1 A Pregação e o pregador
1 A Pregação e o pregador
1 A Pregação e o pregador
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
1<br />
“O púlpito conduz o mundo” (Herman Melville).<br />
A <strong>Pregação</strong> e<br />
o <strong>pregador</strong><br />
A pregação é uma arte e os <strong>pregador</strong>es cristãos foram os que melhor<br />
desenvolveram a arte da pregação. Não se consegue separar cristianismo da<br />
pregação: os dois se amalgamaram ao longo da história. No Antigo Testamento<br />
temos exemplos de como os longos discursos ou pregações comunicavam<br />
ao povo as palavras de Deus. Moisés, Josué, Neemias, Esdras e os<br />
profetas, todos discursavam ao povo transmitindo as palavras de Deus. Boa<br />
parte do livro de Deuteronômio se compõe de pregações que Moisés repetiu<br />
ao povo de Deus no deserto.<br />
Assim, não se pode viver sem a pregação porque o cristianismo é na<br />
realidade uma fusão de Deus e de sua palavra transmitida aos homens. O<br />
próprio cristianismo se tornou sinônimo de pregação, pois através dela as<br />
pessoas são confrontadas com as verdades da palavra de Deus.<br />
Apesar das evidências de que desde os tempos antigos os homens<br />
aprenderam a arte de discursar ou de pregar, quem mais desenvolveu a técnica<br />
do discurso foram os gregos e estes infl uenciaram todo o mundo romano,<br />
e, consequentemente a nação de Israel. O helenismo pode ser visto na cultura<br />
judaica nos dias de Jesus.<br />
Sócrates, fi lósofo da antiga Grécia e que viveu nos anos 470-399 a.C.<br />
[ 15 ]
Josué Gonçalves & João A. de Souza Filho<br />
parece haver infl u enciado o mundo grego com sua maneira de discursar. Daí<br />
vem o estilo de pregação socrático, em que o <strong>pregador</strong> discursa e se empolga<br />
fazendo perguntas e respondendo as mesmas perguntas aos seus ouvintes.<br />
(A propósito, a pregação socrática comum entre os pentecostais vem dando<br />
lugares às pregações dialogais, conversas e ensinamentos que às vezes se tornam<br />
monótonos. Não que seja errado, pois é uma forma de se comunicar o<br />
ensino da palavra de Deus, mas a característica dos grandes <strong>pregador</strong>es do<br />
passado sempre foi a do discurso em voz alta, fi rme, forte e em tom solene,<br />
assunto que será abordado mais adiante).<br />
Depois de Sócrates surge a imponente fi gura de Demóstenes (384-322<br />
a.C.) que devido as difi culdades de se expressar e falar aperfeiçoou a dicção<br />
colocando pequenas pedras na boca enquanto falava. Fazia também parte de<br />
seu treinamento declamar em plena corrida. Olhava-se demoradamente num<br />
grande espelho para ver se sua expressão<br />
causava impacto. “Vem daí a reputação de<br />
não ter sido bem dotado pela natureza e só<br />
É preciso eliminar<br />
a idéia preconcebida de<br />
que pregar é entregar um<br />
sermão, ou discursar<br />
conforme certas regras<br />
homiléticas canônicas.<br />
haver adquirido habilidade e força oratória<br />
pelo trabalho incansável”, escreveu Plutarco.<br />
Ao contrário de outros grandes oradores<br />
atenienses, Demóstenes não gostava de improvisar.<br />
Mais tarde Roma conheceu Cícero<br />
ou Marco Túlio Cícero (106-43 a.C.) um<br />
dos maiores oradores do senado romano.<br />
Cícero, na oratória clássica é o equivalente<br />
romano do grego Demóstenes. Pela sua voz,<br />
postura, gênio, paixão e capacidade de improvisação era dotado para o exercício<br />
da eloquência.<br />
Mas esses grandes oradores discursavam fi losofi a, política e desenvolveram<br />
a arte da oratória para comunicar idéias e pensamentos, diferentemente<br />
dos <strong>pregador</strong>es cristãos do primeiro século que desenvolveram a<br />
arte da oratória ou da pregação para comunicar, não as suas palavras, mas as<br />
palavras de Deus. Pode ser que nossos primeiros apóstolos, especialmente<br />
Paulo tenha estudado a arte da oratória nas escolas gregas da época – certamente<br />
havia este currículo nas escolas – e assimilaram a cultura grega para<br />
[ 16 ]
comunicar as verdades do evangelho.<br />
A diferença entre a oratória dos advogados e fi lósofos gregos e romanos<br />
para os discursos infl amados dos <strong>pregador</strong>es cristãos é que estes utilizaram<br />
a pregação para comunicar aos homens as verdades da palavra de<br />
Deus enquanto aqueles discursavam pensamentos e ideias. Os <strong>pregador</strong>es<br />
buscavam nas Escrituras a fonte e a inspiração, portanto, não faziam discursos<br />
vazios e ocos, mas traziam na arte de falar o fogo da palavra de Deus.<br />
