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Prezado(a) Professor(a): Nesses mais de 39 anos ... - Global Editora

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<strong>Prezado</strong>(a) <strong>Professor</strong>(a):<br />

<strong>Nesses</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> <strong>39</strong> <strong>anos</strong> <strong>de</strong> existência, a <strong>Global</strong><br />

<strong>Editora</strong> vem <strong>de</strong>senvolvendo um intenso trabalho<br />

na área educacional. Nossos objetivos principais<br />

sempre foram e serão a divulgação <strong>de</strong> autores<br />

nacionais e a formação cultural <strong>de</strong> estudantes.<br />

Por isso, tanto a seleção cuidadosa dos textos<br />

como a qualida<strong>de</strong> gráfica na apresentação dos<br />

livros são nossas maiores preocupações. Com<br />

este catálogo, apresentamos consagrados autores<br />

da literatura brasileira e da literatura portuguesa.<br />

Os contos, os poemas, as crônicas e as<br />

peças teatrais que compõem cada obra das coleções<br />

Melhores Contos, Melhores Poemas, Melhores<br />

Crônicas e Melhor Teatro são criteriosamente<br />

selecionados por renomados estudiosos, poetas<br />

e escritores que, além disso, acrescentam às<br />

obras uma bibliografia, uma biografia e um estudo<br />

introdutório sobre a trajetória histórico­<br />

­literária <strong>de</strong> cada autor. Completando este<br />

catálogo, apresentamos obras <strong>de</strong> Afrânio Coutinho,<br />

Cora Coralina, Edla van Steen, Florestan<br />

Fernan<strong>de</strong>s, Gilberto Freyre, Ignácio <strong>de</strong> Loyola<br />

Brandão, Luís da Câmara Cascudo, Marcos Rey,<br />

Marina Colasanti e Sábato Magaldi, entre outros<br />

autores imprescindíveis para um maior aprofundamento<br />

no universo da literatura brasileira.<br />

Des<strong>de</strong> o início, a sua colaboração tem sido <strong>de</strong>cisiva<br />

para o nosso trabalho. Portanto, visite nosso<br />

site www.globaleditora.com.br e <strong>de</strong>ixe seu comentário:<br />

ele sempre será muito bem ­vindo!<br />

RichaRd a. alves<br />

Diretor <strong>de</strong> Marketing


SUMÁRIO<br />

Melhores Contos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .4<br />

Melhores PoeMas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .24<br />

Melhores CrôniCas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .60<br />

Melhor teatro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .76<br />

roteiro da Poesia Brasileira . . . . . . . . . . . . . . . . . . .80<br />

CorresPondênCias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .89<br />

estante GloBal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .91<br />

estante PoliCiais Paulist<strong>anos</strong> . . . . . . . . . . . . . . . . . . .97<br />

Fortuna CrítiCa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .100<br />

literatura PeriFériCa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .103<br />

aFrânio Coutinho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .108<br />

CeCília Meireles . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .113<br />

Cora Coralina . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .115<br />

edla van steen . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .120<br />

Florestan Fernan<strong>de</strong>s . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .124<br />

GilBerto Freyre . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .129<br />

iGnáCio <strong>de</strong> loyola Brandão . . . . . . . . . . . . . . . . . .143<br />

luís da CâMara CasCudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . .154<br />

Manuel Ban<strong>de</strong>ira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .168<br />

MarCos rey . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .171<br />

Marina Colasanti . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .179<br />

Menalton BraFF . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .182<br />

oríGenes lessa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .185<br />

sáBato MaGaldi . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .187<br />

outros autores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .190<br />

índiCe . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .201


C o l e ç ã o<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

DIREÇÃO<br />

EDLA VAN STEEN<br />

4<br />

Os expoentes da literatura brasileira e portuguesa,<br />

representantes das diversas escolas literárias, estão<br />

entre os clássicos reunidos pela <strong>Global</strong> <strong>Editora</strong> na co‑<br />

leção Melhores Contos. São <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 36 coletâneas,<br />

dirigidas pela escritora Edla van Steen, com o objetivo<br />

<strong>de</strong> levar ao público algumas das melhores produções<br />

literárias <strong>de</strong> nossa língua. A rigorosa seleção dos tex‑<br />

tos garante a qualida<strong>de</strong> das obras e justifica o gran<strong>de</strong><br />

sucesso alcançado pela coleção em <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 25 <strong>anos</strong><br />

<strong>de</strong> existência. Os estudantes encontram na coleção<br />

Melhores Contos um material privilegiado <strong>de</strong> estudo<br />

e lazer. Cada volume apresenta uma bibliografia, uma<br />

biografia e um estudo introdutório sobre cada con‑<br />

tista. A qualida<strong>de</strong> das edições é uma priorida<strong>de</strong> da<br />

<strong>Global</strong> <strong>Editora</strong> que, com a coleção Melhores Contos,<br />

tem a certeza <strong>de</strong> estar resgatando para o leitor todo<br />

o fascínio da prosa luso ‑brasileira.


ALUÍSIO AZEVEDO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Ubiratan Machado<br />

Aluísio Azevedo (1857 ‑1913)<br />

Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />

1 a edição – 200 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1278 ‑3<br />

Consi<strong>de</strong>rado a figura máxima do romance naturalista,<br />

no Brasil, Aluísio Azevedo <strong>de</strong>ixou também uma série <strong>de</strong><br />

contos, <strong>de</strong> excelente qualida<strong>de</strong> literária, envolventes e for‑<br />

tes, que transmitem ao leitor a mesma sensação <strong>de</strong> vida<br />

que palpita em seus romances.<br />

Sem a estrita preocupação <strong>de</strong> fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> ao cânon na‑<br />

turalista, que caracterizava o romancista, as histórias curtas<br />

<strong>de</strong> Aluísio revelam um escritor <strong>de</strong> humor irreverente, por<br />

vezes lírico, com uma vaga nostalgia da juventu<strong>de</strong>, preocu‑<br />

pado com a passagem do tempo e a fugacida<strong>de</strong> da vida,<br />

menos pessimista do que em seus romances, mas sem se<br />

afastar da atitu<strong>de</strong> crítica e <strong>de</strong> combate que sempre man‑<br />

teve em relação à sua terra, em particular, e à socieda<strong>de</strong>,<br />

em geral.<br />

Crítico e combativo, duro e cruel algumas vezes, ou‑<br />

tras prestes a se comover, sentimento logo afastado com<br />

um piparote ou uma ironia, nunca ingênuo, o contista<br />

aborda temas e motivos variados: vai do fantástico a situa‑<br />

ções típicas do naturalismo, incluindo páginas <strong>de</strong> reminis‑<br />

cências em forma <strong>de</strong> ficção.<br />

Os críticos se divi<strong>de</strong>m na escolha do melhor trabalho:<br />

“O ma<strong>de</strong>ireiro”, em que o autor se <strong>de</strong>licia com as manhas<br />

e as astúcias femininas; o contun<strong>de</strong>nte “Heranças”, retrato<br />

<strong>de</strong> um conflito <strong>de</strong> gerações; o angustiante “A serpente”; a<br />

avassaladora paixão pelo jogo abordada em “Último<br />

lance”; “Fora <strong>de</strong> horas”, uma reivindicação do simples e<br />

humano direito <strong>de</strong> amar, e quinze outros trabalhos, nos<br />

quais se resumiu a obra <strong>de</strong> contista <strong>de</strong> Aluísio.<br />

Todos esses vinte contos, reunidos em dois volumes,<br />

intitulados Demônios e Pégadas, foram incluídos no vo‑<br />

lume <strong>de</strong> Melhores contos Aluísio Azevedo, que, <strong>de</strong>ssa<br />

forma, não apresenta apenas os melhores trabalhos do es‑<br />

critor, mas sua obra completa no gênero.<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

ANÍBAL MACHADO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Antonio Dimas<br />

Aníbal Machado (1894 ‑1964)<br />

Natural <strong>de</strong> Sabará, MG<br />

7 a edição – 224 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0059 ‑4<br />

Durante muitos <strong>anos</strong> Aníbal Machado foi o escritor<br />

inédito <strong>mais</strong> conceituado do Brasil. Publicava na imprensa<br />

alguns ensaios, trechos do famosíssimo João Ternura e con‑<br />

tos dispersos que, sem a unida<strong>de</strong> em volume, impediam<br />

uma avaliação global do escritor. Apesar do ineditismo,<br />

exercia imensa influência nos meios literários cariocas, um<br />

papel semelhante ao <strong>de</strong>sempenhado por Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong><br />

em São Paulo. Sua casa <strong>de</strong> Ipanema era ponto <strong>de</strong> reunião<br />

<strong>de</strong> escritores, jornalistas, sambistas. Mas o livro sempre<br />

aguardado ia ficando para as calendas gregas. Com a pu‑<br />

blicação, afinal, <strong>de</strong> Vila feliz, em 1944, o público leitor <strong>de</strong>s‑<br />

cobriu que estava diante <strong>de</strong> um dos maiores contistas<br />

brasileiros <strong>de</strong> todos os tempos. O volume reunia apenas<br />

cinco contos (classificados como novelas) <strong>de</strong> excepcional<br />

qualida<strong>de</strong>, elaborados e reelaborados ao longo <strong>de</strong> muitos<br />

<strong>anos</strong>, numa ânsia permanente <strong>de</strong> perfeição. Em verda<strong>de</strong>, o<br />

livro já nascia clássico, com pelo menos duas obras ‑primas,<br />

“Tati, a garota” e “A morte da porta ‑estandarte”. Quinze<br />

<strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, nas Histórias reunidas, Aníbal acrescentava à<br />

lista <strong>de</strong> suas obras ‑primas <strong>mais</strong> dois trabalhos, “O Iniciado<br />

do vento” e “Viagem aos seios <strong>de</strong> Duília”. Os <strong>de</strong><strong>mais</strong>, se<br />

não chegam a tanto, são, porém, inesquecíveis. Quem se es‑<br />

quecerá da pequena epopeia doméstica contada em “O<br />

piano” ou <strong>de</strong> “O <strong>de</strong>funto inaugural”, cujo enterro é quase<br />

uma festa? Dessa forma, sua obra completa <strong>de</strong> contista,<br />

trabalhada ao longo <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 30 <strong>anos</strong>, resume ‑se a<br />

doze trabalhos, soldados entre si por uma atmosfera muito<br />

peculiar, entre concreto e imaginário, realida<strong>de</strong> e sonho,<br />

meio surrealista, meio fantástico, mas sem ja<strong>mais</strong> per<strong>de</strong>r a<br />

coerência psicológica. A análise psicológica dos persona‑<br />

gens, aliás, é penetrante, mas sem cruelda<strong>de</strong>, antes com<br />

simpatia, ternura, pieda<strong>de</strong> por suas fragilida<strong>de</strong>s, tudo ame‑<br />

nizado por uma intensa carga <strong>de</strong> poesia.<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

5


ARTUR AZEVEDO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Antonio Martins <strong>de</strong> Araujo<br />

Artur Azevedo (1855 ‑1908)<br />

Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />

1 a edição – 288 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0607 ‑2<br />

Artur Azevedo morreu em 1908. Agonizava, quando<br />

uma pequena multidão <strong>de</strong> curiosos formou ‑se diante <strong>de</strong> sua<br />

casa, querendo saber o estado <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> do escritor. Logo a<br />

morte sobreveio, comovendo os presentes, a cida<strong>de</strong>, o país.<br />

Nesse momento, podia ‑se aplicar a ele os versos que alguns<br />

<strong>anos</strong> antes, nas mesmas circunstâncias, <strong>de</strong>dicara a Paula<br />

Ney: “pela primeira vez o espírito per<strong>de</strong>ste,/ e fizeste chorar<br />

pela primeira vez”. Durante <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 35 <strong>anos</strong>, o escritor jovial<br />

e buliçoso, malicioso, mas sem ressentimentos ou malda<strong>de</strong>,<br />

distribuíra alegria e bom humor, fazendo o brasileiro rir <strong>de</strong><br />

suas próprias fragilida<strong>de</strong>s e ridículos. Homem <strong>de</strong> teatro, foi<br />

no palco que Artur obteve os maiores triunfos. Suas peças,<br />

disputadas por atores e empresários, eram certeza <strong>de</strong> su‑<br />

cesso e bons lucros. Sua vocação teatral era tão forte que se<br />

impunha a tudo que escrevia.<br />

“Quando repensava o mundo, já o fazia <strong>de</strong> maneira<br />

dramática”, observa Antonio Martins <strong>de</strong> Araujo, no prefá‑<br />

cio aos Melhores contos Artur Azevedo. Suas crônicas e<br />

seus contos trazem a marca do homem <strong>de</strong> teatro, pela fi‑<br />

xação da cena, apresentação dos personagens, diálogos.<br />

Como contista, Artur foi o <strong>mais</strong> popular <strong>de</strong> sua época, fi‑<br />

xando, sem preocupações <strong>de</strong> psicologia, os aspectos gro‑<br />

tescos ou apenas cômicos da pequena burguesia carioca,<br />

em um Rio <strong>de</strong> Janeiro amável, sem violência, on<strong>de</strong> todas as<br />

novida<strong>de</strong>s eram filtradas pela maledicência da rua do Ou‑<br />

vidor. Um Rio <strong>de</strong> Janeiro em que as repartições encerravam<br />

o expediente às três horas da tar<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ixando os escritores,<br />

muitos <strong>de</strong>les funcionários públicos (como Machado <strong>de</strong><br />

Assis e o próprio Artur), disponíveis para o bate ‑papo <strong>de</strong>s‑<br />

contraído na livraria ou na confeitaria. Hoje, cem <strong>anos</strong> após<br />

a morte do escritor, seus contos mantêm a mesma vivaci‑<br />

da<strong>de</strong> e a mesma graça marota que fez as <strong>de</strong>lícias <strong>de</strong> seus<br />

contemporâneos. É ler, comprovar e se regalar.<br />

6<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

ARy QUINTELLA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Monica Rector<br />

Ary Quintella (1933 ‑1999)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

1 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1469 ‑5<br />

Ary Quintella é um dos escritores <strong>mais</strong> <strong>de</strong>sconhecidos<br />

e surpreen<strong>de</strong>ntes do Brasil. Os leitores que gostam <strong>de</strong><br />

ficção e <strong>de</strong>sconhecem sua obra não sabem o que estão<br />

per<strong>de</strong>ndo. Homem <strong>de</strong> múltiplas ativida<strong>de</strong>s, <strong>de</strong>dicou ‑se à<br />

literatura já na maturida<strong>de</strong>, quase quarentão, com amplo<br />

domínio técnico do conto e do romance.<br />

I<strong>de</strong>ntificado em espírito e linguagem com o Rio <strong>de</strong> Ja‑<br />

nei ro, Quintella po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve ser inserido naquela velha tra‑<br />

di ção <strong>de</strong> cronista da cida<strong>de</strong>, que vem <strong>de</strong> Manuel Antônio <strong>de</strong><br />

Almeida, se <strong>de</strong>pura em Machado <strong>de</strong> Assis e Lima Barreto,<br />

passa por Marques Rebelo, até chegar a Sta nis law Ponte Preta.<br />

A sua afinida<strong>de</strong> com esses espíritos não vem apenas<br />

da ligação afetiva com a terra natal e a eleição como<br />

cenário <strong>de</strong> sua obra, mas <strong>de</strong> uma visão do mundo peculiar<br />

ao espírito carioca. No seu caso, utilizando uma linguagem<br />

muito pessoal, fragmentada, como a vida mo<strong>de</strong>rna, on<strong>de</strong><br />

pontificam termos <strong>de</strong> gíria, neologismos, galicismos, an‑<br />

glicismos, Quintella preserva a sua individualida<strong>de</strong>, cons‑<br />

truin do uma obra original, conforme ressalta a crítica.<br />

“Nunca usou ninguém como mo<strong>de</strong>lo. Autores <strong>de</strong> sua<br />

preferência e que possam indiretamente ter <strong>de</strong>ixado alguma<br />

semente são vários e variados: <strong>de</strong> Hemingway, Malaparte,<br />

Kurt Vonnegut a Antonio Tabucchi”, observa Monica Rector<br />

no prefácio aos Melhores contos Ary Quintella.<br />

Contos? Em verda<strong>de</strong>, constitui um <strong>de</strong>safio para o leitor<br />

<strong>de</strong>terminar o gênero das obras curtas <strong>de</strong> Quintella, como<br />

sublinha a prefaciadora. Não importa. Contos, ensaios, crô‑<br />

ni cas, ou quaisquer outros nomes que tenham, Melhores<br />

contos Ary Quintella reúne vinte e nove trabalhos <strong>de</strong> ótimo<br />

nível, extraídos <strong>de</strong> cinco livros, marcados pela presença<br />

da morte, a <strong>de</strong>scoberta da sexualida<strong>de</strong> na adolescência, a<br />

reflexão sobre a amiza<strong>de</strong>, temas peculiares ao universo do<br />

autor, tratados com leveza, mas também uma mal disfarçada<br />

visão trágica da vida.<br />

M e l h o r e s C o n t o s


AURÉLIO BUARQUE<br />

DE HOLANDA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Luciano Rosa<br />

Aurélio Buarque <strong>de</strong> Holanda (1910 ‑1989)<br />

Natural <strong>de</strong> Passo <strong>de</strong> Camaragibe, AL<br />

1 a edição – 216 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1250 ‑9<br />

No Brasil, Aurélio virou sinônimo <strong>de</strong> dicionário. “Você já<br />

consultou o Aurélio?”, “procure no Aurélio” são frases que já<br />

entraram para o cotidiano do brasileiro. O Aurélio, aliás pro‑<br />

fessor Aurélio Buarque <strong>de</strong> Holanda, um dos maiores filólogos<br />

e dicionaristas da língua, não gostava apenas <strong>de</strong> isolar, classi‑<br />

ficar e <strong>de</strong>finir palavras, mas também <strong>de</strong> reuni ‑las em forma <strong>de</strong><br />

contos, líricos, pungentes, repletos <strong>de</strong> humanida<strong>de</strong> e poesia.<br />

Filólogo e poeta, não é <strong>de</strong> se estranhar que os traba‑<br />

lhos reunidos em Dois mundos (seu único livro <strong>de</strong> contos)<br />

conciliassem, com maestria e rigor, a emoção contagiante<br />

e a linguagem <strong>de</strong>purada, o que não significa um texto<br />

duro, correto e seco, empregado pela maioria dos gramá‑<br />

ticos. Nada disso, nenhuma dureza <strong>de</strong> forma (ou <strong>de</strong> fundo),<br />

nenhum preciosismo, mas um português exemplar, con‑<br />

temporâneo, muito pessoal, preservando o <strong>de</strong>licioso sabor<br />

clássico. Ou seja, escritos em língua <strong>de</strong> gente e não no<br />

quimbundo aportuguesado <strong>de</strong> muitos autores<br />

Nascido em Alagoas, Aurélio Buarque mudou ‑se para<br />

o Rio <strong>de</strong> Janeiro já homem feito, sem que o Nor<strong>de</strong>ste se<br />

tornasse para ele apenas uma fotografia na pare<strong>de</strong>. Pelo<br />

contrário, continuou uma realida<strong>de</strong> viva e palpitante <strong>de</strong>ntro<br />

<strong>de</strong> si. Mais vivo, ainda, no momento em que o filólogo<br />

cedia a vez ao contista e ao poeta.<br />

O Nor<strong>de</strong>ste palpita em cada um <strong>de</strong> seus contos, reple‑<br />

tos <strong>de</strong> episódios vividos pelo autor em sua infância e juven‑<br />

tu<strong>de</strong>. São contos no velho sentido, mo<strong>de</strong>rnos, mas com um<br />

pé na tradição, com enredo, po<strong>de</strong>ndo ser contados a uma<br />

terceira pessoa. Entre eles, figuram pelo menos três traba‑<br />

lhos admiráveis, a um milímetro da obra ‑prima, “O chapéu<br />

<strong>de</strong> meu pai”, que anda por aí, em várias antologias, “Zé<br />

Bala” e o trabalho que dá título ao livro, todos selecionados<br />

entre os Melhores contos Aurélio Buarque <strong>de</strong> Holanda,<br />

para regalo do leitor.<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

AUTRAN DOURADO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

João Luiz Lafetá<br />

Autran Dourado (1926)<br />

Natural <strong>de</strong> Patos <strong>de</strong> Minas, MG<br />

2 a edição – 264 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0529 ‑4<br />

Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> sonhava “contar todas as histórias<br />

<strong>de</strong> Minas aos brasileiros do Brasil”. Não contou. Autran<br />

Dourado, mineiro <strong>de</strong> Patos, contou algumas <strong>de</strong>ssas histó‑<br />

rias, com lirismo, aci<strong>de</strong>z, ironia, compondo um universo<br />

muito peculiar, típico das Gerais, filtrado e <strong>de</strong>purado pela<br />

sensibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um escritor extremamente exigente com o<br />

seu texto. A maior parte da obra <strong>de</strong> Dourado está ambien‑<br />

tada em Duas Pontes, cida<strong>de</strong> mítica, uma espécie <strong>de</strong> sín‑<br />

tese <strong>de</strong> todas as cida<strong>de</strong>s mineiras, com os seus cochichos,<br />

os seus dramas <strong>de</strong> consciência (como em “Mr. Moore”,<br />

história <strong>de</strong> um pastor que acolhe um bandido em sua<br />

igreja), os seus momentos <strong>de</strong> ócio (“Os mínimos carapinas<br />

do nada”, uma metáfora do ato criativo), os seus segredos,<br />

as revelações súbitas <strong>de</strong> velhos dramas e tragédias, cortan‑<br />

tes como uma faca só lâmina, as suas velhas terríveis e<br />

mandonas, <strong>de</strong> áspero coração, abrandado pela ternura <strong>de</strong><br />

uma velha criada (“Aquela <strong>de</strong>stelhada”), o conhecimento<br />

da morte na infância (“Manuela em dia <strong>de</strong> chuva”), os ve‑<br />

lhos jogos hum<strong>anos</strong> <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, sedução, amor e ódio, quase<br />

todos transfigurados <strong>de</strong> experiências pessoais do autor,<br />

fatos presenciados ou <strong>de</strong>scobertos na infância e na adoles‑<br />

cência, revitalizados por um estilo exato, sem rebarbas.<br />

Apenas o essencial, modulado pela nota poética ou humo‑<br />

rística. Autor <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta livros, entre romances, no‑<br />

velas, ensaios, Autran Dourado se <strong>de</strong>dica ao conto <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />

início <strong>de</strong> sua carreira, nos dias <strong>de</strong> aprendizado, ainda na<br />

adolescência. Naquela época se conscientizou <strong>de</strong> alguns<br />

dados essenciais ao gênero, que segue até hoje, e aconse‑<br />

lha aos principiantes: “O que se <strong>de</strong>ve buscar num conto é<br />

o efeito único, ao contrário <strong>de</strong> um romance, em que os<br />

efeitos são múltiplos, e <strong>mais</strong>, a linguagem <strong>de</strong>ve ser tensa<br />

no conto, no romance <strong>de</strong>ve ser distendida”. A melhor lição<br />

prática é a leitura <strong>de</strong> seus contos.<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

7


BRENO ACCIOLy<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Ricardo Ramos<br />

Breno Accioly (1921 ‑1966)<br />

Natural <strong>de</strong> Santana do Ipanema, AL<br />

2 a edição – 144 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0297 ‑X<br />

Quando Breno Accioly publicou seu primeiro livro<br />

houve um certo reboliço nos arraiais literários. Os contos <strong>de</strong><br />

João Urso – mórbidos, violentos, atormentados – traziam<br />

alguma coisa nova à literatura brasileira, “em escrita e es‑<br />

trutura, como que uma coerente <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m”, como ob‑<br />

serva Ricardo Ramos no prefácio aos Melhores contos<br />

Breno Accioly. Pareciam obra <strong>de</strong> um russo perdido nos tró‑<br />

picos. Os volumes seguintes – Cogumelos, Maria Pudim, Os<br />

cata ‑ventos – acentuaram as tendências do jovem contista,<br />

o clima <strong>de</strong> revolta contra tudo, o mundo e seus valores, as<br />

estruturas sociais, o comportamento do homem, a própria<br />

miséria da condição humana. A expressão se tornou <strong>mais</strong><br />

sombria e pungente, a angústia, ainda <strong>mais</strong> incômoda,<br />

como um espinho que se entranha na carne, resgatada,<br />

porém, por uma intensa e atormentada força poética. A<br />

crítica ficou perplexa. Tristão <strong>de</strong> Athay<strong>de</strong> distinguiu no uni‑<br />

verso do escritor um “terrível campo <strong>de</strong> transição entre a<br />

luz da consciência e a outra luz da insanida<strong>de</strong>”. Graciliano<br />

Ramos, alagoano como Accioly, observou que a arte do<br />

conterrâneo lhe fazia pensar em coisas e figuras da “terra<br />

espinhosa” on<strong>de</strong> nasceram, inadaptadas a medidas, com<br />

“a bárbara firmeza do cangaceiro e a resistência agreste do<br />

mandacaru”. Para Vinicius <strong>de</strong> Moraes, Accioly “veio abrir<br />

sobre as águas claras do conto brasileiro as comportas <strong>de</strong><br />

sua alma tumultuosa, que habita nas trevas <strong>mais</strong> fundas e<br />

sórdidas do ser”. Tumultuosos eram também os persona‑<br />

gens do escritor, pinçados na pequena comédia humana da<br />

província: usineiros, agregados, prostitutas, humil<strong>de</strong>s fun‑<br />

cionários, duros, ásperos, <strong>mais</strong> instintos do que sentimen‑<br />

tos, perplexos, à sua maneira, diante do gran<strong>de</strong> mistério da<br />

vida. Mistério do qual o escritor parecia <strong>de</strong>s<strong>de</strong>nhar, com o<br />

soberbo <strong>de</strong>sprezo dos <strong>de</strong>sesperados.<br />

8<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

CAIO FERNANDO<br />

ABREU<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Marcelo Secron Bessa<br />

Caio Fernando Abreu (1948 ‑1996)<br />

Natural <strong>de</strong> Santiago do Boqueirão, RS<br />

1 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1018 ‑5<br />

Caio Fernando Abreu passou como um meteoro pelas<br />

letras brasileiras. A trajetória fulminante, a sua luminosida<strong>de</strong>,<br />

a ousadia em tratar temas ditos malditos, numa literatura<br />

tão bem comportada como a nossa, criaram uma certa resis‑<br />

tência à sua obra. Chegaram a acusá ‑lo <strong>de</strong> escritor pesado e<br />

baixo ‑astral, sobretudo por suas abordagens do sexo no<br />

mundo gay. Sentia ‑se magoado, mas admitia o gosto pelo<br />

chulo, o não literário, talvez até o antiliterário, e replicava<br />

que o pesado não era ele, mas a realida<strong>de</strong>. A realida<strong>de</strong>, que<br />

muitos se recusavam a ver, englobava ainda outros aspectos<br />

cruéis ou apenas renovadores, mas con<strong>de</strong>nados em bloco<br />

pelos bem pensantes, dos quais Caio foi o primeiro (ou um<br />

dos primeiros) a tratar na literatura brasileira: drogas, rock,<br />

cultura pop. Romancista, tradutor, teatrólogo, autor <strong>de</strong> lite‑<br />

ratura infantojuvenil, foi no conto que Caio encontrou sua<br />

melhor forma <strong>de</strong> expressão literária. Estreando aos 22 <strong>anos</strong>,<br />

exatamente com um volume <strong>de</strong> contos, <strong>de</strong>ixou oito volumes<br />

no gênero. Como contista, retratou com impieda<strong>de</strong>, “<strong>de</strong>li‑<br />

ca<strong>de</strong>za e paixão, sombra e luminosida<strong>de</strong>, o necessário grão<br />

<strong>de</strong> loucura que ja<strong>mais</strong> lhe permitiria ser medíocre” (Lya Luft),<br />

uma socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nte, insatisfeita, insegura, formada<br />

por seres cada vez <strong>mais</strong> angustiados e vazios, recorrendo<br />

com frequência aos paraísos artificiais para tornar a reali‑<br />

da<strong>de</strong>, se não atraente, pelo menos suportável, mas com a<br />

busca permanente ao amor. Amor que nem sempre se en‑<br />

quadra nas i<strong>de</strong>alizações habituais, mas que nem por isso<br />

<strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser amor. No prefácio aos Melhores contos Caio<br />

Fernando Abreu, Marcelo Secron Bessa sugere que toda a<br />

obra <strong>de</strong> Caio po<strong>de</strong> ser pensada “como um gran<strong>de</strong> romance<br />

<strong>de</strong>smontável, cujo tema maior é o amor”. Maior do que o<br />

amor apenas a paixão pela vida, o prazer <strong>de</strong> viver, talvez até<br />

mesmo sem amor.<br />

M e l h o r e s C o n t o s


DOMINGOS<br />

PELLEGRINI<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Miguel Sanches Neto<br />

Domingos Pellegrini (1949)<br />

Natural <strong>de</strong> Londrina, PR<br />

1 a edição – 288 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0991 ‑5<br />

Com Domingos Pellegrini, o norte do Paraná ganhou<br />

um lugar <strong>de</strong> relevo na geografia literária brasileira. Em sua<br />

obra, sempre i<strong>de</strong>ntificada às questões da terra, a região é<br />

vista em três momentos, correspon<strong>de</strong>ntes a três etapas da<br />

vida do autor. Seu primeiro livro, O homem vermelho<br />

(1977), <strong>de</strong> fundo político, transcorre em época <strong>de</strong> acele‑<br />

rada transformação social, com o <strong>de</strong>sbravamento do inte‑<br />

rior paranaense. Os personagens são violeiros, peões,<br />

operários, caminhoneiros, vivendo experiências primitivas<br />

ligadas à terra. Conto emblemático <strong>de</strong>ssa fase é “O enca‑<br />

lhe dos 300”, em que a terra ‑roxa aparece como metáfora<br />

e a chuva, <strong>de</strong>ixando as estradas intransitáveis, obriga os<br />

caminhoneiros a uma parada não programada, que se ar‑<br />

rasta por sete dias. O segundo momento da obra <strong>de</strong> Pelle‑<br />

grini i<strong>de</strong>ntifica ‑se com a evocação mágica da infância e a<br />

quebra <strong>de</strong>ssa magia pela necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ingressar no ás‑<br />

pero mundo dos adultos, atmosfera que assinala seu livro<br />

<strong>de</strong> contos <strong>mais</strong> bem realizado, Os meninos crescem (1986).<br />

O ciclo se prolonga em obras posteriores, <strong>de</strong> forma obses‑<br />

siva. A nostalgia <strong>de</strong> um tempo perdido caracteriza a ter‑<br />

ceira fase da obra <strong>de</strong> Pellegrini. O tema foi <strong>de</strong>senvolvido <strong>de</strong><br />

maneira magistral em “A mulher dos sonhos”, no qual um<br />

viajante sai Brasil afora, em busca da amante que o aban‑<br />

donou. Ao encontrá ‑la é como se re<strong>de</strong>scobrisse as coisas<br />

simples e essenciais da vida. A atração pelas coisas naturais,<br />

a i<strong>de</strong>ntificação com a terra e os seres simples, <strong>de</strong> certa<br />

forma, se transfigura na linguagem <strong>de</strong> Pellegrini, extraída<br />

da fala do povo, marcando a sua escrita com um certo<br />

barbarismo e uma musicalida<strong>de</strong> selvagem e intensa. A ferro<br />

e fogo, ele marca seu lugar nas letras brasileiras, com uma<br />

obra que, como observa Miguel Sanches Neto, “revela o<br />

fascínio e a violência do processo civilizatório”.<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

EÇA DE QUEIRÓS<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Herberto Sales<br />

Eça <strong>de</strong> Queirós (1845 ‑1900)<br />

Natural <strong>de</strong> Póvoa ‑<strong>de</strong> ‑Varzim, Portugal<br />

5 a edição – 128 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0185 ‑X<br />

Durante quatro ou cinco gerações, a “prosa bárbara”<br />

<strong>de</strong> Eça <strong>de</strong> Queirós embriagou, literalmente, os leitores bra‑<br />

sileiros. Ler Eça era como tomar um narcótico. O leitor pu‑<br />

lava da dimensão normal da vida para um plano requintado,<br />

on<strong>de</strong> a ironia fustigava como um chicote e o Portugal meio<br />

bronco e preconceituoso do século XIX se transformava em<br />

território mágico, tão apaixonante quanto os requintes <strong>de</strong><br />

estilo do escritor, os seus galicismos ousados, as suas com‑<br />

parações <strong>de</strong>liciosas como aquele “sorriso duma doçura <strong>de</strong><br />

tentar abelhas”. Seu primeiro romance, O crime do padre<br />

Amaro, <strong>de</strong>spertou um sem ‑número <strong>de</strong> apaixonados no Bra‑<br />

sil. O próprio Machado <strong>de</strong> Assis, que fez sérias restrições à<br />

obra, reconheceu a gran<strong>de</strong>za do colega <strong>de</strong> além ‑mar. As<br />

gerações seguintes continuaram amando e <strong>de</strong>batendo a<br />

obra <strong>de</strong> Eça. Essa febre se prolonga até as décadas <strong>de</strong> 1920<br />

e 1930. Os rapazes que fizeram a revolução mo<strong>de</strong>rnista<br />

eram leitores fanáticos <strong>de</strong> Eça. Conheciam cada <strong>de</strong>talhe <strong>de</strong><br />

sua obra, os tiques dos personagens, sabiam <strong>de</strong> cor trechos<br />

imensos, em particular dos romances. A preferência pelos<br />

romances <strong>de</strong>ixou os contos em segundo plano. Parece que<br />

o próprio Eça não os valorizava tanto, não se preocupando<br />

sequer em reuni ‑los em volume. A edição dos Contos é<br />

póstuma, reunindo doze trabalhos, publicados ao longo do<br />

tempo. Neles se encontram algumas das melhores páginas<br />

escritas por Eça, como o magistral “José Matias”, uma das<br />

obras ‑primas do gênero na literatura universal, “Perfei‑<br />

ção”, “O <strong>de</strong>funto”, “Suave milagre”, “Civilização”, matriz<br />

<strong>de</strong> um dos romances <strong>mais</strong> famosos <strong>de</strong> Eça, A cida<strong>de</strong> e as<br />

serras. A crítica mo<strong>de</strong>rna não faz por menos: distingue nes‑<br />

ses contos o ponto <strong>mais</strong> alto da obra <strong>de</strong> Eça e a perfeição<br />

máxima <strong>de</strong> sua prosa, com “alguma coisa <strong>de</strong> cristalino, <strong>de</strong><br />

aveludado, <strong>de</strong> on<strong>de</strong>ante, <strong>de</strong> marmóreo”, como queria o<br />

próprio escritor.<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

9


EDLA VAN STEEN<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Antonio Carlos Secchin<br />

Edla van Steen (1936)<br />

Natural <strong>de</strong> Santa Catarina, SC<br />

1 a edição – 296 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1163 ‑4<br />

Edla van Steen ocupa um lugar singular no panorama<br />

do conto brasileiro contemporâneo. Ao contrário <strong>de</strong> muitos<br />

escritores que se esgotam no primeiro livro, a escritora ca‑<br />

tarinense se caracteriza por um constante sentido <strong>de</strong> reno‑<br />

vação e amadurecimento, não apenas da técnica literária,<br />

mas também da visão <strong>de</strong> mundo, como atestam os seis<br />

volumes <strong>de</strong> contos publicados. Cio, lançado em 1965,<br />

muito elogiado pela crítica, ainda não revelava a força que<br />

iria brotar em Antes do amanhecer (1977), livro <strong>de</strong> impreg‑<br />

nação obsessiva <strong>de</strong> temas ligados ao sexo e à morte. Oito<br />

<strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, sai Até sempre (1985), povoado por persona‑<br />

gens enigmáticos, vivendo situações insólitas, naquela zona<br />

fronteiriça entre razão e <strong>de</strong>lírio. Após um silêncio <strong>de</strong> onze<br />

<strong>anos</strong>, Edla volta ao gênero com Cheiro <strong>de</strong> amor (1996), no<br />

qual se mantém fiel ao seu universo, mas evolui para nar‑<br />

rativas <strong>mais</strong> longas, com maior número <strong>de</strong> personagens.<br />

No silêncio das nuvens (2001) e A ira das águas (2004) re‑<br />

velam o pleno amadurecimento literário, mas também<br />

acentuam o <strong>de</strong>sencanto com o mundo, a <strong>de</strong>cepção com a<br />

socieda<strong>de</strong> e as limitações impostas à mulher. Aliás, se a au‑<br />

tora está sempre atenta aos personagens masculinos, seu<br />

interesse maior se dirige ao coração feminino, espécie <strong>de</strong><br />

terra mágica e <strong>de</strong> pesa<strong>de</strong>los, pela qual passeia com curio‑<br />

sida<strong>de</strong> e inquietação. Os Melhores contos Edla van Steen<br />

reúnem 23 trabalhos, dos melhores da literatura brasileira<br />

contemporânea, que lançam o leitor num universo insti‑<br />

gante e intrigante <strong>de</strong> uma autora que, como observa An‑<br />

tonio Carlos Secchin, “procura o nervo da vida, pois, como<br />

afirma certo personagem, move ‑lhe o <strong>de</strong>sejo não <strong>de</strong> pintar<br />

a paisagem, mas <strong>de</strong> estar <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>la – no mesmo passo<br />

arrastando ‑nos a nós todos, seus leitores”.<br />

10<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

FAUSTO WOLFF<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

André Seffrin<br />

Fausto Wolff (1940 ‑2008)<br />

Natural <strong>de</strong> Santo Ângelo, RS<br />

1 a edição – 184 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1185 ‑5<br />

A literatura <strong>de</strong> Fausto Wolff é dura, contun<strong>de</strong>nte e<br />

<strong>de</strong>testa as boas maneiras. Está repleta <strong>de</strong> palavras <strong>de</strong> re‑<br />

volta, <strong>de</strong> pragas, <strong>de</strong> palavrões. E <strong>de</strong> situações equívocas. O<br />

escritor fala, sem volteios ou metáforas, <strong>de</strong> suas preocupa‑<br />

ções pessoais e sociais que, numa escala ascen<strong>de</strong>nte (ou<br />

<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte, quem sabe!), vão da ânsia pela bebida à sem‑<br />

‑vergonhice que domina a política do país.<br />

A maneira direta <strong>de</strong> afirmar, sem papas na língua,<br />

como se dizia nos velhos tempos, fez <strong>de</strong> Fausto Wolff uma<br />

espécie <strong>de</strong> escritor maldito, olhado meio <strong>de</strong> lado pelos bem‑<br />

‑pensantes, talvez aqueles que as suas farpas podiam atin‑<br />

gir. A repulsa <strong>de</strong> tal gente é quase uma consagração. Por<br />

outro lado, os que po<strong>de</strong>m olhar a vida e os fatos <strong>de</strong> frente,<br />

sem temores, gostam <strong>de</strong>ssa maneira ru<strong>de</strong>, agressiva, sob a<br />

qual flui, quase imperceptível, uma intensa pieda<strong>de</strong> pelas<br />

fragilida<strong>de</strong>s e podridões do ser humano.<br />

Essa característica marca toda a sua obra <strong>de</strong> ficcionista<br />

espontâneo, vá lá o termo, que escreve as suas histórias<br />

“<strong>de</strong>sor<strong>de</strong>nadamente, como elas se apresentam no sonho,<br />

sem futuro e sem passado, apenas no presente”, para usar<br />

as suas próprias palavras. Um presente representado com<br />

um certo espírito picaresco, bem em sintonia com a huma‑<br />

nida<strong>de</strong> com a qual <strong>mais</strong> se i<strong>de</strong>ntifica: “os excluídos, os hu‑<br />

milhados e ofendidos, os que não aceitam a hipocrisia e a<br />

mentira, os que se revoltam”, como observa André Seffrin<br />

no prefácio aos Melhores contos Fausto Wolff.<br />

Reunindo nove histórias curtas, o livro constitui uma<br />

excelente introdução (para os não iniciados) ao universo <strong>de</strong><br />

Fausto Wolff. Vale a pena conhecê ‑lo, para se encantar ou<br />

se chocar, amá ‑lo ou <strong>de</strong>testá ‑lo. Em suma, tomar uma ati‑<br />

tu<strong>de</strong> radical, como é <strong>de</strong> gosto do autor. O importante é que<br />

ninguém sai <strong>de</strong> suas páginas como entrou.<br />

M e l h o r e s C o n t o s


HÉLIO PÓLVORA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

André Seffrin<br />

Hélio Pólvora (1928)<br />

Natural <strong>de</strong> Itabuna, BA<br />

1a edição – 288 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1593 ‑7<br />

Em <strong>mais</strong> <strong>de</strong> cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> literária, Hélio<br />

Pólvora construiu uma das obras <strong>mais</strong> sólidas da mo<strong>de</strong>rna<br />

literatura brasileira. Des<strong>de</strong> a sua estreia em 1958, com Os<br />

galos da aurora, o então jovem contista já mostrava quali‑<br />

da<strong>de</strong>s e características muito pessoais, <strong>de</strong>senvolvidas e am‑<br />

pliadas com o tempo e a experiência: o texto envolvente, a<br />

i<strong>de</strong>ntificação com a terra e a gente baiana, a imaginação<br />

fértil, a linguagem trabalhada com <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za artesanal, a<br />

dimensão lírica.<br />

Nessa longa trajetória, Pólvora cultivou a crítica, a crô‑<br />

nica, o romance, a poesia, o ensaio, mas foi no conto que<br />

<strong>de</strong>u o melhor <strong>de</strong> si mesmo. São <strong>de</strong>zesseis volumes <strong>de</strong> histó‑<br />

rias curtas, escritas e reescritas <strong>de</strong> forma obsessiva, na busca<br />

permanente da ilusória perfeição, assim como o fizeram seus<br />

mestres no gênero: Machado <strong>de</strong> Assis, Maupassant, Kathe‑<br />

rine Mansfield, Anton Tchekhov, William Faulkner.<br />

De cada um <strong>de</strong>les, Pólvora absorveu experiências e<br />

ricas sugestões, incorporadas à sua maneira personalíssima<br />

<strong>de</strong> materializar aos olhos do leitor o seu universo, formado<br />

por seres “medíocres, entediados, solitários, inúteis”, como<br />

ele mesmo <strong>de</strong>finiu, e que por isso mesmo atingem o leitor<br />

com o impacto <strong>de</strong> um direto no queixo.<br />

Melhores contos Hélio Pólvora reúne quinze trabalhos<br />

do escritor baiano, cobrindo um período <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta<br />

<strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse “contista extraordinário, que al‑<br />

cançou a estrada real da ficção contemporânea ao dispen‑<br />

sar ra<strong>mais</strong> e caminhos duvidosos e geralmente trilhados<br />

por legião <strong>de</strong> epígonos”, como assinala André Seffrin no<br />

prefácio, sendo capaz, como todo verda<strong>de</strong>iro ficcionista, <strong>de</strong><br />

dizer <strong>mais</strong> coisas do que se dizia antes <strong>de</strong>le. Uma prova <strong>de</strong><br />

que o conto mo<strong>de</strong>rno brasileiro continua repleto <strong>de</strong> vitali‑<br />

da<strong>de</strong>, enriquecendo a longa tradição que se inicia com<br />

Machado <strong>de</strong> Assis e passa por Guimarães Rosa.<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

HERBERTO SALES<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Judith Grossmann<br />

Herberto Sales (1917 ‑1999)<br />

Natural <strong>de</strong> Andaraí, BA<br />

3 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0<strong>39</strong>6 ‑8<br />

Herberto Sales estreou em 1944, com Cascalho, um<br />

romance imenso e violento, ambientado na <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nte re‑<br />

gião das lavras diamantíferas baianas. O sucesso do livro<br />

<strong>de</strong>cidiu o autor a <strong>de</strong>ixar o emprego na pequena cida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Andaraí e tentar a vida no Rio <strong>de</strong> Janeiro. Curiosa a história<br />

do romance, enviado a um concurso no Rio <strong>de</strong> Janeiro, sem<br />

ser premiado. Desalentado, Herberto rasgou os originais<br />

em sua posse, julgando ter <strong>de</strong>struído a obra. Um dos jura‑<br />

dos do concurso, porém, Aurélio Buarque <strong>de</strong> Holanda,<br />

havia guardado uma das cópias, interessado no abundante<br />

número <strong>de</strong> regionalismos, que serviu <strong>de</strong> base à edição do<br />

romance. Depois <strong>de</strong> um longo hiato, no qual publicou dois<br />

livros <strong>de</strong> ensaio, Herberto voltou à ficção, sua vocação au‑<br />

têntica, com o romance Além dos marimbus (1961). A par‑<br />

tir daí, não parou <strong>mais</strong>. O conto foi aventura da maturida<strong>de</strong>,<br />

quando o escritor (nascido em 1917) se achava em plena<br />

posse <strong>de</strong> seus recursos <strong>de</strong> expressão. As Histórias ordiná‑<br />

rias, lançadas em 1966, revelavam um excelente contador<br />

<strong>de</strong> histórias, <strong>de</strong>sses que não fazem cerimônia para pren<strong>de</strong>r<br />

o leitor, envolvê ‑lo na atmosfera <strong>de</strong> seus contos, torná ‑lo<br />

cúmplice e/ou testemunha da ação. Os temas variavam: um<br />

<strong>de</strong>licado mergulho na psicologia feminina, com alguma<br />

coisa <strong>de</strong> machadiano (“Os vigilantes”), uma espécie <strong>de</strong> sá‑<br />

tira às ambições do homem mo<strong>de</strong>rno (“O automóvel”), a<br />

análise <strong>de</strong> um momento <strong>de</strong> crise (“A carta”). Em 1970,<br />

Herberto Sales publicou dois volumes <strong>de</strong> contos, O lobiso‑<br />

mem, saborosas histórias fisgadas no folclore brasileiro, e<br />

Uma telha <strong>de</strong> menos, título significativo, síntese do espírito<br />

geral da obra, na qual todos os personagens são <strong>mais</strong> ou<br />

menos maníacos, presos a uma i<strong>de</strong>ia fixa. Seu último vo‑<br />

lume <strong>de</strong> contos, Armado cavaleiro o audaz motoqueiro<br />

(1980) apresenta a estranha fauna da socieda<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna,<br />

quase sempre também com uma telha a menos.<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

11


HERMILO BORBA<br />

FILHO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Silvio Roberto <strong>de</strong> Oliveira<br />

Hermilo Borba Filho (1917 ‑1976)<br />

Natural <strong>de</strong> Palmares, PE<br />

2 a edição – 176 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1619 ‑4<br />

Homem <strong>de</strong> teatro acima <strong>de</strong> tudo, ensaísta, autor <strong>de</strong> lite‑<br />

ratura infantil, pernambucano <strong>de</strong> quatro costados, impreg‑<br />

nado dos valores, das rebeldias e das irreverências do Nor<strong>de</strong>ste,<br />

Hermilo Borba Filho escreveu também uma fieira <strong>de</strong> contos<br />

saborosos, atrevidos, bocage<strong>anos</strong>, reunidos em três volumes.<br />

Histórias narradas numa linguagem <strong>de</strong> tirar o fôlego,<br />

em frases espichadas, uma cachoeira verbal ritmada pelas<br />

vírgulas, repleta <strong>de</strong> expressões do cotidiano, provérbios, ver‑<br />

sos, interjeições, trechos <strong>de</strong> cantigas, uma mistura harmo‑<br />

niosa em que ao popular se junta o clássico, numa espécie<br />

<strong>de</strong> contraponto, <strong>de</strong> fio <strong>de</strong> colar disciplinando e harmoni‑<br />

zando o fluxo verbal. Mordazes e <strong>de</strong>bochadas, apesar <strong>de</strong><br />

baseadas em fatos reais, colhidos na tradição familiar ou<br />

entre amigos, as histórias curtas <strong>de</strong> Hermilo <strong>de</strong>scambam<br />

com frequência para o fantástico, o absurdo, os exageros tão<br />

típicos do cor<strong>de</strong>l, mas sem <strong>de</strong>scartar a permanente nota <strong>de</strong><br />

bom humor. O bom humor persiste até nos momentos <strong>de</strong><br />

tragédia, como um toque <strong>de</strong> irreverência, criando um clima<br />

<strong>de</strong> patético, tal como ocorre nos contos “O palhaço” e “O<br />

general está pintando”. Ou se introduzindo em momentos<br />

quase surreais, como em “Lindalva” e “A roupa”. Em “O<br />

perfumista”, o humor corre em paralelo ao clima <strong>de</strong> real e<br />

fantástico, ao passo que em “O almirante”, ele se mistura à<br />

crítica <strong>de</strong> costumes, em “uma obra ‑prima <strong>de</strong> narrativa em<br />

curta ‑metragem”, como observa Silvio Roberto <strong>de</strong> Oliveira<br />

no prefácio aos Melhores contos Hermilo Borba Filho. O<br />

humor, <strong>de</strong> certa forma, serve também para tornar menos<br />

dolorosos (talvez até <strong>mais</strong> pungentes, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> do ponto <strong>de</strong><br />

vista) alguns aspectos <strong>de</strong> uma realida<strong>de</strong> áspera, dura, retra‑<br />

tada por Hermilo, sempre preocupado em <strong>de</strong>nunciar os ex‑<br />

cessos dos donos do mundo e os fardos do povo oprimido.<br />

Literatura <strong>de</strong> <strong>de</strong>núncia, por certo, mas redimida por um riso<br />

largo, amplo, rabelaisiano.<br />

12<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

IGNÁCIO DE LOyOLA<br />

BRANDÃO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Deonísio da Silva<br />

Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão (1936)<br />

Natural <strong>de</strong> Araraquara, SP<br />

5 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0286 ‑4<br />

Romancista <strong>de</strong> sucesso internacional, Ignácio <strong>de</strong><br />

Loyola Brandão é também um cultor exímio do conto. Essas<br />

histórias curtas – escritas em linguagem coloquial, sem<br />

complicações <strong>de</strong> estilo ou termos raros, <strong>de</strong> comunicação<br />

imediata com o leitor – complementam sua visão da socie‑<br />

da<strong>de</strong> contemporânea, expressa pelos romances. Mudam os<br />

gêneros, permanece a mesma inquietação do autor, a insa‑<br />

tisfação com certos aspectos da realida<strong>de</strong>, a rebeldia diante<br />

dos po<strong>de</strong>rosos, o incômodo com a situação caótica da ci‑<br />

da<strong>de</strong> (no caso, São Paulo), mas também a simpatia (por<br />

vezes com um fundo <strong>de</strong> cruelda<strong>de</strong>, um jogo sadomaso‑<br />

quista com o personagem) pelos sonhadores frustrados,<br />

quase sempre inofensivos, como no sarcástico “45 encon‑<br />

tros com a estrela Vera Fischer”.<br />

Simpatia e sarcasmo se aguçam ainda <strong>mais</strong> quando<br />

trata do sonhador erótico que às mulheres <strong>de</strong> carne e osso<br />

prefere as mulheres irresistíveis das revistas pornográficas<br />

(“Anúncios eróticos”). A fantasia <strong>mais</strong> forte do que a reali‑<br />

da<strong>de</strong>. A fantasia superando a realida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser uma sim‑<br />

ples opção erótica, mas, em dimensões artísticas, significa o<br />

ingresso no fantástico, tão da preferência do escritor.<br />

Vejam ‑se os contos “O homem que viu o lagarto comer seu<br />

filho” e “O homem cuja orelha cresceu”. Apólogos sem véu<br />

<strong>de</strong> alegoria <strong>de</strong> uma civilização em agonia? Ou <strong>de</strong> um país em<br />

crise? Talvez. Mas o autor sabe que a realida<strong>de</strong>, muitas vezes,<br />

po<strong>de</strong> ser <strong>mais</strong> fantástica, ou pelo menos <strong>mais</strong> contun<strong>de</strong>nte<br />

do que a imaginação. E muito <strong>mais</strong> cruel, como no “Retrato<br />

do jovem brigador”. Seja como for, a ficção <strong>de</strong> Ignácio <strong>de</strong><br />

Loyola traduz a realida<strong>de</strong> do homem brasileiro e a situação<br />

conflituosa da socieda<strong>de</strong> atual, a carência <strong>de</strong> valores, a im‑<br />

posição da violência, o <strong>de</strong>smoronamento das crenças, o<br />

vazio existencial, mas também a persistência dos sonhos<br />

com o futuro. Ainda restam algumas esperanças.<br />

M e l h o r e s C o n t o s


J. J. VEIGA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

J. A<strong>de</strong>raldo Castello<br />

J. J. Veiga (1915 ‑1999)<br />

Natural <strong>de</strong> Corumbá, GO<br />

4 a edição – 176 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0228 ‑9<br />

José J. Veiga foi um cidadão do mundo da fantasia<br />

plena, aquela região misteriosa on<strong>de</strong> os sonhos se introme‑<br />

tem na realida<strong>de</strong> e fenômenos estranhos saco<strong>de</strong>m os ali‑<br />

cerces da razão e zombam da lógica.<br />

A sua obra <strong>de</strong> ficcionista está povoada por fantasmas<br />

bonachões, nada fantasmagóricos (no sentido usual do<br />

termo), <strong>mais</strong> capazes <strong>de</strong> encantar do que assustar, objetos<br />

que se humanizam, mas também <strong>de</strong> casos <strong>de</strong> horror, mis‑<br />

tério, sobrenatural, estranhos, por vezes terríveis, quase<br />

sempre com um sentido <strong>de</strong> alegoria. Ou <strong>de</strong> parábola ka‑<br />

fkiana, como no conto “A máquina extraviada”, uma as‑<br />

sustadora reflexão sobre a falta <strong>de</strong> sentido da vida humana.<br />

Parábola, apólogo ou alegoria, surrealismo ou realismo má‑<br />

gico, a ficção <strong>de</strong> José J. Veiga é <strong>mais</strong> libertação do que<br />

evasão, libertação dos estreitos limites da realida<strong>de</strong> física,<br />

das impossibilida<strong>de</strong>s materiais, abertura ao onírico, à janela<br />

para o caos, aos apelos do <strong>de</strong>sconhecido, mas sempre con‑<br />

tida pelo senso crítico, a preocupação <strong>de</strong> não resvalar no<br />

extravagante pelo extravagante. Sob a nu<strong>de</strong>z forte da fan‑<br />

tasia, o escritor esten<strong>de</strong> o manto diáfano da inquietação<br />

com os <strong>de</strong>stinos e limites do ser humano e do simbolismo<br />

social. “A hora dos ruminantes” foi até interpretada como<br />

apólogo político, inspirado no movimento militar <strong>de</strong> 1964,<br />

o que o transformaria em autor engajado. Veiga negou<br />

com veemência, afirmando ter escrito a obra antes do fato.<br />

O que não a impediu <strong>de</strong> se ajustar à situação como uma<br />

luva. Mas nem tudo são símbolos ou apólogos. Há também<br />

contos extraídos da banal realida<strong>de</strong> do cotidiano, nos quais<br />

Veiga <strong>de</strong>monstra gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za em i<strong>de</strong>ntificar proble‑<br />

mas sociais (como em “Cachimbo”) ou recriar, com uma<br />

leveza e poesia que lembra Katherine Mansfield, um sim‑<br />

ples diálogo <strong>de</strong> crianças (“Diálogo da relativa gran<strong>de</strong>za”).<br />

O escritor sabia se movimentar em muitos terrenos.<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

JOÃO ALPHONSUS<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Afonso Henriques Neto<br />

João Alphonsus (1901 ‑1944)<br />

Natural <strong>de</strong> Conceição do Mato Dentro, MG<br />

1 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0694 ‑2<br />

João Alphonsus foi o contista <strong>mais</strong> original do mo<strong>de</strong>r‑<br />

nismo brasileiro. Dono <strong>de</strong> um estilo leve e envolvente,<br />

como uma boa prosa <strong>de</strong> mineiro, e <strong>de</strong> um humor suave, <strong>de</strong><br />

corrosão mínima, escreveu dois romances (Totônio Pacheco<br />

e Rola ‑Moça), poesias (apenas na mocida<strong>de</strong>) e alguns en‑<br />

saios, mas as suas preferências iam para a história curta.<br />

Em um <strong>de</strong>poimento <strong>de</strong> 1942, reproduzido por Afonso<br />

Henriques Neto no prefácio aos Melhores contos João Al‑<br />

phonsus, o autor admite que seus momentos <strong>mais</strong> plenos<br />

<strong>de</strong> realização literária “estão nos meus contos, gênero que<br />

me atrai e satisfaz quase que exclusivamente, tentador e<br />

difícil, mas tão compensador quando se consegue alguma<br />

coisa que nos pareça verda<strong>de</strong>iramente realizada”.Terceiro<br />

dos quinze filhos do poeta simbolista Alphonsus <strong>de</strong> Guima‑<br />

raens, João provou <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cedo o suave veneno da litera‑<br />

tura. Começando a escrever na adolescência, aos vinte<br />

<strong>anos</strong> já tinha um excelente domínio da arte <strong>de</strong> escrever. É<br />

<strong>de</strong>ssa época (1922), o seu primeiro conto digno <strong>de</strong>sse<br />

nome, “Pesca da baleia”, que serviu <strong>de</strong> título a seu se‑<br />

gundo livro no gênero, publicado em 1941. O primeiro,<br />

Galinha cega, havia saído <strong>de</strong>z <strong>anos</strong> antes. A obra do con‑<br />

tista – “doloroso como os russos” e “conciso como os fran‑<br />

ceses”, segundo José Lins do Rego –, foi completada com<br />

Eis a noite! (1943). No ano seguinte o escritor morreu, em<br />

Belo Horizonte, aos 43 <strong>anos</strong>. O que <strong>de</strong> imediato <strong>de</strong>sperta a<br />

atenção do leitor dos contos <strong>de</strong> João Alphonsus é a simpli‑<br />

cida<strong>de</strong>, a “sua cruel <strong>de</strong>smontagem do ridículo e da insatis‑<br />

fação pequeno ‑burguesa” (Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>),<br />

a recusa a qualquer efeito dramático proposital, daqueles<br />

que o escritor tira da manga para comover o leitor, e sua<br />

mal disfarçada pieda<strong>de</strong> por todos os seres vivos. Foi um<br />

gran<strong>de</strong> amigo dos ani<strong>mais</strong>, e suas histórias <strong>de</strong> bichos per‑<br />

manecem insuperáveis em nossa literatura.<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

13


JOÃO ANTÔNIO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Antônio Hohlfeldt<br />

João Antônio (1937 ‑1996)<br />

Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />

3 a edição – 216 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0335 ‑6<br />

Malandros, boêmios, jogadores <strong>de</strong> sinuca, marginaliza‑<br />

dos pelo sistema, gigolôs, prostitutas, punguistas, vigaristas,<br />

<strong>de</strong>dos ‑duros, leões <strong>de</strong> chácara, trombadinhas, <strong>de</strong>semprega‑<br />

dos, artistas <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ntes, proletários são os gran<strong>de</strong>s persona‑<br />

gens <strong>de</strong> João Antônio. Heróis sujos, <strong>de</strong>sesperançados,<br />

amargos, vivendo o dia a dia da cida<strong>de</strong> com a astúcia, o faro,<br />

o apetite pela sobrevivência das feras na selva.<br />

Mais que a lei da selva, é a lei do cão que rege esse<br />

mundo implacável, sem gran<strong>de</strong>za, duro, visto com curiosi‑<br />

da<strong>de</strong> por um escritor que registra a realida<strong>de</strong> como ela é,<br />

sem atenuantes, sem frases <strong>de</strong> efeito, sem falsos momen‑<br />

tos <strong>de</strong> ternura, no mau sentido da palavra, mas com uma<br />

viva e mal disfarçada simpatia. Simpatia, i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>, empa‑<br />

tia, pois, ao contrário <strong>de</strong> certos escritores <strong>de</strong> gabinete, João<br />

Antônio viveu o mundo <strong>de</strong> seus personagens, conviveu<br />

com mestres da sinuca e otários, sentiu a angústia do tra‑<br />

balhador sem dinheiro para o pão, presenciou a cruelda<strong>de</strong><br />

e a violência das ruas, as perseguições policiais, a passivi‑<br />

da<strong>de</strong> dos que aceitam a sua condição <strong>de</strong> lixo humano e a<br />

rebeldia dos revoltados. Daí vem a força <strong>de</strong> sua narrativa,<br />

expressa numa arte refinada, com um longínquo sabor<br />

clássico, <strong>de</strong> um clássico velhaco (como o chamou Jorge<br />

Amado), senhor <strong>de</strong> todos os segredos do conto, expres‑<br />

sando ‑se em uma linguagem inventiva, enriquecida pelo<br />

coloquial do submundo, habilmente incorporada ao fluxo<br />

da frase artística. Linguagem brasileira, inconfundível, <strong>de</strong><br />

um escritor i<strong>de</strong>ntificado com a sua terra, com o Brasil real,<br />

cruel e discriminador para tantos <strong>de</strong> seus filhos (“sou tão<br />

brasileiro, gosto daqui e não me ajeito a viver nas estran‑<br />

jas”), mas também cheio <strong>de</strong> vida, <strong>de</strong> picardias, <strong>de</strong> energia<br />

e vitalida<strong>de</strong>, que o escritor colhia como se colhe uma purís‑<br />

sima flor do lodo. Como disse o próprio João Antônio, “a<br />

vida não po<strong>de</strong> ser uma lata velha, enferrujada e triste”.<br />

14<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

JOÃO DO RIO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Helena Parente Cunha<br />

João do Rio (1881 ‑1921)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

2 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0248 ‑1<br />

Cínicos, <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ntes, provocadores, os contos <strong>de</strong> João do<br />

Rio refletem o momento <strong>de</strong> transformação do Rio <strong>de</strong> Janeiro,<br />

ao influxo das reformas <strong>de</strong> Pereira Passos, nas duas primeiras<br />

décadas do século XX. Sob as mãos firmes do gran<strong>de</strong> prefeito,<br />

a velha cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> traçado colonial, imunda, ia se transfor‑<br />

mando numa metrópole mo<strong>de</strong>rna, <strong>de</strong> ruas largas e limpas,<br />

cujo símbolo é a abertura da avenida Central. “O Rio civi‑<br />

liza ‑se” era a frase <strong>mais</strong> dita durante a belle époque.<br />

Na cida<strong>de</strong> iluminada a eletricida<strong>de</strong>, on<strong>de</strong> os primeiros<br />

automóveis <strong>de</strong>sfilavam na assustadora velocida<strong>de</strong> <strong>de</strong> 30<br />

km/h, melindrosas e almofadinhas se exibiam à porta das<br />

confeitarias e pela rua do Ouvidor. Surgiam os chamados<br />

vícios elegantes, como a cocaína, multiplicavam ‑se os bor‑<br />

déis e as casas para encontros amorosos clan<strong>de</strong>stinos. A<br />

febre <strong>de</strong> mundanismo, a “vida vertiginosa” dominava a ci‑<br />

da<strong>de</strong>. João do Rio foi o cronista admirável <strong>de</strong>sse universo,<br />

retratado também em reportagens escritas em estilo ágil e<br />

vibrante, que renovaram o jornalismo brasileiro, dando ao<br />

jovem escritor um extraordinário prestígio. Estreando na<br />

imprensa aos <strong>de</strong>zeseis <strong>anos</strong>, fez uma carreira brilhante, que<br />

<strong>de</strong>spertou invejas e o levou à Aca<strong>de</strong>mia Brasileira <strong>de</strong> Letras,<br />

aos 29 <strong>anos</strong>. Nesta época, publicou seu primeiro livro <strong>de</strong><br />

contos, Dentro da noite, uma espécie <strong>de</strong> síntese da obra do<br />

contista, interessado sobretudo nos aspectos patológicos<br />

da natureza humana, nas perversões, nos vícios, confessá‑<br />

veis ou inconfessáveis, e nas situações equívocas ou cho‑<br />

cantes, como vemos em trabalhos como “O bebê <strong>de</strong><br />

tarlatana rosa” e “D. Joaquina”. Como alguns dos maiores<br />

escritores da época, João do Rio abusava do estilo precioso,<br />

das frases <strong>de</strong> efeito, do brilho fácil, dos paradoxos a Oscar<br />

Wil<strong>de</strong>, que agradavam o público da época. Ao leitor <strong>de</strong><br />

hoje po<strong>de</strong>m parecer recursos artificiais, mas sem compro‑<br />

meter o prazer da leitura.<br />

M e l h o r e s C o n t o s


JOEL SILVEIRA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Lêdo Ivo<br />

Joel Silveira (1918 ‑2007)<br />

Natural <strong>de</strong> Aracaju, SE<br />

2 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1623 ‑1<br />

Um dos gran<strong>de</strong>s jornalistas da história da imprensa bra‑<br />

sileira, consi<strong>de</strong>rado o maior repórter <strong>de</strong> sua geração, Joel Sil‑<br />

veira recebeu <strong>de</strong> Manuel Ban<strong>de</strong>ira uma bela louvação: “Como<br />

repórter, não tem quem lhe leve vantagem: possui uma ma‑<br />

neira muito pessoal, pachorrenta, meio songa ‑monga, volun‑<br />

tariamente sem brilho literário – é o anti ‑João do Rio – e,<br />

apesar disso, ou antes por isso mesmo, maciamente perfu‑<br />

rante como uma punhalada que dói quando a ferida esfria”.<br />

Várias <strong>de</strong>ssas qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> repórter estão presentes<br />

nos contos <strong>de</strong> Joel Silveira, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sua rumorosa estreia<br />

com Onda raivosa (19<strong>39</strong>), quando o jovem jornalista <strong>de</strong> 21<br />

<strong>anos</strong>, recém ‑chegado <strong>de</strong> Sergipe, “assaltava as atalaias li‑<br />

terárias e jornalísticas da metrópole com o seu talento,<br />

ousadia e graça, e uma esplêndida e matinal belicosida<strong>de</strong>”,<br />

como informa Lêdo Ivo no prefácio aos Melhores contos<br />

Joel Silveira. A fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> ao jornalismo e à literatura se<br />

manteve a vida toda. O que servia <strong>de</strong> fonte a uma, servia<br />

também <strong>de</strong> inspiração a outra, como ocorre nas Histórias<br />

<strong>de</strong> pracinhas (1945), ocorridas com os soldados brasileiros<br />

que lutaram na Segunda Guerra Mundial (que o autor co‑<br />

briu como repórter) e nos vários volumes posteriores <strong>de</strong><br />

contos. A crítica i<strong>de</strong>ntificou na maneira <strong>de</strong> narrar do con‑<br />

tista, na preferência pelo episódio instantâneo ou pelo as‑<br />

pecto fugaz da vida cotidiana, semelhança com Katherine<br />

Mansfield. Os contos <strong>de</strong>ssa época eram registros <strong>de</strong> instan‑<br />

tes em que nada acontece, mas atravessados por sugestões<br />

e pressentimentos, seu verda<strong>de</strong>iro suporte. A evolução pos‑<br />

terior levou Joel Silveira a novos caminhos, mas preser‑<br />

vando a ironia e a graça do estilo. Em alguns momentos <strong>de</strong><br />

plena realização artística chega no que <strong>de</strong> melhor produziu<br />

o conto brasileiro, como em O dia em que o leão morreu,<br />

“pungente obra ‑prima que só costuma sair da pena avi‑<br />

sada dos clássicos!” (Lêdo Ivo).<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

LÊDO IVO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Afrânio Coutinho<br />

Lêdo Ivo (1924)<br />

Natural <strong>de</strong> Maceió, AL<br />

2 a edição – 144 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0<strong>39</strong>4 ‑1<br />

Poeta exuberante, ensaísta inquietador, tradutor <strong>de</strong><br />

alguns poetas intraduzíveis, como Rimbaud, seduzido eter‑<br />

namente pelas múltiplas aventuras do espírito, Lêdo Ivo<br />

acumula uma rica obra <strong>de</strong> ficção, na qual o conto ocupa<br />

um lugar à parte, seja pelo volume, mo<strong>de</strong>sto em relação ao<br />

número <strong>de</strong> romances, como pela qualida<strong>de</strong> dos trabalhos,<br />

a novida<strong>de</strong>, o domínio da técnica, a maestria da lingua‑<br />

gem. O contista não <strong>de</strong>smerece o poeta.<br />

Lêdo Ivo estreou no conto em 1957, com A cida<strong>de</strong> e os<br />

dias, volume que traz a indicação <strong>de</strong> reunir crônicas e histó‑<br />

rias. Na realida<strong>de</strong>, são contos autênticos, no sentido rigoroso<br />

do termo, e não segundo a classificação elástica <strong>de</strong> Mário <strong>de</strong><br />

Andra<strong>de</strong>, <strong>de</strong> que conto é tudo aquilo que o autor chama <strong>de</strong><br />

conto. Em 1961, publicou o segundo e último volume do<br />

gênero, intitulado Use a passagem subterrânea (1961). Con‑<br />

tista do cotidiano, as suas histórias curtas retratam a comé‑<br />

dia humana carioca, pequenos dramas insuspeitos (“O<br />

flautim”), casos <strong>de</strong> adultério sem remorso (“A viúva e o es‑<br />

tudante”), o <strong>de</strong>spertar da sexualida<strong>de</strong> (“Quando a fruta está<br />

madura”), com um certo <strong>de</strong>sencanto dos homens e da vida,<br />

mas com uma confiança <strong>de</strong>cidida no po<strong>de</strong>r purificador da<br />

poesia. O <strong>de</strong>salento com a humanida<strong>de</strong> alcança uma espécie<br />

<strong>de</strong> auge no belo “Natal carioca”, um breve apólogo <strong>de</strong><br />

sabor agridoce. Os personagens são empregadas domésticas<br />

em namoro com guardas municipais (“O amor em Grajaú”),<br />

aposentados, algumas crianças (a infância ocupa um lugar<br />

importante no mundo do ficcionista). A cida<strong>de</strong> do Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro, on<strong>de</strong> a maioria dos contos se <strong>de</strong>senrola, é uma<br />

gran<strong>de</strong> presença e, como Machado <strong>de</strong> Assis, Lêdo Ivo regis‑<br />

tra com fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> os locais frequentados pelos personagens,<br />

a confeitaria do largo da Carioca, o teatro Carlos Gomes, e<br />

os meios <strong>de</strong> transporte, o bondinho sacolejante <strong>de</strong> Santa<br />

Teresa, os trens da Central, os ônibus congestionados.<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

15


LIMA BARRETO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Francisco <strong>de</strong> Assis Barbosa<br />

Lima Barreto (1881 ‑1922)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

8 a edição – 176 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0081 ‑0<br />

Lima Barreto morreu em novembro <strong>de</strong> 1922, em sua<br />

casa suburbana <strong>de</strong> Todos os Santos, no Rio <strong>de</strong> Janeiro,<br />

lendo a Revue <strong>de</strong>s Deux Mon<strong>de</strong>s. Tinha 41 <strong>anos</strong> e <strong>de</strong>ixava<br />

a obra <strong>de</strong> ficção <strong>mais</strong> importante da literatura brasileira,<br />

<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis. Sua morte, alguns meses <strong>de</strong>‑<br />

pois da Semana <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna, tem alguma coisa <strong>de</strong><br />

simbólica. É como uma espécie <strong>de</strong> retirada <strong>de</strong> cena <strong>de</strong> um<br />

Brasil arcaico, preso a valores em acelerado processo <strong>de</strong><br />

erosão, diante do fulgor <strong>de</strong> um novo mundo que ansiava<br />

por se manifestar, por bem ou à força. Alguma coisa <strong>de</strong>sse<br />

mundo em gestação já estava presente na obra <strong>de</strong> Lima<br />

Barreto: a simpatia pelos marginalizados, a revolta contra<br />

os preconceitos, a ânsia <strong>de</strong> <strong>de</strong>molição social que fez <strong>de</strong>le<br />

um precursor da própria Semana. No prefácio aos Melhores<br />

contos Lima Barreto, Francisco <strong>de</strong> Assis Barbosa lembra a<br />

analogia estabelecida por Otto Maria Carpeaux entre Lima<br />

e os escritores norte ‑americ<strong>anos</strong> da década <strong>de</strong> 1910, inicia‑<br />

dores <strong>de</strong> uma literatura <strong>de</strong> protesto chamada à época <strong>de</strong><br />

“remoção do lixo”. Afinida<strong>de</strong>s à parte, o ensaísta observa<br />

que nenhum dos escritores norte ‑americ<strong>anos</strong> citados –<br />

Upton Sinclair e Jack London – tinham o humor corrosivo<br />

do brasileiro e nem criaram uma obra tão humana como o<br />

Triste fim <strong>de</strong> Policarpo Quaresma. Sensibilida<strong>de</strong> humana,<br />

humor corrosivo, e uma mal disfarçada ternura pelos hu‑<br />

mil<strong>de</strong>s, os vencidos da vida, atirados nos subúrbios (“o su‑<br />

búrbio é o refúgio dos infelizes”, escreveu) assinalam também<br />

os contos <strong>de</strong> Lima. É neles que se realça ainda <strong>mais</strong> o espí‑<br />

rito <strong>de</strong> revolta do escritor, assim como sua permanente in‑<br />

veja dos ricos, sentimentos que se acham presentes em<br />

muitas <strong>de</strong> suas melhores histórias curtas (“O homem que<br />

sabia javanês”, “A biblioteca”, “Cló”, “A nova Califórnia”,<br />

“Clara dos Anjos”), obras ‑primas da literatura brasileira e<br />

universal.<br />

16<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

LUIZ VILELA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Wilson Martins<br />

Luiz Vilela (1942)<br />

Natural <strong>de</strong> Ituiutaba, MG<br />

3 a edição – 248 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0203 ‑1<br />

Tremor <strong>de</strong> terra (1967), o primeiro livro <strong>de</strong> Luiz Vilela,<br />

provocou um pequeno abalo sísmico entre os cultores do<br />

conto e os críticos brasileiros. O autor, então com 24 <strong>anos</strong>,<br />

<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> recusado por vários editores, publicou o livro por<br />

conta própria. Inscrito no Prêmio Nacional <strong>de</strong> Brasília, ob‑<br />

teve o primeiro lugar, superando 250 concorrentes, entre<br />

os quais vários escritores <strong>de</strong> prestígio nacional.<br />

Des<strong>de</strong> logo, Vilela foi apontado como a maior revela‑<br />

ção do conto no Brasil, <strong>de</strong>pois dos já consagrados Dalton<br />

Trevisan e Rubem Fonseca. Nos volumes seguintes, uma<br />

longa trajetória composta por <strong>mais</strong> <strong>de</strong> vinte volumes, a<br />

maioria <strong>de</strong> contos, impôs ‑se em <strong>de</strong>finitivo como um dos<br />

mestres do gênero. Partindo quase sempre <strong>de</strong> uma situa‑<br />

ção banal – uma conversa <strong>de</strong> bar, uma visita –, os contos<br />

<strong>de</strong> Vilela apresentam uma humanida<strong>de</strong> angustiada, solitá‑<br />

ria, amarga, frustrada, em busca <strong>de</strong>sesperada <strong>de</strong> um sen‑<br />

tido para a vida, mas incapazes <strong>de</strong> se comunicar com seus<br />

semelhantes. Os fatos se <strong>de</strong>senrolam com naturalida<strong>de</strong>,<br />

sem truques, em um clima <strong>de</strong> pessimismo, sordi<strong>de</strong>z, gro‑<br />

tesco e ridículo. Como <strong>de</strong>finiu Wilson Martins, no prefácio<br />

aos Melhores contos Luiz Vilela, as páginas <strong>de</strong> Vilela “têm<br />

a palpitação interna do conto, não po<strong>de</strong>riam ser outra<br />

coisa senão contos; é a arte das linhas simples e profundas,<br />

e das dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> execução; é bem a música <strong>de</strong> câ‑<br />

mara e não a sinfonia arranjada para instrumentos menos<br />

numerosos”. O volume <strong>de</strong> Melhores contos Luiz Vilela está<br />

composto por trinta trabalhos. Alguns <strong>de</strong>les consi<strong>de</strong>rados<br />

obras ‑primas da literatura brasileira: “Os sobreviventes”,<br />

“Bárbaro”, “Aprendizado”, “Françoise”, “Luz sobre a porta”,<br />

“Ousadia”, “Um peixe”, “Preocupações <strong>de</strong> uma velhinha”,<br />

que <strong>de</strong>vem permanecer ao lado do melhor produzido por<br />

seus contemporâneos, um Dalton Trevisan, um Rubem Fon‑<br />

seca. Que o leitor julgue por si mesmo.<br />

M e l h o r e s C o n t o s


LyGIA FAGUNDES<br />

TELLES<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Eduardo Portella<br />

Lygia Fagun<strong>de</strong>s Telles (1923)<br />

Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />

11 a edição – 176 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0336 ‑4<br />

Um dos nomes <strong>mais</strong> importantes da literatura brasi‑<br />

leira, mestre do romance, é no conto que Lygia Fagun<strong>de</strong>s<br />

Telles encontra seu <strong>mais</strong> autêntico meio <strong>de</strong> expressão e <strong>de</strong><br />

renovação. Cada um <strong>de</strong> seus livros revela uma nova Lygia,<br />

aberta à totalida<strong>de</strong> da vida, sempre interessada em novos<br />

mistérios, na busca permanente do <strong>mais</strong> intrigante <strong>de</strong><br />

todos eles, o mistério humano.<br />

Começando a escrever ainda adolescente (seu primeiro<br />

livro, repudiado pela autora, foi publicado quando ela tinha<br />

quinze <strong>anos</strong>), alcançou a maturida<strong>de</strong> intelectual com o ro‑<br />

mance Ciranda <strong>de</strong> pedra (1954) e, no conto, com as Histórias<br />

do <strong>de</strong>sencontro (1958), em que predomina uma atmos‑<br />

fera <strong>de</strong> angústia e frustração, que se repete com frequência<br />

em sua obra. A partir daí, publicou vários volumes <strong>de</strong> contos,<br />

nos quais se po<strong>de</strong> fisgar pelo menos uma meia dúzia <strong>de</strong><br />

obras ‑primas. Consagrada pela crítica nacional e internacio‑<br />

nal, comparada a monstros sagrados da literatura universal,<br />

uma Katherine Mansfield, uma Virginia Woolf, Lygia é uma<br />

perfeccionista incansável, escrevendo e reescrevendo inúme‑<br />

ras vezes seus trabalhos, em busca do completo <strong>de</strong>spoja‑<br />

mento, da nota exata que revele o íntimo <strong>de</strong> suas criaturas,<br />

os seus dilaceramentos, as suas inquietações, os seus impas‑<br />

ses diante da vida, aquela nota trágica tão característica <strong>de</strong><br />

sua arte. Escrever é cortar, dizia Marques Rebelo. Com o<br />

domínio da forma, disposta sempre a cortar, nunca a acres‑<br />

cer, Lygia chegou a criar uma sintaxe própria, eliminando os<br />

complementos óbvios da frase. Exemplo: “Filó, a gatinha<br />

correndo e berrando com aquele rabo aceso, uma antena”.<br />

Descartou ‑se <strong>de</strong> muito <strong>mais</strong>, <strong>de</strong> tudo que seja acessório,<br />

atraída pelo essencial, o texto perfeito do qual nada se po<strong>de</strong><br />

acrescentar ou suprimir, até alcançar aquela “clássica sereni‑<br />

da<strong>de</strong> das formas <strong>de</strong> arte <strong>de</strong>finitivas”, que o crítico Paulo<br />

Rónai i<strong>de</strong>ntificou em seus contos.<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

MACHADO DE ASSIS<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Domício Proença Filho<br />

Machado <strong>de</strong> Assis (18<strong>39</strong> ‑1908)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

16 a edição – 384 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1406 ‑0<br />

Uma seleção dos melhores contos <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis<br />

correspon<strong>de</strong> ao que <strong>de</strong> melhor se escreveu no gênero, em<br />

língua portuguesa. Maior escritor brasileiro, romancista cheio<br />

<strong>de</strong> artes e artimanhas, mestre da dubieda<strong>de</strong>, dando a enten‑<br />

<strong>de</strong>r, muitas vezes, o contrário do que quis dizer, conhecedor<br />

profundo da alma humana, o bruxo do Cosme Velho encon‑<br />

trou no conto um esplêndido terreno para suas bruxarias.<br />

Em quase meio século <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> no gênero, Ma‑<br />

chado <strong>de</strong>ixou 205 contos, entre os quais <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> obras‑<br />

‑primas, das melhores escritas em qualquer época e país,<br />

que o colocam como uma espécie <strong>de</strong> pico solitário da litera‑<br />

tura universal, ao lado <strong>de</strong> outros mestres do gênero, Tchecov,<br />

Maupassant, Katherine Mansfield, Jens Peter Jacobsen. No<br />

início <strong>de</strong> sua carreira, o escritor não <strong>de</strong>u muita importância<br />

ao gênero. O primeiro conto, publicado aos <strong>de</strong>zenove <strong>anos</strong>,<br />

chamava ‑se “Três tesouros perdidos”, e o segundo, “O país<br />

das quimeras” só saiu três <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois (em 1862). O exercí‑<br />

cio constante e persistente do gênero só se realiza após<br />

1864. Convidado a colaborar no Jornal das Famílias, as suas<br />

histórias agradam tanto as leitoras que cada número publica<br />

dois ou três trabalhos seus, obrigando ‑o a utilizar diversos<br />

pseudônimos. O pleno domínio do gênero coinci<strong>de</strong> com a<br />

gran<strong>de</strong> crise <strong>de</strong> sua vida, no fim da década <strong>de</strong> 1870, levando ‑o<br />

à <strong>de</strong>scrença, ao pessimismo e ao temor da loucura. É a<br />

época das Memórias póstumas <strong>de</strong> Brás Cubas e dos contos<br />

<strong>de</strong> Papéis avulsos (1882), marcados pela inquietação diante<br />

da condição humana, amargos, irônicos, sarcásticos, críticos<br />

impiedosos do bicho ‑homem, cheios <strong>de</strong> situações ambíguas,<br />

quando nada acontece, mas palpita uma riquíssima carga <strong>de</strong><br />

humanida<strong>de</strong>. Obras ‑primas do quilate <strong>de</strong> “Missa do galo”,<br />

“Uns braços”, “Dona Benedita”, e outros, on<strong>de</strong> a dificul‑<br />

da<strong>de</strong> é escolher o melhor do que, por sua condição, já figura<br />

entre o melhor dos melhores.<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

17


MARCOS REy<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Fábio Lucas<br />

Marcos Rey (1925 ‑1999)<br />

Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />

2 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0593 ‑8<br />

Marcos Rey é daqueles escritores que pren<strong>de</strong>m o leitor<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a primeira frase e só o libertam após o ponto ‑final.<br />

Her<strong>de</strong>iro dos gran<strong>de</strong>s autores <strong>de</strong> romances <strong>de</strong> aventura, com<br />

um gosto mal disfarçado, mas contido, pelo folhetinesco,<br />

sabe como dosar o suspense para manter o leitor sempre <strong>de</strong><br />

fôlego curto, ansioso para <strong>de</strong>svendar o mistério proposto.<br />

Mistério, no caso, nem sempre significa a resolução <strong>de</strong><br />

um enigma complicado, indispensável à salvação da vida do<br />

personagem. O mistério po<strong>de</strong> ser também psicológico, um<br />

daqueles grilos que levam as pessoas aos atos e às atitu<strong>de</strong>s<br />

<strong>mais</strong> estranhos. Uma inclinação in<strong>de</strong>finível, como ocorre no<br />

excelente conto “O locutor da madrugada”, que Fábio Lucas,<br />

no prefácio aos Melhores contos Marcos Rey, classifica, com<br />

razão, como machadiano: “Machadiano com maior liberda<strong>de</strong><br />

quanto à mise ‑en ‑scène”. Romancista, autor <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> qua‑<br />

renta títulos, que alcançaram uma vendagem superior a 5<br />

milhões <strong>de</strong> exemplares, Edmundo Donato (este seu nome ver‑<br />

da<strong>de</strong>iro, o outro é pseudônimo) escreveu <strong>de</strong> tudo um pouco.<br />

Foi redator <strong>de</strong> rádio, publicitário, redigiu roteiros para o ci‑<br />

nema e para a televisão. O conto foi paixão prematura. Antes<br />

mesmo <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r a ler, já vivia envolvido pela magia das<br />

histórias que seu pai lhe contava, à noite, entre goles <strong>de</strong> vinho<br />

branco. Deve ter sido aí que apren<strong>de</strong>u algumas das virtu<strong>de</strong>s<br />

capitais que distinguem os seus contos: o relato direto, obje‑<br />

tivo, sem preciosismos <strong>de</strong> estilo, num ritmo envolvente, tal e<br />

qual uma boa narrativa oral. Aos <strong>de</strong>zessete <strong>anos</strong> publicou o<br />

primeiro conto, em um jornal paulistano. Não parou <strong>mais</strong>,<br />

senhor <strong>de</strong> seu ofício e da arte <strong>de</strong> pren<strong>de</strong>r o leitor. Arte que<br />

começa pelas sugestões lançadas no título <strong>de</strong> seus livros e<br />

contos, <strong>de</strong> gosto popular e mo<strong>de</strong>rno. Confira ‑se: “O enterro<br />

da cafetina”, “Soy loco por ti, América!”, “O pêndulo da<br />

noite”, “O cão da meia ‑noite”, “Eu e meu Fusca”, “Mustang<br />

cor <strong>de</strong> sangue”. O resto fica por conta do talento.<br />

18<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

MARQUES REBELO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Ary Quintella<br />

Marques Rebelo (1907 ‑1973)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

4 a edição – 216 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0296 ‑1<br />

Her<strong>de</strong>iro da tradição carioca <strong>de</strong> Manuel Antônio <strong>de</strong><br />

Almeida, Machado <strong>de</strong> Assis e Lima Barreto, Marques Re‑<br />

belo recriou por meio da ficção, com muita mordacida<strong>de</strong> e<br />

algum lirismo, a vida da cida<strong>de</strong> nas décadas <strong>de</strong> 1930 e 1940.<br />

Depois <strong>de</strong>ssa fase, <strong>de</strong>dicou ‑se <strong>de</strong> preferência ao romance,<br />

escrevendo apenas três contos.<br />

Foi uma época rica em acontecimentos, assinalada por<br />

ditaduras, revoltas armadas, conflitos, perseguições políticas.<br />

A vida material se tornou <strong>mais</strong> complexa, multiplicaram ‑se os<br />

automóveis, a cida<strong>de</strong> cresceu, mas a vida humana continuou<br />

com as mesmas angústias e esperanças. A pequena burgue‑<br />

sia carioca, resi<strong>de</strong>nte na Zona Norte e nos subúrbios, <strong>de</strong> on<strong>de</strong><br />

o escritor extraía a maior parte dos personagens <strong>de</strong> seus con‑<br />

tos, penava com a dureza do cotidiano e do emprego mo‑<br />

<strong>de</strong>sto, acompanhava os programas <strong>de</strong> rádio (são inúmeros os<br />

contos em que os personagens ouvem rádio), esbaldava ‑se<br />

no Carnaval, frequentava cinemas nos fins <strong>de</strong> semana, torcia<br />

e sofria pelo seu time <strong>de</strong> futebol. Muitos viviam em casas <strong>de</strong><br />

pensão, abundantes na cida<strong>de</strong>. Os <strong>mais</strong> privilegiados dispu‑<br />

nham <strong>de</strong> vitrola ortofônica, on<strong>de</strong> ouviam os discos <strong>de</strong> Fran‑<br />

cisco Alves. As aspirações individuais eram mo<strong>de</strong>stas. Todos<br />

queriam <strong>mais</strong> ou menos a mesma coisa: mudar <strong>de</strong> vida, enri‑<br />

quecer, arranjar um(a) amante. Nessas vidas mo<strong>de</strong>stas e inco‑<br />

lores, o escritor encontra material para os seus admiráveis<br />

contos, escritos com arte refinada, em linguagem coloquial e<br />

diálogos vivos, reveladores da psicologia dos personagens.<br />

Escritos com implacável ironia, os contos <strong>de</strong> Rebelo são mar‑<br />

cados também por um permanente <strong>de</strong>sencanto, como se o<br />

escritor indagasse: vale a pena viver? Em raros momentos, a<br />

pieda<strong>de</strong> pelos <strong>de</strong>stinos frustrados estabelece uma inusitada<br />

atmosfera <strong>de</strong> simpatia humana. O lirismo só predomina<br />

quando a nostalgia domina o escritor, na evocação <strong>de</strong> episó‑<br />

dios da infância e da mocida<strong>de</strong>.<br />

M e l h o r e s C o n t o s


MOACyR SCLIAR<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Regina Zilbermann<br />

Moacyr Scliar (1937 ‑2011)<br />

Natural <strong>de</strong> Porto Alegre, RS<br />

6 a edição – 272 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0028 ‑5<br />

Quando o fantástico se junta ao humor o resultado é<br />

no mínimo insólito, surpreen<strong>de</strong>nte, inesperado, sobretudo<br />

se for o humor judaico levado ao extremo, autopunitivo, a<br />

meio caminho entre o <strong>de</strong>sespero e a ironia. Junte ‑se a isso,<br />

doses bem controladas <strong>de</strong> erotismo, <strong>de</strong> sagrado (e <strong>de</strong> uma<br />

permanente tentação <strong>de</strong> <strong>de</strong>ssacralização), uma certa joco‑<br />

sida<strong>de</strong>, e temos os principais ingredientes que compõem a<br />

arte do contista Moacyr Scliar. Essa simples mistura, evi<strong>de</strong>n‑<br />

temente, não basta para fazer um bom conto ou agradar<br />

o leitor. Isso <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> exclusivamente do talento do autor,<br />

da perícia com que controla a técnica do conto, <strong>de</strong> sua<br />

visão maliciosa do mundo, da eleição dos temas, <strong>de</strong> uma<br />

certa impieda<strong>de</strong> com que trata os personagens, em con‑<br />

traste com sua pieda<strong>de</strong> pela condição humana.<br />

A contradição é a primeira marca do humano. E o<br />

universo <strong>de</strong> Moacyr Scliar é povoado por seres hum<strong>anos</strong>,<br />

ou atormentados por sentimentos hum<strong>anos</strong>, sejam eles<br />

simples mortais, um anão que vive no interior <strong>de</strong> um apa‑<br />

relho <strong>de</strong> televisão ou um cadáver, <strong>de</strong>itado na mesa <strong>de</strong> um<br />

necrotério, que avalia e julga os alunos <strong>de</strong> Medicina que lhe<br />

retalham o corpo. Situação insólita <strong>mais</strong> realismo da <strong>de</strong>scri‑<br />

ção e o resultado é a mudança <strong>de</strong> perspectivas do conto, a<br />

sua sedimentação como apólogo ou parábola do mundo<br />

mo<strong>de</strong>rno. Claro, quando se fala dos dias atuais, a violência,<br />

a cruelda<strong>de</strong> do homem para o semelhante, a exacerbação<br />

do sexo, utilizado como elemento <strong>de</strong> dominação, têm <strong>de</strong><br />

estar presente. Outra gran<strong>de</strong> vertente da ficção <strong>de</strong> Scliar é a<br />

vida dos imigrantes ju<strong>de</strong>us, as dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> adaptação,<br />

a persistência em manter hábitos trazidos <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong>s<br />

muito diversas que, como observa Regina Zilbermann no<br />

prefácio, enfocadas com uma mal disfarçada ternura, cons‑<br />

tituem a forma <strong>mais</strong> aguda da arte <strong>de</strong> Scliar “assumir sua<br />

própria individualida<strong>de</strong> e significação”.<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

ORÍGENES LESSA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Glória Pondé<br />

Orígenes Lessa (1903 ‑1986)<br />

Natural <strong>de</strong> Lençóis Paulista, SP<br />

1 a edição – 288 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0855 ‑2<br />

Orígenes Lessa escreveu romances, reportagens, um<br />

curioso livro sobre técnica <strong>de</strong> vendas, uma abundante lite‑<br />

ratura infantojuvenil, tão importante para o povinho miúdo<br />

<strong>de</strong> nossa época quanto a obra <strong>de</strong> Monteiro Lobato, e al‑<br />

guns dos contos <strong>mais</strong> saborosos ja<strong>mais</strong> imaginados e publi‑<br />

cados no Brasil.<br />

Quem o lê pela primeira vez tem a impressão <strong>de</strong> que é<br />

fácil escrever histórias como as <strong>de</strong>le. Tão simples, tão huma‑<br />

nas, narradas em tom malicioso, levemente irônico, por<br />

vezes cruel. Impressão. A realida<strong>de</strong> é muito diferente. A cla‑<br />

reza, a espontaneida<strong>de</strong>, o estilo enxuto e objetivo, o domínio<br />

técnico, tão preciso que dá i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que nem existe técnica,<br />

nada têm a ver com aquela simplicida<strong>de</strong> sinônimo <strong>de</strong> po‑<br />

breza, e sim com a simplicida<strong>de</strong> das coisas naturais, resul‑<br />

tado <strong>de</strong> processos complexos, como a goiaba ou a manga<br />

madura pendurada no galho. Filho <strong>de</strong> um pastor protes‑<br />

tante, Orígenes já nasceu com tinta <strong>de</strong> escrever no sangue.<br />

O pai era um erudito, professor <strong>de</strong> Teologia, e autor <strong>de</strong> vários<br />

livros sobre temas históricos. Em sua missão <strong>de</strong> religioso,<br />

Vicente Themudo Lessa não esquentava lugar. Morou em<br />

Lençóis Paulista (on<strong>de</strong> o futuro escritor nasceu), em São<br />

Paulo, em São Luís do Maranhão, on<strong>de</strong> Orígenes começou<br />

a <strong>de</strong>senvolver seu talento <strong>de</strong> escritor. O primeiro trabalho foi<br />

escrito em caracteres gregos, copiados dos livros do pai. A<br />

estreia em livro se <strong>de</strong>u aos 26 <strong>anos</strong>, um volume <strong>de</strong> contos<br />

intitulado O escritor proibido (1929). A partir daí, não parou<br />

<strong>mais</strong>. Publicou <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> livros. Dez volumes <strong>de</strong> contos, nos<br />

quais explorou as <strong>mais</strong> extremas situações, do <strong>mais</strong> simples<br />

caso fisgado do cotidiano ao fantástico, sempre com um<br />

sentido <strong>de</strong> crítica, mas também <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> e simpatia<br />

humana. O que levou a prefaciadora dos Melhores contos<br />

Orígenes Lessa, Glória Pondé, a afirmar que “a literatura<br />

<strong>de</strong> Orígenes Lessa é, toda ela, <strong>de</strong> comunhão”.<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

19


OSMAN LINS<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Sandra Nitrini<br />

Osman Lins (1924 ‑1978)<br />

Natural <strong>de</strong> Pernambuco, PE<br />

1 a edição – 224 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0814 ‑5<br />

Quando lançou seu primeiro volume <strong>de</strong> contos, Osman<br />

Lins já era um romancista premiado. A precedência, no<br />

caso, explica a preferência. Ao longo <strong>de</strong> sua ativida<strong>de</strong> lite‑<br />

rária, o escritor publicou apenas dois livros <strong>de</strong> contos e<br />

cinco romances, i<strong>de</strong>ntificados pela mesma qualida<strong>de</strong> literá‑<br />

ria, pela busca obstinada pela perfeição formal, segundo a<br />

lição <strong>de</strong> Flaubert. Os gestos (1957) exigiu <strong>mais</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>z <strong>anos</strong><br />

<strong>de</strong> trabalho, o mesmo tempo consumido com Nove, no‑<br />

vena (1966). Escritor <strong>de</strong> formação clássica, Osman Lins se‑<br />

guiu em seu primeiro livro os mo<strong>de</strong>los da narrativa tradicional,<br />

na linhagem machadiana. Em frases curtas e estilo traba‑<br />

lhado, recheado <strong>de</strong> imagens, retrata uma humanida<strong>de</strong><br />

miúda, vivendo pequenos dramas no recinto doméstico,<br />

angustiada, dominada pelo sentimento da solidão e <strong>de</strong><br />

abandono, quase à margem da socieda<strong>de</strong>. Nove, novena<br />

assinala a transformação das narrativas <strong>de</strong> Osman Lins,<br />

uma novida<strong>de</strong> na literatura brasileira. Os contos se <strong>de</strong>sen‑<br />

volvem em vários pl<strong>anos</strong> <strong>de</strong> narração, em fragmentos,<br />

como se fossem módulos, nos quais se movem os persona‑<br />

gens, i<strong>de</strong>ntificados por sinais gráficos. Termos e constru‑<br />

ções barrocas se juntam a ornamentos <strong>de</strong> linguagem <strong>de</strong><br />

outras artes, como teatro, pintura, cinema. “A esses recur‑<br />

sos fun<strong>de</strong> ‑se o estilo preciso, belo, a<strong>de</strong>quado para cada<br />

caso, numa tessitura própria <strong>de</strong> poesia”, “mas distanciado<br />

do fácil consumo”, “exigindo uma leitura empenhada”,<br />

observa Sandra Nitrini no prefácio aos Melhores contos<br />

Osman Lins. Alguns <strong>de</strong>sses contos, classificados pelos críti‑<br />

cos como microrromances, alcançam gran<strong>de</strong> intensida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> expressão, como o “Retábulo <strong>de</strong> Santa Joana Carolina”,<br />

que, segundo José Paulo Paes, “enquadra o <strong>de</strong>stino hu‑<br />

mano numa perspectiva cosmogônica, à maneira dos mis‑<br />

térios medievais, em que se inspirou o escrito”. A crítica<br />

consi<strong>de</strong>ra ‑o a obra ‑prima do autor.<br />

20<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

RIBEIRO COUTO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Alberto Venancio Filho<br />

Ribeiro Couto (1898 ‑1963)<br />

Natural <strong>de</strong> Santos, SP<br />

1 a edição – 248 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0768 ‑8<br />

A maior parte dos contos <strong>de</strong> Ribeiro Couto foi escrita<br />

na mocida<strong>de</strong>, antes dos trinta <strong>anos</strong>, com títulos <strong>de</strong>liciosos<br />

e instigantes, que já dão uma i<strong>de</strong>ia do universo do escritor:<br />

“A casa do gato cinzento”, “O crime do estudante Ba‑<br />

tista”, “Baianinha e outras mulheres”. Depois <strong>de</strong> dobrar o<br />

cabo dos quarenta, publicou apenas um volume no gênero,<br />

Largo da matriz – Clube das esposas enganadas (1933) foi<br />

classificado pelo autor como novelas. A maturida<strong>de</strong>, porém,<br />

não alterou as características do escritor e nem tostou o<br />

frescor e a singeleza <strong>de</strong> suas histórias.<br />

Homem atento à riqueza do cotidiano, Ribeiro Couto<br />

<strong>de</strong>le extraiu o material <strong>de</strong> suas histórias, nas quais o rea‑<br />

lismo é atenuado pelo lirismo e pela nota poética. Em al‑<br />

guns <strong>de</strong> seus melhores contos há um mal disfarçado<br />

sentimentalismo, sem que essa tendência comprometa a<br />

alta qualida<strong>de</strong> dos trabalhos. Na velhice, ao prefaciar a an‑<br />

tologia Histórias da cida<strong>de</strong> gran<strong>de</strong>, Ribeiro Couto dividiu<br />

seus contos em três grupos, <strong>de</strong> acordo com os assuntos e<br />

os ambientes. As “histórias da cida<strong>de</strong> gran<strong>de</strong>” passam ‑se<br />

no Rio <strong>de</strong> Janeiro, quase sempre, abordam vidas em crise<br />

(“O crime do estudante Batista”, “O primeiro amor <strong>de</strong> An‑<br />

tônio Maria”) ou momentos <strong>de</strong> transgressão ao código <strong>de</strong><br />

bom comportamento burguês (“Uma noite <strong>de</strong> chuva ou<br />

Simão”, “Diletante <strong>de</strong> ambientes”), estes vistos pelo escri‑<br />

tor com um certo sarcasmo. Bem diversos são os tipos e<br />

episódios do ciclo <strong>de</strong> “histórias da cida<strong>de</strong> pequena”<br />

(“Baiano”, “Largo da Matriz”). Por último, as “histórias <strong>de</strong><br />

meninos” (“Bilu, Carolina e eu”), as <strong>mais</strong> caras ao escritor,<br />

nas quais há provavelmente uma origem autobiográfica.<br />

Situados em tempos e locais diversos, estes contos estão<br />

unidos pelo espírito e a técnica, a ternura, a ironia, a com‑<br />

preensão das fragilida<strong>de</strong>s humanas e um certo fundo dis‑<br />

creto, muito discreto, <strong>de</strong> <strong>de</strong>sencanto.<br />

M e l h o r e s C o n t o s


RICARDO RAMOS<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Bella Jozef<br />

Ricardo Ramos (1929 ‑1992)<br />

Natural <strong>de</strong> Palmeira dos Índios, AL<br />

2 a edição – 208 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0566 ‑2<br />

Em geral, os filhos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s escritores, quando re‑<br />

solvem escrever, se revelam medíocres. Ricardo Ramos,<br />

filho <strong>de</strong> Graciliano Ramos, é uma exceção. Des<strong>de</strong> sua es‑<br />

treia, em 1954, com os contos <strong>de</strong> Tempo <strong>de</strong> espera, mos‑<br />

trou um talento digno do pai.<br />

A escolha do gênero também não foi por acaso. Ao<br />

longo <strong>de</strong> quase quarenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> literária, o escritor<br />

sempre <strong>de</strong>u preferência ao conto, como veículo i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> ex‑<br />

pressão literária. Publicou romances, novelas, memórias, mas<br />

foi como contista que firmou seu nome, sem viver à sombra<br />

da glória paterna. Definindo a sua maneira <strong>de</strong> escrever con‑<br />

tos, Ricardo Ramos i<strong>de</strong>ntifica como elemento essencial “bus‑<br />

car um momento <strong>de</strong> emoção intensa e breve”, mas <strong>de</strong>spojado<br />

<strong>de</strong> qualquer elemento melodramático ou grandiloquente,<br />

pelos quais, aliás, revela repulsa. O i<strong>de</strong>al é captar aquele ins‑<br />

tante único com a precisão <strong>de</strong> um cirurgião, recriá ‑lo com a<br />

habilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um artesão e concluir com um <strong>de</strong>senlace ines‑<br />

perado, daqueles que saco<strong>de</strong>m o leitor, sem permitir qual‑<br />

quer disparida<strong>de</strong> entre forma e fundo. Claro que, diante <strong>de</strong>ssa<br />

exigência, linguagem e estilo são fundamentais. Alguns críti‑<br />

cos chegam a apontá ‑lo como um dos raros inovadores do<br />

estilo, na literatura mo<strong>de</strong>rna brasileira. Enxuto, preciso, por<br />

vezes ousado, como ao se utilizar dos clichês da linguagem<br />

publicitária para mostrar sua interferência no cotidiano do<br />

homem mo<strong>de</strong>rno (“Circuito fechado”). O homem mo<strong>de</strong>rno<br />

é o gran<strong>de</strong> personagem do escritor, com suas frustrações (“A<br />

mancha na sala <strong>de</strong> jantar”), a violência extrema, em “Matar<br />

um homem”, e no irônico “O policial do ano”, apresentado<br />

em forma <strong>de</strong> roteiro para televisão. Dessa forma, a obra <strong>de</strong><br />

Ricardo Ramos, como observou Bella Jozef, no prefácio aos<br />

Melhores contos Ricardo Ramos, “embora sem intenção do‑<br />

cumentária, forma em seu conjunto um rico testemunho da<br />

realida<strong>de</strong> brasileira”.<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

RUBEM BRAGA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Davi Arrigucci Jr.<br />

Rubem Braga (1913 ‑1990)<br />

Natural <strong>de</strong> Cachoeiro do Itapemirim, ES<br />

12 a edição – 208 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0133 ‑6<br />

Rubem Braga, o sabiá da crônica, o “poeta tão poeta<br />

que não precisa escrever versos” (Sérgio Milliet), “o pri‑<br />

meiro a elevar a crônica ao nível da <strong>mais</strong> alta categoria lite‑<br />

rária” (Antonio Candido e José A<strong>de</strong>raldo Castello), o lírico<br />

envolvente “cuja melhor performance ocorre sempre por<br />

escassez <strong>de</strong> assunto” (Manuel Ban<strong>de</strong>ira), “o mestre no <strong>de</strong>s‑<br />

cobrir o lado significativo dos acontecimentos <strong>mais</strong> triviais”<br />

(José Paulo Paes), gostava também <strong>de</strong> surpreen<strong>de</strong>r seus<br />

leitores com pequenos contos, poéticos, <strong>de</strong> alta categoria<br />

literária, líricos, quase sem assunto ou narrando aconteci‑<br />

mentos triviais.<br />

Nascido em Cachoeiro do Itapemirim, Espírito Santo,<br />

em 1913, Rubem Braga iniciou suas ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cronista em<br />

1932, no Diário da Tar<strong>de</strong>, do Rio <strong>de</strong> Janeiro. No jornalismo<br />

trabalhou em vários jornais, <strong>de</strong> Recife, do Rio <strong>de</strong> Janeiro, <strong>de</strong><br />

Belo Horizonte e <strong>de</strong> outras cida<strong>de</strong>s, ora redator, ora cronista,<br />

ou exercendo as duas funções. Durante o Estado Novo foi<br />

preso várias vezes. Em 19<strong>39</strong>, trabalhava em Porto Alegre<br />

quando foi encarcerado num navio. Cinco <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, <strong>de</strong>‑<br />

sembarcava na Itália, como correspon<strong>de</strong>nte do Diário Ca‑<br />

rioca, para cobrir a Segunda Guerra Mundial. Solicitado por<br />

jornais e revistas, viajou por boa parte do mundo, em parti‑<br />

cular a Europa e as Américas. Casou ‑se diversas vezes. Gos‑<br />

tava <strong>de</strong> passarinhos e <strong>de</strong> olhar o mar <strong>de</strong> sua cobertura em<br />

Ipanema, on<strong>de</strong> viveu os últimos <strong>anos</strong> <strong>de</strong> vida. Muitas <strong>de</strong>ssas<br />

experiências foram aproveitadas em crônicas e, eventual‑<br />

mente, serviram <strong>de</strong> motivos ou inspiração a contos como<br />

“Diário <strong>de</strong> um subversivo”, “Navegação da casa”, “Tuim<br />

criado no <strong>de</strong>do” e várias outras nas quais a velha arte <strong>de</strong><br />

contar histórias, como observa Davi Arrigucci Jr. no prefácio,<br />

guarda “algo <strong>de</strong> um outrora ainda <strong>mais</strong> distante, alguma<br />

coisa da atmosfera primitiva e mágica <strong>de</strong> um passado ances‑<br />

tral e da sabedoria oracular”.<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

21


SALIM MIGUEL<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Regina Dalcastagnè<br />

Salim Miguel (1924)<br />

Natural <strong>de</strong> Kfarsouroum, Líbano<br />

1 a edição – 224 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1378 ‑0<br />

Em sessenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> exercício da literatura, Salim Mi‑<br />

guel construiu uma obra sólida, das <strong>mais</strong> significativas da<br />

ficção brasileira mo<strong>de</strong>rna, formada por romances, ensaios,<br />

volumes <strong>de</strong> contos.<br />

Como contista, suas primeiras experiências foram publi‑<br />

cadas em Sul, revista que congregou os intelectuais catarinen‑<br />

ses, no início da década <strong>de</strong> 1950. Por essa época, ocorreu a<br />

estreia em livro, com Velhice e outros contos (1951), a que se<br />

seguiu, com breve intervalo, Alguma gente (1953). Salim Mi‑<br />

guel só voltaria ao gênero vinte <strong>anos</strong> <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, com mão<br />

experiente, já liberto <strong>de</strong> experimentalismos, senhor <strong>de</strong> todos<br />

os segredos do gênero, com O primeiro gosto (1973).<br />

Cada vez <strong>mais</strong> exigente com seu texto, trabalhando ‑o<br />

com a persistência <strong>de</strong> um Balzac (chega a reescrevê ‑lo até<br />

<strong>de</strong>z vezes), levaria <strong>mais</strong> quinze <strong>anos</strong> até publicar um novo<br />

volume <strong>de</strong> histórias curtas, As areias do tempo (1988), a<br />

que se seguiram As <strong>de</strong>squitadas <strong>de</strong> Florianópolis (1995) e<br />

Onze <strong>de</strong> Biguaçu <strong>mais</strong> um (1997).<br />

Melhores contos Salim Miguel reúne quinze histórias<br />

curtas, representativas das várias fases do autor e <strong>de</strong> sua<br />

visão <strong>de</strong> mundo, interligadas pela permanente inquietação<br />

<strong>de</strong> quem anseia pela verda<strong>de</strong>, parece que sem gran<strong>de</strong> es‑<br />

perança <strong>de</strong> encontrá ‑la.<br />

É um universo muito peculiar, formado por textos<br />

<strong>de</strong>nsos, dolorosos, nos quais a aventura humana é fixada<br />

com angústia e inquietação, e ao qual se tem acesso, em<br />

geral, através dos meandros da memória, na busca <strong>de</strong>ses‑<br />

perada <strong>de</strong> um porto firme, que talvez seja o autoconheci‑<br />

mento, o esclarecimento do mistério <strong>de</strong> si mesmo. Como<br />

observa Antonio Hohlfedt, “a arte do conto em Salim Mi‑<br />

guel é feita <strong>de</strong>sta inteligência da meia palavra, do jogo da<br />

aparência, tudo <strong>de</strong>stinado a chegar até a essência, ao<br />

miolo, ao que somos efetivamente: a terceira margem”.<br />

22<br />

M e l h o r e s C o n t o s<br />

SIMÕES LOPES NETO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Dionísio Toledo<br />

Simões L. Neto (1865 ‑1916)<br />

Natural <strong>de</strong> Pelotas, RS<br />

2 a edição – 144 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1624 ‑8<br />

Simões Lopes Neto passou a vida em Pelotas, sua ci‑<br />

da<strong>de</strong> natal. Era um escritor <strong>de</strong> estilo admirável, sabendo<br />

explorar e valorizar as nuanças da linguagem regional, sem<br />

comprometer a espontaneida<strong>de</strong> dos contadores <strong>de</strong> causos,<br />

aqueles peões que se reúnem nas estâncias gaúchas para<br />

contar casos mirabolantes e histórias reais exageradas até<br />

as raias do absurdo.<br />

Às qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> estilo e aos dons privilegiados <strong>de</strong> nar‑<br />

rador, juntava o escritor uma técnica apurada e um conheci‑<br />

mento profundo da psicologia do habitante dos pampas, os<br />

vaque<strong>anos</strong>, as chinocas, o cantador, o tropeiro, o contraban‑<br />

dista. Escolhendo o conto como elemento <strong>de</strong> expressão lite‑<br />

rária, Simões publicou dois volumes no gênero, os Contos<br />

gauchescos e as Lendas do Sul, respectivamente, em 1912 e<br />

1913, quando o movimento regionalista achava ‑se no auge,<br />

em todo o país. Os contos são narrados por um típico cam‑<br />

peiro, Blau Nunes, “que só tinha <strong>de</strong> seu um cavalo gordo, o<br />

facão afiado e as estradas reais”. Os dois livros, publicados<br />

numa editora da província, não tiveram o reconhecimento<br />

<strong>de</strong>vido no país. Não ultrapassaram as fronteiras do Rio<br />

Gran<strong>de</strong> do Sul, apesar <strong>de</strong> serem superiores, em vários aspec‑<br />

tos, à produção <strong>de</strong> Afonso Arinos e <strong>de</strong> Valdomiro Silveira, os<br />

outros dois gran<strong>de</strong>s representantes do conto regional. A in‑<br />

justiça só começou a ser reparada com a edição crítica das<br />

duas obras, com prefácio <strong>de</strong> Augusto Meyer, no início dos<br />

<strong>anos</strong> 1950, e a inclusão do autor na Prosa <strong>de</strong> ficção (<strong>de</strong> 1870<br />

a 1920), <strong>de</strong> Lúcia Miguel Pereira. A historiadora tornou ‑se<br />

gran<strong>de</strong> admiradora da arte <strong>de</strong> Simões, apontando ‑o como o<br />

“escritor que, como ninguém no Brasil, encontrou o segredo<br />

da arte popular”. Esse segredo está expresso em alguns con‑<br />

tos magistrais, como “O Negrinho do Pastoreio”, sua obra‑<br />

‑prima, “No manantial”, “A Salamanca do Jarau”, dos <strong>mais</strong><br />

perfeitos que já se escreveram no Brasil.<br />

M e l h o r e s C o n t o s


WALMIR AyALA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Maria da Glória Bordini<br />

Walmir Ayala (1933 ‑1991)<br />

Natural <strong>de</strong> Porto Alegre, RS<br />

1 a edição – 176 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1598 ‑2<br />

Poeta antes e acima <strong>de</strong> tudo, Walmir Ayala escreveu<br />

contos repletos <strong>de</strong> mistério, inquietação, <strong>de</strong>safio, angústia<br />

e... poesia. Po<strong>de</strong> ‑se dizer que a obra do contista foi uma<br />

continuação e uma complementação <strong>de</strong> sua mensagem<br />

poética, em busca <strong>de</strong> “uma verda<strong>de</strong> possível, uma beleza<br />

possível”, como ele mesmo <strong>de</strong>finia a sua escrita.<br />

Tendo estreado aos 22 <strong>anos</strong>, com um livro <strong>de</strong> poemas,<br />

Walmir Ayala publicou o seu primeiro livro <strong>de</strong> contos, Ponte<br />

sobre o rio escuro, em 1974, quando já tinha uma obra<br />

poética ampla, consolidada e respeitada, além <strong>de</strong> dois ro‑<br />

mances publicados. A recepção crítica foi excelente. Hélio<br />

Pólvora salientou a perspicácia do autor em injetar poesia,<br />

uma ampla poesia, nos contos, sem que sua prosa se trans‑<br />

formasse num “poema displaced”. Definindo o universo<br />

sombrio do autor, Sonia Coutinho sublinhou que a escuri‑<br />

dão tentadora seria “o componente central <strong>de</strong> seu livro,<br />

feito <strong>de</strong> realida<strong>de</strong>s <strong>mais</strong> sugeridas que reveladas, <strong>de</strong> enig‑<br />

mas que, propositadamente, não se <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong>cifrar”.<br />

O segundo volume <strong>de</strong> contos, O anoitecer <strong>de</strong> Vênus,<br />

saiu <strong>mais</strong> <strong>de</strong> vinte <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois da estreia no gênero, em<br />

1998, sete <strong>anos</strong> após a morte do autor, que o concluíra no<br />

final da década <strong>de</strong> 1970. O crítico Miguel Sanches Neto viu<br />

nele um “significativo acontecimento literário”. Lêdo Ivo<br />

salientou “a voz <strong>de</strong> emissário da sombra” presente no livro,<br />

concluindo ser “a aura do <strong>de</strong>samparo humano” o selo fic‑<br />

cional do autor, que “atinge o território da impieda<strong>de</strong>” em<br />

contos tão cruéis quanto os <strong>de</strong> Villiers <strong>de</strong> L’Isle ‑Adam.<br />

A impieda<strong>de</strong> e a cruelda<strong>de</strong> nascem da revolta do autor<br />

ante a intolerância e a hipocrisia social, po<strong>de</strong>ndo ser sinte‑<br />

tizada no conto que dá título ao volume, centralizado na<br />

fantasia <strong>de</strong> um jovem homossexual. É, em verda<strong>de</strong>, um<br />

conto cruel, mas que, como em toda obra <strong>de</strong> Ayala, revela<br />

uma terrível e angustiada busca da pureza perdida.<br />

NÉLIDA PIñON<br />

Nélida Piñon (1937) – Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

M e l h o r e s C o n t o s P r e l o<br />

23


C o l e ç ã o<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

DIREÇÃO<br />

EDLA VAN STEEN<br />

24<br />

A <strong>Global</strong> <strong>Editora</strong> reuniu nesta coleção <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 61<br />

clássicos da poesia brasileira e portuguesa: dos poe‑<br />

tas quinhentistas e seiscentistas, como Luís <strong>de</strong><br />

Camões e Gregório <strong>de</strong> Matos, a expoentes da litera‑<br />

tura atual. Nomes consagrados em diferentes esco‑<br />

las literárias foram selecionados e chegam ao público<br />

em coletâneas inéditas.<br />

Seguindo a linha da coleção Melhores Contos, carac‑<br />

terizam a coleção Melhores Poemas a cuidadosa se‑<br />

leção dos textos e o zelo pela fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> à produção<br />

original do autor.<br />

Biografia, bibliografia e estudos introdutórios sobre<br />

os poetas estão presentes em cada volume. Esta co‑<br />

leção, também dirigida pela escritora Edla van Steen,<br />

é uma iniciativa editorial que tem levado aos leitores,<br />

nesses <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 25 <strong>anos</strong> <strong>de</strong> existência, os melhores<br />

poemas dos gran<strong>de</strong>s poetas que marcaram a história<br />

da nossa literatura.


