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Cadernos Gestão Pública e Cidadania - FGV-Eaesp - Fundação ...

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<strong>Cadernos</strong><br />

<strong>Gestão</strong> <strong>Pública</strong><br />

e <strong>Cidadania</strong><br />

Avaliação da<br />

Importância de<br />

Atributos de<br />

Projetos de<br />

Desenvolvimento<br />

Inovadores<br />

Autores:<br />

Luis Roque Klering<br />

Roberto Costa Fachin<br />

Zilá Mesquita<br />

Volume 9


CADERNOS GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA<br />

AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DE ATRIBUTOS DE PROJETOS DE<br />

DESENVOLVIMENTO INOVADORES<br />

Luis Roque Klering<br />

Roberto Costa Fachin<br />

Zilá Mesquita<br />

Volume 9<br />

Novembro de 1998


2 CADERNOS GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA<br />

Os Autores<br />

Luis Roque Klering<br />

Professor Pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e<br />

Professor do Programa de Pós-graduação em Administração da UFRGS.<br />

Roberto Costa Fachin<br />

Professor do Programa de Pós Graduação em Administração da UFRGS.<br />

Zilá Mesquita<br />

Professora do Programa de Pós Graduação em Administração da UFRGS.


VOL. 9: AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DE ATRIBUTOS DE PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO INOVADORES 3<br />

ÍNDICE<br />

1. Introdução....................................................................................................................... 5<br />

2. Base Teórica Fundamental............................................................................................. 6<br />

3. Delineamento da pesquisa e método ............................................................................ 10<br />

4. O que é inovação nas experiências de “gestão pública e cidadania" ........................... 15<br />

5. Apreciação Crítica de Programas Inovadores Municipais ........................................... 20<br />

6. Bibliografia................................................................................................................... 29


4 CADERNOS GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA


VOL. 9: AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DE ATRIBUTOS DE PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO INOVADORES 5<br />

1. INTRODUÇÃO<br />

Um dos temas que tem recebido crescente atenção na área da administração pública tem<br />

sido o das inovações. Acredita-se que bons exemplos de projetos, programas ou atividades<br />

públicas influenciem positivamente outras comunidades, que desta forma copiam<br />

experiências bem sucedidas, desenvolvendo a noção do que a teoria do institucionalismo<br />

denomina de “mimetismo por isomorfismo”.<br />

Cada comunidade tem uma cultura específica, com seus padrões de comportamento, ritos,<br />

simbolismos, bem como valores e pressupostos. Tal cultura não é facilmente rompida.<br />

Todavia, a introdução, objetiva ou subliminar, de novas práticas pode estrategicamente<br />

mudar a cultura aí prevalente.<br />

A questão que se coloca é:<br />

Que elementos, critérios ou atributos de um projeto ou programa são mais<br />

importantes, para impactarem e mudarem positivamente os hábitos de uma<br />

comunidade?<br />

Por exemplo, os critérios de impacto na qualidade de vida, credibilidade pública,<br />

envolvimento do público-alvo e outros são, a princípio, todos importantes. Todavia, que<br />

critérios são mais e menos importantes? Cada projeto tem impactos específicos e cada<br />

comunidade também tem peculiares necessidades a serem atendidas. Um bom gestor pode<br />

atuar estrategicamente, gerando maiores impactos com menores recursos ou esforços.<br />

De modo geral, um gestor público pode pensar que existe um esquema ou ranking geral de<br />

importâncias dos critérios, que vale genericamente para os projetos. De fato, pode-se<br />

pensar que o atributo qualidade de vida sempre é mais importante que o critério da<br />

transferibilidade. Todavia, nem sempre isso é verdade, e cada caso exige uma atuação ou<br />

dosagem específica.<br />

Na primeira parte do texto (capítulos 2 e 3), Luis Roque Klering sugere a utilização da<br />

moderna técnica estatística de “análise conjunta” para objetiva e quantitativamente avaliar<br />

a utilidade ou importância de atributos de projetos de desenvolvimento inovadores. Desta<br />

forma, os gestores públicos podem identificar mais claramente que projetos são mais e<br />

menos importantes, para merecerem maior ou menor atenção nas estratégias de<br />

desenvolvimento e partilha de recursos.


6 CADERNOS GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA<br />

Na segunda parte (capítulo 4), Roberto Costa Fachin analisa a ocorrência da estrutura de<br />

fatores ou critérios relevantes, em alguns projetos selecionados dos 20 premiados pelo<br />

Programa de <strong>Gestão</strong> <strong>Pública</strong> e <strong>Cidadania</strong>, no 1 o . Ciclo de Premiação, realizado em 1996.<br />

Na terceira parte (capítulo 5), Zilá Mesquita avalia outro conjunto de projetos, do referido<br />

Ciclo de Premiação.<br />

2. BASE TEÓRICA FUNDAMENTAL 1<br />

2.1. Conceito de Desenvolvimento Econômico e Social<br />

Entende-se neste estudo que desenvolvimento tem um significado bem mais amplo<br />

que o de crescimento econômico, que significa mero aumento da riqueza tangível ou<br />

física. Já em 1980, o relatório da “Brand Comission”, da ONU, referia que<br />

“... desenvolvimento é mais do que a passagem da condição de pobre para<br />

a de rico, de uma economia tradicional rural para uma sofisticada: carrega<br />

ele consigo não apenas a idéia da melhor condição econômica, mas<br />

também a de maior dignidade humana, mais segurança, justiça e<br />

eqüidade” (apud 1).<br />

Amartya Sen (9), por sua vez, refere que a prosperidade econômica não leva<br />

necessariamente ao enriquecimento da vida, citando o exemplo de países com<br />

elevados índices de Produto Interno Bruto e baixos indicadores de qualidade de vida.<br />

Para o autor, o desenvolvimento deve ser definido em relação ao que as pessoas<br />

podem e devem ser e fazer, que denomina de efetivações, no sentido de<br />

potencialidades. Para ele, a ação política (ou pública) deve ter o objetivo de ampliar a<br />

capacidade das pessoas de serem responsáveis por atividades e estados valiosos e<br />

valorizados, ou seja, na linha de uma ética da capacidade. Disso decorre a orientação<br />

de que uma boa ação pública não somente distribui bens a receptores passivos, mas<br />

também amplia as escolhas das pessoas e promove suas capacidades, incluindo a<br />

capacidade de escolha. De acordo com esta ótica, o desenvolvimento humano,<br />

sustentável e socialmente justo, se apoiaria no tripé economia-saúde-educação. Reitera<br />

que “a pobreza, o analfabetismo, a injustica social e a degradação ambiental estão<br />

todos interrelacionados como fatores negativos para o desenvolvimento humano” (9).<br />

1 Os capítulos 2 e 3 foram desenvolvidos pelo prof. Luis Roque Klering, do PPGA/UFRGS


VOL. 9: AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DE ATRIBUTOS DE PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO INOVADORES 7<br />

2.2. Conceito de Cultura Organizacional<br />

Os padrões de comportamento constituem uma manifestação da cultura de uma<br />

organização; podem ser entendidos como sendo as regras de um jogo, ou seja,<br />

estruturas que dão significado às ações. Existem diversos conceitos para cultura<br />

organizacional, dentre os quais o de Schein é, normalmente, o mais aceito:<br />

-"Cultura Organizacional é o padrão de premissas que um grupo inventou,<br />

descobriu ou desenvolveu no processo de aprender a resolver problemas<br />

de adaptação externa e interação interna, e que funcionaram bem o<br />

suficiente a ponto de serem consideradas válidas e, portanto, de serem<br />

ensinadas a novos membros do grupo como a maneira correta de<br />

perceber, pensar e agir com relação a esses problemas ". (8, p.3)<br />

Para Schein, a cultura se divide em três níveis, a saber:<br />

1. dos artefatos e criações: abrangem a tecnologia, arquitetura, estrutura<br />

física, documentos, padrões de comportamento;<br />

2. dos valores;<br />

3. das premissas.<br />

As práticas ou comportamentos, que uma comunidade ou sociedade pode mudar, são<br />

derivados dos valores que cultua; tais valores são transformados, com o tempo, em<br />

pressupostos crescentemente admitidos como certos ("taked for granted"). O quadro a<br />

seguir, adaptado de José M. Anzizu (apud 7), apresenta, de forma ilustrativa, a relação<br />

existente entre cultura organizacional e padrões de comportamento:<br />

Comportamento:<br />

padrões de atuação e<br />

relação<br />

Valores, crenças e princípios<br />

gerais dos fundadores<br />

Valores, crenças e princípios relativos à<br />

organização dos fundadores e líderes<br />

Cultura: valores, crenças e<br />

princípios compartilhados pelos membros<br />

Expressões:<br />

frases, ritos, etc.<br />

Objetos:<br />

edifícios, layout,<br />

vestimentas, etc.


