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Revista Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - Edição nº 31

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<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 1


Entrevista<br />

Nova tecnologia<br />

no combate ao<br />

“mal da vaca louca”<br />

mal da vaca louca, conhecido cientificamente como<br />

BSE (sigla em inglês para encefalopatia<br />

espongiforme bovina), afeta o cérebro do animal,<br />

provocando descontrole motor. As células morrem<br />

e o cérebro fica com a aparência de uma esponja.<br />

A vaca passa a agir como se estivesse enlouquecida, o que explica<br />

o fato de ser conhecida popularmente como mal da vaca louca.<br />

Não há tratamento conhecido para essa doença, que já foi<br />

detectada em cerca de 20 países da Europa, atingindo mais de 180<br />

mil cabeças de gado. Ao contrário da maior parte das enfermidades,<br />

o mal da vaca louca não é transmitido por fungos, vírus ou<br />

bactérias, e sim por proteínas específicas denominadas prions.<br />

Essa doença nunca foi detectada no Brasil e a sua entrada, certamente,<br />

resultaria em um desastre para o país, que tem na pecuária um de seus<br />

principais alicerces econômicos, representando ganhos de mais de R$ 55<br />

bilhões por ano. Sem falar que o rebanho brasileiro é hoje maior do que a<br />

soma dos rebanhos da Argentina, Paraguai e Uruguai. Diante da necessidade<br />

urgente de conter a sua disseminação, a Empresa Brasileira de Pesquisa<br />

Agropecuária (Embrapa), por meio de uma de suas 40 unidades de pesquisa,<br />

a Embrapa Recursos Genéticos e <strong>Biotecnologia</strong>, localizada em Brasília, DF,<br />

desenvolveu um método para detecção de proteínas de origem animal em<br />

rações destinadas a mamíferos, especialmente ruminantes, que tem como<br />

objetivo monitorar a qualidade do alimento e evitar a transmissão de doenças<br />

causadas por substâncias infecciosas, tais como prions transmissores de<br />

encefalopatias espongiformes transmissíveis (TSE), principalmente o mal da<br />

vaca louca.<br />

O método, desenvolvido pela equipe do pesquisador Carlos Bloch Jr há<br />

cerca de três anos, cuja patente foi depositada pela Embrapa em 2002, utiliza<br />

aparelhos de última geração denominados espectrômetros de massa, para a<br />

detecção das proteínas. Para se ter uma idéia do grau de modernidade e de<br />

eficiência desses aparelhos, eles possuem tecnologia comparável à que está<br />

sendo usada pelos robôs Spirit e Opportunity nas pesquisas que estão sendo<br />

feitas pela NASA no Planeta Marte, para a detecção de outros tipos de<br />

moléculas. De acordo com o pesquisador, esses aparelhos são hipersensíveis,<br />

com um limite de detecção altíssimo, de uma parte por milhão, ou seja, se<br />

fizermos uma comparação com uma balança na qual fossem colocadas um<br />

milhão de pessoas, o espectrômetro de massa seria capaz de detectar a ausência<br />

de apenas uma delas.<br />

2 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Metodologia detecta proteínas na ração e evita a contaminação de animais<br />

Entrevista concedida a<br />

Maria Fernanda Diniz


Para falar sobre essa metodologia<br />

e a sua importância para a pesquisa<br />

agropecuária brasileira, a revista<br />

<strong>Biotecnologia</strong>, <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong><br />

entrevistou o pesquisador<br />

da Embrapa Recursos Genéticos<br />

e <strong>Biotecnologia</strong>, Carlos Bloch Jr. Durante<br />

a entrevista, ele falou sobre o<br />

método desenvolvido por sua equipe<br />

e das vantagens que representa<br />

sobre os outros métodos utilizados<br />

até o momento, além dos rumos<br />

dessas pesquisas para o futuro.<br />

BC&D – Em que consiste o<br />

método utilizado pela Embrapa<br />

Recursos Genéticos e <strong>Biotecnologia</strong><br />

e há quanto tempo foi desenvolvido?<br />

Bloch – O método começou a<br />

ser desenvolvido pela nossa equipe<br />

há cerca de três anos, foi aperfeiçoado<br />

ao longo de 2001 e em 2002 foi<br />

depositada a patente. O objetivo<br />

desse método é avaliar a qualidade<br />

das rações destinadas a ruminantes<br />

e, assim, evitar a transmissão de<br />

TSE’s (encefalopatias espongiformes<br />

transmissíveis), especialmente a<br />

encefalopatia espongiforme bovina<br />

(BSE), pela detecção de proteínas de<br />

origem animal, em particular daquelas<br />

provenientes de restos de carcaças<br />

de animais abatidos que pudessem<br />

ser misturados à ração. O<br />

desenvolvimento dessa metodologia<br />

compreende três etapas: a primeira e<br />

mais trabalhosa é a extração do material<br />

protéico para separá-lo, principalmente<br />

de lipídeos e dos carboidratos.<br />

Em seguida, cada amostra<br />

pode ser analisada em dois tipos de<br />

espectrômetros de massa simultaneamente,<br />

o primeiro analisa em poucos<br />

minutos a presença de moléculas<br />

de proteína animal, como a mioglobina,<br />

cadeias alfa e beta da hemoglobina<br />

e proteínas plasmáticas, para<br />

dizer se existe ou não algum indício<br />

de contaminação. O segundo analisa<br />

e quantifica os seus fragmentos<br />

(peptídeos) derivados de moléculas<br />

inteiras de contaminantes, que podem<br />

se formar a partir do ataque de<br />

microrganismos e/ou da ação mecâ-<br />

nica durante o processo de fabricação.<br />

A terceira etapa é a interpretação<br />

dos dados para determinar os<br />

níveis de contaminação e a sua origem,<br />

ou seja, se as moléculas contaminantes<br />

encontradas eram provenientes<br />

de bovinos, suínos, eqüinos,<br />

ovinos, aves, peixes, etc.<br />

“O O grande grande avanço avanço propiciado<br />

propiciado<br />

por por essa essa metodologia metodologia é é o o fato<br />

fato<br />

de de poder poder detectar detectar as as proteínas<br />

proteínas<br />

inteiras inteiras ou ou fragmentos fragmentos delas<br />

delas<br />

com com uma uma precisão precisão de de uma<br />

uma<br />

parte parte por por milhão milhão (PPM).”<br />

(PPM).”<br />

BC&D – Qual é a vantagem da<br />

espectrometria de massa sobre<br />

os outros métodos utilizados para<br />

o controle dessas doenças?<br />

Bloch – A espectrometria de<br />

massa é um método muito mais sensível,<br />

rápido e seguro para se diagnosticar<br />

a presença desse tipo de<br />

molécula. Não é à toa que você<br />

encontra espectrômetros de massa<br />

espalhados por locais e em atividades<br />

que até bem pouco tempo atrás<br />

não se poderia imaginar. Só para<br />

citar alguns exemplos, encontram-se<br />

hoje espectrômetros de massa nos<br />

aeroportos, nos correios, nos esportes,<br />

nos tanques e aviões de guerra,<br />

sem falar nas missões espaciais. São<br />

esses equipamentos que produzem,<br />

com mais rapidez e eficiência, respostas<br />

sobre a presença ou não de<br />

explosivos, material de guerra química<br />

ou biológica. Atualmente, são<br />

utilizados três métodos para monitorar<br />

a qualidade dos alimentos dos ruminantes:<br />

o primeiro é o de microscopia<br />

ótica, que se baseia na procura de<br />

fragmentos de pele, ossos etc. na<br />

ração; o segundo é o método ELISA,<br />

que utiliza anticorpos para detectar<br />

as proteínas alvo; e o terceiro e mais<br />

novo é o método PCR, que detecta o<br />

DNA das proteínas por meio de um<br />

primer (um tipo de gene marcador).<br />

Todos esses métodos apresentam li-<br />

mitações da mesma natureza, ou seja,<br />

não detectam diretamente a presença<br />

de proteína. O primeiro, e mais<br />

utilizado ainda hoje na União Européia<br />

é também o mais falho de todos,<br />

já que a microscopia ótica não permite<br />

a detecção de proteínas. O método<br />

ELISA tem como fator limitante o<br />

fato de utilizar anticorpos específicos<br />

para determinadas classes de proteínas,<br />

o que impede a identificação de<br />

outros grupos; e o terceiro, o de PCR,<br />

esbarra no problema do DNA ser<br />

fragmentado depois do processo de<br />

industrialização, tornando difícil a<br />

sua amplificação para a análise. Logo,<br />

a espectrometria de massa aparece<br />

como o método mais preciso para a<br />

detecção direta e não indireta de<br />

proteínas. O grande avanço propiciado<br />

por essa metodologia é o fato de<br />

poder detectar as proteínas inteiras<br />

ou fragmentos delas com uma precisão<br />

de uma parte por milhão (PPM).<br />

O que isso significa? Se fizermos uma<br />

analogia com uma balança na qual<br />

são colocadas um milhão de pessoas,<br />

o espectrômetro é capaz de detectar<br />

a ausência de apenas uma delas. E os<br />

níveis de detecção estão sendo melhorados<br />

cada vez mais. Os últimos<br />

espectrômetros lançados já têm poder<br />

de menos de uma parte por<br />

milhão, ou seja, menos de uma pessoa,<br />

se continuarmos a seguir aquela<br />

analogia, e tudo isso com muita rapidez<br />

e eficiência automatizáveis. A<br />

parte mais demorada desse processo<br />

é a primeira etapa, na qual é feita a<br />

extração do material a ser analisado.<br />

Essa etapa pode demorar de 36 a 72<br />

horas, mas é comum a todos os<br />

outros métodos. Em suma, ao que<br />

tudo indica, essa metodologia é o<br />

que existe hoje de mais moderno e<br />

seguro para monitorar a qualidade<br />

dos alimentos oferecidos aos ruminantes<br />

e, logo, controlar a disseminação<br />

das encefalopatias espongiformes<br />

transmissíveis, ou TSE’s, como<br />

são conhecidas.<br />

BC&D – As TSE’ s , entre as<br />

quais a mais nociva é a BSE<br />

(encefalopatia espongiforme bovina),<br />

ou mal da vaca louca, re-<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 3


presentam uma ameaça não apenas<br />

para os animais como também<br />

para os seres humanos.<br />

Como se dá a contaminação e<br />

qual o tratamento existente hoje<br />

para essas doenças?<br />

Bloch – As encefalopatias espongiformes<br />

transmissíveis, ou TSE’s,<br />

são doenças progressivas e letais que<br />

afetam o sistema nervoso central e se<br />

caracterizam por alterações anatômicas<br />

localizadas no cérebro. Essas alterações<br />

são um tipo de lesão histológica,<br />

constituídas de vacúolos e depósitos<br />

protéicos. As TSE’s podem resultar de<br />

infecções espontâneas, transmissão<br />

hereditária ou exposição a materiais<br />

contaminados. As TSE’s incluem: a<br />

BSE, conhecida popularmente como<br />

“mal da vaca louca”; a scrapie, ou<br />

paraplexia enzoótica dos ovinos, que<br />

afeta ovinos e caprinos em muitos<br />

países há mais de 200 anos; e a<br />

doença de Creutzfeldt-Jakob (CJD)<br />

que afeta seres humanos, principalmente<br />

com mais de 50 anos de idade.<br />

Essa doença tem distribuição mundial,<br />

com incidência anual de aproximadamente<br />

um caso por milhão e ocorre<br />

de três formas: esporádica (responsável<br />

por 85 a 90% dos casos). familiar<br />

(associada a mutações genéticas, representa<br />

5 a 10% dos casos) e<br />

iatrogênica, ou seja, por contaminação,<br />

(responsável por menos de 5%<br />

dos casos). Logo, em humanos, a<br />

chance de desenvolver a doença por<br />

contaminação é de menos de 5%. Nos<br />

outros 95% dos casos, a doença se<br />

desenvolve naturalmente. Em ovinos<br />

e bovinos, os principais sintomas são<br />

agressividade e falta de coordenação<br />

motora. Em humanos, os principais<br />

sintomas são: mioclonia – contração<br />

muscular brusca e breve – e demência.<br />

Não existe tratamento conhecido<br />

para a BSE, portanto, a única forma de<br />

combatê-la é evitando a contaminação.<br />

Cerca de 125 casos foram<br />

registrados no mundo em humanos,<br />

segundo os Centros de Controle e<br />

Prevenção de Doenças dos Estados<br />

Unidos, e na Europa, aproximadamente<br />

100 pessoas morreram em função<br />

dessa doença. Mas, para os ani-<br />

mais, a situação é bem mais séria,<br />

visto que já foi detectada em mais de<br />

20 países da Europa, atingindo mais<br />

de 180 mil cabeças de gado.<br />

BC&D – Então a BSE tem se<br />

disseminado de forma rápida, especialmente<br />

na Europa. Como se<br />

dá a contaminação?<br />

Bloch – A natureza do agente<br />

infeccioso da BSE, assim como das<br />

outras TSE’s, é ainda motivo de<br />

controvérsia. Acredita-se que as<br />

partículas infecciosas responsáveis<br />

pela BSE são predominantemente<br />

proteínas específicas denominadas<br />

prions, que são compostas, em quase<br />

a sua totalidade, de uma<br />

glicoproteína de conformação anormal,<br />

que se prende à superfície<br />

externa das células. Em outras<br />

palavras, a teoria mais aceita hoje<br />

afirma que o agente infeccioso,<br />

prion, é derivado de uma proteína<br />

da membrana celular, que sofre<br />

uma mutação e forma um tipo insolúvel<br />

e patogênico de prion. Ainda<br />

hoje não está totalmente esclarecido<br />

o mecanismo pelo qual essa<br />

proteína anormal produz as alterações<br />

patológicas no cérebro dos<br />

animais ou indivíduos afetados.<br />

BC&D – Desde que foi diagnosticada<br />

pela primeira vez no<br />

mundo, como se deu a evolução<br />

da BSE ao longo dos anos?<br />

Bloch – Os primeiros casos de<br />

BSE foram diagnosticados no Reino<br />

Unido, em 1986. No final de 1987,<br />

o Departamento de Epidemiologia<br />

do Laboratório Veterinário Central<br />

daquele país concluiu que a disseminação<br />

da doença entre os bovinos<br />

ocorria mediante o consumo de<br />

farinha de carne e ossos, obtida a<br />

partir de carcaças de animais contaminados<br />

e incorporada à ração oferecida<br />

aos bovinos. Essa teoria foi<br />

plenamente confirmada, já que a<br />

proibição do uso daquele produto<br />

na alimentação de ruminantes teve<br />

efeito claro, resultando em redução<br />

significativa no aparecimento de<br />

4 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

novos casos de BSE. Foram levantadas<br />

outras possibilidades de contaminação,<br />

como por exemplo, a<br />

transmissão vertical da vaca para o<br />

bezerro. Mas, o que se sabe de fato<br />

é que a epidemia do “mal da vaca<br />

louca” não teria acontecido se não<br />

houvesse disseminação por meio<br />

da farinha de carne e ossos. Diante<br />

disso, pode-se dizer que se um<br />

bovino contaminado for introduzido<br />

num país ou região onde não<br />

existe BSE, como é o caso do Brasil,<br />

só poderá ocorrer uma epidemia se<br />

a carcaça desse animal for utilizada<br />

para produzir farinha destinada à<br />

alimentação de ruminantes porque<br />

isso gera um sistema de disseminação<br />

e amplificação do agente infeccioso<br />

na população animal. Após<br />

o início da epidemia no Reino Unido,<br />

surgiu a teoria de que os primeiros<br />

casos de BSE teriam resultado<br />

da utilização de carcaças de ovinos<br />

contaminados com scrapie na alimentação<br />

de bovinos e que uma<br />

mudança no processo industrial de<br />

produção de farinha de carne e<br />

ossos teria diminuído a probabilidade<br />

de inativação do agente infeccioso.<br />

Entretanto, foram surgindo<br />

evidências de que a BSE e a scrapie<br />

são doenças diferentes, embora pertencentes<br />

ao mesmo grupo. Uma<br />

das evidências foi obtida a partir da<br />

inoculação experimental de scrapie<br />

em bovinos, que resultou em uma<br />

doença diferente da BSE. Além<br />

disso, a BSE mantém as suas características<br />

durante toda a epidemia,<br />

mesmo quando é transmitida a outra<br />

espécie animal, ao contrário da<br />

scrapie. Sem falar que essa doença<br />

não pode contaminar seres humanos,<br />

como é o caso da BSE. Na<br />

verdade, o ponto em comum entre<br />

as TSE’s é a elevada resistência a<br />

tratamentos físico-químicos de esterilização.<br />

BC&D – Mas há indícios de<br />

que a doença possa ter surgido<br />

antes de 1986, não é verdade?<br />

Bloch – Alguns relatórios técnicos<br />

mais recentes indicam que os


casos de BSE diagnosticados a partir<br />

de 1986 não teriam sido os primeiros<br />

casos da doença que, provavelmente,<br />

já existia no Reino Unido<br />

anteriormente. Alguns veterinários<br />

britânicos alegam ter visto casos<br />

semelhantes antes de 1986 que, na<br />

época, foram diagnosticados como<br />

doenças metabólicas comuns em<br />

vacas de alta produção. Mas não há<br />

comprovação científica sobre essas<br />

evidências.<br />

BC&D – Então a causa mais<br />

provável para a transmissão da<br />

BSE em bovinos está mesmo na<br />

mudança no processo de fabricação<br />

de farinha de carne e ossos,<br />

que tornou possível a reciclagem<br />

do agente infeccioso?<br />

Bloch – Essa, sem dúvida, é a<br />

causa mais provável para a transmissão<br />

dessa doença, o que tem representado<br />

um prejuízo para os produtores<br />

em escala mundial, já que as<br />

rações à base de farinha de osso,<br />

sangue e carne vinham sendo largamente<br />

recomendadas e usadas na<br />

alimentação de animais, como uma<br />

fonte de proteína, devido à presença<br />

de aminoácidos essenciais, minerais<br />

e vitamina B12. Além disso, essa<br />

forma de aproveitamento é uma maneira<br />

eficaz de reciclar os subprodutos<br />

proveniente do abate, evitando custos<br />

econômicos e ambientais adicionais.<br />

No entanto, como os materiais<br />

à base de osso e carnes de animais<br />

mamíferos presentes em dietas para<br />

ruminantes foram considerados a provável<br />

causa da BSE em bovinos, o seu<br />

uso foi proibido na Comunidade Européia,<br />

nos EUA e também no Brasil.<br />

Diante das vantagens desse tipo de<br />

alimentação para os bovinos, várias<br />

têm sido as tentativas de cessar a<br />

transmissão das TSE’s, em particular<br />

da BSE. Alguns trabalhos têm sido<br />

direcionados para a inativação das<br />

partículas infecciosas, favorecendo,<br />

assim, o aproveitamento dos resíduos<br />

do abate. Outros têm visado eliminar<br />

a possibilidade da transmissão<br />

pela detecção de proteínas animais<br />

nas rações e a sua rejeição no caso de<br />

teste positivo. Ambas as formas fazem<br />

uso de procedimentos analíticos<br />

para garantir a ausência de agentes<br />

causadores das TSE’s na alimentação<br />

animal. Dentre esses procedimentos,<br />

estão os que eu já descrevi na questão<br />

anterior, ou seja, a microscopia<br />

ótica, o método ELISA e as análises<br />

de DNA por PCR. A complexidade e<br />

especificidade das biomoléculas têm<br />

dificultado em muito a aplicação das<br />

técnicas freqüentemente utilizadas<br />

para a identificação e caracterização<br />

de compostos inorgânicos e orgânicos<br />

nas rações. Esse fato vem motivando<br />

o desenvolvimento de técnicas<br />

analíticas cada vez mais sofisticadas<br />

e eficientes, com ênfase na precisão<br />

requerida pela moderna biotecnologia.<br />

Dessa forma, chegamos hoje<br />

aos espectrômetros de massa que,<br />

como eu também já mencionei antes,<br />

são o que há de mais moderno e<br />

preciso para a detecção de proteínas<br />

nas rações de ruminantes.<br />

BC&D – E quais são os passos<br />

daqui pra frente, já existe alguma<br />

parceria para repasse dessa<br />

tecnologia à iniciativa privada?<br />

Existe alguma demanda do governo<br />

brasileiro para que essa<br />

tecnologia se torne obrigatória,<br />

de modo a evitar a entrada do<br />

“mal da vaca louca” no Brasil?<br />

Bloch – Creio firmemente que<br />

antes de nos preocuparmos com<br />

qualquer tipo de avanço tecnológico<br />

e sua comercialização, como é o<br />

caso desse método, devemos vê-lo<br />

como uma ferramenta de trabalho.<br />

Ela só poderá servir ao seu propósito<br />

e alcançar sua plenitude de uso<br />

se houver a visão clara do objetivo<br />

final que queremos atingir. Ou seja,<br />

se o nosso objetivo final for o lucro<br />

imediato, puro e simples para satisfazer<br />

acionistas, balanças de pagamentos<br />

e manutenção dos mesmos<br />

paradigmas de produção vigentes<br />

há décadas, essa tecnologia terá um<br />

impacto modesto e servirá somente<br />

nos momentos de crise, como o que<br />

estamos vivendo hoje, caso contrário<br />

cairá no esquecimento, como de<br />

fato ela se encontrava, até o<br />

surgimento da BSE nos Estados Unidos.<br />

Contudo, se tomarmos a decisão<br />

de priorizar a vida, a qualidade<br />

e a sanidade dos alimentos que<br />

chegam às mesas dessa geração e<br />

das próximas, essa tecnologia com<br />

certeza será de grande utilidade,<br />

não somente no processo de identificação<br />

de contaminantes intencionais<br />

ou acidentais, mas poderá<br />

didaticamente demonstrar internamente<br />

e para o exterior que esse<br />

país possui tecnologia de alto nível<br />

para responder a problemas mundiais<br />

imediatos, bem como para<br />

oferecer alternativas mais inteligentes<br />

e com visão de perspectiva para<br />

um setor tão importante como o do<br />

agronegócio. No que diz respeito<br />

aos aspectos legais dessa tecnologia,<br />

ela já está patenteada e pronta para<br />

ser licenciada à iniciativa privada.<br />

Estamos aguardando propostas de<br />

empresas interessadas em utilizála.<br />

Quanto ao governo brasileiro, a<br />

Embrapa e o Ministério da Agricultura,<br />

Pecuária e Abastecimento<br />

(MAPA) estão em entendimento<br />

para discutir a melhor forma de<br />

implementá-la e, assim, dar um grande<br />

passo para reduzir ainda mais a<br />

possibilidade da presença de proteínas<br />

animais nas rações. Provavelmente,<br />

será por meio de uma portaria<br />

que obrigue as empresas a testarem<br />

seus produtos. A nossa equipe<br />

da Embrapa Recursos Genéticos e<br />

<strong>Biotecnologia</strong> tem plenas condições<br />

de atender a essas demandas. Serão<br />

necessárias apenas algumas<br />

adaptações nos laboratórios de espectrometria<br />

de massa, de forma a<br />

torná-los mais aptos a prestar serviços<br />

– visto que hoje são laboratórios<br />

de pesquisa – além da contratação<br />

de pessoal especializado. Nós já<br />

atendemos a uma demanda do<br />

MAPA para análise de 800 amostras<br />

e, dessas, grande parte continha<br />

proteínas animais. No final do mês<br />

de fevereiro, teremos uma nova<br />

reunião com a equipe do Ministério<br />

para fechar essa questão.<br />

___________________________________<br />

O e-mail do Professor Carlos Bloch Júnior é:<br />

cbloch@cenargen.embrapa.br<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 5


BIOTECNOLOGIA <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong><br />

KL3 Publicações<br />

Fundador<br />

Dr. Henrique da Silva Castro<br />

Direção Geral e <strong>Edição</strong><br />

Ana Lúcia de Almeida<br />

E-mail<br />

biotecnologia@biotecnologia.com.br<br />

Home-Page<br />

www.biotecnologia.com.br<br />

Projeto Gráfico<br />

KL3 Publicações LTDA<br />

SHIN CA 05 Conjunto “J”<br />

Bloco “B” Sala 105<br />

Lago Norte - Brasília - DF<br />

Tel.: (061) 468-6099<br />

Fax: (061) 468-3214<br />

Os artigos assinados são de<br />

inteira responsabilidade<br />

de seus autores.<br />

ISSN 1414-4522<br />

Carta ao Leitor<br />

Prezados Leitores,<br />

Já está bem divulgado o problema do “mal da vaca<br />

louca” no mundo todo, principalmente sobre os surtos<br />

que aconteceram na Europa e dizimaram milhares de<br />

cabeças de gado, causando imenso prejuízo.<br />

Aqui no Brasil, felizmente até agora, fomos poupados,<br />

mas sabemos também que pode ser apenas uma<br />

questão de tempo. Por isso mesmo o apoio à pesquisa<br />

dessa importante doença é primordial para a pecuária<br />

no país.<br />

Para falar sobre o assunto convidamos o Dr. Carlos<br />

Bloch Jr., que desenvolve, na Embrapa-Cenargen, um<br />

método de combate à doença. Confira a entrevista.<br />

Dr. Henrique da Silva Castro<br />

Nota: Todas as edições da <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> &<br />

<strong>Desenvolvimento</strong> estão sendo indexadas para o AGRIS<br />

(International Information System for the Agricultural Sciences<br />

and Technology) da FAO e para a AGROBASE (Base de Dados<br />

da Agricultura Brasileira).


Conselho Científico<br />

Dr. Aluízio Borém - Genética e Melhoramento Vegetal<br />

Dr. Henrique da Silva Castro - Saúde;<br />

Dr. Ivan Rud de Moraes - Saúde - Toxicologia;<br />

Dr. João de Deus Medeiros - Embriologia Vegetal;<br />

Dr. Naftale Katz - Saúde;<br />

Dr. Pedro Jurberg - <strong>Ciência</strong>s;<br />

Dr. Sérgio Costa Oliveira - Imunologia e Vacinas;<br />

Dr. Vasco Ariston de Carvalho Azevedo - Genética de Microorganismos;<br />

Dr. William Gerson Matias - Toxicologia Ambiental.<br />

Conselho Brasileiro de Fitossanidade - Cobrafi<br />

Dr. Luís Carlos Bhering Nasser - Fitopatologia<br />

Fundação Dalmo Catauli Giacometti<br />

Dr. Eugen Silvano Gander - Engenharia Genética;<br />

Dr. José Manuel Cabral de Sousa Dias - Controle Biológico;<br />

Dra. Marisa de Goes - Recursos Genéticos<br />

Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares - IPEN<br />

Dr. José Roberto Rogero<br />

Sociedade Brasileira de <strong>Biotecnologia</strong> - SBBiotec<br />

Dr. Luiz Antonio Barreto de Castro - EMBRAPA<br />

Dr. Diógenes Santiago Santos - UFRGS<br />

Dr. José Luiz Lima Filho - UFPE<br />

Dra. Elba P. S. Bon - UFRJ<br />

Entrevista<br />

Entrevista<br />

Colaboraram nesta edição:<br />

Adriano Luiz Tonetti, Alessandra Pereira Fávero, Alexandre<br />

Patto Kanegae, Ana Paula Pacheco Clemente, Anderson<br />

Kurunczi Domingos, Antonio Costa de Oliveira, Bruno<br />

Coraucci Filho, Carla M. Y. Lemos, Celso Omoto, David<br />

John Bertioli, Eleni Gomes, Eliane Cristina Gruszka<br />

Vendruscolo, Elza Fernandes de Araújo, Enio Luiz Pedrotti,<br />

Erica Fuchs, Everaldo Gonçalves de Barros, Fábio Rueda<br />

Faucz, Fernando Irajá Félix de Carvalho, Francismar Corrêa<br />

Marcelino, Gabrielle Mouco, Gaspar Malone, Gláucia Maria<br />

Pastore, Helena Maria Wilhelm, Jorge Fernando Pereira,<br />

José Fernandes Barbosa Neto, Juliana Oliveira Lima, Karina<br />

Proite, Karla Thomas Kucek, Luiz Pereira Ramos, Maira<br />

Jardim Bernardino, Marcio Antônio Silva Pimenta, Márcio<br />

de Carvalho Moretzsohn, Márcio Nitschke, Marcos Barros<br />

de Medeiros, Maria Fernanda Diniz, Maria José Araújo<br />

Wanderley, Marisa Vieira de Queiroz, Marta Fonseca<br />

Martins, Maurílio Alves Moreira, Melânia Lopes Cornélio,<br />

Monita Fiori de Abreu, Patrícia Messenberg Guimarães,<br />

Paulo Alves Wanderley, Paulo Dejalma Zimmer, Paulo<br />

Henrique Machniewicz, Pilar Ximena Lizarazo Medina,<br />

Ricardo Antonio Polanczyk, Roberto da Silva, Rodrigo<br />

Barros Rocha, Ronaldo Stefanutti, Rubens Onofre Nodari,<br />

Samuel Martinelli, Sérgio Batista Alves, Soraya Cristina<br />

Leal-Bertioli, Valdir Marcos Stefenon.<br />

Nova tecnologia no combate ao “mal da vaca louca” 2<br />

Pesquisa esquisa<br />

Silenciamento Gênico e Transgênicos 8<br />

Detecção de resíduos de transgênicos em grãos e produtos derivados 14<br />

Bacillus thuringiensis no Manejo Integrado de Pragas 18<br />

Biodiesel 28<br />

Biofertilizantes Líquidos 38<br />

Iniciativas Genômicas 45<br />

Associação de mutações nos genes BRCA1 e BRCA2 53<br />

Biosurfatantes a partir de resíduos agroindustriais 63<br />

Controle de qualidade de ervas medicinais 68<br />

Nitrato Redutase em Fungos Filamentosos 74<br />

Glucoamilase:Estrutura e termoestabilização 86<br />

Marcadores Moleculares no Melhoramento Genético de Araucária 95<br />

Micropropagação de Macieira 100<br />

Método Alternativo de Tratamento de Esgotos 109<br />

Amendoim Selvagem 116<br />

Bioética 120


Pesquisa<br />

Eliane Cristina Gruszka Vendruscolo<br />

MSc, Melhoramento Genético Vegetal.<br />

Professora de Genética/UFPR - Campus Palotina<br />

vendruscolo.1@osu.edu;<br />

egvendru@vn.com.br<br />

Silenciamento Gênico<br />

e Transgênicos<br />

Introdução<br />

A estrutura genômica de plantas<br />

pode ser alterada por transformação<br />

genética durante o processo<br />

de transferência gênica utilizandose<br />

Agrobacterium tumefaciens, biobalística<br />

e outras técnicas que integram<br />

parte de um genoma (gene<br />

exógeno) em um outro genoma (no<br />

caso, vegetal). A transgenia tem sido<br />

usada com o propósito de integrar<br />

seqüências gênicas de interesse com<br />

conseqüente alteração da expressão<br />

gênica. A expressão desse transgene<br />

nem sempre pode ser predita. Desse<br />

modo, o estudo das conseqüências<br />

dessas transformações tem-se tornado<br />

relevante nos últimos anos<br />

(VOINNET & BAULCOMBE, 1997;<br />

WATERHOUSE et al., 1998;<br />

VAUCHERET et al., 2001).<br />

Vários termos podem ser encontrados<br />

na literatura para descrever<br />

o silenciamento gênico. Esses<br />

incluem cossupressão, RNAi (RNA<br />

de interferência) e quelling (interrupção<br />

da seqüência gênica) em<br />

leveduras. A cossupressão seria o<br />

termo aplicado ao silenciamento<br />

gênico do gene endógeno pela ação<br />

do RNA do transgene. Aqui ambos<br />

os genes, exógeno e endógeno, são<br />

coordenadamente suprimidos.<br />

Quelling é um termo de cossupressão<br />

usado em Neurospora crassa, e<br />

o RNAi é aplicado ao silenciamento<br />

gênico em animais, quando esse<br />

acontece pela ação de uma fita dupla<br />

de RNA, causando a não transcrição<br />

nem a tradução de determinado<br />

gene(BAULCOMBE, 2002).<br />

8 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Importância, mecanismos e modelos do silenciamento gênico<br />

Em vários experimentos, foram<br />

obtidas evidências do silenciamento<br />

gênico em plantas, que levaram<br />

à conclusão que, ao aumentar<br />

o número de cópias de um gene de<br />

interesse em particular, poderia reduzir<br />

a sua expressão (MAZTKE &<br />

MAZTKE, 1995; DEPICKER & VAN<br />

MONTAGU, 1997). WEI et al. (2001)<br />

comentam sobre uma correlação<br />

positiva entre o número de insertos<br />

com pobre expressão gênica. Vários<br />

transgenes inseridos podem ser<br />

silenciados após uma (relativamente)<br />

longa fase de expressão e podem,<br />

às vezes, silenciar a expressão<br />

(parcialmente) de genes homólogos<br />

localizados em posições<br />

ectópicas no genoma (FAGARD &<br />

VAUCHERET, 2000). Em alguns casos,<br />

o silenciamento gênico de<br />

transgenes pode desencadear a resistência<br />

a vírus e, em outros casos,<br />

a infecção viral pode silenciar a<br />

expressão de genes endógenos nas<br />

plantas (BAULCOMBE, 1996).<br />

Mecanismos de<br />

silenciamento gênico<br />

O silenciamento gênico, como<br />

processo, corresponde a uma interação<br />

entre seqüências homólogas de<br />

DNA ou RNA. Até hoje, sabe-se que<br />

o RNA está envolvido em 2 tipos de<br />

silenciamento gênico dependente de<br />

homologia (SGDH): 1) SGPTS (silenciamento<br />

gênico pós-transcricional),<br />

onde a degradação de RNAs<br />

homólogos no citoplasma levaria a<br />

não tradução e 2) SGT (silenciamento<br />

gênico transcricional), que está


elacionado com o bloqueio na transcrição<br />

induzido por um RNA antisenso<br />

derivado do próprio DNA,<br />

que promoveria uma metilação na<br />

região promotora, a nível nuclear, e<br />

a homologia para a metilação dirigida<br />

ocorreria nas regiões transcritas<br />

(WASSENEGGER, 2000; FAGARD &<br />

VAUCHERET, 2000; VAUCHERET et<br />

al., 2001).<br />

Embora os genes que interagem<br />

podem estar muito próximos no<br />

mesmo cromossomo e iniciar a<br />

inativação em cis, muitos sistemas<br />

estudados envolvem a interação de<br />

seqüências localizadas em diferentes<br />

cromossomos ou a transinativação.<br />

Ambos os tipos de SGDH<br />

estão freqüentemente associados<br />

com metilações de novo em seqüências-específicas<br />

do DNA nuclear<br />

(KOOTER et al., 1999;<br />

WASSENEGGER, 2000).<br />

O mecanismo de silenciamento<br />

gênico transcricional (SGT) estaria associado<br />

a metilações de novo na região<br />

do promotor do transgene, que poderiam<br />

ser meioticamente herdáveis<br />

(KOOTER et al., 1999). Essa metilação<br />

seria induzida por pareamento de regiões<br />

homólogas de DNA ou ainda DNA-<br />

RNA. Esse pareamento constitui o passo<br />

inicial para a iniciação do SGPT<br />

(WASSENEGGER & PÉLISSIER, 1998).<br />

O pareamento induziria a uma<br />

metilação dentro da região codificante<br />

do transgene, que levaria a uma prematura<br />

interrupção de sua transcrição.<br />

Como resultado dessa síntese irregular<br />

de mRNA, um RNA aberrante (abRNA)<br />

seria formado (WASSENEGGER &<br />

PÉLISSIER, 1998; HAMILTON &<br />

BAULCOMBE, 1999; MATZKE et al.,<br />

2001).<br />

Estudos recentes têm encontrado<br />

presença de um RNA de, aproximadamente,<br />

25 nt em sense e<br />

antisense, com homologia ao RNA<br />

alvo, em plantas que apresentam<br />

cossupressão e resistência a vírus,<br />

mas que não são encontradas em<br />

plantas usadas como controle. Tal<br />

fato contribui para evidenciar que<br />

existem diferentes formas de silenciamento,<br />

porém todas agindo num<br />

mesmo mecanismo (HAMILTON &<br />

BAULCOMBE, 1999).<br />

A resistência a vírus seria<br />

explicada pelo fato de estes abRNA<br />

serem o molde para que as RNA<br />

polimerases dependentes de RNA<br />

(RPdR) do hospedeiro (vegetal) possam<br />

sintetizar pequenas moléculas<br />

de RNA anti-sense (METTE et al.,<br />

1999; MATZKE et al., 2001;<br />

MLOTSHWA et al., 2002). Esses pequenos<br />

RNA antisense agiriam em<br />

trans, em seqüências de RNA complementares<br />

(RNA viral), levando à<br />

formação de RNA fita dupla (dfRNA).<br />

Um complexo de RNAses específicas<br />

para esses dfRNAs (conhecidas<br />

como Complexo DICER ou RNAses<br />

tipo III, específicas para as dfRNAs),<br />

levariam a degradação dessas moléculas<br />

híbridas e, em conseqüência,<br />

tornariam a planta resistente ao vírus<br />

(METZLAFF et al., 1997;<br />

CERUTTI, 2003).<br />

No caso das integrações múltiplas,<br />

como as cópias do transgene, o<br />

silenciamento se iniciaria por um<br />

pareamento não recíproco entre o<br />

transgene e o gene endógeno, ou<br />

entre os transgenes e, como conseqüência<br />

desse pareamento, o locus<br />

receptor seria metilado, levando a<br />

uma terminação prematura da transcrição<br />

(ENGLISH & BAULCOMBE,<br />

1996; WASSENEGGER, 2000).<br />

A posição de integração do<br />

transgene também parece ser importante<br />

para o silenciamento pelo fato<br />

de o loci silenciador usualmente consistir<br />

de múltiplas cópias do transgene<br />

ligadas. Outro modelo que explica o<br />

silenciamento de transgenes em cópias<br />

múltiplas e invertidas é a formação<br />

de um RNA em alça (alRNA),<br />

que, posteriormente, se transformaria<br />

em dfRNA pela ação de RNA<br />

nucleases causando o efeito do silenciamento<br />

conforme foi descrito acima<br />

(WATERHOUSE et al., 2001). De<br />

modo similar, o dfRNA poderia também<br />

ser usado como molde para<br />

algumas RNA polimerases que transcreveriam<br />

moléculas de RNA antisenso,<br />

homólogos aos mRNAs, formando<br />

os dfRNAs e continuando o<br />

ciclo de silenciamento por indução<br />

do SGT e SGPT (KOOTER et al.,<br />

1999; FAGARD & VAUCHERET,<br />

2000).<br />

Modelos para explicar o<br />

silenciamento gênico<br />

Vários autores têm sugerido<br />

modelos para os mecanismos moleculares<br />

envolvidos no silenciamento<br />

gênico, que não são eventos mutuamente<br />

exclusivos, mas que podem<br />

ser usados individualmente ou<br />

em conjunto para explicar o silenciamento<br />

gênico.<br />

1. Silenciamento mediado<br />

pelo pareamento DNA-DNA<br />

Esse modelo tem sido proposto<br />

para explicar certos tipos de cossupresssão<br />

(JORGENSEN, 1990; MEYER<br />

& SAEDLER, 1996); a trans-inativação<br />

(MATZKE & MATZKE; 1990;<br />

CHANDLER & VAUCHERET, 2001) e<br />

a paramutação (MEYER et al., 1993;<br />

CHANDLER & VAUCHERET, 2001).<br />

O pareamento de regiões homólogas<br />

do DNA, devido à interação<br />

entre duas seqüências homólogas<br />

numa interfase da meiose, levaria à<br />

formação de estruturas em alças, que<br />

seria o precursor da difusão de<br />

metilações no DNA, induzindo o SGT<br />

(ENGLISH & BAULCOMBE, 1996).<br />

Os transgenes diferem muito em<br />

sua capacidade de trans-inativar cópias<br />

homólogas, o que parece estar associado<br />

à capacidade de procurar outras<br />

posições cromossomais com homologia.<br />

A presença de genes silenciadores<br />

muito próximos ao telômero sugere<br />

que regiões teloméricas são sítios favoráveis<br />

para a interação com seqüências<br />

homólogas (MEYER & SAEDLER, 2001).<br />

2. Degradação de RNA em<br />

excesso<br />

Em transgênicos, é comum o<br />

uso de promotores fortes para se<br />

conseguir a alta expressão do<br />

transgene. Como conseqüência, para<br />

a detecção de planta com o inserto,<br />

são esperados níveis altos do mRNA<br />

do transgene. Nesse modelo, os<br />

abRNA seriam produzidos devido a<br />

uma alta taxa de transcrição do DNA,<br />

com isso, os altos níveis de mRNA. Se<br />

essa taxa de mRNA exceder a taxa de<br />

tradução, pode ocorrer, além da de-<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 9


gradação parcial desses mRNA, a<br />

terminação abrupta da transcrição, o<br />

processamento irregular, originando<br />

abRNAs e induzindo ao SGPT<br />

(WASSENEGGER & PÉLISSIER, 1998).<br />

Outrossim, o excesso de produção<br />

de uma determinada proteína pode<br />

transmitir um sinal para a maquinaria<br />

de tradução a fim de induzir a terminação<br />

de sua própria transcrição. As<br />

proteínas em excesso seriam marcadas<br />

por ubiquitinas, por fosforilação ou<br />

por outras modificações pós-transcricionais<br />

(HOCHSTRASSER, 1996;<br />

WASSENEGGER & PÉLISSIER, 1998).<br />

3. Híbridos DNA-RNA<br />

A observação de que o pareamento<br />

DNA-RNA pode induzir padrões<br />

de metilação sugere mudanças<br />

no estado epigenético caracterizado<br />

por um estado específico de metilação<br />

do DNA ou da estrutura da cromatina,<br />

durante o período pré-meiótico ou<br />

de hibridização somática (MEYER &<br />

SAEDLER, 2001). Estudos indicaram<br />

que fragmentos de RNA poderiam<br />

induzir uma hipermetilação em seqüências<br />

homólogas (pareamento<br />

DNA -RNA), causando as mudanças<br />

epigenéticas. Tal fenômeno foi comprovado<br />

em estudos com plantas<br />

transgênicas que continham o cDNA<br />

dos virióides do PSTV da batata. A<br />

metilação no genoma do viróide foi<br />

observada mesmo sem que a<br />

replicação do seu RNA tivesse ocorrido<br />

(WASSENEGGER et al., 1994;<br />

WASSENEGGER, 2000).<br />

Os transcritos poderiam induzir<br />

a metilação em regiões homólogas<br />

de DNA, que seria comum em transformantes,<br />

os quais acumulariam<br />

grandes concentrações dos transcritos<br />

no núcleo, devido às altas taxas<br />

de tradução e do processamento irregular<br />

desses RNAs. Como conseqüência<br />

dessa marcação, a proteína e<br />

seus produtos, após degradação, poderiam<br />

reconhecer seqüências homólogas<br />

surgindo nos ribossomos, e<br />

levando ao término prematuro da<br />

transcrição, além de uma deadenilação<br />

na posição 3’ e, com isso, ao<br />

surgimento dos abRNAs e a indução<br />

do SGPT (JONES et al., 1999).<br />

4. Modelo mediado por<br />

RNA antisenso<br />

O RNA antisenso parece ser<br />

fundamental nos mecanismos de<br />

cossupressão. As fitas duplas de RNA<br />

seriam alvos gerados pelos promotores<br />

presentes no DNA do transgene<br />

e pela ação de RNA polimerases<br />

dependente de RNA ( RPdR)<br />

(LINDBO et al., 1993).<br />

WASSENEGGER & PÉLISSIER<br />

(1998) ainda propõem que esse RNA<br />

poderia surgir devido à posição da<br />

seqüência de DNA produtora do<br />

RNA antisenso, próximo a um promotor<br />

localizado adjacente a uma<br />

cópia de T-DNA integrado e em<br />

anti-senso .<br />

A produção de RNA antisenso<br />

pelas RPdR dependeria de níveis<br />

específicos do RNA senso e do<br />

acúmulo de intermediários de RNA<br />

(durante o processamento ou transporte).<br />

Essa hipótese se baseia no<br />

fato de que as RPdR reconheceriam<br />

os transcritos aberrantes, que seriam<br />

derivados de transcrição, transporte<br />

ou tradução incorreta do<br />

transgene. A produção de abRNA<br />

poderia induzir as mudanças<br />

epigenéticas do gene que influenciaria<br />

o seu processamento (MEYER &<br />

SAEDLER, 1996; WASSENEGGER,<br />

2000).<br />

Certos transgenes somente podem<br />

silenciar ou cossuprimir seqüências<br />

caso contenham um final 3’<br />

homólogo, enquanto certos transgenes<br />

com regiões 5’ homólogas não são<br />

afetadas (ENGLISH et al., 1996). Essas<br />

observações sugerem que os transcritos<br />

antisenso são feitos preferencialmente<br />

nas regiões 3’ do transgene<br />

(WASSENEGGER & PÉLISSIER, 1998).<br />

O papel da metilação e da<br />

estrutura da cromatina no<br />

silenciamento gênico<br />

Em recentes estudos sobre silenciamento<br />

em plantas, a ocorrência<br />

de pareamento entre seqüências<br />

homólogas parece ser condição importante<br />

para o silenciamento<br />

(BAULCOMBE & ENGLISH, 1996;<br />

VOINNET et al., 1998). O silencia-<br />

10 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

mento em trans seria quando uma<br />

região metilada teria homologia com<br />

a região promotora de um determinado<br />

gene, dirigindo uma metilação<br />

de novo nessa região, para induzir o<br />

SGT. Tal fenômeno é conhecido<br />

como metilação do DNA dirigida<br />

por DNA (MDdD)(JONES et al., 1999;<br />

METTE et al., 1999; WASSENEGGER,<br />

2000).<br />

Muitos genes eucarióticos e elementos<br />

transponíveis exibem uma<br />

forte correlação inversa entre densidade<br />

de metilação do DNA e atividade<br />

transcricional ou transposicional.<br />

Ao certo, não se sabe se a<br />

ação da metilação da citosina alteraria<br />

a estrutura da cromatina, mas<br />

estudos em plantas demonstram<br />

uma correlação positiva entre o<br />

número de cópias do transgene, o<br />

aumento da metilação e a diminuição<br />

da atividade transcricional<br />

(KUMPATLA et al.,1997).<br />

Em eucariontes, os resíduos de<br />

citosina do DNA genômico podem<br />

ser metilados na posição 5’da citidina.<br />

As enzimas das DNA metiltransferases<br />

que realizam essa reação têm preferências<br />

por grupos CpG ou CpNpG.<br />

Em ambos os casos, o DNA recentemente<br />

replicado, que contém grupos<br />

CpG ou CpNpG hemimetilados, são<br />

fortes substratos para a ação das<br />

DNA metiltransferases. Tal padrão<br />

asseguraria as metilações de manutenção<br />

e de padrões de metilação<br />

pré-existentes nos cromossomos filhos<br />

(ATHERLY et al.,1999).<br />

Em transgenes, esse padrão de<br />

metilação não é igual. As metilações<br />

localizadas em resíduos de citosina<br />

não estão localizadas em seqüências<br />

CpG ou CpNpGp. Os fatores que<br />

especificam esse padrão de metilação<br />

não simétrico são ainda uma incógnita,<br />

mas parece que a metilação do<br />

DNA é dirigida por um RNA. Não se<br />

sabe se esse RNA seria o sinal em<br />

todos os casos da metilação não<br />

simétrica das citosinas em plantas<br />

(FINNEGAN et al., 1998). Alguns<br />

autores denominam esse fenômeno<br />

de metilação do DNA dirigida por<br />

RNA (MDdR)(WASSENEGGER, 2000;<br />

BAULCOMBE, 2002). Esse padrão<br />

também não parece ser conservado


durante a meiose, em contraste com<br />

o padrão de metilação simétrica<br />

(PARK et al., 1996; LUFF et al.,<br />

1999).<br />

Estudos têm demonstrado que<br />

a metilação do DNA e a estrutura da<br />

cromatina têm um importante papel<br />

no SGT e SGPT. Nessa forma de<br />

silenciamento, a região promotora<br />

e, às vezes, a região codificante dos<br />

transgenes silenciados apresentamse<br />

densamente metilados (KOOTER<br />

et al., 1999). Plantas mutantes para<br />

o gene da proteína DDM1, que remodela<br />

a cromatina, não apresentaram<br />

o silenciamento gênico. Isso<br />

indica um possível papel da<br />

metilação do DNA e da estrutura da<br />

cromatina no estabelecimento e na<br />

manutenção de SGPT. Supõe-se que<br />

o aumento da metilação leve à<br />

heterocromatização do DNA e, com<br />

isso, ao difícil acesso às RNA<br />

polimerases, diminuindo a ação<br />

transcricional (YE et al., 1996;<br />

WASSENEGGER & PÉLISSIER, 1998;<br />

WASSENEGGER et al., 2000).<br />

Embora os modelos atuais proponham<br />

que a produção de um<br />

RNA aberrante, fruto de uma<br />

metilação, seja o causador de uma<br />

finalização prematura da transcrição<br />

do mRNA, existem estudos com<br />

linhagens defeituosas de N. crassa<br />

para o gene da metilase da citosina<br />

(dim2) que exibiram a mesma capacidade<br />

de silenciamento que a linhagem<br />

controle (dim +) (COGONI<br />

& MACINO, 1999). Fato semelhante<br />

foi observado em estudos realizados<br />

com plantas transgênicas de<br />

fumo, onde o gene nptII (neomicina<br />

fosfotransferase) metilado teve a<br />

transcrição e o SGPT normais quando<br />

comparado com uma cópia do<br />

gene nptII não metilado e não silenciado<br />

(VAN HOUDT et al., 1997).<br />

Tais fatos indicam que a metilação<br />

não parece ser condição sine qua<br />

non para a indução e a manutenção<br />

do SGPT (PARK et al., 1996).<br />

Razões para a ocorrência do<br />

silenciamento gênico<br />

Diversos autores têm levantado<br />

o papel do silenciamento gênico . O<br />

silenciamento gênico parece estar<br />

envolvido com a defesa a ácidos<br />

nucléicos estranhos (COVEY, 2000;<br />

JORGENSEN, 1995; MOURAIN et al.,<br />

2000), com a proteção do genoma<br />

contra a inserção de elementos<br />

transponíveis (KETTING et al., 1999;<br />

BAULCOMBE, 2002) e com a<br />

regulação da expressão gênica de<br />

famílias de multigenes ou ainda<br />

genes duplicados em plantas<br />

(TANZER et al., 1997; CHANDLER &<br />

VAUCHERET, 2001).<br />

Uma outra questão poderia ser<br />

levantada, se seqüências homólogas<br />

de DNA podem parear e se tornar<br />

silenciadas, como então explicar que<br />

membros de famílias de genes poderiam<br />

escapar da inativação? MATZKE<br />

& MATZKE (1995) propõem a existência<br />

de duas maneiras de prevenir<br />

esse pareamento: ou pela divergência<br />

de seqüências encontradas em<br />

alelos (heterozigosidade) ou devido<br />

à redução do comprimento de seqüências<br />

homólogas, o que sugere<br />

um papel muito importante para os<br />

íntrons, que dividiriam a região<br />

codificante da proteína em segmentos<br />

pequenos demais para realizar<br />

um pareamento efetivo.<br />

Parece bastante unânime entre<br />

vários autores que o silenciamento<br />

gênico tem como função<br />

principal prevenir a superexpressão<br />

gênica, controlando o número<br />

de cópias de determinado gene ou<br />

ainda ser um mecanismo de defesa<br />

contra a superexpressão de<br />

transgenes (WASSENEGGER &<br />

PÉLISSIER, 1998; KOOTER et al.,<br />

1999; WASSENEGGER, 2000).<br />

Difusão e amplificação do<br />

silenciamento gênico<br />

Um dos mais importantes aspectos<br />

do silenciamento gênico é que<br />

este é um mecanismo autômato, isto<br />

é, pode ser induzido localmente e<br />

pode se espalhar para distantes locais<br />

no organismo (VOINNET et al., 1998;<br />

COVEY, 2000). Esse transporte<br />

sistêmico do sinal de silenciamento<br />

parece relacionar-se com um sinal<br />

móvel, não metabólico, ainda não<br />

completamente identificado. Esse si-<br />

nal, sendo parte integral do processo<br />

de silenciamento, parece interagir com<br />

proteínas de membranas, movendose<br />

de célula em célula através do<br />

floema (plasmodesmata), assemelhando-se<br />

com o padrão de infecção de<br />

vírus nas plantas (PALAUQUI et al.,<br />

1997; VOINNET & BAULCOMBE, 1997;<br />

VOINNET et al., 1998; MLOTSHWA<br />

et al., 2002).<br />

O SGPT teria três fases: início,<br />

manutenção e difusão propriamente<br />

dita. Os transgenes, os vírus e até<br />

mesmo o DNA exógeno (proveniente<br />

da transformação) poderiam<br />

iniciar o SGPT. Alguns autores sugerem<br />

que esse sinal seja na forma<br />

de RNA, mas não é conhecido ainda<br />

qual o tipo de RNA que estaria<br />

envolvido: se abRNA, dfRNA ou<br />

ainda o asRNA (METTE et al., 1999;<br />

KOOTER et al., 1999; MATZKE et<br />

al., 2001; MLOSTHWA et al., 2001).<br />

Esse conceito de difusão célulacélula<br />

e de transporte a longas distâncias<br />

não pode ser descartado,<br />

visto que o vírus tem seu genoma<br />

composto por RNA e esse RNA difunde-se<br />

para dentro da planta, podendo<br />

se mover de célula-célula<br />

através de proteínas codificadas pelo<br />

seu próprio genoma (WATERHOUSE<br />

et al., 2001).<br />

Ainda não está completamente<br />

elucidado como o sinal para o silenciamento<br />

pode se espalhar sistemicamente<br />

pela planta e ainda ter seus<br />

efeitos amplificados. O silenciamento<br />

parece ser um mecanismo de prevenção,<br />

como a vacina é para os<br />

humanos. Parece sensato estabelecer<br />

que o silenciamento nada mais é<br />

que uma mensagem enviada pelas<br />

células já infectadas pelo vírus para<br />

aquelas que ainda não o foram, mas<br />

que estejam na iminência de o ser,<br />

para que essas preparem suas defesas<br />

contra o agente invasor. Se esse<br />

sinal contiver fragmentos da seqüência<br />

viral, as células receptoras poderiam<br />

estar preparadas para degradar<br />

qualquer RNA que contivesse essas<br />

seqüências, mesmo antes de o vírus<br />

chegar (RATCLIFF et al., 1997;<br />

WATERHOUSE et al., 2001).<br />

Esse modelo poderia explicar algumas<br />

observações:1) de que plantas<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 11


transgênicas com transgenes derivados<br />

de vírus podem apresentar uma<br />

recuperação, isto é, apresentar os sintomas<br />

da infecção inicial do vírus,<br />

seguida de crescimento sem os sintomas<br />

e de resistência ao vírus. 2) plantas<br />

transgênicas apresentando cossupressão<br />

tendem, inicialmente, a apresentar<br />

atividade do transgene, mas<br />

um silenciamento progressivo em tecidos<br />

em crescimento (WATERHOUSE<br />

et al., 2001).<br />

Considerações finais<br />

Na última década, o estudo do<br />

silenciamento gênico cresceu consideravelmente.<br />

Já existem evidências<br />

de que características específicas<br />

do DNA, como a metilação e a estrutura<br />

da cromatina, são importantes<br />

para o fenômeno do silenciamento.<br />

Todavia, o seu mecanismo molecular<br />

ainda não foi totalmente<br />

elucidado, mas, em razão de observações<br />

funcionais dos RNA anti-senso,<br />

abRNA, dfRNA, RNA polimerases<br />

e RNA nucleases, os estudiosos desse<br />

assunto puderam elaborar modelos<br />

para os mecanismos de SGDH ,<br />

o SGT e SGPT.<br />

É notória a existência de algumas<br />

dificuldades para o estudo do<br />

silenciamento gênico em plantas<br />

transgênicas. Variações entre as linhas<br />

de plantas transgênicas constituem<br />

uma grande barreira para o<br />

completo estudo desses mecanismos.<br />

Duas linhas transgênicas não são<br />

similares pelo fato de o transgene em<br />

cada planta se situar em diferente<br />

domínio no cromossomo, em diferente<br />

arranjo e também devido à<br />

associação com diferentes quantidades<br />

de DNA do vetor de transformação<br />

(IGLESIAS et al., 1997; STAM et<br />

al., 1997).<br />

Apesar das dificuldades, vislumbram-se<br />

para essa área da ciência<br />

grandes e importantes descobertas: o<br />

completo entendimento da regulação<br />

gênica, a identificação dos fatores<br />

que podem afetar a expressão gênica<br />

e dos transgenes (talvez se discuta no<br />

futuro algumas propriedades dessa<br />

tecnologia) e, ainda mais, a compreensão<br />

dos mecanismos evolutivos.<br />

Agradecimentos<br />

Aos pesquisadores Ivan<br />

Schuster (Coodetec) e Maria Júlia<br />

Corazza Nunes (UEM/PR) pelas<br />

correções e sugestões dadas. Agradeço<br />

a Deus por tudo.<br />

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<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 13


Pesquisa<br />

Francismar Corrêa Marcelino<br />

Mestre em Genética Molecular, Laboratório<br />

de Análises Genéticas - AgroGenética<br />

eg34680@vicosa.ufv.br<br />

Marta Fonseca Martins<br />

Doutora em Genética Molecular, Laboratório<br />

de Análises Genéticas - AgroGenética<br />

mmartins@tdnet.com.br<br />

Marcio Antonio Silva Pimenta<br />

Doutor em Genética Molecular,<br />

Universidade Federal de Viçosa<br />

marciopimenta@vicosa.ufv.br<br />

Maurilio Alves Moreira<br />

PhD, Bioquímica & Genética de Plantas,<br />

Universidade Federal de Viçosa<br />

moreira@ufv.br<br />

Everaldo Gonçalves de Barros<br />

PhD, Biologia Molecular de Plantas,<br />

Universidade Federal de Viçosa<br />

ebarros@ufv.br<br />

Ilustrações cedidas pelos autores<br />

Detecção de resíduos de<br />

transgênicos em grãos e<br />

produtos derivados<br />

Mais de 58 milhões de hectares são<br />

cultivados atualmente no mundo com<br />

espécies transgênicas, sendo a soja, o<br />

milho, o algodão e a canola, as principais<br />

delas. Os países com as maiores áreas<br />

cultivadas com transgênicos são, nesta<br />

ordem, os Estados Unidos, a Argentina, o<br />

Canadá e a China. Estes países respondem<br />

por cerca de 99% da área total plantada<br />

com cultivos transgênicos. O cultivo de<br />

plantas geneticamente modificadas vem<br />

crescendo rapidamente em vários países,<br />

inclusive no Brasil, onde no mês de<br />

setembro foi aprovado, embora com restrições,<br />

o plantio de soja transgênica para<br />

o ano agrícola 2003/2004 (Medida Provisória<br />

1<strong>31</strong>, de 25 de setembro de 2003).<br />

A demanda por análises da presença<br />

de resíduos de transgênicos em matérias-primas<br />

e em alimentos tem aumentado<br />

significativamente no Brasil, nos últimos<br />

dois anos, principalmente após a<br />

comprovação do cultivo ilegal da soja<br />

transgênica, resistente ao herbicida<br />

glifosato, destacadamente no estado do<br />

Rio Grande do Sul, com sementes provenientes<br />

da Argentina. A maior parte das<br />

14 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

A experiência da Universidade Federal de Viçosa<br />

análises tem sido demandada por empresas<br />

exportadoras de grãos de soja e de<br />

produtos derivados. Esses produtos são<br />

exportados, na maioria, para a Europa,<br />

Japão e Coréia. Já antevendo esse cenário,<br />

a Universidade Federal de Viçosa<br />

(UFV), por intermédio do Instituto de<br />

<strong>Biotecnologia</strong> (BIOAGRO), desenvolveu<br />

e otimizou metodologias baseadas na<br />

técnica de PCR (Polymerase Chain<br />

Reaction) para determinar a presença e<br />

quantificar resíduos de transgênicos em<br />

amostras de DNA extraídas de grãos,<br />

bem como de seus produtos derivados.<br />

Recentemente, a AgroGenética, laboratório<br />

incubado na Incubadora de Empresas<br />

de Base Tecnológica da UFV, foi<br />

credenciado junto ao Ministério da Agricultura,<br />

Pecuária e Abastecimento (MAPA)<br />

- Portaria Nº 27, de 15 de maio de 2003,<br />

para a “detecção de modificação genética<br />

em produtos de origem vegetal”.<br />

As modificações genéticas introduzidas<br />

que derivam os organismos<br />

geneticamente modificados (OGMs)<br />

podem ser produzidas por pelo menos<br />

três metodologias:<br />

Figura 1 - Representação da construção presente na soja RR® (Roundup Ready).<br />

Região promotora 35S do vírus do mosaico da couve flor, peptídeo de trânsito de<br />

Petúnia, gene que codifica a proteína EPSPS, que confere a resistência ao herbicida,<br />

e o terminador do gene da nopalina sintase (NOS).


Figura 2 - Análise qualitativa de OGM em amostras de grãos de soja. O DNA das amostras foi<br />

extraído pelo método Wizard e amplificado com primers específicos que anelam ou no gene<br />

da lectina (controle A e B), ou na região do promotor 35S do CaMV (C e D), ou na região<br />

terminadora NOS (E e F), ou na região codificadora do gene EPSPS (G e H). Após a reação de<br />

PCR, os produtos amplificados foram separados em géis de agarose. À esquerda (A, C, E e G)<br />

está exemplificado um resultado negativo e à direita (B, D, F e H), um resultado positivo. Os<br />

símbolos nas canaletas representam: (–), reação de PCR sem DNA (controle); N, soja normal<br />

(controle); T, soja transgênica (controle); 1, 2 e 3, referem-se a amostras de grãos de soja. As<br />

setas indicam as bandas de DNA de interesse.<br />

Figura 3 - Curva de amplificação de uma análise quantitativa em PCR de tempo real. A<br />

determinação da porcentagem de resíduos de OGM é baseada na comparação da curva de<br />

amplificação da amostra analisada com as curvas de amplificação de padrões certificados<br />

contendo quantidades conhecidas de OGMs.<br />

- técnicas do DNA recombinante,<br />

utilizando vetores para transformação<br />

de plantas;<br />

- técnicas envolvendo a introdução<br />

direta do material genético no<br />

organismo;<br />

- fusão celular por métodos não<br />

naturais.<br />

A construção genética utilizada para<br />

produzir OGMs consiste de três elementos<br />

básicos: o promotor, que controla a<br />

expressão do transgene no organismo;<br />

a região codificadora, que codifica a<br />

proteína de interesse; e a região<br />

terminadora, que determina o final do<br />

processo de transcrição do gene. Além<br />

disso, pode ser usado um gene marcador<br />

que serve para selecionar as células que,<br />

de fato, foram transformadas. A soja<br />

resistente ao herbicida glifosato, por<br />

exemplo, tem como região reguladora o<br />

promotor 35S do vírus do mosaico da<br />

couve flor (CaMV); como região<br />

codificadora, o gene para a proteína<br />

EPSPS de Agrobacterium tumefasciens,<br />

que confere a resistência ao herbicida, e<br />

como região terminadora, o terminador<br />

do gene da nopalina sintase (NOS),<br />

também de Agrobacterium (Figura 1).<br />

A identificação de alimentos geneticamente<br />

modificados pode ser feita facilmente<br />

com o auxílio de técnicas de<br />

biologia molecular. OGMs podem ser<br />

identificados pela detecção direta do DNA<br />

exógeno nele contido, do mRNA correspondente<br />

produzido, da proteína resultante<br />

ou, ainda, pela característica introduzida.<br />

Os principais métodos analíticos<br />

de detecção utilizam a técnica da reação<br />

em Cadeia da DNA Polimerase (PCR) para<br />

detectar o DNA exógeno, ou métodos<br />

imunológicos, como o ELISA, para detectar<br />

a proteína. O método analítico escolhido<br />

deve ser sensível, confiável,<br />

reprodutível, minimizando, assim, falsos<br />

positivos e falsos negativos.<br />

Em nosso laboratório a detecção e<br />

quantificação de resíduos de OGMs em<br />

grãos, ingredientes e produtos derivados<br />

é feita pela técnica de PCR. Para tal, é<br />

necessária a extração de DNA das amostras<br />

e amplificação do fragmento de interesse.<br />

Para ser amplificado, o DNA purificado<br />

deve apresentar boa qualidade. Além<br />

disso, como controle, um gene normalmente<br />

presente no organismo, é amplificado<br />

em uma reação paralela. Para produtos<br />

que contenham soja na sua composição<br />

é utilizado o gene da lectina. Para<br />

produtos à base de milho, é utilizado o<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 15


Figura 4 - Percentual dos diferentes produtos analisados para a detecção de OGMs em 2000.<br />

Figura 5 - Percentual dos diferentes produtos analisados para a detecção de OGMs em 2001.<br />

Figura 6 - Percentual dos diferentes produtos analisados para a detecção de OGMs em 2002<br />

Figura 7 - Percentual dos diferentes produtos analisados para a detecção de OGMs em 2003.<br />

16 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

gene da delta zeína. Quando se quer<br />

detectar a presença de OGM em uma<br />

amostra de salsicha, por exemplo, amplifica-se<br />

como controle o gene da lectina,<br />

uma vez que a salsicha geralmente contém<br />

pelo menos 2% de proteína de soja na<br />

sua composição.<br />

O nosso laboratório procura utilizar<br />

métodos validados internacionalmente<br />

nas suas análises. Para a extração<br />

de DNA das amostras é utilizada a<br />

metodologia Wizard, método já validado<br />

pela Comunidade Econômica Européia.<br />

O transgene, ou seja, o segmento<br />

de DNA que foi introduzido na planta,<br />

é amplificado com primers específicos.<br />

Para a detecção do gene RR (Roundup<br />

Ready) são utilizados primers que se<br />

ligam ou à região do promotor 35S do<br />

CaMV, ou à região codificadora, ou ao<br />

terminador NOS. Após a reação de PCR<br />

os produtos amplificados são separados<br />

em géis de agarose. Para as análises<br />

quantitativas, o DNA das amostras é<br />

extraído pela metodologia PrepMan-<br />

Ultra e a análise é baseada no método<br />

TaqMan ® , que utiliza a técnica de PCR<br />

em Tempo Real, para amplificar a seqüência<br />

de DNA do promotor 35S, o<br />

qual está presente na maioria dos OGMs<br />

comercializados até o momento. O procedimento<br />

é extremamente preciso devido<br />

à perfeita complementaridade entre<br />

os primers usados na reação de PCR,<br />

a sonda TaqMan ® e as seqüências alvo<br />

de DNA que estão sendo amplificadas.<br />

A fluorescência liberada durante a reação<br />

é lida pelo sistema de detecção ABI<br />

PRISM ® 7000 e os dados gerados são<br />

analisados eletronicamente. Como a<br />

metodologia é bastante sensível, podese<br />

detectar, numa dada amostra, uma<br />

contaminação da ordem de 0,01%. No<br />

entanto, devido ao limite de recuperação<br />

do DNA durante o processo de<br />

extração e também aos erros inerentes<br />

ao processo de amostragem, temos trabalhado<br />

com um nível de detecção e<br />

quantificação da ordem de 0,1%. Isto é,<br />

uma amostra contendo 0,1% de transgênicos<br />

é classificada como positiva na<br />

nossa análise, tendo como referência<br />

um padrão certificado. Amostras com<br />

uma contaminação menor que 0,1% são<br />

classificadas como negativas. A Figura 2<br />

mostra os possíveis resultados obtidos<br />

em uma análise qualitativa, enquanto<br />

que na Figura 3 pode ser visualizada<br />

uma curva de amplificação numa análise<br />

quantitativa em tempo real. A<br />

quantificação de uma determinada amos-


tra é feita com base na comparação da<br />

sua curva de amplificação com as de<br />

padrões certificados contendo quantidades<br />

conhecidas de OGMs.<br />

Desde o ano de 2000, o laboratório<br />

vem realizando a detecção de OGMs em<br />

grãos e em produtos derivados. Inicialmente<br />

a demanda era concentrada em<br />

amostras de grãos de soja e milho e em<br />

diferentes tipos de preparações de proteínas<br />

de soja. Com o passar dos anos,<br />

observamos um aumento na demanda<br />

pelas análises bem como uma diversificação<br />

das amostras enviadas. Atual-<br />

mente, temos recebido amostras de condimentos<br />

e temperos, óleos, amido de<br />

milho, sopas, fubá, entre outras. A partir<br />

de 2001 foram feitas as primeiras análises<br />

de produtos cárneos. A partir de<br />

2002 houve um aumento expressivo no<br />

número de análises para esse tipo de<br />

produto. Naquele ano, 12,3% do total de<br />

amostras analisadas foram de produtos<br />

cárneos. Até setembro de 2003 a porcentagem<br />

foi de 7,3%.<br />

As Figuras 4, 5, 6 e 7 mostram a<br />

porcentagem de cada classe de produto<br />

analisado em relação ao total de amos-<br />

Figura 8 - Percentual de amostras positivas para a presença de resíduos de OGMs com<br />

relação ao número total de amostras analisadas, entre os anos de 2000 e 2003.<br />

Quadro<br />

1 - Porcentagem<br />

de<br />

amostras<br />

positivas<br />

dentro<br />

de<br />

cada<br />

classe<br />

de<br />

amostras<br />

e com<br />

relação<br />

ao<br />

total<br />

de<br />

amostras<br />

analisadas<br />

% de<br />

% de<br />

% de<br />

% de<br />

% de<br />

% de<br />

% de<br />

% de<br />

amostras<br />

amostras<br />

amostras<br />

amostras<br />

amostras<br />

amostras<br />

amostras<br />

amostras<br />

Tipo<br />

de<br />

Amostra<br />

positivas<br />

pelo<br />

total<br />

de<br />

positivas<br />

dentro<br />

da<br />

classe<br />

positivas<br />

pelo<br />

total<br />

de<br />

positivas<br />

dentro<br />

da<br />

classe<br />

positivas<br />

pelo<br />

total<br />

de<br />

positivas<br />

dentro<br />

da<br />

classe<br />

positivas<br />

pelo<br />

total<br />

de<br />

positivas<br />

dentro<br />

da<br />

classe<br />

amostras<br />

analisada<br />

amostras<br />

analisada<br />

amostras<br />

analisada<br />

amostras<br />

analisada<br />

em<br />

2000<br />

em<br />

2000<br />

em<br />

2001<br />

em<br />

2001<br />

em<br />

2002<br />

em<br />

2002<br />

em<br />

2003<br />

em<br />

2003<br />

Soja grão<br />

Diferentes<br />

3, 89<br />

12, 96<br />

7, 74<br />

35, 42<br />

6, 16<br />

<strong>31</strong>, 69<br />

9, 22<br />

64,<br />

20<br />

tipos<br />

de<br />

proteínas<br />

de<br />

soja<br />

0, 00<br />

0, 0020<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 96<br />

3, 91<br />

2, 13<br />

7,<br />

41<br />

Farelo<br />

de<br />

soja<br />

1, 11<br />

11, 76<br />

1, 37<br />

14, 64<br />

7, 93<br />

54, 72<br />

8, 33<br />

54,<br />

49<br />

Produ<br />

tos<br />

cárneos<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

7, 93<br />

63, 04<br />

5, 32<br />

73,<br />

17<br />

Milho grão<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

1, 06<br />

13,<br />

04<br />

Ração 0, 00<br />

0, 00<br />

1, 82<br />

21, 62<br />

3, 56<br />

49, 06<br />

2, 30<br />

35,<br />

14<br />

Hidrolisad<br />

o<br />

de<br />

soja<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 23<br />

4, 76<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 18<br />

25,<br />

00<br />

Sopas 0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0,<br />

00<br />

Fubá<br />

de<br />

milho<br />

Condimen-<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 18<br />

14,<br />

29<br />

tos<br />

e<br />

temperos<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 55<br />

36, 36<br />

1, 42<br />

61,<br />

54<br />

Lecitina<br />

de<br />

soja<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 82<br />

75, 00<br />

0, 00<br />

0,<br />

00<br />

Óleos<br />

e<br />

gorduras<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 00<br />

0, 27<br />

40, 00<br />

0, 00<br />

0,<br />

00<br />

Outros 0, 00<br />

0, 00<br />

0, 23<br />

2, 22<br />

0, 27<br />

5, 88<br />

2, 30<br />

37,<br />

14<br />

tras desde o ano de 2000. Ao longo dos<br />

anos que temos realizado análises de<br />

OGM em grãos e diferentes tipos de<br />

alimentos, pudemos observar um aumento<br />

gradual no número de amostras<br />

positivas, demonstrando que embora<br />

seja proibido o plantio e a comercialização<br />

de OGM no país, estes de alguma<br />

forma estão presentes no mercado, pelo<br />

menos, desde o ano de 2000. Naquele<br />

ano apenas 5% das amostras analisadas<br />

foram positivas para a presença de<br />

resíduos de OGM. Em 2001, esse<br />

percentual subiu para 11,5%. Em 2002,<br />

para 28,5%, e até setembro de 2003,<br />

32,3% das amostras apresentaram resultado<br />

positivo. A Figura 8 representa de<br />

forma gráfica estes resultados.<br />

A porcentagem de amostras positivas<br />

dentro de cada classe de produtos<br />

também sofreu elevação, principalmente<br />

no caso de grãos de soja, farelo de soja e<br />

ração. A porcentagem de amostras de<br />

grãos de soja positivas para a presença de<br />

OGM em 2000 foi de 3,89 % com relação<br />

ao total de amostras analisadas. Com<br />

relação apenas às amostras de grãos<br />

analisadas, esse percentual foi de 12,96%,<br />

atingindo 35,42%, <strong>31</strong>,69% e 64,20%, respectivamente,<br />

em 2001, 2002 e 2003. As<br />

amostras de farelo OGM subiram de<br />

1,11% do total de amostras analisadas,<br />

em 2000, para 8,33% em 2003, enquanto<br />

as de ração eram 1,82% em 2001 e 2,3%<br />

em 2003. A porcentagem de amostras de<br />

produtos cárneos contendo resíduos de<br />

OGM foi de 7,93% do total de amostras<br />

analisadas e 63,04% com relação ao total<br />

de amostras dessa classe de produtos em<br />

2002. Em 2003, esses valores foram de<br />

5,32% e 73,17%, respectivamente. Com<br />

relação às amostras de milho e derivados<br />

apenas em 2003 começamos a detectar<br />

algumas amostras positivas, o que reflete<br />

a presença de outros cultivos transgênicos,<br />

que não a soja RR®, no mercado<br />

mundial. O Quadro 1 mostra a porcentagem<br />

de amostras positivas em relação ao<br />

número total de amostras analisadas e<br />

dentro de cada classe de amostras.<br />

Os nossos dados permitem concluir<br />

que no período de 2000 a 2003 houve um<br />

aumento gradual da presença de resíduos<br />

de transgênicos em grãos, ingredientes e<br />

alimentos derivados no país, especialmente<br />

com relação à soja. Os dados apontam<br />

também para a necessidade de definição<br />

de normas claras de rotulagem de alimentos.<br />

Para esse fim, é importante que se<br />

disponham de laboratórios qualificados<br />

para realizar esse tipo de análise.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 17


