21.06.2013 Views

Perda Dentária Post Mortem em Processos de Identificação Humana

Perda Dentária Post Mortem em Processos de Identificação Humana

Perda Dentária Post Mortem em Processos de Identificação Humana

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Odontologia e Socieda<strong>de</strong> © 1999<br />

Vol. 1, No. 1/2, 35-38, 1999. Printed in Brazil.<br />

Introdução<br />

<strong>Perda</strong> <strong>Dentária</strong> <strong>Post</strong> <strong>Mort<strong>em</strong></strong> <strong>em</strong> <strong>Processos</strong> <strong>de</strong> I<strong>de</strong>ntificação <strong>Humana</strong><br />

<strong>Post</strong> <strong>Mort<strong>em</strong></strong> Dental Loss in Human I<strong>de</strong>ntification Processes<br />

Rogério N. Oliveira a , Rodolfo F.H. Melani b , José Leopoldo F. Antunes b ,<br />

Eduardo R. Freitas b , Luís C.C. Galvão c<br />

a<br />

Departamento <strong>de</strong> Odontologia Social, Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Odontologia,<br />

Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo;<br />

Doutorando pela Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Odontologia <strong>de</strong> Piracicaba,<br />

Universida<strong>de</strong> Estadual <strong>de</strong> Campinas<br />

b<br />

Departamento <strong>de</strong> Odontologia Social, Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Odontologia,<br />

Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo<br />

c<br />

Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Medicina, Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral da Bahia<br />

Resumo. Os el<strong>em</strong>entos <strong>de</strong>ntários fornec<strong>em</strong> dados imprescindíveis aos processos <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação<br />

humana, sendo entretanto freqüentes suas perdas <strong>em</strong> <strong>de</strong>corrência da esqueletização ou <strong>de</strong> sua<br />

manipulação nas exumações. Por sua importância ímpar nos processos <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação humana e<br />

por as perdas <strong>de</strong>ntárias post mort<strong>em</strong> parecer<strong>em</strong> ser inexoráveis com o passar do t<strong>em</strong>po, procurou-se<br />

<strong>em</strong> uma amostra composta <strong>de</strong> 151 crânios completos obtidos junto ao Museu <strong>de</strong> Anatomia <strong>Humana</strong><br />

do Instituto <strong>de</strong> Biociências da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo quantificar as perdas <strong>de</strong>ntárias existentes,<br />

diferenciando-as <strong>em</strong> anteriores ou posteriores à morte. Os resultados d<strong>em</strong>ostraram haver maior<br />

prevalência da perda <strong>de</strong>ntária post mort<strong>em</strong> dos <strong>de</strong>ntes superiores e do grupo dos <strong>de</strong>ntes incisivos.<br />

Esses dados d<strong>em</strong>onstram ser necessário um cuidado redobrado nos processos <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação<br />

humana, sobretudo nos momentos <strong>de</strong> levantamento do local <strong>de</strong> crime e transporte dos <strong>de</strong>spojos<br />

humanos até local a<strong>de</strong>quado para análises, pois a perda <strong>de</strong> el<strong>em</strong>entos <strong>de</strong>ntários po<strong>de</strong> inviabilizar a<br />

i<strong>de</strong>ntificação.<br />

Palavras-Chave: odontologia legal; antropologia física; extração <strong>de</strong>ntária<br />

Abstract. Dental el<strong>em</strong>ents supply fundamental data to human i<strong>de</strong>ntification processes. However,<br />

post mort<strong>em</strong> <strong>de</strong>ntal loss in exhumations may frequently impair these processes. We have<br />

studied a sample of 151 complete craniums kept at the Museum of Human Anatomy of the Biological<br />

Sciences Institute of the University of São Paulo, in or<strong>de</strong>r to quantify post mort<strong>em</strong> <strong>de</strong>ntal loss. We<br />

could observe the large prevalence of the subject, mainly at maxillary teeth, of the incisive group.<br />