8 CADERNOS GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA<br />

O sentido da expressão "padrões de comportamento" é semelhante ao que Bourdieu<br />

chama de "habitus", ou seja, predisposição em adotar certos tipos de comportamentos<br />

em face das situações dadas.<br />

O desenvolvimento das organizações e sociedades depende da adoção adequada de<br />

programas, métodos ou padrões de trabalho. Padrão tem a conotação de consenso a<br />

respeito de procedimento, medida, maneira de pensar, dirigir [...], com o objetivo de<br />

unificar e simplificar o comportamento das pessoas, frente a situações novas.<br />

Outros autores (como Charles O'Reilly) usam, nesse sentido, o termo "normas", que<br />

caracterizam uma organização ou revelam expectativas a respeito de atitudes e<br />

comportamentos apropriados ou inapropriados e constituem padrões socialmente<br />

aceitos (apud 7).<br />

Nesse estudo, parte-se da idéia central de que os padrões de comportamento, suas<br />

normas e valores, bem como pressupostos podem ser modificados através da<br />

implementação de projetos, programas ou ações que impactem sobre eles.<br />

2.3. Fatores de Desenvolvimento Territorial<br />

Com relação ao crescimento ou desenvolvimento de uma localidade ou região, uma<br />

questão central é:<br />

De quem depende tal crescimento ou desenvolvimento?<br />

De acordo com referências gerais diversas, vários são os fatores que favorecem o<br />

crescimento de territórios, tais como:<br />

- disponibilidade de recursos naturais, como natureza e clima favoráveis, terras<br />

férteis, recursos minerais, recursos hídricos, petróleo e outros;<br />

- existência de centros científicos, que impulsionam o desenvolvimento da<br />

tecnologia e das empresas do entorno, como tem ocorrido na Califórnia,<br />

Massachussets e outros lugares;<br />

- criação de um bom sistema educativo, em que os alunos não apenas freqüentam,<br />

mas efetivamente aprendem e se qualificam para o mercado; bons exemplos nesse<br />

sentido constituem o sistema de ensino profissionalizante da Alemanha, o ensino<br />

fundamental do Japão e outros países asiáticos, bem como o sistema de ensino<br />

universitário dos Estados Unidos;<br />

- estrutura de turismo, como acontece em países da Europa (especialmente na<br />

Espanha), países do Caribe, no Estado da Flórida (EUA) e outros lugares;<br />

- boa estrutura de gastos públicos, de tal forma que áreas fundamentais recebam o<br />

suficiente para sua manutenção e sobrem recursos para investimentos novos;


VOL. 9: AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DE ATRIBUTOS DE PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO INOVADORES 9<br />

- administração pública efetiva, que busque com disposição níveis mais elevados de<br />

crescimento e desenvolvimento;<br />

- implementação de administração adequadamente descentralizada, de forma que as<br />

diversas áreas periféricas tenham a chance de se desenvolverem em níveis<br />

semelhantes às áreas mais centrais;<br />

- implementação de projetos que aproveitem os parcos recursos disponíveis da<br />

melhor forma possível;<br />

- existência de indivíduos e lideranças qualificadas, capazes de inovar, agir<br />

proativamente, buscando o progresso de forma mais autônoma; e<br />

- implementação de uma visão para o mundo, para aprender com experiências<br />

diferentes.<br />

Verifica-se, pelos itens elencados, que o crescimento depende em grande parte de<br />

fatores exógenos, muitas vezes fora de controle dos administradores públicos,<br />

promotores do desenvolvimento. Capitais, tecnologia e conhecimento geral dependem<br />

de condições externas. Outra parte dos fatores são endógenos, podendo ser<br />

desenvolvidos por conta ou esforço próprio. Necessita-se “caçar” oportunidades<br />

externas, aprender com o mundo externo, bem como estimular as possibilidades<br />

internas. Finalmente, necessita-se articular os diversos fatores de crescimento e<br />

desenvolvimento, de tal forma que atuem com sinergia. Por isso, é conveniente referirse<br />

que o crescimento e desenvolvimento dependem da POTENCIALIZAÇÃO dos<br />

diversos FATORES de um território que, numa perspectiva mais abrangente, podem<br />

qualificados da seguinte forma:<br />

- recursos: materiais, humanos e psicossociais<br />

- instituições: flexíveis, inteligentes (que aprendem com seu entorno), maleáveis e<br />

velozes (características da modernidade);<br />

- Atores: indivíduos qualificados, corporações sérias e proativas, coletivos com<br />

responsabilidade social;<br />

- Governos: com procedimentos de administração modernos e manejo estratégico de<br />

recursos;<br />

- Sociedade: implementação de uma cultura ao mesmo tempo competitiva, como<br />

também de solidariedade cooperativa (vide figura 1).


10 CADERNOS GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA<br />

Desenvolvimento territorial em<br />

econ. de mercado abertas e<br />

descentralizadas depende de :<br />

Recursos<br />

materiais<br />

humanos<br />

conhecimentos<br />

Instituições<br />

flexíveis<br />

inteligentes<br />

maleáveis<br />

velozes/rápidas<br />

POTENCIALIZAÇÃO<br />

Atores<br />

indivíduos<br />

corporativos<br />

coletivos<br />

Figura 1 - Fatores de Potencialização do Desenvolvimento Territorial<br />

2.4. Atributos Relevantes de Projetos de Desenvolvimento<br />

Fatores endógenos<br />

associados à<br />

transformação real<br />

no processo de<br />

desenvolvimento<br />

Cultura<br />

indiv./competivid.<br />

solidariedade/coop.<br />

Procedimentos<br />

de governo<br />

de adm.<br />

de informações<br />

Que aspectos ou atributos são importantes na implementação de estratégias de<br />

desenvolvimento? Elencam-se, a seguir, alguns atributos percebidos como sendo<br />

relevantes na implementação de projetos de desenvolvimento inovadores:<br />

a) grau de mudança introduzido, em termos qualitativos ou quantitativos, em<br />

relação a práticas anteriores, inclusive em termos de modernidade do desenho e<br />

das ações do projeto; exemplo: implementação de novo modo ou modelo de<br />

produção ou fornecimento de serviço; mudança de hábito ou costume de trabalho,<br />

ou obtenção de produto ou serviço;<br />

b) grau de impacto na qualidade de vida do público-alvo (inclusive do entorno);<br />

refere-se a melhorias introduzidas em termos de renda, saúde, educação, meioambiente<br />

etc.;<br />

c) grau de transferibilidade, para outras áreas, administrações e regiões;<br />

d) grau de consolidação e ampliação do diálogo com a sociedade civil e agentes<br />

públicos; refere-se à capacidade que um projeto tem de facilitar a troca de<br />

informações entre poder público e a comunidade, bem como gerar “massa crítica”;


VOL. 9: AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DE ATRIBUTOS DE PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO INOVADORES 11<br />

e) grau de responsabilidade na utilização de recursos e oportunidades, inclusive<br />

em termos de organização e planejamento das várias etapas e ações de um projeto;<br />

suas ações devem ser desenvolvidas de forma transparente, equânime e correta;<br />

f) nível de abrangência e envolvimento do público-alvo alcançado; refere-se às<br />

estratégias de convencimento utilizadas por um projeto, que deve entusiasmar as<br />

pessoas, fazê-las ciente da sua existência e funcionamento;<br />

g) grau de credibilidade pública alcançado, especialmente em termos de<br />

importância interna atribuída a um projeto, bem como da sua capacidade de<br />

oferecer pronta-resposta a demandas do público-alvo;<br />

h) viabilidade técnica e financeira de um projeto, programa ou atividade, que deve<br />

ser exeqüível em termos técnicos e financeiros, ou seja, dispor de tecnologia e de<br />

recursos para sua implementação;<br />

i) grau de auto-sustentabilidade: refere-se à capacidade de um projeto vir a<br />

sustentar-se de forma autônoma, tendo em vista seu enfoque no desenvolvimento<br />

das pessoas e organizações envolvidas, evitando a utilização de práticas<br />

paternalistas.<br />

3. DELINEAMENTO DA PESQUISA E MÉTODO<br />

3.1. Tipo de estudo<br />

Para avaliar a importância dos atributos de projetos em geral, o estudo utilizou a<br />

técnica estatística de “análise conjunta”. Portanto, tem um enfoque quantitativo.<br />

