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Gil Vicente na Horta (dp) - Teatro Nacional D.Maria II

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O O O FIM FIM FIM DA DA DA REPRESENTAÇ<br />

REPRESENTAÇÃO<br />

REPRESENTAÇ<br />

REPRESENTAÇÃO<br />

ÃO<br />

Ao contrário do que se passa num considerável número de outros autos, não há<br />

aqui qualquer rubbrica fi<strong>na</strong>l, indicadora dos si<strong>na</strong>is que marcam perante os<br />

espectadores o termo da representação. Não se alude sequer à saíde de ce<strong>na</strong> dos<br />

intervenientes no último quadr. A farsa parece esgotar-se no discurso de pendor<br />

reflexivo e moralista assumido pelo Velho, tardiamente despertado do sonho e<br />

devolvido à realidade, feita agora de solidão e ruí<strong>na</strong>.<br />

Esse discurso derradeiro do protagonista introduz uma nota de inesperada<br />

gravidade, contrastante com o tom ligeiro que domi<strong>na</strong>va as ce<strong>na</strong>s anteriores e<br />

que é, afi<strong>na</strong>l, próprio da forma teatral aqui praticada. A inflexão que então se<br />

verifica nos registos discursivo e dramático confere a Velho um toque de<br />

origi<strong>na</strong>lidade, mercedor de alguma atenção.<br />

Nascida, segundo tudo leva a crer, da dramatização de peque<strong>na</strong>s <strong>na</strong>rrativas de<br />

sabor popular e acentuada comicidade, a a farsa farsa farsa não não não é é é nunca nunca nunca sinónimo sinónimo sinónimo de de de riso<br />

riso<br />

pelo pelo riso. riso. Invariavelmente Invariavelmente empenhada empenhada <strong>na</strong> <strong>na</strong> apresentação apresentação de de situações,<br />

situações,<br />

instituições instituições ou ou ou perso<strong>na</strong>gens perso<strong>na</strong>gens passíveis passíveis de de de censaura censaura e, e, enveredando, enveredando, para para as<br />

as<br />

apresentar, apresentar, pelos pelos caminhos caminhos do do cómico, cómico, sublinha sublinha sempre sempre o o que que nelas nelas há há de<br />

de<br />

risível. risível. risível. O eco primeiro que no espectador espera encontrar é, pois, o riso. Mas, de<br />

regra, o riso imediato abre, discretamente, as portas à reflexão que, a seu tempo,<br />

chegará também, estimulada por uma representação de fundo realista, convite<br />

implícito - mas irrecusável - a uma nova avaliação do mundo.<br />

Em O Velho da <strong>Horta</strong>, ao mesmo tempo que o registo cómico se dilui <strong>na</strong>s estrofes<br />

fi<strong>na</strong>is, tor<strong>na</strong>-se mais directo o convite à reflexão: Fer<strong>na</strong>nd'Eanes pondera o seu<br />

comportamento, lamenta a cegueira e ingenuidade passadas e, arrependido,<br />

anseia pela morte libertadora; as suas palavras incitam o espectador a a<strong>na</strong>lisar<br />

também os aspectos essenciais da história que perante os seus olhos se<br />

representou, mas, mais do que isso, sendo elas próprias expressão de idêntico<br />

investimento a<strong>na</strong>lítico, determi<strong>na</strong>m o sentido em que deverá orientar-se essa nova<br />

reflexão, certamente decalcada da do protagonista, que entretanto se<br />

transformou numa espécie de duplo do espectador. De facto, a mudança operada<br />

in extremis no Velho permite-lhe uma objectividade antes impossível <strong>na</strong> análise<br />

que acaba por fazer: a recuperação do siso temporariamente perdido equivale ao<br />

estabelecimento da distância necessária à avaliação correcta do que lhe<br />

aconteceu; aquele que antes, por demasiado próximo, se mostrava incapaz de ver<br />

revela agora a sua capacidade de visão."<br />

Velho, Lisboa, Quimera, 1991.<br />

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