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Histórias da Meia- Noite - Unama

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pobre namorado fechava o rosto de quando em quando, ou fazia um gesto de<br />

desespero que felizmente escapava aos outros. Ele receava o triunfo de um homem<br />

que física e intelectualmente lhe era superior; que, além disso, gozava naquela<br />

ocasião a grande vantagem de dominar a atenção pública, que era o uso <strong>da</strong> aldeia,<br />

o acontecimento do dia, o homem <strong>da</strong> situação. Tudo conspirava para derrubar a<br />

última esperança de Soares, que era a esperança de ver morrer a moça isenta de<br />

todo o vínculo conjugal. O infeliz namorado tinha o sestro, aliás comum, de querer<br />

ver quebra<strong>da</strong> ou inútil A taça que ele não podia levar aos lábios.<br />

Cresceu porém seu receio quando, estando escondido no taquaral de que falei<br />

acima, para ver passar Isabel, como costumava fazer muitas vezes, descobriu a<br />

pessoa de Camilo na comitiva. Não pode reter uma exclamação de surpresa, e<br />

chegou a <strong>da</strong>r um passo na direção <strong>da</strong> estra<strong>da</strong>. Deteve-se a tempo. Os cavaleiros,<br />

como vimos, passaram adiante, deixando o cioso pretendente a jurar aos céus e à<br />

terra que tomaria desforra do seu atrevido rival, se o fosse.<br />

Não era rival, bem sabemos; o coração de Camilo guar<strong>da</strong>va ain<strong>da</strong> fresca a<br />

memória de Artemisa moscovita, cujas lágrimas, apesar <strong>da</strong> distância, o rapaz sentia<br />

que eram ardentes e aflitivas. Mas quem poderia convencer a Leandro Soares que o<br />

elegante moço <strong>da</strong> Europa, como lhe chamavam não ficaria enamorado <strong>da</strong> esquiva<br />

goiana?<br />

Isabel, entretanto, apenas viu o infeliz pretendente, deteve o cavalo e<br />

estendeu-lhe afetuosamente a mão. Um adorável sorriso acompanhou este<br />

movimento. Não era bastante para dissipar as dúvi<strong>da</strong>s do pobre moço. Diversa, foi<br />

porém a impressão de Camilo.<br />

— Ama-o, ou é uma grande velhaca, pensou ele.<br />

Casualmente, — e pela primeira vez, — olhava Isabel para o filho do<br />

comen<strong>da</strong>dor. Perspicácia ou adivinhação, leu-lhe no rosto esse pensamento oculto;<br />

franziu levemente a testa com uma expressão tão viva de estranheza, que o médico<br />

ficou perplexo e não pode deixar de acrescentar, já então com os lábios, à meia voz,<br />

falando para si:<br />

— Ou fala com o diabo.<br />

— Talvez, murmurou a moça com os olhos fitos no chão.<br />

Isto foi dito assim, sem que os outros dois percebessem. Camilo não podia<br />

desviar os olhos <strong>da</strong> formosa Isabel, meio espantado, meio curioso, depois <strong>da</strong> palavra<br />

murmura<strong>da</strong> por ela em tão singulares condições. Soares olhava para Camilo com a<br />

mesma ternura, com que um gavião espreita uma pomba. Isabel brincava com o<br />

chicotinho. D. Gertrudes, que temia perder a missa do padre Maciel e receber um<br />

reparo amigável do marido, deu voz de marcha, e a comitiva seguiu imediatamente.<br />

CAPÍTULO IV<br />

A FESTA<br />

No sábado seguinte a ci<strong>da</strong>de revestira desusado aspecto. De to<strong>da</strong> a parte<br />

correra uma chusma de povo que ia assistir à festa anual do Espírito Santo.<br />

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