AFFONSO ROMANO<br />

DE SANT’ANNA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Miguel Sanches Neto<br />

Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna (1937)<br />

Natural <strong>de</strong> Belo Horizonte, MG<br />

5 a edição – 312 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1491 ‑6<br />

Des<strong>de</strong> seu primeiro livro <strong>de</strong> poemas, lançado em 1965,<br />

Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna se impôs como uma voz sin‑<br />

gular na poesia brasileira. Canto e palavra revelava um poeta<br />

<strong>de</strong> lirismo duro, pétreo, <strong>de</strong> olhos abertos para a vida, atento<br />

às sugestões e às inquietações do cotidiano, personalíssimo,<br />

com maturida<strong>de</strong> para buscar seu próprio caminho.<br />

Des<strong>de</strong> logo ficou claro que o caminho do poeta come‑<br />

çava, passava e terminava na busca do humano e na i<strong>de</strong>n‑<br />

tida<strong>de</strong> com o seu tempo <strong>de</strong> angústias e perplexida<strong>de</strong>s, sem<br />

excluir o lirismo amoroso nem se esquivar às preocupações<br />

com os mil e um transes e pesa<strong>de</strong>los diários vividos pelo<br />

país, então no auge do regime militar. A essa busca hu‑<br />

mana aliava ‑se a procura <strong>de</strong> sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> poética e <strong>de</strong><br />

novas perspectivas técnicas para seu ofício, expressa nos<br />

poemas reflexivos <strong>de</strong> Poesia sobre poesia, e que, <strong>de</strong> certa<br />

forma, se prolonga em A gran<strong>de</strong> fala do índio guarani.<br />

Aqui, começa a se impor a preocupação com o <strong>de</strong>stino do<br />

Brasil, a necessida<strong>de</strong> intrigante <strong>de</strong> entendê ‑lo e amá ‑lo,<br />

que culmina em Que país é este?, “livro provocado pelo<br />

espanto <strong>de</strong> coisas corriqueiras” (Donaldo Schüler). Com<br />

ele, Affonso ingressa no seleto grupo <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s poetas<br />

brasileiros. A crítica chegou a apontá ‑lo como “o gran<strong>de</strong><br />

poeta brasileiro que obscuramente esperávamos para a su‑<br />

cessão <strong>de</strong> Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>” (Wilson Mar‑<br />

tins). Depois <strong>de</strong> fixar os olhos em seu país, o poeta se volta<br />

para o mundo e o mistério do cosmos, que palpitam em A<br />

catedral <strong>de</strong> Colônia (1985), uma espécie <strong>de</strong> símbolo intem‑<br />

poral <strong>de</strong> beleza e perenida<strong>de</strong>, uma metáfora da história,<br />

em contraste com a brevida<strong>de</strong> da vida humana. Em seus<br />

últimos livros, o poeta revela crescente preocupação com a<br />

gran<strong>de</strong> incógnita da vida e da morte, pressentindo o amargo<br />

momento da partida: “uma quase tristeza/ <strong>de</strong> quem amando<br />

tudo isto/ teve que se retirar”.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

ALBERTO DA<br />

COSTA E SILVA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

André Seffrin<br />

Alberto da Costa e Silva (1931)<br />

Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />

1 a edição – 224 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1186 ‑1<br />

Quem imagina que a gran<strong>de</strong> poesia morreu, precisa<br />

ler com urgência Alberto da Costa e Silva: “Uma ausência<br />

<strong>de</strong> mim por mim se afirma./ E partindo <strong>de</strong> mim, na sombra<br />

sobre/ o chão que não foi meu, na relva simples/ o outro<br />

ser que sonhei se <strong>de</strong>ita e cisma”.<br />

Pertencendo cronologicamente à chamada Geração<br />

<strong>de</strong> 45, o poeta se integra, na realida<strong>de</strong>, àquela socieda<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> poetas autênticos que se colocam por vonta<strong>de</strong> própria<br />

à margem (e acima) das modas efêmeras, i<strong>de</strong>ntificados<br />

com a velha tradição da poesia oci<strong>de</strong>ntal, que se alonga <strong>de</strong><br />

Homero a Rilke, <strong>de</strong> Goethe a Drummond, <strong>de</strong> Camões a<br />

Fernando Pessoa. Isso significa uma ampla abertura espiri‑<br />

tual, mas também uma série <strong>de</strong> exigências que o poeta<br />

Costa e Silva, pondo <strong>de</strong> lado a pressa e a ânsia <strong>de</strong> glória,<br />

cultiva com zelo e paciência, para atingir a forma <strong>de</strong>purada<br />

que lhe caracteriza a poesia, essencialmente lírica, na qual<br />

o velho e eterno soneto ocupa um lugar <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque.<br />

“A sua obra é uma vitória permanente da cultura<br />

sobre a natureza, ou da exigência sobre a facilida<strong>de</strong>”, con‑<br />

forme acentuou Antonio Carlos Villaça. Mas é também,<br />

como toda poesia autêntica, inquieta e perplexa perante o<br />

mistério da vida. O poeta se angustia e reage com uma<br />

preocupação quase obsessiva diante da morte e do tempo<br />

(“o eterno é agora e em si mesmo morre”), uma forte nos‑<br />

talgia da infância (“Vou pedir a meu pai/ que me esqueça<br />

menino”), mas também uma permanente sedução e reve‑<br />

rência pelo amor, sem cerrar os olhos à beleza do mundo,<br />

ao jogo da “luz numa caixa <strong>de</strong> laranjas/ ou a chuva sobre a<br />

mesa <strong>de</strong> verduras no mercado”. É que o poeta sabe que<br />

verda<strong>de</strong> não há, mas múltiplas verda<strong>de</strong>s e que a poesia é<br />

esquiva. É preciso fisgá ‑la no momento <strong>de</strong> sua eclosão: “a<br />

vida canta baixinho/ e, quando grita,/ <strong>de</strong>satam ‑se <strong>de</strong> nós o<br />

sonho e o êxtase”.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

25


ALBERTO DE OLIVEIRA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Sânzio <strong>de</strong> Azevedo<br />

Alberto <strong>de</strong> Oliveira (1857 ‑1937)<br />

Natural <strong>de</strong> Palmital <strong>de</strong> Saquarema, RJ<br />

1 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1232 ‑5<br />

Coedição ABL<br />

Há muito tempo, Alberto <strong>de</strong> Oliveira merecia uma edi‑<br />

ção como essa dos Melhores poemas Alberto <strong>de</strong> Oliveira.<br />

Em vida, o poeta foi coberto <strong>de</strong> glórias, reverenciado, colo‑<br />

cado no panteão dos <strong>de</strong>uses da poesia brasileira, formando,<br />

ao lado <strong>de</strong> Olavo Bilac e Raimundo Correa, a famosa trin‑<br />

da<strong>de</strong> parnasiana.<br />

Mais tar<strong>de</strong>, com a eclosão do Mo<strong>de</strong>rnismo, a visão <strong>de</strong><br />

sua obra foi distorcida, vítima do preconceito e da pressa dos<br />

jovens mo<strong>de</strong>rnistas em se afirmarem, muitas vezes, à custa<br />

<strong>de</strong> prestígio <strong>de</strong> seus antecessores. Con<strong>de</strong>nar ao limbo o que<br />

antes fora admirado rendia então prestígio e uma aura <strong>de</strong><br />

gênio. Dessa forma, todo o movimento parnasiano foi arre‑<br />

messado ao inferno, como exemplo a não ser imitado, “es‑<br />

tigmatizado por não ser o que ele não se propôs a ser”,<br />

conforme a observação <strong>de</strong> Antonio Carlos Secchin.<br />

Apontado como o seguidor <strong>mais</strong> fiel do cânon parna‑<br />

siano, “o parnasiano em regra, extremado, completo, radi‑<br />

cal”, segundo Silvio Romero, Alberto <strong>de</strong> Oliveira começou,<br />

ainda em vida, a ser vítima <strong>de</strong> equívocos da crítica, apon‑<br />

tado como um poeta que teria sacrificado a expressão <strong>de</strong><br />

seus sentimentos, impassível e frio como aquele “Vaso<br />

Grego” <strong>de</strong> um <strong>de</strong> seus <strong>mais</strong> conhecidos poemas. Meros<br />

equívocos, como alerta Sânzio <strong>de</strong> Azevedo no prefácio.<br />

Poeta abundante, gran<strong>de</strong> sonetista (gran<strong>de</strong> na quanti‑<br />

da<strong>de</strong> e na qualida<strong>de</strong>), Alberto <strong>de</strong> Oliveira foi um parnasiano<br />

consciente e aplicado, mas também um lírico transbordante,<br />

<strong>de</strong> sensibilida<strong>de</strong> romântica represada e disciplinada, e <strong>de</strong> um<br />

erotismo contun<strong>de</strong>nte, durante muito tempo ignorado pela<br />

crítica, que legou à literatura brasileira um feixe <strong>de</strong> belos<br />

poemas (“A cigarra da chácara”, “Maré <strong>de</strong> equinócio” e<br />

“Num trem <strong>de</strong> subúrbio”, entre outros), que merecem ser<br />

lembrados enquanto houver amantes da poesia.<br />

26<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

ALMEIDA GARRETT<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Izabela Leal<br />

Almeida Garrett (1799 ‑1854)<br />

Natural do Porto, Portugal<br />

1 a edição – 120 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1594 ‑4<br />

Machado <strong>de</strong> Assis dizia que Almeida Garrett “só por<br />

si valia uma literatura”. E que literatura! Poeta, romancista,<br />

teatrólogo, folclorista, ensaísta, tudo que escreveu foi com<br />

mão <strong>de</strong> mestre e leveza <strong>de</strong> pluma. Romântico i<strong>de</strong>ntificado<br />

com o gosto popular, filtrou a lição dos clássicos criando<br />

um estilo admirável, tão admirável que influenciou Ma‑<br />

chado <strong>de</strong> Assis.<br />

Nascido no Porto, em 1799, morreu em Lisboa, em<br />

1854. Viveu e escreveu em pleno <strong>de</strong>lírio romântico, uma das<br />

fases <strong>mais</strong> ricas da literatura lusa. Como poeta, como se<br />

po<strong>de</strong> comprovar nesta obra, foi <strong>de</strong> um lirismo apaixonado e<br />

<strong>de</strong> um erotismo ar<strong>de</strong>nte, talvez um tanto sádico, escandali‑<br />

zando a conservadora socieda<strong>de</strong> portuguesa. Hoje, passado<br />

<strong>mais</strong> <strong>de</strong> século e meio, os seus poemas não escandalizam<br />

<strong>mais</strong> ninguém, mas mantêm o mesmo frescor, a mesma<br />

graça, o mesmo encanto <strong>de</strong> quando foram escritos. Veja ‑se<br />

em “Não te amo” a audácia com que o poeta se dirige à<br />

amante dizendo não a amar e <strong>de</strong>sejar somente o prazer que<br />

ela po<strong>de</strong> oferecer: “Ai! não te amo, não; e só te quero/ De<br />

um querer bruto e fero/ Que o sangue me <strong>de</strong>vora,/ Não<br />

chega ao coração.”. Amante vulcânico, Garrett foi também,<br />

como bom romântico, i<strong>de</strong>ntificado com a natureza, que li‑<br />

sonjeia em “Coquete dos prados”, on<strong>de</strong> trata do velho tema<br />

da beleza da rosa. A varieda<strong>de</strong> é gran<strong>de</strong>. O poeta aborda<br />

inúmeros temas românticos, sempre numa interpretação<br />

pessoal e apaixonante.<br />

Um dos que melhor <strong>de</strong>finiram a lírica <strong>de</strong> Garrett foi seu<br />

conterrâneo José Augusto França, ao observar que os seus<br />

poemas “caíam como pedras nas águas tranquilas da poesia<br />

romântica nacional, toda voltada para o céu <strong>de</strong> Chateau‑<br />

briand ou para o passado das tradições populares”, levando o<br />

gran<strong>de</strong> Alexandre Herculano “a dizer que seriam suficientes<br />

para fazer perdoar tudo ao autor”. Discordar quem há <strong>de</strong>?<br />

M e l h o r e s P o e M a s


ALPHONSUS DE<br />

GUIMARAENS<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens Filho<br />

Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens (1870 ‑1921)<br />

Natural <strong>de</strong> Ouro Preto, MG<br />

4 a edição – 176 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0338 ‑0<br />

Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens com a sua poesia mística, seu<br />

companheirismo com Deus (“Ninguém anda com Deus <strong>mais</strong><br />

do que eu ando”), sua intimida<strong>de</strong> com a morte (“Sempre vivi<br />

com a morte <strong>de</strong>ntro da alma,/ sempre tacteei nas trevas <strong>de</strong> um<br />

jazigo”), seus amores meio irreais e mórbidos, sua <strong>de</strong>voção a<br />

Nossa Senhora e sua humilda<strong>de</strong> foi uma espécie <strong>de</strong> aprendiz<br />

<strong>de</strong> santo perdido nas montanhas das Gerais.<br />

Habitando velhas cida<strong>de</strong>s mineiras – Ouro Preto, Con‑<br />

ceição do Serro, Mariana –, vivia <strong>de</strong> fato em outra dimen‑<br />

são, um mundo pessoal com incertas conexões com a<br />

realida<strong>de</strong> terrena, expresso com extrema <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za em sua<br />

poesia crepuscular, <strong>de</strong> contornos vagos, com uma suave<br />

música em surdina, patética como um cantochão, ilumi‑<br />

nada pela suave luz do luar, uma das obsessões do poeta,<br />

“o luar, que só para quem sofre existe”. Que ninguém du‑<br />

vi<strong>de</strong> da sincerida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa poesia. Se o Simbolismo não exis‑<br />

tisse, o poeta por certo encontraria uma expressão<br />

semelhante. A fonte estava em sua própria vida cotidiana.<br />

Vivendo sempre em pequenas cida<strong>de</strong>s, sem contatos inte‑<br />

lectuais, tão estimulantes para o escritor, Alphonsus fez da<br />

poesia elemento <strong>de</strong> comunhão e evasão. As duas corriam<br />

em paralelo. A evasão do mundo (que começava em seu<br />

nome literário arcaizado e latinizado), o enclausuramento<br />

em seu mosteiro i<strong>de</strong>al, a exemplo <strong>de</strong> tantos místicos, foi o<br />

caminho <strong>mais</strong> curto – ou talvez o único possível – para a<br />

comunhão com Deus pela fé católica, tão po<strong>de</strong>rosa em sua<br />

obra. Afonso Henriques da Costa Guimarães nasceu em<br />

Ouro Preto, em 1871, cursou a Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Direito <strong>de</strong> São<br />

Paulo, exerceu cargos na magistratura mineira, mas foi<br />

acima <strong>de</strong> tudo poeta. Até a morte, em 1921, quando li‑<br />

berto do peso da matéria, a sua alma, como ele expressou,<br />

tão lindamente, tornou ‑se “trigo <strong>de</strong> Deus no céu aberto”.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

ALPHONSUS DE<br />

GUIMARAENS FILHO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Afonso Henriques Neto<br />

Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens Filho (1918 ‑2008)<br />

Natural <strong>de</strong> Mariana, MG<br />

1 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1326 ‑1<br />

Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens Filho traz a literatura no<br />

sangue, her<strong>de</strong>iro <strong>de</strong> uma tradição literária que remonta a<br />

Bernardo Guimarães (seu avô), o autor <strong>de</strong> A escrava Isaura,<br />

e a Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens (seu pai). Poeta acima <strong>de</strong><br />

tudo, buscando <strong>de</strong> forma incansável a beleza pura, a poe‑<br />

sia sem mácula, o que, <strong>de</strong> certa maneira, o título <strong>de</strong> seu<br />

primeiro livro indica e <strong>de</strong>fine: Lume <strong>de</strong> estrelas.<br />

A partir daí, década <strong>de</strong> 1940, Alphonsus construiu<br />

uma longa e elaborada obra poética, das <strong>mais</strong> importantes<br />

do lirismo brasileiro, na qual o temperamento romântico e<br />

as sugestões simbolistas, associadas a um certo gosto pela<br />

metafísica, foram se <strong>de</strong>purando numa dicção cada vez <strong>mais</strong><br />

pessoal e pura. Como todo escritor autêntico, o poeta foi<br />

localizando seu mundo peculiar, <strong>de</strong>ntro do imenso universo<br />

poético, à medida que via e analisava a sua própria imagem<br />

naquilo que escrevia. Poesia como exercício <strong>de</strong> autoanálise,<br />

mas também <strong>de</strong> infinitas sugestões e aberturas para o<br />

mundo externo, pois, como adverte o poeta, “nenhuma<br />

poesia se faz <strong>de</strong> matéria abstrata”.<br />

Descobertas e rupturas se suce<strong>de</strong>ram em <strong>mais</strong> <strong>de</strong> ses‑<br />

senta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> exercício poético. De caráter permanente foi<br />

a adoção do soneto como uma <strong>de</strong> suas formas preferidas<br />

<strong>de</strong> expressão. Não é, pois, sem razão, que é consi<strong>de</strong>rado<br />

um dos maiores sonetistas da língua. No <strong>mais</strong>, a busca per‑<br />

manente pela renovação, em fases sucessivas, a <strong>de</strong> expres‑<br />

são católica, sob influência ou sugestão <strong>de</strong> Jorge <strong>de</strong> Lima e<br />

Murilo Men<strong>de</strong>s, como a <strong>de</strong>scoberta da gran<strong>de</strong> poesia espa‑<br />

nhola, soldadas pela mesma obsessão: a procura <strong>de</strong> sua<br />

própria e implacável imagem, que é também uma das bus‑<br />

cas permanentes da poesia.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

27


ALVARENGA PEIxOTO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Antonio Arnoni Prado<br />

Alvarenga Peixoto (1743 ‑1791)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

1 a edição – 128 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0780 ‑7<br />

As opiniões sobre a escassa obra poética <strong>de</strong> Alvarenga<br />

Peixoto são divergentes. Menos contraditórias são as infor‑<br />

mações sobre sua vida. Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, Inácio<br />

José <strong>de</strong> Alvarenga Peixoto formou ‑se em leis pela Universi‑<br />

da<strong>de</strong> <strong>de</strong> Coimbra. Em Portugal, ocupou importantes cargos<br />

na magistratura. Ao voltar à cida<strong>de</strong> natal foi festivamente<br />

recebido pelo vice ‑rei, marquês <strong>de</strong> Lavradio, mas preferiu<br />

partir para Minas Gerais, fixando ‑se em São João <strong>de</strong>l ‑Rei.<br />

Ali trocou a advocacia pelos trabalhos <strong>de</strong> mineração,<br />

casou ‑se com Bárbara Heliodora, também poeta (autora do<br />

belo poema “Conselhos a meus filhos”) e fez imensa for‑<br />

tuna. Era o <strong>mais</strong> rico dos inconfi<strong>de</strong>ntes, mas, segundo al‑<br />

guns historiadores, um homem <strong>de</strong> caráter leviano, que teria<br />

se engajado na Inconfidência Mineira apenas como uma<br />

forma <strong>de</strong> se livrar <strong>de</strong> suas imensas dívidas. Preso, durante<br />

os interrogatórios <strong>de</strong>nunciou os companheiros. Há certo<br />

exagero nessas acusações, pois muitos inconfi<strong>de</strong>ntes ti‑<br />

nham dívidas com o fisco. Peixoto não foi exceção. Da mesma<br />

forma, diante do aparato repressor, com exceção <strong>de</strong> Tira‑<br />

<strong>de</strong>ntes, todos fraquejaram e <strong>de</strong>nunciaram os amigos.<br />

Como poeta, Peixoto foi acusado, com a mesma intolerân‑<br />

cia, <strong>de</strong> ser um versejador correto e frio e uma espécie <strong>de</strong><br />

profissional da lisonja. De fato, quase toda a sua obra co‑<br />

nhecida até certa época é dirigida aos po<strong>de</strong>rosos do dia. Da<br />

mediocrida<strong>de</strong> geral, os historiadores salvavam apenas o<br />

“Canto genetlíaco”, em razão <strong>de</strong> suas i<strong>de</strong>ias nativistas. Em<br />

1956, Domingos Carvalho da Silva reavaliou a obra <strong>de</strong> Pei‑<br />

xoto, encontrando nela “o lirismo e a espontaneida<strong>de</strong> dos<br />

verda<strong>de</strong>iros poetas”. Três <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, a <strong>de</strong>scoberta <strong>de</strong><br />

cinco sonetos, mostrou um poeta à altura do que <strong>de</strong> me‑<br />

lhor haviam produzido os contemporâneos, segundo opi‑<br />

nião da crítica. De certa forma, foi o renascimento do poeta.<br />

O <strong>de</strong>bate continua aberto.<br />

28<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

ÁLVARES DE AZEVEDO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Antonio Candido<br />

Álvares <strong>de</strong> Azevedo (1831 ‑1852)<br />

Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />

6 a edição – 208 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0022 ‑5<br />

Álvares <strong>de</strong> Azevedo <strong>de</strong>ixou entre os seus contemporâ‑<br />

neos a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> um gênio, cuja morte prematura, aos vinte<br />

<strong>anos</strong> <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, impediu a plena realização <strong>de</strong> suas possibi‑<br />

lida<strong>de</strong>s. Quase um século <strong>de</strong>pois, Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> voltava<br />

a exaltar a genialida<strong>de</strong> do poeta, “não do gênio atingível<br />

através das paciências compridas, mas do gênio in<strong>de</strong>pen‑<br />

<strong>de</strong>nte, por assim dizer espontâneo, capaz <strong>de</strong> criar uma obra<br />

formidável”.<br />

A espontaneida<strong>de</strong> foi, sem dúvida, um dos traços mar‑<br />

cantes do poeta paulista, que mesmo sem atingir a geniali‑<br />

da<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ixou uma obra formidável, espécie <strong>de</strong> súmula das<br />

inquietações e <strong>de</strong>sejos dos jovens românticos <strong>de</strong> 1850. Quais<br />

eram essas inquietações? Em primeiro lugar o amor, a aproxi‑<br />

mação entre os sexos, dificultada e até obstruída pela rígida<br />

moral patriarcal. Assim, o simples e humano ato <strong>de</strong> amar as‑<br />

sumia, por vezes, um sentido <strong>de</strong> transgressão, muito presente<br />

na obra do nosso poeta, seja no plano social, seja no psicoló‑<br />

gico. Em vários <strong>de</strong> seus poemas, Azevedo i<strong>de</strong>aliza a posse<br />

sexual em sonho como a realização suprema do amor. O amor<br />

estava sempre ligado ao <strong>mais</strong> <strong>de</strong>sbragado sentimentalismo.<br />

Era uma das atitu<strong>de</strong>s bonitas da época, frequentemente cor‑<br />

roída por momentos <strong>de</strong> cinismo e amargura, quase sempre <strong>de</strong><br />

inspiração livresca. Sentimental e um tanto ingênuo, Álvares<br />

<strong>de</strong> Azevedo intoxicou sua literatura com os venenos sutis <strong>de</strong>s‑<br />

tilados das obras do amargo Byron, do melancólico Musset,<br />

do pessimista Leopardi. Ainda bem que tinha em si mesmo<br />

um contraveneno po<strong>de</strong>roso, o seu admirável senso <strong>de</strong> humor,<br />

que o levava a zombar até da morte, como no poema “O<br />

poeta moribundo”, <strong>de</strong>senvolvido “na craveira da <strong>mais</strong> franca<br />

piada”, como observa Antonio Candido no prefácio aos Me‑<br />

lhores poemas Álvares <strong>de</strong> Azevedo. Álvares <strong>de</strong> Azevedo, 150<br />

<strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> sua morte, continua capaz <strong>de</strong> comover e en‑<br />

cantar o leitor. O que <strong>mais</strong> pedir a um poeta?<br />

M e l h o r e s P o e M a s


ÁLVARO ALVES<br />

DE FARIA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Carlos Felipe Moisés<br />

Álvaro Alves <strong>de</strong> Faria (1942)<br />

Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />

1 a edição – 272 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1312 ‑4<br />

Natural da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, filho <strong>de</strong> portugueses,<br />

Álvaro Alves <strong>de</strong> Faria é jornalista, teatrólogo, romancista,<br />

ensaísta, cronista, crítico literário, mas sobretudo poeta.<br />

Pre<strong>de</strong>stinado e prematuro. O primeiro poema foi escrito<br />

aos onze <strong>anos</strong> e aos <strong>de</strong>zesseis concluiu seu primeiro livro,<br />

Noturno maior, publicado alguns <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois.<br />

Outros vieram, cada vez <strong>mais</strong> refinados e pessoais,<br />

<strong>de</strong>monstrando sua vocação autêntica, ao contrário <strong>de</strong> tan‑<br />

tos jovens que publicam livro <strong>de</strong> poemas na adolescência,<br />

para logo se afastarem, e para sempre, da poesia.<br />

O reconhecimento da crítica vem sendo expresso em<br />

artigos e prêmios diversos. Seu quarto livro, 4 cantos <strong>de</strong><br />

pavor e alguns poemas <strong>de</strong>sesperados (1973) recebeu três<br />

dos maiores prêmios literários do país, o Governador do<br />

Estado <strong>de</strong> São Paulo, o Prefeitura Municipal <strong>de</strong> São Paulo e<br />

o Pen Clube Internacional <strong>de</strong> São Paulo. Trajetória poética,<br />

que reúne sua poesia até 2003, recebeu o prêmio <strong>de</strong> me‑<br />

lhor livro <strong>de</strong> poemas do ano, concedido pela Associação<br />

Paulista dos Críticos <strong>de</strong> Arte.<br />

Nos últimos <strong>anos</strong>, após a publicação <strong>de</strong> 20 poemas<br />

quase líricos e algumas canções para Coimbra (1999), sua<br />

obra vem encontrando especial receptivida<strong>de</strong> em Portugal,<br />

on<strong>de</strong> Álvaro costuma participar com frequência <strong>de</strong> recitais<br />

e congressos. A voz do poeta chegou ainda <strong>mais</strong> longe.<br />

Seus poemas estão traduzidos para o inglês, o francês, o<br />

italiano, o espanhol, o alemão, o servo ‑croata e o japonês.<br />

No prefácio aos Melhores poemas Álvaro Alves <strong>de</strong> Faria,<br />

Carlos Felipe Moisés observa que toda a obra <strong>de</strong> Álvaro, “em<br />

suas muitas vertentes (a poesia, a crônica, o romance, o tea‑<br />

tro, a reportagem, a entrevista), me parece ser o testemunho<br />

incansável <strong>de</strong> uma experiência <strong>de</strong> vida. Mas isso não a con‑<br />

fun<strong>de</strong> com a autobiografia ou com o diário íntimo”. Em ver‑<br />

da<strong>de</strong>, dispensa classificações. É sobretudo poesia.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

ANTERO DE QUENTAL<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Benjamin Abdalla Junior<br />

Antero <strong>de</strong> Quental (1842 ‑1891)<br />

Natural <strong>de</strong> Ponta Delgada, Portugal<br />

1 a edição – 128 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0881 ‑1<br />

Antero <strong>de</strong> Quental, homem <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong> estranha,<br />

sombrio, niilista, mas também virtuoso, humil<strong>de</strong>, atormen‑<br />

tado “pelo olhar da esfinge”, segundo a expressão <strong>de</strong> Miguel<br />

<strong>de</strong> Unamuno, “um santo que era um gênio” (Eça <strong>de</strong> Queirós),<br />

foi o <strong>de</strong>stino <strong>mais</strong> trágico da literatura portuguesa.<br />

Poeta e pensador, integrou a famosa Geração <strong>de</strong> 70,<br />

que sacudiu a mesmice da vida portuguesa, procurando in‑<br />

tegrar o país no mundo mo<strong>de</strong>rno. Antero era o centro <strong>de</strong>ssa<br />

geração brilhante, da qual faziam parte Eça <strong>de</strong> Queirós, Oli‑<br />

veira Martins, Ramalho Ortigão. Natural dos Açores, Antero<br />

formou ‑se em Direito pela Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Coimbra (1864),<br />

on<strong>de</strong> sempre assumia a li<strong>de</strong>rança nos conflitos entre o con‑<br />

servadorismo da instituição e o espírito <strong>de</strong> rebeldia dos estu‑<br />

dantes. Durante essa fase escreve as Primaveras românticas,<br />

só publicadas em 1872, os Sonetos (1861) e as O<strong>de</strong>s mo<strong>de</strong>r‑<br />

nas (1865), que traziam um frêmito novo à poesia portu‑<br />

guesa, pregando o progresso social, e cujo fundo o poeta<br />

sintetizou na frase provocadora: “a Poesia mo<strong>de</strong>rna é a voz<br />

da Revolução”. Mas é nos Sonetos que se encontra a men‑<br />

sagem <strong>mais</strong> alta e pessoal, <strong>mais</strong> <strong>de</strong>nsamente humana <strong>de</strong><br />

Antero, traduzindo os seus conflitos íntimos, a sua alta ten‑<br />

são espiritual, a angústia permanente <strong>de</strong> uma alma se<strong>de</strong>nta<br />

<strong>de</strong> luz (“Viva e trabalhe em plena luz: <strong>de</strong>pois/ seja ‑me dado<br />

ainda ver, morrendo,/ o claro sol, amigo dos heróis!”). De‑<br />

pois <strong>de</strong> duas edições com um pequeno número <strong>de</strong> poemas,<br />

os Sonetos completos, dos <strong>mais</strong> perfeitos da língua em todos<br />

os tempos, foram lançados em 1886, constituindo uma es‑<br />

pécie <strong>de</strong> autobiografia <strong>de</strong> uma alma atormentada, ou “me‑<br />

mórias <strong>de</strong> uma consciência” como observou um crítico. A<br />

arte, porém, não apaziguou o coração do poeta, que se sui‑<br />

cidou, em 1891. Guerra Junqueiro, seu amigo, escreveu<br />

então que “<strong>mais</strong> bela ainda que os seus livros, a sua vida”.<br />

Mais bela, talvez. Muito <strong>mais</strong> trágica, com certeza.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

29


ARMANDO FREITAS<br />

FILHO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Heloisa Buarque <strong>de</strong> Hollanda<br />

Armando Freitas Filho (1940)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

1 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0219 ‑7<br />

Armando Freitas Filho é consi<strong>de</strong>rado um dos poetas<br />

<strong>mais</strong> representativos e instigantes da mo<strong>de</strong>rna literatura<br />

brasileira. Nascido no Rio <strong>de</strong> Janeiro, poetando <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a<br />

adolescência, estreou em livro aos vinte e três <strong>anos</strong>. A par‑<br />

tir daí, manteve uma ativida<strong>de</strong> poética constante, <strong>de</strong>purada<br />

a cada nova obra, e sempre em busca <strong>de</strong> novos caminhos.<br />

A poesia reflexiva do primeiro livro logo se enriquece com<br />

uma atitu<strong>de</strong> <strong>mais</strong> participante, aberta para a realida<strong>de</strong> so‑<br />

cial e política. O passo seguinte seria a procura <strong>de</strong> uma<br />

linguagem precisa, <strong>de</strong>senfática, que o aproxima da poesia<br />

Práxis, movimento coor<strong>de</strong>nado por Mario Chamie, que pre‑<br />

tendia ser um “produto que produz” e abolir “a história da<br />

literatura escrita e <strong>de</strong> autores”.<br />

Em meados da década <strong>de</strong> 1970, o poeta está maduro<br />

e consciente <strong>de</strong> seu ofício. Em plena luci<strong>de</strong>z. Procura então<br />

articular <strong>de</strong> forma clara vida e poesia, privilegiando o tra‑<br />

balho artesanal <strong>de</strong> alta precisão.<br />

Numa espécie <strong>de</strong> retorno ao passado, o poeta publica<br />

uma coletânea <strong>de</strong> poemas ‑minuto, valorizado pela geração<br />

marginal dos <strong>anos</strong> 1960, com a qual <strong>de</strong> certa forma se<br />

i<strong>de</strong>ntificava, sem a ela pertencer. Mas logo volta a exigir<br />

<strong>mais</strong> <strong>de</strong> si mesmo, e a refletir, com amargura, sobre a vida.<br />

A sua poesia se torna dura, severa, cinza ‑chumbo, quadro<br />

sombrio que se atenua na reflexão da precarieda<strong>de</strong> da vida.<br />

Cada vez <strong>mais</strong> exigente, o poeta i<strong>de</strong>aliza “escrever um<br />

livro blindado, sob controle, como se estivesse fazendo gi‑<br />

nástica e houvesse feito um livro <strong>de</strong> poemas sarados, for‑<br />

tes, que não se po<strong>de</strong> dizer: este não”. A esta altura, como<br />

observa Heloisa Buarque <strong>de</strong> Hollanda no prefacio aos Me‑<br />

lhores poemas Armando Freitas Filho, já construíra “uma<br />

poética <strong>de</strong> extraordinária beleza e precisão”, que o havia<br />

colocado “<strong>de</strong> forma <strong>de</strong>finitiva, na primeira linha <strong>de</strong> poetas<br />

da história da literatura brasileira contemporânea”.<br />

30<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

ARNALDO ANTUNES<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Noemi Jaffe<br />

Arnaldo Antunes (1960)<br />

Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />

1 a edição – 224 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1410 ‑7<br />

Poeta original, mas insatisfeito consigo mesmo, “sem‑<br />

pre disposto a reapren<strong>de</strong>r como se apren<strong>de</strong> a cair <strong>de</strong>pois<br />

que já se sabe andar” (João Ban<strong>de</strong>ira), maduro, sem per<strong>de</strong>r<br />

o lado infantil, “quanto <strong>mais</strong> criança, paradoxalmente <strong>mais</strong><br />

maduro” (Hugo Sukman), inclassificável, “o pedagogo da<br />

estranheza na socieda<strong>de</strong> brasileira contemporânea <strong>de</strong> mas‑<br />

sas” (André Gar<strong>de</strong>l), Arnaldo Antunes é “ao lado <strong>de</strong> Au‑<br />

gusto <strong>de</strong> Campos, um dos poetas que melhor representam<br />

uma modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> poesia que transita por diversos e di‑<br />

ferentes suportes. Poesia esta que se faz multimídia e mul‑<br />

tiplica sua capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> comunicação com o leitor”<br />

(Vinícius Lima).<br />

Hábil na construção <strong>de</strong> seus poemas, marcados pela<br />

“simplicida<strong>de</strong> ativa”, que “não é a simplicida<strong>de</strong> do simpló‑<br />

rio”, “mas a do ser sem intervalos, buscando sempre a re‑<br />

lação entre a técnica e o momento sempre casual” (Antonio<br />

Medina Rodrigues), Arnaldo Antunes “medita sobre o pre‑<br />

cipício das palavras” e, “armado com tintas <strong>de</strong> carimbo, ele<br />

produz um vaivém incessante, um jogo <strong>de</strong> escon<strong>de</strong>‑<br />

‑escon<strong>de</strong> entre as letras e as formas” (José Thomaz Brum).<br />

Um caos <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias e soluções contraditórias? Po<strong>de</strong> ser.<br />

“Arnaldo Antunes é um <strong>de</strong>sses perigosos que erram – faz<br />

coisas erradas, <strong>de</strong> propósito e sem querer e erra também<br />

porque anda por aí, por vários lados dos tempos, das for‑<br />

mas e das fronteiras”, observa Noemi Jaffe no prefácio aos<br />

Melhores poemas Arnaldo Antunes. E adiante, acentua<br />

que o poeta tem “um jeito <strong>de</strong> ver e escrever as coisas meio<br />

ao contrário, pelo lado <strong>de</strong> on<strong>de</strong> elas não são ordinaria‑<br />

mente vistas: pelo lado <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro, pelo lado errado, pelo<br />

lado do resto, da dúvida”. A dúvida se expressa em poemas<br />

tradicionais, concretistas, visuais, que têm o dom <strong>de</strong> <strong>de</strong>sa‑<br />

fiar e estimular, ao mesmo tempo, o leitor.<br />

M e l h o r e s P o e M a s


AUGUSTO DOS ANJOS<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

José Paulo Paes<br />

Augusto dos Anjos (1884 ‑1914)<br />

Natural do Engenho Pau ‑D’Arco, PB<br />

4 a edição – 208 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0474 ‑0<br />

A publicação do livro Eu, em 1912, causou estranheza<br />

e certa repugnância entre os raros críticos que se dispuseram<br />

a ler o volume. Leitor do naturalista e fisiologista Darwin, o<br />

homem da teoria das espécies, e do biólogo Haeckel, teórico<br />

do transformismo, Augusto dos Anjos apresentava ao leitor,<br />

sem qualquer cerimônia, em versos contun<strong>de</strong>ntes e incômo‑<br />

dos, por vezes irados, i<strong>de</strong>ias, conceitos e o vocabulário espe‑<br />

cífico das especialida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>sses cientistas, or<strong>de</strong>nados sob a<br />

visão pessimista do filósofo Schopenhauer.<br />

Sem compreen<strong>de</strong>r muito bem o que lia, o leitor <strong>de</strong>pa‑<br />

rava com termos como monera, citula, zoófito, e expres‑<br />

sões insólitas. O <strong>mais</strong> chocante, porém, era o gosto do<br />

autor pelos aspectos repugnantes da vida, no plano físico<br />

e moral. Des<strong>de</strong> o primeiro poema do livro, “Monólogo <strong>de</strong><br />

uma sombra”, o autor esclarecia que “a podridão me serve<br />

<strong>de</strong> Evangelho.../ Amo o esterco, os resíduos ruins dos<br />

quiosques”. Por trás dos versos ásperos, da linguagem um<br />

tanto pedantesca, da tristeza dilacerante e incômoda do<br />

poeta, havia no entanto uma visão original da vida. Como‑<br />

vido e perplexo diante do espetáculo imenso do cosmo, em<br />

contraste com a realida<strong>de</strong> mesquinha do cotidiano, o poeta<br />

esten<strong>de</strong> sua fraternida<strong>de</strong> a tudo o que existe: a meretriz, o<br />

tamarindo, o cão, o bêbado, o tuberculoso. Apesar <strong>de</strong> se<br />

tratar <strong>de</strong> uma poesia “difícil”, o Eu é um dos livros <strong>de</strong> ver‑<br />

sos <strong>mais</strong> lidos da literatura brasileira, com <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> edi‑<br />

ções, fascinando e <strong>de</strong>safiando cada nova geração <strong>de</strong><br />

leitores. E assim <strong>de</strong>ve continuar por muito tempo, en‑<br />

quanto o homem for capaz <strong>de</strong> se inquietar com o mistério<br />

da vida. Como observa José Paulo Paes no prefácio aos<br />

Melhores poemas Augusto dos Anjos, o livro “ontem como<br />

hoje, hoje como amanhã, não po<strong>de</strong>rá <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> surpreen‑<br />

<strong>de</strong>r a quantos se <strong>de</strong>brucem sobre a estranha poesia <strong>de</strong> Au‑<br />

gusto dos Anjos”.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

AUGUSTO FREDERICO<br />

SCHMIDT<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Ivan Marques<br />

Augusto Fre<strong>de</strong>rico Schmidt (1906 ‑1965)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

1 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0478 ‑8<br />

Augusto Fre<strong>de</strong>rico Schmidt é um dos poetas <strong>mais</strong> insi‑<br />

nuantes da literatura brasileira. Insinuante e solitário. Seu<br />

primeiro livro, Canto do brasileiro Augusto Fre<strong>de</strong>rico Schmidt<br />

(1928), com tonalida<strong>de</strong>s fortemente românticas, revela a sua<br />

singularida<strong>de</strong> e o <strong>de</strong>scontentamento com a poesia da época,<br />

dominada pelo pitoresco e o malabarismo mo<strong>de</strong>rnista. Nos<br />

livros seguintes, com um tom vagamente moralizante, um<br />

estilo <strong>de</strong>rramado, fluvial, repleto <strong>de</strong> repetições (“uma tor‑<br />

rente majestosa”, observou Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>), Schmidt<br />

como que soletra os gran<strong>de</strong>s temas que iriam se impor na<br />

sua poesia da maturida<strong>de</strong>: a presença da morte (“Serei só eu<br />

a sentir a lenta morte do mundo/ ou todos os seres huma‑<br />

nos, que vivem comigo,/ estão penetrados também, como<br />

eu, <strong>de</strong>ste sentimento confuso e terrível?”), a solidão, a tris‑<br />

teza e a estranheza <strong>de</strong> estar no mundo, predominantes em<br />

Canto da noite (1934).<br />

A plena maturida<strong>de</strong>, o equilíbrio, a segurança, a es‑<br />

pontaneida<strong>de</strong>, se afirma em Mar <strong>de</strong>sconhecido (1942), no<br />

qual o espiritualismo se aguça até o sentimento extremo<br />

“<strong>de</strong> irrealida<strong>de</strong>” (Roger Basti<strong>de</strong>) da vida cotidiana, substi‑<br />

tuído por um mundo vago, impessoal, música ao vento,<br />

expresso num “verso livre amplo e melodioso, com um<br />

toque bíblico, cheio <strong>de</strong> ressonâncias, marcado pela repeti‑<br />

ção quase obsessiva, que assalta e domina a sensibilida<strong>de</strong><br />

do leitor” (Antonio Candido).<br />

A partir <strong>de</strong> Fonte invisível (1949), o autor como que<br />

refina a sua obra e impõe ‑se como o <strong>mais</strong> influente poeta<br />

católico do período. Os livros seguintes são todos curtos,<br />

com poucos poemas e a repetição obsessiva dos mesmos<br />

temas. Manuel Ban<strong>de</strong>ira consi<strong>de</strong>ra que essa repetição, como<br />

nos velhos profetas, lhe confere um timbre próprio e a situa<br />

“numa gran<strong>de</strong>za solitária como a daquela estrela, ‘imagem<br />

<strong>de</strong> um <strong>de</strong>sespero sem forma’, por ele saudada no limiar <strong>de</strong><br />

seu último livro”.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

31


AUGUSTO MEyER<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Tania Franco Carvalhal<br />

Augusto Meyer (1902 ‑1970)<br />

Natural <strong>de</strong> Porto Alegre, RS<br />

1 a edição – 168 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0759 ‑9<br />

Raras vezes um erudito consegue manter o frescor <strong>de</strong><br />

alma e a simplicida<strong>de</strong> capazes <strong>de</strong> comungar e se i<strong>de</strong>ntificar<br />

com as coisas humil<strong>de</strong>s da vida. Augusto Meyer, ensaísta e<br />

biógrafo, erudito à moda europeia, profundo, mas <strong>de</strong> estilo<br />

lépido e solto, soube não só resguardar a sensibilida<strong>de</strong><br />

como preservar certa inocência edênica, o <strong>mais</strong> forte sinal<br />

<strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação do homem com a terra, os hábitos e os<br />

costumes populares, as danças, os bichos, as árvores.<br />

Lírica, um tanto irônica, sem per<strong>de</strong>r a ternura, a poe‑<br />

sia inicial <strong>de</strong> Augusto Meyer se i<strong>de</strong>ntifica com a terra gaú‑<br />

cha, com seu “cheiro bom <strong>de</strong> estábulos e <strong>de</strong> pastos maduros”,<br />

a partir do riquíssimo vocabulário regional. Natural <strong>de</strong> Porto<br />

Alegre, Augusto Meyer (1902 ‑1970) não era um homem<br />

estritamente urbano. Gostava da vida rural, das imensidões<br />

sem fim dos pampas, em cujas paisagens se inspirou em<br />

seu primeiro livro <strong>de</strong> poemas, Coração ver<strong>de</strong> (1926). Em Gi‑<br />

raluz, publicado dois <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, o poeta se inclina pela<br />

poesia <strong>mais</strong> intimista, se <strong>de</strong>sliga do mundo rural, se <strong>de</strong>ixa<br />

perturbar pelo seu auto<strong>de</strong>sconhecimento (“Quem é esse<br />

que mergulhou no lago liso do espelho/ e me encara <strong>de</strong><br />

frente à clarida<strong>de</strong> crua?”) e um certo narcisismo, expresso<br />

em versos como este: “na vidraça garoenta <strong>de</strong>ste bar/ na‑<br />

moro o meu reflexo vago e esguio”. A autoanálise se torna<br />

<strong>mais</strong> aguda em Poemas <strong>de</strong> Bilu (1929), o “filóis” (filósofo)<br />

Bilu, alter ‑ego do poeta, ironizado em todo o <strong>de</strong>correr do<br />

livro (“Bilu, cidadão da harmonia cósmica,/ você <strong>de</strong>ixe <strong>de</strong><br />

bancar o Bau<strong>de</strong>laire”). Ausentando ‑se da poesia durante<br />

muitos <strong>anos</strong> (ou apenas <strong>de</strong>ixando <strong>de</strong> publicar o que escre‑<br />

via), o poeta retorna em plena maturida<strong>de</strong>, na década <strong>de</strong><br />

1950, com poesia grave, mas serena, com certa melancolia<br />

<strong>de</strong> crepúsculo: “Serena esta luz <strong>de</strong> ouro em meu outono:/<br />

recordação, antes do gran<strong>de</strong> sono...”.<br />

32<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

BOCAGE<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Cleonice Berardinelli<br />

Bocage (1765 ‑1805)<br />

Natural <strong>de</strong> Setúbal, Portugal<br />

4 a edição – 184 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1620 ‑0<br />

Manuel Maria Barbosa du Bocage (1765 ‑1805), o<br />

gran<strong>de</strong> nome da poesia portuguesa no século XVIII, <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

cedo sentiu ‑se pre<strong>de</strong>stinado à missão <strong>de</strong> poeta, com os<br />

seus componentes habituais <strong>de</strong> tragédia e sentimentalismo,<br />

segundo o mo<strong>de</strong>lo camoniano. Aos <strong>de</strong>zesseis <strong>anos</strong> foge <strong>de</strong><br />

casa, ingressando na Aca<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> Marinha. Durante o<br />

curso leva uma vida <strong>de</strong> dissipação e boêmia, canta os seus<br />

amores com uma certa Gertru<strong>de</strong>s.<br />

Em 1786, segue para a Índia, passando pelo Rio <strong>de</strong> Ja‑<br />

neiro. Na colônia, entrega ‑se à <strong>de</strong>vassidão sem limites, en‑<br />

volvido com amores baixos. Acaba <strong>de</strong>sertando e regressando<br />

a Portugal, on<strong>de</strong> encontra Gertru<strong>de</strong>s casada com seu irmão.<br />

Acolhido pelos poetas da Nova Arcádia, adota o nome <strong>de</strong><br />

Elmano Sadino. Insubmisso e mordaz, logo se <strong>de</strong>savém com<br />

os colegas, que satiriza em versos violentos. Preso como<br />

autor <strong>de</strong> “papéis sediciosos”, logo entregue à Inquisição,<br />

consegue transferência para o convento dos oratori<strong>anos</strong>, <strong>de</strong><br />

on<strong>de</strong> sai precocemente envelhecido, renegando seu passado<br />

dissoluto. A poesia <strong>de</strong> Bocage se caracteriza pela busca <strong>de</strong><br />

superação <strong>de</strong> contrastes íntimos e pungentes, amores puros<br />

e <strong>de</strong>pravados, a morte como ameaça e libertação, os confli‑<br />

tos entre a fragilida<strong>de</strong> humana e a bonda<strong>de</strong> natural, baseado<br />

nas teorias <strong>de</strong> Rousseau, mas mesmo em seus momentos <strong>de</strong><br />

maior sordi<strong>de</strong>z confiante na benevolência divina e na inter‑<br />

venção miraculosa da Virgem Maria. Por temperamento e<br />

por sua vivência, apesar das alegorias arcádicas e das notas<br />

iluministas, Bocage foi um precursor do Romantismo. Um<br />

pré ‑romântico, com “seu gosto pela solidão e pelo silêncio,<br />

pelas sombras povoadas <strong>de</strong> mochos ou fantasmas, pela na‑<br />

tureza agreste, às vezes locus horrendus, pela tristeza e pela<br />

morte, pelo amor do amor”, sobretudo nos sonetos, como<br />

observa Cleonice Berardinelli no prefácio aos Melhores poe‑<br />

mas Bocage.<br />

M e l h o r e s P o e M a s


BUENO DE RIVERA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna<br />

Bueno <strong>de</strong> Rivera (1911 ‑1982)<br />

Natural <strong>de</strong> Santo Antônio do Monte, MG<br />

1 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0797 ‑1<br />

O nome é sonoro, harmonioso: Bueno <strong>de</strong> Rivera. Pa‑<br />

rece um poeta espanhol. Ou um daqueles burgueses altivos<br />

dos romances <strong>de</strong> Perez Galdós. Impõe um certo respeito. Na<br />

verda<strong>de</strong>, é uma invenção do mineiríssimo poeta cujo nome<br />

na pia batismal era Odorico Bueno, por sinal bem pouco<br />

poético. Descen<strong>de</strong>nte do velho tronco paulista que remonta<br />

a Ama<strong>de</strong>u Bueno, o tal que foi proclamado rei do Brasil, em<br />

1640, nasceu quase três séculos <strong>de</strong>pois, em 1911, em Santo<br />

Antônio do Monte, e faleceu em Belo Horizonte, em 1982.<br />

Bueno <strong>de</strong> Rivera pertence à Geração <strong>de</strong> 45. Quando<br />

lançou seus primeiros livros – Mundo submerso (1944) e Luz<br />

do pântano (1948) –, foi equiparado a outros jovens que se<br />

afirmavam, Lêdo Ivo, João Cabral <strong>de</strong> Melo Neto. A partir daí,<br />

calou ‑se, só lançando uma nova obra (Pasto <strong>de</strong> pedra) em<br />

1971. Os primeiros livros, <strong>de</strong> tendências surrealistas, refle‑<br />

tiam, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o título, “um mundo submerso, subterrâneo,<br />

<strong>de</strong>ssa luz difusa sobre as águas pant<strong>anos</strong>as do tempo”, lem‑<br />

brando uma pintura <strong>de</strong> Salvador Dalí ou <strong>de</strong> Max Ernst, con‑<br />

forme a observação <strong>de</strong> Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna no<br />

prefácio aos Melhores poemas Bueno <strong>de</strong> Rivera.A crítica da<br />

época rasgou seda. Sérgio Milliet garantia que “pela temá‑<br />

tica atualíssima, tanto a <strong>de</strong> participação como a <strong>de</strong> inquieta‑<br />

ção individual, assinalam seus versos um ponto <strong>mais</strong> alto na<br />

mo<strong>de</strong>rna poesia brasileira”. Pasto <strong>de</strong> pedra indica novas in‑<br />

quietações. É um livro <strong>de</strong> participação política, mostrando<br />

um poeta voltado para as raízes barrocas das Gerais, ten‑<br />

tando enten<strong>de</strong>r os personagens da Inconfidência e a própria<br />

formação do estado, com um lirismo a que não falta a con‑<br />

tida ironia mineira. Um ponto a assinalar na edição dos Me‑<br />

lhores poemas Bueno <strong>de</strong> Rivera é a inclusão <strong>de</strong> poemas<br />

inéditos, em número equivalente aos já publicados, reve‑<br />

lando novas facetas <strong>de</strong>sse bom poeta das Minas Gerais.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

CARLOS NEJAR<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Léo Gilson Ribeiro<br />

Carlos Nejar (19<strong>39</strong>)<br />

Natural <strong>de</strong> Porto Alegre, RS<br />

2 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1621 ‑7<br />

Carlos Nejar nasceu em Porto Alegre, em 19<strong>39</strong>, sendo<br />

chamado por alguns críticos <strong>de</strong> “o poeta do pampa brasi‑<br />

leiro”. O português Jacinto do Prado Coelho consi<strong>de</strong>ra ‑o<br />

“o poeta da condição humana”. Estreou em 1960, com<br />

Sélesis, tendo uma vasta obra poética, formada por <strong>mais</strong> <strong>de</strong><br />

vinte títulos.<br />

Poeta <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> capacida<strong>de</strong> verbal, sua poesia apre‑<br />

senta uma gama variada <strong>de</strong> tons: amorosa, elegíaca, medi‑<br />

tativa, mística, épica. Todas as manifestações humanas lhe<br />

interessam. Assim, preocupa ‑o também o social, a revolta<br />

diante da situação “<strong>de</strong> abandono dos pobres no campo,<br />

sem terras, sem paga justa, sem futuro”, que canta, sem<br />

ja<strong>mais</strong> resvalar para “um tom fácil <strong>de</strong> panfleto político”,<br />

como observa Léo Gilson Ribeiro no prefácio aos Melhores<br />

poemas Carlos Nejar. Mais forte do que a preocupação social<br />

é a obsessão por Deus, a busca permanente da divinda<strong>de</strong>,<br />

do po<strong>de</strong>r supremo, que conce<strong>de</strong> a paz, mas cujos <strong>de</strong>sígnios<br />

são incompreensíveis ao homem. Já se ressaltou que os poe‑<br />

mas <strong>de</strong> Nejar <strong>de</strong>dicados a Deus lembram, pela sua simplici‑<br />

da<strong>de</strong> e colorido, os quadros <strong>de</strong> alguns pintores primitivos,<br />

líricos e <strong>de</strong>spojados, <strong>de</strong> olhos fixos no infinito: um Paolo Uccelo,<br />

um Simone Martini. A obsessão pela divinda<strong>de</strong> pren<strong>de</strong> ‑se a<br />

outros dois temas, que inquietam os vivos, mas que <strong>de</strong>cor‑<br />

rem <strong>de</strong>le: o amor (“Amar é a <strong>mais</strong> alta constelação”) e a<br />

morte, que o poeta não consi<strong>de</strong>ra fim, mas início <strong>de</strong> um<br />

outro ciclo. Em síntese, como diz Léo Gilson Ribeiro, no pre‑<br />

fácio aos Melhores poemas Carlos Nejar, a poesia <strong>de</strong> Nejar<br />

po<strong>de</strong> ser comparada a um rio “que atravessasse ida<strong>de</strong>s car‑<br />

regadas <strong>de</strong> heroísmo, luta, feridas, mas nunca <strong>de</strong>sânimo. Tal<br />

o célere e célebre rio <strong>de</strong> que nos fala o filósofo Heráclito,<br />

nunca nele nos banhamos novamente: cada vez suas águas<br />

hão <strong>de</strong> correr, volumosas, rumo a outras paragens, a servir<br />

<strong>de</strong> espelho para outros homens”.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

33


CARLOS PENA FILHO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Edilberto Coutinho<br />

Carlos Pena Filho (1929 ‑1960)<br />

Natural <strong>de</strong> Recife, PE<br />

4 a edição – 128 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0105 ‑1<br />

Carlos Pena Filho nasceu em Recife (Pernambuco), em<br />

1929, e morreu na mesma cida<strong>de</strong>, em um <strong>de</strong>sastre <strong>de</strong> auto‑<br />

móvel, em 1960. Os primeiros poemas, publicados no Suple‑<br />

mento Literário do Diário <strong>de</strong> Pernambuco, já revelavam os<br />

dons do poeta autêntico: intensida<strong>de</strong> e personalida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>scar‑<br />

tadas as influências, inevitáveis num jovem <strong>de</strong> vinte <strong>anos</strong>.<br />

A crítica se entusiasmou. Mauro Mota sublinhava “a<br />

força emotiva e a renovação formal” da poesia <strong>de</strong> Pena<br />

Filho para enfatizar que seus poemas “só fizeram reforçar a<br />

linha inicial <strong>de</strong> preferência temática e do individualismo ex‑<br />

pressional”. Individualista e polêmico, o jovem poeta adota<br />

como forma preferida <strong>de</strong> expressão o soneto, revalorizado<br />

pela chamada Geração <strong>de</strong> 45, com a qual, aliás, não se<br />

i<strong>de</strong>ntificava, acusando ‑a <strong>de</strong> “existente pelo que negou, e<br />

inexistente pelo que po<strong>de</strong>ria mas não ousou afirmar”. Pena<br />

Filho publica seu primeiro livro em 1952, O tempo da busca,<br />

título simbólico que, <strong>de</strong> certa forma, <strong>de</strong>fine sua ativida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>ssa época: uma incansável busca da poesia autêntica,<br />

uma permanente reflexão sobre o cotidiano e a própria obra<br />

e o sentido do que se encontra “além das coisas vãs”. Me‑<br />

mórias do Boi Serapião (1956) inaugura um novo ciclo na<br />

poesia <strong>de</strong> Pena Filho, aberta à <strong>de</strong>núncia social, preocupada<br />

com os sofrimentos do homem nor<strong>de</strong>stino. A i<strong>de</strong>ntificação com<br />

a região, e sobretudo com a cida<strong>de</strong> natal, assinala A verti‑<br />

gem lúcida (1958), no qual se acentuam as qualida<strong>de</strong>s visuais<br />

e plásticas <strong>de</strong> sua poesia, como se “pintasse com palavras”,<br />

como observa Edilberto Coutinho. No ano seguinte, numa<br />

espécie <strong>de</strong> balanço sobre a própria obra, reúne os três livros<br />

publicados e poemas inéditos no Livro geral. Manuel Ban‑<br />

<strong>de</strong>ira aponta a oralida<strong>de</strong>, a fluência narrativa e a força lírica<br />

como as principais características <strong>de</strong>ssa poesia autêntica,<br />

que aspirava chegar “à cor do grito/ à música das cores e<br />

dos ventos”.<br />

34<br />

Capa<br />

Nova<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

CASIMIRO DE ABREU<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Rubem Braga<br />

Casimiro <strong>de</strong> Abreu (18<strong>39</strong> ‑1860)<br />

Natural <strong>de</strong> Vila <strong>de</strong> Capivari, RJ<br />

2 a edição – 112 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑03<strong>39</strong> ‑9<br />

As primaveras, por coincidência lançadas no início da<br />

primavera <strong>de</strong> 1859, tiveram um retumbante êxito <strong>de</strong> crítica.<br />

Nenhum outro livro <strong>de</strong> poemas, até então, havia recebido<br />

tantos elogios na imprensa brasileira. Surgindo num momento<br />

em que se esgotava o lirismo noturno, pesado e sufocante da<br />

Geração <strong>de</strong> 1840, cujo auge se encontra na poesia <strong>de</strong> Álvares<br />

<strong>de</strong> Azevedo, o livro <strong>de</strong> Casimiro <strong>de</strong> Abreu trazia um arrepio<br />

novo à sensibilida<strong>de</strong> do leitor brasileiro. Era como uma janela<br />

aberta numa sala fechada havia muitos <strong>anos</strong>.<br />

O frescor e a espontaneida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa poesia, o lirismo<br />

simples, os namoricos ingênuos e levemente maliciosos, a<br />

melancolia, a certeza da morte prematura (“Se eu tenho <strong>de</strong><br />

morrer na flor dos <strong>anos</strong>,/ Meu Deus! não seja já”), a sauda<strong>de</strong><br />

da pátria (“Eu nasci além dos mares:/ os meus lares, meus<br />

amores ficam lá!”), o sentimentalismo, tão do agrado da<br />

alma brasileira, conquistaram os leitores. Poemas como<br />

“Meus oito <strong>anos</strong>”, “A valsa”, “Moreninha” eram recitados<br />

em todos os saraus. Na época, o público brasileiro interes‑<br />

sado em literatura apenas começava a se formar, constituído<br />

sobretudo por mulheres e estudantes, em geral embriagados<br />

<strong>de</strong> poesia. As tiragens dos livros eram medíocres, duzentos,<br />

trezentos exemplares. Assim, a edição <strong>de</strong> As primaveras, <strong>de</strong><br />

mil exemplares, esgotada em pouco tempo, tornou ‑se no<br />

que hoje se chama um best ‑seller. Logo, conquistou tam‑<br />

bém Portugal, on<strong>de</strong> foram lançadas duas edições sucessivas,<br />

na década <strong>de</strong> 1860. Ao longo do tempo saíram <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong><br />

edições, que fizeram <strong>de</strong> As primaveras o livro <strong>de</strong> versos <strong>mais</strong><br />

lido <strong>de</strong> autor brasileiro, numa prova <strong>de</strong> como o poeta soube<br />

sintonizar com a sensibilida<strong>de</strong> e os sonhos do povo. Um pre‑<br />

sente extra nesta seleção <strong>de</strong> Melhores poemas Casimiro <strong>de</strong><br />

Abreu são os <strong>de</strong>liciosos textos (prefácio e vida do poeta) es‑<br />

critos por Rubem Braga. Afinal, foi preciso <strong>mais</strong> <strong>de</strong> um sé‑<br />

culo para juntar essa dupla.<br />

M e l h o r e s P o e M a s


CASSIANO RICARDO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Luiza Franco Moreira<br />

Cassiano Ricardo (1895 ‑1974)<br />

Natural <strong>de</strong> S. J. dos Campos, SP<br />

1 a edição – 304 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0792 ‑0<br />

Cassiano Ricardo estreou em 1915 e publicou seu úl‑<br />

timo livro <strong>de</strong> poemas em 1964. Meio século <strong>de</strong> poesia, com<br />

uma permanente e surpreen<strong>de</strong>nte capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> renova‑<br />

ção. Conservador e tradicionalista na mocida<strong>de</strong>, seguindo<br />

os breviários do Parnasianismo e do Simbolismo, custou a<br />

aceitar o Mo<strong>de</strong>rnismo. Convertido, participou do movi‑<br />

mento Ver<strong>de</strong> ‑Amarelo, <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong> transformado em “revo‑<br />

lução da anta”, que procurava interpretar o Brasil e ressaltar<br />

sua originalida<strong>de</strong> cultural, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o indígena até a imigração<br />

e a miscigenação racial. Essa filosofia marca os Borrões <strong>de</strong><br />

ver<strong>de</strong> e amarelo, Vamos caçar papagaios, Martim Cererê,<br />

Deixa estar, jacaré, <strong>de</strong> títulos e temática nacionalistas, pu‑<br />

blicados entre 1925 e 1933. A partir daí, a poesia <strong>de</strong> Cas‑<br />

siano Ricardo muda radicalmente, adquire tensão e<br />

<strong>de</strong>nsida<strong>de</strong>, incorpora novas experiências vividas pela poesia<br />

brasileira, da Geração <strong>de</strong> 45 ao Concretismo, numa ânsia<br />

permanente <strong>de</strong> renovação. A crítica se surpreen<strong>de</strong>. Um dia<br />

<strong>de</strong>pois do outro (1947) revela um novo poeta, como se ti‑<br />

vesse <strong>de</strong>bruçado sobre si mesmo e “<strong>de</strong>scoberto as fontes<br />

<strong>mais</strong> profundas <strong>de</strong> sua inspiração” (Manuel Ban<strong>de</strong>ira), li‑<br />

rismo que se amplia e aprofunda nos livros seguintes, A<br />

face perdida e Poemas murais. O poeta se preocupa com o<br />

<strong>de</strong>stino da humanida<strong>de</strong>, mas também com a tragédia do<br />

indivíduo, no meio da multidão, sem <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> lado o<br />

humor. A preocupação com o mundo contemporâneo, os<br />

rumos perigosos da história são o tema <strong>de</strong> Jeremias sem<br />

chorar, livro que traz uma outra surpresa, a adoção da poé‑<br />

tica concretista, o abandono do verso tradicional pelo que<br />

o poeta <strong>de</strong>nomina linossigno. O poeta envelhecera, sua<br />

poesia, porém, rejuvenescia <strong>de</strong> forma permanente, na di‑<br />

versida<strong>de</strong> das técnicas e na visão <strong>de</strong> mundo, ajudando o<br />

leitor “a compreen<strong>de</strong>r o nosso tempo” (Carlos Drummond<br />

<strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>).<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

CASTRO ALVES<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Lêdo Ivo<br />

Castro Alves (1847 ‑1871)<br />

Natural <strong>de</strong> Mutitiba, BA<br />

7 a edição – 136 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0340 ‑8<br />

Castro Alves pertence a uma linhagem <strong>de</strong> poetas <strong>de</strong> que<br />

é impossível, ou pelo menos inconveniente, separar vida e<br />

obra. Palavra por palavra: sadio, sem nada da morbi<strong>de</strong>z <strong>de</strong><br />

seus colegas românticos, sensual, sempre apaixonado, libertá‑<br />

rio, <strong>de</strong>fensor dos direitos da mulher, um tanto <strong>de</strong>magógico.<br />

Como bom romântico, o amor ocupa o primeiro lugar<br />

em sua obra, um amor obsessivo, carnal, quase pagão, puri‑<br />

ficado pela ar<strong>de</strong>nte sensibilida<strong>de</strong> do poeta que, <strong>de</strong> certa<br />

forma, reivindicava direitos iguais para o corpo e o espírito. O<br />

que levou um crítico a chamá ‑lo <strong>de</strong> precursor do amor livre.<br />

A outra gran<strong>de</strong> vertente da obra castroalvina é a poe‑<br />

sia social, na qual se incluem os poemas patrióticos. Sem<br />

ser o primeiro, Castro Alves foi a voz <strong>mais</strong> eloquente e forte<br />

na <strong>de</strong>fesa da raça negra e <strong>de</strong> sua libertação do cativeiro.<br />

Quem nunca se emocionou com o “Navio negreiro”? Mas<br />

nada disso teria importância não fosse o gênio do poeta.<br />

Falecido aos 24 <strong>anos</strong>, com apenas um livro publicado em<br />

vida (Espumas flutuantes), Castro Alves <strong>de</strong>ixou alguns dos<br />

<strong>mais</strong> belos poemas da língua, como “Sub Tegmine Fagi”,<br />

“A hebreia” e “Boa noite”, <strong>de</strong> um inconfundível sabor bra‑<br />

sileiro, pela expressão e “a maneira <strong>de</strong> ver e <strong>de</strong> sentir o am‑<br />

biente e a vida brasileira”, como observou Eugênio Gomes.<br />

Brasileira, um tanto barulhenta e retórica, como o seu tem‑<br />

peramento, a poesia <strong>de</strong> Castro Alves tem momentos <strong>de</strong> um<br />

frescor matinal, como saída do limbo admiráveis modula‑<br />

ções em surdina, <strong>de</strong> voz cochichada ao ouvido, e quadros<br />

soberbos da natureza tropical. Eça <strong>de</strong> Queirós ao ouvir um<br />

amigo <strong>de</strong>clamar: “Às vezes, quando o sol nas matas vir‑<br />

gens/ a fogueira das tar<strong>de</strong>s acendia”, exclamou, arreba‑<br />

tado: “Aí está, em dois versos, toda a poesia dos trópicos”.<br />

A poesia <strong>de</strong> Castro Alves caiu no gosto do povo. A praça é<br />

do povo como o céu é do condor, diz o orador popular, sem<br />

saber que repete um verso do poeta baiano.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

35


CECÍLIA MEIRELES<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Maria Fernanda<br />

Cecília Meireles (1901 ‑1964)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

14 a edição – 200 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0294 ‑4<br />

Consi<strong>de</strong>rada pela crítica a <strong>mais</strong> alta personalida<strong>de</strong> femi‑<br />

nina da poesia brasileira e um dos maiores nomes <strong>de</strong> nossa<br />

literatura, em qualquer época, sem distinções preconceituosas<br />

<strong>de</strong> sexo, Cecília Meireles <strong>de</strong>ixou uma obra poética longa, in‑<br />

tensa e perturbadora. Foram quase trinta livros <strong>de</strong> versos, um<br />

roteiro que se inicia sob a influência parnasiana e simbolista,<br />

se <strong>de</strong>pura numa luta permanente pela expressão pessoal, até<br />

atingir aquela altitu<strong>de</strong> para a qual quaisquer <strong>de</strong>fini ções são<br />

inconsistentes: a poesia pura.<br />

Cecília Meireles nasceu e morreu no Rio <strong>de</strong> Janeiro<br />

(1901 ‑1964), <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ter conhecido quase todo o<br />

mundo, experiência que incorporou à sua poesia, nos ver‑<br />

sos <strong>de</strong> sabor oriental, nos poemas itali<strong>anos</strong>, nas traduções<br />

<strong>de</strong> poetas das <strong>mais</strong> diversas procedências, do indiano Rabin‑<br />

dranah Tagore aos poetas mo<strong>de</strong>rnos <strong>de</strong> Israel. A vocação se<br />

manifestou cedo. Na escola primária, pelo seu mérito nos<br />

estudos, recebeu uma medalha <strong>de</strong> ouro das mãos <strong>de</strong> Olavo<br />

Bilac, então inspetor escolar. Na vida civil exerceu o magis‑<br />

tério, fundou a primeira biblioteca infantil do Brasil. Na vida<br />

espiritual foi poeta em tempo quase integral, pois escreveu<br />

diversos volumes em prosa (ficção, teatro, crônicas, livros<br />

didáticos). A poesia <strong>de</strong> Cecília Meireles se caracteriza pela<br />

ânsia <strong>de</strong> apreensão e compreensão total do fenômeno da<br />

vida: “Preparei meu verso/ com a melhor medida:/ rosto do<br />

universo,/ boca da minha vida”. Na tentativa <strong>de</strong> captar a<br />

Verda<strong>de</strong>, diluída em milhares <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>s, ela vai <strong>de</strong> hori‑<br />

zonte a horizonte, aborda temas variados, expressando ‑se<br />

ora em trovas singelas, ora em poemas <strong>de</strong> um hermetismo<br />

cerrado, por vezes com angústia. Até alcançar a libertação, se<br />

não total, pelo menos a possível no mundo: “Levai ‑me aon<strong>de</strong><br />

quiser<strong>de</strong>s! – aprendi com as primaveras/ a <strong>de</strong>ixar ‑me cortar e<br />

a voltar sempre inteira”.<br />

36<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

CESÁRIO VERDE<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Leyla Perrone ­Moisés<br />

Cesário Ver<strong>de</strong> (1855 ‑1886)<br />

Natural <strong>de</strong> Lisboa, Portugal<br />

1 a edição – 144 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1016 ‑6<br />

Ao contrário <strong>de</strong> certos poetas portugueses – Fernando<br />

Pessoa, Antero <strong>de</strong> Quental, Florbela Espanca –, muito po‑<br />

pulares no Brasil, Cesário Ver<strong>de</strong> é quase <strong>de</strong>sconhecido dos<br />

leitores brasileiros. Não sabem o que estão per<strong>de</strong>ndo.<br />

Vivendo em um período <strong>de</strong> encruzilhada da literatura<br />

portuguesa, o chamado Realismo, ainda fortemente mar‑<br />

cado pela retórica romântica, Cesário foi o único poeta <strong>de</strong><br />

sua geração a se <strong>de</strong>spojar integralmente do Romantismo.<br />

Nos primeiros poemas, em busca <strong>de</strong> si mesmo, cultiva o epi‑<br />

grama cínico e o humor grotesco, à maneira <strong>de</strong> João Penha,<br />

muito em moda à época. Logo, sob a influência <strong>de</strong> Bau<strong>de</strong>‑<br />

laire, começa a afirmar a sua própria personalida<strong>de</strong> artística,<br />

expressando as mil e uma seduções da realida<strong>de</strong> ao seu<br />

redor (“a mim o que me ro<strong>de</strong>ia é o que me preocupa”, es‑<br />

creve a um amigo), as coisas comuns do cotidiano, as bur‑<br />

guesinhas lisboetas, os hotéis da moda, a ativida<strong>de</strong> das<br />

regateiras, um piquenique, a feira livre; fatos dos quais extrai<br />

poemas cheios <strong>de</strong> cores, bem <strong>de</strong>senhados, como pequenos<br />

quadros ou aquarelas. Mas o poeta não se pren<strong>de</strong> apenas<br />

aos aspectos amáveis da vida. Movido por i<strong>de</strong>ais <strong>de</strong> justiça,<br />

solidarieda<strong>de</strong> com os humil<strong>de</strong>s, simpatia pelo povo, não se<br />

esquece do “cardume negro” das varinas, dos operários<br />

“enfarruscados e secos” e dos bairros miseráveis <strong>de</strong> Lisboa,<br />

“aon<strong>de</strong> miam gatas,/ e o peixe podre gera os focos <strong>de</strong> infec‑<br />

ção”. Um <strong>de</strong> seus últimos poemas, que ficou incompleto,<br />

<strong>de</strong>nuncia com veemência o egoísmo dos ricos, em contraste<br />

com a miséria dos pobres. Ao morrer em 1886, <strong>de</strong> tubercu‑<br />

lose, aos 31 <strong>anos</strong>, Cesário havia publicado apenas alguns<br />

poemas avulsos, que não <strong>de</strong>spertaram os louvores da crítica.<br />

O livro <strong>de</strong> Cesário Ver<strong>de</strong>, reunindo sua produção, foi publi‑<br />

cado em 1887, numa tiragem <strong>de</strong> duzentos exemplares. A<br />

partir daí o sucesso do livro não parou <strong>de</strong> crescer.<br />

M e l h o r e s P o e M a s


CLÁUDIO MANUEL<br />

DA COSTA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Francisco Iglésias<br />

Cláudio Manuel da Costa (1729 ‑1789)<br />

Natural <strong>de</strong> Mariana, MG<br />

2 a edição – 216 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1622 ‑4<br />

O <strong>mais</strong> árca<strong>de</strong> dos poetas que viveram em Vila Rica no<br />

século XVIII, o <strong>mais</strong> culto do grupo, o <strong>mais</strong> correto na me‑<br />

trificação e na linguagem e, talvez, “o <strong>mais</strong> profundamente<br />

preso às emoções e valores da terra” (Antonio Candido),<br />

Cláudio Manuel da Costa <strong>de</strong>ixou uma obra variada, com‑<br />

posta <strong>de</strong> sonetos, cantatas, éclogas, epístolas, cançonetas,<br />

além do poema épico “Vila Rica” e <strong>de</strong> “O Parnaso obse‑<br />

quioso”. Alguns historiadores acreditam que tenha colabo‑<br />

rado nas Cartas chilenas, mas nesse aspecto tudo são<br />

hipóteses.<br />

Natural <strong>de</strong> Mariana (MG), o poeta cursou a Universi‑<br />

da<strong>de</strong> <strong>de</strong> Coimbra, sendo <strong>de</strong>ssa época os seus primeiros<br />

trabalhos, não incluídos nas Obras (1768). Concluído o<br />

curso, retornou ao Brasil, fixando ‑se em Vila Rica, adotou<br />

o nome <strong>de</strong> Glauceste Saturnio, como era <strong>de</strong> praxe no Ar‑<br />

cadismo, advogou, acabou se envolvendo na Inconfidência<br />

Mineira. Preso, suicidou ‑se (ou foi assassinado) na Casa dos<br />

Contos, on<strong>de</strong> se achava <strong>de</strong>tido. Na poesia <strong>de</strong> Cláudio Ma‑<br />

nuel da Costa predomina a melancolia e um certo senti‑<br />

mento <strong>de</strong> <strong>de</strong>sencanto, acirrados pelo contraste entre a vida<br />

da metrópole e o ambiente ru<strong>de</strong> das Minas Gerais. O poeta<br />

<strong>de</strong> tudo extrai tristeza, da fugacida<strong>de</strong> das coisas à ausência<br />

da amada, como se na vida não existissem momentos feli‑<br />

zes. É um sensitivo, como confessa em versos admiráveis,<br />

comparando as montanhas rochosas <strong>de</strong> sua terra ao seu<br />

coração: “Destes penhascos fez a natureza/ o berço em<br />

que nasci: oh quem cuidara/ que entre penhas tão duras se<br />

criara/ uma alma terna, um peito sem dureza!”. Alguns<br />

críticos apontam uma certa frieza em seus versos, mas esta<br />

<strong>de</strong>correria da disciplina formal, que disfarça um veio sub‑<br />

terrâneo palpitante <strong>de</strong> emoção, sobretudo nos sonetos, do<br />

qual foi emérito cultor, dos maiores da língua, e que cons‑<br />

tituem a parte <strong>mais</strong> significativa <strong>de</strong> sua obra.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

CORA CORALINA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Darcy França Denófrio<br />

Cora Coralina (1889 ‑1985)<br />

Natural <strong>de</strong> Goiás, GO<br />

3 a edição – 368 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0883 ‑0<br />

Simples, muito próxima do gosto popular, fluindo com<br />

a naturalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um riacho entre pedras. A água é lím‑<br />

pida, cristalina. Sacia a se<strong>de</strong>. Assim é a poesia <strong>de</strong> Cora Co‑<br />

ralina, apesar da poetisa nela <strong>de</strong>scobrir uma certa dureza,<br />

como expressa no poema “Das pedras”:<br />

“Ajuntei todas as pedras/ que vieram sobre mim./ Levan‑<br />

tei uma escada muito alta/ e no alto subi./ Teci um tapete<br />

floreado/ e no sonho me perdi./ Uma estrada,/ um leito,/ uma<br />

casa,/ um companheiro./ Tudo <strong>de</strong> pedra./ Entre pedras/ cres‑<br />

ceu a minha poesia./ Minha vida.../ Quebrando pedras/ e plan‑<br />

tando flores./ Entre pedras que me esmagavam/ levantei a<br />

pedra ru<strong>de</strong>/ dos meus versos”. Esses versos, <strong>de</strong> cunho auto‑<br />

biográfico, <strong>de</strong> certo modo, são injustos em relação à obra da<br />

autora, mas reveladores <strong>de</strong> suas mágoas com a vida. Ana Lins<br />

dos Guimarães Peixoto Brêtas, que <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong> adotou o pseu‑<br />

dônimo <strong>de</strong> Cora Coralina, nasceu em Goiás, então capital do<br />

estado <strong>de</strong> mesmo nome, em 1889, numa família <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s<br />

proprietários rurais empobrecidos. Infância “intimidada, dimi‑<br />

nuída, incompreendida”. Indiferença da mãe. Casamento<br />

com um homem separado da primeira esposa, um escândalo,<br />

a fuga do casal para São Paulo. Teve seis filhos. Com a morte<br />

do marido, após 45 <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ausência, regressa a Goiás, on<strong>de</strong><br />

faleceu em Goiânia, em 1985. Esses fatos, aguçados pela sen‑<br />

sibilida<strong>de</strong> extrema, criaram um fundo pétreo, duro, na poesia<br />

<strong>de</strong> Cora Coralina. Talvez também em sua alma. Mas ela só é<br />

dura quando fala <strong>de</strong> si mesma, <strong>de</strong> seu sentimento <strong>de</strong> inferio‑<br />

rida<strong>de</strong>, da menina que foi um dia, “feia, medrosa e triste”.<br />

Quando olha para seu semelhante predomina a simpatia hu‑<br />

mana, sobretudo pelos humilhados e perseguidos, como<br />

comprovam os comoventes poemas <strong>de</strong>dicados à “Mulher da<br />

vida”, a “A lava<strong>de</strong>ira”, ao “Menor abandonado”. O coração<br />

era mole. Afinal, dureza para si mesmo e amor e tolerância<br />

pelo próximo é prova <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>za espiritual.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

37


CRUZ E SOUSA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Flávio Aguiar<br />

Cruz e Sousa (1861 ‑1898)<br />

Natural <strong>de</strong> Nossa Senhora do Desterro, SC<br />

2 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0570 ‑7<br />

João da Cruz e Sousa, consi<strong>de</strong>rado pelo crítico francês<br />

Roger Basti<strong>de</strong> um dos três maiores poetas do Simbolismo<br />

mundial, ao lado do francês Stéphane Mallarmé e do ale‑<br />

mão Stefan George, nasceu em Desterro (atual Florianópo‑<br />

lis), SC, em 1861. Recebeu excelente educação, dada pelo<br />

antigo senhor <strong>de</strong> seus pais, escravos alforriados. Na cida<strong>de</strong><br />

natal, com Virgilio Várzea, publica o jornal abolicionista<br />

Tribuna Popular. Hostilizado pelos brancos, engaja ‑se numa<br />

companhia teatral como ponto, percorrendo o país. De<br />

volta ao Desterro, publica com seus amigos <strong>de</strong> literatura e<br />

sonhos (Virgilio Várzea e Santos Lostada) um pequeno vo‑<br />

lume em homenagem à atriz Julieta dos Santos (1883), e<br />

dois <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, sempre com Virgilio Várzea, Tropos e<br />

fantasias, <strong>de</strong> gosto parnasiano. Fixa ‑se no Rio <strong>de</strong> Janeiro, a<br />

partir <strong>de</strong> 1890, e começa a publicar na imprensa seus poe‑<br />

mas <strong>de</strong> feição simbolista, gerando reações extremas, da<br />

admiração exaltada à hostilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>clarada, esta <strong>de</strong>vido<br />

sobretudo à cor negra do poeta. No mesmo ano em que se<br />

casa (1893), publica Broquéis e Missal (poemas em prosa),<br />

a que se seguem Evocações (1898, prosa poética) e os vo‑<br />

lumes póstumos Faróis (1900) e Últimos sonetos (1905).<br />

Poesia exótica por sua aura metafísica, a ânsia <strong>de</strong> infinito,<br />

a atração pelo branco, a presença constante do diabo, a<br />

angústia permanente, a obra <strong>de</strong> Cruz e Sousa espelha com<br />

fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> a trajetória do poeta, sua luta para superar a<br />

revolta e o sofrimento e atingir a pura espiritualida<strong>de</strong>.<br />

Como observou Tasso da Silveira, se Broquéis exprime a dor<br />

<strong>de</strong> ser negro, Faróis representa um passo <strong>mais</strong> além, ex‑<br />

pressando a dor <strong>de</strong> ser homem, ao passo que nos Últimos<br />

sonetos palpita a dor, mas também a alegria e a glória, “<strong>de</strong><br />

ser espírito, <strong>de</strong> comungar com o eterno e heroicamente<br />

sobrevoar os abismos e as sombras da pobre terrenali‑<br />

da<strong>de</strong>”. Cruz e Sousa faleceu em 1898.<br />

38<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

DANTE MILANO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Ivan Junqueira<br />

Dante Milano (1899 ‑1991)<br />

Natural <strong>de</strong> São Cristóvão, RJ<br />

1 a edição – 174 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0567 ‑7<br />

Dante Milano (1899 ‑1991) compôs sua obra poética<br />

quase em surdina. Esquivo à vida literária, <strong>de</strong>scrente da gló‑<br />

ria, avesso à mundanida<strong>de</strong>, versejou a vida toda, mas por<br />

imposição íntima, numa permanente busca da beleza. Em<br />

certo sentido foi “o poeta puro por excelência”, vivendo<br />

“para a poesia no sentido <strong>de</strong> viver em poesia” (João Cabral<br />

<strong>de</strong> Melo Neto) e não <strong>de</strong> ser reconhecido como poeta. Escre‑<br />

via muito e rasgava quase tudo. No final, fruto <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong><br />

setenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> poética, restaram 141 poemas. O<br />

suficiente para fazer <strong>de</strong>le uma das principais vozes poéticas<br />

do Mo<strong>de</strong>rnismo e um dos “nossos poetas <strong>mais</strong> fortes e <strong>mais</strong><br />

perfeitos” (Manuel Ban<strong>de</strong>ira) em todos os tempos.<br />

Participante arredio do movimento mo<strong>de</strong>rnista, só pu‑<br />

blicou o primeiro livro perto dos cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> e<br />

contra a sua vonta<strong>de</strong>, graças à astúcia <strong>de</strong> um amigo. Consi‑<br />

<strong>de</strong>rado o maior acontecimento literário do ano e vencedor<br />

do maior prêmio literário da época, as Poesias (1948) apenas<br />

vinham confirmar o que os amigos <strong>mais</strong> íntimos do poeta<br />

estavam encantados <strong>de</strong> saber. Ao longo do tempo, saíram<br />

outras edições da obra, aumentadas e revistas, reafirmando<br />

a extraordinária fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> do poeta a si mesmo, à margem<br />

<strong>de</strong> modas e fórmulas poéticas. Como observa Ivan Junqueira,<br />

no prefácio aos Melhores poemas Dante Milano, “contra‑<br />

riando as tendências efusivas e algo emocionais da poesia<br />

brasileira” Dante Milano “cultiva uma poética do pensa‑<br />

mento emocionado, como o fizeram os chamados ‘poetas<br />

metafísicos’ ingleses do século XVII, o que não significa que<br />

sua expressão haja renunciado à emoção”. Um tanto con‑<br />

tida, a emoção pulsa forte sobretudo nos temas que obce‑<br />

cam o poeta: a morte (“Vem, morte, dor <strong>mais</strong> branda,/ com<br />

esse olhar estagnado e o sorriso tenaz”), o amor, o sonho,<br />

por vezes entrelaçados num mesmo poema: “Quem sonha<br />

se transfigura,/ quem morre sorri da morte”.<br />

M e l h o r e s P o e M a s


FAGUNDES VARELA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Antonio Carlos Secchin<br />

Fagun<strong>de</strong>s Varela (1841 ‑1875)<br />

Natural <strong>de</strong> Rio Claro, RJ<br />

1 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1008 ‑5<br />

Poeta <strong>de</strong> áspero <strong>de</strong>stino, boêmio, alcoólatra, domi‑<br />

nado pelo instinto <strong>de</strong> auto<strong>de</strong>struição, vivendo sempre sem<br />

pouso certo, entre a cida<strong>de</strong> e o campo, Fagun<strong>de</strong>s Varela<br />

representa no Romantismo brasileiro o caso <strong>mais</strong> extremo<br />

<strong>de</strong> angústia, <strong>de</strong>sadaptação e revolta. Em seus versos ne‑<br />

nhum <strong>de</strong>sses sentimentos é artificial, como em tantos <strong>de</strong><br />

seus colegas <strong>de</strong> geração. Cada um <strong>de</strong> seus poemas foi vi‑<br />

vido, sentido, sofrido, fruto <strong>de</strong> uma experiência amarga,<br />

<strong>de</strong> um amor correspondido, <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>silusão amorosa ou da<br />

morte <strong>de</strong> um ente querido, como o pungente “Cântico<br />

do calvário”, escrito pela morte do filho Emiliano, uma das<br />

<strong>mais</strong> belas elegias da língua portuguesa.<br />

Nascido em 1841, em Rio Claro, Rio <strong>de</strong> Janeiro, Varela<br />

estudou Direito nas faculda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> São Paulo e Recife, sem<br />

concluir o curso, mas <strong>de</strong>sfrutando <strong>de</strong> imenso prestígio entre<br />

os colegas. Casou ‑se duas vezes, foi amante da mundana<br />

<strong>mais</strong> popular <strong>de</strong> São Paulo, Ritinha Sorocabana, dois <strong>de</strong> seus<br />

filhos morreram prematuramente. Tinha horror aos i<strong>de</strong>ais <strong>de</strong><br />

vida burguesa. Nunca trabalhou. Como observa Antonio Car‑<br />

los Secchin em Melhores poemas Fagun<strong>de</strong>s Varela, “levou às<br />

últimas consequências a vocação ‘maldita’ <strong>de</strong> ser poeta”.<br />

Morreu em 1875, em Niterói. Poeta <strong>de</strong> transição, her<strong>de</strong>iro do<br />

byronismo <strong>de</strong> Álvares <strong>de</strong> Azevedo e do lirismo singelo <strong>de</strong> Ca‑<br />

simiro <strong>de</strong> Abreu em seu primeiro livro (Noturnas), logo impõe<br />

sua forte personalida<strong>de</strong> poética, modulando temas abolicio‑<br />

nistas, libertários e religiosos. A nota <strong>mais</strong> pessoal <strong>de</strong> sua po‑<br />

esia está ligada à sedução da vida na natureza, em contraste<br />

com suas periódicas crises <strong>de</strong> atração e repulsão pela cida<strong>de</strong>,<br />

expressa em inúmeros poemas: “Eis a cida<strong>de</strong>! Ali a guerra, as<br />

trevas,/ a lama, a podridão, a iniquida<strong>de</strong>;/ aqui o céu azul, as<br />

selvas virgens,/ o ar, a luz, a vida, a liberda<strong>de</strong>!”. Neste conflito<br />

viveu, neste conflito morreu.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

FERNANDO PESSOA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Teresa Rita Lopes<br />

Fernando Pessoa (1888 ‑1935)<br />

Natural <strong>de</strong> Lisboa, Portugal<br />

12 a edição – 176 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0053 ‑7<br />

Os milagres poéticos, como qualquer milagre, não es‑<br />

colhem lugar para acontecer. Fernando Pessoa, um dos<br />

poetas <strong>mais</strong> importantes do século XX e “um dos poetas<br />

<strong>mais</strong> singulares <strong>de</strong> todos os tempos” (Otto Maria Carpeaux),<br />

figura universal, estudado e imitado nos quatro cantos do<br />

mundo, do Japão ao Equador, da França à Austrália, surgiu<br />

em um momento em que a literatura portuguesa atraves‑<br />

sava um período <strong>de</strong> estagnação, que vinha se acentuando<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o <strong>de</strong>saparecimento da geração <strong>de</strong> Eça <strong>de</strong> Queirós e<br />

Antero <strong>de</strong> Quental.<br />

Nascido em Lisboa, em 1888, foi educado em Durban<br />

(África do Sul), para on<strong>de</strong> sua mãe se mudara, após o se‑<br />

gundo casamento. Des<strong>de</strong> os treze <strong>anos</strong> escreveu poemas em<br />

inglês e foi nesse idioma que fez sua estreia, em 1918, com<br />

dois folhetos, Antinous e 35 sonnets, repletos <strong>de</strong> angústia<br />

diante da impotência <strong>de</strong> <strong>de</strong>svendar os mistérios da vida. No<br />

dia a dia, levava uma vida mo<strong>de</strong>sta, trabalhando como corres‑<br />

pon<strong>de</strong>nte comercial e frequentando um limitado círculo <strong>de</strong><br />

amigos. Como ser humano, <strong>de</strong>finiu ‑se “histero ‑neurastênico”,<br />

histérico na emoção e neurastênico na inteligência e na von‑<br />

ta<strong>de</strong>. Em 1934, publicou Mensagem, poemas em louvor da<br />

pátria, que recebeu um prêmio oficial. Quando morreu, no<br />

ano seguinte, era quase um <strong>de</strong>sconhecido. Só então, graças<br />

à iniciativa <strong>de</strong> amigos, sua obra inédita começou a ser editada,<br />

revelando o verda<strong>de</strong>iro Fernando Pessoa, poeta sentimental,<br />

her<strong>de</strong>iro do simbolismo (“o poeta é um fingidor”), e os seus<br />

heterônimos, o cético Alberto Caeiro (“o único sentido oculto<br />

das coisas/ é elas não terem sentido oculto nenhum”), o sen‑<br />

sual Álvaro <strong>de</strong> Campos, discípulo <strong>de</strong> Walt Whitman, vivendo<br />

experiências extremas <strong>de</strong> <strong>de</strong>sagregação da personalida<strong>de</strong> (“<strong>de</strong><br />

quem é o olhar que espreita por meus olhos?”), o meio pagão<br />

Ricardo Reis (“tenho <strong>mais</strong> almas que uma”). Foi um terre‑<br />

moto, cuja vibração continua abalando a poesia universal.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

<strong>39</strong>


FERREIRA GULLAR<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Alfredo Bosi<br />

Ferreira Gullar (1930)<br />

Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />

7 a edição – 296 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0293 ‑7<br />

Ferreira Gullar, testemunha poética da vida brasileira<br />

na segunda meta<strong>de</strong> do século XX e início do novo século, é<br />

um poeta <strong>de</strong> muitas vozes e caminhos, separados por quase<br />

cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> poética, mas entrelaçados pela<br />

coerência íntima, por alguns temas permanentes e a preo‑<br />

cupação fundamental com o ser humano e o mundo que o<br />

envolve. “Todas as coisas <strong>de</strong> que falo estão na cida<strong>de</strong>/ entre<br />

o céu e a terra”, “são coisas, todas elas,/ cotidianas, como<br />

bocas/ e mãos, sonhos, greves,/ <strong>de</strong>núncias”.<br />

Ferreira Gullar, pseudônimo <strong>de</strong> José Ribamar Ferreira,<br />

nasceu em São Luís, Maranhão, em 1930. Aos <strong>de</strong>zenove<br />

<strong>anos</strong> estreou com o volume <strong>de</strong> poemas Um pouco acima do<br />

chão, uma espécie <strong>de</strong> prefácio à sua obra madura, que se<br />

inicia com A luta corporal (1954), um livro inovador pela<br />

linguagem e as experimentações gráficas, que o aproxima‑<br />

ram dos poetas paulistas Décio Pignatari, Haroldo e Augusto<br />

<strong>de</strong> Campos, lançadores da poesia concreta (1956). Na dé‑<br />

cada <strong>de</strong> 1960, Gullar assume uma posição política <strong>de</strong> es‑<br />

querda, i<strong>de</strong>ntifica ‑se com a cultura popular e acredita que<br />

sua poesia possa atuar como um elemento <strong>de</strong> transforma‑<br />

ção social. Dessa fase são os cordéis João Boa Morte e Quem<br />

matou Aparecida? Exilado durante o regime militar, escreveu<br />

na Argentina Poema sujo (1976), <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> repercussão na<br />

época <strong>de</strong> sua publicação e que Vinicius <strong>de</strong> Moraes consi<strong>de</strong>‑<br />

rava “o <strong>mais</strong> importante poema escrito no Brasil nos últimos<br />

<strong>de</strong>z <strong>anos</strong>, pelo menos. E não só no Brasil”. Nos trabalhos<br />

posteriores, sem abrir mão da revolta contra a injustiça e a<br />

opressão, o poeta <strong>de</strong>monstra preocupação com a morte e<br />

a crise da cultura do mundo ultramo<strong>de</strong>rno, a vitória da ba‑<br />

nalida<strong>de</strong> e do consumismo. Como observou Pedro Dantas,<br />

“nenhum outro poeta viveu, exprimiu e experimentou como<br />

ele as angústias <strong>de</strong> uma crise cultural que vai além da cultura<br />

para abranger, no seu todo, o próprio sentido da vida”.<br />

40<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

FLORBELA ESPANCA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Zina C. Bellodi<br />

Florbela Espanca (1894 ‑1930)<br />

Natural <strong>de</strong> Vila Viçosa, Portugal<br />

1 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1017 ‑4<br />

Há quase cem <strong>anos</strong> os sonetos amorosos <strong>de</strong> Florbela<br />

Espanca fascinam e incen<strong>de</strong>iam a sensibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sucessi‑<br />

vas gerações <strong>de</strong> leitores da língua portuguesa. Não menos<br />

fascinante e romanesca são suas origens. Seu nascimento<br />

parece um romance <strong>de</strong> Camilo Castelo Branco. Como sua<br />

esposa legítima fosse estéril, o comerciante José Maria Es‑<br />

panca convence ‑a da conveniência <strong>de</strong> ele gerar um filho<br />

em sua amante, Antonia Conceição Lobo. Desse tratado<br />

insólito, nasce em Vila Viçosa, em 1894, uma menina bati‑<br />

zada com o nome <strong>de</strong> Flor Bela Lobo, <strong>de</strong> pai <strong>de</strong>sconhecido.<br />

A própria esposa <strong>de</strong> José Maria assiste ao nascimento e leva<br />

a criança à casa paterna, on<strong>de</strong> vive, amamentada pela mãe.<br />

Mais tar<strong>de</strong>, a menina adota o lindo nome <strong>de</strong> Florbela <strong>de</strong><br />

Alma da Conceição Espanca.<br />

Parece pre<strong>de</strong>stinada ao amor. Sua curta biografia é assi‑<br />

nalada por vários amores (casou ‑se três vezes, rompeu com a<br />

família, escandalizou a socieda<strong>de</strong> provinciana lusa) e uma<br />

saú<strong>de</strong> precária que a levaria à morte prematura na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Matosinhos, em 1930. Florbela estreia em 1919, com Livro <strong>de</strong><br />

mágoas, a que se seguiram Livro <strong>de</strong> Soror Sauda<strong>de</strong> e Char‑<br />

neca em flor (póstumo), todos compostos exclusivamente por<br />

sonetos. Os Sonetos completos, reunindo ainda os versos iné‑<br />

ditos <strong>de</strong> Reliquae, foram publicados em 1934. Ar<strong>de</strong>nte, sen‑<br />

sual, <strong>de</strong>safiadora, Florbela era mulher <strong>de</strong> imensa riqueza<br />

interior e imensas dúvidas (“A minha vida! Quel gâchis! Se eu<br />

nem mesmo sei o que quero!”), expressando ‑se em versos <strong>de</strong><br />

um erotismo feminino sem paralelo na literatura portuguesa,<br />

mas marcados também pela generosida<strong>de</strong>, o sentimento <strong>de</strong><br />

sacrifício, a ternura extrema, os momentos <strong>de</strong> encanto e <strong>de</strong>‑<br />

sencanto do relacionamento amoroso, e um permanente sen‑<br />

timento <strong>de</strong> insatisfação, que <strong>de</strong>ságua em ânsia pelo infinito,<br />

em libertação, que fazem <strong>de</strong>la uma precursora da liberda<strong>de</strong><br />

feminina.<br />

M e l h o r e s P o e M a s


GILBERTO MENDONÇA<br />

TELES<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Luiz Busatto<br />

Gilberto Mendonça Teles (1931)<br />

Natural <strong>de</strong> Goiás, GO<br />

3 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0326 ‑7<br />

Gilberto Mendonça Teles, nascido em Goiás (1931), é um<br />

cidadão do mundo. Como professor, já viveu e lecionou em<br />

universida<strong>de</strong>s do Uruguai, da França, <strong>de</strong> Portugal e dos Estados<br />

Unidos. Como poeta ja<strong>mais</strong> se <strong>de</strong>svinculou da terra natal, pre‑<br />

sença persistente em todos os momentos <strong>de</strong> sua obra (“Só te<br />

vejo, Goiás, quando me afasto”), espécie <strong>de</strong> reino mágico as‑<br />

sinalado por “uma extinta pureza drummondiana”.<br />

Com uma obra poética extensa (a que se junta uma<br />

intensa ativida<strong>de</strong> como ensaísta), Teles estreou em livro em<br />

1955, num momento em que a última geração literária<br />

surgida na literatura brasileira, a chamada Geração <strong>de</strong> 45,<br />

começava a per<strong>de</strong>r o ardor inicial, lançando ‑se em busca <strong>de</strong><br />

novos caminhos espirituais. O poeta não se i<strong>de</strong>ntifica com<br />

o grupo e segue os seus próprios caminhos: “Sou um poeta<br />

só, sem geração,/ que chegou tar<strong>de</strong> à gare mo<strong>de</strong>rnista/ e<br />

entrou num trem qualquer, na contramão,/ e vai seguindo<br />

sem sair da pista”. Em sua pista particular, fiel a si mesmo,<br />

na contramão das modas efêmeras, um tanto <strong>de</strong>sconfiado<br />

do experimentalismo das vanguardas, a criação poética<br />

está sempre associada à ativida<strong>de</strong> profissional. “O crítico<br />

literário, o professor nunca se separam do artista”, mestre<br />

em conciliar sua poesia com “os temas e motivos poéticos<br />

<strong>de</strong>correntes do tumulto da vida e do mundo”, como ob‑<br />

serva Luiz Busatto no prefácio aos Melhores poemas Gil‑<br />

berto Mendonça Teles. Assim, a evolução do poeta corre<br />

em paralelo à sua condição <strong>de</strong> testemunha <strong>de</strong> seu tempo,<br />

nem tanto pela inclusão <strong>de</strong> fatos contemporâneos em sua<br />

obra, como registro ou material <strong>de</strong> reflexão, mas por aquela<br />

misteriosa sintonia com o universo espiritual da época. Mas<br />

há também a preocupação com os aspectos técnicos e ar‑<br />

tesanais <strong>de</strong> sua arte, fazendo “da criação poética o leitmotiv<br />

<strong>de</strong> toda a sua obra”, <strong>de</strong>finida por Luiz Busatto como uma<br />

permanente “trepidação diante da vida”.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

GONÇALVES DIAS<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

José Carlos Garbuglio<br />

Gonçalves Dias (1823 ‑1864)<br />

Natural <strong>de</strong> Caxias, MA<br />

7 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0272 ‑2<br />

Primeiro gran<strong>de</strong> poeta brasileiro, <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte das três<br />

raças que formaram o país – o negro, o índio e o português –,<br />

Gonçalves Dias soube expressar com engenho e arte, como<br />

nenhum outro romântico, as sugestões do ambiente brasileiro<br />

e as tradições indígenas, além <strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrar simpatia pelo<br />

negro escravo, e recriar a balada medieval lusitana nas Sexti‑<br />

lhas <strong>de</strong> Frei Antão, numa espécie <strong>de</strong> homenagem ao sangue<br />

das três raças que circulavam em suas veias.<br />

Nascido em Caxias, Maranhão, em 1823, filho <strong>de</strong> um<br />

comerciante português e <strong>de</strong> uma cafusa, logo abandonada<br />

pelo pai, Gonçalves Dias formou ‑se em leis, em Coimbra<br />

(1844). Dois <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, publicou no Rio <strong>de</strong> Janeiro seu livro<br />

<strong>de</strong> estreia, Primeiros cantos, que lhe <strong>de</strong>u fama no país e em<br />

Portugal, saudado por Alexandre Herculano como “inspira‑<br />

ções <strong>de</strong> um gran<strong>de</strong> poeta”. A fase que vai até 1851, quando<br />

saíram os Últimos cantos, constitui a melhor parte <strong>de</strong> sua<br />

obra poética, on<strong>de</strong> se encontram seus poemas <strong>mais</strong> inspira‑<br />

dos e populares, inclusive a “Canção do exílio”. E também a<br />

parte <strong>mais</strong> significativa da poesia indianista (classificada por<br />

ele como “poesias americanas”): I ‑Juca ‑Pirama, Marabá,<br />

Canção do Tamoio. A lírica <strong>de</strong> Gonçalves Dias inspira ‑se na<br />

natureza, na religião, mas sobretudo em seus conflitos ínti‑<br />

mos, em um certo fundo <strong>de</strong> permanente melancolia que lhe<br />

marca o temperamento e contagia sua poesia amorosa.<br />

Nesse terreno, nenhum poema supera o extraordinário<br />

“Ainda uma vez – A<strong>de</strong>us!”, dos <strong>mais</strong> belos que já se escre‑<br />

veu no Brasil, suficiente para imortalizar um poeta. Acla‑<br />

mado ainda em vida como “o poeta nacional por excelência”<br />

(José <strong>de</strong> Alencar), apontado <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong> como um lídimo<br />

exemplar “do genuíno povo brasileiro” (Silvio Romero), Gon‑<br />

çalves Dias nada per<strong>de</strong>u <strong>de</strong> sua gran<strong>de</strong>za.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

41


GREGÓRIO DE MATOS<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Darcy Damasceno<br />

Gregório <strong>de</strong> Matos (1636 ‑1696)<br />

Natural <strong>de</strong> Salvador, BA<br />

8 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1582 ‑1<br />

Rancoroso e vingativo, não hesitando em enlamear<br />

quem lhe ofen<strong>de</strong>sse, Gregório <strong>de</strong> Matos foi o cronista fiel e<br />

implacável das “torpezas, vícios e eng<strong>anos</strong>” da socieda<strong>de</strong> bra‑<br />

sileira colonial. Seu verso maledicente não poupava ninguém:<br />

brancos, negros, ju<strong>de</strong>us, nobres, plebeus, padres, po<strong>de</strong>rosos,<br />

prostitutas, a própria cida<strong>de</strong> da Bahia (“presépio <strong>de</strong> bestas”),<br />

o que lhe valeu a alcunha <strong>de</strong> Boca do Inferno. Numa espécie<br />

<strong>de</strong> nativismo voltou ‑se também contra os portugueses, que<br />

acusava <strong>de</strong> exploradores: “os brasileiros são bestas;/ e estão<br />

sempre a trabalhar/ toda a vida, por manter/ mag<strong>anos</strong> <strong>de</strong> Por‑<br />

tugal”. Nascido na Bahia, formado pela Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Coimbra, advogou em Lisboa, satirizou a socieda<strong>de</strong> portu‑<br />

guesa, tornando ‑se temido. De volta à terra natal, por volta<br />

<strong>de</strong> 1680, ali se <strong>de</strong>senten<strong>de</strong>u com todo mundo (“querem ‑me<br />

aqui todos mal;/ mas eu quero mal a todos”), satirizou gregos<br />

e bai<strong>anos</strong> (cerca <strong>de</strong> 95% <strong>de</strong> seus poemas conhecidos são<br />

<strong>de</strong>ssa fase), sofreu uma tentativa <strong>de</strong> assassinato, foi preso e,<br />

já beirando os sessenta <strong>anos</strong>, exilado em Angola. Graças a<br />

amigos, obteve permissão para voltar ao Brasil, fixando ‑se em<br />

Pernambuco, on<strong>de</strong> morreu, sem nunca ter publicado livro. A<br />

obra <strong>de</strong> Gregório <strong>de</strong> Matos permaneceu em manuscrito du‑<br />

rante dois séculos, gerando dúvidas quanto à autoria. Alguns<br />

poemas, em particular os líricos e os religiosos, não passam <strong>de</strong><br />

tradução ou imitação <strong>de</strong> poetas espanhóis, sobretudo Que‑<br />

vedo. Não é a parte <strong>mais</strong> interessante <strong>de</strong> sua obra, mas reve‑<br />

lam, ao lado do satírico implacável, em permanente estado <strong>de</strong><br />

revolta, um moralista e um homem <strong>de</strong> sensibilida<strong>de</strong> religiosa,<br />

preocupado com os “<strong>de</strong>seng<strong>anos</strong> da vida humana”, com a<br />

fugacida<strong>de</strong> das coisas, com a morte. Neste ponto, Gregório<br />

<strong>de</strong> Matos mostrava bem ser um homem <strong>de</strong> sua época, um<br />

homem típico do Barroco.<br />

42<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

GUILHERME DE<br />

ALMEIDA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Carlos Vogt<br />

Guilherme <strong>de</strong> Almeida (1890 ‑1969)<br />

Natural <strong>de</strong> Campinas, SP<br />

3 a edição – 112 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0325 ‑9<br />

Guilherme <strong>de</strong> Almeida viveu uma longa fase da história<br />

da poesia brasileira, que se esten<strong>de</strong> do período crepuscular<br />

que antece<strong>de</strong>u o Mo<strong>de</strong>rnismo ao surgimento e à consolida‑<br />

ção <strong>de</strong> movimentos como o Concretismo ou a Poesia Praxis,<br />

chocantes à sua sensibilida<strong>de</strong> educada nos velhos clássicos.<br />

Foi <strong>mais</strong> <strong>de</strong> meio século <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>, em que o poeta<br />

exibiu um raro virtuosismo e domínio da língua, compondo<br />

poemas <strong>de</strong> sabor camoniano (Camoniana, 1956), recriando<br />

a atmosfera <strong>de</strong> velhos romances populares portugueses<br />

(Pequeno romanceiro, 1957), parodiando a poesia grega<br />

clássica (A frauta que eu perdi, 1924), cultivando o verso<br />

parnasiano, simbolista, mo<strong>de</strong>rnista (Meu, Raça, Encanta‑<br />

mento, todos <strong>de</strong> 1925), mas sem nunca abandonar a nota<br />

romântica, predominante ao longo <strong>de</strong> toda a sua vasta<br />

obra. Seus primeiros livros, anteriores à Semana <strong>de</strong> Arte<br />

Mo<strong>de</strong>rna – <strong>de</strong> Nós (1917) a Era uma vez... (1922) –, reve‑<br />

lam uma poesia <strong>de</strong> meios ‑tons, em que o agudo senti‑<br />

mento da beleza se harmoniza com um certo artificialismo,<br />

muito ao gosto da socieda<strong>de</strong> da época. Tanto assim que os<br />

seus livros andavam nas mãos <strong>de</strong> todas as moças. A a<strong>de</strong>são<br />

ao mo<strong>de</strong>rnismo evi<strong>de</strong>ncia um <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> se ajustar ao gosto<br />

do tempo, mas não representa nenhuma mudança signifi‑<br />

cativa em sua obra. Dispensa “a rima e a métrica, mas a<br />

alma romântica continua”, observa Carlos Vogt no prefácio<br />

aos Melhores poemas Guilherme <strong>de</strong> Almeida. O poeta se<br />

manteve fiel às suas tendências pessoais, o que lhe foi<br />

muito benéfico. Seus livros <strong>de</strong>sfrutavam <strong>de</strong> uma populari‑<br />

da<strong>de</strong> a que nenhum mo<strong>de</strong>rnista chegava perto. Essa popu‑<br />

larida<strong>de</strong> se manteve até a última fase <strong>de</strong> sua obra, carac terizada<br />

por uma linguagem <strong>mais</strong> enxuta, menos rica <strong>de</strong> emoção,<br />

mas na qual ainda se sente, um tanto enfraquecida, a voz<br />

do velho romântico. Guilherme <strong>de</strong> Almeida faleceu em<br />

1969 na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo.<br />

M e l h o r e s P o e M a s


HAROLDO DE CAMPOS<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Inês Oseki ­Dépré<br />

Haroldo <strong>de</strong> Campos (1929 ‑2003)<br />

Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />

3 a edição – 176 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0344 ‑6<br />

Quando se fala em Haroldo <strong>de</strong> Campos, logo se pensa<br />

no movimento concretista e nos inquietos <strong>anos</strong> 1950. Ape‑<br />

sar <strong>de</strong> ser impossível, ou pelo menos impraticável, separar<br />

um do outro, a inquietação do poeta foi muito além das<br />

pesquisas for<strong>mais</strong> do Concretismo, <strong>de</strong>ixando uma obra vasta<br />

e variada – é bem verda<strong>de</strong> que sempre marcada pelo expe‑<br />

rimentalismo –, incluindo a poesia, o ensaio, a tradução.<br />

Natural da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo (1929), Haroldo <strong>de</strong> Cam‑<br />

pos fez inúmeras viagens pelo mundo e apren<strong>de</strong>u diversos<br />

idiomas, ativida<strong>de</strong>s consi<strong>de</strong>radas por ele vitais para a expansão<br />

<strong>de</strong> seus horizontes espirituais e o enriquecimento da própria<br />

língua. Nos <strong>anos</strong> 1950, com Augusto <strong>de</strong> Campos e Décio Pig‑<br />

natari, criou o grupo Noigandres, a “flor que afasta o tédio”,<br />

um dos pilares do movimento concretista. O movimento con‑<br />

cretista foi lançado publicamente em 1956, em uma exposição<br />

no Museu <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna <strong>de</strong> São Paulo. Já era então poeta<br />

com vários livros publicados, a partir do Auto do possesso.<br />

Poemas concretistas foram publicados em livro, pela primeira<br />

vez, no volume O â mago do ô mega (1956). Na época, em<br />

tom polêmico, Haroldo alegava que “o poeta, como afirma<br />

Jakobson, é aquele que configura a materialida<strong>de</strong> da lingua‑<br />

gem. Nesse sentido, toda poesia digna <strong>de</strong>ste nome é concreta:<br />

<strong>de</strong> Homero a Dante, <strong>de</strong> Goethe a Pessoa”. O sentido inovador<br />

acompanhou o poeta ao longo <strong>de</strong> toda a sua obra, até o texto<br />

barroco <strong>de</strong> Galáxias, “livro <strong>de</strong> viagem e <strong>de</strong> viagens, viagem‑<br />

‑livro”, como observa Inês Oseki ‑Dépré no prefácio aos Melho‑<br />

res poemas Haroldo <strong>de</strong> Campos, até o inquietante Finismundo:<br />

a última viagem e os elaborados Novos poemas. A mesma in‑<br />

quietação assinala sua ativida<strong>de</strong> no campo da tradução, por<br />

ele <strong>de</strong>nominada transcriação e <strong>de</strong>finida como “tradução que<br />

se propõe como operação radical”. Uma operação radical<br />

que pôs em português alguns dos maiores poemas <strong>de</strong> todos<br />

os tempos, <strong>de</strong> Safo a Homero, <strong>de</strong> Dante a Maiakóvski.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

HENRIQUETA LISBOA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Fábio Lucas<br />

Henriqueta Lisboa (1901 ‑1985)<br />

Natural <strong>de</strong> Lambari, MG<br />

1 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0733 ‑8<br />

Tímida e esquiva, avessa à publicida<strong>de</strong>, Henriqueta<br />

Lisboa fez uma poesia <strong>de</strong> alta qualida<strong>de</strong> literária, equili‑<br />

brada, diáfana, tentando dizer o indizível, seguindo por um<br />

caminho pessoal, dos <strong>mais</strong> fascinantes da literatura brasi‑<br />

leira, mas com a inconfundível marca das Minas Gerais.<br />

A biografia é singela, sem gran<strong>de</strong>s acontecimentos.<br />

Nascida em Lambari, em 1901, formou ‑se professora no Co‑<br />

légio Sion, <strong>de</strong> Campanha, Minas Gerais, on<strong>de</strong> a diretora lhe<br />

<strong>de</strong>u o apelido <strong>de</strong> “la petite orgueilleuse”, por ser tímida e<br />

solitária. Foi professora <strong>de</strong> Literatura Hispano ‑americana na<br />

Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> Minas Gerais. Manteve correspon‑<br />

dência com Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, sendo a personalida<strong>de</strong> femi‑<br />

nina a quem o escritor paulista “en<strong>de</strong>reçou o seu <strong>mais</strong> <strong>de</strong>licado<br />

diálogo”, como observa Fábio Lucas no prefácio aos Melho‑<br />

res poemas Henriqueta Lisboa. Faleceu em 1985. Suas pri‑<br />

meiras obras, publicadas na década <strong>de</strong> 1920, ainda trazem<br />

as marcas do Simbolismo que, <strong>de</strong> certa forma, persistem até<br />

seus últimos livros. A a<strong>de</strong>são ao Mo<strong>de</strong>rnismo lhe aguçou a<br />

sensibilida<strong>de</strong> e espantou alguns preconceitos pessoais,<br />

permitindo ‑lhe incorporar sugestões literárias enriquecedo‑<br />

ras <strong>de</strong> sua visão muito pessoal da vida. Sua poesia alcança<br />

então uma inconfundível feição pessoal, caracterizada pelo<br />

pudor, a discrição, a suavida<strong>de</strong>, a expressão simples, às vezes<br />

um certo preciosismo. Muito prolífica, publicou <strong>mais</strong> <strong>de</strong> vinte<br />

volumes <strong>de</strong> poesia. Na década <strong>de</strong> 1950, Henriqueta já estava<br />

consagrada como uma das <strong>mais</strong> altas vozes da literatura bra‑<br />

sileira, por nomes como Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> e<br />

Manuel Ban<strong>de</strong>ira, que a comparam a Cecília Meireles. Mas<br />

quem melhor <strong>de</strong>finiu sua personalida<strong>de</strong> talvez tenha sido<br />

Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, ao observar em seus versos “a graça in‑<br />

quieta, simples e um pouco agreste, um pouco ácida, dos<br />

passarinhos”. O canto <strong>de</strong>sse passarinho continua muito<br />

agradável aos amigos da poesia.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

43


IVAN JUNQUEIRA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Ricardo Thomé<br />

Ivan Junqueira (1934)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

1 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0854 ‑4<br />

Quando Ivan Junqueira estreou com Os mortos (1964)<br />

a poesia brasileira vivia um momento <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> ebulição,<br />

marcada por buscas e in<strong>de</strong>finições, no dilema clássico <strong>de</strong> não<br />

saber o que se quer, mas saber muito bem o que não se<br />

<strong>de</strong>seja. Três dos maiores poetas brasileiros <strong>de</strong> todos os tem‑<br />

pos – Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, Manuel Ban<strong>de</strong>ira, João<br />

Cabral <strong>de</strong> Melo Neto –, encontravam ‑se vivos e ativos e essa<br />

presença aumentava a ação disseminadora <strong>de</strong> suas poesias.<br />

As vanguardas – Concretismo, Poesia Práxis etc. – davam<br />

sinais <strong>de</strong> plena vitalida<strong>de</strong>, mas sua recepção limitava ‑se a<br />

grupos bem <strong>de</strong>finidos. Muitos jovens tinham a sensação <strong>de</strong><br />

ter chegado tar<strong>de</strong> <strong>de</strong><strong>mais</strong> num mundo velho <strong>de</strong><strong>mais</strong>.<br />

Alguns raros, como Ivan Junqueira, abriam seu pró‑<br />

prio caminho, sem se engajar em grupos, pela força da<br />

própria personalida<strong>de</strong>. O jovem poeta se impôs com carac‑<br />

terísticas muito pessoais, que marcam toda a sua poesia, na<br />

qual o rigor formal – expresso pela concisão rigorosa, a<br />

seleção vocabular, o trabalho <strong>de</strong> arte e artesanato na cons‑<br />

trução do verso – se alia a uma vasta erudição. Três gran<strong>de</strong>s<br />

temas predominam <strong>de</strong> forma obsessiva nesta poesia cons‑<br />

truída sob o signo do precário, do mistério e do obscuro,<br />

em perspectivas oníricas e fantásticas: a morte, <strong>de</strong> presença<br />

avassaladora, símbolo do absurdo da vida; o amor, <strong>mais</strong><br />

fonte <strong>de</strong> conflitos do que <strong>de</strong> prazeres, e a arte, veículo <strong>de</strong><br />

re<strong>de</strong>nção ao niilismo e à angústia do poeta, que acaba por<br />

acirrar ainda <strong>mais</strong> seus dilemas íntimos. Neste conflito entre<br />

razão e emoção, a primeira sempre prevalece, e <strong>de</strong>ssa<br />

forma Ivan exclui <strong>de</strong> sua poesia tudo que seja transitório,<br />

para se <strong>de</strong>ter nas eternas esfinges que <strong>de</strong>safiam o homem,<br />

em face do absoluto, que ele encara com terror e <strong>de</strong>sa‑<br />

lento: “À beira do claustro/ o monge se inclina/ e na pedra<br />

apren<strong>de</strong>/ o que a pedra ensina:/ que a vida é nada/ com a<br />

morte por cima,/ que o tempo apenas/ este fim lhe adia”.<br />

44<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

JOÃO CABRAL<br />

DE MELO NETO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Antonio Carlos Secchin<br />

João Cabral <strong>de</strong> Melo Neto (1920 ‑1999)<br />

Natural <strong>de</strong> Recife, PE<br />

10 a edição – 252 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1470 ‑1<br />

Diplomata <strong>de</strong> carreira, João Cabral <strong>de</strong> Melo Neto (Recife,<br />

1920 ‑Rio <strong>de</strong> Janeiro, 1999) serviu na Espanha, na Inglaterra,<br />

na França e no Senegal. Situado cronologicamente na Gera‑<br />

ção <strong>de</strong> 45, ocupa posição isolada no panorama histórico da<br />

poesia brasileira, por sua personalida<strong>de</strong> ímpar, sua linguagem<br />

enxuta, as imagens predominantemente visuais, o <strong>de</strong>senho<br />

dos poemas, que parecem traçados a régua e compasso. A<br />

crítica aponta ‑o como o ponto máximo da poesia brasileira do<br />

século XX, ao lado <strong>de</strong> Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>.<br />

Um autor difícil? Sim e não. Ou melhor, um poeta que<br />

exige certa iniciação. Como observa Antonio Carlos Secchin<br />

no prefácio aos Melhores poemas João Cabral <strong>de</strong> Melo Neto,<br />

“para o leitor acostumado à lírica <strong>de</strong> tradição romântica,<br />

nada <strong>mais</strong> inusitado do que a poesia <strong>de</strong>ste autor tão avesso<br />

ao confessionalismo, à saturação subjetiva <strong>de</strong> suas mensa‑<br />

gens.”. A poesia <strong>de</strong> João Cabral, como sugere o próprio<br />

poeta, divi<strong>de</strong> ‑se em duas águas. Na primeira linha predo‑<br />

mina a pesquisa da criação poética, o rigor formal, o repúdio<br />

a qualquer nota sentimental ou interferência do irracional,<br />

que se <strong>de</strong>senvolve a partir <strong>de</strong> O engenheiro (1945), até A<br />

escola das facas (1980), incluindo Uma faca só lâmina (1955)<br />

e Museu <strong>de</strong> tudo (1975). A outra gran<strong>de</strong> vertente é a crítica<br />

social, ácida, mas sem qualquer nota panfletária ou <strong>de</strong>ma‑<br />

gógica, na qual persistem todas as constantes da primeira<br />

linha, mas com uma contundência <strong>de</strong> faca, uma faca só lâ‑<br />

mina. O processo, iniciado com O cão sem plumas (1950), se<br />

acentua em O rio (1954) e Morte e vida severina (1955), rea‑<br />

parece em Dois parlamentos (1960) e Agrestes (1984), e<br />

como que se <strong>de</strong>pura no Auto do fra<strong>de</strong> (1984). Convém<br />

ainda salientar a presença obsessiva da Espanha, ao longo <strong>de</strong><br />

toda a sua obra, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> Paisagens com figuras (1955), Qua‑<br />

<strong>de</strong>rna (1959), Serial (1961) até Crime na Calle Relator (1987)<br />

e Sevilha andando (1990).<br />

M e l h o r e s P o e M a s


JORGE DE LIMA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Gilberto Mendonça Teles<br />

Jorge <strong>de</strong> Lima (1893 ‑1953)<br />

Natural <strong>de</strong> União dos Palmares, AL<br />

3 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0342 ‑9<br />

O alagoano Jorge <strong>de</strong> Lima (1895 ‑1953) foi o poeta <strong>mais</strong><br />

original do Mo<strong>de</strong>rnismo brasileiro, o <strong>mais</strong> preso à tradição e,<br />

talvez, o <strong>mais</strong> nacional. Publicou seus primeiros versos ao<br />

gosto parnasiano (XIV alexandrinos). Alguns poemas <strong>de</strong>sse<br />

livro tiveram imensa receptivida<strong>de</strong> popular, como “O acen<strong>de</strong>‑<br />

dor <strong>de</strong> lampiões”, incluído durante <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> <strong>anos</strong> no reper‑<br />

tório <strong>de</strong> todos os profissionais da <strong>de</strong>clamação.<br />

Liberto da camisa <strong>de</strong> força parnasiana, i<strong>de</strong>ntificado<br />

com a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> expressão do Mo<strong>de</strong>rnismo, entrega ‑se<br />

à experiência regionalista (Poemas, Novos poemas, Poemas<br />

escolhidos, Poemas negros), retratando hábitos e costu‑<br />

mes, lendas e personagens nor<strong>de</strong>stinos, com um inconfun‑<br />

dível sabor brasileiro, impregnados <strong>de</strong> sentimento cristão.<br />

Ressaltando a naturalida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses poemas, observou José<br />

Américo que o poeta “não monta em cavalo <strong>de</strong> pau com<br />

ar <strong>de</strong> quem amansa potros chucros”. A impregnação do<br />

sentimento cristão, a aproximação com a Igreja Católica, a<br />

intenção <strong>de</strong> “restaurar a poesia em Cristo” caracterizam os<br />

poemas <strong>de</strong> Tempo e eternida<strong>de</strong>, A túnica inconsútil, Anun‑<br />

ciação e Encontro <strong>de</strong> Mira Celi. “É agora o homem católico,<br />

o sacralizador da matéria do mundo, o vi<strong>de</strong>nte que ante‑<br />

cipa o estado <strong>de</strong> justiça e <strong>de</strong> pureza a que a humanida<strong>de</strong><br />

voltará um dia, o poeta sem malícia para o qual o sexo e a<br />

carne foram glorificados pela encarnação <strong>de</strong> Cristo”, es‑<br />

creve Murilo Men<strong>de</strong>s. Após o virtuosismo do Livro <strong>de</strong> sone‑<br />

tos, atira ‑se à <strong>mais</strong> ousada, perturbadora, “obscura e<br />

secreta” experiência da poesia mo<strong>de</strong>rna brasileira, Inven‑<br />

ção <strong>de</strong> Orfeu, <strong>de</strong> difícil compreensão em tantos trechos.<br />

Para Gilberto Mendonça Teles, prefaciador dos Melhores<br />

poemas Jorge <strong>de</strong> Lima, não só é o gran<strong>de</strong> livro <strong>de</strong> Jorge <strong>de</strong><br />

Lima, “mas também o gran<strong>de</strong> coroamento estético <strong>de</strong> toda<br />

a sua poesia e, <strong>de</strong> certa forma, <strong>de</strong> toda a poesia brasileira<br />

na primeira meta<strong>de</strong> <strong>de</strong>ste século”.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

JOSÉ PAULO PAES<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Davi Arrigucci Jr.<br />

José Paulo Paes (1926 ‑1998)<br />

Natural <strong>de</strong> Taquaritinga, SP<br />

6 a edição – 248 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0600 ‑2<br />

José Paulo Paes foi a antítese do poeta <strong>de</strong>rramado.<br />

Irônico, por vezes <strong>de</strong> uma ironia perversa, indignado, an‑<br />

gustiado, brincalhão, soube expressar, como poucos poe‑<br />

tas, ironia, indignação, angústia e atitu<strong>de</strong>s lúdicas em<br />

poemas breves, brevíssimos, plenos <strong>de</strong> humor, aproximando ‑se<br />

da síntese dos haicais.<br />

Nem sempre foi assim. A obra <strong>de</strong> miniaturista resulta <strong>de</strong><br />

uma longa <strong>de</strong>puração. Em seus primeiros livros, o poeta revela<br />

gosto pelas formas poéticas <strong>mais</strong> longas, com uma leve queda<br />

pelo soneto. A preferência pela síntese se acentua nos Epigra‑<br />

mas (1958), mas só se realiza plenamente em Anatomias<br />

(1967), livro em que “o epigrama e o i<strong>de</strong>ograma se <strong>de</strong>ram as<br />

mãos” (Augusto <strong>de</strong> Campos), por vezes em soluções jocosas,<br />

como “Epitáfio para um banqueiro” ou “Cronologia”.<br />

Em Meia palavra (1973), o poeta se torna ainda <strong>mais</strong><br />

conciso, sintetizando gran<strong>de</strong>s questões em poemas mínimos.<br />

Um exemplo, no qual o título é maior do que o poema,<br />

encontra ‑se em “O vagido da socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo”, que se<br />

resume ao verso “consummatum est!”. O processo se aguça<br />

em Resíduos (1980), em que a nota humorística não raras<br />

vezes se transforma em sarcasmo, como em “Epitáfio para<br />

Rui”: “...e tenho dito/ bravos!/ (mas o que foi mesmo que ele<br />

disse?)”. A partir <strong>de</strong> A poesia está morta mas juro que não fui<br />

eu (1988) e sobretudo nas Prosas seguidas <strong>de</strong> o<strong>de</strong>s mínimas<br />

(1992), por necessida<strong>de</strong> confessional, bastante discreta, o<br />

poeta ce<strong>de</strong> à tentação dos poemas <strong>mais</strong> longos (aliás, menos<br />

curtos), mas nos quais palpita uma comoção, um quê <strong>de</strong> pun‑<br />

gente, ignorado nos epigramas. O poeta se encaminha para a<br />

fase final <strong>de</strong> sua trajetória, angustiado pela vida vivida, inquieto<br />

diante da morte, preocupações expressas nos poemas leve‑<br />

mente dramáticos das Socráticas, como “Preparativos <strong>de</strong> via‑<br />

gem”, on<strong>de</strong> há este verso revelador: “Ele próprio se sente um<br />

pouco póstumo quando conversa com gente jovem”.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

45


LÊDO IVO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Sérgio Alves Peixoto<br />

Lêdo Ivo (1924)<br />

Natural <strong>de</strong> Maceió, AL<br />

4 a edição – 144 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0292 ‑0<br />

Lêdo Ivo lançou seu primeiro livro em um momento <strong>de</strong><br />

intensa transformação da literatura brasileira, em meados da<br />

década <strong>de</strong> 1940, quando uma nova geração literária emergia<br />

e buscava se afirmar. Os novos da época, conhecidos como<br />

Geração <strong>de</strong> 45 e neomo<strong>de</strong>rnistas, procuravam restabelecer o<br />

equilíbrio entre forma e fundo, “a revalorização da palavra, a<br />

criação <strong>de</strong> novas imagens, a revisão dos ritmos e a busca <strong>de</strong><br />

novas soluções for<strong>mais</strong>” (Tristão <strong>de</strong> Athay<strong>de</strong>), preservando as<br />

liberda<strong>de</strong>s alcançadas pelo Mo<strong>de</strong>rnismo.<br />

A crítica observou que As imaginações (1944) e O<strong>de</strong> e<br />

elegia (1945) encarnavam esses novos rumos da poesia<br />

brasileira, inclusive em suas hesitações. Mas o poeta se dis‑<br />

tinguia pela capacida<strong>de</strong> emocional, uma sensibilida<strong>de</strong> ro‑<br />

mântica e uma espécie <strong>de</strong> alquimia verbal, um amplo<br />

domínio sobre as palavras e rara capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reuni ‑las,<br />

extraindo <strong>de</strong>las efeitos novos, mágicos e surpreen<strong>de</strong>ntes. A<br />

preferência pelo soneto (gênero em que o poeta escreveria<br />

centenas <strong>de</strong> poemas) se afirma a partir <strong>de</strong> Acontecimento<br />

do soneto (1949), uma espécie <strong>de</strong> exercício <strong>de</strong> contenção,<br />

sem abdicar da linguagem luxuriante e da adjetivação ino‑<br />

vadora. Com o tempo, o poeta foi podando excessos, re‑<br />

duzindo os poemas a formas cada vez <strong>mais</strong> sintéticas,<br />

numa ação semelhante ao <strong>de</strong>sgaste produzido pelo tempo,<br />

num esforço <strong>de</strong> extrair apenas o essencial dos fatos, mas<br />

sem renunciar ao permanente exercício do soneto e <strong>de</strong> ou‑<br />

tras formas poéticas <strong>de</strong> sua preferência. Aproxima ‑se da<br />

poesia oriental, em particular do haicai, como po<strong>de</strong> ser<br />

exemplificada em “Confissão do mentiroso” (“Nada tenho<br />

a dizer,/ e toda vez que escrevo/ digo o meu tudo”) e “O<br />

silêncio divino” (“O silêncio. Deus fala/ pelos cotovelos/ ou<br />

é o gran<strong>de</strong> mudo?”). Sintético e mo<strong>de</strong>rno, como os poetas<br />

chineses, há 3 mil <strong>anos</strong>. A verda<strong>de</strong>ira poesia flutua acima<br />

dos tempos.<br />

46<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

LINDOLF BELL<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Péricles Pra<strong>de</strong><br />

Lindolf Bell (1938 ‑1998)<br />

Natural <strong>de</strong> Timbó, SC<br />

1 a edição – 264 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1356 ‑8<br />

Poeta em tempo integral, como observa Péricles Pra<strong>de</strong><br />

no prefácio a esses Melhores poemas Lindolf Bell, Lindolf<br />

Bell foi uma espécie <strong>de</strong> apóstolo da poesia, pregando sua<br />

mensagem poética on<strong>de</strong> houvesse alguém capaz <strong>de</strong> ouvi ‑lo.<br />

Pois nele coabitavam o poeta e o ator, o artista do verso e<br />

o <strong>de</strong>clamador apaixonado, perturbador em seu po<strong>de</strong>r <strong>de</strong><br />

comunicação com os ouvintes. “Nunca tinha visto ninguém<br />

dizer poemas tão bem, com tanta intensida<strong>de</strong>, tanta garra,<br />

tanto domínio da voz, do gesto e do sentido”, registrou<br />

Paulo Leminski.<br />

Em seu apostolado, Bell criou o movimento Catequese<br />

Poética, voltado para a divulgação da poesia em espaços<br />

abertos, em ruas, portas <strong>de</strong> fábricas, viadutos, praças, es‑<br />

colas, bares, teatros, universida<strong>de</strong>s, estádios.<br />

Sua poesia guarda alguma coisa <strong>de</strong>ssa ânsia <strong>de</strong> ser<br />

ouvido por todos, <strong>de</strong> contaminar o mundo e arredores com<br />

a beleza. Mesmo quando expressa sentimentos <strong>mais</strong> ínti‑<br />

mos, parece voltado para uma plateia, com a empostação<br />

e a tonalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> quem fala em voz alta.<br />

Com essa convicção e <strong>de</strong>terminação, Bell publicou treze<br />

livros <strong>de</strong> poemas, testemunhas <strong>de</strong> uma longa trajetória – <strong>mais</strong><br />

<strong>de</strong> trinta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> poética – que se inicia por uma<br />

espécie <strong>de</strong> reação à indiferença humana pelos valores espiri‑<br />

tuais, e se refina na interiorização e na i<strong>de</strong>ntificação com a<br />

natureza, numa busca incansável <strong>de</strong> si mesmo.<br />

Dominando a linguagem, mas sempre em busca <strong>de</strong><br />

novas trilhas, o poeta utilizou “toda a riqueza dos anagra‑<br />

mas, das homofonias, das aliterações e do ritmo, o que faz<br />

da leitura e releitura <strong>de</strong> seus poemas uma experiência lú‑<br />

cida, na qual se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>scobrir sempre novos efeitos não<br />

percebidos anteriormente” (Maria Carneiro da Cunha). O<br />

que, em outras palavras, significa a busca permanente e<br />

paciente da beleza, expressa através da poesia.<br />

M e l h o r e s P o e M a s


LUÍS DE CAMÕES<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Leo<strong>de</strong>gário A. <strong>de</strong> Azevedo Filho<br />

Luís <strong>de</strong> Camões (1524? ‑1580)<br />

Natural <strong>de</strong> Lisboa, Portugal<br />

4 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0291 ‑3<br />

Quando se fala em Luís <strong>de</strong> Camões as pessoas pen‑<br />

sam logo em Os lusíadas. É natural. A epopeia camoniana<br />

é como uma imensa montanha, lançando sombra sobre<br />

tudo que lhe fica próximo. Resume o povo português e<br />

suas aspirações, sendo, como observou Gilberto Freyre “a<br />

<strong>mais</strong> completa das autobiografias coletivas que um homem<br />

<strong>de</strong> gênio já <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> sua própria gente”.<br />

Mas, ao lado do épico, há um poeta da mesma altitu<strong>de</strong>,<br />

<strong>mais</strong> próximo às pessoas comuns, cantando como nunca se<br />

cantou em língua portuguesa sentimentos como o amor, a<br />

amiza<strong>de</strong>, a gratidão, em versos tão fortes e pungentes e com<br />

palavras tão lindamente ditas que até parecem escritas dire‑<br />

tamente para cada leitor. Esse milagre <strong>de</strong> gênio se explica<br />

pelo fato <strong>de</strong> cada poema lírico <strong>de</strong> Camões ser fruto <strong>de</strong> uma<br />

situação vivida com intensida<strong>de</strong>, em uma vida <strong>de</strong> muitos<br />

amores, aventuras e <strong>de</strong>silusões. Luís <strong>de</strong> Camões (1524? ‑1580)<br />

nasceu em uma família da pequena nobreza lusitana, <strong>de</strong>caída<br />

e empobrecida, em local ignorado, talvez Lisboa. A formação<br />

cultural se <strong>de</strong>u em Coimbra, on<strong>de</strong> adquiriu a imensa cultura<br />

expressa em sua epopeia. Na mocida<strong>de</strong>, frequentou os meios<br />

aristocráticos e a boêmia, pelas ruelas noturnas <strong>de</strong> Lisboa.<br />

Envolveu ‑se em brigas, relacionou ‑se com meretrizes do<br />

Bairro Alto. Por razões misteriosas, nunca frequentou os<br />

meios literários. Como soldado, combateu contra os mouros<br />

em Ceuta (Marrocos), per<strong>de</strong>ndo um dos olhos em combate.<br />

Em 1552, após ferir um funcionário do Paço, foi preso e en‑<br />

viado a Goa. Viveu dias difíceis no Oriente. Em um naufrágio<br />

na costa da Cochinchina, per<strong>de</strong>u os bens e a companheira<br />

chinesa, atingindo a costa a nado, com o manuscrito <strong>de</strong> Os<br />

lusíadas. Só regressou a Portugal em 1569. Três <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois<br />

publicou Os lusíadas. Graças ao poema, obteve uma pensão<br />

concedida pelo Estado, mo<strong>de</strong>sta e paga <strong>de</strong> maneira irregular.<br />

Dizem que curtiu miséria e fome.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

LUÍS DELFINO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Lauro Junkes<br />

Luís Delfino (1834 ‑1910)<br />

Natural <strong>de</strong> Desterro, SC<br />

3 a edição – 144 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0250 ‑3<br />

Houve um tempo em que Luís Delfino era consi<strong>de</strong>rado<br />

um poeta da estatura <strong>de</strong> Olavo Bilac. E muito <strong>mais</strong> home‑<br />

nageado. Apontado como o Victor Hugo brasileiro pelos<br />

românticos da década <strong>de</strong> 1860, consi<strong>de</strong>rado o maior poeta<br />

vivo do Brasil, em concurso promovido pela revista A Se‑<br />

mana (1885), eleito Príncipe dos Poetas Brasileiros pelos<br />

jovens simbolistas, em 1898, conseguiu atravessar meio<br />

século <strong>de</strong> poesia reverenciado como um mestre.<br />

Com sua morte, em 1910, e o ineditismo <strong>de</strong> seus poe‑<br />

mas em livro, o poeta sofreu uma baixa consi<strong>de</strong>rável na ad‑<br />

miração dos leitores <strong>de</strong> poesia. A edição <strong>de</strong> suas obras, a<br />

partir <strong>de</strong> 1927, sem separar o ouro do cascalho, não conse‑<br />

guiu restituir ‑lhe o antigo prestígio. Só em nossos dias, o<br />

poeta voltou a fascinar leitores e estudiosos <strong>de</strong> poesia, gra‑<br />

ças a antologias como os Melhores poemas Luís Delfino,<br />

selecionados com critério e conhecimento <strong>de</strong> causa por<br />

Lauro Junkers. Mas sempre manteve a admiração dos inicia‑<br />

dos na arte poética. Manuel Ban<strong>de</strong>ira, por exemplo, consi‑<br />

<strong>de</strong>rava a sua poesia “bem pessoal, <strong>de</strong>liciosamente estranha”.<br />

Dante Milano chega a admitir que se Delfino tivesse domado<br />

o seu impetuoso verbalismo e a sua <strong>de</strong>senfreada imaginação<br />

po<strong>de</strong>ria ter sido “o nosso maior poeta”. Autor <strong>de</strong> poemas<br />

caudalosos na mocida<strong>de</strong>, inspirados pelos <strong>de</strong>lírios românti‑<br />

cos, podou um pouco <strong>de</strong> seus excessos sob a disciplina par‑<br />

nasiana, assim como incorporou uns vagos tons simbolistas.<br />

Foi o Parnasianismo, também, que o levou a i<strong>de</strong>ntificar no<br />

soneto seu veículo i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> expressão. O exagero da época<br />

dizia que escreveu <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 5 mil. Não é preciso tanto para se<br />

manter entre os gran<strong>de</strong>s poetas brasileiros <strong>de</strong> todos os tem‑<br />

pos. Poemas como “As três irmãs”, “Capricho <strong>de</strong> Sardana‑<br />

palo”, “A sultana” e “A primeira lágrima” (os três últimos<br />

sonetos) bastam para lhe garantir um lugar especial na evo‑<br />

lução da poesia brasileira.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

47


LUIZ DE MIRANDA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Regina Zilbermann<br />

Luiz <strong>de</strong> Miranda (1945)<br />

Natural <strong>de</strong> Uruguaiana, RS<br />

1 a edição – 208 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1419 ‑0<br />

Luiz <strong>de</strong> Miranda publicou o seu primeiro livro <strong>de</strong> poe‑<br />

mas, Andança, em 1969. O Brasil vivia um dos momentos<br />

<strong>mais</strong> terríveis <strong>de</strong> sua história, sob o regime <strong>de</strong> ditadura mili‑<br />

tar, que durou <strong>mais</strong> <strong>de</strong> vinte <strong>anos</strong>. Perseguido político, ca‑<br />

çado pela polícia, Miranda escrevia então uma poesia<br />

engajada e corajosa (“On<strong>de</strong> tenho a injustiça/ me <strong>de</strong>tenho”),<br />

reunida em sua segunda obra, Solidão provisória, na qual<br />

acentua a “grávida rebeldia/ que me acompanha”.<br />

Na década <strong>de</strong> 1980, Miranda toma um novo rumo, com<br />

a passagem da poesia política para o lirismo subjetivo, que<br />

assinala daí em diante os seus versos. Voltado para si mesmo<br />

e suas lembranças, o poeta conta como se vê: “Menino ainda<br />

sou/ e assim me canto”. Mas convivendo com o menino, está<br />

o adulto sofrido, “o louco, o <strong>de</strong>serdado, o gaudério”.<br />

O amor é outra presença forte na obra <strong>de</strong> Miranda,<br />

que canta a amada numa poesia que lembra a sensualida<strong>de</strong><br />

arrebatada do rei Salomão, levando Regina Zilberman a<br />

consi<strong>de</strong>rá ‑la uma “espécie <strong>de</strong> Cântico dos cânticos do escri‑<br />

tor gaúcho”.<br />

A outra gran<strong>de</strong> paixão <strong>de</strong> Luiz Miranda é a capital gaú‑<br />

cha, que canta em Porto Alegre – roteiro da paixão. Encar‑<br />

nando o flâneur imaginado por Walter Benjamin, o poeta<br />

percorre a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um extremo a outro, vê o mundo dos<br />

ricos e mergulha no submundo, entre marginais e excluídos,<br />

nos quais i<strong>de</strong>ntifica a expressão <strong>mais</strong> completa da urbe. É<br />

nas madrugadas que as prostitutas “<strong>de</strong> carne e solidão/ es‑<br />

crevem o poema/ <strong>mais</strong> do que secreto/ aquele que se lê/ sob<br />

o céu aberto/ dos quartos <strong>de</strong> aluguel”.<br />

O poeta sente a poesia em toda parte, mas reconhece<br />

a dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> elaborar o poema, “um potro vi<strong>de</strong>nte/ ar‑<br />

mado até os <strong>de</strong>ntes”. O que é um estímulo para quem se<br />

apresenta como poeta “<strong>de</strong> corpo e alma” e vê no poema um<br />

po<strong>de</strong>r que ultrapassa a vonta<strong>de</strong> do criador e “rasga a caixa<br />

do mistério” e “<strong>de</strong>slumbra os objetos da morte”.<br />

48<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

MACHADO DE ASSIS<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Alexei Bueno<br />

Machado <strong>de</strong> Assis (18<strong>39</strong> ‑1908)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

1 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0608 ‑9<br />

Requintada, harmoniosa, equilibrada, a poesia <strong>de</strong> Ma‑<br />

chado <strong>de</strong> Assis ocupa uma posição singular em nossa lite‑<br />

ratura. Des<strong>de</strong> sua estreia, com as Crisálidas (1864), em<br />

pleno período romântico, ele distinguiu ‑se dos seus pares<br />

pela expressão e pelo espírito. Em versos <strong>de</strong> técnica apu‑<br />

rada, com um certo sabor clássico, o jovem poeta falava <strong>de</strong><br />

amor, mas sem a ingenuida<strong>de</strong>, o atropelo e o calor da es‑<br />

cola, <strong>de</strong> suas preocupações com problemas sociais e com a<br />

missão do poeta em meio ao <strong>de</strong>sconcerto do mundo, mas<br />

sem nada revelar <strong>de</strong> seus dramas íntimos, o que lhe valeu<br />

as primeiras acusações <strong>de</strong> frieza.<br />

As Falenas (1870), <strong>mais</strong> amargas que o livro anterior,<br />

indicam o cansaço do autor com o Romantismo e a busca <strong>de</strong><br />

novos caminhos, a preocupação com a linguagem, a metrifi‑<br />

cação, as rimas, a forma, enfim, que se tornaria <strong>mais</strong> visível<br />

ainda nas Americanas (1875). Este livro, uma a<strong>de</strong>são bastante<br />

tardia ao Indianismo, <strong>de</strong>monstra a in<strong>de</strong>pendência do poeta<br />

em relação a modas. Sem publicar livro <strong>de</strong> poemas durante<br />

um quarto <strong>de</strong> século, Machado retorna às estantes com o<br />

volume das Poesias completas (1901), formado por uma sele‑<br />

ção <strong>de</strong> poemas <strong>de</strong> seus livros anteriores e <strong>mais</strong> as Oci<strong>de</strong>ntais.<br />

A nova obra assinala o auge <strong>de</strong> sua evolução poética, com<br />

“poemas cuja perfeição formal não será excedida pelos par‑<br />

nasi<strong>anos</strong>, e cujo pensamento resume a filosofia amarga e<br />

<strong>de</strong>sabusada dos livros <strong>de</strong> prosa da segunda fase” (Manuel<br />

Ban<strong>de</strong>ira). É singular que nas Oci<strong>de</strong>ntais não conste o poema<br />

“Menina e moça”, um dos melhores <strong>de</strong> sua juventu<strong>de</strong>, no<br />

qual figuram os versos “entreaberto botão, entrefechada<br />

rosa,/ um pouco <strong>de</strong> menina e um pouco <strong>de</strong> mulher”, dos <strong>mais</strong><br />

felizes que escreveu em cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> poética.<br />

