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uma leitura performática de Memórias Póstumas de Brás Cubas

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leitor romântico, acost<strong>uma</strong>do com a linearida<strong>de</strong> das exposições <strong>de</strong> peripécias<br />

seqüenciadas, e certamente irritado com o estilo digressivo das <strong>Memórias</strong>. Essa <strong>leitura</strong><br />

<strong>de</strong>ve ser modificada para que se possa ler esse novo relato, mais galante e invulgar. Mas<br />

a polarização <strong>de</strong>sse leitor, também não é o leitor realista. Os fatos narrados são<br />

inverossímeis e a exposição, ao contrário do estilo <strong>de</strong> Eça <strong>de</strong> Queirós, dar-se-á<br />

s<strong>uma</strong>riamente: Mas se lhe disser que foi menos a pneumonia, do que <strong>uma</strong> idéia<br />

grandiosa e útil, a causa da minha morte, é possível que o leitor não creia, e todavia é<br />

verda<strong>de</strong>. Vou expor-lhe s<strong>uma</strong>riamente o caso. Julgue-o por si mesmo. Assis, (1962, p.<br />

512).<br />

O leitor cético do realismo é cinicamente convidado a estabelecer o pacto da<br />

ficção com <strong>uma</strong> narrativa que terá como foco a fantasia ditatorial. E o narrador não se<br />

compromete com longas explicações para que o leitor seja documentariamente<br />

convencido. A exposição é sumária. Portanto, a primeira relação estabelecida é com o<br />

leitor não grave, aquele que aceita a literatura como <strong>uma</strong> experiência lúdica.<br />

A próxima intervenção solicitada ao leitor é a <strong>de</strong> juiz. <strong>Brás</strong> <strong>Cubas</strong> o convoca<br />

para escolher entre a percepção <strong>de</strong> um cônego sobre a “se<strong>de</strong> <strong>de</strong> nomeada” e a <strong>de</strong> um<br />

militar. O primeiro, dissimuladamente, orienta a <strong>leitura</strong> para <strong>uma</strong> percepção realmente<br />

cristã da experiência h<strong>uma</strong>na que <strong>de</strong>ve ser disciplinada no sentido <strong>de</strong> “aliviar a nossa<br />

melancólica h<strong>uma</strong>nida<strong>de</strong>”. O segundo acredita que o amor à nomeada é a mais genuína<br />

expressão da feição h<strong>uma</strong>na. Ora, entre a primeira e a segunda, a <strong>de</strong>cisão cabe ao leitor.<br />

O narrador se propõe a voltar ao emplasto.<br />

O próximo capítulo, “Genealogia”, entretanto, apresenta índices <strong>de</strong> que o tio<br />

militar estava mais próximo das razões da escrita do livro. <strong>Brás</strong> <strong>Cubas</strong> afirma que seu<br />

pai tinha “fumos <strong>de</strong> pacholice” e primava pela ostentação da elegância e para a farsa<br />

como meio <strong>de</strong> conseguir prestígio social.<br />

Essa farsa (retórica) é <strong>de</strong>scrita como estratégia que faria o leitor (...) torcer o<br />

nariz, só porque ainda não chegamos à parte narrativa (...). (Ibid, p. 514). Mas não só<br />

o leitor <strong>de</strong>ste livro. Os outros leitores, “confra<strong>de</strong>s” do primeiro, também torceriam o<br />

nariz porque “preferem a anedota à reflexão”. Sendo a causa da hostilida<strong>de</strong> justa ou não,<br />

o livro estabelece <strong>uma</strong> relação <strong>de</strong> polarização entre aquilo que ele mesmo imagina que o<br />

leitor queira e o material ficcional que ele se propõe a ofertar. Embora o narrador<br />

prometa que <strong>de</strong>ixará a reflexão filosófica <strong>de</strong> lado para agradar ao leitor, a narrativa do

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