3.2. Técnica de pesquisa utilizada<br />

O estudo utilizou a técnica de “análise conjunta” ou “conjoint analysis”, que constitui<br />

uma técnica estatística multivariada, usada especificamente para compreender como<br />

respondentes desenvolvem preferências por produtos ou serviços. Baseia-se no<br />

pressuposto de que os usuários (“consumidores”) avaliam o valor ou utilidade de<br />

produtos ou serviços (reais ou ideais) combinando as várias partes ou frações de<br />

utilidades de diferentes atributos. Constitui uma técnica estatística moderna, que<br />

possui vantagens em relação a outras técnicas tradicionais, como a “escala de Likert”.<br />

Numa “escala de Likert”, um respondente atribui valores, dentre as opções de uma<br />

escala discreta, intervalar e paramétrica, que vai de um valor mínimo (significando a<br />

pior situação ou opção), até um máximo (significando a melhor situação). Ao<br />

responder, o respondente focaliza somente uma questão ou atributo específico, sem se<br />

preocupar em compará-lo com os outros. Resultam daí dificuldades para efetivamente<br />

mensurar as verdadeiras importâncias de atributos, que fazem parte de um conjunto de


12 CADERNOS GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA<br />

atributos de produtos e serviços; muito freqüentemente as médias das respostas<br />

tendem a apresentar variações muito pequenas e pouco significativas, resultando daí<br />

uma baixa capacidade de discriminação das questões ou atributos.<br />

Para ter sucesso, um gestor de produtos ou serviços deve ser capaz de descrevê-los em<br />

termos de atributos relevantes (ou “fatores”), bem como dos seus níveis ou classes.<br />

Quando um analista ou projetista descreve seus produtos e serviços de acordo com um<br />

determinado plano, a combinação é conhecida como “tratamento” ou “estímulo”. Os<br />

estímulos são constituídos por predeterminadas combinações de atributos, e os<br />

respondentes devem julgar acerca das suas preferências (da melhor à pior situação)<br />

pelas várias combinações de atributos (3). A idéia central é apreender a direção das<br />

respectivas preferências, a partir dos comportamentos observados quando vários<br />

atributos são considerados ao mesmo tempo, uns em comparação com outros, e não<br />

individualmente. Por isso, o termo conjunto se refere ao fato de que a importância de<br />

um atributo é avaliada tendo em vista o seu valor de posição no conjunto, e não<br />

considerado individualmente.<br />

Tipicamente, os estudos de “análise conjunta” utilizam de seis a sete atributos, cada<br />

qual com dois a três níveis. Para preparar o instrumento de estimulação do<br />

respondente, o sistema de processamento (SPSS versão 4.1) também gera um conjunto<br />

reduzido de cartões, capazes de representar o conjunto de combinações possíveis. Por<br />

exemplo, para um problema com cinco atributos de três níveis cada um existem 3 x 3<br />

x 3 x 3 x 3 = 243 possibilidades de julgamento. Por isso, o sistema seleciona somente<br />

uma parte do conjunto possível de combinações, de tal forma que o número de opções<br />

(ou cartões) para ordenação seja razoável (entre 16 a 30, por exemplo).<br />

3.3. Procedimentos de levantamento dos dados<br />

Para descobrir as importâncias dos nove atributos referidos no item 2.4, atribui-se os<br />

níveis de “pequena”, “média” e “grande” presença de cada um, em projetos genéricos<br />

de desenvolvimento; para o caso em foco, com 9 atributos, cada um contendo 3 níveis<br />

ou classes, o software gerou 31 cartões, para serem ordenados, de acordo com as<br />

preferências de avaliadores.<br />

A seguir, apresentam-se exemplos de cartões gerados (primeiros e último):


VOL. 9: AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DE ATRIBUTOS DE PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO INOVADORES 13<br />

CARTÃO A<br />

Atributos de projeto,<br />

Nível de presença<br />

programa ou atividade pública<br />

num projeto<br />

Mudança introduzida Média<br />

Impacto na qualidade de vida Média<br />

Transferibilidade Média<br />

Ampliação do diálogo com a sociedade civil Pequena<br />

Responsabilidade na utilização de recursos Pequena<br />

Envolvimento do público-alvo Grande<br />

Credibilidade pública Média<br />

Viabilidade técnica e financeira Grande<br />

Auto-sustentabilidade das ações Grande<br />

CARTÃO B<br />

Atributos de projeto,<br />

Nível de presença<br />

programa ou atividade pública<br />

num projeto<br />

Mudança introduzida Média<br />

Impacto na qualidade de vida Pequena<br />

Transferibilidade Pequena<br />

Ampliação do diálogo com a sociedade civil Pequena<br />

Responsabilidade na utilização de recursos Grande<br />

Envolvimento do público-alvo Pequena<br />

Credibilidade pública Grande<br />

Viabilidade técnica e financeira Média<br />

Auto-sustentabilidade das ações Pequena<br />

CARTÃO ν<br />

Atributos de projeto,<br />

Nível de presença<br />

programa ou atividade pública<br />

num projeto<br />

Mudança introduzida Pequena<br />

Impacto na qualidade de vida Média<br />

Transferibilidade Média<br />

Ampliação do diálogo com a sociedade civil Pequena<br />

Responsabilidade na utilização de recursos Pequena<br />

Envolvimento do público-alvo Grande<br />

Credibilidade pública Grande<br />

Viabilidade técnica e financeira Pequena<br />

Auto-sustentabilidade das ações Pequena


14 CADERNOS GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA<br />

Os conjuntos de 31 cartões foram ordenados por uma amostra de 42 respondentes,<br />

constituídos por pessoas específicas, ou grupos de pessoas. A amostra de pesquisa foi<br />

constituída por mestrandos do PPGA/UFRGS, alunos do curso de Administração da<br />

UFRGS, alunos de cursos de especialização da UFRGS (especialmente de curso de<br />

especialização voltado a executivos do Banco do Brasil), bem como de pessoas ligadas<br />

ao Programa de <strong>Gestão</strong> <strong>Pública</strong> e <strong>Cidadania</strong> da <strong>FGV</strong>/SP. Para fazer o rankeamento dos<br />

31 cartões de um conjunto, os respondentes levavam cerca de 30 minutos; a tarefa era<br />

realizada com maior facilidade pelos respondentes reunidos em grupos de discussão.<br />

3.4. Resultados<br />

A partir das ordenações feitas pelos respondentes, a técnica de “análise conjunta”<br />

definiu as utilidades e importâncias dos diversos atributos; ao todo, as importâncias<br />

somam um percentual de 100%. Para o problema em foco, o sistema retornou as<br />

seguintes importâncias para os diversos critérios ou atributos de projetos de<br />

desenvolvimento inovadores:<br />

a) viabilidade técnica e financeira: 26,8%;<br />

b) impacto sobre a qualidade de vida: 25,1%;<br />

c) responsabilidade na utilização de recursos públicos: 9,7%;<br />

d) envolvimento do público-alvo: 9,7%;<br />

e) auto-sustentabilidade das mudanças: 9,1%;<br />

f) credibilidade pública: 7,0%;<br />

g) ampliação do diálogo com a sociedade civil: 3,1%;<br />

h) transferibilidade: 1,7%.


VOL. 9: AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DE ATRIBUTOS DE PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO INOVADORES 15<br />

3.5. Conclusões<br />

Viabilidade técnica e financeira<br />

26%<br />

Credibilidade pública<br />

7%<br />

A uto-sustentabilidade das<br />

m udanças<br />

9%<br />

M udança introduzida<br />

7%<br />

Im pacto sobre a qualidade de<br />

vida<br />

26%<br />

Envolvim ento do público-alvo<br />

10%<br />

Transferibilidade<br />

R esponsabilidade na utilização 2%<br />

de recursos<br />

10%<br />

Ampliação do diálogo com a<br />

sociedade civil<br />

3%<br />

Os resultados encontrados na avaliação de critérios ou atributos relevantes de projetos<br />

de desenvolvimento têm por base as opiniões da amostra de respondentes da pesquisa;<br />

por isso, contêm um viés que reflete o seu modo de ver e avaliar.<br />

De modo geral, a técnica de “análise conjunta” é utilizada para problemas envolvendo<br />

questões de vendas e marketing; todavia, o exemplo ilustra que ela também pode ser<br />

utilizada, acertadamente, na definição de alternativas em realidades do setor público.<br />