É entendimento de alguns que a arte do discurso é a ferramenta usada<br />
para defesa e exposição de idéias, enquanto a pregação tem a idéia de uma<br />
exposição ou apresentação de um tema, no<br />
caso, a palavra de Deus.<br />
Os grandes discursos ou pregações<br />
feitas por Pedro e Paulo no Novo Testamento<br />
mostram que estes dois apóstolos<br />
comunicavam muito bem o evangelho através<br />
da pregação e da exposição da palavra<br />
de Deus. James Hastings afi rma que a idéia<br />
de pregação da qual Paulo fala em Gálatas<br />
2.2 e em 1 Tessalonicenses 2.9 (no grego khrussw kerusso) carrega o conceito<br />
de “arauto ou proclamador” das boas-novas, 1 portanto, diferentemente do<br />
conceito dos discursos gregos. Ele afi rma ainda que a pregação cristã possui<br />
conteúdo que é o evangelho de Jesus Cristo; o evangelho da graça de Deus e<br />
a proclamação do Cristo, o Filho de Deus.<br />
A ênfase da pregação é exclusivamente do cristianismo. Os revisores<br />
de nossas versões bíblicas colocaram títulos interessantes, como “O discurso<br />
de Pedro” que a Revista e Atualizada apresenta em Atos 3. Ou “Paulo discursa<br />
perante o rei Agripa” (At 26) e “Paulo prega em Roma” (At 28.31). Para<br />
a época, os revisores acertaram usando a palavra discurso, hoje, no entanto,<br />
o melhor termo é pregação.<br />
Hastings acrescenta:<br />
É preciso eliminar a idéia preconcebida de que pregar é entregar um<br />
1 HASTIGNS, James, Dicitionary of the Apostolic Church, Scribners, Vol II p 258<br />
[ 17 ]<br />
A <strong>Pregação</strong> e o Pregador<br />
A pregação é a parte<br />
essencial e a<br />
característica distintiva<br />
do Cristianismo.
Josué Gonçalves & João A. de Souza Filho<br />
sermão, ou discursar conforme certas regras homiléticas canônicas. Que<br />
a mensagem era sempre apoiada por textos do Antigo Testamento, disso<br />
não se duvida; mas a pregação apostólica não se restringia à menção de<br />
textos bíblicos. Era uma pregação espontânea, uma proclamação plena<br />
de autoridade da verdade, fruto da experiência do homem e explicável<br />
somente à luz da encarnação, morte e ressurreição de Jesus Cristo como<br />
salvador dos homens. 2<br />
Edwin Charles Dargan autor de History of Preaching (História da <strong>Pregação</strong>)<br />
maior autoridade em pregação do passado afi rmou que “a pregação<br />
é parte essencial e característica distintiva do cristianismo” e “a pregação é<br />
distintivamente uma instituição cristã”. 3 Os <strong>pregador</strong>es cristãos não repetem<br />
as tradições da história, como o fazem os mestres e gurus de algumas<br />
religiões; os <strong>pregador</strong>es cristãos advogam o direito de serem porta-vozes e<br />
embaixadores de Deus e de sua palavra e seguem ao pé da letra a orientação<br />
de Pedro:<br />
“Quem prega pregue a palavra de Deus; quem serve sirva<br />
com a força que Deus dá. Façam assim para que em tudo Deus<br />
seja louvado por meio de Jesus Cristo, a quem pertencem a glória<br />
e o poder para todo o sempre! Amém!” (1 Pe 4.11 – NTLH<br />
– destaque do autor).<br />
Portanto, pregar não é simplesmente fazer discursos e sermões. Pregar<br />
é falar em nome de Deus. Fala-se o que a palavra de Deus diz e o que se<br />
depreende das Escrituras Sagradas. É neste contexto que o termo pregação<br />
deve ser entendido.<br />
Paulo dava muita importância à pregação e expõe seu ponto de vista<br />
em 1 Coríntios 2.1-5:<br />
“Eu, irmãos, quando fui ter convosco, anunciando-vos o testemunho<br />
de Deus, não o fi z com ostentação de linguagem ou<br />
de sabedoria. Porque decidi nada saber entre vós, senão a Jesus<br />
Cristo e este crucifi cado. E foi em fraqueza, temor e grande tremor<br />
que eu estive entre vós. A minha palavra e a minha pregação<br />
não consistiram em linguagem persuasiva de sabedoria, mas em<br />
2 Ibid, p 258<br />
3 DARGAN, E.C. History of Preaching, Vol. I às pp 12 e 552.<br />
[ 18 ]
demonstração do Espírito e de poder, para que a vossa fé não se<br />
apoiasse em sabedoria humana, e sim no poder de Deus”.<br />
Para Paulo a pregação da palavra de Deus era importante para a conversão<br />
das pessoas. Ele pergunta: “Como, porém, invocarão aquele em quem<br />
não creram? E como crerão naquele de quem nada ouviram? E como ouvirão,<br />
se não há quem pregue? E como pregarão, se não forem enviados? Como<br />
está escrito: Quão formosos são os pés dos que anunciam coisas boas!” (Rm<br />
10.15).<br />
