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Em quatrocentos golpes um retrato da juventude em Truffaut - jandre

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O segredo, <strong>Truffaut</strong> o guar<strong>da</strong>ra para si, o público só soube mais tarde que<br />

Antoine Doinel viveria para contar outras histórias <strong>em</strong> mais cinco filmes.<br />

Com as on<strong>da</strong>s do mar <strong>em</strong> Quatrocentos Golpes as on<strong>da</strong>s <strong>da</strong> nouvelle vague<br />

Característica <strong>da</strong> “Nouvelle Vague” é a ruptura com a estrutura narrativa<br />

tradicional, são os personagens que un<strong>em</strong> <strong>em</strong> si os el<strong>em</strong>entos que se configuram como<br />

fragmentos de <strong>um</strong> discurso. O personag<strong>em</strong> é catalisador de <strong>um</strong> fenômeno discursivo e<br />

na explicitação de seus sentimentos, nas manifestações de sua corporali<strong>da</strong>de, na<br />

profundi<strong>da</strong>de de seus olhares e na liber<strong>da</strong>de <strong>da</strong><strong>da</strong> à câmara, é que o filme acontece.<br />

Assim é <strong>em</strong> Quatre Cents Coups, <strong>um</strong> filme que acontece pelo confluir de<br />

ambigüi<strong>da</strong>des <strong>em</strong> que Antoine está imerso, por isso o caráter de ruptura deste filme com<br />

to<strong>da</strong> <strong>um</strong>a construção estética tradicional, resultando no que <strong>Truffaut</strong> propunha, a<br />

“superação <strong>da</strong> tirania visual” a que estavam submetidos os cineastas <strong>da</strong>quela época,<br />

tirania a qual ele próprio recusava se submeter.<br />

Neste filme e <strong>em</strong> outros que se seguiriam o drama não está no enredo, está na<br />

existência do personag<strong>em</strong>, existir é <strong>um</strong> drama, <strong>da</strong><strong>da</strong> nossa busca que acontece a todo<br />

instante. São os instantes que determinam a montag<strong>em</strong>, são os instantes que costuram os<br />

fragmentos que brotam <strong>da</strong> alma do personag<strong>em</strong>. Não há mais como seguir os cânones e<br />

por isso o personag<strong>em</strong> (e por que não o espectador?) se deixa levar ao sabor <strong>da</strong> on<strong>da</strong>, <strong>da</strong><br />

vague, <strong>da</strong> “nouvelle vague”.<br />

Nesta on<strong>da</strong> que nos traz <strong>Truffaut</strong>, cabe a representação/apresentação apenas<br />

como tentativa de aproximação plena de <strong>um</strong>a reali<strong>da</strong>de h<strong>um</strong>ana, que não é política e<br />

n<strong>em</strong> mesmo psicológica, é simplesmente h<strong>um</strong>ana e simultaneamente simples e<br />

complexa. Tudo precisa acontecer s<strong>em</strong> envere<strong>da</strong>r pelo caminho <strong>da</strong> autocomiseração e<br />

ain<strong>da</strong> menos <strong>da</strong> denúncia política (ponto de vista que o fez romper com Go<strong>da</strong>rd).<br />

Antoine simplesmente vive, e viver neste caso é improvisar, assim como os<br />

filmes <strong>da</strong> “nouvelle vague” segu<strong>em</strong> os r<strong>um</strong>os de <strong>um</strong>a improvisação ao sabor de <strong>um</strong>a<br />

estética <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong>de, onde os custos determinam os limites. Para Antoine viver é<br />

improvisar, diante <strong>da</strong> desord<strong>em</strong> do mundo <strong>em</strong> que vive. Não há fio condutor. Não há,<br />

mesmo, <strong>um</strong>a cor<strong>da</strong>-bamba onde se equilibrar. Para esta <strong>juventude</strong> viver é mergulhar no<br />

vazio do desconhecido.<br />

O drama não é explicitado, não existe como clichê, existe por esta<br />

indeterminação do viver, pela busca pelos fragmentos do amor, pela certeza de que a<br />

morte virá. Diante disso, por que dramatizar? Seria no mínimo redun<strong>da</strong>nte.<br />

E hoje, o que seria de Antoine Doinel?<br />

Visto a luz dos dias de hoje este filme nos apresenta <strong>um</strong>a <strong>juventude</strong> que não<br />

existe mais, a “delinqüência” de Antoine seria risível diante <strong>da</strong> delinqüência de Ken-<br />

Park, de Kids ou dos nossos nacionais, Ci<strong>da</strong>de de Deus e Cama de Gato. Para Antoine<br />

bastaria enviá-lo pelos caminhos dos “mecanismos de correção” mostrados no filme.<br />

Aquele era <strong>um</strong> mundo <strong>em</strong> que adultos mal resolvidos ou não, ditavam as regras e<br />

impunham caminhos. Nosso mundo como explica Abramo(2005) é <strong>um</strong> mundo de<br />

“adultos juvenilizados”.<br />

O olhar de Antoine, que pod<strong>em</strong>os considerar como <strong>um</strong> mote do filme apresenta<br />

traços de doçura, mostra-se feliz nos momentos de aproximação com o cin<strong>em</strong>a. Onde<br />

está o olhar do jov<strong>em</strong> dos filmes de hoje? Há como ver brotar a alma de <strong>um</strong> filme sobre<br />

<strong>juventude</strong>, através do olhar de <strong>um</strong> personag<strong>em</strong> de hoje?

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