In consequence, we <strong>em</strong>phasize the need of redoubled care in human i<strong>de</strong>ntification processes,<br />

specially at the manipulation of mortal r<strong>em</strong>ains, to avoid the risk of post mort<strong>em</strong> <strong>de</strong>ntal losses; which<br />

may difficult a i<strong>de</strong>ntification.<br />

Keywords: forensic <strong>de</strong>ntistry; anthropology, physicl; tooth extraction<br />

Os processos <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação humana, sob seus aspectos<br />

físicos, pod<strong>em</strong> ser entendidos e trabalhados através <strong>de</strong><br />

dois prismas. No primeiro, reconstrutivo, não se t<strong>em</strong> dados<br />

anteriores à morte do indivíduo e se procura estabelecer<br />

Av. Prof. Lineu Prestes, 2227 – 05508-900 – São Paulo, SP<br />

Artigo<br />

el<strong>em</strong>entos genéricos para uma i<strong>de</strong>ntificação geral. No<br />

segundo, comparativo, baseia-se <strong>em</strong> registros anteriores ao<br />

óbito, po<strong>de</strong>ndo ser utilizados os prontuários odontológicos,<br />

que tornam possível uma i<strong>de</strong>ntificação personalista ou individual.


36 Oliveira et al. Odontologia e Socieda<strong>de</strong><br />

Os <strong>de</strong>ntes pod<strong>em</strong> fornecer informações <strong>de</strong>cisivas para<br />

i<strong>de</strong>ntificação humana (Halik, 1991), por isso, ao se proce<strong>de</strong>r<br />

o exame pericial dos arcos <strong>de</strong>ntários é primordial<br />

analisar as ausências <strong>de</strong>ntárias, estabelecendo se elas ocorreram<br />

antes ou <strong>de</strong>pois da morte do indivíduo, e no caso <strong>de</strong><br />

ter ocorrido <strong>em</strong> vida, procura-se estimar o intervalo <strong>de</strong><br />

t<strong>em</strong>po, antes do óbito, <strong>em</strong> que ocorreu esta perda.<br />

Após dirimidas estas questões, passa-se para a análise<br />

comparativa das características dos el<strong>em</strong>entos <strong>de</strong>ntários <strong>em</strong><br />

seus aspectos morfológicos, anatômicos e <strong>de</strong> seus materiais<br />

restauradores. Esta análise é realizada se o indivíduo a ser<br />

i<strong>de</strong>ntificado possuir um prontuário odontológico corretamente<br />

elaborado previamente à sua morte. Sublinha-se a<br />

importância <strong>de</strong>sta documentação, pois freqüent<strong>em</strong>ente<br />

estes meios se mostram os únicos pelos quais se obtém a<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> humana.<br />

A análise dos aspectos morfológicos, anatômicos e dos<br />

materiais restauradores dos el<strong>em</strong>entos <strong>de</strong>ntários são tão<br />

relevantes para os processos <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação humana que<br />

Smith et al. (1997) recomendam que seja preservada a<br />

estrutura coronária externa dos el<strong>em</strong>entos <strong>de</strong>ntários,<br />

mesmo <strong>em</strong> centros <strong>de</strong> pesquisa que já efetuam a extração<br />

do DNA <strong>de</strong> polpa <strong>de</strong>ntária, pois as análises comparativas<br />

do DNA não se contrapõ<strong>em</strong> ou exclu<strong>em</strong> a utilização comparativa<br />

<strong>de</strong> suas estruturas.<br />

Os <strong>de</strong>ntes pod<strong>em</strong> ser perdidos e estar<strong>em</strong> ausentes no<br />

momento do processo <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação, o que dificulta ou<br />

mesmo inviabiliza as respostas necessárias. As perdas <strong>de</strong>ntais<br />

ocorridas após a morte pod<strong>em</strong> ser <strong>de</strong>vidas a fatores<br />

relacionados ao processo natural <strong>de</strong> esqueletização, que<br />

<strong>de</strong>strói os tecidos periodontais que fixam os <strong>de</strong>ntes aos<br />

