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DIREITO DAS COUSAS<br />

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V


DAS<br />

POR<br />

LAFAYETTE HOÜRICUES PEKEI1LY<br />

Adaptação ao Codig-o Civil<br />

POR<br />

JOSE BON.F -CIO DE ANDR DA E m h<br />

/é—y-<br />

3HJ i 2<br />

Re rS.<br />

KIO DE JANEIRO<br />

Typ. BAPTISTA DE SOUZA<br />

Rua da Misericórdia 51<br />

1922<br />

V ;P


Em trabalho que estamos a termina<br />

fayette, escriptor de direito, estas palavras :<br />

Em 1877, Lafayette, já com a fulgida aureola de um<br />

saber vasto e solido, augmenta a riqueza de seu escrinio publicando<br />

o «Direito das Cousas», porventura a mais notável<br />

das suas obras, tractado de direito indispensável aquém milita<br />

no foro, quer como advogado ou juiz, a quem faz o seu<br />

curso nas academias, a quem deseja illustrar seu espirito nos<br />

assumptos jurídicos.<br />

Esse livro tem de figurar em todas as bibliothecas<br />

de direito, tem de ser lido e meditado, é um thesouro zelado<br />

pelos que o possuem, resiste ao tempo, á evolução da<br />

sciencia, tal a íorça das verdades que encerra.<br />

Excluída a posse, cujo conceito se ampliou num desenvolvimento<br />

immenso com as doutrinas de Ihering, as<br />

outras matérias expostas no «Direito das Cousas» ahi estão a<br />

enfrentar o progresso jurídico e tiveram solemne consagração<br />

no Código Civil.<br />

Tendo em vista o valor desse livro, e a circumstancia<br />

de ter sido decretado o Código Civil depois da sua ultima<br />

edição, resolvemos reedital­o com a inclusão do Código<br />

facilitando assim aos estudiosos do direito o confronto das<br />

doutrinas do exímio jurisconsulto com as disposições legaes.<br />

■ - %


Então ver-se-á a justeza dos conceitos proferidos no<br />

Instituto dos Advogados pelo eminente professor Dr. Pinto<br />

da Rocha, em relação a Lafayette :<br />

«E para demonstrar, disse o distincto professor, a marmórea<br />

contextura dos seus períodos, a insuperável clareza<br />

das suas formulas jurídicas bastará observar o Código Civil<br />

Brasileiro em cujo texto ha artigos que são reproduções exactas<br />

de trechos, de períodos oracionaes, de proposições sobretudo<br />

do tratado do «Direito das Cousas».<br />

Bastará citar o trecho do § 15 á pag. 40 da 2? edição<br />

dessa obra admirável que o artigo 522 do Código repetio<br />

quasi ipsis litteris, de tal modo que com a troca de duas palavras<br />

poderia dar se a juxtaposição.<br />

E assim se verifica que não foram só muitas das theses<br />

e doutrinas das suas obras que venceram no Código; foram<br />

também asobriedade,a concisão algebrica,a clareza transparente,<br />

a correcção impeccavel do seu estylo lapidar, no<br />

qual o legislador brasileiro de 1916 encontrou as formulas<br />

precisas para a codificação civil nacional já elaboradas insuperavelmente<br />

desde 1869.»<br />

Publicando, pois, o Direito das Cousas acompanhado<br />

dos artigos do Código Civil, estamos convencidos de<br />

prestar serviço util ás lettras jurídicas, disseminando mais<br />

uma vez as magníficas lições do conselheiro Lafayette.<br />

Commentaries nossos, quaesquer que fossem, seriam<br />

descabidos atcendendo a que inspirando-se o Código Civil<br />

nas doutrinas do "Direito das Cotisas» já este lhe serve de<br />

com n - i tari o valioso, com a profundi ladé do saber e do vigi<br />

ro->o espirito oo inexcedivel jurisconsu.to.<br />

R ; o de Janeiro 30 de junho de 1922.<br />

y usé Bonifacio de Andrada e Silva,


PREFACIO<br />

■*»<<br />

—Sed summa sequar fastigia rerum.<br />

Faz objecto do presente livro o Direito das Cotisas.<br />

Sob esta denominação se comprehendem a posse, o dominio<br />

e os modos de adquiril­o, os direitos reaes separados do dominio<br />

{jura in re aliena), a saber : o usufructo, o uso e a habitação,<br />

as servidões, a emphyteuse, o penhor, a antichrese e a hypotheca.<br />

Aquella simples nomenclatura é por si só sufficiente para<br />

fazer antever a gravidade e o alcance da materia : quer dizer<br />

que estamos á braços com o Direito de propriedade.<br />

Nas condições da vida humana, neste mundo que Kant<br />

chamava—fenomenal,—a propriedade, isto é, o completo de cousas<br />

corporeas susceptiveis de appropriaçao, representa o papel<br />

de um elemento necessário. A subsistência do homem, a cultura<br />

e o engrandeciménto de suas faculdades mentaes, a educação e<br />

o desenvolvimento dos germens que a mão da Providencia depositou<br />

em seu coração, dependem essencialmente das riquezas<br />

materiaes.<br />

D'ahi o caracter sagrado da propriedade. Ella é sagrada<br />

porque tem a sua razão de ser, a sua finalidade, nos elevados destinos<br />

do homem.


VI<br />

Todas, as escolas, assim as antigas como as modernas, a<br />

aceitão. Ha perfeito accordo quanto a legitimidade do principio;<br />

a discórdia só surge, e enérgica, sediciosa, profunda, na maneira<br />

de organisa-la.<br />

O estigma, com que Rousseau fulmina o primeiro homem<br />

que cercou um campo e se proclamou senhor délie, e a qualificação<br />

candente de Proudhon, são gritos de indignação antes contra<br />

a legislação do que contra o principio da propriedade.<br />

Em cada paiz tem a propriedade a sua organisação juridica.<br />

O conjuncto das disposições que formão aquella organisação,<br />

reduzida á um corpo de doutrina systhematico, recebe o nome<br />

de Direito d


VII<br />

instituições humanas são impotentes para reter e conservar as<br />

cousas fora do seu estado natural, pensamento que Horacio com<br />

a liberdade de poeta exprimira nesta pintura, tão viva e tão enérgica<br />

:<br />

Nafuram èxpcílas fur ca, tamen usque recurret,<br />

Et mala perrumpet fwtim fastidia victrix (*)<br />

O Direito civil moderno dos povos cultos em materia de<br />

propriedade se construiu sobre as bases do Direito Romano.<br />

O systhema feudal, productodo enfraquecimento das raças<br />

conquistadas, em fusão com os vencedores que vierão do Norte,<br />

vasto apparelho que succumbiu para dar espaço á democracia triumphante,<br />

introduziu no regimen da propriedade do Direito Romano<br />

profundas alterações, conseqüências naturaes da necessidade<br />

de apoiar no solo a dominação dos senhores sobre as miseras<br />

populações escravisadas.<br />

O Direito feudal acerca da propriedade ha de figurar sempre<br />

na historia como um monumento de iniqüidade e de extravagância,<br />

de despréso pela dignidade humana, do mais atroz sacrifício<br />

da igualdade do Direito ás exigências brutaes de um individualismo<br />

selvagem.<br />

Mas, desde que foi assumindo parte importante e proeminente<br />

na direcção dos governos, o elemento democrático começou<br />

de demolir a superstructura feudal, e afinal acabou por fazer restituir<br />

ao Direito de propriedade as normas simples e justas do<br />

Direito Romano, corrigindo-as com a introducção dos temperamentos<br />

moraes da philosophia christã.<br />

O código civil francez e os que o tomarão por modelo,<br />

consagrão em suas disposições, o triumph o esplendido daquelle<br />

movimento de idéas.<br />

Em Portugal, onde ou nunca reinou o feudalismo, ou exerceu<br />

fraquissima influencia, subsistiu sempre, ou pelo menos do<br />

século XII em diante, o regimen da propriedade do Direito Romano,<br />

supposto o impedissem de funecionar regularmente a instituição<br />

dos morgados, as concessões de bens da Coroa, o viciamento<br />

da emphyteuse e a decadência das leis da amortisação<br />

(*) Epist. I, 11, ver. 24—25,


VIII<br />

A historia do Direito algum dia ha de pagar ao velho<br />

reino do occidente a homenagem de admiração e reconhecimento<br />

que lhe deve. Muitas das doutrinas que a revolução escreveu<br />

no código civil francez, vigoravão de ha séculos nas ordenações<br />

e nas praticas dos tribunaes portuguezes. A precessão em assumptos<br />

desta natureza é uma palma que reverdece e não murcha<br />

entre as que a victoria colheu no Oriente.<br />

O Direito que entre nós regula a propriedade, é ainda o<br />

Direito que herdamos de Portugal, salvo uma ou outra reforma<br />

parcial e as modificações determinadas pelo novo regimen politico,<br />

Direito notável pelo merecimento interno de suas disposições,<br />

mas imperfeitissimo na fôrma externa.<br />

Constitue o fundo da sua contextura o Direito Romano no<br />

próprio texto latino.<br />

A legislação escripta, cheia de lacunas e omissões, não<br />

regula os assumptos de uma maneira cabal e systhematica ; limita-se,<br />

de ordinário, a formular simples alterações e emendas, verdadeiros<br />

retoques do corpo preexistente—o Direito Romano.<br />

A accessão trazida polos costumes e pelas tradicções do<br />

foro, sobre ser minguada, não offerece a firmeza, a precisão e a<br />

segurança que devem caracterisar as regras do direito.<br />

Embora seja a principal e a mais abundante fonte do nosso<br />

dogma jurídico, o Direito Romano só intervém na formação do<br />

nosso Direito objectivo, como direito meramente subsidiário. Ainda<br />

mais : as suas disposições não valem por si sós ; carecem<br />

ainda de reunir um caracter extrinseco e de sua natureza vago e<br />

indefinido—a conformidade com a boa ração, ou com as legislações<br />

dos povos cultos, as vezes divergentes entre si. Falta-lhe,<br />

pois, o predicamento de lei escripta.<br />

Nos povos em que a legislação nacional é defectiva<br />

e recebe o seu complemento do Direito Romano, como na antiga<br />

Allemanha, o poder judiciário exerce na formação do Direito<br />

uma grande influencia. E' pelo seu órgão que se opera a transformação<br />

das instituições antigas, é pela sua acção lenta, mas<br />

efficaz, que o pensamento nacional, a indole do povo,<br />

as exigências da sociedade, os costumes, perfazem o trabalho de<br />

accommodação do Direito Romano á nova ordem de cousas.<br />

Neste sentido algum serviço prestarão os antigos tribunaes<br />

portuguezes. Ainda hoje o subsidio de praxe, que temos,<br />

é o que nos deixou a jurisprudência portugueza.


Jurisprudência brazileira, pôde se dizer sem temeridade,<br />

ainda não a temos.<br />

lX A collecção dos julgados dos nossos tribunaes não offerece<br />

consistência para formação de uma jurisprudência. Carecterisa-os<br />

a mais assombrosa variedade na intelligencia e na applicação<br />

do Direito. Não exprimem tendência alguma, nem o predominio'<br />

do rigor seientifico, nem o affrouxamento da equidade<br />

pratica. Acervo informe de contradicções e incoherencias, muitas<br />

vezes a negação das doutrinas mais conhecidas e dos princípios<br />

mais certos, essa collecção de julgados tem todos os defeitos<br />

e todas as singularidades das creações, que são antes a obra<br />

do instincto cego, á mercê de influencias accidentaes e passageiras,<br />

do que o producto da razão humana, illuminada pela sciencia<br />

e pela discussão. >^><br />

Quem, pois, empr-jhende escrever um livro de doutrina<br />

sobre qualquer dos assumptos regulados pelo nosso Direito Civil,<br />

trava luta com as immensas difficuldades, que de todos os lados<br />

sugerem as lacunas e as incertezas do Corpo de Direito vigente.<br />

Para se construírem as theorias é mister, desde que faltão<br />

os poucos textos escriptos, consultar os costumes, as tradições<br />

do foro, o Direito Romano, a boa razão, os códigos estrangeiros,<br />

as opiniões dos práticos.<br />

Nesta variedade discordante de fontes, como chegar a elementos<br />

lógicos, precisos e certos ? E como dar aos resultados<br />

colhidos a autoridade da certeza legal ?<br />

Em lida com todas aquellas difficuldades, puzemos em pratica<br />

os diversos processos scientificos, para extrahir desse corpo<br />

de regras, tão informe, as doutrinas que nos parecerão exprimir<br />

mais correctamente o estado actual do nosso Direito.<br />

Eis o que nos cumpria dizer quanto as fontes.<br />

Agora outra face do assumpto.<br />

As pessoas pouco familiarisadas com os estudos jurídicos<br />

acreditão que o Direito Civil, preso á letra dos textos, não é<br />

capaz de progresso, senão por via de reformas legislativas.<br />

Este modo de ver é incorrecte<br />

Certo, os textos não podem ser alterados senão por via de<br />

decretos de poder legislativo, mas a formação scientifica do Direito<br />

caminha perpetuamente, não obstante a immobilidade da<br />

lei.<br />

O Di r eito objectivo, isto é, os textos, as fontes, encerrão<br />

os princípios reguladores ; esses princípios, porém, entregues á<br />

IX


X<br />

lógica dos jurisconsultes e á casuística da pratica, desabrochão<br />

de conseqüências em conseqüências, tomão os mais largos desenvolvimentos<br />

e recebem applicações sorprendentes.<br />

D'envolta com as regras expressas subsistem as regras latentes<br />

(1), germens fecundos que o legislador, formulando o pensamento<br />

e a necessidade do seu tempo, depositou no texto da<br />

lei, sem uma consciência clara do assumpto. A sciencia e a pratica<br />

arrancão aquellas regras dos veios em que permanecem occultas,<br />

e, dando-lhes uma precisão luminosa, as reduzem á máximas<br />

definidas.<br />

Ainda mais. A combinação dos diversos elementos fornecidos<br />

pelos textos permitte á sciencia a formação de novas noções<br />

e de novas regras (2),<br />

Assim, pois, de geração em geração, a doutrina, ainda tendo<br />

sempre por base a mesma collecção de textos, progride, muda<br />

de physionomia, se enriquece, se completa, se aperfeiçoa.<br />

E' disto exemplo brilhante o Direito Romano. Aquelles<br />

textos admiráveis de precisão, de energia, de agudeza e profundidade,<br />

descanção, ha muitos séculos, na immobilidade da morte.<br />

Mas a sciencia dogmática do Direito Romano não estaciona,<br />

progride sempre, e em cada século, renova de face. Um grande<br />

numero de verdades que escaparão á penetração da Gloza, e á<br />

exegese dos grandes jurisconsultes do século XVI, ahi surgem<br />

com todo o brilho da sua belleza antiga nos escríptos dos modernos<br />

romanistas da Allemanha.<br />

O Código Civil Francez é de hontem. Pois bem : o corpo<br />

de doutrina que se organiza sobre seus textos, cresce e diariamente<br />

se aperfeiçoa. Compare-se a exegese e a doutrina dos escriptores<br />

mais modernos com os trabalhos dos primeiros corarnentadores;<br />

confronte-se a jurisprudência esboçada nos arestos<br />

da Corte de Cassação nos primeiros tempos, com a jurisprudência<br />

fixada de 1830 para cá. Que progresso, que riqueza de desenvolvimentos,<br />

que revelações !<br />

Um escriptor, aliás estímavel, assustado diante deste phenoineno,<br />

exclamava : « O código civil francez é hoje apenas um<br />

mitho ; os escriptores e os tribunaes da França o dilacerarão e<br />

estão a fazer um Direito Civil que não é o do seu código». Não:<br />

os escriptores e os tribunaes francezes nem dilacerarão o código,<br />

(1) Ihering, L/£sprit du Droit Eomain. Introduct, § 3.<br />

(2) Ihering:, loc. cit.


nem estão a fazer um Direito Civil que não é o do código, mas estudão-no<br />

por todas as suas faces, procedem á investigações profundas<br />

e fazem poderosas combinações: deste trabalho resultão<br />

magníficas e sólidas theorias que. não são senão o Direito do<br />

Código, scientificaruente formulado.<br />

Perderia a razão de ser o livro, que neste momento offerecemos<br />

aos amigos dos estudos juridicos, se em sua composição<br />

não fossem aproveitados, na medida de nossa fraqueza, os<br />

progressos scientificos do Direito nos assumptos que entrão em<br />

seus quadros.<br />

Sob este aspecto a novidade do livro, comparado com o<br />

que se ha escripto sobre o nosso Direito, se revela na exposição<br />

das doutrinas, na classificação e organisação lógica dos princípios<br />

e nos corollarios deduzidos (*).<br />

Porão-nos de grande auxilio a elaboração scientifica por<br />

que nestes últimos tempos ha passado o Direito Romano na Allemanha,<br />

e os grandes trabalhos de exegese sobre o Código Civil<br />

Francez.<br />

O Direito Romano é ainda, como acima observamos, a fonte<br />

mais abundante das regras do nosso Direito.<br />

O código civil francez, bem como os demais códigos,<br />

não são senão a accommodação escripta do Direito Romano á<br />

civilisação moderna. A decretação desses códigos tirou, é certo,<br />

ao Direito Romano a autoridade externa de lei, mas sem embargo,<br />

elle conserva uma autoridade talvez maior ; — continua a ser<br />

a substancia, a regra, o molde do pensamento jurídico moderno.<br />

(**)<br />

D'ahi uma certa unidade de doctrina, em toda a Europa,<br />

nos pontos fundamentaes do Direito Civil. Póde-se, pois, dizer<br />

hoje o que dizia um escriptor notável á outro propósito : Não<br />

é raro ver-se um jurisconsulto italiano procurar a solução de uma<br />

dificuldade do Direito de seu paiz nos tratados dos escriptores<br />

allemães, e um tribunal de Hespanha invocar para justificar suas<br />

decisões os arestos dos tribunaes francezes.<br />

Ahi está a razão da utilidade directa dos trabalhos sobre o<br />

Direito Romano e sobre o Direito Francez para os nossos estudos<br />

juridicos.<br />

(*) Vej. Posse (§2 — 231), Prescripçâo acquisitiva (§ 59 — 80), as Servidões<br />

reaes (§114 — 136) a Hypotheca (§ 172 — 278).<br />

(**) Iheriag, § 3.<br />

XI


Xi!<br />

O presente livro representa um esforço, uma tentativa, um<br />

ensaio no sentido de aproximar a formação scientifica do nosso<br />

Direito, na parte que lhe serve de assumpto, do ponto á que a<br />

doctrina tem chegado nos povos cultos.<br />

Tal é a intenção do livro.<br />

Da intenção ao facto, sabem-n'o todos, vae longo espaço,<br />

difficil de vingar. Mas. .. Salis est magna voluissc.<br />

Ainda algumas palavras, e terminaremos as explicações<br />

que estamos dando ao leitor.<br />

Na formação das theorias hão de notar particular esforço<br />

para reduzir cada principio aos seus elementos lógicos mais<br />

simples.<br />

Ha nisto duas utilidades : — tornar mais clara a intelligencia<br />

das matérias e preparar soluções promptas para as questões<br />

praticas.<br />

Quantas vezes, nas controvérsias jurídicas, as questões<br />

se enredão e se complicão por falta de noções precisas das idéas<br />

elementares que entrão na composição dos princípios que dominão<br />

o assumpto ?<br />

De escriptores nacionaes e estrangeiros extrahimos com<br />

a maior liberdade tudo que fazia ao nosso intento. Nesta praxe<br />

não fizemos senão imitar os exemplos dos nossos predecessores.<br />

Um délies disse francamente : «Je prends mon bien où je le trouve.»<br />

E outro, justificava aquella usança com este pensamento<br />

de Fontenelle : «Ce n'est qu'en montant sur les épaules des autres<br />

que nous pouvons voir d'un peu loin.»<br />

Quizemos ver uni pouco longe e pois praticamos, á lettra, o<br />

conselho de Fontenelle.<br />

Aos homens versados nesta ordem de estudos pedimos<br />

venia para os nossos erros. Elles nol-a darão porque conhecem<br />

as difficuldades do assumpto.<br />

=


DIREITO DAS COUSAS<br />

§ 1. —Direitos reaes.<br />

Os direitos que formão o nosso patrimônio se dividem em<br />

duas classes : — direitos reaes e direitos pessoaes (obrigações) (1).<br />

Estes direitos tocão-se por caracteres communs e se separão<br />

por differences especificas (2).<br />

1. — O direito real é o que affecta a cousa directa e immediatamente,<br />

sob todos ou sob certos respeitos (3), e a segue em<br />

poder de quem quer que a detenha (A). Distingue-se pelas peculiaridades<br />

seguintes :<br />

a) Tem por objecto immediato cousa corporpa, movei ou<br />

immovel (5)<br />

b ) Põe a cousa que é seu objecto em relação immediata<br />

com o sujeito do direito, sem dependência de acto ou prestação<br />

de pessoa determinada, isto é : a existência e o exercicio do direito<br />

real presupõe tão somente o sujeito activo do direito e a<br />

cousa sobre que recahe (6)<br />

(1) Savigny, Droit Rom. § 98 e 36; Marezoll, § 4S e 8.2. Vej. Zachari£e,<br />

Droit Civil français, § 168.<br />

(2) Savigny, cit. § 53; Maynz, Cours de Droit Rom., J 91; Zacharise,<br />

f 177.<br />

(3) Sob todos os respeitos, se é o dominio; sob certos respeitos, se é<br />

um direito real desmembrado do dominio, como a servidão.<br />

(4) Vej. Hubero, Inst. II, I, n. 11; Heinec. Recit., I, § 331; Maynz,<br />

cit., § 91 e 162.<br />

(5) 'Savigny, § 56.<br />

(6) Grocio : Facultas homini in rem competens sine respectu ad certam<br />

personnam. Maynz, § 162: Dans les droits réels, notre droit s'applique directement<br />

à la chose; nous avons le droit et nous pouvons l'exercer sana<br />

que l'intervention d'aucun autre homme soit nécessaire. Savigny, S 56.


2 DIREITO<br />

c ) Por parte de terceiros corresponde lhe, não a obrigação<br />

positiva de dar ou fazer (7), mas a obrigação negativa e<br />

geral de lhe respeitar o exercício, — obrigação commum á todos<br />

os direitos e que se traduz na inviolabilidade qne os reveste (8).<br />

d ) üa adherencia directa e absoluta do direito real á cousa<br />

resulta que as acções creadas para protege-lo (9) podem ser intentadas<br />

contra quem quer que o usurpe ou offenda (10).<br />

2. —Os direitos pessoaes (obrigações) têm por objecto immediate,<br />

não cousas corporeas, senão actos ou prestações de<br />

pessoas determinadas (11). Um grande uumero destes zctos(obligationes<br />

dnndi), uma vez realizados, dão em resultado um direito<br />

real ou conduzem ao exercício desse direito (12), effeito, que suposto<br />

argua intimidade entre uns e outros direitos, todavia não<br />

lhes destroe a differença.<br />

Aos direitos pessoaes, attenta 3 sua essência (prestação<br />

ou acto de terceiro) corresponde a obrigação de dar ou fazer, de<br />

pessoa cuja vontade se acha vinculada por uma necessidade jurídica.<br />

A existência dos ditos direitos presupõe o sujeito activo<br />

do direito, o sujeito passivo da obrigação e o objecto do direito<br />

— o acto ou prestação.<br />

E' também outro corollario da natureza dos direitos pessoaes,<br />

que as acções destinadas a torna-los effectivos não podem<br />

(7) Maynz, II, § 255.<br />

(8) Savigny, § 56; Ortolan, Généralisât, n. 75.<br />

(9) Véj. § 81—88 adiante.<br />

(10) Hubero, Inst. II, I, n. 11; Savigny, § ©6: "la propriété absolute<br />

avec la revendication illimitée". Kan. Methaphys, du Droit, § XI: jus contra<br />

quemlibet hujus rei possessorem. C. Telles, Doctr, das ACQ., § 68.<br />

(11) Savigny, § 53; Maynz, § 162: "Ce qui constitue le véritable objet<br />

de l'obligation... c'est le fait d'une autre personne déterminée.'' Marezoil,<br />

§ 48: "Ces droits sur certaines actions et prestations d'autres personnes<br />

s'appellent obligationes, créances. On les appelle aussi droits personnels,<br />

parceque ce sont les seuls droits auxquels réponde toujours et essentiellement<br />

l'obligation d'une personne déterminée."<br />

(12) Savigny, § 56:: "...la plupart des obligations et les plus importantes,<br />

ont pour object d'arriver, pour l'intermédiaire d'une personne étrangère<br />

à un droit, réel ou du moins, à l'exercice, à la jouissance de ce droit." Tal<br />

é, por exemplo, a obrigação do vendedor de entregar a cousa vendida, e<br />

todas as obrigações de dar (ãanãi). Alguns escriptores modernos têm classificado<br />

as obrigações em obrigações de fazer (jura personnalia in specie),<br />

0 obrigações de dar (jura aâ rem). Vej. Savigny, loc. cit., nota 6.


DAS COUSAS 3<br />

ser dirigidas senão contra a pessoa vinculada pela obrigação<br />

(13).<br />

3.—Os direitos reaes e ressoaes augmentão o poder da<br />

nossa vontade sobre o mundo exterior; constituem, por assim<br />

dizer,um prolongamento artificial das nossas faculdades oriyfinaes;<br />

recahem sobre objectos externos (a cousa, natureza não livre,actos<br />

de terceiros, natureza livre,) e podem se converter em valor pecuniário.<br />

São estes os caracteres communs entre os direitos reaes<br />

e os pessoaes (14).<br />

4. — O domínio (direito de propriedade no sentido stricto)<br />

é o direito real em toda a sua comprehensão, ou antes é a synthèse<br />

de todos os direitos leaes: manifesta-se por todos os actos<br />

que o homem pôde praticar sobre a cousa corporea : é a plena pottstas,<br />

o império exclusivo e absoluto da nossa vontade sobre a<br />

cousa (15).<br />

Desta sujeição absoluta da cousa á vontade humana vem o<br />

uso de se confundir na linguagem vulgar e na jurídica o domínio<br />

com o seu objecto—a cousa—e considera-lo como cousa corporea<br />

(ló)<br />

A. O domínio é susceptível de se dividir em tantos direitos<br />

elementares quantas são as fôrmas por que se manifesta a<br />

actividade do homem sobre as cousas corporeas. E cada um dos<br />

direitos elementares do dominio constitue em si um duetto real:<br />

taes são o direito de usofructo, o de uso, o de servidão (17).<br />

Os direitos reaes, desmembrados do dominio e transferidos<br />

a terceiros se denominão—direitos reaes na cousa alheia {jura<br />

in re aliena) (18).<br />

(13) Kuber. I, II, I, n. 11: "Facultas competens in aliam personnam<br />

ut nobis aliquid det vel faciat, quod ideo producit actionem in certam<br />

personnam, non contra tertium."<br />

(14) Savigny, § 56.<br />

(15) Savigny, cit. § 56. Vej. § 25. adiante.<br />

(16) Maynz, § 162; Pellat, Princip. génér. du Droit Rom., sur la propriété,<br />

Introduct. n. 6.<br />

(17) Savigny, § 56: "Dans le cercle de la propriété, on peut concevoir<br />

une foule de dominations plus restreintes et circonscrites par le droit positif,<br />

formant d'autant de jura in re." Vej. § 25. adiante.<br />

(18) Os direitos reaes, emquanto se conservão reunidos no dominio, não<br />

fazem objecto de estudo especial, porque se absorvem nelle. A 'legislação<br />

só se occupa daquelles direitos e os regula, quando .separados do dominio<br />

— jura in re aliena. Vej. § 25, adiante.<br />

2


4 blREITO<br />

B). Será perinittido ao senhor da cousa fazer no seu domínio<br />

as desmembrações que lheaprouver paracrear direitos reaes<br />

não consagrados nas leis?<br />

A constituição de direitos reaes sobre immoveis entende<br />

directamente corn a organisação da propriedade : crea­lhe restricções,<br />

diminue­lhe o valor, e gravando­a de onus, embaraça­lhe a<br />

circulação:—o que influe directamente sobre o credito territorial,<br />

instituição, com a qual travão grandes interesses de ordem<br />

publica.<br />

Parece, pois, que é mais rasoavel a opinião de que o proprietário<br />

não pôde constituir direitos ou onus reaes que não se<br />

achão estabelecidos e regulados pelas leis (19)<br />

Era esta a doctrina do Direito Romano, e é esta a doctrina<br />

entre nós vigente (20).<br />

C). No estado actual do nosso direito são havidos como<br />

direitos ou onus reaes :<br />

O usofructo,<br />

O uso,<br />

A habitação,<br />

As servidões,<br />

O penhor, (21)<br />

A antichrese,<br />

A hypotheca, (22)<br />

Também se considera como onus real o legado de prestações<br />

ou alimeatos, expressamente consignado no immovel (23)<br />

Afora os ditos direitos, quaesquer outros que os proprietários<br />

conrirão a terceiros sobre os seus immoveis são tidos como<br />

pessoaes (24).<br />

Deixarão, pois, de figurar entre os direitos reaes :<br />

(19) Demolombe IX, n. &15; Martou I, n. 35. Em contrario, Toullier,<br />

Eli, n. 96.<br />

(20) Savigny, § 56, nota (d).<br />

(.21) Vej. § 163 adiante. A lei n. 1.237, de 24 de Setembro de 1864,<br />

art. 6" e § I o , não enumera o penhor entre os direitos reaes, ■porque ella<br />

só trata dos direitos reaes em relação aos immoveis.<br />

• '(22) Lei ir. 1.237, art. ­ 6° e.§ 1"; doer. n. 3.453, de 26 de "Abril de<br />

.. arts. 261, 262 e 263.<br />

O direito real (jús in re aliena) em relação a moveis só ê possivel<br />

no .sufrueto, uso e penhor.<br />

(2a) Lei n. 1.237, art. 6 o .<br />

(24) Lei n. 1.237, art. 6 o , § 1"; Decr. n. 3.453, art. 263.


(27).<br />

DÂS COUSAS S<br />

A superficie (25).<br />

O censo consiyuativo e o reservativo (26)<br />

Os privilégios (direitos de preferencia de certos créditos)<br />

5.—A parte do Direito Civil qne trata dos direitos reaes se<br />

intitula na moderna classificação — Direito das Cousas. E' o objecto<br />

deste livro.<br />

6.—Suposto a2"0$se jurídica não seja um direito real. senão<br />

um facto; todavia, como ella põe o homem em contacio com<br />

as cousas corporeas, g"era direitos relativos ás dita* cousas<br />

e na maneira porque funcciona usurpa as exterioridades do<br />

domínio, costumão os escriptores inclui-la no Direito das cousas,<br />

dandn-lke a precedenci i na ordem das matérias (29)<br />

(25) Vej. a cit. Lei, art. 6 o . Sobre o que seja — superficie, vej. Maynz,<br />

S 238. A essência da superficie consiste em ser direito real; tirando-se-ihe<br />

a natureza de direito real, ella deixa ás existir. Vej. § 179, not 8. adiante.<br />

(26) Vej. Consolidação da.s Leis Civis, art. 364, not., e art. 365.<br />

(27) Vej. Lei n. 1.237, art 6°, § 1".<br />

(28) Savigny, § 53; Maynz, § 91, e .Makeldy, S 120.<br />

(29) Maynz, § 166, v.; Muhlenbruch, Doctr., Pandect., § 229;<br />

Makeldey, § 239.<br />

Savigny (Possess., § 6) faz um longo e profundo estudo acerca do<br />

lugar que deve occupât- a posse no systema do 'Direito Romano. O sábio<br />

jurisconsulte observa que a ziosse é tratada no. Direito como uma condição<br />

dos interdictos ; e, raciocinando nesta ordem de idéas, a colloca entre as<br />

obrigações ex-ãelicíis; porquanto, segundo o seu modo de ver, os interdictos<br />

possessorips se basêão nas obrigações que nascem d'um delicto-


PARTE PRIMEIRA<br />

POSSE, DOMÍNIO<br />

SECÇÂO &TÍ.T7s/t'EiT'&A.<br />

CAPITULO I<br />

POSSE: SUA NATUREZA E EFFEITOS : COMO SE ADQUIRE E COMO SE<br />

PERDE<br />

§ 2. —JSoção da posse<br />

1 A posse (1) consiste no poder de dispor physiciamen<br />

(1) A nossa legislação é totalmente omissa acerca da posse, sua natureza,<br />

modos de adquirir e perder. Existem apenas dispersas nas Ordenações<br />

Philippinas e em leis extravagantes algumas disposições relativas ao U60<br />

das remédios possessorios. Neste importantíssimo assumpto, como em tantos<br />

outros, continua a vigorar o Direito [Romano com as modificações introduzidas<br />

pelo uso moderno e pela pratica de julgar.<br />

A theoria da posse do Direito Tlomano ë por ventura a parte mais<br />

systhematica e profunda daquelle Direito.<br />

Essa theoria, porém, admirável no ponto de vista scientifico, não pôde<br />

convir em todo o seu rigor aos povos modernos.<br />

Os Romanos, dando nimia importância ao elemento material da posse,<br />

a consideravão como um estado de facto, estranho aos princípios que reguião<br />

a acquisição e o exerci cie dos direitos.


s<br />

DIREITO<br />

mente da cousa, com a intenção de dono, e de defende la contra<br />

as ag-gressões de terceiro (2).<br />

Presupõe, portanto, uma cousa physicamente submettida<br />

á dominação da nossa vontade.<br />

A dominação physica da vontade sobre a cousa apparece<br />

no Direito sob dous aspectos :<br />

a ) Como ïacto que é a realização e o exercício de um direito<br />

preexistente;<br />

b ) E como facto que não se acha lig-ado á um direito anterior,<br />

mas que produz effeitos legaes.<br />

No primeiro aspecto a dominação da vontade sobre a<br />

cousa é um corollario do dominio. Aquelle que é senhor da cousa<br />

tem o direito de te-la sob sua detenção (3).<br />

No seguindo aspecto a dominação da vontade sobre a<br />

cousa é a posse.<br />

2—0 dominio não se pôde adquirir senão por titulo justo<br />

e d'uma maneira conforme ao D.reito : é um poder, urna faculdade<br />

juridica em toda a força da sua essência<br />

A posse, porém, não tem por fundamento um direito auterior<br />

de que ella seja a conseqüência e a manifestação; instaura-se<br />

pela simples acquisição do poder physico de dispor da<br />

cousa, unido á intenção de have-la como propria, nada impor-<br />

E' em sentido contrario a tendência do Direito Moderno, iniciada pelo<br />

Direito Canonico, continuada pelos civilistas práticos e fortemente accusada<br />

nos códigos promulgados do século passado para cã. Ha manifesto esforço<br />

para subordinar a posse, tanto quanto o permitte a sua natureza,<br />

ao principio do direito.<br />

A lei franceza, por exemplo, só a protege com a acção competente,<br />

Quando perdura pelo menos um anno e reúne as qualidades para produzir<br />

a usucapião. Cod. do Proc. Civil, art. 23; Cod. Civil, art. 2.229, e Zachariœ.<br />

§ 188. Vej. igualmente o C. C. do Chile art. 918, e o Portuguez, art. 48S.<br />

Este espirito se manifesta nas modificações que a nossa jurisprudência<br />

tem imposto ao Direito Romano, como adiante se verá.<br />

(2) Savigny (Traité de Ia posses., traduit par Henri Staedtler,<br />

7me. édit, 1870), § I o ; Maynz, Droit. Rom., § 166; «Mello, S, 2, § 5: -Naturalis<br />

facultas rei ipsistendi animo sibi habendi.<br />

(3) E' o jus possiãenãi, attributo d° dominio que não se deve confundir<br />

com o jus poLsessionis—posse. Vej. Savigny, cit. § I o ; Marezoll, § 88.


DÀS COUSAS 9<br />

tando se por modo justo ou injusto (4): e, uma vez adquirida,<br />

produz effeitos legaes (5).<br />

A posse é, pois, em sua origem e essência distincta do dominio<br />

: (b) tem vida propria e independente ; pode ou subsistir<br />

só, ou coexistir com elle.<br />

3. --Suposto seja um poder de natureza diversa, a posse<br />

reveste as apparencias e os caracteres exteriores da propriedade.<br />

Com effeito, no modo por que ella funcciona, é o exercicio de<br />

facto, sem a legitimação de um principio juridico, das faculdades<br />

que constituem o dominio ou o direito de propriedade (7).<br />

4,—E', certo, para notar, como sendo um poder que se<br />

gera fora das normas do Direito, viesse a posse a alcançar a protecção<br />

das leis e a tomar tão largos desenvolvimentos entre as<br />

instituições juridicas.<br />

Para isto concorrerão razões ponderosas e de ordem elevada :<br />

l. a — A primeira entende com o respeito devido á personalidade<br />

humana. A posse é a vontade do homem á actuar sobre<br />

uma cousa externa; exprime um estado da pessoa, isto é, a<br />

pessoa em contado com a cousa. Os actos que têm por fim perturbar<br />

aquelle contacte ou subtrahir a cousa á acção do homem,<br />

importão offensa á pessoa. Assim, pois, para resguardar ainv,olabilidade<br />

da pessoa humana, alei se vio forçada a proteger a posse (G)<br />

2:—Ura dos principaes litis do Estado é a organisaçào de<br />

um Poder, incumbido de fazer reinar o direito, e de restabelecer<br />

o seu império onde quer que seja violado. D'ahi o principio<br />

fundamental—que ninguém se pôde fazer justiça por suas proprias<br />

mãos (9). Permittir que aquelle que se julga com melhor<br />

titulo á posse da cousa, perturbasse ou usurpasse a posse em cue<br />

(4) Fr. 3, § 5, D. de adq. poss. in yumma possessionis non<br />

multum interest, juste quis an injuste possideat. Fr. 1, § 9. D<br />

Utipossidet., 43,17.<br />

(5) Vej. adiante, § 4.<br />

(6) Fr. 5, D. de adq. poss.. 41,2: Nec possessio et proprietas misceri<br />

debent. Fr. 12, § I o . D. eoãem. Nihil commune habet proprietas cum pessessione.<br />

Ord. 3.40, § 2; 78 § 3; 4.58 pr. e § I o .<br />

(7) Savigny, § I o ; Maynz, § 166. Os actos possessorios, como o de<br />

cercar o terreno, o de cultival-o, o de cortar arvores, se confundem no<br />

ponto de vista material com os actos dominicaes do proprietário.<br />

(8) E' a doctrina de Savigny (§ 6). Vej. IMaynz, § 166. Em contrario,<br />

Muhlenbruch, Doctr. Pandect., § 229, nota 7.<br />

(9) Fr. 176, pr. D. de reg\ jur., 50,17; fr. 13. D. Quod metus causa.<br />

4,2. Vej. Marezoll, § 48.


10- DIREITO<br />

outro está dessa mesma cousa, seria infringir o dito principio,<br />

seria plantar no seio da sociedade a anarchia, a desordena, a confusão<br />

(10).<br />

3".—A' estas razões, além de outras de utilidade pratica<br />

(11) accresce que na generalidade dos casos a posse anda ligada<br />

ao dominio. Nada, pois, de mais natural do que induzir delia a<br />

presumpção de propriedade, e portanto colloca-la sob a protecção<br />

da lei (.2).<br />

5. — Mas, qualquer que seja a proteção que a lei dá á posse,<br />

essa protecção não firma um estado de cousas inconcusso e<br />

perpetuo. A posse, adquirida de um modo injusto, succumbe afinal<br />

diante do direito (13).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 485 — Considera-se possuidor todo aquelle Que tem de facto o exercício<br />

pleno, ou não, de algum dos poãeres inhérentes ao dominio, ou propriedade.<br />

— 487, 493 e 497.<br />

Art. 486 — Quando, por força de obrigação ou direito, em casos como o<br />

do usufructuario, do credor pignoraticio, do locatário, se exerce, temporariamente,<br />

a posse ãirecta, não annulla esta, ás pessoas, de Quem elles


DAS COUSÁS II<br />

§ 3.—Elementos da posse.<br />

1.—A posse, como se deduz da sua noção (§ 2?) consta<br />

de dous elementos : um material (corpus),—a detenção physica da<br />

cousa; outro moral, (animus)—a intenção de ter a cousa como<br />

propria (14).<br />

A posse resulta da união destes elementos. Um délies sem<br />

o outro é insuficiente para gera-la (15).<br />

A detenção é o facto material que submette a cousa á vontade<br />

do homem e créa para elle a possibilidade de dispor physicamente<br />

delia, com exclusão de quem quer que seja (16).<br />

O elemento moral, a intenção, consiste na vontade de possuir<br />

a cousa como propria (animo sibi habendi).<br />

2.—Esta intenção não se deve confundir com a intenção<br />

do senhor (dominus), conscio de seu direito. A intenção do proprietário<br />

legitimo tem por objecto o dominio; a intenção do mero<br />

possuidor exprime tão somente a deliberação de reputar a cousa<br />

E sendo restituido, poderão litigar ordinariamente sobre a propriedade." Na<br />

acção de reivindicação, provado o domínio, o reivindicante vence, o possuidor<br />

é vencido.<br />

A'cerca da excepção de dominio nas acções possessorias, veja adiante<br />

§ 22, not. 6.<br />

(14) Fr. 3, § 1.° D. de adq. vel amitt. poss (41,2): Adipiscimur possessionem<br />

corpore et animo.<br />

(15) Fr. 3, §1." (D. 41,2): corpore et animo, negue per se anvmo aut<br />

per se corpore.<br />

(16) Veja-se adiante § 10.<br />

A detenção sem o animo sibi habendi, é um meio facto, sem relação com<br />

a acquisição de um direito. Tal é o caso do depositário, do commodatario, do<br />

locatário, os quaes detêm a cousa em virtude de titulo que importa o reconhecimento<br />

de direito de terceiro e exclue a intenção de possuil-a como propria.<br />

Os Romanos designavão a detenção pelas palavras — tenere, corporaliter<br />

possiãere, esse in pos^essione,<br />

A respeito da mera detenção, convém notar:<br />

1." Que ella não é um facto mecânico, mas que, sendo acto de um ser racional,<br />

exprime sempre uma deliberação do espirito. Tenere non est corpore<br />

rem contingere, sed ita attingere ut affectionem tenendi habeas. Doneau,<br />

L. 5, T. 13, § 4. Assim a detenção presupõe a intenção de reter a cousa, sem<br />

incluir o pensamento de tel-a como propria.<br />

2.° Que a mera detenção, embora desligada de relação directa com um<br />

direito, é muitas vezes não a causa, mas a occasião do exercicio de certos<br />

direitos. Assim, aquelle que detém a cousa, pôde repellir as vias de facto<br />

empregadas para arrebatal-a, ou recusar a restituição por motivo de bemfei-


12 DIREITO<br />

por sua e de proceder em relação a ella como se fosse verdadeiro<br />

senhor (17).<br />

3.—Da doctrina exposta resultão os corollarios seguintes<br />

:<br />

1.°—Que o possuidor não reconhece sobre a cousa direito<br />

superior ao seu (18);<br />

2.°—Que a intenção de possuir a cousa como propria nem<br />

sempre presupõe no possuidor a convicção de que a cousa realmente<br />

lhe pertence (19).<br />

§ 4.—Fffeitos legaes da posse.<br />

Tem-se attribuidoá posse muitos e numerosos ef feito s (20),<br />

mas o estudo severo de sua noção e das différentes relações sob<br />

torias e despezas com a mesma cousa (propter debit um cum re junctum).<br />

(Ord., iL. 4, T. 54, § 1.°). No primeiro caso, o direito exercido é o de legitima<br />

defesa; no segundo o de justa indemnização, fundado em uma razão de<br />

equidade: — exceptio doli mali. Zacharice, § 184.<br />

(17) Tal é a intenção do possuidor que sabe não ter direito â cousa. como<br />

a do salteador, a do que esbulha o proprietário. Savigny, § 9.<br />

(18) A intenção, em que está o possuidor de ter a cousa como propria,<br />

exclue necessariamente o reconhecimento do direito de terceiro. E' diversa<br />

a posição do simples detentor, como a do locatário, o qual reconhece o direito<br />

do proprietário.<br />

(19) Opinio seti cogitatio dominii: o salteador, por exemplo, possue a<br />

cousa roubada, mas tem a consciência que ella não lhe pertence. Savigny,<br />

cit. § 9.<br />

(20) Os glosadores e os jurisconsultes que se lhe seguiram, davam ã<br />

posse um grande numero de effeitos. Houve até um que chegou a attribuirlhe<br />

setenta e duas beatitudes. (Savigny, § 3). Mas a analyse desses effeitos<br />

demonstra que são devidos a outras causas que não á posse.<br />

Por exemplo:<br />

!.° "O direito de fazer seus os fruetos percebidos." Não é effeito da posse,<br />

mas da propriedade putativa que deriva da acção Publiciana. (Savigny, § 3<br />

e 22, a.) Veja adiante § 56 e 88.<br />

2.° "Na acção de reivindicação, o possuidor vence, se o autor não<br />

prova o seu domínio." Xão ê uma conseqüência da posse, mas do principio<br />

geral de processo: semper necessitas probanãi incumbit illi qui agit. (Savigny.<br />

§ 3, n. 4).<br />

O direito de defender a posse contra vias de facto e o de reter a cousa<br />

{jus retentionis), não são effeitos da posse, como se demonstrou no § antecedente,<br />

nota 3.<br />

Não se deve confundir a oecupação e a tradição, modos de adquirir o


DAS COÜSAS 13<br />

as quaes apparece ella no campo do Direito, não ihe descobre outros<br />

effeitos além destes :<br />

a ) Dá direito aos interdictos (acções possessorias) (21).<br />

b) Conduz á prescripção acquisitiva (usucapião).<br />

c) Induz a presumpção de propriedade.<br />

1. —A lei protege a posse contra as offensas e usurpações<br />

individuaes, conferindo ao possuidor as acções necessárias para<br />

se manter neila, ou recupera-la quando injustamente perdida<br />

(§ 18).<br />

O direito de invocar os interdictos é um effeito que resulta<br />

da posse desde que ella se constitue pela-simples reunião dos<br />

seus dous elementos substanciaes, independentemente das qualidades<br />

que ella pôde revestir, de justa ou injusta, de boa ou de<br />

má fé (22).<br />

Assim que toda a posse dá direito aos interdictos. A protecção<br />

dos interdictos constitue, pois, o caracter geral da posse no<br />

sentido jurídico (23)<br />

2.—A posse é também a base fundamental da prescripção<br />

acquisitiva (uxitcapiã,); não basta porem por si só para produzir<br />

esta conseqüência, é mister ainda o concurso de outros requisitos,<br />

como justo titulo e bôa fé. Mas, como na acquisição da propriedade<br />

pela usucapião a posse é o elemento gerador dominante,<br />

não sendo os outros requisitos senão qualificações que se lhe<br />

dominio, com a posse. Sempre que se dá. a occupciyão e a tradição, concorrendo<br />

o animo sïbi habenâi, se adquire a posse; no entanto nem sempre se<br />

adquire o domínio, como se a cousa occupada pertence a terceiro, ou se a<br />

tradição é feita á non domino: donde se vê que a occupação e a tradição<br />

não se podem considerar como posse produzindo o domínio, como alguns erradamente<br />

o tem pensado.<br />

(21) A posse em relação- aos interdictos £ denominada pelos Romanistas<br />

— possessio aã interãicta, a posse que leva ã usocapião — possessio ad<br />

usucapionem,.<br />

(22) Fr. I § 9; fr. 2. D. Utipossidetis (41,17); I § 6, de interdictis<br />

(4,15); Ord. L. 4, T. 58 pr. e § 1.°-<br />

Os interdictos são a garantia de direito que a lei confere ao possuidor<br />

contra todo o facto que lhe perturba ou usurpa a posse. A posse é a causa<br />

determinante dos interdictos; a offensa á posse é occasião do seu exercício.<br />

(23) O interdicto presupõe a posse; a posse presupõe o interdicto. iNão<br />

ha posse sem interdicto. I. § 5 de interdict., (4.15); fr. 3, § 8. D. Utaposs.<br />

(41,17). . . . .


14 DIREITO<br />

exigem para aquelle fim, d'ahi procede o considerarem a usucapião<br />

como um effeito d'ella (24).<br />

§ S. —A posse é facta ou direito ?<br />

O elemento material da posse, a detenção, é em si um mero<br />

facto que não acarreta conseqüências legaes.<br />

Mas o concurso do elemento moral, a intenção, transformando-o<br />

em posse, communica-lhe caracter jurídico (26).<br />

Este caracter juridico, resultante da natureza elementar<br />

da posse, e a maneirapela qual ella tem sido tratada pela legislação<br />

civil, elevão-n'a á cathegoria de um direito.<br />

Basta memorar :<br />

1.—Que a posse inclue em si o direito de invocar os interdictos,<br />

verdadeiras acções adaptadas a protege-la contra a perturbação<br />

e o esbulho (27)<br />

2.—Que aposse subsiste, ainda em ausência do possuidor<br />

(28) ; adquire-se e conserva-se por via de representantes (29) ;<br />

liga-se a personalidades civis,destituidas de vontade propria (30) ;<br />

transmitte-se por successão (31) e é susceptível de apreciação pecuniária<br />

(32)<br />

3.—Que o direito que compete ao esbulhado para recu-<br />

(24) Alguns escriptores sustentão que a usucapião não se pôde rigorosamente<br />

reputar effeito da posse, porque' a posse por si sõ é insufficiente<br />

para produzil-a. Maynz, § 166, nota 8. Todavia a posse se acha para com a<br />

usucapião em relação tão intima e estreita, que o largo desenvolvimento<br />

que a posse alcançou no Direito é, em grande parte, devido a ser ella o vehiculo<br />

que leva á usucapião. Os interdictos e a usucapião, observa Savigny<br />

(§ 2), são a razão porque em direito ordinariamente se indaga da existência<br />

da posse.<br />

(26) Fr. 49 pr. D. de adquir. vel amit. poss. (41.2): Plurimum ex jure<br />

possessio mutuatur. Cit. fr. 49, § I o :<br />

Possessio non tantum corporis sed et juris est.<br />

(27) I. pr. de action. (4,6); fr. 51 D. de oblig. et act. (44,7): Nihil<br />

aliud est actio quam jus, quod sibi debeatur, judicio persequendi. Não ha<br />

acção a que não corresponda um direito. Vej. iMaynz, § 136.<br />

(28) Vej. adiante, § 15, n. 1.<br />

(29) Vej. adiante, § 13.<br />

(30) Taes são as corporações de mão-morta, as municipalidades.<br />

(31) Vej. § 12.<br />

(32) Ord. L. 3, T. 70, § 10; Mello, »4,23, § 9, nota.


DAS COUSAS<br />

perar a posse perdida, é um direito puro, desligado de todo elemento<br />

material, isto é, do poder physico actual sobre a cousa(33).<br />

Estes desenvolvimentos e applicações da idéa de posse<br />

serião^inintelligiveis, se ella fosse um simples facto, e não entrasse<br />

ern sua composição um elemento jurídico, energicamente<br />

accentuado (34)<br />

E' pois força reconhecer que a posse é um facto e um direito<br />

: — um facto pelo que respeita á detenção, um direito por<br />

seus effeitos (35).<br />

§ 6 ­ ­ Quaes as cousas que podem ser objecto da posse.<br />

Os dois elementos que em sua reunião formão a posse estão<br />

de si mesmos indicando quaes as cousas sobre que ella pôde<br />

recahir.<br />

1. — Não ha posse sem detenção physica. Não podem,<br />

portanto, ser objecto d'ella senão as cousas corporeas (36) susceptíveis<br />

de serem apprehendidas (37).<br />

2.—■ A posse requer ainda a intenção de ter a cousa como<br />

propria (animus sibi haberidi). Não basta, pois, que as cousas sejão<br />

susceptíveis de apprehensão : mas ainda é mister que possão<br />

ser apropriadas. D'ahi a exclusão dais cousas que estão fora do<br />

commercio, como as ruas, praças publicas, portos, templos, cemitérios<br />

(38).<br />

§. 7 — Compossessão.<br />

1.— A posse é de sua natureza exclusiva. Se alguém tem<br />

o poder de dispor physicamente de uma cousa, é evidente que<br />

(33) Ruddorf, Appendice a Savigrny, 7 a edição, n. 19, in fine<br />

(34) O facto é por sua natureza personalíssimo, inconvertivel e intransmissivel.<br />

Como, pois, alliar o facto com as applicações que a idéa da posse<br />

recebe no systhema do Direito ?<br />

(35) Savigny, § 5; Mulenbruch, § 230.<br />

(36) Fr. 3 pr. D. de adq. vel amit. poss. (41,2); Savigny, § 12. A<br />

idéa — posse, porteriormente se applicou, por extensão, ás cousas incorporeas<br />

(Jura in re aliena). A posse em relação ás cousas incorporeas recebeu<br />

a denominação de—quasi­posse: (quasi­possessio). Vej. adiante, § 16.<br />

(37) Fr. 3, § 17; fr. 30, § 1 e 3, D. adq. poss. (41,2); Savigny, § 9;<br />

Maynz, § 167, nota 11; Mello, L. 3, T. 4. § 11.<br />

(38; Savigny, § 9; Maynz, § 167.<br />

15


Ló DIREITO<br />

em relação á essa mesma cousa outro não pôde ter igual poder :<br />

— o poder d'um ani qui 11 aria o poder do uutro.<br />

Da noção da posse, pois resulta :<br />

Que duas ou mais pessoas não podem ter á urn tempo a<br />

posse da mesma cousa, possuindo-a cada um por inteiro [in solidum)<br />

(39).<br />

D'alii dons princípios de um grande valor pratico :<br />

1.° Emquanto perdura a posse antiga, não pôde começar<br />

a existir nova posse ;<br />

2.°—Firmada a existência da nova posse, a antig-a se entende<br />

extincta (40).<br />

2.— Entretanto nada obsta que diversas pessoas possuão<br />

em.commuai uma mesma cousa indivisa (pro iiidiviso) ; — é o<br />

que se chama posw commun, ou segfuudo a technolog-ia moderna<br />

— cqmpossesaâo — (compossessio) (41).<br />

Neste caso nenhum dos compossuidores possue a cousa<br />

por inteiro, mas cada um possue uma parte abatracta, e não pôde<br />

dispor senão dessa parte (42).<br />

(39) FT. 3, § 5, D. de adq. vei amit. poss. (41,2): Plures eamdem<br />

rem in solidum possidere non possunt. Contra naturam quippe est, ut cum<br />

ego aliquid teneam, tu quoque id tenere videaris. Este fragmento é celebre<br />

entre os interpretes do Direito Romano. A'cerca de sua intelligencia.<br />

vej. Savigny, § 11. Lobão, notas a Mello, L. 3, T. 2, § 8, n. 25.<br />

(40) Savigny, § 11. Se duas pessoas não podem ter a posse da mesma<br />

cousa in soliãum, segue-se que é inconcebivel a coexistência de duas posses.<br />

Os jurisconsultes usão muitas vezes destas phrases : — posse rnais antiga,<br />

posse melhor, posse fundada em melhor titulo. — (Vej. Cod. Civil 'Port.,,<br />

art. 488.)<br />

Estes modos de dizer não presuppõem, como á primeira vista node parecer,<br />

a coexistência


1>AS COÜsAS 17<br />

3.— A relação de direito entre os compossuidores é a seguinte<br />

: cada compossuidor só pôde exercer aobre a cousa actos<br />

posse&sonos que não excluem a posse dos outros compossuidores<br />

(43).<br />

E' de notar que, reahsada a divisão da cousa, cada um<br />

se reputa possuir a parte que lhe toca, desde o momento em que<br />

se estabeleceu a compossessão (44).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 488 — Se varias pesòoas possuírem cousa indivisa, ou. estiverem<br />

no goso do mesmo direito, poderá cada um exercer sobre o objecio commum<br />

actos possessorvos, conitauto que não excluam os dos outros possuidores.<br />

— 634.<br />

que detêm em commum, não terião a pos&e desse prédio. Na posse civ;l<br />

que do defunto passa aos herdeiros, estes, antes de verificado o seu numero.,<br />

como ás vezes acontece, não sabem a quota que lhes ha de caber, mas a<br />

posse délies é inconcussa.<br />

Dá-se a compossessão :<br />

I o Entre os herdeiros, antes de feita partilha ;<br />

J" Entre marido ei mulher, casados segundo o regimen da eommunhão<br />

de bens :<br />

3" Entre consoeios, acerca das cousas communs ,<br />

4 o E em geral em todos os casos, em que cabe a acção com/muni diviáunãi.<br />

(43) Eobão, Interdict., 5 271. E' o principio que regula as relações<br />

dos condôminos, applicado á compossessão. O socio que é molestado peio<br />

outro soco na posse da cousa commum, ou que é delia excluido, pôde invocar<br />

contra esse socio o remédio de força turbativa ou expoliativa. Lobão, lug. cit.<br />

(44) Este principio é de alcance pratico em questões de prescripção<br />

acquis-itiva. Vej. Cod. Civ. do Chile, art. 718.<br />

E' de notar que as cousas que pertencem á sociedade mercantil, moyeis<br />

ou immoveis, emquanto se conservão como taes, não são objecto de<br />

compossessão, porquanto, quem tem a posse 6 a sociedade, pessoa juridica,<br />

e não os sócios<br />

Varias pessoas podem ter a posse da mesma cousa e ao mesmo tempo,<br />

sob diversas relações e para effeitos diversos, como, por exemplo, o devedor<br />

e o credor pignoraticio, dos quaes o primeiro tem a posse para a usuca<br />

pião, e o segundo tão somente para os- interdictos. Pr. 16, D. de adq.,<br />

poss., 41,2.


28 DIREITO<br />

§ 8. — Terminologia, qualificações da %,osse.<br />

1 — A terminologia usual (45) do nosso Direito em materia<br />

de posse é a seguinte :<br />

Posse,<br />

Posse natural.<br />

Posse civil.<br />

2. O termo—po*se —desacompanhado de qualificativos é<br />

ordinariamente empregado para exprimir a posse juridíca, tanto<br />

a que dá direito aos interdictos (46) como a que leva á usucapião<br />

(47).<br />

3. Por posse natural se entende a posse juridica, que effectivamente<br />

e sempre assenta na detenção material (48). Esta<br />

qualificação exclue, portanto, as espécies de posse, que, por um<br />

(.45) O nosso Direito na sua terminologia acerca da posse não tem a<br />

precisão que se requer na lingua juridica, defeito de que também se resentia<br />

o Direito Romano.<br />

As tentativas hercúleas de Savigny, (§ 7), para demonstrar que as expressões<br />

possessio, possessio naturalis e possesio civilis tinhão no Direito<br />

Romano um sentido invariável e consagrado, se quebrão diante das difficuldades<br />

invenciveis que oppõem a


DAS COUSAS 19<br />

desvio da theoria fundamental, se adquirem e se conservão independente<br />

do facto physico da detenção (49).<br />

4.— Pose civil é a que se adquire por iorça da lei, sem necessidade<br />

da apprehensão material da cousa (50). Também se<br />

denomina posse citil a. que é tomada de uma maneira coulorme á<br />

lei (51).<br />

5. — A' posse andão ligadas as qualificações de justa, injusta,<br />

de boa, de ma fé.<br />

6. / osse justa em sentido lato é ;iquel!a cuja acquisiçâo<br />

não répugna ao Direito. .No caso contrario â posse se diz injusta<br />

(52).<br />

Em sentido restricto posse juita significa a que é isenta<br />

de alguni dos très vicios segniutes : — violência, clandestinidade<br />

ou precariedade (53).<br />

natural sem a detenção physiea da cousa. A posse natural a que se allude.<br />

é a posse juridica, e não simplesmente a detenção, pois que se lhe attribuem<br />

effeitos, aos quaes são equiparados os effeitos da posse civil. 'Regulamento<br />

n. 737, de 25 de Novemb. de 1850, art. 597 : "E tendo posse natural ou civil<br />

com effeitos da natural." A contraposição da post.e natural á civil accusa<br />

a differença notada.<br />

(49) Vej. § 12 adiante. Tal é a posse do herdeiro, a adquirida pelo<br />

constituto possessorio (§ 14).<br />

(50) Alv. de 9 de Novemíb. de 1774, e Assento de 16 de Fevereiro de<br />

1786; Mello, L. 3, T. 2, § 8 e nota; Dig. Port., P. I, arts. 587 e 617; Pereira<br />

e Souza, Prim. Linh., nota 788.<br />

A lei de 17 de agosto de 1767, § 7. denomina posse civilis'ima a posse<br />

em que fica a viuva, "de todos os bens do casal assim patrimoniaes como<br />

da cor'a e ordens". Aqui a posse civilissima é tomada na accepção de<br />

posse que se adquire por simples decreto da lei, sem necessidade da apprehensão<br />

material. E' uma reminiscncia da glosa.<br />

(51) Alv. de 9 de Novemb. de 1Í"74 : "Sou servido ordenar que a posse<br />

civil que os ãefunctos em sua vida houverem tido, passe logo nos bens<br />

livres aos herdeiros..."<br />

Qual é a pot se civil que o Alv. presuppôe no defuncto e que por sua<br />

morte passa aos herdeiros ? Parece que ê a posse adquirida de uma maneira<br />

conforme â Lei. O Ass. de 16 de Fevereiro de 1786 dec.ara que o<br />

Alv. allude ás posses, tomadas corporal e civilmente. (Lob., Interdict. § 51.)<br />

(52) Makeldey, § 244; Savigny, § 8; Coelho da Rocha, § 436.<br />

(53) F. 1, § 9, D. Utipossidetis, (43,17); Ord., D. 4, T. 58, pr. "E se<br />

o forçaãor não tiver direito na cousa em que fez a força." § I o : "Porque<br />

se fosse quasi-força, assim como se algum occupasse a posse de cousa vaga<br />

que não fosse por outrem corporalmente possuida." Ord., L. 4, T. 54, § 3 :<br />

3


20 DIREITO<br />

Neste aspecto a idéa de posse entra em relação com a<br />

idea de causa, d'onde a conhecida regra :<br />

«Que ninguém pôde a seu arbítrio mudar a causa de sua<br />

posse» (54).<br />

Possuidor de boa fé é aquelle que está na convicção de<br />

que a cousa por elle possuída, de direito lhe pertence. Ao contrario,<br />

de má fé se diz o possuidor que sabe não lhe assistir direito<br />

para possuir a cousa (55).<br />

'•E se o senhor da cousa, estando em posse delia, a emprestou de sua mão<br />

a outrem a tempo certo, ou emquanto lhe aprouver."<br />

'No Direito Moderno o vicio da precariedade em materia de posse tem<br />

uma significação mais ampla do que no Direito Romano.<br />

O precário, segundo o Direito iRomano, era o pacto pelo quai o proprietário<br />

de uma cousa cedia a outro o uso delia, ou permittia o exercício de<br />

direito de uma servidão, reservando-se a faculdade de revogar esta autorisação<br />

quando lhe aprouvesse. Era um simples pacto, e não um contracto.<br />

visto como não revestia a forma jurídica dos contractos. Se, revogada a<br />

autorisação, a pessoa que houvesse recebido a cousa a titulo precário,<br />

recusava restitui-la, a sua posse se tornava viciosa, isto é, ficava contaminada<br />

do vicio precário. Fr. 2, § 2 e 3, D. de prec. (43,26); Savigny, § 42.<br />

Koje se diz viciada de precariedaiie a posse daquelles que tendo recebido<br />

a cousa das mãos do proprietário por um titulo que os obriga a restituil-a<br />

em prazo certo ou incerto, como por empréstimo ou aluguel, recusam injustamente<br />

fazer a entrega, passando a possuil-a em seu próprio nome. Cod.<br />

Civ. Pranc. arts. 2236, 2232; (Zaoh., § 216). Esta doutrina se harmonisa perfeitamente<br />

com o cit. Ord.. L. 4, T. 54. 5 3". a qual equipara, para o effeito<br />

da restituição da cousa, ao precário (verb, emquanto lhe aprouver) o empréstimo<br />

e o arrendamento, (vi rb. a iempo certo). Nestes casos pôde o<br />

dono da (-ousa emprestada ou alugada a tempo certo, ou pelo tempo que Ihí'<br />

aprouver, usar da accão de esbulho. Lobão, Aeç. summ. Dissert. 12, § 3 o ;<br />

Consolidação das- Leis Civis, nota 1. ao art. 50'9. A recusa da restituição da<br />

cousa pôde constituir o crime definido no art. 258 do Cod. Crim.<br />

(54) Nemo sibi ipsi causam; possessionis ynutare potest. Vej. fr. 33, § 1.<br />

D. de usurpât. (41,3); fr. 3. § 18. 19 e 20. D. de adq. poss., (41,2)<br />

.Assim, aquelle que por exemplo possue a cousa como donatário {pro<br />

dij-iaio), não pôde a seu arbítrio mudar a causa da posse, dizendo que a<br />

possue a titulo de herdeiro ou de comprador. A citada regra é de uma grande<br />

importância nas questões de prescripção acquisitira.<br />

(55) Ord. L. 4. T. 3. § I o : "Se contarão do primeiro dia que a cousa foi<br />

a poder do possuidor com titulo e boa. fé. . . "Salvo se constar da má fé do*<br />

sobreditos. porque então em nenhum tempo poderão p.escrever."


DAS CODSAS 21<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 489 — E' justa a pos.se que não fôr violenta, clandestina ou<br />

precária. — 497.<br />

Art. 490 — E' de boa fé a posse, se o possuidor ignora o vicio, ou o obstáculo<br />

que lhe impede a acquisição da cousa ou do direito possuído. — 491.<br />

Paragraplio único. O possuidor com justo titulo tem por si a presumpção<br />

de boa fé, salvo prova em contrario ou quando a lei expressamente não<br />

aãmitte esta presumpção.<br />

Art. 491 — A posse de bôa fé só perde este caracter, no oa o e desde o<br />

momento em que as circumstancias façam prcsuynir que o possuidor não<br />

ignora que possue indevidamente.<br />

Art. 492 — Salvo prova em contrario, entende-se manter a posse o mesmo<br />

caracter, com, que foi adquirida.<br />

Art. 510 — O possuidor de bôa fé tem, direito, emquanio ella durar, ao$<br />

fruetos percebidos. — 490, 512.<br />

Art. 511 — Os fruetos pendentes ao tempo em que cessar a bôa fé devem<br />

ser restituidos, depois de deduzidas as despezas da prod-ucção e custeio. Devem,<br />

ser também restituidos os fruetos colhidos com antecipação.<br />

Art. 512 — Os fruc.os naturaes e industriaes, reputam-se colhidos e percebidos,<br />

logo que são separados. Os civte reputam-se percebidos ãki por dia.<br />

Art. 513 — O possuidor de má fé rerponde por todos os fruetos colhidos<br />

é percebidos, bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber^ desde<br />

o momento em que se constituiu de má fé; tem direito, porém, ás despezas<br />

da proãucção e custeio.<br />

Art. 514 — O possuidor de bôa fé não responde pela perãa ou deterioração<br />

da cousa, a que não der causa.<br />

Art. 515 — O possuidor de má fé responde pela perda ou deterioração da<br />

cotisa, ainda que acciãentaes, salvo se provar que do mesmo modo se teriam*<br />

dado, estando ella na posse do reivinãicaníe.<br />

Ari. 516 — O possuidor de bôa fé tem direito á indemnização das bemfeitorias<br />

necessárias e úteis, bem como, quanto ás voluptv.arias, se lhe não fort<br />

,n paga*, ao de levantal-as, quando o puder senv detrimento da cousa. Pela<br />

valor das bemfeitorias necessárias e úteis, poderá exercer o direito de retenção.<br />

— 63, 1.566, III.<br />

Ari. 517 — Ao possuidor de má fé, serão resarcidas somente as bemfeitorias<br />

necessárias; mas não lhe assiste o direito de retenção destas, nem o<br />

de levantar as voluptuarias. — 63.<br />

Art. 518 — As bemfeitorias compensam-se com os damnos, e só obrigam<br />

ao resarchnento, se ao tempo da evicção ainda existirem.<br />

Art. 519 — O reivindicante obrigado a indemnizar as bemfeitorias tem direito<br />

de optar entre o seu valor actual e o seu custo


£2 DIREITO<br />

§ 9.— Como se adquire a posse.<br />

Embora a posse seja em si um íacto alheio ás normas<br />

do Direito, todavia, corno produz effeitos jurídicos, a lei define<br />

com precisão os modos pelos quaes ella se adquire e se perde.<br />

A posse consta, como se disse em outro lug-ar, do poder<br />

de dispor physicamente da cousa e do animo de possui-la como<br />

propria.<br />

A sua acquisição, pois. requer um facto externo e um<br />

facto interno (56).<br />

O facto externo {corpus) deve ser Je natureza a pôr a cousa<br />

á nossa disposição : os modernos o denominão -apprehensão.<br />

O facto interno (animus) consiste em um acto do espirito<br />

íia deliberação de possuir como nossa a cousa apprehendida.<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 493 — Adquire-se a. posse:<br />

I - Pela apprehensão da cousa, ou pelo exercido do direito,.<br />

II—Pelo facto de se dispor da cousa, ou do direito.<br />

Ill — Por qualquer dos modos de acquisição em geral.<br />

Paragrapho único. E' applicavel á acquisição da posse, o disposto neste<br />

código, arts. 81 a 85.<br />

.1 •). í'94 —- A posse pôde ser adquirida:<br />

I — Pela própria pessoa que a pretende.<br />

II — Por seu representante ou procurador. — 84.<br />

III — Por terceiro sem mandato, dependendo de gratificação.<br />

IV Pelo constituiu posscssorio. — 520. V.<br />

$ 1. - Apprehe-nsão.<br />

A apprehensão consiste em todo facto que créa para o adquirente<br />

a possibilidade immediata. e actual de dispor physicamente<br />

da cousa e de excluir delia a acção de terceiros (57).<br />

Esta possibilidade se pôde estabelecer indepentemente da<br />

oecupação material do immovel ou da detenção manual da cousa<br />

(56) Fr. 3, § I o , D. de adquir poss (41,2): Adipiscimur possessionem<br />

eorpore et animo.<br />

(57) Savigny, § 14 a JS.


DAS COÜSAS 23<br />

movei ; donde resulta que a apprehensão, no sentido jurídico, nem<br />

sempre accusa o contacto physico com a cousa (58).<br />

1.— Quanto aos immoveis, a apprehensão, se realiza :<br />

a) Pela presença do adquirente no terreno (59).<br />

b) Pelo ingresso nelle, sem necessidade de percorrè-lo em<br />

toda sua extensão (60)<br />

c)T J eAa.appioximação de modo que a dominação physica se<br />

torne possível (61).<br />

A simples presença do adquirente é bastante para consumar<br />

a acquisição da posse. Mas se no lugar se acha presente<br />

outrera que se attribua a posse do immovel, o adquirente não<br />

pode realizar o seu desígnio senão de dous modos : ou com o con-<br />

(,'58) Pr. 1, S 21, D. de Aequir. poss., (41,2): "Non esse enim cor pore<br />

el tactu necesse apprehendere possessionem, sed etiam oculis et affectu: et<br />

argumentum esse eas res mue propter magnitudinem ponderi» moveri non<br />

possunt, ut columnas." Veja-se ainda fr. 3, § 1", D. oedem.<br />

Os commentadores do Direito (Romano denominavam — symbolica e ficta,<br />

— a apprehensão, nos casos cm que ella se realiza sem o contacto physico<br />

com a cousa. Savigny (,§ 14), demonstrou de modo a não deixar duvida, que<br />

esta invenção não so répugna ao caracter e espirito do Direito 'Romano, senão<br />

também que nos casos em que geralmente se admitte a apprehensão<br />

symbolica, não ha nenhum symbolo, mas factos materia.es que acarretam<br />

comsigo a aequisição do poder de physicamente dispor da cousa; modo este<br />

de vêr que ê hoje geralmente aceito. Vej. Mühlenbrueh. § 235, nota 1; Maynz,<br />

? 170, I a observ.<br />

A linguagem do nosso Código Commercial se resente ainda deste erro<br />

da escola. No art. 2*00 define elle diversas espécies de tradição symbolica. O<br />

erro é simplesmente de qualificação: uma vez que o facto induza tradição.<br />

pouco importa que a lei a domine real ou symbolica.<br />

(590 F. 77, D. de rei vindicat. (6.1); Savigny, § 15.<br />

(60) Pr. 3. § 1", D. de adq. poss. (41,2); "Non u tique ita recipiendum<br />

ut qui fundum possidere velit, omnes glebas circumambulet: sed sufficit<br />

quamlibet partem ejus fundi introire. Lob Not a Mello. L. 3. T. 2, § 8.<br />

n. 5: Dig. Port., P. I., art. 593.<br />

Se são prédios diversos e separados, é mister que o adquirente entre em<br />

cada um délies, como, por exemplo, se se trata de duas fazendas que não<br />

formam um só todo. 'Savigny, § 18. e Lobão, loc. cit.<br />

(61) Pr. 18, § 2. D. de adquir. poss. (41.2): "Si yicinum mihi fundum<br />

mercatum venditor in mea turre demonstrei, vacuamque se possessionem<br />

tradere dicat: non minus possidere ccepi quam si pedem finibus intulissem."<br />

Savigny. § 15; Dob., loc. cit., n. 21.


24 DIREITO<br />

sentimento desse outrem (62) ; ou por meio de violência contra<br />

elle exercida (63) ; tanto em um como em outro caso a posse fica<br />

plenamente adquirida (64).<br />

2.— A apprehensão de cousa movei se consuma ou quando<br />

o adquirente a toma nas mãos (65), ou quando occorre algum<br />

dos fat tos seguintes :<br />

1.° A collocação da cousa diante do adquirente de modo<br />

que possa segura-la (66) ;<br />

2.° A entrega do objecto a terceiro, na presença e por<br />

ordem do adquirente (67) ;<br />

3.° A imposição de marca ou signal na cousa que deixa ficar<br />

em poder de um outro (6S) ;<br />

4.° \ remessa das chaves da casa ou armazém, onde o<br />

objecto está guardado, ao adquirente presente no lugar (69) ;<br />

(62) Pr. 18, § I o . D. adq. poss., (41,2): "Vacuamque se tradere possessionem."<br />

Ord., L. 4, T. 58, § 3°."E se alguém comprar alguma cousa... e<br />

lhe foi dado poder por aquelle de quem houve a dita cousa para tomar e haver<br />

a possa delia, demittindo de si, e desamparando a dita posse.... o que<br />

houve cousa... poderá haver e cobrar a posse delia, não achando quem<br />

lh'a contradiga.<br />

(63) Fr. 52, § 2. D. adquir. poss., (41,2); Savigny, § 15. A entrada no<br />

prédio possuido por ausente não importa a acquisição da posse, emquanto<br />

o ausente não tem conhecimento disso, caso em que elle ou cede da posse,<br />

ou intenta recobral-a. Fr. 25, § 2; pr. 46. D. eodem,<br />

(64) 'Neste ultimo caso a posse ê viciosa (vi), mas nem por isso deixa<br />

de ser posse juridica.<br />

(65) Fr. 1, § 1, D. adquir. poss. (41,2); Makeldey, § 2131.<br />

(66) Fr. 79, D. de solutionis. (46,3): Et quodammodo manü longa, cradita<br />

cxistimanda est.<br />

' (67) Fr. 1, § 21, D. adquir. poss, (41,2) : "Si jusserim venditorem procuratori<br />

rem 1 tradere, cum ea in prassentia sit. Fr. 31, § 1. D. de donation.<br />

(39,5).<br />

(68) Fr. 14, § I o . "D. de periculo et commodo rei vendit. (18,6): videri<br />

autem trabes traditas quas emptor signasset. Lob., Not. a Mello L. 3, T. 2,<br />

§ 8, n. 24; Digesto Port., P. I., art. 589; Cod. Coram, art. 200 § 2 O. fr. § 2 U.<br />

eodem consagra decisão em sentido contrario em uma hypothèse em que o<br />

facto material é idêntico, mas não ha contradicção, porque na dita hypothèse,<br />

o objecto embora receba a marca, continua cm poder do antigo possuidor.<br />

(69) Fr. 9, § 6, D. de adquir. rerum. dom., (41.1), fr. 1, § 21, fr. 74, D.<br />

de adquir. poss., (41,2); \Lob.. Not. a 'Mello, L. 3, T. 2, § 8, n. 20; Digest.<br />

Port, P. I, art. 590. Se as chaves são entregues em lugar distante daquelle<br />

onde está o armazém, não se réalisa a acquisição da posse, porque então a<br />

entrega das chaves não dá a possibilidade immediata de dispOr da cousa.


DAS COUSAS 25<br />

5.° A entrega da cousa em casa do adquirente e por ordem<br />

sua ; (70)<br />

6.° Finalmente, quando a cousa, sendo apresentada ou<br />

mostrada ao adquirente, elle encarreg'a á terceiro a guarda delia<br />

(71).<br />

3.— Nos casos que se acabão de enumerar trata-se da<br />

apprebensão de cousas possuídas por terceiros que voluntariamente<br />

cedem de sua posse em favor do adquirente (vacuam tradere possessionem)<br />

(72).<br />

Na apprehensão, porém, de cousas que, ou não estão na<br />

posse de outrem, ou são tomadas contra a vontade do possuidor,<br />

o facto externo deve se manifestar de uma maneira mais enérgica<br />

e positiva, de modo a demonstrar que a cousa effectivamenmente<br />

se acha submettida á nossa dominação physica.<br />

Assim as aves e os animaes bravios, embora feridos, não<br />

se considerão apprehendidos, senão depois de apanhados, mortos<br />

ou vivos. (73) E da mesma sorte o possuidor d'um prédio não<br />

adquire a posse do thesouro neile occulto, emquanto não o descobre<br />

e não o colhe ás mãos (74).<br />

§ 11.—Intenção<br />

1. -Da necessidade do concurso da intenção para acquisição<br />

da posse derivão estas duas conseqüências :<br />

I o . A posse presuppõe no possuidor a consciência da propria<br />

posse, consciência que elle não pôde ter se não conhece a<br />

cousa possuída (75). Assim o possuidor de uma herdade não ad-<br />

(.70) Pr. 18, § 2, D. adquir. poss. (41,2) li' mister que a casa seja habitada<br />

pelo adquirente, ou que esteja occupada com estabelecimento seu,<br />

como negocio, faluica, etc.<br />

(71) Pr. 51. adquir. puss.. (41,2): simui atque custodiam possuíssem,<br />

traditas mihi videtur. Digest l'on., P. I., art. 588.<br />

(72) Nesu's casos a tradição de um poder já creado é sufficiente para<br />

affirmai' a nossa posse.<br />

(73) Pr. 5, § 1, D. de adq. rerun» dom., (41,1); 1. S 13 de divis.<br />

rer. (2,1).<br />

(74) Fr. lã, D. ad exhibendum (40,4); fr. 3, 5 3, D. adq. p< ss., (4(1,2),<br />

Savigny, § 17. »<br />

(70) Pr. 1, § 5 e 22; fr. 2, ir. 4; 8 2, D. de adquir. poss., (41,2). Ignorant!<br />

possessio non adquiritur.


26 DIREITO<br />

quire a posse do thesouro nella enterrado emquanto não o acha<br />

(76).<br />

2.° Não podem adquirir a posse por si os que não tem vontade<br />

propria. São pois incapazes de .adquiri-la as pessoas jurídicas<br />

(/7), os loucos (78) e os infantes (79J, salvo por via de seus<br />

representantes legaes — sj'ndicos, curadores ou tutores (80).<br />

A dita incapacidade não comprehende nem os menores,<br />

que sahirão da infância, os quaes adquirem pessoalmente a posse<br />

sem necessidade da intervenção dos seus representantes (81);nem,<br />

tão pouco, o próprio infante se á apprehensão por elle realizada<br />

junta o tutor a intenção de possuir (82).<br />

2.—Supposto a atquisição da posse resulte da reunião da<br />

apprehensão e 'ia vontade, não é necessário que os dous elementos<br />

coincidão n'uni mesmo momento (83,,. E pois aquelle que já<br />

tem a cousa em seu poder, não carece de nova apprehensão para<br />

adquirir a posse ; basta-lhe accrescentar a intenção de possuir<br />

ao facto preexistente da detenção (84).<br />

Mas. se o detentor da cousa a retém em nome de terceiro,<br />

cimo se é locatário ou conmiodatario, a simples deliberação<br />

de querer possui-la como propria não é suficiente para instaurar<br />

(76) Pr. 3, § 3, D. adquir. poss., (41,2): is enlm qui nescit, non possidet<br />

thesaurum, quamvls fundum possideat.<br />

(77) Fr. 1, § 22, D. adquir. poss., (41,2); fr. 7, § 3; D. ad exhibendum,<br />

(40,4); fr. 1, § 15, D. Si is qui testament, § (47,4).<br />

(78) Fr. 1, § 3; fr. 18, § I o . D. adquir. poss, (41,2).<br />

(79) Fr. 32, § 2; fr. 18, § I o . D. adquir. poss., (41,2); Const., 3 c. adquir.<br />

poss., (7,32). Mello L. 3, T. 2, § 5 ; Lob., Not. ao mesmo § n. 4.<br />

(80) Fr. 2; fr. 1 § 20 e 22, de adq. poss., Savigny, § 26; Lob., Not. a<br />

Mello, loc. cit.<br />

(81) Fr. 32, § 2, D. de adquir. poss., (41,2): Pupillus tairen etiam sine<br />

tutoris auctoritate possesionem nancisci potest. Fr. 1, § 3, D. eoãem:... qute<br />

sententia recipi potest si ejus setatis sine ut intellectum capiant. Vej. Makeldey,<br />

§ 252, nota 17; Lob. Not. a Mello, L. 3, T. 2, § 5, n. 4; Savigny, § 21 e 26,<br />

(82) Fr. 32, §2, D. de adq. poss. (41,2); c. 3, c. de adquir. poss., (7,32);<br />

Savigny, § 21 ; Acearias, n. 214, in fine.<br />

(83) Fr. 3, § D. de adquir. poss., (41,2); Solo animo non posse nos<br />

adq*uirere possessionem si non antecebafc possessio naturalis.<br />

(84) Fr. 9, § S, D. adquir. rerum dom., (41.1); fr. 9, § 9, D. de reb.<br />

credit., (12,1); I. § 44, de rer. division (2.1). Tal é o caso do inquilino que<br />

compra ao proprietário a casa; do commodatario a quem a cousa emprestada<br />

é doada. E' o que os modernos denominão — traditio brevi manu.


DAS COUSAS 27<br />

a posse; é mister ou o consentimento do antigo possuidor (85,)<br />

ou um acto externo que manifeste de um modo sensível a nova<br />

resolução, como a subtracção da cousa ou a recusa de entrega (86).<br />

§ 12,—Excepções: posse sem apprehensâo, posse sem intenção<br />

A detenção núa, sem a vontade de ter a cousa como propria,<br />

não dá a posse ; nem tão pouco a vontade só, sem a detenção<br />

(§ 2 o ).<br />

E' este um dos princípios fundamentaes da theoria da<br />

posse.<br />

Todavia casos ha em que a lei, cedendo ao império de conveniências<br />

praticas, desgarra desse principio e attribue os effeitos<br />

da posse a factos em que fallece um daquelles elementos,como<br />

acontece nas espécies seguintes :<br />

I. Posse sem apprehensâo. Tal é a posse que se transfere por<br />

successão. Pela simples abertura da successão adquirem os herdeiros,<br />

legítimos ou escriptos, independentemente de apprehensâo<br />

de sua parte, a posse civil que tinha o defunto (87).<br />

Este gênero de posse é uma creação abstracta da lei, notável<br />

ainda por outras particularidades, a saber :<br />

1.—A acquisição desta posse requer um titulo legal, o testamento<br />

, ou a qualidade de herdeiro legitimo, de modo que vem<br />

ella a ser conseqüência de um direito preexistente (88);<br />

(g-5) Nota antecedente.<br />

(86) Fr. 3, § 18, 19, 20, D. de adquir. poss., (41,2); Maynz, § 170. A<br />

recusa de entregar, sem fundamento jurídico (jus retentionis), por si só importa<br />

esbulho. Vej. § 22 not. 39 adiante.<br />

(87) Alv. de 9 de Novemb. de 1774. e Ass. de 16 de Fevereiro de 1786.<br />

(Esta espécie de posse, desconhecida no Direito Romano, é uma invenção<br />

do Direito Moderno: acha-se ella consagrada em quasi todos os Códigos<br />

das nações cultas. Vej. Cod. Civil. Br., art. 724 (saisine legale ou héréditaire),<br />

e Cod. Civil Port. art. 483.<br />

(88) Ass. de 16 de Fev. de 1786, 2 o quesito: "E' sua mente (do Alv.<br />

de 9 de Novemb. de 1774), impedir o enorme abuso que se fazia, de se apossarem<br />

dos bens — pessoas estranhas... a quem verdadeiramente não pertencia<br />

o direito da successão, nem o domínio dos bens." Zacar., § 185, nota8.<br />

A posse, como se disse em outro lugar (§ 2), não depende de um direito<br />

anterior, e é em afastar-se desta regra que consiste a particularidade notada.


28 DIREITO<br />

2.-—Só passa aos herdeiros a posse justa, isto é, a posse<br />

que o defunto adquirira por justo titulo (89);<br />

3.—A posse se reputa adquirida pelos herdeiros desde o<br />

momento da morte do autor da herança, ainda mesmo antes de<br />

lhes chegar a noticia deste acontecimento (90).<br />

II. Posse sem intenção. O credor pignoraticio e o emphyteuta<br />

adquirem a posse da cousa empenhada ou aforada (91); no em-<br />

(89) Lobão, Interdict., § 51.<br />

(90) Zacar., § 185, nota 8. B' uma conseqüência lógica da lei.<br />

(91) Fr. 36. D. adquir. poss., (4-1,2); fr. 16; D. de usurpation. (141.3);<br />

fr. 15, § I o . D. qui satisdare cog, (12,8).<br />

Savigny, (§ 23) denomina a posse nestes casos — posse derivada (abgeletteter<br />

Besitz), e imagina uma explicação engenhosa para tirar-lhe o caracter<br />

excepcional e fazel-a entrar nos princípios fundamentaes da theoria.<br />

Para chegar a este resultado ensina que nos ditos casos a posse, isto é, o<br />

jus possessionis, é transferido pelo antigo ao novo possuidor. A detenção da<br />

cousa pelo novo possuidor nada tem de particular, mas a essa detenção deve<br />

elle reunir, não o animo sibi habendi. mas a intenção possidenãi. isto é, a vontade<br />

de adquirir o jus possessionis.<br />

Na impossibilidade de attribuir ao novo possuidor a intenção sibi habendi<br />

pois nem o credor pignoraticio, nem o emphyteuta possuem a cousa como<br />

propria; Savigny procura substituir aquelle elemento substancial da posse pelo<br />

animo possidenãi, interpretação esta que subverte o seu systhema; porquanto<br />

importa o reconhecimento de uma posse excepcional, para a qual não concorre<br />

a intenção sibi habendi, mas uma intenção com fim diverso — a intenção<br />

possidenãi. E' apenas mais uma subtileza com que se enriquece a<br />

sctencia, subtileza que nada explica e que não acha apoio nos textos.<br />

A verdade é que na posse derivada, o Direito se afasta da theoria fundamental.<br />

Porque, pois, não reconhecel-o francamente, como aliás o faz<br />

incidentemente o próprio Savigny? Não é tão commum o desviar-se o legislador<br />

dos princípios theoricos. para attender a necessidades imperiosas<br />

da vida pratica?<br />

Segundo o Direito Romano, davam-se mais duas hypotheses de posse<br />

derivada — a posse do que recebia a cousa a titulo precário; não havendo<br />

convenção em contrario (fr. 4, § I o . D. de precário (43,26); fr. 10, pr. § 1".<br />

D. adquir. poss., (41,2); e a posse daquelle em cujo poder se depositava a<br />

cousa litigiosa até sentença final, convencionando as partes expressamente<br />

que o depositário tivesse a posse para que ficasse interrompida a usucapião,<br />

(fr. 39), D. adquir. poss., (41,2), fr. 17, 5 I o . D. deposit. 1, 16, 3.<br />

No nosso Direito o que recebe a cousa a titulo precário (rogans) não<br />

ihe adquire a posse; detém-a em nome do dono (rogatus). Mello, L. 4,<br />

T. 3, § 7.<br />

Quanto ao seqüestro nos termos expostos, é fora de duvida que, sendo


DAS COÜSAS 29<br />

tanto lhes falta a intenção de possuir a cousa como propria, intenção<br />

que continua a subsistir nos possuidores originários, isto<br />

é, no devedor e no senhorio directo (92).<br />

O intuito da lei nestes casos evidentemente é resguardar<br />

os direitos do credor pignoraticio, e os do emphyteuta, pondo a<br />

cousa sob seu poder.<br />

D'ahi vem que a posse que se lhes reconhece, só lhes dá<br />

direito para invocar os interdictos, (93) continuando a existir na<br />

pessoa do devedor e do senhorio o direito á posse que leva á<br />

usucapião (94).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 495 — A posse transmute-se com os mesmos caracteres aos herdeiros<br />

e leçatarios do possuidor.<br />

Art. 496 — O successor universal continua de direito a posse de seu antecessor;<br />

e ao successor singular é factdtaão unir sua posse u do antecessor,<br />

para os effeiíos legaes. — &&2. 1.572.<br />

§ 13.—Como se adquire a posse por terceiro.<br />

Nada obsta applicar-se á acquisição da posse o principio<br />

da representação. Essa pratica nem répugna á natureza da propria<br />

posse, nem desdiz dos processos usuaes do Direito.<br />

A posse pôde. pois, se adquirir pelo ministério de terceiro<br />

(95).<br />

Nesta forma de acquisição ha a considerar : qual o procedimento<br />

do representante e o do representado ; qual o laço jurídico<br />

que os liga.<br />

duvidosa a posse, é licito as partes convencionar que fique a cousa em posse<br />

de um depositário, até qué a causa seja afinal decidida. Mas não está esta<br />

pratica em uso. Gama allude ao Direito Romano acerca deste assumpto, na<br />

Decis. 277, n. 3.<br />

(92) Savigny, § 20 e 23.<br />

(93) Fr. 16, D. de usurpât., (41,3); Lob., Direito emphyteut., § 1291<br />

Doctr. das ACQ., nota 410.<br />

(94) Fr. 16. D. de usurpât, (41,3); fr. 33, 5 4; D. eodem. fr. 1, § 15;<br />

D. adquir. poss., (41,2).<br />

(95) Paul. Rtcept. sent., D. 5, T. 2, § 2: Sed per -procuratorem adquiri<br />

nobis possessionem posse, utilitatis causa receptum est. Fr. 2, D. adquir.<br />

poss., (41,2). Ord. L. 3. T. 45, § 10; Cod. Coram., art. 455; Mello, L. S.<br />

T. 2, § 7.


30 DIREITO<br />

1 —O terceiro deve appréhender a cousa. No facto da apprehensão<br />

nada ha de particular ; são-lhe, pois, applicaveis as<br />

regras de direito, expostas em outro lugar (§ 10). Mas, realizando<br />

a appreliensão, o terceiro deve faze-lo com intenção de possuir<br />

a cousa, não para si, senão para o adquirente de quem é elle representante<br />

(96).<br />

Da necessidade da dita intenção na pessoa do terceiro dertvão<br />

os corollarios seguintes :<br />

Que não pôde ser representante para este mister aquelle<br />

qne é incapaz de ter vontade, como o louco, o infante (97).<br />

Que se o representante appréhende a cousa com intenção<br />

de possui-la para si ou para outrem, a pessoa representada deixa<br />

de adquirir a posse (98).<br />

2. — O adquirente deve ter a intenção de possuir para si a<br />

cousa que o seu representante appréhende (99); donde resulta qne,<br />

se elle ignora o facto da apprehensão, não adquire a posse ; salvo<br />

por via de ratificação, depois que lhe chega a noticia (100). Todavia<br />

adquire a posse, ainda antes da noticia, se a apprehensão foi<br />

feita :<br />

aj Pelo filho-familia na administração do pecúlio profecticio<br />

(101);<br />

(96) Fr. 1, § 19, D. adquir. pass., (41,2): Si st ipsi velint nobis adquirere<br />

possessionem. Cit. fr., § 20.<br />

(97) Pr. 1, § 9, D. eodem: Cceterum et ill-e per quem volumus possidere<br />

talis esse debet, ut habeat intellectivm possidendi. 1,0b., Not. a Mello. L. 3,<br />

T. 2, § 5, n. 4.<br />

(98) Fr. 1, § 19, D. eodem. Et is eo animo intret in .possessionem, ut<br />

nolit tibi, sed potiús Titio adquirere: non est tibi adquisita possessio.<br />

Quando o terceiro recebe a cousa 'por via de tradição, isto é, por consentimento<br />

e vontade do possuidor, que demitte de si a posse em favor do<br />

adquirente, a simples mudança de vontade do terceiro não impede aacquisição<br />

da posse, a qual se reputa adquirida pela pessoa representada, até que<br />

o terceiro mostre a sua vontade por um acto externo. Fr. 13. 'D. de donationibus<br />

39,5.<br />

(99) Paul. Recept. sent. I^. 5, T. 2, § 1". Possessionem adquirimus et<br />

animo et corpore: animo utiqite nostro; corpore vel nostro vel alieno. Fr. 3,<br />

§ 12, D. adq. poss., (41,2); Phebo, P. II Decis. 105, n. 7 a 10.<br />

(100) Fr. 42, § I o ; fr. 5, § 22; fr. 3 § 12,. T). eodem, Savigns',<br />

§ 26.<br />

(101) Fr. 1, § 5. D. eodem. Item adquirimus possessionem per... filitïm<br />

qui in potestate est et quidem earum rerum, quas peculiariter tenet, etiam<br />

ignorantes.


DAS COÜSAS 31<br />

b) Pelo administrador ou procurador das pessoas jurídicas<br />

(102);<br />

c) Pelo tutor ou curador para o infante ou para o demente<br />

(103);<br />

d ) Por procurador com mandato expresso (104).<br />

3. —E" mister a existência de um vinculo jurídico entre o<br />

terceiro e o adquirente.<br />

Esse vinculo pôde ter por causa ou a autoridade legal do<br />

representante sobre a pessoa representada, como o poder do pai<br />

sobre o filho­famílias, o do tutor sobre o pupillo (lü5), ou um mandato<br />

livremente contrahido (106).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 486 — Quando, por força de obrigação ou direito, em. casos co­rno o<br />

do usofructuario, do credor pignoratwio, do locatário, se exerce, temporariamente<br />

a posse directa, não annulla esta ás pessoas de quem. elles a houveram,<br />

a posse indirecta.<br />

Art. 487 — Não é possuidor aquelle que, achando­se em relação de dependência<br />

para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento<br />

de ordens ou instrucções suas.<br />

Art. 497 ■— Não induzem, posse os netos de mera permissão ou tolerância,<br />

assim como não autorizam a sua acquisíção os netos violentos, ou clandestinos,<br />

senão depois de cessar a. violência, ou a clandestinidade. — 489.<br />

Art. 498 — A posse do im.movel faz presumir até proixx contraria a dos<br />

moveis e objrctos que nelle estiverem,.<br />

' (102) Fr. 1, § 22. D. eodem; fr. 7, S 3. P. ad. exhibendum, (10,4); Savigny,<br />

cit. § 26.<br />

(103) Fr. 13. § I o . P. do adq. rerum dom. (41.1); fr. 1. § 20. D. adquir.<br />

poss., (41,2); fr. 11, 5 (>; D. de prgnor. act.. (,13.7). A excepção quanto as<br />

pessoas jurídicas, in fautes e dementes, 0 uma necessidade proveniente da<br />

ausência de intelligencia e vontade próprias nestas pessoas.<br />

(104) Fr. 42, § 1". 1). adq. poss., (41,2): Procurator, siquidem mandante<br />

domino rem emerit, protinus illi adquirit possessionem: quod si sua sponte<br />

emerit, non, nisi ratam hatouerit dominus emptionem. Egidio, Ex hoc jure,<br />

Clausul. X, n. 9. Neste caso a posse para a usucapião só se entende começar<br />

depois da noticia. Const. 1.. C. de adq. poss. 7,32.<br />

Do texto citado se induis que a posse, tomada por procurador sem ordem<br />

expressa, como por gestor de negócios, procurador geral, só se considera<br />

adquirida, depois da noticia.<br />

(105) Fr. 1, § 5 e 20. D. adq. poss.. Lobão a Mello, L. 3, T. 2, § 5, n. 4<br />

(lOtf) Fr. 1, § 20. fr. 40, § I o . D. eodem. Ord. L. 3, T. 45, '§ 10; Lob.<br />

a Mello, loc. cit.


CA DÎRÎÎITO<br />

§ 14. — Constituto Possessorio.<br />

1. — No constituto possessorio se réalisa a acquisição da posse<br />

por terceiro ; a applicação, porém, do principio da representação<br />

a este caso offerece certas particularidades.<br />

Um dos requisitos da acquisição da posse por terceiro é<br />

que o terceiro appréhenda a cousa (§ 13, n. 1).<br />

Mas. se algniem já detém a cousa como possuidor, não fica<br />

por isso inhibido de mudar de intenção e de, num momento dado,<br />

começar a possui-la para outro. Assim aquelle que vende a outrem<br />

um prédio, pôde ficar possuindo-o em nome do comprador,<br />

o qual dest'arte vem a adquirir a posse por via do vendedor.<br />

Este modo de adquirir a posse é o que em direito se denomina—COtlòtilutü<br />

pOSS£SSuTÍO (107).<br />

2. —Nesse modo de adquirir a posse, a apprehensão préexiste,<br />

visto como o aliénante tem a cousa sob seu poder ; não ha,<br />

pois, necessidade de nova apprehensão; basta somente que elle<br />

por um acto de sua vontade passe a deter a cousa em nome e<br />

como representante do adquirente, para quem é a posse transferida<br />

(108).<br />

3. — A acquisição da posse pelo constituto possessorio se<br />

opéra por força d'uma simples convenção, irnmediatamente, e sem<br />

necessidade de actos externos praticados sobre a cousa (lu9j.<br />

(107) Fr. 18, D. adquir. poss., (41,2): Quod meo nomine possideo, possum<br />

alieno nomine possidore; nec enim niuto mini causam possessionis,<br />

sed desino possiãere et alium possessorem ministério meo facio. Esta lei é<br />

o fundamento primitivo do Constituto possessorio, denominação que não se<br />

encontra nos textos do Direito -Romano, mas de invenção dos commentadores.<br />

Vej. Savigny, § 27.<br />

O Constituto possessorio é conhecido em nossa pratica desde tempos antiquissimos.<br />

A lei de 24 de Setembro de 18&4, art. 5 o , § 6, faz-lhe expressa<br />

allusão nas palavras clausula constitute. Vej. \Loh, «Not. a Mello, L. 3, T. 2,<br />

§ 8, n. 16; Manual do Tabellião, § 27.<br />

(108) O Constituto possessorio é o inverso da acquisição da posse pela<br />

traditio brevi manu (§ 11, n. 2). iNo caso da traãitio brevi manu, o adquirente<br />

já tem a detenção do objecto, a qual se transforma em posse pela reunião<br />

do animo sibi possidendi. iNo Constituto o possuidor converte a sua<br />

posse em mera detenção, transferindo a posse ao adquirente.<br />

(109) Savig-ny, § 27. A acquisição da posse neste caso tem por fundamento<br />

a convenção. Se, portanto, a convenção é nulla, a posse não se<br />

transfere. Gomez, L. 17, Taur. n. 3 a 5; Valasc, Consulta MH5, n. 5 a 9:<br />

Lob. cit., n. 19.


DAS COUSAS 33<br />

4. —O constituto possessorio é muito usado nos contractus<br />

de alienação de immoveis; mas deve ser expressamente convencionado<br />

(110), ou resultar logicamente das cláusulas estipuladas<br />

(111).<br />

E' expresso quando o vendedor ou o doador declara que<br />

tica possuindo a cousa pela clausula coiistüuti, ou em nome do<br />

comprador ou donatário (112).<br />

Resulta das cláusulas estipuladas, quando, por exemplo,<br />

o vendedor conserva o prédio alienado em seu poder, como locatário<br />

(113); ou quando o doador se reserva o usufructo da cousa<br />

doada (114).<br />

Nestes casos é manifesto que se o aliénante retém em seu<br />

poder o objecto, retetn-n'o em nome e como representante do<br />

constítuíario, isto é, daquelle para quem por acto de sua vontade<br />

passam a posse e o domínio.<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 494 — A posse pôde ser adquirida:<br />

I — Pela propria pessoa que a pretende.<br />

II — Por seu representante ou procurador. — 84-<br />

III — Por terceiro sem mandato, dependendo de ratificação.<br />

IY — Pelo constituto possessorio. — 520. V.<br />

§ 15 — Como se perde a posse<br />

A continuação da posse depende essencialmente da coexistência<br />

dos dous elementos que a constituem : o poder de dispor<br />

physicamente da cousa, e a intenção de tê-la como propria<br />

(§3.)<br />

A posse, portanto, se perde ou pela cessação de um daquelles<br />

elementos, ou pela cessação de ambos (115).<br />

(110) Savigny, cit. § 27; Lob., loc. cit., n. 18.<br />

(111) Savigny, cit.. § 27.<br />

(112) Lob., loc. cit. n. 17.<br />

(113) Fr. 77, D. de rei vindicai., 6,1,<br />

(114) Const. 28. 35, § 5. C. de donat. (8,54). Nos dous últimos casos<br />

verifica-se perfeitamente o constituto possessorio. (Savigny, § 27); mas o<br />

fommum dos escriptores. supposto lhes appliquerai as regras do constituto.<br />

^odavia não os incluem sob a dita denominação. Lob. cit., loc. n. 16.<br />

(115) Fr. 42. § 2; fr. 3, § 6 e 13. D. de adq. poss., (41,2); fr. 155.<br />

D. cie reg. per.. (50); L"t igitur nulla possessio adquiri nisi animo et cor-


34 DTR3ITO<br />

1. —Perda pelo Jacto material. A continuação da posse não<br />

presuppõe, como a acquisição, a faculdade immediata e actual de<br />

dispor da cousa. Assim a posse subsiste, emquanto não se torna<br />

impossível o exercício daquella faculdade, ou por outra: só se reputa<br />

perdida quando sobrevem um facto que nos rouba a possibilidade<br />

de a qualquer tempo e á nossa vontade praticar sobre a<br />

cousa actos de possuidor (116) A simples ausência,por exemplo.<br />

por si só não acarreta a cessação da posse, visto como a ausência<br />

não créa para o possuidor a impossibilidade de se approximar<br />

da cousa e delia livremente dispor (117).<br />

Isto 'posto : o poder physico sobre a cousa se extingue e<br />

conseguintemente a posse se perde:<br />

Quanto aos moveis,<br />

Quando a cousa perece (118) ;<br />

Quando se extravia, ou se o lugar onde está se torna inaccessivel<br />

(119).<br />

Quando outrem delia se apodera (120).<br />

Quanto aos immoveis,<br />

Por accidente natural que impede o possuidor de exercer<br />

sobre o immovel poder physico (121) ;<br />

Por acto de terceiro que se apossa do immovel por violência,<br />

ou de qualquer modo (122) ;<br />

pore potest, ita nulla amittitur, nisi in qua ulrutnque m contrarium actwm<br />

est. Savigny, § 30. sobre a interpretação deste fragmento. 1,6b., Not, a Mello,<br />

L. 3. T. 2, § 7, n. 2.<br />

(116) Paul., Recept. Sent., L. 5, T. 2, § I o : >Sed nudo animo adipisci<br />

quidem possessionem non possum us; reiin&re tinmen nuão animo possumus.<br />

Fr. 13, § 13. D. adq. poss., (41.2): idem quatenus si velimus, naturalem possessionem<br />

nancisci possimus. Ord. L. 4, T. 98, § I o . "Como se alguém occupasse<br />

a posse de cousa vaga que não fosse por outrem porporalmente possuída."<br />

Nestas palavras a ord. admitte a continuação da posse sem o poder<br />

physico immediato sobre a cousa. Vej. Savigny, § 31.<br />

(117) Fr. 3, § 7 e 11, fr. 46; fr. 44, pr., CD. adq. poss., (41,2); Lobão,<br />

Interdict, § 218, e Not. a Mello. L,. 3. T. 2, § 7 n. 2.<br />

(118) Fr. 3, § 17. fr. 18, pr. D. eoclem. Maynz. § 172; >Lob., Not. a<br />

Mello, L. 3, T. 2. § 7. n. 4.<br />

(119) Fr. 23, pr. fr. 13. pr. D. adq. poss.. (41,2); -Savigny. § 31.<br />

(120) Fr. 15, D. eoãem.<br />

(121) Fr. 3, § 17; fr. 30, § 3. D. eoãem.<br />

(122) Dig. de vi (43,16); Ord. L. 4, T. 58, pr. e § I o Cod. Civil da Luiaiania,<br />

art. 3412 e 3417. Cod. Civil do Chile, art. 926.<br />

Deject-io ê a palavra consagrada pelo Direito Romano para exprimir


DÂS COUSAS 35<br />

Pela retirada do possuidor que foge sob a pressão de violência<br />

imminente (123).<br />

E' de notar que se, na ausência do possuidor, um terceiro<br />

se apodera do ímmovel, a posse só se considera perdida desde o<br />

momento em que o possuidor, tendo noticia da occupação, se<br />

abstem de retomar o prédio v124). ou desde o momento, em que<br />

tentando recupera-lo, é violentamente repellido (125).<br />

2.— Perda pela intenção. A conservação da posse não requer<br />

no possuidor a consciência continua e permanente da propria<br />

posse. A intenção se entende perdurar emquanto por parte<br />

do possuidor não se manifesta uma resolução em contrario, isto<br />

é, a deliberação de renunciar a posse (126).<br />

Essa resolução pôde ser expressa, como no caso do constitute<br />

possessorio (127), ou tácita que é a que resulta de factos que<br />

virtualmente a incluem, como se por ventura o possuidor lança<br />

á rua moveis que não quer conservar (128).<br />

Da doutrina exposta deriva logicamente a illação que não<br />

a perda cia posse. O nosso Direito traduz a mesma idêa pelas palavras —<br />

força, esbulho.<br />

Reputa-se esbulhado aquelle que é á força retido no immovel de que<br />

estava de posse. Fr. 1, § 47, D. de vi. (43,16); Paul., (Recept. >Sent. L. 5,<br />

T. 6, § 6: Vi dejectus videtur et qui in preedio vi retinetur.<br />

(123) Paul. Recept. Sent. L. 5. T. 6, § 6. Vi dejectus videtur... qui in<br />

via territus est ne ad prœdium suura accédât. Fr. 33, § 2. D. de usurp..<br />

(41,3); Lob., Interdict., § 4 nota. Vej. Savigny § 31.<br />

(124) Fr. 46, fr. 3, § 8; fr. 7, D. adq. poss., (41,2). A ord. L. 4, T. 58.<br />

S I o , denomina - quasi-força a occupação da cousa, estando ausente o<br />

possuidor.<br />

(123) Fr. 25, § 2, D. coãem: "Usque e© possideamus donec revertentes<br />

nos repellat. Fr. 6, § 1°: Unde st revertentem dominum non admiserit,<br />

vi magis intelligi pòssideri, non clam. Cod. Civil Luz., art. 3412. Lob., Not.<br />

a Mello, L. 3, T. 2, § 7. O possuidor se entende repellido, desde que o comprador<br />

lhe nega a posse. Lob., Interdict., § 214. Da doctrina exposta acima<br />

no texto resulta que nunca se pôde dar na posse dos immoveis o vicio da<br />

clandestinidade.<br />

(126) Savigny, § 29.<br />

(127) O ConstiUito possessorio em relação ao que demitte de si a posse,<br />

é um modo de perda. E é tomado aqui neste sentido. Em relação áquelU,<br />

em favor de quem se transfere a posse, — o constitutario — é modo dcadquirir.<br />

Vej.


3S MKÊIYO<br />

podem perder a posse, pela intenção, as pessoas incapazes de<br />

deliberar, a saber, os loucos e os infantes (129.)<br />

3. — A posse se perde pelo facto e pela intenção, quando<br />

o possuidor desiste da vontade de possuir e deixa de reter a<br />

cousa, como nos casos de tradição (130) e de derelicção (abandono)(131).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 520 — Perde­se


DAS COUSAâ 37<br />

Entre o possuidor e o seu representante ha um vinculo de<br />

direito que os liga (^ 15, u. 3).<br />

Convém, pois saber quaes os actos de um e de outro que<br />

podem acarretar a perda da posse.<br />

1. — Perda da posse por acto do posstiidoi . Para que a posse<br />

se conserve é mister a permanência da intenção de te-la como<br />

propria (§ 15). D'ahi a conseqüência— que a posse cessa de existir<br />

desde que o possuidor renuncia a dita intenção, independentemente<br />

de qualquer resolução ou acto do terceiro (133).<br />

A cessação do facto material (detenção) por parte do possuidor<br />

não lhe traz a perda da posse, se a cousa continua no<br />

poder de seu representante, como por exemplo, se, sem embargo<br />

da expulsão do possuidor, permanece, todavia, o prédio sob<br />

a detenção do leitor ou do arrendatário (134).<br />

2.— Por actos de terceiro :<br />

A) Pôde o terceiro mudar de intenção e se resolver a possuir<br />

a cousa para si. Esta simples mudança de vontade, "porém,<br />

não é suf&ciente para operar a perda da posse por parte da pessoa<br />

de quem é representante (135) ; faz se necessário ainda que<br />

esta nova resolução se manifeste por um acto externo de uma<br />

signincação clara, como ou a recusa formal de entregar a cousa,<br />

sem a allegação de fundamento legal, ou a repulsa úo possuidor<br />

(13).<br />

B) Pôde ainda o terceiro, por mera infidelidade e sem ser<br />

em seu proveito, perder a posséda cousa, já abandonando-a, já<br />

entregando-a a outrem. No caso de abandono a posse continua a<br />

subsistir até que algum outro se apodere^da cousa (lo7).No segun-<br />

(133) Savigny, § 33, Muhlenbruch, § 237, n. II.<br />

(134) Fr.. 1, § 19. D. de vi (4-3,10): Lobão a Mello L. 3, T. 2, § 7, n. 2.<br />

(135) Fr. 3, § 19. D. de adq. poss., (41,2). Nemo sibi causam possessions<br />

mutare potest. Savigny, § 33.<br />

(136) Fr. 3, § 18; fr. 25, fr. 44. D. eodem. Lobão, Interdict., § 214,<br />

Doctrina das ACQ. nota 391.<br />

O terceiro pôde ter motivo legal para não restituir a cousa. sem comtudo<br />

desconhecer a posse da pessoa que representa, como no caso de retenção por<br />

bemfeitorias (Ord. L. 4, T. 54, § 1°.). Nesta hypothèse a recusa não importa<br />

perda de posse'.<br />

Os Romanos, nos casos figurados-, só admittiam a perda da posse: quanto<br />

aos moveis, pela tirada fraudulenta da cousa tfurtum, contrectatio) e,<br />

quanto aos immoveis, pela expulsão.<br />

(137) Fr. 40, § I o ; fr. 3, § 8, fr. 42, § 2. D. eodem.


38 hTRElTO<br />

do caso a posse só se considera perdida, desde que o possuidor,<br />

avisado do occorrido, se abstem de rehaver a cousa, ou desde<br />

que. tentando retoma-la, é repellido (138).<br />

3.— A posse se perde pelo terceiro nos mesmos casos em<br />

que a perderia o próprio possuidor se elle mesmo pessoalmente<br />

a tivesse sob sua detenção, como se a cousa perece, se se extravia,<br />

ou se outrem a toma (§ 15).<br />

4. — A posse porém não se perde :<br />

a) Se o terceiro transfere a outrem a mera detenção, como<br />

se o locatário subloca a cousa, ou se o depositário a põe sob a<br />

a guarda de outrem (139);<br />

b) Nem, se o terceiro fallece ou enlouquece (140).<br />

A razão é simples : nenhum destes factos acarreta por si<br />

só a cessação do poder physico do possuidor sobre a cousa.<br />

§ 17? — Quasi — posse.<br />

1.—- Supposto a posse, rigorosamente fallando, só possa<br />

ter por objecto as cotisas corporeas, todavia como ella afinal não<br />

é senão «o exercício de facto das faculdades que se contém no<br />

domínio», pareceu natural, por força de certas analogias, protrahi-laaos<br />

direitos reaes, que se desmembrão do domínio e subsistem<br />

como entidades distinctas e independentes (jura in re aliena)<br />

(141).<br />

E de feito, se o homem pôde se apossar dum prédio que<br />

não é seu e praticar uelle actos de proprietário : pôde da mesma<br />

maneira exercer actos materiaes, correspondentes aos direitos<br />

reaes na cousa alheia, sem que para isso tenha titulo legal, como<br />

se de propria autoridade abre caminho por terreno alheio.<br />

Ainda mais : se a relação em que o possuidor está paru<br />

com a cousa é susceptível de ser perturbada por actos de violência<br />

d'uni terceiro, igualmente o é o exercício dos direitos reaes.<br />

como por exemplo, o de servidão.<br />

2.—-O mesmo fundamento, pois, que ha para conferir ao<br />

possuidor de cousa corporea, movei ou immovel. a protecção dos<br />

(138) Const. 12 C. de adq. poss. (7.32); fr. 25, § 2; fr. 46 D. adq.<br />

pOSS. (4-1,2).<br />

(139) Fr. 3, § 6 D. eodem.<br />

(140) Fr. S>5, § 1" D. eodem; fr. 31, S S D. de usucp. (41,3).<br />

. (141) Veja-se § 1 e 25.


DAS COUSAS 39<br />

interdictos, subsiste para concedê-la ao que exerce de facto sobre<br />

a cousa alheia actos indicativos de direitos reaes.<br />

Estas, analogias tornarão possível, e as necessidades da<br />

vida pratica determinarão, a applicação da posse aos direitos<br />

reaes (142).<br />

3.— Applicada aos direitos reaes, (causas incorporons) a<br />

posse se denomina —quasi —posse (143) por opposição á posse, a<br />

qual só se refere ás cousas corporeas (144)<br />

A cerca da — quasi — posse nos limitaremos aqui a observar<br />

:<br />

1. Que ella resulta da reunião de dous elementos, análogos<br />

ás duas condições constitutivas da posse : — o exercicio material<br />

dos direitos reaes com a intenção de exerce-los para si (sibi<br />

habendi) (145).<br />

2.° Que dá direito á protecção dos inderdictos (146) ;<br />

3.° K, finalmente, conduz á usucapião do direito real, á<br />

que correspondem os factos praticados (147).<br />

(142) Gaio. L. 4. § 139. 1. pi*, de interdict. (4,16); fr. 3, § 17 D. ikvi<br />

(43,6): fr. 33. § 2 D: ex quib. caus. maiores (4,6); fr. 10 pr. D. si serv.<br />

\ irid. (8,5), Savigny. S 12.<br />

São susceptíveis de — quasi posse os direitos reaes seguintes:<br />

Usofructo.<br />

Uso.<br />

Habitação.<br />

As servidões reaes.<br />

O emphyteuta. o credor pignoraticio e o antechresista têm a posse da<br />

propria cousa. (Vej. § 147. n. 5. 163 e 170 adiante).<br />

(143) Gaio. 4 § 139. I. pr, de interdict. (4.15).<br />

(144) Fr. 3 pr. D, de adq. poss. (41.-2): Possideri autem possunt quae<br />

sunt corporalia.<br />

(145) Fr. 7. D. de itinere (43.19). Tamquam suo jure fuere. Fr. 20.<br />

D. Quemadmodum serv. amit. (8.6).<br />

(146) I. pr. interdict. (4.15).<br />

(147) Savigny. § 12.<br />

O direito Romano limitava a posse ãs eousas corporeas < aos (Ux Uos<br />

reaes.<br />

O Direito canonico, dando á idéa da posse um desenvolvimento perfeitamente<br />

analógico, ampliou-a a certos direitos da jurisdicqão eclesiástica, ligados<br />

ao solo. O exercicio do poder episcopal depende da posse da egreja<br />

e seus bens. de modo que. a expulsão de um bispo, da sua diocese, importa<br />

ao mesmo tempo esbulho da posse do solo e bens e da jurisdicção episcopal.<br />

Applicar. portanto, a protecção dos interdictos a esses direitos, não era


40 DIREITO<br />

senão dar maior extensão á noção da posse, sem todavia desnatural-a. (Savigny,<br />

§ 49).<br />

Alguns civilistas práticos foram além e chegaram a sustentar, que todos<br />

os direitos e particularmente os que se referem ao estado das pessoas e ás<br />

obrigações, podião também ser objectos de posse.<br />

Mas é fácil demonstrar o erro dessa doutrina,<br />

A posse presuppõe um facto physico, (a detenção na posse propriamenK<br />

dita, o exercício material do direito na quasi-posse) que põe o homem em<br />

contacto com a cousa; este facto pôde ser objecto de violências, contra as<br />

quaes a lei confere a protecção dos interdictos.'<br />

Pois bem. Os direitos que existem entre marido e mulher, pai e filho,<br />

credor e devedor, são direitos a que correspondem obrigações positivas. Se<br />

essas obrigações não são cumpridas, d'ahi resulta damno para os sujeitos<br />

dos direitos correlativos. O mal causado provém da omissão âo facto,<br />

objecto da obrigação. Este facto, o não cumprimento da obrigação, diffère<br />

radicalmente da violência physica, facto positivo, que embaraça a pratica<br />

de actos sobre a cousa.<br />

Já se vê, pois, que a idéa de posse é absolutamente inapplicavel ao?<br />

direitos pessoaes. Em relação a esses direitos não se concebe a possibilidade<br />

de violências ou perturbações physicas, que careçam do remédio dos interdictos.<br />

As violências que se podem praticar contra o indivíduo para impedil-o<br />

de exercer aquelies direitos, offendem directamente a sua liberdade; são<br />

deliotos contra sua pessoa e não se podem considerar como actos de perturbação<br />

ou usurpação, por exemplo, dos direitos de pai, de credor, etc.<br />

Lobão (Direito emphyt. § 1268) e C. Telles (Digesto Port. P. I. artigo<br />

662) incorrem no erro notado quando dizem que o senhorio directo, á quem<br />

os foros não foram pagos, pôde queixar-se de turbação de seu direito, e conseguintemente<br />

intentar contra o emphyteuta o interdicto de manutenção<br />

(utipossiãelis). No procedimento do emphyteuta que não satisfaz o foro,<br />

não ha turbação (violência) do direito do senhorio, senão simples inexecucão<br />

de uma obrigação, á que o emphyteuta pôde ser compellído pela acção<br />

competente.<br />

E' de notar que a palavra posse no nosso Direito significa muitas vezes<br />

o simples exercício ou o gozo de um direito, e neste sentido é applicavel a<br />

todos os direitos. Assim se diz estar em posse do estado de filho aquêlle que<br />

é tido e havido como filho (Direitos de familia, § 108) ; na posse da liberdade<br />

o que se acha no goso delia. (Vej. por exemplo, as Ord. D. 2, T. 27, § 3.<br />

T. 46, § 56, D. 4, T. 43. § 13).<br />

Não deve confundir, porém, a posse tomada nesta aecepção com a<br />

posse jurídica que dá direitos aos interdictos e á usucapião.<br />

Resta, finalmente, observar que o Alv. de 3 de fevereiro de 1550, excitado<br />

pelo de 2 de maio de 1647, e o Alv. de 18 de fevereiro de 1778, reproduzindo<br />

o direito Canonico, applicavarn a idéa de posse jurídica ao direito de cobrar<br />

dízimos. "E constando... que o dito Cabido está na posse de haver e lhe<br />

pagarem os ditos dízimos, o mantenham na dita posse.. . emquanto por sentença<br />

final... o contrario não fôr determinado." (Cit. Alv. de 3 de fev.<br />

de 1550.)


CAPITULO II<br />

INTERDICTOS POSSESSORIOS<br />

§ 18 — Acções possessorias em geral<br />

1.—Pelos ponderosos motivos, expostos em outro lugar,<br />

(§ 2") a posse foi recebida no s}'sthema do Direito, e chegou a<br />

revestir um caracter altamente jurídico (§ 5).<br />

Consagrada como urna situação que deve ser mantida e respeitada,<br />

emquanto pelos meios reg-ulares não succumbe diante do<br />

direito, era mister protegê-la contra as offensas e usurpações. de<br />

que é susceptivel.<br />

Desta necessidade resultou a creação dos Interdictos —<br />

acções adaptadas á aquelle fim (1).<br />

2. — A posse, em substancia, consiste no poder de dispor<br />

physicamente da cousa. Esse poder é accessivel a aggressões que<br />

podem ou perturbar-lhe o exercício, ou fazê-lo totalmente cessar.<br />

No primeiro caso ha turbarão (2) da posse, no segundo esbulho<br />

(3).<br />

3. — Para resguardar a posse da Inrbação o nosso Direito<br />

ministra os remédios possessorios seguintes (retinendce possessionis).<br />

a) A acção de manutenção ou força turbativa que ás vexes<br />

toma a fôrma de embargos de terceiro possuidor ;<br />

b ) O iúterdicto prohibitorio.<br />

d) Os Romanos denominavão as acções destinadas a proteger a<br />

posse — Interdictos possessorios. Vej. Savigny. §§ 34, 35 e 36'; Maynz, § 174.<br />

Na linguagem eomrnum do nosso Direito estas aeções se chamão indistinetamente<br />

— Interdictos, acções possessorias, remédios possessorios.<br />

(2) Vej. § 19 adiante.<br />

(3) Vej. § 22 adiante.


42 DIREITO<br />

4.—E para recuperar a posse no caso de esbulho (recuperandœ<br />

possessionis ) ;<br />

a ) A acção de esbulho ou de força espoliativa ;<br />

b ) O desforço em continente (4).<br />

(4) Os Romanos tínhão duas ordens de interdictos possessorios :<br />

interdictos retinendae possessionis, e interdictos recuperand cie possessionis.<br />

A primeira cathegoria comprehendia os interdictos utipossidetis, e utruoi:<br />

a segunda os interdictos tonde vi, de clandestina possessions, de precário, e<br />

segundo alguns interpretes o momentarios possessionis. 'Savigny, §§ 36 e<br />

43; Mühlenbruch, § 240.<br />

E para a quasi-posse emprega vão estes e outros interdictos espeeiaes.<br />

Savigny, §§ 45 e 46.<br />

A nossa jurisprudência, porém, só reconhece os remédios possessorios<br />

enumerados no texto, os quaes são sufficientes para proteger a posse e<br />

quasi-posse em todas as applicações possíveis, dispensados por inúteis os<br />

demais interdictos do Direito Romano. Doctr. das AcQões, § 194 e seg.<br />

A' este respeito o Direito Francez levou a sua tendência simplificadora<br />

ao ponto de reunir todos os interdictos possessorios em um sô — la complainte.<br />

(Zachar., § 191.) O Cod. Civil Port., arts. 485 a 487, só estabelece<br />

duas acções possessorias, a de manutenção e a de esbulho; permitte, porém,<br />

implorar mandado do juiz para impedir turbação ou esbulho imminentes.<br />

O interdicto adipiscendae possessionis não era propriamente, no systhema.<br />

do Direito Romano, um interdicto possessorio, como é fácil de ver. O interdicto<br />

possessoriopresuppoe uma posse preexistente, isto é, uma posse já<br />

adquirida que elle tem por fim proteger ou recuperar. Ora, o interdicto<br />

adipiscendae possessionis era a acção pela qual se demandava a acquísiçãn<br />

de uma posse nova" e por conseguinte ainda não existente. Como, pois, classificã'-lo<br />

entre as acções possessorias ? Savigny, § 35; Maynz, § 174.<br />

O interdicto adipiscendae possessionis é totalmente desconhecido no<br />

nosso Direito, e nem delle carecemos.<br />

Alguns dos nossos escriptores entendem que é elle applicavel no caso<br />

da posse civil que do defunto passa aos herdeiros.<br />

Este modo de ver é incorrecto e está em manifesta contradicção com<br />

as disposições do Alv. de 9 de novembro de 1774 e as declarações do Assento<br />

de 16 de fevereiro de 1786.<br />

A posse civil do defunto passa aos herdeiros, segundo a dita lei « Ass.,<br />

com todos os effeitos da posse natural, sem necessidade de ser corporalmente<br />

tomada.<br />

E', portanto, fora de toda a duvida que o herdeiro adquire a .posse pelo<br />

simples facto da morte do autor da herança, de modo que a citada lei não<br />

fez senão crear um modo especial de acquisição da posse. Assim que o herdeiro<br />

não tem necessidade de adquirir a posse por acto próprio, porque elU'<br />

a adquire por força da lei.


DAS COÜSAS 43<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 499 — O possuidor tem direito a .ser mantido >«z. posse em caSo da<br />

ttwrbação, e restituião, no de esbulho. — 52,3.<br />

Art. 500 — Quando varias pessoas se disserem possuidoras, manter-se-á<br />

provisoriamente a que deliver a cousa, não sendo manifesto que a obteve de<br />

alguma das owtrus, por modo vicioso. — 489.<br />

Art. 523 — As acções de manutenção, e as de esbulho sprão swmmérias,<br />

quando intentadas dentro cm anno e dia da tiurbação ou esbulho; e passado<br />

c se prazo, ordinárias, não perdendo, comtudo, o caracter possessorio. —<br />

499. 520. IV.<br />

Paragraplio único. O prazo de anuo e dia, não corre, emquanto o possuidor<br />

defende a posse, restabelecendo a. situação de facto anterior á turba,ção<br />

ou ao esbulho.<br />

sj 19. - Interdictos KETINENÜ/SÍ possessionis. 1. Acção de manutenção<br />

vn de foiça turbativa.<br />

1. — Acção de manutenção ou de força luibativa é como o está<br />

indicando seu nome, destinada a proteger o possuidor contra as<br />

violências que.,;lhe perturbât) a posse (5).<br />

Desta intelligencia da lei. cuja verdade não pôde ser contestada, resulta :<br />

1 — Que o interdicto adipiscenãae possessionis é absolutamente inapplicavel<br />

ao caso vertente, porque o herdeiro jâ adquiriu a posse pela<br />

morte do autor da herança, e pois não carece de acção para adquiri-la: o<br />

dito interdicto não teria objecte<br />

2 — Que o herdeiro, tendo adquirido a pusse civil com todos os effeitos<br />

da natural, pôde, no caso de turbação e esbulho, mesmo oceorridos em vida<br />

do defunto, invocar, como qualquer outro possuidor, os interdictos ou<br />

retinandae ou recuperandue possessionis.<br />

A Ord. L. 4, T. 58. §§ 3 e 4, não contraria a doctrina exposta. A citada<br />

Ord. trata da tomada extrajudicial da posse, em virtude de titulo legal,<br />

como compra e venda, doação. Se ha opposição de terceiro, a posse não<br />

se toma, e o adquirente. para chamar a cousa a si, não tem outro meio senão<br />

recorrer á acção petiioria que resultar do seu titulo, sendo inapplicavel<br />

â hypothèse qualquer dos remédios possessorios conhecidos. L,obãü,<br />

Interdict.. §§ &6 e 69.<br />

(5) Esta acção corresponde aos interdictos Utipossidelis c Utrubi dos<br />

Romanos. Empregavão elles o Utipossidetis para a posse dos immoveis, o<br />

Utrubi para a dos moveis. Savigny, §§ 38 e 3S. Na nossa jurisprudência<br />

os dous interdictos se reunirão em um só — o de força turbativa ou de<br />

manutenção. Doctr. das ACQ., S 190; C. da (Rocha, § #52.<br />

As cousas moveis podem facilmente ser subtrahidas a actos de turba-


44 D.lREíTO<br />

Tem por objecte : a desistência da força, a indemnisação<br />

dos damnos e prejuízos causados e a comminação de pena para o<br />

caso de nova violência (6). Só competa ao possuidor e tão somente<br />

contra o próprio autor da turbação (7).<br />

2. —Da materia da sua intenção se vê que tem por bases<br />

uma violência preexistente e o receio de violências futuras (8).<br />

Se a violência está passada e não ha justo receio de que continue<br />

ou venha a se reproduzir (91, a dita acção deixa de ser applicavel.<br />

porque tem cessado a sua razão de ser—a violência: resta somente<br />

o mal causado, o qual pôde dar lugar á acção de perdas<br />

e damnos (10).<br />

3. — Para que a acção de manutenção possa ser invocada<br />

é mister que concorrão os requisitos seguintes :<br />

1.° Que o autor esteja na posse jurídica da cotisa (11).<br />

ção. üahi veiu o desuso da acção de manuteçâo para a posse dos moveisalguns<br />

códigos modernos supprimirâo-lhe esta applicação. Zacharia?,<br />

§ 187; Cod. Civii do Chile, art. 916.<br />

(6) Fr. 1. § 4; fr. 3. § 11. D. Utipossidetis (.43,17). Doctr. das Acç.<br />

§ 190. Dobão, Interdict.. § 284. Vej. Savigny, § 37. Em outras nações usa-se,<br />

em vez de comminar pena, obrigar-se o trabalhador a prestar caução- Savigny,<br />

S citado.<br />

Se o interdicto é intentado depois de anno e dia, sú se podem pedir os<br />

rendimentos que o turbador effectivamente arrecadou. Pr. 1". pr. D. Utiposs..<br />

(.47,17) e fr. 4. D. de* adquir. rer. dom., (41.1); Doctr. das Acç., nota 413.<br />

(7) Makeldey. § 265; Maynz, § 175. Nem mesmo contra os herdeiros<br />

do turbador, é admittida esta acção, salvo por facto próprio, isto<br />

é, se elles continuão a turbação.<br />

(8) Fr. 1, pr. D. Utipossidetis (43,17) \


DAS COUSAS<br />

2.° Que a posse tenha sido turbada por actos de violência<br />

(12) ;<br />

3.° Que os actos de violência não acarretem a perda da<br />

posse, caso em que teria cabimento outro interdicto (13).<br />

Por violência ou força (vi) se entende todo o acto externo<br />

que impede ou embaraça o possuidor de livremente exercer o seu<br />

poder physico sobre a cousa. Nesta definição entra todo o acto<br />

que, em relação á cousa, é praticado contra a vontade do possuidor<br />

(14).<br />

A turbação pôde consistir em actos positivos, como se o<br />

turbador, sem expulsar o possuidor, cultiva o terreno, corta arvores,<br />

levanta edifícios (15), ou em actos negativos, como se elle<br />

impede o possuidor de praticar daquelles actos (16).<br />

4. —A' acção de manutenção se podem oppôr duas excepçoes,<br />

a saber :<br />

a) A de posse viciosa em relação ao réo, quando a posse<br />

allegada lhe foi tirada pelo autor com violência, ou clandestinamente,<br />

ou com o abuso denominado—precariedade (1.7).<br />

b ) Prescripção de anno e dia, se é proposta pela forma<br />

summaria (18).<br />

5. —Esta acção pertence á classe das duplas ou mixlas (judicia<br />

(Jupticia) (19y. isto é, daquellas acções em que o autor pôde<br />

se tornar réo, e o réo autor : o que em relação ao presente interdicto<br />

oceorre de dou s modos :<br />

a ) Ou quando o rêo prova que é elle quem effectivãmente<br />

(12) Fr. 1, § 4. D. Utipob.s. (43,17); fr. l. D. ütrutoi (48,31)..<br />

(13) Pr. 1, § 4. D. Utiposs.<br />

(14) Fr. 1, §§ 5 e 7. D. Quod vi aut. ciam (.43,24); fr. 20. pr. D. eodern.<br />

Savigny, § 37. A Gloza denominava a turbação ­ ris inqu.ietativa, e o<br />

esbulho violento — vis expulsiva.<br />

(15) Fr. 11. D. de vi.. (43,16).<br />

(16) Fr! 3, § 4: fr. 3. S 2. D. Utipossidetis, (43,17); fr. .".2, § l n . D. de<br />

adq. poss. (41,2).<br />

(17) Fr. 1, § 5; fr. 2. D. Utipossidetis : "Justa enim an injusta aãve­i<br />

sos caeteros possessio sit, in hoc interdicto nihil refert."<br />

(18) 'Mello Freire, iL. 4. T. 6, § 30. iDoetr. das Acç., § 192. Quando<br />

se pedem os lucros que o réo percebeu do facto da turibação, esta acção<br />

só prescreve em trinta annos. Frag. citados á nota (2) acima; Doctr. da.~<br />

A


46 DIREITO<br />

está na posse, caso em que deve ser mantido nella, sendo o autor<br />

condemnado como turbador (20).<br />

b) Ou quando prova que relativamente á elle a posse alienada<br />

pelo autor é viciosa, hypothèse em que o autor, sendo<br />

reputadoesbulhador, é condemnado a restituír­lhe a cousa (21).<br />

COCIGO CIVIL<br />

Art. 503 — O possuidor manutenido, ou reintegrado, na posse, bem direito<br />

á indemnização dos prejuízos soffridos. operando­se a reintegração d<br />

vasta do esbulhador, no mesmo logar do esbulho. — 510 e seg.<br />

Ari. 507 ■— Na posse de menos dí' anno e dia, nenhum possuidor será<br />

manutenido, ou reintegrado juâiciatmente, senão contra, os que não tiverem<br />

melhor posse.<br />

Paragrapho único­ Entende­se melho?\ a jiosse que se fundar em justo<br />

titulo; na falta de titulo, ou senão os títulos eguaes. a mais antiga; se da<br />

mesma data, a posse actual. Mas. se Iodas forem, duvidosas, será sequestrada<br />

a cotisa, emquanto se não apurar a quem toque.<br />

Art. 50)8. — Se a posse fôr de mais de mino e dia, o possuidor será mantido<br />

summariam,enie, até ser convencido pelos meios ordinários.<br />

Art. 509 — O disposto nos artigos antecedentes não se applioa ás servidões<br />

continuas não apparentes, nem ás descontínuas, salvo quando os respectovos<br />

títulos provierem do possuidor do prédio serviente, ou daquelles de<br />

quem este o houve.<br />

Art. 510 — O possuidor de bôa fé tem direito, emquanto ella ãivrar, aos<br />

fruetos percebidos. — 490, 512.<br />

Art. 511 — Os fruetos pendentes ao tempo em que cessar a bôa fé, devem<br />

ser restituidos, depois de deduzidas as despezas da producção e custeio.<br />

Devem ser também restituidos os fruetos colhidos com antecipação.<br />

Ari. 512 — Os fruetos naturaes e industriaes reputarn­se colhidos e percebidos,<br />

logo que são separados. Os civis reputam­se percebidos dki por dia.<br />

§ 20 — //. Embargos de terceiro possuidor<br />

-1 -. u. :-<br />

A penhora judicial, não obstante importar a tirada da<br />

cousa de sob a detenção do possuidor para o poder de um de­<br />

(20) E' o que resulta da fôrma empregada '' L'ti possidetis.'', Savigny,<br />

§ 37; Maynz, § 175.<br />

(,21) Fr. 3, pr. D. Utipossidetis: "Si a me possides, superior sum in<br />

interdicto. Na hypothèse figurada o réo podia recorrer ao interdicto de força<br />

espoliativa (unde vi) contra o autor, mas por evitar­se rodeio, permittlu­selhe<br />

allegar como defesa a materia do dito interdicto, alvitre que produz de<br />

prompto o mesmo resultado. Maynz, cit. § 175.


DAS COUSAS 47<br />

positario, não acarreta a perda da posse, a qual continua a subsistir<br />

na pessoa de quem nella estava (22).<br />

Effectuada em bens que não são do devedor, mas de terceiro,<br />

a penhora torna-se um acto illeg-al e como tal se converte em<br />

um verdadeiro attentado contra a posse (23).<br />

Este attentado, porém, embora tenha por effeito subtrahir<br />

a cousa do poder physico do possuidor, é todavia considerado mera<br />

turbaçao, visto não poder se incluir na definição de esbulho, por<br />

não trazer a perda da posse (24).<br />

A'quelle, cuja posse é turbada por uma penhora illegal nos<br />

termos ditos, a lei concede um remédio possessorio, conhecido<br />

pela denominação de Embargos tie terceiro possuidor (25).<br />

O dito remédio não é senão a propria acção de manutenção<br />

(§ 19) revestindo pelas necessidades praticas do processo uma<br />

fôrma diversa (26).<br />

§ 21. — III. Interdicto pi'ohihitorio<br />

Pôde acontecer que o possuidor se ache sob a ameaça de<br />

turbaçao ou esbulho de sua posse.<br />

Se o receio é justo e fundado,Mhe é pertnittido implorar<br />

ao juiü segurança contra o ag\g-ravo imminente (27).<br />

(22) Ord. L. 3. T. S6, § 1.°... De maneira que o eonclemnado nem por<br />

si, nem por outrem fique por via alguma em posse dos penhores. Posse aqui<br />

é tomada no sentido de simples detenção. (§ S. nota 3). Cama üecis. 277, n. 3;<br />

Decis. 341. n. 3. Moraes. 'Exeetil. !.. 6, cap. 1.2, n. 4*8*; Pereira c Souza, nota 78S<br />

Até a arremataçã.©, compete ao executado o direito de usar do interdieto de fôr.-:<br />

ça espoliativa (Unãe vi) pela cousa penhqrada, no caso.de esbulho; E' denotar<br />

que pela nossa praxe pôde o depositário do objeeto penhorado usar da acção<br />

de manutenção. Pereira e Souza, citada nota 7SS - o que não deixa de. ser<br />

uma verdadeira anomalia.<br />

(23) Ord. L,. 3, T. 86, S 17.<br />

.. (24) Consolidação das Leis Civis. art. 821.<br />

(25) Ord. L. 3. T. S(ï. § 17. Lei de 22 de Dezembro de 1761, § 12. E sendo<br />

igualmente certo que os Embargos de terceiro senhor e possuidor contém, por<br />

sua natureza um remédio meramente possessorio, sempre se ajuntão os títulos<br />

ainda que se não trate senão de justificar com elles a posse.<br />

Os Embargos de terceiro podem também ser de senhor, isto é, fundados nc<br />

dominio. Neste caso tomão a natureza da acção de reivindicação.<br />

(26) Os embargos de terceiro têm por fim. não a recuperação da posse<br />

que não foi perdida, mas simplesmente a manutenção.<br />

(27) Ord. L. 3, T. 78. § õ:... Se algum se temer de outro que o queira


4:S DIREITO<br />

Concede o jui/ a segurança por via de mandado prohibitory<br />

(28).<br />

No dito mandado se impõe preceito ao autor da ameaça<br />

para se abster de qualquer acto de aggressão contra o possuidor,<br />

e se lhe commina pena pecuniária para o caso de transgressão (29).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 501 — O possuidor, que tenha justo receio de ser molestado na posse,<br />

poderá impetrar ao juiz que o segure da violência imminente comminandc<br />

pena a quem lhe Irausgredir o preceito.<br />

£ 22. — A acção de forca espoliaf.iva (unde vi)<br />

1 — Ao possuidor que é esbulhado da posse da cousa movei<br />

ou immovel compete a acção de força espuliãtivã para recuperar<br />

a posse perdida I 30).<br />

offender na pessoa, ou lhe queira sem razão occupar e tomar suas cotisas,<br />

poderá requerer ao juiz que segure á. elle e suas cotisas do outro que o quizer<br />

offender, a qual segurança lhe o juiz dará. Doctr. das ACQ., § 200. Consolidação<br />

das L. Civis art. 812, nota . Cod. Civil Port. art. 485<br />

Turbação anterior e receio de novas turbações, ou turbação permanente<br />

c continua, eis os elementos da acção de força turbativa<br />

O receio de turbação imminente, sem turbação actual, é o fundamento<br />

do interdicto prohitorio.<br />

(28) Lob. Interdict. § 101; Doctr. das Acç. § 20>5.<br />

(29 ! ) Doctr. das Acç. § 200. O rêo pôde contestar ou embargar o mandado:<br />

ha as duas praticas. Embargado ou contestado, o mandado se resolve<br />

om simples citação e a causa toma a fôrma summaria. (Lob. Doctr. das<br />

Acç,, loc. cit.)<br />

O mandado uma vez intimado ao rêo, se este lhe não faz opposição ou<br />

se a opposição é julgada improcedente, constitue um preceito judiciai, cuja<br />

transgressão sujeita o réo á pena comminada.<br />

A pena, no caso do réo incorrer nella, não pôde ser havida senão por<br />

acção ordinária. Lob Interdit.. § 101. Doctrina das Acç. § 205.<br />

(30) Ord. L. 4, T. 58, pr.; L. 2, T. 1. § 2: Mello, !h. 4, T. 6, § 31, e<br />

Doctr. das Acç.. § 185.<br />

A nossa acção de força espoliativa è em substancia o interdicto Unde vi<br />

do Direito Romano alterado e ampliado por influencia do Direito Canonico e<br />

pelas praticas do foro.<br />

O interdicto Unde vi tinha por objecto recuperar a posse dos immoveis<br />

(e não dos moveis), esbulhada por acto violento (vi) e só podia ser intentada<br />

contra o próprio forçador. Savigny, § 40.


_<br />

li AS COUSAS -19<br />

O fim immediato desta acção é alcançar a restituição da<br />

cousa com todos os seus rendimentos e a indemnisação das perdas<br />

e damnos resultantes (31).<br />

A actio spolii do Direito Canonico reproduziu o interdicto Unde vi, apenas<br />

com uma innovação — a de poder ser dirigida contra o terceiro que recebeu<br />

a cousa. conscio do espolio. C. 18, X. de rest. spol.<br />

E' verdade que alguns carionístas sustentavão que o C. 3 Kedintegranda,<br />

c. 3, § I o , consagrou uma outra innovação, — a de permittir o emprego do<br />

interdicto em todos os casos em que se perde a posse sem causa, legitima, não<br />

obstante não ter havido violência. Zicgier, Quest. 1<br />

Esta opinião é de todo pomo infundada ; repelle-a o próprio texto invocado,<br />

bem como outras passagens do Direito Canonico.<br />

O C. Kedintegranda não creou uma nova acgão, mas tão somente estabeleceu<br />

uma excepção em favor dos bispos espoliados, prescrevendo que elles<br />

hão poderião ser accusados perante o synodo (ante avcibsaiionem aut regularem<br />

ad synoãum vocationem), antes de serem reintegrados na igreja e bens<br />

de que houvessem sid*b despojados aut ãolo. aut violentia malorúm,aut per<br />

quascuniQue causas injustas.<br />

Creando a excepção o C. Redint presuppõe a existência das acções pelas<br />

quaes podião os bispos rehaver a igreja e bens. a saber, a de reivindicação<br />

ou interdicto Unde ri," segundo a hypothèse oceorrente. E' esta a verdadeira<br />

intelligencia do dito texto.


50 DIREITO<br />

Só pôde ser intentada :<br />

Pelo possuidor ou por seus herdeiros (32).<br />

Contra o autor do esbulho, fosse o esbulho praticado por<br />

elle ou por mandatário seu (33).<br />

Ou contra terceiro que delle recebesse a cousa conscio do<br />

esbulho (34).<br />

Os herdeiros do forçador só podem ser demandados pelos<br />

lucros e vantagens que lhes tenhão advindo do facto do esbulho<br />

(35).<br />

2. — O direito de exercer esta acção depende do concurso<br />

dos requisitos seguintes ;<br />

1.° Que o autor tivesse a posse da cousa ao tempo do esbulho,<br />

quer essa posse sejajusta, quer injusta (36);<br />

2." 1 Que houvesse perdido a posse ;<br />

a) Por forca ou receio fundado de violência imminente<br />

(37).<br />

b) Clandestinamente (38).<br />

c ) Por abuso de confiança {precário) (39). «<br />

3. A acção de força espoliativa não se illide com a excepção<br />

de domínio. O autor do esbulho é sempre condemnado a restituir<br />

a cousa ao esbulhado, embora allègue dominio evidente e<br />

Xa força nova pedem-se os rendimentos percebidos e os que deixarão de<br />

sel-o por culpa do esbulhador; na velha os rendimentos effectivamentc aproveitados,<br />

Const. 4. C. Unãe vi (8,4); fr. 1. S 15; fr. 19; fr. 13, § 12. D. de<br />

vi. Sc a cousa não existe, restitue-se o seu valor; fr. 1". § 42. D. codent.<br />

(32) Fr. 1. § 30 e 44. D. de vi (43,16).<br />

(33) Fr. 3, § 10. O. 1'tipossideü.s, (43.17), fr. 1". § 12 e 15, fr. 13, § 10<br />

o 12. D. de vi.<br />

(34) Mendes a Castro, P. 11. liv. 4, cap. 10, n. 12, Doctr. das ACQ..<br />

nota 387; Rocha, § 453; Zaeharke. § 190. nota 9; Cod. Civil do Chile. art. 927<br />

(35) Fr. 1, § 48; fr. 2; fr. 3, pr.; fr. 9. D. de vi. (43,16). Doctr. das<br />

Acç., § 387.<br />

(36) Fr. 1, § 9 e 23. D. do vi. I. § 6. de interdict (4.15): licet is ab eo<br />

qui dejecit, vi, vel dam., vel precário possidebat.<br />

(37) F. 1, § 3. 21, 29; fr. 3, § 6 e 7. D. de vi. Ord., D. 1. T. 58, pr.<br />

(38) Ord. L. 4. T. 58, § I o . O vicio da clandestinidade em rigor só<br />

se pôde dar em relação aos moveis. Vej. § 15, nota 11 acima.<br />

(39) Ord. L. 4. T. '54. § 3 o 4; Lobão, Acç. Sum. Dissert., 12, § 25; Interdictos,<br />

§ 111. Consolidação das Leis Civis, nota 1 ao art. 509. Vej. § 8,<br />

nota 9 acima. A nossa pratica admitte o Unde vi contra qualquer terceiro<br />

que injustamente possue a cousa. Vej. Mello, 4,6 § 31; Lobão. Interdict.? 20::<br />

e 209; Cfr. C. C. do Chile, art. 926.


DAS COUSAS 51<br />

notório : fica-lhe, porém, salvo 'o direito de disputar por acção<br />

competente a propriedade da cousa (40).<br />

(40) Ord. L. 3, T. 48, § 2; T. 78, § 3; L. 4, T. 58; pr. e § I o .<br />

A pena da perda do direito sobre a cousa, comruinada ao forçador, cahiu em<br />

desuso. Repert. das Ord., tom. 2, pag. 264, nota (6); Consolid. das Leis Civis,<br />

nota ao art. 81õ.<br />

A disposição do Direito Romano, segundo a qual era inadmissível nas<br />

acções possessorias a excepção de dominio, tem sido uniformemente aceita<br />

pelos códigos modernos. Cod. Civil do Chile, art. 923; Cod. Civil Port,,<br />

art. 487. Esta disposição não tem só por causa a repressão do procedimento<br />

do autor da violência, que, deixando de invocar a autoridade legal, se faz<br />

justiça por suas proprias mãos; mas resulta também da differença entre a<br />

acção possessoria e a petitoria,-<br />

O dominio e a posse são duas entidades radicalmente différentes; cada<br />

uma é protegida por acções igualmente diversas; assim, pois, uma sentença<br />

proferida em acção possessoria evidentemente não poderia constituir couaa<br />

julgada em relação ao dominio.<br />

Neste particular o nosso Direito reproduz o Direito Romano, e está de<br />

harmonia com o Direito Moderno. Ord. 3. T. 40, § 2: T. 78, § 3, e L-iv. 4<br />

T. 58, pr. o § I o .<br />

Pensai-- alguns dos nossos escriptoivs que o Ass. de 16 de Fevereiro de<br />

1786, derogou as citadas ordenações, permiliindo illidir-se o interdicto restitutorio<br />

com a excepção de dominio evidente e notoriamente constante dos autos.<br />

Lobão, Interdict. § 234. Consolidação das Leis Civis, art. 818 e notas.<br />

Esta opinião ê o resultado da intelligencia errônea do dito Assento.<br />

A passagem do Assento que serve de fundamento á opinião alludida<br />

ë o período final da respos a ao 2* quesito, verb, "até para se não seguir..."<br />

Entrara em duvida se a lei de 9 de Novembro de 1774, dispondo que<br />

nos bens vinculados a posse civil passaria ao filho e neto, e na falta destes<br />

ao irmão e sobrinho, havia excluído os bisnetos (2 o quesito do Ass.)<br />

O Assento, interpretando a dita !ei, declarou que sendo a mente delia<br />

que a posse do defunto passe ãquellos? que tiverem um mais verosimil e<br />

provável direito a propriedade, jamais poderia excluir os bisnetos em proveito<br />

dos irmãos e sobrinhos, e termina, dizendo:<br />

Que havendo um parentesco, em que se verifique sem dependência de<br />

maior discussão a certeza e preferencia indubitavel do direito de suecessão:<br />

aquelie que estiver nossa cireumstancia se deve julgar transmissível a posse,<br />

"até para se não seguir o visível absurdo de se julgar nos interdictos restitutorios,<br />

e em outros casos oceorrentes no foro, a referida posse âquelle mesmo,<br />

a que pelo processo e evidencia notória dos autos se deprehende não lhe<br />

dever ser julgada a propriedade." E' este o período invocado.<br />

A hypothèse prevista pelo Assento nas palavras transcriptas, e que elle<br />

quer evitar, ê a seguinte:<br />

Se a posse civil se entendesse transferida ac que não é herdeiro certo.<br />

5


o2 DÍRRJTO<br />

A dita acção toma o nome de força nova quando intentada<br />

dentro de anno e dia, e de força velha, se intentada depois daquelle<br />

lapso de tempo (41),<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 504 — O possuidor pôdt intentar a acção ãc esbulho, ou a d< indemnuaação,<br />

contra o terceira, que recebeu a cousu esbulhada, sabendo<br />

que o era.<br />

\ri 505 — Não obsta á manutenção, ou reintegração na posse, a aliei/ação<br />

de domínio,ou de outro direito sobre a consa. Não se deve. entretanto,<br />

julgar a posse em favor daquelle " quem evidentemente não pertencer o<br />

domínio.<br />

Art. 5'06 Quando o possuidor tirer sido esbulhado, sera r< integrado na<br />

•posse, desde qut o requeira, sem srr ouvido ó autor do esbulho antes da<br />

reintegração.<br />

Art. 507 — Na posse de menos de anno e dia , nenhum possuidor será<br />

manutenião, ou reintegrado judicialmente, senão eon Ira os que não tiverem<br />

,ui lhor posse.<br />

por exemplo, ao sobrinho do defunto, existindo netos; o sobrinho investido<br />

da posse poderia usar da acç_ão de força, e o noto. herdeiro certo, não lhe sendo<br />

licito allegar domínio ver se hia obrigado a entregar os bens. objecto<br />

da posse ao sobrinho a quem por não ser herdeiro, não pertencia a<br />

propriedade dos bens: — absurdo este que resuitaria da falsa intelligence<br />

da alludida lei. e que o Assento quer evita! .<br />

Vias como evita o Assento o dito absurdo 1 ' Evita­o, não revogando as<br />

ordenações citadas, que. ao contrario, suppõe vigentes, mas interpretando<br />

eorrectamente a iei de 9 de Novembro no ser.tido de negar a transmissão da<br />

posse ao que não é herdeiro certo e legitimo isto é no caso figurado ao sobrinho,<br />

o qual, desde que se lhe nega a posse, não poderia usar do interdicto<br />

contra herdeiro certo. — o neto. ficando dest irte tffast ida a hypothèse<br />

■ i ut­ o Assento tevi em vista prevenir.<br />

o assento pois. em vez de revogar, confirma i disposição das Ord ei<br />

I idas isto e que não se pôde illidir a po«*e com a allegação de domínio m is<br />

para ­t­ evitai a.­ conseqüências deste principio em relação ao caso de que<br />

trata, nega a transmissão da posse civil 10 que não é herdeiro certo < uniu<br />

bitavel. Basta ponderar, (o que torna tudo claro) que a posse di que trata<br />

o Assento posse que do défunt i i',^v ao herdeiro — ê uma posse exce<br />

pcional, isto é. — posse que não prtde existir sew //;/< direito anterior i/ui «<br />

fundamente. $ 12. I. n. 1.<br />

F;' de notar que a faculdade que tinha .1 Casa da SuppUcação de fixar<br />

por interpretação authentica o sentido das leis, não incluis em si o poder<br />

de revogar os textos claros e expressos, como são os das Ord. citadas.<br />

(41) Ord. L. 3. T. 4S; Doctr. d.is w $ 186 e 1SÎ). No primeiro caso<br />

• súmmarià no segundo, ordinária


DÁS COTISAS 53<br />

Paragrapho, único. Bntenãe-se melhor a posse que se fundar em justo<br />

titulo; na falta do titulo, ou senão os tiíulos eguaes, a mais antiga; se da<br />

mesma data, a posse actual. Mas, se todas forem duvidosas, será sequestrada<br />

a cousa, emquanto se não apurar a quem toque.<br />

Ari. 510 — O possuidor de boa fé tem dvreito, emquanto ella durar,aos<br />

fructos percebidos. — 490, 512.<br />

Aft, 511 — Os fructos penãentes ao tempo em que cessar a boa fé devem<br />

ser restituiãos, depois de deduzidas as ãespezas da proãucção e custeio. Devem<br />

ser também restituiãos os fructos colhiáos com antecipação.<br />

Art. 512 — Os fructos naturaes e inãustriaes reputam-se colhidos e pevcebiãos,<br />

logo que são separados.<br />

Os civis reputam-se percebidos ãia por dia. < Vide artigos 513. 514, 515<br />

516, 517, 518 e 519.)<br />

§ 23. -— Des forço<br />

Não se pôde recusar ao possuidor o direito de defender-se<br />

e sustentar-se na posse, repellindo pela força as vias de facto<br />

que são dirigidas contra a cousa possuída (42).<br />

Este direito deriva do principio da legitima defesa , não<br />

é, pois, um mero effeito da posse, tanto que pôde também ser<br />

exercido pelo simples detentor (43).<br />

O esforço * direito que deriva da posse, é mais alg-uma<br />

cousa do que o direito de defesa : não se limita á simples repulsa<br />

da violência, mas vai além.<br />

A lei permitte ao possuidor que é esbulhado da cousa,<br />

retoma-la por sua propria força e autoridade, comtanto que o faça<br />

em acto seguido (44). E' isto que no nosso Direito se chama—<br />

desforço.<br />

(42) Fr. 45, § 4. D. act. legem Aquîl. (9,2); fr. 3, § 9 ,D. de vi (4-3,161<br />

Eum igitur qui cum armis venit, possum us armis repellere. Cod. crim.<br />

artigo 14. § 2.<br />

(43) Zacar. § 184. Ve;j. 3, § nota 3, 2 o .<br />

(44) Ord. L/. 4, T. 58, § 2: "...antes que o forçador se occupe em ou.tro<br />

acto separado e diverso do da força."' Estas palavras se applicão hoje a<br />

todos os casos de desforço; porquanto por incompatível com as theses fundamentaes<br />

da nossa Constituição política, não prevalece mais a distineção que<br />

fazia a citada Ord. entre pessoas de pequena condição e fidalgos e cavalheiros<br />

para dar á estes maior espaço para o desforço. E assim se entendeu em<br />

Portugal, onde vigora um regimen politico igual ao nosso. Vej. Cod. Civil<br />

Portug. art. 486. E nesse sentido era a lei romana, d'onde foi tirada a disposição<br />

da Ord "Dummodo soiamus non solum rosistere permissum, ne de-


54 DIREITO<br />

Na pratica do desforço o possuidor deve guardar os princípios<br />

que reg-ulão o exercício da legitima defesa (moderamen inculpatœ<br />

tutela) (45).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 502 — o possuidor turbado, ou. esbulhado, poderá -manter-se, ou restituir-se<br />

por sua propria força, com lauto que o faça logo. — 160, I.<br />

Paragrapho único. Os aclos de defesa, ou de desforço, não podem ir<br />

além do indispensável d manutenção, ov restituição da posse.<br />

CÓDIGO PENAL<br />

Art. 32 — Não serão também criminosos :<br />

§ os que praticarem o crime em legitima defesa, propria,<br />

ou de outrem.<br />

A legitima defesa não é limitada unicamente á protecção<br />

da vida ; ella comprehende todos os direitos que podem ser<br />

lesados.<br />

Art. 34 —Para que o crime seja justificado no caso do<br />

§ 2, deverão intervir conjuntamente em favor do delinqüente,<br />

os seguintes requisitos :<br />

1.° — ag-gressão actual :<br />

2 o . -impossibilidade de prevenir ou obstar a acção, ou<br />

de invocar e receber soccorro da autoridade publiea ;<br />

3.° — empreg-o de meios adequados para evitar o mal e<br />

na proporção da ag-gressão ;<br />

4." — ausência de provocação que occasionasse a<br />

ag-gressão.<br />

jectatur; sed etsi ãejectus quis fuerü, ewntd&m ãejicere, non ex intervaïïo,<br />

sad ex conUnenti, fr. 3, § 9, D. de vi (43,16).<br />

(45) Const. 1 C. imde vi (8,4) Lobão, Interdits.. § S.


SBOÇÃO S E2G-T71ST 3D .A.<br />

DOMÍNIO, MODOS DE ADQUIRIR, ACÇ0ES.<br />

CAPITULO I<br />

DOMÍNIO : OBJECTO E CARACTERES.<br />

§ 24.— Noçãü do domínio.<br />

O direito de prop/ icda.de, em sentido genérico, abrange todos<br />

os direitos que formão o nosso patrimônio (1), isto é, todos os<br />

direitos que podem ser reduzidos á valor pecuniário (2).<br />

(1) Xeste sentido é a locução direito de propriedade empregada na Constituição,<br />

arl. 179, S 22, Acto Add. art. 10. § 3; Lei de 9 de Setembro de 18-26.<br />

art 1°; Cod. Criminal Parte IH. Titulo 3". Veja-se Mackeldey, § 272.<br />

(2) Patrimônio é o acervo de iodos os nossos haveres: — cnnstitu-j<br />

uma universalidade de direito, um todo composto de bens diversos reunidos<br />

sob a unidade da pessoa á que pertence. Zach. S 1&8: Marezoll. § 18.<br />

Compõem o nosso patrimônio:<br />

Os direitos reaes,<br />

Os direitos pessoaes, isto é, direitos a certas acções e prestações de ouïras<br />

pessoas — obrigações, créditos;<br />

A propriedade litteraria, a artística, a de invenções e descobertas.<br />

No sentido objective propriedade significa , não o direito mas a cousa<br />

que é objecto do direito: assim se diz: "propriedades urbanas, propriedades<br />

ruraes."<br />

A propriedade litteraria e a artística ainda não se achão reguladas entre<br />

nós por lei; temos apenas a lacônica disposição do art. 261 do Cod. Crim.<br />

acerca da conlra)eição. E' assumpto, que attentas as suas peculiaridades,


56 DIREITO<br />

Mas, ordinariamente, o direito de propriedade ê tomado em<br />

sentido mais restricto,como comprehendendo tão somente o direito<br />

que tem por objecto directo ou immediato as cotisas corporeas.<br />

Nesta accepção se lhe dá mais geralmente o nome de domínio,<br />

consagrado por monumentos legislativos antiquissimos e de significação<br />

mais espiritual e característica (3).<br />

Domínio é o direito real que vincula e legalmente submettc<br />

ao poder absoluto de nossa vontade a cousa corporea, na substancia,<br />

accidentes e accessorios (4).<br />

Desta noção resulta :<br />

1. Que o dominio envolve a íaculdade de gozar de todas<br />

as vantag-ens e utilidades que a cousa encerra, sob quaesquer relações<br />

(5) ;<br />

2. Que é Wimitado e como tal inclue em si o direito de praticar<br />

sobre a cousa todos os actos que são compativeis com as leis<br />

da natureza (6) ;<br />

3. Que é de sua essência cxhusivo, isto é, contém em si o<br />

direito de excluir da cousa a acção de pessoas estranhas (7).<br />

Estes são os caracteres fundamentaes do dominio.<br />

Todavia é elle susceptível de limites e restricções que lhe<br />

pôde impor ou a lei ou a vontade do senhor (dominas).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 5>24 — A lei assegura ao proprietário o direito de usar, gosar e dispor<br />

de seus bens, e de rehavel-os do poder de quem, quer que injustamente os<br />

possua.<br />

carece de disposições espociaes, que não podem ser suppridas pelas regras<br />

geraes de direito.<br />

Acerca da propriedade do invenções e descobertas veja-se a lei de 28 de<br />

Agosto de 1826, e da de marcas de fabricante e negociante a de 23 de Outubro<br />

de 1875 (n. 2.682).<br />

(3) Pr. 13 pr. D. adq. rer. dom. (41,1): Dominium, mini, id est, proprietas<br />

adqwiritur. Fr. 1, § 1.° D. de senat. Silanian. et Claudian. (2.9,5.)<br />

Domini appcllatione continetur qui habet proprietatem. Assento de 16 de<br />

Fevereiro de 1786, 2 o quesito in fine: - '...se deprehende não lhe dever ser<br />

julgada a propriedade..<br />

(4) Vej. Vinnio Com. ao § 11, I. de rer. division. (2,1) n.3.Mackeldey<br />

§ 272. Maynz § 180, Muhlenbruch. § 241.<br />

(5) "Dominium plena in rem potestas."<br />

(6) Nullus videtur dolo facere qui jure suo utitur: fr. 65 D. de reg.<br />

Jur. 50, 17. Ass. de 2 de Março de 178«, verb. E alem.<br />

(7) Mackeldey § 299, Zachar. § 194.


D4S CO US A S<br />

Paragrapho único. Á propriedade luterana, scientific" c artística será<br />

regulado conforme us disposições do capitulo VI, deste titulo.<br />

j/7. 52 7 — O ãomdnio presume-se exclusivo e ill imitado, até prova em<br />

contrario<br />

Art. 529 — O proprietário, ou o inquilino de um prédio, em que alguém<br />

le m direito de fazer obras, pôde, no caso de dam no imminente, exigir do autor<br />

délias as precisas seguranças contra o prejuízo eventual.<br />

DA PROPRIEDADE IJTTERARIA, SCIENTIEICA E ARTÍSTICA<br />

Código Civil:<br />

Art. 649 — Ao autor de. obra litter avia, «cientifica, ou artística pertence<br />

o direito exclusivo de reproduzil-a. — 1.346.<br />

5 1" — Os herdeiros e suecessores do autor go&arão desse direito pelo<br />

tempo de sessenta annos, a coutar do dia do seu (allecimento.<br />

i 2" - Morrendo o autor sem herdeiros ou suecessores, a obra cáe no<br />

domínio com m um iif>:i paragrapho único.<br />

Art. 650 — tíosrt dos direitos de autor para os ei leitos econômicos por<br />

este Código assegurados, o editor de publicação composta de artigos ou trechos<br />

de autores diversos, reunidos nu/m lodo. ou distribuídos cm series, taes<br />

como jornaes, revistas, diecionarios, encyclopedias e selectas.<br />

Paragrapho único. i'udu autor conserva, neste caso. o seu direito sobre,<br />

a sua- produeeão. e poderá reproduzü-a em separado.<br />

Ar!. 651 - O editor exerce também os direitos .


58 DIREITO<br />

§ 2" — Cada collaborador pôde, entretanto, individualmente, sem acquiescencia<br />

dos outros, defender os 2>roprios direitos contra terceiros, que daquettes<br />

não sejam legítimos representantes.<br />

Art. 655 — O autor de composição musical, feita sobre texto poético,<br />

pôde executal­a, publical­o ou transmittir o seu direito, independente de au~<br />

torização do escHptor, indemnizando, porém, a este, que conservara direito<br />

á reproducção do texto sem a musica.<br />

Art. 656 — Aquelle que, legalmente autorizado, reproduzir obra de arte<br />

­mediante processo artístico différente, ou pelo mesmo processo, havendo na<br />

composição novidade, será quanto á copia, considerado autor.<br />

Paragrapho único. Gosa, eguatmente, dos direitos de autor, sem dependência<br />

de autorização, o que assim reproduzir obra já entregue ao domínio<br />

commum.<br />

Art. 657 — Publicada e exposta d venda uma obra théâtral ou musical,<br />

entende­se annuir o autor a que se represente, ou execute, onde quer que<br />

a sua audição não fôr retribuída.<br />

Ari. 658 — Aquelle que, com autorização do compositor de uma obra<br />

■musical, sobre os seus motivos escrever combinações, eu variações, ton, a<br />

respeito destas, os mesmos direitos, e com, as mesmas garantias, que sobre<br />

aquella o seu autor.<br />

Art. 659 — A cessão, ou a herança, quer dos direitos de autor, quer da<br />

obra de arte. litteratura ou sciencia, não transmute o direito de modifical­a.<br />

Mas este poderá ser exercido pelo autor, em cada edição suecessiva, respeitados<br />

os ão editor.<br />

Paragrapho único. A cessão de artigos jornalísticos não produz effeita,<br />

salvo convenção em contrario, além ão prazo de vinte dias, a contar da sua<br />

publicação. Findo elle, recobra o autor em toda a plenitude o seu direito.<br />

— 1.350.<br />

Art. 660 — A União e os Estados poderão desapropriar por utilidade<br />

publica, mediante indemnização prévia, qualquer obra publicada, cujo dono<br />

a não quizer reeditar.<br />

Art. 661 — Pertencem á União aos Estados, ou aos Municípios:<br />

I — Os manuscriptos de setts archivos, bibliothecas e repartições.<br />

II — As obras encommendadas pelos respectivos governos, e publicadas<br />

á cinta dos cofres públicos.<br />

Paragrapho único. Não caem, porém, no dorninio ãa União, do Estado,<br />

ou do Município, as obras simplesmente por elles subvencionadas.<br />

Art. 662 — As obras publicadas pelo Governo Federal, Estaãoal ou Municipal,<br />

não sendo actos públicos e doctement os officiaes, caem­, quinze annos<br />

depois da publicação, no domínio commum­. — 666, IV.<br />

Art. 663 — Ninguém pôde reproduzir obra, que ainda não tenha cahido<br />

no domínio commum, a pretexto de annotal­a, commental­a ou melhoral­a,<br />

sein permissão do alitor ou seu representante.<br />

S I o — Podem, porém publicar­se em separado, formando obra sobre si,<br />

os comnientarios ou annotaçóes.<br />

§2" — A permissão confere ao proãuclor os direitos do autor da obra<br />

original.


DAS COt'..A S 59<br />

Art. 664 ~ A permissão do autor, necessária lambem para se lhe reduzir<br />

a obra a compêndio ou resumo, attribue, quanto a este, ao resumidor ou compendiador,<br />

os mesmos direitos (Laquelle sobre o trabalho original.<br />

Art. 665 —- E' eguahnente necessária, e produz os mesmos effeitos da permissão<br />

de que trata o artigo antecedente, a licença do autor da obra primitiva<br />

a out rem para, de uni romance extrahir peça théâtral, reduzir a verso<br />

obra cm prosa, e vice-versa, ou delia desenvolver os episódios, o assumpto<br />

c o plano geral.<br />

Paragrapho único. São livres as paraphrases que não forem verdadeira<br />

reproducçâo da obra original.<br />

Art. 666 — Xão se considera offensa aos direitos de autor:<br />

J — A reproducçâo de passagens ou trechos de obras já publicadas e<br />

a inserção, ainda integral, de pequenas composições alheias no corpo de obra<br />

maior, comtanto que esta apresente caracter scientifico, ou seja compilação<br />

destinada a fins/itteraftos, didactico, ou religioso, indicando-se, porém, a origem,<br />

de onde se tomarem, os excerptos, bem como o nome dos autores.<br />

XI .1 reproducçâo, em diários ou periódicos de noticias e artigos sem<br />

caracter /titer'avio ou scientifico publicados em. outros diários, ou periódicos,<br />

mencionando-se os nomes dos autores e os dos periódicos, ou jornaes de onde<br />

forem tra u scriptos.<br />

III — I reproducçâo, em diários < periódicos, de discursos pronunciados<br />

em reuniões publicas de qualquer natureza.<br />

IV — .1 reproducçâo de todos os netos públicos c documentos officines<br />

da União, dos Estados e dos Municípios.<br />

V — A citação em livros, jornaes ou revistas, de passagens de qualquer<br />

obra com intuito de critica ou polemica.<br />

VI — A copia, feita a mão, de uma obra qualquer, comtanto que se não<br />

destine á venda.<br />

VII — A reproducçâo, no corpo de um escripto, de obras de artes figurativas,<br />

comtanto que o escripto seja o principal, e as figuras sirvam somente<br />

pava explicar o texto, não se podendo,porém, deixar de indicar os nomes dos<br />

autores, ou as fontes utilizadas.<br />

VIII — A utilização de um trabalho de ar/e figurativa, para se obter<br />

obra nova.<br />

IX — .4. reproducçâo de obra ãe arte existente nas ruas e praças.<br />

X — A reproducçâo de retratos ou bustos de encommenda particular,<br />

quando feita pelo proprietário dos objectos eucomviendados. A pessoa representada<br />

e seus suecessores hnmediatos pôde oppôr-se á reproducçâo ou publica<br />

exposição do retrato ou busto.<br />

Art. 667 — E' susceptível de cessão o direito, que assiste ao autor de<br />

ligar o nome a todos os seus prodwetos intellect u-aes.<br />

§ 1" — Dará logar a indemmízação por perdas e damnos, a usurpação do<br />

nome do autor ou a sua substituição por outro, não havendo convenção que<br />

a legitime.<br />

§2° — O autor da usurpação, ou substituição será, outrosim, obrigado<br />

a inserir na obra o nome do verdadeiro autor.


60 DIREITO<br />

Art. 668 — Não firmam direito de autor para desfruelar a gatantia da<br />

lei. os escriptos por esta defesos, que forem por sentença mandados retirai'<br />

da circulação.<br />

Art. 669 -- Quem publicar obra. inédita ou reproduzir obra em via de<br />

publicação ou já publicada, pertencente a outrem, sem outorga ou acquiescencia<br />

deste, além de perder, em beneficio do autor, ou proprietário, os exemplares<br />

da reprodiicção fraudulenta que se appréhendèrent, pagar-lhe-á o valor<br />

de toda a edição, menos esses exmplares, ao preço por que estiverem á venda<br />

os genuinos. ou em que forem avaliados.<br />

Paragraphe único. Não se conhecendo o numero de exemplares fraudulentamente<br />

impressos e dis tribu idos, pagará o transgressor o valor de mil<br />

exemplares, além dos apprehendidos.<br />

Art. 670 — Quem vender ou expuzer d venda ou á leitura publica e remunerada<br />

uma obra impressa com fraude, será solidariamente responsável,<br />

com o editor, nos termos do artigo antecedente; e, se a obra far estampada<br />

no estrangeiro, responderá como editor o vendedor, ou o expositor.<br />

Art. 671 Quem publicar qualquer manuseriplo sem permissão do autor<br />

ou de seus herdeiros ou represent atiles, será responsarei por perdus e<br />

dam nos.<br />

Paragrapho único. As cartas-missivas '"'" podem ser publicadas sem<br />

permissão de seus autores ou de quem os represente, mas podem, ser juntas<br />

como documentos em. aulas judiciários.<br />

Art. 672 — o autor, ou proprietário, cuja obra s< reproduzir fraudulentamente,<br />

pod( rá tanto que o saiba, requerer a apprehensão dos exemplares<br />

reproduzidos, subsislindo-llie o direito d indcnvnização de perdas e damnos,<br />

ainda que nenhum exemplar se encontre.<br />

Ari. 673 — Para segurança de seu direito, o proprietário da obra divulgada,<br />

por typographic!, litographia, gravura, moldagem, ou qualquer outro<br />

s/jstema de reproducção. depositará, com destino ao registro, seis exemplares<br />

na Bibliotheca Nacional, no Instituto Nacional de Musica ou na Escola Nacional<br />

de Bellas Artes do Districto Federal, conforme a natureza ãrt proãucção.<br />

Paragrapho único. As certidões do registro induzem a propriedade da<br />

obra, salvo prova em contrario.<br />

§ 25.— Decomposição do domínio.<br />

O domínio encerra em si diversos direitos que são os elementos<br />

de que elle se compõe. Estes direitos, mediante uma divisão<br />

lógica e natural, se podem reduzir aos seguintes :<br />

1. Direito de possuir, de deter physicamente a cousa (8).<br />

(8) Os jurisconsultes chamão a este direito jus possidendi por opposi-<br />

QãO ao jus possessionis. Vej. § 2 nota 3. E' o fundamento particular das aeções<br />

in rem, as quaes têm por fim trazer o objecto ás mãos de seu dono.


HAS CCUSAS is I<br />

2. Direito-'de fazer delia os usos e empregos a que se presta<br />

(9),<br />

3. Direito a todos os seus lructos, rendimentos e product,<br />

os (10) ;<br />

4. Direito de transforma-la e desnatura-la (11) ;<br />

5. Direito de dispor delia, isto é, de aliena-la era todo ou<br />

cm parte, por titulo oneroso ou gratuito, de grava-la com onus<br />

reaes e de abandona-la (12) ;<br />

6. Direito á substancia da cotisa (mtda proprietas) (13) ;<br />

7. Direito :<br />

a) De defende-la contra as violências e injurias de terceiros.<br />

(14) ;<br />

b) De reivindica-la do poder de quem quer que injustamente<br />

a detenha (15) ;<br />

c) Ë de haver a satisfação dos dainuos que se lhe causarem<br />

(16) ;<br />

O direito que constitue a essência do dominio é «o direito<br />

á substancia da cousa». Em torno desse direito vêm, por força<br />

propria, se ag-rupar os direitos elementares do dominio que se<br />

conservão destacados em favor de terceiros, quando desapparece<br />

a causa legal em virtude da qual permaneciao desligados da pessoa<br />

do proprietário (17).<br />

(.9) Ha cousas susceptíveis de uso que si' reproduz, taes -são as cousas<br />

não fungíveis (jus utendi), ha outras, como as substancias alimenlares, cujo<br />

uso importa a sua destruição definitiva (jus aoutendi.)<br />

(10; Jus fruendi Vej. adiante, i: 93.<br />

(.11) Como o de cultivar a terra, de demolir, reconstruir o edifício.<br />

B. Carneiro, L. 2 T. 1. § 48, n. 1.<br />

(12) Orei. L. 4 T. 11 pr. T 36, § 1" T. 43 § 11. Alv. de 20 de Junho<br />

de 1774 preamb: "pervertendo o uso do dominio que compete â cada um<br />

para dispor de seus bens." Constituição, art. 179 § 22. No direito de dispor<br />

os Romanos comprehendião o jus abutenãi.<br />

13) Fr. 4. D. de jure dot. (23,3.), fr. 126. í; 1" D. de verbor. signifie.<br />

(45,1). Tal é o direito que fica ao proprietário, quando um terceiro tem<br />

usofrueto constituído sobre a cousa. Não é mister dizer que "o direito a<br />

substancia da cousa" contém em si a faculdade de dispor desse direito.<br />

(14) Cod. Crim. art. 14, § 2. Veja acima, § 23.<br />

(15) 1 § I o de actionibus. (4,6) D. de rei vindicat. (6.1) ord. .'L. 3 T. 31<br />

pr. verb, "de maneira que sendo a cousa julgada .. ord. L. 4. T. 54.<br />

(16) Cod. Crim. art. 21—32. Doctr. das Aeç. § 68 e nota 123.<br />

(17) Como quando se extingue o usofrueto, o uso, a habitação, casos<br />

em que o proprietário entra na plenitude do dominio. Da mesma sorte na


62 DIREITO<br />

Certo, os demais direitos que entrào na composição do domínio,<br />

como o de usar da cousa, de perceber-lhe os fructos, podem<br />

ser transferidos a pessoa estranha sem que o dono deixe de<br />

ser o proprietário (18). Mas deixa de sê-lo, se o direito á substancia<br />

da cousa passa á outrem.<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

§ 25 A<br />

DO DIREITO DE TAjPAGEM<br />

Art. 588 — O proprietário tem direito a cercar, murar, vallar ou tapar de<br />

qualquer modo o seu prédio, urbano ou- rural, conformando-se com estas<br />

disposições :<br />

§ 1" — Os tapumes divisórios entre propriedades ruraes presumem-se<br />

communs, senão obrigados a concorrer, em partes egtiaes, para as despesas<br />

de sua construcção e conservação, os proprietários dos immoveis confinantes.<br />

— 571.<br />

§ 2" — l'or "tapumes" entenãèm-sè as sebes vivas, as cercas de arame<br />

ou áe madeira, as vallas ou banquetas ou qwaesquer outros meios de separação<br />

dos terrenos, observadas as dimensões estabelecidas em posturas municipaes,<br />

de acccordo com os costumes de cada localidade, comtanlo que impeçam<br />

a passagem, de animaes de grande porte, como sejam gado vaecum, cavallar<br />

e muar.<br />

'§ 3 o —A obrigação de cercar as propriedades para deter nos limites délias<br />

aves domesticas e animaes que exigem tapumes especiaes, como sejam: cabritos,<br />

carneiros e porcos, correrá por conta exclusiva dos respectivos proprietários<br />

ou detentores.<br />

§ 4 o — Quando fôr preciso decolar a cerca viva ou reparar o muro divisório,<br />

o proprietário terá direito de entrar no terreno do viainho, depois<br />

de o prevenir. Este direito, porém, não exclue a obrigação de indemnizar ao<br />

vizinho todo o damno, que a obra lhe occasione. — '587.<br />

§ 5° — Serão feitas e conservadas as cercas marginaes das vias publicas<br />

pela administração, a quem estas incumbirem, ou pelas pessoas, ou em/prezas,<br />

que as explorarem.<br />

emphiteuse o domínio util, eahido em eommisso, se consolida no domínio<br />

directo.<br />

(18) Se o proprietário, por exemplo, cede em favor de terceiro o usofrueto<br />

de seu prédio, perde o direito de retel-o, de dispor délie e de praticar<br />

outros actos dominicaes, emquanto dura o usofrueto. No emtanto continua<br />

a ser tratado e considerado como proprietário. E porque? Porque conserva<br />

o direito á substancia da cousa — - nuda proprietas<br />

O direito á substancia da cous'a tem válpr real porque mais tarde virão<br />

se consolidar nelle os direitos destacados.


DAS corsAs<br />

§ 26. — Objecte do domínio<br />

O objecto do domínio, como se disse em outro lugar ('§ 24)<br />

não pôde ser senão «cotisa corporea». (19)<br />

O domínio, uma vez radicado na cousa, comprehende :<br />

a) A cousa em toda sua substancia e attributos ;<br />

b) Os fructos (20) :<br />

c) E todas as riquezas materiaes á ella inhérentes (21).sem<br />

necessidade de nova acquisição (22).<br />

Assim que : pelo que diz respeito aos immoveis, pertencem<br />

ao proprietário, por virtude do domínio adquirido :<br />

1. Os fructos, propriamente ditos, como sementes, bosques,<br />

plantações(23) ;<br />

2. As pedreiras, as minas de saes, de metaes, de carvão<br />

(19) Cousas corporeas são as cousas physicas: — Qinv tangi possunt.<br />

Incorporeas são as abstracções do espirito — guie tangi non possunt,<br />

consistem propriamente em direitos; que por convenção podem a seu turno<br />

ser objectes de outros direitos, taes como a herança, o usofrueto. as servidões<br />

as obrigações, as tenças: têm valor pecuniário, fazem parte do nosso<br />

patrimônio, e se comprehendem no direito de propriedade em sentido lato.<br />

( § 24, nota 2 acima).<br />

(20) Frucio, em sentido próprio, é o produetc» periódico da cousa:<br />

fruetus est quidquiá ex se nascitur et renascitur. Debaixo desta denominação<br />

.se incluem: I o , os fructos naluraes, productos orgânicos da cousa, como<br />

as crias dos anima os, as sementes das arvores; 2", os fructos civis, rendimentos,<br />

benefícios que se tirão da cousa naturalmente estéril, conn, casas. (Vej.<br />

§ 99, n. 5 adiante.)<br />

(21) São productos do solo. inorgânicos, como pedras, metaes sais.<br />

(22) Tanto os fructos como os productos acima enumerados constituem<br />

accessões; mas aqui a accessão não é um modo de adquirir, mas um simples<br />

incremento da cousa, incremento que pertence ao proprietário, não por<br />

um novo titulo de acquisição', mas tão somente por virtude do domínio já<br />

adquirido. Em outro sentido e sob outra relação de direito, a accessão é<br />

modo de adquirir. (Vej. § 38 adiante.) Zach.. § 202, nota (1).<br />

C23) Fr. 44. IX reivindicat., (6.1); fr. 25. § I o . D.de usuris et fruetibus<br />

(22.1), Consolid. das Leis Civis, art. 45 nota; B. Carneiro, L. 2, T. o,<br />

§ 20, n. 1.<br />

63


4 D IRRITO<br />

de pedra e de quaesquer outros productos naturaes (24), excepto<br />

as de diamantes, que são da propriedade do Estado (25) ,<br />

3. As fontes, as nascentes, e as correntes d'ag-ua particulares<br />

na extensão em que atravessão o terreno (26).O rio particular<br />

que serve de divisa entre prédios de diversos donos pertence<br />

a cada um dos proprietários, ein todo o comprimento de sua<br />

testada até a linha tirada pelo centro do alveo (27j.<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 520 - i propriedade tio nobre e do sub-solo abrange a do que lhe<br />

está superior e inferior cm toda altura e em toda a profundidade, úteis ao<br />

seu exercício, não podendo, todavia, o proprietário impedir trabalhos, que<br />

sejam emprehendidos a uma altura ov profundidade toes, que não tenha elle<br />

interesse algum em obstal-os.<br />

Art. 528 — Os fructos e mais productos dacousa pertencem, ainda quando<br />

separados, ao seu proprietário, salvo se, por motivo iuridico. especial, houverem<br />

de cab^r a outrem.<br />

Art. 529 — O proprietário, ou o inquilino de um prédio, em que alguém,<br />

tem direito de fazer obras, pode, no caso de damno imminente, exigir do<br />

autor deltas as precisas seguranças contra o prejuízo eventual.<br />

DAS AJRVORES LIMITROPHES<br />

Art. 556 — A arvore, cujo tronco estiver na linha divisória, presume-se<br />

pertencer em commum aos donos dos prédios confinantes.<br />

Art. 557 — Os fructos cabidos de arvore do terreno vizinho, pertencem ao<br />

dono do solo onde cahiram, se este fôr de propriedade particular.<br />

Art. 558 — As raízes e ramos de arvores que ultrapassarem a extrema<br />

do prédio, poderão ser cortados, até ao plano vertical divisório, pelo proprietário<br />

do terreno invadido.<br />

(24) Decr. de 29 de Janeiro de 1829; Decr. de 18 de Dezembro de<br />

1851; Condiq. 2 a : Lei do 2S de Outubro de 1848, art. :',3: Consolidação das<br />

Le's Civis. art. 90S.<br />

As concessões de privilégios one o Governo imperial está no habito de<br />

lazer a nacionaes e -estrangeiros, para explorarem minas de ouro. prata,<br />

carvão de pedra, existentes em terrenos particulares, são verdadeiros afrontados<br />

contra o direito de propriedade.<br />

(25) Vej. Consolid. das Leis Civis. art. 52. § 2 o<br />

(26) Resol. de 17 de Agosto de 1775: Lobão, Águas, § 65 e 66; B Carneiro.<br />

L. 2. T. 6. § 30. n. 1; Lei n. 601, de 18 de Setembro de 1850. art 16,<br />

5 3. i argum. ><br />

(27) Lobão. Águas, § 67.


DAS COÜSAS (»5<br />

§ 27— Domínio resoluvel<br />

1. O. domínio é um poder absoluto e exclusivo sobre a cousa.<br />

Destes caracteres resulta que o domínio é de sua natureza irrevogável,<br />

isto é, que uma vez adquirido, não pôde ser desligado da<br />

pessoa do proprietário, senão de consentimento seu (28).<br />

Este principio fundamental soffre apenas uma derogação,<br />

determinada por motivo de interesse publico — a da desapropriação<br />

nos casos em que o bem geral, legalmente verificado, requer<br />

o emprego e uso da propriedade particular (29).<br />

2. Ha, porém, uma espécie de domínio que por virtude<br />

do titulo de sua constituição é revogavel ou resoluvel. phenomeno<br />

este que occorre quando a causa de acquisição do domínio encerra<br />

em si um principio ou condição resolutive do mesmo domínio,<br />

expressa ou tácita (30).<br />

A condição resolutiva. tem. como é sabido, effeito retroactivo.<br />

A resoluçãodo domínio, portanto, pelo preenchimento da<br />

condição resolutiva, retrotrahe os seus effeitos ao tempo da acquisição<br />

(31).<br />

Dahi os corollarios seguintes :<br />

l.' 1 Aquelle em favor de quem se opéra a resolução do domínio<br />

é considerado como se nunca o tivesse alienado de si (32).<br />

2." Kevogado o domínio, entendem-se ipso fado revogados<br />

os direitos reaes concedidos ao tempo cm que pendia a condição<br />

resolutiva (33).<br />

(28) Semel dominus semper dominus. Orei. L. 3. T. 53, § 3: "Porque<br />

o que em algum tempo foi senhor da cousa presume-se por direito ainda<br />

agora o ser" Constituição, art. 179. § 22. Pereira e Souza, nota 529.<br />

(29) Const, art. 179, § 22 Acto Add. art. 10 S 3°; Lei de !» de Setembro<br />

de lSlîfi. art. 1." "A Única exeepção feita ao direito de propriedade conforme<br />

a Const, an 179, 5 22 " Dei n. 363, de 12 tie .Juiho de 184:..<br />

(30) Como nos casos de venda com os pactos additio in dum (ord. L. 4<br />

T. 1 pr.) á retro tord L. 4 T 3. 5 3) da lei Commissoria (Mello, L. 4 T.<br />

5 15), quando estas cláusulas têm a natureza de condição resolutiva. C.<br />

Telles, Manual do Tabeil. ü 240. A doação causa mortis com tradição da<br />

cousa é susceptível de ser revogada pela morte do donatário; depende, portanto,<br />

de condição resolutiva p como tal ilie é applicavel a doctrina exposta.<br />

Lobão Xot. a -Mello. L. 2" T. 10 § 4. n. 28. .No mesmo caso está a propriedade<br />

fidueiaria e o dote inestimado.<br />

(31) Dominium revòcaòile ex lu ne.<br />

(32) Zacar. § 196.<br />

(33) Resoluto jure eoncedentis. resolviiur jus concessurp. Lobão, Fascic.<br />

tom. 1." Dissert.' õ. § 103; Dig. Port. P, 111. art. 366,


Uh DIREITO<br />

3.° O proprietário era favor de quem se resolve o domínio,<br />

pôde reivindicar a cousa de quem quer que a detenha (34).<br />

3. Acontece ás vezes que a acquisição do domínio irrevogável<br />

em sua origem, vera a ser revogada por causa superveniente<br />

(35). Nestes casos a revogação só produz os seus effeitos da data<br />

da causa que a determina (36) : donde se segue :<br />

1.° Que são validos todos os actos praticados em relação<br />

á cousa antes da cansa superveniente de revogação, taes como a<br />

alienação, a instituição de onus (37).<br />

2." Que, por conseqüência, a pessoa, a quem aproveita a<br />

revogação, não tem acção real contra terceiros possuidores, senão<br />

pessoal contra aquelie cujo domínio se resolveu, para obrigai-o<br />

ou a entreg'ar a propria cousa ou a restituir o valor (38).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 647 — Resolvido o domínio pelo implemento da condição ou pelo<br />

advento do term-o, entendem-se também, resolvidos os direitos reaes concedidos<br />

na sua pendência, e o proprietário, cm cujo favor se opera a resolução,<br />

póãe reivindicar a cousa do poder de quem a detenha. — 1.142.<br />

Ari. (MX .SV. porém, o domínio se resolver por outra causa superveniente,<br />

o possuidor, que o tiver adquirido por titulo anterior á resolução, será<br />

considerado proprietário perfeito, restando á pessoa em cujo beneficio houv<br />

a resolução, acção contra aqwelte, cujo domínio se resolveu para haver a propria<br />

cotisa ou seu valor.<br />

i; 28.— Domínio pleno : domínio limitado<br />

O domínio se diz pleno, quando todos os direitos elementares<br />

que o formão se acbão reunidos na pessoa do proprietário :<br />

{Proprietas plena, dominium plenum.) (39).<br />

(34) Fr. 41 D. de reivindicai (6,1); Lobão. Dissert, cit., § 118 o 119.<br />

Dig. Port. TIT. art. 379.<br />

(95) Por exemplo: nos casos de revogação da doação por ingratidão<br />

ford. L, 4 T. 6*3 pr.). por superveniencia de filhos (ord. L. 4 T. 63 pr.)<br />

Vinnio Quest, select. L. 2 c. 32; üoetrina das Acç. § 143 nota 297.<br />

(36) Dominium revoeabile ex nunc. Mackeldey S 274.<br />

(37) Dig. Port. III. art. 138. Rocha § 760.<br />

(38) Doct. das ACQ. § 143, Dig. Port. Ill, art. 139. Mackeldey § 274.<br />

(.39)" Muhlenbruch, § 242; B. Carneiro L. 2 T. 1, § 12, n. 4.


ÎDAS corsA$<br />

A propriedade é de sua natureza livre ; o domínio se presume<br />

pleno (40). Assim aquelle que invoca um direito sobre a<br />

eousaalheia, como por exemplo ode servidão, carece de prova-lo<br />

Sempre que do dominio se destaca algum ou alguns de.<br />

seus direitos elementares, se torna elle limitado ou menos pleno, e<br />

neste aspecto a sua comprehensão varia segundo o numero e a<br />

importância dos direitos separados.<br />

O dominio é limitado :<br />

1.° Na emplrvteuse. Neste caso o dominio, por assim dizer,<br />

se reparte entre o senhor directo e o emphyteuta. O primeiro<br />

conserva a. nua propriedade ; ao segundo passão os demais direitos<br />

inhérentes ao dominio. corno o de usar, usofruir, instituir<br />

servidões. O dominio tanto de um como de outro é menos pleno<br />

(41).<br />

2.° No caso de uso, usofrueto ou habitação. Aqui o dominio<br />

do proprietário soffre menor desfalque do que na emphyteuse.<br />

mas perde parcellas importantes (42).<br />

3.° Na propriedade fiduciãria. O herdeiro fiduciario tem<br />

sem duvida dominio sobre a cousa sujeita a fideicommisso, em<br />

regra não pôde aliena-la, e os onus reaes, com que mais a grava,<br />

se resolvem desde que o fideicommisso se transfere ao herdeiro<br />

fideicommissario (43).<br />

4." Nos casos de servidão, penhor e hypotheca (44). A propriedade<br />

sujeita a estes onus reaes toma a denominação especial<br />

de propriedade gravada (45).<br />

(40) Const, 9, 10, 11, C. do servit, et aq. (3,34) Quiliibet fundus liber<br />

á servitutibus esse presuraitur, Lei de 9 de Julho de 177'3, § 12 "...posto<br />

que de taes servidões se alieguem posses immemoriaes que são repugnantes<br />

á liberdade natural." Zaear. § 194 n. 3.<br />

(41) Vej. adiante § 147 o 151.<br />

(42) Vej. adiante § 93, 112 e 113.<br />

(43) Const. 3 8 2 C. Com. de legat. (6,43), Mackeldey, § 7& 6. 03. Carneiro,<br />

Liiv. 2. T. 1, § 12, n. 11. A alienação que o fiduciario faz da cousa,<br />

objecto do fideicommisso só pôde ser annullada pelo fideicommissario, quando<br />

o fideicommisso lhe é deferido. Lob. Not. a Mello L. 3, T. 7. § 20.<br />

(44) Vej. adiante §§ 114, 163 e 174.<br />

(45) -Mackeldey, § 273.<br />

6<br />

69


BS OllililTü<br />

§ 29.— Restricções legaes do domínio<br />

Além dos limites que se orig-inão na vontade do proprietário<br />

(§ 24), recebe o domínio certas restricções que as leis estabelecem<br />

por motivo de utilidade publica.<br />

Entre essas restricções se enumerão as seg-uintes :<br />

1. O onus real da décima e mais impostos sobre a propriedade<br />

immovel (46) ;<br />

2. O direito real do Estado sobre as minas de diamantes<br />

em terrenos particulares (47) ;<br />

3. A prohibição:<br />

a) de se construírem edifícios junto ás obras de fortificações<br />

nacionaes, salvo precedendo licença do g-overno, com a<br />

clausula de se demolirem á custa do proprietário (48) ;<br />

b) de cultivar, semear, ou ter gado a pastar dentro do<br />

espaço de quinze braças junto aos fossos, contra-escarpas e muralhas<br />

dos fortes e praças de guerra (49) ;<br />

4. As disposições de policia administrativa e municipal<br />

que entendem:<br />

a) com o alinhamento, modo de construcção e condições<br />

de solidez das casas nas cidades, villas e povoados :<br />

b) com a demolição e reparo das que ameação ruína ;<br />

c) com o estabelecimento de machinas, officinas e fabricas<br />

que podem prejudicar a saúde publica. (50)<br />

(46) Lei de 24 de Setembro de 1864, art. 6, § 4.<br />

(47) Ord. L. 2 T. 26, § 16, T. 28 pr. e T. 34, § 4; Alv. de 24 de Dezemb.<br />

de 1734, Decr. de 23 de Out. de 1832, art. 9, Lei de 24 de Setembro de<br />

184'5, art. 9, Lei de 18 de Setembro de 1850, art. 16, § 4 e Dec-eto de 29 de<br />

Novemb., do 1864.<br />

(48) Alv. de 22 de Set. de 1681, Av. de 11 de Dezemb. de 1833.<br />

(49-) Ordenanç. de 20 de Fevereiro de 1708, -cap. 6'5 mandadas observar<br />

pela Resoluç. de 4 de Julho de 1754;Alv. de 30 de iMaio de 1755.<br />

(50) Lei de Outubro de 1828. art. 66, § I o e 3". Esta materia é regulada<br />

nas posturas munícipaes.<br />

O dono de casa ou edifícios que ameação ruina pôde ser constrangido<br />

pelos vizinhos á demoli-los ou repara-los e a prestar caução pelo damno<br />

imminente: fr. 7 e 46 D. de damn, infect. (39,2) 'Doctrina das Acç... § 214.<br />

No nosso paiz as terras particulares não estão sujeitas á servidão legal<br />

de transito publico. Const, art. 179, § 22, Lei de 29 de Agosto de 1827,<br />

art. 17 e Lei n. 601, de 18 de Abril de 1850, art. 16, § 1" (arg.)<br />

Nas cartas de sesmarias se impunha esse onus (o que era um reconhecimento<br />

de que a propriedade particular não lhe estava sujeita por lei.)