Pesquisa<br />

Ricardo Antonio. Polanczyk<br />

Engenheiro Agrônomo, Doutorando – Programa de<br />

Pós Graduação em Entomologia (Escola Superior de<br />

Agricultura Luiz de Queiroz, ESALQ -USP).<br />

rapolanc@esalq.usp.br<br />

Samuel Martinelli<br />

Engenheiro Agrônomo, Doutorando – Programa de<br />

Pós Graduação em Entomologia (Escola Superior de<br />

Agricultura Luiz de Queiroz, ESALQ -USP).<br />

smartine@esalq.usp.br<br />

Celso Omoto<br />

Engenheiro Agrônomo, Prof. Dr. Depto<br />

Entomologia, Fitopatologia e Zoologia Agrícola<br />

(ESALQ-USP).<br />

celomoto@esalq.usp.br<br />

Sérgio Batista Alves<br />

Engenheiro Agrônomo, Prof. Dr. Depto<br />

Entomologia, Fitopatologia e Zoologia Agrícola<br />

(ESALQ-USP).<br />

sebalves@esalq.usp.br<br />

Ilustrações cedidas pelos autores<br />

Bacillus thuringiensis<br />

no Manejo Integrado de Pragas<br />

1. Introdução<br />

A exploração agrícola intensiva,<br />

necessária para atender à crescente<br />

demanda interna por alimentos,<br />

aumento do volume de exportações<br />

agrícolas e necessidade por<br />

produtos como fibras, tem como<br />

fator limitante o impacto negativo<br />

nos ecossistemas. De acordo com<br />

Tilman et al. (2001), diante da continuidade<br />

dos impactos ambientais<br />

globais provocados pela agricultura,<br />

10 9 hectares de ecossistemas naturais<br />

serão convertidos em sistemas<br />

agrícolas até o ano de 2050. Do<br />

mesmo modo, os agroquímicos, utilizados<br />

para o controle de pragas<br />

agrícolas são muitas vezes responsáveis<br />

por contaminações do meio<br />

ambiente e intoxicações de produtores<br />

rurais. Portanto, é importante<br />

o desenvolvimento e implementação<br />

de táticas de controle de pragas<br />

menos agressivas, que estejam de<br />

acordo com as premissas do Manejo<br />

Integrado de Pragas, e que, ao<br />

mesmo tempo, proporcionem o retorno<br />

econômico ao agricultor.<br />

Neste sentido, o controle biológico<br />

é uma importante estratégia<br />

que, através da liberação, incremento<br />

e conservação de insetos parasitóides,<br />

predadores e microrganismos,<br />

impede que os insetos-praga<br />

atinjam níveis populacionais capazes<br />

de causar dano econômico. Indiretamente,<br />

diminui o impacto dos<br />

agroquímicos sobre o meio ambiente,<br />

pois minimiza ou torna desnecessário<br />

o seu uso. Entre os microrganismos<br />

com potencial para serem<br />

empregados no controle biológico<br />

18 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Do uso convencional em Pulverização à <strong>Biotecnologia</strong><br />

destaca-se o entomopatógeno<br />

Bacillus thuringiensis (Bt). Esta bactéria<br />

é capaz de produzir inclusões<br />

cristalinas durante a esporulação,<br />

que são responsáveis pela sua atividade<br />

tóxica. As suas toxinas, após a<br />

ingestão, solubilização e ativação<br />

no intestino do inseto, unem-se às<br />

células do epitélio, formando poros<br />

e desestabilizando os gradientes<br />

osmótico e iônico, fazendo com que<br />

este cesse a alimentação, morrendo<br />

por inanição ou septicemia (Priest,<br />

2000; Glare & O´Callagham, 2000).<br />

Para que a patologia de Bt ocorra é<br />

necessário que o intestino do inseto<br />

permita a eficiente solubilização do<br />

cristal e que proteases ativem as<br />

protoxinas resultantes desta solubilização.<br />

Estas etapas são essenciais<br />

para que a toxina passe pela membrana<br />

peritrófica e se ligue aos receptores<br />

presentes na parede do<br />

intestino médio do inseto. Em função<br />

da variabilidade genética, entre<br />

os insetos há diferenças específicas<br />

e não específicas com relação à<br />

especificidade dos receptores das<br />

toxinas de Bt. A especificidade do<br />

receptor assume papel vital na defesa<br />

do organismo contra esta ação<br />

inseticida, juntamente com a solubilização<br />

do cristal e ativação da toxina.<br />

A ausência de necessidade de<br />

solubilizar o cristal e ativar as toxinas<br />

produzidas pelas plantas transgênicas<br />

pode influenciar a suscetibilidade<br />

dos organismos-alvos e nãoalvos<br />

de controle. A morte do inseto,<br />

no caso de produtos à base de Bt é<br />

uma interação da ação da toxina e<br />

dos esporos; o primeiro fator leva à<br />

formação de poros no tecido epitelial,


causando desiquilíbrio osmótico e<br />

iônico e a segundo causa septicemia<br />

devido à germinação dos esporos,<br />

proporcionada pela redução do pH<br />

intestinal devido à ação das toxinas.<br />

No caso de plantas-Bt, a causa da<br />

morte é somente a toxina.<br />

As primeiras tentativas de utilização<br />

de Bt no controle de pragas<br />

foram feitas na Europa durante a<br />

década de 30. Devido aos êxitos<br />

iniciais, a produção deste patógeno<br />

começou na França em 1938. Nos<br />

EUA, o interesse por este patógeno<br />

aumentou após 1950, principalmente<br />

para o controle de lepidópteros<br />

(Lambert & Peferoen, 1992; Beegle &<br />

Yamamoto, 1992).<br />

Deve-se salientar que a pressão<br />

da opinião pública quanto à saúde<br />

humana e preservação do meio ambiente<br />

incentivou a utilização de produtos<br />

microbianos, principalmente em<br />

hortaliças e frutíferas com alto valor<br />

comercial. Em 1970 foi lançado no<br />

mercado o Dipel (Bt kurstaki) que<br />

provou ser 20 a 200 vezes mais potente<br />

que outros isolados desta bactéria<br />

(Beegle & Yamamoto, 1992). Este<br />

produto, atualmente, é utilizado para<br />

o controle de mais de 167 lepidópterospraga<br />

(Glare & O’Callagham, 2000).<br />

Além disso, em 1976 foi caracterizado<br />

um isolado eficaz para o controle de<br />

insetos da ordem Diptera, denominado<br />

Bt israelensis e em 1983 outro letal<br />

para coleópteros denominado de Bt<br />

tenebrionis. O sucesso do uso de Bt<br />

no mundo só não é maior até agora,<br />

em função da existência de inseticidas<br />

químicos baratos que podem substituí-lo<br />

no controle de lepidópteros.<br />

Além de ser utilizado como<br />

bioinseticida, a partir da metade da<br />

década de 1980, foram obtidas as<br />

primeiras plantas transgênicas com<br />

a incorporação dos genes codificadores<br />

das proteínas tóxicas de Bt<br />

em plantas de fumo e tomate (Dias,<br />

1992). Segundo Ely (1993), mais de<br />

50 espécies de plantas sofreram<br />

transformações deste tipo com resultados<br />

satisfatórios. Formas<br />

truncadas dos genes que codificam<br />

proteínas inseticidas de Bt na sua<br />

forma ativa foram introduzidas e<br />

expressas com sucesso em plantas<br />

de fumo (Vaeck et al., 1987) e<br />

algodão (Perlak et al., 1990). Koziel<br />

et al. (1993), através da inserção de<br />

uma versão modificada do gene<br />

truncado cry1Ab, conseguiram a expressão<br />

da proteína Cry1Ab em altos<br />

níveis em plantas de milho e,<br />

em testes de campo, foi verificada a<br />

proteção contra o consumo foliar e<br />

perfuração de colmos por Ostrinia<br />

nubillalis, uma importante praga<br />

da cultura do milho nos EUA.<br />

De acordo com Clive (2002),<br />

estima-se que foram ocupados cerca<br />

de 58,7 milhões de hectares com<br />

culturas transgênicas no ano de 2002,<br />

com um aumento de 11,6% em relação<br />

ao ano anterior (Figura 1). A<br />

Índia, o maior produtor mundial de<br />

algodão, comercializou algodão-Bt<br />

pela primeira vez em 2002. Também,<br />

foi verificado um aumento da área<br />

pré-comercial de algodão-Bt na Colômbia<br />

e em Honduras. O EUA foi o<br />

país com maior área plantada, cerca<br />

de 39 milhões de hectares (66%),<br />

seguido pela Argentina (23%), Canadá<br />

(6%) e China (4%). A China apresentou<br />

o maior incremento anual<br />

(40%) entre 2001 e 2002 na área<br />

plantada com algodão-Bt, ocupando<br />

51% da área cultivada com esta espécie.<br />

Em termos mundiais, o milho<br />

geneticamente modificado ocupou<br />

12,4 milhões de hectares (com aumento<br />

de 9% em relação à área de<br />

2001), seguido pelo algodão e canola<br />

com 6,8 e 3 milhões de hectares,<br />

respectivamente (Figura 2).<br />

2. Vantagens e Limitações<br />

O emprego de biopesticidas à<br />

base de Bt é altamente desejável em<br />

programas de controle de insetos devi-<br />

do à sua alta especificidade e rápida<br />

degradação do ambiente. No entanto,<br />

de acordo com Vaeck et al. (1987),<br />

independentemente das vantagens do<br />

uso de inseticidas à base de toxinas<br />

produzidas pela bactéria Bt, o emprego<br />

destes produtos em escala comercial<br />

é limitado em função da instabilidade<br />

do cristal protéico em campo, devido<br />

à ação da luz ultravioleta e do seu<br />

alto custo de produção. Em relação ao<br />

efeito destas toxinas sobre insetos benéficos,<br />

Glare & O´Callagham (2000)<br />

relatam estudos realizados sobre o<br />

efeito de várias subespécies e produtos<br />

à base de Bt sobre 9 ordens de<br />

predadores, distribuídos em 25 famílias.<br />

Em relação aos parasitóides, os<br />

mesmos autores enumeram uma série<br />

de trabalhos realizados com Diptera<br />

(Tachinidae) e Hymenoptera<br />

(Aphelinidae, Braconidae, Chalcididae,<br />

Encyrtidae, Eulophidae, Eupelmidae,<br />

Ichneumonidae, Pteromalidae, Scelionidae<br />

e Trichogrammatidae). Em ambos<br />

os casos, embora os estudos tenham<br />

mostrado alguma variação nos<br />

resultados, os produtos formulados com<br />

Bt e suas subespécies apresentam pouco<br />

ou nenhum efeito sobre estes inimigos<br />

naturais.<br />

Os benefícios potenciais do uso<br />

de plantas geneticamente modificadas<br />

como, por exemplo, milho-Bt,<br />

não se limitam apenas à redução na<br />

aplicação de inseticidas de largo<br />

espectro. Estudos mostram a diminuição<br />

dos níveis de micotoxinas<br />

nos grãos destas plantas (Munkvold<br />

et al., 1999).<br />

De acordo com Obrycki et al.<br />

(2001), os riscos ou limitações no<br />

uso das plantas geneticamente mo-<br />

Figura 1. Adoção mundial de plantas geneticamente modificadas (GM)<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 19


dificadas podem ser agrupados em<br />

três categorias: troca de material<br />

genético entre as plantas geneticamente<br />

modificadas e espécies selvagens<br />

aparentadas por meio da dispersão<br />

de grãos de pólen; a seleção<br />

de indivíduos resistentes na população<br />

do inseto-alvo de controle e o<br />

impacto da tecnologia sobre outros<br />

insetos e organismos não-alvos do<br />

controle. Com relação à troca de<br />

material genético, segundo Ellstrand<br />

et al. (1999), as plantas domesticadas<br />

e utilizadas em sistemas agrícolas<br />

não podem ser consideradas<br />

como indivíduos evolutivamente separados<br />

de seus parentes selvagens.<br />

Dentre as 13 mais importantes espécies<br />

utilizadas para a produção de<br />

alimentos, 90% destas formam híbridos<br />

com seus parentes selvagens<br />

em algum local dentro de sua área<br />

de distribuição agrícola. Deste modo,<br />

os centros de origem das espécies<br />

seriam os locais mais suscetíveis a<br />

tal fenômeno. A taxa de fluxo gênico<br />

neste caso tende a ser extremamente<br />

variável e as suas conseqüências<br />

evolutivas dependem de sua magnitude.<br />

A conseqüência evolutiva mais<br />

clara do fluxo gênico é a sua tendência<br />

em homogeneizar a composição<br />

genética das populações. A taxa de<br />

fluxo gênico pode ser efetivamente<br />

zero entre plantas com incompatibilidade<br />

de cruzamento que estejam<br />

isoladas espacialmente ou que não<br />

apresentem sobreposição de suas<br />

épocas de florescimento. Porém, os<br />

autores chamam a atenção em particular<br />

para os agroecossistemas. Em<br />

tais casos, o plantio concentrado de<br />

uma espécie de interesse econômico<br />

pode permitir que outras espécies<br />

(ex: plantas daninhas) sofram<br />

hibridização e introgressão de genes<br />

vindos do campo de produção agrícola.<br />

Assim, o fluxo gênico entre as<br />

plantas domesticadas e seus parentes<br />

selvagens apresenta potencialmente<br />

duas conseqüências danosas:<br />

o aumento da capacidade de invasão<br />

de ambientes por algumas espécies<br />

e o aumento do risco de extinção<br />

destes parentes selvagens. De acordo<br />

com Wolfenbarger & Phifer<br />

(2000), modificações genéticas através<br />

do melhoramento genético, convencional<br />

ou através de engenharia<br />

genética, de uma espécie cultivada,<br />

ou não, podem produzir mudanças<br />

e promover a habilidade de um organismo<br />

se tornar invasor de diferentes<br />

ecossistemas. Deste modo, a<br />

transferência de pólen de plantas de<br />

milho-Bt para plantas selvagens aparentadas<br />

é uma preocupação decorrente<br />

da adoção desta tecnologia<br />

(Bergelson et al., 1998). No entanto,<br />

esta transferência é limitada a regiões<br />

do México e América Central<br />

onde ocorrem plantas do grupo dos<br />

teosíntos (Ellstrand et al., 1999).<br />

O impacto das plantas geneticamente<br />

modificadas sobre a entomofauna<br />

benéfica começou a receber<br />

grande atenção após a publicação de<br />

Losey et al. (1999) na revista Nature.<br />

Este estudo mostrou que o pólen do<br />

milho transgênico expressando toxinas<br />

de Bt causou mortalidade de<br />

cerca de 50% das lagartas da borboleta<br />

monarca (Dannaus plexippus)<br />

(Lepidoptera: Nymphalidae), quatro<br />

dias após a ingestão. Porém, este<br />

trabalho foi bastante criticado, principalmente,<br />

por não relatar precisamente<br />

a quantidade de toxina utilizada<br />

nos bioensaios. Outros estudos,<br />

como os realizados por Leong et al.<br />

(1992) e Hansen & Obrycki (1999)<br />

indicam que este inseto pode ser<br />

afetado pelo milho-Bt, porém os níveis<br />

de mortalidade são bastante inferiores<br />

aos verificados por Losey et<br />

al., (1999). Glare & O´Callagham<br />

(2000) ressaltam que o comportamento<br />

do inseto, migração a partir de<br />

áreas com esta toxina, poderia reduzir<br />

o efeito da toxina sobre esta<br />

espécie.<br />

20 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Figura 2. Taxa de adoção mundial das principais culturas GM em 2002<br />

Deve-se ressaltar que o impacto<br />

das plantas geneticamente<br />

modificadas sobre os organismos<br />

não-alvos do controle pode ser<br />

avaliado através de estudos<br />

toxicológicos e/ou ecológicos<br />

(Obrycki et al., 2001). Nos estudos<br />

toxicológicos, o parâmetro avaliado<br />

é a mortalidade dos herbívoros<br />

e dos consumidores de pólen quando<br />

expostos às toxinas de Bt como<br />

realizado por Losey et al. (1999).<br />

Por sua vez, nos estudos ecológicos<br />

são observados os efeitos da<br />

utilização destas plantas sobre os<br />

demais níveis tróficos constituintes<br />

de uma cadeia alimentar (herbívoros<br />

predadores e parasitóides).<br />

Ainda existem questionamentos<br />

quanto ao impacto das toxinas presentes<br />

em plantas de milho-Bt sobre<br />

insetos polinizadores de outras<br />

plantas. Vandenberg (1990)<br />

detectou valores significativos de<br />

mortalidade de abelhas domesticadas<br />

quando expostas à solução de<br />

Bt tenebrionis, o qual é considerado<br />

específico para coleópteros. Ainda,<br />

segundo Obrycki et al. (2001),<br />

os efeitos das plantas de milho-Bt<br />

também deveriam ser avaliados<br />

sobre decompositores presentes no<br />

solo (ex: Collembola) e outros predadores<br />

vertebrados. Estes últimos<br />

estudos se justificam já que algumas<br />

espécies de pássaros e morcegos<br />

são predadoras de lepidópteros<br />

que freqüentemente ocorrem em<br />

campos de milho.<br />

Em relação ao efeito de plantas<br />

transgênicas sobre inimigos naturais,<br />

de acordo com Orr & Landis


(1997), o número de predadores e<br />

o parasitismo de massas de ovos<br />

de O. nubilalis não foram adversamente<br />

afetados por plantas de milho-Bt<br />

expressando Cry1A(b). Entre<br />

os predadores foram avaliados<br />

adultos e ninfas do percevejo predador<br />

Orius insidiosus, bem como<br />

adultos e larvas de coccinelídeos e<br />

crisopídeos.<br />

Pilcher et al. (1997) conduziram<br />

estudos em laboratório e campo para<br />

determinar os efeitos de milho-Bt<br />

expressando Cry1A(b) sobre insetos<br />

predadores. No laboratório, não foi<br />

verificado qualquer efeito detrimental<br />

agudo sobre o desenvolvimento<br />

pré-imaginal e sobrevivência de<br />

Coleomegilla maculata, O.<br />

insidiosus e Chrysoperla carnea. No<br />

campo, em estudo realizado por dois<br />

anos consecutivos, não foram observados<br />

efeitos adversos sobre a<br />

abundância de predadores de O.<br />

nubilalis (coccinelídeos, crisopídeos<br />

e antocorídeos) quando comparadas<br />

a áreas de milho não geneticamente<br />

modificado. Ainda, os números<br />

de predadores observados antes,<br />

durante e após a liberação dos<br />

grãos de pólen pelas plantas de<br />

milho-Bt sugerem que movimento<br />

dos inimigos naturais no campo não<br />

foi afetado por este tipo de pólen.<br />

Os efeitos de presas alimentadas<br />

com milho-Bt sobre a mortalidade<br />

e desenvolvimento de larvas do<br />

predador C. carnea foram estudados<br />

em condições de laboratório por<br />

Hilbeck et al. (1998a). O predador<br />

foi criado com lagartas de O.<br />

nubilalis, e Spodoptera litorallis alimentadas<br />

com milho contendo a<br />

toxina Cry1A(b). Foi observado prolongamento<br />

no período larval de<br />

crisopídeos criadas continuamente<br />

com presas que foram alimentadas<br />

com o milho geneticamente modificado<br />

foi significativamente maior<br />

comparada com a testemunha, baixo<br />

valor nutricional. Ainda, foi observado<br />

prolongamento no período<br />

larval de crisopídeos criados com<br />

lagartas de O. nubilalis alimentas<br />

com milho geneticamente modificado.<br />

Este efeito pode ser atribuído à<br />

exposição à toxina inseticida em<br />

conjunto com o uso de presas de<br />

baixo valor nutricional.<br />

O desenvolvimento e mortalidade<br />

de formas larvais do predador<br />

Orius majusculus criadas sobre<br />

tripes Anaphothrips obscurus,<br />

alimentados com milho geneticamente<br />

modificado expressando a<br />

d-endotoxina Cry1A(b), foi estudado<br />

por Zwahlen et al. (2000). A<br />

atividade inseticida das plantas de<br />

milho Bt foi comprovada através<br />

de bioensaios utilizando-se lagartas<br />

de O. nubilalis. Não houve<br />

diferença significativa na mortalidade<br />

e no desenvolvimento das<br />

formas imaturas do predador criadas<br />

em A. obscurus alimentados<br />

com milho transgênico expressando<br />

a toxina Cry1A(b), quando comparados<br />

à testemunha criada com<br />

tripes não expostos à proteína inseticida<br />

de B. thuringiensis. Os<br />

resultados obtidos não evidenciaram<br />

efeitos letais ou subletais nos<br />

indivíduos de O. majusculus no<br />

modelo de interação tritrófica (milho<br />

Bt – herbívoro – predador)<br />

elaborado pelos autores. Segundo<br />

os autores, a resposta de O.<br />

majusculus alimentados com tripes<br />

expostos à Cry1A(b) pode ser<br />

explicada pela insensibilidade deste<br />

percevejo à toxina ou pela baixa<br />

quantidade de proteína inseticida<br />

ingerida pelos tripes que se alimentaram<br />

do milho Bt.<br />

AlDeeb & Wilde (2003) não<br />

identificaram diferenças significativas<br />

entre parcelas com milho Bt<br />

Cry3Bb1 e o isogênico, com relação<br />

ao número de insetos não alvos de<br />

controle coletados em armadilhas<br />

do tipo alçapão. As inspeções visuais<br />

de adultos e formas imaturas de<br />

C. maculata , O. insidiosus e<br />

Hippodamia convergens também<br />

não mostraram diferenças significativas<br />

entre os materiais testados.<br />

Segundo Al-Deeb et al. (2001), não<br />

houve diferença significativa entre o<br />

número de adultos e ninfas de O.<br />

insidiosus em plantas milho Bt expressando<br />

a toxina Cry1A(b) e milho<br />

convencional em condições de<br />

campo, em duas localidades estudadas.<br />

Ainda os autores conduziram<br />

teste em laboratório para avaliar os<br />

efeitos de estilo-estigmas de milho-<br />

Bt na mortalidade de formas imaturas<br />

de O. insidiosus. Os resultados<br />

mostraram que quando criados continuamente<br />

sobre estilo-estigmas de<br />

milho convencional ou milho Bt as<br />

ninfas deste percevejo predador<br />

apresentaram 100% de mortalidade,<br />

sugerindo que estes insetos sofreram<br />

com insuficiência nutricional<br />

nesta dieta. Porém, não houve diferença<br />

significativa na mortalidade<br />

das ninfas do percevejo quando alimentadas<br />

com estilo-estigmas de milho-Bt<br />

ou convencional e ovos de O.<br />

nubilalis em dias alternados.<br />

Segundo Barton & Dracup et al.<br />

(2000), as práticas agrícolas têm causado<br />

impactos ambientais nos ecossistemas.<br />

Deste modo, os riscos e<br />

benefícios em potencial da adoção da<br />

tecnologia de plantas geneticamente<br />

modificadas devem ser ponderados<br />

tomando-se como referencial os impactos<br />

ambientais decorridos dos sistemas<br />

atuais de produção agrícola.<br />

Porém, os riscos ao ambiente das<br />

plantas geneticamente modificadas<br />

devem ser avaliados antes de sua<br />

liberação para o plantio comercial, e<br />

posteriormente as áreas ocupadas com<br />

estas culturas devem ser monitoradas.<br />

Portanto, conforme apontado por<br />

Fernandes & Martinelli (2000), os estudos<br />

com plantas transgênicas resistentes<br />

a insetos em áreas extensas<br />

com o objetivo de se determinar quais<br />

são as espécies indicadoras de impacto<br />

ambiental destas plantas em um<br />

determinado sistema devem ser<br />

priorizados. Ainda há a necessidade<br />

de se padronizar métodos de avaliação<br />

e interpretação de resultados, possibilitando<br />

a avaliação destas plantas<br />

por todo o Brasil. Deste modo, estes<br />

resultados poderiam ser levados a<br />

público promovendo uma ampla discussão<br />

sobre o tema.<br />

Não obstante, a evolução da resistência<br />

às toxinas presentes nas<br />

plantas geneticamente modificadas<br />

resistentes a insetos é uma das principais<br />

preocupações para a liberação<br />

comercial destas plantas. De acordo<br />

com Heckel (1997) a partir do momento<br />

em que ocorrer a liberação<br />

para plantio em áreas extensas, as<br />

toxinas de Bt representarão um importante<br />

fator de mortalidade para as<br />

populações dos insetos-alvos. Esta<br />

alta pressão de seleção pode conduzir<br />

à evolução da resistência a estas<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 21


toxinas inseticidas nas populações<br />

dos insetos expostos. Existem várias<br />

conseqüências negativas no desenvolvimento<br />

de resistência às toxinas<br />

de Bt. Além da perda das plantas<br />

transgênicas que expressam tais toxinas<br />

como opção no controle de<br />

insetos, há o risco de que o uso de<br />

formulações comerciais de inseticidas<br />

à base de Bt não seja mais viável<br />

para a aplicação em lavouras de milho<br />

ou em outras culturas. Os produtores<br />

orgânicos perderiam uma importante<br />

opção para o manejo de<br />

pragas, o qual é certificado para o seu<br />

sistema de produção. Além disso, as<br />

possibilidades de substituição destes<br />

produtos de origem biológica por<br />

outros são mínimas. O aumento da<br />

utilização de inseticidas sintéticos<br />

também é outra conseqüência em<br />

potencial do desenvolvimento da resistência<br />

às toxinas de Bt (EPA, 1998).<br />

3. Evolução da Resistência<br />

a Produtos à Base de Bt e<br />

Plantas Geneticamente<br />

Modificadas<br />

A resistência é um fenômeno<br />

pré-adaptativo que se desenvolve<br />

por seleção de indivíduos raros que<br />

podem sobreviver à aplicação de<br />

um inseticida a uma determinada<br />

dose. Um grande número de fatores<br />

genéticos, bio-ecológicos e operacionais<br />

influenciam a taxa de evolução<br />

da resistência. Os fatores genéticos<br />

incluem a variabilidade natural<br />

nas populações, número de<br />

genes envolvidos na manifestação<br />

da resistência e sua freqüência inicial<br />

na população (Georghiou &<br />

Taylor, 1977), a herança da característica<br />

(ex: grau de dominância) e<br />

custo adaptativo associado à resistência<br />

(Van Rie & Ferré, 2000). O<br />

potencial das populações de insetos<br />

em desenvolver resistência aos<br />

produtos formulados com Bt utilizados<br />

no controle de pragas é uma<br />

das principais ameaças ao emprego<br />

desta estratégia de controle de pragas<br />

agrícolas. A evolução da resistência<br />

dos insetos para inseticidas<br />

químicos é bastante comum, com<br />

mais de 500 espécies sendo resistentes<br />

a um ou vários inseticidas Já<br />

para os bioinseticidas é comparati-<br />

vamente mais rara, principalmente<br />

devido ao fato de que estes são<br />

pouco utilizados, se compararmos<br />

com a área tratada com inseticidas<br />

químicos em todo mundo.<br />

Há dois modos de estudar a influência<br />

da variabilidade em populações<br />

naturais sobre a resistência a Bt. A<br />

primeira envolve os estudo das diferenças<br />

na suscetibilidade entre e dentro<br />

de populações. Trabalhos neste<br />

sentido foram desenvolvidos por van<br />

Frankenhuyzen et al. (1995) e Huang<br />

et al. (1997) para Choristoneura<br />

fumiferana e O. nubilalis, respectivamente.<br />

Outra estimativa da variabilidade<br />

para genes de resistência em populações<br />

naturais é medir a herdabilidade<br />

(h 2 ) em experimentos laboratoriais a<br />

partir de uma amostra da população.<br />

Este índice representa a proporção da<br />

variação fenotípica de um determinado<br />

caráter responsável pela variação<br />

genética. Tabashnik (1994a) estimou o<br />

h 2 para 8 espécies de insetos, com valor<br />

relativamente alto para Plodia<br />

interpunctella, mostrando abaixa variação<br />

fenotípica e alta variação genética<br />

aditiva deste inseto.<br />

A estimativa indireta da freqüência<br />

dos alelos de resistência é<br />

fornecida por experimentos laboratoriais<br />

que obtiveram êxito em selecionar<br />

populações resistentes a Bt<br />

(Van Rie & Ferré, 2000). Nestes casos,<br />

pelo menos uma cópia do alelo<br />

de resistência deve estar presente<br />

para o início da seleção. Em experimentos<br />

com lepidópteros (Gould et<br />

al., 1992; 1995), a freqüência de<br />

alelos de resistência nas populações<br />

testadas foi relativamente alta (de 1<br />

a 5 x 10 -3 ).<br />

Quanto à herança da resistência,<br />

McGaughey (1985, 1988) mostraram<br />

que para P. interpunctella a<br />

herança é autossômica de parcialmente<br />

a completamente recessiva.<br />

O mesmo foi verificado para Plutella<br />

xylostella por Tabashnik et al. (1992)<br />

e Tang et al. (1997). Em outro trabalho<br />

com este mesmo inseto, (Ferré<br />

et al., 1991) verificaram que a suscetibilidade<br />

da progênie F1 depende<br />

do sexo do inseto no cruzamento<br />

parental, ainda que a ligação com o<br />

sexo tenha sido eliminada com base<br />

na razão sexual 1:1 dos sobreviventes<br />

da F1 a várias doses da Cry1Ab.<br />

22 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Já para H. virescens os trabalhos<br />

demostraram que os resultados dependem<br />

da linhagem do inseto estudada.<br />

Por exemplo: para a linhagem<br />

SEL a herança mostrou-se autossômica,<br />

incompletamente dominante,<br />

e controlado por vários fatores genéticos<br />

(Sims et al., 1991).<br />

Em relação ao número de genes<br />

envolvidos na resistência, para P.<br />

xylostella há trabalhos que indicam<br />

a ocorrência de mais de um gene<br />

envolvido (Tang et al., 1997). Porém,<br />

segundo Glare & O´Callagham<br />

(2000), a resistência deste inseto<br />

para Cry1Ab mostra-se recessiva<br />

controlada principalmente por um<br />

único alelo autossômico e recessivo,<br />

embora isto não seja sempre atribuído<br />

ao mesmo “loci”. Tabashnik et<br />

al. (1997) relatou que populações<br />

do Hawai e Pensilvânia dividem um<br />

“locus” em que uma mutação recessiva<br />

associada com a reduzida ligação<br />

ao receptor confere resistência<br />

extremamente alta a 4 toxinas de<br />

Bt. Entretanto, outra população, das<br />

Filipinas, mostrou um controle<br />

“multilocus”, de espectro mais reduzido,<br />

e para algumas toxinas de<br />

Bt, a herança genética não é recessiva<br />

e não está associada com a<br />

redução da ligação ao receptor. Já<br />

para Heliothis virescens é provável<br />

que um gene principal parcialmente<br />

recessivo confere resistência a<br />

várias toxinas: Cry1Aa, Cry1Ab,<br />

Cry1Ac e Cry1Fa, causando modificações<br />

no receptor (Gould et al.,<br />

1995; Lee et al., 1995).<br />

Embora a resistência em laboratório<br />

seja obtida em poucas gerações<br />

em alguns insetos, ela é na<br />

maioria dos casos instável, reduzindo<br />

logo após a diminuição da pressão<br />

de seleção, como foi observado<br />

por Tabashnik et al. (1994) e Tang et<br />

al. (1997) para P. xylostella. O custo<br />

adaptativo associado à evolução da<br />

resistência é a causa mais provável<br />

da instabilidade da resistência em P.<br />

xyllostella. Groeters et al. (1994)<br />

mostraram tal redução no custo adaptativo,<br />

sendo que após 5 gerações, a<br />

eclosão das lagartas e fecundidade<br />

foram reduzidos em 10% na linhagem<br />

resistente em comparação com<br />

a suscetível. A compreensão desta<br />

instabilidade pode indicar porque a


<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 23<br />

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Tabela<br />

2 - Relatos<br />

de<br />

possível<br />

desenvolvimento<br />

de<br />

resist<br />

ência<br />

de<br />

insetos<br />

para B acil<br />

l us<br />

thuring<br />

iensis<br />

em<br />

campo<br />

( Glare<br />

& O´<br />

Callagham,<br />

2000)<br />

.<br />

Inseto Subespécie N ível<br />

de<br />

resistên<br />

cia<br />

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s)<br />

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a armiger<br />

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MVP II<br />

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a kurst aki<br />

25 - 426<br />

x Cry1<br />

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x Cry1<br />

Ac<br />

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era<br />

frugip<br />

erda<br />

kurst aki<br />

1,<br />

48<br />

x<br />

evolução da resistência ao Bt é tão<br />

rara e pode auxiliar na elaboração<br />

de estratégias para incrementar a<br />

utilização deste bioinseticida<br />

(Tabashnik et al., 1994).<br />

A alteração da atividade proteolítica<br />

(ativação da toxina) foi verificada<br />

em P. interpunctella para Bt<br />

entomocidus e Bt kurstaki (Johnson<br />

et al., 1990; Oppert et al., 1997). Em<br />

trabalho semelhante realizado por<br />

Van Rie et al. (1990), foi observada a<br />

redução de 50 vezes na afinidade da<br />

toxina pelo receptor. Porém, os autores<br />

não verificaram alteração no número<br />

de receptores presentes para<br />

Cry1Ab na linhagem resistente. Estes<br />

dados indicam que a resistência, neste<br />

caso, é devida a alterações no<br />

receptor de Cry1Ab, pois o mesmo<br />

decréscimo de afinidade não foi observado<br />

para Cry1Ca, que possui 3<br />

vezes mais receptores que a outra<br />

toxina. Este elevado número de receptores<br />

pode explicar a alta suscetibilidade<br />

da linhagem selecionada para<br />

Cry1Ca. Para H. virescens foi verificado<br />

por Lee et al. (1995) que a ligação<br />

da toxina Cry1Aa ao receptor foi<br />

drasticamente reduzida, mas o mesmo<br />

não foi verificado para Cry1Ab e<br />

Cry1Ac. Porém, as toxinas do grupo<br />

Cry1A dividem os mesmos receptores<br />

nesta espécie de inseto, portanto<br />

Cry1Ac e Cry1Ab também se ligam<br />

ao receptor de Cry1Aa. Consequentemente<br />

foi considerada a hipótese<br />

que o receptor alterado para Cry1Aa<br />

causa resistência ao 3 subclasses de<br />

Cry1A (Van Rie & Ferré, 2000).<br />

Exemplos de Resistência de Insetos<br />

a produtos à base de Bacillus<br />

thuringiensis:<br />

1) Em laboratório<br />

Existem vários relatos de evolução<br />

da resistência a Bt em laboratório<br />

(Tabela 1). Para a maioria das espécies<br />

testadas a resistência evolui rapidamente<br />

para Bt kurstaki, Bt<br />

entomocidus e Bt tenebrionis ou Bt<br />

aizawai. Quando a diferença entre<br />

as populações suscetíveis e resistentes<br />

é menor que 10, não fica claro se<br />

a população desenvolveu resistência,<br />

propriamente dita, ou se existe<br />

tolerância entre subgrupos ou<br />

genótipos da espécie em questão<br />

(Glare & O´Callagham, 2000).<br />

O primeiro exemplo de resistência<br />

em laboratório ocorreu com Musca<br />

domestica ao Bt thuringiensis, provavelmente<br />

envolvendo b-exotoxina.<br />

De modo semelhante, trabalhos mostraram<br />

uma evolução de resistência<br />

de 10 da mesma toxina para<br />

Drosophila melanogaster em 30 gerações<br />

(Harvey & Howell, 1964; Wilson<br />

& Burns, 1968; Carlberg &<br />

Lindstrom, 1987).<br />

A partir do primeiro relato de<br />

resistência de Plodia interpunctella a<br />

d-endotoxina (McGaughey &<br />

Beeman, 1988), vários relatos de desenvolvimento<br />

de resistência em laboratório<br />

foram feitos. Em alguns<br />

casos os estudos envolvem a suspensão<br />

esporo + cristal enquanto que em<br />

outros casos apenas toxina(s). Em<br />

alguns casos níveis elevados de resistência<br />

foram obtidos em apenas<br />

algumas gerações usando-se alta pressão<br />

de seleção, como por exemplo:<br />

P. interpunctella para Bt kurstaki e P.<br />

xylostella para Bt aizawai Cry1C, de<br />

3 e 6 gerações respectivamente (Glare<br />

& O´Callagham, 2000).<br />

2) Em campo<br />

Embora alguns trabalhos realizados<br />

em laboratório com alta pressão<br />

de seleção de Bt sobre P.<br />

xylostella (traça-das-crucíferas) [sic]<br />

não tenha sido verificado alteração<br />

significativa na suscetibilidade<br />

24 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

(Devriendt & Martouret, 1976), este<br />

inseto foi o primeiro a mostrar evolução<br />

de resistência para Bt em<br />

campo (Tabashnik et al., 1997),<br />

sendo, até o momento, o único<br />

exemplo em que foi verificada a<br />

evolução da resistência em campo<br />

de um inseto para Bt, embora para<br />

outras espécies de lepidópteros (Tabela<br />

1) tenha sido sugerido esta<br />

possibilidade, porém pouca diferença<br />

na suscetibilidade foi verificada<br />

entre as populações de campo<br />

(resistente) e a de referência em<br />

laboratório (suscetível). Segundo<br />

Glare & O´Callagham (2000), outros<br />

relatos de resistência deste inseto<br />

a produtos à base de Bt foram<br />

feitos em vários países como<br />

Tailândia, Havaí, Japão, Coréia, China,<br />

EUA e América Central.<br />

A espécie influencia a probabilidade<br />

de evolução da resistência<br />

devido à variabilidade genética na<br />

população e à possibilidade de encontrar<br />

o inóculo. Por exemplo, o<br />

hábito migratório e polífago de<br />

Helicoverpa punctigera leva à diluição<br />

de qualquer população resistente<br />

devido ao cruzamento de indivíduos<br />

resistentes com suscetíveis,<br />

entretanto, P. xylostella é um inseto<br />

com mobilidade limitada, não ocorrendo<br />

à diluição da resistência, pelo<br />

cruzamento com insetos suscetíveis<br />

vindos de outras áreas (Glare &<br />

O´Callagham, 2000).<br />

A incidência de resistência cruzada<br />

é geralmente baixa, mas foi<br />

verificada para várias toxinas (Tabela<br />

1). Esta parece estar ligada a<br />

composição da toxina do isolado<br />

utilizado. McGaughey & Johnson<br />

(1994) realizam um estudo detalhado<br />

abordando a resistência para as<br />

toxinas individualmente após a seleção<br />

para resistência aos isolados<br />

Bt kurstaki (HD-1), Bt aizawai (HD-<br />

112 e 133) e Bt entomocidus (HD-<br />

198). Para P. interpunctella, HD-1<br />

resultou em resistência para Cry1Ab<br />

e Cry1Ac, mas não para Cry1Aa,<br />

Cry1B, Cry1C e Cry2A. Resistência<br />

para HD-133 e HD-198 resultou em<br />

resistência a uma maior gama de<br />

toxinas: Cry1Aa, Cry1Ab, Cry1Ac,<br />

Cry1B, Cry1C e Cry2A. Os autores<br />

sugeriram que o espectro relativamente<br />

limitado de resistência às


diferentes toxinas em Bt kurstaki<br />

indicou que a resistência cruzada a<br />

outras subespécies era menos provável<br />

de ocorrer, portanto produtos<br />

baseados em Bt kurstaki deveriam<br />

ser utilizados primeiro. A resistência<br />

de Heliothis virescens é normalmente<br />

relatada à toxina Cry1Ac,<br />

porém existem relatos de resistência<br />

para outras toxinas como:<br />

Cry1Aa, Cry1Ab, Cry1F e Cry2A<br />

(Gould et al., 1992).<br />

4. Manejo da Resistência<br />

Os programas de manejo da<br />

resistência apresentam 3 objetivos<br />

principais: evitar, retardar e reverter<br />

a evolução da resistência (Croft,<br />

1990). Estes objetivos são os mesmos<br />

para o manejo da resistência a<br />

produtos à base de Bt sendo muitas<br />

táticas baseadas nos princípios<br />

mostrados para plantas geneticamente<br />

modificadas. No caso das<br />

plantas Bt são preconizadas várias<br />

estratégias, tais como plantas com<br />

altas doses das toxinas associadas<br />

a áreas de refúgio, misturas de<br />

plantas com diferentes toxinas, mosaicos<br />

de plantas geneticamente<br />

modificadas, combinações de toxinas<br />

com diferentes modos de ação,<br />

ou a combinação de plantas expressando<br />

baixas doses das toxinas<br />

e controle complementar das<br />

pragas pelos inimigos naturais e a<br />

expressão das toxinas em determinados<br />

tecidos ou em um período<br />

de ataque mais intenso da praga<br />

(Neppl, 2000).<br />

A estratégia empregada nos<br />

países com plantio de milho Bt<br />

onde as pragas apresentam hábito<br />

migratório dos adultos e alta mobilidade<br />

nas formas larvais tem sido<br />

a utilização de plantas expressando<br />

altas doses das toxinas associadas<br />

às áreas de refúgio. Esta tática<br />

começou a ser adotada baseandose<br />

no princípio de que os insetos<br />

suscetíveis poderiam imigrar para<br />

uma área com predominância de<br />

insetos resistentes e, por cruzamento,<br />

diluir os alelos de resistência<br />

na população da praga. Este<br />

princípio apenas é valido com a<br />

expressão das toxinas de Bt em<br />

altas doses de modo que a resis-<br />

tência seja funcionalmente recessiva.<br />

Deste modo, apenas restariam<br />

na área com plantas geneticamente<br />

modificadas os indivíduos<br />

resistentes. O refúgio pode variar<br />

em tamanho e disposição e servir<br />

como reservatório de insetos suscetíveis.<br />

O sucesso desta estratégia<br />

depende das seguintes condições:<br />

que o acasalamento seja aleatório<br />

entre os indivíduos resistentes<br />

e suscetíveis, que os insetos<br />

suscetíveis migrem da área de refúgio<br />

para a área com as plantas<br />

geneticamente modificadas e exista<br />

sincronia na emergência de insetos<br />

entre as duas áreas.<br />

Outra estratégia possível para<br />

a liberação de plantas geneticamente<br />

modificadas é a mistura de<br />

sementes transgênicas e convencionais<br />

na forma de linhas da cultura<br />

ou faixas de plantio. Uma área que<br />

utilize esta estratégia resulta numa<br />

mistura de plantas-Bt e convencionais.<br />

Deste modo, o refúgio de<br />

plantas convencionais seria disposto<br />

internamente na área com as<br />

plantas transgênicas. Este refúgio<br />

interno consistiria no reservatório<br />

de suscetibilidade para o fornecimento<br />

de indivíduos suscetíceis<br />

para acasalamento aleatório com<br />

os resistentes que restariam nas<br />

plantas geneticamente modificadas.<br />

A principal limitação deste<br />

método é a taxa de movimento<br />

entre plantas nas formas larvais da<br />

praga-alvo de controle. Esta tática<br />

é indicada para casos específicos<br />

nos quais a forma larval da praga<br />

que se encontra nas plantas convencionais<br />

não se disperse para<br />

plantas geneticamente modificadas<br />

resistentes causando a morte dos<br />

indivíduos suscetíveis.<br />

A mistura de sementes na forma<br />

de linhas de plantio com sementes<br />

convencionais internamente à<br />

área de algodão Bt têm sido utilizada<br />

com sucesso no Arizona, EUA,<br />

para o manejo de lagarta rosada<br />

Pectinophora gossypiella. Neste<br />

caso, a lagarta rosada permanece<br />

dentro das maçãs atacadas o que<br />

limita o movimento das formas<br />

larvais desta espécie entre as plantas<br />

garantindo a sobrevivência dos<br />

indivíduos suscetíveis. Esta estraté-<br />

gia não seria adequada para o manejo<br />

de S. frugiperda já que está<br />

espécie apresenta alta mobilidade<br />

na sua larval. A técnica do plantio<br />

em forma de mosaico envolve áreas<br />

com plantas Bt expressando diferentes<br />

toxinas inseticidas. Deste<br />

modo, os insetos estariam sofrendo<br />

diferentes pressões de seleção ao<br />

longo da faixa de plantio de áreas<br />

geneticamente modificadas. No<br />

entanto, para que esta estratégia<br />

funcione é importante que não ocorra<br />

resistência cruzada entre as toxinas<br />

empregadas. Além disso, existem<br />

críticas quanto à possível eficiência<br />

das diferentes áreas Bt em<br />

atuarem como reservatórios de suscetibilidade<br />

recíprocos, o que possibilitaria<br />

a imigração de indivíduos<br />

suscetíveis entre as diferentes áreas<br />

para a diluição dos alelos de<br />

resistência.<br />

Outra alternativa viável é a rotação<br />

de plantas dispondo deferentes<br />

toxinas inseticidas. Assim como no<br />

caso do mosaico, a resistência cruzada<br />

entre as toxinas pode comprometer<br />

a eficácia deste método. As bases<br />

teóricas na estratégia da rotação são<br />

que o custo adaptativo associado à<br />

resistência leva a redução da freqüência<br />

dos indivíduos suscetíveis e<br />

a imigração de indivíduos suscetíveis.<br />

(Hoy, 1988).<br />

A expressão da toxina de Bt em<br />

tecidos e estádio fenológicos adequados<br />

específicos é uma estratégia<br />

que visa diminuir a pressão de seleção<br />

das plantas-Bt sobre a população<br />

de insetos (Frutos et al., 1999).<br />

Esta estratégia é similar ao uso de<br />

áreas refúgio e mistura de sementes<br />

no sentido que a própria planta<br />

pode atuar como refúgio (Mallet &<br />

Porter, 1992). As plantas poderiam<br />

produzir as toxinas somente quando<br />

o nível de dano fosse alcançado ou<br />

em determinados tecidos mais propensos<br />

ao ataque. No entanto, esta<br />

estratégia não funcionaria para pragas<br />

que atacam todas as partes da<br />

planta. Além disso, esta tática é<br />

dependente de estudos avançados<br />

em biologia molecular a fim de se<br />

encontrar os promotores específicos<br />

que seriam responsáveis pelo<br />

direcionamento da expressão das<br />

toxinas inseticidas.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 25


Embora estudos conduzidos em<br />

laboratório relatem a casos de resistência<br />

as toxinas de Bt e freqüência<br />

inicial elevada de resistência, nos<br />

países que adotam a tecnologia de<br />

plantas Bt no manejo das pragas os<br />

programas de monitoramento não<br />

detectaram ainda aumento na<br />

frequência de resistência (Tabashnik<br />

et. al.,2003). Exemplos de programas<br />

de monitoramento estabelecidos<br />

e bem sucedidos incluem O.<br />

nubilalis (Estados Unidos – 6 anos),<br />

P. gossypiella (Arizona-5 anos),<br />

Helicoverpa armigera (Nordeste da<br />

China-3 anos) e Helicoverpa zea (Carolina<br />

do Norte-2 anos).<br />

Assim, torna-se fundamental o<br />

desenvolvimento de programas de<br />

monitoramento como parte dos programas<br />

que visem manejar a evolução<br />

da resistência. Entretanto, as<br />

estratégias para o manejo da resistência<br />

somente obtêm o êxito esperado<br />

se forem adequadamente<br />

implementadas. É importante que o<br />

agricultor compreenda estas estratégias,<br />

além do monitoramento e assistência<br />

técnica para o sucesso destes<br />

programas (Neppl, 2000). Ainda<br />

são necessários estudos para otimizar<br />

os resultados obtidos com as estratégias<br />

de manejo da resistência, entre<br />

estes, destacam-se as pesquisas<br />

voltadas para os hábitos dos insetos<br />

(migração e acasalamento) que podem<br />

influenciar decisivamente na<br />

viabilidade das táticas empregadas.<br />

Dificilmente pode-se assegurar o<br />

êxito destes programas, pois em<br />

campo muitas variáveis são somadas<br />

aos modelos propostos e, atualmente,<br />

nenhuma das táticas acima<br />

descritas são completamente aceitáveis<br />

em termos de eficácia.<br />

5. Considerações Finais<br />

O uso das estratégias de manejo<br />

implica significativa demanda de<br />

mão-de-obra especializada, principalmente<br />

no sentido de monitorar a<br />

evolução da resistência em áreas<br />

cultivadas com plantas geneticamente<br />

modificadas expressando<br />

toxinas de Bt. Geralmente, a assistência<br />

técnica disponível aos agricultores<br />

limita-se a recomendação<br />

de insumos para viabilizar sua ativi-<br />

dade agrícola, de maneira que os<br />

extensionistas dificilmente atuam<br />

como agentes introdutórios de novas<br />

tecnologias e conhecedores do<br />

seu impacto sobre o meio onde<br />

atuam. Além de determinar o impacto<br />

das plantas transgênicas sobre<br />

o meio ambiente, é necessário<br />

também instruir e qualificar tanto o<br />

agricultor como o extensionista sobre<br />

o potencial desta moderna tática<br />

de controle de pragas. A implementação<br />

de estratégias de manejo<br />

de resistência e programas de monitoramento<br />

são fundamentais para<br />

a exploração sustentável da tecnologia<br />

das plantas Bt. Estas atividades<br />

são exigentes em mão-de-obra<br />

treinada e apoio logístico pelos produtores<br />

rurais, órgãos de assistência<br />

técnica, grupos de consultores<br />

envolvidos com a cultura e das<br />

empresas produtoras de sementes<br />

geneticamente modificadas.<br />

Por fim, não é correto se pensar<br />

que as plantas geneticamente modificadas<br />

serão a alternativa definitiva<br />

para o controle de pragas. O sistema<br />

planta-inseto deve ser estudado e<br />

avaliada a relação custo x benefício<br />

da adoção destas plantas geneticamente<br />

modificadas resistentes a insetos.<br />

Deve-se conhecer toda a gama<br />

de alternativas existentes e escolher<br />

aquela que melhor viabiliza a atividade<br />

agrícola, porém levando-se em<br />

conta o seu impacto sobre o meio<br />

ambiente em comparação às demais<br />

alternativas disponíveis para o controle<br />

de pragas.<br />

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<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 27


Pesquisa<br />

Luiz Pereira Ramos, Ph.D.<br />

Professor Adjunto IV, Departamento de Química,<br />

Universidade Federal do Paraná<br />

lramos@quimica.ufpr.br<br />

Karla Thomas Kucek, B.Sc.<br />

Mestranda em Química Orgânica, Departamento<br />

de Química, Universidade Federal do Paraná<br />

k.kucek@hotmail.com<br />

Anderson Kurunczi Domingos, B.Sc.<br />

Mestrando em Química Orgânica, Departamento<br />

de Química, Universidade Federal do Paraná<br />

anderson@quimica.ufpr.br<br />

Helena Maria Wilhelm, Ph.D.<br />

Pesquisadora, Unidade Tecnológica de Química<br />

Aplicada, Depto. de Química Aplicada, Instituto<br />

de Tecnologia para o <strong>Desenvolvimento</strong>, LACTEC<br />

helenaw@lactec.org.br<br />

Ilustrações cedidas pelos autores<br />

Biodiesel<br />

28 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Um projeto de sustentabilidade econômica e sócio-ambiental para o Brasil<br />

1 - Introdução<br />

Desde o século passado, os combustíveis<br />

derivados do petróleo têm<br />

sido a principal fonte de energia<br />

mundial. No entanto, previsões de<br />

que esse recurso deva chegar ao fim,<br />

somadas às crescentes preocupações<br />

com o ambiente, têm instigado a<br />

busca de fontes de energia renovável<br />

(Ghassan et al., 2003).<br />

O Protocolo de Quioto, concebido<br />

durante o fórum ambiental Rio-92<br />

e ratificado, desde então, por mais de<br />

93 países, vem tentando mobilizar a<br />

comunidade internacional para que<br />

promova uma ação conjunta com o<br />

objetivo de estabilizar na atmosfera a<br />

concentração dos gases causadores<br />

do efeito estufa e, assim, limitar a<br />

interferência antropogênica sobre o<br />

sistema climático global (Greenpeace<br />

International, 2003). Infelizmente, os<br />

termos do referido acordo somente<br />

entrarão rigorosamente em vigor<br />

quando o conjunto de seus signatários<br />

somar, no mínimo, 55% do total de<br />

países emissores do globo, algo que<br />

somente será possível com a ratificação<br />

de, pelo menos, uma das grandes<br />

potências mundiais, a Rússia ou os<br />

Estados Unidos. Em pronunciamentos<br />

recentes, o Presidente da Rússia,<br />

Vladimir Putin, declarou estar ainda<br />

avaliando as condições que levarão o<br />

seu país a tomar tal decisão, demonstrando<br />

que, apesar da evidência de<br />

que o acúmulo desses gases na atmosfera<br />

comprometa fortemente o<br />

equilíbrio dos diferentes ecossistemas<br />

terrestres, interesses geopolíticos<br />

e/ou comerciais têm prevalecido so-<br />

bre os mais eloqüentes interesses da<br />

humanidade.<br />

O Brasil, apesar de não ser um<br />

grande emissor de gases poluentes,<br />

vem promovendo medidas condizentes<br />

com essa nova conjuntura, através<br />

do desenvolvimento e da atualização<br />

periódica de inventários nacionais<br />

sobre o tema (Ministério da<br />

<strong>Ciência</strong> e Tecnologia, 2002). No<br />

momento em que o mercado de carbono<br />

estiver regulamentado, esses<br />

inventários terão uma importância<br />

vital para que o país possa conquistar<br />

espaço e usufruir dessa nova estratégia<br />

de redistribuição de riquezas e de<br />

inclusão social.<br />

Sabe-se que as metas estabelecidas<br />

pelo Protocolo de Quioto somente<br />

poderão ser alcançadas pelo<br />

uso sustentado da biomassa para<br />

fins energéticos. No entanto, recentes<br />

levantamentos demonstram que<br />

apenas 2,2% da energia consumida<br />

no mundo é proveniente de fontes<br />

renováveis (Pessuti, 2003), o que<br />

evidencia um extraordinário potencial<br />

para a exploração de outras<br />

fontes. Considerando-se apenas a<br />

biomassa proveniente de atividades<br />

agroindustriais, ou seja, resíduos<br />

agrícolas, florestais e agropecuários,<br />

calcula-se que o potencial<br />

combustível desse material seja<br />

equivalente a, aproximadamente,<br />

6.587 milhões de litros de petróleo<br />

ao ano (Staiss e Pereira, 2001). Diante<br />

de todo esse potencial, tem<br />

havido uma crescente disseminação<br />

de projetos e de ações voltados<br />

para o uso de óleos vegetais e de<br />

resíduos urbanos e agroindustriais


para a geração de energia, particularmente<br />

por meio de projetos de<br />

co-geração (Cenbio, 2003).<br />

2 - Óleos vegetais como<br />

fonte de energia renovável<br />

Por se tratar de uma fonte de<br />

energia renovável e por seu uso<br />

sustentado não provocar danos ao<br />

meio ambiente, a biomassa tem atraído<br />

muita atenção nos últimos tempos<br />

(Ministério da Indústria e do<br />

Comércio, 1985; Ministério da <strong>Ciência</strong><br />

e Tecnologia, 2002; U.S.<br />

Department of Energy, 1998). Dentre<br />

as fontes de biomassa prontamente<br />

disponíveis, os óleos vegetais<br />

têm sido largamente investigados<br />

como candidatos a programas<br />

de energia renovável, pois proporcionam<br />

uma geração descentralizada<br />

de energia e um apoio à agricultura<br />

familiar, criando melhores condições<br />

de vida (infra-estrutura) em<br />

regiões carentes, valorizando potencialidades<br />

regionais e oferecendo<br />

alternativas a problemas econômicos<br />

e sócio-ambientais de difícil<br />

solução.<br />

A utilização de óleos vegetais in<br />

natura como combustível alternativo<br />

tem sido alvo de diversos estudos<br />

nas últimas décadas (Nag et al., 1995;<br />

Piyaporn et al., 1996). No Brasil, já<br />

foram realizadas pesquisas com os<br />

óleos virgens de macaúba, pinhãomanso,<br />

dendê, indaiá, buriti, pequi,<br />

mamona, babaçu, cotieira, tingui e<br />

pupunha (Barreto, 1982; Ministério<br />

da Indústria e do Comércio, 1985;<br />

Serruya, 1991) e nos testes realizados<br />

com esses óleos em caminhões e<br />

máquinas agrícolas, foi ultrapassada<br />

a meta de um milhão de quilômetros<br />

rodados (Ministério da Indústria e do<br />

Comércio, 1985). No entanto, esses<br />

estudos demonstraram a existência<br />

de algumas desvantagens no uso direto<br />

de óleos virgens: (a) a ocorrência<br />

de excessivos depósitos de carbono<br />

no motor; (b) a obstrução nos<br />

filtros de óleo e bicos injetores; (c) a<br />

diluição parcial do combustível no<br />

lubrificante; (d) o comprometimento<br />

da durabilidade do motor; e (e) um<br />

aumento considerável em seus custos<br />

de manutenção.<br />

Outros autores (Goering e Fry,<br />

1984; Kobmehl e Heinrich, 1998;<br />

Ghassan et al., 2003) demonstraram<br />

que a alta viscosidade e a baixa<br />

volatilidade dos óleos vegetais in<br />

natura podem provocar sérios problemas<br />

ao bom funcionamento do<br />

motor. Dentre os problemas que<br />

geralmente aparecem após longos<br />

períodos de utilização, destacam-se<br />

a formação de depósitos de carbono<br />

por combustão incompleta, a diminuição<br />

da eficiência de lubrificação<br />

do óleo pela ocorrência de polimerização<br />

(no caso de óleos poli-insaturados)<br />

e a atomização ineficiente<br />

e/ou entupimento dos sistemas de<br />

injeção (Peterson et al., 1983; Pryde,<br />

1983; Ma e Hanna, 1999).<br />

Para resolver as desconformidades<br />

descritas acima, houve um<br />

considerável investimento na adaptação<br />

dos motores para que o uso<br />

de óleos vegetais in natura pudesse<br />

ser viabilizado, particularmente<br />

na produção de energia elétrica em<br />

geradores movidos por motores estacionários<br />

de grande porte. Nesses<br />

casos, o regime de operação do<br />

motor é constante e isso facilita o<br />

ajuste dos parâmetros para garantir<br />

uma combustão eficiente do óleo<br />

vegetal, podendo ser utilizada, inclusive,<br />

uma etapa de pré-aquecimento<br />

(pré-câmaras) para diminuir<br />

a sua viscosidade e facilitar a injeção<br />

na câmara de combustão. No<br />

entanto, para motores em que o<br />

regime de funcionamento é variável<br />

(e.g., no setor de transportes),<br />

foi necessário desenvolver uma metodologia<br />

de transformação química<br />

do óleo para que suas propriedades<br />

se tornassem mais adequadas<br />

ao seu uso como combustível. Assim,<br />

em meados da década de 70,<br />

surgiram as primeiras propostas de<br />

modificação de óleos vegetais através<br />

da reação de transesterificação<br />

(Figura 1), cujos objetivos eram os<br />

de melhorar a sua qualidade de<br />

ignição, reduzir o seu ponto de<br />

fluidez, e ajustar os seus índices de<br />

viscosidade e densidade específica<br />

(Shay, 1993, Stournas et al., 1995;<br />

Ma e Hanna, 1999).<br />

3 - O biodiesel como<br />

alternativa para a matriz<br />

energética nacional<br />

Por definição, biodiesel é um<br />

substituto natural do diesel de petróleo,<br />

que pode ser produzido a<br />

partir de fontes renováveis como<br />

óleos vegetais, gorduras animais e<br />

óleos utilizados para cocção de alimentos<br />

(fritura). Quimicamente, é<br />

definido como éster monoalquílico<br />

de ácidos graxos derivados de<br />

lipídeos de ocorrência natural e<br />

pode ser produzido, juntamente com<br />

a glicerina, através da reação de<br />

triacilgliceróis (ou triglicerídeos)<br />

com etanol ou metanol, na presença<br />

de um catalisador ácido ou básico<br />

(Schuchardt et al., 1998; Zagonel<br />

e Ramos, 2001; Ramos, 1999, 2003).<br />

Embora essa tenha sido a definição<br />

mais amplamente aceita desde os<br />

primeiros trabalhos relacionados<br />

com o tema, alguns autores preferem<br />

generalizar o termo e associálo<br />

a qualquer tipo de ação que<br />

promova a substituição do diesel<br />

na matriz energética mundial, como<br />

nos casos do uso de: (a) óleos<br />

vegetais in natura, quer puros ou<br />

em mistura; (b) bioóleos, produzidos<br />

pela conversão catalítica de<br />

óleos vegetais (pirólise); e (c) microemulsões,<br />

que envolvem a injeção<br />

simultânea de dois ou mais<br />

combustíveis, geralmente<br />

imiscíveis, na câmara de combustão<br />

de motores do ciclo diesel (Ma<br />

e Hanna, 1999). Portanto, é importante<br />

frisar que, para os objetivos<br />

deste artigo, biodiesel é tão-somente<br />

definido como o produto da transesterificação<br />

de óleos vegetais que<br />

atende aos parâmetros fixados pelas<br />

normas ASTM D6751 (American<br />

Standard Testing Methods, 2003) e<br />

Figura 1. Reação de transesterificação de óleos vegetais e/ou gorduras animais.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 29


DIN 14214 (Deutsches Institut für<br />

Normung, 2003), ou pela Portaria<br />

n o 255 da ANP (Agência Nacional<br />

do Petróleo, 2003) que, apesar de<br />

provisória, já estabelece as especificações<br />

que serão exigidas para<br />

que esse produto seja aceito no<br />

mercado brasileiro. A grande compatibilidade<br />

do biodiesel com o<br />

diesel convencional o caracteriza<br />

como uma alternativa capaz de atender<br />

à maior parte da frota de veículos<br />

a diesel já existente no mercado,<br />

sem qualquer necessidade de<br />

investimentos tecnológicos no desenvolvimento<br />

dos motores. Por<br />

outro lado, o uso de outros combustíveis<br />

limpos, como o óleo in<br />

natura, as microemulsões, o gás<br />

natural ou o biogás requerem uma<br />

adaptação considerável para que o<br />

desempenho exigido pelos motores<br />

seja mantido (Laurindo, 2003).<br />

Do ponto de vista econômico, a<br />

viabilidade do biodiesel está relacionada<br />

com o estabelecimento de um<br />

equilíbrio favorável na balança comercial<br />

brasileira, visto que o diesel<br />

é o derivado de petróleo mais consumido<br />

no Brasil, e que uma fração<br />

crescente desse produto vem sendo<br />

importada anualmente (Nogueira e<br />

Pikman, 2002).<br />

Em termos ambientais, a adoção<br />

do biodiesel, mesmo que de<br />

forma progressiva, ou seja, em adições<br />

de 2% a 5% no diesel de<br />

petróleo (Ministério da <strong>Ciência</strong> e<br />

Tecnologia, 2002), resultará em uma<br />

redução significativa no padrão de<br />

emissões de materiais particulados,<br />

óxidos de enxofre e gases que contribuem<br />

para o efeito estufa<br />

(Mittelbach et al., 1985). Sendo assim,<br />

sua difusão, em longo prazo,<br />

proporcionará maiores expectativas<br />

de vida à população e, como<br />

conseqüência, um declínio nos gastos<br />

com saúde pública, possibilitando<br />

o redirecionamento de verbas<br />

para outros setores, como educação<br />

e previdência. Cabe aqui ainda<br />

ressaltar que a adição de biodiesel<br />

ao petrodiesel, em termos gerais,<br />

melhora as características do combustível<br />

fóssil, pois possibilita a<br />

redução dos níveis de ruído e melhora<br />

a eficiência da combustão<br />

pelo aumento do número de cetano<br />

(Gallo, 2003).<br />

Em diversos países, o biodiesel<br />

já é uma realidade. Na Alemanha,<br />

por exemplo, existe uma frota significativa<br />

de veículos leves, coletivos<br />

e de carga, que utilizam biodiesel<br />

derivado de plantações específicas<br />

para fins energéticos e distribuído<br />

por mais de 1.000 postos de abastecimento.<br />

Outros países também têm<br />

desenvolvido os seus programas nacionais<br />

de biodiesel e, como conseqüência,<br />

o consumo europeu de biodiesel<br />

aumentou em 200.000 ton.<br />

entre os anos de 1998 e 2000. Já nos<br />

Estados Unidos, leis aprovadas nos<br />

estados de Minnesotta e na Carolina<br />

do Norte determinaram que, a partir<br />

de 1º/1/2002, todo o diesel consumido<br />

deveria ter a incorporação de,<br />

pelo menos, 2% de biodiesel em<br />

base volumétrica.<br />

No Brasil, desde as iniciativas<br />

realizadas na década de 80, pouco se<br />

investiu nesse importante setor da<br />

economia, mas a reincidência de turbulências<br />

no mercado internacional<br />

do petróleo, aliada às pressões que o<br />

setor automotivo vem sofrendo dos<br />

órgãos ambientais, fez com que o<br />

Governo atual iniciasse um novo tra-<br />

30 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

balho com vistas à utilizar óleos vegetais<br />

transesterificados na matriz<br />

energética nacional. Esse trabalho foi<br />

recentemente materializado na forma<br />

de um programa nacional,<br />

intitulado PROBIODIESEL (Portaria<br />

n o . 702 do MCT, de 30 de outubro de<br />

2002), cujo lançamento solene foi<br />

realizado em Curitiba durante a cerimônia<br />

de abertura do Seminário Internacional<br />

de Biodiesel (24 a 26 de<br />

outubro, Blue Tree Towers Hotel).<br />

Naquela mesma ocasião, foi também<br />

divulgada a criação do CERBIO, Centro<br />

Nacional de Referência em Biocombustíveis,<br />

nas dependências do<br />

Tecpar, em Curitiba. A missão do<br />

CERBIO será a de desenvolver o<br />

conceito de biocombustíveis em sua<br />

plenitude, desde a certificação de<br />

produtos até o desenvolvimento tecnológico<br />

de novas rotas que contribuam<br />

para o aumento da viabilidade<br />

e competitividade técnica do biodiesel<br />

nacional.<br />

Ao longo dos últimos anos, o<br />

PROBIODIESEL vem se desenvolvendo<br />

por meio de ações integradas<br />

entre instituições de tecnologia, ensino<br />

e pesquisa, e empresas e associações<br />

direta ou indiretamente ligadas<br />

ao tema, sob a forma de grupos<br />

de trabalho que integram a chamada<br />

Rede Brasileira de Biodiesel. Esse<br />

programa tem como principal objetivo<br />

promover o desenvolvimento<br />

das tecnologias de produção e avaliar<br />

a viabilidade e a competitividade<br />

técnica, sócio-ambiental e econômica<br />

do biodiesel para os mercados<br />

interno e externo, bem como de sua<br />

produção e distribuição espacial nas<br />

diferentes regiões do país (Andrade,<br />

2003; Ministério da <strong>Ciência</strong> e Tecnologia,<br />

2002).<br />

Tabela<br />

1.<br />

Número<br />

de<br />

iodo<br />

e composição<br />

química<br />

em<br />

ácidos<br />

graxos<br />

de<br />

alguns<br />

dos<br />

principais<br />

óleos<br />

vegetais<br />

e gorduras<br />

animais<br />

disponíveis<br />

para<br />

a produção<br />

de<br />

biodiesel<br />

( adaptad<br />

o de<br />

Alsberg<br />

e Taylor,<br />

1928)<br />

.<br />

Fonte<br />

Número<br />

de<br />

Iodo<br />

Láurico Mirístico Principais<br />

Ácidos<br />

Graxos<br />

Palmítico Esteárico Oléico Linoléico Linolênico<br />

Sebo bovino<br />

38-46 - 2, 0 29, 0 24, 5 44, 5 - -<br />

Banha ( suíno<br />

s)<br />

46-70 - - 24, 6 15, 0 50, 4 10, 0 -<br />

Côco 8, 10<br />

45, 0 20, 0 5, 0 3, 0 6, 0 - -<br />

Oliva 79-88 - - 14, 6 - 75, 4 10, 0 -<br />

Amend oin<br />

83-100 - - 8, 5 6, 0 51, 6 26, 0 -<br />

Algodão 108-110 - - 23, 4 - <strong>31</strong>, 6 45, 0 -<br />

Milho 111-130 - - 6, 0 2, 0 44, 0 48, 0 -<br />

Flax 173-201 - 3, 0 6, 0 - - 74, 0 17,<br />

0<br />

Soja 137-143 - - 11, 0 2, 0 20, 0 64, 0 3,<br />

0


4 - Principais matériasprimas<br />

para a produção de<br />

biodiesel<br />

De uma forma geral, pode-se<br />

afirmar que monoalquil-ésteres de<br />

ácidos graxos podem ser produzidos<br />

a partir de qualquer tipo de<br />

óleo vegetal (Tabela 1), mas nem<br />

todo óleo vegetal pode (ou deve)<br />

ser utilizado como matéria-prima<br />

para a produção de biodiesel. Isso<br />

porque alguns óleos vegetais apresentam<br />

propriedades não ideais,<br />

como alta viscosidade ou alto número<br />

de iodo, que são transferidas<br />

para o biocombustível e que o tornam<br />

inadequado para uso direto<br />

em motores do ciclo diesel. Portanto,<br />

a viabilidade de cada matériaprima<br />

dependerá de suas respectivas<br />

competitividades técnica, econômica<br />

e sócio-ambiental, e passam,<br />

inclusive, por importantes aspectos<br />

agronômicos, tais como: (a)<br />

o teor em óleos vegetais; (b) a<br />

produtividade por unidade de área;<br />

(c) o equilíbrio agronômico e demais<br />

aspectos relacionados com o<br />

ciclo de vida da planta; (d) a atenção<br />

a diferentes sistemas produtivos;<br />

(e) o ciclo da planta (sazonalidade);<br />

e (f) sua adaptação territorial,<br />

que deve ser tão ampla quanto<br />

possível, atendendo a diferentes<br />

condições edafoclimáticas (Ramos,<br />

1999, 2003).<br />

Dada a grandeza do agronegócio<br />

da soja no mercado brasileiro,<br />

é relativamente fácil e imediado<br />

reconhecer que essa oleaginosa<br />

apresenta o maior potencial para<br />

servir de modelo para o desenvolvimento<br />

de um programa nacional<br />

de biodiesel. Apenas como exemplo,<br />

dados divulgados pela Abiove<br />

(Associação Brasileira dos Produtores<br />

de Óleos Vegetais) demonstram<br />

que o setor produtivo da soja<br />

já está preparado para atender à<br />

demanda nacional de misturar até<br />

5% de biodiesel no diesel de petróleo,<br />

sendo que proporções superiores<br />

a esta mereceriam uma nova<br />

avaliação para que não haja dúvidas<br />

quanto ao abastecimento de<br />

óleo a esse novo setor da economia.<br />

Por outro lado, segundo da-<br />

dos oficiais da Embrapa (Peres e<br />

Junior, 2003), o Brasil apresenta<br />

um potencial de 90 milhões de<br />

hectares disponíveis, em áreas degradadas<br />

e/ou não exploradas, para<br />

a expansão da atual fronteira agrícola.<br />

Considerando-se apenas a utilização<br />

da soja como matéria-prima<br />

para a produção de biodiesel,<br />

serão necessários apenas 3 milhões<br />

de hectares, ou 1,8 bilhões de litros<br />

de óleo, para a implementação<br />

do B5 (mistura composta de<br />

5% de biodiesel e 95% do petrodiesel),<br />

o que culminaria na geração<br />

de cerca de 234 mil empregos diretos<br />

e indiretos.<br />

Além da soja, várias outras oleaginosas<br />

(e.g., Tabela 1), que ainda<br />

se encontram em fase de avaliação<br />

e desenvolvimento de suas cadeias<br />

produtivas, podem ser empregadas<br />

para a produção do biodiesel (Parente,<br />

2003). A região norte, por<br />

exemplo, apresenta potencial para<br />

uso de dendê, babaçu e soja; a<br />

região nordeste, de babaçu, soja,<br />

mamona, dendê, algodão e coco; a<br />

região centro-oeste, de soja,<br />

mamona, algodão, girassol, dendê<br />

e gordura animal; a região sul, de<br />

soja, colza, girassol e algodão; e a<br />

região sudeste, de soja, mamona,<br />

algodão e girassol (Campos, 2003;<br />

Peres e Junior, 2003). Várias dessas<br />

oleaginosas já tiveram as suas respectivas<br />

competitividades técnica e<br />

sócio-ambiental demonstradas para<br />

a produção de biodiesel, restando,<br />

na maioria dos casos, um estudo<br />

agronômico mais aprofundado que<br />

ratifique os estudos de viabilidade.<br />

Deve-se ainda destacar que a<br />

inserção do biodiesel na matriz energética<br />

nacional representa um poderoso<br />

elemento de sinergia para<br />

com o agronegócio da cana, cujo<br />

efeito será extremamente benéfico<br />

para a economia nacional (Ramos,<br />

1999, 2003). A produção de etanol<br />

é expressiva em, praticamente, todas<br />

as regiões do país, e o novo<br />

programa somente terá a contribuir<br />

para o aumento da competitividade<br />

do setor, valendo-se, inclusive, da<br />

rede de distribuição já existente e<br />

do excelente desempenho das tecnologias<br />

desenvolvidas para a ca-<br />

deia produtiva da cana (Campos,<br />

2003). Nesse contexto, o Brasil se<br />

encontra em uma condição que país<br />

algum jamais esteve na história do<br />

mundo globalizado. Com a evidente<br />

decadência das fontes fósseis,<br />

nenhuma outra região tropical tem<br />

porte e condições tão favoráveis<br />

para assumir a posição de um dos<br />

principais fornecedores de biocombustíveis<br />

e tecnologias limpas para<br />

o século XXI (Vidal, 2000).<br />

5 - O processo de produção<br />

de biodiesel por catálise<br />

homogênea em meio<br />

alcalino<br />

A transesterificação de óleos vegetais<br />

ou gordura animal, também<br />

denominada de alcoólise, pode ser<br />

conduzida por uma variedade de rotas<br />

tecnológicas em que diferentes<br />

tipos de catalisadores podem ser empregados,<br />

como bases inorgânicas<br />

(hidróxidos de sódio e potássio e<br />

bases de Lewis), ácidos minerais (ácido<br />

sulfúrico), resinas de troca iônica<br />

(resinas catiônicas fortemente ácidas),<br />

argilominerais ativados, hidróxidos<br />

duplos lamelares, superácidos,<br />

superbases e enzimas lipolíticas<br />

(lipases) (Schuchardt et al., 1998; Ramos,<br />

2003). Não há dúvidas de que<br />

algumas dessas rotas tecnológicas,<br />

particularmente aquelas que empregam<br />

catalisadores heterogêneos, apresentam<br />

vantagens interessantes como<br />

a obtenção de uma fração glicerínica<br />

mais pura, que não exija grandes<br />

investimentos de capital para atingir<br />

um bom padrão de mercado. Porém,<br />

é também correta a afirmação de que<br />

a catálise homogênea em meio alcalino<br />

ainda prevalece como a opção<br />

mais imediata e economicamente viável<br />

para a transesterificação de óleos<br />

vegetais (Zagonel e Ramos, 2001; Ramos,<br />

2003). Um fluxograma simplificado<br />

do processo de produção de<br />

biodiesel, utilizando a transesterificação<br />

etílica em meio alcalino como<br />

modelo, encontra-se apresentado na<br />

Figura 2.<br />

Seja qual for a rota tecnológica<br />

escolhida, a transesterificação de<br />

óleos vegetais corresponde a uma<br />

reação reversível, cuja cinética é<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 <strong>31</strong>


