instituições que, no âmbito do Estado constitucional - Revista de ...
instituições que, no âmbito do Estado constitucional - Revista de ...
instituições que, no âmbito do Estado constitucional - Revista de ...
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
ÉTICA, MORALISMO E CODIFICAÇÃO DA ÉTICA PELO CONSELHO NACIONAL DE<br />
JUSTIÇA<br />
31<br />
João Batista Damasce<strong>no</strong> *<br />
O Conselho Nacional <strong>de</strong> Justiça (CNJ) propõe um Código <strong>de</strong> Ética para a<br />
magistratura, redigi<strong>do</strong> em termos vagos, <strong>que</strong> servirá para atingir tão somente os juízes<br />
in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes, <strong>que</strong> são os <strong>que</strong> angariam <strong>de</strong>safetos nas cúpulas.<br />
O projeto contém os 13 princípios <strong>do</strong> Código Ibero-america<strong>no</strong> <strong>de</strong> Ética Judicial,<br />
aprova<strong>do</strong> na XIII Cimeira Judicial Ibero-americana <strong>que</strong> se realizou em Santo Domingo,<br />
República Dominicana, em Junho <strong>de</strong> 2006, e em seus 30 artigos sintetiza quase to<strong>do</strong>s 96<br />
artigos da<strong>que</strong>le código, inclusive alguns muitos estranhos.<br />
Mas a curiosida<strong>de</strong> fica por conta da exclusão <strong>do</strong> artigo primeiro <strong>do</strong> Código Ibero-<br />
america<strong>no</strong>, o mais importante para o Esta<strong>do</strong> Democrático e <strong>de</strong> Direito pois é a<strong>que</strong>le <strong>que</strong><br />
melhor serviria á auto<strong>no</strong>mia judicial, por subtrair os cidadãos e o próprio juiz <strong>do</strong>s caprichos<br />
e pessoalida<strong>de</strong>s <strong>do</strong>s julga<strong>do</strong>res, restringin<strong>do</strong> o <strong>que</strong> hoje chamamos <strong>de</strong> pessoalização da<br />
jurisdição, impon<strong>do</strong> a racionalização <strong>no</strong>s julgamentos e cercean<strong>do</strong> o exercício da<br />
cordialida<strong>de</strong> <strong>que</strong> <strong>no</strong>s caracteriza.<br />
Diz o artigo primeiro <strong>do</strong> Código ibero-america<strong>no</strong> <strong>de</strong> ética judicial <strong>que</strong> “as<br />
<strong>instituições</strong> <strong>que</strong>, <strong>no</strong> <strong>âmbito</strong> <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>constitucional</strong>, garantem a in<strong>de</strong>pendência judicial,<br />
não estão dirigidas a situar o Juiz numa posição <strong>de</strong> privilégio. A sua razão <strong>de</strong> ser é a <strong>de</strong><br />
garantir aos cidadãos o direito <strong>de</strong> serem julga<strong>do</strong>s com parâmetros jurídicos, como forma<br />
<strong>de</strong> evitar a arbitrarieda<strong>de</strong> e <strong>de</strong> realizar os valores constitucionais e salvaguardar os<br />
direitos fundamentais.”<br />
A LOMAN (Lei Orgânica da Magistratura Nacional) já é bastante dura com a<br />
conduta pública e privada <strong>do</strong>s magistra<strong>do</strong>s, bastan<strong>do</strong> <strong>que</strong> seja aplicada, coisa raríssima <strong>de</strong><br />
se ver nestas <strong>que</strong>stões. Para o juiz <strong>de</strong>sonesto há as condutas típicas <strong>do</strong> Código Penal. Se<br />
problema há <strong>no</strong>s Esta<strong>do</strong>s (<strong>âmbito</strong> da supremacia <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r local) está <strong>no</strong> mo<strong>no</strong>pólio da<br />
investigação e da ação penal pelos Procura<strong>do</strong>res Gerais <strong>de</strong> Justiça/PGJ, <strong>que</strong> na maioria <strong>do</strong>s