4. O QUE É INOVAÇÃO NAS EXPERIÊNCIAS DE “GESTÃO PÚBLICA<br />

E CIDADANIA” 2<br />

4.1. Considerações gerais<br />

Examinando as diferentes experiências finalistas (20) dentre as 629 inscritas no<br />

primeiro ano de atividades do Programa <strong>Gestão</strong> <strong>Pública</strong> e <strong>Cidadania</strong>, “para<br />

disseminação e premiação de inovações de governos subnacionais brasileiros” (11, p.<br />

7) coube-nos verificar se critérios teóricos definindo o que sejam inovações relevantes<br />

foram, na prática, considerados na seleção das diferentes experiências.<br />

A pergunta básica configura-se na questão “quais são os atributos de projetos,<br />

governos e iniciativas, que os tornam mais ou menos importantes e, portanto,<br />

prioritários?” Os critérios de avaliação são os referidos no item 2.4.<br />

2 O capítulo 4 foi elaborado pelo professor Roberto Costa Fachin, PPGA/UFRGS


16 CADERNOS GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA<br />

Na apresentação do livro organizado por Spink e Clemente (1997, p.7) enfatiza-se<br />

projetos que tenham demonstrado “capacidade de atender às necessidades sociais e<br />

comunitárias, independentemente da sofisticação tecnológica, do porte ou dos recursos<br />

financeiros envolvidos” e que tais projetos “apresentem mudança substancial,<br />

qualitativa ou quantitativa, com relação a práticas e estratégias anteriores”, “apontem<br />

caminhos pelos quais a experiência possa ser repetida por ... outras regiões”, “ampliem<br />

ou consolidem formas de acesso da sociedade a seus agentes públicos”, “estimulem<br />

práticas autóctones e autônomas, que se possam tornar auto-sustentáveis”.<br />

O conjunto do livro procura privilegiar projetos apresentados por 11 governos<br />

subnacionais de diferentes Estados brasileiros que contribuiram com experiências:<br />

Acre (2), Ceará (2), Minas Gerais (3), São Paulo (3), Paraná (3), Rio Grande do Sul<br />

(2), e Maranhão, Espírito Santo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Distrito Federal<br />

(1, cada um). Segue-se uma avaliação de quatro projetos.<br />

4.2. Programas Inovadores do Acre<br />

Dois dos finalistas tiveram origem no Acre: Reforma Agrária Municipalizada: pólo<br />

de produção agroflorestal de Rio Branco, relatado por Monika Grossmann; e A Casa<br />

Rosa Mulher: uma estrela na escuridão, relatado por Ana Alice Alcântara Costa. O<br />

caso do pólo de produção agroflorestal é iniciativa do governo municipal (concepção<br />

do prefeito de Rio Branco, desde o seu cargo anterior como técnico da <strong>Fundação</strong> de<br />

Tecnologia do Estado do Acre) e é ainda dependente de apoio financeiro do nível<br />

local, embora, em sua origem, tenha sido previsto auto-sustentabilidade a partir do<br />

quarto ano do assentamento. Destacam-se neste projeto o impacto na qualidade de<br />

vida do público-alvo, a implementação de mudanças no campo de reformas agrárias e<br />

a perspectiva de auto-sustentabilidade e de transferabilidade além de, aparentemente,<br />

uso adequado de recursos. Os demais itens : envolvimento do público-alvo;<br />

credibilidade pública; grau de consolidação e ampliação do diálogo com a sociedade<br />

civil e agentes públicos, não aparecem no caso. Já o caso “A Casa da Rosa Mulher:<br />

uma estrela na escuridão” caracteriza-se, como outros no livro, por dar atenção a um<br />

público cujo atendimento pelo setor governamental não tem sido privilegiado; no caso,<br />

a mulher prostituta ou sujeita à violência ou simplesmente desatendida, carente e<br />

deseducada. Nota-se vinculação entre a iniciativa da Prefeitura e estudos<br />

desenvolvidos (inclusive CPI) na Câmara Municipal de Rio Branco. Como outros


VOL. 9: AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DE ATRIBUTOS DE PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO INOVADORES 17<br />

projetos do livro, as fontes de recursos financeiras são múltiplas, desde as federais<br />

(Ministério do Bem-Estar Social) às municipais e mesmo internacionais e<br />

provenientes de organizações não-governamentais. Quebrar estereótipos ou evitar<br />

rejeição do projeto por outros segmentos da sociedade acreana, em face do foco em<br />

atendimento preferencial à mulher prostituta, também são apontados como elemento<br />

de inovação assim como o fato de ser a primeira experiência pública para as mulheres<br />

no Estado do Acre. É claramente um projeto não auto-sustentável, ao menos na atual<br />

situação, embora tenha conseguido reunir recursos para apoio a certas atividades. Os<br />

resultados são apontados como excedendo as metas previstas e evidencia-se<br />

preocupação com o uso adequado dos recursos, procurando multiplicar os valores<br />

recebidos em sistemas de parcerias ou simplesmente uso mais econômico dos recursos<br />

recebidos. Como destaque, aponta-se, ainda, o “reconhecimento da população”,<br />

principalmente da população feminina e é nesse ponto que se destaca a sua<br />

transferabilidade para outras regiões, onde contará com apoio dos movimentos<br />

organizados de mulheres.<br />

4.3. Programa de Saúde Global de Joaíma - Minas Gerais<br />

O Programa relatado por Maria do Carmo Lessa Guimarães (in Spink e Clemente,<br />

op.cit.) tem sua principal virtude em ser um projeto de atendimento de serviços<br />

essenciais à zona rural, não limitado a uma área funcional mas efetivamente<br />

englobando várias áreas - saúde, educação, agricultura, serviços civis (documentais,<br />

lazer, higiene pessoal e beleza) - e tudo em forma concentrada de atuação. A inovação<br />

é efetivamente a de buscar uma forma de atendimento diferente - concentrado, num<br />

dia determinado, em determinado povoado rural. - e não a clássica proposição de<br />

criar serviços permanentes em cada região necessitada, muitas vezes sem condição de<br />

manter-se em adequado nível. Outra característica que identificamos foi a de<br />

conseguir a colaboração “voluntária” de profissionais especializados e de<br />

equipamentos disponíveis (escolas municipais, casas de fazenda) nas regiões visitadas.<br />

Preocupação com o planejamento de cada evento (após cada evento, é programado o<br />

seguinte), com decisões coletivas sobre o local de cada evento e tarefas a serem<br />

distribuídas são também visíveis, embora não se tenha evidenciado preocupação com<br />

registro de dados colhidos em cada evento (questões de saúde, por exemplo) para<br />

auxiliar no planejamento epidemiológico das ações preventivas de saúde. Não há no


18 CADERNOS GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA<br />

entanto uma clara contabilização de custos, embora haja contribuição de vários<br />

parceiros de outros níveis organizacionais (Emater, Secretaria de Estado de Trabalho e<br />

Ação Social), nem tampouco de equipe permanente de coordenação do programa. Os<br />

eventos parecem suceder-se em razão de interesses voluntários, organizados<br />

livremente, não havendo sistematizações burocráticas.<br />

4.4. Programa Médico de Família de Londrina - Paraná<br />

A experiência relatada por Clarice Melamed (in Spink e Clemente, op. cit) também se<br />

concentra na zona rural, como etapa inicial de implantação (cinco distritos) e<br />

caracteriza-se por diferentes aspectos: ter iniciado o Programa (Médico de Familia -<br />

PMF) antes que houvesse qualquer normatividade, em âmbito nacional, por parte do<br />

Ministério da Saúde, ainda que hoje ele exista em diferentes comunidades do país,<br />

nem sempre, no relato da autora, com a mesma qualidade e efeitos. Efetivamente, é<br />

um programa que modifica fundamentalmente a forma de atuação do setor saúde, na<br />

perspectiva da proposta do novo sistema de saúde nacional (Sistema Único de Saúde -<br />

SUS) que existe na legislação mas nem sempre apresenta resultados concretos na<br />

prática. “Pretende atingir todos os indivíduos da comunidade, sem exceção. Procura<br />

incentivar a prevenção, ao invés de tratar apenas da doença. Em vez de o indivíduo<br />

procurar o programa é o programa que procura o indivíduo, por meio de visitas e<br />

cadastramento.” (p. 139). É, assim, um projeto que se conforma ao critério de grau de<br />

mudança introduzido, em relação a práticas anteriores. Aspectos dessa mudança<br />

podem ser visualizados na: efetiva interiorização da assistência de saúde, com a<br />

contratação e residência de equipe multidisciplinar no distrito rural atendido; padrões<br />

salariais aparentemente adequados a regime de dedicação exclusiva do pessoal<br />

envolvido; participação da população adscrita ao distrito, via conselhos locais de<br />

saúde (o relato menciona reunião com mais de 100 participantes na discussão da<br />

contratação ou não de um odontólogo). O relato também acentua mudanças no perfil<br />

da população atendida, com a “queda vertiginosa da mortalidade infantil, em apenas<br />

um ano (de 1994 para 1995), de 35,1 por mil nascidos vivos para 3,7 por mil nas áreas<br />

onde o PMF foi instalado” (p.141) e menciona existência de registros quantitativos<br />

