A PSICOLOGIA NO CTI – ADULTO DO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO ...
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A <strong>PSICOLOGIA</strong> <strong>NO</strong> <strong>CTI</strong> <strong>–</strong> <strong>ADULTO</strong> <strong>DO</strong> <strong>HOSPITAL</strong> <strong>UNIVERSITÁRIO</strong>/ UFJF<br />
Resumo:<br />
Fernanda Buzzinari Ribeiro de Sá *<br />
Ao considerar o <strong>CTI</strong> como um local do hospital em que o desamparo, o inesperado,<br />
o acaso e a desestabilização do paciente e da família se manisfestam, o psicanalista neste<br />
propõe a realização de um trabalho de escuta das questões levantadas pelos pacientes<br />
(conscientes, sedadas ou em coma) e familiares relacionadas ao processo de adoecimento,<br />
tratamento e hospitalização.<br />
Palavras-chaves: <strong>CTI</strong>, Psicologia, Psicanálise<br />
Abstract<br />
If considered <strong>CTI</strong> a place that unexpected, incidentally and solitary of patient and family<br />
appear, the psychoanalyst offer a work that listen the questions of patient (conscious, with<br />
sedative or in coma) and family related with sick, treatment and hospitalization.<br />
Key-works: <strong>CTI</strong>, Psychologist, Psychanalyst<br />
_________________________________________________________________________<br />
* Residente de Psicologia Hospitalar e da Saúde do Hospital universitário de Juiz de<br />
Fora/ UFJF
Introdução<br />
Os incessantes avanços científicos recriam a cada dia novas possibilidades diante<br />
dos impasses da vida. A busca da eficácia está presente em todos os campos da vida atual,<br />
principalmente no hospital. <strong>–</strong> sendo está atingida a qualquer preço, às vezes mesmo sem<br />
ética. As tentativas de respostas cientificas racionalizantes, promessas, percentagens,<br />
respostas religiosas, respostas familiares não são suficientes para sustentar o desamparo<br />
inerente ao ser humano.<br />
Do lado da ciência assistimos à sua busca incessante de alcançar a cura para todas as<br />
doenças, procurando dar sempre respostas a tudo, na tentativa de eliminar a morte, e assim<br />
tamponar a falta, transformando a tecnociência numa panacéia universal, pretensamente<br />
capaz de dissolver todos os limites e de transfigurar, até mesmo a condição humana.<br />
O homem vem buscando novas formas de revestir a morte, e a medicina, através da<br />
“tecnociência” tem contribuindo para isto, oferecendo recursos para este revestimento.<br />
Resta nos questionar quais as conseqüências disso para o homem que vive nesta sociedade<br />
moderna.<br />
A busca é pela sobrevivência do corpo tal como ele é visto pelo discurso da ciência<br />
moderna: corpo-objeto, um ajuntamento de órgãos que possui funções fisiológicas. Um<br />
corpo excluído de suas qualidades simbólicas, de seu conteúdo significante. Podemos<br />
pensar que na dificuldade do homem de não se deparar com a grande angustia humana, a de<br />
que somos sujeitos finitos, o discurso cientifico priorizando salvar o corpo-objeto, pode ter<br />
como conseqüência a exclusão da subjetividade, colocando em evidencia o corpo biológico.<br />
A Psicanálise diante dessa tecnociência não deve perder sua especificidade visto que<br />
ela não tem intenção de responder a demanda tão rápido quanto se exige hoje visto que a<br />
dimensão subjetiva deve ser ética e não técnica.