AS COUSAS 69<br />

Ha outras restricçôes legaes que prendem directamente<br />

com a materia das seividões rents. Delias se tratará nos lugares<br />

convenientes. (51)<br />

§ 30. — Condomínio<br />

Poder essencialmente exclusivo, o domínio não pôde pertencer,<br />

ao mesmo tempo, a duas ou mais pessoas, de modo<br />

que cada uma disponha da cousa por inteiro (m solidam).<br />

Não se concebe domínio contra domínio : o domínio de um<br />

aniquillaria o domínio do outro (52).<br />

Mas bem pôde a propriedade de uma mesma cousa pertencer<br />

em commum a diversos, tendo cada um uma parte<br />

ideal (53) : o que se verifica quando a cousa se acha indivisa<br />

(pro indiriso).<br />

Nesta relação de direito a propriedade toma a denominação<br />

de compropriedadc, condomínio (54).<br />

O estado de communhão é regulado, em geral, pelos<br />

princípios seguintes :<br />

1. Cada comproprietario dispõe livremente de sua parte<br />

ideal (55) e em relação á essa parte pôde, independentemente<br />

A lei de 18 de Abril de 1850, cit., art. 16, § I o impõe o mesmo onus ás terras<br />

devolutas que 'forem vendidas, salvo o direito á indemnização pelas bemfeitorias<br />

e terreno occupado.<br />

Em algumas províncias, a legislação provincial sujeita as terras particulares<br />

á. servidão de transito publico, independentemente de indemnização<br />

pelo terreno occupado pelo leito da. estrada.<br />

(51) Vej. adiante, § 121 e 127.<br />

(52) Pr.5, § 15. D. Commodat. vel contra (13,6). Et ait duorum quidem<br />

in solidum dominium vel possessionem esse non posse B. Carneiro,<br />

L. 2, T. 1, § 12, n. 6.<br />

(53) Fr. 5. D. stipulât, serv. (45,3); fr. 25, § 1." D. de verb, signifi.,<br />

(50,16); fr. S. D. de rei vindicat., (6,1); B. Carneiro, L. 2, T. 13, § 83, n. 1.<br />

O estado de communhão pôde resultar:<br />

De contracto, como o de sociedade, ou de compra e venda, doação,<br />

se dous comprão ou recebem em doação uma mesma cousa ;<br />

Ue suecessão legitima ou testamentaria, se são dous ou mais os herdeiros;<br />

De facto accidental, como a confusão de limites.<br />

(54) Maynz, § 181; 'Rocha, § 466; Doctr. das Acç., § 279 e nota 615.<br />

(55) Fr. 68, pr. D. Pro socio, (17,2); Comt. 3 C. de Com. rerum<br />

aliénât., (4,50); Mendes, P. IT, L, 4, cap. 3, n. 24. B. Carneiro, L. 2, T. 13,


to blREI'fO<br />

de consentimento dos outros, exercer em g-eral todos os direitos<br />

que se encerrão no domínio, como aliena-la, constituir<br />

servidões e hypothecas. E', porém, de notar que os<br />

direitos reaes concedidos a terceiros íicão dependentes do<br />

facto material da divisão (56).<br />

2. Mas, como a parte de cada condômino é puramente<br />

ideal e não lhe corresponde parte material fixada, não é<br />

licito a nenhum délies• dispor da cousa em si mesma, no<br />

todo ou em parte physicamente determinada, nem tão pouco<br />

transforma-la, mudar-lhe o estado ou destino (57), salvo :<br />

a) Precedendo consentimento de todos os sócios (58).<br />

b) Ou quando o acto a praticar é necessário para a conservação<br />

da cousa (59).<br />

Todavia pôde o comproprietario empreg'ar a cousa conimum<br />

nos usos a que é destinada, comtanto que o faça sem<br />

prejuízo dos consocios (60).<br />

3. O comproprietario tem direito aos fructos, rendimentos<br />

e accessões da cousa na proporção da sua parte ideal<br />

(61) e é, na mesma proporção, responsável pelas despezas de<br />

conservação, melhoramentos e maneio (62).<br />

§ 84, n. 3. Assim o co-herdeiro, antes da partilha, pôde vender a parte que<br />

íhe pertence na herança.<br />

(56) Const. 1. C. Commun, dividund., (3,39); Comt. Única. Si eomm.<br />

res pig. (8,21); Pardessus, Servit, n. 254 a 258. Lei de 24 de Setembro<br />

de 1864; art. 4, § 8; Reg. de 26 de Abril de 1865. art. 242.<br />

O herdeiro, por exemplo, pûde conceder uma servidão sobre a parte<br />

que lhe ha de tocar no immovel pro indiviso ,rría - s como a servidão presuppõe<br />

um corpo certo, o seu exercício fica em suspenso até a divisão.<br />

A parte que o devedor tem em uma cousa commum pode ser penhorada<br />

e arrematada; o arrematante succède no direito do executado; portanto entra<br />

a possuir a cousa como a possuía o executado. Pereira e Souza, nota<br />

890; B. Carneiro, D. 2, T. 13, § 84, n. 4.<br />

(57) Fr.28. D. Comm. dividund., (10,3) fr. 2. D. de servit. (8,1).<br />

B. Carneiro, L. 2, T. 13, 5 84, ns. 2, 5, « e 7.<br />

(58) Nota antecedente.<br />

(59) Fr. 52, § 10. D. Pro-socio (17,2); Const. 4, C de sedific. privât»<br />

(8,10); B. Carneiro, cit., § 84 n. 85, n. 4.<br />

(60) Lab., Interdict. § 271; Mackeldey, § 301.<br />

(61) Pr.38, § l.°;fr. 52, §10 e 15; fr. 11. D. de Comm.. dividund,<br />

(10,3); Ord. L. 4, T. 44, § 9; T. 96, pr.; B. Carneiro, L. 2, T. 13, § 86,<br />

n. 7; Doetr. das Acç., § 275. nota 604; § 410, nota 967.<br />

(62) Fr. 4. D. de Comm. dividund., (10,3); Ord. L. 4, T. 44, § 10;


DAS COUSÂS 71<br />

4. O estado de communhão 6 de si provisório; a cada<br />

socio assiste, portanto, o direito de a todo o tempo requerer<br />

a divisão, salvo estipulação em contrario (63).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

DOS DIREITOS E DE VERES DOS CONDÔMINOS<br />

Art. 623 — Na propriedade em commum, compropriedade, ou condomínio,<br />

cada condômino, ou consorte pôde:<br />

I — Usar livremente da cousa conforme seu destino, e sobre cila exercei*<br />

todos os direitos compatíveis com a indivisão.<br />

II — Reivindicai-a de terceiro.<br />

III — Alheiar a respectiva parte indivisa, ou graval-a. — 757, 1.139.<br />

Art. 624 — O condômino é obrigado a concorrer, na proporção de sua<br />

parte, para as ãespezas de conservação ou divisão da cousa e support ar na<br />

mesma razão os onus, a que estiver sujeita.<br />

Paragrapho único. Se com isso não se conformar 'algum dos condôminos,<br />

será dividida a cousa, respondendo o quinhão de cada um pela sua parle<br />

nas despezas da divisão.<br />

Art. 625 — As dividas contrahidas por um dos condôminos em proveito<br />

da communhão, e durante ella, obrigam o contrahente; mas asseguram-lha<br />

acção regressiva contra os demais.<br />

Paragrapho único — Se algum délies não annuir, proceder-se-á conforme<br />

o paragrapho único do artigo anterior.<br />

Art. 626 — Quando a divida houver sido contrahida por todos os condôminos,<br />

sem. se descriminar a parte de cada um, na obrigação coUectiva. nem<br />

se estipular solidariedade, enlende-se que cada qual se obrigou proporcionalmente<br />

ao seu quinhão, ou sorte, na cotisa commum.<br />

Art. 627 — Cada consorte responde aos outros pelos fruclos que perceben<br />

da cousa commum, e pelo damno, que lhe causou.. — 63S.<br />

Art. 628 — Nenhum dos comproprietaHos pôde alterar a cotisa commum,<br />

sem o consenso dos outros.<br />

Art. 629 — A todo tempo será licito ao condômino exigir a divisão da<br />

Cousa commum.<br />

Paragrapho único. Podem, porem, os consortes accordai' que fique inãivisa<br />

por termo não maior de cinco annos, susceptível de prorogação ulterior.<br />

B. Carneiro. L. 2, T. 13, § 85, n. 4; § 86. n. 7; Doctr. das ACQ., § 275 e<br />

nota 605.<br />

(63) 'Const. 5. C. Com dividund, (3,7); Ord. D. 1, T. 68, § 37; B. Carneiro,<br />

E. 2, T. 13, § 86, n. 10.<br />

A communhão que resulta do casamento é de sua nautreza definitiva,<br />

e não cessa senão pela dissolução da sociedade conjugal. Direit, de família<br />

§ 66.


72 DIRJÎ1T0<br />

Art. 630 — Se a indivhão fôr condição estabelecida pelo doador, ou testaãor,<br />

entende-se que o foi somente por cinco annos.<br />

Art. 631 — A divisão entre condôminos, é simplesmente declarator ia e<br />

não attributiva ãa propriedade. — 532, I.<br />

Art. 632 — Quando a cousa fôr indivisível, ou se tomar, pela divisão, imprópria<br />

ao seu destino, e os consortes não quizerem adjudical-a a um só,<br />

indemnizando os outros, será vendida e repartido o preço preferindo-se, na<br />

venda, em condições eguaes de offerla, o condômino ao estranho, entre os<br />

condôminos o que tiver na cousa bcnifcitorias mais valiosas, e, não as havendo,<br />

o de quinhão maior.<br />

Art. 633 — Nenhum condômino pôde, sem prévio consenso dos outros,<br />

dar posse, uso ou goso da propriedade a estranhos.<br />

Art. 634 — O condômino, como qualquer outro possuidor, poderá defender<br />

a sua 2)osse contra outrem. — 488.<br />

DA ADMINISTRAÇÃO DO COXLXXUIXIO<br />

Art. 63'5 — Quando por circumstancias de facto ou por désaccorda, não<br />

fôr possível o uso e goso em com,.mum, resolverão os condôminos se a cousa<br />

deve ser administrada, vendida ou alugada.<br />

§ I o — Se todos concordarem que se não venda, d maioria (art. 6i37),<br />

competirá deliberar sobre a administração ou locação ãa cousa commum.<br />

§ 2 o — Pronunciando-sc a maioria pela administração, escolherá também<br />

o administrador.<br />

Art. 636 — Resolvenáo-se alugar a cousa commum, (art. 637), preferirse-á,<br />

em condições eguaes, o condômino ao estranho.<br />

Art. 637 — A maioria, será calculada não pelo numero; senão pelo valor<br />

dos quinhões.<br />

§ I o — As deliberações não obrigarão, não senão tomadas por maioria<br />

absoluta, isto é, par votos que representem mais do meio do valor total.<br />

§ 2° — Havendo empate, decidirá o juiz, a requerimento de qualquer condômino,<br />

ouvidos os outros.<br />

Art. 638 —Os f meios ãa cousa commum, não havendo em, contrario estipulação<br />

ou disposição de ultima vontade, serão partilhados na proporçã.o<br />

dos quinhões. — 627, 639.<br />

Art. 639 — Nos casos de duvida, presumem-se eguaes os quinhões.<br />

Art. 640 — O condômino, que administrar sem opposição dos outros,<br />

presume-se mandatário commum.<br />

Art. 641 — Applicam-se, nos casos omissos, á divisão ido condomínio as<br />

regras de partilha da herança (arts- 1.772 e seguintes).<br />

DO CONDOMÍNIO EM PARED'ES. CERCAS, MUROS E VALLAS<br />

Ari. 642 — O condomínio por meiação de paredes, cercas, muros e vallas<br />

regula-se pelo disposto neste Código. (Arts. 5'54 a 588 e 623 a 634).


to AS cousAS 73<br />

Art. 643 — O proprietário que tiver direito a extremar um invmovel com<br />

paredes, cercas, muros, vallas, ou vallados, tel-o-á egualmente a adquirir<br />

meiação na parede, muro, valia, vallaão, ou cerca do vizinho, emo ols anão -lhe<br />

metade do que actualmcnie valer a obra e o terreno par ella occupaão {artigo<br />

727). — 571.<br />

Art. 644 — Não convindo os dois no preço da obra, arbitrar-se-á meãiante<br />

peritos, a expensas ãe ambos os confinantes.<br />

Ari. 645 — Qualquer que seja o prego da meiação, em quanto o qtie pretender<br />

a divisão não o pagar ou depositar, nenhum uso poderá fazer da parede,<br />

muro, valia, cerca, ou qualquer outra obra divisória.<br />

DO COMPASCUO<br />

Art. 646 — Sc o compascuo em prédios particulares far estabelecido por<br />

servidão, reger-se-á pelas normas deslas. Se não, obserunr-se-á, no que lhe<br />

for applicavel, o disposto neste capitulo, caso ouïra cotisa não estipule o titulo<br />

de onde resulte a comrnunhão de pastos.<br />

Paragrapho único. O compascuo em terrenos baldios e públicos rcgular-se-á<br />

pelo disposto na legislação municipal.


CAPITULO II<br />

MODOS DE ADQUIRIR O DOMÍNIO<br />

§ 31. — Condições gcraes âa acquisição<br />

A acquisição do domínio requer;—pessoa, capn^ de adquirir<br />

; cotisa susceptível de ser adquirida ; um modo de<br />

adquirir<br />

1' Tem capacidade para adquirir domínio todas as pessoas<br />

que têm a capacidade de direito (l), Os incapazes de<br />

facto (2), e as pessoas moraes (3), só podem adquirir domínio<br />

por via de seus representantes — pae, tutor, curador, syndico<br />

ou procurador (4).<br />

2. Pôde ser objecto do domínio, como em outro lugar<br />

(1) A theoria da capacidade das Pessoas, na moderna classificação do<br />

Direito Civil, tem o seu lugar na Parte Geral.<br />

(2) Incapazes de fado são aquelles que, sendo capazes de Direito, todavia,<br />

ou por falta de desenvolvimento ou por fraqueza das faculdades mentaes,<br />

se achão inhibidos de exercerem os seus direitos, como são os menores e<br />

os loucos.<br />

Acerca da incapacidade de menores, loucos e pródigos, veja-se D. de<br />

familia, §§ 152, 165 e 169.<br />

(3) As corporações de mão-morta não podem adquirir ou possuir,<br />

por titulo algum, bens de raiz, sem especial concessão do corpo legislativo".<br />

Consol. das Leis Civis, art. 69. Basta.porém, licença do Governo quando<br />

se trata da acquisição de terrenos ou propriedades necessárias para edificade<br />

igrejas, capellas, cemitérios extra-muros, hospitaes, casas de educação<br />

e de asylo e quaesquer outros estabelecimentos públicos. Lei 1225, de<br />

20 de Agosto de 1864, art. 1.° e Circul. de 22 de Out. de 1864.<br />

(4) Lobão. Xotas a Mello. L. 3. T. 3, § n. 3, Aeç Suram. S 177.


BAS COUSAS 75<br />

se disse, toda cousa corporea que é de sua natureza apropnavel<br />

e que não está fora do commercio (5).<br />

3. A acquisição do dominio, como a de todo o direito<br />

derivado (6), resulta sempre de um acto, ou de um facto, isto<br />

é, de um acto livremente praticado pelo homem, ou de um<br />

facto casual á que a lei liga um tal effeito (7).<br />

O acto ou facto, do qual deriva directa e immediatamente<br />

o dominio, é o que, na lingua do Direito, se denomina<br />

modo de adquirir.<br />

4. O modo de adquirir é, em sua exterioridade, um acto<br />

ou facto material, mas presuppõe um elemento moral preexistente<br />

que o reveste de caracter juridico e lhe communica<br />

a virtude de constituir ou transferir o dominio (8).<br />

Este elemento, os antigos escriptores o chamavão justo<br />

titulo ; mas como a idéa do justo titulo se acha virtualmente<br />

incluída no modo de adquirir, visto que a lei não reconhece como<br />

modos de adquirir senão os que são conformes o Direito,<br />

veiu afinal cahir em abandono a theoria que do justo titulo<br />

separava como cousa différente o modo de adquirir (9).<br />

§ 32. — Divisão e enumeração dos modos de adquirir<br />

' 1. Os diversos modos de adquirir são susceptíveis das<br />

divisões seguinces :<br />

A. Em modos originários e derivados.<br />

O modo de adquirir é originário, quando o dominio adquirido<br />

começa de existir com o acto, de que directamente<br />

resulta, sem relação de casualidade com o estado juridico de<br />

cousas anterior. A classe dos modos originários compreliende<br />

(5) Tem aqui inteira applicaeão o quo se expoz acerca das cousas que<br />

podem ser objecte- da Posse., § 6 acima.<br />

(6) E' sabida a distineoão entre direitos originários (absolutos) e direitos<br />

derivados (hypothetieos) .<br />

(7) Tal é a alluviào, a suecessão.<br />

(8) Justo titulo (causa adquirenâi) ê a causa remota, o principio legal<br />

justificativo da acquisição: por exemplo, na oecupação o justo titulo é a<br />

liberdade natural de adquirir o que não tem dono; na tradição é o contracte<br />

(9) Warkœnig.. Inst., jur. Rom. Privati. § 318. Mackeldey, § 276, nota<br />

(2). Zach. § 178.


76 DIREITO<br />

a occupação, a accessão natural ou mixta e a prescripção<br />

acquisitiva (10).<br />

O modo se dix deriva o quando o adquirente succède<br />

no domínio do proprieuirio anterior. Nest? classe entrão a<br />

accessão artificial, a especificação, a confusão, a commixtão,<br />

a tradição e os demais modos.<br />

A dita distincção é de importância pelos seus effeitos<br />

práticos.<br />

No caso de acquisição originaria, o domínio se instaura<br />

livre e em toda a sua plenitude, tal como o constitue a vontade<br />

do adquirente ; na acquisição derivada, porém, a natureza e<br />

a compreheasão do domínio é determinada pelo direito da<br />

pessoa de quem o adquirente é successor (11) ; d'ahi as duas<br />

conhecidas máximas :<br />

«Ningfuem pôde transferir a outrem direitos que não<br />

tem, ou mais direitos do que tem» (12).<br />

«Resolvido o direito do aliénante, ipso facto resolve-se o<br />

direito alienado (13).<br />

2. Em modo de adquirir por titulo singular (14), e por<br />

titulo universal (15).<br />

A acquisição se dix por titulo singular quando tem por<br />

objecto, não todo o patrimônio de alguém, mas cousas singulares,<br />

ou consistão em cousas individuaes, como uma casa,<br />

um terreno, ou em uma universalidade como um estabelecimento<br />

commercial (16).<br />

(10) Heinecio, Recit. L. 2, T. 1, § 341. Mainz, § 9'5. Savigny, Droit<br />

Rom. Ill, capitulo 105, Vej. Cod. do Chile, art. 703.<br />

(11) Fr.177 D. de reg. juris (50,17): Qui in jus dominiumve alterius<br />

succedit, jure ejus uti debet. Fr. 175, § 1 e fr. 54. D. eodem.. 'Zach., § 181.<br />

(12) Nemo plus juris ad alium transferre potest auam ipse habet.<br />

(13) Resoluto jure concedentis, resolvitur jus coneessum.<br />

(14) Successio in rem, in singulam rem. in singulas res, segundo a<br />

phrase do Direito Romano.<br />

(15) Successio per universitatem, in universum jus.<br />

(16) Ha universalidade de cotisas, como um rebanho, e universalidade<br />

de direito, a que consta de cousas e direitos, como um' estabelecimento commercial,<br />

um pecúlio. Afora o patrimônio (Zach. §§ 168 e 179), tcjdas as<br />

outras universalidades de direito podem ser objecto de. acquisição por titulo<br />

singular, por exemplo, a heranya depois de deferida. Na venda da herança<br />

pelo herdeiro não ha transferencia a titulo universal, porque o herdeiro não<br />

transfere todo o seu patrimônio, mas uma parte desse patrimônio, a saber, a


DAS COUSÂS 77<br />

A acquisição é a titulo univprsal quando resulta de facto<br />

que importa transferencia de todo o patrimônio de um indivíduo.<br />

No nosso Direito só temos um caso de acquisição a<br />

titulo univcr­al ; é o de successão legitima ou testamentaria (17).<br />

Ha numerosas e importantes differenças entre o modo de<br />

adquirir por titulo singular e o modo de adquirir por titulo<br />

universal Aqui nos limitaremos a notar o seguinte :<br />

Na successão á titulo universal todo o patrimônio do<br />

indivíduo (visto que elle desapparece da scena do Direito),<br />

passa á outrem que é chamado a tomar o seu lugar vago.<br />

O adquirente succède em todos os direitos reaes e pessoaes<br />

do seu autor e nas obrigações delle para com terceiros : ■—<br />

o successor continua a pessoa do autor (18).<br />

Na acquisição por titulo singular o direito passa ao<br />

successor tal como se achava constituido, com as vantagens,<br />

restriccões e onus preexistentes (19), mas o successor não<br />

contrahe responsabilidade pelas obrigações pessoaes do aliénante<br />

(20).<br />

3. Os modos de adquirir que naturalmente entrão no<br />

quadro do Direito das Causas, são os seguintes :<br />

Occupação,<br />

Accessão,<br />

Especificação,<br />

Confusão e Commixtão ;<br />

Tradição e Transcripção,<br />

Percepção de fructos da cousa alheia ;<br />

herança, em que succédera e que como tal passara a fazer parte do seu<br />

patrimônio.<br />

(17) A successão, segundo o nosso Direito, só se abre ou por morte<br />

natural, ou pela entrada em ordem religiosa approvada.<br />

Na hypothèse de fallencia ou insolvabilidade os bens alienaveis do fallido<br />

ou insolvavel são todos dados em pagamento aos credores; mas não ha<br />

transferencia de patrimônio: o fallido e o devedor insolvavel conservão os<br />

direitos inalienáveis, os dotes de suas mulheres, etc.<br />

(18) Fr. 59 D. de reg. jur. (50,17): Heredem ejusdem potestatis ju*<br />

risque esse eu jus fuit defunetus, constat. Maynz. § 95, Zach., § 179 e 182.<br />

A utor, nesta accepção, significa a pessoa de quem o adquirente recebe a<br />

cousa, fr. 3, § 2 D. 43, 19.<br />

(19) Vantagens, como servidões activas, onus, como servidões passivas­,<br />

hypothecas.<br />

(30Ï) Maynz, cit. § 95, Zach. § 182.


78 DIREITO<br />

Prescripção acquisitiva.<br />

4. A successão legitima e a testamentaria, a doação causa<br />

mortis, o legado e o casamento — modos de adquirir que tem<br />

por objecto, não tão somente o dominio, mas também os<br />

demais direitos reaes e os pessoaes, pertencem a outras<br />

secções do Direito Civil, ou como partes principaes, ou como<br />

dependências e desenvolvimentos log'icos (21).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 5JO — Adquire-se a propriedade immovel:<br />

I — Pela transcripção do titulo de transferencia no registro do immovel<br />

531 a 535, 589, 676, 856, I.<br />

II — Pela accessão — 536 a 549.<br />

/// — Pela usocapião — 550 a 553.<br />

IV — Pelo direito hereditário, 1.572 e seguintes.<br />

(21) Vej. Direito de familia. Introduce.


TITULO PRIMEIRO<br />

OCCUPAÇÃO, ACCESSÃO, ESPECIFICAÇÃO, CONFUSÃO, COMMISTÃO<br />

§ 33 A — O ocupação<br />

A occupação é o modo de adquirir domínio sobre a<br />

cousa que não tem dono (res nullius). pelo simples facto de<br />

apprehendel-a com o animo de possuil-a como propria (1).<br />

A occupação, portanto, só pôde ter por objecto as cousas<br />

que não estão no dominio alheio, ou porque nunca pertencerão<br />

a outrein (2), ou porque foram abandonadas pelo seu<br />

antigo dono (3).<br />

Na infância das sociedades foi a occupação a fonte<br />

primaria e o modo mais fecundo de acquisição da propriedade.<br />

Hoje, porém, entre os povos cultos, é ella de uso limitado :<br />

as riquezas naturaes já se acham apropriadas ou pelos particulares<br />

ou pelo Estado : bem escasso é o numero das cousas<br />

apropriaveis que permanecem na communhão natural.<br />

O nosso Direito no seu estado actual só consagra duas<br />

espécies de occupação :<br />

A occupação dos seres vivos — Caça e Pesca ;<br />

E a occupação das cousas ínanimadas — Invenção (4).<br />

(1) Pr. 3 D. de acq. rer. dom. (41.1); Quod nullius est, id ratione naturali<br />

occupanti cünceditur. Mello L. 3 T. 3 '§ 2. F-' applieavel ao facto da<br />

apprehensão tudo que se disse acerca da apprehensão como elemento da<br />

Posse. Vej. § 10 acima.<br />

(2) Gaio. Inst. 2 § 66 ....quia antea nullius essent<br />

(3) Fr. I. D. Pro derelíçto (41.7).<br />

(4) Mello, L. 3 T. 3 g 4 e 5. Rocha § 416.


so<br />

.UUiiüu<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 592 — Quem se assenhoriar ãa cousa abandonada ou ainda não apropriada,<br />

para logo lhe adquire a propriedade, não senão essa occupação defesa<br />

por lei. -— 603<br />

Paragrapho único. Volvem a não ter dono as cotisas moveis, guando o<br />

sen as abandona, com, intenção xle renuncial-as.<br />

Art. 593 — São cotisas sem dono e sujeitas á apropriação:<br />

I — Os animaes bravios, emquanto entregues á sua natural liberdade.<br />

— 595.<br />

// — Os mansos e domesticados que não forem assignalaãos, se Uverenx<br />

perdido o habito de voltar ao logar onde costumam recolher-se, salvo a hypothèse<br />

do artigo 596. — 60S e seguintes.<br />

III — Os enxames de abeUms, anteriormente ajjroijriados, se o dono ãa<br />

colmeia, a que pertenciam, os não reclamar immediatameníe.<br />

IV — As pedras, conchas e outras substancias mineraes, vegetaes ou<br />

animaes arrojadas ás praias pelo mar, se não apresentarem signal de domínio<br />

anterior.<br />

§ 34 B — Caça e Pesca<br />

1. Entrão para o domínio de quem as appréhende, as<br />

aves e as feras bravias que vag-ão soltas, as domesticadas que<br />

recuperarão a liberdade natural, e os peixes que não se achão<br />

retidos em viveiros ou piscinas (5)'<br />

2. Para adquirir a propriedade do animal é mister segurai-o<br />

com as nossas mãos, ou apanhal-o em nossas redes,<br />

laços ou armadilhas (6). Sem embargo, reputa-se pertencer ao<br />

caçador a fera que elle persegue, já ferida de modo a não<br />

(5) I. 12 de rer. divis. (2.1).<br />

Para os effeitos de direito os animaes brutos (bestiee) se dividem em<br />

três classes :<br />

Mansos ou domésticos, os que nascem e vivem sujeitos ao homem e o<br />

acompanhão desde tempos immemoriaes, como o cavallo, o boi, o cão.<br />

Bravios ou silvestres, os que supposto possão ser domesticados, por<br />

natureza repeilom o jugo humano e vagão livres.<br />

Domesticados (mansnefactœ), os que sendo de natureza bravios, se<br />

amansão e se habituão a procurar a habitação do homem: in sylvam, ire et<br />

redire soient. O dominio do homem sobre os domesticados se perde quando<br />

elles recuperão a liberdade natural: si recertenãi anvmum ha~bere desierent.<br />

(6) Inst. cie. § 12. Ord. L. 5 T. 62 § 6.


faÀS COUSAâ<br />

poder facilmente escapar, embora nesse acto outrem a appréhenda<br />

(7).<br />

3. O exercício da caça é livre a todos, comtanto que<br />

se guardem as posturas municipaes (8).<br />

E' licito caçar nas terras publicas e nas particulares que<br />

estiverem abertas (9), e pescar no alto mar, nos mares territoViaes<br />

e nos lagos e rios públicos (10).<br />

4. Supposto sem consentimento do dono não seja permittido<br />

caçar em terras particulares, cercadas ou valladas, ou<br />

ainda nas abertas em que houver sementeiras feitas, fructos<br />

pendentes de arvoredo, ou plantações de qualquer gênero (11),<br />

nem tão pouco pescar em rios e lagoas particulares ; todavia,<br />

como as íeras bravias onde quer que vaguem, emquauto<br />

conservam a liberdade natural, não tem dono : as que com<br />

quebra da dita prohibição,­ forem apanhadas em terras ou<br />

águas alheias, pertencem ao occupante (12) ; mas fica elle res­<br />

(7) Port, de Donat. "L. 2 c. 26, n. 16, Lobão, Not. á .Mello L. 3 T. 3 § 4<br />

n. 2. D. Port. HI, art. 6. Cod. do Chile, art. 617, C. C Port. art. 388.<br />

Foi questão largamente discutida entre os jurisconsultos romanos, se<br />

o animal ferido de maneira a poder ser apprehendido, pertencia ao caçador<br />

ou ã outrem que o apprehendesse. Justiniano resolveu a questão no sentido<br />

de que devia pertencer ao apprehensor, pela razão "quod multa accidere<br />

soient, ut earn (feram) non capias (Ins. cit. § 13). A decisão de Justiniano<br />

não foi aceita pelo uso moderno, segundo o qual prevalece a doutrina exposta<br />

no nosso texto, que sem duvida é mais conforme com os principios<br />

de justiça.<br />

(8) Const, art. 179 § 24. No antigo regimen a caça não era indistinctamente<br />

permittida a todos. Ord. L. 5 T. 88 e Alv. de 1 de Julho de 1776 § 4.<br />

A policia e o regimen da caça e pesca são hoje da attribuição das câmaras<br />

municipaes, as quaes providencião a respeito em suas posturas. Consoiid.<br />

das L. Civis, art. 886.<br />

(9) Alv. de 1 de Julho de 1776, § 1 e 3. O dono do terreno pôde prohibir:<br />

ê o direito de exclusão inhérente ao domínio.<br />

(10) Alv. de 3 de 'Maio de 1812 § I o , e de 18 de (Março de 1798 § I o .<br />

Vej. o Décret, n. 2756 de 27 de Fev. de 1861, no qual se estabelecem regras<br />

sobre a construcção e conservação dos curraes de peixe nas costas, portos<br />

e águas navegáveis do império.<br />

(11) Alv. de 1 de Julho de 1776 § 1 e 3.<br />

(12) I. § 12 de rer. divis. (2.1): Nee interest feras bestias et volucres<br />

utrum in suo fundo quis capiat, an in alieno.<br />

■SI


82 DiRfîiTo<br />

ponsavel ao dono do terreno invadido pelo dainno que com sua<br />

entrada houver causado (13).<br />

5. Cedem ig-ualmente ao occupante as abelhas apprehendidas<br />

em terreno próprio ou alheio (14) e os enxames que<br />

deixam de- ser peiseguidos pelo dono da colmêa (15).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art, 594 — Observados os regulamentos administre 'Avós da caça, poderá<br />

ella exercer-se nas terras publicas ou nas particulares, com licença ãe<br />

seu dono.<br />

Art. 595 — Pertence ao caçador o animal por elle apprehendido. Se o caçador<br />

fôr no encalço do animal e o tirer ferido, este lhe pertencerá, embora<br />

outrem o tenha apprehendido. — 5i97.<br />

Art, 596 — Não se reputam animaes de caça os domesticados que fugirem<br />

a. seus donos, ernquanto estes lhes andarem á procura.<br />

Aft. 597 — Se a caça ferida se acolher a terreno cercado, murado, valiado<br />

o» cultivado, o dono deste, não querendo permittir a entrada do caçador,<br />

terá que a entregar, ou expellir.<br />

Ar/. 598 — Aquelle que penetrar em terreno alheio, sem licença do dono,<br />

para Caçar, perderá para este a caça- que apanhe, e responder-lhe-á pelo<br />

damno qtie cause.,<br />

Art. 599 — Observados os regulamentos administrativos, licito é pescar<br />

em agitas publicas ou nas particulares, com consentimento de seu dono.<br />

Art. 6'0û — Pertence ao pescador o peixe, que pescar, e o que arpoado,<br />

ou farpado perseguir, embora outrem, o colha.<br />

Art. 601 Aquelle que, sem permissão do proprietário, pescar, em águas<br />

alheias, perderá para elle o peixe que apanhe, e responder-lhe-á pelo dam a o,<br />

que lhe faça.<br />

Art. 602 — Nas agitas particidares, que cttfavessem terrenos de muitos<br />

donos, cada um dos ribeirinhos tem direito de pescar de seu lado, até ao meio<br />

délias*<br />

(13) Pr. 13 § ult. D. de injur. (47,10). Vin. ao § 12 I. nota. Alv. de 1 de<br />

Julho de 1776 § 2.<br />

(14) I. § 14 de rer. divis. (2.1) Vin., Com. ao cit. § nrPt.<br />

(15) Inst. cit. § 14. Dig. Port. Ill art. 10.<br />

As pombas e os coelhos de origem européa trazidos para o Brasil são<br />

aqui considerados mansos, e portanto podem ser reivindicados pelos seus<br />

donos, provada a identidade.


DÂS COUSAS sâ<br />

§ 35 C. — Invenção<br />

A Invenção {achada), segunda espécie da occupação,<br />

tem por objecto as cousas inauimadas. que não têm dono (16).<br />

Adquirem-se por invenção e entrão para o dominio do<br />

inventor (17):<br />

1. As pedras, pérolas, conchas, o coral, o âmbar e quaesquer<br />

outras substancias ou productos naturaes do mar, achados<br />

nas praias, nos mares territoriaes e no mar alto (18).<br />

2. As cousas abandonadas por seus donos, isto é, postas<br />

fora do seu poder physico com a intenção de não quere-las mais<br />

possuir como próprias (19). O abandono não se presume (20).<br />

(16) Vinnio. Com. ao S 12, r. de rer. divis. (2.1) Seinecio, Recit. § 350,<br />

Mello, L,. 3 T. 3 § 3.<br />

(17) A Invenção é espécie da Occupação; é portanto manifesto que a<br />

acquisição por Invenção requer a apprehensão da cousa achada.<br />

(18) I. § 18 de rer. divis. (2.1); Cabedo. P. II, -Decis, 48, n. 9 e 10;<br />

Portugal, de Donat. L,. 3, eap. 13, n. 92; 'Mello, L. 3, T, 3 S 2. Nota. Supposto<br />

as praias (marinhas) e os mares territoriaes preterição ao Estado,<br />

todavia a nossa jurisprudência tem mantido a disposição do Direito Romano<br />

consagrado no texto. Cfr. o C. Civil Port. art. 46.8.<br />

(19) I. § 46. de l'Pi'um divis. (2.1) Vin. Com. ao mesmo; Mello L». 3.<br />

T. 3 S 5. O abandono exige dous requisitos — a intenção de renunciar o<br />

dominio e a cessação do poder physico sobro a cousa. (da apprehensão).<br />

Não se deve confundir o abandono com o simples desamparo ou deserção.<br />

O proprietário pôde deixar a cousa deserta ou ao desamparo, e sem embargo<br />

conservar o dominio, como acontece na hypothèse da Ord L. T. 90 (bens de<br />

ausentes). Vej. Direito de família. § 171-179.<br />

Pôde ser oecupado por particular o immovel abandonado? Lobão (iNot.<br />

á 'Mello, L. 3 T. 3 S 5, n. 6) sustenta a negativa, dizendo que o immovel, pelo<br />

fado do abandono, passa directamente a pertencer ao Estado.<br />

Parece-nos infundada esta opinião. Não ha lei escripta que attribua o<br />

immovel abandonado ao listado. No caso de duvida ou questão entre ó fisco<br />

e o particular, a decisão deve ser em favor do particular. Não tem applicação<br />

A hypothèse o principio em virtude do qual o Estado adquire a propriedade<br />

das cousas perdidas e dos bens de ausentes, quando não são reclamados pelos<br />

donos ou seus herdeiros. Nestes casos, o Estado adquire a propriedade dos<br />

ditos bens ou por prescripeão. ou como successor, em falta de herdeiros<br />

legaes. Mas em relação ao immovel abandonado nos termos ditos, o Estado<br />

não pôde invocar a prescripção, porque não ha prescripção momentânea,<br />

nem o direito de suceessão porque não ha suecessão em bem que não faz<br />

parte de herança alguma.<br />

(20) Fr. 5 D. de Probat. (22,3); Nemo suum jactare presumitur. E' mis-


84 DIRKITO<br />

3. Metade do thesouro casualmente achado no prédio<br />

alheio (21).<br />

4. Por thesouro se entende em Direito « o deposito antigo<br />

de moeda ou de objecto precioso, enterrado ou escondido, acerca<br />

de cujo dono não haja memória» (22).<br />

O deposito, portanto, deixa de ser thesouro, se é de recente<br />

data, ou se alg-uem pôde justificar propriedade sobre elle.<br />

O thesouro pertence todo ao senhor do prédio, se foi<br />

achado:<br />

aj Pelo próprio dono do prédio, casual ou intencionalmente<br />

(23).<br />

b ) Ou por operário seu incumbido de pesquixa-lo (24).<br />

ter que o abandono seja expresso ou que resulte de actos que virtualmente<br />

o eontenhão. Lob. Not. á Mello. I>. 3 T. 3 5 5 ns. 4 e •">.<br />

(21) I. § 39 de rer. divis. (2.1): At siquis in alieno loco, von data ai<br />

line- opera, sed fortuito invenerit. dimidium domino soli concessit et<br />

dimidinm inventori. Cabed. P. I, Decis. 56. Port, de Donat. L. 3 cap. 13,<br />

n. 91; Lob. Not. á Mello. U 3 T. 3. § 6. n. 3. Cod. Civil francez. art. 716, do<br />

Chile, art. 626. Port:..art. 424.<br />

Mello (loc. cit.) considera o thesouro como bem vago. a que não é achado<br />

senhor certo (Ord. L-. 2 T. 26 § 17). e como tal pertencente ao Estado. Esta<br />

opinião nos parece errônea. O thesouro, como se vê de sua definição legal,<br />

não se pôde incluir nas classes de bens á que se refere a citada Ord. —<br />

"bens vagos a que não é achado senhor certo." Bem vago tem senhor que<br />

pôde appareeer e justificar o seu direito; o thesouro é um deposito antigo.<br />

que não tem senhor, nem certo nem incerto, deposito sobre o qual ninguém<br />

pôde justificar propriedade: eu jus non extat memória.<br />

Assim que: se alguém comparece e prova o seu direito sobre o deposito<br />

achado, deixa elle de ser considerado thesouro e passa a ser cousa<br />

perdida que se restitue ao dono: se o deposito é do recente data. é cousa<br />

perdida e não thesouro. E', pois, claro que a citada Ord. não tem applii<br />

ção ao thesouro.<br />

A disposição do Direito Romano acerca do thesouro tem sido geralmente<br />

adoptada pelos códigos modernos.<br />

(22) Fr. 31 § 1" I). acqu. ror. dom. (41.1): Thesaurus est vêtus qtuedatïi<br />

depositio peeimue. cujus non extat memória. Cod. Civil do Chile, ar:. 6'2ã<br />

('. C. Port, art. 124. Sobre as diversas accepções da palavra thesouro. Vinnio,<br />

Com. ao cit. § 39 da Inst. n. 1.<br />

(23) I. cit. § 39; Const. Unie. C. de thesaur. (10.15) Cabe-lhe metade<br />

como inventor, metade á titulo de accessão do prédio. Vej. adiante, § 151.<br />

(24) ZachariiP, § 200, n. 4. Mas se o operário occtipado em serviço<br />

que tinha, outro fim, como o de lavrar a terra, descobre algum thesouro<br />

adquire metade, como inventor. Const. Unie, de thesaur. (10.15).


»<br />

DAS COUSAS 85<br />

c ) Ou por terceiro que o descobre em acto de pesquiza<br />

intencional não autonsada (25).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 603 — Quem quer que ache cousa alheia perdida, ha de restituil-a<br />

ao dono ou legitimo possuidor. — 591, 592.<br />

Paragrapho único. Não o conhecendo, o inventor fará por ãescobril-o,<br />

e, quando se lhe não depare, entregará o objecto achado á autoridade competente<br />

no logar.<br />

Art. 604 — O que restituir a cousa achada, nos termos do artigo precedente,<br />

terá direito a uma recompensa e á inãemnização pelas despezas que<br />

houver feito com a conservação e transporte da cousa. se o dono não prefe- ,<br />

rir aoanãonal-a.<br />

Art. 605 — O inventor responde pelos prejuízos causados ao proprietário<br />

ou- possuidor legitimo, quando tiver procedido com. ãolo.<br />

Art. 60-6 — Se, decorridos seis mezes do aviso á autoridade, ninguém se<br />

apresentar, que montre domÃnio sobre a cousa, venãer-se-á em hasta publica,<br />

e, deduzidas do preço as despezas, mais a recompensa do inventor (art. 604),<br />

pertencerá o remanescente ao Estado, onde se deparou o objecta perdido.<br />

DO THESOURO<br />

Art. 607 — O deposito antigo de moeda ou cousa,s preciosas, enterrado,<br />

ou occulta de cujo dono não haja. memória, se alguém casualmente o achar<br />

em prédio alheio, dividir- se-á por egual entre o proprietário deste e o inventor.<br />

— 610, 727.<br />

Art. 60S — í?e o que achar fôr o senhor do prédio, algum operário seu,<br />

mandado em pcsquizar, ou terceiro não autorizado pelo dono do prédio, a este<br />

pertencerá por inteiro o thesouro<br />

Art. 609 — Deparando-se em terreno aforado, partir-sc-á egualmente, entre<br />

o inventor e o emphyteuta, ou será deste por inteiro, quando elle mesmo<br />

seja o inventor.<br />

Art. 610 — Deixa de coyisiderar-se thesouro o deposito achado, se alguém,<br />

mostrar que lhe pertence. — 607.<br />

§ 36 D.—Comas que não podem ser occupaJas.<br />

Não podem ser adquiridas por oecupação:<br />

A. Por pertencerem ao Estado:<br />

(25) Const. Unie. C. da thesaur. (10.15): 'Si... in alieno loco thesaurum<br />

scrutatus invenerit, totum hoc locorum domino reddere compeilatur<br />

et ve-lut temerator legis saluberrimse puniatur.


86 DIREITO<br />

1. As terras devolutas (26);<br />

2. Os diamantes, ainda achados em terrenos particulares<br />

salvo quando extrahidos por concessionários de datas, dentro dos<br />

limites da concessão (27).<br />

3. Os metaes e pedras existentes em terras do domínio<br />

do Estado (28);<br />

4. Os despojos tornados a inimigos com que o Império<br />

estiver em guerra (29);<br />

5. As embarcações pertencentes a corsários ou inimigos,<br />

,que se perderem e derem ú costa nas praias do Império, e os<br />

seus carregamentos, salvo convenção ou accordo em contrario (30):<br />

6. Os bens do evento, isto é, gado ou bestas a que não é<br />

achado senhor certo (31);<br />

(26) Lei n. GDI de 18 de Setembro de 1850-, art. I o Regi'.', n. 1.319 de<br />

3D de Janeiro de 1864, arts-. 86 e 87.<br />

Antes da promulgação da citada iei vigorava o costume de adquirirem-se<br />

por occupação (posse era o termo consagrado) as terras devolutas, isto é,<br />

as terras publicas que não se achavão appiicadas a algum uso ou serviço<br />

do Estado, províncias ou municípios.<br />

A dita lei abolio aquelle costume, e tornou dependentes de legitimação<br />

as posses adquiridas por occupação primaria, ou havidas do primeiro<br />

occupante, até a sua data. Lei, art. 5, í-íeg. art. 24.<br />

(27) Ord. L. 2 T. 26 § 16, T 28 pr. e SS 34 e 40; Alv. de 24 de Novemb.<br />

de 1734, Lei de 24 de Setemb. de 1845, art. D; Lei de 18 de Setemb. de 1850.<br />

art. 16 § 4 e Decreto de 29 de Nov. de 1864.<br />

(28) Ord. L. 2. T. 26 S 16 e Decis. de 29 de Janeiro de 1S29.<br />

(29) 'Mello. L. 3 T. 3 S 3; Lei de 20 de Dezembro de 1713 (por. arg.)<br />

Nas guerras continentaes é respeitada a propriedade particular, salvo os<br />

objectos que se considerão artigos de guerra. Wheaton, Element, du Droit<br />

Internat. P. 4, cap. 2 § 5 e 7.<br />

' (30) Lei de 20 de Dezembro de 1713. derogatoria da Ord. L. 2 T. 32<br />

§ 1"; Reg. de 15 de Junho de l'S'59, art. 11. n. 5. Considera-se boa presa<br />

a propriedade particular do inimigo, apprehendida no mar ou nos portos.<br />

Wheaton, cit. S 7. No Tractado de Paris de 30 de Março de 1854. á cuja<br />

doctrina o Brasil também adherio, estipulou-se a inviolabilidade da carga<br />

dos neutros em navios de inimigo, salvo contrabando de guerra.<br />

(31) Ord. L. 3. T. 94. Reg. de 15 de Junho de 1859, art. 85 a 97.<br />

Os bens do evento, fora do município neutro, pertencem á província<br />

onde forem encontrados. Para os processos relativos aos bens do evento são<br />

competentes os provedores de resíduos. Lei 3 de Dezemb. de 1841, art. 114 § 2,<br />

Reg. de 16 de Março de 1842, art. 2 § 2; Regul. de 15 de Junho de 1859, art. 86.<br />

I


DAS OH> 87<br />

B. Por pertencerem a particulares*.<br />

7. As cotisas perdidas (32);<br />

8. Os bens de defunctos e ausentes (33);<br />

9. Os navios naufragados e seus carregamentos, os quaes<br />

devem ser arrecadados e guardados, na conformidade do Código<br />

Commercial (34) e dos regulamentos liscaes, para serem restituidos<br />

a seus donos (35);<br />

§ 37. — II Especificarão<br />

1. A Especificação, outro modo de adquirir domínio, é<br />

a operação pela qual alguém, transformando a cousa ou materia<br />

pertencente á outrem. faz delia uma. espécie nova, como se de bronze<br />

alheio funde uma estatua (3(>).<br />

Para que se verifique a especificação, é mister que a cousa,<br />

pela mudança, se transforme em outra: se o objecto passa<br />

apenas por uma modificação accidental que o deixa na sua fôrma<br />

antiga, não ha especificação (37).<br />

2. A nova espécie pertence:<br />

a ) Ao dono da materia, se pódc ser reduzida á sua primitiva<br />

fôrma, como no caso da estatua de bronze ;<br />

b ) Ao especificador, se a reducção á antiga forma é impraticável,<br />

como na hypothèse da estatua esculpturada em mármore<br />

( 38 ).<br />

Se o especificador fez a nova espécie de materia sua e<br />

alheia, a nova espécie lhe pertence, se as matérias não podem<br />

(32) Cod. Crim. art. 260, Cod. Process. Crim. arts. 191 e 195 Avis, de 20<br />

de Julho de 18 3õ.<br />

(33) Vej. Direito de família § 172.<br />

(34) Cod. Comm. arts. 731 e seguintes.<br />

(35) Reg-, n. 2G47, de 19 de Set. de 1860. arts. 331 o seguintes.<br />

(3íi) Acerca da Especificação não temos lei escripta. Rege a materia<br />

o Direito Romano, como subsidiário, com an modificações do Uso moderno.<br />

Alguns escriptores considerão a Especificação como urna variedade da<br />

Accessão. Ha erro neste modo de ver. Na Especificação não ha juneção de<br />

cousa aiheia á nossa, mas simples transformação de cousa alheia por nosso<br />

esforço. Vinnio. Com. S 2*1. de rer. div. "(2,1) n. 1,<br />

(37) Assim não constituem nova espécie a lã que se tinge de purpura.<br />

o livro que se encaderna.<br />

(38) I. § 25 de rer. divis. (2,1). Vej. a nota 41 abaixo.


88 DIREITO<br />

retomar a forma antiga ; se podem, cada um retirará a sua<br />

materia (39).<br />

3. A razão fundamental da differença das soluções dadas<br />

á questão de Saber a quem fica pertencendo a espccie nova é a<br />

seguinte :<br />

No primeiro caso a materia, embora transformada, se entende<br />

subsistir, porque pôde voltar á fôrma antiga; o dono, portanto,<br />

retém o seu domínio.<br />

No segundo, porém, a materia se reputa consumida com<br />

a obra, visto como não pôde ser restituida ao estado anterior :<br />

com a exúncção da materia se extingue o domínio sobre ella e<br />

o especiríc.idor se apropria da nova espécie como de obra de sua<br />

creacão (40).<br />

4. E' porém de notar que quando o preço da obra excede<br />

consideravelmente o valor da materia, a. nova espécie pertence<br />

sempre ao especificador (41).<br />

5. Além do que fica exposto, se requer, para que o especificador<br />

adquira a propriedade da nova espécie, que faça a<br />

especificação para si (42).<br />

6. Aquelle que adquire a cousa especificada é obrigado<br />

a indemnisar ao outro o prejuízo soffrido.<br />

Assim : se a adquire o especificador, deve indemnisar ao<br />

dono da materia o augmento de valor que lhe trouxe a acquisição,<br />

e se andou de má fé, todos os damnos e perdas resultantes (43).<br />

(39) I, cit. § 25. Vinnio, Com. ao cit. § 6. Segundo o C. do Chile,<br />

irt. 662, a nova espécie, na hypothèse de que se trata, pertence em commum<br />

ao especificador e ao dono da materia, na proporção do preço da obra e valor<br />

da materia. No mesmo sentido Pothier, Prop. n. 187.<br />

(40) Vinnio, Com. ao cit. § 25 L, n. 4; Maynz § 185.<br />

(41) Mello Freire, L. 3 T. 3 § 8, Rocha § 420, Cod. Civil francez, arts. 570<br />

a 572, Cod. Civil do Chile, art. 662. Vej. C. C. Port. art. 2.302.<br />

No sentido exposto foi modificado pelo uso moderno o principio estabelecido<br />

no citado § 25 da I.<br />

(42) Fr. 25 e 27 D. adq. rer. dom. (41.1); Vinnio, loc. cit n. 2.<br />

(4-3) Maynz § 185.Mackeldey § 278. No caso de má fé do especificador,<br />

isto é, de saber que a materia é aiheia, o seu procedimento pôde constituir<br />

o crime de furto, Cod. Crim. art. 257. Vej. Cod. Civil Port. art. 2.30'2 § 2<br />

e art. 2.303.


DAS COUSÀ.S &y<br />

Se porém, adquire a nova espécie o dono da materia, corre­lhe<br />

a obrig­ação de pag ­ ar o preço da obra, obrigação que cessa<br />

se o especificador procedeu de má fé (44). ,<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 611 — Aquelle, que, trabalhando em materia prima, obtiver espécie<br />

nova, desta será proprietário, se a materia era sua, ainda que só emi parte, e<br />

não se puder restituir á fôrma anterior. ■— 613, 617.<br />

Art. 612 — Se Ioda materia fôr alheia, e não se puder reduzir á fôrma.<br />

precedente será do especificaãor de l>ôa fé a espécie nova — 613.<br />

Í! 1" — Mas, sendo praticavel a reducção, ou. quando impraticável­ se a<br />

espécie nova se obteve de má fé. pertencerá ao dono da materia prima.<br />

'i 2 o — Em qualquer caso. porém, se o preço da mão de obra exceder consideravelmente<br />

o valor da materia prima, a espécie nova será do especificador.<br />

Ari. 613 Aos prejudicados nas hypotheses dos dois artigos precedentes,<br />

menos a ultima do artigo 612, S 1", concernente á especificação irrediic!ivel<br />

obtida em má fé. se resarcirá o damno, vine soffrereni.<br />

Art. 614 — A espeeijicacâo obtida por alguma das maneiras do art. 62<br />

attribue a propriedade, ao especificaãor, tuas não o eximi á indemitigação.<br />

§ 38. — III Accessao<br />

1. O senhor da cousa principal adquire de direito a propriedade<br />

das cousas accessories que a ella adherem e que se lhe<br />

incorporão de uma maneira definitiva e permanente.<br />

A acquisição da cousa accessoria se opéra pelo simples<br />

facto da sua união com a principal. Não importa que a uniãb<br />

seja causada por acontecimento natural ou por esforço humano;<br />

nem tão pouco que a cousa accessoria tenha ou não dono.<br />

Kste modo de adquirir domínio se denomina em Direito<br />

—accessão {AS).<br />

(.44) Cnst. s 34 de rer div. (2.1). Jüxi.sie a má fé, ■ quando o especificaãor<br />

sabia que a materia era alheia.<br />

(45) Vinnio, Com., ao § 26 I., de rer. divis. (2.1.); Maynz § 1S6. Mello<br />

Freire, L,. 3 T. 3 § 7 e 8.<br />

A accessão se toma em dous sentidos, ou como modo de adquirir o domínio,<br />

ou como a cousa acerescida, acerescentada — incrementum. Neste<br />

ultimo sentido é ella empregada no art. 4 S 2 da Lei de 24 de Setembro de<br />

1864, e art. 142 § 4 do .Decreto de 26 de A'bril de 1865.<br />

Os fruetos e produetos da nossa propriedade nos pertencem á. titulo de<br />

accessão. Neste caso a accessão não é modo de adquirir, porquanto quem


w<br />

DIRSITO<br />

2. A accessão assenta neste principio fundamental — « que<br />

O accessorio segue a sorte do principal (46).<br />

Toda questão, pois, relativa á acquisição de domínio<br />

pela accessão se resolve afinal tia de saber, qual a cousa principal<br />

e qual a accessoria.<br />

A accessão se pôde dar, ou pela união de immovel á immovel,<br />

ou de inovei a immovel ou de movei á movei (47).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 536 — ­1 accessão pôde dar­se:<br />

I — Pela formação de ilhas. — 537.<br />

II — Por alluvião. — 538 « 540.<br />

III — Por avulsão. •— 541 a 543.<br />

IV — Por abandono de alveo. — 544.<br />

V — Pela construcção de obras ou plantações. —■ 545 a 549.<br />

§ 39 A. — Acccssâo de immovel a immovel<br />

Ha casos em que um immovel se reputa incorporado a<br />

outro immovel, do qual e tido como accessorio.<br />

O dono d,? immovel principal adquire por accessão o immovel<br />

considerado accessorio.<br />

Assim que :<br />

1°. Cedem aos proprietários das terras marginaes as ilhas<br />

que de novo se íormão nos rios públicos e particulares. Se nasce<br />

no meio do rio, a ilha pertence aos proprietários de uma e de<br />

outra marg"em, na proporção da testada de cada um até a linha<br />

que tirada pelo centro do alveo, o divide em duas partes ig­uaes.<br />

tem o domínio da cousa tom direito aos fruetos «em necessidade de nova<br />

asquisição: Fruotus rei frugiferse ejus pars­est. Vej. § 26 acima, nota 4.<br />

(46) Pr. 19 S 13 !.>. au: ­ ., ai'g. leg. '34,2). Accessio cedit principal!. Res<br />

accessoria sequitur rem principalem. Accessorium sequitur suum principale.<br />

A nossa legislação hypothecaria funda varias de suas disposições sobre<br />

a dita regra. Vej. Lei de 24 de Setembro de 1864, art. 2 § 1 e 2, art. 4 S 2<br />

e Decreto de 26 de Abril de 1X65. arts. 139. 142 S 1". 2", 3° e 4" e art. 143<br />

S 1", 3" e 4' .<br />

(47) A divisão da accessão em natural, industrial e mixta tem cahido<br />

cm desuso por iiiexaeta.


DAS COÜSAS<br />

Se acontece, porém, que a ilha surg-e entre esta Unha e uma<br />

das margens, em tal caso accresce aos proprietários dessa margem<br />

(48).<br />

Continua a pertencer ao antigo proprietário o espaço fechado,<br />

em fôrma de ilha, pelas águas do rio que se dividindo em<br />

dous braços, mais abaixo se reúnem em um só leito (49).<br />

2". O alveo abandonado do rio publico (50), que casualmente<br />

muda o curso de suas águas, accresce aos donos dos terrenos<br />

marginaes nos mesmos termos em que a ilha nascida no<br />

(48) I. § 22 de rer., divis. (2.1). Alvará de 28 de Maio de 1791 § 29:<br />

"Quaesquer insoas, camalhões ou mouchões que obstarem ao encanamento,<br />

serão cortadas e destruídas.... sem se considerar compensação aos possuidores,<br />

porque se não deve aos usurpadores do alveo do. rio que com usurpaí<br />

causado ciamno á navegação." O citado § 29 só nega indemnização<br />

pelas ilhas e mouchões artificiaes que considera usurpações. Desta disposição<br />

se induz argumento á contrario sensu cm favor da doctrina do Direito<br />

Romano exposta no texto. Vej. Dob. Dissertação no fim do I o volume das<br />

Notas a Mello,<br />

Xo cap. I. do Regm., das lezirias e paués se attribue ao Estado a propriedade<br />

das ilhas e lezirias do Tejo pelo fundamento de estarem incluídas<br />

em terras reservadas para a corca: declaração que igualmente fornece argumento<br />

a contrario sensu em apoio da nossa doctrina. Vej. Lob.Dissert. cit.<br />

Mello, (D. 3, T. :! § 7) sustenta com as disposições dos §§ 8 e 9 da ord.<br />

L. 2 T. 26, que pertencem ao Estado as ilhas nascidas nos rios públicos. Certo<br />

os rios navegáveis são públicos (cit. S 8), mas a ilha não é uma porção do<br />

rio, senão uni accidente de alveo que por seu turno só é accessorio do rio,<br />

emquanto o rio por elle corre. A inclusão das ilhas adjacentes ás costas do<br />

mar entre as cousas do domínio do Estado, (§ 9) importa, como observa<br />

Lobão, a exclusão das ilhas formadas nos rios.<br />

Segundo ó C. Civil francez, arts. 5G0 e 561, o do Chile, art. 597 e o portuguez,<br />

art. 2.294, as ilhas nascidas nos rios públicos pertencem ao Estado.<br />

A doctrina do Direito Romano acerca deste assumpto e do alveo abandonado<br />

dos rios públicos é para nós. attento o estado da propriedade territorial<br />

no Brasil, preferível ás dos citados códigos. Que monta ao Estado,<br />

senhor entre nós de vastos domínios sob o nome de terras dcvolulas, adquirir<br />

a propriedade de uma ilhota qu ; nasce no meio de algum rio navegável,<br />

ou do alveo do rio que muda o curso? No emtanto, a acquisição<br />

dessa ilhota ou do alveo abandonado pôde ser de grande vantagem ao pequeno<br />

proprietário das margens.<br />

(49) I. § 22. de rer.. divis. (2.1.) Cod. Civil francez, art. 562.<br />

(50) Se o rio £> particular, não ha questão porque o alveo abandonado<br />

pertence aos proprietários marginaes, não por accessão, mas pelo mesmo<br />

titulo porque lhes pertencem as margens,<br />

"1


92 DIREITO'<br />

centro da corrente (51). O novo leito segue a condição do rio e se<br />

torna publico (52).<br />

Todavia se a mudança da corrente foi feita por utilidade<br />

publica em virtude de deliberação do poder competente, o espaço<br />

occupado pelo novo leito deve ser legalmente desapropriado (53),<br />

e para compensar a despeza da desapropriação, o «alveo abandonado<br />

passa a pertencer ao Estado (54).<br />

3." Cedem igualmente aos donos das> margens: os acréscimos,<br />

mouckões e atterros que nellas lenta e insensivelmeute<br />

se vão formando com o limo e os attrictos, trazidos pelas águas<br />

do rio, bem como a porção de terreno que a corrente, retirando<br />

pouco e pouco, deixa descoberta (55).<br />

Accresce finalmente ao proprietário da ribanceira o fragmento<br />

de terra que se lhe vem juntar, impellido pela força das<br />

ag-uas (av/ilsio); pode, porém ser reivindicado pelo dono, antes de<br />

se ligar e se consubstanciar com o terreno onde é deposto (56).<br />

(.51) 1 § 28, de per. divis. (2.1.) Lab. Dissert., citada. Portugal, de<br />

Donát L. 3 c. è, n. 38.<br />

ü que constitue propriamente o rio. é a água corrente. O alveo segue<br />

a condição jurídica do no: é publico quando o é o rio. Se o rio publico toma<br />

nova direcção, o novo leito, embora aberto em terreno particular, se torna<br />

publico, e o alveo antigo, desde que é abandonado, perde a razão porque<br />

..i publico — desinit esse publicus, diz Ulpiano. Portanto, nada de mais<br />

natural e conforme aos principios do que — que o alveo abandonado acresç<br />

aos terrenos marginaes<br />

(52) I. § 23., de rei., divis. (2.1).<br />

(53) Const, art. 179 S 22 e Lei de 9 de Setembro de 1826.<br />

(.54) Alvarás de 12 de Maio de 1694, de 28 de Março de 1791. § 30, e<br />

Alv. de 20 de Novembro de 1795, art. 15. Lei de 29 de Agosto de 1828, arts. 1<br />

e 17 (ag.) Bagn. cap. 14, n. 474 a 478, Lobão, Notas a Mello, L. 3 T. 3 § 7 n. 2.<br />

No caso da desapropriação ser por utilidade provincial ou municipal,<br />

ficará o alveo abandonado pertencendo á província ou ao município ? Parece<br />

que sim, attenta a razão da lei.<br />

(55) I. § 20 de rer. divis. (2. 1). fr. 7 § 1"; fr. 12 pr. fr. 16 e 30 pr.<br />

S 1" D. de adqu. rer. dom. (41. 1). C. de alluvionibus (7. 41) Cod. do Chile,<br />

art. 650. Décret. 26 de Abril de 1865, art. 143 § 4.<br />

Pertencem ao Estado quaesquer accumuláções de terra, casuaes ou<br />

artificiaes, sobre o fundo do mar. Decis. n. 42, de 3 de Fevereiro de 1852.<br />

(56) I. § 21 de rer. divis. (2. 1) Vinnio, Com. ao cit. § Cod. Civil fr.<br />

art. 559, do Chile, art. 652.


CÓDIGO CIVIL<br />

DAS COUSAS 93<br />

Art. 537 — As ilhas situadas nos rios não navegáveis pertencem aos proprietários<br />

ribeirinhos fronteiros, observadas as regras seguintes:<br />

I — As que se formarem no meio do rio, consideram-se acerescimos sobrevinãos<br />

aos terrenos ribeirinhos fronteiros de ambas as margens, na proporção<br />

de suas testadas, até a linha que dividir o alveo em duas partes<br />

iguaes.<br />

II — As que se formarem entre essa linha e uma das margens consideram-se<br />

acerescimos aos terrenos ribeirinhos fronteiros desse 'mesmo lado.<br />

III — As que se formarem- pelo desdobramento de um novo braço do rio<br />

continuam a pertencer aos proprietários dos terrenos á custa dos quaes seconstituir<br />

am.<br />

Art. 538— Os acerescimos formados por depósitos e aterros naturaes, ou<br />

pelo desvio das águas dos rios, ainda que estes sejam navegáveis, pertencem,<br />

aos donos dos terrenos marginaes.<br />

Art. 539 — Os donos de terrenos que confinou .vou águas dormentes<br />

como as de lagos e tanques, não adquirem o solo descoberto pela reiracção<br />

délias, nem perdem- o que rllas invadir<br />

Art. 540 — Quando o terreno alluvial se formar em frente a prédios de<br />

propriedades différentes, ãiviãvr-se-á entre elles, na proporção da testada de<br />

cada um sobre a antiga- margem ; respeitadas as disposições concernentes á<br />

navegação.<br />

Art. 541 — Quando, por força natural violenta, uma porção de terra se<br />

destacar de um prédio e se juntar a outro, poderá o dono do primeiro reclamal-o<br />

do segundo ; cabendo o este a opção entre acquiescer a que se remova<br />

a parte aceresciãa, ou indemnizar ao reclamante. — {Art. 178, § 6 o . n. XI).<br />

Art. 542 — Se ninguém reclamar dentro em uni ar.no, con siderar-se-á<br />

definitivamente incorporada essa porção de terra ao prédio, onde se acha,<br />

perdendo o antigo dono o direito a reivindicai-a, ou ser indemnizado. — (Artigo<br />

178, § 6 o , n. XI).<br />

Art. 543 — Quando a avulsão fór de causa não susceptivel de aãherencia<br />

natural, applicar-se-á o disposto quanto ás cousas perdidas. — 603.<br />

Art. 544 — O alveo abandonado do rio publico, ou particular pertence<br />

aos proprietários ribeirinhos das duas margens sem que tenham direito á indemnização<br />

alguma os donos dos terrenos por onde as águas abrirem novo<br />

curso. Entende-se que os prédios marginaes se estendem até ao meio do<br />

alveo.<br />

S 40 B. —Accessão de moveis a immovel<br />

O senhor do immovel adquire por accessão as cousas moveis<br />

que se lhe incorporão.<br />

Por força do dito principio pertencem ao dono do immovel<br />

:


y+<br />

biKiîi'ro<br />

I o . As arvores nelle plantadas e as sementeiras feitas, por<br />

terceiro, desde que começão a deitar raizes :—[plantât)o et satio)<br />

(57).<br />

2°. O edifício que construe em seu solo com materiaes<br />

alheios (58). Ao dono dos materiaes compete acção de indemnisação<br />

pelas perdas e damnos resultantes (59). Se não usa desta<br />

acção, pôde reivindicar os materiaes a todo tempo que sejão desligados<br />

do edifício (60).<br />

3". O edifício construído em seu solo por extrauho (61). O<br />

dono do solo é obrigado a indemnisar o edifício : I pelo valor<br />

actual se esse valor é inferior ao custo ; II pelo custo se o valor<br />

actual lhe é superior (62).<br />

Por excepção da regra o edifício fica pertencendo ao constructor<br />

nos casos seguintes :<br />

a) Se foi levantado ás claras e em presença do dono do<br />

solo, sem impuguação de sua parte (63).<br />

b ) Se vale muito mais do que o solo por elle occupado.<br />

(&7) I. S 31 e 32 de rer. divis. (2. 1) Lei de '.) de Julho de 1773. B. Carn.<br />

I>. 2 T. 11 S 6(5. n. 1. O dono do terreno deve pagar as despezas da plantação.<br />

Repertório, tom. 4, pag\ 549.<br />

(58) 1. § 29 de rer. divis. (3. 1) B. Carneiro L. 2 T. 11 § 65, n. 1.<br />

Cod. do Chile. art. 669. O D. de 26 de Abril de 1865, art. 143 § 1" presuppõe<br />

o dito principio quando dispõe que a hypotheca comprehende os novos<br />

edifícios construídos no solo hypothecado."<br />

(59) Pegas 7. forons, cap. 241, n. 147. B. Carneiro, cit. 5 65. n. 10.<br />

O Direito Romano conferia ao dono dos materiaes a acção de ligno<br />

jv/ncto para haver o dobro do valor dos mesmos materiaes, obrasse o constructor<br />

do boa ou má fé (I. S 29 de rer. divis. (21,1). fr. 7 § 10 D. de adq.<br />

rer. dom.) Este rigor tem sido reprovado pelo Uso e Direito moderno. Cod.<br />

C. francez, art. 554. Chile, art. 668. No caso de má fé. pôde haver flerto<br />

.(Cod. Crim. art. 257), e então o constructor será responsável pelo valor<br />

dos materiaes e damnos e prejuízos resultantes. (Coei. Crim. art. 21).<br />

(60) I. S 29 de rer. unis. (21.1), B. Carneiro, citado § 65. ns. 9 e 10.<br />

(61) I. S Su de rer. divis. (2.1) Lobão, Casas S 50 e 51. B, Carneiro,<br />

citado 5 65, ns. 1 e 1 ■) Decr. 26 Abril de 1865. cit. an. 14:3 S 1".<br />

(62) Vv. 118 !). reivindicai., 6.1; Pothier, Propriet. n. 346. Dig. Port. I,<br />

arts. 548 e 549. Rocha S 449. C. C. Franc, art. 555, Vej. C. do Chile, art. 669.<br />

Segundo o uso moderno subsiste a obrigação de indemnizar, quer o constructor<br />

estivesse de boa. quer 0.­.' má fé. Cujacio Obser, L. X. cap. 1", Voct. l'ander:<br />

6. 1. n. 36. Lobão Casas S 51 e nota 4.<br />

(63) Pegas, Tom. 6 ad ord. pag. 105, I obão, Casas ï 5", Rocha §. • •


DAS COÜSAS 9§<br />

(64) Nestes dous casos o constructor tem obrigação de pagar ao<br />

dono o valor do solo (65).<br />

4.° As bemfeitorias necessárias c as úteis que não podem<br />

ser separadas sem datnnificação do prédio (66), O senhor do pre- \J<br />

dio é obrigado a indemnisar as bemfeitorias pelo valor que acrescentão<br />

á sua propriedade (67).<br />

5 o . Finalmente, metade do thesouro casualmente descoberto<br />

por terceiro no seu solo (68).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

DAS CONSTRUCÇÕES E PLANTAÇÕES<br />

Art 545 — Toda construcção ou plantação, existente em um terreno, se<br />

presume feita pelo proprietário e á sua custa, até que o contrario se prove.<br />

Art. 546 — \quelle nue semeia, planta, ou edifica em terreno próprio,<br />

com sementes, plantas ou materiaes alheios, adquire a propriedade destes,<br />

was fica obrigado a pagar-lhes o valor, além de responder por perdas c darn<br />

nos, se obrou de má fé.<br />

Art. 547 — Aquelle que semeia, planta on edifica em terreno alheio perde,<br />

em. proveito do proprietário, as sementes, plantas e construcções, mas tem<br />

direito ú inãemnização. Não o terá, porém, se procedeu de má fé, caso em<br />

que poderei .ser constrangido a repor as eousas no estado anterior c a payor<br />

os prejuízos.<br />

Art. 548 — Se de ambas as partes houve má fé, adquirirá o proprietário<br />

as sementes, plantas e construcções, com encarno, porém, de resareir o valor<br />

das bemfeitorias.<br />

Paragrapho único. Presume-se má. fé no proprietário, quando o trabalho<br />

de construcção, ou lavoura se fez em sua presença e son impugnação sua.<br />

Art. 549 — O disposto no artigo antecedente applica-se também ao caso<br />

de não pertencerem as sementes, plantas, ou materiaes a quem de bôa fé<br />

os empregou em solo alheio.<br />

Paragrapho único. O proprietário das sementes, plantas ou materiaes<br />

poderei cobrar do proprietário do solo a i/nãemniíiação devida, quando não<br />

puder liavel-u do plantador, ou constructor.<br />

(64) Mello, L. 3. T. 3 § S, Dob. Casas § 51, B. Carneiro, cit. § 65, n. 21.<br />

(65) Nota antecedente.<br />

(66) Ord. D. 4 T. 48 § T. Décret, de 26 de Abril de 1865, art. 142 § 3<br />

Doctrin. das Acç. § 70 o nota 131; B. Carneiro. D. 2 T. 11 § 67.<br />

(67) Valasc. Cons. 83. ns. 25 a 28, B. Carneiro, cit. § 67, n. 11; Doctr,<br />

das Acç. citada, nota 131. Se a bemfeitoria vale mais do que custou indemniza-se<br />

o custo. Cit. nota 13.1 da Doctr. das Acç.<br />

(68) I. § 39 de rer divis. (2.1) Vej. S e nota 62, acima.


9í, DIR73ITO<br />

§ 41 I. — Accessão de move] a movei<br />

A accessão de cousa movei a cousa movei é modo de adquirir<br />

propriedade, quando, fazendo-se a adjuneção sem consentimento<br />

dos donos (69), as cousas adjunetas ou se não podem separar<br />

ou se deteriorarão com a separação (70). Em qualquer destes<br />

casos adquire a propriedade da cousa accessoria o dono da que é<br />

reputada principal (71).<br />

Em regra se diz principal aquella que pôde subsistir por<br />

si, independentemente do concurso da outra. Todavia se considera<br />

sempre principal a que tem mais valor (72).<br />

Se a cousa alheia é adquirida pelo autor da accessão, é<br />

elle obrig-ado a indemnisar ao dono :—tanto quanto a sua augfmentou<br />

de valor, se procedeu de boa fé (73) ;—todo o damno resultante,<br />

se de má fé (74).<br />

No caso contrario, isto é, se o autor da accessão perde a<br />

cousa em favor do dono da outra, só tem direito á indemnisação,<br />

dado que obrasse de boa fé (75).<br />

§ 42. — IV Confusão e Comrnixtão<br />

Em direito se denomina confusão (confusio) a mistura de líquidos<br />

ou liquefactos(77), e Commixtao (Commixtio) a de solidos(77).<br />

(G9) Havendo consentimento dos donos, a propriedade do todo resultante<br />

da adjuneção das cousas, serA regulada segundo a intenção das partes.<br />

(70) Fr. 6. fr. 7 § I o . D. ad exhibend. (10,4); fr. 23 § 5 D. rei vindicat.<br />

(G.l). Mello, D. 3. T. 3 § 8.<br />


DAS COUSAS 97<br />

O producto resultante da confusão ou da commixtão se<br />

torna commnm entre os donos das substancias mescladas, sempre<br />

que a separação é impossível, ou a mescla seja effeito do acaso,<br />

ou obra de um dos donos sem consentimento do outro (78).<br />

Quando a mistura se opéra de accordo de ambos os donos.<br />

o resultado ainda é commum, não havendo estipulação em contrario<br />

(79).<br />

Se da mistura de materiaes de natureza diversa se fôrma<br />

uma nova espécie (80), a confusão nesse caso reveste a natureza de<br />

especificação, e produz a acquisiçâo do domínio tão somente em<br />

favor do seu autor (81).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

DA CONFUSÃO, COMMISTÃO E ADJUNCÇÃO<br />

Art. 615 — .t.s causa.'; pertencentes a diversos donos, confundidas, misturadas,<br />

ou ajuntada.s. sem. o consentimento délies, continuam a pertencerlhes,<br />

sendo possive! sepa.ral­as sem deterioração.<br />

S 1" — São o senão, ou exigindo a separação dispendio excessivo, subsiste<br />

inâiviso o todo, cabendo a cada um dos donos quinhão proporcional ao valor<br />

da cotisa, com que entrou para a mistura ou aggregado. — ">8 e segs.<br />

(78) I. § 27 e 28 de rer. divis. (2,1), Mello, I. 3 T 3 s 8; Pothier, Propriété<br />

n. 190.<br />

A confusão e commixtão são regidas pelos mesmos principios. A differença<br />

quo a I. nos §§ citados parece estabelecer entre uma e outra. .'■<br />

uma pura aubtileza, como em seu tempo observou Vinnio. Com. ao S 28 n. 2<br />

e 3. Com effeito. no caso de commixtão. se a separação se torna impossi<br />

vel, o acervo resultante é pela natureza das cousas commum<br />

(79) Vej. Maynz S 190.<br />

Estabelecida a communhão. os condôminos têm direito á pedir a divisão.<br />

A pan. indivisa ci­­ cada urn se estima e se determina segundo a<br />

quantidade e a qualidade da substancia que lhe pertencia. T. cit. S 27; U­. 3<br />

§ 2. fi\ D. de rei vindicat. (6,1).<br />

iE' de notar que a confusão e a commixtão, desde que estabelecem a<br />

communhão, import; cia de propriedade. Cada um dos donos das<br />

matérias mescladas, que antes s(5 linha domínio na sua. adquire por um daquelles<br />

fartos condomínio no producto resultante, no qual se inclue a<br />

substancia que pertencia ao outro. Vinnio, Com. ao cit. S 27, n. 1.<br />

(80) Como da mistura de ouro e prata derretidos: Sed et si diversœ<br />

matérias sint et ob id propria species facta sit. forte ex vino et melle mulsum.<br />

aut ex ouro et argentum electrum. I. cit. § 27.<br />

(81) Fr, 5 § I o . D. rei vindicat, (41.1): Vin. Com. ao cit. § 27, n. 5;<br />

Maynz § 190.


98<br />

niRKJTÜ<br />

§ 2 o — Se, porém, uma das cotisas puder considerar-se principal, o dono<br />

sel-o-á do lodo. indemnizando os outros.<br />

Art. 616 — Se a contusão, adjunecão, ou. mistura, se, operou de má fé,<br />

á outra parte caberá escolher entre guardar o todo. pagando a porção, que<br />

não far sua, on renunciar ás que lhe pertencerem, mediante indemnizarão<br />

completa.<br />

Art. 617 — Se da mistura de mate» ias de natureza diversa se formar nova<br />

espécie, a confusão terá a natureza de especificação para o effeito de attribitir<br />

o domínio ao respectivo autor. — 611 e segs.


TITULO SEGUNDO<br />

TRADIÇÃO E TRANSCRIPÇÃO.<br />

§ 43. — Noções geraes<br />

A deslocação do domínio de uma pessoa para outra carece<br />

de uma manifestação visivel, de um signal exterior que atteste e<br />

affirme aquelle acto diante da sociedade. Exige-o a natureza do<br />

domínio. Direito absoluto (erga omncs), o domínio obriga a todos,<br />

pôde ser opposto a todos ; importa, pois, que todos conheção as<br />

suas evoluções. Esta publicidade, ainda mais energicamente a<br />

reclama a segurança dos interesses ligados á propriedade ; — é<br />

ella necessária para prevenir as fraudes que a má fé de uns, protegida<br />

pela clandestinidade, pudera preparar em prejuízo da boa<br />

fé de outros (l).<br />

No estado actual do Direito Civil a Tradição e a Transcripção<br />

são os dois factos externos de que a lei faz, em geral, depender<br />

a transmissão do domínio (2).<br />

(1) A necessidade de um .signal exterior para manifestar a transmissão<br />

do'domínio é confirmada pela historia das 1-egislaQões positivas. Vej. May-nz,<br />

§ 178 e 191, Reviêre et Huguet, Questions sur la transcription, Observât, historiques<br />

et preliminar.; Troplong, Transcription n. 3 e seguintes.<br />

(2) O Cod. Civil francez, inspirando-se nas ideas de Grocio, Wolf,<br />

Puffendorf, Burlamaque e outros, repel lio de seu seio a tradição como modo<br />

de transmissão do domínio, e estabeleceu francamente que o domínio se<br />

transfere pelo mero effeito das convenções (arts. 711, 1.138 e 1.&83.)<br />

Mas a legislação é uma obra essencialmente pratica, e como tal não<br />

pôde abandonar a realidade dos factos pelas especulações rios philosophos.<br />

O Direito francez teve afinal de ceder á força das cotisas. O próprio Cod.<br />

Civil, consagrando o principio que "en fait de meubles la possession vaut<br />

titre" (art. 2.279), restabeleceu de facto a tradição para os moveis. De feito,<br />

se a posse do movel é por si só titulo legitimo de acquisição, a fonte do.do-<br />

8


loo DIREITO<br />

Herdada do Direito Romano (3), a tradição é por sua<br />

natureza epela falta de authenticidade, insuficiente para communicar<br />

ao acto da transferencia do domínio a firmeza e a notoriedade<br />

que lhe são mister. Assim que sob o seu regimen exclusivo<br />

acontecia que um mesmo prédio podia ser secríeamente alienado<br />

minio dos moveis transferidos vem a ser a tradição. Neste ponto, ainda<br />

com as limitações ensinadas pelos jurisconsultes, vai o Direito francez<br />

além do romano, o qual só admittia .1 tradição como modo de jcquisiçáo.<br />

quando fundada em justo titulo.<br />

A doctrina do Código Napoleão ficou, portanto, pelo sou próprio texto<br />

limitada á transferencia dos immoveis. Mas dentro desse limite mesmo ella<br />

foi ainda quasi que annullada pela lei de 23 de Março de 1®5>5, que creou<br />

cm Franga o regimen da transcripção.<br />

(3) O antigo Direito romano cercava a transmissão das cousas mancipi<br />

(erão as que constituião o verdadeiro patrimônio do cidadão) de ritos e<br />

formalidades solemnes (a mancipatio e a cessio in jure): a transmissão das<br />

cousas nec mancipi (cousas do Direito das Gentes) se operava pela simples<br />

tradição. (Maynz, § 178 e 191). Mais tarde, com o progresso das riquezas<br />

e com o augmento das transacções da vida civil ,foi naturalmente<br />

desapparecendo a distineção entre a propriedade Qucritaria e a propriedade<br />

PretoHana, de modo quo já nos começos do século VI aquella distineção<br />

era apenas uma antigualha inútil, vazia de sentido, sem validade pratica.<br />

.Jusüniano, pois, pondo a lei em harmonia com o facto, a abolio de direito<br />

e consagrou a tradição como o modo serai de transferir a propriedade.<br />

( - C. unie, C. de med. jur., tollend. 7,25.)<br />

K' do notai- que a tradição como modo do acquisição do domínio, é<br />

um resultado lógico dos elementos orgânicos do Direito romano, como<br />

deixão entrever as seguintes palavras de Vinnio: "Cur vero ad dominium<br />

transferendum noa placet, sufficere nudam convenientium voluntatem ?<br />

Nimirum quia nemo, ex ratione Juris gentium facto suo rem (sive ea<br />

nUllius sit, sive alterius). adquirit. nisi cujus potostaii et manui subjecta<br />

sit; quod ita quisque consequitur. si earn appréhendent, si possessionem<br />

ejus nasciscatur. Non aliter autem possessio rei aliena? apprehendit et petcam<br />

potestati nostra? res subjici potest, quam si dominus earn tradiderii<br />

in cujustamdiu potestate est et unmet." Com. ao § 40, I. de rer. divis. (2,1).<br />

Assim que, adoptando a tradição, o Direito romano cedia á. natureza<br />

das cousas e se conformava com as suas proprias ideas fundamentaes sobre<br />

a acquisição da posse e do domínio; mas por certo, como observa Troplong<br />

(Transcript, n. 2). não levou em mira nem com as antigas formalidades da<br />

transmissão da propriedade, nem com a tradição, crear e desenvolver o<br />

credito particular.


DAS COUSAS 101<br />

por seu proprietário a duas ou mais pessoas : um dos adquirentes<br />

vinha a ser inevitavelmente victima da fraude (4).<br />

Para pôr cobro a resultados taes, de sobejo demonstrados<br />

por dolorosa experiência, e para dar á propriedade territorial a segurança<br />

e a estabilidade que de si mesma requer e que vivamente<br />

solicitavão os desenvolvimentos e as necessidades da vida moderna,<br />

o g-enio inventivo do legislador creou um novo modo de<br />

transferenciado domínio e de seus direitos elementares :—a transcripçâo<br />

dos títulos de acquisição em registros públicos (5).<br />

Este systhema evidentemente se não podia applicar á transmissão<br />

dos moveis. O movimento incessante e perpetuo das cousas<br />

mobiliárias e a. celeridade com que circulão de mão em mão,<br />

são de todo ponto incompatíveis com as lentidões inhérentes á<br />

transcripçâo. A' isto accresce a difficuldade de fixar-lhes a identidade.<br />

A propriedade immovel tem ao contrario, uma individualidade<br />

perfeitamente caracterisada e a sua mutação, menos {requente<br />

e menos repetida, admitte sem grave damno as demoras<br />

que acarreta o preenchimento das formalidades da Tram cripção.<br />

E' essa a razão fundamental porque a Transcripçâo só<br />

tem sido acceita como modo de transferencia dos immoveis.<br />

Algumas legislações, por timidez em romper com velhas<br />

usanças, não a consagrâo como modo absoluto de transmissão<br />

(4) Exemplos :<br />

I o . O senhor de um prédio vende-o successivamente a duas pessoas;<br />

recebe de cada uma o preço ajustado, e faz entrega do prédio a um dos<br />

compradores: este é quem adquire o domínio, fosse o seu contracta ai.tarior<br />

ou posterior em data. (Ord. L. 4, T. 7 pr.) O outro comprador fica a vêr<br />

navios; não adquire domínio, portanto, su tem acção pessoal para haver<br />

o preço e as perdas e damnos causados, acção que se tornará inefficaz se<br />

o vendedor cair em estado de insolvabilidade.<br />

2°. O proprietário aliena o seu prédio com reserva do usofrueto, em<br />

virtude de cuja clausula o retém em seu poder. (Constüuto possessoi'io,<br />

§ 14 acima). Posteriormente vende-o a outro comprador que paga o preço<br />

e delle toma posse. Mais tarde, o primeiro comprador virá com r\ sua acção<br />

de reivindicação e ha de inevitavelmente triumphar, porque na hypothèse<br />

figurada adquirio o dominio. Ao segundo comprador só resta acção pessoal<br />

contra o vendedor.<br />

A transcripçâo prévins estas fraudes, bem como a de se hypothecar<br />

cousa já alienada ou gravada de onus reaes.<br />

(5) Sobre a origem histórica da transcripçâo, Troplong, Transcx-iption<br />

n. 2, e Pref. Privil. et Hypoth.


102 njRKlTO<br />

do domínio de immoveis, mas requerem-n'a tão somente para a<br />

validade dos effeitos da acquisição em relação a terceiros (6).<br />

Mas como quer que seja : ou requisito imprescindivel para<br />

a transferencia do domínio de immoveis (7), ou uma formalidade<br />

para que os effeitos da acquisição possão ser validamente oppostos<br />

á terceiros, a transcripção em todo o caso imprime ao<br />

àcto a desejada publicidade, e constitue para o adquirente uma<br />

fonte segura de esclarecimentos sobre pontos que muito lhe importa<br />

averig-uar, a saber :<br />

Se o domínio do prédio persévéra na. pessoa do proprietário<br />

apparente ;<br />

Se o domínio se conserva pleno, ou se tem soffrido desmembramentos<br />

com a instituição de uso, usofructo, ou de quaesquer<br />

outros onus reaes.<br />

O registro responde a todas estas questões de facto. Se o<br />

adquirente, pois, se deixa iiludir e envolver pela fraude, attribua-o<br />

á si que não á insufficiencia da lei.<br />

Ainda mais : A. transcripção, como se deprehende de seus<br />

intuitos, não é só um principio de segurança para o adquirente,<br />

é ainda o fundamento cardeal do regimen hypothecario.<br />

Aquelle que quer emprestar sob a garantia da hypotheea<br />

tem tanta necessidade, quanta o adquirente, de conhecer a situação<br />

jurídica da propriedade territorial.<br />

Entre nós a transcripção é hoje o modo legal tie transferencia<br />

de domínio sobre os immoveis (8). A tradição continua a<br />

subsistir, mas tão somente para a transmissão do domínio que<br />

tem por objecto os moveis (9).<br />

(.«) Lei Francesa cio 23 de Março de L855. C. C l'on., art. 951.<br />

(7) C C. da Hollanda, art. 1.4-95: "La propriété de la chose vendue ne<br />

. !,i aquise à l'acheteur que par la tradition."<br />

Art. fi71. "La livraison des immeubles s'opère par la transcription sur<br />

les registres publiques."<br />

C. C. do Chile, art. 68-6: "Sc efectuará la tradition dei domínio de [os<br />

bienes raices por la inscripcion dei titulo en el Rejistro del Conservador. "<br />

No mesmo sentido os códigos da Prussia e Austria.<br />

(S) Lei n. 1.237. de 24 do Setembro fle 1864, art. S; V>w\\ u: n. 3.4-33,<br />

de 26 de Abril de 1863, art. 256 e seg.<br />

f9) Ord. 4.5 § I o , è- T. 7. e Alv. dé 4 de Set. de 1810.


KAír' CUlJSÀS 103<br />

§ 44 IA. — O que c tradição.<br />

Ha duas espécies de tradição : — a tradição nua (nuda<br />

traditio) e a tradição, modo de adquirir domínio.<br />

1 . A tradição nua é a simples entrega da cousa, desacompanhada<br />

da intenção de transferir o domínio. Tal é — a que se<br />

verifica no commodato, no penhor, no deposito, nos quaes ella<br />

intervém como um dos elementos geradores do contracto (10);—a<br />

que se realiza em virtude do contracto de locação, em relação ao<br />

qual é um mero effeito da convenção sem conseqüências jurídicas<br />

directas (11).<br />

2. A tradição, modo de adquirir domínio, consiste na entrega<br />

que o senhor de cousa corporea faz delia á outrem, concorrendo<br />

n'um a intenção de transferir e no outro a de adquirir o<br />

domínio (12).<br />

Modo derivado, de adquirir, a tradição não gera o domínio;<br />

presuppõe­­n'o existente e limita­se a transferi­lo de uma pessoa<br />

para outra (13).<br />

A simples vontade das partes, em regra, não basta para<br />

operar a translação do domínio; é ainda necessário que a intenção<br />

se externe por um facto que ponha a cousa alienada sob o<br />

poder physico do adquirente : esse facto é a tradição (14).<br />

Assim que: «o domínio das cousas moveis não se transfere<br />

pelo mero effeito da vontade das partes, senão pelo accordo<br />

das vontades e conseqüente tradição» (15).<br />

3.—O contracto produz tão somente uni direito pessoal,<br />

(10) Ha contractus que só se tornão perfeito? e acabados com a tradição:<br />

ooligatio re contrahitur: são os contractus denominados — contractus<br />

reaes, por opposição aos contractus consensuaes que são aquelles que se formão<br />

pelo simples consenso das vontades. Mackeldey, § 432, e GVDaynz, II.<br />

S 293 e SI7.<br />

(11) Contractus que não são transiaticios do domínio. Lobão, Not<br />

a ­Mello, L. 3. T. 3. S 10, n. 3.<br />

(12) l. 5 40. de rer. divis. (2,1); fr. 9 e 31. D. adq. rer. dom. (41,1);<br />

fr. 55. D. de oblig. et act. (44.7).<br />

(13) \, § !" e T. 7. Alv. de 4 de Setembro de 1810: "Por<br />

meio da tradição passa o domínio para o comprador." (Vej. Cod. da Aust..<br />

art. 380; da Hç­Handa, arts. 63« e. 6«7, e do Civile, art, 6TO.


104 DIREITO<br />

isto é : para o aliénante a obrigação de fazer a entrega da cousa;<br />

para o adquirente o direito de exigir a tradição. Antes de cumprida<br />

a obrigação, não ha dominio transferido ; — o aliénante retém<br />

a propriedade do objecto alienado e pôde validamente dispor<br />

delle . o adquirente é um mero ciedor, com acção pessoal para<br />

forçar o aliénante ou a entreg-ar a cousa ou a restftuir o preço<br />

no caso de ter sido pago. (16)<br />

O cumprimento da obrigação so se consuma pela tradição,<br />

e a tradição, uma vez realisada, desloca o dominio da pessoa do<br />

aliénante para a do adquirente.<br />

O direito pessoal resultante do contractu (jus ad rem) é, portanto,<br />

a força que pela tradição leva o dominio {jus in ré) ao adquirente.<br />

4. —O principio acima estabelecido, supposto seja uma das<br />

regras fundamentaes do nosso Direito, soffre, todavia, derogações.<br />

Assim : por excepção, o dominio se transfere, sem necessidade<br />

de tradição :<br />

a ) Pela abertura da suecessão legitima ou testamentaria,<br />

aos herdeiros e aos legatarios de cousa certa (17).<br />

b) Por força das convenções matrimoniaes, apenas realizado<br />

o casamento, ao cou juge adquirente (18).<br />

c) Pela consumação do matrimônio celebrado segundo<br />

o costume do Império, á um e outro cônjuge (19) :<br />

d) Por mero effeito do contracto de sociedade universal,<br />

entre os consocios (20).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

DA TRADIÇÃO<br />

Art. 620 — O dominio das cousas não se transfere pelos contractus antes<br />

da tradição. Alas esta se subentende, guando o transmiti ente continua a possuir<br />

pelo constituto possessorio (art. 675). — 494, IV, 868, 1373.<br />

(16) Alv. de 4 de 'Setembro de 1810: "Deste contracto (compra e<br />

venda) nascem as acções pes.oaes ex empto et venãito, para se haver por<br />

meio délias a cousa vendida e o prego.... a acção de reivindicação é real<br />

e tem sua origem immediata no dominio."<br />

(17) Lei de 9 de Novembro de 1774 e Assento de 16 de Fevereiro de 1786.<br />

(18) Lobão, Not. a Mello, L. 3, T. 3, § 10, n. 3. Vej. Direito de familia,<br />

§ 51 o 52. No caso de se estipular doto estimado, o dominio passa ao marido;<br />

no caso de doação passa ao cônjuge donatário.<br />

(19) Ord. L. 4, T. 46. Vej. Direito de familia, § 57.<br />

(20) Ord. L. 4, T. 44, § I o .


DAS COUSAS 105<br />

Art. 621 — Se a cotisa alienada estiver na posse de terceiro, obterá o<br />

adquirente a posse indirecta pela cessão que lhe fizer o aliénante de seu.<br />

direito d restituição da cousa.<br />

Paragrapho único. Nos casos deste artigo- e do antecedente, parte final,<br />

a acquisição da posse indirecta eqüivale á tradição.<br />

Art. $22 — Peita por quem não seja proprietário, a tradição não alheia, a<br />

propriedade. Mas, se o adquirente estiver de l)ôa fé, e o aliénante adquirir<br />

depois o domínio, considera-se revalidada a transferencia e operado o effeito<br />

da tradição, desde o momento do seu acto. — 521.<br />

Paragrapho único. Também não transfere o domínio a tradição, quando<br />

tiver por titulo win acto nullo.<br />

§ 45 B. — Condições<br />

O facto da tradição por si só é insufficiente para operar<br />

a transmissão do dominio :-- requerem-se as condições seguintes<br />

:<br />

Pessoa capaz de alienar e pessoa capaz de adquirir ;<br />

Justa causa de transferencia.<br />

1. Só pôde alienar aquelle que c proprietário da cousa<br />

(21) e está na livre administração de seus bens (22). A tradição,<br />

feita por quem não é proprietário, não importa a<br />

translação do dominio (23); todavia, se o adquirente está de<br />

boa fé e o aliénante de futuro adquire a propriedade da cousa,<br />

a transferencia se entende revalidada (24).<br />

1,21) Pr. 20 D. adq. rer. dom. (.41.1): Traditio nihil amplius transferre<br />

debet vel potest ad eum qui accipit quam est apud eum qui tradit.<br />

(22) Pr. 46 D. adq. rer. dom. (41.1); I. § 2: Quibus aiien. licet vel non<br />

(2,8), Lobao, Notas á Mello, L. 3, T. 3 § 10 n. 3. Não podem alienar os<br />

menores, os loucos, os pródigos, as mulheres casadas. Vej. Direto de família<br />

? 41, 152, 165 e 169.<br />

(23) Neste caso aquelle que recebe a cousa. estando em boa fé. adquiro<br />

a posse que serve de base á prescripção.<br />

(24) Pr. 2, 3 D. de Except, rei venditas et iraditas (21,3). Na hlpothese<br />

figurada o adquirente pôde repellir o aliénante ou o seu successor universal<br />

ou singular com a Excepção rei vendits; et traâits?. E' muito conhecida<br />

a maxima: Quem de evictione tenet actio, eumdem agentem repellit<br />

exceptío.<br />

A dita excepção tem sido adoptada pelos códigos modernos. C. do<br />

Chile, art. 682, da Austria, art. 366, veja-se Maynz I 1,93 e 206.


TOb D IRK I TO<br />

Pôde a tradição ser realizada pelo aliénante, ou por via<br />

de representante seu, como procurador, tutor, curador, syndico<br />

(25).<br />

São em g­eral incapazes de adquirir por tradição os que<br />

são incapazes de contractar (26).<br />

Por parte do adquirente a tradição vem a ser uma verdadeira<br />

tomada de posse, de consentimento do aliénante, e<br />

se reg*ula pelos mesmos principios (27). Ksta tomada de posse<br />

se verifica ou por acto do próprio adquirente» ou de terceiro<br />

(28). Neste ultimo caso o domínio, sempre que é essa a intenção<br />

do aliénante, se reputa transferido ao adquirente, ainda<br />

que o terceiro, trahindo o mandato, acceite a cousa para si (29).<br />

A tradição, feita ou acceita por terceiro, sem consentimento<br />

do aliénante ou do accipiente, é susceptível de ser<br />

revalidada por via de ratificação (30).<br />

2. A tradição requer uma justa causa translaticia do<br />

domínio : iransferendi dominii causa (31). A justa causa não é<br />

senão o concerto da intenção das partes —■ de transferir e<br />

adquirir o domínio (32), um contractu (33), como a compra e venda<br />

(34), a doação, um facto qualquer que manifeste a intenção de<br />

transferir a propriedade ; ou um acto judiciário, como a arrematação,<br />

a adjudicação (35).<br />

(25) il. § 42, 43, de ret. divis: (2,1) fr. 41 g 1" I). adir. rer. dom (41,1).<br />

(26) Lobão, Not. a Mello, L. 3. T. 3 S 10. n. 3. Taes são os menores<br />

e os loucos.<br />

(27) Vej. § 10 acima.<br />

(28) Fr. 9 § 4, fr. 13 e 2­0 D. ad. rer. dom. (41.1).<br />

(29) Fr. 13, D. de donat. (39,5); fr. 37 § 8 D. adq. rerurn dom. (41,1). .<br />

(30) Fr. 12 § 4 D. de solut et libérât. (46,3): Ratihabitio mandato comparatiir.<br />

Cod. do Chile, art. 672.<br />

(31) Fr. 31 D. adq. rer. dom. (41,1): Nunquam nuda traditio transfert<br />

dominium, sed ita si venditio aut. alíqua justa causa prascesserit propter<br />

quam traditio sequeretur.Ord. L. 4, T. 54 § 3 e 4; L. I o T. 78 § 8 ,T. 7fl § 14.<br />

(32) Fr. 55 D. de oblig. et act. (44,7) : In omnibus rebus qua? dominium<br />

transferunt, concurrat. oportet. affectum iex utraque parte contrahentlum,<br />

(33) Ord. L. 4, T. 54 § 3 e 4.<br />

(34) Na compra e venda ha isto de particular, que o comprador, se<br />

não palgou o preço, não adquire o domínio, salvo se a venda foi a credito:<br />

—habita de fide pretio. Ord. L. 4, T. 7 S 1". Alv. de 4 de Setembro de 1810.<br />

(3­5) Pereira e Souza § 434, e not. 862 Cod. do Chile. art. 671: "Nas<br />

vendas forçadas que se fazem por decreto judiciai, á requerimento de um


DAS COtïsAS ro7<br />

3. Se o contracto ou acto que serve de titulo é uullo ou<br />

prohibido por lei (36), a tradição se reduz a um puro facto<br />

material, inhabil para transferir dominio.<br />

§ 46 C. — Erro quanto â tradição<br />

A tradição deixa de acarretar a transferencia do dominio<br />

quando a vicia erro que rompe o accordo de intenções entre o<br />

aliénante e o adquirente.<br />

Entrão nesta qualificação os erros seguintes :<br />

1. Erro da pessoa a quem a tradição é feita, como se<br />

a cousa é entregue a um, mas a intenção do aliénante era<br />

entregal-a a outro (37).<br />

2. Erro pelo que respeita á cousa, como se o aliénante<br />

queria fazer tradição de pannos de seda, mas por engano entregou<br />

estofos de lã (38).<br />

3 Erro quanto ao titulo. Neste caso lia distincções a<br />

fazer :<br />

A. O tradenle entrega o objecto a titulo de deposito ou<br />

de commodato ; o adquirente recebe-o a titulo de mutuo,<br />

ou ao contrario, o tradente o dá por mutuo e o adquirente o<br />

acceita em deposito. Não ha transferencia de dominio, porque<br />

se um está na intenção de o transferir, o outro não tem a de<br />

adquirir, e vice-versa (39).<br />

B. Se ha erro acerca do titulo, mas o titulo presupposto<br />

por cada uma das partes é translaticio do dominio,<br />

como se o aliénante entrega a espécie á titulo de doação e o<br />

adquirente a recebe por mutuo : o erro não impede a transmissão<br />

do dominio, porque sem embargo subsiste a intenção<br />

credor, em hasta pubiica, a pessoa cujo dominio se transfere é o tradente<br />

e o juiz seu representante legal." Lob. Ecx. § 436, 441 e 442.<br />

(36) Vinnio. Com. ao S 40 I. rcr. divis. n. 5; Lobão. Notas a Mello.<br />

L. 3, T. 3 § 10, n. 3. C. do Chile. art. 675.<br />

Titulo nullo: a doação, não insinuada, de valor que excede a taxa da lei.<br />

Contracto prohibido: venda do pai ao filho (Ord. L. 4, T. 12): compra<br />

de bens da testamentaria pelo testamenteiro (Ord. L. 1.. T. 62 g 7); arrematação<br />

em praga pelo juiz ou escrivão (Consolid. das L. C. art. &86 § 7.)<br />

(37) Vinnio. Com. ao § 40. 1. de rer. divis. (2,1). Código do Chile, art. 676.<br />

(38) Fr. 34. D. adq. rer dom. (41,1); C do Chile, art. 676.<br />

(30) Fr. 18, 51". D. adq. rer. dom. iil.1); Vinnio, Cum. ao ait. 5 Io, n. 5.


108 DIREITO<br />

reciproca de transferir e adquirir (40). As relações posteriores<br />

entre as partes nada influem sobre o dominio adquirido. Se<br />

cheg-ão a um accordo quanto ao contractu, aceitando um dos<br />

títulos presuppostos, cessa à questão ; se não é possivel o<br />

accordo, ao aliénante assiste acção pessoal para haver a cousa<br />

ou o seu preço.<br />

C. Pôde o erro consistir em suppôr o aliénante um titulo<br />

que na realidade ou não existe ou é nullo, como se, por exemplo,<br />

dá um objecto em pagamento de divida, pela qual<br />

se julgava, mas effectivamente não era responsável. Nestes<br />

casos o dominio, sem embargo do erro, se transfere; ao aliénante,<br />

porém, fica salvo o direito de haver do adquírente,<br />

por acção pessoal (condido indebiti) a cousa ou o seu valor (41).<br />

§ 47 D. — Modo de se operar a tradição<br />

No facto da tradição a analyse descobre dous factos elementares<br />

: — Da parte do aliénante a entrega (possessionem<br />

vacuam ti adere) ; da do adquirente a apprehensão material da cousa<br />

— a obtenção do poder physico de dispor delia.<br />

A tradição, portanto, em relação ao adquirente, não é<br />

senão a tomada de posse do objecto com consentimento do<br />

aliénante.<br />

D'ahi duas conseqüências :<br />

1? Que só pôde fazer tradição da cousa aquelle que tem<br />

a posse delia. Se o proprietário se acha esbulhado da posse<br />

(40) Fr. 36. D. a-dq. rer. dom. (41,1). Um texto de Ulpiano, (fr.. 18, D.<br />

de reb. cred.), parece dizer o contrario. Os interpretes, como de costume,<br />

imaginão mi! subtilezas para conciliar os dous fragmentos. Vinnio, loc. cit.<br />

n. 5. O Código do Chile (art. 676) aceitou a opinião de Ulpiano. A nós nos<br />

parece preferível a de Juliano (a exarada no nosso texto), sobretudo, no<br />

estado actual do nosso Direito, segundo o qual a tradição só é modo de<br />

adquirir moveis. A conservação do dominio no tradente, dada a hypothèse<br />

figurada, exporia os terceiros que tivessem havido a cousa do adquirente<br />

aos perigos da evicção, o que prejudicaria a segurança das transacções<br />

da vida civil, sem que para isso milite uma razão ponderosa, _ visto como o<br />

direito do tradente fica perfeitamente resguardado com a acção pessoal contra<br />

o adquirente.<br />

(41) D. de Condict. indebiti (12,6); Maynz, § 192; Accarias, n. 226:<br />

Vinnio, Com. ao cit. § 40, n. 3; Doctr. das Acç., § 250. C. C. Francez,<br />

arts. 1.379 e 1.380; Zachar., § 442.<br />

Tem perfeita applicação á espécie a doctrina da nota antecedente. A<br />

acção conãictio indebiti é sempre pessoal.


DÁS COÜSÂS 109<br />

do objecto, evidentemente não pôde pôl o á disposição do adquirente<br />

(42).<br />

2? Que, quanto aos modos de se realisar a tradição, tem<br />

perfeita applicação as regras em outro lugar expostas acerca<br />

da tomada da posse, com consentimento do possuidor anterior<br />

(43).<br />

§ 48 II — Transa ipção e seus effeitos<br />

A transcripção, em substancia, não é senão a tradição<br />

sohmne do immovel alienado (44).<br />

Antes pois de preenchida a formalidade da transcripção<br />

do titulo de transmissão, o domínio sobre immoveis não passa<br />

do aliénante para o adquirente (45).<br />

(42) Vinnio, Com. ao cit. >% 40 da I. de rer. dev. n. 2; Maynz, § 192;<br />

Accarias, n. 227. Mas o proprietário, que está esbulhado da posse do objecto,<br />

pôde ceder a outrern a acção de reivindicação, e como a transferencia<br />

da acção não carece de tradição, com ella passa ao cessionário o<br />

direito real de haver a cousa do poder de quem quer que injustamente a<br />

detenha. Fr. 35, § 4. D. contrahendo emption, (18,13; fr. 15 D. de reg.<br />

juris (50,17): "Qui actionem habet ad rem recuperandam, ipsam rem habere<br />

videtur. Fr. 204, D. idem. Minus est habere actionem quam rem. Não ha<br />

contradicção entre esses dous textos. O primeiro exprime uma verdade de<br />

direito: quem tern a acção tem a cousa que é objecto delia. O segundo exprime<br />

uma verdade de facto: quem tem a acção, mas ainda não possue a<br />

cousa, está em peior condição, porque tem de sustentar uma demanda para<br />

haver a cousa, objecto da acção.<br />

(43) Vej. acima § 10, n. 2.<br />

(44)- Lei n. 1.237, de 24 de Setembro de 1864, art. 8, e Décret, n. 3.453<br />

de 26 de Abril de 1865, art. 256.<br />

E' de notar que a citada Lei creou a transcripção para servir de base<br />

ao regimen hypothecario, e consequentemente declara que ella só se entende<br />

com "a transmissão de immoveis susceptíveis de hypotheca."<br />

Mas segundo a mesma lei, são susceptíveis de hypotheca todos os immoveis<br />

corporeos (art. 2 o § I o e 4 o ). Ora todos os immoveis corporeos<br />

também são susceptíveis de domínio. Dizer, pois, que só fica sujeita á<br />

transcripção a transmissão dos immoveis susceptíveis de hypotheca é o<br />

mesmo que dizer que fica sujeita á dita formalidade a transmissão dos immoveis<br />

corporeos que podem ser objecto do dominio. A transcripção, portanto,<br />

tem a generalidade que no texto se lhe dá.<br />

(45) Lei, cit. art. 8; Décret, art. 257. O principio firmado se acha<br />

consagrado aa quelles artigos de uma maneira que exclue toda duvida.


110 '. DIREITO<br />

Deste principio résultât) os corollarios seguintes que<br />

são outras tautas regras fundamentaes do nosso Direito :<br />

1. Até a transcripção, o aliénante é considerado senhor<br />

do iinraovel e como tal retém todos os direitos que constituem<br />

o dominio, como o de alienar, instituir onus reaes. ce-<br />

A lei si' exprime assim: "A transmissão."... não opéra «eus effeitos<br />

a respeito rir terceiro, senão pela transcripção e desde a data delia" (art S<br />

Décret, art. 67).<br />

A Io; diz. ú respeito de terceiro, um sentido absoluto, sem restricção ou<br />

condição. — quem quer que seja o terceiro. Assim, antes da transcripção,<br />

o adquirente não pôde reivindicar o immovel de terceiro, ou esse terceiro<br />

possua por jusio titulo, ou seja um mero usurpador.<br />

O dominio é um direito absoluto, erga ovines: So não existe cm relação<br />

a terceiro, também não pôde existir entre as proprias partes contractâmes.<br />

Um dominio que só é dominio entre os contractantes, mas que não o é<br />

em relação a terceiros, é uma monstruosidade que répugna á razão.<br />

A lei franceza de 23 de Março de 18'õõ é a este respeito diversa de<br />

nossa: Ella nega os effeitos do dominio. antes do registro do titulo, não<br />

i m relação ã terceiros em absoluto, mas tão somente em relação "á terceiros<br />

que têm direitos sobre o immovel c que os hão conservado de conformidade<br />

com as leis" (art. 3), limitação da qual deriva lógica .e necessariamente<br />

a consequencia que. independentemente de transcripção. o dominio<br />

se transfere em relação á terceiros, "que não têm direitos sobre o<br />

immovel. conservados conforme a lei", como são os usurpadores, os credores<br />

ehirografarios do aliénante, os que não registrarão seus títulos. "Troplony.<br />

os. 151 e 152.<br />

A nossa lei, porém, é absoluta ; declara o dominio insubsistente, em<br />

relação a quaesquer terceiros, antes do registro. Se não ha dominio contra<br />

terceiros, também não o ha entre os contractantes.<br />

Para admittir-se um talpresupposto, fora mister desnaturar o pervertei<br />

i noção de dominio: a lei não o fez nem expressa, nem virtualmente; portanto,<br />

a noção do dominio ha de ser acceita. corno ella o é perante a<br />

sciencia e o Direito.<br />

Cortão todas as duvidas a respeito o Decreto n. 3.453. art. 257 e o Parecer<br />

das commissões de legislação e fazenda do Senado.<br />

"Até a transcripção. os referidos actos são simples contractus gue só<br />

oorigão as partes contractantes". diz o cit. Décret, art. 257.<br />

O contractu por si não importa transferencia de dominio (§ 44, n. 3<br />

acima). Si; pois, o acto de transmissão do immovel, emquanto não é transcriiito,<br />

se considera um simples contractu, â evidente que tal acto não importa<br />

a transferencia de dominio, mesmo entre os próprios contractantes, mas<br />

produz tão somente (lireitos e obrigações pessoaes.<br />

pio Parecer atludido lê-m-se as palavras seguintesj


DAS COUSAS 111<br />

lebrar hypothecas (46). Ü immovel se conserva em seu patrimônio<br />

e fica sujeito ao pagamento de suas dividas (47).<br />

2. O adquirente, emquanto não transcreve o seu titulo,<br />

não pôde validadente dispor do immovel, grava-lo de onus reaes,<br />

ou hvpotheca-lo, nem tão pouco :<br />

"As duas commissões adoptão a transcripção estabelecida na proposição<br />

da câmara dos Deputados, visto como lhes parece evidente a sun<br />

m il idade. "<br />

Porquanto .<br />

1". Essa transcripção não é senão a perfeição da tradição que entre<br />

nós é necessária para operar-se a transmissão do dominío. (Ord. 4,7 pr.) "<br />

(Parecer das commissões reunidas de legislação e fazenda do Senado,<br />

de 19 de Maio de 1864. Annaes do Senado, de 1864, Ses. de 23 de Maio,<br />

vol. I., pag. 48.) Veja Consolid. das I. 'is Civis, art. 531 nota e 534 nola.<br />

A este respeito, a nossa lei adoptou a doctrina dos Códigos da Austria,<br />

Prussia, Baviera e do Chile, art. 686, e sabiamente se af fast ou do systems<br />

da lei franceza de 23 de Marco de 1859, art. 3.<br />

O systema da lei franceza, evidentementi determinado por nimio respeito<br />

ao principio do Cod. Civil'— que o consentimento dos contractantes por si<br />

só é sufficiente para transferir o domínio — mutila e desnatura a essência<br />

do domínio o «lá lugar á grandes e emmaranhadas difficul lades sobre saber,<br />

em différentes hypotheses, qua' p os terceiros á quem o dominio pôde ser<br />

opposto, com ou sem transcripção (Vej. Troplong., Rivière et Huguet).<br />

A doctrina da nossa lei conserva a noção scientifica e legal do dominio,<br />

satisfaz a necessidade de sujeitar a transmissão de dominio a uma fôrma<br />

publica e solemne e evita as difficuldades cia lei franceza, estabelecendo<br />

um principio simples e claro — que antes da transcripção não ha dominio,—<br />

principio diante do qual se esvaem as questões entre adquirentes e terceiros,<br />

que tanto que fazer dão aos escriptores francezes.<br />

(46) Lei art. S e 10 § l". Décret, art. 25*6 e 257.<br />

(47) Se gun Io a lei franceza "la transcription m trouve sa place Que<br />

dans tin conflit de droits réels." Troplong., n. 146. Assim que o direito do<br />

comprador, mesmo sern transcripção, exclue os credores chirografarios do<br />

aliénante, pela razão que, taes credores não têm direitos reaes sobre o immovel<br />

vendido, o portanto não entrão na ciasse dos terceiros, aos quaes<br />

os effeitos cia transmissão não podem ser oppostos, na falta de registro, isto<br />

é, "aux tiers qui ont des droits sur l'immeuble et qui les ont conservé en<br />

se conformant aux lois."<br />

Entre nós ^om a transcripção não ha transferencia de dominio: o immovel,<br />

pois, continua a permanecer no patrimônio do aliénante c fica sujeito<br />

ás suas dividas.


m<br />

DIREITO<br />

a) Reivindica­lo do poder de quem quer que o detenha<br />

com ou sem titulo, em boa ou má fé (48);<br />

b) Ou repellir com excepção de domínio as acções reaes,<br />

as penhoras, arrestos e sequestros, promovidos por terceiros (49).<br />

A posição do adquirente é muito cla^a.<br />

Só adquire o dominio com a transcripção ; antes delia<br />

não tem dominio : — é, portanto, um mero credor do aliénante,<br />

contra o qual só lhe compete acção pessoal para obrig­a­lo ou a<br />

entregar o immovel, ou a indemnisar perdas e damnos, nem<br />

tam pouco pôde invocar a acção de revindicação contra terceiros.<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 856 — O registro de immoveis comprehende:<br />

I — A transcripção dos títulos de transmissão da propriedade. —<br />

530, I, 531.<br />

II — A transcripção dos títulos enumerados no artigo 532.<br />

III — A transcripção dos títulos constitutivos de onus reaes sobre cousas<br />

alheias. — 676, 697, 796.<br />

IV — A inscripção das hypothecas. — 831<br />

Art. 857 — 8e o titulo de transmissão fôr gratuito, poderá ser promovida<br />

a transcripção:<br />

I ■— Pelo próprio adquirente.<br />

II — Por quem de direito o represente.<br />

III — Pelo próprio trans fer ente, com, prova da acceitação do beneficiado.<br />

Art. 858 — A transcripção do titulo de transmissão do dominio ãirecto<br />

aproveita ao titular do dominio util, e vice­versa.<br />

Art. 859 — Presume­se pertencer o direito real á pessoa, em cujo nome<br />

se inscreveu ou transcreveu.<br />

Art. 860 — Se o teor do registro de immoveis não exprimir a verdade, poderá<br />

o prejudicado reclamar que se rectifique. — 967.<br />

Paragrapho único. Emquanto se não transcrever o titulo de transmissão,<br />

o aliénante continua a ser havido como dono do immovel e responde pelos<br />

seus encargos. — &33.<br />

(48) Lei, cit. art. 8, Décret. 256 e 257. O adquirente, antes ãa transcripção,<br />

se acha no mesmo estado em que o comprador de cousa movei antes<br />

da tradição: ainda não adquirio dominio, não pode^, pois, reivindica­lo nem<br />

allega­lo contra quem quer que seja. Segundo a lei franceza o adquirente<br />

na circumstancia dita pôde reivindicar o domínio de todo terceiro que não<br />

tem direito real sobre o immovel, conservado em fôrma legal, como é um<br />

usurpador, ou um adquirente de data posterior que não registrou seu título.<br />

(Troplong. n. 151 e 152).<br />

(49) Não pôde, por exemplo, õppor embargos de terceiro senhor; porque<br />

antes da transcripção não tam dominio.


t>ks corxsAS<br />

Art. 861 — Serão feitas as inscripções, ou transcripções no registro correspondente<br />

ao Io g ar onde estiver o immovel. — 831.<br />

Art. S62 — Salvo convenção em conf.ra.iio, incumbem ao adquirente as despezas<br />

de transcripção dos títulos de transmissão da propriedade e ao devedor os<br />

da inscripção, ou transcripção dos onus reaes.<br />

§ 49. — Condições para a efficacia da transcripção<br />

Para que a transcripção produza o effeito de transferir o<br />

domínio, requerem-se alem da observância das formalidades<br />

externas que lhe são peculiares (§ 52), as condições seguintes :<br />

Capacidade no aliénante e capacidade no adquirente, para<br />

transferir e adquirir ;<br />

Titulo legitimo de transferencia.<br />

I. São applicaveis, pelo que respeita a capacidade do<br />

aliénante e do adquirente, as regras expostas acerca da tradição<br />

sob este mesmo aspecto (50).<br />

Se o immovel não pertence ao aliénante, a transcipção<br />

não importa transferencia do domínio, que fica salvo a quem<br />

fôr (51) Mas. se o adquirente está de boa fé e mais tarde o ali-<br />

(50) Vej. § 45, acima<br />

Se depois da venda, mas antes da transcripção, se abre fallencia ao<br />

aliénante, pôde o adquirente validamente transcrever o titulo ? Não, Decr.<br />

art. 134, Troplong, n. 148. Pensavão de maneira contraria Rivière et<br />

Huguet, n. 194.<br />

('51) Lei. art. 8 o , § 4: "A transcripção não induz a prova do domínio,<br />

que fica salvo a quem fôr." Décret., art. 258. A transcripção não é senão<br />

uma tradição solemne; é evidente, pois. que não pôde transferir direito<br />

que não tem ó aliénante: "Nemo plus juris ad alium transferre potest<br />

quam ipse habet. "<br />

No Direito Germânico a transcripção firma o domínio na pessoa do<br />

adquirente, o qua! em relação a terceiros é considerado como legitimo proprietário,<br />

embora o prédio alienado realmente não pertencesse ao aliénante.<br />

São. portanto, tidas por validas as alienações que o adquirente faz a terceiros<br />

que estão em boa fé, bem como a instituição de onus reaes. Todavia,<br />

se alguém se julgar com direito ao immovel vendido, pôde reclamal-o, fazendo<br />

prenotar nos registros a reclamação. 'Se o seu direito afinal triumpha,<br />

o reivindicante chama a si o immovel, mas é sempre obrigado a respeitar<br />

os onus reaes constituídos antes da prenotação. Troplong, n. 20.<br />

Por oceasião dos debates em nossas câmaras sobre o projecto da reforma<br />

hypothecaria, houve quem opinasse pela adopção do systema Germânico.<br />

(Parecer da câmara dos Deputados, de 14 de Agosto de 1854.)<br />

Era uma pretensão temerária e de todo o ponto incompativel com o<br />

ostado e organização da nossa propriedade territorial e com os princípios<br />

fundamentaes do nosso Direito Publico e Privado:<br />

113


1.14 DÏRETTO<br />

1". A nossa propriedade territorial é incerta quanto á sua origem e<br />

quanto aos seus limites. Os títulos de acquisição são pela maior parte vacillantes<br />

e obscuros: entre elles figurão «orno principaes e primários—as<br />

posses, cercadas sempre de diffiouldades e incertezas, peculiares aos seus<br />

requisitos, e a suecessão a titulo universal, sobre tudo a legitima, com as<br />

dubiedades inberentes ao direito hereditário. Estas duas fontes de acquisição<br />

communicão os seus vicios aos outros gêneros de alienação. Dahi.<br />

esse sem numero de esbulhes e usurpações, que diariamente se praticão.<br />

Como, pois. attento este estado de cousas, dar ã transcripção a forca de<br />

purgar de todos os direitos preexistentes e de constituir de uma maneira<br />

absoluta o domínio em favor do adquirente ? Seria converter em modo<br />

legal -de acquisição a peior das espoliações, sem embargo de quaesquer cautelas<br />

que se tomassem.<br />

2 o . A perpetuidade du domínio é uni dogma fundamental do nosso<br />

Direito, expressamente consagrado pela Constituição, (art. 1?9. § 22). O<br />

domínio, uma vez adquirido, não pôde ser expropriado contra a vontade<br />

do dono, senão por motivo de utilidade publica. A transcripção com o effeito<br />

de firmar o domínio de uma maneira absoluta na pessoa do adquirente,<br />

seria em um grande numero de casos uma verdadeira expropriação forçada.<br />

3 o . A adopção do systema allemâo traria a necessidade de crear uma<br />

jurisdicçâo contenciosa, destinada a liquidar o domínio. Cada transcripção<br />

seria um processo com citação dos interessados, provas, discussão e sentença<br />

final. A controvérsia nasceria, não pela provocação das partes, mas<br />

pela intervenção da autoridade, no que haveria profunda inversão das idéas<br />

recebidas acerca da natureza c funeções do poder judiciário. Ainda mais:<br />

a verdade não poderia appareoer em uma discussão, em que não estarião<br />

presentes todos os interessados.<br />

4". Como conciliar a multiplicidade das alienações de immoveis, facilitada<br />

entre nós pela permissão de se dividir indefinidamente a propriedade<br />

immovel. com a lentidão de cada processo que devia preceder á cada<br />

transcripção ?<br />

Na Allemanha. esse pesado systhema se pratica sem grandes difficuldades,<br />

porque se harmonisa com a organização da propriedade. Alli a propriedade<br />

territorial consta, pela maior parte, de grandes domínios e extensas<br />

herdades que pelas substituições e morgados se mantêm perpetuamente<br />

nas famílias: o que tornou possível a liquidação do domínio pela<br />

formação do cadastro. Uma


t>ÀS COUSES US<br />

enaníe vem adquirir o domínio, revalida-se a transferencia<br />

transcripta (52).<br />

II. Se o acto alienatívo do immovel é nullo ou prohibido<br />

por lei, a transcripção se torna ineficaz e o domínio se não<br />

transfere (53).<br />

§ 50. — Actos sujeitos á transcripção<br />

A transcripção tem por fim principal revelar as mutações<br />

da propriedade immovel, por meio de um svstema de publicidade<br />

que põe ao alcance das pessoas que querem contractar<br />

com o proprietário apparente, esclarecimentos e informações<br />

seguras sobre a existência do domínio e dos onus reaes (54) que<br />

por ventura os restringem (55).<br />

Construída sobre este pensamento, a nossa lei só submette<br />

á transcripção *os actos entre vivos de transmissão de<br />

immoveis, por titulo gatuito ou oneroso» (56), no presupposto de<br />

que os ditos actos não estão sujeitos, seguindo o Direito vigente,<br />

a formalidades que de si mesmas" tenhão o gráo de notoriedade<br />

suffi ciente para prevenir as machinações da ma fé. Taes actos<br />

carecião, pois, da publicidade do registro.<br />

Mas as acquisições de immoveis por successão legitima<br />

ou hereditaria, por doações causa mortis, ou por actos judiciários,<br />

não se achão nas mesmas condições : são actos que, ou pela<br />

maneira porque se realizão, ou pelas iormalidades a que dão<br />

lugar, revestem uma certa publicidade, que, no conceito da lei,<br />

tornava dispensável o registro ; e pois fôrão excluidos da necessidade<br />

da transcripção (57).<br />

Entre os actos judiciários, que importão transferencia<br />

de immoveis, e que são dispensados da transcripção, se incluem:<br />

(52) "Quem de evictione tenet actio, eumdem agentem repellit excluiu.<br />

" § 86, adiante.<br />

(.53) Décret, cit., Hit; e 108. Vej; acima § 45 e nota 16.<br />

(04) Sãn i.amhem sujeitas á transcripção, como já se observou, as<br />

instituições de onus reaes. Neste Titulo, porém, só se trata da transcripção<br />

dos actos translatives de immoveis e não das instituições de onus reaes,<br />

que serão expostas nos lugares convenientes.<br />

(55) Vej. § 43 acima.<br />

(56) Lei, ri. 1.237, art. 8, Décret, n. 3.453, art. 256. Lei franceza. de<br />

23 de Março de 1855, art. I o § 1°.<br />

(57) Lei, art. 8. Décret, art. 260.<br />

9


lift<br />

DIREITO<br />

1. As arrematações era praça publica e as adjudicações ;<br />

2. As sentenças proferidas nas acções divisórias (58);<br />

3. As sentenças pelas quaes nos inventários e partilhas<br />

A exclusão dos .o tos d« acquisição causa mortis foi di terminada por<br />

motivos de uma procedência incontestável, os quaes, em substancia são<br />

os seguintes<br />

j. A suecessão legítima ou a testamentaria dão lugai ã uma serie<br />

de actos de grande publicidade.<br />

2. A transcripçãó tem por fim prevenir a­ fraudes do aliénante cm<br />

prejuízo do adquirente^ fraudes que sõ são possíveis no­ actos entn vivos<br />

(Troplong, Privileg., oi. Hypoth Prefac p. lvj.<br />

:; A suecessão transfere o domínio desde o momento da sua abertura<br />

o independentemente de tradição. (L


DAS COUSAS 117<br />

se adjudicão bens de rai'/ aos herdeiros que pagarão dividas<br />

do casal (59), ou em pagamento do que o casal lhes deve (60).<br />

§ 51. - Enumeração dos actos sujeitos á transcripção<br />

Entrão na classe dos «actos entre vivos de transmissão<br />

de immoveis por titulo oneroso ou gratuito*, e portanto são<br />

sujeitos á transmissão :<br />

1. A compra e venda, e a permuta (61) ;<br />

2. A cessão da acção de reivindicação (62) e a do direito<br />

de remir o immovel vendido sob condição resolutiva (63).<br />

3. A dação em pagamento (64).<br />

4- A transacção que tem caracter translativo de propriedade,<br />

como quando uma das partes, para alcançar um accordo<br />

favorável sobre o direito litigioso, cede á outra um immovel<br />

que não fazia objecto da controvérsia (65).<br />

dos confinantes uma porção maior do qu< a que lhe devia tocar, e o obriga<br />

á indemnisai- aos outros o valor correspondente (torna). I. § 4. 5, 6 de offic.<br />

judie. (4,17). Act. de Siza, cap 6 § 3; Alv. de 14 de Dezembro de 1775. § 9, Lei<br />

de 24 de Setembro de 1864, art. 3 5 8. Doctr. das ACQ. nota 618.<br />

(59) Vej. Ordem., n. in:' de 23 de Agosto de 1850, n. 228 de 18 de Setembro<br />

de L8S0 e Av de 25 de janeiro de 18-54.<br />

(60-) Av. n. 190 de 2« de Maio de 1857.<br />

(61) Lei n. 1.237, art. 8; Deer. n. 3.493, art. 259, S 1 e -2.<br />

(Íi2) Fr. 15. D. res', jur. (50.17): "Qui actionem habet ad rem reóuperandam,<br />

ipsam rem habere videtur."<br />

(63) Tal é a venda com a clausula á retro. Ord. L. !. T. 1, pr.<br />

E' verdade que nem a acção de reivindicação, nem o direito de remir<br />

o immovel no caso alludido, são susceptíveis de hypotheca; mas se o cessionário<br />

reivindica ou rime o immovel, a cessão vem a ser para elle o titulo<br />

de acquísição, e corno tal se inclue na classe cios actos translatives de immoveis.<br />

Troplong, n. 5G e 59.<br />

(,•64) Dec., art. 259, 5 3. A dação em pagamento se equipara á venda,<br />

Lobão, Not. a Mello, L. 2, T. 8. S 19, n. 8.<br />

(65) Deer., art. 259, § 7. O objecto directo e immediato da transacção<br />

é sempre um direito litigioso, ou incerto: ella tem por fim fazer cessar o<br />

litígio, a duvida ou incerteza, por via de accordo das partes, as quaes por<br />

mutuas concessões, firmâo e reconhecem um direito preexistente, mas duvidoso.<br />

('Mafceldey, § 470; Lobão, Seg. Linh., nota 299.) Doumolin dizia<br />

que a transacção "est soia iiberatio controvérsia;." Assim, pois, a transacção,<br />

a respeito do direito que faz objecto delia, ê simplesmente d-eclaratoria e<br />

não transiativa de direito. Aquelle, por exemplo, que por transacção fica


ÜS DIREITO<br />

5. A transferencia que o socio faz de um immovel á sociedade<br />

como contingente do fundo social (66).<br />

6. O dote que não é constituído pela mulher, estimado<br />

ou inestimado (67).<br />

7. Às doações {inter vivos) (68) nas quaes se incluem :<br />

a) As que nas convenções antenupciaes um dos dois contrahentes<br />

faz ao outro (69).<br />

com o immovel, objecto do litígio, não o adquire pelo facto da transacção,<br />

mas tão somente pelo facto preexistente que a transacção reconhece e confessa.<br />

Neste caso a transacção. como observa Troplong, se reduz a uma<br />

simples renuncia do interno de demandar: não está portanto sujeita á<br />

transcripção.<br />

.Mas a transacção pôde ser accidentalmente translativa de dominio.<br />

como no caso a que allude o nosso texto, hypothèse em que deve ser registrada.<br />

Troplong, n. 69 e 80.<br />

Lobão sustenta que a transacção importa transmissão de domínio quando<br />

a pane que tinha o objecto em seu poder, o cede a outro. Not. a Mello,<br />

L. 2. T. 8. S 19. n. 17.<br />

O Deer, cit., art. 251>, i 7. diz: ...."transacção da qual resulte doação<br />

ou transmissão do immovel." Cumpre, porém, notar que tia. transacção<br />

nunca resulta doação: a concessão que uma tias partes faz á outra, é<br />

sempre reciproca, isto é, em retribuição do concessão igual. (Zaoh., S 418.)<br />

(66) Deer., art. 259, § ••• A sociedade mercantil constitue uma. pessoa<br />

moral ou jurídica, distincta das pessoas dos sócios; (Rivière, Repet. ; L. 1.<br />

T. 3, 5 1". pag. 61: Consol, das Leis Civis. art. 40. nota): portanto, emquanto<br />

a sociedade subsiste, o«. sócios não têm sobre o fundo social, nora<br />

direito do propriedade, nem do compropriedade: quem tem a, propriedade<br />

é. a sociedade.<br />

(67) Dec. art. 259 í 6. Direito do Dainii., 5 75. A transcripção tem<br />

por fim garantir o marido contra os credores chirografarios do dotador<br />

e contra as alienações o hypothecas que o mesmo dotador poderá fazei"<br />

depois de constituído o doto.. Xãn é mister advertir que so o dote é feito<br />

pela propria mulher, não é possível a aliou;,cão por cila depois do casamento<br />

por lha faltar capacidade legal.<br />

Se o dote é inestimado. ou estimado taxationis causa, e constituído pela<br />

propria mulher, não ha necessidade do transcrevel-o porque não importa<br />

venda; o dominio da mulher renasce, dissolvida a sociedade conjugai. Direito<br />

de Fatnil., § SS.<br />

Não se deve confundir a transcripção do dote estimado,' toda em favor<br />

do marido, com a inscripção da hypotheca legai da mulher casada sobre<br />

os immoveis do marido, pelo seu dote. Veja S 1ST adiante.<br />

(6'8) Deer., art. 259. S 5.<br />

(69) iDireit. de Fam., § 52. A convenção ante-nupcial. pela qual se


DAS COÜSAS 119<br />

b) As que nas ditas convenções são feitas por estranho<br />

á una dos contrahentes (70).<br />

c) A renuncia de direito adquirido em favor de terceiro<br />

(71).<br />

8. Os actos de transmissão de immoveis entre particulares<br />

e o Kstado como pessoa civil (72), quer o Kstado seja<br />

o aliénante, quer o adquirente (73). Ficão, portanto, excluídas<br />

as concessões que o Estado faz no caracter de poder<br />

publico, como as de minas, caminhos de ferro, canaes (74).<br />

9. Os distractos de contractos translativos do dominio<br />

de immoveis (75).<br />

10. As subrogfações de immoveis inalienáveis por outros<br />

immoveis (7t>).<br />

exclue a eommunhão, não carece .­ei transcripta, porque não importa<br />

transmissão de domínio: cada um aos contrahentes retém os SPIÍS bens.<br />

2.<br />

(71) Deer. art. 259. * 8, arg. Ha duas espécies d,­ renuncia: uma exiutctiva<br />

outra translativa de direitos. A primeira se dá quando s< renuncia<br />

um direito ainda uno adquirido, come uma herança não addida, A segunda<br />

é a que tem por objecte um direito adquirido ; c um aeto bilateral que envolve<br />

doaqão >■ que c sujeito á insinuação Ftepert das Ord., T 2 pag. 181,<br />

nula (a); Lobão, Pascicul., T 1. Disserl 3. S 35.) Tal é a renuncia que<br />

um comproprietario faz na parte indivisa que lhe pertence em um immovei.<br />

Este gênero de renuncia e.siá sujeito A transcripção Troplong, n. 93.<br />

(72) Deci . an 2G7.<br />

(73) No Direito francez, s< o Estado é o aliénante, não é mister transcripção,<br />

porque ­se presume que a administração publica é incapaz das fraudes<br />

que o registro é destinado a precaver Troplong, n. 81 A Julgar­se pela<br />

lisura e Ixxi ir, com que a nossa administração procede nos seus contractos<br />

com os particulares, parece que bem avisado andou o legislador brazi<br />

em não aceitar a distineção do Direito francez,<br />

(74) IDecr.. ar! 2(57 ; Troplong cit. n. 81.<br />

(75) Dec;­, art. 259, § 8, arg O distracto é uni novo contractu, pelo quai<br />

desfaz o contracte primitivo: "distractus est ejusdem natura? cujus<br />

est contractus et uterque equiparatui : solemnitas requisita in contractu,<br />

eadem requiritur m contractu." Alternar., Lobão, Notas a Mello, L. 2, T S,<br />

S 19, n 23. Barbosa ad ord L 4 T 48 pi n 7 O distracto de contractu<br />

translative de domínio importa a seu turno transferencia de dominio. isto<br />

é. o dominio que pelo contracto estava Mimado na pessoa do comprado .<br />

\oit.a liara o vendedor.<br />

(7(>) Deer., art. 26$ S 8 arg. Regimento do Dezembargo do Paço, § 40:<br />

Lei de 22 de fíetemb. de 182'8, art. 2 5 I o .


120 DIREITO<br />

Os actos acima mencionados devem ser transcriptos. embora<br />

estejão subordinados a condição suspensiva ou resolutiva<br />

(77).<br />

Certo, emquacto pende a condição suspensiva, não se opera<br />

a transferencia do domínio ; mas uma vez realizada, aquella<br />

condição tem effeito retro;?ctivo (78) : dahi a necessidade da transcripção<br />

para que a retroactividade do effeito não seja uma sorpreza<br />

para o adquirente em boa fé (79).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 531 — Estão sujeitos á transcripção, ••> respectivo registro, os títulos<br />

translativos da propriedade invmovel, por acto entre vivos. — 533, 589,<br />

§ I o , 850, I, 859, S6'0.<br />

Art. 53l2— Serão também transcriptos 8©6, II.<br />

i" — Os julgados, pelos quaes, nas acções divisórias, se puzer termo á inãivisão.<br />

— €31.<br />

II — As sentenças, que, nos inventariou e partilhas, adjudicarem bens<br />

de raiz em pagamento das dividas da herança.<br />

III — A arrematação e as adjudicações em hasta publica.<br />

Art. 533 — Os actos sujeitos á transcripção {arts. 531 e 532) não transferem,<br />

o dom.inio. senão da data em que se transcreverem, {arts, 856. 860",<br />

§ único).<br />

§ 52. •— Formalidades da transcripção<br />

I. Como se fa^ a transcripção. —O titulo que tem de ser<br />

transcripto deve ser apresentado ao official do registro, com<br />

dous extractos de igual teor, contendo os requisitos da transcripção<br />

e assignados pela parte ou seu advogado (80).<br />

(77) Lei, art. 8. § 5; Deer., art. 259 e 27'5.<br />

(78) Fr. 11, § 1", in fine. D. Qui potiores in pignor. (20.4) : Cum enim<br />

semel conditio extitit, perinde habetur ac si illo tempore, quo stipulatio interposita<br />

est, sine eonditione facta esset. Vej. § 177 adiante.<br />

(79) Troplong, n. 54. Na. verdade, segundo a doetrina legal, se o adquirente,<br />

emquanto pende a condição suspensiva, não registra o seu titulo.<br />

fica exposto á ser victima da fraude do vendedor, que poderá, alienar o immovel<br />

ou hypothecal-o a terceiro. Neste caso, o terceiro terá ganho de causa<br />

contra o primeiro adquirente, se transcrever ou inscrever o seu titulo.<br />

(80) Dec. n. 3.4,)3, art. 63 § 1° e 2° e art. 269. Se os extractos são conformes<br />

um com outro o sufficientes. a transcripção se faz por elles. Se forem<br />

insufficientes. o official do registro suppriráas omissões pelo titulo<br />

Deer., art. '55 e 56.


DAS ­COUSAS 121<br />

Antes de proceder á transcripção, o official tomará no<br />

Protocollo (81)a nota da data da apresentação e o numero de ordem,<br />

sob o qual vai o titulo figurar no reg­istro(82), numero que servirá<br />

para firmar a sua prioridade (83).A nota da apresentação e o numero<br />

se reproduzem no titulo (84).<br />

Praticadas estas diligencias preliminares, fará o official<br />

a transcripção. Consiste ella em escrever no Livro das Tramcripções<br />

as cláusulas e requisitos seguintes (85) :<br />

1. O numero de ordem;<br />

2. A data da apresentação;<br />

3. A freguesia em que o iinmovel é situado ;<br />

4. A denominação do immovel, se for rural, a rua e o numero<br />

se urbano :<br />

5. As confrontações e característicos;<br />

6. O nome e domicilio do adquirente ;<br />

7. O nome e domicilio do transmittente;<br />

8. A natureza do titulo de transmissão, se venda, permuta,<br />

etc.<br />

9. A fôrma do titulo e tabellião que o lavrou ;<br />

10. O valor cio contracte) :<br />

. 11. As condições do contracte).<br />

Terminado dest'arte o registro, lançará o official no Pio­<br />

Acerca dos extractos, vej., adiante § 243<br />

(81) O Protocollo é a chave do registro geral, serve para o apontamento<br />

iic todos us títulos apresentados, e determina a quantidade o qualidade de<br />

cada um e a data de apresentação e numero di ordem. Deer., art. 25.<br />

(82) (Deer., art. 4r> e 52.<br />

(83 Deer., art. 46. Prevalece sempre o numero de ordem do Protocollo,<br />

Dec, a ri. 74.<br />

■ si) Deer., art. 52.<br />

(S3) Deer., art. 269 e seus Si. A transcripção propriamente dita consiste<br />

lia cópia integral do.titulo: é a significação grammatical da palavra. O registro<br />

por extracto se denomina na linguagem de Direito — inscripção<br />

íTroplong". Pref. Privii. et Hypoth. pag. XXXVIII) e é o que temos .sob o<br />

nome incorrecto ti


122 DIRETTO<br />

tocoüo a nota de registrado (86), fará no Indicador Meal (87) e no<br />

Pessoal (88) as declarações necessárias, reproduzirá no titulo a<br />

dita nota de registrado (89), e o restituirá á parte com um dos<br />

extractos, numerando e rubricando as folhas de um e de<br />

outro (90).<br />

A permuta ou subrogação de immovel por immovel importa<br />

a transferencia reciproca dedous immoveis : d'ahi a necessidade<br />

de duas transcripções distinctas, com mutua referencia e<br />

sob números seguidos no Protocol!o e no Livro das Transe,n<br />

(91).<br />

E' licito ás partes, sem prejuízo do registro por extracto.<br />

requerer a transcripção do titulo de verbo ad ver bum no livro auxiliar<br />

para esse fim destinado (92).<br />

II. Lugar da transcripção.—O registro deve ser feito em lugar<br />

sabido e determinado, para que os terceiros que pretendem<br />

entrar em relações com o proprietário apparente do immovel possão<br />

com certezajs seg~urança colher os esclarecimentos de que carecem.<br />

E' essa a razão porque a lei prescreve que a transcripção<br />

se faça na comarca dentro de cujos limites se acha situado o immovel<br />

(93). De feito, se a transcripção se pudesse fazer em qualquer<br />

das comarcas do Império, a publicidade, que quer a lei, estaria<br />

de facto annullada.<br />

Do mesmo principio resulta :<br />

Que o titulo, se comprehende a transmissão de dous ou<br />

mais immoveis, sitos em comarcas diversas, deve ser transcripto<br />

no registro de cada uma délias (94).<br />

(86) Deer., art. 5'7 § 1". A nota ê de "registrado no livro tal, numero tal,<br />

pagina tal."<br />

(87) >Deer., art. 57 S 2". O Indicador Real é o repertório de todos os<br />

immoveis que por qualquer titulo entrão nos livros do Registro. Deer., art. 33<br />

(8 i 8) Deer., art. 57 § 3 o . O Indicador Real >'■ o indice alphabetico de todas<br />

as pessoas que activa ou passivamente figurão nos livros do Registro. Art. 34.<br />

(89) iDecr., art. 58. A nota é de "Registrado no livro tal, numero tal,<br />

pagina tal. "<br />

(90) Deer., art. 58. ü outro extracto é archivado, arl 59 e 79.<br />

(91) Peer., art. 281. Uma só transcripção seria, sufficiente. porque dá<br />

noticia das duas transmissões. A subrogação verifica­se no caso de substituição<br />

de immovel inalienável poi outro (dote).<br />

(92) Deer, art. 273.<br />

(93) Deer., art. 277.<br />

(94) Deer., art. 277 e 227.


DAS COÜSAS 123<br />

Que se o immovel alienado abrange partes de duas comarcas<br />

limitrophes, o título deve igualmente ser registrado em<br />

ambas (95) ;<br />

Que a mesma pratica se deve observar no caso de permuta<br />

de Lmmóvel por immovel, situados em comarcas distinctas (96).<br />

III. A quem compeft' promove-la. — A transcripção pode ser<br />

requerida :<br />

a) Pelo adquirente, por seus representantes legaes ou por<br />

seus successores;<br />

b) Pelo próprio aliénante :<br />

ci E finalmente pelas pessoas interessadas, como os credores<br />

do adquirente, o curador fiscal e os administradores damassa<br />

fallida. (97).<br />

IV. Fôrma do titulo para a transcripção. —Os títulos de que<br />

constão os actos translativos de immoveis só são admittidos á<br />

transcripção, quando :<br />

a ) ou revestem a fôrma de instrumentos públicos (98);<br />

b) ou consistem em escriptos particulares (nos casos em<br />

que a lei o pennitte) (99), assignados pelas partes que nelles iigurão,<br />

reconhecidos pelos omciaes do registro, sellados com o<br />

sello devido e acompanhados do conhecimento do imposto de<br />

transmissão de propriedade (100).<br />

Equiparão-se aos ditos títulos os actos authenticos, passados<br />

em paizes estrangeiros, legalisados pelos cônsules brasileiros<br />

e competentemente traduzidos em vulgar (101).<br />

OS) Deer., art 277 e 228.<br />

(96) Troplotig, ii. 133. O adquirente poderia ser illudido se '1" registro<br />

da comarca, onde esiá situado um dos immoveis permutados, não constasse<br />

a transcripção da permuta.<br />

(97) Deer., arts. 268, 234. 66. O adquirente pôde cahir em fallencia antes<br />

ile ter transeripto o seu titulo.<br />

(98) Deer., art. 77 5 I o .<br />

(99) Lei n. 840. cie 15 de Setembro de 1855, art. 11. O escripto particular<br />

deve ser apresentado em duplicata para que um cios exemplares fique archivaao:<br />

arts. 54 e 59.<br />

(100) Deer., art. 77 S 2" .<br />

(101) Deer., art. 77 § 3 o . O acto passado em paiz estrangeiro e legalisado<br />

pelo consul, pôde ser um papel particular como no caso de venda de bens<br />

de raiz de valor inferior á 20


124 DIREITO'<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 334— A transcripção ãatar-se-á do dia em que se apresentar o litulo<br />

ao official cio registro, e este o prenotar no protocollo.<br />

Art. 533 — Sobrevindo fallcncia ou Insolvencía do aliénante entre a prenotação<br />

ão titulo e a sua transcripção por atraso do officiai, ou duvida julgada<br />

improcedente, far-se-á, não obstante, e, transcripção exigida, Que re~<br />

troage, nesse caso, á data da prenotação.<br />

Paragrapho único. 8e} porém, ao tempo da transcripção ainda não estiver<br />

pago o immovel, o aãquirente, 'notificado da fallencia ou insolvencia do alic-\<br />

nante, depositará em juízo o preço. — 108.<br />

§ 53.—Nullíãades da transcripção.<br />

A inobservância de alguma ou algumas das formalidades<br />

especiaes da transcripção pôde acarretar-lhe a uullidade. segundo<br />

a formalidade omittida ou viciada for ou não substancial.<br />

Entrão na definição de formalidades substanciaes aquellas<br />

que são necessárias para que a transcripção satisfaça os intuitos<br />

de sua creação, isto é, aquellas cuja falta torna a transcripção<br />

insufficiente para ministrar os esclarecimentos de que carecem<br />

os que querem contractar com o dono do immovel (102).<br />

Neste sentido são formalidades substanciaes e devem constar<br />

do registro, sob pena de nullidade, as declarações seguintes<br />

(103):<br />

1. A freguesia em que o immovel é situado.<br />

2. As confrontações e característicos,<br />

3. O nome e domicilio do adquirente,<br />

4. ü nome e domicilio do trasmittente ;<br />

5. A natureza do titulo, como se compra ou doação:<br />

6. A fôrma do titulo e o tabellião que o fez;<br />

7. O valor do contraeto (104).<br />

8. As condições do contractu (105).<br />

(102) Como as declarações relativas ã situação


DAS COUS AS 125<br />

A omissão de qualquer destas declarações verifica-se pela<br />

simples iuspecção do registro ; não carece, pois, de prova estranha<br />

(106),<br />

As nullidades alludidas não podem ser relevadas, ainda<br />

que os extractos não contenhão as omissões de que ellas procedem<br />

(107). A razão é clara: os extractos archivam-se e portanto<br />

se subtrahem aos olhos de terceiros que só consultão o registrei.<br />

Depois de terminada a transcripção, não é mais licito ao<br />

official reparar as nullidades oceorridas (108).<br />

Podem invoca-las em seu favor todas as pessoas a quem<br />

a transcripção prejudica, como é f> próprio aliénante, os seus<br />

credores, ou um adquirente posterior, cujo titulo tenha sido<br />

legalmente transcripto (109).<br />

Estas são as nullidades peculiares á transcripção.<br />

Mas é de notar que também tem-lhe inteira applicação<br />

as regras geraes de direito acerca das nullidades dos actos solemnes.<br />

§ 54. — Averbaçõcs: Cancellamento<br />

Depois de feita a transcripção podem oceorrer íactos que<br />

ou a modifiquem ou a tornem de nenhum effeito. E' mister que<br />

esses factos sejão accusados no registro; ao contrario, pela mais<br />

singular das aberrações, a transcripção viria a ser causa dos erros<br />

que ella é destinada a dissipar (110).<br />

D'ahi a necessidade das averbaçõcs :<br />

I. As âverbaçoes são notas apostas á transcripção, destinadas<br />

(pelo que respeita á transferencia de immoveis) (111) a fazer<br />

constar, entre outras, as oceurrencias seguintes:<br />

(106) São de .sua natureza nullidades de pleno direito; mitanto no<br />

systema do Deer., (art. 105 § I o ) carecem di ser declaradas por sentença.<br />

A omissão do numero de ordem não Importa nuHidade porque o que<br />

. ale é o numero do Prot* «<br />

(107) Deer., art. 279.<br />

dO'8) Deer., art. 280. E' a applicação á espécie de um principio geral<br />

de direito.<br />

(109) Deer., art. 280.<br />

(110) Troplong, Transcript n. 213.<br />

(111) Aqui se trata tão somente das averbações relativas ã transe<br />

dos títulos de transmissão de immoveis.


126 DIRglTO<br />

a ) O implemento ou não implemento de condição suspensiva<br />

ou resolutiva (112), pactuada no titulo transcripto (J13). Neste<br />

caso a averba cão se fax á vista da declaração dos interessados<br />

consignada em documento authentico (114), ou em virtude de declaração<br />

approvada pela outra parte, previamente notilicada para<br />

assistirá esta diligencia (115).<br />

b ) A declaração do numero ou números de ordem das<br />

transcripções posteriores, relativas ao mesmo immovel, ou á<br />

partes alienadas destacadamente. Esta averbação é posta ex-officio<br />

pelo official na columna respectiva da transcripção anterior<br />

(116).<br />

As averbações são em geral sujeitas ás formalidades da<br />

propria transcripção ( 117), e devem ser numeradas, datadas e assignadas<br />

pelo official do registro (118).<br />

II. A transcripção, como em outro lugar se disse (§48)<br />

não sana os vicios dos actos, nem dirime as causas que podem<br />

supprimir-lhes a existência.<br />

D'ahi vem que o acto transcripto pôde ser annullado, ou<br />

rescindido (119) ou cessar de existir por virtude de um principio<br />

resolutivo (120). Deixar subsistir nestes casos a transcripção seria<br />

illudir a terceiros com a validade apparente de um acto posteriormente<br />

nulliíicado (121).<br />

Pode ainda acontecer que o acto transcripto seja valido,<br />

mas que seja nulla a transcripção por se ter omitido alguma<br />

das formalidades substanciaes que lhe são peculiares ( § 53 )<br />

(122).<br />

(112) Como no caso da venda á retro.<br />

(113) Lei, art. 8, 5 5; Dorr., art '-'75.<br />

(114) O escripto particular, reconhecido por tabellião, entra na classe<br />

dos documentos authenticos.<br />

(115) Lei. art. 8. S 5; Deer., art: 275.<br />

i i it; i Deer., art. 276.<br />

(117) Deer., art 45. 57. § 1° 5.x. 59 e 60.<br />

(118) Deer., art. 76.<br />

(119) Como na hypothèse de lesão enorme, de restituição de menores.<br />

(120) Como a revogação da doação, a resolução do domínio na propriedade<br />

luluciaria,<br />

• 121) Toploag n. 213.<br />

(122) Deer., art. 108.


hÀS COUSAS 127<br />

Para prevenir taes enganos e ao mesmo tempo tornar o<br />

registro mais completo, creou a lei a providencia de se cancellar a<br />

transcripção, dada qualquer daquellas hypotheses (123).<br />

O cancellamento, ( é em si uma espécie de averbação ) tem<br />

por fim illidir a transcripção e anniquHlar-lhe todos os effeitos.<br />

Um acto de um tal alcance juridico, não pôde ser consummado<br />

por deliberação de uma só das partes, senão de consentimento<br />

de todos os interessados expressado em documento authentico<br />

(124), ou á vista de sentença passada em julgado que pronuncia a<br />

rescisão, resolução ou nullidade do acto transcripto ou da pro<br />

pria transcripção (125).<br />

Têm competência para requerer o cancellamento as pessoas<br />

cujo direito o registro prejudica, como são o aliénante, os<br />

seus successores ou credores (126), ou o adquirente posterior com<br />

titulo valido e regularmente transcripto (127).<br />

Consiste o cancellamento na certidão, escripta na columna<br />

das averbações do livro respectivo, datada e assignada pelo<br />

officiai do registro — de que a transcripção foi cancellada em<br />

virtude de sentença ou de consentimento dos interessados, com<br />

declaração do motivo que a houver determinado ( 128).<br />

No caso do cancellamento ter sido determinado por nullidade<br />

da transcripção e não do acto transcripto, é evidente que<br />

o acto pôde ser submettidò a nova transcripção, a qual só come<br />

cará a produzir os seus effeitos de sua data (129).<br />

O registro indu/- a presumpção legal da validade do acto<br />

transcripto, e essa presumpção não pôde ser destruida senão<br />

pelo cancellamento. Assim que a lei estabelece o principio:<br />

Que. emquanto o registro não for cancellado, produz<br />

(.123) Deer., art. 102—109.<br />

(124) Xoi.i H4_ acima<br />

(125) Deer., art. 105, § 1" e 2 o ; Lei franeeza, de 23 d< Março de 1855.<br />

(12(í) Como se por via da aeçâo Pauliana (Doctr. das Acç., § 106), obtiverão<br />

a revogação da venda feita em fraude da execução, Troplontgr, n. 220.<br />

(127) Deer., art. 104.<br />

(128) Deer., art. 102. Se, depois da transcripção do acto que foi annullado<br />

ou rescindido, houver transmissão do mesmo immovel, não é mister<br />

earn ellar as transcripções posteriores; basta cancellar aquella de que faz<br />

objecto o acto annullado ou rescindido. Troplong, n. 222.<br />

(129) Deer., art. 108.


Í2á DIREITO<br />

todos os eiïeitos leg-aes, ainda que se prove por outra maneira<br />

que o actoestá desfeito, annullado, rescindido, ou resolvido (130)<br />

Mas os effeitos do cancellamento se retrotrahem ao tempo<br />

em que começou de existir a causa que o determinou — nullidade,<br />

rescisão ou resolução (131).<br />

ij 55. — Confiicto entre duas transcripções<br />

W possivel que o dono de um immovel o aliene successivamente<br />

a duas pessoas diversas (132).<br />

Supponha-se que cada um dos adquirentes registre o seu<br />

titulo.<br />

Qual das duas transcripções deve prevalecer para o effeiío<br />

de produzir a transferencia do domínio ?<br />

(130) Deer., art. 106.<br />

Esta disposição do decreto sempre nos pareceu iniqua e sem razão que<br />

lhe colorasse a iniqüidade. Desde que a transcripção não induz prova absoluta<br />

do domínio, que fica salvo a quem fôr, bastava dar-lhe a virtude de<br />

produzir a presumpção de validado do titulo, presumpção porém MUI- pudesse<br />

.ser iludida por qualquer gênero de prova em contrario. Mas não permittir<br />

11 iic a presumpção seja destruída senão polo cancellamento, é um rigor que<br />

o systema da loi não exigia, e que veio derogar praticas o princípios de uma<br />

justiça irrecusável e consagrados pelas mais antigas tradições do Direito.<br />

Assim, as escripturas nullas de pleno direito, como as que não são assignadas<br />

pelas testemunhas, erã repellidas em juizo, independentemente de<br />

sentenças declaratorias da nullidade proferidas em acção ordinária. Hoje<br />

se escripturas


IDAS èotísiS<br />

Esta questão se resolve pelos princípios seguintes:<br />

Prevalece a transcripção que tem em seu favor a prioridade,<br />

isto é, a que e anterior nos números de ordem doProtocollo ^133).<br />

Se, porém, as duas transcripções estiverem sob o mesmo<br />

numero de ordem por terem sido os títulos apresentados ao mesmo<br />

tempo (134), prefere a transcripção dotitulo que formais antigo<br />

em data (135).<br />

(133) Décret, art 46.<br />

(134) "Ao mesmo tempo" quer dizer, das 6 horas da manhã 10 meiod<br />

i e do meio­dia &s 6 da tarde. Décret, art. 48.<br />

(133) l>. cret. ai t. 49. 2 a parte.<br />

Mas se os títulos Li verem a mesma d.na e is ti msei pçtfes se fizerão<br />

ao mesmo tempo, isto é sob i mesmo numero de ordem ?<br />

E' uma difficuldade que a lei não resoh u.<br />

! : imliiin omissa a esti respeito a lei franceza Troplong, n. 192<br />

Brissol es n 43<br />

Rivière (n 203) i T ipl ng (n 194) p opõem a solução de dar triumpho<br />

ao idquirentc i quem üionanti fez tradii Lo i!.> immovel pela regra »<br />

/ia: cawia mélioi < st conditio possidentis, soluQão tanto mais aceitável entr<br />

quanto a consagi i\ i a Ord. T.. 4 T ï 2 no domínio da tradição pui i<br />

Vias se não houvt tradição nem a um nem a outro adquirente ' Rivière<br />

et Huguet deçlarão a questão insoluvel; Troplong aconselha ao juiz que reco]<br />

a .i presumpcões tiradas de certos preliminares da ti inscripção que não<br />

ex stem no systema da nossa lei.<br />

O p incipio da nossa lei ê qu< prevalei s i transcripção do titulo mais ang<br />

■ Parece pois que se s titulos têm a data do mesmo dia o juiz não está<br />

do de Investigar qu : foi i avrado e assignado em primeiro logar.<br />

129


TITULO TERCEIRO<br />

ACQUISIÇÃO DOS FRUCTOS DA COUSA ALHEIA<br />

§ 56.— Noção<br />

1. Os fructos pertencem ao proprietário da cousa que os<br />

produz. Aquelle, pois, que sem consentimento do dono (l)ou sem<br />

um direito preexistente (2) se apropria dos fructos da cousa de<br />

terceiro, é obrigado a restitui-los.<br />

2. Este principio soffre uma notável derogação em favor<br />

do possuidor de boa fé : de direito elle faz seus todos os fructos<br />

que percebe da cousa alheia (3).<br />

3. Os fructos pinam'es se considerão partes da cousa e<br />

lhe seguem a condição juridica, mas desde o momento em que se<br />

separão delia, constituem objectos distinctos, susceptíveis de<br />

receberem destino diverso.<br />

Por consideração á boa fé do possuidor que descança na<br />

convicção de que a cousa lha pertence e como tal a guarda, deíende,<br />

cultiva e melhora (4). a lei lhe attribue a propriedade de<br />

(1) Ha consentimento, por exemplo, no caso da locação, da antichrese,<br />

cio usofructo convencional.<br />

(2) Direito preexistente, como no caso de usofructo por disposição testamentaria,<br />

ou por disposição de lei.<br />

(3) Fr. 28 D. de usur. 22, 1; fr. 25 S 1° D. eodem; fr. 48 D. adq. rer.<br />

dom. 41, 1; ord. L 2, T. 53 § 5. L. 3. T. 66 § I o , T. 86 § 4 verb. "E em caso<br />

ciue o comprador<br />

(4) I. § 35, de rer. divis. 2, 1: Fructus quos percepit, ejus esse pro<br />

cultura et cura. A cultura e guarda, todavia, não são condições necessárias<br />

para o possuidor fazer seus os fructos. Suos... facit, non tantum eos qui<br />

diligentia et opera ejus pervenerunt, sed omnes: fr. 48 D. adq. rer. dom. 41, 1.<br />

10


132<br />

DIREITO<br />

todos os fructos percebidos, tanto dos consumidos como dos<br />

existentes em ser (extantes) sem impor-lhe a obrigação de restituir<br />

o valor (5).<br />

4. Assim que o possuidor de boa fé, pelo que respeita á<br />

percepção dos fructos, é equiparado ao proprietário (6).<br />

(5) Pm.'] Consi ' C rescind cap. 4. n. 47 c 60 Barbosa, Solut. matrim<br />

Pari II ri 18 Moraes L, 6, cap. 10. n. 21. Mello T.. 3 T. 3 5 9 Lobão Mota<br />

to mesmo, loc cit. n. S.<br />

Segundo o Direito Romano, o possuidor de boa fé fazia seus todos >~<br />

fruetos percebidos, mas era obrigado a destituir os extantes I § 35, de rej<br />

üvis. 2 I El ideo si dominus supervenerit et fundum vindièet, de fruetibus<br />

ib (o oonsumptîs agere non potesi C 22 (' de reivindl< 3 32: Certum esl<br />

mal»? fidei possessores omnes fruetus solere praaestan cum ipsa re; bona<br />

fidei ve o extantes posl autem litis contestationem, universos E como os<br />

textos atribuem ao possuidor a propriedade dos extantes, mis ao mesrn i<br />

tempo obriga o no i restitui los maginârão os interpretes diversos systemas<br />

para explicar a natureza de uma tal pfopriedadi<br />

\ escola antiga sustenta que o domínio sobre os fructos extantes ê um<br />

domínio resoluvel (§ 27 acima) qu< ou se torna definitivo pela prescripção<br />

de três annos. ou si resolve pela reivindicação superveniente da cousa<br />

\ iipuii. Com ao cil § 3


DAS COUSAS 133<br />

A citada dispo.sição se funda em uma razão de equidade.<br />

De um lado está o domínio do senhor da cousa ; do outro<br />

a boa fé do possuidor. A lei mantém o dominio, que deixa salvo<br />

a quem de direito, e protege a boa fé do possuidor contra o imprevisto,<br />

adjudicando-lhe os fructos percebidos.<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

.1/7. 528 — Os fructos e mais proãuctos ãa cousa pertencem, ainda quando<br />

separados, ao seu proprietário, salvo se. por motivo juHãico, especial, hou~<br />

verem de caber a oulrem.<br />

§ 57. — Requisito da boa fé.<br />

1. Possuidor de boa fé, para o effeito de fazer seus os<br />

fructos percebidos, se diz aquelle que possue a cousa com a convicção<br />

de proprietário. Essa convicção requer um titulo (7), mas<br />

como o titulo é antes um elemento da boa fé do que uma condição<br />

essencial da acquisição, nada importa que seja vicioso na<br />

fôrma ou tia substancia (8), ou que seja meramente putativo (9).<br />

Em qualquer destes casos, embora inhabil para transferir dominio,<br />

o titulo é sumciente para fundamentar a boa fé, desde que<br />

o possuidor lhe ignore o vicio (10).<br />

2. E' mister que a boa fé subsista no momento em que os<br />

fructos se separão da cousa (11).<br />

U'ahi vem :<br />

Que o herdeiro faz seus os fructos que em boa fé percebe<br />

da cousa que o defunto possuia de má fé (12).<br />

(7) I. § 35 do rer. diviS. 2. 1; Vinnio, Com. ao cit. § 35 n. 4. Accaria^,<br />

n. 250. Zaeai S 201, Dig. Port. P. I. ail. :>72<br />

(8) Zaear. § 201. D. Port. 1>. I. art. ,".72 o 573.<br />

(9) Vin. Com. ao cil. S 35 da I. n. 4. Gtierreiro, Trat. 2, D. 3 cap. 7,<br />

n. 77. Lobão, Not. á Mello T.. 3 T. 3 § 9 n . S. A crença cm titulo quo realmente<br />

nunca oxisiio só suppre » titulo, quando fundada em erro do Cacto<br />

xi usavol. Nisi forte huie nostras opinioni causam dederit justa et probabilis<br />

facti ignorantia. Vin. loc. cit.<br />

A respeito da influencia do vicio do titulo, de fôrma ou de substancia,<br />

sobre a prescripção, vej. adianto í 68; do titulo putativo S cit. 68.<br />

(10) Ord. L. 4. T. 8 S 6 (arg.) I) Port. 1'. 1. art. 573.<br />

ill) Pr 23. S 1". fr. in, fr. 48 § 1" D. adq. rer. dom. 41. 1. Accar. n. 270.<br />

(12) Zaç. § 201.


m DIREITO<br />

Que o successor do possuidor de boa fé não adquire os<br />

fructos que colhe em má fé (13).<br />

.}. A boa fé cessa de existir por qualquer occurrencia que<br />

importe claramente para o possuidor o conhecimento do vicio ou<br />

defeito do titulo (14).<br />

Mas a má fé superveniente não invalida a acquisição dos<br />

fructos percebidos em boa fé (l5).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Irt 510 O possukloi dt hoa i, /. m direito, emqnanto cila iurar aos<br />

fructos percebidos 490. 512.<br />

if/ oil Os fructos pendentes'ao tempo < m que cessai a boa fé devem<br />

sei restituidos, ois de deduzidas as despezas du prodmcção < custeio. D'<br />

mu ser também restituidos •< frwotos colhidos com antecipação.<br />

\ii r '12 — Os fructos nainrac.s , industriães reputam st colhidos < p< , ­<br />

iWyi(/ov logo 'nu ­são separados<br />

Os civis a pulam­st percebidos dia por dia.<br />

1/7. 513 O possuidor de má ft respondi yoi iodos os fructos colhidos<br />

■ percebidos bem como pelos que, por culpa sua. deixou de perceber, desde<br />

o momento < m qut s< constituiu dt má fé; tem direito, porem as despezas<br />

di pi OdlH Ção i eu si' io<br />

Ir/. 514 O possttiãòi di liou h não respondi pela perda ou deterioração<br />

da COUSCl, " Que não dei causa<br />

Irt. 515 o possuidor d< um fé respondi pila perda ou deterioração<br />

da cousu, ainda que ac&identaes salvo se provar qut do nie&mo modo se<br />

teriam dado. estando 'lia nu possi du reivlndîçanU<br />

[ri ">lii o possuidoi dt bôa ft ti m direito a inãt niin.vação das bewifeitorlas<br />

necessárias < iteia bt 11 como. quanto ('••> voluptuarias, se lhe não'<br />

forem pagas, ao dt levantai as, quando pudei sim tetrrmento da. c&usa<br />

Pelo valor das biinieiiuiais neces irías < úteis, pod rá exercei o direito de<br />

nt, ui.no 63, 1566 1 II<br />

Art. ">17 .Io possuidor de mu i, serão resarciãas sómt itt /s tu m ft il:><br />

iins utii ssm as. mflS nua lin as­.isl, n direito d' CtCTlção pela m lio', I a ne !■<br />

destas ni iu o d, levantar as voluptuarias. — 63.<br />

1// 5 1 N 1 v in m I, ■! oi ias t oui/li n su m ­ st com os dan IIOS < ••" ainn/ai'<br />

ao resaroimento, st ao tempo da evicção ainda existirem.<br />

Ari. 518 ­O ren.mdii anií obrigado a indemnisai­ as bemfeitorias. tem<br />

direito d, optai iiitii. o sin valor art uai i o si u insli.<br />

i ! ! i \ nia a li h !• di'nt,<br />

( 14) Lobão !• as< icul l )iss< rf 4 S 21.<br />

v litis pontes! i< H> nem sempre induz m í< r.ob N H VIelIo I. ;<br />

T. 3 S 9. n. 9.<br />

(16) Ord. i. 3 T f)i­. ^ i I. ijiii i n nus ruetos pôde julgai aqui Io<br />

que acereseeu depois da lide ao itestada em diante


DAS COÜSAS 135<br />

$ 58.-— Separação dos fructos<br />

1. O possuidor de boa fé adquire a propriedade dos fructos<br />

desde que elles se separão da consa, quer por acto seu, quer<br />

por facto meramente casual (16).<br />

2. R' isto uma conseqüência da posséda cotisa- Kssa posse<br />

subsiste com o mesmo titulo sobre os fructos separados (17).<br />

Pelo que respeita, pois, aos iructos desprehendidos, não ha<br />

necessidade de nova apprehensão. A mesma doutrina e pela mesma<br />

razão prevalece em relação ao emphyteuta e ao credor antichresista,<br />

sob cuja posse lição os immoveis sujeitos áquelles direitos<br />

reaes (18).<br />

3. Mas o usoíructuario, o arrendatário, e todos os demais<br />

que sem ter a. posse da cousa, todavia, têm o direito de perceber-lhe<br />

os fructos, não os adquirem para si senão pela percepção<br />

propriamente dita, isto e, pela apprehensão realizada por<br />

acto pessoal, ou por via de representante (19). Nestes casos ha<br />

em substancia uma alienação dos iructos por parte do proprietário<br />

da cousa, e a acquisição depende da tradição que -se realiza<br />

pela apprehensão (20).<br />

• llii. notáveis differenças entre a posse para ,i acquisição dos fructos


TITULO QUARTO<br />

PRESCRIPÇÃO ACOUlSlTlVA<br />

§ 59.— Noção­ geral<br />

1. Ha dous gêneros de prescripção : a acquisitiva {//>­//, apió)<br />

e a iibei tiloria ou extinetiva (1). Tanto a primeira como a segunda<br />

contém em si o principio extiuctivo, donde lhes vem a<br />

denominação commum (2) ; mas uma se distingue da outra por<br />

seu objecto, condições e etïeitos.<br />

2. A acquisitive, tem por objecto o domínio e os direitos<br />

reaes (jura in re aliena)^), presuppòe como condição a posse ; é ao<br />

mesmo tempo causa de acquisição e de extineção de direitos. No<br />

seu modo de actuar predomina a força geradora ; a extineção vem<br />

por via de conseqüência ; o proprietário perde o domínio porque<br />

o adquire o possuidor (4). A lei toma­a pelo seu lado positivo,con­<br />

(1) Mackekley, S 290 ; Maynz, * 148 e L98; Zacar., 5 209; Rocha, S 454.<br />

Savigny (Tract, vol. 4, S 177; vol. ■">. 5 237) eondemna esta classificação<br />

por falsa e errônea. Certo a dita classificação tomada em sentido absoluto,<br />

com referencia aõ Direito Romano, pôde dar lugar aos erros e perigos<br />

que Savigny prevê; mas entendida em termos hábeis, é exaéta e se coaduna<br />

com as doctrinas do Direito .Moderno Acerca deste assumpto.<br />

(2) A palavra — príescrtptio — designava no Direito Romano a extmcção<br />

das acções, reaes ou pessoaes, por falta de exercício do direito durante<br />

um certo prazo; mas como a usucapião (prescripção aquisitiva), ao mesmo<br />

tempo que opéra a acquisição do domínio em favor do possuidor, extingue­o<br />

em relação ao proprietário, dahi vein o dar­se­lhe também a denominação de<br />

prescripção, rei prœscriptio, rem prsescribere. Savigny, cit vol. 4. S 177.<br />

(3) Todos os direitos reaes, salvo a hypotheca, o penhor e a antiehrese,<br />

se podem adquirir por prescripção.<br />

(!) Kant Metaph. do Dir., 5 33: "A extineção não deve ser considerada<br />

senão como conseqüência da usucapião'.'"


13fr DIREITO<br />

sidera-a modo de acquisição e sob este aspecto a regula, marca-lhe<br />

as condições e define-lhe os effeitos (5).<br />

3. A eitinctira é negativa ; nasce da inércia, e tem por<br />

effeito dissolver a obrigação paralysando de-t'arte o direito correlato<br />

(6) : não gera direitos. D'ahi dous corollarios :<br />

I. Nunca pôde tomar a forma de acção :<br />

II. Mas reveste sempre a natureza de excepçao, peremptória<br />

da acção (7).<br />

§ 60. — Fundamentos da prescripção acquisitiva.<br />

A acquisição do domínio por via da prescripção se consuma<br />

á custa de uma perda imposta ao proprietário. Esta pratica<br />

(5) A lei deixa em silencio o iprincipio extinctive) da usucapião. Assim<br />

nas questões de prescripção acquisitiva nunca se indaga se está ou não extineto<br />

o direito do proprietário, mas tão somente se estão preenchidas em favor<br />

do possuidor as condições legaes da prescripção acquisitiva: se sim, opera-se<br />

a acquisição em proveito do prescribente, ficando, ipso facto, extineto o<br />

direito do proprietário.<br />

(6) A prescripção que hoje se denomina extinetiva, no systema do Direito<br />

Romano, só se applicava á Acções; reputava-se extineta toda acção<br />

real ou pessoal, que não era intentada dentro do prazo legal. Neste sentido<br />

a prescripção (exceptio aut prsescriptio temporalis) era a excepçao com que<br />

o réo repellia a acção real ou pessoal extineta por não ter sido intentada em<br />

tempo.


DAS COUSAS 139<br />

sa he fora das regras fundamentaes do Direito : mas é determinada<br />

por imperiosos motivos de utilidade publica.<br />

1. O dominio e os direitos reaes (jura in re aliena) estão sujeitos<br />

a incertezas e vacillacões, resultantes já das dificuldades<br />

de prova, já de VÍCIOS desconhecidos, de que são susceptíveis os<br />

diversos modos de acquisição : contingências ta es collocão o proprietário<br />

sob a ameaça de evicções imprevistas.<br />

No interesse, pois, de tirará propriedade o caracter de provisória<br />

e de dar-lhe estabilidade e segurança, cumpria circumscrever<br />

aquellas incertezas dentro de um certo período de tempo :<br />

d'ahi a necessidade que o direito de propriedade, exercido francamente<br />

dentro de um prazo prefixado e mediante certas condições,<br />

se considerasse peremptoriamente consolidado e garantido<br />

contra as reivindicações fundadas em causas anteriores á posse.<br />

Acabar com as incertezas da propriedade, eis pois, a razão<br />

final da prescripção acquísitiva (8). Ella o couseg-ue de dous<br />

modos. Em alguns casos não faz senão confirmar simplesmente<br />

as transferencias de dominio preexistentes, supprindo a falta de<br />

prova (9). Neste aspecto é perfeitamente legitima e em uada répugna<br />

ao Direito. Na maioria dos casos, porém, tem por missão<br />

sanar os defeitos dos modos de acquisição e nesse caracter se converte<br />

em causa geradora de direitos (10)*<br />

como parte integrante riu Direito ãas obrigações, ao qual se liga intimamente<br />

como um dos modos de extineção dos direitos<br />

(8) Gaio, Inst. Comm. II. § 44: Quod ideo receptum videtui ne rèrum<br />

tiominia diutius in inserto essent. Pr. 1" D


14'0 niKiïiTo<br />

2. A negligenciado proprietário não é propriamente uma<br />

razão determinante da prescripção acquisitiva, mas intervém<br />

como uma consideração moral de grande valor para pô-la sob uma<br />

luz mais favorável, tirando-lhe o caracter espoliativo que á primeira<br />

vista se lhe attribue (11).<br />

Com effeito, antes de consumada a prescripção, subsistem<br />

em pleno vigor os direitos do proprietário ; pôde elle faze-los<br />

valer pelas acções competentes : pôde ainda salva-los pela interrupção<br />

(12) ; tudo depende de sua liberdade. Se se conserva ua<br />

inércia e deixa correr o prazo que a lei lhe concede, a culpa é<br />

sua : o direito não lhe foi violentamente arrebatado, mas por sua<br />

negligencia permittiu que lhe fosse tirado (13).Ha, sem duvida,<br />

em obriga-lo a obrar dentro do prazo marcado, uma certa coacção<br />

; mas é um sacrifício que o bem geral impõe ao interesse<br />

particular. (14)<br />

3. No campo da controvérsia philosophica ha quem conteste<br />

a legitimidade da prescripção.<br />

Mas, como quer que seja, ella estabelece a firmeza da<br />

propriedade, libertando-a de reivindicações inesperadas, corta<br />

pela raiz um g-rande numero de pleitos, planta a paz e a tranquillidade<br />

na vida social : tem a approvação dos séculos e o consenso<br />

unanime dos povos antig-os e modernos (15). Uma instituição<br />

desta natureza assenta necessariamente em fundamentos sólidos<br />

e profundos.<br />

(11) Ptxna negligently phrase que como observa Savigny, não quer<br />

dizer — que a lei teve cm mente punii com a prescripção " negligencia cio<br />

proprietário, mas significa que aquelle que perde o direito por não tel-o exercido,<br />

soffn uma conseqüência da sua < ulpa<br />

(12) Ve.i. adiante S 74.<br />

(13) Gaio, I. Com. II, S 44: (.'um sufficeret domino ad inquirendam rem<br />

.suam anriî aut bienni spatium, quod tempus ad usucaipionem possessor] trj<br />

butum est Pi l !> de usurp il ; Cum sufficeret dominis ad inquirendas<br />

res suas statuti temporis spatium. l-'r. _\s \ S 50, 1G: \'ix est ut non videatur<br />

alienare qui patitur usucapi.<br />

(14) Saviginy vol 4 S 177.<br />

Querem alguns que a prescripção tenha por fundamento a presumpção<br />

de abandono (derelictio) deduzida da inércia do proprietário durante o prazo<br />

legal. Grot. L. 2, cap. 4, § 7: Kant § 33, Hegel, S (>4. Esta suppo^içao é insustentável<br />

Se a derelicção fosse- a causa da prescripção é evidente que i<br />

prescripção desappareceria, resolvendo-se nà oecupação<br />

(15) Cassiodoro (Variai L 5 cap. 37) a denominou "humano


DAS COUSAS Ï41<br />

§ 61.— Definição ãa prescripção acqidsitiva,<br />

1. A prescripção acquisitiva (usucapio) é mcontestadamente<br />

um modo particular de adquirir o domínio. Era verdade ella créa<br />

para o prescribente direitos que não preexistião no seu patrimônio.<br />

Se esses direitos pudessem ser attribuidos a outra caus.i<br />

geradora, como á oceupação, testamento, ou tradição ; a prescripção<br />

ficaria sem objecto, porquanto o seu officio é exactamente<br />

o de supprir a omissão ou


142 DÍKEITO<br />

b) O usofructo. o uso, a habitação e a emphvteuse (19);<br />

c) As servidões reaes (20).<br />

Vê-se, pois, que só pôde ser objecto da preseripção o direito<br />

real, isto e. o direito que vincula directamente a cousa corporéa.<br />

A razão é clara : a preseripção acquisitíva requer como<br />

elemento essencial a posse ou a quasi posse (21), factos que só são<br />

possíveis ou em relação ás cousas corporeas, ou em relação aos<br />

direitos reaes sobre a cousa corporea (22).<br />

Não basta que o direito seja em si prescriptive! : é ainda<br />

mister que a cousa corporea a que se refere possa também ser<br />

prescripta (23). Que importa que alguém, por exemplo, pratique<br />

actos de senhor e possuidor sobre um immovel do uso publico, se<br />

nunca lhe adquirirá o domínio ?<br />

2. São em regra susceptíveis de serem prescriptas, todas<br />

as cousas que não estão fora do commercio (24).<br />

Estão fora do commercio. e portanto não se adquirem por<br />

preseripção :<br />

1". A& cousas sagradas, como os templos, as imagens<br />

(25).<br />

2? As cousas religiosas, como os cemitérios (2b).<br />

3 o . As cousas do domínio publico (27). como os portos, os<br />

rios navegáveis, as ruas. praças e estradas publicas (28): os pateos<br />

e baldios dos municípios e parochias (29); as que são directamente<br />

empregadas pelo Estado em serviço de utilidade geral,<br />

como as fortalezas e as praças de guerra (30).<br />

(19) Vej. adiante, S 95, u. 3 e 146.<br />

(20) Vej. adiante, § 133, n. 5.<br />

(.21) Vej. a nota seguinte.<br />

(22) Vej. acima. § li e 16.<br />

(23) A preseripção não é do direito m abstracto, mas do direito eoncretisado<br />

na cousa. Mourlon, L. 3 T. 20. n. 17.6'3<br />

i24) Vej. § 6 acima.<br />

(25) Nota seguinte.<br />

(26) i'Y 9 D. de usurp., 41,3. Lobão Xotas a Mello. L. 3, T 1. § A<br />

n. I o e § 6.<br />

(27) Consol. das !.. Civis, art. -52. s 1.".<br />

(28) Fr. 9. D. de usurp.. 41,3; Lobão, Not a M-ello I. 3, T. I" ? 8, n. .17.<br />

(29) Pr. 9 D. cit. Lobão, Not. a Miello, L. 3. T. I", 5 8, n. 30, 37 e seguintes.<br />

Sobre pastos e logradouros públicos. Vej. a ord. L. 4. T. 43, 5 12<br />

e 15; Lei n. 601 de 18 de. Setemb. de 1850, an. 5 § -I.<br />

(30-) Vej. Mourlon, J... 3, T. 20. n. 1763, 1"


is COUSÀS 143<br />

Não entrao nesta classe e podem ser preseriptas as cousas<br />

do domínio do Estado, isto é, aquellas acerca das quaes o Estado<br />

é considerado como simples proprietário (31) : taes como as terras<br />

devolutás,as ilhas formadas nos mares territoriaes, os bens em<br />

que succède na falta de herdeiros legaesdo defunto.<br />

3. Ha todavia cousas que, supposto sujeitas ao commercio,<br />

não podem ser preseriptas. a saber :<br />

1. Os bens pertencentes aos impubères, durante a impuberclade<br />

(32).<br />

2 O pecúlio adventicio do .filho­família­, emquanto dura<br />

o pátrio poder (33);<br />

3. Os bens dotaes inalievaveis na constância do matrimônio<br />

(34);<br />

4. Os bens doados pelo marido á concubina antes da dissolução<br />

da sociedade conjugai (35).<br />

§ 63 Diversas espécies de prescripção acquisitiva<br />

1. O requisito da posse continuada por um certo lapso de<br />

tempo, por si só, bastava para pôr termo ás incertezas do domínio.<br />

Mas, ligada tão somente áquelle requisito, a prescripção<br />

acqtiisitrva se converteria, nas mãos da prepotência e da má fé,<br />

em verdadeiro instrumento de espoliação. A necessidade pois de<br />

assenta­la eni uma base moral e de concilia­ia com o respeito<br />

ao direito alheio, fez com que a lei a subordinasse a mais duas<br />

outras condições ­o justo titulo e a boa jè.<br />

(.31) Consol, das !.. Civis, art. 51, 5 2; Rocha, § 86 •■ 81.<br />

A mesma flistinoção se dá relativamente aos bens provineiaes e rnun,eipaes:<br />

lia uns que são próprios das províncias e municipios, e constituem<br />

o seu patrimônio e outros destinados ao uso publico Act Add., art. II. S 4,<br />

ord., !.. i T. 66, ? 11. [,. 1, T. 43, S 12 e L5: Lei de 1° de Oui de 1828,<br />

art 41.4«; Lei a 601, de LS le Setemb de 1850', art.<br />

(32) Mühlenttr.j S 257 e 263 ; Mackeldey, § 291; Mello, 3,4. § 12.<br />

Grande controvérsia a respeito. Mühlenbr . § 263 e 261, not. 7, entende<br />

(Hic contra o impubère não corre prescripção alguma; que contra o menor<br />

corre a extraordinária e não a ordinária;Mackeldey,§ 391, e Boehm., Exerci t.<br />

S4. S 7. sustentão que contra os menores não corre nem a prescripção ordinal],!,<br />

nem a extraordinária opinião adoptada pelo ('. C Franeez, art. i?252.<br />

(33) 5 Vej. 66, nota 8.<br />

(34) Fr. 30 de jur. dot., 5.12; Maynz, S 200.<br />

(35) Ord. 4,66.


144 DIREITO<br />

2. Nem sempre é mister o concurso de todos estes requisitos<br />

: toda prescripção, porém, requer essencialmente a posse<br />

por um lapso de tempo e a boa fé (36).<br />

A necessidade do concurso de todos ou somente de alguns<br />

dos requisitos enumerados varia segundo a condição jurídica dos<br />

Itens (37) e a duração do prazo (38).<br />

D'ahi vem que a prescripção acquisitiva se divide em duas<br />

especies :<br />

I. Prescripção ordinária—-a que se consumma por três, ác/, ou<br />

vinte an nos (nsucapio teu longi temporis prwscriptíó).<br />

II. Prescripção extra ordinária — a que se completa em trinta<br />

ou quarenta annos (longmimi temporis pœscriptio).<br />

A immemorial é antes uma presumpção de acquisição legal,<br />

do que um modo particular de adquirir : constitue uma espécie á<br />

parte (39).<br />

I. — PRESCRIPÇÃO ORDINÁRIA<br />

§ 64 — Requisitos<br />

A.) A prescripção ordinária (de 1res, de/ ou vinte annos)<br />

exige o concurso dos requisitos seguintes :<br />

Cousa hábil,<br />

Posse,<br />

Lapso de tempo,<br />

Justo titulo,<br />

Boa fé (40).<br />

Se fallece algum destes elementos, a prescripção ordinária<br />

mallogra-se, mas em certos casos pôde ser supprida pela extraordinária<br />

(41).<br />

(36) São condições geraes,' communs a toda prescripção<br />

(37) Assim us bens cio domínio do Estado, das Municipalidades e das<br />

igrejas só podem ser adquiridos pela prescripção extraordinária, ri qual dispensa<br />

d requisito do justo titulo. Vej. S adiante.<br />

(38) A posse de trinta annus dispensa o requisito do justo titulo. Vej.<br />

S 70 adiante.<br />

(39) Munlenbruch, 5 265, Mackcldcy, S 297.<br />

(40) Estes requisitos se contém no seguinte conhecido verso:<br />

Res habilis, titulus, fides, possessio, tempus.<br />

(41) Se. por exemplo, se reúnem os demais requisitos, mas falta o<br />

justo titulo, não se verifica a prescripção ordinária; mas bem pôde ella .sei'<br />

supprida pela extraordinária, dado que o lapso de tempo seja sufficiente.


DAS COÜSAS 1.45<br />

§ 65. — Cousa hábil.<br />

B.) Podem­se adquirir por prescripção ordinária todas as<br />

cousas que,não estando fora do commercio,são prescriptiveis (42),<br />

excepto :<br />

1. Os bens cuja venda é prohibida :<br />

a.) ou por lei, (43) como as cousas litigâosas, (44);<br />

b) ou por testamento, como o bem sujeito a lideicommisso<br />

' (45)<br />

2. Os bens dos menores, durante a mcnoridade (46);<br />

3. Os bens adventicios do filho emquanto dura o pátrio<br />

poder (47),<br />

4. Os bens do domínio do Estado (48).<br />

5. Os bens das cidades e villas, e os immoveis das igrejas<br />

e estabelecimentos pios (49).<br />

§ 66. — Posse.<br />

C.) 1. A posse jurídica é a base fundamental de toda prescripção<br />

acquisitive (50) ;mas carece que ella seja adquirida de um<br />

modo justo (51), isto é, que não começriss ou por violência (\i) ou<br />

claudestiuamente(r//7w), ou a titulo pre ario (JtrPfüiio) (52).<br />

(42) \ ( j. § 62 acima.<br />

i43) Fr. 28 D \ S. 50. Hi; te. 12 § 4 i). de publieian. in rem action<br />

6,2 Muhlenbruch. it 261, nota 8 Maynz § 199 nota 9.<br />

(44) Const.. 2. 4. C. d( litig. 3.37; ord. L­. 4 T. 11, M i.ynz > 199. not 10.<br />

(4">) C. 2. C. d< usueap., pro emptore, 7,26 C ! 5 3 C'omm.. do leg.,<br />

i fid< Ecom, 6.43.<br />

(4(i) (' 3 Quib m i objieit, 7,35: Non est ineognitum id temporis quod<br />

m me non etati ti msmissum est. longi temporis prsesi iptioni non imputari:<br />

i i < iinn turn eui ii( incipit quando ad maiorem retatem dominus rei perv<<br />

iH­rii Muhlenh uch g 2(51. nota 7 Vlaynz § 19S : >\ i 13 V T oe1 Pandeel l 4<br />

n. 2:). Mi Ilo ; L § 12<br />

(IT) ('. 1 ('.. rle bonis mate n 6 60; C. 1' (V tit an. except, 7. 40.<br />

(;­ bens adventicios emquanto perdura o pátrio poder são imprescripti­<br />

\ c is Maynz § 200 Mnliu nbru< h ü 21 :<br />

i !S) î 9 I d< Lisui ip. 2 i \\ 18 24, D. usueap 41 3, Mello L. 3. T. I<br />

í 2 ( (i O. Port. I 1 . í. art. 1376.<br />

i KO Novel 9 i ip i Novel. ill. 131 i tp 6 Dig. Port. I'. I. art. 137' , >.<br />

(50) l­'i 25 D. {}:■■ usurp. 41.3: Suie possession usucapio contigen<br />

nun potesl<br />

(•"1) V'ej ^ s nota e S 22 acima.<br />

(.­,:.') Lobão Notas ... .Mello. L. :­, T.*4 5 6, n. 17. Dig Portug P I<br />

•V 1 1352; C c Crane arl !229 l'on art Õ17


14b DIKKITO<br />

2. O vicio da violência continua a subsistir, ainda que â<br />

posse no decurso da sua duração se torne pacifica (53);e, emquanto<br />

não é expurgado, impede a prescripção (54), mas não se transinitte<br />

á posse do terceiro que em boa fé recebe a cousa do esbulhador<br />

(55).<br />

A clandestinidade oceorre quando o adquirente occulta intencionalmente<br />

a tomada de posse daquelle de quem teme contestação<br />

(56). Não cessa de existir pela superveniencia da publicidade<br />

(57).<br />

(53) I. § 2 e S de usucap 2, 6; fr. 4 § (i D. de usurp. 41,3. No Direito<br />

iv.inc.tz o vicio da violência » • xtirpa pela continuação pacifica da posse<br />

C. C. an. 2233, Zacar. § 216.<br />

O emprego de vias de facto para manter a posse pacificamente adquinda,<br />

não a toma violenta: fr. I § 28 D. de vi et vi arm, 43, 16: Sed qui per vim<br />

possessionem suam retinuerit,<br />

: . non vi possidere.<br />

(54) 1. S 3 de usucap. 2. 6. O vicio da violência se expurga, ou quando a<br />

cousa volta ao poder do espoliado e este a restitue ao espoliador, ou quando<br />

consente expressamente na continuação da posse começada por esbulho.<br />

I. cit. § 8.<br />

, (55) As cousas immoveis vi possessce t ws moveis furtados — res furtivas<br />

— segundo o Direito Romano, não podião ser prescriptas nem mesmo<br />

pelo adquiri íé a;­ houvesse cebido do autor do esbulho ou<br />

to. I. cit. S 3; fr. 4. § 22, fr 2.",. D. de usurp. 41,3. Este rigor não<br />

foi acceito pelo Direito Moderno­. De facto a posse do terceiro adquirente não<br />

traz em se o vicio da posse anterior. Por que, pois, negar­lhe a virtude de<br />

produzira ão? Vej. C. C. fr. art. 2233.<br />

(56) ETr. 6 pr. I). de adq. vel amit. pos. 41.2: Ciam possidere eum dicimus<br />

que furtive ingressus est possessionem, ignorante eo quem sibi controversial*]<br />

facturum suspieabatur, ei. faceret, tímebat. Cod. do<br />

Chile, art. Ti:­;.<br />

O possuidor clandestino não pôde prescrever porque sempre se presume<br />

em má fé: elandestinum factum semper prœsumitur dolosum. Merlin, verb.<br />

Prescript. Sect f. § i. ,in. 1.<br />

Savigny (Posse, S 41) sustenta une em Direito Romano a clandestinidade<br />

da posse­ ,'■ totalmente estranha ás questões de propriedade e portanto sem<br />

influencia na prescripção­. Em sentido contrario, porém, prevaleceu a opinião<br />


DAS COHSAS 147<br />

Estes dons vícios são relativos, isto é, só podem ser utilmente<br />

invocados por aquelles contra quem forão commettidos<br />

(58).<br />

3. O titulo precário exclue a intenção de possuir a cousa<br />

como propria (59), e pois torna impossível a prescripção.<br />

A. precariedade, visto que é incompatível com a prescripção,<br />

constitue vicio absoluto : podem invoca­la não só aquelle cuja<br />

confiança foi illudida, como quaesquer terceiros interessados (60).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

l.rt. !!iT ­ Não inãuzem posse os act os de mera permissão ou tolerância.<br />

assim como não autorizam a sua acquisição os actos violentos, ou clandestinos,<br />

senão depois de cessar a violência, ou clandestinidade. ■—■ 489.<br />

Art. 498 — A posse do imm.ovel faz presumir, até prova contraria, a dos<br />

moveis e oojectos que ncllc estiverem.<br />

§ 67. —Lapso de tempo<br />

D.) 1. O lapso de tempo da prescripção ordinária é de<br />

très annos para as cotisas moveis (61) e dez ou vinte para as immoveis:<br />

de dez, se o proprietário e o preseribente residem na<br />

mesma comarca, de vinte, se morão em comarcas différentes<br />

(62).<br />

A presença e a ausência sao determinadas pelo lugar da<br />

residência das pessoas e não pelo lugar da situação do immovel<br />

(63).<br />

(58) Mourlon, loc. cit. n. 182] o 1824.<br />

(59) Voj. § 8, nota 9.<br />

(60)Accarias, n. 214. n. 3, Mourlon, loc. cit. n, 1828.<br />

(61) I. iii'. de usticap. 2.(>; Const, unie C. de usucap. transform. 7,31.<br />

Esta é :i noss;i jurisprudência de tempos immemoriaes. Mello, l>. 3. T. 4.<br />

s 5; Dig. l'on., 1'. i.. art. 1362; Rocha, S 4(>2.<br />

X,. Direito Crancez prevalece a celebre maxima "en lait de meal,le ia<br />

possession vaut titre", isto é. era relação aos moveis a posse induz a<br />

presumpção juris et jure do propriedade. E' de notar que este principio soffre<br />

iiiMs exeepções, a saber, quando o movei vai á mão de terceiro, on por se<br />

ter perdido ou por havei­ sitio furtado, li' uma notável singularidade do Direito<br />

francez. Vej. acima S 4:',. e Z­acarioe, 5 18f6; Mourlon L. 3, T. 20; numero<br />

1.985 e seguintes.<br />

(62) Const. 12 C. de prescript, long­, temp.. 7.83: Const, uni'­. C. de usucap.<br />

transform. 7,31 Novell. 119. cap. 7. Oord. L. 4, T. 3. § I o .<br />

(63) Const. 12. C. de pr.­eseript. longi lemp., 7,33. Saneimus itaque debere<br />

in hujusmodi specie utriusque personne, t.im petentis quam possiden­<br />

11


148<br />

DIRÎÎTTO<br />

Se o prescribente e o proprietário residirão parte do tempo<br />

na mesma comarca e parte em comarcas diversas, duplicão­se os<br />

annos de ausência, isto é, por um anno de presença que falta,<br />

contão­se do us de ausência (64).<br />

tis spectari itomicílium... ütrusque partis domicilio requisito sit expedita<br />

questio pro rebus ubicumque posïtis. Ord. L. 4. T. 3, § l": "E esta demanda<br />

lhe poderá fazei­ atë doz annos cumpridos, se ambos, credor e devedor, erão<br />

moradores em uma comarca. E sendo moradores em desvairadas comarcas,<br />

então lhe poderá ser feita até vinte annos acabados."<br />

Controvertem os interpretes do Direito Romano, se para resolver a questão<br />

da presença ou ausência se deve entender a palavra do texto — ãonúcilium<br />

— no sentido rigoroso de domicilio legal ou de domiciliei de facto, is! ><br />

ë, residência, habitação, pois s< pôde ter o domicilio legal em um lugar e<br />

residir em outro. Pothier sustenta que o ãomicilium do texto se deve tomar<br />

como significando domicilio de facto.<br />

A. nossa lei (ord cit.), usando da palavra moradores resolveu a<br />

questão no sentido da intelligencia dos interpretes que Pothier acompanha.<br />

O verbo morar exprime a idéa de residir, habitar.<br />

A doctrina da cit. ord. dá uni resultado irracional na hypothèse de esta ■<br />

presente o proprietário e ausente o possuidor. Neste caso, o proprietário<br />

sabe do esbulho por estar presente; se não reivindica o immovel, é porque<br />

não quer; a. ausência do possuidor não lhe traz difl'iculdadc peculiar. Nau<br />

ha, pois, razão para o augmento do prazo cm tal caso. Vej. Mmirion. 3,20,<br />

n. 1941.<br />

O Direito francez estabeleci regra diversa, que evita o notado contrasenso.<br />

Segundo o dito Direito u". Civil, art. 2266). é indifférente 0 lugar da<br />

residência do possuidor; considera­se tão somente a residência do proprietário<br />

e a situação do immovel:—o proprietário só se reputa ausente quando<br />

habita ou reside fora da circumscripção ond< é sito o immovel.<br />

Esta regra também não é isenta de dar contrasenso na sua applicação.<br />

A situação do immovel e a residência do proprietário podem estar na mesma<br />

circumscripção, mas a grande distancia; ou em cireumscripções diversas<br />

mas na proximidade uma da outra Xo primeiro caso, o proprietário, a vinte<br />

ou trinta léguas de distancia, se reputa presente; no segundo, embora tenha<br />

0 immovel sob seus Olhos na extrema da divisa, é tido (orno presente.<br />

O principio mais racional reste assumpto, é o do costume de Sedan:<br />

"Çonsidcrão­se presentes os que morão dentro de dez léguas em torno do<br />

immovel;­ ausentes os que morão fora. daquelle raio." \vj. Mourlon, L. :­!,<br />

T. 20. n. 1941, nota 1.<br />

(64) Novell. 119, c. 8; Dig. Port,, I'. I , art. 1&66, C. C. francez, artigos<br />

2265 c 2266; C. do Chile, art. 2.5­08.<br />

Assim, por exemplo: se o proprietário e o possuidor só estiverão presentes<br />

seis annos é miste,­ dobrar os quatro que faltão para completar os de/, que<br />

serião sufficientes a não ter havido ausência,. Neste caso a prescripção sõ<br />

se eonsummaria em quatorze annos, seis entre presentes e oito entre ausentes.


DAS COUSA.S 14


150 DiRRlfO<br />

Pôde o obstáculo provir ou de não ser o tratísmittente senhor<br />

da cousa (a non domino) (67), ou de não ter poder leg"al de<br />

aliena-la (68), ou de erro no modo de acquisição (69);<br />

2. O justo titulo deve ser :<br />

a) Valido, isto 6, passado coin as formalidades externas<br />

substanciaes (70),<br />

b) Certo e real (71),<br />

(67) Pr. 109 D. V. S. 50.16; I. pr. âe usueap. 2.6.<br />

(6S) FY. 109 D. V. s nu pui ivit um q li \ ndidit ius vendendi habere,<br />

pina i oeuratorem tut tutorem ess<<br />

(69) D. pro derelieto, 41,7. Conn» no caso de occupação de cousa que<br />

ci occupante acredita erroneamente ter sido abandonada por seu dono. ou<br />

de tomada de posst de Usado posteriormente revogado por codicillo, ou qu<br />

foi deixado a um e i ntregue a outro por erro de nome. F. 4 D. pro legato, Il S<br />

(70) lia grande controvérsia acerca deste requisito<br />

IS' fora de duvida que o titulo deve revestir as formalidades lega.es es<br />

ternas: assim se O object o doado excede em valor á taxa d.i lei e a doação<br />

não é insinuada deixa ella de constitui) justo titulo para a prescripçãi<br />

D Port. P. 1 m 1-340. G C. ti art. 2267: Mourlon 3,20, n. 1.938.<br />

Si a nullidade provém, não da omissão de formalidades externas mas<br />

de vicio interno, como da incapacidade do transmittente, a questão se resoh '<br />

em uma questão d< boa ou má fé. Se por exemplo o adquirente ignorai i ><br />

estado d< incapacidade do transmittente (ignorantia faoti), a prescripção si<br />

consomma, não obstante a nullidade. Se ao contrario, o possuidor sabia que<br />

o transmittente era menor, mas ignorava que o menor ê por direito incapaz<br />

(ignorantia juris).- neste caso a nullidade embaraça a prescripção. A igno<br />

ninei.i do facto produz a boa fé: a ignorância de direito não. porque nin<br />

guem so presume ignorar a lei. Fi 67, D. d< jur. dot 23,3; fr. 13 § V I). de<br />

usueap 41. 3; fr. 2 5 lã e 10 I), pro emptore. Ois. Port. P. 1. art 1343. Zoa:<br />

* 217. not. 7.<br />

(71) lia também controvérsia acerca da realidade do titulo.<br />

A regra dominant" é que não so admitte titulo que não seja i< al e certo<br />

I. § 11. de usueap. 2.6; C. 4 C. de usueap. pro herede, 7.29: üsucapio no:<br />

prœcedente vero titulo, procedere non potest, c. 4 c. de prœiscript. longi<br />

uni]) 7.33. Lobão Not i. Mello. 3. 4. § 6 n. 3.<br />

lia todavia excepções:—o que se verifica quando a crença ni existência<br />

do justo tiii; o e fundada em erro de facto excusavel, como si o possuidoi<br />

MI. irregoi m mandatário seu de comprar o objeeto e erradamente crê que<br />

«d, executou a sua ordem (fr. n D. pro suo 41.10). ou se recebeu a cousa<br />

em virtude de legado válido, mas posteriormente revogado por codicillo:<br />

(fr. 4 o 9 D. pro legato. Vej. Accar n. 2:14 )<br />

Direito franeez não admitte titulo putativo para a preseripeão Tio<br />

pîong Pies.ript. n 8S8, 889 e 890 Zacar. 5 217 nol ;


DAS COÜSAS 151<br />

c ) Transcriptò no registro geral de comarca, requisito este<br />

tão somente exigido para que possa prevalecer contra as hypothecas<br />

inscriptas, constituídas no mesmo immovel (72).<br />

3. Nos termos expostos constituem justo titulo, entre<br />

outros, os seguintes :<br />

I o . A doação (73) ; o dote (74) ; o legado (75) ,<br />

2". A successão : o que só acontece quando alguém possue<br />

uma cousa pertencente á herança, de que erroneamente se julga<br />

herdeiro (76).<br />

3°. A compra e venda (77), a dação in solutum (78), a<br />

permuta (79) e a transacçao (80).<br />

4°. As sentenças nos juízos divisórios (81), a arrematação<br />

e a adjudicação (82).<br />

4. Não se considerão, portanto, justo titulo para a<br />

prescripção :<br />

(72) Deer. n. 3453 de 245 d» Abril d« 1­865. art. 255 A prescripção fundada<br />

em titulo não registrado pude ser opposta e prevalece contra terceiros*<br />

excepto se fôrem credores per hypothecs inscripta, ou antes só não vale<br />

contra hypothe'ca inscripta. E' de notar une a disposição do cit. art, 255<br />

não entende com a prescripção extraordinária, visto eomo para esta espécie<br />

de prescripção não se requer titulo. Mourlon 1)1. n. 1672. Troplong<br />

Previl. Hyp IV, n. SS3.<br />

(78) I). T. pro donate. 41 6<br />

(74) D. T. pro dole. 41. !i. Verifica­se este titulo quando a cousa dada<br />

em dote ao marido não pertencia ao dotador.<br />

(75) D. T. pro legato, 41, s. O prescribente possue pro legato: ,1",<br />

quando lhe é legada cousa que não pertencia an testador; 2", quando o legado<br />

foi revogado cm codicülo une cia ignorado; '■■ . quando o legado lhe foi entregue<br />

por erro de nome; fr. l I» pro legale<br />

(76) Vr. 33 5 1" l). pro herede Esta hypothèse só se verifica no caso<br />

declarado no nosso texto. Sc o successor possue eomo herdeiro bens qu<<br />

estavão na herança, mas não pertenoião ao defunto, neste caso continua eílt<br />

a posse do defunto e pelo mesmo titulo, portanto, só poderá prescrevei se<br />

o dito titulo for hábil liara isso. Sc o herdeiro possue, corno se fora da herança<br />

cousa que delia não faz parte, possue pro ­suo e não pro herede. Vej<br />

.\la\ n/, § 199, nota 47.<br />

(77) D. T. pro emptore, 41, 4.<br />

(78) Fr. 33 S 3 D. usurp. 41, 3.<br />

(79) Vej. § acima 51.<br />

(80) Vej. § acima 51.<br />

(81) Vej. § acima 50.<br />

(82) Vej. § acima 50.