O conceito bíblico de pregação, portanto é o de um anúncio em que<br />
o arauto proclama de algo novo, as boas-novas. Atribui-se ao teólogo C.H<br />
Dodd a separação da mensagem do evangelho entre kerigma e o didaskalós.<br />
O Kerigma é a proclamação da mensagem, ou o anúncio do evangelho. Faz<br />
parte da proclamação do evangelho a mensagem que anuncia a vida, morte<br />
e ressurreição de Jesus; que apresenta a salvação, o perdão dos pecados e a<br />
vida eterna, enquanto o didaskalós ou o ensinamento estabelece as bases da<br />
dou trina apostólica e o comportamento do cristão em relação a Cristo, aos<br />
irmãos e ao mundo que o cerca. Numa linguagem simples pode-se afi rmar<br />
que o kerigma ou pregação aponta o caminho, enquanto a didaskalos ensina<br />
como andar no caminho. Obviamente que R.C.Worley, em Preaching and Teaching<br />
in the Earliest Church (Pregando e Ensinando na Igreja Primitiva) discorda,<br />
afi rmando que não existe esta separação entre a obra de um evangelista<br />
e a de um <strong>pregador</strong>. 4 Que tanto o didaskaloi (o mestre) quanto o evangelista<br />
pregavam, proclamavam e ensinavam, estabelecendo a conduta dos novos<br />
cristãos.<br />
A pregação e o ensinamento parecem ter ocupado o tempo de Jesus.<br />
“Depois de João ter sido preso, foi Jesus para a Galiléia, pregando<br />
o evangelho de Deus, dizendo: O tempo está cumprido,<br />
e o reino de Deus está próximo; arrependei-vos e crede no<br />
evangelho” (Mc 1.14-15 – destaque do autor).<br />
E se cumpria a profecia de Isaías de que ele pregaria as boas-novas do<br />
Evangelho.<br />
4 GREEN, Michael, Evangelism in the Early Church, Highland Books, Inglaterra, p 246<br />
[ 19 ]<br />
A <strong>Pregação</strong> e o Pregador
Josué Gonçalves & João A. de Souza Filho<br />
“O Espírito do Senhor Deus está sobre mim, porque o Senhor<br />
me ungiu para pregar boas-novas aos quebrantados, envioume<br />
a curar os quebrantados de coração, a proclamar libertação<br />
aos cativos e a pôr em liberdade os algemados; a apregoar o ano<br />
aceitável do Senhor e o dia da vingança do nosso Deus; a consolar<br />
todos os que choram” (Is 61.1-2 – destaque do autor).<br />
E. C. Dargan em History of Preaching (História da <strong>Pregação</strong>) diz que “o<br />
fundador do cristianismo foi, pessoalmente, o primeiro dos seus <strong>pregador</strong>es;<br />
foi antecedido por seu precursor e seguido pelos seus apóstolos. E na pregação<br />
destes a proclamação e ensino da palavra<br />
de Deus se tornaram a característica principal da<br />
A pregação ocupou a<br />
terça parte do<br />
ministério terreno<br />
de Jesus.<br />
religião cristã” 5<br />
O Kerigma ou proclamação tem como<br />
fonte a palavra de Deus. Toda pregação tem de<br />
ter fundamentação nas Escrituras, do contrário<br />
será mero discurso fi losófi co, como muitos <strong>pregador</strong>es<br />
que hoje baseiam suas mensagens em<br />
conceitos de fi losofi a moderna falando apenas<br />
sobre autoestima, autoajuda e apelos pessoais, esquecendo da mensagem revelada<br />
pelo Espírito Santo das Escrituras. Não que não se pregue sobre o<br />
valor da autoestima, desde que o tema esteja fundamentado nas Escrituras<br />
bíblicas.<br />
Assim, quem prega, fala no lugar de Deus. Disse Jesus: “Eu vos envio<br />
como o Pai me enviou.” A pregação ocupou a terça parte do ministério pessoal<br />
de Jesus. “Percorria Jesus toda a Galiléia, ensinando nas sinagogas, pregando<br />
o evangelho do reino e curando toda sorte de doenças e enfermidades<br />
entre o povo” (Mt 4.23).<br />
Se dermos à pregação o prestígio que o Senhor lhe deu, ele nos dará o<br />
mesmo êxito que ele alcançou.<br />
“Os ministros são embaixadores de Deus e falam em nome de<br />
Deus. Se pregarem aquilo que se fundamenta nas Escrituras, a<br />
palavra deles, se for de acordo com a mente de Deus, deve ser<br />
5 DARGAN, E.C. History of Preaching, p 7 Vol. II<br />
[ 20 ]
considerada a de Deus. Isso é asseverado por nosso Senhor e<br />
pelos seus apóstolos. Devemos, portanto, acolher a palavra do<br />
<strong>pregador</strong> como a palavra do próprio Deus. Com que humildade,<br />
portanto, devemos prestar atenção a ela!” 6<br />
O <strong>pregador</strong> interpreta os sentimentos de Deus e os do homem; o <strong>pregador</strong><br />
jorra a luz de Deus no obscuro coração do homem. C.H. Dodd afi rmava<br />
que o Novo Testamento é constituído, em sua maior parte de pregação<br />
apostólica guardada pela igreja primitiva. 7<br />
A pregação e seu<br />
contexto cultural<br />
