ICS da UL - Análise Social - Universidade de Lisboa
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Manuel Villaver<strong>de</strong> Cabral<br />
do sector terciário; os operários <strong>de</strong>stacam-se por uma baixa reivindicação<br />
<strong>da</strong> utili<strong>da</strong><strong>de</strong> do seu trabalho.<br />
Altamente afecta<strong>da</strong> pela condição <strong>de</strong> classe, em estreita associação com<br />
as <strong>de</strong>sigual<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> «capitais escolares» que lhe está associa<strong>da</strong> na socie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
portuguesa, é a socialização primária relativa à realização pessoal e social,<br />
ou seja, os valores e atitu<strong>de</strong>s que os pais transmitem aos filhos nesta dimensão<br />
crucial <strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s mo<strong>de</strong>rnas. Quer no que diz respeito às motivações<br />
recebi<strong>da</strong>s pelos inquiridos, quer no que estes consi<strong>de</strong>ram prioritário legar às<br />
novas gerações, quer ain<strong>da</strong> no que respeita às orientações a <strong>da</strong>r a estas<br />
últimas, o padrão é claro e correspon<strong>de</strong>, <strong>de</strong> forma geral, àquilo que a tradição<br />
sociológica nos habituou a esperar.<br />
Assim, quando os inquiridos foram interrogados acerca <strong>da</strong>s motivações<br />
recebi<strong>da</strong>s dos pais acerca do seu futuro profissional, a classe dos patrões,<br />
empresários e profissionais liberais (classe I) <strong>de</strong>staca-se pela «ambição»<br />
(40%), segui<strong>da</strong> pelo «cumprimento do <strong>de</strong>ver» (33%) e só acessoriamente<br />
pela necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> «ganhar a vi<strong>da</strong>» (24%). Para a nova burguesia assalaria<strong>da</strong>,<br />
o valor mais interiorizado é o «cumprimento do <strong>de</strong>ver» (43%), seguido<br />
pela «ambição» (30%).<br />
Inversamente, a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> «ganhar a vi<strong>da</strong>» prevalece entre to<strong>da</strong>s as<br />
outras classes <strong>de</strong> acordo com a or<strong>de</strong>m que ocupam no esquema <strong>de</strong> estratificação<br />
adoptado, ultrapassando os 50% entre os trabalhadores manuais. Por<br />
sua vez, o «cumprimento do <strong>de</strong>ver» está distribuído <strong>de</strong> forma equilibra<strong>da</strong>,<br />
mas a «ambição» parece ter sido inculca<strong>da</strong> em proporção inversa à classe<br />
social e/ou aos «capitais escolares» her<strong>da</strong>dos e adquiridos pelos inquiridos, só<br />
sendo inferior à média (17%) entre os trabalhadores manuais, em especial os<br />
operários (12%). É lícito ver neste último indicador, como em alguns outros,<br />
um efeito <strong>da</strong> «necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> realização» (need-achievement) semelhante ao<br />
evocado outrora por David McClelland 29 .<br />
Quando interpelados acerca <strong>da</strong>s atitu<strong>de</strong>s perante a vi<strong>da</strong> pessoal e social<br />
que os pais <strong>de</strong>vem transmitir aos filhos, o padrão manifestado pelos inquiridos<br />
é semelhante. As duas classes <strong>de</strong> topo consi<strong>de</strong>ram que os pais <strong>de</strong>vem<br />
prioritariamente ensinar os filhos a «serem responsáveis» (sobretudo a classe<br />
I) e a «interessarem-se pelas coisas <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>» (sobretudo a classe II), sendo<br />
segui<strong>da</strong>s nestas priori<strong>da</strong><strong>de</strong>s pelo salariato não manual, o que indicia a influência<br />
do «capital escolar». Por sua vez, a pequena burguesia surge ao lado<br />
do operariado na valorização <strong>da</strong> «obediência» e na relativa <strong>de</strong>svalorização do<br />
«interesse pelas coisas <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>», mas já se separa do salariato manual e dos<br />
trabalhadores in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes quando estes consi<strong>de</strong>ram que os pais <strong>de</strong>vem<br />
sobretudo ensinar os filhos a «serem trabalhadores».<br />
29 D. McClelland, The Achieving Society, Princeton, Princeton University Press, 1961.