PN 5735.03-5 ; Ap./Ag.: Tc. Porto, 9ª V. (41.02); R.te :
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<strong>PN</strong> <strong>5735.03</strong>-5 1 ; <strong>Ap</strong>./<strong>Ag</strong>.: <strong>Tc</strong>. <strong>Porto</strong>, <strong>9ª</strong> V. (<strong>41.02</strong>);<br />
R.<strong>te</strong> 2 : Sociedade Restauran<strong>te</strong> Os Noivos, de Domingos Alexandre Barros Mon<strong>te</strong>iro Lda,<br />
Avª da Ramada, Burgães, Santo Tirso;<br />
R.das: BCP, Leasing, SA 3 ,<br />
Rua Eugénia de Castro, 352, 1º, <strong>Porto</strong>;<br />
Sociedade Auto José Reis – Reparações e Comércio de Automóveis, Lda 4 ,<br />
Rua Fernando Pires de Lima, 22, Lugar das Taipas, Areias, Santo Tirso.<br />
______________________________________________________________________<br />
Em Conferência no Tribunal da Relação do <strong>Porto</strong><br />
I. Introdução:<br />
(a) A A. não se conformou com a absolvição de BCP Leasing e com o<br />
vencimento reconvencional parcial, condenada a pagar à R. € 7 326,43, e os juros;<br />
agravou também do despacho saneador na par<strong>te</strong> em que julgou proceden<strong>te</strong> a<br />
ilegitimidade aduzida por Sociedade Auto José Reis – Reparações e Comércio de<br />
Automóveis, Lda: o litígio envolve um contrato de locação financeira mobiliária<br />
para fornecimento a crédito de um automóvel que Auto José Reis dolosamen<strong>te</strong><br />
inviabilizou, defendendo a A. que a locatária ou a fornecedora lhe deverão<br />
restituir as rendas que satisfez; BCP Leasing., pelo contrário, que deve ser a A. a<br />
pagar-lhe todas as demais que estão em dívida segundo o contrato, e Auto José<br />
Reis diz: não é par<strong>te</strong> do contrato de locação financeira, todavia, a<br />
responsabilidade que lhe é assacada já foi assumida em processo crime no<br />
âmbito do qual a locadora ob<strong>te</strong>ve um título que lhe permi<strong>te</strong> ser reembolsada de<br />
todas as quantias a que tinha direito, e a benefício de fazer as contas com a A..<br />
(b) Da sen<strong>te</strong>nça recorrida:<br />
1 Vistos: Des. Marques Peixoto (04.02.09): Des. Fonseca Ramos (1057).<br />
2 Adv.: Dr. Mário Augusto Martins, Rua D. Nuno Álvares Pereira, 132, 1º Dto., 4780-439 Santo Tirso.<br />
3 Adv.: Dr. Paulo Magalhães e Silva, Rua de Diu, 159, 4150-274 <strong>Porto</strong>.<br />
4 Adv.: Dr. Francisco Martins, Rua José Luís de Andrade, 63, 4º, 4780 Santo Tirso.<br />
1
(1) Os factos provados, e as cláusulas [do contrato] mostram <strong>te</strong>r Leasing<br />
Atlântico (an<strong>te</strong>cessora de BCP Leasing) celebrado um contrato de locação<br />
financeira, art. 1, DL 149/95, 24.06;<br />
(2) Não se tratando de contrato real quoad constituitionem, à sua perfeição<br />
não in<strong>te</strong>ressa a entrega do bem ao locatário, a entrega não é elemento do<br />
contrato, não respeita à sua formação ou constituição, an<strong>te</strong>s à sua execução,<br />
art. 8/1, lx. cit.<br />
(3) [Então,] a falta de entrega do bem não fundamenta a anulação do<br />
negócio, poderá apenas justificar a resolução, se definitiva, e/ou permitir que<br />
o locatário invoque a excepção de não cumprimento;<br />
(4) [Entretanto,] apesar de numerosa citação de normas legais, a A. não<br />
situa o concreto vício que afectou a formação da sua vontade na negociação e<br />
conclusão do contrato [em causa], e o erro, a existir estaria na declaração<br />
inserta no auto de recepção relativo ao veículo, resultan<strong>te</strong> de artifício<br />
enganoso do fornecedor (ou do seu geren<strong>te</strong>), mas [localiza-se] já na execução<br />
do contrato, suposto validamen<strong>te</strong> constituído: não é alegado nem se vislumbra<br />
que a vontade manifestada no contrato de locação financeira não corresponda<br />
à sua vontade real;<br />
(5) [Por outro lado,] o dolo invocado... provém de <strong>te</strong>rceiro, sem que algo<br />
indicie <strong>te</strong>r tido a locadora conhecimento dele, muito pelo contrário;<br />
(6) E o facto de a A. contratar com o fim, na perspectiva e com a cer<strong>te</strong>za de<br />
que o veículo lhe seria entregue, e que não celebraria o contrato se soubesse<br />
(ou suspeitasse) que tal sucederia, não releva para de<strong>te</strong>rminar a anulação<br />
contratual:...a falta de cumprimento dos contratos não con<strong>te</strong>nde com a falta de<br />
validade do negócio;<br />
(7) Não só pelas cláusulas [escritas do contrato de locação] como através do<br />
jogo dos demais factos provados, tudo permi<strong>te</strong> afirmar que o negócio em causa<br />
foi concluído sem vício que de<strong>te</strong>rmine a sua anulação, donde não poderem ser<br />
acei<strong>te</strong>s as pre<strong>te</strong>nsões da A. [que levaram ao pedido] como decorrências<br />
daquela outra;<br />
(8) Por fim, não alega a A. <strong>te</strong>r resolvido o contrato por comunicação à<br />
locadora, nomeadamen<strong>te</strong> invocando a falta de entrega do veículo ou a falta de<br />
cedência do seu gozo; nem sequer alega tê-la in<strong>te</strong>rpelado (suposto que a<br />
2
prestação não se tornou impossível – o que também não invoca) para esse<br />
concreto efeito, com fixação de um prazo razoável [sob pena de perder o<br />
in<strong>te</strong>resse objecto na prestação];<br />
(9) E não articula facto que lhe permita libertar-se unila<strong>te</strong>ralmen<strong>te</strong> das<br />
obrigações contratuais: tão só e apenas que o veículo lhe não foi entregue<br />
para o utilizar, apesar das diligências junto da R. Auto José Reis<br />
(fornecedora);<br />
(10) Acresce que assinado pela A., o auto de recepção do veículo com as<br />
especificações requeridas, a fornecedora ob<strong>te</strong>ve, entregando-o à locadora, e<br />
por essa razão, o preço da viatura, sem qualquer conhecimento de BCP<br />
Leasing quanto às negociações entre os outros dois parceiros, nomeadamen<strong>te</strong><br />
no sentido de ser retardada, pelo contrário, a entrega do automóvel, e o que<br />
representa sem dúvida uma violação da convenção com o locador;<br />
(11) Cabia à A. portanto exigir responsabilidade à fornecedora e, no<strong>te</strong>-se,<br />
acordou com a locadora não ficar desonerada peran<strong>te</strong> ela em caso de falta de<br />
entrega (e a esta nem sequer é alheia): na não entrega do veículo não há culpa<br />
da locadora, não há incumprimento por par<strong>te</strong> desta que justifique a reacção<br />
da A. no sentido de desvincular-se do contrato;<br />
(12) [Assim,] não havendo, ou não <strong>te</strong>ndo sido alegados os fundamentos<br />
operativos com vista à resolução, e baseando-se nesta (ou na anulação) os<br />
restan<strong>te</strong>s pedidos formulados na restituição das quantias despendidas pela A.,<br />
improcedem todos os pedidos formulados pela A. na p.i.;<br />
(13) Mas no que respeita ao prémio de seguro... sempre es<strong>te</strong> pedido não<br />
mereceria aceitação, mesmo que se acolhesse quer a anulação quer a<br />
resolução do contrato: não se trata de prestação recebida pela R. ou a esta<br />
paga (e, em rigor, nada havia a assegurar, questão que não pede aqui<br />
tratamento);<br />
(14) Quanto à reconvenção: a A. não pagou as rendas 18, 19 e 21/36, com<br />
vencimento em 00.05.15 e meses seguin<strong>te</strong>s, no valor global de € 7 326,43;<br />
(15) E o contrato, segundo o clausulado, entrou em vigor com a entrega à<br />
locadora do auto de recepção assinado pela A., circunstância que acon<strong>te</strong>ceu,<br />
ou pelo menos já tinha acon<strong>te</strong>cido, em 99.01.11, devendo as rendas ser pagas<br />
ao dia 15 de cada mês;<br />
3
(16) [Ora, como já foi dito,] a locadora não <strong>te</strong>ve responsabilidade, nem a A.<br />
lhe a imputa na falta de entrega do veículo: a esta cabia recebê-lo em nome de<br />
BCP Leasing... e certificou (falsamen<strong>te</strong>, embora) esse recebimento, dando por<br />
isso causa a que a R. efectuasse o pagamento da viatura ao fornecedor, mas<br />
sem que es<strong>te</strong> entrasse na efectiva disponibilidade quer de uma quer de outra;<br />
(17) [Ainda assim,] também ficou convencionado que a locadora não<br />
respondia pela entrega a<strong>te</strong>mpada do bem, pela circunstância de não o escolher<br />
nem ao fornecedor, nem <strong>te</strong>r in<strong>te</strong>rvenção no acerto do momento e local da<br />
entrega, aspectos negociados (em nome próprio) pelo locatário;<br />
(18) E também ficou acordado que a falta de entrega do bem pelo fornecedor<br />
ou a não conformidade do mesmo com as condições particulares do contrato<br />
não exoneravam o locatário das suas obrigações contratuais;<br />
(19) [Por conseguin<strong>te</strong>,] não <strong>te</strong>ndo o contrato cessado an<strong>te</strong>cipadamen<strong>te</strong>, está a<br />
A. obrigada ao pagamento das rendas acordadas, obrigação de prazo certo,<br />
pelo que a mora dá lugar ao pagamento de juros contados de vencimento, com<br />
a capitalização requerida;<br />
