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No meio fio tinha uma imagem (pdf)

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NO MEIO FIO TINHA UMA IMAGEM<br />

Arte urbana, slides urbanos... Que experiência é essa a que se propõem estes artistas<br />

ao deixarem colados em paredes, latas de lixo, postes, pequenos pedaços de papel<br />

impressos com seus desenhos, palavras ou frases?<br />

Experiência que nos convida a andar pela cidade, em nossos diferentes trajetos e<br />

itinerários e nos deter ante a um pequeno desenho de um pássaro defecando, ou ainda<br />

diante de três pequenos fantasmas sorrindo...Da aceitação do convite inicial a parar e deter<br />

nosso olhar, para estas expressões artísticas somos levados, a partir daí, a nos envolver num<br />

jogo de “caça” a estes pequenos tesouros urbanos. Eles podem estar em qualquer lugar,<br />

inscrevendo-se na paisagem urbana de um modo totalmente novo, porque não se associam<br />

nem a arte do grafite – arte mural e de grandes proporções – nem tampouco aquelas<br />

manifestações dos pichadores, em sua luta pela posse do espaço (marcando) e de produção<br />

de sentido. O que há de novo nos slides urbanos é justamente esse convite ao jogo<br />

encantado com seu “público” que passa a procurá-los em lugares às vezes inusitados como<br />

no rodapé das paredes ou dos paralelepípedos rente a calçada, ou ainda fixados em portas<br />

ou pontos degradados do espaço urbano.<br />

A arte urbana, como prática cultural e social passa a atuar e ativar os imaginários<br />

sociais. Num primeiro nível, isso ocorre pela possibilidade de conjunção deste duplo<br />

anonimato – de seus criadores e de seu público – no vínculo que proporciona através de<br />

suas obras. De passantes apresados na multidão, que nada vem com seus sentidos<br />

embotados pelo excesso – de pessoas, de automóveis, de barulhos, de <strong>imagem</strong>, de apelos<br />

aos reclames. Somos pungidos por estas pequenas figuras, o olhar detêm-se, a pressa é<br />

contida e ao prosseguir nosso caminho, carregamos na memória apenas a lembrança de um<br />

encantamento. Em outro nível, pelo desa<strong>fio</strong> ao estabelecido das artes que ocupa os salões,<br />

museus e galerias institucionalizados. Expressão de arte das margens, das posições<br />

liminares, dos outsiders, extraindo daí sua força e sua independência.<br />

Arte urbana, contingência e necessidade, efêmera e fragmentária, anônima e<br />

pungente. É sobre esta nova experiência em curso que somos convidados a refletir e<br />

perceber a capacidade que ela tem de provocar a quebra em nossos automatismos<br />

cotidianos de passantes indiferentes e imersos na multidão. Foi Walter Benjamin que disse<br />

ALEGRAR nº 3 - 2006 - ISSN: 1808-5148<br />

www.alegrar.com.br


que a possibilidade de emancipação poderia ocorrer no interior das massas, através destes<br />

diferentes <strong>meio</strong>s como o cinema, a fotografia e mesmo nos movimentando no <strong>meio</strong> da<br />

multidão nas ruas das grandes cidades. Como passantes ou como flâneur, poderíamos ser<br />

atingidos – através daquela <strong>imagem</strong> de um raio que liga a terra ao céu – e assim despertar<br />

nossa consciência.<br />

Talvez estes pequenos slides urbanos possam provocar <strong>uma</strong> mudança – não pela via<br />

de <strong>uma</strong> arte “engajada” – mas pela possibilidade de enfrentar este desa<strong>fio</strong> contemporâneo<br />

que é o de qualificar a vida pública e o espaço público politizando-o. Penso que até agora<br />

este desa<strong>fio</strong> tem sido enfrentado com criatividade e liberdade por estes artistas, aos quais<br />

desconheço nomes, idades e suas faces, mas aos quais encontro-me vinculada.<br />

Ana Luisa Fayet Sallas – Professora do Departamento de Ciências Sociais da UFPR,<br />

coordenadora do Grupo de Estudos Imagem e Conhecimento. analuisa@ufpr.br<br />

ALEGRAR nº 3 - 2006 - ISSN: 1808-5148<br />

www.alegrar.com.br

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