Prezado(a) Professor(a): Nesses mais de 39 anos ... - Global Editora
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<strong>Prezado</strong>(a) <strong>Professor</strong>(a):<br />
<strong>Nesses</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> <strong>39</strong> <strong>anos</strong> <strong>de</strong> existência, a <strong>Global</strong><br />
<strong>Editora</strong> vem <strong>de</strong>senvolvendo um intenso trabalho<br />
na área educacional. Nossos objetivos principais<br />
sempre foram e serão a divulgação <strong>de</strong> autores<br />
nacionais e a formação cultural <strong>de</strong> estudantes.<br />
Por isso, tanto a seleção cuidadosa dos textos<br />
como a qualida<strong>de</strong> gráfica na apresentação dos<br />
livros são nossas maiores preocupações. Com<br />
este catálogo, apresentamos consagrados autores<br />
da literatura brasileira e da literatura portuguesa.<br />
Os contos, os poemas, as crônicas e as<br />
peças teatrais que compõem cada obra das coleções<br />
Melhores Contos, Melhores Poemas, Melhores<br />
Crônicas e Melhor Teatro são criteriosamente<br />
selecionados por renomados estudiosos, poetas<br />
e escritores que, além disso, acrescentam às<br />
obras uma bibliografia, uma biografia e um estudo<br />
introdutório sobre a trajetória histórico<br />
literária <strong>de</strong> cada autor. Completando este<br />
catálogo, apresentamos obras <strong>de</strong> Afrânio Coutinho,<br />
Cora Coralina, Edla van Steen, Florestan<br />
Fernan<strong>de</strong>s, Gilberto Freyre, Ignácio <strong>de</strong> Loyola<br />
Brandão, Luís da Câmara Cascudo, Marcos Rey,<br />
Marina Colasanti e Sábato Magaldi, entre outros<br />
autores imprescindíveis para um maior aprofundamento<br />
no universo da literatura brasileira.<br />
Des<strong>de</strong> o início, a sua colaboração tem sido <strong>de</strong>cisiva<br />
para o nosso trabalho. Portanto, visite nosso<br />
site www.globaleditora.com.br e <strong>de</strong>ixe seu comentário:<br />
ele sempre será muito bem vindo!<br />
RichaRd a. alves<br />
Diretor <strong>de</strong> Marketing
SUMÁRIO<br />
Melhores Contos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .4<br />
Melhores PoeMas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .24<br />
Melhores CrôniCas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .60<br />
Melhor teatro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .76<br />
roteiro da Poesia Brasileira . . . . . . . . . . . . . . . . . . .80<br />
CorresPondênCias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .89<br />
estante GloBal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .91<br />
estante PoliCiais Paulist<strong>anos</strong> . . . . . . . . . . . . . . . . . . .97<br />
Fortuna CrítiCa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .100<br />
literatura PeriFériCa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .103<br />
aFrânio Coutinho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .108<br />
CeCília Meireles . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .113<br />
Cora Coralina . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .115<br />
edla van steen . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .120<br />
Florestan Fernan<strong>de</strong>s . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .124<br />
GilBerto Freyre . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .129<br />
iGnáCio <strong>de</strong> loyola Brandão . . . . . . . . . . . . . . . . . .143<br />
luís da CâMara CasCudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . .154<br />
Manuel Ban<strong>de</strong>ira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .168<br />
MarCos rey . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .171<br />
Marina Colasanti . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .179<br />
Menalton BraFF . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .182<br />
oríGenes lessa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .185<br />
sáBato MaGaldi . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .187<br />
outros autores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .190<br />
índiCe . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .201
C o l e ç ã o<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
DIREÇÃO<br />
EDLA VAN STEEN<br />
4<br />
Os expoentes da literatura brasileira e portuguesa,<br />
representantes das diversas escolas literárias, estão<br />
entre os clássicos reunidos pela <strong>Global</strong> <strong>Editora</strong> na co‑<br />
leção Melhores Contos. São <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 36 coletâneas,<br />
dirigidas pela escritora Edla van Steen, com o objetivo<br />
<strong>de</strong> levar ao público algumas das melhores produções<br />
literárias <strong>de</strong> nossa língua. A rigorosa seleção dos tex‑<br />
tos garante a qualida<strong>de</strong> das obras e justifica o gran<strong>de</strong><br />
sucesso alcançado pela coleção em <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 25 <strong>anos</strong><br />
<strong>de</strong> existência. Os estudantes encontram na coleção<br />
Melhores Contos um material privilegiado <strong>de</strong> estudo<br />
e lazer. Cada volume apresenta uma bibliografia, uma<br />
biografia e um estudo introdutório sobre cada con‑<br />
tista. A qualida<strong>de</strong> das edições é uma priorida<strong>de</strong> da<br />
<strong>Global</strong> <strong>Editora</strong> que, com a coleção Melhores Contos,<br />
tem a certeza <strong>de</strong> estar resgatando para o leitor todo<br />
o fascínio da prosa luso ‑brasileira.
ALUÍSIO AZEVEDO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Ubiratan Machado<br />
Aluísio Azevedo (1857 ‑1913)<br />
Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />
1 a edição – 200 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1278 ‑3<br />
Consi<strong>de</strong>rado a figura máxima do romance naturalista,<br />
no Brasil, Aluísio Azevedo <strong>de</strong>ixou também uma série <strong>de</strong><br />
contos, <strong>de</strong> excelente qualida<strong>de</strong> literária, envolventes e for‑<br />
tes, que transmitem ao leitor a mesma sensação <strong>de</strong> vida<br />
que palpita em seus romances.<br />
Sem a estrita preocupação <strong>de</strong> fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> ao cânon na‑<br />
turalista, que caracterizava o romancista, as histórias curtas<br />
<strong>de</strong> Aluísio revelam um escritor <strong>de</strong> humor irreverente, por<br />
vezes lírico, com uma vaga nostalgia da juventu<strong>de</strong>, preocu‑<br />
pado com a passagem do tempo e a fugacida<strong>de</strong> da vida,<br />
menos pessimista do que em seus romances, mas sem se<br />
afastar da atitu<strong>de</strong> crítica e <strong>de</strong> combate que sempre man‑<br />
teve em relação à sua terra, em particular, e à socieda<strong>de</strong>,<br />
em geral.<br />
Crítico e combativo, duro e cruel algumas vezes, ou‑<br />
tras prestes a se comover, sentimento logo afastado com<br />
um piparote ou uma ironia, nunca ingênuo, o contista<br />
aborda temas e motivos variados: vai do fantástico a situa‑<br />
ções típicas do naturalismo, incluindo páginas <strong>de</strong> reminis‑<br />
cências em forma <strong>de</strong> ficção.<br />
Os críticos se divi<strong>de</strong>m na escolha do melhor trabalho:<br />
“O ma<strong>de</strong>ireiro”, em que o autor se <strong>de</strong>licia com as manhas<br />
e as astúcias femininas; o contun<strong>de</strong>nte “Heranças”, retrato<br />
<strong>de</strong> um conflito <strong>de</strong> gerações; o angustiante “A serpente”; a<br />
avassaladora paixão pelo jogo abordada em “Último<br />
lance”; “Fora <strong>de</strong> horas”, uma reivindicação do simples e<br />
humano direito <strong>de</strong> amar, e quinze outros trabalhos, nos<br />
quais se resumiu a obra <strong>de</strong> contista <strong>de</strong> Aluísio.<br />
Todos esses vinte contos, reunidos em dois volumes,<br />
intitulados Demônios e Pégadas, foram incluídos no vo‑<br />
lume <strong>de</strong> Melhores contos Aluísio Azevedo, que, <strong>de</strong>ssa<br />
forma, não apresenta apenas os melhores trabalhos do es‑<br />
critor, mas sua obra completa no gênero.<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
ANÍBAL MACHADO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Antonio Dimas<br />
Aníbal Machado (1894 ‑1964)<br />
Natural <strong>de</strong> Sabará, MG<br />
7 a edição – 224 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0059 ‑4<br />
Durante muitos <strong>anos</strong> Aníbal Machado foi o escritor<br />
inédito <strong>mais</strong> conceituado do Brasil. Publicava na imprensa<br />
alguns ensaios, trechos do famosíssimo João Ternura e con‑<br />
tos dispersos que, sem a unida<strong>de</strong> em volume, impediam<br />
uma avaliação global do escritor. Apesar do ineditismo,<br />
exercia imensa influência nos meios literários cariocas, um<br />
papel semelhante ao <strong>de</strong>sempenhado por Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong><br />
em São Paulo. Sua casa <strong>de</strong> Ipanema era ponto <strong>de</strong> reunião<br />
<strong>de</strong> escritores, jornalistas, sambistas. Mas o livro sempre<br />
aguardado ia ficando para as calendas gregas. Com a pu‑<br />
blicação, afinal, <strong>de</strong> Vila feliz, em 1944, o público leitor <strong>de</strong>s‑<br />
cobriu que estava diante <strong>de</strong> um dos maiores contistas<br />
brasileiros <strong>de</strong> todos os tempos. O volume reunia apenas<br />
cinco contos (classificados como novelas) <strong>de</strong> excepcional<br />
qualida<strong>de</strong>, elaborados e reelaborados ao longo <strong>de</strong> muitos<br />
<strong>anos</strong>, numa ânsia permanente <strong>de</strong> perfeição. Em verda<strong>de</strong>, o<br />
livro já nascia clássico, com pelo menos duas obras ‑primas,<br />
“Tati, a garota” e “A morte da porta ‑estandarte”. Quinze<br />
<strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, nas Histórias reunidas, Aníbal acrescentava à<br />
lista <strong>de</strong> suas obras ‑primas <strong>mais</strong> dois trabalhos, “O Iniciado<br />
do vento” e “Viagem aos seios <strong>de</strong> Duília”. Os <strong>de</strong><strong>mais</strong>, se<br />
não chegam a tanto, são, porém, inesquecíveis. Quem se es‑<br />
quecerá da pequena epopeia doméstica contada em “O<br />
piano” ou <strong>de</strong> “O <strong>de</strong>funto inaugural”, cujo enterro é quase<br />
uma festa? Dessa forma, sua obra completa <strong>de</strong> contista,<br />
trabalhada ao longo <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 30 <strong>anos</strong>, resume ‑se a<br />
doze trabalhos, soldados entre si por uma atmosfera muito<br />
peculiar, entre concreto e imaginário, realida<strong>de</strong> e sonho,<br />
meio surrealista, meio fantástico, mas sem ja<strong>mais</strong> per<strong>de</strong>r a<br />
coerência psicológica. A análise psicológica dos persona‑<br />
gens, aliás, é penetrante, mas sem cruelda<strong>de</strong>, antes com<br />
simpatia, ternura, pieda<strong>de</strong> por suas fragilida<strong>de</strong>s, tudo ame‑<br />
nizado por uma intensa carga <strong>de</strong> poesia.<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
5
ARTUR AZEVEDO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Antonio Martins <strong>de</strong> Araujo<br />
Artur Azevedo (1855 ‑1908)<br />
Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />
1 a edição – 288 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0607 ‑2<br />
Artur Azevedo morreu em 1908. Agonizava, quando<br />
uma pequena multidão <strong>de</strong> curiosos formou ‑se diante <strong>de</strong> sua<br />
casa, querendo saber o estado <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> do escritor. Logo a<br />
morte sobreveio, comovendo os presentes, a cida<strong>de</strong>, o país.<br />
Nesse momento, podia ‑se aplicar a ele os versos que alguns<br />
<strong>anos</strong> antes, nas mesmas circunstâncias, <strong>de</strong>dicara a Paula<br />
Ney: “pela primeira vez o espírito per<strong>de</strong>ste,/ e fizeste chorar<br />
pela primeira vez”. Durante <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 35 <strong>anos</strong>, o escritor jovial<br />
e buliçoso, malicioso, mas sem ressentimentos ou malda<strong>de</strong>,<br />
distribuíra alegria e bom humor, fazendo o brasileiro rir <strong>de</strong><br />
suas próprias fragilida<strong>de</strong>s e ridículos. Homem <strong>de</strong> teatro, foi<br />
no palco que Artur obteve os maiores triunfos. Suas peças,<br />
disputadas por atores e empresários, eram certeza <strong>de</strong> su‑<br />
cesso e bons lucros. Sua vocação teatral era tão forte que se<br />
impunha a tudo que escrevia.<br />
“Quando repensava o mundo, já o fazia <strong>de</strong> maneira<br />
dramática”, observa Antonio Martins <strong>de</strong> Araujo, no prefá‑<br />
cio aos Melhores contos Artur Azevedo. Suas crônicas e<br />
seus contos trazem a marca do homem <strong>de</strong> teatro, pela fi‑<br />
xação da cena, apresentação dos personagens, diálogos.<br />
Como contista, Artur foi o <strong>mais</strong> popular <strong>de</strong> sua época, fi‑<br />
xando, sem preocupações <strong>de</strong> psicologia, os aspectos gro‑<br />
tescos ou apenas cômicos da pequena burguesia carioca,<br />
em um Rio <strong>de</strong> Janeiro amável, sem violência, on<strong>de</strong> todas as<br />
novida<strong>de</strong>s eram filtradas pela maledicência da rua do Ou‑<br />
vidor. Um Rio <strong>de</strong> Janeiro em que as repartições encerravam<br />
o expediente às três horas da tar<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ixando os escritores,<br />
muitos <strong>de</strong>les funcionários públicos (como Machado <strong>de</strong><br />
Assis e o próprio Artur), disponíveis para o bate ‑papo <strong>de</strong>s‑<br />
contraído na livraria ou na confeitaria. Hoje, cem <strong>anos</strong> após<br />
a morte do escritor, seus contos mantêm a mesma vivaci‑<br />
da<strong>de</strong> e a mesma graça marota que fez as <strong>de</strong>lícias <strong>de</strong> seus<br />
contemporâneos. É ler, comprovar e se regalar.<br />
6<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
ARy QUINTELLA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Monica Rector<br />
Ary Quintella (1933 ‑1999)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
1 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1469 ‑5<br />
Ary Quintella é um dos escritores <strong>mais</strong> <strong>de</strong>sconhecidos<br />
e surpreen<strong>de</strong>ntes do Brasil. Os leitores que gostam <strong>de</strong><br />
ficção e <strong>de</strong>sconhecem sua obra não sabem o que estão<br />
per<strong>de</strong>ndo. Homem <strong>de</strong> múltiplas ativida<strong>de</strong>s, <strong>de</strong>dicou ‑se à<br />
literatura já na maturida<strong>de</strong>, quase quarentão, com amplo<br />
domínio técnico do conto e do romance.<br />
I<strong>de</strong>ntificado em espírito e linguagem com o Rio <strong>de</strong> Ja‑<br />
nei ro, Quintella po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve ser inserido naquela velha tra‑<br />
di ção <strong>de</strong> cronista da cida<strong>de</strong>, que vem <strong>de</strong> Manuel Antônio <strong>de</strong><br />
Almeida, se <strong>de</strong>pura em Machado <strong>de</strong> Assis e Lima Barreto,<br />
passa por Marques Rebelo, até chegar a Sta nis law Ponte Preta.<br />
A sua afinida<strong>de</strong> com esses espíritos não vem apenas<br />
da ligação afetiva com a terra natal e a eleição como<br />
cenário <strong>de</strong> sua obra, mas <strong>de</strong> uma visão do mundo peculiar<br />
ao espírito carioca. No seu caso, utilizando uma linguagem<br />
muito pessoal, fragmentada, como a vida mo<strong>de</strong>rna, on<strong>de</strong><br />
pontificam termos <strong>de</strong> gíria, neologismos, galicismos, an‑<br />
glicismos, Quintella preserva a sua individualida<strong>de</strong>, cons‑<br />
truin do uma obra original, conforme ressalta a crítica.<br />
“Nunca usou ninguém como mo<strong>de</strong>lo. Autores <strong>de</strong> sua<br />
preferência e que possam indiretamente ter <strong>de</strong>ixado alguma<br />
semente são vários e variados: <strong>de</strong> Hemingway, Malaparte,<br />
Kurt Vonnegut a Antonio Tabucchi”, observa Monica Rector<br />
no prefácio aos Melhores contos Ary Quintella.<br />
Contos? Em verda<strong>de</strong>, constitui um <strong>de</strong>safio para o leitor<br />
<strong>de</strong>terminar o gênero das obras curtas <strong>de</strong> Quintella, como<br />
sublinha a prefaciadora. Não importa. Contos, ensaios, crô‑<br />
ni cas, ou quaisquer outros nomes que tenham, Melhores<br />
contos Ary Quintella reúne vinte e nove trabalhos <strong>de</strong> ótimo<br />
nível, extraídos <strong>de</strong> cinco livros, marcados pela presença<br />
da morte, a <strong>de</strong>scoberta da sexualida<strong>de</strong> na adolescência, a<br />
reflexão sobre a amiza<strong>de</strong>, temas peculiares ao universo do<br />
autor, tratados com leveza, mas também uma mal disfarçada<br />
visão trágica da vida.<br />
M e l h o r e s C o n t o s
AURÉLIO BUARQUE<br />
DE HOLANDA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Luciano Rosa<br />
Aurélio Buarque <strong>de</strong> Holanda (1910 ‑1989)<br />
Natural <strong>de</strong> Passo <strong>de</strong> Camaragibe, AL<br />
1 a edição – 216 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1250 ‑9<br />
No Brasil, Aurélio virou sinônimo <strong>de</strong> dicionário. “Você já<br />
consultou o Aurélio?”, “procure no Aurélio” são frases que já<br />
entraram para o cotidiano do brasileiro. O Aurélio, aliás pro‑<br />
fessor Aurélio Buarque <strong>de</strong> Holanda, um dos maiores filólogos<br />
e dicionaristas da língua, não gostava apenas <strong>de</strong> isolar, classi‑<br />
ficar e <strong>de</strong>finir palavras, mas também <strong>de</strong> reuni ‑las em forma <strong>de</strong><br />
contos, líricos, pungentes, repletos <strong>de</strong> humanida<strong>de</strong> e poesia.<br />
Filólogo e poeta, não é <strong>de</strong> se estranhar que os traba‑<br />
lhos reunidos em Dois mundos (seu único livro <strong>de</strong> contos)<br />
conciliassem, com maestria e rigor, a emoção contagiante<br />
e a linguagem <strong>de</strong>purada, o que não significa um texto<br />
duro, correto e seco, empregado pela maioria dos gramá‑<br />
ticos. Nada disso, nenhuma dureza <strong>de</strong> forma (ou <strong>de</strong> fundo),<br />
nenhum preciosismo, mas um português exemplar, con‑<br />
temporâneo, muito pessoal, preservando o <strong>de</strong>licioso sabor<br />
clássico. Ou seja, escritos em língua <strong>de</strong> gente e não no<br />
quimbundo aportuguesado <strong>de</strong> muitos autores<br />
Nascido em Alagoas, Aurélio Buarque mudou ‑se para<br />
o Rio <strong>de</strong> Janeiro já homem feito, sem que o Nor<strong>de</strong>ste se<br />
tornasse para ele apenas uma fotografia na pare<strong>de</strong>. Pelo<br />
contrário, continuou uma realida<strong>de</strong> viva e palpitante <strong>de</strong>ntro<br />
<strong>de</strong> si. Mais vivo, ainda, no momento em que o filólogo<br />
cedia a vez ao contista e ao poeta.<br />
O Nor<strong>de</strong>ste palpita em cada um <strong>de</strong> seus contos, reple‑<br />
tos <strong>de</strong> episódios vividos pelo autor em sua infância e juven‑<br />
tu<strong>de</strong>. São contos no velho sentido, mo<strong>de</strong>rnos, mas com um<br />
pé na tradição, com enredo, po<strong>de</strong>ndo ser contados a uma<br />
terceira pessoa. Entre eles, figuram pelo menos três traba‑<br />
lhos admiráveis, a um milímetro da obra ‑prima, “O chapéu<br />
<strong>de</strong> meu pai”, que anda por aí, em várias antologias, “Zé<br />
Bala” e o trabalho que dá título ao livro, todos selecionados<br />
entre os Melhores contos Aurélio Buarque <strong>de</strong> Holanda,<br />
para regalo do leitor.<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
AUTRAN DOURADO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
João Luiz Lafetá<br />
Autran Dourado (1926)<br />
Natural <strong>de</strong> Patos <strong>de</strong> Minas, MG<br />
2 a edição – 264 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0529 ‑4<br />
Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> sonhava “contar todas as histórias<br />
<strong>de</strong> Minas aos brasileiros do Brasil”. Não contou. Autran<br />
Dourado, mineiro <strong>de</strong> Patos, contou algumas <strong>de</strong>ssas histó‑<br />
rias, com lirismo, aci<strong>de</strong>z, ironia, compondo um universo<br />
muito peculiar, típico das Gerais, filtrado e <strong>de</strong>purado pela<br />
sensibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um escritor extremamente exigente com o<br />
seu texto. A maior parte da obra <strong>de</strong> Dourado está ambien‑<br />
tada em Duas Pontes, cida<strong>de</strong> mítica, uma espécie <strong>de</strong> sín‑<br />
tese <strong>de</strong> todas as cida<strong>de</strong>s mineiras, com os seus cochichos,<br />
os seus dramas <strong>de</strong> consciência (como em “Mr. Moore”,<br />
história <strong>de</strong> um pastor que acolhe um bandido em sua<br />
igreja), os seus momentos <strong>de</strong> ócio (“Os mínimos carapinas<br />
do nada”, uma metáfora do ato criativo), os seus segredos,<br />
as revelações súbitas <strong>de</strong> velhos dramas e tragédias, cortan‑<br />
tes como uma faca só lâmina, as suas velhas terríveis e<br />
mandonas, <strong>de</strong> áspero coração, abrandado pela ternura <strong>de</strong><br />
uma velha criada (“Aquela <strong>de</strong>stelhada”), o conhecimento<br />
da morte na infância (“Manuela em dia <strong>de</strong> chuva”), os ve‑<br />
lhos jogos hum<strong>anos</strong> <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, sedução, amor e ódio, quase<br />
todos transfigurados <strong>de</strong> experiências pessoais do autor,<br />
fatos presenciados ou <strong>de</strong>scobertos na infância e na adoles‑<br />
cência, revitalizados por um estilo exato, sem rebarbas.<br />
Apenas o essencial, modulado pela nota poética ou humo‑<br />
rística. Autor <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta livros, entre romances, no‑<br />
velas, ensaios, Autran Dourado se <strong>de</strong>dica ao conto <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />
início <strong>de</strong> sua carreira, nos dias <strong>de</strong> aprendizado, ainda na<br />
adolescência. Naquela época se conscientizou <strong>de</strong> alguns<br />
dados essenciais ao gênero, que segue até hoje, e aconse‑<br />
lha aos principiantes: “O que se <strong>de</strong>ve buscar num conto é<br />
o efeito único, ao contrário <strong>de</strong> um romance, em que os<br />
efeitos são múltiplos, e <strong>mais</strong>, a linguagem <strong>de</strong>ve ser tensa<br />
no conto, no romance <strong>de</strong>ve ser distendida”. A melhor lição<br />
prática é a leitura <strong>de</strong> seus contos.<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
7
BRENO ACCIOLy<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Ricardo Ramos<br />
Breno Accioly (1921 ‑1966)<br />
Natural <strong>de</strong> Santana do Ipanema, AL<br />
2 a edição – 144 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0297 ‑X<br />
Quando Breno Accioly publicou seu primeiro livro<br />
houve um certo reboliço nos arraiais literários. Os contos <strong>de</strong><br />
João Urso – mórbidos, violentos, atormentados – traziam<br />
alguma coisa nova à literatura brasileira, “em escrita e es‑<br />
trutura, como que uma coerente <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m”, como ob‑<br />
serva Ricardo Ramos no prefácio aos Melhores contos<br />
Breno Accioly. Pareciam obra <strong>de</strong> um russo perdido nos tró‑<br />
picos. Os volumes seguintes – Cogumelos, Maria Pudim, Os<br />
cata ‑ventos – acentuaram as tendências do jovem contista,<br />
o clima <strong>de</strong> revolta contra tudo, o mundo e seus valores, as<br />
estruturas sociais, o comportamento do homem, a própria<br />
miséria da condição humana. A expressão se tornou <strong>mais</strong><br />
sombria e pungente, a angústia, ainda <strong>mais</strong> incômoda,<br />
como um espinho que se entranha na carne, resgatada,<br />
porém, por uma intensa e atormentada força poética. A<br />
crítica ficou perplexa. Tristão <strong>de</strong> Athay<strong>de</strong> distinguiu no uni‑<br />
verso do escritor um “terrível campo <strong>de</strong> transição entre a<br />
luz da consciência e a outra luz da insanida<strong>de</strong>”. Graciliano<br />
Ramos, alagoano como Accioly, observou que a arte do<br />
conterrâneo lhe fazia pensar em coisas e figuras da “terra<br />
espinhosa” on<strong>de</strong> nasceram, inadaptadas a medidas, com<br />
“a bárbara firmeza do cangaceiro e a resistência agreste do<br />
mandacaru”. Para Vinicius <strong>de</strong> Moraes, Accioly “veio abrir<br />
sobre as águas claras do conto brasileiro as comportas <strong>de</strong><br />
sua alma tumultuosa, que habita nas trevas <strong>mais</strong> fundas e<br />
sórdidas do ser”. Tumultuosos eram também os persona‑<br />
gens do escritor, pinçados na pequena comédia humana da<br />
província: usineiros, agregados, prostitutas, humil<strong>de</strong>s fun‑<br />
cionários, duros, ásperos, <strong>mais</strong> instintos do que sentimen‑<br />
tos, perplexos, à sua maneira, diante do gran<strong>de</strong> mistério da<br />
vida. Mistério do qual o escritor parecia <strong>de</strong>s<strong>de</strong>nhar, com o<br />
soberbo <strong>de</strong>sprezo dos <strong>de</strong>sesperados.<br />
8<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
CAIO FERNANDO<br />
ABREU<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Marcelo Secron Bessa<br />
Caio Fernando Abreu (1948 ‑1996)<br />
Natural <strong>de</strong> Santiago do Boqueirão, RS<br />
1 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1018 ‑5<br />
Caio Fernando Abreu passou como um meteoro pelas<br />
letras brasileiras. A trajetória fulminante, a sua luminosida<strong>de</strong>,<br />
a ousadia em tratar temas ditos malditos, numa literatura<br />
tão bem comportada como a nossa, criaram uma certa resis‑<br />
tência à sua obra. Chegaram a acusá ‑lo <strong>de</strong> escritor pesado e<br />
baixo ‑astral, sobretudo por suas abordagens do sexo no<br />
mundo gay. Sentia ‑se magoado, mas admitia o gosto pelo<br />
chulo, o não literário, talvez até o antiliterário, e replicava<br />
que o pesado não era ele, mas a realida<strong>de</strong>. A realida<strong>de</strong>, que<br />
muitos se recusavam a ver, englobava ainda outros aspectos<br />
cruéis ou apenas renovadores, mas con<strong>de</strong>nados em bloco<br />
pelos bem pensantes, dos quais Caio foi o primeiro (ou um<br />
dos primeiros) a tratar na literatura brasileira: drogas, rock,<br />
cultura pop. Romancista, tradutor, teatrólogo, autor <strong>de</strong> lite‑<br />
ratura infantojuvenil, foi no conto que Caio encontrou sua<br />
melhor forma <strong>de</strong> expressão literária. Estreando aos 22 <strong>anos</strong>,<br />
exatamente com um volume <strong>de</strong> contos, <strong>de</strong>ixou oito volumes<br />
no gênero. Como contista, retratou com impieda<strong>de</strong>, “<strong>de</strong>li‑<br />
ca<strong>de</strong>za e paixão, sombra e luminosida<strong>de</strong>, o necessário grão<br />
<strong>de</strong> loucura que ja<strong>mais</strong> lhe permitiria ser medíocre” (Lya Luft),<br />
uma socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nte, insatisfeita, insegura, formada<br />
por seres cada vez <strong>mais</strong> angustiados e vazios, recorrendo<br />
com frequência aos paraísos artificiais para tornar a reali‑<br />
da<strong>de</strong>, se não atraente, pelo menos suportável, mas com a<br />
busca permanente ao amor. Amor que nem sempre se en‑<br />
quadra nas i<strong>de</strong>alizações habituais, mas que nem por isso<br />
<strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser amor. No prefácio aos Melhores contos Caio<br />
Fernando Abreu, Marcelo Secron Bessa sugere que toda a<br />
obra <strong>de</strong> Caio po<strong>de</strong> ser pensada “como um gran<strong>de</strong> romance<br />
<strong>de</strong>smontável, cujo tema maior é o amor”. Maior do que o<br />
amor apenas a paixão pela vida, o prazer <strong>de</strong> viver, talvez até<br />
mesmo sem amor.<br />
M e l h o r e s C o n t o s
DOMINGOS<br />
PELLEGRINI<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Miguel Sanches Neto<br />
Domingos Pellegrini (1949)<br />
Natural <strong>de</strong> Londrina, PR<br />
1 a edição – 288 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0991 ‑5<br />
Com Domingos Pellegrini, o norte do Paraná ganhou<br />
um lugar <strong>de</strong> relevo na geografia literária brasileira. Em sua<br />
obra, sempre i<strong>de</strong>ntificada às questões da terra, a região é<br />
vista em três momentos, correspon<strong>de</strong>ntes a três etapas da<br />
vida do autor. Seu primeiro livro, O homem vermelho<br />
(1977), <strong>de</strong> fundo político, transcorre em época <strong>de</strong> acele‑<br />
rada transformação social, com o <strong>de</strong>sbravamento do inte‑<br />
rior paranaense. Os personagens são violeiros, peões,<br />
operários, caminhoneiros, vivendo experiências primitivas<br />
ligadas à terra. Conto emblemático <strong>de</strong>ssa fase é “O enca‑<br />
lhe dos 300”, em que a terra ‑roxa aparece como metáfora<br />
e a chuva, <strong>de</strong>ixando as estradas intransitáveis, obriga os<br />
caminhoneiros a uma parada não programada, que se ar‑<br />
rasta por sete dias. O segundo momento da obra <strong>de</strong> Pelle‑<br />
grini i<strong>de</strong>ntifica ‑se com a evocação mágica da infância e a<br />
quebra <strong>de</strong>ssa magia pela necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ingressar no ás‑<br />
pero mundo dos adultos, atmosfera que assinala seu livro<br />
<strong>de</strong> contos <strong>mais</strong> bem realizado, Os meninos crescem (1986).<br />
O ciclo se prolonga em obras posteriores, <strong>de</strong> forma obses‑<br />
siva. A nostalgia <strong>de</strong> um tempo perdido caracteriza a ter‑<br />
ceira fase da obra <strong>de</strong> Pellegrini. O tema foi <strong>de</strong>senvolvido <strong>de</strong><br />
maneira magistral em “A mulher dos sonhos”, no qual um<br />
viajante sai Brasil afora, em busca da amante que o aban‑<br />
donou. Ao encontrá ‑la é como se re<strong>de</strong>scobrisse as coisas<br />
simples e essenciais da vida. A atração pelas coisas naturais,<br />
a i<strong>de</strong>ntificação com a terra e os seres simples, <strong>de</strong> certa<br />
forma, se transfigura na linguagem <strong>de</strong> Pellegrini, extraída<br />
da fala do povo, marcando a sua escrita com um certo<br />
barbarismo e uma musicalida<strong>de</strong> selvagem e intensa. A ferro<br />
e fogo, ele marca seu lugar nas letras brasileiras, com uma<br />
obra que, como observa Miguel Sanches Neto, “revela o<br />
fascínio e a violência do processo civilizatório”.<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
EÇA DE QUEIRÓS<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Herberto Sales<br />
Eça <strong>de</strong> Queirós (1845 ‑1900)<br />
Natural <strong>de</strong> Póvoa ‑<strong>de</strong> ‑Varzim, Portugal<br />
5 a edição – 128 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0185 ‑X<br />
Durante quatro ou cinco gerações, a “prosa bárbara”<br />
<strong>de</strong> Eça <strong>de</strong> Queirós embriagou, literalmente, os leitores bra‑<br />
sileiros. Ler Eça era como tomar um narcótico. O leitor pu‑<br />
lava da dimensão normal da vida para um plano requintado,<br />
on<strong>de</strong> a ironia fustigava como um chicote e o Portugal meio<br />
bronco e preconceituoso do século XIX se transformava em<br />
território mágico, tão apaixonante quanto os requintes <strong>de</strong><br />
estilo do escritor, os seus galicismos ousados, as suas com‑<br />
parações <strong>de</strong>liciosas como aquele “sorriso duma doçura <strong>de</strong><br />
tentar abelhas”. Seu primeiro romance, O crime do padre<br />
Amaro, <strong>de</strong>spertou um sem ‑número <strong>de</strong> apaixonados no Bra‑<br />
sil. O próprio Machado <strong>de</strong> Assis, que fez sérias restrições à<br />
obra, reconheceu a gran<strong>de</strong>za do colega <strong>de</strong> além ‑mar. As<br />
gerações seguintes continuaram amando e <strong>de</strong>batendo a<br />
obra <strong>de</strong> Eça. Essa febre se prolonga até as décadas <strong>de</strong> 1920<br />
e 1930. Os rapazes que fizeram a revolução mo<strong>de</strong>rnista<br />
eram leitores fanáticos <strong>de</strong> Eça. Conheciam cada <strong>de</strong>talhe <strong>de</strong><br />
sua obra, os tiques dos personagens, sabiam <strong>de</strong> cor trechos<br />
imensos, em particular dos romances. A preferência pelos<br />
romances <strong>de</strong>ixou os contos em segundo plano. Parece que<br />
o próprio Eça não os valorizava tanto, não se preocupando<br />
sequer em reuni ‑los em volume. A edição dos Contos é<br />
póstuma, reunindo doze trabalhos, publicados ao longo do<br />
tempo. Neles se encontram algumas das melhores páginas<br />
escritas por Eça, como o magistral “José Matias”, uma das<br />
obras ‑primas do gênero na literatura universal, “Perfei‑<br />
ção”, “O <strong>de</strong>funto”, “Suave milagre”, “Civilização”, matriz<br />
<strong>de</strong> um dos romances <strong>mais</strong> famosos <strong>de</strong> Eça, A cida<strong>de</strong> e as<br />
serras. A crítica mo<strong>de</strong>rna não faz por menos: distingue nes‑<br />
ses contos o ponto <strong>mais</strong> alto da obra <strong>de</strong> Eça e a perfeição<br />
máxima <strong>de</strong> sua prosa, com “alguma coisa <strong>de</strong> cristalino, <strong>de</strong><br />
aveludado, <strong>de</strong> on<strong>de</strong>ante, <strong>de</strong> marmóreo”, como queria o<br />
próprio escritor.<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
9
EDLA VAN STEEN<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Antonio Carlos Secchin<br />
Edla van Steen (1936)<br />
Natural <strong>de</strong> Santa Catarina, SC<br />
1 a edição – 296 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1163 ‑4<br />
Edla van Steen ocupa um lugar singular no panorama<br />
do conto brasileiro contemporâneo. Ao contrário <strong>de</strong> muitos<br />
escritores que se esgotam no primeiro livro, a escritora ca‑<br />
tarinense se caracteriza por um constante sentido <strong>de</strong> reno‑<br />
vação e amadurecimento, não apenas da técnica literária,<br />
mas também da visão <strong>de</strong> mundo, como atestam os seis<br />
volumes <strong>de</strong> contos publicados. Cio, lançado em 1965,<br />
muito elogiado pela crítica, ainda não revelava a força que<br />
iria brotar em Antes do amanhecer (1977), livro <strong>de</strong> impreg‑<br />
nação obsessiva <strong>de</strong> temas ligados ao sexo e à morte. Oito<br />
<strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, sai Até sempre (1985), povoado por persona‑<br />
gens enigmáticos, vivendo situações insólitas, naquela zona<br />
fronteiriça entre razão e <strong>de</strong>lírio. Após um silêncio <strong>de</strong> onze<br />
<strong>anos</strong>, Edla volta ao gênero com Cheiro <strong>de</strong> amor (1996), no<br />
qual se mantém fiel ao seu universo, mas evolui para nar‑<br />
rativas <strong>mais</strong> longas, com maior número <strong>de</strong> personagens.<br />
No silêncio das nuvens (2001) e A ira das águas (2004) re‑<br />
velam o pleno amadurecimento literário, mas também<br />
acentuam o <strong>de</strong>sencanto com o mundo, a <strong>de</strong>cepção com a<br />
socieda<strong>de</strong> e as limitações impostas à mulher. Aliás, se a au‑<br />
tora está sempre atenta aos personagens masculinos, seu<br />
interesse maior se dirige ao coração feminino, espécie <strong>de</strong><br />
terra mágica e <strong>de</strong> pesa<strong>de</strong>los, pela qual passeia com curio‑<br />
sida<strong>de</strong> e inquietação. Os Melhores contos Edla van Steen<br />
reúnem 23 trabalhos, dos melhores da literatura brasileira<br />
contemporânea, que lançam o leitor num universo insti‑<br />
gante e intrigante <strong>de</strong> uma autora que, como observa An‑<br />
tonio Carlos Secchin, “procura o nervo da vida, pois, como<br />
afirma certo personagem, move ‑lhe o <strong>de</strong>sejo não <strong>de</strong> pintar<br />
a paisagem, mas <strong>de</strong> estar <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>la – no mesmo passo<br />
arrastando ‑nos a nós todos, seus leitores”.<br />
10<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
FAUSTO WOLFF<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
André Seffrin<br />
Fausto Wolff (1940 ‑2008)<br />
Natural <strong>de</strong> Santo Ângelo, RS<br />
1 a edição – 184 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1185 ‑5<br />
A literatura <strong>de</strong> Fausto Wolff é dura, contun<strong>de</strong>nte e<br />
<strong>de</strong>testa as boas maneiras. Está repleta <strong>de</strong> palavras <strong>de</strong> re‑<br />
volta, <strong>de</strong> pragas, <strong>de</strong> palavrões. E <strong>de</strong> situações equívocas. O<br />
escritor fala, sem volteios ou metáforas, <strong>de</strong> suas preocupa‑<br />
ções pessoais e sociais que, numa escala ascen<strong>de</strong>nte (ou<br />
<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte, quem sabe!), vão da ânsia pela bebida à sem‑<br />
‑vergonhice que domina a política do país.<br />
A maneira direta <strong>de</strong> afirmar, sem papas na língua,<br />
como se dizia nos velhos tempos, fez <strong>de</strong> Fausto Wolff uma<br />
espécie <strong>de</strong> escritor maldito, olhado meio <strong>de</strong> lado pelos bem‑<br />
‑pensantes, talvez aqueles que as suas farpas podiam atin‑<br />
gir. A repulsa <strong>de</strong> tal gente é quase uma consagração. Por<br />
outro lado, os que po<strong>de</strong>m olhar a vida e os fatos <strong>de</strong> frente,<br />
sem temores, gostam <strong>de</strong>ssa maneira ru<strong>de</strong>, agressiva, sob a<br />
qual flui, quase imperceptível, uma intensa pieda<strong>de</strong> pelas<br />
fragilida<strong>de</strong>s e podridões do ser humano.<br />
Essa característica marca toda a sua obra <strong>de</strong> ficcionista<br />
espontâneo, vá lá o termo, que escreve as suas histórias<br />
“<strong>de</strong>sor<strong>de</strong>nadamente, como elas se apresentam no sonho,<br />
sem futuro e sem passado, apenas no presente”, para usar<br />
as suas próprias palavras. Um presente representado com<br />
um certo espírito picaresco, bem em sintonia com a huma‑<br />
nida<strong>de</strong> com a qual <strong>mais</strong> se i<strong>de</strong>ntifica: “os excluídos, os hu‑<br />
milhados e ofendidos, os que não aceitam a hipocrisia e a<br />
mentira, os que se revoltam”, como observa André Seffrin<br />
no prefácio aos Melhores contos Fausto Wolff.<br />
Reunindo nove histórias curtas, o livro constitui uma<br />
excelente introdução (para os não iniciados) ao universo <strong>de</strong><br />
Fausto Wolff. Vale a pena conhecê ‑lo, para se encantar ou<br />
se chocar, amá ‑lo ou <strong>de</strong>testá ‑lo. Em suma, tomar uma ati‑<br />
tu<strong>de</strong> radical, como é <strong>de</strong> gosto do autor. O importante é que<br />
ninguém sai <strong>de</strong> suas páginas como entrou.<br />
M e l h o r e s C o n t o s
HÉLIO PÓLVORA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
André Seffrin<br />
Hélio Pólvora (1928)<br />
Natural <strong>de</strong> Itabuna, BA<br />
1a edição – 288 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1593 ‑7<br />
Em <strong>mais</strong> <strong>de</strong> cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> literária, Hélio<br />
Pólvora construiu uma das obras <strong>mais</strong> sólidas da mo<strong>de</strong>rna<br />
literatura brasileira. Des<strong>de</strong> a sua estreia em 1958, com Os<br />
galos da aurora, o então jovem contista já mostrava quali‑<br />
da<strong>de</strong>s e características muito pessoais, <strong>de</strong>senvolvidas e am‑<br />
pliadas com o tempo e a experiência: o texto envolvente, a<br />
i<strong>de</strong>ntificação com a terra e a gente baiana, a imaginação<br />
fértil, a linguagem trabalhada com <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za artesanal, a<br />
dimensão lírica.<br />
Nessa longa trajetória, Pólvora cultivou a crítica, a crô‑<br />
nica, o romance, a poesia, o ensaio, mas foi no conto que<br />
<strong>de</strong>u o melhor <strong>de</strong> si mesmo. São <strong>de</strong>zesseis volumes <strong>de</strong> histó‑<br />
rias curtas, escritas e reescritas <strong>de</strong> forma obsessiva, na busca<br />
permanente da ilusória perfeição, assim como o fizeram seus<br />
mestres no gênero: Machado <strong>de</strong> Assis, Maupassant, Kathe‑<br />
rine Mansfield, Anton Tchekhov, William Faulkner.<br />
De cada um <strong>de</strong>les, Pólvora absorveu experiências e<br />
ricas sugestões, incorporadas à sua maneira personalíssima<br />
<strong>de</strong> materializar aos olhos do leitor o seu universo, formado<br />
por seres “medíocres, entediados, solitários, inúteis”, como<br />
ele mesmo <strong>de</strong>finiu, e que por isso mesmo atingem o leitor<br />
com o impacto <strong>de</strong> um direto no queixo.<br />
Melhores contos Hélio Pólvora reúne quinze trabalhos<br />
do escritor baiano, cobrindo um período <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta<br />
<strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse “contista extraordinário, que al‑<br />
cançou a estrada real da ficção contemporânea ao dispen‑<br />
sar ra<strong>mais</strong> e caminhos duvidosos e geralmente trilhados<br />
por legião <strong>de</strong> epígonos”, como assinala André Seffrin no<br />
prefácio, sendo capaz, como todo verda<strong>de</strong>iro ficcionista, <strong>de</strong><br />
dizer <strong>mais</strong> coisas do que se dizia antes <strong>de</strong>le. Uma prova <strong>de</strong><br />
que o conto mo<strong>de</strong>rno brasileiro continua repleto <strong>de</strong> vitali‑<br />
da<strong>de</strong>, enriquecendo a longa tradição que se inicia com<br />
Machado <strong>de</strong> Assis e passa por Guimarães Rosa.<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
HERBERTO SALES<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Judith Grossmann<br />
Herberto Sales (1917 ‑1999)<br />
Natural <strong>de</strong> Andaraí, BA<br />
3 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0<strong>39</strong>6 ‑8<br />
Herberto Sales estreou em 1944, com Cascalho, um<br />
romance imenso e violento, ambientado na <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nte re‑<br />
gião das lavras diamantíferas baianas. O sucesso do livro<br />
<strong>de</strong>cidiu o autor a <strong>de</strong>ixar o emprego na pequena cida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Andaraí e tentar a vida no Rio <strong>de</strong> Janeiro. Curiosa a história<br />
do romance, enviado a um concurso no Rio <strong>de</strong> Janeiro, sem<br />
ser premiado. Desalentado, Herberto rasgou os originais<br />
em sua posse, julgando ter <strong>de</strong>struído a obra. Um dos jura‑<br />
dos do concurso, porém, Aurélio Buarque <strong>de</strong> Holanda,<br />
havia guardado uma das cópias, interessado no abundante<br />
número <strong>de</strong> regionalismos, que serviu <strong>de</strong> base à edição do<br />
romance. Depois <strong>de</strong> um longo hiato, no qual publicou dois<br />
livros <strong>de</strong> ensaio, Herberto voltou à ficção, sua vocação au‑<br />
têntica, com o romance Além dos marimbus (1961). A par‑<br />
tir daí, não parou <strong>mais</strong>. O conto foi aventura da maturida<strong>de</strong>,<br />
quando o escritor (nascido em 1917) se achava em plena<br />
posse <strong>de</strong> seus recursos <strong>de</strong> expressão. As Histórias ordiná‑<br />
rias, lançadas em 1966, revelavam um excelente contador<br />
<strong>de</strong> histórias, <strong>de</strong>sses que não fazem cerimônia para pren<strong>de</strong>r<br />
o leitor, envolvê ‑lo na atmosfera <strong>de</strong> seus contos, torná ‑lo<br />
cúmplice e/ou testemunha da ação. Os temas variavam: um<br />
<strong>de</strong>licado mergulho na psicologia feminina, com alguma<br />
coisa <strong>de</strong> machadiano (“Os vigilantes”), uma espécie <strong>de</strong> sá‑<br />
tira às ambições do homem mo<strong>de</strong>rno (“O automóvel”), a<br />
análise <strong>de</strong> um momento <strong>de</strong> crise (“A carta”). Em 1970,<br />
Herberto Sales publicou dois volumes <strong>de</strong> contos, O lobiso‑<br />
mem, saborosas histórias fisgadas no folclore brasileiro, e<br />
Uma telha <strong>de</strong> menos, título significativo, síntese do espírito<br />
geral da obra, na qual todos os personagens são <strong>mais</strong> ou<br />
menos maníacos, presos a uma i<strong>de</strong>ia fixa. Seu último vo‑<br />
lume <strong>de</strong> contos, Armado cavaleiro o audaz motoqueiro<br />
(1980) apresenta a estranha fauna da socieda<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna,<br />
quase sempre também com uma telha a menos.<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
11
HERMILO BORBA<br />
FILHO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Silvio Roberto <strong>de</strong> Oliveira<br />
Hermilo Borba Filho (1917 ‑1976)<br />
Natural <strong>de</strong> Palmares, PE<br />
2 a edição – 176 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1619 ‑4<br />
Homem <strong>de</strong> teatro acima <strong>de</strong> tudo, ensaísta, autor <strong>de</strong> lite‑<br />
ratura infantil, pernambucano <strong>de</strong> quatro costados, impreg‑<br />
nado dos valores, das rebeldias e das irreverências do Nor<strong>de</strong>ste,<br />
Hermilo Borba Filho escreveu também uma fieira <strong>de</strong> contos<br />
saborosos, atrevidos, bocage<strong>anos</strong>, reunidos em três volumes.<br />
Histórias narradas numa linguagem <strong>de</strong> tirar o fôlego,<br />
em frases espichadas, uma cachoeira verbal ritmada pelas<br />
vírgulas, repleta <strong>de</strong> expressões do cotidiano, provérbios, ver‑<br />
sos, interjeições, trechos <strong>de</strong> cantigas, uma mistura harmo‑<br />
niosa em que ao popular se junta o clássico, numa espécie<br />
<strong>de</strong> contraponto, <strong>de</strong> fio <strong>de</strong> colar disciplinando e harmoni‑<br />
zando o fluxo verbal. Mordazes e <strong>de</strong>bochadas, apesar <strong>de</strong><br />
baseadas em fatos reais, colhidos na tradição familiar ou<br />
entre amigos, as histórias curtas <strong>de</strong> Hermilo <strong>de</strong>scambam<br />
com frequência para o fantástico, o absurdo, os exageros tão<br />
típicos do cor<strong>de</strong>l, mas sem <strong>de</strong>scartar a permanente nota <strong>de</strong><br />
bom humor. O bom humor persiste até nos momentos <strong>de</strong><br />
tragédia, como um toque <strong>de</strong> irreverência, criando um clima<br />
<strong>de</strong> patético, tal como ocorre nos contos “O palhaço” e “O<br />
general está pintando”. Ou se introduzindo em momentos<br />
quase surreais, como em “Lindalva” e “A roupa”. Em “O<br />
perfumista”, o humor corre em paralelo ao clima <strong>de</strong> real e<br />
fantástico, ao passo que em “O almirante”, ele se mistura à<br />
crítica <strong>de</strong> costumes, em “uma obra ‑prima <strong>de</strong> narrativa em<br />
curta ‑metragem”, como observa Silvio Roberto <strong>de</strong> Oliveira<br />
no prefácio aos Melhores contos Hermilo Borba Filho. O<br />
humor, <strong>de</strong> certa forma, serve também para tornar menos<br />
dolorosos (talvez até <strong>mais</strong> pungentes, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> do ponto <strong>de</strong><br />
vista) alguns aspectos <strong>de</strong> uma realida<strong>de</strong> áspera, dura, retra‑<br />
tada por Hermilo, sempre preocupado em <strong>de</strong>nunciar os ex‑<br />
cessos dos donos do mundo e os fardos do povo oprimido.<br />
Literatura <strong>de</strong> <strong>de</strong>núncia, por certo, mas redimida por um riso<br />
largo, amplo, rabelaisiano.<br />
12<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
IGNÁCIO DE LOyOLA<br />
BRANDÃO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Deonísio da Silva<br />
Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão (1936)<br />
Natural <strong>de</strong> Araraquara, SP<br />
5 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0286 ‑4<br />
Romancista <strong>de</strong> sucesso internacional, Ignácio <strong>de</strong><br />
Loyola Brandão é também um cultor exímio do conto. Essas<br />
histórias curtas – escritas em linguagem coloquial, sem<br />
complicações <strong>de</strong> estilo ou termos raros, <strong>de</strong> comunicação<br />
imediata com o leitor – complementam sua visão da socie‑<br />
da<strong>de</strong> contemporânea, expressa pelos romances. Mudam os<br />
gêneros, permanece a mesma inquietação do autor, a insa‑<br />
tisfação com certos aspectos da realida<strong>de</strong>, a rebeldia diante<br />
dos po<strong>de</strong>rosos, o incômodo com a situação caótica da ci‑<br />
da<strong>de</strong> (no caso, São Paulo), mas também a simpatia (por<br />
vezes com um fundo <strong>de</strong> cruelda<strong>de</strong>, um jogo sadomaso‑<br />
quista com o personagem) pelos sonhadores frustrados,<br />
quase sempre inofensivos, como no sarcástico “45 encon‑<br />
tros com a estrela Vera Fischer”.<br />
Simpatia e sarcasmo se aguçam ainda <strong>mais</strong> quando<br />
trata do sonhador erótico que às mulheres <strong>de</strong> carne e osso<br />
prefere as mulheres irresistíveis das revistas pornográficas<br />
(“Anúncios eróticos”). A fantasia <strong>mais</strong> forte do que a reali‑<br />
da<strong>de</strong>. A fantasia superando a realida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser uma sim‑<br />
ples opção erótica, mas, em dimensões artísticas, significa o<br />
ingresso no fantástico, tão da preferência do escritor.<br />
Vejam ‑se os contos “O homem que viu o lagarto comer seu<br />
filho” e “O homem cuja orelha cresceu”. Apólogos sem véu<br />
<strong>de</strong> alegoria <strong>de</strong> uma civilização em agonia? Ou <strong>de</strong> um país em<br />
crise? Talvez. Mas o autor sabe que a realida<strong>de</strong>, muitas vezes,<br />
po<strong>de</strong> ser <strong>mais</strong> fantástica, ou pelo menos <strong>mais</strong> contun<strong>de</strong>nte<br />
do que a imaginação. E muito <strong>mais</strong> cruel, como no “Retrato<br />
do jovem brigador”. Seja como for, a ficção <strong>de</strong> Ignácio <strong>de</strong><br />
Loyola traduz a realida<strong>de</strong> do homem brasileiro e a situação<br />
conflituosa da socieda<strong>de</strong> atual, a carência <strong>de</strong> valores, a im‑<br />
posição da violência, o <strong>de</strong>smoronamento das crenças, o<br />
vazio existencial, mas também a persistência dos sonhos<br />
com o futuro. Ainda restam algumas esperanças.<br />
M e l h o r e s C o n t o s
J. J. VEIGA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
J. A<strong>de</strong>raldo Castello<br />
J. J. Veiga (1915 ‑1999)<br />
Natural <strong>de</strong> Corumbá, GO<br />
4 a edição – 176 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0228 ‑9<br />
José J. Veiga foi um cidadão do mundo da fantasia<br />
plena, aquela região misteriosa on<strong>de</strong> os sonhos se introme‑<br />
tem na realida<strong>de</strong> e fenômenos estranhos saco<strong>de</strong>m os ali‑<br />
cerces da razão e zombam da lógica.<br />
A sua obra <strong>de</strong> ficcionista está povoada por fantasmas<br />
bonachões, nada fantasmagóricos (no sentido usual do<br />
termo), <strong>mais</strong> capazes <strong>de</strong> encantar do que assustar, objetos<br />
que se humanizam, mas também <strong>de</strong> casos <strong>de</strong> horror, mis‑<br />
tério, sobrenatural, estranhos, por vezes terríveis, quase<br />
sempre com um sentido <strong>de</strong> alegoria. Ou <strong>de</strong> parábola ka‑<br />
fkiana, como no conto “A máquina extraviada”, uma as‑<br />
sustadora reflexão sobre a falta <strong>de</strong> sentido da vida humana.<br />
Parábola, apólogo ou alegoria, surrealismo ou realismo má‑<br />
gico, a ficção <strong>de</strong> José J. Veiga é <strong>mais</strong> libertação do que<br />
evasão, libertação dos estreitos limites da realida<strong>de</strong> física,<br />
das impossibilida<strong>de</strong>s materiais, abertura ao onírico, à janela<br />
para o caos, aos apelos do <strong>de</strong>sconhecido, mas sempre con‑<br />
tida pelo senso crítico, a preocupação <strong>de</strong> não resvalar no<br />
extravagante pelo extravagante. Sob a nu<strong>de</strong>z forte da fan‑<br />
tasia, o escritor esten<strong>de</strong> o manto diáfano da inquietação<br />
com os <strong>de</strong>stinos e limites do ser humano e do simbolismo<br />
social. “A hora dos ruminantes” foi até interpretada como<br />
apólogo político, inspirado no movimento militar <strong>de</strong> 1964,<br />
o que o transformaria em autor engajado. Veiga negou<br />
com veemência, afirmando ter escrito a obra antes do fato.<br />
O que não a impediu <strong>de</strong> se ajustar à situação como uma<br />
luva. Mas nem tudo são símbolos ou apólogos. Há também<br />
contos extraídos da banal realida<strong>de</strong> do cotidiano, nos quais<br />
Veiga <strong>de</strong>monstra gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za em i<strong>de</strong>ntificar proble‑<br />
mas sociais (como em “Cachimbo”) ou recriar, com uma<br />
leveza e poesia que lembra Katherine Mansfield, um sim‑<br />
ples diálogo <strong>de</strong> crianças (“Diálogo da relativa gran<strong>de</strong>za”).<br />
O escritor sabia se movimentar em muitos terrenos.<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
JOÃO ALPHONSUS<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Afonso Henriques Neto<br />
João Alphonsus (1901 ‑1944)<br />
Natural <strong>de</strong> Conceição do Mato Dentro, MG<br />
1 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0694 ‑2<br />
João Alphonsus foi o contista <strong>mais</strong> original do mo<strong>de</strong>r‑<br />
nismo brasileiro. Dono <strong>de</strong> um estilo leve e envolvente,<br />
como uma boa prosa <strong>de</strong> mineiro, e <strong>de</strong> um humor suave, <strong>de</strong><br />
corrosão mínima, escreveu dois romances (Totônio Pacheco<br />
e Rola ‑Moça), poesias (apenas na mocida<strong>de</strong>) e alguns en‑<br />
saios, mas as suas preferências iam para a história curta.<br />
Em um <strong>de</strong>poimento <strong>de</strong> 1942, reproduzido por Afonso<br />
Henriques Neto no prefácio aos Melhores contos João Al‑<br />
phonsus, o autor admite que seus momentos <strong>mais</strong> plenos<br />
<strong>de</strong> realização literária “estão nos meus contos, gênero que<br />
me atrai e satisfaz quase que exclusivamente, tentador e<br />
difícil, mas tão compensador quando se consegue alguma<br />
coisa que nos pareça verda<strong>de</strong>iramente realizada”.Terceiro<br />
dos quinze filhos do poeta simbolista Alphonsus <strong>de</strong> Guima‑<br />
raens, João provou <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cedo o suave veneno da litera‑<br />
tura. Começando a escrever na adolescência, aos vinte<br />
<strong>anos</strong> já tinha um excelente domínio da arte <strong>de</strong> escrever. É<br />
<strong>de</strong>ssa época (1922), o seu primeiro conto digno <strong>de</strong>sse<br />
nome, “Pesca da baleia”, que serviu <strong>de</strong> título a seu se‑<br />
gundo livro no gênero, publicado em 1941. O primeiro,<br />
Galinha cega, havia saído <strong>de</strong>z <strong>anos</strong> antes. A obra do con‑<br />
tista – “doloroso como os russos” e “conciso como os fran‑<br />
ceses”, segundo José Lins do Rego –, foi completada com<br />
Eis a noite! (1943). No ano seguinte o escritor morreu, em<br />
Belo Horizonte, aos 43 <strong>anos</strong>. O que <strong>de</strong> imediato <strong>de</strong>sperta a<br />
atenção do leitor dos contos <strong>de</strong> João Alphonsus é a simpli‑<br />
cida<strong>de</strong>, a “sua cruel <strong>de</strong>smontagem do ridículo e da insatis‑<br />
fação pequeno ‑burguesa” (Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>),<br />
a recusa a qualquer efeito dramático proposital, daqueles<br />
que o escritor tira da manga para comover o leitor, e sua<br />
mal disfarçada pieda<strong>de</strong> por todos os seres vivos. Foi um<br />
gran<strong>de</strong> amigo dos ani<strong>mais</strong>, e suas histórias <strong>de</strong> bichos per‑<br />
manecem insuperáveis em nossa literatura.<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
13
JOÃO ANTÔNIO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Antônio Hohlfeldt<br />
João Antônio (1937 ‑1996)<br />
Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />
3 a edição – 216 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0335 ‑6<br />
Malandros, boêmios, jogadores <strong>de</strong> sinuca, marginaliza‑<br />
dos pelo sistema, gigolôs, prostitutas, punguistas, vigaristas,<br />
<strong>de</strong>dos ‑duros, leões <strong>de</strong> chácara, trombadinhas, <strong>de</strong>semprega‑<br />
dos, artistas <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ntes, proletários são os gran<strong>de</strong>s persona‑<br />
gens <strong>de</strong> João Antônio. Heróis sujos, <strong>de</strong>sesperançados,<br />
amargos, vivendo o dia a dia da cida<strong>de</strong> com a astúcia, o faro,<br />
o apetite pela sobrevivência das feras na selva.<br />
Mais que a lei da selva, é a lei do cão que rege esse<br />
mundo implacável, sem gran<strong>de</strong>za, duro, visto com curiosi‑<br />
da<strong>de</strong> por um escritor que registra a realida<strong>de</strong> como ela é,<br />
sem atenuantes, sem frases <strong>de</strong> efeito, sem falsos momen‑<br />
tos <strong>de</strong> ternura, no mau sentido da palavra, mas com uma<br />
viva e mal disfarçada simpatia. Simpatia, i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>, empa‑<br />
tia, pois, ao contrário <strong>de</strong> certos escritores <strong>de</strong> gabinete, João<br />
Antônio viveu o mundo <strong>de</strong> seus personagens, conviveu<br />
com mestres da sinuca e otários, sentiu a angústia do tra‑<br />
balhador sem dinheiro para o pão, presenciou a cruelda<strong>de</strong><br />
e a violência das ruas, as perseguições policiais, a passivi‑<br />
da<strong>de</strong> dos que aceitam a sua condição <strong>de</strong> lixo humano e a<br />
rebeldia dos revoltados. Daí vem a força <strong>de</strong> sua narrativa,<br />
expressa numa arte refinada, com um longínquo sabor<br />
clássico, <strong>de</strong> um clássico velhaco (como o chamou Jorge<br />
Amado), senhor <strong>de</strong> todos os segredos do conto, expres‑<br />
sando ‑se em uma linguagem inventiva, enriquecida pelo<br />
coloquial do submundo, habilmente incorporada ao fluxo<br />
da frase artística. Linguagem brasileira, inconfundível, <strong>de</strong><br />
um escritor i<strong>de</strong>ntificado com a sua terra, com o Brasil real,<br />
cruel e discriminador para tantos <strong>de</strong> seus filhos (“sou tão<br />
brasileiro, gosto daqui e não me ajeito a viver nas estran‑<br />
jas”), mas também cheio <strong>de</strong> vida, <strong>de</strong> picardias, <strong>de</strong> energia<br />
e vitalida<strong>de</strong>, que o escritor colhia como se colhe uma purís‑<br />
sima flor do lodo. Como disse o próprio João Antônio, “a<br />
vida não po<strong>de</strong> ser uma lata velha, enferrujada e triste”.<br />
14<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
JOÃO DO RIO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Helena Parente Cunha<br />
João do Rio (1881 ‑1921)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
2 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0248 ‑1<br />
Cínicos, <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ntes, provocadores, os contos <strong>de</strong> João do<br />
Rio refletem o momento <strong>de</strong> transformação do Rio <strong>de</strong> Janeiro,<br />
ao influxo das reformas <strong>de</strong> Pereira Passos, nas duas primeiras<br />
décadas do século XX. Sob as mãos firmes do gran<strong>de</strong> prefeito,<br />
a velha cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> traçado colonial, imunda, ia se transfor‑<br />
mando numa metrópole mo<strong>de</strong>rna, <strong>de</strong> ruas largas e limpas,<br />
cujo símbolo é a abertura da avenida Central. “O Rio civi‑<br />
liza ‑se” era a frase <strong>mais</strong> dita durante a belle époque.<br />
Na cida<strong>de</strong> iluminada a eletricida<strong>de</strong>, on<strong>de</strong> os primeiros<br />
automóveis <strong>de</strong>sfilavam na assustadora velocida<strong>de</strong> <strong>de</strong> 30<br />
km/h, melindrosas e almofadinhas se exibiam à porta das<br />
confeitarias e pela rua do Ouvidor. Surgiam os chamados<br />
vícios elegantes, como a cocaína, multiplicavam ‑se os bor‑<br />
déis e as casas para encontros amorosos clan<strong>de</strong>stinos. A<br />
febre <strong>de</strong> mundanismo, a “vida vertiginosa” dominava a ci‑<br />
da<strong>de</strong>. João do Rio foi o cronista admirável <strong>de</strong>sse universo,<br />
retratado também em reportagens escritas em estilo ágil e<br />
vibrante, que renovaram o jornalismo brasileiro, dando ao<br />
jovem escritor um extraordinário prestígio. Estreando na<br />
imprensa aos <strong>de</strong>zeseis <strong>anos</strong>, fez uma carreira brilhante, que<br />
<strong>de</strong>spertou invejas e o levou à Aca<strong>de</strong>mia Brasileira <strong>de</strong> Letras,<br />
aos 29 <strong>anos</strong>. Nesta época, publicou seu primeiro livro <strong>de</strong><br />
contos, Dentro da noite, uma espécie <strong>de</strong> síntese da obra do<br />
contista, interessado sobretudo nos aspectos patológicos<br />
da natureza humana, nas perversões, nos vícios, confessá‑<br />
veis ou inconfessáveis, e nas situações equívocas ou cho‑<br />
cantes, como vemos em trabalhos como “O bebê <strong>de</strong><br />
tarlatana rosa” e “D. Joaquina”. Como alguns dos maiores<br />
escritores da época, João do Rio abusava do estilo precioso,<br />
das frases <strong>de</strong> efeito, do brilho fácil, dos paradoxos a Oscar<br />
Wil<strong>de</strong>, que agradavam o público da época. Ao leitor <strong>de</strong><br />
hoje po<strong>de</strong>m parecer recursos artificiais, mas sem compro‑<br />
meter o prazer da leitura.<br />
M e l h o r e s C o n t o s
JOEL SILVEIRA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Lêdo Ivo<br />
Joel Silveira (1918 ‑2007)<br />
Natural <strong>de</strong> Aracaju, SE<br />
2 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1623 ‑1<br />
Um dos gran<strong>de</strong>s jornalistas da história da imprensa bra‑<br />
sileira, consi<strong>de</strong>rado o maior repórter <strong>de</strong> sua geração, Joel Sil‑<br />
veira recebeu <strong>de</strong> Manuel Ban<strong>de</strong>ira uma bela louvação: “Como<br />
repórter, não tem quem lhe leve vantagem: possui uma ma‑<br />
neira muito pessoal, pachorrenta, meio songa ‑monga, volun‑<br />
tariamente sem brilho literário – é o anti ‑João do Rio – e,<br />
apesar disso, ou antes por isso mesmo, maciamente perfu‑<br />
rante como uma punhalada que dói quando a ferida esfria”.<br />
Várias <strong>de</strong>ssas qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> repórter estão presentes<br />
nos contos <strong>de</strong> Joel Silveira, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sua rumorosa estreia<br />
com Onda raivosa (19<strong>39</strong>), quando o jovem jornalista <strong>de</strong> 21<br />
<strong>anos</strong>, recém ‑chegado <strong>de</strong> Sergipe, “assaltava as atalaias li‑<br />
terárias e jornalísticas da metrópole com o seu talento,<br />
ousadia e graça, e uma esplêndida e matinal belicosida<strong>de</strong>”,<br />
como informa Lêdo Ivo no prefácio aos Melhores contos<br />
Joel Silveira. A fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> ao jornalismo e à literatura se<br />
manteve a vida toda. O que servia <strong>de</strong> fonte a uma, servia<br />
também <strong>de</strong> inspiração a outra, como ocorre nas Histórias<br />
<strong>de</strong> pracinhas (1945), ocorridas com os soldados brasileiros<br />
que lutaram na Segunda Guerra Mundial (que o autor co‑<br />
briu como repórter) e nos vários volumes posteriores <strong>de</strong><br />
contos. A crítica i<strong>de</strong>ntificou na maneira <strong>de</strong> narrar do con‑<br />
tista, na preferência pelo episódio instantâneo ou pelo as‑<br />
pecto fugaz da vida cotidiana, semelhança com Katherine<br />
Mansfield. Os contos <strong>de</strong>ssa época eram registros <strong>de</strong> instan‑<br />
tes em que nada acontece, mas atravessados por sugestões<br />
e pressentimentos, seu verda<strong>de</strong>iro suporte. A evolução pos‑<br />
terior levou Joel Silveira a novos caminhos, mas preser‑<br />
vando a ironia e a graça do estilo. Em alguns momentos <strong>de</strong><br />
plena realização artística chega no que <strong>de</strong> melhor produziu<br />
o conto brasileiro, como em O dia em que o leão morreu,<br />
“pungente obra ‑prima que só costuma sair da pena avi‑<br />
sada dos clássicos!” (Lêdo Ivo).<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
LÊDO IVO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Afrânio Coutinho<br />
Lêdo Ivo (1924)<br />
Natural <strong>de</strong> Maceió, AL<br />
2 a edição – 144 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0<strong>39</strong>4 ‑1<br />
Poeta exuberante, ensaísta inquietador, tradutor <strong>de</strong><br />
alguns poetas intraduzíveis, como Rimbaud, seduzido eter‑<br />
namente pelas múltiplas aventuras do espírito, Lêdo Ivo<br />
acumula uma rica obra <strong>de</strong> ficção, na qual o conto ocupa<br />
um lugar à parte, seja pelo volume, mo<strong>de</strong>sto em relação ao<br />
número <strong>de</strong> romances, como pela qualida<strong>de</strong> dos trabalhos,<br />
a novida<strong>de</strong>, o domínio da técnica, a maestria da lingua‑<br />
gem. O contista não <strong>de</strong>smerece o poeta.<br />
Lêdo Ivo estreou no conto em 1957, com A cida<strong>de</strong> e os<br />
dias, volume que traz a indicação <strong>de</strong> reunir crônicas e histó‑<br />
rias. Na realida<strong>de</strong>, são contos autênticos, no sentido rigoroso<br />
do termo, e não segundo a classificação elástica <strong>de</strong> Mário <strong>de</strong><br />
Andra<strong>de</strong>, <strong>de</strong> que conto é tudo aquilo que o autor chama <strong>de</strong><br />
conto. Em 1961, publicou o segundo e último volume do<br />
gênero, intitulado Use a passagem subterrânea (1961). Con‑<br />
tista do cotidiano, as suas histórias curtas retratam a comé‑<br />
dia humana carioca, pequenos dramas insuspeitos (“O<br />
flautim”), casos <strong>de</strong> adultério sem remorso (“A viúva e o es‑<br />
tudante”), o <strong>de</strong>spertar da sexualida<strong>de</strong> (“Quando a fruta está<br />
madura”), com um certo <strong>de</strong>sencanto dos homens e da vida,<br />
mas com uma confiança <strong>de</strong>cidida no po<strong>de</strong>r purificador da<br />
poesia. O <strong>de</strong>salento com a humanida<strong>de</strong> alcança uma espécie<br />
<strong>de</strong> auge no belo “Natal carioca”, um breve apólogo <strong>de</strong><br />
sabor agridoce. Os personagens são empregadas domésticas<br />
em namoro com guardas municipais (“O amor em Grajaú”),<br />
aposentados, algumas crianças (a infância ocupa um lugar<br />
importante no mundo do ficcionista). A cida<strong>de</strong> do Rio <strong>de</strong><br />
Janeiro, on<strong>de</strong> a maioria dos contos se <strong>de</strong>senrola, é uma<br />
gran<strong>de</strong> presença e, como Machado <strong>de</strong> Assis, Lêdo Ivo regis‑<br />
tra com fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> os locais frequentados pelos personagens,<br />
a confeitaria do largo da Carioca, o teatro Carlos Gomes, e<br />
os meios <strong>de</strong> transporte, o bondinho sacolejante <strong>de</strong> Santa<br />
Teresa, os trens da Central, os ônibus congestionados.<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
15
LIMA BARRETO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Francisco <strong>de</strong> Assis Barbosa<br />
Lima Barreto (1881 ‑1922)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
8 a edição – 176 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0081 ‑0<br />
Lima Barreto morreu em novembro <strong>de</strong> 1922, em sua<br />
casa suburbana <strong>de</strong> Todos os Santos, no Rio <strong>de</strong> Janeiro,<br />
lendo a Revue <strong>de</strong>s Deux Mon<strong>de</strong>s. Tinha 41 <strong>anos</strong> e <strong>de</strong>ixava<br />
a obra <strong>de</strong> ficção <strong>mais</strong> importante da literatura brasileira,<br />
<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis. Sua morte, alguns meses <strong>de</strong>‑<br />
pois da Semana <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna, tem alguma coisa <strong>de</strong><br />
simbólica. É como uma espécie <strong>de</strong> retirada <strong>de</strong> cena <strong>de</strong> um<br />
Brasil arcaico, preso a valores em acelerado processo <strong>de</strong><br />
erosão, diante do fulgor <strong>de</strong> um novo mundo que ansiava<br />
por se manifestar, por bem ou à força. Alguma coisa <strong>de</strong>sse<br />
mundo em gestação já estava presente na obra <strong>de</strong> Lima<br />
Barreto: a simpatia pelos marginalizados, a revolta contra<br />
os preconceitos, a ânsia <strong>de</strong> <strong>de</strong>molição social que fez <strong>de</strong>le<br />
um precursor da própria Semana. No prefácio aos Melhores<br />
contos Lima Barreto, Francisco <strong>de</strong> Assis Barbosa lembra a<br />
analogia estabelecida por Otto Maria Carpeaux entre Lima<br />
e os escritores norte ‑americ<strong>anos</strong> da década <strong>de</strong> 1910, inicia‑<br />
dores <strong>de</strong> uma literatura <strong>de</strong> protesto chamada à época <strong>de</strong><br />
“remoção do lixo”. Afinida<strong>de</strong>s à parte, o ensaísta observa<br />
que nenhum dos escritores norte ‑americ<strong>anos</strong> citados –<br />
Upton Sinclair e Jack London – tinham o humor corrosivo<br />
do brasileiro e nem criaram uma obra tão humana como o<br />
Triste fim <strong>de</strong> Policarpo Quaresma. Sensibilida<strong>de</strong> humana,<br />
humor corrosivo, e uma mal disfarçada ternura pelos hu‑<br />
mil<strong>de</strong>s, os vencidos da vida, atirados nos subúrbios (“o su‑<br />
búrbio é o refúgio dos infelizes”, escreveu) assinalam também<br />
os contos <strong>de</strong> Lima. É neles que se realça ainda <strong>mais</strong> o espí‑<br />
rito <strong>de</strong> revolta do escritor, assim como sua permanente in‑<br />
veja dos ricos, sentimentos que se acham presentes em<br />
muitas <strong>de</strong> suas melhores histórias curtas (“O homem que<br />
sabia javanês”, “A biblioteca”, “Cló”, “A nova Califórnia”,<br />
“Clara dos Anjos”), obras ‑primas da literatura brasileira e<br />
universal.<br />
16<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
LUIZ VILELA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Wilson Martins<br />
Luiz Vilela (1942)<br />
Natural <strong>de</strong> Ituiutaba, MG<br />
3 a edição – 248 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0203 ‑1<br />
Tremor <strong>de</strong> terra (1967), o primeiro livro <strong>de</strong> Luiz Vilela,<br />
provocou um pequeno abalo sísmico entre os cultores do<br />
conto e os críticos brasileiros. O autor, então com 24 <strong>anos</strong>,<br />
<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> recusado por vários editores, publicou o livro por<br />
conta própria. Inscrito no Prêmio Nacional <strong>de</strong> Brasília, ob‑<br />
teve o primeiro lugar, superando 250 concorrentes, entre<br />
os quais vários escritores <strong>de</strong> prestígio nacional.<br />
Des<strong>de</strong> logo, Vilela foi apontado como a maior revela‑<br />
ção do conto no Brasil, <strong>de</strong>pois dos já consagrados Dalton<br />
Trevisan e Rubem Fonseca. Nos volumes seguintes, uma<br />
longa trajetória composta por <strong>mais</strong> <strong>de</strong> vinte volumes, a<br />
maioria <strong>de</strong> contos, impôs ‑se em <strong>de</strong>finitivo como um dos<br />
mestres do gênero. Partindo quase sempre <strong>de</strong> uma situa‑<br />
ção banal – uma conversa <strong>de</strong> bar, uma visita –, os contos<br />
<strong>de</strong> Vilela apresentam uma humanida<strong>de</strong> angustiada, solitá‑<br />
ria, amarga, frustrada, em busca <strong>de</strong>sesperada <strong>de</strong> um sen‑<br />
tido para a vida, mas incapazes <strong>de</strong> se comunicar com seus<br />
semelhantes. Os fatos se <strong>de</strong>senrolam com naturalida<strong>de</strong>,<br />
sem truques, em um clima <strong>de</strong> pessimismo, sordi<strong>de</strong>z, gro‑<br />
tesco e ridículo. Como <strong>de</strong>finiu Wilson Martins, no prefácio<br />
aos Melhores contos Luiz Vilela, as páginas <strong>de</strong> Vilela “têm<br />
a palpitação interna do conto, não po<strong>de</strong>riam ser outra<br />
coisa senão contos; é a arte das linhas simples e profundas,<br />
e das dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> execução; é bem a música <strong>de</strong> câ‑<br />
mara e não a sinfonia arranjada para instrumentos menos<br />
numerosos”. O volume <strong>de</strong> Melhores contos Luiz Vilela está<br />
composto por trinta trabalhos. Alguns <strong>de</strong>les consi<strong>de</strong>rados<br />
obras ‑primas da literatura brasileira: “Os sobreviventes”,<br />
“Bárbaro”, “Aprendizado”, “Françoise”, “Luz sobre a porta”,<br />
“Ousadia”, “Um peixe”, “Preocupações <strong>de</strong> uma velhinha”,<br />
que <strong>de</strong>vem permanecer ao lado do melhor produzido por<br />
seus contemporâneos, um Dalton Trevisan, um Rubem Fon‑<br />
seca. Que o leitor julgue por si mesmo.<br />
M e l h o r e s C o n t o s
LyGIA FAGUNDES<br />
TELLES<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Eduardo Portella<br />
Lygia Fagun<strong>de</strong>s Telles (1923)<br />
Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />
11 a edição – 176 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0336 ‑4<br />
Um dos nomes <strong>mais</strong> importantes da literatura brasi‑<br />
leira, mestre do romance, é no conto que Lygia Fagun<strong>de</strong>s<br />
Telles encontra seu <strong>mais</strong> autêntico meio <strong>de</strong> expressão e <strong>de</strong><br />
renovação. Cada um <strong>de</strong> seus livros revela uma nova Lygia,<br />
aberta à totalida<strong>de</strong> da vida, sempre interessada em novos<br />
mistérios, na busca permanente do <strong>mais</strong> intrigante <strong>de</strong><br />
todos eles, o mistério humano.<br />
Começando a escrever ainda adolescente (seu primeiro<br />
livro, repudiado pela autora, foi publicado quando ela tinha<br />
quinze <strong>anos</strong>), alcançou a maturida<strong>de</strong> intelectual com o ro‑<br />
mance Ciranda <strong>de</strong> pedra (1954) e, no conto, com as Histórias<br />
do <strong>de</strong>sencontro (1958), em que predomina uma atmos‑<br />
fera <strong>de</strong> angústia e frustração, que se repete com frequência<br />
em sua obra. A partir daí, publicou vários volumes <strong>de</strong> contos,<br />
nos quais se po<strong>de</strong> fisgar pelo menos uma meia dúzia <strong>de</strong><br />
obras ‑primas. Consagrada pela crítica nacional e internacio‑<br />
nal, comparada a monstros sagrados da literatura universal,<br />
uma Katherine Mansfield, uma Virginia Woolf, Lygia é uma<br />
perfeccionista incansável, escrevendo e reescrevendo inúme‑<br />
ras vezes seus trabalhos, em busca do completo <strong>de</strong>spoja‑<br />
mento, da nota exata que revele o íntimo <strong>de</strong> suas criaturas,<br />
os seus dilaceramentos, as suas inquietações, os seus impas‑<br />
ses diante da vida, aquela nota trágica tão característica <strong>de</strong><br />
sua arte. Escrever é cortar, dizia Marques Rebelo. Com o<br />
domínio da forma, disposta sempre a cortar, nunca a acres‑<br />
cer, Lygia chegou a criar uma sintaxe própria, eliminando os<br />
complementos óbvios da frase. Exemplo: “Filó, a gatinha<br />
correndo e berrando com aquele rabo aceso, uma antena”.<br />
Descartou ‑se <strong>de</strong> muito <strong>mais</strong>, <strong>de</strong> tudo que seja acessório,<br />
atraída pelo essencial, o texto perfeito do qual nada se po<strong>de</strong><br />
acrescentar ou suprimir, até alcançar aquela “clássica sereni‑<br />
da<strong>de</strong> das formas <strong>de</strong> arte <strong>de</strong>finitivas”, que o crítico Paulo<br />
Rónai i<strong>de</strong>ntificou em seus contos.<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
MACHADO DE ASSIS<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Domício Proença Filho<br />
Machado <strong>de</strong> Assis (18<strong>39</strong> ‑1908)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
16 a edição – 384 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1406 ‑0<br />
Uma seleção dos melhores contos <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis<br />
correspon<strong>de</strong> ao que <strong>de</strong> melhor se escreveu no gênero, em<br />
língua portuguesa. Maior escritor brasileiro, romancista cheio<br />
<strong>de</strong> artes e artimanhas, mestre da dubieda<strong>de</strong>, dando a enten‑<br />
<strong>de</strong>r, muitas vezes, o contrário do que quis dizer, conhecedor<br />
profundo da alma humana, o bruxo do Cosme Velho encon‑<br />
trou no conto um esplêndido terreno para suas bruxarias.<br />
Em quase meio século <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> no gênero, Ma‑<br />
chado <strong>de</strong>ixou 205 contos, entre os quais <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> obras‑<br />
‑primas, das melhores escritas em qualquer época e país,<br />
que o colocam como uma espécie <strong>de</strong> pico solitário da litera‑<br />
tura universal, ao lado <strong>de</strong> outros mestres do gênero, Tchecov,<br />
Maupassant, Katherine Mansfield, Jens Peter Jacobsen. No<br />
início <strong>de</strong> sua carreira, o escritor não <strong>de</strong>u muita importância<br />
ao gênero. O primeiro conto, publicado aos <strong>de</strong>zenove <strong>anos</strong>,<br />
chamava ‑se “Três tesouros perdidos”, e o segundo, “O país<br />
das quimeras” só saiu três <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois (em 1862). O exercí‑<br />
cio constante e persistente do gênero só se realiza após<br />
1864. Convidado a colaborar no Jornal das Famílias, as suas<br />
histórias agradam tanto as leitoras que cada número publica<br />
dois ou três trabalhos seus, obrigando ‑o a utilizar diversos<br />
pseudônimos. O pleno domínio do gênero coinci<strong>de</strong> com a<br />
gran<strong>de</strong> crise <strong>de</strong> sua vida, no fim da década <strong>de</strong> 1870, levando ‑o<br />
à <strong>de</strong>scrença, ao pessimismo e ao temor da loucura. É a<br />
época das Memórias póstumas <strong>de</strong> Brás Cubas e dos contos<br />
<strong>de</strong> Papéis avulsos (1882), marcados pela inquietação diante<br />
da condição humana, amargos, irônicos, sarcásticos, críticos<br />
impiedosos do bicho ‑homem, cheios <strong>de</strong> situações ambíguas,<br />
quando nada acontece, mas palpita uma riquíssima carga <strong>de</strong><br />
humanida<strong>de</strong>. Obras ‑primas do quilate <strong>de</strong> “Missa do galo”,<br />
“Uns braços”, “Dona Benedita”, e outros, on<strong>de</strong> a dificul‑<br />
da<strong>de</strong> é escolher o melhor do que, por sua condição, já figura<br />
entre o melhor dos melhores.<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
17
MARCOS REy<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Fábio Lucas<br />
Marcos Rey (1925 ‑1999)<br />
Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />
2 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0593 ‑8<br />
Marcos Rey é daqueles escritores que pren<strong>de</strong>m o leitor<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a primeira frase e só o libertam após o ponto ‑final.<br />
Her<strong>de</strong>iro dos gran<strong>de</strong>s autores <strong>de</strong> romances <strong>de</strong> aventura, com<br />
um gosto mal disfarçado, mas contido, pelo folhetinesco,<br />
sabe como dosar o suspense para manter o leitor sempre <strong>de</strong><br />
fôlego curto, ansioso para <strong>de</strong>svendar o mistério proposto.<br />
Mistério, no caso, nem sempre significa a resolução <strong>de</strong><br />
um enigma complicado, indispensável à salvação da vida do<br />
personagem. O mistério po<strong>de</strong> ser também psicológico, um<br />
daqueles grilos que levam as pessoas aos atos e às atitu<strong>de</strong>s<br />
<strong>mais</strong> estranhos. Uma inclinação in<strong>de</strong>finível, como ocorre no<br />
excelente conto “O locutor da madrugada”, que Fábio Lucas,<br />
no prefácio aos Melhores contos Marcos Rey, classifica, com<br />
razão, como machadiano: “Machadiano com maior liberda<strong>de</strong><br />
quanto à mise ‑en ‑scène”. Romancista, autor <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> qua‑<br />
renta títulos, que alcançaram uma vendagem superior a 5<br />
milhões <strong>de</strong> exemplares, Edmundo Donato (este seu nome ver‑<br />
da<strong>de</strong>iro, o outro é pseudônimo) escreveu <strong>de</strong> tudo um pouco.<br />
Foi redator <strong>de</strong> rádio, publicitário, redigiu roteiros para o ci‑<br />
nema e para a televisão. O conto foi paixão prematura. Antes<br />
mesmo <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r a ler, já vivia envolvido pela magia das<br />
histórias que seu pai lhe contava, à noite, entre goles <strong>de</strong> vinho<br />
branco. Deve ter sido aí que apren<strong>de</strong>u algumas das virtu<strong>de</strong>s<br />
capitais que distinguem os seus contos: o relato direto, obje‑<br />
tivo, sem preciosismos <strong>de</strong> estilo, num ritmo envolvente, tal e<br />
qual uma boa narrativa oral. Aos <strong>de</strong>zessete <strong>anos</strong> publicou o<br />
primeiro conto, em um jornal paulistano. Não parou <strong>mais</strong>,<br />
senhor <strong>de</strong> seu ofício e da arte <strong>de</strong> pren<strong>de</strong>r o leitor. Arte que<br />
começa pelas sugestões lançadas no título <strong>de</strong> seus livros e<br />
contos, <strong>de</strong> gosto popular e mo<strong>de</strong>rno. Confira ‑se: “O enterro<br />
da cafetina”, “Soy loco por ti, América!”, “O pêndulo da<br />
noite”, “O cão da meia ‑noite”, “Eu e meu Fusca”, “Mustang<br />
cor <strong>de</strong> sangue”. O resto fica por conta do talento.<br />
18<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
MARQUES REBELO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Ary Quintella<br />
Marques Rebelo (1907 ‑1973)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
4 a edição – 216 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0296 ‑1<br />
Her<strong>de</strong>iro da tradição carioca <strong>de</strong> Manuel Antônio <strong>de</strong><br />
Almeida, Machado <strong>de</strong> Assis e Lima Barreto, Marques Re‑<br />
belo recriou por meio da ficção, com muita mordacida<strong>de</strong> e<br />
algum lirismo, a vida da cida<strong>de</strong> nas décadas <strong>de</strong> 1930 e 1940.<br />
Depois <strong>de</strong>ssa fase, <strong>de</strong>dicou ‑se <strong>de</strong> preferência ao romance,<br />
escrevendo apenas três contos.<br />
Foi uma época rica em acontecimentos, assinalada por<br />
ditaduras, revoltas armadas, conflitos, perseguições políticas.<br />
A vida material se tornou <strong>mais</strong> complexa, multiplicaram ‑se os<br />
automóveis, a cida<strong>de</strong> cresceu, mas a vida humana continuou<br />
com as mesmas angústias e esperanças. A pequena burgue‑<br />
sia carioca, resi<strong>de</strong>nte na Zona Norte e nos subúrbios, <strong>de</strong> on<strong>de</strong><br />
o escritor extraía a maior parte dos personagens <strong>de</strong> seus con‑<br />
tos, penava com a dureza do cotidiano e do emprego mo‑<br />
<strong>de</strong>sto, acompanhava os programas <strong>de</strong> rádio (são inúmeros os<br />
contos em que os personagens ouvem rádio), esbaldava ‑se<br />
no Carnaval, frequentava cinemas nos fins <strong>de</strong> semana, torcia<br />
e sofria pelo seu time <strong>de</strong> futebol. Muitos viviam em casas <strong>de</strong><br />
pensão, abundantes na cida<strong>de</strong>. Os <strong>mais</strong> privilegiados dispu‑<br />
nham <strong>de</strong> vitrola ortofônica, on<strong>de</strong> ouviam os discos <strong>de</strong> Fran‑<br />
cisco Alves. As aspirações individuais eram mo<strong>de</strong>stas. Todos<br />
queriam <strong>mais</strong> ou menos a mesma coisa: mudar <strong>de</strong> vida, enri‑<br />
quecer, arranjar um(a) amante. Nessas vidas mo<strong>de</strong>stas e inco‑<br />
lores, o escritor encontra material para os seus admiráveis<br />
contos, escritos com arte refinada, em linguagem coloquial e<br />
diálogos vivos, reveladores da psicologia dos personagens.<br />
Escritos com implacável ironia, os contos <strong>de</strong> Rebelo são mar‑<br />
cados também por um permanente <strong>de</strong>sencanto, como se o<br />
escritor indagasse: vale a pena viver? Em raros momentos, a<br />
pieda<strong>de</strong> pelos <strong>de</strong>stinos frustrados estabelece uma inusitada<br />
atmosfera <strong>de</strong> simpatia humana. O lirismo só predomina<br />
quando a nostalgia domina o escritor, na evocação <strong>de</strong> episó‑<br />
dios da infância e da mocida<strong>de</strong>.<br />
M e l h o r e s C o n t o s
MOACyR SCLIAR<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Regina Zilbermann<br />
Moacyr Scliar (1937 ‑2011)<br />
Natural <strong>de</strong> Porto Alegre, RS<br />
6 a edição – 272 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0028 ‑5<br />
Quando o fantástico se junta ao humor o resultado é<br />
no mínimo insólito, surpreen<strong>de</strong>nte, inesperado, sobretudo<br />
se for o humor judaico levado ao extremo, autopunitivo, a<br />
meio caminho entre o <strong>de</strong>sespero e a ironia. Junte ‑se a isso,<br />
doses bem controladas <strong>de</strong> erotismo, <strong>de</strong> sagrado (e <strong>de</strong> uma<br />
permanente tentação <strong>de</strong> <strong>de</strong>ssacralização), uma certa joco‑<br />
sida<strong>de</strong>, e temos os principais ingredientes que compõem a<br />
arte do contista Moacyr Scliar. Essa simples mistura, evi<strong>de</strong>n‑<br />
temente, não basta para fazer um bom conto ou agradar<br />
o leitor. Isso <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> exclusivamente do talento do autor,<br />
da perícia com que controla a técnica do conto, <strong>de</strong> sua<br />
visão maliciosa do mundo, da eleição dos temas, <strong>de</strong> uma<br />
certa impieda<strong>de</strong> com que trata os personagens, em con‑<br />
traste com sua pieda<strong>de</strong> pela condição humana.<br />
A contradição é a primeira marca do humano. E o<br />
universo <strong>de</strong> Moacyr Scliar é povoado por seres hum<strong>anos</strong>,<br />
ou atormentados por sentimentos hum<strong>anos</strong>, sejam eles<br />
simples mortais, um anão que vive no interior <strong>de</strong> um apa‑<br />
relho <strong>de</strong> televisão ou um cadáver, <strong>de</strong>itado na mesa <strong>de</strong> um<br />
necrotério, que avalia e julga os alunos <strong>de</strong> Medicina que lhe<br />
retalham o corpo. Situação insólita <strong>mais</strong> realismo da <strong>de</strong>scri‑<br />
ção e o resultado é a mudança <strong>de</strong> perspectivas do conto, a<br />
sua sedimentação como apólogo ou parábola do mundo<br />
mo<strong>de</strong>rno. Claro, quando se fala dos dias atuais, a violência,<br />
a cruelda<strong>de</strong> do homem para o semelhante, a exacerbação<br />
do sexo, utilizado como elemento <strong>de</strong> dominação, têm <strong>de</strong><br />
estar presente. Outra gran<strong>de</strong> vertente da ficção <strong>de</strong> Scliar é a<br />
vida dos imigrantes ju<strong>de</strong>us, as dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> adaptação,<br />
a persistência em manter hábitos trazidos <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong>s<br />
muito diversas que, como observa Regina Zilbermann no<br />
prefácio, enfocadas com uma mal disfarçada ternura, cons‑<br />
tituem a forma <strong>mais</strong> aguda da arte <strong>de</strong> Scliar “assumir sua<br />
própria individualida<strong>de</strong> e significação”.<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
ORÍGENES LESSA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Glória Pondé<br />
Orígenes Lessa (1903 ‑1986)<br />
Natural <strong>de</strong> Lençóis Paulista, SP<br />
1 a edição – 288 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0855 ‑2<br />
Orígenes Lessa escreveu romances, reportagens, um<br />
curioso livro sobre técnica <strong>de</strong> vendas, uma abundante lite‑<br />
ratura infantojuvenil, tão importante para o povinho miúdo<br />
<strong>de</strong> nossa época quanto a obra <strong>de</strong> Monteiro Lobato, e al‑<br />
guns dos contos <strong>mais</strong> saborosos ja<strong>mais</strong> imaginados e publi‑<br />
cados no Brasil.<br />
Quem o lê pela primeira vez tem a impressão <strong>de</strong> que é<br />
fácil escrever histórias como as <strong>de</strong>le. Tão simples, tão huma‑<br />
nas, narradas em tom malicioso, levemente irônico, por<br />
vezes cruel. Impressão. A realida<strong>de</strong> é muito diferente. A cla‑<br />
reza, a espontaneida<strong>de</strong>, o estilo enxuto e objetivo, o domínio<br />
técnico, tão preciso que dá i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que nem existe técnica,<br />
nada têm a ver com aquela simplicida<strong>de</strong> sinônimo <strong>de</strong> po‑<br />
breza, e sim com a simplicida<strong>de</strong> das coisas naturais, resul‑<br />
tado <strong>de</strong> processos complexos, como a goiaba ou a manga<br />
madura pendurada no galho. Filho <strong>de</strong> um pastor protes‑<br />
tante, Orígenes já nasceu com tinta <strong>de</strong> escrever no sangue.<br />
O pai era um erudito, professor <strong>de</strong> Teologia, e autor <strong>de</strong> vários<br />
livros sobre temas históricos. Em sua missão <strong>de</strong> religioso,<br />
Vicente Themudo Lessa não esquentava lugar. Morou em<br />
Lençóis Paulista (on<strong>de</strong> o futuro escritor nasceu), em São<br />
Paulo, em São Luís do Maranhão, on<strong>de</strong> Orígenes começou<br />
a <strong>de</strong>senvolver seu talento <strong>de</strong> escritor. O primeiro trabalho foi<br />
escrito em caracteres gregos, copiados dos livros do pai. A<br />
estreia em livro se <strong>de</strong>u aos 26 <strong>anos</strong>, um volume <strong>de</strong> contos<br />
intitulado O escritor proibido (1929). A partir daí, não parou<br />
<strong>mais</strong>. Publicou <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> livros. Dez volumes <strong>de</strong> contos, nos<br />
quais explorou as <strong>mais</strong> extremas situações, do <strong>mais</strong> simples<br />
caso fisgado do cotidiano ao fantástico, sempre com um<br />
sentido <strong>de</strong> crítica, mas também <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> e simpatia<br />
humana. O que levou a prefaciadora dos Melhores contos<br />
Orígenes Lessa, Glória Pondé, a afirmar que “a literatura<br />
<strong>de</strong> Orígenes Lessa é, toda ela, <strong>de</strong> comunhão”.<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
19
OSMAN LINS<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Sandra Nitrini<br />
Osman Lins (1924 ‑1978)<br />
Natural <strong>de</strong> Pernambuco, PE<br />
1 a edição – 224 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0814 ‑5<br />
Quando lançou seu primeiro volume <strong>de</strong> contos, Osman<br />
Lins já era um romancista premiado. A precedência, no<br />
caso, explica a preferência. Ao longo <strong>de</strong> sua ativida<strong>de</strong> lite‑<br />
rária, o escritor publicou apenas dois livros <strong>de</strong> contos e<br />
cinco romances, i<strong>de</strong>ntificados pela mesma qualida<strong>de</strong> literá‑<br />
ria, pela busca obstinada pela perfeição formal, segundo a<br />
lição <strong>de</strong> Flaubert. Os gestos (1957) exigiu <strong>mais</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>z <strong>anos</strong><br />
<strong>de</strong> trabalho, o mesmo tempo consumido com Nove, no‑<br />
vena (1966). Escritor <strong>de</strong> formação clássica, Osman Lins se‑<br />
guiu em seu primeiro livro os mo<strong>de</strong>los da narrativa tradicional,<br />
na linhagem machadiana. Em frases curtas e estilo traba‑<br />
lhado, recheado <strong>de</strong> imagens, retrata uma humanida<strong>de</strong><br />
miúda, vivendo pequenos dramas no recinto doméstico,<br />
angustiada, dominada pelo sentimento da solidão e <strong>de</strong><br />
abandono, quase à margem da socieda<strong>de</strong>. Nove, novena<br />
assinala a transformação das narrativas <strong>de</strong> Osman Lins,<br />
uma novida<strong>de</strong> na literatura brasileira. Os contos se <strong>de</strong>sen‑<br />
volvem em vários pl<strong>anos</strong> <strong>de</strong> narração, em fragmentos,<br />
como se fossem módulos, nos quais se movem os persona‑<br />
gens, i<strong>de</strong>ntificados por sinais gráficos. Termos e constru‑<br />
ções barrocas se juntam a ornamentos <strong>de</strong> linguagem <strong>de</strong><br />
outras artes, como teatro, pintura, cinema. “A esses recur‑<br />
sos fun<strong>de</strong> ‑se o estilo preciso, belo, a<strong>de</strong>quado para cada<br />
caso, numa tessitura própria <strong>de</strong> poesia”, “mas distanciado<br />
do fácil consumo”, “exigindo uma leitura empenhada”,<br />
observa Sandra Nitrini no prefácio aos Melhores contos<br />
Osman Lins. Alguns <strong>de</strong>sses contos, classificados pelos críti‑<br />
cos como microrromances, alcançam gran<strong>de</strong> intensida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> expressão, como o “Retábulo <strong>de</strong> Santa Joana Carolina”,<br />
que, segundo José Paulo Paes, “enquadra o <strong>de</strong>stino hu‑<br />
mano numa perspectiva cosmogônica, à maneira dos mis‑<br />
térios medievais, em que se inspirou o escrito”. A crítica<br />
consi<strong>de</strong>ra ‑o a obra ‑prima do autor.<br />
20<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
RIBEIRO COUTO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Alberto Venancio Filho<br />
Ribeiro Couto (1898 ‑1963)<br />
Natural <strong>de</strong> Santos, SP<br />
1 a edição – 248 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0768 ‑8<br />
A maior parte dos contos <strong>de</strong> Ribeiro Couto foi escrita<br />
na mocida<strong>de</strong>, antes dos trinta <strong>anos</strong>, com títulos <strong>de</strong>liciosos<br />
e instigantes, que já dão uma i<strong>de</strong>ia do universo do escritor:<br />
“A casa do gato cinzento”, “O crime do estudante Ba‑<br />
tista”, “Baianinha e outras mulheres”. Depois <strong>de</strong> dobrar o<br />
cabo dos quarenta, publicou apenas um volume no gênero,<br />
Largo da matriz – Clube das esposas enganadas (1933) foi<br />
classificado pelo autor como novelas. A maturida<strong>de</strong>, porém,<br />
não alterou as características do escritor e nem tostou o<br />
frescor e a singeleza <strong>de</strong> suas histórias.<br />
Homem atento à riqueza do cotidiano, Ribeiro Couto<br />
<strong>de</strong>le extraiu o material <strong>de</strong> suas histórias, nas quais o rea‑<br />
lismo é atenuado pelo lirismo e pela nota poética. Em al‑<br />
guns <strong>de</strong> seus melhores contos há um mal disfarçado<br />
sentimentalismo, sem que essa tendência comprometa a<br />
alta qualida<strong>de</strong> dos trabalhos. Na velhice, ao prefaciar a an‑<br />
tologia Histórias da cida<strong>de</strong> gran<strong>de</strong>, Ribeiro Couto dividiu<br />
seus contos em três grupos, <strong>de</strong> acordo com os assuntos e<br />
os ambientes. As “histórias da cida<strong>de</strong> gran<strong>de</strong>” passam ‑se<br />
no Rio <strong>de</strong> Janeiro, quase sempre, abordam vidas em crise<br />
(“O crime do estudante Batista”, “O primeiro amor <strong>de</strong> An‑<br />
tônio Maria”) ou momentos <strong>de</strong> transgressão ao código <strong>de</strong><br />
bom comportamento burguês (“Uma noite <strong>de</strong> chuva ou<br />
Simão”, “Diletante <strong>de</strong> ambientes”), estes vistos pelo escri‑<br />
tor com um certo sarcasmo. Bem diversos são os tipos e<br />
episódios do ciclo <strong>de</strong> “histórias da cida<strong>de</strong> pequena”<br />
(“Baiano”, “Largo da Matriz”). Por último, as “histórias <strong>de</strong><br />
meninos” (“Bilu, Carolina e eu”), as <strong>mais</strong> caras ao escritor,<br />
nas quais há provavelmente uma origem autobiográfica.<br />
Situados em tempos e locais diversos, estes contos estão<br />
unidos pelo espírito e a técnica, a ternura, a ironia, a com‑<br />
preensão das fragilida<strong>de</strong>s humanas e um certo fundo dis‑<br />
creto, muito discreto, <strong>de</strong> <strong>de</strong>sencanto.<br />
M e l h o r e s C o n t o s
RICARDO RAMOS<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Bella Jozef<br />
Ricardo Ramos (1929 ‑1992)<br />
Natural <strong>de</strong> Palmeira dos Índios, AL<br />
2 a edição – 208 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0566 ‑2<br />
Em geral, os filhos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s escritores, quando re‑<br />
solvem escrever, se revelam medíocres. Ricardo Ramos,<br />
filho <strong>de</strong> Graciliano Ramos, é uma exceção. Des<strong>de</strong> sua es‑<br />
treia, em 1954, com os contos <strong>de</strong> Tempo <strong>de</strong> espera, mos‑<br />
trou um talento digno do pai.<br />
A escolha do gênero também não foi por acaso. Ao<br />
longo <strong>de</strong> quase quarenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> literária, o escritor<br />
sempre <strong>de</strong>u preferência ao conto, como veículo i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> ex‑<br />
pressão literária. Publicou romances, novelas, memórias, mas<br />
foi como contista que firmou seu nome, sem viver à sombra<br />
da glória paterna. Definindo a sua maneira <strong>de</strong> escrever con‑<br />
tos, Ricardo Ramos i<strong>de</strong>ntifica como elemento essencial “bus‑<br />
car um momento <strong>de</strong> emoção intensa e breve”, mas <strong>de</strong>spojado<br />
<strong>de</strong> qualquer elemento melodramático ou grandiloquente,<br />
pelos quais, aliás, revela repulsa. O i<strong>de</strong>al é captar aquele ins‑<br />
tante único com a precisão <strong>de</strong> um cirurgião, recriá ‑lo com a<br />
habilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um artesão e concluir com um <strong>de</strong>senlace ines‑<br />
perado, daqueles que saco<strong>de</strong>m o leitor, sem permitir qual‑<br />
quer disparida<strong>de</strong> entre forma e fundo. Claro que, diante <strong>de</strong>ssa<br />
exigência, linguagem e estilo são fundamentais. Alguns críti‑<br />
cos chegam a apontá ‑lo como um dos raros inovadores do<br />
estilo, na literatura mo<strong>de</strong>rna brasileira. Enxuto, preciso, por<br />
vezes ousado, como ao se utilizar dos clichês da linguagem<br />
publicitária para mostrar sua interferência no cotidiano do<br />
homem mo<strong>de</strong>rno (“Circuito fechado”). O homem mo<strong>de</strong>rno<br />
é o gran<strong>de</strong> personagem do escritor, com suas frustrações (“A<br />
mancha na sala <strong>de</strong> jantar”), a violência extrema, em “Matar<br />
um homem”, e no irônico “O policial do ano”, apresentado<br />
em forma <strong>de</strong> roteiro para televisão. Dessa forma, a obra <strong>de</strong><br />
Ricardo Ramos, como observou Bella Jozef, no prefácio aos<br />
Melhores contos Ricardo Ramos, “embora sem intenção do‑<br />
cumentária, forma em seu conjunto um rico testemunho da<br />
realida<strong>de</strong> brasileira”.<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
RUBEM BRAGA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Davi Arrigucci Jr.<br />
Rubem Braga (1913 ‑1990)<br />
Natural <strong>de</strong> Cachoeiro do Itapemirim, ES<br />
12 a edição – 208 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0133 ‑6<br />
Rubem Braga, o sabiá da crônica, o “poeta tão poeta<br />
que não precisa escrever versos” (Sérgio Milliet), “o pri‑<br />
meiro a elevar a crônica ao nível da <strong>mais</strong> alta categoria lite‑<br />
rária” (Antonio Candido e José A<strong>de</strong>raldo Castello), o lírico<br />
envolvente “cuja melhor performance ocorre sempre por<br />
escassez <strong>de</strong> assunto” (Manuel Ban<strong>de</strong>ira), “o mestre no <strong>de</strong>s‑<br />
cobrir o lado significativo dos acontecimentos <strong>mais</strong> triviais”<br />
(José Paulo Paes), gostava também <strong>de</strong> surpreen<strong>de</strong>r seus<br />
leitores com pequenos contos, poéticos, <strong>de</strong> alta categoria<br />
literária, líricos, quase sem assunto ou narrando aconteci‑<br />
mentos triviais.<br />
Nascido em Cachoeiro do Itapemirim, Espírito Santo,<br />
em 1913, Rubem Braga iniciou suas ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cronista em<br />
1932, no Diário da Tar<strong>de</strong>, do Rio <strong>de</strong> Janeiro. No jornalismo<br />
trabalhou em vários jornais, <strong>de</strong> Recife, do Rio <strong>de</strong> Janeiro, <strong>de</strong><br />
Belo Horizonte e <strong>de</strong> outras cida<strong>de</strong>s, ora redator, ora cronista,<br />
ou exercendo as duas funções. Durante o Estado Novo foi<br />
preso várias vezes. Em 19<strong>39</strong>, trabalhava em Porto Alegre<br />
quando foi encarcerado num navio. Cinco <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, <strong>de</strong>‑<br />
sembarcava na Itália, como correspon<strong>de</strong>nte do Diário Ca‑<br />
rioca, para cobrir a Segunda Guerra Mundial. Solicitado por<br />
jornais e revistas, viajou por boa parte do mundo, em parti‑<br />
cular a Europa e as Américas. Casou ‑se diversas vezes. Gos‑<br />
tava <strong>de</strong> passarinhos e <strong>de</strong> olhar o mar <strong>de</strong> sua cobertura em<br />
Ipanema, on<strong>de</strong> viveu os últimos <strong>anos</strong> <strong>de</strong> vida. Muitas <strong>de</strong>ssas<br />
experiências foram aproveitadas em crônicas e, eventual‑<br />
mente, serviram <strong>de</strong> motivos ou inspiração a contos como<br />
“Diário <strong>de</strong> um subversivo”, “Navegação da casa”, “Tuim<br />
criado no <strong>de</strong>do” e várias outras nas quais a velha arte <strong>de</strong><br />
contar histórias, como observa Davi Arrigucci Jr. no prefácio,<br />
guarda “algo <strong>de</strong> um outrora ainda <strong>mais</strong> distante, alguma<br />
coisa da atmosfera primitiva e mágica <strong>de</strong> um passado ances‑<br />
tral e da sabedoria oracular”.<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
21
SALIM MIGUEL<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Regina Dalcastagnè<br />
Salim Miguel (1924)<br />
Natural <strong>de</strong> Kfarsouroum, Líbano<br />
1 a edição – 224 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1378 ‑0<br />
Em sessenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> exercício da literatura, Salim Mi‑<br />
guel construiu uma obra sólida, das <strong>mais</strong> significativas da<br />
ficção brasileira mo<strong>de</strong>rna, formada por romances, ensaios,<br />
volumes <strong>de</strong> contos.<br />
Como contista, suas primeiras experiências foram publi‑<br />
cadas em Sul, revista que congregou os intelectuais catarinen‑<br />
ses, no início da década <strong>de</strong> 1950. Por essa época, ocorreu a<br />
estreia em livro, com Velhice e outros contos (1951), a que se<br />
seguiu, com breve intervalo, Alguma gente (1953). Salim Mi‑<br />
guel só voltaria ao gênero vinte <strong>anos</strong> <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, com mão<br />
experiente, já liberto <strong>de</strong> experimentalismos, senhor <strong>de</strong> todos<br />
os segredos do gênero, com O primeiro gosto (1973).<br />
Cada vez <strong>mais</strong> exigente com seu texto, trabalhando ‑o<br />
com a persistência <strong>de</strong> um Balzac (chega a reescrevê ‑lo até<br />
<strong>de</strong>z vezes), levaria <strong>mais</strong> quinze <strong>anos</strong> até publicar um novo<br />
volume <strong>de</strong> histórias curtas, As areias do tempo (1988), a<br />
que se seguiram As <strong>de</strong>squitadas <strong>de</strong> Florianópolis (1995) e<br />
Onze <strong>de</strong> Biguaçu <strong>mais</strong> um (1997).<br />
Melhores contos Salim Miguel reúne quinze histórias<br />
curtas, representativas das várias fases do autor e <strong>de</strong> sua<br />
visão <strong>de</strong> mundo, interligadas pela permanente inquietação<br />
<strong>de</strong> quem anseia pela verda<strong>de</strong>, parece que sem gran<strong>de</strong> es‑<br />
perança <strong>de</strong> encontrá ‑la.<br />
É um universo muito peculiar, formado por textos<br />
<strong>de</strong>nsos, dolorosos, nos quais a aventura humana é fixada<br />
com angústia e inquietação, e ao qual se tem acesso, em<br />
geral, através dos meandros da memória, na busca <strong>de</strong>ses‑<br />
perada <strong>de</strong> um porto firme, que talvez seja o autoconheci‑<br />
mento, o esclarecimento do mistério <strong>de</strong> si mesmo. Como<br />
observa Antonio Hohlfedt, “a arte do conto em Salim Mi‑<br />
guel é feita <strong>de</strong>sta inteligência da meia palavra, do jogo da<br />
aparência, tudo <strong>de</strong>stinado a chegar até a essência, ao<br />
miolo, ao que somos efetivamente: a terceira margem”.<br />
22<br />
M e l h o r e s C o n t o s<br />
SIMÕES LOPES NETO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Dionísio Toledo<br />
Simões L. Neto (1865 ‑1916)<br />
Natural <strong>de</strong> Pelotas, RS<br />
2 a edição – 144 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1624 ‑8<br />
Simões Lopes Neto passou a vida em Pelotas, sua ci‑<br />
da<strong>de</strong> natal. Era um escritor <strong>de</strong> estilo admirável, sabendo<br />
explorar e valorizar as nuanças da linguagem regional, sem<br />
comprometer a espontaneida<strong>de</strong> dos contadores <strong>de</strong> causos,<br />
aqueles peões que se reúnem nas estâncias gaúchas para<br />
contar casos mirabolantes e histórias reais exageradas até<br />
as raias do absurdo.<br />
Às qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> estilo e aos dons privilegiados <strong>de</strong> nar‑<br />
rador, juntava o escritor uma técnica apurada e um conheci‑<br />
mento profundo da psicologia do habitante dos pampas, os<br />
vaque<strong>anos</strong>, as chinocas, o cantador, o tropeiro, o contraban‑<br />
dista. Escolhendo o conto como elemento <strong>de</strong> expressão lite‑<br />
rária, Simões publicou dois volumes no gênero, os Contos<br />
gauchescos e as Lendas do Sul, respectivamente, em 1912 e<br />
1913, quando o movimento regionalista achava ‑se no auge,<br />
em todo o país. Os contos são narrados por um típico cam‑<br />
peiro, Blau Nunes, “que só tinha <strong>de</strong> seu um cavalo gordo, o<br />
facão afiado e as estradas reais”. Os dois livros, publicados<br />
numa editora da província, não tiveram o reconhecimento<br />
<strong>de</strong>vido no país. Não ultrapassaram as fronteiras do Rio<br />
Gran<strong>de</strong> do Sul, apesar <strong>de</strong> serem superiores, em vários aspec‑<br />
tos, à produção <strong>de</strong> Afonso Arinos e <strong>de</strong> Valdomiro Silveira, os<br />
outros dois gran<strong>de</strong>s representantes do conto regional. A in‑<br />
justiça só começou a ser reparada com a edição crítica das<br />
duas obras, com prefácio <strong>de</strong> Augusto Meyer, no início dos<br />
<strong>anos</strong> 1950, e a inclusão do autor na Prosa <strong>de</strong> ficção (<strong>de</strong> 1870<br />
a 1920), <strong>de</strong> Lúcia Miguel Pereira. A historiadora tornou ‑se<br />
gran<strong>de</strong> admiradora da arte <strong>de</strong> Simões, apontando ‑o como o<br />
“escritor que, como ninguém no Brasil, encontrou o segredo<br />
da arte popular”. Esse segredo está expresso em alguns con‑<br />
tos magistrais, como “O Negrinho do Pastoreio”, sua obra‑<br />
‑prima, “No manantial”, “A Salamanca do Jarau”, dos <strong>mais</strong><br />
perfeitos que já se escreveram no Brasil.<br />
M e l h o r e s C o n t o s
WALMIR AyALA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Maria da Glória Bordini<br />
Walmir Ayala (1933 ‑1991)<br />
Natural <strong>de</strong> Porto Alegre, RS<br />
1 a edição – 176 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1598 ‑2<br />
Poeta antes e acima <strong>de</strong> tudo, Walmir Ayala escreveu<br />
contos repletos <strong>de</strong> mistério, inquietação, <strong>de</strong>safio, angústia<br />
e... poesia. Po<strong>de</strong> ‑se dizer que a obra do contista foi uma<br />
continuação e uma complementação <strong>de</strong> sua mensagem<br />
poética, em busca <strong>de</strong> “uma verda<strong>de</strong> possível, uma beleza<br />
possível”, como ele mesmo <strong>de</strong>finia a sua escrita.<br />
Tendo estreado aos 22 <strong>anos</strong>, com um livro <strong>de</strong> poemas,<br />
Walmir Ayala publicou o seu primeiro livro <strong>de</strong> contos, Ponte<br />
sobre o rio escuro, em 1974, quando já tinha uma obra<br />
poética ampla, consolidada e respeitada, além <strong>de</strong> dois ro‑<br />
mances publicados. A recepção crítica foi excelente. Hélio<br />
Pólvora salientou a perspicácia do autor em injetar poesia,<br />
uma ampla poesia, nos contos, sem que sua prosa se trans‑<br />
formasse num “poema displaced”. Definindo o universo<br />
sombrio do autor, Sonia Coutinho sublinhou que a escuri‑<br />
dão tentadora seria “o componente central <strong>de</strong> seu livro,<br />
feito <strong>de</strong> realida<strong>de</strong>s <strong>mais</strong> sugeridas que reveladas, <strong>de</strong> enig‑<br />
mas que, propositadamente, não se <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong>cifrar”.<br />
O segundo volume <strong>de</strong> contos, O anoitecer <strong>de</strong> Vênus,<br />
saiu <strong>mais</strong> <strong>de</strong> vinte <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois da estreia no gênero, em<br />
1998, sete <strong>anos</strong> após a morte do autor, que o concluíra no<br />
final da década <strong>de</strong> 1970. O crítico Miguel Sanches Neto viu<br />
nele um “significativo acontecimento literário”. Lêdo Ivo<br />
salientou “a voz <strong>de</strong> emissário da sombra” presente no livro,<br />
concluindo ser “a aura do <strong>de</strong>samparo humano” o selo fic‑<br />
cional do autor, que “atinge o território da impieda<strong>de</strong>” em<br />
contos tão cruéis quanto os <strong>de</strong> Villiers <strong>de</strong> L’Isle ‑Adam.<br />
A impieda<strong>de</strong> e a cruelda<strong>de</strong> nascem da revolta do autor<br />
ante a intolerância e a hipocrisia social, po<strong>de</strong>ndo ser sinte‑<br />
tizada no conto que dá título ao volume, centralizado na<br />
fantasia <strong>de</strong> um jovem homossexual. É, em verda<strong>de</strong>, um<br />
conto cruel, mas que, como em toda obra <strong>de</strong> Ayala, revela<br />
uma terrível e angustiada busca da pureza perdida.<br />
NÉLIDA PIñON<br />
Nélida Piñon (1937) – Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
M e l h o r e s C o n t o s P r e l o<br />
23
C o l e ç ã o<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
DIREÇÃO<br />
EDLA VAN STEEN<br />
24<br />
A <strong>Global</strong> <strong>Editora</strong> reuniu nesta coleção <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 61<br />
clássicos da poesia brasileira e portuguesa: dos poe‑<br />
tas quinhentistas e seiscentistas, como Luís <strong>de</strong><br />
Camões e Gregório <strong>de</strong> Matos, a expoentes da litera‑<br />
tura atual. Nomes consagrados em diferentes esco‑<br />
las literárias foram selecionados e chegam ao público<br />
em coletâneas inéditas.<br />
Seguindo a linha da coleção Melhores Contos, carac‑<br />
terizam a coleção Melhores Poemas a cuidadosa se‑<br />
leção dos textos e o zelo pela fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> à produção<br />
original do autor.<br />
Biografia, bibliografia e estudos introdutórios sobre<br />
os poetas estão presentes em cada volume. Esta co‑<br />
leção, também dirigida pela escritora Edla van Steen,<br />
é uma iniciativa editorial que tem levado aos leitores,<br />
nesses <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 25 <strong>anos</strong> <strong>de</strong> existência, os melhores<br />
poemas dos gran<strong>de</strong>s poetas que marcaram a história<br />
da nossa literatura.