alvéolos. Outro aspecto diz respeito à anatomia das raízes,<br />

particularmente dos <strong>de</strong>ntes unirradiculares, que conjugada<br />

à <strong>de</strong>struição do periodonto po<strong>de</strong> permitir mais facilmente a<br />

avulsão dos el<strong>em</strong>entos <strong>de</strong>ntários. Não se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong><br />

consi<strong>de</strong>rar o risco <strong>de</strong> perda dos el<strong>em</strong>entos <strong>de</strong>ntários através<br />

da manipulação ina<strong>de</strong>quada dos <strong>de</strong>spojos humanos no levantamento<br />

do local do crime (coleta do material, transporte,<br />

preparo, acondicionamento e encaminhamento para<br />

exame).<br />

Outro fator que influencia o risco <strong>de</strong> perda <strong>de</strong>ntária post<br />

mort<strong>em</strong> é a ida<strong>de</strong> dos indivíduos, por ocasião do óbito.<br />

Whittaker & Molleson (1996) examinaram 92 crânios com<br />

ida<strong>de</strong>s conhecidas e verificaram maior prevalência <strong>de</strong> perda<br />

<strong>de</strong>ntária post mort<strong>em</strong> no grupo <strong>de</strong> indivíduos <strong>de</strong> maior<br />

ida<strong>de</strong>, sugerindo que maiores cuidados sejam tomados nos<br />

procedimentos <strong>de</strong> exumação para minimizar esse tipo <strong>de</strong><br />

perda <strong>de</strong>ntária.<br />

As condições do local on<strong>de</strong> o corpo foi encontrado<br />

pod<strong>em</strong> interferir nesse processo. Locais excessivamente<br />

expostos ao sol, locais sombreados por árvores, <strong>de</strong>spojos<br />

mantidos no interior <strong>de</strong> sacos plásticos por muito t<strong>em</strong>po,<br />

<strong>em</strong>balsamados ou submersos <strong>em</strong> meio aquático, além das<br />

estações do ano (<strong>em</strong> países on<strong>de</strong> estas diferenças sejam b<strong>em</strong><br />

diferenciadas) influenciam nas perdas <strong>de</strong>ntárias post mort<strong>em</strong>.<br />

McKeown & Bennett (1995) sublinham o fato <strong>de</strong> que<br />

estas perdas <strong>de</strong>ntárias, quando estudadas <strong>em</strong> conjunto com<br />

as condições do meio ambiente <strong>em</strong> que os <strong>de</strong>spojos foram<br />

encontrados, fornec<strong>em</strong> indícios compl<strong>em</strong>entares para estimativa<br />

do t<strong>em</strong>po <strong>de</strong> morte.<br />

Tendo <strong>em</strong> vista a importância da matéria para os processos<br />

<strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação humana, o presente estudo teve como<br />

objetivo analisar a incidência das perdas <strong>de</strong>ntárias post<br />

mort<strong>em</strong> <strong>em</strong> uma amostra pré-selecionada, alertando-se para<br />

os comprometimentos que pod<strong>em</strong> <strong>de</strong>correr das perdas <strong>de</strong>ntárias.<br />

Enfatizamos, ainda, a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cuidados especiais<br />

no manuseio <strong>de</strong> crânios humanos envolvidos <strong>em</strong><br />

processos <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação.<br />

Material e Métodos<br />

Foram analisados 151 crânios do Museu <strong>de</strong> Anatomia<br />

<strong>Humana</strong> do Instituto <strong>de</strong> Ciências Biomédicas da Universida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> São Paulo. Estas peças anatômicas foram somadas<br />

a este acervo entre as décadas <strong>de</strong> 20 e 50 e, na atualida<strong>de</strong>,<br />

têm sido utilizadas exclusivamente para fins <strong>de</strong> pesquisa.<br />

Diferentes fatores dirigiram a escolha <strong>de</strong>ste material.<br />

Em primeiro lugar, trata-se <strong>de</strong> acervo constituído com<br />

finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pesquisas no âmbito da Universida<strong>de</strong>, observando-se<br />

o a<strong>de</strong>quado manuseio e conservação. Em segundo<br />

lugar, sua própria longevida<strong>de</strong> faz supor que o mesmo já<br />

tenha experimentado todas as principais mudanças seguidas<br />

ao processo <strong>de</strong> esqueletização. Desse modo, acredita-se<br />

que, <strong>em</strong> sua situação atual, os crânios estudados configur<strong>em</strong><br />

uma boa aproximação da realida<strong>de</strong> pericial.<br />

De modo subsidiário e com intuito <strong>de</strong> trazer mais el<strong>em</strong>entos<br />

