A representação das mulheres na literatura maldita ... - Itaporanga.net
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Considerado um dos primeiros escritores malditos da modernidade, publicou<br />
obras – posteriormente reconhecida pelos surrealistas 2 –, considera<strong>das</strong>, por alguns,<br />
pornográficas, bizarras e “impensáveis”, e levou uma vida de inúmeros escândalos. Os<br />
textos mais maliciosos de Sade, caracterizados por intensa violência e terror sexual e/ou<br />
erótico, eram tidos como capazes de destruir o corpo e a alma de qualquer leitor. Sua<br />
vida desregrada, cheia de episódios de torturas, sodomia e profa<strong>na</strong>ções, lhe valeram<br />
sucessivas prisões marca<strong>das</strong> por libertações e fugas. Na Revolução Francesa foi<br />
conde<strong>na</strong>do à guilhoti<strong>na</strong>, escapando, por um triz, para pouco depois ser encarcerado por<br />
Napoleão em um manicômio.<br />
A obra de Sade foi especialmente influenciada por materialistas e/ou <strong>na</strong>turalistas<br />
do século XVIII, como La Mettrie e D’Holbach 3 , autores que o mesmo leu<br />
fervorosamente.<br />
La Mettrie, por exemplo, um pensador, médico e a<strong>na</strong>tomista francês, defendia<br />
que o corpo seria uma máqui<strong>na</strong> 4 , não existindo nenhuma alma atuando independente<br />
dele, ou seja: o pensamento – o que poderíamos acreditar ser a alma – era conseqüência<br />
da máqui<strong>na</strong> e não algo alheio, fora dela. Se ela não funcio<strong>na</strong>va, tudo parava. Entretanto,<br />
era a matéria que gerava o espírito. Com essas palavras, La Mettrie conseguia derrubar<br />
qualquer esperança de vida após a morte.<br />
Não havendo espírito, o livre-arbítrio e todo o conjunto de preceitos morais que<br />
o acompanha era uma ficção. Se somos ape<strong>na</strong>s máqui<strong>na</strong> mortal, já que no dia que a<br />
máqui<strong>na</strong> parar <strong>na</strong>da mais resta, inclusive se há alma ela deixa de existir, ser gentil ou<br />
malvado para com os semelhantes, agir bem ou mal, tor<strong>na</strong>-se indiferente, não afetando o<br />
funcio<strong>na</strong>mento da aparelhagem de nervos, sangue e músculo de que somos feitos.<br />
Portanto, seguindo os preceitos dos epicuristas 5 , não há mal nenhum em levar uma vida<br />
2 Os surrealistas descobriram nele à vontade de libertar o homem de to<strong>das</strong> as suas opressões, e por isso,<br />
<strong>na</strong>s palavras do surrealista Apolli<strong>na</strong>ire, esse transgressor de espíritos “é o espírito mais livre que jamais<br />
existiu”.<br />
3 Em 1770 D’Holbach publica, sob o nome falso de Mirabaud, o “Sistema da Natureza”, obra que<br />
influenciará o pensamento sadiano (Borges, 2003, p. 248). O Barão D'Holbach, um ateu muito rico e<br />
militante, defendia que o universo é um sistema complexo de substâncias físicas organiza<strong>das</strong> de acordo<br />
com leis mecanicistas de causa e efeito, mais do que desenhado por Deus.<br />
4 O resultado dessa especulação filosófica deu-se com a obra Homme-machine, o homem-máqui<strong>na</strong>, um<br />
devastador ensaio ultra-materialista que circulou em 1748.<br />
5 Epicurismo: Doutri<strong>na</strong> do filósofo grego Epicuro (341 – 270 a.C.), que identifica o bem com o prazer,<br />
que deve ser encontrado <strong>na</strong> prática da virtude e <strong>na</strong> cultura do espírito.<br />
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