AFFONSO ROMANO<br />
DE SANT’ANNA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Miguel Sanches Neto<br />
Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna (1937)<br />
Natural <strong>de</strong> Belo Horizonte, MG<br />
5 a edição – 312 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1491 ‑6<br />
Des<strong>de</strong> seu primeiro livro <strong>de</strong> poemas, lançado em 1965,<br />
Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna se impôs como uma voz sin‑<br />
gular na poesia brasileira. Canto e palavra revelava um poeta<br />
<strong>de</strong> lirismo duro, pétreo, <strong>de</strong> olhos abertos para a vida, atento<br />
às sugestões e às inquietações do cotidiano, personalíssimo,<br />
com maturida<strong>de</strong> para buscar seu próprio caminho.<br />
Des<strong>de</strong> logo ficou claro que o caminho do poeta come‑<br />
çava, passava e terminava na busca do humano e na i<strong>de</strong>n‑<br />
tida<strong>de</strong> com o seu tempo <strong>de</strong> angústias e perplexida<strong>de</strong>s, sem<br />
excluir o lirismo amoroso nem se esquivar às preocupações<br />
com os mil e um transes e pesa<strong>de</strong>los diários vividos pelo<br />
país, então no auge do regime militar. A essa busca hu‑<br />
mana aliava ‑se a procura <strong>de</strong> sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> poética e <strong>de</strong><br />
novas perspectivas técnicas para seu ofício, expressa nos<br />
poemas reflexivos <strong>de</strong> Poesia sobre poesia, e que, <strong>de</strong> certa<br />
forma, se prolonga em A gran<strong>de</strong> fala do índio guarani.<br />
Aqui, começa a se impor a preocupação com o <strong>de</strong>stino do<br />
Brasil, a necessida<strong>de</strong> intrigante <strong>de</strong> entendê ‑lo e amá ‑lo,<br />
que culmina em Que país é este?, “livro provocado pelo<br />
espanto <strong>de</strong> coisas corriqueiras” (Donaldo Schüler). Com<br />
ele, Affonso ingressa no seleto grupo <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s poetas<br />
brasileiros. A crítica chegou a apontá ‑lo como “o gran<strong>de</strong><br />
poeta brasileiro que obscuramente esperávamos para a su‑<br />
cessão <strong>de</strong> Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>” (Wilson Mar‑<br />
tins). Depois <strong>de</strong> fixar os olhos em seu país, o poeta se volta<br />
para o mundo e o mistério do cosmos, que palpitam em A<br />
catedral <strong>de</strong> Colônia (1985), uma espécie <strong>de</strong> símbolo intem‑<br />
poral <strong>de</strong> beleza e perenida<strong>de</strong>, uma metáfora da história,<br />
em contraste com a brevida<strong>de</strong> da vida humana. Em seus<br />
últimos livros, o poeta revela crescente preocupação com a<br />
gran<strong>de</strong> incógnita da vida e da morte, pressentindo o amargo<br />
momento da partida: “uma quase tristeza/ <strong>de</strong> quem amando<br />
tudo isto/ teve que se retirar”.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
ALBERTO DA<br />
COSTA E SILVA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
André Seffrin<br />
Alberto da Costa e Silva (1931)<br />
Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />
1 a edição – 224 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1186 ‑1<br />
Quem imagina que a gran<strong>de</strong> poesia morreu, precisa<br />
ler com urgência Alberto da Costa e Silva: “Uma ausência<br />
<strong>de</strong> mim por mim se afirma./ E partindo <strong>de</strong> mim, na sombra<br />
sobre/ o chão que não foi meu, na relva simples/ o outro<br />
ser que sonhei se <strong>de</strong>ita e cisma”.<br />
Pertencendo cronologicamente à chamada Geração<br />
<strong>de</strong> 45, o poeta se integra, na realida<strong>de</strong>, àquela socieda<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> poetas autênticos que se colocam por vonta<strong>de</strong> própria<br />
à margem (e acima) das modas efêmeras, i<strong>de</strong>ntificados<br />
com a velha tradição da poesia oci<strong>de</strong>ntal, que se alonga <strong>de</strong><br />
Homero a Rilke, <strong>de</strong> Goethe a Drummond, <strong>de</strong> Camões a<br />
Fernando Pessoa. Isso significa uma ampla abertura espiri‑<br />
tual, mas também uma série <strong>de</strong> exigências que o poeta<br />
Costa e Silva, pondo <strong>de</strong> lado a pressa e a ânsia <strong>de</strong> glória,<br />
cultiva com zelo e paciência, para atingir a forma <strong>de</strong>purada<br />
que lhe caracteriza a poesia, essencialmente lírica, na qual<br />
o velho e eterno soneto ocupa um lugar <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque.<br />
“A sua obra é uma vitória permanente da cultura<br />
sobre a natureza, ou da exigência sobre a facilida<strong>de</strong>”, con‑<br />
forme acentuou Antonio Carlos Villaça. Mas é também,<br />
como toda poesia autêntica, inquieta e perplexa perante o<br />
mistério da vida. O poeta se angustia e reage com uma<br />
preocupação quase obsessiva diante da morte e do tempo<br />
(“o eterno é agora e em si mesmo morre”), uma forte nos‑<br />
talgia da infância (“Vou pedir a meu pai/ que me esqueça<br />
menino”), mas também uma permanente sedução e reve‑<br />
rência pelo amor, sem cerrar os olhos à beleza do mundo,<br />
ao jogo da “luz numa caixa <strong>de</strong> laranjas/ ou a chuva sobre a<br />
mesa <strong>de</strong> verduras no mercado”. É que o poeta sabe que<br />
verda<strong>de</strong> não há, mas múltiplas verda<strong>de</strong>s e que a poesia é<br />
esquiva. É preciso fisgá ‑la no momento <strong>de</strong> sua eclosão: “a<br />
vida canta baixinho/ e, quando grita,/ <strong>de</strong>satam ‑se <strong>de</strong> nós o<br />
sonho e o êxtase”.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
25
ALBERTO DE OLIVEIRA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Sânzio <strong>de</strong> Azevedo<br />
Alberto <strong>de</strong> Oliveira (1857 ‑1937)<br />
Natural <strong>de</strong> Palmital <strong>de</strong> Saquarema, RJ<br />
1 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1232 ‑5<br />
Coedição ABL<br />
Há muito tempo, Alberto <strong>de</strong> Oliveira merecia uma edi‑<br />
ção como essa dos Melhores poemas Alberto <strong>de</strong> Oliveira.<br />
Em vida, o poeta foi coberto <strong>de</strong> glórias, reverenciado, colo‑<br />
cado no panteão dos <strong>de</strong>uses da poesia brasileira, formando,<br />
ao lado <strong>de</strong> Olavo Bilac e Raimundo Correa, a famosa trin‑<br />
da<strong>de</strong> parnasiana.<br />
Mais tar<strong>de</strong>, com a eclosão do Mo<strong>de</strong>rnismo, a visão <strong>de</strong><br />
sua obra foi distorcida, vítima do preconceito e da pressa dos<br />
jovens mo<strong>de</strong>rnistas em se afirmarem, muitas vezes, à custa<br />
<strong>de</strong> prestígio <strong>de</strong> seus antecessores. Con<strong>de</strong>nar ao limbo o que<br />
antes fora admirado rendia então prestígio e uma aura <strong>de</strong><br />
gênio. Dessa forma, todo o movimento parnasiano foi arre‑<br />
messado ao inferno, como exemplo a não ser imitado, “es‑<br />
tigmatizado por não ser o que ele não se propôs a ser”,<br />
conforme a observação <strong>de</strong> Antonio Carlos Secchin.<br />
Apontado como o seguidor <strong>mais</strong> fiel do cânon parna‑<br />
siano, “o parnasiano em regra, extremado, completo, radi‑<br />
cal”, segundo Silvio Romero, Alberto <strong>de</strong> Oliveira começou,<br />
ainda em vida, a ser vítima <strong>de</strong> equívocos da crítica, apon‑<br />
tado como um poeta que teria sacrificado a expressão <strong>de</strong><br />
seus sentimentos, impassível e frio como aquele “Vaso<br />
Grego” <strong>de</strong> um <strong>de</strong> seus <strong>mais</strong> conhecidos poemas. Meros<br />
equívocos, como alerta Sânzio <strong>de</strong> Azevedo no prefácio.<br />
Poeta abundante, gran<strong>de</strong> sonetista (gran<strong>de</strong> na quanti‑<br />
da<strong>de</strong> e na qualida<strong>de</strong>), Alberto <strong>de</strong> Oliveira foi um parnasiano<br />
consciente e aplicado, mas também um lírico transbordante,<br />
<strong>de</strong> sensibilida<strong>de</strong> romântica represada e disciplinada, e <strong>de</strong> um<br />
erotismo contun<strong>de</strong>nte, durante muito tempo ignorado pela<br />
crítica, que legou à literatura brasileira um feixe <strong>de</strong> belos<br />
poemas (“A cigarra da chácara”, “Maré <strong>de</strong> equinócio” e<br />
“Num trem <strong>de</strong> subúrbio”, entre outros), que merecem ser<br />
lembrados enquanto houver amantes da poesia.<br />
26<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
ALMEIDA GARRETT<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Izabela Leal<br />
Almeida Garrett (1799 ‑1854)<br />
Natural do Porto, Portugal<br />
1 a edição – 120 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1594 ‑4<br />
Machado <strong>de</strong> Assis dizia que Almeida Garrett “só por<br />
si valia uma literatura”. E que literatura! Poeta, romancista,<br />
teatrólogo, folclorista, ensaísta, tudo que escreveu foi com<br />
mão <strong>de</strong> mestre e leveza <strong>de</strong> pluma. Romântico i<strong>de</strong>ntificado<br />
com o gosto popular, filtrou a lição dos clássicos criando<br />
um estilo admirável, tão admirável que influenciou Ma‑<br />
chado <strong>de</strong> Assis.<br />
Nascido no Porto, em 1799, morreu em Lisboa, em<br />
1854. Viveu e escreveu em pleno <strong>de</strong>lírio romântico, uma das<br />
fases <strong>mais</strong> ricas da literatura lusa. Como poeta, como se<br />
po<strong>de</strong> comprovar nesta obra, foi <strong>de</strong> um lirismo apaixonado e<br />
<strong>de</strong> um erotismo ar<strong>de</strong>nte, talvez um tanto sádico, escandali‑<br />
zando a conservadora socieda<strong>de</strong> portuguesa. Hoje, passado<br />
<strong>mais</strong> <strong>de</strong> século e meio, os seus poemas não escandalizam<br />
<strong>mais</strong> ninguém, mas mantêm o mesmo frescor, a mesma<br />
graça, o mesmo encanto <strong>de</strong> quando foram escritos. Veja ‑se<br />
em “Não te amo” a audácia com que o poeta se dirige à<br />
amante dizendo não a amar e <strong>de</strong>sejar somente o prazer que<br />
ela po<strong>de</strong> oferecer: “Ai! não te amo, não; e só te quero/ De<br />
um querer bruto e fero/ Que o sangue me <strong>de</strong>vora,/ Não<br />
chega ao coração.”. Amante vulcânico, Garrett foi também,<br />
como bom romântico, i<strong>de</strong>ntificado com a natureza, que li‑<br />
sonjeia em “Coquete dos prados”, on<strong>de</strong> trata do velho tema<br />
da beleza da rosa. A varieda<strong>de</strong> é gran<strong>de</strong>. O poeta aborda<br />
inúmeros temas românticos, sempre numa interpretação<br />
pessoal e apaixonante.<br />
Um dos que melhor <strong>de</strong>finiram a lírica <strong>de</strong> Garrett foi seu<br />
conterrâneo José Augusto França, ao observar que os seus<br />
poemas “caíam como pedras nas águas tranquilas da poesia<br />
romântica nacional, toda voltada para o céu <strong>de</strong> Chateau‑<br />
briand ou para o passado das tradições populares”, levando o<br />
gran<strong>de</strong> Alexandre Herculano “a dizer que seriam suficientes<br />
para fazer perdoar tudo ao autor”. Discordar quem há <strong>de</strong>?<br />
M e l h o r e s P o e M a s
ALPHONSUS DE<br />
GUIMARAENS<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens Filho<br />
Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens (1870 ‑1921)<br />
Natural <strong>de</strong> Ouro Preto, MG<br />
4 a edição – 176 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0338 ‑0<br />
Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens com a sua poesia mística, seu<br />
companheirismo com Deus (“Ninguém anda com Deus <strong>mais</strong><br />
do que eu ando”), sua intimida<strong>de</strong> com a morte (“Sempre vivi<br />
com a morte <strong>de</strong>ntro da alma,/ sempre tacteei nas trevas <strong>de</strong> um<br />
jazigo”), seus amores meio irreais e mórbidos, sua <strong>de</strong>voção a<br />
Nossa Senhora e sua humilda<strong>de</strong> foi uma espécie <strong>de</strong> aprendiz<br />
<strong>de</strong> santo perdido nas montanhas das Gerais.<br />
Habitando velhas cida<strong>de</strong>s mineiras – Ouro Preto, Con‑<br />
ceição do Serro, Mariana –, vivia <strong>de</strong> fato em outra dimen‑<br />
são, um mundo pessoal com incertas conexões com a<br />
realida<strong>de</strong> terrena, expresso com extrema <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za em sua<br />
poesia crepuscular, <strong>de</strong> contornos vagos, com uma suave<br />
música em surdina, patética como um cantochão, ilumi‑<br />
nada pela suave luz do luar, uma das obsessões do poeta,<br />
“o luar, que só para quem sofre existe”. Que ninguém du‑<br />
vi<strong>de</strong> da sincerida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa poesia. Se o Simbolismo não exis‑<br />
tisse, o poeta por certo encontraria uma expressão<br />
semelhante. A fonte estava em sua própria vida cotidiana.<br />
Vivendo sempre em pequenas cida<strong>de</strong>s, sem contatos inte‑<br />
lectuais, tão estimulantes para o escritor, Alphonsus fez da<br />
poesia elemento <strong>de</strong> comunhão e evasão. As duas corriam<br />
em paralelo. A evasão do mundo (que começava em seu<br />
nome literário arcaizado e latinizado), o enclausuramento<br />
em seu mosteiro i<strong>de</strong>al, a exemplo <strong>de</strong> tantos místicos, foi o<br />
caminho <strong>mais</strong> curto – ou talvez o único possível – para a<br />
comunhão com Deus pela fé católica, tão po<strong>de</strong>rosa em sua<br />
obra. Afonso Henriques da Costa Guimarães nasceu em<br />
Ouro Preto, em 1871, cursou a Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Direito <strong>de</strong> São<br />
Paulo, exerceu cargos na magistratura mineira, mas foi<br />
acima <strong>de</strong> tudo poeta. Até a morte, em 1921, quando li‑<br />
berto do peso da matéria, a sua alma, como ele expressou,<br />
tão lindamente, tornou ‑se “trigo <strong>de</strong> Deus no céu aberto”.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
ALPHONSUS DE<br />
GUIMARAENS FILHO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Afonso Henriques Neto<br />
Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens Filho (1918 ‑2008)<br />
Natural <strong>de</strong> Mariana, MG<br />
1 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1326 ‑1<br />
Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens Filho traz a literatura no<br />
sangue, her<strong>de</strong>iro <strong>de</strong> uma tradição literária que remonta a<br />
Bernardo Guimarães (seu avô), o autor <strong>de</strong> A escrava Isaura,<br />
e a Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens (seu pai). Poeta acima <strong>de</strong><br />
tudo, buscando <strong>de</strong> forma incansável a beleza pura, a poe‑<br />
sia sem mácula, o que, <strong>de</strong> certa maneira, o título <strong>de</strong> seu<br />
primeiro livro indica e <strong>de</strong>fine: Lume <strong>de</strong> estrelas.<br />
A partir daí, década <strong>de</strong> 1940, Alphonsus construiu<br />
uma longa e elaborada obra poética, das <strong>mais</strong> importantes<br />
do lirismo brasileiro, na qual o temperamento romântico e<br />
as sugestões simbolistas, associadas a um certo gosto pela<br />
metafísica, foram se <strong>de</strong>purando numa dicção cada vez <strong>mais</strong><br />
pessoal e pura. Como todo escritor autêntico, o poeta foi<br />
localizando seu mundo peculiar, <strong>de</strong>ntro do imenso universo<br />
poético, à medida que via e analisava a sua própria imagem<br />
naquilo que escrevia. Poesia como exercício <strong>de</strong> autoanálise,<br />
mas também <strong>de</strong> infinitas sugestões e aberturas para o<br />
mundo externo, pois, como adverte o poeta, “nenhuma<br />
poesia se faz <strong>de</strong> matéria abstrata”.<br />
Descobertas e rupturas se suce<strong>de</strong>ram em <strong>mais</strong> <strong>de</strong> ses‑<br />
senta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> exercício poético. De caráter permanente foi<br />
a adoção do soneto como uma <strong>de</strong> suas formas preferidas<br />
<strong>de</strong> expressão. Não é, pois, sem razão, que é consi<strong>de</strong>rado<br />
um dos maiores sonetistas da língua. No <strong>mais</strong>, a busca per‑<br />
manente pela renovação, em fases sucessivas, a <strong>de</strong> expres‑<br />
são católica, sob influência ou sugestão <strong>de</strong> Jorge <strong>de</strong> Lima e<br />
Murilo Men<strong>de</strong>s, como a <strong>de</strong>scoberta da gran<strong>de</strong> poesia espa‑<br />
nhola, soldadas pela mesma obsessão: a procura <strong>de</strong> sua<br />
própria e implacável imagem, que é também uma das bus‑<br />
cas permanentes da poesia.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
27
ALVARENGA PEIxOTO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Antonio Arnoni Prado<br />
Alvarenga Peixoto (1743 ‑1791)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
1 a edição – 128 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0780 ‑7<br />
As opiniões sobre a escassa obra poética <strong>de</strong> Alvarenga<br />
Peixoto são divergentes. Menos contraditórias são as infor‑<br />
mações sobre sua vida. Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, Inácio<br />
José <strong>de</strong> Alvarenga Peixoto formou ‑se em leis pela Universi‑<br />
da<strong>de</strong> <strong>de</strong> Coimbra. Em Portugal, ocupou importantes cargos<br />
na magistratura. Ao voltar à cida<strong>de</strong> natal foi festivamente<br />
recebido pelo vice ‑rei, marquês <strong>de</strong> Lavradio, mas preferiu<br />
partir para Minas Gerais, fixando ‑se em São João <strong>de</strong>l ‑Rei.<br />
Ali trocou a advocacia pelos trabalhos <strong>de</strong> mineração,<br />
casou ‑se com Bárbara Heliodora, também poeta (autora do<br />
belo poema “Conselhos a meus filhos”) e fez imensa for‑<br />
tuna. Era o <strong>mais</strong> rico dos inconfi<strong>de</strong>ntes, mas, segundo al‑<br />
guns historiadores, um homem <strong>de</strong> caráter leviano, que teria<br />
se engajado na Inconfidência Mineira apenas como uma<br />
forma <strong>de</strong> se livrar <strong>de</strong> suas imensas dívidas. Preso, durante<br />
os interrogatórios <strong>de</strong>nunciou os companheiros. Há certo<br />
exagero nessas acusações, pois muitos inconfi<strong>de</strong>ntes ti‑<br />
nham dívidas com o fisco. Peixoto não foi exceção. Da mesma<br />
forma, diante do aparato repressor, com exceção <strong>de</strong> Tira‑<br />
<strong>de</strong>ntes, todos fraquejaram e <strong>de</strong>nunciaram os amigos.<br />
Como poeta, Peixoto foi acusado, com a mesma intolerân‑<br />
cia, <strong>de</strong> ser um versejador correto e frio e uma espécie <strong>de</strong><br />
profissional da lisonja. De fato, quase toda a sua obra co‑<br />
nhecida até certa época é dirigida aos po<strong>de</strong>rosos do dia. Da<br />
mediocrida<strong>de</strong> geral, os historiadores salvavam apenas o<br />
“Canto genetlíaco”, em razão <strong>de</strong> suas i<strong>de</strong>ias nativistas. Em<br />
1956, Domingos Carvalho da Silva reavaliou a obra <strong>de</strong> Pei‑<br />
xoto, encontrando nela “o lirismo e a espontaneida<strong>de</strong> dos<br />
verda<strong>de</strong>iros poetas”. Três <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, a <strong>de</strong>scoberta <strong>de</strong><br />
cinco sonetos, mostrou um poeta à altura do que <strong>de</strong> me‑<br />
lhor haviam produzido os contemporâneos, segundo opi‑<br />
nião da crítica. De certa forma, foi o renascimento do poeta.<br />
O <strong>de</strong>bate continua aberto.<br />
28<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
ÁLVARES DE AZEVEDO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Antonio Candido<br />
Álvares <strong>de</strong> Azevedo (1831 ‑1852)<br />
Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />
6 a edição – 208 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0022 ‑5<br />
Álvares <strong>de</strong> Azevedo <strong>de</strong>ixou entre os seus contemporâ‑<br />
neos a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> um gênio, cuja morte prematura, aos vinte<br />
<strong>anos</strong> <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, impediu a plena realização <strong>de</strong> suas possibi‑<br />
lida<strong>de</strong>s. Quase um século <strong>de</strong>pois, Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> voltava<br />
a exaltar a genialida<strong>de</strong> do poeta, “não do gênio atingível<br />
através das paciências compridas, mas do gênio in<strong>de</strong>pen‑<br />
<strong>de</strong>nte, por assim dizer espontâneo, capaz <strong>de</strong> criar uma obra<br />
formidável”.<br />
A espontaneida<strong>de</strong> foi, sem dúvida, um dos traços mar‑<br />
cantes do poeta paulista, que mesmo sem atingir a geniali‑<br />
da<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ixou uma obra formidável, espécie <strong>de</strong> súmula das<br />
inquietações e <strong>de</strong>sejos dos jovens românticos <strong>de</strong> 1850. Quais<br />
eram essas inquietações? Em primeiro lugar o amor, a aproxi‑<br />
mação entre os sexos, dificultada e até obstruída pela rígida<br />
moral patriarcal. Assim, o simples e humano ato <strong>de</strong> amar as‑<br />
sumia, por vezes, um sentido <strong>de</strong> transgressão, muito presente<br />
na obra do nosso poeta, seja no plano social, seja no psicoló‑<br />
gico. Em vários <strong>de</strong> seus poemas, Azevedo i<strong>de</strong>aliza a posse<br />
sexual em sonho como a realização suprema do amor. O amor<br />
estava sempre ligado ao <strong>mais</strong> <strong>de</strong>sbragado sentimentalismo.<br />
Era uma das atitu<strong>de</strong>s bonitas da época, frequentemente cor‑<br />
roída por momentos <strong>de</strong> cinismo e amargura, quase sempre <strong>de</strong><br />
inspiração livresca. Sentimental e um tanto ingênuo, Álvares<br />
<strong>de</strong> Azevedo intoxicou sua literatura com os venenos sutis <strong>de</strong>s‑<br />
tilados das obras do amargo Byron, do melancólico Musset,<br />
do pessimista Leopardi. Ainda bem que tinha em si mesmo<br />
um contraveneno po<strong>de</strong>roso, o seu admirável senso <strong>de</strong> humor,<br />
que o levava a zombar até da morte, como no poema “O<br />
poeta moribundo”, <strong>de</strong>senvolvido “na craveira da <strong>mais</strong> franca<br />
piada”, como observa Antonio Candido no prefácio aos Me‑<br />
lhores poemas Álvares <strong>de</strong> Azevedo. Álvares <strong>de</strong> Azevedo, 150<br />
<strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> sua morte, continua capaz <strong>de</strong> comover e en‑<br />
cantar o leitor. O que <strong>mais</strong> pedir a um poeta?<br />
M e l h o r e s P o e M a s
ÁLVARO ALVES<br />
DE FARIA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Carlos Felipe Moisés<br />
Álvaro Alves <strong>de</strong> Faria (1942)<br />
Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />
1 a edição – 272 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1312 ‑4<br />
Natural da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, filho <strong>de</strong> portugueses,<br />
Álvaro Alves <strong>de</strong> Faria é jornalista, teatrólogo, romancista,<br />
ensaísta, cronista, crítico literário, mas sobretudo poeta.<br />
Pre<strong>de</strong>stinado e prematuro. O primeiro poema foi escrito<br />
aos onze <strong>anos</strong> e aos <strong>de</strong>zesseis concluiu seu primeiro livro,<br />
Noturno maior, publicado alguns <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois.<br />
Outros vieram, cada vez <strong>mais</strong> refinados e pessoais,<br />
<strong>de</strong>monstrando sua vocação autêntica, ao contrário <strong>de</strong> tan‑<br />
tos jovens que publicam livro <strong>de</strong> poemas na adolescência,<br />
para logo se afastarem, e para sempre, da poesia.<br />
O reconhecimento da crítica vem sendo expresso em<br />
artigos e prêmios diversos. Seu quarto livro, 4 cantos <strong>de</strong><br />
pavor e alguns poemas <strong>de</strong>sesperados (1973) recebeu três<br />
dos maiores prêmios literários do país, o Governador do<br />
Estado <strong>de</strong> São Paulo, o Prefeitura Municipal <strong>de</strong> São Paulo e<br />
o Pen Clube Internacional <strong>de</strong> São Paulo. Trajetória poética,<br />
que reúne sua poesia até 2003, recebeu o prêmio <strong>de</strong> me‑<br />
lhor livro <strong>de</strong> poemas do ano, concedido pela Associação<br />
Paulista dos Críticos <strong>de</strong> Arte.<br />
Nos últimos <strong>anos</strong>, após a publicação <strong>de</strong> 20 poemas<br />
quase líricos e algumas canções para Coimbra (1999), sua<br />
obra vem encontrando especial receptivida<strong>de</strong> em Portugal,<br />
on<strong>de</strong> Álvaro costuma participar com frequência <strong>de</strong> recitais<br />
e congressos. A voz do poeta chegou ainda <strong>mais</strong> longe.<br />
Seus poemas estão traduzidos para o inglês, o francês, o<br />
italiano, o espanhol, o alemão, o servo ‑croata e o japonês.<br />
No prefácio aos Melhores poemas Álvaro Alves <strong>de</strong> Faria,<br />
Carlos Felipe Moisés observa que toda a obra <strong>de</strong> Álvaro, “em<br />
suas muitas vertentes (a poesia, a crônica, o romance, o tea‑<br />
tro, a reportagem, a entrevista), me parece ser o testemunho<br />
incansável <strong>de</strong> uma experiência <strong>de</strong> vida. Mas isso não a con‑<br />
fun<strong>de</strong> com a autobiografia ou com o diário íntimo”. Em ver‑<br />
da<strong>de</strong>, dispensa classificações. É sobretudo poesia.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
ANTERO DE QUENTAL<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Benjamin Abdalla Junior<br />
Antero <strong>de</strong> Quental (1842 ‑1891)<br />
Natural <strong>de</strong> Ponta Delgada, Portugal<br />
1 a edição – 128 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0881 ‑1<br />
Antero <strong>de</strong> Quental, homem <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong> estranha,<br />
sombrio, niilista, mas também virtuoso, humil<strong>de</strong>, atormen‑<br />
tado “pelo olhar da esfinge”, segundo a expressão <strong>de</strong> Miguel<br />
<strong>de</strong> Unamuno, “um santo que era um gênio” (Eça <strong>de</strong> Queirós),<br />
foi o <strong>de</strong>stino <strong>mais</strong> trágico da literatura portuguesa.<br />
Poeta e pensador, integrou a famosa Geração <strong>de</strong> 70,<br />
que sacudiu a mesmice da vida portuguesa, procurando in‑<br />
tegrar o país no mundo mo<strong>de</strong>rno. Antero era o centro <strong>de</strong>ssa<br />
geração brilhante, da qual faziam parte Eça <strong>de</strong> Queirós, Oli‑<br />
veira Martins, Ramalho Ortigão. Natural dos Açores, Antero<br />
formou ‑se em Direito pela Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Coimbra (1864),<br />
on<strong>de</strong> sempre assumia a li<strong>de</strong>rança nos conflitos entre o con‑<br />
servadorismo da instituição e o espírito <strong>de</strong> rebeldia dos estu‑<br />
dantes. Durante essa fase escreve as Primaveras românticas,<br />
só publicadas em 1872, os Sonetos (1861) e as O<strong>de</strong>s mo<strong>de</strong>r‑<br />
nas (1865), que traziam um frêmito novo à poesia portu‑<br />
guesa, pregando o progresso social, e cujo fundo o poeta<br />
sintetizou na frase provocadora: “a Poesia mo<strong>de</strong>rna é a voz<br />
da Revolução”. Mas é nos Sonetos que se encontra a men‑<br />
sagem <strong>mais</strong> alta e pessoal, <strong>mais</strong> <strong>de</strong>nsamente humana <strong>de</strong><br />
Antero, traduzindo os seus conflitos íntimos, a sua alta ten‑<br />
são espiritual, a angústia permanente <strong>de</strong> uma alma se<strong>de</strong>nta<br />
<strong>de</strong> luz (“Viva e trabalhe em plena luz: <strong>de</strong>pois/ seja ‑me dado<br />
ainda ver, morrendo,/ o claro sol, amigo dos heróis!”). De‑<br />
pois <strong>de</strong> duas edições com um pequeno número <strong>de</strong> poemas,<br />
os Sonetos completos, dos <strong>mais</strong> perfeitos da língua em todos<br />
os tempos, foram lançados em 1886, constituindo uma es‑<br />
pécie <strong>de</strong> autobiografia <strong>de</strong> uma alma atormentada, ou “me‑<br />
mórias <strong>de</strong> uma consciência” como observou um crítico. A<br />
arte, porém, não apaziguou o coração do poeta, que se sui‑<br />
cidou, em 1891. Guerra Junqueiro, seu amigo, escreveu<br />
então que “<strong>mais</strong> bela ainda que os seus livros, a sua vida”.<br />
Mais bela, talvez. Muito <strong>mais</strong> trágica, com certeza.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
29
ARMANDO FREITAS<br />
FILHO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Heloisa Buarque <strong>de</strong> Hollanda<br />
Armando Freitas Filho (1940)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
1 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0219 ‑7<br />
Armando Freitas Filho é consi<strong>de</strong>rado um dos poetas<br />
<strong>mais</strong> representativos e instigantes da mo<strong>de</strong>rna literatura<br />
brasileira. Nascido no Rio <strong>de</strong> Janeiro, poetando <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a<br />
adolescência, estreou em livro aos vinte e três <strong>anos</strong>. A par‑<br />
tir daí, manteve uma ativida<strong>de</strong> poética constante, <strong>de</strong>purada<br />
a cada nova obra, e sempre em busca <strong>de</strong> novos caminhos.<br />
A poesia reflexiva do primeiro livro logo se enriquece com<br />
uma atitu<strong>de</strong> <strong>mais</strong> participante, aberta para a realida<strong>de</strong> so‑<br />
cial e política. O passo seguinte seria a procura <strong>de</strong> uma<br />
linguagem precisa, <strong>de</strong>senfática, que o aproxima da poesia<br />
Práxis, movimento coor<strong>de</strong>nado por Mario Chamie, que pre‑<br />
tendia ser um “produto que produz” e abolir “a história da<br />
literatura escrita e <strong>de</strong> autores”.<br />
Em meados da década <strong>de</strong> 1970, o poeta está maduro<br />
e consciente <strong>de</strong> seu ofício. Em plena luci<strong>de</strong>z. Procura então<br />
articular <strong>de</strong> forma clara vida e poesia, privilegiando o tra‑<br />
balho artesanal <strong>de</strong> alta precisão.<br />
Numa espécie <strong>de</strong> retorno ao passado, o poeta publica<br />
uma coletânea <strong>de</strong> poemas ‑minuto, valorizado pela geração<br />
marginal dos <strong>anos</strong> 1960, com a qual <strong>de</strong> certa forma se<br />
i<strong>de</strong>ntificava, sem a ela pertencer. Mas logo volta a exigir<br />
<strong>mais</strong> <strong>de</strong> si mesmo, e a refletir, com amargura, sobre a vida.<br />
A sua poesia se torna dura, severa, cinza ‑chumbo, quadro<br />
sombrio que se atenua na reflexão da precarieda<strong>de</strong> da vida.<br />
Cada vez <strong>mais</strong> exigente, o poeta i<strong>de</strong>aliza “escrever um<br />
livro blindado, sob controle, como se estivesse fazendo gi‑<br />
nástica e houvesse feito um livro <strong>de</strong> poemas sarados, for‑<br />
tes, que não se po<strong>de</strong> dizer: este não”. A esta altura, como<br />
observa Heloisa Buarque <strong>de</strong> Hollanda no prefacio aos Me‑<br />
lhores poemas Armando Freitas Filho, já construíra “uma<br />
poética <strong>de</strong> extraordinária beleza e precisão”, que o havia<br />
colocado “<strong>de</strong> forma <strong>de</strong>finitiva, na primeira linha <strong>de</strong> poetas<br />
da história da literatura brasileira contemporânea”.<br />
30<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
ARNALDO ANTUNES<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Noemi Jaffe<br />
Arnaldo Antunes (1960)<br />
Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />
1 a edição – 224 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1410 ‑7<br />
Poeta original, mas insatisfeito consigo mesmo, “sem‑<br />
pre disposto a reapren<strong>de</strong>r como se apren<strong>de</strong> a cair <strong>de</strong>pois<br />
que já se sabe andar” (João Ban<strong>de</strong>ira), maduro, sem per<strong>de</strong>r<br />
o lado infantil, “quanto <strong>mais</strong> criança, paradoxalmente <strong>mais</strong><br />
maduro” (Hugo Sukman), inclassificável, “o pedagogo da<br />
estranheza na socieda<strong>de</strong> brasileira contemporânea <strong>de</strong> mas‑<br />
sas” (André Gar<strong>de</strong>l), Arnaldo Antunes é “ao lado <strong>de</strong> Au‑<br />
gusto <strong>de</strong> Campos, um dos poetas que melhor representam<br />
uma modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> poesia que transita por diversos e di‑<br />
ferentes suportes. Poesia esta que se faz multimídia e mul‑<br />
tiplica sua capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> comunicação com o leitor”<br />
(Vinícius Lima).<br />
Hábil na construção <strong>de</strong> seus poemas, marcados pela<br />
“simplicida<strong>de</strong> ativa”, que “não é a simplicida<strong>de</strong> do simpló‑<br />
rio”, “mas a do ser sem intervalos, buscando sempre a re‑<br />
lação entre a técnica e o momento sempre casual” (Antonio<br />
Medina Rodrigues), Arnaldo Antunes “medita sobre o pre‑<br />
cipício das palavras” e, “armado com tintas <strong>de</strong> carimbo, ele<br />
produz um vaivém incessante, um jogo <strong>de</strong> escon<strong>de</strong>‑<br />
‑escon<strong>de</strong> entre as letras e as formas” (José Thomaz Brum).<br />
Um caos <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias e soluções contraditórias? Po<strong>de</strong> ser.<br />
“Arnaldo Antunes é um <strong>de</strong>sses perigosos que erram – faz<br />
coisas erradas, <strong>de</strong> propósito e sem querer e erra também<br />
porque anda por aí, por vários lados dos tempos, das for‑<br />
mas e das fronteiras”, observa Noemi Jaffe no prefácio aos<br />
Melhores poemas Arnaldo Antunes. E adiante, acentua<br />
que o poeta tem “um jeito <strong>de</strong> ver e escrever as coisas meio<br />
ao contrário, pelo lado <strong>de</strong> on<strong>de</strong> elas não são ordinaria‑<br />
mente vistas: pelo lado <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro, pelo lado errado, pelo<br />
lado do resto, da dúvida”. A dúvida se expressa em poemas<br />
tradicionais, concretistas, visuais, que têm o dom <strong>de</strong> <strong>de</strong>sa‑<br />
fiar e estimular, ao mesmo tempo, o leitor.<br />
M e l h o r e s P o e M a s
AUGUSTO DOS ANJOS<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
José Paulo Paes<br />
Augusto dos Anjos (1884 ‑1914)<br />
Natural do Engenho Pau ‑D’Arco, PB<br />
4 a edição – 208 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0474 ‑0<br />
A publicação do livro Eu, em 1912, causou estranheza<br />
e certa repugnância entre os raros críticos que se dispuseram<br />
a ler o volume. Leitor do naturalista e fisiologista Darwin, o<br />
homem da teoria das espécies, e do biólogo Haeckel, teórico<br />
do transformismo, Augusto dos Anjos apresentava ao leitor,<br />
sem qualquer cerimônia, em versos contun<strong>de</strong>ntes e incômo‑<br />
dos, por vezes irados, i<strong>de</strong>ias, conceitos e o vocabulário espe‑<br />
cífico das especialida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>sses cientistas, or<strong>de</strong>nados sob a<br />
visão pessimista do filósofo Schopenhauer.<br />
Sem compreen<strong>de</strong>r muito bem o que lia, o leitor <strong>de</strong>pa‑<br />
rava com termos como monera, citula, zoófito, e expres‑<br />
sões insólitas. O <strong>mais</strong> chocante, porém, era o gosto do<br />
autor pelos aspectos repugnantes da vida, no plano físico<br />
e moral. Des<strong>de</strong> o primeiro poema do livro, “Monólogo <strong>de</strong><br />
uma sombra”, o autor esclarecia que “a podridão me serve<br />
<strong>de</strong> Evangelho.../ Amo o esterco, os resíduos ruins dos<br />
quiosques”. Por trás dos versos ásperos, da linguagem um<br />
tanto pedantesca, da tristeza dilacerante e incômoda do<br />
poeta, havia no entanto uma visão original da vida. Como‑<br />
vido e perplexo diante do espetáculo imenso do cosmo, em<br />
contraste com a realida<strong>de</strong> mesquinha do cotidiano, o poeta<br />
esten<strong>de</strong> sua fraternida<strong>de</strong> a tudo o que existe: a meretriz, o<br />
tamarindo, o cão, o bêbado, o tuberculoso. Apesar <strong>de</strong> se<br />
tratar <strong>de</strong> uma poesia “difícil”, o Eu é um dos livros <strong>de</strong> ver‑<br />
sos <strong>mais</strong> lidos da literatura brasileira, com <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> edi‑<br />
ções, fascinando e <strong>de</strong>safiando cada nova geração <strong>de</strong><br />
leitores. E assim <strong>de</strong>ve continuar por muito tempo, en‑<br />
quanto o homem for capaz <strong>de</strong> se inquietar com o mistério<br />
da vida. Como observa José Paulo Paes no prefácio aos<br />
Melhores poemas Augusto dos Anjos, o livro “ontem como<br />
hoje, hoje como amanhã, não po<strong>de</strong>rá <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> surpreen‑<br />
<strong>de</strong>r a quantos se <strong>de</strong>brucem sobre a estranha poesia <strong>de</strong> Au‑<br />
gusto dos Anjos”.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
AUGUSTO FREDERICO<br />
SCHMIDT<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Ivan Marques<br />
Augusto Fre<strong>de</strong>rico Schmidt (1906 ‑1965)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
1 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0478 ‑8<br />
Augusto Fre<strong>de</strong>rico Schmidt é um dos poetas <strong>mais</strong> insi‑<br />
nuantes da literatura brasileira. Insinuante e solitário. Seu<br />
primeiro livro, Canto do brasileiro Augusto Fre<strong>de</strong>rico Schmidt<br />
(1928), com tonalida<strong>de</strong>s fortemente românticas, revela a sua<br />
singularida<strong>de</strong> e o <strong>de</strong>scontentamento com a poesia da época,<br />
dominada pelo pitoresco e o malabarismo mo<strong>de</strong>rnista. Nos<br />
livros seguintes, com um tom vagamente moralizante, um<br />
estilo <strong>de</strong>rramado, fluvial, repleto <strong>de</strong> repetições (“uma tor‑<br />
rente majestosa”, observou Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>), Schmidt<br />
como que soletra os gran<strong>de</strong>s temas que iriam se impor na<br />
sua poesia da maturida<strong>de</strong>: a presença da morte (“Serei só eu<br />
a sentir a lenta morte do mundo/ ou todos os seres huma‑<br />
nos, que vivem comigo,/ estão penetrados também, como<br />
eu, <strong>de</strong>ste sentimento confuso e terrível?”), a solidão, a tris‑<br />
teza e a estranheza <strong>de</strong> estar no mundo, predominantes em<br />
Canto da noite (1934).<br />
A plena maturida<strong>de</strong>, o equilíbrio, a segurança, a es‑<br />
pontaneida<strong>de</strong>, se afirma em Mar <strong>de</strong>sconhecido (1942), no<br />
qual o espiritualismo se aguça até o sentimento extremo<br />
“<strong>de</strong> irrealida<strong>de</strong>” (Roger Basti<strong>de</strong>) da vida cotidiana, substi‑<br />
tuído por um mundo vago, impessoal, música ao vento,<br />
expresso num “verso livre amplo e melodioso, com um<br />
toque bíblico, cheio <strong>de</strong> ressonâncias, marcado pela repeti‑<br />
ção quase obsessiva, que assalta e domina a sensibilida<strong>de</strong><br />
do leitor” (Antonio Candido).<br />
A partir <strong>de</strong> Fonte invisível (1949), o autor como que<br />
refina a sua obra e impõe ‑se como o <strong>mais</strong> influente poeta<br />
católico do período. Os livros seguintes são todos curtos,<br />
com poucos poemas e a repetição obsessiva dos mesmos<br />
temas. Manuel Ban<strong>de</strong>ira consi<strong>de</strong>ra que essa repetição, como<br />
nos velhos profetas, lhe confere um timbre próprio e a situa<br />
“numa gran<strong>de</strong>za solitária como a daquela estrela, ‘imagem<br />
<strong>de</strong> um <strong>de</strong>sespero sem forma’, por ele saudada no limiar <strong>de</strong><br />
seu último livro”.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
31
AUGUSTO MEyER<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Tania Franco Carvalhal<br />
Augusto Meyer (1902 ‑1970)<br />
Natural <strong>de</strong> Porto Alegre, RS<br />
1 a edição – 168 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0759 ‑9<br />
Raras vezes um erudito consegue manter o frescor <strong>de</strong><br />
alma e a simplicida<strong>de</strong> capazes <strong>de</strong> comungar e se i<strong>de</strong>ntificar<br />
com as coisas humil<strong>de</strong>s da vida. Augusto Meyer, ensaísta e<br />
biógrafo, erudito à moda europeia, profundo, mas <strong>de</strong> estilo<br />
lépido e solto, soube não só resguardar a sensibilida<strong>de</strong><br />
como preservar certa inocência edênica, o <strong>mais</strong> forte sinal<br />
<strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação do homem com a terra, os hábitos e os<br />
costumes populares, as danças, os bichos, as árvores.<br />
Lírica, um tanto irônica, sem per<strong>de</strong>r a ternura, a poe‑<br />
sia inicial <strong>de</strong> Augusto Meyer se i<strong>de</strong>ntifica com a terra gaú‑<br />
cha, com seu “cheiro bom <strong>de</strong> estábulos e <strong>de</strong> pastos maduros”,<br />
a partir do riquíssimo vocabulário regional. Natural <strong>de</strong> Porto<br />
Alegre, Augusto Meyer (1902 ‑1970) não era um homem<br />
estritamente urbano. Gostava da vida rural, das imensidões<br />
sem fim dos pampas, em cujas paisagens se inspirou em<br />
seu primeiro livro <strong>de</strong> poemas, Coração ver<strong>de</strong> (1926). Em Gi‑<br />
raluz, publicado dois <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, o poeta se inclina pela<br />
poesia <strong>mais</strong> intimista, se <strong>de</strong>sliga do mundo rural, se <strong>de</strong>ixa<br />
perturbar pelo seu auto<strong>de</strong>sconhecimento (“Quem é esse<br />
que mergulhou no lago liso do espelho/ e me encara <strong>de</strong><br />
frente à clarida<strong>de</strong> crua?”) e um certo narcisismo, expresso<br />
em versos como este: “na vidraça garoenta <strong>de</strong>ste bar/ na‑<br />
moro o meu reflexo vago e esguio”. A autoanálise se torna<br />
<strong>mais</strong> aguda em Poemas <strong>de</strong> Bilu (1929), o “filóis” (filósofo)<br />
Bilu, alter ‑ego do poeta, ironizado em todo o <strong>de</strong>correr do<br />
livro (“Bilu, cidadão da harmonia cósmica,/ você <strong>de</strong>ixe <strong>de</strong><br />
bancar o Bau<strong>de</strong>laire”). Ausentando ‑se da poesia durante<br />
muitos <strong>anos</strong> (ou apenas <strong>de</strong>ixando <strong>de</strong> publicar o que escre‑<br />
via), o poeta retorna em plena maturida<strong>de</strong>, na década <strong>de</strong><br />
1950, com poesia grave, mas serena, com certa melancolia<br />
<strong>de</strong> crepúsculo: “Serena esta luz <strong>de</strong> ouro em meu outono:/<br />
recordação, antes do gran<strong>de</strong> sono...”.<br />
32<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
BOCAGE<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Cleonice Berardinelli<br />
Bocage (1765 ‑1805)<br />
Natural <strong>de</strong> Setúbal, Portugal<br />
4 a edição – 184 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1620 ‑0<br />
Manuel Maria Barbosa du Bocage (1765 ‑1805), o<br />
gran<strong>de</strong> nome da poesia portuguesa no século XVIII, <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
cedo sentiu ‑se pre<strong>de</strong>stinado à missão <strong>de</strong> poeta, com os<br />
seus componentes habituais <strong>de</strong> tragédia e sentimentalismo,<br />
segundo o mo<strong>de</strong>lo camoniano. Aos <strong>de</strong>zesseis <strong>anos</strong> foge <strong>de</strong><br />
casa, ingressando na Aca<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> Marinha. Durante o<br />
curso leva uma vida <strong>de</strong> dissipação e boêmia, canta os seus<br />
amores com uma certa Gertru<strong>de</strong>s.<br />
Em 1786, segue para a Índia, passando pelo Rio <strong>de</strong> Ja‑<br />
neiro. Na colônia, entrega ‑se à <strong>de</strong>vassidão sem limites, en‑<br />
volvido com amores baixos. Acaba <strong>de</strong>sertando e regressando<br />
a Portugal, on<strong>de</strong> encontra Gertru<strong>de</strong>s casada com seu irmão.<br />
Acolhido pelos poetas da Nova Arcádia, adota o nome <strong>de</strong><br />
Elmano Sadino. Insubmisso e mordaz, logo se <strong>de</strong>savém com<br />
os colegas, que satiriza em versos violentos. Preso como<br />
autor <strong>de</strong> “papéis sediciosos”, logo entregue à Inquisição,<br />
consegue transferência para o convento dos oratori<strong>anos</strong>, <strong>de</strong><br />
on<strong>de</strong> sai precocemente envelhecido, renegando seu passado<br />
dissoluto. A poesia <strong>de</strong> Bocage se caracteriza pela busca <strong>de</strong><br />
superação <strong>de</strong> contrastes íntimos e pungentes, amores puros<br />
e <strong>de</strong>pravados, a morte como ameaça e libertação, os confli‑<br />
tos entre a fragilida<strong>de</strong> humana e a bonda<strong>de</strong> natural, baseado<br />
nas teorias <strong>de</strong> Rousseau, mas mesmo em seus momentos <strong>de</strong><br />
maior sordi<strong>de</strong>z confiante na benevolência divina e na inter‑<br />
venção miraculosa da Virgem Maria. Por temperamento e<br />
por sua vivência, apesar das alegorias arcádicas e das notas<br />
iluministas, Bocage foi um precursor do Romantismo. Um<br />
pré ‑romântico, com “seu gosto pela solidão e pelo silêncio,<br />
pelas sombras povoadas <strong>de</strong> mochos ou fantasmas, pela na‑<br />
tureza agreste, às vezes locus horrendus, pela tristeza e pela<br />
morte, pelo amor do amor”, sobretudo nos sonetos, como<br />
observa Cleonice Berardinelli no prefácio aos Melhores poe‑<br />
mas Bocage.<br />
M e l h o r e s P o e M a s
BUENO DE RIVERA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna<br />
Bueno <strong>de</strong> Rivera (1911 ‑1982)<br />
Natural <strong>de</strong> Santo Antônio do Monte, MG<br />
1 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0797 ‑1<br />
O nome é sonoro, harmonioso: Bueno <strong>de</strong> Rivera. Pa‑<br />
rece um poeta espanhol. Ou um daqueles burgueses altivos<br />
dos romances <strong>de</strong> Perez Galdós. Impõe um certo respeito. Na<br />
verda<strong>de</strong>, é uma invenção do mineiríssimo poeta cujo nome<br />
na pia batismal era Odorico Bueno, por sinal bem pouco<br />
poético. Descen<strong>de</strong>nte do velho tronco paulista que remonta<br />
a Ama<strong>de</strong>u Bueno, o tal que foi proclamado rei do Brasil, em<br />
1640, nasceu quase três séculos <strong>de</strong>pois, em 1911, em Santo<br />
Antônio do Monte, e faleceu em Belo Horizonte, em 1982.<br />
Bueno <strong>de</strong> Rivera pertence à Geração <strong>de</strong> 45. Quando<br />
lançou seus primeiros livros – Mundo submerso (1944) e Luz<br />
do pântano (1948) –, foi equiparado a outros jovens que se<br />
afirmavam, Lêdo Ivo, João Cabral <strong>de</strong> Melo Neto. A partir daí,<br />
calou ‑se, só lançando uma nova obra (Pasto <strong>de</strong> pedra) em<br />
1971. Os primeiros livros, <strong>de</strong> tendências surrealistas, refle‑<br />
tiam, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o título, “um mundo submerso, subterrâneo,<br />
<strong>de</strong>ssa luz difusa sobre as águas pant<strong>anos</strong>as do tempo”, lem‑<br />
brando uma pintura <strong>de</strong> Salvador Dalí ou <strong>de</strong> Max Ernst, con‑<br />
forme a observação <strong>de</strong> Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna no<br />
prefácio aos Melhores poemas Bueno <strong>de</strong> Rivera.A crítica da<br />
época rasgou seda. Sérgio Milliet garantia que “pela temá‑<br />
tica atualíssima, tanto a <strong>de</strong> participação como a <strong>de</strong> inquieta‑<br />
ção individual, assinalam seus versos um ponto <strong>mais</strong> alto na<br />
mo<strong>de</strong>rna poesia brasileira”. Pasto <strong>de</strong> pedra indica novas in‑<br />
quietações. É um livro <strong>de</strong> participação política, mostrando<br />
um poeta voltado para as raízes barrocas das Gerais, ten‑<br />
tando enten<strong>de</strong>r os personagens da Inconfidência e a própria<br />
formação do estado, com um lirismo a que não falta a con‑<br />
tida ironia mineira. Um ponto a assinalar na edição dos Me‑<br />
lhores poemas Bueno <strong>de</strong> Rivera é a inclusão <strong>de</strong> poemas<br />
inéditos, em número equivalente aos já publicados, reve‑<br />
lando novas facetas <strong>de</strong>sse bom poeta das Minas Gerais.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
CARLOS NEJAR<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Léo Gilson Ribeiro<br />
Carlos Nejar (19<strong>39</strong>)<br />
Natural <strong>de</strong> Porto Alegre, RS<br />
2 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1621 ‑7<br />
Carlos Nejar nasceu em Porto Alegre, em 19<strong>39</strong>, sendo<br />
chamado por alguns críticos <strong>de</strong> “o poeta do pampa brasi‑<br />
leiro”. O português Jacinto do Prado Coelho consi<strong>de</strong>ra ‑o<br />
“o poeta da condição humana”. Estreou em 1960, com<br />
Sélesis, tendo uma vasta obra poética, formada por <strong>mais</strong> <strong>de</strong><br />
vinte títulos.<br />
Poeta <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> capacida<strong>de</strong> verbal, sua poesia apre‑<br />
senta uma gama variada <strong>de</strong> tons: amorosa, elegíaca, medi‑<br />
tativa, mística, épica. Todas as manifestações humanas lhe<br />
interessam. Assim, preocupa ‑o também o social, a revolta<br />
diante da situação “<strong>de</strong> abandono dos pobres no campo,<br />
sem terras, sem paga justa, sem futuro”, que canta, sem<br />
ja<strong>mais</strong> resvalar para “um tom fácil <strong>de</strong> panfleto político”,<br />
como observa Léo Gilson Ribeiro no prefácio aos Melhores<br />
poemas Carlos Nejar. Mais forte do que a preocupação social<br />
é a obsessão por Deus, a busca permanente da divinda<strong>de</strong>,<br />
do po<strong>de</strong>r supremo, que conce<strong>de</strong> a paz, mas cujos <strong>de</strong>sígnios<br />
são incompreensíveis ao homem. Já se ressaltou que os poe‑<br />
mas <strong>de</strong> Nejar <strong>de</strong>dicados a Deus lembram, pela sua simplici‑<br />
da<strong>de</strong> e colorido, os quadros <strong>de</strong> alguns pintores primitivos,<br />
líricos e <strong>de</strong>spojados, <strong>de</strong> olhos fixos no infinito: um Paolo Uccelo,<br />
um Simone Martini. A obsessão pela divinda<strong>de</strong> pren<strong>de</strong> ‑se a<br />
outros dois temas, que inquietam os vivos, mas que <strong>de</strong>cor‑<br />
rem <strong>de</strong>le: o amor (“Amar é a <strong>mais</strong> alta constelação”) e a<br />
morte, que o poeta não consi<strong>de</strong>ra fim, mas início <strong>de</strong> um<br />
outro ciclo. Em síntese, como diz Léo Gilson Ribeiro, no pre‑<br />
fácio aos Melhores poemas Carlos Nejar, a poesia <strong>de</strong> Nejar<br />
po<strong>de</strong> ser comparada a um rio “que atravessasse ida<strong>de</strong>s car‑<br />
regadas <strong>de</strong> heroísmo, luta, feridas, mas nunca <strong>de</strong>sânimo. Tal<br />
o célere e célebre rio <strong>de</strong> que nos fala o filósofo Heráclito,<br />
nunca nele nos banhamos novamente: cada vez suas águas<br />
hão <strong>de</strong> correr, volumosas, rumo a outras paragens, a servir<br />
<strong>de</strong> espelho para outros homens”.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
33
CARLOS PENA FILHO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Edilberto Coutinho<br />
Carlos Pena Filho (1929 ‑1960)<br />
Natural <strong>de</strong> Recife, PE<br />
4 a edição – 128 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0105 ‑1<br />
Carlos Pena Filho nasceu em Recife (Pernambuco), em<br />
1929, e morreu na mesma cida<strong>de</strong>, em um <strong>de</strong>sastre <strong>de</strong> auto‑<br />
móvel, em 1960. Os primeiros poemas, publicados no Suple‑<br />
mento Literário do Diário <strong>de</strong> Pernambuco, já revelavam os<br />
dons do poeta autêntico: intensida<strong>de</strong> e personalida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>scar‑<br />
tadas as influências, inevitáveis num jovem <strong>de</strong> vinte <strong>anos</strong>.<br />
A crítica se entusiasmou. Mauro Mota sublinhava “a<br />
força emotiva e a renovação formal” da poesia <strong>de</strong> Pena<br />
Filho para enfatizar que seus poemas “só fizeram reforçar a<br />
linha inicial <strong>de</strong> preferência temática e do individualismo ex‑<br />
pressional”. Individualista e polêmico, o jovem poeta adota<br />
como forma preferida <strong>de</strong> expressão o soneto, revalorizado<br />
pela chamada Geração <strong>de</strong> 45, com a qual, aliás, não se<br />
i<strong>de</strong>ntificava, acusando ‑a <strong>de</strong> “existente pelo que negou, e<br />
inexistente pelo que po<strong>de</strong>ria mas não ousou afirmar”. Pena<br />
Filho publica seu primeiro livro em 1952, O tempo da busca,<br />
título simbólico que, <strong>de</strong> certa forma, <strong>de</strong>fine sua ativida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>ssa época: uma incansável busca da poesia autêntica,<br />
uma permanente reflexão sobre o cotidiano e a própria obra<br />
e o sentido do que se encontra “além das coisas vãs”. Me‑<br />
mórias do Boi Serapião (1956) inaugura um novo ciclo na<br />
poesia <strong>de</strong> Pena Filho, aberta à <strong>de</strong>núncia social, preocupada<br />
com os sofrimentos do homem nor<strong>de</strong>stino. A i<strong>de</strong>ntificação com<br />
a região, e sobretudo com a cida<strong>de</strong> natal, assinala A verti‑<br />
gem lúcida (1958), no qual se acentuam as qualida<strong>de</strong>s visuais<br />
e plásticas <strong>de</strong> sua poesia, como se “pintasse com palavras”,<br />
como observa Edilberto Coutinho. No ano seguinte, numa<br />
espécie <strong>de</strong> balanço sobre a própria obra, reúne os três livros<br />
publicados e poemas inéditos no Livro geral. Manuel Ban‑<br />
<strong>de</strong>ira aponta a oralida<strong>de</strong>, a fluência narrativa e a força lírica<br />
como as principais características <strong>de</strong>ssa poesia autêntica,<br />
que aspirava chegar “à cor do grito/ à música das cores e<br />
dos ventos”.<br />
34<br />
Capa<br />
Nova<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
CASIMIRO DE ABREU<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Rubem Braga<br />
Casimiro <strong>de</strong> Abreu (18<strong>39</strong> ‑1860)<br />
Natural <strong>de</strong> Vila <strong>de</strong> Capivari, RJ<br />
2 a edição – 112 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑03<strong>39</strong> ‑9<br />
As primaveras, por coincidência lançadas no início da<br />
primavera <strong>de</strong> 1859, tiveram um retumbante êxito <strong>de</strong> crítica.<br />
Nenhum outro livro <strong>de</strong> poemas, até então, havia recebido<br />
tantos elogios na imprensa brasileira. Surgindo num momento<br />
em que se esgotava o lirismo noturno, pesado e sufocante da<br />
Geração <strong>de</strong> 1840, cujo auge se encontra na poesia <strong>de</strong> Álvares<br />
<strong>de</strong> Azevedo, o livro <strong>de</strong> Casimiro <strong>de</strong> Abreu trazia um arrepio<br />
novo à sensibilida<strong>de</strong> do leitor brasileiro. Era como uma janela<br />
aberta numa sala fechada havia muitos <strong>anos</strong>.<br />
O frescor e a espontaneida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa poesia, o lirismo<br />
simples, os namoricos ingênuos e levemente maliciosos, a<br />
melancolia, a certeza da morte prematura (“Se eu tenho <strong>de</strong><br />
morrer na flor dos <strong>anos</strong>,/ Meu Deus! não seja já”), a sauda<strong>de</strong><br />
da pátria (“Eu nasci além dos mares:/ os meus lares, meus<br />
amores ficam lá!”), o sentimentalismo, tão do agrado da<br />
alma brasileira, conquistaram os leitores. Poemas como<br />
“Meus oito <strong>anos</strong>”, “A valsa”, “Moreninha” eram recitados<br />
em todos os saraus. Na época, o público brasileiro interes‑<br />
sado em literatura apenas começava a se formar, constituído<br />
sobretudo por mulheres e estudantes, em geral embriagados<br />
<strong>de</strong> poesia. As tiragens dos livros eram medíocres, duzentos,<br />
trezentos exemplares. Assim, a edição <strong>de</strong> As primaveras, <strong>de</strong><br />
mil exemplares, esgotada em pouco tempo, tornou ‑se no<br />
que hoje se chama um best ‑seller. Logo, conquistou tam‑<br />
bém Portugal, on<strong>de</strong> foram lançadas duas edições sucessivas,<br />
na década <strong>de</strong> 1860. Ao longo do tempo saíram <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong><br />
edições, que fizeram <strong>de</strong> As primaveras o livro <strong>de</strong> versos <strong>mais</strong><br />
lido <strong>de</strong> autor brasileiro, numa prova <strong>de</strong> como o poeta soube<br />
sintonizar com a sensibilida<strong>de</strong> e os sonhos do povo. Um pre‑<br />
sente extra nesta seleção <strong>de</strong> Melhores poemas Casimiro <strong>de</strong><br />
Abreu são os <strong>de</strong>liciosos textos (prefácio e vida do poeta) es‑<br />
critos por Rubem Braga. Afinal, foi preciso <strong>mais</strong> <strong>de</strong> um sé‑<br />
culo para juntar essa dupla.<br />
M e l h o r e s P o e M a s
CASSIANO RICARDO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Luiza Franco Moreira<br />
Cassiano Ricardo (1895 ‑1974)<br />
Natural <strong>de</strong> S. J. dos Campos, SP<br />
1 a edição – 304 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0792 ‑0<br />
Cassiano Ricardo estreou em 1915 e publicou seu úl‑<br />
timo livro <strong>de</strong> poemas em 1964. Meio século <strong>de</strong> poesia, com<br />
uma permanente e surpreen<strong>de</strong>nte capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> renova‑<br />
ção. Conservador e tradicionalista na mocida<strong>de</strong>, seguindo<br />
os breviários do Parnasianismo e do Simbolismo, custou a<br />
aceitar o Mo<strong>de</strong>rnismo. Convertido, participou do movi‑<br />
mento Ver<strong>de</strong> ‑Amarelo, <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong> transformado em “revo‑<br />
lução da anta”, que procurava interpretar o Brasil e ressaltar<br />
sua originalida<strong>de</strong> cultural, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o indígena até a imigração<br />
e a miscigenação racial. Essa filosofia marca os Borrões <strong>de</strong><br />
ver<strong>de</strong> e amarelo, Vamos caçar papagaios, Martim Cererê,<br />
Deixa estar, jacaré, <strong>de</strong> títulos e temática nacionalistas, pu‑<br />
blicados entre 1925 e 1933. A partir daí, a poesia <strong>de</strong> Cas‑<br />
siano Ricardo muda radicalmente, adquire tensão e<br />
<strong>de</strong>nsida<strong>de</strong>, incorpora novas experiências vividas pela poesia<br />
brasileira, da Geração <strong>de</strong> 45 ao Concretismo, numa ânsia<br />
permanente <strong>de</strong> renovação. A crítica se surpreen<strong>de</strong>. Um dia<br />
<strong>de</strong>pois do outro (1947) revela um novo poeta, como se ti‑<br />
vesse <strong>de</strong>bruçado sobre si mesmo e “<strong>de</strong>scoberto as fontes<br />
<strong>mais</strong> profundas <strong>de</strong> sua inspiração” (Manuel Ban<strong>de</strong>ira), li‑<br />
rismo que se amplia e aprofunda nos livros seguintes, A<br />
face perdida e Poemas murais. O poeta se preocupa com o<br />
<strong>de</strong>stino da humanida<strong>de</strong>, mas também com a tragédia do<br />
indivíduo, no meio da multidão, sem <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> lado o<br />
humor. A preocupação com o mundo contemporâneo, os<br />
rumos perigosos da história são o tema <strong>de</strong> Jeremias sem<br />
chorar, livro que traz uma outra surpresa, a adoção da poé‑<br />
tica concretista, o abandono do verso tradicional pelo que<br />
o poeta <strong>de</strong>nomina linossigno. O poeta envelhecera, sua<br />
poesia, porém, rejuvenescia <strong>de</strong> forma permanente, na di‑<br />
versida<strong>de</strong> das técnicas e na visão <strong>de</strong> mundo, ajudando o<br />
leitor “a compreen<strong>de</strong>r o nosso tempo” (Carlos Drummond<br />
<strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>).<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
CASTRO ALVES<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Lêdo Ivo<br />
Castro Alves (1847 ‑1871)<br />
Natural <strong>de</strong> Mutitiba, BA<br />
7 a edição – 136 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0340 ‑8<br />
Castro Alves pertence a uma linhagem <strong>de</strong> poetas <strong>de</strong> que<br />
é impossível, ou pelo menos inconveniente, separar vida e<br />
obra. Palavra por palavra: sadio, sem nada da morbi<strong>de</strong>z <strong>de</strong><br />
seus colegas românticos, sensual, sempre apaixonado, libertá‑<br />
rio, <strong>de</strong>fensor dos direitos da mulher, um tanto <strong>de</strong>magógico.<br />
Como bom romântico, o amor ocupa o primeiro lugar<br />
em sua obra, um amor obsessivo, carnal, quase pagão, puri‑<br />
ficado pela ar<strong>de</strong>nte sensibilida<strong>de</strong> do poeta que, <strong>de</strong> certa<br />
forma, reivindicava direitos iguais para o corpo e o espírito. O<br />
que levou um crítico a chamá ‑lo <strong>de</strong> precursor do amor livre.<br />
A outra gran<strong>de</strong> vertente da obra castroalvina é a poe‑<br />
sia social, na qual se incluem os poemas patrióticos. Sem<br />
ser o primeiro, Castro Alves foi a voz <strong>mais</strong> eloquente e forte<br />
na <strong>de</strong>fesa da raça negra e <strong>de</strong> sua libertação do cativeiro.<br />
Quem nunca se emocionou com o “Navio negreiro”? Mas<br />
nada disso teria importância não fosse o gênio do poeta.<br />
Falecido aos 24 <strong>anos</strong>, com apenas um livro publicado em<br />
vida (Espumas flutuantes), Castro Alves <strong>de</strong>ixou alguns dos<br />
<strong>mais</strong> belos poemas da língua, como “Sub Tegmine Fagi”,<br />
“A hebreia” e “Boa noite”, <strong>de</strong> um inconfundível sabor bra‑<br />
sileiro, pela expressão e “a maneira <strong>de</strong> ver e <strong>de</strong> sentir o am‑<br />
biente e a vida brasileira”, como observou Eugênio Gomes.<br />
Brasileira, um tanto barulhenta e retórica, como o seu tem‑<br />
peramento, a poesia <strong>de</strong> Castro Alves tem momentos <strong>de</strong> um<br />
frescor matinal, como saída do limbo admiráveis modula‑<br />
ções em surdina, <strong>de</strong> voz cochichada ao ouvido, e quadros<br />
soberbos da natureza tropical. Eça <strong>de</strong> Queirós ao ouvir um<br />
amigo <strong>de</strong>clamar: “Às vezes, quando o sol nas matas vir‑<br />
gens/ a fogueira das tar<strong>de</strong>s acendia”, exclamou, arreba‑<br />
tado: “Aí está, em dois versos, toda a poesia dos trópicos”.<br />
A poesia <strong>de</strong> Castro Alves caiu no gosto do povo. A praça é<br />
do povo como o céu é do condor, diz o orador popular, sem<br />
saber que repete um verso do poeta baiano.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
35
CECÍLIA MEIRELES<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Maria Fernanda<br />
Cecília Meireles (1901 ‑1964)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
14 a edição – 200 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0294 ‑4<br />
Consi<strong>de</strong>rada pela crítica a <strong>mais</strong> alta personalida<strong>de</strong> femi‑<br />
nina da poesia brasileira e um dos maiores nomes <strong>de</strong> nossa<br />
literatura, em qualquer época, sem distinções preconceituosas<br />
<strong>de</strong> sexo, Cecília Meireles <strong>de</strong>ixou uma obra poética longa, in‑<br />
tensa e perturbadora. Foram quase trinta livros <strong>de</strong> versos, um<br />
roteiro que se inicia sob a influência parnasiana e simbolista,<br />
se <strong>de</strong>pura numa luta permanente pela expressão pessoal, até<br />
atingir aquela altitu<strong>de</strong> para a qual quaisquer <strong>de</strong>fini ções são<br />
inconsistentes: a poesia pura.<br />
Cecília Meireles nasceu e morreu no Rio <strong>de</strong> Janeiro<br />
(1901 ‑1964), <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ter conhecido quase todo o<br />
mundo, experiência que incorporou à sua poesia, nos ver‑<br />
sos <strong>de</strong> sabor oriental, nos poemas itali<strong>anos</strong>, nas traduções<br />
<strong>de</strong> poetas das <strong>mais</strong> diversas procedências, do indiano Rabin‑<br />
dranah Tagore aos poetas mo<strong>de</strong>rnos <strong>de</strong> Israel. A vocação se<br />
manifestou cedo. Na escola primária, pelo seu mérito nos<br />
estudos, recebeu uma medalha <strong>de</strong> ouro das mãos <strong>de</strong> Olavo<br />
Bilac, então inspetor escolar. Na vida civil exerceu o magis‑<br />
tério, fundou a primeira biblioteca infantil do Brasil. Na vida<br />
espiritual foi poeta em tempo quase integral, pois escreveu<br />
diversos volumes em prosa (ficção, teatro, crônicas, livros<br />
didáticos). A poesia <strong>de</strong> Cecília Meireles se caracteriza pela<br />
ânsia <strong>de</strong> apreensão e compreensão total do fenômeno da<br />
vida: “Preparei meu verso/ com a melhor medida:/ rosto do<br />
universo,/ boca da minha vida”. Na tentativa <strong>de</strong> captar a<br />
Verda<strong>de</strong>, diluída em milhares <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>s, ela vai <strong>de</strong> hori‑<br />
zonte a horizonte, aborda temas variados, expressando ‑se<br />
ora em trovas singelas, ora em poemas <strong>de</strong> um hermetismo<br />
cerrado, por vezes com angústia. Até alcançar a libertação, se<br />
não total, pelo menos a possível no mundo: “Levai ‑me aon<strong>de</strong><br />
quiser<strong>de</strong>s! – aprendi com as primaveras/ a <strong>de</strong>ixar ‑me cortar e<br />
a voltar sempre inteira”.<br />
36<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
CESÁRIO VERDE<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Leyla Perrone Moisés<br />
Cesário Ver<strong>de</strong> (1855 ‑1886)<br />
Natural <strong>de</strong> Lisboa, Portugal<br />
1 a edição – 144 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1016 ‑6<br />
Ao contrário <strong>de</strong> certos poetas portugueses – Fernando<br />
Pessoa, Antero <strong>de</strong> Quental, Florbela Espanca –, muito po‑<br />
pulares no Brasil, Cesário Ver<strong>de</strong> é quase <strong>de</strong>sconhecido dos<br />
leitores brasileiros. Não sabem o que estão per<strong>de</strong>ndo.<br />
Vivendo em um período <strong>de</strong> encruzilhada da literatura<br />
portuguesa, o chamado Realismo, ainda fortemente mar‑<br />
cado pela retórica romântica, Cesário foi o único poeta <strong>de</strong><br />
sua geração a se <strong>de</strong>spojar integralmente do Romantismo.<br />
Nos primeiros poemas, em busca <strong>de</strong> si mesmo, cultiva o epi‑<br />
grama cínico e o humor grotesco, à maneira <strong>de</strong> João Penha,<br />
muito em moda à época. Logo, sob a influência <strong>de</strong> Bau<strong>de</strong>‑<br />
laire, começa a afirmar a sua própria personalida<strong>de</strong> artística,<br />
expressando as mil e uma seduções da realida<strong>de</strong> ao seu<br />
redor (“a mim o que me ro<strong>de</strong>ia é o que me preocupa”, es‑<br />
creve a um amigo), as coisas comuns do cotidiano, as bur‑<br />
guesinhas lisboetas, os hotéis da moda, a ativida<strong>de</strong> das<br />
regateiras, um piquenique, a feira livre; fatos dos quais extrai<br />
poemas cheios <strong>de</strong> cores, bem <strong>de</strong>senhados, como pequenos<br />
quadros ou aquarelas. Mas o poeta não se pren<strong>de</strong> apenas<br />
aos aspectos amáveis da vida. Movido por i<strong>de</strong>ais <strong>de</strong> justiça,<br />
solidarieda<strong>de</strong> com os humil<strong>de</strong>s, simpatia pelo povo, não se<br />
esquece do “cardume negro” das varinas, dos operários<br />
“enfarruscados e secos” e dos bairros miseráveis <strong>de</strong> Lisboa,<br />
“aon<strong>de</strong> miam gatas,/ e o peixe podre gera os focos <strong>de</strong> infec‑<br />
ção”. Um <strong>de</strong> seus últimos poemas, que ficou incompleto,<br />
<strong>de</strong>nuncia com veemência o egoísmo dos ricos, em contraste<br />
com a miséria dos pobres. Ao morrer em 1886, <strong>de</strong> tubercu‑<br />
lose, aos 31 <strong>anos</strong>, Cesário havia publicado apenas alguns<br />
poemas avulsos, que não <strong>de</strong>spertaram os louvores da crítica.<br />
O livro <strong>de</strong> Cesário Ver<strong>de</strong>, reunindo sua produção, foi publi‑<br />
cado em 1887, numa tiragem <strong>de</strong> duzentos exemplares. A<br />
partir daí o sucesso do livro não parou <strong>de</strong> crescer.<br />
M e l h o r e s P o e M a s
CLÁUDIO MANUEL<br />
DA COSTA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Francisco Iglésias<br />
Cláudio Manuel da Costa (1729 ‑1789)<br />
Natural <strong>de</strong> Mariana, MG<br />
2 a edição – 216 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1622 ‑4<br />
O <strong>mais</strong> árca<strong>de</strong> dos poetas que viveram em Vila Rica no<br />
século XVIII, o <strong>mais</strong> culto do grupo, o <strong>mais</strong> correto na me‑<br />
trificação e na linguagem e, talvez, “o <strong>mais</strong> profundamente<br />
preso às emoções e valores da terra” (Antonio Candido),<br />
Cláudio Manuel da Costa <strong>de</strong>ixou uma obra variada, com‑<br />
posta <strong>de</strong> sonetos, cantatas, éclogas, epístolas, cançonetas,<br />
além do poema épico “Vila Rica” e <strong>de</strong> “O Parnaso obse‑<br />
quioso”. Alguns historiadores acreditam que tenha colabo‑<br />
rado nas Cartas chilenas, mas nesse aspecto tudo são<br />
hipóteses.<br />
Natural <strong>de</strong> Mariana (MG), o poeta cursou a Universi‑<br />
da<strong>de</strong> <strong>de</strong> Coimbra, sendo <strong>de</strong>ssa época os seus primeiros<br />
trabalhos, não incluídos nas Obras (1768). Concluído o<br />
curso, retornou ao Brasil, fixando ‑se em Vila Rica, adotou<br />
o nome <strong>de</strong> Glauceste Saturnio, como era <strong>de</strong> praxe no Ar‑<br />
cadismo, advogou, acabou se envolvendo na Inconfidência<br />
Mineira. Preso, suicidou ‑se (ou foi assassinado) na Casa dos<br />
Contos, on<strong>de</strong> se achava <strong>de</strong>tido. Na poesia <strong>de</strong> Cláudio Ma‑<br />
nuel da Costa predomina a melancolia e um certo senti‑<br />
mento <strong>de</strong> <strong>de</strong>sencanto, acirrados pelo contraste entre a vida<br />
da metrópole e o ambiente ru<strong>de</strong> das Minas Gerais. O poeta<br />
<strong>de</strong> tudo extrai tristeza, da fugacida<strong>de</strong> das coisas à ausência<br />
da amada, como se na vida não existissem momentos feli‑<br />
zes. É um sensitivo, como confessa em versos admiráveis,<br />
comparando as montanhas rochosas <strong>de</strong> sua terra ao seu<br />
coração: “Destes penhascos fez a natureza/ o berço em<br />
que nasci: oh quem cuidara/ que entre penhas tão duras se<br />
criara/ uma alma terna, um peito sem dureza!”. Alguns<br />
críticos apontam uma certa frieza em seus versos, mas esta<br />
<strong>de</strong>correria da disciplina formal, que disfarça um veio sub‑<br />
terrâneo palpitante <strong>de</strong> emoção, sobretudo nos sonetos, do<br />
qual foi emérito cultor, dos maiores da língua, e que cons‑<br />
tituem a parte <strong>mais</strong> significativa <strong>de</strong> sua obra.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
CORA CORALINA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Darcy França Denófrio<br />
Cora Coralina (1889 ‑1985)<br />
Natural <strong>de</strong> Goiás, GO<br />
3 a edição – 368 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0883 ‑0<br />
Simples, muito próxima do gosto popular, fluindo com<br />
a naturalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um riacho entre pedras. A água é lím‑<br />
pida, cristalina. Sacia a se<strong>de</strong>. Assim é a poesia <strong>de</strong> Cora Co‑<br />
ralina, apesar da poetisa nela <strong>de</strong>scobrir uma certa dureza,<br />
como expressa no poema “Das pedras”:<br />
“Ajuntei todas as pedras/ que vieram sobre mim./ Levan‑<br />
tei uma escada muito alta/ e no alto subi./ Teci um tapete<br />
floreado/ e no sonho me perdi./ Uma estrada,/ um leito,/ uma<br />
casa,/ um companheiro./ Tudo <strong>de</strong> pedra./ Entre pedras/ cres‑<br />
ceu a minha poesia./ Minha vida.../ Quebrando pedras/ e plan‑<br />
tando flores./ Entre pedras que me esmagavam/ levantei a<br />
pedra ru<strong>de</strong>/ dos meus versos”. Esses versos, <strong>de</strong> cunho auto‑<br />
biográfico, <strong>de</strong> certo modo, são injustos em relação à obra da<br />
autora, mas reveladores <strong>de</strong> suas mágoas com a vida. Ana Lins<br />
dos Guimarães Peixoto Brêtas, que <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong> adotou o pseu‑<br />
dônimo <strong>de</strong> Cora Coralina, nasceu em Goiás, então capital do<br />
estado <strong>de</strong> mesmo nome, em 1889, numa família <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s<br />
proprietários rurais empobrecidos. Infância “intimidada, dimi‑<br />
nuída, incompreendida”. Indiferença da mãe. Casamento<br />
com um homem separado da primeira esposa, um escândalo,<br />
a fuga do casal para São Paulo. Teve seis filhos. Com a morte<br />
do marido, após 45 <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ausência, regressa a Goiás, on<strong>de</strong><br />
faleceu em Goiânia, em 1985. Esses fatos, aguçados pela sen‑<br />
sibilida<strong>de</strong> extrema, criaram um fundo pétreo, duro, na poesia<br />
<strong>de</strong> Cora Coralina. Talvez também em sua alma. Mas ela só é<br />
dura quando fala <strong>de</strong> si mesma, <strong>de</strong> seu sentimento <strong>de</strong> inferio‑<br />
rida<strong>de</strong>, da menina que foi um dia, “feia, medrosa e triste”.<br />
Quando olha para seu semelhante predomina a simpatia hu‑<br />
mana, sobretudo pelos humilhados e perseguidos, como<br />
comprovam os comoventes poemas <strong>de</strong>dicados à “Mulher da<br />
vida”, a “A lava<strong>de</strong>ira”, ao “Menor abandonado”. O coração<br />
era mole. Afinal, dureza para si mesmo e amor e tolerância<br />
pelo próximo é prova <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>za espiritual.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
37
CRUZ E SOUSA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Flávio Aguiar<br />
Cruz e Sousa (1861 ‑1898)<br />
Natural <strong>de</strong> Nossa Senhora do Desterro, SC<br />
2 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0570 ‑7<br />
João da Cruz e Sousa, consi<strong>de</strong>rado pelo crítico francês<br />
Roger Basti<strong>de</strong> um dos três maiores poetas do Simbolismo<br />
mundial, ao lado do francês Stéphane Mallarmé e do ale‑<br />
mão Stefan George, nasceu em Desterro (atual Florianópo‑<br />
lis), SC, em 1861. Recebeu excelente educação, dada pelo<br />
antigo senhor <strong>de</strong> seus pais, escravos alforriados. Na cida<strong>de</strong><br />
natal, com Virgilio Várzea, publica o jornal abolicionista<br />
Tribuna Popular. Hostilizado pelos brancos, engaja ‑se numa<br />
companhia teatral como ponto, percorrendo o país. De<br />
volta ao Desterro, publica com seus amigos <strong>de</strong> literatura e<br />
sonhos (Virgilio Várzea e Santos Lostada) um pequeno vo‑<br />
lume em homenagem à atriz Julieta dos Santos (1883), e<br />
dois <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, sempre com Virgilio Várzea, Tropos e<br />
fantasias, <strong>de</strong> gosto parnasiano. Fixa ‑se no Rio <strong>de</strong> Janeiro, a<br />
partir <strong>de</strong> 1890, e começa a publicar na imprensa seus poe‑<br />
mas <strong>de</strong> feição simbolista, gerando reações extremas, da<br />
admiração exaltada à hostilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>clarada, esta <strong>de</strong>vido<br />
sobretudo à cor negra do poeta. No mesmo ano em que se<br />
casa (1893), publica Broquéis e Missal (poemas em prosa),<br />
a que se seguem Evocações (1898, prosa poética) e os vo‑<br />
lumes póstumos Faróis (1900) e Últimos sonetos (1905).<br />
Poesia exótica por sua aura metafísica, a ânsia <strong>de</strong> infinito,<br />
a atração pelo branco, a presença constante do diabo, a<br />
angústia permanente, a obra <strong>de</strong> Cruz e Sousa espelha com<br />
fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> a trajetória do poeta, sua luta para superar a<br />
revolta e o sofrimento e atingir a pura espiritualida<strong>de</strong>.<br />
Como observou Tasso da Silveira, se Broquéis exprime a dor<br />
<strong>de</strong> ser negro, Faróis representa um passo <strong>mais</strong> além, ex‑<br />
pressando a dor <strong>de</strong> ser homem, ao passo que nos Últimos<br />
sonetos palpita a dor, mas também a alegria e a glória, “<strong>de</strong><br />
ser espírito, <strong>de</strong> comungar com o eterno e heroicamente<br />
sobrevoar os abismos e as sombras da pobre terrenali‑<br />
da<strong>de</strong>”. Cruz e Sousa faleceu em 1898.<br />
38<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
DANTE MILANO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Ivan Junqueira<br />
Dante Milano (1899 ‑1991)<br />
Natural <strong>de</strong> São Cristóvão, RJ<br />
1 a edição – 174 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0567 ‑7<br />
Dante Milano (1899 ‑1991) compôs sua obra poética<br />
quase em surdina. Esquivo à vida literária, <strong>de</strong>scrente da gló‑<br />
ria, avesso à mundanida<strong>de</strong>, versejou a vida toda, mas por<br />
imposição íntima, numa permanente busca da beleza. Em<br />
certo sentido foi “o poeta puro por excelência”, vivendo<br />
“para a poesia no sentido <strong>de</strong> viver em poesia” (João Cabral<br />
<strong>de</strong> Melo Neto) e não <strong>de</strong> ser reconhecido como poeta. Escre‑<br />
via muito e rasgava quase tudo. No final, fruto <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong><br />
setenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> poética, restaram 141 poemas. O<br />
suficiente para fazer <strong>de</strong>le uma das principais vozes poéticas<br />
do Mo<strong>de</strong>rnismo e um dos “nossos poetas <strong>mais</strong> fortes e <strong>mais</strong><br />
perfeitos” (Manuel Ban<strong>de</strong>ira) em todos os tempos.<br />
Participante arredio do movimento mo<strong>de</strong>rnista, só pu‑<br />
blicou o primeiro livro perto dos cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> e<br />
contra a sua vonta<strong>de</strong>, graças à astúcia <strong>de</strong> um amigo. Consi‑<br />
<strong>de</strong>rado o maior acontecimento literário do ano e vencedor<br />
do maior prêmio literário da época, as Poesias (1948) apenas<br />
vinham confirmar o que os amigos <strong>mais</strong> íntimos do poeta<br />
estavam encantados <strong>de</strong> saber. Ao longo do tempo, saíram<br />
outras edições da obra, aumentadas e revistas, reafirmando<br />
a extraordinária fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> do poeta a si mesmo, à margem<br />
<strong>de</strong> modas e fórmulas poéticas. Como observa Ivan Junqueira,<br />
no prefácio aos Melhores poemas Dante Milano, “contra‑<br />
riando as tendências efusivas e algo emocionais da poesia<br />
brasileira” Dante Milano “cultiva uma poética do pensa‑<br />
mento emocionado, como o fizeram os chamados ‘poetas<br />
metafísicos’ ingleses do século XVII, o que não significa que<br />
sua expressão haja renunciado à emoção”. Um tanto con‑<br />
tida, a emoção pulsa forte sobretudo nos temas que obce‑<br />
cam o poeta: a morte (“Vem, morte, dor <strong>mais</strong> branda,/ com<br />
esse olhar estagnado e o sorriso tenaz”), o amor, o sonho,<br />
por vezes entrelaçados num mesmo poema: “Quem sonha<br />
se transfigura,/ quem morre sorri da morte”.<br />
M e l h o r e s P o e M a s
FAGUNDES VARELA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Antonio Carlos Secchin<br />
Fagun<strong>de</strong>s Varela (1841 ‑1875)<br />
Natural <strong>de</strong> Rio Claro, RJ<br />
1 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1008 ‑5<br />
Poeta <strong>de</strong> áspero <strong>de</strong>stino, boêmio, alcoólatra, domi‑<br />
nado pelo instinto <strong>de</strong> auto<strong>de</strong>struição, vivendo sempre sem<br />
pouso certo, entre a cida<strong>de</strong> e o campo, Fagun<strong>de</strong>s Varela<br />
representa no Romantismo brasileiro o caso <strong>mais</strong> extremo<br />
<strong>de</strong> angústia, <strong>de</strong>sadaptação e revolta. Em seus versos ne‑<br />
nhum <strong>de</strong>sses sentimentos é artificial, como em tantos <strong>de</strong><br />
seus colegas <strong>de</strong> geração. Cada um <strong>de</strong> seus poemas foi vi‑<br />
vido, sentido, sofrido, fruto <strong>de</strong> uma experiência amarga,<br />
<strong>de</strong> um amor correspondido, <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>silusão amorosa ou da<br />
morte <strong>de</strong> um ente querido, como o pungente “Cântico<br />
do calvário”, escrito pela morte do filho Emiliano, uma das<br />
<strong>mais</strong> belas elegias da língua portuguesa.<br />
Nascido em 1841, em Rio Claro, Rio <strong>de</strong> Janeiro, Varela<br />
estudou Direito nas faculda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> São Paulo e Recife, sem<br />
concluir o curso, mas <strong>de</strong>sfrutando <strong>de</strong> imenso prestígio entre<br />
os colegas. Casou ‑se duas vezes, foi amante da mundana<br />
<strong>mais</strong> popular <strong>de</strong> São Paulo, Ritinha Sorocabana, dois <strong>de</strong> seus<br />
filhos morreram prematuramente. Tinha horror aos i<strong>de</strong>ais <strong>de</strong><br />
vida burguesa. Nunca trabalhou. Como observa Antonio Car‑<br />
los Secchin em Melhores poemas Fagun<strong>de</strong>s Varela, “levou às<br />
últimas consequências a vocação ‘maldita’ <strong>de</strong> ser poeta”.<br />
Morreu em 1875, em Niterói. Poeta <strong>de</strong> transição, her<strong>de</strong>iro do<br />
byronismo <strong>de</strong> Álvares <strong>de</strong> Azevedo e do lirismo singelo <strong>de</strong> Ca‑<br />
simiro <strong>de</strong> Abreu em seu primeiro livro (Noturnas), logo impõe<br />
sua forte personalida<strong>de</strong> poética, modulando temas abolicio‑<br />
nistas, libertários e religiosos. A nota <strong>mais</strong> pessoal <strong>de</strong> sua po‑<br />
esia está ligada à sedução da vida na natureza, em contraste<br />
com suas periódicas crises <strong>de</strong> atração e repulsão pela cida<strong>de</strong>,<br />
expressa em inúmeros poemas: “Eis a cida<strong>de</strong>! Ali a guerra, as<br />
trevas,/ a lama, a podridão, a iniquida<strong>de</strong>;/ aqui o céu azul, as<br />
selvas virgens,/ o ar, a luz, a vida, a liberda<strong>de</strong>!”. Neste conflito<br />
viveu, neste conflito morreu.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
FERNANDO PESSOA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Teresa Rita Lopes<br />
Fernando Pessoa (1888 ‑1935)<br />
Natural <strong>de</strong> Lisboa, Portugal<br />
12 a edição – 176 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0053 ‑7<br />
Os milagres poéticos, como qualquer milagre, não es‑<br />
colhem lugar para acontecer. Fernando Pessoa, um dos<br />
poetas <strong>mais</strong> importantes do século XX e “um dos poetas<br />
<strong>mais</strong> singulares <strong>de</strong> todos os tempos” (Otto Maria Carpeaux),<br />
figura universal, estudado e imitado nos quatro cantos do<br />
mundo, do Japão ao Equador, da França à Austrália, surgiu<br />
em um momento em que a literatura portuguesa atraves‑<br />
sava um período <strong>de</strong> estagnação, que vinha se acentuando<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o <strong>de</strong>saparecimento da geração <strong>de</strong> Eça <strong>de</strong> Queirós e<br />
Antero <strong>de</strong> Quental.<br />
Nascido em Lisboa, em 1888, foi educado em Durban<br />
(África do Sul), para on<strong>de</strong> sua mãe se mudara, após o se‑<br />
gundo casamento. Des<strong>de</strong> os treze <strong>anos</strong> escreveu poemas em<br />
inglês e foi nesse idioma que fez sua estreia, em 1918, com<br />
dois folhetos, Antinous e 35 sonnets, repletos <strong>de</strong> angústia<br />
diante da impotência <strong>de</strong> <strong>de</strong>svendar os mistérios da vida. No<br />
dia a dia, levava uma vida mo<strong>de</strong>sta, trabalhando como corres‑<br />
pon<strong>de</strong>nte comercial e frequentando um limitado círculo <strong>de</strong><br />
amigos. Como ser humano, <strong>de</strong>finiu ‑se “histero ‑neurastênico”,<br />
histérico na emoção e neurastênico na inteligência e na von‑<br />
ta<strong>de</strong>. Em 1934, publicou Mensagem, poemas em louvor da<br />
pátria, que recebeu um prêmio oficial. Quando morreu, no<br />
ano seguinte, era quase um <strong>de</strong>sconhecido. Só então, graças<br />
à iniciativa <strong>de</strong> amigos, sua obra inédita começou a ser editada,<br />
revelando o verda<strong>de</strong>iro Fernando Pessoa, poeta sentimental,<br />
her<strong>de</strong>iro do simbolismo (“o poeta é um fingidor”), e os seus<br />
heterônimos, o cético Alberto Caeiro (“o único sentido oculto<br />
das coisas/ é elas não terem sentido oculto nenhum”), o sen‑<br />
sual Álvaro <strong>de</strong> Campos, discípulo <strong>de</strong> Walt Whitman, vivendo<br />
experiências extremas <strong>de</strong> <strong>de</strong>sagregação da personalida<strong>de</strong> (“<strong>de</strong><br />
quem é o olhar que espreita por meus olhos?”), o meio pagão<br />
Ricardo Reis (“tenho <strong>mais</strong> almas que uma”). Foi um terre‑<br />
moto, cuja vibração continua abalando a poesia universal.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
<strong>39</strong>
FERREIRA GULLAR<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Alfredo Bosi<br />
Ferreira Gullar (1930)<br />
Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />
7 a edição – 296 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0293 ‑7<br />
Ferreira Gullar, testemunha poética da vida brasileira<br />
na segunda meta<strong>de</strong> do século XX e início do novo século, é<br />
um poeta <strong>de</strong> muitas vozes e caminhos, separados por quase<br />
cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> poética, mas entrelaçados pela<br />
coerência íntima, por alguns temas permanentes e a preo‑<br />
cupação fundamental com o ser humano e o mundo que o<br />
envolve. “Todas as coisas <strong>de</strong> que falo estão na cida<strong>de</strong>/ entre<br />
o céu e a terra”, “são coisas, todas elas,/ cotidianas, como<br />
bocas/ e mãos, sonhos, greves,/ <strong>de</strong>núncias”.<br />
Ferreira Gullar, pseudônimo <strong>de</strong> José Ribamar Ferreira,<br />
nasceu em São Luís, Maranhão, em 1930. Aos <strong>de</strong>zenove<br />
<strong>anos</strong> estreou com o volume <strong>de</strong> poemas Um pouco acima do<br />
chão, uma espécie <strong>de</strong> prefácio à sua obra madura, que se<br />
inicia com A luta corporal (1954), um livro inovador pela<br />
linguagem e as experimentações gráficas, que o aproxima‑<br />
ram dos poetas paulistas Décio Pignatari, Haroldo e Augusto<br />
<strong>de</strong> Campos, lançadores da poesia concreta (1956). Na dé‑<br />
cada <strong>de</strong> 1960, Gullar assume uma posição política <strong>de</strong> es‑<br />
querda, i<strong>de</strong>ntifica ‑se com a cultura popular e acredita que<br />
sua poesia possa atuar como um elemento <strong>de</strong> transforma‑<br />
ção social. Dessa fase são os cordéis João Boa Morte e Quem<br />
matou Aparecida? Exilado durante o regime militar, escreveu<br />
na Argentina Poema sujo (1976), <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> repercussão na<br />
época <strong>de</strong> sua publicação e que Vinicius <strong>de</strong> Moraes consi<strong>de</strong>‑<br />
rava “o <strong>mais</strong> importante poema escrito no Brasil nos últimos<br />
<strong>de</strong>z <strong>anos</strong>, pelo menos. E não só no Brasil”. Nos trabalhos<br />
posteriores, sem abrir mão da revolta contra a injustiça e a<br />
opressão, o poeta <strong>de</strong>monstra preocupação com a morte e<br />
a crise da cultura do mundo ultramo<strong>de</strong>rno, a vitória da ba‑<br />
nalida<strong>de</strong> e do consumismo. Como observou Pedro Dantas,<br />
“nenhum outro poeta viveu, exprimiu e experimentou como<br />
ele as angústias <strong>de</strong> uma crise cultural que vai além da cultura<br />
para abranger, no seu todo, o próprio sentido da vida”.<br />
40<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
FLORBELA ESPANCA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Zina C. Bellodi<br />
Florbela Espanca (1894 ‑1930)<br />
Natural <strong>de</strong> Vila Viçosa, Portugal<br />
1 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1017 ‑4<br />
Há quase cem <strong>anos</strong> os sonetos amorosos <strong>de</strong> Florbela<br />
Espanca fascinam e incen<strong>de</strong>iam a sensibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sucessi‑<br />
vas gerações <strong>de</strong> leitores da língua portuguesa. Não menos<br />
fascinante e romanesca são suas origens. Seu nascimento<br />
parece um romance <strong>de</strong> Camilo Castelo Branco. Como sua<br />
esposa legítima fosse estéril, o comerciante José Maria Es‑<br />
panca convence ‑a da conveniência <strong>de</strong> ele gerar um filho<br />
em sua amante, Antonia Conceição Lobo. Desse tratado<br />
insólito, nasce em Vila Viçosa, em 1894, uma menina bati‑<br />
zada com o nome <strong>de</strong> Flor Bela Lobo, <strong>de</strong> pai <strong>de</strong>sconhecido.<br />
A própria esposa <strong>de</strong> José Maria assiste ao nascimento e leva<br />
a criança à casa paterna, on<strong>de</strong> vive, amamentada pela mãe.<br />
Mais tar<strong>de</strong>, a menina adota o lindo nome <strong>de</strong> Florbela <strong>de</strong><br />
Alma da Conceição Espanca.<br />
Parece pre<strong>de</strong>stinada ao amor. Sua curta biografia é assi‑<br />
nalada por vários amores (casou ‑se três vezes, rompeu com a<br />
família, escandalizou a socieda<strong>de</strong> provinciana lusa) e uma<br />
saú<strong>de</strong> precária que a levaria à morte prematura na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Matosinhos, em 1930. Florbela estreia em 1919, com Livro <strong>de</strong><br />
mágoas, a que se seguiram Livro <strong>de</strong> Soror Sauda<strong>de</strong> e Char‑<br />
neca em flor (póstumo), todos compostos exclusivamente por<br />
sonetos. Os Sonetos completos, reunindo ainda os versos iné‑<br />
ditos <strong>de</strong> Reliquae, foram publicados em 1934. Ar<strong>de</strong>nte, sen‑<br />
sual, <strong>de</strong>safiadora, Florbela era mulher <strong>de</strong> imensa riqueza<br />
interior e imensas dúvidas (“A minha vida! Quel gâchis! Se eu<br />
nem mesmo sei o que quero!”), expressando ‑se em versos <strong>de</strong><br />
um erotismo feminino sem paralelo na literatura portuguesa,<br />
mas marcados também pela generosida<strong>de</strong>, o sentimento <strong>de</strong><br />
sacrifício, a ternura extrema, os momentos <strong>de</strong> encanto e <strong>de</strong>‑<br />
sencanto do relacionamento amoroso, e um permanente sen‑<br />
timento <strong>de</strong> insatisfação, que <strong>de</strong>ságua em ânsia pelo infinito,<br />
em libertação, que fazem <strong>de</strong>la uma precursora da liberda<strong>de</strong><br />
feminina.<br />
M e l h o r e s P o e M a s
GILBERTO MENDONÇA<br />
TELES<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Luiz Busatto<br />
Gilberto Mendonça Teles (1931)<br />
Natural <strong>de</strong> Goiás, GO<br />
3 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0326 ‑7<br />
Gilberto Mendonça Teles, nascido em Goiás (1931), é um<br />
cidadão do mundo. Como professor, já viveu e lecionou em<br />
universida<strong>de</strong>s do Uruguai, da França, <strong>de</strong> Portugal e dos Estados<br />
Unidos. Como poeta ja<strong>mais</strong> se <strong>de</strong>svinculou da terra natal, pre‑<br />
sença persistente em todos os momentos <strong>de</strong> sua obra (“Só te<br />
vejo, Goiás, quando me afasto”), espécie <strong>de</strong> reino mágico as‑<br />
sinalado por “uma extinta pureza drummondiana”.<br />
Com uma obra poética extensa (a que se junta uma<br />
intensa ativida<strong>de</strong> como ensaísta), Teles estreou em livro em<br />
1955, num momento em que a última geração literária<br />
surgida na literatura brasileira, a chamada Geração <strong>de</strong> 45,<br />
começava a per<strong>de</strong>r o ardor inicial, lançando ‑se em busca <strong>de</strong><br />
novos caminhos espirituais. O poeta não se i<strong>de</strong>ntifica com<br />
o grupo e segue os seus próprios caminhos: “Sou um poeta<br />
só, sem geração,/ que chegou tar<strong>de</strong> à gare mo<strong>de</strong>rnista/ e<br />
entrou num trem qualquer, na contramão,/ e vai seguindo<br />
sem sair da pista”. Em sua pista particular, fiel a si mesmo,<br />
na contramão das modas efêmeras, um tanto <strong>de</strong>sconfiado<br />
do experimentalismo das vanguardas, a criação poética<br />
está sempre associada à ativida<strong>de</strong> profissional. “O crítico<br />
literário, o professor nunca se separam do artista”, mestre<br />
em conciliar sua poesia com “os temas e motivos poéticos<br />
<strong>de</strong>correntes do tumulto da vida e do mundo”, como ob‑<br />
serva Luiz Busatto no prefácio aos Melhores poemas Gil‑<br />
berto Mendonça Teles. Assim, a evolução do poeta corre<br />
em paralelo à sua condição <strong>de</strong> testemunha <strong>de</strong> seu tempo,<br />
nem tanto pela inclusão <strong>de</strong> fatos contemporâneos em sua<br />
obra, como registro ou material <strong>de</strong> reflexão, mas por aquela<br />
misteriosa sintonia com o universo espiritual da época. Mas<br />
há também a preocupação com os aspectos técnicos e ar‑<br />
tesanais <strong>de</strong> sua arte, fazendo “da criação poética o leitmotiv<br />
<strong>de</strong> toda a sua obra”, <strong>de</strong>finida por Luiz Busatto como uma<br />
permanente “trepidação diante da vida”.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
GONÇALVES DIAS<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
José Carlos Garbuglio<br />
Gonçalves Dias (1823 ‑1864)<br />
Natural <strong>de</strong> Caxias, MA<br />
7 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0272 ‑2<br />
Primeiro gran<strong>de</strong> poeta brasileiro, <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte das três<br />
raças que formaram o país – o negro, o índio e o português –,<br />
Gonçalves Dias soube expressar com engenho e arte, como<br />
nenhum outro romântico, as sugestões do ambiente brasileiro<br />
e as tradições indígenas, além <strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrar simpatia pelo<br />
negro escravo, e recriar a balada medieval lusitana nas Sexti‑<br />
lhas <strong>de</strong> Frei Antão, numa espécie <strong>de</strong> homenagem ao sangue<br />
das três raças que circulavam em suas veias.<br />
Nascido em Caxias, Maranhão, em 1823, filho <strong>de</strong> um<br />
comerciante português e <strong>de</strong> uma cafusa, logo abandonada<br />
pelo pai, Gonçalves Dias formou ‑se em leis, em Coimbra<br />
(1844). Dois <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, publicou no Rio <strong>de</strong> Janeiro seu livro<br />
<strong>de</strong> estreia, Primeiros cantos, que lhe <strong>de</strong>u fama no país e em<br />
Portugal, saudado por Alexandre Herculano como “inspira‑<br />
ções <strong>de</strong> um gran<strong>de</strong> poeta”. A fase que vai até 1851, quando<br />
saíram os Últimos cantos, constitui a melhor parte <strong>de</strong> sua<br />
obra poética, on<strong>de</strong> se encontram seus poemas <strong>mais</strong> inspira‑<br />
dos e populares, inclusive a “Canção do exílio”. E também a<br />
parte <strong>mais</strong> significativa da poesia indianista (classificada por<br />
ele como “poesias americanas”): I ‑Juca ‑Pirama, Marabá,<br />
Canção do Tamoio. A lírica <strong>de</strong> Gonçalves Dias inspira ‑se na<br />
natureza, na religião, mas sobretudo em seus conflitos ínti‑<br />
mos, em um certo fundo <strong>de</strong> permanente melancolia que lhe<br />
marca o temperamento e contagia sua poesia amorosa.<br />
Nesse terreno, nenhum poema supera o extraordinário<br />
“Ainda uma vez – A<strong>de</strong>us!”, dos <strong>mais</strong> belos que já se escre‑<br />
veu no Brasil, suficiente para imortalizar um poeta. Acla‑<br />
mado ainda em vida como “o poeta nacional por excelência”<br />
(José <strong>de</strong> Alencar), apontado <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong> como um lídimo<br />
exemplar “do genuíno povo brasileiro” (Silvio Romero), Gon‑<br />
çalves Dias nada per<strong>de</strong>u <strong>de</strong> sua gran<strong>de</strong>za.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
41
GREGÓRIO DE MATOS<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Darcy Damasceno<br />
Gregório <strong>de</strong> Matos (1636 ‑1696)<br />
Natural <strong>de</strong> Salvador, BA<br />
8 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1582 ‑1<br />
Rancoroso e vingativo, não hesitando em enlamear<br />
quem lhe ofen<strong>de</strong>sse, Gregório <strong>de</strong> Matos foi o cronista fiel e<br />
implacável das “torpezas, vícios e eng<strong>anos</strong>” da socieda<strong>de</strong> bra‑<br />
sileira colonial. Seu verso maledicente não poupava ninguém:<br />
brancos, negros, ju<strong>de</strong>us, nobres, plebeus, padres, po<strong>de</strong>rosos,<br />
prostitutas, a própria cida<strong>de</strong> da Bahia (“presépio <strong>de</strong> bestas”),<br />
o que lhe valeu a alcunha <strong>de</strong> Boca do Inferno. Numa espécie<br />
<strong>de</strong> nativismo voltou ‑se também contra os portugueses, que<br />
acusava <strong>de</strong> exploradores: “os brasileiros são bestas;/ e estão<br />
sempre a trabalhar/ toda a vida, por manter/ mag<strong>anos</strong> <strong>de</strong> Por‑<br />
tugal”. Nascido na Bahia, formado pela Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Coimbra, advogou em Lisboa, satirizou a socieda<strong>de</strong> portu‑<br />
guesa, tornando ‑se temido. De volta à terra natal, por volta<br />
<strong>de</strong> 1680, ali se <strong>de</strong>senten<strong>de</strong>u com todo mundo (“querem ‑me<br />
aqui todos mal;/ mas eu quero mal a todos”), satirizou gregos<br />
e bai<strong>anos</strong> (cerca <strong>de</strong> 95% <strong>de</strong> seus poemas conhecidos são<br />
<strong>de</strong>ssa fase), sofreu uma tentativa <strong>de</strong> assassinato, foi preso e,<br />
já beirando os sessenta <strong>anos</strong>, exilado em Angola. Graças a<br />
amigos, obteve permissão para voltar ao Brasil, fixando ‑se em<br />
Pernambuco, on<strong>de</strong> morreu, sem nunca ter publicado livro. A<br />
obra <strong>de</strong> Gregório <strong>de</strong> Matos permaneceu em manuscrito du‑<br />
rante dois séculos, gerando dúvidas quanto à autoria. Alguns<br />
poemas, em particular os líricos e os religiosos, não passam <strong>de</strong><br />
tradução ou imitação <strong>de</strong> poetas espanhóis, sobretudo Que‑<br />
vedo. Não é a parte <strong>mais</strong> interessante <strong>de</strong> sua obra, mas reve‑<br />
lam, ao lado do satírico implacável, em permanente estado <strong>de</strong><br />
revolta, um moralista e um homem <strong>de</strong> sensibilida<strong>de</strong> religiosa,<br />
preocupado com os “<strong>de</strong>seng<strong>anos</strong> da vida humana”, com a<br />
fugacida<strong>de</strong> das coisas, com a morte. Neste ponto, Gregório<br />
<strong>de</strong> Matos mostrava bem ser um homem <strong>de</strong> sua época, um<br />
homem típico do Barroco.<br />
42<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
GUILHERME DE<br />
ALMEIDA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Carlos Vogt<br />
Guilherme <strong>de</strong> Almeida (1890 ‑1969)<br />
Natural <strong>de</strong> Campinas, SP<br />
3 a edição – 112 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0325 ‑9<br />
Guilherme <strong>de</strong> Almeida viveu uma longa fase da história<br />
da poesia brasileira, que se esten<strong>de</strong> do período crepuscular<br />
que antece<strong>de</strong>u o Mo<strong>de</strong>rnismo ao surgimento e à consolida‑<br />
ção <strong>de</strong> movimentos como o Concretismo ou a Poesia Praxis,<br />
chocantes à sua sensibilida<strong>de</strong> educada nos velhos clássicos.<br />
Foi <strong>mais</strong> <strong>de</strong> meio século <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>, em que o poeta<br />
exibiu um raro virtuosismo e domínio da língua, compondo<br />
poemas <strong>de</strong> sabor camoniano (Camoniana, 1956), recriando<br />
a atmosfera <strong>de</strong> velhos romances populares portugueses<br />
(Pequeno romanceiro, 1957), parodiando a poesia grega<br />
clássica (A frauta que eu perdi, 1924), cultivando o verso<br />
parnasiano, simbolista, mo<strong>de</strong>rnista (Meu, Raça, Encanta‑<br />
mento, todos <strong>de</strong> 1925), mas sem nunca abandonar a nota<br />
romântica, predominante ao longo <strong>de</strong> toda a sua vasta<br />
obra. Seus primeiros livros, anteriores à Semana <strong>de</strong> Arte<br />
Mo<strong>de</strong>rna – <strong>de</strong> Nós (1917) a Era uma vez... (1922) –, reve‑<br />
lam uma poesia <strong>de</strong> meios ‑tons, em que o agudo senti‑<br />
mento da beleza se harmoniza com um certo artificialismo,<br />
muito ao gosto da socieda<strong>de</strong> da época. Tanto assim que os<br />
seus livros andavam nas mãos <strong>de</strong> todas as moças. A a<strong>de</strong>são<br />
ao mo<strong>de</strong>rnismo evi<strong>de</strong>ncia um <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> se ajustar ao gosto<br />
do tempo, mas não representa nenhuma mudança signifi‑<br />
cativa em sua obra. Dispensa “a rima e a métrica, mas a<br />
alma romântica continua”, observa Carlos Vogt no prefácio<br />
aos Melhores poemas Guilherme <strong>de</strong> Almeida. O poeta se<br />
manteve fiel às suas tendências pessoais, o que lhe foi<br />
muito benéfico. Seus livros <strong>de</strong>sfrutavam <strong>de</strong> uma populari‑<br />
da<strong>de</strong> a que nenhum mo<strong>de</strong>rnista chegava perto. Essa popu‑<br />
larida<strong>de</strong> se manteve até a última fase <strong>de</strong> sua obra, carac terizada<br />
por uma linguagem <strong>mais</strong> enxuta, menos rica <strong>de</strong> emoção,<br />
mas na qual ainda se sente, um tanto enfraquecida, a voz<br />
do velho romântico. Guilherme <strong>de</strong> Almeida faleceu em<br />
1969 na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo.<br />
M e l h o r e s P o e M a s
HAROLDO DE CAMPOS<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Inês Oseki Dépré<br />
Haroldo <strong>de</strong> Campos (1929 ‑2003)<br />
Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />
3 a edição – 176 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0344 ‑6<br />
Quando se fala em Haroldo <strong>de</strong> Campos, logo se pensa<br />
no movimento concretista e nos inquietos <strong>anos</strong> 1950. Ape‑<br />
sar <strong>de</strong> ser impossível, ou pelo menos impraticável, separar<br />
um do outro, a inquietação do poeta foi muito além das<br />
pesquisas for<strong>mais</strong> do Concretismo, <strong>de</strong>ixando uma obra vasta<br />
e variada – é bem verda<strong>de</strong> que sempre marcada pelo expe‑<br />
rimentalismo –, incluindo a poesia, o ensaio, a tradução.<br />
Natural da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo (1929), Haroldo <strong>de</strong> Cam‑<br />
pos fez inúmeras viagens pelo mundo e apren<strong>de</strong>u diversos<br />
idiomas, ativida<strong>de</strong>s consi<strong>de</strong>radas por ele vitais para a expansão<br />
<strong>de</strong> seus horizontes espirituais e o enriquecimento da própria<br />
língua. Nos <strong>anos</strong> 1950, com Augusto <strong>de</strong> Campos e Décio Pig‑<br />
natari, criou o grupo Noigandres, a “flor que afasta o tédio”,<br />
um dos pilares do movimento concretista. O movimento con‑<br />
cretista foi lançado publicamente em 1956, em uma exposição<br />
no Museu <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna <strong>de</strong> São Paulo. Já era então poeta<br />
com vários livros publicados, a partir do Auto do possesso.<br />
Poemas concretistas foram publicados em livro, pela primeira<br />
vez, no volume O â mago do ô mega (1956). Na época, em<br />
tom polêmico, Haroldo alegava que “o poeta, como afirma<br />
Jakobson, é aquele que configura a materialida<strong>de</strong> da lingua‑<br />
gem. Nesse sentido, toda poesia digna <strong>de</strong>ste nome é concreta:<br />
<strong>de</strong> Homero a Dante, <strong>de</strong> Goethe a Pessoa”. O sentido inovador<br />
acompanhou o poeta ao longo <strong>de</strong> toda a sua obra, até o texto<br />
barroco <strong>de</strong> Galáxias, “livro <strong>de</strong> viagem e <strong>de</strong> viagens, viagem‑<br />
‑livro”, como observa Inês Oseki ‑Dépré no prefácio aos Melho‑<br />
res poemas Haroldo <strong>de</strong> Campos, até o inquietante Finismundo:<br />
a última viagem e os elaborados Novos poemas. A mesma in‑<br />
quietação assinala sua ativida<strong>de</strong> no campo da tradução, por<br />
ele <strong>de</strong>nominada transcriação e <strong>de</strong>finida como “tradução que<br />
se propõe como operação radical”. Uma operação radical<br />
que pôs em português alguns dos maiores poemas <strong>de</strong> todos<br />
os tempos, <strong>de</strong> Safo a Homero, <strong>de</strong> Dante a Maiakóvski.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
HENRIQUETA LISBOA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Fábio Lucas<br />
Henriqueta Lisboa (1901 ‑1985)<br />
Natural <strong>de</strong> Lambari, MG<br />
1 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0733 ‑8<br />
Tímida e esquiva, avessa à publicida<strong>de</strong>, Henriqueta<br />
Lisboa fez uma poesia <strong>de</strong> alta qualida<strong>de</strong> literária, equili‑<br />
brada, diáfana, tentando dizer o indizível, seguindo por um<br />
caminho pessoal, dos <strong>mais</strong> fascinantes da literatura brasi‑<br />
leira, mas com a inconfundível marca das Minas Gerais.<br />
A biografia é singela, sem gran<strong>de</strong>s acontecimentos.<br />
Nascida em Lambari, em 1901, formou ‑se professora no Co‑<br />
légio Sion, <strong>de</strong> Campanha, Minas Gerais, on<strong>de</strong> a diretora lhe<br />
<strong>de</strong>u o apelido <strong>de</strong> “la petite orgueilleuse”, por ser tímida e<br />
solitária. Foi professora <strong>de</strong> Literatura Hispano ‑americana na<br />
Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> Minas Gerais. Manteve correspon‑<br />
dência com Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, sendo a personalida<strong>de</strong> femi‑<br />
nina a quem o escritor paulista “en<strong>de</strong>reçou o seu <strong>mais</strong> <strong>de</strong>licado<br />
diálogo”, como observa Fábio Lucas no prefácio aos Melho‑<br />
res poemas Henriqueta Lisboa. Faleceu em 1985. Suas pri‑<br />
meiras obras, publicadas na década <strong>de</strong> 1920, ainda trazem<br />
as marcas do Simbolismo que, <strong>de</strong> certa forma, persistem até<br />
seus últimos livros. A a<strong>de</strong>são ao Mo<strong>de</strong>rnismo lhe aguçou a<br />
sensibilida<strong>de</strong> e espantou alguns preconceitos pessoais,<br />
permitindo ‑lhe incorporar sugestões literárias enriquecedo‑<br />
ras <strong>de</strong> sua visão muito pessoal da vida. Sua poesia alcança<br />
então uma inconfundível feição pessoal, caracterizada pelo<br />
pudor, a discrição, a suavida<strong>de</strong>, a expressão simples, às vezes<br />
um certo preciosismo. Muito prolífica, publicou <strong>mais</strong> <strong>de</strong> vinte<br />
volumes <strong>de</strong> poesia. Na década <strong>de</strong> 1950, Henriqueta já estava<br />
consagrada como uma das <strong>mais</strong> altas vozes da literatura bra‑<br />
sileira, por nomes como Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> e<br />
Manuel Ban<strong>de</strong>ira, que a comparam a Cecília Meireles. Mas<br />
quem melhor <strong>de</strong>finiu sua personalida<strong>de</strong> talvez tenha sido<br />
Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, ao observar em seus versos “a graça in‑<br />
quieta, simples e um pouco agreste, um pouco ácida, dos<br />
passarinhos”. O canto <strong>de</strong>sse passarinho continua muito<br />
agradável aos amigos da poesia.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
43
IVAN JUNQUEIRA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Ricardo Thomé<br />
Ivan Junqueira (1934)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
1 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0854 ‑4<br />
Quando Ivan Junqueira estreou com Os mortos (1964)<br />
a poesia brasileira vivia um momento <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> ebulição,<br />
marcada por buscas e in<strong>de</strong>finições, no dilema clássico <strong>de</strong> não<br />
saber o que se quer, mas saber muito bem o que não se<br />
<strong>de</strong>seja. Três dos maiores poetas brasileiros <strong>de</strong> todos os tem‑<br />
pos – Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, Manuel Ban<strong>de</strong>ira, João<br />
Cabral <strong>de</strong> Melo Neto –, encontravam ‑se vivos e ativos e essa<br />
presença aumentava a ação disseminadora <strong>de</strong> suas poesias.<br />
As vanguardas – Concretismo, Poesia Práxis etc. – davam<br />
sinais <strong>de</strong> plena vitalida<strong>de</strong>, mas sua recepção limitava ‑se a<br />
grupos bem <strong>de</strong>finidos. Muitos jovens tinham a sensação <strong>de</strong><br />
ter chegado tar<strong>de</strong> <strong>de</strong><strong>mais</strong> num mundo velho <strong>de</strong><strong>mais</strong>.<br />
Alguns raros, como Ivan Junqueira, abriam seu pró‑<br />
prio caminho, sem se engajar em grupos, pela força da<br />
própria personalida<strong>de</strong>. O jovem poeta se impôs com carac‑<br />
terísticas muito pessoais, que marcam toda a sua poesia, na<br />
qual o rigor formal – expresso pela concisão rigorosa, a<br />
seleção vocabular, o trabalho <strong>de</strong> arte e artesanato na cons‑<br />
trução do verso – se alia a uma vasta erudição. Três gran<strong>de</strong>s<br />
temas predominam <strong>de</strong> forma obsessiva nesta poesia cons‑<br />
truída sob o signo do precário, do mistério e do obscuro,<br />
em perspectivas oníricas e fantásticas: a morte, <strong>de</strong> presença<br />
avassaladora, símbolo do absurdo da vida; o amor, <strong>mais</strong><br />
fonte <strong>de</strong> conflitos do que <strong>de</strong> prazeres, e a arte, veículo <strong>de</strong><br />
re<strong>de</strong>nção ao niilismo e à angústia do poeta, que acaba por<br />
acirrar ainda <strong>mais</strong> seus dilemas íntimos. Neste conflito entre<br />
razão e emoção, a primeira sempre prevalece, e <strong>de</strong>ssa<br />
forma Ivan exclui <strong>de</strong> sua poesia tudo que seja transitório,<br />
para se <strong>de</strong>ter nas eternas esfinges que <strong>de</strong>safiam o homem,<br />
em face do absoluto, que ele encara com terror e <strong>de</strong>sa‑<br />
lento: “À beira do claustro/ o monge se inclina/ e na pedra<br />
apren<strong>de</strong>/ o que a pedra ensina:/ que a vida é nada/ com a<br />
morte por cima,/ que o tempo apenas/ este fim lhe adia”.<br />
44<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
JOÃO CABRAL<br />
DE MELO NETO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Antonio Carlos Secchin<br />
João Cabral <strong>de</strong> Melo Neto (1920 ‑1999)<br />
Natural <strong>de</strong> Recife, PE<br />
10 a edição – 252 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1470 ‑1<br />
Diplomata <strong>de</strong> carreira, João Cabral <strong>de</strong> Melo Neto (Recife,<br />
1920 ‑Rio <strong>de</strong> Janeiro, 1999) serviu na Espanha, na Inglaterra,<br />
na França e no Senegal. Situado cronologicamente na Gera‑<br />
ção <strong>de</strong> 45, ocupa posição isolada no panorama histórico da<br />
poesia brasileira, por sua personalida<strong>de</strong> ímpar, sua linguagem<br />
enxuta, as imagens predominantemente visuais, o <strong>de</strong>senho<br />
dos poemas, que parecem traçados a régua e compasso. A<br />
crítica aponta ‑o como o ponto máximo da poesia brasileira do<br />
século XX, ao lado <strong>de</strong> Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>.<br />
Um autor difícil? Sim e não. Ou melhor, um poeta que<br />
exige certa iniciação. Como observa Antonio Carlos Secchin<br />
no prefácio aos Melhores poemas João Cabral <strong>de</strong> Melo Neto,<br />
“para o leitor acostumado à lírica <strong>de</strong> tradição romântica,<br />
nada <strong>mais</strong> inusitado do que a poesia <strong>de</strong>ste autor tão avesso<br />
ao confessionalismo, à saturação subjetiva <strong>de</strong> suas mensa‑<br />
gens.”. A poesia <strong>de</strong> João Cabral, como sugere o próprio<br />
poeta, divi<strong>de</strong> ‑se em duas águas. Na primeira linha predo‑<br />
mina a pesquisa da criação poética, o rigor formal, o repúdio<br />
a qualquer nota sentimental ou interferência do irracional,<br />
que se <strong>de</strong>senvolve a partir <strong>de</strong> O engenheiro (1945), até A<br />
escola das facas (1980), incluindo Uma faca só lâmina (1955)<br />
e Museu <strong>de</strong> tudo (1975). A outra gran<strong>de</strong> vertente é a crítica<br />
social, ácida, mas sem qualquer nota panfletária ou <strong>de</strong>ma‑<br />
gógica, na qual persistem todas as constantes da primeira<br />
linha, mas com uma contundência <strong>de</strong> faca, uma faca só lâ‑<br />
mina. O processo, iniciado com O cão sem plumas (1950), se<br />
acentua em O rio (1954) e Morte e vida severina (1955), rea‑<br />
parece em Dois parlamentos (1960) e Agrestes (1984), e<br />
como que se <strong>de</strong>pura no Auto do fra<strong>de</strong> (1984). Convém<br />
ainda salientar a presença obsessiva da Espanha, ao longo <strong>de</strong><br />
toda a sua obra, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> Paisagens com figuras (1955), Qua‑<br />
<strong>de</strong>rna (1959), Serial (1961) até Crime na Calle Relator (1987)<br />
e Sevilha andando (1990).<br />
M e l h o r e s P o e M a s
JORGE DE LIMA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Gilberto Mendonça Teles<br />
Jorge <strong>de</strong> Lima (1893 ‑1953)<br />
Natural <strong>de</strong> União dos Palmares, AL<br />
3 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0342 ‑9<br />
O alagoano Jorge <strong>de</strong> Lima (1895 ‑1953) foi o poeta <strong>mais</strong><br />
original do Mo<strong>de</strong>rnismo brasileiro, o <strong>mais</strong> preso à tradição e,<br />
talvez, o <strong>mais</strong> nacional. Publicou seus primeiros versos ao<br />
gosto parnasiano (XIV alexandrinos). Alguns poemas <strong>de</strong>sse<br />
livro tiveram imensa receptivida<strong>de</strong> popular, como “O acen<strong>de</strong>‑<br />
dor <strong>de</strong> lampiões”, incluído durante <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> <strong>anos</strong> no reper‑<br />
tório <strong>de</strong> todos os profissionais da <strong>de</strong>clamação.<br />
Liberto da camisa <strong>de</strong> força parnasiana, i<strong>de</strong>ntificado<br />
com a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> expressão do Mo<strong>de</strong>rnismo, entrega ‑se<br />
à experiência regionalista (Poemas, Novos poemas, Poemas<br />
escolhidos, Poemas negros), retratando hábitos e costu‑<br />
mes, lendas e personagens nor<strong>de</strong>stinos, com um inconfun‑<br />
dível sabor brasileiro, impregnados <strong>de</strong> sentimento cristão.<br />
Ressaltando a naturalida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses poemas, observou José<br />
Américo que o poeta “não monta em cavalo <strong>de</strong> pau com<br />
ar <strong>de</strong> quem amansa potros chucros”. A impregnação do<br />
sentimento cristão, a aproximação com a Igreja Católica, a<br />
intenção <strong>de</strong> “restaurar a poesia em Cristo” caracterizam os<br />
poemas <strong>de</strong> Tempo e eternida<strong>de</strong>, A túnica inconsútil, Anun‑<br />
ciação e Encontro <strong>de</strong> Mira Celi. “É agora o homem católico,<br />
o sacralizador da matéria do mundo, o vi<strong>de</strong>nte que ante‑<br />
cipa o estado <strong>de</strong> justiça e <strong>de</strong> pureza a que a humanida<strong>de</strong><br />
voltará um dia, o poeta sem malícia para o qual o sexo e a<br />
carne foram glorificados pela encarnação <strong>de</strong> Cristo”, es‑<br />
creve Murilo Men<strong>de</strong>s. Após o virtuosismo do Livro <strong>de</strong> sone‑<br />
tos, atira ‑se à <strong>mais</strong> ousada, perturbadora, “obscura e<br />
secreta” experiência da poesia mo<strong>de</strong>rna brasileira, Inven‑<br />
ção <strong>de</strong> Orfeu, <strong>de</strong> difícil compreensão em tantos trechos.<br />
Para Gilberto Mendonça Teles, prefaciador dos Melhores<br />
poemas Jorge <strong>de</strong> Lima, não só é o gran<strong>de</strong> livro <strong>de</strong> Jorge <strong>de</strong><br />
Lima, “mas também o gran<strong>de</strong> coroamento estético <strong>de</strong> toda<br />
a sua poesia e, <strong>de</strong> certa forma, <strong>de</strong> toda a poesia brasileira<br />
na primeira meta<strong>de</strong> <strong>de</strong>ste século”.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
JOSÉ PAULO PAES<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Davi Arrigucci Jr.<br />
José Paulo Paes (1926 ‑1998)<br />
Natural <strong>de</strong> Taquaritinga, SP<br />
6 a edição – 248 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0600 ‑2<br />
José Paulo Paes foi a antítese do poeta <strong>de</strong>rramado.<br />
Irônico, por vezes <strong>de</strong> uma ironia perversa, indignado, an‑<br />
gustiado, brincalhão, soube expressar, como poucos poe‑<br />
tas, ironia, indignação, angústia e atitu<strong>de</strong>s lúdicas em<br />
poemas breves, brevíssimos, plenos <strong>de</strong> humor, aproximando ‑se<br />
da síntese dos haicais.<br />
Nem sempre foi assim. A obra <strong>de</strong> miniaturista resulta <strong>de</strong><br />
uma longa <strong>de</strong>puração. Em seus primeiros livros, o poeta revela<br />
gosto pelas formas poéticas <strong>mais</strong> longas, com uma leve queda<br />
pelo soneto. A preferência pela síntese se acentua nos Epigra‑<br />
mas (1958), mas só se realiza plenamente em Anatomias<br />
(1967), livro em que “o epigrama e o i<strong>de</strong>ograma se <strong>de</strong>ram as<br />
mãos” (Augusto <strong>de</strong> Campos), por vezes em soluções jocosas,<br />
como “Epitáfio para um banqueiro” ou “Cronologia”.<br />
Em Meia palavra (1973), o poeta se torna ainda <strong>mais</strong><br />
conciso, sintetizando gran<strong>de</strong>s questões em poemas mínimos.<br />
Um exemplo, no qual o título é maior do que o poema,<br />
encontra ‑se em “O vagido da socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo”, que se<br />
resume ao verso “consummatum est!”. O processo se aguça<br />
em Resíduos (1980), em que a nota humorística não raras<br />
vezes se transforma em sarcasmo, como em “Epitáfio para<br />
Rui”: “...e tenho dito/ bravos!/ (mas o que foi mesmo que ele<br />
disse?)”. A partir <strong>de</strong> A poesia está morta mas juro que não fui<br />
eu (1988) e sobretudo nas Prosas seguidas <strong>de</strong> o<strong>de</strong>s mínimas<br />
(1992), por necessida<strong>de</strong> confessional, bastante discreta, o<br />
poeta ce<strong>de</strong> à tentação dos poemas <strong>mais</strong> longos (aliás, menos<br />
curtos), mas nos quais palpita uma comoção, um quê <strong>de</strong> pun‑<br />
gente, ignorado nos epigramas. O poeta se encaminha para a<br />
fase final <strong>de</strong> sua trajetória, angustiado pela vida vivida, inquieto<br />
diante da morte, preocupações expressas nos poemas leve‑<br />
mente dramáticos das Socráticas, como “Preparativos <strong>de</strong> via‑<br />
gem”, on<strong>de</strong> há este verso revelador: “Ele próprio se sente um<br />
pouco póstumo quando conversa com gente jovem”.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
45
LÊDO IVO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Sérgio Alves Peixoto<br />
Lêdo Ivo (1924)<br />
Natural <strong>de</strong> Maceió, AL<br />
4 a edição – 144 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0292 ‑0<br />
Lêdo Ivo lançou seu primeiro livro em um momento <strong>de</strong><br />
intensa transformação da literatura brasileira, em meados da<br />
década <strong>de</strong> 1940, quando uma nova geração literária emergia<br />
e buscava se afirmar. Os novos da época, conhecidos como<br />
Geração <strong>de</strong> 45 e neomo<strong>de</strong>rnistas, procuravam restabelecer o<br />
equilíbrio entre forma e fundo, “a revalorização da palavra, a<br />
criação <strong>de</strong> novas imagens, a revisão dos ritmos e a busca <strong>de</strong><br />
novas soluções for<strong>mais</strong>” (Tristão <strong>de</strong> Athay<strong>de</strong>), preservando as<br />
liberda<strong>de</strong>s alcançadas pelo Mo<strong>de</strong>rnismo.<br />
A crítica observou que As imaginações (1944) e O<strong>de</strong> e<br />
elegia (1945) encarnavam esses novos rumos da poesia<br />
brasileira, inclusive em suas hesitações. Mas o poeta se dis‑<br />
tinguia pela capacida<strong>de</strong> emocional, uma sensibilida<strong>de</strong> ro‑<br />
mântica e uma espécie <strong>de</strong> alquimia verbal, um amplo<br />
domínio sobre as palavras e rara capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reuni ‑las,<br />
extraindo <strong>de</strong>las efeitos novos, mágicos e surpreen<strong>de</strong>ntes. A<br />
preferência pelo soneto (gênero em que o poeta escreveria<br />
centenas <strong>de</strong> poemas) se afirma a partir <strong>de</strong> Acontecimento<br />
do soneto (1949), uma espécie <strong>de</strong> exercício <strong>de</strong> contenção,<br />
sem abdicar da linguagem luxuriante e da adjetivação ino‑<br />
vadora. Com o tempo, o poeta foi podando excessos, re‑<br />
duzindo os poemas a formas cada vez <strong>mais</strong> sintéticas,<br />
numa ação semelhante ao <strong>de</strong>sgaste produzido pelo tempo,<br />
num esforço <strong>de</strong> extrair apenas o essencial dos fatos, mas<br />
sem renunciar ao permanente exercício do soneto e <strong>de</strong> ou‑<br />
tras formas poéticas <strong>de</strong> sua preferência. Aproxima ‑se da<br />
poesia oriental, em particular do haicai, como po<strong>de</strong> ser<br />
exemplificada em “Confissão do mentiroso” (“Nada tenho<br />
a dizer,/ e toda vez que escrevo/ digo o meu tudo”) e “O<br />
silêncio divino” (“O silêncio. Deus fala/ pelos cotovelos/ ou<br />
é o gran<strong>de</strong> mudo?”). Sintético e mo<strong>de</strong>rno, como os poetas<br />
chineses, há 3 mil <strong>anos</strong>. A verda<strong>de</strong>ira poesia flutua acima<br />
dos tempos.<br />
46<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
LINDOLF BELL<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Péricles Pra<strong>de</strong><br />
Lindolf Bell (1938 ‑1998)<br />
Natural <strong>de</strong> Timbó, SC<br />
1 a edição – 264 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1356 ‑8<br />
Poeta em tempo integral, como observa Péricles Pra<strong>de</strong><br />
no prefácio a esses Melhores poemas Lindolf Bell, Lindolf<br />
Bell foi uma espécie <strong>de</strong> apóstolo da poesia, pregando sua<br />
mensagem poética on<strong>de</strong> houvesse alguém capaz <strong>de</strong> ouvi ‑lo.<br />
Pois nele coabitavam o poeta e o ator, o artista do verso e<br />
o <strong>de</strong>clamador apaixonado, perturbador em seu po<strong>de</strong>r <strong>de</strong><br />
comunicação com os ouvintes. “Nunca tinha visto ninguém<br />
dizer poemas tão bem, com tanta intensida<strong>de</strong>, tanta garra,<br />
tanto domínio da voz, do gesto e do sentido”, registrou<br />
Paulo Leminski.<br />
Em seu apostolado, Bell criou o movimento Catequese<br />
Poética, voltado para a divulgação da poesia em espaços<br />
abertos, em ruas, portas <strong>de</strong> fábricas, viadutos, praças, es‑<br />
colas, bares, teatros, universida<strong>de</strong>s, estádios.<br />
Sua poesia guarda alguma coisa <strong>de</strong>ssa ânsia <strong>de</strong> ser<br />
ouvido por todos, <strong>de</strong> contaminar o mundo e arredores com<br />
a beleza. Mesmo quando expressa sentimentos <strong>mais</strong> ínti‑<br />
mos, parece voltado para uma plateia, com a empostação<br />
e a tonalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> quem fala em voz alta.<br />
Com essa convicção e <strong>de</strong>terminação, Bell publicou treze<br />
livros <strong>de</strong> poemas, testemunhas <strong>de</strong> uma longa trajetória – <strong>mais</strong><br />
<strong>de</strong> trinta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> poética – que se inicia por uma<br />
espécie <strong>de</strong> reação à indiferença humana pelos valores espiri‑<br />
tuais, e se refina na interiorização e na i<strong>de</strong>ntificação com a<br />
natureza, numa busca incansável <strong>de</strong> si mesmo.<br />
Dominando a linguagem, mas sempre em busca <strong>de</strong><br />
novas trilhas, o poeta utilizou “toda a riqueza dos anagra‑<br />
mas, das homofonias, das aliterações e do ritmo, o que faz<br />
da leitura e releitura <strong>de</strong> seus poemas uma experiência lú‑<br />
cida, na qual se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>scobrir sempre novos efeitos não<br />
percebidos anteriormente” (Maria Carneiro da Cunha). O<br />
que, em outras palavras, significa a busca permanente e<br />
paciente da beleza, expressa através da poesia.<br />
M e l h o r e s P o e M a s
LUÍS DE CAMÕES<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Leo<strong>de</strong>gário A. <strong>de</strong> Azevedo Filho<br />
Luís <strong>de</strong> Camões (1524? ‑1580)<br />
Natural <strong>de</strong> Lisboa, Portugal<br />
4 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0291 ‑3<br />
Quando se fala em Luís <strong>de</strong> Camões as pessoas pen‑<br />
sam logo em Os lusíadas. É natural. A epopeia camoniana<br />
é como uma imensa montanha, lançando sombra sobre<br />
tudo que lhe fica próximo. Resume o povo português e<br />
suas aspirações, sendo, como observou Gilberto Freyre “a<br />
<strong>mais</strong> completa das autobiografias coletivas que um homem<br />
<strong>de</strong> gênio já <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> sua própria gente”.<br />
Mas, ao lado do épico, há um poeta da mesma altitu<strong>de</strong>,<br />
<strong>mais</strong> próximo às pessoas comuns, cantando como nunca se<br />
cantou em língua portuguesa sentimentos como o amor, a<br />
amiza<strong>de</strong>, a gratidão, em versos tão fortes e pungentes e com<br />
palavras tão lindamente ditas que até parecem escritas dire‑<br />
tamente para cada leitor. Esse milagre <strong>de</strong> gênio se explica<br />
pelo fato <strong>de</strong> cada poema lírico <strong>de</strong> Camões ser fruto <strong>de</strong> uma<br />
situação vivida com intensida<strong>de</strong>, em uma vida <strong>de</strong> muitos<br />
amores, aventuras e <strong>de</strong>silusões. Luís <strong>de</strong> Camões (1524? ‑1580)<br />
nasceu em uma família da pequena nobreza lusitana, <strong>de</strong>caída<br />
e empobrecida, em local ignorado, talvez Lisboa. A formação<br />
cultural se <strong>de</strong>u em Coimbra, on<strong>de</strong> adquiriu a imensa cultura<br />
expressa em sua epopeia. Na mocida<strong>de</strong>, frequentou os meios<br />
aristocráticos e a boêmia, pelas ruelas noturnas <strong>de</strong> Lisboa.<br />
Envolveu ‑se em brigas, relacionou ‑se com meretrizes do<br />
Bairro Alto. Por razões misteriosas, nunca frequentou os<br />
meios literários. Como soldado, combateu contra os mouros<br />
em Ceuta (Marrocos), per<strong>de</strong>ndo um dos olhos em combate.<br />
Em 1552, após ferir um funcionário do Paço, foi preso e en‑<br />
viado a Goa. Viveu dias difíceis no Oriente. Em um naufrágio<br />
na costa da Cochinchina, per<strong>de</strong>u os bens e a companheira<br />
chinesa, atingindo a costa a nado, com o manuscrito <strong>de</strong> Os<br />
lusíadas. Só regressou a Portugal em 1569. Três <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois<br />
publicou Os lusíadas. Graças ao poema, obteve uma pensão<br />
concedida pelo Estado, mo<strong>de</strong>sta e paga <strong>de</strong> maneira irregular.<br />
Dizem que curtiu miséria e fome.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
LUÍS DELFINO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Lauro Junkes<br />
Luís Delfino (1834 ‑1910)<br />
Natural <strong>de</strong> Desterro, SC<br />
3 a edição – 144 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0250 ‑3<br />
Houve um tempo em que Luís Delfino era consi<strong>de</strong>rado<br />
um poeta da estatura <strong>de</strong> Olavo Bilac. E muito <strong>mais</strong> home‑<br />
nageado. Apontado como o Victor Hugo brasileiro pelos<br />
românticos da década <strong>de</strong> 1860, consi<strong>de</strong>rado o maior poeta<br />
vivo do Brasil, em concurso promovido pela revista A Se‑<br />
mana (1885), eleito Príncipe dos Poetas Brasileiros pelos<br />
jovens simbolistas, em 1898, conseguiu atravessar meio<br />
século <strong>de</strong> poesia reverenciado como um mestre.<br />
Com sua morte, em 1910, e o ineditismo <strong>de</strong> seus poe‑<br />
mas em livro, o poeta sofreu uma baixa consi<strong>de</strong>rável na ad‑<br />
miração dos leitores <strong>de</strong> poesia. A edição <strong>de</strong> suas obras, a<br />
partir <strong>de</strong> 1927, sem separar o ouro do cascalho, não conse‑<br />
guiu restituir ‑lhe o antigo prestígio. Só em nossos dias, o<br />
poeta voltou a fascinar leitores e estudiosos <strong>de</strong> poesia, gra‑<br />
ças a antologias como os Melhores poemas Luís Delfino,<br />
selecionados com critério e conhecimento <strong>de</strong> causa por<br />
Lauro Junkers. Mas sempre manteve a admiração dos inicia‑<br />
dos na arte poética. Manuel Ban<strong>de</strong>ira, por exemplo, consi‑<br />
<strong>de</strong>rava a sua poesia “bem pessoal, <strong>de</strong>liciosamente estranha”.<br />
Dante Milano chega a admitir que se Delfino tivesse domado<br />
o seu impetuoso verbalismo e a sua <strong>de</strong>senfreada imaginação<br />
po<strong>de</strong>ria ter sido “o nosso maior poeta”. Autor <strong>de</strong> poemas<br />
caudalosos na mocida<strong>de</strong>, inspirados pelos <strong>de</strong>lírios românti‑<br />
cos, podou um pouco <strong>de</strong> seus excessos sob a disciplina par‑<br />
nasiana, assim como incorporou uns vagos tons simbolistas.<br />
Foi o Parnasianismo, também, que o levou a i<strong>de</strong>ntificar no<br />
soneto seu veículo i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> expressão. O exagero da época<br />
dizia que escreveu <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 5 mil. Não é preciso tanto para se<br />
manter entre os gran<strong>de</strong>s poetas brasileiros <strong>de</strong> todos os tem‑<br />
pos. Poemas como “As três irmãs”, “Capricho <strong>de</strong> Sardana‑<br />
palo”, “A sultana” e “A primeira lágrima” (os três últimos<br />
sonetos) bastam para lhe garantir um lugar especial na evo‑<br />
lução da poesia brasileira.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
47
LUIZ DE MIRANDA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Regina Zilbermann<br />
Luiz <strong>de</strong> Miranda (1945)<br />
Natural <strong>de</strong> Uruguaiana, RS<br />
1 a edição – 208 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1419 ‑0<br />
Luiz <strong>de</strong> Miranda publicou o seu primeiro livro <strong>de</strong> poe‑<br />
mas, Andança, em 1969. O Brasil vivia um dos momentos<br />
<strong>mais</strong> terríveis <strong>de</strong> sua história, sob o regime <strong>de</strong> ditadura mili‑<br />
tar, que durou <strong>mais</strong> <strong>de</strong> vinte <strong>anos</strong>. Perseguido político, ca‑<br />
çado pela polícia, Miranda escrevia então uma poesia<br />
engajada e corajosa (“On<strong>de</strong> tenho a injustiça/ me <strong>de</strong>tenho”),<br />
reunida em sua segunda obra, Solidão provisória, na qual<br />
acentua a “grávida rebeldia/ que me acompanha”.<br />
Na década <strong>de</strong> 1980, Miranda toma um novo rumo, com<br />
a passagem da poesia política para o lirismo subjetivo, que<br />
assinala daí em diante os seus versos. Voltado para si mesmo<br />
e suas lembranças, o poeta conta como se vê: “Menino ainda<br />
sou/ e assim me canto”. Mas convivendo com o menino, está<br />
o adulto sofrido, “o louco, o <strong>de</strong>serdado, o gaudério”.<br />
O amor é outra presença forte na obra <strong>de</strong> Miranda,<br />
que canta a amada numa poesia que lembra a sensualida<strong>de</strong><br />
arrebatada do rei Salomão, levando Regina Zilberman a<br />
consi<strong>de</strong>rá ‑la uma “espécie <strong>de</strong> Cântico dos cânticos do escri‑<br />
tor gaúcho”.<br />
A outra gran<strong>de</strong> paixão <strong>de</strong> Luiz Miranda é a capital gaú‑<br />
cha, que canta em Porto Alegre – roteiro da paixão. Encar‑<br />
nando o flâneur imaginado por Walter Benjamin, o poeta<br />
percorre a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um extremo a outro, vê o mundo dos<br />
ricos e mergulha no submundo, entre marginais e excluídos,<br />
nos quais i<strong>de</strong>ntifica a expressão <strong>mais</strong> completa da urbe. É<br />
nas madrugadas que as prostitutas “<strong>de</strong> carne e solidão/ es‑<br />
crevem o poema/ <strong>mais</strong> do que secreto/ aquele que se lê/ sob<br />
o céu aberto/ dos quartos <strong>de</strong> aluguel”.<br />
O poeta sente a poesia em toda parte, mas reconhece<br />
a dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> elaborar o poema, “um potro vi<strong>de</strong>nte/ ar‑<br />
mado até os <strong>de</strong>ntes”. O que é um estímulo para quem se<br />
apresenta como poeta “<strong>de</strong> corpo e alma” e vê no poema um<br />
po<strong>de</strong>r que ultrapassa a vonta<strong>de</strong> do criador e “rasga a caixa<br />
do mistério” e “<strong>de</strong>slumbra os objetos da morte”.<br />
48<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
MACHADO DE ASSIS<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Alexei Bueno<br />
Machado <strong>de</strong> Assis (18<strong>39</strong> ‑1908)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
1 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0608 ‑9<br />
Requintada, harmoniosa, equilibrada, a poesia <strong>de</strong> Ma‑<br />
chado <strong>de</strong> Assis ocupa uma posição singular em nossa lite‑<br />
ratura. Des<strong>de</strong> sua estreia, com as Crisálidas (1864), em<br />
pleno período romântico, ele distinguiu ‑se dos seus pares<br />
pela expressão e pelo espírito. Em versos <strong>de</strong> técnica apu‑<br />
rada, com um certo sabor clássico, o jovem poeta falava <strong>de</strong><br />
amor, mas sem a ingenuida<strong>de</strong>, o atropelo e o calor da es‑<br />
cola, <strong>de</strong> suas preocupações com problemas sociais e com a<br />
missão do poeta em meio ao <strong>de</strong>sconcerto do mundo, mas<br />
sem nada revelar <strong>de</strong> seus dramas íntimos, o que lhe valeu<br />
as primeiras acusações <strong>de</strong> frieza.<br />
As Falenas (1870), <strong>mais</strong> amargas que o livro anterior,<br />
indicam o cansaço do autor com o Romantismo e a busca <strong>de</strong><br />
novos caminhos, a preocupação com a linguagem, a metrifi‑<br />
cação, as rimas, a forma, enfim, que se tornaria <strong>mais</strong> visível<br />
ainda nas Americanas (1875). Este livro, uma a<strong>de</strong>são bastante<br />
tardia ao Indianismo, <strong>de</strong>monstra a in<strong>de</strong>pendência do poeta<br />
em relação a modas. Sem publicar livro <strong>de</strong> poemas durante<br />
um quarto <strong>de</strong> século, Machado retorna às estantes com o<br />
volume das Poesias completas (1901), formado por uma sele‑<br />
ção <strong>de</strong> poemas <strong>de</strong> seus livros anteriores e <strong>mais</strong> as Oci<strong>de</strong>ntais.<br />
A nova obra assinala o auge <strong>de</strong> sua evolução poética, com<br />
“poemas cuja perfeição formal não será excedida pelos par‑<br />
nasi<strong>anos</strong>, e cujo pensamento resume a filosofia amarga e<br />
<strong>de</strong>sabusada dos livros <strong>de</strong> prosa da segunda fase” (Manuel<br />
Ban<strong>de</strong>ira). É singular que nas Oci<strong>de</strong>ntais não conste o poema<br />
“Menina e moça”, um dos melhores <strong>de</strong> sua juventu<strong>de</strong>, no<br />
qual figuram os versos “entreaberto botão, entrefechada<br />
rosa,/ um pouco <strong>de</strong> menina e um pouco <strong>de</strong> mulher”, dos <strong>mais</strong><br />
felizes que escreveu em cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> poética.<br />
A omissão foi recuperada por outros poemas, como “A <strong>de</strong>r‑<br />
ra<strong>de</strong>ira injúria” e o soneto “A Carolina”, <strong>de</strong> altíssimo nível,<br />
dos <strong>mais</strong> belos da língua em que Camões cantou.<br />
M e l h o r e s P o e M a s
MANUEL BANDEIRA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Francisco <strong>de</strong> Assis Barbosa<br />
Manuel Ban<strong>de</strong>ira (1886 ‑1968)<br />
Natural <strong>de</strong> Recife, PE<br />
16 a edição – 176 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0343 ‑9<br />
Manuel Ban<strong>de</strong>ira se dizia um poeta menor. Mas Carlos<br />
Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, que sabia das coisas, consi<strong>de</strong>rava ‑o<br />
“o poeta melhor que todos nós, o poeta <strong>mais</strong> forte”. Exa‑<br />
gero <strong>de</strong> amigo? Talvez. Mas discreto, na justa medida em<br />
que o permite a justiça e a amiza<strong>de</strong>.<br />
Manuel Ban<strong>de</strong>ira nasceu em Recife, Pernambuco, em<br />
1886. Tuberculoso, foi tratar ‑se na Suíça, regressando ao<br />
Brasil em 1917. Nesse ano publica A cinza das horas, se‑<br />
guido <strong>de</strong> Carnaval (1919), livros renovadores e mo<strong>de</strong>rnos,<br />
antecessores do Mo<strong>de</strong>rnismo. O que levou Mário <strong>de</strong> An‑<br />
dra<strong>de</strong>, alguns <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, a chamar o poeta <strong>de</strong> São João<br />
Batista da Nova Poesia. Nestes livros, como em toda a obra<br />
posterior, o poeta se mostra simples, coloquial, irônico. E<br />
irreverente, em poemas como “Os sapos”, nos quais sati‑<br />
riza os parnasi<strong>anos</strong>. Ou em versos como “Quero beber!<br />
Cantar asneiras”, levando um crítico da época a dizer que<br />
já realizara seu <strong>de</strong>sejo. Outra constante: a nota autobiográ‑<br />
fica e confessional, presente em seus versos mesmo quando<br />
o tom é impessoal. E a simpatia pelos seres e aspectos hu‑<br />
mil<strong>de</strong>s da vida, para os quais a maioria dos poetas não tem<br />
olhos <strong>de</strong> ver: o gatinho fazendo xixi, os meninos carvoeiros,<br />
o camelô “dos brinquedos <strong>de</strong> tostão”. O verso livre passa<br />
a predominar a partir <strong>de</strong> O ritmo dissoluto (1924). O poeta<br />
alcança a plenitu<strong>de</strong> em Libertinagem (1930), obra madura,<br />
equilibrada, um tanto pessimista, na qual se aguçam o ce‑<br />
ticismo e a <strong>de</strong>scrença em relação aos valores hum<strong>anos</strong>. Os<br />
livros seguintes, repletos <strong>de</strong> poemas admiráveis, mostram<br />
que o poeta não conheceu a <strong>de</strong>cadência. Pelo contrário,<br />
teve forças para se renovar aos cinquenta <strong>anos</strong> e se interes‑<br />
sar pelo Concretismo, já na velhice. Faleceu em 1968, aos<br />
82 <strong>anos</strong>, preparado para “A viagem <strong>de</strong>finitiva”: “Ir ‑me ‑ei<br />
embora. E ficarão os pássaros/ cantando./ E ficará o meu<br />
jardim com sua árvore ver<strong>de</strong>/ e o seu poço branco.”.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
MÁRIO DE SÁ CARNEIRO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Lucila Nogueira Rodrigues<br />
Mário <strong>de</strong> Sá ‑Carneiro (1890 ‑1916)<br />
Natural <strong>de</strong> Lisboa, Portugal<br />
1 a edição – 216 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0205 ‑0<br />
Mário <strong>de</strong> Sá ‑Carneiro é o <strong>mais</strong> estranho <strong>de</strong> todos os<br />
poetas portugueses. Na vida e na morte. Na capital fran‑<br />
cesa, on<strong>de</strong> vivia graças a uma mesada paterna, levou uma<br />
existência <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>nada, que culminou com o suicídio, em<br />
um hotel, aos vinte e seis <strong>anos</strong>. O ato <strong>de</strong>fine o homem.<br />
Queria uma morte espetacular e para assistir a sua agonia,<br />
convidou um amigo.<br />
Personalida<strong>de</strong> mórbida, na qual a angústia avassalado ra,<br />
o conflito consigo mesmo (“esta inconstância <strong>de</strong> mim pró‑<br />
prio em vibração”) se enfeitava com o culto ao exibicionismo,<br />
eterno adolescente, tímido, narcisista, hipersensível, uma es‑<br />
pécie <strong>de</strong> Rimbaud português, po<strong>de</strong>ria ser um poeta tão<br />
gran<strong>de</strong> quanto seu amigo Fernando Pessoa (ao qual se ante‑<br />
cipou em muitos aspectos), não fosse a morte prematura.<br />
Romântico <strong>de</strong> temperamento, como todo romântico<br />
vida e obra <strong>de</strong> Sá ‑Carneiro são inseparáveis. Sempre con‑<br />
traditório, o poeta obe<strong>de</strong>cia religiosamente à métrica tradi‑<br />
cional, que se chocava com os sentimentos típicos do<br />
homem mo<strong>de</strong>rno, que traduzia em seus versos, por vezes<br />
<strong>de</strong> um <strong>de</strong>sespero insuportável, como insuportável lhe era a<br />
vida e a sua própria figura.<br />
Para suportar a si mesmo e a vida, eterno estrangeiro<br />
num mundo que repudiava, o poeta criou uma espécie <strong>de</strong><br />
personalida<strong>de</strong> imaginária, na esperança <strong>de</strong> se ver com cla‑<br />
reza e se aceitar: “Eu não sou eu nem o outro,/ Sou qual‑<br />
quer coisa <strong>de</strong> intermédio;/ Pilar da ponte do tédio/ Que vai<br />
<strong>de</strong> mim para o Outro”. Nesse jogo arriscado, o poeta osci‑<br />
lava do mundo imaginário (“Ânsia revolta <strong>de</strong> mistérios e<br />
olor,/ Sombra, vertigem, ascensão – Altura!”) à dura reali‑<br />
da<strong>de</strong>, vendo a sua alma “no lavabo dum Café,/ como um<br />
anel esquecido”. Só lhe restava suportar a si mesmo (“Nem<br />
