COIMBRA —Domingo, 16 de junho de 1895 A PENA DE MORTE
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l.° -AJVZNTO T\.° 17<br />
A EDDCACÂO NACIONAL<br />
O Povo porluguez, ou antes a Nação<br />
portugueza começou a ser, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a invasão<br />
dos jesuítas, tomou-se durante o funesto<br />
governo dos Braganças, e hoje mais do que<br />
nunca se mostra uma socieda<strong>de</strong> cheia <strong>de</strong><br />
preconceitos, arruinada <strong>de</strong> vicios, corrompida<br />
até á medulla dos ossos por uma <strong>de</strong>generação<br />
progressiva, a qual não só perturba,<br />
e <strong>de</strong>sorienta a sua <strong>de</strong>primida mentalida<strong>de</strong>,<br />
enerva as energias da sua activida<strong>de</strong><br />
emprehen<strong>de</strong>dora, mas perverte inteiramente<br />
a sua vida moral, ameaça <strong>de</strong>struir<br />
a sua débil e infezada constituição politica,<br />
anniquilar a sua quasi esgotada vitalida<strong>de</strong><br />
economica.<br />
O Povo portuguez é um povo fanatico<br />
sem religião; tem superstições, mas não<br />
tem crenças.<br />
Orgulhoso da sua capacida<strong>de</strong> intelleclual,<br />
ignora o que é mais rudimentar na<br />
sciencia, mais necessário nas suas applicações,<br />
indispensável aos usos da vida ordinaria,<br />
em todas as posições e misteres.<br />
Abarrotado, por longiquas tradições, em<br />
fumaças <strong>de</strong> valentão e em prosapias <strong>de</strong> heroísmo,<br />
hoje, se não é um polirão covar<strong>de</strong>,<br />
é um fraco, um limido, que se arrasta, e<br />
relrae á mais leve ameaça, ao mais pequeno<br />
arremesso; quando muilo grila, e braveja<br />
em um berreiro convulso <strong>de</strong> creança<br />
contrariada; se não foge ou recua <strong>de</strong>ante da<br />
aggressão, lambem não é corajoso na adversida<strong>de</strong>,<br />
ousado no momento do perigo.<br />
E, sobre tudo. o Povo porluguez é hoje<br />
o mais acabado exemplar <strong>de</strong> frivolida<strong>de</strong>, o<br />
mais completo e aperfeiçoado mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong><br />
insensatez, — essa frivolida<strong>de</strong> e insensatez<br />
já proverbiaes em lodo o mundo.<br />
•<br />
Tudo isto provem da educação que lhe<br />
<strong>de</strong>ram, da acção e influencia que sobre elle<br />
exerceram, e do veneno que no seu espirito<br />
innocularam a inquisição e os jesuítas, valiosos<br />
presentes, com que nos mimosearam<br />
os senhores reis d'esles reinos, ullimos representantes<br />
da segunda dynastia.<br />
Foram a inquisição e (/jesuitismo que<br />
fizeram o Povo porluguez limido, cobar<strong>de</strong>:<br />
essa cobardia e timi<strong>de</strong>z que nascem da dissimulação<br />
e da bypocresia, que o medo nos<br />
impõe como norma em lodos os actos da<br />
nossa vida, quando um po<strong>de</strong>r occullo, insidioso,<br />
traiçoeiro nos espiona, e, em tudo<br />
e por toda a parle nos persegue, e opprime,<br />
que o exemplo propaga, o habito e a educação<br />
fixam, e a. herança organicamente<br />
transmitle <strong>de</strong> geração em geração.<br />
Osjesuilas, para nos dominarem, e sujeitarem<br />
á sua suprema lei — a obediencia<br />
incondicional do aulomalo, a inércia, a ímmobilída<strong>de</strong><br />
passiva do cadaver nas mãos<br />
da Or<strong>de</strong>m, fizeram do Povo portuguez um<br />
ignorante, um imbecil,— essa ignorancia e<br />
essa imbecilida<strong>de</strong>, que provêm do fanatismo;<br />
alrophiaram-lhe a alma, por iudole natural<br />
e condição histórica, boa e generosa,<br />
com o subtil veneno das superstições alterradoras.<br />
Bem o disseram, e claramente o <strong>de</strong>monstraram,<br />
com a eloquencia dos faclos<br />
e com lodo o rigor da critica entre outros,<br />
Alexandre Herculano Oliveira Martins 2 ,<br />
e Manuel Bento <strong>de</strong> Sousa 3 , antes d'elies,<br />
i Historia da Inquisição em Portugal. Ene o clero,<br />
etc., et•.<br />
* Historia <strong>de</strong> Portugal, tom. n, liv. 6.° pag. 64 e<br />
passim.<br />
3 O Dr. Minerva, (Critica do ensino em Portu-<br />
gal),<br />
já o havia previsto e affirmado lembem D.<br />
Francisco Manuel<br />
•<br />
As primeiras victimas da sua <strong>de</strong>sastrosa<br />
educação e perniciosa influencia sugestiva<br />
foram os reis e a aristocracia.<br />
Foi nas summida<strong>de</strong>s do po<strong>de</strong>r, nas superiores<br />
camadas sociaes, que elles, os jesuitas,<br />
tomaram o ponto <strong>de</strong> apoio para a<br />
sua alavanca <strong>de</strong>molidora, certos <strong>de</strong> que<br />
atraz d'ellas e arrastado, pelo seu exemplo<br />
e impulso, iria o resto da Nação, e contaminado<br />
seria em breve o Povo inteiro.<br />
E assim succe<strong>de</strong>u.<br />
O calculo não falhou.<br />