28.08.2013 Views

Dos direitos da igreja e do Estado - Faculdade de Direito da ...

Dos direitos da igreja e do Estado - Faculdade de Direito da ...

Dos direitos da igreja e do Estado - Faculdade de Direito da ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

DOS DIREITOS<br />

EGREJA E DO ESTADO<br />

DIOCESES E METROPOLES<br />

POR<br />

Eduar<strong>do</strong> Dally Alves <strong>de</strong> Sá<br />

Celte allianee entre Ia religion et Ia li-<br />

bertb ne pouvait btre durrible qu'i unecon-<br />

dition ; c'est u1on reviendrait au chrislia-<br />

nisrne priruit$.<br />

Louie B~nnc.<br />

COIMBRA<br />

Imprensa <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

1872


La seule r6alitB d'ici-bas, je I'ai toujoors<br />

senti, c'eat I'amour, I'amour sou8 toule ses<br />

formes.<br />

L~ura~inr.<br />

In opere et sermone st omni patieotia<br />

honora patrem tuum,<br />

ut superveniat tibi beoedictio ab eo.. ..<br />

Dedico este livro a meus paes.<br />

Pronunciar este nome é dizer o motivo d'esta consagração.<br />

Coimbra, 30 <strong>de</strong> Abril<br />

<strong>de</strong> 1872.


DISSERTAC~O INAUGURAL<br />

PARA O<br />

ACTO DE CONCLUSOES MAGNAS<br />

DE<br />

Eduar<strong>do</strong> Dally Alves <strong>de</strong> Sá<br />

NA<br />

IB"HGUllLID4IC>B DE lr!mlEITT@<br />

DA<br />

UNIVERSIDADE DE COIMBRA<br />

EM 1872


PRELIMINAR<br />

I Porque 830 mui importantes, ayezar <strong>de</strong> pouco estu<strong>da</strong><strong>da</strong>s, as queslõas <strong>de</strong> direito<br />

oçclesiastico portuguez. I1 O que e o direito priva<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma egreja. 111 Objecto<br />

d'este trabalho -plano <strong>do</strong> livro.<br />

Cui<strong>da</strong>-se hoje que estu<strong>da</strong>r as questóes <strong>de</strong> direito ecclesiastico<br />

vale o mesmo que <strong>de</strong>spojar-se <strong>da</strong> toga <strong>de</strong> tribuno; pensa-se que<br />

agitar a poeira <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes e <strong>do</strong>s canones <strong>do</strong>s concilias importa<br />

afun<strong>da</strong>r-se nas <strong>do</strong>utrinas mais rancorosas e antipathicas <strong>do</strong> ultra-<br />

montanismo.<br />

k mais um erro quc obscurece estes tempos.<br />

Para mim nâo são sobremo<strong>do</strong> dilectos os trabalhos <strong>de</strong> puro dÈ<br />

reito canonico; não que essas questões <strong>de</strong>ixem <strong>de</strong> ter attractivos:<br />

mui em contrario, sobra-lhes a gravi<strong>da</strong><strong>de</strong>, a difficul<strong>da</strong><strong>de</strong> e o gran-<br />

dioso ate; mas, porque não comprehen<strong>do</strong> como, viven<strong>do</strong>-se em<br />

paizes livres e nestes tempos em que tão graves problemas esma-<br />

gam o mun<strong>do</strong>, o ameaçam com as suas trevas, e pe<strong>de</strong>m o con-<br />

curso <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as intelligencias, nos <strong>de</strong>ixemos ficar, <strong>de</strong>scui<strong>do</strong>sos<br />

ou indifferentes, estu<strong>da</strong>n<strong>do</strong> a organisação, intima, interna, <strong>do</strong>mes-<br />

tica <strong>de</strong> uma socie<strong>da</strong><strong>de</strong> ecclesiastica, que coexiste com outros gre-<br />

mios religiosos, que o esta<strong>do</strong> garante em seu exercicio, a quem<br />

permitte uma vi<strong>da</strong> real e legal, e para os quaes nem ao menos<br />

guar<strong>da</strong>mos um olhar.<br />

E comtu<strong>do</strong> 6 ain<strong>da</strong> mui largo o espaço que se abre <strong>de</strong>ante <strong>de</strong><br />

n6s e quc tcmos a explorar.<br />

& to<strong>do</strong> o direito publico ec<strong>de</strong>siastico nas suas relações com o<br />

direito publico temporal.<br />

São as qucstões que tocam egualmente os confins <strong>da</strong>s duas e+


pheras, religiosa e civil, <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> e <strong>da</strong> egreja. I3 o gran<strong>de</strong> problema<br />

<strong>da</strong>s relações <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r espiritual e temporal.<br />

Este estu<strong>do</strong> 6 hoje mais preciso <strong>do</strong> que nunca. Se em tempos,<br />

que lá vão, foi mister ser canonista para oppor uma espa<strong>da</strong> bem<br />

tempera<strong>da</strong> por parte <strong>da</strong> cor<strong>da</strong> ria lucta com a tiara; ho,je, que<br />

um divorcio <strong>do</strong> altar e <strong>do</strong> throno está tálvcz inimincnte; hoje, que<br />

a soberania, per<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a origem immediatamcnte divina, brota ingente<br />

<strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s humanas e sc scciilarisa para <strong>de</strong>ixar á egreja<br />

a forca que lhe é propria e quc a engrand(v-e; hoje, é necessario tnmbem,<br />

mais <strong>do</strong> que entso por\cntiirn, sat~er aqriillo que é (!c c.,itl,i<br />

um para o <strong>da</strong>r a seu <strong>do</strong>no: -o que é <strong>de</strong> Crsar para o <strong>de</strong>ixar sob o<br />

sceptro; o que 6 <strong>de</strong> Deus para, immacula<strong>do</strong>, o ir <strong>de</strong>por nas aras.<br />

A falta d'este estu<strong>do</strong> é <strong>de</strong>ploravel.<br />

As reformas s8o meticulosas e acanlia<strong>da</strong>s. Os conflictos Ievantam-se<br />

<strong>de</strong>sastra<strong>da</strong>mente, e muitas vczcs a naçãio soffre revezes e<br />

tem <strong>de</strong> humilhar-se, porque, riescia dc seus <strong>direitos</strong>, não pó<strong>de</strong><br />

altiva levantar n fronte e repellir a prrtensso injusta.<br />

Não 6 menos triste ver o esta<strong>do</strong> usurpar as attribuiçbes, <strong>de</strong>sconhecer<br />

os <strong>direitos</strong> <strong>da</strong> egreja, e ter <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> se sustentar em falso<br />

terreno com sophismas e violencias ; elle, que dispõe <strong>da</strong> força ;<br />

elle, o <strong>de</strong>positario <strong>do</strong> direito c <strong>da</strong> justiça.<br />

Ha, to<strong>da</strong>via, razões que t&m torna<strong>do</strong> escassos estes trabalhos<br />

nos ultimos tempos.<br />

A ari<strong>de</strong>z <strong>do</strong>s assumptos; sua difficul<strong>da</strong><strong>de</strong>, que exige por veres<br />

irisanas e atura<strong>da</strong>s fadigas; os raros subsidios <strong>de</strong> que podcmos lançar<br />

mão para o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> direito portiigiiez, consistin<strong>do</strong> pela<br />

maior parte em <strong>do</strong>cumentos, sepulta<strong>do</strong>s, muitos rios archivos, outros<br />

perdi<strong>do</strong>s nas paginas <strong>de</strong> avoluma<strong>da</strong>s obras; a lirigua em que<br />

são escriptos gran<strong>de</strong> numero <strong>do</strong>s livros <strong>do</strong>s tractadistas c redigi<strong>do</strong>s<br />

quasi to<strong>do</strong>s os monumentos e leis; lirigua essa que hoje tem mui<br />

poucos ama<strong>do</strong>rcs: - são tu<strong>do</strong> causas qur muitas vezes fazem aban<strong>do</strong>nar<br />

os in-folio e <strong>de</strong>por a penna.<br />

Depois, n6s temos a infelici<strong>da</strong><strong>de</strong> dr viver 'numa epocha, em<br />

que não s6 o latim 6 fossil para muitos, mas em que, tamhem, a<br />

industria apcrfeiçoadissima nos tem proporciona<strong>do</strong> cm to<strong>da</strong>s as<br />

cousas taes commodi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, que a atmosphera empoeira<strong>da</strong> e o aspecto<br />

<strong>de</strong>crepito <strong>de</strong> um archivo afastam para muito longe o maior<br />

*numero.<br />

n8o s6 os tempos : são tambem os logares ; porque 'nesta


pobre terra, on<strong>de</strong> ha tanta escrescencia disforme, nâo avigora o<br />

amor pelo saber, este amor <strong>de</strong>sinteressa<strong>do</strong>, que s6 po<strong>de</strong> servir h<br />

sciencia.<br />

Eu bem sei que hoje as questões sociaes e politicas estão cha-<br />

man<strong>do</strong> a attenção <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s, e que não <strong>de</strong>ve admirar esta emigra-<br />

ção <strong>da</strong>s intelligcncias e <strong>da</strong>s painas para outras paragens ; mas 6<br />

que este mesmo esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> Europa traz novo interesse a estes ob-<br />

jectos.<br />

Não vbmos surgir aqui, a <strong>do</strong>us passos <strong>de</strong> n6s, um parti<strong>do</strong> novo<br />

na historia, ameaça<strong>do</strong>r, cheio <strong>de</strong> trcvas nas siias aspirações - o<br />

neo-catholicismo ?<br />

E que querem estes homens? querem que ahjuremos <strong>da</strong>s ccm-<br />

quistas <strong>de</strong> tantos scculos <strong>de</strong> luctas c <strong>de</strong> sangue espargi<strong>do</strong> ; querem<br />

que reneguemos esta crença tão sanctn <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, c que o ca-<br />

tholicismo (como lhe chamam) lance por to<strong>da</strong> a superficie d'este<br />

tão formoso planeta que habitamos ngo sei que su<strong>da</strong>rio <strong>de</strong> mortos,<br />

que nos vai roubar o espectaculo grandioso d'este cbu tão puro e<br />

tão azul <strong>da</strong> nossa infancia ; - querem que a theocracia torne a<br />

avassallar o mun<strong>do</strong> ; e isto, porque o mun<strong>do</strong> vacilla agora um in-<br />

stante (porque i! um instante a vi<strong>da</strong> <strong>de</strong> algumas gerações), <strong>de</strong>slum-<br />

bra<strong>do</strong> pela luz brilhante <strong>de</strong> uni fóco <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, que a tyrannia<br />

guar<strong>da</strong>va fecha<strong>do</strong> em sua miio <strong>de</strong> ferro, hoje fundi<strong>da</strong> pelo calor<br />

d'essa mesma chamma.<br />

Nas alturas <strong>da</strong> sciencia não ha estes lo<strong>do</strong>s revoltos, estas pai-<br />

xões turbulentas <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>: ha n sereni<strong>da</strong><strong>de</strong> para surgir a justiça,<br />

ha o silencio para ser fecun<strong>da</strong> a meditaçào.<br />

Mas riem por isso fica extranhn a estas convulsões: pelo con-<br />

trario, prev&-as, estu<strong>da</strong>-as, prepara-lhes o remcdio.<br />

Este estu<strong>do</strong> renasce agora, principalmente nos capitulos que<br />

indicámos.<br />

Em sua estructura interna a egreja não tem que innovar ; cum-<br />

pre-lhe antes fazer o que os economistas preten<strong>de</strong>m na esphera<br />

economica : <strong>de</strong>rrubar vicios, esmagar abusos, tipproximar-se, quanto<br />

possivel, <strong>de</strong> sua constituiçao primitiva, para po<strong>de</strong>r acompanhar a<br />

civilisação no seu gran<strong>de</strong> e ca<strong>da</strong> vez mais apressa<strong>do</strong> caminhar.<br />

Estas as razões, por que preferimos para o presente trabalho<br />

este objecto.


As leis <strong>de</strong> disciplina ecclesiastica catholica s8o <strong>de</strong> duas especies :<br />

geraes e especiaes.<br />

A razão está em que esta egreja diz-se ecumenica - <strong>de</strong> to<strong>do</strong><br />

o orbe habita<strong>do</strong>.<br />

Os costumes são varios ; differentes as posições e circumstancias<br />

<strong>da</strong>s christan<strong>da</strong><strong>de</strong>s 'nesta ou 'naquclla parte <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, 'nesta ou<br />

'naquella latitu<strong>de</strong>.<br />

Náo assim emquanto 6 f6, ao <strong>do</strong>gmii. Este é unico, o mesmo;<br />

este pren<strong>de</strong> o gran<strong>de</strong> corpo catholico. A dissi<strong>de</strong>ricia i1 seu respeito<br />

gera a excommunháo <strong>do</strong> seio <strong>da</strong> egreja.<br />

O conflicto nos pontos <strong>da</strong> disciplina fun<strong>da</strong>mental po<strong>de</strong> produzir<br />

os schismas.<br />

D'esta diversi<strong>da</strong><strong>de</strong> apparece o que se chama egreja nacional,<br />

como a Africana, i1 Hispanica, a Romana, a Germanica, a Galli-<br />

cana, a Iasitana ou Portugueza.<br />

Náo que sejam schismaticas; mas que tem úm direito proprio,<br />

propria disciplina que <strong>de</strong>roga as leis geraes <strong>da</strong> egreja.<br />

Ha na historia <strong>da</strong> egreja catholica um perio<strong>do</strong> em que o di-<br />

reito papal se engrossa com as fontes, que por to<strong>do</strong>s os la<strong>do</strong>s as<br />

falsas <strong>de</strong>cretaes recondiiziam <strong>da</strong>s cgrcjas <strong>do</strong> muii<strong>do</strong> christão.<br />

Este acontecimento, unico rias historias ~)rofarin e ccclcsiastica,<br />

não se completou sem graves rcluctancias e resistencias.<br />

As egrejas queriam conserv~lr o que os seus syno<strong>do</strong>s tinham le-<br />

gisla<strong>do</strong> para sua vi<strong>da</strong> propria ; e em muitos logarcs, a <strong>de</strong>speito <strong>da</strong><br />

nova legislação, permaneceram os tisos locaes e as <strong>de</strong>terminações<br />

já <strong>da</strong> antiga disciplina, jh <strong>do</strong>s canones <strong>do</strong>s concilias provinciaes <strong>do</strong>s<br />

primeiros seculos.<br />

'Nasce d'aqui um direito, pela miiior partr consuetudinario, con-<br />

tra as leis escriptas, geraes, o qual, mais ou menos contesta<strong>do</strong><br />

pelos papas, continúa a ser o direito nas egrejas nacionaes.<br />

A isto chamou-se - liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s ~grejas.<br />

Assim, 6 <strong>de</strong> ver que cstas cxprcssfics -liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s egrejas<br />

náo apparecem nos oito primoiros scculos <strong>da</strong> historia ecclcsiastica,<br />

quan<strong>do</strong> jh havia as egrejas nacionacs com seus metropnlitils c sua<br />

feição propria e individual.


São quasi como as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s municipaes na e<strong>da</strong><strong>de</strong> media : li-<br />

ber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, prerogativas, que as egrcjas conquistavam com sua re-<br />

sistencia tenaz e arrisca<strong>da</strong> ás pretens6es <strong>da</strong> sancta s6 ; liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s,<br />

prerogativas, que o episcopa<strong>do</strong>, já por motivos mun<strong>da</strong>nos, ja pela<br />

consciencia <strong>de</strong> sua digriidildt? abati<strong>da</strong>, houve po<strong>de</strong>r sustentar se-<br />

guras, bem firmes em sua mitra.<br />

Muitas vezes tambem a esta idéa <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> uma egreja<br />

vem junctar-se um elemento profano, temporal.<br />

A historia <strong>da</strong> coexistcncia <strong>da</strong>s duas esphcras tem uma epocha, em<br />

que a egreja, não contente com sua vi<strong>da</strong> passa<strong>da</strong> ao la<strong>do</strong> <strong>da</strong> <strong>do</strong><br />

esta<strong>do</strong>, aspira á existencia unica <strong>de</strong> sua orbita.<br />

A lucta b terrivel, porque os combatentes não t&m a princi-<br />

pio forças eguaes; mas por fim a realeza temporal alcança fir-<br />

mar-se sobrc as communas suffoca<strong>da</strong>s e a nobreza <strong>de</strong>strui<strong>da</strong>; e<br />

um equilibrio, prompto a romper-se a ca<strong>da</strong> instante, uma quieta-<br />

ção ameaça<strong>do</strong>ra como a <strong>da</strong>s tempestacles em seus intervallos, sub-<br />

stitue-se tí harmonia tão <strong>do</strong>ce <strong>do</strong> seculo <strong>de</strong> Constantino.<br />

D'aqui nouo aspecto.<br />

O esta<strong>do</strong> tem prerogativas, trophbos que encrava entre as pero-<br />

Ias <strong>da</strong> cor<strong>da</strong> real e que ganhou na liicta com sua rival temivel.<br />

As prcrogitivas dil cor<strong>da</strong> junctam-sr 6s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja, e<br />

d'este to<strong>do</strong> riasce o direi10 ecclesiaslico priua<strong>do</strong> <strong>da</strong>s egrejas na-<br />

cionaes.<br />

No meio d'estcs combates, porem, não é liqui<strong>do</strong> muitas vezes<br />

saber qual o direito, qual a rega.<br />

Conquista<strong>da</strong>, não outorga<strong>da</strong>, a liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, ou a prerogativa, em<br />

quasi to<strong>do</strong>s os casos não foi expressamente confessa<strong>da</strong> pelo direito<br />

papal; - excepção ti lei geral não se presume ; é preciso oppol-a<br />

evi<strong>de</strong>nte tí letra d'aquella, que tem por si a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> venerandit<br />

e irrefragavel <strong>do</strong>s concilias ecumenicos.<br />

Apparece bem clara a dificul<strong>da</strong><strong>de</strong> d'estas questõcs.<br />

A nossa 6 uma d'ellas.


A egreja catholica é visivel ; tem uma estriictura palpavel, con-<br />

cretisa<strong>da</strong> ; tem um governo externo, iimu hicrarcliia miiltipln cm sctis<br />

gráus, e, por conseguinte, uma divivao tcrritorial e jiirisdicçioriiil.<br />

A mu<strong>da</strong>nça <strong>da</strong> Area d'esta dioccsc, a aboliçáo d'aqii(~llii, ii scparaçao<br />

<strong>da</strong> parcclla <strong>de</strong> uma ou <strong>de</strong> mais, para a crecc;io <strong>de</strong> urna<br />

nova, nào é uma cousa que se passe nos ares, nos ~)laiic~las <strong>do</strong><br />

espaço, que não sào o nosso.<br />

O esta<strong>do</strong> pó<strong>de</strong> scr interessa<strong>do</strong>.<br />

Alcm d'isso, a egreja, que tem sacer<strong>do</strong>tes, n8o Ihes ha <strong>de</strong> <strong>da</strong>r<br />

por certo para siistcnlaç30 o extase como o <strong>de</strong> Sancta Cecilia, ou<br />

o triste passadio <strong>do</strong>s cenobitas no <strong>de</strong>serto; ou ficar-se esperan<strong>do</strong><br />

que <strong>de</strong>sça <strong>do</strong>s ares o corvo cari<strong>do</strong>so, ou o mannh provi<strong>de</strong>ncial <strong>do</strong>s<br />

israelitas.<br />

A egreja nasceu <strong>de</strong> pesca<strong>do</strong>res e homens pohrissimos; e o Cliristo<br />

dizia, a quem o queria seguir, que ven<strong>de</strong>sse o que possuissc.<br />

Pouco Ihes bastava. Habentes victum et tegumenium his couicnti<br />

sumus, diziam elles.<br />

Os canoiies mais puros <strong>de</strong> sua disciplina prohibem aos clerigos<br />

o exercicio <strong>do</strong>s offic.ios mun<strong>da</strong>nos e <strong>de</strong> logares na republica.<br />

Felizes tempos estes em que as riquezas <strong>do</strong> clero eram o patri-<br />

moriio <strong>do</strong>s pobres, <strong>da</strong>s viuvas e <strong>do</strong>s con<strong>de</strong>mria<strong>do</strong>s!<br />

Não assistiu comtu<strong>do</strong> por muito tempo o mun<strong>do</strong> a este especta-<br />

culo grandioso <strong>da</strong> cari<strong>da</strong><strong>de</strong> christã.<br />

O christianismo foi essencialmente uma revoluçâo espiritua-<br />

lista.<br />

Ás dissoluções sem nome <strong>do</strong> Imperio, ao materialismo abjecto<br />

<strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s pagãs foi mister oppor este <strong>de</strong>sprendimento abso-<br />

luto <strong>de</strong> tu<strong>do</strong> o que era mun<strong>da</strong>no, porque no mun<strong>do</strong> na<strong>da</strong> havia a<br />

aproveitar.<br />

A cobiça, esta pobreza i<strong>de</strong>al; á luxuria, esta' continencia gran-<br />

<strong>de</strong>mente meritoria, leva<strong>da</strong> ao excesso pelo gran<strong>de</strong> Origenes e seus<br />

imita<strong>do</strong>res; ao orgulho, esta humil<strong>da</strong><strong>de</strong> sem exemplo <strong>do</strong> chrisfio;<br />

aos odios, a paz e o amor, que são o relevo mais avulta<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

christianismo primitivo ; e finalmente, ao rebaixamento <strong>do</strong> espirite,<br />

esta elevaçáo sublime <strong>da</strong> alma até aos p6s <strong>de</strong> Deiis.


A revolução era tão necesseria, que o mun<strong>do</strong> transforma-se ra-<br />

pi<strong>da</strong>mente, como se o clarão <strong>de</strong> um relumpago refulgente subito<br />

brilhasse <strong>do</strong> interior <strong>da</strong> Judéa e para sempre o illuminasse.<br />

Mas isto passou <strong>de</strong>pressa.<br />

Alguns seculos <strong>de</strong> pureza, e, <strong>de</strong>pois, em logar <strong>da</strong>s monstruosi-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>do</strong> velho imperio, a barbarie <strong>do</strong>s tempos <strong>do</strong> feu<strong>da</strong>lismo,<br />

As riquezas concentram-se nas mãos <strong>do</strong>s po<strong>de</strong>rosos <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>,<br />

-a nobreza e o clero: para os outros a pobreza, o trabalho, a<br />

servidão.<br />

assim que, na segun<strong>da</strong> cpocha <strong>da</strong> historia <strong>da</strong> egreja, ella não<br />

tem que pedir ao seculo o pão <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> dia ; muito pelo contrario,<br />

a opulencia <strong>do</strong>ura-lhe a vi<strong>da</strong> e centuplica-lhe o po<strong>de</strong>r.<br />

Depois, não sei por que terrivel biiipança <strong>de</strong> Deus, um dia, os<br />

homens <strong>de</strong>rrubam os altares e <strong>de</strong>sapossnm-na <strong>de</strong> seus bens.<br />

O esta<strong>do</strong>, que por muito tempo se serviu, e porventura ain<strong>da</strong><br />

hoje se serve, <strong>da</strong> religião como meio <strong>de</strong> conservar os costumes, +<br />

offereceu a Deus o que era <strong>de</strong> Cesar, garantiu a <strong>do</strong>taçao e susten-<br />

tação <strong>do</strong> clero catholico pelo thesoiiro publico.<br />

Neste esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> cousas, bom ou mau, a creaçâo <strong>de</strong> uma dio-<br />

cese, a erecção <strong>de</strong> uma metropole, ou patriarchial, não 4 negocio<br />

indiffererite para o esta<strong>do</strong>.<br />

E, ain<strong>da</strong> quan<strong>do</strong> o fosse, podia perguntar-se se alguma lei ha-<br />

via que ao esta<strong>do</strong> conferisse o direito <strong>de</strong> intervir, ou fazer por si<br />

s6 essas modificaçbes na circumscripçào ecclesiastica.<br />

Era urna questão positiva.<br />

fi este o objccto <strong>do</strong> nosso trabalho. Facil 6 vel-o naturalmente<br />

dividi<strong>do</strong> em tres capitiilos :<br />

Qual a legislação geral <strong>da</strong> egreja sobre o assumpto? C<br />

Ha direito ecclesiastico portuguez que a modifique?<br />

Será conveniente este esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> legislação ecclesiastica?<br />

Taes são as tres partes em que se separa este livro.


PARTE PRIMEIRA<br />

LEGISLAÇBO GERAL DA EGREJA<br />

A RESPEITO<br />

ir rlscbh sisnssslo, wino, ~ivislo E cincurnsmirbio<br />

DAS DIOCESES E HETROPOLES<br />

Quare non est, quod a conimuni universalis<br />

Eccle~iae sensu recediirnus loe<strong>da</strong> in<br />

prineipis adulatiene ... Tuta rei istius dispoiientlne<br />

ratio a11 Ecclesiam ptrtiiiel.<br />

PRI~RO DE MARCA, Concord Sacerd. et<br />

Imper. lib. 2.0, cap. 9.O n.O 7.'<br />

Qui monte au<strong>de</strong>ssus <strong>de</strong> I'liumanitb, brise<br />

avec olle Ie pacte <strong>de</strong> nature. Le droit <strong>de</strong><br />

tout faire le pousse A toule oser.<br />

I'ELI.ETA~, Les droils <strong>de</strong> l'homms.


PARTE I<br />

DA LEGISLAÇ~O GERAL DA EGREJA ACERCA DA ERECÇÃO,<br />

SUPPRESS.~~, UNIÃO, DIVISÃO E CIRCUMSCRIPÇÀO<br />

DAS DIOCESES E METBOPOLES<br />

CAPITULO I<br />

Tempos Apostolicos<br />

O primeiro monumento legislatiro a consultar stio os actos <strong>do</strong>s apostolos e não os cba-<br />

nia<strong>do</strong>s canones apostolicoa.-Não apparece ain<strong>da</strong> uma divisfio terrilorial <strong>da</strong> egreja<br />

egual e melhodica.-Apostolos, Presbyteros, egreja ou rebanho.-Que necessi<strong>da</strong><strong>do</strong><br />

presi<strong>de</strong> neslcs tempos i divistio <strong>da</strong> e reja. -A quem pertencia o direi10 <strong>de</strong> crerr<br />

as ~rinieirau dioceses. - Como os uftramonlanos abusam d'esle facto. - OpiniBo<br />

<strong>de</strong> 1. laouel <strong>do</strong> Monte Hodrigues <strong>de</strong> Araujo.<br />

Ha auctores que creem que os mais antigos monumentos escri-<br />

ptos <strong>da</strong> legislação ecclesiastica, esses canones geralmente conhe-<br />

ci<strong>do</strong>s pelo nome <strong>de</strong> canones <strong>do</strong>s apostolos - canones vztlgo aposto-<br />

lorum ou sanctorum et gloriosorum Aposlolorum nomine octo-<br />

ginta caizones, são effectivamente obra <strong>do</strong>s sanctos discipulos <strong>da</strong><br />

Senhor e veneran<strong>do</strong>s por isso mais <strong>do</strong> que os mais veneran<strong>do</strong>s.<br />

Não somos d'esta opinião, e hoje mesmo poucos haverá, talvez<br />

nerilium, .que a queiram perfilhar.<br />

A critica levou á evi<strong>de</strong>ncia o assumpto neste, como em outros<br />

pontos <strong>da</strong> historia <strong>da</strong>s collecções e canones <strong>da</strong> egeja 1.<br />

1 Ácerca d'estes canones famosos discute-se n&o s6 a sua antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> e<br />

portalito sua auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>, mas tambem o numero d'elles.<br />

Os antigos chamavam-lhe sómente canones ecclesiautici-canol?ce pdrl~rn,<br />

veleres caiiones.<br />

A opinib mais segura B a <strong>de</strong> Mons. d'Aubépinc, bispo dlOrleana, naa suas<br />

Obs. liv. 2, eap. 23.<br />

Sb canones <strong>do</strong>a concilias <strong>do</strong>e fins <strong>do</strong> 2.0 seculo, <strong>do</strong> 3.0 e <strong>do</strong>s principias


Nâo começaremos, por conseguinte, o estu<strong>do</strong> <strong>da</strong> legislaçóo cco-<br />

nomica pelo exame d'estes canones : antes d'elles, ha a vcr oiitros<br />

monumentos, ain<strong>da</strong> que não texto <strong>de</strong> lei, para que, d'esta manci-<br />

ra, possamos levar segui<strong>da</strong> a historia <strong>da</strong> legislaçâo ou disciplina<br />

sobrc o ol~jecto <strong>de</strong> que tractamos.<br />

E <strong>do</strong>s actos <strong>do</strong>s apostolos <strong>de</strong> que primeiro lançaremos máo 1,<br />

<strong>do</strong> 4.0; rcgras que os bispos d'esses seculos, homens quasi-apostolici, estatuiam<br />

no meio <strong>da</strong>s pcrsegiiiç0es que a egreja fiofi~ia por aquelles tempos.<br />

Até <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> 7.0 seculo tiveram-nos os gregos como feitos pelos diecipulos<br />

<strong>de</strong> Christo e colligi<strong>do</strong>s e publica<strong>do</strong>s pelo Papa S. Clemente.<br />

No can. 2.0 <strong>do</strong> concilio chama<strong>do</strong> Trullano, ou in Trullo, ou QuindSexto,<br />

diz-se: c..... a<strong>de</strong>o nobis etiam traditi sunt sanctorum e( gloriosorum Apost<strong>do</strong>rum<br />

nomine octo.ginta quinque canones..<br />

Tlieo<strong>do</strong>ro Balsainoii, o sabio patriarclia <strong>de</strong> Antiochia, usa d'estas tâo innoceiites<br />

palavras para calar os latinos, que duvi<strong>da</strong>vam <strong>da</strong> authentici<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s<br />

canones apostolicos, dizen<strong>do</strong> <strong>do</strong>gmaticaiiiciite : c Hujzcspraesenlis canonis perpetuo<br />

recor<strong>da</strong>re: per ipsum enim os eis seclu<strong>de</strong>u qui dicunt a6 Apostolia non<br />

fuisse editos octoginta qc~inque camnes. *<br />

E <strong>de</strong> notar que este concilio teve logar no anno 692 <strong>do</strong> nasciriicnto <strong>de</strong><br />

Christo e que o criidito Patriarcha grego em buas obras mostra gran<strong>de</strong> animosi<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />

por vezcs bem parcial, para com os auctores e padres <strong>da</strong> egreja<br />

latina.<br />

Apczar <strong>de</strong> que alguns d'estes ultimos e <strong>do</strong>s mais recentes mesmo, dão auctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

e tem por certa a origem ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente apostolica d'estes canone8.<br />

Na magnifics edição <strong>do</strong> Corpua JurM Canonici <strong>de</strong> Juato Henningio Boehmer,<br />

escreve este cotispicuo anuota<strong>do</strong>r a pag. 1231 <strong>do</strong> I: tomo:<br />

Quis c~e<strong>de</strong>ret, C'lev~entern hos canones congessisse quos Grlasius in C. 3,<br />

dist. xv apoeryphis annumeravit mriptie, licet postea orientales eosprobaverint<br />

ut cauaae suae in plurimis servirent, vid. c. 4, dist. xvr..... I<strong>de</strong>m agnovit<br />

Leo in c. 3 dist. XVI et y/ri~/qunr/inta dunta&.ezcepit, quue ortho<strong>do</strong>zae<br />

$<strong>de</strong>i ndjugen<strong>da</strong> essent, sed Clr mrnfi non tribuit.<br />

Leia-se Van-Espen. Dksert. in can. vulgo apostol. § 2.0, no tomo 3.0 <strong>da</strong>s<br />

obras, ediç. <strong>de</strong> Lourain - 1753.<br />

Zalw~in Prif~c. Jur. Eccl. Tom. 2.O qiiest. 1.O cap. 3.0. on<strong>de</strong> se aconselha<br />

que se niio confun<strong>da</strong>m estes canones apostolicos coiu as cliama<strong>da</strong>s constituiçõpg<br />

apostolicas.<br />

E muito curiosa e sabia, como to<strong>da</strong>s as d'este auctor, a dissertaça0 sobre<br />

os canones e coiistituiç0es attribiii<strong>da</strong>s aos apostolos, <strong>de</strong> Du Pin a pag. 14<br />

<strong>do</strong> tom. 1.0 <strong>da</strong> Nouvelle BibZiothi.que <strong>de</strong>s auteurs eccl4siastiques- 1690.<br />

1 Os Actos <strong>do</strong>s Apostolos, tambem chama<strong>do</strong>s Hisforia <strong>do</strong>s dpostolos, Euangelho<br />

<strong>da</strong> Remrreição, Evangelho <strong>do</strong> Eapirito Sancto, constitnem uni (10s livros<br />

canon'cos <strong>da</strong> egreja; auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> esta que em to<strong>do</strong> o teinpo geralmente<br />

tem ti<strong>do</strong>. k obra attribui<strong>da</strong> a S. Lucas, evangeliata, e assim <strong>do</strong> maior respeito.<br />

Abrange <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o anno 34 atd o 64 <strong>da</strong> era vulgar, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a ascensgo <strong>de</strong><br />

(:liristo ate que S. Paulo sLe <strong>da</strong> prieão em Roina; muito aprecia<strong>da</strong> ela parte<br />

<strong>do</strong>gpntica que compreben<strong>de</strong>; muito elogia<strong>da</strong> por S. Jerouymo e S. j>oão Olirysostomo.<br />

Os marcionitae e mtrnich&w negaram-lhe a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> - os nicolaitas e


Não queiramos encontrar nestes tempos uma divisõo <strong>da</strong> egreja<br />

methodica, com certo numero <strong>de</strong> parochias, <strong>de</strong> bispos e metroyo-<br />

litas.<br />

Como seria isto possivel, se a egeja ain<strong>da</strong> agora mal comeua<br />

a formar-se, se (I: esta a epocha primeira <strong>da</strong> sua cxistencia, o priri-<br />

cipio <strong>da</strong> evangelisação <strong>da</strong>s <strong>do</strong>utririas <strong>do</strong> Chrislo?<br />

O logar estava toma<strong>do</strong> pelos gentios ou i<strong>do</strong>latras, e ju<strong>de</strong>us ;-<br />

aquelles com os seus templos, estes com suas synagogas.<br />

Gran<strong>de</strong> na antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> mosaica, preclecessora <strong>da</strong> Koma christã,<br />

Jerusalem era o fóco <strong>do</strong> christianismo: d'ahi irradiava para to<strong>da</strong><br />

a Asia-menor, passan<strong>do</strong> para o norte <strong>da</strong>s terras africanas, e <strong>de</strong>-<br />

corria para o occi<strong>de</strong>nte, especialmente para Roma, centro <strong>do</strong><br />

mun<strong>do</strong>.<br />

O que se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>duzir <strong>do</strong>s Actos, <strong>de</strong>strinçar <strong>do</strong> meio <strong>de</strong> suas<br />

narraçbes envolvi<strong>da</strong>s em mystico vEo, é que a christari<strong>da</strong><strong>de</strong> nas-<br />

cente comprehendia - os apostolos - os presbyteros - e a egreja,<br />

ou rebanho 1.<br />

Os apostolos, percorren<strong>do</strong> as ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>do</strong> oriente e occi<strong>de</strong>nte<br />

prégavam a palavra <strong>do</strong> Christo, e on<strong>de</strong> as conversões avultavam,<br />

or<strong>de</strong>navam presbyteros, que nessas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s e logares guar<strong>da</strong>vam<br />

puro o <strong>de</strong>posito sagra<strong>do</strong> <strong>da</strong> nova religiâoe.<br />

gnosticos e outros heresiarchas substituiram-nos por outros livros, hoje jul-<br />

ga<strong>do</strong>s apocryphos, on<strong>de</strong> introduziam os seus erros.<br />

Veja-se Tillemont, Mdmoir. pour servir ci à9hist. eecl. Article S. Luc., Évan-<br />

géliute; e Du Pin, obr. cit., tom. 1.0, pag. 5.<br />

1 Act. xx, 22 - xvr, 22, 26 - xv, 4, que diz : c Quun autem cenisaent Je-<br />

rosolymam, ewreepti sunt ab Ecclesa'a, et ab Apostoli8 et senioribus annuntian-<br />

te8 quanta Deus fecisset cun il1is.r confer. com o 6; e ain<strong>da</strong>, 22, 23, 30 e 41<br />

- XVI, 4 confer. com o 5.0 - xx, 17, 28 - XXI, 18.<br />

E muito para notar que to<strong>do</strong>s estes textos parecem indicar a existencia <strong>de</strong><br />

mais <strong>de</strong> iim bispo nas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s principaes ; restos, talvez, <strong>do</strong> ju<strong>da</strong>ismo. Aqui,<br />

nestes, mais <strong>do</strong> que nos simples presbyteros <strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> inferior plana,<br />

avulta a força <strong>do</strong> episcopa<strong>do</strong> que no futuro ha <strong>de</strong> crear os metropolitas, pa-<br />

triarcbas, etc.<br />

To<strong>da</strong>via esta <strong>do</strong>utrina vae attacar a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> episcopa<strong>do</strong>, que 6 a <strong>do</strong>u-<br />

trina catholica.<br />

S. Clemente, primeiro Bispo <strong>de</strong> Roma, em sua epistola aos corinthios, diz<br />

quc soa apostolos estabeleciam bispos e diaconoa nas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s e ddêas on<strong>de</strong><br />

pdqavam, e esperavam que viesse a haver christ8os.r<br />

2 Muitos exemplos ee po<strong>de</strong>riam junctar d'este procedimento <strong>do</strong>s apostolos,<br />

geral no oriente e occi<strong>de</strong>nte.<br />

Quan<strong>do</strong> S. Paulo prkga em Creta e Candia, <strong>de</strong>ixa, ao retirar-se, a Tito<br />

para acabar a obra <strong>da</strong> fé e pôr presbyteros ou bispos em ca<strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, como<br />

o uaeveram S. Chrysostomo e Theo<strong>do</strong>reto, e clarameqe se vê <strong>do</strong> v. 5.O <strong>do</strong>


Mas o christianismo vivia aqui acosta<strong>do</strong> ao ju<strong>da</strong>ismo e á i<strong>do</strong>la-<br />

tria; não tinha área sua, logar on<strong>de</strong> sua jurisdicção tomasse corpo<br />

e vulto 1.<br />

A egreja era a reunião <strong>do</strong>s converti<strong>do</strong>s, na<strong>da</strong> mais%.<br />

Tal apparece o primeiro rudimento, a mona<strong>da</strong> <strong>da</strong>s futuras pa-<br />

rochias, dioceses <strong>de</strong>pois.<br />

Se estes, que os actos chamam presbyteri, eram bispos: é ponto<br />

que o catholicismo resolveu afirmativamente e que o protestan-<br />

tismo combate para negar a or<strong>de</strong>m episcopal.<br />

A n6s, to<strong>da</strong>via, que nâo estamos tractan<strong>do</strong> <strong>de</strong> theologia, rniis<br />

<strong>de</strong> direito, pouco nos importam agora essas controvcrsias.<br />

Estu<strong>da</strong>mos o direito <strong>da</strong> egreja catholica; -havernos <strong>de</strong> co!lo-<br />

car-nos no ponto dc vista <strong>da</strong>s suas <strong>do</strong>utrinas.<br />

Admitte a egreja catbolica como <strong>do</strong>gma que o episcopa<strong>do</strong> é<br />

grau <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m differente <strong>do</strong> presbytera<strong>do</strong>; que o episcopa<strong>do</strong> 6 a<br />

plcriitri<strong>de</strong> <strong>da</strong> or<strong>de</strong>m; que os bispos são os successores <strong>do</strong>s opos-<br />

tolos, como eram esses presbyteros, <strong>de</strong> que fallam os Actos?<br />

Admitte.<br />

Tanto nos basta. Este 6 o nosso ponto <strong>de</strong> parti<strong>da</strong>. Qualquer<br />

outro seria falso, illogico.<br />

cap. 1.0 <strong>da</strong> Epist. a Tito- que diz : eHujus rei graiia reEqui te in Crefae,<br />

.i~t ea que <strong>de</strong>sunt, corrigas et constituas per civitater pesbgteros, si& et ego<br />

disposzci. 8<br />

k:m Jerusalem, como crescia o numero <strong>do</strong>s fieis, e as perseguig;)rs iiiflninmavam,<br />

os apostolos julgaram conveniente <strong>da</strong>r a esta ci<strong>da</strong><strong>de</strong> bispo pro.<br />

prio, o qual foi, como 8 sabi<strong>do</strong>, 8. Thiago, o justo, ou o menor.<br />

Veja-se Tillemont. Mem. cit. art.c* S. Pierre e S. Jacquc k Mineur. Falani<br />

S. Jeronymo e Tertulliano <strong>de</strong> S. João, Evangelistci, como <strong>do</strong> iiistitiii<strong>do</strong>r<br />

<strong>da</strong> or<strong>de</strong>m episcopal na Asia; o que ngo po<strong>de</strong> ser ver<strong>da</strong><strong>de</strong> absolutamente e h<br />

lettra, mas o 8 emquanto elle, j4 em extrema velhice, ia ain<strong>da</strong> pslns provincias<br />

(Ia Asia para estabelecer bispos, como o attesta Erurebio Hilist. cccler.<br />

Ziv. 3.0, c. 23.<br />

A respeito <strong>da</strong> creação <strong>da</strong>s celebres dioceaes <strong>de</strong> Alexandria, <strong>de</strong> Antiochia,<br />

<strong>de</strong> Africa, Constantinopola e <strong>da</strong>s dioceses <strong>da</strong> Itslia, na<strong>da</strong> se sabe. Os <strong>do</strong>cumentos<br />

faltam abaolutameute para algumas, e noutras as duvi<strong>da</strong>s <strong>de</strong>ixam o<br />

mesmo vacuo.<br />

Veja-se Mr. Bamage, Eiist. <strong>de</strong> ~'Église.<br />

Diz Ewebio, Hht. cc<strong>de</strong>s. Elo. 3, c. 37: cBi (apostoli) postqram in rmdb<br />

ac barbaris reyionibus $<strong>de</strong>i fun<strong>da</strong>menta jecevanl aliisque pastores constituerant,<br />

ad aliue genfea properabant.~<br />

1 Veja-se Mr. Bamage Hist. <strong>de</strong> l1I?glise, chap. vi, n.O 1, a respeito <strong>do</strong><br />

numero <strong>do</strong>e chriatãos no comev <strong>da</strong> egreja.<br />

2 Act. xv, 22-SIV, 22, 23. Muitoa teatoa se referem B egreja <strong>de</strong> Joruealeil,<br />

falan<strong>do</strong> ao rnewno tempo <strong>do</strong> templo, <strong>do</strong>a preebyteroe e <strong>do</strong>s apoetoloa


D'esta arma, aqui temos, como notamos, a origem primeira<br />

<strong>da</strong>s divisões ecclasiasticas.<br />

Toquemos, porem, numa notavel differença.<br />

Hoje, que a egreja catholica tem, como então a i<strong>do</strong>latria greco-<br />

romana, o melhor logar no mun<strong>do</strong>; a divis8o <strong>da</strong>s clioceses tem<br />

uma razão <strong>de</strong> ser diversa <strong>da</strong> d'estes frouxos claròes que aqui <strong>de</strong>-<br />

visamos.<br />

Hoje é a immensa extensão qiie ella abranje- o orbe to<strong>do</strong>-<br />

que pe<strong>de</strong>, que exige, que os rebanhos se divi<strong>da</strong>m e a ca<strong>da</strong> um<br />

se d& um pastor.<br />

Não seria possivel um só rebanho e um s6 pastor. No tempo<br />

<strong>do</strong>s apostolos era diffcrente.<br />

Mui limita<strong>da</strong> era a periphería <strong>da</strong>s conquistas <strong>da</strong> egreja nascente,<br />

mas mui graii<strong>de</strong> a lucta que havia a soffrear.<br />

Começavam então as perseguições; abria-se na primeira pagina<br />

o livro <strong>de</strong> ouro <strong>do</strong> martyrolopio christão.<br />

A semente preciosissirna <strong>da</strong> religiáo infante, <strong>de</strong>posita<strong>da</strong> aqui<br />

por um Paulo eloquente, ou alem por um Pedro veneran<strong>do</strong>, era<br />

logo aban<strong>do</strong>na<strong>da</strong> por elles, porque os povos os apedrejavam e ex-<br />

pulsavam <strong>de</strong> suas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s: indispensavel foi, assim, <strong>de</strong>ixar um<br />

penhor <strong>de</strong> sua <strong>de</strong>feza e conservaçáo. Foram os presbyteros.<br />

Os apostolos, esses, não tinham esta ou aquella ci<strong>da</strong><strong>de</strong>; iam<br />

per universum mundum - <strong>do</strong>cebant omnes gentes; inclusivamente<br />

os proprios presbyteros que a elles recorriam, quan<strong>do</strong> gran<strong>de</strong> du-<br />

vi<strong>da</strong> se levantava hc&rca <strong>de</strong> qualquer ponto <strong>de</strong> fé ou disciplina I.<br />

Aos apostolos, pois, á egreja, na pessoa <strong>de</strong> seus chefes, perten-<br />

cia crear os presbyteros para estas ou aquellas christan<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

fi 'neste facto que hoje os escriptores <strong>da</strong> escola ultramontana<br />

assentam os seus argumentos, para mostrar que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as mais re-<br />

motas eras ao papa pertenceu este privilegio; pois, sen<strong>do</strong> aqui in-<br />

contestavel que os apostolos institiiiam os primeiros presbyteros c<br />

Ihes assignavam ce~ta multidão <strong>de</strong> fieis para reger; e, sen<strong>do</strong> o<br />

papa o successor <strong>de</strong> S. Pedro; parece-lhes que ninguem po<strong>de</strong>rá<br />

oppor-se áis illações, que logicamente julgam <strong>de</strong>correr d'essas duas<br />

ver<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

Adcante (cap. 3.O, n." II), mostraremos o vicio d'este argu-<br />

mento; por ora bastará saber-se que to<strong>do</strong>s estes actos <strong>do</strong>s apos-


tolos tem uma feição espccial <strong>de</strong>diizi<strong>da</strong> <strong>da</strong> natureza <strong>do</strong>s agentes,<br />

que náo eram simples bispos e <strong>de</strong> qucm o episcopa<strong>do</strong>, sc veiii occii-<br />

par 0 seu logar na egreja, não her<strong>do</strong>u comtu<strong>do</strong> a herança inteira.<br />

& um ponto indiibita~el <strong>da</strong> <strong>do</strong>utrina catholica.<br />

Depois náo ha aqui ver<strong>da</strong>dciramcnte uma divisão, ou circum-<br />

scripção ecclesiastica perfeitamente similhantc á que scculos <strong>de</strong>pois<br />

occupou o cui<strong>da</strong><strong>do</strong> <strong>do</strong>s syno<strong>do</strong>s provinciacs. A egrvja nasce agora ;<br />

os prcsbjtcros ficam aqui e além ; mas a egreja não occupa por<br />

emquanto, dizemos assim, um logar <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> no solo <strong>do</strong> zloho.<br />

Dcmais, <strong>de</strong> que os presbyteros foram ortlcna<strong>do</strong>s pelos apostolo$,<br />

1150 se segue que s6 o aposto10 na egreja possa crear os bispos:<br />

- pois quem havia dc or<strong>de</strong>nar os primeiros sacer<strong>do</strong>tes, senão os<br />

dcpositarios <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r espiritiial <strong>da</strong> egeja? a quem o transmittiu<br />

Cbristo? porventiira a Pedro sómente?<br />

E e este objecto um ass~impto <strong>de</strong> <strong>do</strong>gma, inalteravel? e, s6 6<br />

disciplinar, iião 6 preciso, antes <strong>de</strong> nos per<strong>de</strong>rmos nestas vagas<br />

con,jecturas, saber qiial a disciplina <strong>do</strong>s primeiros s(>ciilos?<br />

Qurm Ihcs havia <strong>de</strong> coritcstar a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>, a estes \arfies, que<br />

tinham toca<strong>do</strong>, vivi<strong>do</strong>, communga<strong>do</strong> com a propria divin<strong>da</strong>drb (1.1 .i


Isto que <strong>de</strong>ixamos escripto e que foi o que <strong>da</strong> leitura <strong>do</strong>s Actos<br />

<strong>do</strong>s Apostolos podémos colher, parecehos ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro c historico:<br />

pueril e falso se nos afigura, porem, o que D. Manuel <strong>do</strong> Monte<br />

Rodrigues dc Araujo escreve a pag. 223 <strong>do</strong> tom. 1." <strong>do</strong>s seus<br />

Elementos <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Ecclesiastico.<br />

Não nos chega a iritelligcncia até comprehen<strong>de</strong>r como, na partilha,<br />

que <strong>do</strong>s povos i<strong>do</strong>latras foi feita entre Pcdro e Paulo por<br />

inspiração <strong>do</strong> Espirito Sancto, se veja o primeiro exemplo <strong>de</strong> uma<br />

divisão ecclesia~tica ; divisáo ecclesiastica, on<strong>de</strong> ain<strong>da</strong> nâo havia<br />

seriao gentios e ju<strong>de</strong>us (!).<br />

I? confundir, evangelisar e reger a egreja; pregar a boa nova e<br />

dirigir os ficis.<br />

Nõo cremos tambem fun<strong>da</strong><strong>da</strong> em bom valor historico a preteridi<strong>da</strong><br />

divisão que <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> fizeram os apostolos para cumprir o preceito<br />

<strong>do</strong> Christo ((<strong>do</strong>cete omnes gentes)); como se aquelles sanctos<br />

homens fossem como os sol<strong>da</strong><strong>do</strong>s que dividiram em pe<strong>da</strong>ços a tunica<br />

<strong>do</strong> martyr.<br />

E quan<strong>do</strong> historico, será estc facto novo exemplo <strong>de</strong> divisiio<br />

ecclesiastica ? *<br />

E p6<strong>de</strong> alguem acreditar que os apostolos, que ouviram <strong>da</strong> bocca<br />

<strong>de</strong> Christo o celebre preceito- ((euntes in mundzbm universum<br />

praedicate et-angelium omni creaturae)) - se estabelecessem fixamcnte<br />

testa d'esta ou d'aquella egreja i?<br />

Este alvitre, esta maneira <strong>de</strong> olhar a historia d'estes tempos,<br />

6 tho falsa, que a consequencia irrecusavel d'clla scria o espantoso<br />

absur<strong>do</strong> <strong>de</strong> ver 'nesse facto, nfio s6 um simplcs facto <strong>de</strong> circiimscripçào<br />

ecclesiastica, mas ain<strong>da</strong> o exemplo dii creação <strong>da</strong>s<br />

primeiras divisòes superiores <strong>da</strong> cgre,ja; pois os gentios e os romanos<br />

por converter a f6 formariam duas provincias <strong>de</strong> christãos, e<br />

os apostolos seriam os seus metropolitas; mas metropolitas que<br />

nào teriam egreja propria para sé<strong>de</strong> <strong>de</strong> seu po<strong>de</strong>r, em que não<br />

1 A propria Roma teve um bispo proprio no tempo <strong>do</strong>s apostolos; e a ra-<br />

sRo por que isto foi assim, k porque, diz S. Epipliaiiio, citrr(10 por Tillemont,<br />

Pedro e Paulo não podiam estar Fempre em Roma por causa <strong>da</strong>s viagens<br />

que se viam obriga<strong>do</strong>s a fazer ara prégar o Evangelho.<br />

Ve,j. TiUenont, obr. cil. ari. $. Clement, pape. tom. 2.0, e ahi as outras au-<br />

ctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s cit.<br />

O que acima dizemos a reepeito <strong>de</strong> haver nestes tempos mais <strong>do</strong> um biupo<br />

nas gran<strong>de</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, explica, talvez, as duvi<strong>da</strong>s que sobre o bispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Roina<br />

se levantam por se falai. <strong>de</strong> tres bispos <strong>de</strong> Roma na mesma cpocha-S. Lino,<br />

S. Anacleto e S. Clemente.


permaneceriam <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong>s limites vastissimos <strong>de</strong> suas provin-<br />

cias !<br />

Não pó<strong>de</strong> ser. Os tempos apostolicos t&m um aspecto que lhe é<br />

proprio ; nem os cinco ou sete primeiros seculos <strong>da</strong> egrcja lhe sBo<br />

comparaveis, e muito menos ain<strong>da</strong> os ultimos nove e o seu actual<br />

esta<strong>do</strong>.<br />

Nas crengas catholicas os apostoios soo homens quasi divinos;<br />

immediatos <strong>de</strong>positarios <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r espiritual <strong>da</strong> egreja.<br />

Em sua vi<strong>da</strong>, a egrvja edifica-se; com sua morte, acha-se fir-<br />

ma<strong>da</strong>, como que dcsprcmdi<strong>da</strong> <strong>do</strong> céu, aban<strong>do</strong>na<strong>da</strong> sobre ;i toi~a,<br />

<strong>de</strong>spertan<strong>do</strong> para a existencia ao ru<strong>de</strong> contacto <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> ; - como<br />

o primeiro homem, quan<strong>do</strong> a mão <strong>de</strong> Deus o fez apparecer sobre<br />

o globo 'naquelle momento solemne, que o sublime pintor <strong>de</strong><br />

Julio 11 tão bem soube conceber na mente profun<strong>da</strong> que creou o<br />

Moysés.<br />

Não confuird~inos, pois, O que é diverso, e saibamos apreciar a<br />

' historia com o seu <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> pezo.