Figura 2. Fluxograma simplificado de produção de ésteres etílicos a partir de óleos<br />

vegetais e gordura animal.<br />

regida pelo princípio enunciado em<br />

1888 pelo químico francês Henry-<br />

Louis Le Chatelier (1850-1936) (Figura<br />

1). Portanto, o rendimento da<br />

reação dependerá do deslocamento<br />

do equilíbrio químico em favor<br />

dos ésteres, através da otimização<br />

de fatores, tais como a temperatura<br />

de reação, a concentração e caráter<br />

ácido-base do catalisador, bem<br />

como o excesso estequiométrico<br />

do agente de transesterificação (álcool).<br />

Porém, conversões totais serão<br />

literalmente impraticáveis em<br />

uma única etapa reacional, pois,<br />

além de reversível, tem-se a ocorrência<br />

de reações secundárias como<br />

a saponificação. Para limitar a presença<br />

de triacilgliceróis não reagidos<br />

além dos limites tolerados pelo<br />

motor, muitos processos recorrem<br />

à condução da reação em duas etapas<br />

seqüenciais, que garantam taxas<br />

de conversão superiores a 98%.<br />

Por outro lado, a eliminação de<br />

sabões, catalisador residual e<br />

glicerol livre somente é possível<br />

através de etapas eficientes de lavagem.<br />

De acordo com a literatura, a<br />

reação de obtenção do éster metílico<br />

exige um excesso estequiométrico de<br />

metanol igual a 100% (razão molar<br />

álcool:óleo de 6:1), e uma quantidade<br />

de catalisador alcalino equivalente a<br />

0,5% a 1,0% em relação à massa de<br />

óleo, para que sejam obtidos rendimentos<br />

superiores a 95% (Freedman<br />

et al., 1986). No entanto, duas observações<br />

limitam a simples aplicação de<br />

uma recomendação como esta: (a)<br />

primeiramente, a matéria-prima a ser<br />

32 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

utilizada em cada região é diferente e<br />

isso implica na necessidade de estudos<br />

localizados, que permitam uma<br />

otimização realística ligada a avaliações<br />

confiáveis de toda a cadeia produtiva;<br />

e (b) as condições utilizadas<br />

para a reação de metanólise não podem<br />

ser transferidas para situações<br />

em que outros álcoois, como o etanol,<br />

sirvam de modelo. Com efeito, a transesterificação<br />

com metanol é tecnicamente<br />

mais viável do que a com<br />

etanol comercial, porque a água existente<br />

no etanol (4%-6%) retarda a<br />

reação. O uso de etanol anidro efetivamente<br />

minimiza esse inconveniente<br />

(Figura 2), embora não implique<br />

solução para o problema inerente à<br />

separação da glicerina do meio de<br />

reação que, no caso da síntese do<br />

éster metílico, é indiscutivelmente<br />

muito mais facilitada (Freedman et al.,<br />

1986; Schuchardt et al., 1998; Ramos,<br />

1999). No entanto, basta um ajuste nas<br />

condições de reação para que a separação<br />

de fases aconteça espontaneamente,<br />

sendo que a eficiência do<br />

processo de decantação (da fração<br />

glicerínica) pode ser acelerada pelo<br />

uso de centrífugas contínuas, auxiliadas<br />

ou não pela adição de compostos<br />

tensoativos (Ramos, 2003).<br />

O processo de produção de biodiesel<br />

deve reduzir ao máximo a<br />

presença de contaminações no produto,<br />

como glicerina livre e ligada,<br />

sabões ou água (Figura 2). No caso<br />

da glicerina, reações de desidratação<br />

que ocorrem durante a combustão<br />

podem gerar acroleína, um<br />

poluente atmosférico muito perigoso,<br />

que pode, devido a sua<br />

reatividade, envolver-se em reações<br />

de condensação, que acarretam um<br />

aumento na ocorrência de depósitos<br />

de carbono no motor (Mittelbach et<br />

al., 1985). Sabões e ácidos graxos<br />

livres acarretam a degradação de<br />

componentes do motor, e a umidade,<br />

desde que acima de um limite<br />

tolerável, pode interferir na acidez<br />

do éster por motivar a sua hidrólise<br />

sob condições não ideais de estocagem.<br />

Por essas e outras razões, é<br />

imprescindível que sejam definidas<br />

especificações rígidas para o biodiesel,<br />

de forma que o sucesso do<br />

programa não venha a ser compro-


metido por ocorrências associadas<br />

ao mau controle de qualidade do<br />

produto.<br />

Independentemente da rota<br />

tecnológica, a aceitação do biodiesel<br />

no mercado precisa ser assegurada<br />

e, para isso, é indispensável<br />

que esse produto esteja dentro das<br />

especificações internacionalmente<br />

aceitas para o seu uso. No Brasil,<br />

esses parâmetros de qualidade encontram-se<br />

pré-fixados pela Portaria<br />

n o . 255 da ANP, cuja proposta foi<br />

baseada em normas já existentes na<br />

Alemanha (DIN) e nos Estados Unidos<br />

(ASTM). Tais características e/<br />

ou propriedades, determinantes dos<br />

padrões de identidade e qualidade<br />

do biodiesel, incluem ponto de fulgor,<br />

teor de água e sedimentos,<br />

viscosidade, cinzas, teor de enxofre,<br />

corrosividade ao cobre, número<br />

de cetano, ponto de névoa, resíduo<br />

de carbono, número de acidez,<br />

curva de destilação (ou a temperatura<br />

necessária para a recuperação<br />

de 90% do destilado), estabilidade<br />

à oxidação, teor de glicerina livre e<br />

total, cor e aspecto (Agência Nacional<br />

do Petróleo, 2003). Dentre<br />

esses parâmetros, alguns têm merecido<br />

críticas da comunidade científica<br />

por não apresentarem aplicação<br />

direta ao biodiesel, como o<br />

índice de corrosividade ao cobre e<br />

a curva de destilação. Por essa razão,<br />

a especificação definida pela<br />

portaria é ainda provisional e poderá<br />

ser modificada em função de<br />

novas argumentações e dados experimentais<br />

gerados pela comunidade<br />

científica.<br />

Um aspecto extremamente importante<br />

da Portaria n o 255 da ANP<br />

está relacionado com as limitações<br />

que oferece para o aproveitamento<br />

de todos os óleos vegetais que se<br />

encontram disponíveis no território<br />

nacional. No entanto, é importante<br />

esclarecer que a especificação define<br />

a qualidade do produto a ser<br />

utilizado puro, ou seja, sem a sua<br />

diluição com diesel de petróleo.<br />

Por outro lado, se a concepção do<br />

programa nacional é a de facultar o<br />

uso de misturas dos tipos de B2 a<br />

B20, restringindo o uso de B100<br />

apenas a situações especiais (como<br />

na geração de energia elétrica em<br />

grupo-geradores), talvez fosse adequada<br />

(e possível) a flexibilização<br />

das especificações com vistas a uma<br />

maior inserção das diferentes oleaginosas<br />

que compõem o conjunto<br />

de alternativas regionais de nosso<br />

território. Essa flexibilização estaria,<br />

portanto, restrita somente ao<br />

uso do biodiesel em misturas, valendo-se<br />

do fator de diluição que a<br />

razão volumétrica definida pela<br />

mistura proporciona (Ramos, 2003).<br />

Vale ressaltar que a adição de um<br />

biodiesel de qualidade ao diesel,<br />

até um limite de 20% (B20), não<br />

modifica drasticamente as suas propriedades<br />

e não o desqualifica perante<br />

a Portaria n o . <strong>31</strong>0 da ANP, cujo<br />

conteúdo estabelece as especificações<br />

para comercialização de óleo<br />

diesel automotivo em todo o território<br />

nacional. Obviamente, tal hipótese<br />

precisa ser estudada em todas<br />

as suas implicações, pois precisam<br />

ser dadas garantias para que a<br />

credibilidade do programa não sofra<br />

o impacto de serem consideradas<br />

experiências mal sucedidas<br />

possíveis falhas no funcionamento<br />

do motor e o subseqüente aumento<br />

nos seus custos de manutenção.<br />

Da mesma forma como foram<br />

definidos alguns aspectos agronômicos<br />

essenciais para que um determinado<br />

óleo vegetal apresente competitividade<br />

como matéria-prima<br />

para a produção de biodiesel, importantes<br />

aspectos tecnológicos também<br />

precisam ser atendidos e estes<br />

estão relacionados: (a) à complexidade<br />

exigida para o processo de<br />

extração e tratamento do óleo; (b) à<br />

presença de componentes indesejáveis<br />

no óleo, como é o caso dos<br />

fosfolipídeos presentes no óleo de<br />

soja; (c) ao teor de ácidos graxos<br />

poli-insaturados; (d) ao tipo e teor<br />

de ácidos graxos saturados; e (e) ao<br />

valor agregado dos co-produtos,<br />

como hormônios vegetais, vitaminas,<br />

anti-oxidantes, proteína e fibras<br />

de alto valor comercial.<br />

Diferentes oleaginosas apresentam<br />

diferentes teores em óleos<br />

vegetais (Tabela 1) e a complexidade<br />

exigida para a extração do óleo<br />

pode contribuir negativamente para<br />

a viabilidade do processo (Alsberg<br />

e Taylor, 1928). Oleaginosas de<br />

baixo teor de óleo, como a soja,<br />

exigem procedimentos de extração<br />

caros e relativamente complexos<br />

que praticamente restringem a viabilidade<br />

dessa matéria-prima àquelas<br />

regiões em que já exista uma<br />

razoável capacidade instalada para<br />

o esmagamento de grãos. Porém,<br />

oleaginosas de maior teor em óleos<br />

vegetais, cujos processos de extração<br />

sejam mais simplificados, certamente<br />

apresentarão melhor competitividade<br />

econômica por não exigirem<br />

a instalação de operações<br />

unitárias complexas para esse objetivo.<br />

Por outro lado, a qualidade do<br />

óleo poderá exigir uma etapa de<br />

refino para que também a qualidade<br />

no produto final seja garantida.<br />

Esse é certamente o caso da soja,<br />

que depende do refino para reduzir<br />

a presença de gomas e fosfolipídeos<br />

no biodiesel. Mais uma vez, é<br />

provável que essa observação tenha<br />

pouco significado para regiões<br />

onde a agroindústria da soja esteja<br />

verticalizada ao óleo refinado, mas,<br />

onde não haja esse potencial<br />

agroindustrial, seria desejável que<br />

as matérias-primas selecionadas<br />

para a produção não apresentassem<br />

tal limitação e pudessem sofrer<br />

a alcoólise sem exigir a implantação<br />

de uma unidade de refino. Há<br />

evidências de que alguns óleos vegetais<br />

podem oferecer essa vantagem,<br />

como os de girassol e de<br />

várias espécies de palmáceas (óleos<br />

laurílicos).<br />

O tipo e o teor de ácidos graxos<br />

presentes no óleo vegetal (Tabela<br />

1) têm um efeito marcante sobre a<br />

estabilidade do biodiesel diante do<br />

armazenamento e da oxidação. Por<br />

exemplo, quedas bruscas na temperatura<br />

ambiente promovem o aumento<br />

da viscosidade e a cristalização<br />

de ésteres graxos saturados<br />

que, eventualmente, podem causar<br />

o entupimento de filtros de óleo e<br />

sistemas de injeção. A tendência à<br />

“solidificação” do combustível é<br />

medida através dos pontos de névoa<br />

e de fluidez (ou de entupimento),<br />

que devem ser tanto mais baixo<br />

quanto possível. Abaixamentos no<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 33


ponto de fluidez, muitas vezes motivados<br />

pela aditivação de inibidores<br />

de cristalização (Stournas et<br />

al., 1995; Ramos, 2003), representam<br />

menores restrições do biocombustível<br />

à variações de temperatura,<br />

evitando problemas de estocagem<br />

e de utilização em regiões<br />

mais frias. Obviamente, esse problema<br />

não é exclusivo do biodiesel,<br />

pois o diesel de petróleo contém<br />

parafinas que apresentam tipicamente<br />

o mesmo comportamento.<br />

A formação de depósitos por<br />

precipitação também ocorre em função<br />

do envelhecimento e/ou oxidação<br />

do biodiesel. Testes realizados<br />

pela Bosch (Dabague, 2003), em<br />

parceria com a ANFAVEA (Associação<br />

Nacional dos Fabricantes de<br />

Veículos Automotores), AEA (Associação<br />

Brasileira de Engenharia<br />

Automotiva) e Sindipeças (Sindicato<br />

Nacional da Indústria de Componentes<br />

para Veículos Automotores),<br />

constataram que a degradação<br />

oxidativa do biodiesel gera resinificação<br />

que, por aderência, constitui<br />

uma das principais causas da formação<br />

de depósitos nos equipamentos<br />

de injeção. Em decorrência<br />

desse fenômeno, foi também observada<br />

uma queda no desempenho,<br />

aumento da susceptibilidade à<br />

corrosão e diminuição da vida útil<br />

dos motores.<br />

O ranço oxidativo está diretamente<br />

relacionado com a presença<br />

de ésteres monoalquílicos insaturados.<br />

Trata-se da reação do oxigênio<br />

atmosférico com as duplas ligações<br />

desses ésteres, cuja reatividade aumenta<br />

com o aumento do número<br />

de insaturações na cadeia (Moretto<br />

e Fett, 1989). Assim, por ser relativamente<br />

insaturado, o biodiesel derivado<br />

do óleo de soja é muito<br />

susceptível à oxidação. Os ácidos<br />

linoleico e linolênico, que, juntos,<br />

correspondem a mais de 61% da<br />

composição desse óleo, apresentam,<br />

respectivamente, duas e três<br />

duplas ligações, que podem reagir<br />

facilmente com o oxigênio.<br />

A oxidação de óleos insaturados<br />

representa um processo relativamente<br />

complexo que envolve reações<br />

entre radicais livres e oxigê-<br />

nio molecular. Todo esse processo<br />

é geralmente resumido em três etapas,<br />

denominadas de iniciação, propagação<br />

e finalização. O processo<br />

de polimerização pode ser iniciado<br />

por traços de metais, calor (termólise),<br />

luz (fotólise) ou radicais<br />

hidroxila e hidroperoxila, gerados<br />

pela cisão homolítica de moléculas<br />

de água expostas à radiação<br />

(Kumarathasan et al., 1992).<br />

Os peróxidos e hidroperóxidos<br />

produzidos através da reação<br />

de auto-oxidação podem se polimerizar<br />

com outros radicais e produzir<br />

moléculas de elevada massa<br />

molar, sedimentos insolúveis, gomas<br />

e, em alguns casos, pode quebrar<br />

a cadeia do ácido graxo oxidado,<br />

produzindo ácidos de cadeias<br />

menores e aldeídos (Prankl e<br />

Schindlbauer, 1998). Estudos anteriores<br />

(Clark et al., 1984; Tao, 1995;<br />

System Lab Services, 1997) constataram<br />

que a formação desses ácidos<br />

pode estar ligada à corrosão do<br />

sistema combustível dos motores<br />

porque, devido à alta instabilidade<br />

dos hidroperóxidos, eles apresentam<br />

forte tendência a atacar<br />

elastômeros.<br />

A maioria dos trabalhos até então<br />

realizados sobre a estabilidade<br />

diante da oxidação do biodiesel referem-se<br />

ao estudo de ésteres<br />

metílicos (Prankl e Schindlbauer,<br />

1998; Ishido et al., 2001; Pedersen e<br />

Ingermarsson, 1999), visto que a<br />

maioria dos países que instituíram o<br />

uso desse biocombustível não apresenta<br />

disponibilidade nem infra-estrutura<br />

para produzir etanol como o<br />

Brasil. Esses trabalhos têm confirmado<br />

que, de um modo geral, o<br />

biodiesel de natureza metílica se<br />

oxida após curtos períodos de estocagem,<br />

e que sua inércia química<br />

está diretamente relacionada com<br />

os óleos vegetais empregados na<br />

sua produção (Prankl e Schindlbauer,<br />

1998).<br />

Um dos meios mais comumente<br />

utilizados para se inferir sobre a<br />

susceptibilidade de um determinado<br />

óleo à oxidação é a avaliação de<br />

seu número de iodo. O número de<br />

iodo revela o número de insaturações<br />

de uma determinada amostra e<br />

34 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

esse valor constitui um dos parâmetros<br />

de identidade dos óleos vegetais.<br />

Sendo assim, diferentes tipos<br />

de biodiesel apresentam números<br />

de iodo semelhantes aos dos triglicerídeos<br />

de origem. No entanto,<br />

deve-se salientar que, quando o<br />

objetivo é avaliar a estabilidade à<br />

oxidação de um dado óleo, as informações<br />

obtidas através desse método<br />

não são adequadas, pois o<br />

número de iodo não discrimina que<br />

compostos estão contribuindo para<br />

o valor encontrado. Desse modo,<br />

há óleos diferentes com números<br />

de iodo semelhantes, porém, com<br />

estabilidades à oxidação consideravelmente<br />

distintas. Para se inferir<br />

previsões acerca da estabilidade à<br />

oxidação de um dado óleo é, portanto,<br />

necessário que se conheça a<br />

sua composição percentual em ácidos<br />

graxos, o que só é possível<br />

através do emprego de métodos<br />

cromatográficos de análise.<br />

Somente através do conhecimento<br />

pleno das propriedades que<br />

determinam os padrões de identidade<br />

e a qualidade do biodiesel é<br />

que será possível estabelecer parâmetros<br />

de controle que garantirão<br />

a qualidade do produto a ser<br />

incorporado na matriz energética<br />

nacional.<br />

6 - Aspectos ambientais<br />

relacionados com o uso do<br />

biodiesel<br />

Sabe-se que o aumento na concentração<br />

dos gases causadores do<br />

efeito estufa, como o dióxido de<br />

carbono (CO 2 ) e o metano (CH 4 ), tem<br />

acarretado sérias mudanças climáticas<br />

no planeta. Efeitos como o aumento<br />

da temperatura média global,<br />

as alterações no perfil das precipitações<br />

pluviométricas e a elevação do<br />

nível dos oceanos poderão ser catastróficos<br />

frente à contínua tendência<br />

de aumento da população mundial<br />

(Peterson e Hustrulid, 1998; Shay,<br />

1993). Nesse sentido, a inserção de<br />

combustíveis renováveis em nossa<br />

matriz energética precisa ser incentivada<br />

para frear as emissões causadas<br />

pelo uso continuado de combustíveis<br />

fósseis.


Vários estudos têm demonstrado<br />

que a substituição do diesel de<br />

petróleo por óleos vegetais transesterificados<br />

reduziria a quantidade<br />

de CO 2 introduzida na atmosfera. A<br />

redução não se daria exatamente na<br />

proporção de 1:1, pois cada litro de<br />

biodiesel libera cerca de 1,1 a 1,2<br />

vezes a quantidade de CO 2 liberada<br />

na atmosfera por um litro de diesel<br />

convencional. Todavia, diferentemente<br />

do combustível fóssil, o CO 2<br />

proveniente do biodiesel é reciclado<br />

nas áreas agricultáveis, que geram<br />

uma nova partida de óleo vegetal<br />

para um novo ciclo de produção.<br />

Isso acaba proporcionando um balanço<br />

muito mais equilibrado entre a<br />

massa de carbono fixada e aquela<br />

presente na atmosfera que, por sua<br />

vez, atua no chamado efeito estufa.<br />

Portanto, uma redução real no<br />

acúmulo de CO 2 somente será possível<br />

com a diminuição do uso de<br />

derivados do petróleo. Para cada<br />

quilograma de diesel não usado, um<br />

equivalente a 3,11 kg de CO 2 , mais<br />

um adicional de 15% a 20%, referente<br />

à sua energia de produção, deixará<br />

de ser lançado na atmosfera. Foi<br />

também estimado que a redução<br />

máxima na produção de CO 2 , devido<br />

ao uso global de biodiesel, será<br />

de, aproximadamente, 113-136 bilhões<br />

de kg por ano (Peterson e<br />

Hustrulid, 1998).<br />

A utilização de biodiesel no<br />

transporte rodoviário e urbano oferece<br />

grandes vantagens para o meio<br />

ambiente, tendo em vista que a<br />

emissão de poluentes é menor que a<br />

do diesel de petróleo (Masjuk e<br />

Sapuan, 1995; Clark et al., 1984).<br />

Chang et al. (1996) demonstraram<br />

que as emissões de monóxido e<br />

dióxido de carbono e material<br />

particulado foram inferiores às do<br />

diesel convencional, enquanto que<br />

os níveis de emissões de gases nitrogenados<br />

(NOx) foram ligeiramente<br />

maiores para o biodiesel. Por outro<br />

lado, a ausência total de enxofre<br />

confere ao biodiesel uma grande<br />

vantagem, pois não há qualquer<br />

emissão dos gases sulfurados (e.g.,<br />

mercaptanas, dióxido de enxofre)<br />

normalmente detectados no escape<br />

dos motores movidos a diesel.<br />

Outro aspecto de interesse ambiental<br />

está relacionado com as emissões<br />

de compostos sulfurados. Sabese<br />

que a redução do teor de enxofre<br />

no diesel comercial também reduz a<br />

viscosidade do produto a níveis não<br />

compatíveis com a sua especificação<br />

e que, para corrigir esse problema,<br />

faz-se necessária a incorporação de<br />

aditivos com poder lubrificante. Consumada<br />

a obrigatoriedade na redução<br />

dos níveis de emissão de compostos<br />

sulfurados a partir da combustão<br />

do diesel, a adição de biodiesel<br />

em níveis de até 5% (B5) corrigirá<br />

esta deficiência viscosimétrica, que<br />

confere à mistura propriedades lubrificantes<br />

vantajosas para o motor.<br />

Trabalhos já desenvolvidos no<br />

Brasil na década de 80, quando<br />

foram utilizados vários óleos vegetais<br />

transesterificados, também demonstraram<br />

bons resultados quando<br />

utilizados em motores de caminhões<br />

e tratores, tanto puros quanto<br />

em misturas do tipo B30 (Ministério<br />

da Indústria e do Comércio,<br />

1985). Mais recentemente, foram<br />

realizados testes no transporte urbano<br />

da cidade de Curitiba com<br />

ésteres metílicos de óleo de soja<br />

(Laurindo, 2003). Cerca de 80 mil<br />

litros de biodiesel foram cedidos<br />

pela American Soybean Association<br />

(EUA) e testados na forma da mistura<br />

B20, apresentando resultados<br />

bastante satisfatórios em relação ao<br />

controle. Os testes foram realizados<br />

em 20 ônibus de diferentes<br />

marcas durante três meses consecutivos,<br />

no primeiro semestre de<br />

1998; ao final dos trabalhos, os<br />

resultados obtidos mostraram uma<br />

redução média da fumaça emitida<br />

pelos veículos de, no mínimo, 35%<br />

(Laurindo e Bussyguin, 1999).<br />

O caráter renovável do biodiesel<br />

está apoiado no fato de as matériasprimas<br />

utilizadas para a sua produção<br />

serem oriundas de fontes renováveis,<br />

isto é, de derivados de práticas agrícolas,<br />

ao contrário dos derivados de<br />

petróleo. Uma exceção a essa regra<br />

diz respeito à utilização do metanol,<br />

derivado de petróleo, como agente<br />

transesterificante, sendo esta a matéria-prima<br />

mais abundantemente utilizada<br />

na Europa e nos Estados Unidos.<br />

Isso significa que a prática adotada no<br />

Brasil, isto é, a utilização do etanol,<br />

derivado de biomassa, torna o biodiesel<br />

um produto que pode ser considerado<br />

como verdadeiramente<br />

renovável (Zagonel, 2000). Assim, por<br />

envolver a participação de vários segmentos<br />

da sociedade, tais como as<br />

cadeias produtivas do etanol e das<br />

oleaginosas, a implementação do biodiesel<br />

de natureza etílica no mercado<br />

nacional abre oportunidades para grandes<br />

benefícios sociais decorrentes do<br />

alto índice de geração de empregos,<br />

culminando com a valorização do campo<br />

e a promoção do trabalhador rural.<br />

Além disso, há ainda as demandas por<br />

mão-de-obra qualificada para o processamento<br />

dos óleos vegetais, permitindo<br />

a integração, quando necessária,<br />

entre os pequenos produtores e<br />

as grandes empresas (Campos, 2003).<br />

5 - Conclusão<br />

A intensidade com que o tema<br />

biodiesel tem sido abordado em reuniões<br />

políticas, científicas e tecnológicas<br />

tem dado testemunho do interesse<br />

com que a sociedade e o setor<br />

produtivo vem encarando essa nova<br />

oportunidade de negócios para o<br />

país. Com efeito, diante de tantos<br />

benefícios, como a criação de novos<br />

empregos no setor agroindustrial, a<br />

geração de renda, o fomento ao<br />

cooperativismo, a perspectiva de<br />

contribuição ao equilíbrio de nossa<br />

balança comercial e pelos comprovados<br />

benefícios ao meio ambiente,<br />

pode-se dizer que o biodiesel tem<br />

potencial para constituir um dos principais<br />

programas sociais do governo<br />

brasileiro, representando fator de<br />

distribuição de renda, inclusão social<br />

e apoio à agricultura familiar. No<br />

entanto, neste momento em que as<br />

bases do programa nacional estão<br />

sendo ainda definidas, o desenvolvimento<br />

de projetos de cunho científico<br />

e tecnológico, que possam<br />

oferecer maior segurança aos nossos<br />

tomadores de decisão, é, no<br />

mínino, estrategicamente imprescindível<br />

ao país.<br />

No que diz respeito à evolução<br />

do programa nacional de biocombustíveis,<br />

algumas ações governa-<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 35


mentais poderiam ser de extrema<br />

importância para acelerar o atendimento<br />

às suas principais metas tecnológicas:<br />

(a) instalação de uma<br />

unidade-piloto, desinteressada de<br />

qualquer ganho comercial e preferencialmente<br />

estabelecida em parceria<br />

com instituições públicas de<br />

pesquisa e desenvolvimento, para<br />

auxiliarem nos estudos de viabilidade<br />

técnica e econômica do biodiesel;<br />

(b) estabelecimento das especificações<br />

a serem exigidas para o<br />

licenciamento do produto (processo<br />

já iniciado pela ANP, através da<br />

Portaria n o . 255); (c) ampliação<br />

dos testes em frota cativa para dirimir<br />

quaisquer dúvidas que ainda<br />

persistam sobre o desempenho e a<br />

viabilidade do biodiesel, particularmente<br />

de natureza etílica, seja<br />

puro ou em misturas do tipo B2 a<br />

B20; e (d) abertura de linhas de<br />

financiamento para o desenvolvimento<br />

de novas rotas tecnológicas,<br />

com vistas a simplificar e/ou a<br />

otimizar o processo, a ampliação<br />

das perspectivas para a utilização<br />

de seus subprodutos e a diversificação<br />

da matéria-prima para atender<br />

a vocações regionais.<br />

6 - Referências<br />

Bibliográficas<br />

1. AGÊNCIA NACIONAL DO PE-<br />

TRÓLEO. Portarias de Qualidade,<br />

2003. Disponível em:<br />

<br />

2. ALSBERG, C. L.; TAYLOR, A. E. The<br />

fats and oils, a general review.<br />

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Pesquisa<br />

Marcos Barros de Medeiros<br />

Doutor em Entomologia - ESALQ/USP<br />

Professor Adjunto Centro de Formação de<br />

Tecnólogos / UFPB - Campus de Bananeiras.<br />

barros@iwpb.com.br;<br />

ciagra@cft.ufpb.br<br />

Paulo Alves Wanderley<br />

Doutor em Agronomia - FCAV/UNESP,<br />

Professor nível E do Centro de Formação de<br />

Tecnólogos / UFPB - Campus de Bananeiras<br />

Maria José Araújo Wanderley<br />

Doutora em Agronomia - FCAV/UNESP,<br />

Bolsista de <strong>Desenvolvimento</strong> Científico Regional<br />

CNPq, UFPB Departamento de <strong>Ciência</strong>s Básicas e<br />

Sociais, Campus de Bananeiras<br />

Ilustrações cedidas pelos autores<br />

Biofertilizantes<br />

Líquidos<br />

38 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Processo trofobiótico para proteção de plantas em cultivos orgânicos<br />

1 - Introdução<br />

Nos países desenvolvidos e em<br />

vários outros em desenvolvimento,<br />

como o Brasil, os organoclorados foram<br />

proibidos para o uso agrícola.<br />

Porém, essa foi apenas uma medida<br />

isolada, uma vez que tais produtos<br />

circulam hoje por toda a biosfera<br />

(Paschoal, 1995). O uso de produtos<br />

químicos sem a observação da complexidade<br />

de fatores que interagem<br />

nos agroecossistemas tem sido a maior<br />

causa de desequilíbrio nesses sistemas,<br />

tais como o desenvolvimento de<br />

resistência ao pesticida, ressurgimento<br />

e desencadeamento de pragas secundárias<br />

e quebra de cadeias alimentares<br />

a partir da eliminação de seus<br />

inimigos naturais (parasitóides e predadores)<br />

(Medeiros, 1998).<br />

Até 1945 os ácaros fitófagos eram<br />

tidos como pragas secundárias da<br />

agricultura. No entanto, o desenvolvimento<br />

destas espécies nocivas vem<br />

atingindo, cada vez mais, uma elevada<br />

significação econômica, ao mesmo<br />

tempo em que sua lista não pára<br />

de crescer. Antes de 1946, havia<br />

apenas 10 espécies de insetos e carrapatos<br />

resistentes, todas a produtos<br />

inorgânicos minerais. Em 1969 a resistência<br />

foi confirmada para 424 espécies,<br />

sendo 97 de importância<br />

médica ou veterinária e 127 de importância<br />

agrícola e florestal e de<br />

produtos armazenados (Paschoal,<br />

1979; Chaboussou 1980). Na década<br />

de 90, pelo menos 504 espécies de<br />

insetos e ácaros foram dadas como<br />

resistentes a pelo menos um pesticida.<br />

Destas, 23 espécies são benéficas e<br />

481 são nocivas, sendo 283 de impor-<br />

tância agrícola e 198 de importância<br />

médico-veterinária (Georghiou &<br />

Lagunes-Tejeda, 1991).<br />

Uma nova teoria, hoje amplamente<br />

difundida, converge ao explicar<br />

que, além destes fatores, estes<br />

desequilíbrios também estão fortemente<br />

associados ao estado de<br />

proteólise dominante nos tecidos da<br />

planta. Estudos comprovam que produtos<br />

químicos sintéticos, tais como<br />

agrotóxicos e fertilizantes minerais<br />

solúveis, contêm substâncias que interferem<br />

na proteossíntese, provocam<br />

o acúmulo de aminoácidos livres e<br />

açúcares redutores nos tecidos da planta,<br />

reduzindo sua resistência às pragas<br />

e doenças (Alves et al., 2001;<br />

Chaboussou, 1999; Tokeshi, 2002).<br />

Segundo Primavesi (1998), três<br />

condições são necessárias para que<br />

uma planta seja atacada por pragas e<br />

doenças: 1) a planta deve ser deficientemente<br />

nutrida, oferecendo alguma<br />

substância utilizável para o agente;<br />

2) o agente possa se multiplicar<br />

livremente sem controle biológico, o<br />

que ocorre mais facilmente em<br />

monoculturas; 3) o sistema de autodefesa<br />

da planta deve estar desequilibrado,<br />

em função da nutrição e do<br />

uso de agrotóxicos. Estes princípios<br />

convergem com os fundamentados<br />

por Francis Chaboussou, então diretor<br />

do “Institut National de la<br />

Recherche Agronomique” (INRA) na<br />

França, que em 1979 formulou a<br />

Teoria da Trofobiose. Segundo essa<br />

teoria, todo processo vital está na<br />

dependência da satisfação das necessidades<br />

dos organismos vivos,<br />

sejam eles vegetais ou animais. Dessa<br />

forma, a planta, ou mais precisa-


Figura 01. Simulação da cinética de crescimento celular e da produção de metabólitos<br />

ao longo da fermentação aeróbica do biofertilizante no processo de CLC. Metabólitos<br />

primários: (Etapas de anabolismo e catabolismo): Açúcares, aminoácidos, ácidos<br />

graxos, proteínas, lipídeos, bases nitrogenadas (nucleotídeos e ácidos nucleicos),<br />

precursores moleculares etc. Metabólitos secundários: (Biossíntese de macromoléculas<br />

de elevado peso molecular): toxinas, antibióticos, fitoreguladores (IAA<br />

e giberelinas), ácidos graxos de cadeia longa, fosfolipídeos, polissacarídeos, terpenos<br />

fenóis, polifenois, citoquininas, etc.<br />

mente o órgão vegetal, será atacado<br />

somente quando seu estado bioquímico,<br />

determinado pela natureza e<br />

pelo teor de substâncias nutritivas<br />

solúveis, corresponder às exigências<br />

tróficas (de alimentação) da praga ou<br />

do patógeno em questão.<br />

Estudando-se a relação entre o<br />

estado nutricional de plantas e sua<br />

resistência às doenças constatou-se<br />

que toda circunstância desfavorável<br />

ao crescimento celular tende a provocar<br />

um acúmulo de compostos<br />

solúveis não utilizados, como açúcares<br />

e aminoácidos, diminuindo a<br />

resistência da planta ao ataque de<br />

pragas e doenças (Dufrenoy, 1936).<br />

Comprovou-se mais tarde que a ação<br />

dos agrotóxicos na planta resulta na<br />

inibição da proteossíntese, resultando<br />

num aumento de ácaros, pulgões<br />

e lepidópteros e de doenças<br />

(Chaboussou, 1999; Tokeshi, 2002).<br />

Espécies de pulgões, cochonilhas,<br />

cigarrinhas, cigarras, tripes, outros<br />

insetos sugadores e várias espécies<br />

de ácaros fitófagos, não são capazes<br />

de desdobrar proteínas em aminoácidos<br />

para serem posteriormente<br />

recombinados à conveniência de<br />

cada um. Por isso, eles dependem<br />

de aminoácidos livres existentes na<br />

seiva das plantas ou suco celular e<br />

de microrganismos simbiontes<br />

(Chaboussou, 1980; Panizzi & Parra,<br />

1991; Pinheiro & Barreto, 1996; Gallo<br />

et al., 2002) Os adubos minerais<br />

solúveis, especialmente os nitrogenados,<br />

e os agrotóxicos orgânicos<br />

sintéticos, que quando absorvidos<br />

pelas plantas e translocados em seu<br />

interior, são capazes de interferir<br />

com a fisiologia vegetal, reduzem a<br />

proteossíntese, desencadeando processo<br />

de acúmulo de aminoácidos<br />

livres e açúcares redutores, substâncias<br />

prontamente utilizáveis pelas<br />

pragas e agentes fitopatogênicos, o<br />

que foi correlacionado positivamente<br />

com o aumento populacional desses<br />

organismos (Chaboussou, 1985).<br />

Na agricultura orgânica o uso de<br />

biofertilizantes líquidos, na forma de<br />

fermentados microbianos enriquecidos,<br />

têm sido um dos processos mais<br />

empregados no manejo trofobiótico<br />

de pragas e doenças. Essa estratégia<br />

é baseada no equilíbrio nutricional<br />

da planta (trofobiose), onde a resistência<br />

é gerada pelo melhor equilíbrio<br />

energético e metabólico do vegetal<br />

(Chaboussou, 1985; Pinheiro &<br />

Barreto, 1996). Os biofertilizantes funcionam<br />

como promotores de crescimento<br />

(equilíbrio nutricional) e como<br />

elicitores na indução de resistência<br />

sistêmica na planta. Além disso, ajudam<br />

na proteção da planta contra o<br />

ataque de doenças, por antibiose<br />

(Bettiol et al, 1998) e contra o ataque<br />

de pragas, por ação repelente,<br />

fagodeterrente (inibidores de alimen-<br />

tação) ou afetando o seu desenvolvimento<br />

e reprodução.<br />

2 - Biofertilizantes líquidos<br />

e sua aplicação na<br />

proteção de plantas<br />

Os biofertilizantes possuem compostos<br />

bioativos, resultantes da<br />

biodigestão de compostos orgânicos<br />

de origem animal e vegetal. Em seu<br />

conteúdo são encontradas células vivas<br />

ou latentes de microrganismos<br />

de metabolismo aeróbico, anaeróbico<br />

e fermentação (bactérias, leveduras,<br />

algas e fungos filamentosos) e também<br />

metabólitos e quelatos organominerais<br />

em soluto aquoso. Segundo<br />

Santos & Akiba (1996), os metabólitos<br />

são compostos de proteínas, enzimas,<br />

antibióticos, vitaminas, toxinas,<br />

fenóis, ésteres e ácidos, inclusive de<br />

ação fitohormonal produzidos e liberados<br />

pelos microrganismos.<br />

Na citricultura paulista, os biofertilizantes<br />

vêm sendo produzidos<br />

pelo método de compostagem líquida<br />

contínua em “piscinas” escavadas<br />

no solo, revestidas de lona plástica<br />

de polietileno, com capacidade de<br />

até 50 mil litros. No processo são<br />

utilizados água não clorada e o<br />

inoculante à base de esterco fresco<br />

bovino, e posteriormente enriquecido<br />

com um composto orgânico nutritivo.<br />

O Microgeo é um composto<br />

orgânico, com registro no Ministério<br />

da Agricultura e certificado pelo IBD,<br />

preparado à base de diversas fontes<br />

orgânicas e inorgânicas, sendo enriquecido<br />

com rochas moídas que contêm<br />

cerca de 48% de silicatos de<br />

magnésio, cálcio, ferro e outros<br />

oligoelementos, fundamentais para<br />

estimulação do metabolismo primário<br />

e secundário das plantas. Segundo<br />

Alves et al. (2001) biofertilizantes<br />

obtidos com o Microgeo vêm sendo<br />

utilizados, em pulverização sobre as<br />

plantas, em mais de 8 milhões de pés<br />

de laranja no estado de São Paulo.<br />

A potência biológica de um biofertilizante<br />

é expressa pela grande<br />

quantidade de microrganismos ali<br />

existentes, responsáveis pela liberação<br />

de metabólitos e antimetabólitos,<br />

entre eles vários antibióticos e<br />

hormônios vegetais. Castro et al.<br />

(1992) e Bettiol et al. (1998) isolaram<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 39


Figura 2. Produção de biofertilizantes pelo sistema de compostagem líquida contínua<br />

a céu aberto, em recipientes plásticos.<br />

várias leveduras e bactérias, destacando<br />

Bacillus subitilis, reconhecido<br />

produtor de antibióticos. Atualmente<br />

os biofertilizantes vêm sendo aplicados<br />

em diversas culturas associadas<br />

com o fungo entomopatogênico<br />

Beauveria bassiana, importante inimigo<br />

natural de pragas.<br />

Os efeitos do biofertilizante no<br />

controle de pragas e doenças de plantas<br />

têm sido bem evidenciados. Efeitos<br />

fungistático, bacteriostático e repelente<br />

sobre insetos já foram constatados. Santos<br />

& Sampaio (1993) verificaram uma<br />

propriedade coloidal do biofertilizante<br />

que provoca a aderência do inseto<br />

sobre a superfície do tecido vegetal. Os<br />

autores destacaram também o efeito<br />

repelente e deterrente de alimentação<br />

contra pulgões e moscas-das-frutas.<br />

Medeiros et al. (2000b) verificaram que<br />

o biofertilizante à base de conteúdo de<br />

rúmen bovino e o composto orgânico<br />

Microgeo Ò reduziu a fecundidade, período<br />

de oviposição e longevidade de<br />

fêmeas do ácaro-da-leprose dos citros,<br />

Brevipalpus phoenicis, quando pulverizado<br />

em diferentes concentrações. Esses<br />

mesmos autores comprovaram que<br />

este biofertilizante agiu sinergicamente<br />

com Bacillus thuringiensis e o fungo B.<br />

bassiana, reduzindo a viabilidade dos<br />

ovos e sobrevivência de larvas do bicho-furão-dos-citros<br />

(Ecdytolopha<br />

aurantiana) (Medeiros et al. 2000c).<br />

Estudos recentes comprovaram a redução<br />

de até 95% da fecundidade do ácaro<br />

rajado Tetranychus urticae, de hábito<br />

polífago, em concentrações entre 5 e<br />

50% (Medeiros et al., 2000a; Berzaghi et<br />

al., 2001). Também verificou-se redução<br />

de até 64% da população do pulgão<br />

Aphis sp., quando utilizado o biofertilizante<br />

(10%) associado aos inseticidas<br />

Boveril ® e Metarril ® , 5 kg/ha, em cultivo<br />

de acerola (Medeiros et al., 2001). Aplicações<br />

do biofertilizante associadas à<br />

calda viçosa ou com o Bacillus<br />

thuringiensis reduziram significativamente<br />

o ataque da traça (Tuta absoluta)<br />

e a broca pequena (Neoleucocinodes<br />

elegantalis) em tomateiros (Picanço et<br />

al., 1999; Nunes & Leal, 2001). Também<br />

foi constatado menor severidade de<br />

oídio e de cigarrinha verde em plantas<br />

de feijoeiro pulverizadas com diferentes<br />

misturas de biofertilizantes (Cunha<br />

et al., 2000). Trabalhos conduzidos por<br />

Medeiros (2002) no Laboratório de Patologia<br />

e Controle Microbiano de Insetos<br />

da ESALQ/USP comprovaram que o<br />

biofertilizante líquido reduziu de modo<br />

crônico e significativamente a fecundidade<br />

e o potencial de crescimento populacional<br />

e o tempo de desenvolvimento<br />

de descendentes dos ácaros da<br />

leprose dos citros Brevipalpus phoenicis,<br />

criados sobre plantas tratadas com biofertilizantes.<br />

O estudo comprovou que<br />

o biofertilizante testado agiu por conta-<br />

40 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

to direto e residual e também funcionou<br />

de forma sistêmica na planta.<br />

A ação antibiótica e indução de<br />

resistência sistêmica da planta são<br />

provavelmente os principais mecanismos<br />

de ação do biofertilizante<br />

sobre a praga (D´Andréa & Medeiros,<br />

2002). Os fenômenos podem estar<br />

diretamente associados à complexa<br />

e pouco conhecida composição química<br />

e biológica dos biofertilizantes.<br />

Compostos metabólitos (micro e<br />

macromoléculas), tais como enzimas,<br />

antibióticos, vitaminas, toxinas, fenóis<br />

e outros voláteis, ésteres e ácidos,<br />

inclusive de ação fitohormonal têm<br />

sido identificados nos biofertilizantes<br />

(Santos, 1992). Um composto<br />

coloidal, de consistência mucilaginosa<br />

(goma) e de composição ainda<br />

não conhecida, foi observado por<br />

Medeiros (2002) causando a imobilização<br />

e morte do ácaro B. phoenicis<br />

sobre a folha devido à obstrução de<br />

seu sistema digestivo.<br />

3 - Processos envolvidos na<br />

produção de<br />

biofertilizantes<br />

Não existe uma fórmula padrão<br />

para produção de biofertilizantes.<br />

Receitas variadas vêm sendo testadas,<br />

utilizando-se componentes minerais<br />

para o enriquecimento do meio de<br />

cultivo (Santos, 1992; Magro, 1994).<br />

O processo de fermentação é<br />

complexo e os microrganismos existentes<br />

passam quatro fases distintas<br />

de crescimento celular: 1) Latência -<br />

Compreende o período de adaptação<br />

dos microrganismos, após o qual as<br />

células dão início à fermentação. 2)<br />

Crescimento exponencial – Nessa fase<br />

ocorre elevado processo de divisão<br />

celular, com a produção de biomassa<br />

e liberação dos metabólitos primários:<br />

carboidratos, aminoácidos,<br />

lipídeos, nucleotídeos, vitaminas e<br />

proteínas e enzimas. 3) Fase estacionária<br />

– As células param de se dividir<br />

e as colônias, após juntarem-se, iniciam<br />

um processo de diferenciação<br />

celular produzindo metabólitos secundários<br />

como forma de defesa (antibióticos,<br />

toxinas, fenóis, ácidos orgânicos<br />

e outras proteínas de cadeia<br />

longa, de alto interesse biotecnológico).<br />

4) Morte Celular-Esgotadas to-


Figura 3. Detalhes do experimento utilizando-se ácaros de B. phoenicis criados em<br />

arena, sobre a folha a planta de Canavalia ensiformis. Fonte: Medeiros (2002)<br />

das as reservas de energia, as células<br />

começam a morrer numa velocidade<br />

exponencial.<br />

Cada microrganismo participante<br />

degrada alimento para outro, numa<br />

relação de interdependência mútua e<br />

harmônica e, assim, o processo de<br />

fermentação acaba sendo contínuo,<br />

desde que seja alimentado com meio<br />

nutritivo, o que fundamentou o processo<br />

de compostagem líquida descrito<br />

por D’Andréa & Medeiros (2002).<br />

4 - Produção do<br />

biofertilizante pelo<br />

processo de Compostagem<br />

Líquida Contínua (CLC)<br />

4.1 - Dimensionamento da<br />

Produção<br />

Tanques para compostagem do<br />

biofertilizante podem ser utilizados<br />

para volumes de até 1.000 litros, caixas<br />

de fibrocimento ou plásticas. Para<br />

volumes maiores constrói-se diretamente<br />

no solo, ‘piscinas’ com as dimensões<br />

do volume pretendido, e<br />

com a profundidade máxima de um<br />

metro, as quais são revestidas com<br />

lona plástica. A localização do tanque<br />

deve ser em área ensolarada, mantendo-o<br />

descoberto. Para o dimensionamento<br />

do volume do tanque, deverá<br />

ser considerado um consumo diário<br />

máximo de 10% de biofertilizante, da<br />

sua capacidade. Exemplo: Para um<br />

consumo diário de 100 litros de biofertilizante,<br />

o tanque deverá ter o<br />

volume de 1.000 litros.<br />

4.2- CLC com uso de esterco e<br />

composto orgânico enriquecido<br />

Início da CLC: Para início da<br />

produção do biofertilizante, adicionase<br />

no tanque o esterco fresco de gado<br />

(inoculante), um composto orgânico<br />

enriquecido com minerais (Ex.:<br />

MICROGEO MCO) e água (não<br />

clorada). No caso do Microgeo,<br />

pesquisado e desenvolvido pela equipe<br />

do Laboratório de Patologia e Controle<br />

Microbiano da ESALQ, o preparo<br />

é feito nas seguintes proporções:1,0<br />

quilo do composto orgânico / 4,0<br />

litros esterco de gado / 20,0 litros água<br />

(completando o volume ). Exemplo:<br />

Para a produção de 1.000 litros de<br />

biofertilizante, adiciona-se no tanque<br />

50 quilos do composto, mais 200 litros<br />

de esterco de gado de qualquer origem,<br />

completando com água o<br />

volume de 1.000 litros do tanque.<br />

Agitar duas vezes ao dia manualmente<br />

com um ‘rodo’, que também permitirá<br />

determinar a espessura da camada<br />

orgânica (biomassa) depositada no<br />

fundo do tanque, com o objetivo de se<br />

quantificar a reposição do esterco de<br />

gado no processo CLC. Iniciar o uso<br />

do biofertilizante com aproximadamente<br />

15 dias, após a mistura inicial<br />

dos insumos. Manutenção da CLC:<br />

Para manter a compostagem em meio<br />

líquido de forma contínua, contabilizar<br />

diariamente os volumes de biofertilizante<br />

consumidos repondo no tanque<br />

os insumos nas seguintes proporções:<br />

a) Reposição do composto orgânico:<br />

para cada 30,0 a 40,0 litros de biofertilizante<br />

usado, repor 1,0 quilo do<br />

composto/inoculante. O intervalo de<br />

reposição poderá ser semanal até<br />

mensal, ou seja, intervalos menores<br />

quanto maior o volume de biofertilizante<br />

utilizado. b) Reposição do esterco<br />

de gado: adicionar um volume de<br />

esterco de gado (fresco) suficiente<br />

para manter a mesma proporção<br />

biomassa/ água do início do processo,<br />

sempre quando se verificar com<br />

ajuda do ‘rodo’ a diminuição da camada<br />

orgânica no fundo do tanque. c)<br />

Reposição da água: está em função do<br />

volume de biofertilizante consumido,<br />

da evaporação e das chuvas. O volume<br />

de água a ser adicionado deverá<br />

ser o suficiente para a manutenção do<br />

nível inicial do tanque. A freqüência<br />

de reposição poderá ser diária, usando-se<br />

registro bóia ou até mensal,<br />

também em função do volume de<br />

biofertilizante usado. Nos períodos de<br />

chuvas, recomenda-se fechar os tanques<br />

de até 1.000 litros nos momentos<br />

de ocorrência delas. Manter descobertos<br />

os tanques maiores de 1.000 litros,<br />

retirando para uso posterior o volume<br />

do biofertilizante que eventualmente<br />

poderá transbordar, armazenando-o<br />

em tambores. É importante sempre<br />

manter as proporções de composto<br />

inoculante e esterco de gado, descritas<br />

acima, evitando o uso do biofertilizante<br />

muito diluído (Microbiol, 2001;<br />

D’Andréa & Medeiros, 2002).<br />

5 - Recomendações de uso<br />

Segundo Pinheiro & Barreto<br />

(1996), devido aos elevados efeitos<br />

hormonais e altos teores das substâncias<br />

sintetizadas, o uso de biofertilizantes<br />

em pulverizações foliares normalmente<br />

são feitos com diluições<br />

entre 0,1 e 5%. Concentrações maiores,<br />

entre 20 e 50%, foram utilizadas<br />

por Santos & Akiba (1996) com o<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 41


Figura 4. Caracterização de cadáveres do ácaro da leprose dos citros Brevipalpus<br />

phoenicis: (a) control, (b) Ácaro morto por ação de contato do biofertilizante; (c) e (d)<br />

Foco microbiano e vista ventral e dorçal do gnatosoma e pernas anteriores aderidas<br />

por uma substancia coloidal (goma). Fonte: Medeiros (2002).<br />

biofertilizante “Vairo”. Porém, em<br />

concentrações muito elevadas, o biofertilizante<br />

pode causar estresse fisiológico<br />

na planta retardando seu<br />

crescimento, floração ou frutificação.<br />

Isso se deve provavelmente ao excessivo<br />

desvio metabólico para produção<br />

de substâncias de defesa. Para<br />

hortaliças recomendam-se pulverizações<br />

semanais, utilizando entre 0,1 e<br />

3 % de concentração do biofertilizante,<br />

considerando que as plantas são<br />

de ciclo vegetativo curto e possuem<br />

maior velocidade de crescimento, com<br />

demanda constante de nutrientes.<br />

Em fruteiras, pulverizações entre 1 e<br />

5% do biofertilizante com Microgeo<br />

produziram resultados significativos<br />

na sanidade na cultura. Este biofertilizante<br />

também vem sendo empregado<br />

sobre o solo em concentrações de<br />

até 20%. Este quando aplicado sobre<br />

o mato roçado, como “input”<br />

microbiano, é capaz de aumentar a<br />

compostagem laminar, isto é diretamente<br />

no campo, acelerando os processos<br />

bioquímicos e potencializando<br />

maior atividade microbiana sobre o<br />

solo (D’Andréa & Medeiros, 2002).<br />

As aplicações de biofertilizantes<br />

deverão ser realizadas durante as<br />

fases de crescimento e/ou produção,<br />

evitando-se no florescimento. Devese<br />

dar preferência pelos dias de chu-<br />

va ou irrigação e os horários vespertino<br />

ou noturno, evitando-se os períodos<br />

secos e as horas mais quentes<br />

do dia. Altas concentrações do biofertilizante<br />

podem provocar na planta<br />

demanda de água muito maior<br />

para o seu equilíbrio. Mesmo assim,<br />

pulverizações com o biofertilizante,<br />

na diluição de 1%, nos períodos secos<br />

são possíveis. Apesar de estarem<br />

sob os efeitos do estresse hídrico, as<br />

plantas estarão recebendo energia<br />

entrópica (não utilizável pelos insetos)<br />

e outros fatores de proteção.<br />

6 - Biofertilizantes,<br />

bioinseticidas e<br />

biorremediação<br />

O aumento da população e a<br />

maior atividade industrial fizeram com<br />

que o problema da poluição do ambiente<br />

atingisse níveis alarmantes.<br />

Além de contaminação por detritos<br />

pouco biodegradáveis, como plásticos<br />

e detergentes, soma-se o problema<br />

dos resíduos de industrias e, principalmente,<br />

dos resíduos agroindustriais,<br />

como a vinhaça ou o vinhoto,<br />

resultante da produção de etanol em<br />

grande escala. Estes problemas podem<br />

ser atacados pelo desenvolvimento<br />

de linhagens microbianas capazes<br />

de degradar ou assimilar esses<br />

42 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

compostos para uso como agentes<br />

de biorremediação.<br />

O processo da biorremediação<br />

consiste na descoberta e procriação<br />

de bactérias capazes de “comer” os<br />

agrotóxicos que ficam por muitos anos<br />

no solo e na água. Estas bactérias<br />

devoram os componentes químicos<br />

existentes nos venenos, fazendo com<br />

que o produto perca sua capacidade<br />

de poluir o solo, a água e até mesmo<br />

o organismo humano. Estas bactérias<br />

também não são prejudiciais ao meio<br />

ambiente. Caso os resultados da pesquisa<br />

sejam confirmados, será um<br />

grande avanço para a preservação do<br />

meio ambiente, pois o uso do veneno<br />

é um grande vilão que prejudica o<br />

solo, a água, os animais e o homem<br />

(Azevedo, 1998). Uma saída promissora<br />

para esses problemas seria a<br />

multiplicação em massa desses agentes<br />

de biodegradação de agentes químicos,<br />

em tanques abertos, adotandose<br />

a técnica de cultura em compostagem<br />

líquida contínua. A produção de<br />

biofertilizantes líquidos, à base de<br />

resíduos oriundos da agricultura e da<br />

indústria, modificados por microorganismos,<br />

gerarão substratos úteis como<br />

fertilizantes de solo e como bioprotetores<br />

de plantas para a agricultura.<br />

A partir de compostos ricos em<br />

nutrientes, facilmente acessíveis e de<br />

baixo custo operacional, como os<br />

resíduos sólidos e líquidos oriundos<br />

da agricultura e da indústria, é possível<br />

a adição de microrganismos (leveduras,<br />

bactérias e actinomicetos,<br />

por exemplo) previamente selecionadas,<br />

com as condições necessárias<br />

de ecologia nutricional, que promoverem<br />

o rápido crescimento populacional,<br />

resultando em alta produção<br />

de massa microbiana.<br />

Técnicas sofisticadas, porém com<br />

o mesmo princípio, têm sido utilizadas<br />

em laboratórios, sob condições<br />

controladas em biofermentadores, na<br />

produção líquida de inseticidas à base<br />

de microrganismos entomo patogênicos<br />

(fungos, vírus, bactérias e<br />

nematóides) capazes de controlar as<br />

pragas em níveis aceitáveis, econômicos<br />

e ecológicos (Alves, 1998).<br />

A preocupação em se gerar alternativas<br />

ecológicas ao problema dos<br />

rejeitos líquidos e sólidos na agricultura,<br />

transformá-los em insumos de bai-


Figura 5. Crescimento do fungo entomopatogênico Beauveria bassiana em meio<br />

de biofertilizante líquido<br />

Figura 6. Leveduras isoladas de um biofertilizante produzido por compostagem<br />

líquida contínua<br />

xo custo e capazes de serem aplicados<br />

na atividade produtiva primária, em<br />

cultivos orgânicos, representa um grande<br />

avanço na preservação do meio<br />

ambiente. Contudo, serão necessários<br />

alguns anos de investigação e desenvolvimento,<br />

para que se produzam<br />

metodologias de elevado alcance social,<br />

e grandes esforços no sentido de se<br />

consolidar o emprego desses processos<br />

bioquímicos como forma de se<br />

promover a sustentabilidade dos ambientes<br />

agrícolas.<br />

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Pesquisa<br />

Paulo Dejalma Zimmer, Dr.<br />

Professor do Departamentode de Fitotecnia<br />

FAEM / UFPel<br />

djzimmer@ufpel.tche.br<br />

Gaspar Malone<br />

Doutorando do Programa de Pós Graduação em<br />

<strong>Ciência</strong> e Tecnologia de Sementes / FAEM / UFPel<br />

malone@gaspar.com.ar<br />

Fernando Irajá Félix de Carvalho, PhD.<br />

Professor do Departamento de Fitotecnia<br />

FAEM / UFPel<br />

carvalho@ufpel.tche.br<br />

José Fernandes Barbosa Neto, PhD.<br />

Professor do Departamento de Plantas de Lavoura<br />

Faculdade de Agronomia / UFRGS<br />

jfbn@ufrgs.br<br />

Antonio Costa de Oliveira, PhD.<br />

Professor do Departamento de Fitotecnia<br />

FAEM / UFPel<br />

acosta@ufpel.tche.br<br />

Ilustrações cedidas pelos autores<br />

Iniciativas<br />

Genômicas<br />

Aplicações da ciência genômica no melhoramento de plantas para as regiões de várzea do sul do Brasil<br />

melhoramento genético<br />

de plantas<br />

tem contribuído de<br />

forma decisiva para<br />

o incremento da<br />

produção mundial<br />

de grãos (BORLAUG, 1983). Entretanto,<br />

a necessidade e os desafios<br />

para as próximas duas décadas são<br />

imensos, o ganho genético para a<br />

produtividade está se reduzindo a<br />

cada ano e já não acompanha mais o<br />

aumento da demanda por alimentos<br />

(BORLAUG, 1997; MANN, 1997 e<br />

1999). Atualmente, grandes esforços<br />

estão sendo direcionados no<br />

sentido de elucidar o potencial genético<br />

das espécies cultivadas,<br />

objetivando incrementar a produtividade<br />

e a qualidade. Para o lançamento<br />

de novos cultivares que atendam<br />

à demanda crescente por alimentos,<br />

os programas de melhoramento<br />

de plantas necessitam de grandes<br />

mudanças, principalmente no<br />

que tange à estrutura, à estratégia e<br />

à própria ciência envolvida (STUBER<br />

et al., 1999; KOORNNEEF & STAM,<br />

2001). Além do foco na qualidade e<br />

na produtividade, o melhoramento<br />

genético também pode ser direcionado<br />

no sentido de aumentar a adaptabilidade<br />

das espécies. Essa também<br />

pode ser considerada uma forma<br />

de incrementar a produção de<br />

alimentos, pois áreas marginais podem<br />

ser incorporadas ao sistema<br />

produtivo mediante o desenvolvimento<br />

de genótipos adaptados. No<br />

Sul do Brasil, há cerca de 6,8 milhões<br />

de hectares de terras baixas,<br />

caracterizadas por solos hidromórficos,<br />

que têm o seu sistema agrícola<br />

alicerçado na pecuária extensiva e<br />

no plantio do arroz irrigado. A exploração<br />

inadequada dessa região,<br />

possivelmente associada às dificuldades<br />

operacionais, não tem permitido<br />

uma apropriada rotação de culturas<br />

nem o requerido tempo de<br />

pousio, o que favorece a infestação<br />

da cultura por espécies daninhas,<br />

principalmente o arroz vermelho. A<br />

degradação das características físicas<br />

do solo provocada pela intensa<br />

movimentação de máquinas e equipamentos<br />

extremamente pesados<br />

também impõe a necessidade de<br />

pousio (Figura 1).<br />

Dessa forma, extensas áreas<br />

estão sendo inviabilizadas a cada<br />

ano, tornando-se, muitas vezes, extremamente<br />

árdua a sua recuperação.<br />

A busca de alternativas para<br />

compor o sistema agrícola regional<br />

tem motivado iniciativas importantes<br />

nas Universidades Federais de<br />

Pelotas e do Rio Grande do Sul<br />

(UFPel e UFRGS) e na Embrapa<br />

Clima Temperado (PORTO et al.,<br />

1998). A inclusão de novas culturas,<br />

como a aveia, o milho e o<br />

azevém, no sistema agrícola das<br />

áreas de várzea tem recebido atenção<br />

especial, porém a simples introdução<br />

de genótipos não é suficiente<br />

para a correção, em função da<br />

inexistência de constituições genéticas<br />

adaptadas à condição de encharcamento<br />

dos locais. Desse<br />

modo, há uma grande demanda por<br />

iniciativas voltadas para a geração<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 45


de variabilidade genética, seleção de<br />

constituições genéticas adaptadas às<br />

condições do ambiente e aumento da<br />

eficiência dos programas de melhoramento<br />

de plantas.<br />

Advento das Técnicas<br />

Moleculares<br />

Até a década de 70, pouco se<br />

conhecia sobre a organização do<br />

DNA. A composição dos pequenos<br />

segmentos com função conhecida,<br />

os genes, era a jóia mais desejada<br />

naquela época. Nos últimos anos,<br />

com o surgimento das técnicas<br />

moleculares, e entre elas a técnica<br />

de clonagem molecular, tornou-se<br />

possível o isolamento e a purificação<br />

de porções genômicas. Esses<br />

avanços contribuíram para tornar a<br />

molécula de DNA o foco das principais<br />

investigações nos últimos anos.<br />

A clonagem molecular consiste no<br />

isolamento e na multiplicação de<br />

moléculas de DNA idênticas, e compreende,<br />

pelo menos, dois estágios<br />

importantes: primeiro, o fragmento<br />

do DNA de interesse, chamado de<br />

inserto, é ligado a uma outra molécula<br />

de DNA, denominada vetor,<br />

para formar o que se chama de DNA<br />

recombinante; segundo, a molécula<br />

do DNA recombinante é introduzida<br />

numa célula hospedeira compatível,<br />

num processo chamado<br />

transformação bacteriana. A célula<br />

hospedeira que adquiriu a molécula<br />

do DNA recombinante passa,<br />

então, a ser chamada transformante<br />

ou célula transformada. Atualmente,<br />

as fronteiras da Tecnologia do<br />

DNA recombinante, principalmente<br />

para fins comerciais, parecem ser<br />

ilimitadas. Além dos reflexos diretos,<br />

a tecnologia do DNA recombinante<br />

proporcionou avanços em<br />

todas as áreas da bioquímica, da<br />

fisiologia e da genética. Esses avanços<br />

permitiram a caracterização, a<br />

identificação e a clonagem de uma<br />

série de genes de enzimas, que se<br />

tornaram ferramentas decisivas para<br />

o surgimento de técnicas como a de<br />

marcadores moleculares e de seqüenciamento<br />

de DNA, o que con-<br />

tribuiu para a elucidação de importantes<br />

vias de biossíntese.<br />

No que tange aos desafios para<br />

tornar eficiente o melhoramento de<br />

plantas e para incrementar a produção<br />

mundial de grãos, várias ferramentas<br />

moleculares podem ser incorporadas<br />

aos programas de melhoramento<br />

de plantas com o objetivo de<br />

otimizar a obtenção de genótipos<br />

superiores, por exemplo, a transgenia<br />

(YE et al., 2000), a seleção assistida<br />

por marcadores (FRARY et al., 2000),<br />

a mutação induzida (MALUSZYNSKI,<br />

1998) e a genômica (LIU, 1998;<br />

McCOUCH, 2001).<br />

A busca por soluções para diversificar<br />

o sistema agrícola nas áreas de<br />

várzea do sul do Brasil passa pela<br />

elucidação dos mecanismos fisiogenéticos<br />

envolvidos na tolerância dos<br />

cereais ao encharcamento. Embora já<br />

tenham sido relatadas (DANTAS et al.,<br />

2001), algumas respostas à deficiência<br />

de oxigênio no solo provocada<br />

pelo excesso de água (encharcamento),<br />

ainda permanecem muitas dúvidas<br />

relacionadas com as interações<br />

genéticas que facultam algumas espécies<br />

ou variedades a suportarem solos<br />

com hipoxia decorrente do excesso<br />

de água. A incorporação de tecnologias<br />

moleculares e a formação de<br />

melhoristas treinados para selecionar<br />

genes poderão se refletir em grandes<br />

ganhos de eficiência nos programas<br />

de melhoramento de plantas.<br />

46 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Figura 1 - Sistema de preparação do solo para plantio de arroz pré-germinado em solos<br />

de várzea, utilizando máquinas extremamente pesadas em solos inundados. Essa<br />

associação afeta negativamente a estrutura física do solo. Cortesia Prof. Silmar Peske.<br />

Sintenia e Genomas<br />

Modelos<br />

A sintenia é caracterizada pela<br />

conservação na ordem e no conteúdo<br />

de genes, ou grupos gênicos,<br />

entre espécies relacionadas. Essa<br />

característica também é denominada<br />

colinearidade, e poderá ser altamente<br />

informativa para estudos<br />

comparativos de função, ação e<br />

regulação gênica entre diferentes<br />

genomas (Figura 2). Embora não<br />

seja uma condição estável, pois a<br />

sintenia pode ser perdida no decorrer<br />

da evolução, vários trabalhos<br />

evidenciam a importância das regiões<br />

cromossômicas conservadas<br />

para estudos genéticos comparativos<br />

(BENNETZEN et al., 1998; GALE<br />

& DEVOS, 1998; DEVOS et al., 1999;<br />

FEUILLET & KELLER, 2002).<br />

A sintenia é bastante estudada<br />

na família Brassicaceae e na família<br />

Gramineae, atualmente denominada<br />

Poaceae. Essa família é constituída<br />

por muitas espécies, entre elas<br />

algumas das principais espécies agrícolas<br />

como milho, arroz, trigo, sorgo,<br />

cevada, centeio e aveia (cereais).<br />

Além das variações fenotípicas e<br />

genotípicas existentes entre os cereais,<br />

há muitas variações na estrutura<br />

desses genomas. A variação pode<br />

ser no número de cromossomos, no<br />

nível de ploidia e no tamanho do<br />

genoma - estimado em pares de


Figura 2 – Sintenia entre os genomas do arroz, milho, cevada e trigo. As informações<br />

provenientes do genoma menor podem ser utilizadas para guiar ações no sentido de<br />

localizar, mapear e clonar genes em genomas maiores. Os pontos em amarelo<br />

indicam o posicionamento de alguns genes e os números indicam o cromossomo<br />

(Modificado de GALE & DEVOS, 1998).<br />

bases (pb), podendo existir genomas<br />

muito grandes como o genoma do<br />

trigo, com cerca de 16 bilhões de<br />

bases, como também pode ocorrer<br />

genomas muito pequenos, como é o<br />

caso do do arroz, com cerca de 430<br />

milhões de bases. A estratégia atual<br />

está sendo estudar e caracterizar os<br />

sistemas gênicos em genomas pequenos<br />

(arabidopsis e arroz) e, considerando<br />

a sintenia existente, inferir<br />

sobre os genomas grandes (milho<br />

– 2 500 Mpb, trigo – 16 000 Mpb e<br />

cevada - 4 800 Mpb, por exemplo).<br />

Características de um<br />

Genoma Modelo<br />

A presença de determinadas características<br />

numa espécie pode<br />

torná-la altamente atraente para a<br />

ciência. Sob esse enfoque, as características<br />

mais atraentes numa espécie<br />

vegetal, as quais poderão contribuir<br />

para que ela se torne um modelo,<br />

estão relacionadas com a duração<br />

do ciclo, com o número de<br />

sementes produzidas, com o tamanho<br />

do seu genoma, com a capacidade<br />

de multiplicação em diferentes<br />

ambientes, com a facilidade de manipulação<br />

da polinização (direcionamento<br />

de cruzamentos), com a<br />

capacidade de cultivo in vitro e com<br />

a disponibilidade de informações já<br />

existentes (banco de dados para a<br />

espécie). Essas características geralmente<br />

definem a facilidade de se<br />

obterem resultados, bem como o<br />

seu volume e sua qualidade. A primeira<br />

espécie vegetal utilizada como<br />

modelo para estudos genéticos foi a<br />

ervilha (Pisum sativum L.), quando<br />

Gregor Mendel publicou os resultados<br />

dos primeiros estudos genéticos,<br />

no ano de 1865. É lógico que<br />

naquela época Mendel não considerou<br />

os critérios utilizados atualmente,<br />

mas certamente escolheu a ervilha<br />

pela familiaridade que ele tinha<br />

com o cultivo daquela espécie. Embora<br />

as leis de Mendel não tenham<br />

sido validadas até o seu redescobrimento,<br />

no início do século XX, cons-<br />

tituíram a base científica dos estudos<br />

realizados até hoje. Na história<br />

recente da Biologia de Plantas, uma<br />

outra espécie apresentava muitas<br />

características atraentes e surgia<br />

como modelo entre as dicotiledôneas;<br />

tratava-se da Arabidopsis<br />

thaliana. Essa espécie vegetal é<br />

membro da família Brassicaceae, a<br />

qual inclui espécies cultivadas como<br />

o repolho, o rabanete e a canola.<br />

Embora a arabidopsis não possua<br />

importância agronômica, essa espécie<br />

apresenta vantagens importantes<br />

para a pesquisa básica em genética<br />

e biologia molecular. Além disso,<br />

ou como conseqüência disso,<br />

essa espécie possui o maior volume<br />

de informação disponível dentre todos<br />

os vegetais. No entanto, o modelo<br />

genético Arabidopsis thaliana<br />

limitava-se principalmente ao sistema<br />

genético das dicotiledôneas,<br />

quando um complemento para as<br />

monocotiledôneas começou a ser<br />

procurado. Nos últimos anos, está<br />

sendo dispensada muita atenção a<br />

uma outra espécie, o arroz (Oryza<br />

sativa L.), por ele possuir também<br />

bons atributos para se tornar um<br />

modelo genético vegetal. Embora<br />

seu genoma seja pouco maior, cerca<br />

de três vezes maior que o genoma<br />

de Arabidopsis thaliana L., ainda<br />

assim é cerca de 40 vezes menor do<br />

que o genoma do trigo (Triticum<br />

aestivum L.). Entretanto, a estratégia<br />

de direcionar os esforços para<br />

tornar o arroz um genoma modelo<br />

está alicerçada no interesse de se<br />

obter um modelo entre as gramíneas,<br />

principalmente aquelas produtoras<br />

de grãos, pois, praticamente, todas<br />

as ações dos programas de melhoramento<br />

de plantas estão voltadas para<br />

produtividade, resistência a moléstias<br />

e adaptabilidade. Outro fator<br />

fundamental no interesse de tornar<br />

o arroz um genoma modelo é a<br />

existência de sintenia ou colinearidade<br />

entre os genomas dessa família.<br />

Atividades voltadas para a identificação<br />

e a clonagem de genes com<br />

a utilização de genomas modelos,<br />

como o arroz, são bem mais eficientes<br />

do que em genomas grandes.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 47