à discussão, foi analisada um segundo conjunto<br />

amostral, composto por 100 crânios obtidos junto a um<br />

c<strong>em</strong>itério da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Salvador, que possui a rotina <strong>de</strong><br />

armazenar o material <strong>de</strong> suas exumações <strong>em</strong> sacos plásticos<br />

i<strong>de</strong>ntificados e lacrados, permanecendo nesta condição <strong>de</strong><br />

armazenamento até ser<strong>em</strong> <strong>de</strong>corridos os prazos legais e<br />

administrativos, quando então são entregues a familiares<br />

para que provi<strong>de</strong>nci<strong>em</strong> um <strong>de</strong>stino a<strong>de</strong>quado ou, para os<br />

não reclamados, um novo enterramento, mas agora comunitário.<br />

Os exames foram realizados somente <strong>em</strong> crânios completos<br />

(todos com maxila e mandíbula), nos quais foi observada<br />

a presença ou ausência dos el<strong>em</strong>entos <strong>de</strong>ntários. Os<br />

<strong>de</strong>ntes ausentes foram diferenciados como tendo sido extraídos<br />

<strong>em</strong> vida ou perdidos post-mort<strong>em</strong>. Foram consi<strong>de</strong>rados<br />

<strong>de</strong>ntes extraídos <strong>em</strong> vida aqueles cujos alvéolos<br />

apresentass<strong>em</strong> sinais <strong>de</strong> cicatrização alveolar. Foram consi<strong>de</strong>rados<br />

<strong>de</strong>ntes perdidos post-mort<strong>em</strong>, aqueles cujos<br />

alvéolos abertos não apresentass<strong>em</strong> sinais <strong>de</strong> cicatrização<br />

tecidual.<br />

Esta classificação antropológica teve como parâmetro a<br />

distinção feita por Whittaker & MacDonald (1989),<br />

mostrando-se reprodutível, <strong>de</strong> fácil interpretação e elevada


Vol. 1, No. 1/2, 1999 <strong>Perda</strong> <strong>Dentária</strong> <strong>Post</strong> <strong>Mort<strong>em</strong></strong> 37<br />

concordância entre os examinadores que efetuaram as<br />

análises dos crânios.<br />

Todavia, se durante o processo <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação houver<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> precisar cronologicamente a cicatrização<br />

alveolar <strong>de</strong> um <strong>de</strong>nte perdido com indivíduo ainda <strong>em</strong> vida,<br />

no intuito <strong>de</strong> se estimar quanto t<strong>em</strong>po após a exodontia<br />

daquele el<strong>em</strong>ento <strong>de</strong>ntário o indivíduo veio a falecer, trabalhos<br />

como o <strong>de</strong> Miranda (1994) fornec<strong>em</strong> subsídios a<br />

esses questionamentos.<br />

O conjunto das observações foi submetido à análise<br />

estatística informatizada, através do Programa SPSS 8.0,<br />

1997.<br />

Resultados<br />

A Tabela 1 apresenta, para cada tipo <strong>de</strong> <strong>de</strong>nte, o número<br />

total <strong>de</strong> espaços <strong>de</strong>ntários que não sofreram extração <strong>em</strong><br />

vida, b<strong>em</strong> como a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> perdas <strong>de</strong>ntárias classificadas<br />

como post mort<strong>em</strong>, para amostra A, relativa ao<br />

Museu <strong>de</strong> Anatomia <strong>Humana</strong> do Instituto <strong>de</strong> Biociências da<br />

Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo.<br />

A análise comparativa evi<strong>de</strong>nciou que o grupo dos<br />

<strong>de</strong>ntes incisivos apresentou prevalência <strong>de</strong> perda <strong>de</strong>ntal<br />

post mort<strong>em</strong> significativamente mais elevada que os d<strong>em</strong>ais<br />

tipos <strong>de</strong>ntários (p < 0,05). Em segundo lugar, situaram-se<br />

os <strong>de</strong>ntes pré-molares, com prevalência <strong>de</strong> perda <strong>de</strong>ntária<br />

post mort<strong>em</strong> significativamente mais elevada que os <strong>de</strong>ntes<br />

molares e os <strong>de</strong>ntes caninos (p < 05). Quanto a estes dois<br />

últimos grupos <strong>de</strong>ntários, não foi observada diferença significativa<br />

do ponto <strong>de</strong> vista estatístico (p = 0,795).<br />

Do ponto <strong>de</strong> vista da comparação entre a arcada superior<br />

e a arcada inferior, observou-se diferença significativa<br />

(p < 0,05), com maior porcentag<strong>em</strong> <strong>de</strong> perda <strong>de</strong>ntária post<br />

mort<strong>em</strong> para os <strong>de</strong>ntes maxilares.<br />

A Tabela 2 apresenta, para cada tipo <strong>de</strong> <strong>de</strong>nte, o número<br />

total <strong>de</strong> espaços <strong>de</strong>ntários que não sofreram extração <strong>em</strong><br />

vida, b<strong>em</strong> como a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> perdas <strong>de</strong>ntárias classificadas<br />

como post mort<strong>em</strong>, para a amostra supl<strong>em</strong>entar do<br />

c<strong>em</strong>itério (amostra B).<br />

Discussão<br />

Houve maior prevalência <strong>de</strong> perda <strong>de</strong>ntária post mort<strong>em</strong><br />

nos arcos superiores; tal fato po<strong>de</strong> ser atribuído ao posicionamento<br />

<strong>de</strong> armazenag<strong>em</strong> dos crânios. Em busca <strong>de</strong><br />

maior estabilida<strong>de</strong>, costuma-se apoiar os crânios sobre a<br />

mandíbula, processos massetéricos e osso occipital, ficando<br />

os <strong>de</strong>ntes da maxila mais sujeitos à força da gravida<strong>de</strong>.<br />

Outro fator que po<strong>de</strong> também ter influência na prevalência<br />

<strong>de</strong> perda <strong>de</strong>ntária post mort<strong>em</strong> é a própria <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> óssea<br />

que é geralmente menor na maxila.<br />

De todos os grupos <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntes analisados, os incisivos<br />

apresentaram maior freqüência <strong>de</strong> perda <strong>de</strong>ntária post mort<strong>em</strong>,<br />

fato que po<strong>de</strong> ser justificado pelas características<br />

anatômicas <strong>de</strong>stes <strong>de</strong>ntes. Serra & Ferreira (1976) explicam<br />

que os <strong>de</strong>ntes incisivos pod<strong>em</strong> ser consi<strong>de</strong>rados unirradicu-<br />

lares, visto que são raros os casos <strong>em</strong> que apresentam duas<br />

raízes. Já os caninos, apesar <strong>de</strong> também apresentar<strong>em</strong>, na<br />

maioria das vezes, apenas uma raiz, esta é <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> dimen-<br />

Tabela 1. Freqüência <strong>de</strong> perdas <strong>de</strong>ntárias post mort<strong>em</strong> <strong>em</strong> peças anatômicas<br />

do Museu <strong>de</strong> Anatomia <strong>Humana</strong> da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo<br />

(amostra A), segundo o tipo <strong>de</strong> <strong>de</strong>nte.<br />

Tipos <strong>de</strong>ntários % perdidos Número <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>ntes<br />