CAPITULO I1<br />

Des<strong>de</strong> os tempos apostolicos atb Constantino<br />

A tradicáo e os usos síio quasi exrlusivarn~nte as fontes <strong>da</strong> disciplina tla egreja neste<br />

perio<strong>do</strong>. - Cornecam r apparecer as egrejss in uieis, in puqis, in villis. - Por que<br />

razao a iiecessiiiádu <strong>da</strong> creacíio <strong>de</strong> novas dioceses apparcce agora sob novo aape-<br />

elo. - As obras <strong>do</strong>s padres <strong>do</strong>s primeiros bistoria<strong>do</strong>res; canones <strong>do</strong>s aposloios,<br />

canones <strong>do</strong>s concilios <strong>do</strong> 3.O e 4.' seculo: auxilio que prestam esles rnonumenlog.<br />

- Os vestigios <strong>da</strong> legislaeõo e o raciocinio <strong>de</strong>monstram a exislenria <strong>de</strong> uma di-<br />

visõo <strong>da</strong> egrejti em proviii'eias e parochias.- Nào <strong>de</strong>ve causar espanto o appareci-<br />

menlo prematuro <strong>da</strong> alta digni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Illelropolita. - A queni assistia o direito<br />

<strong>de</strong> crear as novas dioceies. - O laclo <strong>da</strong> prirniliva disciplina sobre a or<strong>de</strong>nacão<br />

<strong>do</strong>s bispos traz gran<strong>de</strong> luz ao objecto. - Os canones xiv e xxxv <strong>do</strong>s apostoloe 0<br />

o caoon xx <strong>do</strong> 4.0 concilio <strong>de</strong> Cartbago resolvem a questiío.<br />

O perio<strong>do</strong> que segue immediatamentc o tempo <strong>do</strong>s apostolos,<br />

e que se po<strong>de</strong> fixar <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os fins <strong>do</strong> primeiro seculo, 6 o mais<br />

agita<strong>do</strong> para a egreja.<br />

fi a epocha <strong>do</strong>s seus gran<strong>de</strong>s combates, epocha que acaba com<br />

a victoria d'ella e sua uni80 com o esta<strong>do</strong> sob o imperio <strong>de</strong> Cons-<br />

tantino Magno.<br />

'Neste espaço <strong>de</strong> quasi tres seculos a lepislayào ccclcsiastica,<br />

singela e pura, como era, conserva-se quasi exclusivamente na tra-<br />

dição e nos usos <strong>da</strong>s egrcjas.<br />

A simplici<strong>da</strong><strong>de</strong> e rigi<strong>de</strong>z <strong>do</strong>s costumes, a austeri<strong>da</strong><strong>de</strong>, fé e vir-<br />

tu<strong>de</strong>s <strong>do</strong>s primeiros christãos, dispensava mesmo as regras <strong>de</strong> dis-<br />

ciplina.<br />

A egreja tinha principalmente <strong>de</strong> esmagar as hercsias sem nu-<br />

mero, que <strong>de</strong>pois:<strong>do</strong> primeiro scculo lhe corroiam o seio ; e, ao<br />

mesmo tempo, <strong>de</strong> supportar o embate <strong>da</strong>s perseguições tremen<strong>da</strong>s<br />

que o imperio lhe movia.<br />

$ assim que, no meio d'estas agitações e d'estas tempesta<strong>de</strong>s,<br />

os raros concilios que se po<strong>de</strong>m reunir e os escriptos <strong>do</strong>s padres<br />

se occupam especialmente <strong>da</strong> rcfutação <strong>da</strong>s <strong>do</strong>utrinas dissi<strong>de</strong>ntes<br />

e <strong>da</strong> exhortação ao martyrio.


A historia guar<strong>do</strong>u a lembarnya <strong>de</strong> alguns d'esses concilios, mas<br />

nem suas actas, nem seus canones e <strong>de</strong>cretos chegaram até n6s 1.<br />

J!i sabemos o que pensar a respeito <strong>do</strong>s canones apostolicos,<br />

monumentos qiie resumem talvez a disciplina d'estcs tempos.<br />

Quem vac len<strong>do</strong> segui<strong>da</strong>rncnte a historia <strong>do</strong> dcsinvolvimento e<br />

progresso <strong>da</strong> egreja, vae perceben<strong>do</strong> como, pouco e pouco, os limites<br />

<strong>da</strong>s egrejas, ou parochias, se V ~ O fixan<strong>do</strong> c assim <strong>de</strong>terrninan<strong>do</strong><br />

a jurisdicçào episcopal ; vae-se-lhe pintan<strong>do</strong> este engrossar<br />

prodigioso <strong>da</strong>s f leiras <strong>do</strong> christianismo 'ncstes seculos prirnciros,<br />

e como a attençBo <strong>do</strong>s bispos tem <strong>de</strong> se multiplicar para prover<br />

Bs necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> seus rebanhos, ca<strong>da</strong> vez mais numerososfl.<br />

Começam aqui a apparecer as egrejas <strong>da</strong>s al<strong>de</strong>ias - in uillis ;<br />

in uicis, i ~ a pagis - pelos campos, pelos logares perdi<strong>do</strong>s fóra <strong>da</strong>s<br />

ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

]O agora que a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> creaçao <strong>de</strong> novas dioccses ou pa-<br />

rochias, a rieccssi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> tocar 'nesta materia <strong>da</strong> circumscripçâo,<br />

apparecc pela primeira vez com novo aspecto.<br />

Outr'ora o que evangelisava, inspira<strong>do</strong> pelo Espirito Sancto, ao<br />

<strong>de</strong>spedir-se <strong>do</strong>s fieis, <strong>de</strong>ixava-lhes uma cabeça pirn os dir - . i11<br />

centro para os reunir em volta.<br />

Agora nao. O bispo, jA estabeleci<strong>do</strong> em certa egreja por insti-<br />

tuiçào apostolica, P& augmcntar-se-lhc o rebanho, porque os chris-<br />

tãos nascem agora nào só <strong>da</strong> palavra intlamma<strong>da</strong> <strong>do</strong> apostolo, mas<br />

tambcm <strong>do</strong> sangue <strong>do</strong>s martyres, que era a semente fectirid:i <strong>do</strong><br />

christiariismo, como dizia uma <strong>da</strong>s mais brilhantes colunii,


conhecer to<strong>do</strong>s, para estar ao pe <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> um na hora <strong>do</strong> perigo<br />

ou <strong>do</strong> <strong>de</strong>salento.<br />

Assim, estes homens sem ambiçbes, arrasta<strong>do</strong>s tí digni<strong>da</strong><strong>de</strong> epis-<br />

copal, <strong>de</strong> que se julgavam sempre indignos c <strong>de</strong> que fugiam, eram<br />

os primeiros a pedir novos pastores, quan<strong>do</strong> a multi<strong>da</strong>o <strong>do</strong>s fieis<br />

crescia a ponto <strong>de</strong> exce<strong>de</strong>r as facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> um homem s6.<br />

l? nas obras <strong>do</strong>s padres, nas <strong>do</strong>s poucos historia<strong>do</strong>res d'estes<br />

seculos e nos canones <strong>do</strong>s apostolos que havemos <strong>de</strong> buscar a dis-<br />

ciplina, ain<strong>da</strong> vacillante e rara. Devemos tambem servir-nos <strong>do</strong>s<br />

canones <strong>do</strong>s concilios <strong>do</strong>s tres ou quatro primeiros seculos <strong>da</strong><br />

egreja <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> paz <strong>de</strong> Constantino ; porque clles contbm, espe-<br />

cialmente os <strong>do</strong> quarto seculo, o resumo, e como que o espelho<br />

<strong>do</strong> que se passava, ou <strong>do</strong> que corria ria tradição, durante os <strong>do</strong>is<br />

anteriores.<br />

As mu<strong>da</strong>nças <strong>de</strong> disciplina náo se faziam <strong>de</strong> um dia para o ou-<br />

tro nestes seis primeiros seculos <strong>da</strong> egreja; e postoque já <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />

terceiro seculo 1 crescessem por algumas partes gran<strong>de</strong>s ambições,<br />

comtu<strong>do</strong> ella tinha ain<strong>da</strong> vozes eloquentes, penas fortissimas, e<br />

exemplos <strong>de</strong> virtu<strong>de</strong> <strong>do</strong> maior vigor e mais alto relevo.<br />

O que vamos dizer fun<strong>da</strong>-se em to<strong>do</strong>s estes subsidios; náo ci-<br />

taremos, porbrn, aqui senão os d'estes <strong>do</strong>is seculos, para niío re-<br />

petir malerias.<br />

A divisa0 ecclesiastica em parochias e provincias, mas princi-<br />

palmente em parochias, é cousa i~idubitavel e bem palpavel <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

estes primeiros tempos.<br />

Demonstram-no os vestigios <strong>da</strong> legislaçáo e prova-o o racio-<br />

cinio.<br />

No can. xrv <strong>do</strong>s apostolos diz-se%<br />

uEpiscopo non licere alienamParochiam propria relicta perva<strong>de</strong>re.. .r<br />

I3 o cari. xv, completan<strong>do</strong> a materia, diz:<br />

aSi quis Presbyter aut Diaconus aut quilibet <strong>de</strong> numero clericorum<br />

1 Leia-se S. Cypriano, sermo quintus <strong>de</strong> lapsis -<strong>da</strong> compilaçlo <strong>de</strong> Erasmo<br />

<strong>de</strong> 1528, pag. 37:) <strong>do</strong> 1.0 vol.<br />

Eloquente oração e euriosissimo monumento historico, que nos revela O<br />

po<strong>de</strong>r <strong>da</strong> egrejx jb nestes tempos e a corrupção monstruosa que então cor-<br />

roía a socie<strong>da</strong><strong>de</strong>; factos estes que <strong>de</strong>ram logar A famosa perseguiçiio <strong>de</strong><br />

Decio, havi<strong>da</strong> pela septima e pela mais horrorosa e inflamma<strong>da</strong>.<br />

2 A licção <strong>do</strong>s canones <strong>do</strong>s apoatoloa, <strong>de</strong> que nos aervimos, 6 a que se acha


areliquens propriam Parochiam pergat ad alienam et omnino <strong>de</strong>migrans<br />

upraeter Episcopum conscientiam in aliena Parochia comoretiir.. . n<br />

Que, sain<strong>do</strong> <strong>da</strong> parochia propria, passavam para oiitro bispo<br />

e outra parochia, comprova-o o cen. xvr que diz:<br />

aEpiscopus vero apud quem memoratos.. . n<br />

No can. XXXIII ain<strong>da</strong> é mais saliente a divisão :<br />

«Si quis Presbyter aut Diacono ah episcopo suo segregetur hunc<br />

anon licere ab alio recepi-n<br />

O can. XXXVI <strong>de</strong>termina :<br />

aãpiscopiim non aii<strong>de</strong>re extra terminos proprios ordinationes facere<br />

uin Civitatibus et Villis quae illi nullo jure subjeclae svnt.n<br />

O can. xxxv falla ain<strong>da</strong> <strong>de</strong> parochin propria.<br />

O can. IX refere-se ao catalogo sacer<strong>do</strong>tal -quilibet ex sacer-<br />

<strong>do</strong>tali catalogo.<br />

A respeito <strong>do</strong>s metropolitas legisla o can. xxxv, man<strong>da</strong>n<strong>do</strong>:<br />

aEpiscopos Gentium singularum scire convenit, quis inter eos pri-<br />

umus habeatur, quem velot caput existiment, et nihil amplius, praeter<br />

uejus conscientiam gerant.. . »<br />

D'estes canones se vê clarissimamente como a egreja estava se-<br />

para<strong>da</strong> em parochias, e como esta divisso era profun<strong>da</strong> e bem<br />

marca<strong>da</strong>.<br />

A pro11ibic;ão <strong>da</strong>s emigraç6es <strong>do</strong>s clerigos, <strong>da</strong>s transferencias<br />

<strong>do</strong>s bispos, <strong>da</strong> or<strong>de</strong>naç8o f6ra <strong>da</strong> parochia, dt: miriistrar em outras<br />

ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s ; os catalogas <strong>do</strong> clero <strong>da</strong>s parochias ; tu<strong>do</strong> prova A secie-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong> como a jurisdicçáo <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> bispo era individual, propria, in-<br />

violavel, soberana.<br />

A parochia que pertencia a um bispo, por direito nenhum <strong>de</strong>-<br />

pendia <strong>de</strong> outro - illi nullo jure subjecta.<br />

juncta ao Codigo <strong>de</strong> Dionysio Exiguo, <strong>de</strong> Henriqae Jtcetello - na Bibliotheca<br />

Jlcns Canm'ci Veterie, tomo 1.0, pag. 101.


E, cousa admiravel, neste esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> disciplina e <strong>do</strong>utrina catho-<br />

lica, com esta soberania tão robusta <strong>do</strong> episcopa<strong>do</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte,<br />

nunca a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> egreja foi melhor, nem mais vigorosamente<br />

comprehendi<strong>da</strong>.<br />

A egreja 6 unica, dizia S. Cypriano 1, como é unico seu fun<strong>da</strong>-<br />

<strong>do</strong>r ; o episcopa<strong>do</strong> é um, como um s6 é Christo e uma s6 a egreja<br />

e o peso d'ella supporta<strong>do</strong> por to<strong>do</strong>s.<br />

Episcopatus unus est, cujus a singulus in solidum pars teneatur 2.<br />

Ecclesia una est.., quomo<strong>do</strong> solis multi radii, sed lumen unum, et<br />

rami arboris multi, sed robur unum tenaci radici fun<strong>da</strong>ntum 3.<br />

A historia vem mostrar, e a<strong>de</strong>ante veremos como em tu<strong>do</strong> se<br />

exigia o assentimento, e communhão <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a egreja, e como as<br />

parochias se aju<strong>da</strong>vam umas Bs outras, se exhortavam h constancia<br />

no martyrio, se louvavam por suas virtu<strong>de</strong>s, se soccorriam nos pe-<br />

rigos, na indigencia, no <strong>de</strong>sterro, na <strong>do</strong>ença, na viuvez.<br />

As cartas que os bispos se enviavam a respeito <strong>de</strong> negocios im-<br />

portantes attinentes B fé, B uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> egreja, creação e or<strong>de</strong>-<br />

naç8o <strong>do</strong>s bispos, eram li<strong>da</strong>s ao povo publicamerite e não poucas<br />

vezes os vemos atravessar os marcs, cxpôr-se aos perigos <strong>da</strong>s tem-<br />

pesta<strong>de</strong>s para se procurarem este abraço fraternal <strong>da</strong>s egrejas<br />

christãs.<br />

Gran<strong>de</strong>s tempos eram estcs em que viviam um S. Cypriano,<br />

um Cornelio e tantos outros, que a morte roubou para sempre e<br />

cuja M<strong>da</strong>, apezar dc obscura, náo era menos grandiosa.<br />

Nào nos afastemos, porem, <strong>do</strong> nosso assumpto.<br />

Diziamos nós que o raciocinio <strong>de</strong>monstrava tambem esta divi-<br />

são jh feita nos primeiros dias; mas, note-se, falavamos <strong>do</strong> racio-<br />

cinio fun<strong>da</strong><strong>do</strong> e corrobora<strong>do</strong> pela historia, e iião <strong>do</strong> raciocinio <strong>de</strong>s-<br />

acompanha<strong>do</strong> d'esse auxilio, o qual em materias <strong>de</strong> faclo, como<br />

estas, pouca força tem; apezar <strong>de</strong> o vermos frequentes vezes cin-<br />

prega<strong>do</strong> em nao raros escriptorcs.<br />

Os aposto104 tinham fun<strong>da</strong><strong>do</strong> as egrejas; os bispos siicccdiam-<br />

Ihes naturalmente aos presbyteros <strong>de</strong> instituição apostolica no go-<br />

verno d'ellas.<br />

1 Epistol. passim.<br />

2 Tract. tert. <strong>de</strong> SimpZicit. paelat., pag. 285 <strong>do</strong> 1.O tomo, ez recoh1ione<br />

diui Erasmi, 1528.<br />

3 Tract. cit., pag. 205.<br />

'


Ninguem ousava transtornar estas cousas, em que os apostolos<br />

tinham posto as màos por inspiração <strong>de</strong> Deus ; as egrejas permaneciam<br />

sobre si, e eram a norma <strong>da</strong>s novas parochias, que com o<br />

espalhar <strong>da</strong> <strong>do</strong>utrina cvangelica se faziam necessarias e se iam<br />

creari<strong>do</strong>.<br />

NBo cram estas, porcm, muitas nos primeiros tempos.<br />

Scguri<strong>do</strong> se re <strong>de</strong> S. Clcmcnte em sua primeira cpistola aos<br />

corinthios, os apostolos tinham dcixa<strong>do</strong> bispos em grcinios <strong>de</strong> fieis<br />

mrii poiico iiumcrosos, pcrisan<strong>do</strong> no scu augmento futuro ; e foi<br />

preciso que cliegassc o mea<strong>do</strong> <strong>do</strong> segun<strong>do</strong> scculo, ])oriro mais ou<br />

niCiIos, 1)ilra que, como quc trarisbor<strong>da</strong>ri<strong>do</strong>, as parochias tivesseiri<br />

<strong>de</strong> separar <strong>de</strong> si algumas christari<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

Como era Dcus que nas assemblcias <strong>do</strong> poro e <strong>do</strong> clero os inspirava<br />

na escolha <strong>do</strong>s bispos, como escreveram os padrta c se acreditava<br />

entao, ningiiem ousava intervir no governo dc rim rebanho<br />

para o quíil o cspirito saricto apontara ccrto pastor.<br />

Que po<strong>de</strong>ria significar o filcto <strong>de</strong> abnntio~iar rima diocesc para<br />

ir para outra? ambiqão? receio <strong>de</strong> perigo, íiinor tla vi<strong>da</strong>? e era<br />

isto a <strong>do</strong>utrina cliristà? eram estes os cxtbniplos <strong>do</strong> E\.iiiipeili~ c as<br />

tradicçòes <strong>do</strong>s apostolos ?<br />

Não seria isto bastarite para dcclarar a indigni<strong>da</strong><strong>de</strong> c justificar<br />

a <strong>de</strong>posiç%o <strong>de</strong> um clerigo, bispo, sacer<strong>do</strong>te ou diacono?<br />

Tacs foram as razòcs d'aquelles cariones ; tal a origem, em mcu<br />

mo<strong>do</strong> dc ver, d'esta divisa0 ccclesiastica tão bem <strong>de</strong>fini<strong>da</strong> e marca<strong>da</strong><br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o principio.<br />

Scja ca<strong>da</strong> um pastor <strong>de</strong> seu rebanho proprio, porque essc rebanho<br />

conhece, c conhecia ja antes, o seu pastor; porque Deus 111'0<br />

<strong>de</strong>u (Spirztus Sariclus vos postcit); porque o episcopa<strong>do</strong> 6 unico,<br />

e aqui, ou alem, em Roma, ou Carthago, tanto é bispo <strong>do</strong> christianismo<br />

Clementc <strong>de</strong> Alexandria, como Ignacio dc Antiochia.<br />

A respeito <strong>do</strong>s metropolitas, <strong>de</strong> que cvidcritemcnte fala, ain<strong>da</strong><br />

que os nBo charne assim, o cari. xxsv, e a que tambem se referem<br />

as cartas <strong>de</strong> S. Cypriano, cscriptas, pcla segun<strong>da</strong> meta<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

seculo terceiro ; não nos <strong>de</strong>ve admirar o seu apparecimcnto tào ce<strong>do</strong>.<br />

O imperio, apesar <strong>de</strong> se approximar <strong>do</strong> occidcrite <strong>de</strong> sua gloria,<br />

e ain<strong>da</strong> um gran<strong>de</strong> faclio, cheio <strong>de</strong> luz e <strong>de</strong> teritaçoes; tem ain<strong>da</strong><br />

um gran<strong>de</strong> podcr <strong>de</strong> attracção e <strong>de</strong> assirnila~80, como to<strong>da</strong>s as<br />

instituições collossaes que com os seculos ganham não sei que<br />

imponentes <strong>direitos</strong> sobre o mun<strong>do</strong>.


O que a historia <strong>de</strong>monstra 6 que, on<strong>de</strong> havia uma metropole<br />

civil, appareceu uma metropole ecclesiastica.<br />

A prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong> e gran<strong>de</strong>za material <strong>de</strong> uma ci<strong>da</strong><strong>de</strong> trazia a su-<br />

premacia para o bispo d'essa ci<strong>da</strong><strong>de</strong>: on<strong>de</strong> um proconsul, on<strong>de</strong><br />

um prefeito <strong>do</strong> pretorio, on<strong>de</strong> um vigario <strong>do</strong> imperio, ahi um me-<br />

tropolita.<br />

Mais importantes pelo maior numero <strong>de</strong> christãos, mais arris-<br />

ca<strong>da</strong>s por mais expostas hs perseguições, mais luzentes por pos-<br />

sui<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> mais egregios bispos e soffre<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> mais brilhantes<br />

martyrios, a sua supremacia erigia-se natural, espontaneamente <strong>de</strong><br />

tu<strong>do</strong> isto.<br />

Assim Roma, assim Constantinopla, assim Carthago, assim Ale-<br />

xandria, assim Antiochia, assim Trevcs, Nico<strong>de</strong>mia e Aqiiilea.<br />

I? tanto isto ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, que, como nota Basnage 1, Jerusalem a<br />

gran<strong>de</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong>. a ci<strong>da</strong><strong>de</strong> sancta, a mãe <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as egrejas, arrasa<strong>da</strong><br />

por Tito, s6 por fim e a muito custo pô<strong>de</strong> alcançar a<strong>do</strong>rnar-se<br />

com o titulo <strong>de</strong> Patriarcha<strong>do</strong>, mas nunca conseguiu o primeiro lo-<br />

gar. Tal a origem post-apostolica d'estas gran<strong>de</strong>s divisòes <strong>da</strong> egrcja.<br />

Prova<strong>da</strong> assim a existencia <strong>de</strong> uma divisão ecclesiatltica 6 pre-<br />

ciso agora dizer quem tinha o direito <strong>de</strong> a traçar.<br />

Primeiro nos é riecessario saber como se or<strong>de</strong>navam e escolhiam<br />

os bispos para esta, ou aquella diocese; porque, como veremos,<br />

este ponto nos resolve a questão em gran<strong>de</strong> parte.<br />

Os bispos não eram escolhi<strong>do</strong>s corrio hoje; eram eleitos pela<br />

plcbe <strong>da</strong> parochia em presença <strong>do</strong>s bispos mais proximos <strong>da</strong> pro-<br />

vincia, que confirmavam a escolha <strong>da</strong>n<strong>do</strong>-lhes o seu assentimento.<br />

I? este um ponto <strong>de</strong> historia indubitavelp.<br />

S. Cypriano em uma <strong>de</strong> suas epistolas a Cornelio, papa 3, es-<br />

creve :<br />

a... Nemo post divinum judicium, post populi suffragium, post co-<br />

uepiscoporum consensum judicem se non jam episcopi, sed,<strong>de</strong>i faceret.))<br />

1 Hist. <strong>de</strong> llAgliae, chap. 2.~-<br />

Vê-se em Tillernont, art. S. Cyprien, evêque <strong>de</strong> Carthage, tom. 4.0, ppg.<br />

55, uin exemplo <strong>de</strong> como a prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong> temporal .e a importancia politica<br />

<strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s B que <strong>da</strong>vam As dioceses a primazia.<br />

Van h'spen. JIM Ecel. Uni. P. I, tit. XIX, c. r e 11,<br />

2 Veja-se Bingham. Origin. Ecclee.<br />

3 Epist. 3.a, lib. 1.0 pag. 15.<br />

3


Na epistola a Felix, presbytero, e Paulo diacono e sua plebe 1,<br />

<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> expor as regras <strong>da</strong> or<strong>de</strong>naçao e escolha <strong>do</strong>s bispos, sa-<br />

cer<strong>do</strong>tes e diaconos, fun<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-se nos numeros <strong>de</strong> Moysks e nos<br />

Actos <strong>do</strong>s apostolos, accrescenta :<br />

uProptrr qiiod diligenter <strong>de</strong> traditione divina et apostolica observa-<br />

ationr sor\;iiidiim est et teiicndum, quod apiid nos qiioque, et fere<br />

«pcr pro~incids universas tenetur, ut ad ordiriatioiies rite celrbran<strong>da</strong>s<br />

«ad eam plebein, cui praepositas ordinatiir, rpiscopi ejiisdcm provin-<br />

«ciae proximi yuiiiqiie conweniant, et rpiscopus dcligatur plebe pre-<br />

usente, qriae singuloriim vitam plenissirne nobit, et uniiis cujusque<br />

aactiim <strong>de</strong> ejus conserialioiie perspexit.))<br />

Notcmos, portanto, que não era só o que se <strong>de</strong>via guar<strong>da</strong>r re-<br />

ligiosameritc por ser tradiyâo divina e observancia apostolica, mas<br />

por scr o que se ftizia fere per provincias universas.<br />

Era a disciplina ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira, a melhor, a mais geral ; era<br />

a lei.<br />

A tradiç'io, que cste padre aconselha a ca<strong>da</strong> passo e tanto ve-<br />

nera cm suas obras, foi brilhantemente <strong>de</strong>fendi<strong>da</strong> neste pcriotlo<br />

pelo celebre S. Justirio, apologista, martyr e <strong>do</strong>utor, que iiveu<br />

tles<strong>de</strong> os comecos <strong>do</strong> segun<strong>do</strong> seculo, <strong>de</strong>fesa que elle eRectuou,<br />

protegen<strong>do</strong>-a com sua penna e edificari<strong>do</strong>-a com suas obras.<br />

Tertulliano e S. Irerieo, escreven<strong>do</strong> nos fins <strong>do</strong> mesmo seculo,<br />

combatcm tambcm sob a mesma ban<strong>de</strong>ira.<br />

E a poucos passos vemos, ain<strong>da</strong> que noutro prrio<strong>do</strong>, rim \iilto<br />

hrilliantissirno, que a egreja celcbra e a historia nòo meiios I.(,,-<br />

peita, S. Agostiriho, que (? o talentos0 continua<strong>do</strong>r d'estes varões<br />

illustres.<br />

Por to<strong>da</strong> n historia os exemplos são numerosissimos, e, <strong>do</strong>n<strong>de</strong><br />

resta noticia <strong>da</strong> ordcnay7io <strong>do</strong>s bispos, isto se v&.<br />

O miiis ieneran<strong>do</strong> exemplo é o <strong>de</strong> S. Lino, bispo <strong>de</strong> Roma,<br />

que, or<strong>de</strong>na<strong>do</strong> pelos apostolos Pedro e Paulo, apezar d'isso, é a<br />

cgr(ja, 6 a plebe christá <strong>de</strong> Roma que o elege.<br />

Era tu<strong>do</strong> paternal aqui ; - nao Iiavia a imposiq'io inconsciente,<br />

q11asi brutal, <strong>da</strong> vontadc <strong>de</strong> um homem, embora bispo, embora<br />

drpositnrio <strong>de</strong> uma herança apostolica (permitta-se a expressáo)<br />

cm linha recta.<br />

O bispo eleito por os <strong>de</strong> sua provincia, não entrava na cornmu-<br />

1 Epist. 4, lib. 1.0, pag. 31.


ihâo <strong>da</strong> egreja, sem expedir cartas e emissarios para to<strong>do</strong> o<br />

mun<strong>do</strong>, .pedin<strong>do</strong> assim o assenso d'ella.<br />

O episcopa<strong>do</strong> era unico : - esta a gran<strong>de</strong> maxima d'cstes se-<br />

culos, <strong>de</strong> que nos nâo <strong>de</strong>vemos esquecer.<br />

Em Corintho, no celebre schisma <strong>do</strong> tempo <strong>de</strong> Clemente, papa,<br />

o povo <strong>de</strong>põe os padres <strong>da</strong> sua egreja pelos achar indignos, como<br />

d manifesto <strong>da</strong>s cpistolas <strong>de</strong> Clcmcnte, j6 por vczds cita<strong>da</strong>s.<br />

Mais <strong>de</strong> um exemplo d'cstc proce<strong>de</strong>r sc v& nos scculos seguin-<br />

tes, e até na propria egreja dc Africa, a mais respeitavel dc to<strong>do</strong>s<br />

estes tempos por suas virtu<strong>de</strong>s, pelos gran<strong>de</strong>s homeiis que occu-<br />

param as suas ca<strong>de</strong>iras episcopaes, por seli respeito pela disciplina<br />

tradicional e zelo no governo ecclesiastico 1.<br />

Insistimos neste ponto, porque teremos adiante <strong>de</strong> entrar cm<br />

uma gran<strong>de</strong> lucta na qual estes factos hiio <strong>de</strong> scr a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira luz;<br />

e, por isso, vamos ain<strong>da</strong> apresentar <strong>do</strong>is exemplos brilhantes d'es-<br />

tes tres primeiros seculos.<br />

Sâo tira<strong>do</strong>s <strong>da</strong>s vi<strong>da</strong>s <strong>de</strong> S. Cypriano, bispo <strong>de</strong> Carthago e <strong>de</strong><br />

S. Cornelio, bispo <strong>de</strong> Roma, ou papa, como querem os escripto-<br />

res catholicos.<br />

Quan<strong>do</strong> no anno 248 <strong>de</strong> J. C. se tractou em Carthago <strong>da</strong> elci-<br />

çâo <strong>do</strong> bispo, ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> acclama<strong>do</strong> pela plebe S. Cypriano, cstc<br />

fugiu cheio <strong>de</strong> humil<strong>da</strong><strong>de</strong> para sua casa, on<strong>de</strong> se escondcu ; por-<br />

que o povo o procurava, preterin<strong>do</strong> os mais antigos presbyteros.<br />

Amictos, cercam-lhe a habitação, guar<strong>da</strong>m-lhe as sahi<strong>da</strong>s e ohri-<br />

gam-n'o a ce<strong>de</strong>r a este pedi<strong>do</strong> unanime.<br />

A historia refere com enthusiasmo a inquietaçâo com que era<br />

espera<strong>do</strong>, e a alegria com que foi recebi<strong>do</strong>.<br />

Não é s6 isto.<br />

Bispo <strong>de</strong> Carthago, este homem illustre na<strong>da</strong> fazia sem tomar<br />

1 Mr. Basnage, obr. cit., cap. 1 <strong>do</strong> liv.,4.0, escreve:<br />

L'dglise d'Afiiqoe est peut-être ceUe qui a le rnieux conservé lu puretk <strong>de</strong><br />

lu Foi, la sZrnplici/d, <strong>da</strong>no lea moeurs, et <strong>da</strong>na le culte; et qzri a <strong>de</strong>fendt~ avec<br />

plus d'ar<strong>de</strong>ur son indépen<strong>da</strong>nee, aa libedé et ses usagee particuliers. Elle a<br />

élk une source obon<strong>da</strong>nte d'honames savans, et d'evêques zBl<strong>de</strong>, qui s'opposkrent<br />

fortement am erreura naissantes <strong>de</strong> Pelage et à Z1Ariani#me soutenu par<br />

I'atctoritk <strong>de</strong>s Pn'nces barbares. Lea persdcutions quleUe a essuy<strong>de</strong>s n'oni. servi<br />

qu'à la rend~e plus illustre, par le nombre et par lu constance <strong>de</strong> ses confesseurs<br />

et <strong>de</strong> ses Martyrs, qu'on vemit ccrnsulter du fond <strong>de</strong> I1Orient et <strong>de</strong> la<br />

Sc*ythie, jusque:<strong>da</strong>ns les lieux ozi iia Ltaiennt réglds.<br />

O niesmo dizem os biographos <strong>do</strong>s bispos <strong>da</strong>s dioceses d'esta illustre<br />

egreja.


conselho <strong>de</strong> seu clero, e pedir o consentimento <strong>do</strong> povo para que<br />

o que elle fizesse fosse ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente feito pela egreja que era,<br />

dizia elle, o povo uni<strong>do</strong> a seu bispo, <strong>de</strong> maneira que o bispo esteja<br />

na egrrja e a egrejs no bispo.<br />

As cartas que escrevia para outros bispos, lia-as, antes <strong>de</strong> as<br />

enviar a seu <strong>de</strong>stino, ao povo <strong>de</strong> sua diocese, e o mesmo fazia com<br />

as que d'elles recebia.<br />

Não menos digno <strong>de</strong> attenção 6 o que se passou com a eleição<br />

<strong>de</strong> S. Cornelio na egreja <strong>de</strong> Roma no anno 261 <strong>da</strong> era Fulpr.<br />

Quan<strong>do</strong> em 20 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 250 S. Fabiano, papa, soffreu o<br />

mart!rio, estava Decio occupan<strong>do</strong> o throno imperial; e o odio que<br />

á religião christã tiriha este homcm violento, a importaricia <strong>da</strong> ca<strong>de</strong>ira<br />

episcopal <strong>de</strong> Roma, já tiio clara <strong>de</strong> epcgios occupa<strong>do</strong>res,<br />

fizeram com que se não po<strong>de</strong>sse eleger bispo para substituir aquelle.<br />

Os padres e diaconos tomaram o governo <strong>da</strong> egreja romana na<br />

sua interini<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Em quanto aos negocios mais importantes e extraordinarios,<br />

como o attesta S. Cypriano, elles na<strong>da</strong> resolkiam, esperari<strong>do</strong> ~)cllo<br />

bispo.<br />

Dezeseis annos <strong>de</strong>pois a ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Roma 6 occupa<strong>da</strong> por<br />

S. Corrielio,<br />

S. Cypriano conta-nos a maneira, por que este vara0 foi or<strong>de</strong>na<strong>do</strong>.<br />

'<br />

Tractava-se <strong>da</strong> eleiçáo para uma <strong>da</strong>s ca<strong>de</strong>iras cpiscopac~ rn:~;.<br />

notaveis e mais imponentes pela tradição apostolica e por seu logar<br />

no centro <strong>do</strong> imperio, e não 6 <strong>de</strong> crer que estes padres, que<br />

durante <strong>de</strong>zcseis annos conservaram tão pura a discitilina c souberam<br />

tão virtuosamente sahir-se <strong>de</strong> táo pesa<strong>do</strong> encargo, não é <strong>de</strong><br />

crer, digo, que no momento solemnissimo <strong>da</strong> or<strong>de</strong>nacão <strong>de</strong> seu<br />

bispo se afftlstassem <strong>da</strong> sã disciplina <strong>da</strong> egreja e <strong>da</strong> tradição apostolica.<br />

Ouçamos o que escreve S. Cypriano 1 :<br />

aNemo jamjam niinc frater charissime, et ad personam Cornelii<br />

acollegae nostri, ut Cornelium nobisciirn veriiis noveris, non <strong>de</strong> mali-<br />

wgnorum et <strong>de</strong>trahentium meri<strong>da</strong>tio scd <strong>de</strong> Dei jridicio, qui eum epis-<br />

acopum fecit et coepiscoporum testimonio. qiiorum numerus iiniversus<br />

uper totum mundum concordi unaiiimitatc consensil. Kam qiiod Cor-<br />

1 Epist. 2:, Iib. 4, píig. 189.


anelium charissimum nostrum <strong>de</strong>o et Christo et ecclesiae ejus, item<br />

aconsacer<strong>do</strong>tibus cunclis can<strong>da</strong>bili praedicatione commen<strong>da</strong>t non istc<br />

aad episcopatum subito pervenit, sed per ornnia ccclcsiastica officia<br />

apromotus et in divinis administrationibus <strong>do</strong>minum saepe prome-<br />

urilus ad sacer<strong>do</strong>tii sublime fastigium cunctis religionis gradibus as-<br />

ucendit.~<br />

Quan<strong>do</strong> com a eleição <strong>de</strong> Cornelio se levantou o famoso schis-<br />

ma <strong>de</strong> Novaciano, o qual se fez or<strong>de</strong>nar bispo fraudulentamerite,<br />

este schismatico escrevia a to<strong>da</strong>s as egrcjas para lhe fazer constar<br />

a sua or<strong>de</strong>nação, dizen<strong>do</strong> que fòra constrangi<strong>do</strong> a acceitar a ca-<br />

<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Roma, que sua humil<strong>da</strong><strong>de</strong> rejeitava i.<br />

Ao mesmo tempo <strong>de</strong>putava padres para Africa e Alexandria a<br />

pedir a communhão d'essas egrejas ; e era isto na epocha em que<br />

por to<strong>da</strong> a parte appareciam as cartas <strong>de</strong> Cornelio tractan<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

mesmo objecto 9.<br />

A vista d'isto tu<strong>do</strong>, em presença d'estes factos, <strong>de</strong> que ningucm<br />

pó<strong>de</strong> duvi<strong>da</strong>r a não duvi<strong>da</strong>r <strong>de</strong> si proprio e <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> to<strong>do</strong>, como<br />

se po<strong>de</strong> crer que um bispo, um metropolita mesmo, ousasse crear<br />

por si s6 uma nova parochia, separar <strong>da</strong> christan<strong>da</strong><strong>de</strong>, ou <strong>de</strong> seu<br />

suffraganeo, uma parcella para a <strong>da</strong>r a outro, ou erigil-a em nova<br />

parochia ?<br />

Como? se o conselho <strong>do</strong>s bispos e metropolitas se ouvia e dc-<br />

via <strong>de</strong> ouvir para as cousas mais insignificantes?<br />

Será preciso <strong>de</strong>monstrar que n8o era importaritc c grave para<br />

estes tempos <strong>de</strong> convicçties e virtu<strong>de</strong>s fazer aqui110 mcsmo que os<br />

apostolos tinham feito pelo mun<strong>do</strong>.<br />

Eis aqui como a fórma <strong>da</strong> eleição <strong>do</strong>s bispos prova que a cir-<br />

cumscripção <strong>de</strong> uma nova parochia não era cousa que se fizesse<br />

sem ouvir os bispos <strong>da</strong> provincia e o metropolita. E para aquel-<br />

les a quem não satisfizerem estes factos ha o texto <strong>da</strong>s leis, que<br />

passamos a expor.<br />

O can. xxxv <strong>do</strong>s apostolos classifica em duas categorias to<strong>do</strong>s<br />

os negocios ecclesiasticos : para uns sào compctcntes os bispos por<br />

si s6 - são as cousas que pertencem exclusivamente á parochia<br />

propria e al<strong>de</strong>ias que lhe estão sujeitas ; para outros, náio 6 com-<br />

petente o bispo s6, nem tão pouco o metropolita: sáio sim corn-<br />

1 Tillenaont, obr. oit., tom. 3.0 art. S. CorneiUe pape.<br />

2 TiUernont, log. cit., art. x, pag. 452.


petentes os bispos <strong>da</strong> provincia, ouvi<strong>do</strong> o metropolita, isto é -<br />

o syno<strong>do</strong> provincial.<br />

Pertencem a esta ultima classe os negocios attinentes a to<strong>da</strong> a<br />

provincia - quae totam Provinciam sive ecclesiam communem<br />

statum concernunt I.<br />

O can. cit. diz :<br />

~Episcopos Gentium singularum scire convenit, quis inter eos pritímus<br />

habeatur, quem velut caput existimcnt, et nihil amplius praeter<br />

trejus conscientiam gerant, quam illa sola singiili, quae Parochiae protrpriae,<br />

et villis quae sub ea sunt competunt: sed nec ille praetcr<br />

(íomnium conscientiam faciat a1iquid.n<br />

Era isto t3o necessario para evitar a arrogancia <strong>do</strong>s bispos e a<br />

anarchia no governo, que o can. acaba dizen<strong>do</strong>:<br />

aSic enim unanimitas erit et glorificabitur Deus per Christum in Spi-<br />

trritu Sancto. ))<br />

Lonaras, o commenta<strong>do</strong>r grego, cita<strong>do</strong> por Van-Espen e estc<br />

escriptor, dizem :<br />

«Hoc autem merito statiim est, ne alioquin primiis Episcopus vel<br />

~Metropolitanus, honore abutens hunc rnutet in <strong>do</strong>minium, et uni<br />

trsibi potestatern arroget, tua ut Bpiscopi sibi consenticntcs, chnritales<br />

oquc vinculo colligati exemplum sint Clero et popiilo dilectionis et con-<br />

trcordiae. u<br />

O cai]. xrv confirma indirectamente isto mesmo.<br />

Ahi se prohibe ao bispo aban<strong>do</strong>nar a parochia propria e ir<br />

para outra ; e comtu<strong>do</strong> admitte-se-lhe que o faca, mas em caso<br />

extremo, dc força maior, quan<strong>do</strong> a cari<strong>da</strong><strong>de</strong> ou a utili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> pro-<br />

sirna cgreja assim o exige imperiosamente ; cauteloso, porem, o<br />

can. accresccnta :<br />

u ... Nisi forte rationabilis cum causa compellat, tamquam qui possit<br />

tíibi<strong>de</strong>m constitiitis plus lucri conferre, ct in causa Religionis aliquid<br />

uprofectos prospicere et hoc non a semetipso pertentet sed multorum<br />

uEpiscoporum judécio et maxima supplicatwne perficiat 2.u<br />

1 Van-Eupen.<br />

obr. cit., tom. 3.0 schol. in can. xxxv apost. Thomas. Vet. et<br />

nov. Ecclee. Uiscipl. P. 1, lib. 1, cap. LIV, n.O 14.<br />

2 Bem sabemos n6s que estes canones nso eram geralmente recebi<strong>do</strong>s na,


Sen<strong>do</strong> assim, como classificar em negocios pertencentes itquillo<br />

que 6 proprio <strong>de</strong> certa parochia a creação <strong>de</strong> uma nova parochia<br />

ou diocese? como admittir que se abalance, com dircito, a acto<br />

<strong>de</strong> tal importancia um metropolita, ain<strong>da</strong> que occupa<strong>do</strong>r <strong>de</strong> algu-<br />

ma <strong>da</strong>s ca<strong>de</strong>iras mais notaveis ? como? se esta 6 a disciplina pura,<br />

a disciplina que se estriba na tradição divina e na obscrvancia<br />

apostolica, a disciplina que se <strong>de</strong>ve guar<strong>da</strong>r e reter, a que se pra-<br />

tica fere per provincias universas; a disciplina que <strong>de</strong>vem <strong>de</strong>fen-<br />

<strong>de</strong>r, mais que as outras, as sés dc origem reconheci<strong>da</strong>mente apos-<br />

tolica, aquellas on<strong>de</strong> os discipulos <strong>de</strong> Jesus se rcuniam, d'on<strong>de</strong><br />

partiam para to<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong>, euntes bini, ondc mais tempo se <strong>de</strong>-<br />

moraram e permaneceram ?<br />

E ninguem ousarb taxar <strong>de</strong> insignificante tal assumpto ;-pois<br />

que ate os proprios, que dcfcn<strong>de</strong>m as <strong>do</strong>utrinas d'alem-montes,<br />

cgreja romana e no occi<strong>de</strong>nte ao tempo em rluc Dionysio Exiguo, ou Pequeiio,<br />

fez a versão d'elles, que poz i testa <strong>do</strong> seu codigo.<br />

As suas palavras, na pref:ição ou epistola ao bispo Estcrão, que prece<strong>de</strong><br />

o codigo. não dão logar a divi<strong>da</strong>s : S... in principio canonea qui CEicz6ntr~r Apostolorum<br />

