Confluências Nº 7 - Maio/Jun. 2009 - Escola Secundária de Camões

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Rosto Foto André Matos - 11º G SCRIPTOMANIAS Confluências Heavenbound I As Horas Tardias Na fúnebre estabilidade da abóboda celeste todas as coisas estremecem e haverá auroras boreais acesas sobre jardins na penumbra e prenúncios de estrelas que são constelações inteiras, e ilhas no meio do vácuo sideral. Algures na grande sala Azul dá-se uma insurreição de cegueira negra e subitamente todas as linhas rectas se corrompem e a tormenta da lucidez é areia fina levada pela maré baixa. II O Emerso E eu trocava estas grutas a céu aberto e claustros desamparados por qualquer extensão meramente infinda, sopro demente da vida lúcida, e com a lucidez agarrada a uma jangada decomposta, contra o iminente naufrágio. (…) VIII As Horas Claras É tarde e há estrelas. E dobrando-se em vénias quando passam são hologramas de incêndios que se extinguem, as horas que precedem a luz solar. Horas demasiado pequenas, ao lado de gentes que com elas condizem, e mundos que de tão insignificantes poderiam ser engolidos, saboreados pelos refinados carnívoros dentro de cujos olhos cabem todos os aquários e estrelas e peixes prateados e pássaros verdes. É cedo e as estrelas desaparecem, há que deixar crescer gigantes dentro de nós. Edward Allaway (heterónimo) Lúcia Chambel, 12ºF Magic princess Adorable princess With blond hair! I cannot guess If it is fair! I feel your presence As big as the space! It is so intense Admiring your face! The problem remains, Keep the dream alive! To take away my pains In less seconds than five! No, do not send The key of the mystery! No, do not put an end To this magic story!… Because your grace And the unknown, Balance my disgrace, Because, I do not know!… Página 2 Carlos Antunes, 12º, 5ª
“Vê que aqueles que devem à pobreza Amor divino, e ao povo, caridade, Amam somente mandos e riqueza, Simulando justiça e integridade. Da feia tirania e de aspereza Fazem direito e vã severidade. Leis em favor do Rei se estabelecem; As em favor do povo só perecem.” Camões (Os Lusíadas, IX,XXVIII) Confluências UMA LEITURA A morte de Ivan Ilitch, Leon Tolstoi (tradução de Adolfo Casais Monteiro) Página 3 Neste livro, Tolstoi confronta o leitor com a morte, ao contar a perturbante história de um ambicioso e respeitado juiz que, apesar de ter levado uma vida pacífica, praticamente sem problemas e cheia de sucessos, se depara com uma doença que lhe será fatal. Acompanhamos assim a agonia deste juiz que, ao mesmo tempo que lida com esta misteriosa doença, tenta arranjar uma justificação para isto lhe acontecer a ele e não outra pessoa, revendo todo o seu passado e opções que fizera, e vivendo numa agonia, dor e solidão crescente, até ao dia da morte. O livro começa retratando o dia em que Ivan Ilitch faleceu. Surpreendentemente, os supostos amigos de Ivan Ilicht, que pertenciam também ao mundo judicial, têm uma atitude muito fria relativamente a este acontecimento. Ao invés de lamentarem o triste acontecimento, tudo o que pensaram foi a influência que tal acontecimento teria nas suas vidas profissionais e carreiras, pensamentos como: “Agora obterei com certeza o lugar de Schtabel ou o de Vinnikov”, por Fiodor Vassilievitch, e “Preciso ver se consigo agora a transferência de meu cunhado de Kaloga para cá”, por Piotr Ivanovitch (os amigos mais chegados de Ivan Ilitch). Além de interpretarem a morte de Ivan Ilicht como um factor que ajudaria toda a gente a subir na carreira, os colegas de trabalho também mantiveram a triste atitude de alegria ao pensarem “não fui eu, foi ele quem morreu, ao menos ainda estou vivo!”. Piotr Ivanovicht, sendo dos melhores amigos de Ivan Ilitch, sente a necessidade de, ao tomar conhecimento da morte de seu camarada, visitar a casa a família deste. Em casa da família de Ilicht reinava por momentos um clima sombrio, triste, e pesado. Piotr Ivanovicht, ao observar o corpo do amigo e todo este clima de escuridão, sentiu uma ponta de tristeza e compaixão para com a família, mas, depois de realizar o seu dever como camarada de Ivan Ilicht, partiu ao encontro de um jogo de cartas com amigos. De seguida, o autor faz uma analepse na história, descrevendo toda a vida de Ivan Ilitch com grande pormenor: filho de um funcionário de ministério que, a partir de certa altura, apenas possuia um lugar fictício, continuando a receber um ordenado