19.04.2013 Views

A trajetória de Romeu e Julieta: do teatro inglês renascentista ao ...

A trajetória de Romeu e Julieta: do teatro inglês renascentista ao ...

A trajetória de Romeu e Julieta: do teatro inglês renascentista ao ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

soavam nos meus ouvi<strong>do</strong>s<br />

como um teci<strong>do</strong> <strong>de</strong> seda<br />

por vinte facas rompi<strong>do</strong>.<br />

Ele tocou nos meus Seios,<br />

que estavam a<strong>do</strong>rmeci<strong>do</strong>s ,<br />

e eles se ergueram, <strong>de</strong> súbito,<br />

como ramos <strong>de</strong> jacinto.<br />

Naquela noite, corri<br />

pelo melhor <strong>do</strong>s caminhos,<br />

montada por um Ginete,<br />

mas sem Sela e sem estribos.<br />

Minhas coxas lhe escapavam,<br />

como peixes surpreendi<strong>do</strong>s,<br />

meta<strong>de</strong> cheias <strong>de</strong> fogo,<br />

meta<strong>de</strong> cheias <strong>de</strong> frio. 21<br />

Existe, portanto, uma gran<strong>de</strong> diferença nas concepções <strong>de</strong> amor utilizadas<br />

nas duas peças. Em Shakespeare, o amor é um sentimento puro,<br />

capaz <strong>de</strong> elevar a alma e, além disto é um sentimento superior que justifica<br />

a atitu<strong>de</strong> <strong>do</strong>s amantes contra as regras da socieda<strong>de</strong>. Em Suassuna, o amor<br />

possui um la<strong>do</strong> mais carnal, <strong>de</strong> atração <strong>do</strong>s corpos, que é <strong>de</strong>monstrada,<br />

sobretu<strong>do</strong>, na cena da noite <strong>de</strong> núpcias, embora seja interpretada por bonecos.<br />

Somente o fato <strong>de</strong> se ter acrescenta<strong>do</strong> tal cena na peça já <strong>de</strong>monstra<br />

diferença suficiente <strong>de</strong> concepção. Os elementos utiliza<strong>do</strong>s na <strong>de</strong>scrição<br />

<strong>de</strong>sta cena ainda remetem a uma gran<strong>de</strong> proximida<strong>de</strong> com a cultura <strong>do</strong><br />

sertão, isto é, o cinto, o revólver, a faca e a própria comparação <strong>do</strong> ato sexual<br />

com o ato <strong>de</strong> montar num cavalo.<br />

No <strong>de</strong>correr <strong>de</strong>ste artigo procuramos mostrar que as três obras analisadas,<br />

apesar <strong>de</strong> terem origens tão distintas, guardam bastante semelhança,<br />

sobretu<strong>do</strong> no que diz respeito <strong>ao</strong> caráter popular. os aspectos da cultura<br />

popular, a saber: a comicida<strong>de</strong>, o apelo <strong>ao</strong> grotesco e à festa são como invariantes<br />

<strong>de</strong> uma estrutura que se atualiza <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com cada socieda<strong>de</strong>,<br />

seja no nor<strong>de</strong>ste (a história <strong>do</strong> amor <strong>de</strong> romeu e <strong>Julieta</strong> <strong>de</strong> Suassuna), em<br />

Minas gerais (romeu e <strong>Julieta</strong> <strong>do</strong> grupo galpão) ou na inglaterra (romeu<br />

e <strong>Julieta</strong> <strong>de</strong> Shakespeare). a socieda<strong>de</strong> fornece os materiais culturais que<br />

serão utiliza<strong>do</strong>s na fabricação <strong>de</strong>sta estrutura, que por ser estrutura não<br />

é estática, mas se modifica <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com os materiais culturais forneci<strong>do</strong>s.<br />

No entanto, por mais que a história contada seja a mesma, houve<br />

significativas variações no que estava sen<strong>do</strong> conta<strong>do</strong>, pois as questões em<br />

pauta em cada contexto histórico e geográfico eram diferentes. Cada autor<br />

apropriou-se da história a seu mo<strong>do</strong> imprimin<strong>do</strong> os valores presentes em<br />

sua socieda<strong>de</strong> na obra <strong>de</strong> arte. Nas palavras <strong>de</strong> Bourdieu, “as oposições que<br />

estruturam a percepção estética não são dadas a priori, mas historicamente<br />

produzidas e reproduzidas, são indissociáveis das condições históricas <strong>de</strong><br />

seu emprego” 22 .<br />

o melhor exemplo disso é o caso <strong>de</strong> Suassuna, que contou uma das<br />

mais conhecidas histórias <strong>de</strong> amor da humanida<strong>de</strong> para negá-la posteriormente,<br />

mostran<strong>do</strong> como, no nor<strong>de</strong>ste, a honra e a lealda<strong>de</strong> à família estão<br />

acima <strong>de</strong> qualquer espécie <strong>de</strong> amor romântico. assim termina a peça <strong>de</strong><br />

Suassuna:<br />

21 SUaSSUNa, ariano. op.<br />

cit. p.8.<br />

22 BoUrDiEU, Pierre. op. cit.<br />

p. 133.<br />

ArtCultura, Uberlândia, v. 11, n. 19, p. 155-168, jul.-<strong>de</strong>z. 2009 167<br />

H i s t ó r i a & Te a t r o

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!