1. A Atuação do Psicólogo no <strong>CTI</strong><br />
Cada vez mais, grandes progressos ocorrem na área hospitalar, permitindo um<br />
prolongamento da vida. Maquinas mais sofisticadas, possibilidades técnicas de diagnósticos<br />
e tratamento de doenças. A medicina, ao longo do tempo, tomou uma distância do doente.<br />
Ocorreu um desvio no olhar do médico que deixa de ver quem o procura e dirige-se apenas<br />
à doença e a relatórios de exames e publicações que são em sua essência compêndios<br />
estatísticos, tão oscilantes e tão manipuláveis.<br />
“Não podemos reduzir o corpo humano a um<br />
emaranhado de órgãos que se articulam entre si. Esse<br />
corpo também diz de si, o corpo fala. A fala prediz<br />
significantes. Esse corpo requer seu deciframento<br />
simbólico. Então é o corpo que se presta aos cuidados<br />
da psicanálise, enquanto uma estrutura significante<br />
marcado pela palavra do Outro. É esse corpo causa o<br />
sujeito e sua dimensão de enigma que oferecem ao<br />
psicanalista instrumentos de trabalho”. (MOURA,<br />
1999: p.45)<br />
Não há função orgânica que não seja marcada pelo discurso, que não sofra os<br />
efeitos da demanda e desejo aos quais é submetida. Não há impulso neuronal que não tenha<br />
em sua origem e sobredeterminação progressiva de uma historicidade simbólica.<br />
(SCHILLER, 1991)<br />
A medicina vai escutar o chamado respondendo também prontamente a este, porém<br />
sendo a dimensão do tempo do sujeito eliminada. Trata o corpo do doente dirigindo seus<br />
cuidados para os signos e sintomas do paciente. Diferentemente, a psicanálise, ao escutar o<br />
chamado na urgência subjetiva, vai articular a pressa exigida pela situação ao tempo do<br />
sujeito que precisará advir. (MOURA, 1999)<br />
No espaço da UTI, alguns controles são feitos em relação à temperatura ambiente,<br />
luminosidade, ruídos e contaminação. Ali a pessoa pode viver de novo. Passa por um<br />
ambiente parecido com o útero materno, onde, a princípio, o ambiente provê as
necessidades. Mas o (re)nascimento exige que a pessoa-bebê respire por si mesma e que,<br />
nas vias do desejo, (re)viva. (MOURA, 1999)<br />
Quando uma pessoa é internada num <strong>CTI</strong>, com freqüência podemos pensar no estado<br />
de desamparo vivenciado pelas pessoas quando esta não dispunha no recursos para efetuar<br />
a ação específica que aliviaria a tensão provocada pelo estado de necessidade. Nesses<br />
casos, o paciente se torna impotente, incapaz muitas vezes de efetuar uma ação específica<br />
para o alívio da tensão interna advinda da dor, sede, fome, impossibilidade de andar,<br />
movimentar-se na cama, falar e até mesmo respirar. Ele, incluindo o paciente em coma,<br />
estará à mercê de um outro que poderá ou não atender sua demanda, ou seja, é este outro<br />
quem preservará os procedimentos necessários à vida do paciente (dieta, oxigênio,<br />
medicação, posição, exames...).<br />
“O sujeito sofre, mas o fato de falar ao analista faz com<br />
que ele tome uma distância em relação ao seu sofrimento.<br />
Essa função do analista, de escutar, por si só pode ser<br />
terapêutica proporcionando uma certa contenção,<br />
evidenciando que a pessoa não está sozinha na sua dor.<br />
Não se trata apenas de escutar, mas sobretudo de levar<br />
quem fala a se escutar. À medida que o paciente fala, ele<br />
também se ouve, podendo assim surgir o novo,<br />
acarretando modificações. Com o paciente em coma, a<br />
situação se inverterá, pois nós falaremos por ele, tentando<br />
nomear e aliviar sua dor, permitindo que ele se sinta<br />
acolhido e compreendido.” (MOURA, 1999: p. 45)<br />
O doente internado torna-se um paciente, sem trocadilhos, uma pessoa resignada aos<br />
cuidados médicos, que deve esperar serenamente a melhora de sua doença. Esse paciente<br />
desnudado por uma instituição total, perde sua identidade, torna-se vulnerável, submisso e<br />
dependente. Compete ao paciente, se estiver consciente, calar-se. O bom paciente na UTI<br />
permanece sedado, quase morto, mesmo que esteja buscando a vida.<br />
Muitos dos que sobrevivem à experiência de internação sobreviveram por haver<br />
algo mais além de aparelhos e tecnologia. Talvez desejo de continuarem vivos. Por outro<br />
lado, há também que se pensar na opção que alguns pacientes fazem pela morte. Não vêem