A omissão foi recuperada por outros poemas, como “A <strong>de</strong>r‑<br />

ra<strong>de</strong>ira injúria” e o soneto “A Carolina”, <strong>de</strong> altíssimo nível,<br />

dos <strong>mais</strong> belos da língua em que Camões cantou.<br />

M e l h o r e s P o e M a s


MANUEL BANDEIRA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Francisco <strong>de</strong> Assis Barbosa<br />

Manuel Ban<strong>de</strong>ira (1886 ‑1968)<br />

Natural <strong>de</strong> Recife, PE<br />

16 a edição – 176 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0343 ‑9<br />

Manuel Ban<strong>de</strong>ira se dizia um poeta menor. Mas Carlos<br />

Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, que sabia das coisas, consi<strong>de</strong>rava ‑o<br />

“o poeta melhor que todos nós, o poeta <strong>mais</strong> forte”. Exa‑<br />

gero <strong>de</strong> amigo? Talvez. Mas discreto, na justa medida em<br />

que o permite a justiça e a amiza<strong>de</strong>.<br />

Manuel Ban<strong>de</strong>ira nasceu em Recife, Pernambuco, em<br />

1886. Tuberculoso, foi tratar ‑se na Suíça, regressando ao<br />

Brasil em 1917. Nesse ano publica A cinza das horas, se‑<br />

guido <strong>de</strong> Carnaval (1919), livros renovadores e mo<strong>de</strong>rnos,<br />

antecessores do Mo<strong>de</strong>rnismo. O que levou Mário <strong>de</strong> An‑<br />

dra<strong>de</strong>, alguns <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, a chamar o poeta <strong>de</strong> São João<br />

Batista da Nova Poesia. Nestes livros, como em toda a obra<br />

posterior, o poeta se mostra simples, coloquial, irônico. E<br />

irreverente, em poemas como “Os sapos”, nos quais sati‑<br />

riza os parnasi<strong>anos</strong>. Ou em versos como “Quero beber!<br />

Cantar asneiras”, levando um crítico da época a dizer que<br />

já realizara seu <strong>de</strong>sejo. Outra constante: a nota autobiográ‑<br />

fica e confessional, presente em seus versos mesmo quando<br />

o tom é impessoal. E a simpatia pelos seres e aspectos hu‑<br />

mil<strong>de</strong>s da vida, para os quais a maioria dos poetas não tem<br />

olhos <strong>de</strong> ver: o gatinho fazendo xixi, os meninos carvoeiros,<br />

o camelô “dos brinquedos <strong>de</strong> tostão”. O verso livre passa<br />

a predominar a partir <strong>de</strong> O ritmo dissoluto (1924). O poeta<br />

alcança a plenitu<strong>de</strong> em Libertinagem (1930), obra madura,<br />

equilibrada, um tanto pessimista, na qual se aguçam o ce‑<br />

ticismo e a <strong>de</strong>scrença em relação aos valores hum<strong>anos</strong>. Os<br />

livros seguintes, repletos <strong>de</strong> poemas admiráveis, mostram<br />

que o poeta não conheceu a <strong>de</strong>cadência. Pelo contrário,<br />

teve forças para se renovar aos cinquenta <strong>anos</strong> e se interes‑<br />

sar pelo Concretismo, já na velhice. Faleceu em 1968, aos<br />

82 <strong>anos</strong>, preparado para “A viagem <strong>de</strong>finitiva”: “Ir ‑me ‑ei<br />

embora. E ficarão os pássaros/ cantando./ E ficará o meu<br />

jardim com sua árvore ver<strong>de</strong>/ e o seu poço branco.”.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

MÁRIO DE SÁ ­CARNEIRO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Lucila Nogueira Rodrigues<br />

Mário <strong>de</strong> Sá ‑Carneiro (1890 ‑1916)<br />

Natural <strong>de</strong> Lisboa, Portugal<br />

1 a edição – 216 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0205 ‑0<br />

Mário <strong>de</strong> Sá ‑Carneiro é o <strong>mais</strong> estranho <strong>de</strong> todos os<br />

poetas portugueses. Na vida e na morte. Na capital fran‑<br />

cesa, on<strong>de</strong> vivia graças a uma mesada paterna, levou uma<br />

existência <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>nada, que culminou com o suicídio, em<br />

um hotel, aos vinte e seis <strong>anos</strong>. O ato <strong>de</strong>fine o homem.<br />

Queria uma morte espetacular e para assistir a sua agonia,<br />

convidou um amigo.<br />

Personalida<strong>de</strong> mórbida, na qual a angústia avassalado ra,<br />

o conflito consigo mesmo (“esta inconstância <strong>de</strong> mim pró‑<br />

prio em vibração”) se enfeitava com o culto ao exibicionismo,<br />

eterno adolescente, tímido, narcisista, hipersensível, uma es‑<br />

pécie <strong>de</strong> Rimbaud português, po<strong>de</strong>ria ser um poeta tão<br />

gran<strong>de</strong> quanto seu amigo Fernando Pessoa (ao qual se ante‑<br />

cipou em muitos aspectos), não fosse a morte prematura.<br />

Romântico <strong>de</strong> temperamento, como todo romântico<br />

vida e obra <strong>de</strong> Sá ‑Carneiro são inseparáveis. Sempre con‑<br />

traditório, o poeta obe<strong>de</strong>cia religiosamente à métrica tradi‑<br />

cional, que se chocava com os sentimentos típicos do<br />

homem mo<strong>de</strong>rno, que traduzia em seus versos, por vezes<br />

<strong>de</strong> um <strong>de</strong>sespero insuportável, como insuportável lhe era a<br />

vida e a sua própria figura.<br />

Para suportar a si mesmo e a vida, eterno estrangeiro<br />

num mundo que repudiava, o poeta criou uma espécie <strong>de</strong><br />

personalida<strong>de</strong> imaginária, na esperança <strong>de</strong> se ver com cla‑<br />

reza e se aceitar: “Eu não sou eu nem o outro,/ Sou qual‑<br />

quer coisa <strong>de</strong> intermédio;/ Pilar da ponte do tédio/ Que vai<br />

<strong>de</strong> mim para o Outro”. Nesse jogo arriscado, o poeta osci‑<br />

lava do mundo imaginário (“Ânsia revolta <strong>de</strong> mistérios e<br />

olor,/ Sombra, vertigem, ascensão – Altura!”) à dura reali‑<br />

da<strong>de</strong>, vendo a sua alma “no lavabo dum Café,/ como um<br />

anel esquecido”. Só lhe restava suportar a si mesmo (“Nem<br />

ópio nem morfina/ Foi álcool <strong>mais</strong> raro e penetrante:/ É só<br />

<strong>de</strong> mim que ando <strong>de</strong>lirante –/ Manhã tão forte que me<br />

anoiteceu”), o que nunca conseguiu.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

49


MÁRIO FAUSTINO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Benedito Nunes<br />

Mário Faustino (1930 ‑1962)<br />

Natural <strong>de</strong> Teresina, PI<br />

3 a edição – 112 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0345 ‑3<br />

Na segunda meta<strong>de</strong> da década <strong>de</strong> 1950, Mário Faus‑<br />

tino era um dos nomes <strong>mais</strong> discutidos da poesia brasileira.<br />

Negado e reverenciado, como todo poeta <strong>de</strong> vanguarda,<br />

tinha ainda a seu favor o fato <strong>de</strong> dirigir, no Suplemento Do‑<br />

minical do Jornal do Brasil, uma página <strong>de</strong>nominada “Poesia<br />

Experiência”, na qual acolhia os poetas novos e divulgava os<br />

mestres universais do verso, <strong>de</strong> Homero a Ezra Pound.<br />

Essa ativida<strong>de</strong>, que durou cerca <strong>de</strong> dois <strong>anos</strong>, foi fun‑<br />

damental à sua ativida<strong>de</strong> criadora, com a incorporação à sua<br />

própria poética <strong>de</strong> temas, técnicas e formas, bebidas nas<br />

tradições multisseculares da poesia oci<strong>de</strong>ntal. Por essa<br />

época, porém, o poeta já havia publicado aquele que seria o<br />

seu único livro, O homem e sua hora (1955), poemas meta‑<br />

fóricos, nos quais se liga ao universo mítico da cultura clás‑<br />

sica e do cristianismo. No prefácio aos Melhores poemas<br />

Mário Faustino, Benedito Nunes observa que “surpreen<strong>de</strong>‑<br />

mos aí o embalo da gran<strong>de</strong> lírica do sobressalto metafísico,<br />

da revivescência órfica e da rememoração histórica, ora dia‑<br />

logal, ora ten<strong>de</strong>ndo ao distanciamento narrativo, épico”,<br />

apreendida em T. S. Eliot, Dylan Thomas, Ezra Pound, Carlos<br />

Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, Cecília Meireles, Jorge <strong>de</strong> Lima.<br />

Ainda, para o mesmo crítico, Faustino seria “o poeta da po‑<br />

esia, o poeta que pensa”, aquele que se aproxima e se<br />

apossa da realida<strong>de</strong> do mundo através da criação verbal. A<br />

morte prematura do poeta (nascido em Teresina, Piauí, em<br />

1930), em um aci<strong>de</strong>nte aéreo no Peru (1962), impediu o<br />

pleno <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> suas possibilida<strong>de</strong>s artísticas,<br />

assim como a divulgação dos poemas escritos após a publi‑<br />

cação <strong>de</strong> seu livro. Uma parte <strong>de</strong>sse material, acha ‑se recu‑<br />

perado nos Melhores poemas Mário Faustino, apresentados<br />

em duas partes, “Dos poemas posteriores” e “O poeta<br />

como tradutor <strong>de</strong> Ezra Pound”. Valem pelo quase inedi‑<br />

tismo, mas sobretudo pelas qualida<strong>de</strong>s do poeta.<br />

50<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

MARIO QUINTANA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Fausto Cunha<br />

Mario Quintana (1906 ‑1994)<br />

Natural <strong>de</strong> Alegrete, RS<br />

17 a edição – 128 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0172 ‑5<br />

Mario Quintana entrou na literatura brasileira quase<br />

em surdina, sem estardalhaço, sem autopromoção, como<br />

um aprendiz <strong>de</strong> feiticeiro brindando o público com seus<br />

baús <strong>de</strong> espanto.<br />

O poeta nasceu em Alegrete, Rio Gran<strong>de</strong> do Sul, em<br />

1906, cursou o Colégio Militar <strong>de</strong> Porto Alegre, trabalhou na<br />

Livraria do Globo, fez jornalismo e inúmeras traduções, rece‑<br />

beu vários prêmios literários. Faleceu em 1994. O principal<br />

dado biográfico é que, ao longo da vida, nunca <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ser<br />

poeta. Ao contrário da maioria dos escritores brasileiros, sem‑<br />

pre apressados, Quintana estreou em livro após os trinta<br />

<strong>anos</strong>, com a coletânea <strong>de</strong> sonetos A rua dos cata ‑ventos<br />

(1940), no qual ainda palpitavam notas neossimbolistas. Le‑<br />

varia seis <strong>anos</strong> para publicar um novo livro, Canções, <strong>de</strong> ex‑<br />

trema simplicida<strong>de</strong> e musicalida<strong>de</strong>, que se renovam nos<br />

surpreen<strong>de</strong>ntes poemas em prosa <strong>de</strong> Sapato florido (1947).<br />

Em Espelho mágico (1948), com um espírito lúdico <strong>de</strong>sconhe‑<br />

cido nas letras brasileiras, o poeta se <strong>de</strong>licia (e <strong>de</strong>licia o leitor)<br />

com pequenos e mágicos epigramas. A adoção do verso livre,<br />

em O aprendiz <strong>de</strong> feiticeiro (1950) coinci<strong>de</strong> com a abertura<br />

para o mundo onírico, com um toque <strong>de</strong> surrealismo. Os li‑<br />

vros seguintes – <strong>de</strong>s<strong>de</strong> Pé <strong>de</strong> pilão, escrito para o público in‑<br />

fantil, até Apontamentos <strong>de</strong> história sobrenatural e Baú <strong>de</strong><br />

espantos – mostram o poeta em permanente processo <strong>de</strong><br />

renovação, ágil, personalíssimo, com “uma qualida<strong>de</strong>, marca,<br />

timbre, ressonância ou maneira que só posso <strong>de</strong>finir como<br />

quintanida<strong>de</strong>”, conforme observa Fausto Cunha no prefácio<br />

aos Melhores poemas Mario Quintana. Apesar do êxito po‑<br />

pular, ou talvez por isso mesmo, a crítica custou a reconhecer<br />

a obra <strong>de</strong> Quintana. Acusavam ‑no <strong>de</strong> passadista, <strong>de</strong> preso a<br />

fórmulas superadas, sem perceber a magia <strong>de</strong> sua poesia e<br />

seu humor refinado. Quando perceberam já era tar<strong>de</strong>. O<br />

poeta já estava <strong>mais</strong> do que consagrado pelo povo.<br />

M e l h o r e s P o e M a s


MENOTTI DEL PICCHIA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Rubens Eduardo Ferreira Frias<br />

Menotti <strong>de</strong>l Picchia (1892 ‑1988)<br />

Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />

1 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0926 ‑5<br />

Coedição ABL<br />

Autor <strong>de</strong> um dos livros <strong>mais</strong> populares da poesia bra‑<br />

sileira, em todos os tempos, Juca Mulato, Menotti <strong>de</strong>l Pic‑<br />

chia foi também cronista, romancista, contista, ensaísta. A<br />

poesia, porém, teve primazia cronológica e sentimental em<br />

sua obra.<br />

Nascido em São Paulo, em 1892, Menotti estreou na‑<br />

quele período <strong>de</strong> lusco ‑fusco da poesia brasileira, entre o<br />

esgotamento do Parnasianismo e a Semana <strong>de</strong> Arte Mo‑<br />

<strong>de</strong>rna. O primeiro livro, com um título provocativo, ao<br />

gosto da época, Poemas do vício e da virtu<strong>de</strong>, revelava um<br />

temperamento original, asfixiado pela linguagem neopar‑<br />

nasiana. O sucesso veio cedo, com a publicação do Juca<br />

Mulato (1917), on<strong>de</strong> traduzia “o gênio triste da nossa<br />

raça”. O poema é uma espécie <strong>de</strong> resposta ao Jeca Tatu, <strong>de</strong><br />

Monteiro Lobato, <strong>de</strong>sanimado, doentio. Juca Mulato, sen‑<br />

timental, cantador, trabalhador, representaria as melhores<br />

virtu<strong>de</strong>s do “brasileiro típico”. Para uma parcela da crítica,<br />

essa poesia, por suas raízes e visão do homem brasileiro,<br />

antecipava ‑se ao Mo<strong>de</strong>rnismo. Cassiano Ricardo chega a<br />

proclamar que o verda<strong>de</strong>iro chefe do Mo<strong>de</strong>rnismo não foi<br />

Mário ou Oswald <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, mas Menotti <strong>de</strong>l Picchia. A<br />

poesia mo<strong>de</strong>rnista <strong>de</strong> Menotti, expressa em Chuva <strong>de</strong><br />

pedra (1924) e na rapsódia República dos Estados Unidos<br />

do Brasil (1928), é solar, plástica, colorida, abundante em<br />

imagens, procurando realizar no plano artístico a diretriz<br />

traçada pelo próprio escritor alguns <strong>anos</strong> antes: “arte bra‑<br />

sileira <strong>de</strong>ve ser brasileira, isto é, girar na ambiência física e<br />

moral da nossa terra e do nosso povo”. Os poemas da<br />

maturida<strong>de</strong>, reunidos em O <strong>de</strong>us sem rosto, revelam um<br />

poeta <strong>mais</strong> intimista, <strong>mais</strong> grave, inquieto diante do misté‑<br />

rio da vida, <strong>de</strong>bruçando ‑se sobre si mesmo, em busca do<br />

menino que foi um dia, com um “dom <strong>de</strong>moníaco <strong>de</strong> se<br />

renovar, para permanecer” (Cassiano Ricardo).<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

MURILO MENDES<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Luciana Stegagno Picchio<br />

Murilo Men<strong>de</strong>s (1901 ‑1975)<br />

Natural <strong>de</strong> Juiz <strong>de</strong> Fora, MG<br />

3 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0480 ‑1<br />

Surrealista, barroco, visionário, Murilo Men<strong>de</strong>s foi<br />

uma das vozes poéticas <strong>mais</strong> pessoais e inovadoras do Mo‑<br />

<strong>de</strong>rnismo brasileiro. Des<strong>de</strong> a estreia, com Poemas (1930),<br />

sua poesia incomodou os conservadores e <strong>de</strong>spertou a<br />

atenção dos que buscavam novos caminhos. O livro reve‑<br />

lava um poeta original e maduro, movimentando ‑se num<br />

ambiente onírico e <strong>de</strong> conciliação <strong>de</strong> extremos, do coti‑<br />

diano prosaico ao metafísico.<br />

Esse caminho seria abandonado <strong>de</strong> maneira abrupta,<br />

com a História do Brasil (1932), sátira à versão oficial <strong>de</strong> nossa<br />

história, expressa em poemas ‑piadas. O livro seria excluído<br />

pelo autor na edição global <strong>de</strong> suas Poesias, em 1959. Os<br />

poemas incluídos em Tempo e eternida<strong>de</strong> (1935), em parceria<br />

com Jorge <strong>de</strong> Lima, exaltam a musa que, com a Igreja Cató‑<br />

lica, divi<strong>de</strong> as atenções do poeta. O conflito se singulariza em<br />

A poesia em pânico (1938), com a vitória da musa, mas tam‑<br />

bém a nota inquietante <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong> mulher e pecado.<br />

O visionário (1941) é escandalosamente surrealista, um dos<br />

livros <strong>mais</strong> representativos e solitários do Mo<strong>de</strong>rnismo. A inte‑<br />

gração à dura realida<strong>de</strong> do mundo, nos dias sombrios da Se‑<br />

gunda Guerra Mundial, assinalam os poemas <strong>de</strong> As metamor ‑<br />

foses (1944) e se prolongam em Poesia liberda<strong>de</strong> (1947). O<br />

mundo parece sem re<strong>de</strong>nção, mas o poeta <strong>de</strong>scobre que ela<br />

é possível pela bonda<strong>de</strong> e pela poesia. Este o clima <strong>de</strong> Mundo<br />

enigma (1945). O <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> fraternida<strong>de</strong> e comunhão hu‑<br />

mana se aprofunda em Contemplação <strong>de</strong> Ouro Preto (1954).<br />

Com a mudança para Roma, em 1957, o poeta se europeíza,<br />

e os livros seguintes trazem uma forte marca da cultura euro‑<br />

peia, não como influência diluída pelas raízes nativas, mas<br />

como marca <strong>de</strong> integração do poeta ao mundo que o cerca.<br />

Integrou ‑se tão bem que passou a poetar em italiano, como<br />

mostram os poemas <strong>de</strong> Ipotesi (1968). Já não era apenas um<br />

poeta brasileiro, mas um poeta do mundo.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

51


NAURO MACHADO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Hil<strong>de</strong>berto Barbosa Filho<br />

Nauro Machado (1935)<br />

Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />

1 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0986 ‑9<br />

Des<strong>de</strong> sua estreia poética, em 1958, com Campo sem<br />

base, o maranhense Nauro Machado (São Luís, 1935) optou<br />

por um caminho muito pessoal. Em vez das experiências <strong>de</strong><br />

vanguarda, abundantes à época, preferiu a “revalorização do<br />

verso, renovando, por <strong>de</strong>ntro, o amplo espectro da chamada<br />

‘tradição da imagem’”, conforme observa Hil<strong>de</strong>berto Barbosa<br />

Filho no prefácio aos Melhores poemas Nauro Machado.<br />

Angustiado com a precarieda<strong>de</strong> da vida, os mistérios da<br />

morte e <strong>de</strong> Deus, os problemas do sexo e da solidão, a fra‑<br />

gilida<strong>de</strong> dos valores hum<strong>anos</strong>, a poesia <strong>de</strong> Nauro representa<br />

um esforço <strong>de</strong> libertação, em busca da plena realização do<br />

espírito. Essa busca, porém, nunca se <strong>de</strong>svincula da própria<br />

busca da poesia: “eu quero e é necessário/ que me sofra e<br />

me solidifique em poeta,/ que <strong>de</strong>strua <strong>de</strong>s<strong>de</strong> já o supérfluo<br />

e o ilusório/ e me alucine na essência <strong>de</strong> mim e das coisas”.<br />

Poesia metafísica? Talvez, como sugerem versos como esses:<br />

“Eu fui há muito alguém que agora tenho/ voltando apenas<br />

neste corpo alheio”. Mas também uma poesia preocupada<br />

com a posição do homem no mundo, as relações, por vezes<br />

ásperas entre as criaturas, e o lugar do poeta, o que gera<br />

novos conflitos íntimos: “nasci para habitar no coração do<br />

universo/ e não nesta casa on<strong>de</strong> o verme resiste/ até mesmo<br />

no último parafuso <strong>de</strong> meus ossos”. Sombria, i<strong>de</strong>ntificada<br />

com as inquietações <strong>mais</strong> perturbadoras do poeta, a poesia<br />

é também, para ele, “um caso <strong>de</strong> vida ou morte”, e uma<br />

presença obsessiva, como comprova sua vasta produção.<br />

São <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta livros, batizados com alguns dos títulos<br />

<strong>mais</strong> instigantes e felizes da poesia mo<strong>de</strong>rna brasileira: Os<br />

parreirais <strong>de</strong> Deus, Masmorra didática, A rosa blindada, Mar<br />

abstêmio, Funil do ser, que reforçam a observação <strong>de</strong><br />

Franklin <strong>de</strong> Oliveira <strong>de</strong> que o poeta “cavalga a poesia como<br />

quem monta cavalos incendiados. Não a traspassa a luz.<br />

Atravessa ‑a a labareda”. Des<strong>de</strong> os títulos.<br />

52<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

OLAVO BILAC<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Marisa Lajolo<br />

Olavo Bilac (1865 ‑1918)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

4 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0004 ‑9<br />

As Poesias, <strong>de</strong> Olavo Bilac, publicadas em 1888, foram<br />

recebidas com um coro <strong>de</strong> louvores, como poucos livros na<br />

literatura brasileira. Apesar do Parnasianismo já estar vitorioso,<br />

a obra era uma novida<strong>de</strong>, “pela graça fluente da linguagem<br />

poética” (Manuel Ban<strong>de</strong>ira), a perfeição dos versos, palpitan‑<br />

tes <strong>de</strong> vida e sensualismo, em contraste com a tão apregoada<br />

frieza marmórea da escola e à própria “profissão <strong>de</strong> fé” com<br />

que o poeta abria o volume, exaltando a perfeição fria do<br />

verso, talhado em “o alvo cristal, a pedra rara,/ o ônix”.<br />

Por essa época, Bilac (Rio <strong>de</strong> Janeiro, 1865) era um<br />

dos boêmios <strong>mais</strong> conhecidos da cida<strong>de</strong>, levando uma vida<br />

que escandalizava as famílias. Depois <strong>de</strong> abandonar, suces‑<br />

sivamente, os cursos <strong>de</strong> Medicina, no Rio <strong>de</strong> Janeiro, e <strong>de</strong><br />

Direito, em São Paulo, entregou ‑se ao jornalismo, profissão<br />

mal paga, o que o obrigou a utilizar múltiplos pseudônimos<br />

para sobreviver. Em 1893, durante a Revolta da Armada,<br />

colocou ‑se contra Floriano Peixoto, sendo preso. Libertado,<br />

exilou ‑se em Minas Gerais, a princípio em Ouro Preto e<br />

<strong>mais</strong> tar<strong>de</strong> em Juiz <strong>de</strong> Fora. Ocupou cargos importantes, foi<br />

um dos fundadores da Aca<strong>de</strong>mia Brasileira <strong>de</strong> Letras, viajou<br />

várias vezes à Europa, publicou livros <strong>de</strong> crônicas, contos,<br />

literatura infantil. Em seu último livro <strong>de</strong> poemas, póstumo,<br />

Tar<strong>de</strong> (1919), o poeta substitui o sensualismo por temas<br />

nacionalistas. Já se percebem os sinais do crepúsculo. Du‑<br />

rante essa fase, <strong>de</strong>dicou ‑se à campanha pelo serviço militar<br />

obrigatório. Faleceu em 1918, em plena glória. A opinião<br />

geral do país podia então ser resumida na frase <strong>de</strong> João do<br />

Rio: “Bilac chegou à perfeição – é sagrado.”. Era também<br />

um poeta muito popular, graças sobretudo à sua lírica amo‑<br />

rosa, expressa nos 35 sonetos da Via Láctea. “Virgens amo‑<br />

rosas” era um soneto que milhares <strong>de</strong> brasileiros sabiam <strong>de</strong><br />

cor. Essa é a melhor consagração.<br />

M e l h o r e s P o e M a s


PATATIVA DO ASSARÉ<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Cláudio Portella<br />

Patativa do Assaré (1909 ‑2002)<br />

Natural <strong>de</strong> Serra <strong>de</strong> Santana, CE<br />

1 a edição – 384 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1119 ‑9<br />

Poeta e violeiro cantador, Patativa do Assaré se tornou<br />

um mito ainda em vida. Her<strong>de</strong>iro <strong>de</strong> uma tradição <strong>de</strong> tro‑<br />

vadores populares nor<strong>de</strong>stinos, cujas raízes remotas po<strong>de</strong>m<br />

se esten<strong>de</strong>r até os aedos gregos, ele criou uma legião <strong>de</strong><br />

admiradores exaltados por todo o Brasil. Alguns, como<br />

Cláudio Portella, que selecionou e prefaciou os Melhores<br />

poemas Patativa do Assaré, não fazem por menos: Patativa<br />

“é ao lado <strong>de</strong> Camões, Homero e Dante, um dos maiores<br />

poetas populares do mundo”.<br />

Antonio Gonçalves da Silva nasceu em 1909, em Serra<br />

<strong>de</strong> Santana, Ceará. Ainda criança per<strong>de</strong>u a visão do olho<br />

direito. Foi leitor apaixonado dos poetas brasileiros. Fasci‑<br />

nado pelas leituras coletivas <strong>de</strong> folhetos <strong>de</strong> cor<strong>de</strong>l e pelo<br />

duelo entre cantadores, começa a poetar aos <strong>de</strong>zesseis<br />

<strong>anos</strong>, quando compra também sua primeira viola. Canta‑<br />

dor <strong>de</strong> improviso, viaja a Belém, aos <strong>de</strong>zenove <strong>anos</strong>, on<strong>de</strong><br />

um conterrâneo lhe dá a alcunha <strong>de</strong> Patativa. Como esse<br />

fosse um apelido comum, Antonio passa a se apresentar<br />

como Patativa do Assaré, cida<strong>de</strong> próxima ao seu local <strong>de</strong><br />

nascimento. Durante 25 <strong>anos</strong> (<strong>de</strong> 1930 a 1955), o poeta vive<br />

na Serra <strong>de</strong> Santana, trabalhando em seu roçado e com‑<br />

pondo gran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong> sua obra, divulgada exclusivamente<br />

por via oral. O primeiro livro – Inspiração nor<strong>de</strong>stina – sai<br />

em 1956, mas a melhor divulgação <strong>de</strong> sua obra era então<br />

pelo rádio. Com uma <strong>de</strong> suas músicas gravada por Luís<br />

Gonzaga, Patativa torna ‑se conhecido em todo o país, re‑<br />

cebendo inúmeras homenagens, até sua morte, em 2002.<br />

Poeta popular, Patativa se preocupava com a forma poé‑<br />

tica, cuidava da métrica e da rima, sem per<strong>de</strong>r a esponta‑<br />

neida<strong>de</strong> que o ligava à terra. Foi poeta do chão nor<strong>de</strong>stino,<br />

sucessor do Cego A<strong>de</strong>raldo, mas também, como observa<br />

José Ramos Tinhorão, um “<strong>de</strong>sses fenômenos da cultura<br />

popular brasileira”.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

PAULO LEMINSkI<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Fred Góes e Álvaro Marins<br />

Paulo Leminski (1944 ‑1989)<br />

Natural <strong>de</strong> Curitiba, PR<br />

6 a edição – 224 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0527 ‑3<br />

Paulo Leminski foi uma das gran<strong>de</strong>s surpresas da poesia<br />

brasileira nos últimos trinta <strong>anos</strong>. Pertencendo a uma gera‑<br />

ção <strong>de</strong> insatisfeitos e irreverentes levou a insatisfação e a<br />

irreverência àquele ponto extremo para o qual só há uma<br />

saída: renovar ou se retirar. Renovou. Teve o dom mágico<br />

<strong>de</strong> mostrar ao país uma voz inconfundível, personalíssima,<br />

fluente e cheia <strong>de</strong> sonorida<strong>de</strong>s misteriosas, como os rios. E<br />

como os rios, enriquecida por muitos afluentes: dos haicais<br />

<strong>de</strong> Bashô às experiências concretistas.<br />

Paulo Leminski Filho nasceu e morreu em Curitiba. Foi<br />

seminarista e faixa preta <strong>de</strong> judô, professor, publicitário,<br />

apresentador <strong>de</strong> televisão. Gostava <strong>de</strong> polemizar. Era uma<br />

mistura <strong>de</strong> samurai e trovador. Homem <strong>de</strong> contrastes, como<br />

as suas origens étnicas: tinha sangue polonês e negro nas<br />

veias. Em sua poesia também convivem muitos contrastes e<br />

inquietações, i<strong>de</strong>ais libertários e <strong>de</strong> contracultura, possivel‑<br />

mente os contrastes, i<strong>de</strong>ais e inquietações <strong>de</strong> sua geração, o<br />

que explica a intensa receptivida<strong>de</strong> popular <strong>de</strong> sua poesia.<br />

Em vida, Leminski lançou três livros <strong>de</strong> poemas: Caprichos e<br />

relaxos (1983), Haitropikais (1985), em parceria com Alice<br />

Ruiz, e Distraídos venceremos (1987). Outros foram publica‑<br />

dos após sua morte, mostrando um poeta prolífico e fasci‑<br />

nado por muitos caminhos, mas extremamente preocupado<br />

com a linguagem, a expressão gráfica do poema, herança<br />

talvez do Concretismo, e a concisão: “um pouco <strong>de</strong> mao/<br />

em todo poema que ensina/ quanto menor/ <strong>mais</strong> do tama‑<br />

nho da china”. Essas preocupações po<strong>de</strong>m sugerir que tenha<br />

sido um poeta <strong>de</strong> gabinete. Nada <strong>mais</strong> falso. Os poemas <strong>de</strong><br />

Leminski nascem <strong>de</strong> “suas vivências <strong>de</strong> beatnik caboclo”,<br />

extraídos ainda palpitantes da árvore ver<strong>de</strong> da vida, e, como<br />

observou Leyla Perrone ‑Moisés, parecem “tão simples que é<br />

quase um <strong>de</strong>saforo.”.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

53


PAULO MENDES<br />

CAMPOS<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Guilhermino Cesar<br />

Paulo Men<strong>de</strong>s Campos (1922 ‑1991)<br />

Natural <strong>de</strong> Belo Horizonte, MG<br />

3 a edição – 212 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0243‑0<br />

No poema autobiográfico “Pensamentos em prosa”,<br />

Paulo Men<strong>de</strong>s Campos conta ter nascido em Belo Hori‑<br />

zonte, em 1922, “oito meses antes da morte <strong>de</strong> Marcel<br />

Proust,/ um século <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> Shelley afogar ‑se no golfo <strong>de</strong><br />

Spezzia./ Nada tenho com eles, fabulosos./ Mas foi através<br />

da literatura que recebi a vida/ e foi em mim a poesia uma<br />

divinda<strong>de</strong> necessária.”.<br />

A divinda<strong>de</strong> necessária levou algum tempo para se impor<br />

em sua vida. Dias <strong>de</strong> revolta no colégio interno. Prenúncio <strong>de</strong><br />

liberda<strong>de</strong> no ginásio, “uma adivinhação <strong>de</strong> poesia nos florilé‑<br />

gios estúpidos”. A consciência <strong>de</strong> ser poeta se torna clara<br />

quando, em Belo Horizonte, começa a participar <strong>de</strong> um grupo<br />

<strong>de</strong> jovens escritores, formado por Fernando Sabino, Otto Lara<br />

Resen<strong>de</strong>, Hélio Pellegrino, amigos <strong>de</strong> toda a vida. Os críticos<br />

filiam a poesia <strong>de</strong> Paulo Men<strong>de</strong>s Campos à Geração <strong>de</strong> 45,<br />

embora o poeta repelisse classificações. Preferia ver ‑se como<br />

um individualista, com dívidas a muitos poetas, <strong>de</strong> épocas<br />

diversas: um García Lorca, um William Blake, um Jorge Luis<br />

Borges. O primeiro livro (A palavra escrita), saiu em 1951, em<br />

pequena tiragem e circulação restrita. Assim, a verda<strong>de</strong>ira es‑<br />

treia ocorreu com O domingo azul do mar (1958), que reve‑<br />

lava um poeta intimista, um tanto proustiano, em permanente<br />

busca do tempo perdido, sobretudo dos dias mágicos, mas<br />

tão atormentados, da infância. Nos livros seguintes, o poeta<br />

evolui para uma visão <strong>mais</strong> abrangente do mundo, reflete<br />

sobre as peculiarida<strong>de</strong>s do país, mas nunca se liberta da “hu‑<br />

manida<strong>de</strong> provincial <strong>de</strong> que é originário”, como observa Gui‑<br />

lhermino Cesar no prefácio aos Melhores poemas Paulo<br />

Men<strong>de</strong>s Campos. Uma parte importante da ativida<strong>de</strong> poética<br />

<strong>de</strong> Campos foi <strong>de</strong>dicada à tradução <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s poetas, <strong>de</strong> li‑<br />

teraturas diversas, <strong>de</strong> Rosalia <strong>de</strong> Castro a W. H. Au<strong>de</strong>n, <strong>de</strong> Carl<br />

Sandburg a Eugenio Montale, várias <strong>de</strong>las incluídas nos Me‑<br />

lhores poemas Paulo Men<strong>de</strong>s Campos.<br />

54<br />

Capa<br />

Nova<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

RAIMUNDO CORREIA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Telenia Hill<br />

Raimundo Correia (1859 ‑1911)<br />

Natural <strong>de</strong> Cururupu, MA<br />

2 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0573 ‑0<br />

Crítico exigente <strong>de</strong> poesia, Manuel Ban<strong>de</strong>ira consi<strong>de</strong>‑<br />

rava Raimundo Correia “o maior artista do verso que já ti‑<br />

vemos” e “o <strong>mais</strong> puramente poeta” da famosa trinda<strong>de</strong><br />

parnasiana, que ele formava com Olavo Bilac e Alberto <strong>de</strong><br />

Oliveira. João Ribeiro ia ainda <strong>mais</strong> longe: “Não sei <strong>de</strong> poeta<br />

algum da nossa língua que se lhe possa comparar, na per‑<br />

feição ou no sentimento e agu<strong>de</strong>za”. Àquela época, e du‑<br />

rante muitos <strong>anos</strong> ainda, Raimundo Correia teve sua corte<br />

<strong>de</strong> fanáticos, capazes <strong>de</strong> recitar <strong>de</strong> cor “As pombas”, “Mal<br />

secreto”, “O vinho <strong>de</strong> Hebe” e outros sonetos e poemas<br />

curtos, nos quais Ban<strong>de</strong>ira encontrava “alguns dos versos<br />

<strong>mais</strong> misteriosamente belos da nossa língua”.<br />

Estreando, com um volume repleto <strong>de</strong> reminiscências<br />

românticas (Primeiros sonhos), “primícias dos primeiros<br />

<strong>anos</strong>”, como o <strong>de</strong>finiu o próprio autor, Raimundo Correia<br />

(nascido em um navio na costa do Maranhão, em 1859, e<br />

falecido em Paris, 1911) já se apresenta no segundo livro<br />

(Sinfonias) em plena maturida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seus dons poéticos. Ali<br />

se encontram os poemas que iriam garantir a fama e a<br />

popularida<strong>de</strong> do poeta, como os sonetos citados. Os livros<br />

seguintes, Versos e versões e Aleluias, mantêm a qualida<strong>de</strong><br />

da obra, sem lhe acrescentar nada <strong>de</strong> novo. Ainda em vida,<br />

Raimundo Correia foi acusado <strong>de</strong> plagiário em um artigo<br />

enfezado <strong>de</strong> Luis Murat. “As pombas” seriam uma simples<br />

adaptação <strong>de</strong> um trecho <strong>de</strong> Theophile Gautier, “O vinho <strong>de</strong><br />

Hebe” transposição <strong>de</strong> um poema <strong>de</strong> Mme. Ackermann e<br />

“Mal secreto”, mera recriação <strong>de</strong> versos <strong>de</strong> Metastásio. A<br />

acusação fez gastar muita tinta. Hoje, esses e outros poe‑<br />

mas <strong>de</strong> Raimundo na mesma situação são consi<strong>de</strong>rados<br />

paráfrases. Inspirar ‑se em textos alheios e reinventá ‑los foi um<br />

processo muito empregado pelo poeta. Talvez diminua<br />

um pouco a sua originalida<strong>de</strong>, mas não compromete ou<br />

reduz em nada sua gran<strong>de</strong>za.<br />

M e l h o r e s P o e M a s


RAUL DE LEONI<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Pedro Lyra<br />

Raul <strong>de</strong> Leoni (1895 ‑1926)<br />

Natural <strong>de</strong> Petrópolis, RJ<br />

1 a edição – 128 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0785 ‑8<br />

Raul <strong>de</strong> Leoni começou a publicar seus poemas em<br />

um momento em que a poesia brasileira lutava para se<br />

<strong>de</strong>sligar do passado, sem ter ainda perspectivas <strong>de</strong> futuro.<br />

O Simbolismo estava exaurido, o Mo<strong>de</strong>rnismo ainda não se<br />

manifestara. Neste claro ‑escuro, o poeta lançou a plaquete<br />

O<strong>de</strong> a um poeta morto (1919) e, no ano da Semana <strong>de</strong><br />

Arte Mo<strong>de</strong>rna, Luz mediterrânea.<br />

A coincidência <strong>de</strong> datas não tem nenhum significado. Os<br />

projetos poéticos <strong>de</strong> Raul <strong>de</strong> Leoni estavam muito longe da<br />

aspiração dos mo<strong>de</strong>rnistas. Sua poesia clara, harmoniosa,<br />

clássica, pagã, em sintonia com os i<strong>de</strong>ais <strong>de</strong> beleza grega e <strong>de</strong><br />

força romana, assemelhava ‑se mesmo à luz mediterrânea,<br />

mas uma luz prestes a se apagar, símbolo <strong>de</strong> uma era que ia<br />

ficando para trás. A propósito, Tristão <strong>de</strong> Athay<strong>de</strong> observou<br />

que “ele dizia, por todos nós, a <strong>de</strong>spedida harmoniosa a um<br />

mundo que <strong>de</strong>saparecia no horizonte. Ele foi o incomparável<br />

intérprete dos nossos a<strong>de</strong>uses a Epicuro”. O próprio poeta<br />

estava preso a um mundo que se <strong>de</strong>spedia. Natural <strong>de</strong> Petró‑<br />

polis (1895), Raul percorreu a Europa antes <strong>de</strong> ingressar na<br />

Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Direito. Por essa época, era um rapaz forte, ale‑<br />

gre, másculo, amando a vida ao ar livre. Desportista, <strong>de</strong>tentor<br />

<strong>de</strong> vários títulos e medalhas, era assíduo também à boêmia<br />

literária, que se reunia nos cafés da Lapa. Nomeado pelo pre‑<br />

si<strong>de</strong>nte Nilo Peçanha, seu padrinho, ingressa na carreira diplo‑<br />

mática, da qual se <strong>de</strong>sliga em pouco tempo. Pouco após sua<br />

eleição como <strong>de</strong>putado estadual, começa a sentir os primeiros<br />

sintomas da tuberculose, que o matou aos 31 <strong>anos</strong>. Luz me‑<br />

diterrânea teve uma excelente receptivida<strong>de</strong>. A crítica ressal‑<br />

tou o aristocracismo do livro e o fato <strong>de</strong> ser um dos raros<br />

poetas brasileiros “<strong>de</strong> emoção puramente filosófica”. Durante<br />

muito tempo, os sonetos <strong>de</strong> Leoni, como “Eugenia”, eram<br />

obrigatórios no repertório dos <strong>de</strong>clamadores. A voz do povo<br />

é uma forma <strong>de</strong> imortalida<strong>de</strong>.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

RIBEIRO COUTO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

José Almino<br />

Ribeiro Couto (1898 ‑1963)<br />

Natural <strong>de</strong> Santos, SP<br />

1 a edição – 200 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0777 ‑7<br />

Sem nunca <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ser um romântico, apesar da even‑<br />

tual tonalida<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna e mo<strong>de</strong>rnista <strong>de</strong> sua poesia, Ribeiro<br />

Couto foi o poeta da província, das pequenas cida<strong>de</strong>s espa‑<br />

lhadas pelo Brasil e pelo mundo, silenciosas, das casas miste‑<br />

riosas, dos quintais com goiabeiras magras e pés <strong>de</strong> chuchu<br />

trepando pelos galhos, dos domingos on<strong>de</strong> nada acontece,<br />

dos crepúsculos ao som do sino, das vidas obscuras.<br />

Nascido em Santos (1898), Rui Ribeiro Couto cursou a<br />

Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Direito <strong>de</strong> São Paulo, que não concluiu,<br />

formando ‑se pela Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ciências Jurídicas e Sociais<br />

do Rio <strong>de</strong> Janeiro. Jornalista, promotor público em São<br />

Paulo e em Minas Gerais, ingressou na diplomacia em<br />

1934, servindo em diversos países da Europa, num exílio<br />

que se refletiria em sua poesia, com uma nota <strong>de</strong> acentuado<br />

saudosismo. Nos primeiros livros – O jardim das confidên‑<br />

cias e Poemetos <strong>de</strong> ternura e <strong>de</strong> melancolia –, o poeta pa‑<br />

rece um tanto temeroso <strong>de</strong> se atirar à vida, vista através <strong>de</strong><br />

uma certa penumbra, que se dissolve nos livros seguintes.<br />

Sem violentar sua sensibilida<strong>de</strong>, o poeta integra ‑se ao<br />

mundo – Um homem na multidão (1926) – consciente do<br />

valor da “experiência vivida”. A experiência vivida pelo<br />

poeta, então, era amarga. Tuberculoso, passa dois <strong>anos</strong> em<br />

Campos <strong>de</strong> Jordão, vagueia pelas cida<strong>de</strong>s mortas do vale<br />

do Paraíba, ambientes que se refletem em Província (1933).<br />

Homem do mundo, diplomata, vivendo nas civilizadas cida‑<br />

<strong>de</strong>s europeias, Ribeiro Couto se volta, singularmente, e<br />

cada vez <strong>mais</strong>, para a simplicida<strong>de</strong> e a nostalgia, o mundo<br />

perdido da infância, o lirismo das modinhas populares, que<br />

marcam seus livros da maturida<strong>de</strong>, Cancioneiro do ausente<br />

(1943), Entre mar e rio (1952) e Longe (1961). Como ob‑<br />

serva José Almino, “poetas como ele não tiveram muita<br />

influência nem <strong>de</strong>ixaram linhagem. Mas são pontos lumi‑<br />

nosos. Inapagáveis.”.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

55


RUy ESPINHEIRA<br />

FILHO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Sérgio Martagão Gesteira<br />

Ruy Espinheira Filho (1942)<br />

Natural <strong>de</strong> Salvador, BA<br />

1 a edição – 296 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1597 ‑5<br />

Ruy Espinheira Filho faz parte da geração <strong>de</strong> poetas que<br />

surgiram no início da década <strong>de</strong> 1970. Uma geração <strong>de</strong> per‑<br />

plexos diante das teorias e proposições da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> e da<br />

sedução da herança multissecular da poesia perene, aquela<br />

que traz em si o tom e o ritmo da eternida<strong>de</strong>, que vai <strong>de</strong><br />

Homero e Virgílio a Fernando Pessoa e Drummond.<br />

Poeta autêntico, Ruy soube conciliar renovação e tra‑<br />

dição. Sem abdicar <strong>de</strong> sua forte personalida<strong>de</strong> e das injun‑<br />

ções da época, manteve ‑se <strong>de</strong>ntro daquela dicção brasileira<br />

<strong>de</strong> fazer poesia, iniciada com a geração <strong>de</strong> Mário <strong>de</strong> An‑<br />

dra<strong>de</strong> e Manuel Ban<strong>de</strong>ira. O que subenten<strong>de</strong> também rigor<br />

formal, linguagem <strong>de</strong>purada e recusa à condição <strong>de</strong>scartá‑<br />

vel da obra <strong>de</strong> arte, comum em nossos dias.<br />

Poesia <strong>de</strong> aflita melancolia, angustiada diante da pas‑<br />

sagem irreversível do tempo (“Não há a<strong>de</strong>uses/ nos pássa‑<br />

ros,/ nos cães, nos insetos,/ nas galáxias que se fazem e<br />

refazem/ esplendorosamente/ para <strong>de</strong>leite <strong>de</strong> <strong>de</strong>us/ ne‑<br />

nhum./ Só em nós/ há a<strong>de</strong>uses”) e da certeza da morte (“O<br />

difícil é aguentar até que a morte chegue”), mas que sabe<br />

captar também as infinitas sugestões do cotidiano e<br />

transformá ‑las em reflexão sobre a condição humana (“O<br />

silêncio sonha nas telhas./ Escrevo isto e nem sei o que sig‑<br />

nifica./ Sei que estou só/ e há silêncio”), on<strong>de</strong> se po<strong>de</strong> ouvir<br />

“o canto abissal do tempo a fluir” e “a música que modula,<br />

entre a tenuida<strong>de</strong> do encanto e o peso das sombras elegía‑<br />

cas, a <strong>mais</strong> rara consonância e a dissonância humanas”,<br />

como observa Sérgio Martagão Gesteira no prefácio.<br />

Com <strong>mais</strong> <strong>de</strong> quinze livros <strong>de</strong> poemas publicados, ro‑<br />

mancista, contista, cronista, ensaísta, reconhecido pelos<br />

leitores <strong>mais</strong> exigentes, como Carlos Drummond <strong>de</strong> An‑<br />

dra<strong>de</strong> (“Poesia concentrada e <strong>de</strong> sutil expressão”) e Fábio<br />

Lucas (“Uma das vozes <strong>mais</strong> autênticas <strong>de</strong> nossa poesia”),<br />

Ruy Espinheira Filho já po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado um clássico da<br />

poesia brasileira mo<strong>de</strong>rna.<br />

56<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

SOSÍGENES COSTA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Aleilton Fonseca<br />

Sosígenes Marinho da Costa (1902 ‑1968)<br />

Natural <strong>de</strong> Belmonte, BA<br />

1 a edição – 224 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1669‑9<br />

Desconhecido pela maioria do público leitor brasileiro,<br />

Sosígenes Costa foi um dos poetas <strong>mais</strong> importantes do sé‑<br />

culo XX. Jorge Amado, seu admirador incondicional, obser‑<br />

vou com argúcia que “poeta do mar, poeta do cacau, poeta<br />

social marcado por seu tempo, tão requintado e ao mesmo<br />

tempo tão popular, pois gran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong> sua obra se baseia<br />

na vida do povo e <strong>de</strong>la se alimenta – folclore, hábitos, expres‑<br />

sões, humanismo – ele ficará nas nossas letras como uma<br />

<strong>de</strong>ssas gran<strong>de</strong>s árvores isoladas que se <strong>de</strong>stacam na floresta”.<br />

Nascido em Belmonte, no sul da Bahia, Sosígenes pas‑<br />

sou a mocida<strong>de</strong> e parte da maturida<strong>de</strong> em Ilhéus, on<strong>de</strong><br />

trabalhou como telegrafista dos Correios e Telégrafos. Mu‑<br />

douse para o Rio <strong>de</strong> Janeiro na década <strong>de</strong> 1950, e ali publi‑<br />

cou o seu único livro, Obra poética (1959), consagrado<br />

com os Prêmios Paula Brito e Jabuti e com a admiração da<br />

crítica, numa época em que ainda havia crítica literária.<br />

Com uma remota origem no parnasianismo e no sim‑<br />

bolismo, a poesia <strong>de</strong> Sosígenes Costa é marcada, sobre‑<br />

tudo, pelo mo<strong>de</strong>rnismo, apesar do poeta se manter<br />

irredutível em relação a aspectos menosprezados pelos<br />

mo<strong>de</strong>rnistas, como o emprego da rima rica. Essa in<strong>de</strong>pen‑<br />

dência realça ainda <strong>mais</strong> a originalida<strong>de</strong> do poeta, brasilei‑<br />

ríssimo, mas com constantes alusões a castelos, duquesas<br />

e pavões. Este animal, com sua beleza requintada, foi uma<br />

das obsessões <strong>de</strong> Sosígenes, autor <strong>de</strong> uma série <strong>de</strong> “sone‑<br />

tos pavônicos”. Confira o início <strong>de</strong> “O primeiro soneto pa‑<br />

vônico”: “Foge a tar<strong>de</strong> entre o bando das gazelas./ A noite<br />

agora vem do precipício./ Sóis poentes, douradas aquare‑<br />

las!/ Mirabolantes fogos <strong>de</strong> artifício!/ Maravilhado assisto<br />

das janelas./ Os coqueiros, pavões <strong>de</strong> um rei fictício,/ abrem<br />

as caudas ver<strong>de</strong>s e amarelas,/ ante da tar<strong>de</strong> o rútilo suplí‑<br />

cio”, pequena amostra <strong>de</strong>ssa poesia personalíssima e forte,<br />

como a árvore solitária da floresta.<br />

M e l h o r e s P o e M a s


SOUSâNDRADE<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Adriano Espínola<br />

Sousândra<strong>de</strong> (1833 ‑1902)<br />

Natural <strong>de</strong> Alcântara, MA<br />

1 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1327 ‑8<br />

Joaquim <strong>de</strong> Sousa Andra<strong>de</strong>, que adotou o nome lite‑<br />

rário bizarro <strong>de</strong> Sousândra<strong>de</strong>, foi o gran<strong>de</strong> terremoto sub‑<br />

terrâneo da poesia brasileira no século XIX. Homem <strong>de</strong><br />

formação clássica rígida, íntimo da literatura grega e latina,<br />

sabedor <strong>de</strong> vários idiomas mo<strong>de</strong>rnos, meio boêmio, tinha<br />

o gosto tanto da aventura física como da intelectual. Via‑<br />

jante, percorreu a Europa e as Américas, formou ‑se em<br />

Letras pela Sorbonne, andou pelas terras dos incas e dos<br />

maias, viveu nos Estados Unidos; poeta, antecipou ‑se em<br />

quase meio século a algumas das gran<strong>de</strong>s inovações da li‑<br />

teratura oci<strong>de</strong>ntal, elaboradas por Ezra Pound e James<br />

Joyce, a partir da década <strong>de</strong> 1920.<br />

A crítica da época não tomou conhecimento do poeta<br />

exótico, vivendo isolado em São Luís do Maranhão, cons‑<br />

ciente da distância que o separava dos contemporâneos:<br />

“Ouvi dizer já por duas vezes que o Guesa errante será lido<br />

cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois; entristeci – <strong>de</strong>cepção <strong>de</strong> quem es‑<br />

creve cinquenta <strong>anos</strong> antes”, anotou.<br />

Como previra, sua obra só começou a ser avaliada a<br />

partir da década <strong>de</strong> 1950, com o re<strong>de</strong>scobrimento <strong>de</strong> sua<br />

originalida<strong>de</strong> e o reconhecimento <strong>de</strong> suas ousadias, como<br />

o plurilinguismo, os arranjos sonoros, a criação <strong>de</strong> palavras<br />

compostas e as sínteses metafóricas, “processos que só na<br />

atualida<strong>de</strong> passaram a ser <strong>de</strong>finitivamente aceitos e incor‑<br />

porados à linguagem poética” (Augusto <strong>de</strong> Campos). O<br />

reconhecimento trouxe a admiração; o estudo sistemático<br />

revelou a exata dimensão <strong>de</strong> sua poesia e afirmou sua po‑<br />

sição ímpar na evolução da literatura brasileira, como poeta<br />

admirável e precursor solitário.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

THIAGO DE MELLO<br />

Seleção e prefácio<br />

Marcos Fre<strong>de</strong>rico krüger<br />

Thiago <strong>de</strong> Mello (1926)<br />

Natural <strong>de</strong> Barreirinha, AM<br />

1 a edição – 304 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1<strong>39</strong>5‑7<br />

Um dos nomes <strong>mais</strong> importantes da chamada Gera‑<br />

ção <strong>de</strong> 45, Thiago <strong>de</strong> Mello ocupa um lugar à parte na‑<br />

quele grupo <strong>de</strong> poetas, cultores da “poesia do caos”. Em<br />

<strong>mais</strong> <strong>de</strong> cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>, o poeta amazonense<br />

construiu uma obra sem similar na literatura mo<strong>de</strong>rna bra‑<br />

sileira, regionalista e universal, libertária, criando o que<br />

Marcos Fre<strong>de</strong>rico, selecionador e prefaciador dos Melhores<br />

poemas Thiago <strong>de</strong> Mello, classifica <strong>de</strong> “utopia particular”.<br />

A utopia <strong>de</strong> Thiago começou a ser formulada a partir<br />

<strong>de</strong> 1951, com sua estreia em livro, com Silêncio e palavra,<br />

no qual predominam as preocupações existenciais e a in‑<br />

quietação com a passagem do tempo. O livro entusiasmou<br />

Álvaro Lins, que pediu aos principais poetas da época “um<br />

lugar, ao vosso lado”, para o estreante.<br />

A lenda da rosa (1956) assinalaria a superação da pri‑<br />

meira fase <strong>de</strong> Thiago e a transição para uma poesia <strong>de</strong><br />

preocupação social, aspirando ao amor e à igualda<strong>de</strong> entre<br />

os homens: pura utopia. A a<strong>de</strong>são <strong>de</strong>finitiva à poesia par‑<br />

ticipante se daria com Faz escuro mas eu canto (1965), no<br />

qual o poeta atenua a linguagem subjetiva para falar <strong>de</strong><br />

realida<strong>de</strong>s objetivas, <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m social. “Não se trata, nessa<br />

situação específica, <strong>de</strong> fazer prosa em versos, mas <strong>de</strong><br />

manter ‑se no fio da navalha da linguagem literária: fazer<br />

poesia política, sem <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> fazer, antes <strong>de</strong> tudo, Poe‑<br />

sia.”. (Marcos Fre<strong>de</strong>rico). No volume, figurava o poema<br />

<strong>mais</strong> famoso <strong>de</strong> Thiago, “Os estatutos do homem”, <strong>mais</strong><br />

tar<strong>de</strong> publicado em sucessivas edições in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes, no<br />

qual proclamava a sua utopia: “o lobo e o cor<strong>de</strong>iro pasta‑<br />

rão juntos/ e a comida <strong>de</strong> ambos terá o mesmo gosto <strong>de</strong><br />

aurora.”. A utopia se manteve ao longo <strong>de</strong> sua carreira,<br />

mesmo nos livros <strong>de</strong> feição regionalista, mas i<strong>de</strong>ntificados<br />

com o sonho <strong>de</strong> fraternida<strong>de</strong> e liberda<strong>de</strong>. Essa utopia é<br />

imortal.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

57


TOMÁS ANTÔNIO<br />

GONZAGA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Alexandre Eulalio<br />

Tomás Antônio Gonzaga (1744 ‑1810)<br />

Natural do Porto, Portugal<br />

5 a edição – 242 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0346 ‑1<br />

Marília <strong>de</strong> Dirceu, publicado em 1792, o livro <strong>de</strong> amor<br />

<strong>mais</strong> lido da língua portuguesa, conta em versos graciosos<br />

e gentis a história dos amores do poeta cinquentão Tomás<br />

Antônio Gonzaga e <strong>de</strong> sua noiva adolescente, Maria Doro‑<br />

téa Joaquina <strong>de</strong> Seixas, vivido no ambiente festeiro <strong>de</strong> Vila<br />

Rica, nos dias que antece<strong>de</strong>ram a Inconfidência Mineira.<br />

O livro tocou em cheio a sensibilida<strong>de</strong> do povo, as liras<br />

foram logo musicadas e cantadas “em serestas <strong>de</strong> esquinas e<br />

árias <strong>de</strong> salão, daí se espraiando pouco a pouco em mancha<br />

<strong>de</strong> óleo, no Reino e nos Domínios, dos serões <strong>de</strong> província aos<br />

<strong>mais</strong> remotos povoados da roça”, informa Alexandre Eulalio<br />

no prefácio aos Melhores poemas Tomás Antônio Gonzaga.<br />

O poema <strong>de</strong> amor <strong>de</strong> Dirceu e da bela Marília divi<strong>de</strong> ‑se em<br />

dois motivos: esperança e <strong>de</strong>silusão. O primeiro está expresso<br />

nos dias <strong>de</strong> alegria, quando os noivos planejam um futuro <strong>de</strong><br />

ventura, e o poeta, na <strong>de</strong>liciosa linguagem dos árca<strong>de</strong>s, insiste<br />

em amenizar a diferença <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>s, lembrando que não era<br />

um vaqueiro qualquer, mas um pastor <strong>de</strong> posses, e que se<br />

encontrava no vigor da força varonil: “Eu vi o meu semblante<br />

numa fonte:/ dos <strong>anos</strong> inda não está cortado;/ os pastores,<br />

que habitam este monte,/ respeitam o po<strong>de</strong>r do meu cajado”.<br />

Como se vê, sob o lirismo <strong>de</strong>licado do poeta pulsa um ero‑<br />

tismo ar<strong>de</strong>nte.Como o casamento tardasse, o poeta se in‑<br />

quieta e lembra à amada a fugacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tudo: “Minha bela<br />

Marília, tudo passa;/ A sorte <strong>de</strong>ste mundo é mal segura;/ Se<br />

vem <strong>de</strong>pois dos males a ventura,/ Vem <strong>de</strong>pois dos prazeres a<br />

<strong>de</strong>sgraça.”. Os versos eram proféticos. Descobertos os pl<strong>anos</strong><br />

<strong>de</strong> conspiração, preso o poeta, o <strong>de</strong>salento domina seus ver‑<br />

sos, escritos na prisão, mas ele procura se manter acima das<br />

<strong>de</strong>sgraças: “Eu tenho um coração maior que o mundo!”. Não<br />

tinha. Exilado em Moçambique, trata <strong>de</strong> se ajustar à nova si‑<br />

tuação, casa ‑se, mas nunca <strong>mais</strong> escreve versos <strong>de</strong> amor. A<br />

sauda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Marília talvez o impedisse.<br />

58<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

VICENTE DE CARVALHO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Cláudio Murilo Leal<br />

Vicente <strong>de</strong> Carvalho (1866 ‑1924)<br />

Natural do Santos, SP<br />

1 a edição – 190 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1063 ‑8<br />

Coedição ABL<br />

Os três mosqueteiros eram quatro: Athos, Porthos,<br />

Aramis e D’Artagnan. A famosa trinda<strong>de</strong> parnasiana –<br />

Olavo Bilac, Raimundo Correia, Alberto <strong>de</strong> Oliveira – tam‑<br />

bém podia ser quatro. Por mérito e justiça, Vicente <strong>de</strong><br />

Carvalho merecia ser o quarto mosqueteiro parnasiano. É<br />

bem verda<strong>de</strong> que ele não po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado um legítimo<br />

parnasiano. É <strong>mais</strong> um clássico, com notas escandalosa‑<br />

mente românticas e alguma surdina simbolista. Parnasiano<br />

apenas pelo rigor da forma, se bem que o seu verso seja<br />

<strong>mais</strong> fluido e musical. Mas se fosse um puro parnasiano...<br />

A resposta a essas reticências encontra ‑se num artigo<br />

provocador <strong>de</strong> Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, no qual, pedindo paciência<br />

à idolatria dos brasileiros, afirmava que Alberto <strong>de</strong> Oliveira e<br />

Olavo Bilac estavam “um <strong>de</strong>grau, um <strong>de</strong>grauzinho abaixo do<br />

Sr. Vicente <strong>de</strong> Carvalho”. Se conhecesse esse escrito, o poeta<br />

por certo o <strong>de</strong>saprovaria. Pelo menos <strong>de</strong> público. Des<strong>de</strong> sua<br />

estreia, com as Ar<strong>de</strong>ntias, em 1885 (tinha então <strong>de</strong>zenove<br />

<strong>anos</strong>), ele sempre se mostrou discreto quanto à glória. Após<br />

o segundo livro, Relicário (1888), converteu ‑se ao Positivismo,<br />

abandonando a ativida<strong>de</strong> poética. A volta foi em gran<strong>de</strong> es‑<br />

tilo. Poemas e canções (1908) teve um imenso sucesso <strong>de</strong><br />

crítica e <strong>de</strong> público, apesar do <strong>de</strong>sastroso prefácio <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s<br />

da Cunha, redimido pelos poemas admiráveis que se lhe se‑<br />

guem: o épico “Fugindo ao cativeiro”, o pungente “Peque‑<br />

nino morto”, a emoção amorosa <strong>de</strong>licada e contida <strong>de</strong> “Rosa,<br />

rosa <strong>de</strong> amor...”, os sonetos <strong>de</strong> sabor camoniano intitulados<br />

“Velho tema”, e <strong>mais</strong> “A ternura do mar”, “Cantigas praia‑<br />

nas”, “Sugestões do crepúsculo”, <strong>de</strong> temas ligados ao mar,<br />

<strong>de</strong> que o poeta foi o gran<strong>de</strong> cantor em nossa literatura. Fato<br />

raro para um livro <strong>de</strong> poemas, teve <strong>de</strong>z edições em quinze<br />

<strong>anos</strong>. É que o poeta, como enfatiza Cláudio Murilo Leal no<br />

prefácio aos Melhores poemas Vicente <strong>de</strong> Carvalho, tinha<br />

“um raro dom <strong>de</strong> fazer ‑se amado”.<br />

M e l h o r e s P o e M a s


WALMIR AyALA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Marco Lucchesi<br />

Walmir Ayala (1933 ‑1991)<br />

Natural <strong>de</strong> Porto Alegre, RS<br />

1 a edição – 280 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1271 ‑4<br />

Uma das vozes <strong>mais</strong> vivas e palpitantes da poesia bra‑<br />

sileira do século XX, Walmir Ayala está <strong>de</strong> volta às livrarias<br />

em seus Melhores poemas Walmir Ayala, com toda a sua<br />

inquietação e tensão, angústia e se<strong>de</strong> <strong>de</strong> absoluto: “E este<br />

medo, e esta glória/ <strong>de</strong> estar vivo, perigosamente vivo/ para<br />

a espada/ que mata para a vida eterna.”.<br />

Essa ânsia pelo eterno, em choque com a fugacida<strong>de</strong> do<br />

tempo, marca toda a poética <strong>de</strong> Ayala, expressa numa lingua‑<br />

gem <strong>de</strong> alta voltagem metafórica, rica <strong>de</strong> significados huma‑<br />

nos, repleta <strong>de</strong> obsessões e <strong>de</strong> musicalida<strong>de</strong>: “Estais na sombra<br />

como um círio,/ brilhas por teu olho <strong>de</strong> cristal/ como um acor<strong>de</strong><br />

brilha ao crepúsculo/ <strong>de</strong> um templo abandonado.”.<br />

Mas, como escreve Marco Lucchesi no prefácio à obra,<br />

essa é uma parte da torrente. “A par disso, há um Walmir<br />

apolíneo, do ritmo preciso e das figuras claras, das imagens<br />

diurnas e <strong>de</strong> sua respectiva geometria. Não existe nele uma<br />

separação ou uma contradição entre Apolo e Dionísio. Sua<br />

poesia se reveste <strong>de</strong>ssa condição ambígua, <strong>de</strong> oração e<br />

morte, do sacrifício cruento à sublimação, do corpo santo<br />

ao <strong>mais</strong> fúlgido erotismo”, apelos <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>nados a Deus e<br />

ao diabo: “Aqui está a vida, aqui está o caminho./ Aqui a<br />

porta das moradas,/ Vamos dormir ao pé do anjo implacá‑<br />

vel e imóvel,/ vamos sentir sua túnica roçar nos nossos<br />

olhos,/ vamos beber seu aroma <strong>de</strong> cisne transpirado, esta<br />

avalanche/ <strong>de</strong> mistério em pleno céu./ Aqui é a terra/ e <strong>de</strong><br />

senti ‑la cresceremos;/ e o que ensina/ a cada um dos que<br />

agora manipulam aços,/ transpõem barreiras e ingressam<br />

corporalmente no tempo, cada um/ que hoje interrompe<br />

Deus em seu <strong>de</strong>scanso”.<br />

A sua poesia inquieta, repleta <strong>de</strong> contradições huma‑<br />

nas, expressão da busca <strong>de</strong>sesperada do poeta por si mesmo,<br />

talvez interrompa também o <strong>de</strong>scanso divino. Mas, com cer‑<br />

teza, marca a ferro e fogo a sensibilida<strong>de</strong> dos leitores.<br />

M e l h o r e s P o e M a s<br />

59


C o l e ç ã o<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

DIREÇÃO<br />

EDLA VAN STEEN<br />

LUÍS MARTINS<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong> Ana Luísa Martins<br />

Luís Martins (1907 ­1981) – Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

MARINA COLASANTI<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong> Marisa Lajolo<br />

Marina Colasanti (1937) – Natural da Asmara, Etiópia<br />

ODyLO COSTA FILHO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong> Cecilia Costa<br />

Odylo Costa Filho (1941 ­1979) – Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />

RODOLFO kONDER<br />

Rodolfo kon<strong>de</strong>r (1938) – Natural <strong>de</strong> Natal, RN<br />

RUBEM BRAGA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong> Carlos Ribeiro<br />

Rubem Braga (1913 ­1990) – Natural <strong>de</strong> Cachoeiro <strong>de</strong><br />

Itapemirim, ES<br />

60<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s P r e l o<br />

Os nomes <strong>mais</strong> <strong>de</strong>stacados da literatura brasileira e<br />

suas crônicas <strong>mais</strong> elaboradas foram reunidos pela<br />

<strong>Global</strong> <strong>Editora</strong> para fazerem parte do universo da<br />

coleção Melhores Crônicas. Dirigida pela escritora<br />

Edla van Steen e tendo seus textos escolhidos e pre‑<br />

faciados por gran<strong>de</strong>s estudiosos da obra <strong>de</strong> cada<br />

autor, essa coleção irá enriquecer ainda <strong>mais</strong> o estu‑<br />

dioso ou o leitor que busca na literatura uma viagem<br />

<strong>de</strong> conhecimento e encanto. Cada obra apresenta<br />

biografia, bibliografia e estudo introdutório sobre o<br />

autor. Lançados Olavo Bilac, Roberto Drummond e<br />

Sérgio Milliet, encontram ‑se em andamento nomes<br />

como Luís Martins, Marina Colasanti e Raul Pompeia,<br />

entre outros, que não po<strong>de</strong>m faltar em sua estante.


AFFONSO ROMANO<br />

DE SANT’ANNA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Letícia Malard<br />

Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna (1937)<br />

Natural <strong>de</strong> Belo Horizonte, MG<br />

1 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0833 ‑1<br />

Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna acredita no po<strong>de</strong>r má‑<br />

gico da crônica interferir no cotidiano, mudar a cabeça dos<br />

homens, contribuir para um mundo melhor, com <strong>mais</strong><br />

amor e menos ódio, <strong>mais</strong> entendimento e menos precon‑<br />

ceito. O efêmero é o seu elemento, mas como o efêmero<br />

do mundo se torna permanente, <strong>de</strong> tão repetido (mudam<br />

os personagens, o drama continua o mesmo), a sabedoria<br />

do cronista consiste em dar um toque <strong>de</strong> eternida<strong>de</strong> àquilo<br />

que é fugaz por sua própria natureza.<br />

Aos olhos do cronista – o “doente <strong>de</strong> seu tempo”, como<br />

o <strong>de</strong>finiu Affonso –, qualquer acontecimento é digno, “as po‑<br />

bres ocorrências <strong>de</strong> nada, a velha anedota, o sopapo casual, o<br />

furto, a facada anônima, a estatística mortuária, as tentativas<br />

<strong>de</strong> suicídio, o cocheiro que foge, o noticiário em suma”, como<br />

sintetizou Machado <strong>de</strong> Assis há <strong>mais</strong> <strong>de</strong> cem <strong>anos</strong>.<br />

Esses fatos miúdos, e outros característicos <strong>de</strong> nossos dias<br />

(a bandidagem, a violência, a corrupção, a selvageria crescente<br />

das guerras políticas e do cotidiano), estão presentes nas crô‑<br />

nicas <strong>de</strong> Affonso, mas o que nelas predomina é uma preocu‑<br />

pação quase obsessiva com a beleza, o amor e as mulheres. A<br />

propósito, leiam ‑se as crônicas “O surgimento da beleza”,<br />

“Amor, o interminável aprendizado” e “O que querem as mu‑<br />

lheres?”. Como se vê, o cronista sabe fisgar o leitor <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />

título (“De que ri a Mona Lisa”; “Casada, amando outro”;<br />

“Mistérios Gozosos”, entre outros). A sedução se acentua na<br />

frase inicial da crônica, sintética e instigante. Alguns exemplos:<br />

“A corrupção não é uma invenção brasileira”; “O surgimento<br />

da beleza paralisa tudo”; “Sei que as pessoas estão pulando<br />

na jugular uma das outras”.Testemunha <strong>de</strong> sua época, “escre‑<br />

vendo para o seu tempo”, o cronista ‑poeta Affonso Romano<br />

<strong>de</strong> Sant’Anna, como acentua Letícia Malard no prefácio às<br />

Melhores crônicas Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna, “escreve<br />

para muito além dos horizontes do seu tempo”.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

ÁLVARO MOREyRA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Mario Moreyra<br />

Álvaro Moreyra (1888 ‑1964)<br />

Natural <strong>de</strong> Porto Alegre, RS<br />

1 a edição – 336 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1<strong>39</strong>8 ‑8<br />

Álvaro Moreyra <strong>de</strong>finiu o espírito <strong>de</strong> suas crônicas no<br />

título <strong>de</strong> seu livro <strong>mais</strong> famoso: As amargas, não... Cronista<br />

e poeta dos aspectos agradáveis da vida, senhor <strong>de</strong> uma<br />

prosa sedutora e leve, que <strong>de</strong>stila malícia, humor, lirismo,<br />

ternura, <strong>de</strong>ixou marcas in<strong>de</strong>léveis na geração posterior <strong>de</strong><br />

escritores.<br />

Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> confessava a sua “in‑<br />

fluência enorme e profunda. Aliás, visível não apenas em<br />

mim, mas em todo um grupo <strong>de</strong> rapazes da minha ida<strong>de</strong>.”.<br />

O poeta <strong>de</strong> Claro enigma consi<strong>de</strong>rava tal influência “um<br />

bem, na medida em que me preservou do mau gosto rei‑<br />

nante no período imediatamente anterior ao mo<strong>de</strong>rnismo”.<br />

Her<strong>de</strong>iro do simbolismo, com o qual a sua sensibili‑<br />

da<strong>de</strong> se afinava, Álvaro Moreyra publicou o primeiro livro<br />

<strong>de</strong> crônicas em 1915, com o título significativo <strong>de</strong> Um sor‑<br />

riso para tudo... Tornou ‑se logo um cronista popular,<br />

atento às surpresas do cotidiano, que recriava em textos<br />

curtos e concisos, repletos <strong>de</strong> diálogos maliciosos, reunidos<br />

em O outro lado da vida e A cida<strong>de</strong> mulher. Este, um pas‑<br />

seio impressionista e lírico pelo Rio <strong>de</strong> Janeiro, cida<strong>de</strong> que<br />

amou com meiguice e sensualida<strong>de</strong>, como um tempera‑<br />

mento <strong>de</strong>licado ama uma mulher.<br />

Em seu livro <strong>mais</strong> famoso, As amargas, não..., cronista<br />

e memorialista se confun<strong>de</strong>m na recriação do passado,<br />

“num fluxo <strong>de</strong> consciência, às vezes caótico, reutilizando,<br />

em alguns momentos, crônicas antigas que tocam suas<br />

lembranças, tudo isso organizado numa relativa ou falsa<br />

cronologia”, permitindo uma leitura reversível, “aos peda‑<br />

ços, <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>nadamente, sem sequência”, como acentua<br />

Mario Moreyra no prefácio. O memorialista predomina<br />

também nas crônicas <strong>de</strong> Havia uma oliveira no jardim, úl‑<br />

timo livro publicado em vida pelo autor, testamento lírico<br />

<strong>de</strong> um discreto apaixonado pela vida, sempre com um sor‑<br />

riso para tudo.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

61


ARTUR AZEVEDO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Orna Messer Levin e Larissa <strong>de</strong><br />

Oliveira Neves<br />

Artur Azevedo (1855 ‑1908)<br />

Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />

1 a edição – 384 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1670 ‑5<br />

Artur Azevedo foi um escritor prolífico. Contista, poeta<br />

e o autor teatral <strong>mais</strong> popular <strong>de</strong> sua época, escrevia com<br />

graça e leveza. Como cronista <strong>de</strong>ixou uma obra imensa: <strong>mais</strong><br />

<strong>de</strong> 4 mil crônicas esparsas em jornais, revistas e almanaques,<br />

conhecidas por um número restrito <strong>de</strong> especialistas e pesqui‑<br />

sadores, que retratam com bom humor e alguma ironia o<br />

cotidiano da vida brasileira e, sobretudo, o dia a dia carioca.<br />

Muito <strong>de</strong>sse material, ou sua maior parte, foi publi‑<br />

cado com pseudônimos diversos, que por si só já <strong>de</strong>finiam<br />

o espírito das crônicas: Elói, o herói, Gavroche (assim era<br />

chamado o moleque parisiense, tipo muito popular no sé‑<br />

culo XIX), X.Y.Z. e Frivolino. A leveza <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> con‑<br />

versa <strong>de</strong> rua, informal e brincalhona, contrastava com a<br />

serieda<strong>de</strong>, quase sisu<strong>de</strong>z, <strong>de</strong> jornais como O País, Diário <strong>de</strong><br />

Notícias, Correio do Povo e A Notícia, em cujas primeiras<br />

páginas eram publicadas.<br />

O tom era leve, mas o assunto, muitas vezes, era da<br />

maior gravida<strong>de</strong>, relacionado com o cotidiano da cida<strong>de</strong>,<br />

como a iluminação e calçamento da Rua do Ouvidor, o pro‑<br />

blema das enchentes <strong>de</strong> abril (dizia ‑se então “abril, águas<br />

mil”) e seu péssimo escoamento, a carestia dos aluguéis,<br />

muitas vezes em habitações <strong>de</strong> péssima qualida<strong>de</strong>, o que<br />

leva o cronista a concluir que “no Rio <strong>de</strong> Janeiro eu não<br />

conheço nada <strong>mais</strong> caro do que uma casa barata”. Outros<br />

temas são típicos da época, como a onda <strong>de</strong> suicídios que<br />

abalou a cida<strong>de</strong> ou a prática <strong>de</strong> mofinas (escrito publicado<br />

na imprensa difamando ou caluniando uma pessoa, sem‑<br />

pre sobre a proteção do anonimato), fatos que revoltavam<br />

o cronista e o faziam per<strong>de</strong>r o seu habitual bom humor.<br />

Leves e breves, as crônicas <strong>de</strong> Artur Azevedo mantêm<br />

a mesma sedução <strong>de</strong> quando foram publicadas na im‑<br />

prensa, com o valor adicional <strong>de</strong> serem hoje um valioso<br />

subsídio para a compreensão da vida carioca no final do<br />

século XIX e início do XX.<br />

62<br />

Capa<br />

Nova<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

AUSTREGÉSILO DE<br />

ATHAyDE<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Murilo Melo Filho<br />

Austregésilo <strong>de</strong> Athay<strong>de</strong> (1898 ‑1993)<br />

Natural <strong>de</strong> Caruaru, PE<br />

1 a edição – 368 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1279 ‑0<br />

Durante <strong>mais</strong> <strong>de</strong> sessenta <strong>anos</strong>, Austregésilo <strong>de</strong><br />

Athay<strong>de</strong> escreveu crônicas diárias, acompanhando e anali‑<br />

sando o que ocorria no país e no mundo, no plano político<br />

e social. Essa produção fantástica, <strong>de</strong> milhares e milhares<br />

<strong>de</strong> páginas, não retrata apenas uma fase conturbada da<br />

história do mundo, mas mostra um cronista participante,<br />

crítico, <strong>de</strong>nunciando com ironia ou veemência, quando tal<br />

se fazia preciso, um “íntimo da História contemporânea”,<br />

como o chamou Eduardo Portela, e “um profeta do seu<br />

tempo”, como ele costumava <strong>de</strong>finir o jornalista.<br />

Como profeta <strong>de</strong> seu tempo e testemunha da história,<br />

“pintou um painel abrangente, focalizando personagens da<br />

cena internacional: o libanês Charles Malek, o soviético Ivan<br />

Pavlov, a americana Eleanor Roosevelt e o francês René Cas‑<br />

sin, com os quais escreveu, durante a III Assembleia Geral da<br />

ONU, realizada em Paris, a Declaração Universal dos Direitos<br />

do Homem”, conforme lembra Murilo Melo Filho no prefá‑<br />

cio às Melhores crônicas Austregésilo <strong>de</strong> Athay<strong>de</strong>.<br />

Mas a visão e a paixão do cronista não se limitavam<br />

aos horizontes cotidi<strong>anos</strong>, ao <strong>de</strong>sconcerto do mundo.<br />

Homem <strong>de</strong> formação clássica, gran<strong>de</strong> conhecedor da lite‑<br />

ratura grega, leitor constante <strong>de</strong> Platão e Aristóteles, apai‑<br />

xonado por Renan, a<strong>de</strong>pto do liberalismo, Athay<strong>de</strong> gostava<br />

<strong>de</strong> nadar naquelas águas eternamente revigorantes e re‑<br />

frescantes que jorram das fontes da cultura humanística.<br />

Dessa forma, muitas <strong>de</strong> suas crônicas são <strong>de</strong>dicadas a<br />

livros e escritores, analisam obras recém ‑lançadas, <strong>de</strong>batem<br />

problemas culturais, lembram figuras que conheceu no co‑<br />

tidiano e <strong>de</strong> leitura, <strong>de</strong> João Ribeiro a Shakespeare, <strong>de</strong> Sin‑<br />

clair Lewis a Otto Lara Resen<strong>de</strong>, <strong>de</strong> François Mauriac a Lima<br />

Barreto, evocados ora com ternura, ora com admiração,<br />

mas sempre com a paixão que caracterizava tudo o que<br />

Athay<strong>de</strong> escrevia.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s


CECÍLIA MEIRELES<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Leo<strong>de</strong>gário A. <strong>de</strong> Azevedo Filho<br />

Cecília Meireles (1901 ‑1964)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

1 a edição – 384 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0857 ‑1<br />

Os leitores que conhecem Cecília Meireles apenas como<br />

poeta, não sabem o que per<strong>de</strong>m ignorando suas crônicas. In‑<br />

sinuante, persuasiva, lírica, suave, feminina, sempre e sempre<br />

poeta, <strong>de</strong> uma leveza <strong>de</strong> pena dançando no ar, por vezes in‑<br />

dignada com o <strong>de</strong>sconcerto do mundo ou as travessuras dos<br />

hum<strong>anos</strong>, a cronista é um caso <strong>de</strong> amor à primeira leitura.<br />

Como em toda relação amorosa autêntica, sobretudo<br />

em sua fase inicial, a cronista está sempre surpreen<strong>de</strong>ndo,<br />

com uma frase feliz, uma colocação inusitada, um piscar <strong>de</strong><br />

olhos brejeiro. No fundo <strong>de</strong>sse mundo amável, porém, há<br />

um certo <strong>de</strong>sencanto diante da vida, quando então se<br />

impõe “a sua tendência para o recolhimento espiritual,<br />

com leve toque <strong>de</strong> melancolia ou <strong>de</strong>sencanto, para não<br />

dizer <strong>de</strong> renúncia e a<strong>de</strong>us”, como observa Leo<strong>de</strong>gário A.<br />

<strong>de</strong> Azevedo no prefácio.<br />

O <strong>de</strong>slumbramento diante do espetáculo do mundo,<br />

porém, predomina nessas crônicas, divididas em três par‑<br />

tes: crônicas em geral, <strong>de</strong> viagem e <strong>de</strong> educação. Que cada<br />

um escolha a sua praia, <strong>de</strong> acordo com as suas tendências,<br />

para iniciar a viagem. Há <strong>de</strong> tudo para todos os gostos:<br />

acontecimentos, impressões – por vezes aproximando ‑se<br />

do conto –, lembranças da infância, reflexões sobre senti‑<br />

mentos, como a cólera ou a bomba atômica. As crônicas<br />

<strong>de</strong> viagem contam fatos vistos, vividos ou sentidos em vá‑<br />

rias partes do mundo (Cecília foi uma gran<strong>de</strong> viajante),<br />

quando não tocam na própria alma <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> ou país.<br />

Vejam ‑se as admiráveis “Evocação lírica <strong>de</strong> Lisboa” e “Ho‑<br />

landa em flor”. Nas crônicas sobre educação Cecília dá<br />

expansão à educadora que havia <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>la (foi profes‑<br />

sora a vida toda), consciente, sem ja<strong>mais</strong> per<strong>de</strong>r a ternura<br />

ou aborrecer o leitor, traçando pequenos quadros palpitan‑<br />

tes <strong>de</strong> vida. Quadros talvez não. São <strong>mais</strong> aquarelas, <strong>de</strong> tons<br />

suaves, traços finos. Resistir, quem há ‑<strong>de</strong>?<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

COELHO NETO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Ubiratan Machado<br />

Coelho Neto (1864 ‑1934)<br />

Natural <strong>de</strong> Caxias, MA<br />

1 a edição – 288 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1126 ‑7<br />

Conhecido sobretudo como romancista e contista,<br />

Coelho Neto <strong>de</strong>ixou uma vasta produção <strong>de</strong> crônicas<br />

(calcula ‑se em <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 8 mil), testemunho palpitante da<br />

vida brasileira nos últimos vinte <strong>anos</strong> do século XIX e nas<br />

três primeiras décadas do século XX. Atento ao cotidiano –<br />

sem abrir mão <strong>de</strong> sua tendência pelo insólito e o excepcio‑<br />

nal –, o cronista soube acompanhar com olhar implacável,<br />

ora <strong>de</strong>siludido, ora compreensivo, mas sempre com graça,<br />

as rapidíssimas transformações que o mundo atravessava e<br />

como estas chegavam e se impunham no Brasil, ou melhor,<br />

no Rio <strong>de</strong> Janeiro.<br />

É para a terra carioca, com seus esplendores e maze‑<br />

las, que o escritor dirige <strong>de</strong> preferência a sua câmera para<br />

fixar múltiplos aspectos da vida da cida<strong>de</strong>: a jogatina, a<br />

exploração religiosa da carida<strong>de</strong> pública, a vida nos corti‑<br />

ços, as conquistas femininas, a paixão pelo futebol. Defen‑<br />

sor do esporte, Coelho Neto foi o primeiro escritor brasileiro<br />

a incluir o futebol em sua obra, como uma ativida<strong>de</strong> nobre<br />

e educativa, além <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a prática da capoeira como<br />

um excelente exercício para a eugenia da raça.<br />

I<strong>de</strong>alismo <strong>de</strong> um lado, crítica incisiva <strong>de</strong> outro, em par‑<br />

ticular à socieda<strong>de</strong> brasileira, que o cronista consi<strong>de</strong>rava<br />

omissa, apática, indiferente aos valores do espírito, sem<br />

amor à pátria, submissa ao pensamento estrangeiro. É pois<br />

com orgulho e reverência, que <strong>de</strong>screve conquistas da<br />

nossa socieda<strong>de</strong> ou façanhas notáveis <strong>de</strong> brasileiros, como<br />

se comprova nas belas crônicas <strong>de</strong>dicadas ao 13 <strong>de</strong> Maio e<br />

aos primeiros voos <strong>de</strong> Santos Dumont.<br />

Apesar <strong>de</strong> recheadas <strong>de</strong> referências à história, à mito‑<br />

logia greco ‑romana e ao mundo bíblico, as crônicas <strong>de</strong><br />

Coelho Neto têm uma visão mo<strong>de</strong>rna da vida e do mundo<br />

que reserva surpresas agradáveis ao leitor atual.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

63


EUCLIDES DA CUNHA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Marco Lucchesi<br />

Eucli<strong>de</strong>s da Cunha (1866 ‑1909)<br />

Natural <strong>de</strong> Cantagalo, RJ<br />

1 a edição – 248 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1552 ‑4<br />

A obra ‑prima imensa que se chama Os sertões <strong>de</strong>ixou<br />

na sombra uma boa parte da obra <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s da Cunha.<br />

Como as suas crônicas, <strong>de</strong>sconhecidas do público e,<br />

mesmo, <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> intelectuais. Um pecado.<br />

Vibrantes, admirativas ou contestadoras, por vezes franca‑<br />

mente hostis (como a <strong>de</strong>dicada aos críticos da época), ou<br />

reverenciosas (“Heróis <strong>de</strong> ontem”), elas traduzem a perma‑<br />

nente preocupação do gran<strong>de</strong> escritor com os problemas<br />

brasileiros e a sua visão muito peculiar, corajosa e inova‑<br />

dora do país. Como observa Marco Lucchesi na apresenta‑<br />

ção, elas constituem “uma incessante releitura do Brasil”.<br />

Claro que essa releitura se processa em muitos níveis.<br />

Razão pela qual, ampliando o conceito <strong>de</strong> crônica, para<br />

ajustá ‑lo à mensagem peculiar <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s, o organizador<br />

incluiu no presente volume, ao lado <strong>de</strong> trabalhos publica‑<br />

dos na imprensa, com estrutura e característica <strong>de</strong> uma<br />

crônica autêntica, fragmentos <strong>de</strong> Os sertões, consi<strong>de</strong>rados<br />

como a gran<strong>de</strong> crônica <strong>de</strong> uma tragédia. Assim, o leitor<br />

terá ocasião <strong>de</strong> conhecer, ou reler, trechos antológicos clás‑<br />

sicos que, isolados do todo – daquele tropel que arrasta o<br />

leitor, tirando ‑lhe a respiração –, nos permitem saborear<br />

com <strong>mais</strong> vagar o estouro da boiada, a inesquecível e pre‑<br />

conceituosa abordagem da figura do Antonio Conselheiro,<br />

lances <strong>de</strong> combate, as mortes <strong>de</strong> Moreira César e do Con‑<br />

selheiro, a visão piedosa dos sertanejos vencidos, uma su‑<br />

cessão <strong>de</strong> quadros que se i<strong>de</strong>ntificam com o conceito <strong>de</strong><br />

crônica <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s, “misturada com o ensaio e a poesia”,<br />

como observa o apresentador, mas que, sobretudo, trans‑<br />

mitem uma po<strong>de</strong>rosa sensação <strong>de</strong> vida.<br />

64<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

FERREIRA GULLAR<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Augusto Sérgio Bastos<br />

Ferreira Gullar (1930)<br />

Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />

1 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0948 ‑6<br />

O poeta Ferreira Gullar cultiva a crônica com a natura‑<br />

lida<strong>de</strong> <strong>de</strong> quem abre uma janela, estica o pescoço e se<br />

<strong>de</strong>bruça para conversar com o leitor, entretê ‑lo, assustá ‑lo<br />

ou ameaçá ‑lo. Susto e ameaça andam juntos, por exemplo,<br />

quando diz que se amedronta diante das afirmações <strong>de</strong><br />

que a crônica é um gênero seríssimo. Pura brinca<strong>de</strong>ira, logo<br />

<strong>de</strong>smentida pela sua prosa leve, espontânea, sem cerimô‑<br />

nia, uma espécie <strong>de</strong> bate ‑papo <strong>de</strong>scontraído com um<br />

amigo, o que não significa fugir da raia, se esquivar a temas<br />

sérios ou seriamente fúteis. Um caso sério.<br />

O namoro com a crônica começou em 1950, no Mara‑<br />

nhão, e prosseguiu, <strong>de</strong> maneira esporádica e quase jocosa, na<br />

revista Manchete, no Rio <strong>de</strong> Janeiro. Gullar, em algumas oca‑<br />

siões, substituiu Rubem Braga, o sabiá da crônica, assinando<br />

os trabalhos com as iniciais R. B. Podia não ser um sabiá, mas<br />

já cantava como um pássaro profissional. Mas foi no Jornal do<br />

Brasil, no período <strong>de</strong> 1957 ‑1962, que <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ser um bis‑<br />

sexto para se entregar ao exercício periódico do gênero.<br />

Exercício magnífico, no qual o cronista aguçava todas<br />

as qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> observador atento à realida<strong>de</strong> cotidiana,<br />

dos fatos políticos que afetam o povo e o país aos casos<br />

banais, seus preferidos, aliás, com os quais, com humor e<br />

simpatia, escreve as suas melhores crônicas. A simpatia hu‑<br />

mana, numa outra perspectiva, está presente também nas<br />

crônicas em que aborda assuntos “<strong>de</strong>sagradáveis”: as mi‑<br />

sérias do povo, a exploração econômica, a opressão. O<br />

cronista parece então se transfigurar, sem papas na língua,<br />

mas sem ja<strong>mais</strong> per<strong>de</strong>r a elegância, solta a voz com a elo‑<br />

quência e a indignação <strong>de</strong> um profeta bíblico, como se<br />

po<strong>de</strong> constatar em “A multinacional corrupção”. As Me‑<br />

lhores crônicas Ferreira Gullar abrangem um período <strong>de</strong><br />

quase cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um cronista atento à<br />

realida<strong>de</strong> dos hum<strong>anos</strong> e à sua infindável comédia.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s


GUSTAVO CORÇÃO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Luiz Paulo Horta<br />

Gustavo Corção (1896 ‑1978)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

1 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1127 ‑4<br />

Gustavo Corção tinha o espírito e a impetuosida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

um cruzado. Católico tradicionalista, passou a vida polemi‑<br />

zando. Gostava <strong>de</strong> brigar ou, pelo menos, não se recusava<br />

ao combate, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que contrariado em suas convicções.<br />

Em especial, as convicções religiosas e políticas. Crítico da<br />

Igreja, <strong>de</strong>vido às resoluções adotadas no Concílio Vaticano<br />

II, e <strong>de</strong>fensor do regime militar imposto ao país, a partir <strong>de</strong><br />

1964, tornou ‑se uma espécie <strong>de</strong> símbolo <strong>de</strong> tudo que havia<br />

<strong>de</strong> <strong>mais</strong> reacionário, um escritor “maldito”, no sentido<br />

<strong>mais</strong> agressivo da palavra, a maldição que nasce da intran‑<br />

sigência e da intolerância.<br />

Tudo isso, hoje, é história. Mas as atitu<strong>de</strong>s e a figura<br />

contraditória do pensador continuam palpitantes e provo‑<br />

cativas, e como tal contestadas com veemência. O que<br />

ninguém contesta é a alta qualida<strong>de</strong> da obra literária cons‑<br />

truída por Corção, os ensaios e romances, entre os quais<br />

sobressai uma das obras ‑primas da ficção brasileira, Lições<br />

<strong>de</strong> abismo.<br />

No mesmo nível <strong>de</strong> feitura literária admirável, en con‑<br />

tra ‑se a obra do cronista, que durante décadas colaborou na<br />

imprensa, irritando, provocando, <strong>de</strong>spertando ódios e pro‑<br />

testos. Uma parte <strong>de</strong>ssa colaboração encontra ‑se reunida<br />

nas Melhores crônicas Gustavo Corção, que <strong>de</strong>svendam<br />

como no polemista extremo coexistia um homem sensível,<br />

apaixonado pela sua cida<strong>de</strong> e observador arguto <strong>de</strong> hábitos<br />

e costumes da época. Ou seja, como observa Luiz Paulo<br />

Horta no prefácio, “po<strong>de</strong>m ‑se distinguir diversos Corções:<br />

o memorialista quase lírico na evocação <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> e <strong>de</strong><br />

um país que não existem <strong>mais</strong>; o observador do dia a dia,<br />

capaz <strong>de</strong> transformar em crônicas saborosas; o polemista,<br />

que podia ser engraçado quando não estava nos seus dias<br />

<strong>mais</strong> azedos; e o escritor <strong>de</strong> temas religiosos, em que ele<br />

<strong>de</strong>scia fundo na meditação sobre as gran<strong>de</strong>s figuras do cris‑<br />

tianismo, como sua amada Catarina <strong>de</strong> Sena”.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

HUMBERTO DE<br />

CAMPOS<br />

Seleção e prefácio<br />

Gilberto Araújo<br />

Humberto <strong>de</strong> Campos (1886 ‑1934)<br />

Natural <strong>de</strong> Miritiba, MA<br />

1 a edição – 352 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1<strong>39</strong>9 ‑5<br />

Coedição ABL<br />

Na década <strong>de</strong> 1920 e início dos <strong>anos</strong> 1930, Humberto<br />

<strong>de</strong> Campos era o escritor <strong>mais</strong> lido e popular do Brasil. Suas<br />

crônicas, publicadas na imprensa carioca, eram transcritas<br />

em jornais <strong>de</strong> todo o país, os seus livros, best ‑sellers abso‑<br />

lutos entre os autores nacionais. Na admiração popular, ele<br />

só tinha um concorrente direto, o Conselheiro X.X., mali‑<br />

cioso, contador <strong>de</strong> histórias <strong>de</strong> alcova e piadas <strong>de</strong> fazer<br />

corar os <strong>mais</strong> pudicos, pseudônimo que encobria o próprio<br />

Humberto.<br />

Escritor i<strong>de</strong>ntificado com a imprensa em <strong>de</strong>dicação<br />

diária, com incursões pelo memorialismo (Memórias é con‑<br />

si<strong>de</strong>rado seu melhor livro) e a crítica, foi sobretudo na crô‑<br />

nica que ele <strong>de</strong>ixou a marca inconfundível <strong>de</strong> seu talento:<br />

um texto repleto <strong>de</strong> referências literárias, históricas e mito‑<br />

lógicas, sobretudo ao mundo greco ‑romano, um estilo pre‑<br />

ciso e elegante, <strong>de</strong> influência clássica, um certo moralismo<br />

e comoção diante das mazelas da vida.<br />

Mesmo com as mudanças no gosto do público, apon‑<br />

tadas e influenciadas pela eclosão do Mo<strong>de</strong>rnismo, o escritor<br />

maranhense continuou lí<strong>de</strong>r absoluto na vendagem <strong>de</strong> livros<br />

no Brasil, o preferido <strong>de</strong> José Olympio que, a partir <strong>de</strong> certa<br />

época, se tornou seu editor exclusivo.<br />

A popularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Humberto só <strong>de</strong>clinou após sua<br />

morte, em 1934, propondo um problema, como observa<br />

Gilberto Araújo <strong>de</strong> Vasconcelos no prefácio às Melhores<br />

crônicas Humberto <strong>de</strong> Campos. Como, num país que cul‑<br />

tiva ídolos, a obra <strong>de</strong> um escritor <strong>de</strong> origem humil<strong>de</strong> “que<br />

terminou imortal da Aca<strong>de</strong>mia, atingindo vendagem estra‑<br />

tosférica para o Brasil, permanece obscurecida na história<br />

<strong>de</strong> nossa literatura. Ainda <strong>mais</strong> se pensarmos que o que ata<br />

as duas pontas da vida <strong>de</strong> Humberto é o trabalho, outro<br />

mito nacional”?<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

65


IGNÁCIO DE LOyOLA<br />

BRANDÃO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Cecilia Almeida Salles<br />

Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão (1936)<br />

Natural <strong>de</strong> Araraquara, SP<br />

1 a edição – 416 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0920 ‑6<br />

O cronista Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão mantém um<br />

caso <strong>de</strong> amor e ressentimento com a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo.<br />

Como em toda relação <strong>de</strong>sse tipo, a ternura convive com a<br />

irritação, as palavras <strong>de</strong> carinho po<strong>de</strong>m se transformar em<br />

setas envenenadas, cheias <strong>de</strong> queixas, os pequenos proble‑<br />

mas do cotidiano costumam se sobrepor aos gran<strong>de</strong>s sa‑<br />

fanões que a vida dá a cada um, apaixonado ou não. São<br />

Paulo é o gran<strong>de</strong> personagem do cronista.<br />

E assim foi <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que esse paulista <strong>de</strong> Araraquara, jorna‑<br />

lista <strong>de</strong> profissão, chegou a São Paulo, no longínquo ano <strong>de</strong><br />

1957. Autor <strong>de</strong> romances <strong>de</strong> sucesso, com <strong>mais</strong> <strong>de</strong> quarenta<br />

livros publicados e <strong>mais</strong> <strong>de</strong> um milhão <strong>de</strong> volumes vendidos,<br />

po<strong>de</strong> ‑se dizer que é na crônica que Ignácio <strong>de</strong> Loyola expressa<br />

com <strong>mais</strong> veemência as suas opiniões e reações, ou, pelo<br />

menos, aquelas opiniões e reações nascidas do atrito diário com<br />

a vida e a cida<strong>de</strong> que escolheu para viver, amar e se irritar.<br />

Claro que o cronista, homem viajado, conhecendo<br />

muitas cida<strong>de</strong>s, gosta também <strong>de</strong> contar as suas vivências,<br />

encantamentos e <strong>de</strong>cepções vividas no exterior. Mas, em<br />

cada uma das crônicas, situadas longe do ar poluído da<br />

Pauliceia, parece que se ouve sempre, numa surdina elo‑<br />

quente, a voz <strong>de</strong> São Paulo. É uma fatalida<strong>de</strong> abençoada<br />

pelos leitores que, <strong>de</strong>ssa forma, através da prosa limpa e<br />

clara do cronista, têm oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> juntar ao prazer<br />

com a leitura do texto o prazer <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobrir e saborear<br />

aspectos da sua cida<strong>de</strong>. Ignácio <strong>de</strong> Loyola <strong>de</strong>la nos dá um<br />

retrato <strong>de</strong> corpo inteiro, <strong>de</strong>nunciando as suas mazelas (o<br />

barulho permanente, as ruas esburacadas, o trânsito caó‑<br />

tico) e os aspectos agradáveis: as incursões pelos sebos, os<br />

prazeres gastronômicos e a re<strong>de</strong>nção <strong>de</strong> todas as irritações<br />

e protestos, quando o cronista, do alto <strong>de</strong> seu apartamento,<br />

lava os olhos nas cores da aurora e se reconcilia com a sua<br />

cida<strong>de</strong>. Amor e ressentimento.<br />

66<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

IVAN ANGELO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Humberto Werneck<br />

Ivan Angelo (1936)<br />

Natural <strong>de</strong> Barbacena, MG<br />

1 a edição – 336 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1187 ‑8<br />

O escritor autêntico está sempre oferecendo surpre‑<br />

sas. Agradáveis, obviamente. Um dos <strong>mais</strong> importantes<br />

romancistas da literatura brasileira contemporânea, com<br />

audiência internacional, dono <strong>de</strong> um texto exemplar, Ivan<br />

Angelo ocupa também um lugar <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque na crônica<br />

brasileira atual. Surpresa? Para muitos leitores, sim.<br />

É que o cronista Ivan Angelo, durante algum tempo,<br />

atuou sobretudo em publicações regionais e numa ativida<strong>de</strong><br />

<strong>mais</strong> ou menos bissexta. A partir <strong>de</strong> 1999 passou a ocupar<br />

uma página quinzenal na revista Veja SP, <strong>de</strong> circulação res‑<br />

trita à cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo. Dessa forma, a publicação das<br />

Melhores crônicas Ivan Angelo irá surpreen<strong>de</strong>r a muito leitor,<br />

pelo Brasil a fora, revelando um cronista ágil, bem ‑humorado<br />

(o velho humor mineiro), mas sobretudo muito envolvente,<br />

<strong>de</strong>sses que pren<strong>de</strong>m o leitor pelo título, aumentam seu inte‑<br />

resse na primeira frase e só o libertam na última linha.<br />

Her<strong>de</strong>iro <strong>de</strong> uma tradição que vem <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong><br />

Assis, passando por Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> e Rubem<br />

Braga, Ivan Angelo apren<strong>de</strong>u com eles todos os matizes do<br />

gênero, para melhor impor sua personalida<strong>de</strong>, sua maneira<br />

própria e inconfundível <strong>de</strong> escrever e ver o mundo, na qual<br />

o interesse pelos fatos cotidi<strong>anos</strong> se entrelaça à atenção com<br />

àquela zona fugidia <strong>de</strong> vida pessoal, que parece in<strong>de</strong>pen‑<br />

<strong>de</strong>nte do tempo, reino mágico <strong>de</strong> cada ser humano. Esse é<br />

um dos segredos do cronista. O outro consiste em escrever<br />

<strong>de</strong> tal forma que a crônica atue “como uma relação pessoal<br />

entre o narrador e o leitor, como se fosse escrita só para esse<br />

leitor”, segundo as suas próprias palavras.<br />

Como observa Humberto Werneck no prefácio, “já<br />

<strong>de</strong>liciosas no varejo do jornal e da revista, reunidas em livro<br />

as crônicas <strong>de</strong> Ivan Angelo ficam ainda melhores – umas<br />

trabalham pelas outras, todas ganham corpo, o conjunto<br />

compõe uma exata combinação <strong>de</strong> sabores.”. O leitor é<br />

quem sai ganhando.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s


JOÃO DO RIO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Edmundo Bouças e Fred Góes<br />

João do Rio (1881 ‑1921)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

1 a edição – 328 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1329 ‑2<br />

João do Rio trouxe para a crônica brasileira um frisson<br />

novo. Quando iniciou sua ativida<strong>de</strong> literária e jornalística, a<br />

nossa imprensa ainda se mantinha no ritmo e no balanço<br />

do século XIX. Repórter e cronista, o jovem aspirante à gló‑<br />

ria entrou pelas redações como uma lufada <strong>de</strong> vento reno‑<br />

vador. Suas crônicas e matérias, tão próximas umas das<br />

outras, escritas em estilo ágil, levantavam a nova realida<strong>de</strong><br />

da socieda<strong>de</strong> brasileira, influenciada pelas modas europeias<br />

e as novas tecnologias, como o cinema, mas revelavam<br />

também aspectos até então menosprezados, numa fusão<br />

<strong>de</strong> pitoresco e dramaticida<strong>de</strong>, que po<strong>de</strong>ria ser <strong>de</strong>finida<br />

como uma visão mo<strong>de</strong>rna do mundo mo<strong>de</strong>rno.<br />

Numa prosa impressionista, na qual o cinismo, a irre‑<br />

verência e um certo tom <strong>de</strong> <strong>de</strong>safio e <strong>de</strong>boche se mescla‑<br />

vam, João do Rio se firmou e se afirmou como o cronista<br />

por excelência da belle époque brasileira. Como toda lu‑<br />

fada <strong>de</strong> vento forte, sacudiu tudo o que achou pela frente,<br />

mas passou rápido.<br />

Em pouco <strong>mais</strong> <strong>de</strong> vinte <strong>anos</strong> <strong>de</strong> frenética ativida<strong>de</strong>, uti‑<br />

lizando os <strong>mais</strong> diversos pseudônimos, escreveu centenas <strong>de</strong><br />

crônicas, uma boa parte <strong>de</strong>las ainda não reunidas em volume.<br />

As colecionadas em livros como As religiões no Rio, Cinemató‑<br />

grafo, A alma encantadora das ruas, Pall ‑Mall Rio e Vida verti‑<br />

ginosa bastam para mostrar a abrangência <strong>de</strong> interesse do<br />

cronista, curioso <strong>de</strong> tudo, fascinado pelas seduções da rua e os<br />

aspectos <strong>mais</strong> torpes da socieda<strong>de</strong>, mas também interessado<br />

no que se passava na alta socieda<strong>de</strong> e no mundo das letras e<br />

das artes. Uma seleção <strong>de</strong>ssas crônicas, como a efetuada em<br />

Melhores crônicas João do Rio, constitui um passeio inesque‑<br />

cível e repleto <strong>de</strong> vida pelo nosso passado (ainda vivo em mui‑<br />

tos aspectos atuais), guiado por um texto mágico, <strong>de</strong> perma ‑<br />

nentes seduções que, para aqueles que ainda o <strong>de</strong>sconhecem,<br />

po<strong>de</strong> ser também uma <strong>de</strong>scoberta e uma revelação.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

JOSÉ CASTELLO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Leyla Perrone ­Moisés<br />

José Castello (1951)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

1 a edição – 304 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0856 ‑0<br />

Como Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, o cronista José Castello<br />

po<strong>de</strong> dizer que é trezentos, 350, talvez <strong>mais</strong>, sempre o<br />

mesmo e sempre variável, <strong>de</strong> acordo com as sugestões e<br />

inquietações do momento. Essa mobilida<strong>de</strong> espiritual as‑<br />

susta alguns leitores. Um <strong>de</strong>les escreveu ao cronista<br />

queixando ‑se <strong>de</strong> que ele mudava a cada semana e<br />

classificando ‑o <strong>de</strong> “sujeito sem caráter”.<br />

O leitor con<strong>de</strong>nava o que talvez seja a maior quali‑<br />

da<strong>de</strong>, ou uma das maiores, <strong>de</strong> José Castello: a capacida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> se renovar a cada dia, a multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> interesses, a<br />

varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> pontos <strong>de</strong> vista. O que seria do cronista, e do<br />

mundo, com a invariabilida<strong>de</strong> e a mesmice elevadas à aspi‑<br />

ração suprema?<br />

No seu caso, a visão múltipla da vida se intensifica por<br />

se tratar <strong>de</strong> um ficcionista, um criador <strong>de</strong> personagens, que<br />

vira e mexe introduz em suas crônicas alguma criatura saída<br />

<strong>de</strong> sua imaginação, mas com vida própria o suficiente para<br />

criar caraminholas na cabeça <strong>de</strong> alguns leitores. A “brinca‑<br />

<strong>de</strong>ira” <strong>de</strong> introduzir seres imaginários no mundo dos vivos<br />

mostra algumas facetas do cronista, o seu humor, por vezes<br />

ácido, a irreverência, o gosto pela paródia convertida em<br />

sarcasmo, provenientes em parte do conhecimento do outro<br />

lado da vida, da face real <strong>de</strong> tantos figurões e figurinhas que<br />

ele, como jornalista profissional e entrevistador, conheceu ao<br />

longo <strong>de</strong> sua ativida<strong>de</strong>. O contato <strong>mais</strong> profundo com a hu‑<br />

manida<strong>de</strong> sugere fantasmas. A propósito, outra preferência<br />

do cronista é pelo fantástico, muitas vezes <strong>de</strong>scambando no<br />

assustador, quando não no <strong>de</strong>clarado terror. Os trabalhos<br />

que integram as Melhores crônicas José Castello são reuni‑<br />

dos em livro pela primeira vez, recolhidos diretamente na<br />

imprensa. A mudança <strong>de</strong> veículo não lhes alterou o paladar.<br />

Como no jornal, mantêm o mesmo sabor <strong>de</strong> vida e a mesma<br />

aci<strong>de</strong>z crítica.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

67


JOSÉ DE ALENCAR<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

João Roberto Faria<br />

José <strong>de</strong> Alencar (1829 ‑1877)<br />

Natural <strong>de</strong> Mecejana, CE<br />

1 a edição – 320 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0799 ‑4<br />

Conhecido pelo público mo<strong>de</strong>rno quase apenas como<br />

romancista, o cronista José <strong>de</strong> Alencar sabia esparramar em<br />

seus folhetins muito da magia que iria encantar os leitores<br />

<strong>de</strong> seus romances. O folhetim <strong>de</strong> varieda<strong>de</strong>s, antecessor da<br />

crônica atual, era uma mistura <strong>de</strong> literatura e jornalismo, <strong>de</strong><br />

crítica e maledicência, escrito com leveza, graça e por vezes<br />

uma certa sem ‑cerimônia brincalhona. Talvez por isso fosse<br />

a leitura preferida das mulheres e dos jovens.<br />

Falasse ele do último escândalo político, do dó <strong>de</strong><br />

peito do tenor da moda, da estreia <strong>de</strong> uma peça ou do livro<br />

do momento, era sempre espirituoso, com pequenas doses<br />

<strong>de</strong> malícia e ironia, ja<strong>mais</strong> penoso ou zangado.<br />

Quando começou a escrever os folhetins <strong>de</strong> Ao Correr<br />

da Pena, para o Correio Mercantil, em 1854, (seguidos<br />

pelas Folhas Soltas) José <strong>de</strong> Alencar já tinha <strong>de</strong> sobra as<br />

qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> bom folhetinista. E <strong>mais</strong> ainda: um estilo<br />

claro, harmonioso, sedutor, <strong>de</strong> que bem poucos podiam se<br />

gabar. Não é <strong>de</strong> se estranhar, pois, o gran<strong>de</strong> sucesso <strong>de</strong><br />

público do jovem <strong>de</strong> 25 <strong>anos</strong>, em um momento em que a<br />

imprensa escrita representava para a socieda<strong>de</strong> o mesmo<br />

papel hoje <strong>de</strong>sempenhado pela televisão. Ao correr da<br />

pena (expressão <strong>de</strong> modéstia que não correspondia ao ca‑<br />

ráter do escritor), Alencar examinava todos os aconteci‑<br />

mentos marcantes ou <strong>de</strong>spercebidos que encantavam,<br />

preocupavam ou monopolizavam a atenção da socieda<strong>de</strong><br />

brasileira do Segundo Reinado: festas, hábitos, vida teatral,<br />

boatos. Por vezes se tornava sério, com uma tintura <strong>de</strong><br />

moralismo, mas sem ja<strong>mais</strong> per<strong>de</strong>r a graça e a leveza.<br />

Nesse caso está a bela crônica sobre a <strong>de</strong>spedida <strong>de</strong> Monte<br />

Alverne do púlpito, acontecimento social que encheu a ca‑<br />

pela imperial com a nata da socieda<strong>de</strong>. A começar pelo<br />

imperador. Essa socieda<strong>de</strong> também vivia com os olhos nas<br />

crônicas <strong>de</strong> Alencar.<br />

68<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

JOSUÉ MONTELLO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Flávia Amparo<br />

Josué Montello (1917 ‑2006)<br />

Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />

1 a edição – 400 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1403 ‑9<br />

Coedição ABL<br />

Escritor que cultivou com êxito todos os gêneros literá‑<br />

rios – romance, conto, história literária, poesia (essa, uma<br />

ati vi da<strong>de</strong> quase clan<strong>de</strong>stina), crítica, ensaio, memorialismo –,<br />

Josué Montello foi também um excelente cronista, atento à<br />

vida em suas múltiplas manifestações.<br />

Durante <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta <strong>anos</strong>, a partir <strong>de</strong> 1955, publicou<br />

crônicas no Jornal do Brasil, muitas vezes três por semana.<br />

Escritas em linguagem fluente, com uma graça her<strong>de</strong>ira da<br />

leveza machadiana, contavam com um público cativo, que<br />

chegava a comprar o jornal sobretudo para lê ‑las.<br />

Homem que respirava literatura vinte e quatro horas<br />

por dia, com uma memória sempre fiel, Montello gostava<br />

<strong>de</strong> rechear os seus escritos com citações, casos, lembranças<br />

<strong>de</strong> leitura, que davam um tom peculiar e inconfundível às<br />

centenas <strong>de</strong> crônicas que <strong>de</strong>ixou no velho jornal carioca.<br />

Parte <strong>de</strong>ssa imensa colaboração, inédita em livro, está<br />

sendo oferecida ao público leitor nas Melhores crônicas<br />

Josué Montello, uma seleção feita com apuro e sagacida<strong>de</strong><br />

por Flávia Amparo. São noventa e quatro crônicas, organiza‑<br />

das sob temas específicos (Memórias, Histórias da aca<strong>de</strong>mia,<br />

Óbices do ofício, Amigos <strong>de</strong> sempre, Homens e livros, Biblio‑<br />

teca íntima, Mestre Machado <strong>de</strong> Assis), que mapeiam com<br />

muita precisão o universo <strong>de</strong> preocupações <strong>de</strong> Montello.<br />

Retiradas da página efêmera do jornal para o livro, as<br />

crônicas <strong>de</strong> Montello mantêm o mesmo encanto que pren‑<br />

dia os leitores na data <strong>de</strong> sua publicação. Leves e breves,<br />

bem ‑humoradas, flagrantes <strong>de</strong> época, algumas <strong>de</strong>las ricas<br />

fontes <strong>de</strong> informação sobre a vida literária da época, elas<br />

convidam o leitor, como observa Flávia Amparo, “para um<br />

diálogo, como os antigos mestres costumavam fazer, par‑<br />

tindo das experiências do cotidiano para alçar outros<br />

voos”. Voos que po<strong>de</strong>m levar o leitor a gran<strong>de</strong>s aventuras.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s


LÊDO IVO<br />

Seleção do autor.<br />

Prefácio e notas <strong>de</strong><br />

Gilberto Mendonça Teles<br />

Lêdo Ivo (1924)<br />

Natural <strong>de</strong> Maceió, AL<br />

1 a edição – 288 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0919 ‑2<br />

Há cronistas sérios e há cronistas leves, mas os <strong>mais</strong> inte‑<br />

ressantes são os que dominam o segredo <strong>de</strong> misturar serie‑<br />

da<strong>de</strong> e leveza, <strong>de</strong> abordar os assuntos <strong>mais</strong> sérios com graça,<br />

por vezes quase frívola, que no fundo é liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> espírito,<br />

encanto diante do mundo, convite ao leitor, ímã literário.<br />

Lêdo Ivo é o exemplo perfeito <strong>de</strong>sse cronista, seduzido<br />

pelo espetáculo da vida, inteligente, divertido, capaz <strong>de</strong><br />

extrair uma crônica do fato <strong>mais</strong> banal ou do <strong>mais</strong> insólito,<br />

<strong>de</strong> uma história <strong>de</strong> namorados ou recém ‑casados ao caso<br />

do <strong>de</strong>funto que se levanta no meio do velório, do humor<br />

das palavras cruzadas numa repartição pública ao tocador<br />

<strong>de</strong> flautim, das transformações urbanas e sociais do Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro ao ladrão <strong>de</strong> paisagem, do sono do pesquisador na<br />

Biblioteca Nacional, após o almoço, aos cachorros do aero‑<br />

porto <strong>de</strong> Vitória.<br />

Um dos poetas <strong>mais</strong> importantes da literatura brasi‑<br />

leira, romancista, ensaísta, contista, senhor <strong>de</strong> todos os<br />

segredos da língua, estilista virtuoso, Lêdo Ivo cultiva a crô‑<br />

nica <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os <strong>anos</strong> 1950. Alagoano <strong>de</strong> nascimento, é um<br />

dos gran<strong>de</strong>s cronistas da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Sebastião do Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro, que escolheu para viver e trabalhar. A propósito,<br />

leiam ‑se nessas suas Melhores crônicas Lêdo Ivo as reunidas<br />

na seção O Rio é uma Festa. Rachel <strong>de</strong> Queiroz observou<br />

que o Rio “ja<strong>mais</strong> foi cantado por nenhum dos seus filhos<br />

com ternura, força poética e inteligências iguais” às <strong>de</strong>cla‑<br />

rações <strong>de</strong> amor <strong>de</strong> Lêdo Ivo à cida<strong>de</strong>. Mas, por vezes, o<br />

cronista também se revolta contra a cida<strong>de</strong> amada. Leia ‑se<br />

“O carioca Marques Rebelo”, que se inicia pela frase pro‑<br />

vocativa: “Marques Rebelo cometeu a imprudência <strong>de</strong> nas‑<br />

cer no Rio <strong>de</strong> Janeiro”, na qual protesta contra “a ingratidão<br />

póstuma da cida<strong>de</strong>” pelos seus escritores. Que ninguém se<br />

engane com a veemência justa do cronista. Protestar tam‑<br />

bém é uma forma <strong>de</strong> amar.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

LIMA BARRETO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Beatriz Resen<strong>de</strong> <strong>de</strong> Freitas<br />

Lima Barreto (1881 ‑1922)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

1 a edição – 304 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0990 ‑7<br />

Lima Barreto gostava <strong>de</strong> publicar as suas crônicas em jor‑<br />

nais e revistas <strong>de</strong> pequena circulação, obscuros, “aos quais<br />

ninguém dá importância”, como ele mesmo confessou. O que<br />

hoje chamaríamos <strong>de</strong> imprensa alternativa. A palavra, aliás –<br />

encarada como uma espécie <strong>de</strong> estigma, <strong>de</strong> marginalida<strong>de</strong> –,<br />

se ajusta bem à vida e à obra do próprio escritor, que <strong>de</strong>testava<br />

a gran<strong>de</strong> imprensa, da mesma forma que abominava a alta<br />

socieda<strong>de</strong> e os po<strong>de</strong>rosos do mundo. Revoltado, amargo, re‑<br />

clamando <strong>de</strong> tudo, dominado pelo sentimento <strong>de</strong> auto<strong>de</strong>strui‑<br />

ção, mantinha, porém, no fundo, uma certa pureza <strong>de</strong> criança<br />

mimada, magoada e <strong>de</strong>siludida com a brutalida<strong>de</strong> da vida.<br />

Suas crônicas, a maioria escrita no período <strong>de</strong> 1918 a<br />

1922, expõem com força esses sentimentos, não raras<br />

vezes expressos num tom panfletário, <strong>de</strong> crítica violenta às<br />

instituições políticas e sociais (“nossa vilã e ávida socieda<strong>de</strong><br />

burguesa”, escreveu), sátira aos costumes e i<strong>de</strong>ntificação<br />

com o povo.<br />

Com o tempo, aumentam a prevenção contra a bur‑<br />

guesia e a i<strong>de</strong>ntificação com o povo, ou pelo menos com<br />

um conjunto <strong>de</strong> sentimentos e comportamentos, i<strong>de</strong>aliza‑<br />

dos ou não, que atribuía ao povo. Dessa posição pessoal<br />

vem sua simpatia pelos movimentos <strong>de</strong> reivindicação da<br />

classe operária e por acontecimentos históricos como a Re‑<br />

volução Russa <strong>de</strong> 1917. Com muito <strong>mais</strong> força e indigna‑<br />

ção, ele trata <strong>de</strong> um problema que o atingia pessoalmente;<br />

o preconceito racial, <strong>mais</strong> aprofundado em sua obra <strong>de</strong><br />

ficção. Afastando ‑se do gosto dominante da época, on<strong>de</strong><br />

predomina um certo artificialismo <strong>de</strong> expressão, Lima Bar‑<br />

reto escreve suas crônicas em tom <strong>de</strong> conversa familiar. A<br />

linguagem po<strong>de</strong> ser acusada <strong>de</strong> frouxa, o estilo <strong>de</strong>scui‑<br />

dado. Mas essas pequenas <strong>de</strong>ficiências são compensadas<br />

por uma intensida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida, raras em sua época. Talvez<br />

por isso continuem tão vivas.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

69


MACHADO DE ASSIS<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Salete <strong>de</strong> Almeida Cara<br />

Machado <strong>de</strong> Assis (18<strong>39</strong> ‑1908)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

2 a edição – 414 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0798 ‑7<br />

Um dos retratos <strong>mais</strong> fiéis e abrangentes da socieda<strong>de</strong><br />

imperial, nos bons tempos do barbaças Pedro II, e do início<br />

da República, encontra ‑se nas crônicas <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis.<br />

Irônico, por vezes cruel, o cronista gostava <strong>de</strong> examinar os<br />

gran<strong>de</strong>s acontecimentos do dia, mas também se <strong>de</strong>liciava<br />

em catar o mínimo e o escondido, sem distinção. Com suti‑<br />

leza, zombava <strong>de</strong> tudo ou quase tudo, conciliando o humor<br />

corrosivo com a expressão elegante, o estilo clássico e uma<br />

linha <strong>de</strong> raciocínio cartesiana. Mas a alma era brasileira, ca‑<br />

rioca, i<strong>de</strong>ntificada com as aspirações da época.<br />

A época vivida e retratada pelo cronista foi palpitante<br />

<strong>de</strong> acontecimentos: a Questão Christie, a Questão Militar,<br />

a Guerra do Paraguai, a abolição da escravatura, a queda<br />

do Império. A República começou quente, para logo ferver<br />

em acontecimentos como o Encilhamento, a Revolta da<br />

Armada contra Floriano Peixoto e Canudos.<br />

Sem <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> examinar esses fatos e um pouco do que<br />

ocorria no mundo, com atenção e acuida<strong>de</strong> extrema, a pre‑<br />

ferência do cronista se voltava sobretudo para o que ocorria<br />

na cida<strong>de</strong>: a vida social, os fatos curiosos, as novida<strong>de</strong>s tea‑<br />

trais e literárias, sem per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista os <strong>de</strong>bates parlamenta‑<br />

res e os acontecimentos políticos, <strong>de</strong>smentindo a propalada<br />

alienação machadiana, uma balela <strong>de</strong> alienados que nada<br />

conhecem <strong>de</strong> sua obra. Durante 45 <strong>anos</strong>, Machado atuou<br />

na imprensa da Corte como cronista. Lidas em sequência<br />

cronológica, suas crônicas revelam uma esplêndida evolu‑<br />

ção, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os primeiros ensaios tateantes do jovem <strong>de</strong> vinte<br />

<strong>anos</strong>, publicados em O espelho, até as obras da maturida<strong>de</strong>,<br />

<strong>de</strong> insuperável graça. Deixou <strong>mais</strong> <strong>de</strong> seiscentos trabalhos no<br />

gênero. O difícil, nesse conjunto soberbo, é a escolha dos<br />

melhores, tarefa <strong>de</strong> que se saiu muito bem a organizadora<br />

do volume, Salete <strong>de</strong> Almeida Cara.<br />

70<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

MANUEL BANDEIRA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Eduardo Coelho<br />

Manuel Ban<strong>de</strong>ira (1886 ‑1968)<br />

Natural <strong>de</strong> Recife, PE<br />

1 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0832 ‑3<br />

Manuel Ban<strong>de</strong>ira escrevia com miraculosa simplicida<strong>de</strong>,<br />

com um <strong>de</strong>spojamento franciscano. O santo <strong>de</strong> Assis se <strong>de</strong>s‑<br />

fez <strong>de</strong> todos os bens – e em certa ocasião até das vestes –<br />

para alcançar aquela simplicida<strong>de</strong> que combina com a<br />

perfeição. Ban<strong>de</strong>ira, espírito franciscano, <strong>de</strong>spojou sua poe‑<br />

sia e prosa <strong>de</strong> todos as bijuterias <strong>de</strong> estilo, dos adjetivos ba‑<br />

lofos, das metáforas inúteis. Escrevia com frases secas e<br />

diretas, na linguagem <strong>de</strong> todo mundo e <strong>de</strong> todo o dia.<br />

Poeta por vocação, a crônica foi uma espécie <strong>de</strong> bate‑<br />

‑papo com amigos, como ele mesmo a <strong>de</strong>finiu, traduzindo as<br />

impressões, as irritações e os estímulos nascidos do cotidiano e<br />

anotados com encanto ou <strong>de</strong>sencanto, numa atenta e risonha<br />

reverência à vida. Se o fundo <strong>de</strong> seu pensamento era austero,<br />

como observou Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, essa austeri‑<br />

da<strong>de</strong> era amenizada por um leve sorriso, sorriso <strong>de</strong>ntuça, que<br />

talvez fosse o supremo refinamento da ironia.<br />

Como bom cronista, tudo lhe servia <strong>de</strong> tema, as suas<br />

andanças pelo Brasil – Ouro Preto, Bahia, Recife –, aspectos<br />

<strong>de</strong> viagem, os pardais, pardais pássaros e pardais literários,<br />

o queijo <strong>de</strong> Minas enviado por um poeta, o livro recém‑<br />

‑lançado, a morte <strong>de</strong> amigos, a sedução das gran<strong>de</strong>s per‑<br />

sonalida<strong>de</strong>s, se chamassem elas Lenin ou Carlitos. Sob o<br />

cronista havia também um crítico sagaz <strong>de</strong> arte, apreciando<br />

com comoção, mas sempre com discernimento, a escultura<br />

<strong>de</strong> um Aleijadinho, as velhas igrejas brasileiras, a arquite‑<br />

tura das cida<strong>de</strong>s adormecidas. Em tudo isso palpitava um<br />

gran<strong>de</strong> sentimento brasileiro e não raramente boas doses<br />

<strong>de</strong> poesia. Às vezes, em vez da crônica esperada, brindava<br />

os leitores com um conto. Neste caso está o <strong>de</strong>licioso “O<br />

professor <strong>de</strong> grego”, que <strong>mais</strong> do que uma história soa<br />

como uma metáfora da própria socieda<strong>de</strong> brasileira. O cro‑<br />

nista era mestre em surpresas e sutilezas.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s


MARCOS REy<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Anna Maria Martins<br />

Marcos Rey (1925 ‑1999)<br />

Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />

1 a edição – 328 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1480 ‑0<br />

Romancista <strong>de</strong> imenso sucesso junto ao público adul‑<br />

to e juvenil, um dos autores <strong>mais</strong> vendidos do Brasil, Mar‑<br />

cos Rey foi também, durante <strong>anos</strong>, um cronista popular,<br />

com tribuna montada na revista Veja. Irônico, ora mali‑<br />

cioso, ora sarcástico, por vezes mordaz, seduzia o leitor<br />

com uma prosa direta, enxuta, bem ‑humorada, como uma<br />

conversa <strong>de</strong> bar. Mas que ninguém se engane. Sob o tom<br />

leve e agradável <strong>de</strong> bate ‑papo, o cronista disseca <strong>de</strong> forma<br />

implacável o bicho ‑homem, suas fragilida<strong>de</strong>s e hipocrisias,<br />

vícios e ridículos, a solidão e as paixões perigosas, mas tam‑<br />

bém sonhos e anseios comoventes.<br />

Pela sua pena ágil, o leitor passeia pela feira (“a feira<br />

é a praia do paulistano”), se inquieta com as filas nos ban‑<br />

cos, se diverte numa sala <strong>de</strong> espera (“o que acontece antes<br />

da consulta, da tese, do pedido <strong>de</strong> empréstimo...”). Sem<br />

per<strong>de</strong>r o tom e o ritmo, o cronista ironiza o drama do pobre<br />

marido surpreendido num motel, conta o episódio meio<br />

grotesco do dublador que per<strong>de</strong>u sua verda<strong>de</strong>ira voz,<br />

evoca uma vingança que durou a vida inteira (página <strong>de</strong><br />

memória, relacionada com a <strong>de</strong>scoberta pelo autor <strong>de</strong> O<br />

coração, famoso livro <strong>de</strong> literatura infantojuvenil, <strong>de</strong> Ed‑<br />

mondo De Amicis).<br />

O memorialista convive com o cronista em vários mo‑<br />

mentos. Assim, quando Rey lembra uma tar<strong>de</strong> <strong>de</strong> autógra‑<br />

fos no Paribar, fala <strong>de</strong> sua paixão pelo rádio, dos “bares da<br />

sauda<strong>de</strong>” (“eles contam a história paulistana”) e da São<br />

Paulo do seu tempo (“não perguntem sobre a garoa, cor‑<br />

sos e borzeguins”).<br />

Aliás, como em toda a sua obra, também nas crônicas<br />

o gran<strong>de</strong> personagem <strong>de</strong> Marcos Rey é a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São<br />

Paulo, as suas ruas e praças, os aspectos inocentes e as<br />

bocas malditas, a vida diurna e noturna, os bares, os locais<br />

<strong>de</strong> encontro e <strong>de</strong>sencontro. A vida em sua plena pulsação.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

MARIA JULIETA<br />

DRUMMOND DE<br />

ANDRADE<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Marcos Pasche<br />

Maria Julieta Drummond<br />

<strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> (1928 ‑1987)<br />

Natural <strong>de</strong> Belo Horizonte, MG<br />

1 a edição – 304 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1672 ‑9<br />

Maria Julieta Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> começou a es‑<br />

crever crônicas por acaso. Nas comemorações públicas<br />

pelos 75 <strong>anos</strong> <strong>de</strong> seu pai, Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>,<br />

ela foi convidada a fazer um texto para a revista Veja. O<br />

que seria um texto jornalístico resultou numa bela crônica,<br />

intitulada “Meu pai”. Agradou a gregos e bai<strong>anos</strong>, e a par‑<br />

tir daí se <strong>de</strong>dicou ao gênero com afinco, originalida<strong>de</strong> e<br />

uma visão muito própria do mundo. Maria Julieta acredi‑<br />

tava, como Guimarães Rosa, que o bicho ‑homem tem<br />

muito a apren<strong>de</strong>r com os ani<strong>mais</strong>, os quais <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>u em<br />

inúmeras crônicas das malva<strong>de</strong>zas humanas e com os quais<br />

se i<strong>de</strong>ntifica a ponto <strong>de</strong> tomá ‑los como mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> con‑<br />

duta. Confira ‑se: “Sendo os gatos tão sábios, tenho sem‑<br />

pre a esperança <strong>de</strong> conseguir, talvez, falando e escrevendo<br />

sobre eles, aceitar melhor as contingências da vida”.<br />

Sua ternura não se limita aos gatos, mas esten<strong>de</strong> ‑se a<br />

todo o reino animal. A bela crônica intitulada “Passarinho”<br />

fala com ternura feminina do animalzinho, “um canário<br />

que não foi feliz, tinha o jeitinho triste <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que chegou<br />

ao apartamento”. Em “Bezerro”, <strong>mais</strong> conto do que crô‑<br />

nica, a cronista sofre ao narrar o abate do animal, num<br />

clima patético.<br />

Maria Julieta foi também cronista do cotidiano, na<br />

qual a sua própria figura ocupa um lugar <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque. Em<br />

certos momentos, ela parece escrever com os olhos fitos no<br />

espelho. Esse quase narcisismo acaba prejudicando sua<br />

visão do mundo e a realização da crônica, mas é ampla‑<br />

mente redimido em belos momentos, como na antológica<br />

“Boas ‑festas”, um daqueles momentos i<strong>de</strong>ais em “que sua<br />

escrita ganha o corpo da maturida<strong>de</strong> e o espírito da meni‑<br />

nice, e, por sua vez, a crônica efetua seu fazer <strong>mais</strong> nobre,<br />

que é o <strong>de</strong> nos interromper para que assistamos ao milagre<br />

da vida”, como observa Marcos Pasche no prefácio.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

71


MARQUES REBELO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Renato Cor<strong>de</strong>iro Gomes<br />

Marques Rebelo (1907 ‑1973)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

1 a edição – 288 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0892 ‑7<br />