Portanto, atualmente a estratégia<br />

mais racional será estudar o arroz,<br />

identificar, clonar e caracterizar seus<br />

genes e, quando tudo estiver<br />

mensurado, atingir os genomas mais<br />

complexos, como os do trigo e do<br />

milho. Dessa forma, os programas de<br />

melhoramento de plantas poderão<br />

aumentar em muito sua eficiência.<br />

A particularidade que o arroz<br />

possui, de ser cultivado sob irrigação<br />

por inundação (várzeas) e sequeiro<br />

(terras altas), também torna essa espécie<br />

modelo para o entendimento<br />

dos mecanismos que controlam a adaptabilidade<br />

das plantas. O Centro de<br />

Genômica e Fitomelhoramento (CGF)<br />

da UFPel está buscando, mediante a<br />

utilização de tecnologias modernas, o<br />

entendimento do sistema de raízes do<br />

arroz (modelo genético). A identificação<br />

de mecanismos morfofisiológicos<br />

e os respectivos controles genéticos<br />

permitirão a identificação e a clonagem<br />

dos genes envolvidos. A sintenia e a<br />

utilização de ferramentas genômicas<br />

adequadas conduzirão à rápida utilização<br />

desse conhecimento para o desenvolvimento<br />

e lançamento de<br />

genótipos superiores, de diversas espécies<br />

que poderão ser adaptadas aos<br />

solos encharcados do sul do Brasil.<br />

Seqüenciamento de<br />

Genomas<br />

Os primeiros passos para o seqüenciamento<br />

de DNA foram dados<br />

por Sanger, em 1977, com o desenvolvimento<br />

do método de seqüenciamento<br />

manual conhecido também<br />

como método da cadeia interrompida.<br />

Hoje o método de Sanger baseiase<br />

na amplificação, por PCR, de fragmentos<br />

de DNA clonados previamente<br />

dentro de vetores conhecidos. Dessa<br />

forma, oligonucleotídeos iniciadores<br />

(primers), complementares à seqüência<br />

do vetor, são utilizados para<br />

amplificar o inserto do DNA a ser<br />

seqüenciado. A metodologia foi chamada<br />

de “cadeia interrompida” em<br />

função de que são utilizados dNTPs<br />

(deoxi-Nucleotídeos Trifosfatos) modificados,<br />

os ddNTPs (dideoxi-Nucleotídeos<br />

Trifosfatos), os quais, quando<br />

incorporados pela enzima Taq polimerase<br />

(a enzima que amplifica o<br />

DNA), não permitem a inclusão do<br />

nucleotídeo seguinte por não apresentarem<br />

a hidroxila no carbono 3 da<br />

dideoxi-ribose do nucleotídeo<br />

terminador. Portanto, a síntese da<br />

molécula de DNA pára nesse ponto<br />

(Figura 3).<br />

Pelo método de Sanger, o processo<br />

de seqüenciamento é realizado<br />

em quatro reações independentes.<br />

Em cada uma delas é adicionado um<br />

ddNTP diferente (ddATP, ddCTP,<br />

ddGTP e ddTTP), geralmente marcados<br />

radiativamente com 32 P. Na cópia<br />

de cada fita de DNA, a partir do<br />

molde, as moléculas são sintetizadas<br />

até que incorporem o nucleotídeo<br />

terminador (ddNTP). O acúmulo de<br />

moléculas terminadas numa mesma<br />

base possibilita sua visualização no<br />

gel. A geração aleatória de moléculas<br />

terminadas nas bases distintas de uma<br />

fita molde de DNA permitirá o estabelecimento<br />

da seqüência de nucleotídeos<br />

do referido molde. A leitura da<br />

seqüência de bases é realizada mediante<br />

a separação, num gel de poliacrilamida<br />

de alta resolução, dos fragmentos<br />

amplificados por PCR. Nesse<br />

tipo de técnica, é possível identificar<br />

cerca de 200 a 300 nucleotídeos. A<br />

Figura 3 apresenta um esquema sintetizado<br />

dessa metodologia.<br />

48 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Figura 3 – Esquema representativo do método de seqüenciamento desenvolvido por<br />

Sanger (A) e do método de seqüenciamento automatizado (B). Consulte o texto para<br />

conferir os detalhes de cada método.<br />

Na última década, o surgimento<br />

dos seqüenciadores automáticos, aliado<br />

à elevada capacidade de processar<br />

informações que a informática<br />

proporcionou, revolucionou a<br />

genômica, dando origem a bioinformática.<br />

O seqüenciamento automático<br />

mantém o mesmo princípio do<br />

método de seqüenciamento manual<br />

proposto por Sanger, mas a possibilidade<br />

de utilizar ddNTPs marcados<br />

fluorescentemente com cores distintas<br />

para cada um deles (ddCTP,<br />

ddGTP, ddATP e ddTTP) permitiu<br />

automatizar o processo (veja Figura<br />

3). Outra grande vantagem do seqüenciamento<br />

automático é a incorporação<br />

de metodologias laser e programas<br />

computacionais que fazem a<br />

leitura dos resultados. As moléculas<br />

fluorescentes utilizadas nos ddNTPs,<br />

quando sensibilizadas pelo laser, emitem<br />

um comprimento de onda, que é<br />

capturada por uma câmera acoplada<br />

ao seqüenciador. A informação é processada<br />

e transformada em seqüências<br />

nucleotídicas por softwares adequados.<br />

Devido à baixa capacidade de<br />

produção proporcionada pelo método<br />

de Sanger, as primeiras seqüências<br />

nucleotídicas foram geradas para estudos<br />

pontuais, como o estabelecimento<br />

da seqüência de alguns genes<br />

e de pequenas regiões cromossômi-


Figura 4 – Detalhes de um exemplar de<br />

Arabidopsis thaliana L. cultivado em<br />

laboratório. Cortesia Dra. M. E. Alvarez.<br />

CIQUIB – CONICET, Universidad Nacional<br />

de Córdoba – Argentina.<br />

cas. À medida que foram desenvolvidos<br />

os seqüenciadores de nucleotídeos<br />

automatizados, a capacidade de<br />

produção de seqüências foi aumentada<br />

muito rapidamente. Em função<br />

disso, surgiram, mediante a associação<br />

de grupos de pesquisa, várias<br />

iniciativas voltadas para o seqüenciamento<br />

de alguns genomas. Os primeiros<br />

esforços foram direcionados para<br />

alguns microorganismos e, em seguida,<br />

para a Arabidopsis thaliana (The<br />

Arabidopsis Genome Initiative*, 2000)<br />

e para a Drosophila melanogaster<br />

(ADAMS et al., 2000), dois organismos<br />

utilizados como modelo na biologia.<br />

Na seqüência, apresentaremos o<br />

que já foi realizado com o intuito de<br />

gerar informações genéticas das principais<br />

espécies, com vistas ao melhoramento<br />

vegetal.<br />

Arabidopsis thaliana - o<br />

genoma da Arabidopis (125 milhões<br />

de nucleotídeos – 125 Mpb) foi<br />

seqüenciado por uma associação internacional<br />

de pesquisadores cha-<br />

Figura 5 – Esquema representativo das principais etapas na geração de bibliotecas<br />

de seqüenciamento. A – Para seqüenciamento estrutural via construção de biblioteca<br />

BAC (Bacterial Artificial Chromosomes). 1 – DNA genômico; 2 – Alinhamento de<br />

fragmentos de 100 a 200 kb em mapa físico (Biblioteca BAC); 3 – Fragmentação<br />

individual dos BACs; 4 – Subclonagem de fragmentos entre 2 e 5 kb. B – Para<br />

seqüenciamento de ESTs (Expressed sequence tags) ou do transcriptoma. 1 – Extração<br />

de RNA mensageiro; 2 – Síntese reversa utilizando RT-PCR; 3 – Síntese de cDNA dupla<br />

fita; 4 – Clonagem dos cDNAs.<br />

mada de Iniciativa Genoma da Arabidopsis<br />

(The Arabidopsis Genome<br />

Initiative * , 2000). A seqüência, o mapa<br />

e as anotações disponíveis atualmente<br />

são resultado de esforços conjuntos<br />

do TIGR (The Institute for<br />

Genomic Research), MIPS (Munich<br />

Information Center for Protein<br />

Sequences) e TAIR (The Arabidopsis<br />

Information resource). Veja uma foto<br />

dessa espécie vegetal observando a<br />

Figura 4.<br />

Arroz (Oryza sativa L.) – Foram<br />

empregados esforços públicos e<br />

privados para seqüenciar essa espécie.<br />

O primeiro esforço privado foi<br />

realizado pela Monsanto (PENNISI,<br />

2000). Mais tarde, os resultados gerados<br />

seriam somados aos resultados do<br />

IRGSP (International Rice Genome<br />

Sequencing Project). O segundo esforço<br />

privado, uma associação entre<br />

duas empresas, a Myriad Genetics e a<br />

Syngenta, utilizou o método whole<br />

genome shotgun, e não acrescentou<br />

resultados significativos ao conjunto<br />

de dados disponibilizados pelos outros<br />

projetos (GOFF et al., 2002).<br />

Foram implementados também dois<br />

esforços públicos para o seqüenciamento<br />

do arroz. O primeiro deles, o<br />

Projeto Internacional de Seqüenciamento<br />

do Genoma do Arroz (IRGSP –<br />

International Rice Genome Sequencing<br />

Project), teve como objetivo seqüenciar<br />

a subespécie japonica. Essa associação<br />

teve início no ano de 1997, em<br />

uma reunião do Simpósio Internacional<br />

de Biologia Molecular de Plantas<br />

realizado em Singapura. Naquela ocasião,<br />

o objetivo da comunidade científica<br />

era socorrer o idealizador do<br />

projeto de seqüenciamento estrutural<br />

do arroz, o RGP (Rice Genome Project)<br />

do Japão. O segundo esforço público<br />

foi liderado pela Academia Chinesa<br />

de <strong>Ciência</strong>s (Chinese Academy of<br />

Sciences) de Beijing, China. Esse projeto<br />

iniciou-se em abril de 2000 e, dois<br />

anos mais tarde, seus resultados foram<br />

publicados pela revista Science<br />

(YU et al., 2002). A grande distinção<br />

estabelecida entre as subespécies<br />

seqüenciadas por esses dois esforços<br />

públicos foi em relação à importância<br />

econômica e geográfica que elas apresentam.<br />

A subespécie seqüenciada<br />

pelo grupo liderado pelos japoneses,<br />

spp japonica, é amplamente cultivada<br />

no Japão, nos Estados Unidos, na<br />

Coréia do Sul e em parte da China. Por<br />

outro lado, a subespécie seqüenciada<br />

pelos chineses, spp indica, é bastante<br />

cultivada na China e no Sudeste Asiático,<br />

bem como no Sul do Brasil. Além<br />

disso, as estratégias de seqüenciamento<br />

utilizadas pelos dois grupos<br />

foram distintas; enquanto o grupo dos<br />

chineses focava a anotação de genes,<br />

pois utilizou a estratégia whole genome<br />

shotgun, o grupo liderado pelo RGP<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 49


Figura 6 – Detalhes de uma lavoura de<br />

arroz irrigado do cultivar BRS 7 “Taim”.<br />

Cortesia Prof. Silmar Peske.<br />

Figura 7 – Detalhes de uma lavoura de<br />

trigo (Triticum aestivum). Cortesia Prof.<br />

Silmar Peske.<br />

focou, além da anotação dos genes, a<br />

geração de informações precisas ao<br />

nível de estruturação e organização<br />

do genoma, pois utilizou a técnica de<br />

seqüenciamento estrutural via construção<br />

de bibliotecas BAC (Bacterial<br />

Artificial Chromosomes) (Figura 5 A).<br />

Veja uma foto dessa espécie vegetal<br />

observando a Figura 6.<br />

Trigo (Triticum aestivum) –<br />

os esforços para determinar a seqüência<br />

de nucleotídeos do trigo<br />

depararam-se com duas grandes barreiras.<br />

A primeira delas se refere ao<br />

tamanho do genoma, que é, aproximadamente,<br />

de 16 bilhões de nucleotídeos<br />

(16.000 Mpb) - cerca de 40<br />

vezes maior que o genoma do arroz.<br />

A segunda delas é que o seu genoma<br />

é diferente do do arroz e da<br />

arabidopsis, ambos diplóides, enquanto<br />

o trigo é hexaplóide. Esses<br />

impedimentos impuseram uma estratégia<br />

preliminar para que fossem<br />

determinadas as seqüências transcritas:<br />

o transcriptoma (bibliotecas<br />

de cDNA) de diferentes estádios do<br />

desenvolvimento da planta (Figura<br />

5 B) Portanto, considerando a estrutura<br />

e o tamanho do genoma do<br />

trigo essa ação é mais lógica do que<br />

pensar num inexeqüível projeto de<br />

seqüenciamento estrutural dessa espécie.<br />

De uma forma geral, a estratégia<br />

visa a gerar seqüências nucleotídicas<br />

dos genes transcritos em<br />

determinados estádios de desenvolvimento<br />

ou sob determinados<br />

estresses do ambiente. O esboço de<br />

uma associação internacional voltada<br />

para a geração dessas informações<br />

começou a ser definido em<br />

1998, com a criação de uma ação<br />

Internacional Cooperativa para a produção<br />

de ESTs (Expressed Sequence<br />

Tags) de trigo. Atualmente, as ações<br />

50 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Figura 8 - Detalhes de uma lavoura de cevada (Hordeum vulgare), safra 2003, da<br />

Linhagem CEV 97043 da propriedade do Produtor Adelar Crespi.<br />

com a intenção de determinar a<br />

posição no mapa dos transcritos são<br />

coordenadas pelo International<br />

Triticeae Mapping Initiative. Os principais<br />

esforços para a criação de<br />

uma coleção de ESTs representativos<br />

do trigo estão sendo liderados<br />

pelos EUA (U. S. Wheat Genome<br />

Project), pelo Canadá (AAFC –<br />

Agriculture and Agri-Food Canada)<br />

e pela Inglaterra (BBSRC –<br />

Biotechnology and Biological<br />

Sciences Research Council). Veja uma<br />

foto dessa espécie vegetal observando<br />

a Figura 7.<br />

Cevada (Hordeum vulgare) –<br />

os esforços para determinar a seqüência<br />

de nucleotídeos da cevada<br />

também sofrem impedimentos devido<br />

ao tamanho do seu genoma ~ 4,8<br />

bilhões de nucleotídeos (4800 Mpb).<br />

O primeiro passo para contornar esse<br />

impedimento foi a produção de mapas<br />

físicos do genoma da cevada com<br />

alta densidade de marcadores; isso<br />

proporcionará a realização de comparações<br />

com o genoma do arroz. O<br />

próximo passo será a criação do<br />

transcriptoma da espécie. Essas decisões<br />

estão sendo implementadas em<br />

um esforço combinado entre cientistas<br />

da América do Norte (North<br />

American Barley Genome Mapping


Figura 9 – Detalhes de uma lavoura de milho (Zea mays) e de espigas maduras<br />

(direita inferior). Cortesia Prof. Silmar Peske.<br />

Project, USA e North American Barley<br />

Genome Mapping Project, Canadá) e<br />

da Europa (Plant Genome Resource<br />

Centre, Alemanha e Scottish Crop<br />

Research Institute, Inglaterra), para<br />

criar uma biblioteca de ESTs<br />

(Expressed Sequence Tags) o mais<br />

completa possível (Figura 5 B). Veja<br />

uma foto dessa espécie vegetal observando<br />

a Figura 8.<br />

Milho (Zea mays) – a principal<br />

iniciativa para seqüenciamento do<br />

genoma do milho foi anunciada em<br />

setembro de 2002 pelo NFS (National<br />

Science Foundation) dos Estados<br />

Unidos. No entanto, há muito tempo<br />

os geneticistas da área do milho<br />

buscavam somar esforços com esse<br />

objetivo (BENNETZEN et al., 2001).<br />

Quatro fatores contribuíram para que<br />

essa iniciativa fosse retardada até<br />

2002. Primeiro, os avanços na<br />

tecnologia de seqüenciamento reduziram<br />

consideravelmente o custo<br />

em comparação com o passado. Segundo,<br />

novas metodologias de<br />

fingerprinting, de alta resolução e<br />

produção, permitiram aumentar a<br />

eficiência na seleção de clones para<br />

o seqüenciamento, reduzindo ao mínimo<br />

a sobreposição de regiões<br />

seqüenciadas. Terceiro, foram desenvolvidas<br />

novas metodologias para<br />

preparar frações do genoma do milho<br />

ricas em genes (YUAN et al.,<br />

2002). Quarto, análises comparativas<br />

do milho com o arroz (Oryza<br />

sativa) ou Arabidopsis sugerem que<br />

a seqüência do genoma dessas duas<br />

espécies não serão suficientes para<br />

entender detalhadamente o conteúdo<br />

de genes do milho e sua expressão<br />

(BENNETZEN et. al., 2001;<br />

CHANDLER & BRENDEL, 2002).<br />

Além disso, algumas características<br />

no genoma do milho sempre dificultaram<br />

a implementação de projetos<br />

de seqüenciamento da espécie. Destaca-se<br />

a existência de várias<br />

subespécies importantes (Zea mays<br />

spp. Huehuetenangensis, Zea mays<br />

spp. mays (mayze), Zea mays spp.<br />

mexicana (teosinto), e Zea mays<br />

spp. Parviglumis); o elevado conteúdo<br />

de DNA repetitivo (regiões<br />

duplicadas) presente no genoma do<br />

milho (HELENTJARIS, 1995) e o tamanho<br />

do seu genoma, cerca de<br />

2500 Mpb.<br />

Da mesma forma que está ocorrendo<br />

na geração de seqüências<br />

nucleotídicas da cevada e do trigo, o<br />

foco para o milho também será a<br />

geração de seqüências dos genes (o<br />

transcriptoma). As interações do sistema<br />

gênico poderão ser obtidas em<br />

genomas como o arroz, principalmente<br />

devido à ocorrência da<br />

sintenia entre os cereais. Veja uma<br />

foto dessa espécie vegetal observando<br />

a Figura 9.<br />

Reflexos da Tecnologia na<br />

Produção de Cereais<br />

Os grandes avanços na produção<br />

mundial de grãos, gerados a<br />

partir de meados do século passado,<br />

são decorrentes de uma contribuição<br />

decisiva do melhoramento clássico<br />

de plantas (BORLAUG, 1983). Ao<br />

contrário do que alguns entusiastas<br />

esperavam, as grandes expectativas<br />

decorrentes das inovações científicas<br />

dos últimos 30 anos não se refletiram<br />

em significativos incrementos na produção<br />

de grãos. Para que as<br />

tecnologias moleculares possam render<br />

os resultados esperados, algumas<br />

barreiras precisam ser superadas.<br />

A principal delas diz respeito à<br />

mudança de cultura nos programas<br />

de melhoramento de plantas, sendo<br />

necessário selecionar genes ao invés<br />

de selecionar plantas (KOORNNEEF<br />

& STAM, 2001). Superadas as barreiras<br />

culturais, a eficiência na implementação<br />

de ferramentas moleculares<br />

em programas de melhoramento<br />

de plantas poderá ser incrementada<br />

mediante a automatização dos processos<br />

de extração de DNA, a geração<br />

de um maior número de seqüências<br />

ligadas (marcadores) a caracteres<br />

de importância agronômica e o barateamento<br />

dos equipamentos e<br />

insumos utilizados. O treinamento<br />

de novos melhoristas também deverá<br />

merecer atenção especial, pois,<br />

além da sólida formação em melhoramento<br />

clássico e em estatística, é<br />

recomendado que esses profissionais<br />

sejam treinados em genética<br />

molecular e técnicas moleculares<br />

aplicadas ao melhoramento de plantas.<br />

Principalmente por que é através<br />

desses novos profissionais que os<br />

programas de melhoramento clássicos<br />

poderão incorporar as novas ferramentas<br />

da biologia molecular.<br />

O setor de melhoramento de<br />

plantas também necessita se articular<br />

para melhorar a capacidade de<br />

processamento das informações já<br />

disponíveis, principalmente aquelas<br />

decorrentes dos diferentes projetos<br />

de seqüenciamento de genomas.<br />

Atualmente, dois fatores contribu-<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 51


em para que as informações disponíveis<br />

não sejam aplicadas rotineiramente.<br />

A primeira delas é que há<br />

carência de bons sistemas de<br />

informática capazes de trocar informações<br />

com os bancos de dados<br />

com a agilidade requerida; a segunda<br />

é que poucos profissionais estão<br />

habilitados a realizarem buscas e a<br />

fazerem comparações de seqüências<br />

através de computadores.<br />

Buscando alternativas para compor<br />

o sistema agrícola das várzeas do<br />

Sul do Brasil, sugerimos a implementação<br />

de ferramentas moleculares e<br />

de bons sistemas de informática para<br />

os programas de melhoramento locais.<br />

Essas ações devem estar voltadas<br />

para a: i) identificação de genes<br />

de tolerância a estresses abióticos em<br />

genomas “modelo” (arroz), com posterior<br />

caracterização em espécies de<br />

interesse (trigo, milho, cevada, sorgo,<br />

aveia e azevém); ii) caracterização<br />

molecular do germoplasma local; iii)<br />

identificação de “genes maiores”, responsáveis<br />

pela adaptação do arroz<br />

ao encharcamento; e, iv) criação de<br />

um banco de mutantes para o sistema<br />

de raízes.<br />

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_______________________________________<br />

* A autoria deste trabalho deverá ser “The Arabidopsis Genome Iniative”. Uma lista completa dos colaboradores aparece no final do artigo original<br />

(Nature, 408: 796-815).


Pesquisa<br />

Paulo Henrique Machniewicz<br />

Biólogo - Faculdades Integradas “Esprírita”<br />

Especialista em Genética Humana PUC-PR,<br />

Responsável pelos laboratórios de Genética,<br />

Imunologia e Microbiologia do Centro Universitário<br />

Campos de Andrade - UniAndrade - Curitiba-PR<br />

paulo.mach@bol.com.br<br />

Fábio Rueda Faucz, Dr<br />

Biologo - UFPR<br />

Mestrado em <strong>Ciência</strong>s Biológicas - UFPR<br />

Doutorado em Genética - UFPR<br />

Professor adjunto - PUC-PR<br />

Professor Titular - UNICEMP-PR<br />

fabiogenetica@yahoo.com<br />

Ilustrações cedidas pelos autores<br />

Associação de mutações nos<br />

genes BRCA1 e BRCA2<br />

Associação de mutações nos genes BRCA1 e BRCA2 causadoras do câncer de mama hereditário<br />

Resumo<br />

Cerca de 10% dos cânceres de<br />

mama podem ser associados a mutações<br />

na linhagem germinativa. Em<br />

1990, foi identificado, no cromossomo<br />

17, o gene BRCA1, composto de<br />

24 exons e codifica para uma proteína<br />

de 1.863 aminoácidos. Mutações neste<br />

gene são responsáveis por metade<br />

de todos os casos familiares de câncer<br />

de mama. Já em 1995, identificaram o<br />

BRCA2, com 27 exons, codificando<br />

para uma proteína de 3.350 aminoácidos.<br />

Este gene encontra-se no cromossomo<br />

13. Mutações neste gene<br />

são responsáveis por cerca de 35%<br />

dos casos familiares precoces de câncer<br />

de mama. Estes dois genes, associados<br />

a outras proteínas, desencadeiam<br />

a doença que mais mata mulheres.<br />

No Brasil, registram-se cerca de 35.000<br />

novos casos de câncer de mama por<br />

ano. O câncer representa uma proliferação<br />

maligna das células ou lóbulos<br />

epiteliais que revestem os ductos<br />

ou lóbulos da mama. O câncer feminino<br />

é raramente encontrado antes dos<br />

25 anos de idade, exceto em casos<br />

hereditários. A transmissão hereditária<br />

de câncer de mama segue o clássico<br />

padrão mendeliano de transmissão<br />

autossômica dominante, com 50% das<br />

crianças de carreadoras, herdando mutações<br />

BRCA1. As portadoras femininas<br />

de mutações são estimadas a<br />

terem um risco de 85% de desenvolvimento<br />

de câncer de mama e ovário,<br />

com maior incidência de câncer bilateral<br />

e mais de 50% dos cânceres de<br />

mama, ocorrendo, antes dos 50 anos.<br />

A prevalência de mutações de BRCA1<br />

e BRCA2 é ocasionalmente mais alta<br />

que o esperado, devido à transmissão<br />

aumentada de algumas mutações, em<br />

certas populações, devido ao efeito<br />

do fundador. A população de Judeus<br />

Askenazi é a que representa um exemplo<br />

claro de mutações, devido ao<br />

efeito do fundador, por cultivarem<br />

suas tradições de união restrita. Por<br />

conseqüência, as mutações encontradas<br />

nesta população são iguais em<br />

inúmeros países para onde migraram.<br />

Outras populações, como Espanhóis,<br />

Indianos, Paquista-neses, Russos e até<br />

tribos Aborígines do Canadá, também<br />

apresentam algumas mutações que<br />

são mais freqüentes e que podem ser<br />

atribuídas ao efeito do fundador.<br />

1. Introdução<br />

O nosso organismo é constituído<br />

por trilhões de células, que se reproduzem<br />

pelo processo de divisão celular.<br />

Este é um processo ordenado e<br />

controlado, responsável pela formação,<br />

crescimento e regeneração de<br />

tecidos saudáveis do corpo. Algumas<br />

vezes, no entanto, as células perdem<br />

a capacidade de limitar e comandar<br />

seu próprio crescimento, passando,<br />

então, a se multiplicarem muito rapidamente<br />

e de maneira aleatória e<br />

desordenada, formando nódulos.<br />

O câncer surge por causa de<br />

alterações no DNA, que resulta na<br />

proliferação incontrolável de células.<br />

A maioria dessas alterações envolve<br />

modificações seqüenciais reais<br />

de DNA. Elas podem surgir como<br />

conseqüência de erros de replicação<br />

aleatórios, exposição a carcinógenos,<br />

ou processos defeituosos de reparo<br />

do DNA.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 53


As lesões da mama limitam-se,<br />

predominantemente, ao sexo feminino<br />

por possuir uma estrutura mamária<br />

mais complexa, volume mamário<br />

maior e extrema sensibilidade<br />

às influências endócrinas predispõem<br />

esse órgão a diversas condições<br />

patológicas (COTRAN, KUMAR,<br />

COLLINS, 2001).<br />

As neoplasias constituem as lesões<br />

mais importantes da mama feminina,<br />

apesar de não serem as mais<br />

comuns. Elas podem surgir a partir<br />

de epitélio escamoso, estruturas glandulares<br />

e tecido conjuntivo.<br />

Existem três grupos de influências<br />

importantes no câncer de mama:<br />

• Fatores genéticos;<br />

• Influências hormonais;<br />

• Fatores ambientais.<br />

No Brasil, registram-se 35.000<br />

novos casos de câncer de mama por<br />

ano, 11.000 deles, só no Estado de São<br />

Paulo. Fatores de risco de câncer na<br />

família, alimentação rica em gorduras,<br />

início precoce da menstruação, menopausa<br />

tardia, 1ª gestação após os 30<br />

anos e o fato de a mulher nunca ter<br />

engravidado são alguns dos fatores<br />

que influenciam para desenvolver um<br />

tumor maligno na mama.<br />

O câncer de mama representa<br />

uma proliferação maligna das células<br />

epiteliais que revestem os ductos<br />

ou lóbulos da mama. É considerado<br />

o mais comum em mulheres, podendo<br />

existir por um longo período,<br />

como doença não-invasiva ou<br />

invasiva, mas não-metástica. Este<br />

fato torna-se mais urgente a necessidade<br />

do diagnóstico precoce e da<br />

conduta apropriada.<br />

Cerca de 10% dos cânceres de<br />

mama podem ser associados a mutações<br />

na linhagem germinativa. Esta<br />

área tem sofrido uma elevação notável<br />

com a identificação de genes<br />

responsáveis por casos em famílias<br />

(BATES, HOCKELMAN, 1982 ).<br />

KING, et al. (1990), usou análise<br />

genética de ligação para identificar o<br />

gene BRCA1 localizado no cromossomo<br />

17q21. Ele é responsável por<br />

aproximadamente metade de todos<br />

os casos familiares precoces de câncer<br />

de mama, bem como pela maioria<br />

dos casos familiares de câncer de<br />

mama e ovário.<br />

SCHUTTE, et al. (1995), identificou<br />

um gene na região 13q12-q13,<br />

com seis mutações diferentes em famílias<br />

com câncer de mama e identificou<br />

como BRCA2. Mutações nesse gene<br />

são responsáveis por aproximadamente<br />

35% dos casos familiares precoces de<br />

câncer de mama. Estão ainda associados<br />

a um risco aumentado de câncer de<br />

mama e de próstata em homens, e de<br />

câncer ovariano e pancreático.<br />

Estes dois genes associados a<br />

outras proteínas desencadeiam a doença<br />

que mais mata mulheres.<br />

Para que se tenha uma avaliação<br />

precisa do risco de desenvolver um<br />

câncer é necessário que se obtenha<br />

uma história da paciente, uma<br />

genealogia do câncer precisa, onde é<br />

possível confirmar os tipos de cânceres<br />

através de documentos hospitalares<br />

e exames.<br />

Devido aos altos custos e dificuldades<br />

para testar mutações em<br />

BRCA1 e BRCA2, são realizadas provas<br />

nas mutações mais prováveis<br />

nas populações. Nas famílias de Judeus<br />

as três principais mutações de<br />

fundador mais freqüentes, 185 del<br />

AG, 5382 ins C em BRCA1 e 617 del<br />

T em BRCA2. Estas três mutações<br />

mais freqüentes respondem por mais<br />

de 90% da população. Quando uma<br />

mutação de fundador é encontrada,<br />

esta já é suficiente para autorizar a<br />

blindagem para todos as três mutações<br />

(BAST, et al 2000).<br />

2. Localização da mama<br />

A mama está localizada entre a<br />

2ª e a 6ª costela, entre a margem<br />

esternal e a linha medioaxilar. O<br />

tecido mamário possui três componentes<br />

principais:<br />

• Tecido glandular: é organizado<br />

em 12 a 20 lobos, onde cada<br />

qual termina num canal que se<br />

abre na superfície do mamilo.<br />

• O tecido glandular é sustentado<br />

por tecido fibroso, incluindo<br />

os ligamentos suspensórios que<br />

estão conectados tanto à pele<br />

quanto à fascia que fica por<br />

debaixo da mama.<br />

• A gordura circunda a mama e<br />

predomina tanto superficialmente,<br />

quanto na periferia<br />

(SPENCER, 1991).<br />

54 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Os vasos linfáticos de grande<br />

parte da mama drenam para a axila.<br />

A borda anterior da axila é formada<br />

pelos músculos peitorais; as bordas<br />

posteriores incluem o subescapular e<br />

o grande dorsal; a borda interna pelo<br />

quadril cortal e músculo denteado<br />

anterior; e a borda externa pela parte<br />

superior do braço.<br />

Os gânglios axilares na parte<br />

alta da axila, perto das costelas e do<br />

denteado anterior. Para dentro deles,<br />

drenam canais provenientes de três<br />

outros grupos de gânglios linfáticos:<br />

1. o grupo peitoral ou anterior;<br />

2. o grupo subescapular (posterior);<br />

3. o grupo lateral;<br />

Convém observar que nem todos<br />

os linfáticos da mama drenam<br />

para a axila. Dependendo da localização<br />

de uma lesão no seio, a disseminação<br />

pode se processar diretamente<br />

para os gânglios infraclaviculares,<br />

para dentro dos canais profundos<br />

existentes no interior do tórax ou<br />

do abdômen, e até para a mama<br />

oposta (BATESE, HOCKENAM, 1982).<br />

Na glândula mamária, os lobos<br />

possuem muitas subdivisões que<br />

são chamadas de lóbulos; estes terminam<br />

em dezenas de pequenos<br />

bulbos produtores de leite. Os lobos,<br />

lóbulos e bulbos são interligados<br />

por tubos finos denominados<br />

ductos. Estes ductos vão até o mamilo<br />

(papilo), localizado no centro<br />

da área escura da pele que se chama<br />

auréola.<br />

Somente com o início da gravidez<br />

é que a mama assume a<br />

maturação morfológica e atividade<br />

funcional completa. Após a cessação<br />

da lactação, os lóbulos regridem<br />

e sofrem atrofia, havendo uma redução<br />

notável no tamanho total da<br />

mama. A maioria das neoplasias<br />

mamárias não contém tecido<br />

adiposo e, em exames como a mamografia,<br />

elas aparecem como massas<br />

de maior densidade, contrastando<br />

com o estroma circundante.<br />

Por conseguinte, a mamografia é<br />

menos sensível em mulheres jovens,<br />

nas quais essas massas podem<br />

ser obscurecidas por tecido<br />

denso circundante (COTRAN,<br />

KUMAR, COLLINS, 2001).


3. Sinais visíveis de Câncer<br />

Mamário<br />

BATES, HOCKELMAN, (1982)<br />

descreveram alterações na mama que<br />

caracterizam um tumor, entre elas<br />

destacam-se:<br />

• Produção de fibrose, ou formação<br />

de tecido cicatricial;<br />

• Sinais de retração que incluem<br />

covas cutâneas, alterações<br />

nos contornos mamários e achatamento<br />

ou desvio do mamilo;<br />

• Aparecimento de nódulo ou<br />

endurecimento da mama ou embaixo<br />

do braço;<br />

• Mudanças no tamanho e ou<br />

formato da mama;<br />

• Alteração na coloração ou na<br />

sensibilidade da pele da mama<br />

ou da auréola;<br />

• Secreção contínua por um<br />

dos ductos;<br />

• Retração da pele da mama ou<br />

do mamilo;<br />

• Inchaço significativo ou<br />

distorção da pele.<br />

• As alterações no contorno<br />

são identificadas por inspeção<br />

cuidadosa das superfícies normalmente<br />

convexas das mamas<br />

e comparando uma mama<br />

com a outra.<br />

• Edema de pele, produzindo<br />

por bloqueio linfático.<br />

4. Classificação dos tipos<br />

de Câncer de Mama<br />

O câncer de mama é subdividido<br />

em dois grandes grupos:<br />

• Carcinomas: que podem ser<br />

diferenciados em câncer lobular<br />

onde começa nos bulbos (pequenos<br />

sacos que produzem<br />

leite); ou câncer dos ductal,<br />

que se formam nos ductos que<br />

levam o leite dos lóbulos para o<br />

mamilo (papila).<br />

• Sarcomas: formam-se nos<br />

tecidos conjuntivos, onde é mais<br />

comum o câncer se dissipar<br />

para outras partes do corpo.<br />

O carcinoma é o mais comum.<br />

Ele é mais comumente encontrado e<br />

diagnosticado na mama esquerda do<br />

que na mama direita.<br />

Os cânceres são bilatérias ou<br />

seqüenciais na mesma mama em 4%<br />

ou mais dos casos. Entre os carcinomas<br />

de mama pequenos o suficiente para<br />

identificar sua área de origem, cerca de<br />

50% surgem no quadrante superior<br />

externo, 10% em cada um dos<br />

quadrantes restantes e cerca de 20% na<br />

região central ou subareolar, o local de<br />

origem influência de modo considerável<br />

o padrão de metástase linfonodal.<br />

Os carcinomas são divididos em<br />

carcinomas não–inflitrantes ou in situ<br />

e carcinomas inflitrantes.<br />

♦ Carcinomas in situ:<br />

• Carcinoma ductal in situ;<br />

• Carcinoma lobular in situ;<br />

♦ Carcinomas Invasivos (infiltrante):<br />

• Carcinoma ductal infiltrante<br />

sem tipo específico;<br />

• Carcinoma lobular invasivo<br />

ou infiltrante;<br />

• Carcinoma medular;<br />

• Carcinoma colóide;<br />

• Carcinoma tubular;<br />

• Carcinoma papilar invasivo.<br />

5. Estágios de<br />

desenvolvimento do<br />

Câncer de Mama<br />

Os diferentes tipos de câncer de<br />

mama, quando são diagnosticados e<br />

confirmados com exame laboratorial,<br />

são classificados conforme o seu tamanho<br />

e presença de metástases nos<br />

linfonodos e a distância. Esta classificação<br />

foi criada para que o médico<br />

possa saber indicar qual o tratamento<br />

mais adequado para o paciente (<br />

HARRISON, et al. 1998 ).<br />

• TX: tumor primário que não<br />

pode ser demonstrado.<br />

• T0: não existe evidência de<br />

tumor primário.<br />

• TIS carcinoma in situ: carcinoma<br />

intraductal e carcinoma<br />

lobular in situ.<br />

• T1: tumor de até 2 cm.<br />

• T1a: tumor de até 0,5 cm.<br />

• T1b: tumor 0,5 > 1 cm.<br />

• T1c: tumor 1cm > 2 cm.<br />

• T2: tumor com mais de 2 cm<br />

e menos de 5 cm.<br />

• T3: tumor com mais de 5 cm.<br />

• T4: tumor de qualquer tamanho<br />

com possível extensão direta<br />

a parede do tórax.<br />

• T4a: extensão a parede do<br />

tórax.<br />

• T4b: edema, ou ulceração, ou<br />

nódulos satélites na parede da<br />

mesma mama.<br />

• T4c: quando encontra-se T4a<br />

e T4b.<br />

• T4d: carcinoma inflamatório.<br />

Gânglios Linfáticos (N)<br />

• NX: quando não se pode afirmar<br />

o comprometimento dos gânglios.<br />

• N0: sem metástase em gânglios<br />

regionais.<br />

• N1: metástase em gânglios axilares<br />

unidos uns aos outros e a outras<br />

estruturas.<br />

• N3: metástase em gânglios linfáticos<br />

da mama interna.<br />

Classificação Patológica<br />

• PNX: quando não se pode<br />

excluir a presença de gânglios.<br />

• PN0: sem metástase em gânglios<br />

regionais.<br />

• PN1: metástase em gânglios<br />

regionais laterais móveis.<br />

• PN1a: somente micrometástases<br />

< 0,2 cm.<br />

• PN1b: metástase em gânglios<br />

maiores de 0,2 cm.<br />

• PN1b1: metástase de 1 a 3<br />

gânglios > 0,2 < 2 cm.<br />

• PN1b2: metástases de 4 ou<br />

mais gânglios > 0,2 a < 2 cm.<br />

• PN1b3: quando atravesa a<br />

parede do gânglio < 2 cm.<br />

• PN1b4: metástase a gânglios<br />

linfáticos de 2 cm ou massa e<br />

dimensão maior.<br />

• PN2: metástase em gânglios<br />

axilares unidos uns aos outros e<br />

a outras estruturas.<br />

• PN3: metástase em gânglios<br />

linfáticos da mama interna.<br />

Metástase a Distância (M)<br />

• MX: presença de metástase à<br />

distância, mas que não pode ser<br />

demonstrado.<br />

• M0: não há evidência de<br />

metástase à distância.<br />

• M1: presença de metástase<br />

supraclaviculares.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 55


São considerados cinco estágios<br />

de desenvolvimento de tumor segundo<br />

o Comitê Americano de Câncer.<br />

• Estágio 0:Carcinoma ductal in<br />

situ e carcinoma lobular in situ.<br />

Sem evidência de tumor nos<br />

linfonodos e metástase à distância.<br />

• Estágio 1: Quando o tumor<br />

tem até 2 cm , mas sem qualquer<br />

evidência de ter se espalhado<br />

pelos gânglios linfáticos<br />

próximos.<br />

• Estágio 2: Inclui tumores de<br />

até 2 cm, mas com envolvimento<br />

de gânglios linfáticos, ou,<br />

então, um tumor primário de<br />

até 5 cm, com linfonodos axilares<br />

afetados, porém móveis, sem<br />

metástase à distância, ou tumor<br />

com mais de 5 cm sem comprometimento<br />

linfonodal nem<br />

metástases distantes.<br />

• Estágio 3: Quando o tumor<br />

tem mais de 5 cm e há envolvimento<br />

dos gânglios linfáticos<br />

da axila do lado da mama afetada.<br />

• Estágio 4: Quando existem<br />

metástases distantes, como no<br />

fígado, ossos, pulmão, pele ou<br />

outras partes do corpo.<br />

6. Frequência e<br />

epidemiologia<br />

O câncer de mama feminino é<br />

raramente encontrado antes dos 25<br />

anos de idade, exceto em casos<br />

familiares. A idade habitual que se<br />

identifica gira em torno dos 30–80<br />

anos, sendo mais comum na meia<br />

idade e velhice.<br />

Encontra-se entre as doenças<br />

mais comuns e a que mais mata<br />

mulheres no Brasil. Dados do Instituto<br />

Nacional do Câncer –I NCA<br />

mostram que foram diagnosticados<br />

neste ano cerca de 30 mil casos<br />

novos e oito mil morreram por causa<br />

da doença.<br />

Este tipo de tumor foi considerado<br />

o 3º que mais mata no Brasil. A<br />

obtenção de uma história familiar<br />

constitui um fator de risco para desenvolvimento<br />

do câncer de mama; 5<br />

a 10% dos casos são atribuíveis á<br />

herança de um gene autossômico<br />

dominante.<br />

A probabilidade de herança genética<br />

aumenta se houver vários parentes<br />

afetados e se for constatada a<br />

ocorrência do câncer numa idade<br />

jovem.<br />

Dois genes são responsáveis pela<br />

maioria dos cânceres de mama hereditário:<br />

o BRCA1 e BRCA2.<br />

O BRCA1, localizado no cromos-somo<br />

17, quando mutante, é<br />

capaz de produzir alto risco (talvez<br />

até 85% ao longo da vida) de câncer<br />

de mama e também de câncer ovariano<br />

(talvez50% de risco ao longo da<br />

vida). Cerca de 1/500 mulheres carregam<br />

uma mutação BRCA1 na linhagem<br />

germinativa, com freqüência,<br />

dando origem a uma história familiar<br />

consistente. Homens com mutações<br />

BRCA1 podem ter um aumento modesto<br />

no risco de câncer de próstata.<br />

“... há uma série de heterogeneidade<br />

mutacional descrito para o<br />

BRCA1, como em geral é o caso nos<br />

distúrbios genéticos. Uma exceção são<br />

as populações Judia Askenazi, em<br />

que um de 100 indivíduos carregam<br />

uma deleção 2-pb particular a 185<br />

del AG no BRCA1.” 1<br />

Mutações em outro gene no cromossomo<br />

13, o BRCA2 também<br />

confere alto risco de câncer de mama,<br />

e um risco um pouco menor de<br />

câncer ovariano; em homens essas<br />

mutações também os tornam propensos<br />

ao desenvolvimento de câncer<br />

de mama.<br />

“Estima-se que a freqüência das<br />

Mutações BRCA 2 seja cerca da<br />

metade da freqüência do BRCA 1 .<br />

Cerca de 1% de Judeus Askenazi<br />

outra vez tem uma mutação comum<br />

há 6174 del T .” 2<br />

A incidência global do câncer de<br />

mama é menor em mulheres negras.<br />

As mulheres nesse grupo desenvolvem<br />

câncer com uma idade mais<br />

avançada e apresentam um aumento<br />

da taxa de mortalidade, em comparação<br />

com as caucasóides.<br />

Os Estados Unidos e a Europa<br />

Setentrional apresentam a maior incidência<br />

da doença.<br />

Tumores de mama associados<br />

ao BRCA1 são mais prováveis em<br />

mulheres com filhos, possuem uma<br />

56 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

fase S maior, e quantidade elevada<br />

de estrógeno e baixos receptores de<br />

progesterona.<br />

7. Hereditariedade<br />

A transmissão hereditária de câncer<br />

de mama segue o clássico padrão<br />

mendeliano de transmissão autossômica<br />

dominante, com 50% das crianças<br />

de carreadoras herdando mutações<br />

BRCA1.<br />

As portadoras femininas de mutações<br />

são estimadas a ter um risco<br />

de 85% de desenvolvimento de câncer<br />

de mama e/ou ovariano, com<br />

uma maior incidência de câncer bilateral<br />

e mais de 50% dos cânceres de<br />

mama ocorrendo antes dos 50 anos.<br />

(BIESECKER, et al. 1993).<br />

“... o câncer de mama genético<br />

incide, geralmente, em mulheres jovens,<br />

antes dos 50 anos de idade. A<br />

ocorrência de mais de 2 casos em<br />

uma família de mulheres jovens,<br />

com menos de 50 anos, sugere que<br />

existe a possibilidade de que seja um<br />

defeito genético na família. Além disso,<br />

estes tumores costumam ser bilaterais;<br />

é freqüente que surjam nas<br />

duas mama, ás vezes não ao mesmo<br />

tempo. A ocorrência de múltiplos casos<br />

em mulheres jovens de tumores<br />

bilaterais, chama a atenção para<br />

que esta seja pela falta de risco .<br />

Outro sinal se dá pelo fato de o câncer<br />

de mama estar associado, nestes casos<br />

genéticos, ao câncer de ovário. A<br />

incidência, em uma mesma família,<br />

de uma mutação genética que predisponha<br />

à ocorrência do câncer.<br />

Estes casos constituem, aproximadamente,<br />

de 6% a 10% dos casos genéticos<br />

de câncer de mama. De 90% a<br />

94% não temos uma história familiar.”<br />

3<br />

CROOP, et al (1990), constataram<br />

que mutações na linhagem germinativa<br />

do BRCA1 são responsáveis<br />

por 2% a 4% de todos os cânceres<br />

mamários. Embora mais que 90%<br />

deles sejam casos esorádicos ocorrendo<br />

em mulheres sem evidências<br />

de susceptibilidade hereditária, análises<br />

de espécies de tumores mamá-<br />

_________________________________________________________________<br />

1 COLLINS,Francis S. 1998.<br />

2 TRENT, Jeffrey M. 1998.<br />

3 <strong>Revista</strong> Hands <strong>nº</strong>3 , 2002.


ios sugerem que anormalidades<br />

somáticas adquiridas no BRCA1 possam<br />

também desempenhar um papel<br />

em muitos desses cânceres.<br />

8. Estudo de associação<br />

Os dois principais genes responsáveis<br />

pela transmissão hereditária do<br />

câncer de mama, o BRCA1 e BRCA2,<br />

codificam proteínas de 1.863 e 3.350<br />

aminoácidos, respectivamente (Anexo<br />

03). Ambos os genes são complexos<br />

formados por mais de 20 exons.<br />

O BRCA1 foi identificado no<br />

lócus 17q21. Este gene codifica uma<br />

proteína zíncica cujo produto pode,<br />

portanto, atuar como fator de transcrição.<br />

(FAUCI, et al 1998) descreveu<br />

que este gene possui 22 exons codificantes<br />

e 2 exons não-codificantes,<br />

estendendo-se por cerca de 100 kb<br />

de seqüência genômica. Seu produto<br />

é uma proteína de 1.863 aminoácidos.<br />

O BRCA2, localizado no cromos-somo<br />

13q12-q13, está associado<br />

com uma maior incidência de câncer<br />

da mama em homens do que em<br />

mulheres, (FAUCI, et al 1998). Este<br />

gene possui 27 exons dispersos por<br />

70 kb de DNA genômico, e seu transcrito<br />

estende-se por cerca de 10 à 12<br />

kb codificando para uma proteína de<br />

3.418 aminoácidos.<br />

Acredita-se que o BRCA1 e o<br />

BRCA2 se comportam como genes<br />

supressores de tumores clássicos, e<br />

que com a perda de uma cópia predispõem<br />

o portador ao desenvolvimento<br />

do câncer (BAST, et al. 2000).<br />

WOOSTER, et al. (1994), estudaram<br />

o acoplamento do genoma em<br />

15 famílias com alto risco de câncer<br />

de mama no BRCA1 em 17q21. Esta<br />

análise descobriu um segundo lugar<br />

suscetível ao câncer de mama, o<br />

BRCA2 no cromossomo 13q12–q13.<br />

O estudo em BRCA2 confere um alto<br />

risco de câncer de mama e não confere<br />

um risco substancialmente elevado<br />

de câncer ovariano, como é o<br />

risco do BRCA1.<br />

Várias pesquisas indicaram uma<br />

associação entre BRCA1 e a proteína<br />

p53, e o encarecimento subseqüente<br />

de atividade de p53 incrimina BRCA1.<br />

O BRCA1 forma complexos com<br />

BRCA2 e Rad 51, que é homólogo do<br />

gene Rec A da E. coli em humanos e<br />

que é essencial à recombinação normal<br />

e estabilidade do genoma (BAST,<br />

et al 2000).<br />

O BRCA1 também pode fazer<br />

um papel de regulação na transcri-<br />

ção, controle do ciclo celular e desenvolvimento.<br />

O BRCA1 foi associado<br />

com a RNA polimerase holoenzima<br />

32 e fita CREB33, que implica na<br />

regulação de transcrição.<br />

Em uma mulher que desenvolve<br />

câncer de mama, antes dos 40 anos, a<br />

chance que ela leva uma mutação em<br />

BRCA1 pode ser tão alta quanto 10%.<br />

O que não é aplicado para BRCA2,<br />

que pode ser associado a uma idade<br />

ligeiramente mais elevada.<br />

A prevalência de certas mutações<br />

de BRCA1 e BRCA2 é ocasionalmente<br />

mais alta que o esperado,<br />

devido à transmissão aumentada de<br />

algumas mutações, em certas populações,<br />

devido ao efeito do fundador<br />

(BAST, et al. 2000).<br />

Foram identificadas mutações de<br />

fundador características para BRCA1<br />

e BRCA2 em famílias de Judeus<br />

Ashkenazi e de descendentes na Islândia,<br />

Finlândia, Hungria, Rússia,<br />

França, Holanda, Bélgica, Suécia, Dinamarca<br />

e Noruega. A maioria dos<br />

estudos realizados em BCRA1 e<br />

BCRA2 foram feitos em caucasóides<br />

dos Estados Unidos e Europa (BAST,<br />

et al. 2000).<br />

Significantemente, existem menos<br />

dados sobre as taxas de muta-<br />

Tabela<br />

1:<br />

Quadro<br />

comparativo<br />

mostrand<br />

o as<br />

propriedades<br />

e funções<br />

dos<br />

genes<br />

BRCA1<br />

e BRCA2<br />

BCRA1 BCRA2<br />

Cromo s<br />

omo<br />

17q21 13q12<br />

Gene 100kb 70kb<br />

Prote ína<br />

1.<br />

863<br />

amino<br />

ácidos<br />

Compo<br />

nente<br />

da<br />

holoen<br />

zima<br />

RNA-polime<br />

rase<br />

3.<br />

418<br />

amino<br />

ácidos<br />

Funçã o<br />

Supre<br />

s<br />

or<br />

tumo<br />

ral<br />

Inter<br />

age<br />

com<br />

Supre<br />

ssor<br />

tumo<br />

ral<br />

Inter<br />

age<br />

com<br />

prot<br />

eínas<br />

nucle<br />

ares<br />

Possí<br />

vel<br />

papel<br />

no<br />

prot<br />

eínas<br />

nucle<br />

aresP<br />

ossív<br />

el<br />

papel<br />

no<br />

repa<br />

ro<br />

do<br />

DNA<br />

repa<br />

ro<br />

do<br />

DNA<br />

Mutaçõ es<br />

> 500<br />

identi<br />

ficadas<br />

> 200<br />

identi<br />

ficadas<br />

Risc o de<br />

cânce<br />

r de<br />

mama<br />

Mais de<br />

70%<br />

aos<br />

80<br />

anos<br />

de<br />

idade<br />

Mais<br />

de<br />

60%<br />

aos<br />

70<br />

anos<br />

de<br />

idade<br />

Idade de<br />

iníci<br />

o<br />

Idade<br />

mais<br />

jovem<br />

( quart<br />

a á quinta<br />

década<br />

de<br />

vida)<br />

50<br />

anos;<br />

mais<br />

idosa<br />

do<br />

que<br />

o BCRA1.<br />

Risc o de<br />

outro<br />

s tumo<br />

res<br />

Risc<br />

o de<br />

cânce<br />

r ovari<br />

ano<br />

de<br />

30-60%<br />

aos<br />

Câncer<br />

de<br />

mama<br />

masc<br />

ulina<br />

, ovári<br />

o,<br />

70<br />

anos<br />

de<br />

idade<br />

Próst<br />

ata,<br />

cólon.<br />

bexig<br />

a,<br />

prós<br />

tata,<br />

pâncr<br />

eas.<br />

Mutaçõ<br />

es<br />

no<br />

cânce<br />

r não<br />

-<br />

famil<br />

iar<br />

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ente.<br />

muta<br />

ções<br />

especí<br />

ficas.<br />

Fonte<br />

: COTRAN,<br />

R.<br />

S.<br />

; KUMAR,<br />

V.<br />

; COLLINS,<br />

T.<br />

2001.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 57


ções de BRCA1 e BRCA2 em famílias<br />

de outros grupos étnicos e raciais<br />

(BAST, et al 2000).<br />

TRAVTIGIAN, et al (1996), observaram<br />

como o BRCA1, a proteína<br />

de BRCA2 é altamente carregada,<br />

¼ dos resíduos é ácido ou básico.<br />

Porém, havia poucas pistas sobre<br />

a função bioquímica de BRCA2.<br />

Foram observados níveis mais altos<br />

de expressão em mama e timo, e<br />

ligeiramente níveis mais baixos em<br />

pulmão, ovário e baço. Em estudo<br />

de 18 famílias, em 9 foi observado<br />

a deleção de 3 nucleotídeos que<br />

altera a armação de leitura, e conduzem<br />

a mutilação da proteína<br />

BRCA2. Os autores notaram que o<br />

BRCA2 é notavelmente semelhante<br />

a BRCA1. Ambos possuem o exon<br />

11 grande; em ambos a tradução<br />

começa no exon 2; ambos têm sucessões<br />

de codificação que são ricas<br />

em Adenina; e são compostos<br />

de aproximadamente 70 Kb de Dna<br />

genômico. O BRCA2 é composto de<br />

27 exons.<br />

WEBER, et al. (1996), estudaram<br />

3 exons de BRCA2 ( exons 10, 11 e<br />

27) em 69 amostras aleatórias de<br />

tumor de mama congelados. Eles<br />

identificaram uma mutação somática<br />

truncada de BRCA2 em carcinoma<br />

ductal primário: deleção de 1 par de<br />

bases e substituídas pela adição de 9<br />

aminoácidos modernos e terminação<br />

da tradução no códon 894.<br />

CONNOR, et al. (1997), em seus<br />

estudos com ratos observaram que o<br />

BRCA1 e BRCA2 são altamente expressos<br />

proliferando células ao limite<br />

de G1/S do ciclo celular da mama<br />

comum vistos em pacientes com<br />

mutações nestes genes, sugere que<br />

BRCA1 e BRCA2 possam estar agindo<br />

no mesmo tempo.<br />

SARAN, et al. (1997), identificaram<br />

uma interação de proteína de<br />

BRCA2 com a proteína de DNA conserto<br />

Rad51. DAVIS, et al. (2001)<br />

mostrou que o BRCA2 faz um papel<br />

duplo na regulação da Rad51, que é<br />

uma proteína essencial para a recombinação<br />

homóloga e conserto de DNA.<br />

Primeiramente, as interações de<br />

Rad51 e o BCR3, ou regiões de BCR4<br />

do BRCA 2, bloqueiam a formação de<br />

filamentos nucleoprotéicos por<br />

Rad51. Alterações para a região de<br />

BCR3 que imitam mutações associa-<br />

das ao câncer de BRCA2 não exibem<br />

este efeito.<br />

Em segundo, o transporte de<br />

Rad51 para o núcleo estava defeituoso<br />

em células que carregam uma<br />

mutação associada ao câncer de<br />

BRCA2. Assim, BRCA2 regula a localização<br />

intracelular e a habilidade de<br />

ligação de DNA de Rad51.<br />

STRUEWING, et al. (1997), estudaram<br />

120 portadoras de mutações<br />

em BRCA1 e BRCA2. As mutações<br />

em BRCA1 estudadas eram 185delAG,<br />

e 5382insC; a mutação de BRCA2<br />

estudada era 6174delT. O risco calculado<br />

de câncer de mama em pacientes<br />

com até 70 anos era de 56%, de<br />

câncer ovariano 16%; e de câncer de<br />

próstata 16%, não havia diferença<br />

significante no risco de câncer de<br />

cólon entre os parentes dos portadores.<br />

Concluíram que de 2% de Judeus<br />

Ashkenazi levam mutações em<br />

BRCA1 e BRCA2, o que confere um<br />

risco aumentado de câncer de mama,<br />

ovário e próstata.<br />

NEUHAUSEN, et al. (1998), analisaram<br />

famílias Judias e identificou 3<br />

mutações mais freqüentes, possivelmente<br />

através do efeito do fundador<br />

que são: 185del AG e 5832 ins C em<br />

BRCA1 e 6174 del T em BRCA2.<br />

JERNISTON, et al. (1999), concluíram<br />

em seus estudos que os portadores<br />

do BRCA1 e mutações do<br />

BRCA2, que têm filhos, estão mais<br />

suscetíveis a desenvolverem câncer<br />

de mama, antes dos 40 anos, que as<br />

portadoras que são nulíparas. Cada<br />

gravidez aumenta o risco de desenvolver<br />

câncer de mama.<br />

As mutações da linhagem germinativa<br />

do BRCA1 são responsáveis<br />

por 2% a 4% de todos os cânceres<br />

mamários. Embora mais que 90%<br />

deles sejam casos esporádicos, ocorrendo<br />

em mulheres sem evidências<br />

de susceptibilidade hereditária, análises<br />

de espécies de tumores mamários<br />

sugerem que anormalidades<br />

somáticas adquiridas no BRCA1 possam<br />

também desempenhar um papel<br />

em muitos desses cânceres (CROOP,<br />

et al. 1990).<br />

FODOR, et al. (1998) determinando<br />

a freqüência do BRCA1 comum<br />

e mutações de BCRA2: 185 del<br />

AG, 5382 ins C e 6174 del T, o DNA<br />

foi analisado para as 3 mutações<br />

através de hibridização de oligonu-<br />

58 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

cleotídeos alelo–específicos (ASO).<br />

Oito pacientes (3%) eram heterozigotos<br />

para a mutação 185 del AG,<br />

dois pacientes (0,75%) para 5382 ins<br />

C e oito pacientes (3%) para 6174<br />

del T. O risco vitalício para câncer<br />

de mama em Judeus Ashkenazi portadores<br />

do BCRA1 185del AG ou<br />

BRCA2 6147 del T foram calculadas<br />

para ser 36%, aproximadamente 3<br />

vezes o risco global para a população<br />

em geral.<br />

Na Austrália, BAHAR, et al.<br />

(2001), encontraram em Judeus<br />

Ashkenazi a mesma prevalência alta<br />

de 4 mutações do fundador, da mesma<br />

forma que acha em Judeus<br />

Ashkenazi nos Estados Unidos e Israel.<br />

As quatro mutações analisadas era<br />

185 del AG e 5182 ins C em BRCA1;<br />

6174 del T em BRCA2 e 11307K em<br />

APC.<br />

STRUEWING, et al. (1995) declarou<br />

que mais de 50 mutações sem<br />

igual tinham sido descobertas no gene<br />

BRCA1, em indivíduos com câncer<br />

de mama e ovário. Em genealogias<br />

de alto risco, portadoras femininas<br />

de uma mutação de BRCA1 tiveram<br />

80 a 90% de risco vitalício em câncer<br />

de mama e 40 a 50% de risco de<br />

câncer de ovário.<br />

STRUEWING, et al. (1995), determinaram<br />

a freqüência da mutação<br />

185 del AG em 858 Ashkenazi, que<br />

buscam prova genética para condições<br />

sem conexão para câncer, e em<br />

815 pessoas de referência não selecionadas<br />

pela origem étnica. Eles acharam<br />

a mutação 185 del AG em 0,9%<br />

de Ashkenazi . Os resultados sugeriam<br />

que 1/100 mulheres de descendência<br />

Ashkenazi possam ter alto<br />

risco de desenvolver câncer de mama<br />

ou ovário.<br />

Entre as 39 mulheres Judias com<br />

câncer de mama antes dos 40 anos,<br />

(FITZ, et al. 1996) acha que 8 (2%)<br />

carregam a mutação 185 del AG.<br />

Em câncer de mama esporádico,<br />

(THOMPSON, et al. 1995) acha o<br />

RNAm do BRCA1 em níveis notadamente<br />

diminuídos durante a transcrição<br />

de carcinoma in situ para câncer<br />

invasivo.<br />

THOMPSON, et al. (1995), acharam<br />

que aquela inibição experimental<br />

da expressão de BRCA1 com oligonucleotídeos<br />

antisense produziu<br />

crescimento acelerado de células nor-


mais e células malignas, mas não<br />

teve nenhum efeito em células<br />

epiteliais não mamárias. Eles interpretaram<br />

estes resultados como indicado<br />

que o BRCA1, normalmente<br />

pode servir como um regulador negativo<br />

de crescimento de células<br />

epiteliais mamárias.<br />

HEDENFALK, et al. (2001),<br />

usando a tecnologia de microarray<br />

para determinar a expressão de<br />

genes em câncer de mama, foi achado<br />

BRCA1 positivos como constatado<br />

com cânceres de mama BRCA2<br />

positivos. A suspeita de que uma<br />

diferença poderia ser achada veio<br />

do fato que os 2 tipos de tumores<br />

são freqüentemente distintos,<br />

histologicamente. Além disso, tumores<br />

com mutações de BRCA1 são<br />

geralmente negativos para estrógeno<br />

e receptores de progesterona,<br />

considerando que a maioria dos<br />

tumores, com mutações de BRCA2,<br />

é positivo para receptores de<br />

hormônios. Amostras de RNA de<br />

tumores primários de 7 portadores<br />

da mutação de BCRA1 e 7 portadores<br />

da mutação de BCRA2 foi com<br />

um microarray de 6.512 clones de<br />

cDNA de 5.361 genes.<br />

ROA, et al. (1996), observaram a<br />

mutação 185 del AG em 1,09% de<br />

aproximadamente 3000 Judeus<br />

Ashkenazi, e a mutação 5382 ins C<br />

em 0,13%, a análise do BCRA2 em<br />

3.058 indivíduos da mesma população<br />

mostraram uma freqüência de<br />

portador de 1,52% pela 6174 del T.<br />

Estes dois alelos são os mais freqüentes,<br />

que predispõem o câncer de<br />

mama hereditário entre Judeus<br />

Ashkenazi .<br />

BAR–SADE, et al. (1997), em<br />

estudo com 639 Judeus Iraquianos<br />

saudáveis, que são um grupo de<br />

pouco risco para a mutação 185 del<br />

AG, que é predominantemente em<br />

Ashkenazi, foram identificados 3 indivíduos<br />

portadores da mutação 185<br />

del AG . As análises de haplótipo<br />

iraquiano mostram que 2 compartilham<br />

um haplótipo em comum com 6<br />

portadores Ashkenazi, e um terço<br />

teve um haplótipo que diferiu por um<br />

único marcador. Isto sugeriu que a<br />

mutação 185 del AG do BCRA1 pode<br />

ter sugerido antes da dispersão das<br />

pessoas judias no Diáspora, pela<br />

mesma época de Cristo.<br />

Alelos mutantes de genes<br />

supressores de tumores, quando herdados,<br />

predispõem os indivíduos a<br />

tipos particulares de câncer. Além<br />

de um envolvimento na suscetibilidade<br />

herdada para câncer, estes<br />

genes de supressão tumoral são<br />

objetivos para mutações somáticas<br />

em tipos de câncer esporádicos. Uma<br />

exceção é o BRCA1, que contribui<br />

com uma fração significante de câncer<br />

de mama e ovário, mas sofre<br />

mutação a taxas baixas em câncer<br />

de mama e ovário esporádicos. Este<br />

achado sugere que outros genes<br />

possam ter como objetivo principal<br />

causar mutações somática em carcinoma<br />

de mama. O outro gene BRCA2<br />

conta, neste estudo, com uma proporção<br />

quase igual a do BRCA1. O<br />

BRCA1 e o BRCA2 se comportam de<br />

forma dominante, tendo em vista<br />

que herda um alelo mutante e têm<br />

um risco maior de desenvolver um<br />

tumor; tumores que eles desenvolverem<br />

perdem o alelo do tipo selvagem<br />

através da perda da heterogozidade.<br />

(TENG, et al. 2002.)<br />

STEPHENSON, em (2003), estudou<br />

mulheres com mutações no<br />

BRCA1 e BRCA2, que têm um risco<br />

mais elevado de desenvolverem câncer<br />

de mama, se fizeram uso de<br />

métodos contraceptivos orais, por,<br />

pelo menos, 5 anos ou antes de 1975<br />

(quando preservativos orais geralmente<br />

tinham um conteúdo de estrógeno<br />

mais alto que os produzidos<br />

depois). Estas têm um risco vitalício<br />

de 50 a 80% de desenvolverem câncer<br />

de mama. O estudo contou com<br />

1<strong>31</strong>1 pares de mulheres que eram<br />

portadoras de mutações danosas, em<br />

um ou ambos genes, a metade de<br />

quem teve câncer de mama e a metade<br />

de quem não tiveram.<br />

LLORT, et al. (2002), em seus<br />

estudos com pacientes espanholas,<br />

analisando mutações em BRCA1 e<br />

BRCA2 têm uma proporção hereditária<br />

significativa baixa, no que diz<br />

respeito ao câncer de mama. O espectro<br />

mutacional nestes genes é muito<br />

grande, com centenas de mutações de<br />

BRCA diferentes mundialmente informadas.<br />

Mutações devido ao efeito do<br />

fundador têm uma fração significativa<br />

de todas as mutações de grupos étnicos.<br />

Em estudo com 35 famílias espanholas<br />

que desenvolveram câncer de<br />

ovário e mama, foram achadas 13<br />

mutações, das quais se tinham notícias<br />

de apenas 3, na Espanha. As dez<br />

mutações modernas são: IVS5+1G>A,<br />

1491delA Leu 1086 Ter, e Gln 895Ter<br />

em BRCA1; Glu 49 Ter, 5373del GTAT,<br />

5947del CTCT, 6672 del TA, 8281 ins<br />

A, e Pro 3039 Leu em BRCA2. Este<br />

estudo, comparado com outros realizados<br />

no país, mostra que das várias<br />

mutações encontradas na Espanha,<br />

nenhuma parece ter relação, com efeito,<br />

do fundador.<br />

KUMAR, et al. (2002), analisaram<br />

a sucessão de codificação do<br />

gene BRCA1 e BRCA2 em 14 pacientes<br />

de câncer de mama hereditário<br />

em mulheres Indianas. A análise foi<br />

realizada em gel de eletroforese sensível<br />

(CSGE), seguido de seqüenciamento.<br />

Três mutações delas modernas<br />

no exon 7, enquanto a outra é um<br />

apagamento de par básico no exon<br />

11 que resulta em mutilação de proteína.<br />

A mutação 185 del AG, previamente<br />

descrita, em Judeus Askenazi,<br />

também foi encontrada nesta população.<br />

Mesmo este sendo o 1º estudo<br />

realizado com famílias da Índia (14<br />

no total) sugestiona uma baixa<br />

prevalência, mas com um envolvimento<br />

definitivo de mutações no<br />

gene BCRA1, entre mulheres Indianas<br />

com câncer de mama.<br />

A população do Paquistão possui<br />

uma taxa de câncer de mama<br />

extremamente alta para populações<br />

Asiáticas e uma das taxas mais altas,<br />

mundialmente, do câncer ovariano.<br />

Neste estudo com 341 casos de câncer<br />

de mama, 120 casos de câncer<br />

ovariano e 200 controles femininos.<br />

A prevalência de mutações no BRCA1<br />

e BRCA2 em pacientes com câncer<br />

de mama são de 6,7%, de câncer<br />

ovariano são 15,8%. Mutações no<br />

gene BRCA1 respondem por 84% das<br />

mutações de câncer ovariano e 65%<br />

das mutações de câncer de mama. A<br />

maioria das mutações descobertas<br />

são novas para o Paquistão. Cinco<br />

mutações de BRCA1: 2080 ins A,<br />

3889 del AG, 4184 del 4, 4284 del AG,<br />

e IVS14 – 1A>G , e uma mutação de<br />

BRCA2 3337C>T, foram encontradas<br />

em múltiplos casos e representam<br />

fortes candidatos ao efeito do fundador,<br />

segundo (LIEDE, et al. 2002).<br />

TERESCHENKO, et al. (2002), estudaram<br />

25 famílias Russas com cân-<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 59


cer de mama e ovário, onde analisaram<br />

mutações nos genes BRCA1 e<br />

BRCA2, usando análise de heteroduplex<br />

e multiplex. Além disso, foram<br />

testadas 22 pacientes com câncer de<br />

mama diagnosticados antes dos 40<br />

anos, sem história familiar e 6 pacientes<br />

com câncer de mama bilateral. A<br />

freqüência de mutações no BRCA1<br />

era de 16%. Uma mutação de BRCA1,<br />

5382 ins C, foi achada em 3 famílias.<br />

Este estudo juntamente com outro<br />

sugere que 5382 ins C no BRCA1 é<br />

uma mutação de fundador na população<br />

Russa. No BRCA2 foram encontradas<br />

3 mutações em pacientes com<br />

câncer de mama sem história familiar,<br />

2 em pacientes jovens e 1 em pacientes<br />

com câncer bilateral. Foram encontradas<br />

4 mutações modernas : 695<br />

ins T, 1528 del 4, 9<strong>31</strong>8 del 4, S1099X.<br />

No ano de 2000 foram diagnosticados<br />

quase 80.000 casos novos de<br />

câncer de mama na Índia. Embora a<br />

identificação de BRCA1 e BRCA2 aumentou<br />

a compreensão na genética<br />

do câncer de mama em populações de<br />

descendência da Europa Ocidental, o<br />

papel destes genes no restante da<br />

população indiana é inexplorado. A<br />

análise de 20 pacientes com câncer de<br />

mama com qualquer história familiar,<br />

ou idade precoce, conduziu a identificação<br />

de duas variantes (3<strong>31</strong>+1G>T;<br />

4476+2T>C) em BRCA1 (10%)<br />

(SAXENA, et al. 2002).<br />

RUIZ, et al. (2002), analisaram<br />

heteroduplex de pacientes mexicanos<br />

com câncer de mama, onde<br />

identificaram mutação truncada em<br />

BRCA1 e BRCA2 (3857 del T; 2663 –<br />

2664 ins A) e oito variantes raras de<br />

significação desconhecida, principalmente<br />

no gene BRCA2, um caso<br />

de câncer de mama masculino também<br />

foi identificada. A maioria das<br />

alterações parecia ser distinta com<br />

uma única observada em mais de<br />

uma família.<br />

LIEDE, et al. (2002), encontraram<br />

duas famílias de descendência<br />

aborígines, ambas com as mesmas<br />

alterações de BRCA1 (1510 ins G;<br />

1506 A>G). As famílias representam<br />

duas Aborígines de tribos canadenses,<br />

embora uma origem ancestral<br />

comum é provável. Esta é a primeira<br />

evidência de uma mutação de BRCA1,<br />

específica para pessoas aborígines<br />

do Norte da América.<br />

A detecção de mutações nos genes<br />

BRCA1 e BRCA2 é feita por técnicas de<br />

biologia molecular capazes de identificar<br />

a alteração de uma única base na<br />

seqüência de DNA. Devido ao grande<br />

tamanho das seqüências de BRCA1 e 2,<br />

primeiramente, busca-se identificar qual<br />

exon contém o sítio mutado, antes de<br />

se proceder ao sequenciamento do<br />

DNA. A seqüência de DNA correspondente<br />

aos vários exons é amplificada<br />

por PCR (reação em cadeia da polimerase)<br />

para a realização desses testes.<br />

Para o screening inicial de mutações,<br />

uma técnica muito utilizada é a<br />

de single strand conformation<br />

polymorphism - SSCP, combinada<br />

com heteroduplex analysis. A técnica<br />

de SSCP baseia-se no fato de que a<br />

conformação tridimensional de fragmentos<br />

de DNA de fita simples<br />

depende da seqüência de nucleotídeos,<br />

sendo que a diferença de um<br />

nucleotídeo altera o padrão de migração<br />

eletrofo-rética. A técnica de<br />

heteroduplex analysis deriva da observação<br />

de que, em reações de PCR,<br />

onde estão presentes moléculas de<br />

DNA selvagens e mutantes, durante<br />

os últimos ciclos, podem ser formados<br />

heteroduplex entre essas duas<br />

espécies de moléculas, os quais terão<br />

um padrão de migração eletroforética<br />

diferente dos homoduplexes. Utilizando-se<br />

fragmentos de tamanho entre<br />

100 e 350 pares de bases, a taxa de<br />

detecção de mutações para o SSCP<br />

como para o heteroduplex analysis, e<br />

a associação dos dois métodos pode<br />

elevar essa taxa para perto de 100%<br />

(sob condições bem controladas e<br />

processamento semi-automatizado).<br />

Após a identificação do exon,<br />

que a abriga a mutação, esta é caracterizada<br />

pelo sequenciamento do<br />

DNA. Conhecida a mutação, torna-se<br />

possível, também, por sequenciamento,<br />

pesquisá-lo em outros membros<br />

da família do paciente, com vistas ao<br />

aconselhamento genético.<br />

9. Discussão<br />

Com a identificação dos dois<br />

principais genes responsáveis pelo<br />

câncer de mama hereditário, o BRCA1<br />

e o BRCA2, a genética deu um grande<br />

salto em busca da cura de doenças<br />

que são estritamente comuns e que<br />

mais matam mulheres.<br />

60 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Em muitas populações, algumas<br />

mutações tornam-se mais freqüentes<br />

devido ao efeito do fundador. Uma<br />

das populações que teve suas mutações<br />

amplamente estudadas foi o de<br />

Judeus Askenazi, onde cerca de 2%<br />

da população leva mutações em<br />

BRCA1 e BRCA2 o que confere um<br />

risco aumentado de câncer de mama,<br />

ovário e próstata.<br />

Em Judeus Askenazi, as principais<br />

mutações encontradas devido<br />

ao efeito do fundador e que já<br />

foram descritas em inúmeros países,<br />

são a 185 del AG e 5382 ins C<br />

no gene BRCA1, e no BRCA2 a 6174<br />

del T. A prevalência alta destas<br />

mutações de fundador na linhagem<br />

germinativa são responsáveis por<br />

2% a 4% de todos os tipos de câncer<br />

mamário.<br />

Em pacientes Espanholas, das<br />

inúmeras mutações já analisadas em<br />

BRCA1 e BRCA2 tem uma proporção<br />

hereditária significativa baixa. A comparação<br />

com outros estudos realizados<br />

no país mostra que nenhuma tem<br />

relação, com efeito, do fundador.<br />

Em mulheres indianas, 3 mutações<br />

modernas foram encontradas e<br />

a 185 del AG foi amplamente encontrada.<br />

Existe uma baixa prevalência,<br />

mas com um envolvimento definitivo<br />

de mutações no gene BRCA1.<br />

No Paquistão, dentre as muitas<br />

mutações já descritas, a 3337 C>T no<br />

BRCA2 representam uma forte<br />

candidata ao efeito do fundador.<br />

Na Rússia, a mutação no BRCA1<br />

5382 ins C foi caracterizada por ser<br />

uma mutação de fundador, e tribos<br />

do Canadá também têm 2 mutações<br />

que são estritamente freqüentes.<br />

A identificação de portadoras de<br />

mutações BRCA1 está limitada a um<br />

número contado de laboratórios, com<br />

acesso para raras famílias, na qual a<br />

análise de vários parentes oferece<br />

informação suficiente para identificar<br />

carreadores com um alto grau de<br />

certeza. Com base na taxa de<br />

carreadoras de uma em 200 a 400<br />

mulheres, a demanda para um<br />

rastreamento populacional será provavelmente<br />

substancial.<br />

A atenção deve ser voltada para<br />

os riscos sociais do teste genético,<br />

como potencial perda de seguro,<br />

estigmatização e discriminação do<br />

empregado.


