ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO: CONCEPÇÕES ...
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<strong>ALFABETIZAÇÃO</strong> E <strong>LETRAMENTO</strong>: <strong>CONCEPÇÕES</strong>,<br />
PERSPECTIVAS E PROPOSTAS PARA A PRÁTICA<br />
PEDAGÓGICA ESCOLAR<br />
Profª. Drª. Filomena Elaine P. Assolini<br />
FFCLRP – USP<br />
1<br />
“Acabou vendo Joan Brossa<br />
que os verbos do Catalão<br />
tinham coisas por detrás<br />
eram só palavras, não”.<br />
João Cabral<br />
Nesta conferência, exponho as metodologias tradicionais de<br />
alfabetização, suas origens, princípios e características e aplicação no atual<br />
sistema educacional brasileiro.. Tanto em relação aos métodos sintéticos<br />
(silábico, fônico e de soletração) como no que diz respeito aos métodos<br />
analíticos (de palavração, sentenciação, dos contos) apresento o que<br />
denomino de “brechas e lacunas”, ou seja, concepções equivocadas que dão<br />
origem a práticas pedagógicas escolares que não possibilitam ao estudante<br />
tornar-se, de fato um sujeito alfabetizado e letrado. Dentre as concepções<br />
equivocadas que circulam no discurso pedagógico escolar, D.P.E.., destaco,<br />
resumidamente, algumas delas: a) ler é sinônimo de decodificar; b) separação<br />
entre letramento e alfabetização; c) o sujeito estudante permanece preso nas<br />
malhas da significação; d) exaustão, tédio e desinteresse, no que concerne à<br />
prática da leitura, tão por parte dos educandos quanto por parte dos<br />
educadores (método sintético).<br />
No que respeita as lacunas e brechas dos métodos analíticos, saliento:<br />
a) entendimento equivocado a respeito do conceito de texto, pensado não<br />
como unidade significativa de sentido (Orlandi, 1988), mas como extensão do<br />
que está escrito; b) a predominância de formações imaginárias a respeito do<br />
que os estudantes encontrariam dificuldades para aprender a ler a partir do<br />
texto; c) atividades e tarefas didático-pedagógicas que não trabalham com o<br />
texto propriamente dito.<br />
Ainda dentro do âmbito desta discussão, mostro que, no Brasil, desde a<br />
década de 40, ocorrem variações em torno dos métodos tradicionais, havendo<br />
misturas aleatórias dos princípios teórico-metodológicos que embasam tais<br />
didáticas de alfabetização.<br />
Encerro este primeiro momento, salientando minha concordância com o<br />
psicolinguista Frank Smith que a afirma “(...) as metodologias tradicionais dão<br />
certo com algumas crianças, mas nenhuma delas é eficaz com todas as<br />
crianças”. (SMITH, 1999, p. 70).<br />
Dando prosseguimento, abordo os estudos de Emília Ferreiro e Ana<br />
Teberosky sobre a psicogênese da língua escrita. As investigações das<br />
pesquisadoras demonstram a existência de mecanismos do sujeito do<br />
conhecimento que, na interação com a linguagem escrita explicam a<br />
emergência de formas idiossincráticas (próprias, particulares) de compreender<br />
o objeto.
Algumas brechas e lacunas concernentes à psicogênese da língua<br />
escrita, tal como postulada por Ferreiro e colaboradores, a partir dos anos<br />
setenta são por mim colocadas, a saber: a) conceitos e definições equivocados<br />
em relação à epistemologia genética piagetiana; b) incorporação dos<br />
conhecimentos dos níveis da escrita aos componentes da chamada prontidão<br />
para a aprendizagem das letras, com utilização da observação dos níveis de<br />
escrita da criança para a formação de classes supostamente tidas como<br />
homogêneas; d) o entendimento de que as situações utilizada para a coleta de<br />
dados, tais como vivenciadas por Ferreiro (1989), Teberosky (1990), dentre<br />
outros pesquisadores se configurariam em situações de aprendizagem.<br />
Coadunando com Tfouni (1995), mostro que “(...) as concepções que em<br />
geral se fazem a respeito da alfabetização correspondem a um modelo linear e<br />
“positivo” de desenvolvimento, segundo o qual a criança aprende a usar e<br />
decodificar símbolos gráficos que representam os sons da fala, saindo de um<br />
ponto “x” e chegando a um ponto “y”.<br />
Avançando com minhas discussões e reflexões, trago as contribuições<br />
das teorias do letramento, tais como formuladas por Magda Soares (1990),<br />
Ângela Kleiman (1995) e Leda Verdiani Tfouni (1988). Apresento os postulados<br />
teórico-metodológicos que embasam cada uma dessas abordagens e exponho<br />
que me filio, há quase quinze anos à abordagem sócio-histórica do Letramento,<br />
proposta por TFOUNI, 1995.<br />
Cumpre ressaltar que tal abordagem está sustentada no aparato teóricometodológico<br />
da Analise de Discurso de Matriz Francesa (A.D).<br />
A proposta pedagógica Alfabetizar letrando, formulada e desenvolvida<br />
por Tfouni, desde os anos 80, é por mim explicada, detalhadamente.<br />
Prosseguindo com a minha exposição teórica, mostro o trabalho que<br />
venho realizando desde 1999, no sentido de acrescentar outras contribuições à<br />
proposta pedagógica de Alfabetizar-Letrando.<br />
Dentre os fundamentos já elaborados, saliento os que abarcam os<br />
conceitos de intérprete-historicizado, os que envolvem o discurso pedagógico<br />
escolar, D.P.E., (concepções de sociedade, de educação, de aluno, do papel<br />
do professor, das posições que ele pode ou não ocupar, a relação entre<br />
educador e educando, a avaliação, a formação inicial e continuada de<br />
professores alfabetizadores) e a reescrita como possibilidade para a<br />
emergência da autoria, posição essencial para que o estudante possa construir<br />
textos (orais ou escritos) em que se coloque como autor de seu próprio dizer.<br />
Um estudante pode ser considerado alfabetizado e letrado quando, além<br />
de ler e escrever fluente e proficientemente, consegue realizar produções<br />
linguísticas (orais e escritas) nas quais ocupa a posição de autor do seu próprio<br />
dizer.<br />
Enfatizo, por fim, a importância dos cursos de formação inicial e<br />
continuada de professores. Esses cursos deveriam ocupar-se também de<br />
investigar a complexidade que envolve o sujeito-professor (CORACINI, 2003).<br />
Uma das formas de concretizar tal investigação seria através de situações<br />
didático-pedagógicas que oferecessem ao futuro educador ou àquele que já se<br />
encontra em pleno exercício da profissão, oportunidades para expressarem sua<br />
subjetividade, concebida aqui como “um estranho país de fronteiras e de<br />
autoridades incessantemente construídas e desconstruídas” (KRISTEVA, 1994,<br />
p. 283).<br />
2
Acredito que o aprimoramento do profissional da educação pode<br />
contribuir para que se torne sujeito de sua própria história, pois somente nessa<br />
condição ele poderá ajudar seus alunos a se tornarem, de fato, sujeitos<br />
alfabetizados e letrados.<br />
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