mais sentido para viver, pois continuar vivo chega a ser desagradável e até mesmo<br />
doloroso. Pode ser este o motivo de muitos pacientes em coma morrerem. Lógico que<br />
existe a questão orgânica, mas junto a esta estão os nossos desejos... (ESSLINGER, 2004)<br />
O corpo técnico das instituições de saúde, por meio de diversos membros, faz<br />
circular a idéia de um corpo tocável apenas nos procedimentos médicos. O corpo da<br />
psicanálise é o corpo erógeno. Um corpo mergulhado no significante, algo recalcado no<br />
simbólico retorna no real do corpo <strong>–</strong> uma lesão de órgão. O corpo para cada sujeito é da<br />
ordem do particular, tomado como ponto de possível interlocução entre o saber da<br />
psicanálise e o saber da medicina. (MOURA, 1999)<br />
2. Alguns aspectos relacionados à morte<br />
Embora a morte seja presença constante no cotidiano hospitalar, há um conluiu em<br />
torno do silêncio. Este traz como conseqüência a solidão do paciente, da equipe de saúde e<br />
da família diante de seus próprios medos e angústias. A solidão a não possibilidade de<br />
comunicação, podem ser, para a família, fatores que ocasionem um luto antecipado, e por<br />
isso, precisam ser pensados no processo de morrer de cada ser humano.<br />
“Embora morrer com dignidade seja um conceito<br />
altamente subjetivo, a medicina paliativa contribui<br />
com alguns aspectos cujo centro da preocupação, não<br />
sendo mais a cura de sintomas, passa a ser o alívio de<br />
sintomas, tanto físicos quanto emocionais,<br />
decorrentes de determinada doença. Dizer que o<br />
paciente encontra-se fora das possibilidades<br />
terapêuticas é uma agressão, pois pode não haver a<br />
cura da doença, mas muito pode ser feito pelo bem<br />
estar da pessoa.” (ESSLINGER, Ingrid, 2004:44)<br />
Muitas vezes, na luta contra a morte, a moderna medicina acaba por esquecer que<br />
somos mortais e que, por trás da doença, existe um ser humano que vive em determinado<br />
contexto, que traz consigo uma história de vida. Mais: que essa história de vida deveria<br />
incluir sua história de morte! Em outras palavras, há na doença e no processo de morrer de
cada indivíduo, uma série de fatores biológicos, psicológicos, sociais e espirituais que<br />
merecem ser levados em conta.<br />
Utilizar todos os recursos para resgatar pessoas é tarefa fundamental das UTIs.<br />
Entretanto, prolongar indefinidamente processos nos quais não se sabe se impera a vida ou<br />
a morte, nos quais só se fala de funções e sinais, e não mais de um ser humano, com uma<br />
vida de relação. Surge assim, um questionamento, pois é possível considerar a morte de<br />
alguém quando sua respiração para ou quando sua “consciência para? ” Será que podemos<br />
considerar vivos o paciente em coma que está esquecido?<br />
O conflito doente-família relaciona-se à família como um sistema e o quanto esta<br />
consegue respeitar as decisões que o paciente tomou, quando ainda lúcido, para ele mesmo.<br />
Ao mesmo tempo, a morte é um tabu, muitas vezes nem existe a possibilidade de falar<br />
abertamente em família sobre essas questões. De um lado, observa-se um desenvolvimento<br />
científico e tecnológico enorme, e de outro, uma dificuldade de comunicação entre o<br />
doente, seus familiares e a equipe de saúde.<br />
Fica evidente a lacuna na formação dos profissionais de saúde no que se refere ao<br />
tema da morte. Muitas vezes é com assombro, tristeza e cobranças que para enterrar as<br />
emoções esses profissionais associam “ser profissional” a não demonstrar emoções. O ideal<br />
seria permitir a tais profissionais que seus sentimentos emergissem, pudessem ser expressos<br />
e elaborados. Assim, quem sabe o relacionamento com os pacientes pudesse modificar e o<br />
sujeito passar a ser “visto”.Diante da morte considerada como fracasso, poderiam surgir<br />
sentimentos de raiva, impotência, fragilidade, frustração, o que pode dificultar um<br />
discernimento na hora das decisões.<br />
“ Falar de morte é falar de vida; é poder pensar<br />
numa qualidade de vida durante o processo de<br />
morrer. É pensar na morte digna, com controle da<br />
dor, dos efeitos colaterais da medicação. É pensar<br />
no enfermo como ser humano e participante, quando<br />
consciente, de seu processo de doença. E se isso não<br />