152 DIREITO<br />

l* 0. As convenções que não são translaticias de dominio,<br />

como alocação, o comrnodato, o deposito (83) :<br />

2 o . Os contractos nullos por defeito de fôrma (84) ;<br />

3 o . Os actos prohibidos por lei (85).<br />

5. O titulo" em virtude do qual começou a posse, se<br />

presume continuar, salvo prova em contrario (86).<br />

§ 69. — Boa jé<br />

F.) 1. Boa fé na materia sujeita é a crença do possuidor<br />

de — que legitimamente lhe pertence cousa sob sua posse (87).<br />

Esta crença é sempre o resultado de erro de facto. O<br />

erro procede da ignorância do vicio ou do obstáculo que impede<br />

a transferencia do dominio, como se a cousa não era do<br />

aliénante ou elle não tinha o poder de aliena-la, e não o sabia<br />

o possuidor (88).<br />

2. O erro de direito nunca pôde servir de fundamento de<br />

boa fé porque «ning-uem se presume ig-norar a lei» (89). O erro<br />

de facto só é acceito quando excusavel, isto é, quando não tem<br />

por causa negligencia culposa (90).<br />

(83) Vej. acima § 8. nota 9.<br />

,(84) Nota 6 acima.<br />

(85) Or. L. 2, T. 53 § 5, Zac. § 219 not Mourlon, 3, 20, n. 1937. Actos<br />

prohibidos, entre outros, os seguintes<br />

I o O pai vender ao filho;<br />

2 o O testamenteiro comprar bens da testamentaria;<br />

3 o O juiz e o escrivão arrematar bens em praça;<br />

4 o O tutor alienar bens do menor sem licença cio juiz.<br />

(86) Merlin, verb. Prescript.<br />

(87) "Bona fides justa opinio nua quis rem alienam tanquam suam<br />

lgnoranter possidet." Boehm. nota 89 ao c. 2 x de prœscript. 2,26 Fr. 109<br />

D. V. S. 50. 16. Cod. do Chile, art. 706.<br />

(88) 'Nota antecedente.<br />

(89) Fr. 4 D. de jur. e fact. ïgnor, 22 6. juris ignorantiam in usucapione<br />

negatur prodesse: facti vero ignorantiam prouesse constai Accarias<br />

n 236 nota (2) Cod. do Chile, art. 706.<br />

(90) Fr. 9 § 2 D. de jur e fact, ignor. 22 6 Maynz § lu:! Mourlon, 120,<br />

n. 1938, Lobão, Fascicui tom. I, Dissert. A, S 7 nota.<br />

O justo titulo é exigido, porque é em regra uma causa excusavel de erro<br />

Com effeito nada de mais natural que julgar-se legitimo senhor aquelle a<br />

quem a cousa é transferida em virtude de acto legal, translaticio da propriedade.<br />

R' ainda por força da mesma consideração que se reputa de má<br />

fé o que possue contra o seu titulo.


DAS COÚSÂS 153<br />

3. As duvidas e apprehensões sobre a legitimidade do<br />

domínio não constituem o possuidor em má ic, porquanto não<br />

excluem de uma maneira absoluta a convicção de proprietário (91).<br />

4. A boa fé se requer assim no começo da posse como<br />

em todo o decurso de sua duração (92). A superveniencia da má<br />

fé, portanto, destroe e anniquila a prescripção que ainda não<br />

esta consummada (93).<br />

5. Boa fé e justo titulo são cousas distinetas (94); mas o<br />

justo titulo estabelece a presumpção da boa fé. D'ahi procede<br />

que na prescripção ordinária, uma \ ez provado o justo titulo, a<br />

boa fé se presume (95).<br />

(91) 1'. Bar-boza, de prescrip., ns 278 280 315, 319 e 320, Zacar. § 217.<br />

E questão muito controvertida: Vej Lob citada Dissertaç<br />

(92) Ord. L, 2. T. 53 ^ ~> : "Porquanto os havemos por constituídos em<br />

mi fé para que nao possâo fazei seus os ditos fruetos, nem prescrevei as<br />

propriedades Oi I I 4. T. 3 5 l": "Salvo st constar da má fé dos sob i<br />

litos porque < >> nenhum tempo poderão prescrever."<br />

O Direito Romano sõ requeria .i boa fé no começo da prescripção Mala<br />

fides superveniens non nocei Vv. 48 5 l D udq. rer. dom 41.1: principio<br />

lue prevaleceu no Direito portuguez anterior .>. promulgação das Oi K<br />

philippinas (Ord Affi L 4 T 4-9 5 3 Manuelin I, 4 T. 33 o 80).<br />

X,i redaeção das Phillipinas introduziu se o prii uno do Direito Ca<br />

nonico que jâ fora ipplicado á prescripção extineth i pela exti ivagante de<br />

D João 111 do 4 de Fevereiro de 1534 (Leão i liei das I Exti P G T 1<br />

Lei D \ ej Mello 3.4 5 8 nol i<br />

\ doctrina do Direito Canonico a respeito consta dos textos seguintes<br />

Synodali judicio difinimus ul nulla vali u


154 DIREIÎO<br />

II. § 70 — Preseripção extraordinária<br />

1. Se a preseripção ürdnuu ut não prevalece no caso<br />

oceurrente por lhe faltar algum dos seus requisitos peculiares<br />

(iusto titulo ou cousa hábil, § 64), pôde ser supprida pela extraordinal<br />

ia, uma vez que O possuidor esteja de boa fé, que a cousa<br />

seja prescriptive! e que a posse tenha durado por trinta<br />

annos (96).<br />

A preseripção extraordinária é portanto subsidiaria da<br />

ordinária.<br />

2. A extraordinária requer, como a ordinária c nos<br />

mesmos termos, a posse e a boa fé (97), mas dispensa o justo titulo<br />

(98). A longa duração da posse é, no conceito da lei, suficiente<br />

para cobrir aquella falta.<br />

3. Adquirem­se pela preseripção extraordinária :<br />

I o . As cousas que o podem ser pela ordinária (99).<br />

2 o . As cousas que, supposto prescript!veis, são todavia<br />

excluídas da catheg­oria das sujeitas a ordinária, como os bens<br />

dos menores pubères, as cousas litig­iosas (100).<br />

4. Esta espécie de preseripção so se çonsumtna no espaço<br />

de tiinta annos, ou se trate de moveis, ou de immoveis<br />

(101).<br />

5. Mas, por excepção, só podem ser prescriptos em<br />

(96) Mühlenbruck, § 2G3 e Maynz, § 20U. Vej. C. T de prescript, trigint..<br />

\ ci quadrag., an. 7,39.<br />

"(97) Const. 8. § 1". (' ut cit.; Oui., i­ ­'. T. 53 S ­ L. 4. T. 3. § 1",<br />

m fuie. \ i j art 450 do C. Commercial.<br />

(98) Cit. Const. 8. S I o . C. prseseript. trigint. vel quadrag., 7.30; Ord.<br />

l .' j l*: E Indo a cousa obrigada a poder do possuidor sem titulo algum,<br />

poder­lhe­ha a demanda ser feita até trinta annus cumpridos." A presumpção<br />

do justo titulo não se ilUde com prova em contrario. Merlin, verb Prsescript.<br />

Sect. 1 ? 5, art 1" n 5 A boa fé ­, presumi nus esta presumpção ced<br />

diante de prova que a exclua.<br />

(9©) Vej. S 155 acima, Isto se verifica no VAS'.' da preseripção ordinária<br />

não prevalecer por falta de titulo<br />

(100) Const 8 § 1 C. prasseript, trig, vel, quadr., an. 7,39; Novella<br />

119, cap 7" V­aeU Funded 4,4, n. 29; Maynz s 200 Mackeldey, § 295;<br />

Mühlenbrui k § W8; Vlello '■ ­l S 12.<br />

(101) C. T. de pnescrip., trig vel quad] an 7 3;>. cul .L. 4. T. 3. § i'\<br />

Mello, L. 3, T. 4, §§ 2 e 6.


DAS COUSAS 155<br />

quarenta annos ON bens do domínio do Estado (102), cidades e<br />

villas, e os immoveis das igrejas e estabelecimentos pios (103).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

DA USUCAPIÃO<br />

.ir/. 650 Aquelle que, por trinta annos, sem interrupção, nem opposU<br />

('m, possuir como seu um immovel, aãquirir-lhe-á o domínio, independentemente<br />

ãe titulo e bôa fé, que, em tal ciso, se presumem : podendo requerer<br />

ao juiz que assim o déchire por sentença, a qual lhe servirá de. titulo para<br />

inscnpção no rei/is/ro de immoveis. — 168, IV.<br />

Irí. 6111 - Se a posse ãa cousu movei se prolongar por dez annos produzirá<br />

usucapião independentemente de titulo ou bôa fé.<br />

l'ara ijrapiw único. As disposições dos artigos B5'2 e 553, são applicaveis<br />

a 'usucapião das cotisas moveis.<br />

III. — REGRAS COMMUNS Á PRESCRIPÇÃO ORDINÁRIA<br />

E Á EXTRA OR DIX ARI A<br />

§ 71. — Como se coula o tempo<br />

1. A prescripção acquisitiva presuppõe aposse por um<br />

certo lapso de tempo (§ 61).<br />

O certo lapso de tempo se conta segundo as regras seguintes:<br />

I a . Por dias civis, isto é, por durações de vinte quatro<br />

horas de meia á meia noite, e não de momento á momento (104);<br />

2 a . Exclue-se do prazo o dia em que começa a posse<br />

(dies a quo) (105) ;<br />

(102) Const. 4 e 5. C. T. eodem; Mello, loc. cit., Dig. Port., P. I,<br />

arl 1376; Mühlenbruck, S 263, n. 5, sustenta que não acha apoio nos textos<br />

.i opinião de que os bens do fisco só prescrevem em 40 annos. Todavia, é<br />

a opinião geralmente aceita.<br />

(.103) Novell., 9 e 111; Novell., 131, cap. 6; C. 23; C. de Sacro-Sanct.<br />

Eccl., L,2; loc., cit.; Dig. Port. I, art. 1376.<br />

(104) Pr. 6, D. de usucap. 41, 3; Mlihlenbruck, S 260, Accarias, n. 237,<br />

D. Port. I, 1361, Rocha S Fr. 8. de feriis, 2, 12: Dies {dia civil) a media nocte<br />

incipit et sequentis noctis media parte finitur. Vej. A. Gellus, Noct. attic.<br />

L. 3 S 2. Dia uai ura] é o espaço de tempo entre o levantar e o pôr-se do so!<br />

1105) Ord. L. 4 T. 3, § 1": us quaes dez e vinte annos, etc Accarias,<br />

U. 237; Rocha S -70.<br />

lia controvérsia entre os commentadores do Direito francez sobre saber<br />

se segundo o art. 2260 do C. C. se deve ou .não contar o primeiro dia. Pela


155 DIREITO<br />

3* O prazo conta-se da data da transcripção do titulo,<br />

quando a prescripção depende desta formalidade (106) ;<br />

4 : ! O ultimo dia, mal começa, é logo havido como .se já<br />

estivesse totalmente passado (107) ;<br />

5 a . Ü prazo é continuo : contão-se os dias como se seguem,<br />

sem deducção dos feriados (108) ;<br />

6 a . Computam-se os mezes como tendo cada um trinta<br />

dias (109) ;<br />

7? Serve de base para o calculo o kalendario greg'oriano<br />

(110).<br />

§ 72. — Accessão de posse<br />

1. Muitas vezes acontece que durante o lapso de tempo<br />

necessário para se consummar a prescripção, a cotisa tenha sitio<br />

possuída por duas ou mais pessoas. Na generalidade destes<br />

casos a lei permitte ao novo possuidor juntar á sua a posse do<br />

antecessor e dest'arte completar o prazo exigido (111). K' o que<br />

em Direito se denomina accessão de posse (accensio possessionis).<br />

Os princípios que regulão este assumpto são diversos,<br />

negativa estão Troplong, Prescript, 2" vol. n. 812; Zacarias, § 2.12, nula 3,<br />

Delvincourt, are. 22(51, MCourlon, n 1924. O C. Civil portuguez manda contar<br />

o primeiro dia, art. 562.<br />

(106) Vej acima 5 6.<br />

(109) Pr. 28, 31 S 22 de /Edil. IMict, 21. 1; Cr. 1! 5 6 D. ad. leg. Jul.<br />

48, 5 Maynz. S 125. n. 2. Vej. Dig. Port. 1. art. L361.<br />

(110) E' o kalendario vigente no Occidente da Europa e entre nCs,<br />

D. P. I. 1361. Vej. Cod. Com. art. 3.^<br />

(111) Fr. 14, § 1" D. do diver, temp, prescript. 11.3, I. 5 12 e 13,<br />

usucap. 2,6. Lobão, Not. a Mello, D. 3, T. 4 § 6, n. 24.


DÂS COüSAS<br />

segundo .i posse é adquirida em virtude de titulo universal ou<br />

singular.<br />

2. Titulo universal. — O herdeiro se reputa continuar a<br />

pessoa do defuneto (112). A posse do defunto passa ao herdeiro<br />

por força da lei (113). A posse do herdeiro vem, pois, a ser a<br />

mesma posse do defunto, continuada na sua pessoa (114).<br />

D'ahi vem :<br />

I o . Que a accessão da posse, fundada em titulo universal,<br />

é obrigatória para o herdeiro (115).<br />

2". Que a posse do defunto se incorpora com todos os<br />

seus vicios e qualidades na posse do herdeiro 1 (116).<br />

3 o . Que, portanto, se a posse do 'defunto era hábil<br />

para a prescripção, persévéra na pessoa do herdeiro com a<br />

mesma virtude (117) : mas se ao successor sobrevem a má fé, não<br />

lhe aproveita a posse do antecessor (118).<br />

4". Que. se a posse do defuneto era viciosa, o vicio se<br />

transmitte á do herdeiro, e. sem embargo delle o ig-uorar, lhe impede<br />

a prescripção (II e )).<br />

3. Titulo singular. — A posse que OÒ suecessores singulares,<br />

como o comprador, o donatário, o arrematante, adquirem,<br />

lhes é pessoal, nasce desligada da posse do aliénante, e, consegumtemente,<br />

extreme dos vicios que a inficionão.<br />

A accessão da posse do antecessor não é pois obrigatória.<br />

Destes principios resultão os corollarios seguintes :<br />

(112) Vej § 12 acima<br />

(113) Vej ci1 § L2 acima<br />

(114) Fr. 30 D quib. ex i au-- maiores 4,6; possessie defuneti quasi<br />

juneta, descendit ad heredem.<br />

(115) Fr. 30 D. eodem: m eadem in heredibus qui in usueapionem succedunt,<br />

servanda sim. Fr. 11 D. de diver temp proscript 44,3: ïamen<br />

apere non poterit quod defunctus mm poiuii. D i'. i art. 1336.<br />

(116) L. 5 12 de usucap 2,6; fr. 2, 5 19 l) pro emptore, 41,4.<br />

(117) 1 S 12 in. cod Diutina possessio quae prodesse cœperat defunheredi...<br />

continuatur.<br />

(118) Esta restricção é uma conseqüência du principio do li Canonico,<br />

transplantado para o nosso Direito (Ord. 1. 2 T. 53 § 5. L. 4 T. 3 § I o .<br />

in fine), segundo o qual a. bôa fé é requerida em todo o decurso do<br />

lapso de tempo.<br />

(119) 1. 5 12 de usucap 2,6: Quod M Hie (defunctus) initiuni justum<br />

nun habuit, heredi... licet ignoranti, possessio non prodest. F. II D. dizei<br />

temp, prescript. 44.3: Cum here» in jus omme defuncti suc-du<br />

ignoratione sua defuncti vitia non excludit.<br />

157


158 "DIREITO<br />

1". O vicio da posse do antecessor não se conrmumca á<br />

pOù.se do successor singular (120), Neste caso a prescripção do<br />

successor começa da sua posse, estando elle de boa fé (121).<br />

2." Se a posse do actual possuidor é de má fé, não lhe<br />

aproveita a do antecessor embora de boa fé (122).<br />

3." Masse a posse do antecessor e ado actual possuidor<br />

são aptas para a prescripção, pôde o novo possuidor juntá­la á<br />

sua para préfacer o lapso de tempo de que carece (123).<br />

3. ° Se a posse do autor só era hábil para a prescripção<br />

extraordinária (12$) e a do successor o é para a ordinária, pode<br />

o successor invocar em seu favor a extraordinária, uma vez que<br />

as duas posses reunidas preenchão o prazo desta espécie de<br />

prescripção (125).<br />

Não e mister diz­er que a accessão tanto no caso da posse<br />

adquirida em virtude de titulo universal, como no da fundada<br />

em titulo singular, requer identidade do animo de possuir :<br />

assim que — ella se tornaria impraticável, se o autor possuísse<br />

como senhor de dominio directo e o successor corno de dominio<br />

util (126).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 552 — o possuidor pôde, paru o fim ã< contar o tempo exigido pelos<br />

artigos antecedentes accrescentai a sua /;oss» a do MU antecessor con<br />

tanto que ambas sejam continuas e /unificas. — 496. 619. S 1.<br />

I;/ 495 i posse transmdtt( •>< con os mesmos caracteres aos herdeiros<br />

< l


Às coUSAS 15«)<br />

§ 73. — Causas que impedem a prescripção.<br />

Impedem a presciipção de rcalisar-se e conseguintemente<br />

a tornão impossível, as causas que excluem de um modo absoluto<br />

algum dos requisitos que não podem ser dispensados. Entrão<br />

nessa dehflição as causas seguintes:<br />

1. A precariedade (1). O titulo/» ecario colloca o possuidor na<br />

obrigação de entregar a cousa, contem em si o reconhecimento<br />

di> direito do proprietário e como tal constitue perpetuo embaraço<br />

á prescripção. Ao possuidor precário são applicaveis as duas<br />

conhecidas regras :<br />

« Ninguém pôde prescrever contra o seu próprio titulo »<br />

í 128).<br />

«A' ninguém é licito mudar o titulo tia sua posse »(129).<br />

Todavia é certo que o vicio da precariedade pode<br />

cessar de existir pela inversão do titulo.<br />

A inversão se opéra de dous modos.<br />

a ) Ou por causa proveniente da pessoa de quem o<br />

possuidor houve a cousa, como se a recebeu a titulo de commodate)<br />

e posteriormente a compra ao commodante, réputando-o<br />

senhor (130)<br />

b ) Ou por causa proveniente de terceiro, como se houve<br />

de um a cousa, a titulo de commodato, e a compra a outro que<br />

reputa ser o verdadeiro dono (131)<br />

Xestes i asos o lapso de tempo para a prescripção só se<br />

começa a coutar da data da inversão do titulo (132).<br />

(127) Wj. $ 8. nota 9, a< ima,<br />

(128) Nemo contra titulum suum usucapere potest Ord. í.. 2 T. 27 § 3.<br />

Mello 3,4 § lo. Vej Merlin verb. Prescript Secl h •§ 6, art 3<br />

(129) Nemo potest sibi mutan i lusam possessionis. \:> S l" D. dp usucap 41 3: idemque Juris erit etïam s, ; a non<br />

domino emerit, cum existimaret eum dominum esse.<br />

(131) ('a n • Si colonus, mortuo lomino emerit fundum ab eo qui existimabai<br />

se heredem ejus vel bonorum possess m esse: incipit pro emptore<br />

possidere.<br />

V'ej. Cod. Civil fr a: i 2238, C. Civii Port. ait. 510<br />

Nos ditos casos não ê o possuidor quo muda o seu titulo, mas sim um<br />

terceiro qu< o inverte. A Gloza Já observava a este respeito: Non sibi<br />

mutare, sed ipsi mutari dicitur causa possessionis<br />

(132) Mourlon, n. 1S50, Cod ( Port., art 510,


Ki O PTTÎKITO<br />

3. A violência e a clandestinidade da posse (133).<br />

3. A superveniencia de má fé (134). A lei requer boa fé<br />

em todo o decurso do lapso de tempo para a prescripção. Se pois<br />

o possuidor, antes de preenchido o prazo, incide em má fé, a<br />

posse fica contaminada de um vicio que a torna impotente para<br />

ycrar a prescripção.<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. ÕÕ;? - As causas qin ol>stam, suspendem, °" 'interrompem u prescripção,<br />

também se applicam «o usucapião (art. filO. S único), assim corno<br />

ao possuidor se estende o disposto qnamto r/o ãei-eãor.<br />

§ 74 Interrupção da prescripção.<br />

1. Dá-se a interrupção da prescripção quando oceorre algum<br />

facto que tem por effeíto eliminar o tempo anteriormente<br />

decorrido, tornando-o inutil para o calculo do prazo leg-al, sem<br />

todavia alterar as condições da posse (135).<br />

A interrupção, pois, só se refere ao passado, e não tem<br />

influencia sobre o futuro: não impede, portanto, o possuidor de<br />

recomeçar a prescripção (136), uma vez que por causa estranha<br />

não venhão a cessar de existir algfum ou alguns dos seus requisitos<br />

(137).<br />

2. Ha duas espécies de interrupção, uma natural, outra<br />

civil (138).<br />

3. 0 elemento fundamental da prescripção, é a yosse<br />

continuada pelo lapso de tempo definido na lei. Assim que a<br />

perda da posse, antes de preenchido o prazo legal, interrompe<br />

(133) D. Port. 1, art, 1357. Vej. acima í; 66.<br />

i 134) Vej. 5 66 acima.<br />

(135) Vlaynz, 5 199, nota 60- Accarias, n. 'l'.\~ : Zacli.. S :íí:i; Lobão.<br />

Not. a Mello, L 3, T. 4, § 10, n. 5.<br />

Acerca da differença entre a interrupção e a suspensão, vej. o í T.">.<br />

adiante.<br />

(136) Pr. ir,. S 2. ]). do usucap., 41,3; fr. 7, § 4. D. proemptore, 41.4.<br />

(137) Se, depois de perder a posse, o prescribente a recobra, mas a esse<br />

tempo incide em má ie por vir a saber que a cousa é alheia, evidentemente<br />

não pôde recomeçar a prescripção. .Vão (• a interrupção que inhibe o começo<br />

da nova prescripção, mas a má te superveniente.<br />

(13S) Mühlenbruch, § ?60; Lobão, loc. cit.


DAS corsAS<br />

a prescripção (139). A este gênero de interrupção denominão cs<br />

escriptores — interrupção natural.<br />

E como a perda da posse se traduz na perda de um dos<br />

elementos essenciaes da prescripção, a interrupção natural tem<br />

um valor absoluto : —pôde ser invocada por quem -quer que nisso<br />

tiver interesse (140).<br />

A interrucção causada pela perda da posse deixa de produzir<br />

effeito, se a posse é recuperada dentro de anno e dia por<br />

via do interdicto competente (141), ou a qualquer tempo pela acção<br />

publiciana (142.!. Xestes casos a posse é considerada como se<br />

nunca fora interrompida.<br />

4. Uma das razões justificativas da prescripção é a inércia<br />

do proprietário, durante o lapso de tempo marcado (143). Se,<br />

pois, o proprietário, antes de terminado aquelle prazo, entra em<br />

actividacle e intenta reivindicar judicialmente o seu direito desapparece<br />

o presuposto da lei : a prescripção se reputa interrompida.<br />

E' a interrupção civil, a qual se opéra:<br />

1/ Pela citação inicial do possuidor para a reivindicação<br />

da cotisa sujeita á prescripção (144).<br />

A citação deixa de ser efficaz para o dito effeito:<br />

(139) Fr. 2. 5. I). de usucap., 41,3; NTaturaüter interrumpitur possessio,<br />

cum quis de possession e vi dejicîtur, \'el aluni res eriptur. Fr. 5,<br />

inf. I), pro donato, 41,6; Mello, !.. 3, T. 4. § lu.<br />

O arresto e a penhora não interrompem a prescripção, porque não<br />

aearretão perda da posse. D. P. 1. art. 1356. Como so perde a posse"<br />

V. acima 5 15.<br />

(1401 Fr. 5. D. do usucap., 41,3: Quo casu non nil reruns cum tantum-<br />


"lo2 DiUiílTO<br />

a ) Se não c fundamentada (145).<br />

1) ) Se é nulla (146);<br />

c) vSe não é accusada emjuixo (147).<br />

d ) Se o possuidor é absolvido da instância (148);<br />

e) Se o autor desiste da acção (149);<br />

f) Se a acção afinal é julgada improcedente (150).<br />

2." Por protesto feito perante autoridade competente contra<br />

o possuidor ausente (151).<br />

A interrupção civil, como se deprehende da sua ra/.ão de<br />

ser— é relativa, isto 6, só aproveita ao seu author e não a terceiros<br />

(152).<br />

C. de an., except. 7,40. Vej Maynz, S L48; Mühlenbruch, S 260, n. 7:<br />

Mackeldc}', S 261.<br />

Tem-se entendido que a disposição do art, 38 do Reg. n. 737, segundo<br />

,i. qual a citação para a conciliação interrompe a préscripção, ê applicavel ás<br />

prescripções acquisitiva e extinetiva do Direito Civil. P. Bapt., Process.,<br />

§ 101. Xesse sentido é o Direito francez, da qual foi tirada a citada disposição.<br />

C". C, art. 22-!.",; c. do Process., art. r>7.<br />

l-:' falsa a opinião dos que pensão que a citação indu/, sempre o possuidor<br />

em má. le. Bem pôde o possuidor, sem embargo dos fundamentos da citação.<br />

continuar, por julgal-os impro< .'dentes, na crença de que a cousa lhe pertence.<br />

1"'. é essa a razão porque o possuidor pode recomeçar a préscripção<br />

depois da. interpellação.<br />

cl 15) Lobão, Xotas a Mello, L. 3, T. 4. $ 10, n. 2. 1".<br />

(146) Lobão, loc. cit.; P. Baptista, Process., S 101. A citação nulla é<br />

como -se não existisse.<br />

Se a ciiacão é para juizo incompetente, interrompe a préscripção? Lo<br />

bão, loc. (ai., n. 2, I". entende que sim. Nesse sentido o C. C. trance/,<br />

artigo 2240.<br />

i 117) Lobão. loc. Cit., n. 2 2".<br />

i 148) Lobão, loc, cit., il, 2, 3 o .<br />

il ID) Lobão, loc. cii.; Cod Process. Dr., art. 40:1.<br />

(150) llcineeio. Recii. L. 2, T. 6, S 447; Mourlon, L. 3. T. 20. n. 1X71.<br />

(151) C. 2.3. C. de an. except. 7.40; Mayna, § 147, nota 22. e 5 190.<br />

nota 66. O protesto deve conter a exposição dos fundamentos do direito.<br />

O fim do protesto ê supprir a citação, que não pôde ser feita a tempo por<br />

estar o possuidor ausente.<br />

(152) Fr. 18. D. de reivindic, 6. 1. Const., 2, C. de ann., except,<br />

7,40; Lobão a -Mello, L. '.',, T. 4, § 10, n. 5.


DAS COUSAS -163<br />

§ 75. — Suspensão<br />

1. A prescripção se diz suspensa quando sobrevem algum<br />

obstáculo que temporariamente a impede, ou de começar (153), ou<br />

de continuar a correr, sem no entanto acarretar perda do tempo<br />

anterior (154), nem modificar as condições da posse (155). Levantado<br />

pois o obstáculo, a prescripção entra a correr de novo, e se<br />

lhe leva em conta o lapso de tempo antoriormente decorrido<br />

(156).<br />

2. No nosso Direito constituem causas de suspensão a<br />

impuberdade, a menoridade, e, debaixo de certos respeitos a<br />

sujeição do filho família ao pátrio poder, a da mulher casada ao<br />

poder marital.<br />

3. Nestas relações de direito a prescripção se suspende e<br />

não corre:<br />

1.° Contra os pupillos emquanto dura a idade pupillar<br />

( 157 );<br />

2.° Contra os menores, (a ordinária) (158);<br />

3.° Contra os filho-familias, pelo que pertence aos bens<br />

adventicios (159), illegalmeute alienados pelo pai (160).<br />

(153) Como se a posse do prescribente foi tomada ao tempo em que<br />

a cousa já pertencia ao menor.<br />

(154) B' nisto que a suspensão se distingue da interrupção: o lapso<br />

de tempo decorrido antes se junta ao tempo que começa a correr depois<br />

que cessa a causa que determina a suspensão.<br />

(155) A suspensão de si mesma não altera as condições da prescripção,<br />

mas se emquanto ella perdura, o possuidor vem a cahk- em má fé, a prescripção<br />

se torna impossível.<br />

(156) Aluhlenbruch, § 257 c 264. Prescripíio dormiens, quiescens. Vej.<br />

Mourlon L. 3, T. 20, n. 1856.<br />

(157) Const. 3. Quib. non objicit. 7,35. Novell. 22, cap. 24. Vej. acima<br />

§ 65. nota 6.<br />

(158) Vej. § 65 acima.<br />

(159) Acerca dos bens adventicios, veja-se Dlreit. de família. § 115. IV.<br />

(160) Const. 1. C. de bon. mateyn 6.60, Novel!. 22, cap. 24, Pinell.<br />

Nesi Tricennale, n. 44. Lob. Not. a Mello, L. 3. T. 4, § 12, n. 12. Sobre a<br />

alienação dos bens adventicios, veja-se IHreit. de fomilia § 116, III. Em<br />

relação aos adventicios extraordinários (D. de Familia, § 116) corre a<br />

prescripção. Lob. loc. cit., n. 14.<br />

V~


164<br />

DIREITO<br />

4.° Contra as mulheres casadas relativamente aos bens<br />

dotaes inestimados ( 161 ), e aos doados pelo marido á concubina<br />

(162).<br />

§77.—Quem tem qualidade para invocar a prescripção: necessidade<br />

de sua allegação.<br />

1. A prescripção pôde ser utilmente invocada, ou por via<br />

de acção (163), ou em íórma de excepção (164):<br />

(161) Const. 30 C. de jur. dot. 5,12. A mesma doctrina se applica aos<br />

bens da mulher, inalienáveis, no regimen da simples separação de bens.<br />

(162) Ord. L. 4, T. 66; 'D. Port. P. I, art. 1289. A citada ord. concede<br />

á mulher e aos seus herdeiros quatro annos a contar da dissolução da sociedade<br />

conjugal, para reivindicar os bens doados á concubina. Vej. Direito<br />

de familia, § 40;5.<br />

Disputavão os interpretes do Direito Romano e disputão ainda os nossos<br />

praxistas, se a prescripção corre:<br />

Contra os ignorantes,<br />

Contra os loucos e pródigos,<br />

Contra os ausentes,<br />

E em geral contra o "non valent em agere."<br />

O principio fundamental da prescripção é a necessidade de pôr termo<br />

ás incertezas inhérentes ao dominio, encerrando-as dentro de prazos certos<br />

e definidos (§ 60). A suspensão tem por effeito prolongar indefinidamente<br />

aquelles prazos, o que traz offensa ao dito principio: d'ahi vem que a stispensão<br />

não pôde ser recebida senão nos casos expresses na lei. Mourlon,<br />

L. 3. T. 20, n. 1892.<br />

Nem o Direito Romano, subsidiário neste assumpto. nem o nosso proprioDireito<br />

incluem outros casos desuspensão além dos enuineradosnonosso<br />

texto (Mühlenbruch, § 257 a): dahi a illação que a prescripção corre contra<br />

as pessoas não exceptuadas. Lobão, Not. a ÍVÍcllo, 3,4, § 12, n. 23 o seg.<br />

A'cercados ignorantes e furiosos, o Direito Romano ê expresso. Nulla<br />

ignorantia aut scieniia spectanda ne altera dubitationis inextricabilis oriatur<br />

oceasio: (Const., C. de usucap. transformand.) Burn qui a furioso bona fido<br />

emit., usacupere posse responsum est.: (fr. 13, § I o D. de usucap., 41,3).<br />

Admittem alguns o beneficio da restituição contra a prescripção ordinária<br />

e extraordinária em favor dos ausentes, furiosos e pródigos. Mühlenbruch.<br />

§ 264, n. 11; Doctr. das Acç. § 104.<br />

(163) Assim, se depois de consummada a prescripção, a cousa é tirada<br />

da posse do prescribente, compete-lhe a reivindicação para rehavel-a.<br />

(164) Se o antigo proprietário da cousa já prescripta intenta reivindical-a,<br />

o prescribente pôde repellir a acção com a excepção de prescripção.


DAS COUSAS 165<br />

1.° Pelo próprio adquirente, e na falta delle, por seus<br />

herdeiros (165).<br />

2.° Pelos credores do adquirente (166J. Os bens, isto é, todas<br />

as cousas, direitos e acções que fazem parte do patrimônio<br />

do devedor e não são exceptuados por lei, ficão sujeitos á solução<br />

de suas dividas (167). O dominio sobre a cousa prescripta<br />

entra naquella definição; pôde portanto ser invocado pelos credores<br />

(168). Assim, por exemplo, o credor que penhora uma cousa<br />

prescripta pelo devedor, pôde repellir com o fundamento da prescripção<br />

os embargos de terceiro senhor.<br />

2. Do mesmo principio resulta:<br />

Que a renuncia da prescripção consummada, feita pelo<br />

devedor em fraude da execução, não vale contra os credores (179).<br />

3. A prescripção não produz os seus effeitos de pleno<br />

direito, mas carece de ser alleg-ada pela parte. Não a pode o juiz<br />

supprir de seu officio (170). Esta disposição singular tem por causa<br />

o caracter excepcional da prescripção (171).<br />

Da dita disposição decorre este corollario:<br />

Que a prescripção. ainda depois de consummada, não se<br />

torna absoluta e irresoluvel, senão depois que é invocada em<br />

juizo (172).<br />

(16'5) Se a prescripção não fi^ou consummada cm vida do possuidor,<br />

os seus herdeiros podem juntar a posse delle á sua, segundo as circumstaucias.<br />

Vej. § 72, acima.<br />

(166) Ou o credor esteja failido, ou não.<br />

(167) Ord. L, 3, T. 86, § 6 e seg. ; Lei de 20 de Junho de 1774, § 22<br />

e 27.<br />

(168) C. C. francez, art. 1116 e 2225; Mourlon, L. 3. T. 20, n. 1793.<br />

(169) E' um dos casos em que é applicavel a acção Pauliana. Com<br />

effeito, se é licito aos credores usarem da dita acção para adirem a herança<br />

repudiada pelo devedor (Doctr. das ACQ., § 109), com igualdade<br />

de razão podem exercel-a para annullar a renuncia de uma prescripção já<br />

consummada. TC tal é a doctrina do Direito francez, G. C, art. 222&; Mourlon,<br />

L. 3,20, n. 1794 e seguintes.<br />

(170) Maynz, § 148; P. Barbosa, Const, de prescrip.. long, temp., n. 1;<br />

Silva, ad. ord. 3. T. 50, n. 38; Doctr. das ACQ., nota 127; C. C. franc,<br />

art. 2223.<br />

(171) O principio de direito é — que o juiz pôde julgar a causa submettida<br />

á sua decisão, absolvendo ou condemnando, pelos fundamentos de facto<br />

provados e pelos de direito que forem applicaveis ao caso, embora não tenhão<br />

sido invocados pelas partes.<br />

(172) Mourlon, 3.20, n. 1767, in fine. Tanto a prescripção não é abso-


166 DIREITO<br />

§ 78. — Renuncia da prcscripção<br />

1. E' licito ao prescribente renunciar a prescripção, ou<br />

começada ou já cousummada (173).<br />

A renuncia, ainda da consummada, não importa alieuação<br />

da cousa prescripta, porquanco a prescripção não se torna<br />

absoluta e definitiva, senão depois de allegada em juizo (174).<br />

Assim que : o proprietário, em cujo beneficio é feita a renuncia,<br />

entra na posse e domínio da cousa; não por novo, senão<br />

pelo seu antigx) titulo (175).<br />

Todavia a renuncia, pois que acarreta a perda do direito<br />

de invocar e fazer valer a prescripção, só pôde ser consentida<br />

pelas pessoas que estão na livre administração de seus bens<br />

(176).<br />

2. Pôde a renuncia ser expressa ou tácita.<br />

A tácita resulta de actos que virtualmente envolvem o reconhecimento<br />

do direito do proprietário, como :<br />

I o . Quando o possuidor compra ao proprietário uma servidão<br />

sobre o immovel, ou lh'o toma de arrendamento.<br />

2". Quando não invoca a prescripção em juízo ;<br />

3 o . Quando subscreve, como testemunha, a escriptura de<br />

venda passada pelo proprietário (177).<br />

§ 79. —Effeitos da prescripção<br />

1. Assim a prescripção ordinária como a extraordinária,<br />

depois de consummadas, transferem ao possuidor a propriedade da<br />

cousa.<br />

luta e definitiva antes de ser invocada, que se a parte a não allega, ella<br />

não prevalece, embora esteja plenamente provada dos autos.<br />

(173) Mourlon III, n. 1778.<br />

Na prescripção exfinctiva não se admitte renuncia antecipada. Mourlon,<br />

L. 3, T. 20. n. 1775 e 1778.<br />

(174) Vej. Mourlon, loc. cit. n. 1768.<br />

(175) Não é devido imposto de transmissão de propriedade, nem ha<br />

necessidade de transcrever o titulo da renuncia.<br />

(176) Mourlon III. n. 1783. Pela mesma razão por que os incapazes não<br />

podem renunciar heranças. O tutor, ainda autorizado pelo juiz de orphãos,<br />

não pôde renunciar a prescripção, porqu? em caso nenhum ê licito<br />

ceder gratuitamente direitos do menor. Vej. Direit. de família, § 154.<br />

(177) Mourlon, loc. cit. n. 1782.


DAS COUSÂS 167<br />

O domínio píissa ao prescribente, pleno ou limitado (178)<br />

segundo a intenção e condições da posse (179).<br />

2. Neste sentido, se o possuidor praticou actos possessorios<br />

que importão o exercício completo das faculdades que<br />

constituem o direito de propriedade, sem impugnação de quem<br />

quer que se attribuisse direitos reaes sobre a cousa, é fora de duvida<br />

que adquire o domínio pleno, extinctos dest'arte os onus<br />

reaes que a gravava© (180).<br />

3. Se, porém, durante a sua posse, os terceiros que tínhão<br />

direitos reaes sobre a cousa, continuarão a exerce­los, ou se<br />

o possuidor sabia da existência desses direitos (181), adquire a<br />

cousa, mas subsistem os onus reaes preexistentes (182).<br />

4. Desta doutrina resulta:<br />

Que o usufrueto, as servidões reaes e a hypotheca, embora<br />

susceptíveis de se extinguirem por força das prescripções que<br />

lhe são peculiares (183), podem todavia cessar de existir por via<br />

da prescripção acquisitiva.<br />

Que se a prescripção acquisitiva é inefficaz para extinguir<br />

os ditos onus reaes, bem podem elles cessar em favor do prescribente<br />

por virtude das prescripções extinetivas que lhes são próprias<br />

(184).<br />

(178) Vej. § 61 acima.<br />

(179) Maynz § 201, Zacar. § 215.<br />

(180) Const. 8 pr. C. de prasserip. 30 vel. 40 ann. 7,39; Ord. L. 4. T. 3<br />

§ 1". Vej. Maynz, § 201, 231 e 254. Zacar. § 215.<br />

(181) Ord. L. 4 T. 3 § I o . "Os quaes dez e vinte annos (para prescrever<br />

a cousa contra a hypotheca) se contarão do primeiro dia que a cousa<br />

foi á poder do possuidor com titulo e bòa fé. Vej. § 278 adiante.<br />

(182) Vej. o cit. § 278.<br />

(183) As servidões e usufrueto se extinguem pelo não uso durante &■'.&<br />

e vinte annos. C. 13 C. de Servart. 3;34. Vej. Maynz, § 231. Vej. § 100<br />

e 134 adiante.<br />

A hypotheca extingue­se pela prescripção da divida ou a cousa hypothecada<br />

esteja em poder do devedo'r (revogada nesta parte a cit. Ord. 4<br />

?


168 DIREITO<br />

5. A consummaçâo da prescripção consolida a causa, o titulo,<br />

que lhe servio de fundamento :—o prescribente é tido como se<br />

fora successor do seu author e fica responsável para com elle pelas<br />

obrigações que nascem do contractu estipulado entre um e outro<br />

(185). Assim: se prescreveu a cousa a titulo de compra, é<br />

obrigado a pagar ao vendedor o preço, não o tendo feito anteriormente*(lS6);<br />

se a titulo de doação, não.se pôde subtrahir ao<br />

cumprimento dos onus e condições {modalidade) impostas pelo<br />

doador (187).<br />

6. O prescribente adquire a cousa com todos os seus accessories,<br />

como servidões activas e accessões (188).<br />

IV § 80.—Prescripção immemorial<br />

1.—Prescripção immemorial é a que assenta em uma posse,<br />

de cujo começo não ha memória entre os vivos (189).<br />

pida), podem elles afinal extinguir-se pelo não uso ou pela prescripção da<br />

divida no caso de hypotheca.<br />

Vej. o cit. § 278 adiante.<br />

(185) Fr. 3 § 4 D. adq. vel amitt. poss. 41.2: Et eum qui usuceperit. et<br />

pro emptor© et pro suo possidere. Fr. 1 § 1, V. pro suo 41.10: sed an<br />

desinam ex causa emptionis (possidere) post usucapionem dubitatur? Et<br />

Mauricianus dicit existimasse non desinere. Accar. n. 241 A.<br />

(186) Fr. Vatic, § 12.<br />

(187) Acearias, cit. § n. 241 A.<br />

(188) Fr. 10 § I o D. usucap. 41.3; Hoc jure utimur ut servitutibus per<br />

-so nunquam longo tempore capi possint. cum iedificiis possint.<br />

(189) Vej. Múhlenbruch § 265, Dunod. P. II. cap. 14. Lob. not. a Mello<br />

L. 3, T. 4, § 7.<br />

A prescripção immemorial não é uma creação do [Direito Romano. No<br />

systema daquelle Direito as aeções reaes que não erão exercidas durante<br />

trinta annos ficavão extinetas. (Maynz, § 148). Assim o possuidor<br />

de mû, fé, embora jamais adquirisse a propriedade da cousa, podia repellir<br />

a reivindicação do proprietário, excepcionando com a prescripção<br />

da acção (MackcldeA' § 231 n. 5). Já se vê, pois, que a prescripção immemorial<br />

acquisitiva não era de necessidade.<br />

Ha, todavia, allusivos a casos particulares em alguns textos, aos quaes<br />

os interpretes levados pelas necessidades da pratica moderna derão uma<br />

extensão arbitraria, e tomando-os como pontos de partida formarão uma<br />

doctrina que obteve a saneção do Direito Canonico e passou depois para o<br />

Direito Civil. Pothier. Prescrip. n. 27S.<br />

No Direito Civil francez (C. C. art. 2262) e no do Chile (C C. artigo


DAS COUSAS 169<br />

Para este gênero de prescripção não ha prazo certo e fixado<br />

(190). Basta que a posse seja immemorial, isto é, que tenha<br />

existido sempre tal como é exercida na actualidade, segundo o depoimento<br />

dos homens mais velhos, pelo que tem elles visto e pelo<br />

que ouvirão de seus maiores (191).<br />

A posse, pois, só se reputa immemorial quando é attestada<br />

por duas g-erações de homens,—a viva, que affirma o que pessoalmente<br />

tem observado, e a morta, que transmittio á viva por<br />

tradição o que ella vio (192).<br />

2. A posse immemorial faz presumir a existência de justo<br />

titulo e de boa fé (193), e não admite prova em contrario (194).<br />

E' essa a razão, porque se costuma dizer que o possuidor adquire<br />

2514 e 2515) é também dispensável a prescripção immemorial, porque segundo<br />

aquellas legislações as acçôes reaes prescrevem em trinta annos quer<br />

aquelle que invoca uma tal prescripção exhiba titulo de sua posse quer não,<br />

quer possua em bôa ou má fé. Vej. Mourlon III, n. 1927.<br />

Nestas condições a prescripção extraordinária torna quasi in util a<br />

immemorial.<br />

A nossa legislação nada contém acerca das condições da prescripção<br />

immemorial; diversas passagens a presuppõem subsistente, já admittindo-a<br />

em uns casos, já excluindo-a em outros. Vej. Oi 1. L. 2, T. 27 e 2S<br />

L. I o , T. 02, § 51, L. 2 T. 34,§ 10, L. 4, T. 43, § 13 e Lei de 9 de<br />

Julho de 1773. § 12.<br />

(190) Dunod, P. IT, cap. 14, Merlin, Prescript. Sect. § 3; Múhlenbruch<br />

paragrapho 265.<br />

(191) C 1 de prasscrip. in Vito: Nisi tanti temp oris allegetur pnescriptio,<br />

cujus contrarii memória non existât. Gloza, ao log. cit.: "Dicant<br />

testes prsescrib entis quod semper vider tint et aiidierunt contrarium et quod<br />

communis est et fuit semper opinio quod sic fuerit et quod non extat contrarii<br />

vel initii memória."<br />

Costuma-se applicar á prescripção immemorial a doctrina do fr. 28 D.<br />

de probat. 22, 3: Cum omnium hsec opinio, nee audisse nee vidisse. cum id<br />

opus fieret, nee ex iis audisse qui vidissont aut audlssent et hoc infinite similiter<br />

sursum accidet: turn memória operis facti non extaret. Vej. Lob.<br />

not. a Mello L. 3, T. 4, § 7. n. 6.<br />

(192) Mühlenbruch § 265: "Contrariam probationem omnem ex eludi<br />

siquidem per duas hominum œtates eadem semper fuit rei conditio."<br />

Supposto a data da posse, possa ser determinada por titulos, inscripções,<br />

monumentos, ella se reputa immemorial desde que o seu começo excede<br />

a memória dos vivos, quer em relação ao que pudessem vêr, quer em relação<br />

ao que pudessem ouvir de seus maiores. Dunod loc. cit.<br />

(193) C. 1 de pravserip. in Vite; Merlin Prescp. Cect. 3, § 3, Lob. 'Not.<br />

a Mello, L. 3, T. 4, § 7 n. 5.<br />

(194) Muhlenbruch, S 265, Lobão. loc. cit. n. 5,


170 DIREITO<br />

o domínio, não propriamente em virtude de prescripção, senão<br />

do titulo presumido, diante do qual cedem todas as dificuldades<br />

que poderião suggerir as outras espécies de prescripções (195).<br />

3. Todas as cousas, ainda as imprescriptiveis segundo as<br />

regras geraes de direito, mas que todavia não são absolutamente<br />

inalienáveis (196), podem ser adquiridas pela prescripção<br />

immemorial, salvo se a lei estabelece excepção expressa (197).<br />

4. No systema do nosso Direito tem a prescripção immemorial<br />

grande utilidade pratica e vem a ser a de supprir a extraordinária<br />

nos casos em que é esta inadmissível por lhe faltar<br />

algum requisito (198).<br />

CÓDIGO CIVIL § 80 A<br />

DOS DIREITOS DE VIZINHANÇA<br />

Do uso nocivo da propriedade<br />

O Código Civil trata nesta secção V, arts. 554 c &5õ, de assumptos que<br />

no direito anterior estavam ligados á posse.<br />

Preceiluam os referidos artigos:<br />

Art. &54 — O proprietário ou. inquilino de um prédio tem o direito de<br />

impedir que o mão uso da propriedade vizinha possa prejudicar a segurança,<br />

o socego e a saúde dos que o habitam.<br />

Art. 555 — O proprietário tem direito a exigir do dono do prédio vizinho<br />

a demolição, ou reparação necessária, quando este ameace ruina, bem como<br />

que preste caução pelo da/m/no imminente.<br />

O direito do artigo 554 se torna effeeUvo pela acção de dam.no infecto —<br />

Doctrina das Acções, § 97, na qual se pede que o visinho seja obrigado a prestar<br />

caução pelo dam no imminente. Também pôde ser proposta acção de<br />

indemnização, si o ãarnno já foi causado.<br />

O mesmo se dá no caso do artigo 555, podendo o proprietário usar dai<br />

acção para pedir que o visinho seja condemnaão a demolir ou reparar o prédio,<br />

uma vez que esteja este ameaçando raina.<br />

(195) Makeldey § 297 L. Dumoulin: Non .tam est prœscriptio quam titulus.<br />

Pothier, Prescript, n. 278.<br />

(196) Taes são as cousas de uso publico: são em regra imprescriptiveis<br />

(§ 62 acima) mas podem ser alienadas, precedendo autorização do poder<br />

competente. A posse immemorial faz presumir esse consentimento. Vej.<br />

Lob. loc. cit.<br />

(197) A. Faber. Cod. L. 7, T. 13 Defin. 7; Lobão, loc. cit. n. 5. Dumoulin:<br />

"Nunquam censetur exclusa, etiam per legem prohibitivam et per universalia<br />

negativa et geminata verba, quamcumque prtescriptionem exe'udentia."<br />

Vej. Pothier, cit. n. 278.<br />

(198) Como no caso de estar o possuidor de má fé ou da oour-a não ser<br />

prescriptivel. V. § 62 c 69 acima.


CAPITULO III<br />

ÂCÇÕES QUE NASCEM DO DOMÍNIO.<br />

§ 81 — Noção<br />

1. O domínio está exposto a ser lesado de dous modos,<br />

a saber :<br />

a) Ou por acto que torna impossível ao proprietário o<br />

exercício de seus direitos sobre a cousa, isto é, pela tirada<br />

da cousa da posse do dono (1);<br />

b) Ou por actos,que sem importarem o esbulho, offendem,<br />

restriug-em ou cerceião algum ou alguns dos direitos dominicaes<br />

(2).<br />

2. O direito protege o domínio com as acções adaptadas<br />

á fazer cessar aquellas lesões e a repolo no seu estado normal.<br />

Estas acções são :<br />

A reivindicação, (3).<br />

A negatoria (4).<br />

3. A reivindicação pôde ser supprida pelo interdicto<br />

possessorio recuperatorio e a negaioria pelo restitutorio (nlipossidelis),<br />

desde que concorrem os requisitos necessários para o<br />

(1) Um cios elementos funaamentaes do domínio é o jus possiãendi,<br />

o direito tie ter a cousa sob o poder: § 25, acima. Os outros direitos, cujo<br />

conjuneto fôrma o domínio, ficarião de facto supprimidos, se o proprietário<br />

não tivesse o direito de reter a cousa sob sua posse. Do jus possiãendi deriva<br />

immediatamente a reivindicação.<br />

(2) Como é, por exemplo, o acto de abrir caminho, de levantar aquedueto,<br />

tirar água, fazer esgoto no prédio alheio.<br />

(3) Vej. adiante S 82.<br />

(4) Vej. adiante § 87.


172 DIREITO<br />

exercicio daquelles remédios. E muitas vezes é mais prudente<br />

lançar mão délies, do que das ditas acções (5).<br />

4. Com a reivindicação tem grande affinidade a Publiciana.<br />

Esta acção compete particularmente ao possuidor de<br />

boa fé em via de prescrever. E' lhe dada, como já se íôra proprietário,<br />

para rehaver a cousa que lhe é tirada e desta arte<br />

recollocar-se nas condições em que dantes estava (6) Pôde<br />

também ser utilmente empregada pelo verdadeiro proprietário (7).<br />

§ 82 — Reivindicação. A)' — A quem e contra quem compete.<br />

1. A reivindicação é a acção real (8) que compete ao senhor<br />

da cousa para retomal-a do poder de terceiro que injustamente<br />

a detém (9).<br />

2. A dita acção tem por causa o domínio. O esbulho," a<br />

tirada da cousa de sob a posse do proprietário, é o motivo do<br />

seu exercicio.<br />

3. Não pode, pois, ser exercida senão por aquelle a quempertence<br />

o dominio (10) pleno, util (11) resoluvel (12), ou con<br />

sistente na propriedade nua (13).<br />

(5) Pr. 12, § 1". D. de aclq., vel amit. possess., 41,2; fr. 24. D. revindicat.,<br />

6,1: "Is qui destinavit rem potere animadvertere debet an aliquio<br />

interdicto possit mancisci possessionem, quia longe commodius est ipsam<br />

possidere et adversarium ad onera petitoris compellere, quam, alio possidente,<br />

petere.<br />

(6) Gaio, I. Com. IV, § 36.<br />

(7) Vej. § 88 adiante.<br />

(8) Assim como os direitos, as acções também se dividem em<br />

reaes e pessoaes.<br />

(9) § I o I. de act., 4,6: Actiones in rem, sunt, veluti si rem. corporalem<br />

possideat quis, quam Titius suam esse affirmât et possessor dominum<br />

se esse dicat; nam si Titius suam esse intendat, in rem, actio est. Pellat<br />

Com. ao fr. 1 de rei vindicai. Vej. Ord. 4, T. 3, T. 57, § 1" e<br />

L,. 3, T. 53, pr.<br />

(10) Fr. 23. I). rei vindicat., 6,1.<br />

(11) § 139 adiante.<br />

(12) Fr. 41, pr. ; f. 66. D. rei-vindicat., 6,1 Muhlenbruch, § 269;<br />

C. Civil do Chile, art. 89>3.<br />

Aquelle em favor de quem ha de reverter o dominio, emquanto não se<br />

verifica a condição resolutiva, não pôde exercer a reivindicação: fr. 29, D.<br />

de mortis causa donat, 39,6; fr. 9. D. rei vindicat. 6,1. Muhlenbruch,<br />

Ü 269, n. 6.<br />

(13) F. 33. D. rei vindicat., 6,1. C. do Chile, art. 893.


DAS COUSAS I/o<br />

4. O reivindincanle é obrigado a provar os dous factos<br />

seguintes :<br />

I o . Que lhe perteice o domínio da cotisa (14) ;<br />

2". Que o réo a rétem em seu poder (15).<br />

5. A prova cio domínio resulta da prova do modo de<br />

acquisição (16). Firmada a acquisição, o domínio se presume<br />

perseverar na pessoa do adquirente emquanto não se mostrar o<br />

contrario (17).<br />

6. Se o modo de acquisição é derivado (18), cumpre<br />

provar que aquelle de quem o autor houve a cousa era delia<br />

proprietário ao tempo da transferencia (19), mas não é mister<br />

(14) Fr. 9. D. rei vindicat., C. 2 e 8; C. de probat., 4,19; Mello, 4,6,<br />

g 10; B. Carneiro. L. 2, § 14, n. 2.<br />

Por Direito Romano o autor devia provar que o dominio lhe pertencia<br />

por causa anterior á litis-contestação; o direito posteriormente adquirido<br />

não podia servir de base á condemnação: fr. 23 © 35. D. de judie. 5,1; Savigny,<br />

Tract., tom. 6, § 262; Pellat, Com. ao fr. 27, § I o , rei vindicat.<br />

O Direito Canonico alterou neste ponto o Direito Romano, estabelecendo<br />

a distincçâo seguinte: "Se o autor especifica na demanda a origem do dominio;<br />

a acquisição por uma causa posterior não pôde ser aceita para<br />

determinar sentença condemnatoria; é mister intentar uma nova acção. Mas,<br />

se ao contrario, o autor limita-se a deduzir o seu dominio, sem declarar precisamente<br />

um modo determinado de acquisição, a superveniencia da acquisição<br />

antes da sentença final podo servir de base á condemnação. C. 3 de sentent.,<br />

in VI, 2,14; Savigny, tom. 6, § 202, B. Mühlenbruch, § 269, n. 4.<br />

No nosso Direito, tanto n'um como n'outro caso, a superveniencia da<br />

acquisição no decurso da lide e antes da sentença final *é sufficient© para<br />

autorizar a condemnação. Ord.D. 3, T. 63, ü 6; Mello 4.6, § 10; B. Carneiro,<br />

L. 2. § 14, n. 8.<br />

(13) S 2. I. de act., 4.6 fr. 12, § 1." D. de adq., vel amit. poss., 41,2.<br />

(16) Vej. § 31 e 32 acima. Pôde o autor allegar causa certa e determinada<br />

de acquisição, ou allegar genericamente que a cousa lhe pertence<br />

jure ãominii, sem expressar a causa: fr. 9. D. rei vindicat. fr. 11, § 2; fr. 14,<br />

§ 2, D., de except., rei judicat., 44,4. São diversas as conseqüências praticas,<br />

segundo segue o autor um ou outro destes alvitres: assim, se allega<br />

causa certa e decahe, pôde sustentar nova acção por nova causa, sem que<br />

se lhe possa oppôr a excepção rei ju-rfica/ai.Mülilenbruch, S 272.<br />

(17) Ord., L. 3. T. 53, § 3. "Qui scmel clominus, semper dominus."<br />

Vej. § 27 acima.<br />

(18) Vej. § 32 acima.<br />

(19) Arg. fr. 20 D. de adq. rer. dom.. 41.1: Traditio nihil amplius<br />

transferre debet vel potest ad cum qui accipit quam est apud euro qui tradit.<br />

Fr. 54, pr. >D. reg. jur. 50,17. Houve grande controvérsia a este


174 DIREITO<br />

levar a investigação além do ponto em que se descobre posse<br />

apta para gerar a prescripção adquisitiva (20).<br />

7. Emquanto a cotisa permanece sob o poder do proprietário,<br />

não existe o facto (injusta privação de posse) que a acção<br />

é destinada a fazer cessar : ao proprietário, pois, nesta condição<br />

não é licito exercital-a, nem ainda com o fundamento que alguém<br />

lhe contesta o domínio (21).<br />

8. Compete a reivindicação contra todo aquelle que injustamente<br />

retém a cotisa e não quer restituil-a ao proprietário ;<br />

quer seja mero detentor, quer possuidor de boa ou de má fé (22).<br />

Ao detentor que possue a cotisa em nome de terceiro, é<br />

permittido desviar a acção de si, nomeando o verdadeiro possuidor<br />

com o qual deverá correr a causa (23). Mas se o verdadeiro<br />

possuidor nega em juízo ter a cousa sob seu poder e o<br />

autor prova o contrario, a cousa é transferida ao autor (24).<br />

Neste caso, se a cousa effectivamente pertence ao réo, não a<br />

poderá elle rehaver senão intentando por sua vez a acção de<br />

reivindicação contra o autor (25).<br />

respeito entre os interpretes do Direito Romano. Pellat, com. ao fr. 9,<br />

rei vindicat.<br />

A prova do domínio que provém de modo derivado de acquisição, é de<br />

ordinário difficii: Aceursio, já dizia — ãonúnii pro~bationem diabolicam. Mas<br />

essa difficuldade pôde ser afastada pelo interdicto recuperatorio (fr. 24,<br />

D. rei vindicat., 6,1) ou pela acção pubiiciana, (§ 88), ou ainda pela prescripção<br />

acquisitiva: (§ 60 e 61).<br />

(20) Mühlenbruch, § 272, n. 5; Pellat, Com. ao § 9, rei vindicat.<br />

(21) Fr. 1, § 6. D. utipossid., 43.17: Actio nequam ultro possessorio<br />

datur, quippe sufficit ei quod possideat. § 2. I. de act., 4,6: In his agit qui<br />

non possidet.<br />

(22) Fr. 9. D. rei vindicat, 61,1: Puto autem, ab omnibus qui tenent et<br />

habent restituendi facultatem, peti posse. Caminha, Libello 1." Annot. II,<br />

not. 6: In propósito suffieit quœvis detentio. Assim pôde acontecer que o réo<br />

que detém a cousa, sem no entanto ter a intenção de possuil-a como sua, se<br />

recuse entregal-a ao dono: neste caso pôde ser demandado pela reivindicação.<br />

(23) Const. 2. C. ubi in rem act., 3,19; ord. Ill, 45, § 10. Sendo falsa<br />

3. allegação do réo, é elle condemnado no dobro: ord. cit. Se o réo que possue<br />

a cousa em nome de terceiro occulta esta eircumstancia, a acção correrá<br />

com elle: Pellat. Com. ao fr. 9, rei vindicat., in fine.<br />

(24) Fr. 80. D. rei vindicat., 6,1; Ord. III, 32, § 2, c T. 40.<br />

(25) Ord. III, 40, § 3. Não está em uso, Consolid. das Leis Civis,<br />

not. 5 ao art. 919.


I<br />

DAS COÜSAS 175<br />

9. A reivindicação é também ■ praticavel contra quem,<br />

supposto não tenha na realidade a posse da cousa, todavia é<br />

reputado possuidor (fidas possessoi). a saber;<br />

a) Contra aquelle que deixou de possuir a cousa com a<br />

intenção de dificultar ao autor o vindical­a (26). Nesta contingência<br />

é facultado ao autor demandar ou o possuidor ficto, ou<br />

o verdadeiro (27).<br />

b) Contra aquelle que, sem ter a posse da cousa, açode á<br />

acção, como se realmente a possuísse (qui se liti obtulit) (28).<br />

O possuidor ficto, pois que não pôde restituir a cousa, é<br />

condemnado a pagar a estimação.<br />

§ 83. B). — Cousas que podem ser objecto da reivindicação<br />

Pois que a reivindicação tem por fim rehaver a cousa sobre<br />

que recahe o domínio, só podem ser objecto delia as que são<br />

susceptíveis ­laquelle direito — as cotisas corporeas (29), a saber :<br />

1 0 . Os moveis e os immoveis (30) ;<br />

2 o . As cousas de sua natureza fungíveis (31), uma vez que<br />

(26) Fr. 27, § 3; fr. 36. T). rei vindicat.. 6.1; fr. 25, § 2. D. Hered.<br />

pet., 5,3; Ord. III, 86, § 16; IV, § 9. Makeldey, § 249.<br />

(27) Const. C. de alien, judie, mut., 2.55; Doetr. das Acç., nota 121.<br />

(.28) Fr. 25, 26, 27, pr. D. rei vindcat., 6,1; B. Carneiro, L. 2, § 14,<br />

n. 22 a 24; Dig. Port., P. I. art. 880; Cod. do Chile, art. 897. Para que<br />

tenha applicação a doctrina exposta, é mister: I o , que o ré o se dê por possuidor<br />

na litis­contestação; 2", que o autor ignore a falsidade da declaração,<br />

Pellat, Com. ao fr. 25, rei vindicat. O fim da lei sujeitando á condemnação,<br />

o possuidor qui se liti obtulit, é impedir que se empregue uma tal fraude<br />

para dar tempo ao verdadeiro possuidor de prescrever a cousa.<br />

(29) Vej. § 26 acima.<br />

(30) Ord. III. 53 pr.; B. Carneiro, L, 2 § 14, n. 35.<br />

(31) Em Direito se diz fungível a cousa que é antes designada pelo gênero<br />

á que pertence do que por sua propria individualidade — res guie pondere,<br />

numero aut mensura constant. Assim uma cousa fungivel é equiparada<br />

íi outra da mesma espécie: dahi vem que o devedor de uma cousa fungível<br />

liberta­se da obrigação entregando outra da mesma qualidade, peso ou medida.<br />

E' de notar que uma cousa fungivel de sua natureza se pôde tornar<br />

não fungivel por convenção, como uma certa quantidade de trigo que alguém<br />

recebe e se obriga a restituir na sua propria individualidade (in specie).


176 DIREITO<br />

se não tenhão confundido com cousa do mesmo gênero e que<br />

possão ser individuaes (32).<br />

3 0- A universalidade de cousas da mesma espécie, como<br />

um rebanho de ovelhas (33), mas não a universalidade de direitos,<br />

como um pecúlio, um estabelecimento commercial (34) ;<br />

4 o . A parte de uma cousa physicamente determinada,<br />

como uma secção certa de terrenos de uma fazenda (35) ;<br />

5 o . A parte ideal de um immovel indiviso, como a metade,<br />

o terço de uma herdade (36).<br />

Os immoveis devem ser designados por sua situação e<br />

confrontações ; os moveis por sigmaes e qualidades distinctivas<br />

(37).'<br />

§ 84 C.) — Objecto de reivindicação.<br />

í. A reivindicação é provocada pelo facto de terceiro que<br />

retem a cousa e contesta ao reivindicante o dominio : o seu fim<br />

(32) Fr. 11, § 12 D. de reb. credit. 12,1: Vindicari numi possunt. si extant.<br />

Dig. Port. P. I, art. 906, C. Civil da Prussia, art. 45 e 4G.<br />

(33) .Fr. 1. pr. § 3. fr. 2, fr. 3 pr. § I o D. rei vindicat. 6,1. Pellat, com.<br />

aos frag, citados.<br />

Observão alguns que a entidade collectiva não pôde ser object.o de dominio,<br />

senão as cousas individuaes que a compõem, e que portanto a reivindicação<br />

de uma cousa collectiva, como é um rebanho, é uma pratica<br />

aceitável pela commodidade que offerece , mas repugnante com a theoria.<br />

(34) Fr. 56. D. rei vindicat. 6,1. Pellat, Com., ao fr. 1 § 3 rei vindicat.<br />

Não se pôde reivindicar a universalidade,corno o pecúlio; reivindicão-se<br />

porém, as cousas corporeas que entrão na sua composição. Todavia a petição<br />

de herança, de sua natureza mui análoga á reivindicação, tem por objecto<br />

uma universalidade de direitos — o espolio do defuneto.<br />

(35) Fr. 60 D. de verb, signif. 50, 16. A secção determinada de um terreno<br />

se considera separada do todo e como tal individuada e portanto susceptive]<br />

de reivindicação.<br />

(36)Fr. 8, fr. 48, § 1" D. rei vindicat. 6,1. Pellat Com. Cod. C. do<br />

Chile, art. 892.<br />

Se Paulo, por e enrrlo, ? senhor de metade d. um prédio que está-pro<br />

indiviso e o prédio é oecupado por Pedro, senhor da outra metade, e por<br />

um terceiro, usurpador: Paulo pôde demandar o usurpador para reivindicar<br />

a medade que lhe pertence. Sobre o modo de resolver as difficuldades que<br />

em différentes hypothèse pôde sugerir a reivindicação de partes indivisas.<br />

Veja-se Pellat no lugar acima citado.<br />

(37) Ord. III. 53 pr.<br />


DAS COUSAS 177<br />

é exactamente fazer reconhecer o direito do proprietário e obrigar<br />

o detentor a restituir a cousa com accessorios, perdas e damnos<br />

(38).<br />

2. A cousa deve ser restituida em espécie (39), no lugar<br />

de sua situação, se é immovel ; no lugar onde se acha, se move!<br />

(40).<br />

Mas se o possuidor é de má fé e a subtraído do lugar onde<br />

estava ao tempo da litis-contestação, para ahi a deve transportar<br />

á sua custa (41).<br />

3. Com a cousa se restituent conjuntamente os seus aug-mentos,<br />

isto é, as accessões e os fructos naturaes e civis (42).<br />

O possuidor de má fé restitue todos os fructos percebidos<br />

antes e depois da litis-contestação, consumidos e extantes (43),<br />

e os que. poderia ou deveria ter colhido (44) ; o de boa" fé tão_ só-<br />

(38) Fr. 20 D. rei vindicat. 6. 1; Doctr. das Acç. § 68.<br />

(39) 'Fr. 68 D. rei vindicat. Const. 21 C. rei vindicat. 3.32; ord. Ill,<br />

86, § 15; Doctrina das Acç. nota 122.<br />

(40) Fr. 10 e 11 D. rei vindicat. 6,1.<br />

(41) Fr. 12 D. codem.<br />

(42) Fr. 17 § 1." D. eodem: Julianus ait non solum fruetus sed etiam<br />

omnem causam preestandam. Fr. 20 D. eodem: Nee enim corpus ipsum<br />

restitui, sed opus est ut et causa, restituatur. Doctr. das Acç. § 68. Vej.<br />

Savigny, tom. 6. § 265.<br />

(43) Veja-se § 56 acima.<br />

(44) Fr. 2-5 § 4 D. hered. pet. 5,3: Scd et fructus, non quos perceperunt,<br />

inquit, sed quos perciperc delmeritnt, cos prasestaturos.Fr. 27, § 3 I).<br />

rei vindicat. 6,1. Const. 2 C. de fruet. 7,51: Nec tantum fructuum prœstationem<br />

eorum quos ipse percepit, agnoscat, sed etiam eos quos percipere<br />

potuisset.<br />

Ha grande controvérsia para saber se se deve calcular pela pessoa do<br />

possuidor ou pela do author a possibilidade de colher os fructos que o possuidor<br />

deixou de aproveitar. Savigny (tom. 6, § 267) diz que é indifférente<br />

para a questão a pouca ou muita diligencia pessoai do author: que o typo<br />

para julgar da responsabilidade do possuidor é a diligencia de um homem<br />

zeloso em geral (düigens pater famílias) e não a diligencia pessoal variável<br />

do author. Dest'arte. comparado o procedimento do possuidor como o d'um<br />

diligente pater famílias, será elle responsável, ou não, pelos fructos que não<br />

aproveitou, segundo procedeu, ou não como o faria o pater famílias.<br />

Esta solução, que não é contrariada pelos textos, tem a approvaçâo expressa<br />

de Paulo, Sent. I, 13 A. § 9: Hi fructus in restitutione prestandi sunt petitori<br />

quos unuquísque düigens pater famílias et honest us colligere potuisset,<br />

Vej. Pellat, Com. ao fr. 62 § 1." reivindicai.


178 DIREITO<br />

mente os fructos percebidos depois da litis-contestação (45), 6<br />

igualmente os que dessa data deixou por culpa sua de perceber<br />

(46).<br />

4. Pôde acontecer que a restituição da cousa se torne impossível<br />

:<br />

Pelo perecimento delia ;<br />

Por ter sido consumida ;<br />

Pela transformação por trabalho que destroe a sua primeira<br />

fôrma (47) ;<br />

Ou finalmente pela perda da posse (48).<br />

A solução destas dificuldades depende das circumstancias<br />

do caso; a saber :<br />

1.° O possuidor de má fé responde pela perda da cousa<br />

ou da posse delia, causada por neglig-encia, culpa ou dolo (49),<br />

e ainda pelo caso fortuito á que a cousa escaparia se estivesse<br />

em poder do dono (50). A sua responsabilidade começa àa data<br />

da má fé (51).<br />

2.° O possuidor de boa fé não é obrigado pela perda anterior<br />

á litis-contestação, houvesse, ou não, culpa ou negligencia<br />

da sua parte : até aquelle momento é tratado pela lei como<br />

proprietário, e pois não deve contas de seus actos (52). Mas<br />

pela perda qne occorre depois da litis-contestação, cabe-lhe a<br />

mesma responsabilidade que ao possuidor de má fé (53) : toda-<br />

(43) § 2, I. de offic. judie. 4.17.<br />

(46) Cit. § 2, I. de offic... qui culpa possessoris percepti non sunt. Tem<br />

aqui applicação 0 exposto em a nota44 acima. O possuidor tem direito a<br />

descontar as despezas que fez para cultura e producção dos fructos. C. 1 C.<br />

de fruet. 7,51.<br />

(47) Como no caso de especificação. Vej. § 37, acima.<br />

(48) Fr.17 § 1.° D. rei vindicat. 6.1: Quod si dolo maio ipse possessor<br />

desierit possidere. Pr'. 63, D. eodem: Si culpa, non fraude quis possessionem<br />

amiserit. Fr. 21 D. eodem.<br />

(49) . Fr.. 45, fr. 36 § D. rei vindicat. 6, 1. Savigny tom 6 § 272.<br />

(50) Fr. 40, D. hered. pet. 5,3; fr. 15 § 3 D. rei vindicat. 6,1; fr. 12<br />

§ 4 D. ad exhibend. 10,4: Tanto magis si apparebit eo casu mortuum sse<br />

qui non incidisset, si turn exhibitus fuisset. Fr. 14 S I o D. deposit. 16,3:<br />

Cum interitura esset ea res etsi restituta esset actori.<br />

Acerca deste ponto ha também grande controvérsia entre os Ttomanistas:<br />

Vej. Savigny, tom. 6, § 274, Pelíat, com. ao fr. 15 § 3 rei vindicat.<br />

051) Maynz, § 205 not. 15.<br />

(52) Fr. 31 § 3 Her. pet. 5,3: Quia quasi rem suam neglexit, nuliœ<br />

querella! subjectus. Doctr. das Ace. § 71, n. 3.<br />

»


DAS COUSAS 179<br />

via se tinha, justa cansa para litig-ar, não responde pelos casos fortuitos<br />

que obrig'ao ao de má fé (54 \ Da litis-contestação resulta<br />

para o possuidor de boa fé a obrigação ' de administrar a cousa<br />

com todo o zelo, attenta a possibilidade de ser outrem julgado<br />

dono (55) : d'ahi a razão porque a lei dessa data em diante o<br />

equipara ao de má fé (56).<br />

3." A responsabilidade do possuidor pela perda da cousa<br />

ou da sua posse, sempre que é motivada por culpa ou negligencia,<br />

se traduz na obrigação de satisfazer as perdas e damnos resultantes<br />

(cesfimatio litis, vel rei) (57). Mas se o réo perdeu a posse<br />

por dolo, isto é, com a intenção de tornar a entrega impossível,<br />

ou, se sem ter posse, acudio á acção, deve ser condemnado<br />

a restítuir o valor da cousa pelo juramento do autor (valor real<br />

e o de affeição) (58).<br />

5.° O possuidor que houver pago a estimação da cousa<br />

fica subrogado nos direitos que o autor tinha sobre ella (59).<br />

(53) Fr. 45, D. reivindicai 6,1: Inter quos erit et bonas fidei possessor<br />

post litem contestatem.<br />

(54) Fr. 40 D. Hered. pet. 5,3: Nee enin debet possessor (b. f.) aut<br />

mortalitatem prœstare aut propter metum hujus periculi temere indefensum<br />

jus suum relinquere. Cujacio, ao dito fr. (tom. VII, pag. 260): LBonas fidei<br />

possessorem, non improbe lüigantem, puta, cum esset aliqua justa causa,<br />

propter quam existimare deberet rem petitoris non esse, sed suam potius aut<br />

autoris sui. Doctr. das Acç. nota 129. Vej. Pellat, ao fr. 15 § 3 rei vindicat.<br />

(55) C. 10 C. de adq. poss. 7,32: Ex interposita contestatione et causa<br />

in judicium deducta, super jure possessionis vacillet ac ãubitet. fr. 25 § 7 D.<br />

heredit petion. 5,3:... Cœpit enim scire rem ad se non pertinentem possidere<br />

se, is qui interpellatur. Vej. Savigny § 264.<br />

(56) Fr. 25 § 7. CD. eodem: Post motam controversiam omnes possessores<br />

pares fiunt.<br />

(57) Fr. 68


180 DIREITO<br />

6.° Quanto ás perdas parciaes (deteriorações), prevalece a<br />

mesma doutrina : o possuidor só responde pelas que são devidas<br />

á culpa ou neg-lig-encia : o de má fé pelas occorridas em<br />

todo o decurso da sua posse ; o de boa fé tão somente pelas acontecidas<br />

depois da litis-contestação (60).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 510 — O possuidor áe bôa fé tem direito, emquanto ella durar, o o s<br />

fructos percebidos. — 490, 512.<br />

Art. 511 — Os fructos pendentes ao tempo em que cessar a bôa fé devem<br />

ser restituiãos depois de deduzidas as despezas de producção e custeio. Devem<br />

ser também reslituidos os fructos colhidos com, antecipação.<br />

Art. 512 — Os fructos naturaes e inâustriaes reputam-se colhidos e percebidos,<br />

logo que são separados. Os civis reputai))-se percebidos dia por dia.<br />

Art. 513 — O possuidor de má fé responde por todos os fructos colhidos<br />

e percebidos bem. como pelos que, por culpa SIM deixou de perceber desdém<br />

o momento em que se constittiiu, de má fé; tem direito, porém, ás despezas<br />

de producção e cítsteio.<br />

Art. 514 — O possiíidor de bôa fé, não responde pela perda ou deterioração<br />

da cousa, a que não der causa.<br />

Art. 515 — O possuidor de má fé responde pela perda, ou deterioração da<br />

cousa ainda que accidentaes, salvo se provar que do mesmo modo se teriam<br />

dado, estando ella na posse do reivinãicante.<br />

Art. 516 — O possuidor de bôa fé tem direito á indenvnização das bemfeitorias<br />

necessárias e úteis, bem como, quanto ás voluptuarias, se lhe não<br />

jorem, pagas, ao de levantal-as, quando o puder, sem detrimento da cousa.<br />

Pelo valor das bemfeitorias necessárias e úteis, poderá exercer o direito de retenção.<br />

— 63, 156ó, III.<br />

mado eqüivalia á venda ; o domínio, se a cousa effectivamente não estava em<br />

poder do réo, só se lhe transferia, quando delia tomava posse: fr. 47.<br />

D. eodem.<br />

•Se porém a restituição da cousa se tinha tornado impossível por dolo,<br />

o domínio não passava ao réo, retinha-o o author: fr. 69 e 70 D. rei vindicat.<br />

Esta doctrina não é aceita hoje por contraria ao principio de equidade<br />

que a ninguém é licito enriquecer-se â custa alheia. A ord. III, 86 § 16<br />

só impõe ao réo que deixou de possuir por dolo a pena de satisfazer, além do<br />

valor real, o da affeição do author.<br />

(60) Fr. 13 D. rei vindicat, 6,1; fr. 25 § 11 D. heredit pet. 5,3 fr. 31,<br />

S 3D. eodem. Pellat, Com. ao fr. 13 rei vindicat. uDoctr. das Acç. nota<br />

123, in fine.


DAS COUSAS 181<br />

§ 85 D). — Prestações do autor.<br />

1. Não é o autor, em regra, obrigado a fazer bom ao possuidor<br />

o preço pelo qual houve este de terceiro a cousa que lhe<br />

é reivindicada (61), mas, como ninguém se pôde locupletar á custa<br />

alheia, deve resarcir ao réo todas as despezas que fez com a<br />

cousa e que redundarão em proveito real.<br />

2. Assim que : corre-lhe a obrigação de indemnisar ao<br />

possuidor,quer de bôa, quer de má fé, as bemfeitorias necessárias,<br />

(62), e as úteis, ainda existentes (63), pelo custo, se o custo é<br />

inferior ao valor actual, pelo valor actual, se lhe é superior o<br />

custo (64).<br />

3. Ao possuidor, consentindo o dono, é licito levantar as<br />

úteis, se podem ser tiradas sem estrag-o do corpo a que adherem(65).<br />

(61) Const 3 e 25. C. de rei vindicat., 3,32; Const. 2. C. de furtis et<br />

servo corrup..., 6,2 Doctr. das Acç- nota 124. A regra estabelecida soffre<br />

exeepções, como são as seguintes:<br />

A). A mulher casada que reivindica o imraovel alienado pelo marido,<br />

sem a sua outhorga, é obrigada a pagar ao comprador o preço, se verteu<br />

em proveito seu ou do casal. Ord. IV, 48, § 4.<br />

B). Igualmente o menor que reivindica cousa sua, vendida pelo tutor sem<br />

a devida autorização nos casos em que é necessária, restitue o preço, se foi<br />

convertido em proveito seu. Const. 16. C. de prœdiis et ai. reb. * 5,71. Vej.<br />

Dir. de Fam., § 153.<br />

(62) Comt. 5. C. rei vindicat., 3,32; fr. 65, pr. D. rei vindicat., 6,1;<br />

Ord. IV, 48, S 7.<br />

(63) Ord. IV, 48, S 7; Valasc, Consult. 83, n. 18; Mello, 4,6, § 10:<br />

B. Carneiro, L. 2, § 67, n. 14, nota (a); Doctr. das Acç., § 72 e nota 131.<br />

Segundo o Dir. Rom., só ao possuidor de bôa fié se pagavão as úteis,<br />

ao de má fé era tão somente permittido tiral-as, sendo isto possível sem detrimento<br />

da cousa (§ 3Oi, I. de rer. divis., 2,1).<br />

Nesta parte o rigor do Direito Romano tem sido modificado pelo uso<br />

moderno: consente-se que o possuidor de má fé possa haver as despezas e<br />

bemfeitorias úteis. Repert. das Ord., tom. 1, pag. 272, nota (a); B. Carneiro,<br />

L. 2, § 67, n. 14, nota (a); Doctr. das Acç., § 72. Cujacio já pensava do<br />

mesmo modo: Com. ao fr. 27, § 5, rei vindicat. Tom. VII, pag. 290; Observât,<br />

XI, I. tom. III, pag. 231.)<br />

(64) F. 38. D. rei vindicat., 6,1: Reddat impensam, ut fundum recipiat..<br />

usque eo duntaxat quo pretíosior factus est. Fr. 48. ID. eodem. Pothier,<br />

Propriété, n. 346; Dig. Port. I, art. 548 e 549; Rocha, § 449.<br />

(65) F. 38. D. rei vindicat., ',1.


182 DIREITO<br />

4. Pelo que respeita ás voluptuaias, isto é, ás que são de<br />

mero ornato e conimodidade e não augmentão o valor da cousa,<br />

o proprietário não deve indemnisação alguma ; o possuidor as<br />

pôde levar, se com a sua extracção a cousa não soffre damno (66).<br />

5. O possuidor, a quem é devido o preço de bemfeitorias,<br />

pôde reter a cousa até que seja paço (67).<br />

6. O proprietário de seu lado pôde exigir que as despezas<br />

por elle devidas sejão compensadas com os fructos que o possuidor<br />

percebeu e fez seus (68).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 517 — Ao possuidor de má fé, serão ressarcidas somente as bemfeitorias<br />

necessárias ; mas não lhe assiste o direito de retenção pela importância<br />

destas nem o de levantar as voíupluarias. — 63.<br />

Art. 518 — As bemfeitorias compensam-se com os ãamnos e só obrigam<br />

ao resarclmenlo, se ao tempo da evicção ainda existirem.<br />

Art. 519 — O reivindi cante obrigado a indemnizar as bemfeitorias, terá<br />

direito de optar entre o seu valor actual e o seu custo.<br />

§ 86 E.) —Excepções do réo.<br />

1. Entre as diversas excepções com que o réo pôde repellir<br />

a reivindicação, ha umas que se traduzem em formal contestação<br />

do domínio, e outras que, sem excluírem o domínio, perimem<br />

todavia a obrigação de restituir a cousa.<br />

2.'Na classe das primeiras, entre outras se inclue rei venàilíc<br />

cl tradita, isto é, a que tem por fundamento o principio seguinte<br />

:<br />

«Que não pode reivindicar a cousa aquelle que seria responsável<br />

ao possuidor pelo preço delia no caso de evicção » (09)<br />

Esta excepção, baseada em uma razão de equidade, pôde<br />

ser opposta nos casos seguintes :<br />

(66) B. Carneiro, L. 2, § 67, n. 12 c 15; Doctr. das Acç., § 72; Makeldey,<br />

§ 302, n. 5, in fine; Zacar., § 218, n. 3.<br />

(67) P. 21, S õ; fr. 48. D. rei vindicat. Ord. 4,54 § I o ; Doctr. das<br />

ACQ., § 72. Pôde o possuidor haver também por meio de acção as despezas<br />

necessárias ou úteis, se não usou em tempo de embargos de retenção:<br />

Valasc, Com. 83. n. 19; R. Carneiro, 2, § 67, n. 14, nota (a).<br />

(68) Ord. ill, 86 S 5, IV, 48, § 7.<br />

(69) "Quem de evictione tenet actio, eumdem agenten repellit exceptio<br />

rei venditse et iracütíe." D. de except., rei vendit et tradit. 21. 3. Mello,<br />

1, 6 § 10 in fine; Doctr. dos Acç. § 3 357, nota 834.<br />

i^


DAS COUSAS 183<br />

l. e Quando a cousa foi alienada ao réo pelo próprio reivindicante<br />

que não era proprietário delia ao tempo da alienação,<br />

mas que a adquiriu por titulo posterior, universal ou singular (70)<br />

2.° Quando, nos termos expostos, a cousa é reivindicada,<br />

não pelo próprio aljenante, mas por quem houve délie a cousa<br />

por titulo universal ou singular (71).<br />

3.° Quando o reivindicante, verdadeiro senhor da cousa,<br />

succedeu por titulo universal á pessoa que a alienou ao réo (72)<br />

A dita excepção só pôde ser utilmente invocada no caso<br />

que a cousa tenha sido effectivamente entregue ao réo (traditce)<br />

ou que elle tenha delia tomado posse, em virtude de titulo valido<br />

(venditce), próprio em these para translerir a propriedade<br />

(73). E' transmissível por successão aos herdeiros do possuidor<br />

(74).<br />

3. Pertencem á classe das segundas :<br />

1.° A de perda da cousa ou da posse delia, nos casos em<br />

que esta excepção é admissível (75).<br />

2.° A que é fundada no direito, real ou pessoal, de reter<br />

a cousa, como se o réo é usofruetuario ou locatário (76).<br />

II. § 87. — Acção negatoria<br />

1. O dominio é de sua natureza illiinitado e exclusivo<br />

(77) e como tal lhe é inhérente a acção negatoria (78).<br />

(70) Fr. 1 D. except, rei vendit, et tradit. 21 3. Marcellus scribit, si<br />

olienum fundum vendideris, et tuum postea factum petas, hac te exceptione<br />

recte repellendum. Digest. Post. I, art. 877.<br />

(71) Fr. 3 § 1.° .D. eodem: Pari ratione vendUoris etiam successoribus<br />

nocebit, sive in universum jus, sive in earn duntaxat rem successerit.<br />

(72) Fr. 72


184 DIREITO<br />

2. Destinadas ambas, a reivindicação e a negatoria, a<br />

proteger o domínio, cada uma o faz de modo diverso, seg'undo<br />

a latitude das usurpações que tendem a corrigir. A reivindicação<br />

é provocada pela perda da posse da cousa (79); a negatoria<br />

por actos de terceiro, que sem importarem a tirada da cousa do<br />

poder do proprietário restringem ou limitão o exercício do domínio<br />

(80). Uma tem por fim vindicai a propria cousa, a outra viudicar<br />

a liberdade da cousa (81).<br />

3. A acçâo negatoria é mais commum e geralmente usada<br />

para excluir a preterição daquelles que se arrogão direitos reaes<br />

na propriedade alheia, e d'ahi provém o tomarem-n'a como<br />

exclusivamente adaptada a repellir sirvidões illegalmente constituídas.<br />

(82).<br />

E' todavia certo que pôde ella ser invocada contra quaesquer<br />

actos attentatorios da liberdade do dominio, embora esses<br />

actos não constituão exercício material de servidões (83).<br />

Por extensão comnete também esta acção ao senhor do dominio util e<br />

ao usufruetuario.<br />

(79) Vej. § 81 acima.<br />

(80) § 2,1 de actionibus 2,4: Ut siquis intenda jus non esse adversário<br />

utendi. fruendi, eundi, agendi aguamve ducendi... Istíe quoque actiones in<br />

rem sunt, sed negatorite. Fr. 8 pr.Si servit, vindic. 8. 5: Et hic quoque<br />

sicut in cœteris servitutibus actio contraria dabitur: hoc est, jus tib non esse<br />

me cogère. Diz-se negatoria, negativa, porque tem por fim negar a servidão<br />

ou o direito que o terceiro se arroga sobre a cousa.<br />

(81) "Vinãicaíio Wbertatis" costumão os escriptores denominar a<br />

negatoria.<br />

(82) Fr. 2 pr. iD. Si servit, vindic. 8,5: Confessoria ei qui servitutes<br />

sibi competere ostendat. negatoria domino qui negat. Vej. Mello 4, 6, § 13,<br />

Doctr. das Acç. § 117.<br />

(83) A.) Fr. 13 D. Si servit, vindic. 8 5: refere-se ao caso de rebentarem<br />

tubos particulares na rua {in via publica) e deitarem água na parede<br />

de terceiro: este pôde intentar a negatoria contra o dono dos tubos, não<br />

para excluir uma servidão que não existe, mas para repellir um facto permanente<br />

que lesa a propriedade do autor. B) Fr. 14 § 1.° fr., 17, D. eodem:<br />

alludem á hypothèse da parede em meio pender para a casa do vizinho<br />

(at in vieini domum semipedem aut amplius procumberet) : ao vizinho compete<br />

a negatoria contra o dono da parede pendida pela razão "jus non esse<br />

ilium parietem ita projectum in suum esse, invito se." Não se trata igualmente<br />

de servidão. Caso semilhante offerece o fr. 6 § 2 D. de arborib.<br />

ca^dend. 47, 7. Em contrario á doctrina exposta, mas sem fundamento, o velho<br />

Caminha, Libel. 3, nota 3.


DAS COUSAS 185<br />

4. Da noção da negatoria resulta que o proprietário que<br />

quer intenta­la, deve provar :<br />

Que a cousa lhe pertence (84) ;<br />

Que o réo o está molestando com a pratica de actos que<br />

o inhibem de exercer livremente e em toda a extensão o seu domínio<br />

(85).<br />

Nesta acção ha isto de singular, que o author não carece<br />

de provar que a sua propriedade é livre : é essa a presumpção<br />

de direito, a qual só pôde ser illidida pela prova em contrario,<br />

prova que incumbe ao réo (86).<br />

Não basta para provocar o exercio da negatoria uma offensa<br />

fugitiva ; é mister uma lesão real e permanente á liberdade do<br />

domínio (87).<br />

5. Tem a dita acção por fim pricipal o reconhecimento da<br />

liberdade da cousa (88), do que são conseqüências : a prohibição<br />

ao réo, sob certa pena (89), de continuar nas mesmas usurpaçoes<br />

(84) Fr. 5 pr. D. Si usufruct, pet. 7. 6; fr. 15, D. de oper. nov. nunt.<br />

49, 1. Mühlenbruch S 292, Doctr. das Acç. § 117; Lobão. Seg. Linh.<br />

nota 532.<br />

(85) Fr. 26 D. de servit, preed. urb. 8, 2. Caminha Libel. 3, nota 3.<br />

(86) Acerca deste ponto houve grande controvérsia entre os jurisconsultes.<br />

A opinião que afinal prevaleceu, como mais conforme á razão do Direito,<br />

é a que fica exarada no nosso texto, ainda mesmo no caso do réo ter a<br />

quasi­posse. Mühlenbruch § 292 nota 22, Maynz § 223, Valasc. Consult. 82<br />

n. 6, Caminha. Libel. 3, nota 2. Mello 4 6 § 17. Lobão Seg. Linh., nota 532.<br />

Ao réo, pois, não basta negar a intenção do autor, mas lhe cumpre provar<br />

que lhe assiste direito á servidão, ou a praticar o acto que o autor impugna.<br />

Doctr. das Acç. § 118. Vej.Zacar. § 218.<br />

(87) Maynz § 207, nota 4.<br />

■Se o réo não tem a quasi­posse da servidão, pôde o autor usar do utipossiãetis<br />

(força turbativa). Vej. § 19 acima.<br />

Se a offensa consiste em acto passageiro que não se reproduz, ao proprietário<br />

assiste acção por perdas e damnos, mas como a offensa cessou, a<br />

negativa não teria objecto.<br />

(88) § 2,1. de artionib. 4, 6; fr. 2 D. Si servit, vindic. 8,5; Caminha,<br />

Libello 3 in fine; Doctr. das Acç. § 117.<br />

(89) Segundo o Dir. Romano impunha­se ao réo caução, fiança para<br />

não .reproduzir a usurpação: fr. 5 § 6 D. Si usufruct, pet. 7. 6; fr. 4 § 2.<br />

fr. 6 § 6, D. 'Si servit, vindic. 8,5. Caminha, Libello cit. nota 7, attesta<br />

que semelhante pratica não estava em uso no seu tempo. No nosso foro segue­se<br />

a lição da Doctr. das Acç. § 117 que é a exposta no texto. P. Baptista.<br />

Theor. e Pratic. do Processo, § 13.


186 DIREITO<br />

(90), e a condemnação, se no caso couber, de repor a cousa no<br />

antigo estado e satisfazer as perdas e damnos causados (91).<br />

III § 88.—Acção Publicictna<br />

1. A acção de reivindicação e a negatoria não podem ser<br />

invocadas senão por quem de direito adquiriu eífectivamente o<br />

domínio (92).<br />

Acha-se, pois, fora da garantia destas acções aquelle que<br />

está em via de adquirir a cousa por meio de prescripção ainda<br />

não consumada. Nestas circumstancias, se lhe é tirada a cousa e<br />

retida por terceiro, que meio lhe restará para rehave-la e recobrar<br />

a antiga posição ? O interdicto recuperatorio poderia ser<br />

utilrnente empregado em alguns casos ( Q 3); mas em relação aos<br />

detentores contra os quaes c inadmissivel (94), o prescribente ficaria<br />

privado de protecção.<br />

2. A necessidade de supprir esta falta determinou a creação<br />

de uma acção especial:—o que se alcançou por meio de uma.fi'<br />

cção, consistente em se considerar antecipadamente como proprietário<br />

quem está em via de prescrever e em se lhe conferir, para<br />

vindicar a cousa cuja posse perdera, uma acção real, que do<br />

nome de seu introductor se ficou chamando Publiciana (95).<br />

(90) Fr. 7, 12, 14 D. Si servit, vindic. 8, 5; Const. 8 C. de servit. 3, 34;<br />

Doctr. das ACQ. § 117.<br />

(91) Fr.õ § 6 D. Si usufruct, pet. 7, 6; fr. 4 § 2, fr. 6 § 6, D. Si ser<br />

vit. vindic. 8, 5. Caminha, Libello, 3, nota 5, Doctr. das ACQ. § 117, Zacart.,<br />

§ 219.<br />

(92) Vej. § 82 e 87. acima.<br />

(93) Vej. § 22, acima.<br />

(94) O interdicto recuperatorio (unâe vi) só é competente contra o autor<br />

da força, e contra o que delle recebeu o objecto, conscio do espolio (§ 22,<br />

acima). Assim, supponha-se que um terceiro tirou a cousa, mesmo ã força,<br />

do poder do que a esbulhara do prescribente: esse terceiro não se considera<br />

esbulhador em relação ao prescribente; contra elle, portanto.não poderia o<br />

prescribente empregar o dito interdicto. Veja-se no entanto o § 22,<br />

nota 10 acima.<br />

(95) Gaio, I. Com. IV, § 36: Datur autem nœc actio ei qui ex justa<br />

causa traditam sibi rem nonãum usucepit, eamque, amissa possessione, petit.<br />

Nam quia non potest earn ex jure Quirit. suam esse intendere, fingitur rem.<br />

usucepisse. Fr. 1, § 2, D. de Publician., in rem action., 6,2.<br />

Acerca da origem histórica desta acção, vej. Maynz, § 178. Observât.,<br />

Pellat, Com. ao T. D. de Publician. in rem action.


DAS COUSAS 187<br />

3. E' remodelada sobre a reivindicação: tem o mesmo fim<br />

—a restituição da cousa, mas fundamento diverso—a posse apta<br />

para a prescripção e nào o dominio.<br />

4. Da exposição feita se vê que a acção Publiciana só<br />

compete ao que tem posse para a prescripção acquisitiva, isto é,<br />

aquelle que possue cousa prescriptivel (96), em bôa fé (97)<br />

e por justa causa (98), propria em these para transferir dominio<br />

(99).<br />

5. Pois que repousa em uma ficção, a Publiciana não pôde<br />

ser dirigida :<br />

a) Contra o verdadeiro proprietário, porque a ficção cede<br />

diante da realidade (100): salvo todavia se o author tem contra o<br />

proprietário alguma allegação que torne inefficaz a excepção de<br />

dominio, como a rei venditce et traditœ (101).<br />

b ) Nem contra aquelle em cujo favor milita a mesma ficção<br />

em que se apoia o author, isto é, que possuísse por titulos<br />

iguaes ao do autor—justa causa e boa fé (102). Nesta igualdade<br />

de condição é melhor a posição do que actualmente possue (103).<br />

(96) p.r. 9, S 5, D. de «Pub. in rem action., 6,2: Hcec actio in his quœ<br />

usucapi non possunt... locum non habct. O fr. 12, § 2. D. eodem, contém<br />

uma excepção a este principio, excepção que não se verifica no nosso Direito<br />

. Vej. Pellat. com. ao cit. fr.<br />

(97) Fr. 3, § I o , fr. 7, § 17. D. eodem. A superveniencia de má fé<br />

torna a prescripção impossível e por conseqüência o exercicio da Publiciana;<br />

Mühlenbruch, § 273, n. 5.<br />

Em contrario, C. Telles, mas sem razão; Dootr. das ACQ., nota 139.<br />

(98) Fr. 1. pr. ; fr. 3, § I o ; fr. 4,5 e 6. D. de Publician. in rem<br />

action, 6,2.<br />

A Publiciana é admissivel, ou a posse fosse adquirida por tradição ou por<br />

apprehensão (fr. 1, § 2; fr. 2 e 3. D. eodem); e ainda sem tradição ou apprehensão<br />

nos casos em que o titulo é por si só sufficiente para transferir<br />

dominio, fr. 11, § 2; fr. 12, § I o , D. eodem. Vej. § 43, acima.<br />

(99) Fr. 13, pr. e § I o , D. eodem. Assim não pôde usar desta acção<br />

o depositário, o commodatario; Doctr. das Acç., nota 140.<br />

(100) Fr. 16 e 17, D. eodem; Mello, 4,6, § 13; Doctr. das Acç., § 76.<br />

(101) Fr. 72. D. rei vindicat., 6,1; fr.4, § 32. D. dolo maio, 4,3; fr.<br />

28; D. de >noxalib., act. 3,41; Pellat., Com. ao fr. 17 de Publ. in rema otion.<br />

(102) Mühlenbruch, § 273; Mello, 4,6, § 13; Doctr. das Acç., § 74.<br />

(103) Fr. 9, § 4. D. Publician. in rem. action, 6,2: Quod si a diversis non<br />

dominis (emerint), melior causa sit possidentis quam petentis. E' muito conhecido<br />

o brocardo: In pari causa melior est conditio possidentis. •


188 - DIREITO<br />

Mas se o author e réo houverão a cousa da mesma pessoa, triumpha<br />

aquelle a quem primeiro foi feita a tradição (104).<br />

Assim que: a Publiciana só pôde ser utilmente intentada<br />

contra aquelle cuja posse ou é inhabil para a prescripção (105)ou<br />

é fundada em direito que succumbe diante do direito do author<br />

6. Ao verdadeiro proprietário também é permittido usar<br />

da Puhliciana, visto reunir elle as condições—de posse, justo titulo<br />

e boa fé (107). E muitas vezes lhe será mais util recorrer á<br />

ella, porque lhe dispensa a prova do dominio, necessária na reivindicação,<br />

prova difficil sempre que se trata de modo derivado<br />

de acquisição (108).<br />

(104) Fr. 9, § 4. D eodem: Siquidem ab eodem non domino emerint,<br />

potior sit cui priori res tradita est. E' o mesmo principio que rege a transferencia<br />

do dominio no caso de compra e venda quando a cousa é vendida pelo<br />

mesmo proprietário a dous compradores. Ord. IV, 7.<br />

Neracio, (fr. 31, § 2. D. de act. empt., 1&,1) dava preferencia tanto no<br />

caso desta, como da nota antecedente, aquelle que teve primeiro a tradição<br />

da cousa. Vej. Mühlenbruch, § 273; Maynz, § 208, nota 27.<br />

(105) Como se o possuidor ou não tem titulo, ou tendo-o, está de<br />

mâ fé.<br />

(106) Como no caso em que o réo tem titulo e bôa fé, mas<br />

recebeu a cousa do mesmo vendedor (ab eodem non domino), depois do autor.<br />

A sua posse era hábil para a prescripção, porque assentava em justo titulo<br />

e boa fé; mas o seu direito é mais fraco, porque o autor, possuindo com as mesmas<br />

condições, tinha a vantagem da tradição anterior.<br />

(107) Fr. 39, fr. 66. £>. de evict., 21,2; Mühlenbruch. S 273; Mello,<br />

4,6, § 13; -Doctr. das Acç., § 77.<br />

(108) O Sr. Dr. Paula Baptista (.Theor. e 'Pratic. dos Procès. 3 a edíç.,<br />

§ 11, nota A), sustenta que "a questão que se agita na Publiciana é sobre a<br />

propriedade, e como verdadeira reivindicação, e que, portanto, tudo quanto os<br />

interpretes dizem a respeito da conveniência em preferir a Publiciana á reivindicação...<br />

não tem valor algum". Ha manifesto equivoco neste juizo do<br />

sábio professor.<br />

Na reivindicação o autor é obrigado a provar o seu dominio; e, se houve<br />

a cousa por tradição, carece ainda provar que o vendedor, por exemplo,<br />

era ao tempo da alienação verdadeiro senhor da cousa. Pois bem: se a cousa a<br />

esse tempo não pertencia ao vendedor, ouse o autor o não pôde provar, decahe<br />

necessariamente na reivindicação, ainda que seja ella intentada contra possuidor<br />

injusto; mas se recorrer á Publiciana, ha de triumphar, porque basta-lhe<br />

a posse, o justo titulo e a bôa fé (uma vez que o réo não possua por titulo igual<br />

ou melhor), sem necessidade de indagar se tem o dominio, ou se era legitimo<br />

senhor aquelle de quem recebeu a cousa.


DAS COUSAS 189<br />

7. A Publiciana coincide com a reivindicação nos resultados:<br />

tem, como ella, por fim fazer condemnar o detentor a restituir<br />

a cousa (pmni cansa) com.accessorios, fructos, perdas e damnos<br />

(109).<br />

Já se vê, pois, que. ha casos em que o autor decahirá, se recorrer á reivindicação<br />

; mas triumphará, se preferir a Publiciana.<br />

(109) Fr. 7, § 6 e 8. D. de Publician. in rem action. 6,2; Mühlenbruch<br />

§ 272; Doctr. das Acç., § 77,


CAPITULO IV<br />

COMO SE PERDE O DOMÍNIO<br />

§ 89.—Causas que determinai) a perda do domínio.<br />

O domínio, pois que é um direito adquirido e não originário<br />

(1), assim como nasce do jacto, assim também se perde pelo<br />

fado.<br />

Os factos, em virtude dos quaes se opéra a perda do dominio,<br />

entendem ou, I o com a pessoa do proprietário, ou 2 o com<br />

o objecto do direito, ou 3° com o direito em si.<br />

§ 90.—Perda pelo jado na primeira relação.<br />

No estado actual do nosso Direito só ha um facto que, alcançando<br />

a pessoa do proprietário, importa para elle a perda do<br />

doininio : é a entrada em religião approvada. Este facto acarreta<br />

a extineção da personalidade civil (2) e com ella a da capacidade<br />

de continuar a ser proprietário (3) Assim o religioso pelo acto da<br />

profissão solemne se reputa civilmente morto e em conseqüência<br />

abre-se-lhe a successão, passando aos herdeiros a titulo universal<br />

o seu patrimônio —direitos reaes e pessoaes (4).<br />

((D Vej. § 31, acima.<br />

(2) Lei de 25 de Junho de 1766 e de 9 de Setembro de 1769, § 10 B. Car<br />

noiro, L. 1, T. 8 §§ 83 e 84.<br />

(3) Decreto de 16 de Setembro de 1817, verb. "E as mesmas leis de<br />

amortização e prohibição de alienar ou adquirir, herdar ou succéder, tanto<br />

para as Ordens em commum como para seus indivíduos, ficarão em sua<br />

força e observância para o futuro." B. Carneiro, cit. § 83, n. 1.<br />

(4) B. Carneiro, cit. § 84 n. 8. E' este o caso único de incapacidade<br />

absoluta. Não temos, a servidão de pena. . .


192 DIREITO<br />

§ 91. --Perda pelo jacto na segunda relação<br />

O domínio tem por objecto cousas corporeas : sem cousa<br />

corporea não se concebe a existência do domínio (5). .<br />

Assim pois o domínio se exting-ue :<br />

1. Quando a cousa perece, como se o prédio se incendeia,<br />

se o animal morre, se o navio naufraga (6),<br />

2. Quando a cousa se consome no mister a que é destinada,<br />

como as roupas que se estrag-ão com o uso. o carvão que se<br />

queima (7);<br />

3. Quando a cousa passa á nova condição que a põe fora<br />

do nosso poder physico, como se o campo é tomado pelo mar (8),<br />

se o animal bravio ou domesticado recobra a liberdade natural (9).<br />

§ 92-—Perda pelo facto na terceira relação.<br />

A perda do domínio mais commumente se verifica por factos<br />

que não iníluem directamente nem sobre a pessoa do proprietário,<br />

nem sobre a cousa, objecto do direito, mas sobre o próprio<br />

direito.<br />

Nesta relação a perda se consuma ou por acto voluntário<br />

do senhor da cousa. ou por facto independente de sua vontade.<br />

A. Por acto voluntário:<br />

I o . Pelo abandono (derelictio) (10);<br />

2 o . Pela alienação a terceiro (11). No primeiro caso o domínio<br />

se exting-ue de uma maneira absoluta (12); no segimdo exting-ue-se<br />

para o aliénante e passa para o adquirente (13).<br />

B. Por acto independente da vontade nos casos seguintes<br />

:<br />

(5) Vej. § 24, acima.<br />

(6) F. 16 1). de legat. 2,22; fr. 30 § 3 D. de adq. vel axnit. possess.<br />

41, 2.<br />

(7) Maynz, § 209.<br />

(8) Fr.23 D. Quib. mod. usufr. amit. 7, 4.<br />

(9) § 12 e 15, I. de rer. divis. 2, 1, fr. 5 § 5 D. de adq. rer.<br />

dom. 41,1.<br />

(10) Vej. § 3S, acima.<br />

(11) Vej. § 31 acima.<br />

(12) A cousa abandonada se torna res nullu e pôde ser novamente<br />

adquirida pelo primeiro occupante. Vej. § 35 acima.<br />

(13) A razão é que uma mesma cousa não pôde ao mesmo tempo pertencer<br />

in solidum á duas ou mais pessoas.


DAS COUSAS 193<br />

I o . Por especificação, commixtão ou accessão (14);<br />

2 o . Pelo implemento da condição resolutiva (15);<br />

3 o . Por virtude da excepção rei vinditœ et trnditœ (16);<br />

4 o . Pela arrematação em praça publica (17);<br />

5 o . Pela adjudicação (18);<br />

6 o . Pela desapropriação por utilidade publica (19);<br />

7 o . Por infracção de leis prohibitivas nos casos nellas<br />

expressos (20).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

• Art. 589 — Além. das cansas de exiincção consideradas neste código, também<br />

se perde a propriedade immovel :<br />

I — Pela alienação.<br />

II — Pela renuncia.<br />

III — Pelo abandono.<br />

IV — Pelo perecimento do immovel. — 78.<br />

S I o — Nos dons primeiros casos deste artigo, os effeitos da perda do domínio<br />

serão subordinados á transcripção do titulo transmissível, ou do act o<br />

reminciativo. no registro do lugar do immovel. — 531, 53'3, 860, § único.<br />

§ 2" — O immovel abandonado arrecadar-se-d como bem- vago, e passará,<br />

dez annos depois, ao domínio do Estado, onde se achar, ou da União, se estiver<br />

no Districto Federal ou em território não constituído Estado.<br />

Art. 590 — Também, se perde a propriedade immovel mediante a desapropriação<br />

por necessidade ou utilidade publica. — Const, art. 72, § 17.<br />

à 1" — Consideram-se casos de necessidade publica:<br />

I — A defesa do território nacional.<br />

II — A segurança publica.<br />

III — OS soecorros públicos, nos casos de calamidade.<br />

IV — A salubridade publica.<br />

§ 2" — Consideram-se casos de utilidade publica:<br />

(14) Vej. os §§ 37, 38. 41 o 42 acima.<br />

(15) No caso, por exemplo de fideieommisso, verificada a condição, o<br />

Objecto passa ao fideicommissario. Vej. § 27 acima.<br />

(16) Maynz § 206, nota 37. O ef feito desta excepção é fazer que o domínio<br />

se extinga na pessoa do reivindicante e se consolide na pessoa<br />

do réo.<br />

(17) Pereira e Souza, § 434.<br />

(18) Pereira e Souza, Nota 862.<br />

(19) Const. Politic, do Império, art. 179, § 22, Act. Add. art. 10 § 3 e<br />

Lei de 9 de Setembro de 1826.<br />

(20) Exemplos: a) ord. 4.71; b) Cod. Criminal, art. 177 e 279; c), Cod.<br />

Comm., art. 457.


194 DIREITO<br />

I — A fundação de povoações e de estabelecimentos de assistência, educação<br />

ou instrucção publica.<br />

li. — A abertura, aiargamento ou prolongamento de ruas, praças, canaes,<br />

estradas de ferro e, em geral, de guaesqaer vias publicas.<br />

III — A conslrucção de obras ou estabelecimentos, destinados ao bem 1<br />

geral de uma localidade, sua decoração e hygiene.<br />

IV — A exploração de minas. — Const., artigo 72. § 17. alínea 2 a .<br />

Art. 591 — Em caso de perigo immiinente, como guerra ou co-mmoção intestina<br />

(Constituição Federal, art. 80), poderão as autoridades competentes<br />

usar ãa propriedade particular até onde o bem publico o exija, garantião ao<br />

proprietário, o direito á indemnização posterior.<br />

Paragrapho único. Nos demais casos, o proprietário será previamente<br />

indemnizado, e, se recusar a indemnização, consignar-sc-lhe-á juãicialmente<br />

o valor. — Const, art. 72, § 17.


PARTE SEGUNDA<br />

DIREITOS REAES (DE USO OU GOSO) NA COUSA<br />

ALHEIA<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 674 — São direitos reaes, além da propriedade:<br />

I — A emphyteuse. — 678 a 694.<br />

II — As servidões. — 695 « 712.<br />

III — O usofructo. — 713 a 741.<br />

IV — O uso. — 742 a 745.<br />

V — A habitação. — 746 a 748.<br />

VI — As rendas expressamente constituídas sobre immoveis. — 749<br />

a 754 1424. a 1431.<br />

T*/7 — O penhor. 768 a 804.<br />

VIII — A antichrese. — 805 a 808.<br />

IX — A hypotheca. — 809 a 855.<br />

Art. 675 — Os direitos reaes sobre émisas moveis, quando constituídos,<br />

ou transmittidos por actos entre vivos, só se adquirem com a tradição<br />

(art. 620).<br />

Art. 676 — Os direitos reaes sobre immoveis constituídos, ou transm.ittidos<br />

por actos entre vivos só se adquirem depois da trans crtnção, ou da inscripção,<br />

no registro de immoveis, dos referidos títulos (arts. 530, n. I, e 856),<br />

salvo os casos expressos neste Ooãigo.<br />

Art. 677 — Os direitos reaes passam com o immovel para o domínio do<br />

comprador, ou successor.<br />

Paragrapho único. Os impostos que recaem sobre prédios transmittemse<br />

aos naquirent es, salvo constando ãa escriptura, as certidões do recebimento,<br />

pelo fisco, dos impostos devidos e, em caso de venda em praça, até o equivalente<br />

do preço da arrecadação. — 1137.<br />

14


CAPITULO I<br />

DO USOFRUCTO<br />

§ 93. —Noção do nsofructo<br />

1. Entre os direitos elementares do domínio avultão por<br />

sua importância pratica o direito de usar da cousa 'e o de<br />

perceber os fr/icíos que ella é capaz de produzir (1). Estes dous<br />

direitos, destacados da pessoa do proprietário e investidos na pessoa<br />

de terceiro, constituem o usofmeto (2).<br />

Presuppõe, pois, o usofrueto duas ordens de direitos na<br />

mesma cousa (3): — os direitos de senhor da cousa (o proprietário)<br />

e os direitos daquelle em favor de quem é elle instituido<br />

(o usofruetuarío. )<br />

2. O senhor conserva o direito â substancia da cousa (4),<br />

ao qual opportunamente virão de novo reunir-se os direitos destacados<br />

(5), e por essa razão continua a ser reputado proprietário<br />

(6). O usofruetuario, portanto exerce os seus direitos em<br />

cousa que está sob o domínio de outrem: dahi o principio que<br />

o usofrueto não se pôde constituir senão na cousa alheia (7).<br />

(1) Vej. § 25. acima.<br />

(2) I. de usufr. 2.4: ususfruetus est... jus iitendi fruendi.<br />

(3) A cousa sobre queiecahe o usofruetô se chama — cousa fruciuaria.<br />

(4) Gaio, I Com. II. § 30: Dominus proprietatis alii usumfructum in<br />

.jure cedere potest ut ille usumfructum habeat et ipse niiãam proprietatem<br />

retineat.<br />

(õ) § 4, I. de usufr. 2,4: Cum autem finitus fuerit totus ususfruetus,<br />

revertitur ad proprietatem.<br />

(6) § 1. edem: Nttãse proprietatis dominus.<br />

(7) I. pr. de usufr.: ususfruetus est jus aJienis rebus utendi fruendi.<br />

Não se deve confundir o direito que tem o proprietário de usufruir a pro-


DAS COUSAS 197<br />

O domínio, despojado dos direitos que formão o usofructo,<br />

se denomina — nua propriedade, (8).<br />

3. Os direitos que ficão ao proprietário inhibem o usofructuario<br />

de exercer os direitos elementares do usofructo na<br />

mesma extensão em que faz o proprietário quando taes direitos<br />

se conservão ligados ao dominio. O proprietário no uso e gozo<br />

da cousa tem a faculdade ampla de altera-la, transformal-a, de<br />

destruir-lhe, emfim, a substancia (9). Mas o direito do usofructuario<br />

não pode ser levado tão longe. Desde que o proprietário<br />

conserva direito á substancia do objecto, o usofruetuario é obrig-ado<br />

a respeita-la: não ha direito contra direito. Assim o usofructo<br />

é um direito sobre a cousa alheia, salva a substancia da<br />

mesma cousa (10).<br />

No assumpto sujeito, por substancia entende-se^ não a cousa<br />

em si com abstração de seus attributos, mas a forma actual, o<br />

caracter principal, o modo de ser delia com as qualidades inhérentes,<br />

ao tempo da constituição do usofrneto (11).<br />

4. No momento em que o usofruetuario adquire o direito<br />

de usar e fruir a cousa, ella se acha necessariamente sujeita a<br />

algum destino compativel com a sua natureza, e no qual é ou<br />

pria cousa, com o usofructo. O direito de usufruir, pertencente ao proprietário,<br />

é um attributo do dominio ligado ao próprio dominio, e o usofructo<br />

um direito distincte-, separado do dominio, sujeito a regras especiaes.<br />

Os antigos escriptores tornavão sensível esta differença, denominando usofructo<br />

causai ao jus utenãi fruenãi do proprietário, e usofructo formal ao<br />

usofructo propriamente dito. Voet Pandect. 7,1 n, 3. Noodt., de Usufr. I.<br />

capitulo 1.<br />

(8) § 4, 1. de usufr. 2,4: Nudss proprietates dominus. Décret, n. 4355,<br />

de 17 de Abri! de 186'J, art. 7.", § 6.":" O valor da núa-propriedade, Décret.<br />

5881, de 28 de Março de 1874, art. 25 § 1." e art 31 S único"' propriedade<br />

separada. "<br />

(9) Vej. S 24, acima.<br />

(10) I. de usufr. pr. 2,4: Jus rebus aiienis utendi fruendi, salva rcrum<br />

substancia. Estas ultimas palavras tem dado lugar a interpretações diversas.<br />

Vej. Maynz, § 212, nota 1. Accar. n. 274, n. 4. Ortolan e Du Courroy á I.<br />

de usuf. pr. 2,4.<br />

(11) Paul. Sent. 3,6 § 31; fr. 5 § 1.° D. Quib. mod. ususfr. amitt. 7,4;<br />

fr. 10 § 1 a 8 D. eodem. Aecarias, n. 274, n. 4. Ortolan, íi 1. de usufr. pr.<br />

Mburlon 2,3, 1503. 150 3. INeste sentido a substancia, por exemplo, d'um:i<br />

casa, não consiste na natureza dos materiaes de que é composta, mas na<br />

disposição e fôrma dada a esses materiaes.


198 DIREITO<br />

tem sido aproveitada. Este destino é um resultado jurídico da<br />

vontade do proprietário sobre a cousa, e a vontade manifestada<br />

ïeg-al mente se presume continuar a subsistir. Ao usofructuario,<br />

pois. não é permittido violar aquella vontade, isto é, mudar o<br />

destino da cousa (12).<br />

5. A propriedade, privada dos direitos de usar e fruir<br />

se torna, por assim dizer, estéril. A perpetuidade deste estado<br />

de cousas reduziria o domínio a uma pura chimera, e só teria<br />

por effeito impedir o tirarem-se da cousa todas as utilidades e<br />

vantagens de que ella é susceptível, quando sujeita á vontade<br />

soberana do dono (13). Por força de motivos tão ponderosos,<br />

não permitte a lei que os direitos que formão o usofructo se<br />

conservem perpetuamente separados do domínio. Por um systhema<br />

bem combinado de modos de extmcção, o usofructo depois de<br />

prasos mais ou menos long-os, vem a fenecer, e os seus elementos<br />

voltão a se incorporar no domínio (14). O usofructo, pois, é<br />

sempre temporário.<br />

6. Os caracteres expostos se podem resumir na fórmula<br />

seguinte:<br />

«O usofructo é o direito real de retirar da cousa alheia<br />

durante um certo período de tempo, mais ou menos long-o, as<br />

utilidades e proveitos que ella encerra, sem alterar-lhe a substancia<br />

ou mudar-lhe o destino.<br />

7. Resta finalmente observar :<br />

a) Que o usofructo é da sua natureza divisivel, isto é, pode<br />

ser constituído por partes em uma mesma cousa, em uma metade,<br />

por exemplo, de urna casa em favor de um, e noutra metade<br />

em favor de outro (lè);<br />

b) Que o usofructo, para diversos effeitos de direito, se<br />

reputa cousa movei ou itnmovd, segundo é inovei ou i m move] o<br />

objecto sobre que recahe (K>).<br />

(12) Fr. 10, § 1 a 8 D. Quib. mod. ususfr. amit. 7,4; Vinnio< I. fio<br />

usufr. pr. 7; Accar., n. 274; Mourlon, 2,3, n. 1504.<br />

(13) Mourlon, 1. 3, n. 1492 e 1493. Laurent VI, n. 3'26.<br />

(14) S 3 e 4, 1. de usufr. 2,4.<br />

(15) Fr. 5. D. de usufr. 7.1; fr. 14,25. D. Qubi. mod. usufr. amit. 7,4,<br />

(16) Prov. de lfi de Fevereiro e 16 de Setembro do 1818, de S de Janei -<br />

io de 1819, Instr. de 1.° de Setembro de 1836. art. 5.°


DAS COUSAS 199<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 713. — Constitue usofrucbo o direito real de fruir as utilidades e Jructos<br />

de uma cotisa, emquanto temporariamente destacado da propriedade-<br />

— 718.<br />

§ 94. — Em que cotisas se pôde constituir o usofrueto.<br />

1. Da noção de usofrueto—direito real de fruir a cousa<br />

alheia sem lhe alterar a substancia - resulta que elle só pôde ser<br />

constituído :<br />

1.° Em bens de raiz.<br />

2.° E nos moveis que não se consomem com o primeiro<br />

uso, como machinas, navios, alfaias, animaes (7).<br />

Nesta ultima classe se comprehendem certas cousas iuimattriacs,<br />

cuja substancia se conserva sempre intacta, a despeito<br />

da fruição de que ellas são susceptíveis (18); taes são a propriedade<br />

litteraria ( 19 ), a propriedade de apólices da divida publica<br />

(20), a de acções ou fundos de bancos e companhias (21).<br />

(17) § 2. de usufr. 2,4: Constituitur autem ususfruetus non tantum in<br />

fundo et œdious, verum etiam in servis et jumentis, eœterisque rebus, exceptis<br />

eis auíe ipso usu consumuntur, nam ha? res neque naturali ratione neque civil<br />

recipiunt usumfructum. Noodt, Usufr. I, cap. 4.<br />

Em direito se dizem "cousas que se consomem com o uso" aquellas que<br />

se extinguem com o primeiro uso, ou physicamente, como o vinho, o pão, ou<br />

juridicamente, como a lã que se emprega nos tecidos, os materiaes com que<br />

se faz o edifício, o dinheiro que se gasta. Vinnio, Com. ao cit. § 2, da I.,<br />

n. 1 e 3. Na phrase do Direito Romano: -— res quae ipso usu aut primo usu<br />

consumuntur; — in abusu continentur, in absumptione sunt: § 2, I. de<br />

usufr.; fr. 5, § 1 e 2 D. de usofruet. earum rerum 7. 5.<br />

(18) Vinn. ao cit. § da I. pr.: sed et rerum incorporalium ususfruetus<br />

constitui potest. Noodt, usufr. I, cap. 4 in fine.<br />

(19) Vej. § 24, acima. O autor de um livro pôde, por exemplo, transferir<br />

a terceiro o usofrueto da propriedade litteraria do mesmo livro, isto é, o<br />

direito de imprimir, reimprimir, e vender o livro, por um certo tempo.<br />

(20) E' muito usual a pratica de se constituir usofrueto em apólices da<br />

divida publica. Nos termos de transferencia se faz averbação do titulo ou<br />

convenção pelo qual se estabelece o usofrueto. Ordem n. 130 de 14 de<br />

Dezembro de 1842.<br />

O usofrueto de apólices tem todo os característicos do verdadeiro usofrueto:<br />

o usofruetuario não adquire a propriedade délias, não as pôde alienar,<br />

não as consome no seu uso, mas, expirado o prazo do seu direito, é obrigado<br />

á restitui-las ao proprietário.<br />

(21) Décret, n. 156, de 28 de Abril de 1842, art. art. 12, § 4; Decreto 2708,


200 DIREITO<br />

São estas as cousas sobre as quaes se pôde exercer o<br />

usofructo.<br />

2. Todavia, a lei por uma razão de analogia, afinal,<br />

admittio uni como usofructo etn relação ás cousas que se consomem<br />

com o primeiro uso (22). Esta nova espécie, que na realidade<br />

não se pôde confundir com o verdadeiro usofructo, tomou<br />

a denominação de quasi-usofructo. As particularidades de sua na-<br />

CODIGO CIVIIv<br />

Ari. 714 — O usofructo pódc recahir em um Ou mais bens, moveis ou<br />

immoveis, em um patrimônio inteiro ou parte deste, abrangendo-lhe, no todo<br />

ou em parte, os jructos e utilidades.<br />

Art. 715 — O usofructo de immoveis quando não restilte do direito de família,<br />

dependerá de transcri/pção no respectivo registro. — 260, i, 389, 676,<br />

856, U i .<br />

Ari. 716 — Salvo disposição em contrario, o usofructo estende-se aos accessorios<br />

da cousa e seus accrescidos — 727.<br />

Ari. 717 — O usofructo só se pôde transferir, por alienação, ao proprietário<br />

da cousa; mas o seu exercício pôde ceder-se por titulo gratuito ou oneroso.<br />

— 724, 739, V.<br />

Art. 718 — O usofructuario tem direito <br />

dinheiro.<br />

Art. 720 — Quando o usofructo recae sobre apólices da divida publica ou<br />

títulos semelhantes, de cotação variável, a alienação délies só se effectuarã<br />

mediante prévio accôrão entre o usufruetuario e o dono.<br />

de 13 de Dezembro de 1860, art. IS, § 2 e Decreto n. 4355, de 17 de Abril<br />

de 1869, art. 7, n Huber. Pandect. 7,5; n. 2-B, Carneiro, § 46, n. 6.<br />

Kmquanto o banco ou companhia subsiste, o usofructo instituído nos fundos<br />

ou aegões é verdadeiro usufrueto e não quasi o usofructo; mas se se liquidão,<br />

o usofructo, passando a se exercer sobre as quantias que as acções<br />

representavão, se converte em quasi usofructo, por cujas regras é então regido<br />

; Vin. e Huber. loc. cit.<br />

(22) Fr. 2 § 1.° D. usufr. ear. rer. 7,5: Que senatusconsulto non id<br />

effectum est ut pecuniœ ususfructus proprié esset; nec enim naturalis ratio<br />

autoritate senatus commutari potuit, sed remédio introducto. caipit quasi<br />

ususfructus haberi. Huber Pandect. 7,5, iNoodt I. cap. 4.


DAS COUSAS 201<br />

tureaa o tornão sujeito a certas regras peculiares, de que ao diante<br />

se dará noticia (23).<br />

§ 95. — Por quem e por que modos pôde ser constituído<br />

o usofructo<br />

A. Desmembramento do direito de propriedade, o usofructo<br />

não pôde ser constituido senão por quem tem o dominio (24)<br />

ou pleno, on util (25), ou resoluvel (26).<br />

Não obsta que a cousa esteja em commum. Nesse caso o<br />

usofructo recahe no parte indivisa do condômino que o institue<br />

(27), e os direitos do usoiructuario se regem, no que lhes fôr<br />

applicavel, pelos princípios que regulão a compropriedade (28).<br />

B. O usofructo se constitue pelos modos seguintes :<br />

I. Por effeito immediato da lei. Toma a qualificação de legal<br />

ou legitimo São desta espécie:<br />

1.° O usofructo do pai sobre os bens adventicios do filho<br />

famílias (29);<br />

2.° Ó usofructo do pai ou mãe binubos nos bens herdados<br />

de filho de primeiras nupcias que se finou intestado, deixando<br />

sobreviventes irmãos germanos (30).<br />

3 o . O usofructo da viuva quinquagenaria com filhos, casada<br />

em segundas nupcias, nas duas terças dos bens de que ella<br />

não pôde dispor (31).<br />

II. Pt r acto voluntário do proprietário, isto é:<br />

Ou por disposição testamentaria (32);<br />

(23) Vej. § 110, adiante.<br />

(24) Múhlenbruch, § 288, B. Carneiro, L. 2,§ 39, n. 1.<br />

(25) P'r. 1 pr. D. quib. mod. usufr. amit. 74; Lobão, Direito Emphyt.<br />

§ 843 e 844, B. Carneiro, cit. § 39, n. 6.<br />

(26) Fr. 105 D. de conditionib. ei demonstrat. 35. 1; B, Carneiro,<br />

cit. § 39, n. 5.<br />

(27) Zachar. § 197; B. Carneiro, cit. § 39. n. 4.<br />

(28) Vej. § 30, acima.<br />

(29) Ord. D. 4" T. 97, § 19; Direito de familia, § 116, n. 4.<br />

(30) Ord. L. 4° T. 91. § 2 e 4; Direito de familia, § 63.<br />

(31) Ord. L. 4 o T. 105; Direito de familia, § 64.<br />

(32) § 1.° 1. de usufruct. 2. 4; fr. 3 pr.; fr. 6 pr. D. de usufruct. 7, 1:<br />

Mello, L. 3 o , T. 13. § 5.<br />

O usofructo pôde ser constituido pelo testador de três modos:<br />

1." Quando lega simplesmente o usofructo do objecto; neste caso a núa<br />

propriedade se entende pertencer ao herdeiro: § 1" I. d usufr.


202 DIREITO<br />

Ou por acto entre vivos ( 33 ), a titulo oneroso ou gratuito<br />

(34).<br />

A disposição testaraentaria opéra por força propria, independentemente<br />

de facto posterior, a constituição real do usofrueto<br />

(35).<br />

A convenção, porém, não é sufficiente por si só para<br />

produzir um tal effeito (36J. E' mister que accéda a quasi-tradição<br />

do direito (37). Si é immovel a cousa sobre que recahe o<br />

usofrueto; para que possa ser opposto a terceiro, cumpre que o<br />

titulo seja transcripto no registro da comarca (38). Antes da<br />

quasi-tradição o usofrueto nHo se reputa transferido; ainda não<br />

ha direito real, senão um mero contracte, que só gera acção pessoal<br />

para obrigar o proprietário a entregar ao usofruetuario a<br />

cousa (39).<br />

2.° Quando lega a propriedade da cousa, reservando o usofrueto (deãueto<br />

usufruetu): a reserva é em beneficio do herdeiro: fr. 6. D. de<br />

usufruct.<br />

3.° Quando lega expressamente a um a propriedade, a outro o usofrueto.<br />

(33) § 1.° I. de usufruct. 2, 4.<br />

(34) Noodt., Usufruct. II, cap. 2: "qualis est venditío et emptio; Mourlon,<br />

I, n. 1506; B. Carneiro, L. 2 o , § 40, n. 8.<br />

(35) Muhlenbruch, § 288: Voet. Pandect. 7, 1, n. 7; B. Carneiro, cit.<br />

§ 40, n. 32, e veja-se § 44, acima.<br />

(36) Vinnio, I. de usufr. § 1.°, n. 2, Heinecio. Pandect. P. II, § 107,<br />

Noodt. II, cap. 2, Pellat. Principes généraux de la propriété, n. 75, Blondeau,<br />

Christhomat. L. 2°, sect. 2 a , pag. 414, nota 3, Accarias, n. 278, B. Carneiro,<br />

cit. § 40, n. 32.<br />

Ha grande controvérsia acerca deste ponto entre os interpretes do Direito<br />

'Romano. A opinião dominante entre os escriptores mais modernos é —<br />

que o direito real do usofrueto se estabelece sobre a cousa pelo simples effeito<br />

das convenções. — Neste sentido, Savigny, 'Poss. § 45, Warnkoeuig Themis,<br />

tomo X, pag. 57, Maynz § 220. Sem embargo da autoridade de nomes<br />

tão respeitáveis, pareceu-nos mais fundada e mais conforme com o systema<br />

do Direito Romano e com a indole do nosso á doutrina exposta no texto. Ao<br />

demais, é a que tem prevalecido na nossa jurisprudência, segundo o testemunho<br />

dos nossos praxistas.<br />

(37) Vej. § 16, acima.<br />

(38) Lei n. 1.237, de 24 de Setembro de 1864, art. 6 o , § 2 o . Decreto<br />

n. 3.453, de 26 de Abril de 1865, art. 264. Vej. acima § 48.<br />

(39) B. Carneiro, cit. § 40, n. 32.


DAS COUSAS 203<br />

III. Porprescripção acquisitive!, ordinária ou extraordinária<br />

segundo os requisitos que oceorrem (40). O usofrneto de ordinário<br />

se adquire pela prescripção, quando o objecto sobre que<br />

recahe não pertence áquelle que o constitue (41). Consummada<br />

a prescripção, o direito do usofruetuario subsiste em pleno vig-or<br />

com todos os seus effeitos diante do verdadeiro proprietário, como<br />

se por elle mesmo houvesse sido estabelecido (42).<br />

C. A constituição do usofrueto pôde ser pura, a termo,<br />

sob condição suspensiva ou resolutiva (43).<br />

§ 96.—Relações entre o proprietário e o usofructuarÍQ.<br />

1. Constituído o usofrueto, o proprietário e o usofruetuario<br />

se mantêm independentes um do outro, cada nm dentro do<br />

circulo de seus direitos. Ao proprietário fica a núa propriedade<br />

com os direitos que lhe são inhérentes (44); ao usofruetuario passa<br />

com todos os seus consectarios o direito de usar e fruir (45):<br />

—duas ordens de direitos sobre a mesma cousa, mas distinetos<br />

« separados.<br />

(40) C. 12; C. de prescript, long. temp. 7,33; B. Carneiro, cit. § 40,<br />

ns. 30 e 81.<br />

O usofrueto sobre cousas, cujo domínio só se adquire por prescripção de<br />

trinta ou quarenta annos (§ 70 acima), não pôde ser constituído senão por<br />

prescripção de igual prazo. Mühlenbruch § 289, Makeldey, § 326, n 4, nota 5.<br />

A ordinária requer quasi-posse por dez ou vinte annos, e bôa fé e justo titulo;<br />

a extraordinária, quasi-posse por trinta annos e bôa fé. MJaynz, § 22S,<br />

Makeldey, § 326, n. 4.<br />

(41) B. Carneiro, cit. § 40, n. 31.<br />

Se o que não é senhor posteriormente adquire o domínio da cousa. sobre<br />

que havia estabelecido usofrueto, a constituição do usofrueto fica rivalidada.<br />

(42) A prescripção se verifica exactamente contra o verdadeiro proprietário.<br />

A disposição do Direito Romano (fr. 6, § 1." 'D. de usufr.) que permittia<br />

ao juiz nas acções divisórias attribuir a um a propriedade, a outro<br />

o usufrueto, segundo o exigia a commodidade da partilha ou divisão, não<br />

tem sido adoptada pelos códigos modernos.<br />

(43) Fr. Vatican. § 48, 49, 50. Voet. Pandect. 7, 1, n. 5; Accarias, n. 277:<br />

B. Carneiro, § 41, ns. 1 a 6.<br />

(44) Taes são: a) o direito de reivindicar a cousa depois de ex/tkicto o<br />

usofrueto, § 25; «) o direito aos produetos que não entrão na classificação<br />

de fruetos, § 99; c) o direito de adquirir as accessões, § 38 e seg.<br />

(45) Vej. § 97, adiante.


204 DIREITO<br />

As relações jurídicas que esta coincidência de direitos sobre<br />

a mesma cousa créa entre o proprietário e o usofructuarío,<br />

tem um caracter puramente negativo (46), eniquanto snbsiste o<br />

usofructo:—um é obrigado a respeitar o direito do outro.<br />

2. A obrigação do proprietário se resume na «de não<br />

praticar acto algum de que possa resultar damno ou embaraço ao<br />

usofructuarío no exercício de seus direitos» (471.<br />

3. Ao proprietário, pois, não é permittido, salvo consentimento<br />

do usofructuarío :<br />

I o . Mudar a substancia ou formada cousa fructuaria,como<br />

demolir edifícios ou construir novos (48);<br />

2 o . Alterar-lhe o destino, como converter terras de cultura<br />

em pastos (49).<br />

3 o . Constituir em favor de terceiro o direito de uso, de<br />

habitação, ou um novo usofructo (50).<br />

4 o . Impor servidões (51).<br />

5 o . Renunciar servidões activas, como permittir ao dono<br />

do prédio serviente fechar o caminho (52).<br />

6 o . Km peiorar de qualquer maneira as condições da cousa<br />

fructuaria, como, por exemplo, cortar as levadas d'agua preexistentes,<br />

tiradas de prédio seu livre para a herdade fructuaria<br />

(53).<br />

(46) A razão é obvia: tanto os direitos do proprietário como os do usofructuarío<br />

em relação á cousa são reaes. — Aos direitos reaes correspondem,<br />

como é sabido, obrigações negativas. Marezoll, § 48. Vej. $ 1 o , acima.<br />

(47) Fr. 7 S 1.°, fr. 17 pr. e § 1." D. de usufructu 7,1; Cod. Civil ranc.<br />

art. 599, do Chile, art. 779. Voet, Pandect. 7,1. n. 20<br />

(48) Fr. cit. na nota antecedente; Momion, I. T. 3, n. 1564.<br />

(49) Mou ri on, loc. cit.<br />

(50) Zachariœ, § 224.<br />

(51) Fr. 15 § 7 D. de usufruct. 7,1. Voet, Pandect. 7,1, n. 20.<br />

(52) Fr. citado: Sed nec servitutem imponere fundo potest proprietárias,<br />

nee amittere. Por Direito Romano não podia o proprietário impor servidão<br />

ao prédio fructuario, nem mesmo consentindo ousufructuario:— subtileza<br />

que não prevalece hoje. Voet, loc. cit. Mello, L,. 3. T. 13 § 3. Vej.<br />

Noodt. Usufr. I, cap. 16.<br />

(53) Fr. 10 § 6. fr. 17 §. l.° 'D. de usufruct. 7,1: Ne deteriorem cotiãitionem<br />

fructuarii faciat proprietárias.<br />

As levadas d'agua e os caminhos que vão do prédio livre do proprietário<br />

para o prédio fructuario não constituem servidões propriamente ditas:<br />

ninguém pôde ter servidão na propria cousa. Vej. § 114, adiante.


L<br />

DAS COUSAS 205<br />

§ 97.—I. Direitos do usojruclo.—Em quo consiste o direito de<br />

i {so fruir.<br />

Os direitos do usofructuario se reduzem, em substancia, ao<br />

direito de de usar da cousa e ao de perceber-lhe os fructos (54)<br />

1. O direito de usar consiste no direito de se servir da cousa,<br />

de aproveital-a em todos os misteres conciliaveis com o seu<br />

destino, sem todavia destruir-lhe a substancia. O uso, pois, exprime<br />

a idéa de um emprego que se repete indefinidamente,que<br />

não consome o objecto, que o deixa subsistir em seu ser (55). Habitar<br />

uma casa, empregar um navio mercante no transporte de<br />

cargas, fazer trabalhar uma machina, são verdadeiros actos de<br />

uso.<br />

2. Além dos usos a que as cousas, segundo a sua natureza<br />

e destino se prestão, tem ellas a propriedade de produzirem fructos;<br />

ha até algumas que em sentido rigoroso não são susceptíveis<br />

de uso e só dão fructos (56).<br />

O direito de apropriar-se os fructos é o mais importante e<br />

fecundo direito do usofructuario. Por força delle pertence ao<br />

usofructuario tudo que a cousa produz e entra na definição de<br />

fructos (57).<br />

No exercício deste direito o usofructuario está sujeito ás<br />

mesmas restricções que limitão o uso : não lhe é licito alterar a<br />

substancia da cousa, nem desvial-a do seu destino (58).<br />

3. O direito de usar pôde existir separado do direito de<br />

perceber os fructos, e então constitue um direito distincto, sujeito<br />

ás regras especiaes (59); mas o direito de fruir {jus fruendt)<br />

de ordinário não subsiste só, anda-lhe quasi sempre ligado o di-<br />

(54) Vej. § 93, acima.<br />

(55) Fr. 12, § 1." D. de usu et habit. 7,8: Ad usiirn, scilicet non ad<br />

ab us um.<br />

'"Utimur his quee, nobis utentibus. permanent; his vero abutimur, quie,<br />

nobis utentibus. pereunt." Boet. in topic. Cicer. L. 2.°. Vinnio á I.de usu<br />

fr. pr. n. 2.<br />

(56) Como a vinha, o cafezeiro, o algodão.<br />

(57) Fr. pr. D. de usofruct. 7,1: Usofructo legato omnis fructus rei<br />

ad fructuarium pertinet.<br />

(58) Vej. S 93, acima.<br />

(59) Fr. 14, § I o ; fr. 2, fr. 1 § 1" D. de usu et habit. 7,8. Constituitur<br />

etiam nudus mus, id est, sine fructu.


206 DIRtílTO<br />

reito de usar, de modo que a constituição do direito depeicebtr os<br />

fructos acarreta virtualmente o direito de usar, salvo clausula em<br />

contrario (60).<br />

§ 98.—II. Continuação: Direitos inhérentes ao usofructo<br />

O usofructo se instaura na cousa tal qual ella se acha ao<br />

tempo em que elle é constituído, e a abrange na totalidade<br />

(61)-<br />

O usofructuario exerce o direito de usar e fruir como o faria<br />

o proprietário, salvo as restricções legaes (62).<br />

Destes dous princípios derivão como corollarios os direitos<br />

seguintes, pertencentes ao usofructuario :<br />

I o . O direito de se utilisar das servidões activas do prédio<br />

(63).<br />

2 o . O direito de fruir os accessorios da cousa, como machinas<br />

e animaes (64); as accessões, como os terrenos accrescidos por<br />

alluvião (65); excepto porém as ilhas nascidas de novo nos rios,<br />

as quaes, só para este fim, se reputão desligadas das terras adjacentes<br />

(66).<br />

(60) Paul. Sentent. Ill, 6 § 24: Fructus enim sine usu esse non potest.<br />

Pr. 14 S 1 e 2 D. de usu et habit. 7,8: Et quidem fructus sine usu esse<br />

non potest.<br />

Todavia, é de notar, os jurisconsultes romanos admittião a possibilidade<br />

de ter um o uso, outro a fruição. Fr. 14, § 3, D. de usu et habit.: Poterit<br />

autem apud alium esse usus, apud alium fructus sine usu, apud aliuni proprietas;<br />

veluti si, qui habet fundum, legaverit. Titio usum, mox heres ejus<br />

tibi fruetum legaverit, vel alio modo constituent. Vej. fr. 5, § 2. D. usufruct,<br />

quemad. cav. 7,9.<br />

(61) Accarias, n. 275, Mourlon, I. 3", n. 1553. C. C. do Chile, art. 774.<br />

(62) Vin. áJ. de usufr. pr. n. õ. Cod. Civil fr. art. 578, Mourlon, 1,3.<br />

n. 1498.<br />

(63) Fr. 15, § 7"


DAS COUSÁS 207<br />

3 o . O direito de perceber os foros e laudemios dos prazos,<br />

de cujo domínio directo é fructuario (67).<br />

4 o . E pois que o usofructo recahe directamente sobre a<br />

cousa e o exercício dos direitos que lhe são inhérentes presuppõe<br />

a posse natural delia, ao usofructuario compete o direito de<br />

have-la e conserva-la sob seu poder (68).<br />

§ 99. -m. 0'queéfruto.<br />

1. Nem todos os productos das cousas se considerão _/>'«•<br />

cios,<br />

Pertencem ao proprietário e não ao usofructuario os productos<br />

que não entrão na definição de fructos (69),<br />

E' pois mister precisar a noção de fructos.<br />

2. Na lingua de Direito, por fructos se entendem os productos<br />

que periodicamente nascem e renascem da cousa, sem acarretar-lhe<br />

a destruição no todo ou em parte (70) como o café, o algodão,<br />

os cereaes, os óleos veg-etaes, a lã, o lejte, as crias dos<br />

animães (7lj.<br />

No sentido declarado não são, portanto, fructos :<br />

I o . A-s substancias naturaes que se extrahem das minas,<br />

como pedras e metaes (72);<br />

2 o . Os aug"mentos por accessão, como ilhas e alluviões<br />

(73).<br />

:>°. O thesouro (74).<br />

(67) Lobão, Direit. Emphyt,. § 1027, Dig. Port. Ill, art. 524.<br />

(68) Pr. » ! I o D, do uaufr. pot. 7 6. Noodt. Usufr. I, cap. 3: "©porte<br />

t fructuarii esse detentionem roi fructuriœ: quia nisi earn rem teneat naturaliter,<br />

non potest ea, cum vult, uti frui." Vej. § 16. acima, nota 2.<br />

(69) Vej. § 26, acima.<br />

(70) Fructus est quidquid ex re nasci et renasci solet. Accarias. n. 275.<br />

Mourlon, L. 1, T. 3, n. 1512.<br />

(71) § 37,1 de rer. divis. 2. 1; Accarias, cit. n. 275.<br />

(72) Fr. 9 § 2, ir. 13, § 5 e 6 D. de usufruct. 7,1. As pedras e os metaes<br />

não-se reproduzem periodicamente, acerescendo que a extracção délies<br />

estraga, o solo.<br />

(73) Paul. Sent. Ill, 6 § 22; Aceessio alluvionum ad fruotuarium fundum,<br />

quia fructus fundi non est, non pertinet. V. § 98, acima.<br />

(74) Fr. 63, § 3 D. de adq. rer do m. 41,1. Sobre o que seja Thesouro no<br />

sentido jurídico, vej. § 35, acima.


20S DIREITO<br />

3. Todavia a qualificação de fructos depende ás vezes do<br />

destino dado pelo proprietário á cousa fructuaria (75). Este destino<br />

pôde ter por effeito ou restringir ou ampliar a noção de<br />

fructo. Assim por exemplo :<br />

a ) As arvores de construcção, que na realidade são fructos<br />

da terra, deixão de sê-lo, se o proprietário não as destinava<br />

a cortes regulares (76).<br />

b ) Ao contrario : as pedras e os metaes, que por si não<br />

tem os caracteres de fructos, se reputão na entanto taes, se as<br />

minas de que são tiradas já estavão abertas e em laboração ao<br />

tempo da constituição do usofructo (77).<br />

4. Chamão-se fructos naturaes os que a cousa produz naturalmente<br />

com ou sem intervenção do trabalho humano, como as<br />

fruetas das arvores, as proprias arvores, o trigo, as crias dos animaes<br />

(78).<br />

5. Ha cousas, porém, que não dão fructos naturaes,como<br />

uma casa, um navio, uma somma de dinheiro. Mas por via destas<br />

cousas se podem obter rendimentos periódicos, permittindose<br />

que, mediante uma certa retribuição, cilas sejão empregadas<br />

em serviço e utilidade de terceiro. Os rendimentos que as ditas<br />

cousas dest'arte produzem (79), se considerão fructos e para se<br />

differencarem das naturaes, tomão a denominação de fructos civis<br />

(80).<br />

§ 100.— IV. Direitos do usofritctnario relativamente ás arvores, minas<br />

e crias de, animaes<br />

Na classe dos produetos que são ou deixão de ser fructos,<br />

segundo o destino da cousa fructuaria, se comprehendem particularmente<br />

as arvores e as substancias tiradas da terra (81).<br />

(75) Vinnio á T. de usufr. pr. n. 8.<br />

(76) Fr. 10; 48 S 1°, 59 § 1" D. Se usufr. 7. 1. Vej. § 100, adianto.<br />

(77) Pr. 9 § 2 e 3. D. eoãem. Vej. § 100, adiante.<br />

(78) Fr. 77 D. de verb, significai. 30. 16; Yinnio, Com. ao § 36 I. de<br />

rei divis., n. 1.<br />

A distincQão de fructos meramente naturaes e fructos inchistriaes (o que<br />

a cousa produz com auxilio da força humana, como o trigo) não tem utilidade<br />

pratica nas questões de usofructo.<br />

(79) Ta! é o aluguel da casa, o juro do dinheiro, o frete do navio.<br />

(80) Fr. 34 'D. de usuris, 22,1: Usura? vicem fructuum. obtinent et mérito<br />

non detent a fruetibus separari. iFr. 29 D. hered. pet. 5.3; Mercês plane


DAS COTISAS 209<br />

1. As arvores se reputão fructos, e pôde o usufructuario<br />

aproprial-as, para emprega-las no seu uso ou para vendel-as, nos<br />

casos seguintes :<br />

a ) Quando fazem parte de viveiros (82);<br />

h) Quando pertencem a bosques destinados pelo proprietário<br />

a cortes regulares, isto é, a mattas de que o proprietário ordinariamente<br />

tirava madeiras para vender (83).<br />

Se, porém, as mattas ainda não se achavam destinadas<br />

pelo proprietário ao corte de madeiras para venda, as arvores se<br />

considerão como um capital posto em reserva e, portanto, não<br />

podem ser extrahidas como fructos (84). Neste caso ao usofructuario<br />

é tão somente permittido cortar as que forem precisas<br />

para as reparações necessárias das bemfeitorias inhérentes á herdade<br />

fructuaria (85) e aproveitar em seu uso as que seccarem ou<br />

cahirem por accidente (80) ;<br />

c) Quando o immovel gravado com o usofructo não offerece<br />

outro rendimento senão o que pôde provir da alienação de<br />

madeiras, embora o proprietário não houvesse dado ás mattas<br />

esse destino (87).<br />

ã eolonis acceptée loco sunt /ructunm. .. item vectura wavivm et jumentorum.<br />

Cfr. Fr. 121 D. de verb, signifie. 50. 16.<br />

(81) Ve.i. S 99v acima.<br />

(82) Fr. § 9 6 D. do usufr. 7. 1. Noodt T. cap. 7. Cod. Civ. fr. art. 590<br />

a 594; C. C. Port. art. 2212; B. Carneiro, L. 2° § 43. n. 32.<br />

(83) Fr. 48 § I o . fr 9 § 7 D. de usufr. 7. 1: fr. 30 D. de seg. verb.<br />

50 16: C Civi fr. art. 59. C i Port, art 2211. B. Cam. oit. 43, n. 4.<br />

No Brasil, em conseqüência da abundância de bosques naturaes. não ha<br />

ainda a pratica do se plantarem arvores de eonstrucção para cortes em êpoi<br />

is regula res. Sem embargo, são applicaveis entre nós os princípios reguladores<br />

da materia, estabelecidos pelo Direito Romano, e com mais ou menos, discrepância<br />

consagrados nos códigos modernos. A regra fundamental ê que — o<br />

usoftuctuario pôde cortar arvores paru seu uso ou para negocio, desde que<br />

ellas fazem parte de mattas de que o proprietário costumava tirar madeiras<br />

para os ditos fins. — Este principio é pratieavel, ou se trate do bosques plantados<br />

ou de bosques naturaes.<br />

(84) Fr. 10. 11. 12 e 18 D. de usufr. 7. 1: VinniO, á T. de usufr. pr.<br />

n. 8: B. Carneiro, cit. S 43. n. 4.<br />

(85) Fr. 12 pr. D. de usufr. 7. 1. B. Carneiro, art. cit. § 43. n. 4. cit.<br />

(86) Fr. 18 D. de usufr. 7. 1. Segundo o Direito francez. as arvores<br />

infructiferas que morrem ou cahem por accidente, pertencem ao proprietário,<br />

as fructiferas ao usofruetuario. Mourlon. L. 1. T. 3, n. 1545.<br />

(87) Fr. 22 pr. D. de usu et habit. 7. 8; Vinnio. Comm. á I. de usufr<br />

pr. n. 8. Accarias. n. 275. D. Port. III. art. 522.


no<br />

DTRElTO<br />

As arvores fructiferas e as de recreio não as pôde o usofructuario<br />

cortar, mas se lhe consente empregar em uso seu as<br />

que morrerem (88).<br />

II. As substancias que se extrahem da terra, como pedras<br />

e metaes, só são tidas como fructos e podem ser adquiridas pelo<br />

usofructuario, quando as minas já estavão abertas e em trabalho<br />

ao tempo da constituição do usofructo (89).<br />

Todavia se o terreno fructuario é imprestável para qualquer<br />

outro mister, ao usofructuario não é vedado abrir minas,<br />

comtanto que o faça com a moderação de um bom pai de família<br />

(90).<br />

III. As crias dos animaes são sempre havidas como fructos,<br />

e como taes pertencem ao usofructuario (91).<br />

Mas se o usofructo tem por objecto, não animaes singulares<br />

(92), senão um rebanho, o usofructuario é obrigado a substituir<br />

com as crias que vêm, as cabeças que vão morrendo ou se<br />

inutilisando (93).<br />

E' porém de notar :<br />

1? Que as crias, no momento em que nascem, são do usofructuario<br />

e só passão ao domínio do proprietário pela substituiçãoeffectiva<br />

(94) ;<br />

(88) Fr. 13 § 4, D. de usufr. 7. 1, B. Carneiro, cit. § 43, n. 5.<br />

(85) Fr. 9 § 2, fr. 13 § 5 e 6 D. de usufr. 7. 1. T). (Port. Parte IIT,<br />

art. 523, Rocha, § 612, n. 3. C. Civil fr. art. 598, do Chile, art. 784,<br />

Port. art. 2213.<br />

O Direito Romano permittia ao usufructuario abrir novas minas, quando<br />

esta innovação não causava prejuizo á cultura, e dava em resultado rendimento<br />

superior ao do grangeio antigo, cit. fr. 9, § 2. Voet. Pandect. 7, 1,<br />

n. 24. Neste ponto não foi seguido pelo direito moderno.<br />

(90) Fr. 22 pr. (arg.) D. de usu et habit. Voet, Pandect, 7, 1, n. 24.<br />

Na província de Minas-Geraes, e principalmente no municipio da capital,<br />

ha. terrenos que não se prestão a outro mister, senão ao da mineração.<br />

(91) Fr. 68. S I o D. de usufr. 7. 1.<br />

(~92) Fr. 70 § 3 O. eoâem : cretorum, si singularum capitum, nihil<br />

t-'uplebit.<br />

(93) 68 § 2 e fr. 69 ü. eodem. Voet, Pandect. 7, 1. n. 26 CD. Port. Ill,<br />

art. 519, Rocha, § 612, n. 1, C. do Chile, art. 78>8, Port. art. 2225.<br />

Se os animaes que formão o rebanho, se perderem na totalidade ou em<br />

numero tal que o usofructo se extinga, o usufructuario é tão sóme-nte obrigado<br />

a entregar as cabeças restantes. Vej. C. C. do Chile, art. 78, 2° alinéa;<br />

C. C. Port. art. 2225, § I o .<br />

(94) Fr. 69 D. de usufr. 7. 1: Nam alioquim, quod nascitur, fructuarii<br />

est: et cum substituit, desinit ejus esse. Fr. 70, § 2 D. eodem.


DAS COÜSAS 211<br />

2.° Que as crias que nascem ao tempo em que o rebanho se<br />

acha completo ficão pertencendo definitivamente ao usofructuario,<br />

devendo elle preencher os claros que se forem abrindo com<br />

as que vierem posteriormente (95).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 725 — Se o usofructo recae em florestas oti minas, podem, o dono e<br />

0 usofructuario prefixar-lhe a extensão do gozo e a maneira da exploração.<br />

Art. 722— As crias dos animaes pertencem ao usofructuario, deduzidas<br />

quantas bastem, para inteirar as cabeças de gado existentes ao começar o<br />

usofructo.<br />

§ 101. — V Cessão do usofructo<br />

1. O usofructo pertence a classe dos direitos intransmissiveis:<br />

não pôde o usofructario despojar-se delle para aliena-lo á terceiro<br />

por titulo oneroso ou gratuito (96).<br />

Mas, entendida a intransmissibilidade em termos absolutos,<br />

o usofructo seria totalmente inutil, desde que ao usofructuario<br />

não fosse possivel fruir a cousa pessoalmente, como se<br />

lh'o impedissem a natureza de suas occupações, a sua idade,<br />

moléstias.<br />

Para obviar este resultado permitte a lei a cessão, não<br />

do direito, do usofructo em si, mas do exercido do direito (97).<br />

(95) Fr.70 § 4 D. eodem: Puto autem verius ea qua: pleno grege edita<br />

sunt, ad fructuarium pertinere; sed posteriorem gregis casum noeere debere<br />

fructuario.<br />

•Se o usufructuario deixa de fazer a substituição devida, fica responsável<br />

ao proprietário pelo valor do animal morto ou inutilisado, fr. 70 pr. Perecendo<br />

a cria posta em substituição, o usofructuario deve repor outra: fr. 70,<br />

1 2*. Vej. Acearias, n. 276, 5° alinéa, nota (2).<br />

(96) § 3 1. de usufr. 2,4; fr. 66 D. de jur. dot. 23,3: Quoniam diximus<br />

usumfructum a fructuario cedi non posse. C. 13 C. de usufr. 3,33;<br />

Portug. De donat. 3. c. 23, n. 59, B. Carneiro. L. 2 § 43, n. 72, Rocha,<br />

paragrapho 619, n. 3.<br />

Em contrario o Direito france-z, C. C. art. 59i8. Mourlon, 1, 3 n.1563<br />

e o C. C. Port. art. 2207. Vej. o C. do Chile, art. 793.<br />

Pôde o usofructuario ceder o usofructo ao proprietário: neste caso o usofructo,<br />

unindo-se ao dominio, se extingue: § 3. 1. de usufr.<br />

(97) Fr. 12, § 2 D. usufr. 7,1; fr. 66 D. de jure dot. 23. 3:^Remedii<br />

loco recte putaverunt ut vel locet hunc usumfructum mulieri maritus vel<br />

13


fcl$ bîR^lTO<br />

Assim é facultado ao usofruetuario alienar 0 exercício do usofructo<br />

por um certo prazo ou pelo tempo que tenha de durar, dar de<br />

■arrendamento o immovel, alugar a casa, formar sociedades para<br />

aproveitar a cousa fruetuaria (98).<br />

Praticando estes actos o usofruetuario não cede o seu direito<br />

mas o exerce por terceiro (99) : o usofructo se conserva sempre<br />

ligado á sua individualidade com as modalidades com que fora<br />

constituído ; é a elle que continuão a pertencer as acções petitorias<br />

e possessorias inhérentes ao direito ; é na pessoa d'elle que<br />

se extingue o usofructo (100).<br />

2. Da doutrina exposta resulta que o terceiro não adquire<br />

direito real sobre a cousa fruetuaria : o direito que lhe vein do seu<br />

contractu com o usofruetuario é meramente pessoal, como o direito<br />

do locatário (101).<br />

Resta observar que a alienação que o usofruetuario por<br />

ventura faz do usofructo, é nulla e como tal não produz effeito<br />

algum (102).<br />

vondat nummo uno ut ipsum quidem jus remaneat penes maritum, perceptio<br />

vero fruetum ad mulierem pertineat. Portug. de Donat. 3, c. 23, n. 60.<br />

B. Carneiro, L. 2 § 43, n. 72.<br />

A doctrina exposta não é uma mera subtileza do Direito Romano, como<br />

a alguns tem parecido. O usofructo é um direito real sobre a cousa alheia.<br />

Conceder, pois, ao usofruetuario o direito de transferir o usofructo a terceiro,<br />

seria na realidade dar­lhe até certo ponto o direito de dispor da cousa alheia.<br />

O C. do Chile,art. 79*3, permitte a cessão do usofructo, mas declara que "o<br />

eedente permanece sempre responsável para com o proprietário."<br />

(98) Fr. 37, 38 e 39 D. de usufr. 7,1; fr. 66 D. de jure dot. 23,3.<br />

O usofructo é susceptive! do ser penhorado, mas no sentido exposto; isto<br />

é, penhora­se, não o usofructo em si, mas a commoãiãade, a faculdade de<br />

exerce­lo, de perceber os fruetos e vantagens da cousa. Moraes, Execut. 6, 8,<br />

cap. 3, n. 3, P. e Souza. Nota 783, Lobão, Execuç. § 111.<br />

(99) IFr. 12 § 2 D. de usufr. 7,1: Usufructuarius vel ipse frui ea re,<br />

vel alii fundum concedere vel locarc vel vendere potest; nam et qui locat,<br />

utitur, et qui vendit.<br />

(100) Accarias, n. 275 in fine, D. Port. III, art. 526:<br />

(101) Pôde tirar da cousa as utilidades e vantagens de que ella é capaz,<br />

mas em virtude do direito pessoal que lhe dá o contracto com o usofruetuario,<br />

exactamente como faz o arrendatário. Consol. das Li. Civ. art. 47. not.<br />

1. A extensão do direito do cessionário mede­se pelas cláusulas da contracto.<br />

(102) § 3,1. de usufr. 2,4: Nam cedendo extraneo nihil agit. Maynz,<br />

§ 212. nota 21; B. Carneiro, cit. § 43, n. 73, nota (a).<br />

Alguns interpretes do D. R. apoiado no fr. 66 ­D. de jur. dot. e fr.


DÀS COUSÀÔ 215<br />

§ 102 — VI. Como adquire o usofructuario os fructos.<br />

O modo de acquisição dos fructos varia, segundo são natiíraes<br />

ou civis.<br />

A.) 1. Os fructos naturaes, emquanto se conservão adhérentes<br />

á cousa fructuaria, se reputão partes integrantes delia,<br />

seguem lhe a condição e, portanto, pertencem ao proprietário<br />

(103). Para adquiri-los carece o usofructuario de separal-os<br />

e apprchendcl-os.<br />

2. Este acto de separa-los e appréhende-los é o que em Direito<br />

se chama —percepção (104).<br />

Não tem o usofructuario, como é sabido, a posse da cousa<br />

(posse que continua na posse do proprietário), nem por conseguinte<br />

a dos fructos pendentes (105). Não pôde, pois, adquirir o<br />

dorninio dos fructos (10b), senão por via da percepção, acto que<br />

os traz para sua posse (107). A percepção vem a ser uma espécie<br />

de tradição, que consiste, da parte do proprietário, na autorização<br />

para colher os fructos, virtualmente concedida com o usofructo,<br />

e, da parte do usofructuario, na apprehensão (108).<br />

E desde que a percepção não é senão a apprehensão, — a<br />

tomada de posse dos fructos, segue-se :<br />

1.° Que a precepção não pôde ser realizada senão pelo<br />

usofructuario ou por quem legalmente o representa (109).<br />

Vatican, § 75 sustentão que a alienação a terceiro importa a perda o extincção<br />

do usofrueto. Vej. Vinnio, ao cit. § 3 do I. n. 4. Tem, no entanto,<br />

prevalecido a opinião seguida no nosso texto.<br />


2Î4 bíRÉfíó<br />

2.° Que nâo se considerão percebidos pelo usofructuarío<br />

e em conseqüência não entrão para seu dominio, os fructos separados<br />

ou por accidente ou por pessoa estranha que não obre em<br />

nome delle (110).<br />

2. O direito do usofructuarío — de perceber os fructos —<br />

começa de existir da data do usofructo, e termina no momento<br />

em que elle se extingue (111)- O usofructuarío, pois adquire<br />

pela percepção as colheitas pendentes ao tempo da constituição<br />

do usofructo (112), assim como perde as que deixa de perceber<br />

por occasião de expirar o usofructo (113). Mas não é obrigado,<br />

na primeira hypothèse a indemnisar ao proprietário, nem tem di-<br />

citur. quam si ipse cos perceperit. Voet Pandect. 7, 1, n. 28. A posse pôde<br />

ser tomada pelo próprio adquirente ou por terceiro: § 13 acima.<br />

(110) Fr. 12 § 5 D. de usufr. 7. 1: Fructus non fiunt fructuarii, nisi<br />

ab eo percipiantur. Fr. 13 D. Quib. mod. usufr. amitt. 7, 4; Vinnio, ao cit.<br />

§ 36. do I, n. 2. Por excepção, as crias dos animaes logo que nascem pertencem<br />

ao usofructuarío independentemente de apprehensão: fr. 28 D. de usur.<br />

22; 10; § 36 I. de rer. divis. 2. 1.<br />

Se os fructos antes de percebidos são roubados, ao usofructuarío supposto<br />

ainda não tenha adquirido o dominio, compete a acção civil de furto: fr.<br />

12, § 5° D. de usufr. 7. 1: usofructuarío autem furti actionem (competere);<br />

quoniam interfuit ejus fructus non esse ablatos. Vej. Doctr. das ACQ. § 225.<br />

Segundo o Direito francez os fructos ficão pertencendo ao usofructuarío<br />

pela simples separação, independentemente de apprehensão effectiva. Mourlon,<br />

I, T. 3, n. 1518.<br />

(111) Fr. 27 pr. D. de usufr. 7. 1: Xam et stantes fructus ad fruetuarium<br />

pertinent: § 36 1. de rer. divis. fr. 13 D. Quib. mod. 7. 4. Vatican,<br />

fr. § 44.<br />

(112) Fr. 27 pr. de usufr. 7. 1: Si pendentes fructus jam maturos reliquisset<br />

testator, fruetuarius eos feret, si die legati cedente, aãhttc pendentes<br />

deprehendisset. B. Carneiro § 43, n. 12; C. €. fr. art. 585, do Chile, art.<br />

781, Port. art. 2203. j i<br />

(113) § 36 1. de rer. divis. 2, 1: Et ideo, licet, maturis fruetibus non<br />

dum. tamen perceptis, decesserit, ad heredem ejus non pertinent, sed do mino<br />

proprietatis adquiruntur. Voet, Pandect., 7, 1, n. 28.<br />

O usofructuarío vende os fructos ainda pendentes e morre antes que<br />

o comprador os colha. E' valida a venda? Pôde o comprador fazer a colheita?<br />

Não: o usofructuarío ainda não tinha adquirido o dominio dos fructos;<br />

não os podia, portanto vender. Proudhon. II, ns. 991 e 995; Marcado<br />

ao art. 585. Em sentido contrario, isto é, que a venda ô valida, e como tal a<br />

deve respeitar o proprietário: Toullier, tom. 2 o , n. 401, Durant, tom. 4 o ,<br />

n 554. Vej. Mourlon, II, T. 3. n. 1518, nota (1).


DAS COUSAS 215<br />

reito na segunda a haver delle as despezas de sementes e culturas<br />

(114).<br />

3. Bem pôde o usofructuario, em vez de cultivar por si<br />

o prédio frngifero, da-lo de arrendamento a terceiro, mediante<br />

uma certa pensão mensal, semestral ou annual ; pôde mesmo sustentar<br />

o arrendamento feito pelo proprietário (115).<br />

Neste caso a pensão representa os fructos naturaes da<br />

cousa fractuaria, d'onde vem que o usofructuario só adquire a<br />

pensão de cada prazo á maneira que o arrendatário vai percebendo<br />

os fructos correspondentes (116).<br />

Em conseqüência :<br />

1? Se, antes de extincto o usofructo, o arrendatário consuma<br />

a colheita, vence o usofructuario toda a pensão (117) ;<br />

2.° Mas, se só parte da colheita estava realizada, ao usofructuario<br />

compete tão somente a quota da pensão correspondente<br />

aos fructos colhidos (11S).<br />

B.) 1. Os fructos civis o usofructuario os adquire, dia por<br />

dia, independentemente do facto material da percepção, isto é, da<br />

tradição (119).<br />

(114) Accarias, n. 275, n. 4, pag. 606; Zaohar. §• 227, Mourion, 1, 3,<br />

n. 1519 e 1520. C. do Chile, art. 781. C. fr. C. 'C. Port. art. 2203, § I o e<br />

2204. Em contrario, Voet, (Pandect. 7, 1, n. 28 in fine) apoiado na autoridade<br />

de um grande numero de jurisconsnultos hollandezes.<br />

(115) Fr. 59. § I o D. de usufr. 7. 1. O usofructuario não está adstricto<br />

a respeitar o arrendamento feito pelo proprietário, salvo clausula expressa<br />

nesse sentido:'fr. cit.<br />

(116) Fr. 58 D. de usufr. 7, 1.<br />

(117) Fr. 58 D. eodem: Fruetuariœ vero heredem, sua die, secundum ea<br />

qua? proponuntur, integram, pensionem percepturum,. D. Port. Ill, art. 517,<br />

C. fr. Mourion, 2, 3, n. 1523.<br />

(118) Fr. 9, § I o . D. locat. conduct. 19, 2: Sed an ex locato teneatur<br />

conductor, ut pro rata temporis quo fruitus est, pensionem prœstet, Marcellus<br />

quierit:... et magis admittit teneri eum. Vinn. ao § 36, I. de rer<br />

divis. n. 3.<br />

A doutrina exposta é relativa aos rendimentos da locação de cousas naturalmente<br />

frugiferas. Pelo que respeita aos fructos civis no sentido próprio,<br />

regem as disposições summariadas na parte B) deste paragraphe). O C. Civil<br />

francez, alterando neste ponto o Direito anterior vigente em França,<br />

equipara para o effeito declarado os rendimentos dos prédios frugiferos aos<br />

fructos civis: art. 586; Mourion, 1, 3, n. 1523.<br />

(119) Fr. 25 § 2 o , fr. 26 D. de usufr. 7, 1. Vin. ao citado § 36 1. n. 3;


216 DIREITO<br />

2. Para se regular o vencimento dos fructos deste gênero<br />

entre o usofructuario e o proprietário, ou no começo (120) ou na<br />

expiração do usofructo, toma­se como unidade o dia e dividem­se<br />

os vencimentos por tantos dias quantos fórmão o prazo a que correspondem<br />

: ao usofructuario pertence o rendimento de cada dia<br />

que passa durante a existência do usofructo ; ao proprietário a<br />

quota relativa ao tempo do prazo, anterior á constituição, ou<br />

posterior ao termo do usofructo (121), segundo fôr o caso.<br />

3. Os fructos civis representão o uso da cousa. Se o usofructuario,<br />

ein lugar de arrenda­la, a tivesse empregado em seu<br />

uso, goza­ia delia até o momento em que acabasse o usofructo.<br />

E' essa 3 razão porque se lhe dá direito aos fructos até aquelle<br />

momento.<br />

4. Pôde acontecer que, ao terminar o usofructo, não sejão<br />

ainda exigiveis os fructos civis de quem os deve, como do locatário<br />

que convencionou pagar no fim do anno. Sem embargo, o<br />

usofructuario adquire direito á sua quota, a qual na época do<br />

vencimento será entregue a elle ou a seus herdeiros (122).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 721 — Salvo direito adquirido por outrem, o usofructuario faz seus,<br />

os fructos naturaes, pendentes ao começar o usofructo, sem encargo de pj.».<br />

gar as ãespezas de proãucção. — 512.<br />

Paragrapho único. Os fructos naturaes, porém, pendentes ao tempo em,<br />

que cessa o usofructo, pertencem ao dono, também sem compensação das<br />

ãespezas.<br />

Art. 723 ■— Os fructos civis, vencidos na data inicial do usofructo pertencem,<br />

ao proprietário, e ao usofructuario os vencidos na data em que cessa<br />

o usofructo. — 512.<br />

Art. 726 — O usofructuario pôde usofruir em pessoa, ou mediante arrendamento,<br />

o prédio, mas não muãar­llie o gênero de cultura, sem licença do\<br />

•<br />

Maynz, § 212, nota 16, D. Port. Ill, art. 516; C. C. fr. art. 586, do Chile,<br />

art. 790, ort. art. 2205.<br />

(120) A hypothèse figurada quanto ao começo do usofructo se verifica<br />

no caso do arrendamento ter sido feito pelo proprietário, como se a cas?<br />

já estava alugada, quando se constituiu o usofructo.<br />

(121) Fr. 26 D. de usufr. Voet, Pandect. 7, 1, n. 30; Mühlenbruch,<br />

§ 282 in fine, Mourlon, I, 3, n. 1532.<br />

(122) Fr. 25 § 2 D. de usufr. 7, 1:... eorum quidem annorum stipulatio,<br />

quibus ususfruetus mansit, adquiritur fruetuario. Accar. n. 275, Mourlon,<br />

2, 3, n. 1522. Em contrario, mas sem fundamento, B. Carneiro, cit.<br />

§ 43, n. 11.


DAS COUSAS 217<br />

proprietário ou autorização expressa no titulo; salvo se, por algum outro*<br />

como os de pae, ou marido, lhe couber tal direito. — 717.<br />

Art. 726 — As cousas que se consomem pelo uso, caem para logo no domínio<br />

do usofructuario, ficando, porém, este obrigado a restituir, findo o usofructo,<br />

o equivalente em gênero, qualidade e quantidade, ou não sendo possível,<br />

o seu valor, pelo preço corrente ao tempo da restituição.<br />

Paragrapho único. Se, porém, as referidas cousas foram avaliadas no titulo<br />

constitutivo do usofrueto, salvo clausula expressa em contrario, o usofructuario<br />

é obrigado a pagal-as pelo preço de avaliação.<br />

Art. 727 — O usofructuario não tem direito à parte do thesoiro achado<br />

por outrem, nem ao preço pago pelo visinho do prédio usofruião, para obter<br />

meação em parede, cerca, muro, valia, ou vallado, (art. 643). — 60'7, 609.<br />

Art. 728 — Não procede o disposto na segunda parte do artigo anterior,<br />

quando o usofrueto recahir sobre universalidade ou quota parte de bens.<br />

II.—OBRIGAÇÕES DO USOFRUCTUARIO<br />

§ 103.—Prestar caução.<br />

1. O usofructuario é responsável pelos damnos e deteriorações<br />

que por culpa ou negligencia sua acontecem á cousa (123).<br />

Ao terminar o usofrueto deve restitui-la ao proprietário<br />

(124).<br />

Pôde succéder, no entanto, que elle a estrague, consuma<br />

ou extravie e que se ache afinal na impossibilidade ou de restitui-la<br />

ou indemnisar as damniíícações causadas.<br />

Para assegurar o proprietário contra os effeitos destas contingências,<br />

a lei impõe ao usofructuario a obrigação de antes<br />

de haver a cousa e entrar no exercício de seus direitos, fazer inventario<br />

dos bens íructuarios com especificação do bom ou máo<br />

estado (125), e de prestar fiança de usufrui-los como bom pai de<br />

familia (126).<br />

(123) § 104, adiante.<br />

(124) § 109 in fine, adiante.<br />

(125) Fr. 1 § 4 D. usufruct, quemad. cav. 7,9, Vinnio 1. de usufr. pr.<br />

n. 9, Pinei. C. 1 C. de bonis mater, p. II, n. 22; Guerreiro, L. 1. T. 4,<br />

cap. '2, n. 1, 'D. Port. Ill, art. 538; C. C. fr. art. -600, do Chile, art. 775.<br />

Este inventario não tem solemnidades; basta constar de documento assignado<br />

pelo usofructuario, Guer. loc. cit. Suppre-o o próprio titulo do<br />

usofrueto, se nelle se declarão especificadamente os bens e o seu estado. O<br />

fim do inventario é fornecer elementos seguros e líquidos para a estimação<br />

do damno causado e do valor da cousa se ella se extraviar.<br />

(126) Fr. 1 e 7 D. usufr. quemad. cav. 7,9; Fr. 13 pr. D. de usufr.


218 DIREITO<br />

2. E' licito substituir a fiança por penhor ou hypotheca de<br />

valor suficiente (127).<br />

3. A impossibilidade, em que por ventura venha a se encontrar<br />

o usofructuario, de dar fiadores, não lhe acarreta a<br />

perda do usofructo (128), mas inhibe-o de exerce-lo por si. Nesta<br />

hypothèse a difficuldade se resolve por um dos dous alvitres<br />

seguintes :<br />

a) Ou a cousa é deixada sob a administração do proprietário,<br />

obrig-ando-se elle com fiança a entregar os fructos e rendimentos<br />

ao usofructuario, deduzidas as despezas (129) ;<br />

b) Ou é de authoridade do juiz arrendada a terceiro, com a<br />

clausula de ser a pensão paga ao usofructuario (130).<br />

4. Por excepção a fiança se dispensa :<br />

1.° No usofructo legal (131);<br />

2.° No usofructo estabelecido por acto entre vivos, senão<br />

foi expressamente estipulada (132). A ommissão de clausula<br />

neste sentido itiduz a presumpção de confiança pessoal do proprietário<br />

.<br />

7,1; Const. 4 C. de usufr. 3,33; ord. L. 4 T. 91 § 3 (arg.) ; Mello, L. 3, T.<br />

13, § 7; C. C. fr. art. 601, do Chile, art. 775.<br />

(127) Makeldey, § 314, n. 4; B. Carneiro, L. 2, § 44, n. 3.<br />

(128) Mello, L. 3, T. 13, § 7; Lobão. Notas ao lug. cit. Dissert. 3<br />

(Jurid, pratic.) § 10 a 13; B. Carneiro, § 44, n. 12; D. Port. III. art. 537;<br />

Cod. Civil fr. art. 605. Aliter pr. D. Romano, fr. 13 pr. D. de usufr. 7,1.<br />

(129) Huber, I. 11, IV, n. 4. Lobão, Not. a Mello, 3,13 § 7 n. 3 e Dissert,<br />

cit. Lobão affirma ser esta a pratica mais seguida. C do Chile, 77'6 e 777.<br />

(130) Vinnio I. de usufr. pr. n. 9, Mello, cit. § 7, B. Carneiro, § 44,<br />

n. 12; D. Port. III, art. 535. C. C. fr. art. 602 e 603.<br />

Mello e outros sustentão que na impossibilidade de dar fiador, o usofructuario,<br />

sendo pessoa fidedigna e não suspeita de prodigalidade, pôde supprir<br />

a fiança com juramento Mas é de notar que a caução juratoria parece excluída<br />

pela ord. 4,73, a qual pronibe em termos absolutos "que se faça contracte<br />

obrigação,... promettimento.. . assim por escripto como por palavra<br />

em que se ponha promettimento de bSa fé nem outro algum juramento. "No<br />

sentido exposto vem um julgado no Repertório das ord. verb." o juramento<br />

ou promettimento de bôa fé.<br />

(131) Maynz § 213, nota 8, Mello, 3,13 § 7, B. Carneiro, § 44, n. 7. D.<br />

Port. III. art. 533.<br />

A razão é que o usofructo legal é estabelecido entre pessoas vinculadas<br />

pelo parentesco:- assim que presume-se no usofructuario um motivo natural<br />

de fidelidade.<br />

(132) Mello, loc. cit. B. Carn. cit. g 44, n. 8.


DAS COUSAS 219<br />

3.° No usofructo constituído por disposição testamentaria,<br />

se o testador a remitte (133);<br />

4.° No usofructo que se reserva o doador na cousa<br />

doada (134).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 729 — O usofructuario, antes de assumir o usofructo, inventariará, d<br />

sua custa, os Tiens, que receber, determinando o estado em que se acham e<br />

dará caução, fidejussoria ou real, se lh'a exigir o dono, de velar-lhe pela conservação,<br />

e entregal-os, findo o usofructo. — 732.<br />

Art. 730 — O usofructuario, que não quizer ou não puder dar caução<br />

sufficiente, perderá o direito de administrar o usofructo; e, neste caso, os<br />

bens serão administrados pelo proprietário, que ficará obrigado, mediante caução,<br />

a entregar ao usofructuario o rendimento délies, deduzidas as ãespezas<br />

da administração, entre as quaes se incluirá a quantia taxada pelo juiz em.<br />

remuneração do administrador.<br />

Art. 731 — Não são obrigados d caução:<br />

I — O doador, que se reservar o usofructo da cousa doada.<br />

II — Os pães, usofructuarios dos bens dos filhos menores. — 389.<br />

§ 104.— Usufruir a cousa como bom pai de família<br />

1. O usofructuario, no exercício de seus direitos sobre a<br />

cousa, deve se haver como um bom pai de família (135). Nesta<br />

relação lhe cumpre :<br />

1? Velar pela guarda e conservação da cousa fructuaria<br />

(136);<br />

2.° Repellir as usurpações de qualquer natureza, como por<br />

exemplo—que terceiros venhão a adquirir por prescripção ou a<br />

(133) Mello, loc. cit. B. Carneiro, § 44, n. 15, D. Port. Ill, art. 533,<br />

C. C. ir. art. 601. Em contrario o D. Direito Romano: C. 7 C. ut in possen.<br />

legat. servand. 6,54, C. 1 C. de usufr.<br />

(134) Vinnio á I. de usufr. pr. n. 8. Guerreiro L. 1.*, Tr. 4, cap. 2,<br />

n. 22, Mello, 3,13, § 7, D. Port. III. art. 533.<br />

(135) § 3 o I. de usufr. 2. 4: Recte enim colère et quasi bonus paterfamilias<br />

uti debet. Fr. 9 .pr. D. de usufr. 7,1 : Sic tamen ut boni viri arbitratu<br />

fruatur, Fr. 65, D. eodem: debet enim omne quod diligens patcr familias<br />

in sua domo facit et ipse facere. C. Carneiro. L. 2°, § 43, n. 21<br />

O Direito Romano tomava o bom pai de família como o modelo do homem<br />

diligente e zeloso.<br />

(136) Fr. 2. D. usufruct, quemad. cav. 7, S. Nam fructuarius custodiam<br />

prœstare debet. Fr. 9 pr. D.: de usufr. 7. 1; B. Carneiro, § 43, n. 21.


220 DIREITO<br />

propriedade da cousa ou servidões reaes (137)—já dando aviso<br />

ao proprietário, já pondo em pratica os remédios de direito que<br />

forem de sua competência (138) ;<br />

3? Exercitar as servidões activas para que não prescrevão<br />

pelo não-uso (139) ;<br />

4.° Abster-se, emfim, de quaesquer actos que porventura<br />

possão estragar a cousa, ou de facto diminuir-lhe o valor (140).<br />

2. Obrigado por lei a tornar como typo de sua diligencia<br />

e zelo o bom pai de familia, o usofructuario é responsável ao proprietário<br />

por todos os damnos e prejuúos que advenhão á cousa<br />

por culpa ou negligencia sua (141).<br />

Não corre por conta delle os damnos provenientes de caso<br />

fortuito ou força maior (142), nem tão pouco as deteriorações que<br />

a cousa recebe no emprego em serviços e usos a que é destinada,<br />

ainda que nesses serviços e usos totalmente se consuma (143).<br />

§ 105.— Obrigações quanto aos onus e reparos.<br />

1. E como o usofructuario retém em seu poder para seu<br />

Proveito e utilidade a cousa alheia, lhe incumbe :<br />

1.° Pagar os impostos a que ella é sujeita, como décimas<br />

urbanas (144);<br />

(137) Pr. 1 § 7. D. usufruct, qüemadm. cav.7. 9: Interdum autem inerit<br />

proprietatis osstimatio, si forte fructuarius, cum passit usumcapionem interpellare<br />

neglexit: omnem enim rei causara suscipit. Mourlon, 1, 3, n. 1588.<br />

(138) D. Port. Ill, art. 566, C. Civil fr. art. 614, Zaehar. § 228, n. 3.<br />

(139) Fr. 15 § 7 D. de usufr. 7, 1: Et si forte fuerint, non utente fructuario,<br />

amissaî (servitutes), hoc quoque nomine tenebitur.<br />

(140) Fr. 13, § 4 o 'D. de usufr. 7, 1; fr. 1, § 3 o D. usufr. quemadm.<br />

cav. 7, 9; Zach., § 228, n. 2 o .<br />

(141) Fr. 1 D. usufr. quemad. cav. 7, 9; C. 4, C. de usufr. 3,33.<br />

Accar. n. 276, D. Port. Ill, art| i532, Mourlon, 1, 3, n. 1588.<br />

(142) Fr. 1 pr. e § 7: fr. 9, § 3. D. usufr. quemad. cav. 7, S:<br />

Maynz, § 213. nota 4.<br />

(143) Fr. 9, § 3 D. usufr. quemad. cav. 7, 9: Si vestis usufructus legatus<br />

sit... quanquam heres stipulatus sit, finito usufructu vestem, reddi,<br />

attamen non obligari promissorem, si earn sine dolo maio aãtritam reddiderit,<br />

Mourlon, I, 3, n. 1534. Noodt 1, cap. 3, verb. Ego addam. . .<br />

(144) Fr. 7, § 2 D. do usufr. 7, 1: Quoniam et alia onera agnoscit. ..<br />

ut... stipendium vel tributum vol salaria. Fr. 28 D. de usu, usufr. et habit.<br />

33,2; B. Carneiro, L. 2, § 43, n. 54, D,. Port. Ill, art. 549.


DAS COUSÂS 221<br />

2.° Satisfazer os encargos que a gravão, como fôròs (145J<br />

e pensões alimentares (146) ;<br />

3.° Fazer os concertos e reparos módicos, necessários para<br />

a conservação da. cousa (147). Pôde, porém, libertar-se deste<br />

onus, renunciando o usofructo (148).<br />

2. Nem o usofructuario, nem o proprietário são obrigados<br />

a reparos grande*, como reconstrucções de edifícios que cahirão<br />

ou de vetustos ou por caso fortuito (149) Mas tanto um<br />

como outro podem faze-los de sua livre vontade (150).<br />

Se os faz o usofructuario: deve guardar a antiga fôrma da<br />

obra, sem amplia-la ou diminui-la nas partes úteis (151). Expirado<br />

o usofructo, tem direito a haver do proprietário as despezas,<br />

dado que a obra fosse necessária 052).<br />

Se os faz o proprietário: as reconstrucções ficão sufeitas ao<br />

usofructo, sem que, no entanto, seja o usofructuario obrigado a<br />

prestar indemnisação alguma (153).<br />

(145) Valasc. Jus Emphy, c. 17, B. Carneiro, § 43, n. 54, D. Port. Ill,<br />

art. 549. Noodt, I, cap. 9.<br />

(146) Voet Pandect. 7, 1, n. 37 .{D. Port. Ill, art. 568. Vej. Lei n. 1237,<br />

de 24 de Setembro do 1864, art. 6, Décret, n. 34'53, de 26 de Outubro de<br />

186'5, art. 261 § 7.<br />

Em posturas municipaes se costuma impor aos proprietários o onus de<br />

collocar Iagedos nas testadas de suas casas para a rua. Deve esta despe'za<br />

correr por conta do usofructuario? Parece que sim: Cepola Tract. 2,<br />

cap. 3, n. 53.<br />

(147) Fr. 9 § 2 D. de usufr. 7. 1: Moclica igitur refectio ad eum pertineat.<br />

§ 3 cit. fr. C. 7 C. de usufr. et habit. 3.33: B. Carneiro, § 43, n. 46,<br />

D. Port. III, art. 539.<br />

(148) Fr. 28, fr. 64 D. de ut-ufr. 7, 1. Lobão, Casas, § 442. Mas se,<br />

por ter deixado de fazer os concertos módicos necessários, resultou damno á<br />

cousa, não pôde o usofructuario furtar-se á obrigação, renunciando o usofructo:<br />

fr. 72 D. de usufr. Lobão, Casas, § 444.<br />

(149) Fr. 7, § 2, D. de usufr. 7, 1: Siqua tamen vetustate corruissent,<br />

neutrvm cogi refice-e. Fr. 65, § I o D. eodem; C 7. C. de usufr. et habit.<br />

3,33, B. Carn., § 43, n. 47, D. Port. III. art. 541, Mourlon, I, 3, n. 1600.<br />

(150) Fr. 7. § 3 D. de usufr. 7, 1; B. Carneiro, § 43, n. 48.<br />

(151) Fr. 7 § 3 D. de usufr. fr. 13 § 7 D. eodem ; D. Port. III, artigo<br />

543.<br />

(152) C. 7 C. de usufr. et hab. 3.33, Voet Pandect. 7. 1, n. 36, B. Carneiro,<br />

§ 43, n. 48. D. Port. III, art. 542, Lobão Casas, § 445. Vej. Mourlon,<br />

I, 3, n. 1600.<br />

(153) Fr. 7 § 2 D. de usufr. 7, 1; Sed si hercs refecerit, passiirum fru-


222 DIREITO<br />

3. A nossa lei não estabelece reg-ras positivas para se<br />

determinar quaes os reparos módicos e quaes os grandes (154) Esta<br />

questão, pois, se resolve a juízo de peritos, os quaes deverão lixar<br />

o seu laudo segundo a relação em que estiver o custo dos<br />

reparos para com a importância dos rendimentos da cousa fructuaria<br />

(155).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 732— O usofruetuario não é obrigado a pagar as deteriorações resultantes<br />

ão exercício regular do usofrueto.<br />

Art. 733— Incumbem ao usofruetuario:<br />

I — As despesas ordinárias de conservação dos bens no estado em que os<br />

recebeu. — 739, VII.<br />

II — Os foros, as pensões e os impostos reaes devidos pela i)osse ou rendimento<br />

da cousa usofruiãa.<br />

Art. 734 — Incumbem ao dono, as reparações extraordinárias e as que<br />

não forem de custo módico; mas o usofruetuario lhe pagará os juros ão capital<br />

despendido com as que forem necessárias á conservação, ou augmenlarem<br />

o rendimento da cousa usofruida.<br />

Paragrapho único. Não se consideram módicas as ãespezas superiores a<br />

dois terços ão liquido rendimento em um anno.<br />

Art. 73'5 — Se a cousa estiver segura, incumbe ao usofruetuario -pagar,<br />

durante o usofrueto, as contribuições ão seguro. — 739, IV.<br />

§ I o — Se o usofruetuario fizer o seguro, ao proprietário .caberá o direito<br />

ãelle resultante contra o segurador.<br />

ctuarium uti. Proudhon, IV, n. 1697, Durant. II, n. 618, Zacar., § 228, n. 2.<br />

Em contrario Mourlon, I, 3, n. 160'0.<br />

(154) O Direito Romano, que como subsidiário rege o assumpto, não define<br />

o que é reparo módico, võe por diante exemplos e deixa a solução das<br />

difficuldades praticas ao principio da analogia: reficere quoque eum íedes per<br />

arbitratum cogi Celsus scribit: hactenus tamen ut sarta tecta habeat. Cit. fr.<br />

7, § 2 e C. 7. C. de usufr. n. 3,33.<br />

Os códigos modernos estabelecem a respeito regras fixas.<br />

O da Prussia (P. I. T. 21, art. 52) define reparos módicos os que não<br />

chegão a custar a quarta parte dos rendimentos de um anno.<br />

OC. C. francez (art. 605) descreve especificadamente os concertos grandes<br />

(grosses rex>arations) e qualifica de módicos os não ennumerados.<br />

O C. C. Port. C. art. (2228 § 1") declara reparações ordinárias (módicas)<br />

aquellas que no anno em que forem necessárias, não excedem dous terços<br />

do rendimento liquido desse anno.<br />

A disposição a respeito, do C. do Chile, (art. 798) tem alguma cousa<br />

de vago.<br />

(155) B. Carneiro, § 43, n. 50.


As COÜSÀS 223<br />

§ 2° — Ëm qualquer hypothèse, o direito âo usofructuario fica suürogado<br />

no valor da indemnização do seguro. — 737.<br />

Art. 736 — Se o usofructo recair em cousa singular, ou parte delia, só<br />

responderá o usofructuario pelo juro da divida, que ella garantir, quando esse<br />

onus fôr expresso no titulo respectivo.<br />

Se recair num patrimônio, ou parte deste, será o usofructuario obrigado<br />

aos juros da divida que onerar o iiatriynonio ou a parte delle, sobre que recaia<br />

o usofructo.<br />

Art. 737 — Se um edifício sujeito a usofructo fôr destruído sem, culpa do<br />

proprietário, não será este obrigado a reconstruil-o, nem o usofructo se restabelecerá,<br />

se o proprietário reconstruir á sua custa o prédio; mas se elle<br />

estava seguro, a indemnização paga fica sujeita ao onus do usofructo.<br />

Se a indemnização do seguro fôr applicada á reconstrucção do prédio,<br />

restabelecer-se-á o usofructo. — 735, § 2 o , 739, IV.<br />

Art. 738 — Também fica subrogaãa no onus do usofructo, em logar âo<br />

prédio, a indemnização paga, se elle fôr desapropriado, ou a importando,<br />

do damno, resarcido pelo terceiro responsável, no caso de damnificação, ou<br />

perda. — 739, IV.<br />

§ 106.—Obrigações quanto á conservação<br />

Pois que o usofructo se exerce sobre a cousa alheia, salva<br />

a substancia (156), o usofructuario é obrigado :<br />

I o . A respeitar a fôrma e o destino dados pelo proprietário<br />

(157): dahi vem que não lhe é permittido converter campos<br />

de cultura em pastos, alterar os compartimentos da casa ou estabelecer<br />

estalag-em na que o proprietário tinha para habitação<br />

(158). Pôde, porem, fazer melhoramentos úteis (159) e de mero<br />

recreio, comtanto que não acarretem transformação do prédio<br />

(160).<br />

2? A não deixar que as culturas existentes se arruinem<br />

(161).<br />

(156) Vej. § 93, acima.<br />

(157) Vin. ál. dt usufr. pr. n. 7, B. Carneiro, § 43, n. 35, Mourlon, 1, 3<br />

numero 1503.<br />

(158) Fr. 7 in fin. fr. 13, § 4 a 8, D. usufr. 7, 1. Zachar. § 228.<br />

(159 Fr. 13, § 6 e 7 D. de usufr. 7, 1, B. Carn., § 43, n. 44.<br />

(160) Fr. 7 in fin. fr. 13, § 7 D. de usufr. Sed et colores et picturas<br />

et marmora poterit (immittere) et sigilla et siquid ad domus ornatum. Por<br />

taes despezas não tem direito a indemnisação. Vin. á I. de usufr. pr. n. 7,<br />

B. Cam., § 43 n. 44 e 52.<br />

(161) Fr. 9 pr. D. de usufr.: Nam et Celsus... scribit cogi eum posse


224 DIRETO<br />

3 o . A substituir por novas : as arvores frujtiferas quê morrerem<br />

(162), as destinadas a talhadias regularei que houver cortado<br />

(163), e as mudas que tirar dos viveiros (164);<br />

4 o . A preencher as cabeças do rebanho que morrerem, com<br />

as crias que forem vindo (165);<br />

5? A manter no estado em que os recebeu, os pombaes,<br />

viveiros de peixes e as colmeias (166).<br />

§ 107.—ObrigaçZes quanto ás dividas do proprietário.<br />

1. O usofructuario por titulo singular não é responsável<br />

pelas dividas do proprietário (167).<br />

Todavia o immovcl fructuario pôde vir a ser penhorado e<br />

arrematado pelos credores do proprietário nos dous casos seguintes:<br />

I o . Se o acto pelo qual se constituio o usofructo não foi<br />

regularmente transcripto no registro geral da comarca (168);<br />

2 o . Se ao tempo da constituição do usofructo o immoveljá<br />

se achava gravado de hypotheca legal ou convencional devidamente<br />

inscripta (169);<br />

2. Se o usofructo tem por causa disposição de ultima vontade,<br />

o usofructuario, é certo, não responde pessoalmente pelas<br />

dividas, nem tem qualidade para ser demandado por ellas (170);<br />

mas os bens fructuarios, no caso do usofructo abranger a herança<br />

reete colère. Vin. cit. n. 7. Mühlenbruch, § 284. Voet, Pandect 7, 1, n. 36.<br />

Como, por exemplo, ter os cafesaes limpos.<br />

(162) Fr. 3S I. de rer divis. 2,1 Voet. Pandect, loc. cit.<br />

(163) Fr. 48 § 1.", fr. 9 § 7 D. de usufr. B. Carn., § 43, n. 4.<br />

(164) Fr. 9. § 6, D. de usufr. B. Carn., § 43. n. 32.<br />

(165) Vej. § 100, acima.<br />

(166) Fr. 62 § 1.°, D. de usufr. 7, 1. B. Carn. § 43, n. 32.<br />

(167) Vej. § 32, acima. Aquelle que adquire por titulo singular não é<br />

responsável pelas dividas do adquirente.<br />

(168) Lei n. 1237, de 24 de -Setembro de 1864, art. 6, § 2, e Décret.,<br />

n. 3453, de 26 de Abril de 1865, art. 264.<br />

O usofructo sobre immoveis não pôde ser opposto a terceiros, senão depois<br />

de transcripto o respectivo titulo. Vej. § 95, acima.<br />

(169) Lei cit. n. 1337, art. 6, §2, Decreto citado .artigo 264. Vej. adiante<br />

paragrapho 257.<br />

(170) Moraes, Execut. 6,7 n. 68 Lobão, Execuç., §45, B. Carn. L. 2, § 41,<br />

n. 10 e seguintes, D. Port. Ill, art. 553.


DAS COUSÂS 225<br />

3fta totalidade ou em quota-parte, ficão sujeitos ás dividas do testador<br />

(171), e o herdeiro (o senhor da nua-propriedade) pôde dal-os<br />

em pag-ameuto, ou nomeando-os directamente á penhora, ou havendo-os<br />

do usofructuario para aquelle fim (172).<br />

A razão é obvia: não ha herança, e por conseqüência usofructo<br />

sobre ella, senão depois de deduzidas as dividas que a<br />

onerão (173)<br />

§ 108 —Ouasi-posse do usofructo.<br />

1. A quctsi-posse do usofructo consiste na pratica, sobre a<br />

cousa, de actos de uso e g"ozo com o animo de usofruir (174).<br />

O exercicio do usofructo, como já se tem observado, presuppõe<br />

a detenção material da cousa. Mas sem embarg-o, subsiste<br />

sempre a differença entre a posse da cousa—posse propriamente<br />

dita (tossessio cerpo^us) e a quasi-posse do usofructo (possessio juris).<br />

2. O proprietário conserva a posse da cousa, o usofructua-<br />

(171) Fr. 43. D. de usu et usufrut et habit. 33,2: Nihil interest utrum<br />

bonorum quis, an rerum teriite partis usumfructum legaverit. Nam si bonorum<br />

ususfructus legabitur, etiam jes alienum. ex bonis deducetur. Fr. 69 I).<br />

Ad. leg. Facult. 35, 2: Usufruetu bonortim legato, ces alienum ex omnibus<br />

rebus deducendum est.<br />

Se o legado de usofructo recahe em cousa certa, o legado não fica sujeito<br />

ás dividas; pôde todavia soffrer reducção. Cit. fr. 43: at si certaritm<br />

rerum ususfructus legatus erit, non idem observabitur.<br />

(172) Guerr. Fr. 1, L. 4, cap. 2, n. 99; Moraes, Execuç., loc. cit. Dobão,<br />

loc. citada.<br />

Se o herdeiro paga dividas da herança, tem direito a haver do usufructuario<br />

bens equivalentes. Lobão, loc. cit.<br />

Não é mister dizer que no caso do usofructo ser constituído em uma quota<br />

da herança, a contribuição dos bens fruetuarios para as dividas deve<br />

guardar a devida proporção.<br />

Xa materia sujeita o Direito francez se aparta da doctrina do Direito<br />

Romano. Segundo aquelle Direito, o usufruetuario de toda a herança ou<br />

d'uma quota delia, paga os juros das dividas, o herdeiro o capital. "Vej.<br />

Mourlon, I, 3, n. 160S.<br />

(173) Voet, Pandect. 7, 1. n. 40.<br />

(174) Fr. 3 § 17 !D. de vi 43. 16: Qui ususfructus nomine qualiter fuit<br />

quasi in possessionem utetur hoc interdicto. Fr. 23, § 2 D. Ex quib. caus.<br />

maior. 4, 6: Ususfructus quasi jiossessio.<br />

Savigny, Poss. § 12 e 45. Vej. § 18, acima.<br />

A quasi-posse do usofructo pôde existir desacompanhada do direito de<br />

usofructo, como se alguém usufrue um prédio por titulo emanado a non-domino.<br />

Vej. B. Carneiro, § 40, n .30.


