Fabiana Lopes da Cunha. O Carnaval entre Os Sexos ... - ANPUH-SP

narrativa nos fala sobre as peripécias de Mr. Linge, um cavalheiro que durante o carnaval
tenta passar a perna na esposa, mentindo a ela sobre a necessidade de viajar a negócios
durante as festividades de Momo. Esta desconfiada resolve maquiar sua cozinheira e
fantasiá-la, para que esta pudesse seduzir seu marido e desmascará-lo. Mr. Linge cai na
cilada e após dançar e fazer galanteios a noite toda para Bringuela, acaba sendo flagrado
por sua esposa. Tal história tem certo teor moral e “educativo”, tentando alertar aos que
usavam o carnaval para dar suas escapadelas, que poderiam se dar muito mal e inclusive
cair na cilada da própria esposa, ou se tornar alvo de chacotas por ter flertado com a
empregada ou com um homem. Além destas histórias veiculadas no período de festa, com o
objetivo de reforçar os laços familiares, foram elaborados também argumentos que
conseguiriam justificar as diferenças entre os sexos e os papéis sociais atribuídos a cada
um. Dentre eles, destacam-se a construção do lar feliz e a relevância da mulher nele, em sua
organização e na criação dos filhos.
Maluf e Mott falam em uma “institucionalização do amor”, onde não poderia
haver espaço para a liberdade individual, a mudança e a experimentação de práticas
amorosas vinculadas ao amor romântico, ou à paixão. Tal rigidez nas regras frente a uma
sociedade ambígua era uma tarefa difícil. Principalmente quando vinculadas à paixão
erótica, ou a outros sentimentos arrebatadores, como o sentimento que Bernardes,
personagem difundido em uma charge da Fon-Fon!, possuía pelo carnaval. 19
Os padrões de comportamento, valores e ideais importados da Europa,
relacionados à moral e ao controle de certas emoções, não eram seguidos por todos, ou da
forma como queriam as autoridades. Muitas vezes, estes padrões impostos pelas classes
políticas chocavam-se com hábitos arraigados, provenientes de formas de sociabilidade
19 Fon-Fon! de 18 de fevereiro de 1909. Nesta crônica Bernardes, era casado, e seus fortes sentimentos pelo
carnaval não se coadunavam com a vida que um homem de família deveria ter, mesmo em dias de festa. No
entanto, apesar de seu estado civil, Bernardes, casado com Clemência, sempre inventava desculpas para poder
sair pela avenida durante o carnaval. No entanto, naquele ano, sua sogra, D. Bermudes, muito desconfiada,
havia resolvido desmascara-lo. Ao final, o genro é desmascarado pela sogra, quando esta vestida de mailot cor
de rosa e corpete preto, passa por ele no baile a fantasia do Palace Theatre, e Bernardes, sem reconhecê-la,
mexe com ela : “cai no maxixe, baiacu!” Ela então irritadíssima, aceita o desafio e passa a rodopiar com
Bernardes, até ele não conseguir mais nem falar, de tão cansado. É aí que ela o desmascara e ele, desesperado,
sai em disparada para fora do evento, enquanto a sogra é ovacionada pelos assistentes.Na história, a sogra se
dá bem e provavelmente Bernardes, depois de tanto sofrer em suas mãos, iria pensar bem antes de sair
escondido novamente no carnaval. Tais histórias, com um fundo moral, tentavam controlar os impulsos
eróticos ou apaixonados dos foliões, durante estas festividades.
Texto integrante dos Anais do XIX Encontro Regional de História: Poder, Violência e Exclusão. ANPUH/SP – USP. São Paulo, 08 a 12 de setembro de 2008. Cd-Rom.
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