<strong>de</strong> Graeco transtulimua, quibua pia plurimi coneensum ~zon prar-<br />

~buere facilem, hoc ipeum vestram noluimus i!/t~ornre arcnctilatem ; quamcta<br />

ipostea quae<strong>da</strong>na constituta Pontijcum ex ipsia cano~~ibus <strong>de</strong>sumpla est via<strong>de</strong>antzsr.<br />

s<br />

Não faça, porem, pcso esta consi&eração, porque o não tem.<br />

Nós não tractamos aqui <strong>de</strong> procurar a disciplina <strong>da</strong> egreja roinsna, ou dc<br />

Constantiriopla, Alexandria, ou <strong>da</strong> Hespanha : queremos saber qual a legisla@~<br />

geral <strong>da</strong> egreja; qual a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira disciplina, regra commuin, direito<br />

geral.<br />

Reconheci<strong>da</strong> a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> aos canones apostolicos; attribui<strong>do</strong> aos seculos<br />

2.0 e 3.0 o seu coiiteú<strong>do</strong>; não po<strong>de</strong>mos, nem <strong>de</strong>vemos, prescindir <strong>de</strong> tão veneran<strong>do</strong>~<br />

monumentos.<br />

Conteste.se essa auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>, negue-se a sua antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> e <strong>de</strong>pois coiifutem-se<br />

as uossas affirmaçòes; mas, emquanto se admittir, como admittimos,<br />

a veraci<strong>da</strong><strong>de</strong> d'eates canones, prcteril-os, <strong>de</strong>sprezal-os, era uma impcr<strong>do</strong>avel<br />

falta.<br />

Os canones apostolicos, se são o transumpto <strong>da</strong> disciplina <strong>do</strong>s concilias<br />

<strong>do</strong> 2.0 e 3.0 seculo, são ao mesmo tempo o espelho fiel <strong>da</strong> tradição spostolica.<br />

Pouco importa quem tenha si<strong>do</strong> o seu aiictor: o que 6 certo é quc, pela<br />

sua materia e pela sua antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> &o, <strong>de</strong>pois <strong>do</strong>s Actos, o monumcnto mais<br />

respeitavel <strong>do</strong>s tres primeiros seculos <strong>da</strong> egreja, preciosa lembrança historica<br />

d'esses tempos e inestimavel <strong>do</strong>cumento <strong>de</strong> legislação primitiva.<br />

Ao que parece eram reconheci<strong>do</strong>s e ti<strong>do</strong>s até por obra <strong>do</strong>s proprios apostolos<br />

no orieute <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito; no occi<strong>de</strong>nte, porem, sc eram jzí corilieci<strong>do</strong>s<br />

antes <strong>da</strong> traducção <strong>de</strong> Dionysio, como o <strong>de</strong>scobrem as palavras d'elle acima<br />

citadita, não eram comtu<strong>do</strong> geralmente recebi<strong>do</strong>s, e difficil era a acceitapâo<br />

<strong>de</strong> sua auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> -pZwimi illia ccnaensum non praehuere facilem.<br />

Mas corno enten<strong>de</strong>r as expres<strong>de</strong>s'<strong>do</strong> celebre abba<strong>de</strong> scitha? nlo se <strong>da</strong>va 4


se baseam, para <strong>da</strong>r ao papa esta prerngiitiva, na importancin inex-<br />

cedivel, summa, <strong>de</strong> similhantes objectos, como abaixo teremos<br />

occasião <strong>de</strong> ver.<br />

Hu bem sei que nenhum d'estcs textos diz, aberta e expres-<br />

samente, que a creação <strong>de</strong> novas dioceses é negocio que s6<br />

pcrtcnce ao syno<strong>do</strong> provincial, e aqui é que est8 a difficul<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>da</strong> questão ; - mas n6s provámos indirectamente qual era a<br />

melhor, a mais pura disciplina ; evidiwcifimos como a tradição<br />

cra respeita<strong>da</strong>, o que era sabi<strong>do</strong> <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s; e, ultimamerite,<br />

troiixernos á luz um canon, que, se o não diz espccificadiimcnt~,<br />

mnritla-o to<strong>da</strong>via mui positivamente na generali<strong>da</strong><strong>de</strong> com que se<br />

exprime.<br />

Acima dissemos que nóo s6 a egreja <strong>de</strong> Africa era uma <strong>da</strong>s<br />

mais rclspeitaveis d'estes tempos e <strong>da</strong>s mais respeita<strong>do</strong>ras <strong>da</strong> tra-<br />

tli(;;n, mas tambem quc os caiiones <strong>do</strong>s coricilios, <strong>do</strong> 4.' seculo,<br />

eram como que o espelho sereno <strong>da</strong> disciplina <strong>de</strong> eritào ; e n6s<br />

vamos citar um canon <strong>do</strong> 4." concilio <strong>de</strong> Africa, celebra<strong>do</strong> no<br />

facil asscntimcnto a que? 9, origem realmente apostolica ou á sua ,i:iri:r li<strong>da</strong><strong>de</strong>?<br />

Dionysio escrevia no começo <strong>do</strong> 6.0 seculo, e traduzia- os <strong>do</strong> grego, porque<br />

vestram noluirnus ignarare sanctitatem, e, notumos bem, inseria-oe no eeu<br />

codigo primeiro <strong>do</strong> que os eanones <strong>de</strong> Nicea.<br />

Não era <strong>da</strong> sua provecta antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> que se duvi<strong>da</strong>va no 5.0 seculo, mas<br />

<strong>de</strong> s11a origem apostolica.<br />

E que iio occi<strong>de</strong>nte, e na propria Roma, alguns havia que Ilies pi ?


tempo <strong>de</strong> Bonifacio, on<strong>de</strong> expressamente se incumbe esta tarefa ao<br />

syno<strong>do</strong> provincial. o can. xx 1 que diz :<br />

aPlacuit et illiid : iit plebes, quae nunquam habuerunt proprios<br />

aepiscopos, nisi ex concilio plenario, uniuscujusque provinciae et pri-<br />

umatis atque consensu ejus ad cujus dioecesim ea<strong>de</strong>m ecclesia perti-<br />

anebat, <strong>de</strong>cretum fuerit, minime accipiant.))<br />

Pouco nos importa agora que nos alleguem exemplos em con-<br />

trario, se alguns positivos se po<strong>de</strong>m offerecer 9. Em to<strong>do</strong>s os tem-<br />

pos se <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> executar as leis e estes tres primeiros seculos,<br />

! Tempore Bonifacii caelesti habitum -Collecção <strong>do</strong> padre Labbe, tom. v.<br />

E o mesmo canon XCVIII <strong>do</strong> Co<strong>de</strong>x Canonum mlesiae afrkanae <strong>da</strong> verslo<br />

<strong>de</strong> Christophoro Justello.<br />

2 Thomaa. Vet. et Nov. discivl. Eccl. P. 1.'. lib. 1.". C~D.<br />

LIV.<br />

Neste logar, como em muitos outros, escrévc este áuctor sem critica ne-<br />

nhuma, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> para quem lê o trabalho <strong>de</strong> tirar <strong>do</strong>s facto8 que allega o<br />

proveito que offerecem.<br />

Do que elle diz aqui não se <strong>de</strong>duz ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente que o metropolita po-<br />

<strong>de</strong>sse por si s6 erigir novos bispa<strong>do</strong>s; mas tambem não 6 positivo que fosse<br />

indispensavel para esse effeito a approvaçho <strong>do</strong> syno<strong>do</strong> provincial.<br />

Os n.OS 4, 5 e 14 parece mesmo estarem em contradicçâo.<br />

Lê-se em um logar :<br />

a ... ita certissimum praebet ejw potestatia argumentum qwrm in eri endie<br />

uintra Prouinciam suam Episcopalibua novis habebant tunc ~etropoitani.<br />

IL.O 4, e maie abaixo.<br />

~Denique potuisse Metropolitas in sua quemque Provincia Episcopales<br />

acreare Se<strong>de</strong>s, saltem coneentiente Prowinciali Conci1io.r n.O 5.<br />

Lê-se noutro logar : aPrimalis Coiicilii Provincidie, et ejus hpiecopb ne-<br />

rceaeariue erat conseneus, e cujue Dioced Episcopatuo <strong>de</strong>cerpebatw. n.° 14.~<br />

e ain<strong>da</strong> :<br />

rDenque Canonea ipez' canones ipsl: expreasie verbb Conciliiu Provinciali-<br />

abus haec probari praecipiunt..<br />

Qual a disciplina <strong>de</strong>pois d'esta confusão?<br />

Talvez a soubesse Thomassino, mas não a sabemos n6s por este livro; e,<br />

ain<strong>da</strong> que a maior parte <strong>do</strong>s exemplos sejam extrahiclos <strong>de</strong> factos <strong>do</strong> seculo IV,<br />

vamos em poucas palavras ver se <strong>da</strong>mos alguma luz a estes logares.<br />

O exemplo <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r <strong>do</strong>s metropolitas, ain<strong>da</strong> que ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro, não po<strong>de</strong> illidir<br />

a força <strong>do</strong>s canones <strong>do</strong>s apostolos que citAmos : sed nec ille praeter omnium<br />

conecientiam faciat alipuid.<br />

Demais, alem <strong>de</strong> esses exemplos serem tira<strong>do</strong>s <strong>de</strong> factos, on<strong>de</strong> o aperto <strong>da</strong>s<br />

circumstancias como que <strong>da</strong>va aos metropolitas não ri6 o direito mas tambem<br />

a obrigação <strong>de</strong> erigir novos bispa<strong>do</strong>s, não dizem elleri se o metropolita pedia<br />

para isso, ou nh, o consentimerito <strong>do</strong>s bispos <strong>da</strong> provincia ; antes, pelo con-<br />

trario, parece entrever-se ista mesino; e o proprio Thomwsino o presentiu,<br />

quan<strong>do</strong> escreveu saltem consentietite concilio provincialz'.<br />

E se este eacriptor em o n.' 14 sabe levantar essa objecção a respeito <strong>da</strong>


alem <strong>de</strong> serem os seculos <strong>da</strong>s perseguições, <strong>da</strong>s heresias e <strong>do</strong>s<br />

schismas, sno tambem os seculos <strong>da</strong> formação <strong>da</strong> hierarchia e po-<br />

<strong>de</strong>res temporaes <strong>da</strong> egreja, on<strong>de</strong> só é positivo e firme o que se<br />

basCa na tradição divina, na observancia apostolica, uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

episcopa<strong>do</strong> e uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> egreja, os quatro gran<strong>de</strong>s principios quc<br />

se nos aRguram ser as quatro ingentes columnas <strong>do</strong> berço <strong>do</strong> ca-<br />

tholicismo e que explicam como tu<strong>do</strong> nestas eras se <strong>de</strong>cidia por<br />

conselho, como tu<strong>do</strong> tinha este aspecto <strong>de</strong>mocratico, como hoje sc<br />

diria, e que então se chamava cvangelico, humil<strong>de</strong>, fraternal, chris-<br />

tão, porque outra cousa não 6 a <strong>de</strong>mocracia.<br />

nova diocese <strong>de</strong> Fussala, e respon<strong>de</strong>r lhe que isso se <strong>de</strong>via subenten<strong>de</strong>r, porque<br />

ri50 ha <strong>de</strong> aqui dizer-se o mesmo?<br />

Silet qui<strong>de</strong>m sanctus <strong>do</strong>ctor consensum Concilii P~ovincialie, at ia confineri<br />

vi<strong>de</strong>tur corzaeneione Primatia qui vix quidquam majoris rei n&i <strong>de</strong> Concilii<br />

sententia ntoliebatxr.<br />

A quem conhece Thomassino njio espantam estes <strong>de</strong>fpitos e rstas inooherencias<br />

: por difiuso e pouco fiel nas citaçGes tem a critica reconheci<strong>do</strong> este<br />

escriptor.<br />

O que não comprehen<strong>de</strong>mos, porhm, 15 que se citem <strong>do</strong>is ou tres factos iiicompletos<br />

e vagos, e que se passaram no iv seculo, r se dica <strong>de</strong>pois riii r.ov -<br />

clrieão que tal era a antiga disciplina <strong>da</strong> egreja <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os liiiineiros sc~ii10-I<br />

NiXo conhecia Thomassino os canones <strong>do</strong>s apostolos que citArnos?<br />

Não sabia o illustre padre <strong>do</strong> oratorio que nestes tempos <strong>de</strong> peraqui@w,<br />

em que a egreja vivia quaei a me<strong>do</strong>, separa<strong>da</strong> c attribula<strong>da</strong> pelas hereaiae,<br />

136 era certo e firme o que ?e ajiistava corn a tradiçiio apostoli<strong>da</strong> e divina?<br />

que tu<strong>do</strong> neste perio<strong>do</strong> se fazia por discussão e conselho, e na<strong>da</strong> imperativa<br />

e <strong>de</strong>spoticameiite?<br />

Aeeim se escreve em bistoria, e assim se tractam geralmente 88 vezrs '13<br />

mais graves quedùes <strong>de</strong> direito ecclcsiastico !<br />

On<strong>de</strong> se não copiam sem discernirnento, os escriptores cibm 9m ou oiitro<br />

mal averigua<strong>do</strong> facto, <strong>de</strong> cujs obscuri<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>duzein o que B fwil para a sua<br />

intenção.<br />

Nio nos admiremos, porem ; porque mais a<strong>de</strong>ante vama ter occa~iio <strong>de</strong><br />

ver um exemplo d'esta levian<strong>da</strong><strong>de</strong> culposa mais espaiitoso e atrevi<strong>do</strong>.<br />

No capitulo seguinte apreciaremos mais <strong>de</strong> espago alguns <strong>do</strong>e factos, a que<br />

Thomasaino aqui se refere.


CAPITULO I11<br />

Des<strong>de</strong> Constantino at6 ao seculo IX<br />

O edicto <strong>de</strong> Mil80 <strong>do</strong> anno 313; suas funestas consequencias no <strong>de</strong>stino <strong>da</strong> egreja. Apparece<br />

o gran<strong>de</strong> problema <strong>da</strong>s relacões <strong>da</strong> egrcxja e <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>. - Comeca a reduccào<br />

a escriplo <strong>da</strong> disciplina ecclesiasli6a. -A leilura <strong>do</strong>s canones e outro; <strong>do</strong>cumenios<br />

revela a divisa0 <strong>da</strong> egreja bem <strong>de</strong>termina<strong>da</strong> e <strong>de</strong>fini<strong>da</strong>, e quáo anti a era a posse<br />

<strong>do</strong>s priviiegioa inetropo~i~icos.-I AO syno<strong>do</strong> provincial pertencia o fireito <strong>da</strong> crea-<br />

$20 <strong>da</strong>s novas dioceses e metropoles. -Sào raros, apezar <strong>da</strong> imporlancia <strong>do</strong> objecto,<br />

os canones a esle respeito: explicac80 d'este facto. - Can. ix <strong>de</strong> Antiochia, Can.<br />

xvii <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia, Can. xx <strong>do</strong> 4.0 cone. <strong>de</strong> Carthago, Can. xvii <strong>do</strong>s <strong>do</strong> Codigo<br />

<strong>da</strong> Egreja Africana. O can. 51, caus. xvi, q. I:, geralmenteallega<strong>do</strong>, iiào<br />

prova o que preten<strong>de</strong>m: o final <strong>do</strong> canou, nao transcripto no Decreto, Lem comtu<strong>do</strong><br />

to<strong>da</strong> a forca probaloria. - A auclori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> syno<strong>do</strong> provincial e reconheci<strong>da</strong> a<br />

ca<strong>da</strong> passo-nos concilias d'estes seculos: textos que o evi<strong>de</strong>nceiam. - A disciplina<br />

primitiva <strong>da</strong> inslilui$o <strong>do</strong>s chama<strong>do</strong>s chorepiscopos conlém um exemplo. - 11 OS<br />

papas ain<strong>da</strong> 1180 tomavam parle nestes negocios. - Opiniães em contrario - Tliomassin,<br />

Goschler, Bellarmino e a eschola ultramontana. - Critica <strong>do</strong>a argumentos<br />

d'estes escriptores.-Nào obsta o can. xxviii <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia: explicaelo d'este ean.--<br />

O cnn. vi <strong>de</strong> Nicea robusiore a nossa opini?io.- Um trecho <strong>do</strong> Tentamen Theologicuni.-<br />

Pactos em contrario <strong>da</strong> disciplina. - A criliea historica <strong>do</strong> P.a Thomassin.<br />

-Não tem peso os exemplos extrabi<strong>do</strong>s tla vi<strong>da</strong> <strong>de</strong> S. Gregorio 111.4) que aignificam<br />

as vers0rs Ialinas <strong>do</strong>s canoiies e rodigos 0rientaes.- No seculo x ain<strong>da</strong> se nAo<br />

reconhecia geralmente a siipremacia papal nestes assumptos.-A hisloria <strong>do</strong> crescimento<br />

<strong>do</strong> papa<strong>do</strong> ate o s~culo ix e <strong>da</strong>s suas relacões coni as gran<strong>de</strong>s egrejas <strong>do</strong><br />

occi<strong>de</strong>nte esclarece este ponto.- 11 l O po<strong>de</strong>r real &o intervinha como parle principal:<br />

caracter especial <strong>da</strong> legislacão c1inonica.-0 aclo 4.0 <strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Calcetlonia<br />

contém os principias regula<strong>do</strong>;es <strong>da</strong> materia: a egreja nunca hesitou em ser O<br />

supremo juiz d'estes negocios.-Can. xii <strong>do</strong> mesmo concilio.-Em varios confliclos<br />

resolvi<strong>do</strong>s nas sessões d'esle coocilio se firma egualinente u mesma disciplina.-Os<br />

canonistas gregos Balsamnn e Zonares e o can. xvii <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia: rocctlencia <strong>da</strong>r<br />

suas razoes. - O ean. xvii nào contradicta o can. xli: explicapiio dP1estes canones.<br />

- Episloia~ <strong>de</strong>cretaes <strong>de</strong> Iniiocencio e Bonifacio I -Factos em conlrario <strong>da</strong>s leis<br />

ecclesias1icas.-Origem d'estas coulradircões, incoherencia <strong>do</strong>s canonistas.<br />

Com o seculo <strong>de</strong> Constantino começa para a egreja uma nova<br />

epocha <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong>.<br />

Na0 po<strong>de</strong>mos ler estas paginas pavorosas <strong>da</strong> historia sem nos<br />

sentirmos penetrar <strong>de</strong> fun<strong>da</strong> tristeza.<br />

A egreja parece-nos aqui uma joven inexperiente e candi<strong>da</strong>, que<br />

- a mão d'uma amiga dissoluta conduzisse para um lupanar.<br />

Sim ! que a egreja vai aqui luzente e radiante, risonha, cheia <strong>de</strong><br />

esperança, confia<strong>da</strong> no celebre rescripto <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> conscieu-


cia e <strong>de</strong> cultos e admitte no gremio <strong>da</strong>s suas assemblêas respeitaveis<br />

um impera<strong>do</strong>r dcvasso, irinbicioso, sem consciencia, srm<br />

crenyas, aspiran<strong>do</strong> ao imperio em tu<strong>do</strong> c em to<strong>do</strong>s; - a egreja<br />

qiiasi a<strong>do</strong>ra este scclera<strong>do</strong> que os mais horren<strong>do</strong>s crimes mancham<br />

e fazem aborrecer; <strong>de</strong>screve-o puro e sancto com a penna <strong>de</strong> seus<br />

historia<strong>do</strong>res; v&-o corifuso e pinta-o cheio <strong>de</strong> emoção quan<strong>do</strong> se<br />

assenta, coberto <strong>de</strong> purpiira c com a fronte cingi<strong>da</strong> <strong>de</strong> pedras reluzentes,<br />

no meio <strong>do</strong>s padres vencran<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Nicea; e, cega, nao v@<br />

que este abraço, que clla cui<strong>da</strong> puro e celestial, é um amplexo<br />

concupisce~ite e humano, que a ha <strong>de</strong> aviltar rio futuro; e, <strong>de</strong>scui<strong>do</strong>sa,<br />

entrega-se nestes braços, que se lhe abrem, qiic ella julga<br />

serem os braços <strong>da</strong> fraterni<strong>da</strong><strong>de</strong> e que sáo súmentc os laços subtis<br />

<strong>do</strong> corpo <strong>da</strong> vibora <strong>da</strong> autocracia e <strong>da</strong>s pcrdiyòes <strong>do</strong> imperio! Que<br />

teria si<strong>do</strong> <strong>da</strong> egreja se n:io fossem os seus Agostinhos, o4 seus<br />

Chrysostomos, os seus Cyprianos? Que seria <strong>da</strong> egrcja se Athanasio<br />

nào tivesse neste primeiro momento a inspirayao <strong>de</strong> <strong>de</strong>clarar<br />

o symbolo <strong>da</strong> f6 para pren<strong>de</strong>r a sua uni<strong>da</strong><strong>de</strong> moral? Que seria d'ella<br />

se niio fosse este mal que lhe corria o imperio e lhe q~iehrantavn<br />

as forças? se n8o fosse este ultimo viver effemina<strong>do</strong> <strong>de</strong> C~i~isiiiiitino<br />

e esta escravidão oriental que acabou em Byzancio <strong>de</strong> dissolver<br />

o imperio?<br />

Quan<strong>do</strong> se reflecte no que podia ter si<strong>do</strong> a egre.ja christã; quan<strong>do</strong><br />

se pensa e se <strong>de</strong>scobre <strong>de</strong> c~ntrc as paginas <strong>do</strong> Evangelho iim horizonte<br />

vastissimo, cheio <strong>de</strong> luz, sublime, e se olha <strong>de</strong>pois As tr41:w.<br />

aos <strong>de</strong>svarios, ás luctas, fis imperfciyòcs que 11o.j~ cobrem tlc Iùllos<br />

este vulto candi<strong>do</strong> e colossal <strong>da</strong> egre.ja, sente-se bem a coridic;80 e<br />

fragili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s colisas humanas, que os proprios livros sanctos tanta<br />

vez nos lembram.<br />

Ou srja Constantino umvulto abjecto, como o fazem Juliario e<br />

Sozomeno, ou um homem puro e justo c gran<strong>de</strong>, como o qucrem<br />

Eusebio, Lactancio; o que (. certo 6 que a cgrcja neste momento<br />

tocava, sem o perceber, em uma <strong>de</strong> suas maiores tentações e <strong>de</strong><br />

suas maiores <strong>de</strong>sgra~as.<br />

A egreja sentia, <strong>de</strong> repente, sob suas máos, os thesouros <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r<br />

temporal, e este contacto infernal <strong>de</strong>spertava-lhe um <strong>de</strong>se-jo novo<br />

e fatal, <strong>de</strong>sprendia-lhe os olhos <strong>do</strong> cbu, ondc os tivera fitos at6<br />

1 Edicto <strong>de</strong> Milão <strong>de</strong> Constantino e Licinio, <strong>do</strong> anno 313 - Lactanc. <strong>de</strong><br />

Mort. pereecut. c. 48 - Euscb. Hist. eccles. x-5


então para Ih'os escravisar com as ambiçóes <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, e para lhe<br />

preparar no futuro as luctas horriveis com o esta<strong>do</strong>, este conjuge<br />

incestuoso com o qual agora se ligava.<br />

É um momento solcmne, gran<strong>de</strong>, cheio <strong>de</strong> turbações, <strong>de</strong> crimes,<br />

<strong>de</strong> horrores rio porvir, e <strong>de</strong> alegrias, <strong>de</strong> victorias, <strong>de</strong> contentamen-<br />

tos no presente.<br />

Como mui bem diz Castelar 1:<br />

aLa conversion <strong>de</strong> Constantino leuanta e1 problema pavoroso que<br />

aun no se ha rcsuclto y que <strong>de</strong>be resolver nuestro siglo, e1 problema <strong>de</strong><br />

Ias relaciones <strong>de</strong>1 po<strong>de</strong>r temporal con e1 espiritual, e1 problema <strong>de</strong> Ias<br />

relaciones <strong>de</strong> la Iglesia con e1 esta<strong>do</strong>.^<br />

Chamem embora os historia<strong>do</strong>res gran<strong>de</strong> ou magno ao Cesar<br />

Romano, cantem nas suas cpopeas c elevem nas suas hyperboles<br />

este seculo <strong>de</strong> Constantirio, que para n6s nem são gran<strong>de</strong>s a epocha<br />

nem o impera<strong>do</strong>r; ou, se o sáo, é porque surgem <strong>de</strong>ante <strong>de</strong> n6s<br />

gran<strong>de</strong>mente fatidicos, gran<strong>de</strong>mente abominaveis.<br />

A historia <strong>da</strong> egreja sem este facto ~odéra e <strong>de</strong>vera ser o livro<br />

mais consola<strong>do</strong>r e m;~is cheio <strong>de</strong> <strong>do</strong>qura c sancti<strong>da</strong><strong>de</strong>; assim, essas<br />

paginas estão <strong>de</strong>negri<strong>da</strong>s por to<strong>da</strong> a especie <strong>de</strong> crimes, e esse livro<br />

não se pó<strong>de</strong> confiar <strong>da</strong>s màos <strong>de</strong> uma <strong>do</strong>nzella, porque em<br />

gran<strong>de</strong> numero <strong>de</strong> seus capitulos, on<strong>de</strong> não 6 o livro <strong>do</strong>s maus<br />

sentimentos, é o livro <strong>da</strong>s dissoluçõcs.<br />

O primeiro effeito bem caracterisa<strong>do</strong> d'cste gran<strong>de</strong> e fatal acontecimento,<br />

o primeiro ponto on<strong>de</strong> rebenta esta podridão que o<br />

imperio, inocula na egreja, virgem e pura atb este tempo, é o seculo<br />

nono; sáo as falsas <strong>de</strong>cretaes.<br />

Até aqui a disciplina conserva-se ri mesma; mas o veneno lavra<br />

activo, e a febre cresce ate esses dias.<br />

Este perio<strong>do</strong> começa pela reducçào a escripto <strong>da</strong> disciplina ecclesiastica.<br />

A egreja firma-se, <strong>de</strong>termina as suas fórmas, organisa-se, reurie<br />

os seus concilios, faz as suas leis.<br />

O clarão <strong>do</strong>s tcmpos apostolicos e <strong>do</strong>s seculos limpi(1os <strong>da</strong>s<br />

perseguições é ain<strong>da</strong> bem intenso para illumiriar os concilios ecumenicos;<br />

a tradicç~o e a voz <strong>do</strong>s padres sustentam a egreja nestes<br />

primeiros momentos.<br />

1 La ciuilieatwn en Zoa cinco primeroa sigloe <strong>de</strong>1 ch~atianimo,<br />

tomo 3.O,<br />

leccioii setima y ultima.


Veremos no capitulo seguinte como tu<strong>do</strong> se transtorna <strong>de</strong>pois,<br />

repentinamente; por agora apontaremos a legislaçào sobre o nosso<br />

objecto.<br />

Se ate aqui a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> religiosa christá vivia completamente<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte e absolutamente <strong>de</strong>sliga<strong>da</strong> <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> civil, <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

este perio<strong>do</strong> o esta<strong>do</strong> <strong>da</strong>s relí~ções 6 outro: k a mutua in<strong>de</strong>pen-<br />

<strong>de</strong>ncia e ao mesmo tempo a mutua alliança: o esta<strong>do</strong> e a egreja<br />

soberanos ca<strong>da</strong> um na sua esphera e eiiten<strong>de</strong>riiio-se reciprocamente<br />

quan<strong>do</strong> se encontram no mesmo ponto.<br />

Aqui, pois, começa ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente o objecto especial <strong>do</strong> nosso<br />

trabalho: o papel que o esta<strong>do</strong> representa com relação 6 egreja<br />

no assumpto <strong>de</strong> circumscripção e erecção <strong>de</strong> dioceses.<br />

Começaremos por <strong>de</strong>monstrar como a divisão <strong>da</strong> egreja em<br />

provincias e parochias (egrcjas, paroecias ou dioceses) 1 bem dcter-<br />

mina<strong>da</strong> e <strong>de</strong>fini<strong>da</strong> permanece nestes e nos seculos seguintes.<br />

NBo gastaremos milito espaço a fazel-o, porque 6 cousa incon-<br />

testavel, e que a leitura <strong>do</strong>s canones e outros monumentos histo-<br />

ricos manifesta a primeira vista.<br />

1 A expressEo parochia, que se encontra a ca<strong>da</strong> passo nestes oanonee e<br />

monumentos <strong>do</strong>s primeiros seculos, não significa como hoje as subdivi6es <strong>de</strong><br />

uma diocesr, mas a propria diocese.<br />

As egrejas, oii parocliias ou paroecias, tinham os seus diaconos e presbyteros,<br />

o seu clero, iriscripto no catalogo sacer<strong>do</strong>tal, adstricto a esss parochia,<br />

viven<strong>do</strong> em muitos logares vi<strong>da</strong> corninum com o bispo.<br />

Limita<strong>da</strong> foi a brea d'rstas circiimscripçòes nestes tempos, porque o 11'<br />

<strong>de</strong>via n&o só coiihecer o sou clero e com elle resolver os negocio* <strong>da</strong> egi q ~r,<br />

mas tambem soccorrer a sua plebe, estar ao pB <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> um na hora <strong>do</strong> perigo<br />

e <strong>da</strong> :~fflicç%o e IIO ii~ornerito <strong>da</strong> <strong>de</strong>srsperariça.<br />

Parece que o Oriente e Africa <strong>de</strong>ixaram per<strong>de</strong>r mais <strong>de</strong>pressa <strong>do</strong> que O<br />

Occicleiite o nome <strong>de</strong> parochia, primeiro paroecia.<br />

A expressgo diocese, que se lhe substitue, vem <strong>da</strong> organisação politica <strong>do</strong><br />

imperio.<br />

1-2 reunião <strong>da</strong>s provincias fazia a diocese, a que presidia o prefeito <strong>do</strong> pre-<br />

torio ou seus vigarios.<br />

1)ioceses appellabantz~r administrationes mulfarum provinciarum, quae in<br />

unurn coactae per Praefectos pretori8 et eorznn vicavios regebantur. L. un.<br />

c. ?rt omn. jud. - L. 3, C. Theod. <strong>de</strong> collat. equor. -L. 34, C. Theod. <strong>de</strong> na-<br />

vicul. - Vocabular. Jur. utriiisq <strong>de</strong> Vicat, vbis -Dioecc,.ws e Paroecia.<br />

Clliristophor. Justell. in observatio. et not. can. 56 Eccles. Afric. -Gos-<br />

chler dict..Encyclop. <strong>de</strong> la Theol. Cathol. vb. dioccse, not.<br />

aDioecesis est (diz Baleamou ao can. rr <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia) qwie multa8 eub re<br />

habet Provinc2as.n<br />

Esta express80 já nestes primeiros tempos se vê alguma vez emprega<strong>da</strong><br />

como nynonimo <strong>de</strong> parochia, especialmente em alguns canones <strong>de</strong> Africa, e<br />

j& no concilio <strong>de</strong> Antiochia no can. rx.


,O can. IV <strong>do</strong> conc. <strong>de</strong> Nicea diz:<br />

~Episcopum convenit, maxime qui<strong>de</strong>m ab omnibus qui sunt in prorvincia<br />

Episcopis ordinari~ e no fim: ~Firmitas autem eorumquae geururilur<br />

per unamquamque Provinciam Metropolitano tribuatur epis-<br />

«copo. »<br />

As prohibições <strong>da</strong>s transferencias e <strong>da</strong> acceitagão <strong>do</strong>s clerigos<br />

excommungn<strong>do</strong>s 'noutras parochias continúa <strong>da</strong> mesma fórma ncstes<br />

tempos, tornan<strong>do</strong> ain<strong>da</strong> mais exclusiva a circumscrip~ão ecclesiastica.<br />

Leiam-se os can. v, xv e xvr <strong>do</strong> cit. conc.<br />

Por vezes mesmo se marca a Brea <strong>da</strong>s provincias nas leis, em<br />

conformi<strong>da</strong><strong>de</strong> com o que o uso estabelecera; como, por exemplo,<br />

se 16 <strong>do</strong> can. vir, a respeito <strong>da</strong> provincia <strong>de</strong> Alexandria.<br />

A mesma di~isão geral se percebe <strong>do</strong> can. xvrr <strong>do</strong> concil.<br />

<strong>de</strong> Ancyra, <strong>do</strong>s can. 111, ix, x e xxr, <strong>do</strong> <strong>de</strong> Antiochia, entre os<br />

quaes 6 terminante o ix.<br />

O mesmo se esclarece com o can. ~ V I I<br />

<strong>de</strong> Laodicea com os <strong>do</strong>s<br />

concilias <strong>de</strong> Africa, que se po<strong>de</strong>m ler no jB cita<strong>do</strong> codigo <strong>da</strong> egreja<br />

Africana; e muitos outros.<br />

<strong>Dos</strong> referi<strong>do</strong>s canones <strong>de</strong> Nicea se <strong>de</strong>scobre quão antiga era já<br />

no iv seciilo esta divisõo ecclesinstica e longa a posse <strong>do</strong>s privilegio~<br />

<strong>do</strong>s metropolitas e <strong>do</strong>s patriarchas, pois que elles s6 fazem<br />

conservar o que o costume antigo estabelecera.<br />

E s6 <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> seculo x que os papas augmentam extraordinariamoiilc<br />

estes prij ilegios, com especiali<strong>da</strong><strong>de</strong> em volta <strong>de</strong> Roma<br />

nas provincias <strong>da</strong> Italiri.<br />

Nestes primeiros tempos ii egreja parece mesmo que tracta este<br />

objecto como uma cousa qiiasi indiff'erente : razões extranhas B cari<strong>da</strong>dc<br />

christa os fizeram nascer, e os bispos tractnm-se muitas<br />

vezes em suas cartas sem usar d'estes titulos e honrarias, chaman<strong>do</strong>-se<br />

simplesmente irmãos dilectos ou carissimos.<br />

Quan<strong>do</strong> <strong>de</strong>pois, com o correr <strong>do</strong>s seculos e o augmento <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r<br />

<strong>da</strong> egrcja, esfria esta cari<strong>da</strong><strong>de</strong> christã e esmorece este espirito<br />

evan~elico <strong>do</strong>s primeiros seculos; então multiplicam-se estes privilegio~<br />

para satisfazer ambiçòes, a ponto <strong>de</strong> ser hoje mui difficil<br />

dizer ao certo qual a emtensao <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> e prerogativas <strong>do</strong>s<br />

patriarchas, exarchas, primazes, metropolitas, etc.<br />

1 Fleury, 4.em* Diecoars eur I'Histoire Eccles.


Demonstra<strong>da</strong> a existencia <strong>de</strong> uma circumscripção ecclesiastica,<br />

cumpre dizer quem podia creal-a ou alteral-a.<br />

A disciplina <strong>da</strong> egreja conserva-se a mesma 'neste espaço <strong>de</strong><br />

tempo.<br />

Vamos provar - 1 .O - que ao syno<strong>do</strong> provincial pertencia este<br />

direito ; .- 2.' - que o bispo <strong>de</strong> Roma náo tinha ain<strong>da</strong> este privi-<br />

legio ; - 3." - que o esta<strong>do</strong> não intervinha como parte principal.<br />

& muito para notar que, sen<strong>do</strong>, como C, este objecto summamente<br />

importante, sejam táo raros os monumentos legislativos.<br />

NBo é isto porque se tenham perdi<strong>do</strong>, mas porque se n8o escreveu<br />

categoricamente esta regra <strong>de</strong> disciplina. Os concilios ecumenicos<br />

orientaes tractam <strong>do</strong>s privilegias <strong>do</strong>s metropolitas, lepislnm<br />

sobre os <strong>direitos</strong> <strong>do</strong>s bispos e attribirições <strong>do</strong>s s~no<strong>do</strong>s, rs~ril,~ III<br />

varios capitulas <strong>de</strong> disciplina ; mas não provi<strong>de</strong>nceiam directamente<br />

para este ponto.<br />

O concilio <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia discute' até questbes levanta<strong>da</strong>s a respeito<br />

<strong>da</strong> creação <strong>de</strong> novas metropoles por parte <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>, e, apezar<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>finir os <strong>direitos</strong> d'elle 'neste assumpto, nBo tem um t ~xt~i<br />

so em que <strong>de</strong>screva os <strong>direitos</strong> respectivos <strong>da</strong> egreja.<br />

Este facto prova que a disciplina era tão geral, tão incontesta<strong>da</strong>,<br />

que não foi preciso provi<strong>de</strong>nciar para ella, <strong>de</strong>finil-a.<br />

Percorrei as paginas d'estes coricilios, tanto <strong>do</strong>s ecumenicos<br />

como <strong>do</strong>s particulares e <strong>do</strong>s africanos, e vereis que principalmente<br />

se occupam não <strong>de</strong> edificar nova disciplina, mas <strong>de</strong> conservar a<br />

sua pureza, castigar abusos, abolir primitivos costumes, .que a<br />

candura primcva conseritia, mas que então jh eram perigosos,<br />

con<strong>de</strong>mnar as heresias e resolver pontos <strong>do</strong>gmaticos.<br />

& ain<strong>da</strong> a tradiçóo <strong>do</strong>s seculos anteriores a fructificar vigorosa,<br />

a impor-se veneran<strong>da</strong> aos concilios, a influir potente na constituição<br />

e governo (Ia egrsja.<br />

E poiico admira similhante respeito pela antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> disciplina<br />

'nestes seculos, quan<strong>do</strong> no duo<strong>de</strong>cimo e seguintes as falsas<br />

<strong>de</strong>cretaes, se obtiveram tão espantosa acceitaçao, foi porque o seu


auctor as attribuiu aos primeiros papas e aos primeiros con-<br />

cilio~.<br />

Esta i<strong>de</strong>a viva e fecun<strong>da</strong>, que tu<strong>do</strong> prendia ao exemplo <strong>do</strong>s<br />

apostolos e <strong>do</strong> fun<strong>da</strong><strong>do</strong>r d'esta socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, alenta<strong>da</strong> pela voz e es-<br />

criptos <strong>do</strong>s padres e apologistas, teria si<strong>do</strong> 'a gloria e paz <strong>da</strong><br />

egreja com o mun<strong>do</strong> livre c com o progresso, scnão fosscm as<br />

frau<strong>de</strong>s inauditas d'esse celebre Isi<strong>do</strong>ro Merca<strong>do</strong>r ou Pecca<strong>do</strong>r.<br />

Essa mesma tradiçiio, que os padres <strong>da</strong> primitiva egreja <strong>de</strong>fen-<br />

diam tão fervorosamente, 6 uma <strong>da</strong>s fontes mais copiosas e res-<br />

peitaveis <strong>do</strong> direito canonico, e ain<strong>da</strong> hoje mais <strong>de</strong> uma voz pro-<br />

testa pelo <strong>de</strong>sprezo em que se tem ti<strong>do</strong>, e clama pela restituicão<br />

<strong>da</strong> antiga simplici<strong>da</strong><strong>de</strong>, pureza e disciplina.<br />

O primeiro canon que encontramos é o can. xx <strong>do</strong> concilio <strong>de</strong><br />

Antiochia, capital <strong>do</strong> oriente, celebra<strong>do</strong> no anno 341 <strong>da</strong> era vul-<br />

gar.<br />

. Diz este can. :<br />

«Per singulas regiones Episcopos convenit nosse Metropolitanum<br />

«Episcopum sollicitiidinern totius L'rovinciae gerere. Propter quod ad<br />

«Metropolim omiies undiqae qui negotia vi<strong>de</strong>ntur habere cbncurrant.<br />

aUn<strong>de</strong> placuit eiim et Iionore praeccllerc, rt nihil amplius praeter<br />

meum, caeteros Episcopos agere (secundiim antiquam a Patril~iis nos-.<br />

((tris Regulam coristitutam), nisi ea tantiim quae ad suam dioecesim<br />

upertincnt, possessionesque siibjcctas. Unusqiiisque enim Episcopus<br />

uhabet suac Parochiae potestatern, ut negat juxta reverentiam singulis<br />

~competentem ; et providciitiani gcrat ornnis possessionis, quae siib<br />

uejus cst potcstate, ita ut Preshyteros et diaconos ordinet, ct singnla<br />

usuo judicio comprehen<strong>da</strong>t. Amplius autem nihil agere tcntet practcr<br />

~Aritistitem Metropolitanum, nec Metropolitanus sine caeterorum gsurat<br />

Consilio Sacer<strong>do</strong>tum.»<br />

.I? a mesma <strong>do</strong>utrina <strong>do</strong> can. xxx~v <strong>do</strong>s Apostolos, que acima<br />

transcrevemos, e ao qual se refere expressamente, como já notámos.<br />

Para que este texto não acabasse com duvi<strong>da</strong>s, fora mister <strong>de</strong>monstrar<br />

que a erecc;%o, suppressão, união e divisão <strong>da</strong>s dioceses<br />

eram negocios, que tantum ad suam Dioecesim pertinent.<br />

Mas o can. diz terminantemente: -ca<strong>da</strong> bispo tem podcr na<br />

sua parocliia para provi<strong>de</strong>nciar ás necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> área que lhe<br />

está sujeita ; amplius outem, accrescenta, tzihil agere tentet praeter<br />

Antistitem metropolitanum.<br />

Nem o metropolita s6 o po<strong>de</strong> fazer, porque o can. é cauteloso<br />

4


em man<strong>da</strong>r que nec Metropolitaaaus sine Gasterorum gera Comilio<br />

Sacer<strong>do</strong>tum 1.<br />

No can. XVII <strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia, o quarto <strong>do</strong>s ecumenicos,<br />

reuni<strong>do</strong>s no anno <strong>de</strong> 4.5 1, estabelece-se a prescripçáo <strong>de</strong><br />

trinta annos para a acquisição diis parochias, cuja posse os bispos<br />

retem sem direito, mas tilcançam itulla cujuscumque injuria, SELE<br />

bo~ta fi<strong>de</strong>, sinc. itrjustis quibusve mediis 9.<br />

Não diz este cari. como se adquiriu esta mera posse. (104 bispa-<br />

<strong>do</strong>s por tanto tempo; mas os canones, já anteriores, jA coiitempo-<br />

raneos e posteriores <strong>de</strong> outros concilios, vêm cheios <strong>de</strong> casos si-<br />

milhantes: a falta <strong>de</strong> tres bispos pelo menos na or<strong>de</strong>nação; a fa-<br />

cto mesmo <strong>de</strong> se ser or<strong>de</strong>na<strong>do</strong> bispo <strong>de</strong> logarcs <strong>do</strong> campo sem<br />

numerosa população e sem se <strong>da</strong>rem casos <strong>de</strong> força maior; as<br />

or<strong>de</strong>nações <strong>de</strong> novos bispos sem consentimento <strong>da</strong> plebe que nunca<br />

os tivera proprios e <strong>do</strong> bispo <strong>de</strong> quem se <strong>de</strong>smeml~rava ; e outros,<br />

eram causas pelas quaes o bispo <strong>de</strong> certa parocliia 1180 tinha direito<br />

a sel-o 'nessa parochia.<br />

O can. <strong>de</strong>termina que, quan<strong>do</strong> a respeito <strong>da</strong> prescripçào <strong>de</strong> qiie<br />

tracta se levantarem contestaçóes, ellas sejam leva<strong>da</strong>s ao syno<strong>do</strong> 111 11vincial<br />

para as resolver.<br />

, -<br />

(c... quod si intra tricennium facta fuerit <strong>de</strong> his, vel IPat aR-<br />

licere eis, qui se laesos asserunt, apud sanctam Synodum prolabdhs<br />

<strong>de</strong> his movere ccrtamen.<br />

E pois a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> e competencia <strong>do</strong> syno<strong>do</strong> provincial iieste<br />

objecto evi<strong>de</strong>ntemente reconheci<strong>da</strong>.<br />

O texto, note-se, na0 diz que recorram ao metropolita, iirm que<br />

<strong>de</strong>cidi1 o bispo <strong>da</strong> parochia mais proxima ou <strong>da</strong> propria e primeira<br />

diocese ; o texto 6 claro.<br />

Quasi to<strong>do</strong>s os escriptores citam o can. xx <strong>do</strong> 4.O concilio. <strong>de</strong><br />

Carthago (o 11 .O <strong>de</strong> Aliica), que 6 <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s o mais <strong>de</strong>cisivo, pois,<br />

falla~i<strong>do</strong> <strong>de</strong>plebibus quae nunquam episcopos habuerunt, diz que os<br />

não recebam nisi ex concilio plenario uniuscujusque prouiwiae<br />

et primatis atque consensu ejus ad cujus dioecesim ea&em ecclrsia<br />

1 Veja abaixo ácerca <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> d'este concilio o que escrevemoa a<br />

pag. 54.<br />

Zonarap in can. xvrr <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia


portinebat)) <strong>de</strong>claran<strong>do</strong> assim outros canones <strong>de</strong> concilim anterio-<br />

res menos exprcssos 1.<br />

'Nestes concilios africanos permittiarn-se algumas excepções a<br />

estes principios, excepções que hoje nao t&m razão <strong>de</strong> ser, porque<br />

se fun<strong>da</strong>vam cm circumstancias puramente <strong>de</strong> occasião e transitorias.<br />

Assim, quan<strong>do</strong> a egreja, ten<strong>do</strong> segui<strong>do</strong> a seita <strong>do</strong>s <strong>do</strong>natistas,<br />

pedia para ficar cathedral, abraçan<strong>do</strong> a uni<strong>da</strong><strong>de</strong>, dispensavam-se o<br />

assentimento <strong>do</strong> bispo e a approvação <strong>do</strong> syno<strong>do</strong>; e <strong>do</strong> mesmo<br />

mo<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> em alguma diocese o bispo extirpava a heresia <strong>de</strong><br />

certa diocese e a possuia juricta á sua pelo espaço <strong>de</strong> tres annos,<br />

ninguern lh'a podia já arrebatar (can. cxrx e can. cxvirr <strong>do</strong> Cod.).<br />

São excepções que confirmam a regra.<br />

Para a erecçào <strong>da</strong>s metropoles, apezar <strong>de</strong> a regra ser, como<br />

temos dicto, o respeito pelo antigo costume, n8o se crean<strong>do</strong> mais<br />

privilegios <strong>do</strong> que os que a antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> estabelecera, como bem<br />

alto o repetem os concilios <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o <strong>de</strong> Nicea; comtu<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong><br />

circumstancias especiaes, como a vastidão <strong>da</strong> provincia, o exigiam,<br />

era s6 com o consentimento <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a egreja, bispos e metropo-<br />

litas que se erigiame.<br />

Ha um texto que o evi<strong>de</strong>nceia: 6 o Can. xvir <strong>do</strong> Codigo <strong>do</strong>s<br />

canones <strong>da</strong> egreja africana3.<br />

Diz :<br />

rPlacuit ut Mauritania Sitifensis ut putavit primatem provinciae Nu-<br />

midiae, ex cujus coetu separatur: ut siium habeat primatcm: quem<br />

consentientibus omnibus primatibus provinciarum africanarum vel<br />

omnibus cpiscopis, propter longinquitatem habere permissa est.n<br />

Allega-se gerahnente o Can. tji, caus. XVI, q. 1 .", para provar<br />

1 Veja supra a pag. 41.<br />

2 S. ergo secundum pristiniim provinciarum morem metropolitanoe Episcopos<br />

coiivciiit iiuinerari.~ Iunoc. iir -resposta a Alexandre bispo <strong>de</strong> Aiitiochia,,Decret.<br />

XLVI no Codigo <strong>do</strong>s canones ecclcsiastiws <strong>de</strong> Diohysio Exiguo.<br />

3 E prirriitivatneiite um cauoue feito no coiicilio <strong>de</strong> Hippoiia <strong>do</strong> aiino <strong>de</strong> 393.<br />

To<strong>da</strong>s as pivvincias romanps <strong>de</strong> Afriea tiriharn um primaz, 4 excepçso <strong>da</strong> <strong>de</strong><br />