for possível, pensar numa atitude de respeito com o<br />
paciente em coma e com sua família. A qualidade<br />
de vida, ainda que subjetiva,pode ser entendida
2. A Equipe Multiprofissional do <strong>CTI</strong><br />
como um processo de morrer sem dor e sofrimento<br />
físico. Neste processo a subjetividade e desejos do<br />
paciente tendem a ser ignorados a favor da vida.<br />
Mas que vida será essa?” (ESSLINGER, Ingrid,<br />
2004: 45)<br />
Os seres humanos vêem-se hoje diante da quebra da identidade pessoal, da ruptura<br />
dos vínculos e normas sociais, da aceleração, competitividade e premência de tempo, além<br />
de flagrantes desequilíbrio sociais como: violência, drogas, desemprego e desigualdades. O<br />
mundo parece transformar-se num grande balcão de negócios e o sistema de saúde não foge<br />
disso. As pessoas estão atônitas a procura de si mesmas e os profissionais de saúde não<br />
fogem disso.<br />
O ser humano doente oferece ao profissional de saúde um desafio quase<br />
intransponível em muitas situações: diagnosticar a razão da enfermidade e tratá-la<br />
eficazmente. Este profissional, no seu cotidiano, vê-se compelido a suportar um conjunto<br />
de angustias, de conflitos, de obstáculos diante de cada ato, de cada pessoa com quem<br />
defronta na prática. Seus pacientes estão sensíveis, vulneráveis, fragilizados; querem apoio,<br />
proteção, segurança;. querem intervenção perfeita e eficaz. Expressam tais sentimentos de<br />
forma “ruidosa” ou velada. Estão ansiosos, inseguros, às vezes em pânico. Estão<br />
agressivos, exigentes, querelantes.<br />
Lidar com o sofrimento implica, muitas vezes, reviver momentos pessoais de<br />
sofrimento. Implica se identificar com a pessoa que sofre e sofrer junto com ela. O<br />
profissional de saúde á chamado a intervir em situações de risco de vida. A angustia, nessas<br />
circunstâncias, é extrema. Desde o doente, que sente a morte iminente, como todos os que o<br />
amam e não querem perdê-lo. Talvez aqui resida o auge da exigência feita a em ser<br />
humano: transformar-se em Deus, num ser onipotente, salvador. O resultado pode ser a<br />
frustração, a impotência, a sensação de fracasso diante do inexorável que é a morte.<br />
Doenças obscuras, de difícil diagnósticos ou de difícil tratamento põem o profissional de<br />
saúde constantemente diante do sentimento de incerteza e impotência.
Pelo que foi exposto, fica clara a complexidade da relação cuidador-cuidado e a<br />
necessidade que têm os profissionais de saúde de encontrarem um ambiente de suporte<br />
capaz de lhes sustentar no exercício de suas funções. De lhes propiciar expressar os<br />
sentimentos de alguém que também precisa ser cuidado. Afinal, quem cuida do cuidador?<br />
Se considerarmos o estresse cotidiano em que vivem tais profissionais no contato direto<br />
com o sofrimento e a morte, fácil é imaginar a vulnerabilidades destes. Estes, tanto quanto<br />
os pacientes, demandam a necessidade de apoio e suporte. Assim, há a necessidade de se<br />
oferecer grupos de suporte aos provedores da saúde além de grupos de reflexão sobre a<br />
tarefa desenvolvida. (CAMPOS, 2005)<br />
O cuidador também precisa ser cuidado. Precisa de alguém que lhe dê suporte, que<br />
lhe ofereça proteção e apoio, facilitando seu desempenho, compartilhando, de algum modo,<br />
sua tarefa.<br />
O grupo de reflexão da tarefa permite aos participantes a expressão de sentimentos,<br />
medos, fantasias, dúvidas, ansiedades, conflitos, vivencias nos hospitais, etc. A dinâmica<br />
grupal favorece a discussão entre seus membros, reunidos a partir de uma situação em<br />
comum. A identificação de um individuo com outro possibilita compartilhar angustias,<br />
ansiedades, limitações, esperanças, sofrimentos, fantasias, fortalecera coesão, entre outros<br />
aspectos que surgem com o desenrolar do processo grupal. (CAMPOS, 2005)<br />
3 Objetivos<br />
- Promover um espaço para que os pacientes e familiares possam expressar seus<br />
desejos, angustias, ansiedades, limitações, esperanças, sofrimentos, fantasias em relação a<br />
hospitalização e principalmente ao <strong>CTI</strong>.<br />
- Oferecer a equipe multiprofissional tanto atendimentos individuais quanto a realização<br />
de grupos de reflexão da tarefa e de suporte emocional.
