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PD 18 - Fundação Astrojildo Pereira

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X. Resenhas<br />

e o estilo transparente do autor, propiciado pela coletânea recémlançada,<br />

revela-se oportuno. Os artistas que destacam sua intransigência<br />

purista (em ambos os gêneros), seu amor ao detalhe soam<br />

como lições a serem meditadas pelo apressado jornalismo nosso de<br />

cada dia.<br />

Para tentar descrever o método crítico de Lúcio Rangel, digamos que<br />

ele costumava analisar a obra e a trajetória dos artistas relacionandoas<br />

ao desenvolvimento do gênero que esses artistas ajudavam a criar,<br />

ou de que eram expoentes. Lúcio percebe, com razão, que a evolução dos<br />

estilos é duplamente motivada: desdobra-se conforme razões históricas,<br />

mas também decorre, claro, de imponderáveis méritos individuais.<br />

A noção materialista, em princípio certeira, de que a história é que<br />

faz os indivíduos, e não o contrário, desmente-se em parte pela observação<br />

do real, no setor ultra-sensível da música. Ou seja: a história<br />

dirige as pessoas; mas os fatos históricos dependem também de<br />

decisões particulares, de acasos, de encontros e desencontros imprevistos.<br />

E dependem um bocado das parcerias, previsíveis ou não.<br />

Nesse sentido, exemplo tirado da primeira seção do livro, dedicada ao<br />

samba, envolve acaso que não foi bem acaso: o encontro entre Sinhô<br />

e Mário Reis, a que Lúcio atribui enorme importância.<br />

Antes de contar o episódio, o crítico lembrava que a técnica e os trejeitos<br />

da ópera, sobretudo italiana, haviam influído sobre o canto dos<br />

artistas populares brasileiros. Estes procuravam transpor a estética<br />

da grande voz – que implica o grande personagem, o grande drama<br />

– para a interpretação de gêneros como o maxixe, música buliçosa,<br />

sensual, dirigida mais ao corpo do que à cabeça. Não podia dar certo.<br />

Por isso, Rangel bendiz o dia em que Mário Reis, jovem grã-fino que<br />

gostava de cantar, procurou Sinhô, para ter aulas de violão com o<br />

compositor famoso. Escreve Lúcio, relatando o encontro: “O jovem<br />

declarou admirar extraordinariamente os sambas de Sinhô. Só conhecia<br />

alguns, disse. E depois de alguma relutância cantou, a pedido<br />

do mestre, que o acompanhava ao violão”, um dos sucessos da hora.<br />

A música era “Que vale a nota sem o carinho da mulher?” e, quando<br />

Mário “acabou de cantar o samba então em grande voga, Sinhô estava<br />

deslumbrado”. O compositor descobria “o intérprete ideal para os<br />

seus sambas”. O rapaz estrearia em disco na semana seguinte, com<br />

duas músicas de Sinhô. O ano era o de 1928.<br />

As qualidades de Mário Reis têm parte com a espontaneidade,<br />

sem dispensar perícia e precisão: o intérprete, ao pronunciar “admiravelmente<br />

as palavras do samba, com extraordinária noção de ritmo<br />

e uma personalidade marcante, deu lição de mestre aos cantores da<br />

198<br />

Política Democrática · Nº <strong>18</strong>

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