Stefe, que recoiihecia o <strong>de</strong> Numidia. 'i\'esse coiicilio Celiano e Honorato, bispos<br />

d'essa proviricia, ~edirarn em tiome <strong>do</strong>s outros o prima<strong>do</strong> para elia. Aurelio,<br />

bispo <strong>de</strong> Carthago, quiz ouvir a to<strong>do</strong> o concilio, e Epigonio propoz que<br />

egualrneute <strong>de</strong>vera <strong>da</strong>r o seu couseritimento a egreja <strong>de</strong> Nuinidia. O cauon<br />

que se fez 15 esse, e 'nelle vemos a cautela com que os padres <strong>de</strong>claram que<br />

o primaz <strong>da</strong> Numidia julgara conveniente e to<strong>do</strong>s os primazes e bispos cone<br />

vinham que ee d6sse a Stefe um primaz seu.


que pertencia ao metropolita e syno<strong>do</strong> provincial o exercicio d'este<br />

direito.<br />

Este can. LI <strong>do</strong> Decreto 6 o can. LIII <strong>do</strong> Codigo Africano e<br />

o 42 <strong>do</strong> terceiro concilio <strong>de</strong> Carthago, <strong>do</strong> anno <strong>de</strong> 397, o qual<br />

diz assim 1 :<br />

((Multis concilis hoc statutum est a coetu sacer<strong>do</strong>tali, ut plebes quae<br />

in dioecesibiis ab episcopis rctinentur qiiac episcopos nunquam haliue-<br />

runt non nisi cum roluntate ejus episcopi a qoo tenentur, accipiant<br />

rectores. »<br />

N50 prova, porém, o que preten<strong>de</strong>m.<br />

As palavras a coetu sucer<strong>do</strong>tali, as unicas que po<strong>de</strong>m involver<br />

alguma duvi<strong>da</strong>, querem dizer, não que a plebe receba o bispo n<br />

coetu sacer<strong>do</strong>~alt. mas que em muitos concilios foi estatui<strong>do</strong> pela<br />

assembleia <strong>do</strong>s bispos que nenhuma plebe, que nunca teve bispo proprio,<br />

o n8o receba serião com a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> sacer<strong>do</strong>te <strong>de</strong> quem se<br />

separa.<br />

Se formos ler este canon na sua integra ao Codigo <strong>do</strong>. cnril)iies<br />

I I<br />

<strong>da</strong> egreja africana, lá acharemos que Epigonio, acaban<strong>do</strong> c . , . I ~ I I<br />

e dirigin<strong>do</strong>-se ao syno<strong>do</strong>, dizia :<br />

aQuapropter si universo sanctissimo coetui placet hoc, quod prese-<br />

qiiutus suum, confirmetur. n<br />

Estc texto que citam <strong>do</strong> Decreto só prova que a plebe não tlo\(><br />

acceitar bispo pela primeira vez contra a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> seu primilivo<br />

reitor.<br />

E como podia ser outra corisa? nâo v6cm (pie c.tc tv~to<br />

tem<br />

iiitcrcala<strong>do</strong> naquelles on<strong>de</strong> se basêa a nova disciplina qiic. coiiíi~re<br />

ao papa esta prerogativa?<br />

Estc cari. 6 o can. XLI, e O can. XLVIII inscreve-se no Decreto<br />

-I)uos episcopatus in unum redigerc apostolica potrsl auctoritas;<br />

o Can. XLIX: - DUOS episcopatus i11 unum redig~re npostolicu<br />

valet auctoriías; - e o can. LIII, fallíin<strong>do</strong> <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> crear<br />

novos bispa<strong>do</strong>s on<strong>de</strong> cresce a multidão <strong>do</strong>s fieis, 18 tem as cxpressões:<br />

ex vigore apostolicae sedis <strong>de</strong>beas ordinare episcopos.<br />

Ao que parece eram muito communs por estcs tempos na cgreja<br />

1 É cita<strong>do</strong> <strong>de</strong>pois no concilio <strong>do</strong> anno 524, bem como outros <strong>do</strong> mesmo<br />

concilio.


africana, por ventura que por causa <strong>de</strong> sua vastidiio, os exemplos<br />

<strong>de</strong> usurpaçóes <strong>de</strong> bispa<strong>do</strong>s e a arrogancia <strong>do</strong>s clerigos levava-os a<br />

excitar a plebe por elles ut illicito facore eos<strong>de</strong>m velinl sibi col-<br />

locare rectores 1.<br />

Para acabar com estes abusos 6 que se fez este canon.<br />

O monge, auctor <strong>da</strong> concol-dia <strong>do</strong>s canones discor<strong>da</strong>ntes, copiou<br />

para a sua obra a primeira parte d'este texto e esqueceu-se <strong>da</strong> ul-<br />

tima ; isto, naturalmente, para realisar a concordia, porque em ver-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong> as <strong>de</strong>rra<strong>de</strong>iras linhas d'este canon, <strong>de</strong>stoavam <strong>da</strong>s jii estabe-<br />

leci<strong>da</strong>s usurpações ou reservas papaes.<br />

N6s servimo-nos d'este canon, para corroborar a opiniáo que<br />

<strong>de</strong>ixamos exara<strong>da</strong>, apezar d'isto tu<strong>do</strong>, e com tanta mais força,<br />

quanto aqui lançamos mào d'elle, não como Graciano no seu De-<br />

creto, quan<strong>do</strong> já o costume, abuso ou n50, e as falsas <strong>de</strong>cretaes<br />

tinham conferi<strong>do</strong> a Roma tantos privilegias; mas em face <strong>da</strong> his-<br />

toria, nào ten<strong>do</strong> necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sprezar algumas palavras que<br />

nos não agra<strong>de</strong>m, antes len<strong>do</strong>-o inteiro, enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong>-o á luz <strong>da</strong><br />

epocha em que foi feito e para que regia, e no meio <strong>da</strong> legislaçáo<br />

canonica que o completa e explica.<br />

O final d'este texto, <strong>de</strong>pois <strong>do</strong>s outros africanos que citámos, e<br />

para quem conhece a historia d'estes primeiros seculos, 6 clarissimo<br />

e positivo.<br />

r0portet enim, diz Aiirelio respon<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a Epigonio, ut qui uni-<br />

eersis fratribus ac toto concilio inhaeserit non solum manet jure inte-<br />

gro, se I e1 dioeceses possi<strong>de</strong>at. At vero qui sibimet pulant plebes suas<br />

sufficere fraterna dileetione mnhmpta, non tantum dioecescs amittant,<br />

sed ul dixi etiam propriis publica careant auctoritate ut rebelles.~<br />

A auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> syno<strong>do</strong> provincial B nos concilias d'este pe-<br />

rio<strong>do</strong> reconheci<strong>da</strong> a ca<strong>da</strong> passo em gran<strong>de</strong> numero <strong>de</strong> cousas que<br />

não sáo mais <strong>do</strong> que applicaçóes <strong>do</strong> principio exara<strong>do</strong> 'naquelle<br />

can. ix <strong>de</strong> Alitiochia.<br />

Não <strong>de</strong>vemos omittir o can. XVI d'esse mesmo concilio, on<strong>de</strong><br />

se v& isto bem claro, na hypothese, .que contém, quasi i<strong>de</strong>ntica,<br />

ou que importa a nova creação dc bispa<strong>do</strong>s.<br />

1 Cit. csn. &rir.


O canon man<strong>da</strong> que :<br />

uSi quis Episcopus vacatis 1, in Ecclesiam prosiliat se<strong>de</strong>mque per-<br />

va<strong>da</strong>t, absque integro perfectoque concilio; hic abjiciatur necesse<br />

est, etsi ciinctus popiilus, quem diripiiit, eiim habere <strong>de</strong>legerit. Per-<br />

fectum vero concilium illud est ubi interfrierit Metropolitanus An-<br />

tistes..<br />

Nem se diga que este concilio é particular, e que por isso não<br />

tcm valor este canon senão para certa parte <strong>do</strong> oriente. Nãio é<br />

assim.'O concilio <strong>de</strong> Antiochia foi tao venera<strong>do</strong> e teve tanta au-<br />

ciori<strong>da</strong><strong>de</strong> no orbe catholico, que um seculo <strong>de</strong>pois, no quarto con-<br />

cilio geral <strong>da</strong> egreja, em Calce<strong>do</strong>nia, reuni<strong>do</strong>s 631 bispos e os<br />

lega<strong>do</strong>s <strong>da</strong> se apostolica, este canon foi li<strong>do</strong> para resolver certa<br />

conten<strong>da</strong> entre <strong>do</strong>is bispos, e applica<strong>da</strong>s as penas 'nclle estatui<strong>da</strong>s.<br />

O mesmo aconteceu com os canones <strong>do</strong>s concilios <strong>de</strong> Laodicea<br />

e <strong>de</strong> Gangres, bem como com os <strong>do</strong>s concilios africanos, especial-<br />

mente <strong>de</strong> Carthago.<br />

Leiam-se tambem os can. XVII e XVIII.<br />

O can. XXIII, falan<strong>do</strong> <strong>da</strong> nomeação <strong>de</strong> successor para o bi5pa<strong>do</strong><br />

feita pelo proprio bispo, exprime-se 'nestes termos:<br />

i, :I -<br />

aEpiscopo non licere pro se altertim siiccessorem sihi c-<br />

licet ad exituni vitae perveniat. Quod si tale aliquici factim<br />

irritiim esse hrijuscemodi est constitiitiim. Servetiir autem jus Ecrle-<br />

siasticiim, id continens: oportere non aliter fieri nisi cum Syiio<strong>do</strong> ct<br />

judicio Episcoporum qui post obitum quiescenlis potestatem habent,<br />

eum, qui dignus extiterit, prom0vere.r<br />

O can. xii <strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Laoci<strong>de</strong>a <strong>de</strong> 370, <strong>de</strong>termiria :<br />

uUt Episcopi judicio Metropolitanorum et eorum Episcoporum, qui<br />

acircumcirca sunt, provehantur ad Ecclesiasticam potestatem; ... u<br />

Na instituição <strong>do</strong>s antigos chorepiscopos, ou <strong>do</strong>s bispos <strong>da</strong>s<br />

egrejas <strong>da</strong>s pequenas villas e aldêas <strong>do</strong> campo, se v& um exemplo<br />

d'esta disciplina.<br />

On<strong>de</strong> a sollicitu<strong>de</strong> d8 bispo náo podia chegar com proveito a<br />

1 Veja-se o schd. a este can. em Vair-Espen. no tom. 3.0 <strong>da</strong>s obras a pag.<br />

140, a respeito <strong>da</strong> sigiiificapão d'eatas expressões - Epiwscqua vacuns.


to<strong>do</strong>s os pontos <strong>da</strong>s diocescs, ou porque os schisms ou as distancias<br />

111'0 não consentiam, ou porqiie a multidão <strong>do</strong>s fieis crescia<br />

<strong>de</strong>smedi<strong>da</strong>mente, ahi se erigiam novos bispa<strong>do</strong>s.<br />

O concilio <strong>de</strong> Sardica <strong>do</strong> anno <strong>de</strong> 347 e o <strong>de</strong> Laodicca <strong>de</strong> 370,<br />

prohibiram e,con<strong>de</strong>mnaram este costume, fun<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-se em que era<br />

preciso conservar em to<strong>do</strong> o seu esplen<strong>do</strong>r e força a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

episcopal,-ne uilescat ttomen Episcopi et aucloritus 1.<br />

Apezar d'isto, mais <strong>de</strong> uma vez sc infringiu esta disciplina, conservan<strong>do</strong>-se<br />

o costiimc <strong>de</strong> certos logares e provincias :- nam cum<br />

ampliorn erant episcopatzas, quatn ut eis Episcopi unius in umpla<br />

civilale <strong>de</strong>ge~ltis cura suficere posset e....<br />

Sancto Agostiriho escrevia :<br />

«Cum me vi<strong>de</strong>rem latius quam oportebat extendi, nec adhiben<strong>da</strong>e<br />

sufficerem diligentiae, quam certissirna ratione adhiberi <strong>de</strong>bere cerne-<br />

bam, Episcopum ibi ordinandiim constitoendumque ciiravi '.B<br />

Bingham assevera que esta lei não foi executa<strong>da</strong> no Egypto,<br />

Libya, Chyprc, Arabia, Asia-Menor, e outros logares *.<br />

Gonzales no lopr cita<strong>do</strong>, bem como quasi to<strong>do</strong>s os escripto-<br />

res, offerecem varios exemplos d'esta inobservancia, como o pro-<br />

vam antigos monumentos.<br />

O auctor <strong>da</strong>s origens ecclesiasticas, quan<strong>do</strong> fala <strong>da</strong>s causas a<br />

que se <strong>de</strong>vem attribuir estes factos, diz 5:<br />

«Una caussa, quamobrem episcopatiis multiplicarentur et nonnuii-<br />

quam in cxigiiis erigerentur locis, erat, quod in ecclesia primitiva<br />

iiniisquisque episcopus, cunsentientc metropolitano azct concilio provin-<br />

&ali approbanle dioccesim suam divi<strong>de</strong>ndi et noviirn episcopum con-<br />

veniente qiio<strong>da</strong>m ejus loco, in ecclesiae emolumentum, constituendi<br />

babet p0testatem.b<br />

A creação pois d'estes chorepiscopos não se fazia em muitos<br />

logares senõo com to<strong>da</strong>s as solemni<strong>da</strong><strong>de</strong>s, ouvi<strong>do</strong> o metropolita e<br />

consentin<strong>do</strong> o syno<strong>do</strong> 6.<br />

1 Cone. Sard. ean. vr (<strong>da</strong> versão <strong>de</strong> Dionysio) e Laodic. enn. LVII.<br />

2 Goiizales Telles, Comment. perpetua in aing1~1.<br />

trztua q7dinq. lar. De-<br />

cret. Gregor. IX, tom. v In libr. v Decret. tit. XXXIII, <strong>de</strong> prrivileg. et meseit.<br />

privilegiat. cap. 1, n.O 4.<br />

3 Epist. 261.<br />

4 Origin. uive Antiq. cceleuiaat. lib. 2, cap. 12.<br />

5 Cit. Lib. 2, csp. 12.<br />

6 Zdwcs'fi) Tom. IV, Que&. n, cap. 11, Ij m.


Discutem acremente os canonistas se os chorepiscopos eram<br />

ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros bispos ou simples presbyteros, vigarios forancos, que<br />

nas al<strong>de</strong>as ruracs tinham certos po<strong>de</strong>res <strong>de</strong>lega<strong>do</strong>s e practicavam<br />

certos actos pertencentes á jurisdicçao episcopal'.<br />

Nào entraremos na questáo, summamente obscura e difficil,<br />

porque liao 6 este o nosso fim, e porque mesmo nos é dispensavel.<br />

Se eram bispos ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros, a sua creaçáo é o objecto mesmo<br />

<strong>do</strong> nosso trabalho, e ahi vemos o reflexo vivo <strong>da</strong> discipliria a<strong>do</strong>-<br />

pta<strong>da</strong> : se eram meros prcsbytcros, ain<strong>da</strong> estes factos nos fornecem<br />

seguro apoio, porque 6 absur<strong>do</strong> suppor que para a instituição <strong>de</strong><br />

um simples presbgtero se pedisse e fosse essencial o assento <strong>do</strong><br />

syno<strong>do</strong> e <strong>do</strong> metropolita, e tal se não exigisse para a creaçào <strong>de</strong><br />

um novo bispa<strong>do</strong>.<br />

Se, por ventura, se segue a opinião media, <strong>de</strong> que alguns eram<br />

ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros bispos e outros simples vigarios, melhor apparece a<br />

disciplina que inculcamos ; porque, náo estan<strong>do</strong> gcralmcrite pro-<br />

va<strong>da</strong> a afirmação <strong>de</strong> Bingham, e pareccw<strong>do</strong> mesmo <strong>de</strong>duzir-se <strong>de</strong><br />

varios carioncs que o chorepiscopo podia ser ordrria<strong>do</strong> pt<strong>do</strong> bispo<br />

1 Bingham, Orig. lib. 2, cap. 14, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> dizer quantas e quaee opinibr<br />

tem liavi<strong>do</strong> sobre esta controversia, citan<strong>do</strong> os auctores que as seguem, incliiia-SP<br />

ft opinigo <strong>de</strong> David I%ion<strong>de</strong>l, que julga ue to<strong>do</strong>s os choiepiscopos<br />

foram bispos ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros ; fun<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-se princip%ente em certo trecho <strong>de</strong><br />

Athanasio, que em nossa opiniào <strong>de</strong>ixa as mesmas duvi<strong>da</strong>s que se levantam<br />

con! a leitura <strong>do</strong>s iiurneiosos canones que tractain <strong>do</strong> assiimpto.<br />

E muito notavel o que diz Basntige na sua Hiaf. <strong>de</strong> Z'Egliae, chap. 2.cmp,<br />

pag. 4 :<br />

~Ces evêques parurent dbs le premier sibcle <strong>de</strong> I'Eglise : mais <strong>da</strong>na cette<br />

premibre iiistitution leur troupeaii ktait renfcimb <strong>da</strong>ns une eenle ville <strong>da</strong>iis<br />

une seule peroisse qui ktait souvent une charnbre hxute ou une cirnetibre<br />

dms leque1 se trouvait un petit nombre <strong>de</strong> fidbles. ~'kvangile passa <strong>de</strong>s villes<br />

& la cnmpagne, et h même temps on eut soin d'c tablir <strong>de</strong>8 pasteiirs <strong>da</strong>ria<br />

les villagee, <strong>da</strong>na les bourgs et <strong>da</strong>ns Ies petitcs villes qui avaient aussi le<br />

caractbre d'Evêque, et qui en faisaient toutes les fonctions <strong>da</strong>ns les sffairee<br />

importantes ; <strong>da</strong>iis les perskciitions ces petits dvêques coiisultaient ceux <strong>da</strong>s<br />

gran<strong>de</strong>s villes ;. qui, plus expkrirnent8s et plus habiles, poiivaiet <strong>do</strong>iiner <strong>de</strong>e<br />

coiiseils salutaires pour condiiire Ic vais-eau pc!n<strong>da</strong>iit Ia tempete. Mais in-<br />

~ensiblemerit les Cvêques <strong>de</strong>s gran<strong>de</strong>s villes se rendirent inaities <strong>de</strong>s autree<br />

On afiiblit I'a~itoritk <strong>de</strong>s chorrvêques et enfiii on les abo1it.r<br />

Veja-se Tliomasa. Part. I.., lib. 2.0, cep. 1.0; Zalwein, Tom. IV, Quebt. 11,<br />

cap. 11, 5 VIII: Ilr. Mexia, 5 148, pap. 180; Gonzalez, 109. cit , n: 8; Du Pin,<br />

toin. 2.0, pag 163 colurn. 1: <strong>da</strong> ATouz.elle Bitlzothèqur, on<strong>de</strong> se fala <strong>de</strong> uma<br />

carta <strong>de</strong> S. Basilio <strong>do</strong>s fins <strong>do</strong> 4.0 seculo a respeito <strong>da</strong> maneira <strong>de</strong> or<strong>de</strong>nar<br />

os chorepiscopos e a pag. 312, 314 e 324 se tracta <strong>do</strong>s seus po<strong>de</strong>res e attri-<br />

buiçces.<br />

Leiam-se oe csn. xrr. <strong>de</strong> hcyra, xm <strong>de</strong> Neocesaree, v u~<br />

e x <strong>de</strong> ~n&&ih.


96 em alguns casos, <strong>da</strong> mesma fórma que o simples presbytero,<br />

&-se bem que quan<strong>do</strong> se requeria o consentimento <strong>do</strong> syno<strong>do</strong> e<br />

approvaçào <strong>do</strong> metropalita o chorepiscopo a or<strong>de</strong>nar ia ser bispo,<br />

e esta or<strong>de</strong>nação importava a erecção <strong>de</strong> um novo bispa<strong>do</strong> ; o que<br />

confirma a nossa e mais geral opinião !.<br />

Insurgem-se alguns escriptores contra a opiniào que estamos<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> e preten<strong>de</strong>m que o pâpa, ou o bispo <strong>de</strong> Homa, tinha<br />

jA neste perio<strong>do</strong> larga e inteire ingcrencin na creaçso, uniào, di-<br />

visão e abolição <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os bispa<strong>do</strong>s <strong>do</strong> orbe catholico.<br />

Tomassine sustenta que ate ao v seculo, foram s6 os syno<strong>do</strong>s<br />

provinciaes e o metropolita que exerceram este po<strong>de</strong>r, e que <strong>de</strong>sdc<br />

O VI, 'nelle e no vir e viii, consliluebatur nwus episcopatus <strong>de</strong><br />

Metropolilani, Concilii Provincialis, Regis e& Summi Pontikcis<br />

consensu.<br />

Goschler 3 assevera que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a mais remota antigui<strong>da</strong><strong>de</strong>, os<br />

1 É muito conheci<strong>do</strong> o exemplo <strong>da</strong> creação <strong>do</strong> bispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Fussala na diocese<br />

<strong>de</strong> Hippona.<br />

Sabe-se <strong>da</strong>s epistolas <strong>de</strong> Sancto Agostinho que elle n8o podia por si s6<br />

remediar os inales que attribulavam esta pequena povoação (veja-se Tillemont<br />

art..315., psg. 837, tom. XIII, e leiam-se as epist. ahi cit.), e por isso<br />

procurou iuttituir nesse burgo um bispa<strong>do</strong>.<br />

Nào foi elle para isto pedir o assentimento <strong>do</strong> papa, nem <strong>do</strong> bispo <strong>de</strong> Carthago,<br />

a mais notavel sB <strong>da</strong> egreja <strong>de</strong> Africa ; mas escreveu ao primaz <strong>de</strong><br />

Numidia para elle mesmo vir or<strong>de</strong>nar o novo bispo.<br />

apropter quem ordinandum aancfttm eenem qui tunc Primatum Nmidiae<br />

~gqrebat, <strong>de</strong> longiquo, ut veniret rqqans, litteris impetravi .... r<br />

E ver<strong>da</strong><strong>de</strong> que se n8ofala aqui <strong>do</strong> concilio provincial; mas, como se atre-<br />

veria a fazel-o sem esse consentimento este sancto ancião, .quan<strong>do</strong> os cano-<br />

nes Ih'o permittiam e quan<strong>do</strong> os anones j& <strong>do</strong> seculo anterior tRo expressa-<br />

mente o exigiam, pois que esta erecção foi feita pelos amos <strong>de</strong>422, e o can.<br />

que cithmos 6 <strong>do</strong> seculo rv?<br />

Realrilente, embora os escriptores citem este facto, d'elle não se <strong>de</strong>duz di-<br />

rectamente o que querem, porque aqui se tracta <strong>da</strong> or<strong>de</strong>nagão <strong>de</strong> um bispo,<br />

e não ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente <strong>da</strong> creação <strong>de</strong> uma nova diocese.<br />

Veja abaixo a ag.<br />

2 Vet. et Nov. bisc P. I, Lib. I, cap. ur e ív.<br />

3 Dict. Encycl. <strong>de</strong> Ia Theol. Cathol. vb. Dioeceee.


papas usaram d'este po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> organisação, posto qae primeiro sómente<br />

nas provincias suburbicarias e no Occi<strong>de</strong>nte.<br />

Notemos que se não limita aqui este facto a este ou aquelle seculo:<br />

Pks ks einq pronièrs siècles, diz esse auctor, le Saint Siège<br />

el ICS grands méiropoliíains instituèrenl 1~s évéehés <strong>de</strong> lSOcci<strong>de</strong>nl.<br />

Au dixithne, au s~ptième et au huitième les t?v&chés n'líairnt instituds<br />

qu'à l'agrénient <strong>de</strong>s méiropolitains, <strong>de</strong>s syno<strong>de</strong>s prouineiaux<br />

et du Paye.<br />

Por maioria <strong>de</strong> razão, accrescenta, isto se verificava nas provincias<br />

converti<strong>da</strong>s pelos missionarios romanos.<br />

Berlarmino, cioso <strong>da</strong>s prerogativas <strong>da</strong> ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> S. Pedro, e<br />

citan<strong>do</strong> certo trecho <strong>do</strong>s escriptos <strong>de</strong> S. Bernar<strong>do</strong>, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que,<br />

pela quali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> apostolica, este po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>ve sempre ter pertenci<strong>do</strong><br />

hquella Se 1.<br />

D'este escriptor se acerca hoje o parti<strong>do</strong> ultramontano, sustentan<strong>do</strong><br />

as mesmas <strong>do</strong>utrinas, confia<strong>do</strong>s c gloriosos pela <strong>de</strong>scoberta<br />

que o celebre car<strong>de</strong>al fez <strong>da</strong> passagem <strong>do</strong> Sancto, dispensan<strong>do</strong>-se<br />

<strong>de</strong> ler a historia d'estes primeiros periotlos e <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> para os irigenuos<br />

a leitura <strong>do</strong>s cawnes <strong>do</strong>s conciiios e <strong>de</strong> outros rnoulirnc1ii4(~.<br />

preciosos.<br />

Outros, e d'estes 6 o maior numero, escreven<strong>do</strong> <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> estabelecimento<br />

<strong>do</strong> direito novissimo, limitam-se a afirmar que este<br />

po<strong>de</strong>r cabe ao papa e ao papa <strong>de</strong>via caber, afastan<strong>do</strong>-se assim cautelosamente<br />

<strong>da</strong> questno <strong>do</strong> antigui<strong>da</strong>dc d'este privilegio.<br />

Alguns d'elles, porém, ao mesmo tcmpo que d'c.jta formii o<br />

v80 inculcan<strong>do</strong>, citam exemplos <strong>de</strong> creayões <strong>de</strong> bispa<strong>do</strong>s feitas pelos<br />

bispos <strong>de</strong> Roma nos primeiros seis seculos <strong>da</strong> cgreja, sem fazerem<br />

caso <strong>de</strong> outras lembranças mais veneran<strong>da</strong>s d'esses tempos. 2.<br />

Eis-nos pois a braços com a maior difficul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a historia<br />

d'este capitulo <strong>da</strong> disciplina ecclesiastica <strong>da</strong> egreja catholica.<br />

A falta <strong>de</strong> critica em uns, a <strong>de</strong>fesa facciosa e pseu<strong>do</strong>-scientifica<br />

<strong>de</strong> um parti<strong>do</strong> exaspera<strong>do</strong> sempre nas suas preten~óes, a <strong>de</strong>ficiencia<br />

ultra-laconica, quasi mera afirmação, 'noutros, sáo tu<strong>do</strong> causas<br />

que concorrem para fechar mais as trbvas d'esta disputa.<br />

1 De controvers. christ. fi<strong>de</strong>i, cap. 24, coll. 2, prop. fiu.<br />

S. Beruar<strong>do</strong> escreveu no seculo XII :<br />

aPlenitu<strong>do</strong> siqui<strong>de</strong>m potestas siiper uriiversas orhis Ecclosias siiigulari<br />

praerogritiva apostolicae sedi <strong>do</strong>nata cst. Pot,est, si utilo judicarerit, novos<br />

ordinare episcopos, ubi hactenus nou fuerit.~<br />

2 Por ex.: Devot. Inst. Canonic. Lib. I, tom. 3, sec. I, § 18.


Como se tracta #uma questão, que é em parte a historia <strong>do</strong><br />

po<strong>de</strong>r papal, alem <strong>de</strong> se inflammarem to<strong>da</strong>s as paixóes e <strong>de</strong> se re-<br />

volverem os antigos odios <strong>de</strong> veihas conten<strong>da</strong>s, como tem <strong>de</strong> se<br />

argumentar com factos, e aquella historia 6 bem la<strong>de</strong>a<strong>da</strong> <strong>de</strong> abusos<br />

e virulentas ambições, os sophismas nascem <strong>de</strong>baixo <strong>do</strong>s olhos <strong>do</strong><br />

leitor imparcial <strong>de</strong> envolta com adulterac&s <strong>da</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>sneces-<br />

sarias e vis nas paginas <strong>de</strong> escriptos <strong>de</strong> homens aliás graves e<br />

eruditos.<br />

Vamos, pois, arma<strong>do</strong>s <strong>de</strong> paciencia e sem prevençào alguma, es-<br />

tu<strong>da</strong>r este ponto.<br />

A razáo em que se estribam é uma asserçso vaga,<br />

quasi incomprehensivel, e falsa á luz <strong>da</strong> histora.<br />

Porque a Se Romana 6 a Se Apostolica, e o successor <strong>de</strong> Pedro<br />

foi o unico que her<strong>do</strong>u este po<strong>de</strong>r universal que tinham os apos-<br />

tolos, por isso lhe pertence na egreja o direito <strong>de</strong> exigir, suppri-<br />

mir, unir e modificar os bispa<strong>do</strong>s 1.<br />

& espantoso e ao mesmo tempo ridiculo.<br />

Espantoso, porque assomhra esta ousadia com que escriptores<br />

<strong>de</strong> nome e saber se atrevem a cscrever estas puerili<strong>da</strong><strong>de</strong>s, como se<br />

estivessem compon<strong>do</strong> para recitar aos indigenas <strong>do</strong> Mexico nas<br />

suas missòes; - e ridiculo, porqiie se preten<strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r uma pre-<br />

rogativa tão importante como esta, s6 porque a ca<strong>de</strong>ira episcopal<br />

<strong>de</strong> Roma se chama ca<strong>de</strong>ira aioosiolica !<br />

Depois, é um ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro paralogismo : pois quem vos ha <strong>de</strong><br />

prestar f6, se quan<strong>do</strong> quereis dcmonstrar qiie o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> crear,<br />

supprimir e modificar os bispa<strong>do</strong>s pertence ao papa, v6s affirmaes<br />

gratuitamente que, primeiro exerci<strong>do</strong> pelos apostolos, s6 o succes-<br />

sor <strong>de</strong> Pedro her<strong>do</strong>u este po<strong>de</strong>r? Provae primeiro esse facto ; mos-<br />

trae-nos como s6 o successor <strong>de</strong> Pedro é successor <strong>do</strong>s apostolos,<br />

1 *Mais i1 faut bien remarquer, avec Suarez, que lea'ap8tres avaient une<br />

juridiction illimitke <strong>da</strong>ne toute I'Eqlise, mais seulement drs Bvêques, et que<br />

ersonne ne succ8<strong>da</strong> h aucun d'eux <strong>da</strong>ns leur juridiction sur tout l'univers.<br />

ee successeur <strong>de</strong> Pierre a seul hérit4 <strong>de</strong> ce pouvoir universel, et sou si6ge a<br />

toujours retenci le titre d'apostoliqiie. Voilh pourqixoi le Pape seul a droit<br />

<strong>da</strong>ns llkglise d'éiiger, <strong>de</strong> supprirner, d'unir ou <strong>de</strong> rnodifier les évêches, et si<br />

I'on voit intervenir dxiis ces sortes d'actes les rois, les empereurs et les autres<br />

souv~rainet6e temporelles, c'& uriiquement rn vertu <strong>de</strong> concessions faites<br />

par 19kglise <strong>da</strong>ns 15ntérêt même du gouveriiement spirituel.~ Ab. Andrb<br />

-Cours <strong>de</strong> Droit Can. vb. Evtehé.<br />

O abba<strong>de</strong> GIaire no seu Diction. Uniu. <strong>de</strong>s Scienc. dccleu. vb. k&ht?, copia<br />

textualmente esae trecho.


como é elle s6 que her<strong>do</strong>u esse privilegio, e ten<strong>de</strong>s ent8o sustenta<strong>do</strong><br />

o que preten<strong>de</strong>is. Antes d'isto não.<br />

Mas para que 6 esta cegiieira, esta ambi~ão parti<strong>da</strong>ria que distingue<br />

os que militam sob cstas turbuleritas ban<strong>de</strong>iras ? Para que<br />

precisaes dc sustentar d'este mo<strong>do</strong> caricato as prerogativas papaes,<br />

se ten<strong>de</strong>s o direito novissimo <strong>da</strong> egreja que ninguem vos po<strong>de</strong>rá<br />

contestar ?<br />

B que elles sentem bem a origem viciosa d'estes <strong>direitos</strong>; elles<br />

conhecem bem que uma frau<strong>de</strong>, ain<strong>da</strong> que o anathema venha<br />

<strong>de</strong>pois <strong>da</strong>r-lhe auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> e protegel-a, náo per<strong>de</strong> nunca o seu<br />

<strong>de</strong>feito primordial.<br />

& que elles comprehen<strong>de</strong>m a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> sanctificar esta<br />

instituiçáo <strong>do</strong> direito novissimo, pren<strong>de</strong>n<strong>do</strong>-a ao tcmpo <strong>da</strong> primitiva<br />

egreja; elles perccbem que é indispensavel, quanto antes, como<br />

que canonisar as <strong>de</strong>cretaes <strong>do</strong>s papas, monumentos historicos <strong>da</strong>s<br />

ambições formi<strong>da</strong>veis que em certo pcrio<strong>do</strong> <strong>da</strong> historia <strong>do</strong> papa<strong>do</strong><br />

o elevaram quasi a porito <strong>de</strong> esmagar o po<strong>de</strong>r temporal <strong>da</strong>s nações<br />

<strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.<br />

E é com abusos, com usurpações; 6 contra os canoncls, corit!<br />

a disciplina geral <strong>da</strong> primitiva egreja; a <strong>de</strong>speito <strong>da</strong> tradiçáo apostolica<br />

e <strong>da</strong>s palavras eloquentes <strong>do</strong>s padres qiie elles preten<strong>de</strong>m<br />

purificar este gran<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r que a legislação ecclesiastica <strong>de</strong>posita<br />

hoje entre as mãos <strong>do</strong> papa!<br />

falso dizer-se ~ U P s6 a egreja <strong>de</strong> Roma teve o titulo apostolica,<br />

porque to<strong>do</strong>s os bispos nos primeiros tempos se chamavam<br />

npostolos c srias sés apostolicas I, e náo s6 apostoli mas pontifices<br />

maximi, principes patrum, etc.<br />

Se ha ou náo razões <strong>de</strong> conveniencia que <strong>de</strong>vam reunir nas<br />

mnos <strong>do</strong> papa este po<strong>de</strong>r, 6 outra questão mui diversa <strong>da</strong> nossa:<br />

aqui tracta-se <strong>do</strong>s factos, <strong>do</strong> que 6 historico, <strong>do</strong> que foi; náo <strong>do</strong><br />

qiic pó<strong>de</strong> ser melhor ou <strong>do</strong> que <strong>de</strong>ve estabelecer-se; e não é assim<br />

que se <strong>de</strong>scobrem estas corisas.<br />

B preciso consultar os monumentos historicos, folhear mais <strong>de</strong><br />

uma vez as actas e disposições legislativas <strong>do</strong>s concilias, <strong>do</strong>s codi-<br />

1 Leia-se JosB Bingham nas 0d.q. Lib. 2.O, Cap. 2, 9 vil.<br />

Chamaram-se ain<strong>da</strong> Prepositi, Antistites, Principes Saoer<strong>do</strong>t,um, Summi Sacer<strong>do</strong>te.~~<br />

Papae, Patres patrum, Epiewpi Episwporum, Vicarii Christi, Angeli<br />

Eccleaiae, etc.<br />

A respeito <strong>do</strong>e metropolitas leia-se o 5 xxiv <strong>do</strong> Cap. 16.


gos <strong>da</strong>s egrejas, <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes, <strong>da</strong>s obras <strong>do</strong>s historia<strong>do</strong>res, e nso<br />

nos ficarmos extasia<strong>do</strong>s na contemplaç80 d'esta subtileza theologica<br />

<strong>de</strong> que a sk <strong>de</strong> Roma se chamava apostolica e este po<strong>de</strong>r era<br />

apostolico.<br />

O que até aqui temos escripto jíi em gran<strong>de</strong> parte respon<strong>de</strong> e<br />

resolve a meio esta questão.<br />

On<strong>de</strong> se diz nos canones que apresentámos e nos <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os<br />

concilios d'este perio<strong>do</strong> que pertence ao papa este privilegio ? On<strong>de</strong><br />

que na0 cabe ao syno<strong>do</strong> provincial e ao metropolita este direito?<br />

Mui pelo contrario: on<strong>de</strong> se não man<strong>da</strong> abertamente, como nos<br />

cariones <strong>de</strong> Africa; on<strong>de</strong> se n8o diz implicita e positivamente, como<br />

nos <strong>de</strong> Antiochia; on<strong>de</strong> se não reconhece a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> e competencia<br />

<strong>do</strong> syno<strong>do</strong> 'noutros objectos, ahi, ain<strong>da</strong> ahi, para quem meditar,<br />

percce <strong>da</strong>r-se por certo que o negocio não passa <strong>do</strong>s limites<br />

<strong>da</strong> provincia.<br />

A tradiçào apostolica, a disciplina mais geral e mais antiga sáo<br />

estas, e csta é a <strong>do</strong>utrina <strong>do</strong>s padres e a sua pratica.<br />

A egreja africana 6 nestes tempos respeitabilissima, tanto talvez<br />

como a <strong>de</strong> Roma, porque, se Roma tira o seu brilho <strong>do</strong> imperio,<br />

aquella vai ganhal-o com a successao <strong>do</strong>s varões mais distinctos<br />

d'estes seculos primeiros, que edificaram a egreja com sua<br />

voz eloquctite, com sua penna brilhante, com o exemplo <strong>de</strong> sua<br />

vi<strong>da</strong> e com o proprio sangue pa<strong>de</strong>cen<strong>do</strong> o martyrio e confessan<strong>do</strong><br />

a fk, e ultimamente com a victoria sobre as heresias mais tenazes<br />

que corroeram a paz e uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> catholicismo nos dias <strong>de</strong> sua<br />

infancia.<br />

As regras d'estes canones apparecem 'nelles não subitamerite<br />

para avivar disciplina, que o <strong>de</strong>suso apagasse, mas vem aos concilio~<br />

a proposito <strong>de</strong> conten<strong>da</strong>s, a respeito <strong>de</strong> cuja soluç8o os padres<br />

não trepi<strong>da</strong>m, e escrevem-se nas suas <strong>de</strong>terminações sómente<br />

para lembrar o que se <strong>de</strong>ve fazer por ser a melhor e mais antiga<br />

e rcspeitavel disciplina.<br />

Pouco importa! pois, que o canon mais claro seja <strong>de</strong> Africa, e<br />

não <strong>de</strong> um concilio ecumenico, porque ahi ou alem elle 6 o espelho<br />

fiel, que a historia nos guar<strong>da</strong>, <strong>do</strong> que geralmente se praticava<br />

então.<br />

E se esta disciplina fosse discor<strong>da</strong>nte <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> e regimen <strong>da</strong><br />

egreja 'nestas epochas, se <strong>de</strong>stoasse <strong>da</strong>s regras <strong>do</strong>s concilios emquanto<br />

á competencia e po<strong>de</strong>res <strong>do</strong>s syno<strong>do</strong>s e metropolitas, mui


em estavam; mas nâú 4 mim, como provamos, e como 6 ponta<br />

incontestavel para quem tenha leitura, airi<strong>da</strong> que curta, <strong>da</strong> historia<br />

(1~ primitiva egreja.<br />

E on<strong>de</strong> está o canon <strong>do</strong> concilio geral para oppbr a esses que<br />

cithmos e á historia e tradiçgo, o qual confira ao papa o po<strong>de</strong>r<br />

<strong>de</strong> crear, unir, supprimir e modificar as dioccses ?<br />

On<strong>de</strong> o costume ? On<strong>de</strong> a tradiç8o ?<br />

& isto o que se não <strong>de</strong>scobre, se não <strong>de</strong>scobrir& nunca, e o que<br />

s6 po<strong>de</strong>ria <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a opiniâo contraria á nossa.<br />

Mas o can. xxviir <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia, dir-nos-hão, nao dii a enten<strong>de</strong>r<br />

que Roma estava orna<strong>da</strong> <strong>de</strong> tantos privilegios, que a Faziam a primeira<br />

<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> christâo ?<br />

Tractemos este objecto com algum vagar.<br />

O can. XXVIII <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia diz :<br />

Sanctorum Patrum <strong>de</strong>creta uhique sequentes et canonem qui nuper<br />

lectus est, crntum et quinquaginta Dei amantissimorum Episco[~orllm<br />

agnoscentrs, ea<strong>de</strong>m qiioqiie et nos <strong>de</strong>cernimiis ac statuimus dc privi-<br />

legiis sanctiissimae Ecclesiae Constiintinopolis novae Romae. Etcniin<br />

antiquae Romae throno, quod urbs illa imperaret, jure Pâtr~s 11"vilegia<br />

tribueriint. Et ca<strong>de</strong>m consi<strong>de</strong>ratione moti centum quinquiigiiila<br />

Dei amantissimi Episcopi, sarictissirno novae Romae throno aequalia<br />

privilegia tribuerunt recte judicantes urbcm quae et imperio et senatu<br />

honorata sit et aequalibus ciirn antiquissima Regina Roma privilegiis<br />

fruatur, etiam in rebus Ecclesiasticis, non secus ac illam extolli ac magnifieri,<br />

secun<strong>da</strong>m post illam existentem: ut et Ponticae et Asianae et<br />

Ibraciae Dioecesis Metropolitani soli, proeterca et Episcopi pracdii 1'1rum<br />

Dioecesium, quae sunt inter Harbaros, à praedicto throno sanctis-<br />

simae Constantinopolitanae Ecclesiae ordinentur : unoauoaue scilicet<br />

praedictarum ~ioecesum Metropolitano cum prorinciae ~pisco~is ordinante.<br />

- auemadmodum divinis canonibus est traditum. Ordinari autem,<br />

sicut dictuui est, praedictarum dioecesum kletropolitanos a Constantinopolitano<br />

Episcopo convenientihus <strong>de</strong> more factis electionihus,<br />

et adipsum relatis. »<br />

A proposito d'este canon levantou-se uma grave disputa no con-<br />

cilio, os bispos lega<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Koma n8o queriam acceital-o, rcpu-<br />

tan<strong>do</strong>-o contrario aos canones <strong>de</strong> Nicea, e preten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> que os pa-<br />

dres o tinham approva<strong>do</strong> coactos e sem liber<strong>da</strong><strong>de</strong>; em uma pala-<br />

vra, repetiram-se estas scenas, communs a to<strong>da</strong>s as epochns, por-<br />

que em to<strong>da</strong>s as epochas os homens têm ti<strong>do</strong> d'estas fraquezas;<br />

o que, to<strong>da</strong>via, não impe<strong>de</strong> que os homens <strong>da</strong> egeja as não <strong>de</strong>-<br />

viem possuir.