Esta<strong>do</strong>s brasileiros são previamente <strong>do</strong>mestica<strong>do</strong>s antes da <strong>no</strong>meação pelo Chefe <strong>do</strong><br />
Executivo.<br />
Como está redigi<strong>do</strong> o projeto <strong>de</strong> código <strong>de</strong> ética, a compra <strong>de</strong> um carro <strong>de</strong> luxo ou<br />
<strong>de</strong> um apartamento em bairro <strong>de</strong> classe média (o <strong>que</strong> é possibilita<strong>do</strong> pelos vencimentos<br />
atualmente garanti<strong>do</strong>s aos magistra<strong>do</strong>s), se se tratar <strong>de</strong> juiz <strong>que</strong> incomo<strong>de</strong> certos membros<br />
da cúpula por sua in<strong>de</strong>pendência, po<strong>de</strong> gerar punição.<br />
Para as <strong>que</strong>stões <strong>que</strong> o Código <strong>de</strong> ética <strong>do</strong> CNJ <strong>que</strong>r tratar, já há o Código Penal,<br />
cuja aplicação se faz necessária para a<strong>que</strong>les <strong>que</strong> in<strong>de</strong>vidamente ingressaram na<br />
magistratura (<strong>no</strong>tadamente alguns <strong>que</strong> ingressam sem concurso pelo chama<strong>do</strong> quinto<br />
<strong>constitucional</strong>, <strong>de</strong>ntre os quais magistra<strong>do</strong>s como os <strong>do</strong>is membros <strong>do</strong> TRT-SP, quais<br />
sejam, a<strong>que</strong>le <strong>que</strong> construiu o prédio e o investiga<strong>do</strong> pela Operação Hurricane).<br />
O Código <strong>de</strong> Ética <strong>do</strong> CNJ parece <strong>que</strong>rer impedir certos tipos <strong>de</strong> relacionamentos <strong>de</strong><br />
magistra<strong>do</strong>s. Mas, como fazê-lo se, excetua<strong>do</strong>s os juízes <strong>de</strong> primeira instância <strong>que</strong> são<br />
to<strong>do</strong>s concursa<strong>do</strong>s (embora por vezes em discutíveis concursos) e, em regra, profissionais,<br />
as cúpulas <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r judiciário, em regra políticas, se formam a partir <strong>de</strong> conchavos e jogos<br />
<strong>de</strong> influência?<br />
Embora 4/5 <strong>do</strong>s membros <strong>do</strong>s tribunais estaduais ou regionais sejam egressos da<br />
carreira, estu<strong>do</strong>s mostram <strong>que</strong> o acesso ao tribunal por merecimento está diretamente<br />
relaciona<strong>do</strong> com os laços <strong>de</strong> parentesco ou relações pessoais, restan<strong>do</strong> – em regra - aos<br />
juízes éticos, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes e comprometi<strong>do</strong>s com os direitos da pessoa humana, a<br />
promoção tardia por antiguida<strong>de</strong>, quan<strong>do</strong> já se aproximam da aposenta<strong>do</strong>ria, quan<strong>do</strong> não<br />
apanha<strong>do</strong>s antes da promoção pela aposenta<strong>do</strong>ria <strong>de</strong>corrente <strong>do</strong> advento da ida<strong>de</strong> limite<br />
para exercício da função pública.<br />
O Código <strong>de</strong> Ética proposto pelo CNJ parece muito bom. Mas, é mais uma<br />
cantilena, estilo moralista-u<strong>de</strong>nista, sem a viabilização <strong>de</strong> uma estrutura funcional <strong>que</strong><br />
imponha efetivamente uma postura ética e <strong>de</strong>mocrática <strong>no</strong> seio da magistratura.<br />
32
O art. 3 o se preocupa em dispor “<strong>que</strong> o juiz <strong>de</strong>ve pautar o <strong>de</strong>sempenho <strong>de</strong> suas<br />
ativida<strong>de</strong>s pelo conjunto das <strong>no</strong>rmas jurídicas, as razões <strong>de</strong> sua edição e a função social<br />