Uma vez que o gene BRCA1 e<br />

BRCA2 tenham sido identificados e<br />

um teste clínico para mutações comuns<br />

esteja disponível, os problemas<br />

levantados no aconselhamento<br />

de uma única família irão assumir<br />

enormes proporções. A prevalência<br />

de carreadoras de mutações BRCA1,<br />

com um risco de aproximadamente<br />

85% de desenvolverem câncer de<br />

mama, em muito excedem a incidência<br />

de qualquer outra doença<br />

genética para qual o rastreamento<br />

pré-sintomático esteja atualmente<br />

disponível.<br />

O rastreamento para mutação<br />

BRCA1 é provavelmente o 1º teste<br />

pré-sintomático que terá lugar na<br />

prática clínica geral, e um sucesso<br />

ou falha desses esforços trará um<br />

grande impacto no futuro deste campo,<br />

com todo o seu potencial para o<br />

avanço da medicina preventiva,<br />

evitando doenças e reduzindo os<br />

custos da saúde. Tem-se a esperança<br />

de que, com o rastreamento genético,<br />

a suscetibilidade ao câncer<br />

de mama, muitas armadilhas possam<br />

ser evitadas.<br />

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Pesquisa<br />

Márcia Nitschke<br />

Doutoranda em <strong>Ciência</strong> de Alimentos<br />

Faculdade de Engenharia de Alimentos – UNICAMP<br />

nitschke@bol.com.br<br />

Gláucia Maria Pastore<br />

Prof a Dr a - Laboratório Bioquímica de Alimentos<br />

Faculdade de Engenharia de Alimentos – UNICAMP<br />

glaupast@fea.unicamp.br<br />

Ilustrações cedidas pelos autores<br />

Biosurfatantes a partir de<br />

resíduos agroindustriais<br />

Avaliação de resíduos agroindustriais como substratos para a produção de biosurfatantes por Bacillus<br />

Introdução<br />

Os surfatantes constituem uma<br />

classe importante de compostos químicos<br />

amplamente utilizados em diversos<br />

setores industriais. Estima-se<br />

que a produção mundial de surfatantes<br />

exceda 3 milhões de toneladas<br />

por ano (Banat, 2000), sendo utilizados<br />

principalmente como matériaprima<br />

na fabricação de detergentes<br />

de uso doméstico.<br />

A grande maioria dos surfatantes<br />

disponíveis comercialmente é<br />

sintetizada a partir de derivados de<br />

petróleo. Entretanto, o crescimento<br />

da preocupação ambiental dos consumidores<br />

combinado com novas<br />

legislações de controle do meio ambiente<br />

levaram os cientistas a<br />

pesquisar surfatantes biológicos<br />

como alternativa para os produtos<br />

existentes.<br />

Os biosurfatantes produzidos<br />

por microrganismos vêm, nos últimos<br />

anos, despertando considerável<br />

interesse devido à sua natureza<br />

biodegradável, baixa toxicidade e<br />

diversidade de aplicações. Entre as<br />

aplicações comerciais dos biosurfatantes<br />

destacam-se a recuperação<br />

do petróleo, biorremediação de<br />

poluentes, formulação de lubrificantes,<br />

além de diferentes utilizações<br />

na indústria têxtil, cosmética, alimentícia<br />

e farmacêutica.<br />

Atualmente, os biosurfatantes<br />

ainda não são amplamente utilizados<br />

pela indústria, devido ao seu alto<br />

custo de produção, associado a métodos<br />

ineficientes de recuperação do<br />

produto e ao uso de substratos caros.<br />

Porém, o problema econômico da<br />

produção de biosurfatantes pode ser<br />

significativamente reduzido por meio<br />

do uso de fontes alternativas de nutrientes<br />

facilmente disponíveis e de<br />

baixo custo.<br />

Uma possível alternativa para<br />

a produção de biosurfatantes seria<br />

o uso de subprodutos agrícolas ou<br />

de processamento industrial. Atualmente,<br />

o aproveitamento de resíduos<br />

vem sendo incentivado por<br />

contribuir para a redução da poluição<br />

ambiental, bem como por permitir<br />

a valorização econômica dos<br />

resíduos que seriam simplesmente<br />

descartados.<br />

O que são biosurfatantes?<br />

Os biosurfatantes possuem uma<br />

estrutura comum: uma porção<br />

lipofílica, usualmente composta por<br />

cadeia hidrocarbonada de um ou mais<br />

ácidos graxos, que podem ser<br />

saturados, insaturados, hidroxilados<br />

ou ramificados, ligados a uma porção<br />

hidrofílica, que pode ser um éster,<br />

um grupo hidróxi, fosfato, carboxilato<br />

ou carbohidrato (Cameotra & Makkar,<br />

1998; Bognolo, 1999). Os microrganismos<br />

produtores distribuem-se em<br />

diversos gêneros, sendo a maioria<br />

produzida por bactérias. As principais<br />

classes de biosurfatantes incluem<br />

glicolipídios, lipopeptídios e<br />

lipoproteínas; fosfolipídios e ácidos<br />

graxos; surfatantes poliméricos e surfatantes<br />

particulados (Desai &<br />

Desai,1993).<br />

Em relação aos surfatantes convencionais,<br />

os biosurfatantes apre-<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 63


sentam vantagens como (Bognolo,<br />

1999):<br />

• elevada atividade superficial e<br />

interfacial, o que os torna comparáveis<br />

ou superiores aos sintéticos<br />

(detergentes aniônicos<br />

sulfatados) em termos de<br />

efetividade e eficiência;<br />

• maior tolerância a pH, temperatura<br />

e força iônica;<br />

• biodegradabilidade;<br />

• baixa toxicidade.<br />

Os biosurfatantes apresentam<br />

ainda a vantagem de poder ser sintetizados<br />

a partir de substratos<br />

renováveis e de possuir grande diversidade<br />

química, possibilitando<br />

aplicações específicas para cada caso<br />

particular (Desai & Banat, 1997).<br />

Outra vantagem dos biosurfatantes<br />

reside no fato de não serem compostos<br />

derivados de petróleo, fator<br />

importante à medida que os preços<br />

do petróleo aumentam. Além disso,<br />

a estrutura química e as propriedades<br />

físicas dos biosurfatantes podem<br />

ser modificadas através de manipulações<br />

genéticas, biológicas ou<br />

químicas, permitindo o desenvolvimento<br />

de novos produtos para necessidades<br />

específicas.<br />

Substratos não convencionais<br />

O sucesso da produção industrial<br />

de biosurfatantes depende do<br />

desenvolvimento de processos mais<br />

baratos e do uso de matérias-primas<br />

de baixo custo, uma vez que estas<br />

representam entre 10% a 30% do<br />

custo total (Cameotra & Makkar,<br />

1998). Apesar disso, poucos trabalhos<br />

têm sido publicados com vistas<br />

a produzir biosurfatantes a partir de<br />

resíduos (Tabela 1). A dificuldade<br />

na seleção de um resíduo está em<br />

encontrar a composição adequada<br />

de nutrientes que permita o crescimento<br />

celular e o acúmulo do produto<br />

de interesse. Em geral, substratos<br />

agroindustriais que contenham<br />

altos níveis de carbohidratos ou de<br />

lipídeos suprem a necessidade de<br />

fonte de carbono para a produção<br />

de biosurfatantes. O estabelecimento<br />

de um processo biotecnológico a<br />

partir desses substratos alternativos<br />

também apresenta outra dificuldade,<br />

que é a padronização devido às<br />

variações naturais de composição,<br />

bem como os custos de transporte ,<br />

armazenagem e tratamento prévio<br />

necessários. Entretanto, a utilização<br />

de resíduos pode diminuir os custos<br />

de produção para níveis competitivos<br />

em relação aos similares obtidos<br />

por via petroquímica e, ao mesmo<br />

tempo, reduzir os problemas ambientais<br />

relativos ao descarte e aos<br />

custos do tratamento (Mercade &<br />

Manresa, 1994; Makkar & Cameotra,<br />

1999a; Makkar & Cameotra, 2002).<br />

Finalmente, deve-se considerar que<br />

o Brasil é um país essencialmente<br />

agrícola e que, portanto, a quantidade<br />

e a facilidade de acesso aos<br />

subprodutos agroindustriais é bastante<br />

significativa.<br />

64 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Biosurfatantes produzidos por<br />

Bacillus<br />

Algumas bactérias do gênero<br />

Bacillus produzem diversos lipopeptídeos<br />

que demonstram atividade<br />

tensoativa ( Rosenberg & Ron,<br />

1999). As culturas de Bacillus<br />

subtilis produzem um lipopeptídeo<br />

cíclico conhecido como surfactina<br />

ou subtilisina (Arima et al., 1968),<br />

considerado um dos mais potentes<br />

biosurfatantes conhecidos (Figura<br />

1). A surfactina também demonstrou<br />

atividade anticoagulante, antitumoral,<br />

antimicrobiana, e, mais recentemente,<br />

estudos comprovaram<br />

atividade antiviral e antimicoplasma<br />

(Vollenbroich et al, 1997a,<br />

1997b).<br />

O objetivo deste estudo foi verificar<br />

a potencialidade do uso de substratos<br />

alternativos para a produção<br />

de biosurfatante por isolados de<br />

Bacillus.<br />

Materiais e Métodos<br />

Foram utilizados cinco isolados<br />

de Bacillus sp. produtores de<br />

biosurfatante pertencentes à coleção<br />

de culturas do Laboratório de<br />

Bioquímica de Alimentos. Para a<br />

Figura 1. Estrutura da surfactina produzida por Bacillus subtilis.<br />

Tabela<br />

1.<br />

Exemplos<br />

de<br />

utilização<br />

de<br />

resíduo<br />

s na<br />

produção<br />

de<br />

biosurfatan<br />

tes<br />

Substrato s<br />

Classe química<br />

Microrganismo Referência<br />

Efluente extração<br />

óleo<br />

oliva<br />

r hamnolipídeos<br />

Pseudomonas sp.<br />

M ercade<br />

et al.<br />

, 1993<br />

Residuos refino<br />

óleo<br />

de<br />

soja<br />

rhamnolipídeos P. aeruginosa<br />

Abalos et al,<br />

2001<br />

Água lavagem<br />

de<br />

batatas<br />

lipopeptídeos B. subtilis<br />

Fox & Bala, 2000<br />

Melaço lipopeptídeos B. subtilis<br />

Makkar<br />

& Cameotra,<br />

1997<br />

Soro de<br />

leite<br />

rhamnolipídeos P. aeruginosa<br />

Koch et al,<br />

1988<br />

Água de<br />

turfa<br />

lipopeptídeos B. subtilis<br />

Sheppard&<br />

Mulligan<br />

1987<br />

Óleo de<br />

fritura<br />

usado<br />

rhamnolipídeos P. aeruginosa<br />

Haba et al,<br />

2000<br />

Óleo lubrificante<br />

usado<br />

g licolipídeos<br />

Rhodococcus sp.<br />

Mercade et al,<br />

1996<br />

Soro leite<br />

desproteinizado<br />

sophorolipídeos C. bombicola<br />

Daniel et al,<br />

1998<br />

Manipueira lipopeptídeos B. subtilis<br />

Santos et al,<br />

1999


produção de biosurfatante foram<br />

utilizados:<br />

• melaço (3% v/v sólidos solúveis)<br />

pH 6,0;<br />

• manipueira (resíduo líquido<br />

proveniente da fabricação de farinha<br />

de mandioca) pH 5,8-5,9;<br />

• soro de leite (fabricação de<br />

queijo mussarela) pH 6,4 ;<br />

• meio sintético proposto por<br />

Cooper et al. (1981) pH 6,8-6,9.<br />

A manipueira foi tratada previamente<br />

com aquecimento a 100°C,<br />

por 3 minutos e centrifugação a<br />

10.000 rpm, por 20 minutos, para<br />

remoção de sólidos. O pH dos resíduos<br />

não foi ajustado. Os meios<br />

foram esterilizados em autoclave a<br />

121°C, por 20 minutos.<br />

Uma alçada das culturas mantidas<br />

a 4°C foi transferida para erlenmeyer de<br />

50 mL, com 20 mL de caldo nutriente e<br />

incubada em agitador rotatório a 120<br />

rpm, 30°C, por 24 horas. Após, 1 mL de<br />

cada cultura a ser testada foi inoculado<br />

em frascos erlenmeyers de 50 mL contendo<br />

15 mL dos respectivos meios,<br />

que foram incubados em agitador<br />

rotativo tipo shaker a 30°C e 150 rpm,<br />

por 72 horas. Os meios foram centrifugados<br />

a 10.000 rpm, por 15 minutos, e<br />

o sobrenadante, livre de células, utilizado<br />

para determinações analíticas.<br />

A tensão superficial foi determinada<br />

em tensiômetro Krüss, modelo<br />

K12, utilizando o método da placa. O<br />

biosurfatante foi isolado do meio de<br />

cultivo por precipitação ácida a pH<br />

2,0, seguida de extração com clorofórmio/metanol<br />

(65:15), segundo<br />

Makkar & Cameotra (1999b). A atividade<br />

emulsificante (E 24 ) foi realizada<br />

em tubos com tampa rosca contendo<br />

4 mL de solução aquosa, 1mg/mL de<br />

biosurfatante (obtido em manipueira)<br />

adicionados de 6 mL de hidrocarbonetos,<br />

sendo que cada tubo foi submetido<br />

a vortex máximo por 2 minutos<br />

e deixado em repouso por 24<br />

horas. O índice E 24 foi determinado<br />

medindo-se a altura da camada emulsionada<br />

(cm) dividindo-a pela altura<br />

total de líquido x 100. A remoção de<br />

petróleo de areia contaminada foi<br />

testada através da saturação de 60g de<br />

areia com 5 mL de petróleo. Porções<br />

de 20g da areia contaminada foram<br />

Figura 2. Percentagem de redução na tensão superficial obtida por isolados de Bacillus<br />

sp. em diferentes substratos.<br />

Figura 3. Atividade emulsificante (E 24 ) de solução de biosurfatante frente à diferentes<br />

hidrocarbonetos. (1) Hexano, (2) Tolueno, (3) Heptano, (4) Decano, (5) Querosene,<br />

(6) Tetradecano, (7) Hexadecano, (8) Óleo de soja, (9) Gordura de côco.<br />

colocadas em erlenmeyer de 250 mL,<br />

adicionando-se-lhe 20 mL de água<br />

(frasco controle) e 20 mL de solução<br />

aquosa 1mg/mL de biosurfatante obtido<br />

(frasco teste). Os frascos foram<br />

agitados a 150 rpm, por 12 horas em<br />

temperatura ambiente. Retirou-se<br />

deles o líquido da primeira lavagem e<br />

procedeu-se a uma segunda adição de<br />

20 mL de água e biosurfatante, incubando-os<br />

nas mesmas condições acima.<br />

O líquido da segunda lavagem foi<br />

removido e a areia foi retirada do<br />

frasco sendo colocada em estufa a<br />

50°C até a secagem.<br />

Resultados e Discussão<br />

Os resultados obtidos nos ensaios<br />

de produção de biosurfatante em<br />

diferentes substratos alternativos são<br />

mostrados na Figura 2. Nota-se que<br />

todos os isolados testados demonstraram<br />

capacidade de produzir biosurfatante<br />

e, conseqüentemente, de reduzir<br />

a tensão superficial dos meios testados,<br />

sendo que a manipueira forneceu<br />

as maiores percentagens de redução ,<br />

na ordem de 42% , para todos os<br />

isolados testados; entretanto, o soro de<br />

leite apresentou uma redução média<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 65


Figura 4. Capacidade de remoção de petróleo de amostra de areia utilizando solução de biosurfactante.<br />

(1) Biosurfatantes, (2) controle, (3) água.<br />

Tabela<br />

2.<br />

Atividade<br />

emulsificante<br />

do<br />

biosurfatan<br />

te<br />

obtido<br />

em<br />

manipueira<br />

H idrocar<br />

boneto<br />

E24<br />

( % )<br />

Hexano 66,<br />

6<br />

Tolueno 72,<br />

7<br />

Heptano 66,<br />

6<br />

Decano 70,<br />

4<br />

Querosene 70,<br />

4<br />

Tetradeca no<br />

70,<br />

9<br />

Hexadecano 69,<br />

0<br />

Óleo de<br />

soja<br />

74,<br />

0<br />

Gordura e côco<br />

70,<br />

9<br />

Petróleo 69,<br />

0<br />

de 10% , ressaltando que o isolado<br />

LB5a não produziu surfatante nesse<br />

resíduo. O melaço também demonstrou<br />

boa potencialidade como substrato<br />

para produção de biosurfatante pelos<br />

microrganismos testados e apresentou<br />

redução média de, aproximadamente,<br />

33%. O meio sintético utilizado<br />

como padrão foi definido por<br />

Cooper et al. (1981), para a produção<br />

de surfactina por Bacillus subtilis ATCC<br />

21332 e vem sendo utilizado, desde<br />

então, como uma referência para a<br />

produção de biosurfatantes de Bacillus.<br />

Nota-se que, apesar de permitir a produção<br />

de biosurfatante por todos os<br />

isolados, esse meio mostrou resultados<br />

inferiores (com redução média de<br />

21,5%) aos da manipueira e do melaço,<br />

sugerindo que estes dois resíduos<br />

possuem uma composição de nutrientes<br />

adequada para a produção de biosurfatantes.<br />

Embora a composição química<br />

varie de acordo com a época do ano e<br />

com o tipo de cultivar de mandioca, a<br />

manipueira possui em sua composição<br />

uma grande quantidade de carbohidratos<br />

(40-60 g/L ) destacando-se ainda a<br />

presença de frutose, glicose e sacarose,<br />

além de nitrogênio (1-2 g/L) e mine-<br />

rais como P, K, Mg, Mn, S, Fe, Cu, Zn,<br />

Ca (Cereda, 1994). Segundo Cooper et<br />

al. (1981), os sais minerais, principalmente<br />

Fe e Mn, são fatores nutricionais<br />

importantes para a produção de surfatantes<br />

por linhagens de Bacillus. A<br />

presença desses minerais, além de<br />

fontes de carbono e nitrogênio, seja,<br />

provavelmente, o principal motivo de<br />

haver maior produção de biosurfatantes<br />

nesse resíduo.<br />

Em adição à tensão superficial,<br />

a estabilização de emulsões é freqüentemente<br />

utilizada como um indicador<br />

da atividade superficial (Abu-Ruwaida<br />

66 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Figura 5 . Águas de lavagem da areia impregnada com petróleo.<br />

A1-A2: água; BS1-BS2: solução biosurfatante 1mg/mL.<br />

et al, 1991). A capacidade emulsificante<br />

do biosurfatante obtido em manipueira<br />

pelo isolado LB5a foi avaliada através<br />

do índice E 24 com diferentes hidrocarbonetos<br />

(Tabela 2). Os índices obtidos<br />

(60%-80%) revelam alta especificidade<br />

do biosurfatante contra todos os<br />

hidrocarbonetos testados, formando<br />

emulsões estáveis do tipo A/O (Figura<br />

3). O composto obtido possui potencial<br />

para uso na biorremediação, recuperação<br />

de petróleo e emulsificação de<br />

óleos e gorduras.<br />

Com vistas a avaliar a capacidade<br />

do biosurfatante produzido em


manipueira pelo isolado LB5a em remover<br />

petróleo de areia contaminada,<br />

procedeu-se a um experimento<br />

ilustrado nas Figuras 4 e 5, onde se<br />

observa que a areia tratada com solução<br />

de biosurfatante apresenta aspecto<br />

mais claro e as respectivas águas de<br />

lavagem demonstram maior capacidade<br />

de recuperação do petróleo em<br />

relação ao tratamento sem tensoativo.<br />

Conclusões<br />

Entre os resíduos agroindustriais<br />

testados, a manipueira foi que demonstrou<br />

a maior potencialidade para<br />

uso como substrato alternativo na<br />

produção de biosurfatantes por isolados<br />

de Bacillus, sendo que o composto<br />

obtido apresentou capacidade para<br />

uso em biorremediação de poluentes<br />

e em recuperação de petróleo.<br />

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<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 67


Pesquisa<br />

Gabrielle Mouco<br />

Aluna de graduação em Farmácia - UNIP<br />

gabimouco@yahoo.com.br<br />

Maira Jardim Bernardino<br />

Aluna de graduação em Farmácia - UNIP<br />

mjb@ajato.com.br<br />

Melânia Lopes Cornélio, Ph.D<br />

Farmacêutica, Ph.D- Química de Produtos Naturais<br />

Professora Titular da Disciplina de Farmacognosia<br />

UNIP - Universidade Paulista-SP<br />

melaniacornelio@yahoo.com.br<br />

Ilustrações cedidas pelos autores<br />

Controle de qualidade<br />

de ervas medicinais<br />

68 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Controle de qualidade de Phyllanthus niruri L. (quebra-pedra)<br />

Introdução<br />

O controle de qualidade da<br />

droga vegetal é imprescindível,<br />

pois muitas espécies vegetais são<br />

vendidas sem nenhuma garantia<br />

de qualidade, o que favorece desde<br />

a venda de espécies falsificadas<br />

até o armazenamento inadequado<br />

da droga vegetal durante a sua<br />

comercialização. A análise aqui descrita<br />

foi realizado com a droga<br />

vegetal adquirida e conhecida popularmente<br />

como quebra-pedra. O<br />

controle de qualidade dessa droga<br />

vegetal foi feito a começar da sua<br />

descrição microscópica, para verificar<br />

a autenticidade da espécie a<br />

fim de evitar equívocos. Também<br />

foram realizados testes químicos<br />

para confirmar as principais classes<br />

de seus constituintes químicos<br />

descritos na literatura (De Souza<br />

et. al., 2002; Duke, 2000). Os interesses<br />

terapêuticos do Phyllanthus<br />

niruri L. provêm principalmente<br />

de suas propriedades diuréticas<br />

para o combate de cálculos renais.<br />

Devido a isso, estão sendo desenvolvidos<br />

vários estudos para isolar<br />

a substância responsável por tais<br />

propriedades, além de elucidar a<br />

melhor maneira de tratamento<br />

(Teske et. al., 1995).<br />

Estudos experimentais com as<br />

folhas e as sementes também têm<br />

demonstrado a sua ação hipoglicemiante,<br />

antibacteriana e anticancerígena.<br />

Em ensaios especiais, mostrou-se<br />

que é ativa contra o vírus da<br />

hepatite B in vivo e in vitro. Além<br />

disso, possui a virtude de dissolver<br />

cálculos renais, impedindo a contração<br />

do ureter e promovendo a<br />

sua desobstrução. Desenvolve atividade<br />

diurética pela elevação da<br />

filtração glomerular e excreção<br />

urinária dos sais de uratos (Tona et.<br />

al., 2001; Teske et. al., 1995; Ogata<br />

et. al., 1992).<br />

Outro estudo realizado mostrou<br />

o efeito do Phyllanthus niruri<br />

sobre a cristalização do oxalato de<br />

cálcio in vitro. Por meio desse estudo,<br />

pôde-se concluir que o extrato<br />

de quebra-pedra interfere no crescimento<br />

e na agregação dos cristais<br />

na urina humana, sugerindo que<br />

essa planta tem um papel potencial<br />

na prevenção de cálculo renal ou<br />

do desenvolvimento (Barros, 2002;<br />

Freitas et. al., 2002; Campos et. al.,<br />

1999; Dias et. al., 1995).<br />

Materiais e Métodos<br />

1 - Dados da Amostra<br />

A amostra analisada foi adquirida<br />

em uma farmácia comercial e<br />

apresentava as folhas secas em fragmentos<br />

de 0,5 cm a 1,0 cm.<br />

Apresentava uma coloração<br />

esverdeada que indicava que a<br />

amostra havia passado por processo<br />

de secagem.<br />

2 - Controle Físico<br />

Processo de Catação -<br />

Determinação da Pureza<br />

Esse processo visou a avaliar<br />

se a amostra apresentava material


estranho, partículas que não correspondessem<br />

à droga analisada. A<br />

quantidade de amostra analisada<br />

foi de 25 g de material vegetal.<br />

3 - Descrição<br />

microscópica<br />

Os fragmentos da parte da folha<br />

foram submetidos a estudo<br />

histológico, e neles foram realizados<br />

cortes do tipo paradérmico e<br />

transversal<br />

4 - Análise química<br />

As folhas secas foram submetidas<br />

a processos químicos de identificação<br />

das seguintes classes de<br />

constituintes químicos: taninos,<br />

heterosídeos flavanoídicos, heterosídeos<br />

saponínicos, heterosídeo<br />

antraquinônicos, alcalóides e óleos<br />

voláteis (Costa, 2001).<br />

A seguir serão apresentadas as<br />

metodologias dos ensaios de identificação<br />

das classes dos constituintes<br />

químicos mencionados. Vale<br />

lembrar que são testes qualitativos<br />

com vistas a somente verificar a<br />

presença ou a ausência do constituinte<br />

químico em questão.<br />

4.1 - Métodos de Identificação<br />

4.1.1 - Taninos<br />

Os taninos são substâncias<br />

polifenólicas, polihidroxiladas, de<br />

alto peso molecular, de origens vegetais,<br />

capazes de precipitar proteínas,<br />

pectinas, alcalóides e metais<br />

pesados em solução aquosa (Simões<br />

et. al., 2001).<br />

A estrutura química é complexa<br />

na sua maioria, apresenta características<br />

adstringentes ao paladar e são<br />

capazes de curtir a pele dos animais,<br />

transformando-a em couro.<br />

Os taninos são sólidos, amorfos<br />

na sua maioria, solúveis em água,<br />

álcool, glicerina e polietilenoglicol.<br />

São insolúveis em solventes orgânicos<br />

apolares.<br />

Classifica-se em gálicos, hidrolisáveis,<br />

catequínicos ou condensados.<br />

Extração Genérica de Taninos<br />

Pesou-se cerca de 2g da droga<br />

(quebra-pedra) pulverizada;<br />

Extraíram-se os taninos com<br />

cerca de 40 mL de água destilada,<br />

deixando-a ferver durante, aproximadamente,<br />

2 minutos;<br />

Filtrou-se em papel de filtro,<br />

procurando manter o pó no fundo<br />

do recipiente;<br />

Repetiram-se mais duas extrações,<br />

com cerca de 10 mL de água cada;<br />

Filtrou-se novamente, como indicado<br />

anteriormente;<br />

Utilizou-se o filtrado para as<br />

reações de identificação seguintes.<br />

Reação com Cloreto Férrico<br />

Em um tubo de ensaio colocou-se<br />

cerca de 1,0 mL da solução<br />

extrativa e adicionaram-se-lhe 5,0<br />

mL de água destilada e uma gota de<br />

cloreto férrico 2% (escorrendo-o<br />

pela parede do tubo).<br />

Foi necessário que se observasse<br />

a formação de um precipitado<br />

ou o aparecimento de colorações:<br />

preta, verde, azul, conforme o<br />

tipo de estrutura química.<br />

Reação com Solução Aquosa de<br />

Alcalóides<br />

Em um tubo de ensaio colocou-se<br />

1,0 mL da solução extrativa,<br />

diluída a uma proporção 1:5. Adicionaram-se-lhe<br />

5 gotas de ácido clorídrico<br />

a 5% e 1 ou 2 gotas de<br />

solução de sulfato de alcalóides.<br />

Esperou-se para observar a formação<br />

de um precipitado branco<br />

ou castanho esbranquiçado.<br />

Reação com Acetato Neutro de<br />

Chumbo<br />

Em um tubo de ensaio colocou-se<br />

1,0 mL da solução extrativa<br />

diluída na proporção 1:5. Adicionaram-se-lhe<br />

1 ou 2 gotas de solução<br />

aquosa de acetato neutro de<br />

chumbo a 10%.<br />

Esperou-se para observar a formação<br />

de um precipitado castanho<br />

avermelhado volumoso e denso.<br />

Reação com Solução de Acetato<br />

de Cobre<br />

Em um tubo de ensaio colocou-se<br />

cerca de 1,0 mL de solução<br />

extrativa diluída na proporção de<br />

1:5. Adicionaram-se-lhe 1 ou 2 gotas<br />

de solução aquosa de acetato de<br />

cobre a 5%.<br />

Esperou-se para se observar a<br />

formação de um precipitado castanho<br />

avermelhado.<br />

Reações Específicas de<br />

Taninos:<br />

Reação com Acetato de<br />

chumbo e Ácido Acético<br />

Glacial<br />

Em um tubo de ensaio colocaram-se<br />

cerca de 3 mL de solução<br />

extrativa e adicionaram-se-lhe cerca<br />

de 2 ml de ácido acético glacial<br />

a 10% e 3 mL da solução de acetato<br />

de chumbo a 10%.<br />

Esperou-se para observar a formação<br />

de um precipitado castanho<br />

avermelhado que indicasse a presença<br />

de taninos gálicos.<br />

Obs: A adição de ácido acético<br />

impede a precipitação de taninos<br />

catequínicos.<br />

Reação com Reativo de<br />

Wasicky<br />

Eliminou-se o precipitado da<br />

reação com acetato de cobre (anterior)<br />

por filtração e utilizou-se o<br />

filtrado.<br />

Adicionaram-se cerca de 0,5<br />

mL de solução de poli-metil-aminobenzaldeído.<br />

Esperou-se para observar<br />

a formação de um precipitado<br />

carmim ou róseo que indicasse a<br />

presença de tanino catequínico.<br />

4.1.2– Saponinas<br />

Saponinas são glicosídeos de<br />

esteróides ou terpenos policíclicos.<br />

Esse tipo de estrutura, que possui<br />

uma parte lipofílica (triterpeno ou<br />

esteróide) e outra hidrofílica (açúcares),<br />

determina a propriedade de<br />

redução da tensão superficial da<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 69


água, característica de suas ações<br />

detergente e emulsificante (Simões<br />

et. al., 2001).<br />

Extração Genérica das<br />

Saponinas<br />

Em um aparelho de refluxo<br />

colocaram-se 90 mL de extrato aquoso<br />

1% da droga.<br />

Adicionaram-se-lhe cerca de 10<br />

mL de ácido clorídrico.<br />

Deixou-se o processo em refluxo<br />

por aproximadamente uma<br />

hora para, em seguida, desligá-lo e<br />

deixá-lo esfriar.<br />

Transferiu-se o líquido para um<br />

funil de separação de 200 mL e<br />

adicionaram-se-lhe 50 mL de clorofórmio.<br />

Repetiu-se a extração com<br />

clorofórmio por mais duas vezes.<br />

Reduziu-se o volume a 75 mL<br />

em banho-maria.<br />

Processos Gerais de<br />

Identificação de Saponinas<br />

Obs.: Para cada reação de identificação,<br />

evaporou-se cerca de 5<br />

mL da fase orgânica obtida anteriormente.<br />

Reação de Rossol: No tubo de<br />

ensaio onde se realizou a evaporação<br />

de 5 mL da fase orgânica, adicionou-se<br />

uma gota de ácido sulfúrico<br />

concentrado.<br />

Esperou-se para observar o<br />

aparecimento de uma coloração vermelha<br />

ou violeta que indicasse a<br />

presença da sapogenina.<br />

Reação de Mitchell: No tubo<br />

de ensaio onde se realizou a evaporação<br />

de 5 mL da fase orgânica,<br />

adicionou-se uma gota de ácido<br />

sulfúrico concentrado e vestígios<br />

de nitrato de prata.<br />

Esperou-se para observar o aparecimento<br />

de uma coloração avermelhada<br />

que indicasse a presença<br />

de sapogenina.<br />

Reação de Rosenthalen: No<br />

tubo de ensaio onde se realizou a<br />

evaporação de 5 mL da fase orgânica,<br />

adicionaram-se uma ou duas<br />

gotas de solução de vanilina a 1%<br />

em ácido clorídrico.<br />

Esperou-se para observar o<br />

aparecimento de coloração azul que<br />

se desenvolvesse somente a quente.<br />

Reação com Reativo de<br />

Sulfo-vanílico: No tubo de ensaio<br />

onde se realizou a evaporação<br />

de 5 mL da fase orgânica,<br />

adicionaram-se uma ou duas gotas<br />

de solução de vanilina 1% em<br />

ácido sulfúrico.<br />

Esperou-se para observar o<br />

aparecimento de coloração violetaazulada.<br />

Reação de Liebermann: No<br />

tubo de ensaio onde se realizou<br />

a evaporação de 5 mL da fase<br />

orgânica, dissolveu-se o resíduo<br />

em 2 mL de ácido acético glacial.<br />

Adicionaram-se-lhe 1 ou 2 gotas<br />

de cloreto férrico a 3%. Em seguida,<br />

verteram-se , pela parede<br />

do tubo, 1 ou 2 mL de ácido<br />

sulfúrico sem agitar . Na superfície<br />

de contato entre os dois líquidos,<br />

poderia formar-se um<br />

anel com coloração pardo-avermelhada<br />

ou verde, que indicaria<br />

a presença de derivados esteroidais,<br />

ou com coloração azul, que<br />

indicaria a presença de derivados<br />

triterpenóides.<br />

4.1.3- Flavonóides<br />

Os flavonóides, biossintetizados<br />

a partir da via dos fenilpropanóides,<br />

constituem uma importante<br />

classe de polifenóis, presentes com<br />

relativa abundância entre os<br />

metabólitos secundários de vegetais<br />

(Simões et. al. 2001).<br />

Extração Genérica de<br />

Compostos Flavonoídicos:<br />

Pesaram-se cerca de 2,0 g da<br />

droga;<br />

Colocada em um béquer, adicionaram-se-lhe<br />

cerca de 15 mL de<br />

etanol a 75%;<br />

Foi fervida por alguns minutos;<br />

Em seguida, foi esfriada e filtrada<br />

em papel de filtro;<br />

70 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Reservou-se esse extrato para<br />

executar as reações gerais de identificação.<br />

Reações Genéricas de<br />

Identificação de Flavonóides<br />

Reação de Shinoda: Adicionaram-se<br />

cerca de 5 mL do extrato<br />

em um tubo de ensaio que continha<br />

uma pitada de magnésio metálico.<br />

Acrescentaram-se-lhe 0,5 - 1,0 mL<br />

de ácido clorídrico.<br />

Observou-se o desenvolvimento<br />

de coloração rósea-avermelhada<br />

indicaria a presença de flavonóis;<br />

violeta indicaria a presença de<br />

flavanonas e laranja indicaria a presença<br />

de flavonas.<br />

Obs.: O desenvolvimento da<br />

cor pode ocorrer imediatamente ou<br />

após algum tempo.<br />

Reação com Cloreto de Alumínio:<br />

Sobre um papel de filtro,<br />

demarcaram-se duas áreas A e B.<br />

Depositaram-se em cada uma delas<br />

algumas gotas do extrato da<br />

droga e esperou-se secar. Em seguida,<br />

colocou-se em uma das áreas<br />

1 gota de solução de cloreto de<br />

alumínio 5% em etanol. Eliminouse<br />

o etanol. Verificou-se o comportamento<br />

da substância nas duas<br />

áreas frente à luz ultravioleta. Observou-se<br />

o aspecto fluorescente<br />

que indicasse a presença de<br />

flavonóides.<br />

Reação com Cloreto Férrico:<br />

Diluiu-se o extrato com água na<br />

proporção de 1:5, em seguida, colocaram-se<br />

em dois tubos de ensaio<br />

5 mL do extrato diluído. Adicionouse<br />

pela parede de um dos tubos 1<br />

gota de cloreto férrico 2%.<br />

Esperou-se para observar o desenvolvimento<br />

de cor, que poderia<br />

variar entre verde, amarelo-castanho<br />

e violeta, de acordo com o tipo<br />

de composto flavonoídico.<br />

Reação com Hidróxido de<br />

Sódio: Diluiu-se o extrato na proporção<br />

de 1:5. Colocaram-se 5 mL<br />

desse extrato diluído em um tubo<br />

de ensaio e adicionaram-se-lhe 1


ou 2 gotas de NaOH 5%.<br />

Observou-se o desenvolvimento<br />

de coloração amarela, que varia<br />

de intensidade.<br />

4.1.4- Glicosídeos<br />

Antraquinônicos<br />

São compostos naturais encontrados<br />

sob forma glicosídica ou<br />

livres derivados do núcleo antracênico.<br />

Relacionam-se diretamente<br />

com antraquinona, uma dicetona<br />

insaturada. Possuem ação catártica<br />

e são classificadas, como catártico<br />

estimulante (Akisue, 2002).<br />

Extração dos glicosídoes<br />

antraquinônicos<br />

Reação de Bornträeger: Pesouse<br />

cerca de 1g da droga, adicionaram-se-lhe<br />

cerca de 20 mL de etanol<br />

a 75% e foi aquecida durante 2<br />

minutos em banho-maria.<br />

Em seguida, realizou-se a filtração<br />

em funil simples e adicionaram-se<br />

ao filtrado cerca de 2mL<br />

de ácido sulfúrico que foi levado<br />

ao banho-maria durante 1 minuto.<br />

Deixou-se o filtrado acidificado<br />

esfriar.<br />

Realizou-se a extração em um<br />

funil de separação com 10 mL de<br />

acetato de etila, e repetiu-se a extração<br />

por mais duas vezes.<br />

Mediram-se cerca de 5 mL da<br />

fase orgânica e adicionaram-se-lhe<br />

cerca de 1 ou 2 gotas de hidróxido<br />

de amônio.<br />

Esperou-se para observar a formação<br />

de uma coloração amarela,<br />

que indicasse a presença da antraquinona<br />

na forma reduzida, ou vermelha,<br />

que indicasse a presença da<br />

antraquinona na forma oxidada.<br />

Reação com Hidróxido de<br />

sódio: Pesaram-se 0,5 g de droga,<br />

que foi colocada em um vidro<br />

de relógio e adicionaram-se-lhe<br />

algumas gotas de hidróxido de<br />

sódio a 0,5%.<br />

Esperou-se para observar o<br />

aparecimento de uma coloração<br />

amarelada, que indicasse a pre-<br />

sença da antraquinona na forma<br />

reduzida, ou de uma coloração<br />

avermelhada que indicasse a presença<br />

da antraquinona na forma<br />

oxidada.<br />

4.1.5 - Alcalóides<br />

Os alcalóides que contêm um<br />

átomo de nitrogênio em um anel<br />

heterocíclico são chamados de<br />

alcalóides verdadeiros e são classificados<br />

de acordo com o sistema<br />

anelar presente na molécula. As<br />

substâncias com o átomo de nitrogênio<br />

que não pertença a um sistema<br />

heterocíclico são denominados<br />

de protoalcalóides.<br />

Compostos nitrogenados com<br />

e sem anéis heterocíclicos, que não<br />

são derivados de aminoácido, são<br />

chamados de pseudoalcalóides<br />

(Simões et. al., 2001).<br />

Métodos de Identificação de<br />

Alcalóides<br />

Pesar cerca de 1g da droga em<br />

um béquer, adicionar 30 mL de<br />

solução de HCL 1,5% e aquecer por<br />

aproximadamente 3 minutos. Em<br />

seguida, filtrar o sobrenadante em<br />

algodão e transferir o filtrado para<br />

um funil de separação.<br />

Testes de Identificação<br />

Alcalinizar o filtrado obtido<br />

anteriormente com solução de<br />

Hidróxido de Amônio (NH 4 OH)<br />

até atingir um pH entre 9 e 10<br />

(utilizar papel tornassol para determinar<br />

o pH).<br />

Em seguida, adicionar ao filtrado<br />

alcalinizado cerca de 15 mL de<br />

Clorofórmio (CHCl 3 ) e agitar para<br />

que os alcalóides presentes passem<br />

para a porção orgânica. Colocar<br />

cinco gotas do extrato em cada<br />

cápsula de porcelana, colocá-las em<br />

uma chapa e esperar secar, após<br />

isso, dissolver o resíduo com 4 gotas<br />

de solução de HCl 1,5% em<br />

todas as cápsulas e em cada uma<br />

adicionar o reagente de identificação<br />

de alcalóides:<br />

Reagente de Sheibler - Adicio-<br />

nar algumas gotas sobre o resíduo e<br />

observar desenvolvimento de coloração<br />

amarelo claro.<br />

Reagente de Bourchardat - Adicionar<br />

algumas gotas sobre o resíduo<br />

e observar o desenvolvimento<br />

de coloração amarelo tijolo.<br />

Reagente de Bertrand - Adicionar<br />

algumas gotas sobre o resíduo e<br />

observar o desenvolvimento de coloração<br />

amarelo tijolo.<br />

Reagente de Mayer - Adicionar<br />

algumas gotas sobre o resíduo e<br />

observar desenvolvimento de um<br />

precipitado floculoso branco.<br />

Reagente de Dragendorff - Adicionar<br />

algumas sobre o resíduo e<br />

observar desenvolvimento de coloração<br />

amarelo tijolo.<br />

4.1.6 - Óleos voláteis<br />

Os óleos voláteis são definidos<br />

como produtos obtidos de partes de<br />

planta por meio da destilação por<br />

arraste com vapor d’água. São misturas<br />

complexas de substâncias voláteis<br />

lipofílicas, geralmente odoríferas<br />

e líquidas (Simões et. al., 2001).<br />

Pesar cerca de 1 g da droga a<br />

ser analisada, colocar em um gral<br />

de vidro, adicionar cerca de 1 mL de<br />

etanol absoluto e triturar. Pingar<br />

uma gota em um papel de filtro,<br />

evaporar e sentir o aroma, o qual<br />

indica a presença de óleos voláteis.<br />

5 - Resultados<br />

Na amostra continha fragmentos<br />

de folhas e caules de tamanhos<br />

que variavam de 0,1 a 1,0 cm de<br />

tamanho.<br />

Observou-se que em 25 g da<br />

amostra que 0,75 g correspondia a<br />

fragmentos de materiais estranhos<br />

à planta. A Farmacopéia Brasileira<br />

recomenda que a porcentagem de<br />

material estranho de outra parte da<br />

planta tenha um limite de tolerência<br />

em torno de 10%.<br />

A análise microscópica da droga<br />

vegetal através dos cortes<br />

histológicos e a sua descrição<br />

macroscópica foram comparadas<br />

com dados da literatura, o que permitiu<br />

confirmar que a droga vegetal<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 71


Tabela 1-<br />

Resultados<br />

das<br />

reações<br />

indicativas<br />

da<br />

presença<br />

ou<br />

ausência<br />

de<br />

taninos<br />

em<br />

P.<br />

niruri<br />

Reativos Anacardium occidentale<br />

Phyllanthus<br />

niruri<br />

Reação com<br />

clore<br />

to<br />

Fér<br />

r ico<br />

( Gerai<br />

s)<br />

PRECIPI TADO<br />

AZUL<br />

-<br />

Reação<br />

com<br />

Solução<br />

Aquosa<br />

de<br />

Alcaló<br />

ides<br />

PRECIPI TADO<br />

CASTANH<br />

O<br />

-<br />

Reação<br />

com<br />

Acetat<br />

o Neutro<br />

de<br />

Chumb<br />

o<br />

PRECIPI TADO<br />

CASTANH<br />

O<br />

-<br />

Reação<br />

com<br />

Solução<br />

de<br />

Acetat<br />

o de<br />

Cobre<br />

PRECIPI TADO<br />

CASTANH<br />

O<br />

-<br />

Reação<br />

com<br />

Acetat<br />

o de<br />

Chumb<br />

o e<br />

Ácido<br />

acétic<br />

o Glacial<br />

PRECIPI TADO<br />

CASTANH<br />

O<br />

-<br />

Reati vo<br />

de<br />

WASICK<br />

Y<br />

PRECIPI TADO<br />

ROSA<br />

-<br />

Reação<br />

com<br />

Clore<br />

to<br />

Fér<br />

r ico<br />

( Especí<br />

fica)<br />

( -)<br />

ausênc<br />

ia<br />

COLORAÇÃO VERDE<br />

-<br />

Tabela<br />

2-<br />

Resultados<br />

das<br />

reações<br />

indicativas<br />

da<br />

presença<br />

ou<br />

ausência<br />

de<br />

glicosídeos<br />

saponínicos.<br />

Reativos Quilaia saponaria<br />

Phyllanthus<br />

niruri<br />

R ossol<br />

+ -<br />

M itche<br />

ll<br />

+ -<br />

R osent<br />

halen<br />

+ -<br />

R eativo<br />

Sulfo-Vaníl<br />

ico<br />

+ -<br />

L ieberm<br />

ann<br />

( + ) pres<br />

ença<br />

( -)<br />

ausênc<br />

ia<br />

+ -<br />

Tabela<br />

3-<br />

Resultado<br />

das<br />

reações<br />

indicativas<br />

da<br />

presença<br />

ou<br />

ausência<br />

de<br />

glicosídeos<br />

flavanoídicos.<br />

Reativos Ginkgo biloba<br />

Phyllanthus<br />

niruri<br />

S hino<br />

da<br />

V ERDE<br />

( flavona<br />

s)<br />

VERDE<br />

( flavona<br />

s)<br />

Clore<br />

to<br />

de<br />

Alumí<br />

nio<br />

FLORESC<br />

ÊN<br />

CIA<br />

AMARELO<br />

-<br />

ACASTAN<br />

HADO<br />

( flavono<br />

l)<br />

FLORESC<br />

ÊN<br />

CIAAMARE<br />

LO-ACASTA-<br />

NHADO<br />

( flavono<br />

l)<br />

Clore<br />

to<br />

Fér<br />

r ico<br />

AMARELO<br />

-ACASTAN<br />

HADO<br />

( flavono<br />

l)<br />

VERDE<br />

( flavona<br />

s)<br />

H idró<br />

xido<br />

de<br />

sódio<br />

A MARELA<br />

( flavono<br />

l)<br />

AMARELA<br />

( flavono<br />

l)<br />

Tabela<br />

4-<br />

Resultado<br />

das<br />

reações<br />

da<br />

presença<br />

ou<br />

ausência<br />

de<br />

glicosídeos<br />

antraquinônicos.<br />

Reativos Dimorphandra mollis<br />

Phyllanthus<br />

niruri<br />

Bornt räege<br />

r<br />

verme lho<br />

verme<br />

lho<br />

Hidró xido<br />

de<br />

Sódio<br />

verme lho<br />

verme<br />

lho<br />

Tabela<br />

5-<br />

Resultados<br />

das<br />

reações<br />

indicativas<br />

da<br />

presença<br />

ou<br />

ausência<br />

de<br />

alcalóides.<br />

Reativos Chichona calisaya<br />

Phyllanthus<br />

niruri<br />

Sheibl er<br />

AMARELO CLARO<br />

AMARELO<br />

CLARO<br />

Bourch ardat<br />

AMARELO TIJOLO<br />

AMARELO<br />

TIJOLO<br />

Dragen dorff<br />

AMARELO TIJOLO<br />

AMARELO<br />

TIJOLO<br />

Bertr and<br />

AMARELO TIJOLO<br />

AMARELO<br />

TIJOLO<br />

Mayer BRANCO BRANCO<br />

em análise era mesmo a espécie<br />

Phyllanthus niruri L (Souza, 2003).<br />

Nos testes realizados para identificar<br />

os taninos, foi usada como<br />

droga padrão o cajueiro (Anacardium<br />

occidentale), droga vegetal que tem<br />

como principais constituintes químicos<br />

os taninos, e a droga em estudo<br />

não indicou a presença de taninos<br />

nos testes realizados (Tabela-1).<br />

5.1 - Saponinas<br />

Para as reações de identificação<br />

de heterosídeos saponínicos<br />

foi utilizada como droga padrão a<br />

quilaia (Quilaia saponaria) para<br />

compará-la com a droga em estudo.<br />

Os resultados demonstraram que a<br />

P. niruri não possui saponinas (Tabela-2).<br />

72 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

5.2 - Flavonóides<br />

Para as reações de identificação<br />

de flavonóides, utilizou-se como droga<br />

padrão a Ginkgo (Ginkgo biloba<br />

). Os resultados das análises mostraram<br />

que a espécie P. niruri apresentou<br />

flavonóides na sua composição<br />

química, de acordo com que se pode<br />

observar na tabela (Tabela-3).


5.3 - Glicosídeos<br />

Antraderivados<br />

Para os resultados das reações<br />

indicativas da presença ou<br />

ausência foi utilizada como droga<br />

padrão o faveiro (Dimorphandra<br />

mollis ) e a droga vegetal em<br />

análise - P. niruri – apresentou,<br />

na sua composição química,<br />

indicativo da presença de glicosídeos<br />

antraquinônicos na forma<br />

oxidada, como podemos observar<br />

na tabela (Tabela-4).<br />

5.4 - Alcalóides<br />

Para as reações de identificação<br />

de alcalóides, utilizou-se como<br />

droga padrão a quina (Chichona<br />

calisaya) e a espécie P. niruri em<br />

estudo apresentou resultado positivo<br />

na presença dos reativos para<br />

alcalóides, como se pode observar<br />

na tabela (Tabela-5).<br />

5.5 - Óleos Voláteis<br />

No teste realizado para indicar<br />

a presença ou ausência de<br />

óleos voláteis, não foi possível,<br />

por meio dele, verificar a presença<br />

de óleos voláteis na espécie em<br />

análise - P. niruri<br />

6 - Discussão<br />

Por meio das análises realizadas,<br />

foi possível identificar a droga<br />

vegetal em estudo como<br />

Phyllanthus niruri (quebra-pedra).<br />

Antes de se utilizar qualquer<br />

droga no preparo de medicamentos,<br />

deve-se submetê-la a uma<br />

análise rigorosa. A identificação e<br />

a pureza da droga, bem como a<br />

avaliação de seus princípios ativos<br />

são tarefas indispensáveis<br />

àqueles que buscam produtos de<br />

qualidade.<br />

De acordo com a literatura, o<br />

Phyllanthus niruri apresenta em<br />

sua constituição substâncias como<br />

glicosídeos antraquinônicos, flavonóides<br />

e alcalóides, além de<br />

outras que não foram investigadas<br />

no presente trabalho, mas que se<br />

sabe fazem parte da constituição<br />

química da planta. Acredita-se que<br />

algumas dessas substâncias sejam<br />

responsáveis pelo efeito terapêutico<br />

atribuído ao quebra-pedra,<br />

porém não se sabe ao certo qual<br />

dessas substâncias é especificamente<br />

a responsável por tal propriedade.<br />

Assim, os constituintes<br />

identificados na análise<br />

fitoquímica foram suficientes para<br />

afirmarmos que a planta utilizada<br />

era realmente o Phyllanthus<br />

niruri, sendo identificada a droga<br />

como verdadeira.<br />

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<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 73


Pesquisa<br />

Jorge Fernando Pereira<br />

Biólogo, MS em Microbiologia Agrícola,<br />

Doutorando em Microbiologia Agrícola;<br />

Universidade Federal de Viçosa.<br />

dgfernando@yahoo.com<br />

Juliana Oliveira Lima<br />

Bióloga; Mestranda em Microbiologia Agrícola;<br />

Universidade Federal de Viçosa.<br />

ju.olima@bol.com.br<br />

Rodrigo Barros Rocha<br />

Biólogo; Mestrando em Genética e Melhoramento;<br />

Universidade Federal de Viçosa.<br />

rodrigobarrosrocha@yahoo.com.br<br />

Pilar Ximena Lizarazo Medina<br />

Bacteriologista; MS em Microbiologia Agrícola;<br />

Doutoranda em Microbiologia Agrícola;<br />

Universidade Federal de Viçosa.<br />

pixilime@hotmail.com<br />

Elza Fernandes de Araújo<br />

Bióloga; DS em Genética UFRGS;<br />

Profª Titular do Departamento de Microbiologia;<br />

Universidade Federal de Viçosa.<br />

ezfa@ufv.br<br />

Marisa Vieira de Queiroz<br />

Bióloga; DS em Genética e Melhoramento ESALQ-<br />

USP; Professora Adjunta do Departamento de<br />

Microbiologia; Universidade Federal de Viçosa.<br />

mvqueiro@ufv.br<br />

Ilustrações cedidas pelos autores<br />

Nitrato Redutase em<br />

Fungos Filamentosos<br />

O potencial multifuncional da nitrato redutase em pesquisas com biologia molecular de fungos<br />

Introdução<br />

ungos filamentosos podem<br />

metabolizar uma série de<br />

compostos nitrogenados<br />

para obterem o requerimento<br />

nutricional necessário<br />

para seu desenvolvimento.<br />

Nesses organismos, o metabolismo<br />

do nitrogênio é um processo<br />

altamente controlado por um complexo<br />

de proteínas reguladoras, que<br />

assegura grande eficiência na utilização<br />

das fontes de nitrogênio disponíveis.<br />

Esse complexo é constituído<br />

por uma série de proteínas que são<br />

requeridas para que vários compostos<br />

secundários sejam assimilados<br />

quando as fontes preferenciais de<br />

nitrogênio, isto é, o amônio ou a<br />

glutamina, não estão disponíveis<br />

(Caddick et al., 1994; Marzluf, 1997).<br />

Entre os compostos secundários, o<br />

nitrato inorgânico é uma excelente<br />

fonte utilizável por muitos fungos<br />

filamentosos. Seu transporte para o<br />

meio intracelular é mediado pela<br />

permease do nitrato, e após sua assimilação,<br />

ocorre a redução seqüencial<br />

do nitrato a nitrito e do nitrito a<br />

amônio, catalisada, respectivamente,<br />

pelas enzimas nitrato e nitrito<br />

redutase. O amônio é considerado o<br />

ponto de partida para o metabolismo<br />

anabólico do nitrogênio em fungos e<br />

a sua incorporação em moléculas<br />

orgânicas é, então, realizada por dois<br />

sistemas: glutamato desidrogenase<br />

(GDH) ou glutamina sintase (GS)/<br />

Glutaminaamida: 2-oxoglutarato<br />

amino transferase (GOGAT), que produzem<br />

glutamato e glutamina (Griffin,<br />

1994) (Figura 1). A enzima nitrato<br />

redutase de fungos é um grande<br />

complexo multiredox, que possui<br />

74 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

duas subunidades idênticas, cada uma<br />

composta de três grupos prostéticos<br />

em domínios separados. Na extremidade<br />

C-terminal, localiza-se o domínio<br />

FAD, mais ao centro da proteína,<br />

o domínio heme, e, na extremidade<br />

N-terminal, o domínio molibdênio. A<br />

reação catalítica envolve a transferência<br />

de um par de elétrons do<br />

NADH ou NADPH para os domínios<br />

FAD, heme e molibdênio e, então,<br />

para o nitrato. A especificidade pelo<br />

doador de elétrons é utilizada para<br />

classificar as nitrato redutases<br />

eucarióticas em 3 grupos: NADHespecífica<br />

(EC 1.6.6.1), que está presente<br />

na maioria das plantas superiores<br />

e em algumas algas, NADPHespecífica<br />

(EC 1.6.6.2), que é encontrada<br />

em fungos e NAD(P)Hbiespecífica,<br />

que é encontrada em<br />

algumas plantas e em algumas algas<br />

(Losada, 1976; Shen et al., 1976;<br />

Renosto et al., 1982).<br />

Em 1989, foi descrito o isolamento<br />

do primeiro gene da nitrato<br />

redutase de fungos filamentosos utilizando-se<br />

o organismo modelo<br />

Aspergillus nidulans (Malardier et al.,<br />

1989). Desde então, genes que codificam<br />

para a enzima nitrato redutase<br />

vêm sendo clonados e seqüenciados<br />

em diversas espécies de fungos<br />

filamentosos representados por organismos<br />

modelos de estudos genéticos<br />

em eucariotos, espécies com<br />

potencial de aplicação industrial ou<br />

com importância fitopatológica e<br />

micorrízica. O interesse na clonagem<br />

desse gene é baseado, principalmente,<br />

no estabelecimento de protocolos<br />

de transformação genética cujo valor<br />

biotecnológico é muito importante<br />

por representar um método de seleção<br />

geral e conveniente. Mas, além


de marca de seleção para transformação,<br />

esse gene também pode ser<br />

utilizado para estudos de organização<br />

e regulação gênica, análises<br />

filogenéticas, obtenção de mutantes,<br />

estudos de grupos de compatibilidade<br />

vegetativa e como isca para<br />

detecção e isolamento de elementos<br />

transponíveis. Baseado nesse contexto,<br />

este trabalho tem como objetivo<br />

apresentar resultados que contribuam<br />

para esse potencial multifuncional<br />

do gene da nitrato redutase em<br />

fungos filamentosos. Mesmo que,<br />

muitas vezes, dentro de uma mesma<br />

espécie, esse gene possa não ser<br />

utilizado com toda essa potencialidade,<br />

ele representa uma das maiores<br />

versatilidades de uso na micologia<br />

molecular.<br />

Organização dos genes de<br />

assimilação do nitrato<br />

O seqüenciamento e a comparação<br />

das seqüências de genes que<br />

codificam para nitrato redutase têm<br />

contribuído para estudos de organização<br />

gênica em fungos filamentosos,<br />

sendo esses estudos imprescindíveis<br />

para o conhecimento de características<br />

importantes como número<br />

e tamanho de íntrons, seqüências<br />

envolvidas com mecanismo de<br />

splicing, tamanho de regiões promotoras,<br />

ligação de genes e sentido da<br />

transcrição entre genes ligados. Um<br />

quadro comparativo da organização<br />

gênica entre os genes da nitrato<br />

redutase de 16 diferentes espécies de<br />

fungos filamentosos é apresentado<br />

na Figura 2.<br />

A análise de seqüências do gene<br />

da nitrato redutase revela a ausência<br />

de íntrons nos fungos Ustilago maydis<br />

(Banks et al., 1993) e Botryotinia<br />

fuckeliana (Levis et al., 1997a) e um<br />

máximo de 12 íntrons para Hebeloma<br />

cylindrosporum (Jargeat et al., 2000).<br />

Em Aspergillus fumigatus, A.<br />

nidulans, A. niger, A. oryzae, A.<br />

parasiticus, Penicillium chrysogenum<br />

e P. griseoroseum, ocorre a presença<br />

de 6 íntrons que, embora possuam<br />

tamanhos diferentes, estão localizados<br />

nas mesmas posições (Johnstone<br />

et al., 1990; Unkles et al., 1992;<br />

Kitamoto et al., 1995; Chang et al.,<br />

1996; Haas et al., 1996; Amaar e<br />

Moore, 1998; Pereira, 2001). Em<br />

Leptosphaeria maculans e<br />

Stagonospora nodorum, esse gene é<br />

interrompido por 4 íntrons que correspondem<br />

aos íntrons II, III, IV e VI<br />

de Aspergillus e Penicillium (Williams<br />

et al., 1994; Cutler et al., 1998), enquanto<br />

em Beauveria bassiana (número<br />

de acesso no Genbank X84950),<br />

Fusarium oxysporum, Gibberella<br />

fujikuroi, Metarhizium anisopliae<br />

(número de acesso no Genbank<br />

AJ001141) e Neurospora crassa, apenas<br />

1 íntron está presente na mesma<br />

posição do íntron VI de Aspergillus e<br />

Penicillium (Okamoto et al. 1991;<br />

Diolez et al., 1993; Tudzynski et al.,<br />

1996). O gene da nitrato redutase de<br />

H. cylindrosporum parece ser o único<br />

que possui íntrons (11 e 12) na<br />

região correspondente ao domínio<br />

FAD (Jargeat et al., 2000). Pode-se<br />

observar na Figura 2 que o tamanho<br />

médio dos íntrons é de, aproximadamente,<br />

58 pares de bases (pb), sendo<br />

o menor de 46 pb e o maior de 92 pb.<br />

Na grande maioria das vezes, esses<br />

íntrons não apresentam similaridade<br />

a não ser nas seqüências envolvidas<br />

com o processo de sua retirada<br />

(splicing). Os íntrons encontrados<br />

Figura 1 - Assimilação de nitrato em fungos filamentosos.<br />

nos genes que codificam a nitrato<br />

redutase em eucariotos não interrompem<br />

a seqüência codificadora<br />

em éxons com os respectivos domínios<br />

funcionais da enzima, sendo<br />

que a maioria deles parece estar<br />

dentro e não entre os domínios funcionais<br />

(Zhou e Kleinhofs, 1996). A<br />

localização dos íntrons é conservada<br />

dentro de fungos, algas e plantas<br />

superiores, em relação a genes para<br />

nitrato redutase, mas, mesmo assim,<br />

difere entre esses grupos. Em algas,<br />

os genes da nitrato redutase de<br />

Chlamydomonas reinhardtii e Volvox<br />

carteri possuem 15 e 9 íntrons, respectivamente,<br />

localizados nos domínios<br />

molibdênio, heme e FAD. A<br />

posição de 8 dos 10 íntrons em Volvox<br />

é idêntica à de Chlamydomonas. Os<br />

quatro íntrons presentes em Oryzae<br />

sativa, Phaseolus vulgaris, Lypersicon<br />

esculentum e Nicotiana tobacum estão<br />

localizados, precisamente, na mesma<br />

posição (Zhou e Kleinhofs, 1996).<br />

Com base no número e na posição<br />

dos íntrons presentes nos genes da<br />

nitrato redutase de fungos filamentosos,<br />

algas e plantas, Zhou e Kleinhofs<br />

(1996) não puderam afirmar se, durante<br />

a evolução, os íntrons foram<br />

incorporados (gain hypotheses) ou<br />

perdidos (loss hypotheses). Então, os<br />

íntrons podem ter sido inseridos no<br />

gene da nitrato redutase após a divergência<br />

entre fungos e plantas, ou o<br />

ancestral desses grupos possuía todos<br />

os íntrons e esses foram perdidos<br />

independentemente após a divergência.<br />

Ainda, segundo esses autores, a<br />

hipótese de embaralhamento de<br />

éxons (exon shuffling), em que as<br />

seqüências que codificam regiões estruturais<br />

ou funcionais da proteína<br />

estariam delimitadas por íntrons, não<br />

parece se aplicar a esse caso, pois as<br />

seqüências que codificam os domínios<br />

funcionais das proteínas nitrato<br />

redutase apenas são separadas por<br />

íntrons em H. cylindrosporum (íntron<br />

9 entre domínios molibdênio e heme).<br />

Além dos íntrons, a organização<br />

dos três genes relacionados com a<br />

assimilação do nitrato em fungos filamentosos<br />

pode ser separada em, pelo<br />

menos, quatro grupos diferentes (de<br />

A a D). No grupo A, os três genes<br />

estão ligados, mas os genes da nitrato<br />

e nitrito redutase são transcritos em<br />

direções opostas, sendo o gene do<br />

transportador transcrito na mesma<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 75


Figura 2 - Comparação da organização dos genes de assimilação do nitrato em fungos filamentosos. Em alaranjado, a região<br />

promotora intergênica dos genes nos quais foram relatadas ligação entre nitrito e nitrato redutase. As setas representam o sentido<br />

da transcrição nesses genes. As caixas abertas indicam a região estrutural com tamanho e posição dos íntrons em relação às regiões<br />

codificadoras dos domínios molibdênio, heme e FAD. O tamanho da região promotora e dos íntrons é dado em pares de bases.<br />