226<br />

DIREITO<br />

rio a quasi-possc do usofructo (175). O usofructuario detém a cousa<br />

(176) como o faz o locatário, em nome do proprietário, em<br />

cujo proveito continuão a correr os effeitos da posse, (177); e ao<br />

mesmo tempo se mantém na quasi-posse do seu direito, em virtude<br />

da qual pôde invocar os interdictos competentes contra as<br />

violências ou turbações causadas por terceiros (178).<br />

3. E pois que a quasi-posse do usofructo se combina com<br />

detenção da cousa, dahi vem que ella se adquire e se perde pelos<br />

mesmos modos que a posse.<br />

Adquire-se, por exemplo, pela entrega da cousa, pela entrada<br />

do usofructuario no immovel (179), uma vez que estes factos<br />

sejão praticados com a intenção de usofruir. Perde-se por todo acto<br />

que acarreta a tirada da cousa do poder do usofructuario (180).<br />

E também se adquire, se conserva (181) e se perde pelo<br />

ministério de terceiro (182).<br />

(175) Savigny. § 12.<br />

(176) Fr. 12 pr. D. adq. vel amit. poss. 41, 2: Naturáliter videtur<br />

possiãere is qui usumfructum habet. Aqui o texto emprega a phrase natura~<br />

liter possiãere no sentido de simples detenção. Vej. Valasc. Jus Emphy. II,<br />

cap. 18, n. 6.<br />

(177) Supponha-se que aquelle que constitue o usofructo não é ainda<br />

proprietário da cousa, mas está em via de prescrevel-a: não obstante a<br />

constituição do usofructo, a prescripção continua a correr em seu favor —<br />

o que é prova de que é elle que tem a posse da cousa, e não o usufructuario.<br />

(178) Nossos antigos praxistas confundião a quasi-posse do usofructo<br />

com a posse da cousa. e consequentemente pensavão que os interdictos de<br />

que o usofructuario pôde lançar mão resultavão da posse, e não da quasiposse.<br />

Vej. Pegas 6, for. C. 181, ns. 13 e 14.<br />

Acerca dos interdictos que competem ao usofructuario, vej. § 111, adiante.<br />

(179) Fr. 3 pr. D. de usufr. 7, 1. Savigny, § 45. Vej. •§ 100, acima.<br />

(180) Vej. § 15 acima.<br />

(181) Se o usofructuario cede o exercício do usofructo a um terceiro<br />

(§ 101, acima), conserva a quasi-posse por via desse terceiro. No caso figurado,<br />

se o proprietário transfere a posse da cousa, o usufructuario retém<br />

sempre a sua quasi-posse, que por assim dizer permanece inhérente ao direito<br />

em se, ao usofructo, e e différente da posse da cousa: fr. 12, § 2D.<br />

de usufruct. 7. 1.<br />

Mas se o exercício do usofructo é cedido ao próprio proprietário, e elle<br />

aliena a cousa sem attenção ao usofructo, neste caso o usufructuario perde<br />

a quasi-posse. A razão ê clara: o proprietário, por cuja via o usufructuario<br />

conserva a quasi-posse, pratica um acto qua importa esbulho da quasi-posse.<br />

Fr. 29 D. Quib. mod. usufr. amit. 7, 4, Savigny, § 45.<br />

(182) Vej. § 16.


Ï>ÀS CDÜSÀS 227<br />

§109. — Como acaba o usofi ucto : conseqüências.<br />

A lei, pelas razões em outro lugar expostas, não permute<br />

que os direitos que formão o usofructo se conservem perpetuamente<br />

separados do domínio (183).<br />

O usofructo, pois, tem uma duração limitada, mais ou<br />

menos longa, mas sempre temporária : principio este que, por<br />

entender com a organisação da propriedade, não pôde ser clerogado<br />

pela vontade das partes (184).<br />

Ha um certo numero de factos que acarretão a extincção<br />

do usofructo ; e esses factos são combinados de modo tal que<br />

em caso nenhum o usofructo, qualquer aliás que seja o seu titulo,<br />

pôde escapar á acção de algum délies.<br />

A . No estado actual do nosso Direito, os factos que põem<br />

termo ao usofructo se reduzem aos seguintes :<br />

1." Moi te do usofructuario 185). O usofructo é um direito<br />

personalíssimo, e portanto intransmissivel por acto entre vivos,<br />

ou por successão (1S6).<br />

Mas bem pôde o testador deixal­o a um indivíduo e a seus<br />

herdeiros : neste caso os herdeiros adquirem o usofructo, não do<br />

usofructuario, mas do testador, de quem são successores em segundo<br />

gráo (187).<br />

2." Preenchimento do termo (188), fixado por lei ou por vontade<br />

do iustituidor.<br />

Constituído em favor de urna pessoa moral, de duração<br />

indefinida, como uma villa, uma corporação de mão­morta, o<br />

usofructo fenece ao cabo de cem annus ; prazo que a vida humana<br />

de ordinário não chega a exceder (189).<br />

(183) Vej. § 93 acima.<br />

(184) S 1" í. tie usufr. 2. 4: Ne tanien in universum inutiles essent poprietates,<br />

semper abscedente usufructu, plaeuit certis modis extingui usumfructum<br />

et art proprietatem reverti. Fr. 3 § 2 D. usufr. 7, 1.<br />

Acear. n. 279, Zachár. 5 250. Mourlon, >L. 2. T. 3, n. 1483. 4Ü4 e 1616.<br />

(185) S 3 I. de usufr.. MCVJK L. 3 T. 13 S 6.<br />

(186J Pr. 3 § 3 !>. Quib. mod. usufr. amit. 7, 1: .. jusfruendi... sicut<br />

siquid aliud quod personse cohseret.<br />

■:, BY. 4 o 5 D. eodem, Zach. S 230, Mourlon, 13. n. 1619.<br />

(188) Fr. 15 D. Quib. mod. usufr. amit. 7, 4. C. 5, C. de usufruct.<br />

et habit. 3, 33.<br />

(189) Fr. 56 D. de usufr. 7. 1: Et. p­lacuit centum annis tuendos esse<br />

municipes quia is finis vila.­ longevi hominis est. D. Port. Ill, art. 571. 0<br />

16


228 MRÏÎITO<br />

O termo é o máximo além do qual não pôde o usofructo<br />

durar : é possível porém que o usofructo acabe antes de preenchido<br />

o prazo, como se occorre anteriormente alguma causa da<br />

extincção, com a morte do usofructuario. a dissolução da pessoa<br />

moral (190).<br />

3.° Implemento da condição resolutiva (191). Assim o usofructo<br />

legal do pai sobre os bens adventicios do filho acaba pela<br />

emancipação (192).<br />

4." Renuncia em favor do proprietário, por titulo oneroso<br />

ou gratuito (193).<br />

5." Consolidação (194). O que se verifica quando o usofructuario<br />

adquire a núa propriedade : a cousa passa para o domínio<br />

do usofructuario, e como ninguém pôde ter usofructo no<br />

que é seu, fica extincto o usofructo (195).<br />

No emtanto revive o usofructo, se a causa da consolidação<br />

vem a cessar de existir coin effeito retroactivo (ex tunc)<br />

como se o domínio daquelle que transferió ao usofructuario a<br />

núa propriedade era résoluvel, ou se o testamento em que ella<br />

foi legada é posteriormente annullado ou rescindido (196).<br />

6.° Resolução do direito do proprietário (197). Resolvido o<br />

C. C. fràncez. (art. 619) e o Port. (art. 2244) reduzirão este prazo á trinta<br />

annos.<br />

(190) C. 7 in fine, C. de usufr. 3,33, Accar. n. 279, n. 2. Mourlon,<br />

I. 3. n. 1621.<br />

Se o usofructo é constituído para durar até que uma terceira pessoa que<br />

não o usufructuario, complete uma certa idade, trinta annos por exemplo;<br />

não se extingue, se a pessoa morre antes de chegar a idade marcada, mas<br />

subsistirá até o tempo em que essa pessoa teria completado a dita idade, se<br />

houvesse continuado a viver. C. 12 C. de usufr. C. do Chile, art. 8D4, C. C<br />

fr. art. 620, Port. art. 2245.<br />

(191) C. 5 C. de usufr. 3. 33.<br />

(192) Vej. Direit. de famílias, § 119.<br />

(193) § 3 I. de usufr. 2. 4; fr. 48 pr.. fr. 64 .1 eusufr. 7. 1.<br />

(194) § 3 1. cit. fr. 4 D. usufruct, quemad. cav. 7. 9.<br />

A consolidação produz uma extincção parcial do usofructo, se o usofructuario<br />

só adquire uma parte indivisa da eo<br />

(195) Vej. acima § 93.<br />

(196) Fr. 57 pr. D. de usufr. 7, 1, B. Carneiro. § 45. n. 9. Pôde dar-se<br />

como exemplo o caso da ord. L. 4 T. 82 § 3.<br />

(197) Fr. 16 D. Quib. mod. usufruct, amit. 7, 4; fr. 103 D. de conditionib.<br />

et demonstrat. 35, 1, Mourlon, I, 3, n. 1632.


DAS COUSAS 229<br />

domínio de quem o constituio, por esse mesmo facto se resolve<br />

o usofructo.<br />

7.° Não-uso durante dez annos entre presentes, vinte entre<br />

ausentes (198). O Não uso é considerado como uma renuncia<br />

tácita, e em conseqüência produz o seu effeito extinctivo, embora<br />

a cousa sobre que recahe o usofructo não tenha sido possuida<br />

como livre durante aquelle prazo, ou pelo proprietário ou por<br />

um terceiro prescribente (199).<br />

Para se não verificar o não-uso, basta que alguém, ainda<br />

sem mandato do usofructuario, mas em nome delle, exerça actos<br />

de uso e gozo sobre a cousa (200).<br />

8.° Transformação substancial da cousa (201) (rei mutatió) :<br />

Occorre, com o dito effeito, a transformação substancial :<br />

a) Ou quando a cousa soffre uma destruição completa,<br />

como se a casa desmorona, se o navio naufraga, se morre todo<br />

o rebanho (202) ;<br />

b) Ou quando se operão mudanças que a tornão imprestável<br />

para o fim a que era destinada, como se o terreno de cultura<br />

se convertesse em um lago, se o rebanho perdeu tantas cabeças<br />

que não pôde ser considerado tal (203).<br />

A extincção do usofructo, causada por trasformação subs­<br />

tancial, é absoluta : o usofructo não continua no objecto trans­<br />

its) Paul. Sent. Ill, 6 § 30; C. 13 C. de servit. 3.34, Mello, 3, 13 § 6,<br />

B. Carneiro, § 45, n. 15.<br />

(199) C. 13 C. de servit. 3.34. Fntendcm alguns interpretes do D. Romano<br />

que o não-uso é insufficiente para operar a extincção do usofructo, so<br />

com elle não coincido a acquisição da cousa por terceiro prescribente ou da<br />

liberdade da cousa pelo proprietário (usucapio libertatis). Esta opinião 6 infundada<br />

á vista da cit. C. 13. de harmonia cam a qual deve ser entendida a<br />

C. 16, S 1" C. deu sufr. Vej. Ace. n. 27>9, 5° e Maynz, S 231, nota 35.<br />

Segundo o Direito franeez o não uso, por si só, extingue o usofructo<br />

em trinta annos, mas o proprietário pôde adquirir a liberdade da cousa, e um<br />

terceiro o dominio delia livre, pela prescripção de 10 e 20 annos, M-our-<br />

)on, 1. 3 n. lGâG.<br />

(200) Fr. 38 D. do usufr. 7. 1.<br />

(201) O que é substavcki da cousa no sentido juridíco? Vej. 93, § acima.<br />

(202) Paul. Sent. Ill, 6 § 3.1 1, de usufr. 2, 4.<br />

(203) Fr. 10, S 2, 3. 4. S. D. Quito, mod. usufr. amit. 7, 9; Mourlon, I,<br />

3. n. 162S. -


23o DIRRITÒ<br />

formado ou nos seus restos (204) ; nem revive da que a cousa<br />

seja restaurada no seu antigo estado (205).<br />

A douctrina exposta só vigora quando a cousa constitue o<br />

objecto único ou principal do usofructo. Mas se a cousa transformada<br />

é accessorio ou dependência, bemfeitorias, por exemplo,<br />

de uma herdade —­ subsiste o usofructo no que resta, como<br />

o solo, os materiaes do edificio (200).<br />

B. Extincto o usofructo por qualquer dos modos declarados,<br />

a não ser pela consolidação ou pela perda da cousa, o proprietário<br />

readquire a liberdade da cousa e o seu domínio se torna<br />

pleno pela reunião dos elementos que se conservavão destacados<br />

(207).<br />

E para rehaver do usofructuario a cousa e inderanisações<br />

que forem devidas, lhe assiste a competente acção. Esta acção,<br />

relativamente aos herdeiros, tem um caracter pessoal : — pôde<br />

ser dirigida contra elles, ainda que nunca houvessem tido a<br />

cousa sob sua detenção (208).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 73.9 — O usofructo extingue­se:<br />

I — Pela morte do usofructuario. — 16vS.<br />

II — Pelo termo de sua duração ■— 1688.<br />

III — Pela cessação da causa de que si origina.<br />

IV — Pela destruição da cousa. não sendo fungível, guardadas as disposições<br />

dos arts. 736 '■'■' 2* parte, e 738. — "•!


DAS COUSAS 231<br />

Ari:. 7-iü — Constituído o usofructo em furar de dois ou mais indivíduos,<br />

extinguir-se-á parte a parir em relação a cada um dos que faUeccrcm. salvo<br />

se, por estipulação expressa, o quinhão desses couber aos sobreviventes, 1716.<br />

Art. 741 — O usofructo constituído em favor de pessoa jurídica extinyuc-se<br />

com esta, ou se cila perdurar, aos cem annos da data em que se conn<br />

e: Pecuniœ quoque ususfruetus legatus. per<br />

annum non utendo ínon amittitur), quia nec ususfructus est. et pecunisz<br />

dominium fructuarii. non heredis e.st. Noodt. ioc. rit.<br />

(215) Vinnio ao cit. •; 2 da I. n. 5. Accar. i>. 280.


232 DIREITO<br />

a restituir, não a propria cousa — o que seria impossível,—mas<br />

ou o valor delia, ou cousas da mesma qualidade e em igual quantidade<br />

(216).<br />

3, Se o objecto do quasi-usofructo é um credito de que é<br />

devedor o próprio usofructuario, tem elle duas vantagens —- a<br />

cessação dos juros e o direito de reter o capital até que o quasiusofructo<br />

se extinga (217).<br />

Se o credito, porém, é devido por terceiro : ao íructuario<br />

assiste o direito de perceber os juros, e de cobrar o capital, vencido<br />

o prazo do pagamento (218). Só depois de cobrado o capital<br />

é que na realidade começa de existir o quasi-usofructo; antes desta<br />

operação, o direito do íructuario é um verdadeiro usufructo (21'J).<br />

4. Pôde ser objecto de quasi-usofructo um estabelecimento<br />

commercial (220). Os bens que formão uma semelhante universalidade<br />

de cousas são destinados á venda : nesta relação de direito<br />

tomão o caracter de cousas fungíveis, e uma vez alienados,<br />

se reputão civilmente consumidos. O quasi-usofructo, pois, se fixa<br />

antes nos valores dos objectos do que nos próprios objectos ;<br />

donde resulta que, acabado o quasi-usofructo, é o Íructuario obrigado<br />

a restituir a estimação dos objectos ao tempo da constituição<br />

do quasi-usofructo, ou objectos do mesmo gênero, e na mesma<br />

quantidade (221).<br />

(216) § 2 I. de usufr.; fr. 7 D. do usufr. ear. rer. 7. 5: Ut quandoque<br />

is mortuus aut capite diminutus sit, ejusdem qualitatis res restituatur, aut<br />

festimatis rebus certas pecuniae cavendum est. O íructuario é obrigado a<br />

restituir cousas do mesmo gênero, e não o valor délias, salvo se houve estipulação<br />

prévia: cit. fr. 7, Accar. n. 280, ÍDurantín, IV. n. 577. Vej. Mourlon.<br />

1, 3, n. 152«. Noodt, loc. cit.<br />

Ha uma grande semelhança entre o quasi-usofructo e o mutuo; todavia..<br />

disünguem-se pelo modo de constituição e extineção.<br />

(217) iFr. 3 e 4 D. de usufr. ear. rer. 7, 5.<br />

(218) Fr. 24 pr. de usufr. et usufr. leg. 33, 2; C. 1. C. de usufr. 3, 33.<br />

(219) Mühlenbruch § 285. Esta distineção não é uma mera subtilexa.<br />

mas tem effeito pratico. Assim se o credito não é cobrado por insolvabilidade<br />

do devedor, a perda é por conta do proprietário e não do íructuario; prevaleceria<br />

porém a solução contraria, se o direito do íructuario, antes de cobrado<br />

o capital, se reputasse quasi-usofructo e não verdadeiro usofrueto,<br />

pois a perda da cousa sujeita a quasi-usofructo é sempre por conta do fructuario.<br />

(220) Proudhon. Serva. I, n. 127, Zachar. § 225.<br />

(221) Zach., cit. § 225, nota 1.


DAS COüSÂS 233<br />

5. Pôde ainda ser objecto de quasi-usofructo uma universalidade<br />

de direitos, como um pecúlio, uma herança (222). Neste<br />

caso o direito do fructuario é regulado : como verdadeiro usofructo<br />

no que pertence ás cousas não fungíveis, como quasi-usofructo<br />

pelo que respeita ás fungíveis (223).<br />

6. E' também o qnasi usofructuario, antes de entrar no<br />

exercício de seus direitos, obrigado a fazer inventario dos objectos,<br />

com especificação da qualidade e quantidade, e garantir a<br />

restituição com fiança, penhor ou hypotheca (224).<br />

7. O quasi-usofructo se constitue e acaba pelos mesmos<br />

modos que o usofructo. Por impossibilidade obvia não lhe são<br />

applicaveis os seguintes modos de extincção do usofructo —c<br />

não-uso, a consolidação, e a transformação da substancia da<br />

cousa (225).<br />

§ 111.— A ecoes que nascem do usofructo.<br />

1. O usofructo, pois que presuppõe a detenção do objecto,<br />

está como o domínio, exposto a ser lesado de dous modos, á saber<br />

: ou por actos que importão a tirada da cousa do poder do<br />

usofructuario, ou por actos que tão somente perturbão o exercício<br />

do direito (226).<br />

Para cada uma daqueilas duas espécies de injurias tem o<br />

domínio uma acção apropriada, para as primeiras a reivindicação,<br />

para as segundas a r.egatoria (227). O usofructo, porém, tanto<br />

no caso da tirada da cousa como no de simples turbação, se de-<br />

(222) Fr. 5 pr. D. de usufr. ear. rer. 7. 5, fr. 24 pr. fr. 37, fr. 43 D. de<br />

usufr. et leg. 33. 2; Mello. 3. 13 § 8.<br />

{223) Accar. n. 280 ín fine, Mello. loc. cit.<br />

224) § 2 I. de usufr. 2, 4: fr. 7 I). de usufr. ear. rer. 7. 5.<br />

E' de bom conselho fixar -na fiança o valor dos objectos, para evitar. a&<br />

difficuldades inhérentes ás liquidações.<br />

A fiança pôde ser dispensada por quem constitue o quasi-usofructo.<br />

\cv n. 280. Mello, 3, 13 § 8.<br />

(225) Ace. loc. cit.. Mello. loc. cit.<br />

(226) Vej. § 81 acima. Ha turbação dos direitos do usofructuario. quando,<br />

por exemplo, um terceiro se arroga uma servidão de transito, de pasto.<br />

na cousa fruetuaria.<br />

(227) Vej. § 82 e § .87 acima.


234 DTRfilTO<br />

fende cora uma só acção — a confessoria (228), real de .sua natureza<br />

(229).<br />

2. A dita acção é também commum as servidões reacs (229).<br />

Quando deriva do direito real de usofruír, tem por *obtecto<br />

:<br />

I O reconhecimento do usofrueto (.231) ;<br />

II. A condemnação do réo :<br />

a) a restituir a cousa ao usofruetuario, se lh'a tirarão do<br />

poder (232) :<br />

b) a cessar a moléstia actual e dar fiança de (pue de futuro<br />

não praticará novos actos de turbaçãò (233);<br />

c) a repor os fruetos colhidos e satisfazer as perdas e damnos<br />

causados (234).<br />

3. Pôde a confessoria, real como é, ser dirigida não só<br />

contra o proprietário, como contra quaesquer terceiros (235).<br />

4. Deve o usofruetuario provar :<br />

Que tem usofrueto constituido na cousa : e o fundamento<br />

da acção (236);<br />

Que o réo, proprietário ou terceiro, a retém injustamente<br />

ou o molesta com actos turbativos de seus direitos : 6 a condição<br />

de exercicio da acção (237).<br />

(228) Fr. 1 pr. fr. 5 § 6 D. Si ususfr. pet. 7, 6. Marezoll, § 109, Maynz<br />

§ 222, Doctr. das Acções; § 99 e nota 216. Doodt. I» cap. 14 Voct. Pandect.<br />

7, 1, n. 33.<br />

(229) § 2 I. de actionib. 4, 6: iEque si agat quis jus sibi esse... íedibus<br />

utendi fruendi. .. in rem actio est. A acção conserva a natureza do direito<br />

de que deriva: o usofrueto é um direito real; real deve ser a acção destinada<br />

a protege-lo. Veja-se Keller, Process. Civil e acç. entre os Romanos, § 87.<br />

Ao usofruetuario. em quanto não tem jus in re constituido na cousa .<br />

quasi-tradicão nus casos em une ella é necessária, só compete acção pessoal<br />

contra o proprietário para obriga-lo a lh'a entregar B. Car. L. 2, § 43, n. 63.<br />

(230) Vej. adiante ? 13.'.<br />

(231) § 2 I. de actionib. 4, 6; Marezoll, cit. § 119, Maynz. cit. § 222.<br />

D'ahi a denominação de confessoria.<br />

(232) Fr. 1 pr. fr. 5 § 6, D. si ususfruct. pet. 7. 6; B. Carn. § 43, n. 61.<br />

Doctr. das Acç. § 99.<br />

(233) Maynz § 222. Marezoll § 109, Doctrina das Acç. nota 216.<br />

(234) Fr. 2. fr. -"> § 6 D- Si ususfr. pel. 7,


DAS COUSAS 235<br />

5. A quasi-posse do usofructuario (actos de uso e gozo) se<br />

confunde com a posse natural da cousa (238), e está portanto sujeita<br />

ás mesmas lesões deque é susceptive] a posse; donde vem<br />

que são applicaveis á defesa da quasi-posse do usofrueto os mesmos<br />

interdictos que protegem a posse (239).<br />

O usofructuario pode pois invocar : a acção de manutenção,<br />

se e turbado na sua quasi-posse ; a de esbulho se a cousa lhe 6<br />

injustamente tirada (240).<br />

6. Do direito que ao usofructuario assiste, de se aprovei! ir<br />

das servidões activas inhérentes ao prédio fruetuario (241), resulta<br />

para elle, como corollario, o direito de intentar em seu proprit<br />

nomt as acções competentes contra os que o perturbarem no exercício<br />

dessas servidões (242).<br />

(238) \ ej. S 16 acima<br />

(239) Vatican, frac § 90 9] 92 i 93 Savignj Poss § -15<br />

(,240) 8,i\ ignj cil s ; ! VIaj nz § 22Î \ ip 16.<br />

(241) \ci § 98 acima.<br />

{242) Pr. pr. fr. 5 s l" D de ususfr. pet 3 6 Maynz loc i<br />

I, cap. 15, B. Carn. § 43, n. 65.


CAPITULO II<br />

USO H HABITAÇÃO<br />

§ 112. — Uso<br />

1. O usofructo se compõe do direito de usar [jits utendi)<br />

e do direito de perceber os fructos (jus frucndi). O direito de<br />

usar pôde subsistir independente do de perceber os fructos :<br />

neste estado constitue um direito redl especial, denominado<br />

uso (1).<br />

2. O uso instituído em separado conserva os mesmos attributes<br />

que lhe são inhérentes quando parte elementar do usofructo<br />

: é o próprio direito de usar tal como o tem o usofruetuario,<br />

mas com exclusão do direito de perceber os fructos, quer<br />

naturaes, quer civis (2).<br />

3. O usuário, pois, tem o direito pleno de uso, isto é. de se<br />

aproveitar da cousa, sem attenção ás suas necessidades pessoaes,<br />

em todos os usos e serviços a que ella se presta (3). O limite do<br />

(1) I. de usii et hábil. 2, 5. D. de usu ei habit. T. 8.<br />

A nossa legislação é lambem totalmente omissa acerca do uso e lial):tação;<br />

apenas a modernissima lei n. 1237. de 24 ãe Setembro de 1964, ari 6".<br />

e o Decreto n. 3453 de 26 de Abril de 1865, art. 261. fazem referencia áquelles<br />

direitos, por oceasião de enumerar os direitos reaes sujeitos á formalidade<br />

da transeripção: Rege. pois. a materia o Direito Romano.<br />

(2) Pr. 2 pr. D. de usu et habi. 7, 8: Cui usus relietus est, uti potest,<br />

frui non potest. Fr. 1 § I o D. rodem: Constituitur etiam nridus usus, id est,<br />

sine fruetu.<br />

(3) Fr. 2 pr., fr. 12 § 3 o D. eodem: Sed si boúm armenti usus relinquatur,<br />

omnem nsnm habebit et ad arandum et ad cœtera ad qu


DAS COUSAS 237<br />

seu direito é o limite do uso ; são-llie em conseqüência permittidos<br />

todos os actos que entrão na definição de uso (4), salva a<br />

substancia e o destino do objecto (5).<br />

Tal é o direito de uso em toda a sua pureza.<br />

4. Sem embargo, se a cousa é de natureza que o uso delia<br />

traz pouco ou nenhum proveito, o Direito afrouxa de sua severidade,<br />

e consente ao usuário a faculdade de perceber uma certa<br />

porção de fructos, tantos quantos bastem para as suas necessidades<br />

e das pessoas de sua íamilia (6). Assim que : se o objecto<br />

do uso é uma iazenda de cultura, o usuário, alem do direito de<br />

habitar as casas, passeiar e se recrear nos terrenos (actos de uso),<br />

bem pôde colher fructos, mas tão somente para as suas necessidades<br />

diárias (7).<br />

Neste aspecto o uso, para não ficar estéril, usurpa até<br />

certo ponto attribuições de usofructo, mas dentro dos limites das<br />

necessidades pessoaes do usuário, limite que não entende com o<br />

uso exercido em sua pureza, extreme de comparticipação do direito<br />

de fruir (jus fruendï) (8).<br />

5. Ouso tem duas particularidades: é indivisível, e portanto<br />

não pôde ser constituído por partes em uma mesma cousa<br />

(')). Nem tão pouco ao usuário é permittido cedê-lo a outrem ou<br />

prêtes, por erro na intelligencia dos textos, construirão uma theoria falsa,<br />

segundo a qual o uso devia ter sempre por limite as necessidades pessoaes<br />

do usuário, ou se tratasse do uso puro {nuãus usas) ou do uso aceidentalmente<br />

acompanhado do direito de perceber uma certa porção de fructos.<br />

Consistia o notado erro em applicar ao uso puro (jus utendi), que é pleno<br />

por Direito 'Romano., o limite que os textos estabelecião tão somente para<br />

o caso em que o uso, por extenção comprehend* o direito a fructos. A dita<br />

theoria, todavia, foi adoptada pelo Código Civil francez, c pelos códigos quo<br />

c tomarão por modelo.<br />

(4) Vej. § 93 acima.<br />

(5) Vej. o cit. § 93.<br />

(6) § 3 e 4 I. de usu et habit. 2, 5: Cr. 12 § 1" Cr. 1-', pr. fr. 16 pr. D.<br />

de usu et habit. 7. 8, Maynz í 215, Makdeldey S 316. Pessoas da família<br />

para este effeito se entendem a mulher ou marido, filhos, pais, sogro, sogra,<br />

genro, nora, criados, operários: fr. 2 § I o , fr. 3, 4, 5. 6 e 7 D. de usu et hab.<br />

(7) § I o e 4 I. de usu et habit.<br />

(8) Vej. nota 3 acima.<br />

(9) Fr. 19 D. de usu et habit. 7. 8: TJsus pars Iegari nun potest; nam<br />

t'.'ui quidem pro parte possumus; uti pro parte non possumus. Miihlenbruch,<br />

§ 286.


238 DIREITO<br />

exercêl­o por via de terceiro (10). Mas se o uso que o proprietário<br />

fazia da cousa, consistia exactamente em arrenda­la, ou loca­la.<br />

ou alienar os seus íructos, pôde o usuário continuar a emprega­la<br />

no mesmo mister (11).<br />

6. O usuário tem por obrig"ação :<br />

1." Garantir a restituição da cousa e as indemnisações devidas,<br />

com fiança idônea (12).<br />

2." Trata­la com o zelo de um bom pai de íamilia (13).<br />

3.° Não embaraçar o livre exercício dos direitos do proprietário,<br />

como por exemplo, que elle cultive a terra e colha os<br />

Íructos (14).<br />

4." Supportar de parceria com o proprietário as despezas<br />

de conservação e os onus a que a cousa é sujeita na proporção do<br />

valor das suas vantagens ; carregando, no emtanto, com todas<br />

aquellas despezas e onus, se o uso, por ser a cousa das que não<br />

dão fructos. lhe absorve toda a utilidade (I5j.<br />

7. O uso. em geral, está sujeito ás leis que regem o usoíructo<br />

: constitue­se nas mesmas cousas e se estabelece e acaba<br />

pelos mesmos modos (16).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

IX) USO<br />

Art. 742 — 0 usuário fruirá à utilidade da cousa dada em itsOj quanto o<br />

exigirem as necessidades pessoaes suas e de sua família.<br />

Art. 743 — Avaliar­se­ão as necessidades pessoaes do usuário, conform'<br />

■i sua condição social


DAS CO ti SA S 259<br />

\rt. 745 -*- São appltcaveîs ao uso. no que não foi contrario d sua natureza<br />

as disposições relativas ao usofructo.<br />

§ 113. Habitação<br />

A habitação, direito real (7), se assemelha ao uso e se<br />

approxima do usofructo, mas disting-ue-se de um e de outro (18).<br />

Consiste no direito de morar e residir na casa alheia (19).<br />

Constitue-se e exting-ue-se pelos mesmos modos que o usofructo<br />

(20), e é, em geral, sujeita ás mesmas leis (21).<br />

Sfio-lhe inhérentes as particularidades seguintes<br />

1. Aquelle que tem o direito de habitação pôde alugar a<br />

casa, mas não cedê-la a terceiro paru a habitar gratuitamente<br />

(22).<br />

2. A habitação não se extingue pelo nâo-nso (23).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

DA HABITAÇÃO<br />

Ari 74li Quando o uso consisth no direito dt habitar gratuitamente,<br />

casa alheia o titular deste direito não 3. de 26 de Abril dí 1865 art 261.<br />

(18) i õ I. do usu et hab.: Neque usus v*id tur nequ< ususf uetus<br />

-ed [uasi proprium aliquod jus. C. 13, C. ât usufi et habit 3, 33.<br />

(19) Mühlenbn ch § 2S7.<br />

(20) C. 13 C. de usufr. et habit 3 33 Maynz 216.<br />

(21) I-"r. 5 ! ! D usufr. juemad ca\ 7, 9 O habitante ê brigad<br />

como o usofrueti irii a a a bem con ervar a i isa e a restiti<br />

(22) § ."> I. de usu et hab. 2. 5, C. 13 C. de usufi ei hab. Voet, Pau<br />

fleet. 1 8, n. 6.<br />

(23) Fr. 10 D. de usu et habit. 7. 9 Voet, cit. n 8 O direito de uso<br />

constituído em uma. casa é diverso do direito de habitação l 5 2 e ã le usu<br />

it habit. Assim que: o uso da casa. ao contrario da habitação, não pôde se<br />

locado a terceiro, e se extingue pelo não-uso. O Direito Romano considerava<br />

a habitação como alimentorum pars Voet cit. n. 9. Segundo o Direito fiancez<br />

(Cod. art. 632 a 634) o direito de habitação confunde-se com o uso da<br />

casa. Xo mesmo sentido o C. C. du Chile, art 811 i o Port art. 2204 § 1.


CAPITULO III<br />

DAS SERVIDÕES<br />

§ 114. ■—■ Noção de servidão.<br />

1. O domínio que o proprietário exerce sobre o seu prédio<br />

tem por limites materiaes as linhas que o dividem dos prédios<br />

adjacentes.<br />

Mas nem sempre o prédio reúne em si todas as condições<br />

de que o proprietário ha mister para tirar d elle todas as vantagens<br />

e utilidades que encerra.<br />

Se a herdade é encravada, carece de vias que, passando<br />

por terrenos alheios, a ponhão em communhão com a estrada<br />

publica ; se lhe fallece água para a laboração de machinas,<br />

faz­se necessário ir buscal­a á fontes ou correntes estranhas.<br />

D"ahi a necessidade das servidões que não são outra cousa<br />

senão direitos por efreito dos quaes uns prédios servem aos outros.<br />

2. Tomada no sentido legal e seientifico, servidão 6 o<br />

direito real constituído em favor de um prédio (o dominante)<br />

sobre outro prédio pertencente a dono diverso (o servi ente)<br />

(1). Esse Direito do senhor do prédio dominante consiste<br />

na faculdade de fazer no prédio serviente o que não lhe fora<br />

permittido se não existisse a servidão (///.$ faeiendi), ou de probibi)<br />

que o dono do dito prédio exerça nelle actos, que, a não<br />

existir a servidão, pudera livremente praticar (jus prohiber! di) (2).<br />

(1) Bartholo: ■•Servitus est jus quoddam prœdio Lnherens, ipsius utilitatem<br />

respiciens et alterius preedii jus seú libertatem minuens.<br />

(2) Servitus es1 /'".s in re aliena quo donnnus aliquid pati in suo veî


DAS COUSAS 241<br />

E' esta a noção fundamental sobre a qual assenta a theoria<br />

das servidões em todos os seus desenvolvimentos.<br />

3. As servidões se constituem pela separação de certo 0<br />

direitos elementares, que se destacão do domínio sobre o prédio<br />

serviente e passão para o dono do prédio dominante. A servidão<br />

de transito, por exemplo, não é senão uma fracção do domínio<br />

do prédio serviente exercida pelo senhor do prédio dominante.<br />

O desmembramento que fôrma a servidão, tem por objecto<br />

ou uma parcella do direito domiuical de usar (ju$ ulendi)<br />

como a servidão de transito, ou uma parcella do direito de usofruir<br />

(jus fruendï) como a servidão de pasto, ou uma parcella do<br />

direito de retirar productos que não são iructos, como a servidão<br />

de tirar água.<br />

A servidão é um augniento para o prédio dominante, uma<br />

diminuição para o serviente (3).<br />

4. Da noção de servidão resultão os corollarios seguintes :<br />

I o . A servidão presuppõe dous prédios, um em favor e utilidade<br />

do qual e estabelecida, outro que ella grava (4).<br />

2 ° E' um direito real sobre a cousa alheia. O direito que se<br />

destaca para constituir a servidão, emquanto exercido pelo<br />

dono do prédio serviente, não se distingue do dominio e nelle<br />

se confunde. Na verdade a servidão só adquire existência, de­<br />

non facere tenetur ad alterius utilitatem E' esta a definição clássica de<br />

servidão.<br />

O Cod. Civ. Franc, (art. 637) a define: "Une servitute est une charge<br />

impossSe sur un heritage appa­rtenant A un autre propriétaire."<br />

O C C do Chili 320): '"Servidumbre es un gravamen impuesto<br />

u : predio en utilidad de òtro prédio de distinto dueno."<br />

O C C Portuguez (arl 2267) igualmente traduz a definição do Ci<br />

!■": meez.<br />

A servidão é ura direito e um ojitts: direito, relativamente ao predio dominante<br />

onus com respeito ao serviente. A definição clássica põe em evi­<br />

. . aquellas duas faces, mas faz sobresahir como idéa dominante o principio<br />

active (jus), o direito A definição dus supracitados Códigos modi<br />

ij ixa, ao contrario, na sombra o principio activo e assignala como idéa prino<br />

caracter passivo da servidão — o onus imposto ao predio<br />

(3) Pr. 5 § 9 D. de nov. oper. nunt. 39. 1,'; Cumquis, posteaquam jus<br />

suum diminuit, alterius auxit, hoc esl posteaquam servïtutem asdibus su:­,<br />

imposuit.<br />

(4) S 3. I. Servit 2. 3.


242 bIRElTO<br />

pois que o direito se desmembra e adhere ao prédio dominante,<br />

a cujo senhor tica pertencendo. Ninguém, pois, pôde ter servidão<br />

11a propria cousa (5).<br />

3." E' um onus imposto á um prédio em utilidade de outro prédio<br />

(6). Sem este vinculo real entre os dous prédios, não ha servidão.<br />

Se um proprietário se prohibe a si mesmo o gozo de<br />

cousa sua, como habitar uma casa. passar por certa região da<br />

sua herdade, mutila com este procedimento os seus direitos,<br />

mas não estabelece servidão, porque a restricção que se impoz<br />

não tem por objecto a utilidade de prédio alheio (7).<br />

Nem tão pouco existe servidão se o dono de mu terreno<br />

permitted alg-uem pescar, caçar ou colher íruetos nelle, porquati-»<br />

to a utilidade da concessão é tão somente em proveito da pessoa<br />

e não do prédio a eila pertencente (8).<br />

4.° A servidão limita a liberdade do prédio sei viente. Com<br />

effeito se a servidão consiste na laculdade de fa~er (jus faciendi),<br />

o dono do prédio .servieute é obrigado a soffrer os actos que a<br />

revelão (pati) (9) ; se na faculdade de prohihir (jus prohibendi),<br />

está elle constituído na necessidade de não praticar os actos<br />

contidos na prohibição (non faciendi) (10). N'uni e n'outro caso<br />

é manifesta a restricção dos direitos dominicaes.<br />

Mas nunca pôde a servidão, em relação ao senhor do prédio<br />

serviente, se traduzir na obrigação de fazer (11). A razão<br />

é clara. O obiecto da servidão 6 sempre uma parcella do domi-<br />

(5) Fr. 26 D. de Servir, prœd. urb. 8. 2: Nulli res sua servit. Vv. 33<br />

5 1" D. de sei vit. prœd. rustic. S, 3:... Nullum prœdium ipsum sibi servire,<br />

Zacar, S 247 n. 4.<br />

(6) 5 3 I. Servit. 2, 3: Nemo enim potest servitutem adquirere urbani<br />

vel rustici prcedii, nisi qui habet prœdium, nee quiscitiam de'bere nisi qui<br />

habet prœdium. Lobão. Not. a Mello, L,. 3 T. 13 S 1". n. 4.<br />

(.7) Fr. 15 1). Servit. S. 1: Quotiens... ne


AS COUSAS 243<br />

nio, Um direito real que recahe directamente sobre a cousa e sobre<br />

ella se exerce. A obrigação de fazer é um facto devido pela<br />

pessoa. A servidão, pois, e a obiigação de fa%er são idéas heterogêneas.<br />

Assim para que a servidão podesse acarretar, como conseqüência<br />

propria, a obrigação de fazer, seria mister que ella se<br />

desvirtuasse, transformando-se do direito real que é, em direito<br />

pessoal (12).<br />

Todavia o senhor do prédio serviente não está inliibido<br />

de contractar a obrigação de fazer ou praticar actos em beneficio<br />

do dono do prédio dominante ; mas uma semelhante obrigação<br />

deriva, não da natureza da servidão, mas da clausula estipulada :<br />

tem pois, um caracter meramente pessoal e como tal pertence á<br />

theoria dos direitos pessoaes (13).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 695 — Impõe-se a servidão predial a um prédio em favor de outro,<br />

pertencente a diverso dono. Por ella perde o proprietário do prédio serviente o<br />

exercício de alguns de seus direitos ãominicaes, oil fica obrigado a tolerar que<br />

délie se utilize, para certo fim, o dono do prédio dominante.<br />

Art. 696 — A servidão não ne presume: reputa-se, na duvida, não existir.<br />

Art. 697 — As servidões não apparentes, só podem ser estabelecidas por<br />

meio de transcripção no registro de immoveis. — 676, 856, III.<br />

Art. 698 —- A posse incontestada e continua de uma servidão por dez ou<br />

vinte anno s, nos termos do art. 551, autoriza o possuidor a transcrevel-a em<br />

seu nome no registro de immoveis, servinão-lhe de titulo a sentença que julgar<br />

consumado usocapião.<br />

Paragrapho único. Se o possuidor não tiver titulo, o prazo do usocapião<br />

será de trinta anno s.<br />

§ 115. — Princípios fundamenta es das servidões<br />

Dominão as servidões em todas as relações de direito os<br />

princípios seguintes :<br />

1. A servidão deve necessariamente trazer ao prédio dominante<br />

uma vantagem real, tornando-o mais util, ou pelo menos,<br />

mais agradável ou mais ameno (14).<br />

(12) Fr. 6 § I o D. Si servit vindic. 8, 5: Servitutem non homminem<br />

debere, sed rem.<br />

(13) Mourlon I. n. 1657, Accarias, n. 264, 3 U .<br />

(14) Fr. 15 pr. D. Servit. 8, 1. fr. 3 pr. D. de aqua cotidian, et œstiv.<br />

43, 20: Fr. 86, D. V. S. 50. 16, Zaear. § 247, n. 1, Mourlon, I, n. 1858, Lobão,<br />

Águas § 94.<br />

17


244 toîfcSi*Ô<br />

2.° E' essencial que os prédios guardem entre si proximidade<br />

tal que a servidão se possa exercer sobre um em effectiva<br />

utilidade do outro (15). Entre dous prédios, por exemplo, que<br />

tem de permeio uma montanha, é impossível a servidão de<br />

vista ou a de não levantar o edifício mais alto (16). Basta a vizinhança.<br />

Assim a servidão de vista se pôde constituir em um<br />

prédio separado do dominante por um prédio livre interposto (17).<br />

A de transito muitas vezes grava, além da herdade contígua,<br />

a que se lhe segue (18).<br />

Ha todavia servidões que de sua natureza requerem a contiguidadc,<br />

como a de metter trave na parede alheia, a de apoiar<br />

o nosso edifício sobre o edifício ou pilastra do visinho (19).<br />

3. Uma vez constituída, a servidão adhere perpettiamtnte<br />

ao prédio dominante e ao serviente, a um como direito, a outro<br />

como onus : torna-se, por assim dizer, uma qualidade jurídica<br />

de cada um délies (20), e inseparavelmente os acompanha em<br />

todas as mutações por que passão (21).<br />

(15( Fr. 5 § I o D. Servit, prœd rustic. 8, 3: Neratius ait nee haustum<br />

pecoris, nee apulsum, neque cretse eximenda?, caleis que coquendœ, jus<br />

posse in alieno esse nisi funditm vicinum habeat. Lobão. Not a Mello, 3,<br />

13 § I o . n. 9. Aguas § 91.<br />

(16) Fr. 38 D. S. P. U. 8, 2: Si sedes meœ á tuis œdibus tantum distent,<br />

ut propici non possint, aut médius mons earum conspectum auferat, servitus<br />

imponi non potest.<br />

(17) Fr. 5 ÍD. Si servit, vindicet. 8, 5: Si inter meas et Titii axles tuse<br />

intercédant, possum Titii tedibus servitutem imponere ne licet ei altius tollendi,<br />

licet tuis non imponatur, quia donee tu non extollis, est utllitas servit<br />

utis.<br />

(18) Fr. I pr. D. Servit prœd. urb. 8, 2; Si intercédât solum publicum<br />

vel via publica, neque itineris actusve, neque altius toi lendi servitutes impedit.<br />

Lobão, Not. a Mello. 3, 13 § I o , n. 9.<br />

(19) Vej. adiante § 129.<br />

(20) Fr. 8€ D. V. Sig. 50, 16; Quid aliud sunt jura prcediorum quam<br />

preedia qualiter se habentia, ut bonitas, salubritas, amplitude<br />

(21) Fr. 23 § 2 D. S. P. R. 8, 3; fr. 12 D. comm: prasdior, 8, 4; Lei<br />

n. 1.237, de 24 de Set. de 1864, art. 6 § 3, Décret, n. 3.453 de 26 de Abril de<br />

1S65, art. 262, Mourlon, I n. 1662, 1809 e 1810. C. C. do Chile, art. 825;<br />

C. C. Port., art. 2268, Lob. Not. á Mello, 3, 13 § 1 n. 1, Águas § 95.<br />

Os Romanos exigião como requisito essencial que toda servidão tivesse<br />

uma causa perpetua. Em que consistia a causa perpetua ? Não são bem precisos<br />

á este respeito os textos, mas da combinação délies (fr. 28. D. S. P. U.<br />

8, 2; fr. 9 D. S. P. R. 8, 3) se induz plausivelmente que por causa perpetua


DAS COUSAS 245<br />

Desde principio derivâo duas conseqüências :<br />

1? A servidão não pôde ser desligada do immovel e transferida,<br />

ou hypothécada em separado (22).<br />

2 a . Aquelle que succède no prédio por titulo universal<br />

ou sing-ular, adquire-o, sem necessidade de declaração expressa,<br />

com todas as servidões activas e passivas (23)<br />

4. A servidão se reputa sempre adherida ao immovel em<br />

si, ou como direito ou como onus, ainda mesmo quando ella<br />

tem por fim exclusivo a utilidade das construcções que estão na<br />

superficie (24). Assim que, supposto a construcção seja demolida,<br />

a servidão, emquanto não se extingue pela prescripção,<br />

continua a vigorar (25).<br />

5. Pois que a servidão é essencialmente estabelecida em<br />

utilidade da cousa, a extenção delia se fixa e se determina pelas<br />

necessidades do prédio dominante. Dest'arte quem tem o direito<br />

de tirar água da cisterna ou fonte alheia, só pôde tirar a que fôr<br />

necessária para os usos da casa e irrigação do prédio dominante,<br />

e não para empreg-al-a em prédio diverso, ou para vendel-a ou<br />

dal-a (26).<br />

se entendia "a propriedade do prédio serviente de prestar por prazo indefinido<br />

e sem necessidade de facto de pessoa estranha a utilidade que é objecto<br />

da servidão". Vej. Jlaynz § 218, n. 3 o . Accarias, n. 266 A.<br />

E' fora de duvida que a maioria das servidões, por força da natureza<br />

das causas, tem uma causa perpetua.<br />

Os códigos modernos não fallão deste requisito. E, tomado no rigor do<br />

Direito Romano, é uma pura subtileza.<br />

Assim que, ninguém hoje põe em duvida que se possa constituir servidão<br />

de tirar água da cisterna, embora a cisterna seja obra humana (manu<br />

fit), nem tão pouco a de transito sobre prédio separado do dominante por<br />

via de rio sem ponte ou passagem publica (Fr. unie. § 4 D. de fonte, 43,<br />

22; fr. 38 D. S. P. R. 8.3).<br />

(22) Fr. 1 § I o . D. Comm. prted. 8, 4; fr. 44 D. locat. 19,2; fr. 11 § 3-<br />

D. de pignorib. 20, 1, Lobão Not á Mello, 3, 13, § I o , o. 3, 5 e 6.<br />

(23) Fr. 20 § I o . D. adq. rer. dom. 41, 1; fr. 23 § 2 D. S. P. R. 8, 3,Lobãc<br />

á Mello, 3, 13 § I o . n. 3.<br />

(24) Fr. 13 pr. D. S. P. R. 8, 3; fr. 11 pr. D. S. P. U. 8, 2, Lobão á<br />

Mello 3, 13 § I o n. 6, 2 o .<br />

(25) Vej. adiante § 134, n. 3.<br />

(26) Fr. 5 § I o . D. S. P. R. 8, 3 o Sed ipse dicit, ut maxime caleis coquendee<br />

et cretse eximer.dn servitus constitui possit, non ultra posse quam<br />

quatenus ad eum ipsum fundum opus sit. Fr. 6, 24 29 D. eodem.<br />

^y


24-b bî&ÉîtfO<br />

§ 116 — Indivisibilidade das servidões<br />

As servidões são indivisíveis (27):<br />

A ) I. Com effeito a servidão activa constitue urr» direito<br />

uno que adhere pleno e inteiro á todas as partes do prédio dominante<br />

e não se quebra em fracções (28). Assim se o prédio vem<br />

á cahir no condomínio de dous ou mais indivíduos, a servidão<br />

subsiste integra e perfeita e cada um dos condôminos a exerce<br />

como se fora o único proprietário (29).<br />

E a servidão não é só indivisível no ponto de vista material;<br />

também o é no ponto de vista ideal. Na verdade se ella<br />

não se pôde separar em tantas fracções quantas são as partes<br />

materiaes do prédio, da mesma sorte não se pôde dividir em<br />

partes ideaes correspondentes ás partes materiaes indivisas: fora<br />

por certo absurdo dizer que ao senhor da quarta parte de um<br />

prédio compete a quarta parte de uma servidão constituída em<br />

favor do mesmo prédio (30).<br />

II. A indivisibilidade da servidão possiva consiste nisto<br />

que o onus, com que grava o prédio serviente, regularmente o affecta<br />

no seu todo e esse onus é sempre o mesmo, único e indiviso,<br />

quer seja ella exercida por proprietário sing-ular do prédio<br />

dominante, quer por diversos condôminos (31),<br />

(27) Pompon, fragment.: Et servitutes divid non possunt, nam earum<br />

usus ita oonnexus est, ut qui eum partiatur, naturam ejus corrumpat<br />

Mourlon, I. n. I 1842, Zacar. § 247; C. C. Portuguez. art. 2269.<br />

A indivisibilidade é um dos caracteres essenciaes das servidões, taes<br />

como ellas se achão constituídas nos códigos modernos. Ainda os códigos<br />

que as não declarão formalmente indivisíveis, lhes dão effeitos que presupõem<br />

a indivisibilidade. Vej. C. C. Franc, art. 700, do Chile, art. 826.<br />

(28) Pr. 23 § 3 'D. de servit, -prced. rustic. 8, 3: Qusecumque servitus<br />

debetur, omnibus ejus partibus debetur. Pr. 6 § I o Comm. prced. 8. 4: Per<br />

partes servitus imponi non potest, sed nec adquiri.<br />

(29) Pr. 23 § 3 D. S. P. R. 8, 3: Et ideo quamvis particulatim venierit<br />

(fundus), omnes partes servitus sequitur et ita ut singuli recté agant jus<br />

sibi esse fundi. C. C. Fr. art. 700, Mourlon, 1, 4, n. 1841, C. do Chile, art. 827,<br />

Port. 2269. E' de notar que os comproprietario-s do dominante, no uso que fazem<br />

da servidão, não a podem tornar mais onerosa ao serviente do que o era<br />

quando exercida por proprietário singular.<br />

(30) Fr. 11 D. de servit. 8, 1: Pro parte dominii servitutem adquiri<br />

non posse vulgo traditur. Fr. 17 D. eodem. Accarias, n. 267.<br />

(31) Fr. 6 § I o D. Comm. prced 8, 4: Per partes servitus imponi non


DAS COUSAS 247<br />

B ) Supposto a servidão, ou como direito ou como onus,<br />

abranja o prédio em todas as suas parcellas, pôde todavia ser<br />

limitada á uma parte determinada. E de feito é licito constituir a<br />

servidão em favor tão somente de uma região certa do prédio<br />

(32) ou sobre um lugar marcado do prédio serviente (33).<br />

A servidão de transito, a de aqueducto, por exemplo, gravão<br />

de ordinário o local, por onde são effectivamente estabelecidas;<br />

mas as regiões do prédio, fora do alcance material da servidão,<br />

se considerão livres e como taes. sendo alienadas, passão<br />

para o adquirente (34).<br />

C ) Certas restricções impostas ao modo de exercer as servidões<br />

não são incompatíveis com o principio da índivisibilidade.<br />

Aquelle que estabelece uma servidão, pôde limitar-lhe<br />

o exercício, como — que o senhor do prédio dominante só passe<br />

pelo serviente á uma certa hora, em dias alternados, a pé e<br />

não a cavallo ou a cavallo e não de carro (35). Assim como também<br />

é licito dividir o uso da ag-ua da fonte ou aqueducto entre<br />

os donos dos prédios dominantes por medidas ou por horas (36).<br />

Sem embargo de limitações desta natureza, as servidões<br />

perseverão inteiras e não por fracções, tanto em relação ao<br />

prédio dominante, como ao serviente (37).<br />

D ) Quando o prédio dominante ou o serviente é dividido<br />

em regiões que passão a pertencer a proprietários différentes, cada<br />

potest. Fr. 13 § I o D. S. P. R. 8, 3, Zacar § 247, not. 9, 'Mourlon, I. n. 1S43,<br />

B. Cam. L. 2, § 70, n. 19.<br />

(32) Acearias, n. 267. nota (1) Lobão á Mello, 3. 13 § 3, n. 3. Pôde-se<br />

por exemplo estipular que a tirada d'agua seja tão somente em favor da<br />

parte do prédio dominante que ella é destinada a regar.<br />

(33) Fr. 21 D. S. P. R. 8, 3: Si mihi concesseris iter aqua? per fundum<br />

tuum, non destinata parte, per quam ducerem, totus fundus tuus serviet.<br />

Accar. n. 267, Ord. 1, 6S § 38. C. C. do Chile, art. 826.<br />

(34) Fr. 13 § I o S. P. R. 8, 3 Et quã primum iter determinatum est,<br />

eã servitus constitit, caetera? partes agri libera; sunt. B. Carn. § 70 n. 20.<br />

35) Fr. 4 § I o . D. Servit. 8, 1; Lobão a Mello, 8, 13 § 3° n. 3 e 4<br />

Aguas § 104.<br />

(36) Fr. 5 § 10- D. Servit. 8, 1; fr. 19 § 4 D. Corn, dividund. 10. 3, Resolução<br />

de 17 de agosto de 1775. Yej. adiante § 124.<br />

(37) Mourlon I, n. 1842.


248 DIREITO<br />

região se reputa enriquecida (38) ou onerada (39) de uma servidão<br />

propria e independente (40).<br />

Nisto não ha divisão da servidão em fracções, mas, porque<br />

ella é indivisível e adhere inteira a todas as partes do prédio,<br />

o Direito a considera em relação á cada região como uma entidade<br />

distincta e subsistente por si mesma.<br />

§ 117 — Efeitos da indivisibilida.de<br />

Da indivisibilidade das servidões resultão, entre outros,<br />

os corollarios seguinte -<br />

1. A servidão não pôde ser adquirida por partes, senão<br />

inteira e completa. Se, por exemplo, uma parte do prédio dominante<br />

é vendida, as servidões activas inhérentes ao mesmo prédio<br />

adherem integralmente á região destacada de modo que o<br />

comprador as exerce nos mesmos termos em que o primitivo proprietário<br />

(41).<br />

2. Nem tão pouco se perde por partes. Neste sentido se<br />

o prédio dominante pertence em commum a diversos, o uso<br />

das servidões por um dos comproprietarios impede a extincção<br />

délias em relação aos que permanecerão em inércia durante o praso<br />

da prescripção (42).<br />

3. Nem também por partes pôde ser demandada- Assim a<br />

sentença proferida em acção confessor ia ( 44 ), intentada por um<br />

só dos comproprietarios do prédio dominante contra o dono do<br />

serviente ou contra um sô dos condôminos do serviente<br />

(38) Pr. 6 § I o D. Quemadmod. servit aittit. 8. 6: Si divisus est fundus<br />

inter sócios regionibus, quod ad servitutem attinet quae ei fundo debetur,<br />

perindé est atque si ab initio duobus fundis debita Kit.<br />

(39) Pr. cit.: Sed si is fundus qui servient, ita divisus est.... si eertus<br />

ac finitus via; locus est. tunc si per longituciinem ejus fundus divisus est.<br />

eadem omnia servanda erunt. qua; si initio constituendas ejus servitutis similiter<br />

hie duo fundi fuissent.<br />

(40) Accarias. n. 267. nota 1.<br />

(41) Fr. 25 D. S. P. R. 8. 3: Si partem fundi mei certam tibi vendidero.<br />

aquaaduetus jus. etiam si alterius partis causa plerumque ducatur, te<br />

quoque sequetur. Mourlon. I, n. 1841.<br />

(42) IFr. 10 D. Quemadmodum servit, amit. 8. 6; C. C. do Chile, art. 886.<br />

Port. art. 2281.<br />

(43) Vej. § adiante 135.


DAS COUSAS 249<br />

aproveita e prejudica, quanto ao reconhecimento da servidão, á<br />

uns e outros, como se todos houvessem sido autores e réos (44).<br />

§ 118— Direitos c omis inhérentes às servidões<br />

A. ) O senhor do prédio dominante pode usar da servidão<br />

em toda a latitude que permittem a natureza delia, o titulo<br />

de sua constituição e os costumes do lugar (45), mas sempre da<br />

maneira que fôr menos damnosa ao prédio serviente(46).<br />

Assiste-lhe o direito de praticar todos os actos, sem os<br />

quaes o exercicio da servidão se tornaria impossível (47).<br />

E'-lhe, pois, permittido:<br />

1. Fazer no prédio serviente, á sua custa, as obras necessárias<br />

para o uso e conservação da servidão, como construir<br />

o aquedueto, abrir e reparar o caminho, praticar escavações e assentar<br />

pontes (48)<br />

2. Cortar as arvores que de qualquer maneira causão<br />

damno á servidão.<br />

3. Metter no prédio serviente mestres de obras e operários<br />

para os serviços e concertos precisos (50).<br />

4. Conduzir por elle os materiaes para as obras e reparos<br />

da servidão (51).<br />

Na pratica destes actos se deve haver de modo que não<br />

(44) Fr. 4 § 3 e 4 D. Si servit, vendicet. 8, 5, Accarias, n. 267, 3 o B.<br />

Cam. L. 2, § 70, n. 22.<br />

Vej. § 135, II adiante.<br />

(45) Mello, 3, 13 § 10 nota, B. Carn. li 2 § 74, n. 30.<br />

(46) Fr. 9 D. Servit. 8, 1: Civüitcr modo; C. C. Franc, art. 702,<br />

Lobão, notas a Mello, 3, 13 § I o , n. 6, 3"; Águas, § 177, IB. Carn. L. 2, § 80,<br />

n. 8 e 15.<br />

(47) Fr. 10 D. Servit. 8, 1; fr. 20 § I o D, S. P. U. 8, 2; fr. 3 § 3, D.<br />

S. R. R. 8, 3; C. C. Fr. art. 696. do Chile, art. 828, Lobão, Águas, § 110.<br />

B. Carn. § fiO. n. 1.<br />

(48) C. C. Fr. art. 697, do Chile. art. 829, Portug. art. 2276, Lobão á-<br />

Mello. 3, 13 § 1° n. 3, 2 o ; B. Carn. § 80, n. 2.<br />

(49) Pr. 4 § 3 D. L. Servit. Vindicet. 8, õ; B. Carn. § 80. H. 4.<br />

(50) Pegas Forens. Cap. 226. n. 37, B. Cam., § 80, n. 9.<br />

(51) B Carn. § 80, art. n. 10.


250 DTRÏilTO<br />

altere as condições da servidão, tornando-a por ventura mais<br />

onerosa ao prédio serviente (52).<br />

Ha ainda a notar:<br />

Que, concedida uma servidão, se entendem concedidas as<br />

que são necessárias para o exercício delia. Assim a servidão de<br />

tirar ag-ua (§ 130, n. 3) acarreta virtualmente a de transito para<br />

a fonte serviente (53).<br />

B.) O senhor do prédio serviente de sua parte é obrigado<br />

;<br />

1. A' soffrer os actos que fazem o ojbecto da servidão<br />

(54),<br />

2. A' permittir os factos que são necessários para o exercício<br />

e conservação da servidão (55).<br />

3. A' se abster de qualquer procedimento que possa embaraçar<br />

o uso delia ou diminuir-lhe as vantagens (56).<br />

4. A' não constituir novas servidões que prejudiquem as<br />

servidões já constituídas (57).<br />

Mas, como a servidão, por importar limitação da liberdade<br />

natural do prédio, se deve sempre entender em termos<br />

strictos (58), o dono do serviente pôde:<br />

a) Exercer o direito concedido em favor do prédio dominante,<br />

uma vez que não prejudique a servidão constituída como<br />

passar pelo caminho (59).<br />

(52) Peg. Forens c. 226, n. 7, Cam. B. § 80, n. 7.<br />

(53) Fr. 3, § 3 D. S. P. R. 8, 3 : Qui habet haustum iter quoque habere<br />

videtur ad hauriendum C. C. Fr., art. 696, Mourlon, I. 4, in. 1838, do<br />

Chile, art. 828, B . Carn. § 80, n. 5.<br />

Não é mister di?,er que isto se entende quando o terreno, por onde o<br />

dono do prédio dominante tem de passar, pertence ao dono da fonte<br />

serviente.<br />

(54) Fr. 15 § I o D. Servit. 8, 1 : ut aliquid patiat.<br />

(55; Fr. 10 D. Servit. 8, 1 ; fr. 20 I o S. P. U. 8, 2, Lobão a Mello,<br />

3, 13, s 1«, n. 5.<br />

(56) Fr. 17 pr., D. S. P. U.,8, 2; fr. 20 § 6 D. eodem ; fr. 13, § I o<br />

D. S. P. R. 8, 3 ; C. C. Fr. art. 701, do Chile, 830, Port. 2278, Lobão a<br />

Mello. 3, 13 § I o , n. 6, 2 o , Águas, § 186.<br />

(57) Fr. 14 D. S. P. R. 8, 3 : Per quem locum viam ali cessero, per<br />

eundein alia aquaîductum cedere non potero.<br />

(58) Lobão, Not. a Mello, 3, 13 § 1, n. 6, 3.° Veja-se acima § 114.<br />

(59) Cabedo, Decis. 74 n. 6, B. Carn. § 32, n. 39 Lobão, Not. a Mello.<br />

L. 3, 13, § 1, n. 7, Águas, § 191, Cod. Frederic. P. HT. 10 § 13, n. 2.


DAS COUSÀS 251<br />

b) Constituir novas servidões da mesma ou diííerente<br />

natureza em favor de outros prédios, comtanto que não offendão<br />

ou diminuão as servidões preexistentes (6f ).<br />

c) Mudar a servidão de um local para outro, comtanto<br />

que a mudança lhe seja util e em nada offenda as commodidades<br />

do prédio dominante (61).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 699 — O dono de uma servidão tem direito a fazer todas as obras necessárias<br />

á sua conservação e uso. Se a servidão pertencer a mais de um ■prédio,<br />

serão as despezas rateadas entre os respectivos donos. — 700.<br />

Art. 700 — As ooras a que se refere o artigo antecedente devem ser feitas<br />

pelo dono do prvdio dominante, se o contrario não dispuzer o titulo expressamente.<br />

— 701.<br />

Art. 701 — Quando a obrigação incumbir ao dono do prédio serviente, este<br />

poderá exonerar­se, abandonando a propriedade ao dono do dominante.<br />

Art. 702 — O dono do prédio serviente não poderá embaraçar de modo aïgum<br />

o uso legitimo da servidão.<br />

Art. 703 — Pôde o dono do prédio serviente remover de um local para outro<br />

a servidão, comtanto que o faça á stia custa e não diminua em nada as<br />

vantagens do prédio dominante.<br />

Art. 704 — Restringir­se­á o uso da servidão ás necessidades do prédio<br />

dominante evitando, quanto possível, aggravar o encargo ao prédio serviente.<br />

Paragrapho único. Constituída para certo fim, a servidão não se pôde<br />

ampliar a outro, salvo o disposto no artigo seguinte.<br />

Art. 705 — Nas servidões de transito a de maior inclue a de menor onus,<br />

e a menos exclue a mais onerosa.<br />

Art. 706 — Se as necessidades da cultura do prédio dominante impuzerem<br />

á servidão maior largueza, o dono do serviente é obrigado a soffrel­aj mas tem<br />

direito a ser indemnizado pelo excesso.<br />

Paragrapho único. Se, porém, esse acerescimo de encargo for devido a<br />

mudança na maneira de exercer a servidão, como no caso de se pretender edi­<br />

(60) Fr. 15. D. Com., prœd. 8, 4 : Qui per certum locum iter aut<br />

actum aiicui cessisset, eum pluribus per cundera locum, vel iter, vel actum<br />

cedere posse, verum est. Fr. 14 D. S. P. R. 8, 3, Voet Comp. Jur. 8, 4,<br />

n. 5 ; B. Carn. § 77, n. 15.<br />

(611 Peg. Forens. Cap. 241, n. 6, Lob. Not. Mello, 3, 13, § 1, n. 7 ;<br />

B. Carn. § 80, n. 30, D. Port. Ill, art. 47l, C. C. Port. art. 2279, Mourlon,<br />

I, n. 1845.<br />

Poderá o dono do prédio dominante mudar a servidão d'tim lugar<br />

para outro? Não: Macedo, Decis, 42, Bag. Resol, Cap. 28, n. 61 D.<br />

Port. Ill, art 469.


252 DIREITO<br />

ficar em terreno ate então destinado á cultura, poderá obstal-o o dono do prédio<br />

serviente.<br />

Art. 707 — As servidões prediaes são indivisíveis- Subsistem, no caso de<br />

partilha, em, beneficio de cada um dos quinhões do prédio dominante, e continuam,<br />

a gravar cada um, dos do prédio serviente, salvo se, por natureza, ou<br />

destino, só se applicarenv a certa parle de tem, ou de outro.<br />

§ 119. —Divisão das servidões quanto á sua naturesa<br />

As servidões, attenta a sua natureza se dividem :<br />

A ). 1. Em urbanas e rústicas. Toda servidão adhere ao<br />

solo (62). Mas ha umas que são estabelecidas para utilidade directa<br />

dos edifícios, como a de luz, a de não levantar mais alto:<br />

estas se denominão urbanas (63). Ha outras que se lig'ào ao solo<br />

sem relação necessária com os edifícios que estão na superficie<br />

tal é a servidão de transito, a de aquedueto: as servidões desta<br />

natureza se dizem rústicas.(64).<br />

2. Em continuas e discontinuas ( 65 ). Continua é aquella,<br />

que, uma vez consummadas as obras que ella presuppõe,<br />

(62) Vej. § 114 acima.<br />

(63) Para a qualificação de urbana, é indifférente que o prédio se<br />

ache collocado no campo ou na cidade.<br />

(64) Fr. 3D. de servit. 8, 1 : servitutes prasdioruni, aliíe in soli, alias<br />

in superficie con si stunt.<br />

Ha grande controvérsia acerca do que entendião os Romanos por servidão<br />

urbana e rústica.<br />

Sustentão alguns que a servidão é urbana ou rústica, segundo è urbano<br />

ou rústico o prédio dominante. (Accarias) : opinião errada, porque<br />

as servidões que são rústicas, sempre o são, embora muitas vezes devidas<br />

á prédio urbano, como é a de transito, a de aquedueto.<br />

Pensão outros que a dita qualificação é ao contrario determinada pelo<br />

prédio serviente (Stnkio) : — opinião igualmente errônea : — a servidão<br />

stillicidii é sempre urbana, ainda que seja rústico o prédio serviente, como<br />

acontece se as águas do telhado cahem sobre um terreno de cultura.<br />

A verdadeira noção de servidão urbana e rústica é a que exprime o<br />

texto de Paulo acima transcripto. noção tirada da natureza intima da<br />

servidão. Virmio. Com., ao § I o J. Servit, 2, 3, n. 3. Du Courroy e Ortolan<br />

ao cit. § I o da I.<br />

(65) Mühlenbruch, $ 274, Creação dos Glozadores, esta technologia<br />

foi evidentemente inspirada pelo fr. 14 D. Servit, 3, 1. Adoptarão-ua os<br />

Códigos modernos : C. C. Fr. art. 668 C. C. do Chile, art. 822, C. C.<br />

Port. art. 2270, § 1° e 2 o Vej. Cardoso Praxe, verb. Servit. Lobão, Notas<br />

a Mello, L,. 3, 13, § I o , n. 12, B. Carn. h. 2, § 78, n. 36.


DAS COUSAS 253<br />

se exerce ou se pôde exercer de si mesma, independentemente<br />

de facto ou factos actuaes do homem, corno é a de<br />

passag-em d'ag-ua, a de luz (66). O característico da servidão<br />

continua consiste antes na possibilidade da continuação do exercício<br />

sem necessidade cie actos humanos do que na seqüência ininterrompida<br />

do exercício (67). Assim a servidão entra na classe<br />

das continuas, desde que o exercício delia pôde ser continuo,<br />

sem facto de homem, embora esse exercício esteja sujeito á<br />

interrupções por accidente, por força maior ou por lei da natureza<br />

(68).<br />

Discontinua se diz a servidão, cujo uso depende de actos<br />

pessoaes do senhor do prédio dominante: tal é a servidão de<br />

transito, a de tirar agfua. E assim se denomina porque os actos<br />

de exercício não são contínuos, mas repetidos e á intervallos (69).<br />

3. Em apparentes e não apparentes (70).<br />

Apparentes são as que se revelão por obras exteriores,<br />

como a de vista por uma janella, a de passag-em por uma porta,<br />

a de aquedueto.<br />

(66) Os actos de homem que o idéa de servidão continua exclue, são<br />

os de exercício e não os de conservação e reparo. Assim não lhe tira o<br />

caracter de continua o concerto de que, por exemplo, possa carecer a de<br />

aquedueto.<br />

(67; Mourlon, I, n. 181S Zacarias, § 248, 2 o .<br />

(í>8) Tal é servidão da passagem d'agua e de esgoto de águas pluviaes :<br />

a primeira pôde ser interrompida no seu exercício por destruição accidental<br />

do aquedueto; z segunda só se exerce quando cahe chuva.<br />

(69) Fr. 14 pr. D. Servit, 8, 1 : Nemo enim tam perpetuo, tam continenter<br />

ire potest ut nullo momento possessio ejus interpellari videatur.<br />

Ha uma distineção moderna que até certo ponto coincide com a divisão<br />

das servidões em continuas e descontinuas. Segundo essa distineção<br />

umas servidões consistem no jus habendi, isto é, no direito de ter obras<br />

externas e gozar do estado de cousas resultante {continuas) e outras no<br />

direito de praticar actos pessoaes de exercicio (descontinuas).<br />

Savigny divide as servidões em três classes :<br />

I a classe : servidões negativas (qua; in non faciendo consístiuit).<br />

2 a classe : servidões positivas, cujos actos de exercicio são actos independentes<br />

em si e não dizem respeito ao prédio serviente, senão d'uma<br />

maneira mediata, como o jus iteneres (servidões descontinuas).<br />

3 a ciasse: servidões positivas, cujo exercicio se acha intimamente ligado<br />

á posse do immove), como a tigni im-niittendi, aquaiductus, (continuas).<br />

Vej. Poss. § 46.<br />

(70) C. C. Fr. art. 689, do Chile, art. 824. Port, art. - 2270, § 3 .e 4.<br />

Rocïia, Direit. Civel § 5S9 D. P. III; art. 442.


254 DIREITO<br />

Kâo apparentes ao contrario, aquellas, cuja existência não<br />

se manifesta por signaes externos, como a de não levantar o edifício<br />

mais alto, a de transito sem caminho visível.<br />

B.) A classificação das servidões em urbanas e rústicas,<br />

de grande importância no Direito Romano, no nosso Direito é<br />

apenas de um valor puramente scientifico (71).<br />

Ao contrario, a divisão em continuas e discontinuas, apparentes<br />

e não apparentes, suposto sem caracter legal, tem significação<br />

pratica. Na verdade as servidões que se agrupão n'umas<br />

daquellas classes, acertos respeitos não se regem pelos princípios<br />

que são aplicáveis ás das outras classes (72).<br />

C.) A servidão pôde ser:<br />

Continua e apparente, como a de levada d'agua;<br />

Continua e não apparente, como a de não levantar o edifício<br />

mais alto;<br />

Discontinua e apparente, como a de transito por caminho<br />

aberto no terreno;<br />

Discontinua e não apparente, como a de transito, a de tirar<br />

água, sem caminho visivel (73).<br />

§ 120 — Classificação das servidões quanto á origem.<br />

As servidões, no ponto de vista de sua origem, se dividem<br />

em duas classes, a saber em:<br />

a ) Servidões legaes,<br />

b ) Servidões convencionaes (74).<br />

I. Ha certas servidões que resultão inelutavelmente da<br />

situação dos prédios, como a de receber as águas que naturalmente<br />

correm do prédio superior. Estas servidões se denominão naturaes.<br />

Ha outras que, supposto se não possão considerar effeitos<br />

necessários da natureza, são todavia indispensáveis para o conveniente<br />

aproveitamento das riquezas e utilidades do prédio. A<br />

lei as créa e estabelece como providencias de interesse commum.<br />

(71) Mello, 3, 13 § 10: '• Differentia inter servitutes urbanas et rústicas<br />

in }>raxi nulla est. B. Cam. L. 2 § 70, n. 3. A dita divisão foi reproduzida<br />

no C. C. fr. art. 687, mas não se lhe attribuiu effeito pratico, Zacar. § 248.<br />

(72) As regras acerca da acquisição das servidões varião segundo ellas<br />

íi3o continuas ou descontinuas, apparentes ou não apparentes. Vej. § 133,<br />

adiante.<br />

(73) Mourloh, I, n. 1818.<br />

(74) Mouiion, I, 1663, Zacar., § 234; Lobão, Águas. § 155 e 156.


DAS COUSAS 25S<br />

As ditas servidões formâo a classe das servidões legacs, nas quaes<br />

se costuuião incluir as naturaes, constituindo ambas uma só<br />

classe.<br />

O característico das servidões lega és está nisto — que<br />

ellas são onus impostos pela lei a um prédio em favor de outro,<br />

sem necessidade do consentimento do dono do serviente (75).<br />

A servidão legal ou deriva immediatamente da lei (76), ou<br />

carece, para ser realmente constituída, de certas diligencias que<br />

deve praticar o senhor do prédio dominante (77).<br />

II. As servidões restringem a liberdade do prédio serviente,<br />

cerceando o domínio: d'onde vem que, fora dos casos declarados<br />

na lei, não podem ser estabelecidas senão com consentimento<br />

de quem é dono do prédio que ellas gravão.<br />

As servidões desta classe são constituídas por convenção<br />

testamento ou prescripção: mas, como é mais freqüente constituil-as<br />

por convenção, tomão a denominação de — convencionais.<br />

(78)<br />

I — SERVIDÕES LEGAES<br />

§ 121, A. — Servidão natural de escoamento das águas<br />

1. O prédio inferior, por virtude de sua propria situação<br />

(79), está sujeito ao onus de receber as águas que naturalmente e<br />

sem obra humana correm do prédio superior (80).<br />

2. A dita servidão, segundo a noção dada, entende tão<br />

somente com as águas pluviaes (81) e com as que nascem espontaneamente<br />

do prédio superior (82), emtanto que seguem a direc-<br />

(75) Vej. adiante, § 121 a 127.<br />

(76) Vej. adiante, § 121.<br />

(77) Vej. adiante, § 122 a 127.<br />

(78) Merlin, Repert. Verb. Servitute.<br />

(79) Fr. 1, § 23. D. de aqua et aqu. pluv. arcend., 39,3: Si tamen lex<br />

non sir agro dicta, agri naturam esse servandam et semper inferiorem<br />

superiori servire. Fr. 2 pr., fr. 22. D. eoãem. Lob., Águas, § 158. Dissertação<br />

sobre as águas pluv., § 41; C. C. fr., art. 640; C. C. do Chile, art. 833;<br />

Port., art. 2,282.<br />

(80) Fr. 1 § I o D. aq. et. aq. pluv. arcend. 39,3; Lob. Ag. cit., §41; Doctr.<br />

das Acç., § 217 e nota 476; Mourlon, I, n. 1,668; Zach., § 235.<br />

(81) Cit. fr. 1, § 1" D. eodem.<br />

(82) Fr. 1, § 2 D. eodem; Mourlon, I, n. 1,668.


256 Diîmiïo<br />

ção que lhes imprime a configuração nativa do solo (83). Não<br />

pôde, pois, ser invocada:<br />

1.° Para as águas, ainda as pluviaes e as nascidas naturalmente,<br />

que são encaminhadas para o prédio inferior por trabalho<br />

humano, como as que cahem do telhado, as que são reunidas<br />

em canal ou esgoto (84);<br />

2.° Nem tão pouco para as que brotão de fonte aberta<br />

por industria humana, embora se lhes deixe seguir a inclinação<br />

natural do terreno (85).<br />

Nestes dous casos, visto como como não se verificão as<br />

condições da servidão natural, ao dono do prédio inferior assiste<br />

o direito de se oppôr á immissão das águas nas suas<br />

terras (86).<br />

Todavia, por excepção á doutrina exposta, a lei, em favor<br />

da agricultura, permitte ao dono do prédio superior dar escoante,<br />

por pequenos sulcos (87) para o prédio inferior, ás águas<br />

cuja estagnação é prejudicial ás sementeiras ou á colheita dos<br />

fruetos (88).'<br />

3. Da servidão natural de escoamento das águas resulta<br />

para o dono do prédio inferior a obrig-ação de não embaraçar<br />

(83) Fr. 1, § I o D. eodem.<br />

(84) Fr. 1, § 1" D. eodem: Cum quis, manu fecerit quo aliter flueret<br />

quam soleret. Fr. 8, § 5, D. si servit vindicat., 8,5; Lobão, Águas § 157<br />

e 15'8; Dissert, sobre as ag. pluv., § 40.<br />

(85) Lobão, Ag. § 159; Mourlon, I, n. 1,668.<br />

(86) Fr. 1, § 1" D. aq. et ag. pluv. arcend., 39,3: Totiensque locum<br />

habet quotiens manu facto opere agro aqua nocitura est, id est: cum<br />

quis manu fecerit quo aliter flueret quam natura soleret; si forte immittendo<br />

earn aut maiorem fecerit aut citatiorem aut vehementiorem, aut si<br />

cumprimendo redundare effecit. Lobão, cit. Dissert, § 40 e 41.<br />

E' de notar que nas hypotheses alludidas cessa a acção negatoria se o<br />

dono do prédio superior adquiriu a servidão convencional de esgoto de águas.<br />

Vej. § 130 A, in fine adiante.<br />

(87) Fr. 1, § 3. D. aq. et aq. pluv. arcend., 39,3: Trebatius quod, frumenti<br />

duntaxat quterendi causa aratro factum solum excipit, § 4... fossas<br />

agrorum siceandorum causa facias... non tamen corrivandœ aquiiS<br />

causa fieri.<br />

(88) Fr. 1, § 3,9. D. eodem. Lobão, citada Dissert, § 53; Mourlon, I,<br />

numero 1,670.<br />

O escoamento (por pequenos sulcos) não pôde ser permittido senão em<br />

caso de necessidade absoluta.


Ï3ÀS COÜSÀS 257<br />

b fluxo das águas do prédio superior para o seu, levantando,<br />

por exemplo, açude ou muro que as desvie ou represe (89).<br />

E o senhor do prédio superior fica inhibido de nelle praticar<br />

obras que tornem a servidão mais onerosa, como, ajuntar<br />

as águas em canal e imprimir-lhes mais rapidez e vehemencia(90).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 563 — O dono do prédio inferior é obrigado a receber as águas que<br />

correm naturalmente do superior.<br />

Se o dono deste fizer obras de arte, para facilitar o escoamento, procederá<br />

de modo que não peiore a condição natural e anterior do outro.<br />

Art. 564 — Quando as águas, artificialmente levadas ao prédio superior,<br />

correrem délie para o inferior, poderá o dono deste reclamar que se desviem,<br />

ou se lhe indemnize o prejuízo, que soffrer.<br />

Ar!. 565 — O proprietário de fonte não captada, satisfeitas as necessidades<br />

de seu consumo, não pôde impedir o curso natural das águas pelos prédios<br />

inferiores.<br />

Art. 566 — As águas pluviaes que correm, por logares públicos, assim<br />

como as dos rios públicos, podem ser utilisaãas, por qualquer proprietário<br />

dos terrenos por onde passem, observados os regulamentos administrativos.<br />

Art. 567 — F/ permittião a quem quer que seja, mediante previa indemnização<br />

aos proprietários prejudicados, canalizar em proveito agrícola ou<br />

industrial, as agitas a que tenlta direito, através de prédios rústicos alheios,<br />

não sendo chácaras ou sitios 'murados, quintaes, pateos, hortas ou jardins.<br />

Paragrapho único. Ao proprietário prejudicado, em, tal caso, também<br />

assiste o direito de indemnização pelos damnos, que de futuro lhe advenham<br />

com a infiltração ou a irrupção das águas, bem como com- a deterioração<br />

das obras destinadas a canalizal-as.<br />

Art. 568 — Serão pleiteadas em acçãc summaria as questões relativas d<br />

servidão de águas e ás inãemniza.çôes correspondentes.<br />

Art. 584 — São prohibidas construcçÕes capazes de polluir, ou inutilizar<br />

para o uso ordinário, a água de poço ou fonte alheia, a ellas preexistente.<br />

Art. 585 — Não é permittido fazer exeavações que tirem ao poço ou á<br />

fonte de outrem a água necessária. E', porém, permittido fazel-as, se apenas<br />

âvminuirem o supprimento do poço ou da fonte do visinho, e não forem -mais<br />

profundas que as deste, em relação ao nível do lençol d'agua.<br />

(89) Fr. 1, § 13, D. eodem: Sciendum est hanc actionem superiori<br />

adversus inferiorem competere ne aquam quœ natura fluat, opere facto inhibeat<br />

per suura agrura decurrere B. Carneiro. L. 2, § 30, n. 9.<br />

(90) Fr. e § cit.: et inferiori advtjrsus superiorem ne aliter aquam mittat<br />

quam fluere natura solet. Lobão, cit. Dissert., § 40, Ag., § 158; B. Carneiro,<br />

§ 30; n. 9; Mourlon I, n. 1,669; C. C. do Chile art. 833, ! Port. art. 2,282.


258 Dl REITO<br />

Art. 58.6—Todo aquelle que violar as disposições dos arts. í>80 c Seguintes,<br />

è obrigado a demolir as construcções feitas, respondendo por perdas<br />

e damnos.<br />

§ 122 B. — Servidão de passagem d?água (aquœducîus)<br />

1. No intuito de proteger a agricultura, a lei confere ao<br />

proprietário de uma herdade o direito de conduzir para ella, pelos<br />

prédios intermédios, em levada ou aquedueto, as águas de que pôde<br />

legalmente dispor (91)-<br />

Este direito, depois de efíectivamente constituído, fôrma<br />

a servidão legal denominada servidão de passagem da água (92).<br />

2. A dita servidão, segundo se induz de sua noção, não<br />

pôde ser reclamada senão por quem é senhor da herdade (93)<br />

por domínio pleno, ou util (94).<br />

Não tem ella por objecto o uso de águas alheias, senão a<br />

passagem ou conducção de águas, cujo uso ou propriedade pertence<br />

por titulo preexistente ao dono da herdade dominante (95), como<br />

(91) Alvará de 27 de Novembro de 1804, § 11.<br />

Esta servidão, creada pela legislação moderna, antes de ter sido expressamente<br />

consagrada em lei, já era recebida em Portugal na pratica de julgar.<br />

Pegas, For. 7, cap. 241. n. 3, Lobão. Dissertação sobre o cit. Alv. de 27 de<br />

Nov. de 1804. § 3.<br />

Em França foi ella estabelecida e regulada pela lei de 29 de Abril de<br />

1845, sendo para, notar que as disposições capitães daquelia lei coincidem com<br />

as do nosso citado Alv. de 27 de Nov. de 1804. Consagra-a também o C. C.<br />

do Chile, art. 861 e seguintes.<br />

(92) Alguns dos nossos escriptores a denominão — servidão aquedueto.<br />

— Preferimos por mais expressiva a denominação franceza — servidão de<br />

passagem d'agua. Ha também servidão de aquedueto convencional. § 130-A,<br />

adiante.<br />

(93) Alv. de 27 de Novembro de 1804, § 11.<br />

"Em qualquer das provincias do reino onde... algum proprietário<br />

emprchender o tirar... canal ou levada para regar suas terras."<br />

(94) Lobão, eit. Dissert. § 17. Não podem, pois, requerer esta servidão o<br />

locatário, o commodatario e quantos possuem em nome alheio. Póde-o, porém,<br />

aquelle que tem posse hábil para a acção Ptubliciana (§ i8>8) porque um<br />

tal possuidor ê equiparado ao proprietário, Lobão, cit. Dissert, e cit. § 17.<br />

(95) Alv. de 27 de Novembro de 1804, § 11, Lobão, cit. Dissert. § 12.<br />

D. Port. Ill, art. 405, Pereira e Souza, nota 1022. Assim o dono de uma herdade<br />

não pôde obter esta servidão para a passagem de água, que pertence<br />

a um terceiro e de que não dispõe. No mesmo sentido o Direito francez:<br />

Mourlon, I, n. 1.695.


DAS COUSAS 259<br />

são as que brotão em terreno seu, as que o atravcssão (96) ou<br />

lhe passão pela extrema, as que são cedidas pelo dono do prédio<br />

vizinho ou as que tira do rio publico. (97).<br />

3. Creada por lei para favorecer tão somente a agricultura,<br />

a alludida servidão não pôde ser concedida senão para as<br />

águas que são destinadas aos usos e serviços dos estabelecimentos<br />

ruraes (98) e não para as que terião de ser applicadas aos<br />

usos puramente domésticos ou no serviço de fabricas industriaes.<br />

4. A servidão de passagem d'aguas não resulta immediatamente<br />

de decreto da lei, mas se constitue por autoridade do<br />

juiz, á requerimento do senhor do prédio dominante, mediante<br />

certas diligencias (99).<br />

E pois que á ninguém é dado se aproveitar gratuitamente<br />

da cousa alheia, aquelle que reclama a servidão, é obrigado á<br />

compor ao dono do prédio serviente os prejuizos e damnos que<br />

com o estabelecel-a lhe causa. (100)<br />

(96) Lobão, cit. Dissert. § 13, Pereira e Souza, cit. nota 1,022. -Concebe-se<br />

facilmente aue muitas vezes a água que nasce ou passa em terreno de quem<br />

pretende a servidão, não possa ser trazida, ao local, onde é necessária, senão<br />

atravessando terras alheias.<br />

(97) Alv. de 27 de Novemb. de 1804, § 11, verb, se de algum rio, ribeira...<br />

Lobão, cit. Dissert. § 7 e 9; Pereira e Souza, cit. not. 1,022.<br />

(98) Alv. de 27 de Novemb. de 1804. § 11: "Para regar as stcas terras.<br />

S 12: ou seja para o rega de terras ou para alguns engenhos. Lobão, cit.<br />

Dissert. S 1 a 6 e 16; Souza, cit. not. 1,022, Doctr. das Aeç. nota 228,<br />

Mburlon, 1. n. 1,692.<br />

O C. do Chile, art. 861. permitte a servidão de passagem do águas também<br />

para o uso de machinas industriaes.<br />

E' de notar que a nossa loi (§ 11) abre uma excepção em favor das povoações,<br />

permittindo-lhes o estabelecimento da dita servidão para. usos<br />

domésticos.<br />

(99) Cit. Lei, § 11. Quanto ao processo, vej. Pereira e Souza, nota 1,0'22.<br />

100) Cit. Lei, § 11: "Pagando-se-lhe o prejuízo por arbítrio de louvados."<br />

Antes de se constituir a servidão, deve o autor depositar o preço<br />

da indemnisação.<br />

Ha quem pense que a servidão legal de passagem d'agua importa expropriacão<br />

da cousa alheia e eomo tal se acha virtualmente abolida pela Const.<br />

Polit, do Imp., a qual (art. 179, § 22) só admitte a desappropriação por motivo<br />

de utilidade publica.<br />

Esta opinião nos parece de todo ponto errônea.<br />

A dita servidão tem por causa a utilidade da agricultura, utilidade que<br />

18


M bikEïfO<br />

5. São passíveis desta servidão todos os prédios circumvizinhos,<br />

excepto os quintaes, hortas, jardins, pomares e cercas<br />

de casas rústicas ou urbanas (101).<br />

6. O dono do prédio serviente é obrigado a consentir na<br />

construcção, pelo local judicialmente marcado, das obras necessárias<br />

para a servidão (102). K lhe fica salvo o direito :<br />

a) De a todo o tempo murar e cercar o terreno, comtanto<br />

que não embarace a passagem da água (103).<br />

b) De mudar o aqued uctoou levada de um local para outro,<br />

uma vez que a mudança seja feita á sua custa, sein offensa da<br />

servidão e precedendo autorisação do juiz (104).<br />

7. Os proprietários dos prédios vizinhos, bem como o<br />

dono do prédio serviente, podem reclamar participação no uso<br />

da água trazida pela levada ou encanamento (105), mas para<br />

isso é mister que concorrão os requisitos seguintes :<br />

1.° Que a água seja commum a uns e outros ou tirada de<br />

rio publico (106).<br />

aproveita a sociedade e que. portanto, entra na definição de titilidade publica.<br />

Uma cousa se diz de utilidade publica, ou quando é direitamente util á entidade<br />

oolleetiva —r Estado, província, ou município., como os edifícios públicos,<br />

praças de guerra; ou quando é immediatamente util ao indivíduo e ao<br />

mesmo tempo ao Estado, como a agricultura, a industria, o commercio. a fundação<br />

da família. Neste sentido é a allocução — utilidade publica — empregada<br />

pela propria Constituição Política do Império, art. 179. § 2.<br />

(101) Alv. de 27 de Nov. de 1804. § 12: Rxcepto. porém, as quintas<br />

nobres e muradas e os quintaes dos prédios urbanos nas cidades ou villas.<br />

Mourlon, 1. n. 1.698: á i'exception des maisons, cours, jardins, parcs et<br />

enclos attenant aux habitations.<br />

•As casas e os curraes. pateos. hortas e jardins que délias dependem não<br />

estão sujeitas á servidão de aqueduetos." C. C. do Chile. art. 862.<br />

(102) Cit. Alv.. § 11.<br />

(103) Cit. Alv. § 11. Neste caso cessa a serventia de caminho < po<br />

tanto ao senhor do prédio dominante só será permittido peneirar ao terre<br />

no serviente para concertos e reparos. E' esta a verdadeira intelligenena<br />

do art S 11. Vej. Lobão. Dissert, cit. § 60: Souza nota 1022.<br />

(104) Cit. Alv. § 13.<br />

(105) Cit. Alv. § 13.<br />

(106) Lobão. cit. Dissert. § 70; P. e Souza, nota 1.022. Ksta servidão é<br />

de passagem e não de tirada d'agua. Assim no caso figurado só pôde<br />

pedir divisão d'agua aquelle que já tem direito a ella ou ao uso Sella<br />

ou porque é tirada do rio publico, ou porque lhe pretence em commum<br />

com os outros. Nada na verdade é mais j isto do que conceder u direito


DÀS COUSAS 261<br />

2.° Que pela sua quantidade baste para todos.<br />

3.° Que paguem ao dono do aqueducto ou levada a respectiva<br />

quota parte de despeja de construcção e reparo (107).<br />

§ 123 C). — bscoante de águas estagnadas.<br />

1. Pelo mesmo motivo de protecçáo aos estabelecimentos<br />

ruraes (§ 122) é permittido ao dono de uma herdade abrir pelos<br />

prédios vizinhos escoadouro para as águas que nella se accumulão<br />

em damno da cultura (108).<br />

O fim desta servidão é dar sahida ás águas estagnadas,<br />

qualquer aliás que seja a origem délias, ou provenhão da inundação<br />

dos rios, ou de fontes artificiaes, ou cousistão em paúes<br />

naturalmente formados (109)<br />

2. O esgoto se pôde fa^er por vallas, canaes, regos ou<br />

por encanamentos subterrâneos (110).<br />

3. A dita servidão só pôde ser concedida:<br />

1.° Quando nao ha sahida para as águas pela propria herdade<br />

(111).<br />

2.° E mediante a prévia indemnisação das perdas e damrios<br />

que com ella se causar ao prédio serviente 1112).<br />

Constitue-se com as mesmas formalidades que se requerem<br />

para a de passagem de águas (113).<br />

de ter parte no aqueducto ou levada á aquelle que, também por ser proprietário<br />

vizinho e dispor da água, poderia reclamar a dita servidão de passagem<br />

d'agua, uma vez que elle contribua com a, sua quota de despeza.<br />

(107) Cit.. Alv., § 1>3. A divisão, não chegando os interessados á. accordo,<br />

se faz a juizo de louvados.<br />

(108) Alv. de 27 ile Xnvemb. de 1804, S 11: ou para as esgotar, sendo<br />

inundadas. Lei franceza de 28 de Abril de 1845, Mourlon, I. n. 16-91;<br />

C. C. do Chile, art. 860. Ha também servidão convencional de esgoto<br />

cie águas: vej. adiante, S 130-A.<br />

(109) Lobão, Dissert, sobre o Alv. de 27 de Novembro de 1804, § L9 e 2-3;<br />

Mourlon, I, n. 1696.<br />

(110) Cit. Alv S 11: "algum canal ou levada... para as esgotar." Lobão,<br />

cit. Dissert. S 18 e 23.<br />

(111) Lobão, cit. Dissert. § 22 in fine.<br />

(112) Cit. Alv. § 11.<br />

(113) Cit. Alv. § 11; Souza. not. 1022.<br />

Não se deve confundir a servidão de escoantc de águas estagnadas com<br />

a servidão natural de escoamento das águas (§ 121).<br />

Esta é um resultado necessário da situação relativa dos prédios, dá sahi-


262 Ï3ÏRÉIT0<br />

§ D). 124. —Servidão de águas supérfluas.<br />

1. O domínio e a posse das ag-uas particulares pertencem<br />

ao dono do prédio em que nascem (114). Pôde elle, pois, livremente<br />

aproveital-as, empreg-ando-as e ainda consummindo-as nos<br />

usos a que são destinadas, como em regrar a terra» mover machinas<br />

: o fluxo natural délias não dá direito em favor dos prédios<br />

inferiores (115).<br />

Mas, se satisfeitas as necessidades do prédio d'onde deriva<br />

a corrente, restão sobras ; a essas sobras têm direito os donos<br />

dos prédios inferiores (116).<br />

2. Este direito constitue uma verdadeira servidão legal;<br />

é serviente o prédio onde brota a nascente, e dominantes os prédios'<br />

inferiores : o objecto da servidão é o uso e gozo das ag-uas<br />

supérfluas.<br />

3. O dono do prédio superior não pode praticar actos que<br />

da tão somente ás águas pluviaes e as que nascem espontaneamente no prédio<br />

dominante, exclue a intervenção do trabalho humano e não impõe a obrigação<br />

de indemnisar ao senhor do prédio serviente.<br />

Aquella, ao contrario, é creada pela lei, admitte obra humana, tem por fim<br />

abrir passagem ás águas estagnadas, qualquer que seja a procedência délias,<br />

e não pôde ser estabelecida senão com prévia indemnisação do dono do prédio<br />

serviente.<br />

Assim que, dado o caso de falta de algum dos requisitos da servidão natural,<br />

pôde o dono do prédio superior reclamar o estabelecimento da servidão<br />

legal de escoante das águas que venhâo a se estagnar nas suas terras.<br />

(114) Résolue, de 17 de Agosto de 1775: "Hei por bem declarar que o<br />

domínio e posse das águas de que se trata, sendo estas como são particulares.<br />

pertencentes aos donos das quintas, onde tem seu nascimento. . . "<br />

E' de notar que a corrente d'agua que não é publica, pertence ao dono do<br />

prédio que atravessa emquanto não lhe transcende os limites. Vej. ü 26, 3<br />

acima.<br />

(115) Resoluç. citada: "o decurso natural délias pelo ribeiro por onde<br />

desaguão. não pôde servir de argumento jurídico em favor dos prédios<br />

inferiores." Lob. Águas, S 70 e 71 : B. Carn. L. 2 § 30. n. 2 § 31 n. 11; C.<br />

C. franc.art.637.<br />

(116) Resoluç. citada, verb.: cuja declaração sou servido fazer...<br />

A lei n. 601, de 18 de Setembro de 1850, art. 16 § 3 declara que ficão<br />

sujeitas a esta servidão as terras devolutas que pelo Estado forem vendidas<br />

aos particulares. A citada lei a este respeito não creou direito novo.<br />

mas fez applieação expressa de um principio preexistente a uma hypothèse<br />

que se ligava ao assumpto de que trata.


DAS COTISAS 263<br />

perturbem ou supprimão a dita servidão, como, por exemplo,<br />

desviar as águas desaproveitadas para leito diverso daquelle por<br />

onde naturalmente correm para os prédios inferiores (117).<br />

4. E pois que esta servidão é de uso e gozo d'agua e não<br />

de aqueducto, aos donos dos prédios inferiores não é licito, por<br />

força delia, fazer açudes ou levadas no prédio superior, salvo se<br />

por convenção adquirirão esse direito (118).<br />

5. Se as sobras são insuficientes para fornecer á cada um<br />

dos prédios inferiores, sem prejuizo de uns e de outros, a quantidade<br />

d'agua de que careção, aos donos desses prédios assiste o<br />

direito de requerer a divisão por dias ou por horas (119).<br />

§ 125 E.) Servidão de transito de prédio encravado.<br />

1. Acontece ás vezes ter alguém um prédio encravado,<br />

isto é, sem serventia de caminho pelos prédios vizinhos para a<br />

via publica (120).<br />

O terreno dest'arte insulado perderia de seu valor e utilidade,<br />

se não fosse permittido dar-lhe sahida pelas herdades<br />

que o circumdão.<br />

A lei confere ao senhor do prédio encravado o direito de<br />

reclamar e estabelecer servidão de transito por uma das herdades<br />

confinantes, mediante indemnisação dos damnos e prejuizos<br />

resultantes (121).<br />

(117) Resoluç. citada.<br />

(118) Por compra, testamento, prescripção: vej. S 133 adiante. A citada<br />

Dei n. 601, art. 16 ? 3. no caso a que allude, confere não só a servidão<br />

das águas supérfluas como a de aqueducto pelo prédio superior, com o onus<br />

da indemnisar bemfeitorias e o terreno oecupado.<br />

(119) Résolue, cit.: "E que entre estes se repartão os ditos sobejos por<br />

dias ou por horas, com um prudente arbítrio de louvados e a contento<br />

das partes."<br />

(120) O encravamento pôde resultar:<br />

Do desabamento do terreno pelo lugar por onde se ligava a estrada<br />

publica;<br />

Da venda ou arrematação de uma seceão que se destaca de uma<br />

fazenda;<br />

Da partilha e divisão de terras que estão em commum.<br />

(121) Repertório dos Ord. tom. 4, pag. 884 nota: Silva ad ord. 4. 1<br />

pr. art. 6. n. 18, Doctrina das Acç. S 115, Lobão Dissert, sobre o Alv. de 27<br />

de Novembro de 1804. § 5 e 90: C. C. francez, art. 682, do Chile, art. -847<br />

e 848; Port., art. 2309 e seg.


264 DIREITO<br />

2. Esta servidão só é admissível quando tem por fim a<br />

communicação com fontes, estradas publicas ou portos de embarque<br />

(122).<br />

Deve ser constituída pelo lugar que for mais conveniente<br />

ao prédio dominante e menos prejudicial ao serviente (123).<br />

3. No estabelece-la se observão as mesmas formalidades<br />

que na servidão legal de passagem de águas (124)<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

.Ir/. 559 — 0 dono do prédio rústico, ou urbano, Que se fichar encravado<br />

em outro, sem sahida pela via publica, fonte ou parlo, ton direito a reclamar<br />

do visinho que lhe deixe passagem, fixando-se a esta judicialmente o rumo,<br />

quando preciso. — 709. II.<br />

Art. 560— Os donos dos prédios por onde se estabelece a passagem<br />

para o prédio encravado, têm direito á indemnização cabal-<br />

Art. 561— O proprietário que, por culpa sua. perder o direito de transito<br />

pelos prédios contíguos, poderá- exigir nova communicação com a via publica,<br />

pagando o dobro do valor da primeira indemnizarão.<br />

Art. 5if>2 — Não constituem servidão as passagens e atravesso/loiros<br />

particulares, por propriedades também particulares, que se não dirigem a<br />

fontes, pontes, ou logares públicos, privados de outra serventia.<br />

O nosso estimavel praxista Sousa Pinto (nota 227 ao § 11'5 da Doctrina<br />

das ACQ.) entende que a servidão legal, de que se trata, é incompatível com<br />

a disposição do § 22 do art. 179 da Const, politic, do Império. Uma semelhante<br />

opinião nos parece infundada pelas razões expostas em a nota 10 ao § 122.<br />

l", assim o pensarão eminentes oscriptores portugueses que tratarão do assumpto<br />

sob o domínio do § 21 do art. 145 da Carta Constitucional de 1826<br />

§ que não é senão a reproducção do citado § 22 do art. 179 da nossa Const.<br />

Correia Telles Doctrina das Acç. § 116; Rocha 5 SM.<br />

Hoje a questão se acha em Portugal legislativamente resolvida no sentido<br />

exposto: vej. C. Civil, art. 2,309 e seg.<br />

Entre nós a doctrina deduzida no texto tem recebido consagração pratica,<br />

como se vê de um Accordão da Relação do Rio de Janeiro summariado<br />

na Jurisprudência do Dr. Mafra, verb., servidão.<br />

(122) Dei de 3 de Julho de 1773, § 12 confirmada nesta parte pelo Decreto<br />

de 17 de Julho de 1778.<br />

(123) Doctrina das Acções, nota 227; Lob. cit. Dissert. S 5 e 90.<br />

(124) Doctrina das Acções, cit. § 115. Lobão, loc. cit.


DAS COUSAS 265<br />

§ 126 F. — Servidão negativa de janellas e/restas<br />

1. Não é permittido ao dono de uma casa abrir janellas e<br />

frestas (125) ou construir terraço (126) na parede que dá para o<br />

campo, jardim, quintal, pateo ou edifício alheio, salvo havendo<br />

áe permeio o espaço de vara e quarta (127).<br />

2. Ksta prohibição constitue uma verdadeira servidão negativa,<br />

creada pela lei em favor do prédio para o qual não se<br />

podem abrir janellas ou levantar terraço, em prejuízo daquelle<br />

em que por virtude da dita servidão não é licito fazer taes obras<br />

(128).<br />

Tem a dita servidão por fim impedir que o prédio dominante<br />

seja devassado do prédio serviente (129).<br />

3. Se entre um e outro prédio medeia o espaço de vara e<br />

quarta ou mais, fallece uma das condições essenciaes da servidão:<br />

nesse caso subsiste plena a liberdade da casa e o dono pôde livremente<br />

abrir janellas ou fazer terraço para o lado do prédio<br />

contíguo, se assim lhe approuver.<br />

Na prohibição exposta não se incluem :<br />

I o . Os terraços cercados de parede tão altas que tornem<br />

impossível o devassamento do quintal ou edifício vizinho (120).<br />

(125) Fresta é uma pequena abertura na parede- destinada á dar vista<br />

(ord. L. I, 68. § 24. Lobão Cas. § 169).<br />

(126) A ord. (1.68. § 24) diz eirado que é o mesmo que terraço ou<br />

I errado.<br />

(127) Ord. !.. I. T. 68. S 24. JJ. Cam. L. 2 Î 54 n. 14 e 16. C. C. fr.<br />

art. 671. "Sem cousa alguma se metter em meio" palavras da cit. ord.<br />

Os nossos escriptores explicão aquellas palavras pela disposição do § ;)•! d.<br />

mesma ord. que marca para o caso de que ahi trata, o espaço intermédio de<br />

vara ( quarta Pegas. íi cit. ord. e cit. § e n. 4 (tom. 6); Lobão. Casas. § 157.<br />

(128) O principio é que cada um pôde abrir na sua casa as janellas<br />

lue !he aprouver. A servidão negativa de janellas importa restricção ao<br />

dito principio. Ord. cit. § 24: B. Com. § 54. n. 1.<br />

(129) Lobão, Casas § 158. E* verdade, como observa Lobão no lugar citado,<br />

que a área ou quintal vizinho podem ser devassados, ainda recuada a<br />

parede, onde se abrem as janellas. vara e quarta; mas convém observar<br />

que o devassamento de maior distancia não é tão vexatório.<br />

(130) Ord. L. 1. T. 68 § 24, B. Carn. § 54. n. 17. Pode-se construir<br />

terraço de simples peitoril. miradouro ou sotéa. uma vez que sejam afastados<br />

vara e quarte da parte externa, do lado do quintal ou casa vizinha.<br />

Lobão, Casas, § 181.


2b6 DIREITO<br />

2 o . Nem tão pouco as seteiras (131) praticadas em altura<br />

tal que só sirvão para a lu% e não para a vista. (132'' Por mais<br />

antig-as que sejão as seteiras, não ficão constituindo servidões e<br />

pois podem ser tapadas pelas construcções do dono do<br />

prédio para onde dão (132).<br />

4. A alludida servidão se exting-ue pela paciência dos actos<br />

prohibidos durante anno e dia, isto é: exting-ue-se se se fez a<br />

janella, fresta ou terraço eo dono do quintal ou edifício contíguo,<br />

estando presente, deixou passar anno c dia sem se oppòr á obra<br />

(134).<br />

CÓDIGO; CIVIL<br />

Art. 572— O proprietário pôde levantar em seu terreno as construcções<br />

que lhe aprouver, salvo o direito dos visinhos e os regulamentos administrativos.<br />

Art. 573— O proprietário pôde embargar a construcção do prédio que<br />

invada a área do seu, ou so1)re este deite gotteiras. bem como a ãaquelle,<br />

em- que a menos de metro e meio do seu. se abra janella, ou se faça eivado.<br />

terraço, ou varanda.<br />

S 1"—A disposição deste artigo não abrange as /restas, seteiras, ou<br />

óculos pura luz, não maiores de dez centímetros de largura sobre vinte de<br />

comprimento.<br />

§ 2" — Os vãos. ou aberturas para lu;: não prescrevem contra 0 visinho,<br />

que, a todo o tempo, levantará, querendo, a sua casa. ou contra-muro, ainda<br />

que lhes vede a claridade.<br />

Art. 574—As disposições do artigo precedente não são applicaveis a<br />

prédios separados por estrada, caminho, rua, ou qualquer ouMi passagem<br />

publica.<br />

Art. 57©— O proprietário edificará de maneira que o beirai do seu telhado<br />

não despeje sobre o prédio visinho, deixando, entre este e o beirai,<br />

quando por outro modo o não possa evitar, um intcrvallo de dez centímetros,<br />

quando menos, de modo que as águas se escoem.<br />

Art. 576—-O proprietário, que annuir em janella, sacada, terraço, ou<br />

.'/oitcira sobre o seu prédio, só até o lapso de anno e dia após a conclusão<br />

da obra, poderá exigir que se desfaça-<br />

(131) Seteiras são aberturas oblongas destinadas á dar luz e não vista<br />

e nisto se distinguem das /restas. Lobão, Casas § 169.<br />

(132) Ord. L. 1. T. 68 § 24, Repert. das ord. 2, pagina 598, B. Car-<br />

§ 54, n. IS e 19.<br />

(133) Ord. citada.<br />

(134) Ord. 1. 68. § 25. Neste caso o prédio serviente fica exonerado da<br />

servidão negativa e recobra a sua liberdade natural.


DAS COUSAS 267<br />

Art. 577— Em prédio rústico, não se poderão, sem licença do visinho.<br />

fazer novas construcções, ou decréscimos ás existentes, a menos de metro<br />

e meio de limite eommum.<br />

Art. 578 — As estrebarias, curraes, pocilgas, estrumeiras, e, em geral,<br />

as construcções que incommodam ou prejudicam a visinhanea, guardarão<br />

a distancia fixada nas posturas municipaes e regulamentos de hygiene.<br />

§ 127 G).—Servidão de mclter trave, {tigni immittendi)<br />

A parede divisória entre dois prédios pôde pertencer a um<br />

délies, ou a ambos<br />

A) Em regra não é licito metter traves na parede alheia<br />

(135). Todavia, por favor a edificação e por motivo de equidade,<br />

a lei permitte madeirar no prédio contíguo, se offerece a necessária<br />

solidez, mediante a indemnisação de metade do custo da<br />

mesma parede (136).<br />

Esta servidão (137) se constitue por autoridade da justiça,<br />

á requerimento do interessado, depositada previamente a importância<br />

da indemnisação calculada á juízo de louvados (138).<br />

Incumbe ao senhor do prédio dominante fazer as despezas<br />

de concertos e reparos, de que venha á carecer a parede serviente<br />

(139). E'­lhe, porém, licito libertar­se deste onus renunciando a<br />

servidão (140).<br />

(135) Ord. L. 1. T. G8. § 35: "E ninguém poderá metter trave em parede<br />

alheia em que não tiver parte.'"<br />

(136) Ord. citada: "Porém se quizer pagar metade do que a dita parede<br />

custou ao senhor delia, poderá nella madeirar, sendo para isso."<br />

A indemnisação de metade do custo da parede não torna quem a presta<br />

condômino da mesma parede: a indemnisação representa, não o preço de<br />

metade da propriedade da parede, mas o preço do onus da servidão. A parede,<br />

pois, continua no dominio exclusivo do seu antigo dono, tão somente sujeita<br />

á servidão. A ord. cit. diz: "poderá nelki madeirar" mas não diz<br />

"terá parte nella.' ­<br />

(137) E' a servidão tigni immittendi. Esta servidão pôde ser legal (é a<br />

de que aqui se trata) ou convencional: vcj. § 12>9, n. 2. adiante.<br />

(138) Valasc. Consult. 22, n. 3; Lobão casas, S 94.<br />

(139) Lobão, Casas § 94.<br />

(140) Lobão. Casas. cit. § 94. Mourlon. I, n. ■ 1.737.


268 DIREITO<br />

B) A parede divisória se prosume cominum, salvo prova<br />

em contrario, directa (241) ou deduzida de indicios (142).<br />

Quando a parede é commum,póde cada um dos condôminos<br />

aproveital-a nos usos á que é destinada, como travejal-a, abrir-lhe<br />

armários, com tanto porém que com suas obras não offenda nem<br />

prejudique os usos a que tem ig-ual direito o outro comproprietário<br />

(143). Não ha nisto exercicio de servidão, senão de domínio,<br />

pois que taes actos são praticados em cousa propria e não alheia<br />

(144).<br />

Correm por conta dos consenhores da parede as despezas<br />

de reconstrucção e concertos, salvo se são motivados por utilidade<br />

particular de um délies, como, por exemplo, se quizesse dar-lhe<br />

maior solidez ou erguel-a mais alto para apoiar novas contrucções<br />

(145).<br />

(141) Ord. 1,68, í 36; Rocha § 5.95, Mourlon, I, n. 1,731. A prova é<br />

directa quando existe titulo positivo, quando se sabe quem a fez.<br />

(142) Lobão. Casas. § 135. Constituem signaes negativos da oommulihão<br />

1" o estar emmadeirada ou travejada em toda a espessura, 2" o abrange-la<br />

toda o telhado do vizinho, 3 o quando a parte superior do muro termina<br />

em um plano inclinado para um dos lados. Lob. cit. § 135 ; Mourlon<br />

I. n. 1.733.<br />

Se uma das casas é mais alta, a parede se presume do dono desta na<br />

parte que se eleva acima da casa mais baixa. Ord. 1.68 § 3'6. A parede<br />

divisória pode pertencer aos donos dos prédios contíguos por partes divisas.<br />

Lobão, casas, § 111.<br />

(.143) Lobão, casas § 117; Rocha § 596.<br />

Não é licito abrir janellas ou praticar qualquer abertura na parede eommum<br />

sem consentimento do outro condômino: (Lob. Casas, § 103, Mourlon,<br />

I, n. 1761), nem tão pouco empregal-a em uso para que não é destinada<br />

(Lobão, Casas § 117).<br />

As regras de direito acerca da communhão da parede divisória diversificão,<br />

a certos respeitos, das regras da communhão em geral:<br />

1" A communhão é um estado provisório que pôde cessar pela vontade<br />

de um dos communistas: a communhão de parede divisória é permanente e<br />

forçada; um dos condôminos não tem acção para obrigar o outro á divisão.<br />

2" o condômino pôde usar da cousa commum, as não lhe é permittido<br />

fazer innovações, invito socio ; o condômino da parede divisória pôde faze-las,<br />

uma vez que não sejão para uso excluído pelo destino da parede. Lobão<br />

Cas. § 117; Mourlon, I, n. 1,715.<br />

(144) Vej. acima § 30. .Desde que a parede é commum, cada socio<br />

fazendo obra nella, usa do que é seu.<br />

(145) Lobão. Casas. § 120 e 122: D. Port. Ill, art. 853; Rocha § 597;<br />

Mourlon. I, n. 1,737.


DAS COUSAS 269<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 569— 'João proprietário pode obrigar o seu confinante a proceder<br />

coni elle á demarcação entre os dois prédios, aviventar rumos apagados e><br />

a renovar marcos destruídos ou arruinados, repartindo-se proporcionalmente<br />

entre os interessados as respectivas despezas.<br />

Ari. 570 — No caso de confusão, os limites, em falta de outro meio, se<br />

determinarão de conformidade com a jyosse; e, não se achando cila provada.<br />

repartir-se-á entre os prédios, proporcionalmente ou, não sendo possível<br />

• 1 divisão commoãa. se adjudicará, a um délies o terreno contestado, mediante<br />

indemnização ao proprietário prejudicado.<br />

Ari. 571— T>o intervallo. muro. valia, cerca, ou qualquer outra obra<br />

divisória entre dois prédios, têm direito a usar em commum os proprietários<br />

confinantes, presumindo-se. até prova em contrario, pertencer a ambos. —<br />

55S. § I o . 643.<br />

Art. '579 — Nas cidades villas e povoados, cuja edificação estiver aãstricta<br />

a alinhamento, o dono de um terreno vago pôde edifical-o, madeirando na parede,<br />

divisória do prédio contíguo, se ella agüentar a nova construcção; m,as<br />

terá de embolsar ao visinho meio valor da parede e do chão correspondente.<br />

Ari. 580 — O confinante, que primeiro construir, pôde assentar a. parede<br />

divisória até -meia espessura no terreno contíguo, sem perder por isso o direito<br />

a haver meio valor delia, se o visinho a travejar (art. 579). Neste caso.<br />

o primeiro fixará a largura do alicerce, assvm como a profundidade, se o terreno<br />

não for de rocha.<br />

Paraorapho único. Se a parede divisória pertencer a um dos visinhos. o<br />

não tiver capacidade para ser traveiad


270 DIREITO<br />

II. SERVIDÕES CONVENCIONAES<br />

§ 12S. Observação geral<br />

Onus imposto á propriedade particular independentemente<br />

do consentimento do dono, as servidões legaes (146) são limitadas<br />

em seu numero:—só existem as que a lei créa (147).<br />

Acerca das servidões convenciona e- vigora principio diverso.<br />

Pois que ellas tem por causa geradora a vontade das partes, a<br />

lei tão somente lhes define os caracteres geraes (148j e deixa á<br />

cada proprietário a liberdade de constituir no seu prédio tantas<br />

servidões quantos são os direitos reaes, que. revestindo aquelles<br />

caracteres, podem ser cedidos em utilidade de prédios alheios.<br />

Ha porém um certo numero de servidões convenciona es,<br />

que, por serem muito usuaes, o direito toma como typos e as faz<br />

objecto de prescripções, destinadas em sua generalidade á supprir<br />

as lacunas e omissões que podem escapar nos titulos pelos<br />

quaes se constituem. Pertencem a esta classe as servidões, de<br />

que se tracta nos dous §§ seguintes, sob a qualificação de urbanas<br />

e rnsticas (149)<br />

§ 129.—tServidoes urbanas<br />

Entre as servidões urbanas constituidas por tacto humano<br />

se incluem as seguintes:<br />

1. A de apoiar o nosso edifício (oneris fereudi") sobre o edificio,<br />

pilastra ou columna do vizinho (150).<br />

(146) Vej. 5 120, acima.<br />

(147) Makeldey, 5 321 in fine, Mlourlon 1. n. 1808, Zach. § 247.<br />

(148) Vej. acima 5 114 a 118.<br />

(149) A nossa legislação é muitíssimo defectiva no que respeita ás servidões<br />

convencionaes. Este assumpto continua á ser regido pelo Direito Romano,<br />

consideravelmente modificado pelo uso moderno. Assim, pois, tanto<br />

entre nós, como nas nações, onde o Direito Romano occupa igual posição legal,<br />

nas soluções das questões que entendem com as servidões convencionaes<br />

se deve pôr a mira antes no titulo de constituição e no fim da servidão, nos<br />

usos e costumes locaes, do que nas expressões e princípios do dito Direito.<br />

-Makeldey, § 339; -Mello. 3. 13. 5 1" nota.<br />

(1&0) S 1" 1. de servit. 2.3: Lobão. Cas. § 90, B. Carneiro, L. 2. S 5«,<br />

numero Io.


DAS COUSAS 271<br />

Incumbe ao dono do prédio dominante reconstruir o muro<br />

ou pilastra serviente e fazer os reparos de que hajão mister (151).<br />

2. A de madurar na parede (íigni immitendi) (152).<br />

O senhor da servidão só pôde metter na parte serviente o<br />

numero de traves marcado no titulo da servidão, e na falta<br />

de estipulação, tantas quantas forem nacssarias para a obra (153).<br />

E' permittido substituir por outras as que se deteriorão,<br />

sem nunca porém exceder o numero preestabelecido (154).<br />

(151) C. C. Franc, art. 667 e 668. Solon Servit, n. 43S; C. C. do Chile,<br />

an. S29: C. C. Port. aits. 2276 c 2277.<br />

Em direito Romano ( sta servidão, segundo a intelligencia mais geralmente<br />

aceita tinha Isto do particular Que a obrigação de reconstruir i<br />

concertar o muro ou pilastra incumbia ao dono do prédio serviente: fr. 6.<br />

i 2. 5 e 7 D. Si servit vindicet. 8,'5, fr. 33 D. Servit, pœdior. urn. 8.2.<br />

Mühlenbruch (§ 277. n. 1 e nota 2 e 3) entende os textos acerca deste ponto<br />

de modo diverso, aventurando a explicação de que a obrigação de reconstruir<br />

i> muro ou pilastra (officnim reficiendi). incumbida ao dono do prédio gravado<br />

não é um effeito da servidão mas do Jus de dam.no infecto por virtude do<br />

qual o dono de qualquer edifício que ameace ruina é forçado a reparal­o.<br />

Lobão (Cas. S 91) e B. Carneiro ( T.,. 2. S 30. n. 20) dão infundadamente<br />

como vigente no nosso Direito a doctrina romana. Uma tal opinião é de<br />

tudo ponto inaceitável:<br />

1° Porque é contraria:<br />

a), A' theoria fundamental das servidões:<br />

b). E á boa razão, porquanto manifestamente répugna á noção de justiça<br />

que aquelle cujo prédio se acha onerado com uma servidão, carregue<br />

ainda com as despezas de reconstrucção e concerto em proveito de terceiro.<br />

2 o Porque não tem em seu favor a tradição do f ro: não M cita um<br />

sô julgado nesse sentido.<br />

3" Porque, finalmente Direito Romano neste lar i m sido corrigido<br />

pela legislação moderna<br />

(152) Pr. s ^ l­ (■ 2" D. s, servit, vindicet 8.5 s ; r Servit 2,3, Ord.<br />

L. 1 T. 68 5 3ã: Lobão. Cas. S 92: P>. Carneiro. 5 50. n. 7. E' a mesma sen<br />

dão de que se tratou no § 127 acima, mas iqui ê considerada com i<br />

convencional.<br />

Por traves se entende toda a materia sobre que se p6de i dificar, como<br />

m ideira pedra, ferro. Huber. Servit. II. n. 6.<br />

(153) Voet ad Pandect. 8.2. n. 2: Lobão Cas. 5 92.<br />

(154) Fr. 14 pr. D. Si servit vindicet 8,5 fr. 11 pr. D. qtiemadm.<br />

.: amit. 8.6: P.. Carneir. § 50. n. 12.<br />

A servidão oneris ferendi dã direito a occupai­ a parede ou pilastra<br />

toda com o peso da nova construecão: a tigni immittendi a oecupar uma<br />

\>artc da parede. E nisto diffère u»m de outra. Loi, Cas í 94.


272 bïRÊI^O<br />

3. A). A de escoar as águas do nosso telhado sobre o terreno<br />

ou edifício alheio, por goteiras {stillation) ou por canos,<br />

tubos ou calhe (si ill iridium re! flumen) (155).<br />

1.° Se a dita servidão é desde começo por goteiras, não<br />

pôde mais tarde ser mudada para calhe, tubo ou cano, salvo consentimento<br />

do dono do prédio serviente (156).<br />

2.° Não é vedado ao dono do prédio serviente construir<br />

novos edifícios ou alçar os existentes, comtanto que taes obras<br />

não prejudiquem a servidão (157). E'-lhe ainda licito, se quizer<br />

levantar a parede de sua casa, quebrar as beiras e cimalhas da<br />

casa dominante, mas com a obrig-ação de tomar as águas e darlhes<br />

conveniente serventia (158).<br />

3.° vSe a calhe ou cano está collocado em parede commum<br />

entre duas casas, uma mais alta (á que pertence a calhe<br />

outra mais baixa, e o dono desta quizer ergue-la, póde-o fazer,<br />

mas deve deixar na parede lugar para o escoamento das águas<br />

da mais alta (159).<br />

B). O senhor do prédio no qual cahem as águas do telhado<br />

vizinho, pôde adquirir o direito de emprega-las em proveito<br />

seu, como para regar terra ou encher cisternas. .Este direito<br />

constitue uma nova servidão (160), e por virtude delia o dono do<br />

edifício, donde escoão as ag*uas, fica inhibido de desvia-las para<br />

novo destino, ou de impedir de qualquer maneira que o outro use<br />

délias (161).<br />

4. A servidão de lu~ e de vista. Todo o proprietário tem o<br />

(155) §11. Servit. 2,3; fr. 2, fr. 17 § 3, D. Servit, prœd. uri). 8,2,<br />

Solon, H. 449; B. Carneiro, S 51, n. 6.<br />

(loi!) Fr. 21 T>. S. P. Ü. s.2. Pegas Forens. 4 cap. 53, n. 20; B. Carneiro,<br />

S 51, n. 13.<br />

(157) Fr. 20 § 6 I». S. P. Ü. 8,2; B. Cam. § 50, n. 34; Solon, n. 447.<br />

( I5SI Ord. Li. 1, T. 68, S 38.<br />

(159) Ord. L. 1, T. 68 S 39.<br />

(160) Maikeldey § 322; B. Cam. S 51, n. 20.<br />

Sustentão alguns que esta é a servidão que os Romanos denominavão<br />

servitus stîllicidii veî fluminis non recipiendi. Vinnio, Com. ao § 1", I. Servit.<br />

2,3, e ao § 2, I. de actionib. 4,6; Bûuber, Servit. II, n. 7 e 9.'<br />

Ha grande controvérsia entre os Romanistas acerca do que se entende<br />

pela servitus stillic. vel flum. non recipiendi. Vej. Miihlenbrueh; § 277, Mafceldey<br />

§ 322, n. 4, nota î. Maynz, § 219, nota 8.<br />

Util) B. Cam. § 51, n. 2U Solon, n. 449.


DAS COÜSÀS<br />

273<br />

direito de levantar construcções no terreno até a maior altura<br />

(162). Do exercicio deste direito resulta muitas vezes para o<br />

prédio vizinho a privação de luz ou de vista : — conseqüências<br />

inevitáveis do doniinio, que só podem ser obviadas pelo estabelecimento<br />

voluntário de servidões apropriadas, á saber, a de luz<br />

e de vista.<br />

A) A servidão de luz consiste no direito de abrir e ter<br />

janellas ou frestas, destinadas á dar claridade á nossa casa, no<br />

muro do vizinho (163), no muro comnium (164; ou no nosso próprio<br />

muro se elle não é separado da propriedade alheia por inter<br />

í alio de vara e quarta (165).<br />

O dono do prédio serviente conserva o direito de fazer no<br />

seu prédio as obras que lhe aprouver, comtanto que não embaracem<br />

a entrada da claridade, tanta quanta é necessária, segundo<br />

o destino especial da servidão (166).<br />

Se porém nc titulo da servidão se estipulou em favor do<br />

prédio dominante direito á luz em toda a plenitude (167), ou se<br />

desde começo ella se estabeleceu com esta extensão, em taes casos ao<br />

(162) Fr. 9 D. S. P. U. 8,2, C. C. 8 e 9 C. de servit. Ord. .B. 1 T. 68<br />

? 24 B.Carn. § 48, n. 1, § 53, n. le paragrapho 55, n. 1.<br />

-V constituição de Zenon (C. 12 C. de edif. privât. 5 10) que creára uma<br />

espécie de servidão legal, vedando levantar a casa de maneira a impedir a<br />

vista do mar ao vizinho, salvo havendo intervallo de cem pés, foi expressamento<br />

derogada pelo Décret, de 12 de Julho de 1753 e Assento de 2 de<br />

Março de 1786.<br />

(163) Fr. 4. D. S. P. U. Muhlenbrueh § 278, n. 6; B. Carn. § 55, n. 22.<br />

(164) Fr. 40ID. S. P. U. 8,2. Mühlenbruch § 278. Vej. acima. § 127, nota.<br />

(165) C. 12, § 3 C. de-aedific, privât 8,10; Ord. 1,68, § 24. 26 e 33. Se<br />

entre a casa e o prédio alheio houver intervallo de vara e quarta, o dono<br />

da .asa pôde abrir janella por direito próprio (Ord. 1.68. S 24 e 33) e, portanto,<br />

independentemente de adquirir a servidão. Só se dá a necessidade de<br />

constituir servidão, quando o intervallo é menor de vara e quarta; e é este<br />

o >aso a que allude o nosso texto. A dita servidão se estabelece pela. prescripção<br />

acquisitiva de anno e dia: Ord. 1,68, § 33.<br />

(166) Fr. 4, fr. 11 pr. fr. 15 D. s. P. U. 8,2 Vinnio, Com. ao § 1"<br />

I. Servit. 2,3, n. 8; Solon, n. 277; B. Carn. § 55, n. 19. Esta é a servi! H s<br />

ïnminis dos Romanos.<br />

A quantidade de luz se determina pelo mister a que é distinada: para<br />

tornar clara uma sala se requer mais luz do que para clarear um corredor.<br />

(167) Ca?polla, Servir, cap. 3, n. 15, Vinnío, loc, cit.. B. Cam. S 55.<br />

ti. 9 e lu.


274 DIREITO<br />

dono do serviente não é liciío diminuil-a ou com obras*ou com<br />

plantações de arvores (168),<br />

B) A servidão de vista vem á ser o direito de conservar<br />

o prospecta do nosso edifício (169). Esta servidão presupõe o direito<br />

de prohibir ao visinho que nos roube ou mesmo diminua a<br />

vista, ou construindo edifícios ou plantando arvores (170). E'-lhe<br />

ainda vedado praticar no seu prédio qualquer novação que prejudique<br />

a belleza e a amenidade da vista (171).<br />

5. Servidão de não levantar mais alto {altius non tollendi) :<br />

— é o direito de prohibir que o vizinho levante o ediíicío mais<br />

alto ou além de certa altura (172).<br />

A prohibição entende tão somente com edifícios ; ao dono<br />

do prédio gravado é pois livre fazer nelle plantações de arvores<br />

(173).<br />

A dita servidão, embora considerada em Direito como<br />

subsistente por si mesma, como objecto próprio, de ordinário<br />

tem como razão final o direito de luz ou de vista (174).<br />

(1GS) Pr. 4, D. S P. r. S,2, fr. 17, pr. e ? I o , D. eodem. Accarias,<br />

li. 268, n. S, nota 1; P.. Cara. S 55, n. lü e 14. E' a serriUis >t< luminibvs<br />

officiatut.<br />

(169) Mühlenbruch S 278, Accarias. n. 269, n. 7.<br />

(170) P. 3,12. 15 D. S. P. U. 8,2,Makeldey. 5 322. n. 6 in fino; Solon.<br />

277. Ord. 3.78 § 4 o ; R. Cam. S 55, n. 16 e 17. E' a servitus de prospecta<br />

ri ne jyrospectui ofjiciatur.<br />

(171) Fr.15. D. S. P. U. 8,2; Accarias. n. 269. n. 7; B. Carn.<br />

§ 55, n. 18. ...<br />

(172) § 1, I. Servit. 2,3; fr. 2, fr. 11 § I o S. P. V. 8,2; C. S e 9<br />

C. de servit, et aqua 3.34. Ord. 1.68, § 33; Repert. das Ordd. 3, pag. 786,<br />

P.. Cam. S 33, n. 4.<br />

(173) Fv. 12 D. S. P. U. 8,2; Solon, n. 442; B. Cam. § 53, n. 5.<br />

Neste ponto é mais ampla a servidão de vista, a quai importa prohibição<br />

não só de levantar edifícios, como de plantar arvores<br />

(174) Exemplo: Ord. 1.68, S 27 e 33.<br />

Estão também em grande desaccordo os interpretes sobre o que se devo<br />

entender por servitus altius tollendi. Accarias, n. 266; Mühlenbruch, S 277.<br />

Além das servidões convencionaes urbanas, acima mencionadas, o Direito<br />

Romano consagra varias outras. Taes são:<br />

Servitus projiciendi


DÀS CÓÜSAS 275<br />

§130. Servidões rústicos<br />

1. Servidão de transito : tem por objecto pôr um prédio em<br />

communicação com outro ou com a via publica, pelos prédios<br />

intermédios (175).<br />

A extensão deste direito é regulada pelo titulo de sua constituição<br />

e pflos usos locaes (176).<br />

A dita servidão, segundo o que é de costume Centre nós,<br />

se estabelece :<br />

a) Para a passagem de homem, á pé (177) ;<br />

b) Para a passagem de homem á cavallo, ou em liteira,<br />

e de animal de carga (178) ;<br />

c) Para a passagem de homem em carro, para a de rebanhos,<br />

e transporte de cargas e [materiaes em vehiculos rodantes<br />

(179).<br />

Incumbe ao poder judiciário, no caso de omissão no<br />

(175) Pr. I. de servit. 2, 3, fr. 1 D. Servit, pried, rustic. 8,3; Mello,<br />

L. 3 T. 13 § 10, B. Cam. L. 2. § 18 n. 1.<br />

Não se deve confundir, como já se observou em outro lugar, a servidão<br />

de transito com os caminhos públicos geraes, provinciaes e municipaes. Os<br />

caminhos públicos não são servidões na accepção jurídica (§ 114), mas onus,<br />

impostos â propriedade immovel. por utilidade, não de outros prédios, mas<br />

das pessoas.<br />

(176) O Direito Romano estabelecia na servidão de transito três grãos<br />

iter, actus e via. Hoje, porém, aquelle Direito não é -strictamente observado<br />

nesta materia. As questões relativas ás servidões de transito se resolv ;m<br />

pelas cláusulas do respectivo titulo, intenção das partes e costumes do lugar,<br />

pospostas as denominações romanas. Mello, 3, 13, § 10, nota.<br />

(177) A servidão itmeris dava direito â passagem a pé e á cavallo:<br />

Pr. I. Servit. 2, 3, fr. 7, pr. fr. 12 ID. S. P. R. 8, 3. Entre nós a servidão<br />

concedida para passagem á pé regularmente não acarreta comsigo o<br />

direito de passar á cavallo.<br />

numero 451.<br />

Em França vigora o mesmo costume: Solon,<br />

1<br />

178) A dita servidSo corresponde em parte a servidão itineris (passagem<br />

de homem á cavallo. .<br />

(179) E' em substarcia a'servidao vise; fr. 1 pr. fr. 7 D. S. P. R. 8,5.<br />

O nosse costume é fundado em bôa razão. Para a passagem de homem á<br />

cavallo e de animaes de carga, não se requer caminho tão largo como para<br />

a passagem de rebanhos ou de materiaes arrastados ou em carros. Esta ultima,<br />

é pois, mais ont-rosa que a primeira. Vej. Solon, cit. n. 451.<br />

19


276 DiRîîitfo<br />

titulo, designar o local, por onde convém abrir o caminho, e a<br />

largura que deve ter (180).<br />

Neste gênero de servidão vigora o principio que a mais<br />

onerosa inclue a menos onerosa e que a menos onerosa exclue a<br />

mais onerosa. (181).<br />

2. A comniuüicação de um prédio para o exterior também<br />

se pôde fazer por lago alheio : — é a servidão de navegar (182).<br />

3. As servidões que se referem ás águas tem por objecto<br />

ou passagem d'agua (aqœâuctus) ou o u?o delia (ctquœ.haustus).<br />

A). A servidão de passagem d'aguas consiste no direito<br />

de tracer para o nosso prédio, pelo prédio alheio, as águas do<br />

nosso domínio ou as de que nos é licito usar (183).<br />

Pôde a água ser trazida em rego, encanamento subterrâneo<br />

ou em aqueducto. Por ser mais oneroso ao prédio servíente,<br />

o aqueducto de pedra só se entende permittido, quando ha<br />

nesse sentido clausula expressa (1S4).<br />

A servidão de expedir as águas do nosso prédio pelo prédio<br />

alheio (aquœ educendce) se rege pelos mesmos princípios da<br />

servidão de passagem d'agua (185).<br />

B) A servidão relativa ao uso d'agua vem á ser o direito de<br />

tira-la da fonte, poço, cisterna ou rio particular alheio {aguce<br />

haustus, aguce hauriendcè) (186).<br />

Na concessão delia si subentende a de transito para chegar<br />

a fonte ou rio (187).<br />

(ISO) Fr. 13 § 1 e 3 D. S. P. R. 8,3; fr. 9 D. Servit. 8,1; Solon; n. 451.<br />

A direcção deve ser dada pela parte em que for menos prejudicial ao<br />

prédio serviente. B. Carn. § 18. n. 20.<br />

(181) Fr. 21, fr. 110 D. de reg. juris, 50, 17; pr. 1. Servit. 2,3; fr.<br />

1, fr. 7 D. S. P. R. 8,3; B. Carn. § 18, n. 14, Lobão a Mello, 3, 13, § 10,<br />

n. 2, 7, 8. Assim a servidão de passagem â pé não inclue a de carro, mas a<br />

de carro inclue todas as outras.<br />

(182) F. 23, § I o D. S. P. R. 8, 3.<br />

(183) Fr. 1 pr. D. S. P. R. 8,3: Aquaxluctus est jus aquam ducendi<br />

per fundum alienum. Lobão, Ag. § 79; B. Carn. § 32, n. 1, 2,12.<br />

(184) Fr.17, § I o D. de aqu. et aq. pluv. arcend. 39,5; Mühlenbruch,<br />

§ 279 n. 16; B. Carn. § 32, n. 38.<br />

Na falta de clausula a respeito, ao juiz compete marcar o lugar por onde<br />

devo passar a levada ou aqueducto: fr. 9 in fine D. Servit. 8,1.<br />

(185) BY. 19 D. Servit. 8,1; fr. 8, § 5 D. Servit, vendicet. 8,5. Não se<br />

deve confundir esta servidão que é convencional com a do § 123, legal.<br />

(,186) Fr. 1 § I o , fr. 9 D. S. P.R. 8,3; B. Cam. § 32, n. 54' e seg.<br />

(187) Fr. 3 § 3 D. S. P. R. 8,3; B. Carn. § 32, n. 59. A dita servi-


DA.S C0Ü3A.S 277<br />

Ha ainda outra servidão de uso d'agua : — é a de levar o<br />

gado á beber em rio ou fonte alheia. Inclue também em si a<br />

de transito (188).<br />

4. Servidão de pasto (servitus pasceudi) : é o direito de pôr<br />

a pastar na herdade de outrem o gado pertencente ao nosso prédio<br />

(189).<br />

No silencio do titulo se observão as regras seguintes :<br />

a) Só podem ser levados á pastar no prédio serviente os<br />

animaes do prédio dominante (190), qualquer que seja a espécie<br />

a que pertenção, com excepção tão sómento dos damninhos (191);<br />

b). Si a herdade serviente é também destinada á cultura,<br />

a servidão não pôde ser exercida senão depois de colhidos os<br />

fructos (192) ;<br />

c). E' licito ao senhor da herdade serviente ter também<br />

os seus rebanhos á pastar nella (jus compascendi) (193) ; mas si o<br />

pasto é insufficiente para os rebanhos d'um e outro, prevalece o<br />

direito do dono do prédio dominante (194).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 646 — Sc o compascuo em- prédios particulares fôr estabelecido por<br />

servidão, reger-se-á pelas normas destas. Se não, observar-se-á no que lhe<br />

dão as vezes se acha ligada á de aqueducto — o que occorre, quando a água,<br />

cujo uso é concedido ao dono do prédio dominante tem de ser conduzida por<br />

levada ou aqueducto.<br />

(188) Fr. 4, fr. 6 § I o D. S. P. R. 8,3, B. Carn. § 32, n. 69.<br />

(189) Fr.l § I o 3. pr. D. P. R. 8,3; Mühlenbrueh § 258 Mello, 3, 13,<br />

§ 10 nota; B. Cam. § 26.<br />

(190) Fr. 3 pr. fr. 5, in fine D. S. P. R. 8,3; B. Carn., 26, n. 5.<br />

(191) Lauterbach, Colleg. Pandect. 8 § 19; B. Carn.. § 26. n. 7-A e S.<br />

(192) Fr. 9 D. Servit. 8, 1: civüiler modo; B. Carn. § 26, n. 7.<br />

(193) C. 6 C. de servit. 3, 34; Mello 3 13, § 10; nota n. 5.<br />

(194) Mello, loc. cit.: "cum non possint nee sua pecora pasci, pra>dii<br />

dominantis domino invito, visi pastura abundet et utriusque pecoribus<br />

sufficiat."<br />

O Direito Romano menciona e regula outras servidões rústicas, entre<br />

as quaes :<br />

Caleis coquenda?.<br />

Creta? eximenda?.<br />

Arenœ fodiendœ.<br />

Pedamenta sumendi.<br />

Lapidis exiomendœ.<br />

Vej. Mühlenbrueh § 258 in fine.


278 blRBîTO<br />

fôr applicd'oel o disposto neste capitulo, caso outra cousa não estipule o titalo<br />

de onde resulte a communhão de pastos.<br />

Paragrapho único- O compasclio em terrenos baldios e públicos regular'<br />

se-á pelo disposto va legislação municipal.<br />

§ 131 — Quasi-posse das seivlãocs.<br />

A noção de posse, como se disse em outro lug-ar, se applica,<br />

por força de analogias intimas, ás servidões e toma a denominação<br />

de quasi-poïse (195).<br />

Consiste a quasi-posse das servidões no exercido dos actos<br />

physicos pelos quaes ellas se manifestão, praticados com a intenção<br />

de quem usa de um direito próprio (1%).<br />

A pratica dos actos que fazem o objecto da servidão constitue<br />

o elemento material da quasi-posse (197) ; fôrma o elemento<br />

moral a intenção que anima taes actos (198).<br />

Os modos de adquirir e perder a quasi-posse das servidões<br />

varião, seg-undo ellas, são discontinua*, continuas, afirmativas ou<br />

negativas (199).<br />

A) As servidões discontinuas (§ 119) se exercem por factos<br />

actuaes do homem, que supposto se realizem sobre o prédio<br />

serviente, guardão o caracter de independência pessoal. A quasiposse,<br />

pois, de taes servidões se adquire pelos actos de exercicio<br />

(195) Vej. § 16 acima.<br />

(196) Fr. 25 D. quemadm. Servit, amit. S,6; Servitute usus non videtur<br />

nisi is qui suo jure uti se eredidit. Fr. 7 D. de itiner. 43.19:... tanquam in<br />

suo jure faceret... nam ut hoc interdictum eompetat, jus fundi possedisse<br />

oportet.<br />

O exercicio do acto da servidão sem o animus possedenãi, isto é, sem<br />

a intenção de exercel-a como direito inhérente ao immovel, não gera a quasi-posse.<br />

Assim aquelle que passa pelo terreno do vizinho casualmente, não<br />

exerce a servidão de transito, e portanto não adquire a quasi-posse desta servidão.<br />

Fr. 25, D. quemadm. Servit, amit. 8,6:... ideoque siquis pro via publica<br />

vel pro alterius servituce usus sit, nec interdictum, neque actio utiliter competit.<br />

Savigny, Posse, § 45.<br />

(197) Fr. 20 D. Servit. 8,1: Ego puto usum ejus juris pro traditione<br />

possessionis accipiendum esse. O uso, o exercício' corresponde a appreheDsão.<br />

Vej. § 16 acima.<br />

(198) Fr.20 D. Servit 8,1:... nisi is qui suo jure eredidit.<br />

(199) Savigny § 46. Vej. acima § 114.


DAS COUSÀS 279<br />

acompanhados da intenção de quem obra por direito próprio<br />

(200J, e perde-se por todo o facto que torna phj-sicamente impossível<br />

o exercício dos poderes que se contem na servidão, como<br />

se o senhor do prédio serviente impede ou obsta a tirada d ; agua<br />

da fonte, a passagem, do caminho (201).<br />

B ) As servidões continuas affirmativas se ligfio de uma<br />

maneira immediata ao prédio, se exercitão por si mesmas, independentemente<br />

de facto actual do homem (§ 119), e presuppõem<br />

obras apropriadas ao seu exercicio (202).<br />

A quasi-posse destas servidões, como facilmente se comprébende,<br />

se adquire pe^o estabelecimento intencional das obras<br />

necessárias ao seu exercicio, como é a construcção do aqueducto<br />

a abertura da janella no muro do vizinho, a inimissão da trave<br />

na parede alheia (203). E se perde por virtude de todo facto que<br />

nos tira o poder sobre as obras da servidão, impossibilitando-lhe<br />

a continuação do exercicio (204).<br />

C ) As negativas consistem no direito de prohibir ao dono<br />

do prédio serviente a pratica de certos actos (§ 114). Este direito<br />

permanece de ordinário em repouso e só entra em actividade,<br />

quando, se o dono do prédio serviente tenta praticar o acto<br />

prohibido, sahe-lhe ao encontro o senhor do dominante. Com a<br />

resistência apparece claro e manifesto o exercicio do direito.<br />

Dahi vem que a quasi-posse das servidões negativas se adquire<br />

pelo acto de opposição que, por parte do senhor do prédio dominante,<br />

impede a pratica do acto prohibido pela servidão (205).<br />

E também se adquire por titulo constituído á non -domino (206).<br />

(200) Fr. 1 § 6 O. de itiner. 43,19; Savigny § 46. E' indifférente que<br />

os actos alludidos se exerção com a paciência do dono do prédio serviente<br />

ou a despeito da resistência por elle opposta. Savigny cit. § 46.<br />

(201) Savigny, § 46.<br />

(202) -Estas servidões formão o maior numero das que os Romanos denominarão<br />

urbanas: consistem "no direito cie ter obras exteriores no prédio<br />

alheio e de gozar do estado de cousas resultante — jus habenãi." Maynz,<br />

§ 218 in fine.<br />

(203) Fr. 20 pr. 03. S. P. R. 8, 3, Savigny § 46.<br />

(204) Como se dono do prédio serviente demole o aqueducto, retira a<br />

trave ou tapa a janella.<br />

(205) Pr.15 D. de oper. nov. nunt. 38,1; fr. 45 D. de damno infecto,<br />

39.2; Savigny, § 46, B. Cam. L. 2, § 78, n. 36.<br />

(206) Savigny, § 46, Maynz § 221. Esta hypothèse se verifica quando o<br />

possuidor, mas não senhor do prédio, nelle constitue uma servidão.


280 DIREITO<br />

Perde-se a quasi-posse das ditas servidões quando o adversário<br />

chega a consummar o acto contrario, como se effectivamente<br />

alça o edifício (207).<br />

D ) A quasi-posse das servidões se pede conservar por via<br />

de pessoa que representa o dono do prédio dominante, e ainda<br />

por possuidor estranho, que de boa ou má fé as exerça como direitos<br />

inhérentes ao prédio (208).<br />

§ 132 — Por quem podem ser constituídas e por quem<br />

adquiridas as servidões<br />

A ) As servidões são verdadeiras parcellas do domínio<br />

(§ 114). D'ahi os corollarios seguintes:<br />

1.° A servidão, qualquer que seja a sua espécie, não pôde<br />

ser estabelecida senão por quem é senhor do iinmovel e está na<br />

livre administração de seus bens (209).<br />

2.° Se é resoluvel o domínio daquelle que a constitue, ella<br />

acaba, resolvido o domínio (210).<br />

3.° O comproprietario do prédio indiviso não tem o direito<br />

de graval-o com servidões, salvo convindo os demais consenhores<br />

(211).<br />

(207) Savigny, § 46.<br />

(208) Fr. 5 e 6 D. quemadm. servit, amit. 8, 6; fr. 20, 21, 22, 23 e 24<br />

D. eodem.<br />

(209) Makeldey § 324, n. 1, B. Carn. L. 2, § 77. n. 1. Doctrina das Acç.<br />

nota 221.<br />

A constituição da servidão a non-ãomino não confere a servidão — direito<br />

—, mas tão somente a quasi-posse da servidão: fr. 11, § I o . D. de Pubücian.<br />

in .rem action. 6. 2.<br />

O marido carece de outhorga da mulher para constituir servidões: Dig-.<br />

Port. Ill, art. 452.<br />

(210) Fr. 11 § I o D. quemadm. servit, amit. 8. 6, fr. 105 D. de conditlonib.<br />

et dem. 35. 1; B. Carn. L. 2, § 77. n. 6 e 9, Doctrina das Acç. § 113,<br />

n. 4. F' applicaçào da regra: Resoluto jure concedentis, resolvitur jus<br />

concessum.<br />

(211) Fr. 2 D. Servit. 8. 1, fr. 34 D. S. P. P.. 8, 3; B. Carn. § 77.<br />

n. 4. Dig. Port. III, art. 452, n. 4. E' obvia a razão: A servidão, como indivisível<br />

que é, não se pode construir por partes, mas abrange o prédio era<br />

seu todo. Assim que a servidão que fosse estabelecida por um só dos senhores<br />

do prédio indiviso, não poderia ficar limitada a sua parte porque ê<br />

indivisível, nem tão pouco poderia graval-o na totalidade, porque um sõ do»<br />

condôminos não tem o direito de dispjr do prédio- todo.


DAS COUSÀS 231<br />

4.° Não é licito ao senhor de urna propriedade impor-lhe<br />

servidão que prejudique o uso-fructo, excepto se o uso-fructuario<br />

consente (212).<br />

Permitfe-se, por extensão, ao senhor do domínio util constituir<br />

servidão no prédio aforado; rnas a servidão se extingue no<br />

momento em que porventura o domiuio util venha a se consolidar<br />

no directo (213).<br />

B ) As servidões, pois que são direitos inhérentes ao immovel,<br />

não podem ser adquiridas senão pelo senhor do prédio<br />

dominante (214).<br />

l.° Se o prédio está em commum, não é permittido á um<br />

dos consenhores adquirir para elle servidão sem o consenso dos<br />

outros cornproprietarios (215).<br />

2.° O senhor de um prédio não pôde adquirir servidão<br />

em favor desse prédio sobre outro prédio que possue em commum<br />

(216).<br />

3.° O dono de prédio sujeito á uso-fructo não está inhibido<br />

de adquirir servidões em favor delle; durante o uso-fructo,<br />

ellas aproveitão ao uso-fructuario (217).<br />

Da mesma sorte as serventias que o dono singular de um prédio lhe<br />

impõe em favor de um prédio de que é consenhor com outros, não tem a natureza<br />

de servidões pela regra que — nulla res suo domino servit, fr. 6,<br />

§ 3 D. Com. pred. 8, 4; fr. 8 § I o . D. Servit. 8, 1.<br />

(212) Mello, 3, 13 § 3, B. Carn. § 77, n. 12. Vej. § 96 acima.<br />

(213) Maikeldey, § 324, n. 5; B. Carn. § 77, n. 7, iDoctr. das Acç. nota<br />

322. O emphyteuta não carece de licença do senhorio directo para constituir<br />

6ervidões, como aliás ensina C. Telles, D. Port. III. art. 452: basta ponderar<br />

que a servidão é parcella do dominio util e se extingue com a propria<br />

emphy teuse.<br />

(214) Fr. 1 § I o . D. Com. prœd. 8, 4; § 3, I. Servit. 2, 3.<br />

(215) Fr. 8 in fine D. Servit. 8, 1; fr. 19 D. S. P. R. 8. 3.<br />

(216) Fr. 8, § I o . D. Servit. 8, 1, fr. 6 § 3 D. Com. prœd. 8, 4.<br />

Mas o dono de um prédio que tem servidão em favor delle sobre outro<br />

prédio, de que posteriormente se torna comproprietario, conserva a servidão:<br />

fr. S § I o D. Servit. 8, 1, Makekley, § 324, nota 3.<br />

(217) Fr. 19, fr. 34 D. S. P. R. 8, 3.


282 DIREITO<br />

§ 133. — Corno se constituem as servidões<br />

As servidões se constituem ;<br />

1. Por actos entre vivos (218) As" servidões"constituídas por<br />

este modo não se entendem realmente estabelecidas e sob a proteccão<br />

das acções reais senão depois que são effectivamente exercidas<br />

pelo dor.o do prédio dominante (219. E para que possão<br />

ser validamente alleg-adas contra terceiros é mister que o titulo,<br />

de onde consta o acto constitutivo, seja transcripto no registro<br />

competente (220).<br />

2. Por disposição de ultima vontade (221), As servidões deixadas<br />

em testamento se transferem independentemente da quasítradicção<br />

(222) e não carecem de ser transcriptas para serem oppostas<br />

a terceiros i223).<br />

3. Por dcstinação do proprietário. Se o senhor de dous prédios<br />

estabelece sobre um serventias visíveis em favor do outro<br />

e posteriormente aliena um délies, ou um e outro passão por<br />

successão á pertencer a donos diversos, as serventias estabele-<br />

(21S) B. Carneiro, L. 2, § 78, n. 1. K' o modo mais geral de constituição<br />

de servidões.<br />

(219) Ha controvérsia entre os Romanistas sobre saber se a simples<br />

convenção dá, nascimento ao diieito real de servidão, ou se para este resultado<br />

é necessário que seja a convenção seguida de effectivo exercício. Vej.<br />

Pellat, Introduc. aux principes gêner, de la propriet., n. 75 e nota 31; Mühlenbruch,<br />

§ 288; Maynz, § 226. No Direito pátrio prevaleceu sempre a, segunda<br />

opinião, opinião que em verdade mais se coaduna com arazão do nosso Direito<br />

Vej. Peg. Forens., 7 vap. 241, n. 96; Doctr. das acç., nota 219; B. Carn.,<br />

§ 78, n. 2 e 3. Hoje esta questão, pelo que respeita a terceiros, perdeu todo<br />

o interesse pratico com a disposição legal que sujeita á transcripção os títulos<br />

constitutivos de servidões.<br />

Cumpre finalmente observar que as servidões negativas ficão effectivamente<br />

constituídas com a simples convenção. B. Carn., § 78, n. 2.<br />

(220)Dei de 24 de Setembro de 1864, art. 6, § 2; Deer. n. 3.453, de 26<br />

de Abril de 1865, art. 264.<br />

(221) A servidão pôde ser legada ou conjunetamente com o prédio,<br />

como se o testador declara que o prédio que deixa a um terá, tal servidão<br />

sobre o prédio que deixa a outro, ou isoladamente, como se deixa ao senhor<br />

do prédio vizinho o direito de transitar, ou conduzir água pelo prédio que<br />

lega a outro.<br />

(222) § I o e 4 o . I. de Servit., 2.3; B. Carn., § 78, n. 19.<br />

(223) Lei de 24 de Setemb. de 1864, art. 6, § 2; Deer. n. 3.453, de 26<br />

de Abril de 1865, art. 264.


DAS COCSAS<br />

283<br />

cidas assumem a natureza de servidões, salvo clausula expressa<br />

em contrario (224).<br />

4. Por adjudicação. Nas acções divisórias é permittido ao<br />

juiz, no caso de necessidade, constituir servidões na parte em<br />

terras dada a um dos consenliores em utilidade da parte qniuhoada<br />

ao outro (225).<br />

5. Por prescripção fcquwtiva (226). Para a acquisição das<br />

servidões por prescripção se exigem os requisitos seguintes:<br />

1.°. Que o iuimovel seja daquelles,, cujo domínio se pôde<br />

adquirir por prescripção (227).<br />

(224) Silva, ad. ord.. 4.1; rubr., art. 7, n. 27 e 43; Lobão, Águas, § 103;<br />

Cam., § 174; D. Port. Ill, art. 449 e 450; C. C. fr., art. 692 e 693; do<br />

Chile, art. 881; Port., art. 2.274.<br />

Em contrario, o Direito Romano: fr. 30, § 1°.; D. S. P. R.., 8,3, fr.<br />

10; D. Corn., prœd., 8,4, fr. unie, D. de servit, legal., 33,3.<br />

(225) Fr. 2, § I o ; fr. 18. D. Comm., dividund. 10,3; fr. 16, § I o e 2°.<br />

D. familiœ ersciscund., 10.2: Peg. For., 7; C. 241, n. 97; D. Port. III, art.<br />

448; B. Carn., § 77, n. 16 e § 78, n. 23.<br />

(226) OC. C. franc., e os que o imitarão, só admittem que se adquirão<br />

por prescripção as servidões continuas apparentes. Entre nós, prevalece<br />

acerca deste assumpto o Direito Romano, segundo o qual se pôde indistinetamente<br />

adquirir por prescripção toda a espécie de servidões. C. 12, C. de<br />

prasseript. long temp., 7,3.<br />

A doctrina franceza foi principalmente inspirada pela conveniência de<br />

evitar as difficuldades que ha em caracterisar a quasi-posse das servidões<br />

não apparentes, (affirmativas ou negativas).<br />

A nós nos parece que a theoria romana, acerca da acquisição da quasi-<br />

Dosse das servidões, corta as alludidas difficuldades.<br />

Com effeito, se se trata de servidões affirmativas não apparentes, como<br />

a de tirar água, a de transito sem caminho visível, a pratica dos actes que<br />

constituem o exercício de taes servidões, tem uma existência material susceptível<br />

de ser perfeitamente caracterisada e provada. Se a questão € relativa,<br />

ãs negativas, a quasi-posse ou se adquire por titulo a non-àomino<br />

(caso esté que não offerece duvida) ou pela contradicção, opposta por quem<br />

pretende a servidão, â pratica do acto prohibido. A resistência caractérisa<br />

energicamente o começo da quasi-posse e é de fácil averiguação e prova.<br />

A doctrina romana, como se vê, joga com elementos muito claros e positivos,<br />

susceptíveis de serem affirmados e estabelecidos com certeza e segurança.<br />

Não ha razão para condemnal-a, creando restricções que mutilão a<br />

realidade da vida jurídica.<br />

(227) Novella 131, cap. 6; C. 12, C. de prescript, long, temp., 7,33;<br />

Mühlenbruch, § 289, nota 9; Makeldey, § 326, nota 5. Assim não se pôde<br />

adquirir por prescripção a servidão de aquedueto por uma praça publica. A


284 DIREITO<br />

2.° Quasi- posse fundada em justa causa, ou pelo menos<br />

adquirida de uni modo não vicioso (228).<br />

3.° Duração continua da quasi-posse por dez annos entre presentes,<br />

por vinte entre ausentes (229), ou por trinta annos se fallece<br />

justa causa ou o immovel é dos que se prescrevem neste prazo (230).<br />

4.° Boa fé (231)'<br />

A prescripção se interrompe:<br />

a ) Se a servidão é negativa, pela pratica dos actos prohibidos<br />

(232).<br />

b ) Se discontinua, por actos que impedem ao dono do<br />

prédio dominante o exercicio delia (233).<br />

c ) Se continua afíirmativa, por qualquer facto que importa<br />

destruição do estado de cousas que o exercicio da servidão presuppõe<br />

(234).<br />

Por proliibição expressa de lei não se podem adquirir por<br />

prescripção, ainda immemorial, caminhos e atravessadores particulares<br />

que não se dirigem com manifesta utilidade a pontes,<br />

fontes ou outros lugares públicos (235).<br />

A servidão adquirida por prescripção se reputa effectiva<br />

e realmente constituída entre o dono do prédio dominante e o do<br />

razão é clara: se se não pode prescrever o domínio, nem tão pouco a servidão,<br />

que é uma parcella delle.<br />

(228) Fr. 10, pr. D. si servit, vindicet., 8,5; fr. 25. D. quemadm.<br />

servit, amit. 8,6; C. 12 C. de prescript, long. temp. 7,33: Tjono possidentis.<br />

Cit. fr. 10, pr. I). 8,5: Siquis diuturno usu et longa quasi possessione<br />

jus aquœ ducendœ nactus sit, non est ei necesse docere de jure quo<br />

aqua constituía est... sed utilem habet actionem ut ostendat per annos<br />

forte tot usum se non vi. non clam, non precário possedisse. B. Carn., S 7S,<br />

n. 24. O direito, é pois mais favorável a acquisição da servidão do que á do<br />

domínio.<br />

(229) C. 1 e 2 C. Servit. 3,34; C. 12 C. de prescript, long. temp. 7,33; B.<br />

Carneiro § 78 n. 25<br />

A servidão de luz ou de vista de que falla a Ord. 1,68, § 33, se adquire<br />

por prescripção de anno e dia.<br />

(230) Makeldey, § 326, n. 4, not. 5; Mühlenbruch, § 289, nota 9; B. Carneiro,<br />

§ 78, n. 24, nota (a).<br />

(231) Fr. 10, pr. (D. Si servit, vindicet., 8,5; C. 1. C. de de servit. 3,34:<br />

Miihlenbruch, § 289; B. Carn., loc. cit.<br />

(232) § 131, acima.<br />

(233) § 131, acima.<br />

(234) § 131, acima.<br />

(235) Lei de 9 de Juiho de 1773, § 12.


DAS COUSAS 285-<br />

serviente pelo só facto da quasi-posse revestida das condições<br />

legfaes, mas para que possa valer contra terceiros, requer-se que<br />

a existência delia conste de acto judicial declaratorio e que esse<br />

acto seja transcrípto no registro competente (236).<br />

O acto declaratorio pode ser : I sentença proferida em acção<br />

confessoria intentada contra o senhor do prédio serviente ;<br />

II sentença dada. em justificação expressa para esse; III confissão<br />

em juizo conciliatório ou em juizo contencioso.<br />

A transcripção dos titulos constitutivos e dos declaratorios<br />

das servidões se faz em geral com as mesmas formalidades<br />

da transcripção dos titulos translatives de domínio (237).<br />

CÓDIGO CIVIL,<br />

DAS SERVIDÕES PREDIAES, DA CONSTITUIÇÃO DAS SERVIDÕES<br />

Art. 695. Impõe-se a servidão predial a um prédio em favor de outro,<br />

pertencente a diverso dono. Por ella perde o proprietário do prédio serviente<br />

o exercício de alguns de seus direitos dominicaes, ou fica obrigado a tolerar<br />

que delle se utilize, para certo Um, o dono do prédio dominante.<br />

Art. 696. A servidão não se presume : reputa-se, na duvida, não existir.<br />

Art. 697. As servidões não apparentes só podem ser estabelecidos por meio<br />

de transcripção no registro de immoveis. 6j6. 8j6, III.<br />

Art. 698. Aposse incontestada e continua de uma servidão por dez ou<br />

vinte annos, nos termos do art. 551, autorisa o possuidor a transeievel-a em<br />

seu nome no registro de immoveis, servindo-lh~e de titulo a sentença que julgar<br />

consummado o usocapião.<br />

Paragrapho único. Se o possuidor não tiver titulo, o praso do usocapião<br />

será de trinta annos.<br />

Art. 699. O dono de uma servidão tem direito a fazer todas as obras<br />

necessárias á sua conservação e uso. Se a servidão pertencer a mais de um<br />

prédio, serão as despezas rateadas entre os respectivos donos. 700.<br />

Art. 700. Ai obras a que se refere o antigo antecedente devem ser feitas'<br />

pelo dono do prédio dominante, se o contrario não dispuzer o titulo expressamente<br />

Art. 701. Quando a obrigação incumbir ao dono do prédio serviente, este<br />

toderá exonerai 0e, abandonando a pi opnedade ao dono do dominante.<br />

(236) Lei de 24 de Setembro de 1864, art. 6, § 5; Deor. n. 3.453, de 26<br />

de Abril de 1865, art. 274.<br />

(237) iDecr. n. 3.452, de 26 de Abril de 1865. Tit. 3, cap. 2, art. 268 e<br />

seguintes. ....<br />

A transcripção dos titulos constitutivos das servidões deve conter os<br />

requisitos declarados no art. 270 do citado Decr. n. 3.453.


286 DIREITO<br />

Art. 702. O dono do prédio serviente não poderá embaraçxr de modo<br />

algum o uso legitimo da servidão.<br />

Art. 703. Pode o dono do prédio serviente remover de um local para.<br />

outro a servidão, contanto que o faça á sua custa e não diminua em nada as<br />

vantagens do prédio dominante.<br />

Art. 704. Restringir-se-á o uso da servidão ás necessidades do prédio<br />

dominant/', evitando, quanto possível, aggravar o encargo ao prédio serviente.<br />

Paragrapho único. Constituída para certo fim, a servidão não se pode<br />

ampliar a outro, salvo o disposto no artigo seguinte.<br />

Art. 705. Nas servidões de transito a de maior inclue a de menor onus,<br />

e a menos exclue a mais onerosa.<br />

Art. 706. Se as necessidades da cultura do prédio dominante impuzerem<br />

á servidão maior largueza, o dono do serviente é obrigado a soffrel-a, mas tem.<br />

direito a ser indemnisado pelo excesso.<br />

Paragrapho único. Se, porém, esse accressimo de encargo for devido a<br />

mudança va maneira de exercer a servidão, como no caso de se pretender edificar<br />

em terreno até então destinado á cultura, poderá obstal-o o dono do prédio<br />

serviente.<br />

Art. 707. As setvidõesprediaes são indivisíveis. Subsistem, no caso de<br />

Cartilha em beneficio de cada um dos quinhões do prédio dominante, e continuam<br />

a gravar cada um dos do prédio serviente, salvo se, por natureza ou destino,<br />

só se applicaram a certa parte de um, ou de outro.<br />

§ 134. — Como se extingitem as servidões<br />

As servidões acabão ;<br />

1. Pela remissão, isto é, pela renuncia que o dono do prédio<br />

dominante faz da servidão em favor do prédio serviente- (238)<br />

A remissão pôde ser expressa ou tácita (239).<br />

2. Pela coníusão. Verifica-se este modo de extineção quando<br />

o prcdio dominante e o serviente cahem sob o dominio de um<br />

só proprietário (240). Mas se um dos dous prédios se acha em<br />

(239) Fr. 8, D. Quemadm. Servit, amit. 8„6; B. Carneiro, L. 2, § 81,<br />

n. 2 e 3. A remissão é tácita, por exemplo, quando o senhor do prédio dominante<br />

não impede que o dono do serviente faça nelle obra incompatível<br />

com o exercício da servidão.<br />

(240) Fr. 1 D. quemadm. Servit, amit. 8,6; fr. 10 D. Com. pned. 8,4;<br />

B. Carn. § 81, n. 5. Pelo principio — nulla res suo domino servit.<br />

Se a confusão é temporária, como no caso de ser resoluvel o dominio de<br />

um dos prédios, a servidão revive. B. Carn., § 81, n. 6.<br />

(241) Fr. 8 § 1" D. Servit. 8,1; fr. 30, § I o D. >S. P. R. 8,3; B. Carneiro,<br />

§ 81. n. 7. Veja acima § 132.


AS CÔUSAâ M<br />

comiiium e afèuniào não abrande todas as partes do prédio indiviso,<br />

nesse caso as servidões não se extinguem (241).<br />

3. Pela destruição do prédio dominante ou do serviente, ou<br />

por accidente que torne impossível o exercício da servidão (242)<br />

Se o prédio é reposto no seu antigo estado ou se cessa o impedimento<br />

do exercício, revivem as servidões, salvo se no intervallo<br />

se extinguirão pelo não-uso.<br />

4. Pela resolução do domínio de quem as constituiu (244).<br />

5. Pela prescripção extinctiva. A prescripção resulta do<br />

não-uso dos direitos que constituem a servidão, por dez annos entre<br />

presentes, por vinte entre ausentes (245).<br />

Acerca deste assumpto ha necessidade de fazer a distincção)<br />

seguinte:<br />

a ). Nas servidões afnrmativas (continuas ou discontinuas,<br />

o não-uso se começa a contar do momento em que cessa o<br />

exercício (246).<br />

(238) Pr.14. § I o D. Servit. 8,1. Pela remissão o prédio serviente se<br />

torna livre.<br />

(242) Mühlenbruch § 290, n. 2. Makeldey § 327,, 4, Maynz, § 230, n. 3.<br />

Para a extinoção do uso-fructo basta a mudança de fôrma ou do destino<br />

(S 109 acima); para a das servidões se requer destruição completa. Maynz,<br />

§ 230, n. 3.<br />

(243) Fr. 20, § 2 D. S. P. U. 8,2; fr. 14 D. quemadm. amit. 8,6;<br />

B. Carn. § 81, n. 27 e 28.<br />

(244) Pr. 11 § I o . iD. quemadm. 'Servit, amit. 8,6; fr. 105 D. de Condit.<br />

et demonstr. 35,1. Vej. § 27 acima.<br />

(245) C. 13 C. de servit. 3,34: Ita et in cœteris servitutibus obtinendum<br />

esse censuimus ut onvnes servitutes non utenão aniittentur... decennio contra<br />

présentes vel viginti spatio annorum contra absentes. Este texto é positivo;<br />

não faz distincção de servidões. E assim tem sido entendido de muitos.<br />

E tal é a doctrina seguida pelos nossos escriptores e consagrada pelos<br />

códigos modernos. Peg. Porens. 7, corp. 93, n. 101; ÍB. Carn. § 81,<br />

n. 11; C. C. Fr. art. 706, do Chile, art. 885 § 5; Port:, art. 2.279, § 2.<br />

Segundo o Direito Romano da época clássica as servidões rústicas se extinguião<br />

pelo simples não uso; pelo que respeitava as urbanas, se requeria,<br />

além do não uso, a iisucapio libertatis pelo dono do prédio serviente: fr. 6,<br />

pr. D. S. P. U. 7,2; fr. 6 § I o fr. 32 D. eodem; Maynz, § 231.<br />

(246) B. Carn., § 81, n. 12 nota (a.) Nas discontinuas cessa o exercício<br />

quando o senhor do prédio dominante deixa de praticar ou é impedido<br />

de praticar os actos próprios da servidão, como se se abstém de tirar água<br />

da fonte, ou não lhe consentem passar pelo caminho. Vej. acima § 131, A).<br />

Nas continuas affirmativas se verifica o não-uso quando desapparece o


288 DIREITO<br />

b ) Nas negativas, porém, o nãô-USo só se reputa datar do<br />

momento em que o dono do prédio dominante perde a quasiposse,<br />

isto é, desde que o dono do serviente chega á consumar<br />

o acto prohibido (247).<br />

O não-uso nos termos expostos importa a extinção da<br />

servidão, quer resulte de ignorância ou negligencia do dono<br />

do prédio dominante, quer de impossibilidade causada por força<br />

maior (248).<br />

Obsta á prescripção o uso da servidão por pessoa que representa<br />

o dono do prédio dominante, ou ainda por possuidor<br />

estranho de boa ou má fé, uma vez que a exerça como direito do<br />

prédio (249).<br />

Se o prédio dominante é commum, basta para evitar a<br />

prescripção, que a exerça um só dos condôminos (250).<br />

•<br />

estado de cousas que é necessário ao exercício délias, como se cahe oaqueducto,<br />

se a janella 6 fechada. (Vej. acima § 131, B).<br />

Segundo a doctrina franceza (C. C. art. 707) o não-uso das servidões<br />

continuas começa a datar 1 do momento em que o dono do prédio serviente ou<br />

um terceiro praticâo actos contrários á servidão: Sem o acto contrario praticado<br />

por alguém — dono do prédio serviente ou um terceiro, não ha<br />

começo de não-uso. Mourlon, 1,4, n. 1854. Esta disposição é conseqüência<br />

do presuposto de que é difficil fixar-se o não uso nas servidões continuas.<br />

O dito presuposto carece de fundamento. O não uso se caractérisa perfeitamente<br />

pela destruição ou cessação do estado de cousas que as servidões<br />

continuas requerem.<br />

A doctrina franceza dá resultado inaceitáveis. Supponha-se que o aqueducto<br />

desaba ou cahe a trave, por accidente, e que neste estado permanecem<br />

as cousas cineoenta, cem annos. A' luz do C. C. fr. estas servidões ao cabo<br />

daquelles prazos não estarão prescriptas!<br />

(247) B. Carn. § 81, n. 12, nota (a). Vej. § acima.<br />

(248) Fr. 19 § 1". fr. 14 D. Quemadm. servit, amit. 8,6; fr. 4 § 27<br />

D. usurpât. 41,3. C. C. fr. art. 707, Mourlon, I, 4, ri. 1850; B. Carneiro<br />

§ 81, n. 17.<br />

(249) Fr. 5 e 6. fr. 20, 22 e 24, D. Quemadm. Servit, amit. 8,6 Mourlon,<br />

I, 4, n. 1860.<br />

(250) Fr. 18 D. S. P. R. 8,3; fr. 6 § I o , D. Quemadm. servit, amit.<br />

8,6, C. C. fr. art. 709.<br />

Se entre os consenhores do prédio dominante ha algum contra o quai a<br />

prescripção não corre como o impubère (§ 62 acima), este favor aproveita a<br />

todos: fr. 10, D. eodem, C. C. fr. cit. art. 709.


DAS COÜSAS 289<br />

E* finalmente de notar que a servidão tembem se extingue<br />

quando alg-uem, por via de prescripção acquisitíva, adquire o prédio<br />

serviente como se fora livre (251).<br />

CÓDIGO CIVIL,<br />

Art. 708 — Salvo nas desapropriações, a servidão, uma vez tranicripta,<br />

só se extingue, com respeito a terceiros, guando cancellada.<br />

Art. 709 — O dono do prédio serviente tem direito, pelos meios jtidiciacs,<br />

ao cancellamento da transcripção, embora o dono do prédio dominante Th'o<br />

impugne:<br />

I — Quando o titular houver renunciado a sua servidão.<br />

II — Quando a servidão fôr de passagem, Que tenha cessado pela abertura<br />

de estrada publica, accessivel ao prédio dominante — 559.<br />

III — Quando o dono do prédio serviente resgatar a servidão.<br />

Art. 710 — As servidões prediaes extinguem-se:<br />

I — Pela reunião dos dois prédios no ãonvkiio da mesma pessoa.<br />

II — Pela suppressâo das respectivas obras por effeito de contractu wu><br />

de outro titulo expresso.<br />

IIT — Pelo não uso, durante dez annos contínuos<br />

Art. 711 — Exiincta, por alguma das causas do artigo anterior, a servidão<br />

predial transcripta, fica ao dono do prédio serviente o direito a fazel-a<br />

cancellar mediante a prova da extineção.<br />

Art. 712 — Se o prédio dominante estimer hypothccado, e a servidão se<br />

mencionar no titulo hypothecario, será também preciso para a cancellar o consentimento<br />

do credor.<br />

§ 135. —Acçòes relativas as servidões.<br />

1. As servidões são por sua natureza sujeitas ás duas<br />

ordens de lesões :<br />

a ) Lesões que lhe supprimem totalmente o exercício, como<br />

se o possuidor do prédio gravado impede a tirada de água, desfaz<br />

o caminho, levanta o edifício mais alto (252);<br />

b ) Lesões que consistem em simples perturbações do direito<br />

como se o dono do prédio serviente vicia a fonte, damnifica<br />

o caminho, construe obras sobre o aquedueto (253).<br />

A lei confere ao senhor do prédio dominante uma acção,<br />

adaptada a fazer valer a servidão contra aquellas lesões.<br />

(251) C. 16 § I o , C. de usufr. et habit. 3,33, (arg.); Warkoenig, § 643,<br />

Mourlon. I, n. 1952.<br />

(252) Pr. 9 D. servit, vindicet. 8, 5: Si co loco per quem iter mihi debetur,<br />

tu a>dificaveris. possum intendere jus mihi esse ire agere.<br />

(253) Pr, 4 § 5, fr. 10 § 1". D. eodem.


290 blREîTO<br />

Esta acção, também competente para proteger o usoíructo,<br />

o uso e a habitação, é a acçâo confessoria (254).<br />

2. Applicada ás servidões, ella se rege pelos principios<br />

seguintes:<br />

1.° Só pôde ser invocada e exercida pelo dono do prédio<br />

dominante (255).<br />

2.° E' intentada contra o autor da lesão, que ás mais<br />

das vezes é o senhor do prédio gravado, mas que pôde ser um<br />

simples possuidor ( 256 ), ou ainda um terceiro sem posse nem<br />

dominio(257).<br />

O autor é obrigado a provar;<br />

I. Que a servidão lhe pertence de direito (258):— o que<br />

presupõe a prova anterior do domínio sobre o prédio dominante<br />

(259).<br />

II. Que a servidão está sendo lezada (260).<br />

3. Na doutrina da coniessoria se faz sentir um dos effeitos<br />

da indivisibilidade das servidões, a saber:<br />

Se o prédio dominante se conserva em commum, a sentença<br />

obtida em acção confessoria proposta por um só dos<br />

condôminos, aproveita á todos quanto ao reconhecimento da servidão<br />

(261). Por força cio mesmo principio se a acção é dirigida<br />

contra um dos senhores do prédio gravado, o julgamento obriga<br />

a todos os demais consenhores (262).<br />

(254) Fr. 2 pr. CD. St servit, vindioet. 8,5: Confessoria ei qui servitutes<br />

sibi competere contenait. Ord. 4, 10 § I o ." "Sendo movida demanda sobre<br />

servidão de alguma causa." 13. Carn. L. 2, § 82„ n. 6, Doctrina das<br />

mencionar no titulo hypothecario, será também preciso fiara a cancellar o con-<br />

Acções, § 112.<br />

(255) Fr. 1 D. 'Si servit, vindioet. 8,5: Actiones de servitutibus rusticis<br />

(give urbanis eorum sunt quorum prœdia sunt. Pode também ser exercida pelo<br />

emphyteuta. R. Carn. § 82, n. 7, Vej. §.<br />

(2156) Fr. 6, § 3 e 4 D. eoãem.<br />

(257) Fr, 10, § I o . D. coãem: Verum etiam cum omnibus agi poterk<br />

quicumque aquam non ducere impediunt, exemplo cœterarum servitutum.<br />

(258) Fr. 10 pr. D. eodem, C. 9 C. Servit, 3,34; B. Carn, § 82, n. 13.<br />

(25-9) Fr. 2 § I a D. eodem; fr. 16 de. Except. 44,1: Quod non aliter viam<br />

mihi deberi probaturus sim quam priús probaverim fundum meum esse.<br />

B. Cam. § 82, n. 15.<br />

(2600 Caminha, ACQ. confess, nota 5. B. Carn. § S2, n. 13.<br />

(261) Fr. 4. § 3 e 4, fr. 19 D. si servit, vindioet. 8, 5.<br />

(262) Fr. citados na nota antecedente e mais fr. 6. § 4, D. eodem.


DAS COUSAS 291<br />

4. Tem a confessoria por fim fazer reconhecer a existência<br />

da servidão (263) e, em conseqüência, condemnar o réo á<br />

cessar a lesão, prestando caução de não reproduzil-a (264) e a<br />

pag-ar os damnos e perdas que houver causado (265).<br />

5. E' também permittido usar da confessoria com o caracter<br />

de Publiciana.<br />

Revestindo a natureza da PubHciana, a confessoria pode<br />

ser invocada:<br />

I. Por aquelle que só tem a quasi-posse das servidões adquirida<br />

em boa fé e sem vicio,<br />

II. E ainda por quem é de direito senhor da servidão mas<br />

que prefere allegar tão somente a quasi-posse como de mais facil<br />

prova ( 266 ).<br />

§ 136. — Acções possessor ias<br />

1. A quasi-posse das servidões se acha exposta ás mesmas<br />

lesões de que são susceptiveis as servidões.<br />

2. As servidões, em tanto que direitos, se considerão<br />

verdadeiros attributos do prédio dominante e como taes constituem<br />

um modo de ser delle (267). D'ahi vem que os actos que<br />

impedem ou perturbão o exercício délias affectão mais ou menos<br />

(263) Fr. 2 pr. D. eoâem, §3 1. de actionib. 4, 6. Caminha Acç.<br />

Confess, nota 7.<br />

(264) Fr. 7. D. eoãem; Cr. 7 D. aqua cotid., 42,22, Mühlenbruch<br />

§ 292, Caminha, ACQ. Confess, nota 9. Pereira e Souza nota '565. Além da<br />

caução também se usa cominar pena para o caso de futura contravenção.<br />

Mendes, trat. 2, 1. 4 cap. 2, n. 8, B. Carn. § 82, n. 7, Doctr. das Acç.<br />

§ 112, 2° Si a lesão consiste em obras que impedem o exercício da servidão, ou<br />

na destruição de obras necessárias ao exercício delia, a sentença deve ordenar,<br />

no primeiro caso, a demolição (Maynz § 222, nota 13) ; no segundo, a reconstrução<br />

(Caminha Acç. Confess, nota 8).<br />

(265) Fr. 4 § 2, fr. 6 § 6 (D. si servit, vindicet. 8, õ, Caminha, Acç.<br />

Confess, nota 6.<br />

(266) Fr. 11 § I o . D. de Pub. in rem action. 6, 2, fr. 1 § 2 o D. S. P. R.<br />

8, 3, Mühlenbruch § 282, Maynz, § 222 in finie, B. Carn. § 82, n. 15 Vej.<br />

Valasc. Consult. 194, n. 30.<br />

(267) A pilastra alheia, sobre a qual descança o nosso edifício, o aqueducto<br />

que lhe traz água da herdade vizinha, são, por assim dizer, augmentes,<br />

accrescimos do prédio. A destruição da pilastra, a demolição do aqueduct<br />

o offendem a integridade do prédio.<br />

20


292 DlRfííTO<br />

directameiite a posse do prédio á que são inhérentes, (268) sem<br />

todavia importarem a perda dessa posse: porquanto, embora despojado<br />

materialmente da servidão, o prédio dominante não deixa<br />

por isso de perseverar sob o poder de seu possuidor.<br />

Desta realidade de facto resultão os corollarios seguintes:<br />

I o . Que é inaplicavel á quasi-posse das servidões o interdicto<br />

recuperatorío (Unde vi-força espoliativa) (269).<br />

2 o . Que, reduzindo-se, em geral, os actos lesivos da quasiposse<br />

á uma mera turbação da posse do prédio dominante, a quasi-posse<br />

pôde ser util e eficazmente defendida pelo interdicto de<br />

manutenção (uti possidetis) (270)--<br />

3 o . E' esta a razão porque a nossa jurisprudência, acompanhando<br />

a tendência do Direito Moderno (271), tem adoptado o<br />

dito interdicto {uti possidetis) como su Eficiente por si só para proteger<br />

a quasi-posse das servidões, qualquer que seja a sua natureza,<br />

continuas ou discontinuas, affirmativas ou negativas (272).<br />

4 o . O interdicto de manutenção applicado á quasi-posse<br />

das servidões tem por fim fazer restabelecer o exercício dos actos<br />

materiaes da servidão e condemnar o autor da lesão á não reproduzil-a<br />

sob pena certa, e á indemnisar as perdas e damnos causados<br />

(273).<br />

(268) Savigny § 46, Maynz, § 224. Esta observação é perfeitamente<br />

exacta relativamente ás servidões, cujo exercício presupõe obras, como a de<br />

aquedueto, onerls ferendi, tigni immittendi.<br />

Pelo que respeitão as descontinuas — servidões que consistem em actos<br />

pessoaes, ê força reconhecer que a supressão da turbação desses actos não<br />

exerce influencia directa sobre a posse do prédio dominante. Savigny,<br />

§ 46 in fine.<br />

(269) Fr. 24, § 27 D. de usurpât. 41,3, Savigny, cit. § 46.<br />

(270) Mühlenbruch, § 293.<br />

(271) Zaear. § 187.<br />

(272) Lobão Interdict. § 94, Doct. das Acç. nota 429 e § 194 e seguintes,<br />

B. Carn. L. 24 § S2, n. 2.<br />

O Direito Romano, fundado no presupposto de que a suppressão ou perturbação<br />

do exercício das servidões que modernamente se denominão discontinuas,<br />

não affectão directamente a posse do prédio dominante, tinha<br />

para algumas daquellas servidões interdictos espeeiaes: no que não o seguirão<br />

as legislações modernas. Vej. Savigny, § 46.<br />

(273) Fr. 3 S 17, fr. 9 § I o D. de vi 43, 16; fr. 1 pr. e § 23 D. de<br />

água cotidian. 43, 20, Maynz § 224 in fine, iDoct. das Acç. § 19-4 e 190.


CAPITULO IV<br />

EMPHYTEUSE<br />

§ 137. — Origem histórica.<br />

1. A emphyteuse,— o direito real de mais larg*a comprehensão<br />

na cousa alheia, — nasceu, se desenvolveu e adquirio<br />

existência propria e definitiva em época em que as diversas instituições<br />

do Direito Civil já formavão um corpo orgânico completo.<br />

São, pois, conhecidas as suas origens e as phazes porque<br />

foi passando, até cheg^ar a se constituir tal qual hoje vig-ora.<br />

2. Creação do Direito Romano, o primeiro esboço delia<br />

se descobre nos arrendamentos que de suas propriedades fazião<br />

aos particulares as cidades, os collegios de sacerdotes e as vestaes<br />

(1). Temporários em principio, os ditos arrendamentos forão<br />

pouco e pouco revestindo um certo caracter de estabilidade<br />

que lhes communicava a qualidade dos locadores, — pessoas moraes<br />

de existência indefinida (2). Caminhando as cousas neste<br />

theor, veio afinal a prevalecer o principio : — que os arrendatários<br />

não poderião ser despejados do immovel emquanto pag-assem<br />

pontualmente a renda estipulada (3). A adopção daquelle<br />

principio converteu de facto os arrendamentos de temporários<br />

(1) Hygin. de condition, agror. Gaio, Com. 3§ 145, fr. 1 pr. D. si ager<br />

vectigal. 6,3; Savigny, Poss. § 9, § 12 a, Mühlenbruch § 294, Maynz,<br />

§ 232, Accar. n. 283.<br />

(2) Paterculus, Histor. II, § 81; Maynz, cit. § 232.<br />

(3) G-aio, Com. 3 § 145: Veluti si aliqua res in perpetuum locata sit,<br />

quod evenit in prcediis municipum, qua? eà lege locantur ut quandiu vectigal<br />

prajstetur, neque ipsi conductori. ncque hceredi ejus prœdium auferatur.<br />

Vej. Savigny, cit., § 9, n. 5, not. 3.


294 MRÎÎITO<br />

em perpétuos. Para proteger a posição jurídica que dest'arte se<br />

creou para os arrendatários, deu-se-lhes uma acção real (actio vectigalis)<br />

.<br />

A concessão de uma tal accão importava virtualmente<br />

o reconhecimento, em favor dos arrendatários de nm direito real<br />

sobre o immovel sujeito ao arrendamento (ager vectigalis).<br />

Este direito real sobre o gaer vectigalis, com a obrig-ação de<br />

pagar uma renda annual (vectigal), já contém em si os elementos<br />

substanciaes da empbyteuse (5).<br />

3. Mais tarde, os imperadores no intuito de attrahirem<br />

cultivadores para as suas vastas propriedades, sitas pela maior<br />

parte em regiões longínquas, tomarão o conselho de arrendal-as a<br />

longos prazos e ainda em perpetuo, por preços inferiores á taxa<br />

commum (6). Os particulares e as igrejas, que também possuião<br />

grandes domínios nas mesmas condições, imitarão o exemplo<br />

(7). O direito, que por virtude destes arrendamentos se concedia<br />

aos arrendatários, adquirio por fim o caracter de direito real. Os<br />

immoveis, da intenção com que erão feitos os arrendamentos,<br />

se ficarão chamando ei/iphy teu ticos (pre/dia emphyteutica), e o direito<br />

resultante — direito emphyteutico (jus emphyteuticum (8).<br />

4. E' fácil de comprehender a profunda analogia que havia<br />

entre os prédios emphyteaticos e o ager vectigalis. E em verdade,<br />

o jus emphyteutico se confundia perfeitamente com o jus<br />

sobre o ager vectigalis. A differença era apenas de nome. Justi-<br />

(4) Fr. 1 § 1.* D. si ager voctig. 6, 3: Qui in perpetuum fundum<br />

fruendum conduxerunt, quamvis non efficiantur domini, tamen placuit competere<br />

eis in rem actionem adversus quemvis possessorem sed et adversus<br />

ejus municipes. Fr. 15, § 26 D. de damn, infect. 39, 2; fr. 66 pr. D. de<br />

eviction. 21, 2. Vej. Pellat, Introduct. Exposé de princip. gêner, de la propriété,<br />

n. 121.<br />

(5) Pellat, cit. Introduct. n. 120 a 123<br />

(6) C. Theodos, de fund, patrim. 11, 61; Gothofred, Paratit. ad C.<br />

Theod. 11, 3. Muhlenbruch, § 294, Maynz, § 232.<br />

(7) Novell. 7 c. 5, Novell, 120, C. 1 C, jur. emphyt. 4,66, Savigny, § 9.<br />

(8) C. 13 C. de prcediis et aliis reb. minor. 5, 71: Etiam vectigale,<br />

vel patrimoniale, sive empliytetiïicum prscdium. Fr. 3, § 4 D. de lebus eorum<br />

qui sub tutel., 27,9.


tíÀS COUSAg 295<br />

mano afinal fundio em uma as duas instituições, ficando consideradas<br />

synonimas as suas denominações (9).<br />

5. No estado do Direito Romano ao tempo daquelle imperador,<br />

a emphyteusc consistia essencialmente no Direito real—de<br />

cultivar o campo alheio mediante uma pensão annual, e de aproveital-o<br />

tão amplamente como o faz o proprietário, sem todavia<br />

destruir-lhe a substancia. Ao senhor do immovel ficava como que<br />

a nua-propriedade ; ao emphyteuta, com a posse juridica, passava<br />

o direito á todas as vantagens materiaes do dominio (10).<br />

6: Por occasião de discutirem difficuldades que a pratica<br />

diária suscitava, controvertião os jurisconsultes a questão de<br />

saber se a emphyteuse procedia do contracto de compra e venda,<br />

ou se do de locação e conducção (11).<br />

Nascia a controvérsia de se descobrirem na emphyteuse effeitos<br />

de um e de outro contracto (12). Mas uma analyse mais<br />

aprofundada do assumpto demonstrou que alguns dos direitos reservados<br />

ao senhor do prédio, e as restricções impostas ao emphyteuta,<br />

não se coadunavão nem com a compra e venda nem<br />

com a locação. Assim que : se resolveu que o contracto pelo<br />

qual se constitue a emphyteuse, é um contracto de uma natureza<br />

especial, que não se confunde com os contractos preexistentes.<br />

Deu-se-lhe o nome de contracto emphyteutico (13).<br />

A emphyteuse, tal como o Direito Romano a organisára,<br />

— pura invenção econômica para melhor aproveitamento das<br />

grandes propriedades, — era uma instituição simples, formada<br />

de elementos singelos, e subordinada a regras claras.<br />

(9) D. 6.3 Inscriptio: Si ager vectigalis, id •est, emphyteuticarius petatur.<br />

Fr. 15 § 1." D. qui satisd. oog. 2, 8: Sed et qui veetiyalem, id est,<br />

emphyteulicum possidet, possessor intelligitur. Savigny cit. § 9.<br />

(10) §3 1. de locat. 3, 24; fr. 1 § 1.° D. si ager vect. 6,3; Novell.<br />

120, cap. 8; Savigny § 9. Maynz § 233.<br />

(11) Gaio. Com. 3 § 145: Adeo autem emptio et venditio et locatio et<br />

conductio familiaritatem aliquam inter se habere videntur, ut in quibusdam<br />

eausis quœri solet utrum emptio et venditio contrahatur, an locatio et<br />

venditio.<br />

(12) Marezoll § 111.<br />

(13) C. 1 C. de jur. emphyt. 4, 66; § 3 I. de locat. '3,24: S?d talis<br />

contractus, quia inter veteres dubitabatur et a quibusdam locatio et a quibusdam<br />

venditio exisUmabatur, lex Zenouiana lata est quœ emphyteseos contractu!<br />

propriam statuit naturam, neque ad locationem, neque ad venditionem<br />

inclinantem, sed suis pactionibus fuleiendam.


296 DIREITO<br />

§ 138 — Origem histórica (Direito pátrio).<br />

1. Em Portugal monumentos dos primeiros séculos da<br />

monarchia attestão já a existência da emphyteuse (14). Naquelle<br />

reino, bem como em outras nações da Europa, a emphyteuse<br />

conservou sempre a essência que lhe den o Direito Romano ;<br />

mas travou-se de outros elementos, filhos da org-anisação social<br />

do tempo, os quaes, por assim dizer, lhe transtornarão a physionomia.<br />

Em torno desta instituição vierão se agrupar direitos e<br />

obrigações alheios á sua indole, destinados a crear a supremacia<br />

do proprietário sobre o. emphyteuta (15).<br />

A pratica quasi universal dos emprazamentos por vidas,<br />

a recusa das renovações, o direito de caducidade, a pena de commisso,<br />

os serviços pessoaes, o augmento das pensões, as luctuosas<br />

e o excesso dos laudemios, fizerão do emphyteuta um servo<br />

votado aos interesses e aos caprichos do senhorio directo (16).<br />

O corpo de doutrina que regulava a materia da emphyteuse,<br />

formado das cláusulas cornmumente usadas nos contractos<br />

de etnprazamentos e das disposições dos foraes, nunca foi objecto<br />

de legislação geral e systematica.<br />

Na compilação Affonsina (17) e na Manuelina (18) apenas<br />

se consagrarão ao assumpto alguns princípios, uns tirados<br />

dos costumes, outros do Direito Romano.<br />

2. Na segunda metade do século XVI, é certo, os romãnistas<br />

portuguezes. na direcção scientifica que davão ao Direito,<br />

iniciarão esforços no sentido de escoimar a emphyteuse das odi-<br />

(14) Mello, 3, 11 § 2, Lobão, Direit. Emphyt. §§ 2, 3, 4 e õ. Appendice<br />

Diplomat. Historie, § 8.<br />

(15) Memória sobre os inconvenientes e vantagens dos prazos por J. P.<br />

Ribeiro, no vol 7, pag\ 284, das Memor. de Lit. Port., Lobão, Append. Diplomat.<br />

Rocha, Not. X.<br />

(16) Vej. o cit. Appendic. Diplomat, de Lobão.<br />

Neste curioso livro vem um grande numero de extractos de documentos<br />

antiquissimos acerca da emphyteuse.<br />

(17) São consagrados a emphyt.ui.se os títulos 77, 78, 79 e 80 do L. 4,<br />

da ord. Affons. (promulgada em 1446) .<br />

(18) Ord. Manuelina, L. 4, T. 62, 63, 64, 65 o 77 §§ 35 e 36. As Manuelinas<br />

acerescentavão os casos em que os prazos devião vir á collação,<br />

(tit. 77 § 35 e 36): introduzirão também outra novidade, e foi a de sujeitar<br />

o contracto emphyteutico á rescisão por lesão. Vej. Lobão, Appendice.<br />

§§ 89


D Á S C O U S À S W<br />

osas excrescencias que a deturpavâo (19). Mas esses esforços forão<br />

estéreis. As ordenações philipinas, posteriormente promulgadas,<br />

se limitarão a reproduzir as disposições das compilações<br />

anteriores (20). E, como d'antes, continuou a prevalecer a jurisprudência<br />

dos costumes e dos foraes.<br />

3. Ainda nos meados do século passado a emplrvteuse era<br />

em Portugal uma das mais largas bases da prepotência das ordens<br />

religiosas e da aristocracia. Uma instituição tal não podia<br />

escapar á política demolidora do grande ministro de D. JoséI.<br />

E com effeito, por occasião de restaurar as leis da amortização,<br />

o Marquez de Pombal pôz por diante princípios que<br />

' alterarão profundamente a emphyteuse tal como a havião constituído<br />

os costumes. A reforma começada é incompleta, mas nella<br />

ressumbra com energia o pensamento de erradicar velhos abusos,<br />

e restituir á emphyteuse a antiga simplicidade do Direito<br />

Romano (21).<br />

3. No Brazil, por força de circumstancias peculiares, nunca<br />

foi a emphyteuse uma instituição odiosa. A vastidão das propriedades<br />

e a escassez de população produzirão aqui os mesmos<br />

resultados que em Roma no tempo dos imperadores : — para<br />

ter quem as cultivasse e aproveitasse cumpria fazer os emprazamentos<br />

com condições vantajosas para o emphytheuta: d'ahi<br />

os prazos perpétuos e a modicidade das pensões.<br />

Nem na época colonial, nem depois da fundação do Império,<br />

puderão entrar em nossos costumes os aforamentos por<br />

vidas, — a g-rande fonte dos abusos e das diffículdades que enredavão<br />

o Direito Portuguez (22)<br />

Em nossa pátria só é conhecida, só está em uso a emphyteuse<br />

perpetua pura. E dest'arte a materia dos prazos, que era<br />

em Portugal, antes das reformas de 1832 e da promulgação do<br />

Código Civil, uma das partes mais complicadas e abstrusas da<br />

jurisprudência, se acha consideravelmente simplificada no nosso<br />

Direito (23).<br />

(19) Valasco e Caldas Pereira.<br />

(20) Ord. Phillip. L. 3, T. 93 § ult. L. 4, T. 36 a 40, T. 9« §§ 23 a<br />

24, T. 97 §§ 23 e 24. T. 13, § 6.<br />

(21) Vej. Leis de 4 de Julho de 1768, de 12 de Maio de 1769, 9 de Setembro<br />

de 1769, §§ 25 e 26, de 4 de Junho de 1776.<br />

(22) Vej. Consoli'1. das L. Civis, art. 609, not. 3. Não nos conta a<br />

existência de prazos de vida no Brazil.<br />

(23) Neste livro só nos occupamos da emphyteuse perpetua pura, e dei-


298 DIREITO<br />

§ 139. — Noção da emphyteuse.<br />

A emphyteuse é o direito real de tirar da cousa alheia todas<br />

as utilidades e vantagens que ella encerra, e de etnpregal-a nos<br />

misteres a que por sua natureza se presta, sem destruir-lhe a<br />

substancia, e com a obrigação de pagar ao proprietário uma<br />

certa renda annual (24)<br />

Desta noção se deprehende que a emphyteuse se compõa<br />

de dous elementos : — direitos reae.s na cousa alheia e obrigações<br />

que têm por objecto prestações pessoaes (25).<br />

I. A). Direito real, a emphyteuse é uma collecção de parcellas<br />

que se destacão do dominio, e que, enfeichadas sob um<br />

nome commum, formão uma entidade distincta.<br />

Na verdade, do dominio se podem desmembrar os direitos<br />

elementares seguintes :<br />

1. O direito de possuir a cousa (jus possidendi) (26)<br />

2. O direito de gozar delia da maneira a mais ampla (27) ;<br />

xaremcs na paz do esquecimento, por estranhos ao nosso Direito, os prazos<br />

de vida.<br />

(24) Mühlenbruch, § 294, Maynz, § 232, Mello 3, 11, § 1.'. Vej. C. C.<br />

Port. art. 1.653.<br />

A palavra empliyteuse se toma em três sentidos. No «ubjectivo, significa<br />

a emphyteuse — direito; no objectivo. a cousa sobre que recahe; no formal,<br />

o contracto pelo qual é constituída. (Mello, 3,11, § 1." nota, Rocha,<br />

§ 532, not.).<br />

Temos ainda na nossa linguagem jurídica as palavras — prazo, para designar<br />

o immovel aforado e — emigrazamento, aforamento — para exprimir o<br />

contracto. (Ord. 4, 37 pr. Lobão, Direit. Emphyt. § 24, Ord. 4, 97, § 22).<br />

A palavra foro Ê também empregada para significar o dominio util, a<br />

emphyteuse — direito (Ord. 4, 8«, § 1." e 37 pr. Lei n. 1.357, de 24 de Setembro<br />

rle 1864, art. 2 § 6 o ). O proprietário do immovel aforado se costuma<br />

denominar senhor ãirecto, ou simplesmente senhorio. (Ord. 4,37, § 2. cit. Lei<br />

de 24 Set. de 1864, art. 2 § I o ), por opposição ao emphyteuta, que 'é de ordinário<br />

chamado — senhorio util, ou foreiro (Ord. 4,36 § 1.°, Lei de 24 de Set.,<br />

cit. art.).<br />

(25) Mazezoll, § 111, Ortolan, Com. ao § 3, I. de locat. et conduct. 3,24.<br />

(26) Sobre a differença entre o — jus possidendi — parcella do dominio,<br />

e o — jus possessionis — posse juridica, veja-se acima § 2,<br />

(27) Tal é o direito de usar, de usofruir, de retirar produetos que não<br />

são fruetos, abrir minas, cortar madeiras. Vej. acima § 97 e seg.