<strong>que</strong> se lhes reconhece. sem receber influências externas e estranhas ao direito”, mas o CNJ<br />
<strong>de</strong>veria estar preocupa<strong>do</strong> em contribuir com a viabilização da <strong>de</strong>mocracia interna e com fim<br />
<strong>do</strong>s favorecimentos, <strong>que</strong> é o <strong>que</strong> na verda<strong>de</strong> <strong>que</strong>bra a in<strong>de</strong>pendência <strong>do</strong> juiz.<br />
No art. 5 o consta <strong>que</strong> “é <strong>de</strong>ver <strong>do</strong> juiz <strong>de</strong>nunciar qual<strong>que</strong>r interferência <strong>que</strong> vise a<br />
atingir sua in<strong>de</strong>pendência”, o <strong>que</strong> <strong>no</strong>s tornaria um punha<strong>do</strong> <strong>de</strong> alcagüetes. E <strong>que</strong>m julgaria<br />
a comunicação <strong>de</strong> irregularida<strong>de</strong>? A<strong>que</strong>le <strong>que</strong> quis atingir a in<strong>de</strong>pendência <strong>do</strong> juiz?<br />
O preceito conti<strong>do</strong> <strong>no</strong> art. 12 (O juiz <strong>de</strong>ve se comportar, na relação com os meios <strong>de</strong><br />
comunicação social, <strong>de</strong> maneira pru<strong>de</strong>nte e eqüitativa) parece bom. Mas, o <strong>que</strong> <strong>no</strong>s garante<br />
<strong>que</strong> qual<strong>que</strong>r entrevista não seja confundida com violação ao disposto <strong>no</strong> art. 13 (O juiz<br />
<strong>de</strong>ve evitar comportamentos ou atitu<strong>de</strong>s <strong>que</strong> possam ser entendi<strong>do</strong>s como <strong>de</strong> busca<br />
injustificada e <strong>de</strong>smesurada por reconhecimento social). Será isto a “Lei da Mordaça <strong>do</strong><br />
Judiciário”?<br />
O art. 16 dispõe <strong>que</strong> “o juiz <strong>de</strong>ve ostentar conduta positiva e <strong>de</strong> colaboração com os<br />
órgãos <strong>de</strong> controle”. O <strong>que</strong> significa ostentar conduta positiva e colaboração com os órgãos<br />
<strong>de</strong> controle? Trata-se <strong>de</strong> ser submisso diante <strong>de</strong> Tomás <strong>de</strong> Tor<strong>que</strong>mada?<br />
O art. 17 dispõe <strong>que</strong> “o juiz <strong>de</strong>ve se comportar <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a dignificar a função e<br />
estar consciente <strong>de</strong> <strong>que</strong> o exercício da ativida<strong>de</strong> jurisdicional impõe restrições e exigências<br />
pessoais nem sempre vigentes para os cidadãos em geral”. A <strong>que</strong> restrição se refere?<br />
Raimun<strong>do</strong> Faoro e Evandro Lins e Silva (cujas qualificações intelectuais e éticas são<br />
dispensadas) jamais abdicaram <strong>de</strong> uma cervejinha pública com os amigos. Evandro, <strong>no</strong><br />
sába<strong>do</strong> <strong>de</strong> manhã <strong>que</strong> antece<strong>de</strong>u à sua morte (assim como em quase to<strong>do</strong>s os sába<strong>do</strong>s<br />
anteriores) estava <strong>de</strong> pé, <strong>de</strong> bermuda, <strong>no</strong> balcão da Taberna <strong>do</strong> Leme (<strong>que</strong> não mais ostenta<br />
este <strong>no</strong>me) na Rua Princesa Isabel em Copacabana com um chopp na mão, sem as<br />
restrições pessoais <strong>que</strong> os moralistas acreditam <strong>que</strong> um ministro <strong>de</strong>va ter e para o escândalo<br />
<strong>de</strong> um verea<strong>do</strong>r eugenista <strong>que</strong> passava por lá e espumava, <strong>de</strong>sejoso <strong>de</strong> dar um tiro para o<br />
