprio.<br />
2.6 Sistema de valorização de pessoas<br />
O sistema de recompensas é o que equilibra a motivação e a remuneração. É o<br />
sistema de recompensas que vai manter dentro da organização os melhores<br />
funcionários e atrair novos talentos no mercado.<br />
A falta de reconhecimento do esforço do empregado pela empresa é o principal<br />
motivo de insatisfação dos funcionários de uma organização. O reconhecimento é<br />
algo simples, que não precisa vir através de prêmios, especialmente se estes são<br />
oferecidos apenas a um setor restrito da empresa.<br />
O reconhecimento pode, e deve, chegar ao empregado com a mesma rapidez<br />
que lhes são apresentadas as críticas em relação à sua produtividade. Implantar um<br />
programa de premiações é uma forma válida de o superior imediato dizer ao<br />
empregado que está satisfeito com o trabalho desenvolvido.<br />
A grande vantagem do sistema de premiações é o impacto psicológico gerado<br />
no funcionário e em seus demais beneficiários, visto que muitas vezes a premiação<br />
se estende, ou é compartilhada, com a família. Os prêmios em dinheiro são<br />
os menos valorizados, visto que não se materializam em algo que as pessoas<br />
possam olhar, recordar e sentirem-se satisfeitas com o esforço despendido em<br />
razão do trabalho.
3 CONCLUSÃO<br />
Uma gestão de pessoas eficiente e eficaz não é simples nem barata.<br />
Quando se trata de relacionamento humano, seja ele de que espécie for nada é<br />
tão simples quanto se apresenta na teoria.<br />
É muito complicado e custoso contentar a todos os funcionários de uma<br />
empresa e garantir vantagem competitiva no mercado. O custo de pessoal vai<br />
refletir diretamente no valor final do produto ou serviço oferecido, pelo que se<br />
torna imperioso o retorno financeiro das vantagens proporcionadas aos<br />
empregados de uma empresa.<br />
A tentativa de criar um ambiente de trabalho harmonioso e propício ao<br />
desenvolvimento de talentos na grande maioria das vezes esbarra na questão<br />
financeira. Empresas de grande porte são mais aptas a desenvolver programas<br />
de aperfeiçoamento e recompensas do que empresas pequenas, que, por vezes,<br />
são obrigadas a investir em determinados funcionários em detrimento de outros.<br />
As empresas que investem na valorização do clima organizacional atraem<br />
a ambição de inúmeros candidatos, pelo que podem se permitir a selecionar<br />
os melhores. Assim, o investimento gestão de pessoas tende a gerar um<br />
retorno financeiro a partir da motivação de seus funcionários em permanecerem<br />
no emprego e apresentarem os melhores resultados.<br />
REFERÊNCIAS<br />
BOHLANDER, George; SNELL, Scott; SHERMAAN, Arthur. Administração de<br />
recursos humanos. São Paulo: Cengage Learning, 2009.<br />
CANDELORO, Raúl. 20 Lições de Jack Welch. Disponível em:<br />
.<br />
Acesso em: 07 jun. 2011.<br />
GHOSHAL, Sumantra; BARTLETT, Christopher A.. A organização<br />
individualizada: As Melhores Empresas são Definidas por Propósitos, Processos e<br />
Pessoas. Rio de Janeiro: Campus, 2000.<br />
TACHIZAWA, Takeshy; FERREIRA, Victor Cláudio Paradela; FORTUNA,<br />
Antônio Alfredo Mello. Gestão de Pessoas: uma abordagem aplicada estratégias de<br />
negócios. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Fgv, 2001. 264 p.<br />
UNIVERSIDADE DE SANTA CRUZ DO SUL (Brasil). Clarise Agnes e Inácio<br />
Helfer. (Org.). Normas para apresentação de trabalhos acadêmicos. 8. ed. Santa<br />
Cruz do Sul: Edunisc, 2006. 72 p.