Na literatura do século XIX a alma carioca palpita em<br />

estado <strong>de</strong> graça plena na obra <strong>de</strong> dois gran<strong>de</strong>s escritores,<br />

Manuel Antônio <strong>de</strong> Almeida e Machado <strong>de</strong> Assis. A tradi‑<br />

ção persiste no início do século seguinte, com o atormen‑<br />

tado Lima Barreto.<br />

Her<strong>de</strong>iro <strong>de</strong>sses gran<strong>de</strong>s espíritos e <strong>de</strong> suas afinida<strong>de</strong>s<br />

mágicas com a terra <strong>de</strong> São Sebastião do Rio <strong>de</strong> Janeiro,<br />

Marques Rebelo produziu toda a sua obra numa espécie <strong>de</strong><br />

ligação mediúnica com a cida<strong>de</strong>, aliás, as várias cida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong>ntro da cida<strong>de</strong>, que convivem no tempo e no espaço,<br />

sintonizado com os sonhos, as rebeldias e as malandragens<br />

<strong>de</strong> seus habitantes, os momentos <strong>de</strong> <strong>de</strong>salento, os encon‑<br />

tros e <strong>de</strong>sencontros amorosos, a paixão pelo futebol, as<br />

transformações urbanísticas, o trabalho cotidiano, os ócios,<br />

os sambas transmitidos pelo rádio, “a tristeza e o pitoresco,<br />

o ar, o paladar, o odor do ajuntamento humano” (Carlos<br />

Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>), os mil e um elos misteriosos e<br />

in<strong>de</strong>finíveis que unem os cidadãos <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> e os dis‑<br />

tinguem dos naturais <strong>de</strong> qualquer outro ponto do globo.<br />

Nascido em Vila Isabel, terra <strong>de</strong> Noel Rosa, Marques Re‑<br />

belo <strong>de</strong> certa forma incorporou ao seu espírito a irreverência<br />

diante da vida e os sentimentos típicos do homem da zona<br />

norte carioca. A leveza dos sambinhas <strong>de</strong> Noel, aquele “feitiço<br />

<strong>de</strong>cente” da Vila, parecem reencarnar no estilo e na lingua‑<br />

gem do escritor, leve, enxuta, sem insistência, amenizando um<br />

tanto sua visão amarga e sarcástica da vida. Rebelo <strong>de</strong>ixou<br />

uma obra ampla e variada, romances, contos, teatro, literatura<br />

infantil, livros <strong>de</strong> viagem pelo Brasil e pelo exterior, e um nú‑<br />

mero imenso <strong>de</strong> crônicas, a maior parte ainda submersa em<br />

jornais e revistas. Várias <strong>de</strong>las foram recuperadas neste vo‑<br />

lume <strong>de</strong> suas Melhores crônicas Marques Rebelo, <strong>de</strong>liciosas<br />

como um docinho <strong>de</strong> coco: “Jacarepaguá”, “Na praia”, “A<br />

mesma música”, outras e outras. Vale a pena prová ‑las.<br />

72<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

MOACyR SCLIAR<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Luís Augusto Fischer<br />

Moacyr Scliar (1937 ‑2011)<br />

Natural <strong>de</strong> Porto Alegre, RS<br />

1 a edição – 384 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0946 ‑X<br />

Na crônica, como em tudo <strong>mais</strong> na vida, cada um dá<br />

o que tem. No caso do cronista, há ainda uma peculiari‑<br />

da<strong>de</strong>: ele não só transmite o que lhe está na alma, como<br />

precisa se <strong>de</strong>spersonalizar ou se <strong>de</strong>sdobrar, sei lá, para cap‑<br />

tar os mistérios e as banalida<strong>de</strong>s do cotidiano. É como uma<br />

antena (talvez parabólica) aberta para o mundo, captando<br />

novida<strong>de</strong>s, sempre filtradas através <strong>de</strong> um temperamento<br />

e uma história <strong>de</strong> vida.<br />

Quanta complicação para dizer que o cronista Moacyr<br />

Scliar, um dos gran<strong>de</strong>s ficcionistas do país, revela a cada mo‑<br />

mento em suas crônicas sua situação <strong>de</strong> médico e <strong>de</strong> ju<strong>de</strong>u,<br />

filho <strong>de</strong> imigrantes. Muito orgulhoso <strong>de</strong> ambas. Essa condição<br />

acentua sua visão crítica da vida e “muitas vezes o ângulo<br />

irônico, quando não humorístico” (humor judaico), como sa‑<br />

lienta Luís Augusto Fischer, no prefácio às Melhores crônicas<br />

Moacyr Scliar, aliás recolhidas em livro pela primeira vez.<br />

Nada <strong>mais</strong> natural também que, como ficcionista au‑<br />

têntico, muitas <strong>de</strong> suas crônicas estejam <strong>mais</strong> i<strong>de</strong>ntificadas<br />

com a ficção do que com a crônica pura, sem fermento.<br />

Ótimo. O fermento da imaginação, sobrepondo ‑se à sim‑<br />

ples observação, muitas vezes tem o dom <strong>de</strong> cutucar o lei‑<br />

tor, <strong>de</strong> <strong>de</strong>spertá ‑lo para outra dimensão da realida<strong>de</strong>, quando<br />

não lançá ‑lo em pleno absurdo. O absurdo serve também,<br />

quase em surdina, para a crítica social, a con<strong>de</strong>nação das<br />

vaida<strong>de</strong>s humanas, a reflexão sobre as armadilhas da vida<br />

mo<strong>de</strong>rna. Mas, seja em seus mergulhos no absurdo ou na<br />

captação do cotidiano, o cronista nunca per<strong>de</strong> o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong><br />

se comunicar com o leitor, através <strong>de</strong> uma linguagem clara,<br />

coloquial, sem rebuscamentos, a linguagem do povo, mas<br />

<strong>de</strong>purada por uma rígida disciplina. Como observa Fischer,<br />

“sua crônica proporciona ao leitor a agradável sensação <strong>de</strong><br />

compartilhamento, que temos ao conversar com um par‑<br />

ceiro”. Po<strong>de</strong> haver melhor diálogo?<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s


OLAVO BILAC<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Ubiratan Machado<br />

Olavo Bilac (1865 ‑1918)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

1 a edição – 304 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1037 ‑6<br />

O poeta Olavo Bilac era capaz <strong>de</strong> ouvir e enten<strong>de</strong>r<br />

estrelas. Mais atento à realida<strong>de</strong> cotidiana, o cronista Bilac<br />

preferia ouvir os rumores do mundo e enten<strong>de</strong>r as angús‑<br />

tias, as esperanças e as perplexida<strong>de</strong>s do bicho ‑homem.<br />

Nada <strong>de</strong> humano lhe era indiferente.<br />

Cultivando a crônica <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a mocida<strong>de</strong>, Bilac alcança o<br />

auge <strong>de</strong> sua ativida<strong>de</strong> ao substituir Machado <strong>de</strong> Assis na crô‑<br />

nica dominical da Gazeta <strong>de</strong> Notícias, o jornal <strong>mais</strong> importante<br />

do país. Nesse posto permanece cerca <strong>de</strong> vinte <strong>anos</strong>, analisando<br />

com ironia e pieda<strong>de</strong>, galhofa e ternura, o inesgotável espetá‑<br />

culo humano e o inquietante cenário político internacional.<br />

Que riqueza <strong>de</strong> acontecimentos. No Brasil, <strong>de</strong>senrola ‑se o<br />

penoso processo <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rnização do país, com a construção<br />

da avenida Central, no Rio <strong>de</strong> Janeiro, a vacina obrigatória, o<br />

ufanismo, a Europa curvando ‑se diante do Brasil com os feitos<br />

<strong>de</strong> Santos Dumont, que o cronista compara a Prometeu e Ícaro.<br />

Mudanças no plano físico, mas sobretudo mudanças <strong>de</strong> men‑<br />

talida<strong>de</strong>, apesar da persistência <strong>de</strong> velhas chagas, como a retra‑<br />

tada em “Hábitos parlamentares”, <strong>de</strong> oportuna atualida<strong>de</strong>. O<br />

cenário internacional assusta, com as guerras russo ‑japonesa e<br />

dos Bálcãs, o conflito <strong>mais</strong> <strong>de</strong>vastador vivido até então pelo<br />

homem, a Primeira Guerra Mundial e a Revolução Soviética <strong>de</strong><br />

1917, que o cronista analisa com inquietação e acuida<strong>de</strong>. Nesse<br />

mundo conturbado, o cronista tem também seus oásis, on<strong>de</strong><br />

sob a crítica por vezes áspera, mas quase sempre brincalhona,<br />

sente ‑se a ternura do poeta. São assim as crônicas sobre a vida<br />

carioca, pequenas aquarelas literárias, coloridas e um tanto ca‑<br />

ricaturais, mas sempre pulsantes <strong>de</strong> vida, como “Gente ele‑<br />

gante”, “O namoro no Rio <strong>de</strong> Janeiro”, “A eloquência da<br />

sobremesa”. Um ponto valioso <strong>de</strong>ssa edição é a publicação <strong>de</strong><br />

crônicas inéditas (<strong>mais</strong> <strong>de</strong> um terço do volume), pela primeira<br />

vez reunidas em livro. Elas ajudam a <strong>de</strong>scobrir por que o cro‑<br />

nista Bilac continua encantado. E encantador.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

RACHEL DE QUEIROZ<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Heloisa Buarque <strong>de</strong> Hollanda<br />

Rachel <strong>de</strong> Queiroz (1910 ‑2003)<br />

Natural <strong>de</strong> Fortaleza, CE<br />

1 a edição – 336 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0949 ‑3<br />

Em sua ativida<strong>de</strong> como cronista, Rachel <strong>de</strong> Queiroz<br />

realizou alguns milagres (literários), como o <strong>de</strong> interessar o<br />

leitor (vários tipos <strong>de</strong> leitores, no tempo e no espaço) du‑<br />

rante quase oitenta <strong>anos</strong> (exatos 77 <strong>anos</strong>). Deve ter batido<br />

alguns recor<strong>de</strong>s. J. Carlos dizia que os seus <strong>de</strong>senhos<br />

davam para cobrir toda a avenida Rio Branco. As crônicas<br />

<strong>de</strong> Rachel <strong>de</strong>vem igualar ou superar esse feito. E como o<br />

maravilhoso caricaturista, sem nunca <strong>de</strong>cair <strong>de</strong> suas quali‑<br />

da<strong>de</strong>s habituais: o tom <strong>de</strong> conversa, em ritmo quase nor‑<br />

<strong>de</strong>stino, o domínio perfeito da língua, dosando com<br />

sabedoria a contribuição popular e o rigor clássico, em<br />

frases que “se movem em leves lufadas cômodas, variadas<br />

com habilida<strong>de</strong> magnífica” (Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>).<br />

Rachel começou a colaborar na imprensa lá pelo ano<br />

<strong>de</strong> 19<strong>39</strong>, quando se transferiu do Ceará para o Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro. Como <strong>de</strong>clarou, a imprensa foi sua “trincheira”.<br />

Dessa trincheira disparou artigos, reportagens, mas sobre‑<br />

tudo crônicas – parte das quais estão recolhidas em treze<br />

livros –, crônicas que traçam uma espécie <strong>de</strong> autobiogra‑<br />

fia espiritual <strong>de</strong> sua autora, mas também um retrato colo‑<br />

rido <strong>de</strong> oito décadas <strong>de</strong> vida brasileira: testemunhos sobre<br />

fatos históricos, quadros da vida carioca ou nor<strong>de</strong>stina,<br />

perfis <strong>de</strong> figuras conhecidas ou populares interessantes,<br />

intimida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> famílias, reflexões sobre a vida humana, o<br />

tempo, a morte, o amor, que tudo está contido na vida, e<br />

a cronista tinha olhos <strong>de</strong> ver e amar (ou se indignar) com<br />

cada fato da vida.<br />

Várias <strong>de</strong>ssas crônicas são, na verda<strong>de</strong>, contos nos<br />

quais Rachel exercitava suas qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ficcionista. Era<br />

como uma mudança temporária <strong>de</strong> instrumento, a sanfona<br />

pela viola, ou vice ‑versa, sem ja<strong>mais</strong> per<strong>de</strong>r o tom e o ritmo<br />

ou <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> fascinar o leitor. Sua conversa sempre enfeiti‑<br />

çava e continua enfeitiçando. É só começar.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

73


RAUL POMPEIA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Cláudio Murilo Leal<br />

Raul Pompeia (1863 ‑1895)<br />

Natural <strong>de</strong> Angra dos Reis, RJ<br />

1 a edição – 224 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1589 ‑0<br />

Autor <strong>de</strong> dois clássicos da literatura brasileira, o ro‑<br />

mance O Ateneu e o volume <strong>de</strong> poemas em prosa Canções<br />

sem metro, Raul Pompeia foi também um constante e pri‑<br />

moroso cronista. As suas primeiras experiências no gênero<br />

remontam ao período <strong>de</strong> estudante, quando escreveu para<br />

jornais do Rio <strong>de</strong> Janeiro, São Paulo e Juiz <strong>de</strong> Fora. Amadu‑<br />

recendo, aprimorou ‑se, produzindo algumas obras ‑primas<br />

da crônica brasileira.<br />

Quem conhece apenas O Ateneu, escrito numa prosa<br />

artística, à maneira dos Irmãos Goncourt, e percorrer os<br />

setenta e um trabalhos reunidos nas Melhores crônicas<br />

Raul Pompeia, vai estranhar a linguagem, modulada nos<br />

<strong>mais</strong> diversos tons, da virulência ao lirismo, da irritação<br />

plena ao sarcasmo <strong>de</strong>molidor.<br />

É que quase todas as crônicas <strong>de</strong> Pompeia estão liga‑<br />

das ao momento político e refletem o ânimo exaltado do<br />

autor, intolerante em suas convicções, agressivo, em sinto‑<br />

nia total com o momento histórico, um dos <strong>mais</strong> conturba‑<br />

dos da evolução da socieda<strong>de</strong> brasileira, marcado pela<br />

abolição da escravatura, a proclamação da República, o<br />

governo <strong>de</strong> Floriano Peixoto, o Marechal <strong>de</strong> Ferro, que<br />

Pompeia <strong>de</strong>fendia e admirava com fanatismo.<br />

Instalado na trincheira da crônica, <strong>de</strong>sfechando petardos<br />

<strong>de</strong>molidores, Pompeia sabia também captar com admirável<br />

sensibilida<strong>de</strong> a palpitação humana que havia por baixo da<br />

tensão <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminados momentos históricos, como na bela<br />

página intitulada “Uma noite histórica”, em que narra a par‑<br />

tida da família imperial, D. Pedro II à frente, para o exílio, antes<br />

do embarque no navio Alagoas, que os conduziria a Portugal.<br />

É página <strong>de</strong> mestre, ressaltada por Cláudio Murilo Leal,<br />

no prefácio, ao sublinhar o “tratamento poético que, ilumi‑<br />

nando a notícia jornalística, transforma ‑a em um texto lite‑<br />

rário duradouro”, redigido “com excepcional sensibilida<strong>de</strong>”.<br />

74<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

ROBERTO DRUMMOND<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Carlos Herculano Lopes<br />

Roberto Drummond (1933 ‑2002)<br />

Natural <strong>de</strong> Santana dos Ferros, MG<br />

1 a edição – 320 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1013 ‑1<br />

O romancista Roberto Drummond fez um sucesso na‑<br />

cional estrondoso com obras como Hilda Furacão e Hitler<br />

manda lembranças. O cronista Roberto Drummond colhia<br />

a sua migalha diária <strong>de</strong> sucesso, mas sua voz ficava restrita<br />

às Minas Gerais. Merecia uma audiência <strong>mais</strong> ampla.<br />

Mineiro <strong>de</strong> nascimento (1933 ‑2002) e <strong>de</strong> carteirinha,<br />

recusando ‑se a migrar para o Rio <strong>de</strong> Janeiro ou São Paulo,<br />

como tantos outros conterrâneos, Roberto Drummond<br />

manteve ‑se fiel a vida toda à cida<strong>de</strong> que adotou (nasceu<br />

em Santana dos Ferros, no interior do estado) e com a qual<br />

se i<strong>de</strong>ntificou na vida e na morte. Foi o cronista <strong>de</strong> Belo<br />

Horizonte, das lendas tão mineiras retratadas na admirável<br />

“Carta para a moça fantasma da rua do Ouro”, dos adul‑<br />

térios, dos crimes, do cotidiano banal e inesperado (a bor‑<br />

boleta azul voando pela Savassi), das paixões e <strong>de</strong>seng<strong>anos</strong><br />

do povo das Minas Gerais, cujo espírito contraditório, bar‑<br />

roco e mo<strong>de</strong>rno tenta compreen<strong>de</strong>r em “Por que sonhas,<br />

Minas?”, na qual faz “a psicanálise selvagem do estado”,<br />

segundo observação do prefaciador das Melhores crônicas<br />

Roberto Drummond, Carlos Herculano Lopes.<br />

Outra forma <strong>de</strong> fazer a psicanálise do povo era através das<br />

crônicas <strong>de</strong> futebol. Em “Para torcer contra o vento”, Drum‑<br />

mond (torcedor fanático do Atlético Mineiro) fez a <strong>de</strong>claração<br />

<strong>de</strong> amor <strong>mais</strong> bela e convicta que um time brasileiro já recebeu.<br />

Como cronista, foi muitas vezes um contador <strong>de</strong> histórias, pois<br />

sua maneira <strong>de</strong> tentar enten<strong>de</strong>r a vida e o mundo era através<br />

da ficção. Assim, vários <strong>de</strong>sses textos, classificados como crôni‑<br />

cas, são na verda<strong>de</strong> pequenos contos. As crônicas reunidas<br />

neste volume foram transcritas diretamente dos jornais on<strong>de</strong><br />

nasceram e conheceram a efêmera glória <strong>de</strong> cada dia. Dessa<br />

forma, na unida<strong>de</strong> do livro, levam ao público <strong>de</strong> todo o país os<br />

textos <strong>de</strong> um <strong>de</strong> seus cronistas <strong>mais</strong> importantes. Ainda bem.<br />

O que é bom aumenta <strong>de</strong> intensida<strong>de</strong> quando compartilhado.<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s


SÉRGIO MILLIET<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Regina Campos<br />

Sérgio Milliet (1898 ‑1966)<br />

Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />

1 a edição – 312 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1062 ‑X<br />

Excelente crítico e ensaísta, poeta razoável, Sérgio<br />

Milliet exerceu a crônica <strong>de</strong> maneira quase alternativa, em<br />

textos esparsos nos <strong>de</strong>z volumes <strong>de</strong> seu Diário crítico e, <strong>de</strong><br />

maneira <strong>mais</strong> explícita, em De ontem, <strong>de</strong> hoje, <strong>de</strong> sempre<br />

e em De cães, <strong>de</strong> gatos, <strong>de</strong> gente.<br />

Não se trata <strong>de</strong> crônicas puras, ajustadas ao mol<strong>de</strong><br />

usual, mas <strong>de</strong> reminiscências pessoais, às vezes em tom <strong>de</strong><br />

memórias, leves alfinetadas nos contemporâneos, discus‑<br />

sões sobre autores e livros, reflexões sobre a vida, com al‑<br />

guma coisa do espírito e do ceticismo <strong>de</strong> Montaigne. Isso<br />

no que se refere aos trabalhos extraídos do Diário crítico.<br />

A propósito, no prefácio às Melhores crônicas Sérgio<br />

Milliet, Regina Campos justifica a inclusão <strong>de</strong> tais traba‑<br />

lhos, parodiando uma observação clássica <strong>de</strong> Mário <strong>de</strong><br />

Andra<strong>de</strong>. O autor <strong>de</strong> Macunaíma dizia que conto é tudo<br />

aquilo que o autor chama <strong>de</strong> conto. Ora, nada <strong>mais</strong> natu‑<br />

ral que o mesmo ocorra com a crônica. Nos textos retira‑<br />

dos dos outros dois volumes há uma aproximação maior<br />

com o conceito <strong>de</strong> crônica, sobretudo as que figuram em<br />

De cães, <strong>de</strong> gatos, <strong>de</strong> gente, nas quais Milliet se revela um<br />

animalista apaixonado, gran<strong>de</strong> e carinhoso conhecedor<br />

da alma animal. A pequena crônica sobre suas ativida<strong>de</strong>s<br />

como pintor, sob os olhos <strong>de</strong> seu cachorro, Barbet, faz as<br />

<strong>de</strong>lícias <strong>de</strong> todo apaixonado por bichos e tem anotações<br />

saborosas, <strong>de</strong> um observador atento dos amigos <strong>de</strong> qua‑<br />

tro patas: “Barbet não gosta muito quando pinto cachor‑<br />

ros. Rosna e por vezes late.”. Ao que o cronista reflete<br />

que ele talvez mudasse <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong>, se fossem ca<strong>de</strong>las.<br />

Muito respeitado em sua época, crítico e pensador, escre‑<br />

vendo com elegância e impressionando “pela capacida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> dizer o essencial <strong>de</strong> forma simples” (Antonio Candido),<br />

Sérgio Milliet continua atual, provocativo e muito agradá‑<br />

vel <strong>de</strong> se ler. O que <strong>mais</strong> <strong>de</strong>sejar?<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

ZUENIR VENTURA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

José Carlos Santos <strong>de</strong> Azeredo<br />

Zuenir Ventura (1931)<br />

Natural <strong>de</strong> Além Paraíba, MG<br />

1 a edição – 400 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0947 ‑8<br />

Dizem que a boa crônica é como um passeio sem sair da<br />

poltrona, graças às artes mágicas do cronista. Se assim for, as<br />

crônicas <strong>de</strong> Zuenir Ventura são como um gran<strong>de</strong> passeio pelo<br />

Brasil, os múltiplos Brasis que convivem entre as fronteiras<br />

amazônicas e o oceano Atlântico, um país marcado pela vio‑<br />

lência, os conflitos sociais, as espertezas <strong>de</strong> toda espécie, mas<br />

também por um invejável senso <strong>de</strong> humor, muito <strong>mais</strong> inte‑<br />

ressante e espontâneo que o tal sense of humour dos ingleses,<br />

um negócio meio artificial, feito <strong>de</strong> ironia e <strong>de</strong>silusão. No<br />

humor um tanto ingênuo do brasileiro palpita vida, irreverên‑<br />

cia, esperança, por vezes sarcasmo e violência. Como enten‑<br />

<strong>de</strong>r esse país contraditório, esbanjando alegria <strong>de</strong> viver,<br />

rebel<strong>de</strong> e conformado ao mesmo tempo?<br />

Muitos já tentaram <strong>de</strong>cifrar o enigma. O cronista tem<br />

também suas explicações, formuladas na instigante crônica<br />

“O Brasil o que é?” A conclusão? Bem, o Brasil não é um<br />

país para principiantes. E ninguém melhor do que Zuenir<br />

conhece essa verda<strong>de</strong> elementar. Ele é um veterano no co‑<br />

nhecimento do Brasil.<br />

Como jornalista viajou milhares <strong>de</strong> quilômetros pelo<br />

país, embrenhou ‑se na selva, conheceu moradores da flo‑<br />

resta e das favelas, as igrejas baianas e as mineiras, os pam‑<br />

pas e o sertão, conviveu com escritores, músicos, homens<br />

públicos. Como morador do Rio <strong>de</strong> Janeiro elegeu a cida<strong>de</strong>,<br />

uma espécie <strong>de</strong> síntese dos mil e um contrastes do Brasil<br />

(que po<strong>de</strong>m ser apreciados numa viagem <strong>de</strong> Ipanema ao<br />

Complexo da Maré), como um dos motivos preferidos <strong>de</strong><br />

suas crônicas. E <strong>de</strong>sses fatos, personagens e cida<strong>de</strong>s, Zuenir<br />

Ventura extrai a matéria viva <strong>de</strong> suas crônicas, pessoais,<br />

leves e incisivas, com ligeiras pitadas <strong>de</strong> ironia e um intenso<br />

po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> comunicação, nas quais “domina a arte <strong>mais</strong> di‑<br />

fícil que existe, a arte <strong>de</strong> parecer que não há arte” (Luis<br />

Fernando Verissimo).<br />

M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />

75


C o l e ç ã o<br />

M e l h o r t e a t r o<br />

DIREÇÃO<br />

SÁBATO MAGALDI<br />

MARTINS PENA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong> Gabriel Fe<strong>de</strong>ricci<br />

Martins Pena (1815­1848) – Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

76<br />

M e l h o r e s t e a t r o P r e l o<br />

Os autores <strong>mais</strong> renomados da dramaturgia bra‑<br />

sileira e suas peças <strong>mais</strong> consagradas foram reuni‑<br />

dos pela <strong>Global</strong> <strong>Editora</strong> para fazer parte da coleção<br />

Melhor Teatro. Dirigida por Sábato Magaldi, um<br />

nome sagrado da crítica teatral brasileira, a coleção<br />

tem seus textos pesquisados e as peças escolhidas<br />

por estudiosos da obra <strong>de</strong> cada autor. Cada obra<br />

apresenta, assim, o trabalho <strong>mais</strong> significativo do<br />

autor tratado. Além disso, traz biografia, bibliografia<br />

e estudo introdutório.<br />

Esta coleção visa a atingir não só os estudiosos da<br />

dramaturgia brasileira e portuguesa como também<br />

todos os leitores que se interessam pela arte magní‑<br />

fica do teatro.


ARTUR AZEVEDO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Barbara Heliodora<br />

Artur Azevedo (1855 ‑1908)<br />

Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />

1 a edição – 368 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1332 ‑2<br />

Coedição ABL<br />

Consi<strong>de</strong>rado por Barbara Heliodora como “o <strong>mais</strong> apai‑<br />

xonado e <strong>de</strong>dicado homem <strong>de</strong> teatro <strong>de</strong> toda a nossa histó‑<br />

ria das artes cênicas”, Artur Azevedo reinou durante <strong>mais</strong> <strong>de</strong><br />

trinta <strong>anos</strong> na cena brasileira, sem rival, absoluto na prefe‑<br />

rência popular. Suas peças, leves, espirituosas, sem pirotec‑<br />

nias verbais ou técnicas, faziam o público sonhar, se comover<br />

e, sobretudo, rir a ban<strong>de</strong>iras <strong>de</strong>spregadas, como então se<br />

dizia. O escritor foi sempre coerente consigo mesmo. Entre<br />

sua primeira comédia, Amor por anexins, escrita na adoles‑<br />

cência, e a produção da maturida<strong>de</strong>, não se nota nenhum<br />

<strong>de</strong>svio <strong>de</strong> rota, nenhuma inclinação para o pessimismo ou a<br />

revolta, apesar <strong>de</strong> ter experimentado, como toda criatura<br />

humana, momentos amargos. Ignorava ‑os. Pelo menos, no<br />

momento <strong>de</strong> escrever.<br />

Suas peças, sejam as operetas ou as comédias <strong>de</strong> cos‑<br />

tume, se situam num mundo on<strong>de</strong> não existe malda<strong>de</strong>,<br />

mas malícia, on<strong>de</strong> os dramas que <strong>de</strong>spontam se resolvem<br />

com uma palavra espirituosa ou uma piada, sem ninguém,<br />

nunca, per<strong>de</strong>r o bom humor. Vencedores e vencidos, mari‑<br />

dos traídos e esposas traidoras (ou o contrário) acabam<br />

sempre por se solidarizar, em nome da alegria, do final feliz<br />

e <strong>de</strong> uma boa gargalhada.<br />

Para tanto, o teatrólogo tinha sua fórmula infalível,<br />

que sabia dosar como ninguém ao gosto popular, e que<br />

sintetizou da seguinte maneira: “Agradam ‑me, não há dú‑<br />

vida, as peças <strong>de</strong> pouco enredo, que conseguem pren<strong>de</strong>r a<br />

atenção do público por meio <strong>de</strong> cenas episódicas discreta‑<br />

mente cosidas à ação geral”. Com essa fórmula simples,<br />

costurada pelo talento, construiu uma série <strong>de</strong> peças <strong>de</strong>s‑<br />

pretensiosas, alegres, brasileiríssimas, que o espectador<br />

nunca esquece, chamem ‑se elas A capital fe<strong>de</strong>ral, O mam‑<br />

bembe ou O genro <strong>de</strong> muitas sogras, trabalhos que inte‑<br />

gram este volume do Melhor teatro Artur Azevedo.<br />

M e l h o r T e a T r o<br />

DOMINGOS OLIVEIRA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

João Roberto Faria<br />

Domingos Oliveira (1936)<br />

Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

1 a edição – 368 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0811 ‑0<br />

Domingos Oliveira acredita que “o teatro tem o tama‑<br />

nho da vida” e que nele o homem po<strong>de</strong> “exercer a forma<br />

<strong>mais</strong> interessante da sabedoria”, “a loucura sob controle”.<br />

Teatrólogo e diretor <strong>de</strong> cinema, Domingos Oliveira<br />

exerce há <strong>mais</strong> <strong>de</strong> quarenta <strong>anos</strong> a arte <strong>de</strong> manter a lou‑<br />

cura sob controle. São <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta peças, entre originais,<br />

adaptações e traduções. Desse universo, foram seleciona‑<br />

dos quatro trabalhos para integrar o volume <strong>de</strong> Melhor<br />

teatro Domingos Oliveira: Do fundo do lago escuro, Amo‑<br />

res, Separações e A primeira valsa.<br />

As quatro peças valorizam experiências pessoais do autor,<br />

transformadas e enriquecidas pela imaginação e a criativida<strong>de</strong>,<br />

uma mistura <strong>de</strong> memória e ficção. Do fundo do lago escuro<br />

dramatiza fatos <strong>de</strong> sua infância, vivida em uma família carioca<br />

<strong>de</strong> classe média alta, nos <strong>anos</strong> 1950. Drama e comédia ao<br />

mesmo tempo, <strong>mais</strong> drama do que comédia, revelando um<br />

lado escuro e amargo do ser humano. A primeira valsa, título<br />

simbólico que resume o espírito da peça, não isenta <strong>de</strong> uma<br />

certa amargura, apresenta o ingresso na vida adulta e a expe‑<br />

riência do casamento. Como a <strong>de</strong>finiu o próprio autor: “uma<br />

história meio verda<strong>de</strong>, meio mentira... uma história da vida,<br />

tirada na última hora e da boca aberta <strong>de</strong>la mesma, a Morte”.<br />

Nas outras duas peças, ambientadas nos <strong>anos</strong> 1990, o clima é<br />

<strong>mais</strong> ameno. Amores analisa as crises domésticas e afetivas <strong>de</strong><br />

uma família da Zona Sul carioca, um tanto <strong>de</strong>sagregada. Sepa‑<br />

rações, como já sugere o título, aborda a insatisfação matrimo‑<br />

nial, que fatalmente conduz à separação e a uma posterior<br />

reaproximação <strong>de</strong> marido e mulher. Apesar <strong>de</strong> tangenciar o<br />

drama, em vários momentos, a peça é uma comédia <strong>de</strong> costu‑<br />

mes, sem aci<strong>de</strong>z, leve, bem ‑humorada, <strong>de</strong> certa forma uma<br />

reverência ao teatro, que, como observou o autor, “talvez não<br />

seja a coisa <strong>mais</strong> bela que o homem inventou, mas talvez seja<br />

a que <strong>mais</strong> se parece com a vida”.<br />

M e l h o r T e a T r o<br />

77


GIANFRANCESCO<br />

GUARNIERI<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Décio <strong>de</strong> Almeida Prado<br />

Gianfrancesco Guarnieri (1934 ‑2006)<br />

Natural <strong>de</strong> Milão, Itália<br />

2 a edição – 280 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0092 ‑6<br />

O teatro <strong>de</strong> Gianfrancesco Guarnieri é como um grito<br />

parado no ar. Um protesto contra a apatia, o conformismo,<br />

o comodismo egoísta dos bem ‑pensantes e dos mal inten‑<br />

cionados, através da <strong>de</strong>núncia social, da ironia quase sar‑<br />

casmo, da revolta.<br />

Des<strong>de</strong> sua estreia, em 1958, com Eles não usam black‑<br />

‑tie, Guarnieri trouxe um alento novo ao teatro brasileiro.<br />

Numa atitu<strong>de</strong> quase <strong>de</strong> provocação, a peça se passa num<br />

morro carioca, entre operários, em um momento <strong>de</strong> greve<br />

que divi<strong>de</strong> dramaticamente uma família. O tema reaparece,<br />

com <strong>mais</strong> intensida<strong>de</strong>, em A semente (1961). Operários “<strong>de</strong>‑<br />

finidos em função <strong>de</strong> sua categoria, atuando coletivamente<br />

contra os patrões” eram um fato <strong>de</strong>sconhecido no teatro bra‑<br />

sileira, como observa Décio <strong>de</strong> Almeida Prado. O ineditismo<br />

da situação, aliada à qualida<strong>de</strong> dramática das peças, explica a<br />

sua imensa repercussão. Coerente consigo mesmo, sem re‑<br />

cuar um milímetro <strong>de</strong> sua combativida<strong>de</strong>, Guarnieri lança em<br />

1973 o seu protesto, em forma <strong>de</strong> metáfora, contra a toda<br />

po<strong>de</strong>rosa censura, então instalada no país. Um grito parado<br />

no ar apresenta o ensaio <strong>de</strong> uma peça, que o espectador<br />

nunca irá conhecer, interrompido a cada momento por inter‑<br />

ferências externas e internas. A indignação com o momento<br />

político é o centro <strong>de</strong> Ponto <strong>de</strong> partida (1976), uma parábola<br />

sobre o autoritarismo. A peça se <strong>de</strong>senvolve numa al<strong>de</strong>ia lon‑<br />

gínqua, perdida no espaço e no tempo, mas os acontecimen‑<br />

tos não <strong>de</strong>ixam dúvida a que país e época se referem. Essas<br />

quatro peças, reunidas no Melhor teatro Gianfrancesco Guar‑<br />

nieri, compreen<strong>de</strong>m uma fase da carreira <strong>de</strong> Guarnieri, mas já<br />

assinalam o espírito <strong>de</strong> toda a sua obra, centrada na política.<br />

Elas propõem também, como observa Décio <strong>de</strong> Almeida<br />

Prado ao espectador (e ao leitor), o paradoxo <strong>de</strong> que “não é<br />

preciso partir <strong>de</strong> suas premissas i<strong>de</strong>ológicas para admirá ‑las<br />

enquanto lição humana e realização estética”.<br />

78<br />

M e l h o r T e a T r o<br />

JUCA DE OLIVEIRA<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Jefferson Del Rios<br />

Juca <strong>de</strong> Oliveira (1935)<br />

Natural <strong>de</strong> São Roque, SP<br />

1 a edição – 360 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1<strong>39</strong>1 ‑9<br />

Ator que dispensa apresentação, Juca <strong>de</strong> Oliveira cos‑<br />

tuma também frequentar a cena teatral como autor <strong>de</strong> comé‑<br />

dias das <strong>mais</strong> representativas do espírito <strong>de</strong> nossa época.<br />

Her<strong>de</strong>iro <strong>de</strong> uma tradição duas vezes milenar, que<br />

nasce na Grécia com Aristófanes, faz Paris morrer <strong>de</strong> rir<br />

com Molière e Fey<strong>de</strong>au, encanta as iaiás e ioiôs do século<br />

XIX brasileiro com Martins Pena e França Júnior, Juca não<br />

<strong>de</strong>smerece esses ascen<strong>de</strong>ntes ilustres, mas se encaixa nessa<br />

linhagem <strong>de</strong> maneira muito pessoal, com um humor agres‑<br />

sivo e surpreen<strong>de</strong>nte, que “acerta o golpe quando o pú‑<br />

blico se distrai”, como observa Jefferson Del Rios no prefácio<br />

do Melhor teatro Juca <strong>de</strong> Oliveira.<br />

Mas trata ‑se <strong>de</strong> “um assaltante do bem”, cujos golpes<br />

não ferem, mas fazem o público rir e se <strong>de</strong>liciar com a rapi‑<br />

<strong>de</strong>z dos diálogos, o efeito surpresa servido a cada frase, com<br />

humor incisivo, mas nunca <strong>de</strong>scompromissado. As comédias<br />

<strong>de</strong> Juca são marcadas por uma análise em tom <strong>de</strong> gozação,<br />

mas ferina, aos hábitos sociais, como a banalização da liber‑<br />

da<strong>de</strong> sexual, como em Qualquer gato vira ‑lata tem uma vida<br />

sexual <strong>mais</strong> sadia que a nossa, mas se caracterizam, sobre‑<br />

tudo, pela crítica político ‑humorística contun<strong>de</strong>nte, no que<br />

se refere às mazelas da vida pública do país.<br />

Essa dramaturgia mergulha os seus alicerces na lama<br />

dos atos políticos, empresariais e familiares, revelando o<br />

seu espírito já no titulo das peças: Às favas com os escrú‑<br />

pulos, Baixa socieda<strong>de</strong>, Caixa dois e Motel Paradiso.<br />

A crítica aos atos é dura, mas o dramaturgo ja<strong>mais</strong><br />

chega à cruelda<strong>de</strong> com seus personagens. “Os seus cana‑<br />

lhas são expostos em público, mas sem o açoite dos pole‑<br />

mistas virulentos. Há uma fração <strong>de</strong> tempo em que eles são<br />

até passíveis <strong>de</strong> compreensão irônica”, observa Jefferson<br />

Del Rios. Talvez porque Juca, sendo um “moralista no ver‑<br />

da<strong>de</strong>iro sentido filosófico”, é também um sentimental.<br />

M e l h o r T e a T r o


MARIA ADELAIDE<br />

AMARAL<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Silvana Garcia<br />

Maria A<strong>de</strong>lai<strong>de</strong> Amaral (1942)<br />

Natural <strong>de</strong> Porto, Portugal<br />

1 a edição – 336 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1064 ‑6<br />

O nome <strong>de</strong> Maria A<strong>de</strong>lai<strong>de</strong> Amaral começou a se tornar<br />

conhecido do público em 1978, com a estreia <strong>de</strong> Bodas <strong>de</strong><br />

papel. O sucesso se repetiu no ano seguinte, com a encena‑<br />

ção <strong>de</strong> A resistência, a primeira peça escrita pela autora, que<br />

havia quatro <strong>anos</strong> aguardava o momento <strong>de</strong> subir à cena.<br />

A resistência reproduz o ambiente <strong>de</strong> redação <strong>de</strong> uma<br />

revista em <strong>de</strong>cadência, na qual a autora trabalhava, tendo<br />

como pano <strong>de</strong> fundo o clima político dos <strong>anos</strong> 1970. A<br />

peça se <strong>de</strong>senvolve em um único dia <strong>de</strong> trabalho, suge‑<br />

rindo duas realida<strong>de</strong>s complementares, as angústias, as<br />

esperanças, os <strong>de</strong>scontentamentos dos jornalistas em rela‑<br />

ção à empresa, à carreira, ao cotidiano, e a atmosfera <strong>de</strong><br />

repressão política e cultural, cuja realida<strong>de</strong> se impõe <strong>de</strong> ma‑<br />

neira indireta, mas indisfarçável.<br />

A ação <strong>de</strong> Bodas <strong>de</strong> papel se limita a três horas da vida<br />

<strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong> pessoas, encerradas em um apartamento <strong>de</strong><br />

luxo, convidadas para um jantar, envolvidas numa espécie<br />

<strong>de</strong> jogo do po<strong>de</strong>r. Os conflitos nascem e se aguçam ao cho‑<br />

que <strong>de</strong> sentimentos e interesses, revelando seres frágeis, ego‑<br />

ístas, isolados em si mesmos, sem objetivos na vida, exceto o<br />

sucesso financeiro, frustrados, mas ansiosos <strong>de</strong> se impor aos<br />

<strong>de</strong><strong>mais</strong>. De Braços abertos aponta <strong>mais</strong> uma vez para as difi‑<br />

culda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> relacionamento dos seres hum<strong>anos</strong>. No caso, um<br />

amor ameaçado pelo ciúme, a frustração, as diferenças <strong>de</strong><br />

classe social, e envolto num clima <strong>de</strong> permanentes provoca‑<br />

ções e <strong>de</strong>savenças, acirrando o sofrimento recíproco. O<br />

mesmo <strong>de</strong>sejo incontrolável <strong>de</strong> ferir e provocar o outro, a<br />

incompreensão e a incomunicabilida<strong>de</strong> formam o clima <strong>de</strong><br />

Querida mamãe, retrato <strong>de</strong> uma relação conflituosa <strong>de</strong> mãe<br />

e filha. Aqui, como nas outras três peças citadas, reunidas no<br />

Melhor teatro Maria A<strong>de</strong>lai<strong>de</strong> Amaral, como observou Sá‑<br />

bato Magaldi, ao tratar <strong>de</strong> um caso particular, “tem o dom<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>itar luz sobre a generalida<strong>de</strong> das coisas”.<br />

M e l h o r T e a T r o<br />

PLÍNIO MARCOS<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Ilka Marinho Zanotto<br />

Plínio Marcos (1935 ‑1999)<br />

Natural <strong>de</strong> Santos, SP<br />

1 a edição – 288 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0815 ‑3<br />

Des<strong>de</strong> a estreia <strong>de</strong> Vestido <strong>de</strong> noiva, <strong>de</strong> Nelson Rodri‑<br />

gues, em 1943, o teatro brasileiro não sofria um impacto<br />

semelhante ao produzido pelas peças <strong>de</strong> Plínio Marcos. O<br />

teatrólogo santista lançava no palco, sem os filtros e as con‑<br />

venções habituais, toda a brutalida<strong>de</strong> do bas ‑fond das cida‑<br />

<strong>de</strong>s brasileiras. Assassinos, prostitutas, malandros e<br />

<strong>de</strong>sajustados <strong>de</strong> todos os tipos viviam, diante dos olhos es‑<br />

tatelados da plateia, situações <strong>de</strong> violência extrema e berra‑<br />

vam em linguagem chula a sua angústia, a tortura da solidão,<br />

a miséria da <strong>de</strong>cadência física, em tom <strong>de</strong> <strong>de</strong>safio, mas tam‑<br />

bém na busca <strong>de</strong>sesperada <strong>de</strong> um sentido para a vida.<br />

“Será que somos gente? berra a prostituta. Através da<br />

simplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sta pergunta transparece a gravida<strong>de</strong> e o pa‑<br />

thos moral das indagações <strong>mais</strong> profundas da filosofia”<br />

(Anatol Rosenfeld). A pergunta, com outras palavras, foi re‑<br />

petida ao longo <strong>de</strong> toda a obra do escritor. Sem resposta.<br />

Plínio Marcos iniciou sua carreira teatral em 1958,<br />

com Barrela, espetáculo representado uma única vez, <strong>de</strong>‑<br />

pois <strong>de</strong> ter sido censurado e liberado, tendo “por <strong>de</strong>stino<br />

ser o maior sucesso <strong>de</strong> escândalo <strong>de</strong> nosso teatro em todos<br />

os tempos e imediatamente proibido durante 21 longos<br />

<strong>anos</strong>”, informa Ilka Marinho Zanotto no prefácio do Me‑<br />

lhor teatro Plínio Marcos. As peças seguintes (Dois perdidos<br />

numa noite suja, Navalha na carne, O abajur lilás e Querô,<br />

para citar apenas as reunidas neste volume) foram encena‑<br />

das, proibidas, perseguidas, louvadas, execradas, discutidas<br />

em nível moral, mas nunca ninguém duvidou <strong>de</strong> suas qua‑<br />

lida<strong>de</strong>s teatrais, da <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> dramática, da força lanci‑<br />

nante dos diálogos. Por sua autenticida<strong>de</strong>, as peças <strong>de</strong><br />

Plínio não per<strong>de</strong>m nada quando lidas. Po<strong>de</strong>m até ganhar<br />

alguma coisa, permitindo uma pausa para pensar ou ame‑<br />

nizar o impacto <strong>de</strong> sua crueza, o que o turbilhão da ence‑<br />

nação ao vivo não permite.<br />

M e l h o r T e a T r o<br />

79


C o l e ç ã o<br />

r o t e i r o d a P o e s i a<br />

B r a s i l e i r a<br />

DIREÇÃO<br />

EDLA VAN STEEN<br />

A coleção Roteiro da Poesia Brasileira apresenta um<br />

panorama abrangente da evolução poética em nosso<br />

país, dos poetas precursores do século XVI aos dias<br />

atuais, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma tradição quase duas vezes se‑<br />

cular. As primeiras antologias poéticas, surgidas no<br />

início do século XIX – o Parnaso brasileiro (1829 ‑<br />

1832), <strong>de</strong> Januário da Cunha Barbosa, e o Florilégio<br />

da poesia brasileira (1850), <strong>de</strong> Varnhagen –, estavam<br />

orientadas por um processo seletivo, mas voltadas<br />

basicamente para a preservação do patrimônio poé‑<br />

tico. Pautadas por um sentido crítico <strong>mais</strong> aguçado,<br />

mas traduzindo também o gosto <strong>de</strong> suas épocas, as<br />

gerações seguintes acrescentaram um novo fator às<br />

80<br />

antologias, o sentido <strong>de</strong> reavaliação do material se‑<br />

lecionado por seus antecessores. Enquanto isso, a<br />

partir <strong>de</strong> certa época, tornaram ‑se comuns antolo‑<br />

gias <strong>de</strong> poetas contemporâneos.<br />

Nunca, porém, autores do passado e contemporâ‑<br />

neos conviveram no mesmo trabalho, como elos <strong>de</strong><br />

uma mesma ca<strong>de</strong>ia, ligados pela sequência natural<br />

da evolução <strong>de</strong> nossa poesia.<br />

Essa é a gran<strong>de</strong> novida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sta coleção. Confiada a<br />

especialistas das respectivas áreas, a coleção dirigida<br />

por Edla van Steen abre o mesmo espaço ao passado<br />

e ao presente, po<strong>de</strong>ndo, pois, ser dividida em dois<br />

campos.<br />

Os sete primeiros volumes (Raízes, Arcadismo, Roman‑<br />

tismo, Parnasianismo, Simbolismo, Pré ‑Mo<strong>de</strong>rnismo e<br />

Mo<strong>de</strong>rnismo) são <strong>de</strong>dicados ao legado do passado, com<br />

reavaliações importantes <strong>de</strong> poemas e autores. Os oito<br />

volumes seguintes apresentam um levantamento e sele‑<br />

ção inéditos da produção poética brasileira a partir do<br />

Pós ‑Mo<strong>de</strong>rnismo, exercendo uma primeira seleção nos<br />

textos <strong>de</strong> época, englobados década a década: <strong>anos</strong> 30,<br />

40, 50, 60, 70, 80, 90 e 2000. Dessa forma, esta coleção<br />

constitui não apenas a <strong>mais</strong> ampla antologia da poesia<br />

brasileira até hoje elaborada, como a <strong>mais</strong> atualizada.


ANOS 30<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Ivan Junqueira<br />

1 a edição – 176 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1150 ‑2<br />

Her<strong>de</strong>ira das conquistas léxicas, prosódicas e estético‑<br />

‑for<strong>mais</strong> do Mo<strong>de</strong>rnismo, a poesia escrita na década <strong>de</strong><br />

1930 caracteriza ‑se, acima <strong>de</strong> tudo, “por uma distensão da<br />

linguagem e do ritmo, o que po<strong>de</strong> ser entendido como<br />

uma inevitável consequência histórica e literária das pro‑<br />

postas que integravam o i<strong>de</strong>ário transgressor da Semana <strong>de</strong><br />

Arte Mo<strong>de</strong>rna”, conforme observa Ivan Junqueira no pre‑<br />

fácio do volume <strong>de</strong>dicado aos Anos 30, da coleção Roteiro<br />

da Poesia Brasileira.<br />

Numa visão sintética, os poetas surgidos no período re‑<br />

pudiavam quaisquer tendências românticas, i<strong>de</strong>alistas ou par‑<br />

nasianas, buscando afirmar ‑se como brasileiros, sem vínculos<br />

com mo<strong>de</strong>los europeus, através da formulação <strong>de</strong> uma nova<br />

técnica <strong>de</strong> representação da vida e a adoção <strong>de</strong> uma expres‑<br />

são verbal tipicamente brasileira, apta a retratar conflitos, con‑<br />

tradições, misérias e gran<strong>de</strong>zas da vida contemporânea.<br />

Foi a época <strong>de</strong> surgimento <strong>de</strong> Carlos Drummond <strong>de</strong><br />

Andra<strong>de</strong>, que se “apresenta como que aquém e além do<br />

movimento mo<strong>de</strong>rnista”, do coloquialismo <strong>de</strong> Henriqueta<br />

Lisboa, do grave e melancólico Emílio Moura, do humor<br />

feérico e epigramático <strong>de</strong> Murilo Men<strong>de</strong>s, do Cobra No‑<br />

rato, <strong>de</strong> Raul Bopp, “o <strong>mais</strong> estranho poema <strong>de</strong> toda a li‑<br />

teratura brasileira” (José Osório <strong>de</strong> Almeida), do ainda<br />

hesitante Vinicius <strong>de</strong> Moraes, in<strong>de</strong>ciso entre os apelos da<br />

carne e o impulso religioso, da refinada Cecília Meireles,<br />

“tocada pela música e a espiritualida<strong>de</strong>”, da amarga Lila<br />

Ripoll, da “poesia <strong>de</strong> expressão quase franciscana” <strong>de</strong><br />

Odylo Costa, filho, do ciclópico Gerardo Mello Mourão, do<br />

inclassificável Jamil Almansur Haddad e <strong>de</strong> Manoel <strong>de</strong> Bar‑<br />

ros, poeta das insignificâncias ou, como ele mesmo se <strong>de</strong>‑<br />

fine, das "ignorãças". Uma época que re<strong>de</strong>finiu os rumos<br />

da poesia brasileira.<br />

R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a<br />

ANOS 40<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Luciano Rosa<br />

1 a edição – 224 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1151 ‑9<br />

A década <strong>de</strong> 1940 é um momento crucial na história da<br />

mo<strong>de</strong>rna poesia brasileira. Her<strong>de</strong>iros do caos <strong>de</strong> tendências<br />

contraditórias do mo<strong>de</strong>rnismo e dos conservadores, que <strong>de</strong><br />

certa forma ainda cultivavam os valores parnasi<strong>anos</strong>, os poe‑<br />

tas que surgiam não encontravam nenhum movimento orga‑<br />

nizado em que se apoiar. O mo<strong>de</strong>rnismo estava morto e<br />

sepultado? Talvez, mas era um morto incômodo. Tanto assim,<br />

que os novos poetas procuravam, antes <strong>de</strong> tudo, se opor a<br />

ele. Como o adolescente em busca <strong>de</strong> se libertar da imagem<br />

esmagadora do pai tirano. Libertação po<strong>de</strong> ser a palavra <strong>de</strong><br />

or<strong>de</strong>m da chamada Geração <strong>de</strong> 45, o grupo que se impôs<br />

com <strong>mais</strong> força em meio à multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vozes da época.<br />

Mas liberda<strong>de</strong> custa caro e é preciso saber para on<strong>de</strong> se vai.<br />

Os jovens poetas proclamavam, então, “a revisão da poética<br />

empreendida no Brasil a partir <strong>de</strong> 1922” – como observa Lu‑<br />

ciano Rosa –, adotando novas técnicas do verso, revalorizando<br />

a métrica e a rima, explorando uma temática voltada em par‑<br />

ticular para os problemas existenciais. Mas a herança mo<strong>de</strong>r‑<br />

nista era esmagadora e um crítico da importância <strong>de</strong> Tristão<br />

<strong>de</strong> Athay<strong>de</strong> <strong>de</strong>slumbrou na obra <strong>de</strong>sses poetas não uma rup‑<br />

tura, mas um prolongamento das experiências <strong>de</strong> 1922,<br />

utilizando ‑se da expressão neomo<strong>de</strong>rnismo para classificá ‑los.<br />

A esse grupo, <strong>mais</strong> ou menos coeso, juntavam ‑se ou‑<br />

tras tendências sem nenhuma afinida<strong>de</strong> com ele ou mesmo<br />

entre si. Vozes solitárias, cuja única ligação com os <strong>de</strong><strong>mais</strong><br />

poetas era a ativida<strong>de</strong> contemporânea. Caso <strong>de</strong> João Ca‑<br />

bral <strong>de</strong> Melo Neto, <strong>de</strong> Joaquim Cardoso, <strong>de</strong> Dante Milano,<br />

<strong>de</strong> Mário Quintana. Este negava pertencer a qualquer es‑<br />

cola poética, observando que “o melhor é seguir cada um<br />

no seu barquinho, e talvez alguns consigam chegar à outra<br />

margem. Isto é: chegar à posterida<strong>de</strong>”.<br />

Este panorama dos Anos 40 mostra uma insuspeitada<br />

riqueza poética e que muitos barquinhos chegaram à pos‑<br />

terida<strong>de</strong>.<br />

81<br />

R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a


ANOS 50<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

André Seffrin<br />

1 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1152 ‑6<br />

Um dos períodos <strong>mais</strong> férteis e turbulentos da poesia<br />

brasileira do século XX, os <strong>anos</strong> 1950 assinalam o surgi‑<br />

mento <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> novos autores e <strong>de</strong> tendên‑<br />

cias, que iriam redirecionar, inquietar e enriquecer a nossa<br />

poesia.<br />

De um lado, havia um grupo <strong>de</strong> poetas cultos, requin‑<br />

tados artífices <strong>de</strong> ritmo e imagem, cultores do velho so‑<br />

neto, que “contribuíram notavelmente para incrementar o<br />

grau <strong>de</strong> consciência técnica e cultural do verso brasileiro,<br />

sem contudo explorar, no mesmo diapasão, suas virtualida‑<br />

<strong>de</strong>s crítico ‑cognitivas” (José Guilherme Merquior).<br />

Em paralelo a esses artífices, alinhavam ‑se movimentos<br />

<strong>de</strong> vanguarda, como a poesia concreta, voltada para a cria‑<br />

ção <strong>de</strong> poema que fosse um objeto ‑mensagem, com estru‑<br />

tura visual em formas geométricas, e o Neoconcretismo,<br />

dissidência do Concretismo, que se afirmou a partir <strong>de</strong> 1957,<br />

mas cujo manifesto só foi assinado dois <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois.<br />

Autores das duas tendências conviviam sem gran<strong>de</strong>s<br />

atritos, utilizando ‑se amplamente <strong>de</strong> seções específicas em<br />

revistas e dos suplementos literários, muitos vigorosos à<br />

época. O Suplemento Dominical do Jornal do Brasil marcou<br />

época, aberto às experiências <strong>de</strong> vanguarda, ao <strong>de</strong>bate <strong>de</strong><br />

i<strong>de</strong>ias e à revisão histórica da poesia brasileira, empreen‑<br />

dida por Mário Faustino, que, <strong>de</strong> certa forma, foi o respon‑<br />

sável pelo vínculo entre as várias tendências poéticas.<br />

Para representar essa época complexa, preocupada em<br />

preservar a tradição e disposta a todas as inovações, foram<br />

selecionados 56 poetas, apresentados por or<strong>de</strong>m cronológica<br />

<strong>de</strong> estreia, cada um com três poemas selecionados, procu‑<br />

rando ‑se <strong>de</strong>ssa forma, “tanto quanto possível dar voz a todas<br />

as vertentes e tendências”, conforme André Seffrin.<br />

82<br />

R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a<br />

ANOS 60<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Pedro Lyra<br />

1 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1153 ‑3<br />

A década <strong>de</strong> 1960 foi <strong>de</strong> fortes contrastes. No campo<br />

político teve início a ditadura militar, que sufocou o país<br />

durante <strong>mais</strong> <strong>de</strong> vinte <strong>anos</strong>. No terreno cultural, eclodiram<br />

os movimentos <strong>de</strong> resistência que, perseguidos pela cen‑<br />

sura e pela polícia, criaram novas formas <strong>de</strong> manifestação<br />

artística. Surgia, assim, o Cinema Novo, o Tropicalismo, a<br />

imprensa nanica, as publicações alternativas. Foi um período<br />

artístico rico, <strong>de</strong> extrema contundência, <strong>de</strong>senvolvido <strong>de</strong><br />

forma quase sempre clan<strong>de</strong>stina.<br />

Em que pese todos os contratempos, a poesia brasi‑<br />

leira viveu uma das fases <strong>mais</strong> criativas <strong>de</strong> sua história, com<br />

o surgimento <strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong> excelentes poetas e um<br />

amplo “sincretismo” <strong>de</strong> estilos e tendências, com vozes <strong>de</strong><br />

todos os estados. Sob esse aspecto, ela foi “a primeira ge‑<br />

ração verda<strong>de</strong>iramente nacional da poesia brasileira”,<br />

como observa Pedro Lyra no prefácio <strong>de</strong>sta obra.<br />

Os caminhos também foram múltiplos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a manu‑<br />

tenção <strong>de</strong> elementos tradicionais <strong>de</strong> expressão poética (poesia<br />

lírica, épica, <strong>de</strong> protesto social, metapoesia) aos experimenta‑<br />

lismos <strong>de</strong> vanguarda expressos no radicalismo do poema‑<br />

‑processo, (pregando em algumas realizações a própria<br />

eliminação da palavra), sem esquecer a poesia <strong>de</strong> resistência<br />

ao regime (chamada <strong>de</strong> alternativa ou marginal), recorrendo<br />

ao mimeógrafo e ao xerox para divulgar a sua mensagem.<br />

Pela sua segmentação nestas três gran<strong>de</strong>s vertentes e<br />

suas subdivisões, a geração dos <strong>anos</strong> 1960 foi a que apre‑<br />

sentou a maior diversida<strong>de</strong> estilística, formal, temática e<br />

i<strong>de</strong>ológica da história da poesia brasileira, mesmo sob a<br />

permanente ameaça do cutelo da repressão, do terror ins‑<br />

titucional, das perseguições. E, <strong>de</strong> certa forma, através <strong>de</strong><br />

vários <strong>de</strong> seus representantes, a sua voz, as suas inquieta‑<br />

ções e a sua ânsia <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> continuam presentes em<br />

nossos dias.<br />

R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a


ANOS 70<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Afonso Henriques Neto<br />

1 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1154‑0<br />

Na década <strong>de</strong> 1970, a poesia brasileira viveu um período<br />

sem similar na sua longa evolução, marcada pela insatisfa‑<br />

ção, a contestação social e política, a busca da liberda<strong>de</strong>.<br />

Poesia <strong>de</strong> resistência, como a classifica Afonso Henriques<br />

Neto no prefácio, em reação a um período marcado pela<br />

repressão aos movimentos culturais e sociais, mas também<br />

<strong>de</strong> busca <strong>de</strong> integração aos ventos do espírito que sopra‑<br />

vam em todo o mundo.<br />

Os <strong>anos</strong> 1960, com sua acelerada mudança <strong>de</strong> costumes,<br />

<strong>de</strong>saguou no cenário <strong>de</strong> 1968, com o fortalecimento das dita‑<br />

duras militares latino ‑americanas, a Guerra do Vietnã, a luta<br />

contra o “perigo comunista”. Em contrapartida, surgiam os<br />

movimentos pacifistas, a onda hippie, o Maio <strong>de</strong> 1968, em<br />

Paris, a música dos Beatles e dos Rolling Stones, a disseminação<br />

dos “paraísos artificiais” e, no Brasil, o movimento tropicalista.<br />

Foi nesse cenário <strong>de</strong> inquietação e esperança que sur‑<br />

giram os poetas da chamada “Geração AI ‑5” (em referên‑<br />

cia ao Ato Institucional n o 5, <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1968), cujas<br />

obras ganharam <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong> o rótulo <strong>de</strong> “poesia marginal”.<br />

Essa marginalida<strong>de</strong> se estendia às publicações, livros tos‑<br />

cos, muitos <strong>de</strong>les utilizando o mimeógrafo, vendidos pelos<br />

autores em bares e em restaurantes.<br />

Sem uma unida<strong>de</strong> estilística, que formasse uma es‑<br />

cola, “a aproximação entre os poetas se dá, na maior parte<br />

das vezes, <strong>mais</strong> em termos comportamentais do que em<br />

relação às obras em si”, observa Afonso Henriques. Ou,<br />

como disse o poeta Cacaso: “Isto não é um movimento li‑<br />

terário. É um poemão. É como se todos estivéssemos escre‑<br />

vendo o mesmo poema a 1.000 mãos”.<br />

Para selecionar os poetas participantes <strong>de</strong>sse poemão,<br />

o organizador dos Anos 70 se restringiu aos autores que<br />

estrearam em livro naquela década, mesmo que publi‑<br />

cando poemas há muito na imprensa. E, apesar da tonali‑<br />

da<strong>de</strong> própria <strong>de</strong> voz <strong>de</strong> cada um, eles formam um coro<br />

afinado e envolvente.<br />

R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a<br />

ANOS 80<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Ricardo Vieira Lima<br />

1 a edição – 248 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1155 ‑7<br />

A renovação poética que se processou na década <strong>de</strong><br />

1980 não foi muito bem percebida à época. Foi uma espécie<br />

<strong>de</strong> terremoto subterrâneo. Os sismógrafos críticos não o<br />

captaram. Era natural. O país, <strong>de</strong> certa forma, renascia do<br />

longo pesa<strong>de</strong>lo da ditadura, com a abertura <strong>de</strong>mocrática,<br />

“lenta, segura e gradual”, e não percebia com clareza o que<br />

se <strong>de</strong>senrolava, pelo menos no plano da poesia. Mas, como<br />

em toda época <strong>de</strong> renascimento, uma nova sensibilida<strong>de</strong><br />

estava no ar. Os poetas jovens não queriam <strong>mais</strong> saber <strong>de</strong><br />

poesia engajada e <strong>de</strong> protestos políticos.<br />

O sonho <strong>de</strong> mudar o Brasil e o mundo chegara ao fim.<br />

As mortes <strong>de</strong> Vinicius <strong>de</strong> Moraes e John Lennon aumenta‑<br />

ram essa certeza. Assim, o artista engajado, o poeta <strong>de</strong> van‑<br />

guarda, os hippies e o tripé sexo, drogas e rock ‑and ‑roll<br />

saiam <strong>de</strong>finitivamente <strong>de</strong> cena.<br />

Iniciava ‑se a época da cultura pop, dos yuppies, do te‑<br />

atro besteirol. O público leitor se interessava pelas memórias<br />

<strong>de</strong> exílio (Fernando Gabeira, Frei Beto), os romances políti‑<br />

cos, os livros ‑reportagem, as biografias <strong>de</strong> notabilida<strong>de</strong>s.<br />

Os novos poetas, com os olhos fixos em si mesmos, fa‑<br />

lando <strong>de</strong> seus interesses, aspirações e perplexida<strong>de</strong>s, tinham<br />

também uma consciência técnica <strong>mais</strong> aprimorada que seus<br />

colegas <strong>de</strong> geração anterior e gostavam <strong>de</strong> estudar. Eram <strong>mais</strong><br />

refinados e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes. “A poesia volta à literatura e se<br />

torna exigente”, observou Heloisa Buarque <strong>de</strong> Hollanda.<br />

Essa nova poesia foi chamada <strong>de</strong> pós ‑mo<strong>de</strong>rnista, mas<br />

Ricardo Vieira Lima, no prefácio aos Anos 80, prefere o<br />

termo pluralismo, que <strong>de</strong>finiria melhor o vasto entrecruza‑<br />

mento <strong>de</strong> tendências, ligados por dois pontos comuns: a<br />

reflexão poética e o apuro do verso.<br />

Anos 80 oferece ao leitor um vasto panorama da<br />

época, reunindo obras <strong>de</strong> cinquenta e cinco poetas, <strong>de</strong> todas<br />

as tendências e regiões do país.<br />

83<br />

R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a


ANOS 90<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Paulo Ferraz<br />

1 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1156 ‑4<br />

Na década <strong>de</strong> 1990, o mundo acelerou o passo e o<br />

compasso, as inovações tecnológicas mudaram a socie‑<br />

da<strong>de</strong>, afetando o cotidiano e a vida <strong>de</strong> todos. Falou ‑se,<br />

como nunca, no fim das utopias e até mesmo no fim da<br />

história. Todos aguardavam, ansiosos, pelo admirável<br />

mundo novo, regulado pela tecnologia e a harmonia social.<br />

Simples <strong>de</strong>vaneios. O que ocorreu, na realida<strong>de</strong>, foi a vitó‑<br />

ria massacrante da banalização, numa socieda<strong>de</strong> que <strong>de</strong>s‑<br />

preza os valores hum<strong>anos</strong> para valorizar, sobretudo, o<br />

espetáculo.<br />

No meio <strong>de</strong>sse liquidificador social e <strong>de</strong>pois das expe‑<br />

riências radicais, como o concretismo, a poesia conseguiu<br />

sair ilesa, e <strong>de</strong> certa forma rejuvenescida pela busca dos poe‑<br />

tas em exprimirem a si mesmos e ao mundo estonteante em<br />

que todos vivemos, apesar (e talvez por isso) <strong>de</strong>ste mundo<br />

não lhes provocar a mínima empatia. Coisa difícil, numa pai‑<br />

sagem social que provoca o <strong>de</strong>sencanto e o mal ‑estar, le‑<br />

vando os poetas à intransigência com o que os cerca, uma<br />

das características <strong>mais</strong> marcantes <strong>de</strong>ssa geração.<br />

Este balanço da última década do século XX reúne 45<br />

poetas, <strong>de</strong> todas as regiões do país, cada um tentando ex‑<br />

pressar a sua busca poética e vital. Como observa o orga‑<br />

nizador do volume, Paulo Ferraz, “<strong>de</strong>sconfiando <strong>de</strong> verda <strong>de</strong>s<br />

alheias, os textos selecionados, entre outras características,<br />

põem ‑se como mecanismos <strong>de</strong> cognição e <strong>de</strong> re<strong>de</strong>scoberta<br />

das sensações. Mais que pensados, são poemas pensando,<br />

que visam a produzir no leitor um estado <strong>de</strong> reflexão seme‑<br />

lhante, <strong>de</strong> tal modo que ele também se interrogue ao ver‑<br />

‑se envolto por objetos emu<strong>de</strong>cidos”. É ler, <strong>de</strong>scobrir,<br />

sintonizar e pensar.<br />

84<br />

R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a<br />

ANOS 2000<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Marco Lucchesi<br />

1 a edição – 184 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1157‑1<br />

Ao contrário dos <strong>de</strong><strong>mais</strong> volumes da coleção Roteiro da<br />

Poesia Brasileira, trabalhados em perspectivas históricas, os<br />

Anos 2000 põem no ombro do organizador a difícil missão <strong>de</strong><br />

fisgar, i<strong>de</strong>ntificar e valorizar, como representativos da época,<br />

um grupo <strong>de</strong> poetas vivos e atuantes no período <strong>de</strong> 2000 a<br />

2006, “num país <strong>de</strong> tão vastas proporções e no seio <strong>de</strong> um<br />

presente que se mostra praticamente inabordável, num oceano<br />

<strong>de</strong> publicações reais e virtuais”, observa Marco Lucchesi.<br />

Real e virtual, no caso, se traduzem por centenas <strong>de</strong><br />

sites, <strong>de</strong> maior ou menor acessibilida<strong>de</strong>, revistas reais e vir‑<br />

tuais, edições <strong>de</strong> autor, a maior parte das quais nem chega<br />

ao <strong>de</strong>pósito legal.<br />

Apesar das dificulda<strong>de</strong>s, Lucchesi buscou incluir em<br />

sua seleção tendências poéticas <strong>de</strong> todas as regiões e esta‑<br />

dos do país, fornecendo um retrato fiel do panorama atual<br />

da poesia brasileira.<br />

Um panorama no qual “alguns críticos sublinham uma<br />

espécie <strong>de</strong> dispersão ou <strong>de</strong> atomização, diante da quebra do<br />

<strong>de</strong>rra<strong>de</strong>iro paradigma – ou bastião – cabralino”, outros pre‑<br />

ferem apontar “seus autores como resíduos epigonais” dos<br />

gran<strong>de</strong>s poetas do século XX, como Drummond, João Ca‑<br />

bral ou os concretistas. “Outros há que buscam <strong>de</strong>finir ten‑<br />

dências literárias, utilizando expressões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m política,<br />

<strong>de</strong>finindo os poetas como inovadores, conservadores ou ne‑<br />

oconservadores, partindo – muitas vezes – do dogma abso‑<br />

luto <strong>de</strong> uma presumida contemporaneida<strong>de</strong>.”.<br />

Com a consciência da dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma seleção,<br />

Marco Lucchesi ressalta que “o que apresentamos agora<br />

não se constitui numa proposta crítica cerrada, mas numa<br />

aproximação, paisagem móvel que reúne as folhas disper‑<br />

sas <strong>de</strong> um livro plural, aberto e inacabado”, formado por<br />

trinta poetas que, bem ou mal, traduzem o gosto e as ten‑<br />

dências <strong>de</strong> sua geração.<br />

R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a


ARCADISMO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Domício Proença Filho<br />

1 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1144 ‑8<br />

Primeiro grupo homogêneo <strong>de</strong> poetas da literatura<br />

brasileira, os árca<strong>de</strong>s não <strong>de</strong>ixaram apenas uma obra rica e<br />

saborosa. De certa forma, ainda timidamente, elaboraram<br />

também uma espécie <strong>de</strong> prefácio à autonomia da literatura<br />

brasileira, que os românticos iriam concretizar e proclamar<br />

com som e com fúria.<br />

Portugueses pela expressão, internacionais pela temática,<br />

Tomás Antonio Gonzaga, Cláudio Manuel da Costa, Alvarenga<br />

Peixoto, Basílio da Gama, Silva Alvarenga e Santa Rita Durão,<br />

com maior ou menor força e ousadia, já se i<strong>de</strong>ntificam com a<br />

terra e revelam traços inconfundíveis <strong>de</strong> sensibilida<strong>de</strong> brasileira,<br />

sem que disso tenham consciência.<br />

O português Gonzaga, filho <strong>de</strong> brasileira, encarnando ‑se<br />

em Dirceu, “honrado pastor” da al<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Marília, <strong>de</strong>ixa<br />

aflorar sob as convenções temáticas umas <strong>de</strong>liciosas vibra‑<br />

ções do que seria, <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, a alma brasileira. Cláudio<br />

Manuel respon<strong>de</strong> ao apelo da terra por oposição,<br />

admirando ‑se <strong>de</strong> “que entre penhas tão duras se criara/<br />

uma alma terna, um peito sem dureza!”. Foi o <strong>mais</strong> ligado<br />

aos mo<strong>de</strong>los arcádicos, mas alguns críticos o apontam<br />

como “o <strong>mais</strong> profundamente preso às emoções e valores<br />

da terra” (Antonio Candido). Mas em matéria <strong>de</strong> brasili‑<br />

da<strong>de</strong>, ninguém supera o mulato Domingos Caldas Barbosa<br />

– já bem afastado do Arcadismo – <strong>de</strong>ngoso, sensual, can‑<br />

tador <strong>de</strong> lundu, cujo sucesso em Portugal encheu <strong>de</strong> inveja<br />

o peito <strong>de</strong> Bocage. Cantava coisas assim: “Não posso<br />

negar, não posso,/ não posso por <strong>mais</strong> que queira,/ que o<br />

meu coração se abrasa/ <strong>de</strong> ternura brasileira”. Abrasar ‑se<br />

<strong>de</strong> ternura brasileira era, em suma, apresentar prenúncios<br />

do Romantismo, que o leitor sensível po<strong>de</strong> <strong>de</strong>tectar, em<br />

alguns casos <strong>de</strong> forma muito incipiente, no <strong>de</strong>licado Silva<br />

Alvarenga, em Basílio da Gama, o maior <strong>de</strong> todos, e até<br />

mesmo no misterioso autor das Cartas chilenas, o primeiro<br />

poema político da literatura brasileira.<br />

R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a<br />

MODERNISMO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Walnice Nogueira Galvão<br />

1 a edição – 184 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1149 ‑6<br />

O Mo<strong>de</strong>rnismo virou a literatura brasileira <strong>de</strong> pernas<br />

pro ar. Des<strong>de</strong>nhando os padrões estéticos vigentes até<br />

então, audaciosos e <strong>de</strong>safiadores, os jovens que se reuniram<br />

no Teatro Municipal <strong>de</strong> São Paulo, em 1922 (e seus seguido‑<br />

res), trouxeram para as nossas letras e artes um frisson novo<br />

e, sobretudo, um <strong>de</strong>splante como até então não se havia<br />

visto, implantando uma autêntica revolução cultural, que se<br />

esten<strong>de</strong>u a todos os setores da vida intelectual do país. Seu<br />

lema po<strong>de</strong>ria ser: mudança radical ou nada.<br />

Uma das frentes <strong>de</strong> combate <strong>mais</strong> visíveis, e por isso<br />

mesmo, <strong>mais</strong> atacada, perseguida e ridicularizada foi a poe‑<br />

sia. Substituindo a gravida<strong>de</strong> do soneto bilaquiano pelo<br />

poema ‑piada, dando a<strong>de</strong>us à rima e à métrica, apunha‑<br />

lando as formas poéticas tradicionais, valorizando o colo‑<br />

quial, iconoclastas e zombeteiros, os jovens mo<strong>de</strong>rnistas<br />

afrontavam não apenas os velhos <strong>de</strong>uses da poesia brasi‑<br />

leira, como também o gosto do povo.<br />

O combate foi duro, mas compensador. “A eferves‑<br />

cência renovadora expressou ‑se em vários tipos <strong>de</strong> ativi‑<br />

da<strong>de</strong>, cenáculos, manifestos, salões, revistas e festivais”,<br />

lembra Walnice Nogueira Galvão, prolongando ‑se até os<br />

começos da década <strong>de</strong> 1930. Por essa época, o que havia<br />

sido subversivo passara a ser imitado, e alguns nomes se<br />

fixaram <strong>de</strong>finitivamente no gosto do público e no conceito<br />

da crítica.<br />

Um roteiro poético da época po<strong>de</strong> seguir muitos ca‑<br />

minhos. Walnice Nogueira Galvão, com critério seguro,<br />

optou pela seleção das principais figuras do movimento,<br />

aquelas que realmente <strong>de</strong>ixaram sua marca em nossa poe‑<br />

sia, <strong>de</strong>zessete poetas que sintetizam o que <strong>de</strong> <strong>mais</strong> impor‑<br />

tante o movimento produziu, alguns <strong>de</strong>les incorporados<br />

em <strong>de</strong>finitivo à sensibilida<strong>de</strong> popular.<br />

85<br />

R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a


PARNASIANISMO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Sânzio <strong>de</strong> Azevedo<br />

1 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1146 ‑4<br />

Aristocrático em sua origem, pregando a arte pela<br />

arte e a impassibilida<strong>de</strong>, o Parnasianismo se adoçou e se<br />

humanizou no Brasil. Em vez da frieza do mármore, exal‑<br />

tada pelos franceses, os poetas brasileiros cultivaram um<br />

discreto sentimentalismo e um exacerbado sensualismo.<br />

Claro que, tudo isso, sob o <strong>mais</strong> restrito culto à forma, que<br />

Olavo Bilac sintetizou e consagrou nos versos famosos da<br />

“Profissão <strong>de</strong> fé”, “vibrando a lança/ em prol do Estilo!”.<br />

Dessa forma, a versificação alcançou um requinte até<br />

então <strong>de</strong>sconhecido na literatura brasileira, com imagens<br />

<strong>mais</strong> sóbrias e linguagem <strong>mais</strong> pura do que a <strong>de</strong> seus ante‑<br />

cessores, excluídos até mesmo muitos brasileirismos. O li‑<br />

rismo, em muitos momentos, se abeberou na velha tradição<br />

portuguesa, que se origina nos poetas dos cancioneiros. O<br />

soneto predominou, com seu fecho <strong>de</strong> ouro, levando ao<br />

<strong>de</strong>lírio poetas, poetastros e <strong>de</strong>clamadores.<br />

Pois, apesar do rigor formal, da introdução <strong>de</strong> temas e<br />

motivos que po<strong>de</strong>riam afastar o leitor, acostumado ao embalo<br />

dos românticos, os poetas parnasi<strong>anos</strong> conseguiram uma no‑<br />

tável popularida<strong>de</strong>. Seus versos foram recitados em salões e<br />

saraus, talvez com a mesma embriaguez dos bons tempos do<br />

Romantismo. Com sua magia verbal, o lirismo sensual, a ca‑<br />

pacida<strong>de</strong> “<strong>de</strong> ouvir e <strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r estrelas”, Bilac foi o último<br />

poeta realmente popular da nossa literatura. Príncipe dos po‑<br />

etas brasileiros. Sua corte era povoada por um esplêndido<br />

time <strong>de</strong> súditos: Alberto <strong>de</strong> Oliveira e Raimundo Correa, os<br />

outros dois membros da trinda<strong>de</strong> parnasiana; Vicente <strong>de</strong> Car‑<br />

valho, gran<strong>de</strong> pintor do mar; Luís Delfino, sensual e ousado,<br />

<strong>de</strong>sfrutando à época <strong>de</strong> imensa popularida<strong>de</strong>; o sóbrio Ma‑<br />

chado <strong>de</strong> Assis; e tantos outros milhares, pois poetar se tornou<br />

então um quase vício. A presente antologia inclui <strong>de</strong>zenove<br />

poetas, <strong>de</strong> expressão diversa, abrangendo todas as tendências<br />

e expressões do Parnasianismo brasileiro.<br />

86<br />

R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a<br />

PRÉ ­MODERNISMO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Alexei Bueno<br />

1 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1148 ‑9<br />

Os historiadores da poesia brasileira costumam con‑<br />

ceituar como Pré ‑Mo<strong>de</strong>rnista a produção das duas décadas<br />

que antece<strong>de</strong>ram a Semana <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna <strong>de</strong> 1922.<br />

Essa visão, <strong>mais</strong> histórica e/ou sociológica, abrange um pe‑<br />

ríodo <strong>de</strong> intenso choque <strong>de</strong> tendências, em que parnasia‑<br />

nos e simbolistas ainda estavam ativos, assistindo ao vago<br />

<strong>de</strong>sabrochar <strong>de</strong> novas tendências.<br />

Na realida<strong>de</strong>, é um conceito negativo, como observa<br />

Alexei Bueno no prefácio ao volume Pré ‑Mo<strong>de</strong>rnismo, “que<br />

só se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>finir pela negação, referindo ‑se àquilo que, sem<br />

ser mo<strong>de</strong>rnista, já não seria <strong>mais</strong> exatamente parnasiano ou<br />

simbolista”.<br />

Foi nessa época que surgiu um gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> poe‑<br />

tas que, <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, iriam a<strong>de</strong>rir ao Mo<strong>de</strong>rnismo. Daí a di‑<br />

ficulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> se escolher, com rigor, os representantes <strong>de</strong>sse<br />

vago Pré ‑Mo<strong>de</strong>rnismo. Alexei Bueno selecionou catorze<br />

nomes significativos do período, advertindo que “po<strong>de</strong>riam<br />

em gran<strong>de</strong> parte ser outros”.<br />

Feita a ressalva, a seleção é impecável, incluindo <strong>de</strong> figu‑<br />

ras ainda com muitos vínculos com o Parnasianismo, como<br />

Ama<strong>de</strong>u Amaral, e o camoniano José Albano, até poetas fran‑<br />

camente mo<strong>de</strong>rnos (no sentido real da palavra, mo<strong>de</strong>rno e<br />

não mo<strong>de</strong>rnista), como Felipe <strong>de</strong> Oliveira, ou <strong>de</strong> afirmação<br />

feminista e erotismo agressivo, como Gilka Machado.<br />

Po<strong>de</strong> ‑se dizer, com algum exagero, que cada poeta re‑<br />

presentava uma tendência, bastando lembrar o nome dos<br />

<strong>de</strong><strong>mais</strong> selecionados: o angustiado Hermes Fontes, o então<br />

prestigiadíssimo Raul Machado, Ronald <strong>de</strong> Carvalho, Murilo<br />

Araújo, Tasso da Silveira, Raul <strong>de</strong> Leoni, Ribeiro Couto, Moacir<br />

<strong>de</strong> Almeida, Onestaldo <strong>de</strong> Pennafort e, acima <strong>de</strong> todos,<br />

sobressaindo ‑se como a gran<strong>de</strong> figura do período, o estra‑<br />

nho e enigmático Augusto dos Anjos, o qual basta para dig‑<br />

nificar qualquer período e qualquer literatura.<br />

R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a


RAÍZES<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Ivan Teixeira<br />

1 a edição – 323 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1143 ‑4<br />

Desconhecida da maioria dos leitores, a poesia brasi‑<br />

leira do período colonial constitui uma crônica apaixonante<br />

do processo <strong>de</strong> integração do homem à terra, <strong>de</strong> sua luta<br />

por incorporá ‑la à civilização oci<strong>de</strong>ntal e, ao mesmo tempo,<br />

plantar o que se convencionou chamar <strong>de</strong> as raízes da<br />

nossa literatura.<br />

Ainda no século do <strong>de</strong>scobrimento, José <strong>de</strong> Anchieta<br />

poetava com leveza e unção, no “estilo humil<strong>de</strong> da oração<br />

<strong>de</strong>vota” – como observa Ivan Teixeira no prefácio do vo‑<br />

lume –, com o objetivo maior <strong>de</strong> livrar os índios da barbárie<br />

e atá ‑los à fé católica. A Prosopopeia, do cristão novo<br />

Bento Teixeira, concebida “como uma espécie <strong>de</strong> prolonga‑<br />

mento ou apêndice” (Ivan Teixeira) <strong>de</strong> Os lusíadas, po<strong>de</strong><br />

também ser lida como uma ficção histórica sobre as origens<br />

do Brasil.<br />

No século XVII, com a consolidação das cida<strong>de</strong>s, os<br />

poetas se multiplicam e cantam por conta própria, com<br />

revolta e <strong>de</strong>sfaçatez pela voz <strong>de</strong> Gregório <strong>de</strong> Matos, o pri‑<br />

meiro poeta nascido no Brasil, ou com <strong>de</strong>slumbramento<br />

pela terra natal, como o fez o baiano Botelho <strong>de</strong> Oliveira,<br />

autor da Música do Parnaso, o primeiro livro <strong>de</strong> autor bra‑<br />

sileiro a ser impresso, inspirador da “Descrição da ilha <strong>de</strong><br />

Itaparica”, <strong>de</strong> frei Manuel <strong>de</strong> Santa Maria Itaparica.<br />

O século XVIII, o século das aca<strong>de</strong>mias, produziu uma<br />

enxurrada <strong>de</strong> poetas, preocupados com futilida<strong>de</strong>s, pecu‑<br />

liar ao espírito agudo e engenhoso da época, que Ivan Tei‑<br />

xeira interpreta como um <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> integrar o país “ao<br />

código civilizado da Europa”.<br />

Para este volume <strong>de</strong> Raízes, Ivan Teixeira selecionou oito<br />

poetas e 79 poemas, alguns longos e com transcrição inte‑<br />

gral, que sintetizam a evolução da poesia brasileira nos três<br />

primeiros séculos e traçam um quadro instigante da socie‑<br />

da<strong>de</strong> colonial, com suas virtu<strong>de</strong>s, mazelas e aspirações.<br />

R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a<br />

ROMANTISMO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Antonio Carlos Secchin<br />

1 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1145 ‑8<br />

Em nenhuma época da história da nossa literatura a<br />

poesia esteve tão perto do povo. Brasileiros até a cutícula,<br />

sonhadores exaltados, líricos revoltados, os poetas român‑<br />

ticos encarnavam os anseios e sonhos da nacionalida<strong>de</strong> –<br />

através da visão i<strong>de</strong>alizada e paradisíaca da natureza, da<br />

exaltação <strong>de</strong> nossa história, do louvor ao indígena –, mas<br />

também os <strong>de</strong>sejos, as frustrações e as perplexida<strong>de</strong>s do<br />

homem, os <strong>de</strong>lírios <strong>de</strong> amor <strong>de</strong> iaiás e ioiôs, o mergulho<br />

perturbador na própria alma, expressos numa linguagem<br />

doce, por vezes quase melosa, muito distante da sintaxe<br />

dura dos portugueses. O público reconhecia ‑se naqueles<br />

poemas, lidos na forma impressa e divulgados em recitati‑<br />

vos, em reuniões e saraus, ao som do piano.<br />

Introduzido no Brasil em 1836, com o aparecimento<br />

dos Suspiros poéticos e sauda<strong>de</strong>s, <strong>de</strong> Gonçalves <strong>de</strong> Maga‑<br />

lhães, o Romantismo reinou sobre mentes e corações até<br />

1870, ano <strong>de</strong> publicação das Espumas flutuantes, <strong>de</strong> Cas‑<br />

tro Alves, consi<strong>de</strong>rado o fim da escola. Durante esses quase<br />

quarenta <strong>anos</strong> surgiram centenas e centenas <strong>de</strong> poetas,<br />

algumas figuras extraordinárias (Gonçalves Dias, Álvares <strong>de</strong><br />

Azevedo, Castro Alves, Fagun<strong>de</strong>s Varela), das quais se<br />

aproximam poetas como Casimiro <strong>de</strong> Abreu e Junqueira<br />

Freire, uma galeria extensa <strong>de</strong> poetas menores e uma infi‑<br />

nida<strong>de</strong> <strong>de</strong> versejadores inclassificáveis.<br />

Alguns antologistas do período se circunscrevem aos<br />

principais nomes do período. Antonio Carlos Secchin optou<br />

por uma seleção <strong>mais</strong> abrangente, com a inclusão <strong>de</strong> um<br />

bom número <strong>de</strong> epígonos, menos significativos em termos<br />

estritos <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> literária, mas indispensáveis na fixa‑<br />

ção integral da sensibilida<strong>de</strong> da época e <strong>de</strong> suas múltiplas<br />

vertentes, figuras pouco lembradas, como Bruno Seabra,<br />

Carlos Ferreira e Narcisa Amália, sem os quais o perfil da<br />

nossa poesia romântica ficaria incompleto.<br />

87<br />

R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a


SIMBOLISMO<br />

Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />

Lauro Junkes<br />

1 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1147 ‑2<br />

Inquietos, <strong>de</strong>scontentes com os estreitos limites da vida<br />

cotidiana, cultivando o vago, o in<strong>de</strong>finível, o que está para<br />

além do mistério, os simbolistas trouxeram à poesia brasileira<br />

um frêmito novo. Instalados em suas torres <strong>de</strong> marfim, repu‑<br />

diando a brutalida<strong>de</strong> do mundo, movimentando ‑se num ter‑<br />

ritório mágico <strong>de</strong> sonho, entre névoas e brumas, ansiosos por<br />

aquela paz que não é <strong>de</strong>ste planeta, os cavalheiros do símbolo<br />

viveram essa busca <strong>de</strong> forma dramática e até mesmo lanci‑<br />

nante e contraditória. Não raras vezes, o <strong>mais</strong> elevado misti‑<br />

cismo conflitou com a plena entrega aos paraísos artificiais.<br />

No plano estético, os simbolistas elevaram ‑se a alturas<br />

poucas vezes alcançadas pela poesia brasileira, apesar <strong>de</strong><br />

nunca gozarem da popularida<strong>de</strong> dos poetas românticos e<br />

<strong>de</strong> alguns parnasi<strong>anos</strong>. Lá no alto, muito acima do chão, entre<br />

as “Estrelas <strong>de</strong> cristais gelados”, como disse lindamente o<br />

Cisne Negro, pairam Cruz e Sousa e Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens,<br />

cuja alma se tornou “trigo <strong>de</strong> Deus no céu aberto...”.<br />

Em níveis <strong>mais</strong> mo<strong>de</strong>stos, mas cheio <strong>de</strong> encantamen‑<br />

tos e seduções, o leitor encontra um grupo <strong>de</strong> poetas ad‑<br />

miráveis e pouco divulgados: o sentimental Mário Pe<strong>de</strong>r ‑<br />

neiras, apaixonado pela vida pequeno ‑burguesa carioca; o<br />

angustiado Marcelo Gama; Auta <strong>de</strong> Sousa, com sua eleva‑<br />

díssima espiritualida<strong>de</strong>; Severiano <strong>de</strong> Resen<strong>de</strong>, estranho e<br />

rebel<strong>de</strong>, espécie <strong>de</strong> anjo <strong>de</strong>caído; o voluptuoso Maranhão<br />

Sobrinho; o hermético Pedro Kilkerry; o melancólico Ernani<br />

Rosas. Nesta antologia figuram 24 poetas, selecionados<br />

com extrema exigência por Lauro Junkes, que teve a cora‑<br />

gem e o bom senso <strong>de</strong> incluir, ao lado dos consagrados,<br />

nomes conhecidos apenas por especialistas, como Narciso<br />

Araújo e Érico Curado. Valeu. Ao conhecê ‑los, o leitor en‑<br />

contrará excelentes surpresas. Para alguns, daquelas sur‑<br />

presas que nunca se esquecem.<br />

88<br />

R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a


C o l e ç ã o<br />

C o r r e s P o n d ê n C i a s<br />

CORRESPONDÊNCIA DE MACHADO DE ASSIS<br />

Aca<strong>de</strong>mia Brasileira <strong>de</strong> Letras<br />

C o r r e s P o n d ê n C i a s P r e l o<br />

Escrever cartas é um ato que se assemelha ao da<br />

confissão. Numa carta, seu autor costuma revelar<br />

para seu correspon<strong>de</strong>nte e para si mesmo reflexões<br />

que, na maioria das vezes, não sente disposição<br />

para expor em público. O espaço privado das corres‑<br />

pondências permite que o sujeito que as escreve<br />

faça juízos surpreen<strong>de</strong>ntes, revele sentimentos au‑<br />

tocensurados e exponha seus projetos pessoais para<br />

seu futuro. A <strong>Global</strong> <strong>Editora</strong>, através <strong>de</strong> sua coleção<br />

Correspondências, tenciona trazer à tona esse uni‑<br />

verso intimista da nossa literatura, publicando cartas<br />

<strong>de</strong> personalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> relevo da cultura brasileira.<br />

89


AÍ VAI MEU CORAÇÃO<br />

AS CARTAS DE TARSILA DO<br />

AMARAL E ANNA MARIA<br />

MARTINS PARA LUÍS MARTINS<br />

Ana Luísa Martins<br />

2 a edição – 248 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1494 ‑7<br />

Um dia, mexendo na gaveta da escrivaninha <strong>de</strong> seu<br />

pai, a menina <strong>de</strong> oito <strong>anos</strong> <strong>de</strong>scobriu uma coleção <strong>de</strong> fotos,<br />

bilhetes, cartas <strong>de</strong> mulheres a ele en<strong>de</strong>reçadas, que a <strong>de</strong>i‑<br />

xou intrigada. Voltou lá várias vezes, <strong>de</strong>cifrando <strong>de</strong> forma<br />

apaixonada aquela papelada amarelada pelo tempo.<br />

Concluiu que o pai, antes <strong>de</strong> se casar com sua mãe,<br />

tivera um outro amor e que as cartas <strong>de</strong>ssa mulher miste‑<br />

riosa e <strong>de</strong> sua mãe encontravam ‑se juntas na mesma ga‑<br />

veta. O caso seria apenas uma história doméstica, que<br />

po<strong>de</strong>ria dar no máximo um conto, não fossem os persona‑<br />

gens nela envolvidos.<br />

O pai da menina era o cronista, romancista, poeta Luís<br />

Martins, a namorada anterior ao casamento, a pintora Tar‑<br />

sila do Amaral e a esposa, Anna Maria Martins.<br />

A menina, Ana Luísa Martins, tornou ‑se mulher e, ao<br />

longo dos <strong>anos</strong>, leu e releu muitas vezes essa correspon‑<br />

dência, até o dia em que, convicta <strong>de</strong> que aquele material<br />

não pertencia apenas à família, mas era uma rica fonte <strong>de</strong><br />

informação para a biografia do pai e da pintora, resolveu<br />

editá ‑las, esclarecendo num prefácio interessantíssimo os<br />

meandros daquela história.<br />

Luís Martins foi o último companheiro <strong>de</strong> Tarsila.<br />

Quando se uniram, ele tinha vinte e seis <strong>anos</strong> e ela, qua‑<br />

renta e sete. A diferença <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>s era consi<strong>de</strong>rada na<br />

época um escândalo. No entanto, o relacionamento durou<br />

<strong>de</strong>zoito <strong>anos</strong> e muitas cartas. O rompimento se <strong>de</strong>u quando<br />

Luís se casou com Anna Maria, parente próximo <strong>de</strong> Tarsila,<br />

provocando um atrito familiar.<br />

A correspondência reunida em Aí vai meu coração re‑<br />

produz cartas en<strong>de</strong>reçadas ao escritor, escritas por Tarsila e<br />

Anna Maria no início da década <strong>de</strong> 1950. Do escritor não<br />

restaram cartas <strong>de</strong>ssa época, que permitissem restabelecer<br />

o possível diálogo epistolar. Não importa. O material apre‑<br />

sentado é da maior importância, “um presente para o fu‑<br />

turo literário <strong>de</strong> São Paulo” (Lygia Fagun<strong>de</strong>s Telles).<br />

90<br />

C o r r e s p o n d ê n C i a s<br />

CâMARA CASCUDO E<br />

MÁRIO DE ANDRADE<br />

CARTAS, 1924 ­1944<br />

Organização e notas <strong>de</strong><br />

Marcos Antonio <strong>de</strong> Moraes<br />

1 a edição – 384 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1481 ‑7<br />

Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> adorava escrever cartas. Em quan‑<br />

tida<strong>de</strong>, ninguém o superou no Brasil. Sua imensa corres‑<br />

pondência acha ‑se reunida em quase vinte volumes e, por<br />

certo, ainda falta muita coisa a compilar. Com Luís da Câ‑<br />

mara Cascudo, o criador <strong>de</strong> Macunaíma se correspon<strong>de</strong>u<br />

durante vinte <strong>anos</strong>, <strong>de</strong> 1924 a 1944, revelando aspectos<br />

pessoais <strong>de</strong> ambos, aspirações e preocupações intelectuais<br />

e uma profunda afinida<strong>de</strong> <strong>de</strong> espírito. As cartas trocadas<br />

têm ainda “a virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> ser uma das fontes <strong>de</strong> duas déca‑<br />

das da história literária do país e, talvez, a primeira ligação<br />

intelectual entre o Su<strong>de</strong>ste e o Nor<strong>de</strong>ste”, observa Dióge‑<br />

nes da Cunha Lima no prefácio.<br />

A sincerida<strong>de</strong> e a preocupação com a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> da<br />

alma brasileira são aspectos marcantes <strong>de</strong>ssa correspondên‑<br />

cia, com pontos <strong>de</strong> vista quase sempre concordantes. “Nós<br />

temos que dar uma alma ao Brasil”, escreve Mário ao amigo,<br />

empenhado em registrar a verda<strong>de</strong>ira i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> do país. A<br />

afinida<strong>de</strong> espiritual ampliou a admiração recíproca, por vezes<br />

balançada pela discordância, logo contornada pela com‑<br />

preensão da liberda<strong>de</strong> intelectual. “Não somos padres e sa‑<br />

cristãos para viver rosnando amém”, escreve Cascudo.<br />

Tanto Mário como Cascudo mostravam ‑se cautelosos<br />

em relação ao <strong>de</strong>stino da correspondência. Mário era radical:<br />

“Sou tão orgulhoso, que tenho sempre na minha pasta <strong>de</strong><br />

escrivaninha uma carta pedindo, caso eu morra, que meus<br />

inéditos sejam <strong>de</strong>struídos”. Talvez blefasse. Cascudo, “ciu‑<br />

mento <strong>de</strong>ssa correspondência”, segundo Diógenes Lima,<br />

autorizou ‑o a publicá ‑la “<strong>de</strong>pois que para mim a noite che‑<br />

gasse”. A noite chegou, como chegou o momento <strong>de</strong> publi‑<br />

cação da correspondência, que Afonso Arinos <strong>de</strong> Melo<br />

Franco, com exagero <strong>de</strong> admiração, achava que seriam tão<br />

importantes quanto as epístolas <strong>de</strong> São Paulo.<br />

C o r r e s p o n d ê n C i a s


s é r i e<br />

e s t a n t e G l o B a l<br />

DIREÇÃO<br />

A. P. QUARTIM DE MORAES<br />

Esta é uma série <strong>de</strong> romances aberta a autores bra‑<br />

sileiros <strong>de</strong> todos os estilos, inclusive estreantes no<br />

gênero. A Estante <strong>Global</strong>, série perfeitamente en‑<br />

quadrada no alto padrão <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conteúdo,<br />

que é marca <strong>de</strong> nosso catálogo, é também <strong>mais</strong><br />

uma iniciativa que reafirma o compromisso da <strong>Global</strong><br />

<strong>Editora</strong> com a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prestigiar e incentivar<br />

a produção literária brasileira.<br />

91


A FALA DO CÉU<br />

Ricardo Prado<br />

1 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1559 ‑3<br />

A mo<strong>de</strong>rna ficção brasileira está repleta <strong>de</strong> boas sur‑<br />

presas para os leitores. Nos últimos <strong>anos</strong>, os jovens ficcio‑<br />

nistas, em romances e contos, vêm apresentando uma<br />

visão original do país, da condição humana e da própria<br />

sobrevivência da humanida<strong>de</strong>, neste conturbado mundo<br />

em que vivemos. Uma das características <strong>de</strong>sses escritores<br />

é a linguagem <strong>de</strong>spojada, direta, livre <strong>de</strong> preciosismos, pe‑<br />

culiar à nossa época, fundamental para se estabelecer uma<br />

comunicação imediata com os leitores.<br />

Essa comunicação é um dos pontos altos do romance<br />

A fala do céu, estreia <strong>de</strong> Ricardo Prado no gênero. A histó‑<br />

ria se passa em Tremedal, on<strong>de</strong> a chuva cai, sem intervalos,<br />

há muitos <strong>anos</strong>. Como é peculiar a muitos lugares isolados,<br />

a cida<strong>de</strong> sofre o domínio implacável <strong>de</strong> uma família, pos‑<br />

suidora <strong>de</strong> um mítico anel tomado dos bugres locais.<br />

Numa simbologia da tradição política latino ‑americana,<br />

que conce<strong>de</strong> aos po<strong>de</strong>rosos o direito <strong>de</strong> apontar seu subs‑<br />

tituto, quando o velho cacique político entra em coma, seus<br />

dois filhos passam a disputar o seu anel. A rivalida<strong>de</strong> se<br />

aprofunda ainda <strong>mais</strong> com o interesse dos rapazes pelo<br />

amor <strong>de</strong> Helena, a forasteira com o ouvido “<strong>mais</strong> que per‑<br />

feito”, capaz <strong>de</strong> ouvir os menores ruídos, os sons <strong>mais</strong> in<strong>de</strong>‑<br />

sejáveis, os <strong>mais</strong> íntimos.<br />

Mas as rápidas transformações que atingem o planeta<br />

chegam também a Tremedal. A chuva começa a diminuir<br />

<strong>de</strong> intensida<strong>de</strong>, inquietando os moradores. E se aquilo for<br />

um sinal <strong>de</strong> alerta, um aviso <strong>de</strong> que o fenômeno seria capaz<br />

<strong>de</strong> provocar um tufão no outro lado do mundo? Seria Tre‑<br />

medal a confirmação da metáfora do Efeito Borboleta,<br />

criada para explicar como as pequenas alterações são ca‑<br />

pazes <strong>de</strong> gerar gran<strong>de</strong>s mudanças? É essa indagação que<br />

inquieta e pesa sobre o <strong>de</strong>stino dos personagens <strong>de</strong>ste sur‑<br />

preen<strong>de</strong>nte romance fantástico.<br />

92<br />

E s t a n t E G l o b a l<br />

A RAINHA DO<br />

CALÇADÃO, OPUS 14<br />

Esdras do Nascimento<br />

1 a edição – 432 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1596 ‑8<br />

Com ousadia literária e uma sedução permanente<br />

para o leitor, A rainha do calçadão, Opus 14 é um romance<br />

surpreen<strong>de</strong>nte e inovador, estruturado em sete narrativas,<br />

que po<strong>de</strong>m ser lidas <strong>de</strong> maneira in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />

se sigam as sequências indicadas pelo autor. São sete cami‑<br />

nhos que o leitor po<strong>de</strong> escolher, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo <strong>de</strong> seu estado<br />

<strong>de</strong> espírito, <strong>de</strong> sua curiosida<strong>de</strong> <strong>de</strong> momento ou da simples<br />

disposição <strong>de</strong> se lançar em <strong>de</strong>terminada aventura espiritual.<br />

Claro que há um oitavo caminho: o percurso tradicional<br />

com começo, meio e fim.<br />

A rainha do calçadão, Opus 14 é um romance do Rio<br />

<strong>de</strong> Janeiro, com as suas belezas, mistérios, <strong>de</strong>safios, <strong>de</strong>sgra‑<br />

ças e seus diversos segmentos sociais, que se movimentam<br />

em círculos equidistantes. Todos os personagens principais<br />

são mulheres, e as narrativas contam a história específica<br />

<strong>de</strong> cada uma <strong>de</strong>las, presas às suas angústias, problemas e<br />

frustrações, em sintonia com a vida da cida<strong>de</strong>. São mulhe‑<br />

res dos <strong>mais</strong> diversos tipos, classes sociais e personalida<strong>de</strong>s:<br />

profissionais realizadas ou fracassadas, honestas ou <strong>de</strong>so‑<br />

nestas, lindas ou feias, livres ou preconceituosas, inseguras<br />

ou oportunistas, cuja alma o autor <strong>de</strong>svenda com cruel‑<br />

da<strong>de</strong> e olho clínico infalível.<br />

Como observa Adriana Riva no prefácio, é difícil es‑<br />

quecer tais personagens, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> conviver com eles, nos‑<br />

sos semelhantes e irmãos, e conhecer a sua frágil humani da<strong>de</strong>:<br />

“Se o futuro habita em nós, dita a voz que mescla narrador<br />

e personagem, no calçadão do autor pontificam as sedu‑<br />

ções e os <strong>de</strong>sejos que fervilham em cada um <strong>de</strong> nós. O romance<br />

inventa a vida”.<br />

E a invenção da vida se apresenta num texto alta‑<br />

mente sofisticado, as narrativas alternando primeira e ter‑<br />

ceira pessoas, misturando passado e presente, objetivida<strong>de</strong><br />

jornalística, enfoque político e elaboradas técnicas literá‑<br />

rias, na sinuosa recriação da vida como ela é ou po<strong>de</strong>ria ser.<br />

E s t a n t E G l o b a l


AVESSO<br />

Tomás Chiaverini<br />

1 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1501 ‑2<br />

Se uma das principais características <strong>de</strong> uma obra lite‑<br />

rária é surpreen<strong>de</strong>r, envolver e inquietar, então Avesso é<br />

uma obra perfeitamente realizada. Narrado em primeira<br />

pessoa, num ritmo alucinante, mistura <strong>de</strong> ficção e <strong>de</strong>poi‑<br />

mento, o livro conta a odisseia <strong>de</strong> um jovem repórter<br />

recém ‑formado em busca do extraordinário, da aventura,<br />

do insólito, que lhe permitam se libertar das imposições e<br />

limitações da socieda<strong>de</strong> e viver a vida plena. É como um rito<br />

<strong>de</strong> passagem para o encontro <strong>de</strong> si mesmo e <strong>de</strong> seu lugar<br />

no mundo, mas que <strong>de</strong>semboca no consequente e inevitá‑<br />

vel ingresso na vida adulta. A história se <strong>de</strong>senrola em uma<br />

das regiões <strong>mais</strong> fascinantes do mundo, a Amazônia. Na<br />

sua busca pela liberda<strong>de</strong>, o jovem permanece durante<br />

meses num barco entre Belém e Manaus. Conhece, então,<br />

e se apaixona por Jaque, uma cana<strong>de</strong>nse, legítima new age<br />

traveler. A paixão se estabiliza numa fase <strong>de</strong> segurança e<br />

tranquilida<strong>de</strong> que é a própria negação da busca do jovem<br />

repórter pela liberda<strong>de</strong> incondicional. A consciência da si‑<br />

tuação gera um conflito íntimo que o leva a adotar atitu<strong>de</strong>s<br />

precipitadas, <strong>de</strong> consequências <strong>de</strong>sastrosas, com a <strong>de</strong>sco‑<br />

berta frustrante da impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> controlar o próprio<br />

<strong>de</strong>stino. Mistura bem dosada <strong>de</strong> mistério, conflitos e ro‑<br />

mance, Avesso é um mergulho sufocante nas inquietações<br />

e na necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> autoafirmação da juventu<strong>de</strong>, sua <strong>de</strong>‑<br />

silusão e a frustrante aceitação da maturida<strong>de</strong>, com suas<br />

limitações e conformismo, e a certeza da impossibilida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> se obter tudo o que se busca. Para quem acaba <strong>de</strong> in‑<br />

gressar nela, a vida adulta é amarga, o fim <strong>de</strong> todos os<br />

sonhos da juventu<strong>de</strong>, o avesso do i<strong>de</strong>al.<br />

E s t a n t E G l o b a l<br />

COM ESSE ÓDIO<br />

E ESSE AMOR<br />

Maria José Silveira<br />

1 a edição – 288 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1525 ‑8<br />

O romance brasileiro atual oferece muitas surpresas<br />

boas, capazes <strong>de</strong> sacudir o leitor <strong>de</strong> seu marasmo e lançá ‑lo<br />

num mundo <strong>de</strong> aventuras insuspeitadas, às quais ele po<strong>de</strong><br />

partilhar sem arriscar a pele e nem mesmo se levantar <strong>de</strong><br />

sua poltrona preferida. É uma das vantagens da ficção<br />

sobre a realida<strong>de</strong>. E é o que oferece Maria José Silveira,<br />

uma das revelações <strong>mais</strong> fortes da ficção brasileira atual,<br />

em Com esse ódio e esse amor.<br />

A trama do livro se <strong>de</strong>senvolve na Colômbia, on<strong>de</strong><br />

alguns brasileiros se envolvem em situações extremas, o<br />

que não os impe<strong>de</strong> <strong>de</strong> exercitar o seu terrível portunhol. A<br />

tensão é permanente, envolvimento com narcotraficantes,<br />

guerrilheiros das Farc, sequestros, medo, pânico, suspense<br />

e uma história <strong>de</strong> amor vivida nas cida<strong>de</strong>s, nas selvas e em<br />

acampamentos nas florestas. Predomina uma atmosfera<br />

pesada, por vezes sufocante, on<strong>de</strong> se acentuam os ciúmes,<br />

a competição, a dor, as dificulda<strong>de</strong>s no relacionamento <strong>de</strong><br />

pessoas <strong>de</strong> culturas tão diversas.<br />

Com esse ódio e esse amor começa <strong>de</strong> uma maneira<br />

e termina <strong>de</strong> outra. Essa estrutura narrativa levou Ignácio<br />

<strong>de</strong> Loyola Brandão a compará ‑lo com o Oito e meio. No<br />

romance, como no filme <strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>rico Fellini, as sequencias<br />

se alternam, há uma história <strong>de</strong> nossos dias e uma história<br />

que retorna no tempo, até os dias <strong>de</strong> Tupac Amaru, as duas<br />

correlacionadas, o passado <strong>de</strong>svendando o presente e per‑<br />

mitindo retornar à origem dos fatos. Como na obra ‑prima<br />

do diretor italiano, há um personagem que prepara um<br />

filme que ja<strong>mais</strong> será rodado. A narrativa, por sua vez, está<br />

entremeada por e ‑mails, um recurso a <strong>mais</strong> utilizado na<br />

ficção, como observa Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão: “A tecno‑<br />

logia vem ampliando as estruturas, permitindo do corte<br />

cinematográfico à edição computadorizada. Daí a mo<strong>de</strong>r‑<br />

nida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ste Com esse ódio e esse amor, que prenuncia<br />

novos tempos em narrativa”.<br />

E s t a n t E G l o b a l<br />

93


EM NOME DO PAI DOS<br />

BURROS<br />

Sílvio Lancellotti<br />

1a edição – 472 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1591 ‑3<br />

Sílvio Lancellotti não faz por menos. Com alguma pe‑<br />

tulância, mas a plena certeza do que afirma, reivindica para<br />

a sua obra a influência do Ulisses, o <strong>de</strong>molidor romance <strong>de</strong><br />

James Joyce. Apenas influência ou também afinida<strong>de</strong>s pro‑<br />

fundas? Eis aí um bom <strong>de</strong>safio para o leitor <strong>de</strong> romances que<br />

gosta <strong>de</strong> longas viagens. Longas e perturbadoras, apesar <strong>de</strong><br />

Em nome do pai dos burros (título que o autor se negou a<br />

abrir mão) – a exemplo da obra invocada como paradigma –<br />

se <strong>de</strong>senrolar em um único dia: 13 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1977.<br />

A data ficou marcada na história do Brasil e na história<br />

do futebol brasileiro por dois episódios catárticos, a queda<br />

do general Sylvio Frota, ministro do Exército do governo<br />

Ernesto Geisel, um dos baluartes da chamada “linha dura”,<br />

remanescente do golpe militar <strong>de</strong> 1964, e a conquista do<br />

campeonato paulista pelo Corinthians, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> vinte e<br />

três <strong>anos</strong> <strong>de</strong> dramática abstinência.<br />

Os dois fatos são acompanhados, com paixão, por um<br />

jovem jornalista, o editor Marcelo Brancaleone, adversário<br />

do regime e torcedor do novo campeão paulista. Essas duas<br />

vertentes se alinhavam em <strong>de</strong>zoito capítulos, entre um pre‑<br />

lúdio e um remate, cada um <strong>de</strong>les baseado numa cor, num<br />

ritmo musical, num órgão do corpo humano e com carac‑<br />

terísticas próprias e surpreen<strong>de</strong>ntes. Num <strong>de</strong>les, Lancellotti,<br />

<strong>de</strong>safiador e quase herético, se apoia no <strong>de</strong>senrolar <strong>de</strong> uma<br />

missa católica; em outro, jocoso, segue o roteiro <strong>de</strong> uma<br />

bula <strong>de</strong> remédio.<br />

Num estilo preciso e meticuloso, repleto <strong>de</strong> invenções<br />

linguísticas, on<strong>de</strong> cada palavra se encaixa como as pedras<br />

<strong>de</strong> um mosaico, o romancista apresenta e <strong>de</strong>senvolve o seu<br />

estranho universo, sem temor <strong>de</strong> <strong>de</strong>safiar, provocar e insti‑<br />

gar o leitor, mas também recompensar amplamente àque‑<br />

les que nele se aventurarem e do qual dificilmente se<br />

<strong>de</strong>sligarão antes da última linha.<br />

94<br />

e s t a n t e G l o B a l<br />

MIGRAÇÃO DOS<br />

CISNES<br />

Ricardo Daunt<br />

1 a edição – 560 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1482 ‑4<br />

O romance brasileiro vive um momento <strong>de</strong> intensa<br />

criativida<strong>de</strong>, ao qual a crítica não tem dado a merecida aten‑<br />

ção. Consciente <strong>de</strong>sse fenômeno, a <strong>Global</strong> i<strong>de</strong>alizou uma<br />

série <strong>de</strong> romances <strong>de</strong> autores nacionais, inaugurada com<br />

Migração dos cisnes, <strong>de</strong> Ricardo Daunt.<br />

Paulistano, formado em administração <strong>de</strong> empresas,<br />

ten do residido durante vários <strong>anos</strong> em Paris, on<strong>de</strong> se graduou<br />

mestre em literatura, pela Sorbonne, Daunt trabalhou em<br />

empresas multinacionais, abandonando tudo para se <strong>de</strong>dicar<br />

em tempo integral à literatura. É autor <strong>de</strong> uma obra literária<br />

am pla, que inclui ensaio, conto, romance, poesia, teatro.<br />

Migração dos cisnes é uma narrativa engenhosa, que<br />

se <strong>de</strong>sdobra como uma sinfonia, narrada em linguagem re‑<br />

quintada, um prazer a <strong>mais</strong> para leitores exigentes. A história<br />

(aliás, as múltiplas histórias) transcorre na Europa, a primeira<br />

parte entre Lisboa e Paris, a segunda, na Irlanda, numa rea‑<br />

lida<strong>de</strong> quase mágica, in<strong>de</strong>finível, entre o sonho e uma reali‑<br />

da<strong>de</strong> em transe.<br />

Como numa composição sinfônica, o romancista uti‑<br />

liza diversas estratégias <strong>de</strong> narração, ora alternando a téc‑<br />

nica, o ritmo, a perspectiva, ora retardando ou acelerando<br />

a ação, realçando o pormenor, ora mergulhando no mundo<br />

dos sonhos ou acompanhando cinematicamente o coti‑<br />

diano dos personagens em suas cida<strong>de</strong>s, em seu trabalho,<br />

em suas relações.<br />

Sinfonia literária, <strong>de</strong> múltiplos aspectos, Migração dos<br />

cisnes é romance introspectivo, <strong>de</strong> suspense, <strong>de</strong> ação. Sobe<br />

e <strong>de</strong>sce <strong>de</strong> tom, mas sempre num ritmo envolvente e, não<br />

raras vezes, surpreen<strong>de</strong>nte. Como no “jogo <strong>de</strong> Dublin”,<br />

planejado por um aposentado que i<strong>de</strong>aliza uma obra literá‑<br />

ria envolvendo James Joyce e para cuja realização elege<br />

vários participantes. É um jogo engenhoso e perturbador,<br />

como toda a trama e <strong>de</strong>senrolar <strong>de</strong> Migração dos cisnes.<br />

E s t a n t E G l o b a l


O ALÇAPÃO<br />

Pedro Cavalcanti<br />

1 a edição – 104 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1606 ‑4<br />

Narrativa fantástica, no estilo do Manuscrito encon‑<br />

trado em Saragoça, <strong>de</strong> Jan Potocki, O alçapão, paradoxal‑<br />

mente, mergulha fundo na realida<strong>de</strong> cruel <strong>de</strong> nossos dias.<br />

Romance <strong>de</strong>lirante e tão intrigante quanto a frase <strong>de</strong><br />

Afonso Schmidt que lhe serve <strong>de</strong> epígrafe: “Às vezes, um<br />

homem vivo é atacado por um tigre morto”.<br />

Três horas da tar<strong>de</strong>. Augusto vem caminhando pela<br />

rua, quando é atingido por uma bala perdida. Sofre uma<br />

concussão cerebral e várias paradas cardíacas. Internado no<br />

Hospital das Clínicas, mergulha durante dias sem fim num<br />

território <strong>de</strong> sombras, <strong>de</strong>lírios, alucinações e pesa<strong>de</strong>los,<br />

aquela zona crepuscular vizinha da morte.<br />

É então que se abre o alçapão e, através <strong>de</strong>le, como<br />

aves <strong>de</strong> agouro, emergem as imagens <strong>de</strong> seu inconsciente,<br />

em boa parte as mesmas do inconsciente coletivo brasileiro.<br />

O que, para o nível da consciência, estava morto e enter‑<br />

rado, ressurge com a força brutal dos fenômenos naturais,<br />

um terremoto ou um vendaval. O ataque do tigre morto.<br />

Sem qualquer lógica consciente, pautando ‑se pelo ilo‑<br />

gismo do inconsciente, e numa espécie <strong>de</strong> metáfora da história<br />

brasileira, a narrativa segue a incoerência das tempesta<strong>de</strong>s e<br />

dos naufrágios dos navegantes lusos, a ética dos ban<strong>de</strong>irantes<br />

e dos cangaceiros, a perspectiva dos palacetes em ruínas e das<br />

favelas, o encantamento dos amores, as marcas sujas da vida.<br />

Neste duro combate, surgem também – como não<br />

podia <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ser, tratando ‑se do Brasil – as soluções má‑<br />

gicas <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa e <strong>de</strong> ataque: rezas bravas para corpo fe‑<br />

chado, feitiçarias para abrir caminhos, em busca <strong>de</strong> um<br />

ponto <strong>de</strong> equilíbrio e paz.<br />

O único guia nessa história <strong>de</strong> incertezas sem nome<br />

nem datas é aquela estranha invenção dos navegadores<br />

portugueses, o “ponto <strong>de</strong> fantasia”, que cada piloto <strong>de</strong><br />

nau colocava on<strong>de</strong> lhe aprouvesse no mapa dos oce<strong>anos</strong> e,<br />

apesar <strong>de</strong> não existir, dava algum sentido à viagem.<br />

E s t a n t E G l o b a l<br />

O HOMEM LÉSBICO<br />

Helio Santos<br />

1 a edição – 304 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1607 ‑1<br />

A provocação começa no título, capaz <strong>de</strong> arrepiar os<br />

machões <strong>de</strong> plantão. E se <strong>de</strong>senvolve, com fino e irresistível<br />

senso <strong>de</strong> humor e ironia, ao longo <strong>de</strong> trezentas páginas,<br />

nas quais Helio Santos fustiga a dificulda<strong>de</strong> do homem mo‑<br />

<strong>de</strong>rno em lidar com seu eu feminino, que a maioria ignora<br />

ou tenta renegar. Sosseguem, pois, machões hipersensíveis,<br />

não se trata <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa ou apologia do homossexualismo.<br />

A proposta é <strong>mais</strong> original, instigante e <strong>de</strong>safiadora.<br />

Mostrar como, no mundo atual, on<strong>de</strong> os gran<strong>de</strong>s ícones são<br />

o sucesso a qualquer custo, a fama e o enriquecimento, o<br />

homem não consegue a felicida<strong>de</strong> pessoal e ainda compro‑<br />

mete a <strong>de</strong> suas parceiras. A razão? Simples, como revelam,<br />

<strong>de</strong> maneira sutil, os personagens do livro: o macho ‑padrão,<br />

no <strong>mais</strong> profundo <strong>de</strong> seu íntimo, inflado <strong>de</strong> preconceitos,<br />

recusa ‑se a aceitar a parcela feminina que vive <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong><br />

cada homem.<br />

Partindo <strong>de</strong>ssa premissa, O homem lésbico se <strong>de</strong>sen‑<br />

volve numa narrativa ágil e hábil, que entrelaça a história<br />

<strong>de</strong> doze mulheres, ao longo <strong>de</strong> sessenta <strong>anos</strong>, começando<br />

no bairro paulistano da Bela Vista e se espichando até a<br />

Londres dos dias atuais, sempre fustigando com vara curta<br />

a onça do machismo, pren<strong>de</strong>ndo o leitor como visgo e<br />

envolvendo ‑o até a última página.<br />

Numa estrutura ficcional impecável, escrito em lingua‑<br />

gem harmoniosa e simples, intercalado <strong>de</strong> reflexões singe‑<br />

las, que não <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> ser profundas, o romance se espraia<br />

em situações gozadas e trágicas, imprevistos e emoções,<br />

sugerindo, sem nenhum tom <strong>de</strong> conselheiro sentimental ou<br />

reflexão do tipo autoajuda, como o homem contemporâ‑<br />

neo po<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver uma forma <strong>de</strong> afeto a<strong>de</strong>quada à<br />

sensibilida<strong>de</strong> feminina, sem per<strong>de</strong>r a sua masculinida<strong>de</strong>.<br />

Um livro provocativo, mas sem nada <strong>de</strong> hostil. Os machões<br />

po<strong>de</strong>m dormir sossegados.<br />

E s t a n t E G l o b a l<br />

95


PÁSSAROS GRANDES<br />

NÃO CANTAM<br />

Luíz Horácio<br />

1 a edição – 224 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1500 ‑5<br />

O novo romance brasileiro está cheio <strong>de</strong> surpresas. Boas<br />

surpresas. De repente, numa livraria qualquer, o leitor toma<br />

ao acaso uma <strong>de</strong>ssas obras, começa a lê ‑la e sente ‑se fis‑<br />

gado. Não consegue <strong>mais</strong> parar, dominado pela curiosida<strong>de</strong><br />

e o prazer da leitura. Esse é, certamente, o melhor elogio que<br />

se possa fazer a uma obra <strong>de</strong> ficção. É o caso <strong>de</strong> quem se<br />

aventurar nas páginas <strong>de</strong> Pássaros gran<strong>de</strong>s não cantam.<br />

Localizado na região fronteiriça do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul,<br />

o romance <strong>de</strong> Luíz Horácio completa a trilogia iniciada com<br />

Perciliana e o pássaro com alma <strong>de</strong> cão, a que se seguiu<br />

Nenhum pássaro no céu, cada um <strong>de</strong>les po<strong>de</strong>ndo ser lido<br />

como obra in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte.<br />

Formado por várias histórias que se entrelaçam, essa<br />

saga dos pampas revela uma percepção extremamente sen‑<br />

sível da cruelda<strong>de</strong> do mundo em contraponto com a capa‑<br />

cida<strong>de</strong> e a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> amar do ser humano. Romance<br />

telúrico, a natureza não <strong>de</strong>sempenha nele apenas o papel<br />

<strong>de</strong> cenário, <strong>de</strong> pano <strong>de</strong> fundo para o <strong>de</strong>senvolvimento da<br />

trama, mas atua como uma força viva e sempre presente.<br />

Outro aspecto importante da obra é a análise do pre‑<br />

conceito racial, que o autor fustiga em passagens on<strong>de</strong> luci‑<br />

<strong>de</strong>z e sarcasmo se unem <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>molidora.<br />

Rebatendo as mo<strong>de</strong>rnas concepções da teoria literá‑<br />

ria, que proclamam a separação entre o autor e sua obra,<br />

Luíz Horácio faz questão <strong>de</strong> afirmar que está inteiro em sua<br />

obra. “Eu próprio não percebo a distinção quando escrevo<br />

meus livros.”<br />

Mestre em letras, autor <strong>de</strong> roteiros para cinema e do‑<br />

cumentários, Luíz Horácio nasceu em Quaraí, na fronteira<br />

com o Uruguai, viveu em Porto Alegre e no Rio <strong>de</strong> Janeiro,<br />

regressando em seguida à capital gaúcha, mas nunca se<br />

libertando dos pampas, on<strong>de</strong> passou a infância e que <strong>de</strong>‑<br />

sempenha em sua obra um papel quase metafísico, insepa‑<br />

rável da alma gaúcha.<br />

96<br />

e s t a n t e G l o B a l


s é r i e<br />

e s t a n t e P o l i C i a i s<br />

P a u l i s t a n o s<br />

DIREÇÃO<br />

A. P. QUARTIM DE MORAES<br />

A novela policial é um gênero literário universal‑<br />

mente apreciado, que consagrou autores como<br />

Conan Doyle, Agatha Christie, Georges Simenon e<br />

Dashiell Hammet, entre outros. No Brasil, vários es‑<br />

critores se <strong>de</strong>dicam, bisextamente, a escrever histó‑<br />

rias policiais. Mas poucos se consi<strong>de</strong>ram especialistas<br />

no assunto. A série Estante Policiais Paulist<strong>anos</strong> se<br />

propõe a criar um nicho específico para o gênero –<br />

histórias ambientadas na gigantesca e muitas vezes<br />

assustadora metrópole <strong>de</strong> São Paulo – e com isso,<br />

talvez, um novo incentivo tanto à criativida<strong>de</strong> dos<br />

escritores quanto ao interesse dos leitores.<br />

97


AS CORES DO CRIME<br />

Pedro Cavalcanti<br />

1 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1503 ‑6<br />

Durante muito tempo os críticos conservadores pro‑<br />

clamaram ser o romance policial um privilégio dos povos<br />

anglo ‑saxões. As razões alegadas eram muitas. Muitas e<br />

frágeis. Todas elas ruíram com o tempo e o surgimento <strong>de</strong><br />

uma rica literatura policial em países os <strong>mais</strong> diversos.<br />

O Brasil também já conta com uma razoável tradição<br />

no gênero, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as experiências pioneiras (e um tanto in‑<br />

gênuas) <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros e Albuquerque, no início do século<br />

XX, até Luís Lopes Coelho que, na década <strong>de</strong> 1950, <strong>de</strong><br />

certa forma, ressuscitou o gênero entre nós. A partir daí, se<br />

a ficção policial não se impôs <strong>de</strong> maneira avassaladora,<br />

pelo menos criou algumas características bem brasileiras,<br />

que o aficionado do gênero vai logo i<strong>de</strong>ntificar em As cores<br />

do crime, <strong>de</strong> Pedro Cavalcanti, primeiro título da série Es‑<br />

tante Policiais Paulist<strong>anos</strong>.<br />

Ambientado no bairro boêmio <strong>de</strong> Vila Madalena,<br />

As cores do crime evolui com todos os bons ingredientes<br />

do gênero: corrupção, dinheiro <strong>de</strong> origem suspeita, <strong>de</strong>sa‑<br />

parecimentos misteriosos, crimes ao vivo e em cores, <strong>de</strong>le‑<br />

gados in<strong>de</strong>cifráveis, paixão sem limites. Em meio a esse<br />

fogo cruzado, num clima <strong>de</strong> alta voltagem, <strong>de</strong>sfilam perso‑<br />

nagens típicos do bairro e da vida paulistana: mendigos,<br />

guardas <strong>de</strong> rua, frequentadores <strong>de</strong> padarias, <strong>de</strong> bares boê‑<br />

mios e <strong>de</strong> vernissages, on<strong>de</strong> se misturam mecenas, picare‑<br />

tas e artistas fracassados.<br />

Jornalista com larga vivência, correspon<strong>de</strong>nte interna‑<br />

cional da revista Veja em Paris, durante <strong>de</strong>z <strong>anos</strong>, Pedro<br />

Cavalcanti participou como enviado especial <strong>de</strong> três guer‑<br />

ras. Autor <strong>de</strong> dois romances, quatro romances juvenis e<br />

dois livros <strong>de</strong> ensaio, estreia no gênero policial com um<br />

perfeito domínio técnico do gênero, agudo conhecimento<br />

do bicho ‑homem e do ambiente retratado, criando uma<br />

história inesquecível.<br />

98<br />

E s t a n t E P o l i c i a s P a u l i s t a n o s<br />

DAMAS TURCAS<br />

Carlos Castelo<br />

Prelo<br />

Damas turcas é a <strong>mais</strong> nova obra da Estante Policiais<br />

Paulist<strong>anos</strong>, série <strong>de</strong> romances acolhida com excepcional<br />

receptivida<strong>de</strong> popular. A ação se <strong>de</strong>senrola numa São Paulo<br />

chuvosa e enigmática, que aguça o mistério ao criar um<br />

clima semelhante ao dos gran<strong>de</strong>s romances policiais do sé‑<br />

culo XIX e início do XX, nos quais a ambiência exterior é<br />

fundamental na intensificação da atmosfera espiritual.<br />

Aliás, a cida<strong>de</strong> se i<strong>de</strong>ntifica com o <strong>de</strong>senvolvimento da<br />

trama, ultrapassando em muito o papel <strong>de</strong> mero pano <strong>de</strong><br />

fundo. A diversida<strong>de</strong> cultural <strong>de</strong> São Paulo, seu gigantismo,<br />

sua capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> abraçar todas as tendências e abrigar<br />

todas as loucuras, surge <strong>de</strong> forma plena nestas páginas, <strong>de</strong><br />

muita água e sangue <strong>de</strong>rramados.<br />

Escrito em frases curtas e perfurantes, como os golpes<br />

assassinos que povoam suas páginas, Damas turcas narra uma<br />

série <strong>de</strong> homicídios praticados com requintes <strong>de</strong> cruelda<strong>de</strong>. O<br />

incumbido <strong>de</strong> <strong>de</strong>svendá ‑los é um tipo pitoresco, nascido no<br />

interior e absorvido pela cida<strong>de</strong> gran<strong>de</strong>, cujo nome lembra o<br />

dos <strong>de</strong>tetives clássicos britânicos: Douglas Hayashi. Ao seu<br />

redor se move uma fauna curiosa, como o amigo e ex‑<br />

‑publicitário Ruy Levino, o ultrarreligioso investigador Arruda,<br />

a bipolar Rachel, esposa <strong>de</strong> Levino, o branquíssimo cachorro<br />

chamado Preto e um time instigante <strong>de</strong> suspeitos.<br />

Fato importante é que essa talvez seja a primeira obra<br />

na qual um ex ‑publicitário utiliza seus conhecimentos téc‑<br />

nicos para colaborar <strong>de</strong>cisivamente na investigação e solu‑<br />

ção <strong>de</strong> um crime.<br />

Como <strong>de</strong>fine Adilson Xavier no prefácio, “Damas tur‑<br />

cas tem a ver com o famoso jogo em que pedras negras e<br />

brancas se digladiam pela sobrevivência. Tem inteligência e<br />

leveza <strong>de</strong> movimentos. Conduz a leitura em pequenos sal‑<br />

tos diagonais que nos recompensam com a chegada vito‑<br />

riosa às linhas adversárias”.<br />

Prelo<br />

E s t a n t E P o l i c i a s P a u l i s t a n o s


O ASSOBIO DA FOICE<br />

Fernando Pessoa Ferreira<br />

1 a edição – 224 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1515 ‑9<br />

Com um título contun<strong>de</strong>nte e provocativo, como todo<br />

bom romance policial, O assobio da foice não dá um se‑<br />

gundo <strong>de</strong> repouso ao leitor. Quem inicia a sua leitura não<br />

larga <strong>mais</strong> o livro, instigado pela narrativa rápida, pontuada<br />

por crimes misteriosos, aparentemente sem nenhuma liga‑<br />

ção entre si, mas que pistas fortuitas conduzem à suspeita<br />

<strong>de</strong> uma organização criminosa especializada em abreviar a<br />

vida <strong>de</strong> idosos ricos que insistem em frustrar as esperanças<br />

<strong>de</strong> her<strong>de</strong>iros ambiciosos e inescrupulosos.<br />

Ambientado em Vila Madalena, bairro paulistano <strong>de</strong><br />

classe média, no qual a vida boêmia anda a par e passo<br />

com o clima <strong>de</strong> agitação cultural, o romance <strong>de</strong> Fernando<br />

Pessoa Ferreira contraria <strong>de</strong> certa forma a lógica tradicional<br />

do gênero ao apresentar como encarregado das investiga‑<br />

ções um <strong>de</strong>tetive humano, sem a aura <strong>de</strong> herói e a infalibi‑<br />

lida<strong>de</strong> do romance policial consagrado. O investigador<br />

Omar Fonseca aposta em pistas equivocadas, engana ‑se,<br />

mas sempre recupera o fio da meada, até a revelação da<br />

verda<strong>de</strong> brutal, tão peculiar à nossa época.<br />

Durante as investigações, surge uma fauna pitoresca,<br />

personagens disparatadas, mas “amarradas pelo fio <strong>de</strong><br />

uma impecável lógica”, como observa Pedro Cavalcanti.<br />

Fernando Pessoa Ferreira, jornalista, poeta e contista,<br />

estreou na ficção policial em 2005 com o romance Os <strong>de</strong>‑<br />

mônios morrem duas vezes. O êxito da obra incentivou ‑o a<br />

prosseguir no gênero. O assobio da foice, que integra a<br />

série Estante Policiais Paulist<strong>anos</strong>, foi concluído pouco an‑<br />

tes da morte do autor, em maio <strong>de</strong> 2010. Como observa<br />

Ruy Castro, os seus leitores “terão <strong>de</strong> passar sem as inúme‑<br />

ras histórias que ele ainda tinha para escrever, cheias <strong>de</strong><br />

humor, ação, observação psicológica e compaixão pelo ser<br />

humano. E <strong>de</strong> um profundo amor pelas mulheres – como<br />

ele, na vida real”.<br />

E s t a n t E P o l i c i a s P a u l i s t a n o s<br />

O PERSEGUIDOR<br />

Tom Figueiredo<br />

1 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1557 ‑9<br />

Com O perseguidor, a série Estante Policiais Paulista‑<br />

nos revela ao público um novo e excelente contador <strong>de</strong><br />

histórias policiais. Depois <strong>de</strong> uma longa carreira como jor‑<br />

nalista e publicitário, o paulistano Antonio José <strong>de</strong> Figuei‑<br />

redo, que se assina Tom Figueiredo, <strong>de</strong>scobriu o seu talento<br />

para o gênero que consagrou Agatha Christie, Edgar<br />

Wallace, Simenon e tantos outros.<br />

Nascia, assim, um novo herói brasileiro, o jovem e<br />

inexperiente repórter policial Cândido Gomes, incumbido<br />

<strong>de</strong> acompanhar um misterioso crime que excitou a opinião<br />

pública da cida<strong>de</strong>. O lado <strong>mais</strong> chocante e sensacional<br />

<strong>de</strong>sse mistério era a foto da cabeça <strong>de</strong> um morto, numa<br />

posição insólita, que havia sido obtida por um fotógrafo do<br />

jornal, antes <strong>de</strong> a polícia <strong>de</strong>sfazer o cenário do crime.<br />

Com este trunfo na mão, o redator ‑chefe resolve ex‑<br />

plorar o mistério a qualquer custo. O fato é <strong>de</strong> domínio<br />

público, mas os <strong>de</strong>talhes não. Ele conta ainda, em relação<br />

aos concorrentes, com outra vantagem: as suas relações<br />

com a polícia e, sobretudo, com o irmão da vítima.<br />

Incumbido <strong>de</strong> escrever a matéria sobre o enigmático<br />

caso, Cândido Gomes põe ‑se em campo. A inexperiência é<br />

compensada por uma mania que vinha da infância: a <strong>de</strong><br />

perseguir as pessoas. O que antes era apenas um compor‑<br />

tamento quase inofensivo revela ‑se um traço essencial em<br />

sua ativida<strong>de</strong>.<br />

Envolvido na trama, o jovem repórter <strong>de</strong>scobre que<br />

perseguir significa também perseguir ‑se e <strong>de</strong>scobrir a si<br />

mesmo em meio ao duro processo <strong>de</strong> uma investigação<br />

criminal. O <strong>de</strong>senvolvimento da trama revela também os<br />

bastidores <strong>de</strong> uma redação <strong>de</strong> jornal popular, on<strong>de</strong> a neces‑<br />

sida<strong>de</strong> permanente <strong>de</strong> dar furos <strong>de</strong> reportagem para au‑<br />

mentar as vendas acaba eliminando qualquer escrúpulo<br />

profissional.<br />

E s t a n t E P o l i c i a s P a u l i s t a n o s<br />

99


C o l e ç ã o<br />

F o r t u n a C r í t i C a<br />

100<br />

Ciente da importância <strong>de</strong> oferecer ao público as<br />

melhores produções literárias da língua portuguesa,<br />

a <strong>Global</strong> <strong>Editora</strong> criou a coleção Fortuna Crítica.<br />

Com reedições cuidadosas <strong>de</strong> clássicos da literatura<br />

brasileira, esta coleção certamente irá agradar aos<br />

apreciadores da boa literatura, além <strong>de</strong> auxiliar na<br />

formação <strong>de</strong> estudantes, que nela encontrarão um<br />

material com conteúdo confiável e abragente <strong>de</strong> es‑<br />

tudo. Cada volume da coleção Fortuna Crítica apre‑<br />

senta um texto introdutório sobre a obra, escrito por<br />

um renomado estudioso <strong>de</strong> literatura, e uma breve<br />

biografia <strong>de</strong> seu autor.