alto, tal como fizera em 1957 na estréia da peça “Per<strong>do</strong>a-me por me traíres” <strong>de</strong> Nelson<br />
Rodrigues <strong>no</strong> Teatro Municipal <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro. O Verea<strong>do</strong>r <strong>de</strong> sobre<strong>no</strong>me Passos passou<br />
33
e Evandro <strong>de</strong>ixou suas pegadas <strong>no</strong> Salão <strong>do</strong>s Passos Perdi<strong>do</strong>s, <strong>que</strong> foram achadas e<br />
continuam a ser seguidas.<br />
O art. 18 diz <strong>que</strong> “o juiz não <strong>de</strong>ve ostentar conduta <strong>que</strong>, aos olhos <strong>de</strong> um<br />
observa<strong>do</strong>r razoável, pareça atentatória aos valores e sentimentos comuns da comunida<strong>de</strong><br />
em <strong>que</strong> <strong>de</strong>sempenha suas funções”. O <strong>que</strong> é um observa<strong>do</strong>r razoável? Razoável aos olhos<br />
<strong>de</strong> <strong>que</strong>m? O recente livro <strong>do</strong> Ministro Eros Grau, Triângulo <strong>no</strong> Ponto, <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> valor<br />
literário, aos olhos <strong>de</strong> um observa<strong>do</strong>r conserva<strong>do</strong>r é atentatório aos valores e sentimentos<br />
comuns da comunida<strong>de</strong>? Se fosse juiz po<strong>de</strong>ria estar sujeito a punição?<br />
É elementar <strong>que</strong> a ostentação <strong>de</strong> ri<strong>que</strong>za incompatível com os ganhos da<br />
magistratura é algo <strong>que</strong> <strong>de</strong>ve propiciar preocupação e apuração. No mínimo exigência<br />
formal <strong>de</strong> explicação sobre a origem da ri<strong>que</strong>za pelos órgãos correcionais. Mas, o art. 21<br />
diz <strong>que</strong> “o juiz <strong>de</strong>ve a<strong>do</strong>tar as medidas necessárias para evitar <strong>que</strong> possa surgir qual<strong>que</strong>r<br />
dúvida razoável sobre a legitimida<strong>de</strong> <strong>de</strong> suas receitas e <strong>de</strong> sua situação econômico-<br />
patrimonial”. O <strong>que</strong> significa isto? O <strong>que</strong> é dúvida razoável? Deverão os juizes andar<br />
disfarça<strong>do</strong>s, em trajes mal ajambra<strong>do</strong>s, dirigin<strong>do</strong> fuscas ou kombis como medidas<br />
necessárias <strong>que</strong> possam evitar dúvidas razoáveis sobre suas receitas? Ou <strong>de</strong>verão andar com<br />
os contrache<strong>que</strong>s pendura<strong>do</strong>s <strong>no</strong> pescoço, como crachás <strong>de</strong>monstrativos <strong>de</strong> seus po<strong>de</strong>res<br />
aquisitivos?<br />
E o art. 22? “O juiz não <strong>de</strong>ve contrair obrigações <strong>que</strong> perturbem o cumprimento<br />
apropria<strong>do</strong> <strong>de</strong> suas funções”. Casou uma filha, trocou <strong>de</strong> carro ou <strong>de</strong> apartamento e teve a<br />
<strong>de</strong>sgraça <strong>de</strong> coincidir com uma inesperada <strong>do</strong>ença na família a ponto <strong>de</strong> se fornicar <strong>no</strong><br />
che<strong>que</strong> especial, tá lasca<strong>do</strong>! O problema não seria <strong>do</strong>s juros garanti<strong>do</strong>s ao capitalismo<br />
financeiro internacional, mas em ter assumi<strong>do</strong> a obrigação.<br />
O art. 25 é a pérola <strong>do</strong> servilismo. Dispõe <strong>que</strong> “o juiz <strong>de</strong>ve manter uma atitu<strong>de</strong><br />
aberta e paciente para receber argumentos ou criticas razoáveis <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a confirmar ou<br />