(aumento do número de consultas, da cobertura vacinal, do número de visitas<br />

domiciliares (antes praticamente inexistente). Menção é feita à “autonomia dada às<br />

equipes no planejamento das ações a serem desenvolvidas” (p.138) o que diferencia,


VOL. 9: AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DE ATRIBUTOS DE PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO INOVADORES 19<br />

qualitativamente, o Programa de outros existentes na área pública, onde a<br />

normatização centralizadora limita a capacidade das equipes de trabalho de decidirem<br />

o seu caminho; o preceito é coerente com o núcleo central do Programa - atendimento<br />

das populações rurais segundo as necessidades identificadas no perfil epidemiológico<br />

e em articulação com a população local. Assim, dos diferentes critérios ou atributos<br />

relevantes, identificados como base para esta análise, o PMF encontra quase todos<br />

atendidos: a) grau de mudança introduzido (já discutido acima); b) grau de impacto na<br />

qualidade de vida do público-alvo (idem); c) grau de transferibilidade (o relato indica<br />

que o programa é transferível mas não indiscriminadamente para todo e qualquer tipo<br />

de região populacional, sendo mais adequado a regiões de população esparsa como a<br />

de zonas rurais); d) grau de diálogo com a sociedade civil (atendido pelas próprias<br />

características do Programa, mas com um certo ceticismo na permanência do<br />

Programa, como concebido, em caso de mudança provocada por episódios eleitorais<br />

subseqüentes); e) grau de responsabilidade na utilização de recursos e oportunidades,<br />

inclusive em termos de organização e planejamento das várias etapas e ações do<br />

projeto (já discutido acima); f) nível de abrangência e envolvimento do público-alvo<br />

alcançado (já discutido acima, embora o grau de envolvimento - a julgar-se pelo<br />

ceticismo apontado acima - ainda não seja a ponto de alcançar sua plena<br />

institucionalização; g) grau de credibilidade pública alcançado (discussão que<br />

entendemos muito relacionada com a feita acima nos itens d e f ; h) viabilidade técnica<br />

e financeira do projeto e i) grau de auto-sustentabilidade: duas condições parecem<br />

estar presentes - substancial esquema de sustentação financeira a partir de recursos da<br />

União mas também significativo envolvimento de recursos da Prefeitura Municipal<br />

(14% do orçamento em saúde, dos quais 1,4% no PMF); não há aparentemente<br />

receios à sustentabilidade do projeto, nos padrões atuais; não foi feita, porém, projeção<br />

de problemas eventualmente oriundos de uma ampliação do Programa a maior número<br />

de distritos e eventuais reações dos prestadores de serviços privados a um quadro de<br />

efetiva mudança no modelo assistencial existente.<br />

O breve exame de quatro projetos entre os finalistas das experiências inscritas no<br />

primeiro ano do projeto “<strong>Gestão</strong> <strong>Pública</strong> e <strong>Cidadania</strong>” se alguma coisa pode indicar,<br />

como caráter geral, são as seguintes: as origens das iniciativas inovadoras surgem de<br />

diferentes setores ou pessoas - ora originam-se no próprio Executivo, ora no pessoal<br />

de nível técnico, ora não é claramente identificável o porquê da iniciativa; as quatro


20 CADERNOS GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA<br />

experiências têm como característica buscar atingir - com serviços públicos - clientelas<br />

normalmente não alcançadas pelos programas tradicionalmente desenvolvidos pelas<br />

administrações públicas; as quatro experiências apresentam alguma característica de<br />

envolvimento da comunidade. A parte que aparentemente é menos desenvolvida em<br />

todas elas é a relativa à sua sustentabilidade técnico-financeira e aos instrumentos de<br />

avaliação: embora haja esforço, na maioria dos casos, de desenvolver registros<br />

quantitativos dos efeitos do projeto, e haver geralmente multi-envolvimento de fontes<br />

na sustentação financeira dos projetos, todos eles, aparentemente podem sofrer, na sua<br />

evolução, com mudanças do quadro político. Este ainda parece ser o maior problema<br />

das inovações estudadas.<br />

5. APRECIAÇÃO CRÍTICA DE PROGRAMAS INOVADORES<br />

MUNICIPAIS3 5.1. Considerações gerais<br />

Os 629 projetos inscritos no 1 o . Ciclo de Premiação do Programa de <strong>Gestão</strong> <strong>Pública</strong> e<br />

<strong>Cidadania</strong>, realizado em 1996, foram classificados em cinco categorias: Administração<br />

e Governo, Infra-Estrutura e Meio-Ambiente, Serviços Públicos, <strong>Cidadania</strong> e Direitos<br />

Humanos e por fim, Desenvolvimento Econômico e Social.<br />

Dos 20 projetos premiados, é digno de nota que 18 pertenciam à esfera local e estavam<br />

sob a gerência de administrações municipais. Para a análise apresentada a seguir,<br />

foram selecionados projetos premiados pertencentes à esfera local. Dentre estes foram<br />

escolhidos quatro, dos quais dois na área de Desenvolvimento Econômico e Social e<br />

dois na área de <strong>Cidadania</strong> e Direitos Humanos. São os seguintes os projetos a seguir<br />

examinados:<br />

1. Programa Municipal de Informação ao Consumidor da Secretaria Municipal de<br />

Agropecuária e Abastecimento da Prefeitura de Juiz de Fora – Minas Gerais.<br />

2. Meninas de Santos: Política de Assistência Social como Inclusão Social<br />

3. Programa de Geração de Emprego e Renda de Quixadá – Ceará<br />

4. Centrais de Abastecimento de Campinas S/A CEASA/Campinas<br />

Os critérios utilizados para a análise constam no item 2.4.<br />

É importante mencionar que o caráter muito recente de grande parte das iniciativas<br />

inscritas dificulta, pelo menos através do único instrumento disponível - os relatórios<br />

3 A análise do capítulo 5 foi elaborada pela professora Zilá Mesquita, do PPGA/UFRGS.


VOL. 9: AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DE ATRIBUTOS DE PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO INOVADORES 21<br />

apreciativos - a análise da medida de cada um destes critérios, ou seja, do grau em que<br />

cada um foi alcançado ou não. Por via de conseqüência, este é um elemento que limita<br />

em grande parte esta interpretação dos resultados.<br />

5.2. Programa Municipal de Informação ao Consumidor da Secretaria Municipal de<br />

Agropecuária e Abastecimento da Prefeitura de Juiz de Fora – Minas Gerais.<br />

De acordo com o relatório do Programa elaborado por Veiga (in Spink e Clemente,<br />

1997), o seu principal objetivo é: “fornecer aos moradores do município alguns dos<br />

instrumentos necessários para que exercitem mais amplamente seus direitos enquanto<br />

cidadãos”. Esse é um aspecto digno de nota por relacionar-se com o primeiro critério,<br />

na medida em que busca sublinhar o direito à informação, e a sua democratização,<br />

talvez um dos direitos humanos emergentes neste fim de século e de milênio.<br />

Porém, além disso, considerando as enormes desigualdades de renda que ainda<br />

grassam em nosso país, disponibilizar informações que facilitem o acesso a<br />

componentes menos dispendiosos, sobretudo da cesta básica, é meritório. Se bem<br />

implementado, pode vir a ser um novo modo de oferta de serviço público e, quem<br />

sabe, com a possibilidade de alterar hábitos de consumo na população usuária deste<br />

serviço, uma vez que, além de pesquisa de preço, ele visa também a fornecer<br />

informações nutricionais sobre os alimentos e receitas alternativas e dietéticas.<br />

Do ponto de vista metodológico, talvez o aspecto que merece ser ressaltado em<br />

primeiro lugar é o que se relaciona ao 5º critério, no que respeita à responsabilidade na<br />

utilização de recursos e oportunidades, inclusive em termos de organização e<br />

planejamento das várias etapas e ações do projeto. Com efeito, o Programa foi<br />

concebido para ser implementado em seis fases, nas quais, tudo indica, se buscou uma<br />

implantação paulatina em termos de área geográfica no município. Assim. ela se deu<br />

inicialmente na área central, de tal forma que à medida que a experiência fosse se<br />

corporificando, seria estendida, na 6ª fase, aos bairros. Essa, inclusive, estava na<br />

dependência da disponibilidade de recursos para aquisição de equipamentos a serem<br />

localizados nos bairros.<br />

Ainda no que respeita a este critério, o relatório aponta que “o monitoramento<br />

constante tem permitido a superação de pontos de estrangulamentos” e que “o<br />

entusiasmo e a dedicação de todos são visíveis e impressionam muito”.


