15.04.2013 Views

CARLOTO, O ADIVINHO

CARLOTO, O ADIVINHO

CARLOTO, O ADIVINHO

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

O<br />

<strong>CARLOTO</strong>,<br />

O <strong>ADIVINHO</strong><br />

António Torrado<br />

escreveu e<br />

Cristina Malaquias ilustrou<br />

meu amigo Carloto, antes de sair de casa para dar<br />

uma voltinha de bicicleta, avisou a mãe:<br />

– Hoje vou cair da bicicleta e esfolar um joelho.<br />

A mãe foi logo buscar a caixa dos primeiros socorros,<br />

para estar tudo à mão, quando o Carloto regressasse da<br />

queda. Não seria acidente grave. Nem, muito menos, o<br />

primeiro.<br />

É que, de facto, o Carloto adivinha as coisas, mas só<br />

coisas que o tivessem como protagonista, isto é, como<br />

centro da referida coisa, não sei se me estou a fazer<br />

entender… Que coisa!<br />

Às vezes, dizia a mãe:<br />

– Hoje, vou chegar todo encharcado a casa.<br />

A mãe ainda acudia:<br />

– Então, leva um chapéu-de-chuva, filho.<br />

Ele explicava:<br />

1<br />

© APENA - APDD – Cofinanciado pelo POSI e pela Presidência do Conselho de Ministros


– Se levo chapéu-de-chuva, já não chove e a chuva<br />

também faz falta…<br />

Coisa complicada.<br />

Só adivinha o pior, dentro do relativo, que não era assim<br />

tão mau como isso.<br />

– Hoje vou perder o boné, na escola.<br />

– Hoje vou rasgar as calças, numas moitas.<br />

– Hoje vou partir os óculos, no futebol.<br />

Não valia a pena prevenir. Estava previsto e acontecia,<br />

i-ne-vi-ta-vel-men-te. O Carloto, conformado com o seu<br />

pequeno poder da adivinhação, resignava-se a que seria<br />

assim pela vida fora. A mãe dele também encolhia os<br />

ombros, sem se inquietar muito, e suspirava:<br />

– O que eu quero é que o meu filho nunca adivinhe<br />

grandes desastres.<br />

Mas, desta vez, alarmou-se. Uma vizinha veio dizer-lhe:<br />

– O seu Carloto caiu da bicicleta, bateu com a cabeça no<br />

passeio e foi de ambulância para o hospital.<br />

A mãe do Carloto atirou-se para dentro de um táxi com<br />

a vizinha e, numa ansiedade, que lhe cortava a respiração,<br />

foi ao hospital saber do seu mais-que-tudo na vida.<br />

O médico tranquilizou-a:<br />

– O seu filho, felizmente, não chegou a sofrer<br />

traumatismo craniano. Quando ele andar de bicicleta,<br />

recomende-lhe que use capacete.<br />

– E não está ferido, senhor doutor?<br />

– Nada de grave. Só esfolou um joelho – respondeu o<br />

médico, com um sorriso simpático.<br />

A mãe foi ver o Carloto, deitado numa cama e ainda um<br />

tanto abalado. Não se lembrava de nada, nem sequer de que<br />

tinha adivinhado o acidente. Ou parte: o joelho esfolado.<br />

2<br />

© APENA - APDD – Cofinanciado pelo POSI e pela Presidência do Conselho de Ministros


Aliás, desde esse dia, fosse do que fosse, talvez da<br />

pancada, o Carloto já não conseguia prever nem sequer<br />

uma unha partida. Perdera os seus poderes especiais.<br />

Uma coisa destas é que o Carloto nunca podia adivinhar.<br />

FIM<br />

3<br />

© APENA - APDD – Cofinanciado pelo POSI e pela Presidência do Conselho de Ministros

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!