(20) Mas a A. na Réplica defendeu que o acordo efectuado pela R. no<br />
processo-crime constitui mais que uma mera anulação, manifesta a inequívoca<br />
resolução do contrato de locação financeira, e acrescentou, como defesa<br />
contra a reconvenção que a man<strong>te</strong>r-se a vigência do contrato, peran<strong>te</strong> esse<br />
acordo lavrado entre a locadora e o geren<strong>te</strong> da fornecedora, tudo redundaria<br />
num inadmissível enriquecimento sem causa;<br />
(21) Contudo, esse acordo não constitui anulação da locação a qual, como se<br />
viu, de nenhum vício genético padece, nem por isso resolveu a R. esse<br />
contrato;<br />
(22) [Ora,] não referiu a A. <strong>te</strong>r-lhe sido manifestada pela R. a in<strong>te</strong>nção de<br />
resolver o contrato, nem aquele acordo constitui declaração de resolução que<br />
deva ser feita à par<strong>te</strong> contrária, como não acon<strong>te</strong>ceu na verdade: não foi<br />
afastada a obrigação de pagamento das rendas;<br />
(23) E não mostra o deba<strong>te</strong> da causa qualquer enriquecimento injustificado<br />
da R. (a única, ao menos aparen<strong>te</strong>men<strong>te</strong>, enriquecida foi Auto José Reis e não<br />
BCP Leasing que desembolsou a totalidade do preço do veículo);<br />
(24) [Aliás,] as pre<strong>te</strong>nsões da R. no processo-crime e nesta acção têm causas<br />
diferen<strong>te</strong>s e assentam em pressupostos diversos: da coexistência daquele<br />
4
acordo e do contrato assinado (que findou em data an<strong>te</strong>rior, todavia) não<br />
redunda qualquer enriquecimento, até porque a locadora nada recebeu, an<strong>te</strong>s<br />
continuando empobrecida, também por culpa da A. ...<br />
(c) Do despacho saneador:<br />
(1) A A. pede a anulação ou a resolução do contrato de locação financeira<br />
que foi celebrado entre si e a locadora, com a restituição do que prestou: são<br />
estas as par<strong>te</strong>s nesse contrato, no qual nem in<strong>te</strong>rvenien<strong>te</strong> é Auto José Reis;<br />
(2) O fornecedor do bem, nes<strong>te</strong> tipo contratual, é estranho ao convénio, não<br />
sendo par<strong>te</strong>, independen<strong>te</strong>men<strong>te</strong> dos direitos que a lei confere ao<br />
utilizador/locatário contra ele e, por outro lado, não exerce a A. nesta acção<br />
qualquer direito relacionado com o bem locado;<br />
(3) Nas acções com os objectivos que a A. apresenta só as par<strong>te</strong>s na relação<br />
ma<strong>te</strong>rial ou substantiva devem estar em Juízo; só elas <strong>te</strong>rão in<strong>te</strong>resse em<br />
demandar e contradizer; ora, Auto José Reis nenhum prejuízo pode sofrer com<br />
a anulação ou a resolução do contrato de locação financeira mobiliária em<br />
causa; nem nele outorgou, nem recebeu da A. quaisquer rendas: nada <strong>te</strong>m a<br />
restituir e em nada a afecta a anulação ou a resolução do contrato, que não<br />
lhe diz respeito;<br />
(4) E nem sequer por via das cláusulas do contrato de leasing (vd. cl. 4 –<br />
condições gerais), a A. poderia pedir a Auto José Reis, Lda a restituição das<br />
rendas, o que não significa não <strong>te</strong>r razão para demandá-la com base em facto<br />
ilícito, como agen<strong>te</strong> do artifício fraudulento gerador de danos e danos<br />
indemnizáveis, ou ainda para a formulação de outras pre<strong>te</strong>nsões com assento<br />
na mesma cláusula /5 e na lei, art. 13, DL 149/85, 24.06, nomeadamen<strong>te</strong><br />
pedindo o ressarcimento daquilo que pagou ou <strong>te</strong>nha de pagar a BCP Leasing;<br />
(5) Mas não é esta nem a pre<strong>te</strong>nsão formulada, nem a fundamentação<br />
alegada.<br />
II. Matéria assen<strong>te</strong>:<br />
(1) A A. dedica-se à actividade de serviços de Restauran<strong>te</strong> e Café, com fins<br />
lucrativos;<br />
5
(2) No âmbito do exercício dessa actividade, a A. celebrou com a 1ª R.,<br />
98.12.22, o contrato de locação financeira mobiliária nº 9805763, com vista à<br />
aquisição de um automóvel Seat Ibiza 1900 TDI, 47-71-MO, a ser fornecido por<br />
Auto José Reis, contrato esse reduzido a escrito, junto;<br />
(3) A A. declarou recebido o veículo em causa da par<strong>te</strong> da fornecedora,<br />
assinando o respectivo auto de recepção;<br />
(4) Por sua vez, Auto José Reis veio a receber da R. a totalidade do preço do<br />
veículo com IVA 17%, no montan<strong>te</strong> de P<strong>te</strong> 2 853 500$00;<br />
(5) Porém, a viatura Seat Ibiza nunca foi entregue pela 2ª R. à A., apesar das<br />
insis<strong>te</strong>n<strong>te</strong>s in<strong>te</strong>rpelações junto da fornecedora, através da in<strong>te</strong>rvenção de BCP<br />
Leasing;<br />
(6) A A. pagou a esta R. a importância de P<strong>te</strong> 1 683 367$00, a título de<br />
rendas e despesas contratuais;<br />
(7) Mas entretanto cessou os pagamentos para com ela, relativos a es<strong>te</strong><br />
contrato de locação financeira;<br />
(8) Entretanto, a R. apresentou, 00.02.08, na Procuradoria da República de<br />
Santo Tirso, queixa contra José Augusto dos Reis Azevedo, geren<strong>te</strong> de Auto José<br />
Reis, imputando-lhe crime de burla qualificada: o denunciado declarou <strong>te</strong>r<br />
entregue [a viatura Seat] à locatária, que induziu a declarar tê-la recebido, e com<br />
o fim de ob<strong>te</strong>r sem mais o preço do automóvel, P<strong>te</strong> 2 853 500$00; sem embargo, a<br />
viatura não foi entregue na data ou em qualquer outra, mas o ardil criou na<br />
denuncian<strong>te</strong>, como o arguido pre<strong>te</strong>ndia, a errada convicção de que o Seat Ibiza<br />
lhe tinha sido efectivamen<strong>te</strong> vendido e entregue [à A.], obtido ilegitimamen<strong>te</strong><br />
porém o dito pagamento do preço;<br />
(9) Es<strong>te</strong> processo correu <strong>te</strong>rmos sob o nº 420.01, 2º Juízo Criminal <strong>Tc</strong>. Santo<br />
Tirso, duran<strong>te</strong> o qual o mencionado José Augusto dos Reis Azevedo confessou a<br />
prática do crime, condenado na pena de dois anos e cinco meses de prisão,<br />
suspensa por três anos;<br />
(10) Nesse mesmo processo, no que toca ao pedido cível, e em 01.11.26,<br />
acordaram a R. e o arguido no seguin<strong>te</strong>: (i) es<strong>te</strong> obrigou-se a pagar a BCP Leasing<br />
o montan<strong>te</strong> de P<strong>te</strong> 3 347 116$00 até 01.12.31, nos escritórios da locadora, <strong>Porto</strong>;<br />
(ii) recebido es<strong>te</strong> montan<strong>te</strong>, BCP Leasing obrigou-se a pagar à locatária, aqui A., a<br />
verba de P<strong>te</strong> 1 660 967$00, relativa a 17 rendas pagas, 15 no montan<strong>te</strong> de P<strong>te</strong> 80<br />
872$00 cada uma, outra de P<strong>te</strong> 81 665$00 e ainda outra de P<strong>te</strong> 285 350$00;<br />
6
(11) A R. desembolsou a totalidade do preço automóvel em favor de Auto<br />
José Reis;<br />
(12) Em 12.98, a A. contactou os serviços comerciais da R. no sentido de lhe<br />
propor a realização de uma operação de leasing mobiliário, pre<strong>te</strong>ndendo adquirir o<br />
veículo Seat já referido;<br />
(13) E <strong>te</strong>ndo a R. acedido à pre<strong>te</strong>nsão da A., celebrou com esta, 98.12.22, o<br />
contrato de locação financeira 980523, junto;<br />
(14) Foi depois remetida à R. a declaração emitida e subscrita por Auto José<br />
Reis, com data de 98.12.09, onde foi descriminado o equipamento e indicado o<br />
respectivo preço;<br />
(15) Entretanto, com data de 99.01.11, foi remetida à R. a factura nº 178 de<br />
Auto José Reis na quantia global de P<strong>te</strong> 2 853 500$00;<br />
(16) A R. não <strong>te</strong>ve contacto prévio com Auto José Reis e que não tivesse sido<br />
resultado da recepção da factura e do pagamento do preço do veículo;<br />
(17) Todos os elementos de que a R. <strong>te</strong>ve conhecimento relativamen<strong>te</strong> ao<br />
veículo, preço, fornecedor e prazos de entrega foram-lhe única e exclusivamen<strong>te</strong><br />
transmitidos pela própria A.;<br />
(18) Através do contrato de locação financeira mobiliária em causa, segundo<br />
ficou escrito, foi convencionado que entraria em vigor na data da entrega [à R.]<br />
do auto da recepção do equipamento, cujo envio incumbia à A.;<br />
(19) Nesse documento, a A. declarou conjuntamen<strong>te</strong> com Auto José Reis que<br />
a viatura Seat referida lhe havia sido devidamen<strong>te</strong> entregue e instalada pela 2ª, e<br />
que correspondia às exigências e especificações requeridas, pelo que o aceitava a<br />
título definitivo;<br />
(20) Face a esta declaração conjunta da A. e de Auto José Reis, ficou a R,<br />
convencida de que o veículo objecto da locação tinha sido efectivamen<strong>te</strong> entregue<br />
e recebido;<br />
(21) Em 99.01.15, por isso, a R. pagou a Auto José Reis a quantia de P<strong>te</strong> 2<br />
853 500$00, corresponden<strong>te</strong> ao preço do veículo cujo fornecimento havia sido<br />