Culturas aparecem e desaparecem no decorrer dos milênios, mas a<br />
cultura da pregação do Evangelho tem permanecido desde os dias de Jesus<br />
e de seus discípulos. “Deus me ungiu para pregar as boas-novas”, afi rmou<br />
Jesus.<br />
Um estudo minucioso de Atos e das epístolas permite ver a pregação<br />
apostólica em três dimensões: Primeiramente na característica individual de<br />
cada <strong>pregador</strong>, na natureza do público ouvinte e nos vários estágios do desenvolvimento<br />
da mensagem. 1. Ela era uma pregação messiânica quando pregada<br />
para os judeus. Pedro e Paulo souberam explorar este aspecto cultural e religioso<br />
dos judeus provando que Jesus era de fato o Messias anunciado pelos<br />
profetas e que era necessário arrependimento dos pecados e fé em Cristo Jesus<br />
para ser serem salvos. 2. Ela era missionária quando pregada aos gentios ou<br />
pagãos. Paulo sabia explorar os conceitos negativos que os pagãos ti nham de<br />
Deus falando da idolatria, das superstições e da noção e rrada que os pagãos<br />
tinham de Deus. 3. Ela era uma pregação edifi cante quando os apóstolos pregavam<br />
para congregações mistas de judeus e gentios. Eles ensinavam que os<br />
muros que separavam judeus de gentios foram derrubados pela obra expiatória<br />
de Jesus Cristo. Em todos, porém, o conteúdo era o mesmo: eles anunciavam<br />
a Deus e a Jesus Cristo; proclamavam a ressurreição e o messianismo<br />
6 WISDON, In Eu Creio na <strong>Pregação</strong>, John Stott, Editora Vida p 36<br />
7 DODD, C.H. The Apostolic Preaching and its Development, Londres, Hodder & Stoughton, 1936, in Blackwood,<br />
Preparação de Sermões, ASTE, p 17.<br />
[ 21 ]<br />
A <strong>Pregação</strong> e o Pregador
Josué Gonçalves & João A. de Souza Filho<br />
de Jesus, sua morte e sua obra expiatória realizada na cruz como essenciais<br />
para a salvação da humanidade.<br />
A forma de se pregar pode variar de país para país e de tempos em<br />
tempos. Os grandes proclamados da pós-reforma como George Whitefi eld,<br />
João Wesley, na Inglaterra e Jonathan Edwards nos Estados Unidos, e tantos<br />
outros utilizaram da pregação para a transformação da sociedade. João Wesley<br />
provocou uma revolução social na Inglaterra pregando para os trabalhadores<br />
das minas de carvão. Vez que outra aparece um fi lme retratando como era a<br />
vida dos americanos do passado, e entre eles a fi gura do <strong>pregador</strong> da palavra<br />
de Deus. Filmes retratando bem ou mal a fi gura do <strong>pregador</strong> empunhando a<br />
Bíblia faz parte da cultura americana.<br />
Tempos atrás os <strong>pregador</strong>es escreviam seus sermões e os liam diante<br />
da congregação. Jonathan Edwards quando pregou seu famoso sermão Pecadores<br />
nas Mãos de um Deus Irado, em 8 de Julho de 1741 não o fez como fazem<br />
hoje os <strong>pregador</strong>es pentecostais com a voz em alta frequência e imponência,<br />
transpirando por todo o corpo, receosos de usar um esboço para não parecer<br />
que não se deixam ser usados pelo Espírito Santo de Deus. Ele leu seu sermão<br />
pausadamente com os óculos na ponta do nariz e deixou que o texto e a<br />
unção do Espírito Santo tocassem os corações. Por isso a história registra que<br />
as pessoas se seguravam nos bancos com medo de cair no inferno, gritando<br />
arrependidas de seus pecados. Os sermões lidos se perpetuaram; os sermões<br />
inspirativos se perderam na história.<br />
A pregação e o púlpito sempre se fi zeram presentes ou estiveram por<br />
trás das revoluções espirituais, que se traduziram em revoluções sociais. A<br />
igreja brasileira tem a força necessária para mudar socialmente o Brasil, tanto<br />
espiritual quanto socialmente, mas, ao que parece a falta de <strong>pregador</strong>es consistentes<br />
com a mensagem bíblica e a ausência de mensagens transformadoras<br />
não vem revolucionando a sociedade. A força de uma mensagem bíblica<br />
pregada através do púlpito é negligenciada pelos <strong>pregador</strong>es.<br />
Herman Melville na obra clássica Moby Dick relata como Ismael, o<br />
protagonista do romance assistiu ao culto na capela frequentada por pescadores<br />
de baleias antes de se lançar na aventura de caçar o maior cachalote<br />
dos oceanos. Melville descreve a capela junto ao porto de onde partiam os<br />
baleeiros. O <strong>pregador</strong> que se chamava Mapple subiu ao púlpito por uma es-<br />
[ 22 ]
cada semelhante as que sobem lateralmente pelo casco do navio. A escada<br />
