Em quatrocentos golpes um retrato da juventude em Truffaut - jandre

Muito rapidamente a foto é requisitada pelo professor de francês ao aluno que
malfadadamente foi pego com ela na mão, o nosso personagem, que é colocado de
castigo contra a parede e atrás de um quadro negro.
Este professor é um personagem que age como um fiscal de fábrica, veste um
uniforme que lembra macacão de operário e trata seus alunos com intensa rudeza.
Quando libera os alunos para o recreio não permite a Antoine que saia da sala de aula,
alegando que “recreação não é um direito é recompensa”.
Os colegas também não parecem em sua maioria, dignos de confiança, pois,
neste ponto a escola, sábia e maldosamente, transforma alguns em fiscais de outros num
forte mecanismo de controle.
Desde estas cenas iniciais podemos perceber que é o olhar de Antoine que nos
conduz e ao próprio diretor, a câmara passeia pelas ruas de Paris levando-nos pelos
caminhos de Antoine quando este sai da escola.
O mundo desse personagem irá se dividir também com a casa, o pequeno e
humilde apartamento onde mora com a mãe e o pai. Ali Antoine realiza pequenas
tarefas, põe a mesa com cuidado, faz compras na mercearia. Neste “lar” são
apresentados os personagens da mãe, uma bela mulher de gênio irascível e do pai que
pensa quase todo o tempo no clube de rali do qual é presidente.
Acuado pelo professor de francês, que lhe impusera como castigo uma tarefa
impossível de realizar em pouco tempo; escrever quatrocentas vezes a frase: - “Eu
estrago as paredes da sala de aula e maltrato a prosódia francesa”, Antoine decide
cabular aula, junto com seu colega René.
Neste primeiro dia em que cabula a aula vai a uma espécie de parque de
diversões em que existe um aparelho de diversão que é, na verdade, uma réplica da
antiga “lanterna mágica”, precursora do cinematógrafo. Ali Antoine se diverte girando
fixo ás paredes do aparelho pela força de atração e o vemos realmente feliz. Seria, de
fato, uma homenagem de Truffaut a sua grande paixão, o cinema.
Num dos dias em que não vai a escola, Antoine andando com o colega pelas
ruas, encontra a mãe aos beijos com outro homem. Não parece muito abalado com o
fato, como se da mãe esperasse qualquer coisa.
Inventa desculpas, falsifica bilhetes, até chegar ao ponto de dizer que não fora às
aulas por motivo de falecimento de sua mãe.Descobertas suas mentiras é seriamente
advertido pelos pais, ameaçado de envio para o “reformatório”. Foge para uma
tipografia abandonada e numa situação clichê (único momento em que vemos um clichê
de vitimização da personagem) rouba leite para matar a fome.
Quando o encontram a mãe, ao que parece, tomada por algum remorso se
esmera em cuidados, lhe dá banho e permite que durma na cama dos pais que é mais
confortável. Conversam, e diante da declaração de Antoine de que gostaria de deixar a
escola, a mãe argumenta que a escola é o lugar onde, embora se aprenda muitas coisas
desnecessárias como Álgebra e Ciências, há a linguagem que é muito importante porque
sempre temos cartas para escrever. Faz com ele um acordo de que se na próxima
redação ficasse entre os cinco primeiros da classe receberia mil francos.
O acordo funciona e inspirado em Balzac, que se torna um ídolo para o menino
este busca elaborar uma boa redação. Numa espécie de altar improvisado com caixas ele
acende uma vela, o que causa um princípio de incêndio. Diante da bronca do pai, a mãe
propõe uma ida ao cinema para verem “Paris é Nossa”.
Esta ida ao cinema é o único momento de felicidade familiar do filme, em que
Antoine aparece de mãos dadas com a mãe e o pai, depois de tomar sorvete, num estado
de espírito de profunda alegria que permanece mesmo no retorno para casa.