I ­JUCA PIRAMA<br />

E OS TIMBIRAS<br />

Gonçalves Dias<br />

Prelo<br />

Consi<strong>de</strong>rado por muitos o maior poeta brasileiro <strong>de</strong><br />

todos os tempos, Gonçalves Dias foi, com certeza, o maior<br />

dos nossos românticos, o primeiro a fixar em poesia, com<br />

alta qualida<strong>de</strong> artística, as sugestões do ambiente brasileiro<br />

e as tradições indígenas. Foi também insuperável poeta lí‑<br />

rico, autor <strong>de</strong> alguns dos <strong>mais</strong> belos poemas <strong>de</strong> amor da<br />

língua portuguesa, como o pungente “Ainda uma vez,<br />

a<strong>de</strong>us...”, e versejador à maneira medieval nas baladas reu‑<br />

nidas nas Sextilhas <strong>de</strong> Frei Antão. Em todos esses aspectos<br />

foi insuperável. Por qualquer caminho que passasse, <strong>de</strong>i‑<br />

xava um facho <strong>de</strong> luz eterna.<br />

Criador do Indianismo <strong>de</strong>ntro do movimento român‑<br />

tico, com as suas “Poesias americanas”, nelas Gonçalves<br />

Dias apresentava as lendas e os mitos dos índios, seus amo‑<br />

res, dramas, conflitos, o áspero processo <strong>de</strong> aproximação e<br />

fusão com o branco, um mundo repleto <strong>de</strong> significados<br />

simbólicos, nos quais se i<strong>de</strong>ntificava a autêntica alma bra‑<br />

sileira, ainda livre das influências da cultura oci<strong>de</strong>ntal.<br />

Como observa Cassiano Ricardo, o Indianismo <strong>de</strong><br />

Gonçalves Dias “nada tem que ver com o Romantismo eu‑<br />

ropeu” nem se acha ligado à mitificação do indígena, pelo<br />

contrário, ele “substitui a i<strong>de</strong>ologia pela realida<strong>de</strong> humana<br />

do índio”.<br />

É essa posição que transmite uma palpitação perma‑<br />

nente <strong>de</strong> vida à obra indianista do poeta. Nesta tradição, com‑<br />

pôs alguns <strong>de</strong> seus <strong>mais</strong> belos poemas, como “Marabá”,<br />

“Canção do tamoio”, “I ‑Juca Pirama” e “Os Timbiras”.<br />

“I ‑Juca Pirama”, que em idioma tupi significa “aquele<br />

que <strong>de</strong>ve morrer”, é consi<strong>de</strong>rado uma obra ‑prima da poe‑<br />

sia brasileira, “como composição poética integral, notável<br />

pelo argumento humano, pela carga lírica que encerra,<br />

pela linguagem em que foi expresso, pela varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

ritmo” (Cassiano Ricardo). Do poema épico “Os Timbiras”,<br />

só foram publicados os quatro primeiros cantos.<br />

Prelo<br />

F o r t u n a C r í t i C a<br />

O CORUJA<br />

Aluísio Azevedo<br />

2 a edição – 304 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1305 ‑6<br />

Maior figura do nosso Naturalismo, Aluísio Azevedo<br />

<strong>de</strong>ixou duas obras ‑primas do romance brasileiro, Casa <strong>de</strong><br />

pensão (1884) e O cortiço (1890), as quais têm em comum<br />

o fato <strong>de</strong> colocarem muita gente em cena, resultando a<br />

ação “não do <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> uma personagem, mas<br />

da coexistência <strong>de</strong> várias, <strong>mais</strong> apreciadas nas suas relações<br />

do que na sua vida interior” (Lúcia Miguel Pereira).<br />

Situado, cronologicamente, entre estas duas obras, O<br />

coruja (1889) afasta ‑se <strong>de</strong>las pela intenção e pelo <strong>de</strong>senvol‑<br />

vimento. Nela, Aluísio Azevedo tentou o estudo psicológico<br />

<strong>de</strong> um sujeito triste e sem sorte, um caipora, na linguagem<br />

da época, dizem que inspirado na figura do historiador Ca‑<br />

pistrano <strong>de</strong> Abreu, mas sem <strong>de</strong>scurar da análise da socie‑<br />

da<strong>de</strong> brasileira. É evi<strong>de</strong>nte que o autor buscava novas<br />

perspectivas para sua arte. Assim, ao contrário <strong>de</strong> seus <strong>de</strong>‑<br />

<strong>mais</strong> livros, há um mínimo <strong>de</strong> <strong>de</strong>scrições, a narração é<br />

parca, quase toda a ação se <strong>de</strong>senrola mediante diálogos.<br />

O clima do livro é sombrio, com predomínio do pessimismo<br />

angustiante <strong>de</strong> Schopenhauer.<br />

Como uma peça teatral, o livro divi<strong>de</strong> ‑se em três par‑<br />

tes, po<strong>de</strong> ‑se dizer três atos, unidos pela presença perturba‑<br />

dora e inquietante do personagem central. A primeira<br />

apresenta a vida <strong>de</strong> um internato, que lembra as cenas<br />

<strong>de</strong>scritas <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong> por Raul Pompeia, em O Ateneu. A<br />

segunda se <strong>de</strong>senrola numa pensão, preparando o grand<br />

finale da terceira parte.<br />

Des<strong>de</strong> seu lançamento, O coruja foi recebido <strong>de</strong> ma‑<br />

neira contraditória pela crítica. Um intelectual do porte <strong>de</strong><br />

Alci<strong>de</strong>s Maia alertou para a significação do livro, na obra<br />

<strong>de</strong> Aluísio e no quadro da literatura brasileira, afirmando<br />

que em sua estranha e doentia personagem central há uma<br />

criatura <strong>de</strong> arte que roça pelo símbolo e não tem rival no<br />

romance brasileiro. A última palavra cabe ao leitor.<br />

F o r t u n a C r í t i C a<br />

101


O NAVIO NEGREIRO<br />

Castro Alves<br />

1 a edição – 32 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1308 ‑7<br />

Milagre da poesia! Nascido há <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 150 <strong>anos</strong> (em<br />

1847), o moço Antonio Fre<strong>de</strong>rico <strong>de</strong> Castro Alves continua<br />

presente no cotidiano – o cotidiano poético – <strong>de</strong> milhares <strong>de</strong><br />

brasileiros. O <strong>mais</strong> romântico e apaixonado <strong>de</strong> todos os ro‑<br />

mânticos brasileiros, a figura humana <strong>mais</strong> fascinante do<br />

nosso Romantismo, libertário, precursor do amor livre, sempre<br />

apaixonado, i<strong>de</strong>alista e sonhador, morto em plena juventu<strong>de</strong><br />

gloriosa, aos 24 <strong>anos</strong>, Castro Alves foi como um furacão, uma<br />

força da natureza, um milagre. Milagre da poesia!<br />

Poeta lírico e social, <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> poemas ainda<br />

hoje <strong>de</strong>corados e <strong>de</strong>clamados pelos amantes da poesia.<br />

Quem não se arrepia com aqueles versos palpitantes <strong>de</strong><br />

sensualida<strong>de</strong> que assim começam: “Boa noite, Maria! Eu<br />

vou ‑me embora./ A lua nas janelas bate em cheio./ Boa<br />

noite, Maria! É tar<strong>de</strong>... É tar<strong>de</strong>.../ Não me apertes assim<br />

contra teu seio”?. Apaixonado pelo eterno feminino,<br />

amante insaciável, Castro Alves foi também um homem<br />

generoso, um apóstolo da igualda<strong>de</strong> dos direitos hum<strong>anos</strong>,<br />

o primeiro gran<strong>de</strong> poeta social da literatura brasileira.<br />

Esse aspecto <strong>de</strong> sua obra se afirma em seus poemas<br />

abolicionistas, escritos numa época em que a libertação do<br />

escravo era apenas um vago projeto <strong>de</strong> sonhadores, uma<br />

utopia. Desse ciclo poético, patético e doloroso, regado ao<br />

sangue do cativo (“Cai orvalho do sangue do escravo,/ Cai<br />

orvalho na face do algoz/ Cresce, cresce, seara vermelha,/<br />

Cresce, cresce, vingança feroz”) sobressai “O navio ne‑<br />

greiro”, subtitulado “Tragédia no mar”, “o maior aconte‑<br />

cimento <strong>de</strong> nossa poesia”, para Agripino Grieco, o símbolo<br />

<strong>mais</strong> forte na literatura brasileira do sofrimento do escravo<br />

e que mantém, ainda hoje, “o mesmo frescor <strong>de</strong> ontem”,<br />

como observa André Seffrin no prefácio ao volume, enri‑<br />

quecido com sugestivas ilustrações <strong>de</strong> Hansen Bahia.<br />

102<br />

F o r t u n a C r í t i C a<br />

VÁRIAS HISTÓRIAS<br />

Machado <strong>de</strong> Assis<br />

Prelo<br />

Publicado em 1895, Várias histórias representa um<br />

dos momentos culminantes da história do conto brasileiro<br />

e da evolução artística <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis. Tendo ‑se ini‑<br />

ciado no gênero ainda na adolescência, com “Três tesouros<br />

perdidos” (1858), o escritor carioca se <strong>de</strong>dicou à história<br />

curta, sobretudo, a partir <strong>de</strong> 1864, quando passou a cola‑<br />

borar no Jornal das Famílias.<br />

A libertação <strong>de</strong> um certo convencionalismo e a afirma‑<br />

ção da inconfundível maneira machadiana – leve, maliciosa,<br />

irônica, cheia <strong>de</strong> subentendidos, realçada por um estilo <strong>de</strong><br />

sabor clássico, significando sua plena maturida<strong>de</strong> artística – se<br />

afirmam com a publicação <strong>de</strong> Papéis avulsos (1882), que está<br />

para a obra do contista como Memórias póstumas <strong>de</strong> Brás<br />

Cubas estão para a do romancista, tornando visível o extraor‑<br />

dinário salto qualitativo em relação aos trabalhos anteriores.<br />

Em Várias histórias, as qualida<strong>de</strong>s artísticas do contista<br />

estão no auge, <strong>de</strong>puradas e filtradas, jorrando para a se<strong>de</strong> do<br />

leitor como pura água <strong>de</strong> fonte. O livro reúne <strong>de</strong>zesseis traba‑<br />

lhos, dos quais pelo menos uma dúzia ou <strong>mais</strong> po<strong>de</strong>m ser<br />

consi<strong>de</strong>rados obras ‑primas da literatura brasileira e universal,<br />

contos que figuram entre o que <strong>de</strong> melhor se escreveu no<br />

gênero, em todas as épocas e países, obras <strong>de</strong> “um pensador<br />

para quem a alma humana não tem segredos” (Olavo Bilac).<br />

A pesquisa em busca dos segredos da alma humana,<br />

por vezes um tanto cruel e dolorosa, mesclada a um certo<br />

cinismo e a um corrosivo sentimento <strong>de</strong> <strong>de</strong>scrença, marcam<br />

a ferro e fogo o leitor <strong>de</strong> trabalhos como “A cartomante”,<br />

“Uns braços”, “A <strong>de</strong>sejada das gentes”, “A causa secreta”,<br />

“O enfermeiro”, “O diplomático”, “Conto <strong>de</strong> escola”, “D.<br />

Paula”, “O Cônego ou a metafísica do estilo”, nos quais<br />

não se sabe o que <strong>mais</strong> admirar, se a perfeição artística ou<br />

o conhecimento da alma humana.<br />

Prelo<br />

F o r t u n a C r í t i C a


C o l e ç ã o<br />

l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a<br />

DIREÇÃO<br />

ELEÍLSON LEITE<br />

Escritas por autores que moram ou têm origem nas<br />

periferias das gran<strong>de</strong>s cida<strong>de</strong>s do Brasil, e que fre‑<br />

quentam seus saraus, núcleos culturais, oficinas e<br />

ONGs, as obras da coleção Literatura Periférica têm<br />

<strong>de</strong>spertado o interesse <strong>de</strong> um público cada vez <strong>mais</strong><br />

amplo; um público sintonizado com o que há <strong>de</strong><br />

novo e interessante na mo<strong>de</strong>rna ficção brasileira.<br />

Além <strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrarem inegável qualida<strong>de</strong> literária,<br />

essas obras apresentam ao leitor, na forma <strong>de</strong><br />

poema, conto, romance e peça <strong>de</strong> teatro, uma lite‑<br />

ratura que expõe com muita indignação os proble‑<br />

mas sociais da vida nas metrópoles, sem <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong><br />

lado boa dose <strong>de</strong> humor e lirismo.<br />

103


A RIMA DENUNCIA<br />

GOG<br />

1 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1420 ‑6<br />

A rima <strong>de</strong>nuncia reúne textos diversos do rapper Ge‑<br />

nival Oliveira Gonçalves, aliás GOG, que, segundo o prefa‑<br />

ciador do volume, Pedro Alexandre Sanches, indicam “a<br />

hora em que o rap se vale da tinta e do pergaminho para<br />

inscrever e sedimentar sua marca na cultura dita oficial <strong>de</strong><br />

seu (nosso) país”.<br />

Os raps apresentados no livro são <strong>de</strong> um poeta popular<br />

que se orgulha <strong>de</strong> suas origens e se i<strong>de</strong>ntifica para o leitor<br />

com o seguinte cartão <strong>de</strong> visitas: “Vamos falar, cara/ em<br />

<strong>de</strong>talhes, propostas, verda<strong>de</strong>s/ que precisam ser ditas/ somos<br />

das ruas e trazemos a você/ nosso cartão <strong>de</strong> visitas”.<br />

De acordo com suas próprias palavras, GOG se empe‑<br />

nha em “questionar a socieda<strong>de</strong> e suas instituições: polícia,<br />

imprensa, família, formadores <strong>de</strong> opinião. Meu ponto <strong>de</strong><br />

vista é o <strong>de</strong> alguém que percebe, inconformado, a lógica<br />

perversa <strong>de</strong>ssas instituições” e se empenha em <strong>de</strong>nunciar<br />

a dura realida<strong>de</strong> cotidiana enfrentada pelo pobre, o analfa‑<br />

beto, o negro: “Entre os que morrem precocemente/ quan‑<br />

tos são da cor da gente?”; “pesquisa publicada prova!/<br />

preferencialmente preto, pobre, prostituta,/ pra polícia<br />

pren<strong>de</strong>r/ pare, pense.../ – por quê?”; “os livros raramente<br />

contam os verda<strong>de</strong>iros fatos”.<br />

São esses fatos que o rapper GOG apresenta em seus<br />

poemas musicados reunidos em A rima <strong>de</strong>nuncia, volume<br />

que, segundo Pedro Alexandre Sanches, pelo aspecto pu‑<br />

ramente artístico, permitem conferir a evolução do poeta<br />

(“como seu discurso e seus versos foram se aprimorando e<br />

afinando”) e “oferece a rara oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estabelecer<br />

uma reflexão crítica sobre o <strong>de</strong>senvolvimento do gênero (o<br />

rap) e seus <strong>de</strong>sdobramentos na vida cotidiana do país, das<br />

periferias ao centros”, através da voz <strong>de</strong> um artista da pe‑<br />

riferia, orgulhoso <strong>de</strong> sê ‑lo.<br />

104<br />

l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a<br />

CELA FORTE<br />

Luiz Alberto Men<strong>de</strong>s<br />

Prelo<br />

Luiz Alberto Men<strong>de</strong>s é um caso à parte na literatura bra‑<br />

sileira. Antigo interno do sistema carcerário, <strong>de</strong>scobriu o<br />

po<strong>de</strong>r da palavra escrita na prisão. A partir daí, nunca <strong>mais</strong><br />

parou <strong>de</strong> escrever. Pura catarse. Seu primeiro livro, o romance<br />

Memórias <strong>de</strong> um sobrevivente, publicado em 2001, surpreen‑<br />

<strong>de</strong>u pela maneira direta e ru<strong>de</strong> <strong>de</strong> narrar a realida<strong>de</strong>, sem<br />

floreios. O sucesso confirmou que o escritor estava no cami‑<br />

nho certo. Vieram outras obras, com igual receptivida<strong>de</strong>.<br />

Cela forte, publicado na coleção “Literatura perifé‑<br />

rica”, reafirma as qualida<strong>de</strong>s do autor, agora <strong>de</strong>puradas<br />

pela experiência. Num clima <strong>de</strong>nso e <strong>de</strong>sesperançado,<br />

Men<strong>de</strong>s <strong>de</strong>scerra novos aspectos <strong>de</strong> uma realida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sa‑<br />

gradável, contun<strong>de</strong>nte, ferina como um punhal, mas viva e<br />

palpitante, extraída <strong>de</strong> sua vivência pessoal.<br />

O livro reúne vinte e seis contos passados <strong>de</strong>ntro e fora<br />

da prisão, sempre retratando o mundo dos marginalizados.<br />

São bandidos endurecidos, policiais i<strong>de</strong>m, homens <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>n‑<br />

tes, falsos valentes, adolescentes <strong>de</strong>scobrindo o sexo, heróis<br />

duvidosos, puxando cana, sequestrando, mendigando. He‑<br />

róis sem heroísmo do submundo, <strong>de</strong> cujas aventuras, por<br />

vezes, o autor extrai uma poesia perturbadora.<br />

Na apresentação, intitulada “Um escritor <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>”,<br />

Marcelino Freire conta como, ao tomar conhecimento da<br />

escrita <strong>de</strong> Men<strong>de</strong>s, comprovou “como a literatura serve<br />

para <strong>de</strong>senclausurar fantasmas, soltar os <strong>de</strong>mônios do<br />

peito. Sem medo. Misturar realida<strong>de</strong> e ficção. Melhor<br />

acerto <strong>de</strong> contas não há”.<br />

O velho Erasmo <strong>de</strong> Roterdã, ao escrever o Elogio da<br />

loucura, sugeriu a loucura irremediável <strong>de</strong> toda a humani‑<br />

da<strong>de</strong>. Luiz Alberto Men<strong>de</strong>s, através <strong>de</strong> seus personagens,<br />

vivendo na ca<strong>de</strong>ia ou livres, mas sempre aprisionados e per‑<br />

seguidos por preconceitos e convenções, parece acreditar<br />

que todos nós somos prisioneiros. Vivendo numa cela forte.<br />

Prelo<br />

l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a


COLECIONADOR<br />

DE PEDRAS<br />

Sérgio Vaz<br />

1 a edição – 168 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1222 ‑6<br />

Colecionar pedras po<strong>de</strong> ser apenas um hobby, mas<br />

saber atirá ‑las, com precisão, é uma arte. Sobretudo quando<br />

se trata <strong>de</strong> pedras em forma <strong>de</strong> poemas, mas nem por isso<br />

menos contun<strong>de</strong>ntes e ferinos. “As pedras não falam, mas<br />

quebram vidraças”, prega Sérgio Vaz. A metáfora é clara.<br />

Com ela, o poeta indica o essencial <strong>de</strong> sua poesia: poemas<br />

atirados como pedradas contra as convenções sociais, as hi‑<br />

pocrisias, os preconceitos. Atiradas com mão precisa e insis‑<br />

tente. De quem nunca vai <strong>de</strong>sistir <strong>de</strong> cantar. “Se outros poetas<br />

pe<strong>de</strong>m silêncio, ele pe<strong>de</strong> <strong>mais</strong> barulho. Se outros escritores<br />

pe<strong>de</strong>m paz, ele quer é guerra”, como diz Ferréz no prefácio.<br />

Barulho e guerra são justificáveis e úteis para <strong>de</strong>nun‑<br />

ciar as misérias e a dura realida<strong>de</strong> do cotidiano da periferia,<br />

como essa pedrada: “Quatro jovens/ morreram na chacina/<br />

do fim da rua./ Conforme a notícia,/ dois <strong>de</strong>les tinham pas‑<br />

sagem./ Os outros dois/ foram assim mesmo.../ clan<strong>de</strong>stina‑<br />

mente.”. Ou esta outra, intitulada “Bala perdida”: “Um<br />

homem/ caído sobre as garrafas/ guardava na memória/<br />

uma bala./ O garoto/ com o olhar caído sobre o homem/<br />

guardava na memória/ a primeira vala.”.<br />

Mas o poeta tem também seu lado lírico e sentimental<br />

que nenhuma guerra consegue <strong>de</strong>struir: “Sonia/ tem o<br />

sono frágil,/ acorda com o barulho dos meus sonhos./ Ma‑<br />

riana/ dorme com anjos,/ não escuta nada./ Eu/ durmo com<br />

os olhos abertos,/ sou coruja.”.<br />

Poeta da periferia e agitador cultural, Sérgio Vaz vive<br />

em Taboão da Serra, na Gran<strong>de</strong> São Paulo, tem quatro li‑<br />

vros publicados, sendo o i<strong>de</strong>alizador da Cooperifa (Coope‑<br />

rativa Cultural da Periferia), evento que transformou um<br />

bar da periferia <strong>de</strong> São Paulo em centro cultural, e criador<br />

do projeto Poesia contra a Violência, que percorre as esco‑<br />

las da periferia incentivando a leitura e a criação poética<br />

como instrumento <strong>de</strong> arte e cidadania.<br />

l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a<br />

DA CABULA<br />

Allan da Rosa<br />

1 a edição – 96 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1280 ‑6<br />

Vencedor do II Prêmio Nacional <strong>de</strong> Dramaturgia Negra<br />

Ruth <strong>de</strong> Souza, ora incorporada à coleção Literatura Perifé‑<br />

rica, Da Cabula, com o subtítulo provocativo <strong>de</strong> “Istória pa<br />

tiatru”, surge para inquietar, reivindicar, contestar, <strong>de</strong>nun‑<br />

ciar o egoísmo e a hipocrisia da socieda<strong>de</strong>.<br />

A peça tem o timbre da própria voz da periferia, com<br />

os seus gritos <strong>de</strong> protesto e seus cantos <strong>de</strong> esperança,<br />

<strong>de</strong>senrolando ‑se como um drama, <strong>mais</strong> um drama, do co‑<br />

tidiano, <strong>de</strong>ntro da cida<strong>de</strong> imensa, que po<strong>de</strong> ser São Paulo,<br />

Rio <strong>de</strong> Janeiro ou qualquer outra. A localização precisa não<br />

é importante.<br />

O importante é a preocupação do autor <strong>de</strong> que o ter‑<br />

ritório da cida<strong>de</strong> só pertence ao povo “quando ele vai ali<br />

cumprir a sua rotina <strong>de</strong> trabalho. Fora <strong>de</strong>sse tempo, o su‑<br />

jeito da periferia é visto como um ser in<strong>de</strong>sejado.” (Concei‑<br />

ção Evaristo).<br />

Neste cenário hostil, <strong>de</strong>senrola ‑se a história <strong>de</strong> Dona<br />

Filomena da Cabula, uma empregada doméstica ansiosa<br />

por aumentar seus horizontes espirituais e que <strong>de</strong>para com<br />

uma dura e <strong>de</strong>vastadora realida<strong>de</strong>, preconceito social e ra‑<br />

cial (“Eu sou uma negra forra?... É, pelo menos larguei a<br />

íngua da casa ‑gran<strong>de</strong>.”), duras barreiras impostas <strong>de</strong> cima<br />

para baixo, levando ‑a a elaborar para si uma outra história,<br />

baseada em valores ancestrais, que a levam ao sonho.<br />

Como sintetizou Nei Lopes, no prefácio à peça, “o texto<br />

<strong>de</strong> Allan da Rosa quer e consegue dinamitar e implodir as<br />

torres <strong>de</strong>sta socieda<strong>de</strong> exclu<strong>de</strong>nte. E o faz com as flores ver‑<br />

melhas <strong>de</strong> seus versos, frases, diálogos e cenas, como neste<br />

Da Cabula. E é assim que sua fervorosa e vigorosa arte cami‑<br />

nha para transcen<strong>de</strong>r a periferia e chegar aos gran<strong>de</strong>s palcos,<br />

com as bênçãos até mesmo do dúbio <strong>de</strong>us mercado – boi<br />

feito para ser comido, ‘com chifre e tudo’”.<br />

l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a<br />

105


DE PASSAGEM MAS<br />

NÃO A PASSEIO<br />

Dinha<br />

1 a edição – 144 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1328 ‑5<br />

O vento da poesia sopra on<strong>de</strong> quer. Em Paris, Teguci‑<br />

galpa ou no Parque Bristol, bairro da periferia <strong>de</strong> São Paulo,<br />

on<strong>de</strong> vive a autora <strong>de</strong> De passagem mas não a passeio, a<br />

cearense Maria Nilda <strong>de</strong> Carvalho Mota, a Dinha. Vive e<br />

verseja com aquela garra peculiar ao nor<strong>de</strong>stino, fazendo<br />

<strong>de</strong> sua mensagem poética “uma trincheira <strong>de</strong> palavras,<br />

mas uma trincheira lírica”, como observa Elisa Lucinda.<br />

O lirismo <strong>de</strong> seus versos adoça e atenua o espírito<br />

combativo <strong>de</strong> Dinha, que há <strong>de</strong>z <strong>anos</strong> vem publicando fan‑<br />

zines <strong>de</strong> poesia, divulgando seus versos <strong>de</strong> forma oral pela<br />

comunida<strong>de</strong> e participando <strong>de</strong> movimentos <strong>de</strong> impulso ao<br />

<strong>de</strong>senvolvimento cultural, econômico e social, integrada<br />

em espírito e verda<strong>de</strong> à região em que vive.<br />

Mas engana ‑se “quem quiser transformar a literatura<br />

marginal ou periférica da Dinha em objeto intelectual folcló‑<br />

rico <strong>de</strong> consumo, em uma maneira pitoresca <strong>de</strong> fazer um<br />

‘contato seguro’ (como ela mesma diz) com aquele <strong>de</strong>sam‑<br />

paro do estado e da pátria” (Elisa Lucinda). A sua poesia,<br />

quase sempre dura (“De aqui, <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro da guerra/ não tem<br />

DIU nem camisinha/ que te proteja da estúpida reprodução/<br />

da fome, da miséria, da ínfima estrutura/ que abafa o cantar<br />

das favelas/ – antigas senzalas mo<strong>de</strong>rnas –/ cemitério geral das<br />

pessoas”), chegando por vezes ao extremo da revolta (“Na<br />

favela on<strong>de</strong> vivi, o barraco/ É <strong>de</strong> quem mora. A horta/ É <strong>de</strong><br />

quem planta. Dignida<strong>de</strong>/ De quem tem armas. Ou insiste. Ou<br />

canta./ Frutos e galinhas foram sempre/ <strong>de</strong> quem conseguiu<br />

comer.../ No momento estou criando armas...”), revela ‑se<br />

também ansiosa pelo amor, um amor talvez um tanto áspero<br />

(“Eu quero te dar/ um tapa tão louco/ que imprima meu <strong>de</strong>s‑<br />

tino/ na lisura do teu rosto./ Um beijo obsceno/ que introduza<br />

o meu sentido/ na ternura do teu senso. Um poema egoísta/<br />

que inclua a tua vida/ em minha vida/ em minha rima/ em<br />

minha sina.”), mas marcante. Como um tapa na cara.<br />

106<br />

l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a<br />

GUERREIRA<br />

Alessandro Buzo<br />

2 a edição – 120 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1224 ‑0<br />

A periferia tem muitas vozes. Líricas, revoltadas, agres‑<br />

sivas, provocativas, conciliadoras, conformistas, por vezes<br />

uma mistura perturbadora disso tudo. Vozes que falam<br />

cada vez <strong>mais</strong> alto, querendo ser ouvidas. E que se expres‑<br />

sam em poemas, peças teatrais, ficção, quase sempre igno‑<br />

radas pela crítica, mas que trazem um vigor, uma palpitação,<br />

um grito <strong>de</strong> protesto tão forte quanto a própria vida. Como<br />

essa Guerreira, <strong>de</strong> Alessandro Buzo, que po<strong>de</strong> ser classifi‑<br />

cada <strong>de</strong> romance, novela, <strong>de</strong>núncia. Não importa.<br />

O que importa é que se trata <strong>de</strong> uma literatura produ‑<br />

zida por morador <strong>de</strong> periferia, que sempre foi personagem<br />

<strong>de</strong> escritores que nunca pisaram lá, e agora começa a se<br />

expressar. E a se expressar com contundência, dizendo ver‑<br />

da<strong>de</strong>s duras <strong>de</strong> ouvir e exibindo uma realida<strong>de</strong> suja, vio‑<br />

lenta, incômoda.<br />

Guerreira conta a história <strong>de</strong> uma jovem que co‑<br />

meça como namorada <strong>de</strong> um bandido, torna ‑se mulher<br />

<strong>de</strong> um rapaz rico, <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong> vira cafetina, dona <strong>de</strong> uma<br />

pousada etc.<br />

No prefácio, Marcelino Freire classifica a obra como<br />

“saga ritmada”, narrada em ritmo vertiginoso, numa lingua‑<br />

gem pessoal: “Em um instante, você passeia por toda uma<br />

São Paulo <strong>de</strong>scortinada. Mesmo poluída. No sentido <strong>de</strong> que<br />

dá para ver, nítida, qual a cara crua da cida<strong>de</strong>. Os persona‑<br />

gens perambulando pela Rua do Carmo, pela Praça Clóvis e<br />

Patriarca. Sem contar a viagem que o autor faz i<strong>de</strong>m pelo Rio<br />

<strong>de</strong> Janeiro.”. Livro para ser lido <strong>de</strong> um fôlego.<br />

Morador do Itaim Paulista, na Zona Leste <strong>de</strong> São<br />

Paulo, Alessandro Buzo tem quatro livros publicados, atua<br />

como promotor <strong>de</strong> espetáculos <strong>de</strong> hip ‑hop e repórter da<br />

revista Rap Brasil, subscrevendo uma coluna sobre hip ‑hop<br />

em cinco sites, um <strong>de</strong>les <strong>de</strong> Portugal. A voz da periferia está<br />

chegando longe.<br />

l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a


LITERATURA, PÃO E<br />

POESIA<br />

Sérgio Vaz<br />

1 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1578 ‑4<br />

Poeta da periferia, agitador cultural, Sérgio Vaz é pre‑<br />

sença ativa nas comunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> todo o Brasil, com a apre‑<br />

sentação <strong>de</strong> seus saraus <strong>de</strong> poesia. Autor <strong>de</strong> seis livros <strong>de</strong><br />

poemas, contemplado com diversos prêmios culturais,<br />

eleito pela revista Época uma das cem pessoas <strong>mais</strong> in‑<br />

fluentes do Brasil, ele lança agora seu primeiro livro <strong>de</strong> crô‑<br />

nicas, intitulado Literatura, pão e poesia.<br />

Para a prefaciadora do livro, Heloisa Buarque <strong>de</strong><br />

Hollanda, o título “diz, literalmente, a que veio”. Ou seja,<br />

é uma afirmação da literatura marginal, ou periférica, uma<br />

visão peculiar do mundo a partir do entorno <strong>de</strong> uma me‑<br />

trópole, no caso São Paulo.<br />

Como cronista do cotidiano, que por vezes opta pelo<br />

conto ou a reflexão, Vaz fala – ora em tom <strong>de</strong> poesia, ora<br />

<strong>de</strong> ironia ou revolta – daquilo que o atinge, comove ou ir‑<br />

rita, oferecendo ao leitor notícias <strong>de</strong> um mundo on<strong>de</strong> “os<br />

brutos também amam” (lembrança irônica e comovida <strong>de</strong><br />

seu primeiro amor), os pedreiros constroem casas para os<br />

outros como se fossem seus próprios lares e as domésticas<br />

“não admitem ser domesticadas”, além do fascínio do fu‑<br />

tebol sobre a garotada, <strong>de</strong> malandros e trabalhadores.<br />

Literatura, pão e poesia é também “quase um manual<br />

<strong>de</strong> conduta”, como observa Heloisa, pela insistência para<br />

que as pessoas (os moradores da periferia) não abram mão<br />

do sonho nem da poesia, mas que resistam sempre <strong>de</strong> “pu‑<br />

nhos cerrados que a luta não para”.<br />

Como sintetiza Eliane Brum, “em sua estreia na crônica,<br />

Vaz profana a língua com talento para incluir nela um naco<br />

maior <strong>de</strong> mundo. Tem <strong>de</strong>dos <strong>de</strong> navalha para disfarçar a ter‑<br />

nura do olhar que afaga as entrelinhas. Nos encanta – e às<br />

vezes nos golpeia – com achados <strong>de</strong> linguagem paridos numa<br />

realida<strong>de</strong> on<strong>de</strong> as frases têm <strong>de</strong> ser puxadas pelo pescoço<br />

para não morrer <strong>de</strong> bala perdida antes mesmo <strong>de</strong> existirem”.<br />

l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a<br />

85 LETRAS E<br />

UM DISPARO<br />

Sacolinha<br />

2 a edição – 120 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1223 ‑3<br />

O clima é <strong>de</strong> violência, revolta, inquietação, um re‑<br />

trato direto, duro, sem meias palavras e sem requintes par‑<br />

nasi<strong>anos</strong> da vida dos miseráveis, dos violentos e dos<br />

humilhados, já sugerida no título <strong>de</strong> alguns <strong>de</strong>sses <strong>de</strong>ze‑<br />

nove contos: “Quem tem medo <strong>de</strong> cagar não come!”, “Re‑<br />

flexões <strong>de</strong> um mendigo”, “85 letras e um disparo”.<br />

O conteúdo não <strong>de</strong>smente os títulos. “O aluno que só<br />

queria cabular uma aula” mostra a revolta <strong>de</strong> um garoto<br />

contra a escola, na qual vê um lugar <strong>de</strong> opressão; “Quem<br />

tem medo <strong>de</strong> cagar não come!” apresenta uma série <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>sastres; “Degradação” penetra nos pensamentos <strong>de</strong> um<br />

policial expulso da corporação, à espera <strong>de</strong> um bico para<br />

sobreviver e saudoso <strong>de</strong> “extorsão, torturas, tapas na cara,<br />

mulheres fáceis, cocaína, mordomias”; “Eu, prostituta?”<br />

expõe os pensamentos <strong>de</strong> revolta <strong>de</strong> uma profissional do<br />

sexo, com uma longínqua esperança <strong>de</strong> vida nova.<br />

Os personagens <strong>de</strong> Sacolinha são frustrados, revolta‑<br />

dos, marginalizados, sem esperanças e sem horizontes, vi‑<br />

vendo ao <strong>de</strong>us ‑dará, “imersos na violência, <strong>de</strong> tal modo que<br />

a violência per<strong>de</strong>u o sentido” (Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão).<br />

Como reconhece Moacyr Scliar, “a maior qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Sacolinha é sua espontaneida<strong>de</strong>. A linguagem ficcional brota<br />

<strong>de</strong>le naturalmente, sem frescuras, sem pretensões a gran<strong>de</strong><br />

literatura, ainda que ele seja influenciado por muitos bons<br />

autores. E esta espontaneida<strong>de</strong>, esta autenticida<strong>de</strong> são dig‑<br />

nas <strong>de</strong> admiração”.<br />

Esta é a segunda edição <strong>de</strong> 85 letras e um disparo,<br />

lançado em 2006, com excelente receptivida<strong>de</strong>. Sacolinha<br />

é o pseudônimo – seria melhor dizer o nome <strong>de</strong> guerra – <strong>de</strong><br />

A<strong>de</strong>miro Alves <strong>de</strong> Sousa, jovem, ainda na faixa dos vinte<br />

<strong>anos</strong>, mas já com uma indicação para o Prêmio Jabuti, que<br />

<strong>de</strong>sponta como uma boa promessa da literatura brasileira.<br />

l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a<br />

107


Arquivo pessoal<br />

C o l e ç ã o<br />

a F r â n i o C o u t i n h o<br />

108<br />

Ensaísta, crítico literário e jornalista baiano. Entre<br />

1942 e 1947 trabalha nos Estados Unidos, na edição<br />

da versão em português da Rea<strong>de</strong>r’s Digest. De volta<br />

ao Brasil, em 1948, cria a primeira cátedra <strong>de</strong> Teoria<br />

e Técnica Literária. Em 1958 torna ‑se catedrático <strong>de</strong><br />

Literatura Brasileira. É eleito membro da Aca<strong>de</strong>mia<br />

Brasileira <strong>de</strong> Letras em 1962. Entre seus inúmeros<br />

livros <strong>de</strong>stacam ‑se A filosofia <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis<br />

(1940), Aspectos da literatura barroca (1950), Da<br />

crítica e da nova crítica (1957), Conceitos <strong>de</strong> litera‑<br />

tura brasileira (1960) e Crítica e críticas (1969). Em<br />

1990 edita a Enciclopédia da literatura brasileira com<br />

J. Galante <strong>de</strong> Sousa.<br />

Apesar <strong>de</strong> sua falta no ato final da publicação da<br />

obra, em que tanto trabalhou, as suas páginas evi‑<br />

<strong>de</strong>nciarão, aos que possuam olhos <strong>de</strong> ver, a sua<br />

marca <strong>de</strong> pesquisador consciente, cioso da verda<strong>de</strong><br />

histórica e, em tudo o <strong>mais</strong> que produziu, a altitu<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> seu espírito. (sobre J. Galante <strong>de</strong> Souza)


A coleção A literatura no Brasil publicada em 6<br />

volumes sob a direção do professor Afrânio Coutinho<br />

é, sem dúvida, o <strong>mais</strong> completo tratado sobre a histó‑<br />

ria da literatura no Brasil. Afrânio Coutinho aborda a<br />

literatura brasileira como uma verda<strong>de</strong>ira obra <strong>de</strong> arte,<br />

falando sobre seu valor estético, encarando ‑a como<br />

um todo, autônoma. Apresenta a literatura brasileira<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua origem no período renascentista, entre os<br />

fins do século XV e princípio do século XVI, até os dias<br />

<strong>de</strong> hoje. A literatura no Brasil, pelo seu nível <strong>de</strong> infor‑<br />

mação e pela fundamentação teórica, traz, enfim,<br />

uma gran<strong>de</strong> contribuição para o estudo e a pesquisa<br />

da língua e da literatura brasileiras.<br />

A LITERATURA<br />

NO BRASIL<br />

VOL. I – INTRODUÇÃO GERAL<br />

Direção:<br />

Afrânio Coutinho<br />

Codireção:<br />

Eduardo <strong>de</strong> Faria Coutinho<br />

7a edição – 528 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0555 ‑3<br />

A literatura no Brasil, primeira história da literatura<br />

brasileira <strong>de</strong> autoria coletiva, nasceu <strong>de</strong> um projeto do mé‑<br />

dico e professor Leonídio Ribeiro, preocupado em reor<strong>de</strong>‑<br />

nar e mo<strong>de</strong>rnizar os estudos na área. A direção foi entregue<br />

ao professor Afrânio Coutinho, responsável por uma equipe<br />

<strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> sessenta críticos, professores, ensaístas, especia‑<br />

lizados nos temas e autores abordados.<br />

Des<strong>de</strong> seu lançamento – que por razões diversas se<br />

arrastou <strong>de</strong> 1955 a 1968 –, a coleção vem tendo sucessivas<br />

reedições e atualização permanente. A presente edição –<br />

sob a codireção <strong>de</strong> Eduardo <strong>de</strong> Faria Coutinho – analisa a<br />

produção literária brasileira até a década <strong>de</strong> 1990.<br />

O primeiro volume estuda os problemas genéricos ou<br />

introdutórios à compreensão da literatura brasileira, divi ‑<br />

‑dindo ‑se em dois gran<strong>de</strong>s blocos. O primeiro engloba os<br />

quatro prefácios escritos por Afrânio Coutinho para as su‑<br />

cessivas edições <strong>de</strong> A literatura no Brasil, expondo a con‑<br />

cepção e o planejamento adotado na obra, no caso a<br />

<strong>de</strong>scrição do processo evolutivo da literatura brasileira<br />

como integração dos estilos artísticos.<br />

No segundo bloco, dividido em oito capítulos, são estu‑<br />

dados aspectos relacionados ao <strong>de</strong>senvolvimento da literatura,<br />

o panorama intelectual europeu no momento do <strong>de</strong>scobri‑<br />

mento e povoamento do Brasil, a língua literária, a literatura<br />

oral e <strong>de</strong> expressão popular, as relações entre escola e litera‑<br />

tura, o escritor e o público, a literatura e o conhecimento da<br />

terra, a gênese da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> um país chamado Brasil, a longa<br />

formação e <strong>de</strong>senvolvimento da língua nacional brasileira,<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o encontro do colonizador com os indígenas às inova‑<br />

ções mo<strong>de</strong>rnistas. Estão lançadas as bases para o estudo da<br />

história da literatura brasileira fundamentadas na análise dos<br />

“estilos <strong>de</strong> época” (era barroca, neoclássica, romântica, rea‑<br />

lista, mo<strong>de</strong>rnista), <strong>de</strong>senvolvido nos volumes seguintes.<br />

A f r â n i o C o u t i n h o<br />

109


A LITERATURA<br />

NO BRASIL<br />

VOL. II – ERA BARROCA/<br />

ERA NEOCLÁSSICA<br />

Direção:<br />

Afrânio Coutinho<br />

Codireção:<br />

Eduardo <strong>de</strong> Faria Coutinho<br />

7 a edição – 336 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0556 ‑1<br />

O segundo volume <strong>de</strong> A literatura no Brasil estuda os<br />

períodos barroco e neoclássico, quando o Brasil começa a<br />

se <strong>de</strong>finir como Brasil, mas ainda <strong>de</strong> maneira incipiente. É<br />

a época <strong>de</strong> aparecimento dos primeiros escritores nascidos<br />

na terra, sob o signo do Barroco, i<strong>de</strong>ntificado como estilo<br />

<strong>de</strong> arte e complexo cultural.<br />

Uma das novida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> A literatura no Brasil no estudo<br />

<strong>de</strong> nossa literatura é a conceituação do período que se es‑<br />

ten<strong>de</strong> <strong>de</strong> meados do século XVI ao fim do século XVIII como<br />

Barroco. Até então toda essa fase era incluída no Classi‑<br />

cismo, sem maiores indagações ou justificativas.<br />

À essa nova luz, foi possível reconsi<strong>de</strong>rar a visão tradi‑<br />

cional sobre as origens da poesia brasileira, a literatura dos<br />

jesuítas, os sermões <strong>de</strong> Vieira, as sátiras <strong>de</strong> Gregório <strong>de</strong><br />

Matos, o movimento aca<strong>de</strong>micista.<br />

No século XVIII, período <strong>de</strong> transição e preparação para<br />

a in<strong>de</strong>pendência, em sintonia com as gran<strong>de</strong>s mudanças<br />

efetuadas no mundo, o país toma consciência <strong>de</strong> si mesmo,<br />

o sentimento nacional se aguça, aumenta a rivalida<strong>de</strong> entre<br />

nativos e reinóis, suce<strong>de</strong>m ‑se os movimentos emancipacio‑<br />

nistas, precursores da in<strong>de</strong>pendência. Nesse mundo em ebu‑<br />

lição, o Neoclassicismo surge como um ponto <strong>de</strong> equilíbrio,<br />

mas também <strong>de</strong> nostalgia <strong>de</strong> uma inocência perdida, com a<br />

volta a uma arte <strong>mais</strong> simples, próxima à natureza, reto‑<br />

mando os velhos i<strong>de</strong>ais clássicos. Uma das tendências domi‑<br />

nantes <strong>de</strong>ssa literatura foi o Arcadismo, a poesia adotada<br />

pelo grupo mineiro, estudado também como encaminha‑<br />

mento ao Romantismo. É uma época <strong>de</strong> primado quase ab‑<br />

soluto da poesia, mas na qual emergem também pensadores,<br />

como Matias Aires e Silva Lisboa, oradores como<br />

Mont’Alverne, jornalistas como Hipólito da Costa e João<br />

Francisco Lisboa. O país já estava às portas do Romantismo.<br />

Mas isso é assunto do próximo volume.<br />

110<br />

A f r â n i o C o u t i n h o<br />

A LITERATURA<br />

NO BRASIL<br />

VOL. III – ERA ROMâNTICA<br />

Direção:<br />

Afrânio Coutinho<br />

Codireção:<br />

Eduardo <strong>de</strong> Faria Coutinho<br />

7 a edição – 376 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0557 ‑X<br />

Nenhum movimento da história da literatura brasileira<br />

se i<strong>de</strong>ntificou tanto com as aspirações do país e os sonhos<br />

e i<strong>de</strong>ais dos brasileiros como o Romantismo. Complexo,<br />

rico, contraditório, esbanjando vitalida<strong>de</strong>, movimento <strong>de</strong><br />

moços, pela ida<strong>de</strong> e o espírito, apesar <strong>de</strong> seus aspectos<br />

mórbidos, o Romantismo revelou o país aos brasileiros, im‑<br />

plantou uma nova mentalida<strong>de</strong> artística e se manteve du‑<br />

rante três gerações, cerca <strong>de</strong> quarenta <strong>anos</strong>.<br />

Essa fase <strong>de</strong> excepcional brilho, i<strong>de</strong>ntificada com o<br />

reinado <strong>de</strong> D. Pedro II, é estudada no terceiro volume <strong>de</strong> A<br />

literatura no Brasil, constituindo uma visão abrangente do<br />

movimento, em sintonia com as mudanças sociais e políti‑<br />

cas <strong>de</strong>senroladas no mundo e no Brasil a partir <strong>de</strong> meados<br />

do século XVIII.<br />

O volume está dividido em oito capítulos. Os dois pri‑<br />

meiros analisam as origens europeias do movimento, suas<br />

características – o inconformismo, a exaltação sentimental,<br />

a melancolia, o culto à natureza –, o Pré ‑Romantismo, as<br />

primeiras manifestações românticas no Brasil, com os poe‑<br />

mas <strong>de</strong> Maciel Monteiro e Gonçalves <strong>de</strong> Magalhães, ainda<br />

com fortes vincos clássicos.<br />

Três capítulos são <strong>de</strong>dicados ao estudo da poesia, gê‑<br />

nero <strong>de</strong> maior prestígio à época, <strong>de</strong>senvolvendo ‑se a partir<br />

do rompimento com o passado e a fixação <strong>de</strong>finitiva do<br />

Romantismo, suas características brasileiras, a i<strong>de</strong>ntificação<br />

das raízes profundas <strong>de</strong> nosso povo com o Indianismo, a<br />

morbi<strong>de</strong>z dos ultrarromânticos e byroni<strong>anos</strong>, as novas cor‑<br />

rentes poéticas introduzidas a partir da década <strong>de</strong> 1860,<br />

sobretudo a influência do velho Victor Hugo. Dois capítulos<br />

são <strong>de</strong>dicados à prosa <strong>de</strong> ficção, centralizados no gran<strong>de</strong><br />

momento criador <strong>de</strong> José <strong>de</strong> Alencar, e nas Memórias <strong>de</strong><br />

um sargento <strong>de</strong> milícias. O panorama da época é comple‑<br />

tado com a análise das origens da crítica literária brasileira<br />

e seu agudo sentimento <strong>de</strong> brasilida<strong>de</strong>.<br />

A f r â n i o C o u t i n h o


A LITERATURA<br />

NO BRASIL<br />

VOL. IV – ERA REALISTA/<br />

ERA DE TRANSIÇÃO<br />

Direção:<br />

Afrânio Coutinho<br />

Codireção:<br />

Eduardo <strong>de</strong> Faria Coutinho<br />

7 a edição – 664 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0558 ‑8<br />

Realismo, Naturalismo, Parnasianismo, Simbolismo, os<br />

gran<strong>de</strong>s movimentos literários, <strong>de</strong> poesia e prosa, da se‑<br />

gunda meta<strong>de</strong> do século XIX, constituem o material <strong>de</strong><br />

estudo do quarto volume <strong>de</strong> A literatura no Brasil.<br />

Uma fase repleta <strong>de</strong> contrastes, uma encruzilhada <strong>de</strong><br />

tendências, na qual, como em toda época <strong>de</strong> intensa cria‑<br />

ção artística, as novas correntes convivem e se atritam com<br />

o espírito conservador e, ao mesmo tempo, com outras<br />

buscas <strong>de</strong> renovação, num processo simultâneo <strong>de</strong> <strong>de</strong>sen‑<br />

volvimento e choque, e numa velocida<strong>de</strong> até então <strong>de</strong>sco‑<br />

nhecida na literatura brasileira.<br />

Foi um dos períodos <strong>mais</strong> ricos da prosa <strong>de</strong> ficção bra‑<br />

sileira, na qual se afirma a obra máxima <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong><br />

Assis, ao mesmo tempo que se impõem os naturalistas, o<br />

impressionismo <strong>de</strong> Raul Pompeia e o realismo social <strong>de</strong><br />

Lima Barreto. É também a época do verbalismo e das <strong>de</strong>s‑<br />

cobertas do Brasil, harmonizadas em Os sertões, da prosa<br />

límpida <strong>de</strong> Joaquim Nabuco às primeiras manifestações re‑<br />

gionalistas. Fase <strong>de</strong> consolidação da crítica brasileira e <strong>de</strong><br />

renovação da poesia, com a disciplina requintada dos par‑<br />

nasi<strong>anos</strong>, logo atropelados pelas primeiras manifestações<br />

simbolistas. Esses aspectos são analisados no primeiro<br />

bloco do livro, sob a classificação geral <strong>de</strong> “era realista”.<br />

O segundo bloco inclui autores e obras reunidas sob a<br />

rubrica <strong>de</strong> “era <strong>de</strong> transição”. Estuda o movimento simbo‑<br />

lista, as manifestações do Impressionismo em prosa, os<br />

primeiros sintomas <strong>de</strong> transição para novas formas <strong>de</strong> ex‑<br />

pressão, o Penumbrismo, o Neoparnasianismo, a busca<br />

pela mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, até a eclosão ruidosa do Mo<strong>de</strong>rnismo.<br />

Iniciava ‑se então uma nova fase, <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> balbúrdia inte‑<br />

lectual e renovação artística, sem semelhante na história da<br />

literatura brasileira (excetuado o Romantismo), que consti‑<br />

tui o assunto do quinto volume <strong>de</strong> A literatura no Brasil.<br />

A f r â n i o C o u t i n h o<br />

A LITERATURA<br />

NO BRASIL<br />

VOL. V – ERA MODERNISTA<br />

Direção:<br />

Afrânio Coutinho<br />

Codireção:<br />

Eduardo <strong>de</strong> Faria Coutinho<br />

7 a edição – 680 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0559 ‑6<br />

A revolução mo<strong>de</strong>rnista e as transformações subse‑<br />

quentes ao movimento são estudadas no quinto volume <strong>de</strong><br />

A literatura no Brasil, em cinco gran<strong>de</strong>s capítulos, <strong>de</strong> cará‑<br />

ter abrangente.<br />

O primeiro capítulo, “A revolução mo<strong>de</strong>rnista”, ana‑<br />

lisa <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os antece<strong>de</strong>ntes do movimento, tendo por fundo<br />

a tensa situação do mundo, que <strong>de</strong>semboca na Primeira<br />

Guerra Mundial e no surgimento dos futuristas, as reper‑<br />

cussões das novas correntes artísticas europeias no Brasil, a<br />

Semana <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna, os diversos grupos mo<strong>de</strong>rnistas,<br />

até o encerramento do ciclo, em 1930.<br />

“O Mo<strong>de</strong>rnismo na poesia”, título do segundo capí‑<br />

tulo, abrange muito <strong>mais</strong> do que o título promete, consti‑<br />

tuindo uma abordagem <strong>de</strong> praticamente toda a poesia<br />

brasileira pós ‑1922, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as ruidosas manifestações pio‑<br />

neiras dos grupos paulistas (Pau ‑Brasil, Verdamarelo, Anta,<br />

Antropofagia), os grupos regionais (carioca, mineiro, gaú‑<br />

cho, nor<strong>de</strong>stino) até a Geração <strong>de</strong> 45.<br />

O terceiro capítulo enfoca os movimentos <strong>de</strong> van‑<br />

guarda, sucessores do Mo<strong>de</strong>rnismo: Concretismo, Neocon‑<br />

cretismo, Poesia Práxis, poema ‑processo, arte ‑correio. O<br />

esplêndido legado da ficção mo<strong>de</strong>rnista, objeto <strong>de</strong> estudo<br />

do quarto capítulo, o <strong>mais</strong> longo da obra, parte da análise<br />

das duas gran<strong>de</strong>s linhagens da ficção brasileira (regiona‑<br />

lista, psicológica e costumista), tradição na qual se alinha<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o romance carioca até o experimentalismo paulista,<br />

do regionalismo nor<strong>de</strong>stino às sondagens psicológicas <strong>de</strong><br />

um Cornélio Pena. O estudo se prolonga aos escritores sur‑<br />

gidos na década <strong>de</strong> 1950, um Guimarães Rosa, uma Clarice<br />

Lispector, e representantes das gerações seguintes. O quinto<br />

capítulo estuda a crítica mo<strong>de</strong>rnista, em suas diversas ex‑<br />

pressões, crítica sociológica, social, estética, a atuação da<br />

nova crítica, o incremento dos congressos <strong>de</strong> crítica, o mo‑<br />

vimento editorial.<br />

A f r â n i o C o u t i n h o<br />

111


A LITERATURA<br />

NO BRASIL<br />

VOL. VI – RELAÇÕES E<br />

PERSPECTIVAS/CONCLUSÃO<br />

Direção:<br />

Afrânio Coutinho<br />

Codireção:<br />

Eduardo <strong>de</strong> Faria Coutinho<br />

7 a edição – 576 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0560 ‑X<br />

O sexto volume <strong>de</strong> A literatura no Brasil complementa<br />

o conhecimento da literatura brasileira, amplamente anali‑<br />

sada nos volumes anteriores, com estudos isolados <strong>de</strong> di‑<br />

versos gêneros (teatro, conto, crônica, literatura infantil),<br />

oferecendo ao leitor um quadro <strong>de</strong> sua evolução histórica<br />

das origens aos autores contemporâneos.<br />

Outro aspecto abordado no volume é o das relações<br />

da literatura com ativida<strong>de</strong>s com as quais convive com<br />

maior ou menor intimida<strong>de</strong>, num permanente processo <strong>de</strong><br />

reciprocida<strong>de</strong>: o jornalismo, a filosofia, as artes plásticas, o<br />

pensamento jurídico.<br />

Completam a obra estudos específicos sobre o pano‑<br />

rama atual das letras brasileiras, atualizados até a década<br />

<strong>de</strong> 1990, oferecendo uma visão metódica sobre o Pós‑<br />

‑Mo<strong>de</strong>rnismo, a nova literatura brasileira expressa através<br />

da ficção e do conto, a literatura das décadas <strong>de</strong> 1980 e<br />

1990, os novos rumos da historiografia literária, além <strong>de</strong><br />

dois capítulos <strong>de</strong>dicados a problemas específicos relacio‑<br />

nados com as origens e a expressão da literatura brasi‑<br />

leira, sua in<strong>de</strong>pendência, o problema da língua brasileira,<br />

o português no Brasil etc., ricos <strong>de</strong> reflexões. O último<br />

capítulo, <strong>de</strong>nominado “Visão final”, é uma espécie <strong>de</strong><br />

complemento ao estudo do volume <strong>de</strong>dicado ao Mo<strong>de</strong>r‑<br />

nismo, com o exame das décadas <strong>de</strong> 1950 e 1960, a nova<br />

feição da crítica, a poesia alternativa pós ‑60, a autonomia<br />

literária, cujas diretrizes foram traçadas <strong>de</strong> forma insubs‑<br />

tituível no século XIX por Machado <strong>de</strong> Assis, “nossa má‑<br />

xima figura literária e maior prosador da língua”, o nome<br />

i<strong>de</strong>al para concluir a obra. Cabe chamar a atenção para o<br />

minucioso índice geral, com entradas por nomes, títulos e<br />

assuntos, facilitando a movimentação do estudioso por<br />

essa imensa e rica floresta <strong>de</strong> fatos literários, um monu‑<br />

mento da cultura brasileira.<br />

112<br />

A f r â n i o C o u t i n h o<br />

ENCICLOPÉDIA DE<br />

LITERATURA BRASILEIRA<br />

VOL. I E VOL. II<br />

Direção:<br />

Afrânio Coutinho e<br />

J. Galante <strong>de</strong> Sousa<br />

Volume I – 2a edição revista, ampliada,<br />

atualizada e ilustrada – 840 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0723 ‑8<br />

Volume II – 2a edição revista, ampliada,<br />

atualizada e ilustrada – 818 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0723 ‑8<br />

Ao contrário <strong>de</strong> muito livro, cujo título promete <strong>mais</strong><br />

do que realmente oferece, a Enciclopédia <strong>de</strong> literatura bra‑<br />

sileira ultrapassa <strong>de</strong> longe as expectativas do leitor e o rigor<br />

do título.<br />

Muito <strong>mais</strong> do que um repertório <strong>de</strong> nomes, os dois<br />

volumes da Enciclopédia – i<strong>de</strong>alizada e dirigida pelos profes‑<br />

sores Afrânio Coutinho e J. Galante <strong>de</strong> Sousa – oferecem um<br />

panorama abrangente da realida<strong>de</strong> literária brasileira, abor‑<br />

dando um sem ‑número <strong>de</strong> temas, problemas, dados e fatos<br />

relacionados com a nossa literatura e a vida literária, através<br />

<strong>de</strong> verbetes redigidos por especialistas, alguns com a ampli‑<br />

tu<strong>de</strong> e a concisão <strong>de</strong> pequenos ensaios. Po<strong>de</strong> ‑se dizer que<br />

<strong>de</strong>ntro da Enciclopédia convivem várias enciclopédias, nor‑<br />

malmente publicadas em obras distintas. A primeira é a en‑<br />

ciclopédia clássica <strong>de</strong> literatura, or<strong>de</strong>nada em verbetes<br />

concisos, redigidos por especialistas, fornecendo o essencial<br />

sobre a vida e a obra dos autores, bem como bibliografia.<br />

Ampliando esse campo <strong>de</strong> informação preliminar, a obra<br />

fornece informações sobre movimentos literários, jornais e<br />

revistas <strong>de</strong> cunho literário, agremiações <strong>de</strong> escritores, livros<br />

por títulos (permitindo ao leitor i<strong>de</strong>ntificar o autor da obra),<br />

pseudônimos, um levantamento <strong>de</strong> personagens <strong>de</strong> obras<br />

<strong>de</strong> ficção até a abordagem <strong>de</strong> temas muito específicos,<br />

como as relações <strong>de</strong> espiritismo e literatura.<br />

A presente edição, revista e ampliada, contém cerca<br />

<strong>de</strong> 15 mil verbetes, incluindo ao redor <strong>de</strong> 1.200 autores<br />

contemporâneos, cujos dados são <strong>de</strong> acesso difícil, ou im‑<br />

possível, mesmo na internet. Para tanto, foram enviados<br />

5.590 formulários a escritores <strong>de</strong> todo o país, solicitando<br />

informações bibliográficas e pessoais. Pela sua amplitu<strong>de</strong> e<br />

atualização, a Enciclopédia <strong>de</strong> literatura brasileira é a obra<br />

<strong>mais</strong> completa do gênero.<br />

A f r â n i o C o u t i n h o


Acervo Pessoal <strong>de</strong> Cecília Meireles<br />

C o l e ç ã o<br />

C e C í l i a M e i r e l e s<br />

OBRAS DE LITERATURA INFANTIL DA AUTORA<br />

• Canção da tar<strong>de</strong> no campo<br />

• Cecília Meireles crônicas para jovens (prelo)<br />

• O menino azul<br />

• Ou isto ou aquilo (prelo)<br />

• Os pescadores e as suas filhas (prelo)<br />

C e C í l i a M e i r e l e s<br />

Nascida no Rio <strong>de</strong> Janeiro, Cecília Meireles (1901‑<br />

‑1964) compôs uma obra poética <strong>de</strong> valor inestimável<br />

e, em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> seu talento ímpar, é comumente ci‑<br />

tada como a maior escritora em língua portuguesa.<br />

Criada pela avó materna, Cecília concluiu o curso nor‑<br />

mal no Instituto <strong>de</strong> Educação do Rio <strong>de</strong> Janeiro. Além<br />

<strong>de</strong> poeta, teve <strong>de</strong>stacada atuação na área <strong>de</strong> educa‑<br />

ção, tendo sido responsável, em 1934, pela criação da<br />

primeira biblioteca infantil do país, no Rio <strong>de</strong> Janeiro,<br />

e mantido entre 1930 e 1933 uma coluna diária sobre<br />

problemas educacionais no Diário <strong>de</strong> Notícias.<br />

O livro <strong>de</strong> estreia foi Espectros, que veio a lume em<br />

1919, mas a consagração se <strong>de</strong>u em 19<strong>39</strong> com Via‑<br />

gem, que recebeu o prêmio Olavo Bilac da Aca<strong>de</strong>mia<br />

Brasileira <strong>de</strong> Letras. Seu livro Romanceiro da Inconfi‑<br />

dência, <strong>de</strong> 1953, foi um divisor <strong>de</strong> águas na trajetória<br />

literária da escritora e estabeleceu ‑se como um dos<br />

maiores clássicos da poesia em língua portuguesa.<br />

Em sua vasta obra poética, Cecília Meireles penetrou<br />

com profundida<strong>de</strong> e estilo próprio numa viagem in‑<br />

trospectiva e seus versos apresentam <strong>de</strong> maneira<br />

intimista temas como solidão, sonhos, melancolia,<br />

mar e morte. A coleção Cecília Meireles publicada<br />

pela <strong>Global</strong> <strong>Editora</strong> traz ao leitor seus principais li‑<br />

vros, com o anseio <strong>de</strong> dar a gran<strong>de</strong>za que a excep‑<br />

cional mestra da lírica em língua portuguesa merece,<br />

por meio <strong>de</strong> um cuidadoso processo <strong>de</strong> estabeleci‑<br />

mento dos textos e <strong>de</strong> novos projetos gráficos.<br />

Eu canto porque o instante existe<br />

e a minha vida está completa.<br />

Não sou alegre nem sou triste:<br />

sou poeta.<br />

113


ROMANCEIRO DA<br />

INCONFIDÊNCIA<br />

9 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1682 ‑8<br />

A literatura brasileira está repleta <strong>de</strong> obras em prosa ro‑<br />

manceando acontecimentos históricos. Des<strong>de</strong> a viagem <strong>de</strong><br />

Cabral e o estabelecimento dos primeiros colonos nesta terra,<br />

até ficções sobre fatos recentes, como os governos militares,<br />

há inúmeros romances e contos. Mas são poucas as obras<br />

poéticas que se arriscam a semelhante tarefa. Uma das exce‑<br />

ções, e por certo a <strong>mais</strong> brilhante, é o Romanceiro da Inconfi‑<br />

dência, iluminado pela poesia altíssima <strong>de</strong> Cecília Meireles.<br />

O poema (na verda<strong>de</strong> formado por vários poemas que<br />

também po<strong>de</strong>m ser lidos isoladamente) recria os dias reple‑<br />

tos <strong>de</strong> angústias e esperanças do final da década <strong>de</strong> 1780,<br />

em que um grupo <strong>de</strong> intelectuais mineiros sonhou se liber‑<br />

tar do domínio colonial português e do <strong>de</strong>sastre que se<br />

abateu sobre as suas vidas e a <strong>de</strong> seus familiares.<br />

Utilizando a técnica ibérica dos romances populares,<br />

atenta aos autos do processo, às cartas, aos testamentos,<br />

à pintura, às modinhas, às estátuas dos profetas <strong>de</strong> Aleija‑<br />

dinho, a poeta recria com intensa beleza o cotidiano, os<br />

conflitos e os anseios daquele grupo <strong>de</strong> sonhadores. Diante<br />

dos olhos do leitor surgem as figuras <strong>de</strong> Tomás Antônio<br />

Gonzaga, o apaixonado <strong>de</strong> Marília, a bela, Cláudio Manuel<br />

da Costa, Bárbara Eliodora e, se sobressaindo sobre todos,<br />

o perfil impressionista <strong>de</strong> Tira<strong>de</strong>ntes, retratado como um<br />

Cristo revolucionário, tal a imagem que se mo<strong>de</strong>lou a partir<br />

do século XIX e se impôs até nossos dias. A i<strong>de</strong>alização<br />

preenche lacunas históricas e enriquece o poema.<br />

Como observa Alberto da Costa e Silva no prefácio,<br />

“com a imaginação a adivinhar o que não se mostra claro<br />

ou não está nos documentos, Cecília Meireles recria poeti‑<br />

camente um pedaço <strong>de</strong> tempo e, ao lhe reescrever poetica‑<br />

mente a história, dá a uma conspiração revolucionária <strong>de</strong><br />

poetas, num rincão montanhoso do Império português, a<br />

consistência do mito”.<br />

114<br />

C e C í l i a M e i r e l e s<br />

VIAGEM<br />

2 a edição – 176 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1706 ‑1<br />

Viagem representa um momento <strong>de</strong> ruptura e renova‑<br />

ção na obra poética <strong>de</strong> Cecília Meireles. Até então, sua<br />

poesia ainda estava ligada ao neossimbolismo e a uma ex‑<br />

pressão <strong>mais</strong> conservadora. O novo livro trouxe a liberta‑<br />

ção, representando a plena conscientização da artista, que<br />

pô<strong>de</strong> a partir <strong>de</strong> então afirmar a sua voz personalíssima:<br />

“Um poeta é sempre irmão do vento e da água:/ <strong>de</strong>ixa seu<br />

ritmo por on<strong>de</strong> passa”, mesmo que esses locais <strong>de</strong> passa‑<br />

gem existam apenas em sua mente.<br />

Como o título sugere, o livro é uma longa e sedutora<br />

viagem, mas por rotas imaginárias, i<strong>de</strong>ntificadas com os<br />

sonhos que se dissolvem em lonjuras sem margens, com<br />

vaga consistência <strong>de</strong> realida<strong>de</strong>, na qual as palavras se har‑<br />

monizam em pura música: “Estou diante daquela porta/<br />

que não sei <strong>mais</strong> se ainda existe.../ Estou longe e fora das<br />

horas,/ sem saber em que consiste/ nem o que vai nem o<br />

que volta.../ sem estar alegre nem triste”.<br />

Esse estado <strong>de</strong> alma – ou estados <strong>de</strong> alma, pois a sen‑<br />

sibilida<strong>de</strong> aguçada do poeta está sempre aberta a estímulos<br />

e sensações – po<strong>de</strong> ser compreendido, como sugere Al‑<br />

fredo Bosi no prefácio, como um “sentimento <strong>de</strong> distân‑<br />

cia”. Essa distância em relação ao mundo visível, material,<br />

favorece uma aproximação <strong>mais</strong> profunda da poeta con‑<br />

sigo mesma, absorvida em seu mundo interior, mas tam‑<br />

bém inquieta e intrigada diante <strong>de</strong> sua própria imagem,<br />

como se comprova nos versos <strong>de</strong> “Retrato”: “Eu não tinha<br />

este rosto <strong>de</strong> hoje,/ assim calmo, assim triste, assim magro,/<br />

nem estes olhos tão vazios,/ nem o lábio amargo”.<br />

Encontro consigo mesma, revelação e <strong>de</strong>scoberta,<br />

sentimento <strong>de</strong> libertação, <strong>de</strong>svio pelas rotas dos sonhos,<br />

essa Viagem se consolida numa série <strong>de</strong> poemas <strong>de</strong> be‑<br />

leza intensa que, por vezes, tocam os limites da música<br />

abstrata.<br />

C e C í l i a M e i r e l e s


Arquivo pessoal<br />

C o l e ç ã o<br />

C o r a C o r a l i n a<br />

OBRAS DE LITERATURA INFANTIL DA AUTORA<br />

• A menina, o cofrinho e a vovó<br />

• A moeda <strong>de</strong> ouro que um pato engoliu<br />

• As cocadas<br />

• Contas <strong>de</strong> dividir e trinta e seis bolos<br />

• De medos e assombrações (prelo)<br />

• Lembranças <strong>de</strong> Aninha (prelo)<br />

• O prato azul ­pombinho<br />

• Os meninos ver<strong>de</strong>s<br />

• Poema do milho<br />

C o r a C o r a l i n a<br />

Ana Lins dos Guimarães Peixoto Brêtas (1889 ‑1985)<br />

teve uma trajetória literária peculiar. Embora escre‑<br />

vesse <strong>de</strong>s<strong>de</strong> moça, tinha 76 <strong>anos</strong> quando seu primeiro<br />

livro foi publicado, e quase noventa quando sua obra<br />

chegou às mãos <strong>de</strong> Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> –<br />

responsável por sua apresentação ao mercado nacio‑<br />

nal. Daí em diante, sua literatura vem conquistando<br />

crítica e público. Cora Coralina não se filiou a ne‑<br />

nhuma corrente literária. Com um estilo pessoal, foi<br />

poeta e uma gran<strong>de</strong> contadora <strong>de</strong> histórias das coisas<br />

<strong>de</strong> sua terra. O cotidiano, os causos, a velha Goiás, as<br />

inquietações humanas são temas constantes em sua<br />

obra, consi<strong>de</strong>rada por vários autores um registro<br />

histórico ‑social do século XX.<br />

Entre pedras<br />

cresceu a minha poesia.<br />

Minha vida...<br />

Quebrando pedras<br />

e plantando flores.<br />

Entre pedras que me esmagavam<br />

levantei a pedra ru<strong>de</strong><br />

dos meus versos.<br />

115


DOCEIRA E POETA<br />

1 a edição – 144 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1417‑6<br />

Cora Coralina tinha o dom <strong>de</strong> servir, como ninguém,<br />

os seus poemas, hum<strong>anos</strong> e doces, mas sabia também<br />

fazer doces, <strong>de</strong>liciosos como um poema. Poeta e doceira.<br />

A fórmula é boa, e começa a <strong>de</strong>safiar o apetite do leitor, à<br />

medida que ele vai tomando conhecimento das receitas<br />

preparadas pela velha poeta.<br />

A maioria <strong>de</strong>las está ligada à tradição doceira goiana,<br />

com a utilização <strong>de</strong> frutas típicas do Cerrado, que aparecem<br />

em épocas <strong>de</strong>terminadas, exigindo que sejam conservadas.<br />

Para tornar viável o preparo, hoje, <strong>de</strong> tais quitutes, foram<br />

necessárias algumas adaptações à nossa época, com a redu‑<br />

ção <strong>de</strong> ingredientes (não é preciso <strong>mais</strong> usar a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

açúcar da época para conservar as frutas) e <strong>de</strong> componentes<br />

<strong>de</strong> algumas receitas (uma <strong>de</strong>las recomenda a utilização <strong>de</strong><br />

trinta ovos), a substituição <strong>de</strong> ingredientes, como a banha<br />

<strong>de</strong> porco, muito usada à época, e o emprego <strong>de</strong> cal virgem,<br />

que po<strong>de</strong> ser substituído por bicarbonato.<br />

Orgulhosa <strong>de</strong> sua arte, Cora Coralina explicava que<br />

seus doces eram diferentes porque glacerizados, escorridos<br />

em peneira e colocados na calda reduzida. Um trabalhão,<br />

para o qual, queixava ‑se Cora, não havia <strong>mais</strong> ninguém<br />

disposto a fazê ‑lo.<br />

Este livro presta uma homenagem aos 120 <strong>anos</strong> do<br />

nascimento <strong>de</strong> Cora Coralina, mostrando uma faceta <strong>de</strong><br />

seu universo pessoal e abrindo para o leitor uma fresta para<br />

se conhecer a arte antiga <strong>de</strong> preparar doces, executada<br />

pela poeta com o mesmo espírito <strong>de</strong> agra<strong>de</strong>cimento à vida<br />

com que compunha os seus poemas. Arte e técnica, das<br />

quais muito se orgulhava Cora Coralina, que costumava<br />

dizer que a boa doceira suja apenas dois <strong>de</strong>dos: o indicador<br />

e o polegar. “Mulher que lambreca toda a mão não é uma<br />

boa doceira.”. Ela sabia do que estava falando.<br />

116<br />

C o r a C o r a l i n a<br />

ESTÓRIAS DA CASA<br />

VELHA DA PONTE<br />

13 a edição – 112 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1161 ‑8<br />

Como toda residência <strong>de</strong> interior habitada muito<br />

tempo pela mesma família, a Casa Velha da Ponte vivia<br />

cheia <strong>de</strong> histórias. Construída “em pedra, ma<strong>de</strong>irame e<br />

barro”, com suas “folhas <strong>de</strong> portas pesada <strong>de</strong> árvores for‑<br />

tes <strong>de</strong>scomunais serradas a mão”, sua senzala <strong>de</strong>sativada<br />

e seus imensos portais, a própria casa já era uma parte viva<br />

da história da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Goiás Velho.<br />

Suas pare<strong>de</strong>s presenciaram histórias <strong>de</strong> amor e suicídios<br />

<strong>de</strong> escravos, enquanto lagartixas buscavam as brechas para<br />

se aquecer. Um dos antigos proprietários, recebedor dos<br />

quintos reais, tinha ‑se apossado do dinheiro do estado. Para<br />

fugir à prisão, teria ocultado no porão moedas e barras <strong>de</strong><br />

ouro, dando origem assim à lenda do tesouro enterrado.<br />

Mais tar<strong>de</strong>, em época <strong>de</strong> esplendor, a família só “almoçava<br />

sua gorda feijoada goiana em pratos e talheres <strong>de</strong> ouro”.<br />

Tradições como essas embalaram a infância <strong>de</strong> Cora<br />

Coralina, criada na velha casa, já então <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nte, “cerra‑<br />

das portas e janelas, resguardando <strong>de</strong> olhar estranho o<br />

<strong>de</strong>smazelo e a pobreza que se instalavam.”.<br />

Essas histórias domésticas e outras vividas na cida<strong>de</strong>,<br />

que impressionavam a menina, são o material vivo e hu‑<br />

mano do livro, registro <strong>de</strong> velhas tradições e, ao mesmo<br />

tempo, retrato fiel e pitoresco <strong>de</strong> uma comunida<strong>de</strong> do Bra‑<br />

sil central no fim do século XIX e início do século XX, com<br />

as suas prostitutas segregadas, vivendo em becos, capazes<br />

<strong>de</strong> valentias, como a narrada no <strong>de</strong>licioso “Minga, zoio <strong>de</strong><br />

prata”, os famosos raptos <strong>de</strong> donzelas (“Cortar em riba do<br />

rasto”), tão frequentes no Brasil antigo, as solteironas<br />

(“Quadrinhos da vida”). Nem faltam as estórias <strong>de</strong> assom‑<br />

bração e assombramento (“Procissão das almas”, “O caso<br />

<strong>de</strong> Mana”), sempre tão vivas no imaginário popular, narra‑<br />

das com aquela insuperável simplicida<strong>de</strong> e leveza <strong>de</strong> Cora<br />

Coralina, encanto <strong>de</strong> seus versos, encanto <strong>de</strong> sua prosa.<br />

C o r a C o r a l i n a


MEU LIVRO DE CORDEL<br />

11 a edição – 112 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0153 ‑4<br />

A simplicida<strong>de</strong>, a qualida<strong>de</strong> <strong>mais</strong> distinta na poesia <strong>de</strong><br />

Cora Coralina, está <strong>mais</strong> presente do que nunca em Meu<br />

livro <strong>de</strong> cor<strong>de</strong>l. O título é significativo, homenagem da au‑<br />

tora “a todas as estórias e poesias <strong>de</strong> Cor<strong>de</strong>l”, e atestado <strong>de</strong><br />

sua afinida<strong>de</strong> com “os anônimos menestréis nor<strong>de</strong>stinos,<br />

povo da minha casta, meus irmãos do Nor<strong>de</strong>ste ru<strong>de</strong>.”.<br />

Essa simplicida<strong>de</strong> anda sempre <strong>de</strong> mãos dadas com<br />

um aguçado espírito <strong>de</strong> fraternida<strong>de</strong> e uma sensibilida<strong>de</strong><br />

aberta à vida e às novida<strong>de</strong>s do mundo. Assim, a poeta<br />

tanto esten<strong>de</strong> a mão a todos os perseguidos (no caso, os<br />

ju<strong>de</strong>us), num gesto <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong>, como presta seu tri‑<br />

buto <strong>de</strong> admiração a Pablo Neruda, poeta <strong>de</strong>scoberto na<br />

velhice e que a <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong>slumbrada.<br />

Vários poemas do livro são autobiográficos. Como<br />

todo artista, Cora Coralina não cessa <strong>de</strong> se olhar no espe‑<br />

lho, <strong>de</strong> se indagar, em busca do mistério <strong>de</strong> si mesma que,<br />

no fim <strong>de</strong> tudo, é o próprio mistério da vida. A segunda<br />

parte do livro é toda confessional. “Cora Coralina, quem é<br />

você?”, indaga a poeta no título <strong>de</strong> um dos poemas. E<br />

respon<strong>de</strong>: “Sou mulher como outra qualquer./ Venho do<br />

século passado/ e trago todas as ida<strong>de</strong>s.”.<br />

Mulher como as outras, mas <strong>de</strong> <strong>de</strong>stino áspero, com o<br />

qual lutou <strong>de</strong> maneira incansável, como conta em “A pro‑<br />

cura”, espécie <strong>de</strong> súmula <strong>de</strong> sua vida: “An<strong>de</strong>i pelos caminhos<br />

da Vida./ Caminhei pelas ruas do Destino/ procurando meu<br />

signo./ Bati na porta da Fortuna,/ mandou dizer que não es‑<br />

tava./ Bati na porta da Fama,/ falou que não podia aten<strong>de</strong>r./<br />

Procurei a casa da Felicida<strong>de</strong>,/ a vizinha da frente me informou/<br />

que ela tinha se mudado/ sem <strong>de</strong>ixar novo en<strong>de</strong>reço./ Procurei<br />

a morada da Fortaleza./ Ela me fez entrar: <strong>de</strong>u ‑me veste nova,/<br />

perfumou ‑me os cabelos,/ fez ‑me beber <strong>de</strong> seu vinho./ Acertei<br />

o meu caminho.”. Acertou o caminho, sobretudo, quando<br />

essa fortaleza começou a se esparramar em poesia.<br />

C o r a C o r a l i n a<br />

O TESOURO<br />

DA CASA VELHA<br />

5 a edição – 144 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0238 ‑4<br />

Poeta em tempo integral, ou pelo menos <strong>de</strong> sensibili‑<br />

da<strong>de</strong> sempre aberta à vida, Cora Coralina escreveu tam‑<br />

bém em boa prosa, como se comprova em O tesouro da<br />

Casa Velha. Livro da velhice, redigido lá pelos noventa e<br />

tantos <strong>anos</strong>, foi um dos últimos trabalhos da autora, que<br />

nele se empenhou com lentidão, gosto e capricho, apesar<br />

da ida<strong>de</strong>, preocupada não apenas com as peças em si, mas<br />

também com a unida<strong>de</strong> do volume. Na época, costumava<br />

brincar com seu médico, pedindo que a tratasse bem, a fim<br />

<strong>de</strong> ter tempo <strong>de</strong> terminar o livro. Não chegou a concluí ‑lo,<br />

a edição foi póstuma.<br />

Esse tesouro reúne <strong>de</strong>zoito contos, vários <strong>de</strong>les basea‑<br />

dos em reminiscências pessoais, provavelmente vividas pela<br />

autora (“As cocadas”, “I<strong>de</strong>al <strong>de</strong> moça”, “Das coisas bem<br />

guardadas e suas consequências”, “Candoca”) e por pessoas<br />

<strong>de</strong> seu relacionamento, em histórias familiares (“O tesouro da<br />

Casa Velha”) ou fatos fisgados na tradição viva goiana (“O<br />

corpo <strong>de</strong> <strong>de</strong>lito”, “Medo”, “As capas do diabo”).<br />

Como contista, Cora Coralina não difere muito da<br />

poeta, a não ser na mudança <strong>de</strong> instrumento, a poesia pela<br />

prosa. São trabalhos simples, com po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> comunicação<br />

com o leitor, sem complicações <strong>de</strong> enredo, narrados <strong>de</strong><br />

forma direta, com as qualida<strong>de</strong>s do contador oral, talvez<br />

por isso <strong>mais</strong> perto do conto popular que do literário, cap‑<br />

tando por vezes com muita graça certos aspectos malicio‑<br />

sos da psicologia do homem do interior. A propósito, leia ‑se<br />

o <strong>de</strong>licioso “Zé Sidrach e Dico Foggia”. O mesmo estilo<br />

simples dos poemas, apesar do emprego <strong>de</strong> alguns arcaís‑<br />

mos (prebenda, gatafunho, baldrame etc.), que não che‑<br />

gam a ser pernósticos (faziam parte da linguagem usual da<br />

infância <strong>de</strong> Cora Coralina), dando ao texto um certo sabor<br />

exótico <strong>de</strong> passado, <strong>de</strong> material encontrado num cofre, <strong>de</strong><br />

tesouro <strong>de</strong> casa velha, <strong>de</strong>safiando a curiosida<strong>de</strong> do leitor.<br />

C o r a C o r a l i n a<br />

117


POEMAS DOS<br />

BECOS DE GOIÁS<br />

E ESTÓRIAS MAIS<br />

22 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1178 ‑2<br />

Quando Cora Coralina estreou, em 1965, com os Poe‑<br />

mas dos becos <strong>de</strong> Goiás e estórias <strong>mais</strong>, a crítica não per‑<br />

cebeu (só perceberia <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>) que ali nascia uma poeta<br />

original, <strong>de</strong> raízes muito profundas na alma popular, com<br />

uma sabedoria dosada <strong>de</strong> ironia, <strong>de</strong> alguém que muito<br />

viveu e sofreu, mas <strong>de</strong> expressão tão suave, com tamanho<br />

frescor, que parecia vir <strong>de</strong> uma jovem. Era e não era ver‑<br />

da<strong>de</strong>, se pon<strong>de</strong>rarmos que a alma não tem ida<strong>de</strong> e os sen‑<br />

timentos não envelhecem. Cronologicamente, a autora era<br />

uma respeitável senhora <strong>de</strong> 75 <strong>anos</strong> (bela ida<strong>de</strong> para uma<br />

estreia poética), vinda do interior <strong>de</strong> Goiás.<br />

O público sentiu <strong>de</strong> imediato o que os críticos não per‑<br />

ceberam: a alta tensão poética daquela poesia, seu po<strong>de</strong>r <strong>de</strong><br />

comunicabilida<strong>de</strong>, a simplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> expressão, o amor pelo<br />

semelhante, a comoção humana que fazia <strong>de</strong> cada leitor um<br />

passante pelos becos cheios <strong>de</strong> tradições <strong>de</strong> Goiás.<br />

Só <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, com o reconhecimento <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s figu‑<br />

ras da literatura brasileira, como Carlos Drummond <strong>de</strong> An‑<br />

dra<strong>de</strong>, alguns críticos começaram a rasgar seda pela poeta.<br />

Ainda bem. Preconceitos postos <strong>de</strong> lado, <strong>de</strong>scobriram nela<br />

uma irmã – em certo sentido <strong>mais</strong> suave, em outro <strong>mais</strong> ás‑<br />

pera – <strong>de</strong> Gabriela Mistral e Rosalia <strong>de</strong> Castro. Irmã, sim, mas<br />

com uma personalida<strong>de</strong> muito própria e forte, quase sem<br />

influências literárias, mas com alguma coisa <strong>de</strong> franciscana.<br />

A “Oração do milho” não parece escrita por Francisco<br />

<strong>de</strong> Assis? Quem, excetuados os corações <strong>de</strong> pedra, não se<br />

comove com esse poema, um dos <strong>mais</strong> belos já escritos no<br />

Brasil? “Senhor, nada valho./ Sou a planta humil<strong>de</strong> dos quin‑<br />

tais pequenos e das lavouras pobres./ Meu grão, perdido por<br />

acaso,/ nasce e cresce na terra <strong>de</strong>scuidada./ Ponho folhas e<br />

haste, e se me ajudar<strong>de</strong>s, Senhor,/ mesmo planta <strong>de</strong> acaso,<br />

solitária,/ dou espigas e <strong>de</strong>volvo em muitos grãos/ o grão<br />

perdido inicial, salvo por milagre,/ que a terra fecundou.”.<br />

118<br />

C o r a C o r a l i n a<br />

VILLA BOA DE GOyAZ<br />

2 a edição – 112 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0750 ‑5<br />

Depois <strong>de</strong> muitos <strong>anos</strong> vivendo longe <strong>de</strong> sua terra natal,<br />

Ana Lins dos Guimarães Peixoto Brêtas regressou à cida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Goiás Velho. Deu ‑se então uma espécie <strong>de</strong> reencontro com as<br />

suas raízes. A sensibilida<strong>de</strong> se aguçou, o passado voltou com<br />

força, e a velha senhora iniciou sua busca do tempo perdido,<br />

assumindo a plena condição <strong>de</strong> poeta. Nascia assim Cora Co‑<br />

ralina, cujos versos logo iriam conquistar o Brasil.<br />

Sem alar<strong>de</strong>, Cora <strong>de</strong>dicou parte <strong>de</strong> sua produção poética<br />

à cida<strong>de</strong> natal. Inédito durante <strong>anos</strong>, esse material, poesia e<br />

prosa, foi reunido na publicação póstuma Villa Boa <strong>de</strong> Goyaz.<br />

Costuma ‑se dizer que cada terra tem o cantor que me‑<br />

rece. Mais do que mérito, é uma questão <strong>de</strong> afinida<strong>de</strong>, meio<br />

misteriosa, entre a pessoa e o ambiente que a envolve. Afini‑<br />

da<strong>de</strong>, porém, nem sempre se traduz por reverência. Muitas<br />

vezes explo<strong>de</strong> em revolta. Quem não se lembra dos versos mal‑<br />

dizentes <strong>de</strong> Gregório <strong>de</strong> Matos contra a Bahia seiscentista?<br />

Ao contrário do poeta baiano, as relações <strong>de</strong> Cora<br />

Coralina com sua cida<strong>de</strong> foram da <strong>mais</strong> estreita ternura.<br />

Com olhos <strong>de</strong> ver e ouvidos <strong>de</strong> ouvir, a poeta goiana regis‑<br />

tra cada aspecto da vida cotidiana da comunida<strong>de</strong> com<br />

frescor e carinho, como se acabasse <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobri ‑los. Nada<br />

escapa à sua atenção e curiosida<strong>de</strong>: o velho telhado <strong>de</strong><br />

<strong>mais</strong> <strong>de</strong> duzentos <strong>anos</strong>, o badalar dos sinos, os velhos car‑<br />

navais, a catedral, a alegria ruidosa dos estudantes, o<br />

museu, as ruas e os becos cheios <strong>de</strong> lendas e mistérios.<br />

Com prazer, recria velhas cantigas folclóricas, algumas <strong>de</strong> <strong>de</strong>sti‑<br />

nação mágica, como a <strong>de</strong> Santa Luzia, com “seu cavalinho/<br />

comendo capim”, que se pronunciava sobre o olho da pessoa<br />

momentaneamente enceguecida por um cisco. Villa Boa <strong>de</strong><br />

Goyaz é poesia, mas também testemunho, um valioso material<br />

para quem <strong>de</strong>sejar reconstituir a vida e um pouco dos sonhos<br />

dos homens e mulheres que viveram naquele chão perdido no<br />

gran<strong>de</strong> planalto central do Brasil.<br />

C o r a C o r a l i n a


VINTÉM DE COBRE<br />

MEIAS CONFISSÕES DE ANINHA<br />

8 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1179 ‑3<br />

No tempo do mil ‑réis, o vintém <strong>de</strong> cobre era a moeda<br />

<strong>mais</strong> <strong>de</strong>svaliosa, aquela que mal comprava um doce. Por<br />

modéstia e também um pouco por malícia (talvez muita<br />

malícia), Cora Coralina batizou com o nome da velha<br />

moeda as suas quase memórias, ou meias ‑confissões, como<br />

ela prefere, redigidas em versos. “É um livro tumultuado,<br />

aberrante, da rotina <strong>de</strong> se fazer e or<strong>de</strong>nar um livro./ Tumul‑<br />

tuado, como foi a vida daquela que o escreveu.”.<br />

Vida tumultuada, cheia <strong>de</strong> esbarrões do <strong>de</strong>stino que, em<br />

vez <strong>de</strong> provocar <strong>de</strong>sânimo, <strong>de</strong>spertaram no espírito <strong>de</strong> Ana<br />

Lins dos Guimarães Peixoto Brêtas (nome verda<strong>de</strong>iro <strong>de</strong> Cora<br />

Coralina) uma fibra <strong>de</strong> guerreira e uma sabedoria simples, por<br />

vezes meio marota, feita <strong>de</strong> respeito e pieda<strong>de</strong> pelo ser hu‑<br />

mano, sobretudo pelos que sofrem, mas também com um<br />

fundo <strong>de</strong> ironia mansa e <strong>de</strong> malícia sem malda<strong>de</strong>, um humor<br />

típico da gente do interior, um sarcasmo angelical (se é que há<br />

sarcasmo entre os anjos), mistura <strong>de</strong> humilda<strong>de</strong> franciscana e<br />

revolta diante das estúpidas repressões da socieda<strong>de</strong> e da du‑<br />

reza dos costumes antigos, sob os quais se criou, foi educada<br />

e que lhe <strong>de</strong>ixou marcas tão profundas na alma:<br />

“Na casa antiga, castigos corporais e humilhantes, coer‑<br />

ção,/ atitu<strong>de</strong>s impostas, ascendência férrea, obediência cega./<br />

Filhos foram impiedosamente sacrificados e <strong>de</strong>spojados./ E para<br />

alguma rebeldia indomável, lá vinha a ameaça terrível, impres‑<br />

sionante/ da maldição da mãe, a que poucos resistiam./ Do<br />

resto prefiro não esmiuçar.”.<br />

Os poemas <strong>de</strong> Vintém <strong>de</strong> cobre são todos escritos<br />

nesse tom simples e comunicativo, num lirismo quase <strong>de</strong><br />

toada sertaneja, ricos <strong>de</strong> experiência humana. Talvez por<br />

pudor, ou auto<strong>de</strong>fesa, nunca revelam toda a dureza dos<br />

fatos. Ficam nas meias confissões. E por malícia são chama‑<br />

dos <strong>de</strong> vintém <strong>de</strong> cobre quando, na realida<strong>de</strong>, constituem<br />

a <strong>mais</strong> pura e autêntica moeda <strong>de</strong> ouro.<br />

C o r a C o r a l i n a<br />

CORA CORAGEM,<br />

CORA POESIA<br />

Vicência Brêtas Tahan<br />

4 a edição – 240 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0235 ‑7<br />

O que <strong>mais</strong> impressiona em Cora Coralina é o equilíbrio<br />

entre sua vida e sua obra. Mulher <strong>de</strong> aparência frágil, le‑<br />

vando trancos e barrancos violentos do <strong>de</strong>stino, soube ex‑<br />

trair <strong>de</strong> suas experiências uma sabedoria agridoce, <strong>mais</strong> doce<br />

do que amarga, simples, um tanto maliciosa e irônica, uma<br />

espécie <strong>de</strong> súmula viva da sabedoria popular, tão forte em<br />

seus poemas. Muitas <strong>de</strong> suas experiências pessoais foram<br />

narradas em versos autobiográficos, contando sobretudo os<br />

sofrimentos e as <strong>de</strong>cepções da infância, o <strong>de</strong>samparo da<br />

menina, um certo complexo <strong>de</strong> inferiorida<strong>de</strong> e um duro sen‑<br />

timento <strong>de</strong> rejeição. Mas faltava um retrato integral, um ro‑<br />

teiro completo <strong>de</strong> sua vida, or<strong>de</strong>nado e contado por um<br />

biógrafo que reunisse a dupla condição <strong>de</strong> conhecer a fundo<br />

a vida <strong>de</strong> Cora Coralina e <strong>de</strong> saber como narrá ‑la.<br />

A tarefa encontrou seu operário <strong>de</strong>dicado e exato em<br />

Vicência Brêtas Tahan, a autora <strong>de</strong> Cora coragem Cora poesia,<br />

filha caçula da poeta. Como a mãe, Vicência escreve com<br />

extrema simplicida<strong>de</strong>, em estilo quase <strong>de</strong> conversa familiar,<br />

direto, saboroso.<br />

A biografia romanceada, forma preferida por Vicência,<br />

lhe permite adotar as liberda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> criação, peculiar à ficção,<br />

sem trair a fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> aos fatos, aumentando o interesse e a<br />

comunicação com o leitor. A vida narrada como uma novela,<br />

tão do agrado do leitor brasileiro. Assim, os episódios são<br />

vistos com um certo distanciamento, mas recriados com ter‑<br />

nura, muito típica da autora, que se revela sobretudo nos<br />

momentos <strong>mais</strong> difíceis da vida da biografada, como sua<br />

fuga <strong>de</strong> casa com um homem separado da esposa, sua inte‑<br />

gração numa socieda<strong>de</strong> muito diferente da goiana, on<strong>de</strong><br />

logo circula sua condição <strong>de</strong> mulher não casada, um fato<br />

terrível naquelas primeiras décadas do século XX, sua aceita‑<br />

ção pela socieda<strong>de</strong>, numa espécie <strong>de</strong> metáfora da própria<br />

vida <strong>de</strong> Cora, uma história <strong>de</strong> superação.<br />

s o B r e C o r a C o r a l i n a<br />

119


Arquivo pessoal<br />

C o l e ç ã o<br />

e d l a v a n s t e e n<br />

120<br />

Nasceu em Santa Catarina, mas vive em São Paulo e<br />

no Rio <strong>de</strong> Janeiro há muitos <strong>anos</strong>. Dirige as coleções<br />

Melhores Contos, Melhores Crônicas, Melhores Poe‑<br />

mas, Roteiro da Poesia Brasileira, Jovens Inteligentes e<br />

Magias, pois é apaixonada pela literatura brasileira,<br />

e acha que por meio <strong>de</strong>sse trabalho presta um serviço<br />

a seus contemporâneos. Como escritora, sabe contar<br />

histórias, vira seus personagens pelo avesso, pene‑<br />

trando nos seus <strong>mais</strong> íntimos segredos, na sua essên‑<br />

cia, para torná ‑los pessoas vivas, <strong>de</strong> carne e osso.<br />

Incorporando as técnicas do teatro e do cinema, a<br />

cada livro apura seu estilo renovador. As situações<br />

inesperadas e os <strong>de</strong>sfechos sempre inusitados tornam<br />

fascinantes os seus livros, reservando ‑lhe um lugar <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>staque na mo<strong>de</strong>rna produção literária do país.<br />

Meu mundo é povoado <strong>de</strong> lembranças dos outros.<br />

Lembranças que incorporo como se fossem minhas<br />

e que <strong>de</strong>pois transformo, transmudo, transfiro.<br />

Memórias do que não fiz ou não vi, mas que, <strong>de</strong><br />

repente, me vêm à tona. Nessa <strong>de</strong>scoberta encontro<br />

a alegria <strong>de</strong> escrever. Um jogo lúdico comigo mesma.<br />

Assim como me surpreendo, quero também surpreen‑<br />

<strong>de</strong>r o leitor.


A IRA DAS ÁGUAS<br />

1 a edição – 224 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0976 ‑1<br />

O poeta Murilo Men<strong>de</strong>s dizia que “só não existe o que não<br />

po<strong>de</strong> ser imaginado”. A frase, adotada como epígrafe <strong>de</strong> A ira<br />

das águas, <strong>de</strong> Edla van Steen, <strong>de</strong>fine o espírito do livro e a abso‑<br />

luta liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> construção temática adotada pela autora.<br />

Recriando o existente, imaginando o inexistente e<br />

pren<strong>de</strong>ndo ‑os na mesma trama, Edla consegue criar em<br />

todos os sete contos do livro um clima <strong>de</strong> incerteza e <strong>de</strong><br />

mistério, cuja origem po<strong>de</strong> se encontrar no inexplicado das<br />

situações ou na mente dos personagens.<br />

Há tramas que se equilibram como no fio da navalha,<br />

como no provocativo “Mãe e filho”, em que a revelação <strong>de</strong><br />

um segredo <strong>de</strong> namorados balança duas famílias, e em<br />

“Mania <strong>de</strong> cinema”, a eclosão <strong>de</strong> um mundo <strong>de</strong> lembran‑<br />

ças <strong>de</strong> uma mulher madura, provocada por uma observa‑<br />

ção <strong>de</strong> um antigo namorado.<br />

Encontros e <strong>de</strong>sencontros físicos e psicológicos assina‑<br />

lam contos como o “Nojo”, no qual Edla mostra ‑se em<br />

pleno domínio do diálogo, justo, conciso e <strong>de</strong>purado, lem‑<br />

brando sua condição <strong>de</strong> autora teatral <strong>de</strong> sucesso, e “Ela e<br />

ele”, história <strong>de</strong> separação. O enigma <strong>de</strong> uma morte mis‑<br />

teriosa é o tema <strong>de</strong> “Rua da praia”.“Um dia como os ou‑<br />

tros” mostra a violência urbana, sem complacência, vista<br />

pela ótica <strong>de</strong> suas maiores vítimas. “A ira das águas” é a<br />

narrativa <strong>mais</strong> longa e complexa do livro, em realida<strong>de</strong> uma<br />

novela, <strong>de</strong>nsa <strong>de</strong> humanida<strong>de</strong>, na qual Deonísio da Silva<br />

enxerga “talvez o ponto <strong>mais</strong> alto <strong>de</strong> sua prosa no gênero<br />

das narrativas curtas”. Autora <strong>de</strong> sucesso nas áreas <strong>de</strong> ci‑<br />

nema, literatura e teatro (Primeira pessoa, escrita especial‑<br />

mente para Eva Wilma, encontra ‑se em cartaz há vários<br />

<strong>anos</strong>, percorrendo o país), com 25 livros publicados, quatro<br />

dos quais traduzidos nos Estados Unidos, com excelente<br />

recepção crítica, Edla van Steen apresenta um dos <strong>mais</strong> im‑<br />

portantes conjuntos <strong>de</strong> obra da literatura brasileira contem‑<br />

porânea, enriquecido por essa A ira das águas.<br />

E d l a v a n S t E E n<br />

ATÉ SEMPRE<br />

1 a edição – 184 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0036 ‑5<br />

Enigmáticas, surpreen<strong>de</strong>ntes, envolvidas por situações<br />

insólitas, os personagens <strong>de</strong> Até sempre vivem naquela fron‑<br />

teira perigosa entre razão e <strong>de</strong>srazão, a um <strong>de</strong>do da <strong>de</strong>mên‑<br />

cia. Edla van Steen gosta <strong>de</strong> sondar essas almas estranhas,<br />

em geral mulheres. O coração feminino é sua terra mágica e<br />

<strong>de</strong> pesa<strong>de</strong>los, pela qual passeia com curiosida<strong>de</strong> e inquieta‑<br />

ção, como se comprova nos onze contos <strong>de</strong>sse livro.<br />

Em “Até sempre”, que dá título ao livro, duas velhas<br />

senhoras, vivendo maritalmente com o mesmo homem,<br />

têm sua vida sacudida pela presença <strong>de</strong> uma sobrinha, es‑<br />

critora estranha que publicara um conto em que o perso‑<br />

nagem cortava o próprio pai num cepo <strong>de</strong> açougue.<br />

Tão ou <strong>mais</strong> inquietante é a octogenária <strong>de</strong> “A pro‑<br />

messa”, que passa <strong>anos</strong> sem cortar as unhas, só admitindo<br />

fazê ‑lo no dia em que a filha abandonar o marido e voltar<br />

para casa. “Folha <strong>de</strong> parreira” narra as relações <strong>de</strong> um casal<br />

com um parceiro, cujo mamilo é pintado <strong>de</strong> ver<strong>de</strong>. A separa‑<br />

ção <strong>de</strong> uma família <strong>de</strong>vido à presença <strong>de</strong> uma estranha carre‑<br />

gando um bebê é o tema <strong>de</strong> “Lembranças no varal: a roda”.<br />

Por vezes, o mistério das almas anda em paralelo ao<br />

mistério <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>terminada situação, como no instigante<br />

“Apesar <strong>de</strong> tudo”, história <strong>de</strong> uma mo<strong>de</strong>lo e <strong>de</strong> um anão<br />

apaixonado, que termina em um assassinato sem solução. A<br />

morte também está presente em “A bela adormecida (ro‑<br />

teiro <strong>de</strong> uma vida inútil)”, no qual a suicida narra seu gesto<br />

extremo, enquanto presencia seu próprio funeral. Em “Vo‑<br />

cação para o Canto Orfeônico” um viúvo vive uma estranhís‑<br />

sima relação com seu filho, procurando inclusive imitar a<br />

mãe no ato <strong>de</strong> aleitamento. Curiosa e atenta às reações <strong>de</strong><br />

seus personagens, com a precisão <strong>de</strong> um operador utilizando<br />

o bisturi, a autora sonda esse universo mórbido com a natu‑<br />

ralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> quem caminha por uma rua ensolarada, o que<br />

aumenta ainda <strong>mais</strong> sua estranheza e seu fascínio.<br />

E d l a v a n S t E E n<br />

121


CHEIRO DE AMOR<br />

Prêmio Nestlé <strong>de</strong> Literatura 1997<br />

(Fundação Nestlé <strong>de</strong> Cultura)<br />

1 a edição – 304 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0535 ‑9<br />

Embora seja autora <strong>de</strong> sucesso nas áreas <strong>de</strong> cinema, lite‑<br />

ratura e teatro, Edla van Steen manifesta sua vocação <strong>mais</strong><br />

autêntica na prosa <strong>de</strong> ficção, romances e contos, terreno em<br />

que ela se movimenta com naturalida<strong>de</strong> e inquietação.<br />

Cheiro <strong>de</strong> amor revela a escritora madura, na plena<br />

posse <strong>de</strong> seus recursos técnicos, instigante, <strong>de</strong>safiadora,<br />

<strong>de</strong>sconfiada da realida<strong>de</strong> cotidiana, com uma visão impla‑<br />

cável da comédia humana, como observa Lauro Junkes no<br />

prefácio à obra:<br />

“Quase que lembraria Dante: ‘Deixai toda esperança,<br />

ó vós que entrais’ por essa ‘selva escura’: nos meandros do<br />

relacionamento humano, nesse intrigado confronto da mu‑<br />

lher com o homem, nesse sobreviver às marcas do tempo,<br />

<strong>de</strong>ixai toda ilusão romântica, <strong>de</strong>salienai ‑vos <strong>de</strong> sentimenta‑<br />

lismos inconsistentes.”.<br />

Essa a atmosfera dos oito contos do livro, que formam<br />

também uma espécie <strong>de</strong> painel do Brasil dos <strong>anos</strong> 1960,<br />

com suas agitações sociais, a repressão militar, o <strong>de</strong>sapare‑<br />

cimento <strong>de</strong> pessoas, o crescimento do uso da droga. Mas<br />

o que predomina é a curiosida<strong>de</strong> e a preocupação com o<br />

humano, com os <strong>de</strong>sencontros conjugais, a revelação<br />

brusca <strong>de</strong> uma natureza lésbica (“Menor que o sonho”), o<br />

vazio existencial terminando pelo suicídio (“Nada a lasti‑<br />

mar” e “Erro”), a vida amorosa <strong>de</strong> uma mulher livre, que<br />

partilha sua cama com três homens, dois <strong>de</strong>les irmãos<br />

(“Cheiro <strong>de</strong> amor”), a frustração amorosa compensada<br />

pela fixação psicológica obsessiva com os astros do cinema<br />

(“Faz <strong>de</strong> conta”), a carência sentimental <strong>de</strong> duas irmãs,<br />

criadas sem o pai, que vêm o mesmo problema atingir seus<br />

filhos (“Rainha ‑do ‑abismo”). Pequenos dramas e comédias,<br />

abismos da alma humana.<br />

122<br />

E d l a v a n S t E E n<br />

CORAÇÕES MORDIDOS<br />

1 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0407 ‑7<br />

Realida<strong>de</strong> ou ilusão? Os fatos serão aquilo que as pala‑<br />

vras dizem ou o seu oposto? On<strong>de</strong> “a lisa e real verda<strong>de</strong>”,<br />

como dizia Guimarães Rosa? Armando um autêntico jogo <strong>de</strong><br />

eng<strong>anos</strong> e equívocos, Edla van Steen, em Corações mordi‑<br />

dos, <strong>de</strong>safia a sagacida<strong>de</strong> do leitor, propõe <strong>de</strong>safios, estimula<br />

sua habilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> raciocínio, arranha sua sensibilida<strong>de</strong> com<br />

o estilete <strong>de</strong> uma história inovadora, instigante, “mistura <strong>de</strong><br />

anticlímax <strong>de</strong> protesto, ironia e alívio”, como a <strong>de</strong>finiu o<br />

crítico norte ‑americano Malcolm Silverman.<br />

A história transcorre na Al<strong>de</strong>ia dos Sinos, um local tran‑<br />

quilo e belo, cheio <strong>de</strong> árvores nativas e chorões plantados por<br />

um personagem, uma espécie <strong>de</strong> microcosmo da socieda<strong>de</strong><br />

brasileira, com seus conflitos e inquietações, que se consome<br />

num acelerado processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>sagregação. E aqui voltamos<br />

ao início <strong>de</strong> tudo. Realida<strong>de</strong> ou ilusão? Os fatos serão aquilo<br />

que as palavras dizem ou o seu oposto? On<strong>de</strong> a verda<strong>de</strong>?<br />

Difícil <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r, já que Corações mordidos é um<br />

romance que se escreve a si mesmo, uma ficção criada a<br />

partir do mundo imaginário <strong>de</strong> Greta. Greta ou Tina? Cria‑<br />

ção <strong>de</strong> um personagem <strong>de</strong> ficção, esse universo tem tam‑<br />

bém estrutura e leis próprias, se bem que sempre em<br />

processo <strong>de</strong> mudança. Assim, um dos personagens, Sonia,<br />

se rebela contra a própria criadora, interessada em “pene‑<br />

trar no universo <strong>mais</strong> íntimo <strong>de</strong> outras pessoas, oriundas <strong>de</strong><br />

estratos aleatórios, que são os daqueles <strong>de</strong> quem ela <strong>de</strong>seja<br />

comprar os sonhos. A criatura sonhada torna ‑se <strong>mais</strong> real<br />

do que o sonhador”, como observa Fausto Cunha.<br />

Jogo <strong>de</strong> eng<strong>anos</strong> e equívocos, partindo do absurdo<br />

para chegar ao enigmático, Corações mordidos representa<br />

um momento <strong>de</strong> angústia e dilaceramento sem muitos<br />

parentes na mo<strong>de</strong>rna ficção brasileira. É um <strong>de</strong>safio pro‑<br />

posto ao leitor, que recompensa bem aos que se propõem<br />

<strong>de</strong>cifrá ‑lo. Conseguirão?<br />

E d l a v a n S t E E n


NO SILÊNCIO<br />

DAS NUVENS<br />

1 a edição – 224 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0701 ‑7<br />

Ao contrário <strong>de</strong> muitos escritores cuja trajetória se ini‑<br />

cia com sua melhor obra, passando em seguida a imitado‑<br />

res <strong>de</strong> si mesmos, a carreira literária <strong>de</strong> Edla van Steen se<br />

caracteriza por um permanente processo <strong>de</strong> renovação e<br />

amadurecimento, não apenas no sentido <strong>de</strong> aprimora‑<br />

mento literário, mas também na visão <strong>de</strong> mundo. A cada<br />

obra, a autora catarinense consegue lançar sua sonda a<br />

maiores profundida<strong>de</strong>s da alma humana.<br />

Neste sentido, No silêncio das nuvens é obra exemplar.<br />

Nela, Edla reafirma, e como que sublinha, todas as suas quali‑<br />

da<strong>de</strong>s <strong>de</strong> narradora e pesquisadora dos caminhos e <strong>de</strong>scami‑<br />

nhos hum<strong>anos</strong>, com sua prosa vigorosa, o estilo preciso, o jogo<br />

permanente e <strong>de</strong>safiador entre o real e o insólito, o domínio<br />

teatral dos diálogos, recriando almas, mas tendo sempre como<br />

pano <strong>de</strong> fundo o quadro da socieda<strong>de</strong> contemporânea.<br />

No silêncio das nuvens reúne quatro contos e uma<br />

novela, unidos por uma visão <strong>de</strong>siludida da vida, por vezes<br />

amarga, como já indica a epígrafe do livro, <strong>de</strong> Carlos Drum‑<br />

mond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>: “As coisas. Que tristes são as coisas,<br />

consi<strong>de</strong>radas sem ênfase.”.<br />

De fato, se há algo que a autora repudia é a ênfase. An‑<br />

tienfática por natureza, essa característica como que distingue<br />

todos os trabalhos do livro, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> “Bodas <strong>de</strong> ouro”, uma refle‑<br />

xão pessimista sobre a velhice e a morte, até “No silêncio das<br />

nuvens”, o encontro <strong>de</strong> velhos amigos, num clima sufocante <strong>de</strong><br />

horrores, passando por “O rei dos malditos”, que se <strong>de</strong>senrola<br />

durante o enterro do protagonista; “A vingança”, a história<br />

cheia <strong>de</strong> surpresas <strong>de</strong> um avarento, e “Amor pelas miniaturas”,<br />

em que o leitor passeia em pleno terreno do insólito, no qual<br />

cinco bonecas influenciam o <strong>de</strong>stino dos protagonistas.Como<br />

resumiu o crítico norte ‑americano David S. George: “No silêncio<br />

das nuvens é um livro maduro, pela temática, mas ao mesmo<br />

tempo pelo estilo, com perdão a Bob Dylan, forever young.”.<br />

E d l a v a n S t E E n<br />

OBRAS DE LITERATURA INFANTIL E JUVENIL<br />

DA AUTORA<br />

• A revolta (prelo)<br />

• Manto <strong>de</strong> nuvem<br />

• O gato barbudo<br />

• O presente<br />

• Por acaso<br />

E d l a v a n S t E E n<br />

123


É<strong>de</strong>r Luiz Me<strong>de</strong>iros/Folha Imagem<br />

C o l e ç ã o<br />

F l o r e s t a n F e r n a n d e s<br />

124<br />

Nascido na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo no dia 22 <strong>de</strong> julho<br />

<strong>de</strong> 1920, Florestan Fernan<strong>de</strong>s começou a trabalhar<br />

aos seis <strong>anos</strong> <strong>de</strong>vido à necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ganhar a vida<br />

“como se fosse um adulto [...] pelas vias da expe‑<br />

riência concreta, no conhecimento do que é a convi‑<br />

vência humana e a socieda<strong>de</strong>”, segundo o próprio<br />

autor. Então ven<strong>de</strong>dor <strong>de</strong> produtos farmacêuticos,<br />

aos <strong>de</strong>zoito <strong>anos</strong> ingressou na Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Filoso‑<br />

fia, Ciências e Letras da USP, on<strong>de</strong> se formou em<br />

Ciências Sociais e doutorou ‑se em 1951. Foi profes‑<br />

sor universitário no Brasil e no exterior, <strong>de</strong>putado<br />

fe<strong>de</strong>ral por dois mandatos e importante sociólogo,<br />

cujas i<strong>de</strong>ias criaram uma nova maneira <strong>de</strong> pensar o<br />

nosso país e a América Latina. Tem <strong>mais</strong> <strong>de</strong>cinquenta<br />

livros publicados, além <strong>de</strong> inúmeros ensaios e artigos<br />

em importantes revistas e jornais.<br />

Ninguém ignora o quanto a heterogeneida<strong>de</strong> cultural<br />

e racial afetou, está afetando e continuará a afetar as<br />

possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento da “civilização<br />

oci<strong>de</strong>ntal” no Brasil. Sob esse aspecto, as questões<br />

pertinentes ao assunto possuem o caráter <strong>de</strong> problema<br />

nacional, o que confere às investigações realizadas ou<br />

em curso um interesse prático iniludível.