22 CADERNOS GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA<br />

No que respeita à responsabilidade especificamente no uso de recursos, verifica-se que<br />

este critério se alia ao 8º, que diz respeito à viabilidade técnica e financeira do<br />

programa. O relatório ressalta que o custo do projeto é relativamente pequeno pois, em<br />

1996, o programa despendera R$ 45.513,00 (quarenta e cinco mil quinhentos e vinte<br />

reais) entre despesas de capital e consumo. Sublinhe-se que todo o trabalho é realizado<br />

com apenas 19 funcionários. Além disso, das seis fases previstas, cinco foram<br />

implementadas em um ano e meio a partir do início da realização do Programa. Este<br />

critério de avaliação – responsabilidade no uso de recursos e oportunidades - aliado ao<br />

de viabilidade técnica e financeira constituem, ao que tudo indica, os pontos fortes do<br />

Programa, do ponto de vista instrumental. Do ponto de vista substantivo, referente a<br />

seus fins, não restam dúvidas sobre o mérito de tentar promover a consciência dos<br />

direitos de cidadania, embora se deva ter bem claras as distinções entre cidadão e<br />

consumidor.<br />

Quanto ao 7º critério, referente à credibilidade pública alcançada, especialmente em<br />

termos de importância interna atribuída ao Programa, bem como da capacidade de<br />

oferecer pronta resposta a demandas do público-alvo, há duas considerações.<br />

Primeiro, é difícil averiguar a credibilidade pública alcançada através da importância<br />

interna atribuída ao Programa, uma vez que este se destina basicamente ao público<br />

externo, além do que não há no relatório maiores referências à credibilidade interna, o<br />

que torna inexeqüível a sua averiguação. Registre-se, porém, a afirmação do<br />

Secretário de Abastecimento de que a agilidade na obtenção da lista de preços estaria<br />

facilitando as licitações. Segundo: parece haver capacidade de oferecer pronta<br />

resposta, porém poucos elementos se tem sobre as demandas do público, até porque o<br />

Programa ainda se encontrava restrito aos usuários da área central, e não havia<br />

alcançado a 6ª etapa, quando, talvez a responsividade do público poderia ser melhor<br />

averiguada. Contudo já houve menção de aumento no número de empresas que<br />

passaram a fornecer cesta básica a seus funcionários por consulta à lista de preços.<br />

Este aspecto, aliado à ampliação de consultas por parte de associações comunitárias,<br />

escolas e associações de donas de casa, poderiam ser um indicador de efetividade do<br />

6º critério: abrangência e envolvimento do público-alvo, ainda que seja impossível<br />

averiguar, com os elementos disponíveis, em que grau isto ocorre.


VOL. 9: AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DE ATRIBUTOS DE PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO INOVADORES 23<br />

Do ponto de vista da sustentabilidade, parece ser um Programa que se sustenta apenas<br />

com recursos financeiros da Prefeitura. Ao se referir eventualmente a parcerias, não há<br />

indicações de que estas se realizem por contribuições financeiras. Antes, as parcerias<br />

parecem estar se efetivando em termos de intercâmbio de informações entre usuários e<br />

administradores do Programa.<br />

Quanto à transferibilidade do Programa, o relatório, referindo-se à sua origem,<br />

menciona que o mesmo se inspirou no “Disque Economia” desenvolvido em Curitiba,<br />

o qual porém se limita ao acesso telefônico. Ora, esta é apenas a primeira etapa do<br />

Programa de Juiz de Fora que o desenvolveu a partir daí. Acredita-se, por este motivo,<br />

que a experiência teria chances de se disseminar e adaptar-se a outras realidades<br />

locais, como preconiza o 8º critério, referente à transferibilidade da experiência.<br />

5.3. Meninas de Santos: Política de Assistência Social como Inclusão Social<br />

Segundo o relatório gerado por Reis(in Spink e Clemente, op.cit) o projeto “Meninas<br />

de Santos” é um trabalho promovido pela administração do município de Santos, no<br />

Estado de São Paulo e coordenado pela Secretaria de Ação Comunitária em parceria<br />

com as Secretarias de Educação, Saúde e Cultura. Destinado a atender crianças e<br />

adolescentes do sexo feminino, vítimas de exploração sexual ou que se encontram em<br />

situações de risco de prostituição, o trabalho é desenvolvido por onze pessoas<br />

compreendendo educadores, estagiários, uma manicura, dois cabeleireiros, um<br />

professor de teatro e um coordenador de nível superior.<br />

Tudo inicia por um trabalho de campo noturno das educadoras buscando uma<br />

aproximação das adolescentes na própria zona de prostituição, em boates, motéis e nas<br />

ruas. Nestas ocasiões as meninas encontram-se freqüentemente trabalhando drogadas.<br />

Durante o dia as educadoras retornam ao local para uma aproximação fora do horário<br />

de trabalho, quando as meninas não se encontram sob o efeito das drogas.<br />

Outro objetivo geral do Projeto é atender problemas relacionados a conflitos<br />

psíquicos, violência doméstica, discriminação, relacionamento amoroso, questões de<br />

saúde e trabalho. A freqüência às atividades do projeto pela menina enseja uma<br />

aproximação de sua família pelo educador que busca não só um maior conhecimento<br />

de sua história de vida, como evitar o rompimento ou reatar vínculos familiares. A<br />

premissa de que apenas a valorização da auto-estima permite trabalhar mais


24 CADERNOS GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA<br />

diretamente questões relacionadas à cidadania e direitos sociais embasa a estruturação<br />

do Projeto. Esse compreende oficinas voltadas ao exercício da auto-estima como as de<br />

beleza, teatro e artes plásticas. A iniciação ao trabalho através de cursos<br />

profissionalizantes é proporcionada pela “Escola Experimental Geração 2001” onde<br />

são atendidas crianças e adolescentes em situação de risco social. Aí se abrem<br />

possibilidades de freqüência a outras oficinas, como as de capoeira, serigrafia, pintura,<br />

escultura, balet e esportes. Além dessas, funciona no local do Projeto também uma de<br />

sexualidade, com vistas ao conhecimento do próprio corpo e seu funcionamento.<br />

A partir deste breve resumo, vejamos quais dos nove critérios parecem estar sendo<br />

contemplados no Projeto sob análise. O ponto forte do mesmo, parece não haver<br />

dúvida, reside no 2º critério que diz respeito ao impacto sobre a qualidade de vida do<br />

público-alvo, ou seja: sobre as adolescentes em situação de exploração sexual ou de<br />

risco de prostituição. Os resultados alcançados em um ano demonstram que o<br />

atendimento ao público-alvo dobrou neste período, além do que, das meninas<br />

matriculadas na escola, o aproveitamento passou de 16% para 84%. Neste sentido,<br />

configura-se como primordial o 6º critério, isto é: a habilidade em promover<br />

estratégias para o envolvimento do público-alvo, que são as meninas, nas atividades<br />

do Projeto.<br />

Entretanto o verdadeiro teste para a eficácia do Projeto refere-se ao 1º critério, ou seja:<br />

à mudança introduzida em relação a práticas anteriores. Como ressalta Reis em seu<br />

relatório, quando passam a freqüentar com regularidade o ambiente do projeto, após<br />

algum tempo as meninas deixam de se prostituir, abandonando em geral,<br />

concomitantemente, o uso de drogas.<br />

O 4º critério emerge também da leitura do relatório, ainda que seja impossível<br />

quantificá-lo através deste instrumento. Trata-se da consolidação e ampliação do<br />

diálogo com a sociedade civil e agentes públicos. A campanha desenvolvida pela<br />

Prefeitura: “Seja um anjo da guarda” e lançada em parceria com o Ministério Público,<br />

Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente, <strong>Fundação</strong> ABRINQ,<br />

Rádio e TV Tribuna busca, junto a empresários, oportunidades de inserção de<br />

adolescentes no mercado de trabalho. Desde então ampliaram-se as parcerias, citandose<br />

ações desenvolvidas junto a vários Conselhos municipais como o Conselho dos<br />

Direitos da <strong>Cidadania</strong> e o Conselho Tutelar da Criança e do Adolescente, além de uma<br />

contribuição anual da UNICEF.