retificar posições antes assumidas”. Isto me parece a comissão <strong>de</strong> vitaliciamento <strong>de</strong> juizes<br />
<strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro. Um juiz foi critica<strong>do</strong> pelos “bons velhinhos <strong>do</strong> vitaliciamento carioca”<br />
por<strong>que</strong> não usava vírgula em suas <strong>de</strong>cisões. Suas sentenças (<strong>no</strong> senti<strong>do</strong> gramatical e não<br />
jurídico) continham, em regra, perío<strong>do</strong>s simples, com apenas uma oração ou frase.<br />
34
Vitalician<strong>do</strong>, cui<strong>do</strong>u <strong>de</strong> tascar vírgulas, mesmo <strong>que</strong> separan<strong>do</strong> o sujeito <strong>do</strong> objeto. Recebeu<br />
um elogio e foi recomenda<strong>do</strong> ao vitaliciamento.<br />
Que um código <strong>de</strong> ética é importante não resta a me<strong>no</strong>r dúvida. Mas, a construção<br />
<strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> ética não se faz com falso moralismo. Ética se constitui com<br />
instrumentos capazes <strong>de</strong> efetivamente garanti-la nas relações sociais. Na magistratura se<br />
po<strong>de</strong>ria começar pela <strong>de</strong>mocratização da estrutura interna <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, cuja verticalização,<br />
acentuada a partir <strong>do</strong> chama<strong>do</strong> Pacote <strong>de</strong> Abril <strong>do</strong> Gover<strong>no</strong> Geisel (1974) <strong>que</strong> instituiu os<br />
órgãos especiais <strong>no</strong>s Tribunais, tem subordina<strong>do</strong> juizes me<strong>no</strong>s resistentes aos caprichos<br />
“ditos superiores” e suprimi<strong>do</strong> a in<strong>de</strong>pendência judicial. Outra medida po<strong>de</strong>ria ser a<br />
instituição <strong>de</strong> critério objetivo para promoção e remoção, <strong>de</strong> observância obrigatória,<br />
tornan<strong>do</strong> o juiz titular <strong>do</strong> direito subjetivo ao <strong>de</strong>slocamento funcional (horizontal quan<strong>do</strong><br />
em remoção ou vertical quan<strong>do</strong> em promoção), se atendi<strong>do</strong> o critério. E aqui seria<br />
necessário distinguir critério (parâmetro aferi<strong>do</strong>r <strong>do</strong> merecimento) <strong>de</strong> requisito (condição<br />
para a concorrência), o <strong>que</strong>, parece, não é objeto <strong>de</strong> distinção <strong>no</strong>s tribunais.<br />
O CNJ po<strong>de</strong> viabilizar a instituição <strong>de</strong> uma estrutura funcional <strong>que</strong> imponha<br />
efetivamente uma postura ética e <strong>de</strong>mocrática <strong>no</strong> seio da magistratura, a partir da<br />
racionalização das relações internas e da <strong>de</strong>mocratização <strong>do</strong> judiciário, com o fim <strong>do</strong>s<br />
favorecimentos e da formação <strong>de</strong> “grupos inter<strong>no</strong>s <strong>de</strong> pressão” ou “lobbystas alça<strong>do</strong>s à<br />
qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> magistra<strong>do</strong>s”, <strong>que</strong> é o <strong>que</strong> na verda<strong>de</strong> <strong>que</strong>bra a in<strong>de</strong>pendência <strong>do</strong> juiz.<br />
Por outro la<strong>do</strong>, é <strong>de</strong> se consi<strong>de</strong>rar <strong>que</strong> sem dinheiro não há corrupção. Portanto, a<br />
execução orçamentária <strong>do</strong>s tribunais, <strong>no</strong>tadamente <strong>do</strong>s tribunais com capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