O número de aminoácidos das respectivas proteínas é dado à direita.<br />

direção da nitrito redutase. Essa organização<br />

é encontrada em A. nidulans,<br />

A. niger, A. parasiticus, A. fumigatus<br />

e P. chrysogenum (Johnstone et al.,<br />

1990; Unkles et al., 1992; Chang et al.,<br />

1996; Amaar e Moore, 1998; Haas e<br />

Marzluf, 1995). O tamanho da região<br />

intergênica é de 1.262 pb em A.<br />

nidulans (Johnstone et al., 1990), 1.668<br />

pb em A. niger (Unkles et al., 1992),<br />

1.670 pb em A. parasiticus (Chang et<br />

al., 1996), 1.229 pb em A. fumigatus<br />

(Amaar e Moore, 1998) e 661 pb em P.<br />

chrysogenum (Haas e Marzluf, 1995).<br />

No grupo B, os três genes também<br />

estão ligados, mas o gene do transportador<br />

está entre os genes da nitrato e<br />

da nitrito redutase, sendo transcritos<br />

na mesma direção descrita no grupo<br />

A. Essa organização é encontrada em<br />

H. cylindrosporum (Jargeat et al.,<br />

2003). No grupo C, os genes da nitrato<br />

e da nitrito redutase estão ligados, são<br />

transcritos na mesma direção, mas o<br />

gene do transportador não está ligado,<br />

como é observado em L. maculans<br />

e S. nodorum (Williams et al., 1994;<br />

Cutler e Caten, 1999). O tamanho da<br />

região intergênica é de 1.438 pb em L.<br />

maculans (Williams et al., 1994) e 829<br />

pb em S. nodorum (Cutler e Caten<br />

1999). No grupo D, apesar da posição<br />

do transportador ainda não ter sido<br />

determinada, os três genes não parecem<br />

estar ligados, como ocorre em<br />

Neurospora crassa (Exley et al., 1993)<br />

e em Gibberella fujikuroi (Tudzynski<br />

et al., 1996).<br />

76 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Regulação do gene da<br />

nitrato redutase<br />

As maiores contribuições para o<br />

conhecimento da regulação do metabolismo<br />

do nitrogênio em fungos<br />

filamentosos baseiam-se nos trabalhos<br />

realizados com os organismos A.<br />

nidulans e Neurospora crassa<br />

(Caddick et al., 1994; Marzluf, 1997),<br />

sendo que, nos últimos anos, estudos<br />

também têm sido relatados para outras<br />

espécies como, por exemplo,<br />

Penicillium chrysogenum (Haas e<br />

Marzluf, 1995; Haas et al., 1996).<br />

A utilização de fontes de nitrogênio<br />

secundárias é controlada de maneira<br />

positiva e negativa, existindo<br />

um sistema de controle global e um


específico. A desrepressão de mais de<br />

100 genes estruturais, incluindo, por<br />

exemplo, genes que codificam transportadores<br />

de aminoácidos, transportadores<br />

de purinas, proteases<br />

extracelulares e enzimas catabólicas,<br />

é dependente da presença do indutor<br />

e da ausência de fontes preferenciais<br />

de nitrogênio (amônio e glutamina).<br />

Essa desrepressão é realizada tanto<br />

pelo regulador global positivo areA<br />

em A. nidulans e seus correspondentes<br />

nit-2 em N. crassa e nre em P.<br />

chrysogenum, quanto por reguladores<br />

específicos. O gene areA codifica<br />

uma proteína reguladora de 876 resíduos<br />

de aminoácidos que contém um<br />

único domínio de ligação ao DNA, o<br />

qual reconhece e se liga a seqüências<br />

que contêm o core GATA (Kudla et<br />

al., 1990; Langdon et al., 1995). As<br />

proteínas AREA, NIT-2 e NRE possuem<br />

somente 30% de homologia, mas,<br />

considerando apenas o domínio de<br />

ligação ao DNA, a identidade é de<br />

98% (Haas e Marzluf, 1995). Em AREA,<br />

o domínio de ligação ao DNA é constituído<br />

por um único dedo de Zn com<br />

quatro cisteínas, seguido de um domínio<br />

terminal básico, que apresenta<br />

uma estrutura compacta formada por<br />

dois pares de folhas-β seguidas por<br />

uma α-hélice e uma cauda não<br />

estruturada. As cadeias laterais ao<br />

dedo de Zn fazem contato altamente<br />

hidrofóbico no sulco maior da molécula<br />

de DNA e a cauda carboxi-terminal<br />

faz contato com o esqueleto de<br />

fosfato (Scazzocchio, 2000). Elementos<br />

com, pelo menos, duas cópias de<br />

seqüências GATA, que podem estar<br />

na mesma direção, ou em direções<br />

opostas, e com espaço de, pelo menos,<br />

30 pb, são considerados fortes<br />

sítios de ligação para NIT-2 (Chiang e<br />

Marzluf, 1994). Para P. chrysogenum,<br />

Haas e Marzluf (1995) descreveram<br />

fortes sítios de ligação de NRE como<br />

regiões com, pelo menos, duas seqüências<br />

GATA com espaçamento<br />

entre 5 e 27 pb, configuradas na<br />

mesma direção ou em direções opostas.<br />

Elementos GATA separados por<br />

74 ou 96 pb não demonstraram ser<br />

fortes sítios de ligação NRE (Haas e<br />

Marzluf, 1995). Para A. parasiticus,<br />

Chang et al. (2000) relataram a ligação<br />

de AREA a segmentos de 42 pb da<br />

região promotora dos genes da nitrato<br />

e da nitrito redutase que continham<br />

um ou dois elementos GATA.<br />

Outro gene importante para o<br />

metabolismo do nitrogênio é o nmr<br />

(do inglês nitrogen metabolism<br />

repressor), que atua de maneira negativa,<br />

reprimindo a síntese de vários<br />

genes. O gene nmr codifica uma<br />

proteína de 54,8 KDa, que não possui<br />

domínio de ligação ao DNA, mas<br />

é capaz de se ligar a uma pequena<br />

região do domínio de ligação ao<br />

DNA e à região carboxi-terminal da<br />

proteína NIT-2 (e possivelmente de<br />

AREA), impedindo a ação dessa proteína,<br />

sendo a glutamina o possível<br />

sinal para essa ligação (Xiao et al.,<br />

1995). Pelo menos para AREA, ainda<br />

existem outros dois níveis de<br />

regulação: a transcrição de areA é<br />

auto-regulada e a estabilidade do<br />

mRNA de areA é menor em células<br />

que crescem em fontes de nitrogênio<br />

preferenciais (Platt et al., 1996). Dessa<br />

forma, na presença de fontes preferenciais,<br />

além de uma menor estabilidade<br />

do mRNA do gene areA, o<br />

regulador NMR se liga à proteína<br />

AREA já sintetizada e impede que<br />

essa proteína se ligue aos promotores<br />

e induza a transcrição dos genes<br />

relacionados com o metabolismo de<br />

fontes secundárias de nitrogênio. Assim,<br />

a célula assegura a assimilação<br />

de nitrogênio a partir de compostos<br />

que são prontamente metabolizáveis.<br />

A indução do gene da permease<br />

do nitrato e dos genes da nitrato<br />

redutase (niaD para Aspergillus sp. e<br />

P. chrysogenum ou nit-3 para N.<br />

crassa) e nitrito redutase (niiA para<br />

Aspergillus sp. e P. chrysogenum ou<br />

nit-6 para N. crassa) requer síntese<br />

de novo, sendo necessária a ausência<br />

das fontes preferenciais e a presença<br />

de nitrato como indutor. Nesse caso,<br />

além do fator de regulação global, é<br />

necessária a presença de um fator<br />

específico chamado nirA em A.<br />

nidulans e nit-4 em N. crassa<br />

(Caddick et al., 1994; Marzluf, 1997).<br />

A proteína NIRA liga-se ao DNA a<br />

partir de um domínio na sua região<br />

amino-terminal (Burger et al., 1991).<br />

Essa proteína se liga à seqüência 5’-<br />

CTCCGHGG-3’, sendo que foram detectados<br />

sítios putativos ou já comprovados<br />

para essa proteína em várias<br />

espécies de ascomicetos (Punt et<br />

al., 1995). Para o reconhecimento de<br />

cis-elementos e expressão do gene<br />

nit-3 em N. crassa (Feng e Marzluf,<br />

1998), é requerida uma interação<br />

específica entre os fatores de<br />

regulação NIT-2 e NIT-4. Em N. crassa,<br />

um acúmulo máximo de mRNA<br />

de nit-3 ocorre apenas 15 minutos<br />

após a indução por nitrato, sendo<br />

que o acúmulo máximo de proteína<br />

ocorre após 60 minutos, e em P.<br />

chrysogenum transcritos de niaD são<br />

detectados com 15 minutos de<br />

indução, e atingem um nível máximo<br />

após 60 minutos (Okamoto et al.,<br />

1991; Haas et al., 1996). Até a presente<br />

data, a única exceção é o<br />

basidiomiceto H. cylindrosporum,<br />

onde o gene da nitrato redutase possui<br />

alto nível de transcrição na presença<br />

de nitrato, uréia, serina e glicina,<br />

sendo possível, neste caso, a<br />

inexistência de fatores de regulação<br />

específicos. Entretanto, na presença<br />

de amônio, ocorre uma forte, mas<br />

incompleta, repressão desse gene,<br />

indicando a existência de um sistema<br />

de regulação geral (Jargeat et al.,<br />

2000). Recentemente, foi reportado,<br />

para H. cylindrosporum, que a transcrição<br />

dos genes da permease do<br />

nitrato e da nitrito redutase também<br />

não é induzida por nitrato, mas é<br />

completamente reprimida por amônio<br />

(Jargeat et al., 2003).<br />

Relações filogenéticas<br />

baseadas na proteína<br />

nitrato redutase<br />

Apesar da proteína nitrato redutase<br />

apresentar regiões comprovadamente<br />

importantes para seu funcionamento,<br />

outras regiões parecem poder sofrer<br />

variação sem acarretar perda de funcionalidade<br />

para a proteína. A região Nterminal<br />

e 2 regiões curtas, entre os<br />

domínios molibdênio e heme e heme e<br />

FAD, apresentaram menor identidade<br />

entre 17 outras proteínas nitrato redutase<br />

de plantas, algas e fungos quando foram<br />

comparadas por Zhou e Kleinhofs<br />

(1996). Essa característica de apresentar<br />

regiões conservadas que flanqueiam<br />

regiões que podem sofrer variação é<br />

interessante para estudos de filogenia.<br />

Esses mesmos autores verificaram que<br />

o gene da nitrato redutase pode ser<br />

utilizado como relógio molecular, pois<br />

genes de diferentes espécies evoluem<br />

em uma taxa constante, e, baseados<br />

nesse gene, estimaram o tempo de<br />

divergência entre fungos e plantas, em<br />

torno de 1 bilhão de anos e, entre algas<br />

e plantas superiores, em torno de 750<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 77


milhões de anos. Além do uso como<br />

relógio molecular, estudos filogenéticos<br />

com a proteína nitrato redutase de fungos<br />

filamentosos têm revelado uma<br />

tendência de agrupar espécies que pertençam<br />

a categorias taxonômicas comuns<br />

(Williams et al., 1994; Cutler et al.,<br />

1998). Assim, esse gene possui características<br />

interessantes para uso em estudos<br />

evolucionários. Na Figura 3 é apresentada<br />

uma árvore filogenética não<br />

enraizada baseada na seqüência de<br />

aminoácidos da proteína nitrato redutase.<br />

Para a construção dessa árvore, seqüências<br />

da proteína nitrato redutase de 16<br />

fungos filamentosos e 1 planta foram<br />

retiradas do GenBank na página do<br />

National Center for Biotechnology<br />

Information (www.ncbi.nlm.nih.gov)<br />

por meio dos seguintes números:<br />

Aspergillus fumigatus (AF336236), A.<br />

nidulans (M58291), A. niger (M77022),<br />

A. oryzae (D49701), A. parasiticus<br />

(U38948), Arabdopsis thaliana<br />

(P11832), Beauveria bassiana<br />

(X84950), Botryotinia fuckeliana<br />

(U43783), Fusarium oxysporum<br />

(Z22549), Gibberella fujikuroi<br />

(X90699), Hebeloma cylindrosporum<br />

(AJ238664), Leptosphaeria maculans<br />

(U04445), Metarhizium anisopliae<br />

(AJ001141), Neurospora crassa<br />

(X61303), Penicillium chrysogenum<br />

(U20779), P. griseoroseum (AY255803),<br />

Stagonospora nodorum (AJ009827) e<br />

Ustilago maydis (AJ<strong>31</strong>5577). O alinhamento<br />

de toda a seqüência de aminoácidos<br />

foi realizado no programa<br />

Clustal X (Thompson et al., 1997),<br />

sendo o alinhamento resultante analisado<br />

pelo método de parsimônia no<br />

programa PAUP* versão 3.1 (Swofford,<br />

1993). Foi feita uma busca heurística<br />

e análise de bootstrap com 1.000 réplicas<br />

para gerar índices de confiabilidade<br />

para cada ramo.<br />

Pode-se observar claramente a<br />

tendência de se agruparem as espécies<br />

analisadas pela ordem à qual<br />

essas pertencem de acordo com a<br />

Figura 3 - Árvore filogenética não enraizada, baseada em análises pelo método de<br />

parsimônia da seqüência de aminoácidos da proteína nitrato redutase de vários fungos<br />

filamentosos. Os números indicam porcentagem dos valores de bootstrap em análise<br />

com 1.000 réplicas.<br />

78 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

taxonomia clássica. Dessa forma, a<br />

seqüência de aminoácidos da proteína<br />

nitrato redutase apresenta uma<br />

aplicação para estudos filogenéticos,<br />

com forte reflexo da história natural<br />

dos fungos filamentosos.<br />

Obtenção de mutantes<br />

deficientes na enzima<br />

nitrato redutase<br />

Uma das grandes vantagens na<br />

aplicação do gene da nitrato redutase<br />

é a fácil obtenção de mutantes espontâneos<br />

por seleção positiva via<br />

resistência ao clorato. Essa seleção<br />

positiva, que favorece o crescimento<br />

do mutante em relação ao selvagem,<br />

é baseada na “similaridade” entre a<br />

molécula de nitrato e seu análogo<br />

tóxico, o clorato. Da mesma forma<br />

que o nitrato, o clorato presente no<br />

meio de cultura é transportado para<br />

o meio intracelular pela permease do<br />

nitrato e é reduzido a clorito pela<br />

ação da enzima nitrato redutase. Entretanto,<br />

diferentemente do nitrito, o<br />

clorito é um composto tóxico que<br />

promove a morte da célula. A teoria<br />

de que o clorato por si só não é<br />

tóxico, mas se torna tóxico pela conversão<br />

a clorito como resultado da<br />

ação da nitrato redutase, foi primeiramente<br />

sugerida por Aberg (1947) e<br />

tem sido confirmada por uma série<br />

de trabalhos. Análises do efeito do<br />

clorito de sódio, tanto in vitro como<br />

in vivo, sugerem que o clorito cause<br />

estresse oxidativo em células de fungos<br />

e, por causar oxidação de<br />

biomoléculas importantes, torna-se<br />

tóxico (Ingram et al., 2003). Dessa<br />

maneira, a célula que apresenta uma<br />

enzima nitrato redutase funcional<br />

morre e aquela que apresenta uma<br />

forma não-funcional sobrevive, pois<br />

não é capaz de reduzir o clorato a<br />

clorito.<br />

Nesse momento, a colônia<br />

mutante, que cresce no meio de cultura,<br />

é resistente ao clorato, mas não<br />

necessariamente é mutante para a<br />

enzima nitrato redutase. Mutações<br />

em, pelo menos, cinco genes podem<br />

levar ao fenótipo de resistência ao<br />

clorato: (i) mutação no gene da<br />

permease do nitrato (crnA), que incapacite<br />

a célula de absorver o clorato<br />

do meio extracelular; (ii) mutação no<br />

gene do regulador específico da assimilação<br />

de nitrato (nirA), que impos-


Figura 4 - Obtenção de mutantes nitrato redutase. 1-) Esquema do protocolo para obtenção de mutantes resistentes ao clorato e<br />

testes de crescimento para anotação da mutação; 2-) Vias metabólicas envolvidas com o fenótipo de resistência ao clorato (possíveis<br />

genes mutados são mostrados em laranja); 3-) Fenótipo de crescimento em placas contendo MM + nitrato (A), MM + nitrito (B) e<br />

MM + hipoxantina (C) de mutantes de Penicillium griseoroseum resistentes ao clorato. Colônias que não crescem em A mas crescem<br />

em B e C são mutantes nitrato redutase; S indica o tipo selvagem utilizado como controle positivo.<br />

sibilite a célula de expressar a enzima<br />

nitrato redutase; (iii) mutação no gene<br />

do regulador geral da assimilação de<br />

nitrogênio (areA), que também impossibilite<br />

a célula de expressar a<br />

enzima nitrato redutase; (iv) mutação<br />

em algum gene envolvido na<br />

biosíntese do cofator molibdênio<br />

(cnxA-J), que, não estando presente,<br />

torna ineficazes a enzima nitrato<br />

redutase e outras enzimas dependentes<br />

desse cofator; e (v) mutação<br />

no próprio gene da nitrato redutase<br />

(niaD), impossibilitando a célula de<br />

sintetizar essa enzima (Cove, 1976;<br />

Cove, 1979). Dessa forma, após a<br />

obtenção das colônias resistentes ao<br />

clorato, é necessário fazer uma discriminação<br />

do fenótipo mutante por<br />

meio de um fácil teste de crescimento<br />

em meio mínimo contendo as<br />

seguintes fontes de nitrogênio: nitrato,<br />

nitrito, hipoxantina, glutamato e<br />

amônio . O crescimento ou não nes-<br />

Tabela<br />

1 - Testes<br />

de<br />

crescimento<br />

de<br />

mutantes<br />

resistentes<br />

ao<br />

clorato,<br />

em<br />

diferentes<br />

fontes<br />

de<br />

nitrogênio.<br />

Mutação<br />

Designação<br />

do<br />

mutante*<br />

Testes<br />

de<br />

crescimento<br />

Clorato Nitrato Nitrito Hipoxantina Glutamato Amônio<br />

Nenhu ma<br />

Selvagem - + + + + +<br />

Nitra to<br />

redut<br />

ase<br />

n iaD<br />

+ - + + + +<br />

Regula dor<br />

especí<br />

fico<br />

n irA<br />

+ - - + + +<br />

Cofator molib<br />

dênio<br />

c nxA-J<br />

+ - + - + +<br />

Regula dor<br />

geral<br />

a reA<br />

+ - - - - +<br />

Perme ase<br />

c rnA<br />

+ + + + + +<br />

* denomi<br />

nação<br />

dos<br />

genes<br />

para<br />

A spe<br />

rgillus<br />

nidulan<br />

s;<br />

+<br />

indic<br />

a cres<br />

cime<br />

nto<br />

e - indic<br />

a ausênc<br />

ia<br />

de<br />

cres<br />

cime<br />

nto.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 79


sas diferentes fontes (Tabela 1) é,<br />

então, correlacionado com a mutação<br />

em um dos cinco possíveis genes<br />

acima relacionados (Figura 4). Como<br />

em todas as espécies de fungos<br />

filamentosos estudadas até o momento,<br />

apenas uma cópia funcional<br />

do gene da nitrato redutase foi encontrada,<br />

mutantes nitrato redutase<br />

são reportados com alta freqüência.<br />

A razão do teste de crescimento<br />

em hipoxantina é que, além do requerimento<br />

por NAD(P)H, as<br />

enzimas nitrato redutase são dependentes<br />

de uma molécula chamada<br />

cofator molibdênio. A ausência desse<br />

cofator impossibilita a célula de<br />

utilizar o nitrato como também<br />

purinas como adenina, hipoxantina<br />

e xantina como única fonte de nitrogênio.<br />

Os mutantes incapazes de<br />

crescer em nitrato e hipoxantina<br />

apresentam uma perda pleiotrópica<br />

da atividade das enzimas nitrato<br />

redutase e xantina desidrogenase,<br />

respectivamente. Como esses<br />

mutantes são defectivos na síntese<br />

de um cofator comum, tanto para a<br />

nitrato redutase como para xantina<br />

desidrogenase, os genes envolvidos<br />

na síntese desse cofator foram denominados<br />

cnx (do inglês common<br />

component for nitrate reductase and<br />

xanthine dehydrogenase) (Pateman<br />

et al., 1964; Cove, 1979). Por meio<br />

de testes de complementação entre<br />

diferentes mutantes, Pateman et al.<br />

(1964) reportaram a existência de<br />

vários loci (cnx ABC, E, F, G e H)<br />

relacionados com vários genes responsáveis<br />

pela produção do cofator<br />

molibdênio, e Arst et al. (1982) relataram<br />

a existência de outro locus<br />

(cnxJ). Unkles et al. (1997) comprovaram<br />

que o locus cnxABC é parte<br />

de um único gene que codifica uma<br />

proteína com dois domínios catalíticos<br />

requeridos para a síntese de um<br />

intermediário do cofator molibdênio.<br />

Um protocolo para obtenção de<br />

mutantes deficientes na enzima nitrato<br />

redutase é apresentado a seguir<br />

e está esquematizado na Figura 4.<br />

Esse protocolo baseia-se em espécies<br />

que apresentam reprodução<br />

assexual e/ou sexual possibilitando<br />

o uso de esporos na análise. Como na<br />

grande maioria das espécies de fungos<br />

filamentosos os esporos são<br />

uninucleados e contêm genoma<br />

haplóide, a mutação é expressa sem<br />

efeito de dominância. Mesmo assim,<br />

algumas espécies de fungos não produzem<br />

esporos in vitro, e esse protocolo<br />

pode ser modificado para obtenção<br />

de mutantes por intermédio<br />

de fragmentos de micélio, onde setores<br />

resistentes ao clorato apresentam<br />

crescimento mais vigoroso. Entretanto,<br />

em algumas espécies de fungos, a<br />

resistência ao clorato parece ser natural,<br />

o que impossibilita a obtenção<br />

de mutantes por essa técnica.<br />

Protocolo para obtenção de<br />

mutantes nitrato redutase (segundo<br />

Cove, 1976; Cove, 1979; Unkles et<br />

al., 1989):<br />

• Preparar uma suspensão de<br />

esporos em tween 80 0,05%<br />

contendo cerca de 10 7 .ml -1<br />

esporos;<br />

• Plaquear 0,1 ml dessa solução<br />

em meio mínimo (MM) sólido<br />

(Pontecorvo et al., 1953) sem<br />

nitrato e acrescido de 470 mM<br />

de clorato de potássio e 10 mM<br />

de glutamato de sódio (clorato<br />

de potássio 57,6 g; glutamato<br />

de sódio monobásico 1,87 g;<br />

KH 2 PO 4 1,5 g; KCl 0,5 g; MgSO 4<br />

0,5 g; FeSO 4 0,01 g; ZnSO 4 0,01<br />

g; glicose 10 g; ágar 15 g; água<br />

destilada 1.000 ml; pH 6,8);<br />

• Incubar as placas a 25 o C por<br />

cerca de 7 a 10 dias;<br />

• Transferir as colônias resistentes<br />

ao clorato para placas<br />

contendo meio completo (MC)<br />

sólido, Pontecorvo et al. (1953)<br />

modificado por Azevedo e Costa<br />

(1973) [meio mínimo adicionado<br />

de peptona 2,0 g; caseína<br />

hidrolisada 1,5 g; extrato de<br />

levedura 2,0 g; solução de vitaminas<br />

1,0 ml; (biotina 0,2 mg;<br />

ácido p-aminobenzóico 10,0 mg;<br />

piridoxina 50,0 mg; tiamina 50,0<br />

mg; ácido nicotínico 100,0 mg;<br />

riboflavina 100,0 mg; água destilada<br />

100 ml); ágar 15 g; água<br />

destilada 1.000 ml; pH 6,8];<br />

• Fazer purificação monospórica<br />

dos mutantes;<br />

• Inocular as colônias resistentes<br />

em placas de MM contendo<br />

10 mM das seguintes fontes de<br />

nitrogênio : nitrato de sódio,<br />

nitrito de sódio, cloreto de<br />

amônio, hipoxantina e glutamato<br />

de sódio;<br />

• Incubar a 25 o C por 3 a 5 dias;<br />

80 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

• Verificar o crescimento e anotar<br />

os fenótipos mutantes;<br />

• Separar e identificar os<br />

mutantes nitrato redutase.<br />

Assim, o sistema nitrato redutase<br />

apresenta vantagens sobre outros<br />

sistemas, como a fácil obtenção de<br />

mutantes espontâneos por seleção<br />

positiva via resistência ao clorato, e,<br />

como não há emprego de mutagênese,<br />

a possibilidade de mutações<br />

secundárias que atinjam genes importantes<br />

ou de interesse é reduzida.<br />

Também esses mutantes apresentam<br />

um único fenótipo desejável,<br />

não utilizar nitrato como única<br />

fonte de nitrogênio, sendo que esse<br />

fenótipo é dispensável sem alterar o<br />

crescimento ou fluxos metabólicos<br />

importantes.<br />

Utilização de mutantes<br />

deficientes na utilização do<br />

nitrato em estudos de<br />

grupos de compatibilidade<br />

vegetativa<br />

Isolados de uma espécie fúngica<br />

podem ser caracterizados pela compatibilidade<br />

ou incompatibilidade vegetativa.<br />

A compatibilidade ocorre<br />

quando micélios de diferentes isolados<br />

podem sofrer anastomoses e originar<br />

heterocários (hifas que contêm<br />

núcleos geneticamente diferentes),<br />

enquanto a incompatibilidade ocorre<br />

quando não há formação de heterocários.<br />

Nem sempre é possível formar<br />

essas anastomoses, principalmente<br />

quando os cruzamentos são<br />

interespecíficos ou intergenéricos,<br />

pois o fator determinante da interação<br />

entre as células pode estar na<br />

parede celular manifestando-se como<br />

bloqueio da fusão celular (Peberdy,<br />

1991). Os isolados que apresentem<br />

compatibilidade podem ser colocados<br />

dentro de um mesmo grupo,<br />

formando um grupo de compatibilidade<br />

vegetativa (GCV). Em fungos<br />

de reprodução assexuada, isolados<br />

de um mesmo GCV são mais similares<br />

geneticamente que isolados de<br />

diferentes GCV.<br />

A heterocariose também é a primeira<br />

etapa para que fungos<br />

assexuados troquem material genético<br />

por meio de um ciclo alternativo<br />

chamado parassexual. Nesse ciclo,<br />

os diferentes núcleos no heterocário<br />

se fundem, originando diplóides he-


terozigotos, e, a seguir, ocorre a produção<br />

de recombinantes por meio de<br />

recombinação mitótica e haploidização<br />

(Pontecorvo & Roper, 1952).<br />

A detecção de heterocários pode<br />

ser alcançada pelo cruzamento de<br />

indivíduos portadores de diferentes<br />

mutações. Quando são formadas<br />

anastomoses entre as hifas desses<br />

diferentes mutantes, o heterocário<br />

pode ser visualizado já que o núcleo<br />

de um indivíduo contém o gene selvagem<br />

que complementa a mutação<br />

do outro. As diferentes mutações<br />

podem estar relacionadas, por exemplo,<br />

à coloração da colônia, mas a<br />

obtenção de mutantes por técnicas<br />

de mutagênese tradicionais é muito<br />

trabalhosa, o que torna esse procedimento<br />

difícil de ser empregado para<br />

estudo com muitos isolados de campo.<br />

Assim, vários trabalhos reportam<br />

o estudo de GCVs utilizando mutações<br />

auxotróficas que incapacitem a<br />

célula de utilizar nitrato como única<br />

fonte de nitrogênio (Puhala, 1985;<br />

Correl et al., 1986; Brooker et al.,<br />

1991). Nesses estudos, é suficiente<br />

fazer a triagem de populações utilizando<br />

indivíduos que contenham mutações<br />

únicas em diferentes genes da<br />

assimilação do nitrato, que possam<br />

ser testados para a sua habilidade de<br />

complementar as mutações e de formar<br />

heterocário em meio contendo<br />

nitrato como única fonte de nitrogênio.<br />

Como o isolamento de mutantes<br />

resistentes ao clorato gera mutações<br />

de diferentes tipos, essas mutações<br />

podem ser utilizadas como marcas<br />

de seleção para a formação dos heterocários.<br />

Assim, esse sistema tornase<br />

simples e rápido para ser utilizado<br />

para essa finalidade.<br />

Estudos de compatibilidade vegetativa<br />

são de particular interesse<br />

em fungos que se reproduzem<br />

assexuadamente, já que os indivíduos<br />

dentro de um GCV podem trocar<br />

informações genéticas por meio de<br />

heterocariose e de ciclo parasexual.<br />

Em fungos fitopatogênicos, os GCVs<br />

podem ser correlacionados com a<br />

patogenicidade, embora essa correlação<br />

não esteja sempre ligada.<br />

Puhalla (1985) utilizou mutantes deficientes<br />

na assimilação de nitrato<br />

para testar a compatibilidade vegetativa<br />

entre 21 isolados de F. oxysporum,<br />

reportando que membros do mesmo<br />

GCV pertenciam à mesma formae<br />

speciales. Correl et al. (1986) também<br />

utilizaram mutantes incapazes de<br />

metabolizar nitrato em testes de compatibilidade<br />

vegetativa para identificar<br />

F. oxysporum f. sp. apii raça 2 de<br />

uma população de raças de F.<br />

oxysporum que colonizava raízes de<br />

aipo. Assim, o teste de compatibilidade<br />

vegetativa é uma ótima ferramenta<br />

para estudos de diversidade<br />

genética constituindo marcadores genéticos<br />

naturais que podem ser utilizados<br />

para diferenciar isolados. Além<br />

disso, em fungos que se reproduzem<br />

sexuadamente, esses estudos também<br />

são importantes para determinar<br />

genes relacionados com o tipo<br />

sexual (mating type), importantes no<br />

reconhecimento e desenvolvimento<br />

do ciclo sexual.<br />

Transformação genética<br />

baseada no gene da nitrato<br />

redutase<br />

Um dos principais passos no desenvolvimento<br />

de uma tecnologia para<br />

manipulação e análise molecular de<br />

um organismo é o estabelecimento de<br />

um protocolo que permita introduzir<br />

seqüências de DNA clonadas em uma<br />

linhagem recipiente. A disponibilidade<br />

de um sistema de transformação<br />

oferece possibilidade de adição e de<br />

deleção de rotas metabólicas em um<br />

organismo de interesse, alterando o<br />

fenótipo selvagem para uma aplicação<br />

específica. As seqüências a serem<br />

introduzidas têm interesses distintos,<br />

dependendo do tipo de organismo<br />

estudado. Dessa forma, o principal<br />

objetivo da clonagem de genes que<br />

codificam nitrato redutase é o estabelecimento<br />

de protocolos de transformação<br />

baseados na complementação<br />

de mutações no gene da nitrato<br />

redutase. Nesse ponto, além das vantagens<br />

inerentes a esse sistema, outra<br />

característica importante é ser baseado<br />

na complementação de uma mutação<br />

auxotrófica, o que evita a introdução<br />

de genes de seleção baseados na<br />

resistência a drogas.<br />

A transformação é realizada pela<br />

introdução do gene da nitrato redutase<br />

em um mutante nitrato redutase por<br />

biobalística ou Agrobacterium<br />

tumefaciens, sendo que o método<br />

mais comum é o da transformação de<br />

protoplastos pela técnica do polietilenoglicol<br />

(PEG)/CaCl 2 . Após a trans-<br />

formação, os protoplastos são<br />

plaqueados por pour-plate em meio<br />

mínimo contendo estabilizador<br />

osmótico e nitrato como única fonte<br />

de nitrogênio. Apenas aquelas células<br />

mutantes onde o gene da nitrato<br />

redutase se integrar, serão capazes<br />

de crescer (Figura 5). Para tanto,<br />

pode-se utilizar um gene da nitrato<br />

redutase já isolado de um organismo<br />

em uma espécie de interesse. Quando<br />

o gene é de uma espécie diferente<br />

da espécie receptora, o sistema é dito<br />

heterólogo, e quando o gene foi<br />

isolado do organismo receptor, o<br />

sistema é dito homólogo.<br />

Nos sistemas heterólogos, geralmente<br />

há baixa similaridade entre o<br />

vetor de transformação e o genoma<br />

do organismo receptor, o que resulta<br />

em baixa freqüência de transformação,<br />

integração aleatória e alto número<br />

de cópias do vetor. Esse padrão de<br />

integração aleatório pode ser interessante<br />

para obtenção de mutantes pela<br />

técnica de REMI (do inglês restriction<br />

enzyme-mediated integration), descrita<br />

por Schiestl e Petes (1991), que é<br />

uma variação da técnica de transformação,<br />

onde enzima de restrição é<br />

adicionada à mistura de transformação<br />

juntamente com o plasmídeo linear.<br />

Queiroz et al. (1998) verificaram<br />

que o gene da nitrato redutase de F.<br />

oxysporum se integrava aleatoriamente<br />

no genoma de P. griseoroseum,<br />

sendo essa característica utilizada por<br />

Soares (2002) para obtenção de<br />

mutantes de P. griseoroseum pela técnica<br />

de REMI.<br />

Mesmo assim, sistemas de transformação<br />

homólogos têm sido desenvolvidos<br />

para vários fungos filamentosos,<br />

incluindo A. oryzae<br />

(Unkles et al., 1989), Cephalosporium<br />

Figura 5 - Seleção de transformantes baseada<br />

no gene da nitrato redutase. Placas com<br />

meio mínimo contendo nitrato como única<br />

fonte de nitrogênio. (A) Controle negativo<br />

- protoplastos do mutante nitrato<br />

redutase que não foram transformados;<br />

(B) protoplastos do mesmo mutante que<br />

foram transformados com gene homólogo<br />

da nitrato redutase.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 81


acremonium (Whithead et al., 1990),<br />

P. chrysogenum (Gouka et al., 1991),<br />

Fusarium oxysporum (Diolez et al.,<br />

1993), G. fujikuroi (Tudzynski et al.,<br />

1996), B. cinerea (Levis et al., 1997a),<br />

S. nodorum (Cutler et al., 1998) e P.<br />

griseoroseum (Pereira, 2001). Na literatura,<br />

existem relatos para A. oryzae<br />

(Unkles et al., 1989) e S. nodorum<br />

(Cutler et al., 1998) de 100% de<br />

integração do vetor no locus da nitrato<br />

redutase, sendo que nesses estudos<br />

foram analisados 22 transformantes<br />

para A. oryzae e 13 transformantes<br />

para S. nodorum. Para B.<br />

cinerea (Levis et al., 1997a), a análise<br />

de 36 transformantes revelou 34<br />

integrações homólogas, sendo 29<br />

eventos de troca gênica. Mesmo que<br />

a utilização de genes homólogos aumente<br />

a probabilidade de ocorrência<br />

de integração em sítios homólogos,<br />

para fungos filamentosos e outros<br />

organismos eucariotos, parecem ser<br />

mais comuns eventos de integração<br />

heteróloga. Sistemas de transformação<br />

homólogos, baseados na complementação<br />

de mutações nitrato<br />

redutase, desenvolvidos para<br />

Cephalosporium acremonium<br />

(Whitehead et al., 1990) e P.<br />

chrysogenum (Gouka et al., 1991)<br />

resultam, na maioria dos transformantes,<br />

na integração do vetor em<br />

sítios diferentes do locus da nitrato<br />

redutase, enquanto que G. fujikuroi<br />

(Tudzynski et al., 1996) e F.<br />

oxysporum (Diolez et al., 1993) ocorreu<br />

um número similar de integrações,<br />

dentro e fora desse locus.<br />

Um sistema de transformação com<br />

alta incidência de integração homóloga,<br />

especialmente troca gênica, pode<br />

ser utilizado para estudos de regiões<br />

importantes, tanto em nível de<br />

regulação como em nível estrutural.<br />

Assim, mutações geradas in vitro,<br />

como alteração dos sítios de ligação<br />

de proteínas reguladoras, podem ser<br />

introduzidas e avaliadas in vivo no<br />

exato local onde reside o gene. Além<br />

disso, essa alta taxa de integração<br />

homóloga é interessante em experimentos<br />

de co-transformação, pois diminui<br />

a probabilidade de integrações<br />

em sítios heterólogos que sejam importantes<br />

para o metabolismo celular<br />

e/ou de interesse biotecnológico.<br />

Vários trabalhos relatam a utilização<br />

de vetores de transformação<br />

que carregam o gene da nitrato<br />

redutase como marcadores de seleção<br />

em experimentos de co-transformação<br />

para introduzir genes de<br />

interesse biotecnológico. Por exemplo,<br />

Ribeiro (2001) relatou a obtenção<br />

de transformantes com até 89%<br />

de aumento na produção de poligalacturonase<br />

quando co-transformou<br />

um mutante nitrato redutase de P.<br />

expansum com o plasmídeo pPE 15,<br />

que carrega o gene homólogo de<br />

poligalacturonase, e o plasmídeo<br />

pNH24, contendo o gene da nitrato<br />

redutase de F. oxysporum como<br />

marcador de seleção. Linhagens<br />

transformantes de A. oryzae apresentaram<br />

a produção de poligalacturonase<br />

aumentada em até 3,2 vezes<br />

quando transformadas com um gene<br />

de poligalacturonase de Penicillium<br />

janthinellum, sendo os transformantes<br />

selecionados pela complementação<br />

de uma mutação nitrato<br />

redutase (Ishida et al. 1997). Cardoso<br />

et al. (2003) utilizaram o gene<br />

homólogo da nitrato redutase de P.<br />

griseoroseum para introduzir uma<br />

construção do gene da pectina liase<br />

e obtiveram transformantes com aumento<br />

expressivo na atividade dessa<br />

enzima.<br />

Utilização do gene da<br />

nitrato redutase como<br />

vetor de expressão<br />

Uma outra perspectiva na aplicação<br />

biotecnológica do gene da nitrato<br />

redutase é sua utilização como<br />

vetor de expressão. Isso é baseado<br />

nas análises de expressão onde são<br />

observadas grandes quantidades de<br />

transcrito do gene da nitrato redutase<br />

apenas poucos minutos após sua<br />

indução por nitrato (Okamoto et al.,<br />

1991; Haas et al., 1996), sendo esse<br />

indutor acessível e de baixo custo.<br />

Essa perspectiva é importante uma<br />

vez que muitos genes de valor biotecnológico<br />

somente são expressos<br />

na presença de um indutor específico<br />

que, muitas vezes, é oneroso e<br />

acarreta a inviabilidade da aplicação<br />

industrial. Para tanto, a região estrutural<br />

do gene de interesse pode ser<br />

clonada sob controle do promotor do<br />

gene da nitrato redutase, abrindo a<br />

possibilidade para a indução do gene<br />

por uma fonte mais acessível e apenas<br />

no momento em que o indutor<br />

estiver presente.<br />

82 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Uso da nitrato redutase<br />

para detecção e isolamento<br />

de elementos<br />

transponíveis<br />

Elementos transponíveis são seqüências<br />

de DNA que podem se<br />

mover no genoma integrando-se<br />

em regiões não homólogas, e que<br />

constituem importantes agentes de<br />

mutação e reorganização gênica,<br />

sendo também utilizados em sistemas<br />

de inativação de genes. Assim,<br />

detectar e isolar esses elementos é<br />

um importante passo para estudos<br />

de biologia básica e aplicada em<br />

um organismo. Diferentes estratégias<br />

são empregadas para o isolamento<br />

de elementos transponíveis<br />

em fungos filamentosos. Entre essas<br />

diferentes estratégias, o método<br />

de armadilha para transposons<br />

(“transposons trapping”) é o melhor<br />

método para detecção e isolamento<br />

de elementos transponíveis<br />

ativos. Esse método requer, além<br />

de um sistema de seleção positiva<br />

de mutantes espontâneos, que o<br />

gene alvo esteja clonado e caracterizado.<br />

Conforme discutido anteriormente,<br />

um dos melhores sistemas<br />

para seleção positiva de<br />

mutantes espontâneos é o sistema<br />

nitrato redutase. Dessa maneira,<br />

esse sistema vem sendo empregado<br />

com muito sucesso para o isolamento<br />

de vários elementos transponíveis<br />

em fungos filamentosos.<br />

Os elementos Fot1, impala, Ant1,<br />

Vader, Flipper e hupfer, são exemplos<br />

de transposons clonados pela<br />

seleção de mutações espontâneas<br />

no gene da nitrato redutase em<br />

Fusarium oxysporum, Aspergillus<br />

niger, A. fumigatus, Botrytis cinerea<br />

e Beauveria bassiana (Daboussi et<br />

al., 1992; Langin et al., 1995; Glayzer<br />

et al., 1995; Amutan et al., 1996;<br />

Levis et al., 1997b; Maurer et al.,<br />

1997).<br />

Para isolar esses elementos utilizando-se<br />

o sistema nitrato redutase,<br />

é necessário isolar mutantes nitrato<br />

redutase e caracterizar, por hibridização<br />

com o gene alvo, o tipo de<br />

mutação que originou o fenótipo<br />

mutante. Nos mutantes isolados podem<br />

ocorrer mutações de diferentes<br />

tipos no gene da nitrato redutase,<br />

como, por exemplo, mutações pontuais,<br />

deleções ou inversões. Além


Figura 6 - Esquema da detecção e isolamento de elementos transponíveis utilizando o gene da nitrato redutase como isca.<br />

desses tipos, também pode ocorrer a<br />

inserção de um fragmento de DNA,<br />

como a inserção de um elemento<br />

transponível. Assim, espera-se que o<br />

resultado da hibridização apresente<br />

algum mutante com o fragmento do<br />

gene alvo maior quando comparado<br />

ao tipo selvagem (Figura 6). Após a<br />

obtenção de um mutante com a inserção,<br />

pode-se fazer um teste de<br />

estabilidade plaqueando-se esporos<br />

do mutante em meio mínimo contendo<br />

nitrato como única fonte de nitrogênio.<br />

Se a inserção for oriunda de<br />

um transposon ativo, esse pode saltar<br />

e reconstituir o fenótipo selvagem,<br />

apresentando maior instabilidade.<br />

O fragmento inserido, ou parte<br />

dele, pode ser recuperado por meio<br />

de bancos genômicos parciais ou de<br />

amplificação com oligonucleotídeos<br />

específicos e, então, seqüenciado e<br />

caracterizado.<br />

Mesmo que o gene da nitrato<br />

redutase não tenha sido clonado para<br />

uma espécie de interesse, há possibilidade<br />

de usar um gene heterólogo<br />

conforme realizado com sucesso por<br />

Daboussi et al. (1992). Esses autores<br />

introduziram o gene da nitrato redutase<br />

de A. nidulans em uma linhagem<br />

mutante para nitrato redutase de F.<br />

oxysporum e isolaram o elemento<br />

Fot1 inserido no gene heterólogo.<br />

Assim, a fácil seleção de mutantes<br />

nitrato redutase têm-se mostrado uma<br />

ótima ferramenta no isolamento de<br />

elementos transponíveis ativos em<br />

diferentes espécies de fungos filamentosos.<br />

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<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 85


Pesquisa<br />

Carla M. Y. Lemos<br />

Lab. de Bioquímica e Microbiologia aplicada<br />

IBILCE - UNESP, Pós Graduação em Microbiologia<br />

Aplicada IB/UNESP - Rio Claro-SP<br />

Erica Fuchs<br />

Department of Food Science and Human Nutrition<br />

Iowa State University, IA-USA<br />

Eleni Gomes<br />

Lab. de Bioquímica e Microbiologia aplicada<br />

Departamento de Biologia<br />

IBILCE - UNESP - São José Rio Preto-SP<br />

Roberto Da Silva<br />

Lab. de Bioquímica e Microbiologia aplicada,<br />

Departamento de Química e <strong>Ciência</strong>s Ambientais,<br />

IBILCE - UNESP - São José Rio Preto-SP<br />

dasilva@qca.ibilce.unesp.br<br />

Ilustrações cedidas pelos autores<br />

Glucoamilase:<br />

Estrutura e termoestabilização<br />

86 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Estrutura e termoestabilização de glucoamilase por técnicas moleculares<br />

Resumo<br />

A glucoamilase (GA) é uma<br />

enzima hidrolítica que catalisa a liberação<br />

sucessiva de β-D-glucose a partir<br />

do amido e oligossacarídeos relacionados.<br />

A GA catalisa eficientemente<br />

a reação de sacarificação do amido<br />

dentro de uma faixa estreita de temperatura.<br />

A sua termoestabilidade limitada<br />

afeta seu uso no processo<br />

industrial, onde a incubação prolongada<br />

em altas temperaturas é necessária.<br />

As estratégias tradicionais para<br />

melhorar a termoestabilidade da GA<br />

de Aspergillus, tais como a imobilização<br />

e modificação química têm falhado<br />

no uso industrial. Atualmente, as<br />

técnicas de evolução dirigida utilizando<br />

a biologia molecular proporcionam<br />

uma importante ferramenta para<br />

melhorar ou mesmo criar novas propriedades<br />

nas enzimas existentes, em<br />

um curto espaço de tempo. Esta revisão<br />

apresenta a importância, estrutura<br />

e função da glucoamilase e as recentes<br />

estratégias da biologia molecular<br />

como ferramenta para melhorar a termoestabilidade<br />

desta enzima.<br />

1. Glucoamilase de<br />

Aspergillus<br />

A glucoamilase (α-1,4-glucan<br />

glucohidrolase, EC 3.2.1.3), também<br />

conhecida como amiloglucosidase, é<br />

uma enzima hidrolítica que catalisa a<br />

quebra das ligações glicosídicas α-<br />

1,4 a partir de uma extremidade não<br />

redutora das moléculas de amilose<br />

ou amilopectina do grânulo de amido<br />

e oligossacarídeos relacionados<br />

liberando β-D-glucose. Em uma ve-<br />

locidade menor, a glucoamilase também<br />

atua hidrolisando as ligações α-<br />

1,6 (Fleetwood e Weigel, 1962). Sugere-se,<br />

portanto, que a ação da<br />

glucoamilase ocorra através de um<br />

mecanismo multisseriado no qual a<br />

enzima atua aleatoriamente em toda<br />

a molécula de substrato (James e Lee,<br />

1997).<br />

A glucoamilase (GA) é amplamente<br />

usada na indústria alimentícia<br />

para a produção de xaropes com alto<br />

teor de glucose e também é empregada<br />

na produção de álcool e xaropes<br />

com alto teor de frutose (1989;<br />

Brumm, 1998; Mathewson, 1998).<br />

Vários microrganismos, plantas<br />

e animais produzem glucoamilase.<br />

Estas enzimas disponíveis comercialmente<br />

são, na sua maior parte, produzidas<br />

por linhagens dos fungos<br />

Aspergillus e Rhizopus. Dentre estas,<br />

a glucoamilase de Aspergillus é a<br />

mais termoestável, apresentando a<br />

máxima atividade em torno do pH<br />

4,5, em temperaturas de 50 a 55°C,<br />

mas ela é rapidamente inativada em<br />

temperaturas próximas a 60°C<br />

(Manjunath et al.,1983; Brumm, 1998).<br />

A glucoamilase catalisa eficientemente<br />

a reação de sacarificação<br />

dentro de um limite relativamente<br />

estreito de temperatura, porque a<br />

sua conformação cataliticamente ativa<br />

muda com o aumento da temperatura.<br />

Esta termoestabilidade limitada<br />

afeta seu uso no processo industrial,<br />

onde a atuação prolongada<br />

em altas temperaturas é necessária.<br />

Na produção de xaropes com alto<br />

teor de glucose, uma pasta de amido<br />

(30-40% BS) é primeiro liquefeita a<br />

105°C por 5 minutos e em seguida,


Figura 1. Imagem da estrutura estendida da glucoamilase de Aspergillus niger idêntica a glucoamilase de Aspergillus awamori.<br />

No lado esquerdo o domínio catalítico (DC), ao centro o filamento ligante ou “linker” (L) e à direita o domínio de ligação ao<br />

substrato (amido) (DLS).<br />

http://nte-serveur.univ-lyon1.fr/nte/heyde/www.public.iastate.edu/_pedro/glase/glase.html (10/10/03)<br />

a 95°C por 2 horas, usando a aamilase<br />

bacteriana termoestável, em<br />

pH 6.0-6.5. Finalmente, o amido<br />

liquefeito é resfriado a 60°C e<br />

hidrolisado por mais 48 a 72 horas<br />

usando a glucoamilase (James e Lee,<br />

1997, Brumm, 1998). Está claro que<br />

a termoestabilidade da glucoamilase<br />

determina a velocidade do processo<br />

como um todo. Trabalhar em<br />

altas temperaturas não apenas pode<br />

acelerar a taxa da reação e consequentemente<br />

diminuir o tempo do<br />

processo, como também pode prevenir<br />

a contaminação microbiológica,<br />

além de reduzir a viscosidade da<br />

mistura de reação. Portanto, o desenvolvimento<br />

de uma glucoamilase<br />

mais termoestável poderá contribuir<br />

para a otimização do processo<br />

de sacarificação do amido. Entretanto,<br />

o conhecimento da estrutura da<br />

proteína e o processo de termoinativação<br />

da enzima são necessários<br />

para elaboração de prognósticos racionais<br />

e planos efetivos de experimentos<br />

de estabilização da estrutura<br />

proteica.<br />

A glucoamilase de Aspergillus é<br />

codificada por um único gene, mas<br />

existem duas ou três formas variáveis<br />

da enzima produzidas por proteólise<br />

limitada (Svensson et al., 1986). Pazur<br />

et al (1971) constatou que as formas<br />

da glucoamilases de Aspergillus niger<br />

são glicoproteinas que possuem quantidades<br />

diferentes de glicosilações.<br />

Como em outras proteínas, após a<br />

síntese no citoplasma, a GA é transportada<br />

em um estado desdobrado<br />

através da membrana do retículo<br />

DC L DLS<br />

endoplasmático (RE). Durante o subseqüente<br />

processo de dobramento,<br />

ocorre a O-glicosilação do “linker”,<br />

filamento que liga o domínio catalítico<br />

(CD) ao domínio de ligação ao substrato<br />

(DLS), e pontes dissulfetos são<br />

formadas (Pryer et al, 1992; Gaut e<br />

Hendershot, 1993). Assim, a GA, na<br />

sua conformação nativa estendida,<br />

assume uma forma de alteres, onde<br />

dois domínios volumosos, o domínio<br />

catalítico e o domínio de ligação ao<br />

amido, estão ligados por um filamento<br />

fino como mostra a figura 1. Esta é<br />

uma imagem simplificada ilustrativa,<br />

uma vez que a estrutura real da GA<br />

completa ainda não está disponível.<br />

A organização dos domínios da molécula<br />

tem sido deduzida através das<br />

diferentes técnicas biofísicas e relatos<br />

disponíveis (Coutinho, 1997;<br />

Sauer, 2000).<br />

As inúmeras proteínas desdobradas,<br />

que entram no lúmem do RE,<br />

devem ser protegidas de quaisquer<br />

agressões e serem mantidas em um<br />

estado de dobramento-competente.<br />

Dobramentos ineficientes ou mutações<br />

em proteínas secretadas resultam<br />

em enzimas com conformação<br />

incorreta e defeito na atividade<br />

(Bonifacino e Klausner, 1994).<br />

Em Aspergillus awamori, o gene<br />

codifica uma GAI de tamanho completo<br />

contendo de 615 a 616 resíduos<br />

de aminoácidos (figura 2), bem como<br />

o peptídeo sinalizador de secreção<br />

no N-terminal. O peptídeo sinalizador<br />

é cortado após a secreção da proteína<br />

pela célula. O outro maior produto<br />

de proteólise da GAI (diz-se da GA<br />

competente) é a GAII resultante da<br />

perda do sítio de ligação ao substrato<br />

localizado na extremidade C-terminal.<br />

A GAII é uma mistura de<br />

polipeptídeos de tamanhos entre 512<br />

e 514 resíduos de aminoácidos, com<br />

atividade catalítica normal mas sem a<br />

habilidade para se ligar ao amido no<br />

estado natural, não gelatinizado<br />

(Svensson et al., 1986).<br />

As proteínas originais de<br />

Aspergillus niger e Aspergillus<br />

awamori, cujas seqüências são idênticas<br />

(Svensson et al., 1989; Nunberg<br />

et al., 1984), consistem de três principais<br />

áreas funcionais (Coutinho e<br />

Reilly, 1994 a-b, Coutinho e Reilly,<br />

1997): (1) o domínio catalítico, constituído<br />

dos resíduos 1 ao 440, (2) o<br />

filamento ligante, formado pelos resíduo<br />

441 ao 512, que é altamente Oglicosilado,<br />

e (3) um domínio de<br />

ligação ao amido no estado natural<br />

na extremidade C-terminal, contendo<br />

os resíduo 513 a 616 (Svensson et<br />

al., 1986; et al., 1989). Além da região<br />

de O-glicosilação do “linker”, dois<br />

outros sítios de N-glicosilação estão<br />

localizados nos resíduos Asn 171 e<br />

Asn 395 (Svensson et al., 1989; Aleshin<br />

et al., 1992). Acredita-se que os resíduos<br />

de carboidratos desempenham<br />

uma importante função na estabilização<br />

da glucoamilase (Manjunath et<br />

al.,1983, Svensson et al.,1989;<br />

Williamson et al., 1992a). Em altas<br />

temperaturas, a GA de A. niger, quimicamente<br />

desglicosilada, (Shenoy<br />

et al., 1984) e a glucoamilase de A.<br />

awamori, geneticamente truncada,<br />

sem parte da região de O-glicosilação<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 87


(Evans et al, 1990), deterioraram-se<br />

mais rapidamente do que as suas<br />

formas selvagens. Além disso, a GAII<br />

em que falta apenas do domínio de<br />

ligação ao substrato, tem termoestabilidade<br />

similar a da GAI (Svensson<br />

et al., 1986), enquanto que uma<br />

glucoamilase especial (GAI’), na qual<br />

faltam parte da região O-glicosilada e<br />

o domínio de ligação ao amido, é<br />

menos estável do que a sua forma<br />

original (Hayashida et al., 1989). A<br />

região de O-glicosilação também facilita<br />

a secreção de GA (Evans et al.,<br />

1990).<br />

A estrutura da GA nativa é muito<br />

difícil de determinar em função do<br />

alto grau de glicosilação. Aleshin et<br />

al (1992) determinou a estrutura cristalina<br />

de uma GA muito próxima da<br />

forma nativa denominada A. awamori<br />

var. X100 (GA’) (figura 3), a qual foi<br />

obtida por proteólise limitada com<br />

subtilisina e apresenta os primeiros<br />

470 resíduos de aminoácidos da proteína<br />

original. Esta seqüência de aminoácidos<br />

da GA’ é 99,4% similar a<br />

GAI de A. niger e A. awamori, com<br />

uma deleção no resíduo 102 (Aleshin<br />

et al, 1992, 1994a). Assim, o estudo<br />

desta estrutura cristalina elucidou a<br />

conformação do domínio catalítico<br />

completo e a conformação da primeira<br />

metade N-terminal da região Oglicosilada<br />

da glucoamilase de<br />

Aspergillus. A estrutura cristalina da<br />

GA de A. awamori var. X100 mostrou<br />

que o domínio catalítico consiste<br />

de treze a-hélices que compreendem<br />

cerca de 51% dos resíduos de<br />

aminoácidos do polipeptídeo total, e<br />

regiões menores de β filamentos<br />

antiparalelos. Doze das α-hélices<br />

estão arranjadas dentro de uma estrutura<br />

denominada barril α/α, consistindo<br />

de seis α-hélices externas e seis<br />

internas que envolvem o sítio<br />

catalítico em forma de funil, constituído<br />

por seis segmentos α/α altamente<br />

conservados (Sauer, 2000). O sítio<br />

catalítico da GA possui uma barreira<br />

de resíduos hidrofóbicos no centro,<br />

os quais separam o núcleo em duas<br />

regiões de volume morto (void), contendo<br />

apenas água. Uma serve como<br />

o sítio ativo propriamente dito e a<br />

outra, tem uma função ainda não<br />

conhecida (Aleshin et al., 1994a). O<br />

sítio ativo contém Glu179 e Glu400<br />

como os dois resíduos de aminoácidos<br />

catalíticos localizados no fundo<br />

do sítio (Harris et al., 1993; Sauer,<br />

2000). A estrutura em barril α/α do<br />

DC da GA de A. awamori, A. niger e<br />

de Saccharomyces fibuligera são similares,<br />

sendo que esta última apresenta<br />

14 α-hélices, 12 das quais estão<br />

na conformação barril α/α (Sevcik et<br />

al, 1998; Sauer et al, 2000). Esta<br />

conformação contrasta com a<br />

topologia de organização em barril<br />

α/β encontrada em outras enzimas<br />

amilolíticas tais como α e β-amilases<br />

(Buisson et al., 1987; e Mikami et al.,<br />

1993) e ciclodestrina glucosiltransferases<br />

(Klein e Schulz, 1991). Observou-se<br />

uma pequena similaridade<br />

entre a estrutura da GA e proteínas<br />

transportadoras de glucose. Assim, a<br />

organização das hélices na GA pode<br />

ser relevante para a conformação de<br />

proteínas que transportam glucose<br />

(Aleshin et al, 1994a).<br />

O segmento O-glicosilado está<br />

numa conformação de cinto estendido<br />

em torno do barril α/α catalítico.<br />

Isto sugere que este segmento serve<br />

como um elo de ligação estrutural<br />

entre o domínio catalítico e o domínio<br />

de ligação. A primeira parte (aminoácidos<br />

441 a 471) desta região Oglicosilada<br />

possui cerca de 10 resíduos<br />

de manoses expostos, que juntos<br />

88 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Figura 2. Seqüência de aminoácidos (1 letra) da GA de A. niger. Letras vermelhas: αhelice;<br />

letras azuis: fita-β; C dentro dos retângulos: resíduos de cisteínas envolvidos<br />

em pontes dissulfetos; N dentro dos retângulos: sitios N-glicosilados; T e S dentro dos<br />

retângulos: sítios O-glicosilados; E dentro dos retângulos: resíduos dos aminoácidos<br />

catalíticos glutâmico 179 e 400; seqüências sombreadas: regiões conservadas S1 a S5;<br />

seqüência sublinhada: sitio de ligação ao substrato. Fonte: Flory, 1993.<br />

com 2 unidades de glucoses ligadas<br />

N-glicosidicamente nos resíduos Asn<br />

171 e Asn 395, formam um cinto de<br />

glicosilações ao redor do domínio<br />

catalítico (Aleshin et al, 1992). Foi<br />

sugerido que a outra parte altamente<br />

O-glicosilada (aminoácidos de 472 a<br />

512) envolva o domínio catalítico<br />

como uma continuação do resíduo<br />

471, fazendo com que o domínio de<br />

ligação ao amido fique próximo ao<br />

sítio ativo (Sauer et al, 2000). O<br />

segmento C-terminal do “linker” contém<br />

cerca de 30 aminoácidos, principalmente<br />

serina e treonina, sendo,<br />

portanto, muito O-glicosilado. A esta<br />

parte particular do linker tem sido<br />

atribuída papéis na estabilidade, secreção<br />

e na digestão do amido cru<br />

(Libby et al, 1994; Sauer et al, 2000).<br />

Embora algumas características como<br />

a compactação da conformação do<br />

barril α/α, a proteção dos carboidratos<br />

e a região O-glicosilada, façam a<br />

GA de Aspergillus mais estável do<br />

que algumas proteínas, uma maior<br />

estabilidade ainda é requerida para<br />

os processos industriais, como explicado<br />

anteriormente.<br />

O domínio de ligação ao amido<br />

possui este nome por causa da sua<br />

capacidade de se ligar ao grânulo de<br />

amido nativo e permitir sua digestão<br />

pelo domínio catalítico (Svensson et


Figura 3. Esquema da glucoamilase (GA’) de Aspergillus awamori var. X100 (Aleshin<br />

et al., 1992). α- hélices (H1 a H13) são simbolizadas por cilindros, sítios de Oglicosilação<br />

são representados por hexágonos simples, e sítios de N-glicosilação são<br />

simbolizados por cadeias de três hexágonos.<br />

al., 1983). Este domínio parece ter a<br />

capacidade de ligar a GA à parede da<br />

célula isto porque tem afinidade por<br />

α-1,4 e α-1,6 glucanos que pertencem<br />

à parede celular. Esta afinidade aumenta<br />

a concentração de GA próxima<br />

da micromembrana da célula<br />

(Neustroev et al., 1993). A GAII, na<br />

qual faltam os resíduos 513 a 616, tem<br />

uma habilidade semelhante a GAI<br />

para digerir amido solúvel, mas possui<br />

uma habilidade drasticamente reduzida<br />

para se ligar e hidrolisar o<br />

amido nativo (Svensson et al., 1989).<br />

Recentemente, foi demonstrado que<br />

o DLS isolado, atuando em grânulos<br />

de amido juntamente com a GAII,<br />

apresentaram um efeito sinergístico<br />

na degradação do substrato insolúvel,<br />

sugerindo que o domínio de ligação<br />

ao substrato se liga ao amido como<br />

uma porção individual e rompe a<br />

compacta estrutura do grânulo de<br />

amido facilitando a hidrólise pelo<br />

domínio catalítico (Southall et al, 1999;<br />

Sauer et al, 2000). O domínio de<br />

ligação ao amido da GA possui uma<br />

significante similaridade de seqüência<br />

de aminoácidos com o domínio de<br />

ligação ao amido da ciclodextrina glicosiltransferase<br />

(CGTase) (Svensson<br />

et al., 1989). A estrutura tridimensional<br />

da CGTase é globular, contendo de 6<br />

a 8 fitas β (Klein e Schulz, 1991). A<br />

estrutura do domínio de ligação ao<br />

amido da GA revela uma estrutura<br />

bem definida em fitas β consistindo<br />

de um par paralelo e 6 pares<br />

antiparalelos que formam um barril β<br />

aberto na lateral. Dois sítios de ligação<br />

para outros ligantes foram encontrados<br />

neste domínio, sendo cada um<br />

no final da molécula em faces opostas<br />

(Sorimachi et al., 1996). O mecanismo<br />

proposto de ligação deste domínio<br />

aos grânulos de amido, parece envolver<br />

a formação de um complexo de<br />

inclusão entre os resíduos hidrofóbicos<br />

do domínio de ligação e os grânulos<br />

de amido (Goto et al., 1994).<br />

Existem quatro pontes dissulfetos<br />

na GA, das quais três estão no<br />

domínio catalítico e uma no domínio<br />

de ligação. No domínio catalítico, as<br />

pontes estão entre os resíduos 210 e<br />

213 (conectando o N-terminal com o<br />

meio da hélice 7), 262 e 270 (contendo<br />

um filamento β antiparalelo) e 222<br />

e 449 (associando o trigésimo resíduo<br />

O-glicosilado do “cinto” com o<br />

domínio catalítico) (Aleshin et al.,<br />

1992). Experimentos sugerem que<br />

existe uma ligação dissulfeto entre os<br />

resíduos 509 e 604 que conecta o Nterminal<br />

com o C-terminal do domínio<br />

de ligação ao substrato (Coutinho<br />

e Reilly, 1994 b).<br />

Existem dois resíduos N-glicosilados<br />

(Asn 171 e Asn 395) na GA, nos<br />

arredores do sítio ativo. Em cada<br />

caso, o N da Asn está ligado à posição<br />

C1 do primeiro resíduo de açúcar (Nacetil-D-glucosamina),<br />

que está ligado<br />

por β (1→4) ao segundo (Nacetil-D-glucosamina)<br />

que por sua<br />

vez se liga ao terceiro resíduo (Dmanose)<br />

(Aleshin et al., 1992). O<br />

número total de resíduos de açúcares<br />

para formar a cadeia glicosil ligada a<br />

Asn 171 e Asn 395 é 5 e 8 respectivamente<br />

(Aleshin et al., 1994 a). A<br />

mutação Asn 395→ Gln que removeu<br />

o sítio de N- glicosilação no resíduo<br />

395, diminuiu drasticamente tanto a<br />

secreção como a termoestabilidade,<br />

mas não alterou a atividade específica<br />

(Chen et al., 1994 b).<br />

Embora a GA de A. awamori<br />

primariamente catalise a clivagem<br />

hidrolítica de ligações a (1,4) com<br />

liberação de β-glucose a partir de<br />

uma extremidade não redutora da<br />

cadeia de amido e oligossacarídeos,<br />

ela também cliva ligações glicosídicas<br />

a (1,6) com uma eficiência catalítica<br />

(Kca t / Km) por volta de 500 vezes<br />

menor do que para as ligações a (1,4)<br />

(Fleetwood e Weigel, 1962).<br />

2. Termoestabilização da<br />

Glucoamilase<br />

2.1. Estratégias tradicionais<br />

A modificação química e a imobilização<br />

são as duas principais estratégias<br />

tradicionais que têm sido exploradas<br />

para melhorar a termoestabilidade<br />

da GA.<br />

Modificação química: altera um<br />

grupo funcional específico nas proteínas,<br />

tal como um grupo carboxila,<br />

por reação química. Embora esta<br />

técnica tenha aumentado a estabilização<br />

da a α-quimotripsina em 1000<br />

vezes (Moshaev et al., 1988), ela<br />

geralmente tem um rendimento negativo<br />

ou relativamente muito pequeno<br />

na termoestabilização da GA<br />

(Sinitsyn et al.,1978; Munch e Tritsch,<br />

1990).<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 89


Imobilização: geralmente resulta<br />

em alguma perda da atividade<br />

enzimática (Lee et al., 1976; Svensson<br />

e Ottesen, 1981; Lenders e Crichton,<br />

1988), mas apesar disso, foi usada<br />

em GA porque ela permite o processo<br />

contínuo de operação. Embora<br />

muitas GAs imobilizadas tenham<br />

melhor estabilidade do que as formas<br />

solúveis, elas ainda não substituíram<br />

estas últimas no uso industrial, isto<br />

porque as GAs imobilizadas devem<br />

ser usadas em temperaturas operacionais<br />

baixas a fim de serem preservadas<br />

por vários meses, e continuarem<br />

viáveis (Lee et al., 1976). Desde que<br />

a energia de ativação para a atividade<br />

enzimática deva ser menor do que<br />

para a inativação da enzima, uma<br />

temperatura de 38 a 40°C é recomendada<br />

para a GA imobilizada. Entretanto,<br />

o decréscimo na temperatura<br />

operacional resulta numa baixa taxa<br />

de reação e em contaminação<br />

microbiológica, que é menos facilmente<br />

controlado em fábricas do que<br />

em laboratório. Lee et al., (1976)<br />

relataram que a GA imobilizada rendeu<br />

xaropes com teores mais baixo<br />

de glucose, 1,0-1,5%, e de Dextrose<br />

Equivalente (DE), 1,0-1,5 unidades,<br />

do que aqueles produzidos por<br />

enzimas solúveis. Isto é atribuído a<br />

limitação da difusão de partículas de<br />

glucose, que resulta em um gradiente<br />

de concentração de glucose e,<br />

consequentemente, leva a uma maior<br />

incidência de reações reversíveis<br />

do que se o gradiente não estivesse<br />

presente (Lee et al., 1980). Além<br />

disso, numa aplicação real, as altas<br />

concentrações do substrato estabilizam<br />

tão bem a GA que o aumento da<br />

termoestabilização proporcionado<br />

pela imobilização torna-se relativamente<br />

insignificante (Klesov e<br />

Gerasimas, 1979).<br />

2.2. Estratégias<br />

moleculares (Evolução<br />

Dirigida de Enzimas)<br />

O advento da engenharia de<br />

proteínas, empregando técnicas de<br />

biologia molecular, proporcionou<br />

novas estratégias para a termoestabilização<br />

de enzimas. O gene da GA de<br />

A. awamori foi clonado e expressado<br />

em Saccharomyces cerevisiae (Innis<br />

et al., 1985) e em Pichia pastoris<br />

(Fierobe et al. 1997), o que permitiu<br />

o emprego da manipulação genética<br />

como uma maneira de modificar a<br />

enzima para melhorar suas propriedades<br />

catalíticas ou físicas.<br />

Estas estratégias para criar novas<br />

ou melhoradas propriedades em<br />

enzimas, atualmente podem ser separadas<br />

em duas estratégias complementares<br />

1) desenho racional e 2)<br />

evolução dirigida. O desenho racional<br />

de proteínas é baseado no conhecimento<br />

detalhado da seqüência primaria,<br />

estrutura, função e mecanismo<br />

de catálise. Através destes conhecimentos,<br />

alterações são introduzidas,<br />

principalmente, por mutação sitio<br />

dirigida, como será discutido abaixo.<br />

A evolução dirigida, (Zhang, 1997)<br />

não exige conhecimento da relação<br />

estrutura-função da enzima. A evolução<br />

dirigida é também chamada de<br />

biotecnologia evolutiva (Arnold e<br />

Volkov, 1999; Reetz e Jaeger, 1999;<br />

Sutherland,2000). O termo evolução<br />

dirigida subtende uma série de experimentos<br />

que reproduzem, de forma<br />

acelerada e em tubos de ensaios, a<br />

evolução da diversidade natural e<br />

adaptação ambiental. Mutações e<br />

recombinações são feitas dando ao<br />

processo uma direção no sentido de<br />

atingir a otimização de uma propriedade<br />

específica (Lehman e Wyss,<br />

2001). Muitas pistas de como melhorar<br />

enzimas vêm dos estudos de como<br />

as enzimas evoluem na natureza. Assim,<br />

esta poderosa técnica objetiva<br />

otimizar o processo de melhoramento<br />

das enzimas utilizando mecanismos<br />

envolvidos na evolução natural (mutação,<br />

recombinação e seleção natural).<br />

Entretanto, a evolução dirigida<br />

difere do processo natural no sentido<br />

em que são os pesquisadores que<br />

definem as propriedades a serem<br />

otimizadas e o processo biotecnológico<br />

acontece em um período curto de<br />

tempo (semanas ou meses) (Reetz,<br />

1999).<br />

Num experimento de evolução<br />

dirigida, primeiramente é induzida<br />

uma alteração no DNA visando uma<br />

resposta específica. Isto resulta em<br />

uma biblioteca de populações com<br />

diferentes graus de possíveis respostas,<br />

incluindo ou não a resposta esperada.<br />

O próximo passo é encontrar<br />

90 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

dentre as milhões de possibilidades,<br />

a solução ou as soluções corretas, ou<br />

seja, a enzima que exibe a propriedade<br />

desejada (Arnold, 1996).<br />

Em suma, este processo consiste<br />

na combinação de técnicas da biologia<br />

molecular apropriadas para a<br />

mutação e expressão do gene,<br />

acopladas a um eficiente e rápido<br />

sistema de seleção. (Reetz e Jaeger,<br />

2000). A idéia é partir de uma enzima<br />

selvagem, realizar a mutagênese no<br />

gene que codifica a enzima e selecionar<br />

os melhores mutantes de acordo<br />

com a característica fenotípica<br />

desejada (Zhang, 1997). Após a seleção<br />

dos mutantes, segue-se novos<br />

ciclos de mutações buscando melhores<br />

mutantes.<br />

Quando a taxa de mutação, tamanho<br />

da biblioteca e o processo de<br />

seleção são adequados, o fenótipo<br />

desejado de uma enzima geralmente<br />

aumenta a cada ciclo de mutações<br />

(Zhang, 1997).<br />

Existe um grande número de<br />

diferentes estratégias de mutagênese<br />

para criar diversidade de seqüências,<br />

tais como a mutação pontual ao acaso<br />

por PCR mutagênico (error-prone<br />

PCR), e o embaralhamento de DNA<br />

(DNA shuffling). Combinações destas<br />

técnicas também vêm sendo utilizadas.<br />

Tais estratégias serão discutidas<br />

a seguir:<br />

2.2.1 Mutação Sítio Dirigida<br />

(MSD)<br />

É uma poderosa técnica na qual<br />

apenas um ou poucos aminoácidos<br />

específicos são substituídos por outros<br />

aminoácidos, por alteração nos<br />

correspondentes nucleotídeos no<br />

gene codificador da proteína. Quando<br />

realizada com sucesso, ela tem a<br />

vantagem de melhorar a característica<br />

desejada da enzima sem afetar<br />

outras propriedades e até mesmo de<br />

criar mutantes carregando várias características<br />

melhoradas.<br />

Nesta ferramenta, as mudanças<br />

precisas, efetuadas na seqüência dos<br />

aminoácidos, são baseadas no conhecimento<br />

detalhado da estrutura da<br />

proteína, função e mecanismo (Chen,<br />

1999). Por exemplo, um resíduo particular<br />

de aminoácido pode ser identificado<br />

como sendo importante para


a atividade catalítica da enzima (Reetz,<br />

1999), sendo assim, uma substituição<br />

individual deste aminoácido poderia<br />

provocar mudanças na estrutura secundária<br />

resultando em enzimas com<br />

características desejáveis (Chen, 1999).<br />

Entretanto, seria impossível predizer<br />

qual dos 19 aminoácidos remanescentes<br />

seria o melhor alvo para a<br />

mutação que resultaria em subsequente<br />

melhoria da propriedade procurada<br />

(Reetz, 1999). Muitas tentativas para<br />

alterar especificamente algumas das<br />

propriedades das enzimas através<br />

desta técnica falharam, isto porque a<br />

introdução de aminoácidos substitutos<br />

têm efeitos inesperados na estrutura<br />

e função da enzima. (Kikuchi,<br />

1999). Além disso, tem sido observado<br />

que em muitos estudos de mutação<br />

sítio dirigida, o aumento da termoestabilidade<br />

está vinculada ao decréscimo<br />

da atividade catalítica (Carrea<br />

e Colombo, 2000). As falhas também<br />

podem ser porque este processo requer<br />

conhecimento de detalhes da<br />

estrutura tridimensional da enzima,<br />

de seu mecanismo de catálise, bem<br />

como um certo grau de intuição na<br />

escolha do aminoácido a ser substituído<br />

(Reetz, 1997). Em muitos casos,<br />

estas substituições foram feitas sem<br />

levar em consideração as propriedades<br />

estruturais da proteína (Chen, 1999).<br />

2.2.2. PCR mutagênico (Errorprone<br />

PCR):<br />

A introdução de mutações através<br />

desta técnica envolve uma modificação<br />

no protocolo de PCR (Jaeger<br />

e Reetz, 2000). Uma reação de PCR é<br />

normalmente realizada de modo a<br />

amplificar qualquer dado DNA com<br />

alta fidelidade. A atividade de correção<br />

de erro 3’ → 5’ da DNA polimerase<br />

assegura que a amplificação do<br />

DNA siga de maneira precisa. Ocasionalmente,<br />

nucleotídeos errados são<br />

incorporados durante a amplificação<br />

levando a mutações com uma freqüência<br />

de 0,1 a 2x 10 -4 por<br />

nucleotídeo para a DNA polimerase<br />

termoestável do Thermus aquaticus<br />

(Taq polimerase). Esta baixa taxa de<br />

erro pode ser aumentada para 7x 10 -3<br />

por nucleotídeo através de um ou<br />

mais dos seguintes procedimentos:<br />

aumento da concentração de MgCl 2 ,<br />

adição de MnCl 2 , aumento na concentração<br />

de dCTP e dTTP e aumento<br />

na quantidade taq polimerase. Para o<br />

propósito de evolução dirigida de<br />

enzima, estas condições devem ser<br />

modificadas a fim de se obter uma<br />

taxa média de 1 a 2 nucleotídeos<br />

mutados por gene, levando a uma<br />

mudança média de 1 aminoácido por<br />

enzima mutante (Reetz, 1999). A vantagem<br />

de tal processo é que pode ser<br />

realizado rapidamente envolvendo<br />

qualquer proteína, mesmo sem o<br />

conhecimento preciso de sua estrutura<br />

(Zhang et al, 1997 e Jaeger e<br />

Reetz, 2000).<br />

2.2.3. Embaralhamento de DNA<br />

(DNA shuffling)<br />

Este poderoso processo de evolução<br />

dirigida, que gera diversidade<br />

por recombinação, é baseado na combinação<br />

de mutações úteis de genes<br />

individuais. Bibliotecas de genes quiméricos<br />

podem ser geradas por fragmentação<br />

aleatória de um gene, seguido<br />

por recombinação dos fragmentos<br />

em uma reação de PCR<br />

(Crameri, 1998).<br />

O embaralhamento de DNA<br />

combinado com uma seleção para a<br />

atividade pode acelerar a evolução<br />

dirigida das características desejadas.<br />

Nesta técnica, a diversidade é<br />

introduzida a partir de uma biblioteca<br />

de mutações pontuais aleatórias<br />

(Christians et al, 1999). Os genes<br />

selecionados podem ser submetidos<br />

a mais ciclos de mutações (reembaralhamento)<br />

e melhorar ainda mais a<br />

sua mutação benéfica original<br />

(Stemmer, 1994a) simulando de forma<br />

acelerada, o processo natural de<br />

recombinação sexual (Christians et<br />

al, 1999).<br />

A técnica consiste basicamente<br />

na fragmentação de um gene com<br />

diferentes mutações pontuais por<br />

DNAse I. A recombinação dos fragmentos<br />

aleatoriamente resulta em<br />

moldes trocados e recombinados. Um<br />

gene recombinante contendo 4<br />

“crossovers” pode ser selecionado da<br />

biblioteca de recombinantes baseado<br />

na função melhorada. O conjunto<br />

selecionado promove o ponto de<br />

partida para outro ciclo de mutações<br />

e recombinações. Este processo iso-<br />

lado causa um baixo número de<br />

mutações pontuais, mas se for desejado,<br />

mutações adicionais podem ser<br />

incorporadas por PCR mutagênico<br />

ou mutagênese por UV no “pool” de<br />

genes (Stemmer, 1994a).<br />

A técnica de embaralhamento<br />

pode ser realizada com mutantes do<br />

mesmo gene e também com genes<br />

homólogos de diferentes espécies<br />

(family shuffling) (Reetz e Jaeger,<br />

1999). Esta recente adaptação permite<br />

que duas ou mais seqüências que<br />

ocorram naturalmente sejam usadas<br />

como material genético iniciador.<br />

Neste método, genes similares são<br />

misturados, fragmentados aleatoriamente<br />

e recombinados sob condições<br />

que permitam o anelamento e a<br />

extensão de fitas complementares<br />

não idênticas (Christians et al, 1999).<br />

A recombinação que ocorre nesta<br />

técnica é causada pela incorporação<br />

de um fragmento derivado de uma<br />

seqüência dentro de outra, baseado<br />

na homologia.<br />

Análises evolutivas de famílias<br />

de enzimas sugerem que mudanças<br />

drásticas na função da enzima exigem<br />

uma considerável mudança na<br />

seqüência de aminoácidos de um<br />

polipeptídeo. Tais mudanças provavelmente<br />

não ocorrem durante o processo<br />

de evolução in vitro, no qual as<br />

enzimas são principalmente melhoradas<br />

por mutações de ponto com<br />

uma tendência a transições e<br />

transversões limitando o acesso a um<br />

amplo espectro de substituições. Em<br />

contraste, a mutação natural, tipicamente<br />

resultante de recombinação<br />

sexual ou homóloga, gera deleções,<br />

inserções, duplicações ou fusões.<br />

Neste último processo, tais mutações<br />

alteram o espaçamento entre<br />

os resíduos de aminoácidos e segmentos<br />

de cadeias de polipeptídeos<br />

e pode resultar em mudanças na<br />

especificidade e novas atividades<br />

catalíticas (Chen, 2001).<br />

“Screening” e Seleção: Grandes<br />

bibliotecas de mais de 10 10 genes<br />

mutantes podem facilmente ser criadas<br />

usando as técnicas acima. Portanto,<br />

o desenvolvimento de um<br />

sistema apropriado de seleção é de<br />

importância chave no processo de<br />

evolução dirigida de enzimas (Reetz,<br />

1999). Seleções efetivas, nas quais<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 91