terminava na metade da parede e era necessário alcançar uma corda feita de lã<br />
penteada, avermelhada que a esposa de um marujo havia tecido. O <strong>pregador</strong><br />
“com a destreza de um marujo, mas sempre venerável, mão após mão subiu<br />
os degraus como se ascendesse para o cesto da gávea maior de seu navio”<br />
e segurando-se nos nós das cordas alcançou o púlpito. Puxou para cima as<br />
cordas e fi cou só, no alto, olhando para sua congregação embaixo.<br />
Herman Melville descreve detalhadamente o púlpito e a pregação de<br />
Mapple para aquela congregação de marujos. Uma pintura atrás do púlpito<br />
mostrava um navio enfrentando bravamente uma tempestade “fora da proteção<br />
de uma costa de rochas negras e da<br />
nevada arrebentação. Mas, ao alto, acima<br />
dos nimbos esvoaçantes e das nuvens<br />
negras, fl utuava uma ilhota de luz solar,<br />
da qual se destacava, radioso, um rosto<br />
de anjo. E essa face resplendente lançava<br />
uma inconfundível mancha de luz sobre<br />
o convés agitado do navio, e o anjo parecia<br />
dizer ‘prossegue, prossegue, nobre<br />
navio; pois vê, o sol está irrompendo; as<br />
nuvens se dissipam e está ao teu alcance<br />
o azul mais sereno’”.<br />
A frente do púlpito se parecia à proa de navio, “e a Santa Bíblia descansava<br />
numa projeção de obra ornamental, que imitava o exporão de uma<br />
nau, encimado por um anteparo de mesa. Que podia existir de mais signifi cativo?<br />
– Pois o púlpito é sempre a parte mais adiantada da terra; tudo o mais<br />
vem depois dele: O púlpito conduz o mundo. Dele se divisa em primeiro<br />
lugar a tempestade da viva cólera de Deus, e a proa deve aguentar o primeiro<br />
impacto. Dele é que primeiro se clama por ventos favoráveis ao Deus das<br />
brisas propícias ou adversas. Sim, em sua travessia, e não viagem completa, o<br />
mundo é um navio; e o púlpito é a proa dele”. 8<br />
“O púlpito conduz o mundo” é a visão de Herman Melville que traduz<br />
a cultura cristã americana e européia para os demais povos da terra. Ele está<br />
8 MELVILLE, Herman em Moby Dick Vol. I 1980 Editora Abril pp 63-65<br />
[ 23 ]<br />
A <strong>Pregação</strong> e o Pregador<br />
... o púlpito sobre o qual<br />
pregam a<br />
Palavra de Deus<br />
determinará o destino<br />
da humanidade.
Josué Gonçalves & João A. de Souza Filho<br />
dizendo que o <strong>pregador</strong>, do alto de seu púlpito tem a destreza de um capitão<br />
que comanda o navio; que o <strong>pregador</strong> conduz o mundo com as palavras de<br />
Deus.<br />
A descrição que Melville faz do sermão de Mapple é impressionante.<br />
O leitor pode ler o sermão que ele pregou para os marinheiros em Moby Dick.<br />
Contudo, o autor descreve como o <strong>pregador</strong> convoca seus ouvintes, os marujos:<br />
“Aí do passadiço de estibordo, mexei-vos para bombordo! Do passadiço<br />
de bombordo, pra estibordo! No meio do navio! No meio do navio!”.<br />
Mapple antes de pregar sobre Jonas e seu infortúnio de ser engolido<br />
por um grande peixe, antes de falar àquela gente rude do mar sobre as consequências<br />
da desobediência, ajoelhou-se “na proa do púlpito (...) e parecia<br />
estar ajoelhado e orando no fundo do mar. Terminada a prece, em tons prolongados<br />
e solenes, como o contínuo bater de um sino em navio que esteja<br />
afundando-se em nevoeiro marinho, em tais tons ele começou a ler o seguinte<br />
hino; mas, mudando nas estâncias fi nais, irrompeu em ribombante exultação<br />
e alegria:<br />
“Costelas e terrores de baleia<br />
Sobre mim com negror funesto se curvaram,<br />
Enquanto, ao lado, ao sol rolavam ondas,<br />
Que me ergueram na crista e logo se abismaram.<br />
A goela aberta eu divisei do inferno,<br />
Onde existiam dor e infi nda provação;<br />
Podem dizer somente os que as sofreram!<br />
Eu mergulhava em plena desesperação.<br />
Do fundo da afl ição clamei por Deus,<br />
Quando no seu auxílio eu não podia crer;<br />
Ele prestou ouvido às minhas queixas;<br />
E deixou a baleia de me acometer.<br />
Ele precipitou-se em minha ajuda,<br />
Como se transportado por delfi m radiante;<br />
A face de meu Deus e Salvador<br />
[ 24 ]
Terrível se mostrou, relâmpago brilhante.<br />
Daquele instante horrível e feliz<br />
A minha voz perpetuará a reminiscência;<br />
A glória, reconheço é de meu Deus,<br />
Pertence-lhe o poder, pertence-lhe a clemência. 9<br />
Assim, Melville mergulha na cultura daquele tempo descrevendo uma<br />
igreja à beira-mar, junto ao porto de onde saíam os caçadores de baleias. E<br />