VOL. 9: AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DE ATRIBUTOS DE PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO INOVADORES 25<br />

No que respeita ainda a este critério, um aspecto sublinhado é a participação dos meios<br />

de comunicação que oferecem o serviço de divulgação do trabalho. Este parece se<br />

constituir também em um indicador indireto do 7º critério no que concerne à<br />

credibilidade pública, na medida em que os meios de comunicação social podem<br />

contribuir para a informação e formação da opinião pública.<br />

Quanto ao 5º critério, que remete à organização e planejamento do Projeto, as<br />

informações concernentes ao universo do público-alvo ainda eram desconhecidas.<br />

Havia também carência de uma avaliação qualitativa sobre as causas dos 39,3% do<br />

público-alvo que abandonara o projeto. Talvez a organização de um banco de dados<br />

para acompanhamento dos vários aspectos do Projeto pudesse dirimir ou auxiliar a<br />

contornar tais deficiências sobre a parte documental, visando não só ao registro puro e<br />

simples, mas ainda a subsidiar uma visão de conjunto sobre os aspectos mais<br />

vulneráveis e necessitados de atenção. Dentre esses, a ampliação do atendimento<br />

sistemático ao serviço de apoio psicológico parece se configurar como uma das<br />

prioridades.<br />

Contudo, é importante ressaltar que as ações integradas entre diversas secretarias<br />

municipais reuniu esforços em torno de um objetivo comum, o que sem dúvida é um<br />

passo importante no sentido de desenvolver eficiência no setor público. Isto<br />

certamente contribuirá para reforçar o 7º critério –a credibilidade pública no que<br />

respeita à importância interna destas ações conjugadas, principalmente se elas<br />

conseguirem desenvolver a capacidade de oferecer uma pronta resposta.<br />

Ainda que o relatório nada mencione quanto ao 3º critério: transferibilidade para<br />

outras áreas, administrações e regiões, crê-se na possibilidade de desenvolver ações<br />

semelhantes onde o problema se apresentar e houver necessidade das mesmas.<br />

Contudo é importante sublinhar a importância de ressalvar as peculiaridades das<br />

culturas locais e, sobretudo, de que seja mantida a filosofia norteadora destas ações.<br />

5.4. Programa de Geração de Emprego e Renda de Quixadá – Ceará<br />

A principal característica deste Programa é a de buscar soluções para um problema – o<br />

desemprego - que tem se exacerbado na realidade contemporânea de vários países,<br />

mesmo aqueles considerados em um patamar de desenvolvimento mais elevado. A<br />

questão se agrava quando ele se apresenta em uma das áreas geográficas das mais


26 CADERNOS GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA<br />

carentes do país, onde as discrepâncias na distribuição de renda são tão acentuadas.<br />

Quixadá, município situado no sertão central do Estado do Ceará, tem ao redor de 70<br />

000 habitantes, dos quais 70% vivem em sua área urbana. O município centraliza<br />

atividades de confecção, ainda que desorganizadamente, de acordo com o relatório de<br />

Vaz e Bargieri (in Spink e Clemente, op. cit), e funciona também como centro<br />

comercial em sua região.<br />

Através de uma pesquisa-diagnóstico foi detectado o desemprego como principal<br />

problema preocupando a população. Tal fato demonstra a busca de diálogo com a<br />

sociedade civil, inerente ao 4º critério. Foi a referida pesquisa que deu origem ao<br />

Programa de Geração de Emprego e Renda para camadas sociais de baixa renda sob a<br />

incumbência da Secretaria Municipal do Trabalho e Ação Social. Ele compreende, em<br />

suma, cinco áreas de atuação: 1 - crédito popular para expansão de pequenos negócios; 2<br />

- apoio e acompanhamento de iniciativas individuais em pequenos negócios; 3 –<br />

formação de cooperativas e associações (estímulo e apoio técnico e jurídico); 4 –<br />

capacitação de mão de obra especializada e 5 – regularização do setor informal da<br />

economia.<br />

A estratégia utilizada para a capacitação de mão de obra especializada foi a busca e<br />

constituição de quatro parcerias com ONGs e organismos como o SEBRAE e o SINE.<br />

Este fato caracteriza a ampliação do diálogo com a sociedade civil e agentes públicos,<br />

elemento constituinte do 4º critério. Ademais, o estabelecimento de convênio com o<br />

SINE abriu a possibilidade de acesso a crédito com o Banco do Nordeste do Brasil,<br />

cuja decisão fundamentou-se na avaliação do 5º critério: responsabilidade no uso de<br />

recursos e oportunidades, e possivelmente também do 7º, a saber: credibilidade<br />

pública, enquanto capacidade de oferecer pronta resposta.<br />

Contudo, além desta estratégia externa, internamente o Programa se articula com<br />

outras iniciativas da Prefeitura, como as seguintes: “Crescer com <strong>Cidadania</strong>” - a<br />

assistência a meninos de rua em situação de fome, incluindo escola, lazer, esporte e<br />

cultura e um programa de profissionalização com geração de renda; “Mutirão” -<br />

cursos profissionalizantes em construção civil e “Hora de Plantar” – aluguel de trator a<br />

pequenos proprietários rurais cujo pagamento, em gêneros produzidos, é destinado à<br />

merenda escolar. Também se incentiva o associativismo. Tais ações deixam<br />

transparecer o 7º critério, referente à credibilidade pública e a capacidade de oferecer<br />

pronta resposta.


VOL. 9: AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DE ATRIBUTOS DE PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO INOVADORES 27<br />

Enfim o relatório aponta para mudanças na cultura política, superando tradicionais<br />

práticas políticas de cunho paternalista e clientelista, o que nos remete ao 1º critério:<br />

introdução de mudanças qualitativas na relação Estado-Sociedade. Em termos<br />

quantitativos, pode-se depreender que também houve ganhos atribuíveis ao 1º critério.<br />

Uma pesquisa realizada pelo SINE indicou redução da taxa de desemprego aberto de<br />

14,61% em 1992 para 8,37% em 1994 e para 7,18% em 1995, absorvendo integrantes<br />

do mercado informal. Este, assim como os quantitativos de financiamento de<br />

pequenos negócios e de capacitação profissional, poderiam ser encarados a priori, e<br />

sujeitos a verificações mais aprofundadas, como um indicador indireto do 2º critério:<br />

impacto na qualidade de vida do público-alvo.<br />

A participação intensa da comunidade, tal como o relatório refere, remete-nos ao 4º<br />

critério, ou seja: a inferir que tem havido uma consolidação e ampliação do diálogo<br />

com a sociedade civil.<br />

5.5. Centrais de Abastecimento de Campinas S/A CEASA/Campinas<br />

O abastecimento em gêneros alimentícios no país é uma questão paradoxal. Em que<br />

pese a sua dimensão continental, que seria uma vantagem em matéria de produção de<br />

alimentos, os numerosos problemas sociais estrutural e conjunturalmente não<br />

resolvidos, aliados a um processo de urbanização que se deu com grande velocidade<br />

nas três últimas décadas, ganham visibilidade maior nas grandes cidades.<br />

A cidade de Campinas é uma capital regional de importância no Estado de São Paulo<br />

que se enquadra nesta problemática. A administração municipal 93-96 decidiu assumir<br />

a gestão das Centrais de Abastecimento de Campinas - CEASA/Campinas – como<br />

campo de aplicação de uma Política Municipal de Abastecimento consubstancida na<br />

implementação de Programas de Abastecimento Alimentar, com fortes repercussões<br />

na Política de Desenvolvimento Econômico.<br />

O aspecto que logo ressalta aos olhos na leitura do relatório de Salgado (in Spink e<br />

Clemente, op. cit) refere-se ao 9º critério, isto é, a sua auto-sustentabilidade, de acordo<br />

não apenas com o primeiro de seus objetivos: criar instrumentos e implementar<br />

procedimentos que permitam a auto-sustentação da Empresa, como nas ações<br />

viabilizadas tanto para o setor varejo, quanto para o setor atacadista. Além disso, atua


28 CADERNOS GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA<br />

também na área social, implantando mecanismos favorecedores do abastecimento da<br />

população menos aquinhoada e criando programas emergenciais para suprir carências.<br />

Neste sentido, programas sociais como o Pão e Leite nos terminais de ônibus e o ISA -<br />

Instituto de Solidariedade para Programas de Alimentação - são parceiros da CEASA,<br />

juntamente com o Instituto de Tecnologia de Alimentos – ITAL, a <strong>Fundação</strong> D<br />

