Negócios em Transporte 1 - Revista Negócios em Transporte
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JorNada dE TraBalho<br />
Descanso obrigatório<br />
Motoristas ganham legislação própria recheada de itens que estabelec<strong>em</strong> t<strong>em</strong>po<br />
de direção e descanso, mas não têm garantia de infraestrutura<br />
Solange Hette<br />
Uma d<strong>em</strong>anda<br />
do século passado<br />
finalmente<br />
foi atendida: os<br />
motoristas profissionais<br />
acabam de ter sua<br />
categoria regulamentada. S<strong>em</strong><br />
uma legislação trabalhista ou<br />
de trânsito que cont<strong>em</strong>plasse<br />
direitos e deveres específicos<br />
da atividade, <strong>em</strong>presas e profissionais<br />
ficavam à marg<strong>em</strong> das<br />
garantias mais el<strong>em</strong>entares de<br />
saúde e segurança.<br />
Depois do disciplinamento<br />
do transporte de cargas no<br />
país com a lei 11.442/2007 e<br />
da criação da conta-frete, que<br />
tira o motorista autônomo da<br />
informalidade, a recém-aprovada<br />
Lei 12.619, que entra <strong>em</strong><br />
vigor a partir de 17 de junho<br />
de 2012, é com<strong>em</strong>orada como<br />
mais um marco rumo à valorização<br />
e profissionalização da<br />
atividade. Foram quase 16 anos<br />
de tentativas de organizar uma<br />
profissão que leva nas costas<br />
60% de tudo que se produz<br />
no país e é o principal meio<br />
de transporte coletivo de pessoas.<br />
Do primeiro projeto de<br />
lei proposto para determinar o<br />
t<strong>em</strong>po de direção <strong>em</strong> rodovias,<br />
<strong>em</strong> 1996, até o mais recente de<br />
2008 que propõe a criação do<br />
Estatuto do Motorista. Há no<br />
Congresso Nacional 29 projetos<br />
sobre o assunto.<br />
Num s<strong>em</strong>inário realizado<br />
na NTC&Log, mais de 500<br />
participantes estiveram aten-<br />
tos às novidades e ao impacto<br />
que terão nas operações e nos<br />
negócios. “Sair da zona de conforto<br />
não é fácil, mas não se faz<br />
omelete s<strong>em</strong> quebrar os ovos”,<br />
avalia Flávio Benatti, presidente<br />
da entidade.<br />
Afinal, há anos o <strong>em</strong>presariado<br />
lida com processos trabalhistas<br />
e decisões jurídicas,<br />
<strong>em</strong>basados por uma colcha de<br />
retalhos de leis apropriadas<br />
para outros modais, como o<br />
ferroviário e o marítimo, que<br />
são cont<strong>em</strong>pladas pela Consolidação<br />
da Lei do Trabalho, mas<br />
muito distantes do rodoviário.<br />
A nova legislação também é<br />
vista como uma oportunidade<br />
de tomar as rédeas de uma<br />
situação perigosa para a saúde<br />
Foto: Mauricio Fernandes<br />
financeira das <strong>em</strong>presas. Para<br />
começar, a nova lei foi criada<br />
considerando as diversas realidades<br />
de qu<strong>em</strong> trabalha com o<br />
transporte rodoviário de cargas<br />
e passageiros, rodando pelo<br />
país afora, muitas vezes passando<br />
dias e dias longe de sua<br />
base ou casa. “A lei é o resultado<br />
de muita pesquisa feita com<br />
os próprios profissionais, com<br />
as <strong>em</strong>presas e também estudos<br />
da legislação de outros países”,<br />
conta Marco Aurélio Ribeiro,<br />
assessor jurídico da NTC.<br />
A partir de uma jornada de<br />
trabalho garantida pela Constituição<br />
Federal de oito horas<br />
diárias e 44 horas s<strong>em</strong>anais, a<br />
nova legislação tratou de criar<br />
regras que levam <strong>em</strong> consideração<br />
as condições típicas da<br />
profissão de motorista, ignoradas<br />
pelas leis vigentes. Daí a<br />
necessidade de alterar e incluir<br />
artigos constantes na CLT e no<br />
Código Nacional de Trânsito,<br />
este para abranger também<br />
os motoristas autônomos, que<br />
s<strong>em</strong> vínculo <strong>em</strong>pregatício, não<br />
são regidos por leis trabalhistas.<br />
Algumas das<br />
novidades presentes<br />
à regra são a<br />
introdução de um<br />
seguro obrigatório<br />
de riscos pessoais,<br />
contratado pela<br />
<strong>em</strong>presa a favor do<br />
motorista <strong>em</strong>pregado,<br />