sua frase não deve ser ignorada: “O púlpito conduz o mundo !”<br />
Ah! Se soubessem disso todos os que sobem ao púlpito para pregar a<br />
palavra de Deus; soubessem os <strong>pregador</strong>es que suas palavras determinarão<br />
o destino da humanidade comportar-se-iam como verdadeiros emissários e<br />
embaixadores de Deus. Não falariam coisas vãs nem se preocupariam com<br />
o conforto ou desconforto de seus ouvintes, porque o púlpito sobre o qual<br />
proclamam as boas-novas de Deus determinará o destino da humanidade.<br />
Dessa forma os grandes <strong>pregador</strong>es sempre estiveram perto de seus<br />
ouvintes falando-lhes numa linguagem que entendiam. O <strong>pregador</strong> rural, que<br />
conhece a labuta do campo; o <strong>pregador</strong> que tem como ouvintes os metalúrgicos;<br />
os que têm como ouvintes a nova geração da cibernética, da era dos<br />
computadores; o <strong>pregador</strong> das áreas de risco, morros e favelas de nossas cidades;<br />
o <strong>pregador</strong> que têm surfi stas como ouvintes, sabem como comunicar<br />
o recado de Deus na cultura de cada segmento da sociedade. Conforme afi rmou<br />
A.W.Blackwood em seu livro Preparação de Sermões, “a pregação devia<br />
ser considerada a mais nobre tarefa que existe na terra”. 10<br />
Às vezes uma pregação pode se resumir numa única frase e seu efeito<br />
depende das circunstâncias e dos ouvintes. Numa noite fria deveria eu pregar<br />
para uma centena de obreiros que se reuniam semanalmente no templo sede<br />
da igreja. O teto do templo era de zinco e o prédio estava em construção. Um<br />
frio gélido desceu sobre a congregação que congelava apesar dos pesados<br />
casacões e das botas que a maioria usava. Havia um acordo de que o culto<br />
não deveria se estender além de nove e meia da noite porque os obreiros<br />
9 Ibid p 66<br />
10 BLACKWOOD, A. W. A Preparação de Sermões, ASTE, São Paulo 1965 p 14<br />
[ 25 ]<br />
A <strong>Pregação</strong> e o Pregador
Josué Gonçalves & João A. de Souza Filho<br />
daquela cidade industrial se levantavam ainda de madrugada para trabalhar.<br />
Mas, quando o dirigente do culto se deu conta faltavam três minutos para o<br />
término do culto. Foi quando ele me cedeu o púlpito, dizendo: Vamos ouvir<br />
a palavra de Deus, apesar do adiantado da hora.<br />
Olhei a congregação e pensei: Meu Deus! Minha pregação deverá durar,<br />
pelo menos 45 minutos para que todos entendam. Melhor é não pregar.<br />
Num lance repentino falei aos irmãos: Queridos, sei do adiantado da hora,<br />
mas preciso lhes pregar a palavra de Deus, portanto, abram suas Bíblias em<br />
João 7.53. Esperei que abrissem o texto e pedi que todos lessem o texto<br />
repetindo comigo: “E cada um foi para sua casa”. Olhando fi xamente aquele<br />
grupo de valorosos obreiros, lhes disse: Diga pro seu irmão: Vamos pra casa!<br />
E despedi o culto com os obreiros repetindo esta frase bíblica uns para os<br />
outros. Todos foram pra suas casas para o aconchego dos cobertores quentes.<br />
Foi o menor sermão que preguei! E foi o que mais impactou aqueles obreiros.<br />
A vida do <strong>pregador</strong><br />
A maior parte dos livros fala muito sobre pregação, e pouco sobre a<br />
vida do <strong>pregador</strong>, exceção ao livro 18 Chaves Para o Sucesso do Ministério<br />
Pastoral 11 em que o autor trata basicamente da vida pessoal do <strong>pregador</strong>.<br />
Não se pode falar sobre pregação sem considerar a vida do <strong>pregador</strong>.<br />
O ministério da pregação da palavra não é tão simples como muitos pensam,<br />
porque o sucesso da pregação deveria estar associado à vida de quem prega.<br />
Mas, nem sempre é assim. Hoje existem muitos <strong>pregador</strong>es de sucesso cuja<br />
vida particular não condiz com as verdades que pregam. Tais <strong>pregador</strong>es<br />
sequer seriam convidados e aceitos nas igrejas dos primeiros séculos, pois,<br />
já naquele tempo os apóstolos compilaram o Didaquê, ou ensino do Senhor<br />
por meio dos doze apóstolos. Na realidade o Didaquê por pouco não entrou<br />
no cânone do Novo Testamento – e bem que poderia fazer parte das cartas<br />
apostólicas, tal qual o livro de Hebreus.<br />
11 SOUZA FILHO, João A. Editora Mensagem Para Todos<br />
[ 26 ]
Assim como os judeus compilaram uma série de regulamentos e de<br />
orientações aos judeus dispersos, baseados nas leis de Moisés, conhecidas<br />
como Talmude – existem os Talmudes Babilônicos e o de Jerusalém que<br />
foram escritos como orientações aos judeus espalhados pelo mundo, assim o<br />
