17.04.2013 Views

Revista Acad.3 - Academia Sul-Mato-Grossense de Letras

Revista Acad.3 - Academia Sul-Mato-Grossense de Letras

Revista Acad.3 - Academia Sul-Mato-Grossense de Letras

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

mania <strong>de</strong> controlar as empregadas, as visitas, sua necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> preencher<br />

o ócio com o tormento <strong>de</strong> nossas vidas.<br />

Quando mais o tempo passava, mais sua presença tinha sobre mim<br />

a força <strong>de</strong> um inferno, no qual resultavam inúteis minhas tentativas <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>samarrar as cordas.<br />

Com a alma virada do avesso, minhas ilusões transformaram-se<br />

em rancores, em vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>struir fibra por fibra os fios frágeis que<br />

ainda nos uniam. E a tensão que me pesava como bola <strong>de</strong> chumbo, começou<br />

a <strong>de</strong>sfazer-se, quando sua memória se envolveu <strong>de</strong> névoa e você penetrou<br />

a fronteira misteriosa do esquecimento.<br />

Convencê-la a internar-se numa clínica não foi fácil. Você usou<br />

todos os argumentos, apelou para a chantagem mas, finalmente, Dagoberto<br />

conseguiu fazer você enten<strong>de</strong>r que era a melhor solução para todos<br />

nós. Pensa que estou livre se seu domínio? De longe você exerce pressão<br />

psicológica sobre mim, ri <strong>de</strong> minhas tolices, faz pouco caso <strong>de</strong> minhas<br />

fraquezas. Que fiz eu que sempre procurei ser boa filha, boa esposa, boa<br />

mãe sofrer tantos boicotes, tanta mesquinhez? O que aconteceu conosco<br />

que hoje nos tratamos como duas estranhas? Na falta <strong>de</strong> coragem para<br />

nos enfrentarmos cara a cara, estou-lhe escrevendo para <strong>de</strong>sabafar e para<br />

pedir-lhe que compreenda o sofrimento <strong>de</strong> sua filha e, se pu<strong>de</strong>r, queira<br />

perdoá-la:<br />

Letícia.<br />

n. 3 – março <strong>de</strong> 2004<br />

Carta <strong>de</strong> Lúcia para sua filha Letícia<br />

Querida filha:<br />

Minha memória não está tão opaca como você pensa. Quem per<strong>de</strong>u<br />

a noção das coisas foi você que mergulhou no reino da fantasia para não<br />

enfrentar seus pequenos <strong>de</strong>mônios. Deixe-me também contar minha<br />

história, mostrar meus pontos <strong>de</strong> vista para que <strong>de</strong>cida se sou realmente<br />

a gran<strong>de</strong> culpada do fracasso <strong>de</strong> seu <strong>de</strong>stino. Quando você nasceu, o céu<br />

parecia ter-se aberto para mim, eu flutuava na maciez <strong>de</strong> uma nuvem ao<br />

pensar que tinha comigo o milagre <strong>de</strong> uma criança feita <strong>de</strong>ssa substância<br />

misteriosa a que chamamos amor e que em nosso carinho queríamos,<br />

seu pai e eu, moldá-la para a felicida<strong>de</strong>. Infelizmente, nossos esforços re-<br />

65

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!