DAS COUSÂS 299<br />

3. O direito de transformai-a, sem todavia deteriorar-lhe<br />

a substancia (28).<br />

4. A faculdade de dispor deste complexo de direitos, e<br />

de transmitti-los a outrem por titulo singular ou universal (29).<br />

A somma daquelles direitos, separados da pessoa do senhor<br />

do immovel e reunidos na pessoa de um terceiro, constitue<br />

a emphvteuse em tanto que direito reel.<br />

Consummada a dita desmembração, o dono do immovel<br />

retém em si urna como que nua-propriedade (3 ') com os seus<br />

consectarios naturaes (31) e com certos direitos creados ou pela<br />

lei (32) ou pelo acto de que emana a emphvteuse (33). Todos os<br />

demais direitos do dominio— direitos que resumem as vantagens<br />

materiaes da propriedade, passão para aquelle a quem a emphyteuse<br />

é conferida, isto é, ao emphyteuta.<br />

Assim que o emphyteuta exerce direitos que a muitos respeitos<br />

o collocão na posição de proorietario. Seduzidos por esta<br />

apparencia, os antig-os glozadores tomarão a emphyteuse como<br />

uma espécie de propriedade, e lhe derão a denominação — de<br />

dominio util (34), — denominação que afinal vingou no uso da<br />

lingua juridica, e tem hoje o caracter de expressão legal (35).<br />

A dita denominação, oorém, pecca por imprópria : na realidade,<br />

a emphyteuse não é uma verdadeira propriedade, mas<br />

(28) Como converter plantações em pastos, demolir e reconstruir edifícios.<br />

(29) § 3, I. de locat. 3, 24: Neque... cuive conductor hceresve ejus id<br />

prœdium vencliderit. aut donaverit, aut dotis nomine deãerit, aliove quoque<br />

modo alienayerit, auferre lieeat, Ord. 4,38 pr.<br />

(30) Vej. acima § 25.<br />

(31) Como o direito de reivindicação, o de consolidação: veja-se adiante<br />

§ 151.<br />

(32) Tal é o direito de opção, o direito ao laudemio: vej. § 152 c 153<br />

adiante.<br />

(33) No contractu ou no testamento se podem estabelecer direitos e<br />

obrigações alheias ã natureza da emphyteuse, uma vez que não lhe offendão<br />

a essência. § 3 T. 3, 24; Ord. 2, 35 § 7; 4, 38, § 4. Vej. adiante, § 144.<br />

' (34) Maynz § 232, Observât.<br />

(35) Alv. de 3 de Novcmb. de 1757; Lei n. 1.237, de 24 de Setembro<br />

de 1S64, art. 2, § 1.°, Décret, n. 4.105, de 22 de Fev. de 1868, art. 5,<br />

§ unico.


300 . DIREITO<br />

um direito sobre a cousa alheia, análogo por sua extensão á propriedade<br />

(36).<br />

B). A emphyteuse, como complexo de direitos reaes, pôde<br />

ser concebida intellectualmente, sem a dependência lógica da<br />

. obrigação de pagar uma renda annual ao proprietário. Não répugna,<br />

por certo, á razão, que o senhor de um immovel faça a<br />

um terceiro cessão, ou gratuita ou por preço pago de uma vez,<br />

dos direitos reaes que formão a emphyteuse (37). Mas, por decreto<br />

da lei, a obrigação de pagar a renda entra como elemento<br />

essencial na composição da emphyteuse, de modo que sem aquella<br />

obrigação, legalmente não ha emphyteuse (38)<br />

Esta obrigação, embora artificialmente ligada á emphyteuse,<br />

conserva sempre a natureza de um vinculo puramente<br />

pessoal, e como talé regulada (39).<br />

II. Entre nós a lei permitte as emphyteuses vitalícias,<br />

isto é, por três vidas (40). Os nossos costumes, porém, repellirão<br />

sempre um tal gênero de emphyteuse ; e só têm consagrado<br />

a perpetua pura (41).<br />

A perpetua pura se distingue por estes dous característicos<br />

:<br />

(36) Savigny, Poss. § 9. n. V, Mühlenbruch, § 294, not. 8, Makeldey,<br />

§ 331, not. 8.<br />

O domínio, ou o direito de propriedade, colloca a cousa sob a dominação<br />

absoluta do dono, de modo que o direito, por assim dizer, se confunde com<br />

a, propria cousa (§ I o acima); a emphyteuse, porém, não é senão um direito<br />

sobre a cousa alheia. Fr. 71 § 5 e 6 D. de reg. jur. &0.16: jus in fundo.<br />

Fr. 3 § 4 D. de rebus eorumque, 27.9: jus praxlii. Or, 3, 47 pr. .. "Nenhum<br />

homem... poderá litigar. .. sobre bens de raiz, setis próprios, ou âe foro feito<br />

para sempre."'<br />

(37) Ortolan, Com. ao cit. §, 3 I. 3. 24.<br />

(38) Fr. 1 pr. D. si ag. vectig. pet. 6, 3; § 3, I. 3, 24; Ord. 4, 39 pr.<br />

Mello, 3, 11 § 3, not.<br />

(39 Vej. adiante, § 148.<br />

(40) Alv. de 3 de Novemb. de 1759: "Estabeleço que. todos os contractes<br />

que não forem pelo menos pelas três referidas vidas, se julguem<br />

de simples locação, sem que seja visto transferir por elles dominio algum<br />

em favor dos locatários."<br />

O citado Alv. derogou a Ord. 4. 39 pr. na parte em que permittia a<br />

emphyteuse por uma, duas vidas, por dez annos e d*ahi para cima.<br />

(41) Vej. a Consolid. das.L. Civ., art. 609, nota 3<br />

De harmonia com este costume forão declaradas perpétuas.<br />

1.° As emphyteuses que havião sido constituídas em terras da fazenda


DAS COUSAS -SOI<br />

a). Os direitos que a constituem, se conservão perpetuamenía<br />

separados do dominio, e só voltão a reunir-se-lhe de novo quando<br />

occorre alg-um facto ou accidente a que a lei dá uma tal virtude<br />

(42) ;<br />

b) A cousa aforada continua a manter a natureza de bem<br />

allodial (43).<br />

IV. Não se deve confundir a emphyteuse com o immovel<br />

sobre que é constituída. Conjuncto de direitos reacs na cousa<br />

alheia (jura in re aliena), ella entra na classe das cottsas incorporeas<br />

(44), e participando da qualidade dos bens em que recahe, é<br />

considerada immovel para todos os effeitos de direito (45).<br />

de Santa Cruz até 1813, e as que para o futuro se constituíssem. (Alv. de<br />

26 de Julho de 1813).<br />

2.° As concedidas pela câmara municipal da corte até 1821 "ainda que<br />

de facto tivessem sido celebradas em vidas, bem como as sub-emphyteuticações,<br />

locações e arrendamentos que os emphyteutas houvessem feito", e as<br />

que de futuro se concedessem. (Alv. de 10 de Abril de 1821, § 2, 3 e 5).<br />

3.° As conferidas pelo Estado em terrenos de marinha e nos chãos<br />

encravados ou adjacentes ás provações. (Lei de 15 de Novemb. de 1831.<br />

art. 51 § 14, Lei de 12 de Set. de 1833, art. 3).<br />

O C. C. Port, acabou com as emphyteuses de vidas e só permitte a perpetua<br />

pura. (Art. 1.654). O mesmo Código estabeleceu a fôrma pela qual<br />

os prazos de nomeação se deverão converter em perpétuos. Arts. 1.6S9<br />

e seguintes.<br />

Os economistas, estudando a organisação da propriedade territorial no<br />

ponto de vista da producção da riqueza, condemnão energicamente a instituição<br />

dos prazos de vidas por incompatível com um systema de regular<br />

aproveitamento tio solo. Na verdade o emphyteuta. cujo direito caducara<br />

por sua morte, não tem estimulo para melhorar o prazo em toda a extensão<br />

de suas posses, e para fecundal-o com trabalho e capitães que não hão<br />

de ser aproveitados por seus herdeiros. A emphyteuse perpetua não padece<br />

deste vicio: quanto aos seus effeitos econômicos, equiparão-na os economistas<br />

á propriedade livre.<br />

A emphyteuse perpetua tem no nosso Direito diversas denominações: —<br />

foro para sempre (Ord. 3, 47 pr. 4, 38 pr.), foro em perpetuo (Ord. 4, 40 pr.<br />

41 pr.), foro perpetuo (Ord. 4, 96 § 23) fateusin (Alv. de 10 de Abril de 1821,<br />

§ 5 o ). em fatiota (Alv. de 3 de Novembro de 1757.<br />

(42) Vej. adiante. § 156.<br />

(43) Portug. de Donat. 3. c. 43, n. 26, Lob. Direit. Emphyt., § 521<br />

C. C. Port. art. 1.662.<br />

(44) Vej. Maynz § 113, Mühlenbruch, § 220.<br />

(45) Ord. 3, 47 pr.


302 DIREITO<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 678 — Dá-se a emphyteuse, aforamento, ou emprasamento, guando<br />

por acto entre vivos, où de ultima vontade, o proprietário attribue a outrem<br />

o domínio util do immovel, pagando a pessoa, que o adquire, e asswn se con'<br />

stitue empTvyteuta*, ao senhorio direct o uma pensão, ou foro, annual, certo'<br />

e invariável. — 676, 679.<br />

Art. 679 — O contractu de emphyteuse éperpetuo. A emphyteuse por tempo<br />

limitado considera-se arrendamento, e como tal se rege.<br />

§ 140. — Em que se distingue a emphyteuse do usufrúcto.<br />

A emphyteuse tem, é certo, alguma analogia com o uso-,<br />

frueto, mas difere delle por traços perfeitamente característicos,<br />

a saber :<br />

1. A emphyteuse é mais ampla do que o usofructo: comprehende,<br />

além do direito de usofruir, o de perceber os produetos que<br />

não entrão na definição de fructos (46) e o de transformar e alterar<br />

a cousa com o único limite de não lhe deteriorar a substancia (47).<br />

2. O emphyteuta tem a. posse jurídica do immovel e. em conseqüência,<br />

adquire os fructos pela simples separação (48) : o<br />

usofructuario possue a cousa em nome do proprietário, e portanto<br />

só faz seus os fructos pela percepção (49).<br />

3. E' da essência da emphyteuse a obrigação de pagar annualmente<br />

uma renda ao proprietário (50) ; o usofructo é de<br />

ordinário gratuito (51).<br />

4. A emphyteuse se transmitte a terceiro, ou por acto<br />

entre vivos, ou por suecessão (52) ; o usofructo — direito — não<br />

pôde ser alienado, e se extingue pela morte do usofructuario (53)<br />

§ 141. — Que cotisas podem ser objecto da emphyteuse<br />

1. Na sua origem, a emphyteuse não foi senão um alvítre<br />

combinado para o fim de, por via de concessões extraordinárias,<br />

attrahir colonos, e dest'arte estimular e provocar o apro-<br />

(46) Vej. acima § 97 e 99.<br />

(47) Novell. 7, c. 3 § 2. Vej. § 139.<br />

(48) Savigny. Poss. § 9, n. V.<br />

(49) Vej. § 102.<br />

(50) Vej. § 139.<br />

(51) Vej. § 9'5.<br />

(52) § 3 I., de locat. 3, 24, Ord. 4, 38 pr., 98 S 23 e 24.<br />

(53) Vej. § 101 e 109, 1.°.


t)AS COUSAS<br />

veitamento de terras que de outra maneira jazerião incultas (54)<br />

D'ahi o uso de só se concederem emphyteuses em immoveis<br />

susceptíveis de cultura (55). Mais tarde, por extensão d'aquelle<br />

uso, se permittio estabelecel-as em casas e edifícios (56).<br />

2. No reino de Portugal, o principio do Direito Romano<br />

recebeu grande ampliação : chegou-se a admittir a emphyteuse<br />

nas proprias arvores, como vinhas e olivaes, emquanto adhérentes<br />

ao solo, sem no emtanto comprehender o próprio solo (57)<br />

e afinal até em réditos annuos perpétuos, nos direitos dominicaes,<br />

e em barcas e pesqueiros (58).<br />

Esta jurisprudência anômala, além de desvirtuar a emphyteuse,<br />

dava lug-ar a graves abusos, para cuja extirpação se tomarão<br />

providencias legislativas, nas quaes transparece o pensamento<br />

de restaurar a simplicidade do Direito Romano acerca deste as«<br />

sumpto (59).<br />

3. No estado actual do nosso Direito, a emphyteuse regularmente<br />

só pôde recahir:<br />

1.° Km terras que não estão cultivadas (60);<br />

2 ° Em terrenos que se destinão á construcçao de casas e<br />

edifícios de todo o gênero (61).<br />

4. Por declaração expressa de lei, os arrendamentos, a<br />

longos prazos e ainda os perpétuos, de terras já cultivadas ou<br />

de casas já construídas, se reputão sempre, para todos os effeitos<br />

de direito, meros contractus de locação e conducção ( (>2 ).<br />

Quer isto dizer:<br />

303<br />

(54) Vej. § 137, acima.<br />

(5


â04 DIREITO<br />

a). Que Os ditos arrendamentos só gerâo direitos pessoaes<br />

e, por conseqüência, não transferem aos arrendatários nem direitos<br />

reaes, nem acções da mesma natureza.<br />

b). Que as rendas que forem estipuladas para o proprietário<br />

hão de ser graduadas, tendo-se em attençào o valor dos<br />

fructos naturaesou civis da cousa arrendada (63).<br />

5. O intuito da lei, traçando uma linha clara de separação<br />

entre o contractu emphyteutico e os contractus de arrendamento,<br />

foi cortar os abusos e inconvenientes resultantes da<br />

confusão d'um e de outro (64). No aforamento a pensão é sempre<br />

módica, porque só tem por fim affirmar o reconhecimento do<br />

domínio directo, e compensar o proprietário da privação do seu<br />

prédio inculto ou desnudado de edifícios, e, por conseqüência,<br />

esterilisado em suas mãos (65). Mas nos contractus de arrendamento<br />

a renda representa a retribuição dos capitães imrnobilisados<br />

no prédio (66).<br />

A corruptella, pois, de se confundirem contractus tão<br />

différentes, causava grande perturbação nas relações de direito,<br />

ministrando pretexto, com apparencias de fundamento jurídico,<br />

para acções de lesão enorme. (67)<br />

tractos, nos quaes-se aforarão ou so aforarem casas já feitas ou quintas Tia<br />

bitaveis e terras fructifères pela mesma renda em que costumavão andar, contiverão<br />

e contêm pela sua natureza contractus de locação por longos tempos<br />

de annos e de vidas, ou colônias perpétuas para serem julgadas por outras<br />

différentes regras, por que se costumão decidir as convenções entre os<br />

rendeiros ou colonos e seus respectivos senhores."<br />

(63) Os comractos de locação, ainda perpétuos, não importão transferencia<br />

de direitos reaes. Alv. de 3 de Novemb. de 1'757. Vej. Lob. Direit. Emphyt.<br />

§ 96.<br />

(64) Vej. a cit. L. de 4 de Julho de 1776, preamb.<br />

(65) Vej. § 148 adiante.<br />

(66) Li. de 4 de Julho de 1776: "Confundindo-se, para assim se pretender<br />

e julgar a natureza do contractu emphyteutico, que essencialmente<br />

consiste em aforar terrenos para edificar casas, ou terras incultas para abrir,<br />

com a outra diversa natureza do contractu de locação por longo tempo de<br />

annos ou de vidas, que consiste em aforar casas, quintas e terras fruetiferas<br />

pela mesma renda em que costumão andai', sem a necessidade de nelles<br />

se fazer bemfeitoria alguma para produzirem as sobreãitas rendas em que<br />

são aforados."<br />

(67) Vej. o Preamb. da cit. Lei de 4 de Julho de 1776. Aquelle, por<br />

exemplo, que tomava por emphyteuse uma casa já feita ou terras cultivadas,<br />

estipulava naturalmente pagar uma pensão, mais ou menos em propor-


■DAS COÜSÀS 30è<br />

6. Entrão na qualificação acima exposta, dos terrenos que<br />

são susceptíveis de emphyteuse, e podem ser aforados :<br />

1.° Os terrenos de marinha Í6S);<br />

2.° Os terrenos reservados para servidão publica nas<br />

margens dos rios navegáveis, e nas dos que se fazem navegáveis'(<br />

69);<br />

3.° Os terrenos de alluvião accrescidos ás marinhas e aos<br />

de que trata o numero antecedente (70);<br />

4.° Os alagadiços e devolutos encravados nas povoações ou<br />

adjacentes a ellas (71):<br />

5.° Os terrenos pertencentes ás antigas missões e aldeamentos<br />

de indios, que estiverem abandonados (72).<br />

As emphyteuses qne se concedem nesses terrenos, recahem<br />

sempre sobre o solo e não sobre as bemfeitorias. E elles se<br />

aforão, ou para cultura, ou para construcção de edifícios. (73).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 680 — Só podem ser ohjecto de envphyteuse terras não cultivadas ou<br />

terrenos que se destinem o edificação.<br />

ção com os rendimentos de taes prédios; mais tarde, porém, invocando &. indole<br />

do seu contracto emphyteutico, arguia a pensão de lesiva, e pedia que<br />

fosse ella reduzida á taxa do foro. 'Para supprimir abusos deste gênero é<br />

que foi promulgada a L. de 4 de Julho de 1776.<br />

(68) Lei de 15 de Novemb. de 1831, art. 51, § 14.<br />

O Décret, n. 4.105, de 22 de Fever, de 1868,, art. 1 § I o define o que<br />

se entende no nosso Direito por terrenos de mai­inha,<br />

069) Lei n. 1.507, de Setemb. de 1860, art. 39. Esta reserva é d'uma<br />

zona de sete braças contadas do ponto médio das cheias ordinárias para o<br />

interior da margem. Cit. Lei n. 1.507 e Décret, de 22 de Fevereiro de<br />

1868, art. 1.", § 2.<br />

Não é mister dizer que a dita zona se entende das terras devolutas que<br />

o Estado possue nas margens dos rios navegáveis. Se a zona de sete braças<br />

se acha no domínio particular por titulo legitimo, não fica sujeita á servidão<br />

publica, salvo desapropriação legalmente feita.<br />

(70) Lei n. 1.114, de 27 de Setembro de 1860, art. 11, § 7, Décret, de<br />

22 de Fever, de 1868, art. 1, § 3.<br />

(71) Lei de 12 de Out. de 1833, art. 3, Lei n. 1.114, de 27 de Setemb.<br />

de I860, art. 11, § 7.<br />

(72) Lei n. 1.114. de 27 de Setemb. de 1860, art. 11, § 8.<br />

(73) Já se vê, pois, que a legislação brazileira acima invocada não<br />

derogou os princípios fundamentaes sobre a emphyteuse, estabelecidos pela<br />

Lei de 4 de Julho de 1776.


306 DIREITO ■<br />

§ 142.—Pessoas que podem constituir emphyícuse<br />

1. A emphyteuse se compõe, como era outro lugar se disse,<br />

de direitos desmembrados do domínio. (74)<br />

A constituição delia, importando cessão de direito em<br />

favor do emphyteuta, é considerada alienação. (75j<br />

A emphyteuse, em tanto que direito, entra na classe das<br />

cousas immoveis. (76).<br />

2. Destas premissas resulta :<br />

Que só podem constituil­a aquelles que têm o domínio<br />

pleno do immovel e estão na livre administração de seus bens.<br />

(77)<br />

O homem casado, para estabelecei a em immoveis particulares<br />

seus ou communs, carece de outhorga da mulher. (78)<br />

Não é licito ao governo concedel­a nos próprios nacionaes,<br />

sem preceder auetorisação legislativa, (79)<br />

3. Achão­se autorisados por lei para concedel­a:<br />

a) O governo geral na corte e província do Rio de Janeiro,<br />

e os presidentes nas demais províncias, em terrenos de marinha,<br />

nos das zonas reservadas para servidão publica nas margens<br />

dos rios navegáveis e dos que se fazem os navegáveis, e nos<br />

de alluvião formados junto aos ditos terrenos. (80)<br />

(74) Vej. § 139.<br />

(75) Vej. o citado § 139.<br />

(76) Vej. o § 138, IV. Na alienação da emphyteuse se transfere, não<br />

o próprio immovel, mas um complexo cie direitos sobre elle {jura in te<br />

aliena).<br />

(77) Mello 3, 11, § 10 Lobão, Direit. Emphyt. § 18 e 24 iD. Port. Ill,<br />

art. 904, C. C. Port. art. 1.667.<br />

(78) Ord. 4, 48 pr., Guerr. Tract. 2, 1.6 c. 2, n. 19, Lobão. Direit. Emphyt.<br />

§ 23, C. C. Port. art. 1.668.<br />

(79) Regiment, de 1 de Outubro de 1586, cap. 16, Lei de 23 de Maio<br />

de 1773, § 19: "Prohibe que da publicação desta em diante se possão aforar<br />

bens alguns que se achem nos próprios da minha real fazenda. E que<br />

délies possão sahir por outros tituios que não sejão os de doação ou o de<br />

venda." Const. Politic, art. 15 § 15, officio de 15 de Novemb. de 1832.<br />

(80) Décret, n. 4.105, de 22 de Fever, de 1S68, art. l.° eart. 5.<br />

Os aforamentos dos terrenos de marinha comprehendidos no município


DAS COÜSAS<br />

b) As câmaras municipaes nos bens do conselho (87)<br />

na corte com dependência da approvação do governo geral<br />

(82), nas províncias mediante autorisação das respectivas assembléas.<br />

(83;<br />

A's igrejas, ás misericórdias, irmandades, ordens terceiras<br />

e quaesques outaas corporações de mão morta é permittido<br />

aforarem os immoveis de sua propriedade. (84). As Ordens regulares,<br />

porém, não o podem fazer sem prévia licença do governo.<br />

(85)<br />

§ 143.—Pessoas que não podem aforar bens para si'<br />

Tém capacidade para tomar bens por aforamento todas<br />

as pessoas que são capazes de diieitos ( 86 ). Mas, como a<br />

emphyteuse consta de direitos dominicaes sobre cousa iminovel<br />

não podem toma-la os que a lei inhibe de adquirir bens de<br />

raiz ( 87 ).<br />

neutro, e do mangue da Cidade Nova, são feitos pela câmara municipal da<br />

corte com approvação do ministro da fazenda. Lei de 3 de Outub. de 1834,<br />

art. 32, § 2, offic. de 8 de Abril de 1835, Avis, de 2 do Maio de 1837, Port,<br />

de 5 de Agosto de 1839, e Décret, n. 4.105, de 22 de Fever, de 18


308 DiRfílTÒ<br />

Naquella prohibição se achão incluídos os conventos, as<br />

igrejas e quaesquer outras corporações de mão-morta (88).<br />

2. Por motivo de decoro e para evitar fraudes, a lei igualmente<br />

prohibe que tomem de aforamento:<br />

1.° Os procuradores fiscaes, — as marinhas e os demais<br />

terrenos que o governo pôde aforar. Ksta disposição comprehende<br />

todos os funccionarios públicos, que em razão de seu officio<br />

intervém na concessão da emphyteuse. (89)<br />

2.° Os vereadores e officiaes das câmaras municípaes, —<br />

os bens do conselho em que servem (90).<br />

3.° Os administradores, mordomos, mesarios, syndicos e<br />

procuradores de igrejas, conventos, irmaudades, e de quaesquer<br />

corporações de mão-morta, — os immoveis pertencentes ás corporações<br />

de que são mandatários (91)<br />

3. Podem tomar bens de aforamento as companhias e<br />

sociedades commerciaes (92). E também os menores e os interdictos<br />

; mas por via de seus representantes leg-aes, e g-uardadas<br />

as formalidades de direito (93).<br />

§ 144. — Como se constitue a emphyteuse.<br />

A emphyteuse se constitue :<br />

Por convenção,<br />

Por testamento,<br />

Por prescripção acquísitiva.<br />

A). Por convenção O contractu pelo qual se estabelece a<br />

emphyteuse, supposto tenha affinidades com a compra e venda<br />

í.88) Ord. 2, 18 pr. (arg.) Lei de 4 de Julho de 1768, § 1° e 4 o (arg.)<br />

Alv. de 12 de Maio de 1769, § 4 (arg.) Mello 3, 11, S 10, Lobão, Direit.<br />

Emphyt.. § 49; B. Carn. L. 1" § 30«, n. 15 G § 307, n. S; C. C. Port,<br />

art. 1669, § 1.°.<br />

(89) Ord. n. 82, de 22 de Julho de 1842 e n. 156, de 4 de Agosto de<br />

1848.<br />

A Ord. 4, 15, e o Alv. de 10 de Maio de 1678, prohibirão aos magistrados<br />

aforar bens nas circumscripções territoriaes em que exerciam jurisdieção.<br />

Estas disposições cahirão em desuso.<br />

(90) Alv. de 23 de Julho de 1766, S 1.", Lei de 1 de Outubro de 1828,<br />

artigo 43.<br />

(91) Alv. de 6 de Dezembro de 1603.<br />

(92) Décret, n. 4105. de 22 de Fevereiro de 1868. art. 13.<br />

(93) Lob. Direit. Emphyt. § 48.


DÂS COUSAS 309<br />

e com a locação, é todavia considerado como um contracto especial<br />

e distincto, com natureza propria : denominão­o contracto<br />

êmphyfeutico (94).<br />

Tem um certo numero de e/feitos naturaes (95) que as partes<br />

podem á seu arbítrio modificar, alterar ou supprimir, uma<br />

vez que as cláusulas estipuladas não lhe desvirtuem a essência<br />

(96).<br />

Por si só não transfere o âireiro real ; nem basta a tradição<br />

(97). O domínio util, como o pleno, não pôde ser opposto<br />

a terceiro, senão depois de transcripto no registro competente<br />

o respectivo titulo (98).<br />

As solemnidades do dito contracto varião segundo a qualidade<br />

das pessoas que concedem a emphyteuse, a saber :<br />

1. Se a emphyteuse tem de ser constituída por hospitaes,<br />

misericórdias, irmandades, confrarias ou ordens terceiras,<br />

a concessão se faz a quem maior lanço offerece em leilão publico,<br />

precedendo louvação do foro e annuncio por editaes com<br />

prazo de vinte dias (99).<br />

(94) ■§ 3, I. de locat. et conduct. 3,24. Mello, 3, 11 § 4, Lobão, Direit.<br />

Emphyt. § 11 e seg.<br />

(95) Sobre os elementos essenciaes e os effeitos naturaes dos contractos,<br />

vej. Muhlenbruch § 104, Maynz § 121, 122 e 123.<br />

E' da essência da emphyteuse:<br />

A transferencia do dominio util,<br />

A obrigação de pagar a pensão annual,<br />

Ser constituída em immovel.<br />

São effeitos naturaes:<br />

O direito de opção,<br />

O direito ao laudemio,<br />

A indivisibilidade, etc. Vej. Mello, 3, 11, § 3, Lobão, TMreit. Emphyt.<br />

§ 8.<br />

(96) Ord. 2, 35, § 7; 4, 38 § 4, Mello, 3, 11 § 3 e nota, Lobão 7. Assim<br />

pôde o senhorio renunciar o direito de opção, o laudemio, a indivisibilidade.<br />

(97) Antes da lei n. 1.237, era necessária a tradição: Muhlenbruch, § 297,<br />

n. 5, Makeidey, § 333, Silva ad. Ord. 4, 1, rubric, art. 1, n. 1 a 11, Mello<br />

3, 11. § I o not. Lobão, § 63. Em contraiio, Maynz § 236, not. 4. A antiga<br />

doctrina da nossa jurisprudência acerca deste ponto é a que ensina Mello<br />

e Lobão.<br />

(98) L. n. 1.237, de 24 de Setembro de 1854, art. 6, '§ 2, Décret, n. 3.453,<br />

de 26 de Abril de 1865, art. 261 e 264. "Vej. C. C. Port. art. 1670.<br />

(99) Ord. 1, 62, § 45, 46 e 48, Lob. Direit. Emphyt. § 32, Rocha,<br />

Nota Y.


310 DIRSÎTO<br />

Estas diligencias se processão perante o juiz da provedoria<br />

(100),<br />

2. Se o immovel pertence a ordens regulares, é mister<br />

licença do governo (101) e deliberação do prelado e seu capitulo<br />

(102).<br />

3. As emphyteuses de bens das igrejas, cabidos e seminários<br />

são concedidas pelo bispo, com voto do cabido (103).<br />

As emphyteuses ecclesiasticas se devem constituir por<br />

escriptura publica, sob pena oe nullidade (KM). Por costume<br />

também se celebrao por escriptura publica as dos estabelecimentos<br />

pios (105).<br />

4. Os aforamentos dos immoveis do conselho se fazem<br />

por deliberação da câmara municipal a que pertencem, mediante<br />

autorisação ou confirmação das assernbléas provinciaes (106).<br />

(100) Ord. cit., Rocha cit. Not. Y.<br />

(101) Lei de 9 de Dezembro de 1S30, art. unie. Décret, n. 665. de 28 de<br />

Novembro de 1849.<br />

(102) Lobão, Direit. Emphyt. § 2'6 e 29, Rocha. Not. Y. Monte Direit.<br />

Ecc!. Braz., § 1.209.<br />

As ordens regulares têm as suas leis orgânicas ou estatutos, nos quaes<br />

vem definida a sua personalidade com seus direitos e obrigações. As alienações<br />

e emphyteuticações dos bens a ellas pertencentes devem ser feitas<br />

de conformidade com as prescripções dessas leis, sob pena de nullidade. Mello,<br />

3,11, § 28, Lobão, § 26.<br />

A concessão de emphyteuse em bens das ordens .regulares e das igrejas<br />

se fazia antigamente por editaes e em leilão publico diante do juizo ecclesiastico.<br />

Lobão. Direit .Dominic, § 160. A jurisdicção ecclesiastica se acha<br />

hoje reduzida ao espiritual e a legislação vigente não estabeleceu nenhuma<br />

providencia a respeito, salvo a dependência de licença do governo quanto ás<br />

emphyteuses em bens das ordens regulares. Vej. § 142 acima.<br />

(10$) Lobão Direit. Emphyt. § 29. Not. in fine; Direit. Dominic. § 161<br />

e seg. Monte, Direit. Eccl. Braz., § 1,209 Vej. o Aiv. n. 85 de 28 de<br />

Março de 1854.<br />

Os immoveis pertencentes ás igrejas parochiaes, que não são necessários<br />

para habitação dos parochos, podem ser aforados com licença do bispo, sem<br />

necessidade de indulto apostólico. Lobão, § 27, D. Port. Ill, art. 913.<br />

Vej. Monte § 1,209.<br />

(104) Ord. 4, 19 pr., Mello, 3, 11, § 28, Lob. § 65.<br />

(105) Vaíasc. J. Emphyt. Quest. 7.<br />

(106) Lei de 1 de Outubro de 1828, art. 42, Vej. § 142 acima. O Avis,<br />

de 29 de Março de 1830 declarou que, para o aforamento de bens do conselho,<br />

não requer edital e praça, formalidades somente exigidas para a venda<br />

e arrendamento.


DAS COUSÂS 311<br />

5. As concessões que o Estado faz de terrenos de marinha<br />

e outros, por aforarnento (107), estão sujeitas a um processo<br />

administrativo especial marcado nos regulamentos do<br />

governo (108).<br />

6. A constituição de emphyteuses por particulares não<br />

é subordinada a formalidades peculiares. O contractu, não excedendo<br />

o valor do dominio util á taxa da lei, pôde ser provado até<br />

por testemunhas. (109). Todavia é de bom conselho reduzil-o<br />

sempre á escriptura publica (110).<br />

§ 145. —Por testamento.<br />

E' licito ao testador deixar a um o dominio directo e a<br />

outro o dominio util (,111). Neste caso a emphyteuse é constituída<br />

por testamento, e tem por titulo a respectiva verba testamentaria.<br />

A emphyteuse legada em testamento se transfere para o<br />

adquirente por força da propria verba, independentemente de<br />

tradição (112).<br />

(107) Vej. Vej. § 142, acima.<br />

(108) Instrucc. de 14 de CSTovemb. de 1832, e Décret, n. 4.105, de 22 de.<br />

Fever, de 1868. Dr. P. Malheiro, Manual do Pracurador dos feit. '§ 307 e<br />

seg. As emphyteuses que o Estado condece em terrenos de marinha e outros,<br />

entrão depois de constituídas, para o Direito Civil, e são por elle regidas:<br />

o processo da concessão pertence ao Direito Administrativo.<br />

(109) Ord. 3, 59 pr. Mello. 3, 11 § 11, Lobão, Emphyt. § 66, Huber,<br />

Prœlect. II, 6, 3 n. 6.<br />

(110) Valasc. Jus. Emphyt. Q. 7, n. 2.<br />

(111) C. 1 C. de jur. emphyt. 4,66; Mello 3, 11, § 11, Lob. Direit. Emphyt.<br />

11. Vej. a Ord., 4,37 § 8.<br />

(112) Vej. acima § 44. Não ha necessidade de transcripção do testamento.<br />

Lei n. 1.237, de 24 de Setembro de 1864, art. 6, § 5, D. n. 3.433,<br />

de 25 de Abril de 1865, art. 264.<br />

(113) Mühlenbruch, § 297, n. 3, Lobão, Direit. Emphyt., § 116 e seguintes.<br />

Rocha, § 539. C. C. Port. art. 1.686.<br />

Este modo de adquirir a emphyteuse era desconhecido do Direito Romano.<br />

Póde-se, talvez, affirmar que o systema do Direito Romano o condemnava.<br />

(Vej. ir. 12, s 2 D. de Publician in rem action. 6,2). Na verdade,<br />

segundo ar-uelle Direito, a idea de quasi-posse não se applicava á emphyteuse<br />

; nem disso havia necessidade pratica, porque o emphyteuta tinha a posse<br />

jurídica da propria cousa.<br />

Este rigorismo foi abandonado pelo Direito moderno. Com effeito, os


312 DIREITO<br />

§ 146. — Por prescripção acqnisitiva.<br />

1. A emphyteuse também se adquire por prescripção(113) :<br />

o que pôde occorrer por um dos três modos seguintes :<br />

a) Quando o individuo, que não é dono do immovel, o<br />

afora a um terceiro (114). Neste caso o terceiro, exercendo o domínio<br />

util, em boa fé, por dez e vinte annos, adquire a emphyteuse,<br />

ainda contra o verdadeiro dono (115).<br />

b) Quando alguém, que está na posse de um immovel, sem<br />

titulo de emphyteuse, o possue todavia como emphyteuta, e<br />

paga pensão ao dono (116).<br />

c) Quando o verdadeiro dono do immovel, ou por ignorar<br />

o seu domínio, ou por qualquer outro motivo nelle se conserva,<br />

e paga, como emphyteuta, pensão á outrem que toma<br />

como senhorio (117).<br />

Nesta hypothèse o supposto senhor adquire o domínio directo,<br />

e o verdadeiro dono se converte em emphyteuta.<br />

2. Para a acquisição da emphyteuse por prescripção se<br />

requer :<br />

Quasi-posse (exercício) dos direitos de emphyteuta, por<br />

direitos de que se compõe a emphyteuse, são na realidade tão susceptíveis de<br />

quasi-posse (base de prescripção) como os de servidão, os do usofructo. Não<br />

havia, pois, obstáculo para applicar a prescripção acquisitiva ã emphyteuse.<br />

(114) Mühlenbruch § 297, Makeldey, § 333, n. 2, Lobão, Direit. Emphyt.<br />

§ 116.<br />

(llõ)Dob. cit. § 116, Direit. Dominicaes, § 149. Se o supposto dono que<br />

deu o immovel por aforamento está em má fé, nunca poderá prescrever o<br />

mesmo immovel contra o verdadeiro proprietário; mas a má fé delle em nada<br />

prejudicará o emphyteuta, que poderá consummar a sua prescripção do domínio<br />

util, a qual, uma vez eonsummada, prevalecerá contra o verdadeiro<br />

dono.<br />

(116) Voet. Pandect. 6, 3, n. 4.<br />

(117) Mühlenbruch, § 297; Maynz § 236, nota 5; Lobão, Direit. Dominicaes,<br />

§ 150. A. hypothèse a que alludimos póde-se verificar por ignorância<br />

do verdadeiro dono, como se o immovel que está possuindo como emphyteuta,<br />

pertencesse á herança, que lhe foi deixada ou em que suecedeu. Pode<br />

também acontecer que o vendedor do immovt-1 estipule ficar com o domínio<br />

util, passando o domínio directo para o comprador. (Dob. D. Empheyt.<br />

§ 101). Supponha-se que neste caso a venda é nulla por algum vicio substancial,<br />

mas que se passão trinta annos: a emphyteuse fica legalmente constituída,<br />

são pela compra e venda, que era nulla, mas pela prescripção.


DAS COUSÁS 313<br />

dez annos entre presentes, vinte entre ausentes, boa fé e justo<br />

titulo (118).<br />

Na falta de justo titulo, a prescripção só se consumma<br />

ao cabo de trinta annos (119).<br />

§ 147. — Direitos do emphyteuta.<br />

Ao emphyteuta competem, em substancia, os direitos seguintes<br />

:<br />

1. De gozar da cousa da maneira a mais ampla (120), a<br />

saber :<br />

a) de perceber-lhe todos os fructos e productos (121) ;<br />

b) e de aproveital-a em todos os misteres a que por sua<br />

natureza se presta (122).<br />

2. De dispor do immovel, isto é : de praticar nelle as<br />

transformações e mudanças que forem necessárias ou úteis, sem<br />

todavia lhe deteriorar a substancia (123).<br />

3. De transferir a outrem o dominio util por successão<br />

(124), ou por actos entre vivos (125). A transmissão por actos<br />

entre vivos depende de audiência do senhorio (126).<br />

4. De constituir na cousa aforada servidões, usofructos<br />

(118) Makeldey, $ 333, Lobão. Direit, Emphyt., § 116 e 117.<br />

(119) Lobão, cit. § 117. Vej. acima § 70. Importa que o prescribente<br />

pague a pensão, como o fazia o verdadeiro emphyteuta. A circumstancia de<br />

ter deixado passar um ou mais annos sem pagal-a nada influe na prescripção,<br />

se as pensões correspondentes a esses annos forem posteriormente pagas<br />

e acceitas.<br />

(120) Hubert. P., 6, 3. n. 3. Mühlenbruch, § 295, Mello, 3, 11 § 12:<br />

C. C. Port. art. 1.673.<br />

(121) Vej. § 139.<br />

(122) Vej. cit. § 139.<br />

(123) Novell. 7 c. 3 § 2. Novell. 120 c. 8, Authent. Qui rem.<br />

C. de sacrosantet. Ecoles. 1, 2. (D. Port. Œil, art. 991. Esta é a verdadeira<br />

doctrina expressamente consagrada nos textos citados. Alguns dos nossos<br />

escriptores, equiparando erradamente o emphyteuta ao usofruetuario, lhe<br />

negão o direito de alterar e mudar a fôrma e o estado da cousa aforada,<br />

Vej. Lob. Direit. Emphyt. § 621, 622 e 623.<br />

(124) § 3 I. de locat. 3,24, Ord. 4, 96 § 23 e 24. Mello 3, 11 § 12.<br />

(125) § 3 I. cit. C. 3, C, de jur. emphyt. 4,66; Ord. 4, 38 pr.<br />

(126) Vej. § 149 adiante.


314<br />

DIREITO<br />

(127) e hypothecas (128) Estes onus reaes cessão com a extincçào<br />

da emphyteuse, e o immovel, operada a consolidação, volta<br />

livre para o poder do senhorio directo (128).<br />

5. De reter sob posse júri die ? o immovel. (129). Por virtude<br />

desta posse o emphyteuta adquire os fruetos pela simples separação<br />

(131).<br />

6. De sub-empbyteuticar o prazo (1.32).<br />

7. De invocar e exercer as acções reaes e as possessorias<br />

que forem competentes para vindicar e proteger o dominio util<br />

e a posse da cotisa aforada (133;.<br />

Ficão sujeitas á emphyteuse, nos mesmos termos que o<br />

immovel, as accessões supervenientes (134).<br />

(127) Fr. 1 pr. in fine. D. quib. mod. usofruet. amit. 8, 4, Mülenbruch,<br />

§ 295, Barb. ad. Ord. 4,38 pr. n. 25 e 26, Mello 3, 11 § 17 n. 10, Lobão<br />

Direit. Emphyt. § 843.<br />

(128) Lei n. 1.237, de 24 de Set. de 1864, art. 2 § 1.°, Décret, n. 3.453,<br />

de 26 de Abril de 1865, art. 138, § 3. O C. C. Port. (art. 1.676) permitte<br />

ao foreiro hypothecar o prédio e onerai-o com servidões "comtanto que a<br />

hypotheca ou o onus não abranja a parte do valor do prédio que corresponde<br />

ao foro e mais um quinto." Não atinamos com o alcance da restricção.<br />

Excutido o prazo, o dominio util passa para o arrematante, sem prejuízo do<br />

dominio directo, que continua em quem d'antes o tinha: para que, pois, a<br />

alludida restricção?<br />

(129) Fr. 31 D. de pignorib. 20. 1; Muhlenbruch, § 257, not. 9 e<br />

§ 295, not. 8, Barboza ad Ord. 4,38 pr. n. Arouca, Allegat. n. 38, n. 39,<br />

D. Port. Ill, § art. 994 e 995.<br />

(130) Savigny, Pon., § 9 n. V, Mello 3, 11 § 12. Nota seguinte:<br />

(131) Fr.15 § 1.° D. satisd. cog. 2, 8; fr. 25. § 1.°. D. de usur. 22, 1:<br />

Ad. bonœ fidei autem possessorem pertineant, quoque modo â solo separati<br />

fuerint: sicut ejus qui vicligalem fundum habet, fructus fiunt simul atque<br />

a solo separati.<br />

(132) Mello, 3,11 § 12. (Vej. § 158, C.) adiante<br />

(133) Vej. o cit. § 158.<br />

(134) Makeldey § 391, A., fr. 10 § 1.", fr. 32 D. de jur. dot. 23,3, Lob.<br />

§ 580. Voet. 6. 3, n. 11.<br />

E' prohibido aos foreiros de terrenos de marinha e dos reservados para<br />

servidão publica nas margens dos rios navegáveis, fazer obra ou uso exclusivo do<br />

terreno que por qualquer fôrma lhes acerescer. Ord. n. 42, de 3 de Fev,<br />

de 1852, Av. n. 379, de 7 de Dezembro de 1855, e Décret, n. 4.105, de 22 de<br />

Fever, de 1868, art. I o e § 3, art. 2 e §§.<br />

A doctrina a respeito é a que fica expendida no texto. Mas nem o governo,<br />

nem qualquer particular está inhibido do excluir das emphyteuses, que<br />

constituem, os terrenos acerescidos.


DAS COUSAS 3l5<br />

§ 148.—Obrigações do emphyteuta. Pagar a pensão.<br />

1. E' da essência da emphyteuse a obrigação, que incumbe<br />

ao emphyteuta, de pagar ao proprietário a yaisào, canon ou<br />

foro annual (135).<br />

Consiste a pensão em quantia certa de dinheiro (136). E'<br />

todavia licito estipulai-a em fructos para os prédios destinados á<br />

cultura (137). Deve ser pag-a, independentemente de exig-encia do<br />

senhorio, no dia em que se vence (138). Incorre o emphyteuta<br />

em commisso, se deixa de pagrai-a por três annos consecutivos,<br />

sendo a emphyteuse secular ( 139 ), por dous, se ecclesiastica<br />

(140).<br />

A pensão não representa o preço dos fructos e vantagens<br />

que o emphyteuta deduz da cousa aforada. Na verdade, só se<br />

aforão terrenos incultos e chãos desnudados de edifícios (141).<br />

Os fructos, e os rendimentos que produzem os bens depois de<br />

aforados, não são portanto senão o resultado do empreg-o do<br />

trabalho e capitães do emphyteuta. (142) Pôra, pois, iniquo forçal-o<br />

a retribuir a outrem emolumentos e vantag-ens que são o<br />

producto da sua actividade.<br />

Outro 6 o destino da pensão: — tem ella por fim compensar<br />

a cessão do immovel para ser aproveitado pelo emphyteuta<br />

(135) § 3 I. de locat. 3. 24, C. 2 C. de jur. omphyt. 4. 66; Ord. 4<br />

39 pr.<br />

(136) Consolid. das L. Civis, art. 614, § I o nota. Tal ê o costume entre<br />

nós. Quem quizer conhecer os usos antigos de Portugal a este respeite<br />

veja Lob. Direit. "Emphyt. § 649 e seguintes.<br />

(137) Ord. 4, 39 pr. A Ord. 4. 40 prohibia que se estipulassem pensões<br />

em fructos nas emphyteuses de casas ou de chãos para casas. Para estas<br />

emphyteuses só erão admittidas pensões em dinheiro ou aves.<br />

(138) C. 2, C. de jur. emphyt. 4, 66, Lobão, Direit. Emphyt. § 725<br />

Rocha § 544.<br />

(139) Ord. 4, 39 pr. e 8 I o . Segundo o C. Civil Port. (art. 1.671) a falta<br />

de pagamento da pensão não induz a pena de commisso.<br />

(140) Ord. 4, 39 § 2.<br />

141) Vej. acima § 139 e Lobão. D. Emphyt. § 746 not.<br />

(142) Vej. o Preamb. da lei de 4 de Julho de 1776, e § 141 acima.


316 DIREITO<br />

(143), e firmar de uma maneira sensível e incessante o reconhecimento<br />

do domínio do senhorio (144).<br />

Este ponto de doutrina é importante por suas conseqüências<br />

praticas. Delle com effeito derivão os corollarios seguintes:<br />

I o . A pensão é sempre módica (145).<br />

2 o . Não pôde ser qualificada de lesiva, por não corresponder<br />

aos rendimentos do prédio (146).<br />

(143) A terra, o trabalho, o capital são como é sabido, os três agentes<br />

da producção da riqueza. Os economistas estão em geral, de accôrdo sobre<br />

a retribuição que é devida ao trabalho (salário) e ao capital (interesse) ;<br />

mas controvertem ainda se á cooperação da terra corresponde uma renda, e<br />

qual ella seja. O systhema de Ricardo, exposto com talento superior nas lições<br />

de Rossi, é engenhoso; mas exprimirá elle a verdade?<br />

Seja como fôr: a terra é sempre um agente indispensável para a producção<br />

da riqueza; e a pensão na emphyteuse corresponde ao preço da cessão,<br />

que o proprietário do terreno inculto faz do direito de cultival-o e tirar<br />

delle todo o 'proveito. Foi este o primitivo fundamento da pensão. Vej.<br />

§ 137 acima. Nam licet, pensio constituatur principaliter pro recognitione dominii,<br />

non tamen desinit haberi ratio in vim merceãis, licet minus principaliter.<br />

Repert. das Ord. 3, pag. 350, nota (a).<br />

(144) Perez, C. jur. emphyt., n. 13, Voet. Pandect. 6, 3. n. 8, Mello. 3.<br />

11, § 13, Alvar, de 26 de Julho de 1813: "Sem mais foro do que um<br />

módico reconhecimento por um morador... para o senhorio do terreno." Ordem<br />

de 20 de Maio e Circular de 20 de Agosto de 1835. O reconhecimento, significado<br />

pelo foro, repetido annualmente, obsta que o dominio directo venha<br />

a ser prescripto.<br />

A idéa de que — o foro se paga em reconhecimento do senhorio directo<br />

— é um resultado do systhema dos antigos jurisconsultes, que por argumento<br />

de analogia appücavão á emphyteuse o Direito dos feudos. A dita idéa foi<br />

afinal expressamente acolhida pela lei.<br />

(145) Lei de 4 de Julho de 1776 pr. e § I o , Alv. de 26 de Julho de 1813,<br />

Ag. Barb. C. de -rescind, vend., n. 32, D. Port. Ill, "art. 933.<br />

A taxa da pensão pôde variar, como o presupõe o Alv. de 15 de Julho<br />

de 1779, § 3, segundo os usos e costumes do lugar (Lobão, D. Emphyt.<br />

§ 1.038) ; mas não pôde ser calculada em ordem a corresponder aos rendimentos<br />

do prédio cultivado ou melhorado com bemfeitorias; porquanto se a pensão<br />

corresponde aos rendimentos nos termos ditos, a emphyteuse perde a sua<br />

natureza e degenera em locação: cit. Dei de 4 de Julho de 1776 pr. e § I o .<br />

Lobão, Direito Emphyt.. § 746 e 747.<br />

(146) Lei de 4 de Julho de 1776, Lob. cit. § 746 e 747. Na verdade, se<br />

o fro não 'representa as rendas do prazo, cultivado ou melhorado, cemo<br />

acima se observa, é manifesto que não se pôde tomar como base para calcular<br />

a lesão o valor dessas rendas. A providencia contida na cit. Lei de


DÀS COUSAS 317<br />

3 o . Não está sujeita á remissão parcial ou total, nem por<br />

motivo de esterilidade, nem por estrag-o ou ruina de colheitas,<br />

proveniente de incêndio, inundação, incursão de inimigos, ou de<br />

qualquer outro caso de força maior (147).<br />

Resta observar que a pensão é uma responsabilidade pessoal<br />

âo emphyteuta, e não um onus inhérente á cousa aforada.<br />

(148).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 687 — O foreiro não tem direito á remissão rio foro, por esterilidade,<br />

ou destruição parcial ão prédio emphyteutico, nem pela perda total de seun<br />

4 de Julho de 1776 teve por fim, como se disse em outro lugar, cortar os<br />

abusos a que dava lugar a confusão de uma e de outra cousa.<br />

A pensão pôde, sem duvida, ser lesiva, mas considerada em si mesma<br />

e em comparação com a taxa usada rio lugar. Neste sentido deve ser entendida<br />

a Ord. 4, 13. § 6. Vej. Silva ad Ord. cit., n. 8, Repert. 3, pag. 350,<br />

nota (a), Lobão. Emphyt. § 62, Direit. Dominic. § 72, D. Port. Ill, art. 932.<br />

As distincQões que niello (3. 11 § 13) e Lobão (D. Emphyt. § 748 e seguinte)<br />

fazem para permittir a remissão do fôro em certos casos, são inadmissiveis,<br />

depois que a emphyteuse foi restituida á sua primitiva simplicidade<br />

pela lei de 4 de Julho de 1776. A pensão não representa o preço das rendas<br />

do prédio aforado, como acontece na locação. Não pôde, portanto, estar subordinada<br />

á influencia de factos que só affectão as rendas. O que os ditos<br />

esoriptores e outros dizem acerca da remissão, só é applicavel aos emprazamentos<br />

que participão da natureza dos arrendamentos, e que pela nova lei<br />

não se podem qualificar emphy^-euses. Vej. Dig. P. III. arts. 934 e 935.<br />

(147) C. 1 C. de jur. emphyt. 4, 66, Voet. Pandect. 6,3, n. 19. Huber<br />

II, 6, 3, n. H 1 , D. P. Ill, art. 934 e 935. Em contrario o C. C. Port.,<br />

art. 1.688.<br />

148) Ortol. Com. ao § 3 I. de locat. 3,24, Mello, 3, 11 § 13.<br />

Pela legislação vigente não -compete hypotheca ao senhorio pelas<br />

pensões.<br />

A lei n. 1.237, de 24 de Set. de 164 e o D. n. 3.453, de 26 de Abril de 1865,<br />

art. 261, § 6, enumerão o fôro entre os onus reaes. Mas a palavra fôro ê<br />

ahi tomada na accepção de emphyteuse, de ãominio util, significação legal,<br />

como se vê entre outras, da Ord. 4. 36 pr. e § I o<br />

Do principio posto no nosso texto resulta que, aquelle a quem a emphyteuse<br />

é transferida, não está obrigado pelas pensões vencidas em época<br />

anterior ã transferencia. Mello, 3, 11 § 13.<br />

A lei de 20 de Junho de 1774, § 38 conferia hypotheca legal privilegiada<br />

ao senhorio directo nos fruetos do prazo para pagamento da pensão ou fôro.<br />

Este privilegio não tem hoje a natureza de hypotheca (§ 269 adiante) : dá<br />

simplesmente preferencia, mas sem o direito de sequela


318 DIREITO<br />

fructos; pôde, em taes casos, porém, abanãonal-o ao senhorio ãirecto, e, independentemente<br />

do seu consenso, fazer inscrever o acto da renuncia<br />

(artigo 691).<br />

§ 149. — Obrigação de pedir consentimento ao senhorio<br />

porá a alienação da eniphyteuse<br />

1. O emphyteuta não pôde alienar o domínio util, quer<br />

por titulo gratuito, quer por titulo oneroso, sem dar prévia denuncia<br />

ao senhorio (149).<br />

Tem a denuncia por fim scientificar o senhorio da alienação,<br />

para que elle possa:<br />

a ) exercer o direito de opção nos casos em que lhe compete<br />

este direito (150).<br />

b) dar ou negar o seu consentimento, isto é approvar, ou<br />

impugnar a pessoa do emphyteuta, se para isso occorrem motivos<br />

legítimos (151).<br />

A denuncia é ainda necessária para o senhorio haver o<br />

laudemio, e saber de quem tem de receber a pensão (152).<br />

2. E pois que a pensão é sempre devida por congenita<br />

com a eniphyteuse, deste principio resulta que a denuncia não<br />

(149) C. 3 C. de jur. Emphyt. 4, 66; Ord. 4, '38 pr.: O foreiro não<br />

poderá vender, escaimbar, nem alhear a cousa aforada Segundo o C. C.<br />

Port. art. 1.677, a falta de aviso ao senhorio não importa commisse mas<br />

só tem por effeito tornar o emphyteuta solidariamente responsável com o<br />

cessionário pelas prestações devidas.<br />

(Î50) Ord. 4, 38 pr "deverá primeiro notificarão senhorio, e requerel-o<br />

se a quer tanto pelo tanto." Lobão, Direit. Emphyt. § 817, nota.<br />

(151) Ord. 4, 38 pr. "E no caso que a quizer doar ou dotar..., todavia<br />

lh'o fará saber para ver se tem algum legitimo embargo."<br />

Do direito que tem o senhorio de approvar ou impugnar a pessoa do<br />

adquirente nasce o dizer-se que a alienação da emphyteuse depende do consentimento<br />

ou licença do senhorio. E na verdade a lei (Ord. 4, 38 pr.)<br />

dil-o expressamente: "o foreiro não poderá vender, escaimbar... sem consentimento<br />

ão senhorio." Mas a citada disposição não se entende em sentido<br />

absoluto. Se a impugnação da pessoa do adquirente é injusta, o consentimento<br />

será supprido pelo juiz; se é justa, a alienação não se faz á pessoa<br />

impugnada, mas se fará á outra, contra a qual não militera motivos legítimos.<br />

Assim que: a alienação, uma vez deliberada pelo emphyteuta, se ha<br />

de eonsummar afinal, sem embargo de opposição do senhorio. Vej. Peg.<br />

Tor. c. 9. Mello, 3, 11 § 15 nota, Lobão, Direit. Emphyt. § 39, n. 5 o .<br />

(152) Mello, 3, 11 § 16, Lobão, Direit. Emphyt. § 817, nota.


DÀS COUSÀS m<br />

pôde ser dispensada em caso nenhum de alienação, ainda naquelles<br />

em que cessa o direito de opção (153), ou em que o senhorio<br />

não pôde impugnar a pessoa do adquirente (145).<br />

3. Consiste a denuncia em um aviso communicado ao<br />

senhorio, com declaração expressa da natureza da alienação, das<br />

suas cláusulas, preço e nome do novo emphyteuta (155).<br />

O aviso ordinariamente se faz por via particular (156);<br />

mas se o senhorio não açode a elle, tem o emphyteuta o recurso<br />

da interpellação judicial (157).<br />

E, se interpellado por esta forma, deixa o senhorio passar<br />

o prazo legal (trinta dias) sem manifestar a sua deliberação<br />

fica livre ao emphyteuta consumar, sem mais dependência, a<br />

alienação (158).<br />

A. omissão da denuncia torna a alienação annullavel (159)<br />

e sujeita o emphyteuta á pena de commisso ( 160 ). Todavia é<br />

licito ao senhorio renunciar expressa ou tacitamente o direito de<br />

tornar effectivas as ditas sancções (161).<br />

§ 150. —Outras obrigações do emphyteuta.<br />

Incumbe ainda ao emphyteuta:<br />

I o . Conservar a substancia da cousa aforada, sob pena<br />

(153) Vej, § 152 adiante.<br />

(154) Tal ê o caso de desapropriação por utilidade publica. Vej. o citado<br />

§ 152.<br />

(155) Ord. 4, 38 pr. Lobão. Dirait. Emphyt. § 929.<br />

(156) Lobão, Direit. Emphyt. § 927. Costuma-se incorporar na escriptura<br />

de alienação o consentimento do senhorio.<br />

(157) Ord. 4. 38 pr. . .. "deve o primeiro notificar ao senhorio e requerei-<br />

o " Sobre a fôrma pratica, vej. Lobão, Direit. Emphyt. § #30.<br />

931 e 932.<br />

O consentimento do senhorio se pôde provar por testemunhas, por escripto<br />

particular e por confissão. Lobão, § 874.<br />

(158) Ord. 4, 38 pr. verb, "os quaes passados...<br />

(159) Ord. cit. § I o verb. "E sendo a venda. ..<br />

(160) Ortd. cit. § I o verb. "E o foreiro por esse mesmo feito<br />

perderá...<br />

(161) OTd. 4, 38, § I o , Mello, 3, 11 § 27, Lobão, Direit. Emphyt. § 875<br />

e 886. Rocha § 551.<br />

Dá-se o caso de renuncia tácita se, por exemplo, o senhorio posteriormente<br />

recebe o laudemio, Lobão, § 919.


320 DIREITO<br />

de commisso e de hidemnisação dos damnos causados üo caso<br />

de culpa (162).<br />

2.° Supportar os onus reaes inhérentes ao immovel, como<br />

as servidões e o usofructo preconstituidos (163J.<br />

3.° Pagar os impostos que gravão directamente o immovel<br />

aforado (164).<br />

4.° Soffrer os damnos parciaes que acontecem ao prazo,<br />

ainda que lhe diniinrão o valor (165).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 682 — E' obrigado o ewiphyteuta a satisfazer os impostos e os onus<br />

reaes que gravarem o immovel.<br />

§ 151 — Direitos do senhorio directo<br />

Os direitos do senhorio directo se podem classificar em<br />

duas catheg-orias:<br />

a ) Direitos dominicaes, que se não transferem ao empr^teuta<br />

(166);<br />

(162) Authent. Qui rem. C. de sacro savet. Eecl. 1, 2, Novell. 120, c. 8,<br />

Mühlenbruch § 2S6, ludb. Direit. Emphyt. § 5.87 e 619, D. Port. Ill, art.<br />

998. O emphyteuta 6 obrigado a fazer as bemfeitorias módicas, necessárias<br />

para a conservação do prazo. Valasc. Quest. 2'6, n. 4, Pinheiro, Disput. 3,<br />

Sect. 1, n. 13 e 14.<br />

O senhorio retém o seu direito á substancia da cousa, direito importante<br />

pela contingência da consolidação. Este direito ficaria anniquilado, se ao<br />

emphyteuta fosse licito destruir a cousa em sua substancia. Hoje que a<br />

emphyteuse só recahe em bens de raiz, são mui raros os casos de destruição.<br />

Todavia concebe-se que o solo N seja devorado pela corrente do rio, pelas<br />

águas pluviaes, por invasão do mar, por terremoto, etc.<br />

(163) Lobão, Direit. Emphyt. § 599. Tal é ainda o caso de legado da<br />

prestações ou alimentos expressamente consignados no immovel (Lei de<br />

24 de Set. art. 6 o ), que é posteriormente aforado.<br />

(164) C. 2 C. de jur. emphyt. 4. 66; Mello, 3, 11 § 12, C. C. Port. art.<br />

1.675. Exemplo: décima urbana.<br />

Nesta obrigação se inclue a de pagar certas fintas ou despezas lançadas<br />

em razão do prédio, como o onus, municipal de calçar o passeio da rua<br />

na testada da casa. Vej. Lobão. Direit. Emphyt. § 600, Mello, 3, 11 § 12.<br />

C. C. Port. cit. art. 1.675.<br />

(165) C. 1 C, de jur. emphyt. 4, 66, Mello, 3, 11 § 12, n. 8, Lobão,<br />

Direit. Emphyt. § 745.<br />

(166) Yej. § 139 acima.


DAS COÜSAS 321<br />

b ) Direitos que nascem do acto constitutivo da emphyteuse<br />

(167).<br />

A). Entre os direitos da primeira cathegoria figura como<br />

principal o direito á substancia da cousa; é elle que fôrma a es<br />

sencia do dominio directo ; é nelle que se vêm fundir os direitos<br />

que constituem a emphyteuse, quando se opera a consolidação<br />

(168).<br />

Deste direito derivão:<br />

1. O direito real sobre as cousas immoveis que por accessão<br />

adherem ao immovel aforado (169), como as ilhas que<br />

surgem de novo, o alveo que o rio abandona, os terrenos de alluvião,<br />

nos termos em outro lugar expostos (170).<br />

Não é preciso advertir que o direito do senhorio sobre as<br />

accessões conserva, emquanto subsiste a emphyteuse, a natureza<br />

de simples dominio directo (171).<br />

2. Direito á metade do Thesouro (172) achado no immovel<br />

(173). O thesouro não é fructo nem producto do immovel,<br />

senão cousa estranha a elle; mas, como por sua antigüidade não<br />

se lhe sabe dono a lei o attribue ao senhor do prédio, onde é<br />

descoberto, e ao inventor, por metade a cada um. O direito,<br />

portanto a uma parte do thesouro é inhérente á qualidade de<br />

proprietário; mas o senhorio directo retém em si essa qualidade;<br />

a elle deve pois pertencer a dita parte (174).<br />

3. Direito de consolidar no dominio directo outil, desde<br />

que occorre alguma das causas a que a lei dá aquelle effeito<br />

(175).<br />

Ao verificar-se a consolidação, o senhorio directo é obrigado<br />

a restituir ao emphyteuta o valor das bemfeitorias e me­<br />

de?) Vej. § 25 e o citado § 139.<br />

(1G8) Vej. § 25 acima.<br />

(Î69) Valasc. Jur. Emphyt. Q. 25, n. 20. Bagn. cap. 14, Lobão, Direit.<br />

Emphyt. § 590.<br />

(170) V-aj. § 38 e segr. acima.<br />

(171) Makeldey, § 331. Voet. Pandect. 6, 3, n. 11.<br />

(172) Vej. § 35 acima.<br />

(173) Mühlenbruch § 295, n. 2, Makeldey, § 331 A, Hub. Pand. 6; 3,<br />

n. 3. Naraur, § 18-7, V. Wetter, § 214. Em contrario. Voet. Pandect. 6, 3,<br />

11. Portug. de Donat. L. 3, cap. 13, n. 43, Lobão. Dissert. Appendie. § 17<br />

. (174) Vej. § 139 acima.<br />

(175) Vej. § 156 adiante.<br />

*


322 DIREITO<br />

lhoramentôs feitos no pra^o (176), salvo as módicas de consef.<br />

vação, e as que houvessem sido estipuladas no contractu (177).<br />

As corporações de mão­morta, realisada a consolidação,<br />

devem, dentro do termo de anno e dia, reemprazar o prédio,<br />

sob pena de commisso (178).<br />

§ 152.— Direito do senhorio directo. (Continuação).<br />

A seg­unda classe dos direitos do senhorio (§ antecedente)<br />

comprehende :<br />

1. O direito á pensão, foro ou canon(179)<br />

2. O direito de opção, preferencia ou prelação, no caso do<br />

emphyteuta querer alienar a emphyteuse, isto é : — o direito de<br />

excluir o comprador e ficar com a emphyteuse pelo preço offerecido,<br />

— tanto pelo tanto (180).<br />

O senhorio, denunciados a alienação, o preço e o nome<br />

do adquirente, é obrigado a declarar a sua deliberação dentro de<br />

trinta dias (181). Se deixa correr aquelle prazo sem fazer a opção,<br />

(176) Ord. 4, 97 § 23, Mello, 3, 11, § 19, Voet. Compendium, 6, 3, n. 10.<br />

(177) Mello cit., Lobão, Direit. Emphyt. § 611, 612 e 613, 604 e 1.122,<br />

Voet. Tandec. 6, 3, n. 52 c 53.<br />

'Se o augmento de valor trazido ao prazo pelas bemfeitorias é maior qu^<br />

o custo délias, pagão­se pelo custo; pelo valor do augmento, se esse augmento<br />

é inferior ao custo. Veja­se S 40 e 85 acima, Lobão, "D. Emphyt., § 1.127.<br />

(178) Lei de 4 de Julho de 1768 § 1.°: "Declaro por nullas, abusivas.<br />

e de nenhum effeito as consolidações d'um com outro domínio nos prazos<br />

pertencentes ás igrejas, ordens e mosteiros e quaesquer outros corpos de<br />

mão­morta, ou as mesmas consolidações se facão por devoluções, commissos,<br />

cpções, ou por qualquer outro modo". Alv. de 12 de Maio de 1769;<br />

§ 4: "Hei por bem declarar, que em todos os casos em que os prazos por<br />

regra geral se podem consolidar com o domínio directo... possão os ditos<br />

corpos de mão­morta consolidar somente para o effeito de ■tornarem ­a emprazar<br />

dentro do anno e dia á pessoas seculares, com pena de devolução á<br />

minha Corca § Vej. B. Cam. L. 1, § 306, n. 16.<br />

(179) § 3 I. de locat. 3,24; Ord. 4, 39.<br />

(180) C. 3 C. de jur. emphyt. 4, 66, Ord.4, 38 pr... "e querendo­a o<br />

senhorio por o tanto, havel­a­ha e não outrent."<br />

(181) Ord. 4, 38 pr... será esperado trinta dias do que fôr requerido.<br />

Por Direito Romano, dous mozes. Cit. C. 3 C. de jur. emphyt.<br />

*


DAS COUSAS 323<br />

ou, se a tendo feito, não exhibe o preço : pôde o eniphyteuta<br />

livremente consummar a alienação (182).<br />

São sujeitos ao direito de opção do senhorio todos os actos<br />

que importão alienação da emphyteuse, ou se trate de alienação<br />

voluntária (183) como a venda, a dação em pagamento (184), a<br />

renuncia (185), a transacção (1SG), ou da alienação feita por decreto<br />

judicial (187).<br />

Todavia, por incompativel com a natureza da alienação,<br />

o direito de opção cessa nos casos :<br />

a) De doação (188) ;<br />

b) De dote estimado ou inestimado (189) ;<br />

c) De troca, salvo por cousa fungível (190) ;<br />

(182) Orei. 4. 38 pr. ... "Os quaes passados (trinta dias) e não declarando<br />

se a quer, então a poderá vender ou escaimbar sem mais esperar<br />

pela resposta ou pagamento do preço... "E não lhe pagando o preço dentro<br />

dos trinta dias, posto que dentro délies declare que a quer, o foreiro a poderá<br />

vender a quem quizer." Lobão, Direit. Emphyt. § 938. C. C. Port,<br />

art. 1.678. Este código dá ao foreiro o direito de preferencia no caso do<br />

senhorio querer vender o domínio directe Cit. art. § 1.<br />

(183) Ord. 4, 38 pr.<br />

(184) Lobão Direit Emphyt. § 816, D. Port. Ill, art. 958.<br />

(1S5) Barboza, ad. Ord. 4, 38 pr. 18.<br />

(186) Barboza, ad. Ord. cit.n. 16; Lobão, Direito Emphyt. § 851. O<br />

consentimento do senhorio só é necessário quando pela transacção o eniphyteuta<br />

demitte de si o prazo.<br />

(187) Ord. 3, 93 § uit., 4, 38 pr.... "mas também na necessária que<br />

se faz por mandado e autoridade da justiça"'. Neste caso a denuncia ao senhorio<br />

se faz depois da arrematação ou adjudicação, e antes de assignada a<br />

respectiva carta. Silv. Ord. 3, 93 § 3, n. 32 e 34. Lob. Direit. Emphyt.<br />

§ 829, Dir. Port. III. art. 957, C. C. Port. art. 1.682 e 1.683.<br />

(188) Ord. 4, 38 pr.... "e no caso que a quizer doar ou dotar." Mello,<br />

3. 11 § 16 Lobão, Direit. Emphyt., § 910.<br />

(189) Ord. cit. Os nossos velhos escriptores sustentavão que se o dote<br />

de prazo era estimado, por valer venda ficava sobordinado ao direito de opção<br />

(Barb. Ord. 4. 38 pr. n. 58). E' erro: estimado ou inestimado, o dote é sempre<br />

uma doação em favor da mulher. Se fòr estimado, e o marido o quizer<br />

vender, pedirá para essa venda o consentimento.<br />

(190) Mello, 3, 11, § 18 not. in fine. Lobão 904. Na troca do prazo po


.324 ÍDlfcÊlYO<br />

d) De desapropriação por utilidade publica (191) ;<br />

e) De divisão do prazo entre os compartes ou a divisão se<br />

faça por glebas, ou encabeçando-se em um (192).<br />

A lei neg"a ás corporações de mão-morta o direito de opção:<br />

é este um coroilario do principio que lhes veda o consolidarem o<br />

dominio util (193).<br />

3. O direito de approvar ou impugnar a pessoa do novo<br />

emphyteuta (194).<br />

O senhorio, se não quer o prazo para si, ou se a alienação<br />

é daquellas que excluem o direito de opção, pôde recusar o<br />

adquirente, occorreudo motivos legítimos (195).<br />

São motivos legítimos para a recusa todos que difficultão,<br />

e embaração a cobrança da pensão, como a pobreza do novo<br />

adquirente, a qualidade de poderoso, de pessoa privilegiada, o<br />

vicio notório de má fé, a residência em lugar afastado ou em<br />

paiz estrangeiro (196).<br />

O direito de impugnar a pessoa do novo emphyteuta<br />

deve ser exercido dentro do mesmo prazo concedido para a opção,<br />

e sob a mesma pena (197).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 683 — O emphyteuta, ou foreiro, não pôde vender nem dar em. pagamento<br />

o dominio util, sem prévio aviso ao senhorio directo, para que esfa<br />

exerça o direito de opção; e o senhorio directo tem trinta dias para declarar,<br />

(191) Mello, 3 11, § 14. Direit. Emphyt. § 896, C. C. Port. art. 1 G78,<br />

paragrapho 3.<br />

(192) Ord. 4. 36 § I o . Ord. 4, 96 § 23 e 24, Lobão, Direit. Emphyt.<br />

Kocha, §^550.<br />

(193)* Lei de 4 de Julho de 1768, § 1°., Alv. de 12 de Maio de 1768. § 4.<br />

A cit. Lei de 4 de Julho de 1769 § 5" permitte aos indivíduos que formão o<br />

corpo do clero secular optar para si os prazos pertencentes á corporação de<br />

mão-morta de que fazem parte, como por exemplo, os membros do cabido.<br />

(194) Ord. 4, 3S pr.... "E todavia hVo fará saber para ver se tem algum<br />

legitimo embargo." Barb, á cit. Ord. n. 48, Mello, 3, 11 § 16.<br />

(195) Se a. impugnação não se funda em causa legitima é julgada improcedente,<br />

e o consentimento supprido pelo juiz. Barb. loc. cit. n. 50,<br />

Lobão, Direit. Emphyt. § 933.<br />

(196) Ord. 4, 38 pr.... '-deve ser vendido a qu&m livremente pague o<br />

foro ao senhorio." Barb, á cit. Ord. n. 48. Peg. Forens. 2 cap. 9, n 64 e<br />

seg. Lobão, Direit. Emphyt. § 935.<br />

(197) Ord. 4, 38 pr. Lobão, § 933.


ÎDÂ.S COÜSAS<br />

por èscrlptò, datado e assignaâo, que quer a preferencia na alienação, pelo<br />

mesmo preço e nas -mesmas condições. — 685, 686, 688, 689<br />

Se dentro do prazo indicado, não responder ou não offereoer o preço da,<br />

alienação, poderá o foreiro effectual-a com quem entender.<br />

Art. 684 — Compete igualmente ao foreiro o direito de preferencia, no<br />

caso ãe querer o senhorio vender o domínio ãirecto ou áal-o em pagamento.<br />

Para este effeito, ficará o dito senhorio sujeito á mesma obrigação imposta,<br />

em semelhantes circumstancias, ao foreiro.<br />

Art. 685 — Se o emphyteuta não cumprir o disposto no art. 683, poderá<br />

o senhorio dirccto usar, não obstante, ãe seu direito de preferencia, havendo<br />

do adquirente o prédio pelo preço ãa acquisição.<br />

Art. 688 — E' licito ao emphyteuta âoar, ãar em ã-ote, ou trocar por<br />

cousa não fungível o prédio aforado, avisando o senhorio ãirecto, dentro em<br />

sessenta dias, contados do aclo ãa transmissão, sob pena ãe continuar responsável<br />

pelo pagamento do foro. — 683.<br />

Art. 68'9 — Fazendo-se penhora, por divida do emphyteuta, sobre o prédio<br />

em-prazado, será citadb o senhorio director para assistir á praça, e terá 1<br />

preferencia, quer, no caso de arrematação, sobre os demais lançaáores em condições<br />

iguaes, quer, em falta dettes, no caso ãe adjudicação.<br />

Art. 690 — Quando o prédio emprazado vier a pertencer a varias pessoas,<br />

estas, dentro em seis mezes, elegerão um cabecel, sob pena ãe se devolver ao<br />

senhorio o direito ãa escolha.<br />

§ I o — Feita a escolha, todas as acções do senhorio contra os foreiros serão<br />

propostas contra o cabecel, salvo a este o direito regressivo contra os outros<br />

pelas respectivas quotas.<br />

§2° — agos de suas dividas.<br />

/06,687.<br />

§ 153. — Continuação : direito ao laudemio.<br />

O senhorio tem direito a haver dous e meio por cento do<br />

preço, pelo qual a emphyteuse é alienada (198).<br />

1. Esta porcentagem, conhecida sob o nome de—laudemio<br />

(198) Ord. 1. 62 § 48; 4, 38. Os laudemios dos terrenos de marinhas e<br />

de outros aforados pelo- Estado são devidos á fazenda nacional (officio de<br />

?. de Abril de 18-35, Lei n. 60,de 20 de Out de 1'838, art. 9 § 37) : o dos terrenos<br />

de marinha da corte á câmara municipal (Lei de 20 de Out. de 1838,<br />

cit. art. 9 § 37, Poit. de 25 de Agosto de 1839).<br />

325


326 DIREITO<br />

— (199) tem por fim compensar ao senhorio a desistência do<br />

direito de tomar o dominio util tanto pelo tanto (200).<br />

D'ahi resulta que o laudemio só é devido das alienações<br />

que dependem da opção (201), e não daquelles que a excluem<br />

(202). Todavia, por excepçao, é exigivel da desapropriação por<br />

utilidade publica (203), e da troca por cousa não fungível (204),<br />

supposto nestes dous casos não seja admissivel a preferencia do<br />

senhorio.<br />

2. Para que o senhorio possa haver o laudenio se requerem<br />

as condições seguintes :<br />

I o . Validade da alienação (205).<br />

2.° Tradição do prazo ao novo emphyteuta (206).<br />

3.° Implemento da condição de que porventura pende a<br />

(199) Sobre a origem da palavra — laudemio — vej. Mello, 3, 11 § 17<br />

nota, e Lobão, § 997 e seg.<br />

Também se designa o laudemio pelas palavras — quarentena, quaãragesima,<br />

pois que o laudemio vem a ser 1 por 40 -— o que eqüivale a dous e<br />

meio por cento.<br />

(200) Mello, 3, 11 § 17, Rocha, § 552. Dizem alguns escriptores que o<br />

laudemio é destinado a retribuir, não propriamente a desistência da opção,<br />

mas a approvação da pessoa do novo emphyteuta. Este modo de vêr é incorrecte).<br />

Na doação, no dote, ha approvação da pessoa do novo emphyteuta<br />

(Ord. 4 38 pr.) ; no emtanto nestes casos não é devido o laudemio.<br />

(201) Vej. § 152 acima. Na transacção só é devido o laudemio quando<br />

o emphyteuta demitte de si o prazo. Barb. Ord. 4, 38 pr. n. 59, Lobão<br />

* 1019.<br />

(202) Mello, 3, 11 § 17. Vej. § 152 acima.<br />

(203) Alv. de 13 de Dezemb. de 1788 § 11:... "depositar a importância<br />

assim do preço da adjudicação, como dos lauãemios que tocarem aos senhorios<br />

directos." E' este o uso entre nós.<br />

(204) Alv. de 20 de Agosto de 1774 § 1 e 2, Alv. n. 6, de 25 de Junho<br />

de 1850, Lob. § 1014. Declara o cit. Aviso que pela troca de terrenos de<br />

marinha foreiros por terrenos da mesma natureza se deve pagar laudemio<br />

de ambos, ou tenhão igual valor, ou um valha mais do que o outro.<br />

Desta intelligencia dada a Ord. 4, 38 pr., se induz que o laudemio é devido de<br />

troca do prazo, ainda por causa não fungível.<br />

(205) Lobão, § 1001 e 1008.<br />

(,206) Barb. ad. Ord. 4, 38 pr. n. 59, Mello, 3, 11 § 17, n. 9, Lob. Direit.<br />

Emphyt. § 1001.


DAS COUSÀS 327<br />

alienação (207). Se a condição é resolutiva, como na yenda a<br />

retro, o laudemio se pag-a desde logo (208).<br />

A obrigação de solvel-o incumbe ao vendedor (209).<br />

3. A sua importância é calculada sobre o preço total da<br />

alienação, sem desconto do valor dos melhoramentos, bemfeitorias<br />

e accessões (210).<br />

Nas trocas serve de base para calculal-o o valor da cousa<br />

pelo qual a emphyteuse é escaimbada (211).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. &86 — Sempre que se realizar a transferencia do domínio util, por<br />

venda ou daç-ão em pagamento, o senhorio ãirecto, .que não usar da opção,,<br />

terá direito de receber do aliénante o laudemio, que será de dois e aneio por 1<br />

cento sobre o preço da alienação, se outro não se tiver fincado no titulo<br />

ãe aforamento.<br />

§ 154.—Indivisibilidade do prazo<br />

1. A cousa aforada, divisivel por sua natureza, se torna<br />

por decreto da lei—juridicamente indivisível (212).<br />

(207) Barb, á cit. Ord. n. 7, Mello, loc. cit. § 17, 'Lob. Direit. Emphyt.<br />

§ 1005. Como no pacto da lei commissoria, na addictio in diem (Vej. Pothier,<br />

Vent., n. 386 e 446.<br />

(208) Barb, á cit. Ord. n. 58, Lob. § 1008. Mas se a venda se .resolve<br />

pelo acontecimento da condição, não é devido novo laudemio, quia non est<br />

nova venditio, sed prioris resolutio. Barb, á cit. Ord. n. 53, Mello, 3, 11 § 17,<br />

n. 4. Em contrario Voct. Pandect. 6, 3, n. 31.<br />

(209) Ord. 1, 62 § 48, 4, 3'8 pr. Mello, 3, 11 § 17. Décret, n. 656, ie<br />

5 de Dezemb. de 1849. Segundo o C. C. Port.art. 1693, § unie, a obrigação<br />

de pagar o laudemio é do adquirente.<br />

Se o domínio directo do prazo se acha incluido em legado de usofrueto,<br />

o laudemio deve ser pago ao usofruetuario. Barb. ad. Ord. 4, 38 pr. n. 60.<br />

(210) Décret, n. 467, de 23 de Agosto de 1846. Este decreto fixou a<br />

intelligencia da Ord. 4,38 pr. cortando as duvidas que a respeito suscitavão<br />

os antigos escriptores. Vej. Lobão, Direit. Emphyt. § 1041, e Appendice,<br />

Dissert. § 40 e seguinte. Nesta Dissert. Lobão mudou de opinião, sustentando<br />

que as bemfeitorias não devem ser computadas para o laudemio.<br />

(211) Lob. Direit. Emphyt. § 1014.<br />

(212) Ord. 4, 36 § 1.": "E porquanto o foro não ha de ser dividido entre<br />

muitos... Ord. 4, 96 § 23: E porque os taes bens, segundo a natureza<br />

dos foros, não se hão de partir e hão de andar em uma só pessoa." Alv.<br />

de 6 de Março de 16fr9 e de 29 de Maio de 1775 § 19. C. C. Port. art. 1.662.


328 DÏRBïTO<br />

Consiste a indivisibilidade do prazo em formar elle um todo<br />

único e integro, que não é licito partir em glebas, ou para distribuir<br />

entre compartes (213), ou para alienar a terceiros (214).<br />

Quer isto dizer que do prazo não se podem destacar g­lebas ou regiões<br />

que venhão a constituir novos prazos, distinctos e separados.<br />

2. Tornando os prazos indivisíveis, teve a lei por intuito<br />

forrar o senhorio ao incommodo de cobrar a pensão d'um grande<br />

numero de devedores, e poupar­lhe ao mesmo tempo os prejuízos<br />

inhérentes ás eventualidades de uma extrema divisão (215).<br />

A indivisibilidade, portanto, só foi creada por utilidade<br />

do senhorio. Deste presupposto resulta que bem pôde elle renuncial­a,<br />

e consentir na divisão (216). Ê' este o alvitre geralmente<br />

usado entre nós nos juizos divisórios (217).<br />

3. Muitas vezes acontece incidir o prazo em estado de<br />

communhão (218). A communhão, por direito provisória, tem<br />

(213) Por morte do emphyteuta passa o prazo aos seus herdeiros, os<br />

quaes o ficão possuindo indiviso até que se faça a partilha.<br />

(214) O emphyteuta, que sem accôrdo do senhorio vende uma parte do<br />

prazo, incorre em commisso.<br />

(215) Ord. 4, 36 § 1°:... "por se não confundir a pensão delle." AlVde<br />

6 de Março de 1669: "Do qual costume... resulta va tão notável prejuízo<br />

aos senhorios de taes prazos, fazendo­se a partilha delle contra a fôrma<br />

dos emprazamentos, por ■cuja causa os ditos senhorios não conhecião já quem<br />

erão os caseiros, assim pela limitação das terras, como pelos foros estarem<br />

divididos em partes tão miúdas que vinha a ficar mais fácil aos senhorios...<br />

deixal­os perder que cobral­os." Vej. Lobão, Direit. Emphyt., § 731.<br />

(216) Gama, Decis. 269, n. 1; Lobão, § 852, Doctr. das Acç. nota 155.<br />

Vej. os Avis. n. 19 de 11 de Janeiro de 1856 e n. 324, de 3 de Outubro<br />

de 1856, e Circul. n. 288, de 8 de Outubro de 1859. Estes Avis, e Circul.<br />

consagrão a doctrina: I o , que os terrenos de marinha aforados podem ser alienados<br />

por partes, precedendo licença; 2 o , que das transferencias de cada uma<br />

das partes se devem passar novos títulos com as condições preexistentes;<br />

3", que os novos foreiros só são obrigados a pagar fjro proporcionado á<br />

parte com que ficarem.<br />

(217) No nosso paiz se pôde dizer que está em pleno vigor o costume<br />

d'Entre Minho e Douro, de que falia o citado Alv. de 6 de Março de 1669<br />

e a que allude Mello (3, 11 § 18, nota), de* nos inventários e partilhas se<br />

dividirem por glebas os prazos. Os senhorios de ordinário se conformão com<br />

esta pratica, entendendo se com os herdeiros quinhoadosacerca do pagamento<br />

do f.*ro, e não raro conseguem délies uma pensão maior do que a que proporcionalmente<br />

deverião pagar.<br />

(218) O prazo se torna commum, ou por casamento superveniente do<br />

emphyteuta, ou por suecessão.


DAS COUSAS<br />

de necessariamente cessar pela partilha. Mas na partilha salva-se<br />

a indivisibilidade do prazo, repartiudo-se tão somente a sua estimação<br />

(219): o que se obtém pelas combinações seguintes:<br />

a) Ou adjudicando o immovel aforado precipuo no quinhão<br />

de um dos compartes com obrigação de fazer aos outros<br />

as reposições devidas (no caso de exceder as forças do quinhão)<br />

(220);<br />

b ) Ou alienando-o a um estranho, e dividindo-se o preço<br />

(221).<br />

§ 155. — Successão dos prados.<br />

Entre nós, como em outro lugar, se disse, só são conhecidos<br />

os prazos perpétuos puros (222).<br />

Estes prazos conservão a natureza e os predicamentos de<br />

bens allodiaes (223), e como taes se transmittem, pela morte do<br />

emphyteuta, aos seus herdeiros legítimos ou testamentarios, segundo<br />

as regras communs do Direito de successão (224), apenas<br />

com as particularidades seguintes :<br />

I. Na falta de descendentes ou ascendentes, de herdeiros<br />

testamentarios ou collateraes, até o décimo gráo, ou de cônjuge<br />

sobrevivente, o dominio util se devolve ao senhorio directo,<br />

excluído o fisco (225). A razão é que em toda a constituição de<br />

emphyteuse se subentende sempre incluida a clausula de reversão<br />

em favor do senhorio para o caso de que o emphyteuta ou seus<br />

successores venhão a fallecer sem herdeiros (226).<br />

(219) Ord. 4, 36 § I o , 4, 96 § 23: "E porque os , aforamentos perpétuos<br />

sernpre se hão de partir por estimação entre os filhos ou herdeiros<br />

do defunto."<br />

(220) Ord. 4, 36 § I o . •<br />

(221) Ord. 4, 96. § 23 o 24.<br />

(222) Vej. § 139 acima.<br />

(223) Guerreir. Tract. 2. L. 2. C. 8 n. 15, Peg. Foren. 2,c. 9 Portug.<br />

de Donation. L. 3, c. 43. n. 26, Lobão, Dircit. Emphyt. § 521, C.C.<br />

Port. art. 1662.<br />

(224) Ord. 4, 96 § 23 e 24, Mello 3, 11, § 20, Lobão, cit. § 521.<br />

(225) Mühlenbruch § 297-, II, n. 2, Makeldey, § 334, n. 4, Mello 3, 11<br />

§ 20, Rocha § 554. C. C. Port. art. 1663.<br />

(226) Esta clausula era sempre estipulada nos antigos aforamentos, até<br />

que afinal revestio a natureza de direito consuetudinario. Vej. L. Teixeira,<br />

3, 11 § 20, n. 5. in fine.<br />

329


330 DIREITO<br />

2. Na partilha se respeita sempre a indivisibilidade do<br />

prazo, dividindo-se-lhe tão somente o valor (227); este resultado<br />

se alcança com algum dos alvitres seguintes, guardada a ordem<br />

em que vão expostos:<br />

a) O prazo se adjudica precipuo a um dos coherdeiros, se<br />

cabe no seu quinhão (22S).<br />

b) Excedendo as forças do quinhão, se encabeça no herdeiro<br />

que fôr escolhido pelo accordo da maioria, com a obrigação<br />

de tornar aos outros a parte do valor que lhes deve tocar<br />

(229).<br />

c) Se não 6 possivel o accordo, ou se nenhum dos herdeiros<br />

quer o prazo, deve ser elle vendido em leilão publico, e reparte-se<br />

o preço (230).<br />

Mas se o defunto era casado, a doutrina exposta soffre<br />

modificação á saber :<br />

Se a emphyteuse foi adquirida na constância do matrimônio,<br />

o prazo pôde ser adjudicado ao cônjuge sobrevivente, ou á<br />

algum dos herdeiros do cônjuge defunto, na fôrma dita (231).<br />

Se porém foi havida antes do casamento, partilha-se sempre<br />

a estimação (232) entre o cônjuge vivo e os herdeiros do<br />

morto, mas o prazo deve ser encabeçado no cônjuge que o trouxe<br />

para o casal, ou em algum de seus herdeiros (233).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 681 — Os bens cmphyteiiticos transmittem-se por herança na mesma<br />

ordem estabelecida a respeito dos allodiaes neste Código, arts. 1.603 a<br />

1.619; mas, não podem ser divididos em glebas sem consentimento do senhorio,<br />

i ,, *l<br />

(227) Ord. 4, 36 § 1.", 4. 96 § 23 e 24.<br />

(228) Ord. 4,36 § 1": "Se tantos bens ficarem por morte do defunto que<br />

possa o faro caber no quinhão de cada um dos herdeiros."<br />

(229) Ord. 4,96 § 23; C. C. Port. art. 1662 § 1°,<br />

(230) Oird. 4,96 § 24; C. C. Port. art. 1662 § 3 o .<br />

Os herdeiros devem nomear o cabeça, ou promover a venda do prazo, dentro<br />

de seis mezes, sob pena de commisso. Ord. cit.<br />

(231) Ord. 4,96 § 24.<br />

(232) Falla-se na hypothèse de ser o casamento por carta de metade.<br />

(233) Ord. 4,96 § 24.


DAS COÜSAS<br />

§ 156.— Como acaba a cmphyteuse.<br />

A emphyteuse acaba :<br />

1. Pela perda total do immovel aforado (234).<br />

2. Pela prescripção da propriedade da cousa, plena e livre,<br />

por utn terceiro (235).<br />

Nestes dous casos, da extincção da emphyteuse não resulta<br />

a consolidação do domínio util no directo (236).<br />

3. Pela resolução do domínio daquelle que a constitue<br />

(237). _ _ ;<br />

4. Pela renuncia que o emphyteuta faz do domínio util em<br />

favor do senhorio (238).<br />

(234) C. 1 in fine C. de jur. emphyt. 4,66; Alvará de 21 de Janeiro<br />

de 1766, Mello, 3 11 § 27. n.l ; C. C. Port. art. 1687. Se a ruina é só parcial,<br />

a emphyteuse subsiste.<br />

(235) Mülenbruch § 297, II, n. 4, Maynz, § 237, not. 4. Mello, 3, 11,<br />

§ 27, n. 3. Vej. 79.<br />

O emphyteuta que deixa passar trinta annos sem pagar a pensão, ficará<br />

por esse facto exonerado delia, e terá dest'arte adquirido livre a propriedade<br />

que lhe estava aforada?<br />

Velhos e modernos escriptores discutem largamente esta questão. No<br />

emtanto parece-nos que, reduzida aos seus elementos naturaes. se lhe pôde<br />

dar uma solução simples e clara. Não ha prescripção acquisitiva sem boa<br />

fé (§ 63 acima). O emphyteuta, portanto, nunca poderá prescrever a propriedade<br />

do prazo, porque tem sicencia que não lhe pertence o domínio directo.<br />

Desde que não lhe é licito, por força da má fé, prescrever o immovel, seguese<br />

que o senhorio directo conserva o seu domínio, e poderá a todo tempo<br />

invocar a reivindicação. O emphyteuta, incurso em commisso por não ter<br />

pago a pensão, ha de necessariamente succumbir.<br />

Bem pôde. acontecer que o emphyteuta seja successor de outro, e que<br />

portanto ignore a existência da emphyteuse. Mas, ainda nesse caso, a prescripção<br />

será impossível, porque a posse vem eivada do vicio da posse do antecessor.<br />

Vej. § 72 acima, acerca da accessão da posse.<br />

Não é mister dizer que o emphyteuta, como qualquer outro possuidor,<br />

poderá prescrever o prazo, se inverter a posse; mas em tal caso deixará de<br />

possuir como emphyteuta, e assumirá nova posição jurídica. Vej.<br />

acima, § 73.<br />

(236) Vej. nota 249 abaixo.<br />


332 DIREITO<br />

5. Pela confusão, isto é, quando o senhorio se torna herdeiro<br />

do emphyteuta, ou o emphyteuta do senhorio (239).<br />

6. Pela opção do senhorio, no caso de alienação (24o).<br />

7. Pela caducidade, isto é, quando o emphyteuta se fina<br />

sem herdeiros (241).<br />

8. Nos casos em que o emphyteuta incorre em commisso,<br />

á saber :<br />

a) Se causa dolosa ou culposamente grave deterioração á<br />

substancia da cousa aforada (242).<br />

b) Se deixar passar, sem solver a pensão, três annos nas<br />

emphyteuses seculares, dous nas ecclesiasticas (2-13). O pagamento<br />

da pensão depois de vencida não releva do commisso, nem<br />

a acceitação por parte do senhorio significa renuncia (244); todavia<br />

na emphyteuse ecclesiastica o foro pôde ser utilmente pago,<br />

emquanto a lide não é contestada (245).<br />

c) Se aliena a emphyteuse por qualquer titulo, sem prévia<br />

denuncia ao senhorio (246).<br />

Não pôde o senhorio por propria autoridade expulsar do<br />

immovel ao emphyteuta que incorre em commisso, mas deve<br />

invocar a intervenção da justiça, recorrendo á accão competente<br />

(247).<br />

(239) Maynz, § 237, n. 3.<br />

(240) Vej. § 152, acima.<br />

(241) Vej. § 155 acima.<br />

(242) Novell. 7, c. 3 g 2, Novell. 12-0 o. 8, Mello 3, 11 '§ 27. O C C.<br />

Port. (art. 1672) só impõe a pena de commisso quando a deterioração é tal<br />

que o valor do prazo se torna inferior ao capital correspondente ao foro e<br />

mais um quinto.<br />

(243) Ord. 4, 39 pr. e § 1 e 2.<br />

(244) Ord. 4, 39 § 1": "Nem será relevado do commisso... ainda que<br />

lhe o senhorio receba, salvo se expressamente lhe aprouver de lhe acceitar a<br />

dita purgação e o relevar do commisso."<br />

(245) Ord. 4, 39 § 2 o : Porém neste caso poderá o foreiro purgar a<br />

mora... de não pagar, offerecendo ao senhorio as pensões devidas em qualquer<br />

tempo.antes que seja citado cm juizo, ou depois de cítado,offerecendo-as<br />

antes da lide contestada."<br />

Os foreiros de terrenos de marinha incorrem em commisso nos mesmos<br />

,casos que os foreiros em geral. Ord. n. 308, de 2 de Julho de 1841. Avis,<br />

n. 376, de 12 de Novemb. de 1856, e de 15 de Novemb. de 1858.<br />

(246) Ord. 4, 38.<br />

(247) Donneau, Com. 9 c. 15. Voet.. 6,3, n. 51, Mello, 3, 11, § 27.


DAS COUSÀS 333<br />

O commisso e de si odioso : dahi a tendência qne a jurisprudência<br />

pratica sempre mostrou para ampliar os motivos da<br />

escusa (248).<br />

A conjuncção do domínio util com o directo é o que em<br />

direito se chama, em sentido genérico,—consolidação (249).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 692 — A emphyteuse extingue-se:<br />

I — Pela natural deterioração do prédio aforado, quando chegue a não:<br />

valer o capital correspondente ao foro e mais um quinto deste.<br />

II — Pelo commisso, deixando o foreiro ãe pagar as pensões devidas, por<br />

três annos consecutivos, caso em que o senhorio o indemnizará das lemfeitorias<br />

necessárias. I<br />

III — Fallecenão o emphyteuta, sem herdeiros, salvo o direito dos<br />

credores.<br />

Art. 693 — Todos os aforamentos, salvo accôrão entre as partes, são resgataveis<br />

trinta annos depois de constituídos, -mediante pagamento de vinte<br />

pensões annuaes pelo foreiro, que não poderá no seu contractu renunciar o<br />

direito ao resgate, nem contrariar as disposições imperativas deste capitulo.<br />

§ 157.—Subctvphyteiise<br />

E' perniittido ao emph} r teuta subemprazar a emphyteuse<br />

(250).<br />

O subemprazamento produz as seg-uintes relações de direito<br />

:<br />

1 . O dominio util se transfere inteiro ao subemphyteuta<br />

(248) Mello, 4, 11 § 27, Lobão, Direit. Emphyt. § 1114, Rocha<br />

•5 557, 2 o .<br />

Sobre as causas de escusa, vej. Lob. § 780 e seg.<br />

A falta de pagamento do laudemio não induz eommisso. Por ser pena,<br />

o commisso só ë admissível nos casos expressos nas leis.<br />

(249) Mello, 3 11 § 27: '• Consolidatio generaliter significai utriusque dominii<br />

in eadem personna conjunctionem quacumque de causa."<br />

(250) Valasc. Quest. 13, n. 19, Mello, 3, 11 § 12, n. 4. Lobão, Direit.<br />

Emphyt. § 37. O C. C. Port. (art. 1701) prohibiu o contractu de subempkyteuse,<br />

para o futuro.<br />

A subemphyteuse é pura creação do Direito Consuetudinario. A respeito<br />

delia não temos lei escripta: fazem-lhe allusão uma ou outra lei. Décret,<br />

n. 5581, de 31 de Março de 1874 art. 4 § 7 e art. 24 § 6..


334 DIREITO<br />

(251), o qual fica dest'arte subrogado em todos os direitos do emphyteuta<br />

(252), com a obrigação porém de pagar-lhe annualmente<br />

um certo foro (253).<br />

2. O emphyteuta perde, em conseqüência, o domínio util,<br />

mas reserva para si um foro, de ordinário, maior que a pensão<br />

que pagava e continua a pagar ao senhorio (254).<br />

3. O senhorio mantém todos os seus direitos (255), a<br />

saber :<br />

Para com o emphyteuta, o direito de haver a pensão (256).<br />

Para com o subemphyteuta, todos os direitos que lhe<br />

competião contra o emphyteuta acerca da cousa aforada (257).<br />

4. O commisso, em que porventura incorra o subemplryteuta,<br />

extingue a emphyteuse mesmo em relação ao emphyteuta<br />

(258).<br />

5. O contracto da subemphj'teuticaçao está sujeito ás<br />

mesmas formalidades da emphyteuse :—deve ser denunciado ao<br />

(251) Peg-. Forens. 2, pag. 878 e seg. Pinheiro, Disput. 2 Sect.<br />

4 § 1.° n. 54.<br />

Controvertião oa velhos praxistas a questão de saber se o subemprazamento<br />

importa a perda do domínio util para o emphyteuta e a translação do<br />

mesmo domínio ao subemphyteuta. Reconhecem todos que o subemphyteuta<br />

exerce sobre a causa aforada os mesmos direitos rcaes que exercia o emphyteuta.<br />

Deste dado resulta invencivelmente que o subemphyteuta, pelo subempraxameuto,<br />

adquire domínio util sobre a cousa. Si o subemphyteuta<br />

adquii e o domínio util, é evidente que não pôde retel-o o emphyteuta<br />

porque é absurdo que duas ou mais pessoas tenhão in solidum domínio, quer<br />

pleno, quer util sobre a mesma cousa. Vej. § 30 acima<br />

(232) Lobão, § 39, n. 2. Como o de cultivar o terreno, edificar nelle,<br />

demolir.<br />

(253) Lobão. Direit. Emphyt., § 37, Rocha, S 561.<br />

O direito que o emphyteuta se reserva de haver do subemphyteuta um<br />

fjro, é elemento substancial da subemphyteuse. Som o dito direito não ha<br />

subemphyteuse. senão uma mera alienação da emphyteuse.<br />

(254) Lobão, § 39, n. 2, Rocha § 561.<br />

(255) Lobão, § 38 nota, § 39. n. 2.<br />

(256) Lobão, § 39, n. 2. O subemphyteuta é solidariamente responsável<br />

com o emphyteuta pela pensão devida ao senhorio. Lobão, loc. cit.<br />

(257) Lobão, § 38, nota, § 39, n. 2.<br />

(258) Gama, Decis. 147, n. 2, Decis. 244, n. 8, Pinheir. Disput. 2 Sect.<br />

4, n. 46, Lobão, § 38 n. 4. Se o sub-emphyteuta cahe em commisso por<br />

não pagar fOro ao emphyteuta, o domínio util volta ao senhorio. Lobão.<br />

§ 38. Not. n. 5.


AS COUSAâ 335<br />

senhorio para que possa elle exercer o direito de opção (259), ou<br />

impugnar a pessoa do subemphyteuta (260).<br />

Deste contractu é igualmente devido laudemio : o laudemio<br />

se paga ao senhorio (261).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 694 — A sub-emphyteiise está sujeita ás mesmas disposições qiie a<br />

emphyteuse. A dos terrenos de marinha e aceresciãos será. regulada em let<br />

especial.<br />

§ 158.—AcçÕes relativas á emphyteuse<br />

Assim o senhorio directo como o emphyteuta se achão<br />

armados das accões necessárias para a defeza e proteccão de seus<br />

direitos.<br />

A). O senhorio directo pôde invocar as accões seguintes :<br />

I. Reaes.<br />

I a . A de reivindicação, para haver o prazo ;<br />

a) Contra qualquer terceiro que injustamente o detenha,<br />

ainda mesmo durante a emphyteuse (262).<br />

b) Contra o próprio emphyteuta, quando oceorre alg-um<br />

dos factos que induzem a consolidação (263).<br />

2: A confessoria, para fazer reconhecer as servidões activas<br />

do prazo (264).<br />

3 a . A negaioria, para repellir a imposição de servidões passivas<br />

indevidas (265).<br />

(259) Lobão, § 38, 3 a . Neste caso o senhorio, fazendo a opção, se torna<br />

sub-emphyteuta do emphyteuta. Lobão, § 39, n. 5 o .<br />

(260) Alv. de 20 de Agosto de 1774, § 2 (arg. Caldas, de rénovât. Q. 13,<br />

n. 51, Pinh. Disput. 2, Sect. 4, n. 66, Mello, 3, 11 § 12 n. 4. Em contrario,<br />

mas sem fundamento. Lobão, Dissert, no App. ao Direit. Emphyt.<br />

(261) Gama, Decis. 244, n. 7 e 8, Decis. 329, n. 5, Cald. Extinct.<br />

cap. 16, n. 34 e 39, Doctrin. das ACQ. not. 937. Desde que se reconhece no<br />

senhorio o direito de opção, não se lhe pôde negar o direito ao laudemio —<br />

corollario.<br />

(262) Valasc. Jur. Emphyt. Q. 14, n. 3, Lobão, Direit. Emphyt. § 1260.<br />

Reivindicado o prazo, deve elle ser entregue ao emphyteuta. Bagn. oa.p.<br />

4, numero 73.<br />

(263) Lobão, Direit. Emphyt. § 1.262.<br />


336 BÎR«1TÔ<br />

Il. E as pêssoaûs :<br />

I a Pelo fôro (266).<br />

T. Pelo laudemio (267).<br />

3 a A ordinária de commisso (26b).<br />

B). Ao emphyteuta competem :<br />

I. Acção pessoal para obrig-ar o senhorio a lhe fazer tradição<br />

do immovel que lhe aforou (269).<br />

II. E as reaes:<br />

I a . De reivindicação do prazo, de que já tem tradição,contra<br />

o próprio senhorio (270), ou contra qualquer terceiro que indevidamente<br />

delle esteja de posse (27l),<br />

2 a . A confessoria (272).<br />

3 a A neg-atoria (273).<br />

C). Com o prazo o senhorio transfere aposse ao empbyteuta<br />

(274): d'ahi o direito que tem o emphyteuta de exercer todos<br />

os interdictos creados para a defeza e reivindicação da<br />

posse (275).<br />

§ 158 A<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

DAS RENDAS CONSTITUÍDAS SOBRE IMMOVEIS<br />

Ko direito anterior ao Código Civil havia o onus real do legado de prestações<br />

ou alimentos expressamente consignado no immovel mas não havia<br />

este direito real das rendas constituídas sobre inwnoveis.<br />

(266) Lob. § 2.269, Doctr. das Acç. § 391. A execução pôde recahir tanto<br />

nos fructos, como no próprio prazo. Alv. de 4 de Julho de 1768, § 4.<br />

Vej. C. C. Port. art. 1.685.<br />

(267) Lobão, § 1.284. Doctr. das Acq., § 399. Tanto a acção pelo fôro.<br />

como a de laudemio, são executivas.<br />

(268) Lobão, § 1196 e seg. Doctr. das Acç., § 397.<br />

(269) Lobão, § 1.287, Doctr. das Acç. § 403, n. 1<br />

(270) Pr. 1 S I o D. Si ager vect. 6, 3. No caso de que o senhorio, depois<br />

de ter feito tradição do prazo, o tomasse, esbulhando o emphyteuta.<br />

(271) Lobão. § 1,318, Doctr. das Acç. § 84, nota 154 e not. 120.<br />

(272) Vej. § 135 acima.<br />

(273) Vej. § 87 acima.<br />

(274) Vej. § 147 acima. Savigny. Poss. § 9, 12 a e 24. A posse do<br />

emphyteuta pertence á classe da posse derivada. Vej. acima § 12, II.<br />

(275) Vej. § 18 a 23 acima.<br />

O senhorio se reputa conservar a posse tão somente para a prescripção<br />

(ad usucapionem). Se o senhorio estava em posse hábil para prescripção da<br />

cousa que aforou a terceiro, a prescripção continua a correr em seu favor.


DAS COÜSAS ââ7<br />

O Código Civil o creòü neste capitulo VII:<br />

"Art. 749 — No caso de desapropriação, por necessidade ou utilidade publica,<br />

de prédio sujeito a constituição da renda (arts. 1.424 a, 1.431), applicarse-á<br />

em constituir outra o preço do immovel obrigado. O mesmo destino terá,<br />

em caso análogo, a inãemnização do seguro.<br />

Art. 750 — O pagamento da renda constituída sobre um immovel incumbe,<br />

de pleno direito, ao adquãrente do prédio gravado. Esta obrigação estende-se<br />

ás rendas vencidas antes da alienação, salvo o direito regressivo do adqxdrente<br />

contra o aliénante. — 677."<br />

Art. 751 — O immovel sujeito a prestações de renda pôde ser resgatado,<br />

pagando o devedor wm capital em espécie, cujo rendimento, calculado pela<br />

taxa legal dos juros, assegure ao credor renda equivalente. — 1.063.<br />

Art. 752 — No caso de fallencia, insolvencia ou execução do prédio gravado,<br />

o credor da renda tem> preferencia


338 DIREITO<br />

próprio ou alheio, uma renda ou prestação periodica, entregando-se cei to capital,<br />

em immoveis ou dinheiro á pessoa que se obrigue a satisfazel-a. /426,1431.<br />

Art. 1425. E' nulla a constituição de renda em- favor de bessoa já fallecida,<br />

ou que, dentro nos dias seguintes, vier a fallecer de moléstia que já<br />

soffria quando foi celebrado o contracta.<br />

Art. 1426. Os bens dados em compensação da renda cahem, desde a<br />

tradição, nó domínio da pessoa que por aquella se obrigou.<br />

Art. 1427. Se o rendeiro ou censuario, deixar de cumprir a obrigação<br />

estipulada, poderá o credor da renda accional-o assim para que lhe pague as<br />

prestações atrasadas, como para que lhe dê garantias das futuras, sob pena de<br />

rescisão do contractu. 1092 § único.<br />

Art. 1428. O credor adquire o direito á renda dia a dia, se a prestação<br />

não houver de ser paga adeantada, no começo de cada um dos períodos prefixos<br />

Art. 1429. Quando a renda fôr constituída em beneficio de duas ou mais.<br />

pessoas, sem determinação da parte de cada uma, entende-se que os seus direitos<br />

são eguaes, e, salvo eslipulação diiersa, não adquirirão os sobrevivos direito á<br />

parte dos que morrerem.<br />

'Art. 1430. A renda constituída por titulo gratuito pode, por acto do<br />

instituia'or, ficar isenta de todas as execuções pendentes e futuras. Esta"isenção<br />

existe de pleno direito em favor dos montepios e pensões alimentícias.<br />

Art. 1431. A renda vinculada a um immovel constitue direito real, de<br />

accordo com o estabelecido nos arts. 74g a 754.— 6j4, VI.


PARTE TERCEIRA<br />

DIREITOS PIGNORATICIOS<br />

$ 159. — Observação geral.<br />

1. D'entre os direitos rears (jura in re aliena) ha três que<br />

fortnão um grupo á parte :<br />

O penhor.<br />

A antichrese,<br />

A hypotheca.<br />

2. Estes direitos se distinguem particularmente dos demais<br />

direitos reaes por traços perfeitamente característicos.<br />

I o . Tem por único fim garantir e assegurar o cumprimento<br />

da obrigação.<br />

2". Não subsistem por si, mas an dão sempre ligados, como<br />

o accessorio ao principal, ás obrigações que garantem.<br />

3. A essência dos ditos direitos consiste em sujeitar a<br />

cousa precipuamcnte, e por via d'um laço real, ao pagamento da<br />

divida.<br />

4. O penhor só pôde ter por objecto cousas moveis. A hypotheca<br />

recahe unicamente em iinmoveis. A antichrese affecta directamente<br />

os fruetos e os rendimentos da cousa, e, por via de<br />

conseqüência, a propria cousa.<br />

5. O penhor e a antichrese têm isto de commum—-que a<br />

cousa que affectão, é entregue ao credor e permanece sob sua<br />

posse juridica.<br />

A hypotheca, ao inverso deixa a cousa sob a posse do seu<br />

dono.<br />

23


DO PENHOR E ANTIGHRESE<br />

CAPITULO I<br />

DO PENHOR<br />

- - . "jftpii<br />

§ 160.—Noção do penhor<br />

Penhor se toma como contracto e como direito.<br />

No primeiro sentido 6 a convenção, pela qual o devedor<br />

ou um terceiro entrega ao credor uma cousa movei com o liui<br />

de sujeital-a por um vinculo real ao pagamento da divida (1).<br />

Na segunda accepção é o direito real, que do dito contracto<br />

resulta para o credor, sobre a cousa (jus pignoris) — isto é — o direito<br />

de sequela e de preferencia (2).<br />

Também se denomina penhor a propria cousa empenhada<br />

(3).<br />

O contracto de penhor pertence á classe dos contractus<br />

reaes ; a sua perfeição, pois, depende da entrega da cousn. Assim<br />

que não ha penhor emquanto não ha tradicção (4).<br />

(1) Fr. S H D. de act. pignorat. fr. IS 5 4 D. de pact. 11. 14 § 71, de<br />

act. 4. fi; Dig Port, HT, art. 1,197, Rocha § 625.<br />

(2) Muhh-nbrucb, § 299, Rocha § 626.<br />

(3) § 7. I. de «act. 4, 6. Lobão. Not. a Mello 3. 14 § 1" n. 1.<br />

(4) Maynz § 292, not. 7, Pothier, Rypoih cap. 1, art 1, § 1". Lobão.<br />

Not. ã Mello, 3. 14 S 2, n. 3.<br />

Vej. acima >§ 44, 'not. 1.


DAS COUSAS 341<br />

§ 161. — Condições do penhor<br />

0 penhor presuppõe duas condições essenciaes para sua<br />

existência legal :<br />

í' A divida ou obrigação que elle é destinado a garantir.<br />

2? A cousa sobre que recahe :<br />

1 . E' susceptível da garantia do penhor toda a obrigação<br />

de dar dinheiro ou que se pôde traduzir em prestação pecuniária<br />

(1), quer seja pura ou condicional (2), quer seja presente ou futura<br />

(3). E' licito constituir-se o penhor antes da obrigação ;<br />

o penhor, porém, só se considera subsistente do momento em que<br />

ella começa de existir (4).<br />

2. Só podem ser objecto de penhor as cousas moveis alienavels<br />

(5), a saber :<br />

a) As corporeas, por exemplo, uma barra de ouro, uma<br />

pedra preciosa, uma universalidade de cousas, como um rebanho<br />

(6) ;<br />

b) As cousas incorporeas, isto é, os direitos e créditos representados<br />

pelos seus títulos, como—letras, apólices, acções<br />

de companhias (7).<br />

Não é prohibido ao devedor dar em penhor a terceiro a<br />

propria cousa que lhe está empenhada (8).<br />

'(1) Maynz § 241, Rocha S Vej. S adiante.<br />

Cl) Vej. o cit. S.<br />

(3) Cit. S.<br />


342 DIREITO<br />

3. No nosso Direito não se podem dar em penhor as cousas<br />

alheias. Subsiste sempre o dominio do senhor, e lhe fica<br />

salvo o direito de reivindical-as da mão do credor, quer elle as<br />

recebesse em boa, quer em má fé (9). Mas, não obstante, prevalece<br />

com todos os seus eíreitos naturaes o contracto pig-noraticio<br />

entre o credor e o devedor (10).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 768 — Constitue-se o penhor pela tradição effective!., que, em garantia<br />

do debito, ao credor, ou a quem o represente, faz o devedor, on alguém<br />

por elle, de um objecto inovei, susceptível de alienação.<br />

Art. 769 — Só se pôde constituir o penhor com a posse da cousa movei<br />

pelo credor, salvo no caso de penhor agrícola ou pecuário, em que os objectos<br />

continuam em poder do devedor, por effeíto da clausula " constitui: "<br />

— 781 a 788.<br />

Art. 789 — A caução de, títulos de créditos inalienáveis equipara-se ao<br />

penhor e vale contra, terceiros, desde que for transcripta, ainda que esses títulos<br />

não hajam sido entregues ao credor.<br />

Art. 790 — Tam-bem se equipara ao penhor mas com as modificações dos<br />

artigos seguintes, a caução de tins em- garantia de outros títulos.<br />

Art. 791 — Esta caução principia a ter effeito com a tradição do titulo<br />

ao credor, e provar-se-á por escripto, nos termos dos arts. 770 e 771.<br />

Art. 792 — Ao credor por esta caução compete o direito de:<br />

I — Conservar e recuperar a posse dos títulos caucionados, por todos os<br />

meios eiveis ou crimes, contra qualquer detentor inclusive o próprio dono.<br />

II — Fazer intimar ao devedor dos títulos caucionados, que não pague<br />

ao seu (redor, emquanto durar a caução (art. 794).<br />

/// — Usar das acções, recursos e excepções convenientes, para assegurar<br />

os seus direitos, bem como os do credor caucionante. como se deste fora<br />

procurador especial.<br />

IV — Receber a. importância, dos títulos caucionados, e restituil-os ao<br />

devedor, quando este solver a obrigação por elles garantida. — 793.<br />

Art. 793 No caso do artigo antecedente, n. IV, o credor eaucionado ficara,<br />

como depositário, responsável ao credor caueionario pelo que receber<br />

além do que este lhe devia.<br />

(9) Fr. 20 D. cie pig. act. 13, 7. C. 2, 4, 6, C. Si alien, res pingn. dat.<br />

tf, 16. Pothler, Hypoth. cap. 4, arc. I § II in fine.<br />

(10) Fr. 9 § 4 D. de pig. act. 13, 7; fr. 22 § 2 ID. eodem. Pothior. loc.<br />

cit. S IT. in fine. O penhor não produz direito real em favor do credor sobre<br />

a cousa alheia; mas, no caso figurado, como contracto prevalece entre o<br />

credor e o devedor com os seus effeitos naturaes. Assim o credor, paga a<br />

divida, não se pôde eximir de restituir a cousa ao devedor sobre o fundamento<br />

que ella não lhe pertence. Vej. Troplong Nantissement, n. &9.


DAS COUSAS<br />

Art. 794 — O devedor do titulo caucionado, tanto que receba a intimação<br />

do art. 792. n. II, ou se dê por sciente da caução, não poderá receber quitação<br />

do seu credor.. . .<br />

Art. 795 — Aquelle que, sendo credor num titulo de credito, depois de o<br />

ter cauclonado, quitar o devedor, ficará, por esse facto, obrigado a saldar imniediatamente<br />

a divida, em cuja garantia prestou a caução; e o devedor, que<br />

sciente de estar caucionado o seu titulo de debito, aceitar quitação do credor<br />

caiicionante, responderá solid ar iam ente, com este. por perdas e damnos ao<br />

caucionado.<br />

Art. 75G — Só aquelle que pôde alienar, poderá hypothecar, dar em antichrese,<br />

ou empenhar. Só as cotisas que se podem alienar poderão ser dada*<br />

em penhor, anlichrese, ou hypoiheca. — 70, 72.<br />

Da transcripção do penhor.<br />

Art. 796 — O penhor agrícola será transcripto no registro de immoveis<br />

— 44, I.<br />

Paragraphe único Emqunto não cancellada, continua a transcripção a<br />

valer contra terceiros.<br />

Art. 797 — O penhor de títulos de bolsa averbar-sc-á nas repartições com,'<br />

petentes, ou na sede da associação emissora.<br />

Art. 798 — O credor que aôceitar em caução títulos ainda não integrados,<br />

poderá sobrevindo qualquer das chamadas ulteriores, executar logo o devedor,<br />

que não realizar a entrada, ou effectual-a sob protesto.<br />

Art. 799 — Se nos termos do artigo antecedente, se effectuai', sob protesto,<br />

a entrada, ao debito se addicionará o valor desta, resalvado ao credor o seu<br />

direito de executar in-cont menti o devedor.<br />

Art. 800 — O credor, ou o devedor, um na ausência do outro ooiiiraheute<br />

pode fazer transcrever o penhor, apresentado o respectivo instrumento na forma<br />

do artigo 135 se for particular - 771.<br />

Art. 801 — Poderá o devedor fazer cancellar a transcripção do instrumento<br />

pignoraticw, apresentando, com a firma reconheciaa, se o documento for<br />

particular, a quitação do credor.<br />

Paragrapho único — O mesmo direito compete ao adquirente do penhor<br />

por adjudicação, compra, suecessão ou remissão, exhibindo seu titulo.<br />

§ 162. — Por quem e como se constitue o penhor<br />

1. Têm capacidade para constituir penhor todas as pessoas<br />

que estão na livre administração de seus bens (10).<br />

2. A constituição do penhor civil no nosso Direito não está<br />

(10) Pothier, Hypoth. cay. 4, art. I, § II.<br />

343


344 DÍRJÍ1TO<br />

sujeita a formalidades de ríg-or (11). Só se requer escriptura publica<br />

quando o valor da cousa empenhada excede á taxa da lei (1^).<br />

3. O contractu de penhor se diz exceder á taxa da lei,<br />

quando o valor da cousa empenhada é superior á dita taxa. Mas<br />

se o valor do penhor é inferior á taxa da lei, ainda que seja superior<br />

á mesma taxa a importância da divida, o contracto pignoraticio<br />

pódc ser passado por escripto particular. A razão é que toda<br />

controvérsia que se suscita acerca do penhor, resolve-se pelo respectivo<br />

contracto e dentro dos limites do seu valor (13).<br />

A . O escripto, pelo qual se constitue o penhor, deve determinar<br />

a divida (14) e especificar os bens empenhados (15).<br />

Não ha necessidade de precisar o algarismo da divida (16).<br />

(11) Vej. Consolid. das Leia Civis, art. 767 e nota.<br />

E" esta doutrina do Direito Romano (Maynz i§ 242. nota 2) e a do antigo<br />

Direito francez: Fothier, Hypoth. cap. 4, art. I.<br />

No 'Direito commercial exige-se como necessária a prova escripta (Cod.<br />

Com. art. 271.<br />

(12) Gnl. 3, T. 59', Alvará, de 3 do Direito Romano. O Direito francez com<br />

fundala razão exige declaração do montante da divida (C. C. art. 2,074<br />

Mourlon III, n. 1,218, 2 o ). Seguiu-o o Cod. Com. art. 272.


DAS COUSAS 345<br />

O nosso Direito não exige a authenticação da data da divida<br />

para que o penhor possa ser opposto a terceiro (17).<br />

5. A tradição, como acima se disse, é elemento substancial<br />

do contracto pignoraticio. Em quanto, pois, a cousa não<br />

c entregue ao credor, não ha penhor legalmente constituído (18).<br />

São admissíveis, como meios de operar a entrega, os diversos<br />

modos de tradição conhecidos no Direito civil — a real,<br />

as symbolicas, as fictícias (19), e ainda a tradição pelo constituía<br />

possessorio (20).<br />

(17) Em França o titulo do penhor não valu contra terceiros, senão<br />

depois que a sua data .se torna certa por acte authentico. F/ uma boa cautella.<br />

Mourlon. III. n. 1.218. 1". Não temos lei a respeito.<br />

(18) Vej. S Kin acima.<br />

(.19) Vej. S lü acima. Rocha, 5 627.<br />

'20) O Direito Romano ê expresso i respeito Veja-se Savigny, Poss.<br />

§ 27. C. Ma) n/ $ 242 nula í~>.<br />

Voet. diz que a disposição do Direito Romano que permitte a tradição<br />

do penhor pelo constítuto não foi aceita na Holla nda pela razão de que segundo<br />

o costume Hoilandez os moveis não têm sequela.<br />

"Sed et secundo, magis est nostri moribus í lud tuale qual< constitutum<br />

possessorium in pignoribus mobilium non ultra probari po.ssit. ex quo placuit<br />

mobília non habere sequela m. el oh id ipsi rei mobilis possessionem<br />

incumbere debere creditorem. ut asserere sibi in ea possit prœlationis jus."<br />

Pandect 20. 1. n. 12.<br />

A razão é decisiva. Na verdade, se no systema do Direito Hoilandez<br />

não subsiste a sequela em relação aos moveis, é evidente que perante aqueile<br />

Direito o penhor não pôde existir sem a detenção physica. e -que. portanto.<br />

!he ê inaplicavei a tradição pelo constítuto.<br />

Em Franca e pela mesma razão domina a mesma doutrina.<br />

Mas segundo o nosso Direito, os moveis são susceptíveis de sequela.<br />

—O credor pignoraticio, que perde a posse do movei pôde rehavel-o ou por<br />

cia de interdicto possessor!©, ou por \ ia de aeção real competente (§ 163<br />

n. õ adiante.) Não vigora entre nõs o prihlcipio francez — Ia 2>ON.sc$sion vaiei:<br />

titre. — Não ha pois, razão para excluir a doutrina do Direito Romano.<br />

I-;' este um dos muitos casos em que as disposições do 'Direito estrangeiro,<br />

por serem corollarios de peculiaridades desse Direito, não podem ser<br />

applicadas ao nosso.<br />

Sustentando o § fi do art. 6 da lei n. 1.357 de 24 de Set. de 1874. § que<br />

applica expressamente a tradição pelo constítuto ao penhor de escravos, o<br />

Si Xabuco de Araújo dizia m s, nado. na sessão d< 16 de Junho de 1804.<br />

o seguinte:<br />

"lEsta exigência do nobre senador não me parece fundada: porque conforme<br />

o direito em geral a clausula constitute se considera uma tradição


346 DIREITO<br />

Quando o objecto do penhor é um direito, como uma letra,<br />

um credito, a tradição se consumiria pela simples entrega do respectivo<br />

titulo (21). E' de advertir que não ha nestes casos necessidade<br />

de intimar ao devedor a constituição do penhor (22) ;<br />

mas, se o devedor não c intimado, as quitações que lhe passa<br />

o seu credor, valem contra o credor que recebeu o titulo em<br />

penhor (23).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 761 — Os contractus de penhor, antichrese e hypotheca, declararão<br />

sob pena de não valerem, contra terceiros. — 770.<br />

I — O total da divida, ou mia estimação,<br />

li — O prazo fixado para paya incuto.<br />

III —■ A taxa dos juros, se houver — 1.262.<br />

IV — .1 cotisa dada em garantia, com. as suas especificações.<br />

Art. 770 — instrumento do penhor convencional determinará precisamente<br />

o calor do debito e o obieclo empenhado, em lermos que o descriminem<br />

dos seus congêneres. — 761.<br />

Quando o objecto do penhor for cotisa fungível, bastará declarar­lhe a<br />

qualidade c quantidade.<br />

symbolica, ou não real. O nobre senador reconhece com Saviyn.v que o<br />

penhor admitte a clausula constitui i (Sem duvida, o que ha de mais<br />

significativo em algumas espécies de tradições symbolieas estabelecidas pelo<br />

código commercial, do que na clausula constitutif... Aqui estão as espécies<br />

de tradição symbolica referidas ­no art. ©OO, ique não 'ê senão exemplificative..<br />

Essas espécies importão tradição fieta, 'como o constitute,porque<br />

nellas, strictamente fallando, não ha symbolo, porém manifestação da vuu­<br />

Lude por palavras." An. 1864, I, pag. 137<br />

O temor de fraude pela possibilidade da antedata não tem fundamento.<br />

O credor que quizer afastar qualquer suspeita, tem em suas anãos o meio<br />

authentique o papel com o reconhecimento da firma ou exija escriptura<br />

publica. Ao mesmo perigo está sujeito o deposito e todos os contractus que<br />

podem ser feitos por escrrpto particular.<br />

(2­1) Arntz, II, n. l,5­94, Troplong, Nantissement, n. 277.<br />

O penhor de acções de companhias, que mão são ao portador, e o de<br />

apólices da divida publica, se fazem por via de transcripção >nos respectivos<br />

livros.<br />

(22) Em França assim no caso de cessão como no de penhor de créditos,<br />

é indispensável a intimação do devedor (Mourlon 111, n. 1,219); e também<br />

na Bélgica (Arntz, II, n. 1,'594) C. da Rocha dá esta doutrina como subsistente<br />

no Direito portuguez ao tempo em que escreveu.<br />

(23) Na ■verdade, se o devedor não teve s­ciemeia do penhor, paga bem<br />

ao credor, e legalmente se exonera da divida.


DAS COUSAS 347<br />

Art. 771 — Se o contractu se fizer mediante instrumento particular, será<br />

firmado pelas parles, c lavrado em duplicata, ficando um exemplar com cada<br />

um dos contrattentes, qualquer dos quaes pode leval-o á transcripção<br />

— 135, 800.<br />

Aft. 776 — São credores pignoraticios, independentes de convenção :<br />

1 — Os hospedeiros, eslalajadeiros ou fornecedores de pousada ou alimento,<br />

sobre as bagagens, moreis, jóias ou dinheiro que os seus consumidores ou<br />

freguezes tiverem com sigo nas respectivas casas ou estabelecimentos, pelas<br />

despesas ou consumo que ahi tiverem feito. — 777<br />

TT — O dono do prédio rústico ou. urbano, sobre os bens moveis que o<br />

rendeiro ou inquilino tiver guarnecendo o mesmo prédio, pelos alugueres ou<br />

rendas. — 1.&86 e VI.<br />

Art. 777 — A conta das dividas enumeradas no artigo antecedente, n. I,<br />

será extrahida conforme a tabeliã impressa, prévia- e ostensivamente exposta<br />

na casa, dos preços da hospedagem, da pensão ou dos gêneros fornecidos, sob<br />

pena de nullidaãe do penhor.<br />

Art. 778 — Em cada um dos casos do art. W6, o credor poderá tomar em<br />

garantia um ou mais objectas até ao valor da ãvviãa.<br />

Art. 779 — Os credores comprehendidos no referido artigo, podem, fazer<br />

effeetivo o penhor, antes de recorrerem á autoridade judiciaria, sempre que<br />

haja perigo na demora.<br />

Art. 780 — Tomado o penhor, requererá o credor, acto continuo, a homologação,<br />

apresentando, com a. conta por menor das despezas do devedor,<br />

a, tabeliã dos preços, junta á relação dos objectos retidos, e pedindo a citação<br />

délie para, em vinte e quatro horas, pagar, ou allegar defesa.<br />

Ari. 781 — Podem ser object o de penhor agrícola: — 44, I, 7'69. 796.<br />

T — Machinas e instrumentos oratorios, ou de locomoção.<br />

TT — Colheitas pendentes ou em via de formação no anno do contractu,<br />

quer resultem, de prévia cultura, quer de producção espontânea do solo.<br />

ITT — Fructos armazenados, em ser, ou beneficiados e acondicionados paro<br />

a venda.<br />

IV — Lenha cortada ou madeira dos mattos Preparada para o còrtc.<br />

V - Animaes de serviço ordinário de estabelecimento agrícola.<br />

Art. 782 — O penhor agrícola só se pôde convencionar pelo prazo de um<br />

anno, ulleriormente prorogavel por seis mezes. — 788.<br />

Art. 783 — Se o prédio estiver hypothecado não se poderá, pena de nullidaãe,<br />

sobre elle constituir penhor agrícola, sem annuencia do \credor hypotliecario,<br />

por este dada no próprio instrumento de constituição de penhor.<br />

Art. 7'84 — No penhor 'de animaes, sob pena de nullidaãe, o instrumento<br />

designal-os-á com a maior precisão, particularisanão, o lugar onde se achem,<br />

e o destino, que tiverem. — 770.<br />

Art. 785 — O devedor não poderá vender o gado empenhado, sem prévio<br />

consentimento eseripto do credor.<br />

Art. 786 — Quando o devedor pretenda vender o gado empenhado, ou,<br />

por negligente, ameace prejudicar o credor, poderá este requerer se deposi-


348 DIREITO<br />

tem os anvmaes sob a guarda de terceiro, ou exigir que se lhe pague u divida<br />

in-continenti.<br />

Ari. 787 — Os animaes da mesma espécie? comprados para substituir os<br />

Diários, fie» in subrogados IT o penhor.<br />

Paragrapho único. Esta substituição preswme-se, mus não valerá contra<br />

terceiros, se não constar d< menção adãicional ao respectivo contracta.<br />

Art. 788 — O penhor de animaes não admille o prazo maior de dois annas,<br />

mas pôde ser prorogado por igual período, averbando-se a prorogação no<br />

titulo respectivo.<br />

Paragrapho único. Vencida a prorogação, o penhor será excutido, quando<br />

não seja reconstituído.<br />

§ 163. — E/jeitos do contractu do penhor : l. Direito real do credor<br />

O contracte- do penhor, consummado pela tradicção, gera<br />

em favor do credor um direito real (jits' pignoHs) sobre a cousa (24).<br />

Este direito é um mero direito de garantia:—tem por effeito<br />

tão somente sujeitar a cousa por um vinculo real ao cumprimento<br />

da obrigação ; não confere ao credor a faculdade de usar delia ou<br />

de aproveitar os seus fruetos e rendimentos (25).<br />

São corollarios do dito direito real os direitos seguintes :<br />

1. O direito de reter a cousa, emquanto a divida não é integralmente<br />

paga (26). O credor adquire a posse jurídica da cousa<br />

empenhada. (27)<br />

2. O direito de fazer vender o penhor, se a divida não é<br />

paga no dia do vencimento (28).<br />

(24) Pr. 10 § a, fr. 17 I >. de pig. et hypoth. 20. 1: Lobão. Not a 'Mello<br />

3, S 14 n. Rocha 5 626.<br />

(25) Fr. 54 !X de furtis, 47.2: Si pignore creditor utatur, furti tenetur.<br />

5 6, 1. de oblig. quse ex quasi-delict- 3, I. Pothier, Hypoth. cap. 4, art. 2 5 2,<br />

i ) Poet. III. art. 1.219, Rocha § 628. Salvo consentimento do devedor.<br />

(26) C. 6 C. de distrh. pign. fr. 19 I). de pig. 20, 1. iMulenbruch S 314,<br />

Pothier, loc. Cit. Art. 2 S 1". Rocha S 626. D. P. Ill, art. 1,210.<br />

(24) Fr. 1 § 15 D, de ad(|. poss. 41. 2, fr. 16 'D. de usurpât. 41, 3; fr.<br />

35 $ 1". D. de pig. act. 13, 7, .Maynz § 167 not.' 14 e § 246 not. HI. O credor<br />

pôde usar dos remédios possessorios. A posse do credor pignoraticio é<br />

outra espécie de posse derivada. O proprietário dá cousa empenhada conserva<br />

a posse civil para a prescripção. 'Fr. 13. fr. 16, fr. 33 (§ 4, 'D. de usurpât,<br />

il. 3. Lobão. Not. a Mello 3, 14 i§ 2, n. 8, Rocha, § 630, n. 2.<br />

(28) Maynz 5 245 e 247, Pothier, loc. cit. art. 2 § I o . Dïg. Port. III.<br />

art. 1.204 e 1,205.


DAS COUSAS 349<br />

A venda se faz judicialmente, coin intimação do devedor<br />

(29).<br />

Não é licito estipular-se no contractu de penhor o pacto commissorio,<br />

isto é ~ que se a divida não fôr paga no prazo ajustado<br />

fique a cousa vendida de pleno direito ao credor, ou pelo preço<br />

da divida (30), ou pelo preço ajustado ao tempo em que o penhor<br />

c constituído (31). Esta prohibição tem por fim proteger o<br />

devedor, sob a pressão da necessidade de momento, contra as<br />

exigências avaras do credor (32). E' igualmente prohibido pela<br />

mesma razão pactuar-se que a cousa ficará ao credor pelo preço<br />

em que elle a estimar (33).<br />

E' peruiittido, porém, porque não subsiste a dita razão,<br />

estipular-se a venda da cousa ao credor pelo preço que fôr estimado<br />

por avaliadores (34).<br />

3. O direito de exig-ir o cumprimento da obrigação ou de<br />

cobrar a quantia, quando o penhor é um direito ou um credito<br />

(3.5). A cousa ou a quantia que fazia objecto do direito empenhado,<br />

rehavida ou cobrada, toma-lhe o lug-ar cm poder do credor<br />

e subsiste como penhor (36).<br />

4. O direito de haver do devedor assim as despezas feitas<br />

com a conservação e guarda do penhor (37), como a indemnisação<br />

( li!»> Dig, Port. Ill, art. 1,204 e 1.20">. iMoraes, Exefcut. 1, cap. A. § 3,<br />

n. 13, Lobão, Process. Execut. cap. 5, Art. 14; Moraes no iugar citado expõo<br />

a praxe da execução do penhor<br />

Pôde estipular-se que a venda seja extra-judicial ; mas ainda neste<br />

caso os louvado* devem .ser judicialmente nomeados. Vej. Moraes e Lob. loc.<br />

cit. Acerca do processo da execução do penhor mercantil, vej. o Reg. n. 737.<br />

art. 282 e seg.<br />

(30) C. ult. C. cie pact. pig. Ord. 4. õ(i pr. Troplong Nantissement, u. 382<br />

1-" uma datio in solulwm.<br />

(31) Tmplong., Nantissement, n. 3>Stí.<br />

(32) Troplong., Nantissement, ri. 370: Un tel pacte est immoral: contra<br />

bonos mores; il est vexatoire; il est un abus du fort sur le faible, une odieuse<br />

spéculation de celui qui a sur celui qui éprouve une nécessité d'argent."<br />

(33) Ord. 4, 5« § 1".<br />

(34) 'Ord. 4, 56 pr. verb. Porém se o devedor... Troplong., n. 3-88.<br />

(3T>) Fr. 18. D. de pig. act. 13, 7, fr. 20 D. de pignorib. 120, I, C. 4, C.<br />

qua res pignor. 8, 17,. Maynz § 241, n. 21. Vej. Cod. Comm. art. 277.<br />

(36) Pothier loc. cit. Maynz S 241.<br />

!37) Fr. 8 D. de pig, act. 13, 7, Dig. Port. Ill, art. 1,210. Rocha § 628,<br />

Pothier, loc. cit. art. 2 § 3.


350 DlRlSiTO<br />

dos prejuízos e perdas que os vicios do mesmo penhor lhe tenhao<br />

causado (38).<br />

5. O direito de reivindicar o penhor, se lhe foi tirado da<br />

posse, contra quem quer que o detenha, ainda que seja o próprio<br />

devedor (39).<br />

6. Ao direito real do penhor (jus pignoris) anda sempre<br />

ligado o direito de preferencia, isto é, o direito do credor pag-ar-se<br />

precipuamente com o producto da venda do objecto empenhado<br />

(40).<br />

7. O direito r&ãl do credor é indivisível nos mesmos termos<br />

em que o é a hypotheca, a saber : o penhor affecta as cousas<br />

empenhadas em todas as suas partes. Assim cada parte da cousa,<br />

ou cada uma das cousas empenhadas, fica sujeita á totalidade da<br />

divida, e a cousa toda, ou todas as cousas dadas em penhor, á<br />

cada fracção da divida (41).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

ATI: 759 — O credor hypothecario


DAS COÜSÂS âsi<br />

a cousa hypothecaãa, ou empenhada, e preferir, no pagamento, a oxitros cre­<br />

dores, observada, quanto d hypotheca, a prioridade na inscripção. — 765.,<br />

833, § único.<br />

Paragrapho único. Exceptua­se desta regra a. divida, proveniente de .salários<br />

do trabalhador agrícola, afim de ser pago pelo prodiiclo da colheita para<br />

a quai houver concorrido com­ o seu trabalho, precipita meute a quae&quei<br />

outros créditas. 1.560, 1.5(13.<br />

Art. 765 — E' nulla a clausula que autorisa o credor pignoralicio, anlichretico<br />

ou hypolhecario a ficar com­ o objeclo da garantia, se a divida, não<br />

jôr paga no vencimento. — 759, 760.<br />

Art. 7b7 — Qttando, excutuio o t>en//or, ou executada a /ivpot/ieca, o produeto<br />

não bastar para pagamento da divida e despezas judtc/aes, continuará o<br />

devedor obrigado pessoalmente pelo restante.<br />

Art. 772 — O credor pignoraticío não póãe, paga a divida, recusar a entrega<br />

da cousa a quem a empenhou. — 802, 1.566, III.<br />

Pôde retel­a, porém, até que lhe indemnizem as despezas devidamente justificadas,<br />

que tiver jeito, não sendo occasionaãas por culpa sua.<br />

Art. 773 — Pôde eguáhnente o credor exigir do devedor a satisfação do<br />

prejuízo que houver so]jrido por vicio da cousa empenhada.<br />

Art. 792 — Ao credor por esta caução compele o direito de:<br />

I — Conservar e recuperar a posse dos títulos caucionados, por Iodos os<br />

meios cweis ou crimes, contra qualquer detentor, inclusive o próprio dona.<br />

II — Fazer intimar ao devedor dos títulos caucionados, que não pague ao<br />

seu credor, emquanto durar a caução, (art. 794).<br />

III —■ Usa.r das acções, recursos e excepções convenientes, para assegura.r<br />

os seus direitos, bem como os do credor caucionante, (­orno se deste fôrcú<br />

procurador especial.<br />

IV — Keccber a importância dos lilulos caucionados. e resliluil­os ao de­<br />

vedor, ((liando esle solver a obrigação por elles garantida. — 793.<br />

Art. 793 — Xo caso do artigo antecedente, n. /1 . a credor caucionado jicará,<br />

como depositário, responsarei ao credor ca acionário, pelo que receba'<br />

alem do que este lhe devia. ■<br />

Art. 794 — O devedor do titulo caucionado, tanto que receita a Ultimação<br />

do art. 792, n. II, ou se dê por scíente da caução, não poderá receber quitação<br />

do seu credor.<br />

Ari. 795 — Aquelle que, sendo credor num titulo de credito, depois de o tar<br />

caucionado. quitar o devedor, ficará, por esse facto, obrigado a saldar immédiataniente<br />

a divida, em cuja garantia prestou a caução; e o devedor, que.<br />

sciente de estar caucionado o seu titulo de debito, acceitar quitação do credor<br />

caucionante. responderá solidaria mente, com esle. por /terdas c damuos aii<br />

caucionado.


353 DIRErTO<br />

§ 164 — Obrigações do credor<br />

Ao credor pigrioraticio incumbe :<br />

1. Conservar a cousa dada em penhor, empregando para<br />

esse fim e deligeucla e o cuidado d'uni bom pai de família (42).<br />

2 Restituir, pag-a a divida, o penhor e seus accessorios,<br />

ao devedor ou á pessoa de quem o recebeu (43), ou, se o penhor<br />

foi vendido, o excesso do preço sobre a quantia devida (44)<br />

3. Indemnisai - o valor da cousa empenhada, se pareceu<br />

por culpa sua (45), ou as deteriorações pue soffreu pelo mesmo<br />

motivo (46).<br />

4. Dar conta, ao deveeor ou dono, dos fructos e rendimentos<br />

da cousa, ou de qualquer utilidade que delia tirasse (47).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 774 — O credor pignoraticio é obrigado como depositário:<br />

1 — A empregar na guarda do penhor a diligencia exigida pela natureza<br />

da cousa.<br />

TI — A entregal-o com os respect ir os fructos e accessões, uma vez paga<br />

a divida, observadas as disposições dos artigos antecedentes.<br />

Ill - - A entregar o que sobeje do preço, qxuvnão a divida fôr paga, seja<br />

por


DAS COUSAS 353<br />

§ 165. — Obrigações do devedor<br />

Por força do contracto pignoraticio o devedor é obrigado:<br />

1. A satisfazer ao credor as despejas que elle fez com a<br />

conservação e g"uarda do penhor (48).<br />

2. A indemnisar os prejuízos que lhe causarão os vícios da<br />

cousa empenhada (49).<br />

ij 166. — Acçôes do credor e devedor: d'um contra o ouho<br />

A) Ao devedor compete a acção pignoraticia direcía contra<br />

o credor para lhe pedir :<br />

1? A restituição do penhor, depois de paga a divida (50)<br />

ou a differença do preço, se o penhor foi vendido (5l). Pôde<br />

esta acção ser exercida ainda antes de pag-a a divida, se o credor<br />

usa indevidamente da cousa empenhada (52) ou se renuncia<br />

o penhor (53).<br />

2." A indemnisação do valor da cousa e prejuízos resultantes,<br />

se pereceu por culpa delle (54) ou a importância das deteriorações<br />

soffridas igualmente por falta do credor (55).<br />

B). Contra o devedor tem o credor a acção pig-noraticia<br />

contraria para delle haver :<br />

1." As despezas feitas com a conservação e guarda do penhor<br />

(56).<br />

2." R as perdas e prejuízos causados pelos vi cios da cousa<br />

empenhada (57).<br />

Í48) Fr. 8. D. pignorat. act. 13, 7.<br />

(49) Fr. 16 S 1". D. eoãem; Pothier, Hypothec, cap. 4. art. 11. § Il in fine.<br />

(50) Fr. 9 § 3 D. de pig. act. 13,7, Pothier, Hypothec, cap. 4. art. 11,<br />

: : 11-, Doctr. das Acq. 5 331. E' a acção de remissão do penhor. \'ej. Reg.<br />

ii. 737. art. 281.<br />

(51) Fr. R S 1." fr. 7 D. eo.lem. Doctr. das Aee. cit. 5 331.<br />

(5'2) C. 3 in fine C. de pig. act. 13. 7; Pothier, loc. cit. Art. II, § IP<br />

(53) Fr. 9 § 3 D. de pig. art. 13,7. Pothier loc. cit. Art. II, S II. O<br />

credor pórie renunciar o penhor, porque elle & substituído por outro ou<br />

por fiança, ou porque o quer.<br />

(54) C. 6, 8 e 9 C. de pig. act. Doctr. das Aee. § 333; Lohao, Not.<br />

a Mello; 3.14 S 3.<br />

(55) Fr. 24 S 3, fr. S 1." D. de pig. act. 13, 7. ©octr. das ACQ. S 331.<br />

(.56) Fr. 8 D. de pig. act, 13. 7. Doutr. d.is Aeç. S 33.2.<br />

(57) Fr. 16 § 1." p». eodem, Dout. das ACQ. § 332 c nota 748.


354 bikuïïo<br />

§ 167.—Dos modos de extincçâo do penhor<br />

0 penhor (jus pignoris) termina:<br />

1 . Pelo pagamento integral da divida (58).<br />

2. Pela perda da cotisa empenhada (50).<br />

3. Pela renuncia do credor, como se elle entreg-a a cotisa<br />

ao devedor (60).<br />

4. Pela resolução do domínio daquélle que constitue o<br />

penhor (61).<br />

5. Pela confusão da qualidade de credor e de proprietário<br />

na mesma pessoa (62).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Ar. 802 — Resolve-se o penhor:<br />

I — Extinguindo-se a obrigação. — 772.<br />

II — Perecendo a cotisa. — 78.<br />

III — Renunciando o credor. — 803.<br />

IV — Resolvendo-se a propriedade da pessoa que o constituiu. — 647.<br />

V — Confunãindo-se na mesma pessoa as qualidades de credor e dono da<br />

eousa. — 304.<br />

TV — Dando-se a adjudicação judicial, a remissão, ou a. venda do penhor,<br />

autorizada pelo devedor. — 774, .111.<br />

Art. 803 — Presume-se a renuncia, do credor, quando consentir na venda<br />

particular do penhor sem reserva de preço, finando resliluir à sua posse ao<br />

devedor, ou quando a-nnuvr a sua substituição por outré garantia<br />

Ari. 804 Operando-se a confusão tão somente quanto á parte do divida<br />

pignoraticia, subsistirá inteiro o penhor quanto ao resto. — SQ'2, A'.<br />

(58) Fr. fi pr. D. quib. mod. pig. solv. 20. 6: Item liberatur pigmus...<br />

si qua ratione obfigatio «'jus finiat.<br />

(",!)) |V)-. x pr. D, eodem. Quando o objecto do penhor o um credito,<br />

rxtini-lo o credito, extingue-se o penhor.<br />

(60) iFr. o. pr. !i>. eodem, C. 7 o » C. de remission, pig. S. 2fi.<br />

(61) iFr. 13 § 1." D. de pig. 20, 1. Ex.: daes-me em penhor livros que<br />

forão legados sob condição resolutiva. Resolvido o vosso dominio pelo implemento<br />

da condição, extingue-se o penhor.<br />

(62) '"Res sua. nemini pignori esse potest."<br />

Não é preciso advertir que a nullidade tia obrigação acarreta por via<br />

de conseqüência a nuJiidaãe do penhor. 'Digest. Port. Ill, art. 1.203.


CAPITULO II<br />

DA ANTICHRESE<br />

§ 168. — Nocãu da antichrese: característicos<br />

1. A Antichrew é a convenção pela qual o devedor, entregando<br />

um immovel ao credor, lhe transfere o direito de perceber<br />

os iructos e rendimentos do mesmo immovel em compensação dos<br />

juros da quantia devida (1).<br />

O objecto próprio da antichrese, na pureza do antig-o direito,<br />

era tão somente compensar os fructos com os juros (2).<br />

Mas como nos casos em que havia excesso do valor dos<br />

fructos ou rendimentos sobre a taxa dos juros, imputava-se, por<br />

força ou da lei ou da convenção, esse excesso no capital, d'ahi<br />

veiu o uso da linguagem jurídica de contundir sob o nome da<br />

antichrese uma e outra operação (3).<br />

Assim que : no estado actual do direito, se diz haver sem-<br />

(1) Pr. 11 § 1." D. de pig. et. hypothec. 20, I. Yoet. Pandect 20. 1 numero<br />

23: Precipue vero protaatum in pignoribus pactum antichreseos, quo<br />

id agitur ut creditor utatur pignore vicem in usuramm, donee debitum solutum<br />

fuerit. Hubero. Pandect, eodem, n. 15: Pactum quo convenit, ut creditor<br />

re pignorata loco usuramm fruatur, secundum cujusque i*ei naturam<br />

Vej. Pothier, Hypotheq. cap. 5, art. l.°, Jourdan, Hypothèque (Etudes de<br />

Droit Romain) P. II, sect. 5, capit. 41 § 2. [Dig. Port. Ill, art. 1,232 e<br />

C da Rocha § 66S.<br />

A Ord. 4, 67 § 4 prohibia a convenção de antichrese por eivada de<br />

usina, e só a permittia entre o senhorio directo e o emphyteuta. Hoje não<br />

subsiste mais esta prohibição, visto como não temos lei de usura. Vej. Consolid.<br />

das Leis Civis, art. 768 nota 1.<br />

(2) Jourdan, Hypotheq., loc. cit. Troplong, Nantissement, Gage et antichrese,<br />

n. 497, e »13.<br />

(3) Troplong, antichre.se, n. 513, Voet. Pandect. 20, 1, n. 23, Rocha<br />

§ 668, Dig. Port. Ill, n, 1,233.<br />

24


356 biktëifo<br />

pre antichrese, quer os rendimentos sejão tão somente compensados<br />

nos juros, quer sejão também imputados no capital (4).<br />

2. A antichrese mais commumente se toma na accepção<br />

do direito que da convenção resulta ao credor (5).<br />

Nesta accepção a antichrese é uin direito real ; e como tal<br />

adhere á cousa e a acompanha por todas as mutações por que<br />

passa (6).<br />

A Convenção por si só (n/idci) não basta para transferir o<br />

direito antichretico ao credor ; é mister a tradição do immovel<br />

sobre o qual ella se constitue (7).<br />

3. Pôde a antichrese andar ligada á hypotheca, ou ter<br />

existência isolada e independente (8). N'um e n'outro caso ella<br />

se rege sempre por suas leis (9).<br />

4. A convenção, pela qual a antichrese c constituída,deve<br />

ser reduzida a escriptura publica, se o valor do direito transferido<br />

excede a taxa da lei (10).<br />

E é de'necessidade, para que possa valer contra terceiros,<br />

que o titulo da sua constituição seja transcripto no registro geral<br />

da respectiva comarca (11).<br />

(4) Nota antecedente. Vej. Cod. Civil franc, art. 2,085, do Chile, artigo<br />

2.442, Portuguez art. 873.<br />

(5) Loi n. 1,237, de 24 de Set. de 1864, an. 6, Décret, n. 3,453, de 25<br />

de Abril de 186a. art. 261. A antichrese torna-se pelo contractu, pelo direito<br />

resultante e pela cousa. Xoodt, Observât. 2, 3.<br />

(6) Lei n. 1,237, art. 6, Décret, n. 3,453, art. 261. Em França ha<br />

grande controvérsia sobre se a antichrese é um direito real ou pessoal<br />

Vej. Troplong cit. n. -",24 e seg., Zacariae, § 438. Mourlon III, n. 1,229 o<br />

1.230.<br />

(7) Pr. 11. § 1." D. de pig. et hypoth. 20, í: Si antichresis pacta sit et<br />

in fundum aut in ;edes aliquis nuluc.alur. Vej. Pothier, loc. cit. Hoje a<br />

transcripção de titulo suppre a tradição. § 48 acima e nota 11 abaixo.<br />

(8) C. 1, C. Cum eo, 4,26; C. 14 C. de usuris 4, 32, .Maynz, § 246, nota<br />

14. Troplong cit., n. 496.<br />

(9) Pothier, loc. cit. Troplong. cit. 496.<br />

(10) Dig. Port. III, art. 1,232, Rocha § 668. A antichrese — direito<br />

rent sobre immovois. é considerada como cousa incorporea immovel, isto 6<br />

immovel pela cousa a que esta ligada.<br />

(11) Loi n. 1.237, art. 6 e § 2 e art. 8, Décret, n. 3.453, art. 261 e 262.<br />

Aeenca do processo da transcripção, vej. acima § 52.<br />

O Direito Romano admittia uma espécie de antichrese tácita, a qual se<br />

reputava existir quando o devedor de quantia sem juros entregava ao credor<br />

um immovel fruglfero. Pr. 8, D., in quib. caus, pig. 20, 2: Cum de-


Às cobsÀâ %$S<br />

CÓDIGO CIVIL,<br />

Art. 805 — Pôde o devedor, ou outrent por elle, entregando ao credor um<br />

immovel, ceder­lhe o direito de perceber, em compensação da div­ida, os fructos<br />

e rendimentos. — 677, 760, 806, 808.<br />

§ I o — E' permittido estipular que os fruotos e rendimentos do immovel,<br />

na sua totalidade, sejam percebidos pelo credor, somente à conta de jtiros.<br />

§ 2" — O immovel hypothecaão pôde ser dado em antichrese pelo devedor<br />

ao credor hypothecario, assim como o immovel sujeito á antichrese pôde ser<br />

hypothecaão pelo devedor ao credor antichretico.<br />

§ 169.—A antichrese em suas relações com a taxa de juros.<br />

1. A.antichrese é por sua natureza, e como o seu nome<br />

o está indicando (12), destinada a compensar os juros do dinheiro<br />

devido :—tem o devedor o uso da somma emprestada; percebe<br />

em retorno o credor os fruetos oa rendimentos da cousa antichrectica.<br />

Ha na realidade uma mutuação de uso (leciproci usus)<br />

,13).<br />

2. Pode acontecer que excedão a taxa dos juros os fruetos<br />

ou rendimentos que o credor percebe. Nesta emergência, será o<br />

credor obrig­ado a restituir o excesso, ou a imputal­o no capital<br />

?<br />

Se ha convenção das partes a respeito, deve se observar<br />

o estipulado. E' licito ao devedor estipular que todos os fruetos<br />

ou rendimentos sejão percebidos á conta tão somente dos juros,<br />

ainda que a importância dos rendimentos exceda á taxa legal ou<br />

bitor gratuita pecunia utatur, protest creditor de fruetibus rei sibi pignorataa<br />

ad modum legitimas usuras retinere. Vej. Cujac. Obser. 8, 17, Voet.<br />

Pandect. 20. 1, n. 23, Huber. Pandect, eodem, n. 15.<br />

'No nosso Direito é absolutamente inadmissível a antichrese tácita, porquanto<br />

ninguém pôde ser obrigado a pagar juros, senão ou por decreto<br />

de lei, ou por estipulagão expressa e escripta. Lei de 24 de Out. de<br />

1831, art. 2.<br />

(Ii2) A palavra grega antichresis — 6 traduzida em latim pela phrase —<br />

reciproci usus. (Hub. Pandect. 20, 1, n. 15) mutuus ■ u$us. Vej. Noodt<br />

Observât. 2, cap. 9.<br />

(13) Jourdan, Hypoth. Part. II, sect. 5, cap. 4,1 § 2: "'Le pacte (de antichrese)<br />

n'est, au fond, qu'une variété de l'échange; on échange l'usage<br />

d'un capital en argent contre l'usage d'un capital d'une autre nature, une<br />

terre, Line maison."


258 DIREITO<br />

convencionada dos mesmos juros. Não temos, como outros povos,<br />

lei de usura, que resista a uma convenção tal (14).<br />

3. Se não ha estipulação a respeito, cumpre distiug-uir :<br />

A) Senão se estipulam juros (gratuita pecunia) e não obstante<br />

o devedor entrega ao credor um prédio frugifero, o principio<br />

de direito é—que o credor deve conta dos rendimentos,—<br />

que deve imputal-os no capital (15). E por uma razão obvia—o<br />

devedor não pôde ser forçado a pagar juros que não estipulou.<br />

B) Se as partes estipularão juros, com taxa definida, ou<br />

sem declaração de taxa (caso em que vigora a taxa legal) (16), o<br />

excesso dos rendimentos ainda deve ser imputado no capital.<br />

Ksta solução é um corollario da natureza da antichrese, tal qual<br />

ella se constituio no seu ultimo estado. A antichrese é um uso<br />

mutuo, ou antes, uma troca de uso por uso. Desde que, pois,<br />

o valor do uso do dinheiro se acha taxado, ou por convenção ou<br />

por força da lei, a conseqüência é que o uso da cousa antichretica.<br />

isto é, a importância dos rendimentos deve compensar os juros<br />

até a concurrente quantia (17). Tal é o principio dos contractus<br />

commutativos (18)<br />

A doutrina contraria daria em resultado pagar o devedor<br />

mais juros do que os estipulados. Ora é injuridica a presumpção<br />

de que alguém quer pagar mais do que deve (19).<br />

Na relação de direito exposta nenhuma influencia exerce<br />

(14) Dei de 24 de üuc. de 1832, art. 1.°. Mo Direito romano e no franco/,<br />

(lei de 1807) uma tal convenção não é permittida por usuraria. Vej.<br />

Mouiion Ml, n. 1,226, Voet, 20 1, n. 23.<br />

(!•">) Segundo o nosso Direito o devedor não é obrigado a. pagar juros,<br />

senão ou mediante estipulação escripta (lei de 24 de Out. de 1832, are. 2.")<br />

ou decreto expresso da ici: Rocha S 77!). No caso figurado, que segundo<br />

.. \). H. era de antichrese tácita, não se dá. pelo nosso, verdadeira antichrese.<br />

Vej. nota 11 do § 168 acima.<br />

(16) Lei de 24 de Out. de 18'»2, art. 3, Cod. Com. art. 248.<br />

(17) Old. 7;: pr. Dig. Port. I, act. 1,164. E' esta a doutrina do Direito<br />

iRomano (fr. 1 § 3 D. de pignor. 20, 1; 'Const. 17 C. de usuris, 4.320;<br />

e a do France/. (Troplong, Antichr. n. 536. K uma tal doutrina não e<br />

conseqüência da lei de usura, como se vae vêr, mas da natureza do contractu.<br />

(18) Pothier. Oblig. n. 33... l'équité, en fait de commerce, consista m<br />

dans l'égalité, desque cette égalité est blessée et qui l'un des contractants<br />

donne plus qu'il ne reçoit, le contrat est vicieux, parce qu'il pêche<br />

contre l'équité qui y doit régner."<br />

(19) 'E' absolutamente inadmissível uma tal presumpção.


DAS COUSAS 359<br />

a lei de liberdade de juros. A dita lei permitte ás partes estipularem<br />

a taxa de juros que lhes aprouver ; eis o seu principio ; mas<br />

da dita lei não se pôde induzir que o devedor seja obrigado a,<br />

pagar mais juros do que estipulou, e é este o ponto da questão 1<br />

sujeita.<br />

4. Releva, porém, advertir que se os rendimentos do<br />

prédio antíchretico são incertos, pois que esta incerteza introduz<br />

no contracto um elemento aleatório; entende-se que o credor não<br />

deve contas ao devedor (20). ,<br />

§ 170.—Direitos do credor antichresista.<br />

1 . O credor antichresista, eis que a cousa lhe é entregue,<br />

adquire sobre ella posse juridica (21), e, por conseqüência, lhe é<br />

permittido intentar em seu próprio nome os remédios possessore<br />

(22).<br />

2. Pôde empregar a cousa nos usos a que c destinada,<br />

usolruil-a por si ou arrendal-a a terceiro, salvo prohibição expressa<br />

no contracto (23).<br />

3. Tem o direito de reter a cousa sob sua posse, emquanto<br />

a divida não fôr paga (24).<br />

4. O direito do credor, transcripto o titulo de antichresc<br />

(20) C. 17 C. de usuris, 4. 32: 'Si ea lege possessionem mater tua apud<br />

credUorem suum obligavit, ut frutus in vicem usurarum eonsequeretur,<br />

obtentu majoris percepti emoiumenti propter incertum proventum rescindi<br />

placita non possunt.<br />

Mas se a incerteza viesse a aesapparecer, como se o credor arrendasse<br />

0 prédio antíchretico por quantia certa, em tal caso o excesso verificado<br />

deve .ser applicado ao capital. Voet, 20, 1. n. 2S. Hub. Pand. cod. n. 15<br />

Donneau sobre a C. 17 C. de us. n. 4.<br />

(21) Fr. 11 § 1.". D. de pig. et hy.poth. 20, 1... cousque retinet possessionem<br />

pignoris loco. F' uma das espécies de posse derivada.. Vej.<br />

acima § 12.<br />

(22) Pothier, Hypoth. cap. 5, art. I o . Dig. Port. I Li art. 1,23«, Rocha<br />

§ (Mit). O citado fr. 11 § 1". D. de pig. et hyp. dava ao credor uma acção<br />

in factum para recuperar a posse da cousa anticretica, Essa


360 DIREITO<br />

no regitro, prevalece contra as alienações e hypothecas da cousa<br />

registradas em data posterior (25), á saber :<br />

A) As alienações da cousa antichretica são validas, mas<br />

o immovel passa para o adquirente com os onus da antichrese.<br />

Assim que : o adquirente não poderá reivindicar o immovel do<br />

poder do credor, senão pagando a divida (26).<br />

B) Igualmente o credor hypothecario (de data posterior)<br />

não pôde excutir o immovel, emquanto não estiver paga a divida<br />

do credor antichresista (27).<br />

5. O direito do antichresista reveste na realidade o caracter<br />

de privilegio sobre os fructos e rendimentos ; porquanto esses<br />

fructos e rendimentos ficão sujeitos ao pagamento da divida,<br />

excluídos os credores de hypothecas posteriormente inscriptas<br />

( 39 )<br />

Km relação, porém, ao valor do immovel em si, o antichresista<br />

é um simples chirographario. Assim se elle deixando de<br />

fazer uso do seu direito de retenção, permitte que se consume a<br />

execução do immovel, não poderá allegar preferencia sobre o<br />

preço (29).<br />

6. Ao credor antichresista é permittido oppôr á penhora<br />

do immovel, embargos de terceiro possuidor, pois que, como acima<br />

se disse, tem posse juridica sobre a cousa antichretica (30).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 760 — O credor antichretico tem direito a reter em seu poder a cousa,<br />

emquanto a. divida não fôr paga. Extingue-se, porém,, esse direito, decorridos<br />

trinta arinos do dia da transcripção. — 756, 80'6, 808.<br />

(26) Leis citadas na nota antecedente. Vej. Pothier, Hypotheq. cap. !><br />

aft. 1, Mouiion III, n. 1,2#0, I o .<br />

(27) Artigos citados na nota 5 acima. Mourlon III, n. 1,230, 2".<br />

Se a cousa, por não ter havido opposição do credor antichresista<br />

foi executada; nada obstante, o direito do credor subsiste com todos os seus<br />

effeitos contra o arrematante. Vej. 'Lobão. Execuç. § 468.<br />

A doutrina de Pereira e Souza (nota 860) — de que os direitos reaes<br />

impostos pelo executado se extinguem com a penhora e arrematação — doutrina<br />

duvidosa mesmo no tempo em que escreveu o sábio praxista, não<br />

tem hoje vigor, desde que os titulos, pelos quaes são constituídos os direitos<br />

reaes, se achão transcriptos no registro geral da comarca.<br />

(28) Mourlon III, n. 1,229, Rocha § 66'9.<br />

(29) Mourlon III, n. 1.231, 1.°, Rocha § 6«».<br />

(30) Ernbargus de terceiro são também remédio possessorio. Vej".<br />

acima § 20.


DAS COUSAS 3bl<br />

írt. 806 — O credor anlichrctico pôde fruto" directamente o im/movel ou<br />

arrendal-o a terceiro, salvo pacto em contrario, mantendo no ultimo caso, até<br />

ser pago, o direito de retenção do im/movel. — 760.<br />

Art. S0'8 — O credor anUchretico pôde vinãicar os seas direitos contra o<br />

adquirente do immovel, os credores chirograpliicos c os hypothccarios posteriores<br />

á transcripção da antichrese — 677, 760, 806.<br />

§ I o — Be, porém, executar o immovel por não pagamento da divida, ou<br />

iicrniittir que outro credor o execute, sem oppor o seu direito de retenção ao<br />

exequente, não terá preferencia sobre o preço.<br />

§ 2" — 1'ambcm não o terá sobre a indemnização do seguro, quando o<br />

prédio seja destruído, nem, se fôr desapropriado, sobre a da desapropriação.<br />

§ 171.—Obrigações do credor aniichresista.<br />

Pois que o credor antichresista tem a posse da cousa,<br />

a administra e percebe-lhe os fructos e rendimentos, é obrig-ado:<br />

I o . A conserval-a e a fazer os reparos úteis e necessários<br />

(31).<br />

2 o . A pag'ar os impostos e os foros que a onerão (32).<br />

Tanto as despezas sob este numero como as do antecedente são<br />

prelevadas nos fructos e rendimentos (33). Se o immovel nada<br />

rende, o devedor as deve pagar ao credor (34).<br />

3? A indemnizar os fructos que deixou de perceber por negligencia,<br />

e as deteriorações que o immovel soffreu por culpa sua<br />

(35).<br />

As obrigações do antichresista são daquellas que procedem<br />

da posse da cousa (obligationes propter rem) Pôde elle, pois, se<br />

eximir délias, entregando a cousa ao devedor (36).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 807 — O credor antivkrctivo responde pelas deteriorações, que, por<br />

culpa sua, o im.rn.ovcl soffrer, e pelos fructos, que, por sua negligencia, deixar<br />

de perceber.<br />

(31) Pothier. Hypothec. C. 5, art. 1. Mourlon, III, n. 1,234, 2 o .<br />

(32) C.


SECÇÂO SEOUJNíOA<br />

HYPOTHECA<br />

CAPITULO I<br />

HYPOTHECA : NOÇÕES GERAfiS<br />

§ 172. — Origem histórica da hypotheca.<br />

1. A hypotheca íoi uma creação lenta e gradual do Direito<br />

Romano.<br />

A idea de asseg'urar o cumprimento da obrigação por<br />

via de uma garantia real devera ter acudido ao espirito do homem<br />

logo que a experiência o advertio da fallibilidade da garantia<br />

puramente pessoal.<br />

Dous forão os primeiros alvitres a que recorrerão os Romanos<br />

para crear a garantia real (1).<br />

2. Consistia o primeiro em alienar ou ceder o devedor ao<br />

credor a cousa destinada a garantir a divida (niancipare vel in<br />

jure cedere'), com a clausula (Jiducia) do credor lh'a revender, paga<br />

a divida (2).<br />

Com esta cessão o credor a adquiria o direito de reivindicar<br />

a cousa se lhe fosse tirada. Nisto estava toda a sua se-<br />

(1) Vej. Maynz I, § 239 e Jourdan, Hypothèque, Etude de Droit Romain<br />

P. I. Sect. I, cap. 5.<br />

(2) Gaio Com. II, § 59 e 60; Izidoro, Origin. V, 25: ÍFiducia est cum<br />

res aliqira 'sumendse mutuœ pecuniae gratia vei mancipatur, vel in<br />

jure ceditur. Boetius, ad Cicer. Topic. 4: Fiduciam vero accipit, cuieumque<br />

res aliqua mancipatur ut earn mancipanti remancipet... Hœc mancipatio<br />

fiduciarja nominatur idcirco quod restituendi fides interponitur.<br />

/


DAS COUSAS 363<br />

gurança. Não se lhe transferia, porém, o direito ás vantagens<br />

materiaes do domínio. Era pois obrig-ado a imputar na divida<br />

os rendimentos c utilidades que lhe advinhão do gozo da cousa<br />

(3). Na falta de pagamento no prazo estipulado, não a podia<br />

reter, mas devia vendel-a e restituir o excesso do preço (4). E<br />

se a divida era paga em tempo, o domínio da cousa não voltava<br />

ao devedor de pleno direito ; — havia mister praticar-se a<br />

mancipação ou cessão com os ritos usuaes (5).<br />

3. O segundo alvitre se reduzia em substancia ao seguinte;<br />

O devedor entregava ao credor a cousa sem lhe transferir<br />

nenhum direito real sobre ella (pignori deponere) (b). A garantia<br />

do credor repousava na impossibilidade physica em que ficava<br />

o devedor de dispor da cousa, e na anciã, natural á este,<br />

de rehavel-a pelo pagamento da divida (7). Mais tarde se conierio<br />

ao credor a posse jurídica com os respectivos interdictos (8).<br />

e de costume se estipulava a clausula de poder elle vender a cousa<br />

e pagar-se com o preço, restituindo a differença (9).<br />

4. Estes al vitres, porém, erão defeituosos e vexatórios.<br />

Um e outro desapossavão o devedor da cousa. O primeiro collocava<br />

o devedor na dependência do credor para readquirir o domínio<br />

(10). O seg - undo, não conferindo direito real algum, deixava<br />

o credor exposto a perder a g - arantia, se porventura a cousa<br />

lhe fosse usurpada e viesse a cahir em mão do terceiro que<br />

não o espoliador (11).<br />

(3) iPaul. Recept. Sentent. II, 13 § 2. Vej. Maynz, cil;. § 239.<br />

(4) Pa*l. Recept. Sentent, ill 13 §§ 1" e 3 o .<br />

(õ) 'Maynz. S 239. .lourrïan, c. 5 (pag. 3


36 + DIREITO<br />

'5. Tacs esboços, pois, não davão ainda a hypotheca'; ella,<br />

porém, ia surgir no campo do direito como meio de vencer uma<br />

difficuldade particular.<br />

O arrendatário do prédio rústico estava na impossibilidadade<br />

de garantir a obrigação de pag-ar as pensões por qualquer<br />

dos dous modos expostos ; não era dono do immovel para poder<br />

cedel-o ao credor, nem tão pouco podia entregar-lhe os instrumentos<br />

e utensílios aratorios. por carecer délies. Diante destas<br />

difficuldades o espirito pratico sugerio a idéa de constituir a<br />

garantia real por uma simples convenção sem a necessidade do<br />

devedor perder a posse da cousa. Com effeito, o arrendatário<br />

se obrigava a dar fiança ás pensões, e se não a dava, ficava o<br />

locador autorisado a appréhender os moveis introduzido» {Mata,<br />

invectá) no prédio (12).<br />

O processo de crear um direito real por uma simples convenção<br />

repug"uava ao antigo Direita Civil. E pois aquelle Direito<br />

não ministrava acção para tornar effectiva uma semelhnte convenção<br />

(13).<br />

6. Um pretor {Salvias), convencido no entanto da equidade<br />

da alludida estipulação, supprio a falta da acção, creando um<br />

interdicto possessorio, por via do qual podia o credor apoderarse<br />

dos moveis introduzidos no prédio ainda quando estivessem<br />

em poder de terceiro (14).<br />

O dito interdicto (adispiscendœ possessionis) não era ainda<br />

satisfactorio : toda a garantia do credor estribava no facto da<br />

posse, e, portanto annulava-se desde que os moveis (illata) estivessem<br />

em mão de pessoa contra quem fosse impraticável o remédio<br />

possessorio (15).<br />

7. Um outro pretor {Servias) deu mais um passo e attribuio<br />

francamente ao dono do prédio arrendado uma acção real<br />

(in rem actio), e desta maneira o armou da faculdade de reivindicar<br />

os moveis, introduzidos no prédio, do poder de quem quer que<br />

os detivesse (16).<br />

(12) Vej. Maynz, cit. § 239 not. 16.<br />

(13) Maynz, cit. § 239, not. 17.<br />

(14) Maynz, cit. § 239, Jourdan, P. I., Sect. 4, cap. 13.<br />

(15) Vcj. a nota 11 acima.<br />

(16) Maynz § 239, Jourdan cap. 14. A in rem actiopresuppunha necessariamente<br />

um direito real sobre os moveis introduzidos (Mala et invicta)<br />

no prédio.


DAS COUSAS 365<br />

O avanço" feito importava nisto : O locador tinha um direito<br />

real sobre os moveis e a competente acção ; este direito elle<br />

o adquiria pela convenção mia, sem necessidade da tradição.<br />

Aqui está em essência a hypotheca.<br />

8. A pratica de todos os dias poz claras a utilidade e vantagens<br />

do invento. E dest'arte, com o andar do tempo, o prin<br />

cipio da acção sciviana íoi-se ampliando a outros casos e acabou<br />

por se tornar geral (17).<br />

A generaiisação do principio da acção tcrviana creou esta<br />

doutrina :<br />

«A convenção simples, núa, é sufficiente para gerar um<br />

direito real [jus in ie) em segurança da divida e por força do qual<br />

o credor pôde perseg-uir a cousa onde quer que seja achada, e<br />

iaijel a vender para se pagar com o seu preço.»<br />

A quelle direito real tomou a denominação de pi gnus hypotheca<br />

(18).<br />

E assim se formou essa admirável instituição, — resultado<br />

antes da suecessão dos factos juridicos, do que realisação d'um<br />

pensamento preconcebido.<br />

Praticada diariamente, os jurisconsultos se apoderarão da<br />

idea, e submettendo-a a uma analyse profunda e a uma causuistica<br />

vasta, a estudarão em sua essência, nos seus corollarios e<br />

nas suas multiplicadas relações com as diversas instituições<br />

do Direito civil.<br />

Desta elaboração resultou um corpo de doutrina scienticamente<br />

organisado.<br />

§ 173. — Amiga legislarão : a nova reforma acerca<br />

da hypotheca.<br />

1. A noção de hypotheca recebeu, de certo, no Direito<br />

Romano, pleno e completo desenvolvimento no que diz respeito<br />

ao estudo dos princípios, aos seus corollarios e variadas applicações.<br />

Mas faltavão ao regimen hypothecario daquelle Direito<br />

(17) May nu S 23©.<br />

(18) A palavra — hypotlicca — é grega e se traduz litteralmcntc em<br />

latim pela palavra — supositio. Tem-se escripto largas Dissertações acerca<br />

da questão de saber se a noção da hypotheca é exclusivamente Romana ou<br />

se foi importada da Grécia. Vej. Jourdan, cap. 18, (pag. 167).


366 DIREITO<br />

os requisitos que são como que as condições de que carece a hypotheca<br />

para que possa desembaraçadamente preencher a missão<br />

que lhe compete — de offerecer garantia segura e certa á<br />

divida, e fortificar o credito territorial.<br />

Estes requisitos são a publicidade ea especialidade (l'J).<br />

No systema romano se admittião as hypothecas geraes<br />

de bens presentes e futuros. Geral ou especial, a hypotheca se<br />

conservava occulta. Era complicada e inextrincavel a materia das<br />

preferencias. Um tal systema deixava o credor exposto ás machinações<br />

da fraude e entregue a todas as contingências da incerteza.<br />

O antigo Direito portuguez herdara o systema romano, e<br />

no decurso de séculos apenas lhe fizera modificações accidentaes.<br />

2. Em 1S46 ensaiou-se entre nós pela primeira vez o principio<br />

da publicidade : mas esse ensaio foi imperfeito e manco :<br />

basta relembrar que continuarão a subsistir as hypothecas geraes,<br />

incompatíveis com um systema regular de publicidade (20).<br />

De ha muito os interesses agricolas, da maior transcencia<br />

em um paiz como o nosso, instavão com energia por uma<br />

reforma que. organisando a hypotheca sobre a larga base da publicidade,<br />

assegurasse ao credito territorial a força e a expansão<br />

de que é capaz (21).<br />

Veio dar satisfação a esses votos a lei de 1864 (22).<br />

(19) Vej. Troplong, Privileg. et Hypoth. Introduction<br />

(2'0) Vej. Troplong, loe. cit. C. da Rocha II Nota. DD<br />

(21) Veja-se a Lei n. 317 do 21 de Out. de '184-3. art. 3'5 e o Décret.<br />

n, 1-82, de 14 de Novembro de 1846.<br />

(2'2) O projecto da reforma hypothecaria foi apresentado na câmara do?<br />

deputados oa sessão de 25 de Julho de 1854, pelo Sr. .T. T. Nabuco de<br />

Araújo, então membro daquella câmara c ministro da justiça.<br />

Em Julho de 1856 o autor do projecto offereceu um. substitutrvo, que<br />

depois de discutido foi approvado em sessão de Agosto desse anno.<br />

No Senado, para onde foi remettida no mesmo anno de 185€, a. proposição<br />

da Câmara dos Deputados correu varia fortuna, até que, emendada<br />

pelas commissões reunidas de legislação e fazenda (Parecer de 19 de Maio<br />

de 1864), e submettida á. discussão, foi approvada, e tendo sido sanceionada<br />

é hoje a lei n. 1.287, de 24 de Setembro de 1864. Para sua execução forão<br />

expedidos Regulamentos por Decretos n, 3.453, de 26 de Abril de 1865 e<br />

n. 3.471, de 3 de Junho de 1865. Os ditos Regulamentos são obra do Sr. Nata<br />

uco de Araújo.


DÀS COUSÂS 367<br />

3. Um bom regimen hypothecario presuppõe :<br />

a) A publicidade da transferencia do dominio e a da constituição<br />

dos onus reaes sobre os immoveis (23) ;<br />

b) A publicidade das hypothecas :<br />

c) A especialidade, como condição da publicidade (24).<br />

Com effeito aquelle que tem de confiar seus capitães sob<br />

a garantia da hypotheca, carece de saber :<br />

1.° Se o immovel offerecido continua no domiuio do proprietário<br />

apparente, e se o valor desse immovel se acha ou não diminuído<br />

pela constituição de onus reaes ;<br />

2." Se o mesmo immovel se acha gravado por hypothecas<br />

anteriores.<br />

Ministrão-lhe estas informações de facto o livro da trauscripção<br />

e o da inscripção.<br />

A nossa lei transladou das legislações modernas para seus<br />

textos os progressos que erão compatíveis com o nosso Direito,<br />

e com o estado da nossa propriedade territorial. Assim :<br />

a) Creou o registo da transcripç-ão dos titulos de transferencia<br />

de dominio e constituirão de onus reaes sobre iminoveis,<br />

e regularisou a inscripção das hypothecas (25).<br />

b ) Estabeleceu a especialidade. Afora as hypothecas legaes<br />

das mulheres casadas, menores e interdictos, todas as mais são<br />

especiaes ou devem ser especialisadas, e dependem da inscripção<br />

para que possão valer contra terceiros (26).<br />

c) Simplificou d'uma maneira notável as questões de<br />

preferencias. A hypotheca périme os privilégios e quaesquer<br />

preferencias (27). Na collisão de hypotheca e hypotheca sobreleva<br />

a que é primeira [prior); a prioridade é determinada pela<br />

data da inscripção, significada no numero de ordem (28).<br />

4. Uma lei hypothecaria é uma obra essencialmente jurídica,<br />

mas nào podem deixar de influir na combinação dos<br />

principios que a devem constituir, considerações tiradas da ordem<br />

econômica.<br />

(23) Troplotigr, cit. Introduc. pag. XXXV, e XL.IV.<br />

(24) Troplong-, Pnvileg. et Hypoth. II, n. 513, infine: la spécialité<br />

prepare l'incription; l'inscription assure la publicité."<br />

(25) Lei n. 1.237, de 24 de Setembro de 1864, art. 7 'Décret, n, 3.453,<br />

de 26 de Abril de 1865, art. 1—100 (Tit. 1.", cap. 1—8).<br />

(26) Cit. Lei u. 1.237, art. 2 § lu e art. 9.<br />

(27) Cit. Lei art. 5 § 1." e 2.°.<br />

(28) Cit. Lei art. 2.° § 9 e art. 9 e § 4, 5 e 6


368 toíkSitô<br />

Na nossa reforma, elaborada sob a pressão das exigências<br />

do credito territorial, predomiuárão evidentemente os motivos<br />

econômicos; dahi o sacrifício do elemento jurídico em pontos da<br />

maior importância (29).<br />

Expungirão-se diversos casos de hypothecas legaes que<br />

tiuhão por si a sabedoria dos séculos, e razões pouderosas de<br />

justiça e equidade (30).<br />

Desarmou-se o devedor de meios de detesa iuauferiveis,<br />

derogfando-se para esse fim princípios fundamentaes do Direito<br />

das Acções e do Processo (3i).<br />

Mas, não obstante estes defeitos que são conseqüências<br />

das ideas do tempo, a reforma deve ser saudada como um<br />

melhoramento e um progresso importante na nossa leg-islaçào<br />

civil.<br />

(29) Vej. Troplong, cit. Introduce, pag. XXVIII.<br />

(30,) Taes são a hypotheca legal do credor de dinheiro, com que se comprou<br />

o immovel, a do credor de alimentos, a do credor de bemfeitorias, a<br />

do credor de despezas funerárias. Vej, Pereira e Souza § 46>8.<br />

(31) Vej. Lei, art. 14 e S 1" — 4°, Décret, n. 3.657 art. 282—-29-2.<br />

A lei e o 'Regulamento, pelo que diz respeito ao devedor, são verdadeiras<br />

leis de excepção. O devedor é, por assim dizer, entregue inerme â<br />

avidez e á impaciência do credor.<br />

São na verdade, excepções tão odiosas quão vexatórias as seguintes:<br />

1.° O seqüestro prévio, contra o qual não se admitte outra defesa senão<br />

a de hypotheca extineta e canceUaãa;<br />

2." A hypotheca, não estando cancellada a inscripção, produz todos os<br />

seus effeitos, ainda que se prove pelos meios mais decisivos que está<br />

extineta.<br />

3." A nullidade da hypotheca não pôde ser opposta como excepção, mas<br />

carece ser decretada cm acção ordinária;<br />

4." Os bens arrematão-se ainda que o sou valor exceda o dobro da<br />

divida.<br />

5." O terceiro detentor não pôde livrar-se da execução, largando a<br />

cousa hypothecada.<br />

"Le crédit n'est pas le seul qui ait droit à dos garanties. La propriété<br />

n'est pas moins fondée à en reclamer... Or pour que la propriété soit<br />

efficacement garantie, il est indispensable qui le débiteur, qui l'a offerte<br />

comme sûreté, trouve, dans des formalités prudentes, la certitude que ses<br />

créanciers n'abuseront pas de la position, ne s'enrichiront pas injustement<br />

à ses dépens, et feront vendre son immeuble á sa vraie valeur. Il faut, de plus,<br />

des precautions pour que la brusquerie dos prêteurs no trouble pas violemment<br />

la possession des tiers détenteurs et consente à entrer avec eux en<br />

compte de leurs ameliorations." Troplong, cit. Introduct. pag. XXVLl I.


'ùkè CÜÜSÀá 369<br />

§ 174. —2\0{ão da hypothec a<br />

A hypotlieca (32) é o direito r


370 blRfilTÕ<br />

2. A' h}'potheca de ordinário anda ligado o direito de<br />

preferencia, isto é, — o direito por força do qual o preço do imuiovel<br />

é precipuainente applicado ao pagamento da divida, excluídas<br />

até á concurrente quantia as dividas que não estão sob igual<br />

garantia (38).<br />

3. O direito de sequela e o de preferencia eis a virtude, a<br />

força da hypotheca. A preferencia, porem, não é, como a sequela,<br />

um corollario necessário do elemento real, mas tão somente<br />

um predicado que a lei artificialmente confere á hypotheca predicado<br />

que também pôde ser attribuido a direitos puramente pessoaes<br />

(39).<br />

4. Os direitos reaes, por via de regra, collocão a cousa em<br />

que recahem, sob a acção physica da pessoa a que pertencem e<br />

que os exerce: tal o dominio, a emphyteuse, o usofructo, o uso da<br />

habitação, as servidões rústicas algumas das urbanas (40). A<br />

hvpotheca, porém, não gera um semelhante effeito—o immovel<br />

hypothecado não fica nem sob a posse, nem sob o poder do credor<br />

(41). Esta peculiaridade procede de que a hypotheca — simples<br />

vinculo real de segurança, não traz para o credor a minima<br />

parcella de direito ás vantagens e utilidades materiaes da propriedade.<br />

5. A constituição de hypotheca propriamente não altera<br />

A palavra sequela no sentido exposto foi primeiro usada em portuguez<br />

por O. Telles. Nota ''-'! ao art. 4 du Decreto de 26 de Out. de 1836; adoptou a<br />

a lei portugueza de l°de Julho de 1863.<br />

(38) l.ei. art. .' i :>. art. 5 5 2. Décret, art. 24:í e 244.<br />

(39) O direito de sequela, jus pignus persequendi, — é, como acima<br />

se observou) o próprio direito real em acção. A preferencia não ê. uma conseqüência<br />

necessária do elemento real. Troplong, II, n. 415.<br />

Assim que: ha casos de hypotheca -sem o effeito da preferencia; ta!<br />

c- a hypotheca judiciaria d.-ei. ait. 3 § 12); ha casos de preferencia sem<br />

hypotheca, como os privilégios que a lei n. 1.237 não derogou (art. 5 § 2).<br />

Mas não ha no nosso Direito hypotheca sem o direito de sequela.<br />

(40) Vej. acima §§ 128 e 130.<br />

(41) § 7 1. de act. 4, 6: At earn qua- sine traditione nuda convention^<br />

tenetur, proprie contineri dicimus. Pr. 9 § 2". 1>. de pig. act. 13, 7:<br />

Proprie pignus dicimus quod ad creditorem transit: Impolltecam, cunt non<br />

transit, nee possessio, ad creditorem. Mello 3, 14 5 l", Troplong, II, n. 386.<br />

Pont. II, n. 321. E' um dos característicos pelos quaes a hypotheca se<br />

distingue do 'penhor. Vej. § 160.


DAS COUSAS 371<br />

as relações de direito entre o devedor e o credor (42). Na verdade<br />

todos os bens alienaveis do devedor estão obrigados ás suas<br />

dividas: qualquer dos credores, sem distinção, tem o direito de<br />

penhorar e excutir os bens que fazem parte do patrimônio do<br />

devedor. Paia isto não ha mister da hypotheca(43). Mas se o immovel<br />

sahe fora do patrimônio do devedor, ou se concorrem outros<br />

credores, então a hypotheca entra em actividade. e se revela a sua<br />

utilidade. A hypotheca, pois, salvo certas restricções ao domínio,<br />

produz os seus effeitos em relação a terceiros, a saber:<br />

a) como direito vai, contra os adquirentes do immovel por<br />

titulo posterior.<br />

b) como direito de preferencia, contra os credores do devedor<br />

commum que não estão sob a protecção de fa\ or da mesma<br />

natureza (44).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Ir/. 809 — Â lei


3T2<br />

DIREITO<br />

iiiimovel (48). A hypotheca, direito real sobre immovel, é também<br />

considerada immovel (49). D'ahi vem que só pôde ser constituída<br />

por aquelles que têm capacidade para alienar immoveis<br />

(50).<br />

Mas, uma vez constituída, pois que fica em tudo subordinada<br />

ao direito pessoal, — ao credito, — ella o acompanha<br />

como se fora movei (51 j. E' esta a razão por que a pôde transferir<br />

o marido sem outhorga da mulher (52) e ainda as pessoas<br />

que por alguma razão de direito estão inhibidas de alienar imiiioveis,<br />

como, os menores que obtiverão carta de supplement<br />

de idade, os casados que ainda não são maiores e os curadores<br />

provisórios de heranças de ausentes (53).<br />

3. A hypotheca é um desmembramento do domínio (54)<br />

Certo ella não traz para o credor o direito de possuir, de g-ozar<br />

ou fruir o immovel, nem tão pouco o de dispor délie ou de alieual-o<br />

(55). Taes faculdades, porem, não são as únicas qne constituem<br />

o domínio. Xelie se mclue o poder de sujeitar a cousa a<br />

qualquer destino a que ella se preste (56). E o que é a hypothe-<br />

Janeiro de 1819 e Instruct;, de l u de Set. de 1836, art. õ. Décret, n. 5.581,<br />

de 28 de Março de 1874, art. lõ § 3".<br />

(48> Consolidação das L. Civis, art. 47.<br />

(Hi) Martou II. n. ©91, Pont. II, n. 328 c 329. Mourlon 3, 18, n. 1.42a,<br />

Arntz II, 1726.<br />

Troplong (Louage, n. 17). Duranton (XIX, n. 241) e vanos outros<br />

sustentão que a hypotheca pertenci' á classe dos moveis (bien mobilier.)<br />

(50) Lei. art. 2 § 4. Décret: art. 124.<br />

(51) .Mourlon. 3. 18, n. 1.42S. l'ont. I n. 328 in fine.<br />

(52) A lei e o I). não são expressos a este respeito, mas o costume e a<br />

jurisprudência são uniformes a este respeito. Não ha exemplo, nem antigo<br />

nem moderno, de se terem annullado transferencias de hypotheca por<br />

falta de outhorga da mulher.<br />

(53) Vej. Direit. de famílias § 160,1, e § 17S.<br />

(54) Vallele, n. 124, Mourlon, 3, n. 1.432, Martou II. n. 690: F.m contrario<br />

Mareadé II, n. 360 e 361 e Demolombe 'IX, n. 471 e 473.<br />

(55) O credor hypotheca rio não tem o direito de alienar o immovel: pôde<br />

penhora-lo, excuti-lo,—direito que também compete ao simples chirographario.<br />

Na arrematação judicial, como é sabido, o vendedor


DAS cousÀá m<br />

ca senão o direito pelo qual a cousa fica destinada por um vinculo<br />

real ao pagamento da divida ?<br />

Ao demais, a hypotheca não pôde ser estabelecida senão<br />

por quem tem o dominio. e o domínio resume em si todos os<br />

direitos de que são susceptíveis as cousas corporeas (57). Não<br />

se cornpreheude, pois, direito real sobre a cousa corporea que não<br />

seja uma parcel la do domínio (58).<br />

§ L76.—Indivisíhilidade da hypotheca<br />

A lei declara a hypotheca indivisível (59). Para esta disposição<br />

concorrerão duas razões ponderosas;­ a diffieuldade pratica<br />

de operar na g­arautia hypothecaria reducções correspondentes<br />

ás reducções da divida, e o pensamento de assegurar ao credor<br />

uma protecção mais efficaz (60).<br />

A indivisibilidade da hypotheca é um attributo exclusivo<br />

di) direito hypothecario. A cousa hypothecada e a obrigação<br />

contiuuão divisiveis se dantes o erão (61)—o que é indivisível étão<br />

somente a hypotheca em si (62). Assim que; a indivisibi 1 idade<br />

se manifesta no \inculo que liga a cousa á obrigação (65).<br />

Consiste a indi visibilidade nisto que o immovel ou immo­<br />

(.">7) O usofructo, o uso, a habitação, a emphyn■■use­, as servidões são<br />

desmenbramentos do dominio. Vej. acima ü 1 e 25.<br />

(5S) Mourlon, 3, 18, n. 1.432. Pont. 1. n. 237.<br />

(õíi)Lei n. 1237. art. 10: Décret, n. 3­l">3, art. 259; fr. 66 D. dé evict.<br />

21, 2: propter indivisam pignoris causam. Accarias,.n. 287; Troplong 11,<br />

n. 3S.S, Paul Pont I. n. 331. A hypotheca não é, como as servidões, indivisível<br />

île sua natureza, mas pur decreto da ici. Dumoulin: indiviãuitatem.<br />

quandam habei, non simplicem ser secundum quid, nec veram et propriam.<br />

. ) I iimoulin: utilitas communis. Maynz § 24(i in fine, Troplong li.<br />

numero 3SS.<br />

(ffl)Por exemplo: o prédio sujeito á emphyteuse é indivisível; ha<br />

também obrigações que são indivisíveis.<br />

(02) Troplong IT. n. 3SS, Pont. I. n. 333 e 33­"». Dumoulin: ipsum prinr<br />

cipale debitum, omni respectu dividnum. Maynz S 240. Assim a hypotheca<br />

não impede que o immovel seja dividido entre os herdeiros do devedor e<br />

a divida entre os do credor.<br />

(63) C. 6 iC. de distrah. pignorib. 8, 2.8:<br />

Dumoulin dizia: \'


374 DIREITO<br />

veis hypothecados e cada uma das suas partes ficão sujeitos á divida<br />

toda e a cada uma das íracções delia (64).<br />

Esta proposição, no interesse da clareza, pode ser decomposta<br />

nas duas seguintes;<br />

a) A cousa em sua integridade fica sujeita ao pagamento da<br />

divida loaa e de cada uma de suas íracções.<br />

b) Cada ama das partes da cousa, divisas ou indivisas, fica essencialmente<br />

obrigada á divida inteira e a caaa uma de suas íracções.<br />

A) O pensamento contido na primeira proposição se revela<br />

claro nas espécies seguintes:<br />

1." O devedor paga dous terços da divida: o immovel ou<br />

ímmoveis hypothecados sem embargo de reducção da divida, coutiuuão<br />

hypothecados por inteiro ao terço restante (5).<br />

2. a Morre o credor ; partilna-se o credito entre os seus<br />

herdeiros : o immovel permanece hypothecado no seu todo á cada<br />

uma das porções da divida qumhoadas a cada herdeiro, isto é :<br />

cada herdeiro tem hypotheca no immovel todo pela fracção de credito<br />

que lhe coube (t>8).<br />

B) A segunda proposição se torna perfeitamente intelligivel<br />

com este exemplo :<br />

O devedor vende metade do prédio hypothecado : a metade<br />

que conserva sob seu domínio permanece hj-pothecada á divida<br />

inteira ; por seu turno continua hypothecada nos termos a me-<br />

(.64) Dei, art. Io, Décret, art. 239. Dumoulin: omnis hypotheca siv.iegis,<br />

sive hominis, est tola in tolo et in qualibei parte. Troplong-. II, n. 389.<br />

Marcou, 11, n. 64*2, C. C. do Chile, art. 2.4us.<br />

(.6."») Dei, ait. lu s 7. art. 11 S 7, Décret, arc. 31U S 3, art. 251. C. '.'>.<br />

C. «le distrahend. pig. s. 2.\: Quandiú non est integra pecunia crediton numerata.<br />

etiam si pro maiore parie earn consecutus .sic. distrahendi rem obîigiitam<br />

non amittit faculcacem. Pr. 10, D. de pig. et hyp. 20 1: Qui pig-nori<br />

plures res accepit, non cogitur unam liberare nisi accepto universo<br />

quantum debitur. Moraes.'Execut. 1, 6, cap. 7, n. 57. Pluribus rebus pro<br />

eodem debito obligatis. quselibec in solidum tenetur: Vej. Mourlon, 3, 18.<br />

u. 1.429, n. 2, Martou II, n. 694.<br />

(68) Lei, art. 10 § 7, arc. 11 § 7, Décret, art. 310, § 3, art. 251. C. 1, C.<br />

si unus ex plurïb. 8, 32: Manifesta et mdubitati juris est, defuncto crediio'.v<br />

multis relictis heredibus, accionem quidem personnalem incer eus lege XII<br />

cabularum dividi; pignus vero in solidum unicuique teneri. Troplong. II,<br />

a. 389, Mourlon. 3, IS n. 1.429, 1.", MCartou U. a. 69U, L'ouc. I, n. 335.


DAS COUSAS 375<br />

tade alienada (69). A extineção da-hypotheca para os donos de<br />

cada unia das metades não pôde resultar senão do pagamento<br />

total da divida.<br />

C) A indivisibilidade da hypotheca produz ainda um ei feito<br />

singular, : o de tornar o adquirente do immovel, ou d'uma day<br />

partes, occasioualmente responsável pela divida toda, ainda que<br />

pessoalmente elle só o seja por uma fracção.<br />

Por exemplo :<br />

1.° Fina-se o devedor : o immovel hypothecado passa a<br />

um de seus herdeiros. Este herdeiro torna-se hypotbecariamçnte responsável<br />

pela divida em sua integridade, ainda que a cargo delle<br />

só ficasse a porção da divida correspondente a seu quinhão (70),<br />

2.° Morre o devedor : o immovel é partilhado por diversos<br />

herdeiros : cada um délies fica hyp&thecariamente obrigado pela divida<br />

toda (71).<br />

A responsabilidade do herdeiro nada tem de pessoal por<br />

(6!)) Lei', art. 10 "...grava immovel integralmente e em cada uma<br />

rias suas partes" Accarias. n. 2S7. 1.". Mourlon. 3. 18, n. 1.429. 2.".<br />

(70) Décret, art. 240, S 2 Troplong. II. n. »90, .Mourlon, 3, IS, n.<br />

1.429. S 2.°. Pont. I, n. 333 e 335, Moraes, Execut. 6, cap. 7, n. 57: Si vero<br />

hypothecaria actione actum sit... in solidum executio ti et adversus eura<br />

heredem qui rein detinet, neque herede illu suam portionem debiti (solvente)<br />

res pro aliqua parte- liberatur, nisi in integrum debitum solvat" Silva au<br />

Ord. 4, 3 pr. n. 62.<br />

(71) Dei. art. lu. Décret. art. 240 § 2. C. 2, C. Si unus ex plurib<br />

S, 32: Actio quidem pcrsonnalis inter heredes pre singulis portionibus<br />

qiuesita scindiLur: pignoris autem jure... qui possidont, tenentes- non pro<br />

modo singularum rerum substantia?, conveniuntur. sed in solidum. Accarias.<br />

n. 2S9. n. 4, Troplong. II, n. 390. Mourlon, 3. 18. n. 1.429. 3.". Moraes.<br />

loc. cit.: Si res conjunctim sive divisim a duobus vel pluribus heredibus<br />

possideatur... potest creditor, quem mallet, impetere ut vel integrum debitum<br />

solvat, vel rem hypotrecatam demittat in solidum pro en parte qua possidet<br />

et non satisfacit, rem prestando pro portione tantum heriditaria."<br />

(72) Lei. art. 10 § 1", 2." e 3.°.<br />

E' um principio de direito que o devedor de obrigações que nascem<br />

• ia posse da eousa. como as do usofruetuario, do credor pignoraticio ou<br />

antechresista, se exonera, abandonando a cousa. E" este o principio do Di-<br />

Romano em materia de hypotheca: totum debitum reddant vel i'l<br />

quod detinent. cédant. E' também a doutrina do Direito francez (Troplong<br />

II, n. 390). Era a do nosso antigo Direito (Ord. 4. 3 pr.) A nova lei neste<br />

ponto se affastou do direito consagrado (an. 10 ^ 2 i- :i): o detentor do immqve)<br />

ou ha de pagar toda a divida ou ha de soffror a execuç;ão; — não<br />

se livra, abandonando a cousa hypothecada. Vej. § 259 e seguintes, adiante.