negociado pela A.;<br />
(22) Mas es<strong>te</strong> pagamento só foi efectuado depois de recebidas as declarações<br />
do fornecedor no sentido de o bem <strong>te</strong>r sido entregue à A., e desta no sentido de o<br />
<strong>te</strong>r recebido sem qualquer reserva;<br />
7
(23) Pelo já aludido contrato de locação financeira, a A. assumiu a obrigação<br />
de pagar à R. 36 prestações mensais;<br />
(24) A primeira no montan<strong>te</strong> de 243 889$00;<br />
(25) E as restan<strong>te</strong>s nos montan<strong>te</strong>s de P<strong>te</strong> 69 032$00 cada, quantias a que<br />
acrescia IVA à taxa legal;<br />
(26) A A. não pagou as rendas nºs 18, 19, 21/36, referen<strong>te</strong>s ao dito contrato,<br />
cujo vencimento ocorreu respectivamen<strong>te</strong> nos dias 15 de cada um dos meses<br />
seguin<strong>te</strong>s a 05.00;<br />
(27) Através do mesmo contrato de locação financeira, comprome<strong>te</strong>u-se a A.<br />
a, median<strong>te</strong> seguro, cobrir por todo o período de vigência do contrato os riscos de<br />
responsabilidade civil ilimitada, danos próprios, assistência em viagem da<br />
viatura até 6 lugares, respeitan<strong>te</strong>s ao veículo Seat;<br />
(28) A A. declarou <strong>te</strong>r recebido uma viatura que sabia não lhe <strong>te</strong>r sido<br />
entregue;<br />
(29) Pelo mencionado contrato a R. obrigou-se para com a A. a adquirir esse<br />
mesmo veículo e a proporcionar-lhe o seu gozo, pelo período do convénio;<br />
(30) E convencionaram as par<strong>te</strong>s: o locador confere por es<strong>te</strong> meio mandato ao<br />
locatário, que expressamen<strong>te</strong> declara aceitá-lo, para proceder à recepção do bem<br />
locado, em seu nome e por sua conta, sendo da responsabilidade do locatário<br />
todos os custos e riscos ineren<strong>te</strong>s à sua entrega, nomeadamen<strong>te</strong> transpor<strong>te</strong>,<br />
instalação, montagem, seguro e arranque de funcionamento;<br />
(31) Auto José Reis, para ob<strong>te</strong>r da locadora o numerário referen<strong>te</strong> ao preço da<br />
viatura induziu a A. a declarar tê-la recebido, garantindo-lhe que a entrega do<br />
veículo ocorreria logo a seguir, dentro de 1 ou 2 dias;<br />
(32) A A. subscreveu, assim, o auto de recepção com o único intuito de<br />
receber o veículo adquirido a Auto José Reis, e que esta lhe ficou de entregar<br />
depois de ob<strong>te</strong>r da R. o preço do mesmo;<br />
(33) Como a entrega da viatura se não concretizou entretanto, a A. passou a<br />
fazer insis<strong>te</strong>n<strong>te</strong>s in<strong>te</strong>rpelações junto de Auto José Reis, a partir de inícios de<br />
01.99, com a finalidade de ob<strong>te</strong>r a entrega da viatura;<br />
(34) Comunicou também à R., a qual passou também a desenvolver contactos<br />
com Auto José Reis, insistindo na entrega da viatura à A.;<br />
8
(35) Foi por se <strong>te</strong>rem gorado todas estas <strong>te</strong>ntativas, quer da A. quer de BCP<br />
Leasing, que a R. procedeu à apresentação da queixa criminal já aludida;<br />
(36) Mas a A. despendeu o montan<strong>te</strong> de P<strong>te</strong> 117 587$00 com o seguro do<br />
automóvel;<br />
(37) <strong>Ap</strong>enas subscreveu o contrato de locação financeira mobiliária na<br />
perspectiva de lhe ser entregue o veículo Seat Ibiza 1900 TDI, objecto desse<br />
mesmo contrato;<br />
(38) E foi em consideração da cer<strong>te</strong>za de a viatura lhe vir a ser entregue que a<br />
A. se decidiu a subscrever o contrato com a R.;<br />
(39) A A. declarou tê-la recebido na absoluta confiança depositada em Auto<br />
José Reis: disseram-lhe e garantiram-lhe que em 1 ou 2 dias lhe seria entregue o<br />
veículo, mas sucedeu de outro modo;<br />
(40) Acaso a A. suspeitasse sequer de Auto José Reis não cumprir o<br />
compromisso assumido jamais celebraria o contrato de locação financeira em<br />
questão, nem assinaria a declaração de recepção do automóvel:<br />
(41) A R. desembolsou a totalidade do preço do Seat, viatura que não<br />
ingressou ma<strong>te</strong>rialmen<strong>te</strong> no património da locadora;<br />
(42) A R. pagou a Auto José Reis o preço acordado com esta para a compra e<br />
venda do veículo identificado nos autos.<br />
III. Cls./Alegações:<br />
(a) Os factos consignados pela A. nos seus articulados e incluídos na base<br />
instrutória foram plenamen<strong>te</strong> comprovados e demonstrados, inclusivamen<strong>te</strong> que a<br />
A. apenas subscreveu o contrato de locação financeira mobiliária na perspectiva<br />
de lhe ser entregue a viatura Seat Ibiza 1900 TDI, objecto desse contrato, e que foi<br />
em consideração da cer<strong>te</strong>za de o veículo lhe vir a ser entregue que se decidiu a<br />
subscrevê-lo com a R.;<br />
(b) Por sua vez, da matéria controvertida, alegada por BCP Leasing e<br />
constan<strong>te</strong> da base instrutória ou foi considerada não provada, ou não sus<strong>te</strong>nta a<br />
sen<strong>te</strong>nça em crise;<br />
9
(c) E quanto às respostas a Q12 e Q13 5 , resultam clara, manifesta e<br />
inequivocamen<strong>te</strong> quer dos documentos apresentados pela A., nos quais se verifica<br />
<strong>te</strong>r sido através desta que a locadora <strong>te</strong>ve conhecimento do incumprimento por<br />
par<strong>te</strong> de Auto José Reis e da não entrega da viatura;<br />
(d) Bem como resultam dos depoimentos prestados pelo próprio sócio<br />
geren<strong>te</strong> de Auto José Reis, o qual, na Audiência, reconheceu e confessou sem<br />
reservas <strong>te</strong>r acompanhado o representan<strong>te</strong> da A. aos balcões de BPA Santo Tirso,<br />
onde es<strong>te</strong> último relatou o sucedido (incumprimento) e <strong>te</strong>ntou resolver o assunto;<br />
(e) Es<strong>te</strong> depoimento foi aliás também plenamen<strong>te</strong> confirmado por um<br />
funcionário do BPA: declarou <strong>te</strong>r acompanhado desde o início todo o processo<br />
respeitan<strong>te</strong> à celebração do leasing e às vicissitudes do fornecimento do<br />
automóvel por par<strong>te</strong> de Auto José Reis;<br />
(f) Contudo, BCP Leasing pre<strong>te</strong>ndia demonstrar que desembolsou a<br />
totalidade do preço do automóvel, e que a viatura não ingressou ma<strong>te</strong>rialmen<strong>te</strong> no<br />
seu património pelo facto de <strong>te</strong>r sido assinado o auto de recepção da viatura pela<br />
A. conjugado com a entrega do documento que lhe foi feita;<br />
(g) Ora, relativamen<strong>te</strong> a esta questão impendia sobre a R. um efectivo ónus<br />
de prova, que não cumpriu, uma vez <strong>te</strong>r ficado apenas assen<strong>te</strong> que BCP Leasing<br />
desembolsou a totalidade do preço do automóvel, veículo que não ingressou<br />
ma<strong>te</strong>rialmen<strong>te</strong> no património da locadora;<br />
(h) Nes<strong>te</strong> sentido, nunca, em momento algum, considerou ou reconheceu o<br />
tribunal recorrido que o desembolso tivesse tido causa na assinatura do auto de<br />
recepção e reexpedição des<strong>te</strong> à R., facto de relevan<strong>te</strong> importância para a correcta,<br />
adequada e boa decisão da causa mas ignorado na sen<strong>te</strong>nça de 1ª instância;<br />
(i) Era igualmen<strong>te</strong> in<strong>te</strong>nção da R., e constitui questão crucial, provar que<br />
procedeu à aquisição do veículo em causa, cedendo à A. o gozo do mesmo;<br />
(j) Mas a es<strong>te</strong> respeito ficou na realidade unicamen<strong>te</strong> assen<strong>te</strong> que a 1ª R.<br />
pagou a Auto José Reis o preço acordado na compra e venda do automóvel;<br />
(k) Assim, também jamais foi demonstrado pela R. que cedeu à denuncian<strong>te</strong><br />
o gozo d viatura, como aquela pre<strong>te</strong>ndia fazer crer e constitui condição sine qua<br />
5 Base instrutória:<br />
...........................<br />
Q12. Só a A. poderia denunciar à 1ª R. o incumprimento de Auto José Reis, por só ela dele poder <strong>te</strong>r<br />
conhecimento? não provado;<br />
Q13. O que a A. não fez? não provado;<br />
.........................<br />
10
non no contrato de locação financeira mobiliária, de acordo com os arts. 1, 9 e 10,<br />
DL 149/95, 24.06;<br />
(l) Sobre tais questões, elementos e requisitos da lei não se pronunciou,<br />
adequada e consis<strong>te</strong>n<strong>te</strong>men<strong>te</strong> a decisão recorrida, que nem tão pouco se reporta a<br />
es<strong>te</strong>s incisos legais;<br />
(m) Optou an<strong>te</strong>s o tribunal recorrido por uma apreciação e in<strong>te</strong>rpretação<br />
restritivas e, no en<strong>te</strong>nder da recorren<strong>te</strong>, equívocas quando, ao contrário do que é<br />
previsto no mencionado DL, afirmou que à perfeição do contrato não in<strong>te</strong>ressa a<br />
entrega do bem ao locatário: a entrega não é elemento do contrato, não respeita à<br />