A INVESTIGAÇÃO<br />

ETNOLÓGICA NO<br />

BRASIL E OUTROS<br />

ENSAIOS<br />

2 a edição – 320 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0138‑1<br />

Investigação etnológica no Brasil e outros ensaios, <strong>de</strong><br />

Florestan Fernan<strong>de</strong>s, reúne cinco estudos publicados em<br />

épocas diversas e incorporados anteriormente a outros li‑<br />

vros do autor. A reunião no presente volume lhes dá a <strong>de</strong>‑<br />

vida unida<strong>de</strong>, facilitando a tarefa do pesquisador.<br />

Os ensaios encontram ‑se agrupados em dois blocos. A<br />

primeira parte, referente a “O mundo dos índios e sua crise”,<br />

estuda o contato do português com o Tupi (ao mesmo<br />

tempo a principal fonte <strong>de</strong> resistência ao colonizador e seu<br />

melhor ponto <strong>de</strong> apoio, entre as populações nativas), o cho‑<br />

que <strong>de</strong>corrente, as mudanças provocadas na civilização tupi<br />

e as reações à conquista (“Os Tupi e a reação tribal à con‑<br />

quista”); a educação entre os Tupinambá – grupo étnico<br />

regido por uma or<strong>de</strong>m tribal “tradicionalista”, “sagrada” e<br />

“fechada” – e sua aplicação na vida prática (“Notas sobre a<br />

educação na socieda<strong>de</strong> tupinambá”); e um estudo sobre a<br />

curiosa figura do professor Tiago Marques Aipobureu, índio<br />

Bororo integrado à civilização do homem branco, que até<br />

viveu na Europa, sem se <strong>de</strong>sligar <strong>de</strong> suas raízes e por isso em<br />

eterno conflito consigo mesmo, dividido entre os apelos <strong>de</strong><br />

duas culturas (“Tiago Marques Aipobureu: um Bororo mar‑<br />

ginal”). A segunda parte, <strong>de</strong>nominada “O conhecimento<br />

etnológico da realida<strong>de</strong>”, divi<strong>de</strong> ‑se em dois capítulos: “Ten‑<br />

dências teóricas da mo<strong>de</strong>rna investigação etnológica no<br />

Brasil”, que avalia a situação da pesquisa etnológica nos<br />

<strong>anos</strong> 1950, e “Um balanço crítico da contribuição etnográ‑<br />

fica dos cronistas”, uma tentativa <strong>de</strong> análise crítica do con‑<br />

teúdo etnográfico dos autores quinhentistas e seiscentistas<br />

que registraram informações sobre a vida social dos Tupi‑<br />

nambá. Os textos são reproduzidos sem alteração, como<br />

documentos <strong>de</strong> uma época, mantendo ileso seu interesse.<br />

F l o r e s t a n F e r n a n d e s<br />

BRANCOS E NEGROS<br />

EM SÃO PAULO<br />

Coautor:<br />

Roger Basti<strong>de</strong><br />

5 a edição – 304 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1258 ‑5<br />

Há muito se fazia necessário uma reedição <strong>de</strong> Brancos<br />

e negros em São Paulo, clássico no estudo das relações<br />

raciais no Brasil. O livro reaparece em momento oportuno,<br />

quando se intensificam os <strong>de</strong>bates sobre a questão das po‑<br />

líticas voltadas aos negros e as cotas em universida<strong>de</strong>s.<br />

As origens da obra remontam à década <strong>de</strong> 1950,<br />

quando o estudo sobre raça e preconceito ganhava contor‑<br />

nos científicos e o Brasil era consi<strong>de</strong>rado um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong><br />

relações harmoniosas entre brancos e negros, tese consa‑<br />

grada nos trabalhos <strong>de</strong> Gilberto Freyre. Por sugestão da<br />

Unesco, foram realizadas pesquisas em quatro metrópoles<br />

brasileiras, cabendo a incumbência, no que se refere à ci‑<br />

da<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, aos professores Roger Basti<strong>de</strong> e seu<br />

discípulo, Florestan Fernan<strong>de</strong>s.<br />

Adotando novos instrumentos teóricos e metodológi‑<br />

cos da sociologia crítica, os autores dirigiram o foco <strong>de</strong> suas<br />

análises para as relações raciais e os mecanismos <strong>de</strong> acomo‑<br />

dação social entre brancos e negros, que “se formaram no<br />

regime senhorial escravocrata, modificaram ‑se à medida que<br />

ruiu a antiga or<strong>de</strong>m senhorial ‑servil, dando lugar a uma so‑<br />

cieda<strong>de</strong> capitalista ‑competitiva baseada no trabalho livre”,<br />

como explica Fernando Henrique Cardoso no prefácio.<br />

A obra recebeu excelente acolhida crítica, mas provocou<br />

também reações irritadas <strong>de</strong> pessoas que viam em suas conclu‑<br />

sões uma atitu<strong>de</strong> perigosa, “como se os investigadores fossem<br />

responsáveis pelas tensões latentes ou abertas, que eles se limi‑<br />

taram a <strong>de</strong>screver e a interpretar” (Florestan Fernan<strong>de</strong>s).<br />

Mais <strong>de</strong> meio século <strong>de</strong>pois, a obra se mantém como<br />

um texto fundamental para a compreensão do problema<br />

da discriminação racial no país e a elaboração <strong>de</strong> políticas<br />

voltadas para a inserção do negro na or<strong>de</strong>m social capita‑<br />

lista brasileira, guiando “as novas gerações na busca <strong>de</strong><br />

melhor entendimento da formação social do Brasil” (Fer‑<br />

nando Henrique Cardoso).<br />

F l o r e s t a n F e r n a n d e s<br />

125


CAPITALISMO<br />

DEPENDENTE E<br />

CLASSES SOCIAIS NA<br />

AMÉRICA LATINA<br />

4 a edição – 152 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0152 ‑7<br />

A reedição <strong>de</strong> Capitalismo <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte e classes sociais<br />

na América Latina ocorre em momento oportuno, quando a<br />

América Latina vive tempos <strong>de</strong> exacerbação do nacionalismo<br />

e <strong>de</strong> repúdio à hegemonia econômica dos Estados Unidos.<br />

O clássico <strong>de</strong> Florestan Fernan<strong>de</strong>s, em seus três capítulos,<br />

ajuda a compreen<strong>de</strong>r a situação atual mediante a análise das<br />

origens históricas <strong>de</strong>ssa velha e persistente crise que, perio‑<br />

dicamente, se manifesta com maior ou menor veemência.<br />

“Padrões <strong>de</strong> dominação externa na América Latina”, o<br />

primeiro ensaio do livro, estuda a imposição do capitalismo<br />

na América Latina e a incapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reação dos países do<br />

continente “<strong>de</strong> impedir sua incorporação <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte ao<br />

espaço econômico, cultural e político das sucessivas nações<br />

hegemônicas”. O estudo analisa quatro tipos <strong>de</strong> dominação<br />

externa: colonialismo, controle do comércio pelas nações<br />

europeias, neocolonialismo surgido após a Revolução Indus‑<br />

trial na Europa e, por fim, a expansão <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s empresas<br />

corporativas no continente, representantes do capitalismo<br />

corporativo ou monopolista e que se apossam, por meio <strong>de</strong><br />

mecanismos financeiros, pressão ou corrupção, do espaço<br />

ocupado anteriormente pelas empresas nativas. A análise se<br />

<strong>de</strong>tém com <strong>mais</strong> atenção e profundida<strong>de</strong> nesse novo tipo <strong>de</strong><br />

imperialismo, “<strong>de</strong>strutivo para o <strong>de</strong>senvolvimento dos países<br />

latino ‑americ<strong>anos</strong>”, na hegemonia econômica dos Estados<br />

Unidos no continente e na dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> resolver, através do<br />

capitalismo, o que o autor chama <strong>de</strong> “o dilema latino‑<br />

‑americano”. “Problemas <strong>de</strong> conceituação das classes sociais<br />

na América Latina” analisa a função das classes sociais no<br />

continente, a dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> conceituá ‑las, sua dinâmica sob<br />

o capitalismo e suas relações com o po<strong>de</strong>r. Em “Sociologia,<br />

mo<strong>de</strong>rnização autônoma e revolução social” o autor expõe‑<br />

seu pensamento sobre a função do sociólogo na evolução<br />

atual da socieda<strong>de</strong>.<br />

126<br />

F l o r e s t a n F e r n a n d e s<br />

FLORESTAN<br />

FERNANDES<br />

LEITURAS & LEGADOS<br />

1 a edição – 376 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1462 ‑6<br />

Florestan Fernan<strong>de</strong>s: leituras & legados reúne doze<br />

ensaios <strong>de</strong> Florestan Fernan<strong>de</strong>s, escritos na mocida<strong>de</strong> e <strong>de</strong><br />

difícil acesso, e a transcrição <strong>de</strong> uma entrevista, concedida<br />

ao programa <strong>de</strong> tevê Roda Viva, na maturida<strong>de</strong>, revelando<br />

a coerência <strong>de</strong> seu pensamento ao longo da vida. Os textos<br />

abordam temas e motivos diversos, tratados com o ímpeto<br />

peculiar ao sociólogo paulista e agrupados em dois módu‑<br />

los: leituras e legados.<br />

O primeiro texto, a introdução escrita por Florestan<br />

para a sua tradução <strong>de</strong> Contribuição à crítica da economia<br />

política, <strong>de</strong> Karl Marx, “centra sua interpretação no trata‑<br />

mento dos problemas analíticos, buscando estabelecer pon‑<br />

tes <strong>de</strong> diálogo entre os autores, tendo em vista embasar e<br />

aprofundar as operações <strong>de</strong> explicação nas ciências sociais”,<br />

esclarece Maria Arminda do Nascimento Arruda no prefácio<br />

à obra, acrescentando ser esse o registro comum aos textos<br />

reunidos no volume, apesar <strong>de</strong> sua varieda<strong>de</strong>.<br />

Com liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> espírito, o jovem estudioso aborda<br />

no módulo <strong>de</strong> leituras realida<strong>de</strong>s tão diversas como “Mário<br />

<strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> e o folclore brasileiro”, “Tiago Marques Aipo‑<br />

bureu; um bororo marginal”, “A economia tupinambá –<br />

ensaio <strong>de</strong> interpretação sociológica do sistema econômico<br />

<strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> tribal”, “A Revolução Constitucionalista<br />

e o estudo sociológico da guerra”, “Contribuição para o<br />

estudo <strong>de</strong> um lí<strong>de</strong>r carismático” e “A aculturação dos sírios<br />

e libaneses em São Paulo”.<br />

No módulo <strong>de</strong> legados são abordados temas como<br />

“A sociologia no Brasil, “A educação como problema so‑<br />

cial”, “As relações raciais em São Paulo reexaminadas”,<br />

“Da aliança à solidarieda<strong>de</strong>”, “Reflexão sobre o socialismo<br />

e a autoemancipação dos trabalhadores”, completados<br />

pela transcrição da entrevista concedida pelo sociólogo<br />

ao programa <strong>de</strong> tevê Roda Viva e o ensaio <strong>de</strong>nominado<br />

“O jovem Florestan”, <strong>de</strong> Antonio Candido.<br />

F l o r e s t a n F e r n a n d e s


MUDANÇAS SOCIAIS<br />

NO BRASIL<br />

4 a edição – 328 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1334 ‑6<br />

Mudanças sociais no Brasil reúne doze ensaios escritos<br />

no período <strong>de</strong> 1946 e 1959, entre a re<strong>de</strong>mocratização,<br />

após a ditadura do Estado Novo, e os <strong>anos</strong> do governo<br />

Juscelino Kubitschek, marcado pelo <strong>de</strong>senvolvimentismo, a<br />

construção <strong>de</strong> Brasília, a mo<strong>de</strong>rnização industrial.<br />

Neles, Florestan Fernan<strong>de</strong>s analisa questões sociológicas,<br />

culturais, econômicas e históricas, <strong>de</strong>bate a luta <strong>de</strong> classes e o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento em um país <strong>de</strong> capitalismo tardio.<br />

Com erudição, clareza e equilíbrio, são analisadas al‑<br />

gumas das preocupações <strong>mais</strong> marcantes da época, ques‑<br />

tões sujeitas a <strong>de</strong>bates ar<strong>de</strong>ntes, como o processo <strong>de</strong><br />

industrialização, então em sua fase inicial, no qual o estu‑<br />

dioso reconhece o êxito, mas alerta para as “<strong>de</strong>bilida<strong>de</strong>s<br />

básicas do padrão brasileiro <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento indus‑<br />

trial”, gerador <strong>de</strong> pontos <strong>de</strong> estrangulamento.<br />

Por ocasião do quarto centenário <strong>de</strong> fundação <strong>de</strong> São<br />

Paulo, o sociólogo analisa as transformações sociais, políti‑<br />

cas e econômicas da cida<strong>de</strong>, que em cinquenta <strong>anos</strong> au‑<br />

mentou <strong>mais</strong> <strong>de</strong> sete vezes a sua população, dando origem<br />

a um mundo social novo, a primeira cida<strong>de</strong> autenticamente<br />

burguesa do Brasil, cujo espaço o homem conquistou, mas<br />

sem domesticá ‑lo, no sentido urbano.<br />

O ensaio sobre a situação do vale do Paraíba, à época,<br />

com seus conflitos sociais, ascensão <strong>de</strong> novas classes, res‑<br />

sentimento dos que per<strong>de</strong>ram po<strong>de</strong>r político, econômico e<br />

social, resulta <strong>de</strong> um trabalho <strong>de</strong> campo, com três viagens<br />

à região.<br />

Mudanças sociais no Brasil, como observa Marco An‑<br />

tonio Villa no prefácio, “permanece como uma importante<br />

contribuição para o conhecimento crítico do nosso país,<br />

como um exercício <strong>de</strong> um sociólogo militante frente à com‑<br />

plexida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> classes, seus dilemas, suas<br />

contradições e possíveis formas <strong>de</strong> superação.”.<br />

F l o r e s t a n F e r n a n d e s<br />

O NEGRO NO MUNDO<br />

DOS BRANCOS<br />

2 a edição – 320 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1230 ‑1<br />

A década <strong>de</strong> 1960 ficou assinalada pelo incremento<br />

dos estudos sobre o negro brasileiro. Durante muitos <strong>anos</strong>,<br />

analisada em um ou outro livro ou artigo esporádico, a<br />

participação do <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> africano no Brasil começou<br />

a ser reavaliada (segundo alguns <strong>de</strong> maneira um tanto i<strong>de</strong>a‑<br />

lizada) por Gilberto Freyre, em Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala<br />

(1933). Nos <strong>anos</strong> seguintes, os estudiosos assumiram posi‑<br />

ções <strong>mais</strong> realistas, pondo <strong>de</strong> lado velhos chavões, como a<br />

inexistência <strong>de</strong> preconceito racial no país. Buscaram ‑se en‑<br />

foques inéditos <strong>de</strong> abordagem do problema, analisaram ‑se<br />

aspectos ainda não avaliados, sempre amparados em pes‑<br />

quisa <strong>de</strong> campo e levantamento minucioso <strong>de</strong> dados.<br />

O negro no mundo dos brancos, do professor Flores‑<br />

tan Fernan<strong>de</strong>s, reflete essas tendências através <strong>de</strong> seus ca‑<br />

torze ensaios, centrados na preocupação com a supremacia<br />

da “raça branca” e o controle do po<strong>de</strong>r que ela exerce em<br />

nossa socieda<strong>de</strong>, fazendo do Brasil um mundo social mo‑<br />

<strong>de</strong>lado pelo branco e para o branco. Estudando a situação<br />

do negro e do mulato na socieda<strong>de</strong> brasileira, vista a partir<br />

<strong>de</strong> São Paulo, Florestan Fernan<strong>de</strong>s levanta os caminhos si‑<br />

nuosos assumidos pelo preconceito, os seus disfarces e o<br />

processo <strong>de</strong> segregação racial, sem agravar ou atenuar o<br />

problema. Sua visão é <strong>de</strong> que o equilíbrio racial na socie‑<br />

da<strong>de</strong> brasileira “proce<strong>de</strong> do modo pelo qual os dois polos<br />

se articulam com um mínimo <strong>de</strong> fricção”, padrão <strong>de</strong> equi‑<br />

líbrio que é a própria base da <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> racial. O livro<br />

aborda ainda outros assuntos <strong>mais</strong> heterogêneos e fortui‑<br />

tos, como o significado das pesquisas sobre relações raciais,<br />

a presença do negro “em nosso folclore e nos quadros da<br />

religião popular”, todos eles se comunicando entre si, aju‑<br />

dando a <strong>de</strong>svendar a situação real do negro na socieda<strong>de</strong><br />

brasileira, mas também afirmando as “preocupações mo‑<br />

rais e políticas” do autor.<br />

F l o r e s t a n F e r n a n d e s<br />

127


SOCIEDADE DE CLASSES<br />

E SUBDESEN VOLVIMENTO<br />

4 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1270 ‑7<br />

Consi<strong>de</strong>rado um clássico dos estudos sociais brasilei‑<br />

ros, Socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> classes e sub<strong>de</strong>senvolvimento reúne di‑<br />

versos ensaios, escritos entre 1965 e 1967, referentes ao<br />

sub<strong>de</strong>senvolvimento brasileiro e às perspectivas históricas<br />

<strong>de</strong> sua superação, nos quadros da socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> classes.<br />

Na época, começava a se formar o conceito <strong>de</strong> <strong>de</strong>sen‑<br />

volvimento, num mundo on<strong>de</strong> a maioria dos países era<br />

pobre e atrasada, pouco industrializada e pouco urbani‑<br />

zada. Países realmente adiantados eram as nações da Eu‑<br />

ropa oci<strong>de</strong>ntal, da América do Norte e o Japão.<br />

O <strong>de</strong>bate sobre a natureza do <strong>de</strong>senvolvimento, e as<br />

causas <strong>de</strong> sua distribuição <strong>de</strong>sigual pelo mundo, tornou ‑se<br />

então intenso. Florestan Fernan<strong>de</strong>s <strong>de</strong>le participou, vol‑<br />

tando seu foco para os problemas específicos da socieda<strong>de</strong><br />

brasileira.<br />

Recorrendo às raízes históricas, para enten<strong>de</strong>r o pre‑<br />

sente, o estudioso <strong>de</strong>monstra como momentos vitais na<br />

vida da nação, no século XIX – como a in<strong>de</strong>pendência e a<br />

abolição da escravatura –, contribuíram para a criação <strong>de</strong><br />

acentuados <strong>de</strong>sajustes na formação do país, já que as mu‑<br />

danças jurídico ‑políticas não produziram as mudanças so‑<br />

cioeconômicas necessárias para a construção <strong>de</strong> uma<br />

or<strong>de</strong>m social competitiva.<br />

Ao avaliar a mo<strong>de</strong>rnização da economia brasileira, e a<br />

sua inclusão no mercado mundial capitalista, Florestan an‑<br />

tevia que o processo levaria à formação <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> classes duplamente <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, pois os rumos <strong>de</strong> sua<br />

economia ligavam ‑se aos interesses dos países ricos, e o<br />

seu <strong>de</strong>senvolvimento sociocultural se veria impossibilitado.<br />

Passados quase cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong>ssas consi<strong>de</strong>rações,<br />

esta reedição permite ao leitor avaliar, com as perspectivas do<br />

tempo, as análises e as teses apresentadas pelo sociólogo.<br />

128<br />

F l o r e s t a n F e r n a n d e s


Arquivo da Fundação Gilberto Freyre<br />

C o l e ç ã o<br />

G i l B e r t o F r e y r e<br />

OBRA DE LITERATURA INFANTIL DO AUTOR<br />

• O outro Brasil que vem aí<br />

G i l B e r t o F r e y r e<br />

Pernambucano do Recife, escritor, sociólogo, etnó‑<br />

logo, antropólogo, educador, jornalista, político, aos 23<br />

<strong>anos</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>u nos Estados Unidos a tese Vida social<br />

no Brasil nos meados do século XIX, tema que <strong>de</strong>sen‑<br />

volveria <strong>de</strong>pois em seu livro <strong>mais</strong> famoso, Casa‑gran<strong>de</strong><br />

& senzala, <strong>de</strong> 1933, no qual fez um dos <strong>mais</strong> comple‑<br />

tos estudos sobre a formação da socieda<strong>de</strong> brasileira.<br />

Apaixonado pelo Brasil e pela cultura luso ‑tropical, <strong>de</strong>s‑<br />

montou teses pessimistas sobre a capacida<strong>de</strong> empre‑<br />

en<strong>de</strong>dora do homem brasileiro, exaltando a trilogia<br />

étnica – índio, branco e negro – sobre a qual se ergueu<br />

nosso país. Deixou vasta obra e colaborou com várias<br />

publicações. Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala é um dos livros<br />

brasileiros <strong>mais</strong> publicados no exterior.<br />

O humano só po<strong>de</strong> ser compreendido pelo humano –<br />

até on<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser compreendido; e compreensão<br />

importa em maior ou menor sacrifício da objetivida<strong>de</strong><br />

à subjetivida<strong>de</strong>. Pois tratando ‑se <strong>de</strong> passado humano,<br />

há que <strong>de</strong>ixar ‑se espaço para a dúvida e até para o<br />

mistério.<br />

129


AÇÚCAR<br />

UMA SOCIOLOGIA DO DOCE,<br />

COM RECEITAS DE BOLOS E<br />

DOCES DO NORDESTE DO BRASIL<br />

5 a edição – 272 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1069 ‑7<br />

Responsável pelo primeiro gran<strong>de</strong> ciclo econômico da<br />

história do Brasil, a cana ‑<strong>de</strong> ‑açúcar moldou a formação e a<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> do Nor<strong>de</strong>ste e o jeito <strong>de</strong> ser e a alma do nor<strong>de</strong>s‑<br />

tino. “Sem açúcar não se compreen<strong>de</strong> o homem do Nor‑<br />

<strong>de</strong>ste”, afirma Gilberto Freyre em Açúcar, subtitulado “uma<br />

sociologia do doce, com receitas <strong>de</strong> bolos e doces do Nor‑<br />

<strong>de</strong>ste do Brasil”.<br />

Lançado em 19<strong>39</strong>, o livro <strong>de</strong>spertou certa surpresa<br />

entre intelectuais. Ora, ora, um escritor consagrado tra‑<br />

tando <strong>de</strong> receitas, falando <strong>de</strong> tachos <strong>de</strong> cobre, <strong>de</strong> ponto <strong>de</strong><br />

doce, <strong>de</strong> fôrmas, <strong>de</strong> colheres <strong>de</strong> pau, <strong>de</strong> raladores, coisas<br />

tão femininas e tão da cozinha...<br />

Dessas insinuações, Gilberto Freyre se <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>u por<br />

antecipação ao utilizar como epígrafe uma frase <strong>de</strong> Domin‑<br />

gos Rodrigues, autor <strong>de</strong> Arte da cozinha, livro publicado no<br />

fim do século XVII e <strong>de</strong>dicado ao con<strong>de</strong> <strong>de</strong> Vimioso: “É o<br />

livro ocasionado aos mordazes pela matéria e pelo estilo;<br />

mas uma e outra cousa será <strong>de</strong> todos respeitada sendo<br />

com o ilustre nome <strong>de</strong> V. S.ª <strong>de</strong>fendido.”.<br />

Hoje, Açúcar é um clássico e, <strong>mais</strong> do que isso, uma<br />

introdução insubstituível ao reino mágico dos doces e dos<br />

bolos nor<strong>de</strong>stinos, magia que se elabora na cozinha e ter‑<br />

mina na barriga do freguês, mas que vive inúmeras outras<br />

fases: da colheita da cana e da goiaba, do caju ou <strong>de</strong> qual‑<br />

quer outra fruta utilizada em doces, à venda, outrora ao re‑<br />

frão tradicional do ven<strong>de</strong>dor <strong>de</strong> rua. Isso sem falar em outra<br />

magia: a dos nomes <strong>de</strong> bolos, bolinhos, biscoitos, sequilhos,<br />

doces. Alguns provocativos, sensuais: argolinhas <strong>de</strong> amor,<br />

baba <strong>de</strong> moça, beijos <strong>de</strong> cabocla, quindim <strong>de</strong> iaiá, outros se<br />

revelando logo, num apelo direto ao paladar: doces <strong>de</strong> jaca<br />

mole, <strong>de</strong> laranja ‑da ‑terra, <strong>de</strong> sapoti, compota <strong>de</strong> cidra ou <strong>de</strong><br />

limão. De todos eles, e <strong>de</strong> alguns sorvetes, fica registrada a<br />

receita (são centenas) neste livro saboroso como um doce <strong>de</strong><br />

coco ou <strong>de</strong> araçá. À escolha do freguês.<br />

130<br />

G i l b e r t o F r e y r e<br />

ASSOMBRAÇÕES DO<br />

RECIFE VELHO<br />

6 a edição revista – 240 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1310 ‑0<br />

O contato com assombrações po<strong>de</strong> ser extremamente<br />

agradável, quando apresentado por um escritor como Gil‑<br />

berto Freyre. Curioso das realida<strong>de</strong>s evi<strong>de</strong>ntes e das reali‑<br />

da<strong>de</strong>s possíveis, o autor <strong>de</strong> Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala conduz<br />

o leitor, neste livro – enriquecido com belas ilustrações <strong>de</strong><br />

Poty –, por um insinuante passeio pelos terrores e imagina‑<br />

ções vivas no passado do povo recifense e ainda persisten‑<br />

tes na atualida<strong>de</strong>.<br />

Sem adotar qualquer postura crítica ou crédula, ape‑<br />

nas com olhos <strong>de</strong> cientista, fascinado por todas as experiên‑<br />

cias humanas, o autor apresenta ao leitor um <strong>de</strong>sfile dos<br />

<strong>mais</strong> variados tipos <strong>de</strong> criaturas <strong>de</strong>moníacas, que a tradição<br />

popular conservou, e ainda conserva e teme, “toda uma<br />

fauna infernal que se a sociologia do sobrenatural <strong>de</strong>scesse<br />

do divino ou do angélico ao misticamente bestial, teria que<br />

consi<strong>de</strong>rar como ‘socieda<strong>de</strong>’ a seu modo animal”, como<br />

observa Freyre.<br />

Os casos apresentados no livro baseiam ‑se na tradição<br />

viva ou segundo o testemunho dos que o viveram. Fisgado<br />

na tradição, há o caso do barão perseguido a vida toda<br />

pelo diabo, que se apossou <strong>de</strong> sua alma e também <strong>de</strong> seu<br />

corpo. Diz ‑se que a família, para fingir enterrá ‑lo, encheu<br />

o caixão <strong>de</strong> pedras.<br />

Contado por testemunha ilustre, o professor Sílvio Ra‑<br />

belo, há o caso do aviso <strong>de</strong> morte, comunicado através do<br />

ruído <strong>de</strong> cristais que pareciam se <strong>de</strong>spedaçar, mas que se<br />

mantinham intatos. O fenômeno se <strong>de</strong>u no exato momento<br />

da morte <strong>de</strong> uma amiga do <strong>de</strong>poente. Mas o sobrenatural<br />

se manifesta também <strong>de</strong> maneira agradável, como se com‑<br />

prova no caso do pobre que ganhou no bicho graças a<br />

Nossa Senhora. Realida<strong>de</strong>? Imaginação? Ou simples mani‑<br />

festações do gran<strong>de</strong> mistério da vida, que continua co‑<br />

nosco, “embora diminuído pela luz elétrica e por outras<br />

luzes”, como escreve Freyre?<br />

G i l b e r t o F r e y r e


CASA ­GRANDE<br />

& SENZALA<br />

51 a edição – 728 páginas<br />

2 encartes coloridos (32 páginas)<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0869 ‑4<br />

Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala, publicada em 1933, <strong>mais</strong> do<br />

que uma re<strong>de</strong>scoberta da nação brasileira, foi uma espécie<br />

<strong>de</strong> fundação do Brasil no plano cultural, como observou<br />

Darcy Ribeiro, tal como Cervantes havia feito em relação à<br />

Espanha, Camões à Portugal e Tolstoi à Rússia. Valorizando<br />

o papel do negro na história brasileira, exaltando a misci‑<br />

genação racial, <strong>de</strong>smistificando preconceitos e reconhe‑<br />

cendo a originalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> nossa cultura, tipicamente<br />

tropical, o livro caiu como um meteoro nos meios intelec‑<br />

tuais. A novida<strong>de</strong> estava tanto no pensamento do autor<br />

como na sua forma <strong>de</strong> se expressar e nos métodos utiliza‑<br />

dos na montagem da obra. A linguagem <strong>de</strong> Gilberto Freyre<br />

tinha uma irreverência <strong>de</strong>sconhecida nas letras brasileiras,<br />

por vezes um tom <strong>de</strong> gozação, que chegou a provocar pro‑<br />

testos <strong>de</strong> algumas correntes <strong>mais</strong> conservadoras. Mais inte‑<br />

ressante ainda foi o material recolhido para mostrar a face<br />

autêntica do Brasil: diários esquecidos, receitas <strong>de</strong> bolos e<br />

doces, práticas cotidianas como o cafuné e a retirada <strong>de</strong><br />

bichos ‑do ‑pé, nas quais se revelavam um exacerbado sen‑<br />

sualismo, relações sexuais entre marido e mulher, entre<br />

sinhô e escravas, entre escravos e sinhás, raptos, o amor à<br />

higiene, os muitos banhos tomados a cada dia pelos brasi‑<br />

leiros, fatos a que ninguém ligava importância, mas muito<br />

<strong>mais</strong> eloquentes na revelação do povo brasileiro e do Brasil<br />

como nação do que as exaltações convencionais <strong>de</strong> feitos<br />

históricos.<br />

Mais <strong>de</strong> setenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> sua publicação, Casa‑<br />

‑gran<strong>de</strong> & senzala firma ‑se como um dos livros capitais da<br />

cultura brasileira, sem o qual é impossível conhecer o Brasil,<br />

ao lado <strong>de</strong> Os sertões, <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s da Cunha, dos romances<br />

da maturida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis, e <strong>de</strong> <strong>mais</strong> uma meia<br />

dúzia <strong>de</strong> obras.<br />

Essa edição, num belo trabalho gráfico, repleta <strong>de</strong><br />

ilustrações em cores, faz jus à obra.<br />

G i l b e r t o F r e y r e<br />

CASA ­GRANDE<br />

& SENZALA EM<br />

QUADRINHOS<br />

3 a edição – 64 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1059 ‑8<br />

Quando Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala surgiu, em 1933, foi<br />

saudado como o <strong>mais</strong> vivo, apaixonante e inovador retrato<br />

da formação da socieda<strong>de</strong> brasileira até então. No livro <strong>de</strong><br />

Gilberto Freyre, escrito como um romance épico, povoado<br />

por brancos, negros e índios, pela primeira vez o povo bra‑<br />

sileiro ganhava ingresso pela porta <strong>de</strong> frente da história.<br />

Em 1981, com o incentivo do autor, o livro foi quadri‑<br />

nizado, com <strong>de</strong>senhos em preto e branco <strong>de</strong> Ivan Wasth<br />

Rodrigues. Gilberto Freyre gostou, classificando o trabalho<br />

“<strong>de</strong> regalo para os olhos e para a inteligência da criança<br />

brasileira” e também “do adolescente e do adulto”. A<br />

adaptação – po<strong>de</strong>ríamos dizer até o roteiro, pois os quadri‑<br />

nhos têm alguma coisa <strong>de</strong> cinematográfico – foi elaborada<br />

pelo professor Estevão Pinto, capaz <strong>de</strong> extrair da obra o<br />

essencial, numa operação tão complicada como é a trans‑<br />

posição <strong>de</strong> um gênero artístico para outro.<br />

Em 2000, nas comemorações do centenário <strong>de</strong> nasci‑<br />

mento <strong>de</strong> Gilberto Freyre, os <strong>de</strong>senhos <strong>de</strong> Rodrigues foram<br />

colorizados por Noguchi, ganhando um extraordinário re‑<br />

levo e dando à obra sua face <strong>de</strong>finitiva. Tinha tudo para<br />

agradar as crianças <strong>de</strong> todas as ida<strong>de</strong>s.<br />

Pois a história em quadrinhos, como reconheceu Freyre,<br />

conta com uma freguesia bem <strong>mais</strong> ampla do que o público<br />

infantil, uma legião <strong>de</strong> leitores fiéis, adolescentes e adultos,<br />

capazes <strong>de</strong> se <strong>de</strong>liciar com Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala quadrini‑<br />

zada, mas também <strong>de</strong> se interessar pela obra original. Essa<br />

é uma das vantagens do quadrinho, sobretudo quando ela‑<br />

borado com arte. Incapaz <strong>de</strong> sintetizar a complexida<strong>de</strong> e a<br />

riqueza <strong>de</strong> pontos <strong>de</strong> vista <strong>de</strong> uma obra como Casa ‑gran<strong>de</strong><br />

& senzala, ele atua como ponte entre os dois gêneros, ma‑<br />

ravilhando o leitor <strong>de</strong> quadrinhos e ao mesmo tempo<br />

aguçando ‑lhe o <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> conhecer a obra matriz. E para<br />

quem já leu a obra, ajuda a recordar e visualizar aspectos e<br />

até <strong>de</strong>spertá ‑lo para as sugestões plásticas do original.<br />

G i l b e r t o F r e y r e<br />

131


CHINA TROPICAL<br />

2 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1587 ‑6<br />

China tropical reúne oito textos do mestre <strong>de</strong> Apipucos<br />

sobre a presença e a influência do Oriente na cultura luso‑<br />

‑brasileira. Tema apaixonante e inesgotável, que inclui ao<br />

mesmo tempo a herança, iniciada às primeiras investidas do<br />

colonizador luso na Ásia e presente <strong>de</strong> muitas formas no<br />

cotidiano do brasileiro, e o <strong>de</strong>safio atualíssimo, envolvendo<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o incremento das relações comerciais do Brasil com a<br />

China, o Japão, a Coreia, a Índia, até a posição política e<br />

diplomática brasileira em relação aos países árabes.<br />

Pioneiro na i<strong>de</strong>ntificação das marcas profundas dos<br />

valores orientais absorvidos pelos portugueses e incorpora‑<br />

dos à nossa cultura, Freyre também anteviu com agu<strong>de</strong>za<br />

o atual estreitamento <strong>de</strong> laços comerciais e econômicos do<br />

Brasil com seus parceiros asiáticos.<br />

Estruturada <strong>de</strong> forma didática, China tropical começa<br />

com um estudo sobre os “Valores asiáticos absorvidos<br />

pelos portugueses”, analisa semelhanças e contrastes entre<br />

“O brasileiro e o europeu” e se esten<strong>de</strong> em longo texto<br />

que po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>finido como uma introdução para se com‑<br />

preen<strong>de</strong>r as relações entre “O Oriente e o Oci<strong>de</strong>nte”, vistas<br />

a partir das influências orientais no Brasil.<br />

Do contato direto <strong>de</strong> Freyre com o continente asiático<br />

são “Viajando pelo Oriente”, trechos do diário escrito<br />

quando <strong>de</strong> sua viagem à Índia, e “Falando a orientais”. A<br />

preocupação <strong>mais</strong> acentuada com as relações futuras entre<br />

Brasil e Oriente são expostas em “O pan ‑asiatismo” e “Arte<br />

e civilização mo<strong>de</strong>rna nos trópicos: a contribuição portu‑<br />

guesa e a responsabilida<strong>de</strong> brasileira”. O último capítulo<br />

procura respon<strong>de</strong>r à instigante questão “Por que China<br />

tropical?”, analisa esse conceito, concluindo já ser o Brasil,<br />

<strong>mais</strong> do que uma China tropical, um “lí<strong>de</strong>r em potencial <strong>de</strong><br />

um dos sistemas <strong>de</strong> civilização <strong>mais</strong> significativos do mundo<br />

mo<strong>de</strong>rno”.<br />

132<br />

G i l b e r t o F r e y r e<br />

DE MENINO A HOMEM<br />

DE MAIS DE TRINTA<br />

E DE QUARENTA,<br />

DE SESSENTA E MAIS ANOS<br />

1 a edição – 224 páginas<br />

1 encarte colorido (32 páginas)<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1077 ‑2<br />

Quase vinte e cinco <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> sua morte, Gilberto<br />

Freyre continua surpreen<strong>de</strong>ndo os leitores. Surpreen<strong>de</strong>ndo e<br />

seduzindo. De menino a homem, livro autobiográfico iné‑<br />

dito, “diário íntimo seguido <strong>de</strong> recordações pessoais em tom<br />

confi<strong>de</strong>ncial semelhante ao <strong>de</strong> diários”, <strong>de</strong>svenda um Gil‑<br />

berto Freyre intrigante e instigante, muito parecido consigo<br />

mesmo, mas ao mesmo tempo bastante diferente. É o<br />

homem amadurecido, que a cada dia vê se aproximar o en‑<br />

contro inevitável com a “in<strong>de</strong>sejada das gentes”, que se<br />

volta para <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> si mesmo, em busca da vida misteriosa<br />

que passou e não volta <strong>mais</strong>. Esse mergulho proustiano nos<br />

labirintos do tempo continua, <strong>de</strong> certa forma, nas recorda‑<br />

ções e indagações formuladas em Tempo morto e outros<br />

tempos. Continua, aprofunda e lança novas luzes sobre as<br />

memórias e o memorialista, menos impressionista e <strong>mais</strong><br />

reflexivo, marca espiritual daqueles que estão prestes a co‑<br />

nhecer o outro lado do mistério<br />

Concebido e realizado na velhice, após os oitenta <strong>anos</strong>,<br />

o diário revela “um Gilberto místico, <strong>mais</strong> do que religioso<br />

sem, contudo, <strong>de</strong>sprezar os arroubos evangélicos <strong>de</strong> uma<br />

adolescência teológica, a <strong>de</strong>screver conversas com Deus,<br />

conversas líricas, amistosas, sem tratamentos solenes, um<br />

Deus próximo, a ouvi ‑lo e a dialogar com um quê <strong>de</strong> sem‑<br />

‑cerimônias”, como observa Fátima Quintas no prefácio.<br />

Marcadas pelo misticismo e a sensualida<strong>de</strong> (Freyre se auto‑<br />

<strong>de</strong>finiu em certa ocasião como “francamente paradoxal”),<br />

essas anotações revelam ao leitor uma nova visão gilbertiana<br />

do passado e <strong>de</strong> seus fantasmas persistentes, dos quais por<br />

certo não po<strong>de</strong>ria libertar ‑se, pois estavam incorporados à<br />

sua própria alma. De menino a homem mostra que, mesmo<br />

na velhice, Freyre não per<strong>de</strong>u a perplexida<strong>de</strong> diante da vida.<br />

Que é uma forma <strong>de</strong> poesia e <strong>de</strong> eterna juventu<strong>de</strong>.<br />

G i l b e r t o F r e y r e


GUIA PRÁTICO,<br />

HISTÓRICO E<br />

SENTIMENTAL DA<br />

CIDADE DO RECIFE<br />

5 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1067 ‑3<br />

Para começo <strong>de</strong> conversa o leitor <strong>de</strong>ve reparar o título<br />

do livro <strong>de</strong> Gilberto Freyre: Guia prático, histórico e senti‑<br />

mental da cida<strong>de</strong> do Recife. O pernambucano nunca diz<br />

Recife, como se fala no sul, mas o Recife. O artigo é indis‑<br />

pensável, parece incorporado ao nome da cida<strong>de</strong> e se as‑<br />

semelha àquelas partículas <strong>de</strong> nobreza que os europeus até<br />

o século XIX (e alguns até hoje) faziam questão <strong>de</strong> usar.<br />

Segundo ponto: sem o menor constrangimento, o<br />

autor proclama que o seu amor pela cida<strong>de</strong> vai até o senti‑<br />

mentalismo. Excelente sinal, sobretudo quando ele serve<br />

para mostrar que nem tudo é paisagem e que, por trás dos<br />

velhos prédios, das pontes seculares, das belas praias recifen‑<br />

ses, existe uma vida singular e palpitante, um povo caloroso,<br />

tradições e uma história (e muitas estórias) contada <strong>de</strong> forma<br />

encantadora por Gilberto Freyre. A aproximação sentimental<br />

do viajante com a cida<strong>de</strong> e sua conquista é facilitada pelo<br />

guia <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua abertura antológica, intitulada “O caráter da<br />

cida<strong>de</strong>”, na qual Freyre compara o Rio <strong>de</strong> Janeiro e a Bahia,<br />

que seduzem o visitante à primeira vista, com a quase discri‑<br />

ção do Recife, cida<strong>de</strong> caprichosa, um tanto feminina, que<br />

resiste a se entregar <strong>de</strong> imediato e cujo “melhor encanto<br />

consiste mesmo em <strong>de</strong>ixar ‑se conquistar aos poucos”. Um<br />

ponto a frisar na presente edição é que o termo prático do<br />

título continua válido. Des<strong>de</strong> o lançamento <strong>de</strong>ste guia, em<br />

1934, a cida<strong>de</strong> se mo<strong>de</strong>rnizou, incorporou novos aspectos,<br />

os en<strong>de</strong>reços <strong>de</strong> agências e empresas mudaram, foram fixa‑<br />

dos novos horários nas linhas <strong>de</strong> ônibus e <strong>de</strong> aviões, restau‑<br />

rantes surgiram. Pois bem, todos esses dados foram<br />

apurados e registrados com rigor. Como a cida<strong>de</strong>, o guia<br />

mudou, para continuar o mesmo.<br />

G i l b e r t o F r e y r e<br />

INSURGÊNCIAS E<br />

RESSURGÊNCIAS<br />

ATUAIS<br />

CRUZAMENTOS DE SINS E NÃOS<br />

NUM MUNDO EM TRANSIÇÃO<br />

2 a edição revista – 368 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1072 ‑7<br />

Com incansável curiosida<strong>de</strong> intelectual e permanente<br />

inquietação pelos <strong>de</strong>stinos do mundo, Gilberto Freyre tam‑<br />

bém se entregou a exercícios <strong>de</strong> futurologia, termo muito<br />

usado na década <strong>de</strong> 1980. Hoje, prefere ‑se usar futurível, que<br />

apresenta um sentido menos rígido. Seja como for, Insurgên‑<br />

cias e ressurgências atuais: cruzamentos <strong>de</strong> sins e nãos num<br />

mundo em transição, lançado em 1983, trata <strong>de</strong> um futuro<br />

possível, a partir das heranças do passado e da realida<strong>de</strong> da<br />

época, o que o autor chamava <strong>de</strong> tempo tríbio.<br />

Polêmico, discutível, gilbertiano, no pleno sentido da<br />

palavra, o livro se elabora em muitos pl<strong>anos</strong> e perspectivas<br />

que, como sempre em sua obra, vão além do que promete<br />

o título, como comprovam as reflexões sobre temas <strong>de</strong> per‑<br />

manente interesse do escritor: raça, religião, a cara e o co‑<br />

ração do Brasil, entre outros.<br />

Desconfiado da filosofia que exalta <strong>de</strong>senvolvimento<br />

e mo<strong>de</strong>rnização quase como sinônimos, Freyre prefere ver<br />

o mundo <strong>de</strong> então como uma época <strong>de</strong> insurgências e res‑<br />

surgências. Ressurgências que contrariam a filosofia da<br />

globalização política, através da imposição <strong>de</strong> um centro<br />

“dominador absoluto <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões”, pretendido por euro‑<br />

peus e norte ‑americ<strong>anos</strong>. Como esperança <strong>de</strong> equilíbrio do<br />

mundo, brotam em todas as partes do planeta as insurgên‑<br />

cias contra esse domínio: o reflorescimento <strong>de</strong> velhas cul‑<br />

turas, <strong>de</strong>monizadas pelo Oci<strong>de</strong>nte e apontadas como ameaças<br />

externas, como o islamismo, a ascensão mundial do po<strong>de</strong>r<br />

chinês, a antevisão do Brasil como uma espécie <strong>de</strong> prefigu‑<br />

ração da humanida<strong>de</strong> do futuro.<br />

Em vários pontos, as projeções <strong>de</strong> Gilberto Freyre já se<br />

realizam. Veja ‑se o conflito do Iraque, um episódio da globa‑<br />

lização que o Oci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong>seja impor ao mundo em choque<br />

com as insurgências daquelas culturas milenares. Muitos ou‑<br />

tros aspectos apontados pelo sociólogo também se esboçam<br />

como realida<strong>de</strong> futura. O tempo dirá se sim ou se não.<br />

G i l b e r t o F r e y r e<br />

133


MODOS DE HOMEM &<br />

MODAS DE MULHER<br />

2 a edição – 336 páginas<br />

1 encarte colorido (16 páginas)<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1336 ‑0<br />

Há muitas maneiras <strong>de</strong> se ver a vida. Um modo origi‑<br />

nal é através dos modos <strong>de</strong> homem e modas <strong>de</strong> mulher.<br />

Difícil? Po<strong>de</strong> ser. Fácil, quando abordado pela graça e eru‑<br />

dição <strong>de</strong> Gilberto Freyre que, como sempre que trata <strong>de</strong> um<br />

assunto, supera em muito o tema proposto.<br />

Apesar da advertência do autor <strong>de</strong> que tais modos e<br />

modas – por vezes não exclusivos <strong>de</strong> um sexo, mas ambí‑<br />

guos, bivalentes ou mistos – são consi<strong>de</strong>rados “sob pers‑<br />

pectiva <strong>mais</strong> sociológica que em puros sentidos literários”,<br />

o livro é percorrido com a sofreguidão e o prazer com que<br />

se lê um romance. Um romance dos bons.<br />

Definidos os característicos do que sejam modos <strong>de</strong><br />

homem e modas <strong>de</strong> mulher, i<strong>de</strong>ntificados seus símbolos e<br />

imagens, confrontados e pon<strong>de</strong>rados, Freyre oferece ao leitor<br />

um autêntico corte na socieda<strong>de</strong> brasileira, da época <strong>de</strong> ioiôs<br />

e iaiás às últimas décadas do século XX, através do levanta‑<br />

mento e da reflexão sobre temas que vão do significado da<br />

dissidência em moda, do repúdio aos excessos artificiais<br />

<strong>de</strong> moda, do conflito entre dionisíaco e apolíneo na moda e<br />

<strong>de</strong> uma nova concepção <strong>de</strong> feminilida<strong>de</strong>, a indagações curio‑<br />

sas, como “é moda falar errado?”, “a mulher brasileira, inven‑<br />

tora <strong>de</strong> modas?” ou “mulher ornamental?”.<br />

Freyre mostra como o traje doméstico, ou <strong>de</strong> trabalho,<br />

<strong>de</strong>svenda a psicologia da mulher brasileira e ajuda a refletir<br />

sobre sua posição na socieda<strong>de</strong>, em momentos históricos di‑<br />

versos. O equivalente po<strong>de</strong> ‑se dizer dos modos <strong>de</strong> homem.<br />

Uma inquietação permanente do autor presente nesta<br />

obra é o problema da miscigenação, com a consagração da<br />

morenida<strong>de</strong> e a fixação na socieda<strong>de</strong> brasileira <strong>de</strong> uma<br />

consciência metarracial, ou seja, além das raças, possível<br />

fator <strong>de</strong> influência nos modos <strong>de</strong> homem, nas modas <strong>de</strong><br />

mulher e, em sentido <strong>mais</strong> amplo, na originalida<strong>de</strong> da<br />

moda brasileira.<br />

134<br />

G i l b e r t o F r e y r e<br />

NORDESTE<br />

7 a edição revista – 256 páginas<br />

1 encarte colorido (16 páginas)<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0837 ‑4<br />

Muito diferente da imagem que a maior parte dos<br />

brasileiros tem da região, o Nor<strong>de</strong>ste, <strong>de</strong> Gilberto Freyre, é<br />

uma terra <strong>de</strong> fartura, <strong>de</strong> águas abundantes, “on<strong>de</strong> nunca<br />

<strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> haver/ uma mancha dágua:/ um avanço <strong>de</strong> mar,<br />

um rio, um riacho,/ o esver<strong>de</strong>ado <strong>de</strong> uma lagoa”, como no<br />

poema <strong>de</strong> Carlos Pena Filho. Classificado pelo autor como<br />

“tentativa <strong>de</strong> ensaio ecológico”, o livro retrata aquela re‑<br />

gião agrária do Nor<strong>de</strong>ste que, segundo Freyre, “foi, por<br />

algum tempo, o centro da civilização brasileira”. O outro<br />

Nor<strong>de</strong>ste, <strong>mais</strong> conhecido pelos brasileiros, foi estudado<br />

por outro escritor, Djacir Menezes.<br />

O Nor<strong>de</strong>ste <strong>de</strong> Gilberto Freyre é o da região da mono‑<br />

cultura da cana, sustentada pelo braço escravo, dos gran‑<br />

<strong>de</strong>s senhores <strong>de</strong> engenho, patriarcais, <strong>de</strong> voz áspera, cujos<br />

gritos faziam tremer crianças e mulheres, mandões, ligados<br />

à terra, aos bichos, à vegetação, “o tipo <strong>mais</strong> puro <strong>de</strong> aris‑<br />

tocrata brasileiro”. Uma aristocracia quase feudal, <strong>de</strong> hábi‑<br />

tos requintados, que sabia recepcionar, lia livros e revistas,<br />

cultivava a música em pi<strong>anos</strong>. Cada proprieda<strong>de</strong> era um<br />

mundo à parte, autossuficiente, dirigido pelo pater fami‑<br />

lias, como um pequeno império.<br />

Ali, mo<strong>de</strong>lada pela cana ‑<strong>de</strong> ‑açúcar, surgiu uma civiliza‑<br />

ção original, hábitos muito peculiares, uma cozinha riquís‑<br />

sima em doces e comidas açucaradas, que levavam ao <strong>de</strong>lírio<br />

as sinhás e os meninos, luxo nos trajes, excesso <strong>de</strong> joias nas<br />

mulheres, uma ativida<strong>de</strong> sexual <strong>de</strong>sregrada, que os moleco‑<br />

tes exibiam, escandalizando os moralistas. Quando <strong>de</strong> sua<br />

publicação, Nor<strong>de</strong>ste foi consi<strong>de</strong>rado uma novida<strong>de</strong> na obra<br />

<strong>de</strong> Gilberto Freyre, um livro eminentemente geográfico, <strong>mais</strong><br />

simples e <strong>de</strong>spojado do que as obras anteriores. O estilo, <strong>de</strong><br />

“sabor sensual, <strong>de</strong>nso, oloroso” (Manuel Ban<strong>de</strong>ira), continuava<br />

o mesmo, assim como a arte <strong>de</strong> narrar do autor, com alguma<br />

coisa <strong>de</strong> romancista.<br />

G i l b e r t o F r e y r e


NOVO MUNDO NOS<br />

TRÓPICOS<br />

3 a edição revista – 376 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1538 ‑8<br />

Novo mundo nos trópicos começou a se estruturar<br />

quando Gilberto Freyre foi convidado a proferir uma série<br />

<strong>de</strong> palestras sobre o Brasil na Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Indiana. O<br />

interesse foi contagiante. A graça e malícia <strong>de</strong> sua exposi‑<br />

ção – amenizadas para não chocar o público norte‑<br />

‑americano –, o profundo conhecimento da realida<strong>de</strong><br />

brasileira agradaram a plateia, formada por intelectuais,<br />

estudantes, professores universitários. As seis conferências<br />

foram reunidas em volume, com o título <strong>de</strong> Brazil: an Inter‑<br />

pretation. Alguns <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, o livro foi reeditado pelo<br />

editor nova ‑iorquino Alfred Knopf, com o título <strong>de</strong> New<br />

World in the Tropics: the Culture of Mo<strong>de</strong>rn Brazil.<br />

Era praticamente uma obra nova, com uma introdu‑<br />

ção do autor e o acréscimo <strong>de</strong> quatro capítulos. Neles,<br />

Freyre abordava temas polêmicos, muito <strong>de</strong> seu agrado,<br />

como a sugestão <strong>de</strong> ter sido a escravidão no Brasil <strong>mais</strong> leve<br />

do que em outros países, ou apresentar o Brasil como uma<br />

“civilização europeia nos trópicos”, ressaltando o fato <strong>de</strong> o<br />

português ter sido <strong>mais</strong> apto para as tarefas <strong>de</strong> colonização<br />

do que os <strong>de</strong><strong>mais</strong> europeus.<br />

A obra foi apresentada ao público brasileiro em duas<br />

etapas, a primeira com a tradução das seis conferências, in‑<br />

titulada Interpretação do Brasil, e a segunda acrescida dos<br />

novos capítulos e com um prefácio escrito diretamente para<br />

esta edição, com o título <strong>de</strong> Novo mundo nos trópicos.<br />

De certa forma, a obra vinha complementar alguns<br />

pontos <strong>de</strong> vista estudados em livros anteriores do autor,<br />

frisando em particular a originalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma civilização<br />

tropical, capaz <strong>de</strong> se autointerpretar <strong>de</strong> maneira revolucio‑<br />

nária, com padrões diversos dos consagrados pela cultura<br />

europeia. Era um ponto <strong>de</strong> vista provocativo, como tudo<br />

escrito por Freyre, ainda hoje sujeito a <strong>de</strong>bates.<br />

G i l b e r t o F r e y r e<br />

O ESCRAVO NOS<br />

ANÚNCIOS DE JORNAIS<br />

BRASILEIROS DO<br />

SÉCULO xIx<br />

4 a edição revista – 248 páginas<br />

1 encarte preto e branco (8 páginas)<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0134 ‑3<br />

Pioneiro em tantos aspectos da cultura brasileira, Gil‑<br />

berto Freyre foi o primeiro a recorrer a anúncios <strong>de</strong> jornais<br />

para capturar e compreen<strong>de</strong>r a realida<strong>de</strong> social da época.<br />

Nesta obra, através dos anúncios <strong>de</strong> jornais, o sociólogo<br />

pernambucano propõe uma interpretação antropológica “<strong>de</strong><br />

característicos <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong> <strong>de</strong>formações <strong>de</strong> corpo<br />

<strong>de</strong> negros ou mestiços, fugidos ou expostos à venda, como<br />

escravos no Brasil do século passado”. Compreenda ‑se: do<br />

século XIX, pois a primeira edição do livro é <strong>de</strong> 1963.<br />

Documentos vivos da época, os anúncios confirmam<br />

a varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> procedência dos negros importados da<br />

África, registram característicos <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m etnográfica e <strong>de</strong><br />

natureza cultural (marcas <strong>de</strong> nação, penteados, barbas,<br />

xales, turbantes, tangas, vestidos) e apontam o que o autor<br />

classifica <strong>de</strong> “característicos constitucionais”: os introverti‑<br />

dos, os calados, <strong>de</strong> rosto fechado, os extrovertidos, <strong>de</strong> as‑<br />

pecto alegre, os angulosos, os arredondados, além dos<br />

eugênicos e dos cacogênicos.<br />

Freyre observa que a língua dos anúncios da época,<br />

exata, minuciosa, por vezes brutal, tem uma expressão na‑<br />

cional superior à “<strong>de</strong> toda literatura do mesmo período, in‑<br />

cluindo o romance com as suas moreninhas e as suas iaiás já<br />

meio <strong>de</strong>saportuguesadas”. Tais anúncios <strong>de</strong>scerram <strong>de</strong>talhes<br />

ignorados pelos estudiosos, que a pinça do pesquisador não<br />

<strong>de</strong>ixa escapar: <strong>de</strong>formações profissionais <strong>de</strong> escravos; negros<br />

e mestiços criados em casa, assumindo característicos sociais<br />

<strong>de</strong> iaiás e ioiôs, como mãos e pés pequenos, sem calosida<strong>de</strong>s<br />

ou <strong>de</strong>formações; escravos quase brancos, como a escrava<br />

Isaura da ficção <strong>de</strong> Bernardo Guimarães, muitos <strong>de</strong>les prová‑<br />

veis filhos dos senhores, mesmo assim postos à venda ou<br />

perseguidos em sua fuga <strong>de</strong> casa; um mundo palpitante <strong>de</strong><br />

ressentimentos, conflitos, que constitui, tanto quanto um<br />

<strong>de</strong>poimento antropológico, um romance vivo da época.<br />

G i l b e r t o F r e y r e<br />

135


OLINDA<br />

2 O GUIA PRÁTICO, HISTÓRICO<br />

E SENTIMENTAL DE CIDADE<br />

BRASILEIRA<br />

8 a edição revista e atualizada – 224 páginas<br />

1 mapa turístico colorido<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1073 ‑4<br />

Feliz a cida<strong>de</strong> que po<strong>de</strong> oferecer ao viajante ou estu‑<br />

dioso um guia como este <strong>de</strong>dicado a Olinda por Gilberto<br />

Freyre. O subtítulo esclarece que se trata <strong>de</strong> um “2 o guia<br />

prático, histórico e sentimental <strong>de</strong> cida<strong>de</strong> brasileira” (o pri‑<br />

meiro foi <strong>de</strong>dicado a Recife), mas na verda<strong>de</strong> é muito <strong>mais</strong><br />

do que isso, um pequeno curso sobre a história, a vida, os<br />

hábitos e as tradições da velha cida<strong>de</strong> pernambucana.<br />

Didático pela distribuição e abrangência dos temas, como<br />

qualquer guia que se preza, seu texto é um exemplo <strong>de</strong> anti‑<br />

didatismo, termo empregado aqui como sinônimo <strong>de</strong> clareza,<br />

graça e liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> expressão, sem nada <strong>de</strong> professoral.<br />

Com aquela reverência e aquela malícia que nascem<br />

do amor, e alguns toques <strong>de</strong> sentimentalismo, Gilberto<br />

Freyre fala dos velhos sobrados, tão característicos da ci‑<br />

da<strong>de</strong>, com seus muxarabis, suas reminiscências da vida<br />

patriarcal, alguns tão penetrados “<strong>de</strong> influências mouras<br />

ou mouriscas”, <strong>de</strong>sperta a atenção para a alma encanta‑<br />

dora das ruas em la<strong>de</strong>ira, para a paisagem formada por<br />

velhas igrejas, coqueiros e cajueiros, praias <strong>de</strong> ver<strong>de</strong>s mares<br />

bravios <strong>de</strong> on<strong>de</strong> partem as jangadas rumo ao mar alto.<br />

Ao retrato da terra se junta a ativida<strong>de</strong> do homem e a<br />

formação histórica da cida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> aquele dia em que o<br />

donatário da capitania, vendo a bela paisagem, exclamou:<br />

“Oh! linda!”. Com tal nome, claro que a cida<strong>de</strong> teria <strong>de</strong> ser<br />

privilegiada e reverenciada na literatura e nas artes plásticas,<br />

como informa o autor. Histórico e sentimental, o guia é<br />

antes <strong>de</strong> tudo prático. Ensina o leitor a se locomover na ci‑<br />

da<strong>de</strong>, a saber admirá ‑la e a <strong>de</strong>scobrir sua originalida<strong>de</strong>. E<br />

<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> tanta consulta às suas páginas e <strong>de</strong> tanto andar,<br />

ao chegar aos altos da cida<strong>de</strong> e olhar em redor, o visitante<br />

por força há <strong>de</strong> concordar com o autor que em Olinda “tudo<br />

se irmana franciscanamente para completar” a “paisagem<br />

ao mesmo tempo cristã e brasileira”. E inesquecível.<br />

136<br />

G i l b e r t o F r e y r e<br />

ORDEM E PROGRESSO<br />

6 a edição revista – 1120 páginas<br />

1 encarte colorido (24 páginas)<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0836 ‑6<br />

Quase meio século <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> sua publicação, Or<strong>de</strong>m<br />

e progresso se mantém mo<strong>de</strong>rna e provocativa como na<br />

época <strong>de</strong> seu lançamento. Durante esse longo período, a<br />

obra <strong>de</strong> Gilberto Freyre foi discutida, atacada, louvada, sem<br />

que per<strong>de</strong>sse uma lasca <strong>de</strong> sua importância, espécie <strong>de</strong><br />

montanha pétrea na planície dos estudos brasileiros. Pelo<br />

contrário, ganhou o reconhecimento universal como docu‑<br />

mento indispensável ao conhecimento do Brasil – os vários<br />

Brasis que convivem no espaço e no tempo – e sua forma‑<br />

ção. Po<strong>de</strong>ndo ser analisada e avaliada como obra in<strong>de</strong>pen‑<br />

<strong>de</strong>nte, Or<strong>de</strong>m e progresso ganha em ser consi<strong>de</strong>rada,<br />

<strong>de</strong>ntro do projeto do autor, uma fase da história da socie‑<br />

da<strong>de</strong> patriarcal brasileira, aquela <strong>de</strong> <strong>de</strong>sintegração do pa‑<br />

triarcalismo, sob o regime <strong>de</strong> trabalho livre.<br />

Obra pioneira como interpretação, Or<strong>de</strong>m e progresso<br />

introduz uma novida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pesquisa nos estudos <strong>de</strong> Sociolo‑<br />

gia e Antropologia, a utilização <strong>de</strong> entrevistas padronizadas,<br />

dirigidas a pessoas que viveram a fase histórica estudada.<br />

Mais sintética do que analítica, segundo o próprio<br />

Freyre, Or<strong>de</strong>m e progresso abrange o período histórico <strong>de</strong><br />

transição da Monarquia para a República, que se esten<strong>de</strong><br />

da assinatura da Lei do Ventre Livre (1871), quando as pres‑<br />

sões para a abolição da escravatura começam a se tornar<br />

irresistíveis, à eclosão da Primeira Guerra Mundial (1914),<br />

época <strong>de</strong> <strong>de</strong>cadência da economia cafeeira e <strong>de</strong> acelera‑<br />

mento do processo <strong>de</strong> industrialização. Fase <strong>de</strong> influência<br />

do pensamento positivista, cujo lema seria incorporado à<br />

ban<strong>de</strong>ira brasileira e serviria <strong>de</strong> título à obra <strong>de</strong> Freyre.<br />

“Mais do que um lema <strong>de</strong> uma corrente político ‑filosófica<br />

particular, o Or<strong>de</strong>m e progresso é uma mística do patro‑<br />

nato político, uma constante nacional”, observa Nicolau<br />

Sevcenko no prefácio a esta nova edição. O Brasil abre ‑se,<br />

então, em <strong>de</strong>finitivo, para o mundo e a mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>.<br />

G i l b e r t o F r e y r e


PERFIL DE EUCLIDES E<br />

OUTROS PERFIS<br />

3 a edição revista – 288 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1562 ‑3<br />

Quando se fala <strong>de</strong> Gilberto Freyre, muita gente se lembra<br />

apenas do revolucionário intérprete do Brasil, o mestre da his‑<br />

tória social. O homem <strong>de</strong> Apipucos foi <strong>mais</strong> do que isso. Ver‑<br />

sátil, com sensibilida<strong>de</strong> literária extrema, ele foi romancista,<br />

poeta e um ensaísta sem paralelo nas letras brasileiras, sa‑<br />

bendo dosar numa mistura muito especial e saborosa sociolo‑<br />

gia, história, antropologia e psicologia, como se po<strong>de</strong> cons tatar<br />

neste fascinante Perfil <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s e outros perfis.<br />

O livro reúne doze ensaios escritos com simpatia e<br />

uma aguda curiosida<strong>de</strong>, quase bisbilhotice, em penetrar na<br />

vida e na alma da figura estudada. Essa sem ‑cerimônia é<br />

responsável por alguns dos trechos <strong>mais</strong> felizes da obra,<br />

como a evocação do jovem Pedro II, que po<strong>de</strong>ria muito<br />

bem figurar na “História do menino no Brasil”, livro que<br />

Gilberto planejou e não realizou.<br />

Sem exagero, po<strong>de</strong> ‑se afirmar que cada perfil indivi‑<br />

dual traça também um perfil das diversas realida<strong>de</strong>s do<br />

Brasil, em épocas distintas. São figuras como Eucli<strong>de</strong>s da<br />

Cunha, genial “revelador da realida<strong>de</strong> brasileira”; Oliveira<br />

Lima, classificado pitorescamente <strong>de</strong> “Quixote gordo”; Au‑<br />

gusto dos Anjos, com sua morbi<strong>de</strong>z; o gran<strong>de</strong> poeta Ma‑<br />

nuel Ban<strong>de</strong>ira, apresentado em três tempos, num intervalo<br />

<strong>de</strong> cinquenta <strong>anos</strong> entre o primeiro e o último ensaio.<br />

As <strong>de</strong><strong>mais</strong> personalida<strong>de</strong>s estudadas são Félix Caval‑<br />

canti, parente <strong>de</strong> Gilberto, um pernambucano típico do sé‑<br />

culo XIX; o filósofo Farias Brito, “mestre sem discípulos”; o<br />

esquecido e admirável poeta Felipe d’Oliveira; Estácio Coim‑<br />

bra, político <strong>de</strong> relevo, governador <strong>de</strong> Pernambuco; o senhor<br />

<strong>de</strong> engenho Júlio Bello, “agricultor sentimental”; o antropó‑<br />

logo Nina Rodrigues; e o poeta e humanista Odilon Nestor.<br />

Quem <strong>de</strong>gustar esses perfis por certo vai concordar<br />

com Antonio Carlos Villaça, que confessava ter pelo livro o<br />

“maior xodó”.<br />

G i l b e r t o F r e y r e<br />

SOBRADOS E<br />

MUCAMBOS<br />

16 a edição comemorativa 70 <strong>anos</strong> – 976 páginas<br />

2 encartes coloridos (32 páginas)<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1175 ‑8<br />

Em Sobrados e mucambos, Gilberto Freyre analisa a<br />

<strong>de</strong>cadência do patriarcado rural e o <strong>de</strong>senvolvimento do<br />

urbano, no período compreendido entre o fim do século<br />

XVIII e a primeira meta<strong>de</strong> do XIX.<br />

Como Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala, a obra estuda o pas‑<br />

sado do povo brasileiro “através <strong>de</strong> seus estilos <strong>de</strong> residên‑<br />

cia e a sua influência sobre a vida e o caráter do mesmo<br />

povo”, pois casa, no Brasil, é também, “como Gilberto<br />

Freyre <strong>de</strong>monstra em sua obra, escola, igreja, banco, par‑<br />

tido político, hospital, casa comercial, hospício, local <strong>de</strong><br />

diversão, parlamento, restaurante, e o que <strong>mais</strong> se queira”,<br />

segundo a observação <strong>de</strong> Roberto DaMatta.<br />

Por certo também teatro, no sentido usado por Cal<strong>de</strong>‑<br />

rón <strong>de</strong> la Barca – o gran<strong>de</strong> teatro do mundo –, com os seus<br />

conflitos familiares, as práticas sexuais, o relacionamento<br />

<strong>de</strong> senhores e escravos, os raptos <strong>de</strong> iaiás, vaida<strong>de</strong>s e orgu‑<br />

lhos <strong>de</strong> famílias, muitas <strong>de</strong>las gabando ‑se <strong>de</strong> uma discutível<br />

pureza racial. Cenário i<strong>de</strong>al para a afirmação social do ba‑<br />

charel e do mulato, uma das características <strong>mais</strong> marcantes<br />

do período, <strong>de</strong> acelerada transformação social, em con‑<br />

traste com a época estudada em Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala,<br />

segundo Freyre “uma quase maravilha <strong>de</strong> acomodação”. A<br />

obra repete as mesmas <strong>de</strong>liciosas ousadias <strong>de</strong> estilo <strong>de</strong><br />

Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala e utiliza os mesmos recursos <strong>de</strong> se<br />

documentar em fontes até então menosprezadas pelos es‑<br />

tudiosos (velhos ca<strong>de</strong>rnos <strong>de</strong> anotações, livros <strong>de</strong> culinária,<br />

anúncios <strong>de</strong> jornais). A versão <strong>de</strong>finitiva <strong>de</strong> Sobrados e mu‑<br />

cambos, como a conhecemos, foi composta em duas eta‑<br />

pas: o texto da primeira edição, lançada em 19<strong>39</strong>, e os<br />

“acréscimos substanciais” e cinco capítulos novos incorpo‑<br />

rados à edição <strong>de</strong> 1951. A presente edição, em bela apre‑<br />

sentação gráfica, ilustrada em cores, vem enriquecida com<br />

um excelente prefácio <strong>de</strong> Roberto DaMatta.<br />

G i l b e r t o F r e y r e<br />

137


TALVEZ POESIA<br />

Prelo<br />

Gilberto Freyre consi<strong>de</strong>rava ‑se um “aprendiz <strong>de</strong><br />

poeta”, o que explica o mo<strong>de</strong>sto título <strong>de</strong> seu livro, Talvez<br />

poesia, mas que, ao mesmo tempo, permite ao autor “li‑<br />

cenças ousadamente antipoéticas”. A obra reúne poemas<br />

escritos ao longo <strong>de</strong> muitos <strong>anos</strong> e “erupções” poéticas, ou<br />

seja, trechos extraídos <strong>de</strong> sua produção em prosa e reduzi‑<br />

dos à forma poemática, tarefa <strong>de</strong>sempenhada pelo autor e<br />

seus amigos, os poetas Mauro Mota e Lêdo Ivo.<br />

O que revela o poeta? Antes <strong>de</strong> tudo, assim como sua<br />

obra <strong>de</strong> sociólogo e antropólogo, mostra‑se apaixonado<br />

pelo Brasil e eterno curioso, não raras vezes saudosista <strong>de</strong><br />

aspectos físicos e imateriais da vida brasileira. Nesse caso,<br />

revela ‑se um persistente observador do cenário <strong>de</strong> ruas,<br />

campos e rios, como po<strong>de</strong>mos comprovar em “Velhas ja‑<br />

nelas do Recife e <strong>de</strong> Olinda”: “Nas ruas napolitanas/ do<br />

bairro <strong>de</strong> São José/ com as roupas a secar/ ainda se encon‑<br />

tram antigas/ janelas quadriculadas/ os xadrezes dos posti‑<br />

gos/ que outrora amouriscavam/ todo o Recife”.<br />

O sonhador se revela em poemas como “O outro Brasil<br />

que vem aí”, no qual, como um profeta, antevê os dias futu‑<br />

ros do país: “Eu ouço as vozes/ eu vejo as cores/ eu sinto os<br />

passos/ <strong>de</strong> outro Brasil que vem aí/ <strong>mais</strong> tropical/ <strong>mais</strong> frater‑<br />

nal/ <strong>mais</strong> brasileiro./ O mapa <strong>de</strong>sse Brasil em vez das cores dos<br />

Estados/ terá as cores das produções e dos trabalhos”.<br />

Poemas nos quais surgem os amarelinhos e as assom‑<br />

brações, tão ao gosto do autor: “Talvez tenha ‑se tornado<br />

alamoa:/ e ruiva como uma alemãzinha/ e apareça nas noites<br />

<strong>de</strong> lua a homens morenos e até pretos,/ assombrando ‑os e<br />

enfeitiçando ‑os/ com a sua nu<strong>de</strong>z <strong>de</strong> branca <strong>de</strong> neve/ mas<br />

<strong>de</strong>smanchando ‑se como sorvete/ quando alguém se aven‑<br />

tura a chegar perto/ do seu nu <strong>de</strong> fantasma/ <strong>de</strong>smanchando‑<br />

‑se como sorvete/ e <strong>de</strong>ixando no ar um frio ou um gelo <strong>de</strong><br />

morte.” Talvez poesia, mas com certeza muito brasileira.<br />

138<br />

Prelo<br />

G i l b e r t o F r e y r e<br />

TEMPO DE APRENDIZ<br />

Prelo<br />

Tempo <strong>de</strong> aprendiz foi publicado quando Gilberto Freyre<br />

já era um mestre. Os <strong>anos</strong> <strong>de</strong> aprendizado estavam longe,<br />

mas foi exatamente essa distância no tempo que valorizou o<br />

imenso material recolhido, fonte riquíssima para se conhecer<br />

e compreen<strong>de</strong>r a formação do escritor pernambucano.<br />

O livro reúne artigos publicados no Diário <strong>de</strong> Pernam‑<br />

buco, entre 1918 e 1926. Neles o jovem Gilberto Freyre esboça<br />

pontos que seriam fundamentais, <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, na sua interpre‑<br />

tação da socieda<strong>de</strong> e da cultura brasileiras, expressos em obras<br />

como Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala e Sobrados e mucambos.<br />

Esses escritos <strong>de</strong> um jovem mal saído da adolescência<br />

revelam extraordinária maturida<strong>de</strong>. Com perspicácia e, por<br />

vezes, certa malícia, Freyre fala <strong>de</strong> si, <strong>de</strong> suas experiências pes‑<br />

soais entre norte ‑americ<strong>anos</strong> (muitos <strong>de</strong>sses artigos foram es‑<br />

critos nos Estados Unidos, on<strong>de</strong> estudava), mas sempre<br />

i<strong>de</strong>ntificado com a realida<strong>de</strong> brasileira. Diziam alguma coisa <strong>de</strong><br />

novo, surpreendiam pelos pontos <strong>de</strong> vista originais, levando<br />

Monteiro Lobato a indagar: “Quem é este Gilberto Freyre?”.<br />

A resposta é fácil: um sujeito a quem nada <strong>de</strong> humano<br />

era estranho. Sagaz e observador, apaixonado pelo pas‑<br />

sado, atento ao mundo convulso do pós ‑guerra e aos<br />

novos rumos que se esboçavam. Escritor acima <strong>de</strong> tudo,<br />

Freyre buscava a expressão literária i<strong>de</strong>al, oscilando entre o<br />

jornalismo puro e a literatura, o que faz <strong>de</strong> muitos <strong>de</strong> seus<br />

artigos pequenos ensaios literários.<br />

Cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, ao se voltar para aquele<br />

tempo e para o jovem que fora um dia, Freyre observa que<br />

procurava então expressar ‑se por meio <strong>de</strong> imagens “cons‑<br />

tituídas por palavras que no sentido lógico juntassem o<br />

mágico, sensual, quase físico (...), a um contorno que pu‑<br />

<strong>de</strong>sse ser visto pelo leitor, som, cor, sabor e até olfato”. Ou<br />

seja, o verbo que fosse carne, i<strong>de</strong>al que se consolidaria em<br />

sua obra <strong>de</strong> maturida<strong>de</strong>.<br />

Prelo<br />

G i l b e r t o F r e y r e


TEMPO MORTO E<br />

OUTROS TEMPOS<br />

TRECHOS DE UM DIÁRIO DE<br />

ADOLESCÊNCIA E PRIMEIRA<br />

MOCIDADE 1915 ­1930<br />

2 a edição revista – 384 páginas<br />

1 encarte colorido (8 páginas)<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1074 ‑3<br />

Tempo morto e outros tempos ocupa um lugar singular<br />

na obra <strong>de</strong> Gilberto Freyre e na própria literatura brasileira. “É<br />

um livro marcante. No gênero nunca se fez coisa sequer se‑<br />

melhante em língua portuguesa”, observa o próprio autor.<br />

Redigido em forma <strong>de</strong> diário, a partir <strong>de</strong> 1915,<br />

quando o escritor tinha quinze <strong>anos</strong>, se esten<strong>de</strong> até 1930,<br />

cobrindo todo o seu período <strong>de</strong> formação intelectual, da<br />

adolescência recifense aos <strong>anos</strong> <strong>de</strong> estudo nos Estados Uni‑<br />

dos e as primeiras viagens à Europa.<br />

Espécie <strong>de</strong> autobiografia juvenil, através do registro <strong>de</strong><br />

reações íntimas, por vezes secretas, experiências munda‑<br />

nas, leituras, encontros com personalida<strong>de</strong>s (algumas <strong>de</strong><br />

influência <strong>de</strong>cisiva no <strong>de</strong>stino do escritor, como Oliveira<br />

Lima), é também, como todo documento memorialístico, o<br />

registro <strong>de</strong> uma época, seus hábitos e inquietações, proble‑<br />

mas e esperanças, refletidos na vida particular do diarista,<br />

intercâmbio entre vida íntima e vida social.<br />

O diário revela também, no adolescente curioso <strong>de</strong><br />

vida, as primeiras inquietações com problemas sobre os<br />

quais, <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, iria refletir <strong>de</strong> forma tão intensa, como o<br />

tempo, em suas várias coor<strong>de</strong>nadas: o tempo cronológico, o<br />

tempo pessoal, o tempo social. Uma surpresa agradável é<br />

verificar que o jovem, que mal se iniciava nas letras, se reve‑<br />

lava um escritor <strong>de</strong> excelentes recursos, com um estilo anun‑<br />

ciador do texto personalíssimo e brasileiríssimo <strong>de</strong><br />

Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala. Enfurnado durante muitos <strong>anos</strong> em<br />

um baú, com uma gran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong>struída pelo cupim, o<br />

texto foi recuperado sem alterações, selecionados os trechos<br />

que o autor, na maturida<strong>de</strong>, julgou <strong>mais</strong> significativo. Diante<br />

disso, o crítico norte ‑americano Stephen Greenblatt classifica<br />

o livro como autoconstrução, documento que permite ob‑<br />

servar um homem maduro revivendo sua juventu<strong>de</strong>, o que<br />

garante a esse tempo morto uma vivíssima atualida<strong>de</strong>.<br />

G i l b e r t o F r e y r e<br />

VIDA SOCIAL NO<br />

BRASIL NOS MEADOS<br />

DO SÉCULO xIx<br />

4 a edição – 160 páginas<br />

1 encarte preto e branco (16 páginas)<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1314 ‑8<br />

Escrita e publicada originalmente em inglês, Vida so‑<br />

cial no Brasil nos meados do século XIX, <strong>de</strong> Gilberto Freyre,<br />

é uma excelente introdução ao conhecimento <strong>de</strong> como<br />

vivia o brasileiro naquela época. Nada <strong>de</strong> pompas históri‑<br />

cas, <strong>de</strong> batalhas e heróis, <strong>de</strong> governadores autoritários ou<br />

conflitos políticos. O que interessa aqui é o cotidiano, os<br />

trajes da época, as relações <strong>de</strong> família, os móveis, os ani‑<br />

<strong>mais</strong> domésticos, os sobrados urb<strong>anos</strong>, as casas ‑gran<strong>de</strong>s –<br />

rurais, em contato íntimo com as senzalas. Ou seja, aquilo<br />

que os irmãos Goncourt batizaram <strong>de</strong> “história íntima” e<br />

sobre a qual especularam que seria “o verda<strong>de</strong>iro romance<br />

que a posterida<strong>de</strong> chamará talvez <strong>de</strong> história humana”.<br />

No caso, uma história íntima que evoca e fixa os tra‑<br />

ços marcantes do homem patriarcal, mandão e intolerante,<br />

da mulher, submissa e astuta, do menino, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cedo uma<br />

pequena cópia do adulto, do escravo, partícipe da vida do‑<br />

méstica, faz ‑tudo, também utilizado como pombo ‑correio<br />

em amores clan<strong>de</strong>stinos <strong>de</strong> sinhás rebel<strong>de</strong>s, da escrava,<br />

tantas vezes tratada como animal <strong>de</strong> prazer do sinhô, go‑<br />

zada e abandonada. Entre senhores e escravos, os burocra‑<br />

tas e alguns pequenos burgueses e pequenos lavradores.<br />

Uma época <strong>de</strong> <strong>de</strong>sprezo pela higiene pública, <strong>de</strong> amor<br />

à tradição, <strong>de</strong> vitória do romantismo nas letras e nas artes,<br />

enchendo <strong>de</strong> sentimentalismo o brasileiro e suavizando o<br />

seu, até então, duro “verbalismo <strong>de</strong> feitio caturramente clas‑<br />

sicista”. A transformação varria a socieda<strong>de</strong>, cujas elites<br />

rurais ainda viviam como se estivessem no fim do século<br />

XVIII, em contraste com intelectuais urb<strong>anos</strong>, a par do pen‑<br />

samento europeu <strong>mais</strong> recente, boa parte <strong>de</strong>les formados<br />

pelas faculda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Direito <strong>de</strong> São Paulo ou do Recife. Em<br />

suma, não apenas um Brasil, mas “vários Brasis, regional‑<br />

mente diversos” que conflitavam e se completavam, for‑<br />

mando um novo Brasil.<br />

G i l b e r t o F r e y r e<br />

1<strong>39</strong>


AS CRIATURAS<br />

DE PROMETEU<br />

GILBERTO FREyRE E A<br />

FORMAÇÃO DA SOCIEDADE<br />

BRASILEIRA<br />

Prêmio Gilberto Freyre 2004/2005<br />

Eli<strong>de</strong> Rugai Bastos<br />

1a edição – 240 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1068 ‑9<br />

Gilberto Freyre continua a <strong>de</strong>safiar e a estimular os es‑<br />

tudiosos. Autor <strong>de</strong> uma obra imensa, voltada para o conhe‑<br />

cimento e a análise apaixonada – e apaixonante – do Brasil,<br />

o mestre <strong>de</strong> Apipucos já foi reverenciado, <strong>de</strong>batido e contes‑<br />

tado em centenas <strong>de</strong> livros e artigos, teses <strong>de</strong> mestrado,<br />

congressos e seminários, em nosso país e no exterior.<br />

Mas ainda há muito a ser investigado e pon<strong>de</strong>rado na<br />

obra <strong>de</strong>sse mo<strong>de</strong>rno Prometeu, sobretudo em sua parte<br />

<strong>mais</strong> substancial, como atesta o livro <strong>de</strong> Eli<strong>de</strong> Rugai Bastos,<br />

vencedor do 1 o Concurso Nacional <strong>de</strong> Ensaios – Prêmio Gil‑<br />

berto Freyre 2004/2005.<br />

O título As criaturas <strong>de</strong> Prometeu é o <strong>de</strong> uma peça <strong>de</strong><br />

Beethoven, composta com temas que iriam figurar em suas<br />

sinfonias posteriores, indicando, nas palavras <strong>de</strong> Eli<strong>de</strong> Rugai,<br />

“a presença <strong>de</strong> uma obra plena <strong>de</strong> organicida<strong>de</strong>”, que ela<br />

i<strong>de</strong>ntifica também na unida<strong>de</strong> da obra <strong>de</strong> Freyre, na qual, a<br />

cada livro encontramos “a retomada, em outra tonalida<strong>de</strong>,<br />

dos temas <strong>de</strong>senvolvidos <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o primeiro texto”.<br />

A articulação <strong>de</strong>sses temas – patriarcalismo, interpe‑<br />

netração <strong>de</strong> etnias/culturas e trópico – constitui a “unida<strong>de</strong><br />

explicativa do pensamento freyriano”. A partir daí, como<br />

variações em uma sinfonia, Freyre <strong>de</strong>senvolveu seu amplo<br />

retrato da formação social brasileira, dando relevo a temas<br />

até então menosprezados pelos estudiosos: o papel do es‑<br />

cravo negro na socieda<strong>de</strong> patriarcal, o lugar da mulher e da<br />

criança, o mito do amarelinho.<br />

Dividido em oito capítulos, o livro abre com uma au‑<br />

tobiografia do sociólogo pernambucano, montada a partir<br />

<strong>de</strong> trechos <strong>de</strong> sua obra e <strong>de</strong> entrevistas por ele concedidas,<br />

concluindo com uma entrevista exclusiva <strong>de</strong> Freyre, reali‑<br />

zada em 1985, dois <strong>anos</strong> antes <strong>de</strong> sua morte, formando<br />

assim um círculo bem gilbertiano: os <strong>anos</strong> <strong>de</strong> formação da<br />

juventu<strong>de</strong> ligados à maturida<strong>de</strong> realizadora.<br />

140<br />

o B r a s v e n C e d o r a s d o P r ê M i o G i l B e r t o F r e y r e<br />

ENSAIO SOBRE<br />

O JARDIM<br />

Prêmio Gilberto Freyre 2006/2007<br />

Solange <strong>de</strong> Aragão<br />

1 a edição – 208 páginas<br />

1 encarte colorido (16 páginas)<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1331 ‑5<br />

Se você não tem o hábito <strong>de</strong> frequentar jardins, está na<br />

hora <strong>de</strong> começar. Po<strong>de</strong> escolher um jardim físico para exercitar<br />

as pernas e se sentar num banco, ou simplesmente se <strong>de</strong>liciar<br />

com este Ensaio sobre o jardim, vencedor do 2 o Concurso<br />

Nacional <strong>de</strong> Ensaios – Prêmio Gilberto Freyre 2006/2007.<br />

Nele, Solange <strong>de</strong> Aragão nos conta o fastígio e a <strong>de</strong>‑<br />

cadência dos jardins, no Brasil, seu surgimento, imposto<br />

por padrões <strong>de</strong> gosto europeu, durante a conquista holan‑<br />

<strong>de</strong>sa no Nor<strong>de</strong>ste, inaugurado por Maurício <strong>de</strong> Nassau, até<br />

as concepções mo<strong>de</strong>rnas, elaboradas por Burle Marx e seus<br />

contemporâneos.<br />

Os primeiros jardins públicos eram elitistas, abertos<br />

apenas aos <strong>de</strong>licados sapatinhos das iaiás e às botinas <strong>de</strong><br />

bico fino dos ioiôs. Os pés <strong>de</strong>scalços dos escravos, os calça‑<br />

dos com chinelos dos caixeiros ou os tamancos dos portu‑<br />

gueses não podiam passear por suas aleias.<br />

Mas podiam entrar nos jardins domésticos, em cujos<br />

canteiros se alinhavam ervas medicinais, pomar, hortaliças e<br />

flores. Essa extensão do sobrado começa a se europeizar no<br />

século XIX, <strong>de</strong>ixando <strong>de</strong> ser local <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong> doméstica para<br />

se tornar apenas regalo a olhos e olfato, coberto sobretudo <strong>de</strong><br />

flores, com a indisfarçável marca do homem da terra.<br />

Solange reflete que “talvez sua brasilida<strong>de</strong> esteja<br />

mesmo na mistura <strong>de</strong> espécies <strong>de</strong> origem tão variada, na<br />

mistura <strong>de</strong> cores e formas, <strong>de</strong> perfumes, <strong>de</strong> signos e mitos,<br />

<strong>de</strong> significações <strong>de</strong> cultura diversa”.<br />

Mais tar<strong>de</strong>, os jardins são plantados para <strong>de</strong>coração<br />

externa das casas, integrados à composição arquitetônica,<br />

dando origem ao movimento <strong>de</strong> valorização da flora nacio‑<br />

nal. Foi a hora e a vez <strong>de</strong> Burle Marx, que aspirava a “in‑<br />

ventar e reinventar a paisagem cultural brasileira”.<br />

Em nossas cida<strong>de</strong>s mo<strong>de</strong>rnas, a verticalização criou os<br />

jardins dos condomínios, sem laços afetivos com os mora‑<br />

dores, se bem que ainda se possam encontrar pessoas re‑<br />

gando um canteiro.<br />

o B r a s v e n C e d o r a s d o P r ê M i o G i l B e r t o F r e y r e


NORDESTE SEMITA<br />

ENSAIO SOBRE UM CERTO<br />

NORDESTE QUE EM GILBERTO<br />

FREyRE TAMBÉM É SEMITA<br />

Prêmio Gilberto Freyre 2008/2009<br />

Caesar Sobreira<br />

1 a edição – 224 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1473 ‑2<br />

Vencedor da terceira edição do Concurso Nacional <strong>de</strong><br />

Ensaios – Prêmio Gilberto Freyre 2008/2009, Nor<strong>de</strong>ste se‑<br />

mita levanta e analisa as diversas manifestações da cultura<br />

semita presentes no cotidiano do povo nor<strong>de</strong>stino. A su‑<br />

gestão do trabalho nasceu das observações agudas e ori‑<br />

ginais sobre o assunto, emitidas por Gilberto Freyre em<br />

Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala, Sobrados e mucambos e Nor<strong>de</strong>ste.<br />

A partir <strong>de</strong> tais sugestões, o antropólogo Caesar Sobreira<br />

<strong>de</strong>senvolveu o seu trabalho, em diálogo permanente com<br />

o pensamento freyriano, mas com abordagem original,<br />

“examinando as estruturas <strong>de</strong> parentesco, os nomes e<br />

suas origens, investigando grupos específicos”, para <strong>de</strong>‑<br />

monstrar “a influência profunda que tiveram os ju<strong>de</strong>us na<br />

construção do Nor<strong>de</strong>ste”, como observa Chaim Samuel<br />

Katz, no prefácio à obra.<br />

Com erudição, mas sem pedantismo, recorrendo à<br />

história e à antropologia, o autor apresenta alguns mo‑<br />

mentos <strong>de</strong>cisivos da história do Nor<strong>de</strong>ste, nos quais <strong>de</strong>s‑<br />

taca as marcas <strong>de</strong>ixadas pela presença do ju<strong>de</strong>u na região.<br />

Essa presença, po<strong>de</strong> ‑se dizer sem exagero, encontra ‑se em<br />

todos os aspectos da vida, dos mitos alimentares ao noma‑<br />

dismo típico do homem do Nor<strong>de</strong>ste, dos amores domés‑<br />

ticos à simbologia semita arraigada na religiosida<strong>de</strong> e na<br />

cultura popular, sublinhando aspectos ainda <strong>mais</strong> específi‑<br />

cos, como o uso <strong>de</strong> mantilha por parte das mulheres nor‑<br />

<strong>de</strong>stinas e o costume <strong>de</strong> se erigir monumentos sagrados<br />

em montes e elevados. Caesar Sobreira conclui lembrando<br />

as raízes semitas da família Freyre, <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes dos “ve‑<br />

lhos cristãos ‑novos”, por sua vez “<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes dos anti‑<br />

gos ju<strong>de</strong>us ibéricos, que, transplantados para o Brasil,<br />

floresceram sob o sol da civilização lusotropical situada e<br />

adaptada” no Nor<strong>de</strong>ste, que “como o próprio Gilberto<br />

Freyre também é semita”.<br />

o B r a s v e n C e d o r a s d o P r ê M i o G i l B e r t o F r e y r e<br />

AS MELHORES FRASES<br />

DE CASA ­GRANDE &<br />

SENZALA<br />

A OBRA ­PRIMA DE<br />

GILBERTO FREyRE<br />

Seleção <strong>de</strong> Fátima Quintas<br />

2 a edição – 288 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1677 ‑4<br />

Publicado em 1933, Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala provocou<br />

uma revolução na maneira <strong>de</strong> os brasileiros verem, sentirem<br />

e analisarem o Brasil. O livro logo se tornou um clássico e<br />

<strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ou, em doses abundantes, elogios e restrições<br />

quanto à visão do autor sobre <strong>de</strong>terminados aspectos da<br />

formação histórico ‑social do país.<br />

Polêmicas à parte, com o objetivo <strong>de</strong> facilitar ao leitor<br />

uma incursão inicial por esta obra rica e complexa, Fátima<br />

Quintas reuniu em As melhores frases <strong>de</strong> Casa ‑Gran<strong>de</strong> &<br />

Senzala, “a obra ‑prima <strong>de</strong> Gilberto Freyre”, como diz o<br />

subtítulo, uma espécie <strong>de</strong> súmula do pensamento gilber‑<br />

tiano sobre a formação do Brasil sob o regime patriarcal.<br />

Para tanto, foram ali pinçadas cerca <strong>de</strong> mil frases, dis‑<br />

tribuídas em 58 temas, or<strong>de</strong>nados, não em or<strong>de</strong>m alfabé‑<br />

tica, mas didática. Como Fátima Quintas explica no prefácio,<br />

a seleção consi<strong>de</strong>rou, sobretudo, “a acepção literária, os<br />

jogos metafóricos, e o vigor <strong>de</strong> conteúdo” das frases.<br />

Os temas indicam o essencial da obra e abordam as‑<br />

pectos como o exílio, a Mata Atlântica, miscigenação, índio<br />

macho, mulher indígena, indumentária, alimentação, casa‑<br />

mento patriarcal, influência moura, a ação <strong>de</strong>letéria da<br />

escravidão e o complexo social da casa ‑gran<strong>de</strong>.<br />

A seleção <strong>de</strong> Fátima Quintas ressalta com precisão a<br />

originalida<strong>de</strong> das frases <strong>de</strong> Gilberto Freyre, conciliando<br />

rigor formal e um certo gosto popular com a justeza da<br />

observação. Note como Freyre <strong>de</strong>finiu o português que co‑<br />

lonizou o Brasil: “É um povo que vive a fazer <strong>de</strong> conta que<br />

é po<strong>de</strong>roso e importante. Que é supercivilizado à europeia.<br />

Que é gran<strong>de</strong> potência colonial”. E sobre a mistura <strong>de</strong><br />

raças: “A miscigenação que largamente se praticou aqui<br />

corrigiu a distância social que doutro modo se teria conser‑<br />

vado enorme entre a casa ‑gran<strong>de</strong> e a mata tropical; entre<br />

a casa ‑gran<strong>de</strong> e a senzala”.<br />

Capa<br />

Nova<br />

s o B r e G i l B e r t o F r e y r e<br />

141


IRREDUTIVELMENTE<br />

ESCRITOR<br />

BIBLIOGRAFIA DE<br />

GILBERTO FREyRE<br />

Edson Nery da Fonseca<br />

Prelo<br />

Gilberto Freyre continua muito presente na cultura e<br />

no pensamento brasileiros. Nos últimos <strong>anos</strong>, sua obra tem<br />

sido estudada e reavaliada nos <strong>mais</strong> variados aspectos. A<br />

força <strong>de</strong> sua presença se reafirma, <strong>mais</strong> uma vez, com a<br />

reedição “aumentada e atualizada” <strong>de</strong> Irredutivelmente<br />

escritor, bibliografia comentada da obra do sociólogo, an‑<br />

tropólogo, pensador social, poeta, ficcionista, ensaísta,<br />

crítico literário e <strong>de</strong> artes plásticas, professor, conferencista,<br />

jornalista e quase político pernambucano, empreendida<br />

por Edson Nery da Fonseca.<br />

O título já diz tudo. Em seus 72 <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> inte‑<br />

lectual, Gilberto Freyre foi antes <strong>de</strong> tudo um escritor, abor‑<br />

dando quase todos os domínios <strong>de</strong> conhecimento, autor <strong>de</strong><br />

uma obra imensa e <strong>de</strong> extraordinária receptivida<strong>de</strong>, com<br />

muitas reedições, e que se <strong>de</strong>sdobrou também na organiza‑<br />

ção <strong>de</strong> obras coletivas, na direção <strong>de</strong> periódicos e numa in‑<br />

tensíssima colaboração jornalística. Freyre foi colaborador<br />

fiel da revista O Cruzeiro, entre 1952 e 1967. Ao todo, nesta<br />

e em outras publicações, redigiu 333 artigos. E, além <strong>de</strong> sua<br />

ativida<strong>de</strong> como escritor, conce<strong>de</strong>u 60 entrevistas.<br />

Irredutivelmente escritor está dividido em doze capítu‑<br />

los, abordando “Livros”, “Opúsculos”, “Organização <strong>de</strong><br />

obras coletivas”, “Direção <strong>de</strong> publicações periódicas e se‑<br />

riadas”, “Contribuições em obras coletivas”, “Prefácios,<br />

apresentações, etc.”, “Colaboração em revistas”, “Entre‑<br />

vistas”, “Textos incluídos em antologias”, “Obras anuncia‑<br />

das e não publicadas”, “Colaboração em jornais” e<br />

“Juvenília”, registrando 1.123 itens. Este número po<strong>de</strong><br />

crescer em edições posteriores, pois em termos <strong>de</strong> biblio‑<br />

grafia o <strong>de</strong>finitivo não existe.<br />

Para facilitar o trânsito do pesquisador por esse cipoal,<br />

o livro oferece quatro índices: temático, onomástico, biblio‑<br />

nímico e cronológico.<br />

142<br />

Prelo<br />

s o B r e G i l B e r t o F r e y r e<br />

SExO À MODA<br />

PATRIARCAL<br />

O FEMININO E O MASCULINO<br />

NA OBRA DE GILBERTO FREyRE<br />

Fátima Quintas<br />

1 a edição – 184 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1263 ‑9<br />

Uma característica do sistema patriarcal era acentuar<br />

ao extremo as diferenças entre os sexos, <strong>de</strong> forma a impor,<br />

sem quaisquer contestações, o império do macho sobre a<br />

fêmea, incutindo na mulher, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a infância, seu papel<br />

submisso, no ambiente doméstico e na socieda<strong>de</strong>.<br />

A obra do sociólogo pernambucano Gilberto Freyre, o<br />

primeiro a estudar o papel da mulher na organização social<br />

brasileira, serve <strong>de</strong> base a Fátima Quintas para aprofundar<br />

a análise do tema, com enfoque voltado para o papel das<br />

mulheres no cotidiano dos engenhos <strong>de</strong> açúcar.<br />

Submissas ou enclausuradas, as mulheres contribuíram,<br />

<strong>de</strong> forma quase subversiva, para a fixação da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> na‑<br />

cional, elaborando e ditando o ritmo e os rituais do cotidiano<br />

familiar da casa ‑gran<strong>de</strong>. Negras e mulatas, cujos corpos elás‑<br />

ticos e rijos <strong>de</strong>spertavam o <strong>de</strong>sejo dos sinhôs, num processo<br />

<strong>de</strong> “clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong> sexual”, segundo a <strong>de</strong>finição da autora,<br />

eram peças vitais ao funcionamento da máquina doméstica,<br />

responsáveis pelas tarefas da casa, amamentando os bebês,<br />

contando histórias mágicas aos meninos, dando ‑lhes colo e,<br />

<strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, iniciando ‑os nos mistérios do sexo.<br />

Sem elas, seria ainda <strong>mais</strong> dura a tarefa das iaiás bran‑<br />

cas, mandonas, preguiçosas, tão submissas ao marido<br />

quanto as escravas, confinadas às pare<strong>de</strong>s da casa ‑gran<strong>de</strong>,<br />

naquilo que a autora chama <strong>de</strong> “isolamento árabe”, mar‑<br />

cadas ao longo da vida pelo rito <strong>de</strong> se tornar adulta, o ca‑<br />

samento, o po<strong>de</strong>r social e psicológico do confessionário,<br />

até o envelhecimento precoce.<br />

Fátima Quintas, com requintes prousti<strong>anos</strong> na análise<br />

da vida da casa ‑gran<strong>de</strong>, recria o cotidiano <strong>de</strong>ssas mulheres e<br />

ilumina a participação <strong>de</strong>las na socieda<strong>de</strong> colonial, muitas<br />

vezes se contrapondo ao po<strong>de</strong>r do macho e contribuindo <strong>de</strong><br />

forma <strong>de</strong>cisiva para a construção <strong>de</strong> uma nova socieda<strong>de</strong>.<br />

s o B r e G i l B e r t o F r e y r e


André Brandão<br />

C o l e ç ã o<br />

i G n á C i o d e l o y o l a<br />

B r a n d ã o<br />

Paulista <strong>de</strong> Araraquara, São Paulo. Nascido em<br />

1936, aos <strong>de</strong>zesseis <strong>anos</strong> começou a trabalhar como<br />

jornalista no jornal Correio Popular (Araraquara),<br />

profissão que ainda exerce e a qual influenciou dire‑<br />

tamente sua ficção.<br />

Uma característica marcante do trabalho <strong>de</strong> Loyola é a<br />

sua narrativa repleta <strong>de</strong> experimentos técnicos – como<br />

a inclusão <strong>de</strong> trechos jornalísticos e flashes da vida co‑<br />

tidiana. Além disso, o autor tece a trama com tamanha<br />

habilida<strong>de</strong> que faz o leitor <strong>de</strong>cifrar <strong>de</strong> novas maneiras<br />

a realida<strong>de</strong> que o cerca. O resultado é um trabalho<br />

inovador, no qual a perspectiva popular prevalece sobre<br />

as estruturas tradicionais da ficção. A linguagem colo‑<br />

quial, a agilida<strong>de</strong> dos diálogos e a preocupação com o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> uma trama que prenda o leitor<br />

também estão presentes em sua obra, e refletem um<br />

posicionamento todo particular diante da literatura.<br />

Para mim, a literatura é a <strong>de</strong>fesa da dignida<strong>de</strong><br />

humana, a <strong>de</strong>núncia <strong>de</strong> sistemas opressores, o<br />

retrato <strong>de</strong> uma época. É uma fotografia, um<br />

documentário dos tempos em que vivemos, é<br />

divertimento, prazer.<br />

143


A ÚLTIMA VIAGEM<br />

DE BORGES<br />

UMA EVOCAÇÃO<br />

1 a edição – 176 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1006 ‑9<br />

Em A última viagem <strong>de</strong> Borges, Ignácio <strong>de</strong> Loyola<br />

Brandão passeia pelo insólito, propõe enigmas, mas sobre‑<br />

tudo <strong>de</strong>safia a argúcia e a imaginação do leitor. Tendo<br />

como personagem central um mistificador <strong>de</strong> gênio (como<br />

o chamou Otto Maria Carpeaux), o escritor argentino Jorge<br />

Luis Borges, a peça se <strong>de</strong>senrola num clima <strong>de</strong> fantasia<br />

<strong>de</strong>lirante, bem ao estilo borgeano, temperado pelo humor<br />

e a ironia típicas do autor paulista. Aos 87 <strong>anos</strong>, cego, sen‑<br />

tindo a presença cada vez <strong>mais</strong> próxima da in<strong>de</strong>sejada das<br />

gentes, Borges inventa (ou <strong>de</strong>scobre?) a palavra ‑síntese, a<br />

<strong>mais</strong> perfeita <strong>de</strong> todas, resumo <strong>de</strong> todas as palavras, cons‑<br />

truída “com sílabas articuladas cheias <strong>de</strong> ternuras e tremo‑<br />

res”. Sem escrevê ‑la ou comunicar a outra pessoa, o velho<br />

escritor acaba por esquecê ‑la.<br />

Para recuperar a palavra mágica, Borges organiza uma<br />

expedição à Biblioteca <strong>de</strong> Babel, em companhia <strong>de</strong> Shera‑<br />

za<strong>de</strong>, a narradora perfeita, que salvou a própria vida pelo<br />

uso da palavra, Sir Richard Burton, o aventureiro inglês do<br />

século XIX, primeiro oci<strong>de</strong>ntal a entrar em Meca, e Funes,<br />

o Memorioso, personagem <strong>de</strong> ficção criado por Borges.<br />

A Biblioteca, no entanto, se opõe com toda a astúcia<br />

ao <strong>de</strong>sejo do escritor e seus amigos. Quer preservar para si<br />

a palavra perfeita. Dúvidas, <strong>de</strong>safios, obstáculos, peripé‑<br />

cias, incursões pelo mundo dos espelhos, o universo dos<br />

labirintos, a terra dos seres imaginários, <strong>de</strong>spertando novas<br />

dúvidas. Somos reais ou meras imagens? Afinal, o grupo<br />

encontra o Bibliotecário Imperfeito, espécie <strong>de</strong> duplo bor‑<br />

geano, zelador da inacessível Biblioteca, reino <strong>de</strong> todas as<br />

palavras, on<strong>de</strong> “estão as coisas criadas e as não criadas”,<br />

acesso a uma viagem infinita. A última viagem <strong>de</strong> Borges<br />

termina com quatro finais possíveis, que po<strong>de</strong>riam ser infi‑<br />

nitos, pois a busca da palavra é a <strong>mais</strong> árdua <strong>de</strong> todas as<br />

buscas: a <strong>de</strong> si mesmo.<br />

144<br />

I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />

ACORDEI EM<br />

WOODSTOCk<br />

Viagem, memórias, perplexida<strong>de</strong>s<br />

1 a edição – 288 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1602 ‑6<br />

Woodstock foi o final simbólico <strong>de</strong> um tempo e o iní‑<br />

cio, um tanto louco, mas livre e sonhador, <strong>de</strong> um novo<br />

mundo. Nem importa se para melhor ou pior. O principal é<br />

que ao reivindicar paz e amor, liberda<strong>de</strong>, sexo total e uso<br />

<strong>de</strong> drogas, embalados durante três dias pelo som <strong>de</strong> um<br />

rock pesadíssimo, aquele festival, realizado no longínquo<br />

ano <strong>de</strong> 1969, fez a cabeça e mudou o comportamento <strong>de</strong><br />

milhões <strong>de</strong> jovens em todo o mundo.<br />

Em busca <strong>de</strong>sse passado mítico, ainda tão presente<br />

em nossas vidas, Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão viajou para a<br />

cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Woodstock, no estado norte ‑americano <strong>de</strong> Ver‑<br />

mont. Ali viveu dias <strong>de</strong> sedução e encantamento, tentando<br />

recriar, em cada lugar on<strong>de</strong> <strong>de</strong>correra o festival, aqueles<br />

momentos <strong>de</strong> magia, <strong>de</strong>lírio e loucura vividos por quinhen‑<br />

tos mil rapazes e moças, em busca <strong>de</strong> um mundo menos<br />

convencional e hipócrita.<br />

A viagem se alongou pelos estados <strong>de</strong> Nova Inglaterra<br />

e Connecticut, uma das regiões <strong>mais</strong> ricas, econômica e in‑<br />

telectualmente dos Estados Unidos, resultando, nas palavras<br />

do autor, em um “relato <strong>de</strong> viagem antiliterário, <strong>de</strong>spreten‑<br />

sioso. Apreensão <strong>de</strong> momentos, fragmentos, anotações do<br />

dia a dia, memórias afetivas interligadas, brinca<strong>de</strong>iras, recor‑<br />

dações particulares, lugares ligando ‑se a leituras ou filmes”.<br />

Um caleidoscópio <strong>de</strong> observações, perplexida<strong>de</strong>s e<br />

sensações, difícil <strong>de</strong> ser enquadrado, com rigor, em qual‑<br />

quer gênero literário. Romance? Nem tanto. Memórias?<br />

Mais ou menos. Relato <strong>de</strong> viagem? Po<strong>de</strong> ser que sim. No<br />

final, nada disso tem muita importância. O principal é que<br />

se trata <strong>de</strong> um livro que encanta, seduz e convida à reflexão<br />

e à evocação <strong>de</strong> um tempo que passou, mas que ilumina e<br />

continua presente em nosso tempo, permitindo ao leitor<br />

acordar também em Woodstock, talvez ao som <strong>de</strong> um<br />

rock. Não custa experimentar.<br />

I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o


BEBEL QUE A<br />

CIDADE COMEU<br />

6 a edição – 400 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0329 ‑1<br />

Bebel que a cida<strong>de</strong> comeu, <strong>de</strong> Ignácio <strong>de</strong> Loyola Bran‑<br />

dão, retrata, com aci<strong>de</strong>z e sarcasmo, humor amargo e im‑<br />

pieda<strong>de</strong>, um dos períodos <strong>mais</strong> negros e, ao mesmo<br />

tempo, <strong>mais</strong> criativos da história brasileira, os <strong>anos</strong> 1960.<br />

Época <strong>de</strong> repressão política, <strong>de</strong> brutalida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> sufoco, mas<br />

também <strong>de</strong> explosão <strong>de</strong> uma irreprimível fome <strong>de</strong> vida, que<br />

não era privilégio brasileiro.<br />

Uma espécie <strong>de</strong> alucinação coletiva em busca <strong>de</strong> novos<br />

horizontes espirituais, <strong>de</strong> cansaço e revolta com a herança do<br />

passado, se apossava da juventu<strong>de</strong>, ao embalo da música dos<br />

Beatles, no consumo cada vez maior <strong>de</strong> alucinógenos. As mu‑<br />

lheres, exibindo as pernas, sob as exíguas minissaias, conquis‑<br />

tavam a <strong>de</strong>finitiva liberda<strong>de</strong> sexual. Entre a placi<strong>de</strong>z dos <strong>anos</strong><br />

1950 e a nova década pareciam ter passado cem <strong>anos</strong>.<br />

Sob o torniquete da ditadura, o Brasil se ajeitava como<br />

podia, dançava twist e chá ‑chá ‑chá, assistia aos filmes do<br />

Cinema Novo, os jovens se mobilizavam em festivais <strong>de</strong><br />

música popular, que iriam revelar Chico Buarque, Caetano<br />

Veloso, Gal Costa, e tantos outros artistas. A televisão – a<br />

“máquina <strong>de</strong> fazer doido”, segundo seu <strong>mais</strong> ácido crítico,<br />

o cronista Sérgio Porto – se impunha com a força <strong>de</strong> um<br />

terremoto. Todos queriam ser atores <strong>de</strong> tevê.<br />

Foi esse também o sonho e a perdição <strong>de</strong> Bebel, atriz,<br />

mo<strong>de</strong>lo fotográfico, figurinha fácil em comerciais, um dos<br />

rostos <strong>mais</strong> conhecidos do país e uma das mulheres <strong>mais</strong><br />

<strong>de</strong>sejadas. Fama, dinheiro, <strong>de</strong>slumbramento. Com a<br />

mesma rapi<strong>de</strong>z com que subiu, Bebel <strong>de</strong>sapareceu da teli‑<br />

nha, triturada pela engrenagem da televisão, atirada fora<br />

como um trapo imprestável. O público exige sempre novos<br />

ídolos.Romance cruel, mostra como, à semelhança <strong>de</strong><br />

Bebel, comida pela cida<strong>de</strong>, toda uma geração <strong>de</strong> jovens<br />

i<strong>de</strong>alistas foi comprimida e <strong>de</strong>glutida pelo sistema. Dias <strong>de</strong><br />

chumbo começavam a invadir o Brasil.<br />

I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />

CABEÇAS DE<br />

SEGUNDA ­FEIRA<br />

5 a edição – 200 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1309 ‑4<br />

O absurdo da vida mo<strong>de</strong>rna em uma cida<strong>de</strong> gran<strong>de</strong><br />

encontra em Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão um crítico cruel e<br />

impiedoso, com um humor agridoce que po<strong>de</strong> ser, no<br />

fundo, simpatia, con<strong>de</strong>scendência ou a suprema forma <strong>de</strong><br />

sarcasmo. Ou todas reunidas, batidas em liquidificador e<br />

bem misturadas. Po<strong>de</strong> ser. Cabeças <strong>de</strong> segunda ‑feira, com<br />

as suas situações insólitas, suas frustrações e suas obsceni‑<br />

da<strong>de</strong>s, exprime um pouco <strong>de</strong>sses sentimentos, mas tam‑<br />

bém a relação <strong>de</strong> amor e asco, fascínio e repulsa que o<br />

autor mantém com sua época e a cida<strong>de</strong> em que vive.<br />

O livro divi<strong>de</strong> ‑se em cinco gran<strong>de</strong>s temas (a criação, o<br />

<strong>de</strong>sejo, o amor, o homem, a mente), que po<strong>de</strong>m servir <strong>de</strong><br />

inspiração a histórias <strong>de</strong> todo tipo e formato, bem comporta‑<br />

das, quadradas, redondas. Loyola <strong>de</strong>les extraiu uma mistura<br />

ácida <strong>de</strong> insólito e gozação, um pouco além ou aquém da<br />

realida<strong>de</strong> (a anã pré ‑fabricada, a irrefreável pari<strong>de</strong>ira), e fla‑<br />

grantes do caos urbano, em visão cínica e implacável: o gozo<br />

atrás das árvores, obscenida<strong>de</strong>s para uma dona <strong>de</strong> casa.<br />

Mas há também lampejos <strong>de</strong> simpatia (em realida<strong>de</strong> sim‑<br />

patia e cruelda<strong>de</strong>, um jogo sadomasoquista com o persona‑<br />

gem) pelos sonhadores frustrados, quase sempre inofensivos,<br />

como no sarcástico “45 encontros com Vera Fischer”.<br />

Simpatia e sarcasmo se aguçam ainda <strong>mais</strong> quando<br />

trata do sonhador erótico que às mulheres <strong>de</strong> carne e osso<br />

prefere as mulheres irresistíveis das revistas pornográficas<br />

(“Anúncios eróticos”). A fantasia superando a realida<strong>de</strong>, a<br />

fuga da vida, temas tão frequentes na obra do autor. Igná‑<br />

cio <strong>de</strong> Loyola Brandão nasceu em 1936, em Araraquara,<br />

São Paulo. Des<strong>de</strong> os <strong>de</strong>zesseis <strong>anos</strong> trabalha no jornalismo,<br />

profissão que influenciou duplamente sua ficção, na lin‑<br />

guagem e na visão <strong>de</strong> mundo. Premiado no Brasil e no<br />

exterior, tem <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta livros publicados, entre roman‑<br />

ces, contos e reportagens, vários <strong>de</strong>les traduzidos.<br />

I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />

145


CADEIRAS PROIBIDAS<br />

11 a edição – 144 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1471 ‑8<br />

Ca<strong>de</strong>iras proibidas atira o leitor em um universo surrea‑<br />

lista, on<strong>de</strong> todas as ca<strong>de</strong>iras são proibidas ou, pelo menos,<br />

não recomendáveis. O fantástico é o clima, o inesperado<br />

sempre acontece, a angústia tritura todo mundo. Medo,<br />

cautela. Afinal, qualquer um po<strong>de</strong> ser envolvido pelo im‑<br />

previsível e <strong>de</strong>scobrir que o ser humano, corpo e alma,<br />

nada vale diante da força.<br />

Metáfora da condição humana esmagada por um re‑<br />

gime <strong>de</strong> força, fábulas <strong>de</strong> um mundo em crise, escritos com<br />

humor amargo, indignação, ironia, os contos <strong>de</strong> Ca<strong>de</strong>iras<br />

proibidas reproduzem, sob o manto diáfano da fantasia, o<br />

clima <strong>de</strong> terror e sufoco dos <strong>anos</strong> 1970. Dias <strong>de</strong> arrocho<br />

político e censura implacável, violência cultivada pelo Estado,<br />

torturas, todos <strong>de</strong>sconfiando <strong>de</strong> todos, a verda<strong>de</strong> proibida<br />

<strong>de</strong> ser dita, ou transmitida apenas através <strong>de</strong> uma represen‑<br />

tação, na qual qualquer semelhança com a realida<strong>de</strong> não era<br />

em absoluto mera coincidência, mas até isso exigia cautela.<br />

Não é difícil estabelecer conexões entre o fantástico<br />

dos contos e a dura realida<strong>de</strong> cotidiana: o homem que re‑<br />

solve contar apenas mentiras e <strong>de</strong>scobre que as mentiras se<br />

tornam verda<strong>de</strong>s ou a situação <strong>de</strong> angústia do sujeito proi‑<br />

bido <strong>de</strong> entrar no cinema e até mesmo sentar na praça por<br />

causa <strong>de</strong> um furo na mão. O homem cuja orelha cresceu<br />

tanto que se espalhou por toda a cida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> indicar o<br />

<strong>de</strong>lator, tão comum à época, que <strong>de</strong>struiu tantas vidas. E os<br />

agentes <strong>de</strong> segurança que estão e não estão nas casas, o<br />

homem <strong>de</strong>sesperado que mata toda a família a tiros, o ci‑<br />

nema <strong>de</strong> on<strong>de</strong> as pessoas não conseguem sair e cuja sessão<br />

nunca começa, os postes que ficam moles, as pedras que<br />

gritam quando pisadas, os homens que se transformam em<br />

barbantes, as letras que caem dos livros.<br />

Alegorias, com um toque <strong>de</strong> fantástico <strong>de</strong> um mundo<br />

e uma época <strong>de</strong> pesa<strong>de</strong>lo on<strong>de</strong> tudo, absolutamente tudo,<br />

estava em <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m.<br />

146<br />

I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />

DENTES AO SOL<br />

5 a edição – 366 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0048 ‑9<br />

Retrato <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> do interior do Brasil, através do<br />

testemunho meio patético, meio venenoso, <strong>de</strong> um cidadão<br />

excluído da comunida<strong>de</strong>, Dentes ao sol provoca e inquieta o<br />

leitor. O narrador foi mesmo con<strong>de</strong>nado ao ostracismo, pelo<br />

povo da terra? Ou teria ‑se afastado, por vonta<strong>de</strong> própria e<br />

tédio <strong>de</strong> uma realida<strong>de</strong> diária mesquinha e asfixiante?<br />

Seja como for, é através <strong>de</strong> seu <strong>de</strong>poimento implacá‑<br />

vel (e com um mal disfarçado sentimento <strong>de</strong> vingança, <strong>de</strong><br />

forra) que se reconstitui sua sufocante vida pessoal e a vida<br />

cotidiana da cida<strong>de</strong>, com as suas trivialida<strong>de</strong>s, as dificulda‑<br />

<strong>de</strong>s <strong>de</strong> relacionamento entre as pessoas, os segredos <strong>de</strong><br />

polichinelo, os preconceitos e os absurdos. Os casos miste‑<br />

riosos que acontecem no escuro do cinema. A mulher que<br />

só atingia o orgasmo fazendo amor em meio a festas po‑<br />

pulares. Os homens metralhados na plataforma da estação.<br />

A piscina que engole os que nela mergulham. O tigre que<br />

rasga as pessoas nas ruas. Os jogos anuais, <strong>de</strong> extrema<br />

violência, com a participação <strong>de</strong> toda a cida<strong>de</strong>. Por que<br />

todos ven<strong>de</strong>m as casas com quintais e compram aparta‑<br />

mentos? A televisão imperando em todos os momentos da<br />

vida. Ninguém sai <strong>mais</strong> <strong>de</strong> casa, a tal ponto que se escreveu<br />

um “Manual prático para se sair <strong>de</strong> casa”, orientando<br />

quem quisesse ir à rua. Realida<strong>de</strong> e simbologia.<br />

Dentes ao sol, em certa medida, é também a home‑<br />

nagem <strong>de</strong> um cinéfilo ao cinema, estabelecendo relações<br />

entre o que ocorre na cida<strong>de</strong>, o que o narrador reconstitui<br />

e os filmes que marcaram sua geração.<br />

Escrito com humor e sarcasmo, o livro parece propor,<br />

sob o <strong>de</strong>salento do narrador, um <strong>de</strong>safio <strong>de</strong> vida e, sobre‑<br />

tudo, <strong>de</strong> renovação: o estímulo à coragem para se perse‑<br />

guir o sonho, a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se buscar a utopia, <strong>de</strong> se<br />

viver com esperança, ainda que contra tudo e todos. Sob<br />

pena <strong>de</strong> enlouquecer à sombra, como o “girassol no<br />

muro”, expondo “os <strong>de</strong>ntes ao sol”.<br />

I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o


DEPOIS DO SOL<br />

2 a edição – 208 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1042 ‑5<br />

Primeiro livro <strong>de</strong> contos publicado por Ignácio <strong>de</strong><br />

Loyola Brandão, Depois do sol retrata a noite paulistana,<br />

nos <strong>anos</strong> 1960, povoada por uma fauna exótica, cheia <strong>de</strong><br />

picardia, malandragem e (algumas vezes) más intenções,<br />

lutando pela árdua sobrevivência <strong>de</strong> cada dia.<br />

Os personagens são garotas <strong>de</strong> programa, marginais, ma‑<br />

nequins, atrizes, boxeurs <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ntes, músicos, a gente típica<br />

da noite, observada com curiosida<strong>de</strong> e simpatia pelo autor.<br />

O livro nasceu da experiência noturna do jovem jorna‑<br />

lista. Após a saída da redação, lá pelas onze horas da noite,<br />

Ignácio <strong>de</strong> Loyola e alguns amigos percorriam bares, boa‑<br />

tes, inferninhos, botecos, vendo, ouvindo, observando.<br />

Terminavam às quatro ou cinco horas da manhã, num<br />

banco da praça da República, para conversar. Depois do sol<br />

mostra uma cida<strong>de</strong> em que a violência, que hoje sufoca a<br />

todos, apenas começava a se impor, mas na qual a cruel‑<br />

da<strong>de</strong>, a angústia, o <strong>de</strong>sespero, características eternas do<br />

bicho ‑homem, estavam muito presentes, como se constata<br />

no concurso <strong>de</strong> resistência <strong>de</strong> dança (“No ritmo lento do<br />

funeral”) e na pequena odisseia <strong>de</strong> todas as noites <strong>de</strong> um<br />

jovem angustiado, que sai <strong>de</strong> casa para beber e brigar (“Re‑<br />

trato do jovem brigador”). Depois do sol é também o ho‑<br />

rário <strong>mais</strong> brilhante do mundo da moda, com suas mil<br />

seduções, <strong>de</strong>sencontros, angústias e mo<strong>de</strong>los em busca <strong>de</strong><br />

fama e dinheiro (“Ascensão ao mundo <strong>de</strong> Annuska”). Só à<br />

noite po<strong>de</strong> acontecer o caso (real) <strong>de</strong> uma atriz, abordada<br />

por uma prostituta, que a confun<strong>de</strong> com uma antiga co‑<br />

lega <strong>de</strong> profissão (“Diálogo com Adriana”) ou a terrível<br />

<strong>de</strong>pressão <strong>de</strong> um homem isolado pela doença (“Doente<br />

<strong>de</strong>ntro da noite”). Mas é <strong>de</strong> qualquer hora a narrativa<br />

kafkiana <strong>de</strong> um imenso congestionamento <strong>de</strong> trânsito (“São<br />

João mão única”). A presente edição <strong>de</strong> Depois do sol traz<br />

uma novida<strong>de</strong>: um roteiro <strong>de</strong> como os contos surgiram e as<br />

pessoas que os inspiraram. É quase um novo conto.<br />

I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />

NÃO VERÁS<br />

PAÍS NENHUM<br />

Prêmio IILA como melhor livro latino­<br />

­americano na Itália 1983<br />

(Instituto Ítalo ­Latino ­Americano)<br />

27 a edição – 384 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1297 ‑4<br />

Durante muitas décadas a poesia “A pátria”, <strong>de</strong> Olavo<br />

Bilac, foi lida, <strong>de</strong>corada e recitada pelas crianças brasileiras.<br />

Os versos iniciais diziam: “Ama, com fé e orgulho, a terra<br />

em que nasceste!/ Criança! Não verás nenhum país como<br />

este!”. Não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser uma ironia cruel encontrar o verso<br />

bilaqueano adotado como título (e com seu significado vi‑<br />

rado pelo avesso) <strong>de</strong> um dos romances <strong>mais</strong> <strong>de</strong>vastadores<br />

e pessimistas da literatura brasileira, o oposto do róseo oti‑<br />

mismo do poeta das estrelas, Não verás país nenhum, <strong>de</strong><br />

Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão.<br />

Enquanto gerações <strong>de</strong> crianças brasileiras recitavam o<br />

poema <strong>de</strong> Bilac, o país (aliás, em sintonia com o mundo) ia<br />

acelerando, lentamente, seu processo <strong>de</strong> auto<strong>de</strong>struição,<br />

com a <strong>de</strong>vastação das florestas, o acúmulo <strong>de</strong> lixo, a <strong>de</strong>gra‑<br />

dação do meio ambiente, a que se juntou, nos últimos<br />

tempos, a <strong>de</strong>struição da camada <strong>de</strong> ozônio do planeta,<br />

projetando perspectivas sombrias para a humanida<strong>de</strong>.<br />

Romance apocalíptico, no sentido <strong>de</strong> contar uma histó‑<br />

ria do fim dos tempos, Não verás país nenhum se <strong>de</strong>senrola<br />

em um futuro não <strong>de</strong>terminado, mas cada vez <strong>mais</strong> presente<br />

na realida<strong>de</strong> do brasileiro. Uma época terrível, na qual a<br />

Amazônia se transformou em um <strong>de</strong>serto sem nenhuma<br />

árvore; on<strong>de</strong> “o lixo forma setenta e sete colinas que ondu‑<br />

lam, habitadas, todas. E o sol, violento <strong>de</strong><strong>mais</strong>, corrói e apo‑<br />

drece a carne em poucas horas”; on<strong>de</strong> a carência <strong>de</strong> água<br />

impõe a reciclagem da urina, bebida pelas pessoas. A admi‑<br />

nistração do país chegou ao caos. Governantes medíocres,<br />

cada vez <strong>mais</strong> afastados do povo, interessados apenas em<br />

vantagens pessoais, uma polícia corrupta e assustadora.<br />

No meio <strong>de</strong>sse mundo sombrio, uma história <strong>de</strong> amor,<br />

na qual o autor sugere que nem tudo está perdido, pelo<br />

menos enquanto o bicho ‑homem alimentar esperanças e<br />

for capaz <strong>de</strong> gestos <strong>de</strong> generosida<strong>de</strong>.<br />

I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />

147


NOITE INCLINADA<br />

Prêmio Pedro Nava 1987<br />

(Aca<strong>de</strong>mia Brasileira <strong>de</strong> Letras)<br />

Prêmio <strong>de</strong> Melhor Romance 1987<br />

(Associação Paulista <strong>de</strong> Críticos <strong>de</strong> Arte)<br />

1 a edição – 384 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0816 ‑1<br />

Noite inclinada, que antes se chamava O ganhador, tal‑<br />

vez seja o romance <strong>mais</strong> sarcástico <strong>de</strong> Ignácio <strong>de</strong> Loyola Bran‑<br />

dão. Conta as peripécias <strong>de</strong> um anti ‑herói, um músico meio<br />

amalucado, figurinha carimbada em todos os festivais <strong>de</strong> mú‑<br />

sica do país, dos internacionais, reunindo os maiores astros<br />

da MPB brasileira, aos realizados em cida<strong>de</strong>s remotas, sem<br />

qualquer repercussão, em busca <strong>de</strong> um prêmio que nunca<br />

alcança e <strong>de</strong> um filho, gerado em uma amiga lésbica cujo<br />

sonho era ser mãe. Transcorrendo em sua maior parte nas<br />

estradas, o romance revela um Brasil cheio <strong>de</strong> contradições,<br />

patético, cruel, meio absurdo, mas sempre bem ‑humorado,<br />

povoado por personagens a um passo do grotesco: a pastora<br />

<strong>de</strong> uma religião que adora um gran<strong>de</strong> peixe encontrado <strong>de</strong>n‑<br />

tro do gelo; as prostitutas indignadas em ato <strong>de</strong> protesto; a<br />

hippie dos <strong>anos</strong> 1960 transformada em uma tranquila dona<br />

<strong>de</strong> casa; o vingador que o<strong>de</strong>ia banheiros sujos; o homem que<br />

mora <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma sereia; a ex ‑bailarina <strong>de</strong> corpo escultu‑<br />

ral, agora com uma imensa gordura e uma perna amputada,<br />

sem per<strong>de</strong>r a alegria <strong>de</strong> viver; a quarentona que se julga prin‑<br />

cesa, membro <strong>de</strong> um incrível fã ‑clube provinciano.<br />

O Ganhador não foge à regra. Alucinado, patético,<br />

julgando ‑se por vezes um ser superior, capaz <strong>de</strong> encontrar<br />

a oitava nota musical, oscila entre o i<strong>de</strong>alismo e o confor‑<br />

mismo, o <strong>de</strong>lírio e a <strong>de</strong>silusão. Adora o aplauso, tem voz<br />

melodiosa e boa presença. Por que não vence? Por que<br />

nunca consegue brilhar? “Porque sou uma mentira. Minha<br />

chance passou, não vi quando beirou”, raciocina, quando<br />

nada <strong>mais</strong> podia aspirar.<br />

Divertido, irreverente, <strong>de</strong>lirante, retrato alucinante do<br />

Brasil das décadas <strong>de</strong> 1970 e 1980, Noite inclinada, título<br />

inspirado em um poema do poeta português Hel<strong>de</strong>r Ma‑<br />

cedo, agri<strong>de</strong> o leitor como um soco bem dado. Agri<strong>de</strong> para<br />

<strong>de</strong>spertá ‑lo.<br />

148<br />

I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />

O ANJO DO ADEUS<br />

SACANAS HONESTOS JOGAM<br />

LIMPO JOGOS SUJOS<br />

2 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0517 ‑0<br />

O anjo do a<strong>de</strong>us, publicado quando Ignácio <strong>de</strong> Loyola<br />

Brandão comemorava trinta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> literatura, representou<br />

uma novida<strong>de</strong> e um <strong>de</strong>safio em sua obra romanesca, um<br />

mergulho sem limites nas podridões da socieda<strong>de</strong> contem‑<br />

porânea. O subtítulo já diz (quase) tudo: “Sacanas hones‑<br />

tos jogam limpo jogos sujos”.<br />

Em ambiente <strong>de</strong> sujeira explícita e clima meio <strong>de</strong> pulp<br />

fiction, O anjo do a<strong>de</strong>us se <strong>de</strong>senrola num ritmo alucinante,<br />

<strong>de</strong> tirar o fôlego e o sono, revelando a face brutal <strong>de</strong> uma<br />

pequena cida<strong>de</strong> do interior brasileiro, Arealva. Uma história<br />

<strong>de</strong> ambição e luta pelo po<strong>de</strong>r, pontilhada <strong>de</strong> sadismo, com<br />

uma sucessão <strong>de</strong> assassinatos, vinganças, mistérios, menti‑<br />

ras, sexo em <strong>de</strong>sespero, farto consumo <strong>de</strong> drogas, ódios<br />

velhos e persistentes, que o cronista narra com cinismo,<br />

sarcasmo, alguma zombaria e absoluta fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong>, segundo<br />

garante ao leitor no capítulo inicial, quando alguns envol‑<br />

vidos nos fatos tentam suborná ‑lo para alterar a história.<br />

Afinal, eliminar a memória ou disfarçar a realida<strong>de</strong> é uma<br />

atitu<strong>de</strong> típica do povo local, com a qual, felizmente, o nar‑<br />

rador não concorda. Nem tudo está podre em Arealva.<br />

Um dos autores <strong>mais</strong> populares e premiados da litera‑<br />

tura brasileira contemporânea, Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão<br />

nasceu em Araraquara, São Paulo, em 1936. Estreou em<br />

livro em 1965, com o volume <strong>de</strong> contos Depois do sol. A<br />

partir daí, não parou <strong>mais</strong>, conciliando a ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> jor‑<br />

nalista com a prática da literatura. Sua obra se caracteriza<br />

pela irreverência, o sarcasmo e a <strong>de</strong>núncia das mazelas da<br />

socieda<strong>de</strong> brasileira, o que lhe criou problemas com o re‑<br />

gime militar. Zero foi proibido pela censura, sendo publi‑<br />

cado primeiro na Itália, em 1974. A edição brasileira só saiu<br />

no ano seguinte. Ignácio <strong>de</strong> Loyola tem <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta obras<br />

publicadas, entre romances, contos, livros <strong>de</strong> viagens e lite‑<br />

ratura infantojuvenil.<br />

I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o


O ANÔNIMO CÉLEBRE<br />

REALITy ROMANCE<br />

2 a edição – 384 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0757 ‑2<br />

Uma das pragas <strong>de</strong> nossa época, sintoma <strong>de</strong> uma socie‑<br />

da<strong>de</strong> em crise, que procura preencher o vazio interior com a<br />

admiração externa, a busca da celebrida<strong>de</strong> tem feito vítimas e<br />

glorificado imbecis. A maior parte <strong>de</strong>les aparece e some com<br />

rapi<strong>de</strong>z. São os quinze minutos <strong>de</strong> fama a que se referia o<br />

pintor norte ‑americano Andy Warhol, o que não <strong>de</strong>sestimula,<br />

antes parece incentivar milhares <strong>de</strong> candidatos.<br />

A busca da fama a qualquer custo é o tema <strong>de</strong> O<br />

anônimo célebre, <strong>de</strong> Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão. Sarcástico,<br />

<strong>de</strong>bochado, impiedoso, esse “reality romance”, como diz<br />

o subtítulo, conta uma história <strong>de</strong> amor, a <strong>de</strong> Letícia, e vá‑<br />

rias sub ‑histórias <strong>de</strong> anônimos em busca da celebrida<strong>de</strong>.<br />

As formas e as fórmulas para obtê ‑la se encontram<br />

generosamente espalhadas pela obra, constituindo ‑se em<br />

autêntico curso <strong>de</strong> acesso à celebrida<strong>de</strong>, com a revelação<br />

<strong>de</strong> truques, rituais, dicas, maneira <strong>de</strong> se comportar em fes‑<br />

tas, o que beber, o traje a<strong>de</strong>quado para cada circunstância,<br />

as grifes do momento, para on<strong>de</strong> viajar, como se aproximar<br />

<strong>de</strong> promoters, os profissionais que contratam para filmes,<br />

novelas, fotos, os lugares quentes para alguém conhecer<br />

celebrida<strong>de</strong>s e começar a se enturmar.<br />

Atenção: para o autêntico aspirante à fama tudo é<br />

válido, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que sirva a seu objetivo maior. Indispensável<br />

esquecer escrúpulos, princípios, ética, o medo ao ridículo.<br />

O bom aspirante <strong>de</strong>ve se acostumar a se curvar, trair, ser<br />

humilhado, virar lixo, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que seja para conseguir seus<br />

nobres i<strong>de</strong>ais. Se chegar lá, saberá como se vingar nos anô‑<br />

nimos que surgirem em seu caminho. Afinal, a própria filo‑<br />

sofia do século XXI reconhece que no jogo da vida vale<br />

tudo para se chegar à televisão. Mas, cuidado, a celebri‑<br />

da<strong>de</strong> po<strong>de</strong> trazer em si os próprios elementos <strong>de</strong> <strong>de</strong>strui‑<br />

ção. Como observa Deonísio da Silva “este é um livro que<br />

entristece e diverte”.<br />

I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />

O BEIJO NÃO<br />

VEM DA BOCA<br />

6 a edição – 376 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1383 ‑4<br />

Depois <strong>de</strong> quarenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> literária, com<br />

uma obra que se caracteriza pelo pessimismo e o sarcasmo,<br />

Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão publicou um inesperado ro‑<br />

mance <strong>de</strong> amor com final feliz.<br />

O beijo não vem da boca aborda, em forma <strong>de</strong> ficção,<br />

sem a pretensão <strong>de</strong> respondê ‑la, uma das perguntas <strong>mais</strong> in‑<br />

quietantes formuladas pelo ser humano, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o momento<br />

em que começou a indagar o porquê da vida e do <strong>de</strong>stino: o<br />

significado do amor e sua influência em nossa vida.<br />

Ana, sedutora, fascinando a todos que <strong>de</strong>la se aproxi‑<br />

mam. Breno, mergulhado numa crise pessoal angustiante,<br />

que envolve a sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>, a masculinida<strong>de</strong>, a sexuali‑<br />

da<strong>de</strong>, os conceitos <strong>de</strong> vida e comportamento. Num balanço<br />

<strong>de</strong> sua vida sentimental, revê amores passados e traça a<br />

própria história da sexualida<strong>de</strong> brasileira nos últimos qua‑<br />

renta <strong>anos</strong>. Há saída para a sua situação? O que o amor<br />

representa em sua vida? O que <strong>de</strong>seja das mulheres?<br />

Encontros, conflitos, <strong>de</strong>sencontros, uma história <strong>de</strong><br />

avanços e recuos, em busca do <strong>mais</strong> procurado <strong>de</strong> todos os<br />

saberes: o saber amar. Expandindo ‑se e retraindo ‑se, como<br />

o próprio sentimento <strong>de</strong> amor, a história se <strong>de</strong>senrola ao<br />

longo <strong>de</strong> três décadas, em cenários diversos: Brasil, Cuba,<br />

Dinamarca, Alemanha. Conflitos <strong>de</strong> cultura, i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s hu‑<br />

manas, divergência <strong>de</strong> opiniões políticas, posições extremas,<br />

refletindo um mundo em crise através da re<strong>de</strong>scoberta do<br />

amor. Como uma espécie <strong>de</strong> símbolo, digamos político,<br />

do <strong>de</strong>stino das nações, há um momento, dos <strong>mais</strong> intensos do<br />

livro, em que brasileiros e alemães se reúnem em Berlim para<br />

uma feijoada, alegres, <strong>de</strong>spreocupados, sem <strong>de</strong>sconfiarem<br />

que estão vivendo os últimos <strong>anos</strong> <strong>de</strong> um mundo dividido<br />

em dois gran<strong>de</strong>s blocos. A presente edição <strong>de</strong> O beijo não<br />

vem da boca foi inteiramente revista e expurgada, tornando ‑se<br />

<strong>mais</strong> enxuta e atraente. É como um novo beijo.<br />

I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />

149


O HOMEM QUE<br />

ODIAVA A<br />

SEGUNDA ­FEIRA<br />

Prêmio Jabuti 2000 (Câmara Brasileira<br />

do Livro)<br />

3 a edição – 168 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0629 ‑0<br />

Na porta da livraria, um homem distribui folhetos<br />

amarelos convidando para uma reunião. Objetivo: extinguir<br />

do calendário as segundas ‑feiras, esse dia nefasto no qual<br />

todos os males da semana (e da vida) começam. Prova cien‑<br />

tífica? O estranho vírus <strong>de</strong>nominado Monday ‑Monday, <strong>de</strong><br />

sintomas incertos e amplitu<strong>de</strong> universal. Mas como eliminar<br />

um dia da semana? Consultas a advogados, na tentativa <strong>de</strong><br />

esclarecer da existência <strong>de</strong> alguma lei a respeito. Desilu‑<br />

sões, frustrações.<br />

A segunda ‑feira, espécie <strong>de</strong> bo<strong>de</strong> expiatório das an‑<br />

gústias, recalques e <strong>de</strong>savenças humanas, marca com sua<br />

presença inquietadora os cinco contos <strong>de</strong> O homem que<br />

odiava a segunda ‑feira.<br />

Contos absurdos (talvez não tão absurdos como o coti‑<br />

diano, se bem pensarmos), situações <strong>de</strong> <strong>de</strong>lírio, metáforas e<br />

alegorias da realida<strong>de</strong>, à sombra da aziaga segunda ‑feira. O<br />

homem que mantém diálogo com uma formiga; a caixa <strong>de</strong><br />

correio que engole mãos; a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> corpos com partes remo‑<br />

víveis, permitindo se retirar ora uma perna, ora a barriga.<br />

A estranha situação <strong>de</strong> pensar e emitir sons sem qual‑<br />

quer sentido, como se falasse um idioma bárbaro ou estivesse<br />

sendo dublado, e a <strong>de</strong>scoberta final <strong>de</strong> não enten<strong>de</strong>r <strong>mais</strong> a<br />

língua que falava (“KersgatoiNula! KersgatoiNula!”). Sátira<br />

às novas gerações, à linguagem contemporânea, incorpo‑<br />

rando estrangeirismos grotescos? Po<strong>de</strong> ser. Mais evi<strong>de</strong>nte é a<br />

perda da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e suas consequências alucinantes, em<br />

“As cores das bolinhas da morte”. Sátiras, humor negro, sar‑<br />

casmo, revolta com o cotidiano, culpa da segunda ‑feira. Que<br />

seja extinta. E se a felicida<strong>de</strong> ou mesmo uma precária tran‑<br />

quilida<strong>de</strong> for impossível assim mesmo, que se acabe também<br />

com a terça, a quarta, a quinta, a sexta, o sábado. Que a vida<br />

seja reduzida a um perpétuo domingo ou que tudo se acabe<br />

numa nefasta segunda ‑feira.<br />

150<br />

iI Gg n á Cc iI o d e lL o y o Ll a B r a n d ã o<br />

O VERDE VIOLENTOU<br />

O MURO<br />

13 a edição – 400 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0365 ‑8<br />

Durante quinze meses, entre 1982 e 1983, Ignácio <strong>de</strong><br />

Loyola Brandão viveu em Berlim, a convite do governo ale‑<br />

mão, “um dos tempos <strong>mais</strong> instigantes e curiosos <strong>de</strong> minha<br />

vida”, uma experiência inesquecível contada em O ver<strong>de</strong><br />

violentou o muro.<br />

A antiga capital alemã ainda estava dividida pelo<br />

Muro, um contraste brutal entre duas socieda<strong>de</strong>s. Do lado<br />

oriental, o povo, em sua maior parte proletário, levava uma<br />

vida sem perspectivas, alimentando rancores e ressenti‑<br />

mentos. No ambiente cosmopolita e rico da parte oci<strong>de</strong>n‑<br />

tal, cheio <strong>de</strong> lojas elegantes, em plena prosperida<strong>de</strong>, a<br />

presença do Muro lhe conferia uma aura particular <strong>de</strong> ci‑<br />

da<strong>de</strong> “única, singular e excitante, original e louca, nervosa<br />

e adorável, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> todas as especulações <strong>de</strong> sua<br />

problemática existência”.<br />

Essa cida<strong>de</strong> refinada e sedutora foi se entregando aos<br />

poucos ao visitante, num longo e lento jogo <strong>de</strong> sedução. No<br />

início, dificulda<strong>de</strong>s com o idioma, irritação com a rigi<strong>de</strong>z dos<br />

hábitos alemães, tensão, <strong>de</strong>cepções, carências. Falta até do<br />

toque do brasileiro, aquela mania <strong>de</strong> pôr a mão no outro ou<br />

pegá ‑lo, enquanto conversa, “necessários a uma comunica‑<br />

ção”. Os alemães, ao contrário, consi<strong>de</strong>ram o gesto uma<br />

invasão <strong>de</strong> privacida<strong>de</strong>. Superada a fase <strong>de</strong> surpresas (as ma‑<br />

nifestações políticas or<strong>de</strong>iras, com a presença até <strong>de</strong> bebês<br />

<strong>de</strong> colo) e inquietações (a falta <strong>de</strong> cor nas ruas, o “cinza<br />

constante, <strong>de</strong> cabo a rabo na Alemanha”), a <strong>de</strong>scoberta <strong>de</strong><br />

prazeres insuspeitos, como andar <strong>de</strong> bicicleta pela cida<strong>de</strong><br />

(“Berlim com bicicleta é outra coisa”), uma riquíssima vida<br />

cultural, viagens pelo país, numa conquista persistente e diá‑<br />

ria. Logo, o conquistador estava conquistado.<br />

Anos <strong>de</strong>pois, ao regressar a Berlim, Loyola compara as<br />

duas cida<strong>de</strong>s, aquela em que vivera, e a surgida após a<br />

queda do Muro, como uma metáfora do reencontro <strong>de</strong> um<br />

povo, mas também a vitória da árvore ver<strong>de</strong> da vida.<br />

iI Gg n á Cc iI o d e lL o y o Ll a B r a n d ã o


PEGA ELE, SILÊNCIO<br />

5 a edição – 128 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1302 ‑5<br />

Se os livros fossem como a caverna mágica <strong>de</strong> Ali<br />

Babá, exigindo palavras ‑chave <strong>de</strong> acesso, a senha para abrir<br />

as portas <strong>de</strong> Pega ele, Silêncio seria violência e busca. Vio‑<br />

lência social, típica <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> competitiva e carente<br />

<strong>de</strong> valores, implacável com os fracos, mas também a velha<br />

e embriagadora violência do bicho ‑homem, que parece<br />

<strong>mais</strong> embriagadora do que nunca em momentos <strong>de</strong> ten‑<br />

são, individual ou coletiva, como o fim da década <strong>de</strong> 1960,<br />

quando se <strong>de</strong>senrolam os três contos do livro <strong>de</strong> Ignácio <strong>de</strong><br />

Loyola Brandão.<br />

Era a época da repressão política, das passeatas, da<br />

reação estudantil, da brutalida<strong>de</strong> da polícia. Em casa, as pes‑<br />

soas viam na tevê um programa muito popular <strong>de</strong> boxe, nas<br />

boates o consumo <strong>de</strong> bolinhas dava um salto histórico e,<br />

como pano <strong>de</strong> fundo da socieda<strong>de</strong>, predominava o medo.<br />

Nesse ambiente vivem e lutam (no sentido real e figu‑<br />

rado) os personagens <strong>de</strong> Ignácio <strong>de</strong> Loyola: um jovem luta‑<br />

dor <strong>de</strong> boxe, oriundo da periferia, vivendo um dia <strong>de</strong> intensa<br />

angústia antes <strong>de</strong> uma luta <strong>de</strong>cisiva para seu <strong>de</strong>stino; a insa‑<br />

tisfação <strong>de</strong> uma atriz ninfomaníaca, on<strong>de</strong> se <strong>de</strong>scerram tam‑<br />

bém os bastidores do teatro brasileiro; um grupo <strong>de</strong> pessoas<br />

obrigadas a encarar a violência do regime, acuadas pelo<br />

medo, em busca <strong>de</strong> alguma coisa in<strong>de</strong>finida, <strong>mais</strong> sugerida<br />

do que dita no livro: a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ascensão social do<br />

boxeur, o prazer permanente ansiado pela atriz, dias <strong>de</strong> paz<br />

e justiça social, <strong>de</strong>sejados pelo grupo <strong>de</strong> perseguidos.<br />

A tensão predomina nos três contos e sob essa pres‑<br />

são permanente os personagens <strong>de</strong>ixam emergir sua face<br />

autêntica, seu egoísmo, suas frustrações e prevenções,<br />

aguçadas pela visão cruel e cética do autor que, <strong>de</strong>finitiva‑<br />

mente, não acredita na humanida<strong>de</strong>. Pega ele, Silêncio foi<br />

finalista do maior concurso <strong>de</strong> contos já instituído no Brasil,<br />

em 1968, e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> essa época é um dos livros <strong>de</strong> Ignácio <strong>de</strong><br />

Loyola preferidos pelo público.<br />

I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />

VEIA BAILARINA<br />

Gran<strong>de</strong> Prêmio da Crítica 1997 (Associação<br />

Paulista <strong>de</strong> Críticos <strong>de</strong> Arte)<br />

5 a edição – 224 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1298 ‑1<br />

Veia bailarina. O título, tão sugestivo e poético, es‑<br />

con<strong>de</strong> uma ameaça terrível. Certa manhã, ao acordar, Ig‑<br />

nácio <strong>de</strong> Loyola Brandão encaminha ‑se para a cozinha,<br />

quando o “corredor balançou como um navio”. Sem se<br />

abalar, resolve conviver com o problema. Tonturas, quem<br />

não as tem? O autodiagnóstico indicava uma labirintite<br />

inocente. Para que se preocupar?<br />

Meses <strong>de</strong>pois, o escritor encontra ‑se a caminho do cen‑<br />

tro cirúrgico <strong>de</strong> um hospital, para uma “cirurgia brutal”, a<br />

trepanação. Ou seja, os médicos iam lhe abrir a cabeça. Era<br />

portador <strong>de</strong> um aneurisma cerebral (que os médicos cha‑<br />

mam pelo dançante nome <strong>de</strong> veia bailarina), “uma granada<br />

<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> minha cabeça, que podia explodir a qualquer mo‑<br />

mento”. Por sorte, a granada fora diagnosticada a tempo.<br />

Se explodisse, ia <strong>de</strong>ixá ‑lo inválido, um vegetal.<br />

Enquanto aguarda a operação, <strong>mais</strong> ou menos como<br />

o náufrago que está se afogando, o escritor faz um balanço<br />

em sua vida, a ameaça do aneurisma, a ansieda<strong>de</strong> se mis‑<br />

tura a velhas perplexida<strong>de</strong>s, revê situações, amigos, como<br />

num cineminha particular, reflete, indaga a si mesmo.<br />

Como observa Deonísio da Silva, “Veia bailarina é um<br />

livro sobre a dor, o medo, as nossas perdas <strong>de</strong> cada dia, as<br />

do varejo, e aquelas acumuladas ao longo da vida, no ata‑<br />

cado”. Mas, em nenhum momento, felizmente, o escritor<br />

sucumbe à tentação <strong>de</strong> se lamuriar. A situação é inquie‑<br />

tante, dramática, mas o tom é suave, bem ‑humorado, por<br />

vezes sarcástico. Após o êxito da operação e a recuperação,<br />

com o prazer <strong>de</strong> se constatar vivo e saudável, o escritor<br />

extrai <strong>de</strong> toda aquela amarga experiência uma lição ele‑<br />

mentar. Tinha <strong>de</strong> recomeçar. Viver a sua vida, com o que<br />

ela tem “<strong>de</strong> bom e ruim, com alegrias e inquietações, so‑<br />

frimento e felicida<strong>de</strong>, encargos, chatices, encontros e <strong>de</strong>‑<br />

sencontros”. A re<strong>de</strong>scoberta da vida.<br />

I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />

151


VOCÊ É JOVEM, VELHO<br />

OU DINOSSAURO?<br />

1 a edição – 176 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1290 ‑5<br />

Perguntar não ofen<strong>de</strong>. O difícil é o indagado pôr <strong>de</strong><br />

lado suas pretensões e vaida<strong>de</strong>s e respon<strong>de</strong>r: Você é jovem,<br />

velho ou dinossauro?<br />

Com esse objetivo, inspirado em uma velha página <strong>de</strong><br />

Machado <strong>de</strong> Assis, Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão propõe neste<br />

livro uma série <strong>de</strong> “testes para saber se sua memória é uma<br />

coisa, mas suas lembranças po<strong>de</strong>m ser outras, mostrando<br />

que você é <strong>mais</strong> jovem, mas também po<strong>de</strong> ser <strong>mais</strong> velho<br />

do que imagina”.<br />

Testes muito simples, através <strong>de</strong> perguntas relaciona‑<br />

das com fatos vividos na infância e na adolescência por<br />

todos os maiores <strong>de</strong> trinta (põe trinta nisso) <strong>anos</strong>. Por<br />

exemplo: “Você era bom em composição, que hoje se<br />

chama redação?”. Ou perguntas <strong>mais</strong> provocativas, que<br />

servem para avaliar suas lembranças do adolescente aco‑<br />

modado ou agressivo que você foi: “Quando começava a<br />

discutir com alguém, fazia um risco com carvão ou caco <strong>de</strong><br />

telha no chão e <strong>de</strong>safiava: Passe daqui?”.<br />

O teste aborda também lembranças ligadas à religio‑<br />

sida<strong>de</strong> (“Qual era a primeira pergunta do catecismo?”) e à<br />

temores <strong>de</strong>la <strong>de</strong>correntes: “Tinha medo <strong>de</strong> tocar a hóstia<br />

com os <strong>de</strong>ntes ou <strong>de</strong> mordê ‑la, porque <strong>de</strong>la sairia o sangue<br />

<strong>de</strong> Cristo, como diziam?”.<br />

E a linguagem daquela época, hem, com sua gíria que<br />

hoje nos faz sorrir, vagamente irônicos e saudosos. Veja se<br />

você lembra se “comentava com os amigos: Aquele broti‑<br />

nho é <strong>de</strong><strong>mais</strong>?”.<br />

No final, esse conjunto <strong>de</strong> indagações constitui um<br />

verda<strong>de</strong>iro inquérito sociológico, mas, por certo, vai tam‑<br />

bém acionar as lembranças <strong>de</strong> muita gente, apontando<br />

dados e fatos não relacionados no livro, preenchendo a fi‑<br />

nalida<strong>de</strong> proposta pelo autor: “um jogo para aproveitar<br />

sozinho ou com os amigos <strong>de</strong>pois do jantar, no fim <strong>de</strong> se‑<br />

mana, nos dias <strong>de</strong> chuva, na cama, entre um casal, em uma<br />

festa, churrasco, no bar, no intervalo <strong>de</strong> convenção <strong>de</strong> tra‑<br />

balho” ou simplesmente para matar o tempo em um con‑<br />

sultório ou numa noite <strong>de</strong> insônia.<br />

152<br />

iI Gg n á Cc iI o d e lL o y o Ll a B r a n d ã o<br />

ZERO<br />

12 a edição – 312 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0280 ‑5<br />

Zero, <strong>de</strong> Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão, nasceu sob<br />

chumbo grosso. Retrato ácido da socieda<strong>de</strong> brasileira na<br />

década <strong>de</strong> 1960, atemorizada pela ditadura militar, a cen‑<br />

sura, a repressão, os esquadrões da morte, o livro, concluído<br />

em 1969, foi recusado por quatro editoras. Caso único na<br />

história da literatura brasileira, teve sua primeira edição em<br />

italiano, em 1974, sendo lançado no Brasil apenas no ano<br />

seguinte. Breve momento <strong>de</strong> relax. Em 1976, voltava a ser<br />

proibido pela censura, só se tornando acessível ao público<br />

três <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois.<br />

Contando com sarcasmo e mau humor uma história<br />

<strong>de</strong> violência extrema, numa socieda<strong>de</strong> dominada pelo vazio<br />

existencial, as aberrações sexuais e <strong>de</strong> comportamento, a<br />

corrupção, o ódio, a mentira, Zero inovava também o ro‑<br />

mance brasileiro, com um texto fragmentado, misturando<br />

slogans publicitários, notas <strong>de</strong> pé <strong>de</strong> página, reprodução<br />

fac ‑similar <strong>de</strong> páginas <strong>de</strong> jornal, <strong>de</strong>poimento, texto jorna‑<br />

lístico, estilo <strong>de</strong> história em quadrinhos, a palavra dura <strong>de</strong><br />

um narrador em primeira pessoa.<br />

Não há nenhuma esperança, todos parecem con<strong>de</strong>na‑<br />

dos ao <strong>de</strong>sespero, vivendo num clima <strong>de</strong> sufocante pessi‑<br />

mismo, introduzido logo na epígrafe do livro, nos versos do<br />

poeta português Alexandre O’Neill: “O medo vai ter tudo/<br />

quase tudo/ e cada um por seu caminho/ havemos todos<br />

<strong>de</strong> chegar/ quase todos/ a ratos/ Sim/ a ratos.”.<br />

Clássico da literatura brasileira, consagrado pela crítica,<br />

prestigiado pelo público, traduzido em oito idiomas, docu‑<br />

mento palpitante <strong>de</strong> uma fase <strong>de</strong> angústia e <strong>de</strong>sespero da<br />

história brasileira, Zero foi eleito um dos cem melhores ro‑<br />

mances do século XX. A presente edição, inteiramente mo‑<br />

<strong>de</strong>rnizada e re<strong>de</strong>senhada, inclui, graças aos mo<strong>de</strong>rnos<br />

recursos da informática, ilustrações suprimidas na primeira.<br />

i G n á C i o d e l o y o l a B r a n d ã o


ZERO<br />

EDIÇÃO COMEMORATIVA<br />

35 ANOS<br />

13 a edição – <strong>39</strong>2 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1499 ‑2<br />

Bem distante do pesa<strong>de</strong>lo da ditadura, sagrado e con‑<br />

sagrado, <strong>de</strong>finido por Antonio Candido “como símbolo<br />

vivo da liberda<strong>de</strong> do espírito e dos direitos da inteligência”,<br />

escolhido como um dos cem melhores livros brasileiros do<br />

século passado, Zero ganha uma primorosa edição come‑<br />

morativa dos trinta e cinco <strong>anos</strong> <strong>de</strong> seu lançamento no<br />

Brasil, com uma capa criativa, prefácio <strong>de</strong> Walnice No‑<br />

gueira Galvão, <strong>de</strong>poimento do autor, fac ‑símiles do origi‑<br />

nal, capas <strong>de</strong> edições estrangeiras (que indicam tratar ‑se da<br />

“história <strong>de</strong> um herói latinoamericano nos cárceres facis‑<br />

tas”), iconografia <strong>de</strong> época e um amplo documentário<br />

sobre as venturas, <strong>de</strong>sventuras e reações provocadas pelo<br />

livro. Com <strong>de</strong>talhes curiosos. Como o levante contra a sua<br />

proibição, o primeiro ataque direto sofrido pela censura do<br />

regime militar. Ou a sua venda, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> proibido, em uma<br />

livraria a cem metros da Polícia Fe<strong>de</strong>ral.<br />

Vale a pena lembrar que, antes <strong>de</strong> sair no Brasil, Zero<br />

foi publicado na Itália, com intensa repercussão internacio‑<br />

nal, e logo traduzido em diversos idiomas. Apesar <strong>de</strong> tratar<br />

<strong>de</strong> um problema <strong>de</strong> consciência nacional, a obra não po<strong>de</strong><br />

ser lida pelos brasileiros. Só no ano seguinte, 1975, o ro‑<br />

mance foi lançado no Brasil, provocando ataques histéricos<br />

nos governantes e a sua consequente proibição. O livro<br />

dizia o que muita gente gostaria <strong>de</strong> ter dito, mas que nin‑<br />

guém ainda ousara fazê ‑lo, pelo menos com a crueza e<br />

rispi<strong>de</strong>z com que Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão retratava a<br />

<strong>de</strong>sesperançada socieda<strong>de</strong> brasileira da década <strong>de</strong> 1960.<br />

Zero po<strong>de</strong> ser lido, hoje, como o romance <strong>de</strong> uma<br />

geração da qual roubaram os principais bens da vida: a<br />

esperança e a liberda<strong>de</strong>, mas, como observa Walnice No‑<br />

gueira Galvão “não se trata <strong>de</strong> um <strong>de</strong>poimento sobre a<br />

ditadura, mas <strong>de</strong> um testemunho da ditadura, gerado pela<br />

paixão e pela agonia por ela impostas”.<br />

i G n á C i o d e l o y o l a B r a n d ã o<br />

OBRAS DE LITERATURA INFANTIL E JUVENIL<br />

DO AUTOR<br />

• Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão crônicas para jovens (prelo)<br />

• Manifesto ver<strong>de</strong><br />

• O homem que espalhou o <strong>de</strong>serto<br />

• O menino que não teve medo do medo<br />

• O primeiro emprego<br />

• O segredo da nuvem<br />

• Os escorpiões contra o círculo <strong>de</strong> fogo<br />

i G n á C i o d e l o y o l a B r a n d ã o<br />

153


Arquivo pessoal<br />

C o l e ç ã o<br />

l u í s d a C â M a r a<br />

C a s C u d o<br />

154<br />

O único estudioso em sua especialida<strong>de</strong> que tinha<br />

uma visão verda<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> nosso folclore, mesmo<br />

tendo vivido por quase nove décadas no Rio Gran<strong>de</strong><br />

do Norte. Nasceu em Natal, em 1898. Além do tra‑<br />

balho como folclorista, foi professor, etnólogo, his‑<br />

toriador e advogado. Foi o jornalista que começou a<br />

escrever crônicas sobre manifestações populares. Em<br />

1941, fundou a Socieda<strong>de</strong> Brasileira <strong>de</strong> Folclore, da<br />

qual foi o primeiro presi<strong>de</strong>nte.<br />

Escreveu aproximadamente 160 livros tendo como<br />

foco a cultura brasileira. Para estabelecer compara‑<br />

ções e reunir novas informações sobre hábitos e cos‑<br />

tumes do povo brasileiro, Cascudo trocava corres ‑<br />

pondência com pesquisadores do Brasil e do mundo.<br />

Além disso, costumava ler um livro por dia. Entre suas<br />

obras <strong>mais</strong> conhecidas, <strong>de</strong>stacam ‑se Dicionário do<br />

folclore brasileiro, Antologia do folclore brasileiro e<br />

Contos tradicionais do Brasil. <strong>Professor</strong> Cascudo –<br />

como ele gostava <strong>de</strong> ser chamado – morreu em 1986.<br />

A memória é a imaginação no povo, mantida e<br />

comunicável pela tradição. Movimentando as<br />

culturas convergidas para o uso, através do tempo.