Didaquê era também uma série de orientações aos cristãos espalhados pelo<br />
mundo da época.<br />
Se vier alguém até você e ensinar tudo o que foi dito anteriormente,<br />
deve ser acolhido. Mas se aquele que ensina é perverso e ensinar outra doutrina<br />
para lhe destruir, não lhe dê atenção. No entanto, se ele ensina para<br />
estabelecer a justiça e conhecimento do Senhor, você deve acolhê-lo como se<br />
fosse o Senhor. Já quanto aos apóstolos e profetas, faça conforme o princípio<br />
do Evangelho. Todo apóstolo que vem até você deve ser recebido como o<br />
próprio Senhor. Ele não deve fi car mais que um dia ou, se necessário, mais<br />
outro. Se fi car três dias é um falso profeta. Ao partir, o apóstolo não deve<br />
levar nada a não ser o pão necessário para chegar ao lugar onde deve parar.<br />
Se pedir dinheiro é um falso profeta. 12<br />
Esta última frase indica como os apóstolos tratavam seriamente a<br />
questão do dinheiro. Apesar de serem rígidos com os <strong>pregador</strong>es, os apóstolos<br />
orientaram as igrejas a recebê-los e honrá-los como servos de Deus.<br />
Todo verdadeiro profeta que queira estabelecer-se em seu meio é<br />
digno do alimento. Assim também o verdadeiro mestre é digno do seu alimento,<br />
como qualquer operário. Assim, tome os primeiros frutos de todos<br />
os produtos da vinha e da eira, dos bois e das ovelhas, e os dê aos profetas.<br />
Porém, se você não tiver profetas, dê aos pobres 13<br />
Tenho por certo que Paulo se inspirava no Talmude para continuar<br />
com sua profi ssão, porque o Talmude orientava os judeus da Dispersão a<br />
trabalharem por conta sem que fosse preciso se tornar empregado, para não<br />
viver novamente a escravidão do Egito. Especialmente orientava os rabinos a<br />
serem bons profi ssionais autônomos.<br />
Paulo parece se preocupar mais com a vida do <strong>pregador</strong> do que com<br />
estilos e modos de se pregar, se bem que, quanto ao conteúdo e ao modo,<br />
ele fala que suas pregações não foram em palavras persuasivas de raciocínio<br />
12 Didaquê 11.1-6<br />
13 Didaquê XII 1-4<br />
[ 27 ]<br />
A <strong>Pregação</strong> e o Pregador
Josué Gonçalves & João A. de Souza Filho<br />
humano, mas em demonstração do Espírito e de poder, assunto que veremos<br />
mais adiante. Dedica-se, sim, a recomendar a Timóteo e a Tito, seus colaboradores<br />
e discípulos a escolher homens segundo determinado padrão que<br />
expõe aos dois em 1 Timóteo 3 e Tito capítulo 1. Como o tema da vida do<br />
obreiro é bem explicitado nas Escrituras Sagradas, quero abordar a vida do<br />
obreiro por outra ótica, a da vida que prega mais alto que os sermões.<br />
Em Varginha, no sul de Minas existe um bairro de nome Bom Pastor<br />
e obteve esse nome devido a um bom pastor, o Bernhard Johnson que era<br />
querido de toda a comunidade. A vida daquele missionário marcou a cidade,<br />
mais que suas pregações. Pouco se ouve falar de suas pregações, mas a marca<br />
de seu pastoreio pode ser sentida até os dias de hoje.<br />
A vida do <strong>pregador</strong> deveria falar mais alto que sua voz e deveria ter<br />
isto em mente: “A minha vida deve falar mais alto que minha própria voz”,<br />
por isso Paulo roga a Tito:<br />
“Torna-te, pessoalmente, padrão de boas obras. No ensino,<br />
mostra integridade, reverência, linguagem sadia e irrepreensível,<br />
para que o adversário seja envergonhado, não tendo indignidade<br />
nenhuma que dizer a nosso respeito” (Tt 2.7-8).<br />
“Torna-te, pessoalmente, padrão de boas obras”, afi rma Paulo, o que<br />
implica que o <strong>pregador</strong> antes de ser proclamador ou querigmático deve ser<br />
o primeiro a arregaçar as mangas e trabalhar em favor do próximo. O <strong>pregador</strong>,<br />
antes de tudo é modelo de vida com suas boas obras. O que marca uma<br />
comunidade é a vida do <strong>pregador</strong> que se preocupa com o bem-estar do povo,<br />
além de se preocupar com a vida dos irmãos e membros de sua igreja. O<br />
<strong>pregador</strong>, antes de ser conhecido pela habilidade da pregação, deve se tornar<br />
conhecido pela habilidade de suas ações.<br />
O que implica dizer que não vive a maior parte do tempo trancado<br />
em seu gabinete pastoral, mas entre as pessoas e carrega nos seus poros o<br />
cheiro da gente, o cheiro das ovelhas. O <strong>pregador</strong>, portanto, é homem de<br />
boas-obras, homem de ação.<br />
Mas, nesse texto podemos ver também a preocupação de Paulo com o<br />