a exigência<br />
de cursos técni-<br />
cos de formação e<br />
aperfeiçoamento<br />
profissional e, <strong>em</strong><br />
especial, o estabelecimento de<br />
regras claras sobre t<strong>em</strong>pos de<br />
direção e descanso. Nada mais<br />
justo, considerando a enorme<br />
repercussão que longas jornadas<br />
causam na capacidade de<br />
o condutor conduzir o veículo.<br />
A lei, com algumas adaptações,<br />
toma como base a regu-<br />
lamentação de outros países<br />
e determina o descanso de 30<br />
minutos a cada quatro horas<br />
de direção ininterruptas, preservado<br />
uma hora de intervalo<br />
de refeição, onze horas de<br />
repouso diário e descanso s<strong>em</strong>anal<br />
de 35 horas. As viagens<br />
de longa distância, <strong>em</strong> que o<br />
motorista fica fora de sua base<br />
ou casa por mais de 24 horas,<br />
ganharam condições especiais,<br />
como a permissão para que<br />
o motorista goze o descanso<br />
de 11 horas diárias na cabine<br />
leito, hotel ou alojamento da<br />
transportadora, <strong>em</strong>barcador ou<br />
destinatário, entre outras.<br />
O que é importante ressaltar<br />
é que a jornada de trabalho é<br />
contada a partir do momento<br />
<strong>em</strong> que o motorista está à<br />
disposição da <strong>em</strong>presa, descontados<br />
o t<strong>em</strong>po de refeição,<br />
repouso, descanso e espera.<br />
Não é mais possível obrigar o<br />
motorista a chegar às sete da<br />
manhã e liberar o caminhão às<br />
15 horas, porque descontada<br />
a hora da refeição ele já terá<br />
cumprido sete horas das oito<br />
horas de sua jornada, o que o<br />
deixa com apenas uma hora<br />
para efetivamente cumprir sua<br />
função, dirigir, antes de começar<br />
a computar duas horas<br />
extras diárias permitidas. “Daí<br />
a necessidade das <strong>em</strong>presas se<br />
organizar<strong>em</strong> e investir<strong>em</strong> <strong>em</strong><br />
planejamento para otimizar o<br />
trabalho do motorista e não<br />
elevar seu custo”, alerta Benatti,<br />
valendo até a implantação<br />
de escalas de motoristas.<br />
Passou das oito horas, adentrou<br />
pelas duas horas extras e<br />
ainda assim extrapolou? É aí<br />
que o t<strong>em</strong>po de espera passa a<br />
ser computado, com algumas<br />
ressalvas. Diz a lei que o t<strong>em</strong>po<br />
de espera se caracteriza pelo<br />
veículo parado no <strong>em</strong>barcador<br />
ou destinatário aguardando<br />
carga e descarga; ou esperando<br />
fiscalização da mercadoria <strong>em</strong><br />
barreiras fiscais ou alfandegárias.<br />
“Esses dois requisitos são<br />
o que diferencia t<strong>em</strong>po de<br />
espera e hora extra, esta limitada<br />
a duas horas diárias e com<br />
adicional de 50% sobre a hora<br />
normal”, explica Ribeiro.<br />
A ressalva é importante porque<br />
o adicional sobre o t<strong>em</strong>po<br />
de espera foi determinado <strong>em</strong><br />
30% do salário hora, e como<br />
não há limite para o t<strong>em</strong>po<br />
máximo permitido não incorre<br />
penalidades e multas como na<br />
hora extra. Note que foi preciso<br />
regulamentar o que deveria<br />
ser exceção, porque<br />
na prática o<br />
t<strong>em</strong>po de espera<br />
é tão comum que<br />
se tornou um dos<br />
maiores motivos<br />
de litígio <strong>em</strong> ações<br />
trabalhistas. Seja<br />
por anotação, diário<br />
de bordo, papeleta,<br />
ficha de trabalho<br />
externo, ou<br />
ainda, por meios<br />
eletrônicos instalados<br />
no veículo, o<br />
controle é responsabilidade do<br />
<strong>em</strong>pregador.<br />
As pendências fundamentais,<br />
porém, continuam no ar:<br />
qu<strong>em</strong> é que vai fiscalizar tudo<br />
isso e a falta de infraestrutura,<br />
que não garante lugar adequado<br />
ao descanso do motorista<br />
<strong>em</strong> viag<strong>em</strong>. n<br />
38 <strong>Negócios</strong> <strong>em</strong> <strong>Transporte</strong><br />
<strong>Negócios</strong> <strong>em</strong> <strong>Transporte</strong> 39<br />
Foto: divulgação<br />
Regulamentação tráz a profissionalização e valorização do motorista