Evi<strong>de</strong>ntemente, se Constantinopola, a nova Roma, a ci<strong>da</strong><strong>de</strong> reel,<br />

vai gozar por este canon <strong>de</strong> riovos e largos privilegios, e elles Iião <strong>de</strong><br />

scr eguacs aos <strong>de</strong> Roma, Roma já os tinha a este tempo, e tinha-os<br />

<strong>de</strong> lia muito, porque os seus lega<strong>do</strong>s appellavam para os canones<br />

<strong>de</strong> Nicca, que rriaii<strong>da</strong>ram conservar os antigos costumes.<br />

É incontestavel : mas, que privilegios eram esses que illustravam<br />

essa cgreja ?<br />

O costume s6 os estabelecera, e o primeiro concilio ecumenico<br />

os revali<strong>da</strong>ra sem os enumerar.<br />

Sabemos, comtu<strong>do</strong>, sem duvi<strong>da</strong> alguma quaes elles seriam, por-<br />

que este can. xxvirr, queren<strong>do</strong> elevar Constantinopola, aáo lhe pre-<br />

teri<strong>de</strong> <strong>da</strong>r mais nem menos <strong>do</strong> quc os <strong>de</strong> que Roma gosava.<br />


tincta <strong>de</strong> sua provincia, e que junctava a isto ser a capital <strong>do</strong> im-<br />

perio, em uma s6 palavra, ser Koma; necessariamente gosavtt d'este<br />

direito como as <strong>de</strong>mais, e na<strong>da</strong> admira que d'elle usasse, como o<br />

<strong>de</strong>ixa ver este canon, em to<strong>da</strong> a diocese polilica, isto 6, em certo<br />

numero <strong>de</strong> proviircias.<br />

Esta importancia, porem, náo esqueçamos, vcm-lhe to<strong>da</strong> <strong>do</strong><br />

la<strong>do</strong> <strong>do</strong> imperio, <strong>da</strong>s circumstancias politicas e temporaes <strong>da</strong> socie-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong>, e não que a egreja a quizesse assim distinguir e illustrar.<br />

k um facto <strong>de</strong> origem essencialmente profana, mas um facto<br />

mui antigo e que a egeja acceitou por essa mesma antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> e<br />

por esta influencia in<strong>de</strong>clinavel que sempre possuem as instiliiições<br />

seculares, e colossaes como o imperio, sobre est'outras <strong>de</strong> fórma<br />

menos concreta e apenas organisan<strong>do</strong>-se, como a egreja 1.<br />

Este mesmo privilegio era jB commum tí Alexandria, Antiochia<br />

e Jerusalem; náo era cousa propria, especial <strong>do</strong> bispo <strong>de</strong> Roma,<br />

por ser bispo em Koma 9.<br />

E se o bispo <strong>de</strong> Roma fruia maiores e mais preciosos privile-<br />

gios, porque o não diz, porque os náo pe<strong>de</strong> este can. xsviii para<br />

a nova Roma?<br />

Isto parece-nos <strong>de</strong>cisivo. A leitura <strong>do</strong> canon, a sua historia, tu<strong>do</strong><br />

nos convence <strong>de</strong> que Iloma não tinha tal privilegio.<br />

Canon nenhnm lh'o confere; e aquelles canoncs <strong>de</strong> Antiochia, <strong>de</strong><br />

que falámos, e que lembravam e revali<strong>da</strong>vam ns regras <strong>do</strong>s tipos-<br />

tolos, coexistiam com estes <strong>de</strong> Calcc<strong>do</strong>nin, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> assim cnten-<br />

<strong>de</strong>rem-se e completarem-se uns pelos outros. Iia mais.<br />

Seja qual for a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia, cano-<br />

nica, jaridicamente, & face <strong>da</strong> historia ninguem o recusoii nem<br />

po<strong>de</strong> recusar, e por isso o que vamos dizer eluci<strong>da</strong> inteiramente<br />

este objecto.<br />

'Neste concilio tracta-se, por mais <strong>de</strong> uma vez, <strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir se o<br />

esta<strong>do</strong> tinha ou não o direito <strong>de</strong> crear novas metropoles e paro-<br />

chias, e v&-se transluzir <strong>do</strong> que os padres dizem e <strong>da</strong> maneira por<br />

que redigem os canones, que, sem necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> intervençto <strong>do</strong><br />

papa, ellas podiam ser erectas. Conserva-se o antigo costume e<br />

1 Veja-se O can. VI <strong>de</strong> Nicea e os scholions not. e comm. <strong>do</strong>s canonistas ao<br />

mesmo.<br />

2 Episcopus Romanus nihilo magis quam alius quispiam solns ordinare<br />

poterat.~ Bingham, Orig. Lib. 2, cap. 10, 9 6."


este náo <strong>da</strong>va ao bispo <strong>de</strong> Roma tal direito, porque as metropo-<br />

les que primeiro houve na egreja, como a ca<strong>da</strong> pas, @O temos rc-<br />

peti<strong>do</strong>, não foram erigi<strong>da</strong>s por bullas <strong>da</strong> SE romana, mas nasce-<br />

ram sensim e <strong>da</strong>s circumstancias politicas <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> imperio,<br />

ao mesmo tempo que os antiqui mores pediam a concurrericia <strong>do</strong><br />

syno<strong>do</strong> e <strong>do</strong> metropolita para a erecção <strong>da</strong>s novas parochias.<br />

Quan<strong>do</strong> por estes canones se rjuizesse ver em Roma certa au-<br />

ctori<strong>da</strong><strong>de</strong> suprema 'neste objecto, essa conjectura (porque seria<br />

uma simples conjectura) nào podia ir albm <strong>de</strong> algumas provincias<br />

suburbicarias e <strong>do</strong> occidcnte, e nunca abranger o orbe to<strong>do</strong>, como<br />

preten<strong>de</strong>m; o que mesmo seria impossivel, porque annulla<strong>do</strong> ficava<br />

o can. XXVIII <strong>de</strong> que falamos, pois que o bispo <strong>de</strong> Constantinopola<br />

não gosaria dc nenhum d'esscs privilegias que lhe confere o canon ;<br />

o qual é perfeitamente incomprehcnsivel, suppon<strong>do</strong> que os privilegio~<br />

<strong>de</strong> Roma, a que se reporta, houvessem po<strong>de</strong>r sobre to<strong>da</strong> a<br />

cgeja catholica.<br />

Do can. VI <strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Nicea se <strong>de</strong>scobre claramente como,<br />

entre as prerogativas <strong>da</strong> SE romana, se não contava este direito <strong>de</strong><br />

participar soberanainente <strong>da</strong> divislo e <strong>de</strong>marcaçao <strong>do</strong>s limites <strong>da</strong>s<br />

parochias, ou dioceses <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o orbe.<br />

E, para não irmos <strong>de</strong>sacompanha<strong>do</strong>s <strong>de</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s 'neste grave<br />

assumpto, vamos citar uma <strong>do</strong>mestica, e por isso mesmo rara e<br />

curiosa.<br />

uEqui<strong>de</strong>m, diz o P." Antonio Pereira <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong>, si divisio et<br />

((<strong>de</strong>signatio Dioeceseon I'apae jure divino reservata esset. vel si ab<br />

uuno Papa ejusmodi divisio ct <strong>de</strong>signatio <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ret : cur, quaeso, Niucoeni<br />

Ptitres Canone VI ubi <strong>de</strong> limitibus et administratione Dioeceseon<br />

(~Xgypti, Orientis et coeterarum Christianariim agunt; non ad jus di-<br />

((vinum, non ad auctoritatem Komani Pontificis provocant, sed tana<br />

tummo<strong>do</strong> ad consuetiidinem vulgo receptam ?. .... . cur item Patres<br />

rConstantinopolitani Canone 11, ubi ean<strong>de</strong>m divisionem confirmant,<br />

unon alio nisi Canonum jure utuntiir I?»<br />

1 Tentarnen Theologicum. Para i, Princip. 1, n.O xrr, pag. 35, 1769.<br />

O caii. vir <strong>de</strong> h'icea B assim:<br />

~Antiyua consuetu<strong>do</strong> servetur per Aegyptum, Lybiam et Pentrtpolim, ita<br />

ut Alexandrinus Episcopus horum oinnium habeat potcstatcm. Quia et Urbis<br />

Romae Episeopo parilis mos est. Similiter auteiii et apnd Ailtiochiam,<br />

coeteras que Provincias, suis privilegia serventur Eeclesiis. Illud antem generalifer<br />

elarum est, yuod si quis praeter sententiam Metropolitani factus<br />

fuerit Episcopus ;-hunc magna Syiiodiis <strong>de</strong>finivit Episcopum esse non oporter?.<br />

Sui autem communi cunctorum <strong>de</strong>creto ratioiiabili, et secundrim Eccle-<br />

5


Se este privilegio era <strong>de</strong> tal mo<strong>do</strong> liga<strong>do</strong> ao Prima<strong>do</strong>, que se<br />

não po<strong>de</strong>sse separar, por que razão, pergunta este mesmo escriptor,<br />

'nesse can. ir <strong>de</strong> Constantinopola, cento e cincoenta padres estabe-<br />

leceram que, <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> <strong>de</strong> Koma, o bispo constantinopolitano teria<br />

a honra <strong>do</strong> prima<strong>do</strong> em segun<strong>do</strong> logar 7<br />

averumtamen, acaba aqiielle texto, Constantinopolitaniis Episcopus,<br />

uhabeat honoris primatum, post Komanum I.:piscopuin: propterea quod<br />

eurbs ipsa sit junior Roma.#<br />

Por que razão, perguntamos ain<strong>da</strong>, os padres respeitabillissimos'<br />

<strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia instituiram o bispo <strong>de</strong> Constalitinopola<br />

Patriarclia, ou Exarcha, <strong>de</strong> duas vastissimas tliocescs, apezar <strong>da</strong><br />

opposiçao vivissima <strong>do</strong>s lega<strong>do</strong>s <strong>de</strong> S. Leão papa ? Idque acewime<br />

olrluciunciibirs Legaíis S. Leowis Papae ?<br />

E ninguem ignora que este can., como muito bem nota o illus-<br />

tre padre Pereira <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong>, se perpetuo repugnasse Al~osío-<br />

licam Sc<strong>de</strong>m, frecslra repugnasse; poisque a honra por elle confe-<br />

ri<strong>da</strong> aos patriarchas <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> real foi sempre e conslanterrierite<br />

por elles exerci<strong>da</strong>.<br />

Apezar <strong>de</strong> tu<strong>do</strong> o que dissemos e expen<strong>de</strong>mos, pon<strong>de</strong>ram alguns<br />

escriptores que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o sexto seculo por <strong>de</strong>ante os factos pare-<br />

cem indicar a existericia d'estes litigiosos privilegias, exoriian<strong>do</strong> a<br />

ca<strong>de</strong>ira episcopal <strong>de</strong> Koma.<br />

Devot, nas suas Instit. Canonicar., escreven<strong>do</strong> que ao Summo<br />

Pontifice cabe o consagrar os .bispos, e erigir os bispa<strong>do</strong>s, unil-os<br />

cm um s6, ou repartil-os em muitos, cita o exemplo <strong>de</strong> S. Grc-<br />

gorio Magno, <strong>do</strong>s fins <strong>do</strong> seculo 6.O, no que d'elle rcfere Joáo Dia-<br />

corio na biographia d'esse homem illustre 1.<br />

siasticam regulam comprobato, duo aut tres, propter contentiones proprias<br />

contradicunt, obtincrtt sententia pliirimorum.~<br />

O can. 11 <strong>do</strong> 1.0 coricilio <strong>de</strong> Constaiitinopola diz :<br />

'Qrii sunt super Dioecesim Episcopi, riequaquam ad Ecclesias, qiise sunt<br />

extra praefixos sibi tcrmiiioa, acce<strong>da</strong>iit ; nec eas hac praesurnptione confun-<br />

<strong>da</strong>rit ; sed juxta canones Alexandrhus Antistes, quae suiit in Aegypto, regat<br />

solum mo<strong>do</strong>; et Orientis Episcopi Orientem tanturn guberneiit, servntis privi-<br />

legiis, quae Nicaenis Cauonibus Eccleaiae Antiochenae tributa sunt. Asia-<br />

iiae quoque Dioeceos Episcopi ea solum quae sunc in Asiana Dioecusi dis-<br />

pensent: necnou et Ponti Episcopi ea tantiim quae sunt in Ponto ; ct Thra-<br />

ciarum, quae in Thraciis sunt, gubernent ...... .<br />

1 Vita S. Gregoiii Magni, lib. 3, cap. 7 opp. S. Gregor. M. tom. 4.O, col.<br />

86, Paris, 1705.<br />

.Nam iit pauca <strong>de</strong> multis contiiigam, ex presbyteris Csrdinalibiis Eccle-


Thomassin gasta tarnbem um largo capitulo com a exposit$o<br />

<strong>de</strong> alguns factos, em que a aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> papa parece sobresahir<br />

com certo vulto.<br />

To<strong>da</strong>via, a quem observar <strong>de</strong>spreveni<strong>do</strong>, bcm <strong>de</strong>pressa sc paten-<br />

tear& que to<strong>do</strong>s estes excmplos são tira<strong>do</strong>s <strong>de</strong> factos quc se pas-<br />

sam ou nas provincias suburhicarias, ou nas missõtbs <strong>da</strong> Germania,<br />

ou <strong>do</strong>s anglo-saxões, ou nas Callias e Ilespariha, ain<strong>da</strong> que merios<br />

iiestas ultimas.<br />

V&-se j& por isto o <strong>de</strong>feito d'estc raciocinar, que s6 a incautos<br />

ou ignorantes po<strong>de</strong> pren<strong>de</strong>r.<br />

Com estes factos, poucos em numero, limita<strong>do</strong>s no espaço em<br />

qiie se dão, se preten<strong>de</strong> justificar uma prerogativa que podia es-<br />

ten<strong>de</strong>r-se a to<strong>do</strong> o orbc catholico; quan<strong>do</strong> era 'nestes tempos<br />

rnuilo mais dilata<strong>do</strong> para o oriciitc o ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro fhco <strong>do</strong> christia-<br />

nismo e para o norte <strong>da</strong> Africa ! Preten<strong>de</strong>-w isto quan<strong>do</strong> os cos-<br />

tumcs <strong>da</strong>s egrejas e os canones <strong>do</strong>s concilias <strong>do</strong>s fins <strong>do</strong> seculo<br />

anterior tãio expressa e geralmentc man<strong>da</strong>jam o contrario e pro-<br />

hibiam taes abusos !<br />

O illustre padre <strong>do</strong> Oratorio, não contente com <strong>de</strong>monstrar a<br />

disciplina <strong>do</strong>s primeiros seculos com factos só <strong>do</strong> rv F, v, vem agora<br />

dizer-nos qiie a disciplina <strong>da</strong> cgrcja catholica miidhra nos seculos<br />

VI, vil c vrri, porque assim o 1)rovam uns poucos <strong>de</strong> factos, pas-<br />

sa<strong>do</strong>s no occi<strong>de</strong>nte e lias missões <strong>da</strong> Gcrmanirr e <strong>da</strong> Inglaterra !<br />

Singular systerna este <strong>de</strong> estu<strong>da</strong>r a legislnqãio canonica, e ain<strong>da</strong><br />

mais singular a clara consciencia d'este liistoria<strong>do</strong>r !<br />

siae suae consecravit Epiwopos, Bonifacium Rhegii Habentium J'erusi et<br />

Douum Blessariae Siciliae. Ex Sul>diacouibiis vero, Gloriosurn Istriae, Festum<br />

Capnae, Petrum Trecas, et Castorium Arimini. At vero ex Monachis monas-<br />

terii sui, Marinianum Bavennae, Maximisnum Syraciisis et Sabinum Calli-<br />

poli, I'iaesules ordiuavit. Sed et Augustinum penes Anglos a Galliarum<br />

Episcopis ordinari praecepit. Per quem nihilominiis ad episcopatum iii caciem<br />

geiite Moriachi e.jusci<strong>de</strong> patrib, tempore diverso provecti sunt : Mellitiis,<br />

Juetus, Laurentius et Pauliiius. Solis diaconibus ~postolicxe Setlis snpw liac<br />

quo<strong>da</strong>rnrno<strong>do</strong> parte parcebat : quorum eum <strong>de</strong>cern et novem plt!riitudiiit: reduii<strong>da</strong>ret,<br />

ipse Bonifacium, Florentinum et Epiphaniuin coiisrc~ravit<br />

Cita ain<strong>da</strong> este escriptor, para exemplos <strong>de</strong> creagão <strong>de</strong> bispa<strong>do</strong>s lias Gallias,<br />

a Gregor. Turon. Histor. E'ranc. lib. 1, cap. 28, col. 23. Par. 1699. Hincniar<br />

llhein. Opusc. 24, cap. 16, pag. 431, tom. 11. Par. 1645.<br />

Notêrnos que estes factos são pela maior parte simples or<strong>de</strong>naç0es oii sagrsç0es<br />

<strong>de</strong> bispos e não claramente novas creaçGes <strong>de</strong> bispos, ou <strong>de</strong> bispa<strong>do</strong>s,<br />

<strong>de</strong> que ninguem po<strong>de</strong>r4 eontestm a Roina o direito <strong>de</strong> fazer, pois que, como<br />

vinios, o direito consueturliriario 111'0 couferira e o cita<strong>do</strong> can. <strong>de</strong> Calee<strong>do</strong>nia<br />

Ih'o revali<strong>da</strong>.<br />

. .


Singular, nBo ; n80 dizemos bem : commum, bem commum nos<br />

canonistas, quan<strong>do</strong> preten<strong>de</strong>m com a antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>r valor e re-<br />

speito ás usurpaç6es papacs, que os n3o têm por si tão s6s.<br />

Este diffuso auctor <strong>da</strong> I'cltis c Noua Disciplina, encontran<strong>do</strong>-se<br />

no meio <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s estes factos, <strong>de</strong> que para seu martyrio fizera a<br />

infeliz <strong>de</strong>scoberta, c sentin<strong>do</strong>-se aperta<strong>do</strong> pelo costume geral <strong>da</strong><br />

egreja, pelos cariones d'ella e pelo cspirito d'estes secuios, parece<br />

que, para cortar diíficul<strong>da</strong><strong>de</strong>s e sahir-se <strong>do</strong> embaraqo, dcii cguul<br />

valor aos factos consentaneos com o. cspirito c lciras diis leis e<br />

áquellcs, que na<strong>da</strong> mais eram <strong>do</strong> que puras infracyfics d'ellas ; -<br />

e porque <strong>de</strong> um la<strong>do</strong> lhe surgia Gregorio III a enviar a Boni-<br />

facio, seu lega<strong>do</strong>, instituir bispa<strong>do</strong>s ria Cprmariia, c <strong>do</strong> outro via<br />

ain<strong>da</strong> em certos conflictos appellar-se para o syno<strong>do</strong> e para o<br />

assentimerito <strong>do</strong> metropolita ; resolveu pelo niellior, o que vale<br />

não ter <strong>de</strong>sata<strong>do</strong> a contestaçâo: disse que eram precisos to<strong>do</strong>s<br />

tres.<br />

Não basta o syno<strong>do</strong>, 6 indispensavel o metropolitn ; não satis-<br />

fazem estes s6s, é essericial a intervenyão <strong>do</strong> pap~i. =\iii,I,i r130<br />

sacia<strong>do</strong> d'este amor <strong>de</strong> tornar complica<strong>do</strong> c solcmne est, {i, i i, o<br />

timi<strong>do</strong> professor, porque veiu a <strong>de</strong>scobrir Justiniano coristruin<strong>do</strong><br />

uma ca<strong>de</strong>ira episcopal na miseravel al<strong>de</strong>ia ondc nascera, exclama<br />

por fim: -NBo se podia tambem 'rirstc negocio prescindir <strong>do</strong><br />

consentimento <strong>do</strong> rei ! -<br />

Por egual systema <strong>de</strong> argumentação algum historia<strong>do</strong>r \ in<strong>do</strong>iiro<br />

<strong>da</strong> eschola d'este dirá, que critrc iiús dcsdc certo anno se permitte<br />

e usa o homicidio, porquc, revolveri<strong>do</strong> <strong>do</strong>cumcntos, soubc que<br />

Antonio assassinara a Francisco em tal <strong>da</strong>ta.<br />

Na historia <strong>da</strong> disciplina ecclesiastica é miii difficil escreler srm<br />

faltar it ver<strong>da</strong><strong>de</strong> e agra<strong>da</strong>n<strong>do</strong> a to<strong>do</strong>s. Tliomassin conseguiu-o,<br />

porbm, com o seu eclectismo falso e pueril. Isto explica porquc,<br />

<strong>de</strong>pois <strong>da</strong> publicação d'esta obra, este cscriptor foi tão queri<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

Roma e <strong>do</strong> rei <strong>de</strong> Franya, a ponto <strong>de</strong> aqurlla o chamar para si e<br />

o monarcha francez o nâo <strong>de</strong>ixar saliir <strong>do</strong> scu reino.<br />

O bom <strong>do</strong> timi<strong>do</strong> professor resolveu ain<strong>da</strong> este conflicto no estylo<br />

<strong>do</strong>s seus trabalhos <strong>de</strong> disciplina ecclesiastica: traduziu a obra para<br />

latim e offereceu-a ao papa.<br />

Emquanto aos exemplos extrahi<strong>do</strong>s <strong>da</strong> biographia e actos <strong>de</strong><br />

S. Cregorio Magno, são <strong>da</strong> mesma forma inconveriicntcmente cha-<br />

ma<strong>do</strong>s; porque, além <strong>de</strong> terem o <strong>de</strong>feito, que jh lhe nothmos, <strong>de</strong>


se passarem s6 em volta <strong>de</strong> Roma, na<strong>da</strong> provam exactamente por<br />

serem practica<strong>do</strong>s por S. Gregorio Magno.<br />

Este homem sombrio 6 o primeiro <strong>do</strong>s acerrimos propugna<strong>do</strong>-<br />

res <strong>da</strong> supremacia papal, o primeiro que acera o gume d'essa<br />

espa<strong>da</strong> terrivel que <strong>de</strong>pois ha <strong>de</strong> brandir satanicamente o pulso <strong>de</strong><br />

ferro <strong>do</strong> celebre Gregorio vrr, <strong>de</strong>positario e <strong>de</strong>fensor <strong>da</strong> uni<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> chrisláo na e<strong>da</strong><strong>de</strong> média.<br />

Este homem, se era o espelho <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s virtu<strong>de</strong>s, se a sua<br />

vi<strong>da</strong> era a pintura <strong>de</strong> humil<strong>da</strong><strong>de</strong>s e aberrações; comtu<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong><br />

se tocava no esplen<strong>do</strong>r <strong>da</strong> ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Roma, elle surgia tremen<strong>do</strong>,<br />

espuman<strong>do</strong> coleras e procuran<strong>do</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>l-a a to<strong>do</strong> o transe.<br />

Este homem, quc escrevia que a força viva <strong>da</strong> egreja era a in-<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia soberana <strong>do</strong> episcopa<strong>do</strong>, escondia-se com a confiança<br />

que ganhavam suas palavras humil<strong>de</strong>s, para chegar mais perto <strong>do</strong><br />

proprio episcopa<strong>do</strong> e nugmcntnr com os seus <strong>de</strong>spojos o brilho<br />

excessivo <strong>da</strong> Sé que occupava, hrilho que hoje quasi eclipso o cla-<br />

r80 <strong>do</strong> episcopa<strong>do</strong> sobre o occi<strong>de</strong>nte, ou que pelo menos o <strong>de</strong>ixa<br />

escondi<strong>do</strong> sob as cinzas <strong>do</strong>s inceiidios que produz 1.<br />

Como, pois, <strong>da</strong>r valor a estes factos pratica<strong>do</strong>s contra os cano-<br />

nes e a <strong>de</strong>speito d'elles ?<br />

On<strong>de</strong> o titulo d'estas prerogativas ?<br />

E quem ha ahi que ignore que 6 exactamente por estes tempos<br />

que se fazem as collecções latinas <strong>do</strong>s canones, se traduzem os ca-<br />

I Greprio I, o gran<strong>de</strong>, é um <strong>do</strong>s mais notaveis papas que conta a hiatoria<br />

<strong>da</strong> egreja. De gran<strong>de</strong> illustração, nasci<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma familia <strong>da</strong> classe <strong>do</strong>s pa-<br />

tricios, este hoinein singular foi sena<strong>do</strong>r e <strong>de</strong>pois prefeito ein Roma. O <strong>de</strong>s-<br />

prem pelas gran<strong>de</strong>zas <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> obrigou-o a retirar-se ao mosteiro <strong>de</strong> San-<br />

cto André, que elle man<strong>da</strong>ra edificar.<br />

Uiri <strong>do</strong>s sete discorios <strong>de</strong> Roma, nuncio em Constantinopla para iinpetrar<br />

o soccorro <strong>de</strong> Tiberio 11 contra 03 Lombar<strong>do</strong>s, secretario <strong>do</strong> papa Pelagio,<br />

Gregorio Magiio foi or<strong>de</strong>na<strong>do</strong> bispo <strong>de</strong> Roma no anno <strong>de</strong> 533, contra siia von-<br />

ta<strong>de</strong>, e <strong>de</strong>pois (lc ter fiigi<strong>do</strong> e se rscon<strong>de</strong>r para evitar o pontifica<strong>do</strong>.<br />

Aduls<strong>do</strong>r <strong>do</strong> podcr temporal <strong>do</strong>s reis, principalmente <strong>do</strong>s francews, <strong>de</strong><br />

quem dizia que o throno se erguia tanto acima <strong>do</strong>s outros, quanto acima <strong>do</strong>s<br />

vasuallos estavam os reis; elle corisi<strong>de</strong>rava essericirl a confirmaçfio <strong>do</strong> ponti-<br />

fica<strong>do</strong> pelos impera<strong>do</strong>res, compra<strong>da</strong> coin avulta<strong>da</strong>s sommaa <strong>de</strong> dinheiro.<br />

Foi a sua vi<strong>da</strong> <strong>de</strong> uina rigi<strong>de</strong>z espaiitosa; pobiissimo o seu passadio; se-<br />

vero o seu trftcto.<br />

Incansavel no cui<strong>da</strong><strong>do</strong> pelas cousas <strong>da</strong> egreja, assiduo no estu<strong>do</strong> <strong>da</strong> litte<br />

ratura e <strong>da</strong> disciplina, apaixona<strong>do</strong> pelo senti<strong>do</strong> mystico <strong>da</strong>s escripturas, mor-<br />

reu breve, gasto por tão duro viver e tão forte geuio.<br />

Se o <strong>de</strong>sprezo <strong>do</strong>s esplen<strong>do</strong>res mun<strong>da</strong>nos lhe fazia passar uma vi<strong>da</strong> simples<br />

e sem fausto, parece comtu<strong>do</strong> que essa mesma ari<strong>de</strong>z <strong>de</strong> espirito lhe concen-


nones gregos <strong>do</strong> oriente e <strong>de</strong> Africa, e apparecem os codigos <strong>da</strong>s<br />

egrejas ?<br />

Para que seriam estes trahalhos, perguntamos? era pura curiosi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

litteraria ou scientifica que os motivava?<br />

E 'riesses codigos n8o reapparecc a disciplina <strong>do</strong>s seculos ante<br />

riores, <strong>de</strong> lia <strong>do</strong>is dias, por assim dizer; porque em Africa no<br />

proprio sexto seculo sc repelem nos concilias os canones que citámos,<br />

e quc3 sào os proprios <strong>do</strong> seculo v apenas?<br />

On<strong>de</strong> estií, ao menos, uma <strong>de</strong>creta1 falsa ou ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira?<br />

Estes factos são, pois, abusos, são infraccaes, que tem a sua<br />

origtbm nas ambições <strong>do</strong>s bispos, n8o $6 em Roma, note-se bem,<br />

mas nas gran<strong>de</strong>s dioeeses <strong>do</strong> proprio oriente e <strong>do</strong> Egypto, e algumas<br />

~7es até sob o governo <strong>de</strong> varões que a rgreja canonisou e<br />

que, í~ <strong>de</strong>i~aram luminosa por seus escriptos admiraveis.<br />

k só dcpois <strong>do</strong> seculo v111 que este costumc adquire certa gc-<br />

nerali<strong>da</strong><strong>de</strong> e permanencia no occi<strong>de</strong>nte; e ate lil, esta simplcs con-<br />

suelutlo (se o cra), tào recente, tào contesta<strong>da</strong>, tno limita<strong>da</strong>, em<br />

guerra aberta com os proprios canones e disciplina <strong>do</strong>s primeiros<br />

dias, po<strong>de</strong>ria ser uma lei, uma lei geral para to<strong>da</strong> a egreln (.,I-<br />

tholica ?<br />

Quem o accreditarb?<br />

Da mesma forma que os canonistas dizem que o esta<strong>do</strong>, por tcr<br />

intervin<strong>do</strong> algumas vezes na erecção e divisão <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, infrin-<br />

giu, fazen<strong>do</strong>-o, as leis ecclesiasticas; o mesmo <strong>de</strong>vem dizer aqui <strong>do</strong><br />

papa, e dc maneira nenhuma <strong>da</strong>r a taes factos o valor exorbitantc<br />

que protendcm attribuir-lhes.<br />

trnva no intimo, prompta a surgir, a mais iracun<strong>da</strong> vehemencia contra os que<br />

preteiidiain usurpar-lhe a supremacia <strong>de</strong> sua egreja.<br />

Vi?-se <strong>de</strong> suas cartas a maneira como elle se levantou contra João, patriar-<br />

cha <strong>de</strong> Constantinopla, que queria usar <strong>do</strong> titulo <strong>de</strong> patriarcha universal.<br />

.Tu o sabes, escievin elle a um seu diacono, que estava na antiga EIyznn-<br />

zio, soffro por muito tempo com paciencia : mas, quan<strong>do</strong> resolvo não esperar<br />

mais, não ha perigo nenhum a que me não exponha livremente e com alegria<br />

para manter a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> pontifical..<br />

Veja a Epist. 1.' <strong>do</strong> liv. 7." <strong>da</strong>s suas.<br />

Comtu<strong>do</strong> este mesmo papa, quan<strong>do</strong> escrevia contra as pretenstes <strong>de</strong> Cons-<br />

tantinopla, dizia que se n&o podia <strong>de</strong>ixar no Olvi<strong>do</strong> que o concilio <strong>de</strong> Calce-<br />

<strong>do</strong>nia offerecera aos bispos <strong>de</strong> Roma o titulo <strong>de</strong> patriarchas universaes, mas<br />

que neiihiim d'elles houve que quizesse a<strong>do</strong>rnar-se <strong>de</strong> tão pesa<strong>do</strong> epitheto com<br />

me<strong>do</strong> que não parecesse querer attribuir-se a si só o episcopa<strong>do</strong> e roubal-o a<br />

seus iriniios.<br />

Este mesiiio padre B o primeiro papa que usa as expres<strong>de</strong>s bem conheci<strong>da</strong>s<br />

d~ ugerm eeruorum Dei..


$ tão ver<strong>da</strong><strong>de</strong> o que dizemos, que no proprio seculo n, apezar<br />

<strong>de</strong> j6 terem appareci<strong>do</strong> as falsas <strong>de</strong>cretiies, ain<strong>da</strong> se n8o reconhe-<br />

cia geralmente no papa o direito <strong>de</strong> erigir metropoles e crear bis-<br />

pa<strong>do</strong>s.<br />

Jo80 ix, nos começos d'esse seculo, instituiu uma metropole e<br />

trcs novos bispa<strong>do</strong>s nas terras <strong>do</strong>s sclavòes, que se tinham conver-<br />

ti<strong>do</strong> h fé catholica.<br />

Pheotmaro, primaz <strong>da</strong> egreja <strong>de</strong> Juvanense, e outros bispos alta-<br />

mente protestaram contra estes factos, como contrarios aos sanctos<br />

canoncs e absorventes <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> episcopal; o que se v6 <strong>da</strong><br />

epistola yue a este pontifice dirigiram 1.<br />

Von Espen escreve a este respeito%:<br />

*Hae querela Episcoporum <strong>de</strong> hac per Homaiiiim Pontificem facta<br />

ercctionc sat ostciidit, nondiim eo temporc gencralitcr agnilam fiiisse<br />

auctoritatem erigcndi Ecclesias Metropoliticas aut Cath're<strong>da</strong>lcs ad llo-<br />

manum Pontificem contra pristinum canoniim instituta e1 Ecclesiae<br />

corisuetudinem esse <strong>de</strong>volutam 3. n<br />

Duas palavras sobre a historia <strong>do</strong> crescimento <strong>do</strong> pnpa<strong>do</strong> at6<br />

iio scciilo ix acabarão <strong>de</strong> nos esclarecer este ponto.<br />

Quan<strong>do</strong> acima nothmos como <strong>de</strong>feito d'csta argumentaqào o sr-<br />

rcm lcmbrn<strong>do</strong>s factos crn limitii<strong>do</strong> numero e pela maior parte pas-<br />

sa<strong>do</strong>s nos suburbios <strong>da</strong> graridc ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, esquecen<strong>do</strong>-se o orieiite<br />

to<strong>do</strong>, nBo dcscobriamos inteiro o nosso pensamento.<br />

Não são s6 ns gran<strong>de</strong>s t\grejas riacioriacs <strong>do</strong> oriclntc c <strong>da</strong> Afrira<br />

septeritrional, que estes escriptores <strong>de</strong>ixam tsqueci<strong>da</strong>s: é o proprio<br />

occi<strong>de</strong>rite, é a mesina Italia, e na historia d'estas egrejas escori-<br />

1 Concil. General. coliim. 498, tom. 9.<br />

2 Tom. 1.0, 11. tit. XIX, cap. 2.O, n.O VIII.<br />

3 Os ino<strong>de</strong>rnos <strong>de</strong>fensores d'estas prerogativas papaes, escreven<strong>do</strong> sobre o<br />

jocllio, cnhem em singular contradicç~o.<br />

Uma <strong>da</strong>s primeiras razòes, por que clamam que ao papa <strong>de</strong>ve pertencer a<br />

crcaç50, união c separação <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, 6 a inexcedivel importancia d'estes<br />

objectos; e tanta consi<strong>de</strong>raçiio lhe dispensam, que d'ella partem como base<br />

<strong>de</strong> iiiducç8o historiea, para inferir que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o8 mais remotos aias <strong>da</strong> egreja<br />

so papa <strong>de</strong>vera ter pertenci<strong>do</strong> este direito.<br />

Se estc~ escriptores a30 sinceros, se conhecem o canon <strong>de</strong> Antiochia e sua<br />

origem c liistorirc, ccmo 6 que nào conce<strong>de</strong>m ao syno<strong>do</strong> provincial a resoluç%o<br />

d'estc assurnpto, negocio <strong>da</strong> provincin e que ii::o B proprio <strong>de</strong> certa arochia?<br />

Ou nAo sabem, ou estio <strong>de</strong> rn& f6, e cui<strong>da</strong>m que nos outroa haktn uma<br />

ignornncia tenebrosa.<br />

Veja Goschler, Diot. log. cit.


<strong>de</strong>m elles os factos numerosissimos, que revelam ião a suprema-<br />

cia papal mas rcluctancias e opposiçbes a essas pretensões.<br />

A conquista <strong>de</strong>finitiva <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r papal <strong>da</strong>ta súmrntc <strong>do</strong> seculo<br />

ix: atC. lá clle lucta, lucta esforça<strong>da</strong>mente, lucta teimosa, tenaz-<br />

mente, ao seu mo<strong>do</strong>, que 6 unico, exccpcional, caracteristico ria<br />

chroriica <strong>da</strong> humani<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

IIa mesmo aqui 'neste grandc facto uma força occulta, rima<br />

mysteriosa c sombria pre<strong>de</strong>stinaçlio, que dirige o singular appare-<br />

cimento d'csta instituição ingente, assombrosa, qiiasi sobre-hu-<br />

mana; tão poetica, tão puramente cclestial na i<strong>de</strong>a, qiie d'ella<br />

concebem os catholicos, quan<strong>do</strong> preten<strong>de</strong>m vel-a como <strong>de</strong>sabro-<br />

char <strong>de</strong> entre os suaves textos quc nos guar<strong>da</strong>m as palavras amo-<br />

rosas <strong>do</strong> Christo em tão solcmnc momento; e no mesmo tempo<br />

tão carrega<strong>da</strong> <strong>de</strong> &ombras, <strong>de</strong>senhan<strong>do</strong>-se com tão vigorosos traços,<br />

colorin<strong>do</strong>-se dc tno inflamma<strong>da</strong>s cores, nas paginas <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong>,<br />

variamente aprecia<strong>da</strong> pelos pensa<strong>do</strong>res.<br />

Por mais soli<strong>da</strong>mente fun<strong>da</strong><strong>da</strong>s que fossem a virtu<strong>de</strong> c humil-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> bispo <strong>de</strong> Roma, havia alli uma tentaçao, uma irifluericia<br />

superior, que se impunha.<br />

Os papas, naturalmente, por força <strong>da</strong>s circumstanciit.s, ailia-<br />

- vam-se, sentiam-se os <strong>de</strong>fensores <strong>da</strong> gran<strong>de</strong>za tradicional d'aquella<br />

ci<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Roma no sexto seculo junctava 6s memorias grandiosas <strong>do</strong> pas-<br />

sa<strong>do</strong>, ao po<strong>de</strong>r immenso que os seculos lhe tinham conqiiista<strong>do</strong> e<br />

reconheci<strong>do</strong>, a influencia e po<strong>de</strong>rio incipiente <strong>de</strong> uma <strong>da</strong>s mais<br />

notaveis sés <strong>do</strong> catholicismo triumphante ; e por isso mesmo c.sta<br />

Roma se sentia agora humilha<strong>da</strong> por ver outra ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> impe-<br />

rio qriasi a roubar-lhe o primeiro logar.<br />

Oppoz-se, oppoz-se com to<strong>da</strong>s as suas forças, usou <strong>de</strong> todns os<br />

meios, moveu guerras, protestou aos quatro vrntos <strong>do</strong> cCu, nunca<br />

reconheceu rasga<strong>da</strong>mente o man<strong>da</strong><strong>do</strong> d'aqiielle concilio <strong>de</strong> Calce-<br />

<strong>do</strong>nia; mas não logrou <strong>de</strong>struir sua irmã mais nova, porque a<br />

lucta, que encetara, era a lucta com o proprio imperio, o qual<br />

sustentava a Roma Junior com to<strong>da</strong>s as suas forças; e 'riella <strong>de</strong>-<br />

positava o pesa<strong>do</strong> mas glorioso encargo <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r cesariano, que<br />

agora <strong>de</strong>scia o throno <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Romulo para subir e se assen-<br />

tar no <strong>da</strong> <strong>de</strong> Constantino.<br />

Aqui a explicação <strong>de</strong> tu<strong>do</strong>.<br />

'Neste afan, com que Roma se precipita vehemente, colerica,


irascivel em a nova conquista <strong>do</strong> papa<strong>do</strong>, ha como que o saciar<br />

d'estes odios turbulentos que lhe vemos revolverem os padres <strong>de</strong><br />

Calce<strong>do</strong>nia, quan<strong>do</strong> exornam o patriarcha <strong>de</strong> Constantinopla <strong>da</strong>s<br />

maiores honras e distincções <strong>da</strong> egreja.<br />

O oriente oppunha-se-lhe ; escarnecia <strong>do</strong> seu po<strong>de</strong>r unico ; e<br />

roubava-lhe a sddc <strong>do</strong> podcr temporal, que por ventura um dia<br />

ella poddra her<strong>da</strong>r: d por isso que em sua mente nasce a id<strong>da</strong><br />

d'esta conquista ; é por isso que elle se arremessa sobre to<strong>do</strong> o<br />

occi<strong>de</strong>nte, prometten<strong>do</strong> a si mesmo ganhar-lhe o imperio.<br />

A empreza parece impossivel ; mas Roma, ain<strong>da</strong> que em ruinas,<br />

ain<strong>da</strong> que incendia<strong>da</strong> pelos barbaros, d scmpre Homa, um gran<strong>de</strong><br />

nome, uma gran<strong>de</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> sem egual, quasi uma personali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

viva, zomban<strong>do</strong> <strong>do</strong>s seculos, ingente, superior, incomprehensivel,<br />

, a rainha <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.<br />

Deixae passar os tempos, que a conquista ha <strong>de</strong> vencer-se ; e<br />

haveis <strong>de</strong> vel-a, ahi, no seciilo rx, coroan<strong>do</strong> a fronte com a tiara<br />

papal. .<br />

Diz um admiravel historia<strong>do</strong>r, e d uma gran<strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong> : -õ<br />

mun<strong>do</strong> antigo caminhava ent8o entre <strong>do</strong>us abysmos - a auto-<br />

cracia <strong>de</strong> um la<strong>do</strong>, <strong>do</strong> outro a thcocracia.<br />

Se com o estabelecimento <strong>do</strong> imperio em Constantinopla, Roma<br />

guar<strong>da</strong>sse para si o pren<strong>de</strong>r este laço moral <strong>da</strong> uni<strong>da</strong><strong>de</strong> politica,<br />

extinclo ficava este antagonismo, que tem si<strong>do</strong> na antigui<strong>da</strong><strong>de</strong>, e<br />

hoje vai sen<strong>do</strong>, a causa primeira <strong>de</strong> tantas turbações e tenebrosas<br />

luctas.<br />

Mas não; Roma e Constantinopola, ambas foram infieis ti sua<br />

id6a ; ambas se invejaram os proprios patrimonios.<br />

Constantinopola quiz ver d'entre as purpiiras imperiaes e <strong>do</strong> meio<br />

<strong>do</strong>s esplen<strong>do</strong>res orientaes o espectaculo tristissimo <strong>da</strong> consciencia<br />

religiosa esmaga<strong>da</strong> pelo podcr secular ; Roma, que segurava <strong>de</strong><br />

facto entre suas m3os a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> religiosa na consciencia <strong>do</strong><br />

mun<strong>do</strong> christão, cubiyou <strong>de</strong>scobrir <strong>do</strong> alto dc seu throno pol* li- .<br />

mites <strong>de</strong> seu po<strong>de</strong>rio, por confins <strong>de</strong> sua monarcliia theocratica,<br />

os proprios limites e confins <strong>do</strong> universo.<br />

& assim que surgem para aquella o schisma, uma escholastica<br />

risivel, que inva<strong>de</strong> os sumptuosos paços <strong>do</strong>s impera<strong>do</strong>res <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s<br />

esses sophismas que, na expressao <strong>de</strong> Castelar, só a cimitarra turca<br />

pô<strong>de</strong> cortar, -e que para estii riascem e se gravam nas paginas<br />

<strong>de</strong> sua chronica esses nomes gran<strong>de</strong>mente celebres <strong>de</strong> Gregorio-vn,


Innocencio III e Bonifacio VIII, e to<strong>da</strong>s essas facçâes que se<br />

chamaram realismo, gallicanismo, ou que se <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ram com as<br />

leis appelli<strong>da</strong><strong>da</strong>s josepliinas e leopoldinas.<br />

lf3 assim que se levanta esta espantosa contradicçao, que perturba<br />

a mente <strong>do</strong> historia<strong>do</strong>r, <strong>de</strong> ser Constantinopola a ci<strong>da</strong><strong>de</strong> christá<br />

nova, e Roma a velha ci<strong>da</strong><strong>de</strong> paga, e <strong>de</strong> Constantinopola guar<strong>da</strong>r<br />

na renascença a successáo <strong>da</strong> idka antiga, e Roma na e<strong>da</strong><strong>de</strong> media<br />

salvar a continui<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> novo.<br />

IIa um facto, que na opiniso <strong>de</strong> Guizot 6 o facto primordial <strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>sinvolvimento <strong>do</strong> papa<strong>do</strong>. Venci<strong>da</strong>, saquea<strong>da</strong>, queima<strong>da</strong> pelos<br />

Hcrulos, Van<strong>da</strong>los e Go<strong>do</strong>s, ltoma foi a unira ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, que nunca<br />

cahiu inteira e realmente sob o jugo germariico : seule elle resta<br />

romaine après la ruim <strong>de</strong> l'empire romain 1.<br />

A lucta entre os romanos <strong>do</strong> occi<strong>de</strong>nte e os barbaros vence<strong>do</strong>-<br />

res foi mui viva primeiro, latente <strong>de</strong>pois, at8 que se fundiram e<br />

harmonisaram linguas, costumes e religibs.<br />

'No mcio <strong>da</strong>s ruinas <strong>do</strong> imperio <strong>do</strong> occi<strong>de</strong>nte, Roma, como<br />

unico vestigio romano, foi naturalmente o centro moral, o sacra-<br />

rio <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as gran<strong>de</strong>s tradições <strong>do</strong> imperio, e assim algumGi ciillsi~<br />

como <strong>de</strong> <strong>de</strong>positaria <strong>de</strong> uns restos <strong>de</strong> soberania nacional e polilica.<br />

'Neste meio surgiu o papa<strong>do</strong> ; 'nelle cresceu e averiguou.<br />

Por fins <strong>do</strong> scculo v111 este po<strong>de</strong>r esttí proxirno <strong>de</strong> seu maior<br />

esplen<strong>do</strong>r ; a coiisciencia <strong>do</strong>s povos attribue <strong>de</strong> facto ao papa uma<br />

ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira supremacia religiosa sobre to<strong>do</strong>s os outros bispos ; os<br />

peregrinos <strong>de</strong> Roma alcan~avam indulgencias ; estas perigi.iria*iles<br />

eram chama<strong>da</strong>s pie<strong>do</strong>sas e meritorias; e os proprios reis c serihores<br />

ri30 percebiam tributos na passagem d'cstrs homens por suas<br />

terras. O bispo <strong>de</strong> Roma começa agora a iisar e a consrritir qiic<br />

o chamem com titulos revela<strong>do</strong>res <strong>de</strong> superiori<strong>da</strong><strong>de</strong>, e que sú i~ vlle<br />

se dirigiam 3.<br />

1 Giiizot, Histoire <strong>de</strong> 2a ciwilis. en France. Par. 1829, tom. 3.0, 2.0m~ lec.<br />

2 E muito frisante o seguinte exemplo, trauscripto por Guizot no logar já<br />

cita<strong>do</strong>:<br />

Alcuin, favorito <strong>de</strong> Carlos Maano, escrevia em 796 ao papa Leão 3.0: -<br />

Trb-saint père, pontife d2u <strong>de</strong> Dieu, vicaire d ~8 apôtvea, hdritier <strong>de</strong>8 pères,<br />

prince <strong>de</strong> I'Egliae, gardien <strong>de</strong> la se<strong>de</strong> colmbe sane tache ......<br />

Em 794 escrevera este mesmo Alcuin a Adriano 1.O:- Trka.excellentpkre<br />

comme je te reconnainpour vicai7.e dn bienheureux Pierre, prince <strong>de</strong> apôtres,<br />

je te rcgar<strong>de</strong> comme hériticr <strong>de</strong> sa miracztleuse puissnnce.<br />

.A wup sQr, accrescenta Guizot, il ne faut point prendre ces ezpressions<br />

Zs ta Zettre; i2 ne faut point croire que Ze pape pos8éddt dum toute sa gran-


Mas tu<strong>do</strong> isto parte s6 <strong>do</strong> occi<strong>de</strong>nte para Roma; tu<strong>do</strong> isto<br />

cresce vagarosamente, e vai augmentan<strong>do</strong> ate ao seculo IX; v&-se<br />

que nfio podc tar<strong>da</strong>r o apparecimento <strong>de</strong> um titulo juridico, posi-<br />

tivo, legal, em que se baseie il luz <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> esta supremacia já<br />

existente <strong>de</strong> facto no poente <strong>do</strong> orbe christão.<br />

Esta a explicação <strong>do</strong>s factos, que parecem <strong>de</strong>monstrar o direito<br />

papal, existente jli 'neste perio<strong>do</strong>, antes <strong>do</strong> apparecimento <strong>da</strong>s fal-<br />

sas <strong>de</strong>cretaes.<br />

A historia particular <strong>da</strong>s egrejas nacionaes mostra bem, por<br />

outro la<strong>do</strong>, a causa <strong>do</strong>s factos oppostos a estes, e que, em maior<br />

numero, posto que parcialmente esqueci<strong>do</strong>s, parecem contradi-<br />

ctal-os. Eram jli organisa<strong>da</strong>s as egrejas <strong>da</strong> Italia, a hespanhola,<br />

a gallo-franca, e começavam as missões na Germania e entre os<br />

anglo-saxões.<br />

A cgrcja lombar<strong>da</strong>, 6s portas <strong>de</strong> Roma, resistiu sempre acer-<br />

rimamente 6s pretensóes <strong>do</strong>s papas; e 6 só quan<strong>do</strong> Pepino e Carlos<br />

Mag110 <strong>de</strong>stroem os seus reis, se apo<strong>de</strong>ram <strong>de</strong> seus territorios e<br />

d'elles fazem as celebres <strong>do</strong>ações aos papas, que estes começam a<br />

gozar ahi <strong>de</strong> seus privilegios.<br />

Os lega<strong>do</strong>s dc Roma, nas longinquas missões, como que adqui-<br />

riam para esta cgreja os novos fieis; as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s obrigavam-<br />

rios mesmo a insiituir novas dioceses para bem commum <strong>do</strong> cn-<br />

tholicismo, e a dcixar aqui e alcm novos bispos, como outr'ora<br />

acontecera com os apostolos e os prcsbyteros nas primeiras evan-<br />

gelisações.<br />

Mas tu<strong>do</strong> isto eram factos, que as forças <strong>da</strong>s circumstancias ex-<br />

plicavam, e que, nem mesmo assim, se passavam sem reluctancias,<br />

como acima notámos, e como com mais <strong>de</strong> um exemplo podkra-<br />

mos provar.<br />

A anarchia <strong>do</strong> systema feu<strong>da</strong>l, as successivas invasões, as guer-<br />

ras tcrriveis <strong>do</strong>s differcntes povos conquista<strong>do</strong>res entre si, nilo <strong>de</strong>i-<br />

xavam quc o episcopa<strong>do</strong>, aqui persegui<strong>do</strong> pelo paganismo <strong>do</strong>s ven-<br />

<strong>de</strong>ur leporvoir qu'elles luâ attribuent, maia ellea attestent quelle 8uprkmatie ré-<br />

ligibuse, morale, i1 possidd <strong>de</strong>jà <strong>da</strong>na lu penske ddrs peuplea.~<br />

Notemos ain<strong>da</strong> que estes acontecimentos passam-se especialmente <strong>do</strong> se-<br />

culo v111 por <strong>de</strong>ante, e no occi<strong>do</strong>nte só, on<strong>de</strong> a ignorxncia era crassissima en-<br />

tre o povo, os reis, os senhores e na maior parte <strong>da</strong> classe clerical.<br />

As <strong>de</strong>cretaes falsas, 'nesta occasiiio, nrio tar<strong>da</strong>tn urn momento ; em breve<br />

v80 apparecer anonymas e subjugar atrevi<strong>da</strong>s a intelligencie humana por<br />

oito seculos.


ce<strong>do</strong>res, alli entranha<strong>do</strong> no revolutear <strong>da</strong>s pelejas, se oppozesse<br />

a estas practicas abusivas e absorventes <strong>de</strong> sua digni<strong>da</strong><strong>de</strong> e sobe-<br />

rania.<br />

Assim a erecçiio <strong>de</strong> novos bispa<strong>do</strong>s nas miss6es foi sempre um<br />

facto sui generis, excepcional, que a evre'a mais ou menos accei-<br />

b J<br />

tou. On<strong>de</strong>, porém, os papas acharam mais resistcncia, on<strong>de</strong> mais<br />

<strong>de</strong> ama vez se viram obriga<strong>do</strong>s a baixar a fronte e humilhar-se<br />

para po<strong>de</strong>rem conseguir seus intentos, foi nas duas gran<strong>de</strong>s egre-<br />

jas <strong>da</strong>s Hespanhas e <strong>da</strong>s Gallias.<br />

'Nesta ultima, a administração ecclesiastica estava em to<strong>da</strong>s as<br />

suas repartiçóes entregue aos clerigos nacionacs e <strong>de</strong>lega<strong>do</strong>s <strong>do</strong><br />

po<strong>de</strong>r temporal.<br />

Os papas nenhum po<strong>de</strong>r tinham 'nestes ncgocios; e se alguma vez<br />

intervinham, é porque os reis assim o queriam, sen<strong>do</strong> essa interveii-<br />

$80 meramente consultiva ; niio convocavam os concilios nacionaes<br />

<strong>da</strong>s egrjas; não tinham 'nellas po<strong>de</strong>r algum temporal: muito<br />

pelo contrario, precisakam <strong>da</strong> confirmaçlío <strong>do</strong>s impora<strong>do</strong>res para<br />

CIO raro OS<br />

efficazmerite sc a<strong>do</strong>rnarem <strong>do</strong> supremo pontifica<strong>do</strong>, c n-<br />

encontramos confessan<strong>do</strong> a sua submissão As <strong>de</strong>terminaçòclh <strong>da</strong>s<br />

capitulares, leis e <strong>de</strong>cretos imperiaes 1.<br />

Começavam por estes tempos os bispos a ter gran<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r e<br />

influencia na politica <strong>da</strong>s nações ; o esta<strong>do</strong> clerical crescia em ri-<br />

quezas c iriflucncia; os concilios eram importantcs ass_embléas<br />

aristocraticas, e mais <strong>de</strong> uma vez sua voz se elevou contra as pre-<br />

tensbes <strong>do</strong>s papas.<br />

Se, to<strong>da</strong>via, isto se passava nas alturas <strong>do</strong> governo politico e<br />

na aristocracia <strong>do</strong> clero e <strong>do</strong>s senhores, diverso era, como 110th-<br />

mos, o que ac,ontccia entre o resto <strong>da</strong>s populações e na parte<br />

moral e religiosa <strong>da</strong> sua supremacia. Ahi crescia, crescia latente,<br />

progressivameritr, cm esphern unicamente i<strong>de</strong>al, e que a espa<strong>da</strong> <strong>do</strong><br />

seculo não podia tocar sem nefan<strong>do</strong> saçrilegio.<br />

Qiian<strong>do</strong> assim se levanta na consciencia <strong>do</strong>s povos um po<strong>de</strong>r<br />

moral, com tarito vigor, com tanta generali<strong>da</strong><strong>de</strong>, espontaneo, in-<br />

volto em certo terror religioso; não tar<strong>da</strong> muito a <strong>de</strong>scer d'essas<br />

eminencias para tomar um corpo no mun<strong>do</strong> real e objectivo ; e<br />

