14.04.2013 Views

As pedras não morrem - Miriam Mambrini

As pedras não morrem - Miriam Mambrini

As pedras não morrem - Miriam Mambrini

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

dizer se, no momento em que a leu, fez ou <strong>não</strong> as associações que mais tarde lhe vieram à cabeça<br />

ou se as buscou, querendo achar uma justificativa para o estranho interesse que despertou nele.<br />

Batman, Capitão América, Homem-Aranha, os super-heróis das revistinhas e da<br />

televisão. O Máscara, vilão das mil caras. Máscaras usadas por ladrões e assassinos, o anonimato<br />

para o pecado e o crime. <strong>As</strong> máscaras da comédia e da tragédia, com suas bocas características.<br />

Máscaras no teatro, nas fantasias, nos bailes e no carnaval.<br />

Quando era bem pequeno, na sua cidade de Barra do Piraí, o avô levou-o junto com a<br />

irmã para comprarem máscaras de carnaval numa barraca de rua. Diabos, caveiras, bebês<br />

horrendos e caras de políticos conhecidos rodopiavam, penduradas em barbantes. A irmã<br />

escolheu logo uma cara de boneca e pediu de quebra uma imensa chupeta. Ele se assustou com<br />

aquelas figuras sinistras e <strong>não</strong> quis nada. O avô disse que ia levar a caveira para mexer com a<br />

empregada, que tinha medo de assombração.<br />

Pelo caminho de volta, o velho foi contando como era o carnaval do seu tempo.<br />

Havia os blocos de rua, os corsos, as pessoas jogavam confete, lança-perfume e serpentina umas<br />

nas outras. Muita gente se fantasiava, punha a máscara no rosto e ia pregar peças nos conhecidos.<br />

Era uma pândega. Não tinha esquecido a palavra: pândega. Só o avô dizia aquilo, mais ninguém.<br />

Conheceu a mulher num baile de terça-feira gorda. Ela usava uma máscara de seda preta que<br />

escondia todo o rosto, pois, por baixo da parte que contornava os olhos, havia uma espécie de<br />

cortininha de renda que tapava o nariz e a boca. Ao contar isso, o avô sacudiu a barriga numa<br />

daquelas risadas inesquecíveis e disse que <strong>não</strong> sabia se tinha se apaixonado pela mulher ou pela<br />

máscara.<br />

Quando chegaram em casa, já perdera o medo da caveira e botou a máscara.<br />

Entraram, ele e a irmã, com aquelas coisas no rosto. A mãe e a empregada fingiram <strong>não</strong><br />

reconhecê-los. Os monstrinhos fizeram uh, ergueram garras de mentira e foi aquela correria pela<br />

casa, a mãe e a empregada soltando gritinhos, o avô rindo. Uma pândega.<br />

Custou até descobrir como é que se abria o arquivo no processador de texto<br />

complicado e obsoleto. Que velharia! Enfim, oitenta reais... Depois de algumas tentativas<br />

frustradas, finalmente conseguiu. Na tela, as letras apareceram de repente.<br />

18 de junho de 1990

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!