Aqui - Sapo

24 Paul Theroux
É movimento ordenado pela sua repetição verbal. Este tipo de
desaparição é elementar, mas poucos regressam silenciosos. Ainda
assim, a convenção é escrever condensando a viagem, começar
— como fazem tantos romances — no meio das coisas, naufragar
o leitor num lugar estranho sem antes o ter ali guiado.
«As formigas-brancas comeram a minha cama de rede», assim
podia começar um livro; ou: «Ali em baixo, o vale da Patagónia
afundava-se em rocha cinzenta, ostentando as suas linhas formadas
em milénios rasgadas por enchentes.» Ou, para escolher
ao acaso as primeiras frases de três livros que tenho ao alcance
da mão:
«Foi quase ao meio-dia de 1 de Março de 1898 que entrei pela
primeira vez no estreito e um tanto perigoso porto de Mombaça,
na costa oriental de África.» (Os Devoradores de Homens de
Tsavo, do tenente-coronel John Henry Patterson.)
«“Bem-vindos!”, anunciava uma grande placa situada ao lado
da estrada à medida que o automóvel completa a sua ascensão
em espiral, do calor das planícies meridionais da Índia até
um frio quase alarmante.» (Ooty Preserved, de Mollie Panter-
-Downes.)
«Da varanda do meu quarto tinha uma vista panorâmica de
Acra, a capital do Gana.» (A quale tribù appartieni?, de Alberto
Moravia.)
A minha pergunta habitual, não respondida por estes livros
de viagens — nem pela maioria —, é: como chegaram lá? Mesmo
sem a sugestão de um motivo, um prólogo é bem-vindo,
uma vez que com frequência o trajecto é tão fascinante quanto
a chegada. Ainda assim, porque a curiosidade implica atraso e o
atraso é visto como um luxo (mas, no fundo, porquê a pressa?),
habituamo-nos a que a vida se limite a uma série de chegadas
e partidas, de triunfos e fracassos, sem nada digno de ser mencionado
no meio. Os cumes são importantes, mas e então as en-