ópio nem morfina/ Foi álcool <strong>mais</strong> raro e penetrante:/ É só<br />
<strong>de</strong> mim que ando <strong>de</strong>lirante –/ Manhã tão forte que me<br />
anoiteceu”), o que nunca conseguiu.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
49
MÁRIO FAUSTINO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Benedito Nunes<br />
Mário Faustino (1930 ‑1962)<br />
Natural <strong>de</strong> Teresina, PI<br />
3 a edição – 112 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0345 ‑3<br />
Na segunda meta<strong>de</strong> da década <strong>de</strong> 1950, Mário Faus‑<br />
tino era um dos nomes <strong>mais</strong> discutidos da poesia brasileira.<br />
Negado e reverenciado, como todo poeta <strong>de</strong> vanguarda,<br />
tinha ainda a seu favor o fato <strong>de</strong> dirigir, no Suplemento Do‑<br />
minical do Jornal do Brasil, uma página <strong>de</strong>nominada “Poesia<br />
Experiência”, na qual acolhia os poetas novos e divulgava os<br />
mestres universais do verso, <strong>de</strong> Homero a Ezra Pound.<br />
Essa ativida<strong>de</strong>, que durou cerca <strong>de</strong> dois <strong>anos</strong>, foi fun‑<br />
damental à sua ativida<strong>de</strong> criadora, com a incorporação à sua<br />
própria poética <strong>de</strong> temas, técnicas e formas, bebidas nas<br />
tradições multisseculares da poesia oci<strong>de</strong>ntal. Por essa<br />
época, porém, o poeta já havia publicado aquele que seria o<br />
seu único livro, O homem e sua hora (1955), poemas meta‑<br />
fóricos, nos quais se liga ao universo mítico da cultura clás‑<br />
sica e do cristianismo. No prefácio aos Melhores poemas<br />
Mário Faustino, Benedito Nunes observa que “surpreen<strong>de</strong>‑<br />
mos aí o embalo da gran<strong>de</strong> lírica do sobressalto metafísico,<br />
da revivescência órfica e da rememoração histórica, ora dia‑<br />
logal, ora ten<strong>de</strong>ndo ao distanciamento narrativo, épico”,<br />
apreendida em T. S. Eliot, Dylan Thomas, Ezra Pound, Carlos<br />
Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, Cecília Meireles, Jorge <strong>de</strong> Lima.<br />
Ainda, para o mesmo crítico, Faustino seria “o poeta da po‑<br />
esia, o poeta que pensa”, aquele que se aproxima e se<br />
apossa da realida<strong>de</strong> do mundo através da criação verbal. A<br />
morte prematura do poeta (nascido em Teresina, Piauí, em<br />
1930), em um aci<strong>de</strong>nte aéreo no Peru (1962), impediu o<br />
pleno <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> suas possibilida<strong>de</strong>s artísticas,<br />
assim como a divulgação dos poemas escritos após a publi‑<br />
cação <strong>de</strong> seu livro. Uma parte <strong>de</strong>sse material, acha ‑se recu‑<br />
perado nos Melhores poemas Mário Faustino, apresentados<br />
em duas partes, “Dos poemas posteriores” e “O poeta<br />
como tradutor <strong>de</strong> Ezra Pound”. Valem pelo quase inedi‑<br />
tismo, mas sobretudo pelas qualida<strong>de</strong>s do poeta.<br />
50<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
MARIO QUINTANA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Fausto Cunha<br />
Mario Quintana (1906 ‑1994)<br />
Natural <strong>de</strong> Alegrete, RS<br />
17 a edição – 128 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0172 ‑5<br />
Mario Quintana entrou na literatura brasileira quase<br />
em surdina, sem estardalhaço, sem autopromoção, como<br />
um aprendiz <strong>de</strong> feiticeiro brindando o público com seus<br />
baús <strong>de</strong> espanto.<br />
O poeta nasceu em Alegrete, Rio Gran<strong>de</strong> do Sul, em<br />
1906, cursou o Colégio Militar <strong>de</strong> Porto Alegre, trabalhou na<br />
Livraria do Globo, fez jornalismo e inúmeras traduções, rece‑<br />
beu vários prêmios literários. Faleceu em 1994. O principal<br />
dado biográfico é que, ao longo da vida, nunca <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ser<br />
poeta. Ao contrário da maioria dos escritores brasileiros, sem‑<br />
pre apressados, Quintana estreou em livro após os trinta<br />
<strong>anos</strong>, com a coletânea <strong>de</strong> sonetos A rua dos cata ‑ventos<br />
(1940), no qual ainda palpitavam notas neossimbolistas. Le‑<br />
varia seis <strong>anos</strong> para publicar um novo livro, Canções, <strong>de</strong> ex‑<br />
trema simplicida<strong>de</strong> e musicalida<strong>de</strong>, que se renovam nos<br />
surpreen<strong>de</strong>ntes poemas em prosa <strong>de</strong> Sapato florido (1947).<br />
Em Espelho mágico (1948), com um espírito lúdico <strong>de</strong>sconhe‑<br />
cido nas letras brasileiras, o poeta se <strong>de</strong>licia (e <strong>de</strong>licia o leitor)<br />
com pequenos e mágicos epigramas. A adoção do verso livre,<br />
em O aprendiz <strong>de</strong> feiticeiro (1950) coinci<strong>de</strong> com a abertura<br />
para o mundo onírico, com um toque <strong>de</strong> surrealismo. Os li‑<br />
vros seguintes – <strong>de</strong>s<strong>de</strong> Pé <strong>de</strong> pilão, escrito para o público in‑<br />
fantil, até Apontamentos <strong>de</strong> história sobrenatural e Baú <strong>de</strong><br />
espantos – mostram o poeta em permanente processo <strong>de</strong><br />
renovação, ágil, personalíssimo, com “uma qualida<strong>de</strong>, marca,<br />
timbre, ressonância ou maneira que só posso <strong>de</strong>finir como<br />
quintanida<strong>de</strong>”, conforme observa Fausto Cunha no prefácio<br />
aos Melhores poemas Mario Quintana. Apesar do êxito po‑<br />
pular, ou talvez por isso mesmo, a crítica custou a reconhecer<br />
a obra <strong>de</strong> Quintana. Acusavam ‑no <strong>de</strong> passadista, <strong>de</strong> preso a<br />
fórmulas superadas, sem perceber a magia <strong>de</strong> sua poesia e<br />
seu humor refinado. Quando perceberam já era tar<strong>de</strong>. O<br />
poeta já estava <strong>mais</strong> do que consagrado pelo povo.<br />
M e l h o r e s P o e M a s
MENOTTI DEL PICCHIA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Rubens Eduardo Ferreira Frias<br />
Menotti <strong>de</strong>l Picchia (1892 ‑1988)<br />
Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />
1 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0926 ‑5<br />
Coedição ABL<br />
Autor <strong>de</strong> um dos livros <strong>mais</strong> populares da poesia bra‑<br />
sileira, em todos os tempos, Juca Mulato, Menotti <strong>de</strong>l Pic‑<br />
chia foi também cronista, romancista, contista, ensaísta. A<br />
poesia, porém, teve primazia cronológica e sentimental em<br />
sua obra.<br />
Nascido em São Paulo, em 1892, Menotti estreou na‑<br />
quele período <strong>de</strong> lusco ‑fusco da poesia brasileira, entre o<br />
esgotamento do Parnasianismo e a Semana <strong>de</strong> Arte Mo‑<br />
<strong>de</strong>rna. O primeiro livro, com um título provocativo, ao<br />
gosto da época, Poemas do vício e da virtu<strong>de</strong>, revelava um<br />
temperamento original, asfixiado pela linguagem neopar‑<br />
nasiana. O sucesso veio cedo, com a publicação do Juca<br />
Mulato (1917), on<strong>de</strong> traduzia “o gênio triste da nossa<br />
raça”. O poema é uma espécie <strong>de</strong> resposta ao Jeca Tatu, <strong>de</strong><br />
Monteiro Lobato, <strong>de</strong>sanimado, doentio. Juca Mulato, sen‑<br />
timental, cantador, trabalhador, representaria as melhores<br />
virtu<strong>de</strong>s do “brasileiro típico”. Para uma parcela da crítica,<br />
essa poesia, por suas raízes e visão do homem brasileiro,<br />
antecipava ‑se ao Mo<strong>de</strong>rnismo. Cassiano Ricardo chega a<br />
proclamar que o verda<strong>de</strong>iro chefe do Mo<strong>de</strong>rnismo não foi<br />
Mário ou Oswald <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, mas Menotti <strong>de</strong>l Picchia. A<br />
poesia mo<strong>de</strong>rnista <strong>de</strong> Menotti, expressa em Chuva <strong>de</strong><br />
pedra (1924) e na rapsódia República dos Estados Unidos<br />
do Brasil (1928), é solar, plástica, colorida, abundante em<br />
imagens, procurando realizar no plano artístico a diretriz<br />
traçada pelo próprio escritor alguns <strong>anos</strong> antes: “arte bra‑<br />
sileira <strong>de</strong>ve ser brasileira, isto é, girar na ambiência física e<br />
moral da nossa terra e do nosso povo”. Os poemas da<br />
maturida<strong>de</strong>, reunidos em O <strong>de</strong>us sem rosto, revelam um<br />
poeta <strong>mais</strong> intimista, <strong>mais</strong> grave, inquieto diante do misté‑<br />
rio da vida, <strong>de</strong>bruçando ‑se sobre si mesmo, em busca do<br />
menino que foi um dia, com um “dom <strong>de</strong>moníaco <strong>de</strong> se<br />
renovar, para permanecer” (Cassiano Ricardo).<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
MURILO MENDES<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Luciana Stegagno Picchio<br />
Murilo Men<strong>de</strong>s (1901 ‑1975)<br />
Natural <strong>de</strong> Juiz <strong>de</strong> Fora, MG<br />
3 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0480 ‑1<br />
Surrealista, barroco, visionário, Murilo Men<strong>de</strong>s foi<br />
uma das vozes poéticas <strong>mais</strong> pessoais e inovadoras do Mo‑<br />
<strong>de</strong>rnismo brasileiro. Des<strong>de</strong> a estreia, com Poemas (1930),<br />
sua poesia incomodou os conservadores e <strong>de</strong>spertou a<br />
atenção dos que buscavam novos caminhos. O livro reve‑<br />
lava um poeta original e maduro, movimentando ‑se num<br />
ambiente onírico e <strong>de</strong> conciliação <strong>de</strong> extremos, do coti‑<br />
diano prosaico ao metafísico.<br />
Esse caminho seria abandonado <strong>de</strong> maneira abrupta,<br />
com a História do Brasil (1932), sátira à versão oficial <strong>de</strong> nossa<br />
história, expressa em poemas ‑piadas. O livro seria excluído<br />
pelo autor na edição global <strong>de</strong> suas Poesias, em 1959. Os<br />
poemas incluídos em Tempo e eternida<strong>de</strong> (1935), em parceria<br />
com Jorge <strong>de</strong> Lima, exaltam a musa que, com a Igreja Cató‑<br />
lica, divi<strong>de</strong> as atenções do poeta. O conflito se singulariza em<br />
A poesia em pânico (1938), com a vitória da musa, mas tam‑<br />
bém a nota inquietante <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong> mulher e pecado.<br />
O visionário (1941) é escandalosamente surrealista, um dos<br />
livros <strong>mais</strong> representativos e solitários do Mo<strong>de</strong>rnismo. A inte‑<br />
gração à dura realida<strong>de</strong> do mundo, nos dias sombrios da Se‑<br />
gunda Guerra Mundial, assinalam os poemas <strong>de</strong> As metamor ‑<br />
foses (1944) e se prolongam em Poesia liberda<strong>de</strong> (1947). O<br />
mundo parece sem re<strong>de</strong>nção, mas o poeta <strong>de</strong>scobre que ela<br />
é possível pela bonda<strong>de</strong> e pela poesia. Este o clima <strong>de</strong> Mundo<br />
enigma (1945). O <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> fraternida<strong>de</strong> e comunhão hu‑<br />
mana se aprofunda em Contemplação <strong>de</strong> Ouro Preto (1954).<br />
Com a mudança para Roma, em 1957, o poeta se europeíza,<br />
e os livros seguintes trazem uma forte marca da cultura euro‑<br />
peia, não como influência diluída pelas raízes nativas, mas<br />
como marca <strong>de</strong> integração do poeta ao mundo que o cerca.<br />
Integrou ‑se tão bem que passou a poetar em italiano, como<br />
mostram os poemas <strong>de</strong> Ipotesi (1968). Já não era apenas um<br />
poeta brasileiro, mas um poeta do mundo.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
51
NAURO MACHADO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Hil<strong>de</strong>berto Barbosa Filho<br />
Nauro Machado (1935)<br />
Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />
1 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0986 ‑9<br />
Des<strong>de</strong> sua estreia poética, em 1958, com Campo sem<br />
base, o maranhense Nauro Machado (São Luís, 1935) optou<br />
por um caminho muito pessoal. Em vez das experiências <strong>de</strong><br />
vanguarda, abundantes à época, preferiu a “revalorização do<br />
verso, renovando, por <strong>de</strong>ntro, o amplo espectro da chamada<br />
‘tradição da imagem’”, conforme observa Hil<strong>de</strong>berto Barbosa<br />
Filho no prefácio aos Melhores poemas Nauro Machado.<br />
Angustiado com a precarieda<strong>de</strong> da vida, os mistérios da<br />
morte e <strong>de</strong> Deus, os problemas do sexo e da solidão, a fra‑<br />
gilida<strong>de</strong> dos valores hum<strong>anos</strong>, a poesia <strong>de</strong> Nauro representa<br />
um esforço <strong>de</strong> libertação, em busca da plena realização do<br />
espírito. Essa busca, porém, nunca se <strong>de</strong>svincula da própria<br />
busca da poesia: “eu quero e é necessário/ que me sofra e<br />
me solidifique em poeta,/ que <strong>de</strong>strua <strong>de</strong>s<strong>de</strong> já o supérfluo<br />
e o ilusório/ e me alucine na essência <strong>de</strong> mim e das coisas”.<br />
Poesia metafísica? Talvez, como sugerem versos como esses:<br />
“Eu fui há muito alguém que agora tenho/ voltando apenas<br />
neste corpo alheio”. Mas também uma poesia preocupada<br />
com a posição do homem no mundo, as relações, por vezes<br />
ásperas entre as criaturas, e o lugar do poeta, o que gera<br />
novos conflitos íntimos: “nasci para habitar no coração do<br />
universo/ e não nesta casa on<strong>de</strong> o verme resiste/ até mesmo<br />
no último parafuso <strong>de</strong> meus ossos”. Sombria, i<strong>de</strong>ntificada<br />
com as inquietações <strong>mais</strong> perturbadoras do poeta, a poesia<br />
é também, para ele, “um caso <strong>de</strong> vida ou morte”, e uma<br />
presença obsessiva, como comprova sua vasta produção.<br />
São <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta livros, batizados com alguns dos títulos<br />
<strong>mais</strong> instigantes e felizes da poesia mo<strong>de</strong>rna brasileira: Os<br />
parreirais <strong>de</strong> Deus, Masmorra didática, A rosa blindada, Mar<br />
abstêmio, Funil do ser, que reforçam a observação <strong>de</strong><br />
Franklin <strong>de</strong> Oliveira <strong>de</strong> que o poeta “cavalga a poesia como<br />
quem monta cavalos incendiados. Não a traspassa a luz.<br />
Atravessa ‑a a labareda”. Des<strong>de</strong> os títulos.<br />
52<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
OLAVO BILAC<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Marisa Lajolo<br />
Olavo Bilac (1865 ‑1918)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
4 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0004 ‑9<br />
As Poesias, <strong>de</strong> Olavo Bilac, publicadas em 1888, foram<br />
recebidas com um coro <strong>de</strong> louvores, como poucos livros na<br />
literatura brasileira. Apesar do Parnasianismo já estar vitorioso,<br />
a obra era uma novida<strong>de</strong>, “pela graça fluente da linguagem<br />
poética” (Manuel Ban<strong>de</strong>ira), a perfeição dos versos, palpitan‑<br />
tes <strong>de</strong> vida e sensualismo, em contraste com a tão apregoada<br />
frieza marmórea da escola e à própria “profissão <strong>de</strong> fé” com<br />
que o poeta abria o volume, exaltando a perfeição fria do<br />
verso, talhado em “o alvo cristal, a pedra rara,/ o ônix”.<br />
Por essa época, Bilac (Rio <strong>de</strong> Janeiro, 1865) era um<br />
dos boêmios <strong>mais</strong> conhecidos da cida<strong>de</strong>, levando uma vida<br />
que escandalizava as famílias. Depois <strong>de</strong> abandonar, suces‑<br />
sivamente, os cursos <strong>de</strong> Medicina, no Rio <strong>de</strong> Janeiro, e <strong>de</strong><br />
Direito, em São Paulo, entregou ‑se ao jornalismo, profissão<br />
mal paga, o que o obrigou a utilizar múltiplos pseudônimos<br />
para sobreviver. Em 1893, durante a Revolta da Armada,<br />
colocou ‑se contra Floriano Peixoto, sendo preso. Libertado,<br />
exilou ‑se em Minas Gerais, a princípio em Ouro Preto e<br />
<strong>mais</strong> tar<strong>de</strong> em Juiz <strong>de</strong> Fora. Ocupou cargos importantes, foi<br />
um dos fundadores da Aca<strong>de</strong>mia Brasileira <strong>de</strong> Letras, viajou<br />
várias vezes à Europa, publicou livros <strong>de</strong> crônicas, contos,<br />
literatura infantil. Em seu último livro <strong>de</strong> poemas, póstumo,<br />
Tar<strong>de</strong> (1919), o poeta substitui o sensualismo por temas<br />
nacionalistas. Já se percebem os sinais do crepúsculo. Du‑<br />
rante essa fase, <strong>de</strong>dicou ‑se à campanha pelo serviço militar<br />
obrigatório. Faleceu em 1918, em plena glória. A opinião<br />
geral do país podia então ser resumida na frase <strong>de</strong> João do<br />
Rio: “Bilac chegou à perfeição – é sagrado.”. Era também<br />
um poeta muito popular, graças sobretudo à sua lírica amo‑<br />
rosa, expressa nos 35 sonetos da Via Láctea. “Virgens amo‑<br />
rosas” era um soneto que milhares <strong>de</strong> brasileiros sabiam <strong>de</strong><br />
cor. Essa é a melhor consagração.<br />
M e l h o r e s P o e M a s
PATATIVA DO ASSARÉ<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Cláudio Portella<br />
Patativa do Assaré (1909 ‑2002)<br />
Natural <strong>de</strong> Serra <strong>de</strong> Santana, CE<br />
1 a edição – 384 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1119 ‑9<br />
Poeta e violeiro cantador, Patativa do Assaré se tornou<br />
um mito ainda em vida. Her<strong>de</strong>iro <strong>de</strong> uma tradição <strong>de</strong> tro‑<br />
vadores populares nor<strong>de</strong>stinos, cujas raízes remotas po<strong>de</strong>m<br />
se esten<strong>de</strong>r até os aedos gregos, ele criou uma legião <strong>de</strong><br />
admiradores exaltados por todo o Brasil. Alguns, como<br />
Cláudio Portella, que selecionou e prefaciou os Melhores<br />
poemas Patativa do Assaré, não fazem por menos: Patativa<br />
“é ao lado <strong>de</strong> Camões, Homero e Dante, um dos maiores<br />
poetas populares do mundo”.<br />
Antonio Gonçalves da Silva nasceu em 1909, em Serra<br />
<strong>de</strong> Santana, Ceará. Ainda criança per<strong>de</strong>u a visão do olho<br />
direito. Foi leitor apaixonado dos poetas brasileiros. Fasci‑<br />
nado pelas leituras coletivas <strong>de</strong> folhetos <strong>de</strong> cor<strong>de</strong>l e pelo<br />
duelo entre cantadores, começa a poetar aos <strong>de</strong>zesseis<br />
<strong>anos</strong>, quando compra também sua primeira viola. Canta‑<br />
dor <strong>de</strong> improviso, viaja a Belém, aos <strong>de</strong>zenove <strong>anos</strong>, on<strong>de</strong><br />
um conterrâneo lhe dá a alcunha <strong>de</strong> Patativa. Como esse<br />
fosse um apelido comum, Antonio passa a se apresentar<br />
como Patativa do Assaré, cida<strong>de</strong> próxima ao seu local <strong>de</strong><br />
nascimento. Durante 25 <strong>anos</strong> (<strong>de</strong> 1930 a 1955), o poeta vive<br />
na Serra <strong>de</strong> Santana, trabalhando em seu roçado e com‑<br />
pondo gran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong> sua obra, divulgada exclusivamente<br />
por via oral. O primeiro livro – Inspiração nor<strong>de</strong>stina – sai<br />
em 1956, mas a melhor divulgação <strong>de</strong> sua obra era então<br />
pelo rádio. Com uma <strong>de</strong> suas músicas gravada por Luís<br />
Gonzaga, Patativa torna ‑se conhecido em todo o país, re‑<br />
cebendo inúmeras homenagens, até sua morte, em 2002.<br />
Poeta popular, Patativa se preocupava com a forma poé‑<br />
tica, cuidava da métrica e da rima, sem per<strong>de</strong>r a esponta‑<br />
neida<strong>de</strong> que o ligava à terra. Foi poeta do chão nor<strong>de</strong>stino,<br />
sucessor do Cego A<strong>de</strong>raldo, mas também, como observa<br />
José Ramos Tinhorão, um “<strong>de</strong>sses fenômenos da cultura<br />
popular brasileira”.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
PAULO LEMINSkI<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Fred Góes e Álvaro Marins<br />
Paulo Leminski (1944 ‑1989)<br />
Natural <strong>de</strong> Curitiba, PR<br />
6 a edição – 224 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0527 ‑3<br />
Paulo Leminski foi uma das gran<strong>de</strong>s surpresas da poesia<br />
brasileira nos últimos trinta <strong>anos</strong>. Pertencendo a uma gera‑<br />
ção <strong>de</strong> insatisfeitos e irreverentes levou a insatisfação e a<br />
irreverência àquele ponto extremo para o qual só há uma<br />
saída: renovar ou se retirar. Renovou. Teve o dom mágico<br />
<strong>de</strong> mostrar ao país uma voz inconfundível, personalíssima,<br />
fluente e cheia <strong>de</strong> sonorida<strong>de</strong>s misteriosas, como os rios. E<br />
como os rios, enriquecida por muitos afluentes: dos haicais<br />
<strong>de</strong> Bashô às experiências concretistas.<br />
Paulo Leminski Filho nasceu e morreu em Curitiba. Foi<br />
seminarista e faixa preta <strong>de</strong> judô, professor, publicitário,<br />
apresentador <strong>de</strong> televisão. Gostava <strong>de</strong> polemizar. Era uma<br />
mistura <strong>de</strong> samurai e trovador. Homem <strong>de</strong> contrastes, como<br />
as suas origens étnicas: tinha sangue polonês e negro nas<br />
veias. Em sua poesia também convivem muitos contrastes e<br />
inquietações, i<strong>de</strong>ais libertários e <strong>de</strong> contracultura, possivel‑<br />
mente os contrastes, i<strong>de</strong>ais e inquietações <strong>de</strong> sua geração, o<br />
que explica a intensa receptivida<strong>de</strong> popular <strong>de</strong> sua poesia.<br />
Em vida, Leminski lançou três livros <strong>de</strong> poemas: Caprichos e<br />
relaxos (1983), Haitropikais (1985), em parceria com Alice<br />
Ruiz, e Distraídos venceremos (1987). Outros foram publica‑<br />
dos após sua morte, mostrando um poeta prolífico e fasci‑<br />
nado por muitos caminhos, mas extremamente preocupado<br />
com a linguagem, a expressão gráfica do poema, herança<br />
talvez do Concretismo, e a concisão: “um pouco <strong>de</strong> mao/<br />
em todo poema que ensina/ quanto menor/ <strong>mais</strong> do tama‑<br />
nho da china”. Essas preocupações po<strong>de</strong>m sugerir que tenha<br />
sido um poeta <strong>de</strong> gabinete. Nada <strong>mais</strong> falso. Os poemas <strong>de</strong><br />
Leminski nascem <strong>de</strong> “suas vivências <strong>de</strong> beatnik caboclo”,<br />
extraídos ainda palpitantes da árvore ver<strong>de</strong> da vida, e, como<br />
observou Leyla Perrone ‑Moisés, parecem “tão simples que é<br />
quase um <strong>de</strong>saforo.”.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
53
PAULO MENDES<br />
CAMPOS<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Guilhermino Cesar<br />
Paulo Men<strong>de</strong>s Campos (1922 ‑1991)<br />
Natural <strong>de</strong> Belo Horizonte, MG<br />
3 a edição – 212 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0243‑0<br />
No poema autobiográfico “Pensamentos em prosa”,<br />
Paulo Men<strong>de</strong>s Campos conta ter nascido em Belo Hori‑<br />
zonte, em 1922, “oito meses antes da morte <strong>de</strong> Marcel<br />
Proust,/ um século <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> Shelley afogar ‑se no golfo <strong>de</strong><br />
Spezzia./ Nada tenho com eles, fabulosos./ Mas foi através<br />
da literatura que recebi a vida/ e foi em mim a poesia uma<br />
divinda<strong>de</strong> necessária.”.<br />
A divinda<strong>de</strong> necessária levou algum tempo para se impor<br />
em sua vida. Dias <strong>de</strong> revolta no colégio interno. Prenúncio <strong>de</strong><br />
liberda<strong>de</strong> no ginásio, “uma adivinhação <strong>de</strong> poesia nos florilé‑<br />
gios estúpidos”. A consciência <strong>de</strong> ser poeta se torna clara<br />
quando, em Belo Horizonte, começa a participar <strong>de</strong> um grupo<br />
<strong>de</strong> jovens escritores, formado por Fernando Sabino, Otto Lara<br />
Resen<strong>de</strong>, Hélio Pellegrino, amigos <strong>de</strong> toda a vida. Os críticos<br />
filiam a poesia <strong>de</strong> Paulo Men<strong>de</strong>s Campos à Geração <strong>de</strong> 45,<br />
embora o poeta repelisse classificações. Preferia ver ‑se como<br />
um individualista, com dívidas a muitos poetas, <strong>de</strong> épocas<br />
diversas: um García Lorca, um William Blake, um Jorge Luis<br />
Borges. O primeiro livro (A palavra escrita), saiu em 1951, em<br />
pequena tiragem e circulação restrita. Assim, a verda<strong>de</strong>ira es‑<br />
treia ocorreu com O domingo azul do mar (1958), que reve‑<br />
lava um poeta intimista, um tanto proustiano, em permanente<br />
busca do tempo perdido, sobretudo dos dias mágicos, mas<br />
tão atormentados, da infância. Nos livros seguintes, o poeta<br />
evolui para uma visão <strong>mais</strong> abrangente do mundo, reflete<br />
sobre as peculiarida<strong>de</strong>s do país, mas nunca se liberta da “hu‑<br />
manida<strong>de</strong> provincial <strong>de</strong> que é originário”, como observa Gui‑<br />
lhermino Cesar no prefácio aos Melhores poemas Paulo<br />
Men<strong>de</strong>s Campos. Uma parte importante da ativida<strong>de</strong> poética<br />
<strong>de</strong> Campos foi <strong>de</strong>dicada à tradução <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s poetas, <strong>de</strong> li‑<br />
teraturas diversas, <strong>de</strong> Rosalia <strong>de</strong> Castro a W. H. Au<strong>de</strong>n, <strong>de</strong> Carl<br />
Sandburg a Eugenio Montale, várias <strong>de</strong>las incluídas nos Me‑<br />
lhores poemas Paulo Men<strong>de</strong>s Campos.<br />
54<br />
Capa<br />
Nova<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
RAIMUNDO CORREIA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Telenia Hill<br />
Raimundo Correia (1859 ‑1911)<br />
Natural <strong>de</strong> Cururupu, MA<br />
2 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0573 ‑0<br />
Crítico exigente <strong>de</strong> poesia, Manuel Ban<strong>de</strong>ira consi<strong>de</strong>‑<br />
rava Raimundo Correia “o maior artista do verso que já ti‑<br />
vemos” e “o <strong>mais</strong> puramente poeta” da famosa trinda<strong>de</strong><br />
parnasiana, que ele formava com Olavo Bilac e Alberto <strong>de</strong><br />
Oliveira. João Ribeiro ia ainda <strong>mais</strong> longe: “Não sei <strong>de</strong> poeta<br />
algum da nossa língua que se lhe possa comparar, na per‑<br />
feição ou no sentimento e agu<strong>de</strong>za”. Àquela época, e du‑<br />
rante muitos <strong>anos</strong> ainda, Raimundo Correia teve sua corte<br />
<strong>de</strong> fanáticos, capazes <strong>de</strong> recitar <strong>de</strong> cor “As pombas”, “Mal<br />
secreto”, “O vinho <strong>de</strong> Hebe” e outros sonetos e poemas<br />
curtos, nos quais Ban<strong>de</strong>ira encontrava “alguns dos versos<br />
<strong>mais</strong> misteriosamente belos da nossa língua”.<br />
Estreando, com um volume repleto <strong>de</strong> reminiscências<br />
românticas (Primeiros sonhos), “primícias dos primeiros<br />
<strong>anos</strong>”, como o <strong>de</strong>finiu o próprio autor, Raimundo Correia<br />
(nascido em um navio na costa do Maranhão, em 1859, e<br />
falecido em Paris, 1911) já se apresenta no segundo livro<br />
(Sinfonias) em plena maturida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seus dons poéticos. Ali<br />
se encontram os poemas que iriam garantir a fama e a<br />
popularida<strong>de</strong> do poeta, como os sonetos citados. Os livros<br />
seguintes, Versos e versões e Aleluias, mantêm a qualida<strong>de</strong><br />
da obra, sem lhe acrescentar nada <strong>de</strong> novo. Ainda em vida,<br />
Raimundo Correia foi acusado <strong>de</strong> plagiário em um artigo<br />
enfezado <strong>de</strong> Luis Murat. “As pombas” seriam uma simples<br />
adaptação <strong>de</strong> um trecho <strong>de</strong> Theophile Gautier, “O vinho <strong>de</strong><br />
Hebe” transposição <strong>de</strong> um poema <strong>de</strong> Mme. Ackermann e<br />
“Mal secreto”, mera recriação <strong>de</strong> versos <strong>de</strong> Metastásio. A<br />
acusação fez gastar muita tinta. Hoje, esses e outros poe‑<br />
mas <strong>de</strong> Raimundo na mesma situação são consi<strong>de</strong>rados<br />
paráfrases. Inspirar ‑se em textos alheios e reinventá ‑los foi um<br />
processo muito empregado pelo poeta. Talvez diminua<br />
um pouco a sua originalida<strong>de</strong>, mas não compromete ou<br />
reduz em nada sua gran<strong>de</strong>za.<br />
M e l h o r e s P o e M a s
RAUL DE LEONI<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Pedro Lyra<br />
Raul <strong>de</strong> Leoni (1895 ‑1926)<br />
Natural <strong>de</strong> Petrópolis, RJ<br />
1 a edição – 128 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0785 ‑8<br />
Raul <strong>de</strong> Leoni começou a publicar seus poemas em<br />
um momento em que a poesia brasileira lutava para se<br />
<strong>de</strong>sligar do passado, sem ter ainda perspectivas <strong>de</strong> futuro.<br />
O Simbolismo estava exaurido, o Mo<strong>de</strong>rnismo ainda não se<br />
manifestara. Neste claro ‑escuro, o poeta lançou a plaquete<br />
O<strong>de</strong> a um poeta morto (1919) e, no ano da Semana <strong>de</strong><br />
Arte Mo<strong>de</strong>rna, Luz mediterrânea.<br />
A coincidência <strong>de</strong> datas não tem nenhum significado. Os<br />
projetos poéticos <strong>de</strong> Raul <strong>de</strong> Leoni estavam muito longe da<br />
aspiração dos mo<strong>de</strong>rnistas. Sua poesia clara, harmoniosa,<br />
clássica, pagã, em sintonia com os i<strong>de</strong>ais <strong>de</strong> beleza grega e <strong>de</strong><br />
força romana, assemelhava ‑se mesmo à luz mediterrânea,<br />
mas uma luz prestes a se apagar, símbolo <strong>de</strong> uma era que ia<br />
ficando para trás. A propósito, Tristão <strong>de</strong> Athay<strong>de</strong> observou<br />
que “ele dizia, por todos nós, a <strong>de</strong>spedida harmoniosa a um<br />
mundo que <strong>de</strong>saparecia no horizonte. Ele foi o incomparável<br />
intérprete dos nossos a<strong>de</strong>uses a Epicuro”. O próprio poeta<br />
estava preso a um mundo que se <strong>de</strong>spedia. Natural <strong>de</strong> Petró‑<br />
polis (1895), Raul percorreu a Europa antes <strong>de</strong> ingressar na<br />
Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Direito. Por essa época, era um rapaz forte, ale‑<br />
gre, másculo, amando a vida ao ar livre. Desportista, <strong>de</strong>tentor<br />
<strong>de</strong> vários títulos e medalhas, era assíduo também à boêmia<br />
literária, que se reunia nos cafés da Lapa. Nomeado pelo pre‑<br />
si<strong>de</strong>nte Nilo Peçanha, seu padrinho, ingressa na carreira diplo‑<br />
mática, da qual se <strong>de</strong>sliga em pouco tempo. Pouco após sua<br />
eleição como <strong>de</strong>putado estadual, começa a sentir os primeiros<br />
sintomas da tuberculose, que o matou aos 31 <strong>anos</strong>. Luz me‑<br />
diterrânea teve uma excelente receptivida<strong>de</strong>. A crítica ressal‑<br />
tou o aristocracismo do livro e o fato <strong>de</strong> ser um dos raros<br />
poetas brasileiros “<strong>de</strong> emoção puramente filosófica”. Durante<br />
muito tempo, os sonetos <strong>de</strong> Leoni, como “Eugenia”, eram<br />
obrigatórios no repertório dos <strong>de</strong>clamadores. A voz do povo<br />
é uma forma <strong>de</strong> imortalida<strong>de</strong>.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
RIBEIRO COUTO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
José Almino<br />
Ribeiro Couto (1898 ‑1963)<br />
Natural <strong>de</strong> Santos, SP<br />
1 a edição – 200 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0777 ‑7<br />
Sem nunca <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ser um romântico, apesar da even‑<br />
tual tonalida<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna e mo<strong>de</strong>rnista <strong>de</strong> sua poesia, Ribeiro<br />
Couto foi o poeta da província, das pequenas cida<strong>de</strong>s espa‑<br />
lhadas pelo Brasil e pelo mundo, silenciosas, das casas miste‑<br />
riosas, dos quintais com goiabeiras magras e pés <strong>de</strong> chuchu<br />
trepando pelos galhos, dos domingos on<strong>de</strong> nada acontece,<br />
dos crepúsculos ao som do sino, das vidas obscuras.<br />
Nascido em Santos (1898), Rui Ribeiro Couto cursou a<br />
Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Direito <strong>de</strong> São Paulo, que não concluiu,<br />
formando ‑se pela Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ciências Jurídicas e Sociais<br />
do Rio <strong>de</strong> Janeiro. Jornalista, promotor público em São<br />
Paulo e em Minas Gerais, ingressou na diplomacia em<br />
1934, servindo em diversos países da Europa, num exílio<br />
que se refletiria em sua poesia, com uma nota <strong>de</strong> acentuado<br />
saudosismo. Nos primeiros livros – O jardim das confidên‑<br />
cias e Poemetos <strong>de</strong> ternura e <strong>de</strong> melancolia –, o poeta pa‑<br />
rece um tanto temeroso <strong>de</strong> se atirar à vida, vista através <strong>de</strong><br />
uma certa penumbra, que se dissolve nos livros seguintes.<br />
Sem violentar sua sensibilida<strong>de</strong>, o poeta integra ‑se ao<br />
mundo – Um homem na multidão (1926) – consciente do<br />
valor da “experiência vivida”. A experiência vivida pelo<br />
poeta, então, era amarga. Tuberculoso, passa dois <strong>anos</strong> em<br />
Campos <strong>de</strong> Jordão, vagueia pelas cida<strong>de</strong>s mortas do vale<br />
do Paraíba, ambientes que se refletem em Província (1933).<br />
Homem do mundo, diplomata, vivendo nas civilizadas cida‑<br />
<strong>de</strong>s europeias, Ribeiro Couto se volta, singularmente, e<br />
cada vez <strong>mais</strong>, para a simplicida<strong>de</strong> e a nostalgia, o mundo<br />
perdido da infância, o lirismo das modinhas populares, que<br />
marcam seus livros da maturida<strong>de</strong>, Cancioneiro do ausente<br />
(1943), Entre mar e rio (1952) e Longe (1961). Como ob‑<br />
serva José Almino, “poetas como ele não tiveram muita<br />
influência nem <strong>de</strong>ixaram linhagem. Mas são pontos lumi‑<br />
nosos. Inapagáveis.”.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
55
RUy ESPINHEIRA<br />
FILHO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Sérgio Martagão Gesteira<br />
Ruy Espinheira Filho (1942)<br />
Natural <strong>de</strong> Salvador, BA<br />
1 a edição – 296 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1597 ‑5<br />
Ruy Espinheira Filho faz parte da geração <strong>de</strong> poetas que<br />
surgiram no início da década <strong>de</strong> 1970. Uma geração <strong>de</strong> per‑<br />
plexos diante das teorias e proposições da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> e da<br />
sedução da herança multissecular da poesia perene, aquela<br />
que traz em si o tom e o ritmo da eternida<strong>de</strong>, que vai <strong>de</strong><br />
Homero e Virgílio a Fernando Pessoa e Drummond.<br />
Poeta autêntico, Ruy soube conciliar renovação e tra‑<br />
dição. Sem abdicar <strong>de</strong> sua forte personalida<strong>de</strong> e das injun‑<br />
ções da época, manteve ‑se <strong>de</strong>ntro daquela dicção brasileira<br />
<strong>de</strong> fazer poesia, iniciada com a geração <strong>de</strong> Mário <strong>de</strong> An‑<br />
dra<strong>de</strong> e Manuel Ban<strong>de</strong>ira. O que subenten<strong>de</strong> também rigor<br />
formal, linguagem <strong>de</strong>purada e recusa à condição <strong>de</strong>scartá‑<br />
vel da obra <strong>de</strong> arte, comum em nossos dias.<br />
Poesia <strong>de</strong> aflita melancolia, angustiada diante da pas‑<br />
sagem irreversível do tempo (“Não há a<strong>de</strong>uses/ nos pássa‑<br />
ros,/ nos cães, nos insetos,/ nas galáxias que se fazem e<br />
refazem/ esplendorosamente/ para <strong>de</strong>leite <strong>de</strong> <strong>de</strong>us/ ne‑<br />
nhum./ Só em nós/ há a<strong>de</strong>uses”) e da certeza da morte (“O<br />
difícil é aguentar até que a morte chegue”), mas que sabe<br />
captar também as infinitas sugestões do cotidiano e<br />
transformá ‑las em reflexão sobre a condição humana (“O<br />
silêncio sonha nas telhas./ Escrevo isto e nem sei o que sig‑<br />
nifica./ Sei que estou só/ e há silêncio”), on<strong>de</strong> se po<strong>de</strong> ouvir<br />
“o canto abissal do tempo a fluir” e “a música que modula,<br />
entre a tenuida<strong>de</strong> do encanto e o peso das sombras elegía‑<br />
cas, a <strong>mais</strong> rara consonância e a dissonância humanas”,<br />
como observa Sérgio Martagão Gesteira no prefácio.<br />
Com <strong>mais</strong> <strong>de</strong> quinze livros <strong>de</strong> poemas publicados, ro‑<br />
mancista, contista, cronista, ensaísta, reconhecido pelos<br />
leitores <strong>mais</strong> exigentes, como Carlos Drummond <strong>de</strong> An‑<br />
dra<strong>de</strong> (“Poesia concentrada e <strong>de</strong> sutil expressão”) e Fábio<br />
Lucas (“Uma das vozes <strong>mais</strong> autênticas <strong>de</strong> nossa poesia”),<br />
Ruy Espinheira Filho já po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado um clássico da<br />
poesia brasileira mo<strong>de</strong>rna.<br />
56<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
SOSÍGENES COSTA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Aleilton Fonseca<br />
Sosígenes Marinho da Costa (1902 ‑1968)<br />
Natural <strong>de</strong> Belmonte, BA<br />
1 a edição – 224 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1669‑9<br />
Desconhecido pela maioria do público leitor brasileiro,<br />
Sosígenes Costa foi um dos poetas <strong>mais</strong> importantes do sé‑<br />
culo XX. Jorge Amado, seu admirador incondicional, obser‑<br />
vou com argúcia que “poeta do mar, poeta do cacau, poeta<br />
social marcado por seu tempo, tão requintado e ao mesmo<br />
tempo tão popular, pois gran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong> sua obra se baseia<br />
na vida do povo e <strong>de</strong>la se alimenta – folclore, hábitos, expres‑<br />
sões, humanismo – ele ficará nas nossas letras como uma<br />
<strong>de</strong>ssas gran<strong>de</strong>s árvores isoladas que se <strong>de</strong>stacam na floresta”.<br />
Nascido em Belmonte, no sul da Bahia, Sosígenes pas‑<br />
sou a mocida<strong>de</strong> e parte da maturida<strong>de</strong> em Ilhéus, on<strong>de</strong><br />
trabalhou como telegrafista dos Correios e Telégrafos. Mu‑<br />
douse para o Rio <strong>de</strong> Janeiro na década <strong>de</strong> 1950, e ali publi‑<br />
cou o seu único livro, Obra poética (1959), consagrado<br />
com os Prêmios Paula Brito e Jabuti e com a admiração da<br />
crítica, numa época em que ainda havia crítica literária.<br />
Com uma remota origem no parnasianismo e no sim‑<br />
bolismo, a poesia <strong>de</strong> Sosígenes Costa é marcada, sobre‑<br />
tudo, pelo mo<strong>de</strong>rnismo, apesar do poeta se manter<br />
irredutível em relação a aspectos menosprezados pelos<br />
mo<strong>de</strong>rnistas, como o emprego da rima rica. Essa in<strong>de</strong>pen‑<br />
dência realça ainda <strong>mais</strong> a originalida<strong>de</strong> do poeta, brasilei‑<br />
ríssimo, mas com constantes alusões a castelos, duquesas<br />
e pavões. Este animal, com sua beleza requintada, foi uma<br />
das obsessões <strong>de</strong> Sosígenes, autor <strong>de</strong> uma série <strong>de</strong> “sone‑<br />
tos pavônicos”. Confira o início <strong>de</strong> “O primeiro soneto pa‑<br />
vônico”: “Foge a tar<strong>de</strong> entre o bando das gazelas./ A noite<br />
agora vem do precipício./ Sóis poentes, douradas aquare‑<br />
las!/ Mirabolantes fogos <strong>de</strong> artifício!/ Maravilhado assisto<br />
das janelas./ Os coqueiros, pavões <strong>de</strong> um rei fictício,/ abrem<br />
as caudas ver<strong>de</strong>s e amarelas,/ ante da tar<strong>de</strong> o rútilo suplí‑<br />
cio”, pequena amostra <strong>de</strong>ssa poesia personalíssima e forte,<br />
como a árvore solitária da floresta.<br />
M e l h o r e s P o e M a s
SOUSâNDRADE<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Adriano Espínola<br />
Sousândra<strong>de</strong> (1833 ‑1902)<br />
Natural <strong>de</strong> Alcântara, MA<br />
1 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1327 ‑8<br />
Joaquim <strong>de</strong> Sousa Andra<strong>de</strong>, que adotou o nome lite‑<br />
rário bizarro <strong>de</strong> Sousândra<strong>de</strong>, foi o gran<strong>de</strong> terremoto sub‑<br />
terrâneo da poesia brasileira no século XIX. Homem <strong>de</strong><br />
formação clássica rígida, íntimo da literatura grega e latina,<br />
sabedor <strong>de</strong> vários idiomas mo<strong>de</strong>rnos, meio boêmio, tinha<br />
o gosto tanto da aventura física como da intelectual. Via‑<br />
jante, percorreu a Europa e as Américas, formou ‑se em<br />
Letras pela Sorbonne, andou pelas terras dos incas e dos<br />
maias, viveu nos Estados Unidos; poeta, antecipou ‑se em<br />
quase meio século a algumas das gran<strong>de</strong>s inovações da li‑<br />
teratura oci<strong>de</strong>ntal, elaboradas por Ezra Pound e James<br />
Joyce, a partir da década <strong>de</strong> 1920.<br />
A crítica da época não tomou conhecimento do poeta<br />
exótico, vivendo isolado em São Luís do Maranhão, cons‑<br />
ciente da distância que o separava dos contemporâneos:<br />
“Ouvi dizer já por duas vezes que o Guesa errante será lido<br />
cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois; entristeci – <strong>de</strong>cepção <strong>de</strong> quem es‑<br />
creve cinquenta <strong>anos</strong> antes”, anotou.<br />
Como previra, sua obra só começou a ser avaliada a<br />
partir da década <strong>de</strong> 1950, com o re<strong>de</strong>scobrimento <strong>de</strong> sua<br />
originalida<strong>de</strong> e o reconhecimento <strong>de</strong> suas ousadias, como<br />
o plurilinguismo, os arranjos sonoros, a criação <strong>de</strong> palavras<br />
compostas e as sínteses metafóricas, “processos que só na<br />
atualida<strong>de</strong> passaram a ser <strong>de</strong>finitivamente aceitos e incor‑<br />
porados à linguagem poética” (Augusto <strong>de</strong> Campos). O<br />
reconhecimento trouxe a admiração; o estudo sistemático<br />
revelou a exata dimensão <strong>de</strong> sua poesia e afirmou sua po‑<br />
sição ímpar na evolução da literatura brasileira, como poeta<br />
admirável e precursor solitário.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
THIAGO DE MELLO<br />
Seleção e prefácio<br />
Marcos Fre<strong>de</strong>rico krüger<br />
Thiago <strong>de</strong> Mello (1926)<br />
Natural <strong>de</strong> Barreirinha, AM<br />
1 a edição – 304 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1<strong>39</strong>5‑7<br />
Um dos nomes <strong>mais</strong> importantes da chamada Gera‑<br />
ção <strong>de</strong> 45, Thiago <strong>de</strong> Mello ocupa um lugar à parte na‑<br />
quele grupo <strong>de</strong> poetas, cultores da “poesia do caos”. Em<br />
<strong>mais</strong> <strong>de</strong> cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>, o poeta amazonense<br />
construiu uma obra sem similar na literatura mo<strong>de</strong>rna bra‑<br />
sileira, regionalista e universal, libertária, criando o que<br />
Marcos Fre<strong>de</strong>rico, selecionador e prefaciador dos Melhores<br />
poemas Thiago <strong>de</strong> Mello, classifica <strong>de</strong> “utopia particular”.<br />
A utopia <strong>de</strong> Thiago começou a ser formulada a partir<br />
<strong>de</strong> 1951, com sua estreia em livro, com Silêncio e palavra,<br />
no qual predominam as preocupações existenciais e a in‑<br />
quietação com a passagem do tempo. O livro entusiasmou<br />
Álvaro Lins, que pediu aos principais poetas da época “um<br />
lugar, ao vosso lado”, para o estreante.<br />
A lenda da rosa (1956) assinalaria a superação da pri‑<br />
meira fase <strong>de</strong> Thiago e a transição para uma poesia <strong>de</strong><br />
preocupação social, aspirando ao amor e à igualda<strong>de</strong> entre<br />
os homens: pura utopia. A a<strong>de</strong>são <strong>de</strong>finitiva à poesia par‑<br />
ticipante se daria com Faz escuro mas eu canto (1965), no<br />
qual o poeta atenua a linguagem subjetiva para falar <strong>de</strong><br />
realida<strong>de</strong>s objetivas, <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m social. “Não se trata, nessa<br />
situação específica, <strong>de</strong> fazer prosa em versos, mas <strong>de</strong><br />
manter ‑se no fio da navalha da linguagem literária: fazer<br />
poesia política, sem <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> fazer, antes <strong>de</strong> tudo, Poe‑<br />
sia.”. (Marcos Fre<strong>de</strong>rico). No volume, figurava o poema<br />
<strong>mais</strong> famoso <strong>de</strong> Thiago, “Os estatutos do homem”, <strong>mais</strong><br />
tar<strong>de</strong> publicado em sucessivas edições in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes, no<br />
qual proclamava a sua utopia: “o lobo e o cor<strong>de</strong>iro pasta‑<br />
rão juntos/ e a comida <strong>de</strong> ambos terá o mesmo gosto <strong>de</strong><br />
aurora.”. A utopia se manteve ao longo <strong>de</strong> sua carreira,<br />
mesmo nos livros <strong>de</strong> feição regionalista, mas i<strong>de</strong>ntificados<br />
com o sonho <strong>de</strong> fraternida<strong>de</strong> e liberda<strong>de</strong>. Essa utopia é<br />
imortal.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
57
TOMÁS ANTÔNIO<br />
GONZAGA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Alexandre Eulalio<br />
Tomás Antônio Gonzaga (1744 ‑1810)<br />
Natural do Porto, Portugal<br />
5 a edição – 242 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0346 ‑1<br />
Marília <strong>de</strong> Dirceu, publicado em 1792, o livro <strong>de</strong> amor<br />
<strong>mais</strong> lido da língua portuguesa, conta em versos graciosos<br />
e gentis a história dos amores do poeta cinquentão Tomás<br />
Antônio Gonzaga e <strong>de</strong> sua noiva adolescente, Maria Doro‑<br />
téa Joaquina <strong>de</strong> Seixas, vivido no ambiente festeiro <strong>de</strong> Vila<br />
Rica, nos dias que antece<strong>de</strong>ram a Inconfidência Mineira.<br />
O livro tocou em cheio a sensibilida<strong>de</strong> do povo, as liras<br />
foram logo musicadas e cantadas “em serestas <strong>de</strong> esquinas e<br />
árias <strong>de</strong> salão, daí se espraiando pouco a pouco em mancha<br />
<strong>de</strong> óleo, no Reino e nos Domínios, dos serões <strong>de</strong> província aos<br />
<strong>mais</strong> remotos povoados da roça”, informa Alexandre Eulalio<br />
no prefácio aos Melhores poemas Tomás Antônio Gonzaga.<br />
O poema <strong>de</strong> amor <strong>de</strong> Dirceu e da bela Marília divi<strong>de</strong> ‑se em<br />
dois motivos: esperança e <strong>de</strong>silusão. O primeiro está expresso<br />
nos dias <strong>de</strong> alegria, quando os noivos planejam um futuro <strong>de</strong><br />
ventura, e o poeta, na <strong>de</strong>liciosa linguagem dos árca<strong>de</strong>s, insiste<br />
em amenizar a diferença <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>s, lembrando que não era<br />
um vaqueiro qualquer, mas um pastor <strong>de</strong> posses, e que se<br />
encontrava no vigor da força varonil: “Eu vi o meu semblante<br />
numa fonte:/ dos <strong>anos</strong> inda não está cortado;/ os pastores,<br />
que habitam este monte,/ respeitam o po<strong>de</strong>r do meu cajado”.<br />
Como se vê, sob o lirismo <strong>de</strong>licado do poeta pulsa um ero‑<br />
tismo ar<strong>de</strong>nte.Como o casamento tardasse, o poeta se in‑<br />
quieta e lembra à amada a fugacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tudo: “Minha bela<br />
Marília, tudo passa;/ A sorte <strong>de</strong>ste mundo é mal segura;/ Se<br />
vem <strong>de</strong>pois dos males a ventura,/ Vem <strong>de</strong>pois dos prazeres a<br />
<strong>de</strong>sgraça.”. Os versos eram proféticos. Descobertos os pl<strong>anos</strong><br />
<strong>de</strong> conspiração, preso o poeta, o <strong>de</strong>salento domina seus ver‑<br />
sos, escritos na prisão, mas ele procura se manter acima das<br />
<strong>de</strong>sgraças: “Eu tenho um coração maior que o mundo!”. Não<br />
tinha. Exilado em Moçambique, trata <strong>de</strong> se ajustar à nova si‑<br />
tuação, casa ‑se, mas nunca <strong>mais</strong> escreve versos <strong>de</strong> amor. A<br />
sauda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Marília talvez o impedisse.<br />
58<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
VICENTE DE CARVALHO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Cláudio Murilo Leal<br />
Vicente <strong>de</strong> Carvalho (1866 ‑1924)<br />
Natural do Santos, SP<br />
1 a edição – 190 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1063 ‑8<br />
Coedição ABL<br />
Os três mosqueteiros eram quatro: Athos, Porthos,<br />
Aramis e D’Artagnan. A famosa trinda<strong>de</strong> parnasiana –<br />
Olavo Bilac, Raimundo Correia, Alberto <strong>de</strong> Oliveira – tam‑<br />
bém podia ser quatro. Por mérito e justiça, Vicente <strong>de</strong><br />
Carvalho merecia ser o quarto mosqueteiro parnasiano. É<br />
bem verda<strong>de</strong> que ele não po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado um legítimo<br />
parnasiano. É <strong>mais</strong> um clássico, com notas escandalosa‑<br />
mente românticas e alguma surdina simbolista. Parnasiano<br />
apenas pelo rigor da forma, se bem que o seu verso seja<br />
<strong>mais</strong> fluido e musical. Mas se fosse um puro parnasiano...<br />
A resposta a essas reticências encontra ‑se num artigo<br />
provocador <strong>de</strong> Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, no qual, pedindo paciência<br />
à idolatria dos brasileiros, afirmava que Alberto <strong>de</strong> Oliveira e<br />
Olavo Bilac estavam “um <strong>de</strong>grau, um <strong>de</strong>grauzinho abaixo do<br />
Sr. Vicente <strong>de</strong> Carvalho”. Se conhecesse esse escrito, o poeta<br />
por certo o <strong>de</strong>saprovaria. Pelo menos <strong>de</strong> público. Des<strong>de</strong> sua<br />
estreia, com as Ar<strong>de</strong>ntias, em 1885 (tinha então <strong>de</strong>zenove<br />
<strong>anos</strong>), ele sempre se mostrou discreto quanto à glória. Após<br />
o segundo livro, Relicário (1888), converteu ‑se ao Positivismo,<br />
abandonando a ativida<strong>de</strong> poética. A volta foi em gran<strong>de</strong> es‑<br />
tilo. Poemas e canções (1908) teve um imenso sucesso <strong>de</strong><br />
crítica e <strong>de</strong> público, apesar do <strong>de</strong>sastroso prefácio <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s<br />
da Cunha, redimido pelos poemas admiráveis que se lhe se‑<br />
guem: o épico “Fugindo ao cativeiro”, o pungente “Peque‑<br />
nino morto”, a emoção amorosa <strong>de</strong>licada e contida <strong>de</strong> “Rosa,<br />
rosa <strong>de</strong> amor...”, os sonetos <strong>de</strong> sabor camoniano intitulados<br />
“Velho tema”, e <strong>mais</strong> “A ternura do mar”, “Cantigas praia‑<br />
nas”, “Sugestões do crepúsculo”, <strong>de</strong> temas ligados ao mar,<br />
<strong>de</strong> que o poeta foi o gran<strong>de</strong> cantor em nossa literatura. Fato<br />
raro para um livro <strong>de</strong> poemas, teve <strong>de</strong>z edições em quinze<br />
<strong>anos</strong>. É que o poeta, como enfatiza Cláudio Murilo Leal no<br />
prefácio aos Melhores poemas Vicente <strong>de</strong> Carvalho, tinha<br />
“um raro dom <strong>de</strong> fazer ‑se amado”.<br />
M e l h o r e s P o e M a s
WALMIR AyALA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Marco Lucchesi<br />
Walmir Ayala (1933 ‑1991)<br />
Natural <strong>de</strong> Porto Alegre, RS<br />
1 a edição – 280 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1271 ‑4<br />
Uma das vozes <strong>mais</strong> vivas e palpitantes da poesia bra‑<br />
sileira do século XX, Walmir Ayala está <strong>de</strong> volta às livrarias<br />
em seus Melhores poemas Walmir Ayala, com toda a sua<br />
inquietação e tensão, angústia e se<strong>de</strong> <strong>de</strong> absoluto: “E este<br />
medo, e esta glória/ <strong>de</strong> estar vivo, perigosamente vivo/ para<br />
a espada/ que mata para a vida eterna.”.<br />
Essa ânsia pelo eterno, em choque com a fugacida<strong>de</strong> do<br />
tempo, marca toda a poética <strong>de</strong> Ayala, expressa numa lingua‑<br />
gem <strong>de</strong> alta voltagem metafórica, rica <strong>de</strong> significados huma‑<br />
nos, repleta <strong>de</strong> obsessões e <strong>de</strong> musicalida<strong>de</strong>: “Estais na sombra<br />
como um círio,/ brilhas por teu olho <strong>de</strong> cristal/ como um acor<strong>de</strong><br />
brilha ao crepúsculo/ <strong>de</strong> um templo abandonado.”.<br />
Mas, como escreve Marco Lucchesi no prefácio à obra,<br />
essa é uma parte da torrente. “A par disso, há um Walmir<br />
apolíneo, do ritmo preciso e das figuras claras, das imagens<br />
diurnas e <strong>de</strong> sua respectiva geometria. Não existe nele uma<br />
separação ou uma contradição entre Apolo e Dionísio. Sua<br />
poesia se reveste <strong>de</strong>ssa condição ambígua, <strong>de</strong> oração e<br />
morte, do sacrifício cruento à sublimação, do corpo santo<br />
ao <strong>mais</strong> fúlgido erotismo”, apelos <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>nados a Deus e<br />
ao diabo: “Aqui está a vida, aqui está o caminho./ Aqui a<br />
porta das moradas,/ Vamos dormir ao pé do anjo implacá‑<br />
vel e imóvel,/ vamos sentir sua túnica roçar nos nossos<br />
olhos,/ vamos beber seu aroma <strong>de</strong> cisne transpirado, esta<br />
avalanche/ <strong>de</strong> mistério em pleno céu./ Aqui é a terra/ e <strong>de</strong><br />
senti ‑la cresceremos;/ e o que ensina/ a cada um dos que<br />
agora manipulam aços,/ transpõem barreiras e ingressam<br />
corporalmente no tempo, cada um/ que hoje interrompe<br />
Deus em seu <strong>de</strong>scanso”.<br />
A sua poesia inquieta, repleta <strong>de</strong> contradições huma‑<br />
nas, expressão da busca <strong>de</strong>sesperada do poeta por si mesmo,<br />
talvez interrompa também o <strong>de</strong>scanso divino. Mas, com cer‑<br />
teza, marca a ferro e fogo a sensibilida<strong>de</strong> dos leitores.<br />
M e l h o r e s P o e M a s<br />
59
C o l e ç ã o<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
DIREÇÃO<br />
EDLA VAN STEEN<br />
LUÍS MARTINS<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong> Ana Luísa Martins<br />
Luís Martins (1907 1981) – Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
MARINA COLASANTI<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong> Marisa Lajolo<br />
Marina Colasanti (1937) – Natural da Asmara, Etiópia<br />
ODyLO COSTA FILHO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong> Cecilia Costa<br />
Odylo Costa Filho (1941 1979) – Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />
RODOLFO kONDER<br />
Rodolfo kon<strong>de</strong>r (1938) – Natural <strong>de</strong> Natal, RN<br />
RUBEM BRAGA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong> Carlos Ribeiro<br />
Rubem Braga (1913 1990) – Natural <strong>de</strong> Cachoeiro <strong>de</strong><br />
Itapemirim, ES<br />
60<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s P r e l o<br />
Os nomes <strong>mais</strong> <strong>de</strong>stacados da literatura brasileira e<br />
suas crônicas <strong>mais</strong> elaboradas foram reunidos pela<br />
<strong>Global</strong> <strong>Editora</strong> para fazerem parte do universo da<br />
coleção Melhores Crônicas. Dirigida pela escritora<br />
Edla van Steen e tendo seus textos escolhidos e pre‑<br />
faciados por gran<strong>de</strong>s estudiosos da obra <strong>de</strong> cada<br />
autor, essa coleção irá enriquecer ainda <strong>mais</strong> o estu‑<br />
dioso ou o leitor que busca na literatura uma viagem<br />
<strong>de</strong> conhecimento e encanto. Cada obra apresenta<br />
biografia, bibliografia e estudo introdutório sobre o<br />
autor. Lançados Olavo Bilac, Roberto Drummond e<br />
Sérgio Milliet, encontram ‑se em andamento nomes<br />
como Luís Martins, Marina Colasanti e Raul Pompeia,<br />
entre outros, que não po<strong>de</strong>m faltar em sua estante.
AFFONSO ROMANO<br />
DE SANT’ANNA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Letícia Malard<br />
Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna (1937)<br />
Natural <strong>de</strong> Belo Horizonte, MG<br />
1 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0833 ‑1<br />
Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna acredita no po<strong>de</strong>r má‑<br />
gico da crônica interferir no cotidiano, mudar a cabeça dos<br />
homens, contribuir para um mundo melhor, com <strong>mais</strong><br />
amor e menos ódio, <strong>mais</strong> entendimento e menos precon‑<br />
ceito. O efêmero é o seu elemento, mas como o efêmero<br />
do mundo se torna permanente, <strong>de</strong> tão repetido (mudam<br />
os personagens, o drama continua o mesmo), a sabedoria<br />
do cronista consiste em dar um toque <strong>de</strong> eternida<strong>de</strong> àquilo<br />
que é fugaz por sua própria natureza.<br />
Aos olhos do cronista – o “doente <strong>de</strong> seu tempo”, como<br />
o <strong>de</strong>finiu Affonso –, qualquer acontecimento é digno, “as po‑<br />
bres ocorrências <strong>de</strong> nada, a velha anedota, o sopapo casual, o<br />
furto, a facada anônima, a estatística mortuária, as tentativas<br />
<strong>de</strong> suicídio, o cocheiro que foge, o noticiário em suma”, como<br />
sintetizou Machado <strong>de</strong> Assis há <strong>mais</strong> <strong>de</strong> cem <strong>anos</strong>.<br />
Esses fatos miúdos, e outros característicos <strong>de</strong> nossos dias<br />
(a bandidagem, a violência, a corrupção, a selvageria crescente<br />
das guerras políticas e do cotidiano), estão presentes nas crô‑<br />
nicas <strong>de</strong> Affonso, mas o que nelas predomina é uma preocu‑<br />
pação quase obsessiva com a beleza, o amor e as mulheres. A<br />
propósito, leiam ‑se as crônicas “O surgimento da beleza”,<br />
“Amor, o interminável aprendizado” e “O que querem as mu‑<br />
lheres?”. Como se vê, o cronista sabe fisgar o leitor <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />
título (“De que ri a Mona Lisa”; “Casada, amando outro”;<br />
“Mistérios Gozosos”, entre outros). A sedução se acentua na<br />
frase inicial da crônica, sintética e instigante. Alguns exemplos:<br />
“A corrupção não é uma invenção brasileira”; “O surgimento<br />
da beleza paralisa tudo”; “Sei que as pessoas estão pulando<br />
na jugular uma das outras”.Testemunha <strong>de</strong> sua época, “escre‑<br />
vendo para o seu tempo”, o cronista ‑poeta Affonso Romano<br />
<strong>de</strong> Sant’Anna, como acentua Letícia Malard no prefácio às<br />
Melhores crônicas Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna, “escreve<br />
para muito além dos horizontes do seu tempo”.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
ÁLVARO MOREyRA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Mario Moreyra<br />
Álvaro Moreyra (1888 ‑1964)<br />
Natural <strong>de</strong> Porto Alegre, RS<br />
1 a edição – 336 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1<strong>39</strong>8 ‑8<br />
Álvaro Moreyra <strong>de</strong>finiu o espírito <strong>de</strong> suas crônicas no<br />
título <strong>de</strong> seu livro <strong>mais</strong> famoso: As amargas, não... Cronista<br />
e poeta dos aspectos agradáveis da vida, senhor <strong>de</strong> uma<br />
prosa sedutora e leve, que <strong>de</strong>stila malícia, humor, lirismo,<br />
ternura, <strong>de</strong>ixou marcas in<strong>de</strong>léveis na geração posterior <strong>de</strong><br />
escritores.<br />
Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> confessava a sua “in‑<br />
fluência enorme e profunda. Aliás, visível não apenas em<br />
mim, mas em todo um grupo <strong>de</strong> rapazes da minha ida<strong>de</strong>.”.<br />
O poeta <strong>de</strong> Claro enigma consi<strong>de</strong>rava tal influência “um<br />
bem, na medida em que me preservou do mau gosto rei‑<br />
nante no período imediatamente anterior ao mo<strong>de</strong>rnismo”.<br />
Her<strong>de</strong>iro do simbolismo, com o qual a sua sensibili‑<br />
da<strong>de</strong> se afinava, Álvaro Moreyra publicou o primeiro livro<br />
<strong>de</strong> crônicas em 1915, com o título significativo <strong>de</strong> Um sor‑<br />
riso para tudo... Tornou ‑se logo um cronista popular,<br />
atento às surpresas do cotidiano, que recriava em textos<br />
curtos e concisos, repletos <strong>de</strong> diálogos maliciosos, reunidos<br />
em O outro lado da vida e A cida<strong>de</strong> mulher. Este, um pas‑<br />
seio impressionista e lírico pelo Rio <strong>de</strong> Janeiro, cida<strong>de</strong> que<br />
amou com meiguice e sensualida<strong>de</strong>, como um tempera‑<br />
mento <strong>de</strong>licado ama uma mulher.<br />
Em seu livro <strong>mais</strong> famoso, As amargas, não..., cronista<br />
e memorialista se confun<strong>de</strong>m na recriação do passado,<br />
“num fluxo <strong>de</strong> consciência, às vezes caótico, reutilizando,<br />
em alguns momentos, crônicas antigas que tocam suas<br />
lembranças, tudo isso organizado numa relativa ou falsa<br />
cronologia”, permitindo uma leitura reversível, “aos peda‑<br />
ços, <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>nadamente, sem sequência”, como acentua<br />
Mario Moreyra no prefácio. O memorialista predomina<br />
também nas crônicas <strong>de</strong> Havia uma oliveira no jardim, úl‑<br />
timo livro publicado em vida pelo autor, testamento lírico<br />
<strong>de</strong> um discreto apaixonado pela vida, sempre com um sor‑<br />
riso para tudo.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
61
ARTUR AZEVEDO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Orna Messer Levin e Larissa <strong>de</strong><br />
Oliveira Neves<br />
Artur Azevedo (1855 ‑1908)<br />
Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />
1 a edição – 384 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1670 ‑5<br />
Artur Azevedo foi um escritor prolífico. Contista, poeta<br />
e o autor teatral <strong>mais</strong> popular <strong>de</strong> sua época, escrevia com<br />
graça e leveza. Como cronista <strong>de</strong>ixou uma obra imensa: <strong>mais</strong><br />
<strong>de</strong> 4 mil crônicas esparsas em jornais, revistas e almanaques,<br />
conhecidas por um número restrito <strong>de</strong> especialistas e pesqui‑<br />
sadores, que retratam com bom humor e alguma ironia o<br />
cotidiano da vida brasileira e, sobretudo, o dia a dia carioca.<br />
Muito <strong>de</strong>sse material, ou sua maior parte, foi publi‑<br />
cado com pseudônimos diversos, que por si só já <strong>de</strong>finiam<br />
o espírito das crônicas: Elói, o herói, Gavroche (assim era<br />
chamado o moleque parisiense, tipo muito popular no sé‑<br />
culo XIX), X.Y.Z. e Frivolino. A leveza <strong>de</strong>ssa espécie <strong>de</strong> con‑<br />
versa <strong>de</strong> rua, informal e brincalhona, contrastava com a<br />
serieda<strong>de</strong>, quase sisu<strong>de</strong>z, <strong>de</strong> jornais como O País, Diário <strong>de</strong><br />
Notícias, Correio do Povo e A Notícia, em cujas primeiras<br />
páginas eram publicadas.<br />
O tom era leve, mas o assunto, muitas vezes, era da<br />
maior gravida<strong>de</strong>, relacionado com o cotidiano da cida<strong>de</strong>,<br />
como a iluminação e calçamento da Rua do Ouvidor, o pro‑<br />
blema das enchentes <strong>de</strong> abril (dizia ‑se então “abril, águas<br />
mil”) e seu péssimo escoamento, a carestia dos aluguéis,<br />
muitas vezes em habitações <strong>de</strong> péssima qualida<strong>de</strong>, o que<br />
leva o cronista a concluir que “no Rio <strong>de</strong> Janeiro eu não<br />
conheço nada <strong>mais</strong> caro do que uma casa barata”. Outros<br />
temas são típicos da época, como a onda <strong>de</strong> suicídios que<br />
abalou a cida<strong>de</strong> ou a prática <strong>de</strong> mofinas (escrito publicado<br />
na imprensa difamando ou caluniando uma pessoa, sem‑<br />
pre sobre a proteção do anonimato), fatos que revoltavam<br />
o cronista e o faziam per<strong>de</strong>r o seu habitual bom humor.<br />
Leves e breves, as crônicas <strong>de</strong> Artur Azevedo mantêm<br />
a mesma sedução <strong>de</strong> quando foram publicadas na im‑<br />
prensa, com o valor adicional <strong>de</strong> serem hoje um valioso<br />
subsídio para a compreensão da vida carioca no final do<br />
século XIX e início do XX.<br />
62<br />
Capa<br />
Nova<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
AUSTREGÉSILO DE<br />
ATHAyDE<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Murilo Melo Filho<br />
Austregésilo <strong>de</strong> Athay<strong>de</strong> (1898 ‑1993)<br />
Natural <strong>de</strong> Caruaru, PE<br />
1 a edição – 368 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1279 ‑0<br />
Durante <strong>mais</strong> <strong>de</strong> sessenta <strong>anos</strong>, Austregésilo <strong>de</strong><br />
Athay<strong>de</strong> escreveu crônicas diárias, acompanhando e anali‑<br />
sando o que ocorria no país e no mundo, no plano político<br />
e social. Essa produção fantástica, <strong>de</strong> milhares e milhares<br />
<strong>de</strong> páginas, não retrata apenas uma fase conturbada da<br />
história do mundo, mas mostra um cronista participante,<br />
crítico, <strong>de</strong>nunciando com ironia ou veemência, quando tal<br />
se fazia preciso, um “íntimo da História contemporânea”,<br />
como o chamou Eduardo Portela, e “um profeta do seu<br />
tempo”, como ele costumava <strong>de</strong>finir o jornalista.<br />
Como profeta <strong>de</strong> seu tempo e testemunha da história,<br />
“pintou um painel abrangente, focalizando personagens da<br />
cena internacional: o libanês Charles Malek, o soviético Ivan<br />
Pavlov, a americana Eleanor Roosevelt e o francês René Cas‑<br />
sin, com os quais escreveu, durante a III Assembleia Geral da<br />
ONU, realizada em Paris, a Declaração Universal dos Direitos<br />
do Homem”, conforme lembra Murilo Melo Filho no prefá‑<br />
cio às Melhores crônicas Austregésilo <strong>de</strong> Athay<strong>de</strong>.<br />
Mas a visão e a paixão do cronista não se limitavam<br />
aos horizontes cotidi<strong>anos</strong>, ao <strong>de</strong>sconcerto do mundo.<br />
Homem <strong>de</strong> formação clássica, gran<strong>de</strong> conhecedor da lite‑<br />
ratura grega, leitor constante <strong>de</strong> Platão e Aristóteles, apai‑<br />
xonado por Renan, a<strong>de</strong>pto do liberalismo, Athay<strong>de</strong> gostava<br />
<strong>de</strong> nadar naquelas águas eternamente revigorantes e re‑<br />
frescantes que jorram das fontes da cultura humanística.<br />
Dessa forma, muitas <strong>de</strong> suas crônicas são <strong>de</strong>dicadas a<br />
livros e escritores, analisam obras recém ‑lançadas, <strong>de</strong>batem<br />
problemas culturais, lembram figuras que conheceu no co‑<br />
tidiano e <strong>de</strong> leitura, <strong>de</strong> João Ribeiro a Shakespeare, <strong>de</strong> Sin‑<br />
clair Lewis a Otto Lara Resen<strong>de</strong>, <strong>de</strong> François Mauriac a Lima<br />
Barreto, evocados ora com ternura, ora com admiração,<br />
mas sempre com a paixão que caracterizava tudo o que<br />
Athay<strong>de</strong> escrevia.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s
CECÍLIA MEIRELES<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Leo<strong>de</strong>gário A. <strong>de</strong> Azevedo Filho<br />
Cecília Meireles (1901 ‑1964)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
1 a edição – 384 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0857 ‑1<br />
Os leitores que conhecem Cecília Meireles apenas como<br />
poeta, não sabem o que per<strong>de</strong>m ignorando suas crônicas. In‑<br />
sinuante, persuasiva, lírica, suave, feminina, sempre e sempre<br />
poeta, <strong>de</strong> uma leveza <strong>de</strong> pena dançando no ar, por vezes in‑<br />
dignada com o <strong>de</strong>sconcerto do mundo ou as travessuras dos<br />
hum<strong>anos</strong>, a cronista é um caso <strong>de</strong> amor à primeira leitura.<br />
Como em toda relação amorosa autêntica, sobretudo<br />
em sua fase inicial, a cronista está sempre surpreen<strong>de</strong>ndo,<br />
com uma frase feliz, uma colocação inusitada, um piscar <strong>de</strong><br />
olhos brejeiro. No fundo <strong>de</strong>sse mundo amável, porém, há<br />
um certo <strong>de</strong>sencanto diante da vida, quando então se<br />
impõe “a sua tendência para o recolhimento espiritual,<br />
com leve toque <strong>de</strong> melancolia ou <strong>de</strong>sencanto, para não<br />
dizer <strong>de</strong> renúncia e a<strong>de</strong>us”, como observa Leo<strong>de</strong>gário A.<br />
<strong>de</strong> Azevedo no prefácio.<br />
O <strong>de</strong>slumbramento diante do espetáculo do mundo,<br />
porém, predomina nessas crônicas, divididas em três par‑<br />
tes: crônicas em geral, <strong>de</strong> viagem e <strong>de</strong> educação. Que cada<br />
um escolha a sua praia, <strong>de</strong> acordo com as suas tendências,<br />
para iniciar a viagem. Há <strong>de</strong> tudo para todos os gostos:<br />
acontecimentos, impressões – por vezes aproximando ‑se<br />
do conto –, lembranças da infância, reflexões sobre senti‑<br />
mentos, como a cólera ou a bomba atômica. As crônicas<br />
<strong>de</strong> viagem contam fatos vistos, vividos ou sentidos em vá‑<br />
rias partes do mundo (Cecília foi uma gran<strong>de</strong> viajante),<br />
quando não tocam na própria alma <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> ou país.<br />
Vejam ‑se as admiráveis “Evocação lírica <strong>de</strong> Lisboa” e “Ho‑<br />
landa em flor”. Nas crônicas sobre educação Cecília dá<br />
expansão à educadora que havia <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>la (foi profes‑<br />
sora a vida toda), consciente, sem ja<strong>mais</strong> per<strong>de</strong>r a ternura<br />
ou aborrecer o leitor, traçando pequenos quadros palpitan‑<br />
tes <strong>de</strong> vida. Quadros talvez não. São <strong>mais</strong> aquarelas, <strong>de</strong> tons<br />
suaves, traços finos. Resistir, quem há ‑<strong>de</strong>?<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
COELHO NETO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Ubiratan Machado<br />
Coelho Neto (1864 ‑1934)<br />
Natural <strong>de</strong> Caxias, MA<br />
1 a edição – 288 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1126 ‑7<br />
Conhecido sobretudo como romancista e contista,<br />
Coelho Neto <strong>de</strong>ixou uma vasta produção <strong>de</strong> crônicas<br />
(calcula ‑se em <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 8 mil), testemunho palpitante da<br />
vida brasileira nos últimos vinte <strong>anos</strong> do século XIX e nas<br />
três primeiras décadas do século XX. Atento ao cotidiano –<br />
sem abrir mão <strong>de</strong> sua tendência pelo insólito e o excepcio‑<br />
nal –, o cronista soube acompanhar com olhar implacável,<br />
ora <strong>de</strong>siludido, ora compreensivo, mas sempre com graça,<br />
as rapidíssimas transformações que o mundo atravessava e<br />
como estas chegavam e se impunham no Brasil, ou melhor,<br />
no Rio <strong>de</strong> Janeiro.<br />
É para a terra carioca, com seus esplendores e maze‑<br />
las, que o escritor dirige <strong>de</strong> preferência a sua câmera para<br />
fixar múltiplos aspectos da vida da cida<strong>de</strong>: a jogatina, a<br />
exploração religiosa da carida<strong>de</strong> pública, a vida nos corti‑<br />
ços, as conquistas femininas, a paixão pelo futebol. Defen‑<br />
sor do esporte, Coelho Neto foi o primeiro escritor brasileiro<br />
a incluir o futebol em sua obra, como uma ativida<strong>de</strong> nobre<br />
e educativa, além <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a prática da capoeira como<br />
um excelente exercício para a eugenia da raça.<br />
I<strong>de</strong>alismo <strong>de</strong> um lado, crítica incisiva <strong>de</strong> outro, em par‑<br />
ticular à socieda<strong>de</strong> brasileira, que o cronista consi<strong>de</strong>rava<br />
omissa, apática, indiferente aos valores do espírito, sem<br />
amor à pátria, submissa ao pensamento estrangeiro. É pois<br />
com orgulho e reverência, que <strong>de</strong>screve conquistas da<br />
nossa socieda<strong>de</strong> ou façanhas notáveis <strong>de</strong> brasileiros, como<br />
se comprova nas belas crônicas <strong>de</strong>dicadas ao 13 <strong>de</strong> Maio e<br />
aos primeiros voos <strong>de</strong> Santos Dumont.<br />
Apesar <strong>de</strong> recheadas <strong>de</strong> referências à história, à mito‑<br />
logia greco ‑romana e ao mundo bíblico, as crônicas <strong>de</strong><br />
Coelho Neto têm uma visão mo<strong>de</strong>rna da vida e do mundo<br />
que reserva surpresas agradáveis ao leitor atual.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
63
EUCLIDES DA CUNHA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Marco Lucchesi<br />
Eucli<strong>de</strong>s da Cunha (1866 ‑1909)<br />
Natural <strong>de</strong> Cantagalo, RJ<br />
1 a edição – 248 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1552 ‑4<br />
A obra ‑prima imensa que se chama Os sertões <strong>de</strong>ixou<br />
na sombra uma boa parte da obra <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s da Cunha.<br />
Como as suas crônicas, <strong>de</strong>sconhecidas do público e,<br />
mesmo, <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> intelectuais. Um pecado.<br />
Vibrantes, admirativas ou contestadoras, por vezes franca‑<br />
mente hostis (como a <strong>de</strong>dicada aos críticos da época), ou<br />
reverenciosas (“Heróis <strong>de</strong> ontem”), elas traduzem a perma‑<br />
nente preocupação do gran<strong>de</strong> escritor com os problemas<br />
brasileiros e a sua visão muito peculiar, corajosa e inova‑<br />
dora do país. Como observa Marco Lucchesi na apresenta‑<br />
ção, elas constituem “uma incessante releitura do Brasil”.<br />
Claro que essa releitura se processa em muitos níveis.<br />
Razão pela qual, ampliando o conceito <strong>de</strong> crônica, para<br />
ajustá ‑lo à mensagem peculiar <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s, o organizador<br />
incluiu no presente volume, ao lado <strong>de</strong> trabalhos publica‑<br />
dos na imprensa, com estrutura e característica <strong>de</strong> uma<br />
crônica autêntica, fragmentos <strong>de</strong> Os sertões, consi<strong>de</strong>rados<br />
como a gran<strong>de</strong> crônica <strong>de</strong> uma tragédia. Assim, o leitor<br />
terá ocasião <strong>de</strong> conhecer, ou reler, trechos antológicos clás‑<br />
sicos que, isolados do todo – daquele tropel que arrasta o<br />
leitor, tirando ‑lhe a respiração –, nos permitem saborear<br />
com <strong>mais</strong> vagar o estouro da boiada, a inesquecível e pre‑<br />
conceituosa abordagem da figura do Antonio Conselheiro,<br />
lances <strong>de</strong> combate, as mortes <strong>de</strong> Moreira César e do Con‑<br />
selheiro, a visão piedosa dos sertanejos vencidos, uma su‑<br />
cessão <strong>de</strong> quadros que se i<strong>de</strong>ntificam com o conceito <strong>de</strong><br />
crônica <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s, “misturada com o ensaio e a poesia”,<br />
como observa o apresentador, mas que, sobretudo, trans‑<br />
mitem uma po<strong>de</strong>rosa sensação <strong>de</strong> vida.<br />
64<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
FERREIRA GULLAR<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Augusto Sérgio Bastos<br />
Ferreira Gullar (1930)<br />
Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />
1 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0948 ‑6<br />
O poeta Ferreira Gullar cultiva a crônica com a natura‑<br />
lida<strong>de</strong> <strong>de</strong> quem abre uma janela, estica o pescoço e se<br />
<strong>de</strong>bruça para conversar com o leitor, entretê ‑lo, assustá ‑lo<br />
ou ameaçá ‑lo. Susto e ameaça andam juntos, por exemplo,<br />
quando diz que se amedronta diante das afirmações <strong>de</strong><br />
que a crônica é um gênero seríssimo. Pura brinca<strong>de</strong>ira, logo<br />
<strong>de</strong>smentida pela sua prosa leve, espontânea, sem cerimô‑<br />
nia, uma espécie <strong>de</strong> bate ‑papo <strong>de</strong>scontraído com um<br />
amigo, o que não significa fugir da raia, se esquivar a temas<br />
sérios ou seriamente fúteis. Um caso sério.<br />
O namoro com a crônica começou em 1950, no Mara‑<br />
nhão, e prosseguiu, <strong>de</strong> maneira esporádica e quase jocosa, na<br />
revista Manchete, no Rio <strong>de</strong> Janeiro. Gullar, em algumas oca‑<br />
siões, substituiu Rubem Braga, o sabiá da crônica, assinando<br />
os trabalhos com as iniciais R. B. Podia não ser um sabiá, mas<br />
já cantava como um pássaro profissional. Mas foi no Jornal do<br />
Brasil, no período <strong>de</strong> 1957 ‑1962, que <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ser um bis‑<br />
sexto para se entregar ao exercício periódico do gênero.<br />
Exercício magnífico, no qual o cronista aguçava todas<br />
as qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> observador atento à realida<strong>de</strong> cotidiana,<br />
dos fatos políticos que afetam o povo e o país aos casos<br />
banais, seus preferidos, aliás, com os quais, com humor e<br />
simpatia, escreve as suas melhores crônicas. A simpatia hu‑<br />
mana, numa outra perspectiva, está presente também nas<br />
crônicas em que aborda assuntos “<strong>de</strong>sagradáveis”: as mi‑<br />
sérias do povo, a exploração econômica, a opressão. O<br />
cronista parece então se transfigurar, sem papas na língua,<br />
mas sem ja<strong>mais</strong> per<strong>de</strong>r a elegância, solta a voz com a elo‑<br />
quência e a indignação <strong>de</strong> um profeta bíblico, como se<br />
po<strong>de</strong> constatar em “A multinacional corrupção”. As Me‑<br />
lhores crônicas Ferreira Gullar abrangem um período <strong>de</strong><br />
quase cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um cronista atento à<br />
realida<strong>de</strong> dos hum<strong>anos</strong> e à sua infindável comédia.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s
GUSTAVO CORÇÃO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Luiz Paulo Horta<br />
Gustavo Corção (1896 ‑1978)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
1 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1127 ‑4<br />
Gustavo Corção tinha o espírito e a impetuosida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
um cruzado. Católico tradicionalista, passou a vida polemi‑<br />
zando. Gostava <strong>de</strong> brigar ou, pelo menos, não se recusava<br />
ao combate, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que contrariado em suas convicções.<br />
Em especial, as convicções religiosas e políticas. Crítico da<br />
Igreja, <strong>de</strong>vido às resoluções adotadas no Concílio Vaticano<br />
II, e <strong>de</strong>fensor do regime militar imposto ao país, a partir <strong>de</strong><br />
1964, tornou ‑se uma espécie <strong>de</strong> símbolo <strong>de</strong> tudo que havia<br />
<strong>de</strong> <strong>mais</strong> reacionário, um escritor “maldito”, no sentido<br />
<strong>mais</strong> agressivo da palavra, a maldição que nasce da intran‑<br />
sigência e da intolerância.<br />
Tudo isso, hoje, é história. Mas as atitu<strong>de</strong>s e a figura<br />
contraditória do pensador continuam palpitantes e provo‑<br />
cativas, e como tal contestadas com veemência. O que<br />
ninguém contesta é a alta qualida<strong>de</strong> da obra literária cons‑<br />
truída por Corção, os ensaios e romances, entre os quais<br />
sobressai uma das obras ‑primas da ficção brasileira, Lições<br />
<strong>de</strong> abismo.<br />
No mesmo nível <strong>de</strong> feitura literária admirável, en con‑<br />
tra ‑se a obra do cronista, que durante décadas colaborou na<br />
imprensa, irritando, provocando, <strong>de</strong>spertando ódios e pro‑<br />
testos. Uma parte <strong>de</strong>ssa colaboração encontra ‑se reunida<br />
nas Melhores crônicas Gustavo Corção, que <strong>de</strong>svendam<br />
como no polemista extremo coexistia um homem sensível,<br />
apaixonado pela sua cida<strong>de</strong> e observador arguto <strong>de</strong> hábitos<br />
e costumes da época. Ou seja, como observa Luiz Paulo<br />
Horta no prefácio, “po<strong>de</strong>m ‑se distinguir diversos Corções:<br />
o memorialista quase lírico na evocação <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> e <strong>de</strong><br />
um país que não existem <strong>mais</strong>; o observador do dia a dia,<br />
capaz <strong>de</strong> transformar em crônicas saborosas; o polemista,<br />
que podia ser engraçado quando não estava nos seus dias<br />
<strong>mais</strong> azedos; e o escritor <strong>de</strong> temas religiosos, em que ele<br />
<strong>de</strong>scia fundo na meditação sobre as gran<strong>de</strong>s figuras do cris‑<br />
tianismo, como sua amada Catarina <strong>de</strong> Sena”.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
HUMBERTO DE<br />
CAMPOS<br />
Seleção e prefácio<br />
Gilberto Araújo<br />
Humberto <strong>de</strong> Campos (1886 ‑1934)<br />
Natural <strong>de</strong> Miritiba, MA<br />
1 a edição – 352 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1<strong>39</strong>9 ‑5<br />
Coedição ABL<br />
Na década <strong>de</strong> 1920 e início dos <strong>anos</strong> 1930, Humberto<br />
<strong>de</strong> Campos era o escritor <strong>mais</strong> lido e popular do Brasil. Suas<br />
crônicas, publicadas na imprensa carioca, eram transcritas<br />
em jornais <strong>de</strong> todo o país, os seus livros, best ‑sellers abso‑<br />
lutos entre os autores nacionais. Na admiração popular, ele<br />
só tinha um concorrente direto, o Conselheiro X.X., mali‑<br />
cioso, contador <strong>de</strong> histórias <strong>de</strong> alcova e piadas <strong>de</strong> fazer<br />
corar os <strong>mais</strong> pudicos, pseudônimo que encobria o próprio<br />
Humberto.<br />
Escritor i<strong>de</strong>ntificado com a imprensa em <strong>de</strong>dicação<br />
diária, com incursões pelo memorialismo (Memórias é con‑<br />
si<strong>de</strong>rado seu melhor livro) e a crítica, foi sobretudo na crô‑<br />
nica que ele <strong>de</strong>ixou a marca inconfundível <strong>de</strong> seu talento:<br />
um texto repleto <strong>de</strong> referências literárias, históricas e mito‑<br />
lógicas, sobretudo ao mundo greco ‑romano, um estilo pre‑<br />
ciso e elegante, <strong>de</strong> influência clássica, um certo moralismo<br />
e comoção diante das mazelas da vida.<br />
Mesmo com as mudanças no gosto do público, apon‑<br />
tadas e influenciadas pela eclosão do Mo<strong>de</strong>rnismo, o escritor<br />
maranhense continuou lí<strong>de</strong>r absoluto na vendagem <strong>de</strong> livros<br />
no Brasil, o preferido <strong>de</strong> José Olympio que, a partir <strong>de</strong> certa<br />
época, se tornou seu editor exclusivo.<br />
A popularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Humberto só <strong>de</strong>clinou após sua<br />
morte, em 1934, propondo um problema, como observa<br />
Gilberto Araújo <strong>de</strong> Vasconcelos no prefácio às Melhores<br />
crônicas Humberto <strong>de</strong> Campos. Como, num país que cul‑<br />
tiva ídolos, a obra <strong>de</strong> um escritor <strong>de</strong> origem humil<strong>de</strong> “que<br />
terminou imortal da Aca<strong>de</strong>mia, atingindo vendagem estra‑<br />
tosférica para o Brasil, permanece obscurecida na história<br />
<strong>de</strong> nossa literatura. Ainda <strong>mais</strong> se pensarmos que o que ata<br />
as duas pontas da vida <strong>de</strong> Humberto é o trabalho, outro<br />
mito nacional”?<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
65
IGNÁCIO DE LOyOLA<br />
BRANDÃO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Cecilia Almeida Salles<br />
Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão (1936)<br />
Natural <strong>de</strong> Araraquara, SP<br />
1 a edição – 416 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0920 ‑6<br />
O cronista Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão mantém um<br />
caso <strong>de</strong> amor e ressentimento com a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo.<br />
Como em toda relação <strong>de</strong>sse tipo, a ternura convive com a<br />
irritação, as palavras <strong>de</strong> carinho po<strong>de</strong>m se transformar em<br />
setas envenenadas, cheias <strong>de</strong> queixas, os pequenos proble‑<br />
mas do cotidiano costumam se sobrepor aos gran<strong>de</strong>s sa‑<br />
fanões que a vida dá a cada um, apaixonado ou não. São<br />
Paulo é o gran<strong>de</strong> personagem do cronista.<br />
E assim foi <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que esse paulista <strong>de</strong> Araraquara, jorna‑<br />
lista <strong>de</strong> profissão, chegou a São Paulo, no longínquo ano <strong>de</strong><br />
1957. Autor <strong>de</strong> romances <strong>de</strong> sucesso, com <strong>mais</strong> <strong>de</strong> quarenta<br />
livros publicados e <strong>mais</strong> <strong>de</strong> um milhão <strong>de</strong> volumes vendidos,<br />
po<strong>de</strong> ‑se dizer que é na crônica que Ignácio <strong>de</strong> Loyola expressa<br />
com <strong>mais</strong> veemência as suas opiniões e reações, ou, pelo<br />
menos, aquelas opiniões e reações nascidas do atrito diário com<br />
a vida e a cida<strong>de</strong> que escolheu para viver, amar e se irritar.<br />
Claro que o cronista, homem viajado, conhecendo<br />
muitas cida<strong>de</strong>s, gosta também <strong>de</strong> contar as suas vivências,<br />
encantamentos e <strong>de</strong>cepções vividas no exterior. Mas, em<br />
cada uma das crônicas, situadas longe do ar poluído da<br />
Pauliceia, parece que se ouve sempre, numa surdina elo‑<br />
quente, a voz <strong>de</strong> São Paulo. É uma fatalida<strong>de</strong> abençoada<br />
pelos leitores que, <strong>de</strong>ssa forma, através da prosa limpa e<br />
clara do cronista, têm oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> juntar ao prazer<br />
com a leitura do texto o prazer <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobrir e saborear<br />
aspectos da sua cida<strong>de</strong>. Ignácio <strong>de</strong> Loyola <strong>de</strong>la nos dá um<br />
retrato <strong>de</strong> corpo inteiro, <strong>de</strong>nunciando as suas mazelas (o<br />
barulho permanente, as ruas esburacadas, o trânsito caó‑<br />
tico) e os aspectos agradáveis: as incursões pelos sebos, os<br />
prazeres gastronômicos e a re<strong>de</strong>nção <strong>de</strong> todas as irritações<br />
e protestos, quando o cronista, do alto <strong>de</strong> seu apartamento,<br />
lava os olhos nas cores da aurora e se reconcilia com a sua<br />
cida<strong>de</strong>. Amor e ressentimento.<br />
66<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
IVAN ANGELO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Humberto Werneck<br />
Ivan Angelo (1936)<br />
Natural <strong>de</strong> Barbacena, MG<br />
1 a edição – 336 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1187 ‑8<br />
O escritor autêntico está sempre oferecendo surpre‑<br />
sas. Agradáveis, obviamente. Um dos <strong>mais</strong> importantes<br />
romancistas da literatura brasileira contemporânea, com<br />
audiência internacional, dono <strong>de</strong> um texto exemplar, Ivan<br />
Angelo ocupa também um lugar <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque na crônica<br />
brasileira atual. Surpresa? Para muitos leitores, sim.<br />
É que o cronista Ivan Angelo, durante algum tempo,<br />
atuou sobretudo em publicações regionais e numa ativida<strong>de</strong><br />
<strong>mais</strong> ou menos bissexta. A partir <strong>de</strong> 1999 passou a ocupar<br />
uma página quinzenal na revista Veja SP, <strong>de</strong> circulação res‑<br />
trita à cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo. Dessa forma, a publicação das<br />
Melhores crônicas Ivan Angelo irá surpreen<strong>de</strong>r a muito leitor,<br />
pelo Brasil a fora, revelando um cronista ágil, bem ‑humorado<br />
(o velho humor mineiro), mas sobretudo muito envolvente,<br />
<strong>de</strong>sses que pren<strong>de</strong>m o leitor pelo título, aumentam seu inte‑<br />
resse na primeira frase e só o libertam na última linha.<br />
Her<strong>de</strong>iro <strong>de</strong> uma tradição que vem <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong><br />
Assis, passando por Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> e Rubem<br />
Braga, Ivan Angelo apren<strong>de</strong>u com eles todos os matizes do<br />
gênero, para melhor impor sua personalida<strong>de</strong>, sua maneira<br />
própria e inconfundível <strong>de</strong> escrever e ver o mundo, na qual<br />
o interesse pelos fatos cotidi<strong>anos</strong> se entrelaça à atenção com<br />
àquela zona fugidia <strong>de</strong> vida pessoal, que parece in<strong>de</strong>pen‑<br />
<strong>de</strong>nte do tempo, reino mágico <strong>de</strong> cada ser humano. Esse é<br />
um dos segredos do cronista. O outro consiste em escrever<br />
<strong>de</strong> tal forma que a crônica atue “como uma relação pessoal<br />
entre o narrador e o leitor, como se fosse escrita só para esse<br />
leitor”, segundo as suas próprias palavras.<br />
Como observa Humberto Werneck no prefácio, “já<br />
<strong>de</strong>liciosas no varejo do jornal e da revista, reunidas em livro<br />
as crônicas <strong>de</strong> Ivan Angelo ficam ainda melhores – umas<br />
trabalham pelas outras, todas ganham corpo, o conjunto<br />
compõe uma exata combinação <strong>de</strong> sabores.”. O leitor é<br />
quem sai ganhando.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s
JOÃO DO RIO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Edmundo Bouças e Fred Góes<br />
João do Rio (1881 ‑1921)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
1 a edição – 328 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1329 ‑2<br />
João do Rio trouxe para a crônica brasileira um frisson<br />
novo. Quando iniciou sua ativida<strong>de</strong> literária e jornalística, a<br />
nossa imprensa ainda se mantinha no ritmo e no balanço<br />
do século XIX. Repórter e cronista, o jovem aspirante à gló‑<br />
ria entrou pelas redações como uma lufada <strong>de</strong> vento reno‑<br />
vador. Suas crônicas e matérias, tão próximas umas das<br />
outras, escritas em estilo ágil, levantavam a nova realida<strong>de</strong><br />
da socieda<strong>de</strong> brasileira, influenciada pelas modas europeias<br />
e as novas tecnologias, como o cinema, mas revelavam<br />
também aspectos até então menosprezados, numa fusão<br />
<strong>de</strong> pitoresco e dramaticida<strong>de</strong>, que po<strong>de</strong>ria ser <strong>de</strong>finida<br />
como uma visão mo<strong>de</strong>rna do mundo mo<strong>de</strong>rno.<br />
Numa prosa impressionista, na qual o cinismo, a irre‑<br />
verência e um certo tom <strong>de</strong> <strong>de</strong>safio e <strong>de</strong>boche se mescla‑<br />
vam, João do Rio se firmou e se afirmou como o cronista<br />
por excelência da belle époque brasileira. Como toda lu‑<br />
fada <strong>de</strong> vento forte, sacudiu tudo o que achou pela frente,<br />
mas passou rápido.<br />
Em pouco <strong>mais</strong> <strong>de</strong> vinte <strong>anos</strong> <strong>de</strong> frenética ativida<strong>de</strong>, uti‑<br />
lizando os <strong>mais</strong> diversos pseudônimos, escreveu centenas <strong>de</strong><br />
crônicas, uma boa parte <strong>de</strong>las ainda não reunidas em volume.<br />
As colecionadas em livros como As religiões no Rio, Cinemató‑<br />
grafo, A alma encantadora das ruas, Pall ‑Mall Rio e Vida verti‑<br />
ginosa bastam para mostrar a abrangência <strong>de</strong> interesse do<br />
cronista, curioso <strong>de</strong> tudo, fascinado pelas seduções da rua e os<br />
aspectos <strong>mais</strong> torpes da socieda<strong>de</strong>, mas também interessado<br />
no que se passava na alta socieda<strong>de</strong> e no mundo das letras e<br />
das artes. Uma seleção <strong>de</strong>ssas crônicas, como a efetuada em<br />
Melhores crônicas João do Rio, constitui um passeio inesque‑<br />
cível e repleto <strong>de</strong> vida pelo nosso passado (ainda vivo em mui‑<br />
tos aspectos atuais), guiado por um texto mágico, <strong>de</strong> perma ‑<br />
nentes seduções que, para aqueles que ainda o <strong>de</strong>sconhecem,<br />
po<strong>de</strong> ser também uma <strong>de</strong>scoberta e uma revelação.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
JOSÉ CASTELLO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Leyla Perrone Moisés<br />
José Castello (1951)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
1 a edição – 304 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0856 ‑0<br />
Como Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, o cronista José Castello<br />
po<strong>de</strong> dizer que é trezentos, 350, talvez <strong>mais</strong>, sempre o<br />
mesmo e sempre variável, <strong>de</strong> acordo com as sugestões e<br />
inquietações do momento. Essa mobilida<strong>de</strong> espiritual as‑<br />
susta alguns leitores. Um <strong>de</strong>les escreveu ao cronista<br />
queixando ‑se <strong>de</strong> que ele mudava a cada semana e<br />
classificando ‑o <strong>de</strong> “sujeito sem caráter”.<br />
O leitor con<strong>de</strong>nava o que talvez seja a maior quali‑<br />
da<strong>de</strong>, ou uma das maiores, <strong>de</strong> José Castello: a capacida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> se renovar a cada dia, a multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> interesses, a<br />
varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> pontos <strong>de</strong> vista. O que seria do cronista, e do<br />
mundo, com a invariabilida<strong>de</strong> e a mesmice elevadas à aspi‑<br />
ração suprema?<br />
No seu caso, a visão múltipla da vida se intensifica por<br />
se tratar <strong>de</strong> um ficcionista, um criador <strong>de</strong> personagens, que<br />
vira e mexe introduz em suas crônicas alguma criatura saída<br />
<strong>de</strong> sua imaginação, mas com vida própria o suficiente para<br />
criar caraminholas na cabeça <strong>de</strong> alguns leitores. A “brinca‑<br />
<strong>de</strong>ira” <strong>de</strong> introduzir seres imaginários no mundo dos vivos<br />
mostra algumas facetas do cronista, o seu humor, por vezes<br />
ácido, a irreverência, o gosto pela paródia convertida em<br />
sarcasmo, provenientes em parte do conhecimento do outro<br />
lado da vida, da face real <strong>de</strong> tantos figurões e figurinhas que<br />
ele, como jornalista profissional e entrevistador, conheceu ao<br />
longo <strong>de</strong> sua ativida<strong>de</strong>. O contato <strong>mais</strong> profundo com a hu‑<br />
manida<strong>de</strong> sugere fantasmas. A propósito, outra preferência<br />
do cronista é pelo fantástico, muitas vezes <strong>de</strong>scambando no<br />
assustador, quando não no <strong>de</strong>clarado terror. Os trabalhos<br />
que integram as Melhores crônicas José Castello são reuni‑<br />
dos em livro pela primeira vez, recolhidos diretamente na<br />
imprensa. A mudança <strong>de</strong> veículo não lhes alterou o paladar.<br />
Como no jornal, mantêm o mesmo sabor <strong>de</strong> vida e a mesma<br />
aci<strong>de</strong>z crítica.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
67
JOSÉ DE ALENCAR<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
João Roberto Faria<br />
José <strong>de</strong> Alencar (1829 ‑1877)<br />
Natural <strong>de</strong> Mecejana, CE<br />
1 a edição – 320 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0799 ‑4<br />
Conhecido pelo público mo<strong>de</strong>rno quase apenas como<br />
romancista, o cronista José <strong>de</strong> Alencar sabia esparramar em<br />
seus folhetins muito da magia que iria encantar os leitores<br />
<strong>de</strong> seus romances. O folhetim <strong>de</strong> varieda<strong>de</strong>s, antecessor da<br />
crônica atual, era uma mistura <strong>de</strong> literatura e jornalismo, <strong>de</strong><br />
crítica e maledicência, escrito com leveza, graça e por vezes<br />
uma certa sem ‑cerimônia brincalhona. Talvez por isso fosse<br />
a leitura preferida das mulheres e dos jovens.<br />
Falasse ele do último escândalo político, do dó <strong>de</strong><br />
peito do tenor da moda, da estreia <strong>de</strong> uma peça ou do livro<br />
do momento, era sempre espirituoso, com pequenas doses<br />
<strong>de</strong> malícia e ironia, ja<strong>mais</strong> penoso ou zangado.<br />
Quando começou a escrever os folhetins <strong>de</strong> Ao Correr<br />
da Pena, para o Correio Mercantil, em 1854, (seguidos<br />
pelas Folhas Soltas) José <strong>de</strong> Alencar já tinha <strong>de</strong> sobra as<br />
qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> bom folhetinista. E <strong>mais</strong> ainda: um estilo<br />
claro, harmonioso, sedutor, <strong>de</strong> que bem poucos podiam se<br />
gabar. Não é <strong>de</strong> se estranhar, pois, o gran<strong>de</strong> sucesso <strong>de</strong><br />
público do jovem <strong>de</strong> 25 <strong>anos</strong>, em um momento em que a<br />
imprensa escrita representava para a socieda<strong>de</strong> o mesmo<br />
papel hoje <strong>de</strong>sempenhado pela televisão. Ao correr da<br />
pena (expressão <strong>de</strong> modéstia que não correspondia ao ca‑<br />
ráter do escritor), Alencar examinava todos os aconteci‑<br />
mentos marcantes ou <strong>de</strong>spercebidos que encantavam,<br />
preocupavam ou monopolizavam a atenção da socieda<strong>de</strong><br />
brasileira do Segundo Reinado: festas, hábitos, vida teatral,<br />
boatos. Por vezes se tornava sério, com uma tintura <strong>de</strong><br />
moralismo, mas sem ja<strong>mais</strong> per<strong>de</strong>r a graça e a leveza.<br />
Nesse caso está a bela crônica sobre a <strong>de</strong>spedida <strong>de</strong> Monte<br />
Alverne do púlpito, acontecimento social que encheu a ca‑<br />
pela imperial com a nata da socieda<strong>de</strong>. A começar pelo<br />
imperador. Essa socieda<strong>de</strong> também vivia com os olhos nas<br />
crônicas <strong>de</strong> Alencar.<br />
68<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
JOSUÉ MONTELLO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Flávia Amparo<br />
Josué Montello (1917 ‑2006)<br />
Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />
1 a edição – 400 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1403 ‑9<br />
Coedição ABL<br />
Escritor que cultivou com êxito todos os gêneros literá‑<br />
rios – romance, conto, história literária, poesia (essa, uma<br />
ati vi da<strong>de</strong> quase clan<strong>de</strong>stina), crítica, ensaio, memorialismo –,<br />
Josué Montello foi também um excelente cronista, atento à<br />
vida em suas múltiplas manifestações.<br />
Durante <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta <strong>anos</strong>, a partir <strong>de</strong> 1955, publicou<br />
crônicas no Jornal do Brasil, muitas vezes três por semana.<br />
Escritas em linguagem fluente, com uma graça her<strong>de</strong>ira da<br />
leveza machadiana, contavam com um público cativo, que<br />
chegava a comprar o jornal sobretudo para lê ‑las.<br />
Homem que respirava literatura vinte e quatro horas<br />
por dia, com uma memória sempre fiel, Montello gostava<br />
<strong>de</strong> rechear os seus escritos com citações, casos, lembranças<br />
<strong>de</strong> leitura, que davam um tom peculiar e inconfundível às<br />
centenas <strong>de</strong> crônicas que <strong>de</strong>ixou no velho jornal carioca.<br />
Parte <strong>de</strong>ssa imensa colaboração, inédita em livro, está<br />
sendo oferecida ao público leitor nas Melhores crônicas<br />
Josué Montello, uma seleção feita com apuro e sagacida<strong>de</strong><br />
por Flávia Amparo. São noventa e quatro crônicas, organiza‑<br />
das sob temas específicos (Memórias, Histórias da aca<strong>de</strong>mia,<br />
Óbices do ofício, Amigos <strong>de</strong> sempre, Homens e livros, Biblio‑<br />
teca íntima, Mestre Machado <strong>de</strong> Assis), que mapeiam com<br />
muita precisão o universo <strong>de</strong> preocupações <strong>de</strong> Montello.<br />
Retiradas da página efêmera do jornal para o livro, as<br />
crônicas <strong>de</strong> Montello mantêm o mesmo encanto que pren‑<br />
dia os leitores na data <strong>de</strong> sua publicação. Leves e breves,<br />
bem ‑humoradas, flagrantes <strong>de</strong> época, algumas <strong>de</strong>las ricas<br />
fontes <strong>de</strong> informação sobre a vida literária da época, elas<br />
convidam o leitor, como observa Flávia Amparo, “para um<br />
diálogo, como os antigos mestres costumavam fazer, par‑<br />
tindo das experiências do cotidiano para alçar outros<br />
voos”. Voos que po<strong>de</strong>m levar o leitor a gran<strong>de</strong>s aventuras.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s
LÊDO IVO<br />
Seleção do autor.<br />
Prefácio e notas <strong>de</strong><br />
Gilberto Mendonça Teles<br />
Lêdo Ivo (1924)<br />
Natural <strong>de</strong> Maceió, AL<br />
1 a edição – 288 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0919 ‑2<br />
Há cronistas sérios e há cronistas leves, mas os <strong>mais</strong> inte‑<br />
ressantes são os que dominam o segredo <strong>de</strong> misturar serie‑<br />
da<strong>de</strong> e leveza, <strong>de</strong> abordar os assuntos <strong>mais</strong> sérios com graça,<br />
por vezes quase frívola, que no fundo é liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> espírito,<br />
encanto diante do mundo, convite ao leitor, ímã literário.<br />
Lêdo Ivo é o exemplo perfeito <strong>de</strong>sse cronista, seduzido<br />
pelo espetáculo da vida, inteligente, divertido, capaz <strong>de</strong><br />
extrair uma crônica do fato <strong>mais</strong> banal ou do <strong>mais</strong> insólito,<br />
<strong>de</strong> uma história <strong>de</strong> namorados ou recém ‑casados ao caso<br />
do <strong>de</strong>funto que se levanta no meio do velório, do humor<br />
das palavras cruzadas numa repartição pública ao tocador<br />
<strong>de</strong> flautim, das transformações urbanas e sociais do Rio <strong>de</strong><br />
Janeiro ao ladrão <strong>de</strong> paisagem, do sono do pesquisador na<br />
Biblioteca Nacional, após o almoço, aos cachorros do aero‑<br />
porto <strong>de</strong> Vitória.<br />
Um dos poetas <strong>mais</strong> importantes da literatura brasi‑<br />
leira, romancista, ensaísta, contista, senhor <strong>de</strong> todos os<br />
segredos da língua, estilista virtuoso, Lêdo Ivo cultiva a crô‑<br />
nica <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os <strong>anos</strong> 1950. Alagoano <strong>de</strong> nascimento, é um<br />
dos gran<strong>de</strong>s cronistas da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Sebastião do Rio <strong>de</strong><br />
Janeiro, que escolheu para viver e trabalhar. A propósito,<br />
leiam ‑se nessas suas Melhores crônicas Lêdo Ivo as reunidas<br />
na seção O Rio é uma Festa. Rachel <strong>de</strong> Queiroz observou<br />
que o Rio “ja<strong>mais</strong> foi cantado por nenhum dos seus filhos<br />
com ternura, força poética e inteligências iguais” às <strong>de</strong>cla‑<br />
rações <strong>de</strong> amor <strong>de</strong> Lêdo Ivo à cida<strong>de</strong>. Mas, por vezes, o<br />
cronista também se revolta contra a cida<strong>de</strong> amada. Leia ‑se<br />
“O carioca Marques Rebelo”, que se inicia pela frase pro‑<br />
vocativa: “Marques Rebelo cometeu a imprudência <strong>de</strong> nas‑<br />
cer no Rio <strong>de</strong> Janeiro”, na qual protesta contra “a ingratidão<br />
póstuma da cida<strong>de</strong>” pelos seus escritores. Que ninguém se<br />
engane com a veemência justa do cronista. Protestar tam‑<br />
bém é uma forma <strong>de</strong> amar.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
LIMA BARRETO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Beatriz Resen<strong>de</strong> <strong>de</strong> Freitas<br />
Lima Barreto (1881 ‑1922)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
1 a edição – 304 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0990 ‑7<br />
Lima Barreto gostava <strong>de</strong> publicar as suas crônicas em jor‑<br />
nais e revistas <strong>de</strong> pequena circulação, obscuros, “aos quais<br />
ninguém dá importância”, como ele mesmo confessou. O que<br />
hoje chamaríamos <strong>de</strong> imprensa alternativa. A palavra, aliás –<br />
encarada como uma espécie <strong>de</strong> estigma, <strong>de</strong> marginalida<strong>de</strong> –,<br />
se ajusta bem à vida e à obra do próprio escritor, que <strong>de</strong>testava<br />
a gran<strong>de</strong> imprensa, da mesma forma que abominava a alta<br />
socieda<strong>de</strong> e os po<strong>de</strong>rosos do mundo. Revoltado, amargo, re‑<br />
clamando <strong>de</strong> tudo, dominado pelo sentimento <strong>de</strong> auto<strong>de</strong>strui‑<br />
ção, mantinha, porém, no fundo, uma certa pureza <strong>de</strong> criança<br />
mimada, magoada e <strong>de</strong>siludida com a brutalida<strong>de</strong> da vida.<br />
Suas crônicas, a maioria escrita no período <strong>de</strong> 1918 a<br />
1922, expõem com força esses sentimentos, não raras<br />
vezes expressos num tom panfletário, <strong>de</strong> crítica violenta às<br />
instituições políticas e sociais (“nossa vilã e ávida socieda<strong>de</strong><br />
burguesa”, escreveu), sátira aos costumes e i<strong>de</strong>ntificação<br />
com o povo.<br />
Com o tempo, aumentam a prevenção contra a bur‑<br />
guesia e a i<strong>de</strong>ntificação com o povo, ou pelo menos com<br />
um conjunto <strong>de</strong> sentimentos e comportamentos, i<strong>de</strong>aliza‑<br />
dos ou não, que atribuía ao povo. Dessa posição pessoal<br />
vem sua simpatia pelos movimentos <strong>de</strong> reivindicação da<br />
classe operária e por acontecimentos históricos como a Re‑<br />
volução Russa <strong>de</strong> 1917. Com muito <strong>mais</strong> força e indigna‑<br />
ção, ele trata <strong>de</strong> um problema que o atingia pessoalmente;<br />
o preconceito racial, <strong>mais</strong> aprofundado em sua obra <strong>de</strong><br />
ficção. Afastando ‑se do gosto dominante da época, on<strong>de</strong><br />
predomina um certo artificialismo <strong>de</strong> expressão, Lima Bar‑<br />
reto escreve suas crônicas em tom <strong>de</strong> conversa familiar. A<br />
linguagem po<strong>de</strong> ser acusada <strong>de</strong> frouxa, o estilo <strong>de</strong>scui‑<br />
dado. Mas essas pequenas <strong>de</strong>ficiências são compensadas<br />
por uma intensida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida, raras em sua época. Talvez<br />
por isso continuem tão vivas.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
69
MACHADO DE ASSIS<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Salete <strong>de</strong> Almeida Cara<br />
Machado <strong>de</strong> Assis (18<strong>39</strong> ‑1908)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
2 a edição – 414 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0798 ‑7<br />
Um dos retratos <strong>mais</strong> fiéis e abrangentes da socieda<strong>de</strong><br />
imperial, nos bons tempos do barbaças Pedro II, e do início<br />
da República, encontra ‑se nas crônicas <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis.<br />
Irônico, por vezes cruel, o cronista gostava <strong>de</strong> examinar os<br />
gran<strong>de</strong>s acontecimentos do dia, mas também se <strong>de</strong>liciava<br />
em catar o mínimo e o escondido, sem distinção. Com suti‑<br />
leza, zombava <strong>de</strong> tudo ou quase tudo, conciliando o humor<br />
corrosivo com a expressão elegante, o estilo clássico e uma<br />
linha <strong>de</strong> raciocínio cartesiana. Mas a alma era brasileira, ca‑<br />
rioca, i<strong>de</strong>ntificada com as aspirações da época.<br />
A época vivida e retratada pelo cronista foi palpitante<br />
<strong>de</strong> acontecimentos: a Questão Christie, a Questão Militar,<br />
a Guerra do Paraguai, a abolição da escravatura, a queda<br />
do Império. A República começou quente, para logo ferver<br />
em acontecimentos como o Encilhamento, a Revolta da<br />
Armada contra Floriano Peixoto e Canudos.<br />
Sem <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> examinar esses fatos e um pouco do que<br />
ocorria no mundo, com atenção e acuida<strong>de</strong> extrema, a pre‑<br />
ferência do cronista se voltava sobretudo para o que ocorria<br />
na cida<strong>de</strong>: a vida social, os fatos curiosos, as novida<strong>de</strong>s tea‑<br />
trais e literárias, sem per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista os <strong>de</strong>bates parlamenta‑<br />
res e os acontecimentos políticos, <strong>de</strong>smentindo a propalada<br />
alienação machadiana, uma balela <strong>de</strong> alienados que nada<br />
conhecem <strong>de</strong> sua obra. Durante 45 <strong>anos</strong>, Machado atuou<br />
na imprensa da Corte como cronista. Lidas em sequência<br />
cronológica, suas crônicas revelam uma esplêndida evolu‑<br />
ção, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os primeiros ensaios tateantes do jovem <strong>de</strong> vinte<br />
<strong>anos</strong>, publicados em O espelho, até as obras da maturida<strong>de</strong>,<br />
<strong>de</strong> insuperável graça. Deixou <strong>mais</strong> <strong>de</strong> seiscentos trabalhos no<br />
gênero. O difícil, nesse conjunto soberbo, é a escolha dos<br />
melhores, tarefa <strong>de</strong> que se saiu muito bem a organizadora<br />
do volume, Salete <strong>de</strong> Almeida Cara.<br />
70<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
MANUEL BANDEIRA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Eduardo Coelho<br />
Manuel Ban<strong>de</strong>ira (1886 ‑1968)<br />
Natural <strong>de</strong> Recife, PE<br />
1 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0832 ‑3<br />
Manuel Ban<strong>de</strong>ira escrevia com miraculosa simplicida<strong>de</strong>,<br />
com um <strong>de</strong>spojamento franciscano. O santo <strong>de</strong> Assis se <strong>de</strong>s‑<br />
fez <strong>de</strong> todos os bens – e em certa ocasião até das vestes –<br />
para alcançar aquela simplicida<strong>de</strong> que combina com a<br />
perfeição. Ban<strong>de</strong>ira, espírito franciscano, <strong>de</strong>spojou sua poe‑<br />
sia e prosa <strong>de</strong> todos as bijuterias <strong>de</strong> estilo, dos adjetivos ba‑<br />
lofos, das metáforas inúteis. Escrevia com frases secas e<br />
diretas, na linguagem <strong>de</strong> todo mundo e <strong>de</strong> todo o dia.<br />
Poeta por vocação, a crônica foi uma espécie <strong>de</strong> bate‑<br />
‑papo com amigos, como ele mesmo a <strong>de</strong>finiu, traduzindo as<br />
impressões, as irritações e os estímulos nascidos do cotidiano e<br />
anotados com encanto ou <strong>de</strong>sencanto, numa atenta e risonha<br />
reverência à vida. Se o fundo <strong>de</strong> seu pensamento era austero,<br />
como observou Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, essa austeri‑<br />
da<strong>de</strong> era amenizada por um leve sorriso, sorriso <strong>de</strong>ntuça, que<br />
talvez fosse o supremo refinamento da ironia.<br />
Como bom cronista, tudo lhe servia <strong>de</strong> tema, as suas<br />
andanças pelo Brasil – Ouro Preto, Bahia, Recife –, aspectos<br />
<strong>de</strong> viagem, os pardais, pardais pássaros e pardais literários,<br />
o queijo <strong>de</strong> Minas enviado por um poeta, o livro recém‑<br />
‑lançado, a morte <strong>de</strong> amigos, a sedução das gran<strong>de</strong>s per‑<br />
sonalida<strong>de</strong>s, se chamassem elas Lenin ou Carlitos. Sob o<br />
cronista havia também um crítico sagaz <strong>de</strong> arte, apreciando<br />
com comoção, mas sempre com discernimento, a escultura<br />
<strong>de</strong> um Aleijadinho, as velhas igrejas brasileiras, a arquite‑<br />
tura das cida<strong>de</strong>s adormecidas. Em tudo isso palpitava um<br />
gran<strong>de</strong> sentimento brasileiro e não raramente boas doses<br />
<strong>de</strong> poesia. Às vezes, em vez da crônica esperada, brindava<br />
os leitores com um conto. Neste caso está o <strong>de</strong>licioso “O<br />
professor <strong>de</strong> grego”, que <strong>mais</strong> do que uma história soa<br />
como uma metáfora da própria socieda<strong>de</strong> brasileira. O cro‑<br />
nista era mestre em surpresas e sutilezas.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s
MARCOS REy<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Anna Maria Martins<br />
Marcos Rey (1925 ‑1999)<br />
Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />
1 a edição – 328 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1480 ‑0<br />
Romancista <strong>de</strong> imenso sucesso junto ao público adul‑<br />
to e juvenil, um dos autores <strong>mais</strong> vendidos do Brasil, Mar‑<br />
cos Rey foi também, durante <strong>anos</strong>, um cronista popular,<br />
com tribuna montada na revista Veja. Irônico, ora mali‑<br />
cioso, ora sarcástico, por vezes mordaz, seduzia o leitor<br />
com uma prosa direta, enxuta, bem ‑humorada, como uma<br />
conversa <strong>de</strong> bar. Mas que ninguém se engane. Sob o tom<br />
leve e agradável <strong>de</strong> bate ‑papo, o cronista disseca <strong>de</strong> forma<br />
implacável o bicho ‑homem, suas fragilida<strong>de</strong>s e hipocrisias,<br />
vícios e ridículos, a solidão e as paixões perigosas, mas tam‑<br />
bém sonhos e anseios comoventes.<br />
Pela sua pena ágil, o leitor passeia pela feira (“a feira<br />
é a praia do paulistano”), se inquieta com as filas nos ban‑<br />
cos, se diverte numa sala <strong>de</strong> espera (“o que acontece antes<br />
da consulta, da tese, do pedido <strong>de</strong> empréstimo...”). Sem<br />
per<strong>de</strong>r o tom e o ritmo, o cronista ironiza o drama do pobre<br />
marido surpreendido num motel, conta o episódio meio<br />
grotesco do dublador que per<strong>de</strong>u sua verda<strong>de</strong>ira voz,<br />
evoca uma vingança que durou a vida inteira (página <strong>de</strong><br />
memória, relacionada com a <strong>de</strong>scoberta pelo autor <strong>de</strong> O<br />
coração, famoso livro <strong>de</strong> literatura infantojuvenil, <strong>de</strong> Ed‑<br />
mondo De Amicis).<br />
O memorialista convive com o cronista em vários mo‑<br />
mentos. Assim, quando Rey lembra uma tar<strong>de</strong> <strong>de</strong> autógra‑<br />
fos no Paribar, fala <strong>de</strong> sua paixão pelo rádio, dos “bares da<br />
sauda<strong>de</strong>” (“eles contam a história paulistana”) e da São<br />
Paulo do seu tempo (“não perguntem sobre a garoa, cor‑<br />
sos e borzeguins”).<br />
Aliás, como em toda a sua obra, também nas crônicas<br />
o gran<strong>de</strong> personagem <strong>de</strong> Marcos Rey é a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São<br />
Paulo, as suas ruas e praças, os aspectos inocentes e as<br />
bocas malditas, a vida diurna e noturna, os bares, os locais<br />
<strong>de</strong> encontro e <strong>de</strong>sencontro. A vida em sua plena pulsação.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
MARIA JULIETA<br />
DRUMMOND DE<br />
ANDRADE<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Marcos Pasche<br />
Maria Julieta Drummond<br />
<strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> (1928 ‑1987)<br />
Natural <strong>de</strong> Belo Horizonte, MG<br />
1 a edição – 304 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1672 ‑9<br />
Maria Julieta Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> começou a es‑<br />
crever crônicas por acaso. Nas comemorações públicas<br />
pelos 75 <strong>anos</strong> <strong>de</strong> seu pai, Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>,<br />
ela foi convidada a fazer um texto para a revista Veja. O<br />
que seria um texto jornalístico resultou numa bela crônica,<br />
intitulada “Meu pai”. Agradou a gregos e bai<strong>anos</strong>, e a par‑<br />
tir daí se <strong>de</strong>dicou ao gênero com afinco, originalida<strong>de</strong> e<br />
uma visão muito própria do mundo. Maria Julieta acredi‑<br />
tava, como Guimarães Rosa, que o bicho ‑homem tem<br />
muito a apren<strong>de</strong>r com os ani<strong>mais</strong>, os quais <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>u em<br />
inúmeras crônicas das malva<strong>de</strong>zas humanas e com os quais<br />
se i<strong>de</strong>ntifica a ponto <strong>de</strong> tomá ‑los como mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> con‑<br />
duta. Confira ‑se: “Sendo os gatos tão sábios, tenho sem‑<br />
pre a esperança <strong>de</strong> conseguir, talvez, falando e escrevendo<br />
sobre eles, aceitar melhor as contingências da vida”.<br />
Sua ternura não se limita aos gatos, mas esten<strong>de</strong> ‑se a<br />
todo o reino animal. A bela crônica intitulada “Passarinho”<br />
fala com ternura feminina do animalzinho, “um canário<br />
que não foi feliz, tinha o jeitinho triste <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que chegou<br />
ao apartamento”. Em “Bezerro”, <strong>mais</strong> conto do que crô‑<br />
nica, a cronista sofre ao narrar o abate do animal, num<br />
clima patético.<br />
Maria Julieta foi também cronista do cotidiano, na<br />
qual a sua própria figura ocupa um lugar <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque. Em<br />
certos momentos, ela parece escrever com os olhos fitos no<br />
espelho. Esse quase narcisismo acaba prejudicando sua<br />
visão do mundo e a realização da crônica, mas é ampla‑<br />
mente redimido em belos momentos, como na antológica<br />
“Boas ‑festas”, um daqueles momentos i<strong>de</strong>ais em “que sua<br />
escrita ganha o corpo da maturida<strong>de</strong> e o espírito da meni‑<br />
nice, e, por sua vez, a crônica efetua seu fazer <strong>mais</strong> nobre,<br />
que é o <strong>de</strong> nos interromper para que assistamos ao milagre<br />
da vida”, como observa Marcos Pasche no prefácio.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
71
MARQUES REBELO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Renato Cor<strong>de</strong>iro Gomes<br />
Marques Rebelo (1907 ‑1973)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
1 a edição – 288 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0892 ‑7<br />
Na literatura do século XIX a alma carioca palpita em<br />
estado <strong>de</strong> graça plena na obra <strong>de</strong> dois gran<strong>de</strong>s escritores,<br />
Manuel Antônio <strong>de</strong> Almeida e Machado <strong>de</strong> Assis. A tradi‑<br />
ção persiste no início do século seguinte, com o atormen‑<br />
tado Lima Barreto.<br />
Her<strong>de</strong>iro <strong>de</strong>sses gran<strong>de</strong>s espíritos e <strong>de</strong> suas afinida<strong>de</strong>s<br />
mágicas com a terra <strong>de</strong> São Sebastião do Rio <strong>de</strong> Janeiro,<br />
Marques Rebelo produziu toda a sua obra numa espécie <strong>de</strong><br />
ligação mediúnica com a cida<strong>de</strong>, aliás, as várias cida<strong>de</strong>s<br />
<strong>de</strong>ntro da cida<strong>de</strong>, que convivem no tempo e no espaço,<br />
sintonizado com os sonhos, as rebeldias e as malandragens<br />
<strong>de</strong> seus habitantes, os momentos <strong>de</strong> <strong>de</strong>salento, os encon‑<br />
tros e <strong>de</strong>sencontros amorosos, a paixão pelo futebol, as<br />
transformações urbanísticas, o trabalho cotidiano, os ócios,<br />
os sambas transmitidos pelo rádio, “a tristeza e o pitoresco,<br />
o ar, o paladar, o odor do ajuntamento humano” (Carlos<br />
Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>), os mil e um elos misteriosos e<br />
in<strong>de</strong>finíveis que unem os cidadãos <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> e os dis‑<br />
tinguem dos naturais <strong>de</strong> qualquer outro ponto do globo.<br />
Nascido em Vila Isabel, terra <strong>de</strong> Noel Rosa, Marques Re‑<br />
belo <strong>de</strong> certa forma incorporou ao seu espírito a irreverência<br />
diante da vida e os sentimentos típicos do homem da zona<br />
norte carioca. A leveza dos sambinhas <strong>de</strong> Noel, aquele “feitiço<br />
<strong>de</strong>cente” da Vila, parecem reencarnar no estilo e na lingua‑<br />
gem do escritor, leve, enxuta, sem insistência, amenizando um<br />
tanto sua visão amarga e sarcástica da vida. Rebelo <strong>de</strong>ixou<br />
uma obra ampla e variada, romances, contos, teatro, literatura<br />
infantil, livros <strong>de</strong> viagem pelo Brasil e pelo exterior, e um nú‑<br />
mero imenso <strong>de</strong> crônicas, a maior parte ainda submersa em<br />
jornais e revistas. Várias <strong>de</strong>las foram recuperadas neste vo‑<br />
lume <strong>de</strong> suas Melhores crônicas Marques Rebelo, <strong>de</strong>liciosas<br />
como um docinho <strong>de</strong> coco: “Jacarepaguá”, “Na praia”, “A<br />
mesma música”, outras e outras. Vale a pena prová ‑las.<br />
72<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
MOACyR SCLIAR<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Luís Augusto Fischer<br />
Moacyr Scliar (1937 ‑2011)<br />
Natural <strong>de</strong> Porto Alegre, RS<br />
1 a edição – 384 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0946 ‑X<br />
Na crônica, como em tudo <strong>mais</strong> na vida, cada um dá<br />
o que tem. No caso do cronista, há ainda uma peculiari‑<br />
da<strong>de</strong>: ele não só transmite o que lhe está na alma, como<br />
precisa se <strong>de</strong>spersonalizar ou se <strong>de</strong>sdobrar, sei lá, para cap‑<br />
tar os mistérios e as banalida<strong>de</strong>s do cotidiano. É como uma<br />
antena (talvez parabólica) aberta para o mundo, captando<br />
novida<strong>de</strong>s, sempre filtradas através <strong>de</strong> um temperamento<br />
e uma história <strong>de</strong> vida.<br />
Quanta complicação para dizer que o cronista Moacyr<br />
Scliar, um dos gran<strong>de</strong>s ficcionistas do país, revela a cada mo‑<br />
mento em suas crônicas sua situação <strong>de</strong> médico e <strong>de</strong> ju<strong>de</strong>u,<br />
filho <strong>de</strong> imigrantes. Muito orgulhoso <strong>de</strong> ambas. Essa condição<br />
acentua sua visão crítica da vida e “muitas vezes o ângulo<br />
irônico, quando não humorístico” (humor judaico), como sa‑<br />
lienta Luís Augusto Fischer, no prefácio às Melhores crônicas<br />
Moacyr Scliar, aliás recolhidas em livro pela primeira vez.<br />
Nada <strong>mais</strong> natural também que, como ficcionista au‑<br />
têntico, muitas <strong>de</strong> suas crônicas estejam <strong>mais</strong> i<strong>de</strong>ntificadas<br />
com a ficção do que com a crônica pura, sem fermento.<br />
Ótimo. O fermento da imaginação, sobrepondo ‑se à sim‑<br />
ples observação, muitas vezes tem o dom <strong>de</strong> cutucar o lei‑<br />
tor, <strong>de</strong> <strong>de</strong>spertá ‑lo para outra dimensão da realida<strong>de</strong>, quando<br />
não lançá ‑lo em pleno absurdo. O absurdo serve também,<br />
quase em surdina, para a crítica social, a con<strong>de</strong>nação das<br />
vaida<strong>de</strong>s humanas, a reflexão sobre as armadilhas da vida<br />
mo<strong>de</strong>rna. Mas, seja em seus mergulhos no absurdo ou na<br />
captação do cotidiano, o cronista nunca per<strong>de</strong> o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong><br />
se comunicar com o leitor, através <strong>de</strong> uma linguagem clara,<br />
coloquial, sem rebuscamentos, a linguagem do povo, mas<br />
<strong>de</strong>purada por uma rígida disciplina. Como observa Fischer,<br />
“sua crônica proporciona ao leitor a agradável sensação <strong>de</strong><br />
compartilhamento, que temos ao conversar com um par‑<br />
ceiro”. Po<strong>de</strong> haver melhor diálogo?<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s
OLAVO BILAC<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Ubiratan Machado<br />
Olavo Bilac (1865 ‑1918)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
1 a edição – 304 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1037 ‑6<br />
O poeta Olavo Bilac era capaz <strong>de</strong> ouvir e enten<strong>de</strong>r<br />
estrelas. Mais atento à realida<strong>de</strong> cotidiana, o cronista Bilac<br />
preferia ouvir os rumores do mundo e enten<strong>de</strong>r as angús‑<br />
tias, as esperanças e as perplexida<strong>de</strong>s do bicho ‑homem.<br />
Nada <strong>de</strong> humano lhe era indiferente.<br />
Cultivando a crônica <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a mocida<strong>de</strong>, Bilac alcança o<br />
auge <strong>de</strong> sua ativida<strong>de</strong> ao substituir Machado <strong>de</strong> Assis na crô‑<br />
nica dominical da Gazeta <strong>de</strong> Notícias, o jornal <strong>mais</strong> importante<br />
do país. Nesse posto permanece cerca <strong>de</strong> vinte <strong>anos</strong>, analisando<br />
com ironia e pieda<strong>de</strong>, galhofa e ternura, o inesgotável espetá‑<br />
culo humano e o inquietante cenário político internacional.<br />
Que riqueza <strong>de</strong> acontecimentos. No Brasil, <strong>de</strong>senrola ‑se o<br />
penoso processo <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rnização do país, com a construção<br />
da avenida Central, no Rio <strong>de</strong> Janeiro, a vacina obrigatória, o<br />
ufanismo, a Europa curvando ‑se diante do Brasil com os feitos<br />
<strong>de</strong> Santos Dumont, que o cronista compara a Prometeu e Ícaro.<br />
Mudanças no plano físico, mas sobretudo mudanças <strong>de</strong> men‑<br />
talida<strong>de</strong>, apesar da persistência <strong>de</strong> velhas chagas, como a retra‑<br />
tada em “Hábitos parlamentares”, <strong>de</strong> oportuna atualida<strong>de</strong>. O<br />
cenário internacional assusta, com as guerras russo ‑japonesa e<br />
dos Bálcãs, o conflito <strong>mais</strong> <strong>de</strong>vastador vivido até então pelo<br />
homem, a Primeira Guerra Mundial e a Revolução Soviética <strong>de</strong><br />
1917, que o cronista analisa com inquietação e acuida<strong>de</strong>. Nesse<br />
mundo conturbado, o cronista tem também seus oásis, on<strong>de</strong><br />
sob a crítica por vezes áspera, mas quase sempre brincalhona,<br />
sente ‑se a ternura do poeta. São assim as crônicas sobre a vida<br />
carioca, pequenas aquarelas literárias, coloridas e um tanto ca‑<br />
ricaturais, mas sempre pulsantes <strong>de</strong> vida, como “Gente ele‑<br />
gante”, “O namoro no Rio <strong>de</strong> Janeiro”, “A eloquência da<br />
sobremesa”. Um ponto valioso <strong>de</strong>ssa edição é a publicação <strong>de</strong><br />
crônicas inéditas (<strong>mais</strong> <strong>de</strong> um terço do volume), pela primeira<br />
vez reunidas em livro. Elas ajudam a <strong>de</strong>scobrir por que o cro‑<br />
nista Bilac continua encantado. E encantador.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
RACHEL DE QUEIROZ<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Heloisa Buarque <strong>de</strong> Hollanda<br />
Rachel <strong>de</strong> Queiroz (1910 ‑2003)<br />
Natural <strong>de</strong> Fortaleza, CE<br />
1 a edição – 336 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0949 ‑3<br />
Em sua ativida<strong>de</strong> como cronista, Rachel <strong>de</strong> Queiroz<br />
realizou alguns milagres (literários), como o <strong>de</strong> interessar o<br />
leitor (vários tipos <strong>de</strong> leitores, no tempo e no espaço) du‑<br />
rante quase oitenta <strong>anos</strong> (exatos 77 <strong>anos</strong>). Deve ter batido<br />
alguns recor<strong>de</strong>s. J. Carlos dizia que os seus <strong>de</strong>senhos<br />
davam para cobrir toda a avenida Rio Branco. As crônicas<br />
<strong>de</strong> Rachel <strong>de</strong>vem igualar ou superar esse feito. E como o<br />
maravilhoso caricaturista, sem nunca <strong>de</strong>cair <strong>de</strong> suas quali‑<br />
da<strong>de</strong>s habituais: o tom <strong>de</strong> conversa, em ritmo quase nor‑<br />
<strong>de</strong>stino, o domínio perfeito da língua, dosando com<br />
sabedoria a contribuição popular e o rigor clássico, em<br />
frases que “se movem em leves lufadas cômodas, variadas<br />
com habilida<strong>de</strong> magnífica” (Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>).<br />
Rachel começou a colaborar na imprensa lá pelo ano<br />
<strong>de</strong> 19<strong>39</strong>, quando se transferiu do Ceará para o Rio <strong>de</strong><br />
Janeiro. Como <strong>de</strong>clarou, a imprensa foi sua “trincheira”.<br />
Dessa trincheira disparou artigos, reportagens, mas sobre‑<br />
tudo crônicas – parte das quais estão recolhidas em treze<br />
livros –, crônicas que traçam uma espécie <strong>de</strong> autobiogra‑<br />
fia espiritual <strong>de</strong> sua autora, mas também um retrato colo‑<br />
rido <strong>de</strong> oito décadas <strong>de</strong> vida brasileira: testemunhos sobre<br />
fatos históricos, quadros da vida carioca ou nor<strong>de</strong>stina,<br />
perfis <strong>de</strong> figuras conhecidas ou populares interessantes,<br />
intimida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> famílias, reflexões sobre a vida humana, o<br />
tempo, a morte, o amor, que tudo está contido na vida, e<br />
a cronista tinha olhos <strong>de</strong> ver e amar (ou se indignar) com<br />
cada fato da vida.<br />
Várias <strong>de</strong>ssas crônicas são, na verda<strong>de</strong>, contos nos<br />
quais Rachel exercitava suas qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ficcionista. Era<br />
como uma mudança temporária <strong>de</strong> instrumento, a sanfona<br />
pela viola, ou vice ‑versa, sem ja<strong>mais</strong> per<strong>de</strong>r o tom e o ritmo<br />
ou <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> fascinar o leitor. Sua conversa sempre enfeiti‑<br />
çava e continua enfeitiçando. É só começar.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
73
RAUL POMPEIA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Cláudio Murilo Leal<br />
Raul Pompeia (1863 ‑1895)<br />
Natural <strong>de</strong> Angra dos Reis, RJ<br />
1 a edição – 224 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1589 ‑0<br />
Autor <strong>de</strong> dois clássicos da literatura brasileira, o ro‑<br />
mance O Ateneu e o volume <strong>de</strong> poemas em prosa Canções<br />
sem metro, Raul Pompeia foi também um constante e pri‑<br />
moroso cronista. As suas primeiras experiências no gênero<br />
remontam ao período <strong>de</strong> estudante, quando escreveu para<br />
jornais do Rio <strong>de</strong> Janeiro, São Paulo e Juiz <strong>de</strong> Fora. Amadu‑<br />
recendo, aprimorou ‑se, produzindo algumas obras ‑primas<br />
da crônica brasileira.<br />
Quem conhece apenas O Ateneu, escrito numa prosa<br />
artística, à maneira dos Irmãos Goncourt, e percorrer os<br />
setenta e um trabalhos reunidos nas Melhores crônicas<br />
Raul Pompeia, vai estranhar a linguagem, modulada nos<br />
<strong>mais</strong> diversos tons, da virulência ao lirismo, da irritação<br />
plena ao sarcasmo <strong>de</strong>molidor.<br />
É que quase todas as crônicas <strong>de</strong> Pompeia estão liga‑<br />
das ao momento político e refletem o ânimo exaltado do<br />
autor, intolerante em suas convicções, agressivo, em sinto‑<br />
nia total com o momento histórico, um dos <strong>mais</strong> conturba‑<br />
dos da evolução da socieda<strong>de</strong> brasileira, marcado pela<br />
abolição da escravatura, a proclamação da República, o<br />
governo <strong>de</strong> Floriano Peixoto, o Marechal <strong>de</strong> Ferro, que<br />
Pompeia <strong>de</strong>fendia e admirava com fanatismo.<br />
Instalado na trincheira da crônica, <strong>de</strong>sfechando petardos<br />
<strong>de</strong>molidores, Pompeia sabia também captar com admirável<br />
sensibilida<strong>de</strong> a palpitação humana que havia por baixo da<br />
tensão <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminados momentos históricos, como na bela<br />
página intitulada “Uma noite histórica”, em que narra a par‑<br />
tida da família imperial, D. Pedro II à frente, para o exílio, antes<br />
do embarque no navio Alagoas, que os conduziria a Portugal.<br />
É página <strong>de</strong> mestre, ressaltada por Cláudio Murilo Leal,<br />
no prefácio, ao sublinhar o “tratamento poético que, ilumi‑<br />
nando a notícia jornalística, transforma ‑a em um texto lite‑<br />
rário duradouro”, redigido “com excepcional sensibilida<strong>de</strong>”.<br />
74<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
ROBERTO DRUMMOND<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Carlos Herculano Lopes<br />
Roberto Drummond (1933 ‑2002)<br />
Natural <strong>de</strong> Santana dos Ferros, MG<br />
1 a edição – 320 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1013 ‑1<br />
O romancista Roberto Drummond fez um sucesso na‑<br />
cional estrondoso com obras como Hilda Furacão e Hitler<br />
manda lembranças. O cronista Roberto Drummond colhia<br />
a sua migalha diária <strong>de</strong> sucesso, mas sua voz ficava restrita<br />
às Minas Gerais. Merecia uma audiência <strong>mais</strong> ampla.<br />
Mineiro <strong>de</strong> nascimento (1933 ‑2002) e <strong>de</strong> carteirinha,<br />
recusando ‑se a migrar para o Rio <strong>de</strong> Janeiro ou São Paulo,<br />
como tantos outros conterrâneos, Roberto Drummond<br />
manteve ‑se fiel a vida toda à cida<strong>de</strong> que adotou (nasceu<br />
em Santana dos Ferros, no interior do estado) e com a qual<br />
se i<strong>de</strong>ntificou na vida e na morte. Foi o cronista <strong>de</strong> Belo<br />
Horizonte, das lendas tão mineiras retratadas na admirável<br />
“Carta para a moça fantasma da rua do Ouro”, dos adul‑<br />
térios, dos crimes, do cotidiano banal e inesperado (a bor‑<br />
boleta azul voando pela Savassi), das paixões e <strong>de</strong>seng<strong>anos</strong><br />
do povo das Minas Gerais, cujo espírito contraditório, bar‑<br />
roco e mo<strong>de</strong>rno tenta compreen<strong>de</strong>r em “Por que sonhas,<br />
Minas?”, na qual faz “a psicanálise selvagem do estado”,<br />
segundo observação do prefaciador das Melhores crônicas<br />
Roberto Drummond, Carlos Herculano Lopes.<br />
Outra forma <strong>de</strong> fazer a psicanálise do povo era através das<br />
crônicas <strong>de</strong> futebol. Em “Para torcer contra o vento”, Drum‑<br />
mond (torcedor fanático do Atlético Mineiro) fez a <strong>de</strong>claração<br />
<strong>de</strong> amor <strong>mais</strong> bela e convicta que um time brasileiro já recebeu.<br />
Como cronista, foi muitas vezes um contador <strong>de</strong> histórias, pois<br />
sua maneira <strong>de</strong> tentar enten<strong>de</strong>r a vida e o mundo era através<br />
da ficção. Assim, vários <strong>de</strong>sses textos, classificados como crôni‑<br />
cas, são na verda<strong>de</strong> pequenos contos. As crônicas reunidas<br />
neste volume foram transcritas diretamente dos jornais on<strong>de</strong><br />
nasceram e conheceram a efêmera glória <strong>de</strong> cada dia. Dessa<br />
forma, na unida<strong>de</strong> do livro, levam ao público <strong>de</strong> todo o país os<br />
textos <strong>de</strong> um <strong>de</strong> seus cronistas <strong>mais</strong> importantes. Ainda bem.<br />
O que é bom aumenta <strong>de</strong> intensida<strong>de</strong> quando compartilhado.<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s
SÉRGIO MILLIET<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Regina Campos<br />
Sérgio Milliet (1898 ‑1966)<br />
Natural <strong>de</strong> São Paulo, SP<br />
1 a edição – 312 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1062 ‑X<br />
Excelente crítico e ensaísta, poeta razoável, Sérgio<br />
Milliet exerceu a crônica <strong>de</strong> maneira quase alternativa, em<br />
textos esparsos nos <strong>de</strong>z volumes <strong>de</strong> seu Diário crítico e, <strong>de</strong><br />
maneira <strong>mais</strong> explícita, em De ontem, <strong>de</strong> hoje, <strong>de</strong> sempre<br />
e em De cães, <strong>de</strong> gatos, <strong>de</strong> gente.<br />
Não se trata <strong>de</strong> crônicas puras, ajustadas ao mol<strong>de</strong><br />
usual, mas <strong>de</strong> reminiscências pessoais, às vezes em tom <strong>de</strong><br />
memórias, leves alfinetadas nos contemporâneos, discus‑<br />
sões sobre autores e livros, reflexões sobre a vida, com al‑<br />
guma coisa do espírito e do ceticismo <strong>de</strong> Montaigne. Isso<br />
no que se refere aos trabalhos extraídos do Diário crítico.<br />
A propósito, no prefácio às Melhores crônicas Sérgio<br />
Milliet, Regina Campos justifica a inclusão <strong>de</strong> tais traba‑<br />
lhos, parodiando uma observação clássica <strong>de</strong> Mário <strong>de</strong><br />
Andra<strong>de</strong>. O autor <strong>de</strong> Macunaíma dizia que conto é tudo<br />
aquilo que o autor chama <strong>de</strong> conto. Ora, nada <strong>mais</strong> natu‑<br />
ral que o mesmo ocorra com a crônica. Nos textos retira‑<br />
dos dos outros dois volumes há uma aproximação maior<br />
com o conceito <strong>de</strong> crônica, sobretudo as que figuram em<br />
De cães, <strong>de</strong> gatos, <strong>de</strong> gente, nas quais Milliet se revela um<br />
animalista apaixonado, gran<strong>de</strong> e carinhoso conhecedor<br />
da alma animal. A pequena crônica sobre suas ativida<strong>de</strong>s<br />
como pintor, sob os olhos <strong>de</strong> seu cachorro, Barbet, faz as<br />
<strong>de</strong>lícias <strong>de</strong> todo apaixonado por bichos e tem anotações<br />
saborosas, <strong>de</strong> um observador atento dos amigos <strong>de</strong> qua‑<br />
tro patas: “Barbet não gosta muito quando pinto cachor‑<br />
ros. Rosna e por vezes late.”. Ao que o cronista reflete<br />
que ele talvez mudasse <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong>, se fossem ca<strong>de</strong>las.<br />
Muito respeitado em sua época, crítico e pensador, escre‑<br />
vendo com elegância e impressionando “pela capacida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> dizer o essencial <strong>de</strong> forma simples” (Antonio Candido),<br />
Sérgio Milliet continua atual, provocativo e muito agradá‑<br />
vel <strong>de</strong> se ler. O que <strong>mais</strong> <strong>de</strong>sejar?<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
ZUENIR VENTURA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
José Carlos Santos <strong>de</strong> Azeredo<br />
Zuenir Ventura (1931)<br />
Natural <strong>de</strong> Além Paraíba, MG<br />
1 a edição – 400 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0947 ‑8<br />
Dizem que a boa crônica é como um passeio sem sair da<br />
poltrona, graças às artes mágicas do cronista. Se assim for, as<br />
crônicas <strong>de</strong> Zuenir Ventura são como um gran<strong>de</strong> passeio pelo<br />
Brasil, os múltiplos Brasis que convivem entre as fronteiras<br />
amazônicas e o oceano Atlântico, um país marcado pela vio‑<br />
lência, os conflitos sociais, as espertezas <strong>de</strong> toda espécie, mas<br />
também por um invejável senso <strong>de</strong> humor, muito <strong>mais</strong> inte‑<br />
ressante e espontâneo que o tal sense of humour dos ingleses,<br />
um negócio meio artificial, feito <strong>de</strong> ironia e <strong>de</strong>silusão. No<br />
humor um tanto ingênuo do brasileiro palpita vida, irreverên‑<br />
cia, esperança, por vezes sarcasmo e violência. Como enten‑<br />
<strong>de</strong>r esse país contraditório, esbanjando alegria <strong>de</strong> viver,<br />
rebel<strong>de</strong> e conformado ao mesmo tempo?<br />
Muitos já tentaram <strong>de</strong>cifrar o enigma. O cronista tem<br />
também suas explicações, formuladas na instigante crônica<br />
“O Brasil o que é?” A conclusão? Bem, o Brasil não é um<br />
país para principiantes. E ninguém melhor do que Zuenir<br />
conhece essa verda<strong>de</strong> elementar. Ele é um veterano no co‑<br />
nhecimento do Brasil.<br />
Como jornalista viajou milhares <strong>de</strong> quilômetros pelo<br />
país, embrenhou ‑se na selva, conheceu moradores da flo‑<br />
resta e das favelas, as igrejas baianas e as mineiras, os pam‑<br />
pas e o sertão, conviveu com escritores, músicos, homens<br />
públicos. Como morador do Rio <strong>de</strong> Janeiro elegeu a cida<strong>de</strong>,<br />
uma espécie <strong>de</strong> síntese dos mil e um contrastes do Brasil<br />
(que po<strong>de</strong>m ser apreciados numa viagem <strong>de</strong> Ipanema ao<br />
Complexo da Maré), como um dos motivos preferidos <strong>de</strong><br />
suas crônicas. E <strong>de</strong>sses fatos, personagens e cida<strong>de</strong>s, Zuenir<br />
Ventura extrai a matéria viva <strong>de</strong> suas crônicas, pessoais,<br />
leves e incisivas, com ligeiras pitadas <strong>de</strong> ironia e um intenso<br />
po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> comunicação, nas quais “domina a arte <strong>mais</strong> di‑<br />
fícil que existe, a arte <strong>de</strong> parecer que não há arte” (Luis<br />
Fernando Verissimo).<br />
M e l h o r e s C r ô n i C a s<br />
75
C o l e ç ã o<br />
M e l h o r t e a t r o<br />
DIREÇÃO<br />
SÁBATO MAGALDI<br />
MARTINS PENA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong> Gabriel Fe<strong>de</strong>ricci<br />
Martins Pena (18151848) – Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
76<br />
M e l h o r e s t e a t r o P r e l o<br />
Os autores <strong>mais</strong> renomados da dramaturgia bra‑<br />
sileira e suas peças <strong>mais</strong> consagradas foram reuni‑<br />
dos pela <strong>Global</strong> <strong>Editora</strong> para fazer parte da coleção<br />
Melhor Teatro. Dirigida por Sábato Magaldi, um<br />
nome sagrado da crítica teatral brasileira, a coleção<br />
tem seus textos pesquisados e as peças escolhidas<br />
por estudiosos da obra <strong>de</strong> cada autor. Cada obra<br />
apresenta, assim, o trabalho <strong>mais</strong> significativo do<br />
autor tratado. Além disso, traz biografia, bibliografia<br />
e estudo introdutório.<br />
Esta coleção visa a atingir não só os estudiosos da<br />
dramaturgia brasileira e portuguesa como também<br />
todos os leitores que se interessam pela arte magní‑<br />
fica do teatro.
