(Re)Visite a UniVeRsidade de CoimbRa
(Re)Visite a UniVeRsidade de CoimbRa
(Re)Visite a UniVeRsidade de CoimbRa
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
RL #36 | APOCALÍPTICOS INTEGRADOS<br />
70<br />
U m a e s p é c i e d e a r t e<br />
João Rosa alexand<strong>Re</strong> *<br />
sabia que um dia ia acabar por<br />
escrever sobre arte. não que eu<br />
seja um gran<strong>de</strong> entendido, mas a<br />
arte tem tantos espectros que,<br />
sobre alguns tipos, sinto-me confortável<br />
para escrever.<br />
podia começar por dizer que alguém,<br />
não sei bem quem, <strong>de</strong>cidiu<br />
que havia 11 tipos <strong>de</strong> arte, sendo eles:<br />
música; dança/Coreografia; pintura;<br />
escultura; teatro; literatura; Cinema;<br />
Fotografia; banda <strong>de</strong>senhada; Jogos<br />
<strong>de</strong> Computador e a arte digital.<br />
porém, apesar <strong>de</strong>stes 11 extensos temas<br />
artísticos, aquilo sobre o que escrevo<br />
hoje é outro tipo <strong>de</strong> arte. a “arte” das<br />
ruas, das ruas <strong>de</strong> Coimbra, da tão nossa<br />
alta universitária.<br />
então que tipo <strong>de</strong> “arte é esta”, tão<br />
comum <strong>de</strong>ntro das muralhas da<br />
cida<strong>de</strong>, mas que afinal não é uma<br />
arte <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>? Que tipo <strong>de</strong> expressão<br />
é esta, que para a ver, não<br />
necessitamos <strong>de</strong> comprar bilhete?<br />
nem mesmo <strong>de</strong> nenhum tipo <strong>de</strong><br />
formação ou conhecimento específico<br />
para a po<strong>de</strong>r apreciar?<br />
para me explicar, dividirei este<br />
tema em três partes.<br />
Escritos <strong>de</strong> Pare<strong>de</strong> – A parte mais<br />
crua <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> “Arte”<br />
na parte mais nobre da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Coimbra, vemos regularmente este<br />
tipo <strong>de</strong> escritos. ora são palavras<br />
<strong>de</strong> amor eterno <strong>de</strong> algum romeu<br />
apaixonado, ora são comentários<br />
políticos anticapitalistas que alguém<br />
insiste em escrever, ou até mesmo<br />
simples pensamentos tornados realida<strong>de</strong><br />
num qualquer muro.<br />
Street Art (Graffitis/Tags)<br />
apesar <strong>de</strong> algo démodé, basta fazermos<br />
o trajeto sé Velha – Faculda<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> direito para vermos em várias<br />
pare<strong>de</strong>s as tags, ou seja, pura e simplesmente,<br />
assinaturas; ou o bombing,<br />
uma <strong>de</strong>rivação do grafitti em que o<br />
<strong>de</strong>senho é muito rudimentar.<br />
Propaganda Política<br />
parte madrinha da Arte que falo, a<br />
propaganda política tem-se verificado,<br />
sobretudo, através <strong>de</strong> murais<br />
nas pare<strong>de</strong>s da rua padre antónio<br />
Vieira, nas pare<strong>de</strong>s das Faculda<strong>de</strong>s<br />
e nas escadas monumentais, on<strong>de</strong><br />
se têm sucedido apelos ao voto e palavras<br />
<strong>de</strong> or<strong>de</strong>m.<br />
A<br />
são estas as três partes daquilo a que<br />
chamo “arte <strong>de</strong> rua” - não é uma<br />
das 11 e, sinceramente, também não<br />
penso que <strong>de</strong>va ser a 12.ª.<br />
É difícil comparar graffiti ou até mesmo<br />
um “Não Pagamos” à atrocida<strong>de</strong><br />
que fizeram às escadas monumentais<br />
em Coimbra. para mim, ambos integram<br />
atos <strong>de</strong> vandalismo e <strong>de</strong> falta <strong>de</strong><br />
civismo. porém, não estaria a ser correto<br />
se dissesse que sou contra a Street<br />
Art; aliás, consigo perceber e encontrar<br />
uma espetacularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alguns<br />
graffitis, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que legalmente feitos<br />
e situados em locais autorizados para<br />
tal. a ilegalida<strong>de</strong> associada aos graffiti<br />
não dignifica, em nada, o que alguns<br />
<strong>de</strong>stes pintores fazem na atualida<strong>de</strong>.<br />
Quanto aos dizeres e àquilo que apeli<strong>de</strong>i<br />
<strong>de</strong> “escritos <strong>de</strong> pare<strong>de</strong>”, confesso<br />
que não consigo encontrar nenhuma<br />
explicação. escrever o quer que seja<br />
numa pare<strong>de</strong> não é senão mais uma<br />
forma do “escritor” contrariar as regras<br />
e sentir a adrenalina <strong>de</strong> fazer algo que<br />
não é permitido e que todos vão ver.<br />
por fim, a propaganda política - como<br />
os murais e pinturas nas escadas<br />
monumentais - são um profundo<br />
atentado ao civismo. pintar locais<br />
públicos ou privados para fins <strong>de</strong><br />
apelo ao voto ou mera comemoração<br />
partidária é <strong>de</strong> uma presunção<br />
vil. o ensino superior não precisa<br />
<strong>de</strong> frases em escadas; precisa, somente,<br />
<strong>de</strong> gente capaz <strong>de</strong> as subir. ter feito<br />
parte da revolução <strong>de</strong> 1974 não<br />
faz do partido X dono da liberda<strong>de</strong><br />
ou todo-po<strong>de</strong>rosos <strong>de</strong> tudo o que é<br />
bem público.<br />
este sentimento <strong>de</strong> “donos do mundo”<br />
aliado a uma constante colagem<br />
dos edifícios da alta universitária a<br />
obras do estado novo é, para estes<br />
“artistas”, o tónico para usar e abusar.<br />
os graffiti po<strong>de</strong>m até ser uma<br />
arte, se feita em locais a<strong>de</strong>quados.<br />
agora, tudo o resto são formas <strong>de</strong><br />
alguns “artistas” terem a atenção<br />
que dizem não precisar. nada disto<br />
é arte. <strong>de</strong>ixar que isto aconteça<br />
e manter impune quem vandaliza<br />
uma das zonas mais ricas do nosso<br />
país, a todos os níveis, só po<strong>de</strong> ser<br />
um sinal <strong>de</strong> cobardia.<br />
um local que se quer património<br />
mundial da unesCo não po<strong>de</strong> ser<br />
refém <strong>de</strong> medos, nem <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ologias<br />
políticas. a uni- versida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Coimbra<br />
e a alta universitária precisam <strong>de</strong> cuidados<br />
e <strong>de</strong> alguém que os preste, <strong>de</strong><br />
forma urgente e capaz.<br />
* ex-dirigente da associação académica <strong>de</strong> Coimbra.