4 Metodologia<br />
O trabalho do psicólogo no <strong>CTI</strong> tem o referencial teórico da Psicanálise, sendo utilizado<br />
outros recursos terapêuticos nos devidos momentos. O aparato teórico unido à demanda<br />
norteiam o trabalho a desenvolvido de acordo com as necessidades e possibilidades de<br />
atendimento aos pacientes, familiares e equipe do <strong>CTI</strong> <strong>–</strong> adulto do Hospital Universitário.<br />
Conclusão<br />
Apesar de todo o avanço tecnológico da UTI, essencial na recuperação da saúde,<br />
este é um lugar mobilizador de muita angústia. Enquanto o aprimoramento tecnológico<br />
aparece com mais aparelhos, exames, isto é, uma leitura orgânica sofisticada acenando com<br />
maiores possibilidades de vida, a subjetividade da pessoa não encontra espaço. E isto é<br />
natural, pois naquele momento o que está em jogo é a vida da pessoa. Só que o orgânico<br />
porta um sujeito que sofre e que angustia.<br />
Percebe-se que o ser humano é constituído para além do corpo por algo que escapa à<br />
concretude celular. É obrigado a postular um constructo não localizável pelo olhar, não<br />
detectável por instrumentos. Deduz que o psiquismo é alicerçado sobre um substrato<br />
orgânico, mas também há um arcabouço formado por símbolos, que determinam<br />
modificações daquele substrato e que compõem uma certa linguagem. (SCHILLER, 1991)<br />
Qualquer doença é a resultante entre o fenômeno orgânico e seu caráter psíquico. Há<br />
um saber inconsciente poderoso e acertado, de que a identificação das razões históricas<br />
individuais e sua compreensão terão papel decisivo no estabelecimento e prevenção de<br />
recorrências. (SCHILLER, 1991)<br />
Passamos nossas vidas procurando nomear, compreender e refletir sobre tudo o que<br />
nos acontece. A palavra e a elaboração têm a função de metáforas que modificam a
qualidade de nossos atos. Espera-se que chegue um dia o tempo de reconhecer-se à doença<br />
como marca, como uma escrita hieroglífica a ser decifrada, inscrita sobre o real concreto do<br />
corpo. A identificação da doença como produção do sujeito quando não escuta seu próprio<br />
desejo. (MOURA, 1999)<br />
Apesar de atuarem com referências diferentes, a medicina e a psicanálise convergem<br />
para o objetivo de aliviar o ser humano de seu sofrimento. Diante do saber que nos<br />
compete, focalizaremos no sujeito que clama por ser ouvido, deixando aos cuidados da<br />
ciência esse corpo em sua pura sintomatologia orgânica. Assim, para nós, a palavra corpo é<br />
um lugar que causa o sujeito do inconsciente. (MOURA, 1999)<br />
“É preciso que alguém diga e aposte que seu corpo pode produzir<br />
algo além dele, além do ser vivente, que produza sentido.<br />
Concerne a esta aposta, entretanto, considerar aquilo que resiste e<br />
resistirá sempre à significância. Esse ponto resistente é o aquém<br />
do sentido.” (COIMBRA, Maria Lúcia. In: DECAT, Marisa.<br />
Psicanálise e hospital <strong>–</strong> a criança e sua dor)<br />
Assim, o psicanalista pode escutar pacientes, familiares e profissionais, sabendo que<br />
a palavra pode ajudar o ser falante a suportar melhor a condição humana. Afinal de contas,<br />
é preciso responder ao chamado e oferecer um espaço para que o sujeito fale e possa ser<br />
escutado de um lugar outro onde ele não é só aquele paciente, doente ou o número de um<br />
leito, mas sim, possui sua vida, seu corpo, sua história.
Referências Bibliográficas<br />
- CAMPOS, Eugênio Paes. Quem cuida do cuidador <strong>–</strong> uma proposta<br />
para os profissionais de saúde. Petrópolis, RJ: Vozes, 2005.<br />
- DECAT, Marisa de Moura. Psicanálise e Hospital. 2ed. Belo Horizonte:<br />
Revinter, 2000.<br />
- DECAT, Marisa de Moura. Psicanálise e Hospital <strong>–</strong> a criança e sua dor.<br />
Belo Horizonte: Revinter, 1999.<br />
- ESSLINGER, Ingrid. De quem é a vida, afinal? São Paulo: Casa do<br />
psicólogo, 2004.<br />
- SCHILLER, Paulo. O médico, a doença e o inconsciente. Rio de Janeiro:<br />
Revinter Ltda, 1991.