ARTUR AZEVEDO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Barbara Heliodora<br />
Artur Azevedo (1855 ‑1908)<br />
Natural <strong>de</strong> São Luís, MA<br />
1 a edição – 368 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1332 ‑2<br />
Coedição ABL<br />
Consi<strong>de</strong>rado por Barbara Heliodora como “o <strong>mais</strong> apai‑<br />
xonado e <strong>de</strong>dicado homem <strong>de</strong> teatro <strong>de</strong> toda a nossa histó‑<br />
ria das artes cênicas”, Artur Azevedo reinou durante <strong>mais</strong> <strong>de</strong><br />
trinta <strong>anos</strong> na cena brasileira, sem rival, absoluto na prefe‑<br />
rência popular. Suas peças, leves, espirituosas, sem pirotec‑<br />
nias verbais ou técnicas, faziam o público sonhar, se comover<br />
e, sobretudo, rir a ban<strong>de</strong>iras <strong>de</strong>spregadas, como então se<br />
dizia. O escritor foi sempre coerente consigo mesmo. Entre<br />
sua primeira comédia, Amor por anexins, escrita na adoles‑<br />
cência, e a produção da maturida<strong>de</strong>, não se nota nenhum<br />
<strong>de</strong>svio <strong>de</strong> rota, nenhuma inclinação para o pessimismo ou a<br />
revolta, apesar <strong>de</strong> ter experimentado, como toda criatura<br />
humana, momentos amargos. Ignorava ‑os. Pelo menos, no<br />
momento <strong>de</strong> escrever.<br />
Suas peças, sejam as operetas ou as comédias <strong>de</strong> cos‑<br />
tume, se situam num mundo on<strong>de</strong> não existe malda<strong>de</strong>,<br />
mas malícia, on<strong>de</strong> os dramas que <strong>de</strong>spontam se resolvem<br />
com uma palavra espirituosa ou uma piada, sem ninguém,<br />
nunca, per<strong>de</strong>r o bom humor. Vencedores e vencidos, mari‑<br />
dos traídos e esposas traidoras (ou o contrário) acabam<br />
sempre por se solidarizar, em nome da alegria, do final feliz<br />
e <strong>de</strong> uma boa gargalhada.<br />
Para tanto, o teatrólogo tinha sua fórmula infalível,<br />
que sabia dosar como ninguém ao gosto popular, e que<br />
sintetizou da seguinte maneira: “Agradam ‑me, não há dú‑<br />
vida, as peças <strong>de</strong> pouco enredo, que conseguem pren<strong>de</strong>r a<br />
atenção do público por meio <strong>de</strong> cenas episódicas discreta‑<br />
mente cosidas à ação geral”. Com essa fórmula simples,<br />
costurada pelo talento, construiu uma série <strong>de</strong> peças <strong>de</strong>s‑<br />
pretensiosas, alegres, brasileiríssimas, que o espectador<br />
nunca esquece, chamem ‑se elas A capital fe<strong>de</strong>ral, O mam‑<br />
bembe ou O genro <strong>de</strong> muitas sogras, trabalhos que inte‑<br />
gram este volume do Melhor teatro Artur Azevedo.<br />
M e l h o r T e a T r o<br />
DOMINGOS OLIVEIRA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
João Roberto Faria<br />
Domingos Oliveira (1936)<br />
Natural do Rio <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />
1 a edição – 368 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0811 ‑0<br />
Domingos Oliveira acredita que “o teatro tem o tama‑<br />
nho da vida” e que nele o homem po<strong>de</strong> “exercer a forma<br />
<strong>mais</strong> interessante da sabedoria”, “a loucura sob controle”.<br />
Teatrólogo e diretor <strong>de</strong> cinema, Domingos Oliveira<br />
exerce há <strong>mais</strong> <strong>de</strong> quarenta <strong>anos</strong> a arte <strong>de</strong> manter a lou‑<br />
cura sob controle. São <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta peças, entre originais,<br />
adaptações e traduções. Desse universo, foram seleciona‑<br />
dos quatro trabalhos para integrar o volume <strong>de</strong> Melhor<br />
teatro Domingos Oliveira: Do fundo do lago escuro, Amo‑<br />
res, Separações e A primeira valsa.<br />
As quatro peças valorizam experiências pessoais do autor,<br />
transformadas e enriquecidas pela imaginação e a criativida<strong>de</strong>,<br />
uma mistura <strong>de</strong> memória e ficção. Do fundo do lago escuro<br />
dramatiza fatos <strong>de</strong> sua infância, vivida em uma família carioca<br />
<strong>de</strong> classe média alta, nos <strong>anos</strong> 1950. Drama e comédia ao<br />
mesmo tempo, <strong>mais</strong> drama do que comédia, revelando um<br />
lado escuro e amargo do ser humano. A primeira valsa, título<br />
simbólico que resume o espírito da peça, não isenta <strong>de</strong> uma<br />
certa amargura, apresenta o ingresso na vida adulta e a expe‑<br />
riência do casamento. Como a <strong>de</strong>finiu o próprio autor: “uma<br />
história meio verda<strong>de</strong>, meio mentira... uma história da vida,<br />
tirada na última hora e da boca aberta <strong>de</strong>la mesma, a Morte”.<br />
Nas outras duas peças, ambientadas nos <strong>anos</strong> 1990, o clima é<br />
<strong>mais</strong> ameno. Amores analisa as crises domésticas e afetivas <strong>de</strong><br />
uma família da Zona Sul carioca, um tanto <strong>de</strong>sagregada. Sepa‑<br />
rações, como já sugere o título, aborda a insatisfação matrimo‑<br />
nial, que fatalmente conduz à separação e a uma posterior<br />
reaproximação <strong>de</strong> marido e mulher. Apesar <strong>de</strong> tangenciar o<br />
drama, em vários momentos, a peça é uma comédia <strong>de</strong> costu‑<br />
mes, sem aci<strong>de</strong>z, leve, bem ‑humorada, <strong>de</strong> certa forma uma<br />
reverência ao teatro, que, como observou o autor, “talvez não<br />
seja a coisa <strong>mais</strong> bela que o homem inventou, mas talvez seja<br />
a que <strong>mais</strong> se parece com a vida”.<br />
M e l h o r T e a T r o<br />
77
GIANFRANCESCO<br />
GUARNIERI<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Décio <strong>de</strong> Almeida Prado<br />
Gianfrancesco Guarnieri (1934 ‑2006)<br />
Natural <strong>de</strong> Milão, Itália<br />
2 a edição – 280 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0092 ‑6<br />
O teatro <strong>de</strong> Gianfrancesco Guarnieri é como um grito<br />
parado no ar. Um protesto contra a apatia, o conformismo,<br />
o comodismo egoísta dos bem ‑pensantes e dos mal inten‑<br />
cionados, através da <strong>de</strong>núncia social, da ironia quase sar‑<br />
casmo, da revolta.<br />
Des<strong>de</strong> sua estreia, em 1958, com Eles não usam black‑<br />
‑tie, Guarnieri trouxe um alento novo ao teatro brasileiro.<br />
Numa atitu<strong>de</strong> quase <strong>de</strong> provocação, a peça se passa num<br />
morro carioca, entre operários, em um momento <strong>de</strong> greve<br />
que divi<strong>de</strong> dramaticamente uma família. O tema reaparece,<br />
com <strong>mais</strong> intensida<strong>de</strong>, em A semente (1961). Operários “<strong>de</strong>‑<br />
finidos em função <strong>de</strong> sua categoria, atuando coletivamente<br />
contra os patrões” eram um fato <strong>de</strong>sconhecido no teatro bra‑<br />
sileira, como observa Décio <strong>de</strong> Almeida Prado. O ineditismo<br />
da situação, aliada à qualida<strong>de</strong> dramática das peças, explica a<br />
sua imensa repercussão. Coerente consigo mesmo, sem re‑<br />
cuar um milímetro <strong>de</strong> sua combativida<strong>de</strong>, Guarnieri lança em<br />
1973 o seu protesto, em forma <strong>de</strong> metáfora, contra a toda<br />
po<strong>de</strong>rosa censura, então instalada no país. Um grito parado<br />
no ar apresenta o ensaio <strong>de</strong> uma peça, que o espectador<br />
nunca irá conhecer, interrompido a cada momento por inter‑<br />
ferências externas e internas. A indignação com o momento<br />
político é o centro <strong>de</strong> Ponto <strong>de</strong> partida (1976), uma parábola<br />
sobre o autoritarismo. A peça se <strong>de</strong>senvolve numa al<strong>de</strong>ia lon‑<br />
gínqua, perdida no espaço e no tempo, mas os acontecimen‑<br />
tos não <strong>de</strong>ixam dúvida a que país e época se referem. Essas<br />
quatro peças, reunidas no Melhor teatro Gianfrancesco Guar‑<br />
nieri, compreen<strong>de</strong>m uma fase da carreira <strong>de</strong> Guarnieri, mas já<br />
assinalam o espírito <strong>de</strong> toda a sua obra, centrada na política.<br />
Elas propõem também, como observa Décio <strong>de</strong> Almeida<br />
Prado ao espectador (e ao leitor), o paradoxo <strong>de</strong> que “não é<br />
preciso partir <strong>de</strong> suas premissas i<strong>de</strong>ológicas para admirá ‑las<br />
enquanto lição humana e realização estética”.<br />
78<br />
M e l h o r T e a T r o<br />
JUCA DE OLIVEIRA<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Jefferson Del Rios<br />
Juca <strong>de</strong> Oliveira (1935)<br />
Natural <strong>de</strong> São Roque, SP<br />
1 a edição – 360 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1<strong>39</strong>1 ‑9<br />
Ator que dispensa apresentação, Juca <strong>de</strong> Oliveira cos‑<br />
tuma também frequentar a cena teatral como autor <strong>de</strong> comé‑<br />
dias das <strong>mais</strong> representativas do espírito <strong>de</strong> nossa época.<br />
Her<strong>de</strong>iro <strong>de</strong> uma tradição duas vezes milenar, que<br />
nasce na Grécia com Aristófanes, faz Paris morrer <strong>de</strong> rir<br />
com Molière e Fey<strong>de</strong>au, encanta as iaiás e ioiôs do século<br />
XIX brasileiro com Martins Pena e França Júnior, Juca não<br />
<strong>de</strong>smerece esses ascen<strong>de</strong>ntes ilustres, mas se encaixa nessa<br />
linhagem <strong>de</strong> maneira muito pessoal, com um humor agres‑<br />
sivo e surpreen<strong>de</strong>nte, que “acerta o golpe quando o pú‑<br />
blico se distrai”, como observa Jefferson Del Rios no prefácio<br />
do Melhor teatro Juca <strong>de</strong> Oliveira.<br />
Mas trata ‑se <strong>de</strong> “um assaltante do bem”, cujos golpes<br />
não ferem, mas fazem o público rir e se <strong>de</strong>liciar com a rapi‑<br />
<strong>de</strong>z dos diálogos, o efeito surpresa servido a cada frase, com<br />
humor incisivo, mas nunca <strong>de</strong>scompromissado. As comédias<br />
<strong>de</strong> Juca são marcadas por uma análise em tom <strong>de</strong> gozação,<br />
mas ferina, aos hábitos sociais, como a banalização da liber‑<br />
da<strong>de</strong> sexual, como em Qualquer gato vira ‑lata tem uma vida<br />
sexual <strong>mais</strong> sadia que a nossa, mas se caracterizam, sobre‑<br />
tudo, pela crítica político ‑humorística contun<strong>de</strong>nte, no que<br />
se refere às mazelas da vida pública do país.<br />
Essa dramaturgia mergulha os seus alicerces na lama<br />
dos atos políticos, empresariais e familiares, revelando o<br />
seu espírito já no titulo das peças: Às favas com os escrú‑<br />
pulos, Baixa socieda<strong>de</strong>, Caixa dois e Motel Paradiso.<br />
A crítica aos atos é dura, mas o dramaturgo ja<strong>mais</strong><br />
chega à cruelda<strong>de</strong> com seus personagens. “Os seus cana‑<br />
lhas são expostos em público, mas sem o açoite dos pole‑<br />
mistas virulentos. Há uma fração <strong>de</strong> tempo em que eles são<br />
até passíveis <strong>de</strong> compreensão irônica”, observa Jefferson<br />
Del Rios. Talvez porque Juca, sendo um “moralista no ver‑<br />
da<strong>de</strong>iro sentido filosófico”, é também um sentimental.<br />
M e l h o r T e a T r o
MARIA ADELAIDE<br />
AMARAL<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Silvana Garcia<br />
Maria A<strong>de</strong>lai<strong>de</strong> Amaral (1942)<br />
Natural <strong>de</strong> Porto, Portugal<br />
1 a edição – 336 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1064 ‑6<br />
O nome <strong>de</strong> Maria A<strong>de</strong>lai<strong>de</strong> Amaral começou a se tornar<br />
conhecido do público em 1978, com a estreia <strong>de</strong> Bodas <strong>de</strong><br />
papel. O sucesso se repetiu no ano seguinte, com a encena‑<br />
ção <strong>de</strong> A resistência, a primeira peça escrita pela autora, que<br />
havia quatro <strong>anos</strong> aguardava o momento <strong>de</strong> subir à cena.<br />
A resistência reproduz o ambiente <strong>de</strong> redação <strong>de</strong> uma<br />
revista em <strong>de</strong>cadência, na qual a autora trabalhava, tendo<br />
como pano <strong>de</strong> fundo o clima político dos <strong>anos</strong> 1970. A<br />
peça se <strong>de</strong>senvolve em um único dia <strong>de</strong> trabalho, suge‑<br />
rindo duas realida<strong>de</strong>s complementares, as angústias, as<br />
esperanças, os <strong>de</strong>scontentamentos dos jornalistas em rela‑<br />
ção à empresa, à carreira, ao cotidiano, e a atmosfera <strong>de</strong><br />
repressão política e cultural, cuja realida<strong>de</strong> se impõe <strong>de</strong> ma‑<br />
neira indireta, mas indisfarçável.<br />
A ação <strong>de</strong> Bodas <strong>de</strong> papel se limita a três horas da vida<br />
<strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong> pessoas, encerradas em um apartamento <strong>de</strong><br />
luxo, convidadas para um jantar, envolvidas numa espécie<br />
<strong>de</strong> jogo do po<strong>de</strong>r. Os conflitos nascem e se aguçam ao cho‑<br />
que <strong>de</strong> sentimentos e interesses, revelando seres frágeis, ego‑<br />
ístas, isolados em si mesmos, sem objetivos na vida, exceto o<br />
sucesso financeiro, frustrados, mas ansiosos <strong>de</strong> se impor aos<br />
<strong>de</strong><strong>mais</strong>. De Braços abertos aponta <strong>mais</strong> uma vez para as difi‑<br />
culda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> relacionamento dos seres hum<strong>anos</strong>. No caso, um<br />
amor ameaçado pelo ciúme, a frustração, as diferenças <strong>de</strong><br />
classe social, e envolto num clima <strong>de</strong> permanentes provoca‑<br />
ções e <strong>de</strong>savenças, acirrando o sofrimento recíproco. O<br />
mesmo <strong>de</strong>sejo incontrolável <strong>de</strong> ferir e provocar o outro, a<br />
incompreensão e a incomunicabilida<strong>de</strong> formam o clima <strong>de</strong><br />
Querida mamãe, retrato <strong>de</strong> uma relação conflituosa <strong>de</strong> mãe<br />
e filha. Aqui, como nas outras três peças citadas, reunidas no<br />
Melhor teatro Maria A<strong>de</strong>lai<strong>de</strong> Amaral, como observou Sá‑<br />
bato Magaldi, ao tratar <strong>de</strong> um caso particular, “tem o dom<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>itar luz sobre a generalida<strong>de</strong> das coisas”.<br />
M e l h o r T e a T r o<br />
PLÍNIO MARCOS<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Ilka Marinho Zanotto<br />
Plínio Marcos (1935 ‑1999)<br />
Natural <strong>de</strong> Santos, SP<br />
1 a edição – 288 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0815 ‑3<br />
Des<strong>de</strong> a estreia <strong>de</strong> Vestido <strong>de</strong> noiva, <strong>de</strong> Nelson Rodri‑<br />
gues, em 1943, o teatro brasileiro não sofria um impacto<br />
semelhante ao produzido pelas peças <strong>de</strong> Plínio Marcos. O<br />
teatrólogo santista lançava no palco, sem os filtros e as con‑<br />
venções habituais, toda a brutalida<strong>de</strong> do bas ‑fond das cida‑<br />
<strong>de</strong>s brasileiras. Assassinos, prostitutas, malandros e<br />
<strong>de</strong>sajustados <strong>de</strong> todos os tipos viviam, diante dos olhos es‑<br />
tatelados da plateia, situações <strong>de</strong> violência extrema e berra‑<br />
vam em linguagem chula a sua angústia, a tortura da solidão,<br />
a miséria da <strong>de</strong>cadência física, em tom <strong>de</strong> <strong>de</strong>safio, mas tam‑<br />
bém na busca <strong>de</strong>sesperada <strong>de</strong> um sentido para a vida.<br />
“Será que somos gente? berra a prostituta. Através da<br />
simplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sta pergunta transparece a gravida<strong>de</strong> e o pa‑<br />
thos moral das indagações <strong>mais</strong> profundas da filosofia”<br />
(Anatol Rosenfeld). A pergunta, com outras palavras, foi re‑<br />
petida ao longo <strong>de</strong> toda a obra do escritor. Sem resposta.<br />
Plínio Marcos iniciou sua carreira teatral em 1958,<br />
com Barrela, espetáculo representado uma única vez, <strong>de</strong>‑<br />
pois <strong>de</strong> ter sido censurado e liberado, tendo “por <strong>de</strong>stino<br />
ser o maior sucesso <strong>de</strong> escândalo <strong>de</strong> nosso teatro em todos<br />
os tempos e imediatamente proibido durante 21 longos<br />
<strong>anos</strong>”, informa Ilka Marinho Zanotto no prefácio do Me‑<br />
lhor teatro Plínio Marcos. As peças seguintes (Dois perdidos<br />
numa noite suja, Navalha na carne, O abajur lilás e Querô,<br />
para citar apenas as reunidas neste volume) foram encena‑<br />
das, proibidas, perseguidas, louvadas, execradas, discutidas<br />
em nível moral, mas nunca ninguém duvidou <strong>de</strong> suas qua‑<br />
lida<strong>de</strong>s teatrais, da <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> dramática, da força lanci‑<br />
nante dos diálogos. Por sua autenticida<strong>de</strong>, as peças <strong>de</strong><br />
Plínio não per<strong>de</strong>m nada quando lidas. Po<strong>de</strong>m até ganhar<br />
alguma coisa, permitindo uma pausa para pensar ou ame‑<br />
nizar o impacto <strong>de</strong> sua crueza, o que o turbilhão da ence‑<br />
nação ao vivo não permite.<br />
M e l h o r T e a T r o<br />
79
C o l e ç ã o<br />
r o t e i r o d a P o e s i a<br />
B r a s i l e i r a<br />
DIREÇÃO<br />
EDLA VAN STEEN<br />
A coleção Roteiro da Poesia Brasileira apresenta um<br />
panorama abrangente da evolução poética em nosso<br />
país, dos poetas precursores do século XVI aos dias<br />
atuais, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma tradição quase duas vezes se‑<br />
cular. As primeiras antologias poéticas, surgidas no<br />
início do século XIX – o Parnaso brasileiro (1829 ‑<br />
1832), <strong>de</strong> Januário da Cunha Barbosa, e o Florilégio<br />
da poesia brasileira (1850), <strong>de</strong> Varnhagen –, estavam<br />
orientadas por um processo seletivo, mas voltadas<br />
basicamente para a preservação do patrimônio poé‑<br />
tico. Pautadas por um sentido crítico <strong>mais</strong> aguçado,<br />
mas traduzindo também o gosto <strong>de</strong> suas épocas, as<br />
gerações seguintes acrescentaram um novo fator às<br />
80<br />
antologias, o sentido <strong>de</strong> reavaliação do material se‑<br />
lecionado por seus antecessores. Enquanto isso, a<br />
partir <strong>de</strong> certa época, tornaram ‑se comuns antolo‑<br />
gias <strong>de</strong> poetas contemporâneos.<br />
Nunca, porém, autores do passado e contemporâ‑<br />
neos conviveram no mesmo trabalho, como elos <strong>de</strong><br />
uma mesma ca<strong>de</strong>ia, ligados pela sequência natural<br />
da evolução <strong>de</strong> nossa poesia.<br />
Essa é a gran<strong>de</strong> novida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sta coleção. Confiada a<br />
especialistas das respectivas áreas, a coleção dirigida<br />
por Edla van Steen abre o mesmo espaço ao passado<br />
e ao presente, po<strong>de</strong>ndo, pois, ser dividida em dois<br />
campos.<br />
Os sete primeiros volumes (Raízes, Arcadismo, Roman‑<br />
tismo, Parnasianismo, Simbolismo, Pré ‑Mo<strong>de</strong>rnismo e<br />
Mo<strong>de</strong>rnismo) são <strong>de</strong>dicados ao legado do passado, com<br />
reavaliações importantes <strong>de</strong> poemas e autores. Os oito<br />
volumes seguintes apresentam um levantamento e sele‑<br />
ção inéditos da produção poética brasileira a partir do<br />
Pós ‑Mo<strong>de</strong>rnismo, exercendo uma primeira seleção nos<br />
textos <strong>de</strong> época, englobados década a década: <strong>anos</strong> 30,<br />
40, 50, 60, 70, 80, 90 e 2000. Dessa forma, esta coleção<br />
constitui não apenas a <strong>mais</strong> ampla antologia da poesia<br />
brasileira até hoje elaborada, como a <strong>mais</strong> atualizada.
ANOS 30<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Ivan Junqueira<br />
1 a edição – 176 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1150 ‑2<br />
Her<strong>de</strong>ira das conquistas léxicas, prosódicas e estético‑<br />
‑for<strong>mais</strong> do Mo<strong>de</strong>rnismo, a poesia escrita na década <strong>de</strong><br />
1930 caracteriza ‑se, acima <strong>de</strong> tudo, “por uma distensão da<br />
linguagem e do ritmo, o que po<strong>de</strong> ser entendido como<br />
uma inevitável consequência histórica e literária das pro‑<br />
postas que integravam o i<strong>de</strong>ário transgressor da Semana <strong>de</strong><br />
Arte Mo<strong>de</strong>rna”, conforme observa Ivan Junqueira no pre‑<br />
fácio do volume <strong>de</strong>dicado aos Anos 30, da coleção Roteiro<br />
da Poesia Brasileira.<br />
Numa visão sintética, os poetas surgidos no período re‑<br />
pudiavam quaisquer tendências românticas, i<strong>de</strong>alistas ou par‑<br />
nasianas, buscando afirmar ‑se como brasileiros, sem vínculos<br />
com mo<strong>de</strong>los europeus, através da formulação <strong>de</strong> uma nova<br />
técnica <strong>de</strong> representação da vida e a adoção <strong>de</strong> uma expres‑<br />
são verbal tipicamente brasileira, apta a retratar conflitos, con‑<br />
tradições, misérias e gran<strong>de</strong>zas da vida contemporânea.<br />
Foi a época <strong>de</strong> surgimento <strong>de</strong> Carlos Drummond <strong>de</strong><br />
Andra<strong>de</strong>, que se “apresenta como que aquém e além do<br />
movimento mo<strong>de</strong>rnista”, do coloquialismo <strong>de</strong> Henriqueta<br />
Lisboa, do grave e melancólico Emílio Moura, do humor<br />
feérico e epigramático <strong>de</strong> Murilo Men<strong>de</strong>s, do Cobra No‑<br />
rato, <strong>de</strong> Raul Bopp, “o <strong>mais</strong> estranho poema <strong>de</strong> toda a li‑<br />
teratura brasileira” (José Osório <strong>de</strong> Almeida), do ainda<br />
hesitante Vinicius <strong>de</strong> Moraes, in<strong>de</strong>ciso entre os apelos da<br />
carne e o impulso religioso, da refinada Cecília Meireles,<br />
“tocada pela música e a espiritualida<strong>de</strong>”, da amarga Lila<br />
Ripoll, da “poesia <strong>de</strong> expressão quase franciscana” <strong>de</strong><br />
Odylo Costa, filho, do ciclópico Gerardo Mello Mourão, do<br />
inclassificável Jamil Almansur Haddad e <strong>de</strong> Manoel <strong>de</strong> Bar‑<br />
ros, poeta das insignificâncias ou, como ele mesmo se <strong>de</strong>‑<br />
fine, das "ignorãças". Uma época que re<strong>de</strong>finiu os rumos<br />
da poesia brasileira.<br />
R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a<br />
ANOS 40<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Luciano Rosa<br />
1 a edição – 224 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1151 ‑9<br />
A década <strong>de</strong> 1940 é um momento crucial na história da<br />
mo<strong>de</strong>rna poesia brasileira. Her<strong>de</strong>iros do caos <strong>de</strong> tendências<br />
contraditórias do mo<strong>de</strong>rnismo e dos conservadores, que <strong>de</strong><br />
certa forma ainda cultivavam os valores parnasi<strong>anos</strong>, os poe‑<br />
tas que surgiam não encontravam nenhum movimento orga‑<br />
nizado em que se apoiar. O mo<strong>de</strong>rnismo estava morto e<br />
sepultado? Talvez, mas era um morto incômodo. Tanto assim,<br />
que os novos poetas procuravam, antes <strong>de</strong> tudo, se opor a<br />
ele. Como o adolescente em busca <strong>de</strong> se libertar da imagem<br />
esmagadora do pai tirano. Libertação po<strong>de</strong> ser a palavra <strong>de</strong><br />
or<strong>de</strong>m da chamada Geração <strong>de</strong> 45, o grupo que se impôs<br />
com <strong>mais</strong> força em meio à multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vozes da época.<br />
Mas liberda<strong>de</strong> custa caro e é preciso saber para on<strong>de</strong> se vai.<br />
Os jovens poetas proclamavam, então, “a revisão da poética<br />
empreendida no Brasil a partir <strong>de</strong> 1922” – como observa Lu‑<br />
ciano Rosa –, adotando novas técnicas do verso, revalorizando<br />
a métrica e a rima, explorando uma temática voltada em par‑<br />
ticular para os problemas existenciais. Mas a herança mo<strong>de</strong>r‑<br />
nista era esmagadora e um crítico da importância <strong>de</strong> Tristão<br />
<strong>de</strong> Athay<strong>de</strong> <strong>de</strong>slumbrou na obra <strong>de</strong>sses poetas não uma rup‑<br />
tura, mas um prolongamento das experiências <strong>de</strong> 1922,<br />
utilizando ‑se da expressão neomo<strong>de</strong>rnismo para classificá ‑los.<br />
A esse grupo, <strong>mais</strong> ou menos coeso, juntavam ‑se ou‑<br />
tras tendências sem nenhuma afinida<strong>de</strong> com ele ou mesmo<br />
entre si. Vozes solitárias, cuja única ligação com os <strong>de</strong><strong>mais</strong><br />
poetas era a ativida<strong>de</strong> contemporânea. Caso <strong>de</strong> João Ca‑<br />
bral <strong>de</strong> Melo Neto, <strong>de</strong> Joaquim Cardoso, <strong>de</strong> Dante Milano,<br />
<strong>de</strong> Mário Quintana. Este negava pertencer a qualquer es‑<br />
cola poética, observando que “o melhor é seguir cada um<br />
no seu barquinho, e talvez alguns consigam chegar à outra<br />
margem. Isto é: chegar à posterida<strong>de</strong>”.<br />
Este panorama dos Anos 40 mostra uma insuspeitada<br />
riqueza poética e que muitos barquinhos chegaram à pos‑<br />
terida<strong>de</strong>.<br />
81<br />
R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a
ANOS 50<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
André Seffrin<br />
1 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1152 ‑6<br />
Um dos períodos <strong>mais</strong> férteis e turbulentos da poesia<br />
brasileira do século XX, os <strong>anos</strong> 1950 assinalam o surgi‑<br />
mento <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> novos autores e <strong>de</strong> tendên‑<br />
cias, que iriam redirecionar, inquietar e enriquecer a nossa<br />
poesia.<br />
De um lado, havia um grupo <strong>de</strong> poetas cultos, requin‑<br />
tados artífices <strong>de</strong> ritmo e imagem, cultores do velho so‑<br />
neto, que “contribuíram notavelmente para incrementar o<br />
grau <strong>de</strong> consciência técnica e cultural do verso brasileiro,<br />
sem contudo explorar, no mesmo diapasão, suas virtualida‑<br />
<strong>de</strong>s crítico ‑cognitivas” (José Guilherme Merquior).<br />
Em paralelo a esses artífices, alinhavam ‑se movimentos<br />
<strong>de</strong> vanguarda, como a poesia concreta, voltada para a cria‑<br />
ção <strong>de</strong> poema que fosse um objeto ‑mensagem, com estru‑<br />
tura visual em formas geométricas, e o Neoconcretismo,<br />
dissidência do Concretismo, que se afirmou a partir <strong>de</strong> 1957,<br />
mas cujo manifesto só foi assinado dois <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois.<br />
Autores das duas tendências conviviam sem gran<strong>de</strong>s<br />
atritos, utilizando ‑se amplamente <strong>de</strong> seções específicas em<br />
revistas e dos suplementos literários, muitos vigorosos à<br />
época. O Suplemento Dominical do Jornal do Brasil marcou<br />
época, aberto às experiências <strong>de</strong> vanguarda, ao <strong>de</strong>bate <strong>de</strong><br />
i<strong>de</strong>ias e à revisão histórica da poesia brasileira, empreen‑<br />
dida por Mário Faustino, que, <strong>de</strong> certa forma, foi o respon‑<br />
sável pelo vínculo entre as várias tendências poéticas.<br />
Para representar essa época complexa, preocupada em<br />
preservar a tradição e disposta a todas as inovações, foram<br />
selecionados 56 poetas, apresentados por or<strong>de</strong>m cronológica<br />
<strong>de</strong> estreia, cada um com três poemas selecionados, procu‑<br />
rando ‑se <strong>de</strong>ssa forma, “tanto quanto possível dar voz a todas<br />
as vertentes e tendências”, conforme André Seffrin.<br />
82<br />
R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a<br />
ANOS 60<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Pedro Lyra<br />
1 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1153 ‑3<br />
A década <strong>de</strong> 1960 foi <strong>de</strong> fortes contrastes. No campo<br />
político teve início a ditadura militar, que sufocou o país<br />
durante <strong>mais</strong> <strong>de</strong> vinte <strong>anos</strong>. No terreno cultural, eclodiram<br />
os movimentos <strong>de</strong> resistência que, perseguidos pela cen‑<br />
sura e pela polícia, criaram novas formas <strong>de</strong> manifestação<br />
artística. Surgia, assim, o Cinema Novo, o Tropicalismo, a<br />
imprensa nanica, as publicações alternativas. Foi um período<br />
artístico rico, <strong>de</strong> extrema contundência, <strong>de</strong>senvolvido <strong>de</strong><br />
forma quase sempre clan<strong>de</strong>stina.<br />
Em que pese todos os contratempos, a poesia brasi‑<br />
leira viveu uma das fases <strong>mais</strong> criativas <strong>de</strong> sua história, com<br />
o surgimento <strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong> excelentes poetas e um<br />
amplo “sincretismo” <strong>de</strong> estilos e tendências, com vozes <strong>de</strong><br />
todos os estados. Sob esse aspecto, ela foi “a primeira ge‑<br />
ração verda<strong>de</strong>iramente nacional da poesia brasileira”,<br />
como observa Pedro Lyra no prefácio <strong>de</strong>sta obra.<br />
Os caminhos também foram múltiplos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a manu‑<br />
tenção <strong>de</strong> elementos tradicionais <strong>de</strong> expressão poética (poesia<br />
lírica, épica, <strong>de</strong> protesto social, metapoesia) aos experimenta‑<br />
lismos <strong>de</strong> vanguarda expressos no radicalismo do poema‑<br />
‑processo, (pregando em algumas realizações a própria<br />
eliminação da palavra), sem esquecer a poesia <strong>de</strong> resistência<br />
ao regime (chamada <strong>de</strong> alternativa ou marginal), recorrendo<br />
ao mimeógrafo e ao xerox para divulgar a sua mensagem.<br />
Pela sua segmentação nestas três gran<strong>de</strong>s vertentes e<br />
suas subdivisões, a geração dos <strong>anos</strong> 1960 foi a que apre‑<br />
sentou a maior diversida<strong>de</strong> estilística, formal, temática e<br />
i<strong>de</strong>ológica da história da poesia brasileira, mesmo sob a<br />
permanente ameaça do cutelo da repressão, do terror ins‑<br />
titucional, das perseguições. E, <strong>de</strong> certa forma, através <strong>de</strong><br />
vários <strong>de</strong> seus representantes, a sua voz, as suas inquieta‑<br />
ções e a sua ânsia <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> continuam presentes em<br />
nossos dias.<br />
R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a
ANOS 70<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Afonso Henriques Neto<br />
1 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1154‑0<br />
Na década <strong>de</strong> 1970, a poesia brasileira viveu um período<br />
sem similar na sua longa evolução, marcada pela insatisfa‑<br />
ção, a contestação social e política, a busca da liberda<strong>de</strong>.<br />
Poesia <strong>de</strong> resistência, como a classifica Afonso Henriques<br />
Neto no prefácio, em reação a um período marcado pela<br />
repressão aos movimentos culturais e sociais, mas também<br />
<strong>de</strong> busca <strong>de</strong> integração aos ventos do espírito que sopra‑<br />
vam em todo o mundo.<br />
Os <strong>anos</strong> 1960, com sua acelerada mudança <strong>de</strong> costumes,<br />
<strong>de</strong>saguou no cenário <strong>de</strong> 1968, com o fortalecimento das dita‑<br />
duras militares latino ‑americanas, a Guerra do Vietnã, a luta<br />
contra o “perigo comunista”. Em contrapartida, surgiam os<br />
movimentos pacifistas, a onda hippie, o Maio <strong>de</strong> 1968, em<br />
Paris, a música dos Beatles e dos Rolling Stones, a disseminação<br />
dos “paraísos artificiais” e, no Brasil, o movimento tropicalista.<br />
Foi nesse cenário <strong>de</strong> inquietação e esperança que sur‑<br />
giram os poetas da chamada “Geração AI ‑5” (em referên‑<br />
cia ao Ato Institucional n o 5, <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1968), cujas<br />
obras ganharam <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong> o rótulo <strong>de</strong> “poesia marginal”.<br />
Essa marginalida<strong>de</strong> se estendia às publicações, livros tos‑<br />
cos, muitos <strong>de</strong>les utilizando o mimeógrafo, vendidos pelos<br />
autores em bares e em restaurantes.<br />
Sem uma unida<strong>de</strong> estilística, que formasse uma es‑<br />
cola, “a aproximação entre os poetas se dá, na maior parte<br />
das vezes, <strong>mais</strong> em termos comportamentais do que em<br />
relação às obras em si”, observa Afonso Henriques. Ou,<br />
como disse o poeta Cacaso: “Isto não é um movimento li‑<br />
terário. É um poemão. É como se todos estivéssemos escre‑<br />
vendo o mesmo poema a 1.000 mãos”.<br />
Para selecionar os poetas participantes <strong>de</strong>sse poemão,<br />
o organizador dos Anos 70 se restringiu aos autores que<br />
estrearam em livro naquela década, mesmo que publi‑<br />
cando poemas há muito na imprensa. E, apesar da tonali‑<br />
da<strong>de</strong> própria <strong>de</strong> voz <strong>de</strong> cada um, eles formam um coro<br />
afinado e envolvente.<br />
R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a<br />
ANOS 80<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Ricardo Vieira Lima<br />
1 a edição – 248 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1155 ‑7<br />
A renovação poética que se processou na década <strong>de</strong><br />
1980 não foi muito bem percebida à época. Foi uma espécie<br />
<strong>de</strong> terremoto subterrâneo. Os sismógrafos críticos não o<br />
captaram. Era natural. O país, <strong>de</strong> certa forma, renascia do<br />
longo pesa<strong>de</strong>lo da ditadura, com a abertura <strong>de</strong>mocrática,<br />
“lenta, segura e gradual”, e não percebia com clareza o que<br />
se <strong>de</strong>senrolava, pelo menos no plano da poesia. Mas, como<br />
em toda época <strong>de</strong> renascimento, uma nova sensibilida<strong>de</strong><br />
estava no ar. Os poetas jovens não queriam <strong>mais</strong> saber <strong>de</strong><br />
poesia engajada e <strong>de</strong> protestos políticos.<br />
O sonho <strong>de</strong> mudar o Brasil e o mundo chegara ao fim.<br />
As mortes <strong>de</strong> Vinicius <strong>de</strong> Moraes e John Lennon aumenta‑<br />
ram essa certeza. Assim, o artista engajado, o poeta <strong>de</strong> van‑<br />
guarda, os hippies e o tripé sexo, drogas e rock ‑and ‑roll<br />
saiam <strong>de</strong>finitivamente <strong>de</strong> cena.<br />
Iniciava ‑se a época da cultura pop, dos yuppies, do te‑<br />
atro besteirol. O público leitor se interessava pelas memórias<br />
<strong>de</strong> exílio (Fernando Gabeira, Frei Beto), os romances políti‑<br />
cos, os livros ‑reportagem, as biografias <strong>de</strong> notabilida<strong>de</strong>s.<br />
Os novos poetas, com os olhos fixos em si mesmos, fa‑<br />
lando <strong>de</strong> seus interesses, aspirações e perplexida<strong>de</strong>s, tinham<br />
também uma consciência técnica <strong>mais</strong> aprimorada que seus<br />
colegas <strong>de</strong> geração anterior e gostavam <strong>de</strong> estudar. Eram <strong>mais</strong><br />
refinados e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes. “A poesia volta à literatura e se<br />
torna exigente”, observou Heloisa Buarque <strong>de</strong> Hollanda.<br />
Essa nova poesia foi chamada <strong>de</strong> pós ‑mo<strong>de</strong>rnista, mas<br />
Ricardo Vieira Lima, no prefácio aos Anos 80, prefere o<br />
termo pluralismo, que <strong>de</strong>finiria melhor o vasto entrecruza‑<br />
mento <strong>de</strong> tendências, ligados por dois pontos comuns: a<br />
reflexão poética e o apuro do verso.<br />
Anos 80 oferece ao leitor um vasto panorama da<br />
época, reunindo obras <strong>de</strong> cinquenta e cinco poetas, <strong>de</strong> todas<br />
as tendências e regiões do país.<br />
83<br />
R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a
ANOS 90<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Paulo Ferraz<br />
1 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1156 ‑4<br />
Na década <strong>de</strong> 1990, o mundo acelerou o passo e o<br />
compasso, as inovações tecnológicas mudaram a socie‑<br />
da<strong>de</strong>, afetando o cotidiano e a vida <strong>de</strong> todos. Falou ‑se,<br />
como nunca, no fim das utopias e até mesmo no fim da<br />
história. Todos aguardavam, ansiosos, pelo admirável<br />
mundo novo, regulado pela tecnologia e a harmonia social.<br />
Simples <strong>de</strong>vaneios. O que ocorreu, na realida<strong>de</strong>, foi a vitó‑<br />
ria massacrante da banalização, numa socieda<strong>de</strong> que <strong>de</strong>s‑<br />
preza os valores hum<strong>anos</strong> para valorizar, sobretudo, o<br />
espetáculo.<br />
No meio <strong>de</strong>sse liquidificador social e <strong>de</strong>pois das expe‑<br />
riências radicais, como o concretismo, a poesia conseguiu<br />
sair ilesa, e <strong>de</strong> certa forma rejuvenescida pela busca dos poe‑<br />
tas em exprimirem a si mesmos e ao mundo estonteante em<br />
que todos vivemos, apesar (e talvez por isso) <strong>de</strong>ste mundo<br />
não lhes provocar a mínima empatia. Coisa difícil, numa pai‑<br />
sagem social que provoca o <strong>de</strong>sencanto e o mal ‑estar, le‑<br />
vando os poetas à intransigência com o que os cerca, uma<br />
das características <strong>mais</strong> marcantes <strong>de</strong>ssa geração.<br />
Este balanço da última década do século XX reúne 45<br />
poetas, <strong>de</strong> todas as regiões do país, cada um tentando ex‑<br />
pressar a sua busca poética e vital. Como observa o orga‑<br />
nizador do volume, Paulo Ferraz, “<strong>de</strong>sconfiando <strong>de</strong> verda <strong>de</strong>s<br />
alheias, os textos selecionados, entre outras características,<br />
põem ‑se como mecanismos <strong>de</strong> cognição e <strong>de</strong> re<strong>de</strong>scoberta<br />
das sensações. Mais que pensados, são poemas pensando,<br />
que visam a produzir no leitor um estado <strong>de</strong> reflexão seme‑<br />
lhante, <strong>de</strong> tal modo que ele também se interrogue ao ver‑<br />
‑se envolto por objetos emu<strong>de</strong>cidos”. É ler, <strong>de</strong>scobrir,<br />
sintonizar e pensar.<br />
84<br />
R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a<br />
ANOS 2000<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Marco Lucchesi<br />
1 a edição – 184 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1157‑1<br />
Ao contrário dos <strong>de</strong><strong>mais</strong> volumes da coleção Roteiro da<br />
Poesia Brasileira, trabalhados em perspectivas históricas, os<br />
Anos 2000 põem no ombro do organizador a difícil missão <strong>de</strong><br />
fisgar, i<strong>de</strong>ntificar e valorizar, como representativos da época,<br />
um grupo <strong>de</strong> poetas vivos e atuantes no período <strong>de</strong> 2000 a<br />
2006, “num país <strong>de</strong> tão vastas proporções e no seio <strong>de</strong> um<br />
presente que se mostra praticamente inabordável, num oceano<br />
<strong>de</strong> publicações reais e virtuais”, observa Marco Lucchesi.<br />
Real e virtual, no caso, se traduzem por centenas <strong>de</strong><br />
sites, <strong>de</strong> maior ou menor acessibilida<strong>de</strong>, revistas reais e vir‑<br />
tuais, edições <strong>de</strong> autor, a maior parte das quais nem chega<br />
ao <strong>de</strong>pósito legal.<br />
Apesar das dificulda<strong>de</strong>s, Lucchesi buscou incluir em<br />
sua seleção tendências poéticas <strong>de</strong> todas as regiões e esta‑<br />
dos do país, fornecendo um retrato fiel do panorama atual<br />
da poesia brasileira.<br />
Um panorama no qual “alguns críticos sublinham uma<br />
espécie <strong>de</strong> dispersão ou <strong>de</strong> atomização, diante da quebra do<br />
<strong>de</strong>rra<strong>de</strong>iro paradigma – ou bastião – cabralino”, outros pre‑<br />
ferem apontar “seus autores como resíduos epigonais” dos<br />
gran<strong>de</strong>s poetas do século XX, como Drummond, João Ca‑<br />
bral ou os concretistas. “Outros há que buscam <strong>de</strong>finir ten‑<br />
dências literárias, utilizando expressões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m política,<br />
<strong>de</strong>finindo os poetas como inovadores, conservadores ou ne‑<br />
oconservadores, partindo – muitas vezes – do dogma abso‑<br />
luto <strong>de</strong> uma presumida contemporaneida<strong>de</strong>.”.<br />
Com a consciência da dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma seleção,<br />
Marco Lucchesi ressalta que “o que apresentamos agora<br />
não se constitui numa proposta crítica cerrada, mas numa<br />
aproximação, paisagem móvel que reúne as folhas disper‑<br />
sas <strong>de</strong> um livro plural, aberto e inacabado”, formado por<br />
trinta poetas que, bem ou mal, traduzem o gosto e as ten‑<br />
dências <strong>de</strong> sua geração.<br />
R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a
ARCADISMO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Domício Proença Filho<br />
1 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1144 ‑8<br />
Primeiro grupo homogêneo <strong>de</strong> poetas da literatura<br />
brasileira, os árca<strong>de</strong>s não <strong>de</strong>ixaram apenas uma obra rica e<br />
saborosa. De certa forma, ainda timidamente, elaboraram<br />
também uma espécie <strong>de</strong> prefácio à autonomia da literatura<br />
brasileira, que os românticos iriam concretizar e proclamar<br />
com som e com fúria.<br />
Portugueses pela expressão, internacionais pela temática,<br />
Tomás Antonio Gonzaga, Cláudio Manuel da Costa, Alvarenga<br />
Peixoto, Basílio da Gama, Silva Alvarenga e Santa Rita Durão,<br />
com maior ou menor força e ousadia, já se i<strong>de</strong>ntificam com a<br />
terra e revelam traços inconfundíveis <strong>de</strong> sensibilida<strong>de</strong> brasileira,<br />
sem que disso tenham consciência.<br />
O português Gonzaga, filho <strong>de</strong> brasileira, encarnando ‑se<br />
em Dirceu, “honrado pastor” da al<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Marília, <strong>de</strong>ixa<br />
aflorar sob as convenções temáticas umas <strong>de</strong>liciosas vibra‑<br />
ções do que seria, <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, a alma brasileira. Cláudio<br />
Manuel respon<strong>de</strong> ao apelo da terra por oposição,<br />
admirando ‑se <strong>de</strong> “que entre penhas tão duras se criara/<br />
uma alma terna, um peito sem dureza!”. Foi o <strong>mais</strong> ligado<br />
aos mo<strong>de</strong>los arcádicos, mas alguns críticos o apontam<br />
como “o <strong>mais</strong> profundamente preso às emoções e valores<br />
da terra” (Antonio Candido). Mas em matéria <strong>de</strong> brasili‑<br />
da<strong>de</strong>, ninguém supera o mulato Domingos Caldas Barbosa<br />
– já bem afastado do Arcadismo – <strong>de</strong>ngoso, sensual, can‑<br />
tador <strong>de</strong> lundu, cujo sucesso em Portugal encheu <strong>de</strong> inveja<br />
o peito <strong>de</strong> Bocage. Cantava coisas assim: “Não posso<br />
negar, não posso,/ não posso por <strong>mais</strong> que queira,/ que o<br />
meu coração se abrasa/ <strong>de</strong> ternura brasileira”. Abrasar ‑se<br />
<strong>de</strong> ternura brasileira era, em suma, apresentar prenúncios<br />
do Romantismo, que o leitor sensível po<strong>de</strong> <strong>de</strong>tectar, em<br />
alguns casos <strong>de</strong> forma muito incipiente, no <strong>de</strong>licado Silva<br />
Alvarenga, em Basílio da Gama, o maior <strong>de</strong> todos, e até<br />
mesmo no misterioso autor das Cartas chilenas, o primeiro<br />
poema político da literatura brasileira.<br />
R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a<br />
MODERNISMO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Walnice Nogueira Galvão<br />
1 a edição – 184 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1149 ‑6<br />
O Mo<strong>de</strong>rnismo virou a literatura brasileira <strong>de</strong> pernas<br />
pro ar. Des<strong>de</strong>nhando os padrões estéticos vigentes até<br />
então, audaciosos e <strong>de</strong>safiadores, os jovens que se reuniram<br />
no Teatro Municipal <strong>de</strong> São Paulo, em 1922 (e seus seguido‑<br />
res), trouxeram para as nossas letras e artes um frisson novo<br />
e, sobretudo, um <strong>de</strong>splante como até então não se havia<br />
visto, implantando uma autêntica revolução cultural, que se<br />
esten<strong>de</strong>u a todos os setores da vida intelectual do país. Seu<br />
lema po<strong>de</strong>ria ser: mudança radical ou nada.<br />
Uma das frentes <strong>de</strong> combate <strong>mais</strong> visíveis, e por isso<br />
mesmo, <strong>mais</strong> atacada, perseguida e ridicularizada foi a poe‑<br />
sia. Substituindo a gravida<strong>de</strong> do soneto bilaquiano pelo<br />
poema ‑piada, dando a<strong>de</strong>us à rima e à métrica, apunha‑<br />
lando as formas poéticas tradicionais, valorizando o colo‑<br />
quial, iconoclastas e zombeteiros, os jovens mo<strong>de</strong>rnistas<br />
afrontavam não apenas os velhos <strong>de</strong>uses da poesia brasi‑<br />
leira, como também o gosto do povo.<br />
O combate foi duro, mas compensador. “A eferves‑<br />
cência renovadora expressou ‑se em vários tipos <strong>de</strong> ativi‑<br />
da<strong>de</strong>, cenáculos, manifestos, salões, revistas e festivais”,<br />
lembra Walnice Nogueira Galvão, prolongando ‑se até os<br />
começos da década <strong>de</strong> 1930. Por essa época, o que havia<br />
sido subversivo passara a ser imitado, e alguns nomes se<br />
fixaram <strong>de</strong>finitivamente no gosto do público e no conceito<br />
da crítica.<br />
Um roteiro poético da época po<strong>de</strong> seguir muitos ca‑<br />
minhos. Walnice Nogueira Galvão, com critério seguro,<br />
optou pela seleção das principais figuras do movimento,<br />
aquelas que realmente <strong>de</strong>ixaram sua marca em nossa poe‑<br />
sia, <strong>de</strong>zessete poetas que sintetizam o que <strong>de</strong> <strong>mais</strong> impor‑<br />
tante o movimento produziu, alguns <strong>de</strong>les incorporados<br />
em <strong>de</strong>finitivo à sensibilida<strong>de</strong> popular.<br />
85<br />
R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a
PARNASIANISMO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Sânzio <strong>de</strong> Azevedo<br />
1 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1146 ‑4<br />
Aristocrático em sua origem, pregando a arte pela<br />
arte e a impassibilida<strong>de</strong>, o Parnasianismo se adoçou e se<br />
humanizou no Brasil. Em vez da frieza do mármore, exal‑<br />
tada pelos franceses, os poetas brasileiros cultivaram um<br />
discreto sentimentalismo e um exacerbado sensualismo.<br />
Claro que, tudo isso, sob o <strong>mais</strong> restrito culto à forma, que<br />
Olavo Bilac sintetizou e consagrou nos versos famosos da<br />
“Profissão <strong>de</strong> fé”, “vibrando a lança/ em prol do Estilo!”.<br />
Dessa forma, a versificação alcançou um requinte até<br />
então <strong>de</strong>sconhecido na literatura brasileira, com imagens<br />
<strong>mais</strong> sóbrias e linguagem <strong>mais</strong> pura do que a <strong>de</strong> seus ante‑<br />
cessores, excluídos até mesmo muitos brasileirismos. O li‑<br />
rismo, em muitos momentos, se abeberou na velha tradição<br />
portuguesa, que se origina nos poetas dos cancioneiros. O<br />
soneto predominou, com seu fecho <strong>de</strong> ouro, levando ao<br />
<strong>de</strong>lírio poetas, poetastros e <strong>de</strong>clamadores.<br />
Pois, apesar do rigor formal, da introdução <strong>de</strong> temas e<br />
motivos que po<strong>de</strong>riam afastar o leitor, acostumado ao embalo<br />
dos românticos, os poetas parnasi<strong>anos</strong> conseguiram uma no‑<br />
tável popularida<strong>de</strong>. Seus versos foram recitados em salões e<br />
saraus, talvez com a mesma embriaguez dos bons tempos do<br />
Romantismo. Com sua magia verbal, o lirismo sensual, a ca‑<br />
pacida<strong>de</strong> “<strong>de</strong> ouvir e <strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r estrelas”, Bilac foi o último<br />
poeta realmente popular da nossa literatura. Príncipe dos po‑<br />
etas brasileiros. Sua corte era povoada por um esplêndido<br />
time <strong>de</strong> súditos: Alberto <strong>de</strong> Oliveira e Raimundo Correa, os<br />
outros dois membros da trinda<strong>de</strong> parnasiana; Vicente <strong>de</strong> Car‑<br />
valho, gran<strong>de</strong> pintor do mar; Luís Delfino, sensual e ousado,<br />
<strong>de</strong>sfrutando à época <strong>de</strong> imensa popularida<strong>de</strong>; o sóbrio Ma‑<br />
chado <strong>de</strong> Assis; e tantos outros milhares, pois poetar se tornou<br />
então um quase vício. A presente antologia inclui <strong>de</strong>zenove<br />
poetas, <strong>de</strong> expressão diversa, abrangendo todas as tendências<br />
e expressões do Parnasianismo brasileiro.<br />
86<br />
R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a<br />
PRÉ MODERNISMO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Alexei Bueno<br />
1 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1148 ‑9<br />
Os historiadores da poesia brasileira costumam con‑<br />
ceituar como Pré ‑Mo<strong>de</strong>rnista a produção das duas décadas<br />
que antece<strong>de</strong>ram a Semana <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna <strong>de</strong> 1922.<br />
Essa visão, <strong>mais</strong> histórica e/ou sociológica, abrange um pe‑<br />
ríodo <strong>de</strong> intenso choque <strong>de</strong> tendências, em que parnasia‑<br />
nos e simbolistas ainda estavam ativos, assistindo ao vago<br />
<strong>de</strong>sabrochar <strong>de</strong> novas tendências.<br />
Na realida<strong>de</strong>, é um conceito negativo, como observa<br />
Alexei Bueno no prefácio ao volume Pré ‑Mo<strong>de</strong>rnismo, “que<br />
só se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>finir pela negação, referindo ‑se àquilo que, sem<br />
ser mo<strong>de</strong>rnista, já não seria <strong>mais</strong> exatamente parnasiano ou<br />
simbolista”.<br />
Foi nessa época que surgiu um gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> poe‑<br />
tas que, <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, iriam a<strong>de</strong>rir ao Mo<strong>de</strong>rnismo. Daí a di‑<br />
ficulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> se escolher, com rigor, os representantes <strong>de</strong>sse<br />
vago Pré ‑Mo<strong>de</strong>rnismo. Alexei Bueno selecionou catorze<br />
nomes significativos do período, advertindo que “po<strong>de</strong>riam<br />
em gran<strong>de</strong> parte ser outros”.<br />
Feita a ressalva, a seleção é impecável, incluindo <strong>de</strong> figu‑<br />
ras ainda com muitos vínculos com o Parnasianismo, como<br />
Ama<strong>de</strong>u Amaral, e o camoniano José Albano, até poetas fran‑<br />
camente mo<strong>de</strong>rnos (no sentido real da palavra, mo<strong>de</strong>rno e<br />
não mo<strong>de</strong>rnista), como Felipe <strong>de</strong> Oliveira, ou <strong>de</strong> afirmação<br />
feminista e erotismo agressivo, como Gilka Machado.<br />
Po<strong>de</strong> ‑se dizer, com algum exagero, que cada poeta re‑<br />
presentava uma tendência, bastando lembrar o nome dos<br />
<strong>de</strong><strong>mais</strong> selecionados: o angustiado Hermes Fontes, o então<br />
prestigiadíssimo Raul Machado, Ronald <strong>de</strong> Carvalho, Murilo<br />
Araújo, Tasso da Silveira, Raul <strong>de</strong> Leoni, Ribeiro Couto, Moacir<br />
<strong>de</strong> Almeida, Onestaldo <strong>de</strong> Pennafort e, acima <strong>de</strong> todos,<br />
sobressaindo ‑se como a gran<strong>de</strong> figura do período, o estra‑<br />
nho e enigmático Augusto dos Anjos, o qual basta para dig‑<br />
nificar qualquer período e qualquer literatura.<br />
R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a
RAÍZES<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Ivan Teixeira<br />
1 a edição – 323 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1143 ‑4<br />
Desconhecida da maioria dos leitores, a poesia brasi‑<br />
leira do período colonial constitui uma crônica apaixonante<br />
do processo <strong>de</strong> integração do homem à terra, <strong>de</strong> sua luta<br />
por incorporá ‑la à civilização oci<strong>de</strong>ntal e, ao mesmo tempo,<br />
plantar o que se convencionou chamar <strong>de</strong> as raízes da<br />
nossa literatura.<br />
Ainda no século do <strong>de</strong>scobrimento, José <strong>de</strong> Anchieta<br />
poetava com leveza e unção, no “estilo humil<strong>de</strong> da oração<br />
<strong>de</strong>vota” – como observa Ivan Teixeira no prefácio do vo‑<br />
lume –, com o objetivo maior <strong>de</strong> livrar os índios da barbárie<br />
e atá ‑los à fé católica. A Prosopopeia, do cristão novo<br />
Bento Teixeira, concebida “como uma espécie <strong>de</strong> prolonga‑<br />
mento ou apêndice” (Ivan Teixeira) <strong>de</strong> Os lusíadas, po<strong>de</strong><br />
também ser lida como uma ficção histórica sobre as origens<br />
do Brasil.<br />
No século XVII, com a consolidação das cida<strong>de</strong>s, os<br />
poetas se multiplicam e cantam por conta própria, com<br />
revolta e <strong>de</strong>sfaçatez pela voz <strong>de</strong> Gregório <strong>de</strong> Matos, o pri‑<br />
meiro poeta nascido no Brasil, ou com <strong>de</strong>slumbramento<br />
pela terra natal, como o fez o baiano Botelho <strong>de</strong> Oliveira,<br />
autor da Música do Parnaso, o primeiro livro <strong>de</strong> autor bra‑<br />
sileiro a ser impresso, inspirador da “Descrição da ilha <strong>de</strong><br />
Itaparica”, <strong>de</strong> frei Manuel <strong>de</strong> Santa Maria Itaparica.<br />
O século XVIII, o século das aca<strong>de</strong>mias, produziu uma<br />
enxurrada <strong>de</strong> poetas, preocupados com futilida<strong>de</strong>s, pecu‑<br />
liar ao espírito agudo e engenhoso da época, que Ivan Tei‑<br />
xeira interpreta como um <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> integrar o país “ao<br />
código civilizado da Europa”.<br />
Para este volume <strong>de</strong> Raízes, Ivan Teixeira selecionou oito<br />
poetas e 79 poemas, alguns longos e com transcrição inte‑<br />
gral, que sintetizam a evolução da poesia brasileira nos três<br />
primeiros séculos e traçam um quadro instigante da socie‑<br />
da<strong>de</strong> colonial, com suas virtu<strong>de</strong>s, mazelas e aspirações.<br />
R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a<br />
ROMANTISMO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Antonio Carlos Secchin<br />
1 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1145 ‑8<br />
Em nenhuma época da história da nossa literatura a<br />
poesia esteve tão perto do povo. Brasileiros até a cutícula,<br />
sonhadores exaltados, líricos revoltados, os poetas român‑<br />
ticos encarnavam os anseios e sonhos da nacionalida<strong>de</strong> –<br />
através da visão i<strong>de</strong>alizada e paradisíaca da natureza, da<br />
exaltação <strong>de</strong> nossa história, do louvor ao indígena –, mas<br />
também os <strong>de</strong>sejos, as frustrações e as perplexida<strong>de</strong>s do<br />
homem, os <strong>de</strong>lírios <strong>de</strong> amor <strong>de</strong> iaiás e ioiôs, o mergulho<br />
perturbador na própria alma, expressos numa linguagem<br />
doce, por vezes quase melosa, muito distante da sintaxe<br />
dura dos portugueses. O público reconhecia ‑se naqueles<br />
poemas, lidos na forma impressa e divulgados em recitati‑<br />
vos, em reuniões e saraus, ao som do piano.<br />
Introduzido no Brasil em 1836, com o aparecimento<br />
dos Suspiros poéticos e sauda<strong>de</strong>s, <strong>de</strong> Gonçalves <strong>de</strong> Maga‑<br />
lhães, o Romantismo reinou sobre mentes e corações até<br />
1870, ano <strong>de</strong> publicação das Espumas flutuantes, <strong>de</strong> Cas‑<br />
tro Alves, consi<strong>de</strong>rado o fim da escola. Durante esses quase<br />
quarenta <strong>anos</strong> surgiram centenas e centenas <strong>de</strong> poetas,<br />
algumas figuras extraordinárias (Gonçalves Dias, Álvares <strong>de</strong><br />
Azevedo, Castro Alves, Fagun<strong>de</strong>s Varela), das quais se<br />
aproximam poetas como Casimiro <strong>de</strong> Abreu e Junqueira<br />
Freire, uma galeria extensa <strong>de</strong> poetas menores e uma infi‑<br />
nida<strong>de</strong> <strong>de</strong> versejadores inclassificáveis.<br />
Alguns antologistas do período se circunscrevem aos<br />
principais nomes do período. Antonio Carlos Secchin optou<br />
por uma seleção <strong>mais</strong> abrangente, com a inclusão <strong>de</strong> um<br />
bom número <strong>de</strong> epígonos, menos significativos em termos<br />
estritos <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> literária, mas indispensáveis na fixa‑<br />
ção integral da sensibilida<strong>de</strong> da época e <strong>de</strong> suas múltiplas<br />
vertentes, figuras pouco lembradas, como Bruno Seabra,<br />
Carlos Ferreira e Narcisa Amália, sem os quais o perfil da<br />
nossa poesia romântica ficaria incompleto.<br />
87<br />
R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a
SIMBOLISMO<br />
Seleção e prefácio <strong>de</strong><br />
Lauro Junkes<br />
1 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1147 ‑2<br />
Inquietos, <strong>de</strong>scontentes com os estreitos limites da vida<br />
cotidiana, cultivando o vago, o in<strong>de</strong>finível, o que está para<br />
além do mistério, os simbolistas trouxeram à poesia brasileira<br />
um frêmito novo. Instalados em suas torres <strong>de</strong> marfim, repu‑<br />
diando a brutalida<strong>de</strong> do mundo, movimentando ‑se num ter‑<br />
ritório mágico <strong>de</strong> sonho, entre névoas e brumas, ansiosos por<br />
aquela paz que não é <strong>de</strong>ste planeta, os cavalheiros do símbolo<br />
viveram essa busca <strong>de</strong> forma dramática e até mesmo lanci‑<br />
nante e contraditória. Não raras vezes, o <strong>mais</strong> elevado misti‑<br />
cismo conflitou com a plena entrega aos paraísos artificiais.<br />
No plano estético, os simbolistas elevaram ‑se a alturas<br />
poucas vezes alcançadas pela poesia brasileira, apesar <strong>de</strong><br />
nunca gozarem da popularida<strong>de</strong> dos poetas românticos e<br />
<strong>de</strong> alguns parnasi<strong>anos</strong>. Lá no alto, muito acima do chão, entre<br />
as “Estrelas <strong>de</strong> cristais gelados”, como disse lindamente o<br />
Cisne Negro, pairam Cruz e Sousa e Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens,<br />
cuja alma se tornou “trigo <strong>de</strong> Deus no céu aberto...”.<br />
Em níveis <strong>mais</strong> mo<strong>de</strong>stos, mas cheio <strong>de</strong> encantamen‑<br />
tos e seduções, o leitor encontra um grupo <strong>de</strong> poetas ad‑<br />
miráveis e pouco divulgados: o sentimental Mário Pe<strong>de</strong>r ‑<br />
neiras, apaixonado pela vida pequeno ‑burguesa carioca; o<br />
angustiado Marcelo Gama; Auta <strong>de</strong> Sousa, com sua eleva‑<br />
díssima espiritualida<strong>de</strong>; Severiano <strong>de</strong> Resen<strong>de</strong>, estranho e<br />
rebel<strong>de</strong>, espécie <strong>de</strong> anjo <strong>de</strong>caído; o voluptuoso Maranhão<br />
Sobrinho; o hermético Pedro Kilkerry; o melancólico Ernani<br />
Rosas. Nesta antologia figuram 24 poetas, selecionados<br />
com extrema exigência por Lauro Junkes, que teve a cora‑<br />
gem e o bom senso <strong>de</strong> incluir, ao lado dos consagrados,<br />
nomes conhecidos apenas por especialistas, como Narciso<br />
Araújo e Érico Curado. Valeu. Ao conhecê ‑los, o leitor en‑<br />
contrará excelentes surpresas. Para alguns, daquelas sur‑<br />
presas que nunca se esquecem.<br />
88<br />
R o t e i R o d a P o e s i a B R a s i l e i R a
C o l e ç ã o<br />
C o r r e s P o n d ê n C i a s<br />
CORRESPONDÊNCIA DE MACHADO DE ASSIS<br />
Aca<strong>de</strong>mia Brasileira <strong>de</strong> Letras<br />
C o r r e s P o n d ê n C i a s P r e l o<br />
Escrever cartas é um ato que se assemelha ao da<br />
confissão. Numa carta, seu autor costuma revelar<br />
para seu correspon<strong>de</strong>nte e para si mesmo reflexões<br />
que, na maioria das vezes, não sente disposição<br />
para expor em público. O espaço privado das corres‑<br />
pondências permite que o sujeito que as escreve<br />
faça juízos surpreen<strong>de</strong>ntes, revele sentimentos au‑<br />
tocensurados e exponha seus projetos pessoais para<br />
seu futuro. A <strong>Global</strong> <strong>Editora</strong>, através <strong>de</strong> sua coleção<br />
Correspondências, tenciona trazer à tona esse uni‑<br />
verso intimista da nossa literatura, publicando cartas<br />
<strong>de</strong> personalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> relevo da cultura brasileira.<br />
89
AÍ VAI MEU CORAÇÃO<br />
AS CARTAS DE TARSILA DO<br />
AMARAL E ANNA MARIA<br />
MARTINS PARA LUÍS MARTINS<br />
Ana Luísa Martins<br />
2 a edição – 248 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1494 ‑7<br />
Um dia, mexendo na gaveta da escrivaninha <strong>de</strong> seu<br />
pai, a menina <strong>de</strong> oito <strong>anos</strong> <strong>de</strong>scobriu uma coleção <strong>de</strong> fotos,<br />
bilhetes, cartas <strong>de</strong> mulheres a ele en<strong>de</strong>reçadas, que a <strong>de</strong>i‑<br />
xou intrigada. Voltou lá várias vezes, <strong>de</strong>cifrando <strong>de</strong> forma<br />
apaixonada aquela papelada amarelada pelo tempo.<br />
Concluiu que o pai, antes <strong>de</strong> se casar com sua mãe,<br />
tivera um outro amor e que as cartas <strong>de</strong>ssa mulher miste‑<br />
riosa e <strong>de</strong> sua mãe encontravam ‑se juntas na mesma ga‑<br />
veta. O caso seria apenas uma história doméstica, que<br />
po<strong>de</strong>ria dar no máximo um conto, não fossem os persona‑<br />
gens nela envolvidos.<br />
O pai da menina era o cronista, romancista, poeta Luís<br />
Martins, a namorada anterior ao casamento, a pintora Tar‑<br />
sila do Amaral e a esposa, Anna Maria Martins.<br />
A menina, Ana Luísa Martins, tornou ‑se mulher e, ao<br />
longo dos <strong>anos</strong>, leu e releu muitas vezes essa correspon‑<br />
dência, até o dia em que, convicta <strong>de</strong> que aquele material<br />
não pertencia apenas à família, mas era uma rica fonte <strong>de</strong><br />
informação para a biografia do pai e da pintora, resolveu<br />
editá ‑las, esclarecendo num prefácio interessantíssimo os<br />
meandros daquela história.<br />
Luís Martins foi o último companheiro <strong>de</strong> Tarsila.<br />
Quando se uniram, ele tinha vinte e seis <strong>anos</strong> e ela, qua‑<br />
renta e sete. A diferença <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>s era consi<strong>de</strong>rada na<br />
época um escândalo. No entanto, o relacionamento durou<br />
<strong>de</strong>zoito <strong>anos</strong> e muitas cartas. O rompimento se <strong>de</strong>u quando<br />
Luís se casou com Anna Maria, parente próximo <strong>de</strong> Tarsila,<br />
provocando um atrito familiar.<br />
A correspondência reunida em Aí vai meu coração re‑<br />
produz cartas en<strong>de</strong>reçadas ao escritor, escritas por Tarsila e<br />
Anna Maria no início da década <strong>de</strong> 1950. Do escritor não<br />
restaram cartas <strong>de</strong>ssa época, que permitissem restabelecer<br />
o possível diálogo epistolar. Não importa. O material apre‑<br />
sentado é da maior importância, “um presente para o fu‑<br />
turo literário <strong>de</strong> São Paulo” (Lygia Fagun<strong>de</strong>s Telles).<br />
90<br />
C o r r e s p o n d ê n C i a s<br />
CâMARA CASCUDO E<br />
MÁRIO DE ANDRADE<br />
CARTAS, 1924 1944<br />
Organização e notas <strong>de</strong><br />
Marcos Antonio <strong>de</strong> Moraes<br />
1 a edição – 384 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1481 ‑7<br />
Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> adorava escrever cartas. Em quan‑<br />
tida<strong>de</strong>, ninguém o superou no Brasil. Sua imensa corres‑<br />
pondência acha ‑se reunida em quase vinte volumes e, por<br />
certo, ainda falta muita coisa a compilar. Com Luís da Câ‑<br />
mara Cascudo, o criador <strong>de</strong> Macunaíma se correspon<strong>de</strong>u<br />
durante vinte <strong>anos</strong>, <strong>de</strong> 1924 a 1944, revelando aspectos<br />
pessoais <strong>de</strong> ambos, aspirações e preocupações intelectuais<br />
e uma profunda afinida<strong>de</strong> <strong>de</strong> espírito. As cartas trocadas<br />
têm ainda “a virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> ser uma das fontes <strong>de</strong> duas déca‑<br />
das da história literária do país e, talvez, a primeira ligação<br />
intelectual entre o Su<strong>de</strong>ste e o Nor<strong>de</strong>ste”, observa Dióge‑<br />
nes da Cunha Lima no prefácio.<br />
A sincerida<strong>de</strong> e a preocupação com a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> da<br />
alma brasileira são aspectos marcantes <strong>de</strong>ssa correspondên‑<br />
cia, com pontos <strong>de</strong> vista quase sempre concordantes. “Nós<br />
temos que dar uma alma ao Brasil”, escreve Mário ao amigo,<br />
empenhado em registrar a verda<strong>de</strong>ira i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> do país. A<br />
afinida<strong>de</strong> espiritual ampliou a admiração recíproca, por vezes<br />
balançada pela discordância, logo contornada pela com‑<br />
preensão da liberda<strong>de</strong> intelectual. “Não somos padres e sa‑<br />
cristãos para viver rosnando amém”, escreve Cascudo.<br />
Tanto Mário como Cascudo mostravam ‑se cautelosos<br />
em relação ao <strong>de</strong>stino da correspondência. Mário era radical:<br />
“Sou tão orgulhoso, que tenho sempre na minha pasta <strong>de</strong><br />
escrivaninha uma carta pedindo, caso eu morra, que meus<br />
inéditos sejam <strong>de</strong>struídos”. Talvez blefasse. Cascudo, “ciu‑<br />
mento <strong>de</strong>ssa correspondência”, segundo Diógenes Lima,<br />
autorizou ‑o a publicá ‑la “<strong>de</strong>pois que para mim a noite che‑<br />
gasse”. A noite chegou, como chegou o momento <strong>de</strong> publi‑<br />
cação da correspondência, que Afonso Arinos <strong>de</strong> Melo<br />
Franco, com exagero <strong>de</strong> admiração, achava que seriam tão<br />
importantes quanto as epístolas <strong>de</strong> São Paulo.<br />
C o r r e s p o n d ê n C i a s
s é r i e<br />
e s t a n t e G l o B a l<br />
DIREÇÃO<br />
A. P. QUARTIM DE MORAES<br />
Esta é uma série <strong>de</strong> romances aberta a autores bra‑<br />
sileiros <strong>de</strong> todos os estilos, inclusive estreantes no<br />
gênero. A Estante <strong>Global</strong>, série perfeitamente en‑<br />
quadrada no alto padrão <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conteúdo,<br />
que é marca <strong>de</strong> nosso catálogo, é também <strong>mais</strong><br />
uma iniciativa que reafirma o compromisso da <strong>Global</strong><br />
<strong>Editora</strong> com a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prestigiar e incentivar<br />
a produção literária brasileira.<br />
91
A FALA DO CÉU<br />
Ricardo Prado<br />
1 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1559 ‑3<br />
A mo<strong>de</strong>rna ficção brasileira está repleta <strong>de</strong> boas sur‑<br />
presas para os leitores. Nos últimos <strong>anos</strong>, os jovens ficcio‑<br />
nistas, em romances e contos, vêm apresentando uma<br />
visão original do país, da condição humana e da própria<br />
sobrevivência da humanida<strong>de</strong>, neste conturbado mundo<br />
em que vivemos. Uma das características <strong>de</strong>sses escritores<br />
é a linguagem <strong>de</strong>spojada, direta, livre <strong>de</strong> preciosismos, pe‑<br />
culiar à nossa época, fundamental para se estabelecer uma<br />
comunicação imediata com os leitores.<br />
Essa comunicação é um dos pontos altos do romance<br />
A fala do céu, estreia <strong>de</strong> Ricardo Prado no gênero. A histó‑<br />
ria se passa em Tremedal, on<strong>de</strong> a chuva cai, sem intervalos,<br />
há muitos <strong>anos</strong>. Como é peculiar a muitos lugares isolados,<br />
a cida<strong>de</strong> sofre o domínio implacável <strong>de</strong> uma família, pos‑<br />
suidora <strong>de</strong> um mítico anel tomado dos bugres locais.<br />
Numa simbologia da tradição política latino ‑americana,<br />
que conce<strong>de</strong> aos po<strong>de</strong>rosos o direito <strong>de</strong> apontar seu subs‑<br />
tituto, quando o velho cacique político entra em coma, seus<br />
dois filhos passam a disputar o seu anel. A rivalida<strong>de</strong> se<br />
aprofunda ainda <strong>mais</strong> com o interesse dos rapazes pelo<br />
amor <strong>de</strong> Helena, a forasteira com o ouvido “<strong>mais</strong> que per‑<br />
feito”, capaz <strong>de</strong> ouvir os menores ruídos, os sons <strong>mais</strong> in<strong>de</strong>‑<br />
sejáveis, os <strong>mais</strong> íntimos.<br />
Mas as rápidas transformações que atingem o planeta<br />
chegam também a Tremedal. A chuva começa a diminuir<br />
<strong>de</strong> intensida<strong>de</strong>, inquietando os moradores. E se aquilo for<br />
um sinal <strong>de</strong> alerta, um aviso <strong>de</strong> que o fenômeno seria capaz<br />
<strong>de</strong> provocar um tufão no outro lado do mundo? Seria Tre‑<br />
medal a confirmação da metáfora do Efeito Borboleta,<br />
criada para explicar como as pequenas alterações são ca‑<br />
pazes <strong>de</strong> gerar gran<strong>de</strong>s mudanças? É essa indagação que<br />
inquieta e pesa sobre o <strong>de</strong>stino dos personagens <strong>de</strong>ste sur‑<br />
preen<strong>de</strong>nte romance fantástico.<br />
92<br />
E s t a n t E G l o b a l<br />
A RAINHA DO<br />
CALÇADÃO, OPUS 14<br />
Esdras do Nascimento<br />
1 a edição – 432 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1596 ‑8<br />
Com ousadia literária e uma sedução permanente<br />
para o leitor, A rainha do calçadão, Opus 14 é um romance<br />
surpreen<strong>de</strong>nte e inovador, estruturado em sete narrativas,<br />
que po<strong>de</strong>m ser lidas <strong>de</strong> maneira in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />
se sigam as sequências indicadas pelo autor. São sete cami‑<br />
nhos que o leitor po<strong>de</strong> escolher, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo <strong>de</strong> seu estado<br />
<strong>de</strong> espírito, <strong>de</strong> sua curiosida<strong>de</strong> <strong>de</strong> momento ou da simples<br />
disposição <strong>de</strong> se lançar em <strong>de</strong>terminada aventura espiritual.<br />
Claro que há um oitavo caminho: o percurso tradicional<br />
com começo, meio e fim.<br />
A rainha do calçadão, Opus 14 é um romance do Rio<br />
<strong>de</strong> Janeiro, com as suas belezas, mistérios, <strong>de</strong>safios, <strong>de</strong>sgra‑<br />
ças e seus diversos segmentos sociais, que se movimentam<br />
em círculos equidistantes. Todos os personagens principais<br />
são mulheres, e as narrativas contam a história específica<br />
<strong>de</strong> cada uma <strong>de</strong>las, presas às suas angústias, problemas e<br />
frustrações, em sintonia com a vida da cida<strong>de</strong>. São mulhe‑<br />
res dos <strong>mais</strong> diversos tipos, classes sociais e personalida<strong>de</strong>s:<br />
profissionais realizadas ou fracassadas, honestas ou <strong>de</strong>so‑<br />
nestas, lindas ou feias, livres ou preconceituosas, inseguras<br />
ou oportunistas, cuja alma o autor <strong>de</strong>svenda com cruel‑<br />
da<strong>de</strong> e olho clínico infalível.<br />
Como observa Adriana Riva no prefácio, é difícil es‑<br />
quecer tais personagens, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> conviver com eles, nos‑<br />
sos semelhantes e irmãos, e conhecer a sua frágil humani da<strong>de</strong>:<br />
“Se o futuro habita em nós, dita a voz que mescla narrador<br />
e personagem, no calçadão do autor pontificam as sedu‑<br />
ções e os <strong>de</strong>sejos que fervilham em cada um <strong>de</strong> nós. O romance<br />
inventa a vida”.<br />
E a invenção da vida se apresenta num texto alta‑<br />
mente sofisticado, as narrativas alternando primeira e ter‑<br />
ceira pessoas, misturando passado e presente, objetivida<strong>de</strong><br />
jornalística, enfoque político e elaboradas técnicas literá‑<br />
rias, na sinuosa recriação da vida como ela é ou po<strong>de</strong>ria ser.<br />
E s t a n t E G l o b a l
AVESSO<br />
Tomás Chiaverini<br />
1 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1501 ‑2<br />
Se uma das principais características <strong>de</strong> uma obra lite‑<br />
rária é surpreen<strong>de</strong>r, envolver e inquietar, então Avesso é<br />
uma obra perfeitamente realizada. Narrado em primeira<br />
pessoa, num ritmo alucinante, mistura <strong>de</strong> ficção e <strong>de</strong>poi‑<br />
mento, o livro conta a odisseia <strong>de</strong> um jovem repórter<br />
recém ‑formado em busca do extraordinário, da aventura,<br />
do insólito, que lhe permitam se libertar das imposições e<br />
limitações da socieda<strong>de</strong> e viver a vida plena. É como um rito<br />
<strong>de</strong> passagem para o encontro <strong>de</strong> si mesmo e <strong>de</strong> seu lugar<br />
no mundo, mas que <strong>de</strong>semboca no consequente e inevitá‑<br />
vel ingresso na vida adulta. A história se <strong>de</strong>senrola em uma<br />
das regiões <strong>mais</strong> fascinantes do mundo, a Amazônia. Na<br />
sua busca pela liberda<strong>de</strong>, o jovem permanece durante<br />
meses num barco entre Belém e Manaus. Conhece, então,<br />
e se apaixona por Jaque, uma cana<strong>de</strong>nse, legítima new age<br />
traveler. A paixão se estabiliza numa fase <strong>de</strong> segurança e<br />
tranquilida<strong>de</strong> que é a própria negação da busca do jovem<br />
repórter pela liberda<strong>de</strong> incondicional. A consciência da si‑<br />
tuação gera um conflito íntimo que o leva a adotar atitu<strong>de</strong>s<br />
precipitadas, <strong>de</strong> consequências <strong>de</strong>sastrosas, com a <strong>de</strong>sco‑<br />
berta frustrante da impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> controlar o próprio<br />
<strong>de</strong>stino. Mistura bem dosada <strong>de</strong> mistério, conflitos e ro‑<br />
mance, Avesso é um mergulho sufocante nas inquietações<br />
e na necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> autoafirmação da juventu<strong>de</strong>, sua <strong>de</strong>‑<br />
silusão e a frustrante aceitação da maturida<strong>de</strong>, com suas<br />
limitações e conformismo, e a certeza da impossibilida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> se obter tudo o que se busca. Para quem acaba <strong>de</strong> in‑<br />
gressar nela, a vida adulta é amarga, o fim <strong>de</strong> todos os<br />
sonhos da juventu<strong>de</strong>, o avesso do i<strong>de</strong>al.<br />
E s t a n t E G l o b a l<br />
COM ESSE ÓDIO<br />
E ESSE AMOR<br />
Maria José Silveira<br />
1 a edição – 288 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1525 ‑8<br />
O romance brasileiro atual oferece muitas surpresas<br />
boas, capazes <strong>de</strong> sacudir o leitor <strong>de</strong> seu marasmo e lançá ‑lo<br />
num mundo <strong>de</strong> aventuras insuspeitadas, às quais ele po<strong>de</strong><br />
partilhar sem arriscar a pele e nem mesmo se levantar <strong>de</strong><br />
sua poltrona preferida. É uma das vantagens da ficção<br />
sobre a realida<strong>de</strong>. E é o que oferece Maria José Silveira,<br />
uma das revelações <strong>mais</strong> fortes da ficção brasileira atual,<br />
em Com esse ódio e esse amor.<br />
A trama do livro se <strong>de</strong>senvolve na Colômbia, on<strong>de</strong><br />
alguns brasileiros se envolvem em situações extremas, o<br />
que não os impe<strong>de</strong> <strong>de</strong> exercitar o seu terrível portunhol. A<br />
tensão é permanente, envolvimento com narcotraficantes,<br />
guerrilheiros das Farc, sequestros, medo, pânico, suspense<br />
e uma história <strong>de</strong> amor vivida nas cida<strong>de</strong>s, nas selvas e em<br />
acampamentos nas florestas. Predomina uma atmosfera<br />
pesada, por vezes sufocante, on<strong>de</strong> se acentuam os ciúmes,<br />
a competição, a dor, as dificulda<strong>de</strong>s no relacionamento <strong>de</strong><br />
pessoas <strong>de</strong> culturas tão diversas.<br />
Com esse ódio e esse amor começa <strong>de</strong> uma maneira<br />
e termina <strong>de</strong> outra. Essa estrutura narrativa levou Ignácio<br />
<strong>de</strong> Loyola Brandão a compará ‑lo com o Oito e meio. No<br />
romance, como no filme <strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>rico Fellini, as sequencias<br />
se alternam, há uma história <strong>de</strong> nossos dias e uma história<br />
que retorna no tempo, até os dias <strong>de</strong> Tupac Amaru, as duas<br />
correlacionadas, o passado <strong>de</strong>svendando o presente e per‑<br />
mitindo retornar à origem dos fatos. Como na obra ‑prima<br />
do diretor italiano, há um personagem que prepara um<br />
filme que ja<strong>mais</strong> será rodado. A narrativa, por sua vez, está<br />
entremeada por e ‑mails, um recurso a <strong>mais</strong> utilizado na<br />
ficção, como observa Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão: “A tecno‑<br />
logia vem ampliando as estruturas, permitindo do corte<br />
cinematográfico à edição computadorizada. Daí a mo<strong>de</strong>r‑<br />
nida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ste Com esse ódio e esse amor, que prenuncia<br />
novos tempos em narrativa”.<br />
E s t a n t E G l o b a l<br />
93
EM NOME DO PAI DOS<br />
BURROS<br />
Sílvio Lancellotti<br />
1a edição – 472 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1591 ‑3<br />
Sílvio Lancellotti não faz por menos. Com alguma pe‑<br />
tulância, mas a plena certeza do que afirma, reivindica para<br />
a sua obra a influência do Ulisses, o <strong>de</strong>molidor romance <strong>de</strong><br />
James Joyce. Apenas influência ou também afinida<strong>de</strong>s pro‑<br />
fundas? Eis aí um bom <strong>de</strong>safio para o leitor <strong>de</strong> romances que<br />
gosta <strong>de</strong> longas viagens. Longas e perturbadoras, apesar <strong>de</strong><br />
Em nome do pai dos burros (título que o autor se negou a<br />
abrir mão) – a exemplo da obra invocada como paradigma –<br />
se <strong>de</strong>senrolar em um único dia: 13 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1977.<br />
A data ficou marcada na história do Brasil e na história<br />
do futebol brasileiro por dois episódios catárticos, a queda<br />
do general Sylvio Frota, ministro do Exército do governo<br />
Ernesto Geisel, um dos baluartes da chamada “linha dura”,<br />
remanescente do golpe militar <strong>de</strong> 1964, e a conquista do<br />
campeonato paulista pelo Corinthians, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> vinte e<br />
três <strong>anos</strong> <strong>de</strong> dramática abstinência.<br />
Os dois fatos são acompanhados, com paixão, por um<br />
jovem jornalista, o editor Marcelo Brancaleone, adversário<br />
do regime e torcedor do novo campeão paulista. Essas duas<br />
vertentes se alinhavam em <strong>de</strong>zoito capítulos, entre um pre‑<br />
lúdio e um remate, cada um <strong>de</strong>les baseado numa cor, num<br />
ritmo musical, num órgão do corpo humano e com carac‑<br />
terísticas próprias e surpreen<strong>de</strong>ntes. Num <strong>de</strong>les, Lancellotti,<br />
<strong>de</strong>safiador e quase herético, se apoia no <strong>de</strong>senrolar <strong>de</strong> uma<br />
missa católica; em outro, jocoso, segue o roteiro <strong>de</strong> uma<br />
bula <strong>de</strong> remédio.<br />
Num estilo preciso e meticuloso, repleto <strong>de</strong> invenções<br />
linguísticas, on<strong>de</strong> cada palavra se encaixa como as pedras<br />
<strong>de</strong> um mosaico, o romancista apresenta e <strong>de</strong>senvolve o seu<br />
estranho universo, sem temor <strong>de</strong> <strong>de</strong>safiar, provocar e insti‑<br />
gar o leitor, mas também recompensar amplamente àque‑<br />
les que nele se aventurarem e do qual dificilmente se<br />
<strong>de</strong>sligarão antes da última linha.<br />
94<br />
e s t a n t e G l o B a l<br />
MIGRAÇÃO DOS<br />
CISNES<br />
Ricardo Daunt<br />
1 a edição – 560 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1482 ‑4<br />
O romance brasileiro vive um momento <strong>de</strong> intensa<br />
criativida<strong>de</strong>, ao qual a crítica não tem dado a merecida aten‑<br />
ção. Consciente <strong>de</strong>sse fenômeno, a <strong>Global</strong> i<strong>de</strong>alizou uma<br />
série <strong>de</strong> romances <strong>de</strong> autores nacionais, inaugurada com<br />
Migração dos cisnes, <strong>de</strong> Ricardo Daunt.<br />
Paulistano, formado em administração <strong>de</strong> empresas,<br />
ten do residido durante vários <strong>anos</strong> em Paris, on<strong>de</strong> se graduou<br />
mestre em literatura, pela Sorbonne, Daunt trabalhou em<br />
empresas multinacionais, abandonando tudo para se <strong>de</strong>dicar<br />
em tempo integral à literatura. É autor <strong>de</strong> uma obra literária<br />
am pla, que inclui ensaio, conto, romance, poesia, teatro.<br />
Migração dos cisnes é uma narrativa engenhosa, que<br />
se <strong>de</strong>sdobra como uma sinfonia, narrada em linguagem re‑<br />
quintada, um prazer a <strong>mais</strong> para leitores exigentes. A história<br />
(aliás, as múltiplas histórias) transcorre na Europa, a primeira<br />
parte entre Lisboa e Paris, a segunda, na Irlanda, numa rea‑<br />
lida<strong>de</strong> quase mágica, in<strong>de</strong>finível, entre o sonho e uma reali‑<br />
da<strong>de</strong> em transe.<br />
Como numa composição sinfônica, o romancista uti‑<br />
liza diversas estratégias <strong>de</strong> narração, ora alternando a téc‑<br />
nica, o ritmo, a perspectiva, ora retardando ou acelerando<br />
a ação, realçando o pormenor, ora mergulhando no mundo<br />
dos sonhos ou acompanhando cinematicamente o coti‑<br />
diano dos personagens em suas cida<strong>de</strong>s, em seu trabalho,<br />
em suas relações.<br />
Sinfonia literária, <strong>de</strong> múltiplos aspectos, Migração dos<br />
cisnes é romance introspectivo, <strong>de</strong> suspense, <strong>de</strong> ação. Sobe<br />
e <strong>de</strong>sce <strong>de</strong> tom, mas sempre num ritmo envolvente e, não<br />
raras vezes, surpreen<strong>de</strong>nte. Como no “jogo <strong>de</strong> Dublin”,<br />
planejado por um aposentado que i<strong>de</strong>aliza uma obra literá‑<br />
ria envolvendo James Joyce e para cuja realização elege<br />
vários participantes. É um jogo engenhoso e perturbador,<br />
como toda a trama e <strong>de</strong>senrolar <strong>de</strong> Migração dos cisnes.<br />
E s t a n t E G l o b a l
O ALÇAPÃO<br />
Pedro Cavalcanti<br />
1 a edição – 104 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1606 ‑4<br />
Narrativa fantástica, no estilo do Manuscrito encon‑<br />
trado em Saragoça, <strong>de</strong> Jan Potocki, O alçapão, paradoxal‑<br />
mente, mergulha fundo na realida<strong>de</strong> cruel <strong>de</strong> nossos dias.<br />
Romance <strong>de</strong>lirante e tão intrigante quanto a frase <strong>de</strong><br />
Afonso Schmidt que lhe serve <strong>de</strong> epígrafe: “Às vezes, um<br />
homem vivo é atacado por um tigre morto”.<br />
Três horas da tar<strong>de</strong>. Augusto vem caminhando pela<br />
rua, quando é atingido por uma bala perdida. Sofre uma<br />
concussão cerebral e várias paradas cardíacas. Internado no<br />
Hospital das Clínicas, mergulha durante dias sem fim num<br />
território <strong>de</strong> sombras, <strong>de</strong>lírios, alucinações e pesa<strong>de</strong>los,<br />
aquela zona crepuscular vizinha da morte.<br />
É então que se abre o alçapão e, através <strong>de</strong>le, como<br />
aves <strong>de</strong> agouro, emergem as imagens <strong>de</strong> seu inconsciente,<br />
em boa parte as mesmas do inconsciente coletivo brasileiro.<br />
O que, para o nível da consciência, estava morto e enter‑<br />
rado, ressurge com a força brutal dos fenômenos naturais,<br />
um terremoto ou um vendaval. O ataque do tigre morto.<br />
Sem qualquer lógica consciente, pautando ‑se pelo ilo‑<br />
gismo do inconsciente, e numa espécie <strong>de</strong> metáfora da história<br />
brasileira, a narrativa segue a incoerência das tempesta<strong>de</strong>s e<br />
dos naufrágios dos navegantes lusos, a ética dos ban<strong>de</strong>irantes<br />
e dos cangaceiros, a perspectiva dos palacetes em ruínas e das<br />
favelas, o encantamento dos amores, as marcas sujas da vida.<br />
Neste duro combate, surgem também – como não<br />
podia <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ser, tratando ‑se do Brasil – as soluções má‑<br />
gicas <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa e <strong>de</strong> ataque: rezas bravas para corpo fe‑<br />
chado, feitiçarias para abrir caminhos, em busca <strong>de</strong> um<br />
ponto <strong>de</strong> equilíbrio e paz.<br />
O único guia nessa história <strong>de</strong> incertezas sem nome<br />
nem datas é aquela estranha invenção dos navegadores<br />
portugueses, o “ponto <strong>de</strong> fantasia”, que cada piloto <strong>de</strong><br />
nau colocava on<strong>de</strong> lhe aprouvesse no mapa dos oce<strong>anos</strong> e,<br />
apesar <strong>de</strong> não existir, dava algum sentido à viagem.<br />
E s t a n t E G l o b a l<br />
O HOMEM LÉSBICO<br />
Helio Santos<br />
1 a edição – 304 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1607 ‑1<br />
A provocação começa no título, capaz <strong>de</strong> arrepiar os<br />
machões <strong>de</strong> plantão. E se <strong>de</strong>senvolve, com fino e irresistível<br />
senso <strong>de</strong> humor e ironia, ao longo <strong>de</strong> trezentas páginas,<br />
nas quais Helio Santos fustiga a dificulda<strong>de</strong> do homem mo‑<br />
<strong>de</strong>rno em lidar com seu eu feminino, que a maioria ignora<br />
ou tenta renegar. Sosseguem, pois, machões hipersensíveis,<br />
não se trata <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa ou apologia do homossexualismo.<br />
A proposta é <strong>mais</strong> original, instigante e <strong>de</strong>safiadora.<br />
Mostrar como, no mundo atual, on<strong>de</strong> os gran<strong>de</strong>s ícones são<br />
o sucesso a qualquer custo, a fama e o enriquecimento, o<br />
homem não consegue a felicida<strong>de</strong> pessoal e ainda compro‑<br />
mete a <strong>de</strong> suas parceiras. A razão? Simples, como revelam,<br />
<strong>de</strong> maneira sutil, os personagens do livro: o macho ‑padrão,<br />
no <strong>mais</strong> profundo <strong>de</strong> seu íntimo, inflado <strong>de</strong> preconceitos,<br />
recusa ‑se a aceitar a parcela feminina que vive <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong><br />
cada homem.<br />
Partindo <strong>de</strong>ssa premissa, O homem lésbico se <strong>de</strong>sen‑<br />
volve numa narrativa ágil e hábil, que entrelaça a história<br />
<strong>de</strong> doze mulheres, ao longo <strong>de</strong> sessenta <strong>anos</strong>, começando<br />
no bairro paulistano da Bela Vista e se espichando até a<br />
Londres dos dias atuais, sempre fustigando com vara curta<br />
a onça do machismo, pren<strong>de</strong>ndo o leitor como visgo e<br />
envolvendo ‑o até a última página.<br />
Numa estrutura ficcional impecável, escrito em lingua‑<br />
gem harmoniosa e simples, intercalado <strong>de</strong> reflexões singe‑<br />
las, que não <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> ser profundas, o romance se espraia<br />
em situações gozadas e trágicas, imprevistos e emoções,<br />
sugerindo, sem nenhum tom <strong>de</strong> conselheiro sentimental ou<br />
reflexão do tipo autoajuda, como o homem contemporâ‑<br />
neo po<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver uma forma <strong>de</strong> afeto a<strong>de</strong>quada à<br />
sensibilida<strong>de</strong> feminina, sem per<strong>de</strong>r a sua masculinida<strong>de</strong>.<br />
Um livro provocativo, mas sem nada <strong>de</strong> hostil. Os machões<br />
po<strong>de</strong>m dormir sossegados.<br />
E s t a n t E G l o b a l<br />
95
PÁSSAROS GRANDES<br />
NÃO CANTAM<br />
Luíz Horácio<br />
1 a edição – 224 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1500 ‑5<br />
O novo romance brasileiro está cheio <strong>de</strong> surpresas. Boas<br />
surpresas. De repente, numa livraria qualquer, o leitor toma<br />
ao acaso uma <strong>de</strong>ssas obras, começa a lê ‑la e sente ‑se fis‑<br />
gado. Não consegue <strong>mais</strong> parar, dominado pela curiosida<strong>de</strong><br />
e o prazer da leitura. Esse é, certamente, o melhor elogio que<br />
se possa fazer a uma obra <strong>de</strong> ficção. É o caso <strong>de</strong> quem se<br />
aventurar nas páginas <strong>de</strong> Pássaros gran<strong>de</strong>s não cantam.<br />
Localizado na região fronteiriça do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul,<br />
o romance <strong>de</strong> Luíz Horácio completa a trilogia iniciada com<br />
Perciliana e o pássaro com alma <strong>de</strong> cão, a que se seguiu<br />
Nenhum pássaro no céu, cada um <strong>de</strong>les po<strong>de</strong>ndo ser lido<br />
como obra in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte.<br />
Formado por várias histórias que se entrelaçam, essa<br />
saga dos pampas revela uma percepção extremamente sen‑<br />
sível da cruelda<strong>de</strong> do mundo em contraponto com a capa‑<br />
cida<strong>de</strong> e a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> amar do ser humano. Romance<br />
telúrico, a natureza não <strong>de</strong>sempenha nele apenas o papel<br />
<strong>de</strong> cenário, <strong>de</strong> pano <strong>de</strong> fundo para o <strong>de</strong>senvolvimento da<br />
trama, mas atua como uma força viva e sempre presente.<br />
Outro aspecto importante da obra é a análise do pre‑<br />
conceito racial, que o autor fustiga em passagens on<strong>de</strong> luci‑<br />
<strong>de</strong>z e sarcasmo se unem <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>molidora.<br />
Rebatendo as mo<strong>de</strong>rnas concepções da teoria literá‑<br />
ria, que proclamam a separação entre o autor e sua obra,<br />
Luíz Horácio faz questão <strong>de</strong> afirmar que está inteiro em sua<br />
obra. “Eu próprio não percebo a distinção quando escrevo<br />
meus livros.”<br />
Mestre em letras, autor <strong>de</strong> roteiros para cinema e do‑<br />
cumentários, Luíz Horácio nasceu em Quaraí, na fronteira<br />
com o Uruguai, viveu em Porto Alegre e no Rio <strong>de</strong> Janeiro,<br />
regressando em seguida à capital gaúcha, mas nunca se<br />
libertando dos pampas, on<strong>de</strong> passou a infância e que <strong>de</strong>‑<br />
sempenha em sua obra um papel quase metafísico, insepa‑<br />
rável da alma gaúcha.<br />
96<br />
e s t a n t e G l o B a l
s é r i e<br />
e s t a n t e P o l i C i a i s<br />
P a u l i s t a n o s<br />
DIREÇÃO<br />
A. P. QUARTIM DE MORAES<br />
A novela policial é um gênero literário universal‑<br />
mente apreciado, que consagrou autores como<br />
Conan Doyle, Agatha Christie, Georges Simenon e<br />
Dashiell Hammet, entre outros. No Brasil, vários es‑<br />
critores se <strong>de</strong>dicam, bisextamente, a escrever histó‑<br />
rias policiais. Mas poucos se consi<strong>de</strong>ram especialistas<br />
no assunto. A série Estante Policiais Paulist<strong>anos</strong> se<br />
propõe a criar um nicho específico para o gênero –<br />
histórias ambientadas na gigantesca e muitas vezes<br />
assustadora metrópole <strong>de</strong> São Paulo – e com isso,<br />
talvez, um novo incentivo tanto à criativida<strong>de</strong> dos<br />
escritores quanto ao interesse dos leitores.<br />
97
AS CORES DO CRIME<br />
Pedro Cavalcanti<br />
1 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1503 ‑6<br />
Durante muito tempo os críticos conservadores pro‑<br />
clamaram ser o romance policial um privilégio dos povos<br />
anglo ‑saxões. As razões alegadas eram muitas. Muitas e<br />
frágeis. Todas elas ruíram com o tempo e o surgimento <strong>de</strong><br />
uma rica literatura policial em países os <strong>mais</strong> diversos.<br />
O Brasil também já conta com uma razoável tradição<br />
no gênero, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as experiências pioneiras (e um tanto in‑<br />
gênuas) <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros e Albuquerque, no início do século<br />
XX, até Luís Lopes Coelho que, na década <strong>de</strong> 1950, <strong>de</strong><br />
certa forma, ressuscitou o gênero entre nós. A partir daí, se<br />
a ficção policial não se impôs <strong>de</strong> maneira avassaladora,<br />
pelo menos criou algumas características bem brasileiras,<br />
que o aficionado do gênero vai logo i<strong>de</strong>ntificar em As cores<br />
do crime, <strong>de</strong> Pedro Cavalcanti, primeiro título da série Es‑<br />
tante Policiais Paulist<strong>anos</strong>.<br />
Ambientado no bairro boêmio <strong>de</strong> Vila Madalena,<br />
As cores do crime evolui com todos os bons ingredientes<br />
do gênero: corrupção, dinheiro <strong>de</strong> origem suspeita, <strong>de</strong>sa‑<br />
parecimentos misteriosos, crimes ao vivo e em cores, <strong>de</strong>le‑<br />
gados in<strong>de</strong>cifráveis, paixão sem limites. Em meio a esse<br />
fogo cruzado, num clima <strong>de</strong> alta voltagem, <strong>de</strong>sfilam perso‑<br />
nagens típicos do bairro e da vida paulistana: mendigos,<br />
guardas <strong>de</strong> rua, frequentadores <strong>de</strong> padarias, <strong>de</strong> bares boê‑<br />
mios e <strong>de</strong> vernissages, on<strong>de</strong> se misturam mecenas, picare‑<br />
tas e artistas fracassados.<br />
Jornalista com larga vivência, correspon<strong>de</strong>nte interna‑<br />
cional da revista Veja em Paris, durante <strong>de</strong>z <strong>anos</strong>, Pedro<br />
Cavalcanti participou como enviado especial <strong>de</strong> três guer‑<br />
ras. Autor <strong>de</strong> dois romances, quatro romances juvenis e<br />
dois livros <strong>de</strong> ensaio, estreia no gênero policial com um<br />
perfeito domínio técnico do gênero, agudo conhecimento<br />
do bicho ‑homem e do ambiente retratado, criando uma<br />
história inesquecível.<br />
98<br />
E s t a n t E P o l i c i a s P a u l i s t a n o s<br />
DAMAS TURCAS<br />
Carlos Castelo<br />
Prelo<br />
Damas turcas é a <strong>mais</strong> nova obra da Estante Policiais<br />
Paulist<strong>anos</strong>, série <strong>de</strong> romances acolhida com excepcional<br />
receptivida<strong>de</strong> popular. A ação se <strong>de</strong>senrola numa São Paulo<br />
chuvosa e enigmática, que aguça o mistério ao criar um<br />
clima semelhante ao dos gran<strong>de</strong>s romances policiais do sé‑<br />
culo XIX e início do XX, nos quais a ambiência exterior é<br />
fundamental na intensificação da atmosfera espiritual.<br />
Aliás, a cida<strong>de</strong> se i<strong>de</strong>ntifica com o <strong>de</strong>senvolvimento da<br />
trama, ultrapassando em muito o papel <strong>de</strong> mero pano <strong>de</strong><br />
fundo. A diversida<strong>de</strong> cultural <strong>de</strong> São Paulo, seu gigantismo,<br />
sua capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> abraçar todas as tendências e abrigar<br />
todas as loucuras, surge <strong>de</strong> forma plena nestas páginas, <strong>de</strong><br />
muita água e sangue <strong>de</strong>rramados.<br />
Escrito em frases curtas e perfurantes, como os golpes<br />
assassinos que povoam suas páginas, Damas turcas narra uma<br />
série <strong>de</strong> homicídios praticados com requintes <strong>de</strong> cruelda<strong>de</strong>. O<br />
incumbido <strong>de</strong> <strong>de</strong>svendá ‑los é um tipo pitoresco, nascido no<br />
interior e absorvido pela cida<strong>de</strong> gran<strong>de</strong>, cujo nome lembra o<br />
dos <strong>de</strong>tetives clássicos britânicos: Douglas Hayashi. Ao seu<br />
redor se move uma fauna curiosa, como o amigo e ex‑<br />
‑publicitário Ruy Levino, o ultrarreligioso investigador Arruda,<br />
a bipolar Rachel, esposa <strong>de</strong> Levino, o branquíssimo cachorro<br />
chamado Preto e um time instigante <strong>de</strong> suspeitos.<br />
Fato importante é que essa talvez seja a primeira obra<br />
na qual um ex ‑publicitário utiliza seus conhecimentos téc‑<br />
nicos para colaborar <strong>de</strong>cisivamente na investigação e solu‑<br />
ção <strong>de</strong> um crime.<br />
Como <strong>de</strong>fine Adilson Xavier no prefácio, “Damas tur‑<br />
cas tem a ver com o famoso jogo em que pedras negras e<br />
brancas se digladiam pela sobrevivência. Tem inteligência e<br />
leveza <strong>de</strong> movimentos. Conduz a leitura em pequenos sal‑<br />
tos diagonais que nos recompensam com a chegada vito‑<br />
riosa às linhas adversárias”.<br />
Prelo<br />
E s t a n t E P o l i c i a s P a u l i s t a n o s
O ASSOBIO DA FOICE<br />
Fernando Pessoa Ferreira<br />
1 a edição – 224 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1515 ‑9<br />
Com um título contun<strong>de</strong>nte e provocativo, como todo<br />
bom romance policial, O assobio da foice não dá um se‑<br />
gundo <strong>de</strong> repouso ao leitor. Quem inicia a sua leitura não<br />
larga <strong>mais</strong> o livro, instigado pela narrativa rápida, pontuada<br />
por crimes misteriosos, aparentemente sem nenhuma liga‑<br />
ção entre si, mas que pistas fortuitas conduzem à suspeita<br />
<strong>de</strong> uma organização criminosa especializada em abreviar a<br />
vida <strong>de</strong> idosos ricos que insistem em frustrar as esperanças<br />
<strong>de</strong> her<strong>de</strong>iros ambiciosos e inescrupulosos.<br />
Ambientado em Vila Madalena, bairro paulistano <strong>de</strong><br />
classe média, no qual a vida boêmia anda a par e passo<br />
com o clima <strong>de</strong> agitação cultural, o romance <strong>de</strong> Fernando<br />
Pessoa Ferreira contraria <strong>de</strong> certa forma a lógica tradicional<br />
do gênero ao apresentar como encarregado das investiga‑<br />
ções um <strong>de</strong>tetive humano, sem a aura <strong>de</strong> herói e a infalibi‑<br />
lida<strong>de</strong> do romance policial consagrado. O investigador<br />
Omar Fonseca aposta em pistas equivocadas, engana ‑se,<br />
mas sempre recupera o fio da meada, até a revelação da<br />
verda<strong>de</strong> brutal, tão peculiar à nossa época.<br />
Durante as investigações, surge uma fauna pitoresca,<br />
personagens disparatadas, mas “amarradas pelo fio <strong>de</strong><br />
uma impecável lógica”, como observa Pedro Cavalcanti.<br />
Fernando Pessoa Ferreira, jornalista, poeta e contista,<br />
estreou na ficção policial em 2005 com o romance Os <strong>de</strong>‑<br />
mônios morrem duas vezes. O êxito da obra incentivou ‑o a<br />
prosseguir no gênero. O assobio da foice, que integra a<br />
série Estante Policiais Paulist<strong>anos</strong>, foi concluído pouco an‑<br />
tes da morte do autor, em maio <strong>de</strong> 2010. Como observa<br />
Ruy Castro, os seus leitores “terão <strong>de</strong> passar sem as inúme‑<br />
ras histórias que ele ainda tinha para escrever, cheias <strong>de</strong><br />
humor, ação, observação psicológica e compaixão pelo ser<br />
humano. E <strong>de</strong> um profundo amor pelas mulheres – como<br />
ele, na vida real”.<br />
E s t a n t E P o l i c i a s P a u l i s t a n o s<br />
O PERSEGUIDOR<br />
Tom Figueiredo<br />
1 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1557 ‑9<br />
Com O perseguidor, a série Estante Policiais Paulista‑<br />
nos revela ao público um novo e excelente contador <strong>de</strong><br />
histórias policiais. Depois <strong>de</strong> uma longa carreira como jor‑<br />
nalista e publicitário, o paulistano Antonio José <strong>de</strong> Figuei‑<br />
redo, que se assina Tom Figueiredo, <strong>de</strong>scobriu o seu talento<br />
para o gênero que consagrou Agatha Christie, Edgar<br />
Wallace, Simenon e tantos outros.<br />
Nascia, assim, um novo herói brasileiro, o jovem e<br />
inexperiente repórter policial Cândido Gomes, incumbido<br />
<strong>de</strong> acompanhar um misterioso crime que excitou a opinião<br />
pública da cida<strong>de</strong>. O lado <strong>mais</strong> chocante e sensacional<br />
<strong>de</strong>sse mistério era a foto da cabeça <strong>de</strong> um morto, numa<br />
posição insólita, que havia sido obtida por um fotógrafo do<br />
jornal, antes <strong>de</strong> a polícia <strong>de</strong>sfazer o cenário do crime.<br />
Com este trunfo na mão, o redator ‑chefe resolve ex‑<br />
plorar o mistério a qualquer custo. O fato é <strong>de</strong> domínio<br />
público, mas os <strong>de</strong>talhes não. Ele conta ainda, em relação<br />
aos concorrentes, com outra vantagem: as suas relações<br />
com a polícia e, sobretudo, com o irmão da vítima.<br />
Incumbido <strong>de</strong> escrever a matéria sobre o enigmático<br />
caso, Cândido Gomes põe ‑se em campo. A inexperiência é<br />
compensada por uma mania que vinha da infância: a <strong>de</strong><br />
perseguir as pessoas. O que antes era apenas um compor‑<br />
tamento quase inofensivo revela ‑se um traço essencial em<br />
sua ativida<strong>de</strong>.<br />
Envolvido na trama, o jovem repórter <strong>de</strong>scobre que<br />
perseguir significa também perseguir ‑se e <strong>de</strong>scobrir a si<br />
mesmo em meio ao duro processo <strong>de</strong> uma investigação<br />
criminal. O <strong>de</strong>senvolvimento da trama revela também os<br />
bastidores <strong>de</strong> uma redação <strong>de</strong> jornal popular, on<strong>de</strong> a neces‑<br />
sida<strong>de</strong> permanente <strong>de</strong> dar furos <strong>de</strong> reportagem para au‑<br />
mentar as vendas acaba eliminando qualquer escrúpulo<br />
profissional.<br />
E s t a n t E P o l i c i a s P a u l i s t a n o s<br />
99
C o l e ç ã o<br />
F o r t u n a C r í t i C a<br />
100<br />
Ciente da importância <strong>de</strong> oferecer ao público as<br />
melhores produções literárias da língua portuguesa,<br />
a <strong>Global</strong> <strong>Editora</strong> criou a coleção Fortuna Crítica.<br />
Com reedições cuidadosas <strong>de</strong> clássicos da literatura<br />
brasileira, esta coleção certamente irá agradar aos<br />
apreciadores da boa literatura, além <strong>de</strong> auxiliar na<br />
formação <strong>de</strong> estudantes, que nela encontrarão um<br />
material com conteúdo confiável e abragente <strong>de</strong> es‑<br />
tudo. Cada volume da coleção Fortuna Crítica apre‑<br />
senta um texto introdutório sobre a obra, escrito por<br />
um renomado estudioso <strong>de</strong> literatura, e uma breve<br />
biografia <strong>de</strong> seu autor.