376 DIREITO<br />

tudo que excede á sua porção viril, mas procede da posse da<br />

cousa (72) e da indivisibilidade da hypotheca (73).<br />

Na verdade, se no primeiro exemplo, o herdeiro pag-ã a<br />

íracção da divida aseu carg-o, mas ticão por pag'ar as porções viris<br />

dos demais herdeiros, o immovel permanece hypothecado inteiro<br />

por virtude da indivisibilidade. O herdeiro aquém foi quinhoado.<br />

não pôde remil-o senão solvendo a divida integralmente.<br />

No segundo exemplo, se o herdeiro possuidor d'uma das<br />

partes do immovel, pag"a a quota da divida imputada no seu<br />

quinhão, mas os outros herdeiros não pag"ão as suas porções viris ;<br />

a hypotheca continua a substituir, e como ella grava o immovel<br />

no seu todo. a parte do herdeiro persévéra, como dantes, sujeita<br />

ao vinculo liypotheeario.<br />

D) A indivisibilidade da hypothcca não é da essência do<br />

direito hypothecario ; c uma pura creação da lei. toda em lavor<br />

do credor (74). 0'ahi a conseqüência que ella pôde ser derogada<br />

por accordo das partes. K' pois licito ao credor e devedor estipularem,<br />

que, pag-a uma certa parte da divida, um dos prédios<br />

hypothecados ou uma certa parte fique ipso jacto livre do onus hypothecario<br />

(75).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 758 — O pagamento de uma au mais prestações da divida não emporta<br />

exoneração correspondente da garantia, ainda que esta comprehend a va-*<br />

rios bens, salvo disposição expressa no título, ou na quitação. — 766.<br />

§ 177. — Condições da hxpothcca<br />

A hypotheca. alem de outras condições, presuppõe como requisitos<br />

essenciaes:<br />

A obrigação que ella garante ;<br />

A cousa sobre que recabe.<br />

(73) «Décret, art. 240. .§ 2.°. "Ainda que pague a parte cia divida<br />

que lhe cabe."<br />

("74) VeJ. not. 2 acima.<br />


DAS COUSAS 377<br />

I. 1. E' suscepitivel de garantia hvpothecaria toda a obrigação<br />

que se pôde reduzir a valor pecuniário (7b).<br />

Se a obrigação tem por objecto dar dinheiro (77) ou cousa<br />

convcrtivel em dinheiro (78), a hypotheea lhe garante directamente<br />

a execução (79). Se. porém, a obrigação é de praticar actos<br />

pessoaes (faciendi ant UÜII jaciendi) como a do mandatário, a do empreiteiro<br />

(80), a hypotheea assegura a indemnisação das perdas<br />

e damnos resultantes da inexecução (81).<br />

(76) Fr. 5 D. de pig. 20, 1; Pothier, Hypoth. na. 59, 60 e 61, Font.<br />

I. numero 710.<br />

A obrigação colloca a pessoa que ella liga na necessidade jurídica de<br />

fazer alguma cousa em favor de nutrem (credor—stipulator). O faCto humano<br />

susceptível de ser objecto de um direito, eis a materia da obrigação.<br />

O facto pôde consistir em dar alguma cousa ou em praticar acto pessoa'..<br />

Obligationum substantia consistât in eo ut alium nobis obstringat vel ad<br />

dandum aliquid. vel faciendum vol prmstandum (fr. 3 D. oblig. et act.)<br />

O facere exprime também o no» faoere. O dare e o facere abrangem todos os<br />

actos que podem ser objecto da obrigação. Vej. MJaynz § 255 e Pothier.<br />

Oblig. n. 141 e 146.<br />

Aqui estamos alludindo ás obrigações susceptíveis de estimação pecuniária.<br />

O sujeito da obrigação pôde ser judicialmente forçado 4 cumpril-a<br />

quando o facto consiste em dar alguma cousa. Neste caso a obrigação<br />

se executa ou pela entrega da cousa ou. na falta deila, de seu valor. Pothier.<br />

Oblig. P. I. art. 1 § 1.°.<br />

.Mas se o facto da obrigação 'é de praticar acto pessoal, como fazer uma<br />

obra. exercer um mandato, o sujeito da obrigação não pôde ser coagido<br />

Ò pratical-o contra sua vontade: mas responde pelas perdas e damnos resultantes<br />

da inexecução. se de sua parte houve dolo ou culpa. Pothier,<br />

loc. cit. § 2, Mello 4. 2. §5.<br />

A hypotheea é destinada a assegurar a execução da obrigação ou as<br />

perdas e damnos resultantes da inexecução.<br />

(77) Fr. 9 § 1." D. de pign. act.; fr. 5 pr. D. de pignorib. 20. 1: Res<br />

hypotecfe dari posse sciendum est pro quacumque obligationc, sive pecunia<br />

mutua detur... sive emptio et venditio contrahatur, vel etiam locatio et<br />

conduetio.<br />

(78) Fr. cit.: sive dos. Tal é a obrigação do tutor e a do curador de<br />

resumirem as cousas do pupillo ou interdicto que são confiadas á sua<br />

guarda e administração.<br />

(79) Vej. a nota 1 acima.<br />

(80) Fr. 5 pr. D. de pignor. et hypoth. 20, 1: vel munãatum. Pothier.<br />

Oblig. n. 146.<br />

(81) Pothier, n. 159 e seg. Maynz, § 258.


378 D1RETT©<br />

2. A hypotheca é um accessorio da obrigação. D'ahi a<br />

necessidade que a obrigação ou já exista ao tempo da constituição<br />

da hypotheca, ou nasça conjunetamente com ella (82).<br />

Pôde a obrigação ser a termo (83), condicional (84) ou futura (85).<br />

3. Se a obrigação é condicional, a hypotheca só se reputa<br />

existir, realisada a condição, com as declarações seguintes :<br />

a) se a condição é casual ou mixta, isto é, daquellas cujo<br />

implemento não depende da vontade dos contractantes, a hypotheca,<br />

realisada a condição, se retrotrahe á data da convenção, e<br />

se foi logo inscripta, prevalece desde então contra terceiros (86).<br />

A obrigação, sujeita á condição casual ou mixta, como é sabido,<br />

se reputa, realisada a condição, existir desde o dia em que foi<br />

contrahída (87).<br />

Assim, se o devedor, depois da convenção, mas antes do<br />

implemento da condição casual ou mixta, faz uma segunda hypotheca<br />

a terceiro por uma obrigação pura, a primeira h}-potheca<br />

sobreleva a segunda (88).<br />

b) Se a condição é potestativa, isto é, daquellas cuja realisação<br />

depende da vontade do devedor {promissoris) a hypotheca<br />

só adquire existência leg"al da data do cumprimento dit condição,<br />

(.S2) Fr. 129 § 1." D. de reg. jur. 50, 17; fr. 5 D. de pig. 20, 1: sive in<br />

presenti contractu, sive piœcedat.<br />

(83) Fr. 5, 'D. rodem... sive pura est obligatio, vel in ãiem. A obrigação<br />

a termo existe desde o dia do eontracto. mas só é exigivel quando se<br />

vence o termo — cum dies venit. Maynz, § 290.<br />

(84) Fr. 5 pr. D. eodem.<br />

(85) Fr. cit. Sed. et futuras obligationis nomine dari possunt. Pothier,<br />

Hypoth, n. 61, Pont. I. n. 710.<br />

Obrigação futura (sem caracter condicionai) é aquella que não existe<br />

i, mas que existirá, praticado o facto de que ella ha de resultar, como<br />

por exemplo, se me prometteis sob hypotheca rostituir uma quantia que eu<br />

desde já me obrigo a-vos emprestar. Vej. Jourõan. Hypoth. cap. 23.<br />

(86) Fr. 11 § 1". fr.9 S 1 o 2 D. Qui potiores. 20. 4, Maynz § 240. not.<br />

7, Jourdan, cap. 23 ? 4. Troplong. II, n. 473.<br />

(.87) Fr. 11 S I o D. Qui potiores, 20. 4: Cum cnim semel conditio extitit<br />

ide habetur ac si ilio tempore, quo stipulatio interposita est, sine conditione<br />

facta esset.<br />

Bartholo (ad L. Balneum): Si conditio est casuális, existente conditiorie<br />

obligatio retrotrahUur.<br />

Hofaker (Principia juris, n. 1.206: sin casuális vol mixta sit, efficatiam<br />

pignus habet ex tempore initœ conditionis. Vej. Troplong. II, n. 475.<br />

(88) Fr. 11 § 1- D. Qui potiores, 20, 4; Troplong II n. 473.


DAS COUSAS 379<br />

embora tenha sido anteriormente inscripta (89). A razão é que<br />

a obrigação subordinada á condição desta natureza, só se torna<br />

vinculo jurídico depois de realisada a condição (90).<br />

4. Se a obrigação é puramente futura, e não condicional,<br />

isto c, se ella depende de uma prestação que o credor ha de fazer,<br />

e por virtude da qual a pessoa, a quem deve ser feita, se ha<br />

de constituir em divida para com o credor ; a hypotheca se reputa<br />

existir desde a data de sua constituição, se desde essa data subsiste<br />

já um vinculo juridico, por força do qual o credor não pôde<br />

deixar de fazer a prestação promettida (91).<br />

Por exemplo :<br />

I o . A hypotheca que alguém constitue para garantir a restituição<br />

do dote que um terceiro se obriga a dar a sua mulher, existe<br />

da data da sua constituição, porque á esse tempo já o dotador<br />

se acha ligado pela obrigação juridica de fazer o dote (92).<br />

2 o . Existe igualmente desde sua data a hypotheca, que um<br />

terceiro estabelece para garantir o credito que lhe abre um banqueiro,<br />

embora as retiradas de dinheiro se facão em datas posteriores.<br />

Na hypothèse figurada fica o banqueiro desde logo obrigado<br />

a fornecer as quantias que estiverem dentro dos limites do<br />

credito aberto (93).<br />

5. Pode­se, pois, formular para o caso de obrigação condicional<br />

ou futura esta doutrina : A hypotheca, tornando­se a<br />

obrigação effectiva, se considera subsistente da data da sua constituição,<br />

se desde esse dia o credor estava obrigado por um vinculo<br />

(89) Fr. 11 pr. iD. eodem. Maynz § 241. not. 6. Jourdan, capit. 23 § '■'<br />

Troplong. II, n. 474.<br />

(90) Bartholo, loc. cit.: si conditio est casual­is.. . obligatio retrotrahitur,<br />

secus, si est potestativa. Voet, Pandect. 20, 4. n. 30.<br />

(91) Pr. 1. D. Qi potiores, 20, 4: Cum ex causa promissionis ad universa<br />

quantitatis exsolution&m, qui dotem promisit,com,pellitur, non utique<br />

solutionum têmpora observanda sunt, sed dies contractas obligation­is; nee<br />

probe dici in potestate ejus esse ne pecuniam, residuam reddercl, ne minus<br />

dotata mulier esse videatur. Fr. 9 pr. D. eodem.<br />

Vej. Maynz § 241, not. 6, Jourdan, cap. 23 § 6.<br />

(92) Cit. fr. 1 D. Qui potiores.<br />

(93) Maynz § 241. not. 6, Jourdan. cap. 23 § 6, pag. 226, Pont T, n. 719.<br />

Lei Belga do 16 de dezembro de 1851, art. 80. Vej. o C. C. do Chile, artigo<br />

2.413. Em sentido contrario Troplong II, n. 479. Vej. nota seguinte.


3S0 DIREITO<br />

juridico a dar ou fazer a prestação, pela qual o devedor se lhe<br />

constitue em divida (94).<br />

0. As obrig-ações nullas não podem servir debase á hypotheca<br />

(95).<br />

§ 178. — Cotisa<br />

Só podem ser objecto de hypotheca as cousas immoveis<br />

que estão no comma cio.<br />

1. O Direito moderno, afastando-se neste ponto do Di-<br />

(1)4) IE (--ta a doutrina que resulta dos textos do Direito Romano, doutrina<br />

restabelecida por Y tngerow, reproduzida por Jourdan (cap. 23) P<br />

idoptada por .Maynz (§ 241 not. 6).<br />

Cujacio (sobre a L. Balneum) o Vbet (Pandect. 20. 4. n. 30) interpretando<br />

mal os textos, havião creado a theorïa de qu a hypotheca. se<br />

a obrigação dependia da vontade do devedor, ainda que a vontade do credor<br />

(stipulator) estivesse juridicamente vinculada, não se retrotrahia á<br />

data da sua constituição, mas só começava a existir da data do implemento<br />

da condição. "Videlicet si erat conditio collata in casum vel in potestatem<br />

stípvlatoris, non in potestatem promissor! " Cujacio.<br />

Seguirão-n'o Troplong e outros.<br />

Mas uma ta! theoria não só não acha apoio nos textos, como nem é<br />

racional, nem resolve certas difficuldades praticas.<br />

O principio que domina o assumpto é o -seguinte: — que a hypotheca<br />


DAS' COUSAS 381<br />

reito Romano, não permittc, a hypotheca de cousas moveis (97).<br />

Esta prohibição é derminada pelas razões seguintes :<br />

1? Os moveis não têm nem a estabilidade, nem a permanência,<br />

nem a individualidade tão caracterisada dos immoveis :<br />

não offerecem, portanto, em sua substancia, um apoio seguro<br />

para a adhesão de um direito real, que se constitue ou por simples<br />

decreto da lei. ou pela mera convenção das partes, sem a necessidade<br />

de entrega ou oecupação da cousa. A garantia seria fallivel,<br />

porque o movei escapa facilmente á sequela. (98)<br />

2 a As cousas moveis andão em perpetuo movimento ; formão<br />

o objecto exclusivo da mercancia entre ot> homens. A sujeição,<br />

pois, délias á hypotheca crearia dificuldades e embaraços ao<br />

commercio : o comprador estaria exposto ás execuções imprevistas<br />

dos credores hypothecarios dos vendedores. (99).<br />

3* O movei, sem perigo para o commercio e sem prejuizo<br />

para o devedor, pôde ser posto, como penhor, sob a guarda<br />

do credor. Não havia, pcis, necessidade de sujeital-o a um direito,<br />

que, não se revelando pelo signal externo da posse, se<br />

converteria em causa de surpresas para terceiros de boa íe. (1000)<br />

2. O fim principal e ultimo da hypotheca é assegurar o<br />

pagamento da divida pelo preço da cousa que ella grava. A hypotheca^<br />

pois, assenta na possibilidade da execução, isto é, da<br />

venda judicial (a arrematacâo) do immovel ; dahi o principio —<br />

que só podem ser objecto delia os immoveis alienaveis. (101)<br />

Não são portanto susceptiveis de hypotheca:<br />

(97) Cod. Civil francez, art. 218, do Chile art. 2.418,, Port. art. »$0.<br />

Segundo o Direito romano, era susceptível de hypotheca tudo que podij<br />

ser alienado. Fr. 9. § 1. D. de pig. et. hypoth. 20, 1: Quod emptionem<br />

venditionemque reciptit, etiam pignorationem recipere potest. Vej. Maynz<br />

§ 241, n. 2. O mesmo principio vigorava entre nós antes da citada lei<br />

de 24 de Setembro de 1864.<br />

(98) Troplong, II n. 395, Pont. I n. 413.<br />

(90) Voet., Pandect. 20, 1. n. 13 e 14. Corrêa Telles: "...Pelo uso hodierno<br />

das nações civilisadas se introduzio que nos moveis não haja sequela<br />

por causa de hypotheca, em razão dos embaraços que isso causava ao<br />

commercio." Nota 22 ao art. 4 do Décret, de 26 de Out. de 1836.<br />

(100) Troplong II. 395, Pont. I n. 413.<br />

(lOl)Dei n. 1.237, art. 2 § 4 Deer. n. 3.453, art. 124. Cujacio: Inutile<br />

omnino est pignus quod emptionem vel venditionem non recipit. Quo<br />

enim mihi pignus, si id distrahere non possum? L,. 68, Paul, ad edict. le:<br />

12 de pig. et hyp. Troplong II, n. 412.


382 DIREITO<br />

1 . O.s immoveis de uso publico, como os portos, praças,<br />

e ruas publicas. (103)<br />

2. Os immovcis applicados aos serviços do listado, como<br />

as fortalezas e praças de g'uerra. (103)<br />

3 Os i mm oveis que têm caracter sagrado ou religioso,<br />

como os templos e os cemitérios. (104).<br />

4. Os immoveis dotaes, inestimados ou estimados sem a<br />

clausula de venda, (105)<br />

5. Os immoveis doados ou deixados em testamento com<br />

.i clausula de não ficarem sujeitos ás dividas do donatário, herdeiro<br />

ou legatario. (106)<br />

6.. Os immoveis que já se achão penhorados. (107)<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art, 756 — Só aquelle que pôde alienar, poderá hypqthecar, dar < m anticbrese,<br />

ou em]>cuhar. Só as cpusas que se podem alienar poderão ser dadas<br />

em iienlior, nuliehre.se. ou hjipollieea. — 70. 72.<br />

Paragrapho uniço. o domínio superveniente revalida, desde a inscripção,<br />

as garantias reaes estabelecidas por quem possuiu a cotisa a titulo de. proprietário.<br />

— 622, 64S.<br />

§ 17 e ». —Oiii immovcis podem ser hypothecados<br />

Ha, corno é sabido, diversas espécies de bens immovcis :<br />

— immoveis por natureza, immoveis por destino, immoveis pela<br />

cousa a que se applicão, immoveis por determinação da lei. (108).<br />

(102) § 62 acima.<br />

(103) § cit.<br />

(104) § cit.<br />

(106) Vej. Direit. de família § 76 e 83', L'ont. 352.<br />

■<br />

Os immovcis dotaes estimados, venditionis '­ansa, passão para o dominio<br />

do uno ido, e são alienaveis. O marido, pois. pôde vendêl­os, hypothecal­os<br />

mas sempre procedendo orthorga da mulher. Ord. 4, 48.<br />

(106) P. Pont. I n. 355. O doador ou testador pôde impor a dita clausula,<br />

que alias é muito usual.<br />

(107) Lei cit. art. 2, § 4. Décret, art. 124 (arg/).<br />

A penhora tira os hens do poder e administração do executado, e<br />

por fim impedir que eiie os consumma, extravie ou aliene. Pereira e Souza,<br />

nota 788. Parece, pois, que o immovel, depois de penhorado, na>><br />

pôde ser hypothecado. Compare­se o art. 321. § 4 do Reg. n. 737, de 25<br />

de Novembro de 1850.<br />

Todavia, em França prevalece doutrina contraria. Vej. Troplong. II<br />

413 bis. Pont. I n. 353<br />

(108) Resol. de 16 de 'Fever, e 16 de Setemb. de 181«, Prov. de 8 de<br />

tem


DAS COUSAS 383<br />

Nem todos estes immoveis são susceptíveis de h3*potheca.<br />

No estado actual do nosso Direito só podem ser hypothecados:<br />

I. Os immoveis por natureza (109). Nesta classe de immoveis<br />

se comprehetidem :<br />

1. O solo. (110).<br />

2. As minas de metaes e pedras (111).<br />

3. Tudo que compõe o solo, como camadas do terras, metaes,<br />

pedras, emquanto ligadas ao mesmo solo. (112.)<br />

4. As cousas vinculadas ao solo por accessão, ou de uma<br />

maneira org-anica, como as arvores adhérentes á terra e os i'ructos<br />

pendentes ; ou artificialmente, como as casas e edifícios de<br />

qualquer natureza (113).<br />

Dos immoveis por natureza só podeirnser hvpothecados de<br />

per si, isoladamente :<br />

a) o solo,<br />

b) e as minas de metaes e pedras. (114).<br />

Janeiro de 1819. Instr. de 1 de Setembro de 1836, art. 5, Décret, n. 5.581,<br />

de 28 de -Março de 1S74. art. 15 ns. 1. 2 e 8; Ord. 3. 47 pr. ; 4. 4*8 § X. Vej.<br />

i'. Pont. I. n. 356.<br />

(10!)) Lei, art. 2. S 1, Décret, art. 138. 5 1. Sobro o que sejão ivn/moveis<br />

por natureza, vej. Mourlon I n. 1.348, Tropioag 11 n. 398, l'ont. 1 n. 357,<br />

Consolid. das L, Civis art. 45.<br />

(110) Kolo. chão, terra, terreno, significão rta linguagem do nosso i »io<br />

immovel cm si. com abstracQão dé bemfeitorias, edifícios e quaesquer<br />

ninas na superficie. A palavra •prédio exprime de ordinário o solo<br />

conjunetamente com o edifício, e outras vezes o terreno tão somente. Bem<br />

de raiz, na sua accepção natural, é o terreno que se presta á cultura: em<br />

-•cmido translato é synonimo de immovel.<br />

(111) Instrucção de l de Setembro de 1836, art. 7. As minas de metaes<br />

e pioras poden - saradas juridicamente do solo e constituir propriedade<br />

distineta. Temos exemplo disto na concessão das antigas da<br />

o nas que o governo está diariamente fazendo de minas nas terras devolutas,<br />

(112) Fr. 17 § 6, .D. empt. 19, 1; Maynz 5 114.<br />

(113)Prov. de 8 de Jan. de 1819. Instr. de 1 de Setembro de 183C, artigo<br />

5 e 6. Vej. Pont. I. n. 3-5».<br />

(114) As minas de pedras e metaes, ainda consideradas distinetas do<br />

são immoveis (Ins. de 1 de Set. de 1836, an. 7. S 3"); entrão portanto,<br />

na letra do art. 2, § 1 da Lei, e 5 1 art. 138, do decreto n. 3.453.<br />

Não se deve confundir a mina — jazida, donde se extrahem os me<br />

e pedras, — com as pedras e metaes exthahidos — moveis.


&8.4<br />

DíRglTO<br />

Os edifícios e os moveis que entrão na sua formação são<br />

em Direito considerados meros accessorios do solo, e como taes<br />

não podem constituir propriedade distincta ; donde resulta que<br />

não é licito hypothecal-os separadamente, senão conjunctamente<br />

com o chão sobre que repousão (115). Vigora a mesma<br />

doutrina acerca das arvores, fruetos e quaesquer moveis ligados<br />

á terra (116).<br />

II. Os immoveis por destino, isto é, as cousas que se<br />

unem ao prédio por um vinculo physico ou moral para o uso, serviço<br />

e aproveitamento effectivo e permanente do mesmo prédio<br />

(117). Taes bens não podem ser hypothecados senão conjuuctamente<br />

com o immovel de que são pertenças. (HS)<br />

Entre os immoveis por destino, se enumerão :<br />

1. Os animaes (especificados na escriptura de hypotheca)<br />

(,115) Os edifícios se considerão no nosso Direito accessorios do solo:<br />

o edifício ou construído pelo dono do solo ou por terceiro, ainda de boa fé,<br />

pertence por uccessão a quem é senhor do solo: guia omue quod inœdificalur..<br />

solo cedit. I. i 29 e 30 de rerum divis. II, I. Vej. acima § 4-0, ÍVIartou III<br />

ii. 955, Pont. I n. 359. Na verdade, o edifício, por força da lei, é sempre d<br />

dono do solo, com obrigação de indemnisai - o valor ou o custo, se foi feito<br />

por terceiro em boa fé. (.Vej. 40 § acima.)<br />

Desde que o edifício é sempre considerado accessorio do solo, segue-se<br />

quo não pôde ser hypothecado sem o solo.<br />

O art. 13S § 1 do décret, diz: "prédios urbanos ou rústicos." Prédio,<br />

como se observou acima, significa o solo coujunctamente com o edifício,<br />

Das palavras do Decreto, pois, resulta, não que o edifício possa ser hypothecado<br />

em separado, mas sim o edifício e o solo (.prédio).<br />

E' de notar que antes da promulgação da lei n. 1257 havia uma hypothèse<br />

em que a casa podia ser hypothecada sem solo — quando a superficie<br />

do solo pertencia ao devedor. A superficie constituía um direito real jus superficii)<br />

e o superficiario podia hypothecal-o (Maynz § 241, Troplong il<br />

n. 404, l'ont, n. 394). 'Mas a citada lei atoolio a superficie, deixando de enunitiai-a<br />

enU - e os direitos reaes, cuja existência respeitou (Lei, art. G i§ 1).<br />

A superficie, sem a natureza de direito real, é incomprehensivel, e se confundiria<br />

plenamente com o arrendamento.<br />

(116) Décret, arts. 13S e 139, Troplong II n. 39« e 404, Pont. Il u. 3G0.<br />

(117) Pr. de 8 de Jan. de 1819, Instr. de 1 de Set. de 1886 art. :.. Deer<br />

n. 55S1 de 2S de Março de 1874, art. 15 n, 2, Consolid. das (Leis Civis art. 4G,<br />

Troplong II n. 399, Pont. II n. 371.<br />

(118) Dei, art. 2 § 1, Décret, arts. 139 e 140.<br />

(119) Lei, art. 2 § 1 e 2, Deer. art. 140 § 1 e 2.


xs COÜSÀÜ ssS><br />

e os instrumentos, utensílios e machinas empreg-ados nos variados<br />

misteres dos prédios agrícolas (ll^j.<br />

2. As sementes e estrumes reservados para a cultura do<br />

immovel. (120)<br />

3. Os engenhos, aqueductox e trilhos de ierro adhérentes<br />

ao solo. (121)<br />

4. As machinas, fabricas, prensas, caldeiras e mais utensilios<br />

de estabelecimentos industriaes e commerciaes, quando<br />

esses estabelecimentos tiverem por instrumento principal o prédio<br />

em que funccionão. (122)<br />

III. A emphyteuse e o domínio directo (223). A emphyteuse<br />

não pode recahir senão sobre o solo (124). O domínio util,<br />

portanto, tem por objecto o solo e os objectos que lhe accrescem<br />

por accessão (125j. A emphyteuse (direito real na cousa alheia)<br />

se considera cousa incorporea. e como adhere ao immovel, reveste<br />

também caracter de immovel (126). Assim que: dos immoveis<br />

que o são pela cousa a que se applicão, a emphyteuse é o único<br />

que pôde ser por si só objecto da hypotheca (127).<br />

(120) Mourlon I n. 1370, e 1372 n. 8.<br />

(121) Instr. de 1 Set. de 1836, art. 7.<br />

(122) Por exemplo: fabricas de feri", de pólvora, serrarias, estabelecimentos<br />

de banhos, trapiches. Na sessão de !) de Julho de 1864, respondendo<br />

ao Sr. Souza Franco, disse o Sr. Nabuco de Araújo: "Em conclusão,<br />

se os estabelecimentos todos de que o nobre senador tratou são immoveis<br />

pela legislação actual, estão comprehendidos na proposta, e se não são immoveis,<br />

não estão e não podem estar comprehendidos." Annaes do Senado,<br />

1864, III pag\ 51.<br />

A qualificação—de immoveis por destino é determinada pela intenção<br />

com que a covisa movei é applicada ao prédio: d'ahi resulta que os moveis<br />

que se ligão ao immovel só pela intenção e effectivo emprego, .sem laço<br />

physico, só se considerão immoveis por destino, quando são unidos ao prédio<br />

pelo dono. Pothier, Commun, n. 63, Demol. IX, n. 210. Pont. I, n. 372.<br />

Se o movei se acha preso ao immovel por vinculo physico, e não pôde<br />

s.r tirado sem deterioração, fica fazendo parte do immovel por accessão,<br />

quem quer que seja o autor da juncção. Vej. § 40 acima.<br />

(123; Lei, art. 2 § I, Décret, an. 138 § 2 e 3.<br />

(124) Vej. § 141 acima.<br />

(125) Vej. § 147 acima.<br />

(126) Consolid. das L. Civis. art. 47.<br />

(127) "O direito real que tem o emphyteuta ê considerado como se<br />

fosse o direito do domínio, e por isso á semelhança deste se designa pelos<br />

immoveis sobre que reoahe." Consolid. das E .Civis. art. 45, not. I. E', na


386 DIREITO<br />

O domínio directo é o direito á propriedade núa, á substancia<br />

da cousa (128); como dominio, se confunde com a propria<br />

cousa. A hypotheca, pois, do dominio directo recahe sobre<br />

o próprio immovel, mas sem em nada modificar a natureza de um<br />

e de outro dominio (129).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

W/ 810 — Podem ser objecte de hypotheca: — 75fi. 825.<br />

/ — Os irum oveis. — 43.<br />

II — Os accessorios dos vnvmoveis eonjiivlamente eom elles. — 58<br />

III — O dominio directo. — ©78.<br />

IT — O dominio util. — 678.<br />

V — As estradas de ferro. — 852.<br />

VI — As minas e pedreiras, independent em ente do solo onde se acham:<br />

Art. 825 — São susceptíveis do contract o de hypotheca os navios', posto<br />

que ainda, em construcção.<br />

As hypothecas de navios reger­se­ão pelo disposto neste Código e nos regulamentos<br />

especiaes, que sobre o assumpto se expedirem.<br />

Art. 812 — O dono do immovel hypothccado pôde constituir sobre elle,<br />

mediante novo titulo, outra hypotheca. em favor do mesmo, ou de outro<br />

credor.<br />

Art. 852 — As hypothecas sobre as estradas de ferro serão inscriptas nu<br />

município da estação inicial da respectiva linha.<br />

\rl. 853 — Os credores hypothecarios não podem, embaraçar a­ exploração<br />

da. linha, nem contrariar as modificações, que a administração deliberar,<br />

no leito ãa estrada, em suas dependências, ou no seu ­material.<br />

Art. 854 ■— A hypotheca será circumscripta á linha ou linhas especificadas<br />

na escripiura e ao respecth\o material de exploração, no estado em que ao<br />

tempo da execução estiverem. Não obstante, os credores hypothecarios poderão<br />

oppor­se á venda da estrada, á de suas linhas, de seus ramaes, ou de parir<br />

considerável do material de exploração; bem como á fusão com outra empresa,<br />

sempre que a garantia do debito lhes parecer com isso enfraquecida<br />

Art. 855 — Nas execuções dessas hypothecas não se passará carta ao<br />

maior licitante, nem ao credor aãjuãiçatario, antes ãe se vntvmar o repn si ntante<br />

ãa Fazenda Nacional, ou do listado, a que tocar a preferencia, para,<br />

dentro em L5 dias, utilizal­a, se quí&er, pagando preço de arrematação, ou<br />

ãa adjudicação fixada.<br />

verdade, este o modo usual do ver, mas ê incorrecto, oomo já se observou<br />

no § 139 acima, nota 13.<br />

(128) Vej. § 25 acima.<br />

(129) O direito de propriedade se confunde com a propria cousa: d'ahi<br />

o designar­se este direito pela propria cousa. Vej. § 1.


DAS COUSAS 387<br />

§ 180.—Os accessorios, depois de separados do<br />

immovel<br />

1. As cousas que se tornarão iramoveis por accessão ou<br />

por destino, uma vez separadas do prédio á que estão unidas,<br />

readquirem a natureza de moveis (130) e, em conseqüência, deixão<br />

de ficar sujeitas á hypotheca porque, segundo a lei, não ha<br />

hypotheca senão de iinmoveis (131).<br />

Assim pois escapão ao vinculo hypothecario—os fructos<br />

depois de colhidos, as arvores que se cortãò, os materiaes que se<br />

arrancão do edifício, as machinas a que o proprietário dá novo<br />

destino (132).<br />

Desta doutrina resulta;<br />

1? Que as cousas, mobilisadas pala separação, sendo alienadas,<br />

passão livres para o poder do adquirente (133).<br />

2 o Que o valor délias, ainda quando penhoradas em mão<br />

do devedor, uão está sujeito ao direito de preferencia do credor<br />

hypothecario (134).<br />

3. A separação é perfeitamente legitima quando resulta<br />

(130) Fr. 17 § 10 e 11, fr. 18 § I o D. de act. empt. et vendit, 19,1; t'r. tïti<br />

S 2 D. de contract, empt. 1.8,1; Cr. 24:' S -I. D. verb, signif. 50, 16. Troplong II,<br />

n. 414, 414 bis. P I. n. :ïTt>. Os romanos denominavão csesa, ruta os moveis<br />

que erão separados do immovel. Vej. Maynz. § 114.<br />

(131) Lei, art. 2. § 1" Décret, an. !3


3SS DIRËIfO<br />

de actos de administração, como se o proprietário colhe os fructos<br />

por estarem maduros, se dá diversa applicação ás machinas por<br />

conveniência superveniente, se desfaz o edifício para approveitar<br />

o solo em outro mister (135).<br />

Não é porém licito ao proprietário operar a mobilisação<br />

com má fé, para defraudar os direitos do credor hypothecario.<br />

Neste caso, a separação produz sempre o effeito de desligar da<br />

hypotheca a cousa mobilisada, effeito inevitável, porque a lei<br />

não admitte o direito de sequela sobre moveis (136) ; mas, se importa<br />

diminuição ou deterioração que torne o immovel insufíiciente<br />

para segurança da divida, pôde o credor pedir reforço da<br />

hypotheca e, na hypothèse de recusa, demandar judicialmente o<br />

pagamento (137).<br />

(135) Troplong II, n. 414 bis, Pont I, n. 362, 376 e 417.<br />

U36) Troplong II, n. 414 bis, Pont I, n, 376, 416 e 417.<br />

Xa sessão do Senado de 16 de Julho de 1864, o Sr. Nabuco de Araújo<br />

dizia: "32' preciso, Sr. presidente, que seja mantido o principio consagrado<br />

pela doutrina e pela jurisprudência de que a hypotheca só versa sobre os<br />

immoveis; esse principio tem um interesse pratico de grande alcance...<br />

os moveis passão para o poder de terceiros sem onus algum: é isto o que<br />

convém á boa fé e ás necessidades do commercio. que ficaria embaraçado se<br />

os bens que andão na mercancia fossem susceptíveis de onus ou passassem<br />

com onus para os terceiros que os adquirissem." Ann. 1864, II, pag. 137.<br />

(137) Lei. art. 4 § 3. Décret, art. 140 § 2, Marrou II, n. 720.<br />

Os escriptores franeezes. combinando diversas disposições do C. Civil,<br />

fazem distineções na questão sujeita, a saber:<br />

Sc os moveis ligados ao immovel são vendidos, o credor pôde se oppôr<br />

á entrega, emquanto se conservão em poder do devedor.<br />

Se os moveis separados j-à estão em poder do adquirente, pôde elle, se<br />

andou de boa fé, retel-os, e dest'arte escapão ã hypotheca; mas se o adquirente<br />

versou em má fé. o credor tem o direito ou de obrigal-o a restituil-os<br />

e repol-os no seu antigo estado, ou de havel-os e repol-os á custa do adquirente.<br />

Pont I, n. 420.<br />

O nosso Direito Civii. porém, não dá ao credor os mesmos recursos e<br />

expedientes que o C. C. francez, para proteger e resguardar os seus direitos.<br />

A doctrina franceza, pois. não pôde ser recebida entre nós O unie.'<br />

recurso do credor na hypothèse sujeita é o do art. 4 5 3 da Le!, e art. 140<br />

§ 2 do Decreto. E' também a solução que Martou, cit. n. 720, dá ã questão<br />

í-m face do Direito Belga,<br />

E quanto aos- escravos ? Parece-nos que a alienação ou retirada delle*<br />

do immovel não os subtraiu- ao vinculo hypothec!<br />

l". Porque a lei exige que elles, sem embargo de serem accessorios do<br />

prédio agrícola, sejão especificados na escriptura de hypotheca. A publi-


DAS COÜSÀS 389<br />

§181. — Immoveis que não podem ser hypothec ados'.<br />

O nosso Direito, no intuito de dar á g-arantia hypothecaria<br />

a maior consistência e solidez, exclue da hypotheca os immoveis<br />

incorporeos (138), excepção feita do dominio util (139).<br />

Assim que : não podem' ser objecto de hypotheca :<br />

I Os immoveis pela cousa a que se applição (140), a<br />

saber :<br />

1?0 usofructo, o uso e a habitação (141) ;<br />

cidade que dest'arte a lei impõe á hypotheca em relação aos escravos seria<br />

ociosa e inutil, se pela venda e conseqüente entrega elles se considerassem<br />

separados do immovel, e portanto desligados da hypotheca. Que necessidade<br />

teriao os terceiros adquirentes de se informarem pelo registro da existência<br />

da hypotheca, se o escravo mobilisado pela venda, passasse a elles livre do<br />

onus hypothecario ?<br />

2". Porque o escravo tem uma individualidade perfeitamente caracter.sada,<br />

e, em conseqüência, não répugna sujeita-lo ao direito de sequela.<br />

Temos, pois, que o escravo, supposto por si só não possa ser objecto d-.'<br />

hypotheca, uma vez hypothecado conjunctamente com o prédio agrícola,<br />

fica sempre sujeito ao vinculo hypothecario, embora posteriormente seja<br />

desligado do mesmo prédio.<br />

E' certo que a lei também requer que os animaes empregados nos prédios<br />

agrícolas sejão especificados na escriptura. (Lei art. 4 § 3, Décret. 14u<br />

S 2). -Vias uma tal especificação não pôde produzir o mesmo effeito que a<br />

especificação dos escravos. O.-- animaes não se distinguem, em regra, senão<br />

pelo gênero e r.ão pelo indivíduo (génère e não espécie). A especificação<br />

délies, pois. não pôde se consistir senão na declaração do gênero.<br />

(138) Lei, art. 2 § 1" Décret, art. 138 e 141.<br />

(139) Vej. § 179 acima. O dominio util entra na classe dos immoveis<br />

incorporeos (§ 179 § acima), mas como pelos seus effeitos materiaes se<br />

confunde com o verdadeiro dominio, a lei admitte que possa receber a hypotheca.<br />

(140) Provisão de 8 de Janeiro de 1819. Instrucç. de 1 de Secemb. de<br />

1836 art. 5: "Por bens de raiz se entendem... todos os que... pelo objecto<br />

a que se applição, partk-ipãó da natureza dos bens de raiz propriamente<br />

taes, como o usofructo das cousas immoveis... Décret, n. 5,581 de 28 de<br />

Março de 1874, art. 15, 3 o .<br />

(141) Décret, n. 3,453 art. 141 § I o . O C. C. fr. admitte a hypotheca<br />

do usofruto de immovel (art. 2,118). O Direito Romano permittia hypothecar<br />

o exercício (emolumento) do usofructo, mas não o direito em si, que<br />

é inalienável. Maynz § 241.<br />

O usofructo se extingue com a vida do usofructuario — o que torna a<br />

hypotheca delle contingente. Vej. § 109 acima.


390 DIREITO<br />

2° As servidões (142) :<br />

3 o A hypotheca, isto é, o próprio direito liypothecario<br />

(143). Não ha. pois, hypotheca de hypotheca (I44j.<br />

4." As acções que tendem á reivindicação de immoveis<br />

(145).<br />

Esta prohibição di% respeito á acção em si e não ao immovel,<br />

objecto delia. Xa verdade, aquelle que é senhor de um<br />

í m movei, com lh'o tirarem da posse, não perde o domínio (14(>j,<br />

e em conseqüência pôde hypothecal-o (147). K dado este caso,<br />

a sorte do direito hypothecario fica dependente do resultado da<br />

acção : assim, se e julgada improcedente, não ha hypotheca ;<br />

se procedente, a hypotheca, subsiste e prevalece desde a data<br />

da inscripcão (148) , e por uma razão obvia : — a sentença não<br />

créa o direito, o quai préexiste, mas limita-se a reconhecel-o e<br />

a declaral-o.<br />

II. Os immoveis por decreto da lei (149), como as prestações<br />

perpétuas ou vitalícias de rendas, pensões, tenças, e foros (lõitj.<br />

(.14:0 Décret, n. 3,453 art. 141 § 2. As servidões adherem perpetuacnente<br />

ao immovel e não podem ser alienadas em separado (§ 115 acima).<br />

!•;'. portanto, impossível hypothecal-as. ,<br />

To.l.ivia, o Direito Romano, por uma singularidade notável, admittia que<br />

.. devedor hypothecasse servidões rústicas a credor que tivesse prédio visinho<br />

do seu: por virtude dessa, hypotheca o credor, emquanto a divida se<br />

nu., vencia, exercia a servidão; mas, vencida a divida, podia alienal-a a. um<br />

dos senhores do prédio visinho, para com o preço pagar-se. Pr. 11 § 13 D.<br />

.le pig-. 20,1, Vcj. Maynz S 241. Troplong D. n. 401.<br />

(143) Décret, n. 3.453 art. 141 (arg.) A hypotheca é cousa incorpore»<br />

immovel. Troplong II, n. 407, Pont I, n. 394. O Direito Romano permiti;..<br />

hypothecar a propria hypotheca: C. 1, Cod. Si pig. pig S,24: Etiam id quod<br />

pignori obligatum est, a creditore pignori obstring;i posse jamdudum placuil<br />

(.144) Em contrario da maxima: pig-nus pigmor] lari potest. Pôde<br />

porém, o credor ceder a divida com a hypotheca (Lei. ait. 12), expediente<br />

que até certo ponto suppre a impossibilidade da hypotheca de hypotheca.<br />

Pojit I, n. 394.<br />

(.145) Décret, art. 141 S 3. Troplong II, n. 406, Pont I, n. 395.<br />

(.146) Vej. § 81 acima.<br />

(.147) Troplong II. n. 4u6 bis e 469, Pont II, n. 642. Dei, art. 2 § I (.irg.).<br />

(14S) Troplong- II. n. 469, Pont II, n. 643.<br />

(149) Pont I, u. 356. Taes são em França as acções .1.» Banco<br />

(150)Ord. 3.47 pr. L4S S l.s. Vej Consolid. das Leis Civis, art. 43.


DAS COUSÂS 391<br />

§ 182. — Da subrogaçâo do immoml pelo pi eco.<br />

A perda da cousa hypolhecada imporia, como se verá no<br />

lugar competente, a extincção da hypotheea (151). Mas se por<br />

alguma combinação ou razão de direito, o valor da cousa, que<br />

perece, e devido ao dono, nada de mais justo do que protrahir os<br />

cileitos da ln'potheca sobre esse valor (152). Uma providencia<br />

tal augmenta a segurança do credor hypotheeario, e em nada<br />

offende o direito dos chirographarios (152).<br />

m D'ahi as disposições de lei que se seguem.<br />

A). No caso de perda da cousa por sinistro, o preço devido<br />

pelo segurador se entende subrogado ao immovel hypothecado<br />

(154).<br />

Por força desta disposição, o direito hypotheeario passa<br />

ila cousa extineta para o preço, que a representa, existente em<br />

poder do segurador (155).<br />

A transferencia da hypotheea para o preço, por effeito da<br />

perda da cousa, produz os corollarios seguintes :<br />

1. A divida se reputa vencida e o credor, em conseqüência,<br />

pôde exigir log-o o pagamento. (156).<br />

(151) Vej. § 276 adiante.<br />

ilõ2) Pretiufn suecedit m locum rei.<br />

(153) Os credores chirographarios não contarão com o valor do immovel<br />

que pela hypotheea já estava subtrahido ao seu pagamento. Não é.<br />

pois, ( ompativel com a razão e cum a equidade que o sinistro, que determina<br />

a ruina da cousa, seja para elles uma causa de vantagens em prejuízo do<br />

credor hypotheeario.<br />

(154) Lei, n. 1,237 art t l á Décret, n. 3,453 art. 128. Esta disposição<br />

ê tirada da lei da Bélgica de 16 de Dezembro de 1851. art. 1". Vej. o C. C.<br />

Portuguez, art. 891 § 3.<br />

(1515) A Lei, cit. art. 2 =i 3 diz: "O preço... devido pelo segurador ao<br />

segurado... fica suorogado ao Vmmovel hypothecado:" D'onde resulta qu*<br />

o direito hypotheeario vincula o preço, cino vinculava o immovel. Martou<br />

III n. 1.009.<br />

(156) E' unia conseqüência necessária do S 3 do cit. .tit. 2 da Lei. .'•<br />

. ição do segurador de pagar o preço do seguro se torna exigivel logo<br />

que oceorre o sinistro — cum dies venit. O direito a que esta obrigação cor-<br />

' espondo. isto é, o direito de haver o preço e applical-o ao pagamento da<br />

divida, passa peio acontecimento do Sinistro ao credoi hypotheeario. Se a<br />

obrigação esta vencida, pôde exigil-a o sujeito do direito correlato. Acerca<br />

da remissão, caso em que a hypotheea passa do immovel paia o preço,<br />

• essa: a dixida. consummada a remissão, se reputa vencida. Lei.<br />

art. 10 § 10, Décret, art. 303 e 308.


302 DIREITO<br />

2. O segurador, por virtude da disposição que dá ao<br />

preço novo destino, fica por elle legalmente responsável ao<br />

credor ou credores hypothecarios, independentemente da necessidade<br />

de interpellação judicia! (157).<br />

3. O preço se reparte entre os credores segundo os direitos<br />

de preferencia de cada um.<br />

De ordinário o seg - urador inclue no contractu com o segurado<br />

a clausula de ficar á sua escolha, ou pagar o preço<br />

ou reconstruir o prédio á sua custa (158). Nesse caso,<br />

se o seg'urador se resolve pelo segundo alvitre, a subrogação<br />

se não effectua, e cessão, portanto, os seus effeitos : — a<br />

divida não se reputa vencida, não pôde o credor exigir o preço,<br />

nem pedir reforço de hypotheca (159), com o que não se lhe diminue<br />

a garantia, visto que a hypotheca, sempre subsistente no<br />

solo, gravará de pleno direito o edifício reconstruído (160).<br />

A applicação do preço é da exclusiva competencio do segurador.<br />

De feito, se o preço, sob pretexto de reconstrucção,<br />

fosse entregue ao dono do prédio, annullada estava de facto a<br />

garantia do credor (161).<br />

(157) O art. 2 § 3 da lei não é expresso no sentido exposto, mas outra<br />

não pôde ser a sua intelligencia. Na verdade, desde que a lei dá novo destino<br />

ao preço do seguro, 6 visto que o segurador não pôde, sem infringil-a. desvial-o<br />

desse destino, como aconteceria se o entregasse ao segurado. E. accresce,<br />

se a lei deixasse ao arbítrio do segurador pagar o preço ao segurado.<br />

teria ella mesma destruído a virtude da providencia que consagra.<br />

Não é mister aviso ou intimação judicial ao segurador, porque a hypo<br />

theca, pela inscripção. se reputa publica. Veja-se Martou, II, n. 271.<br />

(158) JE' muito usual nos nossos seguros a clausula alludida.<br />

(159) Lei, art. 2 S 3. .. não sendo applicado d reparação.<br />

Se na apólice não se estipulou uma tal clausula, poderá o segurador,<br />

por virtude da citada disposição da lei, applicar o preço á reparação ? Não.<br />

porque um tal direito não é attribuido ao segurador pela lei que rege o<br />

seguro, mas nasce tão somente da estipulação das partes. O citado § 3<br />

allude a esta clausula: e não é de presumir que a lei hypothecaria tivesse<br />

em mente fazer uma innovação em assumpto que lhe era alheio. Neste<br />

sentido Claes (n. 267 e 268) entende a lei da Bélgica.<br />


DAS CUUSA& 393<br />

A perda da cousa opera a subrogação, quer o contractu<br />

do seguro tivesse sido feito antes, quer depois, contanto que<br />

o sinistro houvesse acontecido na constância da hypothec» (lb2).<br />

Prevalece a mesma doutrina ainda no caso do seg­urado ter cedido<br />

o preço do seg"uro a terceiro, em data anterior á hypotheca<br />

(163).<br />

E) Ha em Direito um grande numero de casos em que terceiros<br />

são obrigados a compor ao dono a perda total ou parcial<br />

da cousa (164). Occorrendo qualquer destes casos, a hypotheca<br />

ração do prédio, nem tão pouco a de subrogação nu valor devido por terei<br />

iro em razão de perda parcial ou total do objeeto (Project, art. 2 § 3). Foi<br />

a commissão de legislação do senado no Parecer .sobre o dito projecto (11<br />

do Set. de 1854). que lembrou, por inspiração da lei da Bélgica, a conveniência<br />

­i adoptarem aquellas idéas. (Vej ò project subst. da dita commissão<br />

art. 8) Posteriormente, as commissões reunidas de legislação e fazenda no<br />

Parecei de 19 de Maio de 1864. concordando com as observações do I o Paofferecêrão<br />

duas emendas no sentido lembrado, e em conformidade<br />

redigirão o § 3. art. 2, conforme está. An. do Senado. 1864.<br />

O art. 1" da lei da Bélgica foi litteralmente copiado do projecto de reforma<br />

hypotheca. ia submettido á Assomblêa Legislativa de França em 1850<br />

Vej. Maitou I, n. 268.<br />

O conselho de Estado de França ouvido acerca do dito projecto. ponderava<br />

que, sendo o preço do seguro naturalmente destinado á reconstrucção<br />

do prédio era o segurado o mai* competente para fazei a reparação: mas<br />

nhecendo ao mesmo tempo o perigo de confiar o preço ao segurado<br />

suggeria além de nutra.­ cautellas, a de deixar o preço em mão do segurado<br />

ficando 11« incumbid pagando as despezas ã maneira que lhe fossem<br />

ntadas as contas jtistificaãas. Sem embargo destas ponderações o<br />

■;■> foi apresentado á Assembléa Legislativa como se achava redigido.<br />

(182.) Martou, I n 266 Dias Ferreira Not. ao art. 891 do C. Civil<br />

Portuguez. A hypotheca grava o immovel desde o momento da inscripção<br />

itinûa a subsistir em quanto não se extingue por causa legal. Portanto<br />

si o sinistro oceorre em tempo em que a hypotheca se acha constituída, a<br />

conseqüência é. que ella já vincularia na cousa. passa para o preço.<br />

(163) 'Martou I. n 2GT A razão é clara A hypotheca em ultimaanalyes<br />

assegura o valor, o preço da cousa: assim pois em quanto ella subsist'.<br />

uffecta o preço, o qual não pode ser distrahido em favor de terceiro. Pela<br />

. da cousa ella passa sem solução de continuidade para o preço: destas<br />

lissas resulta que a mesma virtude que excluia qualquer terceiro do<br />

o durante a existência da cousa. produz o mesmo effeito em relação<br />

extineta a cousa.<br />

(164) São as obrigações de restituir o preço da cousa ex­delicto velex


394 DIREITO<br />

constituída sobre a cotisa passa para o preço da indemnisação,<br />

e o credor tem o direito de exigil-o e imputal-o no pagamento<br />

da divida (165).<br />

C). Nos mesmos termos e com os mesmos effeitos a hypotheca<br />

do immovel desapropriado por utilidade publica c transferida<br />

para o preço da indemnisação (166).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 762 — A divida considera-se vencida: — 954<br />

/ — Se, deterioranão-se, ou ãepreciando-se a cousa dada em segurança,<br />

desfalcar a garantia, e o devedor, intimado,


DAS COUSAS 395<br />

§ 183. — Cómprehensão da hypotheca<br />

A) A hypotheca, quanto ao seu objecto, comprehende :<br />

1? As cousas que por accessão adhercm ao iinmovel (167),<br />

como são as ilhas que surgem nos rios, o alveo que o rio abandona,<br />

os acerescimos trazidos por alluvião ou pela retirada lenta<br />

das águas (168), os edifícios de novo constfuidos, os auginentos<br />

que se lhes fazem, as arvores e todas as bemfeitorias necessárias<br />

e uteis (169). Os objectos que se incorporão ao immovel, quer<br />

pertenção ao dono. quer a teiceiro, seguem a condição jurídica<br />

do immovel, e ficão sujeitos ás mesmas relações de direito (170)<br />

O terceiro que em boa fé faz bemfeitorias necessárias ou<br />

uteis no prédio alheio, tem, como é sabido, direito a haver do<br />

dono o custo délias, ou o valor que acerescentão ao immovel,<br />

segundo a hypothèse (171). Occorrendo o dito caso, o credor<br />

hypothecario, em cuja utilidade verte a despeza, é obrigado a<br />

descontal­a do preço do immovel arrematado, e a entregar a<br />

respectiva importância ao autor das bemfeitorias (172).<br />

(107) Décret, àrt. 142 e 143. A'qui se trata das cousas que so ligão<br />

"ii se incorporão ao immovel depois de constituída a hypotheca; no § 179<br />

cias cniisas ligadas ou incorporadas antes da constituição da hypotheca.<br />

Assim que na hypothèse do citado S 179 as cotisas se hypothecão conjunctamente<br />

com o immovel. porque já fazem parte delle; no caso do presente<br />

§. a hypotheca, já constituída no immovel. se estendi aos ohjectos que de<br />

futuro se lhe vêm aggregar. São dous aspectos diversos.<br />

(168) Décret, art. 142 5 4 c 143 § 4. Pont. I. n. 404 c 406.<br />

(169) Décret, art. 142 § 3. 143, § I o . Troplong II, n. 551, Pont. I, n. HO,<br />

Martou, II. n. 732.<br />

(170) Vo.j. acima § 40.<br />

(171) Vej. § 40 acima.<br />

(172) Qual a natureza do direito do autor das bemfeitorias â indemnisação<br />

que lhe é devida ? — Será um direito de retenção ? Será algum privilegio<br />

? Nem uma nem outra cousa. Nem o direito de retenção por bemfeitorias.<br />

nem privilegio alsum prevalecem contra a hypotheca (Lei, art. 5 o<br />

§ 1 e 2).<br />

O direito do autor das bemfeitorias é um direito puramente pessoal<br />

contra aquelle, em favor de quem verteu a utilidade da despeza. 'Nesta relação<br />

de direito o credor hypothecario a quem aproveita o augmento de valor<br />

trazido pelas bemfeitorias, está obrigado á indemnisação respectiva, como<br />

o dono. o usofruetuario em cuja vantagem vertesse a despeza. Tal é a opinião<br />

■ le Duranton (n. 272) Zacarias (S 287 nota 27), Dalloz (Hypoth. c. II, Sect. 6.<br />

art. 3 § 2) Martou, (III, n 1322), e de P. Pont. II, n. 1208).


396 DI­REITQ<br />

2.° Os objector que seun&m ao imtuove] por declino (173).<br />

3.° Os direitos que estavão destacados do domínio c voitao<br />

a se fundir nelle, como a empliyteuse e o usufruçto nos casos<br />

de consolidação (174).<br />

4." As servidões activas que se constituem em favor do<br />

prédio (175).<br />

5. ü Os terrenos havidos posteriormente e ligados por<br />

annexação ao ímmovei, isto e, incorporados ao immovel de<br />

modo a formar com elle um todo (176).<br />

B) Pelo que respeita á obrigação, a garantia da hypotheca<br />

abrange :<br />

1. Os juros legaes do capital (177).<br />

2." Os juros ajustados e declarados na cscripLura, vencidos<br />

e por vencer (178).<br />

O C. ■< Portuguez (art. 891 § 2) aceitou expressamente a dita opinião<br />

­ antecedente.<br />

(173) Décret, art. 142 S 1" e 2 o .<br />

(174) Décret, art. 143 § 2 Accarias n. 287, Pont. 1. n. 407, Martou II.<br />

n 781 e 737.<br />

Se a hypotheca tem por objecto tão comente o domínio ãirecto, nenhuma<br />

duvida que ella abrangerá o domínio util, logo que elle venha a se consolidar<br />

no directe porque o directo é o principal<br />

Mas se a hj p tom por objecto o domínio util, e mais tarde t<br />

ãirecto, passa a pertencei ao emphyteuta por compra, suecessão ou por<br />

qualquer outro titulo? \este caso a hypotheca não pôde comprehender o<br />

domínio directo. porque dar­se­hia o absurdo do principal subordinai<br />

lei do aecessorio. E neste sentido d< v< sei entendido o art. 143 § 2 do '!.>■<br />

(175) Décret, art 142 S 1". Pont. I, n. 393.<br />

(176) Décret, art. 143. S 3. O terreno se diz incorporado ou annexa<br />

do a outro, quando passa a fazer parte integrante desse outro, fôrma<br />

«"m elle uma unidade, e fica incluído debaixo da mesma denominação.<br />

A citada disposição (art. 143. § 3) é uma pura creação do Decreto:<br />

íão • stá na lei, nem delia se deduz. Com effeito. a porção de terreno que<br />

o devedor posteriormente adquire, e com a qual alarga a sua fazenda, chácara<br />

ou campo, é sempre uma cotisa que subsiste por si e que nunca se pôde<br />

conside ai accessoria: é uma cousa principal, juxtaposta á outra principal.<br />

E como a hvpotheca é strítissimse intepretrationis, não era licito<br />

dai lhe uma ampjiação que nem a letra da lei nem os princípios por ella<br />

consagrados autorisas Martou II, n. 730. Pont. I. ri. 411.<br />

(177) Décret, n. 3 453 art. 240 § 6.<br />

(178) Dei. act. 10 § 24. Décret, n. 3.453. art. 218, S 8 e art. 240, § G.<br />

n. 3; fr. 8 § 5. D. de pig. act. 13. 7: Cum pignus ex pactione venire po­


DAS COÜSAS 397<br />

A. As penas pecuniárias estipuladas (179).<br />

5. As custas com a acção c execução da divida hj-pothecaria(lSO).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 811 — .1 hypotheca abranye Iodas as accessões, melhoramentos ou<br />

construcções do immovel. -— 62. 536.<br />

Subsistem os onus reaes constituídos e transcriptos, anteriormente á hypotheca,<br />

sobre o mesmo immovel.<br />

§ 184.—Hypothecageral, hypotheca especial.<br />

A hypotheca, sob a relação dos bens e da importância da<br />

divida, c geral ou especial.<br />

test, non solum ob sortem non solutam venire potest, seel ob csetera quoque,<br />

veluti usuras et qute in id impensa sum. Gloza ao fr. 18, D, Qui potiores:<br />

Prior in sorte, intelligitur etiam prior in usuris.<br />

OC C. francez «art. 2.151), não admitte a hypotheca pelos juros posteriores<br />

á sua data, senão por dous annos e pelo anno corrente. Quaes são<br />

os dous annos? Como se conta o anno corrente? São questões largamente<br />

controvertidas pelos escriptores francezes. Vej. Troplong 111, n. 691,<br />

Pont. II. n. 1.013.<br />

A lei da Bélgica (art. 87) põe sob a garantia hypothecaria os juros<br />

a vencer da data da mscnpção por três annos somente. Martou III.<br />

n. 1.115.<br />

C. C. Portuguez, art. 909: "A hypotheca relativa a credito que vença<br />

juros, abrange os vencidos no ultito anno e no corrente."<br />

A razão das citadas disposições é que sem a '.imitação dos juros a uni<br />

numero determinado de annos. a quantia garantida pela hypotheca seria<br />

incerta, e portanto os terceiros que quizessem entrar em negócios de credito<br />

com o devedor, ficarião ignorando a importância exacta que onera o<br />

immovel. Ha'nisto exageração do principio da publickladc.<br />

Com effeito: Se os juiros são convencionaes. a taxa ha de ser declarada<br />

na escriptura: A declaração da taxa fornece base segura para os<br />

cálculos dos terceiros que tenhão de confiar capitães ao devedor.<br />

Se legaes, basta conhecer a divida para saber se são devidos — é<br />

questão de direito: os terceiros não podem allegar ignorância.<br />

(179) Fr. 13, § 6 D. de pignorib. '20, 1: Propter usuras quoqueis.<br />

obligata sit hypotheca. usursn solvi debent, idem et in pasna dicemus. C. 22<br />

C. de usuris, 4, 32. Muhlembruch § 300 not. 7. 8 e 9, Maynz § 225. not. 8<br />

e 9. Allude-se á clausula penal, isto é. á pena pecuniária estipulada para o<br />

caso de inexecução do contracte (Vej. Consolid. das Leis Civis, art. 391,<br />

nota). A estipulação da pena e o quantum devem constar da inscripção.<br />

(180) Lei, art. 5, § 1.° Décret, art. 243 e 244.


398 DIREITO<br />

I. Ilypothcca geral é a que comprehende todos os immovi■!s<br />

do devedor, presentes e futuros, e garante importância liquida<br />

ou illiquida (181).<br />

O Direito moderno (182) a condemna por incompatível com<br />

um system a regular de publicidade.<br />

Com effeito. a generalidade da sua comprehensão exclue<br />

os requisitos que são indispensáveis para dar á publicidade a perfeição<br />

que é necessária.<br />

A publicidade tem por fim fazer conhecer os onus hypothecarios<br />

que gravão o immovei ou immoveis. Mas como dar a<br />

conhecer os ditos onus sem especificar os immoveis ? Como especificar<br />

os que ainda não pertencem ao devedor ? (183).<br />

A publicidade é ainda destinada a revelar a extensão, a<br />

importandia do onus hypothecario, para que os terceiros, que<br />

querem entrar em negocio com o dono do immovei, possao<br />

calcular com exactidão a força da garantia predial que elle oíferece<br />

(184).<br />

Méis este effeito da publicidade desapparece desde que é<br />

illiquida a importância da divida inscripta.<br />

A nossa lei abolio as hypothecas geraes : só admitte, por<br />

excepção, como taes, as hypothecas legaes da mulher casada.<br />

menores e interdictos (185).<br />

II. Hypotheca especial é a que recahe em immoveis determinados<br />

e garante quantia precisa (186).<br />

O immovei se determina pelas declarações seguintes :<br />

T! Denominação, se c rural ; pela rua e numero, se urbano<br />

;<br />

2 a . Situação (freguezia).<br />

3 a . Nome do dono.<br />

(181) iFr. 15 § 1 D. de pig. 20, 1: Caetera etiam bona tenoantur débitons<br />

qua? mine habet et quae postea adquisierit, perinde atque si specialiter<br />

has res fuerint obligatae Paul. Sent. 16, 1 L6; omnia qua; habeo habiturusque<br />

sum. Vej. Troplong II, n. 513 e 515­, Zacariae 5 259.<br />

(182) C. Civil franc, art. 2.129, Lei Belga de 16 de ÍDezembro (le 1851,<br />

art. 78 C. C. Portuguez, art. 911.<br />

(183) Troplong II, n. 515. Vej, 5 244 adiante.<br />

MM) Lei n. 1.237, de 24 de Setembro de 1S64. art. Í. ail. 3, S II e<br />

art. 9. § 27; Décret, n. 3.453. de 26 de Abri) de 1S65, art. 119 e art. 121.<br />

(185) Lei n. 1.237, art. 2 § 10 art. 3, § 11 e art. 4, Décret, n. 3.453.<br />

art. 117, 118 e 119.<br />

(1S6) Troplong II, n. 513. Maynz § 241, Muhienbruch, § 302.


DAS COUSAS 399<br />

4". E característicos, como se está cultivado, ou se é inculto,<br />

ou se é destinado á lavoura, á mineração, a pasto (187).<br />

A quantia deve ser reduzida a algarismo certo e preciso<br />

(188).<br />

No systema do nosso Direito só são permittidas as hypothecas<br />

especiaes ; as que de sua natureza são geraes, carecem<br />

de ser especialisadas para que valhão contra terceiros, salvo as<br />

legfaes da mulher casada, menores e interdictos (189).<br />

III. As disposições de lei, relativas ás hypothecas sob o<br />

aspecto sujeito, são determinadas por motivos de interesse publico<br />

(190).<br />

D'ahi os corollarios seguintes :<br />

1. Não é licito ás partes derogar por estipulação as ditas<br />

disposições (191).<br />

2­ A hypotheca geral, fora dos casos expressamente exceptuados,<br />

é radicalmente nulla (192).<br />

3. A dita nullidade é absoluta; pôde, portanto, ser invocada<br />

pelo devedor, pelos credores hypothecarios e chirographarios,<br />

e por terceiros adquirentes (193).<br />

§ 185. —A hypotheca c um direito excepcional<br />

Todos os bens que estão no patrimônio do devedor constituem,<br />

por via de regra, a garantia commuai dos seus credores,<br />

Se esses bens não bastão para a solução integral de todas as dividas,<br />

cada credor tem o direito de haver em pagamento uma<br />

quota dos valores apurados na proporção da importância do seu<br />

credito (194).<br />

(187) Lei, n. 1.237, art. !» § 24, Décret, n. 3.453, art. 218. Vej. § 244<br />

adiante.<br />

(i.sS) Lei, art. :.:, 5 li. e art. 4. Décret, art. 121. Troplong II. n. 645<br />

tl.S'.i) Lei, art. 2 5 lu. art. 3. 5 lu art. !i. Décret, art. lis e art. 120.<br />

(190) A especialidade é a base do systema hypotheca rio moderno. Vej.<br />

acima § 172 e 173.<br />

(191) A lei a. este respeito é imperatoria e não supletiva da. vontade<br />

das paVtes.<br />

(192) Lei, art. 2 5 lu. art. M S 10, art. 4. art. 9, Décret, art. 11!) o 120.<br />

(193) Grenier I. n. 85, Troploag 11. n. 515.<br />

(194) Ord. 'A. NO, Lei de 20 de Junho de 1774, Reg. n. 7:57, de 2Ü de Novembro<br />

de IS.'.II art. 512 e sèg. Pereira >■ Souza 5 397 e 439.<br />

A divida obriga pessoa do devedor, e, por via de conseqüência, os


400 üikfilTO<br />

O principio memorado, de uma justiça irrecusável, se acha<br />

consagrado em todas as legislações, e fôrma um preceito fundamental<br />

de direito, (i 95).<br />

A hypotheca, porém, em seus effeitos finaes, importa derogação<br />

daquelie principio. Na verdade, o que é ella senão uma<br />

combinação para subtrahir á lei commum os bens que afíecta, e<br />

sujeital-os exclusivamente ao pagamento da divida, em cuia garantia<br />

é constituida? (1%).<br />

Ainda mais. A hypotheca, por força do direito de sequela,<br />

direito que se créa independentemente de tradição e occupação,<br />

conserva a cousa sujeita á divida, ainda quando posta fora do domínio<br />

do devedor e em poder de terceiro. (197)<br />

A hypotheca, pois, se afasta do direito commum em pontos<br />

fundamentaes, e fôrma, por assim dizer, um direito excepcional,<br />

que a lei cerca de cautellas particulares, tendentes a corrigir<br />

os effeitos perniciosos que sem taes cautellas serão inevitáveis.<br />

(198)<br />

D'ahi os corollarios seguintes:<br />

1. ü Direito não admitte nem reconhece outras hypothecas<br />

senão as que são expressamente permittidas, e nos casos e<br />

segundo as fôrmas por lei prescriptas. (199j<br />

bens que estão no «eu patrimônio, isto é no seu dominio. A divida, porém,<br />

isto é. a obrigação, não constitue por M &Ú direito real sobre os bens<br />

do devedor. Assim que: os bens que ^aheni du patrimônio deixão de ílcai<br />

.-.ujfitos á dividas.<br />

(195) Troplong, I, n. 1, L'ont. 1, h. 4.<br />

(.196) Ha outras excepções, como o penhor, o privilegio, o direito de<br />

retenção. Vej. I'. e Souza § 401 e 402.<br />

(197) Vej. § 174 acima.<br />

(.198) A escriptura publica, a especialidade e a inscripção, eis as formalidades<br />

capitães da hypotheca.<br />

(199) Lei, art. 1: ••.Não ha outras hypothecas senão as que esta lei estabelece."<br />

C. C. fr. art. 2.115. Vej. Troplong II, n. 392, Pont. I. n. 322.<br />

O Código Commercial, elaborado em tempo em que não tínhamos uma<br />

legislação systematica e completa acerca de hypothecas, regulou a materia<br />

nos pontos em que tocava com o Direito Commercial: dahi resultou a<br />

singularidade de duas ordens de hypothecas — hypothecas civis e hypothecas<br />

commerciaes. A lei de 24 de Setembro de 1S64, destinada a organisai' u<br />

regimen hypotheeario entre nós. acabou com aquella anomalia, e declarou


DAS COÜSAS 401<br />

2. A lei acerca das hypothecas é restricta, e, portanto,<br />

não pôde ser ampliada por via de interpretação. (200)<br />

E de leito, a faculdade de crear hypothecas arbitrariamente,<br />

fora dos casos e sem as formalidades da lei—tornaria inúteis<br />

e ociosas as providencias legislativas acerca do Direito In -<br />

pothecario, e deixaria exposta á fraude a boa fé de todos,—assim<br />

dos que confiâo seus capitães sob a g-arantia do immovel, como<br />

dos que o adquirem por titulos legítimos. (201)<br />

§ 186.—Cansas da hypotheca<br />

A lei é o principio superior de que depende a legitimidade<br />

ea efficacia da hypotheca. Com effeito, como em outro lugar se<br />

expressivamente que a hypotheca, ainda quando relativa á obrigação puramente<br />

mercantil, seria sempre regulada peia lei civil. Art. 2.<br />

Ficarão, pois derogadas as disposições do Cod. Com. acerca de hypoas.<br />

A lei (.art. 2), se exprime assim: "Ficão derogadas as disposições flo<br />

Cod. Com. relativas á hypotheca de brus de raiz."<br />

Desta disposição parece resultar, a contrario sensu, qu.e continuarão<br />

a substituir as disposições do Cod. Com. relativas a iiypothecas de bens<br />

moveis. Esta inducção, a iás a redacção incorrecta da lei dá lugar, S<br />

lna< eitavel:<br />

1", porque o argumento a contrario sensu não vale quando produz uma<br />

conseqüência em antagonismo com disposição expressa de lei, como a<br />

sição do art. 1 e 2 da lei.<br />

2 . porque a mente da lei no caso transcripto é que ficassem subsistindo<br />

como meros privilégios as hypothecas de moveis estabelecidas pelo Cod.<br />

Commercial.<br />

O Sr. Nabuco de Araújo, respondendo ao St. Souza Franco, em sessão<br />

de 9 de Julho de 1864, dizia:<br />

•.Mas pergunta o nobre senador: Ficão derogadas todas as garantias<br />

que o Código do Com. estabelece com o nome de hypothecas sobre bens moveis?<br />

Direi que não. Estas garantias subsistem sobre os moveis não como<br />

hypothecas mas corno privilegio, sendo que pelo projecto são mantidas as<br />

erencias estabelecidas peia legislação actual quanto aos moveis, semo<br />

es e immoveis não hypothecados. Essas garantias não são mais hypo-<br />

. são privilégios que ficão salvos sobre todos os objectos, menos sobre<br />

os [mmoveis hypothecados." Ann. do Sen., 1864, III, pag. 51.<br />

(2(H)) Privilegia sunt strictissimse interpretrationis Zae. § 256, not. S<br />

l'on:. I, u. 322.<br />

. u'un são estas as razões fundamentaes da especialisagão e da<br />

pção,


402 DIRIÎITO<br />

disse, não ha outras hypothecas senão as que a lei estabelece nos<br />

casos e pela forma por ella prescriptas (§ 185).<br />

Mas a lei é era si um principio abstracto, estéril sem o<br />

acto ou facto, que a traz para a vida pratica. A hypotheca, pois,<br />

além da lei, fonte de sua legitimidade, presuppõe um facto ou<br />

acto, causa imrnediata da sua geração. (202j<br />

Os actos ou factos que produzem a hypotheca, se podem<br />

classificar em très catheg-orias, a saber:<br />

I. Ha um certo numero de actos ou factos, aos quaes a lei<br />

attribue a virtude de gerar a hypotheca, independentemente da<br />

vontade das partes. Assim a hypotheca existe só porque existe<br />

o acto ou facto (203). Xesta cathegoria entrão o casamento, a tutella,<br />

a curatella (204).<br />

A hypotheca, pois, em casos taes, resulta, não da intenção<br />

directa e expressa das partes, mas da lei, uma vez realisadas<br />

as condições estatuídas. D'ahi a denominação á esta classe de<br />

hypothecas —de legaes (205)<br />

(2ü2) Todo direito adquirido tem por titulo a lei positiva ou natural, e<br />

por causa um acto ou facto.<br />

(203 Vej. Troplong II, n. 416, Pont. 1, n. 423.<br />

O C. C. Portuguese (.art. 905) define a hypotheca legal assim:<br />

"As hypothecas legaes resultão immediatamente da lei, sem dependência<br />

iia vontade das partes, e existem pelo fact,. de existir a obrigação :»<br />

que servem de segurança."'<br />

1204) Vej. o § 180 e seguinte.<br />

.20.")) Lei n. 1.237, de 24 de Set. de 1864, art. 2 § 8, 9. 10 e art. 3.<br />

Em rigor a hypotheca legal não procede immediatamente da lei, ma- do<br />

acto a que a iei communica uma tal virtude; mas como, verificado o acto<br />

ou facto, a hypotheca adquire existência, independentemente da vontade das<br />

parus, se costuma dizer que ella nasce da lei.<br />

O Direito Romano dava ao que chamamos hypotheca legal a denominação<br />

de — hypotheca tácita, considerando-a como se fora /licitamente, eontrahida.<br />

Pr. 3 J>. in quib. cms. 20.2: "...tacitam conventionem" £r. ;<br />

eodem; "quasi ici tacite convenerlt." fr. 7. eodem: "...tacite intelliguntur<br />

iiignoris esse"... etiamsi nominatim id non convenerit.<br />

Este modo de considerar a hypotheca legal tem influencia pratica na solução<br />

de diversas questões relativas ao assumpto; porquanto, desde que<br />

se 'he dá por origem a vontade tácita da.- ria:-.,-.-, fica ella. a certos :•••.-,peitos,<br />

subordinada ás regras das convenções; por exemplo, na questão d..<br />

saber se a hypotheca da mulher estrangeira affecta os immoveis que o<br />

marido possue no Império.<br />

Xo Direito Moderno a hypotheca nada tem de convencional. E' uma<br />

pura ereayao da lei, e como tal deve sei- tratada.


DAS COUSAS 403<br />

II. A sentença que condemua alguém á prestação de dinheiro<br />

ou de cousa que é susceptível de ser substituída por dinheiro,<br />

passada em julgado e devidamente inscripta (206), créa<br />

por força propria um direito hypothecario (direito de sequela)sobre<br />

os immoveis do vencido em favor do vencedor (207). A sentença<br />

é a segunda causa da hypotheca. E a hypotheca que procede<br />

delia, toma o nome de— judicial (208).<br />

III. A hypotheca, finalmente, pode ser estabelecida por convenção,<br />

isto 6, por paeto expresso das partes (209). A convenção,<br />

pela qual se constitue a hypotheca, está sujeita a formalidades<br />

de rigor determinadas pela lei (210).<br />

As hypothecas desta classe se chamão-—hypothrcas convencionar<br />

s.<br />

(200) Vej. 5 adiante.<br />

(207) Lei a. l .237, art. 3 5 12.<br />

(208) Décret, n. l.237, art. 136, 5 10.<br />

(209) Lei a., art. 2, S 8, art. I.<br />

(210) Os Romanos dava i a convenção, em que se estipula a hypothecs.<br />

ÍI denominação de pactum hypothecs. No Direito Moderno esta convenção<br />

tem n nome de contractu hypothecario, ou sim] de hypotheca.<br />

O direito Romano consagrava uma outra espécie de hypotheca — a hy<br />

potheca testamentarta, isto é, a hypotheca que o testador constituía pur testamento,<br />

sobre bens determinados ou sabre toda a herança, em garanti*;<br />

de seus credores ou legatarios. Muhlenbruch, § 304. Maynz § 242.<br />

Algumas legislações modernas conservarão esta de hypotheca.<br />

Vej. Lei Beig. art. 44. C. C. Port. art. 910.<br />

A nossa lei, seguindo o C. C. francez, não admittiu a hypotheca testamentaria.<br />

A nós, não nos parece que houvesse solida razão paru coi -<br />

demnal-a. Desde que a sujeitassem á fcnseripção, não podia trazer perturbação<br />

alguma no systems adoptado.<br />

27


CAPITULO II<br />

HYPOTHRCAS LEGAES<br />

§ 187.—Nodes gera es<br />

1. A hypotheca legal é uma providencia destinada a<br />

completar o systema de garantias creadas pela lei para proteger<br />

as pessoas que, ou por incapacidade [1) ou pela natureza de sua<br />

constituição, se achão na impossibilidade de defenderem e regerem<br />

por si os seus bens: taes são a mulher casada, os menores,<br />

o fisco, as igrejas, os mosteiros.<br />

A dita impossibilidade costuma ser remediada, como é<br />

sabido, pelo principio da representação (2).<br />

Mas, quaesquer que sejão as cautellas da lei, aquelle que<br />

é incumbido da guarda e administração dos bens e direitos das<br />

pessoas alludidas, pôde faltara seus deveres, ou por negligencia<br />

ou por má fé.<br />

Na previsão destas contingências e para assegurar a reparação<br />

dos daninos e perdas resultantes, o gênio previdente do direito<br />

inventou a hypotheca legal.<br />

2. No estado actual do nosso Direito tem hypotheca<br />

legal :<br />

a) A mulher casada sobre os immoveis tio marido, pelo<br />

seu dote, e por quaesquer bens ou valores incommunicaveis<br />

( 3 i ;<br />

1) ) Os menores e os interdictos, sobre os immoveis do<br />

(1) A incapacidade pôde ser natural como a dos menores, ou civil,<br />

■omo a da mulher casada, a do pródigo.<br />

C2) Como a igreja, o Estado. As pessoas moraes funecionão na vida<br />

a por via de ntes. Savigny II. S 90.<br />

• 3) Lei ii. ! . 237, a£t. :.:. í !..


D.\S COÜSAS 405<br />

tutor ou curador, pelas obrigações resultantes da ge?tão da tutela<br />

ou curatela (4);<br />

c ) Os filhos menores, sobre os immoveis do pai que administrou<br />

o pecúlio adventicio dos mesmos filhos (5);<br />

d ) Os menores, filhos do primeiro matrimônio, nos iminoveis<br />

do pae ou mãe que passou a segundas nupcias, tendo herdado<br />

bens de filhos daquelle matrimônio (6);<br />

e ) A fazenda publica, geral, provincial ou municipal<br />

sobre os immoveis dos seus thesoureiros, collectores, exactores,<br />

propostos, administradores, rendeiros, coutractadores e fiado<br />

res, pelo alcance ou responsabilidades pecuniárias em que possão<br />

ser achados (7);<br />

f ) As igrejas, mosteiros, misericórdias e as demais corporações<br />

de inão­morta, nos immoveis de seus thesoureiros. prepostos,<br />

procuradores e syndicos, pelas obrigações pecuniárias resultantes<br />

do exercício de quaesquer destes cargos (8j;<br />

g ) ü offendido, sobre os immoveis do delinqüente, pela<br />

satisiação do damno causado (9);<br />

h ) O co­herdeiro, sobre o immovel quinhoado ao herdeiro<br />

reponente, pela torna que lhe é devida (10).<br />

Nestes dous últimos casos a hypotheca legal e determinada<br />

pela natureza da divida e não por favor á pessoa (11).<br />

(4)<br />

(5)<br />

(6)<br />

(7)<br />

(8)<br />

(9)<br />

( il<br />

Cit.<br />

Cit.<br />

Cit.<br />

Cit.<br />

Cit.<br />

LK ;<br />

Lei,<br />

l.. i<br />

Lei<br />

art<br />

art<br />

Ll 1<br />

Lei. ,1! 1<br />

Lei a: l<br />

110) Cit. Lei. art. 3 §8<br />

(11) O Direito Romário estendia a protecção da hypotheca legal i nu;<br />

­­.and. numero de dividas sem attençjlo a pessoa mas ; ft


406 DIREITO<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 827 A lei confen hypotheca: — 820<br />

I — A' mulher casada, sobre õs immoveis do marido para garantia do<br />

dote e dos outros b ■ 'tos à administração maritah<br />

­ 233, II, :<br />

II ­— Aos desci ndt ntes, sobre os immoveis do ascendente, que. lhes admira<br />

os bens. — 385. 840.<br />

/77 — Aos filhos, sobre os immoveis do pae ou da mãe que passar a outras<br />

nupcias, anii s de fazer inventario do casai anterior {art. 183,, ti. XIII).<br />

'IV — A's pessoas naturaes ou jurídicas que não tenham a administração<br />

de seus bens, sobre os imtnoveis de seus ////ores. curadores ou administratradores.<br />

— 418, 840.<br />

V — A' Fazenda Publica Federal. Estadoal ou Municipal, sobre os immoveis<br />

dos Iheseiureiros. coUectores, administradores. exactores, preposlos.<br />

rendeiros ou rontraetadoi es de rendas e f/adores. — 844.<br />

VI Ao of tendido, ou aos seus herdeiros, sobre os immoveis do delinqüente,<br />

para satisfação do damno causado pelo delicio e pagamento das custas,<br />

(artigo S42, ». I). — 829.<br />

Vit —• A ­ Fazenda Publica Federal, Estadoal ou Municipal, sobre os im~<br />

moveis do delinqüente, para o cumprimento das penas.pecuniárias e o pa­ x<br />

gamento das custas (art. 842, n. II). — 829.<br />

VIII — Ao co­herdeiro para garantia do seu quinhão ou torna ãa part'<br />

. lha. sobre o memorei adjudicado ao herdeiro reponenic.<br />

Ari. 819 — O credor da hypotheca legal, ou quem o represente, poderá.<br />

mostrando a insufficiencia dos immoveis especialisados, exigir que seja reforçada<br />

com­ outros, posti riormente adquiridos pelos responsável. — 828.<br />

Art. 820 — .1 hypotheca legal pode ser substituída por caução de títulos<br />

da divida publica federal ou estadual, recebidos pelo valor de sua COtaçãi<br />

ninia no anno cor)''<br />

Art. S28 ­ As hypothecas legaes, de qualquer natureza, não valerão em<br />

caso algum contra terceiros, não estando inscriptas e especializadas. — 81!)<br />

S30, 831. 838, 846, 848.<br />

Art. 830 —■ Vale a inscripção ãa hypotheca, emquanto a obrigarão perdurar;<br />

mas a especialização, em completando 30 annos, deva ser renovada.<br />

harmonisa­Ia com as necessidades do credito territorial. A lei Belga (art<br />

sujeita todas as hypothecas legaes ã formalidade da inscripção e espec<br />

sação, sob pena de não valerem. Este systema tira á hypotheca legal todos<br />

os inconvenientes no ponto de vista econômico, mas deixa expostos a<br />

perigos permanent^ itos de pessoas a quem a lei deve protecção.<br />

A nossa lei seg o alvitre do C. C. francez: só dispensa da n<br />

dade da inscripção e da especialísação a hypotheca ds mulher casada, ■<br />

doa menores e interdictos. O interesse econômico é sacrificado ã razão jurídica,<br />

e com toda a justiça.


TITULO I<br />

IIYPUTHKCA LEGAL DA MüLHIiK CASADA<br />

§ 188.—Condições da hypotheca legal di mulhei casada<br />

A hypotheca attribuida pela lei á mulher casada têm<br />

por elementos geradores:<br />

O casamento;<br />

A incommunicabilidade dos bens (1).<br />

A ) E' mister que o casamento seja valido (2). Produz o<br />

mesmo effeito o casamento putativo, pois que a lei, quanto ás<br />

conseqüências, o equipara ao valido (3).<br />

B ) 1. A hypotheca legal da mulher casada é destinada<br />

a garantir os créditos delia contra o marido no caso de concurso<br />

com terceiros credores.<br />

Mas no regimen da carta de metade, a mulher, pelo que<br />

respeita ao patrimônio cornmum, não só não tem direitos creditorios<br />

contra o marido, como ainda é tão responsável como elle<br />

pelas dividas (4).<br />

Em um tal estado de cotisas torna-se inconcebível a existência<br />

de obrigações pecuniárias do marido para com a mulher,<br />

e. por conseqüência, a de hypothecas.<br />

D'ahi vem que a hypotheca legal da mui her casada presuppõe<br />

por parte delia bens e direitos ineommuuieaveis (5).<br />

d) Lei n. 1.237 ait. 3 S I o , Décret, n. 3.4Õ3. art. 132.<br />

(2) Vej. P. Pont. I, n. 427.<br />

1.3) Pont I, n. 427, Martou II. n. 760. Vej. Direit. do famliia", §S 33 e58.<br />

(4) Direit. de família § 61.<br />

(5) Lei, o. 1.237 art. 3, § 1":<br />

"Pelos contractus antenupciaes exelusivQs /lu comniunhão...<br />

"Pelo bens provenientes cie herança, legados ou doação... deixados<br />

com a clausula de não serem commwiicados."


408 DTREITO<br />

2. A incotnmunicabilidade resulta:<br />

l.° Da estipulação do regimen dota'. (6)<br />

2." De convenção antenupcial, exclusiva da communhão de<br />

todos os bens ou de bens certos e determinados (7):<br />

v" Da doação, legado ou instituição em testamento com a<br />

clausula de não communhão (8,.<br />

3. A convenção antenupcial, de que deriva a incomruunicabilidade,<br />

se­ gfera a hypothec a legal, quando, além de reunir as<br />

condições g­craes de validade (9), encerra ainda as duas cláusulas<br />

seguintes:<br />

a) Expressa exclusão da communhão (10),<br />

bl Estimação cio­' bens ineommunicaveis (11).<br />

A exigência deste ultimo requisito e determinada pela<br />

conveniência de lixar com precisão o \aior da responsabilidade<br />

que a hypotheca garante (12). A omissão, portanto, de uma<br />

(ti; Direit. de família § 82.<br />

(7) O nosso Direito admitte o regimen da simples separação d< bens<br />

e o da communhão com exclusão de certos bens, Vej. Direit de fa<br />

§ 50, &9 e 68.<br />

(8) \A i. n. 1 237, art. 3 5 1<br />

(9) Rseriptura publica < insinuação nos casos em qu< « lei a exig<br />

Lei. art, 3 § :>. Vej Direil de família 5 52 i TT.<br />

(10) Lei art. 3 5 9: "sem expressa exclusão da communhão." Deal<br />

tigo 1 57<br />

O dote, por força da lei independentemení» de clausula a respeito, exclue<br />

a communhão nos bens dotaes ­ iphernaes e nos que o m ­<br />

• du possue i ten >o do t tsamento (Direit de família § 82). Xo entanto<br />

a lei (art. 3 § 9) diz "os dotes não valem contra terceiros sem ■ s<br />

pressa ex­clusão da communhão!"<br />

Quer isto dizei no sentido littéral — que o dote, sem a dita exclusS i<br />

i'xp i ­ a, não produz hypotheca legal.<br />

Mas dana a lei mais virtude ã estipulação expressa qu< á disposição de<br />

.i ; nunca posta em duvida?<br />

Parece, pois. que a citada disposição não pôde entender como os b<br />

que no casamento dota! são por lei ineommunicaveis mas tão somente com os<br />

que Miião communs, sem a expressa exclusão da conimuiiieabilidade, isto é.<br />

os adquiridos na constância do matrimônio Assim a [n< ommunicabilidade<br />

dos adquiridos não node s


DAS COTISAS 409<br />

tal clausula, pode. talvez, ser supprida no processo da eõpecialisação<br />

(13).<br />

O requisito da exclusão expressa da communhão tem como<br />

ra&ão a necessidade de afastar duvidas acerca da existência da<br />

hypotheca (14j.<br />

C) A hypotheca da mulher casada passa, por sua morte,<br />

aos seus herdeiros legítimos ou testamentation (15).<br />

$ 189 — Quaes os aircitos ipie a hypotheca icgal da mulher<br />

casada garante (<br />

A hvpotheca leg­al da mulher casada é destinada a garantir<br />

a responsabilidade do marido pelos, ben*. direitos e acções<br />

que sào próprios délias (16).<br />

A mulher, pois, tem hypotheca leg­al :<br />

o vale contra terceiros sem necessidade de especialisação e de ser inscripta<br />

a iei impõe o requisito da estimação á quai até eerto ponto atténua aquel<br />

les desvios tias regras do systema, fornecendo á> pessoas que tenhão de<br />

entrai em negócios com o marido uma base para calcular a extenção de<br />

suas responsabilidades para com a mulher.<br />

Se ,i estimação é feita taxationis causa a mulher conserva o domini<br />

sobre os liens dotaes i tanto i.sar 'ia acção de reivindicação para<br />

havel­os do poder de terceii'os possuidores (Direii de família § 75 e 84).<br />

Ma­ como o marido é obrigado na falta dos ditos bens a restituir o valor<br />

bem pôde a mulher deixar de exercer a reivindicação e fazer valer a sua<br />

hypotheca. Merlin. Reper. Verb. Remploi. § i». Troplong ir. n. 612.<br />

(13) Xa verdade, fixado o valoi do dote e mais bens incommuni"<br />

na especialisação, cessa toda a incerteza. O art. l(i5 do Décret, n. 3.453<br />

dispensa o arbitramento do valor da responsabilidade do marido para<br />

ialisação, porque pfesupõe esse valor já determinado pela estimação<br />

na escriptura antenupcial<br />

Xa segunda discussão do projecto que ê hoje a lei n l _':>T. ■■ Si. Baião<br />

de Muritiba, no Senado. d;sse:<br />

"Acho que convém declarar até onde deve cheira, a necessidade da estimação<br />

a que se referem as illustres commissões, mesmo porque no s :ï se<br />

impõe a obrigação de determinar na escriptura o valor da responsabi.:<br />

do marido. Esto comprehendo eu. Mas que se requeira cm iodos os casos<br />

a estimação do dote parece­me demasiado "' Ann. 1864. T. pag. 154.<br />

(14) A hypothèse legal geral enfraquec» senão extingue, o credito predial<br />

E' pois, de necessidade que st lhe dê toda . rteza.<br />

(15) Voet, Pandect. 22, 2, n. 1S. Troplong II n. 576.<br />

(16) Vej. S 188 acima.


1 I 0 DIREITO<br />

s J. No regimen total :<br />

a; Pelos bens dotacs, ou consistât» cm inoveis, uii cm immoveis,<br />

ou era cousa de quantidade (17).<br />

b) Pelos bens extradotaes (IS).<br />

c) Pelos fructos civis do dote, vencidos depois da dissolução<br />

da sociedade conjug-al (19).<br />

d) Pela porção de fructos naturaes do dote, acontecidos<br />

depois do casamento, que lhe forem devidos segundo as regras<br />

de direito (20)<br />

II. No regimen da simples separação de bens (21):<br />

a) Pelos bens incommunicaveis.<br />

. . b) Pelos fructos civis e naturaes vencidos depois do L.Isamento<br />

(22)<br />

III. No regimen da communhão :<br />

a) Pelos bens expressamente excluídos da communhão<br />

(23).<br />

b) Pelos fructos e rendimentos destes bens vencidos depois<br />

da cessação da sociedade conjugai (24).<br />

IV. Em qualquer destes regimens :<br />

a) Pelos bens doados ou deixados á mulher com a clausula<br />

de que serão incommunicaveis (25).<br />

b) Pelos prejuízos, perdas e damûos que os bens c direitos<br />

incommunicaveis venhão a soilrer por negligencia, culpa<br />

ou fraude do marido (26).<br />

(17) Acerca do que seja dole e dos bens que podem ser objecto del'.e.<br />

vc.í. Direit. de família, •; 73 e 74.<br />

(18) Mello, 2, 9 § 19 nota. Lobão GXecuç. ? 2v. Bens paraíernaes e recepticios,<br />

Direit. de familia § 82.<br />

(lin Troplong n. n. ll.s n-r. Pont. 1. ti. 436, Martou. Kl, 8-84. Vej. Dii'<br />

ii. de- familia, § S8.<br />

(2fl) Troplong'. II, n. -118 ter. Vej. Direit. de Camilla, cit. § 88.<br />

|21) Lei ii. 1.287, art. 5 S 1". \"ej. ÍDireit. de familia S 68 e seg.<br />

' -- ) No regimen da simples separação communicão-se os fructos colhidos<br />

e adquiridos na constância do matrimônio, Direit. de familia § 68.<br />

(2:'.) Os fructos dos incommunicaveis, percebidos na constância do matrimônio,<br />

não havendo clausula em contrario, se communicão. Direit.<br />

de familia. § 68.<br />

(24) Os fructos dos incommunicaveis. não havendo estipulação em contrario,<br />

se communicão. Direit. de familia, >; 68<br />

(25) Lei n. 1.227, art. 3 § 1".<br />

(26) Lobão M Mello, 2. 9 § 19 n. õ. Como se deixa de cobrar as dividas.<br />

e ellas prescrevem.


DAS C0Ü3AS 411<br />

E' de notar que não ricão sob a garantia da hypotheca<br />

legal :<br />

1." As vantagens que lurein estipuladas em lavor da mulher<br />

para depois da morte do marido (27).<br />

2." Nem os bens incommuni caveis, sobre os quaes a mulher<br />

>e reserva no contracto matrimonial<br />

administração (28).<br />

o direito de livre<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

\rl. 827 — .1 lei confere hypotheca: ■■­ 82


412 D1RKITO<br />

te da mulher. Os bens communs são obrigados ás dividas communicaveis.<br />

A mulher tem por essas dividas a mesma responsabilidade<br />

que o marido, nos mesmos termos e na mesma extensão<br />

(30). Ella, pois, que também e devedora, não pôde invocar<br />

contra os credores da cominunhão o beneficio da hypotheca<br />

legal para excluil­os da meação do marido nos immoveis<br />

(31) Accresce que não ha meação senão depois de pagas as dividas<br />

communs (32).<br />

Mas. se a divida, procedente de facto do marido, é das<br />

incommunicaveis, como. por exemplo, a que ioi contrahida antes<br />

do casamento (33), a que resulta de delicto (34) em tacs<br />

casos não ha razão jurídica para que a hvpotheca legal da mull:<br />

er não estenda os seus effeitos á meação do marido nos immoveis.<br />

Trata­se de dividas particulares do marido — divida<br />

para com a mulher, dividas para com terceiros. E , exactamente,<br />

a hypothèse em que funeciona a hvpotheca legal da<br />

mulher (35).<br />

(30) Voj. Direito ãç família 5 61.<br />

(.31) Os escriptores francezes discutem esta questão .já em rela<br />

hypothèse em que a mulher aceita communhão já em relação a em que<br />

a renuncia. Km relação á 1* hypothèse (â da existência da communhão)<br />

prevalece a opinião de que a mulher não pôde exercer ,i sua hypothec.<br />

ire os immoveis commun­ conti i terceiros Troplong 11. n. 483 ter, Duri<br />

XIV n 516 e XIX n 329 Moui >n (.com restricçõ s) 111 n 1.450<br />

Em contrario Zai i § 244 < Pont. 1. n. 527.<br />

(32) Attenta a indde do nosso Direito, a doutrina exposta no nossi<br />

não pude ser posta em duvida A hypotheca legal da mulher casada sõ<br />

poderia recair na meação do marido nos immoveis mas como é sabido não<br />

liã meação senão depois de pagas as dividas communs do casai O exercício<br />

pois lia hypi th ca da mulher contra os credores da communhão seria impossível<br />

porque ante­ de estarem elk's pagos não ha meação. linda mais:<br />

t preferencia por bem d i hypotheca da mulher daria um resultado que o<br />

Direito não aceita isti ë o de subtrahir bens communs ao pagamento d<br />

­ idas communs para pagai um i divida qu< não é commum — a da mu<br />

(33) Vej. Direito de família. $ 62. Salvo s< o credor por esta divida<br />

■..•m prelação como se o marido lhe hypothecôra o immovel antes do casamento<br />

.<br />

(34) Vej. Direito de família, § BI n. 4.<br />

i35) Xesta hypothèse a divida não é commum: não obriga os bens communs:<br />

a mulher não é por ella responsável Xão concorrem, portanto, as<br />

razõ s que na outra hypothèse excluem a hypotheca.<br />

Mas se o marido constitue hypotheca convencional, em garantia de di­


DAS ÇOUSAS 413<br />

B) Os iimnoveis se reputão sujeitos á hypotheca leg"al<br />

da mulher desde o momento em que entrão para o domínio do<br />

marido, qualquer que seja o titulo de acquisição, ou oneroso,<br />

como a compra e venda, ou gratuito, como a doação (36).<br />

Se o domínio do marido é resoluvel (2>7), a hypotheca da<br />

mulher reveste o mesmo caracter : — resolve­se quando se resolve<br />

o domínio (38).<br />

Xão raro o marido, depois de dissolvida a sociedade conjugai,<br />

mas antes de restituir á mulher ou a seus herdeiros o<br />

que lhe deve. adquire immoveis. Esses immoveis, sem contestação,<br />

incidem, como os que elle houve durante o casamento,<br />

sob o vinculo da hypotheca da mulher. Na verdade, a hypotheca<br />

legal da mulher,, simples accessorio da obrigação vigora em<br />

quanto vigora a obrigação, e subsistindo, subsiste com a sua<br />

natureza de geral, isto é, de comprehensiva cie todos os immoveis<br />

do marido, qualquer que seja o tempo da acquisição. A<br />

época da acquisição nada importa, porque a lei não lhe dá influencia<br />

alguma no que respeita á coinpreliensão das hypothecas<br />

geraes (39).<br />

vida sua particular, sobre um immovel commum o a mulher subscreve a<br />

escriptura, ella se torna também responsav?' pela divida e em conseqüência<br />

iião pôde oppor ao credor a sua hypotheca leg<br />

(36) Lei art. 3, 5 1 e 11. O immovel pertencente á sociedade mercantil<br />

de que o marido faz parte como socio, não está sujeito á. hypotheca legal<br />

da mulher casada, porque é da sociedade — entidade jurídica diversa, e não<br />

.Io marido. Troplong II. n. 434. Pont., I n. ­"112 e 514.<br />

!37) Vej. § 27 acima.<br />

(38) Vej. § 27 acima. Pont. 1. n. 511 e 516.<br />

O immovel que o marido antes do casamento vendeu a terceiro


414 DIKEITO<br />

C). Só o marido permuta um dos seus immoveis por<br />

outro, o direito hvpothecario da mulher rica sujeito a estas<br />

vicissitudes :<br />

1? Pôde ella fazer valer a sua hypotheca sobre o immovcl<br />

que o marido deu em troca, porque a alienação da cous.i<br />

hvpoLüecada, como é sabido, não exting ­ ue o direito de sequela<br />

(40): nesse caso, porém, perderá a hypotheca no immovel<br />

que o marido recebeu pela permuta, se o terceiro permutante,<br />

como lhe 6 permittido (41), tomar o alvitre de reivindical­o (42).<br />

2') Mas se o terceiro permutante, desapossado do immovel.<br />

que recebeu em troca, por virtude da execução da mulher, em<br />

vez de reivindicar o que dera, preferir rehaver do marido as perdas<br />

e damos resultantes (43), a hypotheca da mulher persistirá<br />

no immovel liavido pela permuta, porque esse immovel attento<br />

o alvitre tomado pelo terceiro, se conserva no domínio do marido<br />

(44).<br />

os seus :i pretendei hypotheca legal por dividas que o marido<br />

contrahio para com ella depois de dissolvida a sociedade conjugal. Mas<br />

não é essa a questão sujeita. Trata­se de obrigação que jã existia na constância<br />

do matrimônio. '"­ Lgação estava ­ rantia da hypotheca<br />

li gal, e continua a estar, emquanto não é cumprida ou não prescreve s<br />

ma hypotheca (Lei, AV.. 9 § 3). A lei (art. 3 § 11) diz quo a hypotheca grava<br />

os immoveis presentes e futuros| [Desde QUO, pois. não limita o tempo<br />

da acquisição, prevalece a r< ­ que a hypotheca geral comprehend''<br />

todos os immoveis do ■• m aceepção da época da acquisição.<br />

(40) Troplong 1L. n. 434 his. l'ont. I, n. 515.<br />

(41) C. C. I di mut. 4. 64: At enim si cum venalis possi<br />

esset, permutatio fad quod ah ­ prœstituan est. evictum<br />

■ ■st: quod datum est, >i hoc­ elegeris, cum ratione restitui postulabis. Pothier.<br />

Coniraet. de Vent. n. 624.<br />

(42) De foi;". tiro permutante, pri :ãO da mulher,<br />

do immovel que recebeu em troca, tem o direito de retomar o imrnove<br />

dera (Pothier. loc. cit). Reivindicado pois o immovel. e dest'arte ex<br />

o domínio do maridi «capa o dito immov'. á hypotheca da mulher.<br />

Dmquanto, porém, o permutante não consumiria a reivindicação, subsis';­<br />

n.' immovei a hypotheca da mulher: — é um dos casos da hypotheca<br />

ivel.<br />

(43) C. 29 C. d 8,45, Pothier, Vent. n. 624.<br />

(44) Desde que o permutante pede, não o prédio que dera, mas a indemnisação<br />

das perdas e damnos — quanti interest — é manifesto que o prelio<br />

se conserva no dominio do marido, como. se tivera sido adquirido por<br />

compra, e, portanto, sujeito á hypotheca legal da mulher. Vej. Troplong,<br />

II. n. 434, bis.


DAS COUSAS 415<br />

3. a Se, porém, a mulher exerce primeiro a sua hypotheea<br />

sobre o immovel que o marido recebeu em troca e o producto é<br />

insufficiente para o seu pagamento, é fora de duvida que ella<br />

poderá, por virtude de hypotheea legal, excutir o immovel que o<br />

marido deu em troca, existente em poder do terceiro permutante<br />

(45). Na hypothèse figurada, a acção de reivindicação do permutante<br />

contra o marido, arma que elle tinha para se cobrir dos<br />

effeitos da hypotheea legal da mulher, torna­se inadmissível, porque<br />

o imtnovel sahio do poder do marido por um modo legal. So<br />

lhe resta a acção de perdas e damtios (46).<br />

§ 191 . — Será licito á mulher casada ceder ou<br />

renunciar a sua hypotheea legal?<br />

1. No systema no nosso Direito predomina o principio<br />

de — que os direitos e as obrigações do marido e da mulher, pelo<br />

que respeita o regimen de bens, firmados uma vez pelo casamento,<br />

revestem a natureza de irrevogáveis, e como taes não<br />

podem ser alterados ou modificados por actos posteriores (57).<br />

Este principio tem como razão fundamental a necessidade<br />

de proteger a fraqueza e a complacência da mulher contra a ascendências<br />

e as seducções do marido (48).<br />

2. A hypotheea que a lei confere á mulher casada entra<br />

na comprehensão daquelle principio. Com effeito, e um direito<br />

(45) Tropli ­ :;­ 434 bis. Pont. I. n. 515.<br />

(46) Na verdade a arrematação ào immovel que o marido recebeu em<br />

. ' qu ' se conservava em sen poder, é um; a itamente legitimo, e<br />

por conseqüência transi g ■ o domínio do marido ­ a evieção do<br />

immovel dado a ... execução da mu<br />

Iher, não tem effei itivo: isto é, o domínio do marido sobre o immovel<br />

que recebera em troca, era resoluvel ex­nunc e não ex­turu:, (Makeldey<br />

§ 274.) A resolução ex­nunc não affecta os actos anteriores. Vej.<br />

5 27 acima.<br />

Assim que: uma voz que a arrematação promovida pela mulher, do immovel<br />

que o marido recebera em traça, ' I eritima, o terceiro permutante<br />

que pelo facto de soffrer a perda do immovel que lhe fora


41() DIREITO<br />

que resulta das convenções antetiupciaes, tom.idas definitivas pelo<br />

casamento (49).<br />

Do dito principio resulta—que não é licito á mulher<br />

fazer, na constância do matrimônio, renuncia ou cessão, por forma<br />

g*eral e absoluta, da sua hvpotheca legal, quer em favor do<br />

marido, quer de terceiros (50).<br />

3. Ainda mais. A hvpotheca legal foi especialmente<br />

creada para resguardar os bens e direitos da mulher, incapaz<br />

por sua posição jurídica, e inhabil por natureza, de defendel­os.<br />

D'ahi procede que nem mesmo na convenção antenupcial lhe é<br />

permittido ceder ou renunciar a hvpotheca (51).<br />

4. Mas poderá ella, durante o matrimônio, ceder ou renunciar<br />

a dita hvpotheca em relação á immoveis certos e determina'<br />

dos: Não; na verdade se a mulher tivesse uma tal faculdade, a<br />

sua hvpotheca ficaria exposta a perigos permanentes, ainda que<br />

o marido possuísse, além dos immoveis excluídos pela renuncia,<br />

outros suffieientes para garantia de sua responsabilidade: —bem<br />

fácil lhe seria ir obtendo renuncias parciaes até pôr á descoberto<br />

os direitos da mulher.<br />

Em sunima, a mulher perante a >a^ào do nosso Direito<br />

está inhibida de. por acto voluntário, peiorar da condição que<br />

diante do marido lhe assegurão n casamento e os pactos anteuunciaes<br />

(52).<br />

(49) Vej. acima i 188.<br />

(50) Lobão Exec ; >14 Costa De privileg. credit. Reg:., 2 Amp!. G.<br />

H. 10­'. A renuncia ë nulla e porta ito, pôde a mulhei a todo o tempi/ exercei<br />

a ­­na hypotheca sobre os immoveis do marido ou contra terceiros adquirentes,<br />

ou contra os credores délie<br />

Km França ha grande controvérsia a esi s «ito. I'. Pont, n 421.<br />

entende quo no regimen dotal a mulher não põd< fazer renuncia da su ;<br />

hypotheca. Troplong li. n. 601 pensa que no dito regimen a mulhei não<br />

inhibida de fazei cessão "­a renuncia, mas essa cessão ou renuncia ca<br />

á em favor da mulher, se ao tempo da dissolUQão do casamento o marido<br />

não tiver bens que garantão a restituição dos valores dotaes E i<br />

opinião de Faber. C. 4 21 définit 1~> e 16.<br />

\ '.ei Belga (art. 71. Martou III. n. 9Q1) permitt* a renuncia da hypo­<br />

■. inscripta, não em favor do marido, mas de terceiros<br />

E' doutrina corrente entre os francezes que a mulher node renin.ci<br />

a sua hypotheca, no regimen da communhão. pelos ineommunieaveis que<br />

não têm a natureza de dotais T.'oplon.tr N. n. 60S Pont. 1. n. 452 e 453<br />

(51) Troplong II n 030 Merlin verb inscription ei verb. Transcription<br />

(52) Não § tão rigorosa a lei franceza A.ssim consente ella que a mu­


DAS COÜSAS 417<br />

ij 192. -*-.Cotno se constitue a hypotheca legal da mulher casada<br />

1. A hypotheca legal da mulher casada presuppõe como<br />

condição essencial a existência de bens incommunicaveis. (S3).<br />

A incommunicabilidade, secundo o nosso Direito, em relira<br />

não pôde resultar senão da convenção ante-nupcial, porque,<br />

na ausência de pacto a respeito, vigora por força da lei o regimen<br />

da communhão. (54)<br />

A convenção ante-nupcial se conserva em suspenso, e so<br />

adquire a natureza de acto perfeito e definitivo, depois de celebrado<br />

o casamento. (55).<br />

Destes principies deriva o corollario—que a dita hypotheca<br />

é constituída pela convenção ante-nupcial confirmada pelo casamento<br />

. (56)<br />

Pôde todavia dar-se accidentalmente a incommunicabilidade<br />

de certos bens, não por virtude do pacto ante-nupcial, mas<br />

em conseqüência de doação, legado ou instituição testamentaria,<br />

com a clausula de não-communhão (57). Nestes casos a hypotheca<br />

se reputa constituída pela doação ou disposição testamentaria.<br />

f5S).<br />

2. Importa saber qual a data da hypotheca legal tia. mu-<br />

Iher casada.<br />

A data da hypotheca é determinada pela data da responsabilidade<br />

do marido. (59)<br />

Assim que:<br />

Iher possa na constância do matrimônio, renunciai a communhão — pra<br />

lue n nosso Direito não tolera Lobão a Mello 2.10. 5 4. ISecç. 1*.<br />

Convém finalmente observar que em presença do actual systema hypo<br />

lhecario não se pôd( dizei que este rigrorismo prejudica os interesses do marido,<br />

porquanto tem elle o direito de requerer a espe ;ão da hypo the »<br />

. 'g . da mulher, e de limita-la dest arte a bens certas e determinados deixando<br />

! vi es oa outros<br />

(53) Veja-se 5 188.<br />

I Í4) Ord. 4. 46 pr. Direit. de familia S 56.<br />

(55) Paul. Sem. 2 _' s 12 Sed ante nuptias data (dos) earum expei tat<br />

;im. \'ej. Direit. de família J 53.<br />

(56) Décret, n. 34:,:; de 26 de Abri] de L865 ari 136 § 5<br />

(.57) Lobão a Mello 2 8 § 18, n. 11.<br />

i i Décret, n. 34.,:; ... ; 136 § 6.<br />

i


418 DIREITO<br />

1°. A hypotheca pelos bens e direitos existentes ao tempo<br />

do casamento, subsiste desde esse tempo.<br />

2". Acontece, não raro, estipular­se na convenção antenupcial<br />

a incommunicabilidade dos bens que a mulher adquirir<br />

por titulo gratuito, na constância do matrimônio. (60)<br />

A data da hypotheca por estes bens não pôde ser outra senão<br />

a do dia em que taes bens se tornão exigiveis, porque é nesse<br />

dia que começa de existir a responsabilidade do marido pela<br />

conservação, defesa e guarda délies. (61 i<br />

3 o . Pela mesma razão e nos mesmos termos a hypotheca<br />

pelos bens doados ou deixados á mulher com a clausula da não<br />

coinmunhão se reputão datar do momento em que podem ser<br />

exig­idos. (62)<br />

§ 193.—A hypotheca pôde ser restringida a bens determino dos na<br />

convença o ante­nupcial<br />

Supposto a hypotheca da mulher casada, seja geral, isto é,<br />

comprehensiva de todos os immoveis do marido, presentes e futuros<br />

(63); todavia a lei permitte restringil­a, na convenção ante­nupcial,<br />

a bens certos e determinados. (64)<br />

Nesse caso a hypotheca legal da mulher (preenchidas as<br />

formalidades da especialisação) (65), grava tão somente os Lmmo­<br />

(60) Décret, n. 34r,3 art. 136 § 5.<br />

(61) A hypothèse figurada não está expressamente prevista no d<br />

n. 3453; mas a solução dada no nosso texto é a única que a doutrina a<br />

do assumpto admitte. acerescendo que o citado decreto a adopta on caso perfeitamente<br />

análogo (.art. 135 § 6).<br />

Se a doação, se a deixa depende 'le condição suspensiva, antes de realisada<br />

a condição, o marido nada tem a fazer; ainda não (■ chegada a oecasião de<br />

exercer os sons direitos de administrador du casal. A ­mie dos bens ou direitos<br />

doados ou deixados não corre sob ­sua responsabilidade. Mas, preenchida a<br />

condição, se se conserva em inércia,, se não chama os bons. se não põe em pratica<br />

os meios conservatorio.s que forem necessários, falta evidentemente mis<br />

s­us deveres; responde, portanto, pelas perdas e damnos resultantes.<br />

A data, pois, da hypotheca, não é a do dia do recebimento dos bens. mas<br />

n ilo dia em que podem ser pedidos. Vej. Troplong li. n. 586, Pont. II, n. 756.<br />

(62) Décret, n. 3453 art. 156 § 6.<br />

(63) Dei n, 1237. art. 3 5 11.<br />

(64) Décret, n. 345:; arts. 1K2, 1X3 e 184.<br />


DAS COÜSA.S 419<br />

veis especificados, ficando livres osexcluidos. (66) Esta pratica<br />

é altamente salutar: não põe em perigo a garantia da mulher, e<br />

deixa ao marido os recursos de credito que lhe pôde crear o direito<br />

de dispor dos immoveis subtrahidos á hypotheca. (67)<br />

§ 194.—Hypotheca legal da mulher estrangeira.<br />

A solução das questões que a materia deste paragraphe<br />

encerra, exige a rememoração dos principios seguintes:<br />

1. Os direitos e as obrig-ações dos cônjuges, resultantes<br />

do casamento, são regulados pela lei civil do domicilio do marido.<br />

(68).<br />

A hypotheca legal da mulher casada é um direito que procede<br />

do casamento (69).<br />

Assim que a mulher não pôde ter hypotheca legal, se não<br />

lh'a dá a lei do seu casamento. (70)<br />

(66) Décret, n. 3453 cit., arts. 182, 183 e 184. Se a clausula em que se<br />

estipula a restrieção da hypotheca a immoveis certos não é seguida, da especialisação,<br />

nos termos declarados nos artigos citados do Décret, n. 3433. a<br />

hypotheca da mulher conserva o seu caracter de serai, e affecta, portanto, todos<br />

os immoveis do marido.<br />

Sc a mulher é menor, a dita clausula deve ser consentida pelo pai ou pelo<br />

tutor e juiz de orphãos.<br />

(67) Vej. Troplong ii. n. 637. O mesmo resultado .st» obtém pela especialisaqão.<br />

Vej. adiante S 230 e seg.<br />

1,68) Savigny, Droit Romain, vol. X, S 37!» A) n. 3 Felix, Droit Internai.<br />

privé, Rocco, cap. 20; Valasc. Consult. 138 n. 11, Pheho, Die. 16-"> n. 3, B.<br />

Carneiro I. 15 S 149, n. 9.<br />

Paschoal Fiore. Droit Internai. Privé, n. 82, sustenta em substancia a<br />

mesma doutrina, com a différence de substituir a lei do domicilio pela da nacionalidade.<br />

(69) Vej. § 188 acima. E' de notar que na mór-parte dos paiz.es a hypotheca<br />

legai da mulher procede directamente do casamento, porque, segundo<br />

as l.-i.s desses paizes, lia sempre uma certa porção de bens incommunieaveis.<br />

i'.-.. .'- a lei franeeza, a belga, a do Chile, a da iHespanha.<br />

(70) Felix, Revue des Revues de Droit, vol. V, pas. 119, Rocco 1, cap. 7,<br />

e 111 cap. 3 e 32, I'. Fiore, n. 230 e 231. Ass.m a mulher casada com homem<br />

domiciliado na Hollande não poderia ter hypotheca legal em immovel que o<br />

marido poíssuisse no Brazil, porque a lei da Hollanda não concede á mulher<br />

da tal hypotheca. Fiore, cit. n. 230.<br />

Os eommentadores do C. C. francez, jogando com o systema do Estatuto<br />

Pessoal t Estatuto Real, sustentão que a questão de saber se a mulher casada<br />

tjom estrangeiro tem hypotheca no.s unmoveis que o marido possue em França,<br />

28


420 . biRfii'ro<br />

2. Os direitos e as obrigações estabelecidas pela lei que<br />

rege o casamento, são recebidos e aceitos em paiz estrang-eiro,<br />

desde que taes direitos e obrigações não envolvem offensa, ou<br />

do regimen econômico e social da propriedade nesse paiz, ou de<br />

princípios que interessão á ordem publica, ou de disposições absolutamente<br />

obrigatórias. (71)<br />

3. Mas o systema hypothecario de cada nação affecta a<br />

condição juridica dos imuioveis, e fôrma uma das bases do regimen<br />

econômico da propriedade. A restricção, por exemplo, ou<br />

a ampliação dos casos de hypotheca legal influe directamente<br />

no credito territorial.<br />

O systema hypothecario, pois, não pôde ser alterado ou<br />

modificado pela applicação de lei estrang-eira (72).<br />

4. Dos princípios expostos e da sua combinação deriva o<br />

principio seguinte :<br />

A mulher estrangeira que se casa com estrangeiro, adquire<br />

hypotheca legal sobre os immo\eis que o marido possue no<br />

Brazil (73), comtanto que a legislação, sob cujo império é celebrado<br />

o seu casamento, lhe attribua um tal eifeito (74)<br />

deve ser exclusivamente resolvida pela lei loci rei siUe. donde resulta que<br />

e!la gozará em França da hypotheca legal, embora não !h'a confira a lei de<br />

seu casamento. Troplong TI. n- 513 ter, Pont I, n. 432, Merlin, verb. Remploi.<br />

Xo mesmo sentido Marrou IV, n. 1693.<br />

Fiore (loc. cit.) argumentando com a doutrina de Savigny, refuta vi<br />

riõsamente este modo de ver, incompatível com os princípios.<br />

(71) Savigny, Droit Rom. iî 349, P. Fiore. n. 26. São estes os verdad<br />

critérios para distinguir as leis estrangeiras que podem sei recebidas e applicadas<br />

no paz das que o não podem ser. A velha tbeoria de Estatutos Pessoaes<br />

e Estatutos Eteaes está hoje eondemnada, porque, além de muitissim-v<br />

clefeetiva e incompleta, confunde as ideas e dá logar a innumeros erros. Vej.<br />

Savigny, 8. 5 367. Fiore, n.<br />

(72) Entre nos esta doutrina tem a consagração da lei (art. 2. L. n. 1237).<br />

A este respeito a lei é absolutamente obrigatória, e não pôde portanto sei- prea<br />

pela applicação de lei estrangeira. Savigny § 349.<br />

(73) — Porque a legislação brazileira confere hypotheca legal a mulher<br />

casada.<br />

(74) Nem a lei n. 1237 de 24 de Setembro de 1864, nem o Décret. 3453<br />

de 26 de Abril de 1865. contêm disposição alguma a respeito da materia deste<br />

paragrapho. A questão, pois, fica sob o domínio do Direito Internar<br />

Privado.<br />

A disposição do art. 4 5 4 da citada le;, refere-se ás hypotheeas conven-<br />

. ionaeSj e por conseqüência não .são applicaveis ás hypotheeas legaes. Assim


1)ÀS eoüsÁb m<br />

S. As condições do casamento para produzir a hypotheca<br />

legal, e a definição das obrigações que a dita hypotheca garante,<br />

são da competência da lei que reg-e o casamento (75)<br />

(>. Mas por força dos mesmos principios expostos (n. 2) é<br />

da competência da lei brasileira a determinação dos bens que a<br />

hypotheca comprehende. Assim, se a hypotheca, segundo a lei<br />

do casamento, abrange os moveis, um tal effeito não pôde ser<br />

recebido no Império, porque o nosso Direito não admitte hypotheca<br />

senão de immoveis. (76)<br />

7. A brazileira que se casa com estrangeiro entra perfeitamente<br />

nas condições de estrangeira, e por conseqüência, quanto<br />

á hypotheca legal, lhe são applicaveis os mesmos principios<br />

de direito (77).<br />

8. Não é mister dizer que o casamento de brasileiro com<br />

brazileira ou com estrangeira.celebrado em território estrangeiro,<br />

produz a hypotheca leg'al, nos mesmos termos como se fora celebrado<br />

no Império (78).<br />

pensão os escriptores e praticão os tribunac.-, francezes, na ; ntelligeneia da sua<br />

Lei. que a este respeito é análoga a nossa. Na verdade o C. C. fr. guardando<br />

silencio quanto as hypothecas legaes no ponto sujeito, consagra, quaniu ã^<br />

i onvencionaes, doutrina gun! a da citada disposição da nossa lei.<br />

••Les contraus passés en pays étrangers ne peuvent donner d'hypothèque<br />

sur les biens de France, s'il n'y a des dispositions contraires a ce<br />

principe dans les lois politiques, ou dans les traités."<br />

(75) Savigny 5 oT4 D. e § 381. Fiore. n4 220, a) e b).<br />

(76) Fiore, n. 220 a).<br />

(77) Dei n. Vej. 2096 de 10 de Setemb. de i860, art. 2. Vej. Direito de<br />

tamilia § 29. ^<br />

(78) Vej. Direito de família § 29, II, 1".


TITULO I I<br />

HYPOTHECA LEOAI. DOS MENORES K INTERDICTOS. — I. DOS MKXO-<br />

RES ORPHÃ.OS K [NTERD1CTOS.<br />

§ 1 ( »5. — Causa ila Hypothec a<br />

A hypotheca legal dos menores e interdictos é inhérente<br />

á tutela e á curatela, mas só adquire existência real e effectiva<br />

pela aceitação daquelles cargos (1). Certo, a dita Irypotheca<br />

nasce e se produz por força do decreto da lei ; é mister porém<br />

que se realise o facto a que a lei communica um tal effeito (2).<br />

A tutela e a curatela, ou legitimas ou dativas, são deferidas<br />

por nomeação do juiz (3) ; mas não é o acto de nomeação<br />

que créa a rn-potheca : a nomeação attribue a tutela ou a curatela<br />

á alguém ; ã tutela, a curatela, attribuidas e aceitas, gerão,<br />

por virtude que a lei lhes dá, a hvpotheca |4|.<br />

d) Lei n. 1257. art. :! S 2. Decree, n. 345:j, art. 136. § I o .<br />

A aceitação da tutela e da curatela é considerada em Direito como um<br />

quasi-contractu. -N'a. verdade as obrigações que o tutor e o curador tomâo para<br />

com o menor e para com u interdicto, de administrarem os seus bens. sem que<br />

todavia tenhão feito esíipulação alguma com elles, na.scem de um contractu<br />

ex quasi-contractu oriuntur. Maynz, •; 358.<br />

(2) Vej. S 187 acima.<br />

(3) Vej. Direit. de famil. > 146. A testamentaria é a deferida pelo pai ou<br />

avô legitimo em testamento.<br />

(4) Troplong- II. n. 429: "Ce n'est pas de l'acte de la nomination de tuteur<br />

que -sort l'hypothèque attribué au mineur. Elle découlee du concours de<br />

la qualité de tuteur et de la volonté de la loi. L'acte de nomination n'est<br />

qu'un préliminaire pour arriver à l'hypothèque; mais :: ne la crée pas."<br />

Se a dita hypotheca resultasse do despacho do juiz que uomea o tutor ou<br />

o curador, el la seria judicia! e não legal.


DAS COUSAS 423<br />

Assim que nem a vontade das pessoas que intervém na<br />

constituição da hvpotlieca, nem as circumstancias em meio das<br />

quaes a tutela e «i curatela s,ão deferidas, influem na geração do<br />

direito hypothecario (5).<br />

§ 196. — A quem. compete a hypotheca.<br />

Ksta espécie de hypotheca foi estabelecida para protecção<br />

e garantia dos bens, direitos e acções das pessoas que vivem sob<br />

tutela ou sob curatela (6).<br />

A) No estado actual do nosso Direito são sujeitos á tutela,<br />

e por conseqüência tem hypotheca legal sobre os immoveis do<br />

tutor :<br />

1. Os menores, filhos legitimos, orphãos de pai (7) ;<br />

2. Os menores, lilhos legitimos, que tendo pai vivo, se<br />

achão sob a tutela de terceiro, ou porque o pai é incapaz' ou<br />

porque está ausente em lugar remoto ou não sabido, ou porque<br />

os demittio do pátrio poder (8) :<br />

3. Os menores, filhos illegitimos {*)).<br />

B) Incidem sob curatela e tem, nos mesmos termos, hypotheca<br />

legal sobre os immoveis do curador :<br />

1. Os loucos de todo o g-enero (10) ;<br />

2. Os pródigos (11).<br />

(5) Quer o tutor ou o curador tenhão, ou não, a intenção de obrigarem<br />

seus bens., quer a tutela ou curatela seja aceita na véspera de abertura de<br />

falllencia, a hypothca adquire existência e subsiste com todos os seus effeitos.<br />

Vej. Pont I. n. 489.<br />

(6) Lei n. 1257, art. 3 â 2... " ao.s menores e interdictos. .."<br />

Interãicto, na língua jurídica, significa a pessoa maior, a quem c prohibida<br />

a administração dos bens. Só temos duas ordens de pessoas incluídas na<br />

dita definição — os loucos, e os pródigos declarados tacs por sentença.<br />

O fallido, embora impossibilitado de administrar os seus bens. conserva a<br />

sua capacidade civil — tanto que pôde administrar o dote da mulher, o pecúlio<br />

dos filhos e os bens que lhe forão deixados com a clausula de inalienáveis.<br />

(7) Vej. Ord. I. 102.<br />

(8) Ord. I, bb 5 6 m fine. lx>b. a Mello 2. 11 § 4, B. Carn., L. I o T. 26<br />

§ 223 n. S e 9.<br />

(9) Avis. n. 312 de 20 de Outubro de 1859.<br />

(10) Ord. 4, 103 pr. I. S 3 de curat. (1, 23). Acerca da curatela dos loucos,<br />

vej. Direit. de f. § 163.<br />

Ql) Ord. 4. 103 § 6, Direit. de família § 167.


424 DIREITO<br />

C) A razão fundamental da hypotheca legal na materia<br />

sujeita está no incapacidade do menor ou interdicto para administrar<br />

seus bens e negócios, incapacidade que é supprida pela<br />

capacidade do tutor ou curador.<br />

D'ahi vem que a simples gestão de bens por via de representantes,<br />

não basta para fundamentar a hypotheca (12).<br />

Não tem, portanto, hypotheca legal :<br />

1. Os ausentes, nos immoveis do curador que é dado aos<br />

seus bens (13).<br />

2. O nascituro, sobre os immoveis do curador nomeado ao<br />

ventre (14).<br />

3. A massa fallida. nos bens do curador fiscal (15).<br />

D) A hypotheca legai dos menores e interdictos não se<br />

de--\anece pela morte délies, mas passa a seus herdeiros (I 6).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

irt. S27 — .1 l(i confert hyponieca És20<br />

II — Aos descendentes sobrt os immoveis do ascendente, oyu lhes adnixnistra<br />

os bens. — 385. 840.<br />

11 f — Los filhos sobre os immoveis do pae ou da mãe qui passar a ouïras<br />

nupeias, antes de fazer inventario do (asai anterior (art. 183. n. XIII).<br />

IV -- l's pessoas naturaes ou jurídicas (/ne não tenham a administração<br />

(i< seus bens. sobre os immoveis de seus tutores, curadores ou administradores.<br />

— 418. 840.<br />

(12) A lei n. 1257 (art. 3 S 2) diz "moi 1 .':,- e interdictos". O poder do<br />

tutor, bem como o do curador entendem com a pessoa e bens do menor i do<br />

interdicto. O próprio pródigo não pôde dirpôr de .seus bens «em assistência<br />

do curadoi Vej. Direit. de família. § 168.<br />

(13) Sobre a curatela de bens de aumentes vej. Direit. de família § 171<br />

e seg.<br />

(14) Font I. n. 496. O nascituro, isto é. o ser humano gerado, mas ainda<br />

não nascido, é considerado, quando -se trata dos .seus interesses, como se fora<br />

já nascido. Nascituro pro jam nato habetur. si de eju- commodo agitur. Toda-<br />

\ ia como ainda não adquirio pelo nascimento a responsabilidade de homem<br />

vivo e viável não se lhe dá tutor ou curador da pessoa mas somente curador<br />

de bens.<br />

(15) Vej. o art. 809 e seguint. do Cod. Com.<br />

(16) Faber C. S 7. difinit. ? m not. n. '>. Brunneman. ad L. 42 D. de<br />

àdministr. tut. Yoet. Pandect. 20, 2. n. 18.<br />

Os immoveis dos tutores e curadores passão a seus herdeiros, gravados<br />

com a hypotheca lega! dos menores e interdictos. L.ol>ão. Execuç. § 603.<br />

»


DAS COUSAS 425<br />

§ 197. — (lontra que pessoas é conferida a hypotheca legal doi<br />

menores e interdictos ?<br />

A hypotheca lega] dos menores e interdictos grava os immoveis<br />

presentes e futuros dos tutores e curadores (17).<br />

A) A nossa lei conhece três espécies de tutores : — o tutor<br />

ordinário, o tutor aâ hoc e o pro tutor.<br />

1. A incidência da hypotheca legal do menor sobre os immoveis<br />

do tutor da primeira espécie, isto é. do tutor que é nomeado<br />

para exercer d'uma maneira definitiva e permanente as<br />

funeções da tutela, não é objecto de duvida (18).<br />

2. O que dizer, porém, a respeito do tutor ad hoc?<br />

O tutor ad hoc, na nossa pratica, é o que é nomeado para<br />

representar o menor em um negocio particular (19). Um tutor<br />

tal, attenta a restricção do seu officio, circumscripto a um negocio<br />

especial e de curta duração, não é para se confundir com o<br />

tutor ordinário, cujos poderes não só abrang­em a pessoa e todos<br />

os bens do menor, como ainda se prolongão por todo o decurso<br />

da meuoridade.<br />

Parece, pois. que a hypotheca do menor não alcança ON<br />

bens desta espécie de tutor (20).<br />

A rnesina doutrina e. pela mesma razão, vigora a respeito<br />

do curador que é, por nomeação do juiz de orphãos, incumbido<br />

de representar os menores na liquidação das sociedades mercantis,<br />

em que são interessados (21).<br />

3. O pro tutor, como se sabe, é tutor de fado, que sem nomeação<br />

legal assume a tutela do menor, ou porque em bôa fé se<br />

créa tal, ou ainda sabendo que não o é (22). Este tutor por acto<br />

próprio exerce todas as faculdades da tutela — governa a pes­<br />

(17) Lei n. 1257 art. 3 5 2 e 11.<br />

(18) Lei n. 1257 art. 3 S 2.<br />

(19) Xomêa­se tutor ad hoc quando ainda «ão foi dado tutor ordinal Io<br />

ou elle não está, no lugar e ha necessidade urgente da intervenção da pessoa<br />

do menor em negocio que lhe diz respeito, como aceitação de herança, outhorga<br />

assignatura de escriptura, constituição de procurador para demandas.<br />

(20) Vej. P. Pont. t n. 4!»(S. O mesmo se deve dizer do curador que ■­•<br />

dá aos bens que o menor tem fora de seu domicilio. (Ord. 4, 102 S 8.)<br />

(.21) Vej. ai ; 353 do Cod. Commercial.<br />

(22) Fr. 1 § 1" D. de eo qui pro tutore 27, 5 Pro tutore autem negotia<br />

gerit qui munere tutoria fungitur. .. sive se putet tutorem, sive sciât non esse.<br />

B. Carn. I, 27 § 232.<br />

i


426 DIREITO<br />

soa e administra os bens do menor. No ponto de vista da realidade<br />

do facto não ha differença entre elle e o tutor verdadeiro.<br />

E' pois de necessidade, e ainda talvez por maioria de razão, dar<br />

ao menor contra um semelhante tutor as mesmas garantias que<br />

lhe confere a lei contra o tutor verdadeiro, isto é, — a hypotheca<br />

legral(23)<br />

A nossa jurisprudência, apoiando-se no Direito Romano,<br />

pcrmitte a nomeação de mais de um tutor a um menor, principalmente<br />

quando elle possue pecúlios em regiões diversas (24).<br />

Estes tutores têm um caracter definitivo e gerem a tutela, ou<br />

cummulativatnente, ou cada um em relação aos negócios a seu<br />

cargo, ou em relação aos bens que estão na região de sua competência.<br />

(25). Não ha razão de direito para subtrahir-lhes os<br />

bens á hypotheca legal do menor (36)<br />

B) Subsiste também entre nós a pratica de dar curador<br />

ad hoc, aos intertictos para negocio determinado. Por lorça de<br />

razões análogas ás que Eorão expendidas acerca do tutor ah hoc,<br />

contra taes curadores não têm os interdictos hypotheca legal (27).<br />

§ 19S. —Que obrigações a hypotheca legal dos menores<br />

e interdictos garante.<br />

A hypotheca legal dos menores e interdictos garante as<br />

obrigações dos tutores e curadores para com aquelles incapazes<br />

pela gestão da tutela e curatela. (28)<br />

(23) Faber, Codex 8, 7, définit. 2; Pothior. Hypoth. c. 1 sect. 1 art. "3;<br />

Tropicus II, n. 421; Lobão, Execuç. S 603. E' de necessidade que o indivíduo<br />

libre usurpando a qualidade de tutor. Se elle, porém, apoderando-se dos bens<br />

do menor, os administrasse como seus, em tal caso não obraria como tutor, e<br />

H menor, por conseqüência, não teria, hypotheca legal contra um tal usurpador.<br />

Vej. Troplong, cit. n. 421, e Pont. I, n. 500.<br />

E' de notar que no Direito francez pro tutor tem significação diversa de<br />

de i>ro tutor no sentido do nosso e do Direito romano. Os francezes para significarem<br />

o pro-tutor no sentido do Direito romano, servem-se de uma périphrase<br />

— pessoa que sem ser tutor exerce as funeções de tutor.<br />

(.24) Faber, Codex 6, 19. définit 19; Guerreiro, Tract. 3 L. 6 cap. 5.<br />

(25) Guerr. loc. cit.<br />

(26) Não pôde haver duvida a este respeito, porque os con-tutored<br />

exercem as mesmas attribuições que o tutor singular.<br />

(27) O curador ad hoc dá-se aos interdictos em casos analogue nut- era<br />

que tem lugar a nomeação do tutor ad hoc.<br />

(28) Décret, n. 3453, art. 167. E' para admirar que a lei n. 1257, re-


DAS COUSAS<br />

Ficão, portanto sob a protecção da dita hypotheca as<br />

obrigações seguintes :<br />

1!, a obrigação de indemnisar o valor dos bens que os tutores<br />

e curadores recebem, como t.aes e deixão de restituir por<br />

culpa ou falta : (29)<br />

2% a de restituir os fructos e rendimentos desses<br />

bens (30) ;<br />

3'í. a de indemnisar as perdas, damnos c prejuízos resultantes<br />

:<br />

a) de negligencia, íalta ou culpa, como se deixarão a divida<br />

prescrever, o prédio arruinar-se ; (31)<br />

b) de delicto, como se houveram para si, bens pertencentes<br />

aos tutelados ou curatelados ; (32)<br />

c) de quasi-delicto, como se alienarão sem autorisação judicial,<br />

bens da tutela ou curatela. (33)<br />

4 a , Finalmente a responsabilidade pelos alcances de coulas,<br />

qualquer que seja a procedência desses alcances, (34)<br />

A hypotheca legal, de que se trata, vigora tão somente<br />

para as responsabilidades que procedem da gestão da tutela ou<br />

curatela (35). Estão, pois, fora da comprehensão da dita hypotheca<br />

as dividas em que porventura os tutores e curadores se<br />

possão achar para com os menores e interdictos, originadas por<br />

causas estranhas ao exercício de seus cargos como se se tornão<br />

herdeiros de devedores délies, ou si eram a elles devedores por<br />

titulo anterior á aceitação da tutela ou curatela (36).<br />

Todavia, se taes dividas se vencerão no decurso da tutela<br />

ou curatela, e não forão pagas, incidem sob a garantia da<br />

hypotheca: os tutores ou curadores as devião cobrar de si mesmos<br />

e dar-lhes o destino legal; e se o não fizeram, infringirão<br />

um dever inhérente aos cargos que exercem (37).<br />

guiando systematicamente a matéria das hypothecas, não declaras® quaes<br />

as obrigações que garantem a hypotheca legal dos menores e interdictos<br />

(29) Ord. 1. 88 § 24, 27 e 37: Ord. 111 41 5 3. Ord. IV, 103 S 2 e 6.<br />

(30) Direit. de famii. § 160. 164 e 168. Troplong II. n. 427.<br />

(31) Ord. III, 41 § 3 Ord. IV, 103 § 2 e 6 in fine, Troplong- II. 427.<br />

(32) Cod. Criminal art. 146 e 147.<br />

I S3) Ord. I SS § 26 B. Cam. L. 1" S 239. n. 38.<br />

(34) Lob. a Mello 2 11 § 16, n 20 B. Carn. cit. § 239.<br />

(35) Pont I. n. 501. Uomat dizia Sommes qu i] dou pour sa compti<br />

(36) Troplong II, n. 427. Pont I, n. 501.<br />

(37) Voet. Pandect. 20, 2. 16: "Certi utique juris e&t, tutorem non ab<br />

427


428 DiRKITO<br />

§ 199 - Como se constitue a hypotheca legal aos menons<br />

e into dittos.<br />

A hypotheca legal dos menores e interdictos é constituída<br />

pelo termo da tutela ou curatela (38).<br />

A aceitação de qualquer daquelles cargos pela assignatura<br />

do respectivo termo marca de uma maneira precisa e firme<br />

o começo das responsabilidades do tutor ou curador (39).<br />

Assim que a lei fa/, a hypotheca datar do termo de aceitação<br />

da tutela ou curatela (40).<br />

Ficào, pois. sob a garanti? da hypotheca e desde a data<br />

de sua constituição as responsabilidades do tutor ou curador,<br />

não só pelos bens e direitos dos menores e interdictos, existen<br />

tes ao tempo da acceitação do cargo, como por todos e quaesquer<br />

bens de futuro adquiridos (41)<br />

Nisto nada ha de singular e extraordinário. Com effeito,<br />

acceitando a tutela ou curatela, os tutores e curadores contrahem<br />

as obrigações inhérentes aquelles cargos, isto é, de cuidar da<br />

pessoa e administrar honestamente os bens presentes e futuro<br />

dos menores e interdictos. Da inexecução de taes obrigações,<br />

em qualquer tempo, resulta-lhes a responsabilida de pelas<br />

- tantum pupilli debitoribus sed i i a se exigere oportere si quid ipse pupillo<br />

debeat ei gene iuod adversus ahum prsestare debuít pupillo suo.<br />

id euni quoque idversus se deber prasstare " Pothier, Hypoth. Sect. 2 - 3<br />

art. 4. n. 3. Troplong II n. 427. Zacarise § 264. not. 6.<br />

(38) Dec ret n 3453, art. 136 § 1".<br />

(39) Em rigo: de direito o tutor, logo que tem conhecimento de qui a<br />

tutela lhe foi deferida, é obrigado a entrar no exercício sob pena de responder<br />

pelos damnos resultantes. Ex quo innotuit tutor, se tutorem ess< scire<br />

debet periculum tutela ad eum pertinere (ir. 5 § 1". D. de administ. tutor,<br />

7) Todavia a le pela necessidade da precisão e certeza que deve reinar<br />

na mau: ia prescreve - que a hypotheca datará do termo de aceitação, de-<br />

\ idamente assignado.<br />

(40) Décret, n. 3453. cit. art. 136 S 1°.<br />

O C. C. franc (art. 1135 S I o ) faz a hypotheca datar "du jour de l'acceptation<br />

de la tutele"'. Esta expressão não tem a precisão desejável — d'ahi<br />

largas controvérsias acerca dos factos que constituem a aceitação. Veja-se<br />

•» Troplong II. n. 42S.<br />

(41) Voe. Pandect. 20, 2, n. 17. Faber, C. S 7, définit. 10 Pont. II<br />

n. 74ft:... "La date de l'hypothèque est toujours la même — celle de l'acceptation<br />

de la tutele, quelles que soient les créances du pupille contre son tuteur<br />

et quelles que soient le? époques ou les créances sont nées,"


DAS COUSAS 429<br />

perdas, prejuízos e damnos. E' exactamente essa a responsabilidade<br />

que a hypotheca leg-al g-arante (42).<br />

Na materia sujeita, pois, a hypotheca, como c de regra,<br />

nào precede, mas nasce com a obrigação (43).<br />

§ 300 — Hypotheca legal dos menores c interdictos<br />

estrange i> os<br />

A tutela e a curatela são regidas pela lei do domicilio dos<br />

menores e interdictos (44).<br />

Compete, pois, á dita lei definir os direitos e os efíeitos<br />

daquellas instituições e, por conseqüência, se lhes e inhérente<br />

a hypotheca legal sobre os bens dos tutores e curadores (45).<br />

D'ahi vem que o menor e o interdicto domiciliados no<br />

estrangeiro só podem ter hypotheca legal nos immoveis que o<br />

tutor ou curador possuem no paix, quando a lei do domicilio do<br />

menor ou interdicto lhe confere um tal direito (46).<br />

Mas não basta isto. Pois que, o estabelecimento da hypotheca<br />

legal e a fixação dos casos em que ella é admissível influem<br />

sobre o credito territorial, e a legislação acerca deste assumpto<br />

(42) Pont II. eu. n. 749. Muhlenbruch, Doutrin. Pandect. § 312: Incipil<br />

jus pignon.- plerumque ex tempore quo causa ex-ti tit, illius efficiens...<br />

in legalibus, ex contracta? obligationistempore, licet petendi causa tunc temporis<br />

nondum adparaatur. !•'.' a distineção entre o dies ceãit, dia era que a<br />

obrigação adquire existência, e o dies venit, dia em que se torna exigivel.<br />

(43) Vej. § 177 acima.<br />

(44) Savigny, Droit Romain VIII, § 380. P. Fiore, Droit Internation.<br />

n. 174.<br />

(45) Fiore, n. 220: "Pour determiner quelles sont les obligations qui<br />

peuvent être garanties par le gage et l'hypothèque, on doit appliquer la loi<br />

à laquelle l'obligation est par elle-même soumise'' n. 221: Ce droit est toujours<br />

un accessoire de l'obligation personelle dont il garantit l'exécution, et<br />

pourvu qu'il ne blesse pas le régime de la propriété territoriale, il doit être<br />

g par la loi même qui règle l'obligation principale, soit qu'il provienne. .<br />

soit qu'il découle d'une disposition de la loi."<br />

Vej. Laurent, Princip. du Droit Civil, I. n 116.<br />

(46) Felix, Droit Internat. Priv. n. 68; Fiore, n. 220 e 230... Principe<br />

incontestable pour nous à savoir — que les acts et les obligations ne peuvent<br />

avoir d'autres effets que ceux qui leur sont attribués par la loi qui les regit.<br />

Laurent, cit. n. 116: Xous ci oyons. . . que le statut de l'hypothèque legale<br />

est p( rsonnel en ce sens que c'est la loi étrangère qui decide à quelle<br />

garantie le mineur et la femme marié ont droit.


430 DIREITO<br />

não pôde ser modificada ou alterada pela applicação do Direito<br />

estrangeiro (47): a hypotlieca legal que a lei do domicilio dos<br />

menores e interdictos lhes concede, só grava os immoveis dos tutores<br />

ou curadores, quando a lei da situação desses immoveis<br />

reconhece e consagra a dita espécie de hypotheca (58).<br />

Ha, pois, necessidade do concurso de dous requisitos<br />

para que os menores e interdictos tenhão hypotheca legal nos<br />

immoveis dos seus tutores e curadores sitos fora da sua pátria,<br />

a saber.<br />

1". yue a lei do domicilio dos menores e interdictos lhes<br />

confira uma tal hypotheca,<br />

2". Que a lei da situação dos immoveis reconheça e consagre<br />

a mesma espécie de hypotheca.<br />

Fazendo applicação desta doutrina ao nosso Direito pódesc<br />

firmar o principio seguinte:<br />

«Os menores e interdictos domiciliados no estrang-eiro têm<br />

hypotheca legal nos immoveis que seus tutores ou curadores,<br />

ainda estrangeiros, possuem no Império, desde que a lei do domicilio<br />

dos mesmos menores e interdictos lhes confere um<br />

semelhante direito (49).»<br />

Se os menores e interdictos são brasileiros e a tutela ou<br />

curatela lhes é deferida em paiz estrangeiro, é fora de toda duvida<br />

que lhes assiste a hypotheca sobre os immoveis de seus tutores<br />

ou curadores, situados no Brazil. Xeste caso rege a lei brasileira<br />

não só como a lei da tutela e curatela, senão também<br />

como a lei da situação dos immoveis (50).<br />

(47) Vej. % 194 nota 5, acima.<br />

(48) Felix, n. 6S. Laurent cit. n. 116: En disant que le statut de l'hypothèque<br />

legale est personnel, nous n'entendons dire que l'hypothèque sera<br />

ganisée et exercée conformément à la loi étrangère.<br />

(49) A nossa lei n. 1257 é omissa a respeito da hypotheca legal dos menores<br />

e interdictos domiciliadas no estrangeiro, assim como o é acerca da<br />

hypotheca lesai da mulher casada, também domiciliada fora do paiz. O C. C.<br />

francez é igualmente omisso na materia. A questão pois, entre nós, fica como<br />

na Franca, sujeita aos princípios do Direito Internacional Privado. A doutrina<br />

acima exposta é a que prevalece em França- Troplong II, n. 429. Pont<br />

I. n. 429.<br />

(50) Vej. Troplong II, cit. n. 429.


IDAS eoosAs 431<br />

II. § 201.—Hypotheca dos filhos menores sobre, os<br />

immoveis do pai.<br />

O pai é por lei administrador do pecúlio adveiiticio dos<br />

filhos que tem sob seu poder (51).<br />

Pelas responsabilidades provenientes da adininistraçãs de<br />

um tal pecúlio a lei confere aos filhos, emquanto menores<br />

hypotheca sobre os immoveis do pai (52).<br />

1. O filho pôde se conservar sob o pátrio poder ainda<br />

depois de maior (53). A lei, porém, considerando que o filho,<br />

quando maior está na plenitude de suas faculdades mentaes e que,<br />

por conseqüência, nada o inhibe de pessoalmente exercer os<br />

recursos que lhe offerece o Direito para por cobro á má gestão<br />

do pai (54), neg"a­lhe o favor da hypotheca legal, que só concede<br />

ao filho menor (55). ,<br />

2. O filho­familia, segundo o nosso Direito, pôde ter outros<br />

pecúlios, de diversa nature/.a. isto é, o pecúlio castrense e<br />

o quasi­castrense (5b). Kstes pecúlios durante a menoridade do<br />

lilho, ficão sob a g'uarda e administração do pai, embora elle não<br />

tenha o usofructo dos ditos pecúlios (57). Terão os filhos hypotheca<br />

legal pela administração de taes pelculios ' Xao, porque a<br />

lei reproduzindo o Direito Romano a este respeito (58). so concede<br />

a hypotheca pelas obrig­ações do pai, relativas a administração do<br />

pecúlio adventicio (59).<br />

(51) O d 4 97 ­ 19 Ord I 88 5 li. Sobn o ciu< seja pecúlio atlrcntUHo,<br />

\ ej. Direito de família 5 115 n 1 \<br />

( 52 i Lei ii. 1.257 . ; :;<br />

(53) Ord 4 xi 5 3 Provis 1. _'4 de .Maio de 1823 i Decrel «Io 1 d<<br />

o de 1848.<br />

(54) Ord. 3. :i Í 4. Mell< ­ I § 12, Lobão a Mello eil §12 i 2:>.<br />

(55) Lei n. 1.257 ar.t. 3. § •­;. "Aos filhos menores<br />

Yej. Direjto de família 5 115 e 116.<br />

^ (57) \(j Direito de família S 116. n. li.<br />

(58) C. 6 5 l _ 4 C bonis quœ liber 6. 61; Makeldej § 54S n 6<br />

Maynz, § 243. not. 23. O D. R. refere­se especialmenti aos bens maternos<br />

ou procedentes de ascendente­ maternos.<br />

(59) Vej. Voe;. 20. 2 n 23. \ lei n. 1.257 art. 3 § 3 diz: bens ma<br />

'.~ ou tdventidos x . zão para excluii os bens eastrenses c<br />

ciuasi­castrenses quando ­ consei­vão sob a administração do pai poi sei ■><br />

filho menor. Sena a. exclusão intencional ou nu . ,ia Calta de il<br />

;ão? o que é CÍ i ti. e que a, 'e: sendo expressa a ierc«


«<br />

432 DIRJÎIÏO<br />

3. Ha duas espécies de pecúlios adventicios - pecúlio<br />

adventicio ordinário e pecúlio adventicio extraordinário ou irregular<br />

(60 j.<br />

Pecúlio adventicio desta ultima espécie é aquelle de que<br />

o pai, por excepção de direito, não tem nem o usofructo, nem a<br />

administração (61). Todavia, emquanto o filho é menor, permanece<br />

o dito pecúlio sob a administração do pai (62) Neste<br />

caso subsiste a hypotheca do filho, porque a hypotheca deriva,<br />

não do usofructo, mas da administração (63).<br />

4. A hypotheca grava todos os immoveis do pai, presentes<br />

e futuros (64).<br />

5. E cobre todas as responsabilidades do pai para com o<br />

filho, por motivo da administração do pecúlio.<br />

A dita hypotheca, pois, garante :<br />

I. a obrigação de restituir ao


lus coüsÀb 4oo<br />

II. Pelo titulo de acquisição e desde que os bens se tornao<br />

exigiveis, quanto aos adventicios de procedência diversa (69).<br />

7. A'cerca da hypotheca legal dos menores estrangeiros<br />

sobre os immoveis que seus pais possuem no Império, vigora a<br />

mesma doutrina que a respeito da hypotheca legal dos menores<br />

e interdictos domiciliados em terra estrangeira, a saber : os filhos<br />

só gosão da dita hypotheca nos immoveis que os pais têm<br />

no Brasil, se a lei do domicilio paterno lhes confere uma tal<br />

hypotheca (70).<br />

III. § 202. — Hypotheca legal dos filhos sobre os immoveis<br />

ele pai ou mãi binuba.<br />

1. Por disposição expressa do nosso Direito, o pai que<br />

contrahe segunda nupeias, torna­se simples usoíructuario dos<br />

bens que lhe advém de filho do primeiro matrimônio, herdados<br />

da mãi ou de ascendentes maternos, se esse filho se fina intestado<br />

e lhe sobrevivem irmãos germanos. A propriedade de taes<br />

bens passa aos irmãos do filho premorto. isto é, aos filhos do<br />

primeiro matrimônio (71).<br />

A mesma doutrina e nos mesmos termos vig­ora em relação<br />

á mãi binuba quanto aos bens que herda de tilho das primeiras<br />

nupeias (72).<br />

(69) Décret, cit. art. 136. § 3.<br />

Ainda antes de se tornarem o­ bens exigiveis como se o vencimento depende<br />

de condição suspensiva o pai tem deveres a eum­prii . obrigado .1 promovei<br />

i­ medidas de consei ... 3 como por exemplo exigii 1 caução dt bem<br />

atendo se i filho >'■ senhor da nua propriedade. Se a não requer, 1 sponde<br />

p< a­ perdas e damnos Estará esta responsabilidade sob a garantia da hypo­<br />

.'m ( a • \ \ ista da disposição li­ ,<br />

(7ü) Savignj s í 3Su Fiore, n. 104 . 165 Vej ; 200 acima.<br />

(71) Did. IV 1)1 I 2. 3 e 4.<br />

(72) Ord. eu.<br />

A disposição da citada ord. — que o pai ou mãi binuba .só tem o uso<br />

frueto dos bens herdado­s de filho do primeiro matrimônio prevalece:<br />

1. Quer o filho houvesse fallecido antes, quer depois de conn thidas as<br />

­enunda.s nupeias (Ord. ca. §2).<br />

2. Não .só em favoi do.­ filhos do primeiro matrimônio, como ainda de<br />

sobrinhos, concorrendo com tios (Ord. cit. S 2).<br />

\ dita disposição porém cessa e o pai ou mãi adquire o dominlo pleno<br />

dm­ bens deixados pelo filho do segundo matrimônio:


434 ulRïUïÔ<br />

Assim, entre os filhos do primeiro matrimônio e o pai<br />

ou mãi binuba, dadas as circumstancias expostas, se estabelecem<br />

as relações jurídicas que ha entre o senhor da mia propriedade<br />

e o usofructuario.<br />

2. A lei, no intuito de garantir os direitos dos filhos,<br />

lhes confere, em quanto maiores, hypotheca sobre os immoveis<br />

do pai, ou da mãi, pelos bens de que um ou outro tem na fôrma<br />

dita o usofructo (73).<br />

3. A causa desta hypotheca está no usofructo; ella por<br />

conseqüência se constitue no momento em que o usofructo adquire<br />

existência, a saber :<br />

a) Pela morte do filho, e desde esse momento, se o pai<br />

ou mãi já tinha passado a segundas nupcias (74) ;<br />

b) Pelo segundo casamento e desde sua data, se a esse<br />

tempo o filho já era morto (75).<br />

I. Se os filhos do primeiro matrimônio fallecem todos na constância das<br />

segundas nupcias, antes do pai u mãi, ainda deixando descendentes (Ord.<br />

§ 2 in fine), adopfada nesta hypothèse a opinião de Azão, que só dava aos<br />

sobrinhos o direito de representação quando concorrem com os tios;<br />

II. Se o filho que se fina fez testamento, instituindo o pai ou mãi (Ord.<br />

ü 2 e 4). Neste caso, pensão alguns, como o filho manifestou a vontade de<br />

que seus bens passem ao pai ou mãi, a Ord. attende a esta vontade


DAS CÒÜSÀS 435<br />

4. As obrigações que a dita hypothecagarante são as do<br />

usofructuario para com o senhor da núa propriedade, isto é :<br />

I. A obrig-ação de restituir os bens ou o seu valor aos filhos<br />

do primeiro matrimônio (76) ;<br />

II. A de indemnisar os damnos que os bens soffrerem em<br />

sua substancia, por acto ou facto do pai ou da mai (77) ;<br />

III. A de satisfazer as perdas e prejuízos resultantes da<br />

neu-lig-encia, culpa ou malversação (78).<br />

Ksta hypotheca affecta os ím-moveis presentes e futuros<br />

do pai ou mãi (79).<br />

(76) Vej. §8 103-107 acima.<br />

(77) Xota antecedente.<br />

(78) Nota antecedente.<br />

0 suofructo, de que se trata, é vitalício; as obrigações expostas, portanto,<br />

sô se tornão exigiveis depois da morte do pai ou mãi, e serão cumprilas<br />

pelos seus herdeiros, aos quaes os immoveis passão com o onus hypothecario.<br />

1 791 Lei n. 1257, art. :'. 5 11.<br />

29


TITULO III<br />

HYPOTHKCA T.EOAT, DO ESTADO } v CORPORAÇÕES T>R MÀO­MORTA<br />

§ 203. ■—TJypotheca legal do Estado, províncias e<br />

municipalidades<br />

A) 1. O Estado—pessoa moral—não pôde administrar os<br />

seus bens por si, nem arrecadar as suas rendas. Estas funcções<br />

são confiadas a prepostos.<br />

E, pois que está sujeito á necessidade da representação,<br />

a lei o equipara aos menores (1), e em conseqüência lhe confere<br />

hypotheca contra as pessoas, que são incumbidas de guardar<br />

e administrar­lhe os bens e rendas (2).<br />

2. Compete a dita hypotheca ao Estado, não como entidade<br />

política, senão como pessoa civil, capaz de adquirir e possuir<br />

bens (3). Sob esta face o Estado, denominado no Direito<br />

antigo—fisco (4), toma no Direito moderno o nome de—ja~ev,da<br />

publica nacional (5).<br />

3. A hypotheca legal do Estado tem por causa a guarda<br />

e o maneio., sob obrigação de contas, dos bens e dinheiros que<br />

lhe pertencem. Assim pois ella é conferida:<br />

d) ­Mello. 2. 13 5 9, Pereira e Souza, Nota 598, Silva a,l Ord. 3, 4!, S 6,<br />

M. '■'>: Instrueções «la Directoria Oral do Contencioso de 10 de Abril de 1851.<br />

art. IT.<br />

( i' ) Lei n. 1257, art .355.<br />

(3) Savigny, Droit Rom. 11. í 86, in fin­e, i§ 89 in fine o § 101, May]<br />

S 111.<br />

(4) Nos ultimes tempos do Império Romano a palavra fisco designava<br />

o Estado como pessoa civil. íMavnz. cit. Ü m». Esta denominação passou<br />

para o Direito Portuguez. Vej. Pereira e Souza. J 168 e Not. 913).<br />

(õ) Const. Politic, do império, art. 170.


DÁS eoüâAS AM<br />

I Contra os funccionarios públicos que são encarregados<br />

de receber as rendas e diuheiros públicos, de guarda­los e restituilos,<br />

taes como os thesoureiros (6), os collectores i7), os exactores<br />

(8), os recebedores (9), e os pagadores (10);<br />

II. Contra as pessoas que são prepostas para arrecadar,<br />

xelar e administrar cousas e bens da nação, como os almoxarifes<br />

(ll)> os administradores de fazendas e propriedades do domínio<br />

do Estado (12);<br />

(6) Lei n. 1257. art. 3 5 5. Tomos, além de outros, o ihesourehv. Mo<br />

thesouro publico nacional; (Décret, n. 736 de 20 de Novembro de 1850.<br />

art. 28), os thesoureiros das thesourarias geraes de províncias (cit. De^<br />

cret. n. 730. ar.t. 42 e tabeliã lo. os thesoureiros de alfândegas (Décret,<br />

n. 2647 de 10 de Setembro de i860, art. 135) o thesouneiro da caixa de am­prtisação<br />

(lei de 15 de Novembro de 1827. art. 47 e 48).<br />

Não é mister dizer que a citada disposição não entende com os thesoureiros<br />

e depositários, que supposto sejão de nomeação do governo, todavia<br />

não guardão dinheiros e bens do Estado, como o thesouneiro das loterias, os<br />

depositários públicos, os curadores de heranças jacentes. os thesoureiros dos<br />

cofres de orphãos.<br />

(7) Dei de 27 de Agosto de 1830. Décret, de 7 de Out. de 1831, lei de<br />

15 de Novemb. de 1831, art. 54.<br />

(8) Exactor (do latim■ Exactor) é todo o funecionario encarregado de<br />

cobrar e arrecadar impostos.<br />

(9) Vej. Avis, de 2!) de Julho de 1808. T,oi de I de Out. de 1831, a<br />

6 5 3, circular de 19 de Agosto de 1840.<br />

(10) Décret, n. 736, art. 2\) e 30.<br />

dl) Tacs .são os almoxarifes das repartições de guerra o marinha.<br />

Reg. de 21 e 23 de Fevereiro de 1932, Reg. de 28 de Pev. de l&fil, art. 34<br />

e seg.<br />

A lei u. 1257. cit. art. 3 S 5. não é expressa acerca dos almoxarifes; mas,<br />

ta a natureza de suas funeções, elles se incluem na classe dos prepostos:<br />

tem sob sua suar.ia e administração gêneros, effeitos e materiaes permutes<br />

ao Estado.<br />

(12) Lei n. 1257. cit. art. 3 5 5... "administradores... prepostos." O<br />

Estado pôde ter è tem propriedades que elle explora por via de seus admiidores<br />

e prepostos, como por exemplo, as fazendas que possuía na pro<br />

vincia do Piauhy, a antiga Coudelaria da Cachoeira do Campo em Minas<br />

Geraes. Estes administradores são obrigados a dar comas dos rendimentos<br />

de taes propriedades, e pelos seus alcances o Estado tem hypotheca lega] nos<br />

.seus immoveis.<br />

Mas se um particular em vez de ser preposto do Estado, toma para si de<br />

arrendamento um prédio, uma propriedade do Estado, terá a fazenda publica<br />

hypotheca pelo preço do mento? Não, porque a lei fatia de preposto.


4.18 btRtfcîïO<br />

III. Contra os particulares que to mão por contractos. celebrados<br />

com a administração publica, a arrecadação de impostos<br />

(rendeiros on contract adores) (13).<br />

IV. Contra os abonadores e íiadores dos responsáveis- acima<br />

enumerados (14).<br />

4. Da doutrina exposta resulta:<br />

Que a hypotheca legal do Estado, pelo que respeita aos<br />

funccionarios públicos, entende tão somente com os que têm a<br />

seu cargo receber dinheiro, ou bens nacionaes. e te-los sob Mia<br />

guarda (15), e não com aquelles a quem incumbe fiscalisar-lhes<br />

a arrecadação e ordenar-lhes o emprego (16).<br />

Que, pelo que concerne aos particulares, o Estado não<br />

tem hypotheca pelas dividas em que se possão achar para com<br />

elle, ou provenhao de impostos (1.7), ou de contractos. e quasi<br />

de administrador, e O indivíduo que arrenda paia si D próprio do Estado, não<br />

entra na classe dos administradores ou prepostos do Estado.<br />

(13) Lei ii. 1257, art. •'. S 5. No nosso antigo direito financeiro denominavão-se<br />

rendeiros ou contractadores os particulares a quem o Estado.<br />

mediante um certo preço, dava por arrematacüo o direito de arrecadar uma<br />

espécie determinada de impostos, como o do sal, ou de exeree-r um ramo de<br />

industria ou de commercio de privilegio do Estado, como o fabrico de cartas<br />

de jogo, o corte •


L>AS COUSAS<br />

contractus ou de quasi delicto, salvo pelas de contractus de<br />

rendas (28).<br />

5. A hypotheca legal do Estado g­arante as responsabilidades<br />

pecuniárias dos lunccionarios e pessoas acima declaradas<br />

(n. 3), por alcances de contas, atrasos de entradas, perdas e<br />

daumos resultantes de culpa ou negligencia e lhes affecta os<br />

immoveis que forem especializados (19).<br />

Constitue­se pelo titulo de nomeação, e desde a sua data<br />

|20). Se o cargo, porém, é daquelles que obrig­ão á iiança.<br />

a hypotheca so se reputa constituída pelo respectivo termo (21).<br />

B ) As províncias e as municipalidades são também pessoas<br />

jurídicas, capazes de possuir e adquirir bens ( 22 ). A lei<br />

lhes coniere hypotheca. nos mesmos termos que ao Estado, con*<br />

tra os seus lunccionarios e as pessoas particulares que se achão<br />

para com ellas nas mesmas relações de direito em que estão para<br />

com o Estado os funecionarios e os particulares de que acima se<br />

fez menção (23).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Ari 827 — A I' i confen hypotheca: — 820<br />

(18) Taes são a­ dividas de particulares para turn o Estado poi eom«<br />

pras cie bens e effeitos nuMico*. por contractus de obras. etc.<br />

(19) Lei n. 12.Ï7 art 2 § 10 art. 3 § 10.<br />

(20) Décret, n 3453 art. 136 § 7.<br />

121) Décret, cit.. art. 136 § 7.<br />

Em rigor, os effeitos da hypotheca devião começar da entrada do funccionario<br />

em exercício mas a necessidade de da: maior segurança an Es<br />

lado e de precaver fraudes explica a citada disposição como ella se acha<br />

formulada. Comprehende­.se que um funccionario de má fé poderia aproo<br />

prazo que medeia entre a sua nomearão e entrada em exercício para<br />

subtrahir seus bens a responsabttidade para com o Estado poi via de hypo­<br />

■ ­v ■ as simuladas.<br />

Xo caso de fiança não ha perigo i m datai a hypotheca do respectivo<br />

termo, porque a fiança resguarda os Interesses do Estado contra as fraudes<br />

ijue se pratii assem depois da nomeação.<br />

A hypotheca contra os rendeiro. 1 ­ « coritractadores começa de existir da<br />

data da assignatura do contractu.<br />

Cumpre finalmente observar que a h>poiheea legal do listado só data<br />

da nomeação ou fiança, quando ella é èspecialisada e mscripta dentro do<br />

prazo da prenotação. \


44Ò DIREITO<br />

l' Fafsenda -Publica Federal, Esiadoal ou Municipal, sobre os ùmmovtii<br />

do Ihesonreiros, collectores ad-ministradores, exactores, prepostos, rendeiro*<br />

t contract adores de rendas e fiadores. — 844.<br />

§ 304--- Mypolheca legal da Igreja c corporações de<br />

mão-moi lu<br />

A igreja c as corporações de mão-morta, pela mesma razão<br />

que o Estado (24), são equiparadas aos menores e como á elles a<br />

lei lhes confere hvpotheca sobre os immoveis das pessoas, a quem<br />

c cornmeltida a g'uarda e a gestão de seus bens e a defesa de seus<br />

direitos (25).<br />

1 . A igreja, na materia sujeita, é a pessoa moral, a quem<br />

pertencem o^ bens eccleciasticos (2f>).<br />

2. Xo nosso direito se reputão corporações de mào-morta.<br />

e, portanto, investidas da hypotheca legal:<br />

I. As ordens religiosas conventos e mosteiros;<br />

II. As confrarias, irmandades e ordens terceiras;<br />

III. Os hospitaes e as misericórdias (27)"<br />

(24) Vej. o í antecedente Guerreiro, Tract, i r. í capit 10, a. 71.<br />

(25) Lei n. 1257 an. 3 § ü<br />

(26) Ha diversas opiniòe* acerca de quem seja o proprietário dos bt-ns<br />

occlesiasticos. Vej. Walter 5 24H. iMonte S 1198 A que nos parece mai,- jurídica<br />

é a que attribue a propriedade de taes bens. não â Igreja Universal,<br />

mas ã igreja determinada a cujo uso ^ão applicados como por exemplo,<br />

quanto aos bens parochiaes a corporação dos fieis que formão a parochia sob<br />

açÊjo do culto divino Dicendum esl dominium rerum ecclesiastiearum<br />

1ère penes ecclesiam Miam particularem, cui talia bona applicata sunt<br />

pro dote... Nee personna aliqua singularis habet dominium, sed sola


.'A­ CÛUSAS 441<br />

Mas para que estas pessoas moraes gozem da hvpotheca<br />

legat, é mister que teuhão sido constituídas de harmonia com<br />

as prescripções do direito (28).<br />

Não se considerão corporações de mão­morta, e por conseqüência<br />

não têm hvpotheca legal: os seminários (29), os meros<br />

recolhimentos (30), os montes de soecorro e os pios. as caixas<br />

econômicas e as sociedades de soecorros mútuos (31).<br />

3. São por seus inimoveis sujeitos á hvpotheca:<br />

I. As pessoas que recebem e conservão sob sua guarda<br />

os rendimentos e dinheiros das igrejas e corporações de mãomorta,<br />

como os fabriqueiros e os thesoureiros (32);<br />

II. Os mesarios. definidores e prepostos que administrão<br />

bens pertencentes as mesmas pessoas moraes (33):<br />

III. Os procuradores e syndicos que representão as dita'­,<br />

entidades e gerem os seus direitos e negócios (34).<br />

4. Ficão sob a garantia da hvpotheca as responsabilidades<br />

dos ditos prepostos para com a igreja e corporações de mão<br />

morta, provenientes do exercício dos ditos cargos, a saber:<br />

a ) A obrigação de restituir os dinheiros e rendimentos<br />

recebidos:<br />

(28) Lei de 22 d< Sei de L828 art. 11 Lei de 12 de Agosto de 1834<br />

l \ v.ld c onal) art. 10 5 10. Décret, n. 2711 de 19 de Dezembro de 1860.<br />

art. S3. Vej. B. Cam. § 1 . T. 36 * 302 n. 2.<br />

(29) Vej. Monte 5 1163 e seguintes.<br />

(30) Vej. Berardi Dissert. 4. n. 10. 21.<br />

(31) Loi n. 1083 de 22 de Agosto de 1860, art. 2 § 1 . 13­22. e Deerel<br />

2711 d( 19 de Dezembro de 1860, cap. 4, 5. 7 e S.<br />

Nenhuma destas entidades reúne ots característicos de mão­morta. A cor­<br />

;ão de mão­morta distàngue­se pelo fim — vida religiosa, culto divino ou<br />

exercício de caridade; pela natureza jurídica da entidade — {■ a proprietária<br />

' ­ bens que formão o seu patrimônio, sobre o qual os membros da<br />

corporação não têm nenhum direito nem presente nem futuro; e pela perpetuidade<br />

da sua duração. Vej Savignj il § 86. n. 2.<br />

(32) Lei n. 1257. art 3 § 6. Sobre os fabriqueiros. vej. Monte § 495<br />

seguintes, são de nomeação dos bispos e prestão contas aos juizes de c«as<br />

Vej. o Décret, n. S34 de 2 de Out. de 1851. art. 47. Aviso n. 115 de<br />

27 de Abril de 1855 5 de Nov. cie 1858 a 25 de Janeiro do 1871.<br />

(33) Lei n. 1257. am. 3 $ (5... "prepostos." \s mesas das confrarias •<br />

irmandades exercem o governo econômico das mesmas confrarias e irmandades<br />

e prestão também contas aos juizes de capeHas<br />

(34) "Vej. B. Cam. L. 1 T. 36 S 298 n. 12. Sav.gny II. « 92 n. V.


442 DIREITO<br />

b) A obrigação de indemnisar as perdas, prejuízos c<br />

ckitnnos resultantes de ueg-lig-encia, culpa ou malversação (35).<br />

5. A hypotheca das igrejas c corporações se constitue pelo titulo<br />

de nomeação do íunecionario, e desde a sua data (30).<br />

(35) Ord. 1 62 ? 39. Décret, n. 834, de -' du Out. de 1851, art. 15, 16<br />

•• IV. B. Carneiro L. J T. 35 S 298 n. 11.<br />

(13) Décret, n. 3453. art. 136 § 7. Os effcitos da hypotheca bó começao<br />

da data da nomeação, se a inscnpção é feita no prazo da prenotaçâo.


TITULO IV.<br />

HYPOTHECA LEGAL DOS OFFENDIDOS E A DO ^HERDEIRO.<br />

§ 205 — Hypolheca dos offendidos.<br />

1. O delinqüente é obrigado a satisfazer o damno que<br />

causa com o delicto (1).<br />

A reparação dos prejuízos e perdas que resultão do facto<br />

criminoso tem um caracter especial que a torna particularmente<br />

dignada proteccão da lei. A moral, o direito, os interesses da<br />

sociedade requerem que a vida jurídica, perturbada pelo delicto,<br />

seja restabelecida no seu estado normal, tanto quanto o permittem<br />

as forças humanas, isto é, que se sanem as conseqüências<br />

do crime, que o offendido seja collocado na posição em que estaria<br />

se a lei não tivesse sido violada (2).<br />

Dahi a necessidade que a satisfação seja a mais completa<br />

possível (3).<br />

E corno meio de asseg - ural-a naquelles termos, a lei eonlere<br />

ao offendido hypotheca sobre os immoveis do delinqüente<br />

(4).<br />

(1) Cid. Criminal, art. 21 e .seg.<br />

A doutrina do Código Criminal acerca


444 DJKlITO<br />

2. A can a dA hypotheca é o delicto a acção ou omissão<br />

punida [icia Ici.<br />

A hypotheca compete ao offendido, quer seja clic uma pessoa<br />

physica, como o homem, quer seja uma pessoa moral, como o<br />

Estado, ou uma corporação de mão­morta, uma sociedade mercantil<br />

(5); grava os immoveis do autor do delicio (0), garante a<br />

obrigação de indemnisai' o damno causado c os juros simples e<br />

compostos (7).<br />

3. O damno consiste nas perdas e prejuízos, susceptíveis<br />

ei ti. L257 derogou o Cod Crimina) "Nãu ha outras hypothecas senão ■ '■•<br />

>iu< esta lei estabeleci . " Lei ti. 1237. arl 1 Ora a hypothec i legal pelas<br />

multas uâo si acha entre a­­ que a dila lei estabelece. A multa é pena ( não<br />

reparação do damno causado.<br />

(5) Lei n. 1257 irl ! § 7 " to Estado •■ .tu­ offendidos." Vej. Sa­<br />

\ ígnj 11 i 92<br />

(li) Lei n. 1257, art. 3 5 7. "sobrt os immoveia do ' riminoso." S o<br />

>i me (■ commettido poi ma­­ dum delinqüente, a hypotheca affecta o­ immoveis<br />

de todos elles porqui são soMdariamente responsáveis pela obrigaão<br />

Cod. Cr. ai ; 27<br />

O Cod. d minai (art. 11) iesviando st ,1,1 verdadeira doutrina (Pothier,<br />

Oblig. n. 11S 1 seg 1 impõe aos que segundo o irtigo lu (como menores<br />

de quatorzi innos e loucos) não se devem julgar crhninosos, a obrigação de<br />

reparaj > ma: caus;<br />

0 offendido po ., : 1 daquellas pessoas terá hypothe a legai nos imrao­<br />

­ pela satií 1 damno causado? SAm no domínio exclusivo do<br />

Código "ós ­eus bens comtuão serão sujeitos a satisfação do damno caução<br />

< 11 lei 11. 1257:<br />

1 1'orquí i lei (cit art. 3 5 1' diz sobre os immoveis do criminoso<br />

1­ pessoas ,1 [U( f,e referi o ai ;. 10 do Cod Criminal não se reputão criminosos.<br />

A 1' le hypothi as ê strictisshni juris não admitte interpretação<br />

ampliam a.<br />

2. Porque não subsiste a razão que determina a hypotheca. O mal eau<br />

sado por quem não em mputação, ou por qu m obra sem intenção,<br />

desastn um; calamidade mas não é a violação d( um direito<br />

O Co 1 Ci M 28) também toi*na responsáveis pela satisfação do<br />

damno ( lusado o senhoi do escravo autor do delicto (até o valor do mesmo<br />

■ ­1 avo) ( o qu« ­1 ituitamente participa dos produi os do crimi (até a concurrenti<br />

quan a). ­ sfação qu< Bentham cap. 17 chama substilutlua<br />

Terá o offendido hypotheca legai sobre os immoveis daquelles responsáveis<br />

pela satisfação substitutiva? \â


DAS COUSAS 445<br />

de apreciação pecuniária, que o offendido, cm conseqüência do<br />

delicto, soffrc em sua fazenda c direitos (8).<br />

4. O direito á indemnisação c com elle a hypotheca legal<br />

que lhe serve de garantia, passão aos herdeiros dos offendidos,<br />

assim como a obrigação de satisfaze­la pelo bens da herança<br />

aos herdeiros do delinquete ('.>)•<br />

Esta hypotheca e constituída pelo delicto c desde sua<br />

data (10).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

ir/. .^27 — l lei confere hypotheca: — 840<br />

yj — \o offendido, ou aos seus herdeiros sobrt os Irwmoveis ão deUn<br />

quente, pura satisfação do davx.no causado pelo delicto e pagamento das custas<br />

(arl 842, n. I) — 82!).<br />

(X) As obrigações ex­delicto, obrigações qui a hypotlieca legal garante<br />

não são senão obrigações de dar cousa (restituição da cousu destruída, Cod.<br />

Crim. art. 23) ou de dar dinheiro, o valor equivalente (Cod. Crim.. art. 25).<br />

O mal causado pelo delicto pódi consistir simplesmente em um eoffrimento<br />

physico ou moral sem relação directa ou indirecta com o patrimônio<br />

do offendido. como i o que resulta de ferimento leve que não impede de exercer<br />

a profissão ou de ataqu< a honra. Nestes catóos não ha necessidade<br />

le satisfação pecuniária Todavia não tem faltado quem queira reduzir o<br />

simples softfrimento physico ou moral a valor são extravagâncias do espirito<br />

humano.<br />

O mal que dá lugai .1 satisfação pecuniária é o que directa ou indireütamente<br />

(por via d< conseqüência) offende o indivíduo nos .seu.s direitos reis<br />

A propriedade no èèni de amplo (§ 24 acima) e nos ­seus interesses<br />

legítimos Tal é o que oceorre quando a cousa édestruida on subtrahida;<br />

tal ê o prejuízo que resulta ao offendido que o delicto inhabilita tompoi­ai a<br />

ou íierpetuamente de exercer a ­sua profissão. Nestes casos dá­se a obrigação<br />

de satisfazer o damno cau.sado e com a dita obriga'çao nesce 1 hypotheca<br />

legal.<br />

(9t ("od. Crim. art. 2f>. Lei n. 1257. ait. 3 5 7.. "ao offendido OU aos<br />

■~'us herdeiros " § 1 .1. de perpet. et temporal", act. 4 12. Não é mister dizer<br />

'Me o herdeiro ­" fica obrigado pela satisfação dentro das forças da herança.<br />

DO) Décret, n. !453 arl 136 § 8. Subsiste para a h\poihecaa data do<br />

delicto, se a in.scripção é feita no prazo da prenotação. Tej. § 227 e seg.<br />

adiante.


446 DÍKEIT-O<br />

§ 206—Hypotheca legal da coherdeiro pela torna ou<br />

reposição<br />

1 . Nas partilhas de herança (familiœ erseiscunda) muitas<br />

vezes se costuma adjudicar a um herdeiro um bem que excede o<br />

seu quinhão, ou porque um tal bem não admitte divisão, ou porque<br />

a divisão seria inconveniente: ficando o mesmo herdeiro obrigado<br />

a repor aos outros o excesso em dinheiro. (11).<br />

Esta pratica, a principio tão somente fundada na autoridade<br />

do Direito Romano, recebeu afinal a consagração da lei<br />

escripta (12).<br />

2. Na partilha em que se põe por obra o al vitre da torna,<br />

o herdeiro que é privado da parte em bens, a que corresponde<br />

a mesma torna, peora de condição, porque pelo domínio, pela<br />

propria cousa que perde, adquire um direito pessoal — o direito<br />

de haver o valor da reposição (13).<br />

A praticada torna ou reposição se traduziria, pois, cm<br />

uma injustiça, se a lei não viesse em auxilio do coherdeiro e<br />

não lhe desse uma garantia destinada a resguarda-lo contra as<br />

contingências a que o expõe a mudança de sua posição de credor<br />

de domínio para credor de uma simples obrigação pessoal.<br />

Esta segurança é a hypotheca legal que lhe é conterida<br />

contra o herdeiro obrigado á torna ou reposição (14).<br />

3. A dita hypotheca recahe sobre os bens de raiz da he-<br />

ill) S 4 1. de offic. judieis, 4. 17: lit si in alierius personne praegrav-are<br />

videatur adjudicatiô, debet hune invicem eoheredi certa pecunia, sicut<br />

jam dictum est, coderanare. Fr. 52 § D. faroil. ersciecund. Voj. Pona<br />

eap. fi. n. 59. Bü e 61, Pereira de Carvalho nota 191, Menezes, cap. 3 5 12,<br />

(12) Artig. de Siza, cap. fi S 4: "Outro-sim, muitas vezes acontece entre<br />

os herdeiras que herdão alguns bens de raiz. quando os querem partir<br />

por vir a boa igualdade e cada uni haver direitamente o que lhe pertence<br />

haver, tornarem uns aos outros dinheiro por alguma melhoria que hão em<br />

ilguma parte da partição que assim fazem nos ditos bens."<br />

Alvará de 14 de Dezembro L775 5 9: "B mando outroshn que mai.« não<br />

torne a vir em duvida a questão de se lançar a décima ás tornas compensativas<br />

dos maiores valores de bens com que ficão aquelles que as fazem e as<br />

recebem, "<br />

(13) A obrigação imposta pelo juiz a um herdeiro para repor a outro<br />

o excesso do valor, é toda pessoal.<br />

(14) Lei n. 1257. art. 3 § 8.


;>AS c o USAS 447<br />

rança quínhôados ao herdeiro reponente (15; : d'ahi resulta que<br />

fila não grava os iinmoveis adjudicados a outros herdeiros (16) ;<br />

nem tão pouco os immoveis que o reponente possue e adquiriu<br />

por outro titulo, como compra e venda ou por herança de pessoa<br />

diversa.<br />

A hypotheca garante a importância da toraa.<br />

il.:,) Lei n 1257 art :'. ­ 8 "sobre brifía que '.em us denial,.­, herd, nos ,(>•<br />

comporem o prejuízo soffrido com a evieção Mas i clausula final "sobre o<br />

immovel da herança adjudicado ao herdeiro reponente" sõ tem sentido em<br />

: catão ã hypoilieca pela torna, porque é pela torna que só é obrigado o reponente,<br />

ao passo que pela garantia do quinhão no caso de evici Io são<br />

responsáveis iodos os mais coherdeiros, e a hypotheca pela dita garantia<br />

i ser concedida, gravaria todos os immoveis da hera::<br />

O que a este respeito nos parece é — que houve equivoco, O legislado!<br />

idando as palavras de C. Telles tomou a phrase — garantias pelos seus<br />

— como se fossem synonymas de torna<br />

.Seja como fOi o § 8, como está redigido não pôde sej entendido senão


448 blMMto<br />

4. Nas outras accões divisórias (cotumuni àivtdnhdo e Uniumregundorum)<br />

é também admissível a pratica das tornas (17).<br />

Mas as tornas decretadas nestas accões não têm a garantia da<br />

bypotheca legal, porque a lei só a confere pelas tornas nas partilhas<br />

da herança (família' escisciindoe) (18).<br />

5. A dita hypotheca se constitue pela partilha depois de<br />

julgada e desde a sua data (19).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 827 — A lei confere hypotheca' — 820<br />

YT1T — Ao co-herdeiro para garantia do .seu Quinhão ou torna da partilha,<br />

sobre o immovel adjudicado ao herdeiro reponenre.<br />

como estabelecendo a hypothecs legal pela torna o não pela garantia do quinhão<br />

no sentido exposto.<br />

(.17) Quanto á cowmiini dividunão, í 5 I, de officiia judie. -I. 17.<br />

Quanto á finium regundorum ü f>, I. loc. cit.<br />

(18) Lei n. 1257. art. 3 S 8, pela lor nu da partilhei.<br />

ilü) Décret, n. 3453, art. 136 § 9.


CAPITULO TIT<br />

HYPOTHECA "JUDICIARIA<br />

§ 207. — Noção<br />

1. Importa á ordem social que as decisões dos tributiaes<br />

recebão a mais plena e completa execução (1). No sentido de assegurar<br />

essa execução, a lei confere ás sentenças proferidas sobre<br />

questões do Direito Privado a virtude de crear, em favor do vencedor,<br />

hypotheca sobrebs immoveis do condemnado (2).<br />

(1) Vej. Pereira e Souza Xot. 758, Lobão Execuç. S 1". Troplong­ II,<br />

11. 435 liis. Pont. I. 11. 569.<br />

(2) O Direito Romano não conhecia a hyp judiciaria no .sentido que<br />

modernamente «e lhe dá: o pignus prœtorium e o pipnu.i jndirfale erão eousa<br />

diversa. Vej. Maynz 5 243, Troplong II, n. ­l : »­ r ) 'ois.<br />

A hypotheca judiciaria é propriamente creação ■ '•' Direito Moderno. Em<br />

Pmnça ella foi pela primeira vez consagrada na Orden. de Moulin, art. 35<br />

(Vej. Troplong, art. n. 43."> bis.)<br />

Entre nós tem ella a sua. fonte na Ord. :•>. .S4 S i­l. A citada Ord. a concedia<br />

em caso particular. Das sentenças proferidas pelas relações subalternas<br />

ou por juizes de elevada cathegoria não era licito appellar, mas s­am iiiterpor<br />

o recurso de aggrava ordinário para a Casa da suplicação de Lisboa<br />

(Pereira e Souza. Seg. Liaih. Ü 344 e S..<br />

mas como por virtude do recurso não podia ser executada nos seis mezes, a<br />

Ord. concedia ao vencedor a garantia da fiança ou hypotheca. I'.' é esta a<br />

. spe :!al:dade do caso.<br />

Nos outros casos, quo aliás são os que entrão na regra commum, come a


450 DlkîîlTo<br />

Esta hypotheca àenominada­jadiciaria on judicial (3), resulta<br />

directa e immediatamente da sentença, é uni corollario<br />

delia, como as hypothecas legfaes o são dos actos ou fa et os que<br />

lhes servem de causas (4).<br />

fia pois uma perfeita analogia entre a hypotheca judiciaria<br />

e as leg­aes no ponto de vista da sua g­eração (S) ; mas como<br />

diverg­em quanto aos effeitos. a lei separa uma de outras, e da<br />

judiciaria faz unia espécie distineta.<br />

2. A hypotheca judiciaria consiste no direito de sequela<br />

que compete ao exequente sobre os immoveis do condemnado, e<br />

por virtude do qual esses immoveis ficão sujeitos por um vinculo<br />

real á execução (6). Da natureza real do dito direito resulta<br />

que os immoveis por elle gravados podem serpenhorados e excutidos<br />

ainda em poder de terceiro, a quem fossem alienados<br />

com ou sem fraude (7).<br />

E nisto se encerra toda a força da hypotheca judiciaria.<br />

Fallece­lhe, como já se observou em outro lugar, o segundo efíeito<br />

da hypotheca — o direito de preferencia (8).<br />

sentença quando passada em julgado pode. logo ser executada, não havia necessidade,<br />

no conceito da Ord. da garantia da fiança ou da hypotheca.<br />

X ; o emta­mo os velhos praxãstas e os antigos trfbunaes derão A disposição<br />

ritada Ord. um valor absoluto, e aplicarâo­n'a a todas­ as sentenças condemnatorias,<br />

passadas em julgado, quer pendessem de aggrava ordinário, quer<br />

nào. No Alv. de 5 de Dez. de 1805 se faz allusão á citada Ord.<br />

A lei n. 1257, art. 3)1'. refere­se claramente a aquella Ord. (4. S4 § il)<br />

entendida com a amplitude que lhe dera a opinião dos escriptores


DA.S ÓOÜSÀ.S<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 824 — Compete ao exequente o direito de proseguir na execução da<br />

sentença contra os aãquirentes dos hens do condemnado;. mas, para ser opposto<br />

a terceiros, conforme enter e sem importar preferencia, depende de<br />

inscripção e especiaiisação.<br />

§ 208. -~ .1 hypotheca judicial e o direito de penhor ar<br />

bens alienados tm fraude da excecução<br />

Não se deve confundira hypothecs judicial e o direito de<br />

penhorar bens alienados em fraude da execução. São direitos<br />

distinetos, procedentes de causas diversas, regulados por princípios<br />

différentes, e independentes um do outro.<br />

1. O direito de penhorar bens alienados em fraude da<br />

execução (9) tem este fundamento — que a alienação fraudulenta,<br />

pois que é nulla, não tira os bens do dominio do executor<br />

para o dominio do adquirente (10). Os ditos bens, portanto,<br />

continuão sujeitos ao pag-amento das dividas do executado (11).<br />

O direito de sequela, effeito da hypotheca judiciaria, resulta<br />

immediatainente da sentença e não requer como condição<br />

de sua existência a fraude da alienação (12).<br />

(9) Ord. 3, 88 § 16. Esta Ord. trata da alienação do cousa certa que o<br />

réo é condemnado a entregar, ou por acção real como a de reivindicação, ou<br />

por acção pessoal como a ex. empto; não é porém expressa a respeito da<br />

alienação que faz de s'eus lien.s em fraude da execução « condemnado a pagar<br />

cousa de quantidade, como dinheiro. Mas os tribunaes e os praxistas, apoiannos<br />

textos do Direito Romano acerca da acção Pauliana, ampliarão a<br />

disposição da citada Ord. á esta ultima hypothèse. (Vej. Pegas, forens.<br />

eapit. 5, n. 120. Silva ad Ord. :i. 86 S I o , n.' 33 Pereira e Souza. Nota 777').<br />

U Reg-, n. 737 de 25 de Nov. de L&50, art. 191 § 6 e 494 deu força legal<br />

áquella doutrina em materia commercial.<br />

(in) Pereira, e Souza. Nota 777. n. V: "A alienação que é feita em<br />

fraude da execução sempre é imita... e poi titulo nullo nunca salie a cousu<br />

do dominio do aliénante. "<br />

O Décret, n. 3453. art. 224, presuppoe a dita doutrina quando permute<br />

que a hypotheca judicial recaia em lirais alienados em fraude da execução.<br />

Por que pôde a hypotheca judicia; ser inscripta sobre esses bens? — Porque,<br />

elles continuão a permanecer no patrimônio, no dominio do executado.<br />

ill) Vej. 5 174. n. "> acima.<br />

(12) Ord. 3, 84 S 14... mas logo ficarão hypothecados. Lei n. 1237.<br />

451<br />

30


452 DIREITO<br />

2. O direito de penhorar os bens alienados em fraude da<br />

execução só pôde ser exercido, concorrendo os requisitos segnntites<br />

I, fraude da alienação.<br />

TI, sciencia da fraude por parte do adquirente ( conseilla<br />

; tandis ).<br />

Ill, que o executado não tenha outros bens (1.3).<br />

A hypotheca judiciaria, uma vex inscripta produz o seu<br />

effeito, contra o adquirente do immovel declarado na inscripção,<br />

de uma maneira absolucta, incondicional sem dependência dos<br />

supracitados requisitos (14).<br />

3. Do exposto resulta:<br />

1." Que o direito de penhorar bens ,­ilienados em fraude<br />

da execução é independente e pôde existir sem a hypotheca judiciai<br />

(15). Assim o exequente, a quem fallece favor da hypotheca<br />

judicial por não havel­a inscripto. não está iuhibido de<br />

fazer penhora nos bens alienados em fraude da sua execução<br />

(16).<br />

2.' Que por seu turno o exequente que se acha armado da<br />

hypotheca judiciaria, pôde exercer o direito de penhorar e ex­<br />

ir!. •'! S 12: ­ "a proseguir a execução da sentença contra os adqu rentes<br />

dos do cnndcranado. "<br />

Voei ('Pandect. 42, 8, o. 1­') caractérisa perfeitamente bem a notada differença:<br />

Pro fundamento non habet fraudem accipientis sed jus pignorís<br />

/>i etorii quod ereditores per missionem in possessionem adepti sunt, adeoque<br />

la.m ictionis hypothecaria ex pignore prœtorîo descendem s species est<br />

•ompetens... adversus eos. in |Uos facta eta alienafcio... sive o bona I d<<br />

fuerint, sive conseil fraudîs atque participes un et adversus quosvis tlioí<br />

vel mala fide possidentes cum proptei nexum pra?toris pignorís res in<br />

quem \ s possessorem cum suo onore n msferatur."<br />

(13) Pereira e Souza Mota ~~~ n. V. Voel Pandect. 42. 8. n. 4.<br />

(14) Voet i­n r.t. 12.<br />

(15) \'oei. cit. n. 12: Ve] secundo intervenu alienatio ante missionem<br />

in possessionem, .sed consdio fraudîs atque participe eo in quem res trans ita<br />

.,! ! atque tunc resc ssoris quidem actio dare non potent cum et hù ãe~<br />

ficiai /us pignofîs prœtorîi sed actionis PanlUinœ termini habiles, nous<br />

nempé accipientis hic inveniuntur.<br />

ilti) Este direito não carece do vinculo hypothecary, porque, como<br />

Lcima ­•■ disse, a alienação em fraude da execução é nulla, e como tal deixa<br />

os bens no domínio do executado. caso em que segundo as regras communs<br />


DAS COÜASS 453<br />

cutir os immoveis sujeitos á dita hypotheca, embora a alienação<br />

não houvesse sido feita em fraude da execução, e tenha o executado<br />

outros bens (17).<br />

§ 209—Quaes us sentenças que produzem a hxpotheca<br />

judiciaria<br />

1 . Nem toda a sentença produz a hypotheca judiciaria;<br />

produzem­n'a tão somente as que condemtiâo a parte a cumprir<br />

(17) Voet, cit. n. 12: Yel denique post miss­ionem res a debitores transata?<br />

sunl m aluim sed fraudis hund conscium; atque tunc sola locum invenit<br />

actio reseisxona ex jure in ré seu pignoiv praetorio; non item regulaf'duliüna<br />

actio, cui pïeurumque gebãucti habenfur MUI fraudis participes<br />

non .saut.<br />

Tem­se querido sustentar doutrina contraria a que fica exposta no nosso<br />

texto, isto é. — que o direito de penhorar bens alienados em fraude da execução<br />

não pôde ser exercido pelo exequente, se a sentença não foi inscripta.<br />

K' um erro, e um tal erro provêm de .se pensar que a lei n 1237, art. 3 ?; 1­'<br />

nas palavras "não se considera derogado por esta lei o direito que an ex.quente<br />

compete de proseguir a execução..." se refere ao direito de pênhorai<br />

hens alienados em fraude da execução.<br />

A lei naquellas palavras não allude ao dito direito, isto é, á Ord. 3. 86 5 ir,<br />

mas sim á Ord. 3, 84, § 14. na qual se acha consagrada em termos expressos a<br />

hypotheca judiciaria.<br />

Xão allude, nem pôde alludir â Ord. 3. 86 S 16. porque o direito deduzido<br />

desta ord. nada tem de hypothecario; é o direito commum de todo o exequente<br />

■•>>­ do patrimônio do executado.<br />

No emtanto a Ord. 3. 84 5 14 firma ,1 existência da hypotheca judiciaria<br />

no­ termos os mai­ positivos. E a hypothecs por ella reconhecida, ainda no<br />

domínio exclusivo na mesma Ord.. produzia os seus effeitos contra os terueiros<br />

adquirentes. embora a alienação não fosst fraudulenta. \'ej Doutrina<br />

das An; § 1 10 e noia 213.<br />

Ainda mai­: .> direito de excutii bens alienados em fraude i\.t execução<br />

não é senão a propria ac


454 DIREITO<br />

uma obrigação (18). Na verdade não ha hypotheca, senão como<br />

accessorio de uma obrigação.<br />

2. Assim que: não crêão hypotheca, por serem meramente<br />

declaratorias ou confirmativas (I e !) : a sentença qne julga nullo<br />

o reconhecimento de liliação natural (20), a que declara procedente<br />

a acção de negação de paternidade ( 21 ), a que julga<br />

partilhas judiciaes ou amigáveis, a que homologa concordatas<br />

(22).<br />

3. Mas. eis que a sentença condemna a uma obrigação, a<br />

hypotheca se gera, quer a obrigação seja de dar (dandi), quer de<br />

faxer ou não fazer (fatiendi mit non jaciendi) (23).<br />

Se a obrigação é de dar dinheiro, cessa toda a duvida. Se é<br />

de entreg­ar cousa, e a còusa não pode ser entregue por dólo ou<br />

culpa do condemnado. resolve­se a obrigação na de indemnisar<br />

o valor 24). Se é de fazer ou não fa^er, e a parte não quer executal­a,<br />

converte­se igualmente na de perdas e damnos (25).<br />

(18) Ord. 3, 84 § 14:... o condemnado que não tenha bens de raiz. ' ­ Eo<br />

que tiver bens de raiz que equivalhão o conteúdo na condemnação. .. mas<br />

logo ficão h yp o th ecados. .. para pagamento da execução." Lei n. 1237, art. 3<br />

5 12:... proseguir a execugão da sentença contra os adquirentes dos bens<br />

do condemn­ado. Vej. Troplong II, n. 438.<br />

(19) Troplong. cit. n. 438, Mourlon III, n. 1462.<br />

A sentença, como se sabe, pôde ser condemnatoria (de dar ou de fazer<br />

ou não fazer) ou declaratoria. como nas questões de estado das pessoas, ou<br />

conter adjudicação, como as vezes acontece nas acções divisórias, ou simplesmente<br />

confirmativas, como quando homologa aetos judiciaes ou extrajudiciaes,<br />

como a de partilhas, a que insinua doações.<br />

(20) Quando é intentada .só para a questão de estado da pessoa


DAS COUSAS 455<br />

4. Por força da mesma doutrina não tem a virtude de<br />

produzir hypotheca. ainda quando homologados por sentenças,<br />

os termos e os actos judiciaes, pelos quaes as partes contrahem<br />

obrigações umas para com outras (2b). Em casos taes a obrigação<br />

tem por fonte o accordo ou acto livre das partes, e não é<br />

objecto de condemnação por sentença (28).<br />

5. A hypotheca judiciaria só se reputa constituída, depois<br />

xistae sustenta que o réo pôde ser forçado a cumprir pessoalmente a obrigação<br />

de fazer, sob pena de prisão. Esta opinião, além de repugnar á dignidade<br />

do homem, não tem apoio na nossa legislação. Não ha lei impondo a prisão<br />

em tal caso e, como é sabido, a prisão não pôde ser decretada sem lei expressa.<br />

Se a eousa, que o eondemnado se obrigou a fazer, é de natureza tal jUe<br />

pôde ser feita por terceiro, como construcção ou demolição de obras, recusando<br />

elle cumprir a sentença, o vencedor pôde mandar fazer a obra por outrem e<br />

após executal-o pelo custo com a propria sentença eondemnatoria depois de<br />

liquidada. C. Telles. Doutr. das Acç. § 378, Manual do Process. Civil, § 428.<br />

Nos nossos preceitos cominatorios ou acções de embargos d primeira- o<br />

réo pôde ser eondemnado a fazer ou não fazer cousa determinada, sob certa<br />

pena que pôde ser pecuniária; mas no caso de infracção ou inobservância do<br />

preceito, a pena não pôde ser havida senão por nova acção (Doutr. das Acç.<br />

205. Lob. Acç. Sum. § 570).<br />

Produz hypotheca a sentença que impõe o preceito? Parece que eim<br />

porque a sentença condemna a uma obrigação e traz de ordinário liquidado '<<br />

prejuízo da execução, que vem a ser a pena comínada. A nova ac;ão só o<br />

necessária para firmar a inobservância OJ quebra do preceito.<br />

Os escriptores francezes disputão se a sentença que condemna á prestação<br />

de oiaas. gera a hypotheca judiciaria. Troplong. (II, n. 439) resolve que<br />

não. Xa nossa pratica esta questão não tem objecto. A sentença condemna a<br />

p roscar coiiías, sob pena de ser toenadj á revelia, ba o réo não a presta, é<br />

tomada ã revelia, isto é a sentent:!, a despeito da hííação do eondemnado, c<br />

executada. A hypothec?, é produzi Ia pela sentença me julga, as contas e<br />

condemna o réo no sic-arce.<br />

(26) Taes são os termos de fiança, as traneacções, pendente a lide. os<br />

termos, pelos quaes as partes se concilião perante os juizes d.e paz.<br />

(27) As sentenças de homologação, como é sabido, nada acereseentão<br />

ao' accordo das partes, communicão-lhe apenas um maior gráo de authenticidade.<br />

Os termos, pelos quaes as partes se concilião, embora se.jão exeqüíveis<br />

como sentenças passadas em julgado, não são todavia sentenças condemnatorias;<br />

tem apenas o caracter e a natureza de accordo formulado em juizo.<br />

Troplong II, n. 448. Xão se deve confun lir os ditos termos com as sentenças<br />

que os juizes de paz proferem em causas de sua alçada; estas sentenças,<br />

quando condemnatorias. produzem a hypotheca judiciaria.


456 .DIREITO -<br />

que a sentença passa cm julgado, isto é. depois que se torna<br />

exeqüível (28);<br />

Se o objecto da condemnação é illiquido, como acontece<br />

no caso de indemnisação do valor da cousa. ou de perdas e damtios.<br />

esta cireumstancia não influe na geração da hypotheca,<br />

mas importa para a inscripção. A sentença não poderá ser inscripção<br />

senão depois de liquidada (29).<br />

(28) Ord. 3, 84 § 14. Décret, n, 34&3 art. 136 § LO.<br />

(29) A hypotheca, ou tenha por causa a convenção, ou a lei, ou a sentença,<br />

se reputa existente desde que occorre o acto ou facto de que ella resulta.<br />

A inscripção, attributo da hypotheca, a presupõe e só é necessária para<br />

Mue elhi valha contra terceiros.<br />

O Décret, n. 3453 não previne esta hypothèse-.<br />

O art. 224 ã:z que a hypotheca judiciaria se considera espeoialisada pelo<br />

valor da sentença.<br />

Mas se o valor é illiquido. como tantas \ tzcs acontece? A sentença não<br />

poderia .ser inscripta senão depois de liquidada.