sua formação ou constituição, an<strong>te</strong>s à sua execução;<br />
(n) En<strong>te</strong>ndeu assim o tribunal recorrido que se justifica no caso ver<strong>te</strong>n<strong>te</strong> a<br />
inversão da regra res suo domino perit, invocando para o efeito, incorrectamen<strong>te</strong> a<br />
ver do recorren<strong>te</strong>, o art. 15 do citado diploma;<br />
(o) Sucede, manifesta, notoria e sem equívoco que o risco da perda<br />
de<strong>te</strong>rioração do bem, ali previsto, não se aplica de forma alguma ao caso presen<strong>te</strong>,<br />
uma vez que a previsão e in<strong>te</strong>rpretação de tal preceito só se pode reportar a<br />
situações supervenien<strong>te</strong>s em que o locatário é já e devidamen<strong>te</strong> portador, u<strong>te</strong>n<strong>te</strong> ou<br />
fruidor da coisa;<br />
(p) Tal situação nunca se verificou com a A., que jamais foi a de<strong>te</strong>ntora ou<br />
usuária do bem locado: es<strong>te</strong> nunca lhe foi entregue e nem sequer ma<strong>te</strong>rialmen<strong>te</strong><br />
existiu;<br />
(q) Não colhe, nem procede por isso, a paradoxal posição do tribunal<br />
recorrido ao imputar à recorren<strong>te</strong> culpa e responsabilidade pelo facto de o veículo<br />
automóvel lhe não <strong>te</strong>r sido entregue, considerando, no decorrer, válido e mantido<br />
o contrato de locação financeira, como se nada de anómalo e de grave se tivesse<br />
passado, no alheamento da vontade da locatária;<br />
(r) Por sua vez, não resulta em momento algum dos autos, nem dos factos<br />
assen<strong>te</strong>s, que BCP Leasing <strong>te</strong>nha, designadamen<strong>te</strong>, adquirido o veículo em<br />
questão, que o <strong>te</strong>nha examinado ou que <strong>te</strong>nha concedido à A. o gozo do bem,<br />
conforme dispõe o art. 9, DL 149/95;<br />
(s) Estava, então, BCP Leasing perfeitamen<strong>te</strong> cien<strong>te</strong>, peran<strong>te</strong> esses factos, de<br />
que não podia a locatária usar e fruir o bem em causa, e por não lhe <strong>te</strong>r sido<br />
11
entregue; logo, não existia para es<strong>te</strong> efeito bem como, pelas mesmas razões e<br />
motivos, estava a recorren<strong>te</strong> impedida e impossibilitada de restituir o locado,<br />
findo o contrato, art. 10, lx. cit.;<br />
(t) Além do exposto, foi in<strong>te</strong>ntado procedimento criminal por par<strong>te</strong> de BCP<br />
Leasing contra o geren<strong>te</strong> de Auto José Reis, Lda, acusado, julgado e condenado<br />
pela prática dos crimes de falsificação e burla que o caso concreto in<strong>te</strong>gra;<br />
(u) Aliás, o arguido confessou in<strong>te</strong>gralmen<strong>te</strong> os factos que lhe eram<br />
imputados;<br />
(v) E nesses mesmo autos, BCP Leasing deduziu contra ele pedido de<br />
indemnização cível no sentido de reob<strong>te</strong>r o montan<strong>te</strong> de P<strong>te</strong> 2 853 500$00, do<br />
preço da viatura Seat Ibiza mais IVA, que a R. lhe havia pago, bem objecto da<br />
locação financeira, acrescido dos respectivos juros vencidos desde 99.01.11 e<br />
vincendos;<br />
(w) Ainda no mesmo processo, celebraram BCP Leasing e o arguido,<br />
01.11.26, o sintomático e esclarecedor acordo descrito na matéria assen<strong>te</strong>;<br />
(x) Ora, com o procedimento criminal e acordo ul<strong>te</strong>rior, reconheceu<br />
manifestamen<strong>te</strong> BCP Leasing a al<strong>te</strong>ração anormal das circunstâncias em que as<br />
par<strong>te</strong>s fundaram a decisão de contratar, conferida à <strong>Ap</strong>.e a legítima pre<strong>te</strong>nsão de<br />
resolver o contrato de locação financeira, tal como pediu, invocando os arts. 432<br />
ss CC, maxime 437 cit., expressivos nos articulados;<br />
(y) Aliás, com a sua aludida iniciativa de âmbito penal, foi o próprio BCP<br />
Leasing quem expressamen<strong>te</strong> invocou e fez reconhecer a existência de dolo e má<br />
fé na celebração do negócio por par<strong>te</strong> de Auto José Reis, através do<br />
comportamento provado do geren<strong>te</strong>;<br />
(z) Isso mesmo, o negócio deveria <strong>te</strong>r consistido na venda do veículo<br />
automóvel por Auto José Reis à R., mas nunca chegou a concretizar-se por não <strong>te</strong>r<br />
havido até hoje a entrega e, em consequência, jamais <strong>te</strong>r produzido quaisquer<br />
efeitos o respectivo contrato, art. 879 CC;<br />
(aa) Entretanto, sem a compra e venda da viatura não poderia de modo algum<br />
<strong>te</strong>r sido consumado, como com efeito se não consumou, o contrato de locação<br />
financeira em análise, através da impossibilidade de a locadora poder<br />
proporcionar à locatária, no caso ver<strong>te</strong>n<strong>te</strong>, o gozo e fruição do bem locado;<br />
12
(bb) Cumpre sublinhar a resposta a Q7. 6 : não se ficou a dever o desembolso<br />
ao facto da assinatura do auto de recepção da viatura pela A. e à entrega desse<br />
documento a BCP Leasing;<br />
(cc) E estando, como está, plenamen<strong>te</strong> demonstrado no caso presen<strong>te</strong> a<br />
existência de erro decorren<strong>te</strong> de dolo, é o negócio em questão (contrato de locação<br />
financeira, por vinculação necessária e indissociável ao contrato da aquisição da<br />
viatura) susceptível de anulação, arts. 253 e 254 CC 7 ;<br />
(dd) Pedido es<strong>te</strong> também formulado pela recorren<strong>te</strong>, como pedido al<strong>te</strong>rnativo,<br />
autorizado no art. 468 CPC;<br />
(ee) De qualquer forma, não se compreende, tal como previa promonitoria e<br />
enfaticamen<strong>te</strong> a demandan<strong>te</strong> em 12 e 13 p.i. 8 , que não <strong>te</strong>ndo José Augusto dos<br />
Reis Azevedo pago até 03.03.03, nem até hoje certamen<strong>te</strong>, as quantias a que se<br />
tinha comprometido no dito acordo, BCP Leasing não <strong>te</strong>nha requerido ainda a<br />
respectiva execução por inadimplência 9 ;<br />
(ff) Todavia, ignorou ou não <strong>te</strong>ve em conta a sen<strong>te</strong>nça em crise todos es<strong>te</strong>s<br />
importan<strong>te</strong>s e cruciais factos, elementos e circunstâncias, optando por uma<br />
in<strong>te</strong>rpretação desadequada ao caso em apreço e não se pronunciando devidamen<strong>te</strong><br />
sobre tais questões, nulidade do art. 668/1d CPC;<br />
(gg) Enquanto, incorrecta e injustamen<strong>te</strong> também concluiu que a locação<br />
financeira tinha sido celebrada sem vício que de<strong>te</strong>rmine a anulação ou resolução,<br />
improceden<strong>te</strong>s pois os pedidos da A.<br />
(hh) E fruto desta particular posição, en<strong>te</strong>ndeu o tribunal recorrido dar parcial<br />
ganho de causa à R., quanto ao pedido reconvencional, condenando a A. a pagar-<br />
6<br />
Q7. A . apenas só subscreveu o contrato de locação de financeira mobiliária com a condição e<br />
perspectiva de lhe ser entregue o veículo Seat Ibiza 1900 TDI, o efectivo objecto do negócio celebrado?<br />
Provado apenas que a A. só subscreveu o contrato de locação de financeira mobiliária na perspectiva de<br />
lhe ser entregue o veículo Seat Ibiza 1900 TDI objecto desse contrato.<br />
7<br />
Citou em abono Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª ed. pp. 518 ss.<br />
8<br />
p.i.<br />
.................<br />
12. Ocorre que está a A. convicta de que o arguido não irá pagar à R. o supra citado montan<strong>te</strong>, uma vez<br />
que consta possuir José Augusto dos Reis Azevedo diversas outras dívidas, e não <strong>te</strong>r recursos para as<br />
liquidar;<br />
13. Razão pela qual, a assim acon<strong>te</strong>cer, não receberá a demandan<strong>te</strong> as quantias [de P<strong>te</strong> 1 683 367$00, a<br />
título de rendas e despesas contratuais já pagas, e de P<strong>te</strong> 117 587$00, montan<strong>te</strong> despendido no seguro da<br />
viatura] a que <strong>te</strong>m legalmen<strong>te</strong> direito.<br />
.................<br />
9<br />
Vd. certidão emitida pelo 2º Juízo Criminal de Santo Tirso e junta nes<strong>te</strong>s autos pela A., 03.03.05.<br />
13
lhe a quantia de € 7 326,43, com juros vencidos de € 750,22, a capitalizar nos<br />
<strong>te</strong>rmos requeridos pela reconvin<strong>te</strong>, e os vincendos desde 02.01.23;<br />
(ii) Tal decisão é igualmen<strong>te</strong> objecto de ca<strong>te</strong>górica rejeição e impugnação<br />
pela <strong>Ap</strong>.e no presen<strong>te</strong> recurso, para o que invoca ipsis verbis e mutatis mutandis<br />
os mesmos <strong>te</strong>rmos e fundamentos an<strong>te</strong>riormen<strong>te</strong> expendidos na minuta, até aqui;<br />
(jj) Constituem também e ainda manifestas contradições de julgamento, os<br />
segmentos a seguir elencados:<br />
(i) <strong>Ap</strong>esar de tudo o tribunal a quo continuou a en<strong>te</strong>nder não haver lugar à<br />
resolução ou anulação do contrato de locação financeira, não obstan<strong>te</strong> as<br />