I JUCA PIRAMA<br />
E OS TIMBIRAS<br />
Gonçalves Dias<br />
Prelo<br />
Consi<strong>de</strong>rado por muitos o maior poeta brasileiro <strong>de</strong><br />
todos os tempos, Gonçalves Dias foi, com certeza, o maior<br />
dos nossos românticos, o primeiro a fixar em poesia, com<br />
alta qualida<strong>de</strong> artística, as sugestões do ambiente brasileiro<br />
e as tradições indígenas. Foi também insuperável poeta lí‑<br />
rico, autor <strong>de</strong> alguns dos <strong>mais</strong> belos poemas <strong>de</strong> amor da<br />
língua portuguesa, como o pungente “Ainda uma vez,<br />
a<strong>de</strong>us...”, e versejador à maneira medieval nas baladas reu‑<br />
nidas nas Sextilhas <strong>de</strong> Frei Antão. Em todos esses aspectos<br />
foi insuperável. Por qualquer caminho que passasse, <strong>de</strong>i‑<br />
xava um facho <strong>de</strong> luz eterna.<br />
Criador do Indianismo <strong>de</strong>ntro do movimento român‑<br />
tico, com as suas “Poesias americanas”, nelas Gonçalves<br />
Dias apresentava as lendas e os mitos dos índios, seus amo‑<br />
res, dramas, conflitos, o áspero processo <strong>de</strong> aproximação e<br />
fusão com o branco, um mundo repleto <strong>de</strong> significados<br />
simbólicos, nos quais se i<strong>de</strong>ntificava a autêntica alma bra‑<br />
sileira, ainda livre das influências da cultura oci<strong>de</strong>ntal.<br />
Como observa Cassiano Ricardo, o Indianismo <strong>de</strong><br />
Gonçalves Dias “nada tem que ver com o Romantismo eu‑<br />
ropeu” nem se acha ligado à mitificação do indígena, pelo<br />
contrário, ele “substitui a i<strong>de</strong>ologia pela realida<strong>de</strong> humana<br />
do índio”.<br />
É essa posição que transmite uma palpitação perma‑<br />
nente <strong>de</strong> vida à obra indianista do poeta. Nesta tradição, com‑<br />
pôs alguns <strong>de</strong> seus <strong>mais</strong> belos poemas, como “Marabá”,<br />
“Canção do tamoio”, “I ‑Juca Pirama” e “Os Timbiras”.<br />
“I ‑Juca Pirama”, que em idioma tupi significa “aquele<br />
que <strong>de</strong>ve morrer”, é consi<strong>de</strong>rado uma obra ‑prima da poe‑<br />
sia brasileira, “como composição poética integral, notável<br />
pelo argumento humano, pela carga lírica que encerra,<br />
pela linguagem em que foi expresso, pela varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
ritmo” (Cassiano Ricardo). Do poema épico “Os Timbiras”,<br />
só foram publicados os quatro primeiros cantos.<br />
Prelo<br />
F o r t u n a C r í t i C a<br />
O CORUJA<br />
Aluísio Azevedo<br />
2 a edição – 304 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1305 ‑6<br />
Maior figura do nosso Naturalismo, Aluísio Azevedo<br />
<strong>de</strong>ixou duas obras ‑primas do romance brasileiro, Casa <strong>de</strong><br />
pensão (1884) e O cortiço (1890), as quais têm em comum<br />
o fato <strong>de</strong> colocarem muita gente em cena, resultando a<br />
ação “não do <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> uma personagem, mas<br />
da coexistência <strong>de</strong> várias, <strong>mais</strong> apreciadas nas suas relações<br />
do que na sua vida interior” (Lúcia Miguel Pereira).<br />
Situado, cronologicamente, entre estas duas obras, O<br />
coruja (1889) afasta ‑se <strong>de</strong>las pela intenção e pelo <strong>de</strong>senvol‑<br />
vimento. Nela, Aluísio Azevedo tentou o estudo psicológico<br />
<strong>de</strong> um sujeito triste e sem sorte, um caipora, na linguagem<br />
da época, dizem que inspirado na figura do historiador Ca‑<br />
pistrano <strong>de</strong> Abreu, mas sem <strong>de</strong>scurar da análise da socie‑<br />
da<strong>de</strong> brasileira. É evi<strong>de</strong>nte que o autor buscava novas<br />
perspectivas para sua arte. Assim, ao contrário <strong>de</strong> seus <strong>de</strong>‑<br />
<strong>mais</strong> livros, há um mínimo <strong>de</strong> <strong>de</strong>scrições, a narração é<br />
parca, quase toda a ação se <strong>de</strong>senrola mediante diálogos.<br />
O clima do livro é sombrio, com predomínio do pessimismo<br />
angustiante <strong>de</strong> Schopenhauer.<br />
Como uma peça teatral, o livro divi<strong>de</strong> ‑se em três par‑<br />
tes, po<strong>de</strong> ‑se dizer três atos, unidos pela presença perturba‑<br />
dora e inquietante do personagem central. A primeira<br />
apresenta a vida <strong>de</strong> um internato, que lembra as cenas<br />
<strong>de</strong>scritas <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong> por Raul Pompeia, em O Ateneu. A<br />
segunda se <strong>de</strong>senrola numa pensão, preparando o grand<br />
finale da terceira parte.<br />
Des<strong>de</strong> seu lançamento, O coruja foi recebido <strong>de</strong> ma‑<br />
neira contraditória pela crítica. Um intelectual do porte <strong>de</strong><br />
Alci<strong>de</strong>s Maia alertou para a significação do livro, na obra<br />
<strong>de</strong> Aluísio e no quadro da literatura brasileira, afirmando<br />
que em sua estranha e doentia personagem central há uma<br />
criatura <strong>de</strong> arte que roça pelo símbolo e não tem rival no<br />
romance brasileiro. A última palavra cabe ao leitor.<br />
F o r t u n a C r í t i C a<br />
101
O NAVIO NEGREIRO<br />
Castro Alves<br />
1 a edição – 32 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1308 ‑7<br />
Milagre da poesia! Nascido há <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 150 <strong>anos</strong> (em<br />
1847), o moço Antonio Fre<strong>de</strong>rico <strong>de</strong> Castro Alves continua<br />
presente no cotidiano – o cotidiano poético – <strong>de</strong> milhares <strong>de</strong><br />
brasileiros. O <strong>mais</strong> romântico e apaixonado <strong>de</strong> todos os ro‑<br />
mânticos brasileiros, a figura humana <strong>mais</strong> fascinante do<br />
nosso Romantismo, libertário, precursor do amor livre, sempre<br />
apaixonado, i<strong>de</strong>alista e sonhador, morto em plena juventu<strong>de</strong><br />
gloriosa, aos 24 <strong>anos</strong>, Castro Alves foi como um furacão, uma<br />
força da natureza, um milagre. Milagre da poesia!<br />
Poeta lírico e social, <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> poemas ainda<br />
hoje <strong>de</strong>corados e <strong>de</strong>clamados pelos amantes da poesia.<br />
Quem não se arrepia com aqueles versos palpitantes <strong>de</strong><br />
sensualida<strong>de</strong> que assim começam: “Boa noite, Maria! Eu<br />
vou ‑me embora./ A lua nas janelas bate em cheio./ Boa<br />
noite, Maria! É tar<strong>de</strong>... É tar<strong>de</strong>.../ Não me apertes assim<br />
contra teu seio”?. Apaixonado pelo eterno feminino,<br />
amante insaciável, Castro Alves foi também um homem<br />
generoso, um apóstolo da igualda<strong>de</strong> dos direitos hum<strong>anos</strong>,<br />
o primeiro gran<strong>de</strong> poeta social da literatura brasileira.<br />
Esse aspecto <strong>de</strong> sua obra se afirma em seus poemas<br />
abolicionistas, escritos numa época em que a libertação do<br />
escravo era apenas um vago projeto <strong>de</strong> sonhadores, uma<br />
utopia. Desse ciclo poético, patético e doloroso, regado ao<br />
sangue do cativo (“Cai orvalho do sangue do escravo,/ Cai<br />
orvalho na face do algoz/ Cresce, cresce, seara vermelha,/<br />
Cresce, cresce, vingança feroz”) sobressai “O navio ne‑<br />
greiro”, subtitulado “Tragédia no mar”, “o maior aconte‑<br />
cimento <strong>de</strong> nossa poesia”, para Agripino Grieco, o símbolo<br />
<strong>mais</strong> forte na literatura brasileira do sofrimento do escravo<br />
e que mantém, ainda hoje, “o mesmo frescor <strong>de</strong> ontem”,<br />
como observa André Seffrin no prefácio ao volume, enri‑<br />
quecido com sugestivas ilustrações <strong>de</strong> Hansen Bahia.<br />
102<br />
F o r t u n a C r í t i C a<br />
VÁRIAS HISTÓRIAS<br />
Machado <strong>de</strong> Assis<br />
Prelo<br />
Publicado em 1895, Várias histórias representa um<br />
dos momentos culminantes da história do conto brasileiro<br />
e da evolução artística <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis. Tendo ‑se ini‑<br />
ciado no gênero ainda na adolescência, com “Três tesouros<br />
perdidos” (1858), o escritor carioca se <strong>de</strong>dicou à história<br />
curta, sobretudo, a partir <strong>de</strong> 1864, quando passou a cola‑<br />
borar no Jornal das Famílias.<br />
A libertação <strong>de</strong> um certo convencionalismo e a afirma‑<br />
ção da inconfundível maneira machadiana – leve, maliciosa,<br />
irônica, cheia <strong>de</strong> subentendidos, realçada por um estilo <strong>de</strong><br />
sabor clássico, significando sua plena maturida<strong>de</strong> artística – se<br />
afirmam com a publicação <strong>de</strong> Papéis avulsos (1882), que está<br />
para a obra do contista como Memórias póstumas <strong>de</strong> Brás<br />
Cubas estão para a do romancista, tornando visível o extraor‑<br />
dinário salto qualitativo em relação aos trabalhos anteriores.<br />
Em Várias histórias, as qualida<strong>de</strong>s artísticas do contista<br />
estão no auge, <strong>de</strong>puradas e filtradas, jorrando para a se<strong>de</strong> do<br />
leitor como pura água <strong>de</strong> fonte. O livro reúne <strong>de</strong>zesseis traba‑<br />
lhos, dos quais pelo menos uma dúzia ou <strong>mais</strong> po<strong>de</strong>m ser<br />
consi<strong>de</strong>rados obras ‑primas da literatura brasileira e universal,<br />
contos que figuram entre o que <strong>de</strong> melhor se escreveu no<br />
gênero, em todas as épocas e países, obras <strong>de</strong> “um pensador<br />
para quem a alma humana não tem segredos” (Olavo Bilac).<br />
A pesquisa em busca dos segredos da alma humana,<br />
por vezes um tanto cruel e dolorosa, mesclada a um certo<br />
cinismo e a um corrosivo sentimento <strong>de</strong> <strong>de</strong>scrença, marcam<br />
a ferro e fogo o leitor <strong>de</strong> trabalhos como “A cartomante”,<br />
“Uns braços”, “A <strong>de</strong>sejada das gentes”, “A causa secreta”,<br />
“O enfermeiro”, “O diplomático”, “Conto <strong>de</strong> escola”, “D.<br />
Paula”, “O Cônego ou a metafísica do estilo”, nos quais<br />
não se sabe o que <strong>mais</strong> admirar, se a perfeição artística ou<br />
o conhecimento da alma humana.<br />
Prelo<br />
F o r t u n a C r í t i C a
C o l e ç ã o<br />
l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a<br />
DIREÇÃO<br />
ELEÍLSON LEITE<br />
Escritas por autores que moram ou têm origem nas<br />
periferias das gran<strong>de</strong>s cida<strong>de</strong>s do Brasil, e que fre‑<br />
quentam seus saraus, núcleos culturais, oficinas e<br />
ONGs, as obras da coleção Literatura Periférica têm<br />
<strong>de</strong>spertado o interesse <strong>de</strong> um público cada vez <strong>mais</strong><br />
amplo; um público sintonizado com o que há <strong>de</strong><br />
novo e interessante na mo<strong>de</strong>rna ficção brasileira.<br />
Além <strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrarem inegável qualida<strong>de</strong> literária,<br />
essas obras apresentam ao leitor, na forma <strong>de</strong><br />
poema, conto, romance e peça <strong>de</strong> teatro, uma lite‑<br />
ratura que expõe com muita indignação os proble‑<br />
mas sociais da vida nas metrópoles, sem <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong><br />
lado boa dose <strong>de</strong> humor e lirismo.<br />
103
A RIMA DENUNCIA<br />
GOG<br />
1 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1420 ‑6<br />
A rima <strong>de</strong>nuncia reúne textos diversos do rapper Ge‑<br />
nival Oliveira Gonçalves, aliás GOG, que, segundo o prefa‑<br />
ciador do volume, Pedro Alexandre Sanches, indicam “a<br />
hora em que o rap se vale da tinta e do pergaminho para<br />
inscrever e sedimentar sua marca na cultura dita oficial <strong>de</strong><br />
seu (nosso) país”.<br />
Os raps apresentados no livro são <strong>de</strong> um poeta popular<br />
que se orgulha <strong>de</strong> suas origens e se i<strong>de</strong>ntifica para o leitor<br />
com o seguinte cartão <strong>de</strong> visitas: “Vamos falar, cara/ em<br />
<strong>de</strong>talhes, propostas, verda<strong>de</strong>s/ que precisam ser ditas/ somos<br />
das ruas e trazemos a você/ nosso cartão <strong>de</strong> visitas”.<br />
De acordo com suas próprias palavras, GOG se empe‑<br />
nha em “questionar a socieda<strong>de</strong> e suas instituições: polícia,<br />
imprensa, família, formadores <strong>de</strong> opinião. Meu ponto <strong>de</strong><br />
vista é o <strong>de</strong> alguém que percebe, inconformado, a lógica<br />
perversa <strong>de</strong>ssas instituições” e se empenha em <strong>de</strong>nunciar<br />
a dura realida<strong>de</strong> cotidiana enfrentada pelo pobre, o analfa‑<br />
beto, o negro: “Entre os que morrem precocemente/ quan‑<br />
tos são da cor da gente?”; “pesquisa publicada prova!/<br />
preferencialmente preto, pobre, prostituta,/ pra polícia<br />
pren<strong>de</strong>r/ pare, pense.../ – por quê?”; “os livros raramente<br />
contam os verda<strong>de</strong>iros fatos”.<br />
São esses fatos que o rapper GOG apresenta em seus<br />
poemas musicados reunidos em A rima <strong>de</strong>nuncia, volume<br />
que, segundo Pedro Alexandre Sanches, pelo aspecto pu‑<br />
ramente artístico, permitem conferir a evolução do poeta<br />
(“como seu discurso e seus versos foram se aprimorando e<br />
afinando”) e “oferece a rara oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estabelecer<br />
uma reflexão crítica sobre o <strong>de</strong>senvolvimento do gênero (o<br />
rap) e seus <strong>de</strong>sdobramentos na vida cotidiana do país, das<br />
periferias ao centros”, através da voz <strong>de</strong> um artista da pe‑<br />
riferia, orgulhoso <strong>de</strong> sê ‑lo.<br />
104<br />
l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a<br />
CELA FORTE<br />
Luiz Alberto Men<strong>de</strong>s<br />
Prelo<br />
Luiz Alberto Men<strong>de</strong>s é um caso à parte na literatura bra‑<br />
sileira. Antigo interno do sistema carcerário, <strong>de</strong>scobriu o<br />
po<strong>de</strong>r da palavra escrita na prisão. A partir daí, nunca <strong>mais</strong><br />
parou <strong>de</strong> escrever. Pura catarse. Seu primeiro livro, o romance<br />
Memórias <strong>de</strong> um sobrevivente, publicado em 2001, surpreen‑<br />
<strong>de</strong>u pela maneira direta e ru<strong>de</strong> <strong>de</strong> narrar a realida<strong>de</strong>, sem<br />
floreios. O sucesso confirmou que o escritor estava no cami‑<br />
nho certo. Vieram outras obras, com igual receptivida<strong>de</strong>.<br />
Cela forte, publicado na coleção “Literatura perifé‑<br />
rica”, reafirma as qualida<strong>de</strong>s do autor, agora <strong>de</strong>puradas<br />
pela experiência. Num clima <strong>de</strong>nso e <strong>de</strong>sesperançado,<br />
Men<strong>de</strong>s <strong>de</strong>scerra novos aspectos <strong>de</strong> uma realida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sa‑<br />
gradável, contun<strong>de</strong>nte, ferina como um punhal, mas viva e<br />
palpitante, extraída <strong>de</strong> sua vivência pessoal.<br />
O livro reúne vinte e seis contos passados <strong>de</strong>ntro e fora<br />
da prisão, sempre retratando o mundo dos marginalizados.<br />
São bandidos endurecidos, policiais i<strong>de</strong>m, homens <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>n‑<br />
tes, falsos valentes, adolescentes <strong>de</strong>scobrindo o sexo, heróis<br />
duvidosos, puxando cana, sequestrando, mendigando. He‑<br />
róis sem heroísmo do submundo, <strong>de</strong> cujas aventuras, por<br />
vezes, o autor extrai uma poesia perturbadora.<br />
Na apresentação, intitulada “Um escritor <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>”,<br />
Marcelino Freire conta como, ao tomar conhecimento da<br />
escrita <strong>de</strong> Men<strong>de</strong>s, comprovou “como a literatura serve<br />
para <strong>de</strong>senclausurar fantasmas, soltar os <strong>de</strong>mônios do<br />
peito. Sem medo. Misturar realida<strong>de</strong> e ficção. Melhor<br />
acerto <strong>de</strong> contas não há”.<br />
O velho Erasmo <strong>de</strong> Roterdã, ao escrever o Elogio da<br />
loucura, sugeriu a loucura irremediável <strong>de</strong> toda a humani‑<br />
da<strong>de</strong>. Luiz Alberto Men<strong>de</strong>s, através <strong>de</strong> seus personagens,<br />
vivendo na ca<strong>de</strong>ia ou livres, mas sempre aprisionados e per‑<br />
seguidos por preconceitos e convenções, parece acreditar<br />
que todos nós somos prisioneiros. Vivendo numa cela forte.<br />
Prelo<br />
l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a
COLECIONADOR<br />
DE PEDRAS<br />
Sérgio Vaz<br />
1 a edição – 168 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1222 ‑6<br />
Colecionar pedras po<strong>de</strong> ser apenas um hobby, mas<br />
saber atirá ‑las, com precisão, é uma arte. Sobretudo quando<br />
se trata <strong>de</strong> pedras em forma <strong>de</strong> poemas, mas nem por isso<br />
menos contun<strong>de</strong>ntes e ferinos. “As pedras não falam, mas<br />
quebram vidraças”, prega Sérgio Vaz. A metáfora é clara.<br />
Com ela, o poeta indica o essencial <strong>de</strong> sua poesia: poemas<br />
atirados como pedradas contra as convenções sociais, as hi‑<br />
pocrisias, os preconceitos. Atiradas com mão precisa e insis‑<br />
tente. De quem nunca vai <strong>de</strong>sistir <strong>de</strong> cantar. “Se outros poetas<br />
pe<strong>de</strong>m silêncio, ele pe<strong>de</strong> <strong>mais</strong> barulho. Se outros escritores<br />
pe<strong>de</strong>m paz, ele quer é guerra”, como diz Ferréz no prefácio.<br />
Barulho e guerra são justificáveis e úteis para <strong>de</strong>nun‑<br />
ciar as misérias e a dura realida<strong>de</strong> do cotidiano da periferia,<br />
como essa pedrada: “Quatro jovens/ morreram na chacina/<br />
do fim da rua./ Conforme a notícia,/ dois <strong>de</strong>les tinham pas‑<br />
sagem./ Os outros dois/ foram assim mesmo.../ clan<strong>de</strong>stina‑<br />
mente.”. Ou esta outra, intitulada “Bala perdida”: “Um<br />
homem/ caído sobre as garrafas/ guardava na memória/<br />
uma bala./ O garoto/ com o olhar caído sobre o homem/<br />
guardava na memória/ a primeira vala.”.<br />
Mas o poeta tem também seu lado lírico e sentimental<br />
que nenhuma guerra consegue <strong>de</strong>struir: “Sonia/ tem o<br />
sono frágil,/ acorda com o barulho dos meus sonhos./ Ma‑<br />
riana/ dorme com anjos,/ não escuta nada./ Eu/ durmo com<br />
os olhos abertos,/ sou coruja.”.<br />
Poeta da periferia e agitador cultural, Sérgio Vaz vive<br />
em Taboão da Serra, na Gran<strong>de</strong> São Paulo, tem quatro li‑<br />
vros publicados, sendo o i<strong>de</strong>alizador da Cooperifa (Coope‑<br />
rativa Cultural da Periferia), evento que transformou um<br />
bar da periferia <strong>de</strong> São Paulo em centro cultural, e criador<br />
do projeto Poesia contra a Violência, que percorre as esco‑<br />
las da periferia incentivando a leitura e a criação poética<br />
como instrumento <strong>de</strong> arte e cidadania.<br />
l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a<br />
DA CABULA<br />
Allan da Rosa<br />
1 a edição – 96 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1280 ‑6<br />
Vencedor do II Prêmio Nacional <strong>de</strong> Dramaturgia Negra<br />
Ruth <strong>de</strong> Souza, ora incorporada à coleção Literatura Perifé‑<br />
rica, Da Cabula, com o subtítulo provocativo <strong>de</strong> “Istória pa<br />
tiatru”, surge para inquietar, reivindicar, contestar, <strong>de</strong>nun‑<br />
ciar o egoísmo e a hipocrisia da socieda<strong>de</strong>.<br />
A peça tem o timbre da própria voz da periferia, com<br />
os seus gritos <strong>de</strong> protesto e seus cantos <strong>de</strong> esperança,<br />
<strong>de</strong>senrolando ‑se como um drama, <strong>mais</strong> um drama, do co‑<br />
tidiano, <strong>de</strong>ntro da cida<strong>de</strong> imensa, que po<strong>de</strong> ser São Paulo,<br />
Rio <strong>de</strong> Janeiro ou qualquer outra. A localização precisa não<br />
é importante.<br />
O importante é a preocupação do autor <strong>de</strong> que o ter‑<br />
ritório da cida<strong>de</strong> só pertence ao povo “quando ele vai ali<br />
cumprir a sua rotina <strong>de</strong> trabalho. Fora <strong>de</strong>sse tempo, o su‑<br />
jeito da periferia é visto como um ser in<strong>de</strong>sejado.” (Concei‑<br />
ção Evaristo).<br />
Neste cenário hostil, <strong>de</strong>senrola ‑se a história <strong>de</strong> Dona<br />
Filomena da Cabula, uma empregada doméstica ansiosa<br />
por aumentar seus horizontes espirituais e que <strong>de</strong>para com<br />
uma dura e <strong>de</strong>vastadora realida<strong>de</strong>, preconceito social e ra‑<br />
cial (“Eu sou uma negra forra?... É, pelo menos larguei a<br />
íngua da casa ‑gran<strong>de</strong>.”), duras barreiras impostas <strong>de</strong> cima<br />
para baixo, levando ‑a a elaborar para si uma outra história,<br />
baseada em valores ancestrais, que a levam ao sonho.<br />
Como sintetizou Nei Lopes, no prefácio à peça, “o texto<br />
<strong>de</strong> Allan da Rosa quer e consegue dinamitar e implodir as<br />
torres <strong>de</strong>sta socieda<strong>de</strong> exclu<strong>de</strong>nte. E o faz com as flores ver‑<br />
melhas <strong>de</strong> seus versos, frases, diálogos e cenas, como neste<br />
Da Cabula. E é assim que sua fervorosa e vigorosa arte cami‑<br />
nha para transcen<strong>de</strong>r a periferia e chegar aos gran<strong>de</strong>s palcos,<br />
com as bênçãos até mesmo do dúbio <strong>de</strong>us mercado – boi<br />
feito para ser comido, ‘com chifre e tudo’”.<br />
l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a<br />
105
DE PASSAGEM MAS<br />
NÃO A PASSEIO<br />
Dinha<br />
1 a edição – 144 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1328 ‑5<br />
O vento da poesia sopra on<strong>de</strong> quer. Em Paris, Teguci‑<br />
galpa ou no Parque Bristol, bairro da periferia <strong>de</strong> São Paulo,<br />
on<strong>de</strong> vive a autora <strong>de</strong> De passagem mas não a passeio, a<br />
cearense Maria Nilda <strong>de</strong> Carvalho Mota, a Dinha. Vive e<br />
verseja com aquela garra peculiar ao nor<strong>de</strong>stino, fazendo<br />
<strong>de</strong> sua mensagem poética “uma trincheira <strong>de</strong> palavras,<br />
mas uma trincheira lírica”, como observa Elisa Lucinda.<br />
O lirismo <strong>de</strong> seus versos adoça e atenua o espírito<br />
combativo <strong>de</strong> Dinha, que há <strong>de</strong>z <strong>anos</strong> vem publicando fan‑<br />
zines <strong>de</strong> poesia, divulgando seus versos <strong>de</strong> forma oral pela<br />
comunida<strong>de</strong> e participando <strong>de</strong> movimentos <strong>de</strong> impulso ao<br />
<strong>de</strong>senvolvimento cultural, econômico e social, integrada<br />
em espírito e verda<strong>de</strong> à região em que vive.<br />
Mas engana ‑se “quem quiser transformar a literatura<br />
marginal ou periférica da Dinha em objeto intelectual folcló‑<br />
rico <strong>de</strong> consumo, em uma maneira pitoresca <strong>de</strong> fazer um<br />
‘contato seguro’ (como ela mesma diz) com aquele <strong>de</strong>sam‑<br />
paro do estado e da pátria” (Elisa Lucinda). A sua poesia,<br />
quase sempre dura (“De aqui, <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro da guerra/ não tem<br />
DIU nem camisinha/ que te proteja da estúpida reprodução/<br />
da fome, da miséria, da ínfima estrutura/ que abafa o cantar<br />
das favelas/ – antigas senzalas mo<strong>de</strong>rnas –/ cemitério geral das<br />
pessoas”), chegando por vezes ao extremo da revolta (“Na<br />
favela on<strong>de</strong> vivi, o barraco/ É <strong>de</strong> quem mora. A horta/ É <strong>de</strong><br />
quem planta. Dignida<strong>de</strong>/ De quem tem armas. Ou insiste. Ou<br />
canta./ Frutos e galinhas foram sempre/ <strong>de</strong> quem conseguiu<br />
comer.../ No momento estou criando armas...”), revela ‑se<br />
também ansiosa pelo amor, um amor talvez um tanto áspero<br />
(“Eu quero te dar/ um tapa tão louco/ que imprima meu <strong>de</strong>s‑<br />
tino/ na lisura do teu rosto./ Um beijo obsceno/ que introduza<br />
o meu sentido/ na ternura do teu senso. Um poema egoísta/<br />
que inclua a tua vida/ em minha vida/ em minha rima/ em<br />
minha sina.”), mas marcante. Como um tapa na cara.<br />
106<br />
l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a<br />
GUERREIRA<br />
Alessandro Buzo<br />
2 a edição – 120 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1224 ‑0<br />
A periferia tem muitas vozes. Líricas, revoltadas, agres‑<br />
sivas, provocativas, conciliadoras, conformistas, por vezes<br />
uma mistura perturbadora disso tudo. Vozes que falam<br />
cada vez <strong>mais</strong> alto, querendo ser ouvidas. E que se expres‑<br />
sam em poemas, peças teatrais, ficção, quase sempre igno‑<br />
radas pela crítica, mas que trazem um vigor, uma palpitação,<br />
um grito <strong>de</strong> protesto tão forte quanto a própria vida. Como<br />
essa Guerreira, <strong>de</strong> Alessandro Buzo, que po<strong>de</strong> ser classifi‑<br />
cada <strong>de</strong> romance, novela, <strong>de</strong>núncia. Não importa.<br />
O que importa é que se trata <strong>de</strong> uma literatura produ‑<br />
zida por morador <strong>de</strong> periferia, que sempre foi personagem<br />
<strong>de</strong> escritores que nunca pisaram lá, e agora começa a se<br />
expressar. E a se expressar com contundência, dizendo ver‑<br />
da<strong>de</strong>s duras <strong>de</strong> ouvir e exibindo uma realida<strong>de</strong> suja, vio‑<br />
lenta, incômoda.<br />
Guerreira conta a história <strong>de</strong> uma jovem que co‑<br />
meça como namorada <strong>de</strong> um bandido, torna ‑se mulher<br />
<strong>de</strong> um rapaz rico, <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong> vira cafetina, dona <strong>de</strong> uma<br />
pousada etc.<br />
No prefácio, Marcelino Freire classifica a obra como<br />
“saga ritmada”, narrada em ritmo vertiginoso, numa lingua‑<br />
gem pessoal: “Em um instante, você passeia por toda uma<br />
São Paulo <strong>de</strong>scortinada. Mesmo poluída. No sentido <strong>de</strong> que<br />
dá para ver, nítida, qual a cara crua da cida<strong>de</strong>. Os persona‑<br />
gens perambulando pela Rua do Carmo, pela Praça Clóvis e<br />
Patriarca. Sem contar a viagem que o autor faz i<strong>de</strong>m pelo Rio<br />
<strong>de</strong> Janeiro.”. Livro para ser lido <strong>de</strong> um fôlego.<br />
Morador do Itaim Paulista, na Zona Leste <strong>de</strong> São<br />
Paulo, Alessandro Buzo tem quatro livros publicados, atua<br />
como promotor <strong>de</strong> espetáculos <strong>de</strong> hip ‑hop e repórter da<br />
revista Rap Brasil, subscrevendo uma coluna sobre hip ‑hop<br />
em cinco sites, um <strong>de</strong>les <strong>de</strong> Portugal. A voz da periferia está<br />
chegando longe.<br />
l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a
LITERATURA, PÃO E<br />
POESIA<br />
Sérgio Vaz<br />
1 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1578 ‑4<br />
Poeta da periferia, agitador cultural, Sérgio Vaz é pre‑<br />
sença ativa nas comunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> todo o Brasil, com a apre‑<br />
sentação <strong>de</strong> seus saraus <strong>de</strong> poesia. Autor <strong>de</strong> seis livros <strong>de</strong><br />
poemas, contemplado com diversos prêmios culturais,<br />
eleito pela revista Época uma das cem pessoas <strong>mais</strong> in‑<br />
fluentes do Brasil, ele lança agora seu primeiro livro <strong>de</strong> crô‑<br />
nicas, intitulado Literatura, pão e poesia.<br />
Para a prefaciadora do livro, Heloisa Buarque <strong>de</strong><br />
Hollanda, o título “diz, literalmente, a que veio”. Ou seja,<br />
é uma afirmação da literatura marginal, ou periférica, uma<br />
visão peculiar do mundo a partir do entorno <strong>de</strong> uma me‑<br />
trópole, no caso São Paulo.<br />
Como cronista do cotidiano, que por vezes opta pelo<br />
conto ou a reflexão, Vaz fala – ora em tom <strong>de</strong> poesia, ora<br />
<strong>de</strong> ironia ou revolta – daquilo que o atinge, comove ou ir‑<br />
rita, oferecendo ao leitor notícias <strong>de</strong> um mundo on<strong>de</strong> “os<br />
brutos também amam” (lembrança irônica e comovida <strong>de</strong><br />
seu primeiro amor), os pedreiros constroem casas para os<br />
outros como se fossem seus próprios lares e as domésticas<br />
“não admitem ser domesticadas”, além do fascínio do fu‑<br />
tebol sobre a garotada, <strong>de</strong> malandros e trabalhadores.<br />
Literatura, pão e poesia é também “quase um manual<br />
<strong>de</strong> conduta”, como observa Heloisa, pela insistência para<br />
que as pessoas (os moradores da periferia) não abram mão<br />
do sonho nem da poesia, mas que resistam sempre <strong>de</strong> “pu‑<br />
nhos cerrados que a luta não para”.<br />
Como sintetiza Eliane Brum, “em sua estreia na crônica,<br />
Vaz profana a língua com talento para incluir nela um naco<br />
maior <strong>de</strong> mundo. Tem <strong>de</strong>dos <strong>de</strong> navalha para disfarçar a ter‑<br />
nura do olhar que afaga as entrelinhas. Nos encanta – e às<br />
vezes nos golpeia – com achados <strong>de</strong> linguagem paridos numa<br />
realida<strong>de</strong> on<strong>de</strong> as frases têm <strong>de</strong> ser puxadas pelo pescoço<br />
para não morrer <strong>de</strong> bala perdida antes mesmo <strong>de</strong> existirem”.<br />
l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a<br />
85 LETRAS E<br />
UM DISPARO<br />
Sacolinha<br />
2 a edição – 120 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1223 ‑3<br />
O clima é <strong>de</strong> violência, revolta, inquietação, um re‑<br />
trato direto, duro, sem meias palavras e sem requintes par‑<br />
nasi<strong>anos</strong> da vida dos miseráveis, dos violentos e dos<br />
humilhados, já sugerida no título <strong>de</strong> alguns <strong>de</strong>sses <strong>de</strong>ze‑<br />
nove contos: “Quem tem medo <strong>de</strong> cagar não come!”, “Re‑<br />
flexões <strong>de</strong> um mendigo”, “85 letras e um disparo”.<br />
O conteúdo não <strong>de</strong>smente os títulos. “O aluno que só<br />
queria cabular uma aula” mostra a revolta <strong>de</strong> um garoto<br />
contra a escola, na qual vê um lugar <strong>de</strong> opressão; “Quem<br />
tem medo <strong>de</strong> cagar não come!” apresenta uma série <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>sastres; “Degradação” penetra nos pensamentos <strong>de</strong> um<br />
policial expulso da corporação, à espera <strong>de</strong> um bico para<br />
sobreviver e saudoso <strong>de</strong> “extorsão, torturas, tapas na cara,<br />
mulheres fáceis, cocaína, mordomias”; “Eu, prostituta?”<br />
expõe os pensamentos <strong>de</strong> revolta <strong>de</strong> uma profissional do<br />
sexo, com uma longínqua esperança <strong>de</strong> vida nova.<br />
Os personagens <strong>de</strong> Sacolinha são frustrados, revolta‑<br />
dos, marginalizados, sem esperanças e sem horizontes, vi‑<br />
vendo ao <strong>de</strong>us ‑dará, “imersos na violência, <strong>de</strong> tal modo que<br />
a violência per<strong>de</strong>u o sentido” (Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão).<br />
Como reconhece Moacyr Scliar, “a maior qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Sacolinha é sua espontaneida<strong>de</strong>. A linguagem ficcional brota<br />
<strong>de</strong>le naturalmente, sem frescuras, sem pretensões a gran<strong>de</strong><br />
literatura, ainda que ele seja influenciado por muitos bons<br />
autores. E esta espontaneida<strong>de</strong>, esta autenticida<strong>de</strong> são dig‑<br />
nas <strong>de</strong> admiração”.<br />
Esta é a segunda edição <strong>de</strong> 85 letras e um disparo,<br />
lançado em 2006, com excelente receptivida<strong>de</strong>. Sacolinha<br />
é o pseudônimo – seria melhor dizer o nome <strong>de</strong> guerra – <strong>de</strong><br />
A<strong>de</strong>miro Alves <strong>de</strong> Sousa, jovem, ainda na faixa dos vinte<br />
<strong>anos</strong>, mas já com uma indicação para o Prêmio Jabuti, que<br />
<strong>de</strong>sponta como uma boa promessa da literatura brasileira.<br />
l i t e r a t u r a P e r i F é r i C a<br />
107
Arquivo pessoal<br />
C o l e ç ã o<br />
a F r â n i o C o u t i n h o<br />
108<br />
Ensaísta, crítico literário e jornalista baiano. Entre<br />
1942 e 1947 trabalha nos Estados Unidos, na edição<br />
da versão em português da Rea<strong>de</strong>r’s Digest. De volta<br />
ao Brasil, em 1948, cria a primeira cátedra <strong>de</strong> Teoria<br />
e Técnica Literária. Em 1958 torna ‑se catedrático <strong>de</strong><br />
Literatura Brasileira. É eleito membro da Aca<strong>de</strong>mia<br />
Brasileira <strong>de</strong> Letras em 1962. Entre seus inúmeros<br />
livros <strong>de</strong>stacam ‑se A filosofia <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis<br />
(1940), Aspectos da literatura barroca (1950), Da<br />
crítica e da nova crítica (1957), Conceitos <strong>de</strong> litera‑<br />
tura brasileira (1960) e Crítica e críticas (1969). Em<br />
1990 edita a Enciclopédia da literatura brasileira com<br />
J. Galante <strong>de</strong> Sousa.<br />
Apesar <strong>de</strong> sua falta no ato final da publicação da<br />
obra, em que tanto trabalhou, as suas páginas evi‑<br />
<strong>de</strong>nciarão, aos que possuam olhos <strong>de</strong> ver, a sua<br />
marca <strong>de</strong> pesquisador consciente, cioso da verda<strong>de</strong><br />
histórica e, em tudo o <strong>mais</strong> que produziu, a altitu<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> seu espírito. (sobre J. Galante <strong>de</strong> Souza)
A coleção A literatura no Brasil publicada em 6<br />
volumes sob a direção do professor Afrânio Coutinho<br />
é, sem dúvida, o <strong>mais</strong> completo tratado sobre a histó‑<br />
ria da literatura no Brasil. Afrânio Coutinho aborda a<br />
literatura brasileira como uma verda<strong>de</strong>ira obra <strong>de</strong> arte,<br />
falando sobre seu valor estético, encarando ‑a como<br />
um todo, autônoma. Apresenta a literatura brasileira<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua origem no período renascentista, entre os<br />
fins do século XV e princípio do século XVI, até os dias<br />
<strong>de</strong> hoje. A literatura no Brasil, pelo seu nível <strong>de</strong> infor‑<br />
mação e pela fundamentação teórica, traz, enfim,<br />
uma gran<strong>de</strong> contribuição para o estudo e a pesquisa<br />
da língua e da literatura brasileiras.<br />
A LITERATURA<br />
NO BRASIL<br />
VOL. I – INTRODUÇÃO GERAL<br />
Direção:<br />
Afrânio Coutinho<br />
Codireção:<br />
Eduardo <strong>de</strong> Faria Coutinho<br />
7a edição – 528 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0555 ‑3<br />
A literatura no Brasil, primeira história da literatura<br />
brasileira <strong>de</strong> autoria coletiva, nasceu <strong>de</strong> um projeto do mé‑<br />
dico e professor Leonídio Ribeiro, preocupado em reor<strong>de</strong>‑<br />
nar e mo<strong>de</strong>rnizar os estudos na área. A direção foi entregue<br />
ao professor Afrânio Coutinho, responsável por uma equipe<br />
<strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> sessenta críticos, professores, ensaístas, especia‑<br />
lizados nos temas e autores abordados.<br />
Des<strong>de</strong> seu lançamento – que por razões diversas se<br />
arrastou <strong>de</strong> 1955 a 1968 –, a coleção vem tendo sucessivas<br />
reedições e atualização permanente. A presente edição –<br />
sob a codireção <strong>de</strong> Eduardo <strong>de</strong> Faria Coutinho – analisa a<br />
produção literária brasileira até a década <strong>de</strong> 1990.<br />
O primeiro volume estuda os problemas genéricos ou<br />
introdutórios à compreensão da literatura brasileira, divi ‑<br />
‑dindo ‑se em dois gran<strong>de</strong>s blocos. O primeiro engloba os<br />
quatro prefácios escritos por Afrânio Coutinho para as su‑<br />
cessivas edições <strong>de</strong> A literatura no Brasil, expondo a con‑<br />
cepção e o planejamento adotado na obra, no caso a<br />
<strong>de</strong>scrição do processo evolutivo da literatura brasileira<br />
como integração dos estilos artísticos.<br />
No segundo bloco, dividido em oito capítulos, são estu‑<br />
dados aspectos relacionados ao <strong>de</strong>senvolvimento da literatura,<br />
o panorama intelectual europeu no momento do <strong>de</strong>scobri‑<br />
mento e povoamento do Brasil, a língua literária, a literatura<br />
oral e <strong>de</strong> expressão popular, as relações entre escola e litera‑<br />
tura, o escritor e o público, a literatura e o conhecimento da<br />
terra, a gênese da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> um país chamado Brasil, a longa<br />
formação e <strong>de</strong>senvolvimento da língua nacional brasileira,<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o encontro do colonizador com os indígenas às inova‑<br />
ções mo<strong>de</strong>rnistas. Estão lançadas as bases para o estudo da<br />
história da literatura brasileira fundamentadas na análise dos<br />
“estilos <strong>de</strong> época” (era barroca, neoclássica, romântica, rea‑<br />
lista, mo<strong>de</strong>rnista), <strong>de</strong>senvolvido nos volumes seguintes.<br />
A f r â n i o C o u t i n h o<br />
109
A LITERATURA<br />
NO BRASIL<br />
VOL. II – ERA BARROCA/<br />
ERA NEOCLÁSSICA<br />
Direção:<br />
Afrânio Coutinho<br />
Codireção:<br />
Eduardo <strong>de</strong> Faria Coutinho<br />
7 a edição – 336 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0556 ‑1<br />
O segundo volume <strong>de</strong> A literatura no Brasil estuda os<br />
períodos barroco e neoclássico, quando o Brasil começa a<br />
se <strong>de</strong>finir como Brasil, mas ainda <strong>de</strong> maneira incipiente. É<br />
a época <strong>de</strong> aparecimento dos primeiros escritores nascidos<br />
na terra, sob o signo do Barroco, i<strong>de</strong>ntificado como estilo<br />
<strong>de</strong> arte e complexo cultural.<br />
Uma das novida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> A literatura no Brasil no estudo<br />
<strong>de</strong> nossa literatura é a conceituação do período que se es‑<br />
ten<strong>de</strong> <strong>de</strong> meados do século XVI ao fim do século XVIII como<br />
Barroco. Até então toda essa fase era incluída no Classi‑<br />
cismo, sem maiores indagações ou justificativas.<br />
À essa nova luz, foi possível reconsi<strong>de</strong>rar a visão tradi‑<br />
cional sobre as origens da poesia brasileira, a literatura dos<br />
jesuítas, os sermões <strong>de</strong> Vieira, as sátiras <strong>de</strong> Gregório <strong>de</strong><br />
Matos, o movimento aca<strong>de</strong>micista.<br />
No século XVIII, período <strong>de</strong> transição e preparação para<br />
a in<strong>de</strong>pendência, em sintonia com as gran<strong>de</strong>s mudanças<br />
efetuadas no mundo, o país toma consciência <strong>de</strong> si mesmo,<br />
o sentimento nacional se aguça, aumenta a rivalida<strong>de</strong> entre<br />
nativos e reinóis, suce<strong>de</strong>m ‑se os movimentos emancipacio‑<br />
nistas, precursores da in<strong>de</strong>pendência. Nesse mundo em ebu‑<br />
lição, o Neoclassicismo surge como um ponto <strong>de</strong> equilíbrio,<br />
mas também <strong>de</strong> nostalgia <strong>de</strong> uma inocência perdida, com a<br />
volta a uma arte <strong>mais</strong> simples, próxima à natureza, reto‑<br />
mando os velhos i<strong>de</strong>ais clássicos. Uma das tendências domi‑<br />
nantes <strong>de</strong>ssa literatura foi o Arcadismo, a poesia adotada<br />
pelo grupo mineiro, estudado também como encaminha‑<br />
mento ao Romantismo. É uma época <strong>de</strong> primado quase ab‑<br />
soluto da poesia, mas na qual emergem também pensadores,<br />
como Matias Aires e Silva Lisboa, oradores como<br />
Mont’Alverne, jornalistas como Hipólito da Costa e João<br />
Francisco Lisboa. O país já estava às portas do Romantismo.<br />
Mas isso é assunto do próximo volume.<br />
110<br />
A f r â n i o C o u t i n h o<br />
A LITERATURA<br />
NO BRASIL<br />
VOL. III – ERA ROMâNTICA<br />
Direção:<br />
Afrânio Coutinho<br />
Codireção:<br />
Eduardo <strong>de</strong> Faria Coutinho<br />
7 a edição – 376 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0557 ‑X<br />
Nenhum movimento da história da literatura brasileira<br />
se i<strong>de</strong>ntificou tanto com as aspirações do país e os sonhos<br />
e i<strong>de</strong>ais dos brasileiros como o Romantismo. Complexo,<br />
rico, contraditório, esbanjando vitalida<strong>de</strong>, movimento <strong>de</strong><br />
moços, pela ida<strong>de</strong> e o espírito, apesar <strong>de</strong> seus aspectos<br />
mórbidos, o Romantismo revelou o país aos brasileiros, im‑<br />
plantou uma nova mentalida<strong>de</strong> artística e se manteve du‑<br />
rante três gerações, cerca <strong>de</strong> quarenta <strong>anos</strong>.<br />
Essa fase <strong>de</strong> excepcional brilho, i<strong>de</strong>ntificada com o<br />
reinado <strong>de</strong> D. Pedro II, é estudada no terceiro volume <strong>de</strong> A<br />
literatura no Brasil, constituindo uma visão abrangente do<br />
movimento, em sintonia com as mudanças sociais e políti‑<br />
cas <strong>de</strong>senroladas no mundo e no Brasil a partir <strong>de</strong> meados<br />
do século XVIII.<br />
O volume está dividido em oito capítulos. Os dois pri‑<br />
meiros analisam as origens europeias do movimento, suas<br />
características – o inconformismo, a exaltação sentimental,<br />
a melancolia, o culto à natureza –, o Pré ‑Romantismo, as<br />
primeiras manifestações românticas no Brasil, com os poe‑<br />
mas <strong>de</strong> Maciel Monteiro e Gonçalves <strong>de</strong> Magalhães, ainda<br />
com fortes vincos clássicos.<br />
Três capítulos são <strong>de</strong>dicados ao estudo da poesia, gê‑<br />
nero <strong>de</strong> maior prestígio à época, <strong>de</strong>senvolvendo ‑se a partir<br />
do rompimento com o passado e a fixação <strong>de</strong>finitiva do<br />
Romantismo, suas características brasileiras, a i<strong>de</strong>ntificação<br />
das raízes profundas <strong>de</strong> nosso povo com o Indianismo, a<br />
morbi<strong>de</strong>z dos ultrarromânticos e byroni<strong>anos</strong>, as novas cor‑<br />
rentes poéticas introduzidas a partir da década <strong>de</strong> 1860,<br />
sobretudo a influência do velho Victor Hugo. Dois capítulos<br />
são <strong>de</strong>dicados à prosa <strong>de</strong> ficção, centralizados no gran<strong>de</strong><br />
momento criador <strong>de</strong> José <strong>de</strong> Alencar, e nas Memórias <strong>de</strong><br />
um sargento <strong>de</strong> milícias. O panorama da época é comple‑<br />
tado com a análise das origens da crítica literária brasileira<br />
e seu agudo sentimento <strong>de</strong> brasilida<strong>de</strong>.<br />
A f r â n i o C o u t i n h o
A LITERATURA<br />
NO BRASIL<br />
VOL. IV – ERA REALISTA/<br />
ERA DE TRANSIÇÃO<br />
Direção:<br />
Afrânio Coutinho<br />
Codireção:<br />
Eduardo <strong>de</strong> Faria Coutinho<br />
7 a edição – 664 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0558 ‑8<br />
Realismo, Naturalismo, Parnasianismo, Simbolismo, os<br />
gran<strong>de</strong>s movimentos literários, <strong>de</strong> poesia e prosa, da se‑<br />
gunda meta<strong>de</strong> do século XIX, constituem o material <strong>de</strong><br />
estudo do quarto volume <strong>de</strong> A literatura no Brasil.<br />
Uma fase repleta <strong>de</strong> contrastes, uma encruzilhada <strong>de</strong><br />
tendências, na qual, como em toda época <strong>de</strong> intensa cria‑<br />
ção artística, as novas correntes convivem e se atritam com<br />
o espírito conservador e, ao mesmo tempo, com outras<br />
buscas <strong>de</strong> renovação, num processo simultâneo <strong>de</strong> <strong>de</strong>sen‑<br />
volvimento e choque, e numa velocida<strong>de</strong> até então <strong>de</strong>sco‑<br />
nhecida na literatura brasileira.<br />
Foi um dos períodos <strong>mais</strong> ricos da prosa <strong>de</strong> ficção bra‑<br />
sileira, na qual se afirma a obra máxima <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong><br />
Assis, ao mesmo tempo que se impõem os naturalistas, o<br />
impressionismo <strong>de</strong> Raul Pompeia e o realismo social <strong>de</strong><br />
Lima Barreto. É também a época do verbalismo e das <strong>de</strong>s‑<br />
cobertas do Brasil, harmonizadas em Os sertões, da prosa<br />
límpida <strong>de</strong> Joaquim Nabuco às primeiras manifestações re‑<br />
gionalistas. Fase <strong>de</strong> consolidação da crítica brasileira e <strong>de</strong><br />
renovação da poesia, com a disciplina requintada dos par‑<br />
nasi<strong>anos</strong>, logo atropelados pelas primeiras manifestações<br />
simbolistas. Esses aspectos são analisados no primeiro<br />
bloco do livro, sob a classificação geral <strong>de</strong> “era realista”.<br />
O segundo bloco inclui autores e obras reunidas sob a<br />
rubrica <strong>de</strong> “era <strong>de</strong> transição”. Estuda o movimento simbo‑<br />
lista, as manifestações do Impressionismo em prosa, os<br />
primeiros sintomas <strong>de</strong> transição para novas formas <strong>de</strong> ex‑<br />
pressão, o Penumbrismo, o Neoparnasianismo, a busca<br />
pela mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, até a eclosão ruidosa do Mo<strong>de</strong>rnismo.<br />
Iniciava ‑se então uma nova fase, <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> balbúrdia inte‑<br />
lectual e renovação artística, sem semelhante na história da<br />
literatura brasileira (excetuado o Romantismo), que consti‑<br />
tui o assunto do quinto volume <strong>de</strong> A literatura no Brasil.<br />
A f r â n i o C o u t i n h o<br />
A LITERATURA<br />
NO BRASIL<br />
VOL. V – ERA MODERNISTA<br />
Direção:<br />
Afrânio Coutinho<br />
Codireção:<br />
Eduardo <strong>de</strong> Faria Coutinho<br />
7 a edição – 680 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0559 ‑6<br />
A revolução mo<strong>de</strong>rnista e as transformações subse‑<br />
quentes ao movimento são estudadas no quinto volume <strong>de</strong><br />
A literatura no Brasil, em cinco gran<strong>de</strong>s capítulos, <strong>de</strong> cará‑<br />
ter abrangente.<br />
O primeiro capítulo, “A revolução mo<strong>de</strong>rnista”, ana‑<br />
lisa <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os antece<strong>de</strong>ntes do movimento, tendo por fundo<br />
a tensa situação do mundo, que <strong>de</strong>semboca na Primeira<br />
Guerra Mundial e no surgimento dos futuristas, as reper‑<br />
cussões das novas correntes artísticas europeias no Brasil, a<br />
Semana <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna, os diversos grupos mo<strong>de</strong>rnistas,<br />
até o encerramento do ciclo, em 1930.<br />
“O Mo<strong>de</strong>rnismo na poesia”, título do segundo capí‑<br />
tulo, abrange muito <strong>mais</strong> do que o título promete, consti‑<br />
tuindo uma abordagem <strong>de</strong> praticamente toda a poesia<br />
brasileira pós ‑1922, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as ruidosas manifestações pio‑<br />
neiras dos grupos paulistas (Pau ‑Brasil, Verdamarelo, Anta,<br />
Antropofagia), os grupos regionais (carioca, mineiro, gaú‑<br />
cho, nor<strong>de</strong>stino) até a Geração <strong>de</strong> 45.<br />
O terceiro capítulo enfoca os movimentos <strong>de</strong> van‑<br />
guarda, sucessores do Mo<strong>de</strong>rnismo: Concretismo, Neocon‑<br />
cretismo, Poesia Práxis, poema ‑processo, arte ‑correio. O<br />
esplêndido legado da ficção mo<strong>de</strong>rnista, objeto <strong>de</strong> estudo<br />
do quarto capítulo, o <strong>mais</strong> longo da obra, parte da análise<br />
das duas gran<strong>de</strong>s linhagens da ficção brasileira (regiona‑<br />
lista, psicológica e costumista), tradição na qual se alinha<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o romance carioca até o experimentalismo paulista,<br />
do regionalismo nor<strong>de</strong>stino às sondagens psicológicas <strong>de</strong><br />
um Cornélio Pena. O estudo se prolonga aos escritores sur‑<br />
gidos na década <strong>de</strong> 1950, um Guimarães Rosa, uma Clarice<br />
Lispector, e representantes das gerações seguintes. O quinto<br />
capítulo estuda a crítica mo<strong>de</strong>rnista, em suas diversas ex‑<br />
pressões, crítica sociológica, social, estética, a atuação da<br />
nova crítica, o incremento dos congressos <strong>de</strong> crítica, o mo‑<br />
vimento editorial.<br />
A f r â n i o C o u t i n h o<br />
111
A LITERATURA<br />
NO BRASIL<br />
VOL. VI – RELAÇÕES E<br />
PERSPECTIVAS/CONCLUSÃO<br />
Direção:<br />
Afrânio Coutinho<br />
Codireção:<br />
Eduardo <strong>de</strong> Faria Coutinho<br />
7 a edição – 576 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0560 ‑X<br />
O sexto volume <strong>de</strong> A literatura no Brasil complementa<br />
o conhecimento da literatura brasileira, amplamente anali‑<br />
sada nos volumes anteriores, com estudos isolados <strong>de</strong> di‑<br />
versos gêneros (teatro, conto, crônica, literatura infantil),<br />
oferecendo ao leitor um quadro <strong>de</strong> sua evolução histórica<br />
das origens aos autores contemporâneos.<br />
Outro aspecto abordado no volume é o das relações<br />
da literatura com ativida<strong>de</strong>s com as quais convive com<br />
maior ou menor intimida<strong>de</strong>, num permanente processo <strong>de</strong><br />
reciprocida<strong>de</strong>: o jornalismo, a filosofia, as artes plásticas, o<br />
pensamento jurídico.<br />
Completam a obra estudos específicos sobre o pano‑<br />
rama atual das letras brasileiras, atualizados até a década<br />
<strong>de</strong> 1990, oferecendo uma visão metódica sobre o Pós‑<br />
‑Mo<strong>de</strong>rnismo, a nova literatura brasileira expressa através<br />
da ficção e do conto, a literatura das décadas <strong>de</strong> 1980 e<br />
1990, os novos rumos da historiografia literária, além <strong>de</strong><br />
dois capítulos <strong>de</strong>dicados a problemas específicos relacio‑<br />
nados com as origens e a expressão da literatura brasi‑<br />
leira, sua in<strong>de</strong>pendência, o problema da língua brasileira,<br />
o português no Brasil etc., ricos <strong>de</strong> reflexões. O último<br />
capítulo, <strong>de</strong>nominado “Visão final”, é uma espécie <strong>de</strong><br />
complemento ao estudo do volume <strong>de</strong>dicado ao Mo<strong>de</strong>r‑<br />
nismo, com o exame das décadas <strong>de</strong> 1950 e 1960, a nova<br />
feição da crítica, a poesia alternativa pós ‑60, a autonomia<br />
literária, cujas diretrizes foram traçadas <strong>de</strong> forma insubs‑<br />
tituível no século XIX por Machado <strong>de</strong> Assis, “nossa má‑<br />
xima figura literária e maior prosador da língua”, o nome<br />
i<strong>de</strong>al para concluir a obra. Cabe chamar a atenção para o<br />
minucioso índice geral, com entradas por nomes, títulos e<br />
assuntos, facilitando a movimentação do estudioso por<br />
essa imensa e rica floresta <strong>de</strong> fatos literários, um monu‑<br />
mento da cultura brasileira.<br />
112<br />
A f r â n i o C o u t i n h o<br />
ENCICLOPÉDIA DE<br />
LITERATURA BRASILEIRA<br />
VOL. I E VOL. II<br />
Direção:<br />
Afrânio Coutinho e<br />
J. Galante <strong>de</strong> Sousa<br />
Volume I – 2a edição revista, ampliada,<br />
atualizada e ilustrada – 840 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0723 ‑8<br />
Volume II – 2a edição revista, ampliada,<br />
atualizada e ilustrada – 818 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0723 ‑8<br />
Ao contrário <strong>de</strong> muito livro, cujo título promete <strong>mais</strong><br />
do que realmente oferece, a Enciclopédia <strong>de</strong> literatura bra‑<br />
sileira ultrapassa <strong>de</strong> longe as expectativas do leitor e o rigor<br />
do título.<br />
Muito <strong>mais</strong> do que um repertório <strong>de</strong> nomes, os dois<br />
volumes da Enciclopédia – i<strong>de</strong>alizada e dirigida pelos profes‑<br />
sores Afrânio Coutinho e J. Galante <strong>de</strong> Sousa – oferecem um<br />
panorama abrangente da realida<strong>de</strong> literária brasileira, abor‑<br />
dando um sem ‑número <strong>de</strong> temas, problemas, dados e fatos<br />
relacionados com a nossa literatura e a vida literária, através<br />
<strong>de</strong> verbetes redigidos por especialistas, alguns com a ampli‑<br />
tu<strong>de</strong> e a concisão <strong>de</strong> pequenos ensaios. Po<strong>de</strong> ‑se dizer que<br />
<strong>de</strong>ntro da Enciclopédia convivem várias enciclopédias, nor‑<br />
malmente publicadas em obras distintas. A primeira é a en‑<br />
ciclopédia clássica <strong>de</strong> literatura, or<strong>de</strong>nada em verbetes<br />
concisos, redigidos por especialistas, fornecendo o essencial<br />
sobre a vida e a obra dos autores, bem como bibliografia.<br />
Ampliando esse campo <strong>de</strong> informação preliminar, a obra<br />
fornece informações sobre movimentos literários, jornais e<br />
revistas <strong>de</strong> cunho literário, agremiações <strong>de</strong> escritores, livros<br />
por títulos (permitindo ao leitor i<strong>de</strong>ntificar o autor da obra),<br />
pseudônimos, um levantamento <strong>de</strong> personagens <strong>de</strong> obras<br />
<strong>de</strong> ficção até a abordagem <strong>de</strong> temas muito específicos,<br />
como as relações <strong>de</strong> espiritismo e literatura.<br />
A presente edição, revista e ampliada, contém cerca<br />
<strong>de</strong> 15 mil verbetes, incluindo ao redor <strong>de</strong> 1.200 autores<br />
contemporâneos, cujos dados são <strong>de</strong> acesso difícil, ou im‑<br />
possível, mesmo na internet. Para tanto, foram enviados<br />
5.590 formulários a escritores <strong>de</strong> todo o país, solicitando<br />
informações bibliográficas e pessoais. Pela sua amplitu<strong>de</strong> e<br />
atualização, a Enciclopédia <strong>de</strong> literatura brasileira é a obra<br />
<strong>mais</strong> completa do gênero.<br />
A f r â n i o C o u t i n h o
Acervo Pessoal <strong>de</strong> Cecília Meireles<br />
C o l e ç ã o<br />
C e C í l i a M e i r e l e s<br />
OBRAS DE LITERATURA INFANTIL DA AUTORA<br />
• Canção da tar<strong>de</strong> no campo<br />
• Cecília Meireles crônicas para jovens (prelo)<br />
• O menino azul<br />
• Ou isto ou aquilo (prelo)<br />
• Os pescadores e as suas filhas (prelo)<br />
C e C í l i a M e i r e l e s<br />
Nascida no Rio <strong>de</strong> Janeiro, Cecília Meireles (1901‑<br />
‑1964) compôs uma obra poética <strong>de</strong> valor inestimável<br />
e, em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> seu talento ímpar, é comumente ci‑<br />
tada como a maior escritora em língua portuguesa.<br />
Criada pela avó materna, Cecília concluiu o curso nor‑<br />
mal no Instituto <strong>de</strong> Educação do Rio <strong>de</strong> Janeiro. Além<br />
<strong>de</strong> poeta, teve <strong>de</strong>stacada atuação na área <strong>de</strong> educa‑<br />
ção, tendo sido responsável, em 1934, pela criação da<br />
primeira biblioteca infantil do país, no Rio <strong>de</strong> Janeiro,<br />
e mantido entre 1930 e 1933 uma coluna diária sobre<br />
problemas educacionais no Diário <strong>de</strong> Notícias.<br />
O livro <strong>de</strong> estreia foi Espectros, que veio a lume em<br />
1919, mas a consagração se <strong>de</strong>u em 19<strong>39</strong> com Via‑<br />
gem, que recebeu o prêmio Olavo Bilac da Aca<strong>de</strong>mia<br />
Brasileira <strong>de</strong> Letras. Seu livro Romanceiro da Inconfi‑<br />
dência, <strong>de</strong> 1953, foi um divisor <strong>de</strong> águas na trajetória<br />
literária da escritora e estabeleceu ‑se como um dos<br />
maiores clássicos da poesia em língua portuguesa.<br />
Em sua vasta obra poética, Cecília Meireles penetrou<br />
com profundida<strong>de</strong> e estilo próprio numa viagem in‑<br />
trospectiva e seus versos apresentam <strong>de</strong> maneira<br />
intimista temas como solidão, sonhos, melancolia,<br />
mar e morte. A coleção Cecília Meireles publicada<br />
pela <strong>Global</strong> <strong>Editora</strong> traz ao leitor seus principais li‑<br />
vros, com o anseio <strong>de</strong> dar a gran<strong>de</strong>za que a excep‑<br />
cional mestra da lírica em língua portuguesa merece,<br />
por meio <strong>de</strong> um cuidadoso processo <strong>de</strong> estabeleci‑<br />
mento dos textos e <strong>de</strong> novos projetos gráficos.<br />
Eu canto porque o instante existe<br />
e a minha vida está completa.<br />
Não sou alegre nem sou triste:<br />
sou poeta.<br />
113
ROMANCEIRO DA<br />
INCONFIDÊNCIA<br />
9 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1682 ‑8<br />
A literatura brasileira está repleta <strong>de</strong> obras em prosa ro‑<br />
manceando acontecimentos históricos. Des<strong>de</strong> a viagem <strong>de</strong><br />
Cabral e o estabelecimento dos primeiros colonos nesta terra,<br />
até ficções sobre fatos recentes, como os governos militares,<br />
há inúmeros romances e contos. Mas são poucas as obras<br />
poéticas que se arriscam a semelhante tarefa. Uma das exce‑<br />
ções, e por certo a <strong>mais</strong> brilhante, é o Romanceiro da Inconfi‑<br />
dência, iluminado pela poesia altíssima <strong>de</strong> Cecília Meireles.<br />
O poema (na verda<strong>de</strong> formado por vários poemas que<br />
também po<strong>de</strong>m ser lidos isoladamente) recria os dias reple‑<br />
tos <strong>de</strong> angústias e esperanças do final da década <strong>de</strong> 1780,<br />
em que um grupo <strong>de</strong> intelectuais mineiros sonhou se liber‑<br />
tar do domínio colonial português e do <strong>de</strong>sastre que se<br />
abateu sobre as suas vidas e a <strong>de</strong> seus familiares.<br />
Utilizando a técnica ibérica dos romances populares,<br />
atenta aos autos do processo, às cartas, aos testamentos,<br />
à pintura, às modinhas, às estátuas dos profetas <strong>de</strong> Aleija‑<br />
dinho, a poeta recria com intensa beleza o cotidiano, os<br />
conflitos e os anseios daquele grupo <strong>de</strong> sonhadores. Diante<br />
dos olhos do leitor surgem as figuras <strong>de</strong> Tomás Antônio<br />
Gonzaga, o apaixonado <strong>de</strong> Marília, a bela, Cláudio Manuel<br />
da Costa, Bárbara Eliodora e, se sobressaindo sobre todos,<br />
o perfil impressionista <strong>de</strong> Tira<strong>de</strong>ntes, retratado como um<br />
Cristo revolucionário, tal a imagem que se mo<strong>de</strong>lou a partir<br />
do século XIX e se impôs até nossos dias. A i<strong>de</strong>alização<br />
preenche lacunas históricas e enriquece o poema.<br />
Como observa Alberto da Costa e Silva no prefácio,<br />
“com a imaginação a adivinhar o que não se mostra claro<br />
ou não está nos documentos, Cecília Meireles recria poeti‑<br />
camente um pedaço <strong>de</strong> tempo e, ao lhe reescrever poetica‑<br />
mente a história, dá a uma conspiração revolucionária <strong>de</strong><br />
poetas, num rincão montanhoso do Império português, a<br />
consistência do mito”.<br />
114<br />
C e C í l i a M e i r e l e s<br />
VIAGEM<br />
2 a edição – 176 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1706 ‑1<br />
Viagem representa um momento <strong>de</strong> ruptura e renova‑<br />
ção na obra poética <strong>de</strong> Cecília Meireles. Até então, sua<br />
poesia ainda estava ligada ao neossimbolismo e a uma ex‑<br />
pressão <strong>mais</strong> conservadora. O novo livro trouxe a liberta‑<br />
ção, representando a plena conscientização da artista, que<br />
pô<strong>de</strong> a partir <strong>de</strong> então afirmar a sua voz personalíssima:<br />
“Um poeta é sempre irmão do vento e da água:/ <strong>de</strong>ixa seu<br />
ritmo por on<strong>de</strong> passa”, mesmo que esses locais <strong>de</strong> passa‑<br />
gem existam apenas em sua mente.<br />
Como o título sugere, o livro é uma longa e sedutora<br />
viagem, mas por rotas imaginárias, i<strong>de</strong>ntificadas com os<br />
sonhos que se dissolvem em lonjuras sem margens, com<br />
vaga consistência <strong>de</strong> realida<strong>de</strong>, na qual as palavras se har‑<br />
monizam em pura música: “Estou diante daquela porta/<br />
que não sei <strong>mais</strong> se ainda existe.../ Estou longe e fora das<br />
horas,/ sem saber em que consiste/ nem o que vai nem o<br />
que volta.../ sem estar alegre nem triste”.<br />
Esse estado <strong>de</strong> alma – ou estados <strong>de</strong> alma, pois a sen‑<br />
sibilida<strong>de</strong> aguçada do poeta está sempre aberta a estímulos<br />
e sensações – po<strong>de</strong> ser compreendido, como sugere Al‑<br />
fredo Bosi no prefácio, como um “sentimento <strong>de</strong> distân‑<br />
cia”. Essa distância em relação ao mundo visível, material,<br />
favorece uma aproximação <strong>mais</strong> profunda da poeta con‑<br />
sigo mesma, absorvida em seu mundo interior, mas tam‑<br />
bém inquieta e intrigada diante <strong>de</strong> sua própria imagem,<br />
como se comprova nos versos <strong>de</strong> “Retrato”: “Eu não tinha<br />
este rosto <strong>de</strong> hoje,/ assim calmo, assim triste, assim magro,/<br />
nem estes olhos tão vazios,/ nem o lábio amargo”.<br />
Encontro consigo mesma, revelação e <strong>de</strong>scoberta,<br />
sentimento <strong>de</strong> libertação, <strong>de</strong>svio pelas rotas dos sonhos,<br />
essa Viagem se consolida numa série <strong>de</strong> poemas <strong>de</strong> be‑<br />
leza intensa que, por vezes, tocam os limites da música<br />
abstrata.<br />
C e C í l i a M e i r e l e s
Arquivo pessoal<br />
C o l e ç ã o<br />
C o r a C o r a l i n a<br />
OBRAS DE LITERATURA INFANTIL DA AUTORA<br />
• A menina, o cofrinho e a vovó<br />
• A moeda <strong>de</strong> ouro que um pato engoliu<br />
• As cocadas<br />
• Contas <strong>de</strong> dividir e trinta e seis bolos<br />
• De medos e assombrações (prelo)<br />
• Lembranças <strong>de</strong> Aninha (prelo)<br />
• O prato azul pombinho<br />
• Os meninos ver<strong>de</strong>s<br />
• Poema do milho<br />
C o r a C o r a l i n a<br />
Ana Lins dos Guimarães Peixoto Brêtas (1889 ‑1985)<br />
teve uma trajetória literária peculiar. Embora escre‑<br />
vesse <strong>de</strong>s<strong>de</strong> moça, tinha 76 <strong>anos</strong> quando seu primeiro<br />
livro foi publicado, e quase noventa quando sua obra<br />
chegou às mãos <strong>de</strong> Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> –<br />
responsável por sua apresentação ao mercado nacio‑<br />
nal. Daí em diante, sua literatura vem conquistando<br />
crítica e público. Cora Coralina não se filiou a ne‑<br />
nhuma corrente literária. Com um estilo pessoal, foi<br />
poeta e uma gran<strong>de</strong> contadora <strong>de</strong> histórias das coisas<br />
<strong>de</strong> sua terra. O cotidiano, os causos, a velha Goiás, as<br />
inquietações humanas são temas constantes em sua<br />
obra, consi<strong>de</strong>rada por vários autores um registro<br />
histórico ‑social do século XX.<br />
Entre pedras<br />
cresceu a minha poesia.<br />
Minha vida...<br />
Quebrando pedras<br />
e plantando flores.<br />
Entre pedras que me esmagavam<br />
levantei a pedra ru<strong>de</strong><br />
dos meus versos.<br />
115
DOCEIRA E POETA<br />
1 a edição – 144 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1417‑6<br />
Cora Coralina tinha o dom <strong>de</strong> servir, como ninguém,<br />
os seus poemas, hum<strong>anos</strong> e doces, mas sabia também<br />
fazer doces, <strong>de</strong>liciosos como um poema. Poeta e doceira.<br />
A fórmula é boa, e começa a <strong>de</strong>safiar o apetite do leitor, à<br />
medida que ele vai tomando conhecimento das receitas<br />
preparadas pela velha poeta.<br />
A maioria <strong>de</strong>las está ligada à tradição doceira goiana,<br />
com a utilização <strong>de</strong> frutas típicas do Cerrado, que aparecem<br />
em épocas <strong>de</strong>terminadas, exigindo que sejam conservadas.<br />
Para tornar viável o preparo, hoje, <strong>de</strong> tais quitutes, foram<br />
necessárias algumas adaptações à nossa época, com a redu‑<br />
ção <strong>de</strong> ingredientes (não é preciso <strong>mais</strong> usar a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
açúcar da época para conservar as frutas) e <strong>de</strong> componentes<br />
<strong>de</strong> algumas receitas (uma <strong>de</strong>las recomenda a utilização <strong>de</strong><br />
trinta ovos), a substituição <strong>de</strong> ingredientes, como a banha<br />
<strong>de</strong> porco, muito usada à época, e o emprego <strong>de</strong> cal virgem,<br />
que po<strong>de</strong> ser substituído por bicarbonato.<br />
Orgulhosa <strong>de</strong> sua arte, Cora Coralina explicava que<br />
seus doces eram diferentes porque glacerizados, escorridos<br />
em peneira e colocados na calda reduzida. Um trabalhão,<br />
para o qual, queixava ‑se Cora, não havia <strong>mais</strong> ninguém<br />
disposto a fazê ‑lo.<br />
Este livro presta uma homenagem aos 120 <strong>anos</strong> do<br />
nascimento <strong>de</strong> Cora Coralina, mostrando uma faceta <strong>de</strong><br />
seu universo pessoal e abrindo para o leitor uma fresta para<br />
se conhecer a arte antiga <strong>de</strong> preparar doces, executada<br />
pela poeta com o mesmo espírito <strong>de</strong> agra<strong>de</strong>cimento à vida<br />
com que compunha os seus poemas. Arte e técnica, das<br />
quais muito se orgulhava Cora Coralina, que costumava<br />
dizer que a boa doceira suja apenas dois <strong>de</strong>dos: o indicador<br />
e o polegar. “Mulher que lambreca toda a mão não é uma<br />
boa doceira.”. Ela sabia do que estava falando.<br />
116<br />
C o r a C o r a l i n a<br />
ESTÓRIAS DA CASA<br />
VELHA DA PONTE<br />
13 a edição – 112 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1161 ‑8<br />
Como toda residência <strong>de</strong> interior habitada muito<br />
tempo pela mesma família, a Casa Velha da Ponte vivia<br />
cheia <strong>de</strong> histórias. Construída “em pedra, ma<strong>de</strong>irame e<br />
barro”, com suas “folhas <strong>de</strong> portas pesada <strong>de</strong> árvores for‑<br />
tes <strong>de</strong>scomunais serradas a mão”, sua senzala <strong>de</strong>sativada<br />
e seus imensos portais, a própria casa já era uma parte viva<br />
da história da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Goiás Velho.<br />
Suas pare<strong>de</strong>s presenciaram histórias <strong>de</strong> amor e suicídios<br />
<strong>de</strong> escravos, enquanto lagartixas buscavam as brechas para<br />
se aquecer. Um dos antigos proprietários, recebedor dos<br />
quintos reais, tinha ‑se apossado do dinheiro do estado. Para<br />
fugir à prisão, teria ocultado no porão moedas e barras <strong>de</strong><br />
ouro, dando origem assim à lenda do tesouro enterrado.<br />
Mais tar<strong>de</strong>, em época <strong>de</strong> esplendor, a família só “almoçava<br />
sua gorda feijoada goiana em pratos e talheres <strong>de</strong> ouro”.<br />
Tradições como essas embalaram a infância <strong>de</strong> Cora<br />
Coralina, criada na velha casa, já então <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nte, “cerra‑<br />
das portas e janelas, resguardando <strong>de</strong> olhar estranho o<br />
<strong>de</strong>smazelo e a pobreza que se instalavam.”.<br />
Essas histórias domésticas e outras vividas na cida<strong>de</strong>,<br />
que impressionavam a menina, são o material vivo e hu‑<br />
mano do livro, registro <strong>de</strong> velhas tradições e, ao mesmo<br />
tempo, retrato fiel e pitoresco <strong>de</strong> uma comunida<strong>de</strong> do Bra‑<br />
sil central no fim do século XIX e início do século XX, com<br />
as suas prostitutas segregadas, vivendo em becos, capazes<br />
<strong>de</strong> valentias, como a narrada no <strong>de</strong>licioso “Minga, zoio <strong>de</strong><br />
prata”, os famosos raptos <strong>de</strong> donzelas (“Cortar em riba do<br />
rasto”), tão frequentes no Brasil antigo, as solteironas<br />
(“Quadrinhos da vida”). Nem faltam as estórias <strong>de</strong> assom‑<br />
bração e assombramento (“Procissão das almas”, “O caso<br />
<strong>de</strong> Mana”), sempre tão vivas no imaginário popular, narra‑<br />
das com aquela insuperável simplicida<strong>de</strong> e leveza <strong>de</strong> Cora<br />
Coralina, encanto <strong>de</strong> seus versos, encanto <strong>de</strong> sua prosa.<br />
C o r a C o r a l i n a
MEU LIVRO DE CORDEL<br />
11 a edição – 112 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0153 ‑4<br />
A simplicida<strong>de</strong>, a qualida<strong>de</strong> <strong>mais</strong> distinta na poesia <strong>de</strong><br />
Cora Coralina, está <strong>mais</strong> presente do que nunca em Meu<br />
livro <strong>de</strong> cor<strong>de</strong>l. O título é significativo, homenagem da au‑<br />
tora “a todas as estórias e poesias <strong>de</strong> Cor<strong>de</strong>l”, e atestado <strong>de</strong><br />
sua afinida<strong>de</strong> com “os anônimos menestréis nor<strong>de</strong>stinos,<br />
povo da minha casta, meus irmãos do Nor<strong>de</strong>ste ru<strong>de</strong>.”.<br />
Essa simplicida<strong>de</strong> anda sempre <strong>de</strong> mãos dadas com<br />
um aguçado espírito <strong>de</strong> fraternida<strong>de</strong> e uma sensibilida<strong>de</strong><br />
aberta à vida e às novida<strong>de</strong>s do mundo. Assim, a poeta<br />
tanto esten<strong>de</strong> a mão a todos os perseguidos (no caso, os<br />
ju<strong>de</strong>us), num gesto <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong>, como presta seu tri‑<br />
buto <strong>de</strong> admiração a Pablo Neruda, poeta <strong>de</strong>scoberto na<br />
velhice e que a <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong>slumbrada.<br />
Vários poemas do livro são autobiográficos. Como<br />
todo artista, Cora Coralina não cessa <strong>de</strong> se olhar no espe‑<br />
lho, <strong>de</strong> se indagar, em busca do mistério <strong>de</strong> si mesma que,<br />
no fim <strong>de</strong> tudo, é o próprio mistério da vida. A segunda<br />
parte do livro é toda confessional. “Cora Coralina, quem é<br />
você?”, indaga a poeta no título <strong>de</strong> um dos poemas. E<br />
respon<strong>de</strong>: “Sou mulher como outra qualquer./ Venho do<br />
século passado/ e trago todas as ida<strong>de</strong>s.”.<br />
Mulher como as outras, mas <strong>de</strong> <strong>de</strong>stino áspero, com o<br />
qual lutou <strong>de</strong> maneira incansável, como conta em “A pro‑<br />
cura”, espécie <strong>de</strong> súmula <strong>de</strong> sua vida: “An<strong>de</strong>i pelos caminhos<br />
da Vida./ Caminhei pelas ruas do Destino/ procurando meu<br />
signo./ Bati na porta da Fortuna,/ mandou dizer que não es‑<br />
tava./ Bati na porta da Fama,/ falou que não podia aten<strong>de</strong>r./<br />
Procurei a casa da Felicida<strong>de</strong>,/ a vizinha da frente me informou/<br />
que ela tinha se mudado/ sem <strong>de</strong>ixar novo en<strong>de</strong>reço./ Procurei<br />
a morada da Fortaleza./ Ela me fez entrar: <strong>de</strong>u ‑me veste nova,/<br />
perfumou ‑me os cabelos,/ fez ‑me beber <strong>de</strong> seu vinho./ Acertei<br />
o meu caminho.”. Acertou o caminho, sobretudo, quando<br />
essa fortaleza começou a se esparramar em poesia.<br />
C o r a C o r a l i n a<br />
O TESOURO<br />
DA CASA VELHA<br />
5 a edição – 144 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0238 ‑4<br />
Poeta em tempo integral, ou pelo menos <strong>de</strong> sensibili‑<br />
da<strong>de</strong> sempre aberta à vida, Cora Coralina escreveu tam‑<br />
bém em boa prosa, como se comprova em O tesouro da<br />
Casa Velha. Livro da velhice, redigido lá pelos noventa e<br />
tantos <strong>anos</strong>, foi um dos últimos trabalhos da autora, que<br />
nele se empenhou com lentidão, gosto e capricho, apesar<br />
da ida<strong>de</strong>, preocupada não apenas com as peças em si, mas<br />
também com a unida<strong>de</strong> do volume. Na época, costumava<br />
brincar com seu médico, pedindo que a tratasse bem, a fim<br />
<strong>de</strong> ter tempo <strong>de</strong> terminar o livro. Não chegou a concluí ‑lo,<br />
a edição foi póstuma.<br />
Esse tesouro reúne <strong>de</strong>zoito contos, vários <strong>de</strong>les basea‑<br />
dos em reminiscências pessoais, provavelmente vividas pela<br />
autora (“As cocadas”, “I<strong>de</strong>al <strong>de</strong> moça”, “Das coisas bem<br />
guardadas e suas consequências”, “Candoca”) e por pessoas<br />
<strong>de</strong> seu relacionamento, em histórias familiares (“O tesouro da<br />
Casa Velha”) ou fatos fisgados na tradição viva goiana (“O<br />
corpo <strong>de</strong> <strong>de</strong>lito”, “Medo”, “As capas do diabo”).<br />
Como contista, Cora Coralina não difere muito da<br />
poeta, a não ser na mudança <strong>de</strong> instrumento, a poesia pela<br />
prosa. São trabalhos simples, com po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> comunicação<br />
com o leitor, sem complicações <strong>de</strong> enredo, narrados <strong>de</strong><br />
forma direta, com as qualida<strong>de</strong>s do contador oral, talvez<br />
por isso <strong>mais</strong> perto do conto popular que do literário, cap‑<br />
tando por vezes com muita graça certos aspectos malicio‑<br />
sos da psicologia do homem do interior. A propósito, leia ‑se<br />
o <strong>de</strong>licioso “Zé Sidrach e Dico Foggia”. O mesmo estilo<br />
simples dos poemas, apesar do emprego <strong>de</strong> alguns arcaís‑<br />
mos (prebenda, gatafunho, baldrame etc.), que não che‑<br />
gam a ser pernósticos (faziam parte da linguagem usual da<br />
infância <strong>de</strong> Cora Coralina), dando ao texto um certo sabor<br />
exótico <strong>de</strong> passado, <strong>de</strong> material encontrado num cofre, <strong>de</strong><br />
tesouro <strong>de</strong> casa velha, <strong>de</strong>safiando a curiosida<strong>de</strong> do leitor.<br />
C o r a C o r a l i n a<br />
117
POEMAS DOS<br />
BECOS DE GOIÁS<br />
E ESTÓRIAS MAIS<br />
22 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1178 ‑2<br />
Quando Cora Coralina estreou, em 1965, com os Poe‑<br />
mas dos becos <strong>de</strong> Goiás e estórias <strong>mais</strong>, a crítica não per‑<br />
cebeu (só perceberia <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>) que ali nascia uma poeta<br />
original, <strong>de</strong> raízes muito profundas na alma popular, com<br />
uma sabedoria dosada <strong>de</strong> ironia, <strong>de</strong> alguém que muito<br />
viveu e sofreu, mas <strong>de</strong> expressão tão suave, com tamanho<br />
frescor, que parecia vir <strong>de</strong> uma jovem. Era e não era ver‑<br />
da<strong>de</strong>, se pon<strong>de</strong>rarmos que a alma não tem ida<strong>de</strong> e os sen‑<br />
timentos não envelhecem. Cronologicamente, a autora era<br />
uma respeitável senhora <strong>de</strong> 75 <strong>anos</strong> (bela ida<strong>de</strong> para uma<br />
estreia poética), vinda do interior <strong>de</strong> Goiás.<br />
O público sentiu <strong>de</strong> imediato o que os críticos não per‑<br />
ceberam: a alta tensão poética daquela poesia, seu po<strong>de</strong>r <strong>de</strong><br />
comunicabilida<strong>de</strong>, a simplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> expressão, o amor pelo<br />
semelhante, a comoção humana que fazia <strong>de</strong> cada leitor um<br />
passante pelos becos cheios <strong>de</strong> tradições <strong>de</strong> Goiás.<br />
Só <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, com o reconhecimento <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s figu‑<br />
ras da literatura brasileira, como Carlos Drummond <strong>de</strong> An‑<br />
dra<strong>de</strong>, alguns críticos começaram a rasgar seda pela poeta.<br />
Ainda bem. Preconceitos postos <strong>de</strong> lado, <strong>de</strong>scobriram nela<br />
uma irmã – em certo sentido <strong>mais</strong> suave, em outro <strong>mais</strong> ás‑<br />
pera – <strong>de</strong> Gabriela Mistral e Rosalia <strong>de</strong> Castro. Irmã, sim, mas<br />
com uma personalida<strong>de</strong> muito própria e forte, quase sem<br />
influências literárias, mas com alguma coisa <strong>de</strong> franciscana.<br />
A “Oração do milho” não parece escrita por Francisco<br />
<strong>de</strong> Assis? Quem, excetuados os corações <strong>de</strong> pedra, não se<br />
comove com esse poema, um dos <strong>mais</strong> belos já escritos no<br />
Brasil? “Senhor, nada valho./ Sou a planta humil<strong>de</strong> dos quin‑<br />
tais pequenos e das lavouras pobres./ Meu grão, perdido por<br />
acaso,/ nasce e cresce na terra <strong>de</strong>scuidada./ Ponho folhas e<br />
haste, e se me ajudar<strong>de</strong>s, Senhor,/ mesmo planta <strong>de</strong> acaso,<br />
solitária,/ dou espigas e <strong>de</strong>volvo em muitos grãos/ o grão<br />
perdido inicial, salvo por milagre,/ que a terra fecundou.”.<br />
118<br />
C o r a C o r a l i n a<br />
VILLA BOA DE GOyAZ<br />
2 a edição – 112 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0750 ‑5<br />
Depois <strong>de</strong> muitos <strong>anos</strong> vivendo longe <strong>de</strong> sua terra natal,<br />
Ana Lins dos Guimarães Peixoto Brêtas regressou à cida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Goiás Velho. Deu ‑se então uma espécie <strong>de</strong> reencontro com as<br />
suas raízes. A sensibilida<strong>de</strong> se aguçou, o passado voltou com<br />
força, e a velha senhora iniciou sua busca do tempo perdido,<br />
assumindo a plena condição <strong>de</strong> poeta. Nascia assim Cora Co‑<br />
ralina, cujos versos logo iriam conquistar o Brasil.<br />
Sem alar<strong>de</strong>, Cora <strong>de</strong>dicou parte <strong>de</strong> sua produção poética<br />
à cida<strong>de</strong> natal. Inédito durante <strong>anos</strong>, esse material, poesia e<br />
prosa, foi reunido na publicação póstuma Villa Boa <strong>de</strong> Goyaz.<br />
Costuma ‑se dizer que cada terra tem o cantor que me‑<br />
rece. Mais do que mérito, é uma questão <strong>de</strong> afinida<strong>de</strong>, meio<br />
misteriosa, entre a pessoa e o ambiente que a envolve. Afini‑<br />
da<strong>de</strong>, porém, nem sempre se traduz por reverência. Muitas<br />
vezes explo<strong>de</strong> em revolta. Quem não se lembra dos versos mal‑<br />
dizentes <strong>de</strong> Gregório <strong>de</strong> Matos contra a Bahia seiscentista?<br />
Ao contrário do poeta baiano, as relações <strong>de</strong> Cora<br />
Coralina com sua cida<strong>de</strong> foram da <strong>mais</strong> estreita ternura.<br />
Com olhos <strong>de</strong> ver e ouvidos <strong>de</strong> ouvir, a poeta goiana regis‑<br />
tra cada aspecto da vida cotidiana da comunida<strong>de</strong> com<br />
frescor e carinho, como se acabasse <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobri ‑los. Nada<br />
escapa à sua atenção e curiosida<strong>de</strong>: o velho telhado <strong>de</strong><br />
<strong>mais</strong> <strong>de</strong> duzentos <strong>anos</strong>, o badalar dos sinos, os velhos car‑<br />
navais, a catedral, a alegria ruidosa dos estudantes, o<br />
museu, as ruas e os becos cheios <strong>de</strong> lendas e mistérios.<br />
Com prazer, recria velhas cantigas folclóricas, algumas <strong>de</strong> <strong>de</strong>sti‑<br />
nação mágica, como a <strong>de</strong> Santa Luzia, com “seu cavalinho/<br />
comendo capim”, que se pronunciava sobre o olho da pessoa<br />
momentaneamente enceguecida por um cisco. Villa Boa <strong>de</strong><br />
Goyaz é poesia, mas também testemunho, um valioso material<br />
para quem <strong>de</strong>sejar reconstituir a vida e um pouco dos sonhos<br />
dos homens e mulheres que viveram naquele chão perdido no<br />
gran<strong>de</strong> planalto central do Brasil.<br />
C o r a C o r a l i n a
VINTÉM DE COBRE<br />
MEIAS CONFISSÕES DE ANINHA<br />
8 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1179 ‑3<br />
No tempo do mil ‑réis, o vintém <strong>de</strong> cobre era a moeda<br />
<strong>mais</strong> <strong>de</strong>svaliosa, aquela que mal comprava um doce. Por<br />
modéstia e também um pouco por malícia (talvez muita<br />
malícia), Cora Coralina batizou com o nome da velha<br />
moeda as suas quase memórias, ou meias ‑confissões, como<br />
ela prefere, redigidas em versos. “É um livro tumultuado,<br />
aberrante, da rotina <strong>de</strong> se fazer e or<strong>de</strong>nar um livro./ Tumul‑<br />
tuado, como foi a vida daquela que o escreveu.”.<br />
Vida tumultuada, cheia <strong>de</strong> esbarrões do <strong>de</strong>stino que, em<br />
vez <strong>de</strong> provocar <strong>de</strong>sânimo, <strong>de</strong>spertaram no espírito <strong>de</strong> Ana<br />
Lins dos Guimarães Peixoto Brêtas (nome verda<strong>de</strong>iro <strong>de</strong> Cora<br />
Coralina) uma fibra <strong>de</strong> guerreira e uma sabedoria simples, por<br />
vezes meio marota, feita <strong>de</strong> respeito e pieda<strong>de</strong> pelo ser hu‑<br />
mano, sobretudo pelos que sofrem, mas também com um<br />
fundo <strong>de</strong> ironia mansa e <strong>de</strong> malícia sem malda<strong>de</strong>, um humor<br />
típico da gente do interior, um sarcasmo angelical (se é que há<br />
sarcasmo entre os anjos), mistura <strong>de</strong> humilda<strong>de</strong> franciscana e<br />
revolta diante das estúpidas repressões da socieda<strong>de</strong> e da du‑<br />
reza dos costumes antigos, sob os quais se criou, foi educada<br />
e que lhe <strong>de</strong>ixou marcas tão profundas na alma:<br />
“Na casa antiga, castigos corporais e humilhantes, coer‑<br />
ção,/ atitu<strong>de</strong>s impostas, ascendência férrea, obediência cega./<br />
Filhos foram impiedosamente sacrificados e <strong>de</strong>spojados./ E para<br />
alguma rebeldia indomável, lá vinha a ameaça terrível, impres‑<br />
sionante/ da maldição da mãe, a que poucos resistiam./ Do<br />
resto prefiro não esmiuçar.”.<br />
Os poemas <strong>de</strong> Vintém <strong>de</strong> cobre são todos escritos<br />
nesse tom simples e comunicativo, num lirismo quase <strong>de</strong><br />
toada sertaneja, ricos <strong>de</strong> experiência humana. Talvez por<br />
pudor, ou auto<strong>de</strong>fesa, nunca revelam toda a dureza dos<br />
fatos. Ficam nas meias confissões. E por malícia são chama‑<br />
dos <strong>de</strong> vintém <strong>de</strong> cobre quando, na realida<strong>de</strong>, constituem<br />
a <strong>mais</strong> pura e autêntica moeda <strong>de</strong> ouro.<br />
C o r a C o r a l i n a<br />
CORA CORAGEM,<br />
CORA POESIA<br />
Vicência Brêtas Tahan<br />
4 a edição – 240 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0235 ‑7<br />
O que <strong>mais</strong> impressiona em Cora Coralina é o equilíbrio<br />
entre sua vida e sua obra. Mulher <strong>de</strong> aparência frágil, le‑<br />
vando trancos e barrancos violentos do <strong>de</strong>stino, soube ex‑<br />
trair <strong>de</strong> suas experiências uma sabedoria agridoce, <strong>mais</strong> doce<br />
do que amarga, simples, um tanto maliciosa e irônica, uma<br />
espécie <strong>de</strong> súmula viva da sabedoria popular, tão forte em<br />
seus poemas. Muitas <strong>de</strong> suas experiências pessoais foram<br />
narradas em versos autobiográficos, contando sobretudo os<br />
sofrimentos e as <strong>de</strong>cepções da infância, o <strong>de</strong>samparo da<br />
menina, um certo complexo <strong>de</strong> inferiorida<strong>de</strong> e um duro sen‑<br />
timento <strong>de</strong> rejeição. Mas faltava um retrato integral, um ro‑<br />
teiro completo <strong>de</strong> sua vida, or<strong>de</strong>nado e contado por um<br />
biógrafo que reunisse a dupla condição <strong>de</strong> conhecer a fundo<br />
a vida <strong>de</strong> Cora Coralina e <strong>de</strong> saber como narrá ‑la.<br />
A tarefa encontrou seu operário <strong>de</strong>dicado e exato em<br />
Vicência Brêtas Tahan, a autora <strong>de</strong> Cora coragem Cora poesia,<br />
filha caçula da poeta. Como a mãe, Vicência escreve com<br />
extrema simplicida<strong>de</strong>, em estilo quase <strong>de</strong> conversa familiar,<br />
direto, saboroso.<br />
A biografia romanceada, forma preferida por Vicência,<br />
lhe permite adotar as liberda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> criação, peculiar à ficção,<br />
sem trair a fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> aos fatos, aumentando o interesse e a<br />
comunicação com o leitor. A vida narrada como uma novela,<br />
tão do agrado do leitor brasileiro. Assim, os episódios são<br />
vistos com um certo distanciamento, mas recriados com ter‑<br />
nura, muito típica da autora, que se revela sobretudo nos<br />
momentos <strong>mais</strong> difíceis da vida da biografada, como sua<br />
fuga <strong>de</strong> casa com um homem separado da esposa, sua inte‑<br />
gração numa socieda<strong>de</strong> muito diferente da goiana, on<strong>de</strong><br />
logo circula sua condição <strong>de</strong> mulher não casada, um fato<br />
terrível naquelas primeiras décadas do século XX, sua aceita‑<br />
ção pela socieda<strong>de</strong>, numa espécie <strong>de</strong> metáfora da própria<br />
vida <strong>de</strong> Cora, uma história <strong>de</strong> superação.<br />
s o B r e C o r a C o r a l i n a<br />
119
Arquivo pessoal<br />
C o l e ç ã o<br />
e d l a v a n s t e e n<br />
120<br />
Nasceu em Santa Catarina, mas vive em São Paulo e<br />
no Rio <strong>de</strong> Janeiro há muitos <strong>anos</strong>. Dirige as coleções<br />
Melhores Contos, Melhores Crônicas, Melhores Poe‑<br />
mas, Roteiro da Poesia Brasileira, Jovens Inteligentes e<br />
Magias, pois é apaixonada pela literatura brasileira,<br />
e acha que por meio <strong>de</strong>sse trabalho presta um serviço<br />
a seus contemporâneos. Como escritora, sabe contar<br />
histórias, vira seus personagens pelo avesso, pene‑<br />
trando nos seus <strong>mais</strong> íntimos segredos, na sua essên‑<br />
cia, para torná ‑los pessoas vivas, <strong>de</strong> carne e osso.<br />
Incorporando as técnicas do teatro e do cinema, a<br />
cada livro apura seu estilo renovador. As situações<br />
inesperadas e os <strong>de</strong>sfechos sempre inusitados tornam<br />
fascinantes os seus livros, reservando ‑lhe um lugar <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>staque na mo<strong>de</strong>rna produção literária do país.<br />
Meu mundo é povoado <strong>de</strong> lembranças dos outros.<br />
Lembranças que incorporo como se fossem minhas<br />
e que <strong>de</strong>pois transformo, transmudo, transfiro.<br />
Memórias do que não fiz ou não vi, mas que, <strong>de</strong><br />
repente, me vêm à tona. Nessa <strong>de</strong>scoberta encontro<br />
a alegria <strong>de</strong> escrever. Um jogo lúdico comigo mesma.<br />
Assim como me surpreendo, quero também surpreen‑<br />
<strong>de</strong>r o leitor.
A IRA DAS ÁGUAS<br />
1 a edição – 224 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0976 ‑1<br />
O poeta Murilo Men<strong>de</strong>s dizia que “só não existe o que não<br />
po<strong>de</strong> ser imaginado”. A frase, adotada como epígrafe <strong>de</strong> A ira<br />
das águas, <strong>de</strong> Edla van Steen, <strong>de</strong>fine o espírito do livro e a abso‑<br />
luta liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> construção temática adotada pela autora.<br />
Recriando o existente, imaginando o inexistente e<br />
pren<strong>de</strong>ndo ‑os na mesma trama, Edla consegue criar em<br />
todos os sete contos do livro um clima <strong>de</strong> incerteza e <strong>de</strong><br />
mistério, cuja origem po<strong>de</strong> se encontrar no inexplicado das<br />
situações ou na mente dos personagens.<br />
Há tramas que se equilibram como no fio da navalha,<br />
como no provocativo “Mãe e filho”, em que a revelação <strong>de</strong><br />
um segredo <strong>de</strong> namorados balança duas famílias, e em<br />
“Mania <strong>de</strong> cinema”, a eclosão <strong>de</strong> um mundo <strong>de</strong> lembran‑<br />
ças <strong>de</strong> uma mulher madura, provocada por uma observa‑<br />
ção <strong>de</strong> um antigo namorado.<br />
Encontros e <strong>de</strong>sencontros físicos e psicológicos assina‑<br />
lam contos como o “Nojo”, no qual Edla mostra ‑se em<br />
pleno domínio do diálogo, justo, conciso e <strong>de</strong>purado, lem‑<br />
brando sua condição <strong>de</strong> autora teatral <strong>de</strong> sucesso, e “Ela e<br />
ele”, história <strong>de</strong> separação. O enigma <strong>de</strong> uma morte mis‑<br />
teriosa é o tema <strong>de</strong> “Rua da praia”.“Um dia como os ou‑<br />
tros” mostra a violência urbana, sem complacência, vista<br />
pela ótica <strong>de</strong> suas maiores vítimas. “A ira das águas” é a<br />
narrativa <strong>mais</strong> longa e complexa do livro, em realida<strong>de</strong> uma<br />
novela, <strong>de</strong>nsa <strong>de</strong> humanida<strong>de</strong>, na qual Deonísio da Silva<br />
enxerga “talvez o ponto <strong>mais</strong> alto <strong>de</strong> sua prosa no gênero<br />
das narrativas curtas”. Autora <strong>de</strong> sucesso nas áreas <strong>de</strong> ci‑<br />
nema, literatura e teatro (Primeira pessoa, escrita especial‑<br />
mente para Eva Wilma, encontra ‑se em cartaz há vários<br />
<strong>anos</strong>, percorrendo o país), com 25 livros publicados, quatro<br />
dos quais traduzidos nos Estados Unidos, com excelente<br />
recepção crítica, Edla van Steen apresenta um dos <strong>mais</strong> im‑<br />
portantes conjuntos <strong>de</strong> obra da literatura brasileira contem‑<br />
porânea, enriquecido por essa A ira das águas.<br />
E d l a v a n S t E E n<br />
ATÉ SEMPRE<br />
1 a edição – 184 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0036 ‑5<br />
Enigmáticas, surpreen<strong>de</strong>ntes, envolvidas por situações<br />
insólitas, os personagens <strong>de</strong> Até sempre vivem naquela fron‑<br />
teira perigosa entre razão e <strong>de</strong>srazão, a um <strong>de</strong>do da <strong>de</strong>mên‑<br />
cia. Edla van Steen gosta <strong>de</strong> sondar essas almas estranhas,<br />
em geral mulheres. O coração feminino é sua terra mágica e<br />
<strong>de</strong> pesa<strong>de</strong>los, pela qual passeia com curiosida<strong>de</strong> e inquieta‑<br />
ção, como se comprova nos onze contos <strong>de</strong>sse livro.<br />
Em “Até sempre”, que dá título ao livro, duas velhas<br />
senhoras, vivendo maritalmente com o mesmo homem,<br />
têm sua vida sacudida pela presença <strong>de</strong> uma sobrinha, es‑<br />
critora estranha que publicara um conto em que o perso‑<br />
nagem cortava o próprio pai num cepo <strong>de</strong> açougue.<br />
Tão ou <strong>mais</strong> inquietante é a octogenária <strong>de</strong> “A pro‑<br />
messa”, que passa <strong>anos</strong> sem cortar as unhas, só admitindo<br />
fazê ‑lo no dia em que a filha abandonar o marido e voltar<br />
para casa. “Folha <strong>de</strong> parreira” narra as relações <strong>de</strong> um casal<br />
com um parceiro, cujo mamilo é pintado <strong>de</strong> ver<strong>de</strong>. A separa‑<br />
ção <strong>de</strong> uma família <strong>de</strong>vido à presença <strong>de</strong> uma estranha carre‑<br />
gando um bebê é o tema <strong>de</strong> “Lembranças no varal: a roda”.<br />
Por vezes, o mistério das almas anda em paralelo ao<br />
mistério <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>terminada situação, como no instigante<br />
“Apesar <strong>de</strong> tudo”, história <strong>de</strong> uma mo<strong>de</strong>lo e <strong>de</strong> um anão<br />
apaixonado, que termina em um assassinato sem solução. A<br />
morte também está presente em “A bela adormecida (ro‑<br />
teiro <strong>de</strong> uma vida inútil)”, no qual a suicida narra seu gesto<br />
extremo, enquanto presencia seu próprio funeral. Em “Vo‑<br />
cação para o Canto Orfeônico” um viúvo vive uma estranhís‑<br />
sima relação com seu filho, procurando inclusive imitar a<br />
mãe no ato <strong>de</strong> aleitamento. Curiosa e atenta às reações <strong>de</strong><br />
seus personagens, com a precisão <strong>de</strong> um operador utilizando<br />
o bisturi, a autora sonda esse universo mórbido com a natu‑<br />
ralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> quem caminha por uma rua ensolarada, o que<br />
aumenta ainda <strong>mais</strong> sua estranheza e seu fascínio.<br />
E d l a v a n S t E E n<br />
121
CHEIRO DE AMOR<br />
Prêmio Nestlé <strong>de</strong> Literatura 1997<br />
(Fundação Nestlé <strong>de</strong> Cultura)<br />
1 a edição – 304 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0535 ‑9<br />
Embora seja autora <strong>de</strong> sucesso nas áreas <strong>de</strong> cinema, lite‑<br />
ratura e teatro, Edla van Steen manifesta sua vocação <strong>mais</strong><br />
autêntica na prosa <strong>de</strong> ficção, romances e contos, terreno em<br />
que ela se movimenta com naturalida<strong>de</strong> e inquietação.<br />
Cheiro <strong>de</strong> amor revela a escritora madura, na plena<br />
posse <strong>de</strong> seus recursos técnicos, instigante, <strong>de</strong>safiadora,<br />
<strong>de</strong>sconfiada da realida<strong>de</strong> cotidiana, com uma visão impla‑<br />
cável da comédia humana, como observa Lauro Junkes no<br />
prefácio à obra:<br />
“Quase que lembraria Dante: ‘Deixai toda esperança,<br />
ó vós que entrais’ por essa ‘selva escura’: nos meandros do<br />
relacionamento humano, nesse intrigado confronto da mu‑<br />
lher com o homem, nesse sobreviver às marcas do tempo,<br />
<strong>de</strong>ixai toda ilusão romântica, <strong>de</strong>salienai ‑vos <strong>de</strong> sentimenta‑<br />
lismos inconsistentes.”.<br />
Essa a atmosfera dos oito contos do livro, que formam<br />
também uma espécie <strong>de</strong> painel do Brasil dos <strong>anos</strong> 1960,<br />
com suas agitações sociais, a repressão militar, o <strong>de</strong>sapare‑<br />
cimento <strong>de</strong> pessoas, o crescimento do uso da droga. Mas<br />
o que predomina é a curiosida<strong>de</strong> e a preocupação com o<br />
humano, com os <strong>de</strong>sencontros conjugais, a revelação<br />
brusca <strong>de</strong> uma natureza lésbica (“Menor que o sonho”), o<br />
vazio existencial terminando pelo suicídio (“Nada a lasti‑<br />
mar” e “Erro”), a vida amorosa <strong>de</strong> uma mulher livre, que<br />
partilha sua cama com três homens, dois <strong>de</strong>les irmãos<br />
(“Cheiro <strong>de</strong> amor”), a frustração amorosa compensada<br />
pela fixação psicológica obsessiva com os astros do cinema<br />
(“Faz <strong>de</strong> conta”), a carência sentimental <strong>de</strong> duas irmãs,<br />
criadas sem o pai, que vêm o mesmo problema atingir seus<br />
filhos (“Rainha ‑do ‑abismo”). Pequenos dramas e comédias,<br />
abismos da alma humana.<br />
122<br />
E d l a v a n S t E E n<br />
CORAÇÕES MORDIDOS<br />
1 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0407 ‑7<br />
Realida<strong>de</strong> ou ilusão? Os fatos serão aquilo que as pala‑<br />
vras dizem ou o seu oposto? On<strong>de</strong> “a lisa e real verda<strong>de</strong>”,<br />
como dizia Guimarães Rosa? Armando um autêntico jogo <strong>de</strong><br />
eng<strong>anos</strong> e equívocos, Edla van Steen, em Corações mordi‑<br />
dos, <strong>de</strong>safia a sagacida<strong>de</strong> do leitor, propõe <strong>de</strong>safios, estimula<br />
sua habilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> raciocínio, arranha sua sensibilida<strong>de</strong> com<br />
o estilete <strong>de</strong> uma história inovadora, instigante, “mistura <strong>de</strong><br />
anticlímax <strong>de</strong> protesto, ironia e alívio”, como a <strong>de</strong>finiu o<br />
crítico norte ‑americano Malcolm Silverman.<br />
A história transcorre na Al<strong>de</strong>ia dos Sinos, um local tran‑<br />
quilo e belo, cheio <strong>de</strong> árvores nativas e chorões plantados por<br />
um personagem, uma espécie <strong>de</strong> microcosmo da socieda<strong>de</strong><br />
brasileira, com seus conflitos e inquietações, que se consome<br />
num acelerado processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>sagregação. E aqui voltamos<br />
ao início <strong>de</strong> tudo. Realida<strong>de</strong> ou ilusão? Os fatos serão aquilo<br />
que as palavras dizem ou o seu oposto? On<strong>de</strong> a verda<strong>de</strong>?<br />
Difícil <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r, já que Corações mordidos é um<br />
romance que se escreve a si mesmo, uma ficção criada a<br />
partir do mundo imaginário <strong>de</strong> Greta. Greta ou Tina? Cria‑<br />
ção <strong>de</strong> um personagem <strong>de</strong> ficção, esse universo tem tam‑<br />
bém estrutura e leis próprias, se bem que sempre em<br />
processo <strong>de</strong> mudança. Assim, um dos personagens, Sonia,<br />
se rebela contra a própria criadora, interessada em “pene‑<br />
trar no universo <strong>mais</strong> íntimo <strong>de</strong> outras pessoas, oriundas <strong>de</strong><br />
estratos aleatórios, que são os daqueles <strong>de</strong> quem ela <strong>de</strong>seja<br />
comprar os sonhos. A criatura sonhada torna ‑se <strong>mais</strong> real<br />
do que o sonhador”, como observa Fausto Cunha.<br />
Jogo <strong>de</strong> eng<strong>anos</strong> e equívocos, partindo do absurdo<br />
para chegar ao enigmático, Corações mordidos representa<br />
um momento <strong>de</strong> angústia e dilaceramento sem muitos<br />
parentes na mo<strong>de</strong>rna ficção brasileira. É um <strong>de</strong>safio pro‑<br />
posto ao leitor, que recompensa bem aos que se propõem<br />
<strong>de</strong>cifrá ‑lo. Conseguirão?<br />
E d l a v a n S t E E n
NO SILÊNCIO<br />
DAS NUVENS<br />
1 a edição – 224 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0701 ‑7<br />
Ao contrário <strong>de</strong> muitos escritores cuja trajetória se ini‑<br />
cia com sua melhor obra, passando em seguida a imitado‑<br />
res <strong>de</strong> si mesmos, a carreira literária <strong>de</strong> Edla van Steen se<br />
caracteriza por um permanente processo <strong>de</strong> renovação e<br />
amadurecimento, não apenas no sentido <strong>de</strong> aprimora‑<br />
mento literário, mas também na visão <strong>de</strong> mundo. A cada<br />
obra, a autora catarinense consegue lançar sua sonda a<br />
maiores profundida<strong>de</strong>s da alma humana.<br />
Neste sentido, No silêncio das nuvens é obra exemplar.<br />
Nela, Edla reafirma, e como que sublinha, todas as suas quali‑<br />
da<strong>de</strong>s <strong>de</strong> narradora e pesquisadora dos caminhos e <strong>de</strong>scami‑<br />
nhos hum<strong>anos</strong>, com sua prosa vigorosa, o estilo preciso, o jogo<br />
permanente e <strong>de</strong>safiador entre o real e o insólito, o domínio<br />
teatral dos diálogos, recriando almas, mas tendo sempre como<br />
pano <strong>de</strong> fundo o quadro da socieda<strong>de</strong> contemporânea.<br />
No silêncio das nuvens reúne quatro contos e uma<br />
novela, unidos por uma visão <strong>de</strong>siludida da vida, por vezes<br />
amarga, como já indica a epígrafe do livro, <strong>de</strong> Carlos Drum‑<br />
mond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>: “As coisas. Que tristes são as coisas,<br />
consi<strong>de</strong>radas sem ênfase.”.<br />
De fato, se há algo que a autora repudia é a ênfase. An‑<br />
tienfática por natureza, essa característica como que distingue<br />
todos os trabalhos do livro, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> “Bodas <strong>de</strong> ouro”, uma refle‑<br />
xão pessimista sobre a velhice e a morte, até “No silêncio das<br />
nuvens”, o encontro <strong>de</strong> velhos amigos, num clima sufocante <strong>de</strong><br />
horrores, passando por “O rei dos malditos”, que se <strong>de</strong>senrola<br />
durante o enterro do protagonista; “A vingança”, a história<br />
cheia <strong>de</strong> surpresas <strong>de</strong> um avarento, e “Amor pelas miniaturas”,<br />
em que o leitor passeia em pleno terreno do insólito, no qual<br />
cinco bonecas influenciam o <strong>de</strong>stino dos protagonistas.Como<br />
resumiu o crítico norte ‑americano David S. George: “No silêncio<br />
das nuvens é um livro maduro, pela temática, mas ao mesmo<br />
tempo pelo estilo, com perdão a Bob Dylan, forever young.”.<br />
E d l a v a n S t E E n<br />
OBRAS DE LITERATURA INFANTIL E JUVENIL<br />
DA AUTORA<br />
• A revolta (prelo)<br />
• Manto <strong>de</strong> nuvem<br />
• O gato barbudo<br />
• O presente<br />
• Por acaso<br />
E d l a v a n S t E E n<br />
123
É<strong>de</strong>r Luiz Me<strong>de</strong>iros/Folha Imagem<br />
C o l e ç ã o<br />
F l o r e s t a n F e r n a n d e s<br />
124<br />
Nascido na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo no dia 22 <strong>de</strong> julho<br />
<strong>de</strong> 1920, Florestan Fernan<strong>de</strong>s começou a trabalhar<br />
aos seis <strong>anos</strong> <strong>de</strong>vido à necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ganhar a vida<br />
“como se fosse um adulto [...] pelas vias da expe‑<br />
riência concreta, no conhecimento do que é a convi‑<br />
vência humana e a socieda<strong>de</strong>”, segundo o próprio<br />
autor. Então ven<strong>de</strong>dor <strong>de</strong> produtos farmacêuticos,<br />
aos <strong>de</strong>zoito <strong>anos</strong> ingressou na Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Filoso‑<br />
fia, Ciências e Letras da USP, on<strong>de</strong> se formou em<br />
Ciências Sociais e doutorou ‑se em 1951. Foi profes‑<br />
sor universitário no Brasil e no exterior, <strong>de</strong>putado<br />
fe<strong>de</strong>ral por dois mandatos e importante sociólogo,<br />
cujas i<strong>de</strong>ias criaram uma nova maneira <strong>de</strong> pensar o<br />
nosso país e a América Latina. Tem <strong>mais</strong> <strong>de</strong>cinquenta<br />
livros publicados, além <strong>de</strong> inúmeros ensaios e artigos<br />
em importantes revistas e jornais.<br />
Ninguém ignora o quanto a heterogeneida<strong>de</strong> cultural<br />
e racial afetou, está afetando e continuará a afetar as<br />
possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento da “civilização<br />
oci<strong>de</strong>ntal” no Brasil. Sob esse aspecto, as questões<br />
pertinentes ao assunto possuem o caráter <strong>de</strong> problema<br />
nacional, o que confere às investigações realizadas ou<br />
em curso um interesse prático iniludível.