captação <strong>de</strong> recursos próprios por meios <strong>de</strong> custas e taxas ou repasses, precisa ser<br />
<strong>de</strong>scentralizada em unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>de</strong>spesa, com instituição <strong>de</strong> múltiplos controles, para<br />
tristeza <strong>de</strong> alguns construtores, empreiteiros e inaugura<strong>do</strong>res <strong>de</strong> placas <strong>de</strong> bronze.<br />
Dos juízes con<strong>de</strong>na<strong>do</strong>s criminalmente, pela Justiça <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro <strong>no</strong>s<br />
últimos a<strong>no</strong>s, <strong>do</strong>is ostentavam a Medalha <strong>do</strong> Mérito Judiciário conferidas pelo próprio<br />
Tribunal, o <strong>que</strong> <strong>de</strong>monstra <strong>que</strong> as a<strong>no</strong>malias funcionais, por vezes, se revelam pela<br />
afinida<strong>de</strong> com as cúpulas institucionais e não pela a in<strong>de</strong>pendência em relação a elas.<br />
35
A construção <strong>de</strong> código <strong>de</strong> comportamento basea<strong>do</strong> na “razoabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> senso<br />
comum” po<strong>de</strong>rá servir ao moralismo estilo u<strong>de</strong>nista, jamais à ética. O moralismo é a ética<br />
<strong>de</strong> <strong>que</strong>m não tem ética e não contribui para o aperfeiçoamento das <strong>instituições</strong> republicanas,<br />
ou seja, não contribui para distinção <strong>do</strong> <strong>que</strong> seja público e priva<strong>do</strong>. O moralismo <strong>no</strong>s remete<br />
à<strong>que</strong>le personagem baia<strong>no</strong> <strong>que</strong> <strong>de</strong> tão pouco ético subtraía até discurso alheio, inclusive<br />
discurso sobre ética. Quan<strong>do</strong> a ética tor<strong>no</strong>u-se objeto <strong>de</strong> <strong>de</strong>bate, foi extrema<strong>do</strong>: passou a<br />
discursar sobre a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma “eticida<strong>de</strong> radical, ampla, geral e irrestrita.”<br />
RESUMO: A proposta <strong>de</strong> codificação da ética pelo Conselho Nacional <strong>de</strong> Justiça em<br />
termos vagos como proposto servirá para <strong>de</strong>ixar sob ameaça os juízes in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes,<br />
<strong>que</strong> são os <strong>que</strong> na verda<strong>de</strong> angariam <strong>de</strong>safetos nas cúpulas. O projeto compila<br />
o Código Ibero-america<strong>no</strong> <strong>de</strong> Ética Judicial, aprova<strong>do</strong> em Junho <strong>de</strong> 2006, mas<br />
exlui o mais importante artigo para o Esta<strong>do</strong> Democrático e <strong>de</strong> Direito, <strong>que</strong><br />
é a<strong>que</strong>le <strong>que</strong> diz naõ serem as garantias da magistratura dirigidas a colocar<br />
os juizes em posição <strong>de</strong> privilégio em face da socieda<strong>de</strong> e <strong>que</strong> <strong>de</strong>vem os juizes<br />
julgarem por parâmetros jurídicos. No presente artigo o cientista político<br />
e juiz <strong>de</strong> direito João Batista Damasce<strong>no</strong> aponta os riscos para a in<strong>de</strong>pendência<br />
da magistratura a codificação da ética em termos tão vagos e moralistas como<br />
proposto.<br />
PALAVRAS-CHAVES: Ética. Magistratura. Código. Moralismo. In<strong>de</strong>pendência judicial e<br />
parâmetro jurídico.<br />
* João Batista Damasce<strong>no</strong>, mestre em Ciência Política, Juiz <strong>de</strong> Direito <strong>do</strong> TJ/RJ e membro<br />
da Associação Juizes para a Democracia.<br />
36