ANTOLOGIA DA<br />

ALIMENTAÇÃO<br />

NO BRASIL<br />

2 a edição – 304 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1292 ‑9<br />

Se você, além <strong>de</strong> comer bem, gosta <strong>de</strong> variar <strong>de</strong> prato<br />

e conversar sobre comida, está na hora <strong>de</strong> se <strong>de</strong>liciar com<br />

a Antologia da alimentação no Brasil, que Luís da Câmara<br />

Cascudo organizou como complemento à sua monumental<br />

História da alimentação no Brasil.<br />

O livro reúne 62 textos (tão <strong>de</strong>liciosos quanto o tema<br />

<strong>de</strong> que tratam), evocando aspectos da alimentação do bra‑<br />

sileiro “sob os vários ângulos <strong>de</strong> fixação histórica, etnográ‑<br />

fica, literária, social”, nas palavras do autor.<br />

Trocado em miúdos: tudo o que se relaciona com o<br />

prazer <strong>de</strong> comer e beber, através <strong>de</strong> <strong>de</strong>poimentos <strong>de</strong> estu‑<br />

diosos do assunto, <strong>de</strong> viajantes, <strong>de</strong> gourmets e gourmands<br />

<strong>de</strong>clarados ou disfarçados, em páginas velhas e novas, a<br />

partir do século XVII aos nossos dias.<br />

Com apetite pelo assunto, sem sombra <strong>de</strong> dispepsia,<br />

eles falam <strong>de</strong> rituais <strong>de</strong> alimentação e <strong>de</strong> bebedores, ofere‑<br />

cem receitas <strong>de</strong> pratos tradicionais, <strong>de</strong> doces e salgados, <strong>de</strong><br />

molhos, <strong>de</strong> todo tipo <strong>de</strong> bebidas, dos refrescos tradicionais<br />

(caju, açaí etc.) aos vinhos e licores, exaltam as frutas da<br />

terra, <strong>de</strong>strincham os segredos e evocam os sabores das<br />

cozinhas regionais, analisam a herança <strong>de</strong> origem portu‑<br />

guesa, negra, indígena.<br />

Em prosa ou verso, falam, ainda, <strong>de</strong> muito <strong>mais</strong>, da<br />

arte <strong>de</strong> servir a mesa, do preparo <strong>de</strong> cocktails (uma invasão<br />

norte ‑americana), <strong>de</strong> duelos gastronômicos, dos velhos<br />

mercados, da comercialização <strong>de</strong> alimentos, da caça e da<br />

pesca, da comida <strong>de</strong> santo, das socieda<strong>de</strong>s organizadas<br />

para comer e conversar, contam causos e histórias saboro‑<br />

sas, como a introdução do sorvete no Brasil, os hábitos<br />

alimentares <strong>de</strong> D. Pedro II, o cotidiano <strong>de</strong> bares e cozinhas,<br />

traçando um amplo panorama das preferências gastronô‑<br />

micas do brasileiro e aguçando a gulodice do leitor.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

ANTOLOGIA DO<br />

FOLCLORE BRASILEIRO<br />

Volume I – 9 a edição – 328 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0689 ‑8<br />

Volume II – 6 a edição – 336 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0760 ‑4<br />

Os dois volumes da Antologia do folclore brasileiro, <strong>de</strong><br />

Luís da Câmara Cascudo, formam um painel sem similar<br />

sobre aspectos do folclore e da etnografia brasileira, atra‑<br />

vés da reunião <strong>de</strong> cem textos <strong>de</strong> autores brasileiros e es‑<br />

trangeiros, vários <strong>de</strong>les <strong>de</strong> acesso extremamente difícil. No<br />

prefácio à obra, Cascudo explica seu objetivo: “apresentar<br />

os aspectos <strong>mais</strong> vivos do Povo brasileiro através <strong>de</strong> quatro<br />

séculos”, ajustado ao conceito <strong>de</strong> folclore como “uma ciên‑<br />

cia da psicologia coletiva”, com finalida<strong>de</strong> em psiquiatria,<br />

sociologia, política, religião.<br />

Os <strong>de</strong>poimentos começam quando o Brasil ainda<br />

amanhecia, narrados por viajantes estrangeiros, indo até os<br />

estudiosos brasileiros do século XX. Que viagem fabulosa!<br />

O leitor po<strong>de</strong> partilhar a surpresa <strong>de</strong> Gaspar <strong>de</strong> Carvajal,<br />

em 1541, ao assistir ao combate <strong>de</strong> seus companheiros<br />

com as amazonas; acompanhar o terror <strong>de</strong> Hans Sta<strong>de</strong>n,<br />

prisioneiro dos índios, pronto a ser <strong>de</strong>vorado; os fantasmas<br />

noturnos que apavoravam os índios, segundo o <strong>de</strong>poi‑<br />

mento <strong>de</strong> Anchieta; a dança <strong>de</strong> guerra dos Tupinambá,<br />

narrada por Jean <strong>de</strong> Léry. Nos séculos XIX e XX, com o país<br />

povoado e <strong>de</strong>senvolvido, mas asperamente pitoresco a<br />

olhos <strong>de</strong> estrangeiros, sobretudo europeus, o leitor se <strong>de</strong>li‑<br />

cia com a malhação do Judas, testemunhada por Debret;<br />

as seduções do lundu, dança presenciada por Tollenare;<br />

Spruce ouvindo, <strong>de</strong>liciado, o canto do uirapuru. Não menos<br />

interessante, os autores brasileiros estudam lendas, cren‑<br />

ças, superstições, pesquisam os apelidos, registram quadri‑<br />

nhas populares, ditados, feitiços e <strong>de</strong>safios, narram<br />

vaquejadas, analisam adivinhas, danças típicas, a alimenta‑<br />

ção do homem do povo, refletem sobre o inconsciente<br />

folclórico, numa fantástica viagem <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 450 <strong>anos</strong><br />

pelo imaginário, crenças e terrores do homem brasileiro.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

155


CANTO DE MURO<br />

4 a edição – 232 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1070 ‑0<br />

Quem conhece Luís da Câmara Cascudo apenas como<br />

folclorista e etnógrafo vai se surpreen<strong>de</strong>r (e se <strong>de</strong>liciar) com<br />

este Canto <strong>de</strong> muro. “Romance <strong>de</strong> costumes”, como o<br />

chamou o autor, o livro po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>finido como um <strong>de</strong>sla‑<br />

vado namoro com a natureza e reverência pelas espécies<br />

ani<strong>mais</strong> menos prestigiadas pelo bicho ‑homem: ratos, co‑<br />

bras, escorpiões, morcegos, aranhas, baratas “profissional‑<br />

mente famintas”, formigas, besouros, o grilo “solitário e<br />

tenor”, o sapo “orgulhoso, atrevido e covar<strong>de</strong> na classe<br />

musical dos barítonos”, as lagartixas, muito educadas, ba‑<br />

lançando “as cabecinhas triangulares concordando com<br />

tudo”, todo o povinho miúdo que vive nos quintais das<br />

velhas casas, nos cantos <strong>de</strong> muro, entre trepa<strong>de</strong>iras, tijolos<br />

quebrados, e um tanque, no qual vão se abeberar os bem‑<br />

‑te ‑vis, os xexéus, as lava<strong>de</strong>iras ‑<strong>de</strong> ‑casaca ‑preta.<br />

Com tais senhores e senhoras flagrados em suas ativida‑<br />

<strong>de</strong>s diárias (a busca <strong>de</strong> alimento, a luta das espécies, os rituais<br />

<strong>de</strong> acasalamento), Cascudo constrói uma espécie <strong>de</strong> narrativa<br />

épica, repleta <strong>de</strong> poesia, na qual esses pequenos e humil<strong>de</strong>s<br />

seres assumem a gran<strong>de</strong>za <strong>de</strong> personagens <strong>de</strong> Homero.<br />

De fato, há alguma coisa <strong>de</strong> epopeia na caçada <strong>de</strong><br />

Sofia, a coruja, aos morcegos; no banquete <strong>de</strong> Fu, o sapo,<br />

<strong>de</strong>liciando ‑se com uma colônia <strong>de</strong> mosquitos, mas engo‑<br />

lindo também um inconveniente besouro que ferra sua<br />

língua grossa; no grilo roendo ma<strong>de</strong>ira velha e tendo como<br />

sobremesa sementes ver<strong>de</strong>s e talos tenros; no duelo <strong>de</strong> Ti‑<br />

tius, o escorpião, que ao correr “lembra uma gôndola <strong>de</strong><br />

doge <strong>de</strong> Veneza”; e nas ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> tantos outros Ulisses<br />

e Agamenons do quintal.<br />

Só que eles não lutam pela conquista <strong>de</strong> Troias ou <strong>de</strong><br />

tesouros. A sua luta é <strong>mais</strong> humil<strong>de</strong>, pela sobrevivência da<br />

espécie, o que, no fundo, significa também a própria con‑<br />

servação do planeta e a consequente sobrevivência hu‑<br />

mana. Sob esse aspecto, Canto <strong>de</strong> muro é também um<br />

manual <strong>de</strong> ecologia.<br />

156<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

CIVILIZAÇÃO<br />

E CULTURA<br />

PESQUISAS E NOTAS DE<br />

ETNOGRAFIA GERAL<br />

1 a edição – 736 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0873 ‑1<br />

O subtítulo <strong>de</strong> Civilização e cultura indica que a obra<br />

reúne “pesquisas e notas <strong>de</strong> etnografia geral”. Modéstia.<br />

Na realida<strong>de</strong>, trata ‑se <strong>de</strong> um inigualável tratado da ciência<br />

que estuda “todas as manifestações materiais da ativida<strong>de</strong><br />

humana” (<strong>de</strong>finição <strong>de</strong> Jules Hamy), sentido e construído,<br />

mas sobretudo pensado por um grão ‑mestre do assunto,<br />

capaz <strong>de</strong> raciocinar por sua própria cabeça. “Realizo um<br />

jabuti brasileiro que não se escon<strong>de</strong> no bojo da viola <strong>de</strong><br />

nenhum urubu voador para ir à festa do céu ‘científico’”,<br />

ironiza Luís da Câmara Cascudo. Construída com erudição<br />

caudalosa e simplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> água corrente, sólida e harmo‑<br />

niosa como uma catedral medieval, a obra tanto po<strong>de</strong> ser<br />

compulsada por especialistas como por iniciantes em etno‑<br />

grafia. É uma aula memorável, sem paralelo na língua por‑<br />

tuguesa, pronunciada por vezes em estilo quase <strong>de</strong>sa ‑<br />

busado, que talvez faça muito cientista torcer o nariz.<br />

Assim, para alertar sobre a dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> se ter uma<br />

visão clara do homem pré ‑histórico, Cascudo conta a briga<br />

entre um soldado e um marinheiro, <strong>de</strong>senrolada diante <strong>de</strong><br />

cinquenta pessoas. Apesar <strong>de</strong> tantas testemunhas foi im‑<br />

possível reconstituir como começara e terminara a luta,<br />

tamanha as contradições dos <strong>de</strong>poimentos.<br />

Partindo da conceituação da ciência, analisando sua<br />

evolução, <strong>de</strong>batendo suas doutrinas, a obra sintetiza milha‑<br />

res <strong>de</strong> <strong>anos</strong> <strong>de</strong> civilização e cultura, do Paleolítico aos tem‑<br />

pos históricos, numa viagem milenar, da vida do homem<br />

das cavernas à organização do governo e a formulação <strong>de</strong><br />

leis, trilhando todos os atalhos e avenidas que se <strong>de</strong>senvol‑<br />

veram em paralelo a esse gran<strong>de</strong> milagre: a busca <strong>de</strong><br />

abrigo, a proprieda<strong>de</strong>, as ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> caça e pesca, o co‑<br />

mércio, os transportes, a religião, a família, a compreensão<br />

do próprio caminho do homem como criador e transmissor<br />

<strong>de</strong> civilização e cultura.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o


COISAS QUE<br />

O POVO DIZ<br />

2 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1071‑0<br />

O povo diz cada coisa! Irreverente, brincalhão, criativo,<br />

observador, dizem que sua voz é a voz <strong>de</strong> Deus. Po<strong>de</strong> ser. Se<br />

não for, é pelo menos a voz da experiência, expressa em frases<br />

tão sintéticas e sugestivas que atravessam os séculos. E como!<br />

A própria expressão “voz do povo, voz <strong>de</strong> Deus” é um exem‑<br />

plo <strong>de</strong> perenida<strong>de</strong>, viva e palpitante <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a Roma dos Césa‑<br />

res, há <strong>mais</strong> <strong>de</strong> dois mil <strong>anos</strong>, como mostra Luís da Câmara<br />

Cascudo em Coisas que o povo diz. O livro estuda sessenta<br />

motivos <strong>de</strong> cultura popular <strong>de</strong> nosso país, hábitos, costumes,<br />

frases correntes no dia a dia do brasileiro, expressando a velha<br />

e astuta sabedoria do povo, nascida da observação do coti‑<br />

diano e que assumem, com o tempo, um sabor tão pitoresco.<br />

Muitas vezes são recomendações práticas <strong>de</strong> cautela. Assim a<br />

frase “macaco velho não mete a mão em cumbuca”, comum<br />

entre os índios Tupi a respeito da qual se conta que, <strong>de</strong>sejando<br />

se pegar um macaco jovem, basta colocar uma banana <strong>de</strong>ntro<br />

<strong>de</strong> uma cumbuca. O animal não abre a mão, ficando prisio‑<br />

neiro <strong>de</strong> sua própria gula. Mestre Cascudo mostra que a ori‑<br />

gem da estória vem <strong>de</strong> muito <strong>mais</strong> longe, no tempo e no<br />

espaço, registrada em Roma, na China, na Índia.<br />

Outra expressão <strong>de</strong> cautela é a frase “não meter a mão<br />

no fogo” por alguém. Ou seja, não se responsabilizar pela ino‑<br />

cência alheia. Nasceu na Ida<strong>de</strong> Média, na prova do ferro caldo,<br />

quando o acusado que alegava inocência pegava uma barra <strong>de</strong><br />

ferro aquecida (com a mão protegida com estopa) e andava<br />

com ela alguns metros. Se a mão saísse ilesa, estava provada a<br />

sua inocência. Caso contrário... Há também o registro <strong>de</strong> cren‑<br />

ças mágicas, impossíveis <strong>de</strong> se provar, mas muito populares,<br />

como a <strong>de</strong> que o arrepio seria aviso <strong>de</strong> morte e <strong>de</strong> que não se<br />

<strong>de</strong>ve acen<strong>de</strong>r três cigarros com o mesmo fósforo. E tantas ou‑<br />

tras coisas <strong>mais</strong> que o povo afirma e que Cascudo analisa e in‑<br />

terpreta, num longo e gratificante passeio pelas i<strong>de</strong>ias, crenças<br />

e superstições populares.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

CONTOS TRADICIONAIS<br />

DO BRASIL<br />

13 a edição – 320 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0685 ‑0<br />

Contos tradicionais do Brasil, <strong>de</strong> Luís da Câmara Cas‑<br />

cudo, reúne cem histórias populares, colhidas diretamente<br />

na boca do povo brasileiro. Histórias <strong>de</strong> pobretões que con‑<br />

seguem a mão <strong>de</strong> princesas, <strong>de</strong> <strong>de</strong>mônios logrados pela<br />

astúcia feminina, <strong>de</strong> assombramentos, <strong>de</strong> tratados com a<br />

morte, <strong>de</strong> criminosos <strong>de</strong>nunciados pelo canto <strong>de</strong> um pás‑<br />

saro, <strong>de</strong> enigmas cuja resolução significa a riqueza e a feli‑<br />

cida<strong>de</strong>, um mundo maravilhoso que fascina o brasileiro do<br />

povo, como seduzia, há 4, 5 mil <strong>anos</strong>, o homem do povo<br />

na Suméria, na Babilônia, no Egito. Mestre Cascudo ensina<br />

que o <strong>mais</strong> antigo conto que se conhece, narrando a histó‑<br />

ria <strong>de</strong> dois irmãos, foi escrito por um escriba egípcio, há 32<br />

séculos. História maravilhosa, envolve metempsicose, gra‑<br />

vi<strong>de</strong>z mágica, onipotência real e vários elementos ainda<br />

vivos nas histórias tradicionais brasileiras, num roteiro fan‑<br />

tástico <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 3 mil <strong>anos</strong>, através dos <strong>mais</strong> diversos<br />

povos e culturas, até chegar à boca do contador popular<br />

nor<strong>de</strong>stino ou da mãe carinhosa contando histórias para<br />

adormecer o filho.<br />

Infelizmente, com a urbanização e o advento dos meios<br />

eletrônicos <strong>de</strong> comunicação, essas histórias começaram a ser<br />

esquecidas, vivendo hoje na memória <strong>de</strong> alguns velhos e em<br />

obras como esses Contos tradicionais do Brasil.<br />

Contos que oferecem ao leitor realmente curioso um<br />

duplo prazer: as histórias em si, cuja redação preserva<br />

aquela velha sabedoria e malícia popular, e as notas <strong>de</strong><br />

Mestre Cascudo, eruditíssimas, mas sem sombra <strong>de</strong> pedan‑<br />

tismo, tão sedutoras quanto os próprios contos.<br />

O velho Di<strong>de</strong>rot, citado por Machado <strong>de</strong> Assis, dizia<br />

que quando se faz um conto, o espírito fica alegre, o tempo<br />

escoa ‑se, e o conto da vida acaba, sem a gente dar por isso.<br />

Tão interessante quanto fazer contos é ouvi ‑los ou lê ‑los. O<br />

conto da vida passa rápido e cheio <strong>de</strong> encantamento.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

157


DICIONÁRIO DO<br />

FOLCLORE BRASILEIRO<br />

12 a edição – 756 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1507 ‑4<br />

Obra sem similar em língua portuguesa, e talvez em<br />

todas as outras línguas, o Dicionário do folclore brasileiro,<br />

<strong>de</strong> Luís da Câmara Cascudo, reaparece conforme a última<br />

edição revista pelo autor. A mitologia conta que em luta<br />

com Hércules, Anteu, filho da Terra, cada vez que tocava o<br />

chão renovava as forças, como se ganhasse uma nova vida.<br />

À semelhança do gigante grego, o dicionário <strong>de</strong> Cascudo<br />

renova sua importância, cada vez que reaparece nas livra‑<br />

rias. Espécie <strong>de</strong> súmula <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> quarenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> es‑<br />

tudo e pesquisa apaixonada do folclore e da etnografia<br />

brasileira, a obra é também uma síntese viva e palpitante,<br />

através <strong>de</strong> milhares <strong>de</strong> verbetes, das superstições, crendi‑<br />

ces, mitos, danças, lendas, práticas mágicas adotadas e vi‑<br />

vidas pelo povo brasileiro em seu cotidiano.<br />

Aliás, é isso e muito <strong>mais</strong> do que isso. Registra, por exem‑<br />

plo, locais <strong>de</strong> <strong>de</strong>voção popular, como Bom Jesus da Lapa, na<br />

Bahia, Aparecida e Bom Jesus <strong>de</strong> Pirapora, em São Paulo, for‑<br />

mas <strong>de</strong> trabalho cooperativo (mutirão), movimentos <strong>de</strong> rebel‑<br />

dia popular, como o cangaço, informa sobre os cangaceiros<br />

<strong>mais</strong> famosos, aqueles que <strong>de</strong>ixaram um rastro <strong>de</strong> fama e <strong>de</strong><br />

sangue na alma popular (Cabeleira, Lampião) e, por contraste<br />

e complemento, os santos preferidos pela <strong>de</strong>voção popular:<br />

São Jorge, Lázaro, José, João, Pedro, Gonçalo, Antonio e seu<br />

duplo, muito venerado pelos escravos, Santo Antonio Preto.<br />

Po<strong>de</strong> ‑se afirmar que não há ocorrência <strong>de</strong> caráter fol‑<br />

clórico ou etnográfico que não esteja registrado em seu<br />

<strong>de</strong>vido verbete, sempre enriquecido com bibliografia indis‑<br />

pensável ao aprofundamento do assunto.<br />

Mais do que um dicionário, a obra <strong>de</strong> Cascudo é uma<br />

introdução à cultura viva do povo brasileiro que, graças à<br />

cooperação <strong>de</strong> estudiosos, se amplia e enriquece a cada<br />

edição. Como dizia a Bíblia, escrever livros (sobretudo dicio‑<br />

nários) é uma tarefa sem fim.<br />

158<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

FOLCLORE DO BRASIL<br />

Prelo<br />

Ciência, arte, cultura viva: o folclore está presente na vida<br />

diária <strong>de</strong> cada habitante do planeta, apesar <strong>de</strong> ele nem <strong>de</strong>s‑<br />

confiar. Muitos <strong>de</strong> nossos gestos, expressões e crendices re‑<br />

montam a milhares <strong>de</strong> <strong>anos</strong>. Não há nada <strong>de</strong> novo sob o sol,<br />

já dizia o Rei Salomão. “Há ‘novida<strong>de</strong>s’ que contam 23 mil<br />

<strong>anos</strong>”, completa o mestre Luís da Câmara Cascudo, nesse<br />

autêntico curso <strong>de</strong> extensão cultural, semelhante ao organi‑<br />

zado por muitas universida<strong>de</strong>s, intitulado Folclore do Brasil.<br />

O livro se divi<strong>de</strong> em nove capítulos, abordando cam‑<br />

pos <strong>de</strong> conhecimento específicos do amplo universo do<br />

folclore. Em “Cultura popular e folclore”, Cascudo explica<br />

que nem tudo que é popular é folclore, ilusão cultivada por<br />

muitos. “Festas tradicionais, folguedos e bailes” discute o<br />

Carnaval, São João e Natal, as gran<strong>de</strong>s datas <strong>de</strong> folgança.<br />

“Era uma vez...” analisa o tema apaixonante dos contos<br />

populares, lendas, anedotas e adivinhas, alguns com <strong>mais</strong><br />

<strong>de</strong> 5 mil <strong>anos</strong>. “Bebidas e alimentos populares” é uma pe‑<br />

quena história <strong>de</strong> hábitos e crendices ligados à alimenta‑<br />

ção, do homem <strong>de</strong> Cro ‑Magnon aos dias atuais. “Visagens<br />

e assombrações” mergulha no mundo mágico <strong>de</strong> apari‑<br />

ções, lobisomens e outros seres fantásticos.<br />

A viagem continua com um suave balanceio <strong>de</strong> corpo<br />

no capítulo intitulado “Dança, Brasil!”, no qual Cascudo<br />

lembra que “antes <strong>de</strong> o primeiro brasileiro nascer, indíge‑<br />

nas, portugueses e escravos afric<strong>anos</strong> dançavam há muitos<br />

séculos”. Da dança à “Capoeira” a transição é natural, já<br />

que a luta teve origem em rituais <strong>de</strong> dança. O livro se en‑<br />

cerra com um estudo sobre o provérbio brasileiro “em<br />

tempo <strong>de</strong> murici, cada um cui<strong>de</strong> <strong>de</strong> si”, que po<strong>de</strong> ser visto<br />

como um convite para o leitor, terminado o livro, meditar<br />

sobre o que leu e apren<strong>de</strong>u – e cuidar <strong>de</strong> si.<br />

Prelo<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o


GEOGRAFIA DOS<br />

MITOS BRASILEIROS<br />

3 a edição – 400 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0709 ‑2<br />

Lobisomem, Saci ‑Pererê, Mula sem Cabeça e muitos<br />

outros seres fantásticos, que povoam a imaginação do bra‑<br />

sileiro, são os gran<strong>de</strong>s personagens da Geografia dos mitos<br />

brasileiros, <strong>de</strong> Luís da Câmara Cascudo. Para muita gente,<br />

perdida pelos grotões e roças do país, eles são criaturas tão<br />

vivas quanto o vizinho ou o leitor. Não é para menos. Al‑<br />

guns costumam se intrometer na vida humana, como per‑<br />

turbadores ou entida<strong>de</strong>s benéficas, exigindo doações (o<br />

fumo <strong>de</strong> rolo que o caboclo <strong>de</strong>ixa na encruzilhada para<br />

o Saci) ou aten<strong>de</strong>ndo pedidos, como o Negrinho do Pasto‑<br />

reio. Ou até engravidando moças, função exercida com<br />

muita competência pelo Boto. Esses mitos, ainda palpitan‑<br />

tes <strong>de</strong> vida entre a socieda<strong>de</strong> rural, estão presentes em<br />

todas as regiões do país, como assinala o levantamento <strong>de</strong><br />

Mestre Cascudo, estado a estado, mas cada vez <strong>mais</strong> amea‑<br />

çados pela penetração do rádio e da televisão.<br />

Como em todo fato social, há os <strong>mais</strong> populares (que<br />

Cascudo classifica como “mitos primitivos e gerais”), nos<br />

quais se incluem ainda as entida<strong>de</strong>s que formam os ciclos<br />

“da angústia infantil” e “dos monstros”. No primeiro, figu‑<br />

ras aterradoras para as crianças, como a Coca, as Bruxas e<br />

o Mão <strong>de</strong> Cabelo, <strong>de</strong> Minas Gerais, que corta a “minhoqui‑<br />

nha” dos meninos que não querem dormir.<br />

Entre os mitos <strong>de</strong> menor abrangência geográfica, que<br />

Cascudo classifica como “secundários e locais”, há alguns<br />

que ultrapassaram sua região e hoje são conhecidos em<br />

todo o país, graças à literatura (a Cobra Norato, motivo do<br />

poema <strong>de</strong> Raul Bopp) e o Matita Pereira, da música <strong>de</strong><br />

Antonio Carlos Jobim.<br />

Com sua erudição sem pedantismo, sempre com o<br />

dom <strong>de</strong> interessar o leitor, Mestre Cascudo prova que a<br />

companhia dos monstros, muitas vezes, em vez <strong>de</strong> pesa‑<br />

<strong>de</strong>lo, po<strong>de</strong> ser uma viagem “legitimamente maravilhosa”.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

HISTÓRIA DA<br />

ALIMENTAÇÃO<br />

NO BRASIL<br />

4 a edição – 960 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1583 ‑8<br />

Um observador malicioso, por certo gourmet e gour‑<br />

mand, observou que o índice <strong>de</strong> civilização <strong>de</strong> um povo<br />

po<strong>de</strong> ser medido pelo requinte <strong>de</strong> sua cozinha. Tempos<br />

antes, o glutão Brillat ‑Savarin já afirmara que o <strong>de</strong>stino das<br />

nações <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da maneira como elas se alimentam. Inte‑<br />

ressado na mistura do feijão com o arroz, no preparo dos<br />

temperos, no corte <strong>de</strong> legumes e verduras, nas <strong>de</strong>lícias das<br />

sobremesas, nos rituais e superstições alimentares, Luís da<br />

Câmara Cascudo reuniu durante <strong>mais</strong> <strong>de</strong> vinte <strong>anos</strong> infor‑<br />

mações (e provou comidas) para traçar sua História da ali‑<br />

mentação no Brasil, espécie <strong>de</strong> história do brasileiro através<br />

daquilo que entra pela sua boca.<br />

Com uma abrangência enciclopédica, o <strong>mais</strong> com‑<br />

pleto e fascinante estudo sobre a cozinha brasileira, em<br />

seus múltiplos aspectos, a obra divi<strong>de</strong> ‑se em duas partes.<br />

Na primeira, o autor analisa o tríplice legado que, mistu‑<br />

rado, refogado e temperado, iria formar a cozinha brasi‑<br />

leira típica: a herança indígena, africana e portuguesa.<br />

A segunda parte vai muito além do estudo da cozinha<br />

brasileira, com seus sabores e odores, pratos típicos e mistu‑<br />

ras, registrando e analisando, com gula, mas sem pressa, os<br />

múltiplos elementos sociais que giram próximo à cozinha: a<br />

sociologia da alimentação, o ritmo da refeição (dos bons<br />

tempos em que a família se reunia ao redor da mesa patriar‑<br />

cal à época do fast ‑food), o folclore e as superstições ligadas<br />

à alimentação, as bebidas <strong>de</strong> preferência do brasileiro. Dis‑<br />

cute ainda questões que afetam o paladar e o apetite <strong>de</strong><br />

todos nós, como os mitos ligados à cozinha africana e a<br />

contribuição <strong>de</strong> imigrantes, sobretudo alemães e itali<strong>anos</strong>.<br />

Em síntese, a História da alimentação no Brasil é um<br />

saboroso prato literário, ressaltando uma cozinha original<br />

que, se a observação <strong>de</strong> Brillat ‑Savarin for correta, terá um<br />

brilhante <strong>de</strong>stino.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

159


HISTÓRIA DOS<br />

NOSSOS GESTOS<br />

1 a edição – 286 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0791 ‑2<br />

Os ingênuos que julgam o passado morto precisam ler<br />

urgentemente História <strong>de</strong> nossos gestos, <strong>de</strong> Luís da Câ‑<br />

mara Cascudo. Lição <strong>de</strong> antropologia, evocação histórica,<br />

registro folclórico, escrito com a leveza <strong>de</strong> uma pluma<br />

caindo e a erudição <strong>de</strong> um sábio alemão, o livro, distribuído<br />

em 333 capítulos brevíssimos, mostra a perpetuida<strong>de</strong> mui‑<br />

tas vezes milenar <strong>de</strong> nossos gestos, a primeira linguagem<br />

humana, moedinhas <strong>de</strong> circulação diária cuja data <strong>de</strong><br />

cunhagem ignoramos, alguns remontando à aurora dos<br />

tempos históricos, há 3, 4 mil <strong>anos</strong>.<br />

“O Gesto é anterior à Palavra. Dedos e braços falaram<br />

milênios antes da Voz. As áreas do Entendimento mímico<br />

são infinitamente superiores às da comunicação verbal. A<br />

Mímica não é complementar mas uma provocação ao exer‑<br />

cício da oralida<strong>de</strong>. Sem gestos, a Palavra é precária e pobre<br />

para o entendimento temático”, observa Cascudo.<br />

Quem po<strong>de</strong>ria imaginar que o simples ato <strong>de</strong> esfregar as<br />

mãos, como sinal <strong>de</strong> alegria, tenha nascido nos sacrifícios <strong>de</strong><br />

gratidão aos <strong>de</strong>uses, há milhares <strong>de</strong> <strong>anos</strong>? O V da vitória,<br />

popularizado pelo primeiro ‑ministro inglês Winston Churchill,<br />

durante a Segunda Guerra Mundial, e tão usado hoje pela<br />

geração paz e amor, era o gesto executado pelo gladiador<br />

ferido na arena romana, há 2 mil <strong>anos</strong>, pedindo perdão. Esti‑<br />

car a língua para fora da boca, como sinal <strong>de</strong> zombaria, cons‑<br />

tituía uma atitu<strong>de</strong> velhíssima há 2 mil <strong>anos</strong>, quando o poeta<br />

Pérsio o registrou. A assistência que bate palmas para um ar‑<br />

tista repete um gesto praticado em Babilônia, há <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 3 mil<br />

<strong>anos</strong>, significando então um pedido <strong>de</strong> proteção aos <strong>de</strong>uses.<br />

Há também gestos típicos brasileiros, sem similar em<br />

parte alguma, como o ato <strong>de</strong> dobrar o <strong>de</strong>do indicador<br />

em anzol, que se executa para o papagaio pousar os pés,<br />

dirigindo ‑o à pessoa que fala <strong>de</strong><strong>mais</strong>. Simples, provocativo,<br />

<strong>mais</strong> eloquente do que mil palavras.<br />

160<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

JANGADA<br />

UMA PESQUISA ETNOGRÁFICA<br />

2 a edição – 174 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0711 ‑4<br />

Embarcação <strong>mais</strong> antiga do mundo, com 30 mil <strong>anos</strong><br />

<strong>de</strong> vida, “primeira fórmula consciente do navio dirigido por<br />

mão humana”, a jangada navegou por todos os mares da<br />

Antiguida<strong>de</strong>. Os povos marítimos a conheceram e a utiliza‑<br />

ram como veículo <strong>de</strong> pesca e <strong>de</strong> heroísmos. Há 3 mil <strong>anos</strong><br />

Ulisses já a fabricava com suas próprias mãos, como conta<br />

Homero na Odisseia. Os portugueses a encontraram na<br />

Índia, <strong>de</strong> on<strong>de</strong> transplantaram o termo para o Brasil. O veí‑<br />

culo era <strong>de</strong> uso cotidiano do índio brasileiro (chamado <strong>de</strong><br />

igapeba ou piperi), registrado e <strong>de</strong>scrito por Pero Vaz <strong>de</strong><br />

Caminha, em sua carta, com o nome <strong>de</strong> almadia. Com o<br />

tempo, a jangada foi incorporando novos elementos (vela,<br />

bolina, remo <strong>de</strong> governo) e se tornou uma espécie <strong>de</strong> sím‑<br />

bolo da coragem do homem nor<strong>de</strong>stino, em aventuras diá‑<br />

rias pelos ver<strong>de</strong>s mares bravios <strong>de</strong> sua terra natal, como<br />

Luís da Camada Cascudo conta e louva em sua insuperável<br />

Jangada, o melhor livro até hoje escrito sobre o tema, na<br />

bibliografia mundial.<br />

Admirador <strong>de</strong>clarado do janga<strong>de</strong>iro, Cascudo colheu<br />

parte importante <strong>de</strong> seu material no contato com velhos<br />

mestres do ofício, no Rio Gran<strong>de</strong> do Norte, “meus profes‑<br />

sores na jangada e coisas <strong>de</strong> pescarias”. Esse material pul‑<br />

sando vida foi completado pela pesquisa persistente e<br />

apaixonante em livros e documentos, publicados ao longo<br />

dos séculos. Como acontece em seus estudos, Mestre Cas‑<br />

cudo oferece ao leitor muito <strong>mais</strong> do que promete o título<br />

da obra. Jangada não se limita a ser “uma pesquisa etno‑<br />

gráfica”, como afirma o subtítulo, mas um passeio erudito<br />

pela história, ao longo dos séculos, com incursões pelo ter‑<br />

reno do folclore, da sociologia, da economia, da distribui‑<br />

ção geográfica, acrescida ainda <strong>de</strong> uma pequena antologia,<br />

e <strong>de</strong> um vocabulário específico do tema. É uma boa ocasião<br />

para embarcar nessa jangada.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o


LENDAS BRASILEIRAS<br />

9 a edição – 168 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0710 ‑6<br />

Lendas brasileiras, <strong>de</strong> Luís da Câmara Cascudo, reúne<br />

21 tradições populares das cinco gran<strong>de</strong>s regiões geográfi‑<br />

cas do país. Algumas <strong>de</strong>ssas histórias, sem per<strong>de</strong>r a i<strong>de</strong>nti‑<br />

ficação regional, são hoje conhecidas em plano nacional,<br />

graças à difusão da literatura, do rádio, <strong>de</strong> histórias em<br />

quadrinhos, <strong>de</strong> enredos <strong>de</strong> escolas <strong>de</strong> samba, <strong>de</strong> curtas‑<br />

‑metragens. Assim, as lendas da Iara, do Neguinho do Pas‑<br />

toreio, da morte <strong>de</strong> Zumbi dos Palmares, do aparecimento<br />

da imagem <strong>de</strong> Nossa Senhora Aparecida. No entanto, algu‑<br />

mas das lendas incorporadas ao livro serviram <strong>de</strong> temas a<br />

obras famosas da literatura brasileira, sem se populariza‑<br />

rem. Caso da Cobra Norato, que inspirou o poema famoso<br />

<strong>de</strong> Raul Bopp, tão original em sua expressão e origem, ao<br />

contrário <strong>de</strong> outras que, sem per<strong>de</strong>r a i<strong>de</strong>ntificação com a<br />

terra, são variantes <strong>de</strong> tradições multisseculares, presentes<br />

em todos os povos.<br />

É o caso da missa dos mortos, da cida<strong>de</strong> encantada,<br />

residência <strong>de</strong> uma linda rainha, que para ser <strong>de</strong>sencantada<br />

exige um sacrifício <strong>de</strong> sangue, e das cida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>saparecidas<br />

nas águas do mar ou <strong>de</strong> rios, em geral por castigo divino,<br />

em cujo local se ouvem rumores estranhos, lembrando as<br />

bíblicas Sodoma e Gomorra.<br />

Uma boa parte das lendas reunidas no livro foi ouvida,<br />

e registrada, por Luís da Câmara Cascudo diretamente da<br />

boca do povo. Para as <strong>de</strong><strong>mais</strong>, utilizou fontes escritas, co‑<br />

lhidas em obras <strong>de</strong> escritores ilustres, como o mineiro<br />

Afonso Arinos e o gaúcho Simões Lopes Neto, mas tam‑<br />

bém em revistas <strong>de</strong> difícil acesso, livros raros. Esses textos<br />

encontram ‑se reproduzidos fielmente, com anotações <strong>de</strong><br />

Mestre Cascudo, esclarecendo o significado <strong>de</strong> termos re‑<br />

gionais, fixando a difusão da história. As Lendas brasileiras,<br />

<strong>de</strong> Luís da Câmara Cascudo, oferecem ao leitor um <strong>de</strong>li‑<br />

cioso passeio pela alma brasileira, sem sair da poltrona.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

LITERATURA ORAL<br />

NO BRASIL<br />

2 a edição – 488 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1061 ‑1<br />

Literatura oral no Brasil é livro sem similar na bibliogra‑<br />

fia brasileira. Obra <strong>de</strong> um pesquisador e erudito sem para‑<br />

lelo. Nascido no fim do século XIX e tendo passado a infância<br />

e parte da juventu<strong>de</strong> no sertão nor<strong>de</strong>stino, Luís da Câmara<br />

Cascudo viveu uma época em que ainda prevaleciam valo‑<br />

res, hábitos, costumes e até organização <strong>de</strong> trabalho típicos<br />

do século XVIII. Os livros eram raríssimos. Conhecimentos,<br />

lendas, contos, poesias, autos, tudo era transmitido <strong>de</strong> forma<br />

oral. Mais tar<strong>de</strong>, estudante universitário, leitor voraz, Cas‑<br />

cudo foi verificando a origem, por vezes remotíssima, <strong>de</strong><br />

fatos e histórias presenciados e ouvidos no sertão. A curiosi‑<br />

da<strong>de</strong> do erudito juntava ‑se à realida<strong>de</strong> vivida, base <strong>de</strong> sua<br />

extensa obra, sempre palpitante <strong>de</strong> vida, como esta Litera‑<br />

tura oral no Brasil.<br />

Iniciando ‑se pela origem do conceito <strong>de</strong> literatura<br />

oral, sua abrangência e vitalida<strong>de</strong>, limites e transmissão, o<br />

livro se espraia como círculos concêntricos numa superfície<br />

líquida, registrando e estudando as infindáveis manifesta‑<br />

ções <strong>de</strong> cultura transmitidas pela oralida<strong>de</strong>: canto, dança,<br />

mitos, lendas, fábulas, tradições, rondas infantis, parlen‑<br />

das, mnemonias, adivinhas, anedotas.<br />

Capítulos especiais são <strong>de</strong>dicados aos contos (contos<br />

<strong>de</strong> encantamento, <strong>de</strong> exemplo, facécias etc.), autos popu‑<br />

lares e poesia (em seus vários gêneros e tipos, romances,<br />

metro, <strong>de</strong>safio etc.) em suas múltiplas manifestações, com‑<br />

pletados com antologia.<br />

Com simplicida<strong>de</strong> e erudição, Cascudo registra, analisa,<br />

compara a presença <strong>de</strong> tradições em vários povos, sempre<br />

migrando, “ondulantes na imaginação coletiva”, a contri‑<br />

buição <strong>de</strong> portugueses, negros e indígenas, assim como as<br />

fontes impressas da literatura oral brasileira, a partir do sé‑<br />

culo XVI, muitas <strong>de</strong>las ainda presentes em nosso cotidiano,<br />

numa impressionante vitalida<strong>de</strong> do espírito popular.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

161


LOCUÇÕES<br />

TRADICIONAIS<br />

NO BRASIL<br />

1 a edição – 336 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0872 ‑2<br />

Se você não sabe on<strong>de</strong> Judas per<strong>de</strong>u as botas ou <strong>de</strong><br />

que morreu o Neves, se ignora o que seja viver no fio da<br />

navalha ou estar rente como pão quente, então chegou a<br />

hora e a vez <strong>de</strong> consultar as Locuções tradicionais no Brasil,<br />

<strong>de</strong> Luís da Câmara Cascudo. Trabalho minucioso, o livro<br />

registra e estuda cerca <strong>de</strong> quinhentas frases feitas que, não<br />

se sabe por quais razões misteriosas, se fixaram <strong>de</strong> maneira<br />

in<strong>de</strong>lével na mente do povo, atravessando gerações e con‑<br />

tinuando presentes à vida cotidiana, mesmo quando <strong>de</strong>sa‑<br />

pareceram há muito os fatos que lhe <strong>de</strong>ram origem.<br />

É um prazer acompanhar a erudição sem pedantismo <strong>de</strong><br />

Cascudo a explicar a origem (quando possível) e o passeio das<br />

locuções através <strong>de</strong> longínquas terras, até chegar ao Brasil. A<br />

maioria se originou na península Ibérica, mas algumas circulam<br />

há <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 2 mil <strong>anos</strong>, sem sinal <strong>de</strong> envelhecimento. Assim,<br />

pegar a ocasião pelo cabelo vem da Grécia clássica. A ocasião<br />

era então representada por um efebo <strong>de</strong>snudo e careca, com<br />

apenas um tufo <strong>de</strong> cabelos na testa. Era pegar e não largar.<br />

Há também as nascidas na França, como a popularís‑<br />

sima virar casaca. Se o leitor provavelmente conhece al‑<br />

guém que já virou casaca – hábito tão comum em nossa<br />

vida política –, é interessante saber que a locução nasceu<br />

no século XVIII. Na época, os partidos políticos adotavam<br />

vestes <strong>de</strong> cores diferentes, obrigando os traidores a usar as<br />

cores <strong>de</strong> seus antigos <strong>de</strong>safetos.<br />

Outras têm origem evi<strong>de</strong>nte e quase dispensam co‑<br />

mentário. Assim, a expressão comer como um aba<strong>de</strong>, alusão<br />

à glutonaria dos padres portugueses, objeto <strong>de</strong> um imenso<br />

anedotário. Há ainda as nascidas no Brasil, como para inglês<br />

ver e carcamano. Voltando ao início, a propósito <strong>de</strong> Judas,<br />

Mestre Cascudo adverte que ele nunca usou bota, tipo <strong>de</strong><br />

calçado surgido na Ida<strong>de</strong> Média. A explicação... Bem, o me‑<br />

lhor é consultar o livro. Há quinhentos motivos para isso.<br />

162<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

MADE IN AFRICA<br />

4 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0687 ‑8<br />

No início da década <strong>de</strong> 1960, Luís da Câmara Cascudo<br />

empreen<strong>de</strong>u uma longa viagem <strong>de</strong> estudos pela África Oci‑<br />

<strong>de</strong>ntal e Oriental. O objetivo era pesquisar in loco a alimen‑<br />

tação popular dos bantos, recolhendo subsídios para sua<br />

monumental História da alimentação no Brasil. Em convívio<br />

com o cotidiano da vida africana, o pesquisador ia tendo<br />

oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> constatar as imensas afinida<strong>de</strong>s espirituais,<br />

culturais, mágicas que unem Brasil e África. Indagando,<br />

vendo e observando, tentando compreen<strong>de</strong>r muitas vezes<br />

o que lhe parecia incompreensível, anotava cada fato vivido<br />

ou presenciado, que tivesse relação com o Brasil, colhido<br />

ainda palpitante na realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada dia. Essa, a origem<br />

dos estudos reunidos em Ma<strong>de</strong> in Africa.<br />

Como esclarece no prefácio, o livro reúne indagações<br />

para “um processo autenticador <strong>de</strong> elementos afric<strong>anos</strong><br />

que permanecem no Brasil e motivos brasileiros que vivem<br />

n’África, modificados, ampliados, assimilados, mas ainda<br />

i<strong>de</strong>ntificáveis e autênticos”, muitos <strong>de</strong>les levados por ex‑<br />

‑escravos <strong>de</strong> torna ‑viagem.<br />

As afinida<strong>de</strong>s estão nos <strong>mais</strong> insuspeitos gestos e pos‑<br />

turas do cotidiano, do andar rebolado, cuja origem Mestre<br />

Cascudo i<strong>de</strong>ntifica no bamboleio da angolana, à prática<br />

<strong>de</strong>leitosa do cafuné, também <strong>de</strong> origem banto; em múlti‑<br />

plos aspectos da cozinha brasileira, po<strong>de</strong>ndo começar pela<br />

nossa farofa, idêntica à angolana, e <strong>de</strong> nossas danças, o<br />

escandaloso lundu, contra o qual os moralistas tanto pro‑<br />

testavam, e a umbigada, <strong>de</strong> extrema sensualida<strong>de</strong>, espécie<br />

<strong>de</strong> rápido mimetismo do ato sexual.<br />

Do continente negro também vieram crendices, enti‑<br />

da<strong>de</strong>s mágicas e temores que ainda povoam a alma do<br />

nosso povo, como o Zumbi, <strong>de</strong> presença tão assustadora<br />

no norte do país, os orixás, a crença em <strong>de</strong>terminados<br />

amuletos, como a pata do coelho. Mama África continua<br />

muito viva no cotidiano do brasileiro.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o


MOUROS, FRANCESES<br />

E JUDEUS<br />

TRÊS PRESENÇAS NO BRASIL<br />

3 a edição – 112 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0688 ‑6<br />

Em Mouros, franceses e ju<strong>de</strong>us, Luís da Câmara Cascudo<br />

estuda a presença <strong>de</strong>sses três povos na cultura popular brasi‑<br />

leira. Presenças persistentes através <strong>de</strong> crendices, histórias,<br />

gestos, hábitos alimentares, cujas origens se per<strong>de</strong>m na escura<br />

noite dos tempos, alguns chegados aqui quando o Brasil ape‑<br />

nas <strong>de</strong>spertava para a vida. Constantes culturais <strong>de</strong> 2, 3 mil<br />

<strong>anos</strong>, velhas <strong>de</strong> quinhentos <strong>anos</strong> no país e que continuam,<br />

límpidas e frescas, na vida cotidiana do povo brasileiro.<br />

Depois <strong>de</strong> séculos <strong>de</strong> presença na península Ibérica,<br />

<strong>de</strong>ixando marcas in<strong>de</strong>léveis na vida portuguesa, o mouro<br />

viajou para o Brasil na memória do colonizador, como ob‑<br />

serva Cascudo. Ninguém fala português sem empregar<br />

centenas <strong>de</strong> palavras <strong>de</strong> origem árabe: açúcar, arroz, azei‑<br />

tona. As mães ‑d’água, <strong>de</strong> canto irresistível, são parentes<br />

das mouras encantadas. A presença árabe está em toda<br />

parte, na arquitetura, na doçaria, no pé do nor<strong>de</strong>stino. A<br />

alparcata, tão popular no Nor<strong>de</strong>ste, muitas vezes milenar,<br />

foi introduzida em Portugal pelo berbere.<br />

Presente no Brasil <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as primeiras expedições <strong>de</strong> re‑<br />

conhecimento da terra, o ju<strong>de</strong>u <strong>de</strong>ixou marcas <strong>de</strong> sua cul‑<br />

tura em lendas, cerimônias religiosas, hábitos <strong>de</strong> comércio.<br />

Bem posterior, a influência francesa se tornou avassa‑<br />

ladora a partir, sobretudo, dos séculos XVIII e XIX. Ainda<br />

hoje, os cantadores nor<strong>de</strong>stinos invocam a figura <strong>de</strong> Rol‑<br />

dão, como um herói imbatível, exemplo <strong>de</strong> coragem e hon‑<br />

ra<strong>de</strong>z. “É o único motivo popular inspirado por livro<br />

impresso”, ensina Mestre Cascudo. O livro é a História do<br />

imperador Carlos Magno e dos doze pares <strong>de</strong> França, pre‑<br />

sente em toda casa <strong>de</strong> nor<strong>de</strong>stino letrado, <strong>de</strong> on<strong>de</strong> se di‑<br />

vulgou para o povo fascinado. Roldão e sua espada<br />

durindana continuam exaltados, ainda hoje, na literatura<br />

<strong>de</strong> cor<strong>de</strong>l, como se acabassem <strong>de</strong> sair <strong>de</strong> um combate.<br />

Como dizia Sainte ‑Beuve, a Antiguida<strong>de</strong> é coisa nova.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

PRELÚDIO DA<br />

CACHAÇA<br />

2 a edição – 104 páginas<br />

1 encarte colorido (8 páginas)<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1078 ‑6<br />

Já no século XVII, Gregório <strong>de</strong> Matos gostava <strong>de</strong><br />

saboreá ‑la nas casas amigas do Recôncavo Baiano. Duzentos<br />

<strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, Lima Barreto <strong>de</strong>fendia ‑a <strong>de</strong> seus <strong>de</strong>tratores,<br />

dizendo que não era ela quem fazia mal ao Brasil, mas a<br />

burrice. Ao longo dos séculos, teve e tem muitos nomes e<br />

apelidos: cachaça, moça ‑branca, água que passarinho não<br />

bebe, aguar<strong>de</strong>nte, parati, cana, caninha, branquinha, pinga<br />

e muitos outros. “Bebida do povo, áspera, rebelada, insub‑<br />

missa aos ditames do amável paladar”, como salienta Luís da<br />

Câmara Cascudo nesse <strong>de</strong>licioso Prelúdio da cachaça. Nas‑<br />

cida em data incerta, provavelmente no século XV, em Por‑<br />

tugal, durante muito tempo a etiqueta proibia seu ingresso<br />

em locais <strong>mais</strong> distintos, ensina Mestre Cascudo. Aos pou‑<br />

cos, ela foi conquistando todas as classes sociais e até ga‑<br />

nhando ingresso na história do Brasil. Era moeda <strong>de</strong> troca,<br />

obrigatória, levada pelos traficantes <strong>de</strong> escravos para a<br />

África. Foi com ela que os rebel<strong>de</strong>s brindaram a Confe<strong>de</strong>ra‑<br />

ção do Equador, em 1824. Durante a Guerra do Paraguai,<br />

era fartamente consumida pelas tropas brasileiras e, mistu‑<br />

rada com pólvora, esfregada no corpo. Coisa <strong>de</strong> macho que,<br />

diziam, aumentava a coragem.<br />

Cruel, <strong>de</strong>struidora <strong>de</strong> lares e <strong>de</strong> vidas, não encontra sim‑<br />

patia no folclore, con<strong>de</strong>nada quase sempre em quadrinhas<br />

como essa: “Homem que bebe cachaça,/ mulher que errou<br />

uma vez,/ cachorro que pega bo<strong>de</strong>,/ coitadinho <strong>de</strong>les três!”.<br />

Estudando o assunto pelo ângulo folclórico, sociológico,<br />

etnográfico, histórico, Cascudo conclui que “o brasileiro é<br />

<strong>de</strong>voto da cachaça, mas não é cachaceiro”. Ainda bem.<br />

Cabe ressaltar a qualida<strong>de</strong> gráfica <strong>de</strong>ssa edição, com<br />

a mancha bem distribuída na página, tipos gran<strong>de</strong>s, ótimos<br />

<strong>de</strong> se ler, ilustrações em cores em papel cuchê. Uma obra<br />

que se lê <strong>de</strong> um gole, como um copo <strong>de</strong> boa cachaça.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

163


PRELÚDIO E FUGA<br />

DO REAL<br />

Prelo<br />

Em Prelúdio e fuga do real, Luís da Câmara Cascudo<br />

convoca o leitor para um passeio, sem fronteiras no tempo<br />

e no espaço, com plena liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> imaginação, através<br />

<strong>de</strong> alguns dos motivos, mitos e criações <strong>mais</strong> vivos da<br />

gran<strong>de</strong> cultura do mundo oci<strong>de</strong>ntal. O que significa invocar<br />

e pon<strong>de</strong>rar a respeito <strong>de</strong> problemas e dúvidas que <strong>mais</strong><br />

afligem o ser humano, ao longo dos séculos.<br />

Apresentados em forma <strong>de</strong> epístolas, dirigidas a um su‑<br />

posto <strong>de</strong>stinatário, os textos assumem características <strong>de</strong> nar‑<br />

rativas em tom <strong>de</strong> <strong>de</strong>bate filosófico, sob a invocação <strong>de</strong> um<br />

personagem, real ou imaginário, Epicuro ou Luís <strong>de</strong> Camões,<br />

Dom Quixote ou o Barão <strong>de</strong> Münchhausen, abordando temas<br />

e problemas com os quais se i<strong>de</strong>ntificam na tradição.<br />

É o pretexto para abordar e repensar temas eternos e<br />

inquietadores, como o problema da sobrevivência do espírito,<br />

seu <strong>de</strong>stino póstumo e até sua constituição e aparência, pois,<br />

ao contrário do que prega o catolicismo, o autor não admite<br />

os espíritos puros, simples chama, “sem contorno <strong>de</strong>finido”,<br />

mas acredita que eles continuam vivendo “nas aparências fí‑<br />

sicas utilizadas na travessia da existência terrena”.<br />

Com essa mesma liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> espírito, sem imposi‑<br />

ções <strong>de</strong> doutrinas religiosas ou filosóficas, Mestre Cascudo<br />

salta <strong>de</strong> um tema a outro, sem per<strong>de</strong>r o espírito indagador<br />

e a inquietação pela verda<strong>de</strong>.<br />

Nos 35 textos do livro, o autor dialoga com Montaigne,<br />

Maria Madalena, Ramsés II, Caim, Pangloss, Jean ‑Jacques Rous‑<br />

seau, Aristófanes, o imperador Juliano, <strong>de</strong>bate assuntos como<br />

o ceticismo e a história como disciplina da imaginação, apre‑<br />

senta as consi<strong>de</strong>rações <strong>de</strong> Erasmo <strong>de</strong> Roterdã sobre o <strong>de</strong>stino<br />

póstumo <strong>de</strong> sua obra, conce<strong>de</strong> a Nostradamus o direito <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a profissão <strong>de</strong> prever o futuro, e trata <strong>de</strong> outros trinta<br />

temas, a cujo respeito os homens <strong>de</strong>batem em busca da ver‑<br />

da<strong>de</strong>, muito <strong>mais</strong> interessante do que encontrá ‑la.<br />

164<br />

Prelo<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

REDE DE DORMIR<br />

UMA PESQUISA ETNOGRÁFICA<br />

2 a edição – 232 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0714 ‑9<br />

Durante séculos, milhões <strong>de</strong> brasileiros nasceram, vive‑<br />

ram, amaram e morreram em cima <strong>de</strong>la. No sertão, ela envol‑<br />

via os mortos conduzidos ao cemitério. Cantada por poetas,<br />

chamada carinhosamente <strong>de</strong> “mãe veia”, mãe velha, pelos<br />

<strong>mais</strong> antigos, a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> dormir atravessou os tempos sem que<br />

ninguém lhe <strong>de</strong>dicasse pesquisa, estudo ou análise. O pri‑<br />

meiro trabalho sobre o assunto, pioneiro e insuperável, é esse<br />

Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> dormir, <strong>de</strong> Luís da Câmara Cascudo. Estudioso e apai‑<br />

xonado pela re<strong>de</strong>, já na introdução do livro, Cascudo faz a<br />

<strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> sua insuperável comodida<strong>de</strong>, comparada à cama:<br />

“O leito obriga ‑nos a tomar seu costume, ajeitando ‑nos nele,<br />

procurando o repouso numa sucessão <strong>de</strong> posições. A re<strong>de</strong><br />

toma o nosso feitio, contamina ‑se com os nossos hábitos,<br />

repete, dócil e macia, a forma do nosso corpo.”.<br />

Como em todos os seus estudos, Cascudo esgota o<br />

tema, indo sempre muito além do que propõe o título.<br />

Assim, Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> dormir não se limita à pesquisa etnográfica,<br />

como afirma o subtítulo do livro, mas passeia pela história,<br />

a sociologia, o folclore, reproduz registros literários.<br />

De origem indígena (“até prova em contrário a re<strong>de</strong><br />

possui o copyright sul ‑americano”, observa Cascudo), a re<strong>de</strong><br />

seduziu o colonizador ao primeiro embalo. Pero Vaz <strong>de</strong> Ca‑<br />

minha, o primeiro europeu a registrá ‑la, batizou ‑a com o<br />

nome que atravessaria os tempos, <strong>de</strong>vido à semelhança <strong>de</strong><br />

suas malhas com a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> pescar. Parte da vida do brasi‑<br />

leiro, confeccionada em cipó ou algodão, com o tempo<br />

sofisticou ‑se em variados mo<strong>de</strong>los, com suas varandas maio‑<br />

res ou menores, símbolo <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r social, as franjas, exibidas<br />

vaidosamente, as cores, outro símbolo <strong>de</strong> distinção, sendo<br />

as brancas <strong>de</strong> uso tradicional da aristocracia rural.<br />

Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> dormir é uma excelente leitura para ser feita<br />

na poltrona favorita, na cama ou, <strong>de</strong> preferência, ao em‑<br />

balo da re<strong>de</strong>.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o


RELIGIÃO NO POVO<br />

2 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1079 ‑6<br />

Conhecedor insuperável das paixões, crenças e supersti‑<br />

ções do povo brasileiro, Mestre Cascudo se interessou por todas<br />

as manifestações da alma popular, em estudo persistente e<br />

contínuo. Ao tema da religiosida<strong>de</strong> <strong>de</strong>dicou quarenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong><br />

pesquisas diretas, amparadas e iluminadas pela erudição li‑<br />

vresca, das quais resultaram inúmeros trabalhos esparsos e dois<br />

volumes <strong>de</strong>dicados ao tema – Religião no povo e Superstições<br />

no Brasil –, mas <strong>de</strong> abordagens específicas.<br />

No prefácio a Religião no povo, Cascudo explica que<br />

seu estudo, que ele <strong>de</strong>nomina <strong>de</strong> <strong>de</strong>poimento, não aborda<br />

superstições, bruxarias, amuleto, magia, mas os fenômenos<br />

ligados à religiosida<strong>de</strong> popular, atestados através <strong>de</strong> casos,<br />

bebidos diretamente na fonte, e da atenção persistente do<br />

autor pelo tema. “E o factual logo ce<strong>de</strong> à conclusão cientí‑<br />

fica, num estudo que, pelo fascínio do tema e modo pelo<br />

qual o autor o trata, transforma a obra em trabalho <strong>de</strong><br />

cinzel”, como observa Humberto Nóbrega.<br />

O livro estuda 27 temas ligados a crenças populares,<br />

envolvidas numa religiosida<strong>de</strong> esculpida pela doutrina ca‑<br />

tólica, a partir da colonização. “A catequese cristã infiltrou‑<br />

‑se na mentalida<strong>de</strong> nas manhãs do séc. XVI”, observa<br />

Cascudo. E a partir daí estilhaçou ‑se em inúmeras crendi‑<br />

ces, a maioria <strong>de</strong>las <strong>de</strong> origem remota no tempo, como o<br />

hábito <strong>de</strong> tomar bênção matinal e noturna a pais, avós,<br />

parentes <strong>mais</strong> velhos e até a visitantes ilustres, cujas origens<br />

longínquas o estudioso i<strong>de</strong>ntifica na Bíblia; a <strong>de</strong>voção po‑<br />

pular pelas almas benditas, que Cascudo acompanha ao<br />

longo dos séculos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os lêmures, fantasmas que fre‑<br />

quentavam as casas romanas, no tempo dos césares; o<br />

po<strong>de</strong>r mágico da hora do meio ‑dia; a posição a<strong>de</strong>quada<br />

para orar, e vinte e outros temas que ajudam a compreen‑<br />

<strong>de</strong>r a alma mística do brasileiro.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

SUPERSTIÇÃO<br />

NO BRASIL<br />

5 a edição – 496 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0686 ‑X<br />

Superstição no Brasil reúne três livros <strong>de</strong> Luís da Câmara<br />

Cascudo, publicados em épocas diversas, unidos pela afini‑<br />

da<strong>de</strong> temática: Anúbis e outros ensaios (1951), Superstições e<br />

costumes (1958), Religião no povo (1974). Erudito que escrevia<br />

com leveza e graça, Cascudo acompanha, numa viagem atra‑<br />

vés <strong>de</strong> milênios, a misteriosa caminhada <strong>de</strong> superstições, hábi‑<br />

tos, costumes e sua permanência em terras brasileiras.<br />

O primeiro livro estuda sobretudo crenças e tradições<br />

mágicas presentes na vida do brasileiro. Representado com<br />

corpo <strong>de</strong> homem e cabeça <strong>de</strong> chacal, Anúbis era no antigo<br />

Egito o intérprete dos mortos, aquele que encaminhava as<br />

sombras ao <strong>de</strong>us supremo, Osíris. Quase 4 mil <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, a<br />

sua presença permanece em vários aspectos do cerimonial e<br />

do culto aos mortos. Quase tão velhas quanto Anúbis são as<br />

preces e procissões para pedir chuva, já praticadas na Roma<br />

dos césares, ou o costume <strong>de</strong> se ouvir o que as pessoas falam<br />

na rua, na certeza <strong>de</strong> se ter uma resposta (um sim, um talvez,<br />

um não) às suas dúvidas, prática comum na Grécia, há 3 mil<br />

<strong>anos</strong>, sob as bênçãos <strong>de</strong> Hermes, o Mercúrio romano.<br />

Superstições e costumes estuda quarenta motivos pre‑<br />

sentes no cotidiano do brasileiro, vários <strong>de</strong>les <strong>de</strong> origem<br />

imemorial. Como a atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> não olhar o rosto <strong>de</strong> uma<br />

pessoa, um símbolo <strong>de</strong> respeito já registrado na Bíblia. Ou<br />

a ameaça <strong>de</strong> se mijar na cova do inimigo, documentada em<br />

Roma, há <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 2 mil <strong>anos</strong>.<br />

Religião no povo é o resultado <strong>de</strong> quarenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong><br />

pesquisas sobre a religiosida<strong>de</strong> popular, a intrincada mis‑<br />

tura <strong>de</strong> elementos pagãos no catolicismo popular brasileiro,<br />

os ritos do cotidiano, nascidos no seio da religião (tomar<br />

bênção), orações que per<strong>de</strong>m a força quando interrompi‑<br />

das, a força mágica do meio ‑dia, os castigos aplicados aos<br />

santos, e <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> outros motivos, numa fantástica via‑<br />

gem pelo tempo e a velha e crédula alma humana.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

165


TRADIÇÃO, CIÊNCIA<br />

DO POVO<br />

Prelo<br />

Entre as epígrafes selecionadas por Luís da Câmara<br />

Cascudo para Tradição, ciência do povo, há duas que se<br />

complementam e <strong>de</strong>finem o espírito e a diretriz da obra. A<br />

primeira é um conceito que integra o Direito Canônico e<br />

sentencia: “O Costume é o melhor intérprete das Leis”. A<br />

outra, do antropólogo norte ‑americano Franz Boas, ensina<br />

que “<strong>de</strong>vemos compreen<strong>de</strong>r o indivíduo vivendo em sua<br />

Cultura, e a Cultura como vivida por indivíduos”. Há uma<br />

terceira, o verso famoso <strong>de</strong> Gonçalves Dias – “Meninos, eu<br />

vi!” –, que atesta as investigações próprias empreendidas<br />

pelo autor, no calor da vida, sobre os temas estudados.<br />

Partindo <strong>de</strong>ssas premissas, Cascudo investiga a ciência<br />

do povo brasileiro, com suas peculiarida<strong>de</strong>s e heranças<br />

multisseculares. Como ele adverte, “ciência no plano da<br />

concordância e da compreensão geral. Constituem bases<br />

inamovíveis para o julgamento anônimo, para a apreciação<br />

e mesmo percepção do fato social e econômico”. Em<br />

suma: Memória e Memória coletiva, segundo o conceito <strong>de</strong><br />

Maurice Halbwachs.<br />

A palavra, como o autor adverte na introdução, fica<br />

por conta do “brasileiro dos sertões, cida<strong>de</strong>s ‑velhas e<br />

praias, sem constrangimento e disfarce”. Através <strong>de</strong>ssas<br />

vozes, recolhidas e analisadas pelo autor, o leitor se enfro‑<br />

nha em temas como “Notícia das chuvas e dos ventos do<br />

Brasil”, “Meteorologia tradicional do Sertão”, “Botânica<br />

supersticiosa no Brasil”, “Respingando a ceifa”, “Folclore<br />

do mar solitário”, “O morto brasileiro”, “Os quatro ele‑<br />

mentos” e “Para o estudo da superstição”.<br />

Claro e eruditíssimo, didático e sem inúteis pedantis‑<br />

mos (tão comuns no tratamento <strong>de</strong>ssas matérias), Cascudo<br />

nos ajuda a <strong>de</strong>svendar e compreen<strong>de</strong>r um pouco <strong>mais</strong> a<br />

contraditória e apaixonante alma do brasileiro.<br />

166<br />

Prelo<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

VAQUEIROS E<br />

CANTADORES<br />

1 a edição – 366 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0981 ‑8<br />

Vaqueiros e cantadores eram os heróis <strong>mais</strong> populares<br />

<strong>de</strong> um Nor<strong>de</strong>ste perdido no tempo, quando ainda se vivia<br />

como no século XVIII. O sertanejo mandava fazer uma roupa<br />

<strong>de</strong> casimira para durar a vida toda, ser exibida nas festas, no<br />

casamento e ser enterrado com ela. As filhas usavam os trajes<br />

das mães. Os velhos tomavam banho aos sábados, abençoa‑<br />

vam com os <strong>de</strong>dos unidos e sabiam algumas palavras <strong>de</strong> latim.<br />

O gado se espalhava pelos <strong>de</strong>scampados, reunido nas vaque‑<br />

jadas alegres, celebrado em romances populares, nos quais o<br />

gran<strong>de</strong> herói era o boi, rebel<strong>de</strong>, <strong>de</strong>safiando o vaqueiro, glori‑<br />

ficado pelo povo, o boi Espácio, o boi Surubim. O sertão vivia<br />

<strong>de</strong> ouvido atento às histórias dos cantadores, quase todos<br />

analfabetos, versejando velhos romances, como o da sábia e<br />

astuta donzela Teodora, da Princesa Megalona, da Imperatriz<br />

Porcina, com suas figuras clássicas da tradição medieval: cava‑<br />

leiros andantes, virgens fiéis, paladinos cristãos; os testamen‑<br />

tos <strong>de</strong> Judas em pé ‑quebrado (espécie <strong>de</strong> quadra, quase<br />

sempre <strong>de</strong> sete sílabas); os A.B.C., contando a gesta <strong>de</strong> um<br />

touro, um bo<strong>de</strong>, uma onça suçuarana; os pelos ‑sinais e ora‑<br />

ções satíricos, todos eles documentados e estudados com in‑<br />

superável conhecimento por Luís da Câmara Cascudo.<br />

Os <strong>de</strong>safios entre os gran<strong>de</strong>s mestres paralisavam a<br />

vida ao redor e ficavam perpetuados na mente do povo.<br />

Muitas vezes, os sertanejos se cotizavam para promover<br />

esses encontros.<br />

Os cantadores famosos do sertão, cujas biografias Cas‑<br />

cudo registra – Inácio da Catingueira, Francisco Romano, Rio<br />

Preto, Leandro Gomes <strong>de</strong> Barros, Francisco das Chagas Ba‑<br />

tista e tantos outros –, gozavam <strong>de</strong> imensa popularida<strong>de</strong> e<br />

fixavam em seus versos, como reportagens vivas e palpitan‑<br />

tes, a vida do sertão, seus santos e cangaceiros, padre Cícero<br />

e Lampião, unidos pela mesma admiração, a admiração que<br />

o sertanejo tem pela bonda<strong>de</strong> e pela coragem.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o


VIAJANDO O SERTÃO<br />

4 a edição – 104 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1080 ‑2<br />

No longínquo ano <strong>de</strong> 1934, um jovem professor se‑<br />

cundário participou <strong>de</strong> uma viagem <strong>de</strong> observação pelo<br />

interior do Rio Gran<strong>de</strong> do Norte, organizada pelo interven‑<br />

tor do estado, na qual figuravam técnicos em educação,<br />

agricultura e açudagem. A sua missão consistia em levantar<br />

e mapear a realida<strong>de</strong> cultural e artística vista e vivida.<br />

O jovem professor chamava ‑se Luís da Câmara Cas‑<br />

cudo estava preparado como ninguém para a missão, <strong>de</strong>‑<br />

monstrando excelentes qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> observação, curiosi ‑<br />

da<strong>de</strong> insaciável, i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> com a alma sertaneja e um certo<br />

senso <strong>de</strong> humor, um pouco áspero, para amenizar a dureza<br />

da aventura. Foram <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 1.300 quilômetros percorridos<br />

<strong>de</strong> automóvel, <strong>de</strong> trem, <strong>de</strong> canoa, <strong>de</strong> rebocador, <strong>de</strong> hidroa‑<br />

vião, a pé, <strong>de</strong> ca<strong>de</strong>irinha, “<strong>de</strong>ntro d’água, na lama, nos mas‑<br />

sapés, pulando cercas, saltando, <strong>de</strong> pau em pau, os roçados<br />

que a enchente circundara, correndo nos panascos, empur‑<br />

rando o auto, trabalhando <strong>de</strong> pá, carregando maletas, le‑<br />

vando os companheiros no ombro, livrando os xique ‑xiques,<br />

galopando a cavalo”, além dos momentos <strong>de</strong> fome, frio, can‑<br />

saço, em pleno inverno do Sertão “ver<strong>de</strong> e resplen<strong>de</strong>nte na<br />

vitória pacífica das searas”.<br />

Essa é a origem <strong>de</strong> Viajando o Sertão, um dos primeiros<br />

livros <strong>de</strong> Mestre Cascudo, nascido, segundo o autor, dos in‑<br />

sistentes pedidos <strong>de</strong> amigos. Bendita insistência. Com todas<br />

as qualida<strong>de</strong>s que iriam consagrá ‑lo <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, o gran<strong>de</strong><br />

folclorista fixa, com riquezas <strong>de</strong> <strong>de</strong>talhe, a realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um<br />

mundo ainda repleto <strong>de</strong> reminiscências e valores medievais,<br />

com famílias dominando regiões e ditando “or<strong>de</strong>ns com a<br />

mentalida<strong>de</strong> feudal, fazendo justiça clan<strong>de</strong>stina”, mas já em<br />

acelerado processo <strong>de</strong> integração à vida mo<strong>de</strong>rna, uma mo‑<br />

<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> que ia mudar radicalmente realida<strong>de</strong> e valores,<br />

conforme revela Viajando o Sertão.<br />

L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />

OBRAS DE LITERATURA INFANTIL E JUVENIL<br />

DO AUTOR<br />

• A princesa <strong>de</strong> Bambuluá<br />

• Contos <strong>de</strong> ani<strong>mais</strong> (prelo)<br />

• Contos <strong>de</strong> exemplo (prelo)<br />

• Contos tradicionais do Brasil para jovens<br />

• Couro <strong>de</strong> piolho<br />

• Facécias<br />

• Histórias <strong>de</strong> vaqueiros (prelo)<br />

• Lendas brasileiras para jovens<br />

• Maria Gomes<br />

• O marido da Mãe d’Água e A princesa e o gigante<br />

• O papagaio real<br />

• Vaqueiros e cantadores para jovens<br />

Ll u í s d a C â mM a r a C a s C u d o<br />

167


AMLB/Fundação Casa <strong>de</strong> Rui Barbosa<br />

C o l e ç ã o<br />

M a n u e l B a n d e i r a<br />

168<br />

Manuel Ban<strong>de</strong>ira (1886 ‑1968) nasceu no Recife e<br />

é até hoje consi<strong>de</strong>rado por muitos o maior poeta<br />

brasileiro do século XX. Fixou residência no Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro nos <strong>anos</strong> 1910, on<strong>de</strong> lançou em 1917 seu<br />

primeiro livro, A cinza das horas. Apesar <strong>de</strong> não ter<br />

tomado parte pessoalmente da Semana <strong>de</strong> Arte Mo‑<br />

<strong>de</strong>rna realizada em São Paulo em 1922, apoiou ‑a e<br />

manteve contato intelectual com vários <strong>de</strong> seus par‑<br />

ticipantes, <strong>de</strong>ntre eles, Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Lecionou<br />

literatura entre os <strong>anos</strong> <strong>de</strong> 1938 e 1943 no Colégio<br />

Pedro II, no Rio <strong>de</strong> Janeiro. Em 1940, foi eleito mem‑<br />

bro da Aca<strong>de</strong>mia Brasileira <strong>de</strong> Letras.<br />

Em seus poemas e em seus textos <strong>de</strong> prosa, Ban<strong>de</strong>ira<br />

toca <strong>de</strong> maneira singela e ao mesmo tempo ousada<br />

em aspectos do cotidiano urbano, nas relações fami‑<br />

liares e em toda sorte <strong>de</strong> dilemas hum<strong>anos</strong>. A coleção<br />

Manuel Ban<strong>de</strong>ira publicada pela <strong>Global</strong> <strong>Editora</strong> traz<br />

ao leitor os principais livros do habitante <strong>de</strong> Pasár‑<br />

gada, procurando conferir a eles o lugar <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque<br />

que ocupam no panteão da literatura brasileira, por<br />

meio <strong>de</strong> um cuidadoso processo <strong>de</strong> estabelecimento<br />

dos textos e <strong>de</strong> novos projetos gráficos.<br />

Digam que sou um homem sem orgulho<br />

Um homem que aceita tudo<br />

Que me importa?<br />

Eu quero a estrela da manhã


ESTRELA DA MANHÃ<br />

3 a edição – 96 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1703 ‑0<br />

A primeira edição <strong>de</strong> Estrela da manhã já surgiu como<br />

rarida<strong>de</strong>. Foram apenas cinquenta exemplares, impressos<br />

com capricho e assinados pelo autor, com capa <strong>de</strong> Santa<br />

Rosa e <strong>de</strong>senho <strong>de</strong> Portinari. O livro valorizava a mensagem<br />

do poeta, seu impulso <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> e <strong>de</strong> criação muito pes‑<br />

soal que, já naquela época, 1936, o apontava como um<br />

dos poetas <strong>mais</strong> originais e importantes da história da poesia<br />

no Brasil.<br />

Estrela da manhã reafirmava a posição assumida pelo<br />

poeta a partir <strong>de</strong> Libertinagem, seu livro anterior, a lingua‑<br />

gem irônica alcançando a plenitu<strong>de</strong> do coloquial, as nuan‑<br />

ças <strong>de</strong> humor trágico, a insistência na poética <strong>de</strong> ruptura<br />

com a tradição, a exploração do folclore negro, o tema do<br />

“poeta sórdido”, o interesse pela vertente social, a insus‑<br />

peitada nostalgia da pureza.<br />

O livro reúne alguns dos poemas <strong>mais</strong> importantes <strong>de</strong><br />

Ban<strong>de</strong>ira, pontos culminantes <strong>de</strong> sua poética, a começar<br />

pelo que dá título ao livro, que se inicia pela quadra patética,<br />

“Eu quero a estrela da manhã/ On<strong>de</strong> está a estrela da<br />

manhã?/ Meus amigos meus inimigos/ Procurem a estrela da<br />

manhã”, e termina com o apelo doloroso: “Procurem por<br />

toda parte/ Pura ou <strong>de</strong>gradada até a última baixeza/ Eu<br />

quero a estrela da manhã”. Em “Oração a Nossa Senhora da<br />

Boa Morte”, o poeta revela sua religiosida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sabor popu‑<br />

lar, tão brasileira. “Balada das três mulheres do sabonete<br />

Araxá” é uma variante mo<strong>de</strong>rna e um tanto irreverente <strong>de</strong><br />

um poema famoso <strong>de</strong> Luís Delfino, “As três irmãs”. Outros<br />

momentos marcantes do volume são o sintético e obsessivo<br />

“Poema do beco” (“Que importa a paisagem, a Glória, a<br />

baía, a linha do horizonte?/ – O que eu vejo é o beco”),<br />

“Momento num café”, “Tragédia brasileira”, “Conto cruel”,<br />

“Rondó dos cavalinhos”, “Marinheiro triste”, estrelas <strong>de</strong><br />

primeira gran<strong>de</strong>za da poesia brasileira.<br />

M a n u e l B a n d e i r a<br />

ESTRELA DA TARDE<br />

3 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1702 ‑3<br />

Estrela da tar<strong>de</strong> é livro da maturida<strong>de</strong>, obra crepuscu‑<br />

lar publicada em 1960, quando o poeta já superara a casa<br />

dos setenta <strong>anos</strong>, começava a meditar com <strong>mais</strong> profundi‑<br />

da<strong>de</strong> na passagem <strong>de</strong>sta vida para o outro lado do mistério<br />

e se mostrava convicto <strong>de</strong> ter cumprido bem a difícil missão<br />

<strong>de</strong> viver. Não é <strong>de</strong> se estranhar, pois, a presença <strong>mais</strong> ou<br />

menos obsessiva da morte, saudada com reverência, con‑<br />

formismo e curiosida<strong>de</strong>. “O meu dia foi bom, po<strong>de</strong> a noite<br />

<strong>de</strong>scer,/ (A noite com os seus sortilégios)”, sintetiza Ban‑<br />

<strong>de</strong>ira no poema “Consoada”.<br />

Mas, enquanto a “in<strong>de</strong>sejada das gentes” não vem, o<br />

poeta <strong>de</strong>ixa ‑se absorver, ainda uma vez, por motivos per‑<br />

manentes <strong>de</strong> sua obra, a paixão pela música, compondo<br />

uma “Letra para Heitor dos Prazeres” musicar, o amor, a<br />

amiza<strong>de</strong> fraternal que o leva a cantar amigos perdidos,<br />

Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> e Jayme Ovalle, o que, <strong>de</strong> certa forma,<br />

realça ainda <strong>mais</strong> a presença da morte.<br />

Símbolo da vida e da arte literária, revelando a paixão<br />

do poeta pela tradição, o soneto ocupa um lugar especial<br />

nesta coleção <strong>de</strong> poemas, atestando o virtuosismo inigua‑<br />

lável do sonetista “com o seu malicioso esplendor<br />

simbólico ‑parnasiano” (Lêdo Ivo), um dos maiores da lín‑<br />

gua. Basta ler “Mal sem mudança” e “Sonho branco”.<br />

Ao lado da tradição, o poeta se arrisca em tentadoras<br />

experiências na <strong>mais</strong> radical corrente poética da época: o<br />

concretismo. Os seis poemas concretos do livro <strong>de</strong>mons‑<br />

tram a luci<strong>de</strong>z e a curiosida<strong>de</strong> vivíssima do poeta.<br />

Estrela da tar<strong>de</strong>, com sua preocupação pela morte,<br />

simbolicamente se contrapõe à plenitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida <strong>de</strong> Estrela<br />

da manhã, encerrando um ciclo <strong>de</strong> extraordinária força<br />

criadora, com o poeta purificado em espírito, esperançoso<br />

<strong>de</strong> uma vida <strong>mais</strong> alta: “Sou nada, e entanto agora/ Eis ‑me<br />

centro finito/ Do círculo infinito/ De mar e céus afora./ –<br />

Estou on<strong>de</strong> está Deus”.<br />

169<br />

M a n u e l B a n d e i r a


ITINERÁRIO DE<br />

PASÁRGADA<br />

7 a edição – 184 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1712 ‑2<br />

Em 1954, já sagrado e consagrado como gran<strong>de</strong><br />

poeta, o quase setentão Manuel Ban<strong>de</strong>ira voltou os olhos<br />

para o passado em busca do tempo perdido, <strong>de</strong> suas expe‑<br />

riências e miragens e, em particular, <strong>de</strong> sua Pasárgada, es‑<br />

pécie <strong>de</strong> palavra mágica que o acompanhou por toda a<br />

vida. A fixação surgiu aos quinze <strong>anos</strong>, quando o jovem<br />

estudante <strong>de</strong>scobriu o nome <strong>de</strong>ssa cida<strong>de</strong>zinha fundada<br />

por Ciro, nas montanhas da Pérsia. A partir daí, durante<br />

alguns <strong>anos</strong> ele viveu em Pasárgada. Mais <strong>de</strong> vinte <strong>anos</strong><br />

<strong>de</strong>pois, num momento <strong>de</strong> <strong>de</strong>pressão e <strong>de</strong>sencanto, uma<br />

frase <strong>de</strong> quase libertação surgiu em sua mente: “Vou ‑me<br />

embora pra Pasárgada”. Símbolo <strong>de</strong> evasão, <strong>de</strong> “toda a<br />

vida que podia ter sido e que não foi”, como em seu verso<br />

famoso, Pasárgada acabou se tornando uma i<strong>de</strong>ntificação<br />

do itinerário da própria vida do poeta.<br />

Roteiro <strong>de</strong> uma vida, revivescência do passado, Itine‑<br />

rário <strong>de</strong> Pasárgada não é um livro <strong>de</strong> memórias no sentido<br />

tradicional. Franklin <strong>de</strong> Oliveira observou que se trata da<br />

“primeira biografia estritamente literária que se publica no<br />

Brasil – história da formação <strong>de</strong> uma inteligência poética e<br />

não apenas relato <strong>de</strong> uma vida <strong>de</strong> poeta”.<br />

Claro que essas duas vertentes se <strong>de</strong>senvolvem en‑<br />

trançadas, como os fios <strong>de</strong> um barbante, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o mo‑<br />

mento em que Ban<strong>de</strong>ira ganha consciência da vida, lá pelos<br />

três <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, e se emociona assistindo a uma corrida<br />

<strong>de</strong> bicicletas. Mais tar<strong>de</strong>, i<strong>de</strong>ntificou essa emoção circuns‑<br />

tancial com a emoção <strong>de</strong> natureza artística. “Des<strong>de</strong> esse<br />

momento, posso dizer que havia <strong>de</strong>scoberto o segredo da<br />

poesia, o segredo do meu itinerário em poesia”, confessa.<br />

Esse itinerário poético, tal como o roteiro <strong>de</strong> sua vida,<br />

<strong>de</strong>u muitas voltas, que o memorialista evoca com graça e a<br />

insuperável simplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seu estilo, <strong>de</strong>svendando para o<br />

leitor as mil e uma seduções <strong>de</strong> seu mundo, <strong>de</strong> sua Pasárgada.<br />

170<br />

M a n u e l B a n d e i r a<br />

OBRAS DE LITERATURA INFANTIL E JUVENIL<br />

DO AUTOR<br />

• Manuel Ban<strong>de</strong>ira crônicas para jovens<br />

• Na rua do Sabão<br />

• Os sinos<br />

• Trem <strong>de</strong> ferro<br />

M a n u e l B a n d e i r a


Arquivo Palma B. Donato<br />

C o l e ç ã o<br />

M a r C o s r e y<br />

Pseudônimo <strong>de</strong> Edmundo Nonato, nasceu em São<br />

Paulo, em 1925. Estreou em 1953 com a novela Um<br />

gato no triângulo. Sete <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois publicaria o ro‑<br />

mance Café na cama, um dos best ‑sellers dos <strong>anos</strong><br />

1960. Seguiram ‑se O enterro da cafetina, Memórias<br />

<strong>de</strong> um gigolô, Soy loco por ti, América!, O pêndulo<br />

da noite e O cão da meia ‑noite, entre outros. Escritor<br />

versátil, já era conhecido pela qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seus con‑<br />

tos antes <strong>de</strong> começar a escrever para o público infan‑<br />

tojuvenil. Falecido em 1999, suas cinzas, transportadas<br />

num helicóptero, foram espalhadas sobre a cida<strong>de</strong><br />

que consagrou como cenário <strong>de</strong> seus contos e ro‑<br />

mances: São Paulo.<br />

O Brasil é um dos maiores países do mundo em<br />

comprimento e largura. O Atlântico é a nossa banheira.<br />

As residências po<strong>de</strong>riam ser térreas, ajardinadas,<br />

espaçosas e baratas. Gostaria <strong>de</strong> ver o carteiro todas as<br />

manhãs <strong>de</strong> uniforme limpo, ro<strong>de</strong>ado <strong>de</strong> crianças e<br />

cachorros. Mas há toda uma arquitetura do <strong>de</strong>sconforto,<br />

que <strong>de</strong>ve ren<strong>de</strong>r bilhões... Estamos sendo apertados<br />

entre pare<strong>de</strong>s como nos filmes <strong>de</strong> terror.<br />

171


A ÚLTIMA CORRIDA<br />

3 a edição – 176 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1333 ‑9<br />

Em A última corrida, encontramos Marcos Rey no<br />

auge <strong>de</strong> suas qualida<strong>de</strong>s como narrador. Plena consciência<br />

<strong>de</strong> seu ofício, dosada com ironia, sarcasmo, mordacida<strong>de</strong>.<br />

Texto enxuto, fluente, preciso. Com sua insuperável técnica<br />

<strong>de</strong> contador <strong>de</strong> histórias, ele conduz o leitor aos meandros<br />

e bastidores do mundo do turfe, on<strong>de</strong> se <strong>de</strong>senrola a pe‑<br />

quena saga <strong>de</strong> um jovem inescrupuloso, ansioso por vencer<br />

na vida, apaixonado por uma prostituta, mas com um certo<br />

fundo <strong>de</strong> pureza, uma pureza mesclada <strong>de</strong> maus pensa‑<br />

mentos, a um <strong>de</strong>do da canalhice, como é peculiar a muitos<br />

heróis <strong>de</strong> Marcos Rey.<br />

O ambiente é pitoresco, com uma fauna exótica, com a<br />

cabeça sempre voltada para as patas dos cavalos. São trata‑<br />

dores, jóqueis, proprietários, viciados sôfregos que, ao longo<br />

da narrativa, vão canalizando sonhos e esperanças para um<br />

velho cavalo, prestes a encerrar a sua carreira: Marujo.<br />

Cuidado como um ser humano por seu tratador – um<br />

velho profissional do ramo, honesto e competente, áspero<br />

como um cacto, mas com uma aspereza que escon<strong>de</strong> uma<br />

sensibilida<strong>de</strong> aguda –, Marujo se transforma numa espécie<br />

<strong>de</strong> metáfora dos sonhos e esperanças <strong>de</strong> todos que espe‑<br />

ram que ele vença sua última corrida.<br />

Nela, <strong>de</strong> certa forma, todos pensam em encher os bol‑<br />

sos <strong>de</strong> dinheiro, mas também tonificar a alma com a espe‑<br />

rança <strong>de</strong> que nem tudo é ruim na vida. Há sempre um<br />

último páreo, no qual vale a pena apostar.<br />

Com sua habitual curiosida<strong>de</strong> e compaixão por seus<br />

personagens, Marcos Rey oferece ao leitor um <strong>de</strong>sfile ines‑<br />

quecível <strong>de</strong> seres hum<strong>anos</strong> frágeis e solitários, mas astutos,<br />

sempre à espera <strong>de</strong> dar um bote certeiro para equilibrar a<br />

vida, como são seus personagens, envolvidos numa história<br />

que cresce <strong>de</strong> intensida<strong>de</strong> à medida que se aproxima da<br />

reta <strong>de</strong> chegada, como uma corrida <strong>de</strong>cisiva para o aposta‑<br />

dor angustiado.<br />

172<br />

M a r c o s r e y<br />

CAFÉ NA CAMA<br />

9 a edição – 384 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1536 ‑4<br />

Café na cama é um dos primeiros livros da saga <strong>de</strong><br />

malandragem e <strong>de</strong> vidas tortas construída por Marcos Rey<br />

ao longo <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> quarenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> intensa ativida<strong>de</strong> lite‑<br />

rária. Publicado em 1960, o romance encontrou imediata<br />

repercussão popular, figurando por várias semanas na lista<br />

<strong>de</strong> best ‑sellers. Nele, estão presentes todas as características<br />

literárias que consagraram o autor: a ironia contun<strong>de</strong>nte,<br />

que se confun<strong>de</strong> muitas vezes com o puro sarcasmo, a visão<br />

<strong>de</strong> aspectos menos nobres da vida humana, a violência do<br />

cotidiano, abordados com uma dureza e impieda<strong>de</strong> que o<br />

escritor, <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, classificaria <strong>de</strong> “realismo cru”.<br />

Como boa parte <strong>de</strong> sua obra, Café na cama se <strong>de</strong>sen‑<br />

rola numa São Paulo <strong>de</strong>sconhecida pela maioria <strong>de</strong> seus<br />

moradores, uma cida<strong>de</strong> noturna e misteriosa, povoada por<br />

boêmios, gozadores, garotas <strong>de</strong> programa. É nesse am‑<br />

biente <strong>de</strong> sedução e perversida<strong>de</strong> que mergulha <strong>de</strong> ponta‑<br />

‑cabeça uma jovem e bela ex ‑manicure e ex ‑balconista<br />

suburbana, cujo gran<strong>de</strong> sonho é po<strong>de</strong>r algum dia tomar<br />

café, <strong>de</strong> ban<strong>de</strong>ja, servido na cama. Com a volúpia <strong>de</strong> as‑<br />

censão social e <strong>de</strong> in<strong>de</strong>pendência financeira, ela se prostitui<br />

e passa a conviver com gente da “alta socieda<strong>de</strong>” paulis‑<br />

tana, frequentadores da boemia da década <strong>de</strong> 1950, grã‑<br />

‑finos <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ntes, empresários inescrupulosos, malandros<br />

e arrivistas profissionais, para logo perceber o vazio, a falta<br />

<strong>de</strong> sentido e a <strong>de</strong>cadência <strong>de</strong>ssas vidas, o que não a im‑<br />

pe<strong>de</strong> <strong>de</strong> aceitar as duras regras do jogo e prosseguir na<br />

busca <strong>de</strong> seu sonho, que o autor apresenta com o seu ha‑<br />

bitual humor e impieda<strong>de</strong>.<br />

Café na cama é romance para ser lido a qualquer hora<br />

do dia ou da noite, <strong>de</strong> preferência na cama, com o café<br />

servido <strong>de</strong> ban<strong>de</strong>ja.<br />

M a r c o s r e y


ENTRE SEM BATER<br />

2 a edição – 216 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1475 ‑6<br />

Segundo romance <strong>de</strong> Marcos Rey, publicado original‑<br />

mente em folhetim na Última Hora <strong>de</strong> São Paulo, durante<br />

três meses, Entre sem bater já tem todas as características<br />

que consagraram o autor paulistano: movimentação, estilo<br />

leve e enxuto, personagens vivos e palpitantes, uma trama<br />

bem urdida e envolvente, alinhavada com ironia e sar‑<br />

casmo. Como sempre, a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo é cenário e<br />

personagem, tão envolvidas estão as criaturas que <strong>de</strong>sfilam<br />

diante dos olhos do leitor com a vida da cida<strong>de</strong>, suas ruas<br />

e avenidas, suas boates escuras, os restaurantes caros, o<br />

mundo das corridas <strong>de</strong> cavalos, os escritórios, on<strong>de</strong> se<br />

constroem fortunas e o po<strong>de</strong>r proporcionado pelo dinheiro,<br />

que irá pesar <strong>de</strong>cisivamente no <strong>de</strong>stino dos personagens.<br />

<strong>Nesses</strong> ambientes, <strong>de</strong>senrola ‑se a história <strong>de</strong> um<br />

jovem ambicioso, Ricardo, disposto a quase tudo para as‑<br />

cen<strong>de</strong>r na vida e libertar ‑se do passado <strong>de</strong> miséria e insegu‑<br />

rança que lhe marcara a juventu<strong>de</strong>. A transformação se<br />

acelera quando conhece uma bela mulher, que se torna sua<br />

companheira. Os dois parecem feitos um para o outro,<br />

como a mão para a luva, para se empregar uma metáfora<br />

machadiana, e <strong>de</strong>sfrutam, sem inquietação, os bens con‑<br />

quistados através <strong>de</strong> uma ativida<strong>de</strong> profissional persistente<br />

e criativa <strong>de</strong> Ricardo: apartamento <strong>de</strong> luxo, carro requin‑<br />

tado, belas aparências. Um mundo que parecia sólido, mas<br />

começa a <strong>de</strong>smoronar quando o patrão do rapaz passa a<br />

participar e intervir na vida comum do casal, fascinado pela<br />

bela mulher <strong>de</strong> seu empregado, criando uma situação equí‑<br />

voca e constrangedora que mostra que Ricardo, para man‑<br />

ter seu lugar ao sol, apesar <strong>de</strong> todo o sofrimento, é capaz<br />

<strong>de</strong> tudo. A cena final é antológica, uma espécie <strong>de</strong> fecho<br />

<strong>de</strong> ouro ao romance, que mantém, hoje, o mesmo encanto<br />

e apelo <strong>de</strong> quando <strong>de</strong> sua primeira publicação, abrindo as<br />

suas portas ao leitor. Entre sem bater.<br />

M a r c o s r e y<br />

ESTA NOITE OU NUNCA<br />

5 a edição – 208 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1341 ‑4<br />

A trama é envolvente, a época, dilacerante. Tempos<br />

da revolução <strong>de</strong> 1964. Medo no ar. Angústia. Inquietação.<br />

Um escritor premiado, amputado pela censura e perse‑<br />

guido pela ditadura. Num beco sem saída. Uma tímida lu‑<br />

zinha no fim do túnel começa a brilhar, quando ele se torna<br />

roteirista <strong>de</strong> filmes <strong>de</strong> pornochanchada, no famoso quar‑<br />

teirão da rua do Triumpho, a Hollywood dos pobres, na<br />

Boca do Lixo <strong>de</strong> São Paulo.<br />

A pequena odisseia do roteirista, espécie <strong>de</strong> pícaro do<br />

mundo das letras, é narrada na primeira pessoa. Com iro‑<br />

nia e um escorregadio sarcasmo, datilografando seu texto<br />

num minúsculo apartamento <strong>de</strong> frente para o Minhocão,<br />

ele conta a dura sobrevivência, num ambiente comprimido<br />

entre a pobreza e a marginalida<strong>de</strong>, numa região <strong>de</strong> bares e<br />

boates da pesada, povoado por uma inesquecível galeria<br />

<strong>de</strong> criaturas à margem da socieda<strong>de</strong>: atrizes <strong>de</strong> filmes por‑<br />

nôs, pseudointelectuais, agentes <strong>de</strong> repressão.<br />

Esta noite ou nunca tem um fundo autobiográfico.<br />

Entre 1970 e 1974, um “período negro <strong>de</strong> minha vida”,<br />

Marcos Rey tornou ‑se o roteirista <strong>mais</strong> solicitado do quar‑<br />

teirão do bar ‑restaurante Soberano, na rua do Triumpho.<br />

Era uma tarefa dura. Tinha <strong>de</strong> agradar o público e satisfazer<br />

os censores, “sempre <strong>de</strong> tesoura em punho, cortando<br />

cenas e mutilando filmes inteiros”, gerando um ambiente<br />

<strong>de</strong> baixo ‑astral, “capaz <strong>de</strong> enlouquecer o próprio Natha‑<br />

nael West, que em seu O dia do gafanhoto <strong>de</strong>screveu o<br />

pesa<strong>de</strong>lo californiano dos extras <strong>de</strong> Hollywood”.<br />

O difícil foi transformar esse material caótico, paté‑<br />

tico, maldito, quase trágico, que insistia em sair da pena do<br />

autor, em forma jornalística, num romance puro, sem ranço<br />

<strong>de</strong> documentário, “uma curtição literária para quem se far‑<br />

tou do comedido e das velhas receitas”, o que Marcos Rey<br />

conseguiu plenamente.<br />

M a r c o s r e y<br />

173


MALDITOS PAULISTAS<br />

2 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1688 ‑0<br />

Malditos paulistas, como gran<strong>de</strong> parte da obra <strong>de</strong><br />

Marcos Rey, se <strong>de</strong>senrola em São Paulo, cida<strong>de</strong> que ele<br />

amava e da qual conhecia até os alçapões e buracos dos<br />

ratos. Sobretudo, dos ratos hum<strong>anos</strong>, aqueles que fazem<br />

da malandragem e da esperteza – no sentido brasileiro e<br />

malicioso da palavra – um meio <strong>de</strong> sobrevivência e, por<br />

vezes, <strong>de</strong> enriquecimento.<br />

A diferença do romance em relação aos <strong>de</strong><strong>mais</strong> é que<br />

o herói <strong>de</strong>ste livro (se é que existem heróis na obra <strong>de</strong> Mar‑<br />

cos Rey) é um carioca perdido na Pauliceia, on<strong>de</strong> fora ten‑<br />

tar a vida <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> inúmeros fracassos. É ele quem narra<br />

suas aventuras, venturas e <strong>de</strong>sventuras paulistanas.<br />

Com seu habitual cinismo e humor corrosivo, Marcos<br />

Rey mistura em doses precisas o picaresco e o policial para<br />

embalar o leitor numa história repleta <strong>de</strong> peripécias e <strong>de</strong><br />

suspense, mas que não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser também um romance<br />

<strong>de</strong> costumes, um corte transversal nos diversos segmentos<br />

sociais da capital paulista.<br />

Empregado como motorista na casa do milionário Pa‑<br />

leardi, Raul, o Carioca, <strong>de</strong>scobre na garagem da casa do pa‑<br />

trão um boneco parecido com a Carmen Miranda que,<br />

sabe ‑se lá por qual razão, aguça seu senso <strong>de</strong> Sherlock. A<br />

partir <strong>de</strong>sse fato prosaico, a ação se acelera: o narrador se<br />

torna amante da patroa, para logo ser <strong>de</strong>sprezado, é acusado<br />

<strong>de</strong> furto <strong>de</strong> joias, conhece a prisão, retorna ao emprego, co‑<br />

nhece um novo amor, é expulso novamente da mansão, <strong>de</strong>s‑<br />

cobre a joia que fora acusado <strong>de</strong> roubar, recupera o bom<br />

nome e <strong>de</strong>svenda o mistério da fortuna do patrão.<br />

Como em toda a sua obra, Marcos Rey expõe aqui a<br />

sua <strong>de</strong>silusão, mas também a sua tolerância, com o ser<br />

humano, egoísta e interesseiro, acionado pelos mecanis‑<br />

mos do sexo e da ambição, num mundo dissoluto e mal‑<br />

dito. Malditos hum<strong>anos</strong>!<br />

174<br />

M a r c o s r e y<br />

MANO JUAN<br />

1 a edição – 144 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑1035 ‑2<br />

Marcos Rey sabia como ninguém envolver o leitor em<br />

aventuras e pren<strong>de</strong>r a sua atenção. Mago e mágico da pala‑<br />

vra escrita, <strong>de</strong>scobria na São Paulo imensa e movimentada,<br />

que todo mundo vê, uma cida<strong>de</strong> misteriosa, fascinante, na<br />

qual se <strong>de</strong>senrolavam peripécias e atropelos <strong>de</strong> tirar o fôlego,<br />

como vemos neste Mano Juan. Sem forçar a barra e falando<br />

apenas pelo interesse que <strong>de</strong>spertam, seus livros são tão<br />

apaixonantes quanto as obras <strong>de</strong> Alexandre Dumas ou ou‑<br />

tros mestres do romance <strong>de</strong> aventura.<br />

Só que os heróis do mundo atual não usam capa e es‑<br />

pada, não frequentam palácios, nem manejam com habilida<strong>de</strong><br />

a espada, mas se vestem <strong>de</strong> jeans ou ternos, andam por corti‑<br />

ços e muquifos e, em casos extremos, utilizam revólveres.<br />

A época não é <strong>mais</strong> a dos reis franceses românticos e<br />

i<strong>de</strong>alizados, mas a década <strong>de</strong> 1970, no Brasil, dura, brutal,<br />

com a ditadura atenta como um cão <strong>de</strong> guarda, pronta a<br />

pren<strong>de</strong>r e torturar. Nesse ambiente tenso, Juan, um guerri‑<br />

lheiro boliviano, foge para São Paulo, em busca <strong>de</strong> uma pos‑<br />

sível ajuda. A partir daí, fatos e episódios galopam diante dos<br />

olhos do leitor, envolvido pela atmosfera daqueles dias,<br />

numa narrativa meio realida<strong>de</strong>, meio pesa<strong>de</strong>lo, em ambien‑<br />

tes on<strong>de</strong> se misturam política e submundo, retratados com<br />

a justeza e a fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> <strong>de</strong> quem os conhecia por <strong>de</strong>ntro.<br />

Os pesa<strong>de</strong>los, contratempos, bons momentos e <strong>de</strong>ses‑<br />

peros dos personagens são acompanhados por um autor<br />

irônico, sarcástico, por vezes bem ‑humorado, ora brutal,<br />

ora gozador, sempre implacável, revelando sua <strong>de</strong>scrença<br />

em relação ao bicho ‑homem, mas fazendo questão cerrada<br />

<strong>de</strong> ocultar sua ternura, ou até mesmo sua simpatia. Este<br />

Mano Juan, como observa Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão no<br />

prefácio, “é a amostra viva da maestria <strong>de</strong> Marcos Rey –<br />

sua maneira <strong>de</strong> contar fácil e como é difícil narrar com fa‑<br />

cilida<strong>de</strong> e simplicida<strong>de</strong>”.<br />

M a r c o s r e y


MEMÓRIAS DE UM<br />

GIGOLÔ<br />

22 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1537 ‑1<br />

Memórias <strong>de</strong> um gigolô assinala um momento <strong>de</strong><br />

renovação da ficção <strong>de</strong> Marcos Rey. O espírito é o<br />

mesmo dos livros anteriores e <strong>de</strong> toda a sua obra, a<br />

velha picardia, a saborosa malícia, o permanente mer‑<br />

gulho no mundo dos <strong>de</strong>sclassificados sociais, o sar‑<br />

casmo mal disfarçado contra a hipocrisia social. A<br />

novida<strong>de</strong> é que com esses elementos, permanentes em<br />

sua obra, o autor construiu um romance que, com al‑<br />

guma ousadia, po<strong>de</strong>ríamos chamar <strong>de</strong> romance <strong>de</strong><br />

tese. Ou, talvez, uma antítese, se pon<strong>de</strong>rarmos a sua<br />

origem. Afinal, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r teses, ou escrevê ‑las, é coisa<br />

<strong>de</strong> doutor, e o livro é um <strong>de</strong>poimento em primeira pes‑<br />

soa <strong>de</strong> um explorador <strong>de</strong> mulheres, um cafetão, um<br />

cafifa, um gigolô, ou outro termo qualquer com que<br />

se classifica o representante <strong>de</strong>ssa profissão amaldiço‑<br />

ada pela socieda<strong>de</strong>, embora vista com inveja por muita<br />

gente boa. Evi<strong>de</strong>nte que essa colocação nos <strong>de</strong>scerra<br />

uma visão dura, mas por vezes agridoce da socieda<strong>de</strong>.<br />

E ao mesmo tempo, ela humaniza o personagem, ma‑<br />

treiro, apren<strong>de</strong>ndo com sua própria experiência a se<br />

afirmar no submundo e que, ao pon<strong>de</strong>rar sobre sua<br />

trajetória <strong>de</strong> vida, conclui que não fora um fracasso<br />

total e, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo do ângulo <strong>de</strong> visão, po<strong>de</strong>mos<br />

acrescentar, talvez seja até um triunfador, se o enca‑<br />

rarmos como um simples profissional, convenções so‑<br />

ciais à parte. Afinal, como observa Marcos Rey,“há<br />

profissões <strong>mais</strong> pecaminosas que a <strong>de</strong> gigolô, embora<br />

<strong>mais</strong> cercadas <strong>de</strong> respeitabilida<strong>de</strong>. Não convém<br />

enumerá ‑las aqui. O marginal é sempre o menos res‑<br />

ponsável pela sua marginalida<strong>de</strong>, e simpatizar ‑se com<br />

ele é uma forma, tímida embora, <strong>de</strong> reprovação ao<br />

organismo social que o criou.”<br />

M a r c o s r e y<br />

O CÃO DA MEIA ­NOITE<br />

5 a edição – 216 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0995 ‑8<br />

O cão da meia ‑noite reúne os melhores contos <strong>de</strong> Mar‑<br />

cos Rey. O cenário é São Paulo, não a cida<strong>de</strong> dos executivos,<br />

do comércio intenso, das gran<strong>de</strong>s empresas situadas na ave‑<br />

nida Paulista, mas uma São Paulo que começa a viver<br />

quando a noite cai, habitada por uma fauna humana exótica<br />

aos olhos dos que vivem <strong>de</strong> dia, seres atormentados, quase<br />

<strong>de</strong> outro mundo, frequentadores <strong>de</strong> bares, em busca <strong>de</strong> uma<br />

aventura sexual barata, alcoólatras, a gente da noite.<br />

Nos oito contos do livro a presença dominante é a<br />

solidão humana das gran<strong>de</strong>s metrópoles mo<strong>de</strong>rnas, e os<br />

problemas <strong>de</strong>la <strong>de</strong>correntes: a incomunicabilida<strong>de</strong> entre as<br />

criaturas, o vale ‑tudo para se conseguir dinheiro ou chegar<br />

ao prazer, o egoísmo, a esperteza em todos os seus mati‑<br />

zes, registradas com ironia, sarcasmo, humor corrosivo.<br />

Com domínio absoluto da técnica do conto, sabendo<br />

como <strong>de</strong>senvolver uma história, pren<strong>de</strong>r o leitor e só soltá ‑lo<br />

na última linha, Marcos Rey apresenta, <strong>de</strong> forma quase im‑<br />

piedosa, os personagens <strong>de</strong> seu mundo.<br />

São escribas <strong>de</strong> alma contraditória, oscilando entre a pie‑<br />

da<strong>de</strong> e a cruelda<strong>de</strong>, mas ainda com um resto <strong>de</strong> sentimento<br />

humano, como o notívago <strong>de</strong> “O cão da meia ‑noite”, obra‑<br />

‑prima, um dos <strong>mais</strong> belos contos <strong>de</strong> ani<strong>mais</strong> da literatura<br />

brasileira; o maníaco <strong>de</strong>sequilibrado <strong>de</strong> “Eu e meu Fusca”; a<br />

pequena odisseia <strong>de</strong> um publicitário <strong>de</strong>sempregado (“O bar<br />

dos cento e tantos dias”); uma noite <strong>de</strong> <strong>de</strong>sencontros numa<br />

reunião <strong>de</strong> gente endinheirada (“A escalação”); a <strong>de</strong>silusão<br />

do motorista <strong>de</strong> táxi interessado em política (“O adhema‑<br />

rista”); a festa na mansão <strong>de</strong> um magnata, com farto con‑<br />

sumo <strong>de</strong> álcool e lança ‑perfume (“Soy loco por ti, América!”);<br />

a noite felliniana <strong>de</strong> alguns amigos até a madrugada (“Traje<br />

<strong>de</strong> rigor”); o jogo <strong>de</strong> engana ‑engana entre um artista e seu<br />

secretário, pela posse <strong>de</strong> uma mulher (“Mustang cor <strong>de</strong> san‑<br />

gue”); retratos do vazio existencial da gente da noite.<br />

M a r c o s r e y<br />

175


O CASO DO FILHO DO<br />

ENCADERNADOR<br />

ROMANCE DA VIDA DE UM<br />

ROMANCISTA<br />

3 a edição – 152 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1656 ‑9<br />

O reencontro com um livro <strong>de</strong> Marcos Rey é sempre gra‑<br />

tificante. Esgotado há alguns <strong>anos</strong>, O caso do filho do enca‑<br />

<strong>de</strong>rnador, subtitulado “Romance da vida <strong>de</strong> um romancista”,<br />

surge, para muita gente, como uma novida<strong>de</strong>. Escrito com a<br />

malícia, o bom humor e a ironia por vezes ferina, peculiar ao<br />

autor, é uma autobiografia romanceada, um reencontro do<br />

homem maduro com o menino e o jovem que ele foi um dia,<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o instante em que os seus “sentidos <strong>de</strong>spertaram, igual<br />

a uma lâmpada que acen<strong>de</strong>”, até o momento em que o es‑<br />

critor consagrado encontra sua própria imagem no espelho e<br />

medita sobre sua longa trajetória <strong>de</strong> vida.<br />

Nascido em ambiente doméstico humil<strong>de</strong>, filho <strong>de</strong> um<br />

gráfico e enca<strong>de</strong>rnador, teve pelo menos um handicap: toda<br />

a família gostava <strong>de</strong> ler, o pai, a mãe, presbiteriana, leitora<br />

da Bíblia, os irmãos. Cedo <strong>de</strong>scobriu o prazer dos mundos<br />

paralelos da ficção – primeiro nas histórias em quadrinhos,<br />

mas o que <strong>mais</strong> gostava era ouvir o pai lendo obras como As<br />

mil e uma noites. O menino voava, encarnava ‑se nos heróis<br />

cujas peripécias ouvia, e divagava. Um mundo maravilhoso.<br />

Mais tar<strong>de</strong>, entregou ‑se à literatura. Graças ao irmão, tam‑<br />

bém escritor, Mário Donato, inicia as suas ativida<strong>de</strong>s literá‑<br />

rias, colaborando em revistas. Surgia o futuro escritor.<br />

Em paralelo à sua vida, aos dias <strong>de</strong> boemia na juven‑<br />

tu<strong>de</strong>, aos primeiros sucessos <strong>de</strong> público e <strong>de</strong> crítica, à pai‑<br />

xão pela esposa, Marcos Rey traça um panorama do<br />

mundo e do Brasil a partir da difícil fase da Segunda Guerra<br />

Mundial e do governo <strong>de</strong> Getúlio Vargas.<br />

Quase memórias, O caso do filho do enca<strong>de</strong>rnador<br />

po<strong>de</strong> ser visto também como uma lição <strong>de</strong> vida e persistên‑<br />

cia, nas palavras do autor, “a luta <strong>de</strong> um escritor, que não<br />

veio das camadas privilegiadas da socieda<strong>de</strong>, para manter<br />

seu i<strong>de</strong>al, apesar <strong>de</strong> todas as adversida<strong>de</strong>s” e se consagrar<br />

como um dos autores <strong>mais</strong> populares <strong>de</strong> seu tempo.<br />

176<br />

M a r c o s r e y<br />

O ENTERRO<br />

DA CAFETINA<br />

4 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0977 ‑X<br />

O mundo dos personagens <strong>de</strong> Marcos Rey começa<br />

quando o sol se põe e a noite cai sobre a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo.<br />

Então, boêmios, garotas <strong>de</strong> programa, gigolôs, guerrilheiros<br />

urb<strong>anos</strong> (o livro foi escrito nos dias da ditadura militar), dan‑<br />

çarinas <strong>de</strong> cabarés, taxi ‑girls, alcoólatras começam a sair das<br />

tocas, como ratos famintos, em busca <strong>de</strong> aventuras, <strong>de</strong> diver‑<br />

timento, <strong>de</strong> um trouxa, <strong>de</strong> um trocado, <strong>de</strong> uma garrafa <strong>de</strong><br />

álcool, ou do simples e exato exercício <strong>de</strong> suas profissões.<br />

Como diz o autor, “são homens e mulheres que<br />

param nos bares, restaurantes, inferninhos, cabarés, boates<br />

e em certas casas on<strong>de</strong> tudo se tolera”, por vocação ou<br />

erro <strong>de</strong> educação, dor <strong>de</strong> cotovelo ou outra dor qualquer,<br />

vagabundagem. A noite paulistana, seus mistérios e misé‑<br />

rias, faz a unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> O enterro da cafetina, atando os sete<br />

contos entre si e formando um gran<strong>de</strong> painel.<br />

O que contam essas histórias? Coisas terríveis que<br />

acontecem na noite, como diz a Bíblia, mas também casos<br />

surpreen<strong>de</strong>ntes, quase patéticos, insuspeitas generosida‑<br />

<strong>de</strong>s. Noitadas <strong>de</strong> amigos, regadas a muito álcool, que ter‑<br />

minam <strong>de</strong> forma trágica; o gigolô bem ‑sucedido, homem<br />

<strong>de</strong> muitas mulheres, apaixonado por uma moça <strong>de</strong> família,<br />

a quem auxilia financeiramente; a morte e o enterro retum‑<br />

bante da velha cafetina; jogos <strong>de</strong> sedução em que cada um<br />

procura lograr o outro; a ação <strong>de</strong> guerrilheiros <strong>mais</strong> ou<br />

menos trapalhões; um caso <strong>de</strong> ciúmes neurótico; o redator<br />

alcoólatra lutando pela sobrevivência.<br />

Com um texto fluente, enxuto e domínio absoluto do<br />

conto, Marcos Rey acompanha com naturalida<strong>de</strong> e sar‑<br />

casmo, por vezes zombeteiro, as pequenas odisseias <strong>de</strong><br />

suas criaturas, trituradas pela cida<strong>de</strong> gran<strong>de</strong>, incapazes<br />

<strong>de</strong> encontrar um sentido para a vida e se lixando para isso,<br />

interessadas apenas em viver o imediato. Como autênticas<br />

criaturas da noite.<br />

M a r c o s r e y


O PÊNDULO DA NOITE<br />

2 a edição – 184 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0992 ‑3<br />

Em O pêndulo da noite encontramos um Marcos Rey em<br />

plena forma: irônico, cético em relação à humanida<strong>de</strong>, por<br />

vezes <strong>de</strong>bochado. As narrativas <strong>de</strong>slizam como um carro<br />

numa pista <strong>de</strong> alta velocida<strong>de</strong>. Texto exato, sem palavras a<br />

<strong>mais</strong> e sem preciosismos, a gíria bem empregada, quando<br />

necessário o palavrão. Diálogos vivos. Personagens marcados<br />

pela existência, ásperos, prisioneiros do sistema <strong>de</strong> vida da<br />

cida<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna (São Paulo), alguns vivendo em quiti‑<br />

netes mínimas, fábricas <strong>de</strong> neuroses, ou em pensões baratas.<br />

São vigaristas <strong>de</strong> todas as espécies, assaltantes, pros‑<br />

titutas, psicopatas, jornalistas que mal ganham para comer,<br />

espertalhões, artistas <strong>de</strong> sucesso, ingênuos (o que seria dos<br />

espertos sem eles?). E também ricaços da alta socieda<strong>de</strong>,<br />

satirizados <strong>de</strong> maneira implacável.<br />

Nesse mundo quase pitoresco, a um <strong>de</strong>do da margina‑<br />

lida<strong>de</strong>, predomina um sentimento <strong>de</strong> amarga frustração e <strong>de</strong><br />

permanente solidão, uma absoluta incapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> comuni‑<br />

cação entre os seres hum<strong>anos</strong>, perdidos na selva <strong>de</strong> pedra,<br />

como ani<strong>mais</strong> <strong>de</strong> espécies diferentes. Cada um procura en‑<br />

ganar o outro, na busca <strong>de</strong> suas conveniências, vantagens<br />

pessoais ou prazeres imediatos (“Mustang cor <strong>de</strong> sangue”).<br />

Há os frustrados, que per<strong>de</strong>m qualquer escrúpulo para<br />

alcançar seus fins, mas que po<strong>de</strong>m apenas estar cavando a<br />

própria ruína, como no sarcástico “O dicionarista”.<br />

Mas o autor acredita que nem tudo está perdido, pelo<br />

menos enquanto houver otários como o personagem <strong>de</strong> “O<br />

bolha”, ou figuras com um resto <strong>de</strong> sentimento humano<br />

como o herói <strong>de</strong> “O cão da meia ‑noite”, um dos <strong>mais</strong> belos<br />

contos <strong>de</strong> ani<strong>mais</strong> da literatura brasileira, ponto alto do livro,<br />

ao lado <strong>de</strong> “Eu e meu Fusca”. Um livro com “a força <strong>de</strong> uma<br />

<strong>de</strong>núncia”, como observa João Antônio, que achará seu<br />

lugar “aos trompaços, socos e pontapés”, tal como as coisas<br />

acontecem na socieda<strong>de</strong> brasileira atual.<br />

M a r c o s r e y<br />

ÓPERA DE SABÃO<br />

Prelo<br />

Em Ópera <strong>de</strong> sabão o leitor encontra o melhor da ficção<br />

<strong>de</strong> Marcos Rey. Sarcástico, duro em certos momentos, mas<br />

com um leve fundo <strong>de</strong> pieda<strong>de</strong> pelo bicho ‑homem, o ro‑<br />

mance retrata uma família paulistana abalada e revoltada<br />

com o suicídio <strong>de</strong> Getúlio Vargas, em agosto <strong>de</strong> 1954. O<br />

conhecimento da tragédia, como em tantos outros lares bra‑<br />

sileiros, chegou aos personagens através das ondas do rádio,<br />

então o gran<strong>de</strong> veículo <strong>de</strong> comunicação popular. A televisão<br />

apenas engatinhava e só os ricos tinham aparelhos em casa.<br />

O próprio título alu<strong>de</strong> ao rádio, objeto <strong>de</strong> paixão do<br />

autor. “Ópera <strong>de</strong> sabão” é a tradução em português <strong>de</strong><br />

soap operas, nome dado às radionovelas nos Estados Uni‑<br />

dos, pelo fato <strong>de</strong> serem sempre patrocinadas por sabões e<br />

sabonetes.<br />

Sem ser um romance histórico, no sentido estrito do<br />

termo, a obra entrelaça o fundo histórico com a realida<strong>de</strong><br />

cotidiana dos personagens, reconstituindo com fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong><br />

os <strong>anos</strong> 1950, década <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s transformações na vida<br />

nacional. Foi a época em que a publicida<strong>de</strong> se cristalizou,<br />

as boates entraram na vida dos jovens e a violência urbana<br />

começava a se revelar, mas as radionovelas, esses “folhe‑<br />

tins <strong>de</strong> ouvido”, continuavam imbatíveis na preferência dos<br />

brasileiros. Neste mundo encontramos personagens sem‑<br />

pre hum<strong>anos</strong>, típicos do período, como o pai <strong>de</strong> família<br />

que, como tantos brasileiros <strong>de</strong> então, planeja vingar Ge‑<br />

túlio matando Calos Lacerda.<br />

Como é peculiar em Marcos Rey, o leitor vai se encon‑<br />

trar com uma obra risonha e irônica, um tanto zombeteira,<br />

que acompanha com atenção “as <strong>de</strong>rrapagens da frágil<br />

condição humana – que começou com Adão e Eva, e que<br />

são diferentes <strong>de</strong> nós só porque não foram radiouvintes<br />

nem telespectadores”, na observação precisa e irreverente<br />

<strong>de</strong> Mário Donato.<br />

Prelo<br />

M a r c o s r e y<br />

177


SOy LOCO POR TI,<br />

AMÉRICA!<br />

2 a edição – 168 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0978 ‑8<br />

Autor <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> quarenta títulos, que alcançaram<br />

uma vendagem superior a 5 milhões <strong>de</strong> exemplares, Mar‑<br />

cos Rey (pseudônimo <strong>de</strong> Edmundo Donato) foi antes <strong>de</strong><br />

tudo um contador <strong>de</strong> histórias. Alheio a teorias, coerente<br />

consigo mesmo, sabia como raros pren<strong>de</strong>r a atenção do<br />

leitor e torná ‑lo parceiro, e cúmplice agra<strong>de</strong>cido, das pe‑<br />

quenas e gran<strong>de</strong>s canalhices <strong>de</strong> seus personagens, como<br />

nos sete contos <strong>de</strong> Soy loco por ti, América!<br />

Neste, como nos seus <strong>de</strong><strong>mais</strong> livros, o gran<strong>de</strong> perso‑<br />

nagem é a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, essa “máquina <strong>de</strong> moer<br />

gente” (João Antônio), cenário da luta implacável pela so‑<br />

brevivência, envolvendo malandros e solitários, notívagos e<br />

angustiados, cada um se virando como po<strong>de</strong>, em busca <strong>de</strong><br />

um trocado, <strong>de</strong> um instante <strong>de</strong> simpatia, <strong>de</strong> sexo barato.<br />

Uma fauna humana meio grotesca, que o escritor trata<br />

com ironia, irreverência, humor cáustico, segundo ele, “a<br />

melhor forma <strong>de</strong> apresentar uma crítica”.<br />

Crítica, na verda<strong>de</strong> impiedosa da socieda<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna,<br />

com sua filosofia <strong>de</strong> consumismo, o egoísmo implacável, a<br />

alienação generalizada, o <strong>de</strong>sespero do mundo noturno,<br />

com seus bares e inferninhos, garotas <strong>de</strong> programa, margi‑<br />

nais e <strong>de</strong>sesperados <strong>de</strong> todos os tipos.<br />

A noite é o horário preferido pelos heróis <strong>de</strong> Marcos<br />

Rey para saírem da toca e se revelarem: a fã que surpreen<strong>de</strong><br />

o locutor, madrugada alta; o passeio noturno <strong>de</strong> um publici‑<br />

tário <strong>de</strong>sempregado; os grã ‑finos em sua jornada vazia noite<br />

a <strong>de</strong>ntro, com farto consumo <strong>de</strong> álcool e lança ‑perfume.<br />

Mas a gente do dia também é fascinante, sobretudo quando<br />

se trata <strong>de</strong> um refinadíssimo vigarista, como o personagem<br />

<strong>de</strong> “A enguia”, ou <strong>de</strong> um irremediável apaixonado por polí‑<br />

tica (“O adhemarista”). Qualquer hora é hora para um per‑<br />

sonagem <strong>de</strong> conto sobressair quando quem escreve tem as<br />

artes, artimanhas e astúcias <strong>de</strong> Marcos Rey.<br />

178<br />

M a r c o s r e y<br />

OS HOMENS DO FUTURO (INÉDITO, PRELO)<br />

OBRAS DE LITERATURA JUVENIL DO AUTOR<br />

• A sensação <strong>de</strong> setembro<br />

• Bem ­vindos ao Rio<br />

• Diário <strong>de</strong> Raquel<br />

• Dinheiro do céu<br />

• 12 horas <strong>de</strong> terror<br />

• Enigma na televisão<br />

• Filho <strong>de</strong> peixe (prelo)<br />

• Marcos Rey crônicas para jovens<br />

• Na rota do perigo<br />

• O coração roubado<br />

• O diabo no porta ­malas<br />

• O homem que veio para resolver (prelo)<br />

• O inimigo invisível (prelo)<br />

• O mistério do 5 estrelas<br />

• O rapto do Garoto <strong>de</strong> Ouro<br />

• Os crimes do Olho <strong>de</strong> Boi<br />

• Sozinha no mundo<br />

• Um gato no triângulo<br />

M a r C o s r e y P r e l o<br />

M a r C o s r e y


Affonso R. <strong>de</strong> Sant´Anna<br />

C o l e ç ã o<br />

M a r i n a C o l a s a n t i<br />

Nasceu em Asmara, na Etiópia, na região que atual‑<br />

mente correspon<strong>de</strong> à Eritreia. Viveu em Trípoli, percor‑<br />

reu a Itália em constantes mudanças, transferiu ‑se<br />

com sua família para o Brasil. Viajar foi, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cedo,<br />

sua maneira <strong>de</strong> viver. E, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cedo, apren<strong>de</strong>u a ver o<br />

mundo com duplo olhar <strong>de</strong> quem pertence e ao<br />

mesmo tempo é alheio.<br />

A pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua vida transmitiu ‑se à sua obra.<br />

Pintora e gravadora por formação, é ilustradora dos<br />

seus livros. Foi publicitária, apresentadora <strong>de</strong> televi‑<br />

são, traduziu obras fundamentais da literatura. Jorna‑<br />

lista, publicou livros <strong>de</strong> comportamento e crônicas.<br />

Recebeu numerosos prêmios como contista. É poeta.<br />

Muda a realida<strong>de</strong> externa, mas a nossa realida<strong>de</strong><br />

interior, feita <strong>de</strong> medos e fantasias, se mantém<br />

inalterada. E é com esta que dialogam as fadas,<br />

interagindo simbolicamente, em qualquer ida<strong>de</strong> e<br />

em todos os tempos.<br />

179


DOZE REIS E A<br />

MOÇA NO<br />

LABIRINTO DO<br />

VENTO<br />

12 a edição – 96 páginas<br />

ISBN 978‑85 ‑260 ‑1108‑1<br />

Com <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za e capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sedução, Marina<br />

Colasanti joga com o maravilhoso, o po<strong>de</strong>r da imagina‑<br />

ção, as criaturas fantásticas, <strong>de</strong>monstrando como eles<br />

continuam vivos, palpitantes e essenciais à formação do<br />

ser humano.<br />

Como observa a autora, “nossa realida<strong>de</strong> interior,<br />

feita <strong>de</strong> medos e fantasias, se mantém inalterada. E é com<br />

esta que dialogam as fadas, interagindo simbolicamente,<br />

em qualquer ida<strong>de</strong> e em todos os tempos”.<br />

Este diálogo com o fantástico, <strong>de</strong>ntro da tradição do<br />

gênero, <strong>de</strong>ixa sempre um ensinamento, como o leitor<br />

comprova na história da tecelã solitária que dá vida às<br />

criaturas e coisas que tece, para sua própria <strong>de</strong>silusão (“A<br />

moça tecelã”); no rei que <strong>de</strong>scobre na noite <strong>de</strong> núpcias<br />

um leão em seu quarto (“Entre leão e unicórnio”); no<br />

jardineiro apaixonado por uma roseira quase humana (“A<br />

mulher ramada”); no cansaço do Tempo (“No colo do<br />

ver<strong>de</strong> vale”); nos presentes recebidos pela filha do rei no<br />

dia <strong>de</strong> seu aniversário (“Uma concha à beira‑mar”); na<br />

pequena ilha habitada por ninfas (“On<strong>de</strong> os oce<strong>anos</strong> se<br />

encontram”); no contraste <strong>de</strong> dois príncipes irmãos (“Um<br />

<strong>de</strong>sejo e dois irmãos”); nas garças que chegam no ou‑<br />

tono, em vez <strong>de</strong> na primavera (“De suave canto”); no<br />

guerreiro cansado <strong>de</strong> lutar e que <strong>de</strong>seja apenas viver em<br />

seu castelo (“O rosto atrás do rosto”); na menina que<br />

tinha os cabelos cortados, mas <strong>de</strong>sejava ter tranças (“Uma<br />

ponte entre dois reinos”); na jovem que se olha no espe‑<br />

lho e <strong>de</strong>scobre que sua imagem <strong>de</strong>sapareceu (“À procura<br />

<strong>de</strong> um reflexo”); no labirinto para domar o vento no meio<br />

do jardim (“Doze reis e a moça no labirinto do vento”); no<br />

rei apaixonado pelo silêncio, que constrói muros altíssi‑<br />

mos ao redor <strong>de</strong> seu castelo (“Palavras aladas”).<br />

O livro é enriquecido com os belos <strong>de</strong>senhos da autora.<br />

180<br />

M a r i n a C o l a s a n t i<br />

UMA IDEIA TODA<br />

AZUL<br />

23 a edição – 64 páginas<br />

ISBN 978‑85 ‑260 ‑1109‑0<br />

Publicado em 1979, Uma i<strong>de</strong>ia toda azul ganhou dois<br />

dos prêmios <strong>mais</strong> importantes concedidos a obras <strong>de</strong>stina‑<br />

das ao povinho miúdo: o Gran<strong>de</strong> Prêmio <strong>de</strong> Crítica para Li‑<br />

teratura Infantil, da Associação Paulista <strong>de</strong> Críticos <strong>de</strong> Arte,<br />

e o <strong>de</strong> Melhor Livro para Jovem, no ano <strong>de</strong> publicação, con‑<br />

cedido pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil.<br />

Passados <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta <strong>anos</strong>, o livro continua <strong>mais</strong><br />

azul e sedutor do que nunca. Inspirada por temas, perso‑<br />

nagens e histórias quase tão velhos quanto a humanida<strong>de</strong>,<br />

Marina Colasanti navega pelo fantástico com todas as liber‑<br />

da<strong>de</strong>s da fantasia, que o homem contemporâneo está <strong>de</strong>i‑<br />

xando morrer, dominado pela frieza da tecnologia.<br />

Soltas as asas da imaginação, o leitor <strong>de</strong> todas as ida‑<br />

<strong>de</strong>s penetra num universo inesquecível que, por certo, vai<br />

marcá‑lo por toda a vida. É a oportunida<strong>de</strong> maravilhosa <strong>de</strong><br />

conhecer gnomos da floresta e o vento conversador, <strong>de</strong><br />

assistir princesas transformadas em cisnes ou disfarçadas<br />

<strong>de</strong> corças para seduzir o príncipe eleito, passear em caste‑<br />

los <strong>de</strong> vidro e se angustiar com a sorte da princesinha ador‑<br />

mecida para sempre por arte da magia.<br />

Com encanto, o leitor é apresentado ao rei que só conhe‑<br />

cia o mundo pela palavra do vento (“O último rei”), ao bor‑<br />

dado mágico que torna real os <strong>de</strong>senhos nele feitos (“Além do<br />

bastidor”), à princesa que amava as borboletas (“Por duas asas<br />

<strong>de</strong> veludo”), ao unicórnio enamorado pela princesa (“Um es‑<br />

pinho <strong>de</strong> marfim”), ao rei que tem “Uma i<strong>de</strong>ia toda azul”, ao<br />

príncipe que vai à caçada e encontra seu <strong>de</strong>stino (“Entre as<br />

folhas do ver<strong>de</strong> O”), às fadas tece<strong>de</strong>iras rivais (“Fio após fio”),<br />

à princesa sem ninguém para brincar (“A primeira só”), a uma<br />

história <strong>de</strong> amor proibido (“Sete <strong>anos</strong> e <strong>mais</strong> sete”), às conse‑<br />

quências da sur<strong>de</strong>z real (“As notícias e o mel”).<br />

O livro é enriquecido com belas ilustrações da autora,<br />

inspirada na arte pictórica medieval.<br />

M a r i n a C o l a s a n t i


23 HISTÓRIAS DE<br />

UM VIAJANTE<br />

1 a edição – 224 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0988 ‑5<br />

As mulheres são sempre surpreen<strong>de</strong>ntes. Sobretudo<br />

quando atuam em universos tradicionalmente dominados<br />

pelos homens. Como a velha arte <strong>de</strong> contar histórias.<br />

Assim, as 23 histórias <strong>de</strong> um viajante, <strong>de</strong> Marina Colasanti,<br />

instigam e inquietam o leitor pela estrutura e <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong><br />

dos temas, mas sobretudo pela sensibilida<strong>de</strong> feminina que<br />

está por trás <strong>de</strong>las. O tema da viagem em busca <strong>de</strong> conhe‑<br />

cimento, <strong>de</strong> uma revelação ou da iluminação, existe <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

que o homem começou a cultivar a arte <strong>de</strong> contar. Na rea‑<br />

lida<strong>de</strong>, partir envolve, <strong>de</strong> certa forma, a própria inquietação<br />

que projeta o ser humano ao <strong>de</strong>sconhecido, a se<strong>de</strong> <strong>de</strong> se‑<br />

guir para a frente, <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobrir, mas também <strong>de</strong> revelar. O<br />

viajante está sempre em busca <strong>de</strong> alguma coisa misteriosa,<br />

mas traz também a inquietação, como o cavaleiro <strong>de</strong>ste<br />

livro, que consegue penetrar no domínio <strong>de</strong> um príncipe<br />

misterioso, isolado do mundo por altas muralhas. Ali, como<br />

uma espécie <strong>de</strong> Sheraza<strong>de</strong>, passa a narrar as 23 histórias<br />

reunidas no volume, “como se soubesse o que ia no cora‑<br />

ção do príncipe”.<br />

Como se encarregado <strong>de</strong> uma missão, talvez sem o<br />

saber, o cavaleiro ‑narrador <strong>de</strong>sperta o príncipe para uma<br />

nova realida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>scerrando ‑lhe amplas perspectivas espi‑<br />

rituais, numa espécie <strong>de</strong> iniciação mágica.<br />

Seguindo o mo<strong>de</strong>lo clássico, os 23 contos narrados<br />

pelo viajante se <strong>de</strong>senvolvem a partir da proposição lan‑<br />

çada na história inicial, cujo significado se revela no final,<br />

fechando o ciclo iniciático. Dessa forma, o livro po<strong>de</strong> ser<br />

lido como uma série <strong>de</strong> contos ou como um romance unido<br />

pelo fio sutil que liga todas as histórias e as projeta muito<br />

além das fronteiras do possível.<br />

Mantendo a unida<strong>de</strong> espiritual com a escrita, as ilus‑<br />

trações do livro são da própria autora. A mão que inquieta<br />

com a palavra sabe também encantar com o <strong>de</strong>senho.<br />

M a r i n a C o l a s a n t i<br />

OBRAS DE LITERATURA INFANTIL E JUVENIL DA<br />

AUTORA<br />

• A menina arco ­íris<br />

• A moça tecelã<br />

• Cada bicho seu capricho<br />

• Com certeza tenho amor<br />

• Do seu coração partido<br />

• O homem que não parava <strong>de</strong> crescer<br />

• O lobo e o carneiro no sonho da menina<br />

• O menino que achou uma estrela<br />

• O nome da manhã (poesia, prelo)<br />

• O ver<strong>de</strong> brilha no poço<br />

• Ofélia, a ovelha<br />

• Poesia em 4 tempos<br />

• Um amor sem palavras<br />

M a r i n a C o l a s a n t i<br />

181


Arquivo pessoal<br />

C o l e ç ã o<br />

M e n a lt o n B r a F F<br />

182<br />

<strong>Professor</strong>, contista e romancista, Menalton Braff é<br />

natural <strong>de</strong> Taquara, no Rio Gran<strong>de</strong> do Sul. Passou a<br />

adolescência em Porto Alegre, em meio à literatura e<br />

à política, envolvendo‑se com o movimento estudan‑<br />

til durante a ditadura militar. Por conta <strong>de</strong> sua militân‑<br />

cia, Menalton Braff vê‑se forçado a abandonar o<br />

curso <strong>de</strong> Economia na URGS e a <strong>de</strong>saparecer como<br />

cidadão por alguns <strong>anos</strong>. Nos <strong>anos</strong> 1970, mudou‑se<br />

para São Paulo, on<strong>de</strong> concluiu o curso <strong>de</strong> Letras e<br />

ministrou aulas <strong>de</strong> Literatura Brasileira em faculda<strong>de</strong>s<br />

da capital paulista. Em seus dois primeiros livros assi‑<br />

nou com o pseudônimo Salvador dos Passos, pas‑<br />

sando a usar o próprio nome a partir <strong>de</strong> À sombra do<br />

cipreste, obra que lhe ren<strong>de</strong>u o Prêmio Jabuti – Livro<br />

do ano, em 2000. A coleção Menalton Braff traz ao<br />

leitor algumas das principais obras <strong>de</strong>sse que é consi‑<br />

<strong>de</strong>rado um dos gran<strong>de</strong>s autores <strong>de</strong> sua geração.<br />

Esta chuva surpresa nenhuma, aquelas nuvens gros‑<br />

sas amontoando‑se a tar<strong>de</strong> toda no topo do morro<br />

escuro. Primeiro aviso se formando além da Vila da<br />

Palha, no alto. Então pensei, Vai chover.