A INVESTIGAÇÃO<br />
ETNOLÓGICA NO<br />
BRASIL E OUTROS<br />
ENSAIOS<br />
2 a edição – 320 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0138‑1<br />
Investigação etnológica no Brasil e outros ensaios, <strong>de</strong><br />
Florestan Fernan<strong>de</strong>s, reúne cinco estudos publicados em<br />
épocas diversas e incorporados anteriormente a outros li‑<br />
vros do autor. A reunião no presente volume lhes dá a <strong>de</strong>‑<br />
vida unida<strong>de</strong>, facilitando a tarefa do pesquisador.<br />
Os ensaios encontram ‑se agrupados em dois blocos. A<br />
primeira parte, referente a “O mundo dos índios e sua crise”,<br />
estuda o contato do português com o Tupi (ao mesmo<br />
tempo a principal fonte <strong>de</strong> resistência ao colonizador e seu<br />
melhor ponto <strong>de</strong> apoio, entre as populações nativas), o cho‑<br />
que <strong>de</strong>corrente, as mudanças provocadas na civilização tupi<br />
e as reações à conquista (“Os Tupi e a reação tribal à con‑<br />
quista”); a educação entre os Tupinambá – grupo étnico<br />
regido por uma or<strong>de</strong>m tribal “tradicionalista”, “sagrada” e<br />
“fechada” – e sua aplicação na vida prática (“Notas sobre a<br />
educação na socieda<strong>de</strong> tupinambá”); e um estudo sobre a<br />
curiosa figura do professor Tiago Marques Aipobureu, índio<br />
Bororo integrado à civilização do homem branco, que até<br />
viveu na Europa, sem se <strong>de</strong>sligar <strong>de</strong> suas raízes e por isso em<br />
eterno conflito consigo mesmo, dividido entre os apelos <strong>de</strong><br />
duas culturas (“Tiago Marques Aipobureu: um Bororo mar‑<br />
ginal”). A segunda parte, <strong>de</strong>nominada “O conhecimento<br />
etnológico da realida<strong>de</strong>”, divi<strong>de</strong> ‑se em dois capítulos: “Ten‑<br />
dências teóricas da mo<strong>de</strong>rna investigação etnológica no<br />
Brasil”, que avalia a situação da pesquisa etnológica nos<br />
<strong>anos</strong> 1950, e “Um balanço crítico da contribuição etnográ‑<br />
fica dos cronistas”, uma tentativa <strong>de</strong> análise crítica do con‑<br />
teúdo etnográfico dos autores quinhentistas e seiscentistas<br />
que registraram informações sobre a vida social dos Tupi‑<br />
nambá. Os textos são reproduzidos sem alteração, como<br />
documentos <strong>de</strong> uma época, mantendo ileso seu interesse.<br />
F l o r e s t a n F e r n a n d e s<br />
BRANCOS E NEGROS<br />
EM SÃO PAULO<br />
Coautor:<br />
Roger Basti<strong>de</strong><br />
5 a edição – 304 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1258 ‑5<br />
Há muito se fazia necessário uma reedição <strong>de</strong> Brancos<br />
e negros em São Paulo, clássico no estudo das relações<br />
raciais no Brasil. O livro reaparece em momento oportuno,<br />
quando se intensificam os <strong>de</strong>bates sobre a questão das po‑<br />
líticas voltadas aos negros e as cotas em universida<strong>de</strong>s.<br />
As origens da obra remontam à década <strong>de</strong> 1950,<br />
quando o estudo sobre raça e preconceito ganhava contor‑<br />
nos científicos e o Brasil era consi<strong>de</strong>rado um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong><br />
relações harmoniosas entre brancos e negros, tese consa‑<br />
grada nos trabalhos <strong>de</strong> Gilberto Freyre. Por sugestão da<br />
Unesco, foram realizadas pesquisas em quatro metrópoles<br />
brasileiras, cabendo a incumbência, no que se refere à ci‑<br />
da<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, aos professores Roger Basti<strong>de</strong> e seu<br />
discípulo, Florestan Fernan<strong>de</strong>s.<br />
Adotando novos instrumentos teóricos e metodológi‑<br />
cos da sociologia crítica, os autores dirigiram o foco <strong>de</strong> suas<br />
análises para as relações raciais e os mecanismos <strong>de</strong> acomo‑<br />
dação social entre brancos e negros, que “se formaram no<br />
regime senhorial escravocrata, modificaram ‑se à medida que<br />
ruiu a antiga or<strong>de</strong>m senhorial ‑servil, dando lugar a uma so‑<br />
cieda<strong>de</strong> capitalista ‑competitiva baseada no trabalho livre”,<br />
como explica Fernando Henrique Cardoso no prefácio.<br />
A obra recebeu excelente acolhida crítica, mas provocou<br />
também reações irritadas <strong>de</strong> pessoas que viam em suas conclu‑<br />
sões uma atitu<strong>de</strong> perigosa, “como se os investigadores fossem<br />
responsáveis pelas tensões latentes ou abertas, que eles se limi‑<br />
taram a <strong>de</strong>screver e a interpretar” (Florestan Fernan<strong>de</strong>s).<br />
Mais <strong>de</strong> meio século <strong>de</strong>pois, a obra se mantém como<br />
um texto fundamental para a compreensão do problema<br />
da discriminação racial no país e a elaboração <strong>de</strong> políticas<br />
voltadas para a inserção do negro na or<strong>de</strong>m social capita‑<br />
lista brasileira, guiando “as novas gerações na busca <strong>de</strong><br />
melhor entendimento da formação social do Brasil” (Fer‑<br />
nando Henrique Cardoso).<br />
F l o r e s t a n F e r n a n d e s<br />
125
CAPITALISMO<br />
DEPENDENTE E<br />
CLASSES SOCIAIS NA<br />
AMÉRICA LATINA<br />
4 a edição – 152 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0152 ‑7<br />
A reedição <strong>de</strong> Capitalismo <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte e classes sociais<br />
na América Latina ocorre em momento oportuno, quando a<br />
América Latina vive tempos <strong>de</strong> exacerbação do nacionalismo<br />
e <strong>de</strong> repúdio à hegemonia econômica dos Estados Unidos.<br />
O clássico <strong>de</strong> Florestan Fernan<strong>de</strong>s, em seus três capítulos,<br />
ajuda a compreen<strong>de</strong>r a situação atual mediante a análise das<br />
origens históricas <strong>de</strong>ssa velha e persistente crise que, perio‑<br />
dicamente, se manifesta com maior ou menor veemência.<br />
“Padrões <strong>de</strong> dominação externa na América Latina”, o<br />
primeiro ensaio do livro, estuda a imposição do capitalismo<br />
na América Latina e a incapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reação dos países do<br />
continente “<strong>de</strong> impedir sua incorporação <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte ao<br />
espaço econômico, cultural e político das sucessivas nações<br />
hegemônicas”. O estudo analisa quatro tipos <strong>de</strong> dominação<br />
externa: colonialismo, controle do comércio pelas nações<br />
europeias, neocolonialismo surgido após a Revolução Indus‑<br />
trial na Europa e, por fim, a expansão <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s empresas<br />
corporativas no continente, representantes do capitalismo<br />
corporativo ou monopolista e que se apossam, por meio <strong>de</strong><br />
mecanismos financeiros, pressão ou corrupção, do espaço<br />
ocupado anteriormente pelas empresas nativas. A análise se<br />
<strong>de</strong>tém com <strong>mais</strong> atenção e profundida<strong>de</strong> nesse novo tipo <strong>de</strong><br />
imperialismo, “<strong>de</strong>strutivo para o <strong>de</strong>senvolvimento dos países<br />
latino ‑americ<strong>anos</strong>”, na hegemonia econômica dos Estados<br />
Unidos no continente e na dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> resolver, através do<br />
capitalismo, o que o autor chama <strong>de</strong> “o dilema latino‑<br />
‑americano”. “Problemas <strong>de</strong> conceituação das classes sociais<br />
na América Latina” analisa a função das classes sociais no<br />
continente, a dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> conceituá ‑las, sua dinâmica sob<br />
o capitalismo e suas relações com o po<strong>de</strong>r. Em “Sociologia,<br />
mo<strong>de</strong>rnização autônoma e revolução social” o autor expõe‑<br />
seu pensamento sobre a função do sociólogo na evolução<br />
atual da socieda<strong>de</strong>.<br />
126<br />
F l o r e s t a n F e r n a n d e s<br />
FLORESTAN<br />
FERNANDES<br />
LEITURAS & LEGADOS<br />
1 a edição – 376 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1462 ‑6<br />
Florestan Fernan<strong>de</strong>s: leituras & legados reúne doze<br />
ensaios <strong>de</strong> Florestan Fernan<strong>de</strong>s, escritos na mocida<strong>de</strong> e <strong>de</strong><br />
difícil acesso, e a transcrição <strong>de</strong> uma entrevista, concedida<br />
ao programa <strong>de</strong> tevê Roda Viva, na maturida<strong>de</strong>, revelando<br />
a coerência <strong>de</strong> seu pensamento ao longo da vida. Os textos<br />
abordam temas e motivos diversos, tratados com o ímpeto<br />
peculiar ao sociólogo paulista e agrupados em dois módu‑<br />
los: leituras e legados.<br />
O primeiro texto, a introdução escrita por Florestan<br />
para a sua tradução <strong>de</strong> Contribuição à crítica da economia<br />
política, <strong>de</strong> Karl Marx, “centra sua interpretação no trata‑<br />
mento dos problemas analíticos, buscando estabelecer pon‑<br />
tes <strong>de</strong> diálogo entre os autores, tendo em vista embasar e<br />
aprofundar as operações <strong>de</strong> explicação nas ciências sociais”,<br />
esclarece Maria Arminda do Nascimento Arruda no prefácio<br />
à obra, acrescentando ser esse o registro comum aos textos<br />
reunidos no volume, apesar <strong>de</strong> sua varieda<strong>de</strong>.<br />
Com liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> espírito, o jovem estudioso aborda<br />
no módulo <strong>de</strong> leituras realida<strong>de</strong>s tão diversas como “Mário<br />
<strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> e o folclore brasileiro”, “Tiago Marques Aipo‑<br />
bureu; um bororo marginal”, “A economia tupinambá –<br />
ensaio <strong>de</strong> interpretação sociológica do sistema econômico<br />
<strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> tribal”, “A Revolução Constitucionalista<br />
e o estudo sociológico da guerra”, “Contribuição para o<br />
estudo <strong>de</strong> um lí<strong>de</strong>r carismático” e “A aculturação dos sírios<br />
e libaneses em São Paulo”.<br />
No módulo <strong>de</strong> legados são abordados temas como<br />
“A sociologia no Brasil, “A educação como problema so‑<br />
cial”, “As relações raciais em São Paulo reexaminadas”,<br />
“Da aliança à solidarieda<strong>de</strong>”, “Reflexão sobre o socialismo<br />
e a autoemancipação dos trabalhadores”, completados<br />
pela transcrição da entrevista concedida pelo sociólogo<br />
ao programa <strong>de</strong> tevê Roda Viva e o ensaio <strong>de</strong>nominado<br />
“O jovem Florestan”, <strong>de</strong> Antonio Candido.<br />
F l o r e s t a n F e r n a n d e s
MUDANÇAS SOCIAIS<br />
NO BRASIL<br />
4 a edição – 328 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1334 ‑6<br />
Mudanças sociais no Brasil reúne doze ensaios escritos<br />
no período <strong>de</strong> 1946 e 1959, entre a re<strong>de</strong>mocratização,<br />
após a ditadura do Estado Novo, e os <strong>anos</strong> do governo<br />
Juscelino Kubitschek, marcado pelo <strong>de</strong>senvolvimentismo, a<br />
construção <strong>de</strong> Brasília, a mo<strong>de</strong>rnização industrial.<br />
Neles, Florestan Fernan<strong>de</strong>s analisa questões sociológicas,<br />
culturais, econômicas e históricas, <strong>de</strong>bate a luta <strong>de</strong> classes e o<br />
<strong>de</strong>senvolvimento em um país <strong>de</strong> capitalismo tardio.<br />
Com erudição, clareza e equilíbrio, são analisadas al‑<br />
gumas das preocupações <strong>mais</strong> marcantes da época, ques‑<br />
tões sujeitas a <strong>de</strong>bates ar<strong>de</strong>ntes, como o processo <strong>de</strong><br />
industrialização, então em sua fase inicial, no qual o estu‑<br />
dioso reconhece o êxito, mas alerta para as “<strong>de</strong>bilida<strong>de</strong>s<br />
básicas do padrão brasileiro <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento indus‑<br />
trial”, gerador <strong>de</strong> pontos <strong>de</strong> estrangulamento.<br />
Por ocasião do quarto centenário <strong>de</strong> fundação <strong>de</strong> São<br />
Paulo, o sociólogo analisa as transformações sociais, políti‑<br />
cas e econômicas da cida<strong>de</strong>, que em cinquenta <strong>anos</strong> au‑<br />
mentou <strong>mais</strong> <strong>de</strong> sete vezes a sua população, dando origem<br />
a um mundo social novo, a primeira cida<strong>de</strong> autenticamente<br />
burguesa do Brasil, cujo espaço o homem conquistou, mas<br />
sem domesticá ‑lo, no sentido urbano.<br />
O ensaio sobre a situação do vale do Paraíba, à época,<br />
com seus conflitos sociais, ascensão <strong>de</strong> novas classes, res‑<br />
sentimento dos que per<strong>de</strong>ram po<strong>de</strong>r político, econômico e<br />
social, resulta <strong>de</strong> um trabalho <strong>de</strong> campo, com três viagens<br />
à região.<br />
Mudanças sociais no Brasil, como observa Marco An‑<br />
tonio Villa no prefácio, “permanece como uma importante<br />
contribuição para o conhecimento crítico do nosso país,<br />
como um exercício <strong>de</strong> um sociólogo militante frente à com‑<br />
plexida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> classes, seus dilemas, suas<br />
contradições e possíveis formas <strong>de</strong> superação.”.<br />
F l o r e s t a n F e r n a n d e s<br />
O NEGRO NO MUNDO<br />
DOS BRANCOS<br />
2 a edição – 320 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1230 ‑1<br />
A década <strong>de</strong> 1960 ficou assinalada pelo incremento<br />
dos estudos sobre o negro brasileiro. Durante muitos <strong>anos</strong>,<br />
analisada em um ou outro livro ou artigo esporádico, a<br />
participação do <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> africano no Brasil começou<br />
a ser reavaliada (segundo alguns <strong>de</strong> maneira um tanto i<strong>de</strong>a‑<br />
lizada) por Gilberto Freyre, em Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala<br />
(1933). Nos <strong>anos</strong> seguintes, os estudiosos assumiram posi‑<br />
ções <strong>mais</strong> realistas, pondo <strong>de</strong> lado velhos chavões, como a<br />
inexistência <strong>de</strong> preconceito racial no país. Buscaram ‑se en‑<br />
foques inéditos <strong>de</strong> abordagem do problema, analisaram ‑se<br />
aspectos ainda não avaliados, sempre amparados em pes‑<br />
quisa <strong>de</strong> campo e levantamento minucioso <strong>de</strong> dados.<br />
O negro no mundo dos brancos, do professor Flores‑<br />
tan Fernan<strong>de</strong>s, reflete essas tendências através <strong>de</strong> seus ca‑<br />
torze ensaios, centrados na preocupação com a supremacia<br />
da “raça branca” e o controle do po<strong>de</strong>r que ela exerce em<br />
nossa socieda<strong>de</strong>, fazendo do Brasil um mundo social mo‑<br />
<strong>de</strong>lado pelo branco e para o branco. Estudando a situação<br />
do negro e do mulato na socieda<strong>de</strong> brasileira, vista a partir<br />
<strong>de</strong> São Paulo, Florestan Fernan<strong>de</strong>s levanta os caminhos si‑<br />
nuosos assumidos pelo preconceito, os seus disfarces e o<br />
processo <strong>de</strong> segregação racial, sem agravar ou atenuar o<br />
problema. Sua visão é <strong>de</strong> que o equilíbrio racial na socie‑<br />
da<strong>de</strong> brasileira “proce<strong>de</strong> do modo pelo qual os dois polos<br />
se articulam com um mínimo <strong>de</strong> fricção”, padrão <strong>de</strong> equi‑<br />
líbrio que é a própria base da <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> racial. O livro<br />
aborda ainda outros assuntos <strong>mais</strong> heterogêneos e fortui‑<br />
tos, como o significado das pesquisas sobre relações raciais,<br />
a presença do negro “em nosso folclore e nos quadros da<br />
religião popular”, todos eles se comunicando entre si, aju‑<br />
dando a <strong>de</strong>svendar a situação real do negro na socieda<strong>de</strong><br />
brasileira, mas também afirmando as “preocupações mo‑<br />
rais e políticas” do autor.<br />
F l o r e s t a n F e r n a n d e s<br />
127
SOCIEDADE DE CLASSES<br />
E SUBDESEN VOLVIMENTO<br />
4 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1270 ‑7<br />
Consi<strong>de</strong>rado um clássico dos estudos sociais brasilei‑<br />
ros, Socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> classes e sub<strong>de</strong>senvolvimento reúne di‑<br />
versos ensaios, escritos entre 1965 e 1967, referentes ao<br />
sub<strong>de</strong>senvolvimento brasileiro e às perspectivas históricas<br />
<strong>de</strong> sua superação, nos quadros da socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> classes.<br />
Na época, começava a se formar o conceito <strong>de</strong> <strong>de</strong>sen‑<br />
volvimento, num mundo on<strong>de</strong> a maioria dos países era<br />
pobre e atrasada, pouco industrializada e pouco urbani‑<br />
zada. Países realmente adiantados eram as nações da Eu‑<br />
ropa oci<strong>de</strong>ntal, da América do Norte e o Japão.<br />
O <strong>de</strong>bate sobre a natureza do <strong>de</strong>senvolvimento, e as<br />
causas <strong>de</strong> sua distribuição <strong>de</strong>sigual pelo mundo, tornou ‑se<br />
então intenso. Florestan Fernan<strong>de</strong>s <strong>de</strong>le participou, vol‑<br />
tando seu foco para os problemas específicos da socieda<strong>de</strong><br />
brasileira.<br />
Recorrendo às raízes históricas, para enten<strong>de</strong>r o pre‑<br />
sente, o estudioso <strong>de</strong>monstra como momentos vitais na<br />
vida da nação, no século XIX – como a in<strong>de</strong>pendência e a<br />
abolição da escravatura –, contribuíram para a criação <strong>de</strong><br />
acentuados <strong>de</strong>sajustes na formação do país, já que as mu‑<br />
danças jurídico ‑políticas não produziram as mudanças so‑<br />
cioeconômicas necessárias para a construção <strong>de</strong> uma<br />
or<strong>de</strong>m social competitiva.<br />
Ao avaliar a mo<strong>de</strong>rnização da economia brasileira, e a<br />
sua inclusão no mercado mundial capitalista, Florestan an‑<br />
tevia que o processo levaria à formação <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> classes duplamente <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, pois os rumos <strong>de</strong> sua<br />
economia ligavam ‑se aos interesses dos países ricos, e o<br />
seu <strong>de</strong>senvolvimento sociocultural se veria impossibilitado.<br />
Passados quase cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong>ssas consi<strong>de</strong>rações,<br />
esta reedição permite ao leitor avaliar, com as perspectivas do<br />
tempo, as análises e as teses apresentadas pelo sociólogo.<br />
128<br />
F l o r e s t a n F e r n a n d e s
Arquivo da Fundação Gilberto Freyre<br />
C o l e ç ã o<br />
G i l B e r t o F r e y r e<br />
OBRA DE LITERATURA INFANTIL DO AUTOR<br />
• O outro Brasil que vem aí<br />
G i l B e r t o F r e y r e<br />
Pernambucano do Recife, escritor, sociólogo, etnó‑<br />
logo, antropólogo, educador, jornalista, político, aos 23<br />
<strong>anos</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>u nos Estados Unidos a tese Vida social<br />
no Brasil nos meados do século XIX, tema que <strong>de</strong>sen‑<br />
volveria <strong>de</strong>pois em seu livro <strong>mais</strong> famoso, Casa‑gran<strong>de</strong><br />
& senzala, <strong>de</strong> 1933, no qual fez um dos <strong>mais</strong> comple‑<br />
tos estudos sobre a formação da socieda<strong>de</strong> brasileira.<br />
Apaixonado pelo Brasil e pela cultura luso ‑tropical, <strong>de</strong>s‑<br />
montou teses pessimistas sobre a capacida<strong>de</strong> empre‑<br />
en<strong>de</strong>dora do homem brasileiro, exaltando a trilogia<br />
étnica – índio, branco e negro – sobre a qual se ergueu<br />
nosso país. Deixou vasta obra e colaborou com várias<br />
publicações. Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala é um dos livros<br />
brasileiros <strong>mais</strong> publicados no exterior.<br />
O humano só po<strong>de</strong> ser compreendido pelo humano –<br />
até on<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser compreendido; e compreensão<br />
importa em maior ou menor sacrifício da objetivida<strong>de</strong><br />
à subjetivida<strong>de</strong>. Pois tratando ‑se <strong>de</strong> passado humano,<br />
há que <strong>de</strong>ixar ‑se espaço para a dúvida e até para o<br />
mistério.<br />
129
AÇÚCAR<br />
UMA SOCIOLOGIA DO DOCE,<br />
COM RECEITAS DE BOLOS E<br />
DOCES DO NORDESTE DO BRASIL<br />
5 a edição – 272 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1069 ‑7<br />
Responsável pelo primeiro gran<strong>de</strong> ciclo econômico da<br />
história do Brasil, a cana ‑<strong>de</strong> ‑açúcar moldou a formação e a<br />
i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> do Nor<strong>de</strong>ste e o jeito <strong>de</strong> ser e a alma do nor<strong>de</strong>s‑<br />
tino. “Sem açúcar não se compreen<strong>de</strong> o homem do Nor‑<br />
<strong>de</strong>ste”, afirma Gilberto Freyre em Açúcar, subtitulado “uma<br />
sociologia do doce, com receitas <strong>de</strong> bolos e doces do Nor‑<br />
<strong>de</strong>ste do Brasil”.<br />
Lançado em 19<strong>39</strong>, o livro <strong>de</strong>spertou certa surpresa<br />
entre intelectuais. Ora, ora, um escritor consagrado tra‑<br />
tando <strong>de</strong> receitas, falando <strong>de</strong> tachos <strong>de</strong> cobre, <strong>de</strong> ponto <strong>de</strong><br />
doce, <strong>de</strong> fôrmas, <strong>de</strong> colheres <strong>de</strong> pau, <strong>de</strong> raladores, coisas<br />
tão femininas e tão da cozinha...<br />
Dessas insinuações, Gilberto Freyre se <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>u por<br />
antecipação ao utilizar como epígrafe uma frase <strong>de</strong> Domin‑<br />
gos Rodrigues, autor <strong>de</strong> Arte da cozinha, livro publicado no<br />
fim do século XVII e <strong>de</strong>dicado ao con<strong>de</strong> <strong>de</strong> Vimioso: “É o<br />
livro ocasionado aos mordazes pela matéria e pelo estilo;<br />
mas uma e outra cousa será <strong>de</strong> todos respeitada sendo<br />
com o ilustre nome <strong>de</strong> V. S.ª <strong>de</strong>fendido.”.<br />
Hoje, Açúcar é um clássico e, <strong>mais</strong> do que isso, uma<br />
introdução insubstituível ao reino mágico dos doces e dos<br />
bolos nor<strong>de</strong>stinos, magia que se elabora na cozinha e ter‑<br />
mina na barriga do freguês, mas que vive inúmeras outras<br />
fases: da colheita da cana e da goiaba, do caju ou <strong>de</strong> qual‑<br />
quer outra fruta utilizada em doces, à venda, outrora ao re‑<br />
frão tradicional do ven<strong>de</strong>dor <strong>de</strong> rua. Isso sem falar em outra<br />
magia: a dos nomes <strong>de</strong> bolos, bolinhos, biscoitos, sequilhos,<br />
doces. Alguns provocativos, sensuais: argolinhas <strong>de</strong> amor,<br />
baba <strong>de</strong> moça, beijos <strong>de</strong> cabocla, quindim <strong>de</strong> iaiá, outros se<br />
revelando logo, num apelo direto ao paladar: doces <strong>de</strong> jaca<br />
mole, <strong>de</strong> laranja ‑da ‑terra, <strong>de</strong> sapoti, compota <strong>de</strong> cidra ou <strong>de</strong><br />
limão. De todos eles, e <strong>de</strong> alguns sorvetes, fica registrada a<br />
receita (são centenas) neste livro saboroso como um doce <strong>de</strong><br />
coco ou <strong>de</strong> araçá. À escolha do freguês.<br />
130<br />
G i l b e r t o F r e y r e<br />
ASSOMBRAÇÕES DO<br />
RECIFE VELHO<br />
6 a edição revista – 240 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1310 ‑0<br />
O contato com assombrações po<strong>de</strong> ser extremamente<br />
agradável, quando apresentado por um escritor como Gil‑<br />
berto Freyre. Curioso das realida<strong>de</strong>s evi<strong>de</strong>ntes e das reali‑<br />
da<strong>de</strong>s possíveis, o autor <strong>de</strong> Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala conduz<br />
o leitor, neste livro – enriquecido com belas ilustrações <strong>de</strong><br />
Poty –, por um insinuante passeio pelos terrores e imagina‑<br />
ções vivas no passado do povo recifense e ainda persisten‑<br />
tes na atualida<strong>de</strong>.<br />
Sem adotar qualquer postura crítica ou crédula, ape‑<br />
nas com olhos <strong>de</strong> cientista, fascinado por todas as experiên‑<br />
cias humanas, o autor apresenta ao leitor um <strong>de</strong>sfile dos<br />
<strong>mais</strong> variados tipos <strong>de</strong> criaturas <strong>de</strong>moníacas, que a tradição<br />
popular conservou, e ainda conserva e teme, “toda uma<br />
fauna infernal que se a sociologia do sobrenatural <strong>de</strong>scesse<br />
do divino ou do angélico ao misticamente bestial, teria que<br />
consi<strong>de</strong>rar como ‘socieda<strong>de</strong>’ a seu modo animal”, como<br />
observa Freyre.<br />
Os casos apresentados no livro baseiam ‑se na tradição<br />
viva ou segundo o testemunho dos que o viveram. Fisgado<br />
na tradição, há o caso do barão perseguido a vida toda<br />
pelo diabo, que se apossou <strong>de</strong> sua alma e também <strong>de</strong> seu<br />
corpo. Diz ‑se que a família, para fingir enterrá ‑lo, encheu<br />
o caixão <strong>de</strong> pedras.<br />
Contado por testemunha ilustre, o professor Sílvio Ra‑<br />
belo, há o caso do aviso <strong>de</strong> morte, comunicado através do<br />
ruído <strong>de</strong> cristais que pareciam se <strong>de</strong>spedaçar, mas que se<br />
mantinham intatos. O fenômeno se <strong>de</strong>u no exato momento<br />
da morte <strong>de</strong> uma amiga do <strong>de</strong>poente. Mas o sobrenatural<br />
se manifesta também <strong>de</strong> maneira agradável, como se com‑<br />
prova no caso do pobre que ganhou no bicho graças a<br />
Nossa Senhora. Realida<strong>de</strong>? Imaginação? Ou simples mani‑<br />
festações do gran<strong>de</strong> mistério da vida, que continua co‑<br />
nosco, “embora diminuído pela luz elétrica e por outras<br />
luzes”, como escreve Freyre?<br />
G i l b e r t o F r e y r e
CASA GRANDE<br />
& SENZALA<br />
51 a edição – 728 páginas<br />
2 encartes coloridos (32 páginas)<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0869 ‑4<br />
Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala, publicada em 1933, <strong>mais</strong> do<br />
que uma re<strong>de</strong>scoberta da nação brasileira, foi uma espécie<br />
<strong>de</strong> fundação do Brasil no plano cultural, como observou<br />
Darcy Ribeiro, tal como Cervantes havia feito em relação à<br />
Espanha, Camões à Portugal e Tolstoi à Rússia. Valorizando<br />
o papel do negro na história brasileira, exaltando a misci‑<br />
genação racial, <strong>de</strong>smistificando preconceitos e reconhe‑<br />
cendo a originalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> nossa cultura, tipicamente<br />
tropical, o livro caiu como um meteoro nos meios intelec‑<br />
tuais. A novida<strong>de</strong> estava tanto no pensamento do autor<br />
como na sua forma <strong>de</strong> se expressar e nos métodos utiliza‑<br />
dos na montagem da obra. A linguagem <strong>de</strong> Gilberto Freyre<br />
tinha uma irreverência <strong>de</strong>sconhecida nas letras brasileiras,<br />
por vezes um tom <strong>de</strong> gozação, que chegou a provocar pro‑<br />
testos <strong>de</strong> algumas correntes <strong>mais</strong> conservadoras. Mais inte‑<br />
ressante ainda foi o material recolhido para mostrar a face<br />
autêntica do Brasil: diários esquecidos, receitas <strong>de</strong> bolos e<br />
doces, práticas cotidianas como o cafuné e a retirada <strong>de</strong><br />
bichos ‑do ‑pé, nas quais se revelavam um exacerbado sen‑<br />
sualismo, relações sexuais entre marido e mulher, entre<br />
sinhô e escravas, entre escravos e sinhás, raptos, o amor à<br />
higiene, os muitos banhos tomados a cada dia pelos brasi‑<br />
leiros, fatos a que ninguém ligava importância, mas muito<br />
<strong>mais</strong> eloquentes na revelação do povo brasileiro e do Brasil<br />
como nação do que as exaltações convencionais <strong>de</strong> feitos<br />
históricos.<br />
Mais <strong>de</strong> setenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> sua publicação, Casa‑<br />
‑gran<strong>de</strong> & senzala firma ‑se como um dos livros capitais da<br />
cultura brasileira, sem o qual é impossível conhecer o Brasil,<br />
ao lado <strong>de</strong> Os sertões, <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s da Cunha, dos romances<br />
da maturida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis, e <strong>de</strong> <strong>mais</strong> uma meia<br />
dúzia <strong>de</strong> obras.<br />
Essa edição, num belo trabalho gráfico, repleta <strong>de</strong><br />
ilustrações em cores, faz jus à obra.<br />
G i l b e r t o F r e y r e<br />
CASA GRANDE<br />
& SENZALA EM<br />
QUADRINHOS<br />
3 a edição – 64 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1059 ‑8<br />
Quando Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala surgiu, em 1933, foi<br />
saudado como o <strong>mais</strong> vivo, apaixonante e inovador retrato<br />
da formação da socieda<strong>de</strong> brasileira até então. No livro <strong>de</strong><br />
Gilberto Freyre, escrito como um romance épico, povoado<br />
por brancos, negros e índios, pela primeira vez o povo bra‑<br />
sileiro ganhava ingresso pela porta <strong>de</strong> frente da história.<br />
Em 1981, com o incentivo do autor, o livro foi quadri‑<br />
nizado, com <strong>de</strong>senhos em preto e branco <strong>de</strong> Ivan Wasth<br />
Rodrigues. Gilberto Freyre gostou, classificando o trabalho<br />
“<strong>de</strong> regalo para os olhos e para a inteligência da criança<br />
brasileira” e também “do adolescente e do adulto”. A<br />
adaptação – po<strong>de</strong>ríamos dizer até o roteiro, pois os quadri‑<br />
nhos têm alguma coisa <strong>de</strong> cinematográfico – foi elaborada<br />
pelo professor Estevão Pinto, capaz <strong>de</strong> extrair da obra o<br />
essencial, numa operação tão complicada como é a trans‑<br />
posição <strong>de</strong> um gênero artístico para outro.<br />
Em 2000, nas comemorações do centenário <strong>de</strong> nasci‑<br />
mento <strong>de</strong> Gilberto Freyre, os <strong>de</strong>senhos <strong>de</strong> Rodrigues foram<br />
colorizados por Noguchi, ganhando um extraordinário re‑<br />
levo e dando à obra sua face <strong>de</strong>finitiva. Tinha tudo para<br />
agradar as crianças <strong>de</strong> todas as ida<strong>de</strong>s.<br />
Pois a história em quadrinhos, como reconheceu Freyre,<br />
conta com uma freguesia bem <strong>mais</strong> ampla do que o público<br />
infantil, uma legião <strong>de</strong> leitores fiéis, adolescentes e adultos,<br />
capazes <strong>de</strong> se <strong>de</strong>liciar com Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala quadrini‑<br />
zada, mas também <strong>de</strong> se interessar pela obra original. Essa<br />
é uma das vantagens do quadrinho, sobretudo quando ela‑<br />
borado com arte. Incapaz <strong>de</strong> sintetizar a complexida<strong>de</strong> e a<br />
riqueza <strong>de</strong> pontos <strong>de</strong> vista <strong>de</strong> uma obra como Casa ‑gran<strong>de</strong><br />
& senzala, ele atua como ponte entre os dois gêneros, ma‑<br />
ravilhando o leitor <strong>de</strong> quadrinhos e ao mesmo tempo<br />
aguçando ‑lhe o <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> conhecer a obra matriz. E para<br />
quem já leu a obra, ajuda a recordar e visualizar aspectos e<br />
até <strong>de</strong>spertá ‑lo para as sugestões plásticas do original.<br />
G i l b e r t o F r e y r e<br />
131
CHINA TROPICAL<br />
2 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1587 ‑6<br />
China tropical reúne oito textos do mestre <strong>de</strong> Apipucos<br />
sobre a presença e a influência do Oriente na cultura luso‑<br />
‑brasileira. Tema apaixonante e inesgotável, que inclui ao<br />
mesmo tempo a herança, iniciada às primeiras investidas do<br />
colonizador luso na Ásia e presente <strong>de</strong> muitas formas no<br />
cotidiano do brasileiro, e o <strong>de</strong>safio atualíssimo, envolvendo<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o incremento das relações comerciais do Brasil com a<br />
China, o Japão, a Coreia, a Índia, até a posição política e<br />
diplomática brasileira em relação aos países árabes.<br />
Pioneiro na i<strong>de</strong>ntificação das marcas profundas dos<br />
valores orientais absorvidos pelos portugueses e incorpora‑<br />
dos à nossa cultura, Freyre também anteviu com agu<strong>de</strong>za<br />
o atual estreitamento <strong>de</strong> laços comerciais e econômicos do<br />
Brasil com seus parceiros asiáticos.<br />
Estruturada <strong>de</strong> forma didática, China tropical começa<br />
com um estudo sobre os “Valores asiáticos absorvidos<br />
pelos portugueses”, analisa semelhanças e contrastes entre<br />
“O brasileiro e o europeu” e se esten<strong>de</strong> em longo texto<br />
que po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>finido como uma introdução para se com‑<br />
preen<strong>de</strong>r as relações entre “O Oriente e o Oci<strong>de</strong>nte”, vistas<br />
a partir das influências orientais no Brasil.<br />
Do contato direto <strong>de</strong> Freyre com o continente asiático<br />
são “Viajando pelo Oriente”, trechos do diário escrito<br />
quando <strong>de</strong> sua viagem à Índia, e “Falando a orientais”. A<br />
preocupação <strong>mais</strong> acentuada com as relações futuras entre<br />
Brasil e Oriente são expostas em “O pan ‑asiatismo” e “Arte<br />
e civilização mo<strong>de</strong>rna nos trópicos: a contribuição portu‑<br />
guesa e a responsabilida<strong>de</strong> brasileira”. O último capítulo<br />
procura respon<strong>de</strong>r à instigante questão “Por que China<br />
tropical?”, analisa esse conceito, concluindo já ser o Brasil,<br />
<strong>mais</strong> do que uma China tropical, um “lí<strong>de</strong>r em potencial <strong>de</strong><br />
um dos sistemas <strong>de</strong> civilização <strong>mais</strong> significativos do mundo<br />
mo<strong>de</strong>rno”.<br />
132<br />
G i l b e r t o F r e y r e<br />
DE MENINO A HOMEM<br />
DE MAIS DE TRINTA<br />
E DE QUARENTA,<br />
DE SESSENTA E MAIS ANOS<br />
1 a edição – 224 páginas<br />
1 encarte colorido (32 páginas)<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1077 ‑2<br />
Quase vinte e cinco <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> sua morte, Gilberto<br />
Freyre continua surpreen<strong>de</strong>ndo os leitores. Surpreen<strong>de</strong>ndo e<br />
seduzindo. De menino a homem, livro autobiográfico iné‑<br />
dito, “diário íntimo seguido <strong>de</strong> recordações pessoais em tom<br />
confi<strong>de</strong>ncial semelhante ao <strong>de</strong> diários”, <strong>de</strong>svenda um Gil‑<br />
berto Freyre intrigante e instigante, muito parecido consigo<br />
mesmo, mas ao mesmo tempo bastante diferente. É o<br />
homem amadurecido, que a cada dia vê se aproximar o en‑<br />
contro inevitável com a “in<strong>de</strong>sejada das gentes”, que se<br />
volta para <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> si mesmo, em busca da vida misteriosa<br />
que passou e não volta <strong>mais</strong>. Esse mergulho proustiano nos<br />
labirintos do tempo continua, <strong>de</strong> certa forma, nas recorda‑<br />
ções e indagações formuladas em Tempo morto e outros<br />
tempos. Continua, aprofunda e lança novas luzes sobre as<br />
memórias e o memorialista, menos impressionista e <strong>mais</strong><br />
reflexivo, marca espiritual daqueles que estão prestes a co‑<br />
nhecer o outro lado do mistério<br />
Concebido e realizado na velhice, após os oitenta <strong>anos</strong>,<br />
o diário revela “um Gilberto místico, <strong>mais</strong> do que religioso<br />
sem, contudo, <strong>de</strong>sprezar os arroubos evangélicos <strong>de</strong> uma<br />
adolescência teológica, a <strong>de</strong>screver conversas com Deus,<br />
conversas líricas, amistosas, sem tratamentos solenes, um<br />
Deus próximo, a ouvi ‑lo e a dialogar com um quê <strong>de</strong> sem‑<br />
‑cerimônias”, como observa Fátima Quintas no prefácio.<br />
Marcadas pelo misticismo e a sensualida<strong>de</strong> (Freyre se auto‑<br />
<strong>de</strong>finiu em certa ocasião como “francamente paradoxal”),<br />
essas anotações revelam ao leitor uma nova visão gilbertiana<br />
do passado e <strong>de</strong> seus fantasmas persistentes, dos quais por<br />
certo não po<strong>de</strong>ria libertar ‑se, pois estavam incorporados à<br />
sua própria alma. De menino a homem mostra que, mesmo<br />
na velhice, Freyre não per<strong>de</strong>u a perplexida<strong>de</strong> diante da vida.<br />
Que é uma forma <strong>de</strong> poesia e <strong>de</strong> eterna juventu<strong>de</strong>.<br />
G i l b e r t o F r e y r e
GUIA PRÁTICO,<br />
HISTÓRICO E<br />
SENTIMENTAL DA<br />
CIDADE DO RECIFE<br />
5 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1067 ‑3<br />
Para começo <strong>de</strong> conversa o leitor <strong>de</strong>ve reparar o título<br />
do livro <strong>de</strong> Gilberto Freyre: Guia prático, histórico e senti‑<br />
mental da cida<strong>de</strong> do Recife. O pernambucano nunca diz<br />
Recife, como se fala no sul, mas o Recife. O artigo é indis‑<br />
pensável, parece incorporado ao nome da cida<strong>de</strong> e se as‑<br />
semelha àquelas partículas <strong>de</strong> nobreza que os europeus até<br />
o século XIX (e alguns até hoje) faziam questão <strong>de</strong> usar.<br />
Segundo ponto: sem o menor constrangimento, o<br />
autor proclama que o seu amor pela cida<strong>de</strong> vai até o senti‑<br />
mentalismo. Excelente sinal, sobretudo quando ele serve<br />
para mostrar que nem tudo é paisagem e que, por trás dos<br />
velhos prédios, das pontes seculares, das belas praias recifen‑<br />
ses, existe uma vida singular e palpitante, um povo caloroso,<br />
tradições e uma história (e muitas estórias) contada <strong>de</strong> forma<br />
encantadora por Gilberto Freyre. A aproximação sentimental<br />
do viajante com a cida<strong>de</strong> e sua conquista é facilitada pelo<br />
guia <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua abertura antológica, intitulada “O caráter da<br />
cida<strong>de</strong>”, na qual Freyre compara o Rio <strong>de</strong> Janeiro e a Bahia,<br />
que seduzem o visitante à primeira vista, com a quase discri‑<br />
ção do Recife, cida<strong>de</strong> caprichosa, um tanto feminina, que<br />
resiste a se entregar <strong>de</strong> imediato e cujo “melhor encanto<br />
consiste mesmo em <strong>de</strong>ixar ‑se conquistar aos poucos”. Um<br />
ponto a frisar na presente edição é que o termo prático do<br />
título continua válido. Des<strong>de</strong> o lançamento <strong>de</strong>ste guia, em<br />
1934, a cida<strong>de</strong> se mo<strong>de</strong>rnizou, incorporou novos aspectos,<br />
os en<strong>de</strong>reços <strong>de</strong> agências e empresas mudaram, foram fixa‑<br />
dos novos horários nas linhas <strong>de</strong> ônibus e <strong>de</strong> aviões, restau‑<br />
rantes surgiram. Pois bem, todos esses dados foram<br />
apurados e registrados com rigor. Como a cida<strong>de</strong>, o guia<br />
mudou, para continuar o mesmo.<br />
G i l b e r t o F r e y r e<br />
INSURGÊNCIAS E<br />
RESSURGÊNCIAS<br />
ATUAIS<br />
CRUZAMENTOS DE SINS E NÃOS<br />
NUM MUNDO EM TRANSIÇÃO<br />
2 a edição revista – 368 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1072 ‑7<br />
Com incansável curiosida<strong>de</strong> intelectual e permanente<br />
inquietação pelos <strong>de</strong>stinos do mundo, Gilberto Freyre tam‑<br />
bém se entregou a exercícios <strong>de</strong> futurologia, termo muito<br />
usado na década <strong>de</strong> 1980. Hoje, prefere ‑se usar futurível, que<br />
apresenta um sentido menos rígido. Seja como for, Insurgên‑<br />
cias e ressurgências atuais: cruzamentos <strong>de</strong> sins e nãos num<br />
mundo em transição, lançado em 1983, trata <strong>de</strong> um futuro<br />
possível, a partir das heranças do passado e da realida<strong>de</strong> da<br />
época, o que o autor chamava <strong>de</strong> tempo tríbio.<br />
Polêmico, discutível, gilbertiano, no pleno sentido da<br />
palavra, o livro se elabora em muitos pl<strong>anos</strong> e perspectivas<br />
que, como sempre em sua obra, vão além do que promete<br />
o título, como comprovam as reflexões sobre temas <strong>de</strong> per‑<br />
manente interesse do escritor: raça, religião, a cara e o co‑<br />
ração do Brasil, entre outros.<br />
Desconfiado da filosofia que exalta <strong>de</strong>senvolvimento<br />
e mo<strong>de</strong>rnização quase como sinônimos, Freyre prefere ver<br />
o mundo <strong>de</strong> então como uma época <strong>de</strong> insurgências e res‑<br />
surgências. Ressurgências que contrariam a filosofia da<br />
globalização política, através da imposição <strong>de</strong> um centro<br />
“dominador absoluto <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões”, pretendido por euro‑<br />
peus e norte ‑americ<strong>anos</strong>. Como esperança <strong>de</strong> equilíbrio do<br />
mundo, brotam em todas as partes do planeta as insurgên‑<br />
cias contra esse domínio: o reflorescimento <strong>de</strong> velhas cul‑<br />
turas, <strong>de</strong>monizadas pelo Oci<strong>de</strong>nte e apontadas como ameaças<br />
externas, como o islamismo, a ascensão mundial do po<strong>de</strong>r<br />
chinês, a antevisão do Brasil como uma espécie <strong>de</strong> prefigu‑<br />
ração da humanida<strong>de</strong> do futuro.<br />
Em vários pontos, as projeções <strong>de</strong> Gilberto Freyre já se<br />
realizam. Veja ‑se o conflito do Iraque, um episódio da globa‑<br />
lização que o Oci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong>seja impor ao mundo em choque<br />
com as insurgências daquelas culturas milenares. Muitos ou‑<br />
tros aspectos apontados pelo sociólogo também se esboçam<br />
como realida<strong>de</strong> futura. O tempo dirá se sim ou se não.<br />
G i l b e r t o F r e y r e<br />
133
MODOS DE HOMEM &<br />
MODAS DE MULHER<br />
2 a edição – 336 páginas<br />
1 encarte colorido (16 páginas)<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1336 ‑0<br />
Há muitas maneiras <strong>de</strong> se ver a vida. Um modo origi‑<br />
nal é através dos modos <strong>de</strong> homem e modas <strong>de</strong> mulher.<br />
Difícil? Po<strong>de</strong> ser. Fácil, quando abordado pela graça e eru‑<br />
dição <strong>de</strong> Gilberto Freyre que, como sempre que trata <strong>de</strong> um<br />
assunto, supera em muito o tema proposto.<br />
Apesar da advertência do autor <strong>de</strong> que tais modos e<br />
modas – por vezes não exclusivos <strong>de</strong> um sexo, mas ambí‑<br />
guos, bivalentes ou mistos – são consi<strong>de</strong>rados “sob pers‑<br />
pectiva <strong>mais</strong> sociológica que em puros sentidos literários”,<br />
o livro é percorrido com a sofreguidão e o prazer com que<br />
se lê um romance. Um romance dos bons.<br />
Definidos os característicos do que sejam modos <strong>de</strong><br />
homem e modas <strong>de</strong> mulher, i<strong>de</strong>ntificados seus símbolos e<br />
imagens, confrontados e pon<strong>de</strong>rados, Freyre oferece ao leitor<br />
um autêntico corte na socieda<strong>de</strong> brasileira, da época <strong>de</strong> ioiôs<br />
e iaiás às últimas décadas do século XX, através do levanta‑<br />
mento e da reflexão sobre temas que vão do significado da<br />
dissidência em moda, do repúdio aos excessos artificiais<br />
<strong>de</strong> moda, do conflito entre dionisíaco e apolíneo na moda e<br />
<strong>de</strong> uma nova concepção <strong>de</strong> feminilida<strong>de</strong>, a indagações curio‑<br />
sas, como “é moda falar errado?”, “a mulher brasileira, inven‑<br />
tora <strong>de</strong> modas?” ou “mulher ornamental?”.<br />
Freyre mostra como o traje doméstico, ou <strong>de</strong> trabalho,<br />
<strong>de</strong>svenda a psicologia da mulher brasileira e ajuda a refletir<br />
sobre sua posição na socieda<strong>de</strong>, em momentos históricos di‑<br />
versos. O equivalente po<strong>de</strong> ‑se dizer dos modos <strong>de</strong> homem.<br />
Uma inquietação permanente do autor presente nesta<br />
obra é o problema da miscigenação, com a consagração da<br />
morenida<strong>de</strong> e a fixação na socieda<strong>de</strong> brasileira <strong>de</strong> uma<br />
consciência metarracial, ou seja, além das raças, possível<br />
fator <strong>de</strong> influência nos modos <strong>de</strong> homem, nas modas <strong>de</strong><br />
mulher e, em sentido <strong>mais</strong> amplo, na originalida<strong>de</strong> da<br />
moda brasileira.<br />
134<br />
G i l b e r t o F r e y r e<br />
NORDESTE<br />
7 a edição revista – 256 páginas<br />
1 encarte colorido (16 páginas)<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0837 ‑4<br />
Muito diferente da imagem que a maior parte dos<br />
brasileiros tem da região, o Nor<strong>de</strong>ste, <strong>de</strong> Gilberto Freyre, é<br />
uma terra <strong>de</strong> fartura, <strong>de</strong> águas abundantes, “on<strong>de</strong> nunca<br />
<strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> haver/ uma mancha dágua:/ um avanço <strong>de</strong> mar,<br />
um rio, um riacho,/ o esver<strong>de</strong>ado <strong>de</strong> uma lagoa”, como no<br />
poema <strong>de</strong> Carlos Pena Filho. Classificado pelo autor como<br />
“tentativa <strong>de</strong> ensaio ecológico”, o livro retrata aquela re‑<br />
gião agrária do Nor<strong>de</strong>ste que, segundo Freyre, “foi, por<br />
algum tempo, o centro da civilização brasileira”. O outro<br />
Nor<strong>de</strong>ste, <strong>mais</strong> conhecido pelos brasileiros, foi estudado<br />
por outro escritor, Djacir Menezes.<br />
O Nor<strong>de</strong>ste <strong>de</strong> Gilberto Freyre é o da região da mono‑<br />
cultura da cana, sustentada pelo braço escravo, dos gran‑<br />
<strong>de</strong>s senhores <strong>de</strong> engenho, patriarcais, <strong>de</strong> voz áspera, cujos<br />
gritos faziam tremer crianças e mulheres, mandões, ligados<br />
à terra, aos bichos, à vegetação, “o tipo <strong>mais</strong> puro <strong>de</strong> aris‑<br />
tocrata brasileiro”. Uma aristocracia quase feudal, <strong>de</strong> hábi‑<br />
tos requintados, que sabia recepcionar, lia livros e revistas,<br />
cultivava a música em pi<strong>anos</strong>. Cada proprieda<strong>de</strong> era um<br />
mundo à parte, autossuficiente, dirigido pelo pater fami‑<br />
lias, como um pequeno império.<br />
Ali, mo<strong>de</strong>lada pela cana ‑<strong>de</strong> ‑açúcar, surgiu uma civiliza‑<br />
ção original, hábitos muito peculiares, uma cozinha riquís‑<br />
sima em doces e comidas açucaradas, que levavam ao <strong>de</strong>lírio<br />
as sinhás e os meninos, luxo nos trajes, excesso <strong>de</strong> joias nas<br />
mulheres, uma ativida<strong>de</strong> sexual <strong>de</strong>sregrada, que os moleco‑<br />
tes exibiam, escandalizando os moralistas. Quando <strong>de</strong> sua<br />
publicação, Nor<strong>de</strong>ste foi consi<strong>de</strong>rado uma novida<strong>de</strong> na obra<br />
<strong>de</strong> Gilberto Freyre, um livro eminentemente geográfico, <strong>mais</strong><br />
simples e <strong>de</strong>spojado do que as obras anteriores. O estilo, <strong>de</strong><br />
“sabor sensual, <strong>de</strong>nso, oloroso” (Manuel Ban<strong>de</strong>ira), continuava<br />
o mesmo, assim como a arte <strong>de</strong> narrar do autor, com alguma<br />
coisa <strong>de</strong> romancista.<br />
G i l b e r t o F r e y r e
NOVO MUNDO NOS<br />
TRÓPICOS<br />
3 a edição revista – 376 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1538 ‑8<br />
Novo mundo nos trópicos começou a se estruturar<br />
quando Gilberto Freyre foi convidado a proferir uma série<br />
<strong>de</strong> palestras sobre o Brasil na Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Indiana. O<br />
interesse foi contagiante. A graça e malícia <strong>de</strong> sua exposi‑<br />
ção – amenizadas para não chocar o público norte‑<br />
‑americano –, o profundo conhecimento da realida<strong>de</strong><br />
brasileira agradaram a plateia, formada por intelectuais,<br />
estudantes, professores universitários. As seis conferências<br />
foram reunidas em volume, com o título <strong>de</strong> Brazil: an Inter‑<br />
pretation. Alguns <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, o livro foi reeditado pelo<br />
editor nova ‑iorquino Alfred Knopf, com o título <strong>de</strong> New<br />
World in the Tropics: the Culture of Mo<strong>de</strong>rn Brazil.<br />
Era praticamente uma obra nova, com uma introdu‑<br />
ção do autor e o acréscimo <strong>de</strong> quatro capítulos. Neles,<br />
Freyre abordava temas polêmicos, muito <strong>de</strong> seu agrado,<br />
como a sugestão <strong>de</strong> ter sido a escravidão no Brasil <strong>mais</strong> leve<br />
do que em outros países, ou apresentar o Brasil como uma<br />
“civilização europeia nos trópicos”, ressaltando o fato <strong>de</strong> o<br />
português ter sido <strong>mais</strong> apto para as tarefas <strong>de</strong> colonização<br />
do que os <strong>de</strong><strong>mais</strong> europeus.<br />
A obra foi apresentada ao público brasileiro em duas<br />
etapas, a primeira com a tradução das seis conferências, in‑<br />
titulada Interpretação do Brasil, e a segunda acrescida dos<br />
novos capítulos e com um prefácio escrito diretamente para<br />
esta edição, com o título <strong>de</strong> Novo mundo nos trópicos.<br />
De certa forma, a obra vinha complementar alguns<br />
pontos <strong>de</strong> vista estudados em livros anteriores do autor,<br />
frisando em particular a originalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma civilização<br />
tropical, capaz <strong>de</strong> se autointerpretar <strong>de</strong> maneira revolucio‑<br />
nária, com padrões diversos dos consagrados pela cultura<br />
europeia. Era um ponto <strong>de</strong> vista provocativo, como tudo<br />
escrito por Freyre, ainda hoje sujeito a <strong>de</strong>bates.<br />
G i l b e r t o F r e y r e<br />
O ESCRAVO NOS<br />
ANÚNCIOS DE JORNAIS<br />
BRASILEIROS DO<br />
SÉCULO xIx<br />
4 a edição revista – 248 páginas<br />
1 encarte preto e branco (8 páginas)<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0134 ‑3<br />
Pioneiro em tantos aspectos da cultura brasileira, Gil‑<br />
berto Freyre foi o primeiro a recorrer a anúncios <strong>de</strong> jornais<br />
para capturar e compreen<strong>de</strong>r a realida<strong>de</strong> social da época.<br />
Nesta obra, através dos anúncios <strong>de</strong> jornais, o sociólogo<br />
pernambucano propõe uma interpretação antropológica “<strong>de</strong><br />
característicos <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong> <strong>de</strong>formações <strong>de</strong> corpo<br />
<strong>de</strong> negros ou mestiços, fugidos ou expostos à venda, como<br />
escravos no Brasil do século passado”. Compreenda ‑se: do<br />
século XIX, pois a primeira edição do livro é <strong>de</strong> 1963.<br />
Documentos vivos da época, os anúncios confirmam<br />
a varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> procedência dos negros importados da<br />
África, registram característicos <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m etnográfica e <strong>de</strong><br />
natureza cultural (marcas <strong>de</strong> nação, penteados, barbas,<br />
xales, turbantes, tangas, vestidos) e apontam o que o autor<br />
classifica <strong>de</strong> “característicos constitucionais”: os introverti‑<br />
dos, os calados, <strong>de</strong> rosto fechado, os extrovertidos, <strong>de</strong> as‑<br />
pecto alegre, os angulosos, os arredondados, além dos<br />
eugênicos e dos cacogênicos.<br />
Freyre observa que a língua dos anúncios da época,<br />
exata, minuciosa, por vezes brutal, tem uma expressão na‑<br />
cional superior à “<strong>de</strong> toda literatura do mesmo período, in‑<br />
cluindo o romance com as suas moreninhas e as suas iaiás já<br />
meio <strong>de</strong>saportuguesadas”. Tais anúncios <strong>de</strong>scerram <strong>de</strong>talhes<br />
ignorados pelos estudiosos, que a pinça do pesquisador não<br />
<strong>de</strong>ixa escapar: <strong>de</strong>formações profissionais <strong>de</strong> escravos; negros<br />
e mestiços criados em casa, assumindo característicos sociais<br />
<strong>de</strong> iaiás e ioiôs, como mãos e pés pequenos, sem calosida<strong>de</strong>s<br />
ou <strong>de</strong>formações; escravos quase brancos, como a escrava<br />
Isaura da ficção <strong>de</strong> Bernardo Guimarães, muitos <strong>de</strong>les prová‑<br />
veis filhos dos senhores, mesmo assim postos à venda ou<br />
perseguidos em sua fuga <strong>de</strong> casa; um mundo palpitante <strong>de</strong><br />
ressentimentos, conflitos, que constitui, tanto quanto um<br />
<strong>de</strong>poimento antropológico, um romance vivo da época.<br />
G i l b e r t o F r e y r e<br />
135
OLINDA<br />
2 O GUIA PRÁTICO, HISTÓRICO<br />
E SENTIMENTAL DE CIDADE<br />
BRASILEIRA<br />
8 a edição revista e atualizada – 224 páginas<br />
1 mapa turístico colorido<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1073 ‑4<br />
Feliz a cida<strong>de</strong> que po<strong>de</strong> oferecer ao viajante ou estu‑<br />
dioso um guia como este <strong>de</strong>dicado a Olinda por Gilberto<br />
Freyre. O subtítulo esclarece que se trata <strong>de</strong> um “2 o guia<br />
prático, histórico e sentimental <strong>de</strong> cida<strong>de</strong> brasileira” (o pri‑<br />
meiro foi <strong>de</strong>dicado a Recife), mas na verda<strong>de</strong> é muito <strong>mais</strong><br />
do que isso, um pequeno curso sobre a história, a vida, os<br />
hábitos e as tradições da velha cida<strong>de</strong> pernambucana.<br />
Didático pela distribuição e abrangência dos temas, como<br />
qualquer guia que se preza, seu texto é um exemplo <strong>de</strong> anti‑<br />
didatismo, termo empregado aqui como sinônimo <strong>de</strong> clareza,<br />
graça e liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> expressão, sem nada <strong>de</strong> professoral.<br />
Com aquela reverência e aquela malícia que nascem<br />
do amor, e alguns toques <strong>de</strong> sentimentalismo, Gilberto<br />
Freyre fala dos velhos sobrados, tão característicos da ci‑<br />
da<strong>de</strong>, com seus muxarabis, suas reminiscências da vida<br />
patriarcal, alguns tão penetrados “<strong>de</strong> influências mouras<br />
ou mouriscas”, <strong>de</strong>sperta a atenção para a alma encanta‑<br />
dora das ruas em la<strong>de</strong>ira, para a paisagem formada por<br />
velhas igrejas, coqueiros e cajueiros, praias <strong>de</strong> ver<strong>de</strong>s mares<br />
bravios <strong>de</strong> on<strong>de</strong> partem as jangadas rumo ao mar alto.<br />
Ao retrato da terra se junta a ativida<strong>de</strong> do homem e a<br />
formação histórica da cida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> aquele dia em que o<br />
donatário da capitania, vendo a bela paisagem, exclamou:<br />
“Oh! linda!”. Com tal nome, claro que a cida<strong>de</strong> teria <strong>de</strong> ser<br />
privilegiada e reverenciada na literatura e nas artes plásticas,<br />
como informa o autor. Histórico e sentimental, o guia é<br />
antes <strong>de</strong> tudo prático. Ensina o leitor a se locomover na ci‑<br />
da<strong>de</strong>, a saber admirá ‑la e a <strong>de</strong>scobrir sua originalida<strong>de</strong>. E<br />
<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> tanta consulta às suas páginas e <strong>de</strong> tanto andar,<br />
ao chegar aos altos da cida<strong>de</strong> e olhar em redor, o visitante<br />
por força há <strong>de</strong> concordar com o autor que em Olinda “tudo<br />
se irmana franciscanamente para completar” a “paisagem<br />
ao mesmo tempo cristã e brasileira”. E inesquecível.<br />
136<br />
G i l b e r t o F r e y r e<br />
ORDEM E PROGRESSO<br />
6 a edição revista – 1120 páginas<br />
1 encarte colorido (24 páginas)<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0836 ‑6<br />
Quase meio século <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> sua publicação, Or<strong>de</strong>m<br />
e progresso se mantém mo<strong>de</strong>rna e provocativa como na<br />
época <strong>de</strong> seu lançamento. Durante esse longo período, a<br />
obra <strong>de</strong> Gilberto Freyre foi discutida, atacada, louvada, sem<br />
que per<strong>de</strong>sse uma lasca <strong>de</strong> sua importância, espécie <strong>de</strong><br />
montanha pétrea na planície dos estudos brasileiros. Pelo<br />
contrário, ganhou o reconhecimento universal como docu‑<br />
mento indispensável ao conhecimento do Brasil – os vários<br />
Brasis que convivem no espaço e no tempo – e sua forma‑<br />
ção. Po<strong>de</strong>ndo ser analisada e avaliada como obra in<strong>de</strong>pen‑<br />
<strong>de</strong>nte, Or<strong>de</strong>m e progresso ganha em ser consi<strong>de</strong>rada,<br />
<strong>de</strong>ntro do projeto do autor, uma fase da história da socie‑<br />
da<strong>de</strong> patriarcal brasileira, aquela <strong>de</strong> <strong>de</strong>sintegração do pa‑<br />
triarcalismo, sob o regime <strong>de</strong> trabalho livre.<br />
Obra pioneira como interpretação, Or<strong>de</strong>m e progresso<br />
introduz uma novida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pesquisa nos estudos <strong>de</strong> Sociolo‑<br />
gia e Antropologia, a utilização <strong>de</strong> entrevistas padronizadas,<br />
dirigidas a pessoas que viveram a fase histórica estudada.<br />
Mais sintética do que analítica, segundo o próprio<br />
Freyre, Or<strong>de</strong>m e progresso abrange o período histórico <strong>de</strong><br />
transição da Monarquia para a República, que se esten<strong>de</strong><br />
da assinatura da Lei do Ventre Livre (1871), quando as pres‑<br />
sões para a abolição da escravatura começam a se tornar<br />
irresistíveis, à eclosão da Primeira Guerra Mundial (1914),<br />
época <strong>de</strong> <strong>de</strong>cadência da economia cafeeira e <strong>de</strong> acelera‑<br />
mento do processo <strong>de</strong> industrialização. Fase <strong>de</strong> influência<br />
do pensamento positivista, cujo lema seria incorporado à<br />
ban<strong>de</strong>ira brasileira e serviria <strong>de</strong> título à obra <strong>de</strong> Freyre.<br />
“Mais do que um lema <strong>de</strong> uma corrente político ‑filosófica<br />
particular, o Or<strong>de</strong>m e progresso é uma mística do patro‑<br />
nato político, uma constante nacional”, observa Nicolau<br />
Sevcenko no prefácio a esta nova edição. O Brasil abre ‑se,<br />
então, em <strong>de</strong>finitivo, para o mundo e a mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>.<br />
G i l b e r t o F r e y r e
PERFIL DE EUCLIDES E<br />
OUTROS PERFIS<br />
3 a edição revista – 288 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1562 ‑3<br />
Quando se fala <strong>de</strong> Gilberto Freyre, muita gente se lembra<br />
apenas do revolucionário intérprete do Brasil, o mestre da his‑<br />
tória social. O homem <strong>de</strong> Apipucos foi <strong>mais</strong> do que isso. Ver‑<br />
sátil, com sensibilida<strong>de</strong> literária extrema, ele foi romancista,<br />
poeta e um ensaísta sem paralelo nas letras brasileiras, sa‑<br />
bendo dosar numa mistura muito especial e saborosa sociolo‑<br />
gia, história, antropologia e psicologia, como se po<strong>de</strong> cons tatar<br />
neste fascinante Perfil <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s e outros perfis.<br />
O livro reúne doze ensaios escritos com simpatia e<br />
uma aguda curiosida<strong>de</strong>, quase bisbilhotice, em penetrar na<br />
vida e na alma da figura estudada. Essa sem ‑cerimônia é<br />
responsável por alguns dos trechos <strong>mais</strong> felizes da obra,<br />
como a evocação do jovem Pedro II, que po<strong>de</strong>ria muito<br />
bem figurar na “História do menino no Brasil”, livro que<br />
Gilberto planejou e não realizou.<br />
Sem exagero, po<strong>de</strong> ‑se afirmar que cada perfil indivi‑<br />
dual traça também um perfil das diversas realida<strong>de</strong>s do<br />
Brasil, em épocas distintas. São figuras como Eucli<strong>de</strong>s da<br />
Cunha, genial “revelador da realida<strong>de</strong> brasileira”; Oliveira<br />
Lima, classificado pitorescamente <strong>de</strong> “Quixote gordo”; Au‑<br />
gusto dos Anjos, com sua morbi<strong>de</strong>z; o gran<strong>de</strong> poeta Ma‑<br />
nuel Ban<strong>de</strong>ira, apresentado em três tempos, num intervalo<br />
<strong>de</strong> cinquenta <strong>anos</strong> entre o primeiro e o último ensaio.<br />
As <strong>de</strong><strong>mais</strong> personalida<strong>de</strong>s estudadas são Félix Caval‑<br />
canti, parente <strong>de</strong> Gilberto, um pernambucano típico do sé‑<br />
culo XIX; o filósofo Farias Brito, “mestre sem discípulos”; o<br />
esquecido e admirável poeta Felipe d’Oliveira; Estácio Coim‑<br />
bra, político <strong>de</strong> relevo, governador <strong>de</strong> Pernambuco; o senhor<br />
<strong>de</strong> engenho Júlio Bello, “agricultor sentimental”; o antropó‑<br />
logo Nina Rodrigues; e o poeta e humanista Odilon Nestor.<br />
Quem <strong>de</strong>gustar esses perfis por certo vai concordar<br />
com Antonio Carlos Villaça, que confessava ter pelo livro o<br />
“maior xodó”.<br />
G i l b e r t o F r e y r e<br />
SOBRADOS E<br />
MUCAMBOS<br />
16 a edição comemorativa 70 <strong>anos</strong> – 976 páginas<br />
2 encartes coloridos (32 páginas)<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1175 ‑8<br />
Em Sobrados e mucambos, Gilberto Freyre analisa a<br />
<strong>de</strong>cadência do patriarcado rural e o <strong>de</strong>senvolvimento do<br />
urbano, no período compreendido entre o fim do século<br />
XVIII e a primeira meta<strong>de</strong> do XIX.<br />
Como Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala, a obra estuda o pas‑<br />
sado do povo brasileiro “através <strong>de</strong> seus estilos <strong>de</strong> residên‑<br />
cia e a sua influência sobre a vida e o caráter do mesmo<br />
povo”, pois casa, no Brasil, é também, “como Gilberto<br />
Freyre <strong>de</strong>monstra em sua obra, escola, igreja, banco, par‑<br />
tido político, hospital, casa comercial, hospício, local <strong>de</strong><br />
diversão, parlamento, restaurante, e o que <strong>mais</strong> se queira”,<br />
segundo a observação <strong>de</strong> Roberto DaMatta.<br />
Por certo também teatro, no sentido usado por Cal<strong>de</strong>‑<br />
rón <strong>de</strong> la Barca – o gran<strong>de</strong> teatro do mundo –, com os seus<br />
conflitos familiares, as práticas sexuais, o relacionamento<br />
<strong>de</strong> senhores e escravos, os raptos <strong>de</strong> iaiás, vaida<strong>de</strong>s e orgu‑<br />
lhos <strong>de</strong> famílias, muitas <strong>de</strong>las gabando ‑se <strong>de</strong> uma discutível<br />
pureza racial. Cenário i<strong>de</strong>al para a afirmação social do ba‑<br />
charel e do mulato, uma das características <strong>mais</strong> marcantes<br />
do período, <strong>de</strong> acelerada transformação social, em con‑<br />
traste com a época estudada em Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala,<br />
segundo Freyre “uma quase maravilha <strong>de</strong> acomodação”. A<br />
obra repete as mesmas <strong>de</strong>liciosas ousadias <strong>de</strong> estilo <strong>de</strong><br />
Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala e utiliza os mesmos recursos <strong>de</strong> se<br />
documentar em fontes até então menosprezadas pelos es‑<br />
tudiosos (velhos ca<strong>de</strong>rnos <strong>de</strong> anotações, livros <strong>de</strong> culinária,<br />
anúncios <strong>de</strong> jornais). A versão <strong>de</strong>finitiva <strong>de</strong> Sobrados e mu‑<br />
cambos, como a conhecemos, foi composta em duas eta‑<br />
pas: o texto da primeira edição, lançada em 19<strong>39</strong>, e os<br />
“acréscimos substanciais” e cinco capítulos novos incorpo‑<br />
rados à edição <strong>de</strong> 1951. A presente edição, em bela apre‑<br />
sentação gráfica, ilustrada em cores, vem enriquecida com<br />
um excelente prefácio <strong>de</strong> Roberto DaMatta.<br />
G i l b e r t o F r e y r e<br />
137
TALVEZ POESIA<br />
Prelo<br />
Gilberto Freyre consi<strong>de</strong>rava ‑se um “aprendiz <strong>de</strong><br />
poeta”, o que explica o mo<strong>de</strong>sto título <strong>de</strong> seu livro, Talvez<br />
poesia, mas que, ao mesmo tempo, permite ao autor “li‑<br />
cenças ousadamente antipoéticas”. A obra reúne poemas<br />
escritos ao longo <strong>de</strong> muitos <strong>anos</strong> e “erupções” poéticas, ou<br />
seja, trechos extraídos <strong>de</strong> sua produção em prosa e reduzi‑<br />
dos à forma poemática, tarefa <strong>de</strong>sempenhada pelo autor e<br />
seus amigos, os poetas Mauro Mota e Lêdo Ivo.<br />
O que revela o poeta? Antes <strong>de</strong> tudo, assim como sua<br />
obra <strong>de</strong> sociólogo e antropólogo, mostra‑se apaixonado<br />
pelo Brasil e eterno curioso, não raras vezes saudosista <strong>de</strong><br />
aspectos físicos e imateriais da vida brasileira. Nesse caso,<br />
revela ‑se um persistente observador do cenário <strong>de</strong> ruas,<br />
campos e rios, como po<strong>de</strong>mos comprovar em “Velhas ja‑<br />
nelas do Recife e <strong>de</strong> Olinda”: “Nas ruas napolitanas/ do<br />
bairro <strong>de</strong> São José/ com as roupas a secar/ ainda se encon‑<br />
tram antigas/ janelas quadriculadas/ os xadrezes dos posti‑<br />
gos/ que outrora amouriscavam/ todo o Recife”.<br />
O sonhador se revela em poemas como “O outro Brasil<br />
que vem aí”, no qual, como um profeta, antevê os dias futu‑<br />
ros do país: “Eu ouço as vozes/ eu vejo as cores/ eu sinto os<br />
passos/ <strong>de</strong> outro Brasil que vem aí/ <strong>mais</strong> tropical/ <strong>mais</strong> frater‑<br />
nal/ <strong>mais</strong> brasileiro./ O mapa <strong>de</strong>sse Brasil em vez das cores dos<br />
Estados/ terá as cores das produções e dos trabalhos”.<br />
Poemas nos quais surgem os amarelinhos e as assom‑<br />
brações, tão ao gosto do autor: “Talvez tenha ‑se tornado<br />
alamoa:/ e ruiva como uma alemãzinha/ e apareça nas noites<br />
<strong>de</strong> lua a homens morenos e até pretos,/ assombrando ‑os e<br />
enfeitiçando ‑os/ com a sua nu<strong>de</strong>z <strong>de</strong> branca <strong>de</strong> neve/ mas<br />
<strong>de</strong>smanchando ‑se como sorvete/ quando alguém se aven‑<br />
tura a chegar perto/ do seu nu <strong>de</strong> fantasma/ <strong>de</strong>smanchando‑<br />
‑se como sorvete/ e <strong>de</strong>ixando no ar um frio ou um gelo <strong>de</strong><br />
morte.” Talvez poesia, mas com certeza muito brasileira.<br />
138<br />
Prelo<br />
G i l b e r t o F r e y r e<br />
TEMPO DE APRENDIZ<br />
Prelo<br />
Tempo <strong>de</strong> aprendiz foi publicado quando Gilberto Freyre<br />
já era um mestre. Os <strong>anos</strong> <strong>de</strong> aprendizado estavam longe,<br />
mas foi exatamente essa distância no tempo que valorizou o<br />
imenso material recolhido, fonte riquíssima para se conhecer<br />
e compreen<strong>de</strong>r a formação do escritor pernambucano.<br />
O livro reúne artigos publicados no Diário <strong>de</strong> Pernam‑<br />
buco, entre 1918 e 1926. Neles o jovem Gilberto Freyre esboça<br />
pontos que seriam fundamentais, <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, na sua interpre‑<br />
tação da socieda<strong>de</strong> e da cultura brasileiras, expressos em obras<br />
como Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala e Sobrados e mucambos.<br />
Esses escritos <strong>de</strong> um jovem mal saído da adolescência<br />
revelam extraordinária maturida<strong>de</strong>. Com perspicácia e, por<br />
vezes, certa malícia, Freyre fala <strong>de</strong> si, <strong>de</strong> suas experiências pes‑<br />
soais entre norte ‑americ<strong>anos</strong> (muitos <strong>de</strong>sses artigos foram es‑<br />
critos nos Estados Unidos, on<strong>de</strong> estudava), mas sempre<br />
i<strong>de</strong>ntificado com a realida<strong>de</strong> brasileira. Diziam alguma coisa <strong>de</strong><br />
novo, surpreendiam pelos pontos <strong>de</strong> vista originais, levando<br />
Monteiro Lobato a indagar: “Quem é este Gilberto Freyre?”.<br />
A resposta é fácil: um sujeito a quem nada <strong>de</strong> humano<br />
era estranho. Sagaz e observador, apaixonado pelo pas‑<br />
sado, atento ao mundo convulso do pós ‑guerra e aos<br />
novos rumos que se esboçavam. Escritor acima <strong>de</strong> tudo,<br />
Freyre buscava a expressão literária i<strong>de</strong>al, oscilando entre o<br />
jornalismo puro e a literatura, o que faz <strong>de</strong> muitos <strong>de</strong> seus<br />
artigos pequenos ensaios literários.<br />
Cinquenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, ao se voltar para aquele<br />
tempo e para o jovem que fora um dia, Freyre observa que<br />
procurava então expressar ‑se por meio <strong>de</strong> imagens “cons‑<br />
tituídas por palavras que no sentido lógico juntassem o<br />
mágico, sensual, quase físico (...), a um contorno que pu‑<br />
<strong>de</strong>sse ser visto pelo leitor, som, cor, sabor e até olfato”. Ou<br />
seja, o verbo que fosse carne, i<strong>de</strong>al que se consolidaria em<br />
sua obra <strong>de</strong> maturida<strong>de</strong>.<br />
Prelo<br />
G i l b e r t o F r e y r e
TEMPO MORTO E<br />
OUTROS TEMPOS<br />
TRECHOS DE UM DIÁRIO DE<br />
ADOLESCÊNCIA E PRIMEIRA<br />
MOCIDADE 1915 1930<br />
2 a edição revista – 384 páginas<br />
1 encarte colorido (8 páginas)<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1074 ‑3<br />
Tempo morto e outros tempos ocupa um lugar singular<br />
na obra <strong>de</strong> Gilberto Freyre e na própria literatura brasileira. “É<br />
um livro marcante. No gênero nunca se fez coisa sequer se‑<br />
melhante em língua portuguesa”, observa o próprio autor.<br />
Redigido em forma <strong>de</strong> diário, a partir <strong>de</strong> 1915,<br />
quando o escritor tinha quinze <strong>anos</strong>, se esten<strong>de</strong> até 1930,<br />
cobrindo todo o seu período <strong>de</strong> formação intelectual, da<br />
adolescência recifense aos <strong>anos</strong> <strong>de</strong> estudo nos Estados Uni‑<br />
dos e as primeiras viagens à Europa.<br />
Espécie <strong>de</strong> autobiografia juvenil, através do registro <strong>de</strong><br />
reações íntimas, por vezes secretas, experiências munda‑<br />
nas, leituras, encontros com personalida<strong>de</strong>s (algumas <strong>de</strong><br />
influência <strong>de</strong>cisiva no <strong>de</strong>stino do escritor, como Oliveira<br />
Lima), é também, como todo documento memorialístico, o<br />
registro <strong>de</strong> uma época, seus hábitos e inquietações, proble‑<br />
mas e esperanças, refletidos na vida particular do diarista,<br />
intercâmbio entre vida íntima e vida social.<br />
O diário revela também, no adolescente curioso <strong>de</strong><br />
vida, as primeiras inquietações com problemas sobre os<br />
quais, <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, iria refletir <strong>de</strong> forma tão intensa, como o<br />
tempo, em suas várias coor<strong>de</strong>nadas: o tempo cronológico, o<br />
tempo pessoal, o tempo social. Uma surpresa agradável é<br />
verificar que o jovem, que mal se iniciava nas letras, se reve‑<br />
lava um escritor <strong>de</strong> excelentes recursos, com um estilo anun‑<br />
ciador do texto personalíssimo e brasileiríssimo <strong>de</strong><br />
Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala. Enfurnado durante muitos <strong>anos</strong> em<br />
um baú, com uma gran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong>struída pelo cupim, o<br />
texto foi recuperado sem alterações, selecionados os trechos<br />
que o autor, na maturida<strong>de</strong>, julgou <strong>mais</strong> significativo. Diante<br />
disso, o crítico norte ‑americano Stephen Greenblatt classifica<br />
o livro como autoconstrução, documento que permite ob‑<br />
servar um homem maduro revivendo sua juventu<strong>de</strong>, o que<br />
garante a esse tempo morto uma vivíssima atualida<strong>de</strong>.<br />
G i l b e r t o F r e y r e<br />
VIDA SOCIAL NO<br />
BRASIL NOS MEADOS<br />
DO SÉCULO xIx<br />
4 a edição – 160 páginas<br />
1 encarte preto e branco (16 páginas)<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1314 ‑8<br />
Escrita e publicada originalmente em inglês, Vida so‑<br />
cial no Brasil nos meados do século XIX, <strong>de</strong> Gilberto Freyre,<br />
é uma excelente introdução ao conhecimento <strong>de</strong> como<br />
vivia o brasileiro naquela época. Nada <strong>de</strong> pompas históri‑<br />
cas, <strong>de</strong> batalhas e heróis, <strong>de</strong> governadores autoritários ou<br />
conflitos políticos. O que interessa aqui é o cotidiano, os<br />
trajes da época, as relações <strong>de</strong> família, os móveis, os ani‑<br />
<strong>mais</strong> domésticos, os sobrados urb<strong>anos</strong>, as casas ‑gran<strong>de</strong>s –<br />
rurais, em contato íntimo com as senzalas. Ou seja, aquilo<br />
que os irmãos Goncourt batizaram <strong>de</strong> “história íntima” e<br />
sobre a qual especularam que seria “o verda<strong>de</strong>iro romance<br />
que a posterida<strong>de</strong> chamará talvez <strong>de</strong> história humana”.<br />
No caso, uma história íntima que evoca e fixa os tra‑<br />
ços marcantes do homem patriarcal, mandão e intolerante,<br />
da mulher, submissa e astuta, do menino, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cedo uma<br />
pequena cópia do adulto, do escravo, partícipe da vida do‑<br />
méstica, faz ‑tudo, também utilizado como pombo ‑correio<br />
em amores clan<strong>de</strong>stinos <strong>de</strong> sinhás rebel<strong>de</strong>s, da escrava,<br />
tantas vezes tratada como animal <strong>de</strong> prazer do sinhô, go‑<br />
zada e abandonada. Entre senhores e escravos, os burocra‑<br />
tas e alguns pequenos burgueses e pequenos lavradores.<br />
Uma época <strong>de</strong> <strong>de</strong>sprezo pela higiene pública, <strong>de</strong> amor<br />
à tradição, <strong>de</strong> vitória do romantismo nas letras e nas artes,<br />
enchendo <strong>de</strong> sentimentalismo o brasileiro e suavizando o<br />
seu, até então, duro “verbalismo <strong>de</strong> feitio caturramente clas‑<br />
sicista”. A transformação varria a socieda<strong>de</strong>, cujas elites<br />
rurais ainda viviam como se estivessem no fim do século<br />
XVIII, em contraste com intelectuais urb<strong>anos</strong>, a par do pen‑<br />
samento europeu <strong>mais</strong> recente, boa parte <strong>de</strong>les formados<br />
pelas faculda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Direito <strong>de</strong> São Paulo ou do Recife. Em<br />
suma, não apenas um Brasil, mas “vários Brasis, regional‑<br />
mente diversos” que conflitavam e se completavam, for‑<br />
mando um novo Brasil.<br />
G i l b e r t o F r e y r e<br />
1<strong>39</strong>
AS CRIATURAS<br />
DE PROMETEU<br />
GILBERTO FREyRE E A<br />
FORMAÇÃO DA SOCIEDADE<br />
BRASILEIRA<br />
Prêmio Gilberto Freyre 2004/2005<br />
Eli<strong>de</strong> Rugai Bastos<br />
1a edição – 240 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1068 ‑9<br />
Gilberto Freyre continua a <strong>de</strong>safiar e a estimular os es‑<br />
tudiosos. Autor <strong>de</strong> uma obra imensa, voltada para o conhe‑<br />
cimento e a análise apaixonada – e apaixonante – do Brasil,<br />
o mestre <strong>de</strong> Apipucos já foi reverenciado, <strong>de</strong>batido e contes‑<br />
tado em centenas <strong>de</strong> livros e artigos, teses <strong>de</strong> mestrado,<br />
congressos e seminários, em nosso país e no exterior.<br />
Mas ainda há muito a ser investigado e pon<strong>de</strong>rado na<br />
obra <strong>de</strong>sse mo<strong>de</strong>rno Prometeu, sobretudo em sua parte<br />
<strong>mais</strong> substancial, como atesta o livro <strong>de</strong> Eli<strong>de</strong> Rugai Bastos,<br />
vencedor do 1 o Concurso Nacional <strong>de</strong> Ensaios – Prêmio Gil‑<br />
berto Freyre 2004/2005.<br />
O título As criaturas <strong>de</strong> Prometeu é o <strong>de</strong> uma peça <strong>de</strong><br />
Beethoven, composta com temas que iriam figurar em suas<br />
sinfonias posteriores, indicando, nas palavras <strong>de</strong> Eli<strong>de</strong> Rugai,<br />
“a presença <strong>de</strong> uma obra plena <strong>de</strong> organicida<strong>de</strong>”, que ela<br />
i<strong>de</strong>ntifica também na unida<strong>de</strong> da obra <strong>de</strong> Freyre, na qual, a<br />
cada livro encontramos “a retomada, em outra tonalida<strong>de</strong>,<br />
dos temas <strong>de</strong>senvolvidos <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o primeiro texto”.<br />
A articulação <strong>de</strong>sses temas – patriarcalismo, interpe‑<br />
netração <strong>de</strong> etnias/culturas e trópico – constitui a “unida<strong>de</strong><br />
explicativa do pensamento freyriano”. A partir daí, como<br />
variações em uma sinfonia, Freyre <strong>de</strong>senvolveu seu amplo<br />
retrato da formação social brasileira, dando relevo a temas<br />
até então menosprezados pelos estudiosos: o papel do es‑<br />
cravo negro na socieda<strong>de</strong> patriarcal, o lugar da mulher e da<br />
criança, o mito do amarelinho.<br />
Dividido em oito capítulos, o livro abre com uma au‑<br />
tobiografia do sociólogo pernambucano, montada a partir<br />
<strong>de</strong> trechos <strong>de</strong> sua obra e <strong>de</strong> entrevistas por ele concedidas,<br />
concluindo com uma entrevista exclusiva <strong>de</strong> Freyre, reali‑<br />
zada em 1985, dois <strong>anos</strong> antes <strong>de</strong> sua morte, formando<br />
assim um círculo bem gilbertiano: os <strong>anos</strong> <strong>de</strong> formação da<br />
juventu<strong>de</strong> ligados à maturida<strong>de</strong> realizadora.<br />
140<br />
o B r a s v e n C e d o r a s d o P r ê M i o G i l B e r t o F r e y r e<br />
ENSAIO SOBRE<br />
O JARDIM<br />
Prêmio Gilberto Freyre 2006/2007<br />
Solange <strong>de</strong> Aragão<br />
1 a edição – 208 páginas<br />
1 encarte colorido (16 páginas)<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1331 ‑5<br />
Se você não tem o hábito <strong>de</strong> frequentar jardins, está na<br />
hora <strong>de</strong> começar. Po<strong>de</strong> escolher um jardim físico para exercitar<br />
as pernas e se sentar num banco, ou simplesmente se <strong>de</strong>liciar<br />
com este Ensaio sobre o jardim, vencedor do 2 o Concurso<br />
Nacional <strong>de</strong> Ensaios – Prêmio Gilberto Freyre 2006/2007.<br />
Nele, Solange <strong>de</strong> Aragão nos conta o fastígio e a <strong>de</strong>‑<br />
cadência dos jardins, no Brasil, seu surgimento, imposto<br />
por padrões <strong>de</strong> gosto europeu, durante a conquista holan‑<br />
<strong>de</strong>sa no Nor<strong>de</strong>ste, inaugurado por Maurício <strong>de</strong> Nassau, até<br />
as concepções mo<strong>de</strong>rnas, elaboradas por Burle Marx e seus<br />
contemporâneos.<br />
Os primeiros jardins públicos eram elitistas, abertos<br />
apenas aos <strong>de</strong>licados sapatinhos das iaiás e às botinas <strong>de</strong><br />
bico fino dos ioiôs. Os pés <strong>de</strong>scalços dos escravos, os calça‑<br />
dos com chinelos dos caixeiros ou os tamancos dos portu‑<br />
gueses não podiam passear por suas aleias.<br />
Mas podiam entrar nos jardins domésticos, em cujos<br />
canteiros se alinhavam ervas medicinais, pomar, hortaliças e<br />
flores. Essa extensão do sobrado começa a se europeizar no<br />
século XIX, <strong>de</strong>ixando <strong>de</strong> ser local <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong> doméstica para<br />
se tornar apenas regalo a olhos e olfato, coberto sobretudo <strong>de</strong><br />
flores, com a indisfarçável marca do homem da terra.<br />
Solange reflete que “talvez sua brasilida<strong>de</strong> esteja<br />
mesmo na mistura <strong>de</strong> espécies <strong>de</strong> origem tão variada, na<br />
mistura <strong>de</strong> cores e formas, <strong>de</strong> perfumes, <strong>de</strong> signos e mitos,<br />
<strong>de</strong> significações <strong>de</strong> cultura diversa”.<br />
Mais tar<strong>de</strong>, os jardins são plantados para <strong>de</strong>coração<br />
externa das casas, integrados à composição arquitetônica,<br />
dando origem ao movimento <strong>de</strong> valorização da flora nacio‑<br />
nal. Foi a hora e a vez <strong>de</strong> Burle Marx, que aspirava a “in‑<br />
ventar e reinventar a paisagem cultural brasileira”.<br />
Em nossas cida<strong>de</strong>s mo<strong>de</strong>rnas, a verticalização criou os<br />
jardins dos condomínios, sem laços afetivos com os mora‑<br />
dores, se bem que ainda se possam encontrar pessoas re‑<br />
gando um canteiro.<br />
o B r a s v e n C e d o r a s d o P r ê M i o G i l B e r t o F r e y r e
NORDESTE SEMITA<br />
ENSAIO SOBRE UM CERTO<br />
NORDESTE QUE EM GILBERTO<br />
FREyRE TAMBÉM É SEMITA<br />
Prêmio Gilberto Freyre 2008/2009<br />
Caesar Sobreira<br />
1 a edição – 224 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1473 ‑2<br />
Vencedor da terceira edição do Concurso Nacional <strong>de</strong><br />
Ensaios – Prêmio Gilberto Freyre 2008/2009, Nor<strong>de</strong>ste se‑<br />
mita levanta e analisa as diversas manifestações da cultura<br />
semita presentes no cotidiano do povo nor<strong>de</strong>stino. A su‑<br />
gestão do trabalho nasceu das observações agudas e ori‑<br />
ginais sobre o assunto, emitidas por Gilberto Freyre em<br />
Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala, Sobrados e mucambos e Nor<strong>de</strong>ste.<br />
A partir <strong>de</strong> tais sugestões, o antropólogo Caesar Sobreira<br />
<strong>de</strong>senvolveu o seu trabalho, em diálogo permanente com<br />
o pensamento freyriano, mas com abordagem original,<br />
“examinando as estruturas <strong>de</strong> parentesco, os nomes e<br />
suas origens, investigando grupos específicos”, para <strong>de</strong>‑<br />
monstrar “a influência profunda que tiveram os ju<strong>de</strong>us na<br />
construção do Nor<strong>de</strong>ste”, como observa Chaim Samuel<br />
Katz, no prefácio à obra.<br />
Com erudição, mas sem pedantismo, recorrendo à<br />
história e à antropologia, o autor apresenta alguns mo‑<br />
mentos <strong>de</strong>cisivos da história do Nor<strong>de</strong>ste, nos quais <strong>de</strong>s‑<br />
taca as marcas <strong>de</strong>ixadas pela presença do ju<strong>de</strong>u na região.<br />
Essa presença, po<strong>de</strong> ‑se dizer sem exagero, encontra ‑se em<br />
todos os aspectos da vida, dos mitos alimentares ao noma‑<br />
dismo típico do homem do Nor<strong>de</strong>ste, dos amores domés‑<br />
ticos à simbologia semita arraigada na religiosida<strong>de</strong> e na<br />
cultura popular, sublinhando aspectos ainda <strong>mais</strong> específi‑<br />
cos, como o uso <strong>de</strong> mantilha por parte das mulheres nor‑<br />
<strong>de</strong>stinas e o costume <strong>de</strong> se erigir monumentos sagrados<br />
em montes e elevados. Caesar Sobreira conclui lembrando<br />
as raízes semitas da família Freyre, <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes dos “ve‑<br />
lhos cristãos ‑novos”, por sua vez “<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes dos anti‑<br />
gos ju<strong>de</strong>us ibéricos, que, transplantados para o Brasil,<br />
floresceram sob o sol da civilização lusotropical situada e<br />
adaptada” no Nor<strong>de</strong>ste, que “como o próprio Gilberto<br />
Freyre também é semita”.<br />
o B r a s v e n C e d o r a s d o P r ê M i o G i l B e r t o F r e y r e<br />
AS MELHORES FRASES<br />
DE CASA GRANDE &<br />
SENZALA<br />
A OBRA PRIMA DE<br />
GILBERTO FREyRE<br />
Seleção <strong>de</strong> Fátima Quintas<br />
2 a edição – 288 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1677 ‑4<br />
Publicado em 1933, Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala provocou<br />
uma revolução na maneira <strong>de</strong> os brasileiros verem, sentirem<br />
e analisarem o Brasil. O livro logo se tornou um clássico e<br />
<strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ou, em doses abundantes, elogios e restrições<br />
quanto à visão do autor sobre <strong>de</strong>terminados aspectos da<br />
formação histórico ‑social do país.<br />
Polêmicas à parte, com o objetivo <strong>de</strong> facilitar ao leitor<br />
uma incursão inicial por esta obra rica e complexa, Fátima<br />
Quintas reuniu em As melhores frases <strong>de</strong> Casa ‑Gran<strong>de</strong> &<br />
Senzala, “a obra ‑prima <strong>de</strong> Gilberto Freyre”, como diz o<br />
subtítulo, uma espécie <strong>de</strong> súmula do pensamento gilber‑<br />
tiano sobre a formação do Brasil sob o regime patriarcal.<br />
Para tanto, foram ali pinçadas cerca <strong>de</strong> mil frases, dis‑<br />
tribuídas em 58 temas, or<strong>de</strong>nados, não em or<strong>de</strong>m alfabé‑<br />
tica, mas didática. Como Fátima Quintas explica no prefácio,<br />
a seleção consi<strong>de</strong>rou, sobretudo, “a acepção literária, os<br />
jogos metafóricos, e o vigor <strong>de</strong> conteúdo” das frases.<br />
Os temas indicam o essencial da obra e abordam as‑<br />
pectos como o exílio, a Mata Atlântica, miscigenação, índio<br />
macho, mulher indígena, indumentária, alimentação, casa‑<br />
mento patriarcal, influência moura, a ação <strong>de</strong>letéria da<br />
escravidão e o complexo social da casa ‑gran<strong>de</strong>.<br />
A seleção <strong>de</strong> Fátima Quintas ressalta com precisão a<br />
originalida<strong>de</strong> das frases <strong>de</strong> Gilberto Freyre, conciliando<br />
rigor formal e um certo gosto popular com a justeza da<br />
observação. Note como Freyre <strong>de</strong>finiu o português que co‑<br />
lonizou o Brasil: “É um povo que vive a fazer <strong>de</strong> conta que<br />
é po<strong>de</strong>roso e importante. Que é supercivilizado à europeia.<br />
Que é gran<strong>de</strong> potência colonial”. E sobre a mistura <strong>de</strong><br />
raças: “A miscigenação que largamente se praticou aqui<br />
corrigiu a distância social que doutro modo se teria conser‑<br />
vado enorme entre a casa ‑gran<strong>de</strong> e a mata tropical; entre<br />
a casa ‑gran<strong>de</strong> e a senzala”.<br />
Capa<br />
Nova<br />
s o B r e G i l B e r t o F r e y r e<br />
141
IRREDUTIVELMENTE<br />
ESCRITOR<br />
BIBLIOGRAFIA DE<br />
GILBERTO FREyRE<br />
Edson Nery da Fonseca<br />
Prelo<br />
Gilberto Freyre continua muito presente na cultura e<br />
no pensamento brasileiros. Nos últimos <strong>anos</strong>, sua obra tem<br />
sido estudada e reavaliada nos <strong>mais</strong> variados aspectos. A<br />
força <strong>de</strong> sua presença se reafirma, <strong>mais</strong> uma vez, com a<br />
reedição “aumentada e atualizada” <strong>de</strong> Irredutivelmente<br />
escritor, bibliografia comentada da obra do sociólogo, an‑<br />
tropólogo, pensador social, poeta, ficcionista, ensaísta,<br />
crítico literário e <strong>de</strong> artes plásticas, professor, conferencista,<br />
jornalista e quase político pernambucano, empreendida<br />
por Edson Nery da Fonseca.<br />
O título já diz tudo. Em seus 72 <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> inte‑<br />
lectual, Gilberto Freyre foi antes <strong>de</strong> tudo um escritor, abor‑<br />
dando quase todos os domínios <strong>de</strong> conhecimento, autor <strong>de</strong><br />
uma obra imensa e <strong>de</strong> extraordinária receptivida<strong>de</strong>, com<br />
muitas reedições, e que se <strong>de</strong>sdobrou também na organiza‑<br />
ção <strong>de</strong> obras coletivas, na direção <strong>de</strong> periódicos e numa in‑<br />
tensíssima colaboração jornalística. Freyre foi colaborador<br />
fiel da revista O Cruzeiro, entre 1952 e 1967. Ao todo, nesta<br />
e em outras publicações, redigiu 333 artigos. E, além <strong>de</strong> sua<br />
ativida<strong>de</strong> como escritor, conce<strong>de</strong>u 60 entrevistas.<br />
Irredutivelmente escritor está dividido em doze capítu‑<br />
los, abordando “Livros”, “Opúsculos”, “Organização <strong>de</strong><br />
obras coletivas”, “Direção <strong>de</strong> publicações periódicas e se‑<br />
riadas”, “Contribuições em obras coletivas”, “Prefácios,<br />
apresentações, etc.”, “Colaboração em revistas”, “Entre‑<br />
vistas”, “Textos incluídos em antologias”, “Obras anuncia‑<br />
das e não publicadas”, “Colaboração em jornais” e<br />
“Juvenília”, registrando 1.123 itens. Este número po<strong>de</strong><br />
crescer em edições posteriores, pois em termos <strong>de</strong> biblio‑<br />
grafia o <strong>de</strong>finitivo não existe.<br />
Para facilitar o trânsito do pesquisador por esse cipoal,<br />
o livro oferece quatro índices: temático, onomástico, biblio‑<br />
nímico e cronológico.<br />
142<br />
Prelo<br />
s o B r e G i l B e r t o F r e y r e<br />
SExO À MODA<br />
PATRIARCAL<br />
O FEMININO E O MASCULINO<br />
NA OBRA DE GILBERTO FREyRE<br />
Fátima Quintas<br />
1 a edição – 184 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1263 ‑9<br />
Uma característica do sistema patriarcal era acentuar<br />
ao extremo as diferenças entre os sexos, <strong>de</strong> forma a impor,<br />
sem quaisquer contestações, o império do macho sobre a<br />
fêmea, incutindo na mulher, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a infância, seu papel<br />
submisso, no ambiente doméstico e na socieda<strong>de</strong>.<br />
A obra do sociólogo pernambucano Gilberto Freyre, o<br />
primeiro a estudar o papel da mulher na organização social<br />
brasileira, serve <strong>de</strong> base a Fátima Quintas para aprofundar<br />
a análise do tema, com enfoque voltado para o papel das<br />
mulheres no cotidiano dos engenhos <strong>de</strong> açúcar.<br />
Submissas ou enclausuradas, as mulheres contribuíram,<br />
<strong>de</strong> forma quase subversiva, para a fixação da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> na‑<br />
cional, elaborando e ditando o ritmo e os rituais do cotidiano<br />
familiar da casa ‑gran<strong>de</strong>. Negras e mulatas, cujos corpos elás‑<br />
ticos e rijos <strong>de</strong>spertavam o <strong>de</strong>sejo dos sinhôs, num processo<br />
<strong>de</strong> “clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong> sexual”, segundo a <strong>de</strong>finição da autora,<br />
eram peças vitais ao funcionamento da máquina doméstica,<br />
responsáveis pelas tarefas da casa, amamentando os bebês,<br />
contando histórias mágicas aos meninos, dando ‑lhes colo e,<br />
<strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, iniciando ‑os nos mistérios do sexo.<br />
Sem elas, seria ainda <strong>mais</strong> dura a tarefa das iaiás bran‑<br />
cas, mandonas, preguiçosas, tão submissas ao marido<br />
quanto as escravas, confinadas às pare<strong>de</strong>s da casa ‑gran<strong>de</strong>,<br />
naquilo que a autora chama <strong>de</strong> “isolamento árabe”, mar‑<br />
cadas ao longo da vida pelo rito <strong>de</strong> se tornar adulta, o ca‑<br />
samento, o po<strong>de</strong>r social e psicológico do confessionário,<br />
até o envelhecimento precoce.<br />
Fátima Quintas, com requintes prousti<strong>anos</strong> na análise<br />
da vida da casa ‑gran<strong>de</strong>, recria o cotidiano <strong>de</strong>ssas mulheres e<br />
ilumina a participação <strong>de</strong>las na socieda<strong>de</strong> colonial, muitas<br />
vezes se contrapondo ao po<strong>de</strong>r do macho e contribuindo <strong>de</strong><br />
forma <strong>de</strong>cisiva para a construção <strong>de</strong> uma nova socieda<strong>de</strong>.<br />
s o B r e G i l B e r t o F r e y r e
André Brandão<br />
C o l e ç ã o<br />
i G n á C i o d e l o y o l a<br />
B r a n d ã o<br />
Paulista <strong>de</strong> Araraquara, São Paulo. Nascido em<br />
1936, aos <strong>de</strong>zesseis <strong>anos</strong> começou a trabalhar como<br />
jornalista no jornal Correio Popular (Araraquara),<br />
profissão que ainda exerce e a qual influenciou dire‑<br />
tamente sua ficção.<br />
Uma característica marcante do trabalho <strong>de</strong> Loyola é a<br />
sua narrativa repleta <strong>de</strong> experimentos técnicos – como<br />
a inclusão <strong>de</strong> trechos jornalísticos e flashes da vida co‑<br />
tidiana. Além disso, o autor tece a trama com tamanha<br />
habilida<strong>de</strong> que faz o leitor <strong>de</strong>cifrar <strong>de</strong> novas maneiras<br />
a realida<strong>de</strong> que o cerca. O resultado é um trabalho<br />
inovador, no qual a perspectiva popular prevalece sobre<br />
as estruturas tradicionais da ficção. A linguagem colo‑<br />
quial, a agilida<strong>de</strong> dos diálogos e a preocupação com o<br />
<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> uma trama que prenda o leitor<br />
também estão presentes em sua obra, e refletem um<br />
posicionamento todo particular diante da literatura.<br />
Para mim, a literatura é a <strong>de</strong>fesa da dignida<strong>de</strong><br />
humana, a <strong>de</strong>núncia <strong>de</strong> sistemas opressores, o<br />
retrato <strong>de</strong> uma época. É uma fotografia, um<br />
documentário dos tempos em que vivemos, é<br />
divertimento, prazer.<br />
143
A ÚLTIMA VIAGEM<br />
DE BORGES<br />
UMA EVOCAÇÃO<br />
1 a edição – 176 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1006 ‑9<br />
Em A última viagem <strong>de</strong> Borges, Ignácio <strong>de</strong> Loyola<br />
Brandão passeia pelo insólito, propõe enigmas, mas sobre‑<br />
tudo <strong>de</strong>safia a argúcia e a imaginação do leitor. Tendo<br />
como personagem central um mistificador <strong>de</strong> gênio (como<br />
o chamou Otto Maria Carpeaux), o escritor argentino Jorge<br />
Luis Borges, a peça se <strong>de</strong>senrola num clima <strong>de</strong> fantasia<br />
<strong>de</strong>lirante, bem ao estilo borgeano, temperado pelo humor<br />
e a ironia típicas do autor paulista. Aos 87 <strong>anos</strong>, cego, sen‑<br />
tindo a presença cada vez <strong>mais</strong> próxima da in<strong>de</strong>sejada das<br />
gentes, Borges inventa (ou <strong>de</strong>scobre?) a palavra ‑síntese, a<br />
<strong>mais</strong> perfeita <strong>de</strong> todas, resumo <strong>de</strong> todas as palavras, cons‑<br />
truída “com sílabas articuladas cheias <strong>de</strong> ternuras e tremo‑<br />
res”. Sem escrevê ‑la ou comunicar a outra pessoa, o velho<br />
escritor acaba por esquecê ‑la.<br />
Para recuperar a palavra mágica, Borges organiza uma<br />
expedição à Biblioteca <strong>de</strong> Babel, em companhia <strong>de</strong> Shera‑<br />
za<strong>de</strong>, a narradora perfeita, que salvou a própria vida pelo<br />
uso da palavra, Sir Richard Burton, o aventureiro inglês do<br />
século XIX, primeiro oci<strong>de</strong>ntal a entrar em Meca, e Funes,<br />
o Memorioso, personagem <strong>de</strong> ficção criado por Borges.<br />
A Biblioteca, no entanto, se opõe com toda a astúcia<br />
ao <strong>de</strong>sejo do escritor e seus amigos. Quer preservar para si<br />
a palavra perfeita. Dúvidas, <strong>de</strong>safios, obstáculos, peripé‑<br />
cias, incursões pelo mundo dos espelhos, o universo dos<br />
labirintos, a terra dos seres imaginários, <strong>de</strong>spertando novas<br />
dúvidas. Somos reais ou meras imagens? Afinal, o grupo<br />
encontra o Bibliotecário Imperfeito, espécie <strong>de</strong> duplo bor‑<br />
geano, zelador da inacessível Biblioteca, reino <strong>de</strong> todas as<br />
palavras, on<strong>de</strong> “estão as coisas criadas e as não criadas”,<br />
acesso a uma viagem infinita. A última viagem <strong>de</strong> Borges<br />
termina com quatro finais possíveis, que po<strong>de</strong>riam ser infi‑<br />
nitos, pois a busca da palavra é a <strong>mais</strong> árdua <strong>de</strong> todas as<br />
buscas: a <strong>de</strong> si mesmo.<br />
144<br />
I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />
ACORDEI EM<br />
WOODSTOCk<br />
Viagem, memórias, perplexida<strong>de</strong>s<br />
1 a edição – 288 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1602 ‑6<br />
Woodstock foi o final simbólico <strong>de</strong> um tempo e o iní‑<br />
cio, um tanto louco, mas livre e sonhador, <strong>de</strong> um novo<br />
mundo. Nem importa se para melhor ou pior. O principal é<br />
que ao reivindicar paz e amor, liberda<strong>de</strong>, sexo total e uso<br />
<strong>de</strong> drogas, embalados durante três dias pelo som <strong>de</strong> um<br />
rock pesadíssimo, aquele festival, realizado no longínquo<br />
ano <strong>de</strong> 1969, fez a cabeça e mudou o comportamento <strong>de</strong><br />
milhões <strong>de</strong> jovens em todo o mundo.<br />
Em busca <strong>de</strong>sse passado mítico, ainda tão presente<br />
em nossas vidas, Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão viajou para a<br />
cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Woodstock, no estado norte ‑americano <strong>de</strong> Ver‑<br />
mont. Ali viveu dias <strong>de</strong> sedução e encantamento, tentando<br />
recriar, em cada lugar on<strong>de</strong> <strong>de</strong>correra o festival, aqueles<br />
momentos <strong>de</strong> magia, <strong>de</strong>lírio e loucura vividos por quinhen‑<br />
tos mil rapazes e moças, em busca <strong>de</strong> um mundo menos<br />
convencional e hipócrita.<br />
A viagem se alongou pelos estados <strong>de</strong> Nova Inglaterra<br />
e Connecticut, uma das regiões <strong>mais</strong> ricas, econômica e in‑<br />
telectualmente dos Estados Unidos, resultando, nas palavras<br />
do autor, em um “relato <strong>de</strong> viagem antiliterário, <strong>de</strong>spreten‑<br />
sioso. Apreensão <strong>de</strong> momentos, fragmentos, anotações do<br />
dia a dia, memórias afetivas interligadas, brinca<strong>de</strong>iras, recor‑<br />
dações particulares, lugares ligando ‑se a leituras ou filmes”.<br />
Um caleidoscópio <strong>de</strong> observações, perplexida<strong>de</strong>s e<br />
sensações, difícil <strong>de</strong> ser enquadrado, com rigor, em qual‑<br />
quer gênero literário. Romance? Nem tanto. Memórias?<br />
Mais ou menos. Relato <strong>de</strong> viagem? Po<strong>de</strong> ser que sim. No<br />
final, nada disso tem muita importância. O principal é que<br />
se trata <strong>de</strong> um livro que encanta, seduz e convida à reflexão<br />
e à evocação <strong>de</strong> um tempo que passou, mas que ilumina e<br />
continua presente em nosso tempo, permitindo ao leitor<br />
acordar também em Woodstock, talvez ao som <strong>de</strong> um<br />
rock. Não custa experimentar.<br />
I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o
BEBEL QUE A<br />
CIDADE COMEU<br />
6 a edição – 400 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0329 ‑1<br />
Bebel que a cida<strong>de</strong> comeu, <strong>de</strong> Ignácio <strong>de</strong> Loyola Bran‑<br />
dão, retrata, com aci<strong>de</strong>z e sarcasmo, humor amargo e im‑<br />
pieda<strong>de</strong>, um dos períodos <strong>mais</strong> negros e, ao mesmo<br />
tempo, <strong>mais</strong> criativos da história brasileira, os <strong>anos</strong> 1960.<br />
Época <strong>de</strong> repressão política, <strong>de</strong> brutalida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> sufoco, mas<br />
também <strong>de</strong> explosão <strong>de</strong> uma irreprimível fome <strong>de</strong> vida, que<br />
não era privilégio brasileiro.<br />
Uma espécie <strong>de</strong> alucinação coletiva em busca <strong>de</strong> novos<br />
horizontes espirituais, <strong>de</strong> cansaço e revolta com a herança do<br />
passado, se apossava da juventu<strong>de</strong>, ao embalo da música dos<br />
Beatles, no consumo cada vez maior <strong>de</strong> alucinógenos. As mu‑<br />
lheres, exibindo as pernas, sob as exíguas minissaias, conquis‑<br />
tavam a <strong>de</strong>finitiva liberda<strong>de</strong> sexual. Entre a placi<strong>de</strong>z dos <strong>anos</strong><br />
1950 e a nova década pareciam ter passado cem <strong>anos</strong>.<br />
Sob o torniquete da ditadura, o Brasil se ajeitava como<br />
podia, dançava twist e chá ‑chá ‑chá, assistia aos filmes do<br />
Cinema Novo, os jovens se mobilizavam em festivais <strong>de</strong><br />
música popular, que iriam revelar Chico Buarque, Caetano<br />
Veloso, Gal Costa, e tantos outros artistas. A televisão – a<br />
“máquina <strong>de</strong> fazer doido”, segundo seu <strong>mais</strong> ácido crítico,<br />
o cronista Sérgio Porto – se impunha com a força <strong>de</strong> um<br />
terremoto. Todos queriam ser atores <strong>de</strong> tevê.<br />
Foi esse também o sonho e a perdição <strong>de</strong> Bebel, atriz,<br />
mo<strong>de</strong>lo fotográfico, figurinha fácil em comerciais, um dos<br />
rostos <strong>mais</strong> conhecidos do país e uma das mulheres <strong>mais</strong><br />
<strong>de</strong>sejadas. Fama, dinheiro, <strong>de</strong>slumbramento. Com a<br />
mesma rapi<strong>de</strong>z com que subiu, Bebel <strong>de</strong>sapareceu da teli‑<br />
nha, triturada pela engrenagem da televisão, atirada fora<br />
como um trapo imprestável. O público exige sempre novos<br />
ídolos.Romance cruel, mostra como, à semelhança <strong>de</strong><br />
Bebel, comida pela cida<strong>de</strong>, toda uma geração <strong>de</strong> jovens<br />
i<strong>de</strong>alistas foi comprimida e <strong>de</strong>glutida pelo sistema. Dias <strong>de</strong><br />
chumbo começavam a invadir o Brasil.<br />
I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />
CABEÇAS DE<br />
SEGUNDA FEIRA<br />
5 a edição – 200 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1309 ‑4<br />
O absurdo da vida mo<strong>de</strong>rna em uma cida<strong>de</strong> gran<strong>de</strong><br />
encontra em Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão um crítico cruel e<br />
impiedoso, com um humor agridoce que po<strong>de</strong> ser, no<br />
fundo, simpatia, con<strong>de</strong>scendência ou a suprema forma <strong>de</strong><br />
sarcasmo. Ou todas reunidas, batidas em liquidificador e<br />
bem misturadas. Po<strong>de</strong> ser. Cabeças <strong>de</strong> segunda ‑feira, com<br />
as suas situações insólitas, suas frustrações e suas obsceni‑<br />
da<strong>de</strong>s, exprime um pouco <strong>de</strong>sses sentimentos, mas tam‑<br />
bém a relação <strong>de</strong> amor e asco, fascínio e repulsa que o<br />
autor mantém com sua época e a cida<strong>de</strong> em que vive.<br />
O livro divi<strong>de</strong> ‑se em cinco gran<strong>de</strong>s temas (a criação, o<br />
<strong>de</strong>sejo, o amor, o homem, a mente), que po<strong>de</strong>m servir <strong>de</strong><br />
inspiração a histórias <strong>de</strong> todo tipo e formato, bem comporta‑<br />
das, quadradas, redondas. Loyola <strong>de</strong>les extraiu uma mistura<br />
ácida <strong>de</strong> insólito e gozação, um pouco além ou aquém da<br />
realida<strong>de</strong> (a anã pré ‑fabricada, a irrefreável pari<strong>de</strong>ira), e fla‑<br />
grantes do caos urbano, em visão cínica e implacável: o gozo<br />
atrás das árvores, obscenida<strong>de</strong>s para uma dona <strong>de</strong> casa.<br />
Mas há também lampejos <strong>de</strong> simpatia (em realida<strong>de</strong> sim‑<br />
patia e cruelda<strong>de</strong>, um jogo sadomasoquista com o persona‑<br />
gem) pelos sonhadores frustrados, quase sempre inofensivos,<br />
como no sarcástico “45 encontros com Vera Fischer”.<br />
Simpatia e sarcasmo se aguçam ainda <strong>mais</strong> quando<br />
trata do sonhador erótico que às mulheres <strong>de</strong> carne e osso<br />
prefere as mulheres irresistíveis das revistas pornográficas<br />
(“Anúncios eróticos”). A fantasia superando a realida<strong>de</strong>, a<br />
fuga da vida, temas tão frequentes na obra do autor. Igná‑<br />
cio <strong>de</strong> Loyola Brandão nasceu em 1936, em Araraquara,<br />
São Paulo. Des<strong>de</strong> os <strong>de</strong>zesseis <strong>anos</strong> trabalha no jornalismo,<br />
profissão que influenciou duplamente sua ficção, na lin‑<br />
guagem e na visão <strong>de</strong> mundo. Premiado no Brasil e no<br />
exterior, tem <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta livros publicados, entre roman‑<br />
ces, contos e reportagens, vários <strong>de</strong>les traduzidos.<br />
I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />
145
CADEIRAS PROIBIDAS<br />
11 a edição – 144 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1471 ‑8<br />
Ca<strong>de</strong>iras proibidas atira o leitor em um universo surrea‑<br />
lista, on<strong>de</strong> todas as ca<strong>de</strong>iras são proibidas ou, pelo menos,<br />
não recomendáveis. O fantástico é o clima, o inesperado<br />
sempre acontece, a angústia tritura todo mundo. Medo,<br />
cautela. Afinal, qualquer um po<strong>de</strong> ser envolvido pelo im‑<br />
previsível e <strong>de</strong>scobrir que o ser humano, corpo e alma,<br />
nada vale diante da força.<br />
Metáfora da condição humana esmagada por um re‑<br />
gime <strong>de</strong> força, fábulas <strong>de</strong> um mundo em crise, escritos com<br />
humor amargo, indignação, ironia, os contos <strong>de</strong> Ca<strong>de</strong>iras<br />
proibidas reproduzem, sob o manto diáfano da fantasia, o<br />
clima <strong>de</strong> terror e sufoco dos <strong>anos</strong> 1970. Dias <strong>de</strong> arrocho<br />
político e censura implacável, violência cultivada pelo Estado,<br />
torturas, todos <strong>de</strong>sconfiando <strong>de</strong> todos, a verda<strong>de</strong> proibida<br />
<strong>de</strong> ser dita, ou transmitida apenas através <strong>de</strong> uma represen‑<br />
tação, na qual qualquer semelhança com a realida<strong>de</strong> não era<br />
em absoluto mera coincidência, mas até isso exigia cautela.<br />
Não é difícil estabelecer conexões entre o fantástico<br />
dos contos e a dura realida<strong>de</strong> cotidiana: o homem que re‑<br />
solve contar apenas mentiras e <strong>de</strong>scobre que as mentiras se<br />
tornam verda<strong>de</strong>s ou a situação <strong>de</strong> angústia do sujeito proi‑<br />
bido <strong>de</strong> entrar no cinema e até mesmo sentar na praça por<br />
causa <strong>de</strong> um furo na mão. O homem cuja orelha cresceu<br />
tanto que se espalhou por toda a cida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> indicar o<br />
<strong>de</strong>lator, tão comum à época, que <strong>de</strong>struiu tantas vidas. E os<br />
agentes <strong>de</strong> segurança que estão e não estão nas casas, o<br />
homem <strong>de</strong>sesperado que mata toda a família a tiros, o ci‑<br />
nema <strong>de</strong> on<strong>de</strong> as pessoas não conseguem sair e cuja sessão<br />
nunca começa, os postes que ficam moles, as pedras que<br />
gritam quando pisadas, os homens que se transformam em<br />
barbantes, as letras que caem dos livros.<br />
Alegorias, com um toque <strong>de</strong> fantástico <strong>de</strong> um mundo<br />
e uma época <strong>de</strong> pesa<strong>de</strong>lo on<strong>de</strong> tudo, absolutamente tudo,<br />
estava em <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m.<br />
146<br />
I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />
DENTES AO SOL<br />
5 a edição – 366 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0048 ‑9<br />
Retrato <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong> do interior do Brasil, através do<br />
testemunho meio patético, meio venenoso, <strong>de</strong> um cidadão<br />
excluído da comunida<strong>de</strong>, Dentes ao sol provoca e inquieta o<br />
leitor. O narrador foi mesmo con<strong>de</strong>nado ao ostracismo, pelo<br />
povo da terra? Ou teria ‑se afastado, por vonta<strong>de</strong> própria e<br />
tédio <strong>de</strong> uma realida<strong>de</strong> diária mesquinha e asfixiante?<br />
Seja como for, é através <strong>de</strong> seu <strong>de</strong>poimento implacá‑<br />
vel (e com um mal disfarçado sentimento <strong>de</strong> vingança, <strong>de</strong><br />
forra) que se reconstitui sua sufocante vida pessoal e a vida<br />
cotidiana da cida<strong>de</strong>, com as suas trivialida<strong>de</strong>s, as dificulda‑<br />
<strong>de</strong>s <strong>de</strong> relacionamento entre as pessoas, os segredos <strong>de</strong><br />
polichinelo, os preconceitos e os absurdos. Os casos miste‑<br />
riosos que acontecem no escuro do cinema. A mulher que<br />
só atingia o orgasmo fazendo amor em meio a festas po‑<br />
pulares. Os homens metralhados na plataforma da estação.<br />
A piscina que engole os que nela mergulham. O tigre que<br />
rasga as pessoas nas ruas. Os jogos anuais, <strong>de</strong> extrema<br />
violência, com a participação <strong>de</strong> toda a cida<strong>de</strong>. Por que<br />
todos ven<strong>de</strong>m as casas com quintais e compram aparta‑<br />
mentos? A televisão imperando em todos os momentos da<br />
vida. Ninguém sai <strong>mais</strong> <strong>de</strong> casa, a tal ponto que se escreveu<br />
um “Manual prático para se sair <strong>de</strong> casa”, orientando<br />
quem quisesse ir à rua. Realida<strong>de</strong> e simbologia.<br />
Dentes ao sol, em certa medida, é também a home‑<br />
nagem <strong>de</strong> um cinéfilo ao cinema, estabelecendo relações<br />
entre o que ocorre na cida<strong>de</strong>, o que o narrador reconstitui<br />
e os filmes que marcaram sua geração.<br />
Escrito com humor e sarcasmo, o livro parece propor,<br />
sob o <strong>de</strong>salento do narrador, um <strong>de</strong>safio <strong>de</strong> vida e, sobre‑<br />
tudo, <strong>de</strong> renovação: o estímulo à coragem para se perse‑<br />
guir o sonho, a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se buscar a utopia, <strong>de</strong> se<br />
viver com esperança, ainda que contra tudo e todos. Sob<br />
pena <strong>de</strong> enlouquecer à sombra, como o “girassol no<br />
muro”, expondo “os <strong>de</strong>ntes ao sol”.<br />
I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o
DEPOIS DO SOL<br />
2 a edição – 208 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1042 ‑5<br />
Primeiro livro <strong>de</strong> contos publicado por Ignácio <strong>de</strong><br />
Loyola Brandão, Depois do sol retrata a noite paulistana,<br />
nos <strong>anos</strong> 1960, povoada por uma fauna exótica, cheia <strong>de</strong><br />
picardia, malandragem e (algumas vezes) más intenções,<br />
lutando pela árdua sobrevivência <strong>de</strong> cada dia.<br />
Os personagens são garotas <strong>de</strong> programa, marginais, ma‑<br />
nequins, atrizes, boxeurs <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ntes, músicos, a gente típica<br />
da noite, observada com curiosida<strong>de</strong> e simpatia pelo autor.<br />
O livro nasceu da experiência noturna do jovem jorna‑<br />
lista. Após a saída da redação, lá pelas onze horas da noite,<br />
Ignácio <strong>de</strong> Loyola e alguns amigos percorriam bares, boa‑<br />
tes, inferninhos, botecos, vendo, ouvindo, observando.<br />
Terminavam às quatro ou cinco horas da manhã, num<br />
banco da praça da República, para conversar. Depois do sol<br />
mostra uma cida<strong>de</strong> em que a violência, que hoje sufoca a<br />
todos, apenas começava a se impor, mas na qual a cruel‑<br />
da<strong>de</strong>, a angústia, o <strong>de</strong>sespero, características eternas do<br />
bicho ‑homem, estavam muito presentes, como se constata<br />
no concurso <strong>de</strong> resistência <strong>de</strong> dança (“No ritmo lento do<br />
funeral”) e na pequena odisseia <strong>de</strong> todas as noites <strong>de</strong> um<br />
jovem angustiado, que sai <strong>de</strong> casa para beber e brigar (“Re‑<br />
trato do jovem brigador”). Depois do sol é também o ho‑<br />
rário <strong>mais</strong> brilhante do mundo da moda, com suas mil<br />
seduções, <strong>de</strong>sencontros, angústias e mo<strong>de</strong>los em busca <strong>de</strong><br />
fama e dinheiro (“Ascensão ao mundo <strong>de</strong> Annuska”). Só à<br />
noite po<strong>de</strong> acontecer o caso (real) <strong>de</strong> uma atriz, abordada<br />
por uma prostituta, que a confun<strong>de</strong> com uma antiga co‑<br />
lega <strong>de</strong> profissão (“Diálogo com Adriana”) ou a terrível<br />
<strong>de</strong>pressão <strong>de</strong> um homem isolado pela doença (“Doente<br />
<strong>de</strong>ntro da noite”). Mas é <strong>de</strong> qualquer hora a narrativa<br />
kafkiana <strong>de</strong> um imenso congestionamento <strong>de</strong> trânsito (“São<br />
João mão única”). A presente edição <strong>de</strong> Depois do sol traz<br />
uma novida<strong>de</strong>: um roteiro <strong>de</strong> como os contos surgiram e as<br />
pessoas que os inspiraram. É quase um novo conto.<br />
I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />
NÃO VERÁS<br />
PAÍS NENHUM<br />
Prêmio IILA como melhor livro latino<br />
americano na Itália 1983<br />
(Instituto Ítalo Latino Americano)<br />
27 a edição – 384 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1297 ‑4<br />
Durante muitas décadas a poesia “A pátria”, <strong>de</strong> Olavo<br />
Bilac, foi lida, <strong>de</strong>corada e recitada pelas crianças brasileiras.<br />
Os versos iniciais diziam: “Ama, com fé e orgulho, a terra<br />
em que nasceste!/ Criança! Não verás nenhum país como<br />
este!”. Não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser uma ironia cruel encontrar o verso<br />
bilaqueano adotado como título (e com seu significado vi‑<br />
rado pelo avesso) <strong>de</strong> um dos romances <strong>mais</strong> <strong>de</strong>vastadores<br />
e pessimistas da literatura brasileira, o oposto do róseo oti‑<br />
mismo do poeta das estrelas, Não verás país nenhum, <strong>de</strong><br />
Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão.<br />
Enquanto gerações <strong>de</strong> crianças brasileiras recitavam o<br />
poema <strong>de</strong> Bilac, o país (aliás, em sintonia com o mundo) ia<br />
acelerando, lentamente, seu processo <strong>de</strong> auto<strong>de</strong>struição,<br />
com a <strong>de</strong>vastação das florestas, o acúmulo <strong>de</strong> lixo, a <strong>de</strong>gra‑<br />
dação do meio ambiente, a que se juntou, nos últimos<br />
tempos, a <strong>de</strong>struição da camada <strong>de</strong> ozônio do planeta,<br />
projetando perspectivas sombrias para a humanida<strong>de</strong>.<br />
Romance apocalíptico, no sentido <strong>de</strong> contar uma histó‑<br />
ria do fim dos tempos, Não verás país nenhum se <strong>de</strong>senrola<br />
em um futuro não <strong>de</strong>terminado, mas cada vez <strong>mais</strong> presente<br />
na realida<strong>de</strong> do brasileiro. Uma época terrível, na qual a<br />
Amazônia se transformou em um <strong>de</strong>serto sem nenhuma<br />
árvore; on<strong>de</strong> “o lixo forma setenta e sete colinas que ondu‑<br />
lam, habitadas, todas. E o sol, violento <strong>de</strong><strong>mais</strong>, corrói e apo‑<br />
drece a carne em poucas horas”; on<strong>de</strong> a carência <strong>de</strong> água<br />
impõe a reciclagem da urina, bebida pelas pessoas. A admi‑<br />
nistração do país chegou ao caos. Governantes medíocres,<br />
cada vez <strong>mais</strong> afastados do povo, interessados apenas em<br />
vantagens pessoais, uma polícia corrupta e assustadora.<br />
No meio <strong>de</strong>sse mundo sombrio, uma história <strong>de</strong> amor,<br />
na qual o autor sugere que nem tudo está perdido, pelo<br />
menos enquanto o bicho ‑homem alimentar esperanças e<br />
for capaz <strong>de</strong> gestos <strong>de</strong> generosida<strong>de</strong>.<br />
I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />
147
NOITE INCLINADA<br />
Prêmio Pedro Nava 1987<br />
(Aca<strong>de</strong>mia Brasileira <strong>de</strong> Letras)<br />
Prêmio <strong>de</strong> Melhor Romance 1987<br />
(Associação Paulista <strong>de</strong> Críticos <strong>de</strong> Arte)<br />
1 a edição – 384 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0816 ‑1<br />
Noite inclinada, que antes se chamava O ganhador, tal‑<br />
vez seja o romance <strong>mais</strong> sarcástico <strong>de</strong> Ignácio <strong>de</strong> Loyola Bran‑<br />
dão. Conta as peripécias <strong>de</strong> um anti ‑herói, um músico meio<br />
amalucado, figurinha carimbada em todos os festivais <strong>de</strong> mú‑<br />
sica do país, dos internacionais, reunindo os maiores astros<br />
da MPB brasileira, aos realizados em cida<strong>de</strong>s remotas, sem<br />
qualquer repercussão, em busca <strong>de</strong> um prêmio que nunca<br />
alcança e <strong>de</strong> um filho, gerado em uma amiga lésbica cujo<br />
sonho era ser mãe. Transcorrendo em sua maior parte nas<br />
estradas, o romance revela um Brasil cheio <strong>de</strong> contradições,<br />
patético, cruel, meio absurdo, mas sempre bem ‑humorado,<br />
povoado por personagens a um passo do grotesco: a pastora<br />
<strong>de</strong> uma religião que adora um gran<strong>de</strong> peixe encontrado <strong>de</strong>n‑<br />
tro do gelo; as prostitutas indignadas em ato <strong>de</strong> protesto; a<br />
hippie dos <strong>anos</strong> 1960 transformada em uma tranquila dona<br />
<strong>de</strong> casa; o vingador que o<strong>de</strong>ia banheiros sujos; o homem que<br />
mora <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma sereia; a ex ‑bailarina <strong>de</strong> corpo escultu‑<br />
ral, agora com uma imensa gordura e uma perna amputada,<br />
sem per<strong>de</strong>r a alegria <strong>de</strong> viver; a quarentona que se julga prin‑<br />
cesa, membro <strong>de</strong> um incrível fã ‑clube provinciano.<br />
O Ganhador não foge à regra. Alucinado, patético,<br />
julgando ‑se por vezes um ser superior, capaz <strong>de</strong> encontrar<br />
a oitava nota musical, oscila entre o i<strong>de</strong>alismo e o confor‑<br />
mismo, o <strong>de</strong>lírio e a <strong>de</strong>silusão. Adora o aplauso, tem voz<br />
melodiosa e boa presença. Por que não vence? Por que<br />
nunca consegue brilhar? “Porque sou uma mentira. Minha<br />
chance passou, não vi quando beirou”, raciocina, quando<br />
nada <strong>mais</strong> podia aspirar.<br />
Divertido, irreverente, <strong>de</strong>lirante, retrato alucinante do<br />
Brasil das décadas <strong>de</strong> 1970 e 1980, Noite inclinada, título<br />
inspirado em um poema do poeta português Hel<strong>de</strong>r Ma‑<br />
cedo, agri<strong>de</strong> o leitor como um soco bem dado. Agri<strong>de</strong> para<br />
<strong>de</strong>spertá ‑lo.<br />
148<br />
I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />
O ANJO DO ADEUS<br />
SACANAS HONESTOS JOGAM<br />
LIMPO JOGOS SUJOS<br />
2 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0517 ‑0<br />
O anjo do a<strong>de</strong>us, publicado quando Ignácio <strong>de</strong> Loyola<br />
Brandão comemorava trinta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> literatura, representou<br />
uma novida<strong>de</strong> e um <strong>de</strong>safio em sua obra romanesca, um<br />
mergulho sem limites nas podridões da socieda<strong>de</strong> contem‑<br />
porânea. O subtítulo já diz (quase) tudo: “Sacanas hones‑<br />
tos jogam limpo jogos sujos”.<br />
Em ambiente <strong>de</strong> sujeira explícita e clima meio <strong>de</strong> pulp<br />
fiction, O anjo do a<strong>de</strong>us se <strong>de</strong>senrola num ritmo alucinante,<br />
<strong>de</strong> tirar o fôlego e o sono, revelando a face brutal <strong>de</strong> uma<br />
pequena cida<strong>de</strong> do interior brasileiro, Arealva. Uma história<br />
<strong>de</strong> ambição e luta pelo po<strong>de</strong>r, pontilhada <strong>de</strong> sadismo, com<br />
uma sucessão <strong>de</strong> assassinatos, vinganças, mistérios, menti‑<br />
ras, sexo em <strong>de</strong>sespero, farto consumo <strong>de</strong> drogas, ódios<br />
velhos e persistentes, que o cronista narra com cinismo,<br />
sarcasmo, alguma zombaria e absoluta fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong>, segundo<br />
garante ao leitor no capítulo inicial, quando alguns envol‑<br />
vidos nos fatos tentam suborná ‑lo para alterar a história.<br />
Afinal, eliminar a memória ou disfarçar a realida<strong>de</strong> é uma<br />
atitu<strong>de</strong> típica do povo local, com a qual, felizmente, o nar‑<br />
rador não concorda. Nem tudo está podre em Arealva.<br />
Um dos autores <strong>mais</strong> populares e premiados da litera‑<br />
tura brasileira contemporânea, Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão<br />
nasceu em Araraquara, São Paulo, em 1936. Estreou em<br />
livro em 1965, com o volume <strong>de</strong> contos Depois do sol. A<br />
partir daí, não parou <strong>mais</strong>, conciliando a ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> jor‑<br />
nalista com a prática da literatura. Sua obra se caracteriza<br />
pela irreverência, o sarcasmo e a <strong>de</strong>núncia das mazelas da<br />
socieda<strong>de</strong> brasileira, o que lhe criou problemas com o re‑<br />
gime militar. Zero foi proibido pela censura, sendo publi‑<br />
cado primeiro na Itália, em 1974. A edição brasileira só saiu<br />
no ano seguinte. Ignácio <strong>de</strong> Loyola tem <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta obras<br />
publicadas, entre romances, contos, livros <strong>de</strong> viagens e lite‑<br />
ratura infantojuvenil.<br />
I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o
O ANÔNIMO CÉLEBRE<br />
REALITy ROMANCE<br />
2 a edição – 384 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0757 ‑2<br />
Uma das pragas <strong>de</strong> nossa época, sintoma <strong>de</strong> uma socie‑<br />
da<strong>de</strong> em crise, que procura preencher o vazio interior com a<br />
admiração externa, a busca da celebrida<strong>de</strong> tem feito vítimas e<br />
glorificado imbecis. A maior parte <strong>de</strong>les aparece e some com<br />
rapi<strong>de</strong>z. São os quinze minutos <strong>de</strong> fama a que se referia o<br />
pintor norte ‑americano Andy Warhol, o que não <strong>de</strong>sestimula,<br />
antes parece incentivar milhares <strong>de</strong> candidatos.<br />
A busca da fama a qualquer custo é o tema <strong>de</strong> O<br />
anônimo célebre, <strong>de</strong> Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão. Sarcástico,<br />
<strong>de</strong>bochado, impiedoso, esse “reality romance”, como diz<br />
o subtítulo, conta uma história <strong>de</strong> amor, a <strong>de</strong> Letícia, e vá‑<br />
rias sub ‑histórias <strong>de</strong> anônimos em busca da celebrida<strong>de</strong>.<br />
As formas e as fórmulas para obtê ‑la se encontram<br />
generosamente espalhadas pela obra, constituindo ‑se em<br />
autêntico curso <strong>de</strong> acesso à celebrida<strong>de</strong>, com a revelação<br />
<strong>de</strong> truques, rituais, dicas, maneira <strong>de</strong> se comportar em fes‑<br />
tas, o que beber, o traje a<strong>de</strong>quado para cada circunstância,<br />
as grifes do momento, para on<strong>de</strong> viajar, como se aproximar<br />
<strong>de</strong> promoters, os profissionais que contratam para filmes,<br />
novelas, fotos, os lugares quentes para alguém conhecer<br />
celebrida<strong>de</strong>s e começar a se enturmar.<br />
Atenção: para o autêntico aspirante à fama tudo é<br />
válido, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que sirva a seu objetivo maior. Indispensável<br />
esquecer escrúpulos, princípios, ética, o medo ao ridículo.<br />
O bom aspirante <strong>de</strong>ve se acostumar a se curvar, trair, ser<br />
humilhado, virar lixo, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que seja para conseguir seus<br />
nobres i<strong>de</strong>ais. Se chegar lá, saberá como se vingar nos anô‑<br />
nimos que surgirem em seu caminho. Afinal, a própria filo‑<br />
sofia do século XXI reconhece que no jogo da vida vale<br />
tudo para se chegar à televisão. Mas, cuidado, a celebri‑<br />
da<strong>de</strong> po<strong>de</strong> trazer em si os próprios elementos <strong>de</strong> <strong>de</strong>strui‑<br />
ção. Como observa Deonísio da Silva “este é um livro que<br />
entristece e diverte”.<br />
I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />
O BEIJO NÃO<br />
VEM DA BOCA<br />
6 a edição – 376 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1383 ‑4<br />
Depois <strong>de</strong> quarenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> literária, com<br />
uma obra que se caracteriza pelo pessimismo e o sarcasmo,<br />
Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão publicou um inesperado ro‑<br />
mance <strong>de</strong> amor com final feliz.<br />
O beijo não vem da boca aborda, em forma <strong>de</strong> ficção,<br />
sem a pretensão <strong>de</strong> respondê ‑la, uma das perguntas <strong>mais</strong> in‑<br />
quietantes formuladas pelo ser humano, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o momento<br />
em que começou a indagar o porquê da vida e do <strong>de</strong>stino: o<br />
significado do amor e sua influência em nossa vida.<br />
Ana, sedutora, fascinando a todos que <strong>de</strong>la se aproxi‑<br />
mam. Breno, mergulhado numa crise pessoal angustiante,<br />
que envolve a sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>, a masculinida<strong>de</strong>, a sexuali‑<br />
da<strong>de</strong>, os conceitos <strong>de</strong> vida e comportamento. Num balanço<br />
<strong>de</strong> sua vida sentimental, revê amores passados e traça a<br />
própria história da sexualida<strong>de</strong> brasileira nos últimos qua‑<br />
renta <strong>anos</strong>. Há saída para a sua situação? O que o amor<br />
representa em sua vida? O que <strong>de</strong>seja das mulheres?<br />
Encontros, conflitos, <strong>de</strong>sencontros, uma história <strong>de</strong><br />
avanços e recuos, em busca do <strong>mais</strong> procurado <strong>de</strong> todos os<br />
saberes: o saber amar. Expandindo ‑se e retraindo ‑se, como<br />
o próprio sentimento <strong>de</strong> amor, a história se <strong>de</strong>senrola ao<br />
longo <strong>de</strong> três décadas, em cenários diversos: Brasil, Cuba,<br />
Dinamarca, Alemanha. Conflitos <strong>de</strong> cultura, i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s hu‑<br />
manas, divergência <strong>de</strong> opiniões políticas, posições extremas,<br />
refletindo um mundo em crise através da re<strong>de</strong>scoberta do<br />
amor. Como uma espécie <strong>de</strong> símbolo, digamos político,<br />
do <strong>de</strong>stino das nações, há um momento, dos <strong>mais</strong> intensos do<br />
livro, em que brasileiros e alemães se reúnem em Berlim para<br />
uma feijoada, alegres, <strong>de</strong>spreocupados, sem <strong>de</strong>sconfiarem<br />
que estão vivendo os últimos <strong>anos</strong> <strong>de</strong> um mundo dividido<br />
em dois gran<strong>de</strong>s blocos. A presente edição <strong>de</strong> O beijo não<br />
vem da boca foi inteiramente revista e expurgada, tornando ‑se<br />
<strong>mais</strong> enxuta e atraente. É como um novo beijo.<br />
I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />
149
O HOMEM QUE<br />
ODIAVA A<br />
SEGUNDA FEIRA<br />
Prêmio Jabuti 2000 (Câmara Brasileira<br />
do Livro)<br />
3 a edição – 168 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0629 ‑0<br />
Na porta da livraria, um homem distribui folhetos<br />
amarelos convidando para uma reunião. Objetivo: extinguir<br />
do calendário as segundas ‑feiras, esse dia nefasto no qual<br />
todos os males da semana (e da vida) começam. Prova cien‑<br />
tífica? O estranho vírus <strong>de</strong>nominado Monday ‑Monday, <strong>de</strong><br />
sintomas incertos e amplitu<strong>de</strong> universal. Mas como eliminar<br />
um dia da semana? Consultas a advogados, na tentativa <strong>de</strong><br />
esclarecer da existência <strong>de</strong> alguma lei a respeito. Desilu‑<br />
sões, frustrações.<br />
A segunda ‑feira, espécie <strong>de</strong> bo<strong>de</strong> expiatório das an‑<br />
gústias, recalques e <strong>de</strong>savenças humanas, marca com sua<br />
presença inquietadora os cinco contos <strong>de</strong> O homem que<br />
odiava a segunda ‑feira.<br />
Contos absurdos (talvez não tão absurdos como o coti‑<br />
diano, se bem pensarmos), situações <strong>de</strong> <strong>de</strong>lírio, metáforas e<br />
alegorias da realida<strong>de</strong>, à sombra da aziaga segunda ‑feira. O<br />
homem que mantém diálogo com uma formiga; a caixa <strong>de</strong><br />
correio que engole mãos; a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> corpos com partes remo‑<br />
víveis, permitindo se retirar ora uma perna, ora a barriga.<br />
A estranha situação <strong>de</strong> pensar e emitir sons sem qual‑<br />
quer sentido, como se falasse um idioma bárbaro ou estivesse<br />
sendo dublado, e a <strong>de</strong>scoberta final <strong>de</strong> não enten<strong>de</strong>r <strong>mais</strong> a<br />
língua que falava (“KersgatoiNula! KersgatoiNula!”). Sátira<br />
às novas gerações, à linguagem contemporânea, incorpo‑<br />
rando estrangeirismos grotescos? Po<strong>de</strong> ser. Mais evi<strong>de</strong>nte é a<br />
perda da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e suas consequências alucinantes, em<br />
“As cores das bolinhas da morte”. Sátiras, humor negro, sar‑<br />
casmo, revolta com o cotidiano, culpa da segunda ‑feira. Que<br />
seja extinta. E se a felicida<strong>de</strong> ou mesmo uma precária tran‑<br />
quilida<strong>de</strong> for impossível assim mesmo, que se acabe também<br />
com a terça, a quarta, a quinta, a sexta, o sábado. Que a vida<br />
seja reduzida a um perpétuo domingo ou que tudo se acabe<br />
numa nefasta segunda ‑feira.<br />
150<br />
iI Gg n á Cc iI o d e lL o y o Ll a B r a n d ã o<br />
O VERDE VIOLENTOU<br />
O MURO<br />
13 a edição – 400 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0365 ‑8<br />
Durante quinze meses, entre 1982 e 1983, Ignácio <strong>de</strong><br />
Loyola Brandão viveu em Berlim, a convite do governo ale‑<br />
mão, “um dos tempos <strong>mais</strong> instigantes e curiosos <strong>de</strong> minha<br />
vida”, uma experiência inesquecível contada em O ver<strong>de</strong><br />
violentou o muro.<br />
A antiga capital alemã ainda estava dividida pelo<br />
Muro, um contraste brutal entre duas socieda<strong>de</strong>s. Do lado<br />
oriental, o povo, em sua maior parte proletário, levava uma<br />
vida sem perspectivas, alimentando rancores e ressenti‑<br />
mentos. No ambiente cosmopolita e rico da parte oci<strong>de</strong>n‑<br />
tal, cheio <strong>de</strong> lojas elegantes, em plena prosperida<strong>de</strong>, a<br />
presença do Muro lhe conferia uma aura particular <strong>de</strong> ci‑<br />
da<strong>de</strong> “única, singular e excitante, original e louca, nervosa<br />
e adorável, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> todas as especulações <strong>de</strong> sua<br />
problemática existência”.<br />
Essa cida<strong>de</strong> refinada e sedutora foi se entregando aos<br />
poucos ao visitante, num longo e lento jogo <strong>de</strong> sedução. No<br />
início, dificulda<strong>de</strong>s com o idioma, irritação com a rigi<strong>de</strong>z dos<br />
hábitos alemães, tensão, <strong>de</strong>cepções, carências. Falta até do<br />
toque do brasileiro, aquela mania <strong>de</strong> pôr a mão no outro ou<br />
pegá ‑lo, enquanto conversa, “necessários a uma comunica‑<br />
ção”. Os alemães, ao contrário, consi<strong>de</strong>ram o gesto uma<br />
invasão <strong>de</strong> privacida<strong>de</strong>. Superada a fase <strong>de</strong> surpresas (as ma‑<br />
nifestações políticas or<strong>de</strong>iras, com a presença até <strong>de</strong> bebês<br />
<strong>de</strong> colo) e inquietações (a falta <strong>de</strong> cor nas ruas, o “cinza<br />
constante, <strong>de</strong> cabo a rabo na Alemanha”), a <strong>de</strong>scoberta <strong>de</strong><br />
prazeres insuspeitos, como andar <strong>de</strong> bicicleta pela cida<strong>de</strong><br />
(“Berlim com bicicleta é outra coisa”), uma riquíssima vida<br />
cultural, viagens pelo país, numa conquista persistente e diá‑<br />
ria. Logo, o conquistador estava conquistado.<br />
Anos <strong>de</strong>pois, ao regressar a Berlim, Loyola compara as<br />
duas cida<strong>de</strong>s, aquela em que vivera, e a surgida após a<br />
queda do Muro, como uma metáfora do reencontro <strong>de</strong> um<br />
povo, mas também a vitória da árvore ver<strong>de</strong> da vida.<br />
iI Gg n á Cc iI o d e lL o y o Ll a B r a n d ã o
PEGA ELE, SILÊNCIO<br />
5 a edição – 128 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1302 ‑5<br />
Se os livros fossem como a caverna mágica <strong>de</strong> Ali<br />
Babá, exigindo palavras ‑chave <strong>de</strong> acesso, a senha para abrir<br />
as portas <strong>de</strong> Pega ele, Silêncio seria violência e busca. Vio‑<br />
lência social, típica <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> competitiva e carente<br />
<strong>de</strong> valores, implacável com os fracos, mas também a velha<br />
e embriagadora violência do bicho ‑homem, que parece<br />
<strong>mais</strong> embriagadora do que nunca em momentos <strong>de</strong> ten‑<br />
são, individual ou coletiva, como o fim da década <strong>de</strong> 1960,<br />
quando se <strong>de</strong>senrolam os três contos do livro <strong>de</strong> Ignácio <strong>de</strong><br />
Loyola Brandão.<br />
Era a época da repressão política, das passeatas, da<br />
reação estudantil, da brutalida<strong>de</strong> da polícia. Em casa, as pes‑<br />
soas viam na tevê um programa muito popular <strong>de</strong> boxe, nas<br />
boates o consumo <strong>de</strong> bolinhas dava um salto histórico e,<br />
como pano <strong>de</strong> fundo da socieda<strong>de</strong>, predominava o medo.<br />
Nesse ambiente vivem e lutam (no sentido real e figu‑<br />
rado) os personagens <strong>de</strong> Ignácio <strong>de</strong> Loyola: um jovem luta‑<br />
dor <strong>de</strong> boxe, oriundo da periferia, vivendo um dia <strong>de</strong> intensa<br />
angústia antes <strong>de</strong> uma luta <strong>de</strong>cisiva para seu <strong>de</strong>stino; a insa‑<br />
tisfação <strong>de</strong> uma atriz ninfomaníaca, on<strong>de</strong> se <strong>de</strong>scerram tam‑<br />
bém os bastidores do teatro brasileiro; um grupo <strong>de</strong> pessoas<br />
obrigadas a encarar a violência do regime, acuadas pelo<br />
medo, em busca <strong>de</strong> alguma coisa in<strong>de</strong>finida, <strong>mais</strong> sugerida<br />
do que dita no livro: a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ascensão social do<br />
boxeur, o prazer permanente ansiado pela atriz, dias <strong>de</strong> paz<br />
e justiça social, <strong>de</strong>sejados pelo grupo <strong>de</strong> perseguidos.<br />
A tensão predomina nos três contos e sob essa pres‑<br />
são permanente os personagens <strong>de</strong>ixam emergir sua face<br />
autêntica, seu egoísmo, suas frustrações e prevenções,<br />
aguçadas pela visão cruel e cética do autor que, <strong>de</strong>finitiva‑<br />
mente, não acredita na humanida<strong>de</strong>. Pega ele, Silêncio foi<br />
finalista do maior concurso <strong>de</strong> contos já instituído no Brasil,<br />
em 1968, e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> essa época é um dos livros <strong>de</strong> Ignácio <strong>de</strong><br />
Loyola preferidos pelo público.<br />
I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />
VEIA BAILARINA<br />
Gran<strong>de</strong> Prêmio da Crítica 1997 (Associação<br />
Paulista <strong>de</strong> Críticos <strong>de</strong> Arte)<br />
5 a edição – 224 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1298 ‑1<br />
Veia bailarina. O título, tão sugestivo e poético, es‑<br />
con<strong>de</strong> uma ameaça terrível. Certa manhã, ao acordar, Ig‑<br />
nácio <strong>de</strong> Loyola Brandão encaminha ‑se para a cozinha,<br />
quando o “corredor balançou como um navio”. Sem se<br />
abalar, resolve conviver com o problema. Tonturas, quem<br />
não as tem? O autodiagnóstico indicava uma labirintite<br />
inocente. Para que se preocupar?<br />
Meses <strong>de</strong>pois, o escritor encontra ‑se a caminho do cen‑<br />
tro cirúrgico <strong>de</strong> um hospital, para uma “cirurgia brutal”, a<br />
trepanação. Ou seja, os médicos iam lhe abrir a cabeça. Era<br />
portador <strong>de</strong> um aneurisma cerebral (que os médicos cha‑<br />
mam pelo dançante nome <strong>de</strong> veia bailarina), “uma granada<br />
<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> minha cabeça, que podia explodir a qualquer mo‑<br />
mento”. Por sorte, a granada fora diagnosticada a tempo.<br />
Se explodisse, ia <strong>de</strong>ixá ‑lo inválido, um vegetal.<br />
Enquanto aguarda a operação, <strong>mais</strong> ou menos como<br />
o náufrago que está se afogando, o escritor faz um balanço<br />
em sua vida, a ameaça do aneurisma, a ansieda<strong>de</strong> se mis‑<br />
tura a velhas perplexida<strong>de</strong>s, revê situações, amigos, como<br />
num cineminha particular, reflete, indaga a si mesmo.<br />
Como observa Deonísio da Silva, “Veia bailarina é um<br />
livro sobre a dor, o medo, as nossas perdas <strong>de</strong> cada dia, as<br />
do varejo, e aquelas acumuladas ao longo da vida, no ata‑<br />
cado”. Mas, em nenhum momento, felizmente, o escritor<br />
sucumbe à tentação <strong>de</strong> se lamuriar. A situação é inquie‑<br />
tante, dramática, mas o tom é suave, bem ‑humorado, por<br />
vezes sarcástico. Após o êxito da operação e a recuperação,<br />
com o prazer <strong>de</strong> se constatar vivo e saudável, o escritor<br />
extrai <strong>de</strong> toda aquela amarga experiência uma lição ele‑<br />
mentar. Tinha <strong>de</strong> recomeçar. Viver a sua vida, com o que<br />
ela tem “<strong>de</strong> bom e ruim, com alegrias e inquietações, so‑<br />
frimento e felicida<strong>de</strong>, encargos, chatices, encontros e <strong>de</strong>‑<br />
sencontros”. A re<strong>de</strong>scoberta da vida.<br />
I g n á c I o d e L o y o L a B r a n d ã o<br />
151
VOCÊ É JOVEM, VELHO<br />
OU DINOSSAURO?<br />
1 a edição – 176 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1290 ‑5<br />
Perguntar não ofen<strong>de</strong>. O difícil é o indagado pôr <strong>de</strong><br />
lado suas pretensões e vaida<strong>de</strong>s e respon<strong>de</strong>r: Você é jovem,<br />
velho ou dinossauro?<br />
Com esse objetivo, inspirado em uma velha página <strong>de</strong><br />
Machado <strong>de</strong> Assis, Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão propõe neste<br />
livro uma série <strong>de</strong> “testes para saber se sua memória é uma<br />
coisa, mas suas lembranças po<strong>de</strong>m ser outras, mostrando<br />
que você é <strong>mais</strong> jovem, mas também po<strong>de</strong> ser <strong>mais</strong> velho<br />
do que imagina”.<br />
Testes muito simples, através <strong>de</strong> perguntas relaciona‑<br />
das com fatos vividos na infância e na adolescência por<br />
todos os maiores <strong>de</strong> trinta (põe trinta nisso) <strong>anos</strong>. Por<br />
exemplo: “Você era bom em composição, que hoje se<br />
chama redação?”. Ou perguntas <strong>mais</strong> provocativas, que<br />
servem para avaliar suas lembranças do adolescente aco‑<br />
modado ou agressivo que você foi: “Quando começava a<br />
discutir com alguém, fazia um risco com carvão ou caco <strong>de</strong><br />
telha no chão e <strong>de</strong>safiava: Passe daqui?”.<br />
O teste aborda também lembranças ligadas à religio‑<br />
sida<strong>de</strong> (“Qual era a primeira pergunta do catecismo?”) e à<br />
temores <strong>de</strong>la <strong>de</strong>correntes: “Tinha medo <strong>de</strong> tocar a hóstia<br />
com os <strong>de</strong>ntes ou <strong>de</strong> mordê ‑la, porque <strong>de</strong>la sairia o sangue<br />
<strong>de</strong> Cristo, como diziam?”.<br />
E a linguagem daquela época, hem, com sua gíria que<br />
hoje nos faz sorrir, vagamente irônicos e saudosos. Veja se<br />
você lembra se “comentava com os amigos: Aquele broti‑<br />
nho é <strong>de</strong><strong>mais</strong>?”.<br />
No final, esse conjunto <strong>de</strong> indagações constitui um<br />
verda<strong>de</strong>iro inquérito sociológico, mas, por certo, vai tam‑<br />
bém acionar as lembranças <strong>de</strong> muita gente, apontando<br />
dados e fatos não relacionados no livro, preenchendo a fi‑<br />
nalida<strong>de</strong> proposta pelo autor: “um jogo para aproveitar<br />
sozinho ou com os amigos <strong>de</strong>pois do jantar, no fim <strong>de</strong> se‑<br />
mana, nos dias <strong>de</strong> chuva, na cama, entre um casal, em uma<br />
festa, churrasco, no bar, no intervalo <strong>de</strong> convenção <strong>de</strong> tra‑<br />
balho” ou simplesmente para matar o tempo em um con‑<br />
sultório ou numa noite <strong>de</strong> insônia.<br />
152<br />
iI Gg n á Cc iI o d e lL o y o Ll a B r a n d ã o<br />
ZERO<br />
12 a edição – 312 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0280 ‑5<br />
Zero, <strong>de</strong> Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão, nasceu sob<br />
chumbo grosso. Retrato ácido da socieda<strong>de</strong> brasileira na<br />
década <strong>de</strong> 1960, atemorizada pela ditadura militar, a cen‑<br />
sura, a repressão, os esquadrões da morte, o livro, concluído<br />
em 1969, foi recusado por quatro editoras. Caso único na<br />
história da literatura brasileira, teve sua primeira edição em<br />
italiano, em 1974, sendo lançado no Brasil apenas no ano<br />
seguinte. Breve momento <strong>de</strong> relax. Em 1976, voltava a ser<br />
proibido pela censura, só se tornando acessível ao público<br />
três <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois.<br />
Contando com sarcasmo e mau humor uma história<br />
<strong>de</strong> violência extrema, numa socieda<strong>de</strong> dominada pelo vazio<br />
existencial, as aberrações sexuais e <strong>de</strong> comportamento, a<br />
corrupção, o ódio, a mentira, Zero inovava também o ro‑<br />
mance brasileiro, com um texto fragmentado, misturando<br />
slogans publicitários, notas <strong>de</strong> pé <strong>de</strong> página, reprodução<br />
fac ‑similar <strong>de</strong> páginas <strong>de</strong> jornal, <strong>de</strong>poimento, texto jorna‑<br />
lístico, estilo <strong>de</strong> história em quadrinhos, a palavra dura <strong>de</strong><br />
um narrador em primeira pessoa.<br />
Não há nenhuma esperança, todos parecem con<strong>de</strong>na‑<br />
dos ao <strong>de</strong>sespero, vivendo num clima <strong>de</strong> sufocante pessi‑<br />
mismo, introduzido logo na epígrafe do livro, nos versos do<br />
poeta português Alexandre O’Neill: “O medo vai ter tudo/<br />
quase tudo/ e cada um por seu caminho/ havemos todos<br />
<strong>de</strong> chegar/ quase todos/ a ratos/ Sim/ a ratos.”.<br />
Clássico da literatura brasileira, consagrado pela crítica,<br />
prestigiado pelo público, traduzido em oito idiomas, docu‑<br />
mento palpitante <strong>de</strong> uma fase <strong>de</strong> angústia e <strong>de</strong>sespero da<br />
história brasileira, Zero foi eleito um dos cem melhores ro‑<br />
mances do século XX. A presente edição, inteiramente mo‑<br />
<strong>de</strong>rnizada e re<strong>de</strong>senhada, inclui, graças aos mo<strong>de</strong>rnos<br />
recursos da informática, ilustrações suprimidas na primeira.<br />
i G n á C i o d e l o y o l a B r a n d ã o
ZERO<br />
EDIÇÃO COMEMORATIVA<br />
35 ANOS<br />
13 a edição – <strong>39</strong>2 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1499 ‑2<br />
Bem distante do pesa<strong>de</strong>lo da ditadura, sagrado e con‑<br />
sagrado, <strong>de</strong>finido por Antonio Candido “como símbolo<br />
vivo da liberda<strong>de</strong> do espírito e dos direitos da inteligência”,<br />
escolhido como um dos cem melhores livros brasileiros do<br />
século passado, Zero ganha uma primorosa edição come‑<br />
morativa dos trinta e cinco <strong>anos</strong> <strong>de</strong> seu lançamento no<br />
Brasil, com uma capa criativa, prefácio <strong>de</strong> Walnice No‑<br />
gueira Galvão, <strong>de</strong>poimento do autor, fac ‑símiles do origi‑<br />
nal, capas <strong>de</strong> edições estrangeiras (que indicam tratar ‑se da<br />
“história <strong>de</strong> um herói latinoamericano nos cárceres facis‑<br />
tas”), iconografia <strong>de</strong> época e um amplo documentário<br />
sobre as venturas, <strong>de</strong>sventuras e reações provocadas pelo<br />
livro. Com <strong>de</strong>talhes curiosos. Como o levante contra a sua<br />
proibição, o primeiro ataque direto sofrido pela censura do<br />
regime militar. Ou a sua venda, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> proibido, em uma<br />
livraria a cem metros da Polícia Fe<strong>de</strong>ral.<br />
Vale a pena lembrar que, antes <strong>de</strong> sair no Brasil, Zero<br />
foi publicado na Itália, com intensa repercussão internacio‑<br />
nal, e logo traduzido em diversos idiomas. Apesar <strong>de</strong> tratar<br />
<strong>de</strong> um problema <strong>de</strong> consciência nacional, a obra não po<strong>de</strong><br />
ser lida pelos brasileiros. Só no ano seguinte, 1975, o ro‑<br />
mance foi lançado no Brasil, provocando ataques histéricos<br />
nos governantes e a sua consequente proibição. O livro<br />
dizia o que muita gente gostaria <strong>de</strong> ter dito, mas que nin‑<br />
guém ainda ousara fazê ‑lo, pelo menos com a crueza e<br />
rispi<strong>de</strong>z com que Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão retratava a<br />
<strong>de</strong>sesperançada socieda<strong>de</strong> brasileira da década <strong>de</strong> 1960.<br />
Zero po<strong>de</strong> ser lido, hoje, como o romance <strong>de</strong> uma<br />
geração da qual roubaram os principais bens da vida: a<br />
esperança e a liberda<strong>de</strong>, mas, como observa Walnice No‑<br />
gueira Galvão “não se trata <strong>de</strong> um <strong>de</strong>poimento sobre a<br />
ditadura, mas <strong>de</strong> um testemunho da ditadura, gerado pela<br />
paixão e pela agonia por ela impostas”.<br />
i G n á C i o d e l o y o l a B r a n d ã o<br />
OBRAS DE LITERATURA INFANTIL E JUVENIL<br />
DO AUTOR<br />
• Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão crônicas para jovens (prelo)<br />
• Manifesto ver<strong>de</strong><br />
• O homem que espalhou o <strong>de</strong>serto<br />
• O menino que não teve medo do medo<br />
• O primeiro emprego<br />
• O segredo da nuvem<br />
• Os escorpiões contra o círculo <strong>de</strong> fogo<br />
i G n á C i o d e l o y o l a B r a n d ã o<br />
153
Arquivo pessoal<br />
C o l e ç ã o<br />
l u í s d a C â M a r a<br />
C a s C u d o<br />
154<br />
O único estudioso em sua especialida<strong>de</strong> que tinha<br />
uma visão verda<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> nosso folclore, mesmo<br />
tendo vivido por quase nove décadas no Rio Gran<strong>de</strong><br />
do Norte. Nasceu em Natal, em 1898. Além do tra‑<br />
balho como folclorista, foi professor, etnólogo, his‑<br />
toriador e advogado. Foi o jornalista que começou a<br />
escrever crônicas sobre manifestações populares. Em<br />
1941, fundou a Socieda<strong>de</strong> Brasileira <strong>de</strong> Folclore, da<br />
qual foi o primeiro presi<strong>de</strong>nte.<br />
Escreveu aproximadamente 160 livros tendo como<br />
foco a cultura brasileira. Para estabelecer compara‑<br />
ções e reunir novas informações sobre hábitos e cos‑<br />
tumes do povo brasileiro, Cascudo trocava corres ‑<br />
pondência com pesquisadores do Brasil e do mundo.<br />
Além disso, costumava ler um livro por dia. Entre suas<br />
obras <strong>mais</strong> conhecidas, <strong>de</strong>stacam ‑se Dicionário do<br />
folclore brasileiro, Antologia do folclore brasileiro e<br />
Contos tradicionais do Brasil. <strong>Professor</strong> Cascudo –<br />
como ele gostava <strong>de</strong> ser chamado – morreu em 1986.<br />
A memória é a imaginação no povo, mantida e<br />
comunicável pela tradição. Movimentando as<br />
culturas convergidas para o uso, através do tempo.