apenas aqueles clones carregando a<br />

característica desejada sobrevivam<br />

ou cresçam mais rápido são raras<br />

(Arnold e Volkov, 1999). No caso do<br />

emprego de vetores (plasmídios), o<br />

“screening” é feito para obter os<br />

mutantes que incorporaram o vetor<br />

contendo o gene desejado. O vetor<br />

geralmente carrega um gene para<br />

resistência a algum antibiótico, por<br />

isso utiliza-se o plaqueamento das<br />

linhagens submetidas ao processo<br />

de mutagênese em um meio contendo<br />

o antibiótico. As colônias que<br />

crescerem neste meio, certamente<br />

incorporaram o vetor e podem ser<br />

escolhidas para a próxima etapa. Em<br />

outros casos, a mutação positiva<br />

resulta em reparo de algum defeito<br />

que poderá ser usado como ferramenta<br />

para a seleção. Por exemplo,<br />

a recuperação da habilidade de produção<br />

de enzimas formadoras de<br />

halos na placa de seleção. A etapa<br />

seguinte é a escolha de colônias que<br />

tenham a característica desejada, por<br />

exemplo, o aumento na termoestabilidade<br />

enzimática. Assim, as<br />

enzimas das colônias positivas no<br />

“screening” serão submetidas a testes<br />

de termoinativação a fim de se<br />

isolar as colônias produtoras de<br />

enzimas termoestáveis.<br />

2.3. Enzimas<br />

termoestabilizadas por<br />

estratégias moleculares<br />

Akanuma et al (1998) introduziram<br />

o gene leuB (que codifica para a<br />

3-isopropilmalato desidrogenase envolvida<br />

na biossíntese de leucina) no<br />

microrganismo termofílico Thermus<br />

thermophilus usando técnicas de evolução<br />

dirigida de enzimas. Após mutação<br />

no gene da enzima, eles obtiveram<br />

uma variante termoestável. A<br />

estabilidade térmica da enzima<br />

mutante foi 10°C acima da observada<br />

na enzima selvagem.<br />

A técnica da evolução dirigida<br />

foi aplicada à kanamicina nucleotidiltransferase<br />

(KNTase), uma enzima<br />

que confere resistência ao antibiótico<br />

kanamicina. Variantes desta<br />

enzima apresentaram resistência a<br />

kanamicina a uma temperatura de<br />

63°C e foram produzidas por dois<br />

ciclos seguidos de mutações resul-<br />

tando em duas substituições de aminoácidos<br />

(Reetz e Jaeger, 1999).<br />

Kikuchi et al (1999) aplicaram<br />

esta técnica nos genes xylE e nahH<br />

que codificam para a enzima catecol<br />

2,3-dioxigenase. Mais de 2000 clones<br />

híbridos foram criados e posteriormente<br />

selecionados para estabilidade<br />

térmica. A melhor enzima quimérica<br />

selecionada foi testada a 50°C e<br />

a vida média foi de 70 min, muito<br />

maior do que a enzima codificada<br />

pelos genes selvagens xylE (2,7min)<br />

e nahH (5,4min).<br />

Yang et al (2000) criaram um<br />

mutante para o gene da subtilisina E<br />

através da técnica de PCR mutagênico.<br />

Análises do seqüenciamento revelaram<br />

apenas uma substituição (A→G).<br />

O tempo de vida médio da atividade<br />

da enzima mutante, quando encubada<br />

a 65°C, foi de aproximadamente 80<br />

min enquanto que uma outra linhagem<br />

mutante (mutante original usado<br />

no PCR mutagênico) e a linhagem<br />

selvagem apresentaram um tempo de<br />

13 e 15 min respectivamente.<br />

Miyazaki et al (2000) usaram a<br />

técnica de embaralhamento de DNA<br />

em uma subtilisina S41 psicrofílica<br />

com o objetivo de aumentar sua termoestabilidade<br />

e atividade. Após a<br />

terceira geração de bibliotecas criadas<br />

por PCR mutagênico, três variantes<br />

termoestáveis foram identificadas.<br />

Das três, uma enzima mutante<br />

em particular teve a maior atividade<br />

residual após incubação a 70°C. Esta<br />

subtilisina S41 variante contém 7 substituições<br />

de aminoácidos, todas contribuindo<br />

para o aumento da sua<br />

termoestabilidade.<br />

A temperatura ótima da lipase<br />

foi aumentada em até 15°C através<br />

da mutagênese aleatórea utilizando a<br />

técnica de PCR com tendência ao<br />

erro (Kohno et al, 2001).<br />

Utilizando-se da técnica de embaralhamento<br />

de DNA Hayashi et al.<br />

(2001), obtiveram quimeras de βglucosidase<br />

com a termoestabilidade<br />

aumentada em até 16°C quando comparadas<br />

com a enzima original.<br />

A evolução dirigida foi também<br />

usada para melhorar a termoestabilidade<br />

da galactose oxidase (Sun et<br />

al, 2001). Foi observado que as<br />

enzimas mutantes obtidas, mantinham<br />

a atividade enzimática e a<br />

92 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

especificidade pelo substrato semelhantes<br />

às da enzima selvagem, entretanto,<br />

a termoestabilidade foi aumentada.<br />

O T 50 (temperatura na qual<br />

as enzimas perdem 50% da sua atividade)<br />

foi aumentado para 67°C para<br />

os dois mutantes mais termoestáveis<br />

enquanto que a selvagem não ultrapassou<br />

63°C.<br />

Experimentos com a GA usam<br />

na sua grande maioria a MSD como<br />

ferramenta para a obtenção de características<br />

desejadas melhoradas, uma<br />

boa revisão neste assunto foi apresentada<br />

por Ford (1999). Várias abordagens<br />

preconizadas para estabilização<br />

podem ser acessadas pela MSD,<br />

como por exemplo, as substituições<br />

dos resíduos flexíveis de glicina em<br />

α-helices, substituições de seqüências<br />

susceptíveis a desamidação e quebra<br />

Asn-Gly, alterações em ligações<br />

frágeis como Asp-X, introdução de<br />

prolina que reduz o número de conformações<br />

no estado desdobrado,<br />

acréscimo cisteínas para aumentar o<br />

número de pontes dissulfetos, além<br />

de combinações destas abordagens<br />

em mutantes múltiplos etc. (Ford,<br />

1999; Sauer, 2000).<br />

Libby et al (1994) testaram o<br />

efeito de deleções de aminoácidos<br />

na região O-glicosilada da GA de<br />

Aspergillus awamori. Foram feitas<br />

deleções para remover os resíduos<br />

de 466 a 512 (GAI), de 485 a 512<br />

(GAII) e de 466 a 483 (GAIII). Analisando<br />

as frações intracelulares e<br />

extracelulares, observou-se que a<br />

região deletada da GAIII afetou a<br />

secreção enquanto que a deleção da<br />

GAII contribuiu para a produção e<br />

uma estrutura estável da proteína.<br />

Para todos os mutantes foram encontradas<br />

atividades catalíticas similares<br />

à selvagem indicando que as deleções<br />

não afetaram o sítio catalítico.<br />

Chen et al. (1994) substituíram<br />

a seqüência susceptível a desamidação,<br />

Asn182-Gly, por Ala182-Gly, o<br />

que resultou em decréscimo de 2,5<br />

vezes na taxa de termoinativação a<br />

60 e 65°C.<br />

O efeito da substituição de resíduos<br />

flexíveis de glicina por alanina<br />

em quatro diferentes α-hélices na GA<br />

de Aspergillus awamori foram estudados<br />

(Chen et al, 1996). Substituições<br />

simples de Gly137 e Gly139 e


no mutante múltiplo contendo ambas<br />

as mutações estabilizaram a GA contra<br />

a termoinativação irreversível.<br />

Com o objetivo de estudar o<br />

papel das regiões conservadas na GA<br />

de Aspergillus awamori, Sierks et al<br />

(1993) realizaram substituições nos<br />

resíduos de Leu177, Trp178 e Asn182<br />

por His, Arg e Ala, respectivamente.<br />

Quando se substituiu Leu177 por His<br />

houve um grande aumento na energia<br />

de ativação para substratos com<br />

ligação α(1→4) e α(1→6); na substituição<br />

Trp178 por Arg, a energia<br />

aumentou para substratos com ligações<br />

α(1→6), mas não para α(1→4).<br />

Estas substituições indicaram que os<br />

resíduos de aminoácidos Leu177 e<br />

Trp178 estão localizados no subsítio<br />

1 e 2 respectivamente. Por outro<br />

lado, a substituição Asn182 por His<br />

não alterou os valores de energia de<br />

ativação para nenhum tipo de ligação<br />

do substrato, sugerindo que este<br />

resíduo não é crucial para o mecanismo<br />

catalítico da GA.<br />

Fiorobe et al. (1996) substituiram<br />

Ala246 por Cys, criando mais<br />

uma ponte dissulfeto entre este resíduo<br />

e o resíduo Cys320. O mutante<br />

apresentou maior atividade residual<br />

e atividade catalítica por 15 minutos<br />

comparado a linhagem selvagem.<br />

Fiorobe et al. (1998) produziram um<br />

mutante substituindo o Glu 400 por<br />

Cys. A atividade do mutante, após<br />

oxidação da cisteina para acido<br />

cisteinosulfínico, elevou a atividade<br />

do mutante para 160% em relação a<br />

linhagem selvagem. Entretanto, não<br />

houve ganho de termoestabilidade.<br />

Uma ponte dissulfeto foi criada<br />

substituindo Asn20 e Ala27 por Cys<br />

na GA de Aspergillus awamori e<br />

observou-se um aumento na termoestabilidade<br />

de 1,2 kJ/mol a 65°C (Li<br />

et al, 1998).<br />

Mutantes contendo prolina em<br />

substituição a vários aminoácidos foram<br />

estudados por Allen et al. (1998).<br />

O maior sucesso com mutação simples<br />

foi obtido no mutante Ser30→Pro,<br />

resultando em um aumento da energia<br />

livre de termoinativação de 1,6 kJ/<br />

mol a 65°C. Os autores ainda combinaram<br />

diferentes mutações termoestáveis<br />

e obtiveram um triplo mutante<br />

contendo Gly137→Ala, Ser30→Pro e<br />

Asn20→Cys/Ala27→Cys que apresen-<br />

tou aumento cumulativo de termoestabilidade<br />

de 4,4 kJ/mol.<br />

Estes experimentos, embora tenham<br />

como objetivo principal a melhora<br />

em propriedades da enzima,<br />

paralelamente desempenham um papel<br />

de extrema importância, o de<br />

elucidar as funções de inúmeros segmentos<br />

da cadeia polipeptídica da<br />

proteína.<br />

3. Conclusão e<br />

perspectivas futuras<br />

As técnicas de evolução dirigida<br />

disponíveis, associadas a considerações<br />

teóricas e às várias experiências<br />

relatadas de sucesso ou não, disponíveis<br />

na literatura, têm levado a uma<br />

crescente seleção de mutações bem<br />

sucedidas para termoestabilização da<br />

GA. Todavia, este sucesso ainda não<br />

refletiu significativamente na produção<br />

de enzima industrialmente satisfatória,<br />

deixando o campo ainda aberto<br />

para novas experiências.<br />

Os organismos atualmente disponíveis<br />

para clonagem e expressão<br />

da GA são mesofílicos, criando dificuldades<br />

para a seleção de enzimas<br />

mais termoestáveis. Além disso as<br />

linhagens de E. coli utilizadas são<br />

deficientes em glicosilação e formação<br />

de pontes dissulfetos, essenciais<br />

para a GA ativa. Pesquisas com<br />

bacterias termofílicas e/ou bacterias<br />

competentes para a clonagem e expressão<br />

da GA estruturalmente ativa,<br />

podem ser alternativas viáveis para<br />

reduzir tempo e manipulação.<br />

A maior parte das informações<br />

sobre seqüências de GA são dos<br />

fungos mesofílicos, A. niger e A.<br />

awamori. Informações de seqüências<br />

de GAs termoestáveis, seriam importantes<br />

para orientação racional de<br />

desenhos de experimentos de evolução<br />

dirigida. Entretanto, poucas GAs<br />

termoestáveis de fungos termofílicos<br />

foram relatadas. Dentre estes estão<br />

Humicola grisea var. thermoidea<br />

(Tosi et al. 1993), Aspergillus<br />

fumigatus (Brandani e Peralta, 1998)<br />

e Thermomyces lanuginosus (Li et al<br />

1998). Informações sobre seqüências<br />

genéticas são ainda mais raras. A<br />

procura por novas fontes de GAs<br />

termoestáveis, bem como informações<br />

sobre a proteína e seu gene<br />

codificador são um campo aberto e<br />

com enormes perspectivas futuras.<br />

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Pesquisa<br />

Valdir Marcos Stefenon<br />

Biólogo – Mestre em <strong>Biotecnologia</strong><br />

Depto. de <strong>Ciência</strong>s Biológicas e da Saúde – UNIPLAC<br />

gene_mol@hotmail.com<br />

Rubens Onofre Nodari<br />

Eng. Agrônomo – Doutor em Genética<br />

Departamento de Fitotecnia – CCA – UFSC<br />

Ilustrações cedidas pelos autores<br />

Marcadores Moleculares<br />

no Melhoramento Genético<br />

de Araucária<br />

Caracterização da diversidade genética em Araucaria angustifolia<br />

Introdução<br />

A exploração florestal foi uma<br />

importante alavanca para o desenvolvimento<br />

econômico do Sul do Brasil<br />

desde o início do século XX, com<br />

intensidade crescente nas décadas de<br />

1950 a 1970 (Guerra et al., 2002).<br />

A principal espécie explorada nesse<br />

ciclo foi a Araucaria angustifolia<br />

(Bert.) O. Ktze., única representante<br />

da Família Araucariaceae no Brasil e<br />

principal espécie que compõe a floresta<br />

ombrófila mista ou mata de<br />

araucária (Guerra et al., 2002). No<br />

Brasil, a distribuição natural dessa<br />

espécie se dá em amplas áreas nos<br />

estados do Rio Grande do Sul, Santa<br />

Catarina e Paraná, e em alguns pontos<br />

mais elevados de São Paulo, Rio de<br />

Janeiro e Minas Gerais (Reitz e Klein,<br />

1966).<br />

Todavia, a alta qualidade de sua<br />

madeira para os mais diversos fins,<br />

desde a construção civil até a produção<br />

de celulose e de papel, fez com<br />

que essa espécie fosse exaustivamente<br />

explorada, tendo como conseqüência<br />

uma drástica redução das grandes reservas<br />

de A. angustifolia no sul do país.<br />

Além dessa exploração desordena-da,<br />

o avanço das fronteiras agrícolas<br />

foi outro fator responsável pela<br />

redução das populações naturais dessa<br />

importante espécie florestal.<br />

Em função desses acontecimentos,<br />

a araucária encontra-se hoje na<br />

Lista Oficial de Flora Ameaçada de<br />

Extinção (IBAMA, 2002) e os remanescentes<br />

de floresta ombrófila mista<br />

estão reduzidos a fragmentos isolados<br />

de diversos tamanhos.<br />

Em alguns desses fragmentos, estima-se<br />

que grande parte da diversidade<br />

genética tenha sido perdida (Schögl,<br />

2000; Auler et al., 2002), fato que<br />

inviabiliza a regeneração natural da<br />

espécie, devido à endogamia acentuada<br />

e à redução do fluxo gênico entre<br />

suas populações.<br />

Nos últimos anos, diversas discussões<br />

a respeito desse tema vêm<br />

apontando para a necessidade de se<br />

desenvolver o melhoramento genético<br />

dessa conífera, com vista a regenerar<br />

a Floresta de Araucária e disciplinar<br />

os plantios com finalidade lucrativa,<br />

seja pela exploração da madeira,<br />

seja pela venda das sementes comestíveis<br />

ou de outros subprodutos.<br />

Entretanto, antes de os programas<br />

de melhoramento genético serem<br />

implementados, é necessário que se<br />

conheça a diversidade genética existente<br />

entre as populações remanescentes<br />

e dentro delas. Esses estudos<br />

são importantes para que se interprete<br />

o efeito da fragmentação dos remanescentes<br />

sobre a estrutura genética<br />

das populações: informação essencial<br />

para o planejamento de programas de<br />

melhoramento.<br />

Esse conhecimento, além de reduzido,<br />

tem sido produzido basicamente<br />

a partir de marcadores morfológicos<br />

(Shimizu e Higas, 1980;<br />

Monteiro e Spelz, 1980; Kageyama e<br />

Jacob, 1980) e isoenzimas (Shimizu et<br />

al., 2000; Auler et al., 2002; Mantovani<br />

et al., 2002).<br />

Considerando a utilização de marcadores<br />

RAPD (Williams et al., 1990;<br />

Welsh e McClelland, 1990) e AFLP<br />

(Vos et al., 1995) para estudos genéticos<br />

em diversas espécies florestais, o<br />

objetivo deste estudo foi determinar a<br />

capacidade informativa desses marcadores<br />

para a caracterização da diversidade<br />

genética de populações naturais<br />

de A. angustifolia.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 95


Material e Métodos:<br />

Material vegetal e<br />

Extração de DNA<br />

O material vegetal utilizado neste<br />

estudo foi composto por amostras foliares<br />

de trinta indivíduos adultos de uma<br />

população natural do Parque Ecológico<br />

Municipal de Lages, Estado de Santa<br />

Catarina, coletados e acondicionados<br />

em sacos plásticos que continham sílica<br />

gel. Inicialmente, foram testados sete<br />

protocolos para extração de DNA vegetal<br />

com base na utilização do detergente<br />

CTAB. Com esses testes, chegou-se à<br />

conclusão de que era necessário otimizar<br />

um protocolo específico para a espécie,<br />

a fim de eliminar os compostos contaminantes<br />

do DNA presentes nas folhas de<br />

araucária (principalmente proteínas e<br />

polifenóis) e a fim de evitar a liofilização<br />

do material vegetal.<br />

Aproximadamente 150 mg de folhas<br />

foram congeladas em nitrogênio<br />

líquido e maceradas completamente em<br />

gral de porcelana. Ao pó resultante,<br />

acrescentou-se 1,5 mL de tampão de<br />

extração [CTAB 2%; NaCl 1,5 M; EDTA 20<br />

mM; Tris-HCl (pH 8,0) 100 mM; PVP 2%;<br />

2-mercaptoetanol 1%]. O material foi<br />

transferido para tubos eppendorf de 2 mL<br />

e mantido em banho-maria (60°C) por 40<br />

min. A cada 15 minutos, o material foi<br />

homogeneizado por inversão. Após essa<br />

etapa, o material foi deixado sobre a<br />

bancada até alcançar a temperatura ambiente,<br />

quando lhe foram acrescidos, em<br />

cada tubo, 600 µL de CIA [clorofórmio:<br />

álcool isoamílico 24:1]. O material foi<br />

homogeneizado durante três minutos,<br />

por inversão, e centrifugado a 13.000<br />

RPM, por 5 min. A porção aquosa que<br />

continha o DNA foi transferida para dois<br />

novos tubos e foram acrescidos a ela 5 µL<br />

de RNAse A (10 µg/mL). Após 40 min, a<br />

34°C, realizou-se uma segunda extração<br />

orgânica com CIA. Após a centrifugação<br />

(13.000 RPM, por 5 min), a porção<br />

aquosa foi transferida para novos tubos,<br />

aos quais adicionaram-se 50 µL de solução<br />

de CTAB 10% [CTAB 10%; NaCl 1,4<br />

M], a 60°C. Após a homogeneização,<br />

realizou-se uma terceira extração orgânica<br />

com CIA. A porção aquosa foi<br />

transferida para novos tubos e o DNA foi<br />

precipitado pela adição de 2/3 do volume<br />

de álcool isopropílico gelado(-20°C).<br />

O material foi mantido por 30 min a -<br />

20°C e, posteriormente, centrifugado a<br />

7.000 RPM, por 5 min . O álcool<br />

isopropílico foi descartado e o DNA<br />

desidratado novamente com 1 mL de<br />

álcool etílico 95%. O material permaneceu<br />

por 10min a -20°C e centrifugado a<br />

8.000 RPM, por 5 min. O álcool etílico foi<br />

descartado e deixou-se o precipitado<br />

secar a temperatura ambiente. O DNA foi<br />

diluído em 100 µL de TE, a temperatura<br />

ambiente, por um período de 12 a 16<br />

horas, e armazenado a -20°C.<br />

A concentração de DNA foi determinada<br />

pela comparação com quantidades<br />

conhecidas de DNA de fago<br />

lambda (20, 50, 100 e 200 ng/µL), após<br />

eletroforese em gel de 0,8% de agarose,<br />

corado com solução de 0,02% de<br />

brometo de etídio. A leitura espectrofotométrica<br />

da razão OD260/OD280<br />

foi utilizada para determinar a pureza<br />

das amostras frente à contaminação<br />

por proteínas.<br />

Reações RAPD<br />

Para reações RAPD, foram utilizados<br />

seis iniciadores comercializados<br />

pela Operon Technologies ® (OPA04,<br />

OPA09, OPA17, OPC06, OPF16,<br />

OPAN15). O coquetel da reação constou<br />

de tampão de PCR 1X, 3,8 mM de<br />

MgCl 2 , 0,4 mM de dNTPs, 0,4 µM de<br />

iniciadores, 1 U de Taq DNA polimerase<br />

e 1,5 ng/ µL de DNA. As reações de PCR<br />

foram desenvolvidas em termociclador<br />

PTC-100 (MJ Research Inc.) em um<br />

volume de 13 µL. O programa utilizado<br />

foi composto de uma etapa inicial de<br />

desnaturação (4 min. a 92°C), seguida<br />

de 35 ciclos de amplificação (45 s. a<br />

92°C; 45 s. a 35°C; 1 min e 15 s. a 72°C),<br />

e terminada com uma etapa final de<br />

elongação das cadeias de DNA (3 min a<br />

72°C). Os produtos amplificados foram<br />

separados por eletroforese horizontal<br />

submersa em tampão TBE 1X, em gel de<br />

1,5% de agarose, corado com solução<br />

de 0,02% de brometo de etídio. As<br />

bandas foram visualizadas sob luz ultravioleta<br />

e os géis fotografados com filme<br />

Polaroid preto e branco.<br />

96 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Figura 1: Polimorfismo revelado em marcadores RAPD em A. angustifolia, entre os trinta<br />

indivíduos da população do Parque Ecológico Municipal de Lages, utilizando o iniciador<br />

OPA04. Linhas 1 a 30: indivíduos da população. M= marcador de peso molecular 1kb.<br />

Reações AFLP<br />

Sete combinações de iniciadores<br />

para reações AFLP foram selecionadas<br />

aleatoriamente no kit AFLP ® Analysis<br />

System I / Life Technologies ® (E-<br />

ACG+M-CAC, E-ACT+M-CAA, E-<br />

ACA+M-CTT, E-ACG+M-CAG, E-<br />

AAG+M-CTG, E-ACC+M-CAT e E-<br />

ACC+M-CAC) e as reações foram desenvolvidas<br />

de acordo com o protocolo de<br />

Vos et al. (1995), com pequenas modificações.<br />

Inicialmente, realizou-se a restrição<br />

do DNA com as enzimas EcoRI e<br />

MseI, durante duas horas, a 36°C. A<br />

ligação dos oligonucleotídeos adaptadores<br />

foi realizada por 2 horas, a 20°C,<br />

em um volume de 25 µL. Na etapa<br />

seguinte (pré-amplificação), o DNA foi<br />

amplificado com a utilização de iniciadores<br />

com uma base seletiva (EcoRI-A e<br />

MseI-C). O DNA pré-amplificado foi<br />

diluído em uma razão de 1:25 e amplificado<br />

novamente, utilizando-se iniciadores<br />

com três bases seletivas (EcoRI-<br />

ANN e MseI-CNN). As etapas de restrição<br />

enzimática, de ligação dos adaptadores<br />

e de amplificações foram realizadas<br />

em termociclador PTC-100 (MJ<br />

Research Inc.). Os produtos amplificados<br />

foram separados por eletroforese<br />

vertical em tampão TBE 1X, em gel de<br />

6% de poliacrilamida. As bandas foram<br />

visualizadas após coloração com nitrato<br />

de prata.<br />

Para a coloração, os géis foram<br />

fixados com solução de 0,5% de ácido<br />

acético + 5% de etanol, por 10 min., e<br />

com solução de 1% de ácido nítrico,<br />

por três minutos. Posteriormente, foram<br />

impregnados com solução de nitrato<br />

de prata 0,2%, durante trinta minutos.<br />

Após esse tempo, uma solução<br />

de 3% de carbonato de sódio + 0,2% de<br />

formaldeído foi utilizada para a revelação<br />

das bandas, durante o tempo necessário.<br />

As revelações foram finalizadas<br />

com a utilização de uma solução<br />

de 5% de ácido acético. Após cada


etapa, os géis foram lavados durante 20<br />

segundos com água destilada. Todos<br />

os tratamentos foram realizados sob<br />

leve agitação. Após a secagem dos géis<br />

em temperatura ambiente, as bandas<br />

foram visualizadas sob luz branca e os<br />

géis fotografados com máquina digital.<br />

Caracterização da<br />

Diversidade Genética e<br />

Capacidade Informativa<br />

Os índices de diversidade estimados<br />

foram: a similaridade genética,<br />

o número médio de bandas, a porcentagem<br />

de bandas polimórficas e a<br />

diversidade genética. Os padrões de<br />

bandas obtidos com os marcadores<br />

RAPD e AFLP foram analisados e para<br />

eles construiu-se uma matriz binária,<br />

que identificava sua presença ou sua<br />

ausência, codificadas por 1 ou 0, respectivamente.<br />

A partir dessa matriz<br />

de dados, com o auxílio do software<br />

NTSYS-pc 2.02 (Rohlf, 1990), foi determinado<br />

o índice de similaridade<br />

genética de Jaccard entre os indivíduos<br />

e pelo método de agrupamento<br />

UPGMA (método das médias das distâncias),<br />

foram gerados, separadamente<br />

e de maneira agrupada, os<br />

dendrogramas para marcadores RAPD<br />

e AFLP. Para determinação da diversidade<br />

genética, foi utilizado o índice<br />

de Shannon, dado pela fórmula H= -<br />

Σ pi ln(pi), onde pi corresponde à<br />

freqüência de cada alelo (Lewontin,<br />

Figura 2: Dendrograma de similaridade genética entre indivíduos, estimado pelo<br />

índice de Jaccard para a população de A. angustifolia do Parque Ecológico Municipal<br />

de Lages, gerado a partir de 18 marcadores RAPD (r=0,83).<br />

1970). Como ambos os marcadores<br />

apresentam característica dominante,<br />

considerou-se cada banda amplificada<br />

como sendo um loco com dois alelos,<br />

presente ou ausente no gel.<br />

Para determinar a capacidade informativa<br />

dos marcadores RAPD e<br />

AFLP, foram utilizados para a comparação<br />

dados gerados a partir de marcadores<br />

isoenzimáticos (Auler et al.,<br />

2002) e PCR-RFLP (Schögl, 2000) provenientes<br />

da mesma população. Devido<br />

à diferente natureza dos marcadores,<br />

o índice de diversidade de<br />

Shannon foi determinado para todos<br />

os dados e usado como parâmetro de<br />

comparação.<br />

Resultados e Discussão:<br />

A partir dos seis iniciadores utilizados<br />

para as reações RAPD, foram<br />

obtidos dezoito marcadores polimórficos,<br />

de um total de 62 bandas<br />

amplificadas, com uma média de 11,16<br />

bandas amplificadas por iniciador. A<br />

média de bandas polimórficas foi de<br />

3,0 por iniciador, com uma porcentagem<br />

média de 26,9%. O índice de<br />

diversidade de Shannon foi igual a 0,53<br />

(Tabela 1). A figura 1 apresenta o<br />

padrão de bandas obtido com o iniciador<br />

OPA04, para reações RAPD.<br />

As sete combinações empregadas<br />

para as reações AFLP revelaram 62<br />

Tabela<br />

1:<br />

Iniciadores<br />

utilizado<br />

s nas<br />

reações<br />

RAPD<br />

e respectivo<br />

s índices<br />

de<br />

diversid<br />

ade<br />

genética<br />

para<br />

a<br />

população<br />

de<br />

A.<br />

angustifo<br />

lia<br />

do<br />

Parque<br />

Ecológico<br />

Municipal<br />

de<br />

Lages.<br />

Iniciadores<br />

Número<br />

total<br />

de<br />

bandas<br />

Bandas polifórmicas<br />

Q uantidad<br />

e<br />

%<br />

Índice<br />

de<br />

diversid<br />

ade<br />

( H)<br />

OPA4 12 0 3<br />

25, 0%<br />

0,<br />

58<br />

OPA9 13 0 2<br />

15, 4%<br />

0,<br />

59<br />

OPA17 06 0 1<br />

16, 7%<br />

0,<br />

58<br />

OPC6 09 0 3<br />

33, 3%<br />

0,<br />

52<br />

OPF16 13 0 5<br />

38, 5%<br />

0,<br />

56<br />

OPAN15 09 0 4<br />

44, 4%<br />

0,<br />

43<br />

Médias para<br />

marcadores<br />

RAPD<br />

11, 16<br />

3 , 0<br />

26, 9 %<br />

0,<br />

53<br />

Tabela<br />

2:<br />

Combinaçõ<br />

es<br />

de<br />

iniciadores<br />

utilizado<br />

s nas<br />

reações<br />

AFLP<br />

e respectivo<br />

s índices<br />

de<br />

diversid<br />

ade<br />

genética<br />

para<br />

a população<br />

de<br />

A.<br />

angustifo<br />

lia<br />

do<br />

Parque<br />

Ecológico<br />

Municipal<br />

de<br />

Lages.<br />

Iniciadores<br />

Número<br />

total<br />

de<br />

bandas<br />

Bandas polimórficas<br />

Q uantidad<br />

e<br />

%<br />

Índice<br />

de<br />

diversid<br />

ade<br />

( H)<br />

E-AGC + M-CAC<br />

90 4 4, 4%<br />

0,<br />

65<br />

E-ACT + M-CAA<br />

100 1 0<br />

10, 0%<br />

0,<br />

45<br />

E-ACA + M-CTT<br />

60 3 5, 0%<br />

0,<br />

68<br />

E-ACG + M-CAG<br />

100 2 1<br />

21, 0%<br />

0,<br />

55<br />

E-AAG + M-CTG<br />

80 6 7, 5%<br />

0,<br />

56<br />

E-ACC + M-CAT<br />

105 7 6, 6%<br />

0,<br />

55<br />

E-ACC + M-CAC<br />

90 1 1<br />

12, 2%<br />

0,<br />

50<br />

Médias para<br />

marcadores<br />

AFLP<br />

89, 3<br />

8 , 8<br />

9, 8%<br />

0,<br />

54<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 97


marcadores polimórficos, em um total<br />

de 625 bandas amplificadas. A média<br />

de bandas totais amplificadas foi de<br />

89,3 e de bandas polimórficas foi de<br />

8,8 por combinação de iniciadores. A<br />

porcentagem média de bandas<br />

polimórficas foi de 9,8%. Para marcadores<br />

AFLP, o índice de diversidade<br />

de Shannon foi de 0,54 (Tabela 2).<br />

Quando os dois tipos de marcadores<br />

foram analisados conjuntamente,<br />

o total de bandas amplificadas foi<br />

de 687, com 80 bandas polimórficas,<br />

que correspondiam a 11,6%. As médias<br />

de bandas totais e polimórficas<br />

amplificadas foram de 52,8 e 6,15 por<br />

iniciador, respectivamente. A diversidade<br />

genética determinada pelo índice<br />

de Shannon foi de 0,54 (Tabela 3).<br />

Marcadores isoenzimáticos (Auler<br />

et al., 2002) empregados na mesma<br />

população acessaram uma diversidade<br />

genética de Shannon de H=0,29, ao<br />

passo que marcadores PCR-RFLP de<br />

DNA de cloroplastos (Schögl, 2000)<br />

detectaram um único haplótipo na<br />

população, correspondendo a uma<br />

diversidade virtualmente inexistente.<br />

Nesse caso, marcadores RAPD e AFLP<br />

mostraram-se altamente eficientes, detectando<br />

uma diversidade genética<br />

quase duas vezes maior (1,8 x) que<br />

aquela determinada por isoenzimas.<br />

Apesar de caracterizar-se pela análise<br />

da molécula de DNA da mesma<br />

forma que as técnicas RAPD e AFLP, a<br />

técnica PCR-RFLP aplicada a genomas<br />

de cloroplastos não possibilitou a<br />

detecção de diversidade nesta população.<br />

Já as técnicas RAPD e AFLP não<br />

demonstraram limitações para acessar<br />

a diversidade genética em populações<br />

altamente exploradas, como a utilizada<br />

nesta pesquisa.<br />

Quando os valores obtidos no<br />

presente trabalho são comparados a<br />

outros estudos que utilizaram as técnicas<br />

RAPD e AFLP, estes podem ser<br />

considerados baixos. Contudo, há de<br />

se considerar que os estudos com<br />

isoenzimas e PCR-RFLP utilizados como<br />

parâmetro para a comparação também<br />

apresentaram valores baixos para essa<br />

população, quando comparados a ou-<br />

tras populações de A. angustifolia analisadas<br />

antes.<br />

Por outro lado, uma criteriosa<br />

seleção de combinações de iniciadores<br />

permite que a técnica AFLP apresente<br />

um polimorfismo muito maior<br />

(Stefenon, 2003).<br />

A similaridade genética foi analisada<br />

em função dos três dendrogramas<br />

gerados: um, a partir dos 18 marcadores<br />

RAPD polimórficos (Figura 2), o<br />

segundo, a partir dos 62 marcadores<br />

AFLP polimórficos (Figura 3) e o terceiro,<br />

a partir dos 80 marcadores RAPD<br />

e AFLP polimórficos agrupados (Figu-<br />

98 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Figura 3: Dendrograma de similaridade genética entre indivíduos, estimado pelo<br />

índice de Jaccard para a população de A. angustifolia do Parque Ecológico Municipal<br />

de Lages, gerado a partir de 64 marcadores AFLP (r=0,83).<br />

Figura 4: Dendograma de similaridade genética entre indivíduos, estimado pelo índice<br />

de Jaccard para a população de A. angustifolia do Parque Ecológico Municipal de Lages,<br />

gerado a partir de 18 marcadores RAPD e 62 marcadores AFLP agrupados (r=0,80).<br />

ra 4). A maior similaridade genética<br />

entre indivíduos foi de 86% (indivíduos<br />

L11 e L13), com marcadores RAPD;<br />

81 % (indivíduos L5 e L26), com<br />

marcadores AFLP e 71% (indivíduos<br />

L6 e L7), com o agrupamento dos dois<br />

tipos de marcadores. Nesse ponto,<br />

percebe-se que o maior número de<br />

marcadores permite uma maior discriminação<br />

entre os indivíduos analisados.<br />

A comparação entre os três<br />

dendrogramas permite ainda perceber<br />

que, no agrupamento dos marcadores,<br />

o maior número de bandas<br />

Tabela<br />

3:<br />

Médias<br />

para<br />

os<br />

índices<br />

de<br />

diversid<br />

ade<br />

genética<br />

estimados<br />

para<br />

a população<br />

de<br />

A.<br />

angustifo<br />

lia<br />

do<br />

Parque<br />

Ecológico<br />

Municipal<br />

de<br />

Lages,<br />

a partir<br />

de<br />

marcadores<br />

RAPD<br />

e AFLP.<br />

Marcadores<br />

Número<br />

total<br />

de<br />

bandas<br />

Bandas polimórficas<br />

Q uantidad<br />

e<br />

%<br />

Índice<br />

de<br />

diversid<br />

ade<br />

( H)<br />

Médias para<br />

marcadores<br />

RAPD<br />

11, 16<br />

3 , 0<br />

26, 9%<br />

0,<br />

53<br />

Médias para<br />

marcadores<br />

AFLP<br />

89, 3<br />

8 , 8<br />

9, 8%<br />

0,<br />

54<br />

Médias RAPD<br />

+ AFLP<br />

52, 8<br />

6 , 15<br />

11, 6%<br />

0,<br />

54


AFLP fez com que o dendrograma<br />

ficasse muito semelhante ao gerado<br />

unicamente dos marcadores AFLP.<br />

Utilizando-se um valor máximo<br />

de 50% para a similaridade genética<br />

entre os indivíduos, o dendrograma<br />

gerado a partir de marcadores RAPD<br />

(Figura 2) dividiu-se em doze grupos.<br />

A maior similaridade genética foi observada<br />

entre os indivíduos L11 e L13,<br />

com 86% de similaridade e o ponto de<br />

união de todos os grupos apresenta<br />

30,5% de similaridade.<br />

O dendrograma gerado de marcadores<br />

AFLP (Figura 3) dividiu-se em<br />

quinze grupos, utilizando-se 50%<br />

como similaridade máxima; o ponto<br />

de união de todos os grupos apresenta<br />

24% de similaridade. Com esses<br />

marcadores, a similaridade genética<br />

entre pares de indivíduos variou de<br />

24% a 81%.<br />

Deve-se considerar que existe uma<br />

relação entre o número dado a cada<br />

planta e sua proximidade geográfica,<br />

sendo mais próximos geograficamente<br />

os indivíduos cujos números são mais<br />

próximos. Dessa forma, pode-se observar<br />

que os argumentos de plantas<br />

são aleatórios, formados por indivíduos<br />

dispersos pelo Parque, em uma área<br />

de 2,34 km 2 . Esse dado sugere que<br />

indivíduos geograficamente, os quais<br />

podem ser aparentados, não apresentam<br />

grande similaridade genética.<br />

Considerações Finais<br />

Um aspecto importante a ser considerado<br />

é que a A. angustifolia provavelmente<br />

possuía uma grande diversidade<br />

genética antes da exploração ocorrida<br />

durante o ciclo da madeira no sul<br />

do Brasil (Auler et al., 2002).<br />

Dessa forma, antes de qualquer<br />

previsão de melhoramento genético é<br />

essencial conhecer a diversidade genética<br />

existente nas populações remanescentes,<br />

para possibilitar a seleção<br />

de plantas e sementes a serem utilizadas,<br />

tanto para a produção de mudas,<br />

quanto para cruzamentos controlados.<br />

A exemplo do ocorrido no Parque<br />

Ecológico Municipal de Lages,<br />

durante o ciclo da madeira, a seleção<br />

promovida pelo homem até o momento,<br />

foi a retirada dos melhores<br />

fenótipos, em detrimento dos demais.<br />

Devido ao acesso aleatório a amplas<br />

regiões genômicas praticamente<br />

livres da ação da seleção natural, as<br />

técnicas RAPD e AFLP geram um gran-<br />

de número de marcadores virtualmente<br />

neutros. Neste caso, dos resultados<br />

obtidos no presente trabalho,<br />

pode-se concluir que essas técnicas<br />

apresentam-se como poderosas ferramentas<br />

para a caracterização da diversidade<br />

genética dos remanescentes de<br />

A. angustifolia, com vistas ao melhoramento<br />

genético da espécie.<br />

Agradecimentos<br />

Ao CNPq, UNIPLAC e FUNCITEC<br />

pelo apoio financeiro e à Prefeitura<br />

do Município de Lages, pelo apoio na<br />

obtenção do material vegetal.<br />

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[Dissertação de Mestrado, Universidade<br />

Federal de Santa Catarina]<br />

VOS, P.; HOGERS, R.; BLEEKER, M.;<br />

REIJANS, M.; VANDELEE, T.;<br />

HORNES, M.; FRIJTERS, A.; POT, J.;<br />

PELEMAN, J.; KUIPER, M.; ZABEAU,<br />

M. AFLP: a new technique for DNA<br />

fingerprinting. Nucleic Acid<br />

Research, 23:4407-4414, 1995.<br />

WELSH, J.; MCCLELLAND, M.<br />

Fingerprinting genomes using PCR<br />

with arbitrary primers. Nucleic<br />

Acids Research, 18(24):7213-<br />

7218, 1990.<br />

WILLIAMS, J. G. K.; KUBELIK, A. R.;<br />

LIVAK, K. J.; RAFALSKI, J. A.;<br />

TINGEY, S. V. DNA polymorphism<br />

amplified by arbitrary primers are<br />

useful as genetic markers. Nucleic<br />

Acids Research, 18(22):65<strong>31</strong>-<br />

6535, 1990.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 99


Pesquisa<br />

Monita Fiori de Abreu<br />

Acadêmica do curso de Agronomia,<br />

Bolsista PIBIC/BIP/CNPq - Laboratório de<br />

Morfogênese e Bioquímica Vegetal - CCA/UFSC.<br />

monitaf@yahoo.com<br />

Enio Luiz Pedrotti<br />

Ph.D., Prof. Adjunto IV , Departamento de<br />

Fitotecnia - Laboratório de Morfogênese e<br />

Bioquímica Vegetal -CCA/UFSC.<br />

pedrotti@cca.ufsc.br<br />

Ilustrações cedidas pelos autores<br />

Micropropagação<br />

de Macieira<br />

Introdução<br />

A cultura da macieira possui papel<br />

de destaque no cenário frutícola<br />

brasileiro. Atualmente, a área cultivada<br />

no Brasil está estimada em 30 mil<br />

hectares, com uma produção aproximada<br />

de 967 mil toneladas (ABPM,<br />

2003). Visando atender às demandas<br />

de mudas da pomicultura nacional,<br />

faz-se necessária a aplicação de métodos<br />

eficientes para garantir grande<br />

quantidade de material vegetal de alta<br />

qualidade genética e fitossanitária.<br />

A produção de mudas da macieira<br />

tradicionalmente é efetuada através<br />

de técnicas de propagação vegetativa,<br />

como a enxertia de cultivares<br />

copa sobre um porta-enxerto. Tradicionalmente<br />

a muda é obtida através<br />

de mergulhia de cepa (Driessen &<br />

Souza Filho, 1986). Porém, esse método<br />

restringe o número de mudas<br />

obtidas, requer muito tempo, além<br />

de poder resultar em mudas de baixa<br />

qualidade fitossanitária.<br />

Diante da problemática relacionada<br />

às técnicas convencionais de<br />

propagação, a biotecnologia através<br />

do aperfeiçoamento das técnicas de<br />

cultivo in vitro, tem sido uma excelente<br />

opção para a multiplicação desta<br />

frutífera (Figura 1). Possibilita a<br />

produção de mudas de alta qualidade<br />

sanitária oriundas da cultura de<br />

meristemas livres de vírus, evitando,<br />

desta forma, os problemas de disseminação<br />

de vírus e outros patógenos<br />

durante a fase de propagação.<br />

Diversos trabalhos vêm sendo<br />

conduzidos no Laboratório de<br />

Morfogênese e Bioquímica Vegetal<br />

(CCA/UFSC) a partir de projetos fi-<br />

100 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Avanços nos protocolos de micropropagação<br />

nanciados pelo CNPq e FINEP. As<br />

principais linhas de pesquisa foram<br />

no sentido de desenvolver metodologias<br />

que abrangem desde o isolamento<br />

e inoculação in vitro de<br />

meristemas, até a aclimatização das<br />

plantas micropropagadas.<br />

Metodologia<br />

1 - Isolamento e Inoculação<br />

in vitro<br />

A introdução e o estabelecimento<br />

de meristemas in vitro é uma<br />

das fases mais delicadas da micropropagação.<br />

O isolamento de<br />

meristemas é um processo oneroso<br />

(Nunes et al., 1999) mas é primordial,<br />

pois é uma condição que garante<br />

a produção de brotações livres de<br />

patógenos. A oxidação e a contaminação<br />

provocam grandes perdas do<br />

material. Os meristemas extraídos<br />

das gemas apicais apresentam taxas<br />

de oxidação acima de 40%. A percentagem<br />

de contaminação é constatada<br />

em cerca de 35% dos<br />

explantes. Num trabalho conduzido<br />

com o porta-enxerto M.9, todos os<br />

tubos de ensaio com meio de cultura<br />

contaminado apresentaram oxidação<br />

(Tabela 1). Os agentes contaminantes<br />

como fungos e bactérias liberam<br />

compostos que causam a oxidação.<br />

O estabelecimento in vitro é<br />

executado segundo metodologias<br />

consideradas clássicas para esta fase<br />

(Pedrotti, 1993; Nunes et al. 1999).<br />

As gemas são extraídas com o auxílio<br />

de um bisturi e estas, são submetidas<br />

à lavagem com água destilada/<br />

autoclavada e detergente Tween


Tabela<br />

1.<br />

Contaminação,<br />

oxidação,<br />

números<br />

de<br />

gemas<br />

e brotos<br />

e<br />

percentual de<br />

calos<br />

no<br />

porta-enxerto<br />

de<br />

macieira<br />

'M-9'<br />

( Malus<br />

p umilla<br />

M.<br />

) , a partir<br />

da<br />

cultura<br />

de<br />

meristemas<br />

e gemas<br />

axilares.<br />

Parâmetro<br />

s Analisados<br />

Meristemas Tratamen<br />

tos<br />

G emas<br />

CV<br />

( % )<br />

Conta mina<br />

ção<br />

( % )<br />

38, 6 a 32, 2 a 14,<br />

1<br />

Oxidaç ão<br />

( % )<br />

42, 3 b 58, 4 a 12,<br />

5<br />

Nº médi<br />

o de<br />

gema<br />

s por<br />

brot<br />

o 3, 0 b 5, 0a<br />

12,<br />

6<br />

Nº médi<br />

o de<br />

brot<br />

os<br />

form<br />

ados<br />

3, 0 a 4, 0 a 9,<br />

6<br />

Calos ( % )<br />

62, 3 a 12, 4 b 14,<br />

1<br />

Figura 1: Frascos do cultivo in vitro de macieira<br />

20®por 20 minutos. Em seguida, as<br />

gemas são imersas em solução de<br />

Anfotericina B®(25 mg.L -1 ) por 10<br />

minutos. Em câmara de fluxo laminar,<br />

as gemas são imersas em etanol 70%<br />

por 1 minuto, seguida de solução de<br />

hipoclorito de sódio 4%, por 10 minutos.<br />

Durante este processo os frascos<br />

são mantidos sob agitação contínua.<br />

Posteriormente, faz-se uma<br />

tríplice lavagem com água destilada/autoclavada<br />

e as gemas permanecem<br />

em uma solução de ácido<br />

ascórbico 15% por 10 minutos até<br />

serem inoculadas em sais e vitaminas<br />

de MS (Murashige e Skoog, 1962),<br />

sacarose (30 g.L -1 ), ágar (6 g.L -1 ) sem<br />

suplementação de fitorreguladores<br />

(Souza et al.,2003).<br />

As gemas axilares introduzidas<br />

in vitro têm apresentado oxidação<br />

acima de 50%, enquanto que os meios<br />

de cultura contaminados com fungos<br />

e bactérias são normalmente acima<br />

de 30% (Tabela 1). Da mesma<br />

forma, todos os tubos contendo meio<br />

de cultura contaminados apresentaram<br />

oxidação. Quando os explantes<br />

não apresentam oxidação nem contaminação,<br />

são transferidos de tubos<br />

de ensaio com novos meios de cultura<br />

para eliminar resíduos fenólicos<br />

liberados pelas plantas no meio de<br />

cultura inicial (Zanol, 1996). Nos tra-<br />

balhos conduzidos no laboratório,<br />

após a transferência dos meristemas<br />

provenientes de gemas apicais e segmentos<br />

nodais com gemas axilares,<br />

não ocorrem mais problemas de contaminação<br />

nem oxidação.<br />

O crescimento e desenvolvimento<br />

dos meristemas e gemas axilares<br />

são normalmente lentos até 30 dias<br />

após a inoculação, não sendo observado<br />

o crescimento de brotações.<br />

Aos 60 dias, é possível observar o<br />

desenvolvimento de brotações. Para<br />

o porta-enxerto M.9, os meristemas e<br />

gemas axilares introduzidos in vitro,<br />

formam um número médio de 3 e 5<br />

gemas por broto, respectivamente<br />

(Tabela 1).<br />

As diferenças observadas na introdução<br />

in vitro e multiplicação podem<br />

ser consequência do estado fisiológico<br />

das plantas matrizes, onde<br />

foram coletados os explantes como<br />

salientaram Grattapaglia & Machado<br />

(1990). Quando material vegetal coletado<br />

é retirado das matrizes no final<br />

do verão, possivelmente, as gemas já<br />

iniciam o processo de entrada em<br />

dormência, o que diminui a sobrevivência<br />

dos meristemas e gemas introduzidos<br />

in vitro. Desta forma, a época<br />

mais interessante para a introdução<br />

in vitro é aquela que corresponde<br />

a um intenso crescimento<br />

vegetativo nas condições naturais.<br />

2 - Multiplicação do<br />

material vegetal<br />

A composição salina mais utilizada<br />

nos meios de cultura é a MS<br />

(Murashige & Skoog, 1962), geralmente<br />

suplementada com reguladores<br />

de crescimento que permitem<br />

direcionar as respostas morfogenéticas<br />

(George, 1996). Para a<br />

fase de multiplicação in vitro da<br />

macieira, Ribas & Zanette (1992)<br />

Tabela<br />

2.<br />

Efeito<br />

de<br />

diferentes<br />

concentraçõ<br />

es<br />

de<br />

BAP<br />

em<br />

meio<br />

de<br />

cultura<br />

MS<br />

sobre<br />

a resposta<br />

de<br />

na<br />

fase<br />

de multiplicação<br />

i n vitro<br />

de macieira<br />

( M alus<br />

platycarpa)<br />

após<br />

45<br />

dias<br />

de<br />

cultura.<br />

Concentraç<br />

ão<br />

de<br />

BAP<br />

Nº<br />

de<br />

brotações<br />

por<br />

explante<br />

Altura<br />

das<br />

brotações<br />

( cm)<br />

Comprimento<br />

dos<br />

entrenós<br />

( cm)<br />

Vitrificação<br />

( % )<br />

0, 00<br />

µ M<br />

1, 0 c<br />

2, 3 a<br />

0, 59<br />

b<br />

42,<br />

0 a<br />

1, 11<br />

µ M<br />

2, 0 b<br />

2, 6 a<br />

0, 59<br />

b<br />

18,<br />

0 c<br />

2, 22<br />

µ M<br />

3, 0 a<br />

2, 6 a<br />

0, 54<br />

c<br />

18,<br />

0 c<br />

4, 44<br />

µ M<br />

2, 0 b<br />

2, 9 a<br />

0, 65<br />

a<br />

24,<br />

0 b<br />

CV ( % )<br />

14, 2<br />

15, 3<br />

13, 3<br />

18,<br />

9<br />

Médias<br />

seguid<br />

as<br />

de<br />

mesm<br />

a letra<br />

na<br />

verti<br />

cal<br />

não<br />

difere<br />

m signi<br />

ficati<br />

vament<br />

e entre<br />

si,<br />

ao<br />

nível<br />

de<br />

5%<br />

de<br />

prob<br />

abilid<br />

ade,<br />

pelo<br />

teste<br />

de<br />

Duncan.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 101


utilizaram o meio MS suplementado<br />

com 1,0 mg.L -1 de BAP e 1,0<br />

mg.L -1 de tiamina, e Modgil et al.<br />

(1999) obtiveram a maior taxa de<br />

multiplicação de brotações da cultivar<br />

Tydeman´s Early Worcester adicionando<br />

ao meio de cultura 4,4 µM<br />

de BAP e 5,0 µM de KIN. Para o<br />

porta-enxerto Marubakaido Nunes<br />

et al. (1999) utilizaram concentrações<br />

de BAP entre 1,11 e 4,44 µM.<br />

Quando se pretende estudar o<br />

comportamento de um novo genótipo,<br />

os explantes são repicados para tubos<br />

de ensaio (2,5 x 15,0 cm) contendo 15<br />

mL de sais e vitaminas de MS, suplementado<br />

com diferentes concentrações<br />

de benzilaminopurina (BAP) (0;<br />

0,25; 0,50 e 1.0 mg.L -1 ), 30,0g.L -1 de<br />

sacarose, 6,0 g.L -1 de ágar. Para um<br />

genótipo usado com planta indicadora<br />

de viroses, é possível verificar que as<br />

concentrações de BAP influenciam sua<br />

resposta in vitro (Tabela 2). O material<br />

é mantido no escuro por 48 horas, após<br />

este período, é transferido para a sala<br />

de crescimento sob fotoperíodo de 16<br />

horas e temperatura de 25 ± 2°C e 40<br />

µmol.m -2 .s -1 de radiação luminosa,<br />

fornecidas por lâmpadas fluorescentes<br />

Phillips® Super 84.<br />

3 - Microenxertia<br />

Tendo em vista as características<br />

da cultura, a associação das técnicas<br />

de micropropagação e microenxertia<br />

permite combinar as vantagens da<br />

rápida multiplicação in vitro, com a<br />

união de dois genótipos diferentes:<br />

um clone copa, selecionado para<br />

produzir frutos de alta qualidade, e<br />

um clone de porta-enxerto, que confere<br />

à cultivar copa características<br />

relevantes, como: vigor, produtividade,<br />

qualidade de frutos, resistência a<br />

fatores adversos como a patógenos<br />

do solo, além de realizar funções<br />

básicas de suporte da planta, fornecimento<br />

de água e nutrientes e a adaptação<br />

às condições de solo, clima e<br />

doenças.<br />

A micronexertia foi inicialmente<br />

desenvolvida por Murashige et al.<br />

(1972) e posteriormente melhorada<br />

por Navarro et al.(1975), buscando a<br />

produção de citrus livres de viroses.<br />

Esta técnica permite a obtenção de<br />

plantas livres de patógenos, aplica-<br />

Figura 2: Fenda do microenxerto de macieira.,<br />

início de brotação na copa, 30 dias após<br />

a microenxertia.<br />

ção de quarentena em espécies vegetais<br />

cuja disponibilidade seja de<br />

apenas algumas gemas vegetativas,<br />

separação entre viroses e outras doenças,<br />

além de estudos fisiológicos,<br />

histológicos e histoquímicos nas<br />

enxertias. Porem ainda é um desafio<br />

promover com sucesso a enxertia de<br />

um material tão pequeno e frágil<br />

como aquele proveniente de plantas<br />

produzidas in vitro. (Obeidy & Smith,<br />

1991). Para garantir a viabilidade do<br />

microenxerto é necessário que as<br />

células da base do microenxerto da<br />

cultivar copa, entrem novamente em<br />

divisão, pois são diferenciadas, ou<br />

seja, já deixaram o ciclo celular e<br />

não sofrem mais desdiferenciação.<br />

Na retomada do ciclo celular é possível<br />

induzir novas competências e<br />

diferenciar para estabelecer os tecidos<br />

estruturais e condutores (Taiz &<br />

Zeiger, 1991). O estabelecimento de<br />

novos tecidos condutores é o resultado<br />

do sucesso do método.<br />

Nos trabalhos desenvolvidos no<br />

Laboratório de Morfogênese e Bioquímica<br />

Vegetal, como modelo, foram<br />

utilizados dois porta-enxertos<br />

(M9 e Marubakaido) e uma cultivar<br />

copa (Gala) de macieira. O portaenxerto<br />

M9 (Malus pumila Mill.) é o<br />

mais utilizado no sul do Brasil, tendo<br />

como característica principal diminuir<br />

o vigor da planta. Além de redu-<br />

102 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Figura 3: Detalhes dos pontos de conexão<br />

observados no corte histológico do microenxerto<br />

de macieira, 90 dias após a microenxertia.<br />

zir o porte da planta, o M9 aumenta<br />

a precocidade e é um dos poucos<br />

porta-enxertos que apresenta boa<br />

resistência à podridão do colo<br />

(Phytophthora cactorum) (Barrit,<br />

1999). O porta-enxerto Marubakaido<br />

(Malus prunifolia Borkh.) é de origem<br />

japonesa, sendo bastante utilizado<br />

como porta-enxerto comercial<br />

no Japão, Europa bem como no Brasil<br />

(Bessho et al., 1993). É vigoroso,<br />

apresenta resistência à podridão-docolo,<br />

relativa resistência a Rosellinia<br />

sp. e é muito sensível a viroses<br />

(Denardi, 1986). A culitvar copa Gala<br />

(Malus domestica Borkh.) é a primeira<br />

em volume de produção no Brasil,<br />

apresenta frutificação precoce, alta<br />

produtividade e boa adaptação a altitudes<br />

superiores a 1000m (Denardi,<br />

1986).<br />

4 - Estudos histológicos<br />

A microenxertia é realizada em<br />

fenda simples conforme a metodologia<br />

proposta por Hartmann et al.<br />

(1990). Em câmara de fluxo laminar,<br />

a parte apical das plântulas dos<br />

porta-enxertos é retirada e a altura<br />

das plantas uniformizada em 5 cm<br />

de altura. Para a variedade copa<br />

Gala sãopreparados microgarfos<br />

com uma única gema lateral. Através<br />

de um corte em fenda simples


Tabela<br />

3.<br />

Número<br />

e comprimento<br />

de<br />

raízes<br />

em<br />

plantas<br />

micropropagad<br />

as<br />

dos<br />

porta-enxertos<br />

de<br />

macieira<br />

M.<br />

7,<br />

M.<br />

9 e Marubakaido,<br />

submetidos<br />

a diferentes<br />

concentraçõ<br />

es<br />

e formas<br />

de<br />

aplicação<br />

de<br />

Ácido<br />

Indolbutírico<br />

( AIB)<br />

e ao<br />

crescimento<br />

das<br />

raízes<br />

em<br />

diferentes<br />

substrato<br />

s.<br />

N úmero<br />

de<br />

raízes<br />

Comprimento<br />

das<br />

raízes<br />

( cm)<br />

T ratamento<br />

s " M.<br />

7"<br />

" M.<br />

9"<br />

" Marubakaido"<br />

" M.<br />

7"<br />

" M.<br />

9"<br />

" Marubakaido"<br />

1 4, 0 ± 1,<br />

0 c 5, 0 ± 1,<br />

0 a 10, 0 ± 2,<br />

0 a 1, 7 ± 0,<br />

1 b 2, 7 ± 0,<br />

5 a 1,<br />

8 ± 0,<br />

4 b<br />

2 6, 0 ± 0,<br />

5 b 3, 0 ± 1,<br />

0 b 3, 0 ± 1,<br />

0 b 1, 9 ± 0,<br />

1 ab<br />

0, 5 ± 0,<br />

2 c 0,<br />

5 ± 0,<br />

3 c<br />

3 8, 0 ± 1,<br />

0 a 0, 0 ± 0,<br />

0 c 2, 0 ± 0,<br />

5 c 2, 2 ± 0,<br />

2 a 0, 0 ± 0,<br />

0 d 0,<br />

4 ± 0,<br />

3 c<br />

4 9, 0 ± 1,<br />

0 a 5, 0 ± 1,<br />

0 a 13, 0 ± 2,<br />

0 a 2, 2 ± 0.<br />

2 a 1, 6 ± 0,<br />

2 b 3,<br />

4 ± 0,<br />

5 a<br />

Médias<br />

na<br />

coluna<br />

seguid<br />

as<br />

da<br />

mesm<br />

a letra<br />

não<br />

difere<br />

m estat<br />

isti<br />

camen<br />

te<br />

entre<br />

si,<br />

ao<br />

nível<br />

de<br />

5 % de<br />

prob<br />

abilid<br />

ade,<br />

pelo<br />

teste<br />

de<br />

Tukey.<br />

Trata<br />

ment<br />

os:<br />

1 - Induçã<br />

o in vitro<br />

em 1.<br />

5 µ M de<br />

AIB<br />

em<br />

ágar<br />

e cres<br />

cime<br />

nto<br />

das<br />

raíz<br />

es<br />

i n vitro<br />

em<br />

ágar;<br />

2 - Induçã<br />

o in vitro<br />

em 1.<br />

5 µ M de<br />

AIB<br />

em<br />

ágar<br />

e cres<br />

cime<br />

nto<br />

das<br />

raíz<br />

es<br />

i n vitro<br />

em<br />

subst<br />

rato<br />

mine<br />

ral;<br />

3 - Induçã<br />

o in vitro<br />

com 0,<br />

49<br />

M de<br />

AIB<br />

e cres<br />

cime<br />

nto<br />

i n vitro<br />

em<br />

subst<br />

rato<br />

mine<br />

ral;<br />

4 - Induçã<br />

o ex vitro<br />

com<br />

0,<br />

49<br />

M de<br />

AIB<br />

e cres<br />

cime<br />

nto<br />

das<br />

raíz<br />

es<br />

em<br />

subst<br />

rato<br />

mine<br />

ral<br />

conco<br />

mita<br />

nte<br />

com<br />

a fase<br />

de<br />

aclima<br />

tizaçã<br />

o.<br />

Tabela<br />

4.<br />

Enraizamen<br />

to,<br />

número<br />

e comprimento<br />

de<br />

raízes<br />

de<br />

microestacas<br />

do<br />

porta-enxerto<br />

de<br />

macieira M.<br />

9 ( Malus pumila)<br />

, tratadas<br />

com<br />

AIB<br />

e submetidas<br />

ao<br />

enraizamen<br />

to<br />

ex vitro,<br />

em<br />

substrato<br />

de<br />

casca<br />

de<br />

arroz<br />

carbonizad<br />

a e vermiculita<br />

1:<br />

1 ( v/<br />

v)<br />

, por<br />

um<br />

período<br />

de<br />

30<br />

dias.<br />

A IB(<br />

mg/<br />

L)<br />

Enraizamen to(<br />

% )<br />

N úmero<br />

deraízes<br />

Comprimento<br />

das<br />

raízes<br />

( cm)<br />

0 64 b<br />

3, 5 b<br />

3,<br />

5 a<br />

500 82 a<br />

6, 0 a<br />

4,<br />

1 a<br />

1000 84 a<br />

6, 0 a<br />

4,<br />

5 a<br />

1500 30 c<br />

7, 5 a<br />

4,<br />

7 a<br />

* Médias<br />

seguid<br />

as<br />

de<br />

mesm<br />

as<br />

letra<br />

s nas<br />

coluna<br />

s não<br />

difere<br />

m signi<br />

ficati<br />

vament<br />

e pelo<br />

teste<br />

de<br />

Duncan<br />

a 5%<br />

.<br />

ns<br />

- não<br />

signi<br />

ficati<br />

vo.<br />

realizado nas plântulas dos portaenxertos,<br />

e um corte em bisel no<br />

minigarfo da cultivar copa, é realizada<br />

a enxertia com o auxílio de<br />

duas pinças. Os microenxertos são<br />

então inoculados em frascos com<br />

meio de cultura MS (Murashige &<br />

Skoog, 1962) e transferidos para a<br />

sala de crescimento, com temperatura<br />

de 25±2ºC, fotoperíodo de 16<br />

horas e luminosidade de 40 µmol.m -<br />

2 .s -1 , onde permanecem até as coletas<br />

dos segmentos. Para os estudos<br />

histológicos, de ambas as combinações<br />

enxerto-porta-enxerto, Gala sobre<br />

Marubakaido e Gala sobre M9,<br />

são realizadas 120 microenxertias,<br />

o que diminuem os erros experimentais.<br />

O material vegetal coletado<br />

é fixado em glutaraldeído 2,5%<br />

em tampão fosfato de sódio 0,1M –<br />

pH7,2, desidratado em série etílica<br />

e emblocado em parafina (Johansen,<br />

1940). Os cortes são corados com<br />

azul de toluidina e montados, entre<br />

lâmina e lamínula, com bálsamo do<br />

Canadá. A análise dos cortes<br />

histológicos é feita em microscopia<br />

óptica e em lupa, 30 e 90 dias após<br />

a microenxertia (Figuras 2 e 3). A<br />

conexão dos microenxertos é<br />

vizualizada a partir de duas etapas.<br />

O primeiro momento se dá em poucos<br />

dias e é caracterizado pela morte<br />

de camadas celulares da interface<br />

do enxerto e pela formação de células<br />

parenquimáticas que preenchem<br />

o ponto de enxertia, resultando<br />

no desenvolvimento de uma<br />

camada necrótica na fenda. Na segunda<br />

etapa, ocorre a proliferação<br />

de um calo em associação com a<br />

região vascular da copa e do portaenxerto,<br />

formando uma ponte na<br />

interface do enxerto. Posteriormente,<br />

há a diferenciação de algumas<br />

células do calo em novas células<br />

cambiais. Ocorre, então, a união<br />

entre os tecidos afins da copa e do<br />

porta-enxerto resultando no estabelecimento<br />

de uma conexão cambial<br />

contínua. Na última fase, a<br />

continuidade da epiderme no ponto<br />

de enxertia é restaurada. O posterior<br />

desenvolvimento da copa pelo<br />

alongamento e desenvolvimento de<br />

brotações caracteriza o sucesso da<br />

microenxertia, observado em até<br />

30 dias em macieira (Abreu et al.,<br />

2003).<br />

5 - Enraizamento de<br />

plantas micropropagadas<br />

O enraizamento de microestacas<br />

é considerado por vários autores<br />

um dos estágios mais críticos do<br />

processo de propagação massal de<br />

plantas perenes (Wang, 1991), pois<br />

depende do genótipo e de sua condição<br />

fisiológica no momento da<br />

indução ao enraizamento (Martins &<br />

Pedrotti, 2001). A emissão de raízes<br />

por uma microestaca pode ser dividida<br />

em três fases, que compreendem<br />

a desdiferenciação celular, a indução<br />

e a organização dos primórdios<br />

radiculares (Hartmann et al., 1997;<br />

Blakesley et al., 1991). Na maioria<br />

dos protocolos estabelecidos para a<br />

micropropagação de plantas, o enraizamento<br />

é induzido in vitro, utilizando<br />

meios de cultura contendo uma<br />

auxina (Harbage & Stimart, 1996;<br />

Deklerk et al., 1997; Ferri et al., 1998).<br />

Para a maioria das espécies, a auxina<br />

é necessária na fase de indução das<br />

raízes enquanto que, na fase de diferenciação<br />

dos primórdios e no crescimento<br />

das raízes, a presença de<br />

auxinas no meio de cultura pode<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 103


inibir o processo (Deklerk et al.,1995).<br />

A concentração de auxina a ser adicionada<br />

ao meio de cultura para o<br />

estágio de indução, depende da concentração<br />

endógena deste hormônio<br />

em cada genótipo utilizado (Blakesley<br />

et al., 1991), sendo que altas concentrações,<br />

por períodos de exposição<br />

prolongados, podem determinar a<br />

formação de calos na base das microestacas.<br />

Para Pasqual & Ishida (1992),<br />

o melhor enraizamento in vitro foi<br />

obtido em meio MS, geleificado, contendo<br />

1 mg/L de AIB.<br />

As condições de temperatura, a<br />

luminosidade da câmara de crescimento<br />

e a disponibilidade de oxigênio<br />

junto à base das microestacas,<br />

além de fatores anatômicos inerentes<br />

ao genótipo, podem inibir a evolução<br />

do processo morfogenético induzido<br />

pelas auxinas. Apesar de<br />

Harbage & Stimart (1996), Deklerk et<br />

al. (1997) e outros autores utilizarem<br />

o processo de indução e crescimento<br />

das raízes in vitro, McClelland et al.<br />

(1990) ressaltam que as raízes produzidas<br />

in vitro não são funcionais quando<br />

transferidas para a fase de aclimatização.<br />

Para garantir a sobrevivência<br />

nesse estágio, é necessário que a<br />

planta produza novas raízes, o que<br />

demanda um grande consumo de<br />

reservas que deveriam ser utilizadas<br />

para o crescimento da parte aérea.<br />

Além disto, Debergh & Maene (1981)<br />

salientam a necessidade de desenvolver<br />

sistemas de indução que permitam<br />

a produção de raízes funcionais<br />

para o processo de aclimatização<br />

e para o aumento da qualidade<br />

das plântulas.<br />

5.1 - Enraizamento in vitro<br />

Os resultados obtidos com a<br />

indução in vitro de raízes em portaenxertos<br />

de macieira, mostraram diferenças<br />

em relação aos parâmetros<br />

avaliados, em função do genótipo e<br />

da concentração e forma de aplicação<br />

da auxina (Martins & Pedrotti,<br />

2001). (Tabela 3). Resultados semelhantes<br />

foram obtidos com macieira<br />

por Harbage et al. (1998), os quais<br />

concluíram que a capacidade de emitir<br />

raízes e de estabelecer um sistema<br />

radicular, é uma condição intrínseca<br />

de cada genótipo<br />

No caso do porta-enxerto M.7, o<br />

enraizamento realizado in vitro em<br />

ágar apresentou resultados inferiores<br />

quanto ao número de raízes. Provavelmente<br />

as concentrações de AIB utilizadas<br />

não possibilitaram a indução do<br />

mesmo número de raízes que foi observado<br />

para o ‘Marubakaido’, já que as<br />

respostas são dependentes do genótipo<br />

(Blakesley et al., 1991). É possível que,<br />

para este porta-enxerto, o pH do meio<br />

de cultura não tenha favorecido a absorção<br />

de auxinas pelas células da<br />

base da microestaca, tendo em vista<br />

que a penetração de auxinas nas células<br />

depende do equilíbrio entre ácidos<br />

livres e formas aniônicas, que são<br />

dependentes do pH (Harbage et al.,<br />

1998). O maior número de raízes obtido<br />

para as microestacas do ‘M.9’ e do<br />

‘Marubakaido (Tabela 4), induzidas ex<br />

vitro com o AIB dissolvido em água e<br />

transferidas diretamente para o substrato<br />

mineral para a aclimatização, reforça<br />

as conclusões emitidas por Rogers<br />

& Smith, (1992). Estes autores aumentaram<br />

a eficiência no enraizamento de<br />

roseiras quando utilizaram substratos<br />

minerais para o crescimento das raízes,<br />

comparados com meios de cultura<br />

geleificados. Estes resultados abrem<br />

perspectivas concretas para o uso de<br />

substratos porosos para o enraizamento<br />

in vitro, o que diminui os custos de<br />

produção de plantas micropropagadas.<br />

Com esta metodologia é possível<br />

substituir os meios de cultura contendo<br />

ágar por substratos minerais, o que<br />

diminui custos e produz raízes de<br />

melhor qualidade do que as produzidas<br />

in vitro.<br />

Figura 4 : Crescimento de raízes em<br />

porta-enxertos de macieira, após indução<br />

ao enraizamento<br />

104 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

5.2 - Enraizamento ex vitro<br />

Em função dos custos da fase de<br />

enraizamento e aclimatização das<br />

plantas micropropagadas, uma série<br />

de trabalhos foram conduzidos no<br />

Laboratório de Morfogênese e Bioquímica<br />

Vegetal (Pedrotti & Voltolini,<br />

2001). Os principais objetivos foram<br />

de induzir o enraizamento ex vitro<br />

em substratos porosos que servem<br />

apenas de suporte para as plântulas<br />

como acontece na estaquia tradicionalmente<br />

usada para a propagação<br />

de várias espéceis. Para isto, são<br />

utilizadas miniestacas do porta-enxerto<br />

M.9, de 2 a 2,5 cm de comprimento,<br />

com dois pares de folhas,<br />

preparadas a partir de brotações micropropagadas.<br />

A indução ao enraizamento<br />

é efetuada submergindo<br />

10mm da base das miniestacas durante<br />

10 segundos em diferentes concentrações<br />

de ácido indolbutírico (0,<br />

500, 1000, ou 1500 mg/L ). Em seguida,<br />

as miniestacas são transferidas<br />

para bandejas alveoladas contendo o<br />

substrato terra roxa e casca de arroz<br />

carbonizada 1:1 (v/v.). As bandejas<br />

são então colocadas dentro de caixas<br />

plásticas com uma lâmina de água de<br />

5 mm para manter a umidade relativa<br />

elevada. As caixas são cobertas com<br />

uma lâmina de vidro, conforme metodologia<br />

descrita por Pedrotti (1993).<br />

Durante 30 dias essas caixas são<br />

mantidas em câmara de aclimatização<br />

com temperatura de 27±2 °C,<br />

fotoperíodo de 16 horas com intensidade<br />

luminosa de 30 µmol.m -2 .s -1 .<br />

Após esse período, as plantas são<br />

avaliadas quanto ao percentual de<br />

enraizamento, número e comprimento<br />

das raízes emitidas.<br />

As maiores percentagens de enraizamento<br />

com 82 e 84 % são observadas<br />

nas miniestacas tratadas com<br />

500 e 1000 mg/L de AIB, respectivamente<br />

O menor percentual de enraizamento<br />

(29,6%) é obtido com 1500<br />

mg/L de AIB. As microestacas-controle<br />

produzem em média 3,4 raízes.<br />

Estes valores são inferiores<br />

àqueles observados nos tratamentos<br />

com AIB. Para os níveis de AIB de<br />

500, 1000 e 1500 mg/L, o resultado é<br />

a produção de 5,6 a 7,6 raízes respectivamente,<br />

não diferindo estatisticamente<br />

entre si.