1 Leão 3.0 escrevia ao impera<strong>do</strong>r :<br />

.Nos si incompetenter aliquid egimne, et in subditis justae legis tramitem<br />

iion conservavimus, vestro ac missorum vestrorum c~incta volumus emeu-<br />

<strong>da</strong>re judicio :.D Caus. 2.", Quest. LI, Can. XLI; e veja-se ain<strong>da</strong> a Distinc. x.


muito mais necessaria se faz esta concretisação, quan<strong>do</strong>, como<br />

'nestas cpochns, a ignorancia pezava nos espiritos obscureci<strong>do</strong>s, a<br />

supcrsti~ao siibstitiiia as crenças puras e intelligentes ; as fórmas<br />

<strong>da</strong> go~ernaq$o politica temporal eram incertas, unicamente pra-<br />

ticas, ohc<strong>de</strong>ccn<strong>do</strong> a um instincto ou h força <strong>da</strong>s circumstancias,<br />

c a idéa dc soberania e a distiricção <strong>do</strong> podcr temporal e espiri-<br />

tual não surgia ain<strong>da</strong> clara na iritelligencia <strong>do</strong>s povos, <strong>de</strong>sacostu-<br />

ma<strong>do</strong>s <strong>da</strong>s theorias.<br />

Em quanto este espantoso phenomeno avultava, moven<strong>do</strong>-se por<br />

si, e crescia <strong>de</strong>smedi<strong>da</strong>mente com o terminar <strong>do</strong> seculo viii; os<br />

papas, na esphera temporal, postoque já meio e indirectamente<br />

conquista<strong>da</strong>, iam soffreii<strong>do</strong> revczes, pacirntes, perseveran<strong>do</strong>, pro-<br />

testan<strong>do</strong> aqui contra as opposições <strong>do</strong>s bispos nacionaes, confes-<br />

san<strong>do</strong> alli a svperiori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s <strong>de</strong>cretos imperiaes, aproveitan<strong>do</strong>-se<br />

<strong>do</strong> referver <strong>da</strong>s paixões <strong>do</strong>s reis para <strong>da</strong>r auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> ao seu po-<br />

<strong>de</strong>r, <strong>de</strong>scasan<strong>do</strong>-os ou casan<strong>do</strong>-os <strong>de</strong> novo, em vi<strong>da</strong> <strong>da</strong>s outras es-<br />

posas ; ingerin<strong>do</strong>-se nas disputas <strong>da</strong>s familias reaes, e procuran<strong>do</strong><br />

conciliar os paes e os filhos, quan<strong>do</strong> a discordia os separava; em<br />

uma palavra, promptos a avançar quari<strong>do</strong> a inadvertencia <strong>do</strong>s se-<br />

nhores e <strong>do</strong>s reis Ihes abria logar on<strong>de</strong> coubesse a sagra<strong>da</strong> mão<br />

poritifical.<br />

Tii<strong>do</strong> isto, porem, se era rcalmcntc existente, nao era ain<strong>da</strong><br />

ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente positivo, e o tempo ?ão corria fagueiro para<br />

abstracções metaplijsicos, nem concepçòes tlieoricas e itlcaes.<br />

Os escriptores falam <strong>da</strong> crença, que vivia na tradição <strong>do</strong>s povos,<br />

<strong>de</strong> que acima <strong>do</strong>s papas liavia alguma cousa <strong>de</strong> mais sancto <strong>do</strong><br />

que a vonta<strong>de</strong> pura d'elles ; - os antigos carioiies e disciplina,<br />

esses echos perdi<strong>do</strong>s <strong>da</strong> voz <strong>do</strong>s padres imita<strong>do</strong>res <strong>do</strong>s apostolos,<br />

tu<strong>do</strong> isso, mas confuso, vago, in<strong>de</strong>ciso e que pesava na,intima<br />

consciencia c lembrança <strong>do</strong>s homens religiosos.<br />

V&-se, sente-se que vai apparecer, ao fin<strong>da</strong>r <strong>do</strong> seculo vrri, um<br />

titulo positivo <strong>do</strong> podcr j6 ganho <strong>do</strong> papa<strong>do</strong> suprcmo; e pcrce-<br />

be-sc lambem que esse titulo, ou não lia dc ter valor, ou ha <strong>de</strong> ir<br />

pren<strong>de</strong>r-sc na alta antigui<strong>da</strong><strong>de</strong>, trazer aos ollios <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, bem<br />

<strong>de</strong>fini<strong>do</strong> e claro, o que o mun<strong>do</strong> entrevia <strong>do</strong> meio <strong>da</strong>s sombras<br />

que lhe envolviam a mente mergulha<strong>da</strong> rias pcriumbras <strong>da</strong> igrio-<br />

rancio, s6 alumia<strong>da</strong> a espaços pela frouxa luz <strong>da</strong> tradição incon-<br />

sistente.<br />

Eis aqui, pois, como não <strong>de</strong>vemos estranhar o <strong>de</strong>pararmos na lei-


tura <strong>da</strong> historia d'estes seculos com factos, que se nos offerecem<br />

contradictorios e iiiconciliaveis ao primeiro aspecto 1.<br />

Vamos agora <strong>de</strong>sinvolver a t,erceira parte d'este capitulo, -<br />

provar como não tomavam parte 'neste objecto os reis, ou impe-<br />

ra<strong>do</strong>res 9.<br />

1 Guar<strong>da</strong>mo-nos para a 2.' parte d'eate trabalho, emquanto ao esta<strong>do</strong> <strong>da</strong>s<br />

relages <strong>da</strong> egrcja hespariliola com a roniana.<br />

2 Bem sabemos n6s que ccrto iiuinero <strong>de</strong> indivicluos nos hão <strong>de</strong> perguntar,<br />

se, no meio <strong>de</strong> tantas duvi<strong>da</strong>s e contradicçtes, a origem divina <strong>do</strong> papa<strong>do</strong> iião<br />

ser8 seguro caminho?<br />

Enten<strong>da</strong>mo.nos.<br />

NBo pscrevemos aqui influi<strong>do</strong>s por crenças catholicas, nem por <strong>de</strong>screnças<br />

acatholicas.<br />

Se fosse um objecto ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente organico e que as leis ecclesiasticas<br />

estabelecessem, esse seria o nosso ponto <strong>de</strong> parti<strong>da</strong> ; mas, longe <strong>de</strong> ser <strong>de</strong>termina~%~<br />

<strong>da</strong> lrgislação canonica, 8 elle um objecto esseiicialmente <strong>do</strong> intimo<br />

fôro, <strong>de</strong> pura crença, pois que se pren<strong>de</strong>, fora <strong>do</strong> campo profano <strong>da</strong> historia,<br />

em factos sobrenaturaes, ao amago mesmo <strong>da</strong> religiko c <strong>da</strong> revelaçào.<br />

NBo escrevemos para catholicos, riem para protestantes : prociiramos sdmente<br />

a pureza <strong>da</strong> legislaçiio catholica <strong>da</strong> egreja christii; e por isso não tocamos<br />

'nesse melindroso objecto, iicm, com o que dizemos, o enppomos oii esquecemos<br />

e contrariamos; porque iião 6 condição sine qua non <strong>da</strong> suprri~iaci;~ papal<br />

<strong>de</strong> origem divina, pertencer-lhe, ou ter-lhe pertenci<strong>do</strong>, mais este oii acliic~lle<br />

direito no capitulo <strong>de</strong> pura disciplina.<br />

Po<strong>de</strong> conceber-se no campo <strong>da</strong>s crençes catholicas a ori ein divina <strong>do</strong> papa<strong>do</strong>,<br />

e ao mesmo tempo admittir-se qiie nos primeiros secu 7 os não pertencera<br />

ao papa, entre outros privilegio.;, o dc que tractamos.<br />

A essencia <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r papal, na opiniào catliolica, não é este ou aquelle direito<br />

<strong>de</strong> rnrra disciplina : 6 um podcr espiritual, 6 cei ta supremacia rnoral,<br />

qiiasi divina, to<strong>da</strong> <strong>de</strong> amor, to<strong>da</strong> <strong>de</strong> paz; nâo <strong>de</strong>stina<strong>da</strong> a seccar as fontes exuberantes<br />

<strong>da</strong> vi<strong>da</strong> local <strong>da</strong> egreja, mas pmposta para as alimentar~l~ conservação<br />

<strong>da</strong> uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> fé e pureza <strong>do</strong>s costumcs e disciplina; e a isciplina<br />

pura, no ohjecto <strong>de</strong> que escrevemos, é exactamente a que apontamos, e ~iào a<br />

que actualiiiente se preten<strong>de</strong> sustentar e 6 lei.<br />

Note-se mais aue não arrrumentamos com simples factos <strong>de</strong>spi<strong>do</strong>s <strong>da</strong> alictori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

legal cia cgreja: -quem assim argume;ta são os prop;ios auctores<br />

ecclesiasticos: baseamos to<strong>da</strong>s as nossas asserpões na letra <strong>do</strong>s proprios CBnoiie.;,<br />

rios dictarnes <strong>da</strong>s epistolas <strong>de</strong>cretaee <strong>do</strong>s papas, e nas pa$nas <strong>do</strong>e escriptos<br />

tlos padres mais veneran<strong>do</strong>s e contemporaneos <strong>do</strong>s acontecimentos, que<br />

iiarrainos c <strong>do</strong>s factos que procuramos <strong>de</strong>scobrir.


Tnmbem aqui não encontramos um texto <strong>de</strong> lei expresso, que<br />

directa e terminantemente resolva o assumpto; mas, note-se, nem<br />

por isso é menos positiva a regra <strong>de</strong> disciplina goveriia<strong>do</strong>ra <strong>do</strong><br />

assumpto.<br />

A legislação canonica tem isto <strong>de</strong> especial: náo offerece este<br />

aspecto geral, syrithetico e sgstematico, que estamos acostiima<strong>do</strong>s<br />

a <strong>de</strong>scobrir nas legislaçòes contemporaneos; C casuistica; os seus<br />

canones fazem-se, nào para crear novas <strong>de</strong>terminaç~cs, mas para<br />

avivar costumes, praxes geraes, com tanta aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong>, porem, como<br />

as mais categoricas leis mo<strong>de</strong>rnas <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> civil.<br />

& a gran<strong>de</strong> influencia tradicional <strong>do</strong>s seculos primitivos, que<br />

mais dc uma vez temos feito notar com insistericia, e que nunca<br />

advertiremos <strong>de</strong> sobejo.<br />

Não hesitou a egreja em se julgar supremo juiz d'estcs negocios,<br />

e E só <strong>de</strong>pois d'rstes tempos que os <strong>de</strong>fensores <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> c pri-<br />

vilcgios <strong>do</strong>s reis, os rcalistas ou regalistas, preten<strong>de</strong>m conferir-lhe<br />

este po<strong>de</strong>r.<br />

Temos mesmo a felici<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> eiicoiitrar bem clara a <strong>de</strong>finiçáo<br />

<strong>da</strong> egrcja 'rieste ponto <strong>de</strong> sua disciplina.<br />

No ncto quarto <strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Calcc<strong>do</strong>nia foi <strong>de</strong>cidi<strong>da</strong> uma ce-<br />

lebre quest'io, em cujo <strong>de</strong>bate os padres estiibelccerum bem ter-<br />

minaritcs os principias relativos a estes objeclos.<br />

A conten<strong>da</strong> <strong>da</strong>va-se entre <strong>do</strong>is bispos, l'liocio <strong>de</strong> Tyro e Eus-<br />

tathio <strong>de</strong> Beryta, Acerca <strong>do</strong> direito metropolitico <strong>da</strong> alta Phe-<br />

riicia.<br />

Acoriteccra que, por uma pragmatica <strong>do</strong> impera<strong>do</strong>r Lelo Be-<br />

rytn, I'ora eleva<strong>da</strong> a metropole civil, preten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> por esta occasiáo<br />

o bispo d'esta ci<strong>da</strong><strong>de</strong> ter si<strong>do</strong> por este facto eleva<strong>do</strong> h digni<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> metropolita.<br />

O conllicto tinha-se aggrava<strong>do</strong> muitissimo, porque Eustathio oc-<br />

cupara logo na quali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> metropolita algumas <strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong><br />

diocrse <strong>de</strong> Phocio.


Para <strong>da</strong>r vali<strong>da</strong><strong>de</strong> a esta <strong>de</strong>smembra~ão, Eustathio preten<strong>de</strong>ra e<br />

obtivera dc Phocio, que este subscrevrsse ft effecliia<strong>da</strong> <strong>de</strong>smembraçao<br />

<strong>de</strong> sua dioccse, <strong>da</strong>n<strong>do</strong> assim uma prova irrecusavel <strong>da</strong> renuricia<br />

<strong>de</strong> seus <strong>direitos</strong>.<br />

Phocio vinha agora dizen<strong>do</strong> que subscrevera contra sua vonta<strong>de</strong>,<br />

coagi<strong>do</strong> c com me<strong>do</strong> <strong>da</strong>s minas, metil mirtarzrm, por temer que<br />

o accusassem <strong>de</strong> <strong>de</strong>sobediencia, ou <strong>de</strong> menos respeito aos man<strong>da</strong><strong>do</strong>s<br />

<strong>do</strong> po<strong>de</strong>r civil.<br />

Phocio, ao que parece, era um pobre homem,.que, ven<strong>do</strong> agora<br />

reuni<strong>do</strong> um concilio ecumenico, se lembrara <strong>de</strong> impetrar <strong>do</strong> impera<strong>do</strong>r<br />

liceriça para submettcr ao juizo <strong>do</strong> concilio as suas meticulosas<br />

pretensões, cui<strong>da</strong>n<strong>do</strong> 16 no intimo qiie o impera<strong>do</strong>r se não<br />

atreveria a combater frente a frente o po<strong>de</strong>r immenso <strong>da</strong> egreja<br />

congrega<strong>da</strong>.<br />

Elabora com effcito um libello, no qual expõe as circumstancias<br />

em que assignara, e leva-o ao impera<strong>do</strong>r, jft <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> reuni<strong>do</strong> o<br />

concilio, para lhe pedir que consentisse na apresentação <strong>do</strong> negocio<br />

6 <strong>de</strong>cisào <strong>do</strong>s pedrcs.<br />

Como o impera<strong>do</strong>r annuisse, Wocio rogou a leitura <strong>do</strong> referi<strong>do</strong><br />

libello na presença <strong>do</strong> concilio.<br />

Eiistathio, a quem não convinha que a questão se resolvesse<br />

pelos padres, porque previa a ~oluçâo que ahi havia <strong>de</strong> obter,<br />

levanta-sc dizen<strong>do</strong> que o impera<strong>do</strong>r, a imperatriz, os juizes e o<br />

sena<strong>do</strong> e os amantissimos padres Leao e Anatolio os tinham<br />

reuni<strong>do</strong> alli para outra cousa, qual era a soluçao <strong>da</strong> questáo <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>finição <strong>da</strong> f6 ; e, accrescentava, ((jubele ante omnia subscriba <strong>de</strong>finiíionem,<br />

ut questio li<strong>de</strong>i abso~uatur '.»<br />

Eustathio, porkrn, que, ao contrario <strong>do</strong> bispo <strong>de</strong> Tyo, crn homcm<br />

<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> astucia, ajunctava 6s suas razbes estas apparentemrnte<br />

francas palavras :<br />

((Quod, si acabava elle, <strong>de</strong> mea quoque causa juòetis nztnc quaeri,<br />

non sum in mora, sed prolinus respon<strong>de</strong>o.))<br />

Os juizes intervCm e man<strong>da</strong>m ler as allcgayõcs dc Phocio ao<br />

impera<strong>do</strong>r.<br />

Feita a leitura, esses <strong>de</strong>lcga<strong>do</strong>s <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r civil perguntam a<br />

1 Nas antece<strong>de</strong>ntes sessões <strong>do</strong> concilio tinha havi<strong>do</strong> grave disputa sobre<br />

este assum to, que mais <strong>de</strong> uma vez fora adia<strong>do</strong>. Veja a aclbo rv d'este<br />

mncil. ~abis, Conc. Genev.] tom. zv, rol. 552.


Eustathio se alguma cousa tinha a dizer contra as razões offereci-<br />

<strong>da</strong>s por Phocio.<br />

nJuhete eum (disse aquelle) dicere utrum secundum canones movet<br />

an secundum IrgesPn<br />

uEgo a regulis non disce<strong>do</strong> (respon<strong>de</strong>u Phocio) nec volo typis Pa-<br />

trum evertere, sed postulo ne jura illa evertantur.))<br />

Disseram ent8o os judices e o sena<strong>do</strong>:<br />

sacrat tis si mo Domino orhis placuit non jiixta sacras litteras (as im-<br />

periaes) aut pragmaticos typos res sanctissimorum Episcoporum proce-<br />

<strong>de</strong>re, sed juxta regulas a sanctis Patribus latas. Omni igitur cessante<br />

e sacris pragmaticis <strong>de</strong>finitione, canones capitulis editi 1egaiitur.a<br />

O syno<strong>do</strong> approva esta sentença, proferin<strong>do</strong> estas palavras:<br />

uContra regulas nihil pragmaticum valebit. RegulaePatriim 1eneant.n<br />

Leu-se então, em cumprimento <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong>s juizes e sena<strong>do</strong>, o<br />

canon iv <strong>de</strong> Nicca, ondc se reconhece a soberania inteira <strong>do</strong> me-<br />

tropolita <strong>de</strong>ntro <strong>da</strong> provincia, e que acaba dizen<strong>do</strong>:<br />

((Firmitas autem eorum quae geruntur per unamquamqueProvinciam<br />

Metropolitano tribuatur Episcopo.))<br />

Acaba<strong>da</strong> a leitura, os padres exclamam :<br />

Unum juxta regulas sanctorum Patrumvoluimus esse Metropolitam.<br />

Petimus ut regulae SS. Patrum teneant.~<br />

Então o bispo Nicopolitano diz :<br />

nTreceutorum <strong>de</strong>cem et octo Patrum Regula unum vult Metropolitam<br />

in unaquaque Provincia, Episcopum esse et siipplicamus, ut etiam niiiic<br />

oirtus Ilegularum in omnia et in omnes Provimias valeat cessantibus<br />

omnibus pragmalicis, quae ex concursatione et ainbitione fiunt, quae-<br />

qiie Ueum a sanclis Patribiis sancita sunt.n<br />

Por ultimo, os magnificentissimos e gloriosissimos juizes revali-<br />

<strong>da</strong>ram a mesma sentença, 'nestes termos :<br />

.Justa regulas trecentorum <strong>de</strong>cem et octo sanctorum Patrum et<br />

jiixta sententiam totius sanctae Sgnodi, Photius revr.rendissimus Epis-<br />

copus Tyriorum Melropolis omnem potestatem ordinandi in universis<br />

civitatibus primae Phoenices Provincia habcbit. Eustathiiis vero rcvc-<br />

6


endissimus episcopus e sacro pragmatico typo nihil ampliiis sihi vin-<br />

dicet, quam reliqui Episcopi ejus<strong>de</strong>m Provinciae et ali his consentia1<br />

sancta Synodiis, e<strong>do</strong>ceat.<br />

Entáo o sagra<strong>do</strong> concilio acclama 'ncstes termos :<br />

aHoc justum judicium, hoc Dei judicium, haec juxta sententia.~<br />

Era j& isto bastante para conhecer as regras <strong>da</strong> disciplina, os<br />

principios regula<strong>do</strong>res d'este objecto ao tempo d'este concilio.<br />

Os padres não hesitam, a sua dccisao 6 prompta, conforme aos<br />

antigos canones, cuja auctori<strong>da</strong>dc <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o primeiro dia elles tinham<br />

expressamente c~rifc~~ild~ 1 - a sua <strong>de</strong>cisão é firme e inabalave1<br />

ria prcscnça mesma <strong>do</strong>s commissarios ou <strong>de</strong>lega<strong>do</strong>s <strong>do</strong> impera<strong>do</strong>r"<br />

os piles sTlo os primcirns, note-se bem, a pcclir que se<br />

leiam os canones, as leis ecclesiasticas, e a pronunciar-se contra as<br />

illaçaes que <strong>da</strong>s prasmaticas, ou sagra<strong>da</strong>s letras impcriacs, o bispo<br />

<strong>de</strong> Ileryta quizera tirar.<br />

Aqui pois to<strong>da</strong> a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> e in<strong>de</strong>pendcncia <strong>da</strong> cgreja ao la<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> irnpcrio civil, o qual não so k o primeiro a reconhecer-lh'a, mas<br />

ate a auxilial-a com sua forca, com seu auxilio externo, para ser<br />

inteira e livre a acçào <strong>de</strong> seu po<strong>de</strong>r e o exercicio <strong>de</strong> seus <strong>direitos</strong>.<br />

Não é só isto porém.<br />

Ao fin<strong>da</strong>r d'estn controversia, Cecropio, bispo <strong>de</strong> Scbastopol,<br />

levantou-se e propoz que, para se nfo repelirem <strong>de</strong> fiitiiro simi-<br />

Ihantes questaes e conflictos, se estatuisse que nrrihum effeito teriam<br />

para a egreja as pragmoticas em <strong>de</strong>trimento <strong>do</strong>s canones.<br />

aEa pragmatica quae in <strong>de</strong>trimentum Canonum a quibus<strong>da</strong>m facta<br />

1 O primeiro canon <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>uia, Q semelhança <strong>do</strong> <strong>de</strong> Nicea, diz :<br />

Regulaa Sanetorum Yatrum per &n@a nunc uaque oo~~cilia constitutaa<br />

proprium robur ottineve <strong>de</strong>crevimue.<br />

2 Os impera<strong>do</strong>res ad ordinandum presidiam Qs vezes em pesson aos concilio~;<br />

na maior parte <strong>do</strong>s casos, porém, enviavam os <strong>de</strong>lega<strong>do</strong>s seus que se<br />

chamavam juizes.<br />

Estes juizes mantinham a or<strong>de</strong>m no concilio, ouviam os padres, coiitavrm<br />

os votos e man<strong>da</strong>vam ern coiifornii<strong>da</strong><strong>de</strong> promulgar os csnoii(+-. Nuncrt elles<br />

intervinham na discussão ; seu officio era merainente externo ; evitar as altercaçòes,<br />

conservar a or<strong>de</strong>m ua discussZo.<br />

Vem d'aqui o appelli<strong>da</strong>r-se Constantiuo communis episcopus remm externamm.<br />

Goetoss a egreja, sem per<strong>de</strong>r sua in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia, acceitava este auxilio<br />

que o esta<strong>do</strong> lhe prcstsva.


sunt in omni Provincia : Canones autern per omnia teneant. Sic 6<br />

et Fi<strong>de</strong>s custoditur et unaquaeque Eccksiu tutum otatum habebit.))<br />

Perguntan<strong>do</strong> os juizes ao syrio<strong>do</strong> se consentiam na opinião <strong>de</strong><br />

Cecrol)io, o syno<strong>do</strong> exclama :<br />

u0nines ea<strong>de</strong>m dicirnus, universa pragmatica cessabunt; Regulae te-<br />

ncant: et hoc a vobis fiat.u<br />

Os juizes dizem entáo :<br />

nEx sententia sanctae Synodi, in aliis quoque omnibus provinciis re-<br />

gulae tcneant. D<br />

n'esta discussão tirou a sua origem o can. XII <strong>do</strong> concilio. Este<br />

cari. é assim :<br />

((Pervenit ad nos quod qui<strong>da</strong>m praetcr ecclesiastica statuta facientes,<br />

convolariint ad potestatcs ct per pragmnticam formam in duo unam<br />

provinciam diviseriint: ita iit ex hoc facto diio rnetropolitani esse vi-<br />

dcantur in una proiincia : statiiit ergo saricta Synodus <strong>de</strong> rtliquo<br />

niiiii ab Episcopis taie tentari ; alioqiiiii, qrii hoc admissus f rit amis-<br />

sioiic gradiis proprii subj'jacebit. Quiiecurnque vcru civita % s litteris<br />

Irriperi~libiis Metropolitnni iiominis honore subnixac sunt. honore tan-<br />

turnmo<strong>do</strong> perfriiantiir et qiii Ecclesiarn ejiis gubernat Episcopus : sal-<br />

tis scilicct verae metropolis privilegiis suis. 10<br />

Em outras contestações hcercn <strong>do</strong> direito metropolitico resol-<br />

vi<strong>da</strong>s nas sessões d'este concilio se a<strong>do</strong>ptam os mesmos principios<br />

e se man<strong>da</strong> ler o mesmo can. iv dti Nicea, assento primeiro e<br />

mais veneran<strong>do</strong> <strong>da</strong> soberania <strong>do</strong>s metropolitas livre e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte<br />

<strong>do</strong> esta<strong>do</strong>.<br />

Os proprios bispos, interessa<strong>do</strong>s nas conten<strong>da</strong>s, si10 os primeiros<br />

a appellar para as regras <strong>do</strong>s sanctos padres e para o antigo cos-<br />

tume.<br />

Na contestação entre Eunomio, bispo <strong>de</strong> Nicomedia, e Anastacio,<br />

1 Chr. Lupus Synod. Gener. ac Provinc. <strong>de</strong>creta et canones, pag. 1, achol.<br />

et not. ad can. XII Caleed.<br />

Este privilegio, purarneute honorifico, que o can. conce<strong>de</strong> aos bispos <strong>da</strong>s<br />

ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s recentcriieiite eleva<strong>da</strong>s á digni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> metropoleu, consistia &ente<br />

no uso <strong>do</strong> titulo <strong>de</strong> metropolita e em occupar nos eoncilios provinciaee o pri-<br />

meiro logar <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> metropolita ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro.


ispo <strong>de</strong> Nicea, este ultimo, convi<strong>da</strong><strong>do</strong> pelos juizes a respon<strong>de</strong>r 6s<br />

allegações <strong>do</strong> lihello <strong>de</strong> Eunomio, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> appellar para ariti-<br />

gui<strong>da</strong><strong>de</strong> e velha disciplina, acaba dizen<strong>do</strong> : - Nec enim ego ali-<br />

quid amplius v010 '.<br />

Apezar, porem, <strong>de</strong> tão claro scr o assiimpto cm face d'estes<br />

canories c lia prcscnça <strong>da</strong> liisloria d'estc concilio, os carionistas<br />

gregos, entre cllcs os celcbres Balsamon e Zoiiaras, crbem que em<br />

vista mesmo d'esses canoncs se <strong>de</strong>scobre que ao esta<strong>do</strong>, por con-<br />

cessão <strong>da</strong> egreja, pertence o direito <strong>da</strong> erecçáo <strong>de</strong> metropoles e<br />

dioceses.<br />

Argumentam com o final <strong>do</strong> can. xvrr, o qual estatue o se-<br />

guinte:<br />

aSi qua vero civitas potestate imperiali novata est, aut si protinus<br />

innovetur, civiles dispositiones et publicas, ecclesiasticarum quoque<br />

parochiarum ordines subsequantur.~<br />

Ao primeiro aspecto este canori parccc contradizer o can. xri<br />

acima transcripto; porque alli se tira aos impera<strong>do</strong>res o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong><br />

crear digni<strong>da</strong><strong>de</strong>s ecclesiasticas por pragmaticas suas, e aqui se or-<br />

<strong>de</strong>na a inteira submissão ao que por auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> imperial se fizer;<br />

alli os padrcs tinham dicto que a pragrnatica não valia contra a<br />

regra; aqui <strong>de</strong>creta-se a superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s civiles et publicas dis-<br />

positiones.<br />

Depois <strong>do</strong> que temos narra<strong>do</strong> <strong>da</strong> historia <strong>do</strong> concilio, se v& bem<br />

jA que este final <strong>do</strong> can. xvrr nóo p6<strong>de</strong> significar o que os cano-<br />

nistas gregos preten<strong>de</strong>m 2.<br />

A antiriomia 6 s6 apparente, como vamos <strong>de</strong>monstrar.<br />

Mais <strong>de</strong> uma vez temos dicto quc as gran<strong>de</strong>s divisões ccclesias-<br />

ticas nóo apparcccram por <strong>de</strong>termiriaçúo meramente ecclesiastica;<br />

as circuinstancias as produziram com sira força in<strong>de</strong>clinavel, e a<br />

egreja as acceitou <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os seus primeiros dias.<br />

É' (pieentão mal se comprchciitlia c~iiantos odios e ambipões<br />

haviam <strong>de</strong>pois gerar estes gran<strong>de</strong>s po<strong>de</strong>res metropoliticos e pa-<br />

triarchaes.<br />

fi que então, in<strong>de</strong>cisa ain<strong>da</strong> em sua fdrrna, como qiir ingeriiia e<br />

pura e sem na<strong>da</strong> comprehen<strong>de</strong>r ain<strong>da</strong> <strong>da</strong>s cousas <strong>do</strong> n~iinclo, a<br />

1 Veja-se a actio xirr.<br />

2 Chr. I~upus. - Byuod. gener. ac provinc. <strong>de</strong>creta ct canona. P. I..,<br />

scliol. et itot. ad can. xvir Chalce<strong>do</strong>u.


egreja, persegui<strong>da</strong> pela i<strong>do</strong>latria, nóo podia passar sem estes gran-<br />

<strong>de</strong>s centros <strong>de</strong> acção, indispensaveis para susteiitar sua attribula<strong>da</strong><br />

vi<strong>da</strong>.<br />

A riqueza, a importancia politica <strong>da</strong>s gran<strong>de</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, metro-<br />

poles <strong>do</strong> imperio, o perigo que ahi corriam os bispos; a urgente<br />

necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> conservar mais atea<strong>do</strong> nesses logares o clarão <strong>da</strong><br />

fé, que chamava assim os mais veneran<strong>do</strong>s padres para essas ca-<br />

<strong>de</strong>iras ; tu<strong>do</strong> concorria para a acceitação <strong>de</strong> uma divisão ecclesias-<br />

tica que coincidia com a politica, e que a ella ia buscar seu nome.<br />

Quan<strong>do</strong> a egreja chega a maior e<strong>da</strong><strong>de</strong> e reflecte no seu orga-<br />

nismo, vê então o peso <strong>da</strong> antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> sagra<strong>da</strong> como que a sellar<br />

para sempre o que 'nesses remotos dias, inconsciente e soffre<strong>do</strong>ra,<br />

<strong>de</strong>ixara que a corrente <strong>do</strong>s acontecimentos architectasse.<br />

NZo hesita um momento; curva a fronte, e a ca<strong>da</strong> instante e nas<br />

suas maiores solemni<strong>da</strong><strong>de</strong>s, ella confessa o respeito pela vetustez<br />

<strong>do</strong>s seus institutos e pela tradição, preciosa fonte d'essas lem-<br />

branças.<br />

* por isso que, on<strong>de</strong> apparecia uma nova ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, ahi um<br />

novo bispo; on<strong>de</strong> tima alterayóo na circumscripyão politica <strong>da</strong>s<br />

provincias romanas, ahi uma modificação na circiimscripç80 eccle-<br />

siastica <strong>da</strong>s provincias <strong>da</strong> ejire:ja; passan<strong>do</strong> os bispos <strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

dcsmcmhra<strong>da</strong>s <strong>de</strong> uma provincia para a jurisdicçtio <strong>do</strong> metropolita<br />

d'aquella, á qual agora na divisão politica pertencia a sua ci<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

O que o can. xvii relembra é isto; o que o can. xii man<strong>da</strong> 6<br />

que, quan<strong>do</strong> as provincias se divi<strong>da</strong>m em duas ou mais por sugges-<br />

tões e machinayões <strong>do</strong>s bispos juncto <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r civil e imperial<br />

para grangearem a honra <strong>do</strong> privilegio metropolitico, taes divisbes<br />

não tivessem senão um mero effeito honorifico, e que os bispos<br />

fossem <strong>de</strong>spoja<strong>do</strong>s <strong>de</strong> sua alta digni<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Este canon revela pois com a maior certeza que o antigo cos-<br />

tume, a regra consuetudinaria <strong>da</strong> disciplina era, que se elevasse<br />

uma nova metropole on<strong>de</strong> o imperio a edificara tambem; porque<br />

vemos por esse can. os bispos pedirem ao po<strong>de</strong>r civil a creação <strong>de</strong><br />

novas metropoles politicas, confia<strong>do</strong>s nas consequencias legaes e<br />

canonicas d'esses factos.<br />

Vê-se tambem profun<strong>da</strong>mente grava<strong>da</strong> a mesma regra no res-<br />

peito que o can. tributa á nova creação <strong>de</strong> metropoles no imperio,<br />

ornan<strong>do</strong> os bispos <strong>da</strong>s novas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s com o nome e simples honras<br />

<strong>de</strong> metropolitas. Porem, notemos ain<strong>da</strong>, o legisla<strong>do</strong>r ecclesiastico


n8o se atreve a annullar, porque o não pó<strong>de</strong>, a obra <strong>da</strong> legislaçiío<br />

civil, a divisão politica nova, embora obti<strong>da</strong> a rogo <strong>do</strong>s bispos; n8o<br />

se abalança a <strong>de</strong>ixar contra o antigo costume uma metropole politica<br />

sem um metropolita ecclesiastico, e ao mesmo tempo não<br />

p6<strong>de</strong> sanccionar os resulta<strong>do</strong>s <strong>da</strong>s ambições <strong>de</strong> seus pontifices.<br />

por isso que, con<strong>de</strong>mnan<strong>do</strong>-os á ignominia <strong>da</strong> <strong>de</strong>posição, respeita o<br />

po<strong>de</strong>r civil e a tradição <strong>da</strong> alta antigui<strong>da</strong><strong>de</strong>, ornan<strong>do</strong> <strong>do</strong> nome e<br />

meras honras <strong>de</strong> metropolita os bispos <strong>da</strong>s novas metropoles <strong>do</strong><br />

imperio.<br />

Longe, portanto, <strong>de</strong> se contradizerem, estes canones explicam-se<br />

mutuamente, presuppõem-se, completam-se.<br />

Na0 se po<strong>de</strong> dizer que <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> can. xvirr a antiga disciplina<br />

tenha fica<strong>do</strong> <strong>de</strong>roga<strong>da</strong>; porque to<strong>do</strong> o espirito <strong>do</strong> can. XII a sup<br />

põe, e suas <strong>de</strong>terminações são geraes pelo respeito para com ella ;<br />

e porque, finalmente, o can. xviir expressamente a revali<strong>da</strong>.<br />

O objecto principal d'este can. não 6 o mesmo, porem, <strong>do</strong> can.<br />

XII.<br />

Tracta-se 'nelle <strong>da</strong> usurpação <strong>da</strong>s cgrejas rusticas pelos bispos,<br />

que assim se occupam inconscientes <strong>de</strong> sua invasão ; e, como estes<br />

actos abusivos, attentatorios <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> epis~opaes~ po<strong>de</strong>m trazer<br />

graves contestaç6cs (como ao tempo d'este concilio mais <strong>de</strong> um<br />

exemplo havia), por isso o can., <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> estabelecer uma prescripção<br />

<strong>de</strong> tres annos, man<strong>da</strong> que qualquer contestaçào, levanta<strong>da</strong><br />

antes <strong>de</strong> <strong>de</strong>corri<strong>do</strong> esse tempo, seja leva<strong>da</strong> ás auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s ecclesiasticas<br />

que indica. Porem, como dn innovaçào lia categoria politica<br />

<strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s pelo po<strong>de</strong>r civil provinha alteraçõo rias jurisdicções<br />

episcopnes e metropoliticas, era indisponsavel resalvar esta hypothese,<br />

<strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> 'nella inteiro vigor hs regras canonicas <strong>de</strong>pois<br />

<strong>da</strong> modificação 'nas circumscripç6es ecclesiasticas e politicas, oriun<strong>da</strong>s<br />

<strong>da</strong> pragmatica <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r imperial.<br />

Ha uma <strong>de</strong>creta1 <strong>de</strong> Innocencio, <strong>do</strong> anno 40$, anterior ao con-<br />

cilio <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia, cujos actos acabamos dc referir, a qual man<strong>da</strong><br />

que as divisões feitas pela egreja se nâo possam mu<strong>da</strong>r pelos prin-<br />

cipes.<br />

«Nam quod sciscitaris, diz, utrum divisis imperiali judicio provin-<br />

ciis ut duae Metropoles fiant : sic duo Metropolitani Episcopi <strong>de</strong>beanl<br />

nominari. Non ergo visum est ad nobilitatem necessitatum mun<strong>da</strong>na-<br />

rum Dei Ecclesiam comrnutari, honoresque aut divisiones perpeti : .


quas pro suis causis facien<strong>da</strong>s duxerit Imperator : ergo secundum p&-<br />

tinum pmvbuiqrum niorm metropolitanos Episcopos wnocnil num+<br />

rari 1.n<br />

De uma outra <strong>de</strong>creta1 <strong>de</strong> Bonifacio r, <strong>do</strong> anno 419, se <strong>de</strong>s-<br />

cobre egualmente bem clara esta disciplina, pois man<strong>da</strong> que ne-<br />

nhum bispo se or<strong>de</strong>ne 'na proviricia coiztempto Metropolitanof.<br />

Pedro <strong>de</strong> Marca, quan<strong>do</strong> rcfcre que Justiniano eleva a arcebis-<br />

pa<strong>do</strong> a ci<strong>da</strong><strong>de</strong> on<strong>de</strong> nascera, escreve que elle « vi<strong>de</strong>tur canones<br />

concilii Calche<strong>do</strong>nensi infregisse » c procura ao mesmo tempo<br />

<strong>de</strong>monstrar que a egreja gallicana nunca consentiu que os reis<br />

erigissem novos bispa<strong>do</strong>s 3.<br />

'Nesse facto mesmo, <strong>de</strong> Justininno esorbitar <strong>de</strong> sua esphera,<br />

não se v& uma inteira infracç30 <strong>da</strong>s leis <strong>da</strong> egreja ; porque, alem<br />

<strong>do</strong> respeito que a egreja sempre mostrou para com os impera<strong>do</strong>-<br />

res, e que lhe garantiu a paz <strong>de</strong> alguns seculos, além d'essa <strong>de</strong><br />

ferencia pelo po<strong>de</strong>r civil, que era como qiie uma compensação <strong>do</strong><br />

auxilio e <strong>da</strong> forca que elle lhe prestava ; a egreja intervem para<br />

sellar com a sua auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> a nova erecção <strong>de</strong> Justiniano: Vir-<br />

gilio, papa, a ratifica 4.<br />

Thomassin apresenta-nos alguns factos, em que parece impe<br />

1 Veja a Decret. XLVI <strong>do</strong> Co<strong>de</strong>s Canon. Ecclesi~ticomm, sive, Co<strong>de</strong>s Canon.<br />

Vetus Ecclesiae Romanae, <strong>de</strong> Dionysio Exiguo, na Bihlioth. Jur. Can.<br />

Veter. <strong>de</strong> Henrique Juetello, 1661. k em resposta a Alexandre, bispo <strong>de</strong> Antiochia.<br />

Veja ain<strong>da</strong> Can. LI Caus. XVI. q. I, e O Cap. xvr <strong>de</strong> major. et obd.<br />

2 Veja a iv Decrrt. d'este papa no mesmo Codigo.<br />

8 Conc. Sacerd. ~t Imper. Lib. 2.0, cap. 9.", n." 1.<br />

4 Veiu prestar grati<strong>de</strong> serviqo ao estu<strong>do</strong> d'este interessante ponto <strong>da</strong> historia<br />

<strong>da</strong> egreja, <strong>da</strong> Iiistoria geral, e <strong>de</strong> um <strong>do</strong>a mais momentosos problemas<br />

<strong>do</strong> nosso tempo -o problema <strong>da</strong>s relaçòes <strong>da</strong> egieja e <strong>do</strong> eatrr<strong>do</strong>, O livro pu-<br />

blica<strong>do</strong> ha poucos aiinos por Rliallia e Potlis- Les canons <strong>de</strong>s saints ApÔtres,<br />

dcs conciles ecttmbiqr~es P/ pror


trar-se o consentimento <strong>do</strong>s reis; mas stío in<strong>de</strong>cisos, obscuros,<br />

limita<strong>do</strong>s em numero. Muitos em contrario nos refere o sabio Pe-<br />

dro <strong>de</strong> Marca na sua bem conheci<strong>da</strong> obra <strong>da</strong> Concordia <strong>do</strong> Sa-<br />

cer<strong>do</strong>cio e <strong>do</strong> Imperio l.<br />

Gonzales lembra, tambem em contrario, que Wamba, rei <strong>do</strong>s<br />

go<strong>do</strong>s, prneier morem el consue~utiinem eccl~siae, man<strong>do</strong>u bispo<br />

para os suburbios <strong>de</strong> Tole<strong>do</strong> a um certo Rstcvão, que fdra bispo<br />

<strong>de</strong> Meri<strong>da</strong>, sem esperar, nem consultar a egreja. No diiotlccimo<br />

concilio <strong>de</strong> Tole<strong>do</strong> este rei vem em pessoa prostrar-se aos 116s <strong>do</strong>s<br />

pndrcs, pedir-lhes perdão para si, e <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong>-lhes á sua vonta<strong>de</strong> o<br />

<strong>de</strong>stino <strong>do</strong> sacer<strong>do</strong>te que fizera bispo.<br />

- (c... Praedictus i<strong>de</strong>m vir, prostratus hiimo, medicamine nostri prae-<br />

cccepti et sibi <strong>da</strong>re veniam petiit et qiiid potissimum operteret fieri <strong>de</strong><br />

apersona ejus qui illic ordinatus fuerat rioslri oris sententia <strong>de</strong>cernen-<br />

adum poposcit 2. n<br />

Isto foi pelos fins <strong>do</strong> vrr seculo.<br />

Éi <strong>de</strong> ver que to<strong>do</strong>s estes exemplos S ~ <strong>do</strong>s O ultimos annos d'cstc<br />

pcrio<strong>do</strong>, cuja historia vamos narrari<strong>do</strong> rio capitiilo <strong>da</strong> discil~lina <strong>da</strong><br />

egreja. Ao mesmo tempo que ella vai pnhan<strong>do</strong> forças e tomnn<strong>do</strong><br />

vulto, o esta<strong>do</strong> vae tambcm constitiiin<strong>do</strong>-se, o turbilhzo <strong>da</strong>s<br />

invasões vai-se dissipan<strong>do</strong> ; o systcma feu<strong>da</strong>l <strong>de</strong>tcrrninan<strong>do</strong>-se.<br />

Mais <strong>do</strong>is seculos, e a egrcja sobrepujar& o esta<strong>do</strong> ; por emquanto,<br />

<strong>do</strong>cil e como que não calciilan<strong>do</strong> as coiiscquencias <strong>do</strong> que<br />

fazia, ella, sem renunciar ao uso <strong>de</strong> seus <strong>direitos</strong>, procurava caminhar<br />

<strong>de</strong> harmonia com elle.<br />

A soberania <strong>do</strong> solo, base <strong>do</strong> feu<strong>da</strong>lismo incipiente d'estes seculos<br />

chama a intervençâo <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> 'nestes negocios ; mas ella<br />

tem uma terrivel rival, porque, emquanto aqiiclla theoria é puramente<br />

practica e rudimentar, a epre-ja está cm to<strong>do</strong> o seti vigor,<br />

com uma organisaçâo robusta, arma<strong>da</strong> <strong>de</strong> iim podcr immenso: tem<br />

os seus <strong>direitos</strong> <strong>de</strong>fini<strong>do</strong>s, baseia-se em um complexo <strong>de</strong> theorias<br />

que os padres elaboraram e os concilios perpetuaram com os seus<br />

canones.<br />

dUion ..... Mais tout eli repottssant l'immiztion esaggkrke <strong>de</strong> l'ktat, <strong>da</strong>na les af-<br />

faires <strong>de</strong> l'kglise, le clerge s'rst approprid.francheme71t pktsieure lois civiles<br />

exeellentes, surtout celle relalivc u la famille ....... V<br />

1 Vet. et Nov. discipl. Lib. 2.0, CRP. 4.<br />

2 Gonzales, Comm. perpet. Tom. v, tit. XXXIII, cap. 1.0, n.O 4.


Esta a explicaçâo <strong>da</strong>s contradicções nos vestigios historicos <strong>da</strong>s<br />

novas creações <strong>de</strong> bispa<strong>do</strong>s.<br />

Devemos notar, porem, um singular <strong>de</strong>feito <strong>de</strong> argumentação<br />

que encontramos nos escriptores. Como acabamos <strong>de</strong> ver, quan<strong>do</strong><br />

elles narram os factos que revclam a intervenção <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>, dizem<br />

to<strong>do</strong>s que era uma infrocç30 <strong>da</strong>s leis canonicas contra o costume<br />

r disciplina <strong>da</strong> egreja ; mas, quaii<strong>do</strong> referem aquelles que <strong>de</strong>sco-<br />

brem a supremacia papal 'nestes objectos, longe <strong>de</strong> Ihes imputar<br />

uma infracçao, acceitam-nos para base <strong>de</strong> seus argumentos.<br />

Em um e outro caso ha eguaes razòes para os classificar <strong>de</strong><br />

abusos e infracções ; que em ambos elles ha a legislaç3io ecclesias-<br />

tica bem positiva e clara.<br />

Nõo insistimos mais sobre este ponto. Nâo 6 contan<strong>do</strong> o nu-<br />

mero <strong>de</strong> factos como quem conta votos, que se resolvem as ques-<br />

tòcs dc in<strong>da</strong>gaç8o historica. Quan<strong>do</strong> a legislaçao se expressa tão<br />

positiva e appella tão vivamente para as regras c antiga disciplina,<br />

n:~o s'io essas paginas <strong>de</strong> Thomassin, sempre inconsistentes, que<br />

nos mostram a revogação <strong>da</strong> disciplina ecclesiastica.<br />

O ultimo seculo d'este perio<strong>do</strong> 6 como que vacillante e in<strong>de</strong>-<br />

ciso, porque, acima o dissemos, 'nelle palpita um po<strong>de</strong>r já real-<br />

mente existente e que procura a vi<strong>da</strong> legal, um titulo que o jus-<br />

tifique juridicamente aos olhos <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> ; e ao mesmo tempo<br />

esboça-se confusa a theoria <strong>de</strong> uma nova constituiçâo politica <strong>do</strong><br />

po<strong>de</strong>r temporal <strong>da</strong>s nações <strong>da</strong> Europa.