ANTOLOGIA DA<br />
ALIMENTAÇÃO<br />
NO BRASIL<br />
2 a edição – 304 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1292 ‑9<br />
Se você, além <strong>de</strong> comer bem, gosta <strong>de</strong> variar <strong>de</strong> prato<br />
e conversar sobre comida, está na hora <strong>de</strong> se <strong>de</strong>liciar com<br />
a Antologia da alimentação no Brasil, que Luís da Câmara<br />
Cascudo organizou como complemento à sua monumental<br />
História da alimentação no Brasil.<br />
O livro reúne 62 textos (tão <strong>de</strong>liciosos quanto o tema<br />
<strong>de</strong> que tratam), evocando aspectos da alimentação do bra‑<br />
sileiro “sob os vários ângulos <strong>de</strong> fixação histórica, etnográ‑<br />
fica, literária, social”, nas palavras do autor.<br />
Trocado em miúdos: tudo o que se relaciona com o<br />
prazer <strong>de</strong> comer e beber, através <strong>de</strong> <strong>de</strong>poimentos <strong>de</strong> estu‑<br />
diosos do assunto, <strong>de</strong> viajantes, <strong>de</strong> gourmets e gourmands<br />
<strong>de</strong>clarados ou disfarçados, em páginas velhas e novas, a<br />
partir do século XVII aos nossos dias.<br />
Com apetite pelo assunto, sem sombra <strong>de</strong> dispepsia,<br />
eles falam <strong>de</strong> rituais <strong>de</strong> alimentação e <strong>de</strong> bebedores, ofere‑<br />
cem receitas <strong>de</strong> pratos tradicionais, <strong>de</strong> doces e salgados, <strong>de</strong><br />
molhos, <strong>de</strong> todo tipo <strong>de</strong> bebidas, dos refrescos tradicionais<br />
(caju, açaí etc.) aos vinhos e licores, exaltam as frutas da<br />
terra, <strong>de</strong>strincham os segredos e evocam os sabores das<br />
cozinhas regionais, analisam a herança <strong>de</strong> origem portu‑<br />
guesa, negra, indígena.<br />
Em prosa ou verso, falam, ainda, <strong>de</strong> muito <strong>mais</strong>, da<br />
arte <strong>de</strong> servir a mesa, do preparo <strong>de</strong> cocktails (uma invasão<br />
norte ‑americana), <strong>de</strong> duelos gastronômicos, dos velhos<br />
mercados, da comercialização <strong>de</strong> alimentos, da caça e da<br />
pesca, da comida <strong>de</strong> santo, das socieda<strong>de</strong>s organizadas<br />
para comer e conversar, contam causos e histórias saboro‑<br />
sas, como a introdução do sorvete no Brasil, os hábitos<br />
alimentares <strong>de</strong> D. Pedro II, o cotidiano <strong>de</strong> bares e cozinhas,<br />
traçando um amplo panorama das preferências gastronô‑<br />
micas do brasileiro e aguçando a gulodice do leitor.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
ANTOLOGIA DO<br />
FOLCLORE BRASILEIRO<br />
Volume I – 9 a edição – 328 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0689 ‑8<br />
Volume II – 6 a edição – 336 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0760 ‑4<br />
Os dois volumes da Antologia do folclore brasileiro, <strong>de</strong><br />
Luís da Câmara Cascudo, formam um painel sem similar<br />
sobre aspectos do folclore e da etnografia brasileira, atra‑<br />
vés da reunião <strong>de</strong> cem textos <strong>de</strong> autores brasileiros e es‑<br />
trangeiros, vários <strong>de</strong>les <strong>de</strong> acesso extremamente difícil. No<br />
prefácio à obra, Cascudo explica seu objetivo: “apresentar<br />
os aspectos <strong>mais</strong> vivos do Povo brasileiro através <strong>de</strong> quatro<br />
séculos”, ajustado ao conceito <strong>de</strong> folclore como “uma ciên‑<br />
cia da psicologia coletiva”, com finalida<strong>de</strong> em psiquiatria,<br />
sociologia, política, religião.<br />
Os <strong>de</strong>poimentos começam quando o Brasil ainda<br />
amanhecia, narrados por viajantes estrangeiros, indo até os<br />
estudiosos brasileiros do século XX. Que viagem fabulosa!<br />
O leitor po<strong>de</strong> partilhar a surpresa <strong>de</strong> Gaspar <strong>de</strong> Carvajal,<br />
em 1541, ao assistir ao combate <strong>de</strong> seus companheiros<br />
com as amazonas; acompanhar o terror <strong>de</strong> Hans Sta<strong>de</strong>n,<br />
prisioneiro dos índios, pronto a ser <strong>de</strong>vorado; os fantasmas<br />
noturnos que apavoravam os índios, segundo o <strong>de</strong>poi‑<br />
mento <strong>de</strong> Anchieta; a dança <strong>de</strong> guerra dos Tupinambá,<br />
narrada por Jean <strong>de</strong> Léry. Nos séculos XIX e XX, com o país<br />
povoado e <strong>de</strong>senvolvido, mas asperamente pitoresco a<br />
olhos <strong>de</strong> estrangeiros, sobretudo europeus, o leitor se <strong>de</strong>li‑<br />
cia com a malhação do Judas, testemunhada por Debret;<br />
as seduções do lundu, dança presenciada por Tollenare;<br />
Spruce ouvindo, <strong>de</strong>liciado, o canto do uirapuru. Não menos<br />
interessante, os autores brasileiros estudam lendas, cren‑<br />
ças, superstições, pesquisam os apelidos, registram quadri‑<br />
nhas populares, ditados, feitiços e <strong>de</strong>safios, narram<br />
vaquejadas, analisam adivinhas, danças típicas, a alimenta‑<br />
ção do homem do povo, refletem sobre o inconsciente<br />
folclórico, numa fantástica viagem <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 450 <strong>anos</strong><br />
pelo imaginário, crenças e terrores do homem brasileiro.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
155
CANTO DE MURO<br />
4 a edição – 232 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1070 ‑0<br />
Quem conhece Luís da Câmara Cascudo apenas como<br />
folclorista e etnógrafo vai se surpreen<strong>de</strong>r (e se <strong>de</strong>liciar) com<br />
este Canto <strong>de</strong> muro. “Romance <strong>de</strong> costumes”, como o<br />
chamou o autor, o livro po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>finido como um <strong>de</strong>sla‑<br />
vado namoro com a natureza e reverência pelas espécies<br />
ani<strong>mais</strong> menos prestigiadas pelo bicho ‑homem: ratos, co‑<br />
bras, escorpiões, morcegos, aranhas, baratas “profissional‑<br />
mente famintas”, formigas, besouros, o grilo “solitário e<br />
tenor”, o sapo “orgulhoso, atrevido e covar<strong>de</strong> na classe<br />
musical dos barítonos”, as lagartixas, muito educadas, ba‑<br />
lançando “as cabecinhas triangulares concordando com<br />
tudo”, todo o povinho miúdo que vive nos quintais das<br />
velhas casas, nos cantos <strong>de</strong> muro, entre trepa<strong>de</strong>iras, tijolos<br />
quebrados, e um tanque, no qual vão se abeberar os bem‑<br />
‑te ‑vis, os xexéus, as lava<strong>de</strong>iras ‑<strong>de</strong> ‑casaca ‑preta.<br />
Com tais senhores e senhoras flagrados em suas ativida‑<br />
<strong>de</strong>s diárias (a busca <strong>de</strong> alimento, a luta das espécies, os rituais<br />
<strong>de</strong> acasalamento), Cascudo constrói uma espécie <strong>de</strong> narrativa<br />
épica, repleta <strong>de</strong> poesia, na qual esses pequenos e humil<strong>de</strong>s<br />
seres assumem a gran<strong>de</strong>za <strong>de</strong> personagens <strong>de</strong> Homero.<br />
De fato, há alguma coisa <strong>de</strong> epopeia na caçada <strong>de</strong><br />
Sofia, a coruja, aos morcegos; no banquete <strong>de</strong> Fu, o sapo,<br />
<strong>de</strong>liciando ‑se com uma colônia <strong>de</strong> mosquitos, mas engo‑<br />
lindo também um inconveniente besouro que ferra sua<br />
língua grossa; no grilo roendo ma<strong>de</strong>ira velha e tendo como<br />
sobremesa sementes ver<strong>de</strong>s e talos tenros; no duelo <strong>de</strong> Ti‑<br />
tius, o escorpião, que ao correr “lembra uma gôndola <strong>de</strong><br />
doge <strong>de</strong> Veneza”; e nas ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> tantos outros Ulisses<br />
e Agamenons do quintal.<br />
Só que eles não lutam pela conquista <strong>de</strong> Troias ou <strong>de</strong><br />
tesouros. A sua luta é <strong>mais</strong> humil<strong>de</strong>, pela sobrevivência da<br />
espécie, o que, no fundo, significa também a própria con‑<br />
servação do planeta e a consequente sobrevivência hu‑<br />
mana. Sob esse aspecto, Canto <strong>de</strong> muro é também um<br />
manual <strong>de</strong> ecologia.<br />
156<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
CIVILIZAÇÃO<br />
E CULTURA<br />
PESQUISAS E NOTAS DE<br />
ETNOGRAFIA GERAL<br />
1 a edição – 736 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0873 ‑1<br />
O subtítulo <strong>de</strong> Civilização e cultura indica que a obra<br />
reúne “pesquisas e notas <strong>de</strong> etnografia geral”. Modéstia.<br />
Na realida<strong>de</strong>, trata ‑se <strong>de</strong> um inigualável tratado da ciência<br />
que estuda “todas as manifestações materiais da ativida<strong>de</strong><br />
humana” (<strong>de</strong>finição <strong>de</strong> Jules Hamy), sentido e construído,<br />
mas sobretudo pensado por um grão ‑mestre do assunto,<br />
capaz <strong>de</strong> raciocinar por sua própria cabeça. “Realizo um<br />
jabuti brasileiro que não se escon<strong>de</strong> no bojo da viola <strong>de</strong><br />
nenhum urubu voador para ir à festa do céu ‘científico’”,<br />
ironiza Luís da Câmara Cascudo. Construída com erudição<br />
caudalosa e simplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> água corrente, sólida e harmo‑<br />
niosa como uma catedral medieval, a obra tanto po<strong>de</strong> ser<br />
compulsada por especialistas como por iniciantes em etno‑<br />
grafia. É uma aula memorável, sem paralelo na língua por‑<br />
tuguesa, pronunciada por vezes em estilo quase <strong>de</strong>sa ‑<br />
busado, que talvez faça muito cientista torcer o nariz.<br />
Assim, para alertar sobre a dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> se ter uma<br />
visão clara do homem pré ‑histórico, Cascudo conta a briga<br />
entre um soldado e um marinheiro, <strong>de</strong>senrolada diante <strong>de</strong><br />
cinquenta pessoas. Apesar <strong>de</strong> tantas testemunhas foi im‑<br />
possível reconstituir como começara e terminara a luta,<br />
tamanha as contradições dos <strong>de</strong>poimentos.<br />
Partindo da conceituação da ciência, analisando sua<br />
evolução, <strong>de</strong>batendo suas doutrinas, a obra sintetiza milha‑<br />
res <strong>de</strong> <strong>anos</strong> <strong>de</strong> civilização e cultura, do Paleolítico aos tem‑<br />
pos históricos, numa viagem milenar, da vida do homem<br />
das cavernas à organização do governo e a formulação <strong>de</strong><br />
leis, trilhando todos os atalhos e avenidas que se <strong>de</strong>senvol‑<br />
veram em paralelo a esse gran<strong>de</strong> milagre: a busca <strong>de</strong><br />
abrigo, a proprieda<strong>de</strong>, as ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> caça e pesca, o co‑<br />
mércio, os transportes, a religião, a família, a compreensão<br />
do próprio caminho do homem como criador e transmissor<br />
<strong>de</strong> civilização e cultura.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o
COISAS QUE<br />
O POVO DIZ<br />
2 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1071‑0<br />
O povo diz cada coisa! Irreverente, brincalhão, criativo,<br />
observador, dizem que sua voz é a voz <strong>de</strong> Deus. Po<strong>de</strong> ser. Se<br />
não for, é pelo menos a voz da experiência, expressa em frases<br />
tão sintéticas e sugestivas que atravessam os séculos. E como!<br />
A própria expressão “voz do povo, voz <strong>de</strong> Deus” é um exem‑<br />
plo <strong>de</strong> perenida<strong>de</strong>, viva e palpitante <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a Roma dos Césa‑<br />
res, há <strong>mais</strong> <strong>de</strong> dois mil <strong>anos</strong>, como mostra Luís da Câmara<br />
Cascudo em Coisas que o povo diz. O livro estuda sessenta<br />
motivos <strong>de</strong> cultura popular <strong>de</strong> nosso país, hábitos, costumes,<br />
frases correntes no dia a dia do brasileiro, expressando a velha<br />
e astuta sabedoria do povo, nascida da observação do coti‑<br />
diano e que assumem, com o tempo, um sabor tão pitoresco.<br />
Muitas vezes são recomendações práticas <strong>de</strong> cautela. Assim a<br />
frase “macaco velho não mete a mão em cumbuca”, comum<br />
entre os índios Tupi a respeito da qual se conta que, <strong>de</strong>sejando<br />
se pegar um macaco jovem, basta colocar uma banana <strong>de</strong>ntro<br />
<strong>de</strong> uma cumbuca. O animal não abre a mão, ficando prisio‑<br />
neiro <strong>de</strong> sua própria gula. Mestre Cascudo mostra que a ori‑<br />
gem da estória vem <strong>de</strong> muito <strong>mais</strong> longe, no tempo e no<br />
espaço, registrada em Roma, na China, na Índia.<br />
Outra expressão <strong>de</strong> cautela é a frase “não meter a mão<br />
no fogo” por alguém. Ou seja, não se responsabilizar pela ino‑<br />
cência alheia. Nasceu na Ida<strong>de</strong> Média, na prova do ferro caldo,<br />
quando o acusado que alegava inocência pegava uma barra <strong>de</strong><br />
ferro aquecida (com a mão protegida com estopa) e andava<br />
com ela alguns metros. Se a mão saísse ilesa, estava provada a<br />
sua inocência. Caso contrário... Há também o registro <strong>de</strong> cren‑<br />
ças mágicas, impossíveis <strong>de</strong> se provar, mas muito populares,<br />
como a <strong>de</strong> que o arrepio seria aviso <strong>de</strong> morte e <strong>de</strong> que não se<br />
<strong>de</strong>ve acen<strong>de</strong>r três cigarros com o mesmo fósforo. E tantas ou‑<br />
tras coisas <strong>mais</strong> que o povo afirma e que Cascudo analisa e in‑<br />
terpreta, num longo e gratificante passeio pelas i<strong>de</strong>ias, crenças<br />
e superstições populares.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
CONTOS TRADICIONAIS<br />
DO BRASIL<br />
13 a edição – 320 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑0685 ‑0<br />
Contos tradicionais do Brasil, <strong>de</strong> Luís da Câmara Cas‑<br />
cudo, reúne cem histórias populares, colhidas diretamente<br />
na boca do povo brasileiro. Histórias <strong>de</strong> pobretões que con‑<br />
seguem a mão <strong>de</strong> princesas, <strong>de</strong> <strong>de</strong>mônios logrados pela<br />
astúcia feminina, <strong>de</strong> assombramentos, <strong>de</strong> tratados com a<br />
morte, <strong>de</strong> criminosos <strong>de</strong>nunciados pelo canto <strong>de</strong> um pás‑<br />
saro, <strong>de</strong> enigmas cuja resolução significa a riqueza e a feli‑<br />
cida<strong>de</strong>, um mundo maravilhoso que fascina o brasileiro do<br />
povo, como seduzia, há 4, 5 mil <strong>anos</strong>, o homem do povo<br />
na Suméria, na Babilônia, no Egito. Mestre Cascudo ensina<br />
que o <strong>mais</strong> antigo conto que se conhece, narrando a histó‑<br />
ria <strong>de</strong> dois irmãos, foi escrito por um escriba egípcio, há 32<br />
séculos. História maravilhosa, envolve metempsicose, gra‑<br />
vi<strong>de</strong>z mágica, onipotência real e vários elementos ainda<br />
vivos nas histórias tradicionais brasileiras, num roteiro fan‑<br />
tástico <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 3 mil <strong>anos</strong>, através dos <strong>mais</strong> diversos<br />
povos e culturas, até chegar à boca do contador popular<br />
nor<strong>de</strong>stino ou da mãe carinhosa contando histórias para<br />
adormecer o filho.<br />
Infelizmente, com a urbanização e o advento dos meios<br />
eletrônicos <strong>de</strong> comunicação, essas histórias começaram a ser<br />
esquecidas, vivendo hoje na memória <strong>de</strong> alguns velhos e em<br />
obras como esses Contos tradicionais do Brasil.<br />
Contos que oferecem ao leitor realmente curioso um<br />
duplo prazer: as histórias em si, cuja redação preserva<br />
aquela velha sabedoria e malícia popular, e as notas <strong>de</strong><br />
Mestre Cascudo, eruditíssimas, mas sem sombra <strong>de</strong> pedan‑<br />
tismo, tão sedutoras quanto os próprios contos.<br />
O velho Di<strong>de</strong>rot, citado por Machado <strong>de</strong> Assis, dizia<br />
que quando se faz um conto, o espírito fica alegre, o tempo<br />
escoa ‑se, e o conto da vida acaba, sem a gente dar por isso.<br />
Tão interessante quanto fazer contos é ouvi ‑los ou lê ‑los. O<br />
conto da vida passa rápido e cheio <strong>de</strong> encantamento.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
157
DICIONÁRIO DO<br />
FOLCLORE BRASILEIRO<br />
12 a edição – 756 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1507 ‑4<br />
Obra sem similar em língua portuguesa, e talvez em<br />
todas as outras línguas, o Dicionário do folclore brasileiro,<br />
<strong>de</strong> Luís da Câmara Cascudo, reaparece conforme a última<br />
edição revista pelo autor. A mitologia conta que em luta<br />
com Hércules, Anteu, filho da Terra, cada vez que tocava o<br />
chão renovava as forças, como se ganhasse uma nova vida.<br />
À semelhança do gigante grego, o dicionário <strong>de</strong> Cascudo<br />
renova sua importância, cada vez que reaparece nas livra‑<br />
rias. Espécie <strong>de</strong> súmula <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> quarenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> es‑<br />
tudo e pesquisa apaixonada do folclore e da etnografia<br />
brasileira, a obra é também uma síntese viva e palpitante,<br />
através <strong>de</strong> milhares <strong>de</strong> verbetes, das superstições, crendi‑<br />
ces, mitos, danças, lendas, práticas mágicas adotadas e vi‑<br />
vidas pelo povo brasileiro em seu cotidiano.<br />
Aliás, é isso e muito <strong>mais</strong> do que isso. Registra, por exem‑<br />
plo, locais <strong>de</strong> <strong>de</strong>voção popular, como Bom Jesus da Lapa, na<br />
Bahia, Aparecida e Bom Jesus <strong>de</strong> Pirapora, em São Paulo, for‑<br />
mas <strong>de</strong> trabalho cooperativo (mutirão), movimentos <strong>de</strong> rebel‑<br />
dia popular, como o cangaço, informa sobre os cangaceiros<br />
<strong>mais</strong> famosos, aqueles que <strong>de</strong>ixaram um rastro <strong>de</strong> fama e <strong>de</strong><br />
sangue na alma popular (Cabeleira, Lampião) e, por contraste<br />
e complemento, os santos preferidos pela <strong>de</strong>voção popular:<br />
São Jorge, Lázaro, José, João, Pedro, Gonçalo, Antonio e seu<br />
duplo, muito venerado pelos escravos, Santo Antonio Preto.<br />
Po<strong>de</strong> ‑se afirmar que não há ocorrência <strong>de</strong> caráter fol‑<br />
clórico ou etnográfico que não esteja registrado em seu<br />
<strong>de</strong>vido verbete, sempre enriquecido com bibliografia indis‑<br />
pensável ao aprofundamento do assunto.<br />
Mais do que um dicionário, a obra <strong>de</strong> Cascudo é uma<br />
introdução à cultura viva do povo brasileiro que, graças à<br />
cooperação <strong>de</strong> estudiosos, se amplia e enriquece a cada<br />
edição. Como dizia a Bíblia, escrever livros (sobretudo dicio‑<br />
nários) é uma tarefa sem fim.<br />
158<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
FOLCLORE DO BRASIL<br />
Prelo<br />
Ciência, arte, cultura viva: o folclore está presente na vida<br />
diária <strong>de</strong> cada habitante do planeta, apesar <strong>de</strong> ele nem <strong>de</strong>s‑<br />
confiar. Muitos <strong>de</strong> nossos gestos, expressões e crendices re‑<br />
montam a milhares <strong>de</strong> <strong>anos</strong>. Não há nada <strong>de</strong> novo sob o sol,<br />
já dizia o Rei Salomão. “Há ‘novida<strong>de</strong>s’ que contam 23 mil<br />
<strong>anos</strong>”, completa o mestre Luís da Câmara Cascudo, nesse<br />
autêntico curso <strong>de</strong> extensão cultural, semelhante ao organi‑<br />
zado por muitas universida<strong>de</strong>s, intitulado Folclore do Brasil.<br />
O livro se divi<strong>de</strong> em nove capítulos, abordando cam‑<br />
pos <strong>de</strong> conhecimento específicos do amplo universo do<br />
folclore. Em “Cultura popular e folclore”, Cascudo explica<br />
que nem tudo que é popular é folclore, ilusão cultivada por<br />
muitos. “Festas tradicionais, folguedos e bailes” discute o<br />
Carnaval, São João e Natal, as gran<strong>de</strong>s datas <strong>de</strong> folgança.<br />
“Era uma vez...” analisa o tema apaixonante dos contos<br />
populares, lendas, anedotas e adivinhas, alguns com <strong>mais</strong><br />
<strong>de</strong> 5 mil <strong>anos</strong>. “Bebidas e alimentos populares” é uma pe‑<br />
quena história <strong>de</strong> hábitos e crendices ligados à alimenta‑<br />
ção, do homem <strong>de</strong> Cro ‑Magnon aos dias atuais. “Visagens<br />
e assombrações” mergulha no mundo mágico <strong>de</strong> apari‑<br />
ções, lobisomens e outros seres fantásticos.<br />
A viagem continua com um suave balanceio <strong>de</strong> corpo<br />
no capítulo intitulado “Dança, Brasil!”, no qual Cascudo<br />
lembra que “antes <strong>de</strong> o primeiro brasileiro nascer, indíge‑<br />
nas, portugueses e escravos afric<strong>anos</strong> dançavam há muitos<br />
séculos”. Da dança à “Capoeira” a transição é natural, já<br />
que a luta teve origem em rituais <strong>de</strong> dança. O livro se en‑<br />
cerra com um estudo sobre o provérbio brasileiro “em<br />
tempo <strong>de</strong> murici, cada um cui<strong>de</strong> <strong>de</strong> si”, que po<strong>de</strong> ser visto<br />
como um convite para o leitor, terminado o livro, meditar<br />
sobre o que leu e apren<strong>de</strong>u – e cuidar <strong>de</strong> si.<br />
Prelo<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o
GEOGRAFIA DOS<br />
MITOS BRASILEIROS<br />
3 a edição – 400 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0709 ‑2<br />
Lobisomem, Saci ‑Pererê, Mula sem Cabeça e muitos<br />
outros seres fantásticos, que povoam a imaginação do bra‑<br />
sileiro, são os gran<strong>de</strong>s personagens da Geografia dos mitos<br />
brasileiros, <strong>de</strong> Luís da Câmara Cascudo. Para muita gente,<br />
perdida pelos grotões e roças do país, eles são criaturas tão<br />
vivas quanto o vizinho ou o leitor. Não é para menos. Al‑<br />
guns costumam se intrometer na vida humana, como per‑<br />
turbadores ou entida<strong>de</strong>s benéficas, exigindo doações (o<br />
fumo <strong>de</strong> rolo que o caboclo <strong>de</strong>ixa na encruzilhada para<br />
o Saci) ou aten<strong>de</strong>ndo pedidos, como o Negrinho do Pasto‑<br />
reio. Ou até engravidando moças, função exercida com<br />
muita competência pelo Boto. Esses mitos, ainda palpitan‑<br />
tes <strong>de</strong> vida entre a socieda<strong>de</strong> rural, estão presentes em<br />
todas as regiões do país, como assinala o levantamento <strong>de</strong><br />
Mestre Cascudo, estado a estado, mas cada vez <strong>mais</strong> amea‑<br />
çados pela penetração do rádio e da televisão.<br />
Como em todo fato social, há os <strong>mais</strong> populares (que<br />
Cascudo classifica como “mitos primitivos e gerais”), nos<br />
quais se incluem ainda as entida<strong>de</strong>s que formam os ciclos<br />
“da angústia infantil” e “dos monstros”. No primeiro, figu‑<br />
ras aterradoras para as crianças, como a Coca, as Bruxas e<br />
o Mão <strong>de</strong> Cabelo, <strong>de</strong> Minas Gerais, que corta a “minhoqui‑<br />
nha” dos meninos que não querem dormir.<br />
Entre os mitos <strong>de</strong> menor abrangência geográfica, que<br />
Cascudo classifica como “secundários e locais”, há alguns<br />
que ultrapassaram sua região e hoje são conhecidos em<br />
todo o país, graças à literatura (a Cobra Norato, motivo do<br />
poema <strong>de</strong> Raul Bopp) e o Matita Pereira, da música <strong>de</strong><br />
Antonio Carlos Jobim.<br />
Com sua erudição sem pedantismo, sempre com o<br />
dom <strong>de</strong> interessar o leitor, Mestre Cascudo prova que a<br />
companhia dos monstros, muitas vezes, em vez <strong>de</strong> pesa‑<br />
<strong>de</strong>lo, po<strong>de</strong> ser uma viagem “legitimamente maravilhosa”.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
HISTÓRIA DA<br />
ALIMENTAÇÃO<br />
NO BRASIL<br />
4 a edição – 960 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1583 ‑8<br />
Um observador malicioso, por certo gourmet e gour‑<br />
mand, observou que o índice <strong>de</strong> civilização <strong>de</strong> um povo<br />
po<strong>de</strong> ser medido pelo requinte <strong>de</strong> sua cozinha. Tempos<br />
antes, o glutão Brillat ‑Savarin já afirmara que o <strong>de</strong>stino das<br />
nações <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da maneira como elas se alimentam. Inte‑<br />
ressado na mistura do feijão com o arroz, no preparo dos<br />
temperos, no corte <strong>de</strong> legumes e verduras, nas <strong>de</strong>lícias das<br />
sobremesas, nos rituais e superstições alimentares, Luís da<br />
Câmara Cascudo reuniu durante <strong>mais</strong> <strong>de</strong> vinte <strong>anos</strong> infor‑<br />
mações (e provou comidas) para traçar sua História da ali‑<br />
mentação no Brasil, espécie <strong>de</strong> história do brasileiro através<br />
daquilo que entra pela sua boca.<br />
Com uma abrangência enciclopédica, o <strong>mais</strong> com‑<br />
pleto e fascinante estudo sobre a cozinha brasileira, em<br />
seus múltiplos aspectos, a obra divi<strong>de</strong> ‑se em duas partes.<br />
Na primeira, o autor analisa o tríplice legado que, mistu‑<br />
rado, refogado e temperado, iria formar a cozinha brasi‑<br />
leira típica: a herança indígena, africana e portuguesa.<br />
A segunda parte vai muito além do estudo da cozinha<br />
brasileira, com seus sabores e odores, pratos típicos e mistu‑<br />
ras, registrando e analisando, com gula, mas sem pressa, os<br />
múltiplos elementos sociais que giram próximo à cozinha: a<br />
sociologia da alimentação, o ritmo da refeição (dos bons<br />
tempos em que a família se reunia ao redor da mesa patriar‑<br />
cal à época do fast ‑food), o folclore e as superstições ligadas<br />
à alimentação, as bebidas <strong>de</strong> preferência do brasileiro. Dis‑<br />
cute ainda questões que afetam o paladar e o apetite <strong>de</strong><br />
todos nós, como os mitos ligados à cozinha africana e a<br />
contribuição <strong>de</strong> imigrantes, sobretudo alemães e itali<strong>anos</strong>.<br />
Em síntese, a História da alimentação no Brasil é um<br />
saboroso prato literário, ressaltando uma cozinha original<br />
que, se a observação <strong>de</strong> Brillat ‑Savarin for correta, terá um<br />
brilhante <strong>de</strong>stino.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
159
HISTÓRIA DOS<br />
NOSSOS GESTOS<br />
1 a edição – 286 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0791 ‑2<br />
Os ingênuos que julgam o passado morto precisam ler<br />
urgentemente História <strong>de</strong> nossos gestos, <strong>de</strong> Luís da Câ‑<br />
mara Cascudo. Lição <strong>de</strong> antropologia, evocação histórica,<br />
registro folclórico, escrito com a leveza <strong>de</strong> uma pluma<br />
caindo e a erudição <strong>de</strong> um sábio alemão, o livro, distribuído<br />
em 333 capítulos brevíssimos, mostra a perpetuida<strong>de</strong> mui‑<br />
tas vezes milenar <strong>de</strong> nossos gestos, a primeira linguagem<br />
humana, moedinhas <strong>de</strong> circulação diária cuja data <strong>de</strong><br />
cunhagem ignoramos, alguns remontando à aurora dos<br />
tempos históricos, há 3, 4 mil <strong>anos</strong>.<br />
“O Gesto é anterior à Palavra. Dedos e braços falaram<br />
milênios antes da Voz. As áreas do Entendimento mímico<br />
são infinitamente superiores às da comunicação verbal. A<br />
Mímica não é complementar mas uma provocação ao exer‑<br />
cício da oralida<strong>de</strong>. Sem gestos, a Palavra é precária e pobre<br />
para o entendimento temático”, observa Cascudo.<br />
Quem po<strong>de</strong>ria imaginar que o simples ato <strong>de</strong> esfregar as<br />
mãos, como sinal <strong>de</strong> alegria, tenha nascido nos sacrifícios <strong>de</strong><br />
gratidão aos <strong>de</strong>uses, há milhares <strong>de</strong> <strong>anos</strong>? O V da vitória,<br />
popularizado pelo primeiro ‑ministro inglês Winston Churchill,<br />
durante a Segunda Guerra Mundial, e tão usado hoje pela<br />
geração paz e amor, era o gesto executado pelo gladiador<br />
ferido na arena romana, há 2 mil <strong>anos</strong>, pedindo perdão. Esti‑<br />
car a língua para fora da boca, como sinal <strong>de</strong> zombaria, cons‑<br />
tituía uma atitu<strong>de</strong> velhíssima há 2 mil <strong>anos</strong>, quando o poeta<br />
Pérsio o registrou. A assistência que bate palmas para um ar‑<br />
tista repete um gesto praticado em Babilônia, há <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 3 mil<br />
<strong>anos</strong>, significando então um pedido <strong>de</strong> proteção aos <strong>de</strong>uses.<br />
Há também gestos típicos brasileiros, sem similar em<br />
parte alguma, como o ato <strong>de</strong> dobrar o <strong>de</strong>do indicador<br />
em anzol, que se executa para o papagaio pousar os pés,<br />
dirigindo ‑o à pessoa que fala <strong>de</strong><strong>mais</strong>. Simples, provocativo,<br />
<strong>mais</strong> eloquente do que mil palavras.<br />
160<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
JANGADA<br />
UMA PESQUISA ETNOGRÁFICA<br />
2 a edição – 174 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0711 ‑4<br />
Embarcação <strong>mais</strong> antiga do mundo, com 30 mil <strong>anos</strong><br />
<strong>de</strong> vida, “primeira fórmula consciente do navio dirigido por<br />
mão humana”, a jangada navegou por todos os mares da<br />
Antiguida<strong>de</strong>. Os povos marítimos a conheceram e a utiliza‑<br />
ram como veículo <strong>de</strong> pesca e <strong>de</strong> heroísmos. Há 3 mil <strong>anos</strong><br />
Ulisses já a fabricava com suas próprias mãos, como conta<br />
Homero na Odisseia. Os portugueses a encontraram na<br />
Índia, <strong>de</strong> on<strong>de</strong> transplantaram o termo para o Brasil. O veí‑<br />
culo era <strong>de</strong> uso cotidiano do índio brasileiro (chamado <strong>de</strong><br />
igapeba ou piperi), registrado e <strong>de</strong>scrito por Pero Vaz <strong>de</strong><br />
Caminha, em sua carta, com o nome <strong>de</strong> almadia. Com o<br />
tempo, a jangada foi incorporando novos elementos (vela,<br />
bolina, remo <strong>de</strong> governo) e se tornou uma espécie <strong>de</strong> sím‑<br />
bolo da coragem do homem nor<strong>de</strong>stino, em aventuras diá‑<br />
rias pelos ver<strong>de</strong>s mares bravios <strong>de</strong> sua terra natal, como<br />
Luís da Camada Cascudo conta e louva em sua insuperável<br />
Jangada, o melhor livro até hoje escrito sobre o tema, na<br />
bibliografia mundial.<br />
Admirador <strong>de</strong>clarado do janga<strong>de</strong>iro, Cascudo colheu<br />
parte importante <strong>de</strong> seu material no contato com velhos<br />
mestres do ofício, no Rio Gran<strong>de</strong> do Norte, “meus profes‑<br />
sores na jangada e coisas <strong>de</strong> pescarias”. Esse material pul‑<br />
sando vida foi completado pela pesquisa persistente e<br />
apaixonante em livros e documentos, publicados ao longo<br />
dos séculos. Como acontece em seus estudos, Mestre Cas‑<br />
cudo oferece ao leitor muito <strong>mais</strong> do que promete o título<br />
da obra. Jangada não se limita a ser “uma pesquisa etno‑<br />
gráfica”, como afirma o subtítulo, mas um passeio erudito<br />
pela história, ao longo dos séculos, com incursões pelo ter‑<br />
reno do folclore, da sociologia, da economia, da distribui‑<br />
ção geográfica, acrescida ainda <strong>de</strong> uma pequena antologia,<br />
e <strong>de</strong> um vocabulário específico do tema. É uma boa ocasião<br />
para embarcar nessa jangada.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o
LENDAS BRASILEIRAS<br />
9 a edição – 168 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0710 ‑6<br />
Lendas brasileiras, <strong>de</strong> Luís da Câmara Cascudo, reúne<br />
21 tradições populares das cinco gran<strong>de</strong>s regiões geográfi‑<br />
cas do país. Algumas <strong>de</strong>ssas histórias, sem per<strong>de</strong>r a i<strong>de</strong>nti‑<br />
ficação regional, são hoje conhecidas em plano nacional,<br />
graças à difusão da literatura, do rádio, <strong>de</strong> histórias em<br />
quadrinhos, <strong>de</strong> enredos <strong>de</strong> escolas <strong>de</strong> samba, <strong>de</strong> curtas‑<br />
‑metragens. Assim, as lendas da Iara, do Neguinho do Pas‑<br />
toreio, da morte <strong>de</strong> Zumbi dos Palmares, do aparecimento<br />
da imagem <strong>de</strong> Nossa Senhora Aparecida. No entanto, algu‑<br />
mas das lendas incorporadas ao livro serviram <strong>de</strong> temas a<br />
obras famosas da literatura brasileira, sem se populariza‑<br />
rem. Caso da Cobra Norato, que inspirou o poema famoso<br />
<strong>de</strong> Raul Bopp, tão original em sua expressão e origem, ao<br />
contrário <strong>de</strong> outras que, sem per<strong>de</strong>r a i<strong>de</strong>ntificação com a<br />
terra, são variantes <strong>de</strong> tradições multisseculares, presentes<br />
em todos os povos.<br />
É o caso da missa dos mortos, da cida<strong>de</strong> encantada,<br />
residência <strong>de</strong> uma linda rainha, que para ser <strong>de</strong>sencantada<br />
exige um sacrifício <strong>de</strong> sangue, e das cida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>saparecidas<br />
nas águas do mar ou <strong>de</strong> rios, em geral por castigo divino,<br />
em cujo local se ouvem rumores estranhos, lembrando as<br />
bíblicas Sodoma e Gomorra.<br />
Uma boa parte das lendas reunidas no livro foi ouvida,<br />
e registrada, por Luís da Câmara Cascudo diretamente da<br />
boca do povo. Para as <strong>de</strong><strong>mais</strong>, utilizou fontes escritas, co‑<br />
lhidas em obras <strong>de</strong> escritores ilustres, como o mineiro<br />
Afonso Arinos e o gaúcho Simões Lopes Neto, mas tam‑<br />
bém em revistas <strong>de</strong> difícil acesso, livros raros. Esses textos<br />
encontram ‑se reproduzidos fielmente, com anotações <strong>de</strong><br />
Mestre Cascudo, esclarecendo o significado <strong>de</strong> termos re‑<br />
gionais, fixando a difusão da história. As Lendas brasileiras,<br />
<strong>de</strong> Luís da Câmara Cascudo, oferecem ao leitor um <strong>de</strong>li‑<br />
cioso passeio pela alma brasileira, sem sair da poltrona.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
LITERATURA ORAL<br />
NO BRASIL<br />
2 a edição – 488 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1061 ‑1<br />
Literatura oral no Brasil é livro sem similar na bibliogra‑<br />
fia brasileira. Obra <strong>de</strong> um pesquisador e erudito sem para‑<br />
lelo. Nascido no fim do século XIX e tendo passado a infância<br />
e parte da juventu<strong>de</strong> no sertão nor<strong>de</strong>stino, Luís da Câmara<br />
Cascudo viveu uma época em que ainda prevaleciam valo‑<br />
res, hábitos, costumes e até organização <strong>de</strong> trabalho típicos<br />
do século XVIII. Os livros eram raríssimos. Conhecimentos,<br />
lendas, contos, poesias, autos, tudo era transmitido <strong>de</strong> forma<br />
oral. Mais tar<strong>de</strong>, estudante universitário, leitor voraz, Cas‑<br />
cudo foi verificando a origem, por vezes remotíssima, <strong>de</strong><br />
fatos e histórias presenciados e ouvidos no sertão. A curiosi‑<br />
da<strong>de</strong> do erudito juntava ‑se à realida<strong>de</strong> vivida, base <strong>de</strong> sua<br />
extensa obra, sempre palpitante <strong>de</strong> vida, como esta Litera‑<br />
tura oral no Brasil.<br />
Iniciando ‑se pela origem do conceito <strong>de</strong> literatura<br />
oral, sua abrangência e vitalida<strong>de</strong>, limites e transmissão, o<br />
livro se espraia como círculos concêntricos numa superfície<br />
líquida, registrando e estudando as infindáveis manifesta‑<br />
ções <strong>de</strong> cultura transmitidas pela oralida<strong>de</strong>: canto, dança,<br />
mitos, lendas, fábulas, tradições, rondas infantis, parlen‑<br />
das, mnemonias, adivinhas, anedotas.<br />
Capítulos especiais são <strong>de</strong>dicados aos contos (contos<br />
<strong>de</strong> encantamento, <strong>de</strong> exemplo, facécias etc.), autos popu‑<br />
lares e poesia (em seus vários gêneros e tipos, romances,<br />
metro, <strong>de</strong>safio etc.) em suas múltiplas manifestações, com‑<br />
pletados com antologia.<br />
Com simplicida<strong>de</strong> e erudição, Cascudo registra, analisa,<br />
compara a presença <strong>de</strong> tradições em vários povos, sempre<br />
migrando, “ondulantes na imaginação coletiva”, a contri‑<br />
buição <strong>de</strong> portugueses, negros e indígenas, assim como as<br />
fontes impressas da literatura oral brasileira, a partir do sé‑<br />
culo XVI, muitas <strong>de</strong>las ainda presentes em nosso cotidiano,<br />
numa impressionante vitalida<strong>de</strong> do espírito popular.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
161
LOCUÇÕES<br />
TRADICIONAIS<br />
NO BRASIL<br />
1 a edição – 336 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0872 ‑2<br />
Se você não sabe on<strong>de</strong> Judas per<strong>de</strong>u as botas ou <strong>de</strong><br />
que morreu o Neves, se ignora o que seja viver no fio da<br />
navalha ou estar rente como pão quente, então chegou a<br />
hora e a vez <strong>de</strong> consultar as Locuções tradicionais no Brasil,<br />
<strong>de</strong> Luís da Câmara Cascudo. Trabalho minucioso, o livro<br />
registra e estuda cerca <strong>de</strong> quinhentas frases feitas que, não<br />
se sabe por quais razões misteriosas, se fixaram <strong>de</strong> maneira<br />
in<strong>de</strong>lével na mente do povo, atravessando gerações e con‑<br />
tinuando presentes à vida cotidiana, mesmo quando <strong>de</strong>sa‑<br />
pareceram há muito os fatos que lhe <strong>de</strong>ram origem.<br />
É um prazer acompanhar a erudição sem pedantismo <strong>de</strong><br />
Cascudo a explicar a origem (quando possível) e o passeio das<br />
locuções através <strong>de</strong> longínquas terras, até chegar ao Brasil. A<br />
maioria se originou na península Ibérica, mas algumas circulam<br />
há <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 2 mil <strong>anos</strong>, sem sinal <strong>de</strong> envelhecimento. Assim,<br />
pegar a ocasião pelo cabelo vem da Grécia clássica. A ocasião<br />
era então representada por um efebo <strong>de</strong>snudo e careca, com<br />
apenas um tufo <strong>de</strong> cabelos na testa. Era pegar e não largar.<br />
Há também as nascidas na França, como a popularís‑<br />
sima virar casaca. Se o leitor provavelmente conhece al‑<br />
guém que já virou casaca – hábito tão comum em nossa<br />
vida política –, é interessante saber que a locução nasceu<br />
no século XVIII. Na época, os partidos políticos adotavam<br />
vestes <strong>de</strong> cores diferentes, obrigando os traidores a usar as<br />
cores <strong>de</strong> seus antigos <strong>de</strong>safetos.<br />
Outras têm origem evi<strong>de</strong>nte e quase dispensam co‑<br />
mentário. Assim, a expressão comer como um aba<strong>de</strong>, alusão<br />
à glutonaria dos padres portugueses, objeto <strong>de</strong> um imenso<br />
anedotário. Há ainda as nascidas no Brasil, como para inglês<br />
ver e carcamano. Voltando ao início, a propósito <strong>de</strong> Judas,<br />
Mestre Cascudo adverte que ele nunca usou bota, tipo <strong>de</strong><br />
calçado surgido na Ida<strong>de</strong> Média. A explicação... Bem, o me‑<br />
lhor é consultar o livro. Há quinhentos motivos para isso.<br />
162<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
MADE IN AFRICA<br />
4 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0687 ‑8<br />
No início da década <strong>de</strong> 1960, Luís da Câmara Cascudo<br />
empreen<strong>de</strong>u uma longa viagem <strong>de</strong> estudos pela África Oci‑<br />
<strong>de</strong>ntal e Oriental. O objetivo era pesquisar in loco a alimen‑<br />
tação popular dos bantos, recolhendo subsídios para sua<br />
monumental História da alimentação no Brasil. Em convívio<br />
com o cotidiano da vida africana, o pesquisador ia tendo<br />
oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> constatar as imensas afinida<strong>de</strong>s espirituais,<br />
culturais, mágicas que unem Brasil e África. Indagando,<br />
vendo e observando, tentando compreen<strong>de</strong>r muitas vezes<br />
o que lhe parecia incompreensível, anotava cada fato vivido<br />
ou presenciado, que tivesse relação com o Brasil, colhido<br />
ainda palpitante na realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada dia. Essa, a origem<br />
dos estudos reunidos em Ma<strong>de</strong> in Africa.<br />
Como esclarece no prefácio, o livro reúne indagações<br />
para “um processo autenticador <strong>de</strong> elementos afric<strong>anos</strong><br />
que permanecem no Brasil e motivos brasileiros que vivem<br />
n’África, modificados, ampliados, assimilados, mas ainda<br />
i<strong>de</strong>ntificáveis e autênticos”, muitos <strong>de</strong>les levados por ex‑<br />
‑escravos <strong>de</strong> torna ‑viagem.<br />
As afinida<strong>de</strong>s estão nos <strong>mais</strong> insuspeitos gestos e pos‑<br />
turas do cotidiano, do andar rebolado, cuja origem Mestre<br />
Cascudo i<strong>de</strong>ntifica no bamboleio da angolana, à prática<br />
<strong>de</strong>leitosa do cafuné, também <strong>de</strong> origem banto; em múlti‑<br />
plos aspectos da cozinha brasileira, po<strong>de</strong>ndo começar pela<br />
nossa farofa, idêntica à angolana, e <strong>de</strong> nossas danças, o<br />
escandaloso lundu, contra o qual os moralistas tanto pro‑<br />
testavam, e a umbigada, <strong>de</strong> extrema sensualida<strong>de</strong>, espécie<br />
<strong>de</strong> rápido mimetismo do ato sexual.<br />
Do continente negro também vieram crendices, enti‑<br />
da<strong>de</strong>s mágicas e temores que ainda povoam a alma do<br />
nosso povo, como o Zumbi, <strong>de</strong> presença tão assustadora<br />
no norte do país, os orixás, a crença em <strong>de</strong>terminados<br />
amuletos, como a pata do coelho. Mama África continua<br />
muito viva no cotidiano do brasileiro.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o
MOUROS, FRANCESES<br />
E JUDEUS<br />
TRÊS PRESENÇAS NO BRASIL<br />
3 a edição – 112 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0688 ‑6<br />
Em Mouros, franceses e ju<strong>de</strong>us, Luís da Câmara Cascudo<br />
estuda a presença <strong>de</strong>sses três povos na cultura popular brasi‑<br />
leira. Presenças persistentes através <strong>de</strong> crendices, histórias,<br />
gestos, hábitos alimentares, cujas origens se per<strong>de</strong>m na escura<br />
noite dos tempos, alguns chegados aqui quando o Brasil ape‑<br />
nas <strong>de</strong>spertava para a vida. Constantes culturais <strong>de</strong> 2, 3 mil<br />
<strong>anos</strong>, velhas <strong>de</strong> quinhentos <strong>anos</strong> no país e que continuam,<br />
límpidas e frescas, na vida cotidiana do povo brasileiro.<br />
Depois <strong>de</strong> séculos <strong>de</strong> presença na península Ibérica,<br />
<strong>de</strong>ixando marcas in<strong>de</strong>léveis na vida portuguesa, o mouro<br />
viajou para o Brasil na memória do colonizador, como ob‑<br />
serva Cascudo. Ninguém fala português sem empregar<br />
centenas <strong>de</strong> palavras <strong>de</strong> origem árabe: açúcar, arroz, azei‑<br />
tona. As mães ‑d’água, <strong>de</strong> canto irresistível, são parentes<br />
das mouras encantadas. A presença árabe está em toda<br />
parte, na arquitetura, na doçaria, no pé do nor<strong>de</strong>stino. A<br />
alparcata, tão popular no Nor<strong>de</strong>ste, muitas vezes milenar,<br />
foi introduzida em Portugal pelo berbere.<br />
Presente no Brasil <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as primeiras expedições <strong>de</strong> re‑<br />
conhecimento da terra, o ju<strong>de</strong>u <strong>de</strong>ixou marcas <strong>de</strong> sua cul‑<br />
tura em lendas, cerimônias religiosas, hábitos <strong>de</strong> comércio.<br />
Bem posterior, a influência francesa se tornou avassa‑<br />
ladora a partir, sobretudo, dos séculos XVIII e XIX. Ainda<br />
hoje, os cantadores nor<strong>de</strong>stinos invocam a figura <strong>de</strong> Rol‑<br />
dão, como um herói imbatível, exemplo <strong>de</strong> coragem e hon‑<br />
ra<strong>de</strong>z. “É o único motivo popular inspirado por livro<br />
impresso”, ensina Mestre Cascudo. O livro é a História do<br />
imperador Carlos Magno e dos doze pares <strong>de</strong> França, pre‑<br />
sente em toda casa <strong>de</strong> nor<strong>de</strong>stino letrado, <strong>de</strong> on<strong>de</strong> se di‑<br />
vulgou para o povo fascinado. Roldão e sua espada<br />
durindana continuam exaltados, ainda hoje, na literatura<br />
<strong>de</strong> cor<strong>de</strong>l, como se acabassem <strong>de</strong> sair <strong>de</strong> um combate.<br />
Como dizia Sainte ‑Beuve, a Antiguida<strong>de</strong> é coisa nova.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
PRELÚDIO DA<br />
CACHAÇA<br />
2 a edição – 104 páginas<br />
1 encarte colorido (8 páginas)<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1078 ‑6<br />
Já no século XVII, Gregório <strong>de</strong> Matos gostava <strong>de</strong><br />
saboreá ‑la nas casas amigas do Recôncavo Baiano. Duzentos<br />
<strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, Lima Barreto <strong>de</strong>fendia ‑a <strong>de</strong> seus <strong>de</strong>tratores,<br />
dizendo que não era ela quem fazia mal ao Brasil, mas a<br />
burrice. Ao longo dos séculos, teve e tem muitos nomes e<br />
apelidos: cachaça, moça ‑branca, água que passarinho não<br />
bebe, aguar<strong>de</strong>nte, parati, cana, caninha, branquinha, pinga<br />
e muitos outros. “Bebida do povo, áspera, rebelada, insub‑<br />
missa aos ditames do amável paladar”, como salienta Luís da<br />
Câmara Cascudo nesse <strong>de</strong>licioso Prelúdio da cachaça. Nas‑<br />
cida em data incerta, provavelmente no século XV, em Por‑<br />
tugal, durante muito tempo a etiqueta proibia seu ingresso<br />
em locais <strong>mais</strong> distintos, ensina Mestre Cascudo. Aos pou‑<br />
cos, ela foi conquistando todas as classes sociais e até ga‑<br />
nhando ingresso na história do Brasil. Era moeda <strong>de</strong> troca,<br />
obrigatória, levada pelos traficantes <strong>de</strong> escravos para a<br />
África. Foi com ela que os rebel<strong>de</strong>s brindaram a Confe<strong>de</strong>ra‑<br />
ção do Equador, em 1824. Durante a Guerra do Paraguai,<br />
era fartamente consumida pelas tropas brasileiras e, mistu‑<br />
rada com pólvora, esfregada no corpo. Coisa <strong>de</strong> macho que,<br />
diziam, aumentava a coragem.<br />
Cruel, <strong>de</strong>struidora <strong>de</strong> lares e <strong>de</strong> vidas, não encontra sim‑<br />
patia no folclore, con<strong>de</strong>nada quase sempre em quadrinhas<br />
como essa: “Homem que bebe cachaça,/ mulher que errou<br />
uma vez,/ cachorro que pega bo<strong>de</strong>,/ coitadinho <strong>de</strong>les três!”.<br />
Estudando o assunto pelo ângulo folclórico, sociológico,<br />
etnográfico, histórico, Cascudo conclui que “o brasileiro é<br />
<strong>de</strong>voto da cachaça, mas não é cachaceiro”. Ainda bem.<br />
Cabe ressaltar a qualida<strong>de</strong> gráfica <strong>de</strong>ssa edição, com<br />
a mancha bem distribuída na página, tipos gran<strong>de</strong>s, ótimos<br />
<strong>de</strong> se ler, ilustrações em cores em papel cuchê. Uma obra<br />
que se lê <strong>de</strong> um gole, como um copo <strong>de</strong> boa cachaça.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
163
PRELÚDIO E FUGA<br />
DO REAL<br />
Prelo<br />
Em Prelúdio e fuga do real, Luís da Câmara Cascudo<br />
convoca o leitor para um passeio, sem fronteiras no tempo<br />
e no espaço, com plena liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> imaginação, através<br />
<strong>de</strong> alguns dos motivos, mitos e criações <strong>mais</strong> vivos da<br />
gran<strong>de</strong> cultura do mundo oci<strong>de</strong>ntal. O que significa invocar<br />
e pon<strong>de</strong>rar a respeito <strong>de</strong> problemas e dúvidas que <strong>mais</strong><br />
afligem o ser humano, ao longo dos séculos.<br />
Apresentados em forma <strong>de</strong> epístolas, dirigidas a um su‑<br />
posto <strong>de</strong>stinatário, os textos assumem características <strong>de</strong> nar‑<br />
rativas em tom <strong>de</strong> <strong>de</strong>bate filosófico, sob a invocação <strong>de</strong> um<br />
personagem, real ou imaginário, Epicuro ou Luís <strong>de</strong> Camões,<br />
Dom Quixote ou o Barão <strong>de</strong> Münchhausen, abordando temas<br />
e problemas com os quais se i<strong>de</strong>ntificam na tradição.<br />
É o pretexto para abordar e repensar temas eternos e<br />
inquietadores, como o problema da sobrevivência do espírito,<br />
seu <strong>de</strong>stino póstumo e até sua constituição e aparência, pois,<br />
ao contrário do que prega o catolicismo, o autor não admite<br />
os espíritos puros, simples chama, “sem contorno <strong>de</strong>finido”,<br />
mas acredita que eles continuam vivendo “nas aparências fí‑<br />
sicas utilizadas na travessia da existência terrena”.<br />
Com essa mesma liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> espírito, sem imposi‑<br />
ções <strong>de</strong> doutrinas religiosas ou filosóficas, Mestre Cascudo<br />
salta <strong>de</strong> um tema a outro, sem per<strong>de</strong>r o espírito indagador<br />
e a inquietação pela verda<strong>de</strong>.<br />
Nos 35 textos do livro, o autor dialoga com Montaigne,<br />
Maria Madalena, Ramsés II, Caim, Pangloss, Jean ‑Jacques Rous‑<br />
seau, Aristófanes, o imperador Juliano, <strong>de</strong>bate assuntos como<br />
o ceticismo e a história como disciplina da imaginação, apre‑<br />
senta as consi<strong>de</strong>rações <strong>de</strong> Erasmo <strong>de</strong> Roterdã sobre o <strong>de</strong>stino<br />
póstumo <strong>de</strong> sua obra, conce<strong>de</strong> a Nostradamus o direito <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a profissão <strong>de</strong> prever o futuro, e trata <strong>de</strong> outros trinta<br />
temas, a cujo respeito os homens <strong>de</strong>batem em busca da ver‑<br />
da<strong>de</strong>, muito <strong>mais</strong> interessante do que encontrá ‑la.<br />
164<br />
Prelo<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
REDE DE DORMIR<br />
UMA PESQUISA ETNOGRÁFICA<br />
2 a edição – 232 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0714 ‑9<br />
Durante séculos, milhões <strong>de</strong> brasileiros nasceram, vive‑<br />
ram, amaram e morreram em cima <strong>de</strong>la. No sertão, ela envol‑<br />
via os mortos conduzidos ao cemitério. Cantada por poetas,<br />
chamada carinhosamente <strong>de</strong> “mãe veia”, mãe velha, pelos<br />
<strong>mais</strong> antigos, a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> dormir atravessou os tempos sem que<br />
ninguém lhe <strong>de</strong>dicasse pesquisa, estudo ou análise. O pri‑<br />
meiro trabalho sobre o assunto, pioneiro e insuperável, é esse<br />
Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> dormir, <strong>de</strong> Luís da Câmara Cascudo. Estudioso e apai‑<br />
xonado pela re<strong>de</strong>, já na introdução do livro, Cascudo faz a<br />
<strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> sua insuperável comodida<strong>de</strong>, comparada à cama:<br />
“O leito obriga ‑nos a tomar seu costume, ajeitando ‑nos nele,<br />
procurando o repouso numa sucessão <strong>de</strong> posições. A re<strong>de</strong><br />
toma o nosso feitio, contamina ‑se com os nossos hábitos,<br />
repete, dócil e macia, a forma do nosso corpo.”.<br />
Como em todos os seus estudos, Cascudo esgota o<br />
tema, indo sempre muito além do que propõe o título.<br />
Assim, Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> dormir não se limita à pesquisa etnográfica,<br />
como afirma o subtítulo do livro, mas passeia pela história,<br />
a sociologia, o folclore, reproduz registros literários.<br />
De origem indígena (“até prova em contrário a re<strong>de</strong><br />
possui o copyright sul ‑americano”, observa Cascudo), a re<strong>de</strong><br />
seduziu o colonizador ao primeiro embalo. Pero Vaz <strong>de</strong> Ca‑<br />
minha, o primeiro europeu a registrá ‑la, batizou ‑a com o<br />
nome que atravessaria os tempos, <strong>de</strong>vido à semelhança <strong>de</strong><br />
suas malhas com a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> pescar. Parte da vida do brasi‑<br />
leiro, confeccionada em cipó ou algodão, com o tempo<br />
sofisticou ‑se em variados mo<strong>de</strong>los, com suas varandas maio‑<br />
res ou menores, símbolo <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r social, as franjas, exibidas<br />
vaidosamente, as cores, outro símbolo <strong>de</strong> distinção, sendo<br />
as brancas <strong>de</strong> uso tradicional da aristocracia rural.<br />
Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> dormir é uma excelente leitura para ser feita<br />
na poltrona favorita, na cama ou, <strong>de</strong> preferência, ao em‑<br />
balo da re<strong>de</strong>.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o
RELIGIÃO NO POVO<br />
2 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1079 ‑6<br />
Conhecedor insuperável das paixões, crenças e supersti‑<br />
ções do povo brasileiro, Mestre Cascudo se interessou por todas<br />
as manifestações da alma popular, em estudo persistente e<br />
contínuo. Ao tema da religiosida<strong>de</strong> <strong>de</strong>dicou quarenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong><br />
pesquisas diretas, amparadas e iluminadas pela erudição li‑<br />
vresca, das quais resultaram inúmeros trabalhos esparsos e dois<br />
volumes <strong>de</strong>dicados ao tema – Religião no povo e Superstições<br />
no Brasil –, mas <strong>de</strong> abordagens específicas.<br />
No prefácio a Religião no povo, Cascudo explica que<br />
seu estudo, que ele <strong>de</strong>nomina <strong>de</strong> <strong>de</strong>poimento, não aborda<br />
superstições, bruxarias, amuleto, magia, mas os fenômenos<br />
ligados à religiosida<strong>de</strong> popular, atestados através <strong>de</strong> casos,<br />
bebidos diretamente na fonte, e da atenção persistente do<br />
autor pelo tema. “E o factual logo ce<strong>de</strong> à conclusão cientí‑<br />
fica, num estudo que, pelo fascínio do tema e modo pelo<br />
qual o autor o trata, transforma a obra em trabalho <strong>de</strong><br />
cinzel”, como observa Humberto Nóbrega.<br />
O livro estuda 27 temas ligados a crenças populares,<br />
envolvidas numa religiosida<strong>de</strong> esculpida pela doutrina ca‑<br />
tólica, a partir da colonização. “A catequese cristã infiltrou‑<br />
‑se na mentalida<strong>de</strong> nas manhãs do séc. XVI”, observa<br />
Cascudo. E a partir daí estilhaçou ‑se em inúmeras crendi‑<br />
ces, a maioria <strong>de</strong>las <strong>de</strong> origem remota no tempo, como o<br />
hábito <strong>de</strong> tomar bênção matinal e noturna a pais, avós,<br />
parentes <strong>mais</strong> velhos e até a visitantes ilustres, cujas origens<br />
longínquas o estudioso i<strong>de</strong>ntifica na Bíblia; a <strong>de</strong>voção po‑<br />
pular pelas almas benditas, que Cascudo acompanha ao<br />
longo dos séculos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os lêmures, fantasmas que fre‑<br />
quentavam as casas romanas, no tempo dos césares; o<br />
po<strong>de</strong>r mágico da hora do meio ‑dia; a posição a<strong>de</strong>quada<br />
para orar, e vinte e outros temas que ajudam a compreen‑<br />
<strong>de</strong>r a alma mística do brasileiro.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
SUPERSTIÇÃO<br />
NO BRASIL<br />
5 a edição – 496 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0686 ‑X<br />
Superstição no Brasil reúne três livros <strong>de</strong> Luís da Câmara<br />
Cascudo, publicados em épocas diversas, unidos pela afini‑<br />
da<strong>de</strong> temática: Anúbis e outros ensaios (1951), Superstições e<br />
costumes (1958), Religião no povo (1974). Erudito que escrevia<br />
com leveza e graça, Cascudo acompanha, numa viagem atra‑<br />
vés <strong>de</strong> milênios, a misteriosa caminhada <strong>de</strong> superstições, hábi‑<br />
tos, costumes e sua permanência em terras brasileiras.<br />
O primeiro livro estuda sobretudo crenças e tradições<br />
mágicas presentes na vida do brasileiro. Representado com<br />
corpo <strong>de</strong> homem e cabeça <strong>de</strong> chacal, Anúbis era no antigo<br />
Egito o intérprete dos mortos, aquele que encaminhava as<br />
sombras ao <strong>de</strong>us supremo, Osíris. Quase 4 mil <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois, a<br />
sua presença permanece em vários aspectos do cerimonial e<br />
do culto aos mortos. Quase tão velhas quanto Anúbis são as<br />
preces e procissões para pedir chuva, já praticadas na Roma<br />
dos césares, ou o costume <strong>de</strong> se ouvir o que as pessoas falam<br />
na rua, na certeza <strong>de</strong> se ter uma resposta (um sim, um talvez,<br />
um não) às suas dúvidas, prática comum na Grécia, há 3 mil<br />
<strong>anos</strong>, sob as bênçãos <strong>de</strong> Hermes, o Mercúrio romano.<br />
Superstições e costumes estuda quarenta motivos pre‑<br />
sentes no cotidiano do brasileiro, vários <strong>de</strong>les <strong>de</strong> origem<br />
imemorial. Como a atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> não olhar o rosto <strong>de</strong> uma<br />
pessoa, um símbolo <strong>de</strong> respeito já registrado na Bíblia. Ou<br />
a ameaça <strong>de</strong> se mijar na cova do inimigo, documentada em<br />
Roma, há <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 2 mil <strong>anos</strong>.<br />
Religião no povo é o resultado <strong>de</strong> quarenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong><br />
pesquisas sobre a religiosida<strong>de</strong> popular, a intrincada mis‑<br />
tura <strong>de</strong> elementos pagãos no catolicismo popular brasileiro,<br />
os ritos do cotidiano, nascidos no seio da religião (tomar<br />
bênção), orações que per<strong>de</strong>m a força quando interrompi‑<br />
das, a força mágica do meio ‑dia, os castigos aplicados aos<br />
santos, e <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> outros motivos, numa fantástica via‑<br />
gem pelo tempo e a velha e crédula alma humana.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
165
TRADIÇÃO, CIÊNCIA<br />
DO POVO<br />
Prelo<br />
Entre as epígrafes selecionadas por Luís da Câmara<br />
Cascudo para Tradição, ciência do povo, há duas que se<br />
complementam e <strong>de</strong>finem o espírito e a diretriz da obra. A<br />
primeira é um conceito que integra o Direito Canônico e<br />
sentencia: “O Costume é o melhor intérprete das Leis”. A<br />
outra, do antropólogo norte ‑americano Franz Boas, ensina<br />
que “<strong>de</strong>vemos compreen<strong>de</strong>r o indivíduo vivendo em sua<br />
Cultura, e a Cultura como vivida por indivíduos”. Há uma<br />
terceira, o verso famoso <strong>de</strong> Gonçalves Dias – “Meninos, eu<br />
vi!” –, que atesta as investigações próprias empreendidas<br />
pelo autor, no calor da vida, sobre os temas estudados.<br />
Partindo <strong>de</strong>ssas premissas, Cascudo investiga a ciência<br />
do povo brasileiro, com suas peculiarida<strong>de</strong>s e heranças<br />
multisseculares. Como ele adverte, “ciência no plano da<br />
concordância e da compreensão geral. Constituem bases<br />
inamovíveis para o julgamento anônimo, para a apreciação<br />
e mesmo percepção do fato social e econômico”. Em<br />
suma: Memória e Memória coletiva, segundo o conceito <strong>de</strong><br />
Maurice Halbwachs.<br />
A palavra, como o autor adverte na introdução, fica<br />
por conta do “brasileiro dos sertões, cida<strong>de</strong>s ‑velhas e<br />
praias, sem constrangimento e disfarce”. Através <strong>de</strong>ssas<br />
vozes, recolhidas e analisadas pelo autor, o leitor se enfro‑<br />
nha em temas como “Notícia das chuvas e dos ventos do<br />
Brasil”, “Meteorologia tradicional do Sertão”, “Botânica<br />
supersticiosa no Brasil”, “Respingando a ceifa”, “Folclore<br />
do mar solitário”, “O morto brasileiro”, “Os quatro ele‑<br />
mentos” e “Para o estudo da superstição”.<br />
Claro e eruditíssimo, didático e sem inúteis pedantis‑<br />
mos (tão comuns no tratamento <strong>de</strong>ssas matérias), Cascudo<br />
nos ajuda a <strong>de</strong>svendar e compreen<strong>de</strong>r um pouco <strong>mais</strong> a<br />
contraditória e apaixonante alma do brasileiro.<br />
166<br />
Prelo<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
VAQUEIROS E<br />
CANTADORES<br />
1 a edição – 366 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0981 ‑8<br />
Vaqueiros e cantadores eram os heróis <strong>mais</strong> populares<br />
<strong>de</strong> um Nor<strong>de</strong>ste perdido no tempo, quando ainda se vivia<br />
como no século XVIII. O sertanejo mandava fazer uma roupa<br />
<strong>de</strong> casimira para durar a vida toda, ser exibida nas festas, no<br />
casamento e ser enterrado com ela. As filhas usavam os trajes<br />
das mães. Os velhos tomavam banho aos sábados, abençoa‑<br />
vam com os <strong>de</strong>dos unidos e sabiam algumas palavras <strong>de</strong> latim.<br />
O gado se espalhava pelos <strong>de</strong>scampados, reunido nas vaque‑<br />
jadas alegres, celebrado em romances populares, nos quais o<br />
gran<strong>de</strong> herói era o boi, rebel<strong>de</strong>, <strong>de</strong>safiando o vaqueiro, glori‑<br />
ficado pelo povo, o boi Espácio, o boi Surubim. O sertão vivia<br />
<strong>de</strong> ouvido atento às histórias dos cantadores, quase todos<br />
analfabetos, versejando velhos romances, como o da sábia e<br />
astuta donzela Teodora, da Princesa Megalona, da Imperatriz<br />
Porcina, com suas figuras clássicas da tradição medieval: cava‑<br />
leiros andantes, virgens fiéis, paladinos cristãos; os testamen‑<br />
tos <strong>de</strong> Judas em pé ‑quebrado (espécie <strong>de</strong> quadra, quase<br />
sempre <strong>de</strong> sete sílabas); os A.B.C., contando a gesta <strong>de</strong> um<br />
touro, um bo<strong>de</strong>, uma onça suçuarana; os pelos ‑sinais e ora‑<br />
ções satíricos, todos eles documentados e estudados com in‑<br />
superável conhecimento por Luís da Câmara Cascudo.<br />
Os <strong>de</strong>safios entre os gran<strong>de</strong>s mestres paralisavam a<br />
vida ao redor e ficavam perpetuados na mente do povo.<br />
Muitas vezes, os sertanejos se cotizavam para promover<br />
esses encontros.<br />
Os cantadores famosos do sertão, cujas biografias Cas‑<br />
cudo registra – Inácio da Catingueira, Francisco Romano, Rio<br />
Preto, Leandro Gomes <strong>de</strong> Barros, Francisco das Chagas Ba‑<br />
tista e tantos outros –, gozavam <strong>de</strong> imensa popularida<strong>de</strong> e<br />
fixavam em seus versos, como reportagens vivas e palpitan‑<br />
tes, a vida do sertão, seus santos e cangaceiros, padre Cícero<br />
e Lampião, unidos pela mesma admiração, a admiração que<br />
o sertanejo tem pela bonda<strong>de</strong> e pela coragem.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o
VIAJANDO O SERTÃO<br />
4 a edição – 104 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1080 ‑2<br />
No longínquo ano <strong>de</strong> 1934, um jovem professor se‑<br />
cundário participou <strong>de</strong> uma viagem <strong>de</strong> observação pelo<br />
interior do Rio Gran<strong>de</strong> do Norte, organizada pelo interven‑<br />
tor do estado, na qual figuravam técnicos em educação,<br />
agricultura e açudagem. A sua missão consistia em levantar<br />
e mapear a realida<strong>de</strong> cultural e artística vista e vivida.<br />
O jovem professor chamava ‑se Luís da Câmara Cas‑<br />
cudo estava preparado como ninguém para a missão, <strong>de</strong>‑<br />
monstrando excelentes qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> observação, curiosi ‑<br />
da<strong>de</strong> insaciável, i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> com a alma sertaneja e um certo<br />
senso <strong>de</strong> humor, um pouco áspero, para amenizar a dureza<br />
da aventura. Foram <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 1.300 quilômetros percorridos<br />
<strong>de</strong> automóvel, <strong>de</strong> trem, <strong>de</strong> canoa, <strong>de</strong> rebocador, <strong>de</strong> hidroa‑<br />
vião, a pé, <strong>de</strong> ca<strong>de</strong>irinha, “<strong>de</strong>ntro d’água, na lama, nos mas‑<br />
sapés, pulando cercas, saltando, <strong>de</strong> pau em pau, os roçados<br />
que a enchente circundara, correndo nos panascos, empur‑<br />
rando o auto, trabalhando <strong>de</strong> pá, carregando maletas, le‑<br />
vando os companheiros no ombro, livrando os xique ‑xiques,<br />
galopando a cavalo”, além dos momentos <strong>de</strong> fome, frio, can‑<br />
saço, em pleno inverno do Sertão “ver<strong>de</strong> e resplen<strong>de</strong>nte na<br />
vitória pacífica das searas”.<br />
Essa é a origem <strong>de</strong> Viajando o Sertão, um dos primeiros<br />
livros <strong>de</strong> Mestre Cascudo, nascido, segundo o autor, dos in‑<br />
sistentes pedidos <strong>de</strong> amigos. Bendita insistência. Com todas<br />
as qualida<strong>de</strong>s que iriam consagrá ‑lo <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, o gran<strong>de</strong><br />
folclorista fixa, com riquezas <strong>de</strong> <strong>de</strong>talhe, a realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um<br />
mundo ainda repleto <strong>de</strong> reminiscências e valores medievais,<br />
com famílias dominando regiões e ditando “or<strong>de</strong>ns com a<br />
mentalida<strong>de</strong> feudal, fazendo justiça clan<strong>de</strong>stina”, mas já em<br />
acelerado processo <strong>de</strong> integração à vida mo<strong>de</strong>rna, uma mo‑<br />
<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> que ia mudar radicalmente realida<strong>de</strong> e valores,<br />
conforme revela Viajando o Sertão.<br />
L u í s d a C â m a r a C a s C u d o<br />
OBRAS DE LITERATURA INFANTIL E JUVENIL<br />
DO AUTOR<br />
• A princesa <strong>de</strong> Bambuluá<br />
• Contos <strong>de</strong> ani<strong>mais</strong> (prelo)<br />
• Contos <strong>de</strong> exemplo (prelo)<br />
• Contos tradicionais do Brasil para jovens<br />
• Couro <strong>de</strong> piolho<br />
• Facécias<br />
• Histórias <strong>de</strong> vaqueiros (prelo)<br />
• Lendas brasileiras para jovens<br />
• Maria Gomes<br />
• O marido da Mãe d’Água e A princesa e o gigante<br />
• O papagaio real<br />
• Vaqueiros e cantadores para jovens<br />
Ll u í s d a C â mM a r a C a s C u d o<br />
167
AMLB/Fundação Casa <strong>de</strong> Rui Barbosa<br />
C o l e ç ã o<br />
M a n u e l B a n d e i r a<br />
168<br />
Manuel Ban<strong>de</strong>ira (1886 ‑1968) nasceu no Recife e<br />
é até hoje consi<strong>de</strong>rado por muitos o maior poeta<br />
brasileiro do século XX. Fixou residência no Rio <strong>de</strong><br />
Janeiro nos <strong>anos</strong> 1910, on<strong>de</strong> lançou em 1917 seu<br />
primeiro livro, A cinza das horas. Apesar <strong>de</strong> não ter<br />
tomado parte pessoalmente da Semana <strong>de</strong> Arte Mo‑<br />
<strong>de</strong>rna realizada em São Paulo em 1922, apoiou ‑a e<br />
manteve contato intelectual com vários <strong>de</strong> seus par‑<br />
ticipantes, <strong>de</strong>ntre eles, Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. Lecionou<br />
literatura entre os <strong>anos</strong> <strong>de</strong> 1938 e 1943 no Colégio<br />
Pedro II, no Rio <strong>de</strong> Janeiro. Em 1940, foi eleito mem‑<br />
bro da Aca<strong>de</strong>mia Brasileira <strong>de</strong> Letras.<br />
Em seus poemas e em seus textos <strong>de</strong> prosa, Ban<strong>de</strong>ira<br />
toca <strong>de</strong> maneira singela e ao mesmo tempo ousada<br />
em aspectos do cotidiano urbano, nas relações fami‑<br />
liares e em toda sorte <strong>de</strong> dilemas hum<strong>anos</strong>. A coleção<br />
Manuel Ban<strong>de</strong>ira publicada pela <strong>Global</strong> <strong>Editora</strong> traz<br />
ao leitor os principais livros do habitante <strong>de</strong> Pasár‑<br />
gada, procurando conferir a eles o lugar <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque<br />
que ocupam no panteão da literatura brasileira, por<br />
meio <strong>de</strong> um cuidadoso processo <strong>de</strong> estabelecimento<br />
dos textos e <strong>de</strong> novos projetos gráficos.<br />
Digam que sou um homem sem orgulho<br />
Um homem que aceita tudo<br />
Que me importa?<br />
Eu quero a estrela da manhã
ESTRELA DA MANHÃ<br />
3 a edição – 96 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1703 ‑0<br />
A primeira edição <strong>de</strong> Estrela da manhã já surgiu como<br />
rarida<strong>de</strong>. Foram apenas cinquenta exemplares, impressos<br />
com capricho e assinados pelo autor, com capa <strong>de</strong> Santa<br />
Rosa e <strong>de</strong>senho <strong>de</strong> Portinari. O livro valorizava a mensagem<br />
do poeta, seu impulso <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> e <strong>de</strong> criação muito pes‑<br />
soal que, já naquela época, 1936, o apontava como um<br />
dos poetas <strong>mais</strong> originais e importantes da história da poesia<br />
no Brasil.<br />
Estrela da manhã reafirmava a posição assumida pelo<br />
poeta a partir <strong>de</strong> Libertinagem, seu livro anterior, a lingua‑<br />
gem irônica alcançando a plenitu<strong>de</strong> do coloquial, as nuan‑<br />
ças <strong>de</strong> humor trágico, a insistência na poética <strong>de</strong> ruptura<br />
com a tradição, a exploração do folclore negro, o tema do<br />
“poeta sórdido”, o interesse pela vertente social, a insus‑<br />
peitada nostalgia da pureza.<br />
O livro reúne alguns dos poemas <strong>mais</strong> importantes <strong>de</strong><br />
Ban<strong>de</strong>ira, pontos culminantes <strong>de</strong> sua poética, a começar<br />
pelo que dá título ao livro, que se inicia pela quadra patética,<br />
“Eu quero a estrela da manhã/ On<strong>de</strong> está a estrela da<br />
manhã?/ Meus amigos meus inimigos/ Procurem a estrela da<br />
manhã”, e termina com o apelo doloroso: “Procurem por<br />
toda parte/ Pura ou <strong>de</strong>gradada até a última baixeza/ Eu<br />
quero a estrela da manhã”. Em “Oração a Nossa Senhora da<br />
Boa Morte”, o poeta revela sua religiosida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sabor popu‑<br />
lar, tão brasileira. “Balada das três mulheres do sabonete<br />
Araxá” é uma variante mo<strong>de</strong>rna e um tanto irreverente <strong>de</strong><br />
um poema famoso <strong>de</strong> Luís Delfino, “As três irmãs”. Outros<br />
momentos marcantes do volume são o sintético e obsessivo<br />
“Poema do beco” (“Que importa a paisagem, a Glória, a<br />
baía, a linha do horizonte?/ – O que eu vejo é o beco”),<br />
“Momento num café”, “Tragédia brasileira”, “Conto cruel”,<br />
“Rondó dos cavalinhos”, “Marinheiro triste”, estrelas <strong>de</strong><br />
primeira gran<strong>de</strong>za da poesia brasileira.<br />
M a n u e l B a n d e i r a<br />
ESTRELA DA TARDE<br />
3 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1702 ‑3<br />
Estrela da tar<strong>de</strong> é livro da maturida<strong>de</strong>, obra crepuscu‑<br />
lar publicada em 1960, quando o poeta já superara a casa<br />
dos setenta <strong>anos</strong>, começava a meditar com <strong>mais</strong> profundi‑<br />
da<strong>de</strong> na passagem <strong>de</strong>sta vida para o outro lado do mistério<br />
e se mostrava convicto <strong>de</strong> ter cumprido bem a difícil missão<br />
<strong>de</strong> viver. Não é <strong>de</strong> se estranhar, pois, a presença <strong>mais</strong> ou<br />
menos obsessiva da morte, saudada com reverência, con‑<br />
formismo e curiosida<strong>de</strong>. “O meu dia foi bom, po<strong>de</strong> a noite<br />
<strong>de</strong>scer,/ (A noite com os seus sortilégios)”, sintetiza Ban‑<br />
<strong>de</strong>ira no poema “Consoada”.<br />
Mas, enquanto a “in<strong>de</strong>sejada das gentes” não vem, o<br />
poeta <strong>de</strong>ixa ‑se absorver, ainda uma vez, por motivos per‑<br />
manentes <strong>de</strong> sua obra, a paixão pela música, compondo<br />
uma “Letra para Heitor dos Prazeres” musicar, o amor, a<br />
amiza<strong>de</strong> fraternal que o leva a cantar amigos perdidos,<br />
Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> e Jayme Ovalle, o que, <strong>de</strong> certa forma,<br />
realça ainda <strong>mais</strong> a presença da morte.<br />
Símbolo da vida e da arte literária, revelando a paixão<br />
do poeta pela tradição, o soneto ocupa um lugar especial<br />
nesta coleção <strong>de</strong> poemas, atestando o virtuosismo inigua‑<br />
lável do sonetista “com o seu malicioso esplendor<br />
simbólico ‑parnasiano” (Lêdo Ivo), um dos maiores da lín‑<br />
gua. Basta ler “Mal sem mudança” e “Sonho branco”.<br />
Ao lado da tradição, o poeta se arrisca em tentadoras<br />
experiências na <strong>mais</strong> radical corrente poética da época: o<br />
concretismo. Os seis poemas concretos do livro <strong>de</strong>mons‑<br />
tram a luci<strong>de</strong>z e a curiosida<strong>de</strong> vivíssima do poeta.<br />
Estrela da tar<strong>de</strong>, com sua preocupação pela morte,<br />
simbolicamente se contrapõe à plenitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida <strong>de</strong> Estrela<br />
da manhã, encerrando um ciclo <strong>de</strong> extraordinária força<br />
criadora, com o poeta purificado em espírito, esperançoso<br />
<strong>de</strong> uma vida <strong>mais</strong> alta: “Sou nada, e entanto agora/ Eis ‑me<br />
centro finito/ Do círculo infinito/ De mar e céus afora./ –<br />
Estou on<strong>de</strong> está Deus”.<br />
169<br />
M a n u e l B a n d e i r a
ITINERÁRIO DE<br />
PASÁRGADA<br />
7 a edição – 184 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1712 ‑2<br />
Em 1954, já sagrado e consagrado como gran<strong>de</strong><br />
poeta, o quase setentão Manuel Ban<strong>de</strong>ira voltou os olhos<br />
para o passado em busca do tempo perdido, <strong>de</strong> suas expe‑<br />
riências e miragens e, em particular, <strong>de</strong> sua Pasárgada, es‑<br />
pécie <strong>de</strong> palavra mágica que o acompanhou por toda a<br />
vida. A fixação surgiu aos quinze <strong>anos</strong>, quando o jovem<br />
estudante <strong>de</strong>scobriu o nome <strong>de</strong>ssa cida<strong>de</strong>zinha fundada<br />
por Ciro, nas montanhas da Pérsia. A partir daí, durante<br />
alguns <strong>anos</strong> ele viveu em Pasárgada. Mais <strong>de</strong> vinte <strong>anos</strong><br />
<strong>de</strong>pois, num momento <strong>de</strong> <strong>de</strong>pressão e <strong>de</strong>sencanto, uma<br />
frase <strong>de</strong> quase libertação surgiu em sua mente: “Vou ‑me<br />
embora pra Pasárgada”. Símbolo <strong>de</strong> evasão, <strong>de</strong> “toda a<br />
vida que podia ter sido e que não foi”, como em seu verso<br />
famoso, Pasárgada acabou se tornando uma i<strong>de</strong>ntificação<br />
do itinerário da própria vida do poeta.<br />
Roteiro <strong>de</strong> uma vida, revivescência do passado, Itine‑<br />
rário <strong>de</strong> Pasárgada não é um livro <strong>de</strong> memórias no sentido<br />
tradicional. Franklin <strong>de</strong> Oliveira observou que se trata da<br />
“primeira biografia estritamente literária que se publica no<br />
Brasil – história da formação <strong>de</strong> uma inteligência poética e<br />
não apenas relato <strong>de</strong> uma vida <strong>de</strong> poeta”.<br />
Claro que essas duas vertentes se <strong>de</strong>senvolvem en‑<br />
trançadas, como os fios <strong>de</strong> um barbante, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o mo‑<br />
mento em que Ban<strong>de</strong>ira ganha consciência da vida, lá pelos<br />
três <strong>anos</strong> <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, e se emociona assistindo a uma corrida<br />
<strong>de</strong> bicicletas. Mais tar<strong>de</strong>, i<strong>de</strong>ntificou essa emoção circuns‑<br />
tancial com a emoção <strong>de</strong> natureza artística. “Des<strong>de</strong> esse<br />
momento, posso dizer que havia <strong>de</strong>scoberto o segredo da<br />
poesia, o segredo do meu itinerário em poesia”, confessa.<br />
Esse itinerário poético, tal como o roteiro <strong>de</strong> sua vida,<br />
<strong>de</strong>u muitas voltas, que o memorialista evoca com graça e a<br />
insuperável simplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seu estilo, <strong>de</strong>svendando para o<br />
leitor as mil e uma seduções <strong>de</strong> seu mundo, <strong>de</strong> sua Pasárgada.<br />
170<br />
M a n u e l B a n d e i r a<br />
OBRAS DE LITERATURA INFANTIL E JUVENIL<br />
DO AUTOR<br />
• Manuel Ban<strong>de</strong>ira crônicas para jovens<br />
• Na rua do Sabão<br />
• Os sinos<br />
• Trem <strong>de</strong> ferro<br />
M a n u e l B a n d e i r a
Arquivo Palma B. Donato<br />
C o l e ç ã o<br />
M a r C o s r e y<br />
Pseudônimo <strong>de</strong> Edmundo Nonato, nasceu em São<br />
Paulo, em 1925. Estreou em 1953 com a novela Um<br />
gato no triângulo. Sete <strong>anos</strong> <strong>de</strong>pois publicaria o ro‑<br />
mance Café na cama, um dos best ‑sellers dos <strong>anos</strong><br />
1960. Seguiram ‑se O enterro da cafetina, Memórias<br />
<strong>de</strong> um gigolô, Soy loco por ti, América!, O pêndulo<br />
da noite e O cão da meia ‑noite, entre outros. Escritor<br />
versátil, já era conhecido pela qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seus con‑<br />
tos antes <strong>de</strong> começar a escrever para o público infan‑<br />
tojuvenil. Falecido em 1999, suas cinzas, transportadas<br />
num helicóptero, foram espalhadas sobre a cida<strong>de</strong><br />
que consagrou como cenário <strong>de</strong> seus contos e ro‑<br />
mances: São Paulo.<br />
O Brasil é um dos maiores países do mundo em<br />
comprimento e largura. O Atlântico é a nossa banheira.<br />
As residências po<strong>de</strong>riam ser térreas, ajardinadas,<br />
espaçosas e baratas. Gostaria <strong>de</strong> ver o carteiro todas as<br />
manhãs <strong>de</strong> uniforme limpo, ro<strong>de</strong>ado <strong>de</strong> crianças e<br />
cachorros. Mas há toda uma arquitetura do <strong>de</strong>sconforto,<br />
que <strong>de</strong>ve ren<strong>de</strong>r bilhões... Estamos sendo apertados<br />
entre pare<strong>de</strong>s como nos filmes <strong>de</strong> terror.<br />
171
A ÚLTIMA CORRIDA<br />
3 a edição – 176 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1333 ‑9<br />
Em A última corrida, encontramos Marcos Rey no<br />
auge <strong>de</strong> suas qualida<strong>de</strong>s como narrador. Plena consciência<br />
<strong>de</strong> seu ofício, dosada com ironia, sarcasmo, mordacida<strong>de</strong>.<br />
Texto enxuto, fluente, preciso. Com sua insuperável técnica<br />
<strong>de</strong> contador <strong>de</strong> histórias, ele conduz o leitor aos meandros<br />
e bastidores do mundo do turfe, on<strong>de</strong> se <strong>de</strong>senrola a pe‑<br />
quena saga <strong>de</strong> um jovem inescrupuloso, ansioso por vencer<br />
na vida, apaixonado por uma prostituta, mas com um certo<br />
fundo <strong>de</strong> pureza, uma pureza mesclada <strong>de</strong> maus pensa‑<br />
mentos, a um <strong>de</strong>do da canalhice, como é peculiar a muitos<br />
heróis <strong>de</strong> Marcos Rey.<br />
O ambiente é pitoresco, com uma fauna exótica, com a<br />
cabeça sempre voltada para as patas dos cavalos. São trata‑<br />
dores, jóqueis, proprietários, viciados sôfregos que, ao longo<br />
da narrativa, vão canalizando sonhos e esperanças para um<br />
velho cavalo, prestes a encerrar a sua carreira: Marujo.<br />
Cuidado como um ser humano por seu tratador – um<br />
velho profissional do ramo, honesto e competente, áspero<br />
como um cacto, mas com uma aspereza que escon<strong>de</strong> uma<br />
sensibilida<strong>de</strong> aguda –, Marujo se transforma numa espécie<br />
<strong>de</strong> metáfora dos sonhos e esperanças <strong>de</strong> todos que espe‑<br />
ram que ele vença sua última corrida.<br />
Nela, <strong>de</strong> certa forma, todos pensam em encher os bol‑<br />
sos <strong>de</strong> dinheiro, mas também tonificar a alma com a espe‑<br />
rança <strong>de</strong> que nem tudo é ruim na vida. Há sempre um<br />
último páreo, no qual vale a pena apostar.<br />
Com sua habitual curiosida<strong>de</strong> e compaixão por seus<br />
personagens, Marcos Rey oferece ao leitor um <strong>de</strong>sfile ines‑<br />
quecível <strong>de</strong> seres hum<strong>anos</strong> frágeis e solitários, mas astutos,<br />
sempre à espera <strong>de</strong> dar um bote certeiro para equilibrar a<br />
vida, como são seus personagens, envolvidos numa história<br />
que cresce <strong>de</strong> intensida<strong>de</strong> à medida que se aproxima da<br />
reta <strong>de</strong> chegada, como uma corrida <strong>de</strong>cisiva para o aposta‑<br />
dor angustiado.<br />
172<br />
M a r c o s r e y<br />
CAFÉ NA CAMA<br />
9 a edição – 384 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1536 ‑4<br />
Café na cama é um dos primeiros livros da saga <strong>de</strong><br />
malandragem e <strong>de</strong> vidas tortas construída por Marcos Rey<br />
ao longo <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> quarenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> intensa ativida<strong>de</strong> lite‑<br />
rária. Publicado em 1960, o romance encontrou imediata<br />
repercussão popular, figurando por várias semanas na lista<br />
<strong>de</strong> best ‑sellers. Nele, estão presentes todas as características<br />
literárias que consagraram o autor: a ironia contun<strong>de</strong>nte,<br />
que se confun<strong>de</strong> muitas vezes com o puro sarcasmo, a visão<br />
<strong>de</strong> aspectos menos nobres da vida humana, a violência do<br />
cotidiano, abordados com uma dureza e impieda<strong>de</strong> que o<br />
escritor, <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, classificaria <strong>de</strong> “realismo cru”.<br />
Como boa parte <strong>de</strong> sua obra, Café na cama se <strong>de</strong>sen‑<br />
rola numa São Paulo <strong>de</strong>sconhecida pela maioria <strong>de</strong> seus<br />
moradores, uma cida<strong>de</strong> noturna e misteriosa, povoada por<br />
boêmios, gozadores, garotas <strong>de</strong> programa. É nesse am‑<br />
biente <strong>de</strong> sedução e perversida<strong>de</strong> que mergulha <strong>de</strong> ponta‑<br />
‑cabeça uma jovem e bela ex ‑manicure e ex ‑balconista<br />
suburbana, cujo gran<strong>de</strong> sonho é po<strong>de</strong>r algum dia tomar<br />
café, <strong>de</strong> ban<strong>de</strong>ja, servido na cama. Com a volúpia <strong>de</strong> as‑<br />
censão social e <strong>de</strong> in<strong>de</strong>pendência financeira, ela se prostitui<br />
e passa a conviver com gente da “alta socieda<strong>de</strong>” paulis‑<br />
tana, frequentadores da boemia da década <strong>de</strong> 1950, grã‑<br />
‑finos <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ntes, empresários inescrupulosos, malandros<br />
e arrivistas profissionais, para logo perceber o vazio, a falta<br />
<strong>de</strong> sentido e a <strong>de</strong>cadência <strong>de</strong>ssas vidas, o que não a im‑<br />
pe<strong>de</strong> <strong>de</strong> aceitar as duras regras do jogo e prosseguir na<br />
busca <strong>de</strong> seu sonho, que o autor apresenta com o seu ha‑<br />
bitual humor e impieda<strong>de</strong>.<br />
Café na cama é romance para ser lido a qualquer hora<br />
do dia ou da noite, <strong>de</strong> preferência na cama, com o café<br />
servido <strong>de</strong> ban<strong>de</strong>ja.<br />
M a r c o s r e y
ENTRE SEM BATER<br />
2 a edição – 216 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1475 ‑6<br />
Segundo romance <strong>de</strong> Marcos Rey, publicado original‑<br />
mente em folhetim na Última Hora <strong>de</strong> São Paulo, durante<br />
três meses, Entre sem bater já tem todas as características<br />
que consagraram o autor paulistano: movimentação, estilo<br />
leve e enxuto, personagens vivos e palpitantes, uma trama<br />
bem urdida e envolvente, alinhavada com ironia e sar‑<br />
casmo. Como sempre, a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo é cenário e<br />
personagem, tão envolvidas estão as criaturas que <strong>de</strong>sfilam<br />
diante dos olhos do leitor com a vida da cida<strong>de</strong>, suas ruas<br />
e avenidas, suas boates escuras, os restaurantes caros, o<br />
mundo das corridas <strong>de</strong> cavalos, os escritórios, on<strong>de</strong> se<br />
constroem fortunas e o po<strong>de</strong>r proporcionado pelo dinheiro,<br />
que irá pesar <strong>de</strong>cisivamente no <strong>de</strong>stino dos personagens.<br />
<strong>Nesses</strong> ambientes, <strong>de</strong>senrola ‑se a história <strong>de</strong> um<br />
jovem ambicioso, Ricardo, disposto a quase tudo para as‑<br />
cen<strong>de</strong>r na vida e libertar ‑se do passado <strong>de</strong> miséria e insegu‑<br />
rança que lhe marcara a juventu<strong>de</strong>. A transformação se<br />
acelera quando conhece uma bela mulher, que se torna sua<br />
companheira. Os dois parecem feitos um para o outro,<br />
como a mão para a luva, para se empregar uma metáfora<br />
machadiana, e <strong>de</strong>sfrutam, sem inquietação, os bens con‑<br />
quistados através <strong>de</strong> uma ativida<strong>de</strong> profissional persistente<br />
e criativa <strong>de</strong> Ricardo: apartamento <strong>de</strong> luxo, carro requin‑<br />
tado, belas aparências. Um mundo que parecia sólido, mas<br />
começa a <strong>de</strong>smoronar quando o patrão do rapaz passa a<br />
participar e intervir na vida comum do casal, fascinado pela<br />
bela mulher <strong>de</strong> seu empregado, criando uma situação equí‑<br />
voca e constrangedora que mostra que Ricardo, para man‑<br />
ter seu lugar ao sol, apesar <strong>de</strong> todo o sofrimento, é capaz<br />
<strong>de</strong> tudo. A cena final é antológica, uma espécie <strong>de</strong> fecho<br />
<strong>de</strong> ouro ao romance, que mantém, hoje, o mesmo encanto<br />
e apelo <strong>de</strong> quando <strong>de</strong> sua primeira publicação, abrindo as<br />
suas portas ao leitor. Entre sem bater.<br />
M a r c o s r e y<br />
ESTA NOITE OU NUNCA<br />
5 a edição – 208 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1341 ‑4<br />
A trama é envolvente, a época, dilacerante. Tempos<br />
da revolução <strong>de</strong> 1964. Medo no ar. Angústia. Inquietação.<br />
Um escritor premiado, amputado pela censura e perse‑<br />
guido pela ditadura. Num beco sem saída. Uma tímida lu‑<br />
zinha no fim do túnel começa a brilhar, quando ele se torna<br />
roteirista <strong>de</strong> filmes <strong>de</strong> pornochanchada, no famoso quar‑<br />
teirão da rua do Triumpho, a Hollywood dos pobres, na<br />
Boca do Lixo <strong>de</strong> São Paulo.<br />
A pequena odisseia do roteirista, espécie <strong>de</strong> pícaro do<br />
mundo das letras, é narrada na primeira pessoa. Com iro‑<br />
nia e um escorregadio sarcasmo, datilografando seu texto<br />
num minúsculo apartamento <strong>de</strong> frente para o Minhocão,<br />
ele conta a dura sobrevivência, num ambiente comprimido<br />
entre a pobreza e a marginalida<strong>de</strong>, numa região <strong>de</strong> bares e<br />
boates da pesada, povoado por uma inesquecível galeria<br />
<strong>de</strong> criaturas à margem da socieda<strong>de</strong>: atrizes <strong>de</strong> filmes por‑<br />
nôs, pseudointelectuais, agentes <strong>de</strong> repressão.<br />
Esta noite ou nunca tem um fundo autobiográfico.<br />
Entre 1970 e 1974, um “período negro <strong>de</strong> minha vida”,<br />
Marcos Rey tornou ‑se o roteirista <strong>mais</strong> solicitado do quar‑<br />
teirão do bar ‑restaurante Soberano, na rua do Triumpho.<br />
Era uma tarefa dura. Tinha <strong>de</strong> agradar o público e satisfazer<br />
os censores, “sempre <strong>de</strong> tesoura em punho, cortando<br />
cenas e mutilando filmes inteiros”, gerando um ambiente<br />
<strong>de</strong> baixo ‑astral, “capaz <strong>de</strong> enlouquecer o próprio Natha‑<br />
nael West, que em seu O dia do gafanhoto <strong>de</strong>screveu o<br />
pesa<strong>de</strong>lo californiano dos extras <strong>de</strong> Hollywood”.<br />
O difícil foi transformar esse material caótico, paté‑<br />
tico, maldito, quase trágico, que insistia em sair da pena do<br />
autor, em forma jornalística, num romance puro, sem ranço<br />
<strong>de</strong> documentário, “uma curtição literária para quem se far‑<br />
tou do comedido e das velhas receitas”, o que Marcos Rey<br />
conseguiu plenamente.<br />
M a r c o s r e y<br />
173
MALDITOS PAULISTAS<br />
2 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1688 ‑0<br />
Malditos paulistas, como gran<strong>de</strong> parte da obra <strong>de</strong><br />
Marcos Rey, se <strong>de</strong>senrola em São Paulo, cida<strong>de</strong> que ele<br />
amava e da qual conhecia até os alçapões e buracos dos<br />
ratos. Sobretudo, dos ratos hum<strong>anos</strong>, aqueles que fazem<br />
da malandragem e da esperteza – no sentido brasileiro e<br />
malicioso da palavra – um meio <strong>de</strong> sobrevivência e, por<br />
vezes, <strong>de</strong> enriquecimento.<br />
A diferença do romance em relação aos <strong>de</strong><strong>mais</strong> é que<br />
o herói <strong>de</strong>ste livro (se é que existem heróis na obra <strong>de</strong> Mar‑<br />
cos Rey) é um carioca perdido na Pauliceia, on<strong>de</strong> fora ten‑<br />
tar a vida <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> inúmeros fracassos. É ele quem narra<br />
suas aventuras, venturas e <strong>de</strong>sventuras paulistanas.<br />
Com seu habitual cinismo e humor corrosivo, Marcos<br />
Rey mistura em doses precisas o picaresco e o policial para<br />
embalar o leitor numa história repleta <strong>de</strong> peripécias e <strong>de</strong><br />
suspense, mas que não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser também um romance<br />
<strong>de</strong> costumes, um corte transversal nos diversos segmentos<br />
sociais da capital paulista.<br />
Empregado como motorista na casa do milionário Pa‑<br />
leardi, Raul, o Carioca, <strong>de</strong>scobre na garagem da casa do pa‑<br />
trão um boneco parecido com a Carmen Miranda que,<br />
sabe ‑se lá por qual razão, aguça seu senso <strong>de</strong> Sherlock. A<br />
partir <strong>de</strong>sse fato prosaico, a ação se acelera: o narrador se<br />
torna amante da patroa, para logo ser <strong>de</strong>sprezado, é acusado<br />
<strong>de</strong> furto <strong>de</strong> joias, conhece a prisão, retorna ao emprego, co‑<br />
nhece um novo amor, é expulso novamente da mansão, <strong>de</strong>s‑<br />
cobre a joia que fora acusado <strong>de</strong> roubar, recupera o bom<br />
nome e <strong>de</strong>svenda o mistério da fortuna do patrão.<br />
Como em toda a sua obra, Marcos Rey expõe aqui a<br />
sua <strong>de</strong>silusão, mas também a sua tolerância, com o ser<br />
humano, egoísta e interesseiro, acionado pelos mecanis‑<br />
mos do sexo e da ambição, num mundo dissoluto e mal‑<br />
dito. Malditos hum<strong>anos</strong>!<br />
174<br />
M a r c o s r e y<br />
MANO JUAN<br />
1 a edição – 144 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑1035 ‑2<br />
Marcos Rey sabia como ninguém envolver o leitor em<br />
aventuras e pren<strong>de</strong>r a sua atenção. Mago e mágico da pala‑<br />
vra escrita, <strong>de</strong>scobria na São Paulo imensa e movimentada,<br />
que todo mundo vê, uma cida<strong>de</strong> misteriosa, fascinante, na<br />
qual se <strong>de</strong>senrolavam peripécias e atropelos <strong>de</strong> tirar o fôlego,<br />
como vemos neste Mano Juan. Sem forçar a barra e falando<br />
apenas pelo interesse que <strong>de</strong>spertam, seus livros são tão<br />
apaixonantes quanto as obras <strong>de</strong> Alexandre Dumas ou ou‑<br />
tros mestres do romance <strong>de</strong> aventura.<br />
Só que os heróis do mundo atual não usam capa e es‑<br />
pada, não frequentam palácios, nem manejam com habilida<strong>de</strong><br />
a espada, mas se vestem <strong>de</strong> jeans ou ternos, andam por corti‑<br />
ços e muquifos e, em casos extremos, utilizam revólveres.<br />
A época não é <strong>mais</strong> a dos reis franceses românticos e<br />
i<strong>de</strong>alizados, mas a década <strong>de</strong> 1970, no Brasil, dura, brutal,<br />
com a ditadura atenta como um cão <strong>de</strong> guarda, pronta a<br />
pren<strong>de</strong>r e torturar. Nesse ambiente tenso, Juan, um guerri‑<br />
lheiro boliviano, foge para São Paulo, em busca <strong>de</strong> uma pos‑<br />
sível ajuda. A partir daí, fatos e episódios galopam diante dos<br />
olhos do leitor, envolvido pela atmosfera daqueles dias,<br />
numa narrativa meio realida<strong>de</strong>, meio pesa<strong>de</strong>lo, em ambien‑<br />
tes on<strong>de</strong> se misturam política e submundo, retratados com<br />
a justeza e a fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> <strong>de</strong> quem os conhecia por <strong>de</strong>ntro.<br />
Os pesa<strong>de</strong>los, contratempos, bons momentos e <strong>de</strong>ses‑<br />
peros dos personagens são acompanhados por um autor<br />
irônico, sarcástico, por vezes bem ‑humorado, ora brutal,<br />
ora gozador, sempre implacável, revelando sua <strong>de</strong>scrença<br />
em relação ao bicho ‑homem, mas fazendo questão cerrada<br />
<strong>de</strong> ocultar sua ternura, ou até mesmo sua simpatia. Este<br />
Mano Juan, como observa Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão no<br />
prefácio, “é a amostra viva da maestria <strong>de</strong> Marcos Rey –<br />
sua maneira <strong>de</strong> contar fácil e como é difícil narrar com fa‑<br />
cilida<strong>de</strong> e simplicida<strong>de</strong>”.<br />
M a r c o s r e y
MEMÓRIAS DE UM<br />
GIGOLÔ<br />
22 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1537 ‑1<br />
Memórias <strong>de</strong> um gigolô assinala um momento <strong>de</strong><br />
renovação da ficção <strong>de</strong> Marcos Rey. O espírito é o<br />
mesmo dos livros anteriores e <strong>de</strong> toda a sua obra, a<br />
velha picardia, a saborosa malícia, o permanente mer‑<br />
gulho no mundo dos <strong>de</strong>sclassificados sociais, o sar‑<br />
casmo mal disfarçado contra a hipocrisia social. A<br />
novida<strong>de</strong> é que com esses elementos, permanentes em<br />
sua obra, o autor construiu um romance que, com al‑<br />
guma ousadia, po<strong>de</strong>ríamos chamar <strong>de</strong> romance <strong>de</strong><br />
tese. Ou, talvez, uma antítese, se pon<strong>de</strong>rarmos a sua<br />
origem. Afinal, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r teses, ou escrevê ‑las, é coisa<br />
<strong>de</strong> doutor, e o livro é um <strong>de</strong>poimento em primeira pes‑<br />
soa <strong>de</strong> um explorador <strong>de</strong> mulheres, um cafetão, um<br />
cafifa, um gigolô, ou outro termo qualquer com que<br />
se classifica o representante <strong>de</strong>ssa profissão amaldiço‑<br />
ada pela socieda<strong>de</strong>, embora vista com inveja por muita<br />
gente boa. Evi<strong>de</strong>nte que essa colocação nos <strong>de</strong>scerra<br />
uma visão dura, mas por vezes agridoce da socieda<strong>de</strong>.<br />
E ao mesmo tempo, ela humaniza o personagem, ma‑<br />
treiro, apren<strong>de</strong>ndo com sua própria experiência a se<br />
afirmar no submundo e que, ao pon<strong>de</strong>rar sobre sua<br />
trajetória <strong>de</strong> vida, conclui que não fora um fracasso<br />
total e, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo do ângulo <strong>de</strong> visão, po<strong>de</strong>mos<br />
acrescentar, talvez seja até um triunfador, se o enca‑<br />
rarmos como um simples profissional, convenções so‑<br />
ciais à parte. Afinal, como observa Marcos Rey,“há<br />
profissões <strong>mais</strong> pecaminosas que a <strong>de</strong> gigolô, embora<br />
<strong>mais</strong> cercadas <strong>de</strong> respeitabilida<strong>de</strong>. Não convém<br />
enumerá ‑las aqui. O marginal é sempre o menos res‑<br />
ponsável pela sua marginalida<strong>de</strong>, e simpatizar ‑se com<br />
ele é uma forma, tímida embora, <strong>de</strong> reprovação ao<br />
organismo social que o criou.”<br />
M a r c o s r e y<br />
O CÃO DA MEIA NOITE<br />
5 a edição – 216 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0995 ‑8<br />
O cão da meia ‑noite reúne os melhores contos <strong>de</strong> Mar‑<br />
cos Rey. O cenário é São Paulo, não a cida<strong>de</strong> dos executivos,<br />
do comércio intenso, das gran<strong>de</strong>s empresas situadas na ave‑<br />
nida Paulista, mas uma São Paulo que começa a viver<br />
quando a noite cai, habitada por uma fauna humana exótica<br />
aos olhos dos que vivem <strong>de</strong> dia, seres atormentados, quase<br />
<strong>de</strong> outro mundo, frequentadores <strong>de</strong> bares, em busca <strong>de</strong> uma<br />
aventura sexual barata, alcoólatras, a gente da noite.<br />
Nos oito contos do livro a presença dominante é a<br />
solidão humana das gran<strong>de</strong>s metrópoles mo<strong>de</strong>rnas, e os<br />
problemas <strong>de</strong>la <strong>de</strong>correntes: a incomunicabilida<strong>de</strong> entre as<br />
criaturas, o vale ‑tudo para se conseguir dinheiro ou chegar<br />
ao prazer, o egoísmo, a esperteza em todos os seus mati‑<br />
zes, registradas com ironia, sarcasmo, humor corrosivo.<br />
Com domínio absoluto da técnica do conto, sabendo<br />
como <strong>de</strong>senvolver uma história, pren<strong>de</strong>r o leitor e só soltá ‑lo<br />
na última linha, Marcos Rey apresenta, <strong>de</strong> forma quase im‑<br />
piedosa, os personagens <strong>de</strong> seu mundo.<br />
São escribas <strong>de</strong> alma contraditória, oscilando entre a pie‑<br />
da<strong>de</strong> e a cruelda<strong>de</strong>, mas ainda com um resto <strong>de</strong> sentimento<br />
humano, como o notívago <strong>de</strong> “O cão da meia ‑noite”, obra‑<br />
‑prima, um dos <strong>mais</strong> belos contos <strong>de</strong> ani<strong>mais</strong> da literatura<br />
brasileira; o maníaco <strong>de</strong>sequilibrado <strong>de</strong> “Eu e meu Fusca”; a<br />
pequena odisseia <strong>de</strong> um publicitário <strong>de</strong>sempregado (“O bar<br />
dos cento e tantos dias”); uma noite <strong>de</strong> <strong>de</strong>sencontros numa<br />
reunião <strong>de</strong> gente endinheirada (“A escalação”); a <strong>de</strong>silusão<br />
do motorista <strong>de</strong> táxi interessado em política (“O adhema‑<br />
rista”); a festa na mansão <strong>de</strong> um magnata, com farto con‑<br />
sumo <strong>de</strong> álcool e lança ‑perfume (“Soy loco por ti, América!”);<br />
a noite felliniana <strong>de</strong> alguns amigos até a madrugada (“Traje<br />
<strong>de</strong> rigor”); o jogo <strong>de</strong> engana ‑engana entre um artista e seu<br />
secretário, pela posse <strong>de</strong> uma mulher (“Mustang cor <strong>de</strong> san‑<br />
gue”); retratos do vazio existencial da gente da noite.<br />
M a r c o s r e y<br />
175
O CASO DO FILHO DO<br />
ENCADERNADOR<br />
ROMANCE DA VIDA DE UM<br />
ROMANCISTA<br />
3 a edição – 152 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1656 ‑9<br />
O reencontro com um livro <strong>de</strong> Marcos Rey é sempre gra‑<br />
tificante. Esgotado há alguns <strong>anos</strong>, O caso do filho do enca‑<br />
<strong>de</strong>rnador, subtitulado “Romance da vida <strong>de</strong> um romancista”,<br />
surge, para muita gente, como uma novida<strong>de</strong>. Escrito com a<br />
malícia, o bom humor e a ironia por vezes ferina, peculiar ao<br />
autor, é uma autobiografia romanceada, um reencontro do<br />
homem maduro com o menino e o jovem que ele foi um dia,<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o instante em que os seus “sentidos <strong>de</strong>spertaram, igual<br />
a uma lâmpada que acen<strong>de</strong>”, até o momento em que o es‑<br />
critor consagrado encontra sua própria imagem no espelho e<br />
medita sobre sua longa trajetória <strong>de</strong> vida.<br />
Nascido em ambiente doméstico humil<strong>de</strong>, filho <strong>de</strong> um<br />
gráfico e enca<strong>de</strong>rnador, teve pelo menos um handicap: toda<br />
a família gostava <strong>de</strong> ler, o pai, a mãe, presbiteriana, leitora<br />
da Bíblia, os irmãos. Cedo <strong>de</strong>scobriu o prazer dos mundos<br />
paralelos da ficção – primeiro nas histórias em quadrinhos,<br />
mas o que <strong>mais</strong> gostava era ouvir o pai lendo obras como As<br />
mil e uma noites. O menino voava, encarnava ‑se nos heróis<br />
cujas peripécias ouvia, e divagava. Um mundo maravilhoso.<br />
Mais tar<strong>de</strong>, entregou ‑se à literatura. Graças ao irmão, tam‑<br />
bém escritor, Mário Donato, inicia as suas ativida<strong>de</strong>s literá‑<br />
rias, colaborando em revistas. Surgia o futuro escritor.<br />
Em paralelo à sua vida, aos dias <strong>de</strong> boemia na juven‑<br />
tu<strong>de</strong>, aos primeiros sucessos <strong>de</strong> público e <strong>de</strong> crítica, à pai‑<br />
xão pela esposa, Marcos Rey traça um panorama do<br />
mundo e do Brasil a partir da difícil fase da Segunda Guerra<br />
Mundial e do governo <strong>de</strong> Getúlio Vargas.<br />
Quase memórias, O caso do filho do enca<strong>de</strong>rnador<br />
po<strong>de</strong> ser visto também como uma lição <strong>de</strong> vida e persistên‑<br />
cia, nas palavras do autor, “a luta <strong>de</strong> um escritor, que não<br />
veio das camadas privilegiadas da socieda<strong>de</strong>, para manter<br />
seu i<strong>de</strong>al, apesar <strong>de</strong> todas as adversida<strong>de</strong>s” e se consagrar<br />
como um dos autores <strong>mais</strong> populares <strong>de</strong> seu tempo.<br />
176<br />
M a r c o s r e y<br />
O ENTERRO<br />
DA CAFETINA<br />
4 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0977 ‑X<br />
O mundo dos personagens <strong>de</strong> Marcos Rey começa<br />
quando o sol se põe e a noite cai sobre a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo.<br />
Então, boêmios, garotas <strong>de</strong> programa, gigolôs, guerrilheiros<br />
urb<strong>anos</strong> (o livro foi escrito nos dias da ditadura militar), dan‑<br />
çarinas <strong>de</strong> cabarés, taxi ‑girls, alcoólatras começam a sair das<br />
tocas, como ratos famintos, em busca <strong>de</strong> aventuras, <strong>de</strong> diver‑<br />
timento, <strong>de</strong> um trouxa, <strong>de</strong> um trocado, <strong>de</strong> uma garrafa <strong>de</strong><br />
álcool, ou do simples e exato exercício <strong>de</strong> suas profissões.<br />
Como diz o autor, “são homens e mulheres que<br />
param nos bares, restaurantes, inferninhos, cabarés, boates<br />
e em certas casas on<strong>de</strong> tudo se tolera”, por vocação ou<br />
erro <strong>de</strong> educação, dor <strong>de</strong> cotovelo ou outra dor qualquer,<br />
vagabundagem. A noite paulistana, seus mistérios e misé‑<br />
rias, faz a unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> O enterro da cafetina, atando os sete<br />
contos entre si e formando um gran<strong>de</strong> painel.<br />
O que contam essas histórias? Coisas terríveis que<br />
acontecem na noite, como diz a Bíblia, mas também casos<br />
surpreen<strong>de</strong>ntes, quase patéticos, insuspeitas generosida‑<br />
<strong>de</strong>s. Noitadas <strong>de</strong> amigos, regadas a muito álcool, que ter‑<br />
minam <strong>de</strong> forma trágica; o gigolô bem ‑sucedido, homem<br />
<strong>de</strong> muitas mulheres, apaixonado por uma moça <strong>de</strong> família,<br />
a quem auxilia financeiramente; a morte e o enterro retum‑<br />
bante da velha cafetina; jogos <strong>de</strong> sedução em que cada um<br />
procura lograr o outro; a ação <strong>de</strong> guerrilheiros <strong>mais</strong> ou<br />
menos trapalhões; um caso <strong>de</strong> ciúmes neurótico; o redator<br />
alcoólatra lutando pela sobrevivência.<br />
Com um texto fluente, enxuto e domínio absoluto do<br />
conto, Marcos Rey acompanha com naturalida<strong>de</strong> e sar‑<br />
casmo, por vezes zombeteiro, as pequenas odisseias <strong>de</strong><br />
suas criaturas, trituradas pela cida<strong>de</strong> gran<strong>de</strong>, incapazes<br />
<strong>de</strong> encontrar um sentido para a vida e se lixando para isso,<br />
interessadas apenas em viver o imediato. Como autênticas<br />
criaturas da noite.<br />
M a r c o s r e y
O PÊNDULO DA NOITE<br />
2 a edição – 184 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0992 ‑3<br />
Em O pêndulo da noite encontramos um Marcos Rey em<br />
plena forma: irônico, cético em relação à humanida<strong>de</strong>, por<br />
vezes <strong>de</strong>bochado. As narrativas <strong>de</strong>slizam como um carro<br />
numa pista <strong>de</strong> alta velocida<strong>de</strong>. Texto exato, sem palavras a<br />
<strong>mais</strong> e sem preciosismos, a gíria bem empregada, quando<br />
necessário o palavrão. Diálogos vivos. Personagens marcados<br />
pela existência, ásperos, prisioneiros do sistema <strong>de</strong> vida da<br />
cida<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna (São Paulo), alguns vivendo em quiti‑<br />
netes mínimas, fábricas <strong>de</strong> neuroses, ou em pensões baratas.<br />
São vigaristas <strong>de</strong> todas as espécies, assaltantes, pros‑<br />
titutas, psicopatas, jornalistas que mal ganham para comer,<br />
espertalhões, artistas <strong>de</strong> sucesso, ingênuos (o que seria dos<br />
espertos sem eles?). E também ricaços da alta socieda<strong>de</strong>,<br />
satirizados <strong>de</strong> maneira implacável.<br />
Nesse mundo quase pitoresco, a um <strong>de</strong>do da margina‑<br />
lida<strong>de</strong>, predomina um sentimento <strong>de</strong> amarga frustração e <strong>de</strong><br />
permanente solidão, uma absoluta incapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> comuni‑<br />
cação entre os seres hum<strong>anos</strong>, perdidos na selva <strong>de</strong> pedra,<br />
como ani<strong>mais</strong> <strong>de</strong> espécies diferentes. Cada um procura en‑<br />
ganar o outro, na busca <strong>de</strong> suas conveniências, vantagens<br />
pessoais ou prazeres imediatos (“Mustang cor <strong>de</strong> sangue”).<br />
Há os frustrados, que per<strong>de</strong>m qualquer escrúpulo para<br />
alcançar seus fins, mas que po<strong>de</strong>m apenas estar cavando a<br />
própria ruína, como no sarcástico “O dicionarista”.<br />
Mas o autor acredita que nem tudo está perdido, pelo<br />
menos enquanto houver otários como o personagem <strong>de</strong> “O<br />
bolha”, ou figuras com um resto <strong>de</strong> sentimento humano<br />
como o herói <strong>de</strong> “O cão da meia ‑noite”, um dos <strong>mais</strong> belos<br />
contos <strong>de</strong> ani<strong>mais</strong> da literatura brasileira, ponto alto do livro,<br />
ao lado <strong>de</strong> “Eu e meu Fusca”. Um livro com “a força <strong>de</strong> uma<br />
<strong>de</strong>núncia”, como observa João Antônio, que achará seu<br />
lugar “aos trompaços, socos e pontapés”, tal como as coisas<br />
acontecem na socieda<strong>de</strong> brasileira atual.<br />
M a r c o s r e y<br />
ÓPERA DE SABÃO<br />
Prelo<br />
Em Ópera <strong>de</strong> sabão o leitor encontra o melhor da ficção<br />
<strong>de</strong> Marcos Rey. Sarcástico, duro em certos momentos, mas<br />
com um leve fundo <strong>de</strong> pieda<strong>de</strong> pelo bicho ‑homem, o ro‑<br />
mance retrata uma família paulistana abalada e revoltada<br />
com o suicídio <strong>de</strong> Getúlio Vargas, em agosto <strong>de</strong> 1954. O<br />
conhecimento da tragédia, como em tantos outros lares bra‑<br />
sileiros, chegou aos personagens através das ondas do rádio,<br />
então o gran<strong>de</strong> veículo <strong>de</strong> comunicação popular. A televisão<br />
apenas engatinhava e só os ricos tinham aparelhos em casa.<br />
O próprio título alu<strong>de</strong> ao rádio, objeto <strong>de</strong> paixão do<br />
autor. “Ópera <strong>de</strong> sabão” é a tradução em português <strong>de</strong><br />
soap operas, nome dado às radionovelas nos Estados Uni‑<br />
dos, pelo fato <strong>de</strong> serem sempre patrocinadas por sabões e<br />
sabonetes.<br />
Sem ser um romance histórico, no sentido estrito do<br />
termo, a obra entrelaça o fundo histórico com a realida<strong>de</strong><br />
cotidiana dos personagens, reconstituindo com fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong><br />
os <strong>anos</strong> 1950, década <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s transformações na vida<br />
nacional. Foi a época em que a publicida<strong>de</strong> se cristalizou,<br />
as boates entraram na vida dos jovens e a violência urbana<br />
começava a se revelar, mas as radionovelas, esses “folhe‑<br />
tins <strong>de</strong> ouvido”, continuavam imbatíveis na preferência dos<br />
brasileiros. Neste mundo encontramos personagens sem‑<br />
pre hum<strong>anos</strong>, típicos do período, como o pai <strong>de</strong> família<br />
que, como tantos brasileiros <strong>de</strong> então, planeja vingar Ge‑<br />
túlio matando Calos Lacerda.<br />
Como é peculiar em Marcos Rey, o leitor vai se encon‑<br />
trar com uma obra risonha e irônica, um tanto zombeteira,<br />
que acompanha com atenção “as <strong>de</strong>rrapagens da frágil<br />
condição humana – que começou com Adão e Eva, e que<br />
são diferentes <strong>de</strong> nós só porque não foram radiouvintes<br />
nem telespectadores”, na observação precisa e irreverente<br />
<strong>de</strong> Mário Donato.<br />
Prelo<br />
M a r c o s r e y<br />
177
SOy LOCO POR TI,<br />
AMÉRICA!<br />
2 a edição – 168 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0978 ‑8<br />
Autor <strong>de</strong> <strong>mais</strong> <strong>de</strong> quarenta títulos, que alcançaram<br />
uma vendagem superior a 5 milhões <strong>de</strong> exemplares, Mar‑<br />
cos Rey (pseudônimo <strong>de</strong> Edmundo Donato) foi antes <strong>de</strong><br />
tudo um contador <strong>de</strong> histórias. Alheio a teorias, coerente<br />
consigo mesmo, sabia como raros pren<strong>de</strong>r a atenção do<br />
leitor e torná ‑lo parceiro, e cúmplice agra<strong>de</strong>cido, das pe‑<br />
quenas e gran<strong>de</strong>s canalhices <strong>de</strong> seus personagens, como<br />
nos sete contos <strong>de</strong> Soy loco por ti, América!<br />
Neste, como nos seus <strong>de</strong><strong>mais</strong> livros, o gran<strong>de</strong> perso‑<br />
nagem é a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, essa “máquina <strong>de</strong> moer<br />
gente” (João Antônio), cenário da luta implacável pela so‑<br />
brevivência, envolvendo malandros e solitários, notívagos e<br />
angustiados, cada um se virando como po<strong>de</strong>, em busca <strong>de</strong><br />
um trocado, <strong>de</strong> um instante <strong>de</strong> simpatia, <strong>de</strong> sexo barato.<br />
Uma fauna humana meio grotesca, que o escritor trata<br />
com ironia, irreverência, humor cáustico, segundo ele, “a<br />
melhor forma <strong>de</strong> apresentar uma crítica”.<br />
Crítica, na verda<strong>de</strong> impiedosa da socieda<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna,<br />
com sua filosofia <strong>de</strong> consumismo, o egoísmo implacável, a<br />
alienação generalizada, o <strong>de</strong>sespero do mundo noturno,<br />
com seus bares e inferninhos, garotas <strong>de</strong> programa, margi‑<br />
nais e <strong>de</strong>sesperados <strong>de</strong> todos os tipos.<br />
A noite é o horário preferido pelos heróis <strong>de</strong> Marcos<br />
Rey para saírem da toca e se revelarem: a fã que surpreen<strong>de</strong><br />
o locutor, madrugada alta; o passeio noturno <strong>de</strong> um publici‑<br />
tário <strong>de</strong>sempregado; os grã ‑finos em sua jornada vazia noite<br />
a <strong>de</strong>ntro, com farto consumo <strong>de</strong> álcool e lança ‑perfume.<br />
Mas a gente do dia também é fascinante, sobretudo quando<br />
se trata <strong>de</strong> um refinadíssimo vigarista, como o personagem<br />
<strong>de</strong> “A enguia”, ou <strong>de</strong> um irremediável apaixonado por polí‑<br />
tica (“O adhemarista”). Qualquer hora é hora para um per‑<br />
sonagem <strong>de</strong> conto sobressair quando quem escreve tem as<br />
artes, artimanhas e astúcias <strong>de</strong> Marcos Rey.<br />
178<br />
M a r c o s r e y<br />
OS HOMENS DO FUTURO (INÉDITO, PRELO)<br />
OBRAS DE LITERATURA JUVENIL DO AUTOR<br />
• A sensação <strong>de</strong> setembro<br />
• Bem vindos ao Rio<br />
• Diário <strong>de</strong> Raquel<br />
• Dinheiro do céu<br />
• 12 horas <strong>de</strong> terror<br />
• Enigma na televisão<br />
• Filho <strong>de</strong> peixe (prelo)<br />
• Marcos Rey crônicas para jovens<br />
• Na rota do perigo<br />
• O coração roubado<br />
• O diabo no porta malas<br />
• O homem que veio para resolver (prelo)<br />
• O inimigo invisível (prelo)<br />
• O mistério do 5 estrelas<br />
• O rapto do Garoto <strong>de</strong> Ouro<br />
• Os crimes do Olho <strong>de</strong> Boi<br />
• Sozinha no mundo<br />
• Um gato no triângulo<br />
M a r C o s r e y P r e l o<br />
M a r C o s r e y
Affonso R. <strong>de</strong> Sant´Anna<br />
C o l e ç ã o<br />
M a r i n a C o l a s a n t i<br />
Nasceu em Asmara, na Etiópia, na região que atual‑<br />
mente correspon<strong>de</strong> à Eritreia. Viveu em Trípoli, percor‑<br />
reu a Itália em constantes mudanças, transferiu ‑se<br />
com sua família para o Brasil. Viajar foi, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cedo,<br />
sua maneira <strong>de</strong> viver. E, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cedo, apren<strong>de</strong>u a ver o<br />
mundo com duplo olhar <strong>de</strong> quem pertence e ao<br />
mesmo tempo é alheio.<br />
A pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua vida transmitiu ‑se à sua obra.<br />
Pintora e gravadora por formação, é ilustradora dos<br />
seus livros. Foi publicitária, apresentadora <strong>de</strong> televi‑<br />
são, traduziu obras fundamentais da literatura. Jorna‑<br />
lista, publicou livros <strong>de</strong> comportamento e crônicas.<br />
Recebeu numerosos prêmios como contista. É poeta.<br />
Muda a realida<strong>de</strong> externa, mas a nossa realida<strong>de</strong><br />
interior, feita <strong>de</strong> medos e fantasias, se mantém<br />
inalterada. E é com esta que dialogam as fadas,<br />
interagindo simbolicamente, em qualquer ida<strong>de</strong> e<br />
em todos os tempos.<br />
179
DOZE REIS E A<br />
MOÇA NO<br />
LABIRINTO DO<br />
VENTO<br />
12 a edição – 96 páginas<br />
ISBN 978‑85 ‑260 ‑1108‑1<br />
Com <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za e capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sedução, Marina<br />
Colasanti joga com o maravilhoso, o po<strong>de</strong>r da imagina‑<br />
ção, as criaturas fantásticas, <strong>de</strong>monstrando como eles<br />
continuam vivos, palpitantes e essenciais à formação do<br />
ser humano.<br />
Como observa a autora, “nossa realida<strong>de</strong> interior,<br />
feita <strong>de</strong> medos e fantasias, se mantém inalterada. E é com<br />
esta que dialogam as fadas, interagindo simbolicamente,<br />
em qualquer ida<strong>de</strong> e em todos os tempos”.<br />
Este diálogo com o fantástico, <strong>de</strong>ntro da tradição do<br />
gênero, <strong>de</strong>ixa sempre um ensinamento, como o leitor<br />
comprova na história da tecelã solitária que dá vida às<br />
criaturas e coisas que tece, para sua própria <strong>de</strong>silusão (“A<br />
moça tecelã”); no rei que <strong>de</strong>scobre na noite <strong>de</strong> núpcias<br />
um leão em seu quarto (“Entre leão e unicórnio”); no<br />
jardineiro apaixonado por uma roseira quase humana (“A<br />
mulher ramada”); no cansaço do Tempo (“No colo do<br />
ver<strong>de</strong> vale”); nos presentes recebidos pela filha do rei no<br />
dia <strong>de</strong> seu aniversário (“Uma concha à beira‑mar”); na<br />
pequena ilha habitada por ninfas (“On<strong>de</strong> os oce<strong>anos</strong> se<br />
encontram”); no contraste <strong>de</strong> dois príncipes irmãos (“Um<br />
<strong>de</strong>sejo e dois irmãos”); nas garças que chegam no ou‑<br />
tono, em vez <strong>de</strong> na primavera (“De suave canto”); no<br />
guerreiro cansado <strong>de</strong> lutar e que <strong>de</strong>seja apenas viver em<br />
seu castelo (“O rosto atrás do rosto”); na menina que<br />
tinha os cabelos cortados, mas <strong>de</strong>sejava ter tranças (“Uma<br />
ponte entre dois reinos”); na jovem que se olha no espe‑<br />
lho e <strong>de</strong>scobre que sua imagem <strong>de</strong>sapareceu (“À procura<br />
<strong>de</strong> um reflexo”); no labirinto para domar o vento no meio<br />
do jardim (“Doze reis e a moça no labirinto do vento”); no<br />
rei apaixonado pelo silêncio, que constrói muros altíssi‑<br />
mos ao redor <strong>de</strong> seu castelo (“Palavras aladas”).<br />
O livro é enriquecido com os belos <strong>de</strong>senhos da autora.<br />
180<br />
M a r i n a C o l a s a n t i<br />
UMA IDEIA TODA<br />
AZUL<br />
23 a edição – 64 páginas<br />
ISBN 978‑85 ‑260 ‑1109‑0<br />
Publicado em 1979, Uma i<strong>de</strong>ia toda azul ganhou dois<br />
dos prêmios <strong>mais</strong> importantes concedidos a obras <strong>de</strong>stina‑<br />
das ao povinho miúdo: o Gran<strong>de</strong> Prêmio <strong>de</strong> Crítica para Li‑<br />
teratura Infantil, da Associação Paulista <strong>de</strong> Críticos <strong>de</strong> Arte,<br />
e o <strong>de</strong> Melhor Livro para Jovem, no ano <strong>de</strong> publicação, con‑<br />
cedido pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil.<br />
Passados <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta <strong>anos</strong>, o livro continua <strong>mais</strong><br />
azul e sedutor do que nunca. Inspirada por temas, perso‑<br />
nagens e histórias quase tão velhos quanto a humanida<strong>de</strong>,<br />
Marina Colasanti navega pelo fantástico com todas as liber‑<br />
da<strong>de</strong>s da fantasia, que o homem contemporâneo está <strong>de</strong>i‑<br />
xando morrer, dominado pela frieza da tecnologia.<br />
Soltas as asas da imaginação, o leitor <strong>de</strong> todas as ida‑<br />
<strong>de</strong>s penetra num universo inesquecível que, por certo, vai<br />
marcá‑lo por toda a vida. É a oportunida<strong>de</strong> maravilhosa <strong>de</strong><br />
conhecer gnomos da floresta e o vento conversador, <strong>de</strong><br />
assistir princesas transformadas em cisnes ou disfarçadas<br />
<strong>de</strong> corças para seduzir o príncipe eleito, passear em caste‑<br />
los <strong>de</strong> vidro e se angustiar com a sorte da princesinha ador‑<br />
mecida para sempre por arte da magia.<br />
Com encanto, o leitor é apresentado ao rei que só conhe‑<br />
cia o mundo pela palavra do vento (“O último rei”), ao bor‑<br />
dado mágico que torna real os <strong>de</strong>senhos nele feitos (“Além do<br />
bastidor”), à princesa que amava as borboletas (“Por duas asas<br />
<strong>de</strong> veludo”), ao unicórnio enamorado pela princesa (“Um es‑<br />
pinho <strong>de</strong> marfim”), ao rei que tem “Uma i<strong>de</strong>ia toda azul”, ao<br />
príncipe que vai à caçada e encontra seu <strong>de</strong>stino (“Entre as<br />
folhas do ver<strong>de</strong> O”), às fadas tece<strong>de</strong>iras rivais (“Fio após fio”),<br />
à princesa sem ninguém para brincar (“A primeira só”), a uma<br />
história <strong>de</strong> amor proibido (“Sete <strong>anos</strong> e <strong>mais</strong> sete”), às conse‑<br />
quências da sur<strong>de</strong>z real (“As notícias e o mel”).<br />
O livro é enriquecido com belas ilustrações da autora,<br />
inspirada na arte pictórica medieval.<br />
M a r i n a C o l a s a n t i
23 HISTÓRIAS DE<br />
UM VIAJANTE<br />
1 a edição – 224 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0988 ‑5<br />
As mulheres são sempre surpreen<strong>de</strong>ntes. Sobretudo<br />
quando atuam em universos tradicionalmente dominados<br />
pelos homens. Como a velha arte <strong>de</strong> contar histórias.<br />
Assim, as 23 histórias <strong>de</strong> um viajante, <strong>de</strong> Marina Colasanti,<br />
instigam e inquietam o leitor pela estrutura e <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong><br />
dos temas, mas sobretudo pela sensibilida<strong>de</strong> feminina que<br />
está por trás <strong>de</strong>las. O tema da viagem em busca <strong>de</strong> conhe‑<br />
cimento, <strong>de</strong> uma revelação ou da iluminação, existe <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
que o homem começou a cultivar a arte <strong>de</strong> contar. Na rea‑<br />
lida<strong>de</strong>, partir envolve, <strong>de</strong> certa forma, a própria inquietação<br />
que projeta o ser humano ao <strong>de</strong>sconhecido, a se<strong>de</strong> <strong>de</strong> se‑<br />
guir para a frente, <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobrir, mas também <strong>de</strong> revelar. O<br />
viajante está sempre em busca <strong>de</strong> alguma coisa misteriosa,<br />
mas traz também a inquietação, como o cavaleiro <strong>de</strong>ste<br />
livro, que consegue penetrar no domínio <strong>de</strong> um príncipe<br />
misterioso, isolado do mundo por altas muralhas. Ali, como<br />
uma espécie <strong>de</strong> Sheraza<strong>de</strong>, passa a narrar as 23 histórias<br />
reunidas no volume, “como se soubesse o que ia no cora‑<br />
ção do príncipe”.<br />
Como se encarregado <strong>de</strong> uma missão, talvez sem o<br />
saber, o cavaleiro ‑narrador <strong>de</strong>sperta o príncipe para uma<br />
nova realida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>scerrando ‑lhe amplas perspectivas espi‑<br />
rituais, numa espécie <strong>de</strong> iniciação mágica.<br />
Seguindo o mo<strong>de</strong>lo clássico, os 23 contos narrados<br />
pelo viajante se <strong>de</strong>senvolvem a partir da proposição lan‑<br />
çada na história inicial, cujo significado se revela no final,<br />
fechando o ciclo iniciático. Dessa forma, o livro po<strong>de</strong> ser<br />
lido como uma série <strong>de</strong> contos ou como um romance unido<br />
pelo fio sutil que liga todas as histórias e as projeta muito<br />
além das fronteiras do possível.<br />
Mantendo a unida<strong>de</strong> espiritual com a escrita, as ilus‑<br />
trações do livro são da própria autora. A mão que inquieta<br />
com a palavra sabe também encantar com o <strong>de</strong>senho.<br />
M a r i n a C o l a s a n t i<br />
OBRAS DE LITERATURA INFANTIL E JUVENIL DA<br />
AUTORA<br />
• A menina arco íris<br />
• A moça tecelã<br />
• Cada bicho seu capricho<br />
• Com certeza tenho amor<br />
• Do seu coração partido<br />
• O homem que não parava <strong>de</strong> crescer<br />
• O lobo e o carneiro no sonho da menina<br />
• O menino que achou uma estrela<br />
• O nome da manhã (poesia, prelo)<br />
• O ver<strong>de</strong> brilha no poço<br />
• Ofélia, a ovelha<br />
• Poesia em 4 tempos<br />
• Um amor sem palavras<br />
M a r i n a C o l a s a n t i<br />
181
Arquivo pessoal<br />
C o l e ç ã o<br />
M e n a lt o n B r a F F<br />
182<br />
<strong>Professor</strong>, contista e romancista, Menalton Braff é<br />
natural <strong>de</strong> Taquara, no Rio Gran<strong>de</strong> do Sul. Passou a<br />
adolescência em Porto Alegre, em meio à literatura e<br />
à política, envolvendo‑se com o movimento estudan‑<br />
til durante a ditadura militar. Por conta <strong>de</strong> sua militân‑<br />
cia, Menalton Braff vê‑se forçado a abandonar o<br />
curso <strong>de</strong> Economia na URGS e a <strong>de</strong>saparecer como<br />
cidadão por alguns <strong>anos</strong>. Nos <strong>anos</strong> 1970, mudou‑se<br />
para São Paulo, on<strong>de</strong> concluiu o curso <strong>de</strong> Letras e<br />
ministrou aulas <strong>de</strong> Literatura Brasileira em faculda<strong>de</strong>s<br />
da capital paulista. Em seus dois primeiros livros assi‑<br />
nou com o pseudônimo Salvador dos Passos, pas‑<br />
sando a usar o próprio nome a partir <strong>de</strong> À sombra do<br />
cipreste, obra que lhe ren<strong>de</strong>u o Prêmio Jabuti – Livro<br />
do ano, em 2000. A coleção Menalton Braff traz ao<br />
leitor algumas das principais obras <strong>de</strong>sse que é consi‑<br />
<strong>de</strong>rado um dos gran<strong>de</strong>s autores <strong>de</strong> sua geração.<br />
Esta chuva surpresa nenhuma, aquelas nuvens gros‑<br />
sas amontoando‑se a tar<strong>de</strong> toda no topo do morro<br />
escuro. Primeiro aviso se formando além da Vila da<br />
Palha, no alto. Então pensei, Vai chover.