circunstâncias do negócio, e da in<strong>te</strong>ncionalidade de BCP Leasing, ínsita no acordo<br />
levado a cabo no processo crime, ou as consequências decorren<strong>te</strong>s da confissão do<br />
arguido e da condenação des<strong>te</strong>;<br />
(ii) Daí persistirem exclusivamen<strong>te</strong> para a A. as consequências e as obrigações<br />
resultan<strong>te</strong>s da anómala manu<strong>te</strong>nção desse convénio, e nenhum dever contratual<br />
daí advindo inadmissivelmen<strong>te</strong> para as demais par<strong>te</strong>s;<br />
(iii) E segundo o tribunal recorrido, a única, ao menos aparen<strong>te</strong>men<strong>te</strong> enriquecida<br />
foi Auto José Reis, como se dúvidas houvesse desse exaustivo e mais que provado<br />
facto e lamentável realidade;<br />
(iv) Todavia foi essa mesma Auto José Reis que o tribunal, através do despacho<br />
saneador, considerou atipicamen<strong>te</strong> par<strong>te</strong> ilegítima e absolveu da instância;<br />
(kk) Mostra-se de igual modo confusa e incongruen<strong>te</strong> a razão da par<strong>te</strong> final do<br />
penúltimo parágrafo da sen<strong>te</strong>nça em análise, que escapa ao alcance e<br />
en<strong>te</strong>ndimento da <strong>Ap</strong>.e, quando se refere que a locadora continua empobrecida e<br />
também por culpa da A. e, ressarcida por um dos devedores, não manifestou a R,<br />
in<strong>te</strong>nção de pedir ressarcimento ao outro 10 .<br />
(ll) A sen<strong>te</strong>nça recorrida violou portanto, por erro de in<strong>te</strong>rpretação, todas as<br />
normas legais citadas do DL 149/85, 24.06, e desrespeitou as normas contratuais<br />
estabelecidas entre as par<strong>te</strong>s.<br />
(mm) Deve ser revogada e substituída por acórdão que a<strong>te</strong>nda os pedidos<br />
formulados pela A. na p.i.<br />
10 Na conciliação hermenêutica do passo obscuro foi <strong>te</strong>ntada a fórmula de I.(b)(24).<br />
14
IV. Contra-alegações:<br />
(a) A recorren<strong>te</strong> limitou-se a invocar de erro decorren<strong>te</strong> de dolo e má fé da<br />
fornecedora Auto José Reis, Lda, não sendo possível, a<strong>te</strong>ndendo aos factos<br />
provados imputar à recorrida contudo qualquer conduta indiciadora de dolo,<br />
também, ou de uso de um artifício adequado a induzir um erro a par<strong>te</strong> contrária;<br />
(b) O erro, a existir, estaria na declaração inserta no auto de recepção relativa<br />
ao recebimento do veículo, sendo a sua eventual relevância afastada pela<br />
indesculpabilidade desse erro da recorren<strong>te</strong>, e pelo não reconhecimento por par<strong>te</strong><br />
da recorrida da essencialidade da entrega para a conclusão do negócio;<br />
(c) Nos <strong>te</strong>rmos de cl.4/5.6 da condições gerais do contrato sub judicie, a<br />
recorrida não responde, na verdade, pela entrega a<strong>te</strong>mpada do bem, competindo à<br />
recorren<strong>te</strong> o exercício de qualquer acção ou direito contra o fornecedor por<br />
incumprimento des<strong>te</strong>;<br />
(d) Por outro lado, a recorren<strong>te</strong> nunca alegou <strong>te</strong>r resolvido o contrato,<br />
invocando a falta de entrega do automóvel, nem invocou quaisquer factos que<br />
tivessem permitido desvincular-se unila<strong>te</strong>ralmen<strong>te</strong>, resultando aliás dos factos<br />
provados que não houve incumprimento por par<strong>te</strong> da <strong>Ap</strong>.a que justifique essa<br />
desvinculação;<br />
(e) Face ao exposto, o contrato de locação financeira dos autos foi concluído<br />
sem qualquer vício que de<strong>te</strong>rmine a sua anulação, assim como não se verificam<br />
nem foram legados pela recorren<strong>te</strong> fundamentos em que se possa basear essa<br />
anulação;<br />
(f) A sen<strong>te</strong>nça recorrida deve ser in<strong>te</strong>iramen<strong>te</strong> mantida.<br />
V. Cls./<strong>Ag</strong>ravo:<br />
(a) Na causa de pedir da presen<strong>te</strong> acção, além do contrato de locação<br />
financeira foi também alegada a existência de promessa de fornecimento/venda<br />
pela R. Auto José Reis, Lda do veículo automóvel objecto da locação;<br />
(b) Es<strong>te</strong> negócio é subjacen<strong>te</strong> ao contrato de locação financeira que só foi<br />
celebrado em consequência daquele;<br />
15
(c) ambas as relações jurídicas estão directa e objectivamen<strong>te</strong> vinculadas,<br />
sendo o fornecimento/venda da viatura causa e condição do contrato de locação<br />
financeira;<br />
(d) O erro doloso e conscien<strong>te</strong> provocado pela demandada Auto José Reis,<br />
Lda, de<strong>te</strong>rminou a não consumação, quer de facto, quer de direito, daquele<br />
negócio (contrato de locação financeira);<br />
(e) Daí a sua ineficiência e consequen<strong>te</strong> anulação ou resolução, uma vez que<br />
nunca A. recebeu de qualquer das RR o bem (veículo) locado;<br />
(f) Nes<strong>te</strong> sentido é Auto José Reis, Lda responsável pela anulação ou<br />
resolução, por <strong>te</strong>r sido in<strong>te</strong>rvenien<strong>te</strong> e beneficiada com o fecho do contrato de<br />
locação financeira;<br />
(g) Logo, é par<strong>te</strong> legítima nesta acção 11 , por <strong>te</strong>r eviden<strong>te</strong> vínculo na relação<br />
ma<strong>te</strong>rial controvertida, e manifesto in<strong>te</strong>resse em contradizer;<br />
(h) A decisão recorrida contrariou os arts. 227, 236, 247, 253, 254 e 879 ss<br />
CC, 29 CPC;<br />
(i) Deve ser revogado e substituído por acórdão que decida pela<br />
legitimidade da R. Auto José Reis, Lda.<br />
VI. Contra-alegações: não houve.<br />
VII. Recurso: foi julgado em Colectivo.<br />
VIII. Sequência:<br />
(a) O ordenamento português, primeiro no DL 171/79 e depois no DL<br />
149/95, 24.06, al<strong>te</strong>rado pelo DL 265/97, 02.10, seguiu, em matéria de leasing, um<br />
consenso doutrinário, jurídico e económico acerca da figura, ancorado na prática<br />
negocial dos países europeus. Contudo, a regulamentação do país limita<br />
for<strong>te</strong>men<strong>te</strong> o princípio da liberdade de estipulação contratual, que surge<br />
constrangida nes<strong>te</strong> contrato de direito privado, a que se aplica subsidiariamen<strong>te</strong><br />
não apenas o Direito Privado em geral, mas também o regime da locação<br />
11 Citou em abono Ac. RP, 82.11.04, CJ (1982), V/245 e Alberto dos Reis, Comentário ao Código de<br />
Processo Civil, I/41.<br />
16
constan<strong>te</strong> do Código Civil 12 : as regras legais são, por um lado, imperativas, por<br />
outro, a prática fez emergir contratos-tipo, levando a que o contrato de locação<br />
financeira não seja negociado caso a caso, mas an<strong>te</strong>s emergen<strong>te</strong> das e nas<br />
sociedades locadoras; <strong>te</strong>nde a ser um contrato de adesão 13 .<br />
Deve ser-lhe aplicado um critério de arrumo jurídico, que nos apresenta ou o<br />
leasing mobiliário ou o leasing imobiliário, plataformas de aspectos frisan<strong>te</strong>s quer<br />
do ponto de vista jurídico e fiscal, quer também económico e financeiro.<br />
(b) Como primeiro passo da contratação, o futuro locatário apresenta à<br />
sociedade de locação financeira uma proposta que con<strong>te</strong>rá a indicação do<br />
vendedor, a carac<strong>te</strong>rização da coisa a locar, os prazos de entrega e demais<br />
cláusulas do contrato de aquisição; e, muito embora de ordinário seja havida a<br />
locação financeira como uma operação tripartida, os sujeitos do contrato de<br />
leasing são apenas dois: a sociedade locadora e o locatário utilizador do bem.<br />
O fornecedor é então um estranho ao contrato de leasing já que nele não é par<strong>te</strong> 14 .<br />
Entretanto, as coisas móveis só poderão ser locadas por quem as possa utilizar<br />
como bens de equipamento, i.é, bens com os quais exista, da par<strong>te</strong> do locador,<br />
uma relação específica de utilidade empresarial.<br />
(c) No entanto, se o fornecedor desse equipamento não é par<strong>te</strong> no contrato,<br />
não se segue porém que possa ser rasurado do horizon<strong>te</strong> e clima do consenso: o<br />
objecto da compra e venda é simultaneamen<strong>te</strong> objecto do financiamento, cujo<br />
produto recebe do locador e do contrato de locação financeira que es<strong>te</strong> realiza com<br />
o locatário.<br />
Há necessariamen<strong>te</strong> uma ligação entre es<strong>te</strong> último e o fornecedor, justamen<strong>te</strong><br />
porque o locador muitas vezes nem sequer chegará a de<strong>te</strong>r ma<strong>te</strong>rialmen<strong>te</strong> qualquer<br />
bem. Mas é o locador quem contrata com o fornecedor, embora seguindo<br />
12 Duar<strong>te</strong>, Rui Pinto, Escritos sobre Leasing e Factoring, Princípia, Lisboa, 2001, p. 47.<br />
13 Vd. Mota Pinto, C.A., Contratos de Adesão, in RDES, XX, 2, 3 e 4 (Abril-Dezembro 1973).<br />