Considerando que o porta-enxerto<br />

M.9 é de difícil enraizamento<br />

é possível sugerir que o mesmo<br />

necessite de níveis maiores de<br />

auxinas ou outros coofatores para<br />

aumentar o enraizamento, já que<br />

James & Thurnbon (1981) só obtiveram<br />

45% de enraizamento com<br />

este porta-enxerto quando adicionaram<br />

fluoroglucinol no meio de<br />

cultura. Possivelmente as condições<br />

de indução in vitro, utilizadas por<br />

estes autores dificultaram a absorção<br />

da auxina, como constatado<br />

por Harbage et al. (1998). Além<br />

disto, a intensidade luminosa da<br />

câmara de crescimento pode ter<br />

contribuído para inativar parte da<br />

auxina aplicada. Khosh-khui & Sink<br />

(1982) obtiveram aumento no enraizamento<br />

de roseira com o<br />

sombreamento da base das estacas.<br />

Valores mais elevados no enraizamento<br />

de pereira (Wang, 1991) e<br />

em macieira (Fortes & Leite,1993)<br />

foram obtidos com a manutenção<br />

das plantas no escuro. A maior porosidade<br />

e aeração dos substratos<br />

utilizados também podem favorecer<br />

a indução e o crescimento de<br />

raízes, como foi observado por Jay-<br />

Allemand et al. (1992).<br />

Os níveis de AIB superiores a<br />

500 mg/L não aumentam a percentagem<br />

de enraizamento do porta-enxerto<br />

M.9. Estes resultados podem<br />

estar relacionados com os teores<br />

endógenos de auxinas produzidas<br />

por gemas e folhas jovens, como<br />

sugerem Hartmann et al. (1997), pois<br />

mesmo sem aplicação de AIB, as<br />

percentagens de enraizamento do<br />

porta-enxerto M.9 foram de 63,5 %.<br />

A exposição das miniestacas ao AIB<br />

por 10 segundos é suficiente para a<br />

indução de primórdios radiculares e<br />

o desenvolvimento e crescimento<br />

posteriores das raízes (Figura 4).<br />

Jarvis et al. (1983) observaram um<br />

aumento na síntese de RNA 20 horas<br />

após a aplicação de auxina o que<br />

corresponde às primeiras divisões<br />

celulares.<br />

6 - Aclimatização<br />

Durante a fase de aclimatização,<br />

as plantas micropropagadas devem<br />

se adaptar a um ambiente completamente<br />

diferente das condições em<br />

que ela foi produzida in vitro. Durante<br />

este período a planta deve compor<br />

uma estrutura anatômica e fisiológica<br />

capaz de suportar as condições de<br />

alta demanda evaporativa da atmosfera<br />

e de alta radiação luminosa.<br />

Quando transferidas para condições<br />

ex vitro, as mudas normalmente apresentam<br />

altas taxas de transpiração,<br />

em função da alta condutividade hidráulica<br />

de suas folhas e a funcionalidade<br />

dos estômatos (Brainerd &<br />

Fuchigami, 1981; Schakel et al., 1990),<br />

o que, na maioria das situações, provoca<br />

elevado déficit hídrico, podendo<br />

provocar a morte das mudas (Díaz-<br />

Pérez et al., 1995).<br />

Apesar dos avanços nos protocolos<br />

de multiplicação in vitro, poucos<br />

trabalhos foram realizados no sentido<br />

de elucidar problemas ligados à aclimatização<br />

das plantas (Avanzato &<br />

Cherubini, 1993). Para Ziv (1995), a<br />

aclimatização pode comprometer o<br />

processo de micropropagação por envolver<br />

a neoformação de um sistema<br />

radicular e a passagem para condições<br />

de cultivo ex vitro.<br />

Durante a fase de multiplicação<br />

das brotações in vitro, os estômatos<br />

apresentam-se com formas e estruturas<br />

anormais (Blanke & Belcher,<br />

1989) e a densidade pode ser diferente<br />

das folhas de plantas cultivadas<br />

ex vitro (Cappelades et al., 1990;<br />

Sciutti & Morini, 1993). Para diver-<br />

Figura 5.: Desenho esquemático da metodologia de aclimatização de plantas micropropagadas (Pedrotti, 1993).<br />

A e B: Indução ao enraizamento in vitro.<br />

C: Indução ao enraizamento ex vitro.<br />

D: Início do processo de aclimatização.<br />

E: Plantas sendo mantidas em sala com nebulização.<br />

F: Fotoperíodo sendo mantido em 16 horas de luz para evitar a entrada em dormência.<br />

G e H: Plantas transferidas à campo para completar o crescimento.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 105


Figura 6: Crescimento e desenvolvimento de mudas de macieira após aclimatização.<br />

sos autores, (Pospisilova et al., 1997),<br />

os estômatos in vitro não são funcionais,<br />

permanecem contentemente<br />

abertos ou fechados e são insensíveis<br />

aos estímulos habituais de escuro,<br />

alta concentração de CO 2 , ABA<br />

e potencial hídrico. Desta forma, a<br />

grande transpiração pode causar dificuldades<br />

durante o processo de<br />

aclimatização.<br />

A metodologia recomendada<br />

por Pedrotti (1993) (Figura 5) e<br />

utilizada no LMBV por Pedrotti &<br />

Voltolini (2001), possibilitou bons<br />

resultados para vários genótipos de<br />

macieira. Neste processo, as plantas<br />

são induzidas ao enraizamento<br />

ex vitro e transferidas para bandejas<br />

alveoladas.<br />

As bandejas são colocadas em<br />

caixas plásticas cobertas com uma<br />

placa de vidro transparente. Esta<br />

condição, permite a manutenção da<br />

umidade relativa em 100%. Com<br />

esta metodologia, a sobrevivência<br />

das plantas situa-se entre 70 e 95%<br />

(Tabela 5). No que concerne à matéria<br />

seca produzida pelas raízes e<br />

parte aérea das plantas, os maiores<br />

valores são obtidos quando as plantas<br />

receberam 1000 mg/L de AIB na<br />

fase de indução ao enraizamento. A<br />

aclimatização pode ser efetuada em<br />

câmaras de nebulização que mantém<br />

alta umidade relativa, o que<br />

diminuem as possibilidades de desidratação<br />

e morte das plantas. Neste<br />

sentido, Maciel et al. (2002)<br />

demostraram que é possível obter<br />

altos índices de sobrevivência de<br />

plantas do porta-enxerto M.7. Neste<br />

processo, as bandejas são transferidas<br />

para diretamente para a câmara<br />

de nebulização. Aos 30 dias<br />

após a transferência ex vitro, a percentagem<br />

de enraizamento é maior<br />

nas mudas que foram aclimatizadas<br />

no substrato composto por casca de<br />

arroz carbonizada, já que esta aumenta<br />

o espaço poroso como foi<br />

observado por Lê & Collet (1991) e<br />

por Avanzato & Cherubini (1993).<br />

As altas percentagens de enraizamento<br />

coincidem com as de sobrevivência,<br />

pois todas as plantas<br />

que enraizaram sobreviveram, e co-<br />

106 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

incidem com os de crescimento das<br />

mudas (Figura 6). Maciel et al. (2002)<br />

sugerem que a umidade relativa no<br />

ambiente utilizado garantiu as condições<br />

adequadas para a aclimatização<br />

das mudas. Esta hipótese é corroborada<br />

por Campostrini & Otoni<br />

(1996), pois plântulas produzidas in<br />

vitro não estão adaptadas ao novo<br />

ambiente, pois não possuem mecanismos<br />

de proteção contra a desidratação,<br />

já que seus estômatos geralmente<br />

se encontram abertos<br />

(Schackel et al., 1990). No entanto,<br />

segundo Pospíslová et al.(1997) e<br />

Bolar et al. (1998), durante a aclimatização<br />

as mudas ativam os mecanismos<br />

que permitem sua sobrevivência<br />

após a transferência para a casa<br />

de vegetação. Possivelmente as condições<br />

de aclimatização utilizadas<br />

neste trabalho possibilitaram a sobrevivência<br />

da planta até a entrada<br />

em funcionamento dos estômatos, o<br />

que permitiu um maior controle sobre<br />

as perdas de água, o que está de<br />

acordo com Sutter (1988).<br />

Considerações Finais<br />

Os resultados obtidos nesse laboratório<br />

corroboram com aqueles<br />

que foram publicados por vários<br />

grupos de pesquisa nacionais e estrangeiros.<br />

As metodologias desenvolvidas<br />

permitem a produção comercial<br />

de mudas de porta-enxertos<br />

e copa de macieira micropropagados.<br />

Em que pese as peculiaridades de<br />

cada genótipo a grande maioria dos<br />

clones utilizados atualmente podem<br />

ser produzidos seguindo protocolos<br />

semelhantes. A perspectiva do uso<br />

da indução ao enraizamento realizado<br />

simultaneamente à aclimatização<br />

das plantas ex vitro pode diminuir em<br />

até 50% o custo de produção de uma<br />

Tabela<br />

5.<br />

Sobrevivên<br />

cia,<br />

número<br />

e comprimento<br />

de<br />

raízes<br />

altura<br />

e número<br />

de<br />

folhas<br />

de<br />

miniestacas<br />

do<br />

porta-enxerto de<br />

macieira<br />

M.<br />

9 ( Malus pumila)<br />

, submetidas<br />

ao<br />

enraizamen<br />

to<br />

ex vitro,<br />

em<br />

diferentes<br />

concentraçõ<br />

es<br />

de<br />

AIB,<br />

45<br />

dias<br />

após<br />

a repicagem<br />

para<br />

substrato<br />

mineral.<br />

AIB<br />

Sobrevivênciadas<br />

Número<br />

de<br />

Comprimen<br />

to<br />

das<br />

Comprimen<br />

to<br />

das<br />

Número<br />

de<br />

( mg/<br />

L)<br />

plantas<br />

( % )<br />

raízes<br />

raízes<br />

( cm)<br />

brotações<br />

( cm)<br />

folhas<br />

0 85 b 10, 1 ns<br />

12, 0 ns<br />

5, 3 ns<br />

7,<br />

5 ns<br />

500 95 a 11, 5<br />

12, 5<br />

6, 3<br />

8,<br />

0<br />

1000 70 c 16, 0<br />

11, 6<br />

6, 9<br />

7,<br />

5<br />

1500 73 c 20, 0<br />

11, 3<br />

6, 9<br />

7,<br />

8<br />

* Médias<br />

seguid<br />

as<br />

de<br />

mesm<br />

as<br />

letra<br />

s nas<br />

coluna<br />

s não<br />

difere<br />

m signi<br />

ficati<br />

vament<br />

e pelo<br />

teste<br />

de<br />

Duncan<br />

a 5%<br />

.<br />

ns<br />

- não<br />

signi<br />

ficati<br />

vo


muda micropropagada, o que torna<br />

viável o uso comercial da micropropagação.<br />

A produção de mudas de alta<br />

qualidade genética e sanitária é um<br />

fator de extrema importância para a<br />

garantia da competitividade da<br />

pomicultura nacional. Neste sentido,<br />

a aplicação das técnicas aqui abordadas<br />

abrem perspectivas para a instalação<br />

de laboratórios comerciais para<br />

atender à demanda de mudas para a<br />

renovação de pomares pouco produtivos<br />

e a implantação de novos pomares<br />

com alta densidade.<br />

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Pesquisa<br />

Adriano Luiz Tonetti<br />

Mestre em Saneamento e Ambiente - UNICAMP<br />

atonetti@fec.unicamp.br<br />

Bruno Coraucci Filho, Dr<br />

Professor Associado da Faculdade de Engenharia<br />

Civil - UNICAMP<br />

Alexandre Patto Kanegae<br />

Mestre em Saneamento e Ambiente - UNICAMP<br />

Ronaldo Stefanutti, Dr<br />

Doutor pelo CENA-USP<br />

Ilustrações cedidas pelos autores<br />

Método Alternativo de<br />

Tratamento de Esgotos<br />

Reator anaeróbio com recheio de bambu associado com filtros biológicos de areia<br />

Resumo<br />

ste artigo apresenta os resultados<br />

encontrados para<br />

o estudo de um sistema<br />

alternativo de tratamento<br />

de esgotos constituído por<br />

reator anaeróbio com recheio<br />

de bambu associado a um filtro<br />

biológico de areia. Tal combinaçaão<br />

possui baixo custo e busca minimizar<br />

o sério problema de saneamento pelo<br />

qual o Brasil passa.<br />

O reator anaeróbio foi alimentado<br />

com uma vazão de 2 l/min e seu<br />

efluente era aplicado em cinco cargas<br />

hidráulicas (20, 40, 60, 80 e 100 l/m 2 )<br />

sobre a superfície de quatro filtros de<br />

areia com diferentes profundidades<br />

de leitos (25, 50, 75 e 100 cm).<br />

Devido à ação dos microrganismos<br />

anaeróbios e aeróbios, que aderem<br />

à superfície do bambu e da areia,<br />

obteve-se uma excelente remoção<br />

de matéria orgânica do esgoto que,<br />

caso fosse lançada em um corpo de<br />

água antes do processo de tratamento,<br />

levaria ao consumo de oxigênio e<br />

a uma mortandade da fauna e flora<br />

aquáticas. Quanto ao nitrogênio, ocorreu<br />

uma grande transformação da<br />

sua parte orgânica em nitrato, demonstrando<br />

a grande adaptação das<br />

bactérias responsáveis por esta reação<br />

bioquímica ao meio formado<br />

pela areia. Os organismos patogênicos<br />

foram em grande medida removidos,<br />

adequando o efluente a alguma<br />

prática de reuso.<br />

Palavras-chave: filtro de areia,<br />

pós-tratamento, efluente anaeróbio,<br />

baixo custo.<br />

Introdução<br />

O Brasil é um dos países que<br />

possuem o maior fluxo interno de<br />

água. Porém, há uma enorme<br />

disparidade na distribuição deste recurso<br />

entre suas diferentes regiões.<br />

Enquanto que no norte existe uma<br />

abundância hídrica, no sul e sudeste,<br />

industrializados e populosos, ocorre<br />

a escassez causada pelo elevado consumo<br />

e grande poluição dos rios,<br />

resultante da precária situação do<br />

saneamento básico.<br />

Este quadro alarmante acarreta<br />

sérios problemas à saúde pública e<br />

ao meio ambiente levando a mortandade<br />

de um grande número de espécies.<br />

Portanto, um dos desafios atuais<br />

para a melhoria desta situação é o<br />

desenvolvimento de sistemas de tratamento<br />

simples, eficientes e adaptáveis<br />

às condições econômicas e estruturais<br />

do nosso país.<br />

O Tratamento Anaeróbio<br />

O tratamento anaeróbio depende<br />

dos microrganismos que agem na<br />

ausência de oxigênio, transformando<br />

os dejetos gerados pela ação<br />

humana em produtos mais simples<br />

como metano, gás carbônico e água<br />

(METCALF e EDDY, 1991). Estes<br />

compostos mais simples podem<br />

retornar ao meio ambiente sem comprometer<br />

o planeta e seu ecossistema.<br />

Apesar da boa eficiência deste<br />

sistema, entre 10 e 30% da matéria<br />

orgânica não é degradada, o que<br />

impede que seu efluente atenda à<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 109


Figura 1: Filtro anaeróbio de fluxo ascendente.<br />

legislação brasileira quanto a este<br />

parâmetro, havendo necessidade de<br />

um pós-tratamento.<br />

O reator anaeróbio é caracterizado<br />

pela presença de um material de<br />

recheio estacionário e inerte no interior<br />

de um tanque fechado. O esgoto<br />

penetra pela parte inferior e flui até a<br />

sua saída na área superior. No decorrer<br />

do escoamento, o esgoto entra em<br />

contato com este material. Sobre a<br />

superfície deste recheio ocorre a formação<br />

natural de um biofilme que<br />

degrada o substrato contido no fluxo<br />

de esgoto (Figura 1).<br />

O material de recheio no qual<br />

os microrganismos aderem deve<br />

ter as seguintes características: estrutura<br />

resistente, ser biológica e<br />

quimicamente inerte, leveza, porosidade<br />

elevada e preço reduzido.<br />

Tal sistema possui a vantagem<br />

de consumir pouca energia e produzir<br />

uma quantidade mínima de<br />

lodo, além de não depender da<br />

utilização de complexos equipamentos<br />

mecânicos.<br />

Pesquisadores da UNICAMP diagnosticaram<br />

que o uso de anéis de<br />

bambu poderia satisfazer a tais prérequisitos<br />

(CAMARGO, 2000). Este<br />

material apresenta a vantagem de<br />

possuir um baixo custo e ser facilmente<br />

encontrado no Brasil. Desta<br />

forma, construíram e operaram quatro<br />

reatores que possuíam o bambu<br />

como recheio e obtiveram uma remoção<br />

média de matéria orgânica<br />

(DBO) superior a 75%. Quanto ao<br />

nitrogênio orgânico, somente uma<br />

parcela de sua concentração foi transformada<br />

em amônia.<br />

Pode-se concluir ao final deste<br />

trabalho inicial que, apesar dos bons<br />

resultados, havia a necessidade de se<br />

realizar um pós-tratamento do<br />

efluente anaeróbio gerado pelo reator<br />

de bambu, pois ele não se adequava<br />

à legislação brasileira. Assim,<br />

buscando manter as características<br />

de um tratamento alternativo e barato<br />

decidiu-se aplicar o efluente gerado<br />

sobre a superfície de filtros biológicos<br />

de areia.<br />

A associação do reator anaeróbio<br />

com filtros biológicos de areia<br />

seria uma alternativa que preservaria<br />

o baixo custo total. Outro item<br />

importante seria a possibilidade de<br />

dispor o efluente gerado diretamente<br />

sobre os cursos d’água, ou<br />

reutilizá-lo na irrigação, ou no consumo<br />

não-humano, seguindo a orientação<br />

da Organização Mundial de<br />

Saúde (OMS, 1989).<br />

No Brasil, esta combinação seria<br />

aplicável nas pequenas cidades, em<br />

bairros isolados e condomínios fechados<br />

das metrópoles, onde a instalação<br />

de uma rede coletora de esgotos<br />

apresentaria custo elevado.<br />

Filtros Biológicos de Areia<br />

O filtro biológico de areia é um<br />

método de tratamento bastante antigo,<br />

inicialmente adotado na remoção<br />

de turbidez da água potável. A partir<br />

do século XIX, na Europa e nos<br />

Estados Unidos, passou a ser aproveitado<br />

na depuração de esgotos<br />

(MICHELS, 1996).<br />

110 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

O funcionamento deste sistema<br />

baseia-se na aplicação de afluente<br />

intermitentemente sobre a superfície<br />

de um leito de areia. Durante a infiltração<br />

do líquido ocorre a purificação<br />

por mecanismos físicos, químicos e<br />

biológicos.<br />

O tratamento físico é resultante<br />

do peneiramento e o químico<br />

ocorre pela adsorsão de determinados<br />

compostos. A purificação depende<br />

principalmente da oxidação<br />

bioquímica que ocorre no contato<br />

do afluente com a cultura biológica.<br />

Devido a esta característica,<br />

Jordão e Pessoa (1995) afirmam<br />

que este tipo de sistema é incorretamente<br />

chamado de filtro, pois seu<br />

funcionamento não possui como<br />

explicação primordial o peneiramento<br />

ou a filtragem. Neste mesmo<br />

sentido, KRISTIANSEN (1981) sustenta<br />

que o leito de areia, em conjunto<br />

com os microrganismos, forma<br />

um filtro vivo.<br />

Material e Métodos<br />

Este projeto de pesquisa está<br />

instalado em uma área experimental<br />

situada na Estação de Tratamento de<br />

Efluentes Graminha, na cidade de<br />

Limeira, Estado de São Paulo. O esgoto<br />

bruto é originário de um bairro<br />

residencial denominado Graminha.<br />

Inicialmente esta água residuária passa<br />

por um tratamento preliminar composto<br />

por grades de retenção e caixa<br />

de areia e em seguida, uma pequena<br />

Figura 2: Vistas externa (esquerda) e interna (direita) dos reatores anaeróbios.


Tabela<br />

1:<br />

Denominação<br />

dos<br />

filtros<br />

biológico<br />

s e profund<br />

idades<br />

do<br />

leito<br />

de<br />

areia.<br />

Profund<br />

idade<br />

do<br />

Leito<br />

Filtro<br />

( centímetros)<br />

F 5<br />

F 0<br />

F 5<br />

F 0<br />

025<br />

050<br />

075<br />

100<br />

porção do seu fluxo é direcionada até<br />

quatro reatores anaeróbios com recheio<br />

de bambu.<br />

Cada reator possui volume de<br />

500 l e foi construído em aço inox<br />

tendo formato cilíndrico e fundo<br />

cônico, que funcionou como um<br />

compartimento para a distribuição<br />

do esgoto (Figura 2). O meio suporte<br />

foi constituído de anéis de bambu<br />

da espécie Bambusa tuldoides.<br />

O caule do bambu foi cortado em<br />

pedaços de aproximadamente 5 cm<br />

(CAMARGO, 2000).<br />

Estes reatores anaeróbios foram<br />

operados com fluxo ascendente, tendo<br />

uma vazão de 2 l/min e tempo de<br />

detenção hidráulica de 3 horas, controlados<br />

diariamente.<br />

Filtros de Areia<br />

Na construção do leito dos filtros<br />

foram empregadas três camadas<br />

posicionadas a partir da base. A primeira<br />

foi constituída por brita e pos-<br />

Figura 3: Esquema dos filtros de areia.<br />

2<br />

5<br />

7<br />

10<br />

suía 20 cm de profundidade. Logo<br />

acima estava a camada formada por<br />

pedregulho, com 10 cm de profundidade,<br />

que objetivava sustentar a areia,<br />

impedindo que suas partículas fossem<br />

arrastadas para fora da estrutura<br />

do sistema. Quanto à camada de<br />

areia, buscando-se determinar qual<br />

era a espessura ideal para a realização<br />

do tratamento, empregou-se quatro<br />

filtros com diferentes profundidades<br />

de leito, conforme apresentado<br />

na Tabela 1.<br />

A areia empregada foi a popularmente<br />

denominada de grossa comercial,<br />

possuindo um diâmetro efetivo<br />

(D ) de 0,093 mm. Salienta-se<br />

10<br />

que estes materiais foram os mais<br />

comumente encontrados na região<br />

de desenvolvimento do projeto.<br />

Na construção dos filtros, foi<br />

utilizada uma caixa cilíndrica com<br />

estrutura de fibra de vidro e diâmetro<br />

de 100 cm. Na Figura 3 há um esquema<br />

da disposição das diferentes camadas<br />

que compõem os filtros.<br />

Para a distribuição uniforme<br />

do afluente sobre o leito dos filtros,<br />

empregou-se uma placa quadrada<br />

de 20 cm de comprimento, feita de<br />

madeira e posicionada no centro da<br />

camada superficial (Figura 4). Após<br />

o lançamento do afluente pela tubulação<br />

de distribuição, existe o<br />

choque do líquido com esta placa,<br />

distribuindo as gotículas sobre a<br />

superfície.<br />

Buscando-se determinar a capacidade<br />

de tratamento dos filtros<br />

biológicos de areia, foram aplicadas<br />

as cargas hidráulicas de 20, 40,<br />

60, 80 e 100 l/m 2 de efluente proveniente<br />

dos reatores anaeróbios sobre<br />

as superfícies. Cada carga hidráulica<br />

foi empregada pelo período<br />

de um mês entre as segundas e<br />

sextas-feiras.<br />

Na Figura 5 está apresentado de<br />

forma esquemática o fluxograma de<br />

funcionamento deste sistema de tratamento<br />

em estudo.<br />

As seguintes amostras foram obtidas<br />

semanalmente: esgoto bruto,<br />

efluente dos reatores anaeróbios com<br />

recheio de bambu e efluentes dos<br />

filtros de areia. Todas as análises<br />

foram baseadas no Standard Methods<br />

for the Examination of Water and<br />

Wastewater (AWWA/ANHA/WEF,<br />

1999).<br />

Os parâmetros físicos, químicos<br />

e biológicos analisados foram os<br />

seguintes: pH, demanda bioquímica<br />

de oxigênio (DBO), série do nitrogênio<br />

(nitrogênio orgânico e<br />

amoniacal, nitrito e nitrato) e<br />

coliformes totais.<br />

Resultados<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 111<br />

pH<br />

O estudo deste parâmetro é de<br />

extrema importância em um sistema<br />

biológico. Isto porque os microrganismos<br />

responsáveis pelo tratamento<br />

dos esgotos necessitam de um pH<br />

que varie entre 4 e 8. Caso contrário<br />

existe o impedimento da formação<br />

do biofilme responsável pela depuração<br />

do efluente.<br />

De acordo com a Figura 6 podese<br />

fazer uma divisão dos valores de


pH encontrados para os filtros biológicos<br />

de areia em dois grupos básicos.<br />

O primeiro engloba os pHs encontrados<br />

nas cargas hidráulicas de<br />

20, 40 e 60 l/m 2 onde houve tendência<br />

para valores superiores a 7. No<br />

segundo grupo, constituído pelas<br />

cargas de 80 e 100 l/m 2 nota-se valores<br />

inferiores ao pH neutro.<br />

A característica encontrada para<br />

o primeiro grupo não se adequa aos<br />

Figura 4: Vista externa (esquerda) e superior<br />

(direita) de um filtro de areia, tendo ao centro<br />

a placa de distribuição de afluente.<br />

resultados esperados. De acordo com<br />

a análise dos compostos nitrogenados,<br />

esperava-se que a transformação<br />

dos nitrogênios orgânico e<br />

amoniacal em nitrato causasse a redução<br />

do pH. Tal fato ocorreria devido<br />

à redução de alcalinidade<br />

provocada pelas bactérias aeróbias<br />

no processo metabólico da degradação<br />

da matéria orgânica. Uma possível<br />

explicação para esta característi-<br />

Figura 5: Fluxograma do sistema de tratamento em estudo.<br />

Figura 6: Variação do pH durante as semanas de coleta.<br />

112 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

ca pode ser a formação de um sistema<br />

tampão químico pela areia. Assim,<br />

apesar do consumo de compostos<br />

alcalinos, haveria o impedimento<br />

da queda do pH do efluente dos<br />

filtros de areia.<br />

A formação do sistema tampão<br />

pelo leito de areia pode ser<br />

comprovada pelo fato do filtro<br />

F025, que possui o menor volume<br />

de areia, possuir tendência aos<br />

menores pHs e também por ter<br />

sido o primeiro a apresentar os<br />

valores mais baixos. O filtro de 100<br />

cm manteve valores altos de pH<br />

ate o final da aplicação da carga de<br />

100 l/m 2 .<br />

Vê-se também que o sistema,<br />

mesmo sob condições temporárias<br />

de aplicações de pHs bastante anormais,<br />

conforme encontrado na sexta<br />

semana, mostrou-se capaz de<br />

amortecê-los. Isso também pode<br />

ser notado nas duas últimas semanas<br />

de aplicação da carga de 100 l/<br />

m 2 , quando houve a geração de um<br />

efluente ácido pelos reatores anaeróbios<br />

de bambu. Observa-se que<br />

nesta situação os efluentes dos quatro<br />

filtros não tiveram uma tendência<br />

a acompanhá-lo nesta queda<br />

brusca.<br />

Quando se comparam os valores<br />

encontrados para o pH com aqueles<br />

exigidos pela legislação brasileira<br />

(CONAMA 20/86), que permite a<br />

emissão de um efluente cujo pH<br />

varie entre 4 e 9, nota-se que o<br />

sistema propiciou valores bastante<br />

satisfatórios.<br />

Demanda Bioquímica de<br />

Oxigênio - DBO<br />

Caso seja lançado em um corpo<br />

de água uma grande quantidade<br />

de matéria orgânica, haverá o consumo<br />

parcial dela pelos microrganismos<br />

presentes no meio. Como<br />

conseqüência desta degradação,<br />

esta colônia formada consome grande<br />

quantidade de oxigênio, levando<br />

à morte diversas espécies da<br />

fauna e da flora.<br />

No que se refere a DBO, parâmetro<br />

que determina a quantidade<br />

de matéria orgânica, os reatores


Tabela<br />

2:<br />

Remoção<br />

média<br />

de<br />

DBO<br />

no<br />

sistema<br />

de<br />

tratamento<br />

nas<br />

cargas<br />

hidráulicas<br />

aplicadas.<br />

Ponto<br />

de<br />

Remoção<br />

média<br />

de<br />

DBO<br />

( % )<br />

Coleta<br />

20 l/<br />

m2<br />

40 l/<br />

m2<br />

60 l/<br />

m2<br />

80 l/<br />

m2<br />

100<br />

l/<br />

m2<br />

F025 95, 3 97, 3 93, 7 95, 8 91,<br />

3<br />

F050 98, 0 98, 9 98, 7 96, 5 94,<br />

9<br />

F075 97, 5 98, 9 98, 8 98, 3 97,<br />

0<br />

F100 97, 6 98, 8 99, 4 99, 3 98,<br />

7<br />

Figura 7: DBO média para cada uma das cargas hidráulicas aplicadas.<br />

Figura 8: Média para a concentração dos compostos nitrogenados no esgoto bruto<br />

e efluente dos reatores de bambu em cada carga hidráulica.<br />

anaeróbios propiciaram uma remoção<br />

média de aproximadamente<br />

48%. Este resultado está de acordo<br />

com as possibilidades dos microrganismos<br />

anaeróbios e com os dados<br />

encontrados para materiais de<br />

recheio normalmente empregados<br />

em estações de tratamento de grande<br />

porte.<br />

Quanto aos filtros de areia, vêse<br />

pela Figura 7 a excelente remoção<br />

de DBO. O maior valor encontrado<br />

foi de somente 29 mg/l, obtido no<br />

efluente do filtro com 25 cm de<br />

profundidade, durante a aplicação<br />

da maior carga hidráulica. Este resultado<br />

está muito abaixo do máximo<br />

permitido pela legislação brasileira,<br />

que é de 90 mg/l.<br />

Outra característica observada<br />

é que quanto mais profundo o leito<br />

de areia, melhores foram os resultados.<br />

Isto pode ser explicado pelo<br />

fato de que quanto maior a profundidade,<br />

maior a quantidade de areia<br />

revestida com biofilme. Assim existe<br />

uma ampla possibilidade de contato<br />

do material orgânico com os<br />

microrganismos.<br />

Quando se observa a Tabela 2,<br />

que apresenta os percentuais de<br />

remoção da DBO em todo o sistema,<br />

observa-se o valor mínimo de<br />

91,3%. O filtro com 100 cm de<br />

profundidade nunca removeu menos<br />

que 97,6%, independente da<br />

carga de aplicação.<br />

Nitrogênio<br />

A remoção dos compostos nitrogenados<br />

presentes no esgoto é de<br />

extrema importância. Caso isto não<br />

ocorra tem-se o lançamento de um<br />

efluente tóxico que pode levar à<br />

morte de micro e macrorganismos.<br />

Tal fato ocorre devido ao nitrogênio<br />

amoniacal ou devido à eutrofização,<br />

que acaba por criar um meio propício<br />

à floração de algas.<br />

Pela Figura 8 percebe-se que<br />

tanto o esgoto bruto como o<br />

efluente dos reatores de bambu<br />

eram constituídos de compostos<br />

nitrogenados pouco degradados<br />

(nitrogênio orgânico e amoniacal).<br />

Assim, desde a produção dos<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 113


Figura 9: Média para a concentração dos compostos nitrogenados no filtro F025 e<br />

F050 em cada carga hidráulica.<br />

dejetos pelo ser humano até a chegada<br />

à estação de tratamento ocorreram<br />

poucas transformações em<br />

sua composição. Isto ocorre principalmente<br />

devido ao fato de os<br />

organismos responsáveis pela decomposição<br />

dos compostos nitrogenados<br />

agirem somente em presença<br />

de oxigênio.<br />

Ao comparar-se o esgoto bruto<br />

com o efluente dos reatores de bambu,<br />

nota-se que apesar da sua característica<br />

anaeróbia, a amônia na maioria<br />

das situações superava o valor<br />

de nitrogênio orgânico. Quanto às<br />

concentrações de nitrato e nitrito,<br />

observa-se que foram muito pequenas<br />

para estes dois pontos de coleta.<br />

Pelas Figuras 9 e 10, nota-se<br />

que o efluente dos reatores anaeróbios<br />

de recheio de bambu ao<br />

infiltrar-se através do leito de areia<br />

dos filtros biológicos sofreu grandes<br />

alterações no que se refere aos<br />

compostos nitrogenados. Ou seja,<br />

existiu uma grande transformação<br />

do nitrogênio orgânico e do<br />

amoniacal para nitrato, independente<br />

da carga que era empregada.<br />

Tal modificação é resultante das<br />

nitrobactérias, que em ambientes<br />

aerados levam tais compostos à sua<br />

forma mais oxidada.<br />

Para os filtros F025 e F050, a<br />

partir da carga de 60 l/m 2 passa a<br />

haver um aumento da concentração<br />

de nitrogênio amoniacal, que foi<br />

ampliada na de 80 l/m 2 . Este aumento<br />

pode ser explicado pelo<br />

acréscimo de carga, que acarretou<br />

na diminuição do tempo de contato<br />

entre o líquido que se infiltrava e a<br />

cultura biológica aderida à areia.<br />

Quanto maior era a profundidade<br />

do leito, maior era o processo de<br />

nitrificação, ou seja, de transformação<br />

do nitrogênio orgânico em nitrato.<br />

Assim, de acordo com a Figura 10,<br />

nota-se que o filtro com 100 cm de<br />

profundidade de leito propiciava uma<br />

114 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

completa nitrificação. Assim, a<br />

somatória das concentrações de todos<br />

os compostos nitrogenados era<br />

muito semelhante à de nitrato.<br />

Coliformes Totais<br />

Os coliformes totais são uma<br />

classe de organismos adotada pela<br />

engenharia sanitária como um indicador<br />

da presença de organismos<br />

patogênicos. Assim, caso esteja em<br />

pequenas quantidades, pode-se supor<br />

que a água também não conterá<br />

seres vivos que possam causar algum<br />

dano a saúde.<br />

Ao analisar-se as concentrações<br />

de coliformes totais pela Figuras 11,<br />

vê-se que o afluente sempre possuía<br />

valores superiores a 10 6 NMP/100 ml,<br />

chegando em alguns casos a superar<br />

10 9 NMP/100 ml. Desta forma, podese<br />

constatar que os reatores anaeróbios<br />

com recheio de bambu realmente<br />

não removem estes organismos,<br />

conforme afirma a literatura.<br />

Quanto aos filtros de areia, nas<br />

baixas cargas o F025 já apresentava<br />

valores mais altos que os outros três,<br />

e no decorrer do desenvolvimento do<br />

projeto, sempre possuía as maiores<br />

concentrações. Por outro lado, o filtro<br />

com 100 cm de profundidade chegava<br />

a gerar um efluente capaz de atender<br />

à legislação brasileira para a água<br />

potável quanto a coliformes totais.<br />

Ao observar-se a comparação<br />

entre o afluente e o efluente do filtro<br />

de areia apresentada na Tabela 3,<br />

percebe-se a grande remoção de<br />

coliformes totais que este sistema<br />

propiciou. O filtro com menor profundidade<br />

de leito, o F025, apresentou<br />

altos percentuais, sendo no mínimo<br />

igual a 84%. Os dois filtros mais<br />

profundos tiveram valores superiores<br />

a 99% em praticamente todas as<br />

situações em estudo.<br />

Conclusões<br />

A análise destes resultados demonstra<br />

a grande viabilidade deste<br />

sistema biológico para o tratamento<br />

de efluente de pequenas comunidades,<br />

utilizando materiais presentes<br />

nas próprias comunidades.


Figura 10: Concentração dos compostos nitrogenados nos filtros F075 e F100.<br />

Figura 11: Concentração de coliformes totais.<br />

Tabela<br />

3:<br />

Remoção<br />

média<br />

da<br />

concentração<br />

de<br />

Coliformes<br />

Totais<br />

nos<br />

filtros<br />

biológico<br />

s de<br />

areia<br />

em<br />

cada<br />

carga<br />

hidráulica.<br />

Ponto<br />

de<br />

Remoção<br />

dos<br />

Coliformes<br />

Totais<br />

( % )<br />

Coleta<br />

20 l/<br />

m2<br />

40 l/<br />

m2<br />

60 l/<br />

m2<br />

80 l/<br />

m2<br />

100<br />

l/<br />

m2<br />

F025 97, 5 89, 8 84, 8 84, 9 87,<br />

0<br />

F050 99, 9 99, 2 98, 0 87, 4 96,<br />

3<br />

F075 100, 0 99, 9 99, 4 99, 5 97,<br />

0<br />

F100 100, 0 100, 0 99, 9 99, 9 99,<br />

9<br />

O efluente gerado estava em conformidade<br />

com o exigido pela legislação<br />

brasileira para a emissão em um<br />

corpo receptor, sendo compatível com<br />

aqueles produzidos nas grandes estações<br />

de tratamento existentes nas grandes<br />

cidades brasileiras. Outro ponto é<br />

a possibilidade do reuso deste líquido<br />

em alguma atividade humana, resguardando<br />

os mananciais naturais para<br />

usos mais nobres.<br />

Agradecimentos<br />

A FAPESP, CNPq, FINEP, Caixa<br />

Econômica Federal e PROSAB pelo<br />

apoio e financiamento na construção<br />

do projeto e em sua manutenção.<br />

Referências Bibliográficas<br />

AWWA/ANHA/WEF. Standard<br />

methods for the examination of<br />

water and wastewater. 19 a edição.<br />

Nova Iorque: American Public Health<br />

Association, 1999.<br />

CAMARGO, S. A. R. Filtro anaeróbio<br />

com enchimento de bambu<br />

para tratamento de esgotos sanitários:<br />

avaliação da partida e operação.<br />

Campinas: Faculdade de Engenharia<br />

Civil, UNICAMP, 2000. Dissertação<br />

de Mestrado.<br />

JORDÃO, E. P.; PESSOA, C. A.<br />

Tratamento de esgotos domésticos.<br />

3 a edição. Rio de Janeiro: ABES, 1995.<br />

KRISTIANSEN, R. Sand-filter<br />

trenches for purification of septic<br />

tank effluent: III. The micro flora,<br />

Journal of Environmental Quality,<br />

n. 10, p. 361–364, 1981c.<br />

METCALF e EDDY. Wastewater<br />

engineering, treatment, disposal<br />

and reuse. 3 a edição. Nova Iorque:<br />

McGraw - Hill, International Editions,<br />

1991.<br />

MICHELS, C. J. System suited<br />

for small communities. Water<br />

Environmental & Technology, n.<br />

8, v. 7, p. 45-48, 1996.<br />

OMS - ORGANIZAÇÃO MUN-<br />

DIAL DE SAÚDE. Directrices sanitárias<br />

sobre el uso de águas<br />

residuales en agricultura e<br />

aquicultura. Séries de reportagens<br />

técnicas. N 778. OMS, Genebra,<br />

1989.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 115


Pesquisa<br />

Soraya Cristina Leal-Bertioli - PhD<br />

Pesquisadora EMBRAPA Recursos<br />

Genéticos e <strong>Biotecnologia</strong>,<br />

soraya@cenargen.embrapa.br<br />

Patrícia Messenberg Guimarães - PhD<br />

Pesquisadora EMBRAPA Recursos<br />

Genéticos e <strong>Biotecnologia</strong>,<br />

messenbe@cenargen.embrapa.br<br />

Alessandra Pereira Fávero - MsC<br />

Pesquisadora EMBRAPA Recursos<br />

Genéticos e <strong>Biotecnologia</strong>,<br />

favero@cenargen.embrapa.br<br />

Márcio de Carvalho Moretzsohn - MsC<br />

Pesquisador EMBRAPA Recursos<br />

Genéticos e <strong>Biotecnologia</strong>,<br />

marciocm@cenargen.embrapa.br<br />

Karina Proite - MsC<br />

Estudante de doutorado da UnB,<br />

proite@cenargen.embrapa.br<br />

David John Bertioli - PhD<br />

Pesquisador Universidade Católica de Brasília<br />

david@pos.ucb.br<br />

Ilustrações cedidas pelos autores<br />

Amendoim Selvagem<br />

amendoim cultivado,<br />

Arachis hypogaea, é<br />

uma das leguminosas<br />

produtoras de grãos<br />

mais plantada em todo<br />

o mundo, devido ao seu alto conteúdo<br />

de proteína e óleos insaturados. É<br />

cultivado extensivamente na China,<br />

Índia e Estados Unidos, além de diversos<br />

países da América Latina e<br />

África (Conab, 2002). Os principais<br />

problemas da cultura estão relacionados<br />

ao ataque de fungos da parte<br />

aérea e nematóides, necessitando periodicamente<br />

da utilização de defensivos<br />

agrícolas (Hagan, 1998 ;<br />

Subrahmanyam et al., 1983; Bailey,<br />

2002). Espécies silvestres de Arachis<br />

têm-se mostrado altamente promissoras<br />

como fonte de resistência a<br />

diversas pragas que atingem o amendoim<br />

e outras culturas, sendo que já<br />

foram identificadas algumas espécies<br />

com resistência a três fungos<br />

foliares (Cercospora arachidicola,<br />

Cercosporidium personatum e<br />

Puccinia arachidis) e ao nematóide<br />

das galhas (Meloidogyne spp.). Busca-se,<br />

agora, desenvolver ferramentas<br />

para a utilização destas espécies<br />

silvestres em programas de melhoramento<br />

genético, visando à obtenção<br />

de cultivares de amendoim com resistência<br />

mais duradoura (Fig.1).<br />

O projeto “Identificação de resistências<br />

a stress biótico em Arachis selvagem<br />

e desenvolvimento de ferramentas<br />

para o melhoramento genético<br />

através de mapeamento e genômica<br />

comparativa” combina esforços e habilidades<br />

de pesquisadores da Embrapa<br />

Recursos Genéticos e <strong>Biotecnologia</strong>,<br />

Universidade Católica de Brasília, IBONE<br />

(Instituto Botanico del Nordeste, Argentina),<br />

Universidade de Aarhus (Di-<br />

116 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Uma fonte de resistência a pragas<br />

foto ilustrativa<br />

namarca) e Sainsbury’s Laboratories (Inglaterra)<br />

na busca de genes de resistência<br />

a fungos e nematóides patogênicos<br />

ao amendoim, e no desenvolvimento<br />

de um mapa genético para Arachis que<br />

possibilite a utilização destes genes.<br />

Produção de um mapa<br />

genético para facilitar a<br />

seleção assistida<br />

Espécies silvestres de Arachis possuem<br />

alta diversidade genética e constituem<br />

uma rica fonte de genes de<br />

resistência. Diversos trabalhos têm mostrado<br />

que as espécies silvestres são<br />

muito mais resistentes a doenças do<br />

que a espécie cultivada (Arachis<br />

hypogaea) (Holbrook et al., 2000). O<br />

amendoim cultivado é tetraplóide (tem<br />

quatro conjuntos de cromossomos, dois<br />

conjuntos do chamado genoma A e<br />

dois conjuntos do genoma B), enquan


to que a maioria das espécies silvestres<br />

é diplóide (apenas dois conjuntos de<br />

cromossomos). Esta diferença de<br />

ploidia dificulta a introgressão de genes<br />

dos parentes silvestres, uma vez que os<br />

híbridos obtidos de maneira tradicional<br />

são triplóides estéreis. Por isso,<br />

para obter híbridos férteis, necessita-se<br />

fazer cruzamentos entre espécies silvestres<br />

com genomas AA e BB. Os<br />

híbridos obtidos (AB) são então submetidos<br />

a tratamento com colchicina<br />

para duplicar o número de cromossomos,<br />

obtendo-se, assim, anfidiplóides<br />

sintéticos (AABB), que, em princípio,<br />

são compatíveis com o amendoim cultivado.<br />

Estes híbridos são então cruzados<br />

com A. hypogaea dando continuidade<br />

ao programa de pré-melhoramento<br />

de Arachis.<br />

Tradicionalmente, nos programas<br />

de melhoramento de plantas que envolvem<br />

hibridações seguidas de retrocruzamentos,<br />

grande parte do genoma<br />

da parental doadora é incorporada ao<br />

genoma da planta receptora e, por<br />

isso, são necessárias várias gerações<br />

para a eliminação gradual dos genes<br />

indesejáveis, enquanto o genótipo do<br />

Fig.1 - Sementes de diferentes espécies de Arachis<br />

parental recorrente é mantido para os<br />

demais locos. Em cada geração são<br />

selecionadas as plantas que apresentam<br />

a característica de interesse a ser<br />

introgredida, e as demais características<br />

do parental recorrente. Este processo<br />

de seleção, após a introgressão,<br />

pode ser otimizado através da construção<br />

de mapas genéticos e da identificação<br />

de marcadores moleculares<br />

fortemente associados aos genes de<br />

interesse. Desta forma, é possível, em<br />

cada fase de seleção, a escolha dos<br />

indivíduos que contenham o máximo<br />

de características do parental recorrente,<br />

diminuindo assim o tempo do<br />

processo de melhoramento. Isso é<br />

particularmente importante em programas<br />

que visam à introgressão de<br />

genes de resistência a pragas. Neste<br />

caso, a seleção indireta através de<br />

marcadores moleculares possibilita,<br />

além da redução de tempo, a identificação<br />

e seleção de genótipos resistentes<br />

na ausência do patógeno e a<br />

transferência e manutenção de mais<br />

de um gene de resistência principal<br />

durante a seleção (piramidização de<br />

genes de resistência).<br />

Para a implementação de um<br />

esquema efetivo de seleção assistida<br />

por marcadores em programas de<br />

melhoramento genético, três requerimentos<br />

são essenciais: (1) alguns<br />

marcadores devem estar fortemente<br />

ligados aos genes que controlam as<br />

características de interesse; (2) os<br />

marcadores devem estar facilmente<br />

disponíveis para a análise de grandes<br />

populações e (3) as técnicas utilizadas<br />

devem ser reproduzíveis entre<br />

laboratórios e com baixo custo.<br />

Mapeamento comparativo:<br />

Um atalho para um mapa<br />

genético<br />

Espécies de Arachis têm genomas<br />

muito grandes. O genoma<br />

haplóide de Arachis hypogaea tem<br />

aproximadamente 1,74 x 10 9 pares de<br />

bases. Isto dificulta a identificação e o<br />

mapeamento direto de genes de interesse.<br />

Uma outra espécie da família<br />

das leguminosas, Lotus japonicus, tem<br />

um genoma bem menor, tem um<br />

mapa genético de alta resolução já<br />

disponível e os projetos de seqüenci-<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 117


Fig.2 - Exemplo de estudo de sintenia: Marcadores moleculares (M1 a M4) em posições<br />

colineares nos genomas de Lotus e Arachis.<br />

amento de ESTs (expressed sequenced<br />

tags) e do genoma estrutural estão<br />

quase completos (Asamizu et al., 2000;<br />

Sato et al., 2001). Por isso, L. japonicus<br />

tem sido considerada uma plantamodelo<br />

para todas as leguminosas,<br />

auxiliando no entendimento de outras<br />

espécies de genomas mais complexos.<br />

A comparação entre estes dois<br />

gêneros e a análise da ordem dos<br />

genes nos cromossomos possibilita a<br />

identificação de regiões correlatas<br />

entre os dois genomas (chamada<br />

sintenia), ou seja, o mapeamento comparativo.<br />

Neste processo, são identificados<br />

marcadores moleculares comuns<br />

aos diversos genomas, chamados marcadores-âncoras.<br />

Como exemplo de<br />

transferência de informação da planta<br />

modelo para leguminosas cultivadas<br />

pode-se citar o caso dos fenótipos<br />

mutantes: uma vez que o gene responsável<br />

por um fenótipo mutante<br />

seja clonado em Lotus, a análise<br />

fenotípica comparativa e a informação<br />

do mapa podem ser utilizadas<br />

como base para identificar genes candidatos<br />

para o gene correspondente<br />

em outras leguminosas.<br />

No caso específico de Arachis, a<br />

análise genômica comparativa poderá<br />

auxiliar no desenvolvimento de<br />

marcadores para o melhoramento genético<br />

da cultura, o que certamente<br />

facilitará a clonagem de genes de<br />

interesse. A exploração da colinearidade<br />

entre genes de Arachis e Lotus<br />

buscando a identificação entre as duas<br />

espécies e a identificação de regiões<br />

cromossômicas ortólogas (genes homólogos<br />

localizados em genomas de<br />

diferentes organismos) tem sido realizada<br />

através do desenvolvimento de<br />

um banco de ESTs de Arachis (Guimarães<br />

et al., 2003 ). Este banco de<br />

dados deverá acelerar o mapeamento<br />

do genoma de Arachis, a identificação<br />

de resistências e o desenvolvimento<br />

de marcadores a serem utilizados nos<br />

programas de melhoramento. Um benefício<br />

adicional do projeto é o desenvolvimento<br />

de um sistema genético<br />

unificado para a família das leguminosas,<br />

pois trabalhando com Lotus que é<br />

considerado um dos gêneros mais<br />

adaptados desta família e Arachis que<br />

é considerado um dos mais primitivos,<br />

qualquer região de similaridade<br />

encontrada provavelmente existirá em<br />

todas as leguminosas. Até o momento,<br />

já foram encontradas homologias<br />

entre Lotus e Arachis em vários genes<br />

que codificam para enzimas envolvidas<br />

em importantes cadeias metabólicas,<br />

além da homologia entre genes<br />

envolvidos na simbiose destas plantas<br />

com bactérias fixadoras de nitrogênio<br />

estarem sendo estudadas (Sandal, et<br />

al., 2003) (Fig. 2). A identificação de<br />

tais regiões pode facilitar o isolamento<br />

de genes envolvidos neste processo,<br />

possibilitando o desenvolvimento<br />

de variedades de Arachis com maior<br />

capacidade de fixação de nitrogênio,<br />

o que resultaria na redução da utilização<br />

de fertilizantes nitrogenados, contribuindo<br />

para uma produção de alimentos<br />

mais sustentável.<br />

118 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Estudos de expressão gênica<br />

O estudo da expressão gênica tem<br />

demonstrado ser uma importante ferramenta<br />

no entendimento dos processos<br />

biológicos em nível molecular. Por exemplo,<br />

estes estudos podem ser utilizados<br />

na identificação de uma rede de genes<br />

expressos de fundamental importância<br />

no desenvolvimento de uma determinada<br />

estrutura, ou na resposta de um<br />

organismo a um estímulo externo. O<br />

estudo da expressão gênica diferencial<br />

pode contribuir para a caracterização de<br />

resistências, pois possibilita a identificação<br />

de genes–chave desta rede através<br />

da comparação da expressão gênica<br />

durante o desenvolvimento de uma estrutura<br />

sob condições normais e em<br />

organismos carregando uma mutação<br />

ou submetidos a algum tipo de stress.<br />

Através do acúmulo de dados da expressão<br />

diferencial de vários genes sob diferentes<br />

condições, pode-se reconstruir as<br />

vias reguladas por estes genes, predizer<br />

onde eles atuam e identificar novos<br />

genes associados ao processo.<br />

Para o entendimento da função de<br />

um gene, é fundamental o estudo de<br />

onde e quando ele é expresso. Recentemente,<br />

várias estratégias foram desenvolvidas<br />

para permitir o estudo da função<br />

de vários genes simultaneamente,<br />

entre elas: a genética reversa (geração de<br />

mutações específicas em genes de interesse),<br />

screens mutagênicos (geração de<br />

mutações randômicas e screening de um<br />

pool de mutantes para se identificar<br />

fenótipos de interesse) e bioinformática<br />

(a análise dos dados gerados por todas as<br />

estratégias acima). As estratégias acima,<br />

associadas aos projetos genoma, que<br />

têm como objetivo o sequenciamento do<br />

genoma inteiro de vários organismos,<br />

têm possibilitado o estudo sistemático da<br />

expressão diferencial de genes em nível<br />

de genoma como um todo. A análise da<br />

expressão diferencial de genes em resposta<br />

ao ataque de um patógeno constitui,<br />

portanto, uma ferramenta importante<br />

no isolamento de genes de resistência<br />

ou de fatores envolvidos com a interação<br />

patógeno-hospedeiro.<br />

Neste projeto, a identificação de<br />

genes expressos diferencialmente em<br />

germoplasma resistente de Arachis está<br />

sendo realizada através da análise de ESTs<br />

e de microarranjos. Para tal, várias bibliotecas<br />

de cDNA foram construídas a partir<br />

de Arachis stenosperma submetido a<br />

diferentes situações de stress (inoculado<br />

com nematóides e fungos) as quais estão


sendo seqüenciadas de forma massal<br />

visando à construção de um banco de<br />

dados de ESTs e dos chips de DNA.<br />

Uma vez isolados e confirmada<br />

sua função, estes genes podem ser<br />

introgredidos para o amendoim cultivado<br />

ou transferidos a outras plantas de<br />

interesse econômico, que sejam atingidas<br />

pelas mesmas pragas, como a soja<br />

e feijão, para as quais já existem disponíveis<br />

métodos de transformação.<br />

O impacto da utilização<br />

destas novas técnicas no<br />

cultivo do amendoim<br />

O Brasil produz atualmente aproximadamente<br />

170 mil toneladas de<br />

amendoim, sendo o maior produtor o<br />

estado de São Paulo, com aproximadamente<br />

60 mil ha plantados e 80-90% da<br />

produção do país (Conab, 2002). Um<br />

dos principais problemas dos produtores<br />

de amendoim deste estado é o<br />

ataque de doenças fúngicas de parte<br />

aérea, como a mancha barrenta<br />

(Didymella arachidicola), mancha castanha<br />

(Cercospora arachidicola), mancha<br />

preta (Cercosporidium personatum),<br />

ferrugem (Puccinia arachidis) e<br />

verrugose (Sphaceloma arachidis). A<br />

principal cultivar plantada no país é a<br />

cv. Tatu, com aproximadamente 80%<br />

da área plantada e é altamente susceptível<br />

às doenças acima citadas. A última<br />

cultivar de A. hypogaea lançada pelo<br />

Instituto Agronômico de Campinas<br />

(IAC), a IAC-Caiapó, é de ciclo longo<br />

(com 130 dias) e possui resistência<br />

moderada às cercosporioses, à mancha<br />

barrenta e a ferrugem (Conab, 2002).<br />

As espécies silvestres da secção<br />

Arachis têm sido utilizadas no melhoramento<br />

do amendoim na Índia, Argentina,<br />

Estados Unidos e Brasil. Várias das espécies,<br />

que, na maioria, são brasileiras,<br />

possuem níveis de resistência a pragas e<br />

doenças superiores aos encontrados em<br />

acessos de A. hypogaea (Stalker & Moss,<br />

1987; Fávero et al., 2000 e 2001). A falta de<br />

informações sobre o potencial destas<br />

espécies para o melhoramento de cultivares<br />

é a principal barreira para seu uso. As<br />

69 espécies silvestres de Arachis descritas<br />

e existentes são restritas ao Brasil, Bolívia,<br />

Paraguai, Argentina e Uruguai, sendo 57<br />

endêmicas ao Brasil. As expedições de<br />

coleta realizadas desde 1959 têm permitido<br />

a preservação de mais de 1600 acessos<br />

no banco de germoplasma, localizado na<br />

Embrapa Recursos Genéticos e <strong>Biotecnologia</strong>,<br />

através de seu curador e principal<br />

coletor, Dr. José Francisco M. Valls. Neste<br />

banco de germoplasma, há acessos que<br />

representam todas as espécies de Arachis,<br />

exceto uma, Arachis martii, considerada<br />

extinta.<br />

A identificação de espécies resistentes<br />

a doenças e pragas e a localização<br />

de marcadores associados aos genes de<br />

interesse auxiliarão sobremaneira a seleção<br />

de plantas com resistência, desde as<br />

primeiras fases do programa de melhoramento,<br />

até a obtenção de novas cultivares.<br />

Acredita-se que a possibilidade da<br />

piramidização de genes tornará as novas<br />

cultivares com resistências mais duradouras<br />

do que se fosse utilizada apenas<br />

a seleção baseada em avaliação agronômica<br />

e fitopatológica das plantas, pois<br />

será possível a identificação de marcadores<br />

moleculares ligados a genes de resistência<br />

localizados nos genomas A e B<br />

oriundos de espécies silvestres e incorporados<br />

ao amendoim cultivado.<br />

O projeto irá propiciar o diálogo<br />

mais intenso entre os parceiros na cooperação<br />

científica e tecnológica entre a<br />

União Européia e América Latina. Isto<br />

também beneficiará o treinamento de<br />

jovens pesquisadores em tecnologias de<br />

ponta em genômica e citogenética. Os<br />

mapas genéticos gerados e o mapeamento<br />

comparativo entre os genomas de<br />

Arachis e Lotus poderão facilitar o melhoramento<br />

de amendoim e, possivelmente,<br />

os programas de melhoramento de outras<br />

leguminosas. O desenvolvimento de variedades<br />

melhoradas de amendoim adaptadas<br />

à América Latina auxiliará na redução<br />

do uso de defensivos agrícolas e<br />

poluição associada, sem perdas na produtividade,<br />

contribuindo para o desenvolvimento<br />

sustentável da agricultura.<br />

Bibliografia Citada<br />

Asamizu, E., Nakamara, Y., Sato, S., e<br />

Tabata, S. (2000). Generation of<br />

7137 non-redundant expressed<br />

sequence tags from a legume, Lotus<br />

japonicus. DNA research 7 127-130.<br />

Bailey, J. (2002). Peanut Disease<br />

Management. North Carolina Peanut<br />

Production Guide. Chapter 6. 19 pp.<br />

Conab (2002). Conjuntura Semanal.<br />

Especiais 16-2009. Ministério da<br />

Agricultura, Pecuária e Abastecimento<br />

. Companhia Nacional de<br />

Abastecimento-Conab.<br />

Fávero, A. P.; Moraes, S. A.; Vello, N.<br />

A.; Valls, J. F. M. Caracterização de<br />

acessos de germoplasma de espécies<br />

silvestres de Arachis (Secção<br />

Arachis) resistentes à ferrugem<br />

(Puccinia arachidis). Anais do 46 o<br />

Congresso Nacional de Genética,<br />

19 a 23 de setembro de 2000 -<br />

Águas de Lindóia- SP, p.533-534<br />

Fávero, A. P.; Moraes, S. A.; Vello, N. A.;<br />

Valls, J. F. M. Caracterização de espécies<br />

silvestres de amendoim quanto à<br />

resistência à mancha castanha visando<br />

à introgressão de genes ao amendoim<br />

cultivado. Anais do I Congresso<br />

de Melhoramento de Plantas, 03 a 06<br />

de abril de 2001 - Goiânia, GO.<br />

Guimaraes, P.M., Leal-Bertioli, S., Seijo,<br />

G., Parniske, M., Stougaard, J., Bertioli,<br />

D. (2003). The identification of<br />

resistances to biotic stress in wild<br />

Arachis germplasm, and the<br />

development of tools for breeding by<br />

genetic mapping and comparative<br />

genomics. Annals of the 7 th Congress<br />

of Plant Molecular Biology, Barcelona,<br />

2003.<br />

Hagan, A (1998). Foliar diseases of<br />

peanuts. Alabama Cooperative<br />

Extension System. ANR-369. (http//<br />

www. Aces.edu /department/<br />

extcomm/publications/anr/anr-<br />

369.html)<br />

Holbrook, C.C., Stephenson, M.G. e<br />

Johnson, A.W. (2000). Level and<br />

geographical distribution of<br />

resistance to Meloidogyne arenaria<br />

in the US peanut germplasm<br />

collection. Crop Science 40 1168-<br />

1171.<br />

Sandal, N., Madsen, L., Radutoiu, S.,<br />

Krusell, L., Madsen, E., Kanamori,<br />

N., Sato, S., Tabata, S., James, E.,<br />

Krause, K., Udvardi, M., Stougaard,<br />

J. (2003). Mapping and Map based<br />

cloning of symbiotic genes in the<br />

model legume Lotus japonicus.<br />

Annals of the 7 th Congress of Plant<br />

Molecular Biology, Barcelona, 2003.<br />

Sato, S., Kanerko, T., Nakamura, Y.,<br />

Asamizu, E. kato, T. e Tabata, S.<br />

(2001). Strucutural analysis of a Lotus<br />

japonicus genome. I. Sequence<br />

features and mapping of fifty-six<br />

TAC clones which cover the 5,4 Mb<br />

regions of the genome. DNA<br />

Research 8 <strong>31</strong>1-<strong>31</strong>8.<br />

Stalker, H.T., Moss, J.P. (1987).<br />

Speciation, cytogenetics, and<br />

utilization of arachis species.<br />

Advances in Agronomy 41 1-40.<br />

Subrahmanyam, P., McDonald, D.,<br />

Gibbons, R.W. e Subba Rao, P.V.<br />

(1983). Components of resistance to<br />

Puccinia arachidis in peanuts.<br />

Phytopathology 73 (2) 253-256.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 119


Pesquisa<br />

Ana Paula Pacheco Clemente<br />

Bióloga, Especialista em Bioética, Direito e<br />

aplicações, coordenadora e professora dos cursos de<br />

pós-graduação lato sensu e extensão em Bioética da<br />

PUCMinas e UFLA, e do curso de extensão em<br />

Tanatologia e Bioética do IEC-PUC Minas, membro<br />

da diretoria do Capítulo de Bioética da SBCM,<br />

consultora da Comissão de Bioética e Biodireito da<br />

OAB-MG, membro fundador e da Diretoria<br />

Executiva da Sociedade Brasileira de Bioética<br />

Regional Minas Gerais.<br />

paulaclemente@bioconsulte.bio.br;<br />

paulaclemente@bol.com.br<br />

Bioética<br />

A área das ciências biológicas é<br />

a que mais privilegia o conceito de<br />

Bioética da forma como foi concebido<br />

inicialmente. Ela possui um campo<br />

muito vasto de atuação para o<br />

profissional que transita entre a área<br />

da saúde e a do meio ambiente.<br />

Segundo Potter, criador do termo,<br />

que era biólogo e oncologista, a atuação<br />

da Bioética seria buscar a boa<br />

qualidade de vida, pela interação do<br />

ser humano com o meio ambiente.<br />

Esse conceito foi adaptado pelo Instituto<br />

Rose e Kennedy de Reprodução<br />

Humana e Bioética, que tornou<br />

assim a Bioética voltada para a<br />

biomedicina e a biotecnologia. A<br />

Bioética tradicional, dos EUA, é baseada<br />

em quatro princípios fundamentais,<br />

que são:<br />

Autonomia: direito do paciente<br />

de participar ativamente de seu tratamento,<br />

refutando, concordando, discutindo<br />

e decidindo junto com o<br />

médico a melhor conduta a ser tomada.<br />

Esse conceito vem da filosofia,<br />

uma vez que o termo supramencionado<br />

significa autogoverno. Entretanto,<br />

para que tal aconteça, o sujeito<br />

(paciente) deve receber informações<br />

claras e precisas sobre seu quadro<br />

clínico, diagnóstico, tratamento e<br />

prognóstico.<br />

Beneficência e não-maleficência,<br />

as quais possuem origem hipocrática.<br />

A primeira pugna por sempre buscar<br />

o bem do paciente; já a segunda<br />

determina que, existindo dúvida<br />

quanto ao bem a ser ofertado ao<br />

paciente e sobre os seus efeitos<br />

120 <strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003<br />

Pluralidade e transdisciplinaridade<br />

colaterais, ou seja, se estes forem<br />

maiores que aqueles, o médico não<br />

deve atuar, uma vez que a atuação<br />

médica deve sempre buscar o bem<br />

do paciente.<br />

O princípio da justiça prega o<br />

livre acesso de todos a um tratamento<br />

médico de qualidade, e a livre<br />

distribuição dos progressos da medicina<br />

para todos os seres humanos.<br />

Deve-se ressaltar a existência,<br />

antes de Potter, dos movimentos<br />

pré-bioéticos, tais como o Código<br />

de Nuremberg, o qual estabeleceu<br />

regras mínimas para pesquisas clínicas<br />

em seres humanos, e a Declaração<br />

Universal dos Direitos Humanos,<br />

que estipula direitos e garantias<br />

mínimos de respeito à vida humana.<br />

Ambos buscaram impedir reincidências<br />

das atrocidades cometidas pela<br />

humanidade nas duas grandes guerras<br />

mundiais.<br />

Hodiernamente, bioética é a<br />

parte da ética que cuida das questões<br />

referentes à vida humana, à saúde,<br />

aos avanços da biotecnologia e aos<br />

efeitos destes sobre o homem. Busca<br />

sempre o bom e o melhor para o ser<br />

humano, possuindo, desta forma, um<br />

caráter antropocentrista bastante<br />

acentuado, que busca privilegiar a<br />

interação homem/meio ambiente.<br />

A atuação do biólogo no meio<br />

ambiente busca a proteção da biodiversidade,<br />

a manutenção de espécies<br />

em vias de extinção, a preservação<br />

do meio ambiente e da qualidade de<br />

vida. O licenciamento ambiental e o<br />

relatório de impacto ambiental de


esponsabilidade técnica do biólogo<br />

é de extrema importância para evitar<br />

acidentes ecológicos. O Brasil possui<br />

uma legislação ambiental que regulamenta<br />

as atividades dos profissionais<br />

que atuam na área. A Bioética<br />

influencia nas decisões à medida<br />

que analisa a interação do ser humano<br />

com o ambiente e os reflexos<br />

causados pelas ações propostas pelo<br />

homem.<br />

Mais recentemente temos tido<br />

discussões sobre transgênicos e<br />

OGMs, não só na área de meio<br />

ambiente, mas também na área médica,<br />

com a produção de animais<br />

transgênicos para transplante de<br />

órgãos, vacinas e medicamentos<br />

manipulados geneticamente. Temos<br />

também biotecnologia na formação<br />

de biomateriais, reprodução humana<br />

assistida, que gera grandes polêmicas<br />

por causa da doação de sêmen,<br />

óvulo, útero de substituição,<br />

que muda os pilares de filiação,<br />

trazendo gêmeos em idades diferentes,<br />

crianças com até cinco pais,<br />

crianças com material genético de<br />

três pais em resultado de exame de<br />

DNA com técnica de rejuvenescimento<br />

de óvulo; gestação após a<br />

morte dos pais biológicos, mudança<br />

de paradigma quanto à filiação, privilegiando<br />

a paternidade e maternidade<br />

sócio-afetivas.<br />

O Projeto Genoma Humana com<br />

a descoberta de todos os genes humanos<br />

, trará benefícios e proporcionará,<br />

daqui a alguns anos, a cura para<br />

várias doenças. Nesse âmbito haverá<br />

um avanço na medicina preditiva<br />

que, através da avaliação genética,<br />

pode fazer o diagnóstico de várias<br />

doenças que poderiam se manifestar<br />

ou não no futuro. Hoje já é possível<br />

fazer o diagnóstico de algumas doenças,<br />

porém não é possível curá-las, os<br />

benefícios são apresentados na<br />

melhoria da qualidade de vida e da<br />

adaptação do paciente.<br />

Já há algumas décadas, a medicina<br />

fetal proporciona, através do<br />

diagnóstico pré-natal, a possibilidade<br />

de diagnóstico de doenças cromossômicas,<br />

como a síndrome de<br />

Down. Hoje, contamos com a biotecnologia<br />

por meio do diagnóstico ge-<br />

nético pré-implantação; podemos<br />

fazer a análise genética retirando um<br />

blastômero do embrião, ou seja, uma<br />

célula totipotente, que poderá virar<br />

outro ser humano idêntico ao da<br />

célula de onde foi retirado. Dessa<br />

forma, o diagnóstico é realizado no<br />

embrião, não havendo necessidade<br />

de retirar nenhum material biológico<br />

após a implantação, para não correr<br />

o risco de um aborto.<br />

Com a descoberta de doenças<br />

genéticas pela micromanipulação de<br />

embriões, é possível descartar esses<br />

embriões “anormais” pondo em prática<br />

a chamada Eugenia doce, que<br />

seria o descarte de embriões e fetos<br />

com defeitos congênitos. Aí surge a<br />

discussão sobre o que é normal e o<br />

que é anormal. Caso do casal surdomudo<br />

que recorreu ao banco de sêmen<br />

para buscar um doador de sêmen<br />

surdo para ter seu bebê.<br />

A terapia gênica vai proporcionar<br />

através da utilização de vetores,<br />

como vírus e bactérias, a cura das<br />

doenças das quais forem localizados<br />

os genes que as causam, removendo<br />

ou acrescentando o gene saudável à<br />

pessoa.<br />

Outra questão discutida pela<br />

Bioética é o direito à identidade genética<br />

nos casos em que a criança foi<br />

adotada ou tenha nascido por intermédio<br />

de material genético doado, o<br />

que não desfaz o vínculo de paternidade;<br />

direito não para fins de herança<br />

nem tampouco para negatória de<br />

paternidade, mas, simplesmente, pelo<br />

direito de conhecer suas origens. O<br />

advento do exame de DNA trouxe a<br />

certeza biológica, mas muitos têm<br />

utilizado tal exame de forma errônea.<br />

Deve-se ter sempre o exame de DNA<br />

como mais uma prova judicial a ser<br />

juntada aos autos do processo, a fim<br />

de preservar a dignidade e a privacidade<br />

humanas. Ninguém é obrigado<br />

a fornecer prova contra si mesmo.<br />

A banalização do exame de DNA<br />

tem trazido conseqüências indesejáveis<br />

não só para o Direito de Família<br />

e de Sucessões, mas também para a<br />

Criminalística, porque ainda existem<br />

peritos despreparados para coletar o<br />

material biológico na cena do crime.<br />

É preciso seriedade e responsabilida-<br />

de para utilizar tal prova; deve-se<br />

evitar contaminação do material,<br />

armazená-lo de forma adequada, ter<br />

uma cadeia de custódia, solicitar autorização<br />

por escrito nos casos de<br />

investigação de paternidade ou de<br />

maternidade.<br />

Assim, as questões da bioética<br />

podem ser classificadas como emergentes,<br />

aquelas advindas do avanço<br />

da biotecnologia e da biociência, e<br />

persistentes as que possuem suas<br />

origens na má distribuição de recursos<br />

e em um sistema econômico<br />

excludente. Por esse motivo, a<br />

bioética deve recortar seu sujeito de<br />

trabalho por etnia, raça, sexo e condição<br />

econômica, uma vez que a<br />

busca do que é bom e melhor varia<br />

de acordo com essas características.<br />

Devido à complexidade dos valores<br />

envolvidos em sua atuação,<br />

esse campo de discussão revela-se<br />

como a ciência da composição, ou<br />

seja, todos os assuntos dentro do<br />

âmbito de atuação da bioética atingem<br />

toda a sociedade, logo, as decisões<br />

sobre eles devem ser tomadas<br />

com a participação de todas as partes<br />

envolvidas.<br />

A Bioética busca uma reflexão<br />

da biotecnologia apresentada pelas<br />

ciências biomédicas para que elas<br />

possam ser utilizadas em benefício<br />

da sociedade. Busca o melhor para a<br />

coletividade, fazendo interagir o homem<br />

com o meio ambiente, com<br />

vistas a propiciar a ele uma melhor<br />

qualidade de vida. O trabalho<br />

transdisciplinar faz-se necessário a<br />

fim de proporcionar um atendimento<br />

mais humanizado e justo na área<br />

das ciências da vida. Dessa forma,<br />

buscam-se soluções novas para conflitos<br />

novos.<br />

Destarte, a bioética representa a<br />

ciência do diálogo transdisciplinar, ou<br />

melhor, propõe a composição possível<br />

com os vários estranhos morais,<br />

pois um médico para atuar bioeticamente<br />

deve respeitar a individualidade<br />

de seu paciente e o advogado que<br />

abraçar causa tão apaixonante deve<br />

conhecer biomedicina e os avanços<br />

biotecnológicos. Assim como cada<br />

profissional, na sua área de atuação,<br />

deve buscar essa composição.<br />

<strong>Revista</strong> <strong>Biotecnologia</strong> <strong>Ciência</strong> & <strong>Desenvolvimento</strong> - <strong>Edição</strong> <strong>nº</strong> <strong>31</strong> - julho/dezembro 2003 121

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