Revista Acad.3 - Academia Sul-Mato-Grossense de Letras
Revista Acad.3 - Academia Sul-Mato-Grossense de Letras
Revista Acad.3 - Academia Sul-Mato-Grossense de Letras
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
n. 3 – março <strong>de</strong> 2004<br />
Rui Garcia Dias<br />
Rui Garcia Dias nasceu em Três Lagoas, em<br />
1935. Ingressou na magistratura estadual e, em<br />
1979, tomava posse, como <strong>de</strong>sembargador, do<br />
recém-criado Tribunal <strong>de</strong> Justiça. Dedica-se à<br />
crônica. Ocupa a ca<strong>de</strong>ira 23 da <strong>Aca<strong>de</strong>mia</strong>. De<br />
suas obras citem-se O CAPANGA E OUTROS<br />
CAUSOS e O NEGRO ORESTES E OUTROS CONTOS.<br />
Piloto<br />
Piloto era um cachorro malhado muito querido pelo pantaneiro<br />
agregado e familiares.<br />
Mestiço <strong>de</strong> vira-lata com cão americano tinha o rabo enrolado em<br />
forma <strong>de</strong> biscoito e o dono o consi<strong>de</strong>rava um guarda fiel, além <strong>de</strong> eficaz<br />
para trilhar batida <strong>de</strong> onça. Piloto não era mimado, vivia às próprias<br />
custas e a braços com sua rabugem que não aumentava porque o dono a<br />
combatia com uma solução composta <strong>de</strong> pólvora e limão; dolorida, mas<br />
eficaz, já que o barreiro não era suficiente para eliminar os parasitas. Piloto<br />
comia o que achava nas suas andanças e aproveitava da amiza<strong>de</strong><br />
com as crianças da casa que lhe jogavam ossos <strong>de</strong> galinha e restos <strong>de</strong> comida<br />
<strong>de</strong> quando em vez. Com isso mantinha vitalida<strong>de</strong> suficiente para trotear<br />
ao lado do cavalo do dono nas longas caminhadas pelos corixos e pradarias.<br />
Suas costelas à mostra não eram prova <strong>de</strong> maus tratos, mas efeitos da malhação<br />
diária nos campeios e caçadas ao porco monteiro. Apesar <strong>de</strong> esperto<br />
não teve experiência suficiente para proteger-se contra a voracida<strong>de</strong> das<br />
piranhas. Foi no corixo próximo à casa. Estava bebendo água à sua moda<br />
distraída quando teve parte da língua <strong>de</strong>vorada por uma piranha ligeira.<br />
O pobre afastou-se ganindo <strong>de</strong> dor e <strong>de</strong> olhar triste <strong>de</strong> quem pe<strong>de</strong> socorro.<br />
A dona da casa o acudiu <strong>de</strong> pronto, mas nada podia fazer senão<br />
manifestar solidarieda<strong>de</strong> através <strong>de</strong> carinho e aplicação superficial <strong>de</strong><br />
81