CAI'ITULO IV<br />

As falsas <strong>de</strong>cretaes *<br />

Apparecimento <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretam <strong>de</strong> Isi<strong>do</strong>ro. - Es antosa auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> com que se iiiipòem.<br />

-Dura oito seculos a erenca nas falsas lecretaee. - A reforma ealliolica <strong>do</strong> se-<br />

culo xvi nao podia uri6càr a disciplina.-E completameote nllera<strong>da</strong> em suas<br />

bases. - Textos <strong>da</strong>s Pdlsae <strong>de</strong>cretaes relativos ao nosso objecto.- Uma opiriiSo <strong>de</strong><br />

Tbomassiu.- Grave diffieul<strong>da</strong><strong>de</strong> no Capitulo <strong>da</strong> disciplina <strong>da</strong> egreja.<br />

Entre os fins <strong>do</strong> seculo vIir e mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> seculo IX, apparecc<br />

ria egrcja Occi<strong>de</strong>ntal uma nova collecç8o latina <strong>de</strong> canones e <strong>de</strong>-<br />

cretaes.<br />

1 NPo se sabe a epocha precisa <strong>do</strong> apparecimcnto dlesta notavel collecçPo<br />

<strong>de</strong> canones.<br />

Aguirre assigiiala <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o comep <strong>do</strong> septimo at8 ao fim <strong>do</strong> nono o espaço<br />

provavel <strong>da</strong> sua publicaç&o.<br />

Hincmar, arcebispo <strong>de</strong> Reims, em um opusciilo coritra seu neto, no cap. 24,<br />

cita<strong>do</strong> pelos canonistns fala <strong>do</strong> ~Iibro collcçíaritrn Epistolarum ab I<strong>do</strong>ra,<br />

quem <strong>de</strong> Hispania aallatum Riculphus Episcopits 17logicntinits in hujuemodi<br />

rimt et in Capitulis Ilegni studiosus, obtinuit, et ietas regionee ez iUo replM<br />

fecit..<br />

Sabe-se que a este Richolf siicce<strong>de</strong>u em 786 Lullo; e por conseguinte que<br />

aquella collecção existia jh no ultimo quartel <strong>do</strong> seculo viir.<br />

Como ~ahisse <strong>da</strong> Hespanha, e tivesse por nome <strong>de</strong> auctor o nome <strong>de</strong> Isi-<br />

<strong>do</strong>ro, cui<strong>do</strong>u-se, e o proprio Hincmar foi o ~rimeiro a crel-o, que era <strong>de</strong>vi<strong>da</strong><br />

so celebre bispo <strong>de</strong> Sevilha.<br />

Como porém 'nesta collecçb apparecem <strong>de</strong>terminaçóes <strong>de</strong> concilios, con-<br />

voca<strong>do</strong>s <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> morte d'este bispo, as opiiii0es divi<strong>de</strong>m-se, qliercn<strong>do</strong><br />

uns que <strong>de</strong> outro Isi<strong>do</strong>ro se falla, pensan<strong>do</strong> outros, como o car<strong>de</strong>al Aguirre,<br />

que esses canones foram accrescenta<strong>do</strong>s posterimente 4 primitiva collecçlo<br />

<strong>do</strong> aiictor <strong>da</strong>s Etymo1og;aa.<br />

Geralmente chama-se lhe a collecçfio <strong>de</strong> Isi<strong>do</strong>ro Merca<strong>do</strong>r, -porque se<br />

encontram, no começo <strong>da</strong> prefação <strong>de</strong> um <strong>do</strong>s exemplaras mais antigos, qiie<br />

existe em Roma, as expressões ~Isi<strong>do</strong>rus mercator ser- ChTisti, leclori con-<br />

eervo SUO......^<br />

Pedro <strong>de</strong> Marca lembra que seria Isi<strong>do</strong>rus Prccntor e n&o Mercator, por-<br />

que d'aquelle titulo usavam os bispos em sigii;il <strong>do</strong> humil<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

David Bloii<strong>de</strong>l, o distincto critico <strong>da</strong>s collecgGes <strong>do</strong> direito ecclesiastico,


O pobre Dionysio Esiguo, que gastara os annos e abreviára a<br />

vi<strong>da</strong>, revolven<strong>do</strong> os archivos <strong>da</strong> egreja romana, cobrin<strong>do</strong>-se <strong>da</strong><br />

poeira suffoca<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> muitos seculos, náo encontrára em premio<br />

<strong>de</strong> suas fadigas os monumentos vetustissimos, preciosos, os mais<br />

veneran<strong>do</strong>s monumentos que o auctor <strong>da</strong>s novas <strong>de</strong>cretaes tivera<br />

a felici<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobrir. A siia collecção, fructo <strong>de</strong> tantos traba-<br />

lhos, que viera repetir ti egreja latina os sagra<strong>do</strong>s canones apos-<br />

tolicos, quasi <strong>de</strong>sconheci<strong>do</strong>s ate ent80, ia agora para sempre per-<br />

<strong>de</strong>r a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> que tão justamente alcançára.<br />

& que a nova collecçâo illustrava-sc na primeira pagina com<br />

um nome respeita<strong>do</strong> em to<strong>do</strong> o orbe catholico - o nome <strong>de</strong> Isi-<br />

<strong>do</strong>ro bispo, o sabio e virtuoso sacer<strong>do</strong>te <strong>de</strong> Sevilha.<br />

k que a nova collecção offcrecia ao mun<strong>do</strong> christão as <strong>de</strong>cre-<br />

taes <strong>do</strong>s primeiros papas, as mais sanctas <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s, mais respeita-<br />

vcis <strong>do</strong> que os proprios concilias geraes <strong>do</strong> iv c seguintes secu-<br />

10s; e o muii<strong>do</strong> absorto rojava a fronte por terra, confessan<strong>do</strong> o<br />

erro em que vivkra, porque essas <strong>de</strong>cretaes mostravam-lhe que a<br />

disciplina que julgára ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira e pura era falsa e viciosa; qiie a<br />

tradiçáo que tanto reverenciára era uma voz mentirosa que o fi-<br />

zera durante oito seculos falsificar as palavras <strong>do</strong> Christo, os di-<br />

ctames <strong>do</strong>s apostolos e as <strong>do</strong>utrinas <strong>do</strong>s padres.<br />

Subitamente, Roma, cuja auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> suprema era geralmente<br />

contesta<strong>da</strong> em materias disciplinares, surge immensa, cheia <strong>da</strong> luz<br />

pura e sancta <strong>da</strong> antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira, eleva-se até ao firmamento,<br />

pren<strong>de</strong>-se 'nelle e 'nelle brilha como uma <strong>de</strong> suas mais formosas<br />

estrellas.<br />

A christan<strong>da</strong><strong>de</strong> prostra-se, a<strong>do</strong>ran<strong>do</strong>-a; o episcopa<strong>do</strong> hesita um<br />

preten<strong>de</strong> que o auctor d'esta collecgllo não era hespanhol mas gemano-<br />

franco.<br />

Muito se tem discuti<strong>do</strong> a falsi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes e outros <strong>do</strong>cumentos d'eata<br />

collecçlo; e hoje, pragas critica esclareci<strong>da</strong>, existe elabora<strong>do</strong> catalogo <strong>da</strong>s<br />

<strong>de</strong>cretaes apocryphas.<br />

Questionam tambern os escriptores sobre e6 esta compilaçlio foi forja<strong>da</strong>, ou<br />

nllo, para favorecer os interesses <strong>da</strong> egreja romana; ou se foi pie<strong>do</strong>sa a fal-<br />

sifica* <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes.<br />

A auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> d'esta collecção foi immeusa, porque inui gran<strong>de</strong> era ain<strong>da</strong><br />

o respeito pela antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> e pela tradição, e porqiie os papas a recommen-<br />

<strong>da</strong>vam fervorosamente.<br />

Nicolau I <strong>da</strong> em suas epistolas um exemplo bem claro <strong>de</strong> quanto foram<br />

<strong>de</strong>fendi<strong>da</strong>s pelos papas estas <strong>de</strong>cretaes, eapecialmente a respeito <strong>do</strong> julga-<br />

mento e <strong>de</strong>posição <strong>do</strong>e bispos. A exaltação <strong>de</strong> Nícolau ao throno <strong>de</strong> S. Pedro<br />

teve logar no ano <strong>de</strong> 858.


momento, levanta o olhar altivo para aquelle colosso, que pensa<br />

phantasmagorico; mas aquella luz offusca-lhe a vista com seu .<br />

clarao, nào sei se satanico se divino; quer protestar contra a nova<br />

soberania; mas acinia <strong>de</strong> sua voz, elle ouve, troan<strong>do</strong> nos ceus, a voz<br />

verierari<strong>da</strong> <strong>do</strong>s primeiros papas, cujas sombras lhe apparccem co-<br />

Ijertas com a çaridi<strong>da</strong> turiica, saliiri<strong>do</strong> <strong>da</strong>s catacumbas, orna<strong>do</strong>s <strong>da</strong>s<br />

palmas <strong>do</strong> martyrio e <strong>do</strong> esplen<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s sanctos. Então o proprio<br />

episcopa<strong>do</strong> rola ate os pks <strong>do</strong> pontifica<strong>do</strong> supremo <strong>de</strong> envolta com<br />

to<strong>da</strong> a egreja, com to<strong>do</strong> o edificio singelo, mas grandioso, mas<br />

purissimo, mas sancto, <strong>da</strong> antiga disciplina. 1<br />

E tu<strong>do</strong> isto fdra um logro, o embuste vilissimo <strong>de</strong> um homem<br />

infame, que escond6ra o seu nome abjecto sob o puro nome <strong>de</strong><br />

um varão respeitavel, a quem assim imputava um <strong>do</strong>s maiores cri-<br />

mes, um <strong>do</strong>s factos mais nefan<strong>do</strong>s, que a historia <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> estre-<br />

mece <strong>de</strong> narrar!<br />

Durante oito seculos durou esta comedia; durante oito secu-<br />

10s se accreditou na pureza <strong>da</strong>s inventa<strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes.<br />

Taes são os tristes effeitos <strong>da</strong> ignorancia!<br />

Foi preciso que a egreja se visse <strong>de</strong>spe<strong>da</strong>ça<strong>da</strong> pelo seu mais<br />

cruel schisma ; que a intelligeiicia <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> resuscitasse ; que fosse<br />

indispensavel para certa seita provar a vani<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s alicerces <strong>da</strong><br />

gran<strong>de</strong> supremacia romaria; foi preciso tu<strong>do</strong> isto, tantos seculos,<br />

1 Hincmar e quasi to<strong>do</strong>s os bispos gauleees fizeram viva opposigo hs <strong>de</strong>cretaes.<br />

f1i:icmar & urli <strong>do</strong>s bultos mais graridiosamente esculpi<strong>do</strong>s <strong>do</strong> episcopa<strong>do</strong><br />

d'estes teiripos <strong>de</strong> perdiçiio e igiioraricia. Homem, mui sahio, couhece<strong>do</strong>r<br />

<strong>da</strong> antiga disciplina, elle fez urna guerra tenaz As <strong>de</strong>cretaes <strong>de</strong> Isi<strong>do</strong>ro;<br />

uso que po<strong>de</strong>sse pro\.ar e coiivencer-se <strong>da</strong> falsificação d'aquelles <strong>do</strong>cuineiitos,<br />

que Ih'o uBo c(~riseiitiaui as luzes <strong>de</strong> seu tempo; mas porque sente, corno que<br />

adiviiilia que ha alli uma força infernal acoberta<strong>da</strong> corn as puras vestes <strong>do</strong>s<br />

piinieiros e mais ~ltiitos bispos <strong>de</strong> Roma. As falsas <strong>de</strong>cretaes rebaixavam o<br />

opiscopa<strong>do</strong>, roul?avain-lhe a soberania e a iu<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ucia; é ver<strong>da</strong><strong>de</strong>; - mas<br />

nio 8 86 por isto que este lioiriein combate a força e auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> legal <strong>da</strong><br />

collecçâo <strong>do</strong> pretendi<strong>do</strong> Isi<strong>do</strong>ro; 6 priiicipalmeiite contra o monstruoso capitulo<br />

<strong>da</strong>s appeilaçòes para o papa, que elle emprega seus esforços, bem ven<strong>do</strong><br />

as fui:csta~i e tristiusimas coiisequericias d'essir disciplina inaudita. Hincinar<br />

dizia que a nova collecção, ou codigo, nào <strong>de</strong>via ter força <strong>de</strong> lei,-porque, não<br />

estail<strong>do</strong> grau<strong>de</strong> numero <strong>de</strong> suas <strong>de</strong>cietaes no Co<strong>de</strong>z Canonum, nao podia ella<br />

inverter a disciplina estabeleci<strong>da</strong> por tantos <strong>de</strong>cretos poritificios e tão voneraveis<br />

cariones. Na<strong>da</strong> couseguiu to<strong>da</strong>via.<br />

Esse homem, tie era mui illustra<strong>do</strong>, nlo se podia porem chamar um canonista;<br />

longe, bem loiige d'isso. A cultura <strong>de</strong> sua intelligeucia era maia pagii<br />

e litterata, <strong>do</strong> que cliristrt e theologiça, e por isso o brilho <strong>de</strong> seu taleiito tem<br />

muitas vezes estes reflexos <strong>da</strong> fraqueza e corrupção <strong>do</strong> ultimo perio<strong>do</strong> <strong>da</strong> litteratura<br />

romana.


tantas luctas, tantos crimes, tantas calami<strong>da</strong><strong>de</strong>s, para se conhecer<br />

e <strong>de</strong>scobrir a hlsificaçào d'aquelles <strong>do</strong>cumentos.<br />

Começa<strong>do</strong> este trabalho pcios protcstantes, que iriterromperam<br />

ao celebre Erasmo para lhe tomar a palavra e <strong>de</strong>sinvolver a idha,<br />

que elle se não atrevia a puhlicar ; a propria egreja catholica teve<br />

<strong>de</strong> man<strong>da</strong>r corrigir as suas volumosas collecções, to<strong>da</strong>s vicia<strong>da</strong>s<br />

por aquelle monstruoso e infernal parto <strong>de</strong> um homem ignora<strong>do</strong><br />

e amaldiçoa<strong>do</strong> pela posteri<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Apezar <strong>de</strong> tu<strong>do</strong>, os <strong>de</strong>feitos radica<strong>do</strong>s pelas <strong>de</strong>cretaes perma-<br />

neceram; existem ain<strong>da</strong> hoje, e s6 Deus sabe quan<strong>do</strong> soará a sua<br />

ultima hora.<br />

Quan<strong>do</strong> se fez a reforma catholica <strong>do</strong> seculo xvr, esta mu<strong>da</strong>nça,<br />

esta purificação <strong>da</strong> disciplina era impossivel, porque a reforma fa-<br />

zia-se em opposição h recente reforma protestante, que atacára a<br />

supremacia papal com esse mesmo <strong>de</strong>feito.<br />

Alguma cousa se conseguiu, mas não se quiz tocar no coração<br />

mesmo <strong>do</strong> schisma: por ventura teria si<strong>do</strong> possivel uma reconciliação.<br />

Aqui, como em tu<strong>do</strong>, se revela a fraqueza <strong>da</strong> nossa condiçiio: o<br />

<strong>de</strong>stino, como diz um bello pocta francez, dh uma hora por scculo<br />

á humani<strong>da</strong><strong>de</strong> para se regenerar: esta hora b uma revolução, e os<br />

homens pe~<strong>de</strong>m-na a <strong>de</strong>spe<strong>da</strong>çarem-se mutuamente; entregam á<br />

vingança a hora <strong>da</strong><strong>da</strong> por Deus á regeneração e ao progresso.<br />

E se ao menos nús vissemos sómente a perpetuação <strong>do</strong> mesmo regi-<br />

men cffectua<strong>da</strong> pelas riovns <strong>de</strong>cretaes, que nas falsas fossem beber<br />

o seu cspirito, comprchcndiamos facilmerite este esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> cousas;<br />

mas é que temos <strong>de</strong>para<strong>do</strong> com escriptores, que continuam hoje a<br />

citar aquelles <strong>do</strong>cumentos apocryphos, e que, não satisfeitos ain<strong>da</strong>,<br />

nos v&m dizer que foi proui<strong>de</strong>ncial o apparecimento <strong>da</strong>s falsas <strong>de</strong>-<br />

cretaes i !<br />

k mui certo o que diz um <strong>do</strong>s primeiros philosophos <strong>do</strong> seculo<br />

passa<strong>do</strong>: uTout abus s'éternise <strong>de</strong> lui-rn4me; c'ca; l'écurie <strong>de</strong><br />

Augias; i1 faut un Hercule pour la nett0yer.r<br />

1 Bergier- Diction. ( 7 ~ Tl,éolo$r, vb. Ddcrhtales.<br />

Na Enc?/clopedia Catholica este facto tem, albm <strong>de</strong> um caracter benefico<br />

em seus eEeitos, a ~pparencia <strong>de</strong> ingeuua ignoraricia em sua origem. L)]z-se<br />

ahi, vb. décrétales-e ... celui qi~i Zrs a fabrigiiéeo n'a Été susriti ,li I,u~é Par<br />

les paprs; i1 lea a faites en Esl~agnc et non en lialie; i1 a vortl~l c.'layer par<br />

<strong>de</strong> faus ttlre.9, um jurispru<strong>de</strong>~rce étnblie f~rrl~it lui conme tous @s rornanc8er8,<br />

il a prêtd am per8onnayes Jea quatres prel,&iers siècles <strong>de</strong> Z'hVjlioe leo id<strong>de</strong>8<br />

et le langage du v111 siècle. .. c'a Ctk Z'ouz'rage <strong>de</strong> lu ndcessitk plutôt que <strong>de</strong>


A antiga disciplina foi inteiramente altera<strong>da</strong> por estas constituições<br />

e falsas <strong>do</strong>cretaes attribui<strong>da</strong>s aos primeiros papas.<br />

O primeiro perio<strong>do</strong> <strong>da</strong> historia <strong>da</strong> legislação ecclesiastica est8<br />

aqui irremediavelmente assignala<strong>do</strong>. 1<br />

Não cabe no plano d'cste trabalho <strong>de</strong>senvo1;er o quadro <strong>do</strong>s<br />

effeitos perniciosissimos que trouxe para o futuro <strong>do</strong> catholicismo<br />

este singular acontecimeitto.<br />

Vamos sómente apontar a fonte d'on<strong>de</strong> dimanou no objecto <strong>de</strong><br />

que nos occupamos a alteração <strong>da</strong> disciplina.<br />

O primeiro <strong>do</strong>cumento esth em Graciano, Dist. ~xxx can. 2.'<br />

]E: uma pretendi<strong>da</strong> epistola <strong>do</strong> papa Clemente, que diz assim:<br />

aIn illis vero civitatihus, in quihiis olim apud ethnicos primi Flamines<br />

eorum, atqne primi legis <strong>do</strong>ctores erant, episcoporiim primales poni<br />

vel patriarchas B. Petriis praecepit, qiii reliquorum episcoporiim causas<br />

et maiora, quoties neccsse foret, negotia in fi<strong>de</strong> agitarent, et pau10<br />

post.<br />

In illis autem civitatibus, in quibus dudum apud praedictos erant archiflamines<br />

quos tamen minores tenebant, quam memoratos primates,<br />

archiepiscopos institui praecepit, et infra.<br />

In singulis vero reliqiiis civitatihiis sirigiilos et non hinos, vel ternos<br />

aut plures. episcopos constit~ii prarcepit, qiii non primatiim, aut archiepi~~Op0riiin.<br />

arit metropolitanorum nomine, quia matres civitatum<br />

non tenent; sed episcoporiirn tantum vocabulo potirentur; qiioniam nec<br />

intrr ipsos apostolos par institiitio friit, sed unus omnibus pfaefuit.n<br />

O segiin<strong>do</strong> encontra-se na Dist. xcrx can. 4.O I? uma epistola<br />

2." <strong>de</strong> Ariacleto, papa, aos bispos <strong>da</strong> Italia, Acerca <strong>da</strong> ohediencia<br />

<strong>de</strong>vi<strong>da</strong> aos primazes e patriarchas, e <strong>do</strong> logar on<strong>de</strong> se <strong>de</strong>vem erigir<br />

estas digni<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

Transcreveremos s6 o principio, pois A mui extensa :<br />

aprovinciae multo antc Christi adventum tempore divisae siint ma-<br />

l'ambition ... ce pouvoir, quoique portd Ir l'ezcès et <strong>de</strong>venu abuaiy, 0 fait beazc<br />

coup plus <strong>de</strong> I~ien, que <strong>de</strong> mal.<br />

Christiano Lupo escreve que ao fin<strong>da</strong>r <strong>do</strong> seculo viri se achava muito <strong>de</strong>-<br />

primi<strong>da</strong> a majesta<strong>de</strong> <strong>da</strong> sB apoatolica nas Gallias e Gerrnania pelos francos,<br />

na Hespanha prilos sarracenos, e lia Italia o Illyria pelos lórnbsr<strong>do</strong>s e gregos,<br />

e que por isso um pie<strong>do</strong>so chriatiío, pius ji<strong>de</strong>lis, forjára etltas epistolas <strong>de</strong>cre-<br />

taes, attribiiiii<strong>do</strong>-as virtuosamente aos primeiros papas. Scholion ao can. 1x1<br />

<strong>do</strong>s Ih'otatwr S. Gregorii vii Potztificia.<br />

I 1 Como veremos, 6 especialmente <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seaulo xx qiie comep a altera-


xirna ex parte, et postea ab Apostolis, et B. Clemente prae<strong>de</strong>cessore<br />

nostro ipsa divisio cst renovata. .. .u<br />

t<br />

O terceiro <strong>do</strong>cumento é a epistola <strong>de</strong> Aniceto, papa, aos bispos<br />

<strong>da</strong>s Galiias a respeito <strong>do</strong> nome <strong>de</strong> primaz e <strong>de</strong> quem po<strong>de</strong> só usar<br />

d'este titulo. Vem na llist. xczx. can. 2.O, que diz :<br />

~Nulli archiepiscopi primates vocentur, nisi illi qui primas pars tenent<br />

civitates quarum episcopos Apostoli, et successores Apostolorum<br />

regulariter patriarchas et primates esse constituerunt: nisi aliqua gens<br />

<strong>de</strong>inceps ad fi<strong>de</strong>m convertalur, cui necesse sit propter multitudinern<br />

eorum primatem constitiii.u<br />

O pontifica<strong>do</strong> <strong>de</strong> Anacleto 6 <strong>do</strong> anno 78, o <strong>de</strong> Clemente, <strong>de</strong> 9i,<br />

ção nas leis disciplinares, ten<strong>do</strong> por base a eollec@o <strong>de</strong> Isi<strong>do</strong>ro. Os pontos<br />

em que principalmente consistiu esta mu<strong>da</strong>np siio os seguintes :<br />

Convocação <strong>do</strong>s concilias - As falsas <strong>de</strong>cretaes não os permittem sem or<strong>de</strong>m<br />

dimaiia<strong>da</strong> <strong>do</strong> papa, ou sem o consentimento d'elle.<br />

Julgamento <strong>do</strong>s bispos - Pelas fslsas <strong>de</strong>cretaes s6 o papa os po<strong>de</strong> julgar. E<br />

<strong>do</strong>s principio8 mais repeti<strong>do</strong>s iiestas epistolas apocryphas.<br />

Transferencia <strong>do</strong>s bispos-As <strong>de</strong>cretaes <strong>de</strong> Isi<strong>do</strong>ro si, vêern o papa investi<strong>do</strong><br />

d'esse po<strong>de</strong>r.<br />

Erecçüo <strong>de</strong> ~bouos bispa<strong>do</strong>s<br />

&<strong>da</strong> tr1ri6o e dtviaEio i Segun<strong>do</strong> essas <strong>de</strong>cretaes s6 ao papa pertence<br />

Creap?io <strong>de</strong> patriarchai, me- / este direito.<br />

tropalitas e primazes<br />

Appellaçües para o papa - Por estas <strong>de</strong>cretaes, os bispos, qualquer padre,<br />

ern uma palavra, qualquer pessoa <strong>de</strong> qualquer parte <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong><br />

se cui<strong>de</strong> vexa<strong>da</strong> por uma auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> ecclesiastica, ou civil, po<strong>de</strong> appellar<br />

para o papa!<br />

Anacleto, Sixto i, Sixto 11, Fabiano, Cornelio, Victor, Zepbirino, Marcello<br />

e Julio, to<strong>do</strong>s estes nove papas, to<strong>do</strong>. estes martyres veneran<strong>do</strong>s, têm em<br />

sua bocca as falsas palavras <strong>de</strong> Isi<strong>do</strong>ro para suetentar este abuso espantoso<br />

! Qual seria o interesse d'este pie<strong>do</strong>so embusteiro? Ha alguem<br />

que acredite que a reforma, ao menos neste ponto, se fizesse sem'm et<br />

sine sensu? ha alguem que acredite que esta disciplina <strong>da</strong>s appellaçcies<br />

ao p:ipa cra a discipliria geral e coiisiietudiniiria c qrie pedia assini iinperiosarnentc<br />

qiie, a <strong>de</strong>~peito <strong>do</strong>s ciiiioriea, se passasse a eecripto ? h'o<br />

tempo <strong>de</strong> S. Pabiniio e <strong>de</strong> S. Cornelio vivia S. Cypriano, que escreveu<br />

contra as appellaç0es ao papa. No tempo <strong>de</strong> Sancto Agostiuho, no seciilo<br />

v, n egreja <strong>de</strong> Africa utto recebia taes iippellnçGes, e at8 ao ix seculo<br />

mui poucos exemplos se encoritram d'esta disciplina, e não ser <strong>da</strong><br />

parte <strong>do</strong>s gran<strong>de</strong>s metropolitas e etn raros casos.<br />

As irnmuni<strong>da</strong><strong>de</strong>u e exempPes <strong>do</strong>s clerigos a respeito <strong>do</strong>e po<strong>de</strong>res civis v&m<br />

tarnbern aqui beber a sua origem.<br />

Veja mais extensamente sobre este objecto os excellentes - ~ 8cmr8 sur<br />

Z1lIistoire ecclésiastiquc <strong>do</strong> abba<strong>de</strong> Peury especialmente o 4.0- e O que a<br />

respeito d'elles escreve Voltaire nas MdZarrges Hbtoriques, tom. 1.0, wp. 3.0.


e o <strong>de</strong> Aniceto <strong>de</strong> 157 ! Veja-se, pois, que grosseira falsificação<br />

esta nos termos, nas <strong>de</strong>terminaçòes <strong>do</strong> texto, em tu<strong>do</strong> palpavel,<br />

saliente cni tu<strong>do</strong>; dissonarite <strong>do</strong> espirito <strong>da</strong> epocha a que se attri-<br />

biie, impossivel mesmo dc se ter realiça<strong>do</strong> nos fins <strong>do</strong> primeiro<br />

scculo. E, ao mesmo tempo, qiie supremacia colossal a qiie d'ahi<br />

sr tlescobre na çadcira <strong>de</strong> Pedro !<br />

Deixii estupefacto esta au<strong>da</strong>cia <strong>de</strong> quem quer que fosse o seu<br />

aiictor !<br />

Accrescentai a isto os esforços feitos, havia já tres seculos, <strong>da</strong><br />

parte <strong>de</strong> Koma, por ventura inconscientes, para conqiiistar o pri-<br />

meiro logar ; o respeito ignorante <strong>da</strong> christan<strong>da</strong><strong>de</strong> ; a effectiva su-<br />

premacia religiosa e moral jh conquista<strong>da</strong> no fim <strong>do</strong> seculo v111 ;<br />

c ten<strong>de</strong>s assim a explicação <strong>do</strong> temor com que foram acceitas as<br />

<strong>de</strong>cretaes e <strong>do</strong> ar<strong>do</strong>r com que os papas as <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ram!<br />

Thomassin, quan<strong>do</strong> preten<strong>de</strong> explicar a transformação por que<br />

passa nos fins <strong>do</strong> seculo viir a disciplina <strong>da</strong> egreja, escreve estas<br />

riotaveis palavras :<br />

ulta cum rebus hiimanis comparatum est, ut jus qoodlihet ad eum<br />

tan<strong>de</strong>m dc\ol\atiir cique adhaerescat, cui caeteri illud permittunt,<br />

ciirandiim. <strong>de</strong>fiingendiimque diutissime.. ... . EIaec innoxia cst et sin-<br />

cera ratio qiia dcvoluta praescriptaqtie sunt pleraqiie jura, nec Pon-<br />

tificibiis, ncc Episcopis animum ad hacc advertentibus, sed sensim,<br />

sine sensu, invalescentc usu ct rcs itii confirmante ut infirmari <strong>de</strong>in<strong>de</strong><br />

netitiquam possinl. In utraqiie hotninum politia, ita multa fiunt iner-<br />

pcctata, inopiria; nemine fere diin fiunt advertente, nemine cum fa-<br />

cta sunt, infecta jum red<strong>de</strong>re pol1erite.n<br />

Sensim et sine sensu! Mas, se isto A ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, consentiu-se,<br />

consentiu a propria egreja no menoscabo <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s con-<br />

cilio~ ecumenicos, fomentou o <strong>de</strong>sprezo <strong>da</strong> pura disciplina pri-<br />

mitiva ! to<strong>do</strong> o crime <strong>da</strong> infame falsificação <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes peza so-<br />

bre ella ! Não ; não po<strong>de</strong> ser; porque entáo nâo teriam esses <strong>do</strong>-<br />

cumentos ganha<strong>do</strong> o respeito que alcançaram, porque foi exacta-<br />

mente pela sua antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> veneran<strong>da</strong> que elles po<strong>de</strong>ram obter<br />

tão gran<strong>de</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Sensim e1 sitte sensu! pois não havia aqui alguma cousa <strong>de</strong><br />

melhor, <strong>de</strong> superior, que se impunha? não era outra u disciplina<br />

oriun<strong>da</strong> <strong>da</strong> tradição apostolica? então porque é que se fazem essas<br />

<strong>de</strong>cretaes? A um puro effeito <strong>da</strong>s circumstancias, uma pura negli-<br />

gencia? e para que v&m agora os seus escriptores dizes-nos qiie


<strong>de</strong>s<strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os tempos a sB apostolica teve esta prerogativa? estamos<br />

nós nos seculos <strong>da</strong>s falsas <strong>de</strong>cretaes, cegos pela ignorancia<br />

miseravel d'esses tempos ? As falsas <strong>de</strong>cretaes não sáo uma etraducçno<br />

<strong>da</strong> disciplina consuetudiriaria pura. O seu apparecimento 6<br />

um facto essencialmente activo e intelligente e que por isso mesmo<br />

a egreja <strong>de</strong>ve reprovar.<br />

Surge to<strong>da</strong>via aqui uma dificul<strong>da</strong><strong>de</strong> mui extraordinaria. Como<br />

durante oito seculos se acreditou na pureza <strong>da</strong>s falsas <strong>de</strong>cretaes e<br />

a ellas se c!(w inteira força, apezar <strong>de</strong> sua falsi<strong>da</strong><strong>de</strong>; acontece que<br />

a disciplina <strong>do</strong>s concilios <strong>do</strong>s oito primeiros seculos, postoque nTio<br />

leva<strong>da</strong> i1 practica, continúa 'nestes oito annos seguintes a ser realmente<br />

a lei, a disciplina ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira ; porque to<strong>da</strong> a nova disciplina<br />

ou se fun<strong>da</strong> nas <strong>de</strong>cretaes falsas, ou se baseia em <strong>de</strong>cretaes,<br />

que, postoqric dimana<strong>da</strong>s <strong>do</strong> legitimo po<strong>de</strong>r legislativo <strong>da</strong> egreja,<br />

n;?o tem comtu<strong>do</strong> uma razão <strong>de</strong> ser acceitavel, nem paranós, riem<br />

para o proprio legisla<strong>do</strong>r, porque foi sua <strong>do</strong>utrina bebi<strong>da</strong> nos<br />

erros radicn<strong>do</strong>s por aquelle embuste.<br />

Como poi+m <strong>de</strong>rrubar to<strong>do</strong> este edificio, quan<strong>do</strong> o concilio <strong>de</strong><br />

Trcnto nol-o impe<strong>de</strong> com o seu anathema, e o tempo com n sua<br />

auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> ?<br />

A outros o cui<strong>da</strong><strong>do</strong> <strong>de</strong> solver este problema, se solução possivel<br />

se Ilie encontra: vamos cxpon<strong>do</strong> as phases di~ legislação canonica<br />

singelamente e sem pretcnsòcs <strong>de</strong> propbr reformas 'nestes<br />

capitulas d'essa legislação.<br />

Resta-nos observar que em to<strong>da</strong> esta collecção o esta<strong>do</strong> não<br />

tem partilha 'na herança <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r. O capitulo seguinte explicará<br />

esta exclusão.


CAPITULO V<br />

Des<strong>de</strong> o seculo IX até o concilio tri<strong>de</strong>ntino<br />

O que d primeira visla parece <strong>de</strong>duzir-se <strong>da</strong> leitura <strong>da</strong>s falsas <strong>de</strong>cre1aes.-Data d'esle<br />

orio<strong>do</strong> a supremacia (iontifical <strong>do</strong>s papas.-l\clorinas <strong>da</strong> ili~cil~lina comeca<strong>da</strong> por<br />

gilvestre e LeiIo, C continua<strong>da</strong> pui- Gregorio vil eseus soccessores -As fiilids <strong>de</strong>crelaes<br />

r50 falalincrile o inoltlc d'ruta reforma.- Esta<strong>do</strong> iiiiellectuii: e riiciral <strong>do</strong> occidtbnte<br />

<strong>da</strong> Europa: sua influencia no estu(lo e <strong>de</strong>senvolvimenln <strong>do</strong> direito pontificio.-<br />

Ahsoluts soberariia <strong>de</strong> Hoini~. - El)istola <strong>de</strong> Alekaiidre 111. -Os glo~sographos.-<br />

Epistolas <strong>de</strong> Celeslirio 111 e Innoccncio [ir.-A disçil~iina ;i respeito <strong>da</strong> circumscri-<br />

~cào <strong>da</strong>s dioceses torna-se iiileirarneoie geral <strong>de</strong>pois ilus capituloe v e vi, erlra, <strong>de</strong><br />

5880 xxii. -Os can. 48 e 49 Cous xvi, q r. -0piniao dc alguns auctores <strong>da</strong> eschola<br />

gallicana. - (:onlirrilacùo dò dircilo <strong>do</strong>a ilecretaes no cor:cilio <strong>de</strong> Trento. -<br />

Esta<strong>do</strong> <strong>da</strong>3 relacõeli <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r'chl)iritual e temporiil -Em que casos se <strong>de</strong>vem çrear<br />

os bispa<strong>do</strong>s, supprimil-os, unil-os e dividil-os.<br />

Quan<strong>do</strong> se I@em as falsas <strong>de</strong>cretaes, o que primeiro surge na<br />

rnciitch C. qucellas tinham em vista favorecer os primazes e não o<br />

t)ill)X a lettra dc seus tcxlos em muitos logares 'assim o parece<br />

iiidicar. comtu<strong>do</strong> 'oellas que se basba a elevaçiio esaggera<strong>da</strong> tla<br />

ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Pedro. Se attcntarmos <strong>de</strong> mais peito, sc rcllectirmos<br />

por um pouco, havemos <strong>de</strong> recuar estupetàctos ; liorquc <strong>de</strong>baixo<br />

<strong>de</strong> to<strong>da</strong>s aquellas paginas se <strong>de</strong>scobre não sei que colossal podcr,<br />

cu-jo aspecto inllexivel faz estremecer, c <strong>de</strong> quo o ~iilto iinmciiso<br />

eriche <strong>de</strong> sombras o episcopa<strong>do</strong> 'na egrcja e a realeza 'rio mun<strong>do</strong>.<br />

A supremacia pontifica1 <strong>do</strong>s papas está inteiramente estabele-<br />

ci<strong>da</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> este tempo.<br />

Depois <strong>de</strong> uma serie <strong>de</strong> pontifices que infamaram com sua vi<strong>da</strong><br />

a chronica <strong>do</strong> papa<strong>do</strong>, no espaço em que o futuro <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> os-<br />

cilla e ameaça per<strong>de</strong>r-se entre a velha civilisação romana agorti-<br />

sante e a nova civilisação feu<strong>da</strong>l nascente e mal segura ; a egreja<br />

v& subir ao throno poiitifical no scciilo x um homem singular,<br />

Silvestre ri,. que, nos curtos dias que vive, sabe com uin vigor<br />

extrnordinario reformar a disciplina, e <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r com uma energia<br />

terrivel a supremacia papal.


Annos <strong>de</strong>pois LeBo ix continúa a obra <strong>da</strong> purificaçáo <strong>do</strong>s costumes,<br />

e seus successores, Gregorio v~r, Urbano ri, Paschoal ir,<br />

Eugenio 111, Alexandre i11 e Innocente 111, procuram acabal-a,<br />

levantan<strong>do</strong> a disciplina abati<strong>da</strong> durante 150 annos. 'Nestes tempos<br />

<strong>de</strong> ignorancia o typo que se Ihes apresentava <strong>de</strong>ante, que se Ihes<br />

impunha, eram as falsas <strong>de</strong>cretaes.<br />

O monge IIil<strong>de</strong>bran<strong>do</strong>, esse vulto severo, s6 digno <strong>do</strong> cinzel <strong>de</strong><br />

Miguel Angclo, e <strong>de</strong> quem tanto bem e tanto mal se tem escripto,<br />

elle e outros poiitifices, zelosos <strong>da</strong> pureza <strong>do</strong>s costumrs, erguem<br />

<strong>de</strong> en~olta com a disciplina o supremo po<strong>de</strong>r pontifical.<br />

Os scculos xr e xrr são os seculos <strong>do</strong> renascimento <strong>da</strong>s letras,<br />

os seculos <strong>da</strong>s cscolas, <strong>da</strong>s universi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, <strong>da</strong> pbilosophia escolastica,<br />

(\a theologia positiva.<br />

Paris e Bolonha brilham uma e outra esclareci<strong>da</strong>s por seus professores<br />

<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> fama, por um Abklard, por um Alberico <strong>de</strong><br />

Keims, por um Pedro Lombar<strong>do</strong>, o bispo auctor <strong>da</strong>s famosas<br />

Sentenças.<br />

Em Bolonha, ci<strong>da</strong><strong>de</strong> já t8o conheci<strong>da</strong> por sua universi<strong>da</strong><strong>de</strong> e<br />

pela rcriovaçuo <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> e <strong>de</strong>scoberta <strong>da</strong>s leis romanas, um monge<br />

hencdictino procura harmonisar os velhos canones, as* falsas <strong>de</strong>cretam<br />

e varios trechos <strong>de</strong> S. Gregorio, <strong>de</strong> S. Agostinho, <strong>de</strong> S. Jeronymo<br />

e <strong>do</strong> sabio Isi<strong>do</strong>ro <strong>de</strong> Sevilha.<br />

Apparece o Becreto, a Concordia discor<strong>da</strong>nfium canonum, e<br />

por esta collecção se explica e ensina o direito canonico nas uriivcrsi<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

Quem olha para o occi<strong>de</strong>nte <strong>da</strong> Europa 'nestes seculos <strong>de</strong>scobre<br />

uma cfYervescencia, uma agitação sinpularissima. Des<strong>de</strong> o seeu10<br />

ix que Roma se via suff'oca<strong>da</strong> pela multidão que corria <strong>de</strong><br />

to<strong>da</strong>s as partes <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>. Os cscriptores pintam-rios o corisistorio<br />

<strong>do</strong>s car<strong>de</strong>aes como um parlamento e um tribunal, que começava<br />

seus trabalhos com o romper <strong>do</strong> dia (t os acnbavíi com o chegar<br />

<strong>da</strong> noite. Os papas não podiam respirar iim momcnto. As riquezas<br />

vasam-se na gran<strong>de</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os latlos <strong>da</strong> Europa, e <strong>de</strong><br />

envolta com ellas a perdiçuo e a <strong>de</strong>svergonha. Homii surge immensa,<br />

quasi tão gran<strong>de</strong> como no tempo em quc o imperio, cheio <strong>de</strong><br />

vi<strong>da</strong>, vencera o mun<strong>do</strong>; porque a Roma christã tinha o fulgor divino<br />

a illuminar-lhe a fronte, e a recor<strong>da</strong>ção <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> a erguelhe<br />

o pe<strong>de</strong>stal.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, ain<strong>da</strong> que a vi<strong>da</strong> intellecual seja cheia <strong>de</strong> mo-


vimento e <strong>de</strong> calor nas universi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, escolas e collegios, comtu<strong>do</strong><br />

este viver 6 rachitico. Ensinava-se a thcologia sem conhecer<br />

a tradiçáo, sem ter noticia <strong>do</strong>s livros <strong>do</strong>s padres, perdi<strong>do</strong>s nas<br />

bibliotliecas <strong>do</strong>s mosteiros ! explicava-se o direito canonico sem<br />

saber a historia ecclesiastica !<br />

O amor <strong>da</strong> fama, a siiperficiali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s estu<strong>do</strong>s <strong>da</strong>va origem A<br />

filaucia e pe<strong>da</strong>ntismo escolastico; fazia nascer essas subtilezas, impertinencias<br />

e distincçbes, hoje proverbiaes, que cortavam o v60 ao<br />

espirito e enchiam as universi<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

Na<strong>da</strong> admira portanto que nos fins <strong>do</strong> seculo xir, quan<strong>do</strong> Graciano<br />

elaborava o dccreto, corresse na tradiçáo a <strong>do</strong>utrina <strong>de</strong> que<br />

o papa era superior aos canones e que seu po<strong>de</strong>r não tinha limites.<br />

Debaixo d'este influxo foi architecta<strong>da</strong> a Concordia <strong>do</strong>s canones<br />

discor<strong>da</strong>nies, explica<strong>do</strong> o direito <strong>do</strong> Decreto nos cursos publico~<br />

; os proprios papas cm suas <strong>de</strong>cretaes obe<strong>de</strong>ceram a este<br />

impulso <strong>do</strong> tempo e <strong>do</strong>s acontecimentos, cui<strong>da</strong>ram-se mesmo obriga<strong>do</strong>s<br />

em consciencia a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r ate Ii morte este po<strong>de</strong>r, em o alargar<br />

por to<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong>.<br />

No seculo XIII (1238) o catalao Kaymun<strong>do</strong> <strong>de</strong> Penia-fort<br />

coml'bc a celebre collccyão <strong>de</strong> <strong>de</strong>cretaes, chama<strong>da</strong> <strong>de</strong> Grcgorio<br />

is, e por ella se continúa e~isinan<strong>do</strong> o direito canonico, oii antes,<br />

o direito pontificio. A confusa0 foi estrema ; a antiguidnclc inteiramente<br />

<strong>de</strong>spreza<strong>da</strong>, As dispensas <strong>da</strong>s leis, o cahos dc constituiçbes<br />

novas, <strong>de</strong>rogan<strong>do</strong>-se umas As outras, fizeram <strong>da</strong> jurispru<strong>de</strong>ncia<br />

canonica a jurispru<strong>de</strong>ncia mais arbitraria e incerta.<br />

Alguns papas eram romanistas distinctos ; a Europa consultava-os<br />

<strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as partes ácerca <strong>de</strong> objectos puramentecivis; o<br />

seu po<strong>de</strong>r crescia sobre a soberania temporal, aju<strong>da</strong><strong>do</strong> <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s<br />

estas espantosas circumstancias; e assim o direito canonico vai-se<br />

augmentan<strong>do</strong> <strong>de</strong> capitulas <strong>de</strong> mero direito civil.<br />

Os <strong>do</strong>utores <strong>de</strong>cretalistas que o ensinavam nas escolas transformam-se<br />

nos celeberrimos glossa<strong>do</strong>res <strong>do</strong>s seculos XII e 1111 l.<br />

Este esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> direito pontificio mostra-nos clarissimamente<br />

1 Mui celebres na historia <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvol\~imeiito<br />

<strong>do</strong> direito caiioi~ico, milia-<br />

mosos no seu tempo e alguns seculos <strong>de</strong>pois, os glosen<strong>do</strong>res não prestam<br />

gran<strong>de</strong> servi90 hoje ao estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>; suas glossas são insufficicntee; 08<br />

poritos obscuros não se interpretam com clareza ; falta a critica, porque se<br />

nElo conhecia a historia <strong>da</strong> egrejr, nem se possuia a eciencia <strong>da</strong>s antigul<strong>da</strong>-


como era gran<strong>de</strong> e como foi unico neste perio<strong>do</strong> o po<strong>de</strong>r papal.<br />

On<strong>de</strong> a soberania episcopal 4 on<strong>de</strong> a sobcrania <strong>do</strong> metropolita e<br />

<strong>do</strong>s syno<strong>do</strong>s provinciaes 4<br />

Tu<strong>do</strong> <strong>de</strong>sappareccu - a ignorancia e a superstiçno enchem o<br />

mun<strong>do</strong> <strong>de</strong> trevas ; e <strong>do</strong> meio d'esta esciiridno, d'entrc a crapula<br />

abjecta, d'entre as ambiçòcs vergonhosas, d'cntre os crimes mais<br />

nefan<strong>do</strong>s <strong>da</strong> perdição <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Clemente, v&-sc brilhar <strong>de</strong> tim<br />

brilho satariico o brutal e violento colosso <strong>do</strong> papa<strong>do</strong>, ergileii<strong>do</strong>-<br />

se <strong>de</strong> alem <strong>do</strong>s Alpes e dcscançan<strong>do</strong> a espa<strong>da</strong> <strong>de</strong> S. Paulo sobrc:<br />

to<strong>do</strong> o velho mun<strong>do</strong>'.<br />

Quem nâo presente a reforma protestante? quem nâo vê pro-<br />

xima a gran<strong>de</strong> transformação politica <strong>da</strong> Europa?<br />

Assim tambem, ao fin<strong>da</strong>r d'este perio<strong>do</strong>, o direito poiitificio pá-<br />

rcce ameaça<strong>do</strong> <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> revolução. No capitiilo seguinte vere-<br />

mos o <strong>de</strong>stino d'esta ingente instituicão : agora vamos Icr as <strong>de</strong>-<br />

cretiirs qiic firmam expressamcntc~ ao podcr pontificio os <strong>direitos</strong>,<br />

qiie no pcrio<strong>do</strong> anterior pertenciam aos sgno<strong>do</strong>s <strong>da</strong>s proliiicias,<br />

rmcjii,riito ao objecto <strong>de</strong> qite nos viimos occupiiri<strong>do</strong>.<br />

liicaxaridrc 111, tcn<strong>do</strong> criviatlo certo cardcal, lega<strong>do</strong> n Inicrr, iio<br />

ieiiio <strong>de</strong> Sicilia, com differentcs man<strong>da</strong>tos nega-lhe <strong>de</strong>pois aspe-<br />

ramcrite, como uma <strong>da</strong>s maiores faciil<strong>da</strong><strong>de</strong>s, reserva<strong>da</strong>s ao summo<br />

potitifice, cm signal <strong>de</strong> valioso privilcgio, a <strong>de</strong> unir e dividir os<br />

<strong>de</strong>s, iiitlispensaveis elemeiitos <strong>de</strong> uma sã iiitcrprettrç%o. O mesino crrso, por<br />

qiie rll~s crimrçain a glossa, como se llies tem nota<strong>do</strong>, e P riiiii i.ic il \vi.,<br />

r1%0 i ii:i niainr parte <strong>da</strong>s glossas mais <strong>do</strong> que urri extracto <strong>do</strong> prnp~ io t ('\to,<br />

AR vem i~tb pelas mesmas palavias. Abun<strong>da</strong>in as etymologias e ti? cit icicu<br />

<strong>de</strong> Iíi~nl es parnllelos, iiiiico serviço real qiie prestani ao estiidioso.<br />

1 Michelet, traduzin<strong>do</strong> ns memorias <strong>de</strong> Luthero, eacreve, falati<strong>do</strong> <strong>da</strong> viagem<br />

d'este homem celehre a Rorna : * On now dispense <strong>de</strong> peindre cettr Itnlie<br />

<strong>de</strong>s Borgia. I1 y avait crrtainemenfe à cetfe dpo@b@ quelque <strong>do</strong>se qui s'rst<br />

EU rarement ou jarnLiis <strong>da</strong>ne Z'histoire : une pervern'td raieonn<strong>de</strong> r6 soientifi-<br />

que, une magnifique osterrtation <strong>de</strong> eckl6ratesse, disona to& d'un mot : tepr?tre<br />

alh<strong>de</strong>, se croyaght roi du mo7r<strong>de</strong>.m<br />

Leiam-se as memorias cl'csse homem <strong>do</strong> norte 'neste capitulo, on<strong>de</strong> são insiispeitas<br />

ain<strong>da</strong> para os proprio.j catholicos ii~ais inelindrosos ; pois que Luthern,<br />

qiistn<strong>do</strong> veiu a Roma. arri~chr~ a vi<strong>da</strong>, cheio <strong>de</strong> feivor, para ver a<br />

gran<strong>de</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> S. Pedrc . BastnrB dizer que a pervere&a subira a tal excesso,<br />

que os padres chegavam a dizer, quan<strong>do</strong> consagravam a liostia: 1Pani.4<br />

es, et panis munebis.,<br />

A mesma drsniorcilisaç30 <strong>do</strong>s ultimos dias <strong>do</strong> imperin, que exacerbou a penna<br />

<strong>de</strong> Juvenal e inflammou a8 paginas <strong>do</strong> Apocalypsc, talvez superior a esta, não<br />

se apresenta com este sorkiso <strong>de</strong> cynisnio e com esta affectagào <strong>de</strong> siiperiori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

que avulta aqui.


ispa<strong>do</strong>s, e <strong>de</strong> a<strong>do</strong>rnar com a honra primacial a certa egreja, sub-<br />

metten<strong>do</strong>-lhe outras 6 sua jurisdic@ío.<br />

A epistola <strong>de</strong>cretal, em que isto se or<strong>de</strong>nava, dizia assim:<br />

u . Licet in regno Siciliae generalis sit tibi commissa legatio,<br />

a<strong>de</strong>o tamen sine spcciali man<strong>da</strong>to nostro non <strong>de</strong>biiisti mnnus enten-<br />

<strong>de</strong>re, qiiac in signiim prisilegii singiilaris siinl taiitun: summo Ponti-<br />

fici rcservata... An existimas qiiia vices nostras tanquam legato tibi<br />

commisimiis exequen<strong>da</strong>s, quod Panormitanam Ecclesiam posses srib-<br />

jicere Menanensi, ut illam praeficeres isti concesso sibi privilegio pri-<br />

maliae? An putas ex ea<strong>de</strong>m caiisa tibi licere duos episcopatus uuire,<br />

vel unum divi<strong>de</strong>re sine liceutia speciali?»<br />

Quan<strong>do</strong>, <strong>de</strong>pois, esta epistola vem fazer parte <strong>da</strong> collecçáo <strong>de</strong><br />

Gregorio ix, e constituir ahi o Cap. zv, De oficio legati; os<br />

glos~ographos começaram a estabelecer a regra cm to<strong>da</strong> a sua ge-<br />

nerali<strong>da</strong>tle, affirman<strong>do</strong> que para qualquer parte <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> aquelle<br />

privilegio era efficaz, e que só.no summo pontifice fôra reserva<strong>do</strong>,<br />

com exclusão <strong>do</strong>s mctropolitas 1.<br />

O Cap. VIZI, De exccssibus praelator., extrahi<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma epis-<br />

tola <strong>de</strong> Celestino i11 ao bispo Faustino, 6 támbem claro:<br />

aSic~it iinire Episcopatus atque potestata suhjicere alienae, ad summum<br />

Pontificem pertinere dignoscitrir : ita Episcopi est Ecclesiarum<br />

suae dioccsis unio et subjectio carum<strong>de</strong>m.))<br />

O emiiiente po<strong>de</strong>r <strong>do</strong>s papas sobre o episcopa<strong>do</strong>, posto que náo<br />

especialmente a respeito <strong>do</strong> nosso oI),iocto, 8, alem <strong>de</strong> outros 10-<br />

gares, luminosamente expressivo rio Cap. zz, Dc translat. episcop.,<br />

epistola <strong>de</strong> Innocencio i11 :<br />

((Sicut ergo Episcoporum translatio, <strong>de</strong>positio et cessio: sic et ele-<br />

ctoriim post confirmationem (sliiritiialis ratione conjugii) soli est Ko-<br />

rn:ino l'ontifici reservata; licel iisqiic ad tcmpora ista, quod caiitum<br />

fiierat ab Episcopis, expressiim non fiieratelectis :....o<br />

1 Sebast. Berardi - Comme~ltaria in jns Ecc2es.- Tem. 2, Diss. Cap.<br />

1 .o - E8tevão L)no?y, Jmis I>o?tlificii Tomi IY, Paro I continens conc2usionee<br />

et abeolutbsirnunt igadieem. ac sztmmam omnim materiartim, quae exponu~ltur<br />

in textu et glouaia totim juris Canonici d in concilio Tri<strong>de</strong>ntino<br />

et regulie cancellariae et quibua<strong>da</strong>m Bullia ex/ravagantibua maxime dktin-<br />

ctiogie contestus - vb. E@opatzls, nS0<br />

2.