14 Duar<strong>te</strong>, Rui Pinto, Escritos sobre Leasing e Factoring, Princípia, Lisboa, 2001, p. 52.<br />
17
instruções do locatário, e que, no íntimo da nossa lei, parece até fazê-lo sem que o<br />
locatário o represen<strong>te</strong> 15 , muito embora a lei estabeleça, no que diz respeito às<br />
relações entre locatário e fornecedor, que aquele exercerá contra es<strong>te</strong> último, e<br />
quando disso seja caso, todos os direitos relativos à coisa locada 16 .<br />
Face à lei portuguesa, em boa verdade, o locatário não representará<br />
necessariamen<strong>te</strong> o locador no contrato celebrado com o fornecedor, nem será<br />
necessariamen<strong>te</strong> quem receba a entrega da coisa fornecida, en<strong>te</strong>ndimento es<strong>te</strong> que<br />
resulta de a lei prever os trâmi<strong>te</strong>s contratuais entre o locador e o locatário, os<br />
deveres e direitos recíprocos de um e outro e de ser omissa quanto à in<strong>te</strong>rvenção<br />
directa do locatário junto do fornecedor, excepto no que diz respeito à regra de<br />
responsabilização da sociedade locadora por actos praticados pelo locatário<br />
an<strong>te</strong>riores ao contrato de locação financeira 17 .<br />
Voltando ao objecto do leasing mobiliário que cristaliza em bens de equipamento,<br />
parece de exigir que entre o bem locado e as mercadorias ou serviços oferecidos<br />
ao público pelo utilizador haja uma relação de causalidade. E naturalmen<strong>te</strong> como<br />
contrapartida da concessão do gozo da coisa e da eventual transmissão do direito<br />
de propriedade sobre ela, está o locatário obrigado ao pagamento das rendas e do<br />
preço: há correspectividade inegável, analisada a lei, onde se diz por exemplo<br />
estar par<strong>te</strong> da contrapartida da transmissão da propriedade do bem incluída já nas<br />
rendas. E no caso da locação financeira mobiliária pode certamen<strong>te</strong> ser deduzida<br />
da correspondência entre a duração do contrato e o período de amortização do<br />
equipamento, prazo es<strong>te</strong> imposto na lei 18 .<br />
(d) Ora bem! Pelo contrato de locação financeira, o locador fica obrigado, e<br />
o locatário adquire os correlativos direitos, a adquirir a coisa objecto do contrato,<br />
a conceder o gozo da mesma e a vendê-la ao locatário, caso es<strong>te</strong> a queira no fim<br />
do contrato, em suma, a obrigação de conceder o gozo da coisa representa o<br />
núcleo do contrato.<br />
15 Aut. cit., id., p. 53.<br />
16 Art. 13, DL 149/95.<br />
17 Aut. cit., id., p. 57.<br />
18 DL 149/95, art. 6/3: o prazo da locação financeira de coisas móveis não deve ultrapassar o que<br />
corresponder ao período presumível de utilização económica da coisa.<br />
18
Ao princípio, no entanto, o equipamento objecto da locação financeira nem sequer<br />
é ainda propriedade do locador que apenas se obriga a adquiri-lo. Trata-se aqui de<br />
uma locação de bem futuro, segundo os arts. 211 e 399 CC 19 , à qual não são<br />
aplicáveis, por disposição expressa da lei 20 , certas normas especiais relativas à<br />
locação constan<strong>te</strong>s da lei civil.<br />
Vejamos as diferenças: (i) na locação financeira o locador não assegura ao<br />
locatário o gozo da coisa para os fins a que ela se destina, visto que não responde<br />
pelos vícios da coisa locada, nem pela inadequação face à finalidade do contrato,<br />
salvo o disposto no art. 1034 CC 21 (irresponsabilidade que resulta naturalmen<strong>te</strong> de<br />
não ser ele quem disponibiliza o equipamento, de nem sequer o conhecer, por não<br />
chegar a detê-lo, peran<strong>te</strong> uma actuação meramen<strong>te</strong> financeira e limitada a libertar<br />
os fundos para a operação; (ii) na locação financeira o risco de perecimento ou da<br />
de<strong>te</strong>rioração da coisa corre pelo locatário 22 , inverso da regra res suo domino perit,<br />
em desfavor do locatário (justifica-se na modalidade particular revestida no direito<br />
de propriedade do locador: o domínio <strong>te</strong>ndencial, por todo o período da utilidade,<br />
per<strong>te</strong>nce ao locatário); (iii) na locação financeira o locatário está obrigado a<br />
efectuar o seguro da coisa por forma a abranger a sua perda ou de<strong>te</strong>rioração ou a<br />
responsabilidade civil emergen<strong>te</strong> por danos que ela provoque 23 (defesa em favor<br />
do locador e dos restan<strong>te</strong>s credores do locatário, paralela à circunstância de o risco<br />
pela perda ou de<strong>te</strong>rioração correr pelo locatário); (iv) na locação financeira, o<br />
locador <strong>te</strong>m direito a fazer suas, sem compensação, todas as peças ou todos os<br />
outros elementos acessórios incorporados na coisa pelo locatário (porque a<br />
sociedade de locação financeira não presta, ao longo do contrato, a assistência<br />
técnica ao ma<strong>te</strong>rial, não estando por isso em condições de igualdade com o<br />
locatário, quando se tratasse de estimar as substituições e as melhorias).<br />
No mais o regime é idêntico ao da locação, nomeadamen<strong>te</strong> quanto ao dever de<br />
restituição pelo locatário, de avisar o locador dos vícios da coisa e perigo de<br />
19<br />
Duar<strong>te</strong>, Rui Pinto, Escritos sobre Leasing e Factoring, Princípia, Lisboa, 2001, p. 64.<br />
20<br />
vd. art. 17, DL 149/95.<br />
21<br />
Vd. art. 12, DL 149/95.<br />
22<br />
Art. 15, DL 149/95: prevê a possibilidade de estipulação contrária.<br />
23<br />
Art. 10/1j, DL 149/95, red. DL 265/97.<br />
19
esbulho, dever de utilizar o equipamento para o seu fim, direito de o locador o<br />
examinar, obrigação de o locatário pagar a renda, e possibilidade de usar os meios<br />
facultados ao possuidor na defesa do bem locado.<br />
Entretanto, o quantitativo da renda deve permitir a amortização e será reduzido<br />
proporcionalmen<strong>te</strong> em caso de quebra do preço de aquisição ou em virtude do<br />
incumprimento contratual do fornecedor 24 .<br />
(e) Consideremos agora que nos contratos de locação financeira o locador se<br />
obriga a vender a coisa ao locatário, caso es<strong>te</strong> queira, findo o contrato 25 , ou do<br />
outro ponto de vista, o locatário pode comprá-la, num prazo convencionado,<br />
median<strong>te</strong> o pagamento de um preço certo ou de<strong>te</strong>rminável, nos <strong>te</strong>rmos do próprio<br />
contrato 26 : eis aqui de um contrato promessa unila<strong>te</strong>ral de venda, que obriga o<br />
locador peran<strong>te</strong> o locatário.<br />
(f) No longo deba<strong>te</strong> doutrinário sobre a natureza jurídica do leasing, não<br />
perpassa, por mais especiais que sejam os pontos de análise, nenhuns que não<br />
possam corresponder a cláusulas de um contrato de locação, e também não seria<br />
possível nunca, por menos que fossem tais sulcos, sus<strong>te</strong>ntar a compatibilidade da<br />
locação financeira com a definição legal de compra e venda: o con<strong>te</strong>údo<br />
especializado da locação financeira, eivado porventura de muitas cláusulas não<br />
frequen<strong>te</strong>s na locação, não contraria o conceito legal desse contrato típico; mas a<br />
causa-função da locação financeira diverge essencialmen<strong>te</strong>.<br />
Todavia, para o legislador português, es<strong>te</strong> último aspecto na diversidade em que<br />
se inaugura e constitui foi in<strong>te</strong>iramen<strong>te</strong> modelado em normas singulares. Podemos<br />
portanto afirmar que o núcleo do contrato de locação financeira corresponde, no<br />
Direito português, à essência de uma locação, pese embora o facto de algumas,<br />
não poucas, das normas especiais sobre a locação financeira contrariarem o<br />
regime geral da locação 27 . Soma-se-lhe o contrato promessa unila<strong>te</strong>ral de compra<br />
e venda sobre a coisa locada, reconfigurado assim o en<strong>te</strong>ndimento da locação<br />
24 Art. 5, DL 149/95.<br />
25 Art. 9/1, DL 149/95.<br />
26 Art. 1, DL 149/95.<br />
27 Duar<strong>te</strong>, Rui Pinto, Escritos sobre Leasing e Factoring, Princípia, Lisboa, 2001, p. 83.<br />
20
financeira como uma união ou coligação de contratos, e não como contrato<br />
misto 28 .<br />
(g) É an<strong>te</strong>s de mais a causa-função que permi<strong>te</strong> atribuir à locação financeira<br />
uma individualidade específica e, na verdade, o que a sociedade de locação<br />
financeira pre<strong>te</strong>nde do direito de propriedade que adquire não é o<br />
aproveitamento das qualidades da coisa (dos eu valor de uso), função típica de<br />
um direito real de gozo e maxime des<strong>te</strong> – mas que ele reforce a possibilidade de<br />
realização dos seus direitos de crédito sobre o locatário 29 . Naturalmen<strong>te</strong>, a<br />
sociedade de locação financeira está sempre mais in<strong>te</strong>ressada em ob<strong>te</strong>r o<br />
pagamento da totalidade das rendas, e muito menos o equipamento locado,<br />
mesmo embolsadas as rendas já recebidas: é certo que no leasing o direito de<br />