apesar de ser um inútil – era o segundo de três filhos: o primeiro seguiu uma carreira análoga à do pai, e o terceiro era um completo falhado. Estudou na Escola de Direito, onde finalizou os seus estudos com notas brilhan- tes e, apesar de constantemente mudar de lugar de residência e de trabalho, foi cada vez progre- dindo mais na sua carreira. Para onde quer que fosse, criava relações e uma reputação de homem agradável e alegre. As pessoas respeitavam-no e gostavam da sua jovialidade, alegria e bom humor fora das horas de trabalho, pois, quando exercia as suas funções, era um perfeccionista rigoroso. Assim, Ivan vivia uma vida muito próxima da perfeita até conhecer e se casar com Prascovia Fiodorovna. Este casamento não tinha como base o amor, mas sim o facto de, ao casar-se, Ivan Ilitch concretizar o seu desejo de constituir famí- lia e, ao mesmo tempo, com este acto agradar às pessoas colocadas em cargos mais altos. Depois, com a gravidez, Fiodorovna passou a perturbar a existência correcta e agradável de Ivan Ilitch, tornando-se irritadiça, mostrando-se ciumenta sem motivo aparente e procurando discussões. Sempre que se dava uma discussão entre os dois, Ilitch virava-se para o trabalho e só se preocupava com sua carreira, coisa que o fazia feliz e o afastava de quaisquer problemas. Até então, Ivan Ilitch conseguira ter uma vida praticamente sem problemas, agradável, correcta e com êxito. No entanto, a pouco e pouco, sua doença foi mostrando indícios: tudo começara com um gosto estranho na boca que sentia esporadicamente, e uma leve impressão do lado esquerdo do ventre. Após frequentar diversos médicos conceituados, não havia chegado a qualquer conclusão sobre a natureza de sua doença, e esta ia-se agravando cada vez mais. Acamado, doente, e sabendo que irá morrer, nada resta a Ilitch senão a lucidez para se indagar sobre este acontecimento. O leitor assiste então, a monólogos e pensamentos verdadeiramente surpreendentes e assustadores, sobre o sentido da vida e a morte. Antes de mais, devo dizer que o livro me surpreendeu de uma maneira que nenhum outro o fizera até agora. Não fazia ideia de que um livro com apenas 91 páginas poderia carregar consigo tanto conteúdo, abordando temas tão interessantes e ao mesmo tempo assustadores. Está escrito de uma forma muito clara, com linguagem simples e bastante acessível, embora com um pequeno, mas muito importante pormenor. Tolstoi escreve de uma forma tão intensa, tão envolvente que faz o leitor acreditar que se pode encontrar nessa situação, sentindo o que Ivan Ilitch sentia, pensando o que Ivan Ilicht pensava. Na minha opinião, a habilidade de Liev Tolstoi transpor para os olhos e mente do leitor o sofrimento e agonia, quase (senão de facto) impossíveis de suportar, vividos pela personagem principal à medida que o livro se aproxima do seu desfecho, é simplesmente avassaladora, inigualável e única, pois até agora não encontrei nenhum escritor que tão bem descreva o sofrimento, a dor, o caos e o drama pessoais. Quanto aos problemas e temas subjacentes a este livro, o livro foca os dois talvez mais importantes e incertos temas existentes: o sentido da vida e da morte. Temas e questões para as quais a resposta é, e sempre será, incerta; no entanto, a perspectiva de um indivíduo que sempre levou uma vida aparentemente muito próxima da perfeita e que, de repente, se confronta com a doença que o irá matar (só não sabe ele quando) não deixa de ser extremamente interessante e curiosa, porém perturbadora. Além destas características principais do livro, é no entanto importante salientar que “A morte de Ivan Ilitch” adquire também um tom crítico na apreciação da sociedade, ou melhor, da classe social que o livro foca: o facto de poucos se preocuparem com a morte de Ivan Ilitch, com excepção da família, e imediatamente pensarem no impacto que isso terá nas suas carreiras, incluindo os amigos mais próximos, e de vários indivíduos ocuparem “cargos fantasma” perante a justiça, onde não realizam qualquer trabalho, continuando no entanto a ganhar ordenados que podem chegar a grandes quantias, faz com que aquela sociedade seja caracterizada como hipócrita, em que a amizade para pouco serve, a não ser como meio de obter cargos e ordenados mais elevados. Concluindo, um livro muito bom que vale a pena ler, de fácil leitura e grande reflexão. Hugo Rocheteau, 11º A
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