CAPITULO IV<br />

H YI'OTH EC A COX VEK CIO N A L<br />

§ 210.—Condições<br />

A hypotheca c um desmembramento du domínio (1),<br />

Aquelle que a constitue transfere um direito real sobre o immovel:<br />

pratica, portanto, um acto de alienação (2).<br />

D'ahi vem que a hypotheca requer na pessoa de quem a<br />

confere duas condições, a saber:<br />

I. Capacidade para alienar o imniovel.<br />

II. Dominio na cousa que vai ser hypothecada. (3).<br />

Na falta destas condições ou de uma délias, a hypotheca<br />

não pode ser estipulada.<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. Tôt; -— Só* aquelle que pude alienar poderá hypothecar, dar cm antichrese,<br />

ou empenhar. No as cousas que se podem alienar, poderão ser dadas<br />

em penhor, antichrese, nu hypotheca. 70 72.<br />

Parayrapho único. dominio superveniente revalida, desde a inscripção<br />

as garantias reais estabelecidas por quem possuía a cousa n titulo de.pruprietariò.<br />

— 622, 848.<br />

(1) Vej. § 175 acima.<br />

(2) Barbosa ad Ord. 4. 48 n. 10. Guerreiro Tract. 2. L. 6. cap. 2. n. 14.<br />

Pont. 11, ti. 508, Troplong II, n. 460.<br />

A alienação no caso sujeito não é 'Io dominio iodo. .senão de um fragmento.<br />

O direito real denominado — hypotheca se destaca da pessoa do<br />

senhor do immovol. e passa para o credor hypothecario. Vej. os §>'i? 25 e 175<br />

acima.<br />

(3) Lei n. 1.237, art. 2 í 4 o : Só pôde hypothecar quem pôde alheiar.<br />

E só pôde alheiar quem tem o dominio e está na livre administração de seus<br />

bens. Vej. Pont. II, n. 60S e Zacaria?. § 266.


4ò8 DIRKITO<br />

I. § 211. A.)Capaadade para hypothecai<br />

A capacidade para hypothecar é determinada, nàô pela<br />

capacidade^ $e obrigar, mas pela capacidade de alienai.<br />

Ha com efíeito pessoas que podem contrahir obrigações,<br />

mas que não podem alienar immoveis:—taes são os menores<br />

emancipados (5). os casados que ainda não completarão vinte um<br />

annos de idade (6), e os herdeiros ou curadores provisórios (b).<br />

A dita prohibição comprehende virtualmente a hypotheca<br />

convencional, porque a hypotheca envolve a alienação duma<br />

parte do domínio (8).<br />

Assim pois a capacidade de fe abrigar não inclue em si a<br />

capacidade de hypothecar: mas a capacidade de alienar contem<br />

a de hypothecar.<br />

D'ahi a regra fundamental: so pode hypothecar quem<br />

pode alienar (9).<br />

§ 212. B.)—Qjuies as pessoas capazes de hypothecar.<br />

Toda pessoa, physica ou moral, que está no exercício pleno<br />

da capacidade de alienar immoveis. pôde hypothecal-o para<br />

segurança de divida sua ou- de terceiro ílUi.<br />

1. O homem casado, sem outhorg-a da mulher, não pôde<br />

'li Le n 128' J ? I 1'iohibiui-, aldenare hypothecare prohibitue<br />

etiam censetur.<br />

(5) Orri. 1 88, S 2$ Direit. de família § 159<br />

(6) Ord. cit. Direil de família, cit. § 159.<br />

(7) Rocha S 397. Direit. de família § 17S<br />

(8) Olea. de Cess. jur. T. 2, q. 1, n. 33: Qui immobilia alienan- non<br />

potest, nec jus Quod ad ea habet, transferre valet.<br />

Certamente as dividas que o menor emancipado ou casado contrahr<br />

obrigão os immoveis que lhe pertencem. Mas va grande difference entre<br />

os ndirectamente e obrigal-os direelamente pela hypotheca convencional.<br />

Esta difference s< acha fortemente ãecusada em outrai dispos<br />

il*, lei: O marido, por exemplo, não pócU alienai ou hypotheear sem outhc-rga<br />

da mulher, immoveis do casal Mão obstante, us ditos immoveis ficão sujeitos<br />

ás dividas que contrahe independentemente de consentimento da mulhei.<br />

(9) Lei n. 1237 a:; 2 § t Décret n. 3457 art. 124.<br />

(10) Lei n. 1237. art. 2 § 4 e 7. Décret, n- 3453, art. 127.


DAS COUSAS 459<br />

aliénai immoveis communs ou próprios (11); nem, por Conseqüência,<br />

sem a dita outhorga, hypothecal-os (12).<br />

2. A lei reconhece naquelle que é senhor de um immovel<br />

e se acha na livre administração de seus bens, o direito de hvpothecal-o<br />

para garantir obrigação de terceiro. E" um direito<br />

que deriva logicamente do dominio: quem é dono de uma cousa,<br />

pode dar-lhe o destino que lhe aprouver, como, por exemplo,<br />

^ujeital-ii ao pagamento de divida alheia ( 13).<br />

3. 1£\ porém, de notar, que a hypotheca cm favor de<br />

divida de terceiro não reveste a natureza de fiança, salvo declaração<br />

expressa (IA).<br />

Aquelle que constitue uma hypotneca nos termos ditos.<br />

não toma a responsabilidade pessoal pela divida, mas tão somente<br />

submette, por um vinculo real, o immovel seu ao pagametito<br />

da divida g-arantida: contrahe, não uma obrigação pessoal,<br />

mas uma obrigação hypotheçaria, isto é. a de pagar a divida pela<br />

cousa hypothecada e dentro das forças e valor delia (15). Não<br />

lhe são, pois, applicaveis as regras da fiança. Assim, não responde<br />

por seu patrimônio pela divida, ainda que o immovel hvpothecado<br />

pereça ou o valor delle não seja sufficiente para cobrir<br />

toda a divida (16); nem tão pouco pôde invocar o beneficio de<br />

ordem (7).<br />

Todavia aquelle que hypotheca bens seus por divida de<br />

terceiro não está inhibido de tomar a responsabilidade de íiador<br />

(18). Neste caso, além da obrigação hypotheçaria, coutrahe a<br />

obrigação pessoal de íiador.<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

i)/ 764 Salvo clausula expressa O terceiro que presta garantia real<br />

(1J) Ord. 4. 48 Lobão a Mello. 2, 8 § IS.<br />

(12) Lei n. 1237 art 2 5 4. Cod. Comm. art. 267. Já era a opinião dominante<br />

no Direito preexistente. Vej. Gama, Deeis. 108 n. 6. Guerr. Trai 2.<br />

I. i, cap. 12. n. 14, Barboza ad Ord. 4. 48, n. 10.<br />

(13) Lei n. 1237. art. 2 § 7. Décret, n. 3453. art. 127.<br />

(14) Lei cit. art. 4-7 Não s o fiadoi porém qualquer terceiro itodu<br />

hypotheeai seus bens pela obrigação alheia.<br />

5) Merlin verb Hypoth. Sect. 2 § 3 art 6 n 6 Zacariœ § 266.<br />

nota 6. Pont II. n. 608.<br />

(16) Pont II. n. 608. O fiador responde pessoalmente por ioda a divida.<br />

(17) Vej. Ord. 3. 92: 4. 59 pr. Doutr. das ACQ 5 339. n. 1 e nota 768.<br />

(18) Lei. art. 2 § 7: -Não sú o fiador... Décret, n. 3453, art. 127.<br />

Pont II, n. 608.


460 DI REI TU<br />

por fluiria alheia, não fica obrigado n substituil-a, ou reforçal-a, quando, por<br />

culpa de outran, se perca, deteriore, ou desvalie.<br />

§213 C.)—Incapazes de hypothecar: a mulher casada<br />

A mulher casada, qualquer que seja o regimen de bens do<br />

casamento, incide sob o poder do marido e fica por esse facto<br />

constituida em estado de incapacidade (I e *). Não pôde, portanto,<br />

alienar nem hypothecar os immoveis communs ou próprios (20).<br />

Todavia o dito principio não é tão rig-oroso que não soi ira<br />

derogações. Ha na verdade situações em que é licito á mulher<br />

casada alienar e hypothecar bens:—o que oceorre nos casos seguintes:<br />

1. Quando se acha separada do marido por divorcio perpetuo<br />

passado em julgado. A mulher, desquitada nos termos<br />

ditos, readquire a plenitude de sua capacidade (21).<br />

2. Quando é maior de dezoito annos e exerce, de consen<br />

timento do marido, profissão mercantil (22).<br />

A mulher casada commerciante é reputada em Direito<br />

capaz para todos os actos de mercancia; pôde, pois. alienar e hypothecar<br />

os immc veis incommunicaveis que são próprios delia<br />

(23) e ainda os dotaes (24). Nesta faculdade, porém, não se<br />

(19) Pheb. Decis 62, n 5, Decis. »8, n. 3 e 4. Cabedo, P. I. Decis. 10C,<br />

n. ultimo. Loi.. Not. a Mello, L. 2, 8 § 18, n. 40<br />

(20) Dei n. 1237 art. 2 § 4 Vej Direito de família, § 38, n. 4 S 65,<br />

70. 83 e 91.<br />

(21) Peg Forens. 9 n. 354, Guerreiro, T. 2 L 6, cap. 8. n. 37, 40. 50.<br />

51, 68


DAS COUSAS 461<br />

comprehends a de alienar ou. hypothecar os immoveis communs<br />

e os incommunicaveis do marido, salvo consentimento dclle<br />

(25).<br />

3. Pode finalmente a mulher casada hypothecar os immoveis<br />

que o marido doou á concubina e que ella reivindicou (26).<br />

Xestes bens a mulher adquire domínio exclusivo e dispõe livremente<br />

délies.<br />

£ 214. D).—Filho-familias, menores e interdictos<br />

A.) 1. Os filho-famílias, emquanto menores, se conservão<br />

sob a absoluta tutela dos pais; não podem, portanto, alienar<br />

nem hypothecar os immoveis de sua propriedade (27).<br />

Depois que se tornão maiores, nada ha que lhes vede hypothecar<br />

os immoveis. que pertencem á classe dos castrenses ou<br />

quasi — castrenses, ou dos adventicios extraordinários (28); porquanto,<br />

em realação a estes pecúlios, são havidos como pessoas<br />

revestidas de plena capaeidade (29)<br />

Quanto aos adventicios ordinários, não lhes e permittido<br />

alienal-os e hypothecal-os, emquanto permanecem sob o pátrio<br />

poder e subsiste o usofrueto do pai (30).<br />

2. Podem alienar e por conseqüência hypothecar bens de<br />

raiz para acudir ás necessidades de seu commercio.<br />

a) O filho-familias, maior de dezoito annos que exerce<br />

(25) Cod. Comm. art. 27. A redacção deste artigo é defeituosa. Veja-se<br />

;i Nota In do Direito de família.<br />

(26) Ord. 4, 66:... "E e>-sa cuusa que ella a si demandar e veneer, queremos<br />

seja sua propria in.solid wm. .sem seu marido haver em ella parte, e que<br />

possa fazer delia tudo que Die aprouver, a*si e tão perfeitamente como se não<br />

--' casada. "<br />

Poderá a mulher casada hypothecar, sem consentimento do marido os<br />

iinmoveks, sobre os iuac.< reservou em pacto ante-nupcial a livre administração<br />

e disposição, e cs que lhe forão doados ou deixados com uma tal<br />

clausula? Não, porque, segundo o nosso Direito, nenhum dos cônjuges<br />

pôde aliéna!- immoveis, aimia próprios e sob -sua exclusive administração, sem<br />

aecÔrdB do outro (Ord. 4-48), salvo no.s casos expressos em lei.<br />

(27) Vej. Du-eit. de família. S 116, n. II.<br />

(28) V.ej. a Obr. citada H 115 e 116.<br />

(29) C. 6. 7. C. de bonis quae liber. (6. 61): fi. 2 D. ad Senat. Maced.<br />

1 l. 16. Huber. Pandect. 20, 3. n. 4.<br />


462 DIREITO<br />

profissão mercantil, de consentimento do pai dado por escriptura<br />

publica (3l);<br />

b ) O filho-famílias maior de vinte e um annos associado<br />

ao commercio do pai (32);<br />

c ) O tilho-familias maior de vinte e um annos que com<br />

autorisação escripta do pai levanta estabelecimento commercial<br />

(33).<br />

B. 1. Os menores e os interdictos não podem alienar seus<br />

bens, nem portanto hypothecal-os (34).<br />

2. Não podem igualmente hvpothecar os seus immoveis<br />

os menores emancipados e os menores casados, emquanto não<br />

completão vinte e um annos de cdade, salvo precedendo decreto<br />

judicial (35).<br />

3. Os menores emancipados, quando exercem profissão<br />

mercantil, não ti cão inhibidos de alienar e hvpothecar os seus<br />

bens, sempre que assim o exijão as necessidades da sua mercancia<br />

(36).<br />

(31) Cod. Comm art. 1. n. Ill, verb. "Os filho-íamilias... "<br />

(32) Cod. Comm. citado, art. 1. n. Ill, verb "O filho maior de vinte<br />

um annos. . . "<br />

(33) Cod. Comm.. oit. art. 1 n. Ill, verb.... "e o que com sua appi<br />

ovação. . . "'<br />

He o filho-familia é maior de dezoito annos e menor de vinte um. para<br />

commercial- precisa de autorização do pai provada por escrlptura publica<br />

é maior de vinte e um anno.-;, basta autorisação por escripto particular, ou que<br />

esteja associado ao commercio do pai.<br />

(34) Não podem constituir hypotnecas por convenção porque «ao incapazes<br />

mas os seus immoveis estão sujeitos á hypothecas lega.es, e á judiciaria<br />

Âissim, se o menor de vinte um annos. mas maior de dezesete annos<br />

commette um delicto, os seus bens ficão legalmente hypothecados á indemnize<br />

ão do damno causado. Voet. Pandect. 27. 9 n. 4: Diversum est. si de<br />

pfgnore non conventional! sed legali questio sit: quippe quo etiam pupillaria<br />

i>ona gravari obtinult. Troplong II. n. 481 e 482.<br />

(35) Ord I 88 -Í2Í Ë havendo o menor tal carta ou sendo casado e de<br />

idade de vinte (innos vendendo elle ou enlheando ou obrigando alguma<br />

possessão de raiz. com consentimento e autoridade da justiça... não poderá<br />

usar do beneficio de restituição. E fazendo elle a dita enlheaçao ou obrigação<br />

sem authoridade de justiça o tal contra-cto será nenhum e de nenhum valor.<br />

i l C. de his qui veniam aetatis: Eos qui veniam aetatie... impetraverunt. ..<br />

non solum alienationem. sed etiam hypothecam minime posse sine decreta ;ntositione<br />

rerum suarum immobilium facere jubemus.<br />

(36) Cod. Comm. art. 1, n. II e art. 26. Menores emancipados, isto 6.<br />

os que obtiverão carta de emancipação. Vej. Direit. de família. § 158, n. 2.


t)AS COttëAS 463<br />

§ 215 E). — Fallidos. herdeiros provisórios e corporações de meio-morta.<br />

1. 1. Os fallidos ficão privados do direito de administrarem<br />

os seus bens e dispor délies, desde o dia da publicação<br />

da sentença de abertura da fallencia (37). E por conseqüência<br />

não podem dessa data por diante hypothecal-os.<br />

Ainda mais : a hypotheca que estipularem entre a dnla<br />

da sentença e a da publicação da mesma sentença será sempre ineficaz,<br />

porque a inscripção depois da data da sentença é nulla(38).<br />

2. Da doutrina exposta resulta que são validas as hypothecas<br />

constituidas pelos fallidos, antes da data da sentença<br />

que lhes abre a fallencia.<br />

Este principio, porém, soffre uma excepção:<br />

E'nulla de pleno direito a hypotheca estipulada pelo fallido<br />

dentro dos quarenta dias, precedentes a época legal da quebra,<br />

para garantir divida contrahida em data anterior á escriptura<br />

da mesma hypotheca (39).<br />

A circumstancia de ser a hypotheca constituída dentro do<br />

prazo dos quarenta dias por divida que já se achava contrahida,<br />

íirma a presumpção de fraude, presumpção á que a lei dá um<br />

caracter absoluto e indiscutível.<br />

Mas se a hypotheca, estipulada no alludido prazo, garante<br />

divida que se contrahe na mesma data, desapparece a .presumpção<br />

de fraude e a hypotheca é valida (40).<br />

3. A incapacidade do fallído não é absoluta, senão relativa<br />

aos bens, direito se acções que estão obrig-ados ao seu passivo<br />

Os bens incommunicaveis da sua mulher, o pecúlio dos filhos e<br />

as cotisas que lhe houverem sido doadas ou deixadas com a clausula<br />

de não ficarem sujeitas ás suas dividas, se conservai) e'eontinuão<br />

sol) sua posse e administração. Em relação a estes liens<br />

A capacidade dos menores, dos filho-faraiüas e das mulheres casadas commerciantes<br />

é restricta aos actos do commercio; a hypotheca, portanto, por<br />

contrahida, só é valida quando connexa com a mercancia. Na duvida<br />

Of actos de uns o outros se presumem commerciaes. Cod. Comni. art. 26.<br />

(37) Cod. Coram. art. 826. A lei respeita a boa re dos terceiros que entrão<br />

em negocio com a pessoa fallida. e por i.ssc faz datar a incapacidade da<br />

publicação da sentença que abre a fallencia.<br />

(38) Décret, n. 3403 de 26 de Abri] de 1865. art. 134.<br />

(39) Cod. Comm. ar;. 827 í 2. Ici n. 1237. uri. 2 § 11, Décret n. 3453,<br />

ail. 132.<br />

(4,U) Décret, n. 345,3, art. 133.


464 DIREITO<br />

subsiste a capacidade do fallido. E' pois fora de duvida, que<br />

pôde hypothecar aqueiles cuja condição jurídica não répugna<br />

á hypotheca (41).<br />

4. As pessoas não commerciantes que caheni em estado<br />

de insolvabilidade, conservam em toda a plenitude a capacidade<br />

civil ; não ticão, portanto, inhibidas de validamente hypothecarem<br />

os seus immoveis a qualquer dos seus credores (42).<br />

II. Os herdeiros provisórios, isto é, aqueiles a quem é<br />

deferida a curadoria de herança de pessoa que se presume morta,<br />

não podem, emquanto a suecessão não se torna definitiva 1.43),<br />

dispor de bens de raiz. nem por conseqüência hypotheca-los (44).<br />

III. Não podem igualmente as ordens regalares hypothecar<br />

os seus immoveis, sem licença do governo. (45).<br />

Não comprehende a dita prohibição as egrejas, contrarias<br />

e irmandades. ás quaes é permittido dispor dos seus inoveis<br />

e immoveis, g-uardados as prescripções dos seus compromissos e<br />

as solemnidades de direito (46).<br />

II. i> 216 — A.) Segundo elemento da capacidade de hypothecar<br />

: — domínio.<br />

1. A capacidade de hypothecar, além do poder de alienar,<br />

requer na pessoa de quem constitue a hypotheca, dorainio<br />

sobre a cousa hypothecada (47).<br />

(41) Como são os bens incommunicaveis da mulher, quando alienaveis,<br />

n pecúlio adventicio do filho em certos caso.-, rumo para contrahlr empréstimo<br />

destinado a pagar divida de que o pecúlio venha onerado.<br />

142) Zacharia», - 266: "Le débiteur non nimnipivaiii qui se trouve<br />

état de déconfiture ne perd pas le droit de hypothéquer ses immeubles" Troplong<br />

111. n. 662 Pont II. n. 622<br />

(43) Vej. Ord. I 62 § 38. Reg. do Dezemb. do Paço; art. 40 Deoi<br />

de 15 de Junho de 1859, arl 47 e seg. Direit. de famiiia § 176 e seg. \ estes<br />

herdeiros o nosso Direito denomina - curadores provisórios<br />

(44) Rocha § 397, Dig. Port. II. art. 76] e 762, Cod. C. Port. art. 76.<br />

A hypotheca que o herdeiro provisório constitue em immovel da herança<br />

fica sujeito á condição résolu ti va inhérente á suecessão feto (. se resolverá,<br />

se apparecer o ausente ou parente mais proximo. Vej Direít. de<br />

família § 179.<br />

(45) Lei de í) de Dezembro de 1830. Décret n. 655 de 2S de Novemb.<br />

de 1849, Deere, n 834 de 2 de Out. de 1851. art 44 i M in fine, Avis, n 115<br />

de 21 de Março de 1863.<br />

(46) Avis, de 26 de Fev. de îsvi ,. ,. .Ms de 17 de Novembro de 1Í<br />

(47) Lei n. 1237, art. 2 § 6. art. 4 § 8.


DAS COUSAS 465<br />

Assim só pôde hvpothecar aquelle que é senhor do immovel<br />

(48).<br />

E' nulla a hypotheca constituída em bens de terceiro (49).<br />

2. Mas não raro acontece hypothecar o devedor cousa<br />

que não lhe pertence, masque posteriormente entra para seu<br />

domínio por titulo oneroso ou gratuito (50).<br />

Terá a acquisição posterior a virtude de revalidar a hypotheca<br />

preexistente ? A nossa lei resolve expressamente esta questão.<br />

A acquisição posterior do domínio só revalida a hypotheca<br />

anterior quando quem a constituio estava na posse do<br />

immovel, em boa te e com justo titulo (51) isto é, quando tinha<br />

o immovel sob sua posse, com os requisitos para a prescripção<br />

acquisitiva ordinária (52). •<br />

(48) O. (i C. Si aliena res pignori dat. 8, 16 Maynz - 241 not. 9.<br />

(49) J.ÇM n. L237 an _' Î 6 C Unie. C. Si com res pignor dat. »il<br />

• 21 Maynz § 241, not 10 Troploiig [I, n. 518.<br />

(50) Como doação herança, compra e venda.<br />

(51) Lei n. 1237. ar( _' § 6 Décret n. 3453 art 126<br />

A citada lei aceitou a opinião de Aecursio: Accursius ait dare hypoiln•cariam<br />

si tempore convenu pignoris debitor earn rem bona fide possidebat<br />

quoniam propter bonam fidem eo tempore quodam modo in bonis debitoris<br />

intelligitur; non si earn rem mala fide possidebat.<br />

Quer isto dizei- que a acquisição posterior só re^ ilida a hypotheca quando<br />

o devedor ao tempo em que a constituio, tinha sobre o immovel a propriedade<br />

/uihUciaiia, isto é, estava em via de prescreve-Ia.<br />

^e o devedor possue em boa Pé mas nã< tem justo ; tulo? \ icqu síção<br />

o não ser pela prescripção trintennaria, não revalida a hypotheca. A le não<br />

admitte d seussão; é terminante — exige justo titulo<br />

Sempre que a acquisição se consumma por prescripção ordinária ou \<br />

dinaria a hypo heca que fora constituída no decurso do prazo SÍ reputa<br />

ri validada porque a prescripção para todos os i ffei • ihe a sua virtudi<br />

ao começo da posse (Vej acima S 79, n. 5).<br />

A lei (art. 2 § li) requer a boa fé no devedor. A má fé. portanto do erelor,<br />

isto é. a soieneia de que o immovel não pertencia HO devedor, não impede<br />

a revalidação da h Voet Pandect 20 3 n. 4: Mec interest<br />

sciverit tempore obHgationis an ignoraverit, rem alienam e-~--e si modo<br />

postea veie dominium obliganti qusessitum sit. N'o mesmo sentido Merlin<br />

Quest, de Droit, verb. Hypoth. e Tropiong II. rr. 525<br />

(52) Entre o^ Romanos a acquisição posterior do domínio revalidava d<<br />

facto a hypotheca, quer o devedoi estivesse de boa quer má fé. Krão estae<br />

i- razões: v. o devedoi não podia allegar a nullidade da hypotheca contra<br />

o credor porque seria 'om a excepção de dolo — exceptiorn ãoh<br />

mali submovebitur (fr. 3 § ' S C Maeed.) 2* os terceiros que depois da


466 blkEItO<br />

Se o devedor não estava na posse do i mm ovei, ou estava<br />

na posse, mas lhe faltava boa fé, ou justo titulo, a hypotheea<br />

não se revalida com a acquisição posterior : é sempre nulla (56).<br />

3. Revalidada nos termos expostos, a hypotheea se considera<br />

subsistente para todos os effeitos desde a inscripção (54),<br />

e, em conseqüência, prevalece contra as hypothecas que o devedor<br />

constituísse mais tarde, ainda mesmo depois que adquiriu o<br />

domínio (55). A revalidação retrotrahe a sua força ao tempo em<br />

em que foi praticado o acto revalidado.<br />

Mas as hypothecas anteriormente constituídas pelo verdadeiro<br />

dono perimem as que forão estipuladas pelo possuidor.<br />

A razão é manifesta : a hypotheea constituída pelo dono é desde<br />

sua data valida e não se desfaz por acto posterior trauslaticio<br />

do domínio (56 ).<br />

acquisição pelo possuidor houvessem delle o immovel, ou em l'avo; de qu< m<br />

o possuidor constituísse hypotheea. não poderuão ter melhores direitos do<br />

que o mesmo possuidor; se, pois, o próprio possuidor não podia annullar a<br />

hypotheea. nem tão pouco os que receberão cousa delle. Cujacio Lei 41 D. de<br />

pig act. Zazius, ao t. qui potiores; Voet, tit. eodem (20, 4) n. 31; Corvinus:<br />

"Contra creditorem quia., venit contra factum suum et doli mali replicatio<br />

ei obstabit. Contra eoe qu a debitores causam habent, quia debent authoris<br />

sui jure uii." \'ej. o fr. 41 D. de pignor. act. Maynz ~ 241.<br />

Esta e a verdadeira doutrina acerca do assumpto. Não foi todavia ac<<br />

pela noSiSíi lei. e por um motivo singula] — temeu­se que filhos perdulários<br />

hypothecassem em vida dos pais a paire de suas futuras legitimas.em im<br />

moveis. Vej. Parecei 'ia eommissão de legislação do Senado de 11 de sde<br />

1857. I'm tal receio era perfeitamente puerii, em presença das próprias<br />

disposições do projecto; l", porque o projecto vedava a hypotheea de cousas<br />

futuras e indeterminadas; ­" porque a rivalidação presuppunha sempre a<br />

posse do immovel e os filhos em vida dos pais não têm a posse cias legitimas<br />

que lhe têm de tocar, salvo doação antecipada caso em que a hypotheea ê<br />

possível, porquanto hypothecão o que ë seu<br />

(53) \v < ursio: ■• Xnn ­ earn rem mala fiã­e possid.ebat. Vej. nota ã<br />

\~,4) Lei n. 1237 art. 2 ï 6: ■■(> domínio superveniente revalida desde<br />

( inscripção a.s hypotheca~<br />

(55) Voet, Pandect. 20 4. 31: Quod M priori a non dom.no pignus de<br />

vinetum sit. posteriori lutem illud ipsum ab eodem, sed jam domino :<br />

adhuc prior pot.or e>i: eo quod ipso primo dom. ,. >>qui­­n: momento firmauini<br />

priori fun pignoris jus. Troplong 11. n 522<br />

(56) Maynz § 241. nota 10: ­L.n ratification retroagit alors sauf .­.<br />

l'égard des dispositions que le propriétaire a pu faire avant d'avoii rai<br />

E nota 14, in fine: "H Va sailN dire tu reste que les hypothèques, validées<br />

ainsi par une consideration d'équité, seront toujours primées par celles que


DAS COUSAS 467<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 756 — Só aquélle que pôde alienar, poderá hypothecar, dar em antichrese,<br />

ou empenhar. Só as cousas que se podem alienar, poderão $


468 DIREITO -<br />

3. Os prepostos e mandatários, ainda com poderês délivre<br />

administração (60).<br />

4. -Os gerentes, directores e liquidantes de sociedades<br />

mercantis ou civis, ou de companhias anonymas, salvo concessão<br />

de poderes expressos (61) .<br />

5. Os inventariantes, sem o accordo de todos os herdeiros<br />

(62).<br />

6. Os que se achão na posse de bens de terceiro e ainda<br />

não adquirirão legalmente o domínio (63).<br />

§ 218.—Nullidode da hypotheca de menores e interdictos proveniente<br />

da falta de decreto judicial<br />

1. A hypotheca constituída pelo menor ou por seu tutor,<br />

sem decreto judicial, é nulla ipso jure, isto é, independentemente<br />

da prova de lesão (64).<br />

Esta nullidade. porém, não é absolueta, senão relativa.:<br />

foi introduzida em favor e proveito do menor, e só pôde ser<br />

declarada, mediante reclamação delle ou de seu representante<br />

legal (65).<br />

2. Aos credores, no sentido de assegurarem o pagamento<br />

de suas dividas, é licito invocar e exercer certos direitos do deve-<br />

que permittão a amortisação da divida com os rendimentos dos bens, ou para<br />

levantar quantias com que se evitem execuções, que realisadas de prompto,<br />

lhes trarião ruina. B. Cara. § 239, n. 27.<br />

(60) Vinio, § 42 J. de rerum divis. 2, 1, Mello, 3, 14 § 11, n. 3, Troplong,<br />

Mandat, n. 276 e 286, Pont II, h. 663.<br />

(61) Troplong, Société, n. 686, Delangle, n. 146, Pont II, n. 633, Martou<br />

III n. 957. Vej. Cod. Com. art. 351. Os poderes especiaes podem ser confiados<br />

no contractu ou em procuração em separado.<br />

(62) Lobão Fascic. 3. Dissert. 2, Rocha, II, Nota U. O inventariante,<br />

como é sabido, não pôde alienar immoveis de herança, nem por conseqüência<br />

hypothecal-os.<br />

(63) Troplong II, n. 468, Pont II, n. 631, Martou III n. 954. A razão<br />

é obvia: não é permittido hypothecar bens de terceiro. Vej. § 216 acima.<br />

(64) Guer. T. 3, L. 7 C. 2, n. 120. B. Cara. L. 1, T. 27 § 239, n. 38<br />

e seg. Lobão a Mello 2, 13 § 8 n. ., 3 o . Voet, Pandect. 4, 4 n. 52, e 27, 9,<br />

n. 4 e 9. Troplong. II. n. 488.<br />

(65) Fr. 13 § 29 D. de act. empt. (19. 1): "Si quis a pupillo sine tutoris<br />

autoritate, emerit, ex uno latere constat contractus; nam q"ui emit,<br />

obligatus est pupillo, pupillum sibi non obligat. B. Cam. L. 1, T. 26 § 224,<br />

n. 6 e 7, Pothier, Coût, de Orleans, t. 20, n. 24.-Troplong II, n. 497.


£AS,.COl?SAS 46


4?0 DIREITO<br />

D'ahi vêm que as hypothecas que o menor, depois de<br />

maior, constitue entre a data da h}*potheca nulla e a data da<br />

ratificação, embora validas e inscriptas, não prevalecem contra<br />

a hypotheca constituída na menoridade, tácita ou expressamente<br />

ratificada (73).<br />

4. Toda esta doutrina se applica ás In'pothecas constituídas<br />

pelos interdictos, eivadas do mesmo vicio da falta do decreto<br />

judicial (74).<br />

§ 219.—Influencia, sobre a hypotheca, das condições a que<br />

está sujeito o domínio.<br />

«A hypotheca só pôde ser constituida por quem tem<br />

domínio sobre o immovel (§ 210).<br />

Mas pôde o domínio estar sob condição resolutiva (75);<br />

pôde a acquisição delle depender de condição suspensiva (76);<br />

pôde o immovel se achar em estado de communhão; pôde finalmente<br />

estar na posse de terceiro usurpador.<br />

Qualquer destas circumstancias exerce influencia na hypotheca.<br />

I. A condição resolutiva do domínio não inhibe o pro-<br />

nullité relative cette difference que, quant à la première, ni la renonciation...<br />

ni quelque autre moyen... ne peuvent l'effacer... Si plus tard l'acte est<br />

confirmé expressément au tacitement par celui qui était en droit de se prévaloir<br />

de la nullité, cette confirmation ne constitue pas une corroboration<br />

avec effet retroatif d'une chose déjà existente, mais plutôt une formation<br />

nouvelle de l'acte qui avait été fait antérieurement, mais alors sans effect."<br />

"Il en est tout autrement si la nullité n'est qui relative. Cette nullité<br />

n'est pas introduite que dans l'intérêt exclusif d'une personne déterminée:<br />

si celle-ci préfère ne pas l'invoquer, l'acte qui n'était nul que conditionnelle-<br />

Hient est censé avoir été absolument valable dès le principe. "<br />

(73) Troplong II, n. 494 e 495, Pont. II, n. 616, Pothier. Orleans, t. 20,<br />

n. 24, Zachar. § 266, nota 4.<br />

(74) Tropflong. II, n. 500, Pont. II, n. 615 e 616.<br />

(75) Condição resolutiva é um acontecimento futuro e incerto, de que<br />

por vontade das partes fica dependendo a extincção d'um direito. Mas-nz<br />

§ 123. Se o acontecimento é certo, não ha condição, Tnas termo com effeito<br />

resolutivo. Mühlenbruch § 105.<br />

(76) Condição suspensiva é um acontecimento futuro e incerto, do qual<br />

por vontade das partes fica dependendo a acquisição de um direito. E igualmente<br />

se o acontecimento é certo, não ha condição, mas 'termo. Maynz, loc.<br />

cit. e II §, Mühlenbruch § 105.


DAS COUSAS 471<br />

prietario de hypothecar o immovel (77). Mas, como ning-uem<br />

pôde transferir a outrem nem mais nem melhores direitos do<br />

que tem, a hypotheca fica subordinada á resolução do dominio,<br />

isto é: deixa de existir desde que se resolve o dominio de quem<br />

a constituiu (78).<br />

Todavia, se a resolução do dominio procede, não de causa<br />

necessária, inhérente ao titulo de acquisição, mas de causa nova<br />

e posterior (79), a h}"potheca subsiste não obstante a cessação do<br />

dominio, como acontece no caso de resolução do dominio do<br />

donatário por superveniencia de ingratidão (80).<br />

II. Se o dominio não está ainda adquirido, mas a acquisição<br />

depende de condição suspeusiva, como se alg-uem faz doação<br />

a outrem dum prédio, se esse outrem chegar á idade de trinta<br />

annos, poderá o donatário hypothecar a casa antes de verificada a<br />

condição ?<br />

Certo o immovel, antes de verificada a condição, não faz<br />

parte do patrimônio, mas o direio de adquiril-o nos termos da<br />

clausula condicional é um direito absolutamente deferido (81).<br />

(77) Noodt, Pandetc, 20, T. 6. Voet, Pandect. L. 20 T. 6, n. 8, Troplong<br />

II, 465, Zacarias. i§ 266 e 196. Pont. II, n. 637.<br />

(78) F. 4 § 4 D. de in diem addüctione, 18, 2: MarceLlus scribi't, purê<br />

vendito et in diem addicto fundo, si melior conditio allata sit, rem ipignoon<br />

esse desinere, si emptor eum fundum pignori dedis*?ct. Fr. 3 D. Quib. mod.<br />

pign. vel hyp. solv. 20, 6: Si... forte emptor, antequam melior conditio offerretur,<br />

hanc (rem) pignari dedit; finitur pignus, meliore conditione allata.<br />

Troplong II, n. 466, Pont. II, n. 645.<br />

Convém notar que se a resolução do dominio depende do acontecimento<br />

certo, como a do dominio do fiduciario, a hypotheca seria Inútil porque é sabido<br />

que o dominio ha de cessar e com elle a hypotheca. Ao contrario, no<br />

caso da aãdictio in diem, se passa o prazo e ninguém offerece melhor preço,<br />

a hypotheca constituída pelo comprador adquire existência.definitiva.<br />

(79) Voet, Pandect. 20, 5, n. 8 e 9, Troplong II, 466, Pont II, n. 646.<br />

Vej. Makeldey, Droit Romain, § 274, n. 1 e 2.<br />

(80) Se a causa da 'resolução depende tão somente da vontade daquelle<br />

que constitue a hypotheca, a resolução do dominio não resolve a hypotheca:<br />

fr. 3 D. quib. mod. pig. vel hypoth. solv. 20, 6: Marcellus ait finiri pignus,<br />

si melior conditio fuerit allata: quanquam ubi sic res distiracta est, nisi em~<br />

ptori ãisplicuisset, pignus finiri non putet. Voet, cit. n. 8. Troplong II,<br />

n. 466.<br />

(81) O direito de haver a cousa sob condição suspensiva é um direito<br />

adquerido — jus delatum — tanto que passa aos herdeiros § 4. I. de verb,<br />

oblig. 3, 15. Muhlenbruch, § 108, n. 2, Maynz II, § 290, nota 18.


472 DIREITO<br />

D'ahi vem que o sujeito do direito condicional pôde alie*<br />

nar a cousa, transferindo-a com a condição imposta. E se pôde<br />

alienal-a, porque não poderá hypotheca-la, sob a mesma condição<br />

? (82).<br />

A disposição legal que veda a hypotlieca de bens futuros<br />

(S3) não entende com o caso vertente.<br />

A lei prohibe a hypotlieca geral e de bens futuros, isto é,<br />

de bens incertos em si, e de acquisição imprevista, de bens que<br />

não podem ser individtiados. Mas o immovel, cuja acquisição<br />

depende de condição suspensiva, é em si certo, e se acha individuado.<br />

Só ha incerteza quanto á acquisição. E o que répugna<br />

á lei, é a incerteza dos bens, incompatível com a especialidade, e<br />

não a contingência da hypotlieca pela incertesa da acquisição; porquanto<br />

contingência igual corre a hypotlieca de bens sujeitos á<br />

condição resolutiva (84).<br />

III. Quando o immovel se acha pro indiviso, não pôde ser<br />

hypothecado na sua totalidade, senão de consentimento de todos os<br />

comproprietarios (85). Cada comproprietario, porém, pôde hypo-<br />

(82) Merlin, verb. Hypo th. Sect. 2 § 3, n. 5, Troplong II, n. 468 ter,<br />

Pont II, n. 636.<br />

(83) O art. 4 da lei n. 1237, diz assim: "A hypotheca convencional deve<br />

ser especial, cam quantia determinada, sobre bens presentes. Ficão prohibidas<br />

e de nenhum effeito as hypothecas geraes e sobre bens futuros. "<br />

A razão deste decreto é que a lei quer, por espirito de systema, a hypotheca<br />

especial e condemna a hypotheca geral.<br />

A especialidade da hypotheca consiste na determinação da quantia e na<br />

inãividuação do immovel sobre que recahe (§ 184 acima). A lei, pois, prohibe<br />

a hypotheca de bens futuros, porque ordinariamente taes bens, por incertos,<br />

não podem ser determinados.<br />

Mas desde que o bem, embora dependente de acquisição futura, pôde ser<br />

in-divJduado, e o direito de havel-o, embora subordinado á condição suspensiva,<br />

é jâ um direito defirido, cesssa a razão da lei e a hypotheca é admissível.<br />

Os francezes entendem no sentido exposto o seu código, sustentando que<br />

não ha antinomia entre o art. 2125 e o art. 2129.<br />

(84) Vej. acima n. 1. Na hypothèse alludida, a hypotheca, verificada a<br />

condição de que depende a acquisição do immovel, se entende datar da inscripção,<br />

porque, como é sabido (§ 177) a condição, uma vez realizada, retrotahe<br />

o seu effeito á -data do acto.<br />

(85) Fr. 68 D. IPro socio 17, 2: Nemo ex socüs plus parte sua potest<br />

alienare. etsi totorum bonorum socii sint. Lei n. 1237, art. 4 § 8. Troplong.<br />

II, n. 469 Ms, Pont II. n. 640.


DAS . COUSA.S 473<br />

thecar isoladamente a parte ideal que lhe pertence, se o immovel<br />

é susceptível de divisão (86).<br />

E, feita posteriormente a divisão, a hypotheca recahe, e<br />

por assim dizer se concrétisa na parte que toca ao condômino<br />

que a constituiu (87). Se na divisão não couber ao condômino<br />

quinhão algum noimmovel, como ás vezes acontece na partilha<br />

da herança (família crsciscundœ), a conseqüência é que a hypotheca<br />

deixa de existir por não ter objecto (88) Assim a existência da<br />

hypotheca de immoveis que fazem parte duma universalidade de<br />

bens, depende da partilha.<br />

IV. Quando o immovel não está na posse do devedor,<br />

mas tem elle o direito de se fazer reconhecer legitimo dono e de<br />

chamal-o a si por via de acção de nullidade (89), de reivindica-<br />

(86) Led cit. art. 4 § 8. Este § é copia littéral do art. 107 da lei portuguesa<br />

cie I o de Julho de 1863.<br />

A lei diz '-se for ãivisivel. Falia a lei da indivisibilidade jurídica, como é a<br />

do prédio eiriphyteutico?<br />

_ Parece-nos que sim, não obstante a explicação em sentido diverso do<br />

Avis. n. 2 de 4 de Janeiro de 1869.<br />

1." Porque physicamente todo o immovel é ãivisivel;<br />

2.° Porque se a lei" alludisse a prédios de difficil ou incommoda divisão,<br />

como são as casas, teria usado da expressão conveniente e não d'uma phrase<br />

que exclue absolutamente a divisão — hypothèse que em relação a immoveis<br />

sõ se dá com os juridicamente indivisíveis ;<br />

3." Porque não ha razão para prohibir a hypotheca de partes de cousa<br />

de diifficiH divisão, assam como não ha para a alienação. E' melhor ao credor<br />

ter hypotheca na parte do prédio de difficil divisão do que não ter garantia<br />

alguma. A tutela da lei no caso figurado viria em prejuízo do tutelado.<br />

Assim, pois, a phrase — se for ãivisivel — refere-se âs cousas que a lei<br />

prohibe dividir.<br />

(87) Troplong II, n. 469 bis, Pont II, n. 640. A divisão, como se sabe,<br />

fixa o direito de cada condômino na parte que lhe é quinhoada.<br />

(88) Troplong, cit. n. 469 lis, Pont II, cit. n. 640. Lobão, Fase. T. 3,<br />

Dissert. 2, C. de Rocha. Nota U. A doutrina destes dous últimos esoriptores<br />

acerca da alienação feita por herdeiros antes da partilha, tem perfeita applicação<br />

ao caso de hypotheca.<br />

(89) Como no caso de lesão enormissima. Doutr. das Acç. Nota 845.<br />

Se a venda é desfeita por motivo de lesão enorme, subsistem as hypothecas<br />

constituídas pelo réo, porque a acção de lesão enorme é pessoal, Doutr. das<br />

Acç. Nota 845.


474 DIREITO<br />

tão ou rescisão (90), é-fora de duvida que pôde hypothecal-o.~<br />

A hjrpotheca, porém, fica subordinada ao resultado da acção :<br />

se a acção ving-a, a hypotheca prevalece ; se é julg-ada improcedente,<br />

a hypotheca succumbe (91).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art- 757 — A cotisa commum a diversos proprietários não póãe ser dada<br />

em- garantia real, na sua totalidade, sem o consentimento de todos; mas cada<br />

um póãe individualmente dar em garantia real a parte Que tiver, se fôr divu<br />

sivel a causa, e só a respeito dessa parte vigorará a indivis ibiliãade da hypotheca.<br />

— 623, III, 758.<br />

§ 220. — Foimalidades externas da hypotheca convencional.<br />

A lei considerando — que a hypotheca importa a cessão<br />

de um direito real sobre cousa immovel, — que ella é uma excepção<br />

de direito com effeitos contra terceiros, julgfou de boa cautella<br />

sujeital-a á formalidades que lhe imprimissem o caracter de enérgica<br />

authenticidade (92).<br />

Dominada destes intuitos, a lei prescreve a escriptura publica<br />

como fôrma substancial da hypotheca convencional (93).<br />

A.) Desta disposição resulta que são applicaveis á convenção,<br />

pela qual é constituída a hypotheca, os princípios de<br />

direito relativos aos contractos, emtatito que dependentes da<br />

escriptura publica para sua validade, a saber :<br />

1. hypotheca convencional que não se acha reduzida á es-<br />

(90) Como no caso do immovel ter sido injustamente usurpado por<br />

terceiro.<br />

(91) Troplong II, n. 468. Pont II, n. 642. Vej acima § 181, n. 4.<br />

(92) Vej. Pont II, n. 655. Pothier (Hypothec, cap. I, Sect. 1 art. 1<br />

§ 1") diz que a escriptura publica é exigida para supprir a tradição. A razão<br />

não pôde ser outra senão a necessidade de dar á hypotheca convencional o<br />

maior gráo de certeza e segurança, attentooseu effeitopara com terceiros que<br />

não são partes na convenção.<br />

(93) Lei n. 1237, art. 4 § 6: "A escriptura publica é da substancia da<br />

hypotheca convencional, ainda que sejão privilegiadas as pessoas que a<br />

constituem." Décret, n. 3454 art. 135. As ultimas palavras da lei "ainda<br />

que sejão privilegiadas etc. " são ociosas. O escripto de pessoa privilegiada<br />

só suppre a esoriptura ' publica quando ella é oxigida aã probanãum, e não<br />

quando é da -substancia do contractu, como no caso de convenção hypothecaria.


DAS COUSAS 475<br />

criptura publica, se considera como não subsistente, embora tenha<br />

sido inscripta (94).<br />

2. E'licito ao devedor, antes de assignada a escriptura pu-blica<br />

da hypotheca, arrepender-se da promessa de constituil-a(S»5).<br />

3. A falta de escriptura publica não pode ser supprida,,<br />

ainda por confissão ou juramento do devedor (96).<br />

B.) A lei requer em termos expressos e positivos a escriptura<br />

publica.<br />

São, pois, insufficientes para dar existência á hvpotheca<br />

convencional quaesquer outros instrumentos ou actos públicos<br />

que não entrão na definição de escriptura publica (97), como<br />

termos lavrados em autos (^8), termos de conciliação (99),<br />

contractus passados nas^repartições publicas (100).<br />

C.) As cláusulas de que resulta a hypotheca convencional<br />

como a designação da cousa hypothecada, a fixação da quantia<br />

garantida, devem constar da escriptura publica, e não podem<br />

ser suppridas por declarações de escriptos particulares (101). s<br />

(94) Décret, n. 3453. art. 135. Consolidação cias Leis Civis, art. 366,<br />

nota (1).<br />

(95) Ord. 4, 19 pr. e § I o . Consolid. das Leis Civis, art. 376.<br />

(96) Consolidação das Leis Civis, art. 377, nota 3,<br />

(97) Ha differença entre escriptura publica e instrumentos públicos.,<br />

A escriptura publica é a que é lavrada por tabellião ou notario em,livro de<br />

notas e com formalidades particulares. Instrumento publico é o gênero, escriptura<br />

é uma espécie. Vej. Pereira e Souza § 214 e 215, C. Rocha § 187<br />

e 188.<br />

(98) Por exemplo: termos de amigável composição em autos.<br />

(99) Troplong II, n. 505. bis, Mourlon, III, n. 1484, Pont. II, n. 662.<br />

O termo de conciliação tem força de sentença (Lei de 20 de Set. de 1829,<br />

art. 4. Reg. n. 737 de 25 de Novembro de 1850, art. 34), mas não é escriptura<br />

publica.<br />

(100) Os contractus passados nas repartições publicas, de conformidade<br />

com as leis e regulamentos da administração, têm, sem duvida, caracter authent'co,<br />

mas não se incluem na definição de escriptura publica. Vej. Troplong.<br />

II, 505, bis, Pont. II, 663. Aviso n. 273 de 22 de Agosto de 1871 e Res.,<br />

de 26 de Out. de 1867, a que se refere o Aviso n. 373 de 28 de Out. do<br />

mesmo anno.<br />

(101) As cláusulas que formão a substancia do contractu são indivisíveis;<br />

devem, pois, constar da mesma escriptura. O principio exposto no<br />

texto é geral, portanto, applicavel a todos os contractus para os quaes se<br />

requer a escriptura. A prova complementar por testemunhas ou escriptos<br />

particulares só pôde ser ad.rnittida para circumstancias que não são substanciaes.<br />

Vej. Lobão Supl. Leg. Linh. Dissert 5. § 37 Pont,. II, n. 656.


476 DIREITO<br />

Mas é de advertir que a constituição da hypotheca é cousa<br />

distincta da divida. A divida, pois, pôde constar de escripto particular<br />

nos casos em que o direito o permitte (102); bastando<br />

que a escriptura de hypotheca faça referencia á ella, com determinação<br />

da quantia.<br />

D.) Se a obrigação que a hypotheca g-arante depende de<br />

ulterior liquidação, como no caso de abertura de credito (103) ;<br />

na escriptura se deve declarar o máximo da quantia coberta (104).<br />

mas, para se determinarem as quantias effectivamente retiradas,<br />

são admissiveis papeis e recibos particulares (105).<br />

§ 221. - - Especialidade da hypotheca convencional.<br />

A hypotheca convencional deve ser especial, sob pena de<br />

nullidade (106).<br />

A especialidade da hypotheca tem por fim, como se disse<br />

em outro lug-ar (107), aclarar a situação do devedor, fornecendo<br />

elementos para se calcular a exteução da sua responsabilidade<br />

hypothecaria, e portanto qual a garantia real que lhe resta.<br />

Sem o dito requisito a publicidade pela inscripção seria incompleta<br />

(108).<br />

A especialidade, attento o seu fim, requer duas indicações<br />

:<br />

a) A individuação dos bens submettidos á hypotheca ;<br />

b) A fixação do valor da divida garantida (109).<br />

I. A especialidade, pelo que respeita aos bens, consiste<br />

na designação do immovel ou immoveis por seu nome e situação,<br />

(102) Vej. Consolidação das Leis Civis, art. 369.<br />

(103) Vej. § 177, acima.<br />

(104) Lei n. 1237, art. 4: "A hypotheca convencional deve ser especial,<br />

com quantia determinada." Décret, n. 3453, art. 119.<br />

(105) Merlin, Quest, de Droit, verb. Hypothec: La loi exige l'authenticité<br />

dans le titre constitutif de l'hypothèque; mais se borne là, et pour<br />

étendre sa disposition jusqu'aux pièces nécessaires pour régler et liquider<br />

la créance ainsi hypothéquée, il faudrait être législateur. Trop-long II, n. 477<br />

e 508, Pont. II, n. 660. Nesta pratica não ha quebra do principio. O máximo<br />

ãa divida que a hypotheca garante consta de escriptura, e se torna publica<br />

pela inscripção — é o que importa a terceiros saberem.<br />

(106) Lei n. 1237, art. 4, Décret, n. 3453, art. 119.<br />

(107) Vej. 184 acima.<br />

(108) Troplong II, n. 513 e 515. Pont II, n. 670.<br />

109) Lei n. 1237, art. 4, Décret, n. 3453.. oit. art. 119.


«<br />

DAS CODSAS 477<br />

ein ordem a que a sua individualidade fique bem determinada<br />

(110).<br />

As declarações do nome e situação devem ser consignadas<br />

na escriptura da constituição da hypotheca, e não podem ser<br />

suppridas por escripto particular ou pelas enunciações da ins-,<br />

cripção (111).<br />

Acontece, não raro, não ter o immovel denominação como<br />

se é uma facha destacada. Neste caso a individualidade se determina<br />

pelas confrontações e situação (112).<br />

E' de bom conselho inserir na escriptura os limites do<br />

immovel, a sua natureza (113) e característicos, se bem que a<br />

omissão destes requisitos, uma vez que conste o nome e situação,<br />

não induza nullidade (114).<br />

(110) Lei n. 1237, art. 4 § I o : "deve indicar nomeadamente o immovel<br />

ou immovel em os quaes ella consiste (!) assim como a sua situação e característicos<br />

. "<br />

A situação determina-se pela freguezia e município, Décret, n. 3453,<br />

art. 218 § 9 e art. 235.<br />

(111) Lei n. 1237, art. 4 § I o . "A hypotheca convencional deve indicar<br />

nomeadamente o immovel ou immoveis em os quaes ©Ha consiste, assim com.0<br />

a sua situação." Décret, n. 3453, art. 218 § 9 e 10. art. 235. A denominação<br />

do immovel e a situação são cláusulas substanciaes da escriptura de hypotheca:<br />

é o que se deduz dos artigos citados da lei e Decreto.<br />

'Convém notar que a escriptura e a inscripção são coutas distinctas. A inscripção<br />

presuppõe escriptura valida, e a escriptura só é valida quando constem<br />

os requisitos legaes. '"Designer dans l'inscription l'immeuble grevé, c'est<br />

satisfaire au vœu de la loi qui prescrit la publicité sans rien faire relativement<br />

à la spécialité, laquelle ne peut rencontrer que ïdans l'acte constitutif<br />

de l'hypothèque." Pont II. n. 672.<br />

(112) Se o immovel é rural, determina-se de ordinário pela denominação,<br />

se urbano, pela rua e numero ou rua e prédios vizinhos (Décret, n. 3453,<br />

art. 218, § 10).<br />

Se é rural e não tem denonrnação, determina-se pelos limites e situação.<br />

Nisto não pôde haver um rigor judaico: o que a «lei quer é que o immovel<br />

fique claramente individuado: a denominação (e na falta os limites) e a situação<br />

dão, por via de regra, o resultado desejado.<br />

(113) Se está inculto, se tem edifícios, se é cercado ou aberto, etc.<br />

(114) Estas enunciações não são substanciaes, porque não são necessárias<br />

para determinar a dndividualidade do immovel.<br />

A formula — ''hypotheca todos os immoveis que possue na freguezia tal"<br />

não satisfaz a prescripção da lei, porque não individualisa os bens. A hypotheca<br />

concebida naquelles termos seria geral, e por conseqüência nulla. Vej.<br />

Pont II, n. 674.


•<br />

478 DIREITO<br />

E' licito ao devedor e aos seus credores invocarem a<br />

nullidade proveniente da falta de qualquer das declarações que<br />

são substanciaes (115).<br />

II. Quanto ao valor da obrigação, é essencial que seja<br />

determinado em quantia precisa (116). Se a obrigação é illiquida<br />

(117), esta circumstancia não embaraça a constituição da hypotheca;<br />

ella porem não poderá ser inscripta senão por quantia<br />

determinada prefixada por accôrdo expresso entre o devedor e o<br />

credor.<br />

§ 222 — Direito ãe pedir reforço da hxpotheca.<br />

A convenção hypothecaria indica de si mesma desconfiança<br />

na pessoa do credor. Porque não tem fé na.pessoa, procura o<br />

credor a garantia da cousa (119).<br />

Assim que: sem a hypotheca, o credor não fiaria do devedor.<br />

A hypotheca é, pois, a condição do prazo (120).<br />

D"ahi vem que se o ira movei perece ou soffre deterioração<br />

que o torne insuficiente para segurança da obrigação, cessa de<br />

existir o fundamento do prazo; a divida se reputa vencida e<br />

(115) Troplong n. 515, Pont II, n. 672.<br />

(116) Lei n. 1237, art. 4: A hypotheca convencional deve ser com quantia<br />

determinada." Décret, n. 3453, art. 119... "a quantia que ella garante<br />

deve ser determinada ou estimada." Pont II, n. 7C2, Troplong II, n. 545.<br />

E' de notar que a obrigação pôde ser incerta em sua existência, como se<br />

ê condicional, mas precisa quanto a quantia. Pont. II, n. 706.<br />

(117) Como se a hypotheca foi constituída para garantir a indemnisação<br />

de perdas e damnos que venhão a occorrer, ou o fornecimento de gêneros e<br />

materiaes ou de dinheiro.<br />

(118) Lei n. 1237, art. 4 § 5, Décret, n. 3453, art. 119.<br />

O C. Civil franc, (art. 2132) dá neste caso direito ao credor de inscrever<br />

a hypotheca pela estimação que lhe parecer razoável. E' certo que o credor<br />

pO.de abusar de uma tal faculdade, fixando a quantia em somma exorbitante;<br />

mas para corrigir semelhante abuso o mesmo Código confere ao devedor o<br />

direito de requerer a reducção do valor estimado.<br />

O alvitre do C. C. franc, nos parece melhor que o da nossa lei, segundo<br />

a qual a inscripção da hypotheca fica dependente do devedor. Pôde, pois, o<br />

devedor, depois de assignar a esicriptura, recusar o seu accôrdo para a fixação<br />

do valor, e dest'arte inutilisar a hypotheca. Pont. II, n. 706.<br />

(119) Fr. 25 D. de reg. jur. : Plus cautionis in re est quam in personna.<br />

(120) Pont II, n. 690. Habita de pretio fide.


DAS COUSAS 479<br />

pôde ser exigida pelo credor, salvo se o devedor se offerece a<br />

restaurar a garantia, dando novas hypothecas (121).<br />

A escolha da alternativa—pagar incontinente, ou dar reforço<br />

de hypotheca, é direito»do devedor (122).<br />

A) Da doutrina exposta se deprehende que o direito do credor<br />

de exigir a divida, se não lhe são offerecidas novas seguranças<br />

reaes, presuppõe dous requisitos, a saber:<br />

I. E' mister que o pagamento da divida esteja suspenso<br />

pelo prazo (123). Se a divida está vencida porque terminou o<br />

prazo, cessa a alternativa : o devedor não pôde adiar o cumprimento<br />

da obrigação offerecendo novas garantias (124).<br />

II. O segundo requisito consiste na perda (125J ou na deterioração<br />

do immovel.<br />

1. E" indifférente para o effeito de que se trata, que a<br />

perda ou a deterioração resulte de força maior, ou caso fatal; de<br />

culpa ou negligencia do devedor. A lei não faz distinccão alguma<br />

( 126 )<br />

2. O texto falia de deterioração, isto é, de mal material<br />

(121) Lei n. 1237, art. 4 § 3, Décret, n. 3453, art. 128.<br />

(122) Lei., cit. art. 4 § 3:... "pode o credor demandar logo a mesma<br />

divida, se o devedor recusar o reforço. "<br />

Assim, se o devedor offerece reforço, o credor não pôde mais exigir o<br />

pagamento. O pedido do credor é alternativo. Em França vigora disposição<br />

igual. Vej. Troplong II, n. 542, Pont II, n. 695.<br />

(123) Lei cit. art. 4 § 3; Pont II, n. 691.<br />

(124) E' este o effeito pratico do requisito.<br />

(125) Acerca da perda ou extineção do immovel. vej. adiante § 276.<br />

(126) Em França (C. C. art. 2131), só se dá o caso de reforço quando a<br />

deterioração procede de caso fortuito ou força makir. A razão é porque segundo<br />

o artigo 1188 o devedor perde o beneficio do prazo quando cahe em<br />

fahencia ou diminue por facto seu as garantias do credor: Assim se a perda<br />

ou deterioração é o resultado de culpa do devedor, cessa o beneficio do prazo.<br />

e elle não pôde readquiril-o offerecendo nova hypotheca. E' o caso do<br />

art. 1188. Mas se a perda ou deterioração é casual, o devedor pôde reconquistar<br />

o beneficio do prazo, offerecendo reforço. E' a hypothèse do art. 2131.<br />

Troplong II, n. 542, Pont II, n. 692.<br />

Entre nós., porém, não prevalece a doutrina dò art. 1188. O devedor só<br />

perde o beneficio do prazo em fallencia ou caso de insolvabilidade (Décret,<br />

n. 3453, art. 240 § 6). Porranto vigora a disposição do art. 4 § 3 da lei,<br />

quer a perda ou deterioração seja casual, quer o resultado de culpa do devedor,<br />

isto é: o cit. art. 4 § 3 não encontra limitação, como o art. 2131 do C. C.<br />

fr. no art. 1188 do mesmo Código.


480 DIREITO<br />

'soffrido pelo immovel (127). A diminuição de valor, portanto,<br />

que é devida, rião á mal material, mas a causas econômicas<br />

(128), não fundamenta o pedido de reforço (129).<br />

3. Nem tão pouco é capaz do mesmo effeito a deterioração<br />

existente ao tempo em que foi constituida a hypotheca<br />

(130). Neste caso a insufliciencia se reputa conhecida do credor<br />

(131), e se nada obstante, confiou na pessoa do devedor e aceitou<br />

a garantia dada, dão lhe fica razão para dizer que falta a<br />

base de sua confiança.<br />

4. Também não autorisa a exigência de reforço a insuficiência<br />

do immovel, procedente da marcha normal de factos<br />

previstos como, é por exemplo, a diminuição de valor que sobrevem<br />

pela perda de madeiras destinadas ao corte existentes<br />

no terreno hypothecado ou que resulta da extracção de pedras e<br />

metaes de minas já ein laboração ao tempo em que foi estipulada<br />

a hypotheca (132).<br />

5. Não bastão quaesquer estragos; mas é necessário que<br />

sejão de natureza a tornar o immovel realmente insufficiente,<br />

isto é: releva que o valor do imtnovel, em conseqüência da deterioração<br />

soffra diminuição tal que o seu preço, segundo a estimativa<br />

commum, se torne insufficiente para pagar a divida e os<br />

juros que se vencerem até a terminação do praso (13 3).<br />

(127) Deterioração é o mal que offende a integridade da cousa, Vej.<br />

Pont II, n. 693.<br />

(128) Como. por exemplo, uma fazenda que diminuir de valor por mudança<br />

na direcção da estrada publica. Assim os prédios da villa da Estrella<br />

ficarão reduzidos a menos do terço do seu valor com a abertura da estrada<br />

de ferro de Mauâ.<br />

(129) Pont II, cit. n. 693.<br />

(130) Lei cit. art. 4 § 3, Pont II. n. 693.<br />

(131) Mas, se o devedor illudir a boa fé do credor, occultando-lhe a deterioração?<br />

Neste caso não tem lugar o reforço: quia fraus omnia corrumpit.<br />

Vej. Pont II, n. 693.<br />

(132) Pont II, n. 693.<br />

(133) Lei cit. art. 4 § 3, "insufficientes para segurança da divida."<br />

Troplong II, n. 544.<br />

Se o immovel hypothecado é divisível, se o devedor vende uma parte<br />

e o comprador rime essa parte? Haverá neste caso deterioração no sentido<br />

da lei? Não, porque o credor recebe o valor da parte remida, e fica o credito<br />

proporcionalmente reduzido. Tropíong (11. n. 544) e Pont (II, n. 694)<br />

eustentão que em tal caso ha razão para a perda do beneficio do prazo (art.<br />

1188) e não para o reforço, objecto do art. 2131.


DAS COUSAS 48i<br />

B ) Resta finalmente observar que a nova hypotheca que<br />

o devedor constitue para substituir a do immovel perdido ou para<br />

reforçar a do immovel deteriorado, se entende existir para os<br />

seus effeitos legaes da data em que é inscripta e não da data da<br />

hypotheca substituída ou reforçada. Esta doutrina é uma conseqüência<br />

necessária dos dous requisitos — especialidade e publicidade<br />

das Irypothecas convencionaes (134).<br />

§ 223.—Influencia da hypotheca sobre, o vencimento da obrigação<br />

1. Nas obrigações de dinheiro, a termo, é muito usual<br />

estipular-se o pagamento por parcellas, em prazos determinados.<br />

A obrigação de pagar a quantia toda é de sua natureza<br />

divisivel, e, portanto, nada de mais natural do que, por accordo<br />

das partes, scindi-la em tantas obrig-ações quantas são as prestações<br />

convencionadas (135).<br />

2. Mas se uma obrigação estipulada na dita fôrma é garantida<br />

por hypotheca, poderião occorrer na execução difficuldad.es<br />

graves.<br />

Vence-se a primeira prestação e não é paga. Quer se executar<br />

o devedor pela prestação vencida.<br />

Como excutir a cousa hj'pothecada? Excutil-a em sua totalidade?<br />

Não; porque a divida toda não está vencida; porque a<br />

hypotheca, arrematado o immovel, se extinguiria (§ 227) e o<br />

preço que representa o immovel, deduzida a prestação vencida,<br />

seria restituido ao devedor, que não é obrigado a pagar as prestações<br />

não vencidas, e dest'arte a garantia, de facto, teria desapparecido.<br />

Excutir na parte correspondente a importância da prestação<br />

vencida? Também não: o prédio bem pôde ser iiidisivel ou<br />

de difficil divisão, e quem a faria? Ainda mais: a divisão por<br />

partes correspondentes ás prestações, as mais das vezes, acarretaria<br />

a diminuição das vantagens e utilidades do immovel, e traria<br />

como conseqüência o enfraquecimento da garantia.<br />

,' - (134) Troplong II, n. 543, Pont II, n. 696.<br />

O direito de pedir reforço ou pagamento incontinente compete também<br />

aos credores de hypothecas legaes, depois de especialisadas. Décret, n. 3453,<br />

art. 185 e 186.<br />

(135) Pothier, oblig. n. 288 e segts. Laurent, Princip. de Droit Civil»<br />

XVII, n. 368. ,- _ ,


482 DIREITO<br />

3. Para obviar a estas difficuldades praticas, a lei tomou<br />

o al vitre de declarar vencida a divida toda, se alguma das prestações<br />

se vence e não é paga. (136)<br />

Ha nisto talvez rigor e dureza para com o devedor, mas<br />

é um mal previsto, e. pois, fica­lhe tempo e liberdade pa.ra se<br />

acautelar.<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 7'62 — A divida considera­se vencida: — 654.<br />

I — Se, deteriorando­se, ou deprecianão­se a cotisa dada em. segurança,<br />

desfalcar a garantia, e o devedor, intimado, a não reforçar. — 764.<br />

II — Se o devedor cahir em insolvencia, ou fallir.<br />

III — Se as prestações não forem pontualmente pagas, toda vez que deste<br />

modo se achar estipulado o pagamento.<br />

Neste caso, o recebimento posterior da prestação atrazada importa re­<br />

.nuncia do credor ao seu direito de execução immediata.<br />

IV — Se perecer o objecto dado em garantia, hypothèse na qual a indemnização,<br />

estando elle seguro, ou havendo quem a tenha afiançado, se subrogará<br />

na cotisa destruída, em beneficio do credor, a quem assistirá sobre<br />

ella preferencia até o seu completo reembolso. — 1.158, I.<br />

V — Se se desapropriar a cotisa dada em garantia, ãepositanão­se a parte<br />

do preço, que fôr necessária para o pagamento integral do credor. —<br />

1.558, II.<br />

Paragrapho único. Xos casos dos ns. IV e V, só se vencerá a hypotheca<br />

antes do prazo estipulado, se o sinistro, ou a desapropriação recahir sobre o<br />

objecto dado em garantia e esta não abranger outros; subsistindo, no caso<br />

contrario, a divida reduzida, com a respectiva garantia sobre os demais bens,<br />

não desapropriados, damnificados on destruídos. ■—763.<br />

Ari. 763 — O antecipado vencimento da divida nas hypotheses do artigo<br />

anterior, paragrapho único, não importa o dos juros correspondentes ao prazo<br />

convencional por decorrer.<br />

§ 224.—Hypotheca convencional constituída cm pai^ estrangeiro.<br />

A) A doutrina scientifica, acerca da h}­potheca convencional<br />

constituída sobre immoveis sitos em paiz estrangeiro, é<br />

a seguinte:<br />

1. A convenção de hypotheca é acceita e recebida com os<br />

seus effeitos no Estado em cujo território se acha o immovel,<br />

(136) Lei n. 1.237, art. 4 § 9. Décret, n. 3.457, art. 130, Esta disposição<br />

foi tirada da lei portugueza de 1 de julho de 1863, art. 90. E' denotar<br />

que não foi reproduzida no C. Civil Fort.


DAS Cousis 48â<br />

desde que a legislação desse Estado admitte e consagra o direito<br />

real denominado—hypotheca. (137)<br />

2. As formalidades externas da convenção são reguladas<br />

pela lei do Estado, onde a hypotheca é estipulada (138).<br />

3. A hypotheca, porém, não pôde produzir os seus effeitos,<br />

senão sob a condição de ser inscripta no lugar da situação<br />

do immovel, de conformidade com as prescripções da lei desse<br />

lugar (139).<br />

4. São igualmente da alçada da lei da situação do immovel<br />

a designação dos bens que podem ser hypothecados, a preferencia<br />

que a hypotheca confere, a acção e a execução (140).<br />

B) A nossa lei, modelando-se pelas disposições do Código<br />

Civil francez (141), e inspirando-se em principios falsos e condemnados<br />

(142), afastou-se nesta materia da doutrina verdadeira.<br />

1. Na verdade ella nega, em termos positivos, todo e<br />

(137) Démangeât sobre Felix, n. 476 nota (a), Fiore, Droit Internation.<br />

ns. 221 e 224.<br />

(138) Fiore, n. 220, b.: como, por exemplo, se a hypotheca pôde ser<br />

constituída em instrumento particular (Direito Romano).<br />

(139) iSavigny, tom. 8 § 368, Fiore, 220, b.<br />

(140) Savigny, tom. 8 § 368. Fiore, n. 220, a.<br />

(141) C. C. francez, art. 2.128. A disposição deste artigo foi om geral<br />

aceita pelos códigos, que tomarão o francez como typo. Vej. Felix, n. 476<br />

e segs.<br />

Este artigo é objecto de viva critica de Démangeât.Fiore, n. 222 e outros.<br />

"Les rédacteurs de l'article 2.128, se conformant à la tradition de l'ancienne<br />

jurisprudence, dans laquelle tout acte notarié importait hypothèque<br />

générale, ont confondu mal à propos le droit réel d'hypothèque et la force<br />

exécutoire: on ne comprend pas pourquoi le propriétaire qui par un acte<br />

passé en pays étranger peut aliéner son immeuble ou le grever de servitude<br />

ne pourrait pas également le grever d'un droit d'hypothèque." Démangeai<br />

sobre Felix, n. 476, nota (a).<br />

(142) A disposição da nossa lei é uma conseqüência da confusão que<br />

Introduz nas idéas a celebre distincção de Estatuto Pessoal e Estatuto .-eal.<br />

Os sectários desta distincção sustentâo que a hypotheca, como direito real<br />

que é, deve ser em tudo regida pela Zoei rei sitœ. fFiore, n. 270, i). Mas não<br />

é esse o principio dominante no assumpto. A lei d'u


484 IMRËÎTO<br />

qualquer effeito ás hvpothecas estipuladas em paiz estrangeiro<br />

sobre immoveis situados no império (143).<br />

Assim que: não são recebidas nem produzem effeito algum<br />

no Brazil as hj-pothecas constituídas em escripturas ou instrumentos<br />

públicos lavrados por notarios ou officiaes de nação estrangeira,<br />

ainda entre brazileiros ou em favor de brasileiro (144)<br />

2. A citada lei só abre duas excepções áquelle principio,<br />

a saber:<br />

1? Dá effeito ás hypothecas estipuladas no estrangeiro,<br />

quando uma tal concessão tenha sido feita em tratados (145).<br />

2". Dá igualmente effeito ás hypothecas estipuladas em<br />

paiz estrangeiro, entre brazileiros ou em favor de brazileiro, sendo<br />

celebradas nos consulados, com as solemnidades e requisitos<br />

do nosso Direito (146).<br />

3. Os cônsules exercem as funcções de notarios para as<br />

pessoas das nações de que são agentes (147). Nas escripturas de<br />

hypotheca que lavrareo, são obrigados a observar as solemnidades<br />

e os requisitos exigidos pela lei (148).<br />

4. Não é preciso advertir que taes escripturas devem ser<br />

inscriptas no Império, no registro da comarca a que pertence o<br />

immovel hypothecado (149).<br />

C143) Lei n. 1.257, art. 4 § 4, Decreto ri. 3.453, art. 129.<br />

1144) Lei cit. art. 4 § 4.<br />

(145) Lei cit. arc. Não sabemos de Tratado do Império eom putc-nda<br />

ot rrfir,geira em que se estipulasse a alludida concessão.<br />

(146) Lei, art. 4 § 4: '"Salvo. . . se forem celebrados entre b^az'leiros ou<br />

-m iavor délies...<br />

(147) Vej. Decreto n. 520 de 11 de Junho de 1847, art. í;6, e Decreto<br />

n. 4.968 de 24 de Maio de 1872, are. 97 (§ 7).<br />

1.148) Lei, are. 4 § 4... -'com as solemnidades e condições desta lei."<br />

Assim, a escriptura deve eepecficar o immovel por seu nome e situarão, e<br />

declarar a importância precisa da divida.<br />

U49) Lei cit. art. 4 § 4.


CAPITULO V.<br />

PUBLICIDADE DA HYPOTHECA<br />

§ 225. — Noções Gemes<br />

O nosso Direito faz da publicidade a condição necessária da<br />

efficacia da hypotheca. A hypotheca que não adquire a publicidade<br />

pelo meio legal, se conserva em estado de perfeita inércia : — não<br />

vale contra terceiros, isto e, não produz nem o direito de sequela,<br />

nem o de preferencia (1).<br />

A publicidade é realisada por via da inscripçâo (2).<br />

Tem a inscripçâo por fim : I. Ministrar terceiros unia noticia<br />

exacta dos onus hypothecarios do íminovel ; II. Fixar a<br />

data legal de cada hypotheca (3)<br />

No terreno da lei a hypotheca, qualquer seja a sua notoriedade,<br />

se reputa occulta, emquanto não é inscripta (4).<br />

A inscripçâo não é um elemento componente da hypotheca.<br />

senão um requisito extrinseco. A hypotheca nasce, fórma-se<br />

e subsiste independentemente da inscripçâo ; a inscripçâo é uma<br />

formalidade que se requer para que ella entre em actividade (5).<br />

(1) Lei n. 1237, art. 9 e §§, Décret, n. 3453, art. 116 § 2 e art. 120.<br />

Troplong. II, n. 554 e seg. e III. n. 725. Pont. II, n. 723 e sog. Vej. acima<br />

S 173'.<br />

(2) Lei n. 1237, art. 7 e 9, Décret, n. 3453, art. 80 e seg.<br />

(3) Lei n. 1237, art. 9 § 4 e 24, Décret, n. 3453, art. 116, 213 e seg.<br />

218. Vej. Troplong, Privileg. et Hypoth. Introduct.<br />

(4) Lei, art. 9: "As hypothecas legaes especialisadas, assim como as<br />

convencionaes, somente valem contra terceiros desde a data da inscripçâo."<br />

Pont. II, n. 728.<br />

(5) Vej. Décret, n. 3453, art. 107 e 108, Troplong. II, n. 566 e III. 646.<br />

Zacarias, § 267.


486 ÙÎRËITO<br />

A inscripção, pois, presuppõe sempre uma hj^potheca valida<br />

(6). D'ahi os corollarios seguintes :<br />

1. As faltas e vicios que affectão a constituição da hypotheca<br />

não podem ser suppridos pelas cláusulas da inscripção (7) ;<br />

2. As omissões e defeitos da inscripção a seu turno não<br />

se podem sanar pelas declarações do titulo constitutivo da hypotheca<br />

(8) ;<br />

3. A nullidade da hypotheca torna inutil e ociosa a inscripção<br />

(9) :<br />

4. A nullidade da inscripção não importa a nullidade da<br />

hypotheca ( 10).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 856 — O registro de immoveis comprehenãe :<br />

I — A. transcripção dos títulos de transmissão da propriedade. —<br />

530, I, 531.<br />

// — A transcripção dos títulos enumerados no artigo 532.<br />

III — A transcripção dos tit ulos constitutivos de onus reaes sobre cousas<br />

alheias. — 676, 697, 796.<br />

IV — A inscripção das hypothecas. — 831.<br />

Art. 857 — Se O titulo de transmissão fôr gratuito, poderá ser promovida a<br />

transcripção :<br />

I — Pelo próprio adquirente.<br />

II — For quem de direito o represente.<br />

III — Pelo próprio transference, com- prova da acceitação do beneficiado.<br />

Art. 858 — A transcripção do titulo de transmissão do dominio ãirecto<br />

aproveita ao titular do dominio util, e vice-versa.<br />

Art. 859 — Presume-se pertencer o direito real á pessoa, em cujo nome<br />

se inscreveu, ou transcreveu.<br />

Art. 860 — Se o teor do registro, de imvnoveis não exprvmir a verdade, poderá<br />

o prejudicado reclamar que se rectifique. — 967.<br />

Paragrapho único. Kmquanto se não transcrever o titulo de transmissão,<br />

o aliénante con!inúa a ver iiavido como dono do iiwmovel, e responde<br />

pelos seus encargos. — 533.<br />

Art. 861 — Serão feitas as inscrições, ou transcripções no registro correspondente<br />

ao lugar onde estiver o vmmovel. — S31<br />

Art. 862 — Salvo convenção em contrario, incumbem ao adquirente as<br />

(6) 'Décret, n. 3453, art. 68 e seg. Zacarias, § 267.<br />

(7) Zacariœ § 267.<br />

(S) Décret, n. 3453, art. 235, Zacariie, S 267.<br />

(9) Décret, art. 105 § 106 e 10S.<br />

(10) Décret, art. 107 e 10S.


DAS COUSAS 4-87'<br />

despezas de transoripção dos títulos de transmissão de propriedade c ao devedor<br />

as da inscripção, ou transcripsão dos onus reaes.<br />

§ 226 —Actos preparatórios da inscripção.<br />

A publicidade, no systema do nosso Direito, requer como<br />

condição a especialidade da hypotheca (10).<br />

A inscripção, pois, instrumento pelo qual se réalisa a<br />

publicidade, deve reproduzir de necessidade os caracteres que de<br />

determinão a especialidade : — quantia certa e bens individuados<br />

(11).<br />

As hypothecas convencionaes trazem já em si os elementos<br />

da especialidade (12) ; a inscripção délias, pois, não offerece<br />

dificuldade.<br />

Mas as hypothecas legaes e a juridica. no momento em<br />

que se constituem, não affectão bens determinados. E nem sempre<br />

são certas e precisas as quantias que garantem (13).<br />

A inscripção, portanto, daquellas hypothecas não pôde<br />

ser consumtnada, sem que previamente se fixem as quantias garantidas<br />

e se especifiquem os immoveis sobre que têm de recahir.<br />

A fixação prévia da quantia e da designação dos immoveis<br />

se fazem mediante certas formalidades. O complexo dessas formalidades<br />

constitue o processo denominado — Especialisação (14).<br />

A especialisação. embora summaria e rápida, não é obra,<br />

para um dia. Assim bem podéra acontecer que a hypothecas que<br />

dependem de um tal processo viessem a ser preteridas por hypothecas<br />

convencionaes posteriores que fossem primeiro que ellas<br />

inscriptas (15). A lei. porem, fornece um remédio para evitar<br />

semelhante contingência. Esse remédio é a Vrenotação (16).<br />

(11) Lei n. 1237, art. 2 § 10, art. 4 e § 1. Troplong. II, n. 513: "La<br />

spécialité préparc l'inscription: l'inscription assure la publicité." Vej. acima<br />

§ 184.<br />

(12) Lei n. 1237, art. 3 § 11 art. 4, Décret, n. 3453, art. 121 § 1 e 2.<br />

(13) Vej. § 221 acima.<br />

(14) Vej. § 187 acima.<br />

(15) Lei n. 1237, art. 2 § 10, art. 3 § 10 e art. 9 § 27, Décret, n. 3453,<br />

art. 157-187.<br />

(16) Por exemplo: um exactor de fazenda, emquanto se faz a especialisação<br />

da hypotheca legal, a que é sujeito, constitue uma hypotheea convencional<br />

em immovel seu em favor de terceiro; esse terceiro inscreve a hy-


488 DIREITO<br />

§ 227 — Hypothecas sujeitas á inscripçâo ; hypo the cas<br />

dependentes da especialisação.<br />

1. São sujeitas á formalidade da inscripçâo, sob pena de<br />

não valerem contra terceiros :<br />

a) As hypothecas convencionaes (17).<br />

b) A hypotheca judiciaria (18);<br />

c) As hypothecas legaes (19), excepto :<br />

I A das mulheres casadas,<br />

II. A dos menores e interditos (21).<br />

2. Carecem de ser especialisadas para que possão ser<br />

inscriptas, a judiciaria e as legaes que dependem de inscripçâo<br />

para valerem contra terceiros, a saber :<br />

A da fazenda publica, de províncias e municipalidades ;<br />

A das egrejas e corporações de mão-morta,<br />

A do co herdeiro,<br />

A do offendido.<br />

Estas hypothecas podem ser prenotadas (22).<br />

3. A lei, por considerações de justiça, exime da necessidade<br />

da inscripçâo as hypotheeas legaes da mulher casada,<br />

dos menores e interdictos (23) ; todavia no interesse de manter<br />

o regínien da publicidade, tanto quanto é possível, ordena<br />

que sejão inscriptas, com a declaração, porém, que a falta de<br />

inscripçâo não lhes suprime os effeítos contra terceiros (24).<br />

potheca antes de terminada a especialisação. A hypotheca convencional prevalecerá<br />

contra a da fazenda, salvo o remédio da prenotação, registro provisório,<br />

que retrahe os effeitos da inscripçâo á sua data, se a inscripçâo chega<br />

a ser conservada no prazo legal (30 dias). Vej. adiante § 230.<br />

(17) Lei n. 1237, art. 9 § 27, Décret, n. 3453, art. 144-156.<br />

(18) Lei n. 1.237. art. 9, Décret, n. 3.453, art. 119.<br />

(19) Dei, art. 3 § 12, Décret, art. 122.<br />

(20) Lei, art. 3 § 10, art. 9, Décret, art. 120 e 122.<br />

(21) Lei, art. 3, § 10, art. 9, Décret, art. 123.<br />

Hypothecas de menores, isto é:<br />

I, de onenores orphãos de pais (§ acima).<br />

IT, de filhos imenores pelo pecúlio adventkrio (§ aoima).<br />

Ill, de filhos menores do primeiro matrimônio pelos bens que o pai de<br />

mài binuba herda de filhos daquelle matrimônio (§ acima).<br />

(22) Lei, art. 3 e 9.<br />

(23) Lei, art. 9 § 27. Décret, art. 144.<br />

(24) Lei, art. 2 § 10, art. 3 § 10 e 11, art. 9, Décret, art. 123.


DAS COUHAS 489<br />

As ditas hypotheeas conservão a sua natureza de geraes e portanto,<br />

para inscrevel-as não ha mister especialisal-os (25). E<br />

porque produzem os seus ef feitos desde a data da sua constituição,<br />

dispensão aprenotação (26).<br />

Nada obstante, é permittido aos responsáveis especialisal-as,<br />

ista é, restingil-as a sommas definidas e a bens determinados<br />

(27). A especialisação neste caso é motivada, não tanto<br />

pela necessidade de preparar elementos para a publicidade,<br />

como pelo interesse de deixar ao responsável o direito de dispor<br />

livremente dos immoveis que não são comprehendidos na especialisação.<br />

0 25) Artigos citados na .nota antecedente.<br />

(26) Loi, art. 3 § 11. Décret, art. 118, 123, 188 e 212.<br />

(27) Vej. Lei, art. 9 § 27, Décret, art. 144.<br />

(28) Lei, art. 9 § 11, Décret, art. 123, 157 e seg.


TITULO I<br />

PRENOTAÇÂO<br />

§ 227. a. — 0 que c a prenotaçâo (<br />

1. A prenotaçâo é a iuscripção provisi-fia das hypothecas<br />

que não podem ser inscriptas senão depois de especiali<br />

sadas (1).<br />

Provisória como é, ella vig"ora por urn prazo curto. Esse<br />

prazo é concedido para as diligencias da especialisação e conseqüente<br />

inscripção (2).<br />

2. A utilidade da prenotaçâo consiste na virtude de retrotrahir<br />

os effeitos da inscripção que se réalisa dentro do seu<br />

prazo, á data da constituição da hypotheca (3).<br />

3. A prenotaçâo é um favor que a lei concede ás pessoas<br />

a quem competem hypothecas que dependem da especialisação.<br />

Aquelle, pois, que deixa de requerel-a no prazo legal (4), renuncia^apenas<br />

a uma vantag-em, mas não perde o direito de a<br />

(1) Lei n. 1.237, art. 9 § 27, Décret, n. 3.453, art. 144.<br />

(2) Lei, cit. art. 27: "A's hypothecas legaes sujeitas á especialisação ''<br />

inscripção, assim como á judicial, será concedido um prazo razoável que não<br />

excederá de trinta dias, para verificação dos ditos autos.<br />

(3) Lei, art. 9, § 27, Décret, n. 1.237, art. 152 § I o e 2°.<br />

Em outros paizes subsiste a prenotaçâo sob o nome de registro provisório,<br />

não só para os títulos de transmissão de dominío e imposição de onus<br />

reaes, como para as hypothecas. Vej. a Lei de Hespanha, art. 42 a 46, a<br />

portugueza de 1 de Julho de 1863, art. 52 e segs. C. Civil Port. art. 966 e<br />

seg. Vej. também Troplong Privileg. e Hypotheq. introduet.<br />

(4) O prazo da prenotaçâo não pôde exceder de trinta dias, e começa<br />

a correr da data da constituição da hypotheca (Décret, art. 150). E', portanto,<br />

manifesto que, passado o dito prazo, já não é mais permitt'ido requerel-a.


DAS COUSAS 491<br />

todo tempo inscrever a sua hypotheca, uma vex que se apresente<br />

com os elementos necessários, isto 6, com a especialisação (5).<br />

§ 228.—Prazp da prenotação: a quem compete marcal-o,<br />

necessidade de prova da hypotheca.<br />

1. O prazo, dentro do qual vig-ora a prenotação. e que é<br />

concedido, como já se disse, para a especialisação e inscripção,<br />

não pôde exceder o máximo de trinta dias úteis, contados da<br />

data da constituição da hypotheca (6).<br />

2. Este prazo é em muitos casos, como o está demonstrando<br />

a experiência de todos os dias, insuficiente para nelle se<br />

consnmmarem as diligencias da especialisação. Como, por exemplo,<br />

especialisar em termo tão limitado a hypotheca do offendido,<br />

quanda a pronuncia, base da prenotação, se retarda por mezes e<br />

mezes (7) ? Como especialisar no mesmo prazo a hypotheca judicial,<br />

quando a sentença condemna em quantia que carece de ser<br />

liquidada na execução (8) ? K nos casos em que ha necessidade<br />

de se expedir precatória para comarca diversa, afim de se avaliarem<br />

os immoveis lá sitos (9) ?<br />

(5) Esta doutrina deriva lógica e necessariamente da natureza e fim<br />

da prenotação.<br />

A hypotheca legal do coherdeiro e a judical não carecem da especialilo<br />

em forma (Décret, arts. 223 e 224). O prazo da prenotação relativamente<br />

a estas hypothecas é dado para a obtenção do titulo necessário para<br />

a inscripção — formal de partilha o carta de sentença. Vej. Avizo n. GO de<br />

7 de P'evcrer de 1867, n. õ.<br />

(6) Lei n. 1.237, art. 9 § 27; Décret, n. 3.453. art. 144.<br />

Dias úteis: — quer dizer — que não se contão para o dito prazo os dias<br />

feriados. Makeldey, § 195 n. 1.<br />

(7) Vej. a nota 12 abaixo.<br />

(8) Vej. § acima 209.<br />

• 9) Vej. Décret, art. 179. Ainda mais, no processo de especialisação<br />

pôde se dar o caso de mais de uma avaliação (Décret, art. 173) e de mais de<br />

um recurso de aggravo (Décret, art. 174 § 2). Como vencer tudo îsto em<br />

trinta dias?<br />

Nos paizes onde vigora o registro provisório, as leis concedem prazo<br />

nunca inferior a um anno. Vej. a lei port, de 1 de Julho de 1863, art. 59,<br />

C. C. Port. art. 974, Loi de Hespanha, art.<br />

Consagrar a prenotação e estreital-a nos limites de trinta dias, vale o<br />

mesmo que escrevel-a na lei e recusar-lhe os meios de vida.


492 DIKKITO<br />

3. O prazo da prenotação é fixado dentro do máximo de<br />

trinta dias, pelo juiz de direito da comarca, onde são situados os<br />

immoveis sujeitos á liypotheca, a requerimento dos interessados<br />

ou dos seus representantes legaes (10).<br />

O prazo começa a correr da data da constituição da hypotheca,<br />

por exemplo, do dia em que foi perpetrado o delicto, se<br />

se trata da hypotheca legal do offendido (11). A data, na relação<br />

sujeita, é da maior importância pelos seus effeitos práticos:<br />

convém, pois, que seja definida d'uma maneira positiva e em<br />

ordem a excluir duvidas. E' essa a razão por que a lei quer que<br />

o juiz a declare no despacho da concessão do prazo (12).-<br />

4. Não pôde a prenotação ser effectuada sem a prova da<br />

existência da hypotheca. Em verdade a prenotação, pondo o responsável<br />

sob a ameaça de uma hypotheca de comprehensão<br />

indefinida, lhe affecta gravemente o credito: fora, pois, um<br />

perigo e uma injustiça deixar a pratica de um acto tal ao arbitrio<br />

de quem quer que ostentasse a pretenção de credor hypothecario.<br />

A lei, em conseqüência, requer que o pedido de concessão<br />

do prazo seja instruído com documento comprobatorio da hypotheca<br />

(13).<br />

Assim é mister exhibir: se se trata da hypotheca legal<br />

da fazenda publica, geral, provincial ou municipal, o titulo de<br />

nomeação do funccionarlo, ou certidão da nomeação ou do termo<br />

A preoceupação do nosso legislador não foi outra senão a de limitar ao<br />

menor espaço de tempo possível a situação, em que a prenotação colloca o<br />

responsável, tolhido no seu credito territorial, em quanto não se consumma a<br />

especialisação. Mas isso não o justifica: ou a prenotação era uma instituição<br />

util e então convinha adoptal-a seriamente, ou não valia o sacrifício; e paia<br />

que escrevel-a na. lei e tirar-lhe ao mesmo tempo os meios de vida pratica?<br />

(10) Décret, n. 3.453, art. 145. Se o? immoveis são situados em comarcas<br />

diversas? Parece que é competente para conceder o prazo o juiz de<br />

direito de qualquer das comarcas.<br />

(11) Lei n. 1.237, art. 9 § 27, Décret, n. 3.453, art. 150.<br />

(12) Décret, art. 151.<br />

(13) Décret, art. 146. Neste artigo vem uma remissão entre parentheses<br />

ao art. 136 § 2, 4 e 8. Ha manifesto equivoco na remissão aos §§ 2 e 4<br />

do dito art. 136; porquanto o § 2 trata da hypotheca legal dos filhos pelos<br />

bens adventicios, e o § 4 da hjnpotheca dos filhos do primeiro matrimônio<br />

sobre os immoveis do pai ou mãi binuba — hypothecas estas que nem são<br />

susceptíveis, nem carecem de prenotação. Vej. Lei, art. 9 § 27 e Décret,<br />

art. 144.


DAS COUSAS 493<br />

de fiança (14); se da hypotheca das igrejas e corporações de<br />

mão-morta, o titulo de nomeação ou certidão authentica (15); se<br />

de hypotheca do coherdeiro certidão do formal de partilha (16);<br />

se de hypotheca do offendido, certidão da pronuncia (17); se de<br />

hypotheca judicial, certidão da sentença condemnatoria (18).<br />

§ 229—Como se réalisa a prenotação.<br />

A prenotação se faz pela maneira seguinte:<br />

1. Exhibido o despacho do juiz e o documento da hypotheca,<br />

o official do registro consignará no protocollo (19), a nota<br />

de apresentação com a respectiva data e numero de ordem que<br />

competir (20).<br />

• 14) Décret, art. 146 e 136 § 7.<br />

(15) Décret, art. 146 e 136 § 7. Por exemplo: a provisão de fabriiiueiro,<br />

a procuração pela qual é nameado o «yndico, a certidão da acta da<br />

eleição dos mesarios, definidores, etc.<br />

C16) Décret, art. 146 e 136 § 9. Se o herdeiro já tem o formal de partilha,<br />

não carece da prenotação, porque o forma! por si só habilita para a<br />

inscripção. Décret, art. 223.<br />

(17) Décret, art. 146 e 136 § 8. Para a prenotação da hypotheca do offendido<br />

é preciso provar quem é o delinqüente. E a prova não pôde ser outra<br />

senão a da pronuncia, que alias só firma uma presurrvpção. Antes da pronuncia<br />

não ha declaração emanada do juiz, de quem seja o delinqüente, Se a prenotação<br />

só pôde ser feita á vista da sentença condemnatoria definitiva, então<br />

a prenotação da hypotheca do offendido é absolutamente impossível, porque<br />

é impossível que, dentro de trinta dias, a con tarda data do crime.se complete<br />

o summario, siga-se o julgamento e se esgotem os recursos legaes.<br />

E' de advertir que a hypotheca do offendido. prenotada e inseripta antes<br />

da condemnação passada em julgado, é contingente e só se tornará definitiva<br />

por essa condemnação.<br />

(18) Décret, art. 146 e art. 136 § 10. Vej. Av. n. 60 de 17 de Fev.<br />

de 1867, n. 5. Se o exequente pôde obter carta de sentença dentro dos trinta<br />

dias. não haverá necessidade da prenotação, porque a carta de sentença habilita<br />

para a inscripção. Vej. Décret, art. 224.<br />

(19) A lei n. 1237 (art. *9 (§ 27) dispunha que a prenotação fosse tomada<br />

em livro especi'ilj o Décret, n. 3453, porém, fazendo do protocollo a<br />

chave e o centro do registro (art. 25) prescreve que nelle se facão as prenotações<br />

(art. 26 e 148). Esta modificação no plano da lei teve por causa a<br />

necessidade de simplíf.car o registro, e é uma conseqüência do systema<br />

adoptado de constituir o protocollo o regulador do numero de ordem, isto é,<br />

da prioridade.<br />

(20) Décret, n. 3453, art. 148.


494 D IRRITO<br />

Esta nota o official a deve reproduzir com as ditas cláusulas<br />

no documento da hypotheca (21).<br />

No espaço do protocollo reservado para as annotações (22<br />

é de obrigação do official explicar a sig-nificação daquella nota,<br />

isto é, declarar que ella importa a prenotação da hypotheca<br />

constante do documento apresentado, certificando ao mesmo<br />

tempo qual o prazo concedido e o dia em que começou a<br />

correr (23).<br />

O despacho e o documento íicão archivados no registro<br />

(24).<br />

2. Se dentro do prazo da prenotação. o credor apresentar<br />

o documento da especialisação, ou o documento que a suppre<br />

(25), realisar-se-ha então a inscripção no livro competente (26).<br />

Disto lavrará o official no protocollo, na mesma columna das<br />

annotações, a competente nota, referindo expressamente o numero<br />

da inscripção e a folha do livro (27).<br />

Se, porém, o prazo se findar sem que se faça a inscripção,<br />

o official, a requerimento da parte interessada, escreverá<br />

a respectiva declaração abaixo da nota da prenotação (28).<br />

E' de advertir, que, ainda quando a parte não requeira<br />

cancellamento da prenotação, ella ficará ipso jure sem effeito<br />

desde que a inscripção não fôr realisada dentro do prazo (29)<br />

(21) Décret, oit. art. 148.<br />

(22) Vej. Décret, art. 13, n. 1", art. 24 e 25.<br />

• (23) Décret, art. 153: "Na columna das annotações do protocollo, o<br />

official do registro lançará a nota seguinte:<br />

'"Prenotação durante o prazo (tal) que corre do dia tal, marcado pelo<br />

juiz de direito, por despacho de tal data, o qual despacho com o requerimento<br />

respectivo fica por mim archivado." Data e assignatura.<br />

(24) Décret, cit. art. 153.<br />

(25) Formal de partilha ou carta de sentença; Décret, art. 223 e 224.<br />

(26) Décret, art. 155. A inscripção se faz como de ordinário, isto é, de<br />

conformidade com os arts. 45 e seg. Vej. § 242 e seg. adiante.<br />

(27) Décret, art. 57 § I o . Sempre que se faz a inscripção, é necessário<br />

dar disso noticia no protocollo.<br />

(28) Décret, art. 154.<br />

(29) O prazo é improrogavel: findo elle, não é mais admissível a inscripção.<br />

Vej. Av. n. 60 de 7 de fev. de 1867, n. 1.


£>AS COÜSÀS 4^5<br />

§ 230, —Effeitos da prenoíação<br />

1. Sea inscripção se consumma dentro do prazo concedido,<br />

o numero de ordem, sob o qual se fez no protocollo a<br />

prenotação, se torna definitivo e como tal determina a prioridade<br />

da hypotheca (30).<br />

A inscripção, no dito caso, retrotrahe os seus effeitos á<br />

data da constituição da hypotheca e a hypotheca prenotada e<br />

inscripta prevalece contra todas as hypothecas que forão posteriormente<br />

apresentadas embora houvessem sido inscriptas antes (31).<br />

E' nisto que está a virtude e a efficacia da prenotação.<br />

2. Mas, se se finda o prazo e a hypotheca prenotada não<br />

é inscripta, a prenotação se reputa annullada por força do decreto<br />

da lei, e sem effeito o numero de ordem que se lhe dera no<br />

protocollo (32).<br />

Assim que : se a mesma hypotheca fôr mais tarde trazida<br />

a registro, como é permittido, tomará no protocollo um novo<br />

numero de ordem, segundo pela data da nova apresentação lhe<br />

competir (33),<br />

(30) Décret, n. 3453, art. 152 S 1".<br />

(31) Lei, arc. 9 § 27 Décret, art. 152 ,§ 1 e 2.<br />

A lei n. 1237 (art. 9 § 27) prohibia formalmente a inscripção de outra?<br />

hypothecas do mesmo devedor durante o prazo da prenotação: — prohibiçâo<br />

inutil, porque a inscripção dessas hypothecas jamais poderia prejudicar a<br />

hypotheca prenotada, segundo o próprio systema da lei. O Décret, n. 3453<br />

admittio a possibilidade da inscripção de taes hypothecas. Se por um lado a<br />

prohibiçâo era inutil, quanto á hypotheca prenotada, por outro lado trazia<br />

difficuldades praticas pelo que respeita a inscripção das que se apresentavão<br />

dentro do prazo da prenotação: Como determinar o numero que se lhes devia<br />

dar no protocollo? O Av. n. 60 de 7 de fev. de 1867, n. 4, confirma a doutrina<br />

do Décret, n. 3453.<br />

Xão deixa de ser curiosissimo este systema de corrigir os erros da Jei por<br />

via de regulamentos do poder executivo!<br />

(32) Décret, n. 3453, art. 149 e 154.<br />

(33) Décret, art. 108 e Av. n. 60 de 7 de Fev. de 1867, n. 2.


TITULO IL<br />

KSPECJAUSAÇÃO.<br />

§ 231.—Em que. consiste a cspecialisacão.<br />

As hypothecas iegaes, com excepção da do coherdeiro,<br />

são em sua origem geraes. Não recahem, no momento em que nascem,<br />

em bens individuaes, nem garantem obrigações que representem<br />

sempre quantia certa e liquida (1).<br />

Mas a inscripção, no systema do nosso Direito, presuppõe<br />

quantia precisa e bens determinados (2).<br />

E' mister, portanto, converter as hypothecas legaes que<br />

dependem essencialmente da inscripção em hypothecas especiaes,<br />

para que possão ser inscriptas.<br />

A especialisação é o processo por via do qual se obtém<br />

aquella conversão (3).<br />

Tem a especialisação por fim:<br />

a) Reduzir a responsabilidade garantida pela hypotheca<br />

a valor monetário, certo e determinado;<br />

(1) A hypotheca do coherdeiro nasce, por assim dizer, especialisada: a<br />

quantia da torna e o immovel sobre o 'qual recahe a hypotheca, ificão determinados<br />

pelo acto constitutivo da hypotheca — a partilha. As demais hypothecas<br />

legaes, porém, como a do menor, do interdicto, do offendido, no momento<br />

em que se constituem, não abrangem bens determinados, nem a esse<br />

tempo é sabido o valor das obrigações dos responsáveis.<br />

A hypotheca da mulher casada e a da fazenda publica, quando constituída<br />

pelo termo de fiança, têm quantia certa, mas também não comprehendem<br />

bens determinados.<br />

(2) Vej. acima § 226.<br />

(3) Vej. Décret, n. 3457, art. 157-187.


Í5ÁS CÒÜSÂS 49?<br />

b) Individuar e estimar o immovel ou immoveís sobre os<br />

quaes tem de recahir a h_vpotheca (4).<br />

As formalidades e diligencias que a lei prescreve para a<br />

especialisação, são todas calculadas naquelle sentido.<br />

A especialisação se faz em juizo, mediante formulas sumin<br />

aria s (5).<br />

W permittido especialisar as hypothecas legaes dos menores,<br />

interdictos e mulheres casadas, embora possão ser inscriptas<br />

com o caracter de geraes (6).<br />

§ 231. a. Qual o jui% competente para a especialisação?<br />

Por quem pôde ser requerida ?<br />

A.) A competência do juiz para a especialisação é determinada<br />

pela qualidade da pessoa, a quem pertence a hypotheca.<br />

A lei quer que a especialisação corra perante o juiz á quem particularmente<br />

incumbe a protecção das pessoas e direitos daquelles<br />

em cujo favor loi creada a hypotheca (7).<br />

Assim compete :<br />

1. Ao juiz de orphãos a especialisação da hypotheca legal<br />

dos menores e interdictos (8)<br />

2- Ao juiz dos feitos da fazenda a especialisação da hypotheca<br />

da fazenda publica-geral, das províncias e municipalidades<br />

(9).<br />

(4) Décret, art. 162 en. 1 e 2.<br />

1,5) A especialisação, segundo o C. C. Portuguez (art. 909) é simpiieiseima.<br />

Eis a sua disposição a respeito: As hyipothecas legaes podem ser registradas<br />

em relação a todos os bens do devedor; pôde, porém, o dsvedor<br />

exigir que o registro se limite aos bens necessários para o cumprimento da<br />

ação, e tem a faculdade de designar os que para isso quizer.<br />

(ir. Décret, art. 123 e 188-217.<br />

(") Vej. Décret, n. 3453, art. 157.<br />

(8) Décret, n. 3453, art. 157 § I o .<br />

( Q ) Décret, cit. art. 157 § 2. para requerer a especialisação da hypotheca<br />

legal da fazenda nacional forão designados por Avis, m 402 de 12 de<br />

Setembro de 1865 os procuradores dos feitos de fazenda e seus agentes.<br />

Xão havia razão para submetter a especialisação da hypotheca das municipalidades<br />

ao juízo dos feitos. As câmaras nas questões de Direito Privado<br />

estão sujeitas ao juízo commum. E accreece que havendo para cada província<br />

um só juiz dos feitos, residente na capital, torna-se difficil e dispen-


498 DlkiîlTO<br />

3. Ao juiz da provedoria a da hypotheca da igreja e corporações<br />

de mão-morta (10).<br />

4. Ao juiz do cível a hypotheca das mulheres casadas e a<br />

dos offendidos (11).<br />

B.) A tarefa de requerer e promover a especialísação, a<br />

lei ou a deixa ao cuidado dos interessados, ou a impõe como obrigação<br />

a certos funccionarios, se á hypotheca se prende um interesse<br />

de ordem publica.<br />

Nestes termos:<br />

1. São competentes para requerer a especialisação da<br />

hj-potheca leg-al da mulher casada, menores e interdictos:<br />

a) os responsáveis, isto é, tutores, curadores, pais e maridos<br />

(12);<br />

b) Os adquirentes dos immoveis pertencentes aos responsáveis,<br />

quando por ventura queirão remil-os (13).<br />

As ditas hypothecas, como já disse, não carecem le ser<br />

especiaJisadas para que sejão inscriptas, nem de serem inscriptas<br />

para que valhão contra terceiros (14). A especialisação, pois, só<br />

é util aos responsáveis e aos adquirentes; aos responsáveis, porque<br />

restring-e a hypotheca a immoveis determinados, deixandolhes<br />

livres os outros (15), aos adquirentes, porque lhes permitte<br />

a remissão (16). E pois que são os únicos interessados e de sua<br />

neglig-encia nenhum prejuizo pôde resultar ás pessoas investidas<br />

de taes hypothecas, a lei lhes confia a especialisação.<br />

2. A obrigação de especialisar a hypotheca da fazenda<br />

geral, provincial e municipalidades, incumbe aos responsáveis,aos<br />

seus fiadores (17), e particularmente aos empregados que forem<br />

para isso designados (18)<br />

diosa a especialisação das hypothecas das municipalidades de lugares distantes.<br />

Esta diffieuldade annulla de facto a hypotheca legal das municipalidades.<br />

(10) Décret, an. 157 S 3.<br />

(11) Décret, art. 157 § 4.<br />

(12) Décret, art. 158 § 1.<br />

(13) Décret, art. 158 § 2. Vej. Dei n. 1237 art. 10 S 11, Décret, art. 304.<br />

(14) Dei n. 1237, art. 3 § 11 e art. 9, Décret, art. 123.<br />

(15) Vej. §.<br />

(16) Vej. § 262 adiante.<br />

(17) Décret, art. 159 § 1.<br />

(18) Décret, art. 159 § 2, 3 e 4


DAS eOUSÁb<br />

Estas hypothecas são daquellas que não prevalecem contra<br />

terceiros sem inscripção. E como garantem directamenre interesses<br />

públicos, a lei estabelece providencias para que sejão especialisadas<br />

e inscriptas quando os responsáveis se hajão a respeito<br />

com negligencia.<br />

3. A especialísação da hvpotheca da igreja e corporações<br />

de mão-morta deve ser requerida:<br />

a) pelos responsáveis;<br />

b) pelos procuradores que para esse fim ellas constituírem:<br />

c) pelo promotor de capellas (19).<br />

A intervenção obrigada do promotor de capellas representa<br />

a acção do Estado, conigindo com a sua vigilância a omissão<br />

dos responsáveis e das proprias corporações (20)<br />

4. A hypotheca do offendido tem um caracter meramente<br />

particular; o cuidado, pois, da sua especialísação é deixado á livre<br />

vontade dos responsáveis e das pessoas a quem ella pertence<br />

(2i).<br />

Se o offendido fôr o Estado, a província, as municipalidades,<br />

a igreja, as corptfrações de mão-morta, os menores, interdictos<br />

ou as mulheres casadas,a especialísação deve ser promovida<br />

pelos seus representantes legaes (22).<br />

5. A hypotheca legal do herdeiro e a judicial não carecem<br />

de especialísação em fôrma (23). A do coherdeiro tem sempre<br />

quantia determinada—a torna, e recahe necessariamente no immovel<br />

quinhoado ao coherdeiro reponente (24). A do exequente<br />

traz a quantia precisada na sentença, e grava os immoveis que<br />

forem designados nos extractos (25).<br />

(19) Décret, art. 160.<br />

(20) O Estado intervém porque a igreja e as corporações de mão-morta<br />

Rão equiparados a menores. Vej. acima § 204.<br />

(21) Décret, art. 161.<br />

(22) Os representantes das ditas entidades, como são os procuradores<br />

dos feitos, collectores, tutores, maridos, syndicos, .são por lei obrigados a<br />

promover as medidas conservatórias dos direito.-; daquellas pessoas, entre as<br />

quaes figura a da especialísação das "hypothecas legaes pelais obrigações exdelicto.<br />

(23) Décret, art. 223 e 224.<br />

(24) Lei n. 1237, art. 3 § S, Décret, cit. art. 223.<br />

(25) Décret, art. 224. Se a sentença condemna em quantia illiquida?<br />

Vej. § acima 209.<br />

j j


SOÔ D t REI TO<br />

§ 232.—Aihitrameiito da responsabilidade: designação e avaliação dos<br />

immoveis.<br />

1. A designação do immovel ou immoveis que a hypotheca<br />

tem de gravar, é um direito de quem requer a especialisacão<br />

(26).<br />

2. O arbitramento da quantia pela qual deve ser especiasada<br />

a hypotheca, e a avaliação dos immove's que forem designados,<br />

se fazem por louvados nomeados pelo juiz a aprazimento das<br />

partes (27).<br />

A parte que requer a especialisacão é obrigada a declarar,<br />

segundo a sua estimativa, a importância da responsabilidade<br />

e o valor dos immoveis nomeados, instruindo a petição com o documento<br />

demonstrativo do seu calculo e com a relação de outros<br />

immoveis que porventura o responsável possua, além dos<br />

designados (28).<br />

3. O montante da responsabilidade e o valor dos immoveis<br />

devem ser fixados segundo as regras de Direito.<br />

Assim no arbitramento da importância da h}'potheca dos<br />

menores, interdictos e corporações de mão morta se tomarão em<br />

consideração, não só o valor dos bens como o total dos rendimentos<br />

que se hão de vencer até o termo da tutela, curatela, ou<br />

administração dos responsáveis. (29)<br />

Não entrão, porém, no calculo os immoveis. Não podem<br />

elles ser extraviados ou consumidos; a sua permanência oíferece<br />

uma garantia igual á da hypotheca (30)-<br />

A importância da responsabilidade do criminoso se arbitra<br />

segundo as regras da satisfação do damno causado (31).<br />

(26) Décret, n. 3457, art. 162.<br />

E' de notar que a especialisacão deve ser requerida com os documentos<br />

que comprovão a existência da hypotheca. Vej. § 228 acima.<br />

(27) Décret, art. 164. A nomeação dos arbitradores se faz em audiência.<br />

Se ha immoveis sitos em comarca diversa, se avalião por precatória.<br />

Décret, art. 179.<br />

(28) Décret, art. 162 e 163. A relação dos immoveis, além dos designados,<br />

é para o caso de occorrer algumas das hypotheses previstas nos<br />

arts. 173, 177 e 178.<br />

(29) Décret, art. 167.<br />

(30) Décret, art. 168. Este artigo allude tão somente á hypotheca legal<br />

das mulheres casadas, menores e interdictos. Não ha razão para excluir da<br />

citada disposição os immoveis da igreja e corporações de mão-morta.<br />

(31) Décret, art. 169, Cod. Crim. art. 21 e seg. Vej. acima § 205.


DAS COTISAS Sol<br />

A . Dispensão o arbitramento da responsabilidade:<br />

a) A hypotheca da mulher casada, porque a estimativa<br />

deve constar da convenção antenupcial (32);<br />

b) A. hypotheca legal da fazenda publica, quando constituída<br />

pelo termo de fiança, no qual já vem fixada a importância<br />

da responsabilidade (33).<br />

Dispensão o arbitramento da responsabilidade e a avaliação<br />

de immoveis:<br />

A hypotheca do coherdeiro (34).<br />

A hypotheca do exequeute (35).<br />

§ 233.—Julgamento da especililisação por sentença.<br />

1. Arbitrada a importância da responsabilidade e avaliados<br />

os immoveis, serão ouvidas a respeito as partes (36).<br />

E'-lhes permittido allegar o que lhes oceorrer:<br />

a) Sobre a estimação da responsabilidade, arguindo-a de<br />

diminuta ou exagerada.<br />

b) Sobre a qualidade dos bens e suas sufficiencias, como<br />

se são livres ou gravados de onus reaes, de valor inferior ou superior<br />

á importância da obrigação ;<br />

c) Sobre a avaliação que pôde ser errônea, ou por baixa<br />

ou por alta (37).<br />

2. Satisfeita esta formalidade, o juiz decidirá como fôr<br />

de justiça (38).<br />

Se julgar procedente a especialisação, mandará proceder<br />

á inscripção da hypotheca, declarando no texto da sentença a<br />

(32) Décret. 165. Mas se o dote não é estimado, será' admissível o arbitramento?<br />

(Parece que sjm. E é naturalmente este o caso á que allude o<br />

art. 167, quando applica ao arbitramento da responsabilidade pela hypotheca<br />

da mulher casada as regras que estabelece; aliás estaria em manifesta contradicção<br />

com o citado art. 165. Vej. acima l§ 188.<br />

(33) Décret, art. 166. Se o funecionario não estiver sujeito A fiança, ha<br />

lugar o arbitramento.<br />

(34) Décret, art. 223.<br />

(35) Décret, art. 224.<br />

(36) Décret, n. 3453, art. 170. Concede-se para o dito fim a cada uma<br />

das partes o prazo de quarenta e oito horas. Cit. art. 170.<br />

(37) Décret, art. 170 §§ I o , 2" e 3 o .<br />

(38) Décret, art. 171, 176, 177 e 178.


êoi btkUità<br />

importância da responsabilidade e os immoveis sujeitos, por<br />

sua denominação, sitio e característicos (39).<br />

3. Pôde o juiz deixar de homologar o arbitramento e a<br />

avaliação dos louvados, e corrigil-os, se entender que assim o requer<br />

a justiça (40),<br />

Do despacho qre homologa ou corrige o arbitramento e a<br />

avaliação, cabe o recurso de aggravo (41).<br />

4. Se o juiz. homologando ou corrigindo o arbitramento<br />

e a avaliação, se convencer que os bens designados nao são livres<br />

ou sufficientes, e tem o responsável outros bens além dos nomeados,<br />

mandará que sejão estes avaliados (42).<br />

üu despacho que julga os bens designados não livres ou<br />

não sufficientes, compete igualmente o recurso de aggravo (43).<br />

5. A especialisacão será julgada procedente, quando nomolog-ando<br />

ou corrigindo o arbitramento e avaliação, entender o<br />

juiz que os ininioveis são livres e sufficientes, para garantir a responsabilidade<br />

(44).<br />

6. Se os immoveis avaliados, ou não são livres, ou não<br />

são sufficientes, a sentença pôde variar de conclusão, segundo a<br />

hypothèse occorrente, a saber :<br />

a) Se os immoveis designados não são ou livres ou sufficientes,<br />

e o responsável tem outros immoveis, serão estes avaliados,<br />

e se reunirem as qualificações legaes, nelles será especialisada<br />

a hypotheca (45) ;<br />

b) Se, porém,, são livres, mas insufficientes os immoveis<br />

designados, e o responsável não tem outros immoveis, a especialisacão<br />

será julgada procedente, reduzindo o juiz a importância<br />

da hypotheca ao valor dos bens dados (46), salvo se se trata da<br />

(31) Décret, art. 171, 172 e 176.<br />

(40) Décret, art. 171.<br />

(41) Décret, art. 174 § I o . E' a sentença que homologa a especiansaefío<br />

r.a hypothèse do arc. 171.<br />

(42) Décret, art. 173. Neste caso o juiz não julga ainda a especialisacão,<br />

mas manda proceder a uma nova diligencia.<br />

(43) Décret, art. 174 § 2°. O aggravo não suspende a diligencia da nova<br />

avaliação. Décret, art. 175.<br />

(44) Décret, art. 171.<br />

(45) Décret, art. 173 e 176.<br />

(46) Décret, art. 178. A redu^ção do valor da hypotheca ao valor do<br />

immovcl, no caso figurado, não tem razão de ser. Era melhor deixar a hypo-


DAS COUSAS Ò03<br />

hypotheca legal das mulheres casadas, menores e interdictos,<br />

casos estes em que a especialisação será julgada improcedente<br />

(47).<br />

c) Se os bens designados não forem do responsável (48)<br />

ou estiverem sujeitos a onus que tornem a hypotheca in util (49),<br />

e o responsável não tiver outros immoveis, a especialisação será<br />

julgada improcedente (50).<br />

7. A sentença de especialisação devidamente extrahida,<br />

constitue o titulo com o qual se requer a inscripção da hypotheca<br />

especialisada (51).<br />

üieca subsistir por toda a divida sobre o immovel de valor insuffíciente do<br />

que reduzir a hypotheca ao valor do immovel. Vigorando a doutrina do Decreto,<br />

a hypotheca só subsiste pelo valor dado ao immovel na avaliação; o<br />

dono da hypotheca portanto será. havido como chirographario, mesmo em relação<br />

ao immovel especialisado, pela divida na parte que exceder ao valor a<br />

que a hypotheca foi reduzida, se esse immovel augmentar de valor, como se<br />

for melhorado, se nelle se fizerem edificações. O direito de preferencia,<br />

como é sabido, não pôde aproveitar á divida na parte, em que deixou<br />

de ser hypothecaria.<br />

O citado artigo 178 diz no final: "Salvo os privilégios sobre os outros<br />

bens do devedor (lei, art. 5 § 2) não susceptíveis de hypotheca." Estas palavras<br />

alludem ao caso de ter o credor da hypotheca legal algum dos privilegio»<br />

que a lei deixou subsistir: em tal caso o privilegio continua a vigorar,<br />

ainda dada a reducção de que se trata.<br />

(47) Décret, art. 177.<br />

A razão é clara: A hypotheca das mulheres casadas, menores e interdietotó,<br />

valem sem inscripção contra terceiros, sobre todos os immoveis do responsável;<br />

mas uma vez especialisadas e inscriptas só affectam os bens<br />

designados. Se, portanto, os immoveis especiaiisados são insufficientes, seria<br />

sacrificar o direito daquellas pessoas especialisar a hypotheca em taes immo­<br />

Yi s ■ — perderião a garantia geral de todos os immoveis que os responsáveis<br />

de futuro adquirissem pela garantia especial de bens insufficientes.<br />

(48) Se forem de terceiros, não podem ser hypothecados (§ 216 acima)<br />

salvo consentimento do dono, caso em que a hypotheca seria convencional.<br />

(49) Como se estivessem sujeitos a hypothecas anteriormente inscriptas,<br />

a usofrueto etc.<br />

(50) Neste caso a especialisação é impossível, porque o responsável não<br />

tem immoveis sobre os quaes possa recahir a hypotheca.<br />

(51) Décret, art. 220.


504 DIREITO<br />

§ 234.— Particularidades da cspecialisação da<br />

bypotheca legal da mulher casada.<br />

1. No contractu antenupcial pôde o marido especificar<br />

os immoveis seus sobre os quaes deve recahir a hypotheca leg-al<br />

da mulher.<br />

Parece que esta designação por si só era sufficiente para<br />

communicar á hypotheca o caracter de especial, e dest'arte autorisar<br />

a inscripção, independentemente de mais formalidades,<br />

como se pratica com a hypotheca convencional (52).<br />

Todavia a lei sujeita a hypotheca na h} r potese figurada á<br />

necessidade da especialisação, dispensando no entanto o arbitramento<br />

e a avaliação (53).<br />

Km vista da escriptura antenupcial, donde consta o dote<br />

estimado e os immoveis desig-nados, e mediante requerimento<br />

(54), o jui/i julgfa a hypotheca especialisada e manda proceder á<br />

inscripção, declarando na sentença o valor da responsabilidade<br />

e individuando os immoveis (55).<br />

2. Pôde bem acontecer que o valor dos immoveis mencionados<br />

na escriptura antenupcial sejão excessivamente superiores<br />

a estimação do dote : — o que se converte em manifesto prejuizo<br />

do marido, cujo credito soffre diminuição desnecessária, e dos<br />

credores, a cujo pag-amento seria inutilmente subtrahido o valor<br />

que excede á responsabilidade hypothecaria do marido. Occorrendo<br />

o alludido caso, é permittido ao marido e a seus credores impugnarem<br />

a especialisação, feita pela fôrma dita, dos immoveis desig-nados<br />

na escriptura antinupcial, e requerer que a especialisação<br />

se faça com as suas solemnidades reg-ulares, isto e, com arbitramento<br />

e avaliação (56).<br />

(52) Vej. o art. 2.140 e 2.142 do C. C. francoz, Troplong II, n. 637 e III<br />

n. 712. Cujario, sobre a C. de rei uxor. C. Ubi conventionale est hypotheca,<br />

super vacua est legitima.<br />

(53) Décret, n. 3.457, art. 182 e 183.<br />

(54) A especialisação deve ser requerida pelo marido.<br />

(55) Décret, art. 183.<br />

(56) Décret, art. 184. Depois de especialisada e inscripta a hypotheca<br />

legal da mulher casada, poderá o marido requerer a reducção quanto aos immoveis?<br />

Não. A hypotheca legal, depois de especialisada e inscripta, é regulada<br />

pelos princípios relativos á hypotheca convencional ou especial. Décret,<br />

art. 185. Ora, a redução de immoveis sujeitos a hypothecas especiaes, é pro-<br />

V


DAS COUSAS 505<br />

§ 235. — Effeitos da especialisação.<br />

As hypothecas legaes, depois de especialisadas e inscriptas<br />

(57), se transformão em hypothecas especiaes, e como taes,<br />

quanto a seus effeitos, ficão sujeitas aos princípios de direito<br />

que regem as hypothecas convencionaes (58).<br />

Desta doutrina resultão os corollarios seguintes :<br />

1. As ditas hypothecas, especialisadas e inscriptas, só<br />

g-ravão os immoveis designados.<br />

2. Os responsáveis dispõem livremente dos immoveis que<br />

não forão comprehendidos na especialisação.<br />

3. Os immoveis especialisados podem ser remidos pelos<br />

terceiros adquirentes (59).<br />

4. Tornando-se os ditos immoveis insufficientes para garantir<br />

a responsabilidade, é licito aos credores pedir reforço da<br />

hypotheca (60).<br />

Para o reforço, a designação se faz segundo o processo<br />

regular da especialisação (61).<br />

hifoida, salvo convindo o credor: art. 240 § I o . B a mulher casada não pôde<br />

convir nisso. Vej. acima '§ 191.<br />

(57) Não é preciso dizer que a especialisação, não sendo seguida da inscripyão,<br />

não produz effeito algum.<br />

(58) Décret, n. 3453, art. 185.<br />

(59) Lei n. 1237, art. 10 s 11, Décret, art. 304.<br />

(60) Décret, art. 186.<br />

(61) 'Décret, art. 187.


TITULO III<br />

INSCRIPÇXo.<br />

§ 23b. —Pessoas que tem qualidades para requererem a<br />

in script; à o.<br />

1. A inscripção, em regra, é deixada ao cuidado do credor<br />

hypothecario. Tal é a disposição acerca da hypotheca convencional<br />

e de algumas das legaes (1). Negocio de interesse particular,<br />

a lei a confia á vigilância do interessado.<br />

Ha, porém, hypothecas, de cuja inscripção a lei faz um<br />

dever. Estas hypothecas são :<br />

1. As geraes, isto é, as das mulheres casadas, menores e<br />

interdictos (2).<br />

II. As hypothecas estabelecidas em favor da cousa publica<br />

e de certas pessoas incapazes (3).<br />

A citada disposição, pelo que respeita ás hypothecas g-eraes,<br />

tem por motivo o pensamento de salvar o principio da publicidade<br />

da indifferença das partes (4) : quanto ás segundas, c<br />

determinada pela necessidade de resguardar os interesses de pessoas,<br />

a quem o Estado deve protecção. attenta a incapacidade ou<br />

impossibilidade de exercerem por si os seus direitos (5).<br />

2. .r_ bem da ordem e da clareza, podem ser divididas<br />

em duas classes as pessoas que têm qualidade para requererem<br />

a inscripção, a saber :<br />

(1) Vej. § 239 adiante.<br />

(2) Vej. § 237 c 238 adiante.<br />

(3) Hypothecas da fazenda publica; hypothecas da igreja e corporações<br />

de mão-morta. Vej. § 239 adiante.<br />

(4) Vej. § 238.<br />

(5) Vej. § 187 acima.


DAS COUSAS 507<br />

a) Pessoas que têm qualidade para requererem a inscripção<br />

das hypothecas geraes.<br />

b) Pessoas que têm qualidade para requererem a inscripção<br />

das hypothecas especiaes ou especialisadas.<br />

I. INSCRIPÇÃO DAS HYPOTHECAS GERAES.<br />

§ 237. - Pessoas que têm qualidade para requererem a inscripção da hypotheca<br />

legal da mulher casada.<br />

E' obrigação do marido inscrever a hypotheca leg"al da<br />

mulher dentro do prazo de oito dias a contar da constituição da<br />

mesma hypotheca (6), isto é :<br />

a) da data do casamento, quando a incommunicabilidade<br />

resulta de convenção ante-nupcial (7) ;<br />

b) da data da acquisição ou do dia em que ella se torna<br />

exigivel, se se trata de bens deixados ou doados na constância<br />

do matrimônio com a clausula — de não —-• communhão (8).<br />

No intuito de assegurar a inscripção, a lei estabelece as<br />

prescripções seguintes :<br />

1. Õ tabellião, em cujas notas se lavrar escriptura de<br />

pacto ante-nupcial ou de doação, exclusivos da communhão, bem<br />

como o escrivão da provedoria que'registrar testamento contendo<br />

herança ou legado incommunicaveis em favor de mulher casada,<br />

deverão^ sob pena de responsabilidade criminal, notificar o marido<br />

para fazer inscrever a respectiva hypotheca (9).<br />

2. Se o marido não faz a inscripção no dito prazo de oito<br />

dias, o pai, qualquer parente da mulher casada ou o doador,<br />

são autorisados, a requerel-a (10).<br />

3 No caso de herança ou leg-ado com a clausula de incom­<br />

municaveis, se a hypotheca não for inscripta dentro de três me­<br />

te) Décret. 3453, art. 188 e 189.<br />

(7) Décret, art. 189: "oito dias depois de constituída a hypotheca da<br />

mulher casada'' e art. 136 § 5.<br />

(8) IDecret. art. 189 e art. 136 § 6.<br />

(9) Décret, art. 190. O tabellião ou escrivão deve certificar á margem<br />

da nota ou registro a notificação.<br />

(10) Décret, art. 189. São autorisados, mas não obrigados. Po-derá requerer<br />

a inscripção um. estranho? Em França se entende que não, e bem, por<br />

uma razão de decoro. Pont II, n. 845.


508 DIREITO<br />

zes depois de rigistrado o testamento, é obrig-ado a inscrevel-a<br />

o testamenteiro (11).<br />

4. A lei vai além e chama ainda a intervenção e a vigilância<br />

dos magistrados encarregados da administração da justiça.<br />

Assim incumbe :<br />

a) Ao juiz da provedoria — ordenar a notificação do marido<br />

para a inscripeão da hypotheca por herança ou legado incommunicaveis,<br />

se o escrivão for negligente em cumprir o seu<br />

dever (12) ,<br />

b) Ao juiz de direito em correição — examinar se os escrivães<br />

da provedoria fazem as notificações, responsabilisandoos<br />

pelas faltas (13) ; e — constranger, sob pena de desobediência,<br />

a requerer a inscripção aos maridos que, tendo sido notificados,<br />

deixarão de fazel-a (14).<br />

5. Para tornar effectiva a execução das providencias expostas,<br />

a lei estabelece diversas saneções, a saber :<br />

I. Os juizes, escrivães, e tabelliães que não cumprirem os<br />

seus deveres relativos á inscripção das hypothecas leg-aes das<br />

mulheres casadas serão criminalmente responsáveis e ficão obrigados<br />

a satisfazer o damno causado (15).<br />

II. O testamenteiro que não requerer a inscripção nos<br />

casos em que é obrig-ado, perderá o direito á vintena (16).<br />

(11) Décret, ant. 191.<br />

(12) Décret, art. 192. Pôde o juiz punir correocionalmente o escrivão,<br />

ijire for achaldo em falta.<br />

(13) Décret, art. 193.<br />

(14) Décret, art. 194. O citado art. diz: "constrangerá o marido" mas<br />

não especifica, o meio. Fica, pois, o caso sujeito á regra geral — imposição<br />

da pena de desobediência.<br />

(15) Lei n. 1237, art. 9 § 21. Décret, art. 197.<br />

Não pôde haver damno causado em relação á mulher casada porque a sua<br />

hypotheca legal vale contra terceiros, não obstante a falta de inscripção.<br />

O damno só pôde oceorrer em relação a terceiros que, ignorando a existência<br />

da hypotheca por não haver sido inscripta, comprassem immoveis do marido<br />

ou aceitassem hypotheca sobro elles.<br />

(16) Décret, art. 19õ. O art. 9 >§ 22 da lei diz: "perderá em favor das<br />

partes lesadas a vintena." O cit. art. 195 declara que o testamenteiro perderá<br />

a vintena em favor da mulher casada.<br />

A falta de inscripção, como se observou em a nota precedente, não lesa,<br />

nem pôde lesar a mulher.


DAS COÜSAS S09<br />

%<br />

E sem constar da itiscripção, a testamentaria não será<br />

julgada cumprida (17).<br />

III. O marido que alienar alg-um ou todos os seus immoveis<br />

não estando inscripta a hypotheca legal da mulher, se presume<br />

proceder com fraude e fica sujeito ás penas de estellionato<br />

salvo se declarar ao adquirente a existência da dita hypotheca<br />

(18).<br />

Constituem elementos substanciaes do estellionato no<br />

caso sujeito, presupposta a alienação :<br />

I o O facto de não estar a hypotheca inscripta :<br />

2 o A não — revelação da existência da hypotheca ao adquirente<br />

(19).<br />

(17) Décret, art. 196.<br />

(18) Dei n. 1237, art. 9 § 22, Décret, art. 198.<br />

Deve a declaração da responsabilidade que tem pelo dote ou doação, ser<br />

expressa? Se o marido se limitar a dizer 'que é casado por convenção antenupcial<br />

exclusiva da comimunhão, será sufificiente esta declaração para excluir<br />

a presumpção da fraude?<br />

A lei requer evidentemente uma declaração expressa: trata-se da boa fé<br />

de terceiro e essa boa fé pôde ser facilimente 'illudida por palavras, cuja significação<br />

só esteja ao alcance de quem é entendido em Direito. Vej. Pont II,<br />

n. 854.<br />

A presumpção de fraude, resultante da falta de declaração da hypotheca,<br />

admitte prova em contrario? Não, se a prova 'for deduzida de ignorância ou<br />

erro de direito; sim, se fôr deduzida de erro acerca de facto, que se tivesse<br />

existido, importaria a extinccão da hypotheca, como se o marido acreditava a<br />

mulher .morta, e se se tivesse aberto o seu testamento, no quail elle fosse instituído<br />

herdeiro.<br />

(19) Lei n. 1237, art. 9 § 22: ficão sujeitos ás penas de estellionato pela<br />

omissão da inscripção, verificada a fraude, Décret, art. 198:... fica pela<br />

omissão da inscripção sujeito ás penas de estellionato. .. se no caso de alienação...<br />

não declarar a responsabilidade..."<br />

O Decreto diz "no caso de alienação."' Nestas palavras estará também<br />

oomprehendida a hypotheca constituída pelo marido? Certamente que sim:<br />

1", porque a hypotheca é uma espécie de alienação; 2 o , porque imilita maior<br />

razão, quanto á hypotheca. Certamente no caso- de alienação o adquirente<br />

cem meio de resguardar-se da fraude, recorrendo á remissão; mas no caso de<br />

hypotheca o prejuízo é inevitável.<br />

O art. 1238 do Cod. Civil franc, allude tão .somente ao caso de hypotheca<br />

Cs escriptores francezas, visto como a hypotheca é .menos comprehensiva do<br />

que a alienação, e tem o adquirente contra a fraude o alvitre da remissão, entendem<br />

que o citado art. 1236 não inclue o caso de alienação. Duranton XX,<br />

n. 42, Pont II, n. 849.


510 DIKÜ1TO<br />

ê<br />

Na falta de um daqúelles elementos, a alienação deixa<br />

de revestir a natureza de estellionato.<br />

Assim :<br />

Se a hypotheca se acha inscripta, cessa a razão de fraude<br />

excluída pela publicidade do registro (20).<br />

Se a hypotheca não está inscripta, mas o marido declara<br />

ao adquirente o onus hypothecario do immovel, cessa igualmente<br />

a razão da fraude, incompatível com a sciencia da hypotheca<br />

preexistente (21).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 838 — Compete aos interessados, exhibindo o traslado da escriptura,<br />

requerer a inscripção da hypotheca, incumbindo especialmente «promover a<br />

da legal, ás pessoas determinadas nos artigos seguintes. — 843, 845.<br />

Art. 839 — Incumbe ao marido, ou ao pae, requerer a inscripção e espe-<br />

.vkilisação da hypotheca legal da inulher casada. — 827, I.<br />

5 I o — O official publico que lavrar a escriptura de dote, ou lançar cm<br />

nota a relação dos bens particulares da mulher, communical-o-á ex-officio ao<br />

official do registro de immoveis.<br />

§2° — Consideram-se interessados em requerer a inscripção des Ia hypotheca,<br />

no caso de não o fazer o marido ou o pae, o dotaãor, a propria' mulher<br />

e qualquer dos seus parentes suecessiveis.<br />

§ 238.—B.) Pessoas com qualidade para requererem a inscripção da<br />

hypotheca legal dos menores e interdictos<br />

No mesmo intuito de asseg'urar a publicidade da hypotheca<br />

legal dos menores e interdictos, pelo que vai nisso de interesse<br />

a terceiros (22), a lei estabelece uma combinação de prescripções<br />

análogas ás que ficão expostas acerca da inscripção da<br />

hypotheca legal da mulher casada.<br />

Assim que:<br />

1. São por força da lei obrigados á inscrever a hypotheca<br />

legal dos menores e interdictos:<br />

(20) Lei, art. 9 § 21, "omissão da inscripção". Décret, art. 198; Pont II,<br />

n. 852.<br />

(21) Décret, art. 198: "Se não declarar a responsabilidade." Nemo<br />

videtur fraudare eos qui sciunt et consentiunt, fr. 145 D. R. J. Pont II,<br />

n. 856.<br />

(22) A lei recommenda a publicidade das ditas hypothecas tão somente<br />

por interesse de terceiros e não dos 'menores e interdictos, pois que aquellas<br />

hypothecas valem contra terceiros, ainda que não estejão insexiptas.


Í)AS COÜSÂÍ3 511<br />

a) O tutor e o curador, oito dias depois de assignado o<br />

termo de tutela ou curatela, ainda mesmo antes de entrarem no<br />

exercicio de suas íuncções; (23)<br />

b) O pai ou mãi, oito dias depois de constituida a hypotheca(24).<br />

No caso de omissão do tutor, curador, pai ou mãi, são<br />

auctori^ados a inscrevel-a os parentes do menor ou interdicto<br />

(25).<br />

c) O testamenteiro, se dentro de três mezes a contar do<br />

registro do testamento, em que é deixada herança ou legado a<br />

menor ou interdicto, a respectiva hypotheca não tiver sido inscripta(26).<br />

'A. A lei impõe a certos ofnciaes, revestidos de caracter<br />

publico, o dever de cooperarem para a inscripção, por via de<br />

diligencias consentaneas coin a indole de suas funcções. Estas<br />

diligencias se resumem nas seguintes:<br />

O escrivão de órfãos, quando lavrar termo de tutela, curatela<br />

ou de juramento de cabeça de casal, deve notificar o tutor,<br />

curador ou pai para fazer a inscripção da. hypotheca resultante<br />

(27).<br />

O tabellião, em cuja nota se passar escriptura de doação<br />

em favor de menor ou interdicto, bem como o escrivão da provedoria<br />

que registar testamento contendo herança ou legado a<br />

algum daquelles incapazes, são obrigados a remetter ao escrivão<br />

de órfãos um certificado, no qual mencionarão:<br />

I. O nome e domicilio do doador ou testador:<br />

IT. O nome, filiação e domicilio do menor ou interdicto,<br />

III. O objecto doado ou legado.<br />

(23) Lei n. 1237, art. 9 i§ 17, Décret, art. 199 § I o .<br />

(24) Lei, art. 9 § 17, Décret, art. 199 § 2 o .<br />

(25) Lei n. 1237, art. 9 §>§ 13 e 18 e Décret, art. 200.<br />

Na redacção dos §§ 17 e 18 do art. 9 da lei n. 1237 ha manifesto equivoco.<br />

O >§ 17 diz "inscripção da hypotheca ão pai". O pai não tem hypotheca<br />

legal, mas sim o filho menor. O § 18 se exprime assim: "pôde ser requerida<br />

por qualquer parente do pai." E' o mesmo engano. A lei deveria ter dito<br />

"parente do menor".<br />

O Décret, n. 3453, art. 199, cormgio aquelles erros.<br />

(26) Lei. art. 9 § 12, Décret, art. 204.<br />

(27) Lei, art. 9 >§ 14, Décret. 201. O escrivão deve certificar a notificação<br />

á margem do termo do tutela, curatela ou do juramento do cabeça de casal.<br />

Décret, art. 201.


m blRËÏTÔ<br />

IV. A data da escriptura de doação ou da abertura do<br />

testamento (28).<br />

Uma vez de posse do certificado, o escrivão de órfãos o<br />

apresentará ao juiz para que nomeie tutor. No caso de já haver<br />

tutor ou curador nomeado, ou do menor ter pai vivo, juntará o<br />

dito certificado aos autos respectivos. So o menor tiver pai mas<br />

ainda não houver inventario, o escrivão autoará o certificado,<br />

o apresentará ao juiz e notificará o pai para a inscripcão<br />

(29).<br />

3. E' também chamada a intervenção dos magistrados<br />

encarregados da administração da justiça.<br />

Assim incumbe:<br />

Ao juiz da provedoria ordenar a remessa do certificado a<br />

carg-o do seu escrivão (30).<br />

Ao juiz de órfãos, logo que chegue ao seu conhecimento o<br />

certificado, dar tutor ou curador au menor ou interdicto, ordenar<br />

os notificações, e constranger o tutor, curador ou pai a fazer a<br />

inscripcão, sob pena de desobediência (31);<br />

Ao juiz de direito em correiçâo verificar se os juizes e<br />

officiaes incumbidos da incripção desempenharão os seus deveres,<br />

responsabilisaudo-os pelas faltas, e constranger os tutores,<br />

curadores e pais a fazel-a (32).<br />

4. O curador geral de órfãos tem também por obrigação<br />

promover a pratica das diligencias que são necessárias para a<br />

iuscripção, e tornal-a effectiva (33).<br />

5. A lei completa as disposições acima expostas com as<br />

sancções seguintes:<br />

a) Os juizes, curadores geraes e escrivães que faltarem<br />

aos seus deveres relativos á inscripcão ficarão sujeitos á responsabilidade<br />

civil ou criminal que no caso couber (34).<br />

b) As partilhas e as contas de tutela, curatela ou da testamentaria,<br />

sem constar da inscripcão, não serão julgadas por<br />

sentença (35).<br />

(28) Lei, art. 9 § 14, 'Décret, art. 202.<br />

(29) Décret, art. 203 e §§.<br />

(30) Lei, art. 9 § 14, Décret, art. 205.<br />

(31) Lei, art. 9 § 14, Décret, art. 206.<br />

(32) Lei, art. 9 § 14, Décret, art. 207.<br />

(33) Lei, art. 9 § 14, Décret, art. 208.<br />

(34) Lei, art. 9 § 21, Décret, art. 211.<br />

(35) Décret, art. 206 e 210.


t>Aâ CoüâÀs éi.3<br />

c) O testamenteiro que deixar de fazer a inscripção, nos<br />

casos em que é obrigado, perderá a vintena (3b);<br />

d) O tutor, curador ou o pai que alienar algum ou todos<br />

os immoveis seus, não estando inscripta a hypotheca legal do<br />

menor ou interdicto, se presume proceder com fraude e incorre<br />

nas penas de estellionato, salvo se declarar ao adquirente a existência<br />

da dita hypotheca (37).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 840 — Incumbe requerer a inscripção e especialização da hypotheca.<br />

legal dos incapazes:<br />

I — Ao pae, mãe, tutor, ou curador, antes de assumir a administração dos<br />

respectivos bens e, em falta ãaquelles, ao Ministério Publico.<br />

II — Ao inventoriante, ou ao testaimenteiro, antes de entregar o legado,<br />

ou a herança.<br />

Art. 841 — O escrivão do inventario, em se assignando termo de tutela,<br />

remetterá de officio, e com a possível brevidade, uma cópia délie ao official<br />

do registro de vmmoveis.<br />

Paragrapho único. Na inscripção desta hypothecs se considerará interessado<br />

qualquer parente successivel do incapaz.<br />

II. INSCRIPÇÃO DE HYPOTHECAS ESPECIAES OU<br />

ESPECIALISADAS.<br />

§ 239.—Pessoas que tem qualidade para requererem a inscripção a as<br />

hypothecas especiaes ou especialisadas.<br />

A.) A inscripção das hypothecas que dependem de uma<br />

tal formalidade para que valhão contra terceiros, deve ou pode<br />

ser requerida pelas pessoas que são competentes para promoverem<br />

a especialisação (38), a saber:<br />

1. A hypotheca legal do Estado, das províncias e muni-<br />

(36) Lei, art. 9 § 22, Décret, art. 209. O dito artigo 209 do Decreto, smquanto<br />

declara que o testamenteiro perderá vintena em favor dos menores e<br />

.nterdictos, interpreta o art. 9 § 22 da lei com a mesma infiâelidade que o artigo<br />

195. A falta de inscripção da hypotheca legal não pôde lezar os menores<br />

e os interdictos, visto como as ditas hypothecas valem contra terceiros, emt>ora<br />

não estejão inscriptas. Vej. § 237, nota 11.<br />

(37) Lei, art. 9 § 22, Décret. 212. Tem perfeita applicação ao caso a<br />

doutrina relativa ao estellionato commetido pelo marido. Vej. acima § 237.<br />

n. 5, III, notas 13, 14, 15 e 16.<br />

(38) Décret, n. 3.457, art. 233.


SÍ4 ÍJIRK1TO<br />

cipios, pelos responsáveis, seus fiadores, ou pelo empregado que<br />

for designado para essa tarefa (39);<br />

2. A da egreja e corporações de mão-morta, pelos respon-,<br />

saveis, pelos procuradores nomeados para esse fim ou pelo promotor<br />

de capellas (40)<br />

3. A do offendido pelos responsáveis, ou pelo próprio olfendido<br />

(41).<br />

4. A judicial pelo exequente (42).<br />

Jncorrem nas penas de estellionato os responsáveis da<br />

fazenda publica e os responsáveis por administração e guarda dos<br />

bens de corporações de mão-morta, que por fraude deixarem de<br />

inscrever as respectivas hypothecas (43).<br />

B.) Para a inscripção das hypothecas convencionaes a<br />

lei abre aos interessados todas as facilidades:<br />

I. O direito de requerer a inscripção das hypotliecas convencionaes,<br />

como é de razão, pertence particularmente ao credor,<br />

o qual o exerce por si ou por procurador, ou por pessoa que compareça<br />

por parte delle, embora não exhiba procuração (44).<br />

No caso de cessão, de morte ou incapacidade do credor,<br />

podem requerer a inscripção aquelles que legalmente o representão,<br />

a saber:<br />

1. Os cessionários, os herdeiros ou legatarios (45).<br />

(39) Lei n. 1.237, art. 9 § 20. Décret, arts. 233 e 158.<br />

(40) Lei, art. 9 § 16, Décret, arts. 233 e 160.<br />

(41) Lei, art. 9 § 15, Décret, arts. 233 e 161. A lei (cit. art. 9 S 15)<br />

incumbio a inscripção da- hypotheca do offendido ao promotor publico, ao escrivão<br />

e ao juiz do processo e execução e ao juiz de direito em eorreição.<br />

O Décret, n. 3.453 deixou estas entidades no li'in'bo do esquecimento (arLs.<br />

233 e 161), e com razão: a hypotheca entende com a reparação do damno<br />

causado — eousa de mero interesse privado com que nada tem a ver a justiça<br />

publica.<br />

(42) Décret, art. 233 e 224.<br />

(43) Lei, art. 9 § 22. Assim se o responsável da fazenda publica, depois<br />

de nomeado ou de entrar em exercício e antes de inscrever a hypotheca,<br />

vende ou hypotheca immoveis seus, e depois é achado em- alcance e não pôde<br />

satisfazel-o, incorre manifestamente nas penas do estellionato. Se o responsável<br />

satisfaz o alcance, não ha estellionato, porque em tal caso não se realiza<br />

a obtenção do alheio.<br />

(44) Lei, art. 9 § 7, Décret, art. 234 §'§ I o e 3 o .<br />

(45) Lei, art. 9 § 7, Décret, art. 234 § 3 o : "As pessoas que os représentât<br />

" Pont. II, n. 931, Morton. Ill, n. 1.052.


AS COÜSÀS SIS<br />

2. O curador fiscal e os administradores das massas faludas<br />

(46).<br />

3. Os curadores e tutores (se o credor é menor ou interdicto)(47).<br />

A fazenda publica pode ser credora por hypotheca convencional.<br />

Em tal caso a inscripção incumbe aos ag-entes encarregados<br />

da defeza e conservação de seus direitos (48).<br />

II. A lei consente que a inscripção da hypotheca convencional<br />

possa ser requerida:<br />

a). Pelos devedores e seus representantes (49).<br />

b). E por todas as pessoas que forem interessadas nisso,<br />

como são: —o credor do credor hypothecario (50); o senhor da<br />

núa propriedade, quando a hypotheca é em favor do usofructuario<br />

por quantia que faz objecto do uso-fructo (51); o fiador<br />

do devedor (52).<br />

(46) Décret, art. 234 § 3 o Cod. Coram, art. 834, e Reg. n. 738 de 20 de<br />

Nov. .de 1850, art. 156 e 157.<br />

O curador fiscal e os administradores das 'massas falida» são obrigados,<br />

segundo os citados artigos do Cod. Comim. e Reg. n. 738, a praticar todos<br />

os actos conservatórios dos direitos do failido. Assim, se lia uma hypotheca<br />

"stipulada em favor do failido e, quando ocem-i-e a fallencia, ella ainda não<br />

está inscripta, deve o curador fiscal fazel-a inscrever. Não é para se confundir<br />

esta hypotheca com a da inscripção da hypotheca constituída pelo devedor<br />

que falho. Vej. § 215 acima e Martou. III. ai. 1.043.<br />

(47) 'Décret, art. 234 §-3°. Os tutores e curadores são igualmente obrigados<br />

a ipromover as diligencias necessárias ipara conservar os direitos dos<br />

menores e interdietos. Se pois se estipula alguma hypotheca em favor de<br />

menor ou interdicto, como está acontecndo todos os dias, ao tutor ou curador<br />

cumpre inscrevel-a, sob pena de responsabilidade pelos damnos resultantes.<br />

Allude-se aqui á hypotheoas convencionaes em favor dos menores ou interdictos,<br />

e não ás legaes.<br />

(48) Vej. Dr. Perdigão Malheiro, Manual § 45.<br />

(49) Décret, art. 234 § 2" e 3 o . O devedor não tem interesse em inscrever<br />

a hypotheca; só o pôde fazer por lealdade.<br />

(50) Décret, art. 234 § 4". Martou. til, ai. 1.054.<br />

(51) Vej. acima § 110. W certo que o senhor da propriedade tem a garantia<br />

da caução de bene ittenão (§ 103 acima), mas essa garantia pôde não<br />

ser suff ioiente.<br />

(52) Muitas vezes o credor não se satisfaz com a hypotheca e exige ainda<br />

fiança. Nesta hypothèse é manifesto o interesse do fiador em requerer a<br />

inscripção: — a efifieacia da hypotheca lhe aproveita, pois >que, 'pelo menos,<br />

importará diminuição do seu prejuizo.<br />

34


£1«<br />

DIREITO<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 838 — Compete aos interessados, exhibinâo o traslado da escriptura,<br />

requerer a inscripção da hypotheca; incumbindo, especialmente promover a<br />

da legal ás pessoas determinadas nos artigos seguintes. — 843, 845.<br />

Art. 839 — Incumbe ao marido, ou ao pae, requerer a inscripção e especialisação<br />

da hypotheca legal da mulher casada. — 827, I.<br />

§ 1» — o official publico que lavrar a escriptura do dote, ou lançar em<br />

nota a relação dos bens particulares da mulher, communical-o-a éx-offic o<br />

ao official do registro de vmmoveis<br />

§ 2" — Consideram-se interessados em requerer a inscripção desta hypotheca,<br />

no caso de não o fazer o marido ou o pae, o dotador, a propria mulher<br />

e qualquer dos seus parentes successiveis..<br />

Art. 840 — Incumbe requerer a inscripção e especialisaçáo da hypotheca<br />

legal dos incapazes:<br />

1 — Ao pae, mãe, lut or, ou curador, antes de assumir a administração dos<br />

respectivos bens, e, em falta daquelles, ao Ministério Fublico.<br />

LI — Ao inventoriante, ou ao teslamenteiro, antes de entregar o legado,<br />

ou a herança.<br />

Art. 841 — O escrivão ão inventario, em se assignando termo de tutela,<br />

remetterã, de officio, e com a possível brevidade, uma cópia delle ao official<br />

do registro de invmoveis.<br />

i'aragrapho único. JSia inscripção desta hypotheca se considerará interessado<br />

qualquer parente suceessivel do incapaz.<br />

Art. 84;! — A inscripção da hypotheca legal ão offenãido compete, além<br />

deste:<br />

I — Be elle for incapaz, ao seu tutor, ou curador, para satisfação do estatuído<br />

no art. 827, n. VI.<br />

II — Ao Ministério Fublico, para o disposto no artigo 827, n. VII.<br />

Art. 843 — Os interessados na inscripção das referidas hypothccas podem<br />

pessoalmente promovel-a. ou solicitar a sua promoção official ao Ministério<br />

Publico.<br />

Art. 844 — A inscripção da hypotheca dos bens dos responsáveis para<br />

com a Fazenda Publica será requerida por elles mesmos, e, em sua falta,<br />

pelos procuradores e representantes fiscaes. — 827. V.<br />

Art. 845 — As pessoas a quem incumbir a inscripção e a especialisaçáo<br />

das hypothecas legaes, ficarão sujeitas a perdas e ãamnos pela omissão.<br />

§ 240. -Lugar em que deve ser feita a inscripção<br />

1. A inscripção, como já se disse, não tem outro fim senão<br />

fornecer, por via da publicidade, aos terceiros que por ventura<br />

hajão de entrar em relação de neg-ocio com o senhor do immo-


DAS COÜSAS ol7<br />

vel, informação certa e exacta acerca da existência dos onus hypothecarios<br />

que gravão o mesmo (53).<br />

E' de intuição que aquelle fim não podéra ser alcançado<br />

se fosse permittido fazer a inscripção em qualquer dos registros<br />

do Império (54).<br />

A lei, pois, marca com a devida precisão qual o lugar em<br />

que a inscripção deve ser tomada.<br />

2. Cada registro, como se sabe, corresponde á circumscripção<br />

territorial da nossa divisão judiciaria denominada—comarca<br />

(55). A competência do registro é determinada pela situação do<br />

immovel.<br />

A inscripção, portanto, deve ser feita no reg-istro da<br />

comarca , onde é situado o immovel hypothecado (56).<br />

O decreto da lei a este respeito é imperativo e absoluto<br />

dahi os corollarios seguintes:<br />

1.° A inscripção que é tomada em registro de comarca<br />

diversa da da situação do immovel, não tem validade, isto é, não<br />

produz effeito contra terceiros (57);<br />

2.° Os terceiros, por conseqüência, que são interessados<br />

em averiguar da existência dos onus hypotheearios sobre o immovel,<br />

não têm a consultar senão o registro da comarca onde é<br />

sito o immovel, única fonte leg'al de informação (58).<br />

3.° Se os irnmoveis hypothecados peio mesmo titulo são<br />

différentes e se achão situados em comarcas diversas, deve o<br />

titulo ser inscripto em cada uma dessas comarcas (59).<br />

Pode acontecer que o immovel hypothecado encerre em<br />

seu âmbito partes que penetrão em uma ou mais comarcas<br />

(53) Vej. acima § 173 e 225.<br />

(54) iNa verdade se a inscripção pudesse ser feita em qualquer dos registros<br />

do Império, os terceiros que quizessem saber «e existem onus hypothecarios<br />

sobre o immovel, terião de examinar todos os registros — o que, poi<br />

impossível, annullaria de facto a publicidade.<br />

(55) Lei, n. 1.237, art. 7 § I o e 3", Décret, n. 3.453, art. 1.<br />

(56) Lei, art. 7 § I o , Décret, art. 226.<br />

(57) R' uma conseqüência necessária do systeana da lei. Vej. Troplone<br />

III, n. 671 bis. Zachariœ § 268, Martou, III, n. 1.034, Pont IÏ, 867.<br />

(58) Não é mister dizer que o registro, quanto ás hyipobhecas geraes das<br />

mulheres casadas, menores e interdiotos, 'não pôde servir de fonte de informação,<br />

porque taes hypothecas não carecem da inscripção para valerem contra<br />

terceiros. A ausência da inscripção, quanto a estas hypothecas, não prova<br />

que ellas não existão.<br />

(59) Décret, art. 227.<br />

A


m DIREITO<br />

limitrophes. Neste caso a hypotheca será inscripta em cada um<br />

dos registros dessas comarcas (60),<br />

A inscripção, na hypothèse alludida, em uma só das comarcas,<br />

só dá valor á hypotheca contra terceiros na parte do<br />

immovel comprehendida nessa comarca: a hypotheca relativamente<br />

aos seguimentos de terreno em comarcas, em que não se fez<br />

a inscripção, se considera como não inscripta, e, portanto, despojada<br />

de vig-or contra terceiros (61).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 831 — Todas as hypothecas serão inscriptas no registro do logar do<br />

immovel, ou no de cada um délies, se o titulo se referir a diversos. — 848,<br />

S52, 856, IV, 861.<br />

Art. 832 — Para, a inscripção das hypothecas haverá em cada cartório do<br />

registro de imm oveis os livros necessários.<br />

Art. 833 — As inscripções e averoações, nos livros de hypothecas, seguirão<br />

a ordem, on que forem requeridas, verificando-se ella pela da sua numeração<br />

successiva no protocollo.<br />

Paragrapho único. O numero de ordem, determina a prioridade, e esta a<br />

preferencia entre as hypothecas. — 759, 847.<br />

Art. 852 — As hypothecas sobre as estradas de ferro serão inscriptas no<br />

município da estação inicial da respectiva linha.<br />

§ 241. — Tempo em que. a inscripção deve- ser feita.<br />

A regra dominante é que a inscripção só produz seus effeitos<br />

da data em que é tomada (62).<br />

D'ahi vem que em principio não ha prazo marcado para<br />

dentro delle se realisar a inscripção. O interesse da parte está<br />

em inscrever a hypotheca o mais cedo que lhe fôr possivel, por-<br />

(60) Décret, art. 228.<br />

(61) A resolução exposta resulta logicamente do fim e da necessidade da<br />

inscripção. Vej. Martou III, n. 1.035, Pont. II, n. 867.<br />

Nem a lei, nem o decreto definem o lugar onde devem ser inscriptas as<br />

hypothecas legaes não especialisadas das imulheres casadas, menores e interdictos.<br />

Essas 'hypothecas, emquanto não são especialisadas, conservão o caracter<br />

de geraes e portanto não affectão bens designados. Esta consideração<br />

deixa ver que a inscripção não produzirá o effeito desejado, senão sendo<br />

feita em todas as comarcas, onde o responsável possue immoveis. E assim se<br />

pratica em França. Pont II. n. 841.<br />

(62) Lei n. 1237, art. 9, Décret, n. 3457, art. 115 e 116,


DAS COUSAS 519<br />

que a preferencia é determinada pela prioridade, e o direito de<br />

sequela só produz effeito da data do registro em diante (63).<br />

Assim que: é permittido á parte inscrever validamente a<br />

hypotheca a todo tempo (64).<br />

Todavia ha pelo que respeita ao tempo particularidades que<br />

convém notar e são as seguintes:<br />

1. A inscripção, que é feita depois que o immovel sahio<br />

do domínio do devedor por titulo legfal, não vig­ora contra o titulo<br />

anteriormente transcripto (65).<br />

2. A inscripção das hypothecas legfaes que não podem ser<br />

inscriptas senão depois de especialisadas (66) deve ser consummada<br />

dentro do prazo da prenotação (67). A infracção<br />

deste preceito rouba á inscripção a virtude de retrotrahir­se á<br />

época da constituição daquellas hypothecas (68).<br />

3. As hypothecas legaes, que sem a inscripção não valem<br />

contra terceiros, e as convencionaes, não podem ser validamente<br />

inscriptas depois da sentença de abertura da fallencia do responsável<br />

ou devedor (69). Esta doutrina é uma conseqüência do<br />

principio que os direitos dos credores do fallido se reputão fixados,<br />

de uma maneira definitiva e inalterável, pela sentença que<br />

abre a fallencia (70).<br />

(63) Vej. § 173 e 225.<br />

(64) Desde que a lei não marca prazo para a inscripção e estabelece que<br />

os cffeitos delia se produzem da sua data em diante, a conseqüência é que a<br />

inscripção pôde ser tomada a qualquer tempo. Vej. Troplong, III, n. 647.<br />

Pont. II, n. 870.<br />

(65) Lei, art. 8, Décret, art. 256 e 259. Vej. aciona ■§ 48 e adiante § 257.<br />

(66) Lei, art. 9 § 27, Décret, art. 144. Vej. acima § 227.<br />

(67) Décret, art. 152 §■§ I o e 2°. Vej. aoima § 227 a.<br />

(68) Vej. § 2,>0 scima.<br />

69) Décret, ait. 134. Vej. Martou III. n. 1043 e 1045 bis. e .1 215<br />

acima, nota.<br />

(70) Delem, et le Poitvin, III, n. 263. Troplong. III, n. 649. Pont II,<br />

n. 871.<br />

Nesta disposição ha rigor excessivo. A inscripção é uma medida de conservação<br />

e não de acquisição de direitos. Seria, pois, de justiça permittir a<br />

inscripção depois da abertura da fallencia, uma vez que a 'hypotheca tivesse<br />

sido constituída de uma maneira legal. O dito rigor augmenta de intensidade<br />

em relação ás hypothecas legaes, a respeito das quaes é inadtmissivel a suspeita<br />

de fraude. Vej. Troplong, III. n. 653.


52Ô DIREITO<br />

§ 242 — Títulos em virtude dos quaes pôde ser requerida,<br />

a inscripção.<br />

A lei, por uma ra*;ão que é obvia, faü depender a inscripção<br />

da prova da hypotheca.<br />

A inscripção accusa a existência de onus hypothecarios<br />

sobre o immovel : o onus hypothecario diminue na proporção do<br />

seu valor o credito real do devedor; não seria, pois, de bom conselho<br />

deixar o credito alheio exposto ao capricho, á imprudência<br />

e á malig-nidade de terceiros (71).<br />

Km conseqüência a inscripção não pôde ser feita sem a<br />

exhibição do titulo ou documento, d'onde consta a constituição<br />

da hypotheca (72).<br />

A ) 1. Assim para a inscripção das hypothecas g-eraes (73)<br />

é mister apresentar o titulo da constituição délias ou o documento<br />

que attesta o facto de que derivão, a saber:<br />

a) Se a hypotheca é de mulher casada,—a escriptura<br />

antenupcial ea certidão do casamento ( 74 ) : — a escriptura de<br />

doação ou certidão de testamento, no caso de bens doados ou deixados<br />

com a clausula de incommunicaveis (75):<br />

b) Se é de orphãos ou interdictos — o termo de tutela ou<br />

curatela (76);<br />

c) Se é de filho menor contra o pai pela legitima materna,—a<br />

certidão de óbito da mãe ou do termo de juramento de<br />

cabeça de casal (77);<br />

d) Se de filho menor contra o pai por bens adventictos<br />

adquiridos de terceiros — o título ou a certidão do titulo de<br />

acquisição (78);<br />

e) Se de filhos menores do primeiro matrimônio contra o<br />

pai ou mãe binuba por bens herdados de filho do dito matri-<br />

(71) Vej. § 173 acima.<br />

(72) Décret, n. 3.457, art. 53 § I o , 214 § I o , 220.<br />

(73) Vej. § 237 e 238.<br />

(74) Décret, art. 214 § I o , 136 § 5.<br />

(75) Décret, art. 214 § I o , 136 § 6, 190 e 191.<br />

(76) Décret, art. 214 § I o , 136 § I o .<br />

(77) Décret, art. 214 § I o , 136 § 2 e 201.<br />

(78) Décret, art. 214 § I o , 136 § 3 e 202.


DAS COUSAS<br />

rnonio—a certidão das segundas nupcias e a do óbito do irmão<br />

fallecido (79).<br />

2. Para a inscripção das hypothecas legaes especialisadas<br />

deve a parte exhibir a sentença de especialisação (80). A dita sentença<br />

prova a hypotheca, pois que a especialisação não pôde ser<br />

consummada sem a demonstração da existência da hypotheca (81).<br />

3. Serve de titulo para a inscripção da hypotheea do coherdeiro<br />

o formal de partilha, e para a do exequente a respectiva<br />

carta de sentença (82).<br />

4. A inscripção das hypothecas convencionaes se faz á<br />

vista das escripturas pelas quaes são constituídas (S3).<br />

B) Ou a hypotheca seja convencional ou legal, não são<br />

admissíveis para a inscripção, senão títulos ou documentos legaes,<br />

isto é :<br />

1.° Instrumentos públicos (84).<br />

2.° Os escriptos particulares assignados pelas partes, reconhecidos<br />

pelos officiaes do registro e sellados, nos casos em que<br />

a lei permitte a prova por taes escriptos (85).<br />

3.° Os actos authenticos passados em paizes estrangeiros,<br />

legalisados pelos cônsules brasileiros e traduzidos na lingua<br />

nacional (86).<br />

C) O official do registro não deve fazer a inscripção, se<br />

não lhe é apresentado o titulo ou documento legal ; todavia se<br />

a inscripção é tomada, apezar de não haver sido exhibido o documento<br />

ou de não ter sido exhibido em devida forma, sem em-<br />

(79) Décret, art. 214 § I o , 136 § 4. A 'hypotheca data das segundas nupcias,<br />

se ao tempo em que se reaMsão, o filho do primeiro matrimônio já era<br />

fallecido; do fallecimento, se quando occorre, já existem as segundas nupcias<br />

Vej. acima i§ 202, n. 3.<br />

(80) Décret, art. 220.<br />

(81) Vej. § 231 e seg. acima.<br />

(82) Décret, art. 223 e 224.<br />

(83) Décret, art. 53 e 77, § I o e 135.<br />

(84) Décret, art. 77 § I o .<br />

(85) Décret, art. 77 1 2. Ha casos em que a hypotheca legal pôde resultar<br />

de escripto pasticular, como no de doação, dentro da taxa da lei, á menor<br />

ou á mulher casada com a clausula de incommunicabilidade; no de doação<br />

além da taxa, feita por mulher casada por contractu exclusivo da communhão.<br />

a seu filho menor, por antecipação da legitima de bens a ella pertencente e<br />

do que tem a livre administração.<br />

(86) Décret, art. 77 § 3. Taes são os actos contendo termos de tutela ou<br />

contractus antenupciaes passados no estrangeiro Vej. !§ X-94 e 200 acima.<br />

521


522 DIREITO<br />

bargo ella vale e produz todos os seus effeitos (87). E por uma<br />

razão decisiva :<br />

No systema da lei a publicidade da hypotheca resulta da<br />

inscripção tomada no registro e não da nota de registrado lançada<br />

no titulo ou documento da hypotheca, titulo ou documento<br />

que é entregue á parte e que não está sujeito ao exame de terceiros.<br />

A inscripção, portanto, lavrada no livro competente satisfaz<br />

plenamente o intuito da lei, réalisa em toda plenitude a<br />

publicidade e deve prevalecer, não obstante não ter sido apresentado<br />

o titulo ou documento, se a hypotheca foi legalmente<br />

constituida (88).<br />

§242. — Formalidades a preencher para se realisar a inscripção.<br />

A) Registro noprotocollo.<br />

1. O titulo da hypotheca, apresentado para a inscripção,<br />

é primeiro registrado no protocollo.<br />

Consiste o registro do protocollo em uma ementa contendo<br />

a declaração da apresentação do titulo, da data em que é<br />

feita, da qualidade do mesmo titulo e do numero de ordem que<br />

lhe compete (89).<br />

A data da apresentação e o numero de ordem se reproduzem<br />

no titulo (90).<br />

2. O numero de ordem, dado no protocollo ao titulo, exprime<br />

a data do registro e como tal firma a prioridade (91), ainda<br />

contra títulos que, sendo posteriormente apresentados, venhão<br />

por algum motivo legal a ser anteriormente inscriptos (92).<br />

(87) A lei não decreta nullidade, nem elia resulta da sua razão. Vej.<br />

Décret, art. 235.<br />

(88) Troplong 111, u. (>77. Zacharia? § 275 'nota 6. Pont II, n. 940.<br />

(89) Décret, n. 3453. art. 45 e 25. Vej. o modelo n. I annexo ao citado<br />

Decreto.<br />

(90) Décret, cit. art. 45. A data da apresentação e o numero de ordem<br />

se reproduzem no documento por esta fôrma:<br />

"N. 28, ipaig. 3 do protocollo. Apresentado no dia 27 de Junho de 1875<br />

das seis horas da imanhã ao meio dia. O official F. "<br />

(91) Lei n. 1237, art. 9 § 4, Décret, art. 46.<br />

(92) Décret, cit. art. 46. CNo caso da prenotaçao (Décret, art. 152) ou<br />

de duvida opposta pelo official (art. 69 a 74) pôde acontecer que as hypotheeas<br />

posteriormente apresentadas sejão inscriptas antes. Vej. § 230. Mas<br />

prevalece sempre o 'numero de ordem do protocollo.


DAS COOSAS 523<br />

Confere-se ao titulo o numero de ordem que immediatameiite<br />

se segue ao numero de ordem do ultimo titulo registrado<br />

(93).<br />

3. Pôde acontecer que se apresentem a registro dous ou<br />

mais titulo ao mesmo tempo.<br />

A locução «ao mesmo tempo» significa o espaço de tempo<br />

que vai das seis horas da manhã ao meio dia ; — e do meio dia<br />

ás seis da tarde : cada um destes dous espaços constitue a unidade<br />

que a lei indica pelas palavras — ao mesmo tempo (94).<br />

a) Os titulos de hypotheca que forem apresentados a registro<br />

ao mesmo tempo por pessoas diversas terão o mesmo numero<br />

de ordem, quer as hypothecas sejão relativas aos mesmos immoveis,<br />

quer a immoveis différentes (95).<br />

b) Mas se dous ou mais titulos forem apresentados pela<br />

mesma pessoa : I o . se se referem aos mesmos immoveis, receberão<br />

o mesmo numero addicionando-se-lhe na repetição uma letra<br />

segundo a ordem alphabetica (96) 2°, se disserem respeito a immoveis<br />

différentes terão números seguidos (97).<br />

4. O official do registro não tem competência para julgar<br />

da validade ou nullidade dos titulos apresentados para a inscripção.<br />

K', pois, obrigado a tomar no protocollo a nota de apresentação<br />

sob o numero de ordem que competir ao titulo (98).<br />

Feito o registro no dito livro, e assegurado cest'arte o numero<br />

de ordem (99), poderá recusar á inscripção, se duvidar da<br />

(93) Lei n. 1237, art. 9 § 4, Décret, art. 25 e 45.<br />

(94) Lei, art. 9 § 5, Décret. 48.<br />

(95) Lei, art. 9 § 5, Décret, art. 47. Parece que quando os titulos se<br />

referem a immov&is différentes, embora apresentados por pessoas diversas,<br />

não havia necessidade de se lhes dar o mivmo numero, porque é impossível<br />

o cunflicto de direitos. Mas pôde haver duvida na oceasião do registro se os<br />

immoveis são ou não différentes, e em tal caso o mais seguro é conferir-se aos<br />

titulos o mesmo numero de ordem.<br />

(96) Décret, art. 51. E' uma mera questão de clareza. O numero de<br />

ordem se repete desta maneira:<br />

IN. 221.<br />

N. 221 A.<br />

N. 221 B. Vej. o modelo n. I annexo ao Décret.<br />

(97) Décret, art. 50 e 51.<br />

(98) Décret, art. 68 a 74.<br />

(99) A nota de apresentação do titulo e o numero de ordem tomados no<br />

protocollo resguardão os direitos do credor e evitão os abusos, a que daria<br />

lugar a faculdade de suscitar ^duvidas, exercida com má fé..


524 DIREITO<br />

validade do titulo e nesse caso deve entreg-al-o á parte com a duvida<br />

escripta, fazendo no protocollo a devida annotação (100).<br />

Ao juiz de direito da comarca, a cujo conhecimento a<br />

parte levará a duvida, compete resolvel-a (101).<br />

Se a duvida é julgada improcedente, o official consummará<br />

a inscripção (102); se procedente, o official cancellará o registro<br />

á vista da certidão do despacho enviado pelo escrivão do<br />

juiz. (103).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 833 — As inscripções e averbações, nos livros de hypothecas, seguirão a<br />

ordem, em que j or em requeridas, verificando-se ella pela da sua numeração suecessiva<br />

no protocollo.<br />

Paragrapho único. O numero de ordem determina a prioridade, e esta a<br />

preferencia entre as hypothecas.<br />

Art. 834 — Quando o official tiver duvida sobre a legalidade da inscripção<br />

requerida, ãeclaral-a-á por escripto ao requerente depois de mencionar,<br />

cm fôrma deprenotação, o pedido no respectivo livro.<br />

Art. 835 — Se a duvida, dentro em trinta dias, for julgada improcedente,<br />

a inscripção far-se-á com o mesmo numero que teria na data da prenolação<br />

No caso contrario, desprezada esta, receberá a inscripção o numero correspondente<br />

á data, em que se tornar a requerer.<br />

Art. 836 — Não se inscreverão no mesmo dia duas hypothecas, ou um,a<br />

hypotheca e outro direito real, sobre o mesmo im/movel, em favor de pessoas<br />

diversas, salvo determinando-se precisamente a hora, em que se lavrou cada<br />

uma das escripturas.<br />

Art. 837 — Quando, antes de inscripta a primeira, se apresentar ao official<br />

do registro, para inscrever, segunda hypotheca, sobrestará elle na inscripção<br />

desta, depois de a prenotar, até trinta dias, aguardando que o interessado<br />

inscreva primeiro a precedente.<br />

§ 243. — B) — Inscripção no livro competente.<br />

Registrado o titulo da hypotheca no protocollo, seguemse<br />

os actos da inscripção.<br />

(100) Décret, art. 69 e 70.<br />

(101) Décret, art. 71.<br />

(102) Décret, art. 73. Devo o official declarar na columna das annotações<br />

que a duvida foi julgada improcedente por despacho do juiz, mencionando<br />

a data.<br />

(103) Décret, art. 72. O cancellamento se faz pela competente declaração<br />

na columna das annotacoes. Vej. modelo n. I, annexo ao Decreto.


DAÍ COUSAS 525<br />

1. A inscripção se faz no livro para ella destinado (104),<br />

á vista do titulo, já registrado no protocollo, e do extracto do<br />

mesmo titulo (105).<br />

Se o titulo é escripto particular, nos casos em que a lei o<br />

admitte, deve a parte apresentar dous do mesmo theor (106).<br />

2. O extracto é um resumo, em separado, das forças do<br />

titulo e deve de necessidade conter as declarações que constituem<br />

as cláusulas obrigadas da inscripção (107). Exhibem-se dous de<br />

igual theor, ambos assignados pela parte ou por seu advogado<br />

ou procurador (103).<br />

Cumpre que os extractos sejão conformes entre si e que<br />

encerrem com fidelidade os elementos da inscripção.<br />

E' da obrigação do official coiiferil-os entre si e com o<br />

titulo (109). Se são errados ou insufficientes, o official, fazendo a<br />

inscripção, pelo titulo emendará os erros e supprirá as omissões<br />

(110). '<br />

3. Consiste a inscripção em trasladar para o livro competente<br />

as cláusulas que. segundo a lei a constituem (111), e que<br />

devem constar dos extractos, supprindo-se-lhe as omissões com o<br />

titulo (112).<br />

(104) Décret, n. 3.457, art. 26 e 27. Para a inscripção


52e DIREITO<br />

4. Feita a inscripção, accusa-se a sua realisação no protocoilo<br />

onde já se acha notada a apresentação do titulo consignando-se<br />

sob a rubrica—annotações—a competente observação<br />

(113), a qual deve ser reproduzida no titulo (114).<br />

Se a inscripção é de hypotheca prenotada e se verifica no<br />

prazo legal (115), o numero de ordem da prenotação será transportado<br />

para a sentença de especialisação que serve de titulo<br />

para a inscripção (116).<br />

5. Consummada pela maneira exposta a inscripção, e numeradas<br />

e rubricadas as tolhas dos extractos, o official entregará<br />

á, parte o titulo e um dos extractos, e archivará o outro, com um<br />

dos títulos quando exhibidos em dobro (117).<br />

6. Se a hypotheca é das geraes que não são constituídas<br />

por títulos, mas por factos que se provão com documentos, as<br />

notas que se escrevem no titulo constatando a apresentação e a<br />

copia que retém em seu poder; se porém o erro ou omissão não estão no extracto,<br />

mas somente na inscripção, a responsabilidade é do conservador e a<br />

parte tem a prova no extracto que se lhe restituiu. (Vej. Troplong III, n. 678<br />

e 695 Pont. II n. 946 e 947 Marton III, n. 1.060.)<br />

No nosso système, iporém, os extractos não são a fonte legal da inscripção:<br />

o official deve conferil-os com o titulo e pelo titulo suprir-lhes as<br />

omissões (Décret, art. 98 § 2, art. 55 e 56). Portanto os extractos não abrevião<br />

nem facilitam a tarefa do official, ao contrario augtnentão-lhe o trabaího,<br />

pois tem de examinar titulo e extractos e de conferil-os. JE desde 'que os<br />

extractos não são a fonte obrigada da inscripção, desde que o official deve<br />

supprir-lhe as omissões pelo titulo, o erro ou a omissão da inscripção serão<br />

sempre filhos da culpa ou negligencia do official, porque se os extractos erão<br />

imperfeitos, á elle cumpria emendar os erros ou supprir as omissões com o titulo,<br />

e por conseqüência não havia também razão para duplicar os extrades.<br />

Para que, pois, os extractos no nosso systema? Para facilitar trabalho?<br />

Não, porque ao contrario augmentão-no. Para mostrar de quem é o erro ou<br />

omissão na inscripção? Também não, porque a culpa do erro ou da omissão<br />

é sempre do official, fossem ou não suffieientes os extractos. Para certificar<br />

que a inscripção se fez? Ainda não, porque no próprio titulo se fazem as<br />

notas de apresentação e inscripção.<br />

(113) Décret, art. 57 § 1". A nota aliudida é assim: "Registrado no livro<br />

da inscripção especial (ou geral) numero tal, pagina tal.<br />

Vej. modelo n. I, annexo ao Decreto.<br />

(114) Décret, art. 58.<br />

(115) Vej. Décret, art. 149 e 152 e o § 230 acima.<br />

(116) Décret, art. 221.<br />

(117) Décret, art. 58 e 59.


DAS COUSÂS s27<br />

inscripção (118), serão lançadas no extracto que se entreg­a á<br />

parte, archivando­se o outro extracto com os documentos offerecidos<br />

(119).<br />

7. Quando a hypotheca é constituída em um só titulo e o<br />

immovel ou immoveis são situados na mesma comarca, basta<br />

uma só inscripção (120), ainda quando occorra alg­uma das hypotheses<br />

seguintes:<br />

1'? A de serem différentes os créditos g­arantidos:<br />

2 a . A de um o credor e mais d'uni os devedores;<br />

3? A de ser um o devedor e mais d'um os credores;<br />

4? A de serem mais d'um os credores e os devedores<br />

(121).<br />

Nestes dous últimos casos, como são mais d um os credores,<br />

bastará uma só inscripção, se todos os credores collectivamente<br />

a requererem. Não havendo accordo para este fim, cada<br />

credor promoverá a sua inscripção (122).<br />

8. Se sobre o mesmo immovel houver já outra hypotheca<br />

inscripta, o official deve mencionar na coiumna das averbações<br />

do protocollo o numero de ordem da hypotheca anterior, e certificar<br />

no titulo que a hypotheca delle constante é a segunda ou<br />

terceira, referindo ao mesmo tempo o numero ou números de ordem<br />

das hypothecas anteriores (123).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 837 — Quando, antes de inscripta a primeira, se apresentar ao official<br />

do registro para inscrever segunda hypotheca, solirestará elle na inscripção<br />

desta, depois de a prenotar, até trinta dias, aguardando que o interessado<br />

inscreva primeiro a precedente.<br />

(118) Décret, art. 45 e 58.<br />

(119) Décret, art. 215.<br />

(120) Décret, arc. 226.<br />

(121) Martou, III, n. 1063 e 1065. Pont II, n. 951 e seg. E' esta a doutrina<br />

franceza, e nem na lei nem no Decreto ha disposição alguma que a.<br />

exclua.<br />

(122) A doutrina exposta é uma conseqüência do principio de que a inscripção<br />

só pôde ser requerida pelo credor, seu representante, ou por quem<br />

tiver interesse em que ella se faça, em nenhum dos quaes casos se achão, uns<br />

para com os outros, os credores pelo mesmo titulo. O interesse de cada um é<br />

inscrever a hypotheca na sua parte.<br />

■Se a diváda fôr indivisa, isto é, por partas não definidas na escriptura?<br />

Parece que a inscripção requerida por um só dos credores aproveita a todos.<br />

(123) Décret, art. 225. A presoripção deste artigo não tem utilidade ai­


528 DIREITO<br />

§ 244.—C.) Cláusulas ou requisitos da inscripção.<br />

A inscripção, instrumento da publicidade, deve conter as<br />

informações que são necessárias para esclarecer os terceiros<br />

acercada responsabilidade hypothecaria do devedor (124).<br />

Em todo o rigor três são as indicações necessárias para<br />

se conseguir aquelle resultado: I a a do immovel hypothecado, 2 a<br />

a do nome do devedor, 3 a . a da quantia garantida (125).<br />

Todavia a nossa lei, imitando a legislação dos povos civílisados,<br />

além daquellas, exige outras, que sem serem determinadas<br />

por uma necessidade lógica, são no entanto úteis.<br />

As enunciações ou requisitos varião segundo a inscripção<br />

é de b} r potliecas especiaes e especialisadas ou de hypothecas geraes<br />

(126).<br />

I. São requisitos ou cláusulas obrigadas da inscripção da<br />

hypotheca especial ou especialisada:<br />

1. «O numero de ordem», isto é, o numero que lhe compete<br />

no livro da inscripção. Não se deve confundir este numero<br />

de ordem com o numero de ordem do protocollo (127).<br />

2. «A data em que é feita a inscripção» (128). Este requisito<br />

e o antecedente não são substanciaes. O numero de ordem<br />

da inscripção e a data não têm effeitos práticos. A prioridade,<br />

como se sabe, é determinada pelo numero de ordem do protocollo<br />

e pela datada apresentação (129).<br />

3. «O nome, o domicilio e profissão do credor» (130):—<br />

requisito essencial, segundo a lei, supposto nada importe para o<br />

conhecimento da situação do devedor (131).<br />

Se o credor é uma firma social, basta declarar o nome da<br />

guma pratica no sentido da publicidade e é inutil ao credor, ao qual só interessa<br />

saber da existência de outras hypothecas, conquanto não se constitue<br />

a sua.<br />

(124) Troplorag III, n. 665.<br />

(125) Troplong III, n. 668 bis.<br />

(126) Vej. Décret, art. 213 e 218.<br />

(127) Décret, art. 218 § I o . Vej. modelo n. 2, ajinexo ao Décret.<br />

(128) Décret, art. 218 § 2.<br />

(129) Décret art. 46. Nos casos do art. 152 e 69 a 70 do Decreto pôde<br />

acontecer que uma hypotheca inscripta em data posterior á outra tenha prioridade<br />

em relação a essa outra, por ter «ido primeiro que elia apresentada e<br />

registrada no protocollo. Vej. acima § 230.<br />

(130) Lei, n. 1237, art. 9 § 24, Décret, art. 218/§ 3.


DÂS COUSAS S29<br />

firma (132); se é fallido, ou se fez cessão da hypotheca, sem embargo<br />

inscreve-se lhe o nome, fazendo-se a competente nota nas<br />

averbações (133).<br />

4. «O nome, o domicilio e profissão da devedor» (134).<br />

A indicação do nome do devedor é necessária para determinar<br />

a identidade do immovel (135).<br />

A inscripção deve accusar sempre o nome do devedor,quer<br />

elle já não exista, quer o immovel já lhe tenha sahido do poder<br />

(136). Se a hypotheca é constituida por um terceiro que não o<br />

devedor, inscreve-se conjunctamente o nome do devedor e o deste<br />

terceiro (137).<br />

5. «O titulo, a sua data e o nome do tabellião que o lavrou»<br />

(138). A indicação do titulo consiste na declaração de sua<br />

forma como se é escriptura publica, sentença condemnatoria, formal<br />

de partilha ou sentença de especialisação (139). Requer-se a<br />

data para calcular-se a prescripçao, e o nome do tabellião para<br />

facilitar a busca.<br />

(131) Troplong III, n. 668 bis verb. Et d'abord: Pont II, n. 969'. Para<br />

se conhecer o onus hypotheeario sobre o immovel e a situação do devedor, 6<br />

evidente que não ha necessidade de saber-se o nome do credor.<br />

(132) Martou III, n. 1068, Pont IL, n. 963.<br />

(133) Pont II, n. 963.<br />

Trata-se do caso em que o credor faliece ou faz cessão da hypotheca antes<br />

de inscripta.<br />

Em França entende-se que a inscripção pôde ser feita no nome collective<br />

dos herdeiros ou no nome do cessionário. Entre nós parece mais consentaneo<br />

com as disposições cio Decreto que a inscripção se faça sempre em<br />

nome do credor, fazendo-se menção do óbito delle ou da cessão nas averbações,<br />

mediante a prova apresentada ao official.<br />

(134) Lei, art. 9 § 24, Décret, art. 218 § 4.<br />

(135) Troplong III, n. 668 bis, Pont II, 977.<br />

(136) Martou III, n. 1111 e 1114, Pont II, n. 973 e 975. Na hypothèse<br />

de não estar o immovel em podeT do devedor, porque elle o alienou a terceiro,<br />

a inscripção só é util se é feita antes que o adquirente tenha transe rip to o<br />

seu titulo. Vej. acima §.<br />

(137) Delebecque, Com. Legisl. n. 441. Pont (II n. 976) e Morton (III,<br />

n. 1074) sustentão que só se deve inscrever o nome do dono do dmmovel, e<br />

com razão, porque, não sendo o ionmovel do devedor, nada importa o seai<br />

nome para se saber o onus hypotheeario que grava esse immovel, -»om uan<br />

tal onus affecta o credito real do devedor.<br />

(138) Lei, art. 9 § 24, Décret, art. 218 § 5, Martou III, n. 1075.<br />

(139) Pont II, n. 982.


530 DIREITO<br />

6. «O valor do credito ou a sua estimação pelas partes»<br />

(140). A enunciação do valor é indispensável para se conhecer a<br />

extensão do onus hypothecario do immovel (141).<br />

7. «Epocha do vencimento»: circunistancia de importância<br />

para os terceiros, no estado actual do nosso Direito (142).<br />

8. «Juros estipulados»:—elemento do valor da responsabilidade<br />

(143).<br />

9. «Freguezia da situação do immovel»<br />

10. «Denominação do immovel se fôr rural; a indicação da<br />

rua se urbano». (144) Este e o requisito do numero antecedente<br />

são indispensáveis para manter o principio da especialidade e determinar<br />

a identidade do immovel.<br />

11. «Os característicos do immovel». E' um requisito que<br />

pôde ser omíttido (145).<br />

E* licito ao credor eleger na inscripção um domicilio,onde<br />

receba as notificações relativas á inscripção (1 4 6).<br />

A lei declara radicalmente nulla a inscripção que não contém<br />

os requisitos expostos, exeepto os mencionados sob os números<br />

1, 2 e 11, e os relativos á profissão do credor e devedor<br />

Ha nisso excesso de rigor. O principio scientifico é—que<br />

a inscripção só deve ser nulla quando se omitte algum dos requi-<br />

(140) Lei, art. 9 § 24, Décret, art. 218 § 6.<br />

(141) Troplong III, n. 683. Pont II, n. 9-85, Martou III, n. 1078 e 1079.<br />

(142) Lei, art. 9 § 24. Décret, art. 218 § 7. Troplong (III, n. 668 e<br />

685) e Pont (II, n. 992) entendem que esta declaração não tem importância<br />

para terceiros. Assim é no systema do C. C. írancez e da Lei Belga.<br />

Entre nós, porém, interessa muito aos terceiros conhecerem aquella clausula,<br />

porque o credor hypothecario que occupa o ,prinaeiro lugar e cuja divida<br />

ainda não se acha vencida pôde impedir a execução do que está em segundo<br />

lugar. Vej. adiante § 273.<br />

(143) Lei, art 9 § 24, Décret, art. 218 § 8<br />

(144) Lei, art. 9 § 24. Décret. 218 i§ 9 e 10, Troplong. HT, n. 6S9, Pont II<br />

n. 999.<br />

(145) Lei, art. 9 § 24, Décret, art. 218 § 11 e art. 235.<br />

(146) Lei, art. 9 § 24, Décret, art. 218 l§ 12, 2 a parte. O domicilio escolhido<br />

só vale para as acções que são relativas á inscripção, como são as acções<br />

para annullal-a ou rescindil-a o para a remissão; para as outras acções prevalece<br />

o domicilio real.<br />

Pont II, »66 Martou III, n. 1069.<br />

(147) Décret, art. 235.


DÀS coüsÀè 531<br />

sitos que são necessários para dar conhecimento da situação do<br />

devedor. Estes requisitos são os que se achão acima mencionados<br />

sob os números 4, 6, 9 e 10. E tal é hoje em França a opinião dominante<br />

(148).<br />

CÓDIGO CIVIIv<br />

Art. 846 — A inscripção da hypotheca, leoal, ou convencional, declarará:<br />

I — O nome, o domicilio e a. profissão do credor e do devedor.<br />

II — A data, a natureza do titulo, o valor do credito e o da cotisa ou sua<br />

estimação, fixada por accôrdo atire as parles, o prazo e juros estipulados.<br />

III — A situação, denominação e os característicos da cansa hypothecada.<br />

Paragrapho único. O credor, além do seu domicilio real, poderá designar<br />

outro, onde possa também ser citado. — 42.<br />

Art. 847 — Os credores chirographarios e os por hypotheca não inscripta<br />

em primeiro logar e sem concurrentiel, só por via de acção ordinária de nnl/idade<br />

ou rescisão poderão invalidar os effeitos da primeira hypotheca, a que<br />

compete a prioridade pelo respectivo registro.<br />

Art. 848 — As hypothecas somente valem contra terceiros desde a data da<br />

inscripção. Emquanto não inscriptas, as hypotheeas só subsistem entre os contra<br />

h entes.<br />

Ari. 862 — Salvo convenção em contrario, incumbem ao adquirente as despczas<br />

da tinnscripção dos Mulos de transmissão da propriedade e ao devedor<br />

os da inscripção, ou transei ipção dos onus reaes.<br />

§ 245.—D.) Particularidades da inscripção da hypotheca<br />

judiciaria.<br />

II. A hypotheca judiciaria, ao constituir-se, não affecta<br />

bens certos (149). Parece, pois, que devia passar pelo processo<br />

regular da especialisação para que pudesse ser inscripta.<br />

Todavia a lei a dispensa das formalidades daquelle processo<br />

(150):—dá a quantia como liquidada pela sentença e deixa<br />

a especialisação a vontade do exequente (151).<br />

E' na verdade o exequente quem por propria autoridade<br />

faz a especialisação; e a faz, designando nos extractos os itnmo-<br />

(148) Troplong III, n. COS his. o Pont II. n. Oõfi a 960. Na fBelgira a<br />

doutrina exposta foi consagrada na lei de 16 de Dezembro de 1851, art. 85.<br />

Ycj. Martou III, n. 1104.<br />

(149) Vej. § 226 acima.<br />

(150) Décret, n. 3.453, art. 224.<br />

(151) Décret, art. 224.<br />

35


532 MRÊÏTO<br />

veis do coudemnado sobre os quaes deve a hypotheca recahir<br />

(152).<br />

No exercício deste direito o exequente pódc designar qualquer<br />

ou quaesquer dos immoveis existentes no patrimônio do<br />

condemnado.<br />

Ainda mais: é-lhe permittido designar os que tiverem sido<br />

alienados em fraude da execução (153).<br />

§ 246. — E. Inscripção das hypothccas geraes.<br />

III. Supposto as hypothccas geraes não careção da inscripção<br />

para que valhão contra terceiros, a lei por motivos de conveniência<br />

obvia e por força das exigências do systema adoptado,<br />

recommenda que ellas sejão inscriptas, estabelecendo para esse<br />

fim uma combinação de meios coercitivos.<br />

As cláusulas da inscripção de taes hypothecas são calculadas<br />

para lhes dar a publicidade, compatível com a sua natureza<br />

de geraes.<br />

Geraes, como são, é manifesto que no registro délias não<br />

se pôde precisar a importância da responsabilidade, nem tão pouco<br />

designar bens certos em que recaião.<br />

As cláusulas ou indicações que a inscripção das alludidas<br />

hypothecas devem conter, são as seguintes :<br />

I a . O nome, o domicilio e profissão do responsável (154) ;<br />

2 ! ! O nome do credor — mulher casada, menor ou interdicto,<br />

domicilio e filiação (155) ;<br />

3 a A causa da responsabilidade (casamento, tutela, cura-<br />

(lõ2) Décret, cit. art. 224: "a qual recahirn, not. immoveis do devodo 1 "<br />

condemnado... designados pelo exequente nos extractos."<br />

(153) Décret, art. 224: -existentes na posse délie ou alienados cm, fraud*<br />

da execução."<br />

Pereira e Sousa, Prim. Linh. Not. 777 dá a razão: "A alienação<br />

que é feita em fraude cia execução senypre é nulla e. .. por titulo nullo nunca<br />

sahe a cousa do ãomÂnio do aliénante."<br />

Quando a venda se entende feita em fraude da execução? Vej. Pereira<br />

e Souza 777 e Reg. n. 737 de 20 de Novembro de 1850, art. 494.<br />

Se a alienação foi feita legalmente, não pôde o exequente designal-os nos<br />

extractos.<br />

(154) Décret, n. 3.453, art. 213 § 1, 2 e 3.<br />

(155) Décret, art. 213 § 4, 5 e 6.


AS C0URÁ6 533 '<br />

tela, herança materna, acquisição de bens adrenticios, doação<br />

ou testamento) (156) ;<br />

4? A data da responsabilidade (157) : — circumstancía<br />

importante, porque as hypothecas geraes produzem os seus effeitos<br />

desde o momento da sua constituição (158).<br />

As irregularidades ou omissões que por ventura occorrão<br />

na inscripção destas hypothecas, podem motivar a responsabilidade<br />

do official do registro, mas são absolutamente innocuas<br />

em relação ás pessoas a quem as ditas hjpothecas aproveitão.<br />

§ 247. — Arcrbaçòes.<br />

A inscripção, ou seja de h}*pothecas especiaes ou especialisadas,<br />

contém uma rubrica geral destinada a receber a nota<br />

dos factos e circumstancias que influem ou podem de qualquer<br />

modo influir sobre o direito hypothecario.<br />

A dita rubiica tem o titulo de — averbaçoes (159).<br />

Constituem objecto de averbaçoes, entre outros, os factos<br />

seguintes :<br />

1. O facto de ser a inscripção de hypotheca preuotada<br />

(160);<br />

2. A existência de outra hypotheca sobre o mesmo tmmovel<br />

anteriormente iuscripta (161). Consiste a averbação em declarar<br />

o numero de ordem do protocol Io da hypotheca auteriormeute<br />

inscripta (162) ;<br />

3. A circunistancia de ser a hypotheca inscripta constituída<br />

para firmeza da transmissão do próprio immovei hypothecado,<br />

constante do mesmo titulo. A averbação deve fazer referencia<br />

á transcripção (163) ;<br />

(156) Décret, art. 213 § 7.<br />

(157) Décret, art. 213 § 8.<br />

(158) Vej. acima S l!i2, 199, 201 e 202.<br />

(159) Dei n. 1237, art. !» § 2G. Décret, n, 3453. art. 78. Vej. ,modei«<br />

n. 2 annexo ao Décret.<br />

(160) Décret, art. 78. A commemoração desta circumotartcia tom a utilidade<br />

de explicar a razão porque a hypotheca, supposto inscripta posteriormente<br />

a outras, tem prioridade sobre cilas. Ve.i. Décret, art. 152 § I o e 2 o .<br />

(161) Décret, art. 225.<br />

(162) Vej. § 242 acima.<br />

(163) Décret, art. 229.


534 bïREITO<br />

4. A cessão ou subrog-ação da hypotheca feita antes uo<br />

depois da inscripção (164) ;<br />

5. A extincção da hypotheca ou da inscripção (cancellamento)<br />

(165).<br />

Todas as averbações devem ser numeradas, datadas e assignadas<br />

(166).<br />

As averbações que não são tomadas ao mesmo tempo que<br />

a inscripção (168), mas em data posterior, se fazem com as<br />

mesmas formalidades da inscripção (168).<br />

§ 248. — Irregularidades da Inscripção<br />

Determinão a nullidade da inscripção as irregularidades<br />

que resultão de erro ou omissão de formalidade essencial.<br />

1. Assim são nullas as inscripções :<br />

I o Quando tomadas em comarca diversa daquella em que<br />

é sito o immovel (169J ;<br />

2 o Quando se deixa de dar ao titulo apresentado o numero<br />

de ordem que lhe compete no protocollo (170) ;<br />

3 o Quando se omitte alg'uma ou algumas das enunciações<br />

substanciaes, como a do nome do devedor, a da situação do immovel<br />

(171).<br />

Os erros e as omissões dos extractos, que não passarem<br />

para a inscripção, em nada a affectão (172). Mas o erro ou<br />

omissão da inscripção produz o seu effeito irritante, ainda que<br />

(164) Décret, art. 78.<br />

(165) Décret, art. 78. A averbação, em que se consigna a extincção da<br />

hypotheca ou da inscripção, tem o nome de cancellamento. Vej. s 250<br />

adiante.<br />

(166) Décret, art. 76.<br />

(167) Taes as averbações sob n. 1, 2 e 3 do nosso texto.<br />

(168) Décret, art. 60. A parte que requer a averbação deve apresentar<br />

o titulo ou documento donde consta o facto que é objecto da averbação,<br />

como, por exemplo, a escriptura de cessão ou documento da extincção da hypotheca,<br />

com os respectivos extractos; faz-se no protocollo a nota de apresentação,<br />

data e numero de ordem; reproduz-se esta nota no titulo e procede-se<br />

em seguida á averbação no livro da insciipçâo.<br />

(169) Vej. acima § 239.<br />

(170) Vej. § acima 243.<br />

(171) Décret, art. 235.<br />

(172) Décret, art. 56. Martou III, n. 1062.


DAS COUSAS 535<br />

os extractos sejão completos (173). E por uma razão obvia : A<br />

fonte de informações para os terceiros é a inscripção ; os extractos<br />

não são instrumentos de publicidade, nem como taes se<br />

exhibem,mas se conservão subtrahidos ao exame do publico (174).<br />

2. A hypotheca, como se sabe, contém uma excepção<br />

das regras geraes de direito (175) : d'ahi resulta que todos aquelles<br />

a quem aproveita a nullidade da inscripção, .como são os<br />

credores hypothecarios do mesmo devedor, tetn o direito de invocar<br />

as irregularidades que substancialmente vicião a inscripção<br />

(176).<br />

Os terceiros adquirem aquelle direito desde o momento<br />

em que acontece a nullidade (177).<br />

3. Uma vez terminada a inscripção, não é licito ao official<br />

do registro reparar as nullidades occurrentes (178). A admissão<br />

de uma pratica tal, além de importar offensa de direitos de<br />

terceiros, abriria espaço a graves abusos (179).<br />

Ao credor em tal caso não resta outro recurso senão o de<br />

requerer nova inscripção (180).<br />

§ 249. — Perempção do registro<br />

A) As inscripções das hypothecas especiaes ou especialisadas<br />

vigoram por trinta annos, mas podem ser renovadas emquanto<br />

as ditas hypothecas não se extinguem (181).<br />

Ao cabo daquelle prazo as inscripções, não tendo sido<br />

renovadas, se consideram peremptas e perdem por conseqüência<br />

a virtude de dar valor á hypotheca contra terceiros (182).<br />

(173) Décret, art. 236, Martou, art. n. 1062.<br />

(174) Troplong III, n. 695, Pont li, n. 1012. Voj. acima § 243.<br />

(175) Vej. acima § 185.<br />

(176) Décret, art. 237. Podem invocal-o os terceiros adquirentes. E os<br />

credores chirographarios ? Não, porque não lhes assiste direito real algum<br />

sobre o immovel.<br />

(177) Décret, art. 237.<br />

(178) Décret, art. 237.<br />

(179) Attenta a importância dos direitos resultantes da inscripção, é<br />

mister afastar delia tudo quanto possa crear suspeitas.<br />

(180) Troplong III, n. 655 lis, Pont II, n. 1012.<br />

(181) Décret, n. 3453, art. 238.<br />

(182) Troplong III, n. 713, Mourlon III, n. 1584, Martou III, n. 1147.


536 DIREITO<br />

2. O dito termo conta-se da data da inscripcão, excluindo-se<br />

o primeiro e incluindo-se o ultimo dia (183).<br />

3. A perempção da inscripcão não traz de si mesmo a<br />

prescripção da hypotheca. A hypotheca prescreve com a obrigação,<br />

mas a obrigação, pelas suspensões e interrupções de que<br />

é susceptível a prescripção á que está sujeita, pôde durar indefinidamente<br />

(L84). K pois ocoorre muitas vezes a perempção da<br />

inscripcão, continuado no emtanto a subsistir o direito hypotheeario<br />

(185).<br />

4. O renovamento da inscripcão pode ser feito no decurso<br />

dos trinta annos, ou depois de terminado este prazo (186). Feita<br />

dentro do prazo, a renovação restaura a inscripcão orig-inaria<br />

com todos os seus effeitos e lhe conserva o numero de ordem<br />

que lhe competia (187). Realísada, porém, depois do prazo, vale<br />

como uma nova inscripcão, d'onde resulta que só produz effeito<br />

da sua data em diante (188).<br />

5. A renovação só é necessária quando a inscripcão não<br />

tem produzido todos os seus effeitos dentro do prazo dos trinta<br />

annos. Assim, se os bens hypothecados são excutidos ou remidos<br />

dentro do prazo, seria inutil a renovação (189).<br />

Ha porém casos em que a inscripcão se reputa ter pro-<br />

(183) Dies á quo non computatur in termino. Dies termini computatur<br />

in termino. Vej. Troplong III, n. 714, Pont II, n. 1039.<br />

(184) Pôde a obrigação por via de suecessivas interrupções da prescripção,<br />

vir a perdurar quarenta cincoenta, cem annos. Vej. Pont II, n. 1035.<br />

(185) Décret, art. 238: "Se entre ella e a segunda não houver interrupção."<br />

Mourlon III, n. 1584, Pont II, ri. 1035.<br />

lia todavia casos em que a perempção da inscripcão dá lugar á uxtincção<br />

da hypotheca, como, por exemplo, se, perempta a inscri.pção e antes de<br />

ser ella renovada, o devedor aliena o immovel e o adquirente transcreve «<br />

titulo, ou se se abrefallencíaao devedor. Pont II, n. 1036, Mourlon III, n.1585.<br />

(186) Décret, art. 238, in fine.<br />

(187) Décret, art. 238: '•Conservando, porém, a hypotheca o mesmo numero<br />

de ordem da primeira inscripcão, se entre ella e a segunda não houver<br />

interrupção." Vej. Troplong III, n. 716 bis, Mourlon III, n. 1584, Pont II,<br />

n. 1063.<br />

(188) Décret, cit. art. 238.<br />

(1S9) Diz-se que a inscripcão tem produzido os sctis effeitos quando ella<br />

ha dado o resultado que é destinado a gerar e que portanto pôde cessar sem<br />

prejuízo do credor.