RESENHA<br />
A <strong>PSICOLOGIA</strong> <strong>NO</strong> <strong>CTI</strong> <strong>–</strong> <strong>ADULTO</strong> <strong>DO</strong> <strong>HOSPITAL</strong> <strong>UNIVERSITÁRIO</strong>/ UFJF<br />
A maioria dos casos de internação em um hospital é algo que desestabiliza não só o<br />
sujeito internado, mas também seus familiares, já que nunca estiveram preparados para<br />
enfrentar a doença, a morte, o imprevisível. Nestes momentos, as respostas que o sujeito<br />
sustenta já não são suficientes, pois algo aconteceu que vacilou suas certezas. A surpresa, o<br />
imprevisto, o acaso da doença, a possibilidade de morte, podem caracterizar um momento<br />
de crise. (MOURA, 1999)<br />
Ninguém está preparado para o encontro com o Real, pois o Real nos deixa sem<br />
palavras se tornando insuportável. O hospital é um espaço privilegiado onde o psicanalista<br />
se depara com pessoas diante de acontecimentos inesperados em suas vidas,<br />
acontecimentos estes que, pelo fato de serem inesperados, podem destruir o sujeito do seu<br />
ancoramento significante. Pelo fato da destituição aguda que pode ocorrer nessas situações,<br />
os acontecimentos se tornam traumáticos e diante da falta de bordeamento significante o<br />
sujeito se vê imerso na angústia. Na urgência, o sujeito é lançado no estado inicial de<br />
desamparo, estado que pode repetir-se em qualquer momento da vida, revelando a<br />
precariedade da condição humana. (MOURA, 1999)<br />
O hospital é um espaço privilegiado onde o psicanalista se depara com pessoas<br />
diante de acontecimentos inesperados em suas vidas, acontecimentos estes que, pelo fato de<br />
serem inesperados, podem destruir o sujeito do seu ancoramento significante, se parti do<br />
pressuposto que o sujeito é efeito de significante.<br />
Pelo fato da destituição aguda que pode ocorrer nessas situações, os acontecimentos<br />
se tornam traumáticos e diante da falta de bordeamento significante o sujeito se vê imerso<br />
na angústia. Penso que esta angústia acomete o paciente em coma, diante da falta de<br />
significantes para nomear o momento que vive. O sujeito ali “esquecido” fica imerso num<br />
vazio e numa angústia. (MOURA, 1999)<br />
Na urgência, o sujeito é lançado no estado inicial de desamparo, estado que pode<br />
repetir-se em qualquer momento da vida, revelando a precariedade da condição humana.<br />
Estas situações com as quais se depara o psicanalista em um hospital o confrontam com<br />
uma práxis atípica, a da urgência, quando o sujeito vai estar assujeitado às situações<br />
inesperadas, e deste lugar pode fazer um chamado ao analista. Assim, trabalhar com<br />
pacientes em coma seria sustentar a dimensão de sujeito de quem está assujeitado. Diante<br />
da clínica da urgência sustentada pelos conceitos da clínica da demanda a ser formulada em<br />
palavras, pois se trata de uma aposta no sujeito: a de transformar a urgência do paciente em<br />
coma, onde o sujeito não tem palavras, a partir de uma construção do analista,<br />
reintroduzindo-o na cadeia significante.<br />
A psicanálise nasce para apontar a necessidade de uma escuta. O doente não é<br />
sujeito de um corpo apenas. É sujeito de uma linguagem que modela suas formas e atos e<br />
tem algo a dizer sobre sua doença. Esta ciência compreende um campo de estudo que é o<br />
inconsciente, abrindo-se, assim, uma nova perspectiva à compreensão do sujeito e sua<br />
jmplicação na doença. Caberá ao psicanalista iniciar e sustentar um discurso, para que dele<br />
resultem não efeitos imediatos e impressionantes, mas que possa, para o sujeito, a doença<br />
se tornar uma possibilidade de seu desejo despertar. (MOURA, 1999)
A intervenção da Psicanálise no Hospital e no <strong>CTI</strong> buscaria levar o paciente a um<br />
nível de subjetividade produtiva, para a qual o corpo é inexplícito. Ao lidar com alguém<br />
inapto à subjetivação, teríamos que sustentar até o último instante, em condições marcadas<br />
pela doença,a possibilidade de que algo aconteça; um ínfimo movimento sendo o bastante ,<br />
pois ele pode fazer surgir o sujeito, raro, pontual e capaz.