propriedade é utilizado para fins de garantia do crédito.<br />
Contudo, a possibilidade de o locador permanecer proprietário no fim do contrato<br />
também é um objectivo central do en<strong>te</strong>ndimento. Não basta em todo o caso para<br />
podermos equiparar o leasing financeiro aos negócios fiduciários 30 em que o<br />
devedor transmi<strong>te</strong> o bem ao credor com exclusivo fim de garantia, porque a coisa<br />
objecto da locação financeira nem provém do património do devedor, mas de um<br />
<strong>te</strong>rceiro, que é de todo estranho in<strong>te</strong>nto de garantia: nada há pois aqui que seja<br />
inovadoramen<strong>te</strong> conflituan<strong>te</strong> com a figuração do direito do locador como direito<br />
de propriedade, nem tão pouco nada que recomende uma especial construção dos<br />
direitos do locatário 31 .<br />
(h) As rendas da locação financeira são, do ponto de vista substancial,<br />
fracções de uma prestação, e não prestações autónomas; ...[no] cálculo<br />
28 Galvão Telles, Manual dos Contratos em Geral, 3ª ed., Coimbra, 1965, p. 395; Antunes Varela, Das<br />
Obrigações em Geral, 2º ed., I, Coimbra, 1973, pp. 224 ss, ambos no sentido de o contrato misto dar<br />
lugar a uma fusão num único contrato de elementos per<strong>te</strong>ncen<strong>te</strong>s a vários, que perdem a sua<br />
individualidade.<br />
29 Duar<strong>te</strong>, Rui Pinto, Escritos sobre Leasing e Factoring, Princípia, Lisboa, 2001, p. 86.<br />
30 Fiducia cum creditore: no sentido dessa equiparação Giovanoli, Mario, Le crédit-Bail (Leasing) en<br />
Europe: Développement et Nature Juridique, Paris, Li<strong>te</strong>c, 1980, p. 359; realçando a semelhança<br />
funcional, Mota Pinto, Direitos Reais, Coimbra, 1972, p. 68.<br />
31 Aut. cit., id., p. 87.<br />
21
financeiro... são rigorosamen<strong>te</strong> iguais às prestações (rendas, na <strong>te</strong>rminologia do<br />
cálculo financeiro) pelas quais um mutuário reembolsa capital e paga juros<br />
(quando a amortização do capital e o pagamento dos juros não são feitos em<br />
prestações separadas) 32 Enquanto isto, muitos contratos de leasing, prevêem que<br />
os locadores, em caos de incumprimento do locatário, e em al<strong>te</strong>rnativa à resolução<br />
do contrato, possam exigir an<strong>te</strong>cipadamen<strong>te</strong> as rendas vincendas até final do<br />
contrato. É uma dessas regras que está em jogo, agora.<br />
Alguma jurisprudência <strong>te</strong>m negado a validade das cláusulas 33 . Contudo, a cláusula<br />
é comum no trânsito in<strong>te</strong>rnacional nomeadamen<strong>te</strong> nos contratos de amortização<br />
in<strong>te</strong>ira, tal como são os contratos de locação financeira previstos na lei ou<br />
desenhados na prática institucional portuguesa 34 , em que o serviço financeiro<br />
prestado ao locatário é idêntico ao que qualquer Banco poderia prestar, median<strong>te</strong><br />
hipo<strong>te</strong>ca ou penhor sobre o bem financiado. Mas a empresa de leasing fica titular<br />
do direito de propriedade sobre o mesmo, não se seguindo que os contratos-tipo<br />
não prevejam a resolução, principalmen<strong>te</strong> para o caso de incumprimento<br />
definitivo se o locatário não tiver meios com que pagar. Nestas circunstâncias o<br />
locador preferirá naturalmen<strong>te</strong> reaver o equipamento, e acrescentam as cláusulas<br />
que para além disso <strong>te</strong>rá direito às rendas vencidas e não pagas, com os juros até à<br />
data da resolução e a uma indemnização prelos prejuízos sofridos, a qual, quando<br />
<strong>te</strong>m a natureza de cláusula penal, veio a ser limitada pela in<strong>te</strong>rvenção na matéria<br />
do Banco de Portugal que se verificou até ao DL 168/89, 24.03: 20% da soma das<br />
rendas vincendas com o valor residual 35 .<br />
Estas soluções não são diferen<strong>te</strong>s, por exemplo, no caso de incumprimento do<br />
contrato promessa de compra e venda, considerada a bipolaridade<br />
32 Duar<strong>te</strong>, Rui Pinto, Escritos sobre Leasing e Factoring, Princípia, Lisboa, 2001, p. 200; segue: esta<br />
natureza da locação financeira está hoje reconhecida pela própria lei portuguesa nas regras sobre<br />
contabilização, nomeadamen<strong>te</strong> nas que mandam registar o bem locado no activo do locatário financeiro<br />
e desagregar os pagamentos feitos por es<strong>te</strong> ao locador em reembolso de capital e juros – notas à conta<br />
42 do POC, nomeadamen<strong>te</strong> alínea c), aprovado pelo DL 410/89, 21.11.<br />
33 Ac. STJ, 94.11.17, BMJ 441/274; Ac. STJ, 94.07.05, BMJ 439/516; Ac. RL, 93.06.24, BMJ 428/662;<br />
Ac. STJ, 91.03.07, BMJ 405/465; Ac. RC, 93.11.23, CJ (1993/XVIII), V/38; Ac. RL, 92.02.27, CJ<br />
(1992/XVII), I/172, Ac. RL, 90.03.13, CJ (1990/XV), II/129.<br />
Ver no mesmo sentido na doutrina estrangeira, Giovanolli, Mario, op. cit. p. 249 ss.<br />
34 O conjunto dos pagamentos a satisfazer pelo locatário ao locador financeiro corresponde à amortização<br />
in<strong>te</strong>gral do valor investido por es<strong>te</strong> no equipamento.<br />
35 Duar<strong>te</strong>, Rui Pinto, Escritos sobre Leasing e Factoring, Princípia, Lisboa, 2001, p. 201.<br />
22
esolução/execução específica. E não é posto em causa, no domínio regulamentar<br />
do leasing, o reitorado do art. 781 CC: a falta de realização de uma das prestações<br />
da obrigação do mutuário importa o vencimento de todas, i.é, as cláusulas que<br />
conferem aos locadores financeiros o direito a, em caso de incumprimento pelo<br />
locatário, exigir an<strong>te</strong>cipadamen<strong>te</strong> as rendas vincendas são funcionalmen<strong>te</strong><br />
equivalen<strong>te</strong>s à faculdade de o mutuan<strong>te</strong> exigir o pagamento an<strong>te</strong>cipado de todas<br />
as prestações, em caso de falta de pagamento de alguma 36 .<br />
Des<strong>te</strong> modo, as cláusulas em análise não são abusivas, e tal como a jurisprudência<br />
mais recen<strong>te</strong> <strong>te</strong>m dito 37 . Trata-se afinal de uma perda do benefício do prazo pelo<br />
locatário que abrange todas as prestações, e no sentido que prestações vem a<br />
adquirir segundo o art. 781 CC.<br />
(i) As consequências da não entrega do bem locado pelo fornecedor sobre os<br />
direitos e obrigações recíprocos do locador e do locatário, é <strong>te</strong>ma que <strong>te</strong>m tido<br />
também tratamento jurisprudencial. O Ac. STJ, 95.11.30 38 , concluiu pela validade<br />
das cláusulas através das quais (i) o locador se não responsabiliza pela entrega do<br />
equipamento ou pela correspondência des<strong>te</strong> às especificações indicadas pelo<br />
locatário, competindo a es<strong>te</strong> último reagir pelo incumprimento do fornecedor, ou<br />
(ii) a mão entrega do equipamento ou essa desconformidade do mesmo não<br />
exoneram o locatário das obrigações que <strong>te</strong>m peran<strong>te</strong> o locador, contudo, Ac. STJ,<br />
94.11.22 39 , considerou não pode esquivar-se a locadora às obrigações de<br />
concessão do gozo do bem ao locatário, nem à obrigação da entrega.<br />
Não colhe, mas a primeira opinião jurisprudencial citada, os arts. 11 e 13, DL<br />
149/95, 24.06 40 , consagram a isenção de responsabilidade do locador financeiro<br />
pela realização de prestações a cargo do fornecedor, i.é, a regra legal de lhe caber<br />
conceder o gozo do bem locado não acarreta o risco de o fornecedor não cumprir<br />
36<br />
Aut. cit., p. 201.<br />
37<br />
Ac. STJ, 99.01.20, CJ-STJ, (1999/VII), I; Ac. STJ, 98.10.20, CJ-STJ (1998/VI), III; Ac. STJ, 95.05.18,<br />
CJ-STJ(1995/III), II; Ac. RL, 94.09.20, CJ (1994/XIX), IV; principalmen<strong>te</strong> Ac. RL, 98.07.09 (Salazar<br />
Casanova), segundo a apreciação de Pinto Duar<strong>te</strong>, na par<strong>te</strong> em que coloca a hipó<strong>te</strong>se de a cláusula em<br />
discussão dever ser in<strong>te</strong>rpretada no sentido de sóo actuar em al<strong>te</strong>rnativa à resolução.<br />
38<br />
BMJ 451.<br />
39<br />
CJ-STJ (1994-II), III.<br />
40<br />
De início os arts. 20 e 23, DL 171/79, 06.06.<br />
23
e, nes<strong>te</strong> mesmo sentido, vai a ressalva para o disposto no art. 1034 CC,<br />
estabelecida no regime da resolução da locação financeira.<br />
(j) Através desta visão sintética da natureza jurídica, das vicissitudes,<br />
direitos e obrigações das par<strong>te</strong>s no contrato de leasing, é-nos fornecido um quadro<br />
que coincide com o acerto do despacho saneador (inquestionável e que por isso se<br />
mantém desde já) ou da sen<strong>te</strong>nça de 1ª instância. Resta, no entanto, sopesar o caso<br />
do ponto de vista da possível influência da sen<strong>te</strong>nça penal alegada na resposta à<br />
reconvenção. Na verdade, impressiona o argumento de a R. reconvin<strong>te</strong> passar a<br />
dispor de duas vias executivas para conseguir ob<strong>te</strong>r, digamos assim, a mesma<br />