DAS COUSAS 537<br />

duzido o seu effeito, sem que todavia a divida esteja paga (190)<br />

D'ahi a necessidade de terminar com precisão o momento em que<br />

se verifica aquelle phenomeno, isto é, em que a inscripção tem<br />

preenchido o seu destino.<br />

A inscripção, pelo que respeita á preferencia, é havida<br />

como tendo produzido o seu effeito desde o momento em que,<br />

arrematados os bens, se deposita o preço. Na verdade, depositado<br />

o preço, os direitos dos credores se consideram fixados de<br />

uma maneira irrevogável, subsistindo as preferencias existentes<br />

até aquelle momento (191).<br />

Desta doutrina resulta:<br />

a) Que, se no prazo dos trinta annos se acha incluída<br />

a epocha do deposito do preço, não ha necessidade de renovação;<br />

b) Que, ao contrario, se no tempo em que se verifica o<br />

deposito do preço, já está findo o prazo dos trinta annos, o credor<br />

não pôde ser acceito como hypothecario, salvo se opportunamente<br />

renovou a inscripção (192).<br />

Pelo que respeita ao direito de sequela, a inscripção se<br />

ha como tendo preenchido o seu destino, desde que o preço da<br />

remissão é pago ou depositado (193).<br />

6. A renovação pôde ser requerida pelas mesmas pessoas<br />

que são competentes para fazer a inscripção e se consumma pela<br />

mesma maneira e com as mesmas formalidades com que se opera<br />

a inscripção (194).<br />

B. As mscripções das hypothecas geraes subsistem por<br />

(190) Mourlon III, n. 1590: "Il y a évidemment un moment où l'inscription<br />

ayant produit tout son effet, il n'est plus nécessaire de la renouveller,<br />

quoique le créancier n'ait pas encore encaissé sa créance. "<br />

(191) Troplong III, n. 722 bis, Pont Li, n. 1Ü56 e 1057, Mourlon III,<br />

n. 1590 e 1591. Jj] tanto é verdadeira a doutrina exposta que a arrematagão<br />

purga o immovel da hypotheca. Vej. § 277.<br />

(192) Pont II, n. 1056.<br />

(193) Décret, art. 238, 298 e 308. Vej. Mourlon III, n. 1591, 2°. Pont II,<br />

n. 1060 e 1061.<br />

(194) Décret, art. 238: "devem ser renovadas pela mesma forma estabelecida<br />

neste capitulo."<br />

Ha apresentação do titulo e extractos, registro no protocollo e inscripçãc<br />

no livro competente, com averbação.


538 DIREITO<br />

todo o tempo do casamento, tutela, curatela, ou administração dos<br />

pais, e por mais um anno (195).<br />

Todavia, se ao findar o anuo, penderem em juízo acções<br />

relativas ás responsabilidades que aquellas hypothecas garantem,<br />

as inscripções continuarão a subsistir emquanto as ditas acções<br />

não forem decididas (196).<br />

Convém notar que o prazo da prescripção das hypothecas<br />

geraes coincide com o prazo da perempção da inscripção. As hypothecas<br />

geraes cessam de existir nos mesmos casos em que a<br />

inscripção se entende perempta (197).<br />

Mas a prescripção das hypothecas geraes é distineta da<br />

prescripção das obrigações que cilas garantem. Assim que pôde<br />

a h} 7 potheca estar prescripta, subsistindo no emtanto a obrigação'(198).<br />

§ 250.—Cancellamento da inscripção.<br />

1. O cancellamento de uma inscripção é uma nota lançada<br />

no registro por via da qual se faz constar que d'ahi em diante<br />

cessa a inscripção de existir (199)<br />

A inscripção créa a efficacia da hypotheca contra terceiros;<br />

o cancellamento supprime-lhe aquella virtude.<br />

2. O cancellamento não é em si mesmo senão a manifestação<br />

legal da causa, por effeito da qual a inscripção deixa de ter<br />

existência real.<br />

O cancellamento, pois, é determinado:<br />

a) Pelas causas que tornam a inscripção nulla (200).<br />

(195) Décret, art. 216.<br />

(196) Décret, cit. art. 216.<br />

(197) Lei n. 1237, art. 9 § 3.<br />

(198) A regra de direito é que a hypotheca, accessorio da obrigação,<br />

só prescreve, quando prescreve a obrigação. (Vej. adiante § 278). No caso<br />

vertente se dá uma excepção da dita regra: — a hypotheca prescreve, mas<br />

a obrigação pôde subsistir. A obrigação do tutor, do curador, do pai, por actos<br />

de administração só prescreve em trinta annos. Pôde acontecer que o menor,<br />

quatro ou cinco annos depois de cessar a tutela, peça contas ao tutor. Em<br />

tal caso subsiste a obrigação do tutor, mas sem a garantia da hypotheca.<br />

(199) Décret, n. 3.453, art. 102; Troplong III, n. 737 Pont, II, n. 1.069.<br />

Na nossa pratica o cancellamento é conhecido pelo nome de baixa. Vej. o<br />

Reg. de 14 de Novemb. de 1846, art. 18 o 19.<br />

(200) Décret, n. 3.453, art. 108, Troplong III, n. 746 Pont. II, n. 1.082.


»<br />

DAS COÜSAS 539<br />

b) Pelas causas que acarretam ou a nullidade ou a extincção<br />

da hypotheca (201).<br />

3. São competentes para requerer o cancellamento as pessoas<br />

a quem a inscripção prejudica., a saber:<br />

O devedor ou o senhor do prédio hypothecado;<br />

Os terceiros, adquirentes ou possuidores do immovel;<br />

Os credores por hypothecas posteriormente inscriptas<br />

(202).<br />

4. O cancellamento é ou voluntário ou necessário.<br />

a). O cancellamento voluntário é o que se opera de consentimento<br />

do credor (203). Deve o consentimento ser expresso<br />

e constar de documento autbentico, isto é:<br />

De instrumento publico,<br />

Ou de instrumento particular reconhecido nos casos permittidos<br />

por lei (204).<br />

O consentimento para o fim declarado importa virtualmente<br />

a coníissão de um facto que tem a virtude de extinguir uma garantia<br />

de direitos: não pôde, portanto, ser dado senão por pessoas<br />

que estão na livre administração dos bens. (205).<br />

Se o credor pertence á classe dos incapazes, o consentimento<br />

é prestado por seu representante, mediante as formalidades<br />

legaes (206).<br />

b). Cancellamente forçado é o que é feito em virtude de<br />

sentença passada em julgado (207).<br />

Assiste á parte á quem aproveita o cancellamento, acção<br />

para pedi-lo judicialmente (208). O cancellamento pôde ser o<br />

(201) Décret, art. 78 e 108, verb... e não na nullidade ou solução do<br />

contractu." Quanto aos modos de extincção da hypotheca, vej. § 275 adiante.<br />

(202) Décret, art. 104, Pont. II, 1.071. Não podem requerer o cancellamento<br />

os credores chirografarios, porque não lhes assiste nenhum direito real<br />

sobre a cousa. Vej. § 274 adiante.<br />

(203) Décret, art. 105 § 2°. E' competente para dar o .consentimento o<br />

herdeiro ou cessionário do credor. Carece o herdeiro provar a sua qualidade,<br />

isto é, exhibir o formal de partilha. Vej. Martou III, n. 1.182.<br />

(204) O cancellamento tem a natureza de acto liberatorio.<br />

(205) Troplong III. n. 738 bis, Pont. II. n. 1.075, Martou III, n. 1.183.<br />

(206) Se é um menor o credor, deve preceder alvará do juiz de orphãos.<br />

(207) Décret, art. 105 S 2.<br />

(208) lista acção é ordinária, tem por fundamento qualquer das causas<br />

que determinão o cancellamento, como a de nullidade da inscripção, e é diri-


540 DIRBITO<br />

objecto principal da acção (209) ou pôde ser pedido como conseqüência<br />

do objecto principal (210).<br />

E' sufficiente para determinar o cancellamento toda a sentença<br />

que firma a existência de causa que importa a extincção da<br />

hypotheca (211).<br />

5. O official do registro é obrigado a fazer o cancellamento,<br />

desde que lhe são apresentados em fôrma legal os instrumentos<br />

respectivos, isto é, a prova do consentimento do credor, ou<br />

a sentença passada em julgado (212).<br />

6. O cancellamento se consumma por meio duma certidão<br />

lavrada na columna das averbações do livro da inscripção, datada<br />

e assignada pelo official. Nessa certidão deve o official declarar<br />

o concellamento, a razão delle e o titulo em virtude do qual é<br />

feito (213).<br />

7. Pôde o cancellamento ter por objecto, não a inscripção<br />

toda, mas uma de suas cláusulas, como acontece quando por accordo<br />

do credor a brpotheca é reduzida a um dos immoveis inscriptos<br />

(214).<br />

8. O cancellamento não importa de si mesmo a extincção<br />

de hypotheca que já não esteja extiucta por uma causa legal. O<br />

credor pois, se a hypotheca continua a subsistir, pôde requerer<br />

nova inscripção (215). A nova inscripção, porém, só valerá da<br />

sua data em diante (216):<br />

9. E' o cancellamento susceptivel de ser annullado ou<br />

gida contra o credor. E' competente o juiz do domicilio eleito na inscripção<br />

e na falta de domicilio eleito, o do domicilio real. Vej. § 248 acima.<br />

(209) Como se a acção tem por único objecto a nullidade da inscripção.<br />

(210) Por exemplo, se pede a nullidade do contracte e por via de conseqüência<br />

a nullidade da inscripção.<br />

(211) Como por exemplo:<br />

a). A sentença que julga provado o pagamento da divida, ou a propria<br />

divida prescripta;<br />

b). A que julga o pagamento feito por deposito ;<br />

c). A que julga a remissão (Décret, art. 308);<br />

d). A carta de arrematação ou de adjudicação (Vej. I 277 adiante).<br />

(212) Vej. Pont. II, n. 1.097 e 1.098, Martou III. n. 1.180.<br />

(213) Décret, art. 102. O cancellamento é uma das espécies de averbação.<br />

Vej. § 247 acima.<br />

(214) Décret, art. 78 e 109.<br />

(215) Décret, art. 107.<br />

(216) Décret, cit. art. 107.


DAS COUSAS 541<br />

por vicio substancial ou por ulterior revogação da sentença que<br />

o motivara (217). Neste caso não revive a antiga inscripção ;<br />

ha necessidade de se tomar nova que só subsistirá de sua data<br />

(218). Assim o requer o regimen da publicidade, cuja virtude<br />

repousa na fé absoluta que devem merecer as declarações do<br />

registro.<br />

10. Emquanto não é cancellado, o registro produz todos<br />

os seus effeitos, ainda que se prove por outra maneira que o contractu<br />

está desfeito, extincto. annullado ou rescindido (219).<br />

(217) Como se houve concessão de Revista e o Tribunal Réviser v xformou<br />

a sentença em virtude da qual se fez o cancellamento Vej. Pont. I)<br />

n. 1.107. •<br />

(218) Troplong III, n. 746, Pont II, n. 1.107, Marto­u III, n. 1.224.<br />

(219) Lei, art. 11 § 6, Décret, art. 106.<br />

Esta disposição contraria princípios fundamentaes de direito, dá lugar &<br />

absurdos intoleráveis e não é reclamada pelas necessidades loucas do eys­<br />

Uma da publicidade.<br />

1. E' um principio fundamental de Direito que o contracto nullo ipso*<br />

jure, como é o de divida de jogo confessado na escriptura ft de divida provenu<br />

nte de compra de bens da tutela ou testamentaria pelo tutor ou testair.en­<br />

♦eiro, não pôde ser acceito em juizo. Mas, segundo a citada disposição do ar*<br />

v igo 106 do Decreto, se um contracto tal se acha garantido por escriptura de<br />

hypotheca inscripta, emquanto a inscripção não fôr annullada por acça© ordinária,<br />

o juiz hade acceital­o e dar­lhe execução I<br />

2. O credor hypothecario é pago da divida, passa quitação por escriptura<br />

publica, mas omitte­se o consentimento para o cancellamento. Se este<br />

credor se apresenta em concurso de preferencia, não poderá ser TepellidO<br />

porque a inscripção não está cancellada.<br />

A inscripção é nulla, porque nella se omittio o nome do devedor ou o<br />

quantum da divida (Décret, art. 235). O credor vom a concurso de preferencia<br />

; hade ser recebido, hade triumfar, porque a inscripção ainda não foi<br />

"ancellada por virtude de sentença!<br />

Pôde a razão humana tolerar absurdos deste quilate?<br />

3. A razão do systema da publicidade não exigia a conbagração do absurdo<br />

arguido.<br />

O principio dominante do systema é que não vale contra terceiro onus<br />

>u direito real que não esteja aceusaão no registro. Nisto é que está a virtud*<br />

e a utilidade do registro.<br />

Mas o systema não requer, nem é da sua natureza que valha por forçé.<br />

contra terceiro um onus inscripto mas que não tem existência jurídica. Em<br />

que aproveita á terceiro que valha um onus, um direito real extincto?<br />

O citado art. 11 § 6 e o art. 106 do Décret, são evidentemente o resui­


542 DIKJÏITO<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art, S'30 — A extincção da hypotheca só começa a 1er effeito contra ter*<br />

ceiros depois de averbada no respectivo registro.<br />

Art. 851 — A inscripção ca nccllar-se-á, em cada wm dus casos de extiw<br />

cção de hypotheca, á vista da respectiva prova ou, independente desta, a requerimento<br />

de ambas as partes, se forem capazes, e conhecidas do official<br />

do registro.<br />

tado ae confusão de idéas aliás claras. Sem duvida não pôde valer contra terceiros<br />

um onus, um direito real que não consta do registro. Mas seria absurdo<br />

concluir de«te principio que todo o onus, só porque consta do registro,<br />

deve prevalecer contra terceiros. São duas ordens de idéas muito distinetas.<br />

Martou, III, n. 1.215: "Une inscription périmée, une inscription viciée<br />

par une nullité, une inscription, dont la créance est éteinte par le payement,<br />

la remise de la dette ou la prescription, existe aussi matériellement, mais ne<br />

s'en, trouve pas moins destituée d'effet ã l'égard des personnes au prejudice<br />

desquelles on voudrait s'en servir."<br />

!. Podem-se todavia evitar os notados absurdos,acceitando-se a intelligencia<br />

exposta em a nota 21 ao § 54 acima.


CAPITULO VI.<br />

DA CKSSÃO E SUBROGAÇÃO DE HYPOTHT3CAS.<br />

§ 251. — Cessão de hypotheca.<br />

1. A cessão propriamente dita é a transferencia que o<br />

credor faz a terceiro, do seu direito contra o devedor (1), ou por<br />

titulo gratuito ou por oneroso (2).<br />

A cessão não opera a extincção da divida. Por força<br />

delia o credito passa da pessoa do cedente para a do cessionário,<br />

tal qual existe : o cessionário representa o cedente, succède<br />

no lugar dei le ; é, na realidade, um procurador em causa<br />

propria (3).<br />

2. Por uma conseqüência da sua propria natureza, a cessão<br />

da divida importa a cessão dos accessorios da divida — juros,<br />

privilégios e hypothecas (4).<br />

3. Em virtude do dito principio a cessão da divida hypothecaria,<br />

feita em devida fôrma (por escriptura publica) acarreta,<br />

necessariamente a cessão da hypotheca, embora não haja a respeito<br />

declaração expressa (5).<br />

(1) Olea, Cessionib. (Q. I, n. 100): Cessio est quasi traditio et jurie et<br />

aetionis ex aliquo titulo in a Mum facta translatio".<br />

Alciato: "Proprii juris in alium facta translatio aut collatio."<br />

3alcfo: "Modus quasi-traditionis, ex quo justransfertur in eessionarium."<br />

Vej. Muhlenbruch § 496, Mourlou II!, n. 673, Troplong I, n. 340.<br />

(2) A cessão pôde ter por causa uma doaqão, uma compra e venda. Vej.<br />

Makeldey ,§ 369 in fine. Troplong I, n. 340.<br />

(3) Makeldey § 373, Muhlenbruch § 500, Troplong I. n. 340.<br />

(4) Fr. 6, 23 D. de heredit vel act. vendit. 18, 4, C. 7 C. eodem. 4, 39.<br />

Muhlenbruch § 500, Makeldey § 373, n. 3.<br />

(5) Lei n. 1237, art. 13, Décret, n. 4453, art. £45 e 246.


544 DIREITO<br />

Mas, se a divida consta de titulo separado e distincto da<br />

escriptura de hypotheca, como é a letra de cambio, nota promissória<br />

e semelhantes, a cessão da divida por si só não importa a<br />

cessão da hypotheca ; em tal caso carece a hypotheca de cessão<br />

expressa (6)<br />

4. A cessão de hypotheca, qualquer aliás que seja o titulo<br />

da divida, deve ser feita por escriptura publica ou por termo nos<br />

autos. E' uma formalidade essencial (7).<br />

5. A averbação da cedencia no livro da inscripção não é<br />

uma necessidade no systema do nosso regimen. A publicidade se<br />

firma pela inscripção da hypotheca. A cessão não accrescenta nem<br />

diminue os onus do immovel hypothecado ; o conhecimento delia,<br />

portanto, não interessa a terceiros (8). A lei, pois, deixa a averbação<br />

da cedencia á vontade do cessionário (9).<br />

6. Pôde ser transferida por cessão toda e qualquer hypotheca,—a<br />

convencional, a judicial, a legal, excepto a da mulher<br />

casada na constância do matrimônio (10).<br />

7. Não é permittido desligar a h^ypotheca da divida e cedel-a<br />

em separado (11).<br />

(6) Décret, art. 246 verb, "carece de expressa cessão da hypotheea pelos<br />

meios estabelecidos no art. 245."<br />

(7) Lei n. 1237, art. 13, Décret, art. 245.<br />

(8) Troplong I. n. 363: "Si le cédant a pris avant le transport une<br />

inscription de nature à conserver son privilège, le cessionaire en est investi<br />

par l'existenoe même de la cession, et le benefice de l'inscription lui profite<br />

de telle sorte qu'il n'est obligé de faire aucun acte de publicité pour mettre<br />

au grand jour les nouveaux droits qu'il acquiert. Et en effet qu'importe aux<br />

tiers intéressés que les droits du cédant soient exercés personnellement par<br />

lui ou par quelqu'un qui le represente?"<br />

(9) Lei n. 1237, art. 13: "O cessionário do credito hypothecario... tem<br />

o direito de fazer inscrever á margem da inscripção principal a cessão. " O<br />

exercício do direito é livre em si; aliás seria obrigação e não direito.<br />

O Décret, art. 248 fazendo dependente da averbação o exercício dos direitos<br />

do cessionário sobre o immovel hypothecado como que a torna obrigatória.<br />

Nesta parte o Décret, corrige a lei. — Não o podia fazer.<br />

A averbação da cedencia só interessa ao cessionário, pois que tem a utilidade<br />

de impedir que o cedente de má fé se possa conluiar com. outros cre<br />

dores e cancellar a inscripção, prejudicando ctest'arte ao cessionário que teria<br />

de fazer nova inscripção, perdendo a prioridade da primeira inscripção.<br />

(10) Vej. .§ 191 acima.<br />

(11) Jourdan, Hypothéq.: Cap. 39. No direito francez é permittido á<br />

mulher renunciar a sua hypotheca para abrir espaço á hypotheca convencional<br />

de credor do marido. Troplong II n. 601, Pont I, n. 421.


DAS COÜSAS 545<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 755 — Nas dividas garantidas por penhor, antichrese ou hypotheca, a<br />

cousa dada em garantia fica sugeita, por vinculo real, ao cumprimento da obrigação.<br />

§ 252. —Subrogação.<br />

1. A subrogação, como se sabe, é a substituição do credor<br />

que é pago por aquelle que paga a divida ou fornece a quantia<br />

para o pagamento (12).<br />

2. Diffère a subrogação essencialmente da cessão :<br />

L.? A cessão não extingue a divida, mas a transfere a<br />

outrem ; o preço por que é feita representa o valor do credito cedido<br />

; o credor continua obrigado pela mesma divida (13).<br />

A subrogação, ao contrario, extingue a divida ; a quantia<br />

que o credor recebe é destinada a lhe pagar a divida ; o<br />

devedor fica exonerado da divida paga e responde por nova divida<br />

ao subrogado — ao que fornece a quantia para o pagamento (14).<br />

2.° Na cessão a intenção das partes é alienar e adquirir<br />

(o credito). Na subrogação o credor não tem em mira alienar a<br />

divida, mas pagar­se delia : o intuito do fornecedor do dinheiro<br />

é fazer um favor ao devedor e não especular (i5).<br />

3.° A cessão só pôde ser feita pelo credor ; a subrogação<br />

pôde sel­o ou pelo credor ou pelo devedor (16).<br />

.,"'■ ~ ^ ><br />

(12) Renusson define a subrogação; "La mutation d'un créancier en un<br />

autre créancier, quand les droits du créancier qui est payé passent à l'autre<br />

qui a fourni ses deniers pour le payement. "<br />

Dumoulin {de usuris) : "Subrogatio est tran^fusio unius creditor^ in<br />

aiium, eadem vel mitiori conditione." Vej. Troplong I, n. 349, Mourlon II.<br />

n. 1360, Jourdan, cap. 39.<br />

A palavra subrogação vem do Direito Canonico. Os Romanos exprimião a<br />

idea pelas palavras cessio actionum a lege, beneficium cedenãary/m actionum,<br />

successio. substitutio. Muhlenbruch § 321 e 486, Troplong I, n. 351.<br />

(1.3) Makeldey § 373, Mublenbruch § 500, Maynz II § 274.<br />

As condições pessoaes do. devedor podem determinar modificações na<br />

oxistonciada divida Assim se o cessionário é impubère, a prescripção da divida<br />

fica suspensa.<br />

(14) Troplong I, n. 349, Mourlon II, n. 1360, Arntz II, n. 180, Jourdan,<br />

cap. 39.<br />

(15) Troplong cit. n. 394, Mourlon II, n. 1355, 2 o , Dumoulin... metiori<br />

conditione, Arntz, cit. 180.<br />

(10) Fr. 3 D. quœ res pignor. (20, 3); fr. 12 § 8 D. Qui potiores


546 DIREITO<br />

3. A nossa lei admitte expressamente a possibilidade da<br />

subrogação de hypotheca. E como em nada lhe alterou a natureza,<br />

é visto que a subrog-ação subsiste tal qual a constitue o direito<br />

preexistente (17),<br />

4. A subrog-ação é convencional ou legal (18).<br />

A convencional, em relação a hypotheca, se pôde dar:<br />

a) Em favor do comprador do immovel hypothecado que<br />

paga a divida (19).<br />

b) Em favor daquelle que paga a divida hypothecaria, ou<br />

fornece quantia para o pagamento (2* 1 )*<br />

5. A subrogação legal, isto é, a que se opera de pleno direito,<br />

occorre :<br />

a) Em favor do credor hypothecario que paga a divida<br />

hypothecaria do credor que tem prioridade sobre elle (21).<br />

b) Em favor do fiador que paga a divida hypothecaria que<br />

afiançou. (22).<br />

C. 1, C. Qui potior. (8, 18) Troplong T, n. 354, Jourdan, cap. 39 Arntz, cit.<br />

ii. ISO.<br />

(17) Lei n. 1237, Titulo VI. "Das cessões e subrogações. " Art. 13: O<br />

cessionário do credito hy.pothecario, ou a pessoa validamente subrogaãa no<br />

dito credito. Vej. -Décret, n. 3453, art. 247 e art. 248.<br />

Os práticos confundem muitas vezes a cessão e a. subrogação, — erro de<br />

que felizmente escapou a no.ssa lei. Da linguagem .por ella usada vê-se que<br />

na sua mente cessão e subrogação são cousas distinetas. O art. 248 do Décret.<br />

3453 allude exclusivamente á subrogação o consagra um principio que<br />

lhe é peculiar — a necessidade da prova do pagamento do que ella resulta.<br />

(18) Troplong I, n. 352, Mourlon II, n. 1365, Jourdan, cap. 39. § 2.<br />

(19) iFr. 17 D. Qui potior 20, 4, fr. 6 D. de distrah. pig. (20, 5); C. 3 C.<br />

Qui potior. 8, 18, Mayiíz § 250, not. 8 e § 273, nota 1, Jourdan, cap. 39, § 4.<br />

Muhlenbruch § 321, nota 3.<br />

Xo Direito francez este caso ë de subrogação legal. C. Civil, art. 1261,<br />

2°, Trop'ong T, n. 378. Não temos dispcsiQão de lei a respeito, rege, portanto<br />

o Direito Romano como su.>s:uiario.<br />

Vej. adiante § 261.<br />

(20) Fr. 3 D. Quœ res pignor. 20, 3; fr. 12 § 8 e 9. D. Qui poitor,<br />

Maynz § 250, e not. 7, Muhlenbruch § 321, 2, Jourdan, cap. 39 § 4. Rocha<br />

§ 154. Dig. Port. I, art. 1097.<br />

(21) Fr. 16 D. Qui potior. C. 7 C. Qui potior. 8, IS, Maynz § 250, not. 10,<br />

Muhlenbruch § 321, 3. Rocha § 153, Dig. Port. I, art. 1101.<br />

(22) Ord. 3, 92, Rocha § 153 Digest. Port. I, art. 1098. Repert das<br />

Ordd, torn. II, pag. 429 nota. Consolidação das Leis Civis art. 796 not.


DAS coUSÀS 54?<br />

6. Para que a subrogacão, quer convencional, quer legal,<br />

produza os effeitos, é necessário que o pàg-amento de que ella<br />

resulta, conste de instrumento publico (23).<br />

7. A averbação da subrogacão é, como a da cessão, deixada<br />

ao arbítrio do subrogado (24).<br />

8. O credor subrogado adquire os mesmos direitos e as<br />

mesmas acções que competiam ao primeiro credor (25).<br />

Ha grande controvérsia entre os eseriptores para explicar o processo<br />

lógico pelo qual a subrogacão opera a transferencia, ao subrogado, da hypotheca<br />

que pertencia ao credor pago.<br />

Muhlenbruch, Mourlon, Arntz e outros resolvem a difficuldade sustentando<br />

que ha uma cessão fictícia, legai ou convencional, isto é, que no facto<br />

da subrogacão ?e presuppõe uma cessão da hypotheca do credor em favor do<br />

subrogado.<br />

Esta doutrina além de defectiva, cahe diante de uma impossibilidade<br />

jurídica. A subrogacão pôde ser feita pelo devedor, facto incompatível com<br />

a cessão, que »ó pôde sei feita pelo credor. A subrogacão extingue a. divida,<br />

e uma vez extincta a divida, não se compi ehende como o credor possa conserreito<br />

á hypotheca e ti ansfei il a<br />

O jurisconsulto allemão Baehofen di« que não ha explicação á dar, que<br />

i ubrogação é uni facte irreductivel como a successâo no direito do defunto,<br />

isto ê, que, paga a divida hypothecaria e concorrendo os elementos legaes da<br />

subrogacão, o subrogado succède na hypotiheca da divida extíncta.<br />

Jourdan imagina uma theoria, próxima da de Baehofen, que aliás elle<br />

censura energicamente. Segundo Jourdan, a divida e a hypotheca se extinguem<br />

com a subrogacão: creada esta situação, trata-se de saber, a quem<br />

aproveitará o desappareciinento da. divida e da hypotheca: aproveita, diz<br />

elle, áquelle que com dinheiro seu operou a extineção da divida e hypotheca,<br />

com .i condição de 1er elle um direito real sobre a cousa gravada pela hypotheca.<br />

Esta theoria é manca: — não explu-a a .subrogacão em favor daquelle<br />

que paga ou fornece dinheiro para > pagamento da divida, sem ter direito<br />

real preexistente sobre a cousa hypothecada.<br />

A nós, m).-; parece preferível a theoria de 'Baehofen: — reconhece francamente<br />

a realidade do facto e lhe dá uma explicação simples, que não mutila<br />

a subrogacão e que não répugna aos processos usuaes do Direito.<br />

(23) Décret, n. 3463 arl 217 Ye.i. h . 24 S 3 de reb. aueto. jud. posit.<br />

42, 5. Jourdan, cap. 39. § 2.<br />

(24 1 Dei n. 1237. art. 13 Vej. o arl 248 do Décret n. 3453 e a nota 9<br />

ao § 2">1 acima.<br />

(25) Lei, art. 13, Décret, art. 248. Décret, de 14 de Julho de 1759:<br />

"subrogado representa a pessoa e faz as vezes daquelle em cujo lugar se<br />

subroga." Dá noticia deste Décret. Fernandes Thomaz no seu Repertório.<br />

36


CAPITULO VIT.<br />

§ 253.—Effeitos cia hypotheca.<br />

A hypotheca—direito constituído em favor do credor —<br />

produz três ordens de effeitos:<br />

a) Effeitos em relação ao senhor do imniovel;<br />

b) Effeitos em relação aos terceiros detentores do immovel;<br />

c) Effeitos em relação aos diversos credores do mesmo<br />

devedor, quer hypotheearíos, quer privilegiados ou simples chirografarios.<br />

I. § 251.—E/feitos em relação ao dono do imniovel.<br />

A hypotheca consiste no vinculo real que prende o objecte<br />

gravado ao cumprimento da obrigação ( § 1 74 ); ella, pois,<br />

deixa na pessoa do senhor do imniovel o domínio com todos os<br />

seus corollarios, salvo as limitações que o dito vinculo impõe<br />

Assim o dono do imniovel, quer elle o houvesse bypothecado<br />

por divida sua, quer por divida alheia (2), retém:<br />

1. O direito de ter a cousa sob sua posse e de exercer<br />

os interdictos creados para proteger ou reivindicar essa posse<br />

2. O direito de usar e gozar do imniovel, de perceber-lhe<br />

os íructos, arrendal-o; em fim de tirar delle todas as vantagens<br />

que são compatíveis com a sua natureza (4).<br />

(1) Vej. § 174 acima.<br />

(2) Vej. § 212 acima.<br />

(3) § 7 T. de act. 4, 6.<br />

(4) Fr. 2 § 9 D. de releg. (11, 7); fi\ 35 § 1" de pignorib. (13, 7). Maynz<br />

§ 246 not. 2, Zacarias, S 28íi, ti. 2 e 3.


Às COÜSÀS 543<br />

3. O direito de constituir nelle emphyteuses, usofructo e<br />

servidões. Estes direitos são resoluveis. A resolução se verifica<br />

no caso de execução pela divida hypothecaria (5).<br />

4. O direito de exercer a acção de reivindicação contra<br />

quem quer que injustamente o detenha (6).<br />

5. O direito de consummar a prescripção acquisitiva que<br />

se achava em andamento ao tempo da constituição da hypothecs<br />

(7).<br />

§ 255. — Pôde o devedor bypothecar o mesmo ímmovel<br />

segunda ve~ í<br />

1. O systema hypothecario é organisado no sentido de dar<br />

ao credito real todo o elasterio de que elle é capaz.<br />

A lei, pois, permitte ao proprietário tirar do seu Ímmovel<br />

todo o proveito que offerece, corno fonte de credito guardados,<br />

porém, os limites que a boa fé e o direito alheio<br />

impõem.<br />

2. Assim o devedor que constitue hypotheca em um immovel,<br />

não fica inhibido de hypothecal-o segunda vez a novo<br />

credor, desde que o valor do mesmo immovel é sufficiente para o<br />

pagamento de todas as dividas hypothec arias (H)<br />

3. Se a primeira hypotheca se extingue por qualquer razão<br />

de direito, como por pagamento, renuncia, prescripção, a<br />

segunda hypotheca retrahe a sua compreheiisão ao immovel todo<br />

e exclue em conseqüência as hypothecas posteriormente constituídas<br />

ou iuscriptas (')).<br />

Se do uso e gozo res-ultarem deteriorações que tornem o irrumovel insufficiente<br />

para garantir a divida, ao credor assiste o direito de pedir reforqo,<br />

c de, em caso de recusa, exigir o pagamento incontinente. Lei, n. 1.237. art. 4<br />

S 3, Décret, n. 3.453, art. 128.<br />

(5) Fr. 205 I). de reg. jur. (50, 17), C. 15 C. de pignorib. (arg.) S, 14;<br />

Maynz S 24fi, not. 5. A utilidade pratica que lia. em constituir os ditos direitos<br />

reaew no immovel hypothecado, é — que. paga a divida e extincta a<br />

hypotheca, elles ficão subsistindo e desde a data da sua constituição.<br />

(G) Fr. 40 pr. D. de pignorib. 13, 7; fr. 205 1). de reg. jur. 50, 17,<br />

Maynz S 246, nota 2.<br />

(7) Fr. 16 D. de usurp. 41,3, Ma-keldey § 350, n. 3.<br />

(8) Lei, n. 1.237, art. 4 § 7, Cod. Criminal, art. 204 § 3.<br />

!)) Lei, cit. art. 4 § 7. A lei allude expressamente ao caso de extin-


èèo Î3IRE1Ï0<br />

4. Pôde a segunda hypotheca ser feita no mesmo instrumento<br />

em que é constituída a primeira; mas neste caso é essencial<br />

a declaração de que ella só comprehoude os remanescentes<br />

ou sobras (10). Em falta de uma tal declaração, entende-se que<br />

o imniovel é dado em uma só hypotheca (in solidam) aos demais<br />

credores em condições ig-uaes, sem prelação de uns sobre outros<br />

(11).<br />

5. Se o devedor hypotheca segunda vez o immovel e o<br />

valor delle não basta para cobrir as dividas garantidas, a segunda<br />

hypotheca é sempre valida (12), ainda nos casos em que a lei a<br />

prohibe (13). Tornal-a nulla seria na verdade converter em<br />

cção por pagamento, mas subsiste a mesma razão nos outros casos de extincção<br />

de hypotheca. A lei, pois, exprimiu o que pleurumque fit.<br />

(10) A segunda hypotheca pôde sei passada na mesma ou em diversa<br />

oseriptüra. Tanto n'um como n'outro caso ©e costuma declarar que a secunda<br />

hypotheca só recahe no que sobrar, paga a primeira. A dita clausula<br />

é usada não só para firmar a orãem da hypotheca, como para afastar a suspeita<br />

do estellionato do citado art. 264 § 3 do Cod. Crim.<br />

(lá) Maynz § 246, not. 8, 19 e 21, Lemonnier, n. 127 e 128. E' a doctrina<br />

corrente em todas as legislações.<br />

(13) A disposição do Cod. Crim. art. 264 é a seguinte:<br />

'•julgar-se-ha crime de estellionato:<br />

"§ -3." A hypotheca especial da mesma cousa a diversas pessoas, não<br />

chegando o seu valor para pgaamento de todos os credores hypothccarios. "<br />

O elemento moral da dita espécie de estellionato consiste na fraude, no<br />

dolo, pelo qual o devedor obtém dinheiro do segundo credor, occultando a existência<br />

da primeira hypotheca, e dest'arte enganando-o com uma graantia illusorUt.<br />

Assim é corrente que deixa de haver estellionato, sempre que o devedor<br />

declara ao segundo credor a existência da primeira hypotheca. E tal<br />

é d doctrina do Direito Romano, fonte do citado art. 264. Pr. 3, § 1, Stelionatus,<br />

47, 20. Maxime si quis rem alii obligatam, dissimulata obliyatioiie, per<br />

ealliditatem alia distraxerit. Voet, D. eodem, n. 2; Idemque est, si rem<br />

aliei-; rursus obliget, dissimulata olãigatione. Vej. também o fr. 36 § 1." J>.<br />

de pignorib. act. 13, 7, e Maynz, § 246, Observât.<br />

Entendida neste sentido a disposição do § 3 art. 264 do Cod. Crim., é<br />

fora de duvida que a segunda hypotheca, ainda quando o valor do imniovel<br />

não 6 sufficiente para o pagamento de todos os credores hypothecarios. nãc<br />

pôde constituir estellionato, estando inscripta a primeira hypotheca.<br />

No systema da lei n. 1.237 a publicidade, feita a inseripção, se presume,<br />

juris et jure. A ninguém com efifeito é licito allegár ignorância da hypotheca<br />

inscripta (Vej. § 226 acima).<br />

Isto posto, o devedor, inscripta a primeira hypotheca, não pôde iljudir


DAS COUSAS 551<br />

prejuízo do segundo credor uma providencia que foi introduzida<br />

principalmente em favor delle para resguarda-lo das machinações<br />

da fraude (14).<br />

6. A segunda hypotheca, no caso figurado, corre as vicissitudes<br />

seg-uintes:<br />

a) Se a primeira hypotheca foi inscripta antes delia,<br />

prevalece a primeira (15).<br />

b) Se ambas forão inscriptas ao mesmo tempo, vingão uma<br />

e outra e occupão a mesma ordem (lb).<br />

c) Se a segunda hypotheca foi inscripta antes da primeira,<br />

triunfa a segunda (17).<br />

d) Prevalecendo a primeira por haver sido inscripta em<br />

data anterior, a segunda, uma vez extincta a primeira, passa a<br />

subsistir no immovel todo (18).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 812 — O dono do immovel hypothecaão póãe constituir sobre elle,<br />

mediante novo titulo, outra hypotheca, em favor do mesmo, ou de outro credor.<br />

a bôa fé do segundo credor, porque ahi está o registro, fonte de informação<br />

para os interessados.<br />

O credor, por sou turno, não pôde allegar ignorância, porque a publicidade<br />

do registro legalmente a exclue. Se acceita hypotheca sobre o immovel<br />

já gravado de outra hypotheca, é porque quer e não porque se deixasse illudir.<br />

Desapparece. pois, o elemento moral do delicto. Nemo videtur fraudare<br />

eos qui sciunt et consentiunt (fr. 154 D. de reg. jur. 50, 17).<br />

No sentido exposto entendem os escriptores francezes o art. 2.059 do C.<br />

Civil. Vej. Mourlon 111, n. 1.197.<br />

Se, porém, a primeira hypotheca já estava reduzida á escriptura publica,<br />

mas não tinha sido ainda inscripta, e o devedor faz segundo hypotheca a<br />

terceiro: se em tal caso a primeira é inscripta antes da segunda, dá-se o estellionato,<br />

porque a bôa fé do segundo credor, visto ignorar elle a existência<br />

da primeira hypotheca. foi illudida e a fraude triumphou.<br />

Vem em confirmação da doctrina expedida PS disposições da lei n. 1.237,<br />

art. 9 .§ 22 e Decree, n. 3.453, art. 198 e 212. Vej. acima § 237. n. Ill e<br />

238, n. 5.<br />

(14) C. 6 C. de legJbus : Quod favore quorumdam constitutum est.<br />

quibusdam casibus ad l;esionem eorum nolumus inventum videri.<br />

(15) Dei, n. 1.237, art. 2 § 9, Décret, art. 115.<br />

(IG) Dei, cit. art. 2 § 9 Décret, art. 47, 48 e 49.<br />

(17) Dei, cit. art. 2 § 9 Décret, art. 115. Se a primeira não está inscripta,<br />

não pôde ser allegada contra terceiros.<br />

(18) Dei, art. 4 § 7.


552 DIKËITO<br />

§ 256. —Pude o devi dor alienar o immovel hypothecado ?<br />

A' cerca da alienação da cotisa hypothecada, lia a fazer as<br />

disüncções seguintes:<br />

1 . A alienação é em si mesma valida, mas não prejudica<br />

as hypothecas especiaes inseriptas, nem as gentes (19) anteriores<br />

em data, inseriptas ou não (20).<br />

A alienação, pois, transfere o domínio sobre o immovel<br />

ao adquirente; o immovel, porém, passa ao adquirente com o<br />

onus hypothecario (2 1 ).<br />

2. A alienação do immovel gravado com 113'potheca especial,<br />

constitue o crime de estellionato, se ao tempo em que se consumma,<br />

a hypotheca ainda não estava inscripta, e o adquirente<br />

não foi avisado da existência delia (22). Concorrendo as mesmas<br />

circurnstancias, incorre igualmente nas penas do estellioua'o o<br />

responsável por hypotheca geral, que aliena qualquer dos seus<br />

immoveis (23).<br />

II. § 257. — Effeit os da hypothec a cm relação a terceiros<br />

d'tent ores.<br />

1. O effeito da hypotheca em relação a terceiros detentores<br />

consiste, como em outro lugar se disse, no direito de sequela.<br />

(24).<br />

A hypotheca, como direito real que é, acompanha o immovel<br />

pelas mutações por que passa e subsiste sempre em pleno<br />

vigor, emquanto não se extingue por algum dos modos legaes<br />

(25).<br />

O direito de sequela c o próprio direito hypothecario em<br />

acção;—é o direito em virtude do qual o credor pôde ir haver o<br />

(ií>) Hypothecas geraes — a da 'mulher casada, e a de menores c interdictos.<br />

(20) Vej. § 227.<br />

(21) Fr. 205 D. do reg. jur. 50, 17, Novella 112 cap. 1; fr. 18


DAS COUSAS 553<br />

immovel em posse de quem quer que o detenha e ftiüel-o vender<br />

em praça (26).<br />

2. Attenta a virtude do direito de sequela, não desfazem<br />

nem offendem a hypotheca os actos seg-uintes:<br />

a) As alienações posteriores do immovel, no todo ou em<br />

parte, por titulo oneroso ou gratuito, singular ou universal, esteja<br />

o adquirente de boa ou má fé (27).<br />

b) A desmembração de qualquer dos elementos que formão<br />

o dominie, como a constituição de usufructo, servidão, anticlirese.<br />

Estes direitos se resolvem com a execução do immovel<br />

pela divida bypothecaria (28); salvo se os respectivos títulos<br />

forão transcriptos anteriormente á inscripção da hypotheca<br />

(29).<br />

c) Os contractus dos quaes resultão direitos puramente<br />

pessòaes em relação ao immovel. como o arrendamento a curto ou<br />

longo prazo, quer celebrado antes, quer depois de constituída a<br />

hypotheca (30).<br />

3. O direito de sequela, é exercido contra o terceiro detentor,<br />

por via de penhora, em execução da sentença condemnatoria<br />

do devedor (31).<br />

(26) Lei n. 1237 de 24 de Setembro de 1864, art. 10 § 1.° 3." e 4.°, Décret,<br />

n. 3453 de 26 de Abril de 1865, art. 309, Ord. 4, 3 pr. :<br />

"Se o devedor que obrigou alguma sua cousa ao seu credor, a vender a<br />

o-utrem ou a alhear por qualquer outra maneira... passará a cowsa com seu<br />

encargo da obrigação e poderá o credor demandar o possuidor delia... para<br />

haver por ella pagamento de sua divida."<br />

(27) Lei n. 1237, art. 10 § 1." e 4.° Ord. 4, 3 pr. "...a vender a outrem<br />

ou a alhear por qualquer outra maneira." Tropíong, III. n. 775, Pont II,<br />

n. 1.112 e 1113. Voet, Tandect. 20, I, n. 13: "Lffectus hypothecs in eo consists<br />

quod res ipsas afficiat, deinceps transituras cum suo onere in quemvis<br />

possessorem, sive 111» oneroso sive lucrativo titulo in alium, sive conscium,<br />

sive ignarum vinculi pignoris, translata; «int." Bynkersoek J. P. L. 2 c.<br />

16 n. 8.<br />

(28) Lei, art. 8, Décret, art. 264. Em França ha questão á respeito.<br />

Troplong III, n. 777 Us.<br />

(29) Vej. os artigos citados em a nota precedente. .<br />

(.30) Lei, art. 6 § 1.°: "Os outros onus que os proprietários impuzorem<br />

aos seus prédios, se haverão como pcssoaes; e não podem prejudicar os credores<br />

hypothecarios *' Décret, art. 263. Cfr. a ord. 4, 9.<br />

(31) Lei. art. 10 § 5, Décret, art. 309 e 310. Vj. § 271 adiante.


554 DIREITO<br />

§258.—Posição do terceiro detentor.<br />

1. O terceiro delei/lor, como adiante se dirá. pôde se eximir<br />

plenamente dos effeitos do direito de sequela, operando a remissão<br />

do imraovel (32" 1 .<br />

Mas, se não põe cm pratica aquelle alvitre, fica exposto<br />

a soffrer a expropriação judicial do immovel (33).<br />

Esta necessidade em que o detentor se acha de soíírer a<br />

expropriação judicial, é uma conseqüência directa da hypotheca.<br />

Na verdade, o terceiro detentor não contrahiu obrigação alguma<br />

pessoal para com o credor, mas a posse em que elle está do immovel<br />

hypothe:ado o sujeita á obrigação, por assim dizer, real<br />

vinculada ao objecto (34).<br />

2. O detentor que. por não haver remido o immovel, está<br />

obrigado a supportar a expropriação judicial, pôde evital-a:<br />

a) ou pagando integralmente a divida hypothecaria (35).<br />

b) ou oppondo certas excepções de direito (36).<br />

3. No sentido genérico, detentor significa todo aquelle que<br />

tem o objecto sob seu poder physico. No sentido, porém, em<br />

que é empregado na relação sujeita, exprime o terceiro que possue<br />

o immovel com animo de senhor, como por, exemplo, aquelle que<br />

o houve por compra por suecessão, o que está em via de prescrevel-o.<br />

Assim a lei as mais das vezes o domina adquirente<br />

(37).<br />

Não estão, portanto, sujeitos ao seqüestro, execução e aos<br />

corollarios resultantes, aquelles que são meros detentores do immovel,<br />

como o depositário, o colono, o arrendatário, o leitor, o<br />

administrador. Nestes casos a execução deve correr contra o<br />

verdadeiro possuidor, isto c, contra a pessoa que os detentores<br />

representão (38).<br />

(32) Vej. S 262 adiante.<br />

(33) Lei, n. 1237, ant. 10 S 1.", 3." e 4." Décret, n. 3457, art. 293 e 309.<br />

(34) Orel. 4, 3 pr... "passará a cousa com sou encargo da obrigação."<br />

E' a obrig


DAS COUSÁS<br />

§ 259.—Expropriaiao foiçada<br />

555<br />

1. O adquirente que se resigna á soífrer a expropriação judicial<br />

do immovel hypotliecado, fica obrigado:<br />

L? A figurar de réo em todos os actos da execução<br />

( 39 ><br />

- 2 o A receber o immovel por adjudicação, quando não haja<br />

lançador (40), preenchendo d'est'arte a differença entre o preço<br />

da acquisição e o da avaliação (41).<br />

O preço da avaliação<br />

acquisição (42).<br />

nunca será inferior ao preço da<br />

3'' A. pagar as despezas e custas judiciaes (43).<br />

4 o . A indemnisar aos credores hypothecarios a diminuição<br />

do valor do prédio, proveniente das deteriorações por elle<br />

causadas (44).<br />

2. O adquirente, porém, não responde:<br />

a) Pela perda ou deterioração do iminovel procedente de<br />

causa<br />

(45).<br />

estranha á sua vontade, como incêndio, inundação<br />

b) Nem tao pouco, porque não contrahiu obrigação pes­<br />

soal para com os credores, pela differença entre a importan­<br />

ts)) Lei n. 1237, art. 10 § 1.° e 3, Décret, n. 3.453. art. 309 § 1".<br />

(40) Décret, art. 312.<br />

(41) Lei, art. 10 § 3, Décret, art. 309 § 3.° No caso de adjudicação o<br />

adquirente é obrigado a depositar o preço da avaliação. Se o preço da avaliação<br />

é superior ao da acquisição, é evidente que o detentor adianta a differença.<br />

Vej. § 261.<br />

(42) Lei, art. 10 § 3 m-fine, Décret, art. 311.<br />

(43) Lei, art. 10 § 3, Décret, art. 309 § 2." Quaes são as despezas judiciaes<br />

que não entrão na definição de custas? Veja Pereira e Souza. Nota.<br />

(44) Lei, art. 10 § 1." Décret, art. 309 § 4." Esta indemnisação só pôde<br />

ser pedida por acção: depende da prova do damno causado, de quem foi a<br />

causa, e de avaliação.<br />

O adquirente possue o immovel como seu, obra portanto em relação á<br />

elle com a consciência de dono; parece, pois, que não devia ser responsável a<br />

terceiros pela diminuição de valor resultante de seus actos. Qui quasi rem<br />

suam neglexit, nulli querela subjectus est. (fr. 31 § 3 D. de heridet. pet.)<br />

A publicidade da hypotbeea, porém., modifica esta doctrina: o adquirente suppõe-ee<br />

legalmente sabedor da hypotheca pela inscripção; tomando, pois, posse<br />

do immovel, é tido como se fora guarda delle. Pont II, n. 1199, Mourlon III,<br />

n. 1657.<br />

(45) Pr. 16 § 3 D. de pig. 20, 1. Pont II, n. 1201, Mourlon n. 1657.


556 DIREITO<br />

cia total da divida e o preço da arrematacão ou o da adjudicação<br />

(46).<br />

3. A faculdade de abandonar a cousa para se eximir da<br />

obrigação real inhérente á posse da mesma cousa, é um direito<br />

de todo o possuidor. E' esta a cloctrina do Direito Romano e das<br />

legislações dos povos cultos (47). A nossa lei, porém, rompendo<br />

com a sciencia e com a tradição, abolio em materia de hypotheca<br />

aqiiella faculdade e colloca o adquirentc na necessidade, se não<br />

puder evita Ia pelos outros meios, de soffrer a expropriação judicial<br />

com todos os seus corollarios (48)<br />

4. O terceiro detentor tem direito a haver dos credores hypothccarios<br />

a iudeninisação das bemfeitorias necessárias e úteis<br />

que houver feito no immovel, pelo principio de que elles vertem<br />

cm utilidade desses credores (49).<br />

O dito direito, porém, é puramente pessoal. E para torna-lo<br />

effectivo o detentor não pôde usar da /eiei/nlo, porque a retenção<br />

não pode ser opposta á hypotheca (50;, nem induzir preferencia,<br />

porque a lei não lh'a dá (51):<br />

O terceiro detentor vem a ser, pois, um mero credor chirog-raíario<br />

do valor das bemfeitorias.<br />

§ 260. — Pagamento integral da divida : cxcepções de direito.<br />

1. O terceiro detentor que é obrigado a soffrer a expropriação<br />

forçada por não ter opportunamente remido o immo-<br />

(4(!) Maynz § 252. A lei não impõe tal obrigação, nem ella resulta juridicamente<br />

da posição do detentor.<br />

(47) Ff. 66 pr. D. de evict. 21, 2, Maynz, [§ 252, c) not. 18, Ord. 4, 3 pr.<br />

'• poderá o credor demandar o possuidor delia que ou lhe pague a divida. .. ou<br />

lhe dê e entregue a dita cotisa" Cod. Oivil francez, art. 2168.<br />

(48) Lei, art. 10 § 2, Décret, art. 314. E' uma injustiça que nada justifica.<br />

Esta idéa foi ventilada em França por occasião do projecto de reforma<br />

hypothecary de 1848, mas não triumphou.<br />

(49) Fr. 29 § 2 de pig. et hyp.; Cod. Civil, franc, art. 2175, Pont. II,<br />

D. 1205 e seg. Mou r Ion IIT, n. 1657.<br />

A indemnisaçâo é devida pelo custo das bemfeitorias, se o custo é inferior<br />

ao valor accresccntado; pelo valor das bemfeitorias, se o custo é superior.<br />

Veja acima § 40.<br />

(50) A' hypotheca só podem ser oppostos direitos reaes anteriorrn<br />

transcriptos. Lei art. 6 §§ 1.° e 2."<br />

(51) As preferencias que não derivão da hypotheca, não lhe podem ser<br />

oppostas. Lei, art. 5 § 2° Pont. II 1208, Zacarias § 287 e notas 11.


DAS COüSÂS SS7<br />

vel, pôde evita­la ou suspendê­la. pagando a divida hypothecaria<br />

(52).<br />

1'7 mister, porém, para alcançar aquelle resultado, que<br />

pague integralmente a divida e juros, ainda que só possua uma<br />

parte do immovel (54). Esta disposição é uma conseqüência da<br />

indivisibilidade da hypttheca (54).<br />

2. E' de advertir que a alienação que o devedor fax do<br />

immovel, não derroga o termo e as condições da divida. 0<br />

terceiro detentor, por conseqüência, g­osa do praso concedido ao<br />

devedor (55),<br />

3. O Direito Romano (56) e a nossa antiga legislação<br />

concedião ao terceiro detentor o beneficio de ordem ou execução,<br />

isto é. o direito de forçar o credor hypothecario a executar primeiro<br />

os bens do devedor e seus fiadores, quer a h} r potheca fosse<br />

geral, quer especial (57). Hoje não é mais licito ao detentor usar<br />

daquelle beneficio : abolio­o a lei (58).<br />

4. Pôde, porém, o detentor oppor ao credor hypothecario,<br />

além das excepções g"eraes de nullidade da divida, de pagamento,<br />

de prescripção. (59) a excepção chamada de garantia,<br />

como no caso do credor se tornar herdeiro da pessoa de quem o<br />

adquirente houve o immovel (60).<br />

(52) Fr. 16 § 3 D. de pig. et hypothec. 20, 18; fr. 2, 12 § 1." D. quit»,<br />

•mod. solvit. 20, 6, Ord. 4, 3 pr... "e poderá o credor demandar o possuidor<br />

delia que ou lhe pague a divida, ou..." Lei n. 1237, art. 10, § 3, Décret,<br />

n. 3453, art. 310 § 3.<br />

(53) Lei, art. 10 § 3, Décret, art. 310 § 3. Veja­se Pont II, n. 1130<br />

Zacariœ § 287.<br />

(f>4) Pont 11, n. 1130, Troplong. III, n. 788. Aquelle que possue uma<br />

parte do immovel hypothecado fica hypotheeaiiamcnte responsável por toda<br />

il.vida; se resta só uma parcella da divida á pagar, sem erwbargo a hypotheca<br />

subsistirá na totalidade do immovel. Veja § 176 acima.<br />

(55) Troplong. III, n. 788.<br />

(56) \Novella 4 cap. 2, CVIaynz § 252.<br />

(57) Ord. 4, 3 p. "Demandando, porém, o credor primeiro o seu devedor,<br />

e fazendo em seus bens e de seu fiador (se o tiver dado) execução como<br />

se por Direito deve fazer."<br />

(58) Lei, art. 10 § 2, Décret, art. 313.<br />

(59) iSe a divida está paga ou prescripta, a hypotheca se considera extineta.<br />

portanto C fora de duvida que o detentor pôde invocar taes excepções.<br />

(60) Quem de erdetione tenet actio, etwndem. agenten repellit exceptio.<br />

]■',' ;\ celebre excepção ãoli moli. Veja Pothier, Orleans. 20, n. 41, Troplong III,<br />

n. 806, Pont II, n. 1167, Martou, III, n. 1273.


558 DIREITO<br />

A cxccpção de cedeiicia de acções (ceden darum aetionum)<br />

não é admissível no nosso Direito (61).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 816* — tj 4 o Disporá de ai cão regressiva contra o vendedor, o adquirente<br />

que soffrer expropriação do immovel mediante licitação, ou penhor a, o que pagar<br />

a hypotl eca, o que por causa da adjudicação ou licitação, desembolsar com o<br />

pagamento da hypolheca importância excedente á da compra e o que supporlar<br />

custas e despesas judiciaes — g8$ II.<br />

§ 261. — Acção regressiva do adqnirente contra o vendedor.<br />

1. O adquirente. que soífreu a expropriação forçada ou<br />

pagou a divida hypothecaria, tem a acção regressiva contra o aliénante<br />

do immovel para rehaver :<br />

A) No caso de expropriação :<br />

1." As despezas e custas judiciaes (62) ;<br />

2.° O preço da acquisição, seja o havia pago (t>3) ;<br />

3? A differença entre o preço de acquisição e o valor por<br />

que lhe foi adjudicado o immovel (64) ;<br />

4." As despezas e damnos que lhe causou a expropriação<br />

(65).<br />

Se o preço, pelo qual o immovel foi arrematado, é superior<br />

á importância da divida, juros e despezas, o adquirente recolhe o<br />

excesso (66).<br />

B) No caso de haver evitado a expropriação, pagando a<br />

dívida :<br />

1.° A importância que despendeu com a solução da divida,<br />

se o preço da acquisição já estava pago (67) ;<br />

(61) Veja adiante § 261, n. 4.<br />

(62) Lei, n. 1.237, art. 10 «§ 8, Décret, n. 3.453, art. 315 § 4.<br />

(63) Loi, art. 10 § 8, Décret, art. 315, |§ 2. Se o preço ainda não estava<br />

pago, 6 claro que o detentor não tem direito a havel-o. Mourlon, III, n. 1.662.<br />

(64) Lei, art. 10 § 8, Décret, art. 315 § 3. O adquirente tem direito a<br />

esta differença quer o pi-eço esteja pago, quer não.<br />

(65) Troplong III, n. 838 e 844. Ord. 3. T. 45 § 3. Dootrina das Acções<br />

§ 355 nota 825.<br />

(66) Mourlon, III, n. 1.626, n. 5 e n. 1.704, Pont. II, n. 1.394, Vej.<br />

S 265, nota 16.<br />

(67) Lei, art. 10 § 8, Décret. 315 § 2.<br />

(68) Mourlon, III, n. 1.662, I o .


t>ÀS COUSÀS 559<br />

2." Ou, se o preço não está pago, a differença entre a importância<br />

despendida e o dito preço (68).<br />

A acção regressiva, de que se trata, não é senão a propria<br />

acção de evicção. a qual, como se sabe. compete a todo adquirente<br />

por titulo oneroso contra o aliénante para obrigai o ou a<br />

lhe restituir o preço, perdas, e damnos, se a cousa lhe foi tirada,<br />

ou a lhe satisfazer as despezas que fez para assegurar a posse<br />

da cousa, perturbada por causa preexistente á alienação (69).<br />

2. Pode acontecer que o aliénante não seja o devedor,<br />

como se elle houvesse hypothecaclo o prédio por divida alheia<br />

ou o houvesse adquirido já onerado de hypotheca. Ainda neste<br />

caso tem o terceiro detentor acção de evicção contra o aliénante<br />

(71) ; e a de gestor de negócios contra o devedor (7l).<br />

3. Se o titulo pelo qual o terceiro detentor adquirio o itnmovel,<br />

é uma doação, não lhe assiste acção de evicção contra o<br />

doador, pois que o doador não está obrigado a evicção (72), mas<br />

pôde usar da acção de gestor de negocio ou contra o próprio doador,<br />

se elle é o devedor da quantia a que o immovel se acha<br />

trypothecado (73), ou contra quem quer que seja o devedor (74).<br />

4. No estado actual do nosso Direito o facto da expropriação<br />

forçada ou do pagamento da divida hypothecaria não induz<br />

a subrogação legal do detentor nos direitos e acções do cre/.or.<br />

O detentor, portanto, não poderá exercer os direitos e acções do<br />

credor hypothecario, senão mediante cedeucia expressa e por escriptura<br />

publica da divida e hypotheca (75).<br />

(69) ürd. 3, 45 § 3, Trop long III, n. 844, Vente n. 415. Mourlon III,<br />

n. 1.661, Pont II, n. 1.218, Zachar. § 355. S' de advertir que no caso sujeito<br />

não lia necessidade de chaanamento do aliénante á authoria. A lei (art,<br />

IO ^ S) na.i a exige. Troplong". cit. n. 844.<br />

(70) L,ei, art. 10 § 8, Mourlon 111, n. 1.662.<br />

(71) Mourlon, III, n. 1.662, Pont II, n. 1.218, Martou 111. n. 1.381.<br />

Aquelle que paga a divida alheia, não fica sobrogado nos direitos do credor,<br />

mas é considerado como gestor de negócios do devedor e põ-r via da actio rtegotíorum<br />

yesiorum pôde haver a importância do devedor. Mourlon loc. cit.<br />

(72) Mourlon III, n. 1.663.<br />

(73) Mourlon, III, n. 1.663. Na verdade o donatário não contrahe a<br />

obrigação de pagar as dividas do doador.<br />

(74) .Mourlon, III, n. 1.663.<br />

(75) Lei, art. 13, Décret, art. 245-248 e § 252 acima.<br />

Notsta subrogaqão ha a attender-se a subrogação da divida e a subrogação<br />

da hypotheca. A da divida pude «ser por simples esdipto particular, se a di-


560 DIKÍÉITO<br />

Ha toda conveniência para o detentor em obter a cedencia<br />

das acções e hypotheca dos credores. Armado dos direitos dos<br />

credores, elle poderá, no caso de surgirem novos credores por<br />

hypotheras posteriores sobre o immovel, excluil-os em concurso<br />

de preferencia (77) ; poderá ainda haver as iudemnisações, que<br />

lhe são devidas, pelo preço de outros immoveis pertencentes ao<br />

aliénante e que houvessem sido hypothecados conjuuctamente<br />

com o immovel que lhe foi expropriado ou que elle reteve por<br />

haver pag-o a divida (77).<br />

§ 262. — Remissão.<br />

1 . O adquirente de immovel que vem g-ravado de hypotheca<br />

no todo ou em parte, fica sujeito, como já se disse, a<br />

vida for daquellas que podem ser contrahidas- por um tal meio; a da hypotheca<br />

deve ser sempre por escriptura publica (Vej. § 252).<br />

Mas a propria subrogação da divida deve ser expressa, pois fora dos casos<br />

declarados era lei não se admitte a subrogação necessária. E tal era a<br />

dootrina do Direito Romano. Vej. Olea, de Cession. T. 4. q. 1, Mayns II,<br />

S 273. Coelho da Rocha (§ 153, n. 5) e O. Telíes (Dig-. Port. I, art. 1.097)<br />

,,-ustontão que segundo o nosso Direito o possuidor que pagar a divida hypothecaria,<br />

fica legalmente subrogado nos direitos do credor. Aquelles illustres<br />

escriptores applicarão ao nosso direito uma disposição de direito estrangeiro,<br />

expressa em textos positivos. (Cod. Civil fr. art. 1.251). Mas como resolver<br />

com textos de lei estrangeh-a uma questão, como a da subrogação necessária,<br />

i|iie não pôde ser resolvida, senão por texto expresso que não temos?<br />

Por Direito Romano o possuidor podia repeilir a expropriação judicial<br />

com a excepção cedendarum actionum, isto é, tinha o direito de forçar o credor<br />

a lhe fazer cessão expressa da divida e hypotheca, sob pena de não proíseguir<br />

a execução contra elle. Maynz I. § '252, not. 32.<br />

Será uma tal pratica admissível no nosso Direito, segundo o qual também<br />

a hypotheca não se entende subrogada senão mediante cessão expressa?<br />

Parece-nos que não. A lei dá ao credor hypothecario o direito absoluto e<br />

incondicional de ser pago pelo immovel hypothecado. A obrigação de ienunciar<br />

o seu direito em favor do possuidor que lhe paga a dívida, renuncia que<br />

lhe pôde ser prejudicial no caso da hypotheca abranger outros immoveis que<br />

lhe garantão outro credito contra o mesmo devedor, é um limite e um onus<br />

que não pôde ser admittido sem disposição expressa. C. Telles


DÃS coüsAè Sbt<br />

soffrer à expropriação forçada ou a pag - ar integralmente a divida<br />

hypothecaria (78).<br />

A expropriação forçada, além de expol-o á perda do immovei,<br />

onera-o com accrescimo de despesas e com as custas<br />

judiciaes (79). O pagamento integral da divida é sempre vexatório,<br />

sobretudo quando a importância dessa divida excede o<br />

preço de acquisição (80).<br />

E n'um e n'outro caso corre o adquirente o risco de não<br />

poder rehaver o preço, se já o pagou e o aliénante se acha em<br />

estado de insolvabilidade.<br />

Para prevenir contingências taes, a lei ministra ao adquirente<br />

um meio de efficacia decisiva — a remissão (81).<br />

2. Consiste a iemissão em libertar o immovel da írypotheca<br />

ou hypothecas, pagando aos credores as dividas, não pela<br />

sua importância total, mas até a concurrencia do preço ou valor<br />

do mesmo immovel (82).<br />

E' da maior conveniência para a ordem civil e econômica<br />

o dar ao adquirente meio prompto de liquidar o seu dominio<br />

sobre o immovel e de escoimal-o de toda incerteza, por quanto a<br />

seg-urança e a firmeza do dominio facilitão a circulação dos bens.<br />

A remissão créa um momento de completa e absoluta libertação<br />

do immovel (83).<br />

E' esta a sua razão de ser.<br />

E se é de vantag-em para o adquirente ; em nada prejudica<br />

aos interesses dos credores, pois que elles vem afinal a receber<br />

aquillo que estava nos seus cálculos e loi a base de sua<br />

confiança — o valor do immovel (84).<br />

(78) Vej. § 258 acima.<br />

(79) Vej. § 259 acima.<br />

(80) Vej. § 260 acima.<br />

(81) A remissão (purge) é uma creação do Direito .moderno. Nao a<br />

conhecerão os Romanos. A nossa antiga legislação já a consagrava, mas regülava-a<br />

d'uma maneira imperfeita. Vej. Ürd. 4 T. 6.<br />

(82) Lei n. 1237, art. 10 § 4, 5, 7 e 8; Décret, n. 3457. art. 293 e 308;<br />

Ord. 4, 6 pr. "Leve logo e offereoa o preço porque a comprar, perante o juiz<br />

ordinário do lugar... E tanto que isto assim for feito e o preço oCferecido e<br />

consignado, o comprador haverá seguramente a cousa comprada, e nunca lhe<br />

mais poderá ser demandada por algum credor, á que pelo devedor fosse obrigada".<br />

(83) Vej. Pont II, n. 1266, Martou II, n. 1371 e 1376. Palavras de Persil<br />

no seu Relatório de 1847.<br />

(84) Pont II, n. 1266.


S62 DÍRRlTO<br />

3. Da razão de ser da remissão derivão os corollarios seguintes<br />

:<br />

a) A remissão pôde ser requerida e consuminada, ainda<br />

que as dividas não estejão vencidas (S5) ou ainda quando os<br />

credores se abstenhão de vir com as suas acções contra o devedor<br />

(86). A dependência do vencimento das dividas ou das acções<br />

dos credores tenderia a prolonger o estado de incerteza do domínio,<br />

que a remissão é destinada a cortar.<br />

b) E' uma faculdade que compete a todo adquirente (87)<br />

uma vez que elle não tenha fig'urado como parte ou no contracto<br />

de que procede a obrig­açao garantida, ou na convenção da hvpotheca<br />

(88), qualquer aliás que seja o titulo de acquisição,<br />

oneroso, como a venda, a troca ; gratuito, como a doação (89).<br />

c) A remissão é por ig­ual admissivel ainda quando o detentor<br />

houvesse adquirido, não o todo, mas uma parte, divisa,<br />

ou indivisa, do immovel (90).<br />

4. Pois que a remissão tem por fim expurgar o immovel<br />

das hvpothecas preexistentes, é evidente que só podem ser object*)<br />

delia as cotisas e direitos susceptíveis de hvpothecas (92).<br />

Assim que não podem ser remidos o usofrueto, o uso, a habitação,<br />

as servidões (92).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 815 — Ao adquirente do iw/movcl hypothecario cabe igualmente o<br />

íhreito de remil­o. — 849, IV, 985, II.<br />

S 1" — Se o adquirente quizer forrar­se aos effeitos da execução da hy­<br />

/lollieca, notificará judicialmente, dentro em trinta, dias, o seu­ contracto aos<br />

(85) Lei, art. 10 S 10, Décret, art. 303.<br />

(86) Mourlon HI, n. 1681, Martou JY, n. 1410,<br />

(87) Lei, art. lo SS ■'•, l e 8, Ponl H, n, 1270, Mourlon III, n', 1683,<br />

Martou IV, n. 1378.<br />

(88) V't'j. o § seguinte.<br />

(89) O legatario de coüsa singula!' pôde remir o immovel legado; não o<br />

pôde porém o herdeiro o qual se reputa continuar a pessoa do defunto com os<br />

mesmos direitos e obrigações; salvo se ao defunto pertencia o direito de remir<br />

e elle não o exerceu em vida e ainda não está passado o prazo para a remissão.<br />

Ve.j. o § seguinte.<br />

(90) Pont II, n. 1270, Martou IV, n. 1378 in fine. Não ê preciso dizer<br />

que a remissão só eomprehende a parte adquirida pelo detentor.<br />

(91) L/ei, art. 10 § 3 e 4, Décret, art. 298 e 308.<br />

(92) Vej. Décret, art. 141, Pont II. n. 1281 e seguintes, Martou IV,<br />

in f. 380,


Xs cousÀè M<br />

credores hytpoVhecarios, propondo, para a remissão, no minima, o preço por'<br />

que adquiriu o immovel. — 533, 816, § 2 o , 818.<br />

A notificação executar­se­á no domicilio inscripto (art. 840, paragrapho<br />

único), ou por eâitaes, se alli não estiver o credor.<br />

§ 2" — O credor notificado pôde, no prazo assignado para a opposição,<br />

requerer que o imm,ovel seja licitado. — 816 e § 1".<br />

Art. 814 — A hypotheca anterior pôde ser remida, em, se vencendo, pelo<br />

credor da segunda, se o devedor não se offerecer a remil­a.<br />

S 1" —■ Para a remissão, neste caso, consignará o segundo credor a importância<br />

do debito anterior para levantal­a e o d&veãor para remil­a. se quizer.<br />

Ü 2" —O sei/undo credor, que remir a liijpolliecu anterior, ficará ipso facto<br />

subrogadç nos direitos desta, sem. prejuizo dos que lhe com pel irem conl.ru o<br />

devedor com m um..<br />

Art. 818 — A" licito aos interessados fazer constar das escriptnras o valor<br />

entre si ajustado dos iin moveis bupothecados, o qual será a base para as><br />

arrematações, adjudicações e remissões, dispensada a avaliação.<br />

As remissões não serão permittidas antes de realizada a primeira praça<br />

iifcm depois da assignatura do auto de arrematação.<br />

Art. 821 — Nos casos de insolvencia ou fallencia do devedor hypoihecatio, o<br />

direito de remissão devolve­se á massa, em prejuizo da qual não poderá o credor<br />

impedir o pagamento do preço por que foi avaliado o immovel. O restante da<br />

divida hypothecaria entrará em concurso com as chirograph ar ias.<br />

No caso de insolvencia. cabe. aquelle direito aos credores em concurso<br />

Art: 822 — Pôde o credor liypothecario, no caso de insolvcncia ou fallen<br />

cia do devedor, para pagamento de sua divida, requerer a adjudicação do im<br />

movei, 'avaliado em quantia inferior a esta, desde que dê quitação pela sua<br />

totalidade.<br />

Ait. 823 — São nulla*;, em beneficio da massa, as hypothecas celebradas,<br />

em garantia de débitos anteriores nos 40 dias precedentes­ á declaração legal de<br />

insolvencia ou quebra<br />

§ 263. — O item pode requerer a remissão Ï<br />

c\ remissão presuppoe o domínio, como meio que é de livral­o<br />

do onus hypothecario.<br />

O direito, pois, de remir pertence exclusivamente ao que<br />

adquire domínio sobre o immovel ou está em via de prescreveio<br />

(93).<br />

Uma vez posta cm pratica, a remissão déroba em pontos<br />

importantes o contracto de que procede a obrigação principal e<br />

a propria convenção hypothecaria, a saber :<br />

Quanto á obrigação principal, torna­a vencida antes do<br />

t93) Lei, art. 10 § 3 e 4, Décret, art. 309 e seguintes, l'uni. II, n. 1270,<br />

Zacar. § 293 bis, Mourloii III, n. 1683.<br />

37


564 mi


Ás COÜSÀ.S Sf.S<br />

Não comprehende esta prohibiçao o legatario de cousa<br />

singular, pois que não suecede nas obrigações do defunto (102).<br />

5. O herdeiro, a quem é dado em partilha uma parte do<br />

imniovel hypothecado, embora haja pag-o a sua porção viril. Na<br />

verdade supposto com o pagamento cesse para elle a obrigação<br />

pessoal, todavia fica, como herdeiro, sujeito á convenção<br />

constitutiva da hypotheca, estipulada pelo defunto, e pela qual<br />

o mesmo defunto tomara o empenho de deixar subsistir a hypotheca<br />

até o pag-amento integral da divida (103).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 766 — O successores do deve do* não podem remir parcialmente ò penhor<br />

ou a hypotheca na proporção dos seus quinhões ; qualquer délies, porém, pôde<br />

fazel-o no todo. — 758.<br />

Paragrapho único. O herdeiro ou o successor que fizer a remissão, fica<br />

suorogaão nos direitos do credor pelas quotas que houver satisfeito.<br />

Art. 767 — Quando, excutido o penhor, ou executada a hypotheca, o produelo<br />

não liastar para pagamento da divida e despezas judiciaes, continuará o<br />

devedor obrigado pessoalmente pelo restante. — 1.556.<br />

§ 264. — Fôrma da remissão.<br />

1. A remissão não pôde ser exercida senão por quem<br />

tem dominio sobre o immovel (§ 263). O domínio sobre immoveis<br />

não se adquire senão depois de transe'ripto o respectivo titulo,<br />

se é entre vivos (§ 48). D'ahi vem que o adquirente não<br />

pôde requerer a remissão senão depois de transeripto o titulo de<br />

acquisição (l4).<br />

(102) Mourlon III, n. 1685, 5." Martou IV, n. 1378.<br />

(103) Mourlon III, n. 1686 e 1687, Pont II, n. 1273.<br />

Sustentão alguns eseriptores a opinião contraria, argumentando que —<br />

«íesde (|iie o herdeiro paga a sua quota, da divida, cessa a obrigação pessoal<br />


oòi> DIREITO<br />

A lei marca uni prazo fatal dentro do qual a remissão<br />

deve ser iniciada. Esse prazo é de trinta dias a contar da data<br />

da transcripção (105). Passado o dito prazo, decahe o adquirente<br />

do direito de remir (106).<br />

2. Para se operar a remissão é mister que sejão notificados<br />

todos os credores que têm hypothecas inscriptas sobre o iuimovel<br />

(107).<br />

Na notificação deve o adquirente determinar o inimovel<br />

e declarar :<br />

prietarios precedentes que deixão de satisfazer essa formalidade; basta que<br />

transcreva o seu. Zacarise S 294, nota 2, Martou IV, n. 1.419.<br />

■No systema da nossa lei só são sujeitos á transcripção os actos translatives<br />

do domínio entre vivos (§ 50 acima). Isto posto, se o immovel foi adquirido<br />

a titulo de legado, ha lugar a remissão (§ 263, n. 4); mas o legado<br />

não está sujeito á transcripção. Deverá o testamento ­ser inscripto para que<br />

possa eífectuar­se a transcripção? No caso de resposta negativa, de que<br />

data deve ser contado o prazo de trinta dias? Xa França e na 'Bélgica, onde<br />

subsistt­ ã este respeito disposição análoga â nossa, entendem os escriptores<br />

que para a remissão na hypothèse figurada deve o testamento ser transevipto.<br />

Troplong IV, n. 91)3, l'ont 11. n. 1.291, Martou IV, n. 1.389.<br />

(105) Lei, art. 10 § 3 e 4, Décret, art. 295 e 309.<br />

Esta disposição é tirada da lei francezà II brumavre, an. VII, art. 30.<br />

O Cod. Napòl. (.ait. 2,183), fora do ca.se> de intimação dos credores ao adquirente<br />

para pagar a divida ou largar o immovel, caso em que fixa o prazo de<br />

trinta dias, deixa­lh' a liberdade de requerer a remissão, quando lhe approuver,<br />

feita porém a transcripção. A lei belga no caso de intimação marca o prazo<br />

de trinta dias; na falta de intimação o de um anno.(Art. 110 e 111,Vej,Martou<br />

IV, n. 1.417). Arntz (II, n. 1.931) diz que a lei marca aquelle prazo para que<br />

os credores não sejão obrigados a permanecer longo tempo na incerteza e<br />

paia que não dependa do novo proprietário o escolher á. sua vontade o momento<br />

mais favorável a seus interesses, como por exemplo, o de uma depreciação<br />

accidentai ou passageira.<br />

(106) Décret, art. 295. Dentro dos trinta dias pode o adquirente repellir<br />

a penhora, pois dentro desse prazo lhe é licito fazei­ a remissão a qual<br />

exclue a penhora.<br />

(107) Lei, art. 10 S 3 e 4, Décret, art. 293; Pont. II, n. 1.302, Martou<br />

IV, n. 1.405.<br />

Não ha necessidade de notificar aos credores, cujas hypothecas forão ,inscriptas<br />

depois de transcripto o titulo do adquirente, porque essas hypothecas<br />

não podem ser oppostas ao dito titulo Martou, IV, n. 1.420.<br />

Se algum credor porhypothecaanteriormente inecripta deixa de ser intimado,<br />

a remissão não produz effeito em re;ação a elle. Pont II, n. 1.302,<br />

Martou IV, n. 1.405. Se a in­>cnpc;ao está perempta? Vej. § 249 acima.


DAS COüSAS 567<br />

I. A natureza do titulo de acquisição (108).<br />

II. O nome do aliénante -,<br />

III. O preço pelo qual o houve (109), ou o valor em que o<br />

estima. A pratica de declarar o valor se observa ou quando o<br />

o detentor quer offerecer preço maior que o da acquisição. ou<br />

quando obteve o immovel por titulo gratuito, ou o houve por um<br />

só preço, conjunctainente com outros imnioveis livre's, ou com<br />

cotisas moveis (110).<br />

IV. A offerta de pag-ar aos credores inscriptos a importância<br />

das dividas até a concurrente quantia do preço ou do valor<br />

estimado (111).<br />

A notificação se faz a cada credor no domicilio eleito na<br />

inscripção, e por edital, se ahi não é encontrado (112).<br />

3. Os credores, uma vez notificados, podem ou acceitar o<br />

preço ou valor offerecido, ou requerer dentro de vinte e quatro<br />

horas que o immovel seja posto em licitação (113).<br />

(108) Lei, art. 10 § 4, Décret, art. 296.<br />

109) Lei, art. 10 § 4, Décret, art. 296. No 'pree.0 se devem Incluir todos<br />

os elementos que o compõem, como o onus imposto ao adquirente de pagar<br />

uiiw certa renda por certo prazo. (Troplorig IV, n. 925, Zacar. § 294. c.) Não<br />

é mister advertir que no caso do immovel ser adjudicado a terceiro, este onus<br />

caducav<br />

(110) Dei e Décret, art. citados na nota precedente. Pont II, n. 1.307 e<br />

1.308 e .-eg. Mártou IV, n 1.307, .Mourlon III, n. 1.705.<br />

(111) Lei, art. 10 § 4 e 7. Décret, art. 293, 296 e 298. Pont II, n. 1.318.<br />

Zacar. S 294. 3". Assim se H divida hypothecaria fôr de importância inferior<br />

ao preço, o adquirente só pagará ;i importância da divida: se de importância<br />

Superior, só até o preço offerecido ou fixado pela licitação.<br />

O Cod. Nap. tart. 2.183) e a lei Belga (art. 110) exigem um grande numero<br />

de declarações tendentes a esclarecei os credores hypothecarlos, co.no<br />

por exemplo, a de todas as hypothecas inscriptas, elementos indispensáveis<br />

para que os credores posSão safeer se lhes convém acceitar o preço ou valor<br />

estimado, ou pedir a licitação. A nossa lei, que só dá aos credores vinte quatro<br />

horas para deliberarem, deixa a cargo d'elle'è o verificar a importância das<br />

dividas inscriptas!<br />

(112) Lei. art. 10 § 4, Décret, art. 297. O juiz competente é do foro<br />

cívii do lugar da situação do immovel. Se não ha domieilo eleito, a notificação<br />

deve ser feita no domicilio verdadeiro E* a regra de Direito. Vej.<br />

Mai um IV, n. 1.404.<br />

'113) Lei. art. 10 S 5 e 7, Décret, art. 296, 298 e 299 As vinte luato<br />

horas devem ser assignadas em audiência. Alvará de 22 de Janeiro le 1819


56§ DIREITO<br />

4 A acceitação expressa ou tácita da offerta importa<br />

para o adquirente a obrigação pessoal para com os credores de<br />

lhes pagar as dividas até a concurencia do preço ou valor declararado<br />

(114) ; d'ahi a conseqüência — que se o immovel pereça<br />

depois da acceitação, continua o adquirente, não obstante, obrigado<br />

aos credores pelo dito preço ou valor (115).<br />

5. Se os credores, por entenderem que o preço ou valor esmado<br />

é inferior ao valor real do immovel e á importância das<br />

dividas inscriptas, recusarão aolferta e requerem a licitação,<br />

ao juix cumpre ordenal­a (116), marcando dia e íaaendo­a annunciar<br />

por três editaes publicados cm três dias seg­uidos sem interpolação<br />

(117).<br />

A licitação é destinada a resolver uma questão de preço<br />

entre o adquirente e os credores. Só elles, pois, são admittidos a<br />

tomar parte nesta operação. Todavia permitte a lei que também<br />

concorrão a ella os tiadores do devedor (118).<br />

A licitação requerida por um só credor aproveita a todos :<br />

D'ahi procede que a desistência de um não prejudica aos outros.<br />

(119).<br />

Serve de base para a licitação o preço ou o valor declarado<br />

pelo adquirente. Não podem os lanços exceder o quinto d'aquelle<br />

preço ou valor (120).<br />

A acceitação é expressa Quando os credores comparecem e declarão estar<br />

peio preço, ou valor declarado; tácita, quando deixão correr as vinte quat"o<br />

horas sem requerer a licitação.<br />

(114) Troplong IV, n. 931 Us, Pont II, n. 1.320, Martou, IV, n. 1.436 o<br />

1.537: "O adquirente não ú mais devedor om razão da detenção do immovel,<br />

mas por virtude do vinculo pessoal creado pela acceitação, pelos credores, da<br />

sua offerta. "<br />

Sem embargo de dizer a lei (art. 10 § 7) — que, não sendo requerida a licitação,<br />

o preço ou valor declarado se haverá por definitivamente fixado, ■—<br />

todavia se a declaração do preço ou valor não é verdadeira, mas fraudulenta,<br />

aos credores assiste direito para haver do adquirente a quota dissimulada.<br />

Pont. II, n. 1.330, Martou IV, n. 1.534, Zacar. § 294, 3 o .<br />

(115) Martou IV, n. 1.537.<br />

(116) O juiz competente é o da situação do immovel. Segundo a Ord. 4,<br />

6 pr. era o juiz do lugar do contracto de acquisição do immovel.<br />

(117) Decivt. art. 299.<br />

(118) Lei, art. 10 § 6, Décret, art. 300 § 1.° 2." c 3."<br />

(119) Lei, art. 10 § 5 e 6. Pont II, n. 1.384,<br />

(120) Décret, art. 301.


DAS COUSAS 569<br />

6. O imtnovel é adjudicado ao licitante que maior lanço<br />

offcrece. Em igualdade de circumstancias deve ser preferido o<br />

o adquirente, isto é, o immovel lhe será adjudicado tanto portanto,<br />

attento o maior lanço, se elle o quizer (121).<br />

7. Ou os credores acceitem a offerta do adquirente ou a<br />

licitação se torne effectiva ; o immovel não se reputa remido e<br />

as dividas extinctas, senão depois de pago o preço ou valor, ou<br />

de consignado em juizo (122).<br />

Pago ou depositado o preço, a remissão é julgada por<br />

sentença. E á vista da sentença se cancella a inscripção (123).<br />

As hypothecas geraes, porém, continuão a subsistir, salvo<br />

se o adquirente praticou as diligencias, por via das quaes<br />

cilas podem ser remidas ou substituídas (124).<br />

CÓDIGO Civile<br />

Art. 816 — São aãmittiãos a licitar:<br />

I — Os credores hypothecarios.<br />

II — Os fiadores.<br />

III — O mesmo adquirente.<br />

§ I o — Não senão requerida a licitação, o preço ãa acquisição ou aquelle<br />

que o adquirente propuser, haver-se-á por definitivamente fixado para a remissão<br />

do immovel, que, pago ou depositado o dito preço, ficará livre de hypothecas.<br />

§2° — Não notificando o adquirente, nos trinta dias do art. 815 § I o , os<br />

credores hypothecarios, ficam obrigados:<br />

I — A's perdas e ãamnos para com os credores hypothecarios.<br />

II — A's custas e despezas judiciaes.<br />

III — A' differença entre a. avaliação e a adjudicação, caso esta<br />

se effectue.<br />

§ 3° — O immovel será penhoraão c vendido por conta do adquirentr,<br />

ainda que elle queira pagar, ou depositar o preço da venda, ou da avaliação,<br />

exoepto se o credor tíonsentir, se o preço ãa venda ou da avaliação bastar<br />

para a solução ãa hypotheca, ou se o adquirente a resgatar.<br />

(121) Décret, art. 302.<br />

(122) Décret, art. 298 e 300. Se entre os credores hypothecarios ha<br />

perfeito aecôrdo «obre a ordem de suae preferencias, o pagamento se pôde<br />

fazer amigavelmente; se ha questão a respeito, o preço deve ser consignado.<br />

Keg. n. 737 art. 393, § 3.° Vej. Pont II, n. 1.334.<br />

(123) Décret, art. 299 e 308.<br />

(124) Zacar. § 294, 4." Vej. § 266 adiante.


570 DIREITO<br />

1 avaliação não será nunc» cm preço inferior ao do renda.<br />

S 4" — Disporá de aeção regressiva contra o vendedor o adr/uirente, que<br />

■soilnr ejpropriação do immovel mediante licitação, ou penhora. o que pagar<br />

a hppotheca, o que por causa da adjudicação, ou licitação, desembolsar com<br />

0 pagamento da hypotheoa importância excedente á da compra e o que. supportar<br />

custas e despesas jiidieiaes. — 985, II.<br />

§ 265. — Direitos tio adquirente no dectwso da remissão c depot* d'ella<br />

coiisummada.<br />

1. O adquirente conserva o dominio do immovel, cm quanto<br />

não é elle .adjudicado a terceiro licitcinte (125). D'ahi os corollarios<br />

seguintes :<br />

I o Subsistem, mas sob condição resolutive, os direitos<br />

reacs que pelo adquirente fossem até aquella data constituídos<br />

no immovel (126).<br />

2° Perecendo o immovel antes da adjudicação a terceiro,<br />

perece por conta do adquirente (127).<br />

2. Se o immovel é adjudicado ao adquirente, a adjudicação<br />

não é para elle o titulo de acquisição, mas apenas a confirmação<br />

do titulo anterior pelo qual o houve. Assim entende­se que<br />

nessa hypothèse o immovel permaneceu sempre no dominio do<br />

adquirente (128).<br />

Se porém o immovel é adjudicado a terceiro, o dominio<br />

delle passa no mesmo instante para esse terceiro e o immovel é<br />

tido como se nunca houvera pertencido ao adquirente (129) ;<br />

d'onde procede que se resolvem todos os onus, que o adquirente<br />

constituirá sobre o mesmo immovel em favor de quem quer que<br />

seja (130).<br />

(12.">) A alienarão do immovel hypothecado não é nulla, mas transfere<br />

a cousa com o onus hypotheeario. Ord. 4 T. 6. Veja­se S 256 acima, Troplong<br />

Vente n. 79, Hypoth. et Privil, IV, n. 949, Zacar. § 294, 4.<br />

(126) Troplong IV. n. 962, Dalloz, 35, I, 23.<br />

(127) Mourlon III ri. 1699.<br />

(128) Pont íí, n. 1388, Mourlon III, n. 1703, Zach. S 294, 4".<br />

(129) Veja Mourlon 111. n. 1.700 nota (1), Troplortg IV, n. 962, Zacar.<br />

S 294, 4."<br />

(130) Troplong IV. n. 962, Martou IV, n. 1559, Arntz II, n. 1942, 1.°


DAS COUSÂS 571<br />

3. O adqiiirente, consummada a remissão, tem acção (131)<br />

para haver do aliénante :<br />

a) No caso de acceitação do preço offerecido, o dito preço,<br />

se já estava pago (132), ou a parte do preço que eííectivamente<br />

despendeu (133);<br />

d) No caso de acceitação do valor estimado, o preço e<br />

a differenca entre o preço eo dito valor, se o preço estava pago,<br />

(1 l 5) se não estava pago tão somente a differenca (135) ;<br />

c) No caso do immovel lhe ter sido adjudicado, a differenca<br />

entre o preço de acquisição e o valor da adjudicação (136),<br />

d) No caso de adjudicação a terceiro, o preço do immovel,<br />

se esse preço já estava pago (137).<br />

e) Em todos estes casos as despejas e custas judiciaes<br />

4. Se o immovel foi havido por titulo gratuito, o adquirente<br />

não tem acção de evicção contra o doador, pois, como em<br />

outro lugar se disse, o doador não é obrig-ado á eviccão ; nias<br />

assiste-lhe a acção de gestor de negócios (actio uegotiorum gestorum)<br />

para reliaver as quantias, despendidas com a remissão, do<br />

devedor, á cuja responsabilidade estava hypothecado o immovel,<br />

quer esse devedor seja pessoa estranha, quer seja o próprio<br />

doador (139).<br />

5. Se recolhido o preço da licitação, e pagos os credores,<br />

restão sobras, essas sobras pertencem de direito ao aliénante<br />

; e o adquirente não tem sobre ellas preferencia para ser pago<br />

das indemnisacões que lhe são devidas (140).<br />

(131) CE' a acção de evicqâo.<br />

(132 Lei, n. 1237, art. 10 5 8, Décret, art. 315 § 1."<br />

(133) Pôde a divida ser menor que o preço do immovel; neste caso se o<br />

preço está pago, o adquirente tem direito a lia ver a quota que dispendeu.<br />

(134) Lei, art. 10 § 8, Décret, art. 315 § 3.°<br />

(135) Se o preço não está pago ao aliénante, paga-o o adquirente ao credor,<br />

e só lhes resta haver a differenca.<br />

(136) Lei, art. 10 § 8, Décret, art. 315, § 3."<br />

(137) Lei, art. 10 § 8, Décret, art. 315 § 1."<br />

f 138) Lei, art. 10 § 8, Décret, art. 315 § 4."<br />

(139) >Mourlon 111, n. 1661 a 1663 e 1704 Pont II, n. 1393.<br />

O donatário é successor individual, portanto não fica obrigado a pagar as<br />

dividas 3o doador: Se as pagar, paracoxiscrvar o immovel, tem acção de gestor<br />

de negócios contra elle. Veja acima § 261.<br />

(140) Mourlon IV, n. 1704, Pont II, n. 1394, Zacar. § 294, 4."<br />

A differenca que se nota entre o caso de expropriação /orçada (§ 261,


572 . DIREITO<br />

6 Os credores são obrigados a satisfazer ao adquirente<br />

as bemíeitorias úteis c necessárias que lhe houver feito no immovel<br />

(141).<br />

§ 266. — Remissão das hxpothecas legues, a) geracs,b) es'<br />

peciülisadas.<br />

1. As hypothecas geravs (142), emquanto não são especialisadas,<br />

não podem ser remidas pelo processo acima descripto<br />

(§ 264) ; falta-lhes para isso um requisito indispensável —<br />

a lixação da importância da responsabilidade (143).<br />

Mas a lei, attenta a conveniência de facilitar ao adquirente<br />

um meio de liquidar o seu domínio, ministra um outro expediente<br />

— permitte a substituição das ditas hypothecas por fianças<br />

idôneas (144).<br />

Deve a fiança ter a mesma comprehensão que a hypotheca,<br />

isto é, cobrir a responsabilidade em toda sua extensão<br />

(145).<br />

Importa que os fiadores reunão as condições de idoneidade<br />

(146).<br />

Presta a fiança o responsável (147). E' ouvido a respeito<br />

o promotor publico como curador geral (148).<br />

nota 5 acima) e o presente, provem de que neste (o de remissão) o immovel,<br />

uma vez arrematado por terceiro, é havido como se nunca, houvera pertencido<br />

ao adquirente (§ acima, n. 2) e pois não lhe pôde pertencer o excesso de<br />

valor, pagas as dividas hypothecarias ; entretanto que no caso de expropriação<br />

forçada, o adquirente sempre conserva a qualidade de dono e por conseqüência<br />

de direito lhe pertence o alludido excesso. Vej. Mourlon III, n. 1626.<br />

(141) Pont II, n. 1397, Mourlon IV, n. 1542 e 1543.<br />

(142) As únicas hypothecas geraes que a lei admette são a da mulher<br />

casada e a dos menores e interdictos.<br />

(143) Se não é conhecida a importância precisa da responsabilidade,<br />

como saber a quantia que deve ser paga ao credor?<br />

(144) Lei, n. 1237, art. 10 § 11, Décret, n. 3453, art. 305.<br />

(145) Décret, cit. art. 305, "serão substituídas por fianças".<br />

(146) Décret, cit. art. 305. Veja Pereira e Souza § 172 e Not. 370, Dig.<br />

Port. I, art. 415.<br />

(147) Décret, art. 305. E' a regra.<br />

(148) Décret, art. 306.


DAS eOUSAS 573<br />

Prestada afiança e julgada boa pelo juiz competente (149),<br />

o inimovel se reputa livre da hypotheca (150).<br />

2. As hypothecas legaes que se, achão especialisadas, revestem<br />

os caracteres das hypothecas especiaes, e como taes íicão<br />

sujeitas ás regras do direito relativas a este ultimo g-cnero de<br />

hypothecas (151).<br />

As hypothecas legaes especialisadas são, portanto, remiveis,<br />

como o são as especiaes, nos mesmos termos e segundo as<br />

mesmas formalidades (152).<br />

Na remissão destas hypothecas figura:<br />

Pela fazenda publica, o empregado designado;<br />

Pelas corporações de mão-morta, o promotor de capellas.<br />

Pela mulher casada e menores interdictos, o promotor<br />

publico, como curador g-eral(153).<br />

3. Acerca da remissão das hypothecas legaes especialisadas<br />

ha uma particularidade que convém notar:<br />

As hypothecas legaes, como é sabido, garantem responsabilidades<br />

eventuaes que não só podem deixar de existir, corno<br />

ainda só são exigiveis depois de opportunamente verificadas. A<br />

responsabilidade do tutor, por exemplo, só se torna liquida e exigivel<br />

quando na tomada de contas se apurão alcances (154).<br />

Isto posto, e feita a remissão em epocha em que a obrigação<br />

do responsável ainda não se acha apurada: qual o destino<br />

que se deve dar ao preço e valor do immovel?<br />

A dita importância evidentemente não pôde nem deve ser<br />

paga a pessoa a quem pertence a hypotheca, porque não<br />

(140) Décret, art. 306. E' competente o juiz do eivei, «e a hypotheca ú<br />

de mulher 1 casada, o de orphãos, se de menores e interdictos.<br />

(150) A hypotheca deixa de subsistir no immovel remido, mas subsiste<br />

nos immoveis que ficão sob o domínio do responsável.<br />

(loi) Décret, art. 1S5 e 186.<br />

(152) Lei, art. 10 § 11, 2 o periodo. Décret, art. 304.<br />

(153) Décret, art. 304.<br />

(154) No mesmo caso está a responsabilidade do marido, a dos conectores,<br />

a dos syndicos das corporações de mão-morta.<br />

(155) Os escriptores francezes aconselhão diversos alvitres, como o de<br />

ficar a quantia em mão do adquirente, o de entrega-la aos credores hypotheearios,<br />

que vem na ordem das preferencias depois da hypotheca legal, com<br />

obrigação de restituirem-n'a, verificado o alcance. Nenhum destes alvitres<br />

offerece a segurança do deposito. Veja Troplong IV, n. 993 e Pont II, n. 1426.


574 DIREITO<br />

ha ainda divida verificada e c possível que ella venha a não<br />

existir.<br />

Parece, pois, que o preço ou o valor do iminovel remido<br />

deve ser consig'nado era deposito para ser levantado por quem de<br />

direito, isto é:<br />

Pelo credor, se opportunamente se verificar alcance do<br />

responsável;<br />

Pelo responsável, se não houver alcance (155).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 816 — 8ãX> admillidos a licitar:<br />

I — OS credores lt//i>otIiccarios.<br />

II — Os fiaãores.<br />

III -— 0 mesmo adqttirciite.<br />

§ 5" — ,1 hypotheca legal é remirei na fôrma por qiie o são as hypothecas<br />

especiaes, figurando pelas pessoas, a que pertencer, as competentes, segundo<br />

a legislação em vigor.<br />

III. § 267.—Ejfcilos da hypotheca cm relação aos credores.<br />

1. O direito de preferencia ou prelação, eis o ef feito da hypotheca<br />

em relação aos credores (156).<br />

Todos os bens do devedor, segundo as regras íundamentaes<br />

de direito, estão obrigados ao pagamento de todas as suas<br />

dividas.<br />

E se o valor dos bens não basta para a solução integral das<br />

dividas, ha lug"ar o rateio entre os credores, na proporção do credito<br />

de cada um (157).<br />

A hypotheca deroga aquclle principio, creando a preferencia<br />

ou a prelação em favor do credor hypothecario (158).<br />

2. Consiste a preferencia ou prelação no direito que tem<br />

o credor de tomar prccipuamente para seu pagamento todo o<br />

preço do iminovel hypothecado, ou a parte que c sufficicnte<br />

para o dito pagamento, excluídos os credores em cujo favor não<br />

militão hypothecas da mesma graduação (159).<br />

(156) Vej. § 174 acima.<br />

1157) § 1 sr> acima. Mourlon 111. n. 123(i e seguintes, Troplong 1, ti. 4.<br />

(158-) São também derogagões do mesmo principio o direito de retenção<br />

(Mourlon III, n. 1211) e os privilégios.<br />

'159) Décret, n. -1357, are 243, 244 e 292 § 3, 2 a parte.


DAS COÜSAS ê75<br />

3. O direito de sequela vincula por um laço real a cousa<br />

liypothecada ao cumprimento da obrigação. O direito de preferencia<br />

assegura ao credor a applicação precipua do preço da cousa<br />

ao pagamento da divida A sequela é, pois, uma condição de<br />

efficacia da preferencia (160).<br />

Entrão estes dous elementos na composição da hypotheca<br />

nos termos seguintes:<br />

A sequela fôrma a substancia, a essência da hypotheca<br />

(162); a preferencia é uma qualidade extrinseca que a lei liga á<br />

hypotheca (162). Ha hypotheca sem o effeito da preferencia (163);<br />

não ha hypotheca sem a sequela.<br />

§ 268.—O que é que det-imiua a pieferencia'<br />

O credor hypothecario, ao haver o pagamento pela cousa<br />

hypothecada, pôde ter em frente três ordens de credores do<br />

mesmo devedor:<br />

—Outros credores hypothecarios,<br />

Credores privilegiados,<br />

Credores chirografarios.<br />

I, A questão de preferencia surge entre credores hypothecarios,<br />

quando as duas hypotliecas rëcahem sobre o mesmo immovel<br />

e o preço dei le é insulticiente para o pagamento integral<br />

de todos.<br />

(Decorrendo esta hypothèse, á qual dos credores caberá a<br />

preferencia ?<br />

1. A preferenciei, ou concorrão só credores por hypotliecas<br />

especiacs, ou só credores por hypotliecas geraes, ou conjun-<br />

(160) Troplong III, n. 77."). E' por isso que os privilégios, reduzidos<br />

pela nossa lei a direitos puramente pessoaés, são hoje uma garantia manca.<br />

Que é feito, por exemplo, do privilegio do credor que forneceu dinheiro para<br />

a compra do prédio, des que o prédio se acha posto por meio legal fora áo patrimônio<br />

do devedor?<br />

(lfil) A hypotheca é um direito real; sem ,\ sequela, que é o direito real<br />

em acção, ella deixaria de existir. Vej. acima § 174 e nota 8.<br />

(162) A preferencia pôde andar ligada a um due.to puramente pessoal:<br />

tal é a preferencia que dá o privilegio.<br />

(163) A hypotheca judiciaria. Décret, art. 11,1


S?6 DíRErtO<br />

ctamente credores por hypotheeas g-eraes e especíaes. ê determinada<br />

pela prioridade da hypotheca (104).<br />

Póde-se, pois, formular o principio seg-uinte: Exclue as<br />

demais hypotheeas concurrentes aquella que tem por si & prioridade<br />

(165).<br />

2. A prioridade é estabelecida, ou pela data da constituição<br />

da hypotheca, ou pela data da inscripção, seg-undo a espécie<br />

da hypotheca (166), a saber:<br />

a) Quanto ás hypotheeas gferaes (da mulher casada,<br />

menores e interdictos) pela data da sua constituição (167).<br />

b) Quanto ás leg-aes que dependem de inscripção, pela<br />

data da constituição, se são inscriptas dentro do prazo da prenotação(168);<br />

c) Quanto ás convencionaes e ás leg-aes que não forão prenotadas,<br />

pela data da inscripção, isto é, pelo numero de ordem<br />

(169).<br />

O numero de ordem do protocollo, como se disse em outro<br />

lugar, representa a data da inscripção, data que firma a existência<br />

da hypotheca contra terceiros (170).<br />

3. A prioridade entre as hypotheeas que valem sem a<br />

inscripção (as g"eraes) e as hypotheeas que dependem da inscripção,<br />

não pôde ser resolvida pelo numero de ordem, porque as<br />

g-eraes, não sendo inscriptas, não têm o dito numero (171).<br />

(164) Lei n. 12.37, art. 2 § 9, Décret, n. 3453, art. 115.<br />

(165) Fr. 3 pr. fr. 8, D. de pig. et hyp. 20, 1; C 2. 4, G, 7 e 8 C. qui<br />

pOtio;\ 8, 18; Novell. 91, cap. 1.<br />

iü' a antiga regra: prior in tempore, potior in jure — regra ahsoluta no<br />

nosso Direito, e cuja consagração simplificou, d'uma maneira admirável o<br />

assumpto, removendo as questões de preferencias, tão abstrusas e enredadas<br />

no Direito Romano e ainda no francez.<br />

(166) Hi hypotheeas, cuja existência legal contra terceiros começa da<br />

data da sua constituição (a da mulher casada, a de menores e interdictos, e<br />

as legaes inscr ptas no prazo da prenotação), e ha outras, que só valem da<br />

data da inscripção (as convencionaes e as leg-aes inscriptas fora do prazo<br />

da prenotação).<br />

(167) As daj mulheres casadas, menores o interdictos. Lei art. 9, Décret,<br />

art. 116 § 1.° e 123.<br />

(168) Décret, art. 116, § 2.° e 152 § 2." Vej. § 230 acima.<br />

(169) Décret, art. 116 § 3.<br />

(170) Vej. acima § 242.<br />

(171) Lei art. 9, 2." período, Décret, art. 1:>3.


kè cousis 57^<br />

Procede a mesma observação em relação ás hypothecas<br />

leg-aes iuscriptas 110 pra^o da prenotação, porque a prioridade<br />

délias, é também determinada pela data de sua constituição<br />

(172).<br />

No concurso, pois, de taes hypothecas com as convencionaes<br />

ou com as legates inscriptas, mas não prenotadas, a prioridade<br />

se resolve pela comparação de datas, isto é, da data da<br />

constituição daquellas e da data da inscripção destas (173).<br />

(172) Décret, art. 116 § 2 e 152 § 2. E' de. notar que a lei (art. 9 § 27)<br />

prohibia a inscripção de outras hypothecas dentro do prazo da prenotação.<br />

Neste ponto, como em outros, o Decreto corriigio a lei, permittindo a inscripção<br />

no dito prazo, mas com a declaração de que a inscripção não valerá<br />

contra a hypotheca prenotada, se esta for inscripta no prazo da prenotação.<br />

Decreto art. 152 §§ 1." e 2." e Av. n. €0 de 7 de Fevereiro de 1866. O Decreto<br />

cedeu a necessidade pratica. Na verdade, se não se tomasse o numero<br />

de ordem, no protocollo, das hypothecas apresentadas no prazo da prenotação,<br />

em que ordem, passado aquelle prazo, serião ellas inscriptas? Seria<br />

mister crear um registro provisório para ellas, aliás ficaria ao arbítrio e capricho<br />

do officiai do registro a collocação délias, em relação aos números<br />

que lhes deviam tocar, ou então serião consideradas como apresentadas ao<br />

mesmo tempo. O Decreto solveu a difficuldade pela maneira exposta (art. lf>2<br />

S§ 1." o 2.").<br />

(173) O numero de ordem representa a data da inscripção. Lei art. í)<br />

S 4, 5 e 6. Ainda resta uma difficuldade :<br />

Para se determinar o numero de ordem, o dia se divide em dous tempos<br />

— 1." das seis horas da manhã ao meio — 2." do meio dia á seis horaw<br />

da tarde — cada um destes tempos reptesenta uma data. No emtanto para<br />

as hypothecas, cuja prioridade é firmada pela data da sua constituição, o<br />

Jia tomado em sua integridade representa uma data.<br />

Isto posto: No concurso de hypothecas inscriptas e de hypothecas, cuja<br />

prioridade é determinada pela data da constituição, como calcular-se a prioridade?<br />

Parece que os dous tempos em que se divide o dia para a inscripção,<br />

se deve para este effeito considerar como formando uma só data, sendo indifférente<br />

que no caso figurado a inscripção tenha sido feita de manhã ou<br />

de tarde.<br />

'Mas, se concorrem duas hypothecas inscriptas no .mesmo dia, uma de<br />

manhã e outra de tarde, com uma hypotheca geral constituída no mesmo dia<br />

em que forão inscriptas as duas, como solver a difficuldade? Considerar as<br />

duas inscriptas como iguaes em tempo á geral? Mas a que foi inscripta de<br />

manhã vence a que foi inscripta de tarde; portanto como iguala-las em<br />

frente da geral? Eis um caso em que se pôde exclamar eomo Cujacio: crua;<br />

juris stwdisorum.


578 DIREITO<br />

4. A hypotheca geral, como acima se disse, périme sempre<br />

as hypothecas espociaes posteriores. Todavia os bens especialmente<br />

hypothecados não podem ser executados por credores geraes<br />

anteriores, senão depois de executados os outros bens do devedor<br />

(174).<br />

Esta doutrina envolve derogação do principio da indivisibilidade,<br />

mas assenta em urna razão de equidade—resguarda<br />

os interesses do credor da hypotheca especial sem prejuizo do<br />

credor pela hypotheca geral (175)<br />

5. Se gravão o immovel duas ou mais hypothecas inseri'<br />

ptas sob o mesmo numero, ou tendo a mesma data legal (176),<br />

c manifesto que cessa entra ellas a questão de prioridade, e os<br />

credores, a quem pertencem, se oonsiderão iguaes nos seus direitos:—o<br />

preço do immovel, em conseqüência, se divide entre uus<br />

e outros na proporção de seus créditos (pro-ratn) (177).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 759 — 0 credor li/jpoiliecario e o piunoralieio, têm o direito de exe.itlir<br />

a cansa hjiiiolheenda, ou emqienhada, e preferir, no i>a


DAS COUSAS $í<br />

dores, observada, quanto á hypotheca, a prioridade na inscripção. — 765, <br />

sa da divida, a preferencia que elle determina é regulada, não<br />

pela prioridade, mas pela maior prerogative, isto é, pelo maior<br />

favor que o credito merece (180).<br />

3. No estado actual do nosso Direito o privilegio é um<br />

direito puramente pessoal—produz a preferencia, mas não dá a<br />

sequela; pôde ser opposto aos credores do mesmo devedor, inas<br />

não pôde ser invocado contra terceiros deteutores (181).<br />

(17S) Vej. iMourlon III, n. 1.247, Troploitg I, n. 17 o eegs. Zacaria:<br />

% 256.<br />

Podem determinar o privilegio:<br />

Razões de equidade (despezas e custas judiciaes, fornecimento por terceiro<br />

do dinheiro para a compra do immovel).<br />

Razões de humanidade (despezas da ultima enfermidade).<br />

Razões de interesse geral (despezas funerárias). Vej. Mourlon, loc. cit.<br />

(179) A palavra — privilegio — tem em Direito outras accepções. Vej.<br />

Maynz § 90..<br />

(180) Pr. 32 D. de reb. auetor. judie. pass. 42, 5. Privilegia non extempore<br />

extimantur, sed ex causa, et si ejusdem fuerint tiluli concurrent,<br />

licet diversitas temporis in his fuerit. Pereira e Souza § 469.<br />

(181) Segundo a lei n. 1.237 (art. 6 e § 1.°) não lia outras direitos<br />

reaes além dos que se achão enumerados no citado artigo. Os privilégios não<br />

se achão contemplados no dito artigo; não são por conseqüência direitos reaes,<br />

mas devem ser havidos como direitos pessoaes.<br />

No Direito Romano prevalece a mesma doctrina. O privilegio, segundo<br />

a quelle Direito, é .sempre pessoal, e só se confunde com o direito real, quando<br />

38


580 tiíkSitto<br />

5. O nosso antigo Direito imprimia em certas hypothecas<br />

o caracter de -privilegiadas e lhes dava preeininencia sobre as<br />

hj^pothecas simples, legaes ou convencionaes. A lei, actualmente<br />

vig - ente, derogou um tal systema. Hoje a hypotheca, legal ou<br />

convencional, é pura e illide e périme sempre o privilegio, qualquer<br />

que seja a sua prerogativa (182)<br />

Este principio é absoluto; só se lhe conhece uma excepção<br />

—a que respeita ás despejas e custas judiciaes feitas com a execução<br />

do immovel. As ditas despejas, por decreto expresso da<br />

lei, são precipuametite tiradas do producto da arrematação da<br />

eovsa hypothecada (183).<br />

6. Os privilégios, pois, só subsistem e produzem effeito,<br />

quando ou se referem a moveis, ou a immoveis que não estão hypothecados<br />

(184).<br />

III. Credores chirograj harios se dizem aquelles que não têm<br />

por lei direito a ser pagos de preferencia.<br />

O credor chirographario fica sob o império do direito<br />

comrnum. Exclue-o a hypotheca, ainda que de data posterior<br />

(185).<br />

ligado á hypotheca. Mas neste caso o vinculo real provém da hypotheca e<br />

não do provilegio. Cujacio, Récitât, solem. C Qui potior, c. 7.<br />

Em Franga os privilégios são tidos como r&aes e em conseqüência gravão<br />

a. cousa. Troplong I, n. 23. Na antiga jurisprudência prevalecia a doutrina<br />

do Direito 'Romano (Trop'ong. cit. n. 23).<br />

Oumprc advertir que continuão a subsistir com a natureza de reaes certos<br />

privilégios ou preferencias que o Código Commercial estabelece em relação<br />

a navios ou mercadorias. Lei n. 1-237, art. 2, Décret, n. 3.453, art. 112.<br />

lírão verdadeiras hypothecas. que hoje em presença do systema da lei perderão<br />

aquella denominação, e vigorão como obrigações rcaes. (Décret, cit.<br />

art. 112).<br />

Tem-se suscitado a questão de saber se as hypothecas lega es privilegiadas,<br />

estabelecidas pela nossa antiga legislação e derogadas pela lei n. 1.237,<br />

continuão a vigorar com o mero caracter de privilégios. Parece-nos que sim.<br />

Os créditos, a que competia hypotheca legal privilegiada, reunião o duplo<br />

predicamento do privilegio e da hypotheca, razão porque excluião a hypo<br />

theca simples. Abolida pela lei a hypotheca, é fora de duvida que subsiste<br />

o privilegio, o qual não foi expungido.<br />

(182) Lei, n. 1.227, art. 5 § 2, Décret. n. 3.453, art. 244.<br />

(183) Lei, n. 1.237, art. 5 § I o , Décret, art. 243.<br />

(184) Lei, art. 5 § 2.<br />

(185) Vej. acima § 185.


Ms cousAs 58 Í<br />

IV. A preeminencia que a lei confere á hypotheca sobre<br />

o privilegio e o chirographo é decisiva e absoluta.<br />

Assim que:<br />

1 . Os credores privilegiados ou chirographarios não podem,<br />

sob pena de nullidade, excutir os immoveis hypothecados, salvo<br />

nos casos de fallencia ou insolvabilidade (186).<br />

2. Ainda nos casos de fallencia ou insolvabilidade, não é<br />

licito aos ditos credores disputar preferencia com os hypothecarios,<br />

nem mesmo contestar a legitimidade da hypotheca, uma vez<br />

que ella conste de escriptura publica e esteja devidamente inscripta<br />

(187).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 759 — O credor hypothecario e o pipnoraticio têm, o direito de excutir<br />

a cotisa hypothecada, ou empenhada, e preferir, no pagamento, a outros credores,<br />

observada, quanto á hypotheca, a prioridade na inscripção. — 75G.<br />

833, § único.<br />

Paragrapho único. Exceptua-se desta regra a divida proveniente de salários<br />

do trabalhador agrícola, afim de ser pago pelo producto da colheita para<br />

a qual houver concorrido com o seu trabalho, precipuamente a quaesquer outros<br />

créditos. — 1.560, 1.563.*<br />

(186) Décret, n. 3.453, art. 240 § 5.<br />

(187) Décret, n. 3.453 art. 240 i§ 6, n. 5 e art. 292 § 3.<br />

Parece que o Dec. se refere As nullidades dependentes de ocção rescisória.<br />

Se as nullidades, porém, são de pleno direito, como por exemplo se a escriptura<br />

não está assignada por duas testemunhas, se não foi lida ás partes,<br />

parece que o chirographario pôde invocal-as. Uma hypotheca que soffre de<br />

taes vícios, perde o seu caracter jurídico, não tem existência legal e o juiz<br />

não pôde acceital-a. Vej. Reg. n. 737, arts. 682 e 683 §§ 1 e 2; Pereira e<br />

Souza. Not. 465.<br />

E' também para nós fora de duvida que o chirografario em concurso de<br />

preferencia pôde arguir as nullidades da inscripção, visíveis pela propria escriptura,<br />

ou provadas por certidão do registro, como, se na inscripção não<br />

vem declarado o nome e a situação do immovel, quantia determinada (Décret,<br />

art. 235).<br />

A nota 8 ao § 248 deve ser entendida de harmonia com a presente nota<br />

e com a 7 do § 274, isto é: O credor chirografario não tem acção para fazer<br />

declarar as nullidades arguidas, mas em concurso de preferencias pôde invocal-a.


CAPITULO VIII<br />

ACÇÕRS RELATIVAS AO DIRIOITO HYPQTHECARIO<br />

§ 270.—AcçÔes do credor: noção histórica<br />

1. O Direito Romano dava ao credor hypochecario uma<br />

acção especial, destinada a fazer valer e á tornar effectiva a hypotheca.<br />

Esta acção, á principio chamada—quasi serviana, tomou<br />

afinal o nome de—acção hypothecaria (actio hypothecaria) (1).<br />

Podia ser intentada contra todo o possuidor, quer fosse o<br />

próprio devedor, quer um terceiro (2) e tinha por objecto forçar<br />

o detentor a entreg-ar a cousa hypotíiecada ao credor (3).<br />

Uma vez posta a cousa sob a detenção do credor, era-lhe<br />

licito ou vendel-a ou reteba até ser pago (4).<br />

2. Na nossa antig-a pratica a acção do credor hypothecario<br />

contra o devedor tinha nm caracter puramente pessoal. A<br />

sentença se executava nos bens hypothecados sem nenhuma particularidade<br />

(5). Os effeitos da hypotheca se conservavão,por assim<br />

(1) § 7 I. de actionib. 4, 6, C. 1 C. Com. de legat. 6, 43, Maynz § 252.<br />

Também .«e denominava — actio pigneratitia.<br />

(2) Fr. 12 pr. e § 7 D. de Qui potior. 20. 4; €. 14 e 18 C. de De pign.<br />

8, 14.<br />

(3) Fr. 16 § 3; fr. 17 pr., fr. 21 § 3 D. De pign. 20, 1.<br />

Nesta acção o credor devia provar:<br />

1." O dominio daquelle que constituísse a hypotheca (no ciso da acção<br />

se* intentada contra terceiro possuidor);<br />

2.° A existência da divida;<br />

3." A constituição da hypotheca.<br />

V"ej. Maynz § 252, Makeldey § 260. Quanto á formula, Keller S 33.<br />

(4) Lemonier, De l'hypolh. en Droit Rom. n, 167, Voet.-Pandect. XX, L<br />

(5) Ve.j. Doctr. das Acções §368.


DAS COUSAS 583<br />

dizer, latentes, para entrar em actividade tão somente no caso<br />

de sobrevir concurso de preferencia (6).<br />

A acção, propriamente hypothecaria, só era usada contra<br />

terceiro possuidor (7) e tinha por fim obrig-al-o ou á pag - ar a divida<br />

ou á entreg-ar a cousa hypothecada para nella correr a execução<br />

(8). Esta pratica era uma conseqüência das disposições<br />

que vigoravão acerca da materia hypothecaria. Na verdade o terceiro<br />

possuidor gozava do beneficio de execução; e contra elle não<br />

era exequivel a sentença condetnnatoria do devedor (9).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 816 — O registro de immoveis comprehende:<br />

I — A transcripção dos títulos ãe transmissão da propriedade.<br />

II — A transcripção dos títulos enumerados no artigo 532.<br />

III — A transcripção dos títulos constitutivos de onus reaes sobre causas<br />

alheias.<br />

IV — A inscripção das hypothecas.<br />

§271.—Acção do credor segundo o direito actual<br />

A lei actualmente vigente acabou com a acção propriamente<br />

hypothecaria (10).<br />

O seu systema á respeito se reduz ao seguinte:—dá ao<br />

credor acção pessoal contra o devedor e torna a sentença exequivel<br />

contra o terceiro possuidor da cousa hypothecada (11)<br />

(6) A hypotheca é uma garantia contra terceiros: — o direito de sequela<br />

e o de preferencia só entrão em actividade em relação á terceiros: Vej. acima<br />

§ 174, n. 5.<br />

(7) Vej. Doctr. das ACQ. cit. § 168.<br />

(8) Acção propriamente hypothecaria, isto é, acção real, tendo por objecto<br />

um direito real — o direito hypothecario.<br />

(8) Ord. 4, 3 pr.:... "poderá o credor demandar o possuidor delia que<br />

ou lhe pague a divida ou lhe dê e entregue a dita cousa, para haver por ella<br />

pagamento de suadivida".<br />

(9) Ord. 4, 3 pr.: "demandando o credor primeiro o seu devedor".<br />

(10) A acção propriamente hypothecaria é real porque deriva de um<br />

direito real. Troplong III, n. 779.<br />

A lei n. 1.237, tit. 7 e o Décret. 3.453, tit. 4 chamâo hypothecaria a<br />

acção do credor contra o devedor. E' uma denominação imprópria.<br />

(11) Lei, art. 10 § 1." e art. 14, Décret, art. 282 e 309 § 10.


58+ DIREITO<br />

Neste systema o direito de sequela não carece do apparelho<br />

das acções para produzir os seus cffeitos contra terceiros;<br />

mas entra em actividade e recebe a consagração judicial na intancia<br />

da execução e por via da execução (12).<br />

A acçâo do credor varia, segundo a hypotheca é convencional<br />

ou leg-al (13).<br />

A) 1. Acção que compete ao credor por hypotheca convencional<br />

para haver a divida, é a de assig-nação de dez dias (14).<br />

A lei, porém, não decretou, nem podia decretar a dita<br />

acção em termos absolutos e incondicionaes, nem derog-ou os<br />

princípios que lhe reg-ulão a competência (15).<br />

2. A assig-nação de dez dias, segundo o Direito preexistente,<br />

não é admissível para as obrig-ações illiquidas, ou dependentes<br />

de factos ou condições que carecem ou de provas aliunde<br />

ou de provas que não podem ser ministradas incontinente (16).<br />

Esta regra, sem duvida, vigora para as dividas hypothccarias<br />

que, nos termos expostos, são illiquidas ou dependentes de<br />

lactos não provados. A assig-nação de dez dias presuppõe instrumentos<br />

que por seus caracteres de certeza e verdade excluem<br />

razoavelmente duvidas ou suspeitas de eng-ano (17). Seria pois incivil<br />

e antijuridico admittir a derogação de um principio tão importante<br />

á deíeza, sem disposição expressa.<br />

3. Ig-ualmente a assig-nação de dez dias só é praticavel<br />

entre as proprias partes contractantes (18) Não obstante, com-<br />

(12) Lei, art. Id § 1.": "exeqüíveis contra quem quer que for o detentor"<br />

Décret, art. 30!) § 1." A sentença é exeqüível contra terceiro detentor,<br />

ainda quando a. hypotheca «seja simplesmente legal (art. 10 § 1.°<br />

da lei).<br />

(13) A acção de que trata a lei, art. 14 e §§, e o Décret, art. 282 e seg.<br />

é i) riva ti va do credor de hypotheca convencional. A lei diz: "Aos credores de<br />

hypothecas convencionaes, inscriptas e celebradas depois desta lei, compete.<br />

.. "<br />

'(14) Lei, art. 14, Décret, art. 282. A lei manda seguir o processo e a<br />

execução estabelecidos pelo Décret, n. 737, de 25 de Novembro de 1850.<br />

(15) Lei, art. 14, Décret, art. 282.<br />

(16) Décret, n. 737, art. 248, Pereira e Souza, not. 957.<br />

(17) Voj. Ord. 3, 25, Décret, n. 737. art. 247.<br />

(18) Décret, n. 737, art. 267.


DAS COUSAS 585<br />

petirá ao credor hypothecario cessionário? Parece que não (19).<br />

lia todavia julgados em contrario (20).<br />

4. A acção por divida e hypotheca convencional é sempre<br />

civil, ainda que seja mercantil a causa de que procede a mesma<br />

divida (21). Neste particular, a lei subordina a divida que é principal,<br />

á hypotheca que é o accessorio. Não ha que discutir se<br />

a divida foi contrahida conjunctamente com a hypotheca, na<br />

mesma escriptura. ou se preexistia á hypotheca: eis que a divida<br />

está garantida por hypotheca convencional, a acção é civil.<br />

5. Na execução de hypothecas convencionaes (22) se observâo<br />

as particularidades seguintes;<br />

(19) 1." Porque a lei faz remissão ao Décret, n. 737, cujo art. 267 é<br />

expresso;<br />

2." Porque a assignação de dez dias é uma acção violenta, que, mutilando<br />

o direito dá defeza, autorisa a condemnação antes de discussão regular; e<br />

excepcional como é; não pôde ser ampliada por via de interpretação.<br />

(20) A jurisprudência dos Tribunaes tem variado. Os que sustentão a<br />

doctrina contraria, argumentão — quo a intenção da lei foi dar á escriptura<br />

de hypotheca uma execução rápida c expedita, — que todo o seu systema se<br />

acha combinado para o fim de proporcionar ao credor todos os meios de rehaver<br />

com maxima facilidade o capital emprestado — o que contribue para<br />

fortificar e augmentai - o credito territorial, principal intento da lei. Esta<br />

argumentação, por mais plausível rçue pareça, não é suifficiente .para fundamentar<br />

o presuposto. O art. 2C7 do Décret, n. 737 é expresso, e entendendo<br />

elle com o direito de defeza, não seria jurídico dal-o como derogado, não por<br />

virtude de disposiçõesexpressas, mas por motivos geraes, deduzidos da razão<br />

da lei.<br />

(21) Lei, art. 14, Décret, art. 283.<br />

(22) As particularidades que se seguem no nosso texto sob n. I o , 2 o e<br />

3", são excepções decretadas tão somente em favor das execuções por hypothecas<br />

convencionaes:<br />

1." Porque se achão consagradas no art. 14 da lei, artigo que só trata<br />

da acção do credor de hypotheca convencional. As excepções são sempre<br />

restrictivas.<br />

2." Porque os motivos que determinarão aquellas excepções — necessidade<br />

de facilitar os empréstimos sobre a propriedade immovel pela promptidão<br />

do reembolso para dest'arte desenvolver o credito territorial — não tem<br />

connexão alguma com as hypothecas legaes, destinadas não a favorecer interesses<br />

econômicos, mas ã proteger certas pessoas incapazes de por si mesmas<br />

defenderem os seus direitos (Vej. § 187 acima).


586 DIREITO<br />

I a . Os immoveis hjpothecados podem ser arrematados,<br />

ainda que o seu valor exceda o dobro da divida (23).<br />

2 a . Não prevalece contra o credor hypothecario o privilegio<br />

de integridade em favor das fabricas de assucar e mineração (24).<br />

3 a . Não são adinittidos á disputar preferencia com o credor<br />

hypothecario credores que não tcnhão por seu turno hypothecas<br />

sobre o immovel arrematado (25).<br />

B.) Aos credores por hypotheca legal assistem as acções<br />

que lorem competentes, attenta a natureza das dividas (26). Estas<br />

ações são sempre civis (27).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 826 — A execução do immovel hypothecadofar-se-há por ucção execução.<br />

Não será valida a venda judicial de immoveis gravados por hypothecas devidamente<br />

inscriptas, sem que tenham sido notificados judieialmcnte os respectivos<br />

credores hypotheca rios que não forem de qualquer modo partes /ia execução.<br />

(23) Lei, art. 14. § 1.° Décret. 292 § 1.° Assim pois em relação as<br />

( xi i lições por hypothecas convencionaes se acha derogado o § 24 da lei de<br />

20 de Junho de 1774.<br />

(24) Lei, art. 14 § 2, Décret., art. 292 § 2.<br />

Acha-se igualmente, nos mesmos termos, derogada a lei de 30 de Agosto<br />

do 1833, isto é, ! ão somente em relação á execução por hypotheca convencional.<br />

(25) Décret, art. 292 i§ 3.<br />

O citado § 3 é concebido assim:<br />

" Só podem disputar preferencia com o credor hypothecario outros credores<br />

que se apresentarem com hypothecas inscriptas sobre o mesmo immovel".<br />

Esta i edacção e imperfeita. Os credores por hypothecas geraes não inucriptas<br />

(menores, intordietos e mulheres casadas), quando o devedor não<br />

uossue outros bens, ou depois de executados os que tiver, podem disputar<br />

preferencia sobre o immovel especialmente hypothecado. Lei, art. 14 § 3,<br />

art. 2 i§ 9 Décret, art. 240 § 4, arts. e 115 e 116; doutrina esta que o dito<br />

S 3 do dito art. 292 contraria, redigido como está.<br />

(26) Assim se a divida é do fisco, compete acção executiva; se de tutores<br />

para com menores, executa-se a sentença que julga o alcance de contas; se<br />

do marido para com a mulher por dote e a quantia é liquida, pôde ser usada<br />

a assignação de dez dias, entre as proprias partes, como em caso de divorcio.<br />

Desde que a lei e o Décret, só dão a assignação de dez dias aos credores<br />

por hypothecas convencionaes, é manifesto que ficão excluídas as acções<br />

por hypothecas legaes, as quaes continuão a ser reguladas pelo direito preexistente.<br />

(27) As dividas a que a lei vigente confere hypotheca legal, são todas<br />

civis. Vej. § 187 acima.


DAS COUSAS 587<br />

§ 272.—Sequestra<br />

A acção do credor por hypotheca convencional pôde ser<br />

precedida de seqüestro do ímtnovel ou immoveis hypothecados<br />

(28), contra quem quer que seja o detentor (29).<br />

Tirando a cousa de sob a detenção do possuidor, o seqüestro<br />

réalisa até certo ponto, e por via mais rápida, o fim immediate»<br />

da acção hypothecaria do Direito Romano (30).<br />

Tem o seqüestro duplo fim:—sujeitar á hypotheca (31) os<br />

íruetos e rendimentos do prédio, percebidos desde o momento em<br />

que elle se réalisa (32), e impedir da sua data em diante a mobilisação<br />

dos accessorios do ira movei e dos immoveis por destino<br />

(33).<br />

Para a concessão do seqüestro basta a exhibição da cscriptura<br />

publica da hypotheca (34), mas é mister que o escri-<br />

(28) Lei n. 1.237, art. 14, Décret, n. 3.453, art. 284. E' licito ao credor<br />

dispensar o seqüestro, remédio extraordinário introduzido tão somente por<br />

utilidade sua.<br />

Convém advertir que não podem usar do dito remédio os credores por<br />

hypothecas legaes. Lei, art. 14, Décret, art. 282 e 283.<br />

(29) Lei, art. 14, Décret, art. 284.<br />

(30) Km Direito Romano o fim immediate da acção hypothecaria é<br />

reivindicar a cousa para o poder do credor.<br />

(31) Isto é, ao vinculo real e á preferencia.<br />

(32) Décret, art. 286 § 1.° — O seqüestro não pôde comprehender os<br />

fruetos colhidos ainda quando armasenados no estabelecimento hypothecado.<br />

Uma vez colhidos, os fruetos tornão-se moveis e escapão á hypotheca. Troplong<br />

III, n. 404.<br />

A penhora também produz o ©ffeito de sujeitar â hypotheca os fruetos<br />

que se colherem.<br />

(33) Os accessorios e os immoveis por destinação, também escapão á<br />

hypotheca, desde que são separados do immovel principal. Troplong II,<br />

n. 404 e 414. Vej. acima § 180.<br />

(34) Décret, art. 284.


5«8 DIREITO<br />

ptura I contenha a constituição de hypotheca de existência jurídico<br />

(35) II e não padeça vicio substancial visível (36).<br />

§ 273.—Meios de preservar a hypotheca.<br />

A hypotheca—direito real com existência propria, constituído<br />

na cousa alheia — emquanto não está vencida a divida<br />

fica exposta á eonting-encias que podem anniquila-la.<br />

Assim é possível que um credor com seg-unda hypotheca<br />

bobre o immovei, o seqüestre e penhore antes que a divida do<br />

credor da primeira hypotheca esteja vencida (37).<br />

(35) Está nas attribuições do juiz repellir ex-officio os instrumentos publicos<br />

ou particulares contendo contratos ou estipulações prohibidas por lei.<br />

Assim se o credor apresenta uma escriptura de hypotheca de moveis, do escravos<br />

separados do immovel, de navios, não lhe pôde conceder o seqüestro,<br />

porque a lei vigente não admit te hypotheca de moveis.<br />

A disposição do art. 284 "o seqüestro deve ser deferido independentemente<br />

de outro requisito que não seja a falta de pagamento" presuppõe a<br />

existência de hypotheca nos termos da lei. Se não ha hypotheca jurídica,<br />

e isto se deprohende do instrumento cxhibido, como conceder o seqüestro?<br />

(36) E' também outro principio que se não deve acceitar em juizo, escripturas<br />

substancialmente nullas por motivo de vícios visíveis, como se não<br />

i 'não assignadas por uma das partes ou por duas testemunhas, ou quando<br />

não consta haverem sido lidas ás partes. Em presença de uma escriptura<br />

assim viciada, como permittir o seqüestro? Vej. § 250 e nota 21.<br />

A'cerca do processo do seqüestro subsistem as disposições seguintes:<br />

1. O seqüestro carece da formalidade da conciliação, que pôde ser anterior<br />

ou posterior: esta mesma conciliação serve para a acção. Décret.<br />

art. 288.<br />

2. O seqüestro só admitte embargos de extincção aa hypotheca. Décret,<br />

art. 289.<br />

3. Não admitte outro recurso que não seja o de aggravo. Décret, art.<br />

290. Pôde pois o possuidor do immovel aggravar:<br />

a) Do despacho que concede o seqüestro;<br />

b) do seqüestro depois de realisado;<br />

c) de qualquer despacho relativo a procedência do seqüestro.<br />

4. O seqüestro, legalmente feito, só cessa pelo pagamento da divida, isto<br />

é, pela extincção da hypotheca. Décret, art. 286. Se, pois, o seqüestro é nullo,<br />

como se foi decretado por virtude de titulo nullo de pleno direito, pode ser<br />

julgado improcedente por despacho do juiz, despacho do qual cabe aggravo.<br />

(37) A arrematação do immovel hypothecado extingue todas as hypothecas<br />

que o gravão (§ 277, n. 8). Se, pois, o credor ãa primeira hypotheca


DAS COÜSAS 589<br />

E' também possível que um terceiro, em posse do immovel,<br />

esteja em via de consumar a prescripção acquísitiva, antes<br />

de se vencer a divida hypothecaria (38).<br />

Quaes os recursos do credor para conjurar perigos taes ?<br />

A) Para o caso em primeiro lugar alludido o Direito francez<br />

consagra uma providencia simples e decisiva: — a primeira<br />

hypotheca se reputa vencida e o credor fica dest'arte habilitado<br />

para entrar em concurso e excluir o credor da segunda hypotheca<br />

(39).<br />

A nossa lei não contém disposição expressa á respeito.<br />

li' certo que ella adoptou a pratica franeeza nos casos de<br />

íallencia e insolvabilidade, declarando as dividas hypothecarias<br />

vencidas em qualquer daquellas occurrencias (40). Mas, muitas<br />

vezes se verifica a hypothèse, a que estamos alludindo, sem que<br />

o devedor esteja fallido ou insolvavel (41).<br />

No silencio da lei vig-ora como subsidiário o Direito Romano,<br />

o qual sem embargo das differenças no que diz respeito a<br />

disliacção do immovel hypothecado ministra todavia principio<br />

para resolver a dificuldade.<br />

Segundo o dito direito, o credor primeiro em ordem {prior<br />

in tempore) podia impedir que, antes delle, os credores posteriores<br />

executassem a cousa hypothecada (42). Esta disposição é perfeitamente<br />

juridica.<br />

Mas o dito direito de impedir a execução aos credores<br />

posteriores tem como razão fundamental a necessidade de acautelar<br />

o anniquilamento da primeira Irypotheca. Desde que, pois,<br />

cessa a dita necessidade, com ella cessa o direito conseqüente.<br />

não vencida não tivesse meio de obstar a execução, perderia inevitavelmente<br />

a sua garantia hypothecaria.<br />

(38) Antes de vencida a divida o credor não ipóde seqüestrar ou penhorar<br />

o immovel. Como, pois, interromper a prescripção acquisitive que se está<br />

consumando em favor de terceiro?<br />

(39) Troplong III, n. 804, Zacarias § 295, uVIartou III, n. 1.272.<br />

(40) Décret, n. 3.453, art. 240 § 6, n. 2.<br />

(41) Dá-se diariamente o caso de estar um prédio sujeito a duas hypotheca»,<br />

sem que no emtanto o devedor se ache fallido ou insolvavel.<br />

(42) Fr. 15 § 5 D. de ri judie. 42, 1, C. 8 C. Qui potior. 8, 18:<br />

Diversis temporibus eadem re duobus jure pignoris obligata, eum qui<br />

prior, data mutua pecunia, pignus accepit, potiorem haberi certi et manifesti<br />

juris est; sic alias secundum (creditorem) distrahendi potestatem hujus pignoris<br />

consequi, nisi priori creditori debita fuerit soluta quantitas.


590 DIREITO<br />

Estando, portanto, vencida a primeira hypotheca, podem os credores<br />

da segunda executar o immovel, porque então nada impede<br />

o credor da primeira de fazer valer a sua preferencia (43),<br />

O meio que assiste ao primeiro credor para impedir a<br />

execução do immovel hypothecado antes de vencida a sua divida<br />

e o de embargos de terceiro prejudicado (44).<br />

3). A prescripção acquisitiva. ordinária ou extraordinária<br />

corre, como é sabido, contra o credor hypothecario.<br />

Se a divida está vencida, desapparece o perigo, porque o<br />

credor pôde interromper o curso da prescripção pelo seqüestro<br />

ou pela penhora (45).<br />

Se, porem, a divida ainda não se venceu, o credor no<br />

estado actual do nosso Direito, não tem meio de interromper a<br />

prescripção.<br />

O nosso Direito só admitte dous modos de interromper a<br />

prescripção acquisitiva—a citação para a reivindicação da cousa<br />

ou protesto no caso de ausência do possuidor. Estes dous<br />

meios presuppõem a possibilidade que fallece ao credor hypothecario,<br />

uma vez que a hypotheca não está vencida (46).<br />

(43) 'Segundo o Direito Koma.no o credor prior in tempore podia obstar a<br />

distractio aos segundos credores, ainda mesmo estando vencida a sua divida<br />

(Maynz § 250). Nesta parte o D. R. não ;p6de ser acceito entre nós; falta a<br />

necessidade que justifica o direito de impedir a execução.<br />

(44) Neste sentido ha já ca*o,s julgados. Não pôde ser embaraço a disposição<br />

do art. 604 do Décret, n. 737. O citado artigo, redigido em época<br />

anterior á reforma da legislação hypothecaria, não podia cogitar d'urna hypothèse<br />

que havia'de surgir no domínio d'uma lei ainda não existente.<br />

B' de notar que se o credor da primeira hypotheca não impede a execução,<br />

resta-lhe o direito de haver por acção ordinária dos credores que hajão<br />

recolhido o preço da arrematação, a parte precipua que lhe devia tocar como<br />

hypothecario. Vej. Décret, n. 337, art. 610, ord. 4, 6 § 2 e Pereira e Souza.<br />

Nota 901.<br />

(45) O seqüestro e a penhora interrompem a .prescripção. Vej. §§ acima<br />

74, n. 3 e 15, n. 1.<br />

(46) Vej. acima § 74.<br />

Os francezes tem para interromper a prescripção a acção en interruption,<br />

que compete ao credor hypothecario contra o possuidor. E' uma acção que<br />

foi creada pelos costumes e estylos.<br />

Nota. O D. Romano dava ao credor hypothecario os seguintes meios<br />

conservatórios:<br />

1.° O direito de íntenlar utiliter as acções negatorias e confessorias de<br />

servidões em relação ao immovel hypothecado;


Âs COÜSÀS ê9i<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 813 — Salvo o caso de insolvencia do devedor, o credor da segunda<br />

hypoiheca, embora vencida, não poderá executar o immovel antes de vencida<br />

a primeira.<br />

Paragrapho único. Não constitue fundamento para a insolvencia a. falta<br />

de pagamento das obrigações garantidas por hypothecas posteriores d<br />

primeira.<br />

Art. 817 — Mediante simples averbação, requerida por ambas as parles,<br />

poderá prorogar-se a. hypotheca, até perfazer trinta annos, da data do*<br />

contracta. Desde que perfaça trinta annos, só poderá subsistir o contracLo<br />

de hypotheca, reeonstituindo-se por novo titulo e nova inscripção ; e, nesse<br />

caso, lhe será mantida a precedência, que então lhe competir.<br />

Art. 818 — E' licito aos interessados fazer constar das escripturas o valor<br />

entre si ajustado dos immoveis hypothecados, o qual será a base para as arrematações,<br />

adjudicações e remissões, dispensada a- avaliação.<br />

As remissões não serão permittidas antes de realizada a primeira praça<br />

nem depois da assignatxira do auto de arremataçáo.<br />

§ 274.-—Acções de ti retiros contra a hypotheca<br />

A hypotheca pôde ser nulla:<br />

1.° Porque é nulla a obrigação que ella garante (47);<br />

2." Por vicio substancial, interno ou externo, inhérente á<br />

propria convenção Irypothecaria (48).<br />

Pôde ainda ser inefficax contra terceiros por inobservância<br />

de formalidade substancial da inscripçào (49).<br />

A lei dá as acções competentes para a declaração daquellas<br />

nullidadcs (50).<br />

Estas acções, porém, só podem ser inteutadas:<br />

2." de denunciar obra nova.<br />

"d. 0 De pedir caução J)amni infecti.<br />

4.° De usar do interdioto quod vi ant ciam. Vej. Maynz •§ 247, Jourdan,<br />

oa.p. 44.<br />

Serão admissíveis na nossa pratica estes meios? Parece-me que sim. Não<br />

lemos na no.^sa legislação principio algum a que répugne o emprego de taes<br />

meios.<br />

(47) Vej. § 173, n. 2 e adiante § 276 acima.<br />

(48) Vej. § 225 acima. Vicio interno, como se a hypotheca é simulada,<br />

se é constituída por pessoa incapaz (§ 212); vicio externo, como se a escrii<br />

ptura não está assignada pela parte ou por duas testemunhas.<br />

(49) Vej. acima § 248.<br />

(50) Lei, art. 11 § 5, Décret, art. 105 § 1.° 1ÜS, 240 § 6, n. 5 e 219 § 5.


S9â bikmfo<br />

a ) Pelo devedor;<br />

b ) Pelos credores hypothecarios, a quem a hypotheca ou<br />

a inscripção prejudica (51).<br />

c ) Por terceiros adquirentes do immovel (52).<br />

Os credores chirographarios, como é sabido, não tem direito<br />

real sobre os bens que formão o patrimônio do devedor.<br />

A obrigação do devedor para com elles é pessoal. Sem duvida<br />

quem se obriga, obriga os .seus bens, mas por via de conseqüência,<br />

e não, directamente, por vinculo real.<br />

E desde que fallece aos chirographarios direito real sobre<br />

os bens do devedor, é visto que não podem disputar por via de<br />

acção a questão de validade da h}'potheca que é um dtreito real<br />

(53).<br />

(51) Troplong- III n. 745 Pont II n. 1.083.<br />

(52) Troplong cit. n. 745 Pont. cit. n. 1.083. O adquirente com titulo<br />

transcripto tem interesse em annullar a hypotheca inscripta em data anterior.<br />

(53) Em concurso de preferencia, porém, caso em que todos haveres do<br />

devedor se aehão apurados para a solução de suas dividas, o chirographario<br />

tem o direito de pedir a declaração das nullidades absolutas e dos vicios .^ubstaijciaesda<br />

inscripção. Vej. not. 10 do $ 2G9 acima.


«<br />

CAPITULO IX.<br />

DOS MODOS PELOS QUAES SE EXTINGUE A HYPOTHECA,<br />

§ 275.—Extincção da hypotheca.<br />

A extincção da hypotheca é determinada :<br />

1. Pela extincção da obrigação principal (1);<br />

2. Pela perda da cousa hypothecada (2) ;<br />

3. Pela renuncia do credor (3);<br />

4. 1'ela confusão do domínio e da hypotheca na mesma<br />

pessoa (4).<br />

5. Pela resolução do domínio de quem constitue a hypotheca<br />

(5) ;<br />

6. Pela expiração por utilidade publica (6) ;<br />

7. Pela remissão do immovel (7) :<br />

8. Pela arrematação solemne em praça publica (8) ;<br />

9. Pela prescripção (9).<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 849 — A hypotheca extingue-se:<br />

I — Pelo ãesapparecvmento da obrigação principal.<br />

(1) Lei n. 1.237, art. 11 § 1.° Décret, n. 3.453, art. 249 § 1."<br />

(2) Loi, art. 11 § 2, Décret, art. 249 § 2.<br />

(3) Lei, art. 11 § 3, Décret, art. 249 S 3.<br />

(4) Pr. 29 D. De pig. act. 13, 7; fr. 9 D. Quib. mod. pign. 20, fi; fr.<br />

30 in fine, De excep. rei judicat. 44, 2.<br />

(5) Fr. 3 D. Quib. mod. pign. 20. G, fr. 31 20, 1; fr. 4 S 3 D. De Jn<br />

diem addict 18 2.<br />

(6) Lei, art. 2 § 3.<br />

(7) Lei, art. 11 § 4, Décret, art. 249 S 4.<br />

(8) Vej. § 277 adiante.<br />

(9) Lei, art.. 11 § 7, Décret, art. 254 o 255.


£94 biRÜiTü<br />

II — Pela destruição ãa cousa ou resolução do domínio. — 77, 78, 647.<br />

III — Pela renuncia do credor.<br />

IV — Pela remissão. — 815.<br />

V — Pela sentença passada em julgado.<br />

VI — Pela prescripção. — 177.<br />

VII — Pela arrematação ou adjudicação.<br />

Art. 762 — A divida considera-se vencida. — 954.<br />

J — Se, deteriorando-se, ou depreciando-se a cousa dada em segurança,<br />

desfalcar a garantia, e o devedor, intimado, a não reforçar. — 7£4.<br />

II — Se o devedor cahir em insolvencia, ou fallir.<br />

III — Se as prestações não forem pontualmente pagas, toda vez que deste<br />

modo se achar estipulado o pagamento.<br />

Neste caso, o recebimento posterior da prestação atrasada importa renuncia<br />

do credor ao seu direito de execução immediata.<br />

IV — Se perecer o object o ãaão em garantia, hypothèse na qual a in<br />

demnização, estando elle seguro, ou havendo quem a tenha afiançado, se su<br />

brogará na cousa destruída, em beneficio do credor, a quem assistirá sobre<br />

elle preferencia até o seu completo reembolso. — 1.158, I.<br />

V — Se se desapropriar a cousa dada em garantia, depositando-se a parie<br />

do preço, que fôr necessária para o pagamento integral do credor. — 1.558, II.<br />

Paragrapho unico. Nos casos dos ns. IV e V, só se vencerá a hypotheca<br />

antes do prazo estipulado, se o sinistro, ou a desapropriação recahir sobre<br />

o objecto ãaão em garantia e esta não abranger outros; subsistindo, no caso<br />

contrario, a divida reduzida, com a respectiva garantia sobre os demais bens,<br />

não desapropriados, ãam.nificaáos, ou destruídos. — 763.<br />

Art. 763 — O antecipado vencimento da divida nas hypotheses do artigo<br />

anterior, paragrapho unico, não importa o dos juros correspondentes ao prazo<br />

convencional por decorrer.<br />

§ 276.—Pela extineção da obrigação -principal, jierda da con*a<br />

e renuncia do credor.<br />

1. A hypotheca, como puro accessorio que é da obrig-ação<br />

principal, extineta a dita obrig-ação, perde a razão de ser,<br />

deixa de ter objecto, e portanto cessa de existir (10).<br />

Extinguem a hypotheca, em conseqüência, todas as causas<br />

que extinguem a obrigação, como o pagamento, o perdão, a no<br />

vação, a confusão (11).<br />

(10) Vej. § 175 acima.<br />

(11) Pont II. n. 1.228. A ex pro-missio e a delegação do devedor, extinguem<br />

a hypotheca, salvo estipulação em contrario, Vej. Pothier, Oblig.<br />

n. 563. Troplong I, n. 346, Makeldey § 530.<br />

*


kà couáAê &»)5<br />

E' mister que a extincção da obrigação seja :<br />

1.° total. Se subsiste alguma cousa da obrigação, a hypotheca,<br />

por effeito da indivisibilidade, persévéra em sua integridade<br />

(12).<br />

2.° definitiva (13). Na verdade se a obrigação revive por<br />

alguma razão de direito, com ella revive a hypotheca, como<br />

aconteceria se a obrigação se extinguisse por dação em pagamento,<br />

e mais tarde a cousa dada em pagamento fosse evicta<br />

ao credor (14).<br />

E' de advertir, quanto á este caso, que se a inscripção não<br />

foi cancellada, a hypotheca restaurada conserva o seu numero de<br />

ordem ; se, porém, a inscripção se cancellou, é necessário faze-la<br />

de novo e a hypotheca terá o numero de ordem que então<br />

lhe venha á competir (15).<br />

2. A perda ou destruição da cousa hypothecada arrasta a<br />

perda da hypotheca no todo ou em parte, segundo a perda da<br />

cousa é total ou parcial (16). A ruina do edifício não opera a extincção<br />

da hypotheca no solo (17).<br />

3. A renuncia da hypotheca pôde ser expressa ou tácita.<br />

E' expressa quando o credor a enuncia em termos directos<br />

e formaes (18).<br />

(12) Fr. 9 § 1.° D. De pign. act. 13, 7, Aecarias, n. 288, Troplong II,<br />

n. 846, Pont II, n. 1.229.<br />

(13) Troplong IV, n. 847, Pont II, 1.230.<br />

(14) Fr. 46 D. de novat. 46, 2, C. 8. C. de sentent, et interlocut. 7, 45.<br />

Ha grande controvérsia entre os interpretes do Direito Romano acerca deste<br />

ponto, isto é: se, tirada ao credor a cousa dada em pagamento, revive a antiga<br />

obrigação do devedor; ou se a dita obrigação se considera extincta, cabendo<br />

ao credor, não a antiga acção, mas a acção de evictione.<br />

O effeito pratico desta questão 'é — que se revive a antiga obrigação,<br />

com ella revive a hypotheca; mas, se a obrigação extinguio-se e ao comprador<br />

compete a acção de evicçâo, extincta também fica a hypotheca. No<br />

primeiro sentido Cujacio, Observât. 19, 38 e outros. No segundo Doneau D. 25<br />

C. 4 C. de evict. Voet. Pandect. 46, 3, n. 13, Troplong IV, n. 852 e Pont II,<br />

n. 1.230.<br />

(15) Troplong IV, n. 857 e 858, Pont II, n. 1.230.<br />

(16) Lei, art. 11 § 2, Décret, art. 249 § 2. A ruina 'total pôde ser causada<br />

por terremoto ou inundação.<br />

(17) Os edifícios que se levantão no solo hypothecado, seguem a condição<br />

do solo pelo principio de accessão. Vej. acima § 179, nota 8.<br />

39


596 DIREITO<br />

A tácita resulta de actos do credor que necessariamente a<br />

prcsuppõem. isto é, que não podem ter outra explicação (I e *).<br />

Assim a hypotheca se reputa tacitameute renunciada :<br />

1.° Se o credor consente na venda do immovel que lhe<br />

está hypothecado (20).<br />

2.° Se assigna coiijunctamente com o devedor a escriptura<br />

de alienação do immovel, e a sua assig"natura não pôde ter outra<br />

explicação que não a renuncia (21),<br />

3.° b-e consente que o devedor hypothèque o immovel á outrera<br />

(22)<br />

§ 277.—Pela confusão, resolução do domínio, exproprlação,<br />

remissão e arrematação.<br />

Acontece ás vexes adquirir o credor o immovel que lhe está<br />

hypothecado. A reunião da qualidade de credor á de proprietário<br />

do immovel hypothecado, acarreta a extineção da hypotlieca,<br />

(18) Troplong IV, n. 868.<br />

(19) Troplong, cit. n. 868.<br />

(20) Fr. 4 § 1." D. Quito, mod. pig. solvit.<br />

Si in venditionc pignoris consenserit creditor, vel ut debitor banc rem<br />

permutée, vel donet, vel in doiem del, dicendum erit pignus liberar!. O consentimento<br />

deve constar da escriptura publica da alienação.<br />

(21) Troplong IV, n. 869, Pont II, n. 1.237.<br />

Assim, -se o credor houvesse assignado a escriptura de venda, como testemunha,<br />

tanquam. merus testis duntaxat, não se entenderia haver renunciado<br />

a hypotheca.<br />

(22) Fr. 12 D. Quito, mod. pign. soiv. 20,6,:<br />

Paulus respondit, Sempronium antiquiorem creclitorem consentientetn<br />

quum debitor eamdem rem tertio creditor! obligaret, jus .suum pignoris remisisse<br />

videri.<br />

Na duvida pelas circumstancias, de qual ser.a a intenção do credor, se<br />

deve presumir que a renuncia é unicamente em favor do credor a quom a<br />

hypotheca é consentida, e não absoluta ergo omnes. Fr. 9 § 1.", fr. 12 pr. D.<br />

Quib. mod. pig. solvit. 20,6; fr. 12 S 4 D. Qui potiores, 20, 4. Troplong IV,<br />

n. 871.<br />

Se o credor assignasse a escriptura de hypotheca do immovel a outrem,<br />

como notario ou como testemunha, não se poderia, presumir a renuncia<br />

salvo se a escriptura declarasse o immovel livre e desemtoargado. Troplong<br />

IV, n. S71, Pont II, n. 1.287 e Martou IV, n. 1.340.


As COUSÀS S97<br />

porque ninguém pôde ter hypotheca u'aquillo que é seu (23). A<br />

hypotheca. como se sabe, é um direito real na cousa alheia (24).<br />

Mas a hypotheca revive, se o immovei é tirado do poder<br />

do credor por força de uma causa anterior e necessária, como<br />

por exemplo, por execução de outros credores hypothecarios<br />

(25).<br />

5. A hypotheca constituída por quem tem domínio resoluvel<br />

no im movei, como é o comprador com a clausula á retro, se<br />

resolve e se exting-ue com o domínio (26) Este effeito, porém, só<br />

se produz quando a resolução é determinada por causa inhérente<br />

á acquisição. Se a resolução não se prende á causa da acquisição,<br />

mas se opera por causa superveniente, como no caso de revogação<br />

de doação por ingratidão, subsistem as hypothecas constituídas<br />

(27).<br />

6. Expropriado o immovel por utilidade publica, a hypotheca<br />

passa delle para o preço e se extingue, portanto, no immovel<br />

(28).<br />

7. xi remissão, como se vio em outro logar (§ 22),<br />

opera a extiucção definitiva das hypothecas que gravão o immovel<br />

(2 ( )).<br />

8. A arrematação, feita por autoridade da justiça em<br />

execução regular (30), exüuguia, segundo o nosso antigo Direito,<br />

as hypothecas sobre a cousa, salvo as hypothecas legaes do<br />

lisco (31).<br />

Nem a lei. nem o decreto que a regulamentou, incluem<br />

entre os modos de extineção de hypotheca a arrematação (32).<br />

(23) l-'v. 2\) D. de pig. act. 17. 7; iY. 9 D. Quib. mod. pi-gn. solvit.<br />

20, 0; Er. 80 S l." 1). de except, rei judicat. 11. 2:... Neque enin potesi<br />

•se vera re, domino constituto creditore, Pont, 11 ; n. L.223,<br />

(24) Vej. 5 159 c 174 acima.<br />

(.25) Accarias, n. 288, 3, u Pont. II, n. 1.223.<br />

(26) Pr. 3 n Quib. mod. pign. solvet. 20, 6; fr. 4 l). De in diem addict,<br />

18, 2, Ponl 11. n. 1.225. Troplong IV, n. 888.<br />

(27) Vej. S 219 acima.<br />

(30) Arrematação em execução de sentença e não as arrematações *em<br />

solemnidade e só por méro despacho, como as que se usâo no juizo de inv< ntarip<br />

e partilhas.<br />

(31) Ord. 4. 6 § 2 e 3, Orden. de fazenda ca>p. 156 e Lei 2." de 22 de<br />

Dezembro de 1761, T. 3 5 L5. Veja-se Pereira e Souza 5 433 e not. 860, Consolidação<br />

das leis Civis, art. 1.297.<br />

(32) Igual omissão se nota no Cod. Civil franc, art. 2.180.


S98 MRElfO<br />

Que concluir desta omissão ? Foi ella intencional ? foi obra<br />

do acazo ?<br />

Parece-nos que a omissão foi meramente casual e que, portanto,<br />

continua a substituir a antig-a doutrina (33), só com este<br />

correctivo que resulta da indole da hypotheca tal qual foi consagrada<br />

pela nova lei—que a arrematação exting-ue também a hypotheca<br />

leg-al do fisco (34).<br />

Na verdade, a lei constituiu as hypothecas leg-aes em<br />

perfeita igualdade, não dando preferencia á umas sobre outras ;<br />

derog-ou pois neste ponto o direito preexistente, o qual conferia<br />

maior prerog-ativa á hypotheca leg-al da fazenda publica<br />

(33).<br />

A arrematação é um acto publico e solemne ; precedem -<br />

n'a editaes ; consumma-se em audiência. Não ha, pois, necessidade<br />

de intimação dos credores hypothecarios para que a cousa<br />

arrematada passe livre ao arrematante" (36) Na remissão, ao<br />

contrario, é indispensável a intimação dos ditos credores, porque<br />

a venda é particular e não tem a publicidade dos actos judiciários<br />

(37).<br />

§ 278.—Extincçào por prescripção.<br />

A hypotheca também se extingme :<br />

a) Pela prescripção extinctiva, por via de conseqüência ;<br />

b) Pela prescripção acquisitiva, directamente.<br />

A.) A hypotheca, como acima se disse, se exting-ue pelos<br />

mesmos modos por que se exting-ue a obrig-ação principal (38).<br />

(33; Vej. Dr. Perdigão Malheiro, Repertório da Lei Hypoth. nota 44.<br />

Para admittir-se que a antiga legislação não foi neste ponto derogada, basta<br />

ponderar que em a nova lei não ha disposição alguma em contrario.<br />

(34) Vej. Consolidação das leis Civis, art. 1.297, nota.<br />

(35) Sobre as hypothecas legaes da fazenda publica segundo a antiga<br />

legislação, vej. a Consol. das Leis Civis, art. 1.272, § I o a 5" e 1.275.<br />

(36) Pereira e Souza, nota 860, in fine.<br />

(37) Vej. § 262 acima.<br />

Em França exige-se a citação dos credores hypothecarios inscriptos, e o<br />

chamamento pela imprensa dos credores de hypothecas geraes não inscriptas.<br />

Mourlon III, n. 1.721 e 1.722.<br />

A adjudicação solemnemente feita produz os mesmos eflféi-tos que a arrematação<br />

.<br />

(38) Vej. § 276 acima.<br />


DAS COUSÂS 599<br />

A prescripção, pois que extingue a obrigação principal,<br />

extingue, por via de conseqüência, a hypotheca (39).<br />

A prescripção da hypotheca, operada por este modo, aproveita<br />

não só ao devedor como a qualquer terceiro que porventura<br />

esteja na posse do immovel como senhor (40).<br />

B.) A extineção da hypotheca, outrosim, se consumma por<br />

eífeito de uma espécie de prescripção acquisitiva (41).<br />

(39) Lei. n. 1.237, art. 11 § 7, Décret, n. 3.459, art. 254.<br />

Segundo o Direito Romano, a acção hypotheearia se reputava extineta<br />

pela prescripção:<br />

a) contra terceiros possuidores, em trinta annos;<br />

b) Contra os próprios devedores ou seus herdeiros em quarenta annos.<br />

Vej. Accarias, n. 288, 7 o .<br />

E no domínio do nosso antigo Direito, a acção hypotheearia prescrevia<br />

contra o devedor e seus herdeiros em vinte annos entre presentes, quarenta<br />

entre auzentes á contar da obrigação. Ord. 4, 3 § 1." in-fine, verb "E se a<br />

eousa obrigada sempre íôr no poder do devedor..."<br />

A lei vigente simplificou o as^umpto, estabelecendo para a hypotheca a<br />

mesma prescripção extinetiva da obrigação.<br />

(40) Arntz. II, n. 1.918, 1.°, Mourlon III. n. 1.671.<br />

(41) Tal é a doutrina do Direito Romano, das Ord. Phillip, e do nosso<br />

Direito actual.<br />

1.) Const. 8 C. de pneeript. trigint. vel quadragint. an. 7, 39: Si quis<br />

omptionis vel donationis vel alterius cujuscumque contractus titulo rem aliquam<br />

bona fide per decern vel viginti annos possiderit et longe temporis excepcionem<br />

contra dominos ejus vel creditores hypothecam prœtendentes sibi<br />

ucquisierit. posteaque fortuito casu possessionem ejus rei perdiderit, posse<br />

«uni oüarn actionem ad vindicand.un rem eamdem habere sancimus."<br />

2.) Ord. 4, 3 § 1." "Esta demanda lhe poderá fazer até dez annos cumpridos,<br />

se ambos credor e devedor erão moradores em uma comarca. B sendo<br />

moradores em desvairadas comarcas então poderá, ser feita a demanda até<br />

vinte annos acabados. Os quaes dez e vinte annos se contarão do primeiro<br />

dia que a cousa foi a poder do possuidor com titulo e boa fé. E vindo a<br />

eousa obrigada á poder do possuidor sem titulo algum, poder-lhe-ha a demanda<br />

ser feita até trinta annos cumpridos, contados pelo modo sobredito. "<br />

As citadas palavras se referem a prescripção acquisitiva, pois que alludem<br />

expressamente a prescripção fundada na posse.<br />

3.) A lei n. 1.237, art. 11, nada diz quanto a prescripção acquisitiva<br />

como modo de extinguir a hypotheca; subsiste, portanto, a doctrina da Ord.<br />

acima transcripta e presuppoem-n'a vigente o art. 255 do Décret, n. 4.453.<br />

t O § 7.°, período 2 o . do citado art. 11 da lei se acha redigido assim:<br />

"A prescripção da hypotheca não pôde ser independente e diversa da<br />

obrigação principal. "


600 DIREITO<br />

Esta prescripção (libertcttis iisitcapio) presuppõe os mesmos<br />

requisitos da prescripção acquisitiva da propriedade.—boa íé, e<br />

posse por dezannos entre presentes e vinte entre ausentes se fundada<br />

em justo titulo, por trinta annos se desacompanhada de justo<br />

titulo (42).<br />

Aquelle, pois, que possue um immovel com os requisitos<br />

da prescripção acquisitiva, o adquire livre das hypothecas preexistentes.<br />

A dita prescripção, porém, é distincta da acquisitiva do<br />

domínio, embora possão muita vez coincidir. A primeira corre<br />

contra o credor, a sèg-uflda contra o dono do immovel—o que determina<br />

differenças importantes (*3).<br />

Assim que :<br />

1.° Figure-se que o possuidor adquiriu o immovel do verdadeiro<br />

dono (a domínio) e por titulo legal, mas que o immovel<br />

lhe veio onerado de hypotheca. Neste cazo o possuidor o prescreve,<br />

não para adquirir o domínio que lhe foi transferido por titulo<br />

que dispensa a prescripção, mas tão somente para libertal-o<br />

da h}'potheca. Eis, pois, a prescripção acquisitiva da liberdade<br />

do prédio a funccionar sem o concurso da prescripção acquisitiva<br />

do domínio (44).<br />

2.° Pôde acontecer que uma corra e que outra esteja suspensa<br />

ou interrompida, como se o dono do immovel é maior e o<br />

credor menor de quartoze annos ou vice-versa (45) ou se um re-<br />

Estas palavras entendem exclu*)vãmente com a prescripção extinetiva<br />

e tiverão por fim derogar a Ord. 4, 3 § 1.° in-fine, a qual, reproduzindo o<br />

I). Romano, requeria para a prescripção da Hypotheca, quando a cousa obrigada<br />

continuava no podei- do devedor ou de seus herdeiros, vinte annos entre<br />

p-esentese quarenta entre auzentes, ao passo que a obrigação prescrevia<br />

em trinta.<br />

Seria, pois, um. erro deduzir da citada disposição — que ella havia abolido<br />

o modo de extineção da hypotheca pela prescripção acquisitiva. E ahi está<br />

o art. 255 do Décret, n. 3.453 para tirar toda a duvida.<br />

(42) C. 8 e § 1." C. da prœscript. trig, vel quadrag. ann. 6, 39; Ürd. 4,<br />

3 § 1." Troplong IV, n. 877, Mourlon III, n. 1.675, Pont II, n. 1.247.<br />

(43) Maynz § 254, 6". Zacaritc § 293, Mourlon, III, n. 1.673. Troplong IV,<br />

n. 878, Pont II, n. 1.254.<br />

(44) Mourlon; III, n. 1.672.<br />

(15) O dono do immovel é maior: corre contra elle a prescripção; o crc<<br />

dor é menor de quatorze annos: em relação a elle a prescripção fica sus<br />

pensa. Vej. § 75 acima.


DAS COUSAS 601<br />

side na província e outro não : d'onde vem que bem pôde o possuidor<br />

consummar a prescripção acquisitiva do domínio, antes de<br />

consummada a acquisitiva da liberdade do immovel.<br />

3.° Os actos que importão a interrupção de uma das ditas<br />

prescripções, não acarretão a interrupção da outra (46).<br />

A bôa fé na prescripção acquisitiva da liberdade do prédio<br />

consiste na ignorância, em que o possuidor se acha da existência<br />

da hypotheca (47). A inscripção embora tenha por effeito<br />

a publicidade da hypotheca, não é por si só suficiente para induzir<br />

o possuidor em má fé (46).<br />

Quanto ao prazo, a alludida prescripção tem uma particularidade,<br />

a saber :<br />

O prazo, se se trata da prescripção ordinária de dez e vinte<br />

annos, conta-se, não do dia posse, mas da data da transcripção<br />

do titulo de acquisição (49).<br />

Na prescripção extraordinária (trintennaria) o prazo começa<br />

a correr da posse. A razão é manifesta. A prescripção extraordinária<br />

não carece de titulo, ao contrario, suppre-o (50).<br />

FIM<br />

(46) Zacariœ § 293, Troplong III, n. 878 Us.<br />

(47) Pont II, n. 1.250, Troplong IV, n. 879-882.<br />

(48) Pont II, n. 1.250, Troplong IV, n. 883.<br />

Em contrario C. Telles, Doctrina das Acções, Addic. ao 8 171.<br />

(49) Décret, n. 3.453, art. 255.<br />

(50) Pont II, n. 1.251 e 1.252, Mourlon III n. 1.672, Troplong IV<br />

n. 883.


602 DIREITO<br />

CÓDIGO CIVIL<br />

Art. 525^—E' plena a propriedade, quando todos os seus direitos elemense<br />

acham reunidos no do proprietário ; limitada, qnando tem onus real, ou é<br />

re solúvel.<br />

Art. 829 — Quando os bens do criminoso uãa bastarem para a solução<br />

integral das obrigações enumeradas no art. 827 nos. VI e VII, a satisfação<br />

do ojfendido e seus herdeiros preferirá ás penas pecuniárias e custas judielaes.


INDICE<br />

DIRBITOS KLE/VE«<br />

PARTE PRIMEIRA<br />

POSSE: DOMÍNIO<br />

SECÇÃO PRIMEIRA<br />

CAPITULO I.<br />

PAGINAS<br />

Posse : sua natureza c effeitos : como se adquire e como se<br />

perde 7<br />

CAPITULO II.<br />

Interdictos possessorios * 41<br />

SECÇÃO SEGUNDA<br />

DOMÍNIO, MODOS DE ADQUIRIR: ACÇÕES.<br />

CAPITULO I.<br />

Domínio : objecto e caracteres 55<br />

CAPITULO II.<br />

Modos de adquirir o dominio 74<br />

Titulo primeiro : Occupacão, accessão, especificação, confusão,<br />

commixião 79<br />

Titulo segundo : Tradicção e transcripção 99<br />

Titulo terceiro : Acquisição de fruetos da cousa alheia 131<br />

Titulo quarto : Prescripção acquisitiva 137<br />

CAPITULO III. .<br />

Acções que nascem do dominio. . . " 171<br />

CAPITULO IV.<br />

Como se perde o dominio 191<br />

PARTE SEGUNDA<br />

DIREITOS REAES (DE USO F. GOZO) NA COUSA ALHEIA,<br />

CAPITULO I.<br />

Usufructo 196<br />

CAPITULO II.<br />

Uso e habitação 236<br />

CAPITULO III.<br />

Servidões • 240


604<br />

Empln tcuse<br />

Direitos pignoraticios .<br />

Capitulo I. Penhor<br />

Capitulo II. — Antichrese<br />

CAPITULO IV<br />

PARTE TERCEIRA<br />

SECÇAO PRIMEIRA<br />

PENHOR E ANTICHRESE<br />

SEÕçXÒSEGUNDA<br />

HYPOTHECA<br />

Capitulo I. — H\ pothéca : noções geraes<br />

Capitulo II. — Hvpothecas legaés.<br />

Titulo primeiro. — Hvpotheca legal da mulher casada<br />

Titulo' segundo. -I. Hypotheca legal dos menores orphãos e<br />

interdictos ... •<br />

II. —Hypotheca dos filhos menores sobre os immo<br />

veis do pai<br />

III. —Hypotheca legal dós filhos sobre os immoveis<br />

'Titulo terceiro<br />

Titulo quarto.<br />

do pai ou mãi binuba<br />

— Hypotheca legal do Estado e corporações de<br />

mão-morta<br />

- Hypotheca legal dos offendidos e a do coherdeiro<br />

— Hypotheca judiciaria<br />

— Hypotheca convencional<br />

Capitulo III<br />

Capitulo IV.<br />

Capitulo V. — Publicidade da hypotheca. . . .<br />

Titulo primeiro. Prenotação<br />

Titulo segundo. — Especialisação<br />

Titulo terceiro. — Inscripção<br />

Capitulo VI. —Cessão e subrogação dê hvpothecas<br />

Capitulo VII.— Effeitoh da hypotheca<br />

I. — Éffeiïos em relação ao dono do immovel<br />

II. — Effeitos em relação a terceiros detentores<br />

III. — Effeitos em relação aos credores<br />

Capitulo VIII. — Acções relativas ao direito hypothecario<br />

Capitulo IX. —Modos pelos quaes se extingue a hypotheca<br />

PAGINAS<br />

. . 293<br />

339<br />

340<br />

355<br />

362<br />

404<br />

407<br />

422<br />

431<br />

433<br />

436<br />

443<br />

449<br />

457<br />

485<br />

490<br />

496<br />

506<br />

543<br />

548<br />

548<br />

552<br />

574<br />

582<br />

593


INDICE ALPHABETIC<br />

A<br />

ACÇÕES. —Veja-se o direito â que é relativa<br />

ACÇÒKS possessorias. —Veja-se Interdictos possessorios<br />

ACCESSÃO : modo de adquirir, § 38 — de immovel á iminovclg 39 ;<br />

de moveis á immovel § 40, de movei á movei, S 41.<br />

ACOUISIÇÃO : por tituto singular, por titulo universal ; differenças,<br />

effeitos, S 32, n. 2.<br />

ACUAS: á quem pertencem? s 26, n. 3.<br />

Ar.vEO : do rio abandonado : 39, n . 2.<br />

ANTICHRESE : deiinição, contractu, direito, formalidades, ü ldH.<br />

— Antichrese nas suas relações com a taxa de juros, § 169.<br />

Direitos do credor-autichresista § 170; obrigações S 171.<br />

ARVORE : á quem pertence ? § 40.<br />

AVERBAÇÃO.—Veja-se Inscripção e Traiiscripção.<br />

B<br />

BEMFEITOKIAS : S 40, n. 2", 3 o e 4 o , SÜ 85, 105, 106, 109, 51, n. 3,<br />

183.<br />

— Direitos do possuidor sobre as bemfeitorias em relação ao<br />

credor hypothecario, £ 258: n. 4<br />

BENS .ulveutieios, castrenses e quasi castreuses.—Veja-se Hypotheca<br />

legal dos menores.<br />

c<br />

CAÇA : modo de adquirir; leis que a regulão §34.<br />

CASAMENTO. Veja rTypotheca da mulher casada.<br />

CANCELAMENTO. — Veja Inscripção e transcripção.<br />

CESSÃO de h3'potheca : § 251.<br />

CHIROGRAFARIO (credor): §269, n. III.<br />

COMMIXTÃO : modo de adquirir domínio, Ü 42.<br />

COMPOSSESSÃO : í 7 e Ü 3.<br />

CONDIÇÕES : O que é ? Como influem na hypotheca para garantia de<br />

obrigações que lhe são subordinadas? S 177 e 210,<br />

nota.s 1 e 2.<br />

CONDOMÍNIO : § 30 e S 7.<br />

CONFUSÃO : modo de adquirir. S 42.<br />

CONSTITUTO possessono § 14.<br />

COKPOKAÇÕES de mão-morfa : Podem constituir umphyteiises, cxcepto<br />

as ordens regulares, S 142 ; mas não tomal-as para<br />

si. § 142.<br />

— Tem hypothec,t. legal, § 204.<br />

— Podem constituir hypotheca legal, excepto as ordens regui.ires,<br />

* 215, n. III.<br />

CREDORES hypothecarios. —Veja-se Hypotheca.<br />

CKEDORES chirografarios : S 279, n. III.<br />

CREDORES privilegiados: § 269.<br />

CRIAS de animaes : § 100, n. III.<br />

CONSUL : competente para lavrar escripturas de hypotheca nos paizes,<br />

onde residem, § 224. n. 3.<br />

CURADOR : de interdictos, § 197.


D<br />

DESFORÇÔ : § 23.<br />

DETENTOR : § 23.<br />

DIREITOS pignoraticios : § 159.<br />

DIREITOS pessoaes : S 1.<br />

DIREITOS reaes : § 1.<br />

DIVIDA hypothecaria : § 177.<br />

DOAÇÃO : com clausula exclusiva da communhão- § 188. — Veja-se.<br />

Hypotheca legal de mulher casada.<br />

DOMÍNIO : Noção, caracteriscos, § 24.<br />

— Direitos elementares do dominio, §25.<br />

— Que cousas podem ser objecto do dominio, § 26.<br />

— Dominio resoluvel. Ex nunc, ex tunc, § 27.<br />

— Dominio pleno, dominio limitado, § 28 e á p&g- 002 o<br />

art. 525 do Cod. Civil.<br />

— Dominio util, § 139.<br />

— Restricções legaes do dominio, g 29.<br />

— Condomínio, direitos dos condôminos, § 30.<br />

— Modos de adquirir o dominio : Condições geraes, § 31.<br />

— Divisão e enumeração dos modos de adquirir o dominio,<br />

§ 31.<br />

— Modos de perder o dominio : causas que determinão a<br />

perda, § 89. 90, 91 e 92.<br />

— AcçÕes que nascem do dominio: Noção, § 81, Reivindicação,<br />

condições, § 82 ; cousas que podem ser reivindicadas,<br />

§ 83 ; objecto da reivindicação, § 84 ; prestações<br />

do autor, § 85 ; excepções e defesa do réo, § 86.<br />

— Acção negatoria, condições, objecto, § 87.<br />

— Acção Publiciana, § 88.<br />

DOTE: Está sob a protecção da hypotheca legal,§ 188.<br />

E<br />

EDIFÍCIO : construído no terreno alheio, ou no terreno próprio com<br />

material alheio, S 40.<br />

— Comprehende-se na hypotheca do solo, $ 179 c S 183.<br />

EMBARGOS de terceiro: remédio possessorio, § 20.<br />

EMPHYTEUSE • origem histórica, § 137 e 138.<br />

— Definição, característicos, § 139.<br />

— Em que se distingue do uso-íructo. § 140.<br />

— Que cousas podem ser objecto delia. § 141.<br />

— Pessoas que podem constituir emphyteuse, § 142.<br />

— Pessoas que podem aforar bens para si, S 143.<br />

— Como se constitue a emphyteuse? Por convenção, ^<br />

144 ; por testamento, § 145 ; por prescrição acquisitiva,<br />

§ 146.<br />

— Direitos do emphyteuta, § 147.<br />

— Obrigações do emphyteuta : pagar a pensão, § 148 ; pedir<br />

consentimento ao senhorio para a alienação,?; 140,<br />

outras obrigações, S 150.<br />

— Direitos do senhorio directo, § 151 : continuação, § 152 :<br />

laadçmio, § 153.


MÏ<br />

— Indivisibilidade do prazo, g 154.<br />

— Successâo, § 155.<br />

— Como acaba a emphyteuse, S 156.<br />

— Sub­emphyteuse, § 157.<br />

— Acções relativas à. emphyteuse, § 158.<br />

— Pode ser objecto de hypotheca, § 179, n. III.<br />

KSI'KCTALISAÇAO DA HYPOTHECA. —Em que consiste, §226 c 221.<br />

— Por quem pôde ser requerida e a que juiz, § 231 A.<br />

— Arbitramento da responsabilidade ; . designação e avaliação<br />

dos immoveis, S 232.<br />

— Julgamento por sentença, §233.<br />

— Particularidades da especialisação da hypotheca da mulher<br />

casada, § 234.<br />

— Fyffeitos da especialisação, § 235.<br />

ESPECIFICAÇÃO. —Modo de adquirir domínio, definição, condições,<br />

§37.<br />

RXCRPÇÃO : de domínio na força turbativa (««ate vi), intelligencia do<br />

Assento de 16 de Fevereiro de 1786, § 22, n. 3.<br />

— de do li mali (rei venditee et traditee) * 86<br />

— de execução § 160, u. 3.<br />

— cedendai■itui actionem §.<br />

FERAS; bra vias, mansas, domesticadas, § 34<br />

FONTES : §. 26 n. 3.—Veja­se servidões<br />

FKUCTOS : acquisição dos fruetos da còusa alheia ; adquire­os o possuidor<br />

de boa fé ; fruetos pendentes, extantes, consumidos,<br />

§ 56.<br />

— Questão sobre o clominio dos fruetos extantes, * 56<br />

— Boa fé do possuidor, § 57.<br />

— O possuidor de boa fé os adquire pela simples separação<br />

e porque razão ? Da mesma forma o credor artichresista<br />

e o emphyteuta, § 58.<br />

— O que é frueto, § 99. "<br />

Fii.nOS : Veja­se hvpotheca legal.<br />

H<br />

HABITAÇÃO : Direito real, em que cousiste, g 123.<br />

HYPOTHECA : Direito real pignoraticio, S 159<br />

— Origem histórica, §172.<br />

■—­A antiga legislação ; novíssima reforma., § 173.<br />

— Definição, característicos, § 174.<br />

— Natureza da hypotheca, § 175.<br />

— Indivisibilidade, § 176.<br />

— Condições da hypotheca, obrigação, g 177.<br />

— Cousa, § 178.<br />

— Que immoveis podem ser hypothecados, § 179.<br />

— Qual a sorte dos moveis, separados dos immoveis hypothecados.<br />

§ 180.<br />

— Immoveis que não podem ser hypothecados, § 181.


608<br />

— Subrogação do inimovel no preço (sinistro, desapropriação<br />

e índemnisação) § 182.<br />

— Comprehensão da hypotheca quanto á cotisa c quanto<br />

á obrigaçáo, | 183.<br />

— Hypotheca geral, especial, § 184.<br />

A hypotheca é um direito excepcional, § 185<br />

— Causas de hypotheca (legal, judicial e convencional)<br />

S 186.<br />

HYPOTHKCAS r,i GAI..-, noção geral, § 1ST.<br />

I. hypotheca legal da mulher cas.ida, condições, S 188.<br />

— Quaes os direitos garantidos pela h\ pothec.t legal d,i<br />

mulher casada, § 189.<br />

— Sobre que bens do marido recahe, §, 190..<br />

Pode a mulher ceder ou renunciar a sua hypotheca,<br />

t 191.<br />

— Como se constitue e desde que data, s 192.<br />

— Restricção da hypotheca aos immoveis designados na<br />

escriptura antinupcial, S 193.<br />

— Hypotheca legal da mulher estrangeira, § 194<br />

II Hypotheca legal de orphãos e interdict os causa da<br />

hyootheca, § 195.<br />

— A' quem compete, S 196.<br />

— Contra quem, S 197.<br />

One obrigações garante, § 198<br />

Como se constitue e desde que data, § 199.<br />

— Hypotheca legal dos menores e interdictos estrangeiros,<br />

% 200.<br />

III. Hypotheca dos filhos sobre os immoveis do pai,<br />

§ 201 .<br />

IV. Hypotheca legal dos filhos sobre os immoveis do pai<br />

ou mãi binuba, § 202.<br />

V. Hypotheca legal do Estado, § 203.<br />

VI. Hypotheca da igreja e corporações de mão morta,<br />

S 204.<br />

VII. Hypotheca legal dos offendidos e coherdeiros, § 205<br />

e 206; e á pag. 602 o art. 829 do Cod Civ<br />

— Hypotheca judiciaria : Noção e histórico. § 207.<br />

A hypotheca judicial e o direito de penhorar bens alienados<br />

em fraude da execução, § 208.<br />

— Quaes as sentenças que produzem a hypotheca judicial,<br />

§ 200.<br />

— Hypotheca convencional : condições, elementos da capacidade,<br />

S 210.<br />

— Capacidade (direito de alienar) § 211.<br />

Pessoas capazes de hypothecar, S 212<br />

— Incapazes de hypothecar: a mulher casada, s 213.<br />

— Filho famílias, menores e interdiefos, § 214 ; fallidos,<br />

herdeiros provisórios e corporações úc mão morta,<br />

S 21-<br />

— Capacidade (domínio).! 216<br />

— Poder de administrar não contém poder de hypothecar,<br />

§ 217.


(»09<br />

— Nullidade da hypotheca convencional dos menores e<br />

iuterdictos, g 218.<br />

Influencia sobre a hypotheca das condições a que está<br />

sujeito o immovel, s 219.<br />

— Formalidades externas, s 220.<br />

Especialidade da hypotheca convencionol, S 221.<br />

— Direito de pedir reforço da hypotheca, S 222.<br />

— Influenciada hypotheca sobre o vencimento da obrigação,<br />

S 223.<br />

— Hypotheca convencional constituída em paia estrangeiro,<br />

S 224.<br />

— Veja-se Publicidade, Prenotação, Especialisação e Inscripçâo.<br />

Kffeitos da hypotheca: S 253.<br />

T \',m relação ao dono do immovel : conserva o direito<br />

de reter o immovel. de usufruil-o, de constituir sei<br />

vidões, etc. S 254.<br />

— Pôde o dono do immovel hypotheca-lo segunda vez?<br />

§ 255. Quando a segunda hypotheca constitue estellionato<br />

? cit §, nota 10. —Sorte da segunda hypotheca.<br />

cit. § n. 10.<br />

— Pôde o devedor alienar o immovel hypothecadoS 256.<br />

II. Effeitos da hypotheca em relação aos terceiros detentores<br />

: direito de sequela. Não prevalecem contra a<br />

hypotheca as alienações posteriores, a constituição de<br />

onu» reu.es, nem as obrigações pessoaes em relação<br />

ao immovel, S 257.<br />

— Posição do terceiro detentor : obrigação de supportai' a<br />

execução se não rime o immovel ou não paga a divida,<br />

§ 258.<br />

— EJxpropriação forçada : faculdade de abandonar o immovel,<br />

§ 259.<br />

— Pagamento integral da divida — beneficio de ordem ou<br />

de execução. S 260.—Kxcepção cedendarum actionwm,<br />

cit. §.<br />

III. T-.fïcitos da hypotheca em relação aos credores : Consiste<br />

na preferencia, s 267.<br />

— A preferencia é determinada pela prioridade. Diversas<br />

questões acerca da prioridade, >j 208.<br />

— Credores privilegiados e chirografarios sua natureza<br />

é direito puramente pessoal, s 269. Cede diante, da<br />

hypotheca, cit. §269.<br />

Acções relativas ao direito hypothecario : Acção do credor,<br />

noção histórica. § 270.<br />

-Acção do credor segundo o direito actual: diversas<br />

questões á respeito, S 271 •<br />

— Sequestros, s 272.<br />

— Meios de preservar a hypotheca, S 273.<br />

Acções de terceiros contra a hypotheca, s 274.<br />

— Modos pelos quaes se extingue a h\( otheca, § 2/5.<br />

— Pela extineção da obrigação principal, § 270, n 1.<br />

— Pela perda da cotisa, cit. 276, n. 2.


m<br />

— Pela renuncia, §276, n. 3.<br />

— Pela confusão, § 277, n. 4.<br />

— Pela resolução do domínio, cit. § 277. n. 5.<br />

­Pela expropriação, cit. S 277, n. 6.<br />

— Pela remissão, cit. § 277, n. 7.<br />

­Pela arrcmatação em praça, § 277, n. 8.<br />

— Pela prescripção extinctiva, § 278, A.<br />

— Pela' pre»cripção acquisitiva, cit. § 278, B.<br />

IGREJA : tem hypotheca legal, § 204.<br />

ÏI/HAS : que se for mão nos rios públicos e particulares, § 39.<br />

IMMOVEIS, S 178, 179 e 181.<br />

iNDivisiBiiylDADE : das servidões, S 116 c 117 : dos prasos, § 154 ;<br />

da hypotheca, § 176.<br />

INSCKIPÇÃO : da hypotheca, S 225 ; actos preparatórios, § 226.<br />

— Hypothecas sujeitas á inscripção, S 227.<br />

— Pessoas que podem requerer a inscripção, S 236.<br />

INSCKIPÇÃO das hypothecas legaes geraes, quem a pôde requerer ? a<br />

de mulher casada, § 237 ; a de menores e interdictos,<br />

§238.<br />

INSCRÍPÇÕES das hypothecas especiaes ou especiaUsadas. Pessoas<br />

que a podem requerer, § 239.<br />

— Lugar em que deve ser feita a inscripção, § 240 ; tempo,<br />

§ 241.<br />

­­ Títulos para a inscripção, § 242.<br />

— Formalidades da inscripção : registro no protocollo,<br />

§ 242. ><br />

— Inscripção no livro competente, § 243.<br />

—■ Cláusulas da inscripção, § 244.<br />

— Particularidades da inscripção da hypotheca judicial,<br />

§ 245.<br />

— Imicripções das hypothecas geraes, § 246.<br />

— Averbações, § 247 .<br />

Irregularidades da inscripção, § 248.<br />

— Perempção do registro, § 249.<br />

— Cancellamento da inscripção, § 250.<br />

INTERDICTOS.—Veja­se Hypotheca legal.<br />

JUROS : na anüchrese, § 196; da divida hypothecaria, § 183 C<br />

L<br />

IVAUDEMIO : § 183.<br />

M<br />

MENORES.—Veja­se Hypotheca legal.<br />

MINAS : pertencem ao dono do solo, § 26, n. 2.<br />

— Podem ser objecto de hypotheca, § 179, n. 4 B.<br />

MODOS oe perder o dominio : § 89, 90, 61 e 92.<br />

Mui,HER casada.—Veja­se Hypotheca legal.


611<br />

N<br />

NurYi.ii)Ai'i<br />

— Da Transcripção, S 53 : do acto transcripto, 5 54<br />

­Da hvpotheca S 175 e 225, ns. U4§ 269 e 274.<br />

Da inscripçâo, s 225, s 248, § 250. n . 10. 269, e 274<br />

■—Acções de mülidade da hvpotheca, S 274.<br />

O<br />

OCCUPAÇÃO : modo de adquirir. 5 33.<br />

OBKKAÇÃO : direito pessoal, ^ I.<br />

1 OBRIGAÇÃO : quaes as que a hvpotheca garante, í 177.<br />

OPÇÃO (direito : í 152 n. 2.<br />

P<br />

PACTO A\TK\I i'Ci \: ([..ando produz hvpotheca legal, g 188.<br />

PAH : os immoveis de sua propriedade sujeitos a hvpotheca Legal<br />

do filhos, » 195 a 200.<br />

PATRIMÔNIO > 1 e 24.<br />

PEDREIRAS : Pertencem ao dono do solo, S 26, n. 3.<br />

PENHOR : Noções, eoutracto, direito real, S 160.<br />

— Condições, obrigação, cousa. S 161.<br />

— Porque pôde ser constituido e como se constitue. Necessidade<br />

da tradição, S 162.<br />

Quando o objecto é um direito. S 172.<br />

bíleitos do eoutracto do penhor ; direito real do credor,<br />

posse,direito de executar a cousa empenhada, de reivindical­a,<br />

pacto commissorio, s 103.<br />

— Direito de seqüência e de preferencia. S 163.<br />

— Indivisibilidade do penhor, S 163.<br />

— Obrigação do credor, S 164; do devedor; s 166.<br />

— Modos de cxtincção do penhor, s 167.<br />

PESCA : modo de adquirir, leis que a regulão, § 34.<br />

POSSE: qual o lugar que occupa nas instituições do Direito Civil<br />

S 1, C) 11. ().<br />

— Noção da posse ; corno se distingue do dominio : quaes<br />

as razões que determinarão a sua creação. s 2.<br />

— De que elemento se compõe, J 5<br />

— EfTeitos legaes. s 4.<br />

— E' direito on facto, S 5.<br />

— Que cotisas podem ser objecto de posse, s 6.<br />

— Compossessão, s 7.<br />

— Teriniuoloiïia da posse, qualiticações, civil, civilissima,<br />

natural, justa, injusta, viciosa, s 8.<br />

— Corno se adquire, s 6<br />

— Apprehenção. ficta, symbolica, § 10.<br />

— Intenção: consciência do possuidor ; pessoas que não<br />

podem adquirir. §11.<br />

— Posse derivada: sem apprehensão (a do herdeiro) sem<br />

detenção (a do emphyteuta e do pignoraticioï S 12.<br />

— Como se adquire a posse por terceiro, S 13.<br />

— Constituto possessorio, expresso, tácito, s 14.<br />

— Como se perde a posse, pelo facto, pela intenção, ü 15.<br />

— Perda da posse por terceiro. S 10.<br />

40


612<br />

— Quasi posse, elementos que a constituem ; doutrina do.<br />

Direito Canouico a respeito, § 16.<br />

— Acções que resultão da posse, interdictos possessorios,<br />

S 18.<br />

— Interdictos retintndce possession-is : I Acçâo de força turbativa<br />

(utipossidetis) objecto, condições, excepções,<br />

g 19.<br />

II. Embargos de terceiro possuidor, s 20.<br />

III. Interdictos prohibitorios, S 21.<br />

— Interdictos recuperando? possessionis, I Acções de força<br />

turbativa (uudevi), objecto, condições, excepções, § 22,<br />

II. Destorço, 5 23.<br />

— Interdicio adipsisceudœ possess/oui's, i 18,<br />

PKI:I ERENCIA : effeito do penhor, S 163, n. 6.<br />

— Effeito da hvpotheca, s 174, n. 2.<br />

— Em que consiste. S 269.<br />

PKKNOTAÇÃO : S 226.<br />

Km que consiste; S 227.<br />

— Prazo da prenotação ; a quem compete marca-lo, S 228.<br />

— Como se realiza, S 229.<br />

— Effeitos, S 230.<br />

PRESCRIPÇÃO ACOUISITIVA : Noção, differença da extinetiva s 59.<br />

— Fundamentos da acquisição, % 60.<br />

— Definição ; é modo de adquirir, * 61 .<br />

— Cousa e direitos que podem ser adquirido 1 -- pela preferi<br />

pção S 62.<br />

— Diversas espécies de prescripção, S 63.<br />

•—Prescripção ordinana acquisitiva : requisitos, * (>4 ;<br />

cousa hábil jj 65 ; posse, S 66 ; lapso de tempo ; S 67,<br />

justo titulo, ü 68 ; boa fé, í 69.<br />

—-Prescripção extraordinária: Requisitos;' é subsidiaria<br />

da ordinária, s 70.<br />

— Regras communs á ordinária e extraordinária :<br />

— Como se conta o tempo S 71.<br />

— Accessão de posse, S "2.<br />

— Causas qne impedem a prescripção, s 73, que interrompam,<br />

S 74, que suspendem, s 75.<br />

— Quem tem qualidade para invocar a prescripção ; deve<br />

ser allegada, s 77.<br />

— Renuncia da prescripção. S 78.<br />

— Effeitos da presciipção, s 79.<br />

— Prescripção immemorial, s 80.<br />

PRIORIDADE : S 242 e s 267.—Veja-se Hvpotheca.<br />

PRIVILEGIO : quaes os que a novíssima reforma deixou subsistir.<br />

S 269.<br />

— Xao vale contra a hypotheca, S 269.<br />

— Em que consiste ; não tem natureza de direito real,.<br />

g 269.<br />

PROPRIEDADE : direito, diversas accepções, s 24<br />

PUBLICIDADE : dos actos eutre vivos translatives de dominio sobre<br />

immoveis, s 43 e 48.<br />

— Da hypotheca, s 225. -Veja-se Inscripção.


613<br />

R<br />

REMÉDIOS possessorios.—Veja-se Posse.<br />

REMISSÃO : O que é, s 263.<br />

Quem pôde requerer a remissão, S 265<br />

— Formalidades da remissão, s 264.<br />

— Direitos do adqnirenle no decurso da remissão e depois<br />

delia consummada, S 275.<br />

— Remissão das hypothecas legaes, geraes e especialisadas,<br />

§ 266.<br />

REIVINDICAÇÃO (acçáo), 82.<br />

RESOLUÇÃO do domínio, s 27.<br />

S<br />

SENTENÇAS : quaes as que produzem hypotheca, s 209.<br />

I-i vjuEEA : eft'eito do penhor, s 163, n. 5 ; de hypotheca, S 174, n. 1.<br />

SEOUESTKO, meio preparatório da acção hypothecaria, s 272.<br />

SERVIDÕES: Definição, § 114.<br />

— Princípios fundamentaes, S 115.<br />

— Indivisibilidade, s 118.<br />

— Effeitos da indi visibilidade, s 117.<br />

— Direitos e onus inhérentes, S 118.<br />

— Divisão das servidões quanto á sua natureza—urbanas,<br />

rústicas ; continuas, descontinuas, apparentes, não<br />

apparentes, s 119.<br />

Classificação, quanto a sua Origem—legaes e convenci<br />

onaes S 120.<br />

— Servidões legaes :<br />

— De escoamento natural das águas, g 121.<br />

De passagem d'agua, S 122.<br />

— De escoante de águas estagnadas, § 123.<br />

— De água» supérfluas, S 124.<br />

— De passagem do prédio encravado. í 125.<br />

— Negativa de janellas e frestas, s 126.<br />

— De metter traves. > 127.<br />

Servidões convencionaes : observação S 122.<br />

— Urbanas : de apoiar o nosso edifício no edifício ou muro<br />

alheio {onerts ferendi) S 129. n. 1 ; de madeirar na parede<br />

alheia (tigni immittendij S 129. n. 2 ; stillicidii, S<br />

129, n. 3; de luz e vista, S 129, n. 4; allius non toilendi,<br />

§ 129, n. 5.<br />

— Rústicas: de transito, § 130, n. 1; de navegar, cit ;<br />

S n, 2 ; de passagem d'agua (aquœducttis) cit. § n. 3.<br />

de tirar água (aquce haustus), cit. Sn. 4 ; de pasto<br />

(pascendi), cit. in. 4.<br />

Quasi-posse das servidões, § 131.<br />

— Por quem podem ser constituídas e por quem adquiridas,<br />

S 132.<br />

— Como se constituem, por actos entre vivos, testamento.<br />

destinação do proprietário, adjudicação e prescripção<br />

acquisitiva, § 133.<br />

— Como se extinguem, S 134.<br />

— Acções, | 135. /<br />

— Acções possessorias, S 136.


SUBKOGAÇXO . do iininovel no preço; conseqüências, s 132.<br />

-Da hypothecs, necessária, voluntária, S 252.<br />

ESTELIONATO : s 237, n. 5, III. s 238. n. 5, â) e s 255 n. 6.<br />

SUPERFICIE direito real abolido, S I, II; S 179,<br />

T<br />

THESOURO Definição ; pertence metade ao inventor, a outra metade<br />

ao dono do solo, § 35, n. 3.<br />

— Achado em terreno aforado, metade pertence ao senhorio<br />

directo e não ao emphyteuta, S 151, u. 2.<br />

TITULO ju.sto titulo e modo de adquirir, g 31, n. 4.<br />

TRADIÇÃO : Noção geral histórica s 43.<br />

— O que é tradição? tradição nua, tradição, elemento dos<br />

contractus mies; tradição, modo de adquirir, s 44.<br />

- Condições da tradição para transferir o domínio, S 35.<br />

Erro quanto á tradição effeitos, S 46.<br />

— Modo pratico de operar a tradição, g 47.<br />

TRANSCRIPÇÃO : Histórico, S 43.<br />

— O que é transcripção : quaes seus effeitos, S 48.<br />

— Condições para a eiricacia da transcripção, S 40.<br />

Actos sujeitos á transcripção, g 50 ; enumeração desses<br />

actos, S 51.<br />

— Formalidades da transcripção : como se faz a transcripção,<br />

S 52, n. 1 ; lugar em que deve ser feita, cit. §,<br />

n. 2 : a quem compete prômove-la. cit S n. 3 ; fôrma<br />

do titulo para a transcripção. cit. S a. 4.<br />

— Nullidades da transcripção, s 53. i.<br />

— Averbações, cancellamento, S 54. L<br />

— Conflicto entre duas transcripções, s 55.<br />

TUTELA : causa da hypotheca legal, Í; 187 c 195.<br />

TUTOR : í 197.—Veja-se hvpotheca.<br />

u<br />

Uso: DeHniçao, particularidade, obrigações do usuário, j 112.<br />

Uso-i-KUCTO : Definição, S 93.<br />

— Em que cousas se pôde constituir o uso-fructo. S 94.<br />

— Por quem e por que modo pode ser constituído,<br />

S 95.<br />

— Relações entre o proprietário c o uso-fructuario. S 96.<br />

— Direitos do uso-fructuario, S 97 e 98.<br />

— O que é fructo. S 99.<br />

— Direitos do uso-fructuario em relação á arvores, minas<br />

e crias de animaes, s 100,<br />

— Cessão do uso-fructo, S 10l.<br />

— Como adquire o uso-fructuario Os fructos, s 102.<br />

Obrigações do uso-fructuario : prestar caução, S 103.<br />

— Usufruir a cousa como bom pae de família, S 104.<br />

- Obrigações quanto aos onus e reparos, S 105 ; quanto a<br />

conservação, S 106 ; quanto ás dividas do proprietário,<br />

S 107.<br />

— Quasi-posse do uso-fructo, S 108.<br />

— Como acaba o uso-fructo : effeitos. § 109.<br />

— Quasi-usofructo, s 110.<br />

Acções que nascem do uso-fructo. S 111.


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