À SOMBRA DO<br />

CIPRESTE<br />

6 a edição – 112 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1579 ‑1<br />

Menalton Braff surgiu na literatura brasileira como um<br />

vendaval. Impossível ignorá ‑lo <strong>de</strong>pois do lançamento e da<br />

extraordinária acolhida, <strong>de</strong> público e <strong>de</strong> crítica, <strong>de</strong> À som‑<br />

bra do cipreste, laureado com o Prêmio Jabuti como o Livro<br />

do Ano <strong>de</strong> 2000.<br />

À sombra do cipreste <strong>de</strong>sfila uma humanida<strong>de</strong><br />

comum, <strong>de</strong>ssas pessoas que esbarramos na rua, a cada dia,<br />

com as quais convivemos no trabalho ou no ambiente fa‑<br />

miliar. É <strong>de</strong>sse barro que Braff cria os seus personagens,<br />

lembrando ‑nos o conselho <strong>de</strong> Rilke a um jovem poeta. O<br />

gran<strong>de</strong> escritor austríaco recomendava a seu correspon‑<br />

<strong>de</strong>nte observar o cotidiano e, se <strong>de</strong>le não fosse capaz <strong>de</strong><br />

extrair riquezas, culpar ‑se a si mesmo, por não saber ver.<br />

Menalton Braff sabe não apenas ver o cotidiano, como<br />

surpreen<strong>de</strong>r o ser humano, nele imerso, em situações ‑limite,<br />

em momentos <strong>de</strong> intensa dramaticida<strong>de</strong>, a que todos esta‑<br />

mos sujeitos. Os <strong>de</strong>zoito contos, concisos e precisos, reunidos<br />

em À sombra do cipreste, surpreen<strong>de</strong>m o leitor, exata mente,<br />

pela perspicácia com que revelam, sob a superfície tranquila,<br />

as águas revoltas no íntimo <strong>de</strong> cada um.<br />

Moacyr Scliar observou que À sombra do cipreste<br />

apresenta “o conto em sua melhor expressão”, ressaltando<br />

ainda a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Braff em surpreen<strong>de</strong>r os segredos e<br />

dilemas <strong>de</strong> seus personagens, não sendo outra “a função<br />

da gran<strong>de</strong> literatura: através da beleza dos textos, revelar‑<br />

‑nos a verda<strong>de</strong> que está oculta em cada pessoa, em todas<br />

as pessoas”.<br />

<strong>Professor</strong>, contista, romancista (Bolero <strong>de</strong> Ravel e Ta‑<br />

pete <strong>de</strong> silêncio foram também publicados pela <strong>Global</strong>),<br />

consi<strong>de</strong>rado um dos escritores <strong>mais</strong> importantes da litera‑<br />

tura brasileira atual, o gaúcho Menalton Braff vive hoje em<br />

Serrana, próximo a Ribeirão Preto, com <strong>de</strong>dicação integral<br />

à literatura.<br />

M e n a l t o n B r a f f<br />

BOLERO DE RAVEL<br />

1 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1514 ‑2<br />

O novo romance <strong>de</strong> Menalton Braff é como uma me‑<br />

lodia envolvente, <strong>de</strong> ritmo intenso e crescente, já expressa<br />

no título: Bolero <strong>de</strong> Ravel. À sombra <strong>de</strong>ssa música,<br />

<strong>de</strong>senrola ‑se um drama familiar <strong>de</strong> cores negras, envol‑<br />

vendo uma mulher <strong>de</strong>cidida, dinâmica e bem ‑sucedida na<br />

vida, e o irmão, eterno adolescente, incapaz <strong>de</strong> amadure‑<br />

cer. O contraste <strong>de</strong> temperamentos e objetivos <strong>de</strong> vida leva<br />

ao rompimento brusco das relações, e a ameaça <strong>de</strong> inter‑<br />

namento do rapaz num manicômio. Deterioração física e<br />

mental. Delírio. Um clima obsessivo e angustiante, que o<br />

romancista explora com maestria e vigor: “A cada salto<br />

dado pelo cachorro, ele cresce, infla e aumenta o peso, e<br />

seus <strong>de</strong>ntes alcançam as nuvens. Então ele se volta para as<br />

crianças e as <strong>de</strong>vora como se fossem gotas do mar. E pula<br />

novamente, arrancando pedaços <strong>de</strong> nuvens, que ele en‑<br />

gole, faminto. Seu pelo está sujo, escuro como as nuvens<br />

que ele já engoliu. Suas unhas imensas alcançam o Sol e o<br />

<strong>de</strong>spedaçam. Então sumimos numa noite sem fim. Apenas<br />

a escuridão existe. Apenas a escuridão. Apenas”.<br />

Natural do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul, professor <strong>de</strong> literatura<br />

brasileira, Menalton Braff tem uma das obras <strong>mais</strong> impor‑<br />

tantes das letras brasileiras contemporâneas, formada por<br />

seis romances, três volumes <strong>de</strong> contos, sete novelas juvenis<br />

e infantis. Entre os vários prêmios literários que conquistou<br />

figuram o Jabuti (livro do ano <strong>de</strong> 2000). Foi finalista na<br />

Jornada <strong>de</strong> Passo Fundo, no Portugal Telecom, no Jabuti<br />

(duas vezes) e na primeira edição do Prêmio São Paulo <strong>de</strong><br />

Literatura. Recebeu menção honrosa do Prêmio Casa <strong>de</strong> las<br />

Américas, <strong>de</strong> Havana, Cuba.<br />

Atualmente, resi<strong>de</strong> na região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, inte‑<br />

rior <strong>de</strong> São Paulo, on<strong>de</strong> se <strong>de</strong>dica à literatura, em ativida<strong>de</strong><br />

diária, interrompida por participações em salões literários e<br />

feiras <strong>de</strong> livros em diversas localida<strong>de</strong>s do Brasil.<br />

M e n a l t o n B r a f f<br />

183


TAPETE DE SILÊNCIO<br />

1 a edição – 128 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1605 ‑7<br />

Cada livro <strong>de</strong> Menalton Braff se assemelha a um tiro em<br />

meio ao silêncio. Desperta o leitor, provoca ‑o e o mantém<br />

alerta, intrigado e seduzido até a última linha, como acon‑<br />

tece com Tapete <strong>de</strong> silêncio, indicativo <strong>de</strong> renovação e <strong>de</strong><br />

uma nova posição do autor diante do seu universo ficcional.<br />

Diferente <strong>de</strong> seu último romance, Bolero <strong>de</strong> Ravel,<br />

centralizado em um único e enigmático personagem, em<br />

Tapete <strong>de</strong> silêncio o centro da ação é partilhado por múlti‑<br />

plos personagens, irmanados por um objetivo comum:<br />

manter a or<strong>de</strong>m e zelar pela honra <strong>de</strong> uma pequena ci‑<br />

da<strong>de</strong>, ironicamente batizada <strong>de</strong> Pouso do Sossego.<br />

Ao contrário do que indica seu nome, a cida<strong>de</strong>zinha<br />

vive um clima <strong>de</strong> tensão e intranquilida<strong>de</strong>, que leva <strong>de</strong>z <strong>de</strong><br />

seus principais habitantes a se reunirem, numa noite chu‑<br />

vosa, no coreto da praça da matriz, entre cochichos, risos<br />

abafados e pigarros, à espera da meia ‑noite.<br />

O que discutem, esperam e acontece nesta longa e<br />

trágica noite é narrado em primeira pessoa pelo lí<strong>de</strong>r do<br />

grupo, o comerciante Osório, numa linguagem concisa,<br />

precisa, banhada <strong>de</strong> poesia. Em segundo plano, <strong>de</strong>nomi‑<br />

nado “Coro”, sugerindo o clima <strong>de</strong> uma tragédia grega,<br />

um narrador em terceira pessoa traça uma espécie <strong>de</strong> pe‑<br />

quena história da comunida<strong>de</strong>, na qual passado e presente<br />

dialogam e da qual emergem ódios e prevenções, mesqui‑<br />

nharias, mágoas, rancores, contrastando com a ruidosa e<br />

festiva chegada <strong>de</strong> uma companhia circense na cida<strong>de</strong>.<br />

Nesse pequeno mundo, povoado <strong>de</strong> personagens em‑<br />

blemáticos e tão hum<strong>anos</strong>, Braff <strong>de</strong>snuda os mecanismos<br />

e os subterrâneos da luta pelo po<strong>de</strong>r, entrelaçado à ambi‑<br />

ção pessoal, à hipocrisia e à intolerância. Retrato duro e<br />

implacável da vida <strong>de</strong> Pouso do Sossego, Tapete <strong>de</strong> silêncio<br />

é também uma metáfora <strong>de</strong> toda a socieda<strong>de</strong> humana.<br />

184<br />

M e n a l t o n B r a f f


Espaço Cultural “Cida<strong>de</strong> do Livro”<br />

C o l e ç ã o<br />

o r í G e n e s l e s s a<br />

Nascido em Lençóis Paulista, São Paulo, Orígenes<br />

Lessa (1903 ‑1986) é reconhecido como um dos<br />

gran<strong>de</strong>s escritores brasileiros, por suas brilhantes<br />

obras voltadas para os públicos infantil e juvenil,<br />

além <strong>de</strong> sua notável habilida<strong>de</strong> na escrita <strong>de</strong> contos<br />

e romances. Passou parte <strong>de</strong> sua infância em São<br />

Luís do Maranhão e, posteriormente, em São Paulo,<br />

ingressou no Seminário <strong>de</strong> Teologia. Após abando‑<br />

nar o Seminário, seguiu para o Rio <strong>de</strong> Janeiro.<br />

Orígenes Lessa trilhou uma carreira literária marcada<br />

pelo sucesso <strong>de</strong> público e <strong>de</strong> crítica. O escritor proi‑<br />

bido, publicado em 1929, teve excelente acolhida.<br />

Com esse e outros títulos, como Garçon, garçon‑<br />

nette, garçonnière, Omelete em Bombaim e A noite<br />

sem homem, consagrou ‑se como um dos <strong>mais</strong> <strong>de</strong>s‑<br />

tacados contistas brasileiros.<br />

O feijão e o sonho, publicado em 1937, lhe valeu o<br />

Prêmio Antônio <strong>de</strong> Alcântara Machado. O livro, além<br />

<strong>de</strong> ultrapassar a barreira das quarenta edições, ganhou<br />

uma adaptação como novela para TV, que alcançou<br />

enorme sucesso. Em 1955, seu romance Rua do sol foi<br />

agraciado com o Prêmio Carmen Dolores Barbosa.<br />

A partir dos <strong>anos</strong> 1970, o escritor <strong>de</strong>dicou ‑se com<br />

afinco à literatura infantojuvenil, publicando quase<br />

quarenta títulos que o tornaram querido por crian‑<br />

ças e jovens. Nos corações e mentes <strong>de</strong> gerações <strong>de</strong><br />

leitores ficaram livros como Memórias <strong>de</strong> um cabo<br />

<strong>de</strong> vassoura, Confissões <strong>de</strong> um vira ‑lata e João Si‑<br />

mões continua. Foi membro da Associação Brasileira<br />

<strong>de</strong> Imprensa e da Aca<strong>de</strong>mia Brasileira <strong>de</strong> Letras.<br />

A coleção Orígenes Lessa publicada pela <strong>Global</strong> Edi‑<br />

tora reúne seus principais livros, com o anseio <strong>de</strong><br />

trazer novamente ao público leitor os textos <strong>de</strong>ste<br />

escritor <strong>de</strong> raro talento, que soube como poucos<br />

transitar com igual habilida<strong>de</strong> entre o campo da fic‑<br />

ção adulta e da literatura para crianças e jovens.<br />

185


O FEIJÃO E O SONHO<br />

Prelo<br />

Orígenes Lessa foi um dos autores brasileiros <strong>mais</strong> po‑<br />

pulares em sua época. Seus romances e livros <strong>de</strong> contos<br />

narravam o que público queria ler, em linguagem sedutora<br />

e comunicativa, mas sem fazer concessões. Mestre na arte<br />

<strong>de</strong> recriar o cotidiano e <strong>de</strong> criar tipos dos quais o leitor<br />

nunca se esquece, teve várias obras traduzidas para outros<br />

idiomas e adaptadas para o cinema.<br />

Sua literatura, aliás, tinha muito <strong>de</strong> cinematográfica<br />

na construção das cenas e precisão dos diálogos, como se<br />

comprova em O feijão e o sonho, que fez as <strong>de</strong>lícias <strong>de</strong><br />

várias gerações <strong>de</strong> leitores.<br />

Publicado em 1938, o livro encontrou imediata recep‑<br />

tivida<strong>de</strong> do público e admiração da crítica. Em pouco<br />

tempo entrou naquela galeria restrita <strong>de</strong> romances brasilei‑<br />

ros reeditados <strong>de</strong> tempos em tempos e sempre prestigiados<br />

pelo leitor, na qual figuram, entre outros, A Moreninha, O<br />

Guarani, Dom Casmurro e O Ateneu.<br />

Em linguagem simples, quase coloquial, O feijão e o<br />

sonho aborda um tema pouco explorado na literatura bra‑<br />

sileira: a luta <strong>de</strong> um escritor pobre para alcançar a realiza‑<br />

ção artística, os sonhos literários em conflito com a dura<br />

realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada dia, a incompreensão da esposa, as con‑<br />

tas a pagar. Um tema amargo, explorado com humor agri‑<br />

doce e uma discreta ternura, que não impe<strong>de</strong> a crítica<br />

ferina ao egoísmo da socieda<strong>de</strong>.<br />

O feijão e o sonho foi também, <strong>de</strong> forma indireta,<br />

responsável pela abertura <strong>de</strong> um caminho inesperado na<br />

carreira do escritor. Convidado a <strong>de</strong>bater o livro em uma<br />

reunião escolar, apesar do interesse dos alunos, Lessa com‑<br />

preen<strong>de</strong>u a ina<strong>de</strong>quação da obra para o público jovem. Foi<br />

então que enveredou por um caminho que nunca imagi‑<br />

nou, a literatura infantojuvenil, alegre e esperançosa como<br />

a juventu<strong>de</strong>, sem a aspereza e o suave <strong>de</strong>sencanto presen‑<br />

tes em O feijão e o sonho.<br />

186<br />

CONFISSÕES DE UM VIRA­LATA<br />

MEMÓRIAS DE UM CABO DE VASSOURA<br />

o r í G e n e s l e s s a P r e l o


Arquivo pessoal<br />

C o l e ç ã o<br />

s á B a t o M a G a l d i<br />

Nasceu em Belo Horizonte, em 1927. Trabalhou<br />

como crítico teatral em vários jornais e revistas. Pro‑<br />

fessor titular <strong>de</strong> Teatro Brasileiro da Escola <strong>de</strong> Comu‑<br />

nicação e Artes da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, on<strong>de</strong><br />

se tornou professor emérito. Lecionou durante quatro<br />

<strong>anos</strong> na Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Paris III (Sorbonne Nouvelle)<br />

e <strong>de</strong> Provence, em Aix ‑en ‑Provence. Membro da Aca‑<br />

<strong>de</strong>mia Brasileira <strong>de</strong> Letras. É autor <strong>de</strong> diversos livros,<br />

entre os quais po<strong>de</strong>m ‑se <strong>de</strong>stacar: Aspectos da dra‑<br />

maturgia mo<strong>de</strong>rna (1963), O cenário no avesso<br />

(1991), Um palco brasileiro: o Arena <strong>de</strong> São Paulo<br />

(1984), O texto no teatro (1999), Mo<strong>de</strong>rna dramatur‑<br />

gia brasileira (1998), Cem <strong>anos</strong> <strong>de</strong> teatro em São<br />

Paulo (2000) e Depois do espetáculo (2003).<br />

É preciso que o dramaturgo tome cada vez <strong>mais</strong><br />

consciência <strong>de</strong> que precisa escrever para a cena, tendo<br />

como mediador aquele que sabe materializar o seu<br />

mundo e o outro que empresta voz à sua palavra.<br />

187


PANORAMA DO<br />

TEATRO BRASILEIRO<br />

5 a edição rev. e ampliada – 328 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0561 ‑8<br />

Durante muito tempo a crítica encarou com certo me‑<br />

nosprezo o teatro brasileiro. Elegendo como padrão, em<br />

geral, peças do repertório francês, os críticos acabavam<br />

sempre por propor comparações <strong>de</strong>scabidas entre autores<br />

nacionais e estrangeiros. Com uma agravante: na visão<br />

<strong>de</strong>les, tudo que fosse brasileiro era ruim e imitativo. Quando<br />

muito, reconheciam o esforço dos românticos para com‑<br />

preen<strong>de</strong>r e revelar o país, um certo sentimento brasileiro<br />

em Martins Pena e uma ou outra concessão generosa.<br />

Essa mentalida<strong>de</strong> só seria abalada no século passado,<br />

com o aparecimento <strong>de</strong> autores <strong>de</strong> presença <strong>mais</strong> impac‑<br />

tante, como Nelson Rodrigues, mas sobretudo por uma<br />

tentativa honesta <strong>de</strong> reavaliação do teatro brasileiro, a par‑<br />

tir <strong>de</strong> suas origens.<br />

Neste ponto, o Panorama do teatro brasileiro, <strong>de</strong> Sábato<br />

Magaldi, se firmou <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua publicação como um clássico da<br />

historiografia teatral. Clássico um tanto à maneira <strong>de</strong> Casa‑<br />

‑gran<strong>de</strong> & senzala, no sentido <strong>de</strong> trazer à cena fatos até então<br />

<strong>de</strong>sprezados ou mal compreendidos, como as relações entre<br />

realida<strong>de</strong> social e teatro, as motivações artísticas, a valorização<br />

do papel dos atores. Afinal, o teatro brasileiro nasceu como<br />

forma <strong>de</strong> catequese, utilizando atores improvisados.<br />

Sem preconceitos, falso otimismo ou submissão às<br />

opiniões do passado, Sábato Magaldi analisa o teatro bra‑<br />

sileiro época a época, autor a autor, proce<strong>de</strong>ndo a reavalia‑<br />

ções, aprofundando a compreensão <strong>de</strong> autores como José<br />

<strong>de</strong> Alencar e França Júnior, <strong>de</strong>tectando vínculos entre as<br />

peças e a realida<strong>de</strong> social, sem ja<strong>mais</strong> per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista o<br />

primado do estético.<br />

Esta edição está atualizada, tanto quanto o permite a<br />

dinâmica da vida. Ao texto primitivo, <strong>de</strong> 1962, foram acres‑<br />

cidos dois apêndices, tratando da dramaturgia atual e das<br />

tendências observadas nas últimas décadas.<br />

188<br />

s á B a t o M a G a l d i<br />

TEATRO DA OBSESSÃO<br />

NELSON RODRIGUES<br />

1 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0917 ‑6<br />

Nelson Rodrigues passou pelo teatro brasileiro como<br />

uma espécie <strong>de</strong> tsunami. Provocativo, <strong>de</strong>molidor, obcecado,<br />

<strong>de</strong>spertou cóleras terríveis e admirações enlevadas, tal como<br />

se a realida<strong>de</strong>, por alguns momentos, se transformasse numa<br />

cena <strong>de</strong> suas próprias peças. Nesse clima meio surrealista, o<br />

público vaiava com furor ou aplaudia. A censura fazia a sua<br />

função, proibindo sete <strong>de</strong> suas peças. Nunca se havia visto<br />

nada semelhante na história do teatro brasileiro.<br />

Acompanhando com interesse apaixonado a carreira<br />

“do maior autor teatral brasileiro <strong>de</strong> todos os tempos, do dra‑<br />

maturgo que <strong>de</strong>u dimensão universal à nossa literatura dra‑<br />

mática”, Sábato Magaldi teve oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudar toda<br />

a sua obra, peça a peça. São esses trabalhos, elaborados como<br />

prefácio ao Teatro completo <strong>de</strong> Nelson Rodrigues, que se<br />

acham reunidos em Teatro da obsessão: Nelson Rodrigues.<br />

Dividido em três módulos (peças psicológicas, míticas<br />

e tragédias cariocas), o livro po<strong>de</strong> ser lido como um curso<br />

<strong>de</strong> introdução à obra do autor pernambucano e uma espé‑<br />

cie <strong>de</strong> vacina contra “os equívocos que praticamente acom‑<br />

panharam o lançamento <strong>de</strong> todos os espetáculos”, muitos<br />

dos quais ainda vivos e robustos.<br />

Com precisão, em linguagem límpida e raciocínio claro,<br />

Sábato Magaldi analisa as peças, como realida<strong>de</strong> teatral,<br />

sem per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista suas repercussões na socieda<strong>de</strong> brasi‑<br />

leira, ainda bastante preconceituosa. Numa análise técnica,<br />

ressalta a força do diálogo <strong>de</strong> Nelson Rodrigues e o fato <strong>de</strong><br />

suas peças pertencerem “<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início, ao domínio do tea‑<br />

tro e da literatura, feito que não era a norma entre nós”.<br />

Teatro da obsessão é estudo fundamental à compre‑<br />

ensão <strong>de</strong> um autor que teve “a coragem <strong>de</strong> <strong>de</strong>smascarar o<br />

homem, <strong>de</strong>spido <strong>de</strong> véus embelezadores”, sendo capaz <strong>de</strong><br />

ir “ao fundo da miséria existencial, num mundo aparente‑<br />

mente regido pelo absurdo”.<br />

s á B a t o M a G a l d i


TEATRO DA RUPTURA<br />

OSWALD DE ANDRADE<br />

1 a edição – 184 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0918 ‑4<br />

Para a crítica brasileira, Vestido <strong>de</strong> noiva, <strong>de</strong> Nelson<br />

Rodrigues, é o primeiro marco da literatura dramática mo‑<br />

<strong>de</strong>rna no Brasil. Ninguém duvida da justeza <strong>de</strong>sse juízo,<br />

quando se pensa que, ao valor da peça, se somou a bri‑<br />

lhante montagem <strong>de</strong> Ziembinski para Os comediantes, es‑<br />

treada em <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1943. Como espetáculo, realização<br />

teatral autêntica, a afirmação é <strong>de</strong>finitiva.<br />

“Sob o prisma da dramaturgia, porém, cabe reivindi‑<br />

car a precedência da obra <strong>de</strong> Oswald <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>: O rei da<br />

vela (escrita em 1933 e publicada em 1937), O homem e o<br />

cavalo (1934) e A morta (1937). Muitas das inovações dos<br />

textos <strong>de</strong> Nelson Rodrigues já se encontram nos <strong>de</strong> Oswald<br />

<strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>”. Este é o ponto <strong>de</strong> partida <strong>de</strong> Teatro da rup‑<br />

tura: Oswald <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, <strong>de</strong> Sábato Magaldi.<br />

Rompendo com a <strong>de</strong>sconfiança (e, por vezes, <strong>de</strong>clarada<br />

má vonta<strong>de</strong>) da crítica em relação à obra teatral <strong>de</strong> Oswald,<br />

Sábato Magaldi, após uma releitura atenta <strong>de</strong> suas peças,<br />

concluiu pela “importância excepcional <strong>de</strong>ssa dramaturgia”.<br />

Expondo seus pontos <strong>de</strong> vista com clareza e profundo<br />

conhecimento do teatro (em sua dupla vida como obra li‑<br />

terária e realização teatral), analisa todas as peças do autor<br />

paulista (inclusive inéditos), assinalando a evolução liberta‑<br />

dora <strong>de</strong> Oswald a partir das primeiras experiências, redigi‑<br />

das em francês. O criador autêntico e inovador se firma na<br />

“análise furiosa” da realida<strong>de</strong> brasileira e das classes domi‑<br />

nantes, expressa em O rei da vela; na con<strong>de</strong>nação implacá‑<br />

vel da civilização burguesa oci<strong>de</strong>ntal, formulada em O<br />

homem e o cavalo, até a busca <strong>de</strong> um novo (e talvez equi‑<br />

vocado) caminho, na tentativa lírica <strong>de</strong> A morta.<br />

Voltando à sua proposição inicial, Magaldi analisa se‑<br />

melhanças fundamentais entre a obra teatral <strong>de</strong> Oswald e<br />

a <strong>de</strong> Nelson, concluindo que, se não houve influência do<br />

paulista sobre o pernambucano, pelo menos é inegável a<br />

sua precedência.<br />

s á B a t o M a G a l d i<br />

189


o u t r o s a u t o r e s<br />

190


A VIDA É UM SHOW<br />

Guga <strong>de</strong> Oliveira<br />

1 a edição – 208 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1512 ‑8<br />

Que a vida é um show, ninguém duvida. O difícil é ter<br />

olhos <strong>de</strong> ver e capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> captar os pequenos casos do<br />

cotidiano, aparentemente sem importância, mas que na<br />

pena (perdão, nas teclas do computador) <strong>de</strong> um bom nar‑<br />

rador se transformam em espetáculo, em números <strong>de</strong> um<br />

show permanente e interminável chamado vida. Pois Guga<br />

<strong>de</strong> Oliveira tem esse dom.<br />

Homem do cinema e da televisão, publicitário bem‑<br />

‑sucedido, tendo produzido e dirigido <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> docu‑<br />

mentários e alguns longa ‑metragens, <strong>de</strong>tentor <strong>de</strong> vários<br />

prêmios internacionais, criador do programa Fantástico,<br />

Guga <strong>de</strong> Oliveira é também um escritor <strong>de</strong> humor fino,<br />

irônico e irreverente, mas com uma sensibilida<strong>de</strong> sempre<br />

alerta, por trás do ar <strong>de</strong> malandro durão.<br />

Ao contrário <strong>de</strong> certos escritores, que procuram ocul‑<br />

tar a sua personalida<strong>de</strong> no momento <strong>de</strong> escrever, Guga<br />

está inteiro e sem disfarces em A vida é um show. O livro,<br />

narrado em linguagem coloquial, tem a sua cara e o seu<br />

espírito: informal, <strong>de</strong>spretencioso, rebel<strong>de</strong>.<br />

O show oferecido por Guga ao leitor reúne <strong>mais</strong> <strong>de</strong><br />

quarenta “causos”, fisgados ao longo <strong>de</strong> uma vida rica e<br />

movimentada – situados em diversos países –, vários <strong>de</strong>les<br />

tendo por mote personalida<strong>de</strong>s conhecidas, como Sophia<br />

Loren, Regina Duarte e a legendária Eny, dona do maior<br />

bor<strong>de</strong>l brasileiro da década <strong>de</strong> 1950. E também o próprio<br />

autor, que com um ar <strong>de</strong> sobrevivente feliz e <strong>de</strong>bochado<br />

(“não posso me dar ao luxo <strong>de</strong> morrer”), nos conta como<br />

escapou <strong>de</strong> um enfarte e <strong>de</strong> várias paradas cardíacas.<br />

Como o show da vida, A vida é um show faz rir, co‑<br />

move, surpreen<strong>de</strong>, como observa Valéria Balbi: “Seguindo<br />

a narração do Guga, alguns contos têm a classe <strong>de</strong> um<br />

Fitzgerald tupiniquim. Em outros, ele surge como um rotei‑<br />

rista <strong>de</strong> cinema do neorrealismo italiano. De repente um<br />

estilo cirúrgico e analítico, e <strong>mais</strong> outro, singelo, caipira...”.<br />

Um show variado.<br />

G u G a d e o l i v e i r a<br />

ANTOLOGIA DE<br />

CONTOS DA UBE<br />

Fábio Lucas, Jeanette Rozsas e<br />

Levi Bucalem Ferrari (orgs.)<br />

1 a edição – 136 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑13<strong>39</strong> ‑1<br />

Antologias, sobretudo <strong>de</strong> muitos autores, são sempre<br />

fonte <strong>de</strong> surpresas. Ótimo, quando essas surpresas são<br />

agradáveis, estimulantes e gratificantes, como ocorre com<br />

essa antologia da União Brasileira <strong>de</strong> Escritores. I<strong>de</strong>alizada<br />

em conversas dos membros da associação, a i<strong>de</strong>ia logo se<br />

<strong>de</strong>senvolveu como uma corrente, com alguns dos autores<br />

selecionados indicando outros, formando, assim, elo a elo,<br />

uma ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> vinte contos.<br />

O tema era livre, com os organizadores – Fábio Lucas,<br />

Jeanette Rozsas e Levi Bucalem Ferrari – conce<strong>de</strong>ndo aos<br />

autores inteira liberda<strong>de</strong> para escrever o que bem <strong>de</strong>sejas‑<br />

sem. Daí a diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> assuntos, estilos e abordagens,<br />

conduzidos por autores famosos, alguns com obras tradu‑<br />

zidas em diversos idiomas, como Lygia Fagun<strong>de</strong>s Telles,<br />

jornalistas conhecidos, advogados, professores, psicólogos,<br />

críticos, editores multimídia, nascidos e vivendo nos <strong>mais</strong><br />

diversos pontos do território brasileiro, irmanados por essa<br />

aventura no reino mágico da história curta.<br />

É a própria diversida<strong>de</strong> na unida<strong>de</strong>, oferecendo um<br />

retrato das tendências atuais do conto brasileiro, mas tam‑<br />

bém uma amostragem das preocupações do brasileiro com<br />

a realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seu país e os <strong>de</strong>stinos da humanida<strong>de</strong>.<br />

Her<strong>de</strong>ira da Socieda<strong>de</strong> dos Escritores Brasileiros, fun‑<br />

dada na década <strong>de</strong> 1940 por um grupo <strong>de</strong> intelectuais reu‑<br />

nidos em torno <strong>de</strong> Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> e Sérgio Milliet, a<br />

União Brasileira <strong>de</strong> Escritores nasceu em 1958, congre‑<br />

gando alguns dos <strong>mais</strong> importantes intelectuais do país. A<br />

presente antologia foi organizada para comemorar o cin‑<br />

quentenário da instituição, invertendo <strong>de</strong>ssa forma o pro‑<br />

cedimento clássico dos aniversários. Em vez dos amigos e<br />

convidados, aqui quem presenteia é o aniversariante.<br />

F á B i o l u C a s , J e a n e t t e r o z s a s e l e v i B . F e r r a r i ( o r G s . )<br />

191


ANTOLOGIA DO<br />

CORDEL BRASILEIRO<br />

Seleção e apresentação <strong>de</strong><br />

Marco Haurélio<br />

1 a edição – 256 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1599 ‑9<br />

O cor<strong>de</strong>l está vivo e muito vivo. Po<strong>de</strong> até não ter a mís‑<br />

tica dos tempos em que Lampião andava pelo sertão e era<br />

cantado com temor e admiração, mas os novos cor<strong>de</strong>listas<br />

mantêm a mesma graça, encanto e saliência <strong>de</strong> seus anteces‑<br />

sores. A prova, para ser <strong>de</strong>gustada como um bom queijo <strong>de</strong><br />

coalho, está na Antologia do cor<strong>de</strong>l brasileiro, na qual Marco<br />

Haurélio reúne quinze cordéis dos séculos XIX e XX.<br />

Esse amplo panorama inclui <strong>de</strong>s<strong>de</strong> mestres do pas‑<br />

sado, hoje mitificados, como o paraibano Leandro Gomes<br />

<strong>de</strong> Barros, consi<strong>de</strong>rado o maior poeta popular do Brasil e<br />

um dos pioneiros do gênero, o alagoano Manoel D’Almeida<br />

Filho, o baiano Antônio Teodoro dos Santos, até o próprio<br />

Marco Haurélio, ainda na faixa dos trinta <strong>anos</strong> e que man‑<br />

tém viva a tradição do gênero. São histórias cujas origens<br />

remontam à mitologia grega e aos contos <strong>de</strong> fadas, tempe‑<br />

radas pela experiência <strong>de</strong> mundo e a sagacida<strong>de</strong> do serta‑<br />

nejo, nas quais a esperteza do fraco e o seu heroísmo,<br />

unidos a uma malícia muito típica do homem do povo nor‑<br />

<strong>de</strong>stino, conseguem superar todos os obstáculos, até<br />

mesmo os <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m mágica. Magia, eis aí a palavra que<br />

melhor <strong>de</strong>fine esses poemas em que os bichos falam, os<br />

homens <strong>de</strong>scem ao inferno, mendigos conquistam rainhas,<br />

e personagens como Pedro Malazartes e João Grilo <strong>de</strong>‑<br />

monstram como a comicida<strong>de</strong>, o riso, a peraltice po<strong>de</strong>m<br />

superar a força e a malda<strong>de</strong>.<br />

Essas características, que encantaram gerações, se<br />

mantêm vivas em nossos dias, quando o cor<strong>de</strong>l utiliza<br />

meios <strong>de</strong> comunicação como a internet, estimulando a<br />

curiosida<strong>de</strong> do leitor virtual, mas sem revelar o final da his‑<br />

tória, incitando ‑o <strong>de</strong>ssa forma a adquirir o tradicional fo‑<br />

lheto. Ou seja, como observa Marco Haurélio no prefácio:<br />

“o cor<strong>de</strong>l, paradoxalmente, se renova para continuar o<br />

mesmo”. Ainda bem.<br />

192<br />

s e l e ç ã o e a P r e s e n t a ç ã o d e M a r C o h a u r é l i o<br />

CAMINHOS DIVERSOS<br />

SOB OS SIGNOS DO CORDEL<br />

Costa Senna<br />

1 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1260 ‑8<br />

Ainda hoje, em muitos pontos do Brasil, o cor<strong>de</strong>l é a<br />

única literatura lida pelo povo. Lida e amada. No Nor<strong>de</strong>ste,<br />

ela continua tão presente na vida cotidiana como o feijão<br />

<strong>de</strong> corda ou a manteiga <strong>de</strong> garrafa. Qual o nor<strong>de</strong>stino que<br />

não levantou voo com o “Pavão misterioso”, não se im‑<br />

pressionou com a saga <strong>de</strong> Antonio Silvino ou não riu a valer<br />

com a “Chegada <strong>de</strong> Lampião no inferno”?<br />

Com o processo permanente <strong>de</strong> migração do homem<br />

do Nor<strong>de</strong>ste, o gênero se espalhou por todo o país, se bem<br />

que cultivado quase exclusivamente por nor<strong>de</strong>stinos.<br />

Natural do Ceará, cantor e compositor, autor <strong>de</strong> inú‑<br />

meros cordéis, livros e CDs, radicado em São Paulo, Costa<br />

Senna trouxe para o Sul toda a fantasia e a criativida<strong>de</strong> do<br />

cor<strong>de</strong>l nor<strong>de</strong>stino, adaptando ‑o à realida<strong>de</strong> da região, sem<br />

per<strong>de</strong>r o sabor da terra <strong>de</strong> origem, vivendo com um pé na<br />

tradição e outro na mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>.<br />

Dessa forma, sem per<strong>de</strong>r o senso da realida<strong>de</strong> nem o<br />

gosto pelo pitoresco, o poeta <strong>de</strong>screve São Paulo (“Em<br />

frente ao chope da Sé/ tem um monte <strong>de</strong> bicheiro,/ um<br />

grita: “Hoje é macaco”,/ outro diz: “Não, é carneiro”./<br />

Neste louco labacé/ vive a praça da Sé/ <strong>de</strong> janeiro a ja‑<br />

neiro”), protesta contra a <strong>de</strong>gradação do planeta, como<br />

um ambientalista (“Nós po<strong>de</strong>mos evitar/ a extinção da Mãe<br />

Terra,/ parando a poluição, / ensinando ao que erra/ que a<br />

paz é <strong>mais</strong> importante/ do que o aterrorizante/ mercado <strong>de</strong><br />

fazer guerra”) e por fim, <strong>de</strong>siludido com seu semelhante,<br />

apela para os céus (“Meu Jesus, o mundo on<strong>de</strong>/ um dia<br />

Você passou,/ hoje está muito pior, / nada nele melhorou./<br />

O homem vem feito traça,/ multiplicando a <strong>de</strong>sgraça/ que<br />

ele mesmo plantou”), mas termina <strong>de</strong>sesperançado: “Se a<br />

mente não me engana,/ a nossa colmeia humana/ em<br />

breve vai <strong>de</strong>rreter”.<br />

Essa antologia <strong>de</strong> poemas <strong>de</strong> Costa Senna traz ilustrações<br />

<strong>de</strong> Jô Oliveira, inspiradas nas xilogravuras nor<strong>de</strong>stinas.<br />

C o s t a s e n n a


CHEZ MME. MAIGRET<br />

Renata Pallottini<br />

1 a edição – 148 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1556 ‑2<br />

Georges Simenon foi o escritor <strong>mais</strong> prolífico e um dos<br />

<strong>mais</strong> populares do século XX. Deixou <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 400 volumes,<br />

dos quais cerca <strong>de</strong> 100 contam as façanhas do <strong>de</strong>legado<br />

Jules Maigret, da Polícia Judiciária francesa, que inspirou<br />

<strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> filmes, tornando ‑o um dos personagens <strong>mais</strong><br />

famosos da mitologia do século.<br />

Homem pon<strong>de</strong>rado, cheio <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>s humanas,<br />

respeitando os criminosos como seres hum<strong>anos</strong>, Maigret<br />

resolvia os seus casos menos pela investigação criminal do<br />

que pelo conhecimento da alma do criminoso. Mas tinha<br />

também o seu lado burguês, levando uma vida familiar<br />

tranquila, num apartamento parisiense mo<strong>de</strong>sto, ao lado<br />

da esposa, Louise, <strong>de</strong> presença apagada nos livros. O escri‑<br />

tor só a põe em cena para se referir aos pratos caprichosos<br />

que ela preparava para o marido e o chá acolhedor com<br />

que o aguardava, à noite.<br />

Inconformada com essa omissão, a poeta e roman‑<br />

cista Renata Pallottini resolveu tirar Mme. Maigret da som‑<br />

bra do marido famoso, dotando ‑a <strong>de</strong> insuspeitadas<br />

qualida<strong>de</strong>s. Ela começa a busca <strong>de</strong> novas alternativas <strong>de</strong><br />

vida ao dar um balanço na mediocrida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua vida. Por<br />

que não mudar?<br />

A mudança se dá e da maneira <strong>mais</strong> insólita: Louise se<br />

torna concorrente do inspetor famoso, passando a investi‑<br />

gar um crime no qual o marido vinha trabalhando.<br />

O resultado é um imbróglio <strong>de</strong>licioso, narrado em pri‑<br />

meira pessoa pela própria Mme. Maigret. Como nos livros<br />

<strong>de</strong> Simenon, a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Paris, com seu insuperável<br />

charme, também é uma personagem importante no <strong>de</strong>sen‑<br />

rolar da história, misto <strong>de</strong> romance policial e <strong>de</strong> costumes,<br />

mas sobretudo uma reivindicação bem ‑humorada <strong>de</strong> que<br />

as mulheres são tão capazes quanto os homens. Mesmo<br />

quando se trata do insuperável <strong>de</strong>tetive Maigret.<br />

r e n a t a P a l l o t t i n i<br />

CONTOS DE VISTA<br />

Elisa Lucinda<br />

1 a edição – 132 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0944 ‑3<br />

Apontada como uma das gratas revelações da litera‑<br />

tura brasileira atual, Elisa Lucinda, em Contos <strong>de</strong> vista, brinca<br />

com as palavras, saco<strong>de</strong> o leitor, ironiza situações, mas faz<br />

sobretudo uma apaixonada <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> amor à vida.<br />

Uma <strong>de</strong>claração que parece se esten<strong>de</strong>r além das pa‑<br />

lavras e pulsar num gran<strong>de</strong> palco – talvez, o palco da vida –,<br />

<strong>de</strong>nunciando assim a múltipla sensibilida<strong>de</strong> e varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

seus caminhos: atriz <strong>de</strong> teatro, cinema e televisão, autora<br />

teatral <strong>de</strong> sucesso (sua peça O semelhante ficou seis <strong>anos</strong><br />

em cartaz, no Brasil e no exterior), poeta que encontrou um<br />

jeito novo <strong>de</strong> popularizar a poesia, num tom coloquial,<br />

meio mágico, meio apaixonado.<br />

Escritas em épocas diversas, as <strong>de</strong>zesseis histórias <strong>de</strong><br />

Contos <strong>de</strong> vista têm a unida<strong>de</strong> espiritual <strong>de</strong> quem olha a<br />

vida com profundo interesse, atenta a dramas e comédias,<br />

mas sempre com um humor sadio, sem amarguras. Várias<br />

<strong>de</strong>las reproduzem, com plena evidência, situações vividas<br />

pela autora, mas o elemento autobiográfico não tem maior<br />

significado. Para Elisa Lucinda, experiência e imaginação se<br />

equivalem, não fosse ela, acima <strong>de</strong> tudo, poeta. Não <strong>de</strong>ixa<br />

<strong>de</strong> ser curioso que vários contos do livro têm como perso‑<br />

nagens principais motoristas <strong>de</strong> táxi, envolvidos em situa‑<br />

ções ora grotescas, ora surpreen<strong>de</strong>ntes, como no divertido<br />

e inesperado “Pelo cheiro”, ou em confissões repletas <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>speito, como em “Mulher é o diabo”.<br />

Mas o táxi da vida corre em todas as direções e a au‑<br />

tora tem sempre um olho atento para todos os lados e si‑<br />

tuações, o comum e o insólito. Como no conto “Denise”,<br />

em que o amor <strong>mais</strong> puro <strong>de</strong> duas meninas gira em torno<br />

<strong>de</strong> uma lata <strong>de</strong> goiabada, ou a experiência in<strong>de</strong>finível da<br />

menina ao ver a avó matar um peru para a ceia <strong>de</strong> natal<br />

(“Lembrando parece cinema”). Os Contos <strong>de</strong> vista estão,<br />

sobretudo, repletos <strong>de</strong> vida.<br />

e l i s a l u C i n d a<br />

193


CORDÉIS QUE<br />

EDUCAM E<br />

TRANSFORMAM<br />

Costa Senna<br />

1 a edição – 136 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1679 ‑8<br />

A partir da década <strong>de</strong> 1980, alguns cor<strong>de</strong>listas passa‑<br />

ram a colocar o seu talento a serviço da educação. Abrindo<br />

novos caminhos para o gênero, sem se <strong>de</strong>sligarem das tra‑<br />

dições seculares, tornaram ‑se uma espécie <strong>de</strong> auxiliares dos<br />

professores na difícil missão <strong>de</strong> formar o caráter dos jovens.<br />

Essa corrente tem um representante singular na figura do<br />

cearense Costa Senna, autor do instigante Cordéis que<br />

educam e transformam.<br />

Escrito com a clara intenção <strong>de</strong> “fazer do mundo um<br />

lugar melhor para se viver”, como observa Cláudio Portella<br />

no prefácio, o livro reúne poemas <strong>de</strong> intenção didática, es‑<br />

critos com a leveza e a força <strong>de</strong> comunicação peculiar ao<br />

gênero, falando da mulher, do prazer da leitura, <strong>de</strong> mate‑<br />

mática, mas também abordando temas do cotidiano que<br />

afetam, e por vezes perturbam, a vida do homem contem‑<br />

porâneo, como corrupção, discriminação racial e violência.<br />

Como bom poeta popular, Costa Senna vai direto ao<br />

assunto. Notem como ele introduz o tema da violência, que<br />

“[...] caminha/ Pelo mundo <strong>de</strong> mãos dadas/ Com drogas,<br />

assaltos, roubos,/ Corrupções <strong>de</strong>senfreadas./ Sequestros,<br />

assassinatos/ Entre pessoas e ratos/ Ela vai dando picadas”.<br />

Preocupado com a educação, Senna <strong>de</strong>dica ainda poe‑<br />

mas a “Uma viagem na história”, “Nas asas da leitura”, “A<br />

saga da humanida<strong>de</strong>”, “Os atropelos do português”, “Via‑<br />

gem ao mundo do alfabeto”, “A matemática em cor<strong>de</strong>l”,<br />

uma homenagem a Paulo Freire, que ele classifica <strong>de</strong><br />

“nobre menestrel” cuja “luz está na Terra/ E com as estrelas<br />

do céu”, “Água, a mãe da vida”, “A fonte da juventu<strong>de</strong>”,<br />

sobre saú<strong>de</strong>, esporte e lazer, e o divertido “Criança, que<br />

bicho é esse?”, valendo ‑se da velha adivinha popular: “Tira<br />

o ‘s’, põe o ‘p’,/ O seu nome vira papo./ Sem o ‘sa’ e com<br />

o ‘tra’/ Esse bichinho é um trapo/ Gosta muito <strong>de</strong> lagoa,/ É<br />

tranquilo, numa boa.../ Esse bicho é o?... SAPO”.<br />

194<br />

C o s t a s e n n a<br />

kATMANDU<br />

Anna Maria Martins<br />

2 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1517 ‑3<br />

Desfrutando <strong>de</strong> um prestígio extraordinário na década<br />

<strong>de</strong> 1970 e seguintes, semelhante ao do soneto nos tempos<br />

do parnasianismo, o conto começou a ser olhado com cau‑<br />

tela a partir <strong>de</strong> certa época. A aparente facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reali‑<br />

zação, os exageros, o experimentalismo quase sempre<br />

enganador, criaram um clima <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconfiança e reserva em<br />

relação ao gênero. Insistiu ‑se mesmo em se falar em crise e<br />

agonia. Talvez, mas com uma ressalva. Crise, no sentido <strong>de</strong><br />

processo conduzindo ao amadurecimento e agonia com o<br />

significado <strong>de</strong> “luta”, como no ensaio <strong>de</strong> Miguel <strong>de</strong> Una‑<br />

muno, A agonia do cristianismo.<br />

Pois “este sentido agônico da criação, <strong>de</strong> cuja consci‑<br />

ência o escritor não po<strong>de</strong> ja<strong>mais</strong> apartar ‑se, está na raiz da<br />

escritura <strong>de</strong> Anna Maria Martins, como o <strong>de</strong>monstra a se‑<br />

quencia <strong>de</strong> seus contos reunidos em A trilogia do empare‑<br />

dado e outros contos (1973), Sala <strong>de</strong> espera (1978) e<br />

Katmandu”, observa Nilo Scalzo no prefácio ao livro.<br />

Contista do nosso tempo, irreverente e quase cruel,<br />

Anna Maria Martins, em seus contos, <strong>de</strong>smonta o edifício<br />

da socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo, supostamente arquitetada sob<br />

o signo da comunicação, mas que em realida<strong>de</strong> reduz o<br />

homem à condição <strong>de</strong> simples número, agravando ‑lhe a<br />

solidão e a confusão espiritual. Como observa Nilo Scalzo,<br />

“sem recorrer ao tom apocalíptico, a escritora disseca, por<br />

vezes <strong>de</strong> modo quase asséptico, esse mundo em <strong>de</strong>sagre‑<br />

gação, no plano social e individual, pondo assim em evi‑<br />

dência o drama do homem contemporâneo”.<br />

Katmandu reúne vinte histórias curtas, divididas em<br />

duas partes, nas quais a atmosfera <strong>de</strong>nsa é realçada pela<br />

frase <strong>de</strong>spojada, o domínio dos pl<strong>anos</strong> <strong>de</strong> tempo, a frag‑<br />

mentação <strong>de</strong> blocos habilmente montados, à semelhança<br />

da linguagem cinematográfica, musical e televisiva, <strong>de</strong>s‑<br />

cerrando <strong>de</strong> diferentes ângulos as situações e os persona‑<br />

gens em ação.<br />

a n n a M a r i a M a r t i n s


LER O MUNDO<br />

Affonso Romano <strong>de</strong> Sant'Anna<br />

1 a edição – 248 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1524 ‑1<br />

Ler o mundo é uma tarefa em que os artistas se em‑<br />

penham <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que o homem tomou consciência <strong>de</strong> si. A<br />

primeira expressão <strong>de</strong>sse exercício encontra ‑se nos <strong>de</strong>se‑<br />

nhos e inscrições rupestres do nosso antepassado pré‑<br />

‑histórico. Com o tempo, essa leitura se tornou cada vez<br />

<strong>mais</strong> refinada. Homero leu o mundo e o expressou na Ilíada<br />

e na Odisseia; Dante, na Divina comédia; Balzac, na Comé‑<br />

dia humana; Proust, na série Em busca do tempo perdido.<br />

Em nossos dias <strong>de</strong> correria, falta <strong>de</strong> tempo e domínio<br />

massacrante da tecnologia, on<strong>de</strong> a cada dia surgem novos<br />

códigos, ler o mundo <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ser um mero exercício poé‑<br />

tico <strong>de</strong> admiração para se tornar “uma questão <strong>de</strong> sobre‑<br />

vivência”, como observa Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna no<br />

único texto <strong>de</strong>ste volume que não se enquadra na catego‑<br />

ria <strong>de</strong> crônica. Que a afirmação incisiva, porém, não en‑<br />

gane ninguém. Há, e por certo sempre haverá, lugar para<br />

a poesia, o humor, a observação inteligente, o protesto<br />

sagaz diante do <strong>de</strong>sconcerto do mundo e dos <strong>de</strong>smandos<br />

dos políticos, características das crônicas <strong>de</strong> Affonso, que<br />

tornam a leitura e a interpretação do mundo agradáveis e<br />

fazem <strong>de</strong>las um exercício constante <strong>de</strong> sedução.<br />

Aliás, <strong>de</strong> seduções, variáveis como os temas aborda‑<br />

dos em Ler o mundo: as relações entre os ricos e a cultura,<br />

os modismos <strong>de</strong> linguagem, a arte da “contação” <strong>de</strong> his‑<br />

tórias, a recenseadora do IBGE, como os surdos se relacio‑<br />

nam com a música, a moda <strong>de</strong> feiras e bienais, a segunda<br />

vida <strong>de</strong> cada um <strong>de</strong> nós, os livros <strong>de</strong> que todos falam e<br />

poucos leram, o <strong>de</strong>stino <strong>de</strong> livros e bibliotecas na virada do<br />

século XX para o XXI, até o anexo documentado sobre a<br />

<strong>de</strong>missão do cronista da presidência da Biblioteca Nacional.<br />

O que sugere que, muitas vezes, ler o mundo é um exercí‑<br />

cio <strong>de</strong> amargura e frustração.<br />

a F F o n s o r o M a n o d e s a n t ' a n n a<br />

MEUS ROMANCES<br />

DE CORDEL<br />

Marco Haurélio<br />

1 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1554 ‑8<br />

Quem pensa que a literatura <strong>de</strong> cor<strong>de</strong>l morreu, não<br />

sabe <strong>de</strong> nada. Adaptada ao violento processo <strong>de</strong> urbaniza‑<br />

ção sofrido pelo país, nos últimos cinquenta <strong>anos</strong>, ela con‑<br />

tinua muito viva no meio rural e cada vez <strong>mais</strong> presente no<br />

ambiente urbano. O consumo popular <strong>de</strong> folhetos do gê‑<br />

nero continua forte. Os cor<strong>de</strong>listas atuais, discípulos e su‑<br />

cessores <strong>de</strong> Leandro Gomes <strong>de</strong> Barros, do cego A<strong>de</strong>raldo,<br />

<strong>de</strong> Zé Pretinho, seguem com muita <strong>de</strong>voção e talento a<br />

lição <strong>de</strong>sses mestres inesquecíveis, até hoje lembrados pelo<br />

povo e reconhecidos pelos intelectuais. É nessa tradição<br />

muitas vezes secular que se insere o cor<strong>de</strong>lista Marco Hau‑<br />

rélio, autor <strong>de</strong> vários folhetos <strong>de</strong> sucesso. Sete <strong>de</strong>ssas obras<br />

estão reunidas em Meus romances <strong>de</strong> cor<strong>de</strong>l (“O herói da<br />

Montanha Negra”, “Presepadas <strong>de</strong> Chicó e astúcias <strong>de</strong><br />

João Grilo”, “História <strong>de</strong> Belisfronte, o filho do pescador”,<br />

“A briga do major Ramiro com o Diabo”, “História da<br />

Moura Torta”, “Os três conselhos sagrados”, “Galopando<br />

o cavalo Pensamento”). Se o poeta já não tem a mesma<br />

ingenuida<strong>de</strong> dos velhos cantadores, sabe ainda como en‑<br />

treter o leitor, reter a sua atenção e extrair uma graça nova<br />

<strong>de</strong> temas e personagens multisseculares, consagrados pela<br />

tradição. O fato do homem do século XXI ainda se encantar<br />

com histórias <strong>de</strong> princesas, <strong>de</strong> ani<strong>mais</strong> fantásticos que au‑<br />

xiliam os heróis, <strong>de</strong> lutas com o diabo, prova que nem<br />

mesmo a frieza da tecnologia e a voracida<strong>de</strong> da socieda<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> consumo conseguem matar a imaginação humana e o<br />

seu gosto pelo fantástico. O cor<strong>de</strong>l, veículo <strong>de</strong> evasão e<br />

catarse, parece eterno, como toda arte autêntica.<br />

M a r C o h a u r é l i o<br />

195


O CARDEAL E O<br />

REPÓRTER<br />

HISTÓRIAS QUE FAZEM HISTÓRIA<br />

Ricardo Carvalho<br />

1 a edição – 184 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1221 ‑9<br />

Ultrapassado o momento <strong>de</strong> sua publicação, quando<br />

atua como veículo <strong>de</strong> informação ou <strong>de</strong>núncia, a reporta‑<br />

gem jornalística, a boa reportagem, po<strong>de</strong> se transformar<br />

num excelente subsídio para a história. Mais interessante<br />

ainda po<strong>de</strong> ser a reportagem da reportagem, quando o<br />

autor se dispõe a contar os auxílios recebidos e as tramas e<br />

dificulda<strong>de</strong>s que teve <strong>de</strong> superar para concluir seu trabalho<br />

e que não figuram no texto entregue ao leitor.<br />

É o que faz Ricardo Carvalho em O car<strong>de</strong>al e o repór‑<br />

ter, que traz o subtítulo <strong>de</strong> “histórias que fazem História”.<br />

O livro reúne doze capítulos contando a gênese e as peri‑<br />

pécias <strong>de</strong> outras tantas reportagens publicadas na década<br />

<strong>de</strong> 1970 e <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> repercussão à época, quando a falta<br />

<strong>de</strong> respeito aos direitos hum<strong>anos</strong> tornava a prática jornalís‑<br />

tica um risco permanente.<br />

O jornalista contava então com a colaboração <strong>de</strong> um<br />

misterioso informante, bem situado na estrutura social, que<br />

hoje sabemos ser o car<strong>de</strong>al <strong>de</strong> São Paulo dom Paulo Eva‑<br />

risto Arns.<br />

Passados <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta <strong>anos</strong>, com emoção que não<br />

exclui o humor, o repórter <strong>de</strong>scerra os bastidores <strong>de</strong> episó‑<br />

dios como a campanha <strong>de</strong> libertação do preso político Apa‑<br />

recido Galdino, encerrado no Manicômio Judiciário, sem<br />

julgamento; o encontro do corpo do primeiro <strong>de</strong>saparecido<br />

político brasileiro; a publicação da primeira lista <strong>de</strong> <strong>de</strong>sapa‑<br />

recidos políticos brasileiros; a i<strong>de</strong>ntificação dos filhos <strong>de</strong><br />

presos políticos, sequestrados pelas forças <strong>de</strong> repressão no<br />

Cone Sul; a história da reunião dos bispos latino ‑americ<strong>anos</strong><br />

em Puebla, no México, que teve a presença do papa João<br />

Paulo II, e outros que “po<strong>de</strong>m ter ajudado na construção<br />

<strong>de</strong> uma opinião pública <strong>mais</strong> consciente e <strong>mais</strong> fortalecida”<br />

segundo suas palavras.<br />

Como observa A. P. Quartim <strong>de</strong> Moraes, “escrita com<br />

paixão, esta obra é uma aula <strong>de</strong> História e <strong>de</strong> Jornalismo”.<br />

196<br />

r i C a r d o C a r v a l h o<br />

O CÓDIGO DAS ÁGUAS<br />

Lindolf Bell<br />

5 a edição – 128 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0473 ‑5<br />

O poeta catarinense Lindolf Bell foi uma espécie <strong>de</strong><br />

guerrilheiro da poesia. Durante toda a sua vida se empenhou<br />

em divulgá ‑la, on<strong>de</strong> houvesse um ouvido humano capaz <strong>de</strong><br />

captar a mensagem <strong>de</strong> sua metralhadora poética.<br />

Com essa finalida<strong>de</strong> criou, em 1964, o movimento<br />

Catequese Poética, pioneiro na divulgação da poesia em<br />

espaços abertos, em ruas, portas <strong>de</strong> fábricas, viadutos, pra‑<br />

ças, escolas, bares, teatros, universida<strong>de</strong>s, estádios.<br />

Querendo <strong>mais</strong>, sempre <strong>mais</strong>, como bom guerrilheiro,<br />

criou as Praças <strong>de</strong> Poesia, os Painéis ‑Poema, os Corpoemas<br />

(camisetas com poema), cartões ‑postais, papéis ‑carta‑<br />

‑poema e o primeiro programa <strong>de</strong> televisão <strong>de</strong>dicado à<br />

poesia. No exercício mágico <strong>de</strong> sua arte, <strong>de</strong>ixou treze livros<br />

<strong>de</strong> poemas, uma obra <strong>de</strong>nsa, que inclui <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a <strong>de</strong>núncia<br />

do <strong>de</strong>saparecimento gradual dos sentimentos <strong>de</strong> fraterni‑<br />

da<strong>de</strong> a busca ao tempo perdido, que lhe permitisse aquele<br />

encontro profundo consigo mesmo, <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> todo ser<br />

humano que se espiritualiza, até a plena interiorização, a<br />

marca talvez <strong>mais</strong> forte <strong>de</strong> O código das águas.<br />

Esse código misterioso se manifesta <strong>de</strong> muitas formas,<br />

como naquele rio chamado amor, “<strong>de</strong>spojado <strong>de</strong> intransi‑<br />

gências,/ preconceitos,/ perplexo no eterno <strong>de</strong>sejo”, que flui<br />

<strong>de</strong>ntro do poeta “com sabor <strong>de</strong> paciência/ e extraordinário<br />

sabor <strong>de</strong> nada”. Está por trás também <strong>de</strong> sua inquietação:<br />

“Que faço neste tempo/ entre terra e céu <strong>de</strong> ironia?”.<br />

Ao contrário <strong>de</strong> Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> que confessava ser<br />

duzentos, Bell crê, por um momento, na unida<strong>de</strong> interna:<br />

“Me somo./ E fico um./ Me multiplico./ E permaneço um./<br />

Me divido./ E continuo um./ Me diminuo./ E resto um./ Me<br />

escrevo./ E sou nenhum”. Logo <strong>de</strong>scobre “mil i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s<br />

secretas” e, se não consegue se encontrar, pelo menos já<br />

<strong>de</strong>scobriu o essencial para seguir adiante: “Menor do que<br />

meu sonho não posso ser.”.<br />

l i n d o l F B e l l


O CONTO DA MULHER<br />

BRASILEIRA<br />

Edla van Steen (org.)<br />

3 a edição – 192 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1257 ‑8<br />

As mulheres estão impossíveis. Ocupando posições cada<br />

vez <strong>mais</strong> vitais no mundo mo<strong>de</strong>rno, elas começam, também,<br />

a superar o homem, quantitativamente, no terreno das artes,<br />

em especial a literatura. Se bem que em arte, como reconhece<br />

Edla van Steen no prefácio a O conto da mulher brasileira,<br />

artistas “não têm sexo: são artistas”, o fato representa, no<br />

mínimo, um fenômeno sociológico digno <strong>de</strong> nota.<br />

Reunindo <strong>de</strong>zenove contos <strong>de</strong> autoras contemporâneas,<br />

além <strong>de</strong> sua qualida<strong>de</strong> literária, essa antologia é também um<br />

indicador preciso das angústias, preocupações e perplexida<strong>de</strong>s<br />

da mulher brasileira. Os temas são esclarecedores. Assim, a<br />

maioria <strong>de</strong>sses trabalhos trata da frustração existencial, quase<br />

sempre <strong>de</strong>corrente da frustração amorosa, evi<strong>de</strong>nciando que,<br />

nesse aspecto, a mulher atual, como as mulheres do passado,<br />

continua pondo antes e acima <strong>de</strong> tudo a realização no terreno<br />

amoroso, o “Amor entre dois sexos que se complementam, e<br />

reencontram a Unida<strong>de</strong> primordial”, na observação <strong>de</strong> Nelly<br />

Novaes Coelho, no posfácio à obra.<br />

O que mudou foi a presença da mulher na socieda<strong>de</strong><br />

e sua visão <strong>de</strong> mundo. O amor continua essencial, mas o<br />

relacionamento com o homem mudou radicalmente.<br />

Ontem, submissa e <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, mulher ‑objeto, como<br />

então se dizia; hoje, ela exige a realização integral <strong>de</strong> seu<br />

afeto, no mesmo nível do parceiro. O que constitui <strong>mais</strong><br />

um motivo <strong>de</strong> frustração e revolta, sem invalidar a busca<br />

permanente da felicida<strong>de</strong> individual.<br />

Mas esses contos expressam buscas ainda <strong>mais</strong> inquie‑<br />

tantes, como a do significado da vida. O que somos? Por que<br />

e para que vivemos? Indagações expressas num texto pertur‑<br />

bador <strong>de</strong> Hilda Hilst. Pensar no mistério do <strong>de</strong>stino humano<br />

é cair no terreno do absurdo e do oculto, temas tratados,<br />

com maestria, nos contos <strong>de</strong> Lygia Fagun<strong>de</strong>s Teltes e Judith<br />

Grossmann, exemplos da complexida<strong>de</strong> <strong>de</strong> assuntos e da<br />

riqueza <strong>de</strong> temas abordados nesta antologia.<br />

e d l a v a n s t e e n ( o r G . )<br />

O IMAGINÁRIO<br />

COTIDIANO<br />

Moacyr Scliar<br />

3 a edição – 184 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0729 ‑7<br />

Nem sempre a vida imita a arte. Com muito <strong>mais</strong> fre‑<br />

quência, a vida inspira a arte, por razões óbvias. A riqueza<br />

do cotidiano é infinita. Saber explorar esse material inesgotá‑<br />

vel é prova <strong>de</strong> sagacida<strong>de</strong>, mas exige também do escritor uma<br />

certa adaptação, como ocorreu com Moacyr Scliar na elabo‑<br />

ração dos trabalhos reunidos em O imaginário cotidiano.<br />

Acostumado a extrair o material <strong>de</strong> suas obras da pró‑<br />

pria mente, o escritor gaúcho sentiu ‑se um tanto embara‑<br />

çado quando recebeu convite da Folha <strong>de</strong> S. Paulo para<br />

escrever ficção baseada em notícias publicadas no jornal.<br />

Ou seja, a arte não apenas imitando a vida, mas se estrutu‑<br />

rando a partir da própria realida<strong>de</strong> cotidiana imediata.<br />

No início, Scliar ficou em dúvida, mas logo se conscien‑<br />

tizou das múltiplas possibilida<strong>de</strong>s da proposta. Fascinou ‑o a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> explorar uma espécie <strong>de</strong> história virtual<br />

“que complementa ou amplia a história real (se é que sabe‑<br />

mos exatamente o que é uma história real)”. Assim, passou<br />

a pinçar aqui e ali trechos do noticiário, aparentemente inca‑<br />

pazes <strong>de</strong> servir <strong>de</strong> material inspirador <strong>de</strong> ficção: o mercado<br />

da Bolsa <strong>de</strong>ixando um operador neurótico, quatro pessoas<br />

feridas por balas perdidas, macacos famintos que inva<strong>de</strong>m<br />

as cida<strong>de</strong>s, homem preso por forjar o próprio sequestro, um<br />

pretenso mo<strong>de</strong>lo matemático capaz <strong>de</strong> prever gols no fute‑<br />

bol, o jogador que queria direitos autorais sobre os seus gols.<br />

São indicações sumárias, que o escritor explora com<br />

sarcasmo, comoção ou a <strong>mais</strong> pura gozação, mas sempre<br />

com aquele dom <strong>de</strong> se comunicar com o leitor e envolvê ‑lo<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a primeira frase.<br />

OBRAS DE LITERATURA JUVENIL E INFANTIL<br />

DO AUTOR<br />

• Gota d’água<br />

• Um sonho no caroço do abacate<br />

M o a C y r s C l i a r<br />

197


ÓPERA NEGRA<br />

Martinho da Vila<br />

1 a edição – 96 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0699 ‑1<br />

Em Ópera negra, Martinho da Vila exalta as qualida<strong>de</strong>s<br />

da raça negra – qualida<strong>de</strong>s humanas, musicais, poéticas –,<br />

reivindica igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s na socieda<strong>de</strong> e<br />

aponta a discriminação racial e social, sobretudo a dirigida às<br />

classes pobres, vítimas <strong>de</strong> uma dupla opressão: policial e dos<br />

bandidos. É uma obra <strong>de</strong> <strong>de</strong>núncia e combate, mas não <strong>de</strong><br />

ódio racial. Combate suave, <strong>de</strong> quem <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, vencedor,<br />

possa dizer, como São Paulo: “Combati o bom combate.”.<br />

Ópera negra simula a representação <strong>de</strong> uma ópera no<br />

Teatro Municipal do Rio <strong>de</strong> Janeiro, em dia <strong>de</strong> casa cheia.<br />

Divi<strong>de</strong> ‑se em três atos e um epílogo. O primeiro é uma lou‑<br />

vação à raça, com a apresentação <strong>de</strong> negros que marcaram<br />

a história brasileira: Cruz e Sousa, Lima Barreto, Luís Gama,<br />

João Clapp, André Rebouças, Zumbi dos Palmares e tantos<br />

outros. Os dois atos seguintes contam a história <strong>de</strong> um<br />

jovem que se torna bandido e não consegue <strong>mais</strong> se libertar.<br />

Mesmo regenerado, a socieda<strong>de</strong> não o aceita. Uma história<br />

<strong>de</strong> todo dia nas favelas cariocas e <strong>de</strong> outras cida<strong>de</strong>s.<br />

Nascido em uma pequena cida<strong>de</strong> do interior do Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro, Duas Barras, Martinho conhece o problema <strong>de</strong> perto.<br />

Ainda criança, a família migrou para a cida<strong>de</strong> do Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro, fixando ‑se na Serra dos Pretos Forros. Após exercer<br />

algumas profissões, <strong>de</strong>spontou em um festival <strong>de</strong> música,<br />

em 1967. A partir daí, como cantor e compositor, acumu‑<br />

lou sucessos, tornando ‑se um dos campeões <strong>de</strong> venda <strong>de</strong><br />

discos no país. Com vários álbuns editados no exterior, é<br />

artista admirado em Portugal e nos países afric<strong>anos</strong>. Já na<br />

maturida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>dicou ‑se à literatura, criando a sua própria<br />

editora. Ópera negra é seu quarto livro.<br />

OBRA DE LITERATURA JUVENIL DO AUTOR<br />

• Vamos brincar <strong>de</strong> política?<br />

198<br />

M a r t i n h o d a v i l a<br />

POEMAS DE AMOR<br />

Augusto Fre<strong>de</strong>rico Schmidt<br />

2 a edição – 112 páginas<br />

ISBN 85 ‑260 ‑0210 ‑4<br />

Poeta <strong>de</strong> inspiração bíblica, Augusto Fre<strong>de</strong>rico Schmidt<br />

foi um lírico amoroso <strong>de</strong> tonalida<strong>de</strong> única na literatura bra‑<br />

sileira. Qual a mulher que não se sentiria gloriosa, homena‑<br />

geada com versos como esses: “Quando repousarás em mim<br />

como a poesia nos gran<strong>de</strong>s poetas/ Como a pureza na alma<br />

dos santos/ Como os pássaros nas torres das igrejas?/<br />

Quando repousará o teu amor no meu amor?”.<br />

Pertencendo, cronologicamente, à segunda fase do<br />

Mo<strong>de</strong>rnismo, Schmidt sempre se caracterizou pela in<strong>de</strong>‑<br />

pendência em relação a modas literárias. Na contramão das<br />

frases curtas, concisas, econômicas dos mo<strong>de</strong>rnistas, expres‑<br />

‑sava ‑se num estilo <strong>de</strong>rramado, fluvial, cheio <strong>de</strong> repetições.<br />

Essa singularida<strong>de</strong> se afirma <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o primeiro livro, Canto<br />

do brasileiro Augusto Fre<strong>de</strong>rico Schmidt, no qual rebela ‑se<br />

contra o lirismo dominante: “Não quero <strong>mais</strong> o Brasil/ Não<br />

quero <strong>mais</strong> geografia/ Nem pitoresco.”.<br />

O poeta queria <strong>de</strong>scobrir sua geografia interna, os cami‑<br />

nhos a serem seguidos por seu espírito, sem imposições <strong>de</strong><br />

modas. A insatisfação com a realida<strong>de</strong> cotidiana acaba por<br />

levá ‑lo a um permanente processo <strong>de</strong> fuga, do mundo e <strong>de</strong> si<br />

mesmo. Só havia uma saída: “Cantar – claro cantar – para não<br />

ficar louco.”. Mas parece que, quanto <strong>mais</strong> se buscava, <strong>mais</strong><br />

se estranhava e <strong>mais</strong> se afastava <strong>de</strong> si mesmo, romântico e<br />

insatisfeito, com forte tendência à melancolia e ao isolamento,<br />

preocupado com a morte, solitário e angustiado.<br />

Esse quadro sombrio foi, <strong>de</strong> certa maneira, resgatado<br />

por seu forte sentimento religioso, ou antes, uma vaga reli‑<br />

giosida<strong>de</strong>, talvez <strong>mais</strong> uma busca do que uma crençaque, <strong>de</strong><br />

certa forma, contaminou também sua poesia, “<strong>de</strong> senti‑<br />

mento romântico fundamente brasileiro, a que se junta certa<br />

nostalgia oriental” (Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>) e na<br />

qual a relação entre homem e mulher está tingida por uma<br />

vaga e incerta religiosida<strong>de</strong>.<br />

a u G u s t o F r e d e r i C o s C h M i d t


POETAS DA AMÉRICA<br />

DE CANTO<br />

CASTELHANO<br />

Seleção, tradução e notas <strong>de</strong><br />

Thiago <strong>de</strong> Mello<br />

1 a edição – 496 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1561 ‑6<br />

Apesar dos programas <strong>de</strong> aproximação e integração<br />

econômica da América Latina, no plano cultural o Brasil<br />

continua ignorando os vizinhos <strong>de</strong> língua espanhola.<br />

Quando muito editamos romances <strong>de</strong> repercussão univer‑<br />

sal, best ‑sellers lidos tanto na Europa, como na China. Há<br />

uma ou outra exceção. Mas, quando se trata <strong>de</strong> poesia, o<br />

<strong>de</strong>sconhecimento é completo. Contam ‑se nos <strong>de</strong>dos os<br />

poetas argentinos, chilenos, mexic<strong>anos</strong> ou <strong>de</strong> outras nacio‑<br />

nalida<strong>de</strong>s apresentados ao público brasileiro em edições<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes. Mesmo a inclusão <strong>de</strong>sses poetas em anto‑<br />

logias é rara. Uma brilhante exceção foi Manuel Ban<strong>de</strong>ira,<br />

que traduziu poemas <strong>de</strong> vários <strong>de</strong>les. Mas, por <strong>mais</strong> sur‑<br />

preen<strong>de</strong>nte que seja, não havia até hoje nenhuma antolo‑<br />

gia abrangente da poesia hispano ‑americana.<br />

Com poemas selecionados e traduzidos por Thiago <strong>de</strong><br />

Mello, Poetas da América <strong>de</strong> canto castelhano é, pois, um<br />

livro pioneiro. Mais do que isso: uma <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> amor e<br />

admiração e um exercício <strong>de</strong> fraternida<strong>de</strong>. Durante doze<br />

<strong>anos</strong>, o poeta amazonense pesquisou e interpretou poetas<br />

do continente. Uma parcela <strong>de</strong>ste trabalho – 400 poemas <strong>de</strong><br />

120 autores – está reunida nesta antologia, em traduções<br />

<strong>de</strong> excelente nível.<br />

Este passeio poético no tempo e no espaço, com re‑<br />

presentantes <strong>de</strong> todos os países do continente, contempla<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> clássicos da poesia <strong>de</strong> língua espanhola, universal‑<br />

mente consagrados, como Pablo Neruda, Jorge Luis Bor‑<br />

ges, César Vallejo, Rubén Darío, Gabriela Mistral, Nicolás<br />

Guillén, José Asunción Silva, José Martí, até jovens poetas<br />

em fase <strong>de</strong> afirmação.<br />

Poetas da América <strong>de</strong> canto castelhano convida ainda a<br />

incursões <strong>mais</strong> profundas no território poético <strong>de</strong> nossos vizi‑<br />

nhos, na busca permanente do que Thiago <strong>de</strong> Mello chama<br />

<strong>de</strong> o “triunfo da beleza, da verda<strong>de</strong> e da ternura humana”.<br />

s e l e ç ã o , t r a d u ç ã o e n o t a s d e t h i a G o d e M e l l o<br />

QUANDO O PODER<br />

CORROMPE,<br />

CORROMPE A NÃO<br />

MAIS PODER<br />

Ciro Pellicano<br />

1 a edição – 160 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1409 ‑1<br />

O humor continua sendo o melhor remédio para o<br />

mau humor. A frase po<strong>de</strong> ser acaciana, mas não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong><br />

ser verda<strong>de</strong>ira. Mas existe humor tolo e humor refinado. As<br />

ofertas do primeiro são amplas, gerais e irrestritas. As que<br />

envolvem inteligência e criativida<strong>de</strong> são <strong>mais</strong> raras. Mas<br />

ainda existem, como comprova esse <strong>de</strong>licioso Quando o<br />

po<strong>de</strong>r corrompe, corrompe a não <strong>mais</strong> po<strong>de</strong>r, que traz o<br />

subtítulo longo, mas não menos significativo <strong>de</strong> “fraseolo‑<br />

gia <strong>de</strong> resistência à irracionalida<strong>de</strong> cotidiana: um olhar crí‑<br />

tico sobre a shopping ‑centerização progressiva das relações<br />

humanas, seja lá o que isso possa significar”.<br />

Publicitário, jornalista, contista, Ciro Pellicano se rea‑<br />

liza sobretudo no humor, em geral frases curtas e incisivas,<br />

ironizando hábitos e costumes <strong>de</strong> nosso tempo (por exem‑<br />

plo: “Até quinze <strong>anos</strong> atrás, eu vivia muito bem sem um<br />

telefone celular. Hoje, então, viveria muito melhor”), atitu‑<br />

<strong>de</strong>s <strong>de</strong> todos os tempos (“O prolixo, quando sozinho, fala<br />

com seus borbotões”), preocupações do homem mo<strong>de</strong>rno<br />

(“Se <strong>de</strong>cidisse escrever um livro <strong>de</strong> dieta alimentar, eu o<br />

faria magrinho, magrinho”) ou paródias a textos clássicos<br />

(“No sétimo dia, Deus <strong>de</strong>scansou – e os homens começa‑<br />

ram a <strong>de</strong>sfazer o mundo”).<br />

As frases são intercaladas com textos <strong>mais</strong> longos,<br />

pequenos flagrantes extraídos do cotidiano, contos ou<br />

quase contos, envolvendo personagens nem sempre bem‑<br />

‑humorados como Virgulino Lampião ou <strong>de</strong> melhor astral,<br />

como Zequinha <strong>de</strong> Abreu, o imortal compositor <strong>de</strong> “Tico‑<br />

‑Tico no fubá”.<br />

O que significa que o autor sabe <strong>de</strong>scobrir humor em<br />

todas as situações, oferecendo ao leitor o pretexto para<br />

boas risadas, sem a pretensão <strong>de</strong> originalida<strong>de</strong> absoluta.<br />

Como ele mesmo reconhece, lembrando Mark Twain, “o<br />

único homem que teve certeza <strong>de</strong> estar dizendo uma frase<br />

original foi Adão”.<br />

C i r o P e l l i C a n o<br />

199


TODOS OS<br />

GANHADORES DO<br />

PRÊMIO NOBEL DE<br />

LITERATURA<br />

1901 ­2010<br />

Lu<strong>de</strong>nbergue Góes<br />

1 a edição – 288 páginas<br />

ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1526 ‑5<br />

O Prêmio Nobel <strong>de</strong> Literatura é a honraria máxima que<br />

um escritor po<strong>de</strong> almejar, além <strong>de</strong> ser muito gratificante em<br />

termos financeiros. O vencedor fica consagrado e rico, se<br />

bem que a sua atribuição muitas vezes cause <strong>de</strong>sagrado,<br />

pela evi<strong>de</strong>nte conotação política. Tal fato explica a conces‑<br />

são a vários escritores, digamos, <strong>de</strong> recursos mo<strong>de</strong>stos,<br />

enquanto outros, artistas <strong>de</strong> gênio (lembremos Marcel<br />

Proust, James Joyce, Jorge Luis Borges, Franz Kafka, Émile<br />

Zola, Guimarães Rosa), ficam a ver navios. Há ainda uma<br />

certa complacência com os escritores escandinavos, muitas<br />

vezes em prejuízo <strong>de</strong> colegas <strong>de</strong> outras regiões do planeta.<br />

Nada disso abala o prestígio do prêmio, instituído em<br />

1900, pela Aca<strong>de</strong>mia Sueca, que em seus 110 <strong>anos</strong> <strong>de</strong> exis‑<br />

tência laureou 107 escritores (não houve premiação du‑<br />

rante a II Guerra Mundial, <strong>de</strong> 1940 a 1943), do poeta<br />

parnasiano francês Sully Prudhomme ao romancista peru‑<br />

ano Mario Vargas Llosa.<br />

É a história <strong>de</strong> cada um <strong>de</strong>sses artistas que o jornalista<br />

Lu<strong>de</strong>nbergue Góes conta em Todos os ganhadores do Prê‑<br />

mio Nobel <strong>de</strong> Literatura, precedido por uma notícia sobre<br />

o criador do prêmio, o cientista sueco Alfred Nobel, e o<br />

processo <strong>de</strong> elaboração do Nobel <strong>de</strong> literatura, que não<br />

figurava no primeiro testamento <strong>de</strong> Alfred Nobel.<br />

Em linguagem fluente, acessível e espaço rigorosa‑<br />

mente igual para todos, Góes apresenta um breve resumo<br />

da vida do laureado e uma relação <strong>de</strong> suas obras <strong>mais</strong> im‑<br />

portantes, constituindo o conjunto um importante e rico<br />

material <strong>de</strong> pesquisa.<br />

Jornalista com quase sessenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> carreira, Lu‑<br />

<strong>de</strong>nbergue Góes trabalhou em O Estado <strong>de</strong> S. Paulo, nas<br />

tevês Ban<strong>de</strong>irantes e Globo e, durante <strong>de</strong>z <strong>anos</strong>, na asses‑<br />

soria <strong>de</strong> comunicação do governo <strong>de</strong> São Paulo. É autor<br />

dos livros ABC do Código Da Vinci e Mulher brasileira em<br />

primeiro lugar.<br />

200<br />

l u d e n B e r G u e G ó e s


ÍNDICE<br />

Para facilitar sua consulta, este índice está<br />

classificado da seguinte forma:<br />

negrito: nome das obras;<br />

itálico: nome dos autores;<br />

redondo: nome dos selecionadores, organizadores e<br />

tradutores.<br />

Aca<strong>de</strong>mia Brasileira <strong>de</strong> Letras .............................................................. 89<br />

Acor<strong>de</strong>i em Woodstock.................................................................. 144<br />

Açúcar ............................................................................................. 130<br />

Adriano Espínola ................................................................................. 57<br />

Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna ................................................... 33, 195<br />

Afonso Henriques Neto ........................................................... 13, 27, 83<br />

Afrânio Coutinho ...................................................... 109, 110, 111, 112<br />

Afrânio Coutinho ................................................................................ 15<br />

Aí vai meu coração ........................................................................... 90<br />

Alberto Venancio Filho ........................................................................ 20<br />

Alçapão, O ........................................................................................ 95<br />

Aleilton Fonseca .................................................................................. 56<br />

Alessandro Buzo ............................................................................... 106<br />

Alexandre Eulalio ................................................................................ 58<br />

Alexei Bueno ................................................................................. 48, 86<br />

Alfredo Bosi ........................................................................................ 40<br />

Allan da Rosa .................................................................................... 105<br />

Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens Filho .......................................................... 27<br />

Aluísio Azevedo ................................................................................ 101<br />

Álvaro Marins ..................................................................................... 53<br />

Ana Luísa Martins ............................................................................... 90<br />

Ana Luísa Martins ............................................................................... 60<br />

Anna Maria Martins .......................................................................... 194<br />

Anna Maria Martins ............................................................................ 71<br />

André Seffrin .................................................................... 10, 11, 25, 82<br />

Anjo do a<strong>de</strong>us, O ........................................................................... 148<br />

Anônimo célebre, O ....................................................................... 149<br />

Anos 30 ............................................................................................. 81<br />

Anos 40 ............................................................................................. 81<br />

Anos 50 ............................................................................................. 82<br />

Anos 60 ............................................................................................. 82<br />

Anos 70 ............................................................................................. 83<br />

Anos 80 ............................................................................................. 83<br />

Anos 90 ............................................................................................. 84<br />

Anos 2000 ......................................................................................... 84<br />

Antologia da alimentação no Brasil ............................................. 155<br />

Antologia <strong>de</strong> contos da uBE ......................................................... 191<br />

Antologia do cor<strong>de</strong>l brasileiro ...................................................... 192<br />

Antologia do folclore brasileiro .................................................... 155<br />

Antonio Arnoni Prado ......................................................................... 28<br />

Antonio Candido ................................................................................ 28<br />

Antonio Carlos Secchin .................................................... 10, <strong>39</strong>, 44, 87<br />

Antonio Dimas ...................................................................................... 5<br />

Antônio Hohlfeldt ............................................................................... 14<br />

Antonio Martins <strong>de</strong> Araujo .................................................................... 6<br />

Arcadismo ......................................................................................... 85<br />

Ary Quintella ....................................................................................... 18<br />

Assobio da foice, O .......................................................................... 99<br />

Assombrações do Recife Velho ..................................................... 130<br />

Até sempre ..................................................................................... 121<br />

Augusto Fre<strong>de</strong>rico Schmidt ............................................................... 198<br />

Augusto Sérgio Bastos ........................................................................ 64<br />

Avesso ............................................................................................... 93<br />

Barbara Heliodora ............................................................................... 77<br />

Beatriz Resen<strong>de</strong> <strong>de</strong> Freitas ................................................................... 69<br />

Bebel que a cida<strong>de</strong> comeu ............................................................. 145<br />

Beijo não vem da boca, O .............................................................. 149<br />

Bella Jozef ........................................................................................... 21<br />

Benedito Nunes .................................................................................. 50<br />

Benjamin Abdalla Junior ...................................................................... 29<br />

Bolero <strong>de</strong> Ravel .............................................................................. 183<br />

Brancos e negros em São Paulo .................................................... 125<br />

Cabeças <strong>de</strong> segunda ‑feira ............................................................. 145<br />

Ca<strong>de</strong>iras proibidas ......................................................................... 146<br />

Caesar Sobreira ................................................................................. 141<br />

Café na cama .................................................................................. 172<br />

Câmara Cascudo e Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>: Cartas, 1924 ‑1944 ............ 90<br />

Caminhos diversos: sob os signos do cor<strong>de</strong>l ................................ 192<br />

201


Canto <strong>de</strong> muro ............................................................................... 156<br />

Cão da meia ‑noite, O ..................................................................... 175<br />

Capitalismo <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte e classes sociais na América Latina ..... 126<br />

Car<strong>de</strong>al e o repórter: histórias que fazem História, O................. 196<br />

Carlos Castelo ..................................................................................... 98<br />

Carlos Felipe Moisés ............................................................................ 29<br />

Carlos Herculano Lopes ....................................................................... 74<br />

Carlos Ribeiro ..................................................................................... 60<br />

Carlos Vogt ......................................................................................... 42<br />

Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala .................................................................. 131<br />

Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala em quadrinhos ........................................ 131<br />

Caso do filho do enca<strong>de</strong>rnador, O ................................................ 176<br />

Castro Alves ...................................................................................... 102<br />

Cecilia Almeida Salles .......................................................................... 66<br />

Cecilia Costa ....................................................................................... 60<br />

Cecília Meireles ................................................................................. 114<br />

Cela Forte ........................................................................................ 104<br />

Cheiro <strong>de</strong> amor ............................................................................... 122<br />

Chez. Mme. Maigret ...................................................................... 193<br />

China tropical ................................................................................. 132<br />

Ciro Pellicano .................................................................................... 199<br />

Civilização e cultura ....................................................................... 156<br />

Cláudio Murilo Leal ....................................................................... 58, 74<br />

Cláudio Portella .................................................................................. 53<br />

Cleonice Berardinelli ........................................................................... 32<br />

Código das águas, O ...................................................................... 196<br />

Coisas que o povo diz .................................................................... 157<br />

Colecionador <strong>de</strong> pedras ................................................................. 105<br />

Com esse ódio e esse amor ............................................................. 93<br />

Confissões <strong>de</strong> um vira‑lata ............................................................ 186<br />

Conto da mulher brasileira, O ....................................................... 197<br />

Contos <strong>de</strong> vista ............................................................................... 193<br />

Contos tradicionais do Brasil ......................................................... 157<br />

Cora coragem Cora poesia ............................................................ 119<br />

Cora Coralina ............................................................ 116, 117, 118, 119<br />

Corações mordidos ........................................................................ 122<br />

Cordéis que educam e transformam ............................................ 194<br />

Cores do crime, As ........................................................................... 98<br />

Correspondência <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis .......................................... 89<br />

Coruja, O ......................................................................................... 101<br />

202<br />

Costa Senna .............................................................................. 192, 194<br />

Criaturas <strong>de</strong> Prometeu, As ............................................................. 140<br />

Da Cabula ....................................................................................... 105<br />

Damas turcas .................................................................................... 98<br />

Darcy Damasceno ............................................................................... 42<br />

Darcy França Denófrio ......................................................................... 37<br />

Davi Arrigucci Jr. ........................................................................... 21, 45<br />

De menino a homem ..................................................................... 132<br />

De passagem mas não a passeio .................................................. 106<br />

Décio <strong>de</strong> Almeida Prado ...................................................................... 78<br />

Dentes ao sol .................................................................................. 146<br />

Deonísio da Silva ................................................................................. 12<br />

Depois do sol .................................................................................. 147<br />

Dicionário do folclore brasileiro.................................................... 158<br />

Dinha ................................................................................................ 106<br />

Dionísio Toledo ................................................................................... 22<br />

Doceira e poeta .............................................................................. 116<br />

Domício Proença Filho ................................................................... 17, 85<br />

Doze reis e a moça no labirinto do vento .................................... 180<br />

Edilberto Coutinho .............................................................................. 34<br />

Edla van Steen .................................................................. 121, 122, 123<br />

Edla van Steen .................................................................................. 197<br />

Edmundo Bouças ................................................................................ 67<br />

Edson Nery da Fonseca ..................................................................... 142<br />

Eduardo Coelho .................................................................................. 70<br />

Eduardo <strong>de</strong> Faria Coutinho ........................................ 109, 110, 111, 112<br />

Eduardo Portella ................................................................................. 17<br />

Eli<strong>de</strong> Rugai Bastos ............................................................................. 140<br />

Elisa Lucinda ..................................................................................... 193<br />

Em nome do pai dos burros ............................................................ 94<br />

Enciclopédia <strong>de</strong> literatura brasileira ............................................. 112<br />

Ensaio sobre o jardim .................................................................... 140<br />

Enterro da cafetina, O ................................................................... 176<br />

Entre sem bater .............................................................................. 173<br />

Escravo nos anúncios <strong>de</strong> jornais brasileiros do século xix, O .... 135<br />

Esdras do Nascimento ......................................................................... 92<br />

Esta noite ou nunca ....................................................................... 173<br />

Estórias da Casa Velha da Ponte ................................................... 116<br />

Estrela da manhã ........................................................................... 169<br />

Estrela da tar<strong>de</strong> .............................................................................. 169


Fábio Lucas ........................................................................... 18, 43, 191<br />

Fala do céu, A ................................................................................... 92<br />

Fátima Quintas .................................................................................. 142<br />

Fátima Quintas .................................................................................. 141<br />

Fausto Cunha ..................................................................................... 50<br />

Feijão e o sonho, O ........................................................................ 186<br />

Fernando Pessoa Ferreira ..................................................................... 99<br />

Flávia Amparo ..................................................................................... 68<br />

Flávio Aguiar ....................................................................................... 38<br />

Florestan Fernan<strong>de</strong>s .................................................. 125, 126, 127, 128<br />

Florestan Fernan<strong>de</strong>s: leituras & legados ...................................... 126<br />

Francisco <strong>de</strong> Assis Barbosa ............................................................ 16, 49<br />

Francisco Iglésias ................................................................................. 37<br />

Fred Góes ..................................................................................... 53, 67<br />

Folclore do Brasil ............................................................................ 158<br />

Geografia dos mitos brasileiros .................................................... 159<br />

Gilberto Araújo ................................................................................... 65<br />

Gilberto Freyre .......... 130, 131, 132, 133, 134, 135, 136, 137, 138, 1<strong>39</strong><br />

Gilberto Mendonça Teles ............................................................... 45, 69<br />

Glória Pondé ....................................................................................... 19<br />

GOG ................................................................................................. 104<br />

Gonçalves Dias .................................................................................. 101<br />

Guerreira ......................................................................................... 106<br />

Guga <strong>de</strong> Oliveira ............................................................................... 191<br />

Guia prático, histórico e sentimental da cida<strong>de</strong> do Recife .......... 133<br />

Guilhermino Cesar .............................................................................. 54<br />

Helena Parente Cunha ........................................................................ 14<br />

Helio Santos ........................................................................................ 95<br />

Heloisa Buarque <strong>de</strong> Hollanda ........................................................ 30, 73<br />

Herberto Sales ...................................................................................... 9<br />

Hil<strong>de</strong>berto Barbosa Filho ..................................................................... 52<br />

História da alimentação no Brasil ................................................. 159<br />

História dos nossos gestos ............................................................ 160<br />

Homem lésbico, O ............................................................................ 95<br />

Homem que odiava a segunda ‑feira, O ....................................... 150<br />

Homens do futuro, Os ................................................................... 178<br />

Humberto Werneck ............................................................................ 66<br />

i ‑Juca Pirama e os timbiras ............................................................ 101<br />

Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão ....................... 144, 145, 146, 147, 148, 149,<br />

150, 151, 152, 153<br />

Ilka Marinho Zanotto .......................................................................... 79<br />

imaginário cotidiano, O ................................................................. 197<br />

Inês Oseki ‑Dépré ................................................................................. 43<br />

insurgências e ressurgências atuais .............................................. 133<br />

investigação etnológica no Brasil e outros ensaios, A ................ 125<br />

ira das águas, A .............................................................................. 121<br />

irredutivelmente escritor ............................................................... 142<br />

itinerário <strong>de</strong> Pasárgada ................................................................. 170<br />

Ivan Junqueira ............................................................................... 38, 81<br />

Ivan Marques ...................................................................................... 31<br />

Ivan Teixeira ........................................................................................ 87<br />

Izabela Leal ......................................................................................... 26<br />

J. A<strong>de</strong>raldo Castello ............................................................................ 13<br />

J. Galante <strong>de</strong> Souza .......................................................................... 112<br />

Jangada .......................................................................................... 160<br />

Jeanette Rozsas ................................................................................. 191<br />

Jefferson Del Rios ............................................................................... 78<br />

João Luiz Lafetá .................................................................................... 7<br />

João Roberto Faria ........................................................................ 68, 77<br />

José Almino ........................................................................................ 55<br />

José Carlos Garbuglio ......................................................................... 41<br />

José Carlos Santos <strong>de</strong> Azeredo ............................................................ 75<br />

José Paulo Paes ................................................................................... 31<br />

Judith Grossmann ............................................................................... 11<br />

Katmandu ....................................................................................... 194<br />

Larissa <strong>de</strong> Oliveira Neves ..................................................................... 62<br />

Lauro Junkes ................................................................................. 47, 88<br />

Lêdo Ivo ........................................................................................ 15, 35<br />

Lendas brasileiras ........................................................................... 161<br />

Léo Gilson Ribeiro ............................................................................... 33<br />

Leo<strong>de</strong>gário A. <strong>de</strong> Azevedo Filho .................................................... 47, 63<br />

Ler o mundo ................................................................................... 195<br />

Letícia Malard ..................................................................................... 61<br />

Levi Bucalem Ferrari .......................................................................... 191<br />

Leyla Perrone ‑Moisés .................................................................... 36, 67<br />

Lindolf Bell ........................................................................................ 196<br />

Literatura no Brasil vol. i: introdução geral, A ............................. 109<br />

Literatura no Brasil vol. ii: era barroca/era neoclássica, A .......... 110<br />

Literatura no Brasil vol. iii: era romântica, A ............................... 110<br />

Literatura no Brasil vol. iV: era realista/era <strong>de</strong> transição, A ....... 111<br />

203


Literatura no Brasil vol. V: era mo<strong>de</strong>rnista, A .............................. 111<br />

Literatura no Brasil vol. Vi: relações e perspectivas/<br />

conclusão, A ............................................................................. 112<br />

Literatura oral no Brasil ................................................................. 161<br />

Literatura, pão e poesia ................................................................. 107<br />

Locuções tradicionais no Brasil ..................................................... 162<br />

Luciana Stegagno Picchio .................................................................... 51<br />

Luciano Rosa ................................................................................... 7, 81<br />

Lucila Nogueira Rodrigues ................................................................... 49<br />

Lu<strong>de</strong>nbergue Góes ............................................................................ 200<br />

Luís Augusto Fischer ........................................................................... 72<br />

Luís da Câmara Cascudo .......... 154, 155, 156, 157, 158, 159, 160, 161,<br />

162, 163, 164, 165, 166, 167<br />

Luiz Alberto Men<strong>de</strong>s ......................................................................... 104<br />

Luiz Busatto ........................................................................................ 41<br />

Luíz Horácio ........................................................................................ 96<br />

Luiz Paulo Horta .................................................................................. 65<br />

Luiza Franco Moreira ........................................................................... 35<br />

Machado <strong>de</strong> Assis ............................................................................. 102<br />

Ma<strong>de</strong> in Africa ................................................................................ 162<br />

Malditos paulistas .......................................................................... 174<br />

Mano Juan ...................................................................................... 174<br />

Manuel Ban<strong>de</strong>ira ....................................................................... 169, 170<br />

Marcelo Secron Bessa ........................................................................... 8<br />

Marco Haurélio ................................................................................. 195<br />

Marco Haurélio ................................................................................. 192<br />

Marco Lucchesi ....................................................................... 59, 64, 84<br />

Marcos Antonio <strong>de</strong> Moraes ................................................................. 90<br />

Marcos Fre<strong>de</strong>rico Krüger ..................................................................... 57<br />

Marcos Pasche .................................................................................... 71<br />

Marcos Rey ....................................... 172, 173, 174, 175, 176, 177, 178<br />

Maria da Glória Bordini ....................................................................... 23<br />

Maria Fernanda .................................................................................. 36<br />

Maria José Silveira ............................................................................... 93<br />

Marina Colasanti ....................................................................... 180, 181<br />

Mario Moreyra .................................................................................... 61<br />

Marisa Lajolo ................................................................................ 52, 60<br />

Martinho da Vila ............................................................................... 198<br />

Melhor teatro Artur Azevedo ......................................................... 77<br />

Melhor teatro Domingos Oliveira ................................................... 77<br />

204<br />

Melhor teatro Gianfrancesco Guarnieri ......................................... 78<br />

Melhor teatro Juca <strong>de</strong> Oliveira ....................................................... 78<br />

Melhor teatro Maria A<strong>de</strong>lai<strong>de</strong> Amaral ........................................... 79<br />

Melhor teatro Plínio Marcos............................................................ 79<br />

Melhores contos Aluísio Azevedo .................................................... 5<br />

Melhores contos Aníbal Machado .................................................... 5<br />

Melhores contos Artur Azevedo ....................................................... 6<br />

Melhores contos Ary Quintella ......................................................... 6<br />

Melhores contos Aurélio Buarque <strong>de</strong> Holanda ................................ 7<br />

Melhores contos Autran Dourado .................................................... 7<br />

Melhores contos Breno Accioly ......................................................... 8<br />

Melhores contos Caio Fernando Abreu ............................................ 8<br />

Melhores contos Domingos Pellegrini .............................................. 9<br />

Melhores contos Eça <strong>de</strong> Queirós ....................................................... 9<br />

Melhores contos Edla van Steen ..................................................... 10<br />

Melhores contos Fausto Wolff ........................................................ 10<br />

Melhores contos Hélio Pólvora ....................................................... 11<br />

Melhores contos Herberto Sales ..................................................... 11<br />

Melhores contos Hermilo Borba Filho ............................................ 12<br />

Melhores contos ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão ................................. 12<br />

Melhores contos J. J. Veiga ............................................................. 13<br />

Melhores contos João Alphonsus ................................................... 13<br />

Melhores contos João Antônio ....................................................... 14<br />

Melhores contos João do Rio .......................................................... 14<br />

Melhores contos Joel Silveira .......................................................... 15<br />

Melhores contos Lêdo ivo ............................................................... 15<br />

Melhores contos Lima Barreto ........................................................ 16<br />

Melhores contos Luiz Vilela ........................................................... 16<br />

Melhores contos Lygia Fagun<strong>de</strong>s Telles ......................................... 17<br />

Melhores contos Machado <strong>de</strong> Assis ............................................... 17<br />

Melhores contos Marcos Rey .......................................................... 18<br />

Melhores contos Marques Rebelo .................................................. 18<br />

Melhores contos Moacyr Scliar ....................................................... 19<br />

Melhores contos Orígenes Lessa .................................................... 19<br />

Melhores contos Osman Lins .......................................................... 20<br />

Melhores contos Ribeiro Couto....................................................... 20<br />

Melhores contos Ricardo Ramos ..................................................... 21<br />

Melhores contos Rubem Braga ....................................................... 21<br />

Melhores contos Salim Miguel ........................................................ 22<br />

Melhores contos Simões Lopes Neto .............................................. 22


Melhores contos Walmir Ayala ....................................................... 23<br />

Melhores crônicas Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’anna........................ 61<br />

Melhores crônicas Álvaro Moreyra ................................................. 61<br />

Melhores crônicas Artur Azevedo .................................................. 62<br />

Melhores crônicas Austregésilo <strong>de</strong> Athay<strong>de</strong>.................................. 62<br />

Melhores crônicas Cecília Meireles ................................................. 63<br />

Melhores crônicas Coelho Neto ...................................................... 63<br />

Melhores crônicas Eucli<strong>de</strong>s da Cunha ............................................. 64<br />

Melhores crônicas Ferreira Gullar ................................................... 64<br />

Melhores crônicas Gustavo Corção ................................................. 65<br />

Melhores crônicas Humberto <strong>de</strong> Campos ..................................... 65<br />

Melhores crônicas ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão .............................. 66<br />

Melhores crônicas ivan Angelo ....................................................... 66<br />

Melhores crônicas João do Rio ........................................................ 67<br />

Melhores crônicas José Castello ...................................................... 67<br />

Melhores crônicas José <strong>de</strong> Alencar ................................................. 68<br />

Melhores crônicas Josué Montello ................................................. 68<br />

Melhores crônicas Lêdo ivo ............................................................. 69<br />

Melhores crônicas Lima Barreto ...................................................... 69<br />

Melhores crônicas Luís Martins ....................................................... 60<br />

Melhores crônicas Machado <strong>de</strong> Assis ............................................. 70<br />

Melhores crônicas Manuel Ban<strong>de</strong>ira .............................................. 70<br />

Melhores crônicas Marcos Rey ........................................................ 71<br />

Melhores crônicas Maria Julieta Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> ............ 71<br />

Melhores crônicas Marina Colasanti ............................................... 60<br />

Melhores crônicas Marques Rebelo ................................................ 72<br />

Melhores crônicas Moacyr Scliar ..................................................... 72<br />

Melhores crônicas Odylo Costa Filho ............................................. 60<br />

Melhores crônicas Olavo Bilac ........................................................ 73<br />

Melhores crônicas Rachel <strong>de</strong> Queiroz ............................................. 73<br />

Melhores crônicas Raul Pompeia .................................................... 74<br />

Melhores crônicas Roberto Drummond ......................................... 74<br />

Melhores crônicas Rodolfo Kon<strong>de</strong>r ................................................ 60<br />

Melhores crônicas Rubem Braga ..................................................... 60<br />

Melhores crônicas Sérgio Milliet ..................................................... 75<br />

Melhores crônicas Zuenir Ventura .................................................. 75<br />

Melhores frases <strong>de</strong> Casa ‑Gran<strong>de</strong> & Senzala, As .......................... 141<br />

Melhores poemas Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna ....................... 25<br />

Melhores poemas Alberto da Costa e Silva ................................... 25<br />

Melhores poemas Alberto <strong>de</strong> Oliveira ........................................... 26<br />

Melhores poemas Almeida Garrett................................................. 26<br />

Melhores poemas Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens ............................... 27<br />

Melhores poemas Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens Filho ...................... 27<br />

Melhores poemas Alvarenga Peixoto............................................. 28<br />

Melhores poemas Álvares <strong>de</strong> Azevedo .......................................... 28<br />

Melhores poemas Álvaro Alves <strong>de</strong> Faria ........................................ 29<br />

Melhores poemas Antero <strong>de</strong> Quental ............................................ 29<br />

Melhores poemas Armando Freitas Filho....................................... 30<br />

Melhores poemas Arnaldo Antunes ............................................... 30<br />

Melhores poemas Augusto dos Anjos ............................................ 31<br />

Melhores poemas Augusto Fre<strong>de</strong>rico Schmidt .............................. 31<br />

Melhores poemas Augusto Meyer ................................................. 32<br />

Melhores poemas Bocage ............................................................... 32<br />

Melhores poemas Bueno <strong>de</strong> Rivera ................................................ 33<br />

Melhores poemas Carlos Nejar ....................................................... 33<br />

Melhores poemas Carlos Pena Filho ............................................... 34<br />

Melhores poemas Casimiro <strong>de</strong> Abreu ............................................. 34<br />

Melhores poemas Cassiano Ricardo ............................................... 35<br />

Melhores poemas Castro Alves ....................................................... 35<br />

Melhores poemas Cecília Meireles.................................................. 36<br />

Melhores poemas Cesário Ver<strong>de</strong>..................................................... 36<br />

Melhores poemas Cláudio Manuel da Costa ................................. 37<br />

Melhores poemas Cora Coralina ..................................................... 37<br />

Melhores poemas Cruz e Sousa ...................................................... 38<br />

Melhores poemas Dante Milano ..................................................... 38<br />

Melhores poemas Fagun<strong>de</strong>s Varela ................................................ <strong>39</strong><br />

Melhores poemas Fernando Pessoa ............................................... <strong>39</strong><br />

Melhores poemas Ferreira Gullar.................................................... 40<br />

Melhores poemas Florbela Espanca ............................................... 40<br />

Melhores poemas Gilberto Mendonça Teles .................................. 41<br />

Melhores poemas Gonçalves Dias .................................................. 41<br />

Melhores poemas Gregório <strong>de</strong> Matos ............................................ 42<br />

Melhores poemas Guilherme <strong>de</strong> Almeida ...................................... 42<br />

Melhores poemas Haroldo <strong>de</strong> Campos........................................... 43<br />

Melhores poemas Henriqueta Lisboa ............................................. 43<br />

Melhores poemas ivan Junqueira ................................................... 44<br />

Melhores poemas João Cabral <strong>de</strong> Melo Neto ................................ 44<br />

Melhores poemas Jorge <strong>de</strong> Lima .................................................... 45<br />

Melhores poemas José Paulo Paes ................................................. 45<br />

Melhores poemas Lêdo ivo ............................................................. 46<br />

205


Melhores poemas Lindolf Bell ......................................................... 46<br />

Melhores poemas Luís <strong>de</strong> Camões .................................................. 47<br />

Melhores poemas Luís Delfino ........................................................ 47<br />

Melhores poemas Luiz <strong>de</strong> Miranda ................................................ 48<br />

Melhores poemas Machado <strong>de</strong> Assis ............................................. 48<br />

Melhores poemas Manuel Ban<strong>de</strong>ira ............................................... 49<br />

Melhores poemas Mário <strong>de</strong> Sá ‑Carneiro ........................................ 49<br />

Melhores poemas Mário Faustino .................................................. 50<br />

Melhores poemas Mario Quintana ................................................. 50<br />

Melhores poemas Menotti <strong>de</strong>l Picchia ........................................... 51<br />

Melhores poemas Murilo Men<strong>de</strong>s .................................................. 51<br />

Melhores poemas Nauro Machado ................................................. 52<br />

Melhores poemas Olavo Bilac ......................................................... 52<br />

Melhores poemas Patativa do Assaré ............................................ 53<br />

Melhores poemas Paulo Leminski .................................................. 53<br />

Melhores poemas Paulo Men<strong>de</strong>s Campos ..................................... 54<br />

Melhores poemas Raimundo Correia ............................................. 54<br />

Melhores poemas Raul <strong>de</strong> Leoni ..................................................... 55<br />

Melhores poemas Ribeiro Couto..................................................... 55<br />

Melhores poemas Ruy Espinheira Filho ......................................... 56<br />

Melhores poemas Sosígenes Costa ................................................ 56<br />

Melhores poemas Sousândra<strong>de</strong> ...................................................... 57<br />

Melhores poemas Thiago <strong>de</strong> Mello ................................................ 57<br />

Melhores poemas Tomás Antônio Gonzaga .................................. 58<br />

Melhores poemas Vicente <strong>de</strong> Carvalho .......................................... 58<br />

Melhores poemas Walmir Ayala ..................................................... 59<br />

Memórias <strong>de</strong> um cabo <strong>de</strong> vassoura .............................................. 186<br />

Memórias <strong>de</strong> um gigolô ................................................................ 175<br />

Menalton Braff ......................................................................... 183, 184<br />

Meu livro <strong>de</strong> cor<strong>de</strong>l ........................................................................ 117<br />

Meus romances <strong>de</strong> cor<strong>de</strong>l .............................................................. 195<br />

Migração dos cisnes ......................................................................... 94<br />

Miguel Sanches Neto ...................................................................... 9, 25<br />

Moacyr Scliar .................................................................................... 197<br />

Mo<strong>de</strong>rnismo ..................................................................................... 85<br />

Modos <strong>de</strong> homem & modas <strong>de</strong> mulher ........................................ 134<br />

Monica Rector ...................................................................................... 6<br />

Mouros, franceses e ju<strong>de</strong>us ........................................................... 163<br />

Mudanças sociais no Brasil ........................................................... 127<br />

Murilo Melo Filho ................................................................................ 62<br />

206<br />

Não verás país nenhum ................................................................. 147<br />

Navio negreiro, O ........................................................................... 102<br />

Negro no mundo dos brancos, O .................................................. 127<br />

No silêncio das nuvens .................................................................. 123<br />

Noemi Jaffe ........................................................................................ 30<br />

Noite inclinada ............................................................................... 148<br />

Nor<strong>de</strong>ste ......................................................................................... 134<br />

Nor<strong>de</strong>ste semita: ensaio sobre um certo Nor<strong>de</strong>ste que em<br />

Gilberto Freyre também é semita ........................................... 141<br />

Novo mundo nos trópicos ............................................................. 135<br />

85 letras e um disparo ................................................................... 107<br />

Olinda: 2 o guia prático, histórico e sentimental <strong>de</strong> cida<strong>de</strong><br />

brasileira ................................................................................... 136<br />

Ópera <strong>de</strong> sabão .............................................................................. 177<br />

Ópera negra ................................................................................... 198<br />

Or<strong>de</strong>m e progresso ........................................................................ 136<br />

Orígenes Lessa .................................................................................. 186<br />

Orna Messer Levin .............................................................................. 62<br />

Panorama do teatro brasileiro ...................................................... 188<br />

Parnasianismo .................................................................................. 86<br />

Pássaros gran<strong>de</strong>s não cantam ......................................................... 96<br />

Paulo Ferraz ........................................................................................ 84<br />

Pedro Cavalcanti ........................................................................... 95, 98<br />

Pedro Lyra ..................................................................................... 55, 82<br />

Pega ele, Silêncio ........................................................................... 151<br />

Pêndulo da noite, O ....................................................................... 177<br />

Perfil <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s e outros perfis .................................................. 137<br />

Péricles Pra<strong>de</strong> ...................................................................................... 46<br />

Perseguidor, O .................................................................................. 99<br />

Poemas <strong>de</strong> amor ............................................................................. 198<br />

Poemas dos becos <strong>de</strong> Goiás e estórias <strong>mais</strong> ................................ 118<br />

Poetas da América <strong>de</strong> canto castelhano ....................................... 199<br />

Pré ‑Mo<strong>de</strong>rnismo............................................................................... 86<br />

Prelúdio da cachaça ....................................................................... 163<br />

Prelúdio e fuga do real .................................................................. 164<br />

Quando o po<strong>de</strong>r corrompe, corrompe a não <strong>mais</strong> po<strong>de</strong>r ........... 199<br />

Rainha do calçadão, Opus 14, A ...................................................... 92<br />

Raízes ................................................................................................ 87<br />

Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> dormir ............................................................................... 164<br />

Regina Campos ................................................................................... 75


Regina Dalcastagnè ............................................................................. 22<br />

Regina Zilbermann ........................................................................ 19, 48<br />

Religião no povo ........................................................................... 165<br />

Renata Pallottini ................................................................................ 193<br />

Renato Cor<strong>de</strong>iro Gomes ...................................................................... 72<br />

Ricardo Carvalho ............................................................................... 196<br />

Ricardo Daunt ..................................................................................... 94<br />

Ricardo Prado ..................................................................................... 92<br />

Ricardo Ramos ...................................................................................... 8<br />

Ricardo Thomé .................................................................................... 44<br />

Ricardo Vieira Lima ............................................................................. 83<br />

Rima <strong>de</strong>nuncia, A ........................................................................... 104<br />

Roger Basti<strong>de</strong> .................................................................................... 125<br />

Romanceiro da inconfidência ........................................................ 114<br />

Romantismo ..................................................................................... 87<br />

Rubem Braga ...................................................................................... 34<br />

Rubens Eduardo Ferreira Frias.............................................................. 51<br />

Sábato Magaldi ........................................................................ 188, 189<br />

Sacolinha .......................................................................................... 107<br />

Salete <strong>de</strong> Almeida Cara ....................................................................... 70<br />

Sandra Nitrini ...................................................................................... 20<br />

Sânzio <strong>de</strong> Azevedo ........................................................................ 26, 86<br />

Sérgio Alves Peixoto ............................................................................ 46<br />

Sérgio Martagão Gesteira ................................................................... 56<br />

Sérgio Vaz................................................................................. 105, 107<br />

Sexo à moda patriarcal .................................................................. 142<br />

Silvana Garcia ..................................................................................... 79<br />

Sílvio Lancellotti .................................................................................. 94<br />

Silvio Roberto <strong>de</strong> Oliveira .................................................................... 12<br />

Simbolismo ....................................................................................... 88<br />

Sobrados e mucambos ................................................................... 137<br />

Socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> classes e sub<strong>de</strong>senvolvimento ............................... 128<br />

Solange <strong>de</strong> Aragão ........................................................................... 140<br />

Sombra do cipreste, À ................................................................... 183<br />

Soy loco por ti, América! ............................................................... 178<br />

Superstição no Brasil ..................................................................... 165<br />

Talvez poesia .................................................................................. 138<br />

Tania Franco Carvalhal ........................................................................ 32<br />

Tapete <strong>de</strong> silêncio ........................................................................... 184<br />

Teatro da Obsessão: Nelson Rodrigues ........................................ 188<br />

Teatro da Ruptura: Oswald <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> ....................................... 189<br />

Telenia Hill .......................................................................................... 54<br />

Tempo <strong>de</strong> aprendiz ........................................................................ 138<br />

Tempo morto e outros tempos ..................................................... 1<strong>39</strong><br />

Teresa Rita Lopes ................................................................................. <strong>39</strong><br />

Tesouro da Casa Velha, O .............................................................. 117<br />

Thiago <strong>de</strong> Mello ................................................................................ 199<br />

Todos os ganhadores do Prêmio Nobel <strong>de</strong> Literatura,<br />

1901 ‑2010 ................................................................................. 200<br />

Tom Figueiredo ................................................................................... 99<br />

Tomás Chiaverini ................................................................................. 93<br />

Tradição, ciência do povo .............................................................. 166<br />

Ubiratan Machado .................................................................... 5, 63, 73<br />

uma i<strong>de</strong>ia toda azul ....................................................................... 180<br />

Última corrida, A ............................................................................ 172<br />

Última viagem <strong>de</strong> Borges, A .......................................................... 144<br />

Vaqueiros e cantadores ................................................................. 166<br />

Várias histórias ............................................................................... 102<br />

Veia bailarina .................................................................................. 151<br />

Ver<strong>de</strong> violentou o muro, O ............................................................ 150<br />

Viagem ............................................................................................ 114<br />

Viajando o Sertão .......................................................................... 167<br />

Vicência Brêtas Tahan ........................................................................ 119<br />

Vida é um show, A ......................................................................... 191<br />

Vida social no Brasil nos meados do século xix .......................... 1<strong>39</strong><br />

Villa Boa <strong>de</strong> Goyaz ......................................................................... 118<br />

23 histórias <strong>de</strong> um viajante ........................................................... 181<br />

Vintém <strong>de</strong> cobre ............................................................................. 119<br />

Você é jovem, velho ou dinossauro? ............................................ 152<br />

Walnice Nogueira Galvão .................................................................... 85<br />

Wilson Martins ................................................................................... 16<br />

Zero ................................................................................................. 152<br />

Zero: edição comemorativa 35 <strong>anos</strong> ............................................. 153<br />

Zina C. Bellodi ..................................................................................... 40<br />

207

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