Molares superiores 29,528 352<br />

Molares inferiores 30,189 355<br />

Molares 29,865 707<br />

Pré-molares superiores 38,583 467<br />

Pré-molares inferiores 36,752 461<br />

Pré-molares 37,705 928<br />

Caninos superiores 28,829 254<br />

Caninos inferiores 32,394 247<br />

Caninos 30.575 501<br />

Incisivos superiores 79,636 378<br />

Incisivos inferiores 48,813 447<br />

Incisivos 61,774 825<br />

Dentes superiores 44,611 1.451<br />

Dentes inferiores 38,328 1.510<br />

Total <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntes 41,368 2.961<br />

Tabela 2. Freqüência <strong>de</strong> perdas <strong>de</strong>ntárias post mort<strong>em</strong> <strong>em</strong> peças anatômicas<br />

<strong>de</strong> um c<strong>em</strong>itério da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Salvador (amostra B), segundo o tipo <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>nte.<br />

Tipos <strong>de</strong>ntários % perdidos Número <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>ntes<br />

Molares superiores 42,609 115<br />

Molares inferiores 35,000 100<br />

Molares 39,070 215<br />

Pré-molares superiores 44,737 76<br />

Pré-molares inferiores 53,846 156<br />

Pré-molares 50,862 232<br />

Caninos superiores 66,667 66<br />

Caninos inferiores 53,719 121<br />

Caninos 58,289 187<br />

Incisivos superiores 71,795 117<br />

Incisivos inferiores 70,168 238<br />

Incisivos 70,704 355<br />

Dentes superiores 56,417 374<br />

Dentes inferiores 57,073 615<br />

Total <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntes 56,825 989


38 Oliveira et al. Odontologia e Socieda<strong>de</strong><br />

são, a mais volumosa das raízes <strong>de</strong>ntárias, além <strong>de</strong> ligeiramente<br />

curva, o que explicaria sua menor prevalência <strong>de</strong><br />

perda <strong>de</strong>ntária post mort<strong>em</strong>. Os pré-molares, <strong>em</strong> geral,<br />

apresentam uma única raiz g<strong>em</strong>inada, não sendo incomum<br />

a bifurcação nos <strong>de</strong>ntes superiores. E os molares, <strong>em</strong> geral,<br />

apresentam três raízes, com exceção dos terceiros molares,<br />

que apresentam gran<strong>de</strong> variação quanto a este aspecto <strong>de</strong><br />

sua morfologia.<br />

A observação da maior prevalência <strong>de</strong> perda <strong>de</strong>ntária<br />

post mort<strong>em</strong> nos <strong>de</strong>ntes incisivos coaduna com os achados<br />

<strong>de</strong> Borrman et al. (1996), que analisaram um esqueleto<br />

humano <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> 9.800 anos, constatando a perda post<br />

mort<strong>em</strong> <strong>de</strong> 7 el<strong>em</strong>entos <strong>de</strong>ntários, dos quais 5 eram incisivos.<br />

Em relação ao estudo supl<strong>em</strong>entar (amostra B), encontrou-se<br />

um gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> arcos <strong>de</strong>ntários totalmente<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong>ntados, o que po<strong>de</strong> ser atribuído à diss<strong>em</strong>inação da<br />

utilização <strong>de</strong> próteses totais como forma <strong>de</strong> tratamento<br />

odontológico, mas que também pod<strong>em</strong> reportar a grupos<br />

sócio, econômico e culturalmente marginalizados. Outro<br />

aspecto observado foi a não padronização das perdas <strong>de</strong>ntárias;<br />

isto é, praticamente não houve diferenças nas perdas<br />

<strong>de</strong>ntárias superiores e inferiores, o que po<strong>de</strong> ser imputado<br />

à forma <strong>de</strong> armazenamento <strong>de</strong>stes crânios, postos <strong>em</strong> sacos<br />

plásticos juntamente com todo o esqueleto e <strong>em</strong>pilhados<br />

uns sobre os outros. Foi também observado prevalência <strong>de</strong><br />

perdas <strong>de</strong>ntárias post mort<strong>em</strong> ainda mais elevada que para<br />

a amostra A, o que po<strong>de</strong> ser explicado pelas condições <strong>de</strong><br />

manipulação e armazenag<strong>em</strong> <strong>de</strong>ste material no c<strong>em</strong>itério,<br />

ou mesmo r<strong>em</strong>eter a possíveis evidências da prática con<strong>de</strong>nável<br />

do comércio ilegal <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntes.<br />