À SOMBRA DO<br />
CIPRESTE<br />
6 a edição – 112 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1579 ‑1<br />
Menalton Braff surgiu na literatura brasileira como um<br />
vendaval. Impossível ignorá ‑lo <strong>de</strong>pois do lançamento e da<br />
extraordinária acolhida, <strong>de</strong> público e <strong>de</strong> crítica, <strong>de</strong> À som‑<br />
bra do cipreste, laureado com o Prêmio Jabuti como o Livro<br />
do Ano <strong>de</strong> 2000.<br />
À sombra do cipreste <strong>de</strong>sfila uma humanida<strong>de</strong><br />
comum, <strong>de</strong>ssas pessoas que esbarramos na rua, a cada dia,<br />
com as quais convivemos no trabalho ou no ambiente fa‑<br />
miliar. É <strong>de</strong>sse barro que Braff cria os seus personagens,<br />
lembrando ‑nos o conselho <strong>de</strong> Rilke a um jovem poeta. O<br />
gran<strong>de</strong> escritor austríaco recomendava a seu correspon‑<br />
<strong>de</strong>nte observar o cotidiano e, se <strong>de</strong>le não fosse capaz <strong>de</strong><br />
extrair riquezas, culpar ‑se a si mesmo, por não saber ver.<br />
Menalton Braff sabe não apenas ver o cotidiano, como<br />
surpreen<strong>de</strong>r o ser humano, nele imerso, em situações ‑limite,<br />
em momentos <strong>de</strong> intensa dramaticida<strong>de</strong>, a que todos esta‑<br />
mos sujeitos. Os <strong>de</strong>zoito contos, concisos e precisos, reunidos<br />
em À sombra do cipreste, surpreen<strong>de</strong>m o leitor, exata mente,<br />
pela perspicácia com que revelam, sob a superfície tranquila,<br />
as águas revoltas no íntimo <strong>de</strong> cada um.<br />
Moacyr Scliar observou que À sombra do cipreste<br />
apresenta “o conto em sua melhor expressão”, ressaltando<br />
ainda a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Braff em surpreen<strong>de</strong>r os segredos e<br />
dilemas <strong>de</strong> seus personagens, não sendo outra “a função<br />
da gran<strong>de</strong> literatura: através da beleza dos textos, revelar‑<br />
‑nos a verda<strong>de</strong> que está oculta em cada pessoa, em todas<br />
as pessoas”.<br />
<strong>Professor</strong>, contista, romancista (Bolero <strong>de</strong> Ravel e Ta‑<br />
pete <strong>de</strong> silêncio foram também publicados pela <strong>Global</strong>),<br />
consi<strong>de</strong>rado um dos escritores <strong>mais</strong> importantes da litera‑<br />
tura brasileira atual, o gaúcho Menalton Braff vive hoje em<br />
Serrana, próximo a Ribeirão Preto, com <strong>de</strong>dicação integral<br />
à literatura.<br />
M e n a l t o n B r a f f<br />
BOLERO DE RAVEL<br />
1 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1514 ‑2<br />
O novo romance <strong>de</strong> Menalton Braff é como uma me‑<br />
lodia envolvente, <strong>de</strong> ritmo intenso e crescente, já expressa<br />
no título: Bolero <strong>de</strong> Ravel. À sombra <strong>de</strong>ssa música,<br />
<strong>de</strong>senrola ‑se um drama familiar <strong>de</strong> cores negras, envol‑<br />
vendo uma mulher <strong>de</strong>cidida, dinâmica e bem ‑sucedida na<br />
vida, e o irmão, eterno adolescente, incapaz <strong>de</strong> amadure‑<br />
cer. O contraste <strong>de</strong> temperamentos e objetivos <strong>de</strong> vida leva<br />
ao rompimento brusco das relações, e a ameaça <strong>de</strong> inter‑<br />
namento do rapaz num manicômio. Deterioração física e<br />
mental. Delírio. Um clima obsessivo e angustiante, que o<br />
romancista explora com maestria e vigor: “A cada salto<br />
dado pelo cachorro, ele cresce, infla e aumenta o peso, e<br />
seus <strong>de</strong>ntes alcançam as nuvens. Então ele se volta para as<br />
crianças e as <strong>de</strong>vora como se fossem gotas do mar. E pula<br />
novamente, arrancando pedaços <strong>de</strong> nuvens, que ele en‑<br />
gole, faminto. Seu pelo está sujo, escuro como as nuvens<br />
que ele já engoliu. Suas unhas imensas alcançam o Sol e o<br />
<strong>de</strong>spedaçam. Então sumimos numa noite sem fim. Apenas<br />
a escuridão existe. Apenas a escuridão. Apenas”.<br />
Natural do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul, professor <strong>de</strong> literatura<br />
brasileira, Menalton Braff tem uma das obras <strong>mais</strong> impor‑<br />
tantes das letras brasileiras contemporâneas, formada por<br />
seis romances, três volumes <strong>de</strong> contos, sete novelas juvenis<br />
e infantis. Entre os vários prêmios literários que conquistou<br />
figuram o Jabuti (livro do ano <strong>de</strong> 2000). Foi finalista na<br />
Jornada <strong>de</strong> Passo Fundo, no Portugal Telecom, no Jabuti<br />
(duas vezes) e na primeira edição do Prêmio São Paulo <strong>de</strong><br />
Literatura. Recebeu menção honrosa do Prêmio Casa <strong>de</strong> las<br />
Américas, <strong>de</strong> Havana, Cuba.<br />
Atualmente, resi<strong>de</strong> na região <strong>de</strong> Ribeirão Preto, inte‑<br />
rior <strong>de</strong> São Paulo, on<strong>de</strong> se <strong>de</strong>dica à literatura, em ativida<strong>de</strong><br />
diária, interrompida por participações em salões literários e<br />
feiras <strong>de</strong> livros em diversas localida<strong>de</strong>s do Brasil.<br />
M e n a l t o n B r a f f<br />
183
TAPETE DE SILÊNCIO<br />
1 a edição – 128 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1605 ‑7<br />
Cada livro <strong>de</strong> Menalton Braff se assemelha a um tiro em<br />
meio ao silêncio. Desperta o leitor, provoca ‑o e o mantém<br />
alerta, intrigado e seduzido até a última linha, como acon‑<br />
tece com Tapete <strong>de</strong> silêncio, indicativo <strong>de</strong> renovação e <strong>de</strong><br />
uma nova posição do autor diante do seu universo ficcional.<br />
Diferente <strong>de</strong> seu último romance, Bolero <strong>de</strong> Ravel,<br />
centralizado em um único e enigmático personagem, em<br />
Tapete <strong>de</strong> silêncio o centro da ação é partilhado por múlti‑<br />
plos personagens, irmanados por um objetivo comum:<br />
manter a or<strong>de</strong>m e zelar pela honra <strong>de</strong> uma pequena ci‑<br />
da<strong>de</strong>, ironicamente batizada <strong>de</strong> Pouso do Sossego.<br />
Ao contrário do que indica seu nome, a cida<strong>de</strong>zinha<br />
vive um clima <strong>de</strong> tensão e intranquilida<strong>de</strong>, que leva <strong>de</strong>z <strong>de</strong><br />
seus principais habitantes a se reunirem, numa noite chu‑<br />
vosa, no coreto da praça da matriz, entre cochichos, risos<br />
abafados e pigarros, à espera da meia ‑noite.<br />
O que discutem, esperam e acontece nesta longa e<br />
trágica noite é narrado em primeira pessoa pelo lí<strong>de</strong>r do<br />
grupo, o comerciante Osório, numa linguagem concisa,<br />
precisa, banhada <strong>de</strong> poesia. Em segundo plano, <strong>de</strong>nomi‑<br />
nado “Coro”, sugerindo o clima <strong>de</strong> uma tragédia grega,<br />
um narrador em terceira pessoa traça uma espécie <strong>de</strong> pe‑<br />
quena história da comunida<strong>de</strong>, na qual passado e presente<br />
dialogam e da qual emergem ódios e prevenções, mesqui‑<br />
nharias, mágoas, rancores, contrastando com a ruidosa e<br />
festiva chegada <strong>de</strong> uma companhia circense na cida<strong>de</strong>.<br />
Nesse pequeno mundo, povoado <strong>de</strong> personagens em‑<br />
blemáticos e tão hum<strong>anos</strong>, Braff <strong>de</strong>snuda os mecanismos<br />
e os subterrâneos da luta pelo po<strong>de</strong>r, entrelaçado à ambi‑<br />
ção pessoal, à hipocrisia e à intolerância. Retrato duro e<br />
implacável da vida <strong>de</strong> Pouso do Sossego, Tapete <strong>de</strong> silêncio<br />
é também uma metáfora <strong>de</strong> toda a socieda<strong>de</strong> humana.<br />
184<br />
M e n a l t o n B r a f f
Espaço Cultural “Cida<strong>de</strong> do Livro”<br />
C o l e ç ã o<br />
o r í G e n e s l e s s a<br />
Nascido em Lençóis Paulista, São Paulo, Orígenes<br />
Lessa (1903 ‑1986) é reconhecido como um dos<br />
gran<strong>de</strong>s escritores brasileiros, por suas brilhantes<br />
obras voltadas para os públicos infantil e juvenil,<br />
além <strong>de</strong> sua notável habilida<strong>de</strong> na escrita <strong>de</strong> contos<br />
e romances. Passou parte <strong>de</strong> sua infância em São<br />
Luís do Maranhão e, posteriormente, em São Paulo,<br />
ingressou no Seminário <strong>de</strong> Teologia. Após abando‑<br />
nar o Seminário, seguiu para o Rio <strong>de</strong> Janeiro.<br />
Orígenes Lessa trilhou uma carreira literária marcada<br />
pelo sucesso <strong>de</strong> público e <strong>de</strong> crítica. O escritor proi‑<br />
bido, publicado em 1929, teve excelente acolhida.<br />
Com esse e outros títulos, como Garçon, garçon‑<br />
nette, garçonnière, Omelete em Bombaim e A noite<br />
sem homem, consagrou ‑se como um dos <strong>mais</strong> <strong>de</strong>s‑<br />
tacados contistas brasileiros.<br />
O feijão e o sonho, publicado em 1937, lhe valeu o<br />
Prêmio Antônio <strong>de</strong> Alcântara Machado. O livro, além<br />
<strong>de</strong> ultrapassar a barreira das quarenta edições, ganhou<br />
uma adaptação como novela para TV, que alcançou<br />
enorme sucesso. Em 1955, seu romance Rua do sol foi<br />
agraciado com o Prêmio Carmen Dolores Barbosa.<br />
A partir dos <strong>anos</strong> 1970, o escritor <strong>de</strong>dicou ‑se com<br />
afinco à literatura infantojuvenil, publicando quase<br />
quarenta títulos que o tornaram querido por crian‑<br />
ças e jovens. Nos corações e mentes <strong>de</strong> gerações <strong>de</strong><br />
leitores ficaram livros como Memórias <strong>de</strong> um cabo<br />
<strong>de</strong> vassoura, Confissões <strong>de</strong> um vira ‑lata e João Si‑<br />
mões continua. Foi membro da Associação Brasileira<br />
<strong>de</strong> Imprensa e da Aca<strong>de</strong>mia Brasileira <strong>de</strong> Letras.<br />
A coleção Orígenes Lessa publicada pela <strong>Global</strong> Edi‑<br />
tora reúne seus principais livros, com o anseio <strong>de</strong><br />
trazer novamente ao público leitor os textos <strong>de</strong>ste<br />
escritor <strong>de</strong> raro talento, que soube como poucos<br />
transitar com igual habilida<strong>de</strong> entre o campo da fic‑<br />
ção adulta e da literatura para crianças e jovens.<br />
185
O FEIJÃO E O SONHO<br />
Prelo<br />
Orígenes Lessa foi um dos autores brasileiros <strong>mais</strong> po‑<br />
pulares em sua época. Seus romances e livros <strong>de</strong> contos<br />
narravam o que público queria ler, em linguagem sedutora<br />
e comunicativa, mas sem fazer concessões. Mestre na arte<br />
<strong>de</strong> recriar o cotidiano e <strong>de</strong> criar tipos dos quais o leitor<br />
nunca se esquece, teve várias obras traduzidas para outros<br />
idiomas e adaptadas para o cinema.<br />
Sua literatura, aliás, tinha muito <strong>de</strong> cinematográfica<br />
na construção das cenas e precisão dos diálogos, como se<br />
comprova em O feijão e o sonho, que fez as <strong>de</strong>lícias <strong>de</strong><br />
várias gerações <strong>de</strong> leitores.<br />
Publicado em 1938, o livro encontrou imediata recep‑<br />
tivida<strong>de</strong> do público e admiração da crítica. Em pouco<br />
tempo entrou naquela galeria restrita <strong>de</strong> romances brasilei‑<br />
ros reeditados <strong>de</strong> tempos em tempos e sempre prestigiados<br />
pelo leitor, na qual figuram, entre outros, A Moreninha, O<br />
Guarani, Dom Casmurro e O Ateneu.<br />
Em linguagem simples, quase coloquial, O feijão e o<br />
sonho aborda um tema pouco explorado na literatura bra‑<br />
sileira: a luta <strong>de</strong> um escritor pobre para alcançar a realiza‑<br />
ção artística, os sonhos literários em conflito com a dura<br />
realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada dia, a incompreensão da esposa, as con‑<br />
tas a pagar. Um tema amargo, explorado com humor agri‑<br />
doce e uma discreta ternura, que não impe<strong>de</strong> a crítica<br />
ferina ao egoísmo da socieda<strong>de</strong>.<br />
O feijão e o sonho foi também, <strong>de</strong> forma indireta,<br />
responsável pela abertura <strong>de</strong> um caminho inesperado na<br />
carreira do escritor. Convidado a <strong>de</strong>bater o livro em uma<br />
reunião escolar, apesar do interesse dos alunos, Lessa com‑<br />
preen<strong>de</strong>u a ina<strong>de</strong>quação da obra para o público jovem. Foi<br />
então que enveredou por um caminho que nunca imagi‑<br />
nou, a literatura infantojuvenil, alegre e esperançosa como<br />
a juventu<strong>de</strong>, sem a aspereza e o suave <strong>de</strong>sencanto presen‑<br />
tes em O feijão e o sonho.<br />
186<br />
CONFISSÕES DE UM VIRALATA<br />
MEMÓRIAS DE UM CABO DE VASSOURA<br />
o r í G e n e s l e s s a P r e l o
Arquivo pessoal<br />
C o l e ç ã o<br />
s á B a t o M a G a l d i<br />
Nasceu em Belo Horizonte, em 1927. Trabalhou<br />
como crítico teatral em vários jornais e revistas. Pro‑<br />
fessor titular <strong>de</strong> Teatro Brasileiro da Escola <strong>de</strong> Comu‑<br />
nicação e Artes da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, on<strong>de</strong><br />
se tornou professor emérito. Lecionou durante quatro<br />
<strong>anos</strong> na Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Paris III (Sorbonne Nouvelle)<br />
e <strong>de</strong> Provence, em Aix ‑en ‑Provence. Membro da Aca‑<br />
<strong>de</strong>mia Brasileira <strong>de</strong> Letras. É autor <strong>de</strong> diversos livros,<br />
entre os quais po<strong>de</strong>m ‑se <strong>de</strong>stacar: Aspectos da dra‑<br />
maturgia mo<strong>de</strong>rna (1963), O cenário no avesso<br />
(1991), Um palco brasileiro: o Arena <strong>de</strong> São Paulo<br />
(1984), O texto no teatro (1999), Mo<strong>de</strong>rna dramatur‑<br />
gia brasileira (1998), Cem <strong>anos</strong> <strong>de</strong> teatro em São<br />
Paulo (2000) e Depois do espetáculo (2003).<br />
É preciso que o dramaturgo tome cada vez <strong>mais</strong><br />
consciência <strong>de</strong> que precisa escrever para a cena, tendo<br />
como mediador aquele que sabe materializar o seu<br />
mundo e o outro que empresta voz à sua palavra.<br />
187
PANORAMA DO<br />
TEATRO BRASILEIRO<br />
5 a edição rev. e ampliada – 328 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0561 ‑8<br />
Durante muito tempo a crítica encarou com certo me‑<br />
nosprezo o teatro brasileiro. Elegendo como padrão, em<br />
geral, peças do repertório francês, os críticos acabavam<br />
sempre por propor comparações <strong>de</strong>scabidas entre autores<br />
nacionais e estrangeiros. Com uma agravante: na visão<br />
<strong>de</strong>les, tudo que fosse brasileiro era ruim e imitativo. Quando<br />
muito, reconheciam o esforço dos românticos para com‑<br />
preen<strong>de</strong>r e revelar o país, um certo sentimento brasileiro<br />
em Martins Pena e uma ou outra concessão generosa.<br />
Essa mentalida<strong>de</strong> só seria abalada no século passado,<br />
com o aparecimento <strong>de</strong> autores <strong>de</strong> presença <strong>mais</strong> impac‑<br />
tante, como Nelson Rodrigues, mas sobretudo por uma<br />
tentativa honesta <strong>de</strong> reavaliação do teatro brasileiro, a par‑<br />
tir <strong>de</strong> suas origens.<br />
Neste ponto, o Panorama do teatro brasileiro, <strong>de</strong> Sábato<br />
Magaldi, se firmou <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua publicação como um clássico da<br />
historiografia teatral. Clássico um tanto à maneira <strong>de</strong> Casa‑<br />
‑gran<strong>de</strong> & senzala, no sentido <strong>de</strong> trazer à cena fatos até então<br />
<strong>de</strong>sprezados ou mal compreendidos, como as relações entre<br />
realida<strong>de</strong> social e teatro, as motivações artísticas, a valorização<br />
do papel dos atores. Afinal, o teatro brasileiro nasceu como<br />
forma <strong>de</strong> catequese, utilizando atores improvisados.<br />
Sem preconceitos, falso otimismo ou submissão às<br />
opiniões do passado, Sábato Magaldi analisa o teatro bra‑<br />
sileiro época a época, autor a autor, proce<strong>de</strong>ndo a reavalia‑<br />
ções, aprofundando a compreensão <strong>de</strong> autores como José<br />
<strong>de</strong> Alencar e França Júnior, <strong>de</strong>tectando vínculos entre as<br />
peças e a realida<strong>de</strong> social, sem ja<strong>mais</strong> per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista o<br />
primado do estético.<br />
Esta edição está atualizada, tanto quanto o permite a<br />
dinâmica da vida. Ao texto primitivo, <strong>de</strong> 1962, foram acres‑<br />
cidos dois apêndices, tratando da dramaturgia atual e das<br />
tendências observadas nas últimas décadas.<br />
188<br />
s á B a t o M a G a l d i<br />
TEATRO DA OBSESSÃO<br />
NELSON RODRIGUES<br />
1 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0917 ‑6<br />
Nelson Rodrigues passou pelo teatro brasileiro como<br />
uma espécie <strong>de</strong> tsunami. Provocativo, <strong>de</strong>molidor, obcecado,<br />
<strong>de</strong>spertou cóleras terríveis e admirações enlevadas, tal como<br />
se a realida<strong>de</strong>, por alguns momentos, se transformasse numa<br />
cena <strong>de</strong> suas próprias peças. Nesse clima meio surrealista, o<br />
público vaiava com furor ou aplaudia. A censura fazia a sua<br />
função, proibindo sete <strong>de</strong> suas peças. Nunca se havia visto<br />
nada semelhante na história do teatro brasileiro.<br />
Acompanhando com interesse apaixonado a carreira<br />
“do maior autor teatral brasileiro <strong>de</strong> todos os tempos, do dra‑<br />
maturgo que <strong>de</strong>u dimensão universal à nossa literatura dra‑<br />
mática”, Sábato Magaldi teve oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudar toda<br />
a sua obra, peça a peça. São esses trabalhos, elaborados como<br />
prefácio ao Teatro completo <strong>de</strong> Nelson Rodrigues, que se<br />
acham reunidos em Teatro da obsessão: Nelson Rodrigues.<br />
Dividido em três módulos (peças psicológicas, míticas<br />
e tragédias cariocas), o livro po<strong>de</strong> ser lido como um curso<br />
<strong>de</strong> introdução à obra do autor pernambucano e uma espé‑<br />
cie <strong>de</strong> vacina contra “os equívocos que praticamente acom‑<br />
panharam o lançamento <strong>de</strong> todos os espetáculos”, muitos<br />
dos quais ainda vivos e robustos.<br />
Com precisão, em linguagem límpida e raciocínio claro,<br />
Sábato Magaldi analisa as peças, como realida<strong>de</strong> teatral,<br />
sem per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista suas repercussões na socieda<strong>de</strong> brasi‑<br />
leira, ainda bastante preconceituosa. Numa análise técnica,<br />
ressalta a força do diálogo <strong>de</strong> Nelson Rodrigues e o fato <strong>de</strong><br />
suas peças pertencerem “<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início, ao domínio do tea‑<br />
tro e da literatura, feito que não era a norma entre nós”.<br />
Teatro da obsessão é estudo fundamental à compre‑<br />
ensão <strong>de</strong> um autor que teve “a coragem <strong>de</strong> <strong>de</strong>smascarar o<br />
homem, <strong>de</strong>spido <strong>de</strong> véus embelezadores”, sendo capaz <strong>de</strong><br />
ir “ao fundo da miséria existencial, num mundo aparente‑<br />
mente regido pelo absurdo”.<br />
s á B a t o M a G a l d i
TEATRO DA RUPTURA<br />
OSWALD DE ANDRADE<br />
1 a edição – 184 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0918 ‑4<br />
Para a crítica brasileira, Vestido <strong>de</strong> noiva, <strong>de</strong> Nelson<br />
Rodrigues, é o primeiro marco da literatura dramática mo‑<br />
<strong>de</strong>rna no Brasil. Ninguém duvida da justeza <strong>de</strong>sse juízo,<br />
quando se pensa que, ao valor da peça, se somou a bri‑<br />
lhante montagem <strong>de</strong> Ziembinski para Os comediantes, es‑<br />
treada em <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1943. Como espetáculo, realização<br />
teatral autêntica, a afirmação é <strong>de</strong>finitiva.<br />
“Sob o prisma da dramaturgia, porém, cabe reivindi‑<br />
car a precedência da obra <strong>de</strong> Oswald <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>: O rei da<br />
vela (escrita em 1933 e publicada em 1937), O homem e o<br />
cavalo (1934) e A morta (1937). Muitas das inovações dos<br />
textos <strong>de</strong> Nelson Rodrigues já se encontram nos <strong>de</strong> Oswald<br />
<strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>”. Este é o ponto <strong>de</strong> partida <strong>de</strong> Teatro da rup‑<br />
tura: Oswald <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, <strong>de</strong> Sábato Magaldi.<br />
Rompendo com a <strong>de</strong>sconfiança (e, por vezes, <strong>de</strong>clarada<br />
má vonta<strong>de</strong>) da crítica em relação à obra teatral <strong>de</strong> Oswald,<br />
Sábato Magaldi, após uma releitura atenta <strong>de</strong> suas peças,<br />
concluiu pela “importância excepcional <strong>de</strong>ssa dramaturgia”.<br />
Expondo seus pontos <strong>de</strong> vista com clareza e profundo<br />
conhecimento do teatro (em sua dupla vida como obra li‑<br />
terária e realização teatral), analisa todas as peças do autor<br />
paulista (inclusive inéditos), assinalando a evolução liberta‑<br />
dora <strong>de</strong> Oswald a partir das primeiras experiências, redigi‑<br />
das em francês. O criador autêntico e inovador se firma na<br />
“análise furiosa” da realida<strong>de</strong> brasileira e das classes domi‑<br />
nantes, expressa em O rei da vela; na con<strong>de</strong>nação implacá‑<br />
vel da civilização burguesa oci<strong>de</strong>ntal, formulada em O<br />
homem e o cavalo, até a busca <strong>de</strong> um novo (e talvez equi‑<br />
vocado) caminho, na tentativa lírica <strong>de</strong> A morta.<br />
Voltando à sua proposição inicial, Magaldi analisa se‑<br />
melhanças fundamentais entre a obra teatral <strong>de</strong> Oswald e<br />
a <strong>de</strong> Nelson, concluindo que, se não houve influência do<br />
paulista sobre o pernambucano, pelo menos é inegável a<br />
sua precedência.<br />
s á B a t o M a G a l d i<br />
189
o u t r o s a u t o r e s<br />
190
A VIDA É UM SHOW<br />
Guga <strong>de</strong> Oliveira<br />
1 a edição – 208 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1512 ‑8<br />
Que a vida é um show, ninguém duvida. O difícil é ter<br />
olhos <strong>de</strong> ver e capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> captar os pequenos casos do<br />
cotidiano, aparentemente sem importância, mas que na<br />
pena (perdão, nas teclas do computador) <strong>de</strong> um bom nar‑<br />
rador se transformam em espetáculo, em números <strong>de</strong> um<br />
show permanente e interminável chamado vida. Pois Guga<br />
<strong>de</strong> Oliveira tem esse dom.<br />
Homem do cinema e da televisão, publicitário bem‑<br />
‑sucedido, tendo produzido e dirigido <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> docu‑<br />
mentários e alguns longa ‑metragens, <strong>de</strong>tentor <strong>de</strong> vários<br />
prêmios internacionais, criador do programa Fantástico,<br />
Guga <strong>de</strong> Oliveira é também um escritor <strong>de</strong> humor fino,<br />
irônico e irreverente, mas com uma sensibilida<strong>de</strong> sempre<br />
alerta, por trás do ar <strong>de</strong> malandro durão.<br />
Ao contrário <strong>de</strong> certos escritores, que procuram ocul‑<br />
tar a sua personalida<strong>de</strong> no momento <strong>de</strong> escrever, Guga<br />
está inteiro e sem disfarces em A vida é um show. O livro,<br />
narrado em linguagem coloquial, tem a sua cara e o seu<br />
espírito: informal, <strong>de</strong>spretencioso, rebel<strong>de</strong>.<br />
O show oferecido por Guga ao leitor reúne <strong>mais</strong> <strong>de</strong><br />
quarenta “causos”, fisgados ao longo <strong>de</strong> uma vida rica e<br />
movimentada – situados em diversos países –, vários <strong>de</strong>les<br />
tendo por mote personalida<strong>de</strong>s conhecidas, como Sophia<br />
Loren, Regina Duarte e a legendária Eny, dona do maior<br />
bor<strong>de</strong>l brasileiro da década <strong>de</strong> 1950. E também o próprio<br />
autor, que com um ar <strong>de</strong> sobrevivente feliz e <strong>de</strong>bochado<br />
(“não posso me dar ao luxo <strong>de</strong> morrer”), nos conta como<br />
escapou <strong>de</strong> um enfarte e <strong>de</strong> várias paradas cardíacas.<br />
Como o show da vida, A vida é um show faz rir, co‑<br />
move, surpreen<strong>de</strong>, como observa Valéria Balbi: “Seguindo<br />
a narração do Guga, alguns contos têm a classe <strong>de</strong> um<br />
Fitzgerald tupiniquim. Em outros, ele surge como um rotei‑<br />
rista <strong>de</strong> cinema do neorrealismo italiano. De repente um<br />
estilo cirúrgico e analítico, e <strong>mais</strong> outro, singelo, caipira...”.<br />
Um show variado.<br />
G u G a d e o l i v e i r a<br />
ANTOLOGIA DE<br />
CONTOS DA UBE<br />
Fábio Lucas, Jeanette Rozsas e<br />
Levi Bucalem Ferrari (orgs.)<br />
1 a edição – 136 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑13<strong>39</strong> ‑1<br />
Antologias, sobretudo <strong>de</strong> muitos autores, são sempre<br />
fonte <strong>de</strong> surpresas. Ótimo, quando essas surpresas são<br />
agradáveis, estimulantes e gratificantes, como ocorre com<br />
essa antologia da União Brasileira <strong>de</strong> Escritores. I<strong>de</strong>alizada<br />
em conversas dos membros da associação, a i<strong>de</strong>ia logo se<br />
<strong>de</strong>senvolveu como uma corrente, com alguns dos autores<br />
selecionados indicando outros, formando, assim, elo a elo,<br />
uma ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> vinte contos.<br />
O tema era livre, com os organizadores – Fábio Lucas,<br />
Jeanette Rozsas e Levi Bucalem Ferrari – conce<strong>de</strong>ndo aos<br />
autores inteira liberda<strong>de</strong> para escrever o que bem <strong>de</strong>sejas‑<br />
sem. Daí a diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> assuntos, estilos e abordagens,<br />
conduzidos por autores famosos, alguns com obras tradu‑<br />
zidas em diversos idiomas, como Lygia Fagun<strong>de</strong>s Telles,<br />
jornalistas conhecidos, advogados, professores, psicólogos,<br />
críticos, editores multimídia, nascidos e vivendo nos <strong>mais</strong><br />
diversos pontos do território brasileiro, irmanados por essa<br />
aventura no reino mágico da história curta.<br />
É a própria diversida<strong>de</strong> na unida<strong>de</strong>, oferecendo um<br />
retrato das tendências atuais do conto brasileiro, mas tam‑<br />
bém uma amostragem das preocupações do brasileiro com<br />
a realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seu país e os <strong>de</strong>stinos da humanida<strong>de</strong>.<br />
Her<strong>de</strong>ira da Socieda<strong>de</strong> dos Escritores Brasileiros, fun‑<br />
dada na década <strong>de</strong> 1940 por um grupo <strong>de</strong> intelectuais reu‑<br />
nidos em torno <strong>de</strong> Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> e Sérgio Milliet, a<br />
União Brasileira <strong>de</strong> Escritores nasceu em 1958, congre‑<br />
gando alguns dos <strong>mais</strong> importantes intelectuais do país. A<br />
presente antologia foi organizada para comemorar o cin‑<br />
quentenário da instituição, invertendo <strong>de</strong>ssa forma o pro‑<br />
cedimento clássico dos aniversários. Em vez dos amigos e<br />
convidados, aqui quem presenteia é o aniversariante.<br />
F á B i o l u C a s , J e a n e t t e r o z s a s e l e v i B . F e r r a r i ( o r G s . )<br />
191
ANTOLOGIA DO<br />
CORDEL BRASILEIRO<br />
Seleção e apresentação <strong>de</strong><br />
Marco Haurélio<br />
1 a edição – 256 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1599 ‑9<br />
O cor<strong>de</strong>l está vivo e muito vivo. Po<strong>de</strong> até não ter a mís‑<br />
tica dos tempos em que Lampião andava pelo sertão e era<br />
cantado com temor e admiração, mas os novos cor<strong>de</strong>listas<br />
mantêm a mesma graça, encanto e saliência <strong>de</strong> seus anteces‑<br />
sores. A prova, para ser <strong>de</strong>gustada como um bom queijo <strong>de</strong><br />
coalho, está na Antologia do cor<strong>de</strong>l brasileiro, na qual Marco<br />
Haurélio reúne quinze cordéis dos séculos XIX e XX.<br />
Esse amplo panorama inclui <strong>de</strong>s<strong>de</strong> mestres do pas‑<br />
sado, hoje mitificados, como o paraibano Leandro Gomes<br />
<strong>de</strong> Barros, consi<strong>de</strong>rado o maior poeta popular do Brasil e<br />
um dos pioneiros do gênero, o alagoano Manoel D’Almeida<br />
Filho, o baiano Antônio Teodoro dos Santos, até o próprio<br />
Marco Haurélio, ainda na faixa dos trinta <strong>anos</strong> e que man‑<br />
tém viva a tradição do gênero. São histórias cujas origens<br />
remontam à mitologia grega e aos contos <strong>de</strong> fadas, tempe‑<br />
radas pela experiência <strong>de</strong> mundo e a sagacida<strong>de</strong> do serta‑<br />
nejo, nas quais a esperteza do fraco e o seu heroísmo,<br />
unidos a uma malícia muito típica do homem do povo nor‑<br />
<strong>de</strong>stino, conseguem superar todos os obstáculos, até<br />
mesmo os <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m mágica. Magia, eis aí a palavra que<br />
melhor <strong>de</strong>fine esses poemas em que os bichos falam, os<br />
homens <strong>de</strong>scem ao inferno, mendigos conquistam rainhas,<br />
e personagens como Pedro Malazartes e João Grilo <strong>de</strong>‑<br />
monstram como a comicida<strong>de</strong>, o riso, a peraltice po<strong>de</strong>m<br />
superar a força e a malda<strong>de</strong>.<br />
Essas características, que encantaram gerações, se<br />
mantêm vivas em nossos dias, quando o cor<strong>de</strong>l utiliza<br />
meios <strong>de</strong> comunicação como a internet, estimulando a<br />
curiosida<strong>de</strong> do leitor virtual, mas sem revelar o final da his‑<br />
tória, incitando ‑o <strong>de</strong>ssa forma a adquirir o tradicional fo‑<br />
lheto. Ou seja, como observa Marco Haurélio no prefácio:<br />
“o cor<strong>de</strong>l, paradoxalmente, se renova para continuar o<br />
mesmo”. Ainda bem.<br />
192<br />
s e l e ç ã o e a P r e s e n t a ç ã o d e M a r C o h a u r é l i o<br />
CAMINHOS DIVERSOS<br />
SOB OS SIGNOS DO CORDEL<br />
Costa Senna<br />
1 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1260 ‑8<br />
Ainda hoje, em muitos pontos do Brasil, o cor<strong>de</strong>l é a<br />
única literatura lida pelo povo. Lida e amada. No Nor<strong>de</strong>ste,<br />
ela continua tão presente na vida cotidiana como o feijão<br />
<strong>de</strong> corda ou a manteiga <strong>de</strong> garrafa. Qual o nor<strong>de</strong>stino que<br />
não levantou voo com o “Pavão misterioso”, não se im‑<br />
pressionou com a saga <strong>de</strong> Antonio Silvino ou não riu a valer<br />
com a “Chegada <strong>de</strong> Lampião no inferno”?<br />
Com o processo permanente <strong>de</strong> migração do homem<br />
do Nor<strong>de</strong>ste, o gênero se espalhou por todo o país, se bem<br />
que cultivado quase exclusivamente por nor<strong>de</strong>stinos.<br />
Natural do Ceará, cantor e compositor, autor <strong>de</strong> inú‑<br />
meros cordéis, livros e CDs, radicado em São Paulo, Costa<br />
Senna trouxe para o Sul toda a fantasia e a criativida<strong>de</strong> do<br />
cor<strong>de</strong>l nor<strong>de</strong>stino, adaptando ‑o à realida<strong>de</strong> da região, sem<br />
per<strong>de</strong>r o sabor da terra <strong>de</strong> origem, vivendo com um pé na<br />
tradição e outro na mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>.<br />
Dessa forma, sem per<strong>de</strong>r o senso da realida<strong>de</strong> nem o<br />
gosto pelo pitoresco, o poeta <strong>de</strong>screve São Paulo (“Em<br />
frente ao chope da Sé/ tem um monte <strong>de</strong> bicheiro,/ um<br />
grita: “Hoje é macaco”,/ outro diz: “Não, é carneiro”./<br />
Neste louco labacé/ vive a praça da Sé/ <strong>de</strong> janeiro a ja‑<br />
neiro”), protesta contra a <strong>de</strong>gradação do planeta, como<br />
um ambientalista (“Nós po<strong>de</strong>mos evitar/ a extinção da Mãe<br />
Terra,/ parando a poluição, / ensinando ao que erra/ que a<br />
paz é <strong>mais</strong> importante/ do que o aterrorizante/ mercado <strong>de</strong><br />
fazer guerra”) e por fim, <strong>de</strong>siludido com seu semelhante,<br />
apela para os céus (“Meu Jesus, o mundo on<strong>de</strong>/ um dia<br />
Você passou,/ hoje está muito pior, / nada nele melhorou./<br />
O homem vem feito traça,/ multiplicando a <strong>de</strong>sgraça/ que<br />
ele mesmo plantou”), mas termina <strong>de</strong>sesperançado: “Se a<br />
mente não me engana,/ a nossa colmeia humana/ em<br />
breve vai <strong>de</strong>rreter”.<br />
Essa antologia <strong>de</strong> poemas <strong>de</strong> Costa Senna traz ilustrações<br />
<strong>de</strong> Jô Oliveira, inspiradas nas xilogravuras nor<strong>de</strong>stinas.<br />
C o s t a s e n n a
CHEZ MME. MAIGRET<br />
Renata Pallottini<br />
1 a edição – 148 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1556 ‑2<br />
Georges Simenon foi o escritor <strong>mais</strong> prolífico e um dos<br />
<strong>mais</strong> populares do século XX. Deixou <strong>mais</strong> <strong>de</strong> 400 volumes,<br />
dos quais cerca <strong>de</strong> 100 contam as façanhas do <strong>de</strong>legado<br />
Jules Maigret, da Polícia Judiciária francesa, que inspirou<br />
<strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> filmes, tornando ‑o um dos personagens <strong>mais</strong><br />
famosos da mitologia do século.<br />
Homem pon<strong>de</strong>rado, cheio <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>s humanas,<br />
respeitando os criminosos como seres hum<strong>anos</strong>, Maigret<br />
resolvia os seus casos menos pela investigação criminal do<br />
que pelo conhecimento da alma do criminoso. Mas tinha<br />
também o seu lado burguês, levando uma vida familiar<br />
tranquila, num apartamento parisiense mo<strong>de</strong>sto, ao lado<br />
da esposa, Louise, <strong>de</strong> presença apagada nos livros. O escri‑<br />
tor só a põe em cena para se referir aos pratos caprichosos<br />
que ela preparava para o marido e o chá acolhedor com<br />
que o aguardava, à noite.<br />
Inconformada com essa omissão, a poeta e roman‑<br />
cista Renata Pallottini resolveu tirar Mme. Maigret da som‑<br />
bra do marido famoso, dotando ‑a <strong>de</strong> insuspeitadas<br />
qualida<strong>de</strong>s. Ela começa a busca <strong>de</strong> novas alternativas <strong>de</strong><br />
vida ao dar um balanço na mediocrida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua vida. Por<br />
que não mudar?<br />
A mudança se dá e da maneira <strong>mais</strong> insólita: Louise se<br />
torna concorrente do inspetor famoso, passando a investi‑<br />
gar um crime no qual o marido vinha trabalhando.<br />
O resultado é um imbróglio <strong>de</strong>licioso, narrado em pri‑<br />
meira pessoa pela própria Mme. Maigret. Como nos livros<br />
<strong>de</strong> Simenon, a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Paris, com seu insuperável<br />
charme, também é uma personagem importante no <strong>de</strong>sen‑<br />
rolar da história, misto <strong>de</strong> romance policial e <strong>de</strong> costumes,<br />
mas sobretudo uma reivindicação bem ‑humorada <strong>de</strong> que<br />
as mulheres são tão capazes quanto os homens. Mesmo<br />
quando se trata do insuperável <strong>de</strong>tetive Maigret.<br />
r e n a t a P a l l o t t i n i<br />
CONTOS DE VISTA<br />
Elisa Lucinda<br />
1 a edição – 132 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0944 ‑3<br />
Apontada como uma das gratas revelações da litera‑<br />
tura brasileira atual, Elisa Lucinda, em Contos <strong>de</strong> vista, brinca<br />
com as palavras, saco<strong>de</strong> o leitor, ironiza situações, mas faz<br />
sobretudo uma apaixonada <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> amor à vida.<br />
Uma <strong>de</strong>claração que parece se esten<strong>de</strong>r além das pa‑<br />
lavras e pulsar num gran<strong>de</strong> palco – talvez, o palco da vida –,<br />
<strong>de</strong>nunciando assim a múltipla sensibilida<strong>de</strong> e varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
seus caminhos: atriz <strong>de</strong> teatro, cinema e televisão, autora<br />
teatral <strong>de</strong> sucesso (sua peça O semelhante ficou seis <strong>anos</strong><br />
em cartaz, no Brasil e no exterior), poeta que encontrou um<br />
jeito novo <strong>de</strong> popularizar a poesia, num tom coloquial,<br />
meio mágico, meio apaixonado.<br />
Escritas em épocas diversas, as <strong>de</strong>zesseis histórias <strong>de</strong><br />
Contos <strong>de</strong> vista têm a unida<strong>de</strong> espiritual <strong>de</strong> quem olha a<br />
vida com profundo interesse, atenta a dramas e comédias,<br />
mas sempre com um humor sadio, sem amarguras. Várias<br />
<strong>de</strong>las reproduzem, com plena evidência, situações vividas<br />
pela autora, mas o elemento autobiográfico não tem maior<br />
significado. Para Elisa Lucinda, experiência e imaginação se<br />
equivalem, não fosse ela, acima <strong>de</strong> tudo, poeta. Não <strong>de</strong>ixa<br />
<strong>de</strong> ser curioso que vários contos do livro têm como perso‑<br />
nagens principais motoristas <strong>de</strong> táxi, envolvidos em situa‑<br />
ções ora grotescas, ora surpreen<strong>de</strong>ntes, como no divertido<br />
e inesperado “Pelo cheiro”, ou em confissões repletas <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>speito, como em “Mulher é o diabo”.<br />
Mas o táxi da vida corre em todas as direções e a au‑<br />
tora tem sempre um olho atento para todos os lados e si‑<br />
tuações, o comum e o insólito. Como no conto “Denise”,<br />
em que o amor <strong>mais</strong> puro <strong>de</strong> duas meninas gira em torno<br />
<strong>de</strong> uma lata <strong>de</strong> goiabada, ou a experiência in<strong>de</strong>finível da<br />
menina ao ver a avó matar um peru para a ceia <strong>de</strong> natal<br />
(“Lembrando parece cinema”). Os Contos <strong>de</strong> vista estão,<br />
sobretudo, repletos <strong>de</strong> vida.<br />
e l i s a l u C i n d a<br />
193
CORDÉIS QUE<br />
EDUCAM E<br />
TRANSFORMAM<br />
Costa Senna<br />
1 a edição – 136 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1679 ‑8<br />
A partir da década <strong>de</strong> 1980, alguns cor<strong>de</strong>listas passa‑<br />
ram a colocar o seu talento a serviço da educação. Abrindo<br />
novos caminhos para o gênero, sem se <strong>de</strong>sligarem das tra‑<br />
dições seculares, tornaram ‑se uma espécie <strong>de</strong> auxiliares dos<br />
professores na difícil missão <strong>de</strong> formar o caráter dos jovens.<br />
Essa corrente tem um representante singular na figura do<br />
cearense Costa Senna, autor do instigante Cordéis que<br />
educam e transformam.<br />
Escrito com a clara intenção <strong>de</strong> “fazer do mundo um<br />
lugar melhor para se viver”, como observa Cláudio Portella<br />
no prefácio, o livro reúne poemas <strong>de</strong> intenção didática, es‑<br />
critos com a leveza e a força <strong>de</strong> comunicação peculiar ao<br />
gênero, falando da mulher, do prazer da leitura, <strong>de</strong> mate‑<br />
mática, mas também abordando temas do cotidiano que<br />
afetam, e por vezes perturbam, a vida do homem contem‑<br />
porâneo, como corrupção, discriminação racial e violência.<br />
Como bom poeta popular, Costa Senna vai direto ao<br />
assunto. Notem como ele introduz o tema da violência, que<br />
“[...] caminha/ Pelo mundo <strong>de</strong> mãos dadas/ Com drogas,<br />
assaltos, roubos,/ Corrupções <strong>de</strong>senfreadas./ Sequestros,<br />
assassinatos/ Entre pessoas e ratos/ Ela vai dando picadas”.<br />
Preocupado com a educação, Senna <strong>de</strong>dica ainda poe‑<br />
mas a “Uma viagem na história”, “Nas asas da leitura”, “A<br />
saga da humanida<strong>de</strong>”, “Os atropelos do português”, “Via‑<br />
gem ao mundo do alfabeto”, “A matemática em cor<strong>de</strong>l”,<br />
uma homenagem a Paulo Freire, que ele classifica <strong>de</strong><br />
“nobre menestrel” cuja “luz está na Terra/ E com as estrelas<br />
do céu”, “Água, a mãe da vida”, “A fonte da juventu<strong>de</strong>”,<br />
sobre saú<strong>de</strong>, esporte e lazer, e o divertido “Criança, que<br />
bicho é esse?”, valendo ‑se da velha adivinha popular: “Tira<br />
o ‘s’, põe o ‘p’,/ O seu nome vira papo./ Sem o ‘sa’ e com<br />
o ‘tra’/ Esse bichinho é um trapo/ Gosta muito <strong>de</strong> lagoa,/ É<br />
tranquilo, numa boa.../ Esse bicho é o?... SAPO”.<br />
194<br />
C o s t a s e n n a<br />
kATMANDU<br />
Anna Maria Martins<br />
2 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1517 ‑3<br />
Desfrutando <strong>de</strong> um prestígio extraordinário na década<br />
<strong>de</strong> 1970 e seguintes, semelhante ao do soneto nos tempos<br />
do parnasianismo, o conto começou a ser olhado com cau‑<br />
tela a partir <strong>de</strong> certa época. A aparente facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reali‑<br />
zação, os exageros, o experimentalismo quase sempre<br />
enganador, criaram um clima <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconfiança e reserva em<br />
relação ao gênero. Insistiu ‑se mesmo em se falar em crise e<br />
agonia. Talvez, mas com uma ressalva. Crise, no sentido <strong>de</strong><br />
processo conduzindo ao amadurecimento e agonia com o<br />
significado <strong>de</strong> “luta”, como no ensaio <strong>de</strong> Miguel <strong>de</strong> Una‑<br />
muno, A agonia do cristianismo.<br />
Pois “este sentido agônico da criação, <strong>de</strong> cuja consci‑<br />
ência o escritor não po<strong>de</strong> ja<strong>mais</strong> apartar ‑se, está na raiz da<br />
escritura <strong>de</strong> Anna Maria Martins, como o <strong>de</strong>monstra a se‑<br />
quencia <strong>de</strong> seus contos reunidos em A trilogia do empare‑<br />
dado e outros contos (1973), Sala <strong>de</strong> espera (1978) e<br />
Katmandu”, observa Nilo Scalzo no prefácio ao livro.<br />
Contista do nosso tempo, irreverente e quase cruel,<br />
Anna Maria Martins, em seus contos, <strong>de</strong>smonta o edifício<br />
da socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo, supostamente arquitetada sob<br />
o signo da comunicação, mas que em realida<strong>de</strong> reduz o<br />
homem à condição <strong>de</strong> simples número, agravando ‑lhe a<br />
solidão e a confusão espiritual. Como observa Nilo Scalzo,<br />
“sem recorrer ao tom apocalíptico, a escritora disseca, por<br />
vezes <strong>de</strong> modo quase asséptico, esse mundo em <strong>de</strong>sagre‑<br />
gação, no plano social e individual, pondo assim em evi‑<br />
dência o drama do homem contemporâneo”.<br />
Katmandu reúne vinte histórias curtas, divididas em<br />
duas partes, nas quais a atmosfera <strong>de</strong>nsa é realçada pela<br />
frase <strong>de</strong>spojada, o domínio dos pl<strong>anos</strong> <strong>de</strong> tempo, a frag‑<br />
mentação <strong>de</strong> blocos habilmente montados, à semelhança<br />
da linguagem cinematográfica, musical e televisiva, <strong>de</strong>s‑<br />
cerrando <strong>de</strong> diferentes ângulos as situações e os persona‑<br />
gens em ação.<br />
a n n a M a r i a M a r t i n s
LER O MUNDO<br />
Affonso Romano <strong>de</strong> Sant'Anna<br />
1 a edição – 248 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1524 ‑1<br />
Ler o mundo é uma tarefa em que os artistas se em‑<br />
penham <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que o homem tomou consciência <strong>de</strong> si. A<br />
primeira expressão <strong>de</strong>sse exercício encontra ‑se nos <strong>de</strong>se‑<br />
nhos e inscrições rupestres do nosso antepassado pré‑<br />
‑histórico. Com o tempo, essa leitura se tornou cada vez<br />
<strong>mais</strong> refinada. Homero leu o mundo e o expressou na Ilíada<br />
e na Odisseia; Dante, na Divina comédia; Balzac, na Comé‑<br />
dia humana; Proust, na série Em busca do tempo perdido.<br />
Em nossos dias <strong>de</strong> correria, falta <strong>de</strong> tempo e domínio<br />
massacrante da tecnologia, on<strong>de</strong> a cada dia surgem novos<br />
códigos, ler o mundo <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ser um mero exercício poé‑<br />
tico <strong>de</strong> admiração para se tornar “uma questão <strong>de</strong> sobre‑<br />
vivência”, como observa Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna no<br />
único texto <strong>de</strong>ste volume que não se enquadra na catego‑<br />
ria <strong>de</strong> crônica. Que a afirmação incisiva, porém, não en‑<br />
gane ninguém. Há, e por certo sempre haverá, lugar para<br />
a poesia, o humor, a observação inteligente, o protesto<br />
sagaz diante do <strong>de</strong>sconcerto do mundo e dos <strong>de</strong>smandos<br />
dos políticos, características das crônicas <strong>de</strong> Affonso, que<br />
tornam a leitura e a interpretação do mundo agradáveis e<br />
fazem <strong>de</strong>las um exercício constante <strong>de</strong> sedução.<br />
Aliás, <strong>de</strong> seduções, variáveis como os temas aborda‑<br />
dos em Ler o mundo: as relações entre os ricos e a cultura,<br />
os modismos <strong>de</strong> linguagem, a arte da “contação” <strong>de</strong> his‑<br />
tórias, a recenseadora do IBGE, como os surdos se relacio‑<br />
nam com a música, a moda <strong>de</strong> feiras e bienais, a segunda<br />
vida <strong>de</strong> cada um <strong>de</strong> nós, os livros <strong>de</strong> que todos falam e<br />
poucos leram, o <strong>de</strong>stino <strong>de</strong> livros e bibliotecas na virada do<br />
século XX para o XXI, até o anexo documentado sobre a<br />
<strong>de</strong>missão do cronista da presidência da Biblioteca Nacional.<br />
O que sugere que, muitas vezes, ler o mundo é um exercí‑<br />
cio <strong>de</strong> amargura e frustração.<br />
a F F o n s o r o M a n o d e s a n t ' a n n a<br />
MEUS ROMANCES<br />
DE CORDEL<br />
Marco Haurélio<br />
1 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1554 ‑8<br />
Quem pensa que a literatura <strong>de</strong> cor<strong>de</strong>l morreu, não<br />
sabe <strong>de</strong> nada. Adaptada ao violento processo <strong>de</strong> urbaniza‑<br />
ção sofrido pelo país, nos últimos cinquenta <strong>anos</strong>, ela con‑<br />
tinua muito viva no meio rural e cada vez <strong>mais</strong> presente no<br />
ambiente urbano. O consumo popular <strong>de</strong> folhetos do gê‑<br />
nero continua forte. Os cor<strong>de</strong>listas atuais, discípulos e su‑<br />
cessores <strong>de</strong> Leandro Gomes <strong>de</strong> Barros, do cego A<strong>de</strong>raldo,<br />
<strong>de</strong> Zé Pretinho, seguem com muita <strong>de</strong>voção e talento a<br />
lição <strong>de</strong>sses mestres inesquecíveis, até hoje lembrados pelo<br />
povo e reconhecidos pelos intelectuais. É nessa tradição<br />
muitas vezes secular que se insere o cor<strong>de</strong>lista Marco Hau‑<br />
rélio, autor <strong>de</strong> vários folhetos <strong>de</strong> sucesso. Sete <strong>de</strong>ssas obras<br />
estão reunidas em Meus romances <strong>de</strong> cor<strong>de</strong>l (“O herói da<br />
Montanha Negra”, “Presepadas <strong>de</strong> Chicó e astúcias <strong>de</strong><br />
João Grilo”, “História <strong>de</strong> Belisfronte, o filho do pescador”,<br />
“A briga do major Ramiro com o Diabo”, “História da<br />
Moura Torta”, “Os três conselhos sagrados”, “Galopando<br />
o cavalo Pensamento”). Se o poeta já não tem a mesma<br />
ingenuida<strong>de</strong> dos velhos cantadores, sabe ainda como en‑<br />
treter o leitor, reter a sua atenção e extrair uma graça nova<br />
<strong>de</strong> temas e personagens multisseculares, consagrados pela<br />
tradição. O fato do homem do século XXI ainda se encantar<br />
com histórias <strong>de</strong> princesas, <strong>de</strong> ani<strong>mais</strong> fantásticos que au‑<br />
xiliam os heróis, <strong>de</strong> lutas com o diabo, prova que nem<br />
mesmo a frieza da tecnologia e a voracida<strong>de</strong> da socieda<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> consumo conseguem matar a imaginação humana e o<br />
seu gosto pelo fantástico. O cor<strong>de</strong>l, veículo <strong>de</strong> evasão e<br />
catarse, parece eterno, como toda arte autêntica.<br />
M a r C o h a u r é l i o<br />
195
O CARDEAL E O<br />
REPÓRTER<br />
HISTÓRIAS QUE FAZEM HISTÓRIA<br />
Ricardo Carvalho<br />
1 a edição – 184 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1221 ‑9<br />
Ultrapassado o momento <strong>de</strong> sua publicação, quando<br />
atua como veículo <strong>de</strong> informação ou <strong>de</strong>núncia, a reporta‑<br />
gem jornalística, a boa reportagem, po<strong>de</strong> se transformar<br />
num excelente subsídio para a história. Mais interessante<br />
ainda po<strong>de</strong> ser a reportagem da reportagem, quando o<br />
autor se dispõe a contar os auxílios recebidos e as tramas e<br />
dificulda<strong>de</strong>s que teve <strong>de</strong> superar para concluir seu trabalho<br />
e que não figuram no texto entregue ao leitor.<br />
É o que faz Ricardo Carvalho em O car<strong>de</strong>al e o repór‑<br />
ter, que traz o subtítulo <strong>de</strong> “histórias que fazem História”.<br />
O livro reúne doze capítulos contando a gênese e as peri‑<br />
pécias <strong>de</strong> outras tantas reportagens publicadas na década<br />
<strong>de</strong> 1970 e <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> repercussão à época, quando a falta<br />
<strong>de</strong> respeito aos direitos hum<strong>anos</strong> tornava a prática jornalís‑<br />
tica um risco permanente.<br />
O jornalista contava então com a colaboração <strong>de</strong> um<br />
misterioso informante, bem situado na estrutura social, que<br />
hoje sabemos ser o car<strong>de</strong>al <strong>de</strong> São Paulo dom Paulo Eva‑<br />
risto Arns.<br />
Passados <strong>mais</strong> <strong>de</strong> trinta <strong>anos</strong>, com emoção que não<br />
exclui o humor, o repórter <strong>de</strong>scerra os bastidores <strong>de</strong> episó‑<br />
dios como a campanha <strong>de</strong> libertação do preso político Apa‑<br />
recido Galdino, encerrado no Manicômio Judiciário, sem<br />
julgamento; o encontro do corpo do primeiro <strong>de</strong>saparecido<br />
político brasileiro; a publicação da primeira lista <strong>de</strong> <strong>de</strong>sapa‑<br />
recidos políticos brasileiros; a i<strong>de</strong>ntificação dos filhos <strong>de</strong><br />
presos políticos, sequestrados pelas forças <strong>de</strong> repressão no<br />
Cone Sul; a história da reunião dos bispos latino ‑americ<strong>anos</strong><br />
em Puebla, no México, que teve a presença do papa João<br />
Paulo II, e outros que “po<strong>de</strong>m ter ajudado na construção<br />
<strong>de</strong> uma opinião pública <strong>mais</strong> consciente e <strong>mais</strong> fortalecida”<br />
segundo suas palavras.<br />
Como observa A. P. Quartim <strong>de</strong> Moraes, “escrita com<br />
paixão, esta obra é uma aula <strong>de</strong> História e <strong>de</strong> Jornalismo”.<br />
196<br />
r i C a r d o C a r v a l h o<br />
O CÓDIGO DAS ÁGUAS<br />
Lindolf Bell<br />
5 a edição – 128 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0473 ‑5<br />
O poeta catarinense Lindolf Bell foi uma espécie <strong>de</strong><br />
guerrilheiro da poesia. Durante toda a sua vida se empenhou<br />
em divulgá ‑la, on<strong>de</strong> houvesse um ouvido humano capaz <strong>de</strong><br />
captar a mensagem <strong>de</strong> sua metralhadora poética.<br />
Com essa finalida<strong>de</strong> criou, em 1964, o movimento<br />
Catequese Poética, pioneiro na divulgação da poesia em<br />
espaços abertos, em ruas, portas <strong>de</strong> fábricas, viadutos, pra‑<br />
ças, escolas, bares, teatros, universida<strong>de</strong>s, estádios.<br />
Querendo <strong>mais</strong>, sempre <strong>mais</strong>, como bom guerrilheiro,<br />
criou as Praças <strong>de</strong> Poesia, os Painéis ‑Poema, os Corpoemas<br />
(camisetas com poema), cartões ‑postais, papéis ‑carta‑<br />
‑poema e o primeiro programa <strong>de</strong> televisão <strong>de</strong>dicado à<br />
poesia. No exercício mágico <strong>de</strong> sua arte, <strong>de</strong>ixou treze livros<br />
<strong>de</strong> poemas, uma obra <strong>de</strong>nsa, que inclui <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a <strong>de</strong>núncia<br />
do <strong>de</strong>saparecimento gradual dos sentimentos <strong>de</strong> fraterni‑<br />
da<strong>de</strong> a busca ao tempo perdido, que lhe permitisse aquele<br />
encontro profundo consigo mesmo, <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> todo ser<br />
humano que se espiritualiza, até a plena interiorização, a<br />
marca talvez <strong>mais</strong> forte <strong>de</strong> O código das águas.<br />
Esse código misterioso se manifesta <strong>de</strong> muitas formas,<br />
como naquele rio chamado amor, “<strong>de</strong>spojado <strong>de</strong> intransi‑<br />
gências,/ preconceitos,/ perplexo no eterno <strong>de</strong>sejo”, que flui<br />
<strong>de</strong>ntro do poeta “com sabor <strong>de</strong> paciência/ e extraordinário<br />
sabor <strong>de</strong> nada”. Está por trás também <strong>de</strong> sua inquietação:<br />
“Que faço neste tempo/ entre terra e céu <strong>de</strong> ironia?”.<br />
Ao contrário <strong>de</strong> Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> que confessava ser<br />
duzentos, Bell crê, por um momento, na unida<strong>de</strong> interna:<br />
“Me somo./ E fico um./ Me multiplico./ E permaneço um./<br />
Me divido./ E continuo um./ Me diminuo./ E resto um./ Me<br />
escrevo./ E sou nenhum”. Logo <strong>de</strong>scobre “mil i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s<br />
secretas” e, se não consegue se encontrar, pelo menos já<br />
<strong>de</strong>scobriu o essencial para seguir adiante: “Menor do que<br />
meu sonho não posso ser.”.<br />
l i n d o l F B e l l
O CONTO DA MULHER<br />
BRASILEIRA<br />
Edla van Steen (org.)<br />
3 a edição – 192 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1257 ‑8<br />
As mulheres estão impossíveis. Ocupando posições cada<br />
vez <strong>mais</strong> vitais no mundo mo<strong>de</strong>rno, elas começam, também,<br />
a superar o homem, quantitativamente, no terreno das artes,<br />
em especial a literatura. Se bem que em arte, como reconhece<br />
Edla van Steen no prefácio a O conto da mulher brasileira,<br />
artistas “não têm sexo: são artistas”, o fato representa, no<br />
mínimo, um fenômeno sociológico digno <strong>de</strong> nota.<br />
Reunindo <strong>de</strong>zenove contos <strong>de</strong> autoras contemporâneas,<br />
além <strong>de</strong> sua qualida<strong>de</strong> literária, essa antologia é também um<br />
indicador preciso das angústias, preocupações e perplexida<strong>de</strong>s<br />
da mulher brasileira. Os temas são esclarecedores. Assim, a<br />
maioria <strong>de</strong>sses trabalhos trata da frustração existencial, quase<br />
sempre <strong>de</strong>corrente da frustração amorosa, evi<strong>de</strong>nciando que,<br />
nesse aspecto, a mulher atual, como as mulheres do passado,<br />
continua pondo antes e acima <strong>de</strong> tudo a realização no terreno<br />
amoroso, o “Amor entre dois sexos que se complementam, e<br />
reencontram a Unida<strong>de</strong> primordial”, na observação <strong>de</strong> Nelly<br />
Novaes Coelho, no posfácio à obra.<br />
O que mudou foi a presença da mulher na socieda<strong>de</strong><br />
e sua visão <strong>de</strong> mundo. O amor continua essencial, mas o<br />
relacionamento com o homem mudou radicalmente.<br />
Ontem, submissa e <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, mulher ‑objeto, como<br />
então se dizia; hoje, ela exige a realização integral <strong>de</strong> seu<br />
afeto, no mesmo nível do parceiro. O que constitui <strong>mais</strong><br />
um motivo <strong>de</strong> frustração e revolta, sem invalidar a busca<br />
permanente da felicida<strong>de</strong> individual.<br />
Mas esses contos expressam buscas ainda <strong>mais</strong> inquie‑<br />
tantes, como a do significado da vida. O que somos? Por que<br />
e para que vivemos? Indagações expressas num texto pertur‑<br />
bador <strong>de</strong> Hilda Hilst. Pensar no mistério do <strong>de</strong>stino humano<br />
é cair no terreno do absurdo e do oculto, temas tratados,<br />
com maestria, nos contos <strong>de</strong> Lygia Fagun<strong>de</strong>s Teltes e Judith<br />
Grossmann, exemplos da complexida<strong>de</strong> <strong>de</strong> assuntos e da<br />
riqueza <strong>de</strong> temas abordados nesta antologia.<br />
e d l a v a n s t e e n ( o r G . )<br />
O IMAGINÁRIO<br />
COTIDIANO<br />
Moacyr Scliar<br />
3 a edição – 184 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0729 ‑7<br />
Nem sempre a vida imita a arte. Com muito <strong>mais</strong> fre‑<br />
quência, a vida inspira a arte, por razões óbvias. A riqueza<br />
do cotidiano é infinita. Saber explorar esse material inesgotá‑<br />
vel é prova <strong>de</strong> sagacida<strong>de</strong>, mas exige também do escritor uma<br />
certa adaptação, como ocorreu com Moacyr Scliar na elabo‑<br />
ração dos trabalhos reunidos em O imaginário cotidiano.<br />
Acostumado a extrair o material <strong>de</strong> suas obras da pró‑<br />
pria mente, o escritor gaúcho sentiu ‑se um tanto embara‑<br />
çado quando recebeu convite da Folha <strong>de</strong> S. Paulo para<br />
escrever ficção baseada em notícias publicadas no jornal.<br />
Ou seja, a arte não apenas imitando a vida, mas se estrutu‑<br />
rando a partir da própria realida<strong>de</strong> cotidiana imediata.<br />
No início, Scliar ficou em dúvida, mas logo se conscien‑<br />
tizou das múltiplas possibilida<strong>de</strong>s da proposta. Fascinou ‑o a<br />
possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> explorar uma espécie <strong>de</strong> história virtual<br />
“que complementa ou amplia a história real (se é que sabe‑<br />
mos exatamente o que é uma história real)”. Assim, passou<br />
a pinçar aqui e ali trechos do noticiário, aparentemente inca‑<br />
pazes <strong>de</strong> servir <strong>de</strong> material inspirador <strong>de</strong> ficção: o mercado<br />
da Bolsa <strong>de</strong>ixando um operador neurótico, quatro pessoas<br />
feridas por balas perdidas, macacos famintos que inva<strong>de</strong>m<br />
as cida<strong>de</strong>s, homem preso por forjar o próprio sequestro, um<br />
pretenso mo<strong>de</strong>lo matemático capaz <strong>de</strong> prever gols no fute‑<br />
bol, o jogador que queria direitos autorais sobre os seus gols.<br />
São indicações sumárias, que o escritor explora com<br />
sarcasmo, comoção ou a <strong>mais</strong> pura gozação, mas sempre<br />
com aquele dom <strong>de</strong> se comunicar com o leitor e envolvê ‑lo<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a primeira frase.<br />
OBRAS DE LITERATURA JUVENIL E INFANTIL<br />
DO AUTOR<br />
• Gota d’água<br />
• Um sonho no caroço do abacate<br />
M o a C y r s C l i a r<br />
197
ÓPERA NEGRA<br />
Martinho da Vila<br />
1 a edição – 96 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0699 ‑1<br />
Em Ópera negra, Martinho da Vila exalta as qualida<strong>de</strong>s<br />
da raça negra – qualida<strong>de</strong>s humanas, musicais, poéticas –,<br />
reivindica igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s na socieda<strong>de</strong> e<br />
aponta a discriminação racial e social, sobretudo a dirigida às<br />
classes pobres, vítimas <strong>de</strong> uma dupla opressão: policial e dos<br />
bandidos. É uma obra <strong>de</strong> <strong>de</strong>núncia e combate, mas não <strong>de</strong><br />
ódio racial. Combate suave, <strong>de</strong> quem <strong>mais</strong> tar<strong>de</strong>, vencedor,<br />
possa dizer, como São Paulo: “Combati o bom combate.”.<br />
Ópera negra simula a representação <strong>de</strong> uma ópera no<br />
Teatro Municipal do Rio <strong>de</strong> Janeiro, em dia <strong>de</strong> casa cheia.<br />
Divi<strong>de</strong> ‑se em três atos e um epílogo. O primeiro é uma lou‑<br />
vação à raça, com a apresentação <strong>de</strong> negros que marcaram<br />
a história brasileira: Cruz e Sousa, Lima Barreto, Luís Gama,<br />
João Clapp, André Rebouças, Zumbi dos Palmares e tantos<br />
outros. Os dois atos seguintes contam a história <strong>de</strong> um<br />
jovem que se torna bandido e não consegue <strong>mais</strong> se libertar.<br />
Mesmo regenerado, a socieda<strong>de</strong> não o aceita. Uma história<br />
<strong>de</strong> todo dia nas favelas cariocas e <strong>de</strong> outras cida<strong>de</strong>s.<br />
Nascido em uma pequena cida<strong>de</strong> do interior do Rio <strong>de</strong><br />
Janeiro, Duas Barras, Martinho conhece o problema <strong>de</strong> perto.<br />
Ainda criança, a família migrou para a cida<strong>de</strong> do Rio <strong>de</strong><br />
Janeiro, fixando ‑se na Serra dos Pretos Forros. Após exercer<br />
algumas profissões, <strong>de</strong>spontou em um festival <strong>de</strong> música,<br />
em 1967. A partir daí, como cantor e compositor, acumu‑<br />
lou sucessos, tornando ‑se um dos campeões <strong>de</strong> venda <strong>de</strong><br />
discos no país. Com vários álbuns editados no exterior, é<br />
artista admirado em Portugal e nos países afric<strong>anos</strong>. Já na<br />
maturida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>dicou ‑se à literatura, criando a sua própria<br />
editora. Ópera negra é seu quarto livro.<br />
OBRA DE LITERATURA JUVENIL DO AUTOR<br />
• Vamos brincar <strong>de</strong> política?<br />
198<br />
M a r t i n h o d a v i l a<br />
POEMAS DE AMOR<br />
Augusto Fre<strong>de</strong>rico Schmidt<br />
2 a edição – 112 páginas<br />
ISBN 85 ‑260 ‑0210 ‑4<br />
Poeta <strong>de</strong> inspiração bíblica, Augusto Fre<strong>de</strong>rico Schmidt<br />
foi um lírico amoroso <strong>de</strong> tonalida<strong>de</strong> única na literatura bra‑<br />
sileira. Qual a mulher que não se sentiria gloriosa, homena‑<br />
geada com versos como esses: “Quando repousarás em mim<br />
como a poesia nos gran<strong>de</strong>s poetas/ Como a pureza na alma<br />
dos santos/ Como os pássaros nas torres das igrejas?/<br />
Quando repousará o teu amor no meu amor?”.<br />
Pertencendo, cronologicamente, à segunda fase do<br />
Mo<strong>de</strong>rnismo, Schmidt sempre se caracterizou pela in<strong>de</strong>‑<br />
pendência em relação a modas literárias. Na contramão das<br />
frases curtas, concisas, econômicas dos mo<strong>de</strong>rnistas, expres‑<br />
‑sava ‑se num estilo <strong>de</strong>rramado, fluvial, cheio <strong>de</strong> repetições.<br />
Essa singularida<strong>de</strong> se afirma <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o primeiro livro, Canto<br />
do brasileiro Augusto Fre<strong>de</strong>rico Schmidt, no qual rebela ‑se<br />
contra o lirismo dominante: “Não quero <strong>mais</strong> o Brasil/ Não<br />
quero <strong>mais</strong> geografia/ Nem pitoresco.”.<br />
O poeta queria <strong>de</strong>scobrir sua geografia interna, os cami‑<br />
nhos a serem seguidos por seu espírito, sem imposições <strong>de</strong><br />
modas. A insatisfação com a realida<strong>de</strong> cotidiana acaba por<br />
levá ‑lo a um permanente processo <strong>de</strong> fuga, do mundo e <strong>de</strong> si<br />
mesmo. Só havia uma saída: “Cantar – claro cantar – para não<br />
ficar louco.”. Mas parece que, quanto <strong>mais</strong> se buscava, <strong>mais</strong><br />
se estranhava e <strong>mais</strong> se afastava <strong>de</strong> si mesmo, romântico e<br />
insatisfeito, com forte tendência à melancolia e ao isolamento,<br />
preocupado com a morte, solitário e angustiado.<br />
Esse quadro sombrio foi, <strong>de</strong> certa maneira, resgatado<br />
por seu forte sentimento religioso, ou antes, uma vaga reli‑<br />
giosida<strong>de</strong>, talvez <strong>mais</strong> uma busca do que uma crençaque, <strong>de</strong><br />
certa forma, contaminou também sua poesia, “<strong>de</strong> senti‑<br />
mento romântico fundamente brasileiro, a que se junta certa<br />
nostalgia oriental” (Carlos Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>) e na<br />
qual a relação entre homem e mulher está tingida por uma<br />
vaga e incerta religiosida<strong>de</strong>.<br />
a u G u s t o F r e d e r i C o s C h M i d t
POETAS DA AMÉRICA<br />
DE CANTO<br />
CASTELHANO<br />
Seleção, tradução e notas <strong>de</strong><br />
Thiago <strong>de</strong> Mello<br />
1 a edição – 496 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1561 ‑6<br />
Apesar dos programas <strong>de</strong> aproximação e integração<br />
econômica da América Latina, no plano cultural o Brasil<br />
continua ignorando os vizinhos <strong>de</strong> língua espanhola.<br />
Quando muito editamos romances <strong>de</strong> repercussão univer‑<br />
sal, best ‑sellers lidos tanto na Europa, como na China. Há<br />
uma ou outra exceção. Mas, quando se trata <strong>de</strong> poesia, o<br />
<strong>de</strong>sconhecimento é completo. Contam ‑se nos <strong>de</strong>dos os<br />
poetas argentinos, chilenos, mexic<strong>anos</strong> ou <strong>de</strong> outras nacio‑<br />
nalida<strong>de</strong>s apresentados ao público brasileiro em edições<br />
in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes. Mesmo a inclusão <strong>de</strong>sses poetas em anto‑<br />
logias é rara. Uma brilhante exceção foi Manuel Ban<strong>de</strong>ira,<br />
que traduziu poemas <strong>de</strong> vários <strong>de</strong>les. Mas, por <strong>mais</strong> sur‑<br />
preen<strong>de</strong>nte que seja, não havia até hoje nenhuma antolo‑<br />
gia abrangente da poesia hispano ‑americana.<br />
Com poemas selecionados e traduzidos por Thiago <strong>de</strong><br />
Mello, Poetas da América <strong>de</strong> canto castelhano é, pois, um<br />
livro pioneiro. Mais do que isso: uma <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> amor e<br />
admiração e um exercício <strong>de</strong> fraternida<strong>de</strong>. Durante doze<br />
<strong>anos</strong>, o poeta amazonense pesquisou e interpretou poetas<br />
do continente. Uma parcela <strong>de</strong>ste trabalho – 400 poemas <strong>de</strong><br />
120 autores – está reunida nesta antologia, em traduções<br />
<strong>de</strong> excelente nível.<br />
Este passeio poético no tempo e no espaço, com re‑<br />
presentantes <strong>de</strong> todos os países do continente, contempla<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> clássicos da poesia <strong>de</strong> língua espanhola, universal‑<br />
mente consagrados, como Pablo Neruda, Jorge Luis Bor‑<br />
ges, César Vallejo, Rubén Darío, Gabriela Mistral, Nicolás<br />
Guillén, José Asunción Silva, José Martí, até jovens poetas<br />
em fase <strong>de</strong> afirmação.<br />
Poetas da América <strong>de</strong> canto castelhano convida ainda a<br />
incursões <strong>mais</strong> profundas no território poético <strong>de</strong> nossos vizi‑<br />
nhos, na busca permanente do que Thiago <strong>de</strong> Mello chama<br />
<strong>de</strong> o “triunfo da beleza, da verda<strong>de</strong> e da ternura humana”.<br />
s e l e ç ã o , t r a d u ç ã o e n o t a s d e t h i a G o d e M e l l o<br />
QUANDO O PODER<br />
CORROMPE,<br />
CORROMPE A NÃO<br />
MAIS PODER<br />
Ciro Pellicano<br />
1 a edição – 160 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1409 ‑1<br />
O humor continua sendo o melhor remédio para o<br />
mau humor. A frase po<strong>de</strong> ser acaciana, mas não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong><br />
ser verda<strong>de</strong>ira. Mas existe humor tolo e humor refinado. As<br />
ofertas do primeiro são amplas, gerais e irrestritas. As que<br />
envolvem inteligência e criativida<strong>de</strong> são <strong>mais</strong> raras. Mas<br />
ainda existem, como comprova esse <strong>de</strong>licioso Quando o<br />
po<strong>de</strong>r corrompe, corrompe a não <strong>mais</strong> po<strong>de</strong>r, que traz o<br />
subtítulo longo, mas não menos significativo <strong>de</strong> “fraseolo‑<br />
gia <strong>de</strong> resistência à irracionalida<strong>de</strong> cotidiana: um olhar crí‑<br />
tico sobre a shopping ‑centerização progressiva das relações<br />
humanas, seja lá o que isso possa significar”.<br />
Publicitário, jornalista, contista, Ciro Pellicano se rea‑<br />
liza sobretudo no humor, em geral frases curtas e incisivas,<br />
ironizando hábitos e costumes <strong>de</strong> nosso tempo (por exem‑<br />
plo: “Até quinze <strong>anos</strong> atrás, eu vivia muito bem sem um<br />
telefone celular. Hoje, então, viveria muito melhor”), atitu‑<br />
<strong>de</strong>s <strong>de</strong> todos os tempos (“O prolixo, quando sozinho, fala<br />
com seus borbotões”), preocupações do homem mo<strong>de</strong>rno<br />
(“Se <strong>de</strong>cidisse escrever um livro <strong>de</strong> dieta alimentar, eu o<br />
faria magrinho, magrinho”) ou paródias a textos clássicos<br />
(“No sétimo dia, Deus <strong>de</strong>scansou – e os homens começa‑<br />
ram a <strong>de</strong>sfazer o mundo”).<br />
As frases são intercaladas com textos <strong>mais</strong> longos,<br />
pequenos flagrantes extraídos do cotidiano, contos ou<br />
quase contos, envolvendo personagens nem sempre bem‑<br />
‑humorados como Virgulino Lampião ou <strong>de</strong> melhor astral,<br />
como Zequinha <strong>de</strong> Abreu, o imortal compositor <strong>de</strong> “Tico‑<br />
‑Tico no fubá”.<br />
O que significa que o autor sabe <strong>de</strong>scobrir humor em<br />
todas as situações, oferecendo ao leitor o pretexto para<br />
boas risadas, sem a pretensão <strong>de</strong> originalida<strong>de</strong> absoluta.<br />
Como ele mesmo reconhece, lembrando Mark Twain, “o<br />
único homem que teve certeza <strong>de</strong> estar dizendo uma frase<br />
original foi Adão”.<br />
C i r o P e l l i C a n o<br />
199
TODOS OS<br />
GANHADORES DO<br />
PRÊMIO NOBEL DE<br />
LITERATURA<br />
1901 2010<br />
Lu<strong>de</strong>nbergue Góes<br />
1 a edição – 288 páginas<br />
ISBN 978 ‑85 ‑260 ‑1526 ‑5<br />
O Prêmio Nobel <strong>de</strong> Literatura é a honraria máxima que<br />
um escritor po<strong>de</strong> almejar, além <strong>de</strong> ser muito gratificante em<br />
termos financeiros. O vencedor fica consagrado e rico, se<br />
bem que a sua atribuição muitas vezes cause <strong>de</strong>sagrado,<br />
pela evi<strong>de</strong>nte conotação política. Tal fato explica a conces‑<br />
são a vários escritores, digamos, <strong>de</strong> recursos mo<strong>de</strong>stos,<br />
enquanto outros, artistas <strong>de</strong> gênio (lembremos Marcel<br />
Proust, James Joyce, Jorge Luis Borges, Franz Kafka, Émile<br />
Zola, Guimarães Rosa), ficam a ver navios. Há ainda uma<br />
certa complacência com os escritores escandinavos, muitas<br />
vezes em prejuízo <strong>de</strong> colegas <strong>de</strong> outras regiões do planeta.<br />
Nada disso abala o prestígio do prêmio, instituído em<br />
1900, pela Aca<strong>de</strong>mia Sueca, que em seus 110 <strong>anos</strong> <strong>de</strong> exis‑<br />
tência laureou 107 escritores (não houve premiação du‑<br />
rante a II Guerra Mundial, <strong>de</strong> 1940 a 1943), do poeta<br />
parnasiano francês Sully Prudhomme ao romancista peru‑<br />
ano Mario Vargas Llosa.<br />
É a história <strong>de</strong> cada um <strong>de</strong>sses artistas que o jornalista<br />
Lu<strong>de</strong>nbergue Góes conta em Todos os ganhadores do Prê‑<br />
mio Nobel <strong>de</strong> Literatura, precedido por uma notícia sobre<br />
o criador do prêmio, o cientista sueco Alfred Nobel, e o<br />
processo <strong>de</strong> elaboração do Nobel <strong>de</strong> literatura, que não<br />
figurava no primeiro testamento <strong>de</strong> Alfred Nobel.<br />
Em linguagem fluente, acessível e espaço rigorosa‑<br />
mente igual para todos, Góes apresenta um breve resumo<br />
da vida do laureado e uma relação <strong>de</strong> suas obras <strong>mais</strong> im‑<br />
portantes, constituindo o conjunto um importante e rico<br />
material <strong>de</strong> pesquisa.<br />
Jornalista com quase sessenta <strong>anos</strong> <strong>de</strong> carreira, Lu‑<br />
<strong>de</strong>nbergue Góes trabalhou em O Estado <strong>de</strong> S. Paulo, nas<br />
tevês Ban<strong>de</strong>irantes e Globo e, durante <strong>de</strong>z <strong>anos</strong>, na asses‑<br />
soria <strong>de</strong> comunicação do governo <strong>de</strong> São Paulo. É autor<br />
dos livros ABC do Código Da Vinci e Mulher brasileira em<br />
primeiro lugar.<br />
200<br />
l u d e n B e r G u e G ó e s
ÍNDICE<br />
Para facilitar sua consulta, este índice está<br />
classificado da seguinte forma:<br />
negrito: nome das obras;<br />
itálico: nome dos autores;<br />
redondo: nome dos selecionadores, organizadores e<br />
tradutores.<br />
Aca<strong>de</strong>mia Brasileira <strong>de</strong> Letras .............................................................. 89<br />
Acor<strong>de</strong>i em Woodstock.................................................................. 144<br />
Açúcar ............................................................................................. 130<br />
Adriano Espínola ................................................................................. 57<br />
Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna ................................................... 33, 195<br />
Afonso Henriques Neto ........................................................... 13, 27, 83<br />
Afrânio Coutinho ...................................................... 109, 110, 111, 112<br />
Afrânio Coutinho ................................................................................ 15<br />
Aí vai meu coração ........................................................................... 90<br />
Alberto Venancio Filho ........................................................................ 20<br />
Alçapão, O ........................................................................................ 95<br />
Aleilton Fonseca .................................................................................. 56<br />
Alessandro Buzo ............................................................................... 106<br />
Alexandre Eulalio ................................................................................ 58<br />
Alexei Bueno ................................................................................. 48, 86<br />
Alfredo Bosi ........................................................................................ 40<br />
Allan da Rosa .................................................................................... 105<br />
Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens Filho .......................................................... 27<br />
Aluísio Azevedo ................................................................................ 101<br />
Álvaro Marins ..................................................................................... 53<br />
Ana Luísa Martins ............................................................................... 90<br />
Ana Luísa Martins ............................................................................... 60<br />
Anna Maria Martins .......................................................................... 194<br />
Anna Maria Martins ............................................................................ 71<br />
André Seffrin .................................................................... 10, 11, 25, 82<br />
Anjo do a<strong>de</strong>us, O ........................................................................... 148<br />
Anônimo célebre, O ....................................................................... 149<br />
Anos 30 ............................................................................................. 81<br />
Anos 40 ............................................................................................. 81<br />
Anos 50 ............................................................................................. 82<br />
Anos 60 ............................................................................................. 82<br />
Anos 70 ............................................................................................. 83<br />
Anos 80 ............................................................................................. 83<br />
Anos 90 ............................................................................................. 84<br />
Anos 2000 ......................................................................................... 84<br />
Antologia da alimentação no Brasil ............................................. 155<br />
Antologia <strong>de</strong> contos da uBE ......................................................... 191<br />
Antologia do cor<strong>de</strong>l brasileiro ...................................................... 192<br />
Antologia do folclore brasileiro .................................................... 155<br />
Antonio Arnoni Prado ......................................................................... 28<br />
Antonio Candido ................................................................................ 28<br />
Antonio Carlos Secchin .................................................... 10, <strong>39</strong>, 44, 87<br />
Antonio Dimas ...................................................................................... 5<br />
Antônio Hohlfeldt ............................................................................... 14<br />
Antonio Martins <strong>de</strong> Araujo .................................................................... 6<br />
Arcadismo ......................................................................................... 85<br />
Ary Quintella ....................................................................................... 18<br />
Assobio da foice, O .......................................................................... 99<br />
Assombrações do Recife Velho ..................................................... 130<br />
Até sempre ..................................................................................... 121<br />
Augusto Fre<strong>de</strong>rico Schmidt ............................................................... 198<br />
Augusto Sérgio Bastos ........................................................................ 64<br />
Avesso ............................................................................................... 93<br />
Barbara Heliodora ............................................................................... 77<br />
Beatriz Resen<strong>de</strong> <strong>de</strong> Freitas ................................................................... 69<br />
Bebel que a cida<strong>de</strong> comeu ............................................................. 145<br />
Beijo não vem da boca, O .............................................................. 149<br />
Bella Jozef ........................................................................................... 21<br />
Benedito Nunes .................................................................................. 50<br />
Benjamin Abdalla Junior ...................................................................... 29<br />
Bolero <strong>de</strong> Ravel .............................................................................. 183<br />
Brancos e negros em São Paulo .................................................... 125<br />
Cabeças <strong>de</strong> segunda ‑feira ............................................................. 145<br />
Ca<strong>de</strong>iras proibidas ......................................................................... 146<br />
Caesar Sobreira ................................................................................. 141<br />
Café na cama .................................................................................. 172<br />
Câmara Cascudo e Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>: Cartas, 1924 ‑1944 ............ 90<br />
Caminhos diversos: sob os signos do cor<strong>de</strong>l ................................ 192<br />
201
Canto <strong>de</strong> muro ............................................................................... 156<br />
Cão da meia ‑noite, O ..................................................................... 175<br />
Capitalismo <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte e classes sociais na América Latina ..... 126<br />
Car<strong>de</strong>al e o repórter: histórias que fazem História, O................. 196<br />
Carlos Castelo ..................................................................................... 98<br />
Carlos Felipe Moisés ............................................................................ 29<br />
Carlos Herculano Lopes ....................................................................... 74<br />
Carlos Ribeiro ..................................................................................... 60<br />
Carlos Vogt ......................................................................................... 42<br />
Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala .................................................................. 131<br />
Casa ‑gran<strong>de</strong> & senzala em quadrinhos ........................................ 131<br />
Caso do filho do enca<strong>de</strong>rnador, O ................................................ 176<br />
Castro Alves ...................................................................................... 102<br />
Cecilia Almeida Salles .......................................................................... 66<br />
Cecilia Costa ....................................................................................... 60<br />
Cecília Meireles ................................................................................. 114<br />
Cela Forte ........................................................................................ 104<br />
Cheiro <strong>de</strong> amor ............................................................................... 122<br />
Chez. Mme. Maigret ...................................................................... 193<br />
China tropical ................................................................................. 132<br />
Ciro Pellicano .................................................................................... 199<br />
Civilização e cultura ....................................................................... 156<br />
Cláudio Murilo Leal ....................................................................... 58, 74<br />
Cláudio Portella .................................................................................. 53<br />
Cleonice Berardinelli ........................................................................... 32<br />
Código das águas, O ...................................................................... 196<br />
Coisas que o povo diz .................................................................... 157<br />
Colecionador <strong>de</strong> pedras ................................................................. 105<br />
Com esse ódio e esse amor ............................................................. 93<br />
Confissões <strong>de</strong> um vira‑lata ............................................................ 186<br />
Conto da mulher brasileira, O ....................................................... 197<br />
Contos <strong>de</strong> vista ............................................................................... 193<br />
Contos tradicionais do Brasil ......................................................... 157<br />
Cora coragem Cora poesia ............................................................ 119<br />
Cora Coralina ............................................................ 116, 117, 118, 119<br />
Corações mordidos ........................................................................ 122<br />
Cordéis que educam e transformam ............................................ 194<br />
Cores do crime, As ........................................................................... 98<br />
Correspondência <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis .......................................... 89<br />
Coruja, O ......................................................................................... 101<br />
202<br />
Costa Senna .............................................................................. 192, 194<br />
Criaturas <strong>de</strong> Prometeu, As ............................................................. 140<br />
Da Cabula ....................................................................................... 105<br />
Damas turcas .................................................................................... 98<br />
Darcy Damasceno ............................................................................... 42<br />
Darcy França Denófrio ......................................................................... 37<br />
Davi Arrigucci Jr. ........................................................................... 21, 45<br />
De menino a homem ..................................................................... 132<br />
De passagem mas não a passeio .................................................. 106<br />
Décio <strong>de</strong> Almeida Prado ...................................................................... 78<br />
Dentes ao sol .................................................................................. 146<br />
Deonísio da Silva ................................................................................. 12<br />
Depois do sol .................................................................................. 147<br />
Dicionário do folclore brasileiro.................................................... 158<br />
Dinha ................................................................................................ 106<br />
Dionísio Toledo ................................................................................... 22<br />
Doceira e poeta .............................................................................. 116<br />
Domício Proença Filho ................................................................... 17, 85<br />
Doze reis e a moça no labirinto do vento .................................... 180<br />
Edilberto Coutinho .............................................................................. 34<br />
Edla van Steen .................................................................. 121, 122, 123<br />
Edla van Steen .................................................................................. 197<br />
Edmundo Bouças ................................................................................ 67<br />
Edson Nery da Fonseca ..................................................................... 142<br />
Eduardo Coelho .................................................................................. 70<br />
Eduardo <strong>de</strong> Faria Coutinho ........................................ 109, 110, 111, 112<br />
Eduardo Portella ................................................................................. 17<br />
Eli<strong>de</strong> Rugai Bastos ............................................................................. 140<br />
Elisa Lucinda ..................................................................................... 193<br />
Em nome do pai dos burros ............................................................ 94<br />
Enciclopédia <strong>de</strong> literatura brasileira ............................................. 112<br />
Ensaio sobre o jardim .................................................................... 140<br />
Enterro da cafetina, O ................................................................... 176<br />
Entre sem bater .............................................................................. 173<br />
Escravo nos anúncios <strong>de</strong> jornais brasileiros do século xix, O .... 135<br />
Esdras do Nascimento ......................................................................... 92<br />
Esta noite ou nunca ....................................................................... 173<br />
Estórias da Casa Velha da Ponte ................................................... 116<br />
Estrela da manhã ........................................................................... 169<br />
Estrela da tar<strong>de</strong> .............................................................................. 169
Fábio Lucas ........................................................................... 18, 43, 191<br />
Fala do céu, A ................................................................................... 92<br />
Fátima Quintas .................................................................................. 142<br />
Fátima Quintas .................................................................................. 141<br />
Fausto Cunha ..................................................................................... 50<br />
Feijão e o sonho, O ........................................................................ 186<br />
Fernando Pessoa Ferreira ..................................................................... 99<br />
Flávia Amparo ..................................................................................... 68<br />
Flávio Aguiar ....................................................................................... 38<br />
Florestan Fernan<strong>de</strong>s .................................................. 125, 126, 127, 128<br />
Florestan Fernan<strong>de</strong>s: leituras & legados ...................................... 126<br />
Francisco <strong>de</strong> Assis Barbosa ............................................................ 16, 49<br />
Francisco Iglésias ................................................................................. 37<br />
Fred Góes ..................................................................................... 53, 67<br />
Folclore do Brasil ............................................................................ 158<br />
Geografia dos mitos brasileiros .................................................... 159<br />
Gilberto Araújo ................................................................................... 65<br />
Gilberto Freyre .......... 130, 131, 132, 133, 134, 135, 136, 137, 138, 1<strong>39</strong><br />
Gilberto Mendonça Teles ............................................................... 45, 69<br />
Glória Pondé ....................................................................................... 19<br />
GOG ................................................................................................. 104<br />
Gonçalves Dias .................................................................................. 101<br />
Guerreira ......................................................................................... 106<br />
Guga <strong>de</strong> Oliveira ............................................................................... 191<br />
Guia prático, histórico e sentimental da cida<strong>de</strong> do Recife .......... 133<br />
Guilhermino Cesar .............................................................................. 54<br />
Helena Parente Cunha ........................................................................ 14<br />
Helio Santos ........................................................................................ 95<br />
Heloisa Buarque <strong>de</strong> Hollanda ........................................................ 30, 73<br />
Herberto Sales ...................................................................................... 9<br />
Hil<strong>de</strong>berto Barbosa Filho ..................................................................... 52<br />
História da alimentação no Brasil ................................................. 159<br />
História dos nossos gestos ............................................................ 160<br />
Homem lésbico, O ............................................................................ 95<br />
Homem que odiava a segunda ‑feira, O ....................................... 150<br />
Homens do futuro, Os ................................................................... 178<br />
Humberto Werneck ............................................................................ 66<br />
i ‑Juca Pirama e os timbiras ............................................................ 101<br />
Ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão ....................... 144, 145, 146, 147, 148, 149,<br />
150, 151, 152, 153<br />
Ilka Marinho Zanotto .......................................................................... 79<br />
imaginário cotidiano, O ................................................................. 197<br />
Inês Oseki ‑Dépré ................................................................................. 43<br />
insurgências e ressurgências atuais .............................................. 133<br />
investigação etnológica no Brasil e outros ensaios, A ................ 125<br />
ira das águas, A .............................................................................. 121<br />
irredutivelmente escritor ............................................................... 142<br />
itinerário <strong>de</strong> Pasárgada ................................................................. 170<br />
Ivan Junqueira ............................................................................... 38, 81<br />
Ivan Marques ...................................................................................... 31<br />
Ivan Teixeira ........................................................................................ 87<br />
Izabela Leal ......................................................................................... 26<br />
J. A<strong>de</strong>raldo Castello ............................................................................ 13<br />
J. Galante <strong>de</strong> Souza .......................................................................... 112<br />
Jangada .......................................................................................... 160<br />
Jeanette Rozsas ................................................................................. 191<br />
Jefferson Del Rios ............................................................................... 78<br />
João Luiz Lafetá .................................................................................... 7<br />
João Roberto Faria ........................................................................ 68, 77<br />
José Almino ........................................................................................ 55<br />
José Carlos Garbuglio ......................................................................... 41<br />
José Carlos Santos <strong>de</strong> Azeredo ............................................................ 75<br />
José Paulo Paes ................................................................................... 31<br />
Judith Grossmann ............................................................................... 11<br />
Katmandu ....................................................................................... 194<br />
Larissa <strong>de</strong> Oliveira Neves ..................................................................... 62<br />
Lauro Junkes ................................................................................. 47, 88<br />
Lêdo Ivo ........................................................................................ 15, 35<br />
Lendas brasileiras ........................................................................... 161<br />
Léo Gilson Ribeiro ............................................................................... 33<br />
Leo<strong>de</strong>gário A. <strong>de</strong> Azevedo Filho .................................................... 47, 63<br />
Ler o mundo ................................................................................... 195<br />
Letícia Malard ..................................................................................... 61<br />
Levi Bucalem Ferrari .......................................................................... 191<br />
Leyla Perrone ‑Moisés .................................................................... 36, 67<br />
Lindolf Bell ........................................................................................ 196<br />
Literatura no Brasil vol. i: introdução geral, A ............................. 109<br />
Literatura no Brasil vol. ii: era barroca/era neoclássica, A .......... 110<br />
Literatura no Brasil vol. iii: era romântica, A ............................... 110<br />
Literatura no Brasil vol. iV: era realista/era <strong>de</strong> transição, A ....... 111<br />
203
Literatura no Brasil vol. V: era mo<strong>de</strong>rnista, A .............................. 111<br />
Literatura no Brasil vol. Vi: relações e perspectivas/<br />
conclusão, A ............................................................................. 112<br />
Literatura oral no Brasil ................................................................. 161<br />
Literatura, pão e poesia ................................................................. 107<br />
Locuções tradicionais no Brasil ..................................................... 162<br />
Luciana Stegagno Picchio .................................................................... 51<br />
Luciano Rosa ................................................................................... 7, 81<br />
Lucila Nogueira Rodrigues ................................................................... 49<br />
Lu<strong>de</strong>nbergue Góes ............................................................................ 200<br />
Luís Augusto Fischer ........................................................................... 72<br />
Luís da Câmara Cascudo .......... 154, 155, 156, 157, 158, 159, 160, 161,<br />
162, 163, 164, 165, 166, 167<br />
Luiz Alberto Men<strong>de</strong>s ......................................................................... 104<br />
Luiz Busatto ........................................................................................ 41<br />
Luíz Horácio ........................................................................................ 96<br />
Luiz Paulo Horta .................................................................................. 65<br />
Luiza Franco Moreira ........................................................................... 35<br />
Machado <strong>de</strong> Assis ............................................................................. 102<br />
Ma<strong>de</strong> in Africa ................................................................................ 162<br />
Malditos paulistas .......................................................................... 174<br />
Mano Juan ...................................................................................... 174<br />
Manuel Ban<strong>de</strong>ira ....................................................................... 169, 170<br />
Marcelo Secron Bessa ........................................................................... 8<br />
Marco Haurélio ................................................................................. 195<br />
Marco Haurélio ................................................................................. 192<br />
Marco Lucchesi ....................................................................... 59, 64, 84<br />
Marcos Antonio <strong>de</strong> Moraes ................................................................. 90<br />
Marcos Fre<strong>de</strong>rico Krüger ..................................................................... 57<br />
Marcos Pasche .................................................................................... 71<br />
Marcos Rey ....................................... 172, 173, 174, 175, 176, 177, 178<br />
Maria da Glória Bordini ....................................................................... 23<br />
Maria Fernanda .................................................................................. 36<br />
Maria José Silveira ............................................................................... 93<br />
Marina Colasanti ....................................................................... 180, 181<br />
Mario Moreyra .................................................................................... 61<br />
Marisa Lajolo ................................................................................ 52, 60<br />
Martinho da Vila ............................................................................... 198<br />
Melhor teatro Artur Azevedo ......................................................... 77<br />
Melhor teatro Domingos Oliveira ................................................... 77<br />
204<br />
Melhor teatro Gianfrancesco Guarnieri ......................................... 78<br />
Melhor teatro Juca <strong>de</strong> Oliveira ....................................................... 78<br />
Melhor teatro Maria A<strong>de</strong>lai<strong>de</strong> Amaral ........................................... 79<br />
Melhor teatro Plínio Marcos............................................................ 79<br />
Melhores contos Aluísio Azevedo .................................................... 5<br />
Melhores contos Aníbal Machado .................................................... 5<br />
Melhores contos Artur Azevedo ....................................................... 6<br />
Melhores contos Ary Quintella ......................................................... 6<br />
Melhores contos Aurélio Buarque <strong>de</strong> Holanda ................................ 7<br />
Melhores contos Autran Dourado .................................................... 7<br />
Melhores contos Breno Accioly ......................................................... 8<br />
Melhores contos Caio Fernando Abreu ............................................ 8<br />
Melhores contos Domingos Pellegrini .............................................. 9<br />
Melhores contos Eça <strong>de</strong> Queirós ....................................................... 9<br />
Melhores contos Edla van Steen ..................................................... 10<br />
Melhores contos Fausto Wolff ........................................................ 10<br />
Melhores contos Hélio Pólvora ....................................................... 11<br />
Melhores contos Herberto Sales ..................................................... 11<br />
Melhores contos Hermilo Borba Filho ............................................ 12<br />
Melhores contos ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão ................................. 12<br />
Melhores contos J. J. Veiga ............................................................. 13<br />
Melhores contos João Alphonsus ................................................... 13<br />
Melhores contos João Antônio ....................................................... 14<br />
Melhores contos João do Rio .......................................................... 14<br />
Melhores contos Joel Silveira .......................................................... 15<br />
Melhores contos Lêdo ivo ............................................................... 15<br />
Melhores contos Lima Barreto ........................................................ 16<br />
Melhores contos Luiz Vilela ........................................................... 16<br />
Melhores contos Lygia Fagun<strong>de</strong>s Telles ......................................... 17<br />
Melhores contos Machado <strong>de</strong> Assis ............................................... 17<br />
Melhores contos Marcos Rey .......................................................... 18<br />
Melhores contos Marques Rebelo .................................................. 18<br />
Melhores contos Moacyr Scliar ....................................................... 19<br />
Melhores contos Orígenes Lessa .................................................... 19<br />
Melhores contos Osman Lins .......................................................... 20<br />
Melhores contos Ribeiro Couto....................................................... 20<br />
Melhores contos Ricardo Ramos ..................................................... 21<br />
Melhores contos Rubem Braga ....................................................... 21<br />
Melhores contos Salim Miguel ........................................................ 22<br />
Melhores contos Simões Lopes Neto .............................................. 22
Melhores contos Walmir Ayala ....................................................... 23<br />
Melhores crônicas Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’anna........................ 61<br />
Melhores crônicas Álvaro Moreyra ................................................. 61<br />
Melhores crônicas Artur Azevedo .................................................. 62<br />
Melhores crônicas Austregésilo <strong>de</strong> Athay<strong>de</strong>.................................. 62<br />
Melhores crônicas Cecília Meireles ................................................. 63<br />
Melhores crônicas Coelho Neto ...................................................... 63<br />
Melhores crônicas Eucli<strong>de</strong>s da Cunha ............................................. 64<br />
Melhores crônicas Ferreira Gullar ................................................... 64<br />
Melhores crônicas Gustavo Corção ................................................. 65<br />
Melhores crônicas Humberto <strong>de</strong> Campos ..................................... 65<br />
Melhores crônicas ignácio <strong>de</strong> Loyola Brandão .............................. 66<br />
Melhores crônicas ivan Angelo ....................................................... 66<br />
Melhores crônicas João do Rio ........................................................ 67<br />
Melhores crônicas José Castello ...................................................... 67<br />
Melhores crônicas José <strong>de</strong> Alencar ................................................. 68<br />
Melhores crônicas Josué Montello ................................................. 68<br />
Melhores crônicas Lêdo ivo ............................................................. 69<br />
Melhores crônicas Lima Barreto ...................................................... 69<br />
Melhores crônicas Luís Martins ....................................................... 60<br />
Melhores crônicas Machado <strong>de</strong> Assis ............................................. 70<br />
Melhores crônicas Manuel Ban<strong>de</strong>ira .............................................. 70<br />
Melhores crônicas Marcos Rey ........................................................ 71<br />
Melhores crônicas Maria Julieta Drummond <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> ............ 71<br />
Melhores crônicas Marina Colasanti ............................................... 60<br />
Melhores crônicas Marques Rebelo ................................................ 72<br />
Melhores crônicas Moacyr Scliar ..................................................... 72<br />
Melhores crônicas Odylo Costa Filho ............................................. 60<br />
Melhores crônicas Olavo Bilac ........................................................ 73<br />
Melhores crônicas Rachel <strong>de</strong> Queiroz ............................................. 73<br />
Melhores crônicas Raul Pompeia .................................................... 74<br />
Melhores crônicas Roberto Drummond ......................................... 74<br />
Melhores crônicas Rodolfo Kon<strong>de</strong>r ................................................ 60<br />
Melhores crônicas Rubem Braga ..................................................... 60<br />
Melhores crônicas Sérgio Milliet ..................................................... 75<br />
Melhores crônicas Zuenir Ventura .................................................. 75<br />
Melhores frases <strong>de</strong> Casa ‑Gran<strong>de</strong> & Senzala, As .......................... 141<br />
Melhores poemas Affonso Romano <strong>de</strong> Sant’Anna ....................... 25<br />
Melhores poemas Alberto da Costa e Silva ................................... 25<br />
Melhores poemas Alberto <strong>de</strong> Oliveira ........................................... 26<br />
Melhores poemas Almeida Garrett................................................. 26<br />
Melhores poemas Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens ............................... 27<br />
Melhores poemas Alphonsus <strong>de</strong> Guimaraens Filho ...................... 27<br />
Melhores poemas Alvarenga Peixoto............................................. 28<br />
Melhores poemas Álvares <strong>de</strong> Azevedo .......................................... 28<br />
Melhores poemas Álvaro Alves <strong>de</strong> Faria ........................................ 29<br />
Melhores poemas Antero <strong>de</strong> Quental ............................................ 29<br />
Melhores poemas Armando Freitas Filho....................................... 30<br />
Melhores poemas Arnaldo Antunes ............................................... 30<br />
Melhores poemas Augusto dos Anjos ............................................ 31<br />
Melhores poemas Augusto Fre<strong>de</strong>rico Schmidt .............................. 31<br />
Melhores poemas Augusto Meyer ................................................. 32<br />
Melhores poemas Bocage ............................................................... 32<br />
Melhores poemas Bueno <strong>de</strong> Rivera ................................................ 33<br />
Melhores poemas Carlos Nejar ....................................................... 33<br />
Melhores poemas Carlos Pena Filho ............................................... 34<br />
Melhores poemas Casimiro <strong>de</strong> Abreu ............................................. 34<br />
Melhores poemas Cassiano Ricardo ............................................... 35<br />
Melhores poemas Castro Alves ....................................................... 35<br />
Melhores poemas Cecília Meireles.................................................. 36<br />
Melhores poemas Cesário Ver<strong>de</strong>..................................................... 36<br />
Melhores poemas Cláudio Manuel da Costa ................................. 37<br />
Melhores poemas Cora Coralina ..................................................... 37<br />
Melhores poemas Cruz e Sousa ...................................................... 38<br />
Melhores poemas Dante Milano ..................................................... 38<br />
Melhores poemas Fagun<strong>de</strong>s Varela ................................................ <strong>39</strong><br />
Melhores poemas Fernando Pessoa ............................................... <strong>39</strong><br />
Melhores poemas Ferreira Gullar.................................................... 40<br />
Melhores poemas Florbela Espanca ............................................... 40<br />
Melhores poemas Gilberto Mendonça Teles .................................. 41<br />
Melhores poemas Gonçalves Dias .................................................. 41<br />
Melhores poemas Gregório <strong>de</strong> Matos ............................................ 42<br />
Melhores poemas Guilherme <strong>de</strong> Almeida ...................................... 42<br />
Melhores poemas Haroldo <strong>de</strong> Campos........................................... 43<br />
Melhores poemas Henriqueta Lisboa ............................................. 43<br />
Melhores poemas ivan Junqueira ................................................... 44<br />
Melhores poemas João Cabral <strong>de</strong> Melo Neto ................................ 44<br />
Melhores poemas Jorge <strong>de</strong> Lima .................................................... 45<br />
Melhores poemas José Paulo Paes ................................................. 45<br />
Melhores poemas Lêdo ivo ............................................................. 46<br />
205
Melhores poemas Lindolf Bell ......................................................... 46<br />
Melhores poemas Luís <strong>de</strong> Camões .................................................. 47<br />
Melhores poemas Luís Delfino ........................................................ 47<br />
Melhores poemas Luiz <strong>de</strong> Miranda ................................................ 48<br />
Melhores poemas Machado <strong>de</strong> Assis ............................................. 48<br />
Melhores poemas Manuel Ban<strong>de</strong>ira ............................................... 49<br />
Melhores poemas Mário <strong>de</strong> Sá ‑Carneiro ........................................ 49<br />
Melhores poemas Mário Faustino .................................................. 50<br />
Melhores poemas Mario Quintana ................................................. 50<br />
Melhores poemas Menotti <strong>de</strong>l Picchia ........................................... 51<br />
Melhores poemas Murilo Men<strong>de</strong>s .................................................. 51<br />
Melhores poemas Nauro Machado ................................................. 52<br />
Melhores poemas Olavo Bilac ......................................................... 52<br />
Melhores poemas Patativa do Assaré ............................................ 53<br />
Melhores poemas Paulo Leminski .................................................. 53<br />
Melhores poemas Paulo Men<strong>de</strong>s Campos ..................................... 54<br />
Melhores poemas Raimundo Correia ............................................. 54<br />
Melhores poemas Raul <strong>de</strong> Leoni ..................................................... 55<br />
Melhores poemas Ribeiro Couto..................................................... 55<br />
Melhores poemas Ruy Espinheira Filho ......................................... 56<br />
Melhores poemas Sosígenes Costa ................................................ 56<br />
Melhores poemas Sousândra<strong>de</strong> ...................................................... 57<br />
Melhores poemas Thiago <strong>de</strong> Mello ................................................ 57<br />
Melhores poemas Tomás Antônio Gonzaga .................................. 58<br />
Melhores poemas Vicente <strong>de</strong> Carvalho .......................................... 58<br />
Melhores poemas Walmir Ayala ..................................................... 59<br />
Memórias <strong>de</strong> um cabo <strong>de</strong> vassoura .............................................. 186<br />
Memórias <strong>de</strong> um gigolô ................................................................ 175<br />
Menalton Braff ......................................................................... 183, 184<br />
Meu livro <strong>de</strong> cor<strong>de</strong>l ........................................................................ 117<br />
Meus romances <strong>de</strong> cor<strong>de</strong>l .............................................................. 195<br />
Migração dos cisnes ......................................................................... 94<br />
Miguel Sanches Neto ...................................................................... 9, 25<br />
Moacyr Scliar .................................................................................... 197<br />
Mo<strong>de</strong>rnismo ..................................................................................... 85<br />
Modos <strong>de</strong> homem & modas <strong>de</strong> mulher ........................................ 134<br />
Monica Rector ...................................................................................... 6<br />
Mouros, franceses e ju<strong>de</strong>us ........................................................... 163<br />
Mudanças sociais no Brasil ........................................................... 127<br />
Murilo Melo Filho ................................................................................ 62<br />
206<br />
Não verás país nenhum ................................................................. 147<br />
Navio negreiro, O ........................................................................... 102<br />
Negro no mundo dos brancos, O .................................................. 127<br />
No silêncio das nuvens .................................................................. 123<br />
Noemi Jaffe ........................................................................................ 30<br />
Noite inclinada ............................................................................... 148<br />
Nor<strong>de</strong>ste ......................................................................................... 134<br />
Nor<strong>de</strong>ste semita: ensaio sobre um certo Nor<strong>de</strong>ste que em<br />
Gilberto Freyre também é semita ........................................... 141<br />
Novo mundo nos trópicos ............................................................. 135<br />
85 letras e um disparo ................................................................... 107<br />
Olinda: 2 o guia prático, histórico e sentimental <strong>de</strong> cida<strong>de</strong><br />
brasileira ................................................................................... 136<br />
Ópera <strong>de</strong> sabão .............................................................................. 177<br />
Ópera negra ................................................................................... 198<br />
Or<strong>de</strong>m e progresso ........................................................................ 136<br />
Orígenes Lessa .................................................................................. 186<br />
Orna Messer Levin .............................................................................. 62<br />
Panorama do teatro brasileiro ...................................................... 188<br />
Parnasianismo .................................................................................. 86<br />
Pássaros gran<strong>de</strong>s não cantam ......................................................... 96<br />
Paulo Ferraz ........................................................................................ 84<br />
Pedro Cavalcanti ........................................................................... 95, 98<br />
Pedro Lyra ..................................................................................... 55, 82<br />
Pega ele, Silêncio ........................................................................... 151<br />
Pêndulo da noite, O ....................................................................... 177<br />
Perfil <strong>de</strong> Eucli<strong>de</strong>s e outros perfis .................................................. 137<br />
Péricles Pra<strong>de</strong> ...................................................................................... 46<br />
Perseguidor, O .................................................................................. 99<br />
Poemas <strong>de</strong> amor ............................................................................. 198<br />
Poemas dos becos <strong>de</strong> Goiás e estórias <strong>mais</strong> ................................ 118<br />
Poetas da América <strong>de</strong> canto castelhano ....................................... 199<br />
Pré ‑Mo<strong>de</strong>rnismo............................................................................... 86<br />
Prelúdio da cachaça ....................................................................... 163<br />
Prelúdio e fuga do real .................................................................. 164<br />
Quando o po<strong>de</strong>r corrompe, corrompe a não <strong>mais</strong> po<strong>de</strong>r ........... 199<br />
Rainha do calçadão, Opus 14, A ...................................................... 92<br />
Raízes ................................................................................................ 87<br />
Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> dormir ............................................................................... 164<br />
Regina Campos ................................................................................... 75
Regina Dalcastagnè ............................................................................. 22<br />
Regina Zilbermann ........................................................................ 19, 48<br />
Religião no povo ........................................................................... 165<br />
Renata Pallottini ................................................................................ 193<br />
Renato Cor<strong>de</strong>iro Gomes ...................................................................... 72<br />
Ricardo Carvalho ............................................................................... 196<br />
Ricardo Daunt ..................................................................................... 94<br />
Ricardo Prado ..................................................................................... 92<br />
Ricardo Ramos ...................................................................................... 8<br />
Ricardo Thomé .................................................................................... 44<br />
Ricardo Vieira Lima ............................................................................. 83<br />
Rima <strong>de</strong>nuncia, A ........................................................................... 104<br />
Roger Basti<strong>de</strong> .................................................................................... 125<br />
Romanceiro da inconfidência ........................................................ 114<br />
Romantismo ..................................................................................... 87<br />
Rubem Braga ...................................................................................... 34<br />
Rubens Eduardo Ferreira Frias.............................................................. 51<br />
Sábato Magaldi ........................................................................ 188, 189<br />
Sacolinha .......................................................................................... 107<br />
Salete <strong>de</strong> Almeida Cara ....................................................................... 70<br />
Sandra Nitrini ...................................................................................... 20<br />
Sânzio <strong>de</strong> Azevedo ........................................................................ 26, 86<br />
Sérgio Alves Peixoto ............................................................................ 46<br />
Sérgio Martagão Gesteira ................................................................... 56<br />
Sérgio Vaz................................................................................. 105, 107<br />
Sexo à moda patriarcal .................................................................. 142<br />
Silvana Garcia ..................................................................................... 79<br />
Sílvio Lancellotti .................................................................................. 94<br />
Silvio Roberto <strong>de</strong> Oliveira .................................................................... 12<br />
Simbolismo ....................................................................................... 88<br />
Sobrados e mucambos ................................................................... 137<br />
Socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> classes e sub<strong>de</strong>senvolvimento ............................... 128<br />
Solange <strong>de</strong> Aragão ........................................................................... 140<br />
Sombra do cipreste, À ................................................................... 183<br />
Soy loco por ti, América! ............................................................... 178<br />
Superstição no Brasil ..................................................................... 165<br />
Talvez poesia .................................................................................. 138<br />
Tania Franco Carvalhal ........................................................................ 32<br />
Tapete <strong>de</strong> silêncio ........................................................................... 184<br />
Teatro da Obsessão: Nelson Rodrigues ........................................ 188<br />
Teatro da Ruptura: Oswald <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> ....................................... 189<br />
Telenia Hill .......................................................................................... 54<br />
Tempo <strong>de</strong> aprendiz ........................................................................ 138<br />
Tempo morto e outros tempos ..................................................... 1<strong>39</strong><br />
Teresa Rita Lopes ................................................................................. <strong>39</strong><br />
Tesouro da Casa Velha, O .............................................................. 117<br />
Thiago <strong>de</strong> Mello ................................................................................ 199<br />
Todos os ganhadores do Prêmio Nobel <strong>de</strong> Literatura,<br />
1901 ‑2010 ................................................................................. 200<br />
Tom Figueiredo ................................................................................... 99<br />
Tomás Chiaverini ................................................................................. 93<br />
Tradição, ciência do povo .............................................................. 166<br />
Ubiratan Machado .................................................................... 5, 63, 73<br />
uma i<strong>de</strong>ia toda azul ....................................................................... 180<br />
Última corrida, A ............................................................................ 172<br />
Última viagem <strong>de</strong> Borges, A .......................................................... 144<br />
Vaqueiros e cantadores ................................................................. 166<br />
Várias histórias ............................................................................... 102<br />
Veia bailarina .................................................................................. 151<br />
Ver<strong>de</strong> violentou o muro, O ............................................................ 150<br />
Viagem ............................................................................................ 114<br />
Viajando o Sertão .......................................................................... 167<br />
Vicência Brêtas Tahan ........................................................................ 119<br />
Vida é um show, A ......................................................................... 191<br />
Vida social no Brasil nos meados do século xix .......................... 1<strong>39</strong><br />
Villa Boa <strong>de</strong> Goyaz ......................................................................... 118<br />
23 histórias <strong>de</strong> um viajante ........................................................... 181<br />
Vintém <strong>de</strong> cobre ............................................................................. 119<br />
Você é jovem, velho ou dinossauro? ............................................ 152<br />
Walnice Nogueira Galvão .................................................................... 85<br />
Wilson Martins ................................................................................... 16<br />
Zero ................................................................................................. 152<br />
Zero: edição comemorativa 35 <strong>anos</strong> ............................................. 153<br />
Zina C. Bellodi ..................................................................................... 40<br />
207