cobertura dos prejuízos derivados do incumprimento contratual, visando par<strong>te</strong>s<br />
distintas e que não são garan<strong>te</strong>s uma da outra, mesmo divergen<strong>te</strong>s!<br />
Um dos problemas diz respeito ao valor do caso julgado penal. Aqui, uma<br />
sen<strong>te</strong>nça crime reconheceu BCP Leasing como ofendida de crime de burla, por <strong>te</strong>r<br />
desembolsado o preço do automóvel em favor do fornecedor que não o entregou<br />
dolosamen<strong>te</strong>, apropriando-se median<strong>te</strong> embus<strong>te</strong> do numerário. Por outro lado, foi<br />
ele condenado a indemnizar, rever<strong>te</strong>ndo todo o cálculo financeiro da operação,<br />
mas para que BCP Leasing procedesse à divisão com a aqui A., segundo as<br />
prestações que esta já honrara.<br />
Diz-nos o art. 84 CPP 41 haver caso julgado, nos <strong>te</strong>rmos do caso julgado civil,<br />
peran<strong>te</strong> a decisão penal que conheça do pedido de indemnização conexo, mas não<br />
estão verificadas no caso as clássicas três identidades, observado o pedido<br />
reconvencional e o pedido cível da acção criminal: (i) os sujeitos são diferen<strong>te</strong>s<br />
(BCP Leasing/A.; idem/geren<strong>te</strong> da fornecedora); (ii) a causa de pedir também<br />
(dano criminal/incumprimento do contrato de locação financeira por par<strong>te</strong> do<br />
locatário); (iii) ainda assim, diferen<strong>te</strong> é o pedido (pagamento de todas as<br />
rendas/indemnização pelos prejuízos decorren<strong>te</strong>s do dano criminal).<br />
(k) Entretanto, a propositura da acção criminal, ou pelo menos o pedido de<br />
indemnização conexo quererá significar resolução tácita do contrato de leasing? A<br />
41 ...a decisão penal, ainda que absolutória, que conhecer do pedido civil constitui caso julgado nos<br />
<strong>te</strong>rmos em que a lei atribui eficácia de caso julgado às sen<strong>te</strong>nças civis.<br />
24
sen<strong>te</strong>nça recorrida respondeu não, e até ver coincidiremos com ela. Enfim, tudo se<br />
passa com estranho ao contrato em jogo: para além do mais, o geren<strong>te</strong> responde<br />
por si próprio e não em representação da fornecedora.<br />
Certo é, porém, que no acordo homologado no processo criminal, quanto ao<br />
pedido de indemnização conexa, a R., BCP Leasing, por escrito, avançou de motu<br />
proprio (estranho e desnecessário que era à economia da resolução do litígio) e foi<br />
acei<strong>te</strong> pelo tribunal um modelo de composição que lógica e necessariamen<strong>te</strong><br />
pressupõe, por isso mesmo, tratar-se de uma proposta de revogação do consenso<br />
que firmou com a A. É que só es<strong>te</strong> sentido pode <strong>te</strong>r incluir no i<strong>te</strong>m pagamento da<br />
indemnização pelo arguido, não a pos<strong>te</strong>rior faculdade livre, mas um verdadeiro<br />
dever de a locadora acertar contas, recebida, com a contrapar<strong>te</strong> no leasing, tidas<br />
em consideração assim as prestações entretanto percebidas: revogação ab initio do<br />
contrato, acei<strong>te</strong> a nulidade da compra e venda do veículo, porque nem nela<br />
in<strong>te</strong>rveio a fornecedora – foi condenado criminalmen<strong>te</strong> o simulador da gerência (e<br />
com a finalidade de enriquecer ele só à custa alheia).<br />
Em paralelo, assen<strong>te</strong> em suma que a locatária não beneficiou de qualquer modo do<br />
financiamento, e assunção congruen<strong>te</strong> de <strong>te</strong>r de ser restituída das rendas satisfeitas<br />
segundo um contrato cujos efeitos afinal haviam de ser voluntária e<br />
consensualmen<strong>te</strong> destruídos, porque a resolução válida se traduz aqui não numa<br />
mera declaração ao outro contraen<strong>te</strong> 42 mas num contrato de resolução: o modelo<br />
por que envereda não está previsto nem na lei, nem nas cláusulas.<br />
Ora, a proposta, revelada com toda a probabilidade do <strong>te</strong>xto do acordo judicial<br />
penal foi feita publicamen<strong>te</strong> 43 nes<strong>te</strong> caso, porque fez par<strong>te</strong> da Audiência, art. 321<br />
CPP, e ficou a constar da acta, art. 362/1.f CPP. A aceitação deduz-se, por seu<br />
turno, da propositura da presen<strong>te</strong> causa, em que a A. solicita justamen<strong>te</strong> aquela<br />
restituição à qual no fim de contas essa mesma proposta mediata de contrato de<br />
42 Vd. art. 436 CC.<br />
43 A norma do art. 225 CC comporta o en<strong>te</strong>ndimento que quadricule o sentido aparen<strong>te</strong>men<strong>te</strong> restritivo do<br />
<strong>te</strong>xto legal, ...quando se dirija a pessoa desconhecida ou cujo paradeiro seja por aquele ignorado, noutro<br />
extremo, segundo o qual o segmento deve ser lido da seguin<strong>te</strong> forma: até nessas circunstâncias é válida a<br />
declaração negocial pública, sendo corren<strong>te</strong> e admitida em circunstâncias nas quais a destinatária<br />
contrapar<strong>te</strong> não está presen<strong>te</strong> por motivo justificado, ou da vida institucional, podendo no entanto,<br />
segundo a normalidade das circunstâncias, vir a tomar conhecimento da proposta, séria e completa.<br />
25
esolução de autoria da R. se refere. Por fim, nem foi revogada na forma de oferta,<br />
nem por comunicação à recorren<strong>te</strong>: <strong>te</strong>mos de <strong>te</strong>r por validamen<strong>te</strong> celebrado esse<br />
mesmo contrato de resolução a que nos <strong>te</strong>mos vindo a referir 44 .<br />
(l) Qual a influência desta linha de raciocínio na apreciação do recurso?<br />
Leva ao inverso da solução dada pela sen<strong>te</strong>nça de 1ª instância. O problema não<br />
pode ser resolvido através das normas que estabelecem o regime da locação<br />
financeira mobiliária mas dos factos produzidos pela vontade das par<strong>te</strong>s no que<br />
diz respeito à subsistência do convénio. E com efeito, A. e R. convencionaram<br />
resolver o leasing. Deve portanto a locadora restituir as rendas que a locatária lhe<br />
entregou, e sem contrapartida, porque BCP Leasing concebeu e aceitou, para tarde<br />
demais desdizer, nem sequer <strong>te</strong>r havido financiamento de que a outra tivesse sido<br />
beneficiária.<br />
(m) E nesta direcção procede ainda assim o pedido de reembolso dos prémios<br />
de seguro do automóvel, a que o contrato revogado obrigava a A.: a lógica é<br />
exactamen<strong>te</strong> a mesma e nela nada in<strong>te</strong>rfere a nulidade da transmissão do veículo<br />
para BCP Leasing, porque o tomador do seguro seria sempre <strong>te</strong>rceiro, nes<strong>te</strong> caso.<br />
(n) Tudo visto, e os arts. 217/1, 224, 225, 230/1 e 406/1 CC, decidem, julgar<br />
improceden<strong>te</strong>, como vimos já, o <strong>Ag</strong>ravo, mas revogar a sen<strong>te</strong>nça recorrida e<br />
substituí-la por es<strong>te</strong> acórdão em que julgam proceden<strong>te</strong> o pedido e improceden<strong>te</strong> a<br />
reconvenção.<br />
IX. Custas – ficou a constar: do <strong>Ag</strong>ravo, pela <strong>Ag</strong>.e e da <strong>Ap</strong>elação pela <strong>Ap</strong>.a,<br />
sucumben<strong>te</strong>s.<br />
44 Vd. arts. 217/1, 224, 225, 230/1 e 406/1 CC.<br />
No modo tácito da declaração negocial de BCP Leasing pode pôr-se o problema de estar incluída a<br />
cláusula, habitual em comércio (e a A. é também comercian<strong>te</strong>) de reserva de boa cobrança. Contudo, não<br />
há, nem seria natural que houvesse, no acordo criminal o mínimo de dedutível correspondência<br />
verbalizada, ou espectável ou razoável, peran<strong>te</strong> as circunstâncias concretas, a esse sentido implícito no<br />
desígnio da R. reconvin<strong>te</strong>: absurdo seria que num acordo, depois homologado por sen<strong>te</strong>nça, coubesse a<br />
dúvida de princípio sobre o cumprimento das obrigações nele estipuladas. O arco normativo que vai do<br />
art. 236/1 ao art. 239 CC só nos pode portanto dar indicação para valer o sentido negocial que a A., nessas<br />
circunstâncias, poderia naturalmen<strong>te</strong> <strong>te</strong>r deduzido do comportamento da declaran<strong>te</strong>: são firmes os acordos<br />
judiciais.<br />
26
X. Reclamação, do MP, nos <strong>te</strong>rmos dos arts. 666/2, 667/1, 716 e 749 CPC – o<br />
acórdão é omisso quanto às custas devidas na 1ª instância.<br />
XI. Resposta: não houve.<br />
XII. Cumpre apreciar e decidir:<br />
A mera leitura imediata da condenação em custas (IX.), demonstra a razão do<br />
Digno Procurador-geral da República (Adjunto), pelo que ao <strong>te</strong>xto será<br />
substituído, na lógica no entanto do que já decorria do fragmento publicado:<br />
IX. Custas: pela <strong>Ap</strong>.a sucumben<strong>te</strong>, incluindo as da <strong>Ap</strong>elação; do <strong>Ag</strong>ravo pela<br />
<strong>Ag</strong>.e.<br />
XIII. Custas: sem custa, por não serem devidas.<br />
27