Conclusões<br />

1. Nas amostras estudadas foi constatada a ocorrência<br />

<strong>de</strong> elevada porcentag<strong>em</strong> <strong>de</strong> perdas <strong>de</strong>ntárias, sendo possível<br />

distinguir-se através <strong>de</strong> parâmetros visuais (sinais <strong>de</strong> cicatrização<br />

alveolar) se as mesmas se <strong>de</strong>ram antes ou após a<br />

morte do indivíduo.<br />

2. Na amostra A, as perdas <strong>de</strong>ntárias post mort<strong>em</strong> apresentaram<br />

padrão <strong>de</strong> prevalência mais elevada nos arcos<br />

superiores e nos <strong>de</strong>ntes incisivos.<br />

3. Existe a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cuidados redobrados no<br />

manejo dos <strong>de</strong>spojos humanos, no sentido <strong>de</strong> se evitar a<br />

ocorrência <strong>de</strong> perdas <strong>de</strong>ntárias post mort<strong>em</strong>, pois a ausência<br />

dos el<strong>em</strong>entos <strong>de</strong>ntários po<strong>de</strong> inviabilizar uma i<strong>de</strong>ntificação<br />

individual.<br />

Agra<strong>de</strong>cimentos<br />

Ao Prof. Dr. Edson Liberti, Diretor do Museu <strong>de</strong><br />

Anatomia <strong>Humana</strong> do Instituto <strong>de</strong> Biociências da Universida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> São Paulo, que nos permitiu acesso à amostra do<br />

presente trabalho.<br />

Referências Bibliográficas<br />

1. Borrman, H.; Engstrom, E.U.; Alexan<strong>de</strong>rsen, V.;<br />

Jonssom, L.; Gerdin, A.L.; Carlsson, G.E. (1996)<br />

Dental conditions and t<strong>em</strong>poromandibular joints in an<br />

early mesolitic bog man. Swed Dent J. 1-2, 1-14.<br />

2. Halik, J. (1991) New York State <strong>de</strong>ntists report to<br />

disaster. N.Y. State Dent J. 4, 23, Apr.<br />

3. McKeown, A.H.; Bennett, J.L. (1995) A Preliminary<br />

Investigation of <strong>Post</strong>mort<strong>em</strong> Tooth Loss. Journal of<br />

Forensic Sciences 5, 755-57, Sep.<br />

4. Miranda, R.F.S. (1995) Avaliação cronológica da cicatrização<br />

alveolar através <strong>de</strong> radiografias voltadas<br />

para o interesse pericial. Dissertação <strong>de</strong> Mestrado <strong>em</strong><br />

Ciências, Área <strong>de</strong> Odontologia Legal e Deontologia,<br />

Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Odontologia <strong>de</strong> Piracicaba, Universida<strong>de</strong><br />

Estadual <strong>de</strong> Campinas.<br />

5. Serra, D.O.; Ferreira, F.V. (1976) Anatomia Dental.<br />

2ed., São Paulo: Artes Medicas.<br />

6. Smith, B.C.; Holland, M.M.; Sweet, D.L.; Dizinno,<br />

J.A. (1997) DNA and forensic odontology. In: Manual<br />

of Forensic Odontology, ed. C.M. Bowers and G.L.,<br />

BELL, pp. 283-98., 3 rd edition, Ontario: American<br />

Society of Forensic Odontology.<br />

7. Whittaker, D.K.; MacDonald, D.G. (1989) A Colour<br />

Atlas of Forensic Dentistry London: Wolfe Medical<br />

Publications, p. 49.<br />

8. Whittaker, D.K.; Molleson, T. (1996) Caries prevalence<br />

in the <strong>de</strong>ntition of a late eighteenth century<br />

population. Arch Oral Biol 1, 55-61, Jan.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!