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www.psicologia.com.pt<br />
esquerda, supondo que essa área seria o “(…) centro das imagens motoras das palavras” (Luria,<br />
1977, p.61).<br />
Em 1874, no mesmo ano em que Wundt publicava Princípios da Psicologia Fisiológica, o<br />
neurologista alemão Carl Wernicke (1848-1905) descrevia a relação causal entre a lesão na<br />
primeira circunvolução temporal esquerda e uma das formas clínicas da afasia, a afasia sensorial.<br />
O nome afasia sensorial foi escolhido por Wernicke para contrastar com o conceito de afasia<br />
motora descrito anteriormente por Broca. Na afasia motora os sujeitos falariam pouco, mas<br />
compreenderiam a linguagem, enquanto que na afasia sensorial a fala está preservada, mas a sua<br />
linguagem é inapropriada e a compreensão da linguagem dos outros está prejudicada (Kristensen,<br />
Almeida & Gomes, 2001; Luria, 1977). Wernicke considerou ainda a possibilidade de uma lesão<br />
afectar as fibras associativas que conectam a primeira circunvolução temporal à terceira<br />
circunvolução frontal no hemisfério esquerdo, postulando, assim, a existência de um tipo de<br />
afasia no qual o paciente compreenderia a linguagem de outros e teria capacidade de produção,<br />
apesar do distúrbio severo na repetição (afasia de condução).<br />
Assim, a noção de áreas separadas do discurso no hemisfério esquerdo poderem ser centros<br />
de funções complexas do discurso foi sendo amplamente difundida e aceite, tornando-se uma das<br />
ideias bases da neurologia clássica (Luria, 1977). Num curto espaço de tempo foram descobertos<br />
vários desses centros (teriam por base uma lesão numa área cortical circunscrita) originando<br />
novos tipos de afasia: afasia amnésica (resultante de lesões no lobo temporal), afasia de condução<br />
(incapacidade de repetir palavras associada com discurso espontâneo preservado) e afasia<br />
transcortical (perturbação no discurso espontâneo ou na compreensão do discurso, associada com<br />
a preservação da repetição e do reconhecimento de palavras).<br />
Todo um conjunto de formas de afasias, esquemas de lesões neurológicas e o respectivo<br />
papel que desempenham na linguagem foi descrito até 1880, permanecendo imutável durante um<br />
século e sendo ainda hoje utilizado por alguns neurologistas, apesar dos conflitos entre a<br />
realidade clínica e as ideias bases da ciência contemporânea. De facto, o tipo de afasia descrita<br />
como de condução é um dos que levanta muitas reservas, visto que nunca foi encontrado um<br />
único paciente que fosse incapaz de repetir palavras, mas mantivesse o discurso espontâneo. De<br />
igual forma, parece dúbia a presunção de que a afasia motora tem sempre por base uma lesão na<br />
área de Broca, tendo-se verificado casos em que a autópsia revelou que esta zona estava intacta<br />
(Luria, 1977).<br />
1.2. Contributos da Neuropsicologia<br />
Pedro Miguel Lopes de Sousa 6