Paschoal, a Abrasso/Credicard, o Sindicato e a Associação dos Permissionários da<br />

CEASA. O amplo espectro de parcerias bem atesta a abrangência e envolvimento do<br />

público-alvo, como propugna o 6º critério.<br />

O impacto na qualidade de vida (critério 2) dos menos favorecidos é proporcionado<br />

pela instalação do Centro de Processamentos e Cozinha Industrial (com capacidade<br />

produtiva de 500 kg/dia), que aproveita os excedentes de comercialização antes<br />

desperdiçados, complementando a alimentação de 600 famílias e fornecendo<br />

alimentos processados a 100 entidades cadastradas. Dados quantitativos relacionados<br />

ao aumento de alimentos comercializados e à ampliação em 53% da área construída<br />

também podem ser considerados como indicadores indiretos de melhoria na qualidade<br />

de vida. É de se ressaltar que sete das dez metas principais do plano Plurianual 1994-<br />

97 foram realizadas, revelando responsabilidade no uso de recursos, além de<br />

organização e planejamento, como preconiza o 5º critério. Referenda-o ainda, o fato<br />

de que algumas iniciativas não previstas foram incluídas, tais como: o Instituto de<br />

Solidariedade para Programas de Alimentação - ISA - o Programa Pão e Leite e o<br />

Programa de Aproveitamento de Lixo.<br />

As parcerias, ao permitirem esses investimentos através do pagamento de aluguel pelos<br />

permissionários e pela cobrança de condomínio, atestam a presença do 8º critério: a<br />

viabilidade técnica e financeira do Programa e da empresa CEASA. Ainda em termos de<br />

resultados, a expansão dos negócios e da CEASA elevou de 300 para 1300 o número de<br />

permissionários, o que se coaduna não só com o 8º, mas também com o 9º critério: a<br />

auto-sustentabilidade. Também na área social as parcerias se viabilizaram de forma<br />

intersetorializada através do Projeto Sopão e do Programa Pão e Leite.<br />

Para finalizar, a impressão que se tem da leitura do relatório desta experiência de<br />

gestão pública exitosa é que se inverteu a arcaica relação Estado-Sociedade que ainda<br />

perdura no Brasil. Neste caso, ao invés de se socializar os custos e prejuízos de<br />

organismos privados inoperantes, com toda a sociedade encampando-os pelo governo,


VOL. 9: AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DE ATRIBUTOS DE PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO INOVADORES 29<br />

e privatizando lucros de organizações públicas eficazes, as evidências levam a crer que<br />

se inverteu o processo: houve partilha de custos com o setor privado e uma<br />

socialização dos lucros, com possibilidades de favorecer os menos afortunados.


30 CADERNOS GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA<br />

BIBLIOGRAFIA<br />

1. CARAVANTES, Geraldo R. & CAIDEN, Gerald E. Reconsideração do conceito de<br />

desenvolvimento. Caxias do Sul: EDUCS, 1988.<br />

2. FIGUEIREDO, Rubens & LAMOUNIER, Bolivar. As cidades que dão certo: experiências<br />

inovadoras na administração pública brasileira. Brasília: MH Comunicação, 1996.<br />

3. CHURCHILL Jr., Gilbert A. Marketing Research: metodological foundations. EUA: the<br />

Dryden Press, 1995.<br />

4. FREITAS, Maria Esther. Cultura organizacional: formação, tipologias e impacto. São<br />

Paulo: Makron e McGraw-Hill. 1991. 140p.<br />

5. HAIR Jr., Joseph F. et allii. Multivariate Data Analysis. New Jersey (EUA): Prentice Hall,<br />

1995.<br />

6. HAMEL, G. & PRAHALAD, C.K. Competindo pelo futuro: estratégias inovadoras para<br />

obter o controle do seu setor e criar mercados de amanhã. Rio de Janeiro: Campus, 1995.<br />

7. KLERING, LUIS ROQUE. Relação entre estágios de informatização e padrões de<br />

comportamento administrativo em organizações brasileiras. São Paulo, Faculdade de<br />

Economia, Administração e Contabilidade, 1994 (tese de doutorado).<br />

8. SCHEIN, Edgar. Coming to a new awareness of organizational culture. Sloan<br />

Management Review, Winter 1984.<br />

9. SEN, A. O desenvolvimento como expansão de capacidade. In: Revista Lua Nova. No. 28.<br />

São Paulo, CEDEC, 1993.<br />

10. SOUTO, A.L.S. et allii. Como reconhecer um bom governo? o papel das Administrações<br />

municipais na melhoria da qualidade de vida. São Paulo: Pólis, 1995.<br />

11. SPINK, PETER & CLEMENTE, ROBERTA (cord.). 20 Experiências de <strong>Gestão</strong> <strong>Pública</strong><br />

e <strong>Cidadania</strong>. Rio de Janeiro: <strong>FGV</strong>, 1997.


VOL. 9: AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DE ATRIBUTOS DE PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO INOVADORES 31<br />

CADERNOS GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA<br />

O Programa <strong>Gestão</strong> <strong>Pública</strong> e <strong>Cidadania</strong> é uma iniciativa conjunta da <strong>Fundação</strong> Getúlio Vargas e da <strong>Fundação</strong><br />

Ford foi implantado em 1996 com o objetivo de premiar e disseminar iniciativas inovadoras de governos<br />

subnacionais.<br />

Além dos <strong>Cadernos</strong> <strong>Gestão</strong> <strong>Pública</strong> e <strong>Cidadania</strong> o Programa publica outros estudos, pesquisas e livros. A lista<br />

completa das publicações pode ser acessada no site: http://inovando.fgvsp.br.<br />

Os <strong>Cadernos</strong> <strong>Gestão</strong> <strong>Pública</strong> e <strong>Cidadania</strong> são uma coleção de estudos e pesquisas no campo da administração e<br />

da gestão pública. Os estudos discutem aspectos teóricos e práticos de experiências inovadoras em gestão<br />

pública e objetivam contribuir para a disseminação de informações e para o avanço da discussão acerca das<br />

possibilidades de inovação na prática da gestão pública.<br />

Os autores são pesquisadores, membros do Programa, professores universitários e outros envolvidos no estudo<br />

da gestão pública.<br />

Números anteriores<br />

Vol. 1 A Administração <strong>Pública</strong> Brasileira Inovando a Forma de Governar: apresentação dos 629<br />

programas inscritos no Ciclo de Premiação de 1996.<br />

Ricardo Vasquez Beltrão (Org.) 1997.<br />

Vol. 2 Criação do Capital Social: o caso da ASMARE.<br />

Pedro Jacobi e Marco A.Teixeira.1997.<br />

Vol. 3 Desafio e Inovação em Políticas <strong>Pública</strong>s: programas para crianças e adolescentes em<br />

situação de risco.<br />

Laura Veiga, Bruno L.Diniz Costa e Carla B.Ladeira Carneiro. 1997.<br />

Vol. 4 Governo Local e Novas Formas de Provisão e <strong>Gestão</strong> de Serviços Públicos no Brasil.<br />

Marta Ferreira Santos Farah.1997.<br />

Vol. 5 <strong>Gestão</strong> <strong>Pública</strong> em Busca de <strong>Cidadania</strong>: Experiências de Inovação em Salvador.<br />

José Antônio Gomes Pinho, Mercejane W.Santana e Sônia M. B.Cerqueira 1997.<br />

Vol. 6 Estudo Comparativo de Resultados Alcançados por Programas na Área de Saúde.<br />

Humberto Marques Filho.1997.<br />

Vol. 7 <strong>Gestão</strong> <strong>Pública</strong> e <strong>Cidadania</strong>: Metodologias Participativas em ação.<br />

Fernando Guilherme Tenório e Jacob E. Rozemberg. 1997.<br />

Vol. 8 A Administração <strong>Pública</strong> Brasileira Inovando a Forma de Governar : apresentação dos 297<br />

programas inscritos no ciclo de premiação de 1997.<br />

Ricardo Ernesto Vasquez Beltrão (org.)1998.


GESTÃO PÚBLICA E CIDADANIA<br />

Escola de Administração de Empresas de São Paulo da <strong>Fundação</strong> Getulio Vargas<br />

Av. 9 de Julho, 2029 - 11º andar<br />

São Paulo – SP – CEP 01313-902<br />

Tel.: (11) 3281-7904/3281-7905 – Fax: (11) 3287-5095<br />

e-mail: inovando@fgvsp.br – home-page: http://inovando.fgvsp.br

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