modo de se pregar, porque ele fala em integridade, ou exemplo de boa conduta.<br />
Os vizinhos não crentes conhecem melhor os <strong>pregador</strong>es que os membros<br />
da igreja. Recordo-me de quando um comitê enviado pela convenção<br />
[ 28 ]
dos pastores foi ao meu bairro fazer um levantamento de minha vida, não<br />
apenas entre lojistas, no barbeiro, nas ruas e entre os membros da igreja para<br />
averiguar meu comportamento, antes de ser ordenado ao santo ministério.<br />
Só fi quei sabendo do que estava acontecendo depois que o comitê partiu, e<br />
sequer imaginei que escarafuncharam minha vida pra ver se encontravam alguma<br />
falha. Que bom que isto continuasse, porque teríamos mais gente séria<br />
no ministério! Estilo de vida íntegro e irrepreensível.<br />
“É preciso que o bispo seja respeitado pelos de fora da Igreja,<br />
para que não fi que desmoralizado e não caia na armadilha do<br />
Diabo” (1 Tm 3.7 – NTLH).<br />
Uma das condições que Paulo exigia dos obreiros é que tivessem bom<br />
testemunho dos de fora, o que implica em ser conhecido da vizinhança como<br />
homem honesto e de palavra.<br />
Paulo fala também em reverência, porque muitos <strong>pregador</strong>es, jovens<br />
e velhos carecem de maior seriedade. O <strong>pregador</strong> deve levar a sério o ministério<br />
da pregação, deixando de lado frases jocosas e anedotas apimentadas,<br />
adotando uma linguagem sadia e irrepreensível. Mais adiante falaremos sobre<br />
a linguagem chula, imprópria do representante de Deus. Pode-se falar<br />
uma mesma verdade usando-se uma linguagem mais sofi sticada e apropriada.<br />
Conhecer os sinônimos de certas palavras deixam a mensagem enriquecida.<br />
Linguagem sadia e irrepreensível signifi ca pregar e viver o dia-a-dia com sobriedade.<br />
Nós os <strong>pregador</strong>es somos ouvidos e vistos e muito visados. Vivemos<br />
constantemente na vitrine da sociedade e no púlpito devemos mostrar<br />
seriedade porque representamos diretamente o nosso Deus. Ele confi a em<br />
nós.<br />
O adversário que espera de nós uma falha para apontar seu dedo acusador<br />
fi cará envergonhado, porque para Paulo, o adversário está à cata de<br />
pequenos erros para poder nos acusar, por isso, uma linguagem sadia deixa o<br />
adversário envergonhado.<br />
Um dos maiores <strong>pregador</strong>es português foi Antônio Vieira. Pregou<br />
em terras brasileiras e deixou vários volumes de suas pregações conhecidas<br />
popularmente como sermões do Padre Antônio Vieira. Dentre todos, o mais<br />
famoso é o sermão da sexagésima pregado na capela real de Lisboa em 1655<br />
logo depois de retornar do Maranhão onde trabalhou com missionário católi-<br />
[ 29 ]<br />
A <strong>Pregação</strong> e o Pregador
Josué Gonçalves & João A. de Souza Filho<br />
co. Vieira prega sobre a parábola do semeador e toca na vida do semeador.<br />
Vieira destaca a efi cácia da boa semente, mas enfatiza bastante a vida do que<br />
semeia.<br />
Ele afi rma que cinco coisas devem fi car salientes na vida do <strong>pregador</strong>:<br />
A pessoa, o conhecimento, a matéria, o estilo e a voz. E se desdobra falando<br />
da pessoa do <strong>pregador</strong> iniciando com a frase: “O <strong>pregador</strong> se defi ne pela vida<br />
e exemplo. Ter nome de <strong>pregador</strong> ou ser <strong>pregador</strong> de nome, não importa;<br />
as ações, a vida, o exemplo e as obras são as que convertem o mundo. Qual<br />
o melhor conceito que o <strong>pregador</strong> leva para o púlpito? É o conceito que os<br />
ouvintes têm dele. Antigamente convertia-se o mundo; hoje por que não se<br />
converte ninguém? Porque hoje pregam-se palavras e pensamentos; antigamente<br />
pregavam-se palavras e obras. Palavras sem obras são tiro sem bala;<br />
atroam, mas não ferem”.<br />
Noutra parte ele diz: “Por isso Cristo comparou o <strong>pregador</strong> ao semeador.<br />
O pregar, que é falar, faz-se com a boca; o pregar que é semear, faz-se<br />
com a mão. Para falar ao vento, bastam palavras; para falar ao coração são<br />
necessárias obras (...) as palavras ouvem-se; as obras veem-se”. 14<br />
A vida do <strong>pregador</strong> sempre deve falar mais alto que suas pregações.<br />
“A chama do amor do Calvário é intensa e deve causar resplendor no<br />
púlpito.” (Christmas Evans)<br />
“Se conseguirmos pregar somente Cristo para nosso povo, teremos<br />
pregado tudo a eles.” (Richard Baxter)<br />
14 VIEIRA, Antônio, Sermões, Tomo I, Lello & Irmão, Editores 1951 pp 12-13.<br />
[ 30 ]