No Cap. I, De Se<strong>de</strong> vacante, <strong>do</strong> mesmo papa, v&-se egualmerite<br />

que ao papa pertencia a creaçao <strong>da</strong>s dioceses:<br />

aNovit ille, diz csse texto, qiii scrutator est cordirim qiiod licet<br />

prae<strong>de</strong>eessor noster, Ecclesiam vestram ereserit cathedralem, ipsam<br />

Bathoniensi EcClesiae unien<strong>do</strong>, ut i<strong>de</strong>m esset Episcopus.. . a<br />

Este costume tornou-se perfeitamente geral, <strong>de</strong>pois que JoBo XXII<br />

publicou as extravagantes, quinta e sexta, De praebendis et di-<br />

- gniralibus.<br />

O Cap. v, extra, tractan<strong>do</strong> <strong>da</strong> divis8o em cinco dioceses <strong>da</strong> <strong>de</strong><br />

Tolosa, <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> exposiçào mui dilata<strong>da</strong> <strong>do</strong>s motivos d'essa divi-<br />

são, vem dizen<strong>do</strong> :<br />

rNos ... praemissis et aliis sua<strong>de</strong>ntibus justis causis ex certa nostra<br />

sctentia <strong>de</strong> fratrum nostror~im coiisilio concordi ct Apostolicae pleniludine<br />

potestatis ad lau<strong>de</strong>m Dci, exaltationem ccclcsiac, fi<strong>de</strong>liumqiic<br />

salutem, Episcopatum ipsum, dictamqiic diecesim 'I'holosanain Aportolica<br />

auctoritate dividimus in quinque dioccsis, qrias per ccrtos distingui<br />

limites faciemus.. . »<br />

O Cap. VI, Nuper certis ex causis, extra, <strong>de</strong> praebcrtdis, re-<br />

ferin<strong>do</strong>-se ain<strong>da</strong> ao mesmo negocio <strong>de</strong> Tolosa, dá uma idéa tão<br />

perfeita <strong>do</strong> que era o po<strong>de</strong>r papal 'nestes tempos, que não po<strong>de</strong>-<br />

mos <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ce<strong>de</strong>r ao <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> o transcrever para aqui em<br />

gran<strong>de</strong> parte:<br />

rNuper, começa esse Cap. VI, certis ex caiisis quae nostriim ct<br />

fratrrim nostrorum animos ad id rationabiliter indiixeriint, qi~ondiirn<br />

Episcopatum Tholosanum in Archiepiscopatum, srii nirtropoliianam<br />

ereximus Ecclesiam : aiiator villas. auarum ciiiiirrilibet iiisianirnus vo-<br />

. . "<br />

cahulo civitates, quator catht,drales Ecclesias crcLli\imiis, riniim \ri<strong>de</strong>-<br />

licc-t in villa montis Albani, quon<strong>da</strong>m Caturccn. dioccesis adjicien<strong>da</strong><br />

sibi certa parte qiion<strong>da</strong>m diorcesis Tholosan. altc~r;tiri i11 \illa I..iirnbe-<br />

riaci, aliam i11 villi sancti Pauli, et aliam in villa Itiiis 1.1 <strong>de</strong> ltobes-<br />

tria qiion<strong>da</strong>m 'l'holosan dioecesis.<br />

Quas qiiidcm Ecclesias una ciim Apamiariim Ecrlesia qriam siiffraganeas<br />

sut)jecimiis ipsi mrtro~>olit;inac Tholosannc Ecclrsiiie. De bonis<br />

quoqiie et reditibus dicti quon<strong>da</strong>m Episropaliis 'l'Iiolus;in. 'I'iini ipsi<br />

Tholosan. qiiam pracdiciis Ecclesiis su1Tritg;incis ccrtaui portionrm,<br />

quam iiniciiiqiie ill;iriim <strong>de</strong>bere sufficcre \idiniiis, pro\idiriiiis iissignandnm,<br />

totale honorum c1 reditiium, ipsoritm rcsiduo dispositiom<br />

noatrae et sedis Aportolicae reseraalo. Alia eti;im circa praruiissa feeimus,<br />

<strong>de</strong>erevimus ct ordinavimus cx certa nostra scientia, et ipsorum


fratrum ' k t d i eonsilio et aaostolicae nlmitudine outestatis dis-<br />

trictios B;bjbCdrs rre quis cujusc;imque pra'eerninentiae: ordinis, con-<br />

ditionis rut siatus &iamsi Archirpiscopali dignitate fiilgeret, ipsfim<br />

ordinationem nostram iaqediret, praesiimeret, vel turbare.. . . . .»-<br />

Em segiii<strong>da</strong> a extrava,.ante <strong>de</strong>creta, alem <strong>da</strong>s jti hilmina<strong>da</strong>s na<br />

1)rimc.irn cpistola, outras penas contra os que impedirem a exe-<br />

riiqào <strong>da</strong>s or<strong>de</strong>nanyas papaes.<br />

Era isto pela primeira meta<strong>de</strong> <strong>do</strong> sr~culo xiv.<br />

Sáo ain<strong>da</strong> bem tcrmiiiantcs os canones seguintes quanto h uniào<br />

e divisão <strong>da</strong>s dioceses:<br />

O can. XLVIII, Caus. XVI, q. r, <strong>do</strong> papa Gregorio:<br />

nQiiia igitur Cumani castri Sacer<strong>do</strong>s cursum ~itae hujus expl(>vit,<br />

iitras qiic nos ecclesiaspraesentis aitctoritatispaginn unisse, tibiqucromniisisse<br />

cognosce: propriiimquc iitrariimquc ecclcsiari~m scilo te csse<br />

Pontificem. Et i<strong>de</strong>o te, quaeciimqric tibi dc eariim patrimonio, vcl<br />

clcri ordinatione, sinc promotioiie, jii\ta canoniirn statiita tisa fiicrint<br />

ordinnre, atquc clisponcrc, Iiabe1,is iit proprius revcra Sacer<strong>do</strong>s liberam<br />

ex nostrae nucloritat;~ consensu afqice permissione 1icentiam.u<br />

O can. XLIX, Caz4s. xrrz, q. r, <strong>do</strong> mcsmo Gregorio, usa quasi <strong>de</strong><br />

cguaes exprcssíies :<br />

r...... qiiippe iit Pontifex proprius liberam habeas ex praesenti nos-<br />

tra permissione 1icentiam.n<br />

Depois <strong>de</strong> Joào xxii, os papas têm goza<strong>do</strong>, sem coritestação,<br />

d'este importante pri\ilcgio, como dc miiitos outros.<br />

' Alguns auctores dir escola gallicaiia, tclri<strong>do</strong> <strong>de</strong> confessar o direito<br />

<strong>do</strong>s papas em quanto 6 união e tlivisào <strong>da</strong>s dioceses em preseiqa<br />

<strong>do</strong>s canoncs <strong>de</strong>cisivos e tcrmiiiarites, prrtcn<strong>de</strong>m, comtu<strong>do</strong>,<br />

que similliante prikilepio Ihes não pcrtcbrice com exclusào <strong>do</strong>s metropolitas<br />

a rcspeito di~ erccyão o11 aholiyao <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, por náo<br />

<strong>de</strong>scobrirem nas dccretaes um tcxto bem positivo 1. Estes me- 1<br />

.<br />

1 Gibert - Corpus Jlcr. Cason. per regulaa, tom. 2.0, tit. vil, 5 vr, pag.<br />

133. > edic. . 1735.<br />

Sustelita este escriptor que a creaqàn c ahnliçiio <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s perterico ao<br />

papa c rn~tropolitns, e iiXn, só hcliiellr; poriliio iiào riicoiitra (6 opini80<br />

d'ellc) texto nenhiirn qiie ~~nsitiv:iiiieiitc oxrliiri os metropolitas; e que, cmquaiito<br />

os can. 50 e 51, ('aiis. ~$1, q. 1, exprt~ssairicnte os clinniam, e juricta-<br />

mente 110 seculo ri I, ain<strong>da</strong> o Cap. r\ I <strong>de</strong> major. et obedient. d'elles fala 'neetee


mos, porém, confessam que a praxe <strong>de</strong> ha muito tem consagra<strong>do</strong><br />

este costume.<br />

Niio são, pois, s6 as <strong>de</strong>cretaes, cm riosso mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> ver, bem categoricas:<br />

6 o direito consuetiidinnrio ; é a prescrip~ao, 6 a analogia<br />

1, que lhe conferem esse privilegio.<br />

No penultimo concilio ecumeiiico a egrrja confessa isto mesmo<br />

perante o catholicismo, e no momento mais solemnc <strong>de</strong> sua existencia,<br />

quan<strong>do</strong> <strong>de</strong>cidia irremediavelmeiite <strong>do</strong> seu futuro; quan<strong>do</strong><br />

combatia o protestantismo nascente e ameaça<strong>do</strong>r.<br />

((Et guia jure optimo, faziam os padres escrever nos capiti~los <strong>da</strong>s<br />

soas ordcnancas disciplinares <strong>de</strong> reformasão, et qiiia jure optinlo dis-<br />

tinctae fuerunt diocceses et parochiae ac unicuique gregi proprii attri-<br />

buli pastores, et inferiorum ecçlcsiarurn rectores, etc. u<br />

9 'Ncsse mesmo concilio se fulmina o anathema contra aquelles<br />

qiie disserem não serem ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros e Iegitimos bispos os qut. o SSO<br />

em virtu<strong>de</strong> <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> pontifice; o que vale dizer tlc urna<br />

maneira encoberta, mas segura polo nníithemn, que rino sfio Iegi-<br />

timos e ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros os que niio forem institui<strong>do</strong>s por graça d'a-<br />

qiiella auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> 5.<br />

Em mais <strong>de</strong> um logar os padres <strong>de</strong> Trento expressamente lem-<br />

negocios; B certo que nRo obsta nenhum <strong>do</strong>s capitulou d ~ <strong>de</strong>cretaes, s cita<strong>do</strong>6<br />

para jiistificar este prikilegio, porqiie são mal interpreta<strong>do</strong>s.<br />

Niio somos dleste sentir; parece-rios esaggera<strong>da</strong> esta opioigo <strong>de</strong> Gihert, o<br />

qiial coiif~ssa, elle propiio, que o costume tem si<strong>do</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito teolpo contra<br />

a soiiteiiça geniiiiia <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes.<br />

NLo iios admiremos d'cstas controversias: B mais facil saber eem contestaç&o<br />

o direito <strong>da</strong> egiFja antes <strong>do</strong> Decreto, <strong>do</strong> que por este e pelas <strong>de</strong>cretaes,<br />

como muito bcrn nota Edchardio. ITermt 1~ JVT. Lih. duo 5 308 e not.<br />

1 Pois concebe-si, que ao papa pertença o piiviltgio (IR iiiiião e divisão<br />

<strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, e lhe 1150 pcrtc-riçn o <strong>da</strong> sua creaç,To c abolição?<br />

2 C'onc. Tri<strong>de</strong>nt. Sess. 14, <strong>de</strong> reformat. cap. JX.<br />

1 Conc. Tri<strong>de</strong>nt. Scss. 23, can. vrii.<br />

.Si qui dixerit, epracopos, qui arsctoritate Romani Pontificis assumuntur<br />

non esse legitzmos et veros episcopos, sed Jiymentum humanum; anathema<br />

sit.,<br />

Devoti, Inst. Canonicar. Lib. 1, tit. 3, S. 1, fj 18, no!. l..,e~creve, f~lan<strong>do</strong><br />

FI respeito <strong>da</strong>s prerogativas <strong>do</strong> papa e a ~reposito <strong>da</strong> cit. Sess. 23, ran. vrrl<br />

<strong>do</strong> concilio tri<strong>de</strong>iitiiio: altaque si a co~icilio tamquam cafholio m <strong>do</strong>-pa <strong>de</strong>-<br />

Jinitum est, veros ac legitimo8 esse Episcopos, quia Surnmo Yoirtifie crealb<br />

sunt, facile inlelligitur, legitimam esse IJo~~tifici creandwum Ep'scoporum<br />

poteslaten, sine qua &?i ver3 ac legitivni Episcopi Imberi non po88unt.*


am a soberania plena <strong>da</strong> s6 Apostolica, que canon algum, nem<br />

<strong>de</strong>creto <strong>de</strong> concilio p6<strong>de</strong> ferir.<br />

Baslarh ler o Cap. xxi <strong>de</strong> Refor. <strong>da</strong> Sais. xxv:<br />

(~Postremo sancta Synodus omnia et siogola, sub quibuscumque<br />

clatisiilis et terbis, quae <strong>de</strong> moriirn rcforinatiorie atgue ecclesiastica<br />

disriplinn. tnrn suh fel. rcc. Paiilo rir. ac Julio rir, qiiam sub beatissimo<br />

Pio rv. I>oiitificibus maximis. in hoc sacro concilin shtuta sunt, <strong>de</strong>-<br />

clíirat, ita dccrela fiiisse, ut in bis salva semper auctoritas sedis apos-<br />

tolicae et sit, et esse inlelligatur.. 1<br />

O que acahamos <strong>de</strong> kr nas pieinas <strong>do</strong>s <strong>de</strong>cretos e <strong>do</strong>s canoiies<br />

<strong>do</strong> concilio ecumeoico <strong>do</strong> secuio svr, e que nos parece a perpe-<br />

tuaçiío <strong>da</strong> zrancle theoeracia, esboça<strong>da</strong> a largos traços no direito<br />

diis clcc.ret ICS, na0 E mais <strong>do</strong> que o ultimo esforço, o <strong>de</strong>rra<strong>de</strong>iro<br />

?rito tl'iimo causa que se sentevenci<strong>da</strong>. A posição <strong>da</strong> egreja <strong>de</strong>pois<br />

<strong>do</strong> scciilo svi 6 inteiramente nova nas suas relações com o po<strong>de</strong>r<br />

tcmpnral.<br />

Neste perio<strong>do</strong> a egeja E perfeitamente in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, soberana;<br />

e mais <strong>do</strong> que isso, é <strong>do</strong>mina<strong>do</strong>ra. O gran<strong>de</strong> Gregorio vi1 tinha<br />

imagina<strong>do</strong> para a egreja uma architectura colossal no estylo egy-<br />

pcio e oriclntal <strong>da</strong>s grari<strong>de</strong>s theocracias primitivas; mas nas socie-<br />

tlii<strong>de</strong>s moilcrrias corria um sangue tliflercrite, os scus clcmcntos<br />

rram outro^; u tlioocracia ciihiii por terra no tempo d'cllc, <strong>de</strong>s-<br />

pe<strong>da</strong>~an<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> encoiitro á nobreza feu<strong>da</strong>l; e <strong>de</strong>pois acabou <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>struir-se nos fins <strong>do</strong> seculo xiii com o embate <strong>da</strong> realeza altiva,<br />

e no scculo xvi com a colera <strong>da</strong> revoluç80 religiosa e <strong>da</strong> heresia<br />

triumphante 9.<br />

Como pois pensar um momento s6 na iritervenç80 <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> nos<br />

1 Veja-se ain<strong>da</strong> R Seas. vil, <strong>de</strong> Reform. pr. - r Ea<strong>de</strong>m sacrosancta Syr10di~t,<br />

eisrlem prasi<strong>de</strong>ntibus Zeqatis, inccpt~rm resi<strong>de</strong>ntiae et reformationi.~ ne-<br />

~loti 112, ad Dei lau<strong>de</strong>m et cllktianae religMzis incrementum persrqui intendrirs,<br />

cct seq~iitur, etatue~~dt~rn censuit, salva sempet in omnibua Sedb ApoetoIic?r<br />

aucloritate.<br />

2 E no scculo XIXI qiie ee lev~nta no sul <strong>da</strong> França a cclchre heresia e<br />

seita <strong>do</strong>s alhigeiises, r que em gran<strong>de</strong> paite <strong>do</strong> norte ,e occi<strong>de</strong>nte <strong>da</strong> Eiiiopa<br />

se sente o prirnriro estremecer <strong>do</strong> prateit:tritismo. E o tempo em qiie 80<br />

liinpnm 2s arin s para s guerra religiofi.1 e .e preparam os ataques ao po<strong>de</strong>r<br />

<strong>da</strong> egrt.ia; é o tempo <strong>de</strong> S. Luiz 11% Frnl~qa, O auctor <strong>da</strong>s prim~iras prRgmaticas,<br />

e iippoiu <strong>de</strong> Wiclef na Ingliitrrr~ Ditam principalmente <strong>do</strong> seciilo<br />

XIV as priinciras luctrs <strong>do</strong>s reis e <strong>do</strong>s papas.<br />

FBo d'este tempo os conflictos com ou i~ri~iria<strong>do</strong>rea, a guerra <strong>da</strong>s investiduras<br />

e as gran<strong>de</strong>s cotiten<strong>da</strong>s com os aiiti.piipas.


negocios <strong>de</strong> creaçso e circumscripção <strong>de</strong> dioceses, quan<strong>do</strong> era esse<br />

pelas <strong>de</strong>cretaes, como vimos, um <strong>do</strong>s mais preciosos ornamentos<br />

<strong>da</strong> tiara, e os papas o <strong>de</strong>cidiam <strong>de</strong> sciencia certa, <strong>de</strong> pleno po<strong>de</strong>r,<br />

e ajunctan<strong>do</strong> a seus <strong>de</strong>cretos as penali<strong>da</strong><strong>de</strong>s fortissimas, que Ihes<br />

eram garantia mui eficaz ?<br />

Se alli, no tempo <strong>do</strong> imperio e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> Constantino, a egreja<br />

ao passo que resistia ao po<strong>de</strong>r civil, se aproveitava <strong>de</strong> seus regu-<br />

lamentos, e perfilhava suas constituições; era que ella jh pretendia<br />

transpor os limites <strong>de</strong> sua natural jiirisdicyão, conservan<strong>do</strong> ao<br />

mesmo tempo esse <strong>do</strong>ce laço, que Constantirio conseguira atar cm<br />

bons tempòs passa<strong>do</strong>s.<br />

Agora, porem, ella <strong>de</strong>spe<strong>da</strong>ça to<strong>da</strong>s essas prisões, e campêa s6<br />

e unica sobre a Europa.<br />

A disciplina, pois, Acerca <strong>do</strong> nosso objecto C 'ncste pcrio<strong>do</strong> a<br />

mesma emquanto ao po<strong>de</strong>r temporal e inteiramente outra quanto a<br />

cgre.ja :-PXC~US~O inteira <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>-soberania absoluta <strong>da</strong> cgreja<br />

na pessoa cio papa.<br />

Antes <strong>de</strong> passarmos ao capitulo seguirite diremos cm resumi<strong>da</strong><br />

cxposi~80 quaes os casos em que o direito <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes permittia<br />

a crciiçao <strong>da</strong>s dioceses, sua união e divisfio.<br />

As causas <strong>de</strong> erecção <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s sào <strong>de</strong> duas especies: -gcracs<br />

e particulares.<br />

As geraes cifram-se em duas :<br />

I - a evi<strong>de</strong>nte utili<strong>da</strong><strong>de</strong> - eui<strong>de</strong>ns uiiliias.<br />

I1 - a urgente necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> - urgens necessitas.<br />

Os canonistas <strong>de</strong>duzem as particulares <strong>da</strong>s causas, que rias <strong>de</strong>cretnes<br />

os papas expressamente dizem ser as que pediam a creação<br />

<strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s nesta ou naquella região.<br />

D'essas, expressas nas <strong>de</strong>cretaes, apenas se contam tres, que<br />

são as hypotheses seguintes:<br />

I - Se cresce a povoaçáo <strong>do</strong>s fieis e elles <strong>de</strong>sejam ter bispo<br />

proprio (caus. xvr, Quest. I, can. 5).<br />

11- Sc e tão diffusa a área <strong>da</strong> diocese, que não po<strong>de</strong> um<br />

bispo s6 prover a to<strong>da</strong>s as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s d'clla; ou se C <strong>de</strong>masia<strong>do</strong><br />

duro ao povo ver-se obriga<strong>do</strong> a ir a gran<strong>de</strong>s distancias tractar <strong>de</strong><br />

to<strong>do</strong>s aquelles importantes negocios que tem <strong>de</strong> sc passar na se<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> uma diocese (cap. v, <strong>de</strong> praebend. et dignit.)<br />

111- Se pela extensão, <strong>da</strong> diocese ou sua opulencia, a nimia


abun<strong>da</strong>ncia <strong>de</strong> seus reditos sr torna causa <strong>de</strong> <strong>de</strong>smoralisaç80 (cap. 5.'<br />

De praebendis et dignit. 1).<br />

Cumpre-nos notar que, classifican<strong>do</strong> em tres especies as causas<br />

particulares <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, ri80 querem os canonistas <strong>da</strong>r a enten<strong>de</strong>r<br />

que fóra d'essas hupotheses se riáo possa erigir um bispa<strong>do</strong> novo.<br />

To<strong>da</strong>s as \e7it.; qiie a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> urgente, e por conseguinte a evidcritc<br />

utilitldc!ts, o reclamar imperiosamentr, posto que náo se verifique<br />

nerihiima <strong>da</strong>s especies <strong>do</strong> cap. 5." 8 , oii caus. xv~ <strong>da</strong><br />

questão 1 ."o Decreto, <strong>de</strong>ve ain<strong>da</strong> o summo poritifice, sollicito em<br />

acudir ás necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>do</strong>s povos, expedir a competente bulla <strong>de</strong><br />

erecçso.<br />

O qiir dizpmos <strong>da</strong> erecçào <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s A <strong>da</strong> mesma forma applicavel<br />

á sua união, divisão e suppressão.<br />

As causas <strong>da</strong> união e dibisáo <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s são igualmente geraes<br />

e purticiilarese.<br />

As causas geraes <strong>da</strong> uniáo e divisáo não se acham especifica<strong>da</strong>s<br />

1 August. Barbosa, Jur. Ecclea. Univers. lib. 1.0, cap. 2.0, n.O 131 in fine.<br />

Gibert, Corp. Jur. Canonic. per regulas, tom. 2.0, tit. vri, 5 vi, Reg. vi et vir.<br />

2 Gibert, lng. cit.-August. Barbosa, Jur. Caiz071. I~kterpret. ~S'electa, tom. vi,<br />

Praetermissa et addz'tam. ad CoUectun. Doctor. i l quiiique ~ Llecretal. 1ilir.caus.<br />

xvr, q. I.', pag. 327.<br />

Estevào Danyc, Jur. Pontif. tom. iv, Pars I:, vb. episcopntzts, n.O 2, diz:<br />

, a... caiisa rioros Episcopatus erigendi est multiplicatio populi duin tarnen<br />

solt~innihiis et frequentioribus locis fiaiit ne vi!escat Episcopalis digiiitws-<br />

glos. mirlfiplicat ir1 exirav. se<strong>de</strong>s Apost. De o$cio clele,q. ittler comrntrne8.r<br />

~~Epi9cnpa!usiiii reditibus pluririium abuii<strong>da</strong>iis et tc.i.ritorium grau<strong>de</strong> habeiis<br />

ita quod Episcopus singularum omriem viilturn iiispicere non possit, po:<br />

test erigi in Aletropolim nornm, cui pro Siiffinganeis Ecclcsiis possunt errgi<br />

Episcopatus illi, et alii <strong>de</strong>putati er!rauag. Sduator <strong>de</strong> prarb. inler commune8.s<br />

Os cauoniatas distingiiem tres varie<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> uuiVes: a utuito suppressiva<br />

-mio suppres.viva, a uriiiio accessoria - unio accessoria, e a uniao priiicipal-principaliu<br />

unio.<br />

Em a unicio suppressiva uin <strong>do</strong>^ bispa<strong>do</strong>s unieri<strong>do</strong>s supprime-se iriteiramente;-é<br />

como se não tivesse existi<strong>do</strong>. A proviscio <strong>do</strong> bispo iiào faz nieliç50<br />

algiiiiia d'elle. Se por exemplo entre nós o bispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Evora se unisse ao <strong>do</strong><br />

Al~arve st/,ppressice, o bispo 86 po<strong>de</strong>ria usar <strong>do</strong> titulo <strong>de</strong> bispo <strong>do</strong> Algarve,<br />

e tipo <strong>de</strong> bispo <strong>de</strong> Evora e <strong>do</strong> Algarve juncta ou separa<strong>da</strong>mente.<br />

E o exemplo <strong>do</strong> can. 49, caiis. xvi, q. 1.'<br />

A união accessoria cffectua-se? quan<strong>do</strong> um bispa<strong>do</strong> se une ou accrescenta<br />

a outro, fazeri<strong>do</strong>-se como que um simples accessorio ou aniiexo d'elle-qua&<br />

accessorium eeu anlcexa-não <strong>de</strong>sapparece inteiramente como se nRo existira<br />

quau<strong>do</strong> na união auppressive; mas tambem não,conserva egcial altura ao lii<strong>do</strong><br />

d'aqi~elle a que se une como na pri,ncipaliter. E a especie <strong>do</strong> cap. 8.O De excessib.<br />

pra<strong>da</strong>t. e <strong>do</strong> cap. 1.0 h'e Se<strong>de</strong> Vac.<br />

A uiiião principal dá-se, quan<strong>do</strong> se unem <strong>do</strong>is bispa<strong>do</strong>s, conservan<strong>do</strong>-se<br />

comtu<strong>do</strong> ambos e não se submetten<strong>do</strong> nenhum d'elles ao outro. Na provisão


em nenhum texto; mas, como para a creação <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, eHas<br />

<strong>de</strong>vem ser a urgens necessitas e eui<strong>de</strong>ns ulilitas. k o que se <strong>de</strong>duz<br />

<strong>do</strong> can. 2. Disl. m e <strong>do</strong>s cap. 20 e 23 <strong>de</strong> Electione.<br />

As particulares <strong>de</strong> união S ~ O os casos em que occorrem a urgente<br />

necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> e evi<strong>de</strong>nte utili<strong>da</strong><strong>de</strong> ; e vem expressas duas : -<br />

a falta ou diminuiçâo <strong>do</strong> povo <strong>da</strong> diocese qiie não precisa <strong>de</strong> <strong>do</strong>is<br />

bispos-e a invasão <strong>do</strong>s inimigos (can. 48 e 49, Caus. xvr, q. 1).<br />

Das causas particulares <strong>de</strong> divisâo s6 falam o can. 5, Caus.<br />

xvr, q. i, e o cap. 5. <strong>de</strong> praebend. et dignit., e são as mesmas<br />

<strong>da</strong> creação <strong>de</strong> novos bispa<strong>do</strong>s, porque realmente a divisão<br />

involve uma nova erecção <strong>de</strong> dioceses.<br />

ambos guar<strong>da</strong>m seu nome, c para nao parecer que um d'ellrs e&& sujeito ao<br />

outro, coiijurictamerite se iiornettm ria provisio, lios coiitraetos e lias assigiiaturra.<br />

Neste caso o bispo tem a op@o para residir em amhas as egrejt~s<br />

OU só<br />

numa d'ellas. Assim, iin liypotlicse <strong>da</strong> uniio principaliter feita tios Iiitipaclos<br />

<strong>do</strong> Algarve e Evorri, o bispo lia <strong>de</strong> chamar-se e wssigiiar-se bispo (10 A1g:ii.c.a<br />

e <strong>de</strong> Evora; elle po<strong>de</strong> residir ou 96 em Evpra, ou sd cni Paro, ou ter resi<strong>de</strong>ii-<br />

cia permarieiite em ambas as ejirejas. E o exemplo <strong>do</strong> mn. 4.8, caiis. xvr,<br />

y. 1.. Veja Gibert no logar cita<strong>do</strong>.


CAPITULO V1<br />

A SB Apostolica e as Egrejas nacionaes;<br />

ultimo esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> direito <strong>da</strong> egreja<br />

Comcc:i a lucta <strong>do</strong> pe<strong>de</strong>r tomporrl contra a ré apostolica.- A escola ultramonlana<br />

reriiige, rib<strong>de</strong>cen<strong>do</strong> a uma lei <strong>da</strong> bistoria.- Erradi~ caminlio qiie ;i i~xl.t~j;i seguiu<br />

no concilio <strong>de</strong> Tmnlo.-A porirão <strong>da</strong> egreja e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o reculo xvii iii;i iliíliri1.-<br />

Apparecem os <strong>de</strong>fensorm <strong>da</strong>s likr<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong>r tarejas iiacioiiaes : consei1iienci;is d'estr,<br />

eslii<strong>do</strong> <strong>do</strong> (li reito eccle6iaitico.-0s realistas, os ulLr~monlaoos, a pliiloso y1iii1.-A<br />

escola teii~pei-a<strong>da</strong> ou constiiucioniil. - Ultima ybase <strong>da</strong> disciplina Acerca <strong>da</strong> eirruuscripcão<br />

e creaeào <strong>do</strong>e bispa<strong>do</strong>s.<br />

A historia <strong>da</strong> scgun<strong>da</strong> meta<strong>de</strong> <strong>do</strong> seculo xvr fecha em sua ultima<br />

pagina o capitulo <strong>do</strong> direito poritificio; esvaem-se os sonhos<br />

que sonhára Gregorio vir e algiins <strong>de</strong> seus successores ; a theocracia<br />

está con<strong>de</strong>mna<strong>da</strong> para sempre.<br />

Comcça npra uma lucta incarisatel: <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os la<strong>do</strong>s se ataca<br />

o ~v<strong>de</strong>r <strong>da</strong> ccrre'a no po<strong>de</strong>r papal; a soberania temporal. clariiiin<strong>do</strong><br />

0.J<br />

:~mancipiiçã~, tai quasi a esmagar a in<strong>de</strong>pendt~!ic,i~i (i qii(:<br />

tem dircito a egreja, a <strong>de</strong>positaria <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r espiritual.<br />

Se <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> tantos seciilos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>za, se <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> espantosos<br />

esforços, <strong>de</strong> táo custosa perseleratiça, a sé apostoiica conseguira<br />

cobrir o orbe com a rcdc <strong>de</strong> siia jiirisdiccão larguissima ; se agora<br />

a reforma levantava o collo, ameaça<strong>do</strong>ra e triumphaiitc ; se uma<br />

parte <strong>da</strong> Europa rasgava, rin<strong>do</strong>-se, iis bullas <strong>da</strong> excommiinh~o papal<br />

e viraba as costas aos poritificcs, <strong>de</strong>sprezan<strong>do</strong>-os ; como não<br />

qiiereis que Roma se erguesse tambem <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> primeiro, terrivel<br />

e inespera<strong>do</strong> rebbs, que a arrrmesshre <strong>da</strong> ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Yedro?<br />

como não quereis v6s, que, repulsa<strong>da</strong> atC ao outro la<strong>do</strong> <strong>do</strong>s Alpes,<br />

a cohorte <strong>de</strong>fensora <strong>da</strong>s tradiçòes papaes náo surja outra vez d'alem<br />

d'esses montes, voltan<strong>do</strong> á lucta ?<br />

Niio se apagam assim as vestigios <strong>da</strong>s instituiçbes que foram<br />

alguma cousa no mun<strong>do</strong>, que resumiram uma epocha, que presidiram<br />

ao seli <strong>de</strong>senvolvimento e <strong>do</strong>minaram o seu viver.


Destruiu porventura o christianismo, <strong>de</strong> uma vez ],ara sempre,<br />

o elemento romano <strong>da</strong> civilisação? e não era este mesmo irilliicnciatlo<br />

pelo espirito <strong>de</strong> outros gran<strong>de</strong>s cyclos <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> <strong>da</strong> humnni<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

?<br />

k acsim que se pren<strong>de</strong>m as geraçòes; 6 assim qiie o mun<strong>do</strong> vai<br />

arrastiiní10 a sua i<strong>da</strong>, fruiii<strong>do</strong> a heranya <strong>do</strong>s st~ciilos e soffren<strong>do</strong><br />

as d6rc.s <strong>do</strong>s vestigios indcl~*veis <strong>do</strong> veneno, qiir 'riesta o11 'iiiiquclla<br />

epodlia corroeu as socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s e Ihes causou a morte ; qiic é este<br />

tambcm outro Icga<strong>do</strong> <strong>do</strong>s tempos, bem triste mas ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro.<br />

Nuo 6 poríb~n (l'cste facto que nos <strong>de</strong>vemos Iamcntar, que scria<br />

isso loucura ; <strong>de</strong>vemos <strong>de</strong>plorar antes, e <strong>de</strong>plorar bem <strong>do</strong> fun<strong>do</strong><br />

<strong>da</strong> alma, o caminho erra<strong>do</strong>, que a egrcja tem segui<strong>do</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> este<br />

tempo.<br />

Se, <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> revoluçào religiosa e politica <strong>do</strong> seculo xvr, acabou<br />

<strong>de</strong> facto a gran<strong>de</strong> supremacia <strong>de</strong> Roma ; comtu<strong>do</strong> ella continuou<br />

a existir vika, iiidccliiiavel no direito <strong>da</strong> cgrcja. Esta exislencia<br />

6 falsa, (s affectadii, firigi<strong>da</strong> nas leis, mas persiste com a forca<br />

d'ellas.<br />

Que outra cousa B o concilio <strong>de</strong> Trento, senh a ~)c~rp(>tiiii~G~<br />

<strong>de</strong> to<strong>da</strong>? as prerogativas <strong>da</strong> tiara <strong>do</strong>s papas? Qriaiitlo to<strong>do</strong>s os que<br />

olham ao quiidro immeriso <strong>da</strong> ki<strong>da</strong> dii egr~ja bPcrn i~l)l)roximar-se<br />

o scculo xvi, cui<strong>da</strong>m logo <strong>de</strong>parar com urna nova eporha ria Icgislação<br />

ecclcsiastica. Na historia <strong>de</strong> qualquer outro dirfaito, isso<br />

teriii acontcci<strong>do</strong>; porém aqui nao, que tu<strong>do</strong> se passa <strong>de</strong> outro<br />

mo<strong>do</strong> : isto tem <strong>de</strong> particular, <strong>de</strong> mui singular, a historia d'esse<br />

direito.<br />

Keuiic-se um concilio ; disciitem-se as questões <strong>de</strong> disciplina ;<br />

tu<strong>do</strong> isto compelii<strong>do</strong>, obriga<strong>do</strong> pela forca <strong>de</strong> um gran<strong>de</strong> aconteciincrito,<br />

que as leis fataes <strong>da</strong> Iiistoria mokiam e que ninguem no<br />

miiri<strong>do</strong> podia evitar ; e este concilio, loiige tlc transigir com esse<br />

facto terri\rl que o fi~cra corilociir, sclla com a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> moral<br />

<strong>da</strong> palavra <strong>de</strong> scus bispos, com a inspirayão divina e sobrenatural<br />

<strong>da</strong>s <strong>de</strong>cisões conciliares, (* tlcfeiiílr com a ameaya tremen<strong>da</strong><br />

<strong>do</strong> anaihema to<strong>da</strong> a obra <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> ; petrifica com sua voz, veneran<strong>da</strong><br />

para o catliolicismo, as institui~òes então já incompativeis<br />

com a ci,ilisaçào, e que rio futuro, ou haviam <strong>de</strong> produzir a perdiçuo<br />

<strong>da</strong> egreja, se se nao regenerasse, ou haviam <strong>de</strong> seccar as<br />

fontes mesmas <strong>do</strong> progresso, e, involven<strong>do</strong> <strong>de</strong>pois o mun<strong>do</strong> no<br />

su<strong>da</strong>rio <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, dizer-lhe fatidicamente : - ~ivei agora ! -


Foi este iim <strong>do</strong>s gran<strong>de</strong>s erros <strong>da</strong> egrqa ; e o futuro, n8o em<br />

nossa vitl,i <strong>de</strong> certo, mas ás gera~iòes \iii<strong>do</strong>uras, saberá dizcr quaes<br />

os fiiriestos resulta<strong>do</strong>s d'taste <strong>de</strong>ploravel acontecimento.<br />

O concilio quiz impòr as suils <strong>de</strong>cisòes ao mun<strong>do</strong> cntholico, c<br />

mais <strong>de</strong> uma iiac;8o Ih'as niio qui~ acceitar sem reslriçcòes.<br />

A posição <strong>da</strong> egreja <strong>de</strong>s<strong>de</strong> este momento começa <strong>de</strong> ser mui dif-<br />

ficil, porque enceta a lucta com a realeza ; e em muitos logares,<br />

o qiic cra inteiramente novo, são os proprios monarchas que <strong>de</strong>-<br />

fen<strong>de</strong>m as heresias.<br />

Ao mesmo tempo, como a rcforma protestanlc 6 odiosa para a<br />

monarchia, porque a forca, que 'riella se irivol\e e que acaba <strong>de</strong><br />

ahalar o tlirorio <strong>de</strong> Yedro, 6 capaz <strong>de</strong> <strong>de</strong>struir tambem os thronos<br />

<strong>do</strong>s reis, iic.onttlce que os combatciiles, que se acercam <strong>do</strong>s moriar-<br />

t 1~19. ntac,,irn a se aposto!ica, preti:ri<strong>de</strong>ri<strong>do</strong> cubrir com seu escu<strong>do</strong><br />

o c ,itli ,li( ,\mo ; e, como este se idctitilica 110 papa<strong>do</strong>, centro <strong>da</strong><br />

SO. csli,,. \Crn iiiagar a existencia <strong>da</strong> legislacào geral <strong>da</strong> egreja,<br />

(Ia Icpislação verd~dciramente cathoiica, ecumeriica, pugnan<strong>do</strong> tão<br />

s6 pelas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong>s egrejiis.<br />

Ca<strong>da</strong> um tracta <strong>de</strong> si, ca<strong>da</strong> um procura fazer na sua cgrcja as<br />

reformas qiic a <strong>de</strong>ixem coexistir com os progressos <strong>da</strong> moriarchia,<br />

com os dirclitos <strong>da</strong> coroa; mais tar<strong>de</strong> isto passa-se (Ia mesma manvira,<br />

mas para ajustar ao imperio <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> o calholicismo <strong>da</strong> egreja.<br />

lrsk inolirncaiilo eniituli-se, a <strong>de</strong>speito <strong>de</strong> sé apostolica, sem o<br />

aeii tisst~titimeiito, e algumas vezes mesmo sem clla sabcbr; mas<br />

ciliicitua-sc e k reali<strong>da</strong><strong>de</strong>. Nasce d'aqui um esta<strong>do</strong> abortivo, mori-<br />

struoso ; po<strong>de</strong> quasi dizer-se com acerto - o calholicismo romano<br />

-porque o pretentli<strong>do</strong> catholicisrno <strong>da</strong>s outras egrejas d diverso<br />

<strong>do</strong> <strong>de</strong> Koma; e d'este mo<strong>do</strong> elle <strong>de</strong>sapparece a meio <strong>de</strong> sobre a<br />

terra.<br />

A ver<strong>da</strong><strong>de</strong> é que este esta<strong>do</strong> 6 incomprehensivcl, mas real; a ver-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong> 6 quc a cgreja tem razào dc se queixar <strong>da</strong>s nações catho-<br />

lictis ; -1niis tambem é ver<strong>da</strong><strong>de</strong> que só a separação <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is po<strong>de</strong>res,<br />

<strong>de</strong>iliin<strong>do</strong> a cgreja entregue ao seu proprio vi~er, po<strong>de</strong>rá<br />

c.orisc1puir o catholicismo ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro, se um catliolicismo k possivel<br />

; c tambcm 6 f6ra <strong>de</strong> duvi<strong>da</strong>, para n6s, que aquella scparaçâo<br />

só po<strong>de</strong>rá inteiramente verificar-se, quan<strong>do</strong> a egrqa quizer rcformar-scl,<br />

mo<strong>de</strong>lar a sua coristituiçào pela architectura <strong>do</strong> primitivo<br />

christi;iirisrno, porque o que actualmente se podc sem erro chamar<br />

cuílrolicismo romano, k um conjuricto <strong>de</strong> instituições iricom-<br />

8


pativeis com o progresso, com a liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, que é s6 o futuro <strong>do</strong><br />

mun<strong>do</strong>, que palpita ancioso por ella.<br />

Eis aqui a origem, a explicaçZío <strong>de</strong> encontrarmos hoje as bi-<br />

bliothecas clicias <strong>de</strong> uma immensa multid8o <strong>de</strong> canonistas <strong>do</strong>s so-<br />

CII~OS XVI e xvir, em cujas obras a <strong>do</strong>utrina conserva o mesmo<br />

caractcr <strong>da</strong> <strong>do</strong>s escriptos <strong>do</strong>s srculos anteriores. A glosa hoje si-<br />

gnifica ain<strong>da</strong> tanto como entáo, e mais que entao crescem os com-<br />

mentarios aos cinco livros <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes <strong>de</strong> Gregorio ix, e nestas<br />

paginas continúa assim a apparecer inteira a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> Se<br />

Apostolica.<br />

Ao mesmo tempo vão <strong>de</strong>terminari<strong>do</strong>-se as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong>8 eprejas;<br />

publica-se o resumo, como que o codigo <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> algu-<br />

mas 1; o clero francez retine-se em assemblea e promulga os qua-<br />

tro celebres principios <strong>de</strong> sua Declarução; diz ao mun<strong>do</strong> que a<br />

egreja gallicana pensa e crê que o papa, e to<strong>da</strong> a egrejti, s6 re-<br />

ceberam <strong>de</strong> Deus po<strong>de</strong>r sobre as cousas espirituaes e não sobre as<br />

temporaes;-que pensa e crê que o papa não é supcrior aos cano-<br />

nes; e que a plenitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r <strong>da</strong> sancta Sé tal, que, não só<br />

não tira força alguma aos canones <strong>do</strong> coricilio cciimenico <strong>de</strong> Coiis-<br />

tanya, mas que ate, segun<strong>do</strong> os canones, <strong>de</strong>vc ser excrci<strong>da</strong>.<br />

E, ao sentir renascer sua antiga e venerari<strong>da</strong> força, o episcopa<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>sperta e as fileiras <strong>do</strong> gallicanismo engrossam-se; a <strong>do</strong>utrina <strong>da</strong>s<br />

libcr<strong>da</strong>dcs <strong>da</strong>s egrejas vae-se tornan<strong>do</strong> <strong>do</strong> <strong>do</strong>miriio <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s e ac-<br />

ceitn-se como a cvi<strong>de</strong>ncia e a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, os magistra<strong>do</strong>s enten<strong>de</strong>m c alargam, em dctri-<br />

mento <strong>do</strong> podcr <strong>da</strong> egreja, estas mesmas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, a ponto <strong>de</strong> os<br />

seus proprios <strong>de</strong>fensores se verem obriga<strong>do</strong>s a diier qiic náo en-<br />

ten<strong>de</strong>m as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja como as concebem os magistra<strong>do</strong>s%.<br />

1 Nn França os irmãos Pithoii, aiitigos calvinistas, puhlicarnm o Traitk dra<br />

libertés <strong>de</strong> l'(gZise Gallicane em 1594, e <strong>de</strong>pois Dnpuys <strong>de</strong>u a publico as pro-<br />

vas d'essas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s famosas.<br />

2 Como o disse Hoçsu~t, na França, no seu disciirso sobro a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> fk.<br />

NFio po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> dizer duas palavras a respeito d'este gran<strong>de</strong> facto,<br />

que occupou os seculos xvrr e xvirr.<br />

Quan<strong>do</strong>, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> serenar a tempesta<strong>de</strong> levanta<strong>da</strong> pelo moiige di Witemherg,<br />

a eschola d'alem-montes couscgue erguer-se <strong>de</strong> iiol o, a bua colerii i e-<br />

<strong>do</strong>bra tcmivel, e naquellas nações on<strong>de</strong> a reforma n%o foi abraça<strong>da</strong>, ahi ella<br />

emprega to<strong>do</strong>s OS nieios para diiniiiuir e acabar o po<strong>de</strong>r <strong>do</strong>s reis. A seita <strong>do</strong><br />

Jesus tem em seus escondi<strong>do</strong>s <strong>de</strong>aignios o ~~~~ogrnrnma <strong>de</strong> Gregorio vir. Conto<br />

agora, a scienein surgira rmancipadn <strong>da</strong>s trevas <strong>da</strong> c<strong>da</strong><strong>de</strong>-media e <strong>do</strong> crrpusculo<br />

<strong>do</strong> retiascimento; ern quanto na escuridão essa seita emprega to<strong>do</strong>a 06


Juiictainciitc com tu<strong>do</strong> isto, ao sei1 la<strong>do</strong>, ora iiitlueiician<strong>do</strong>-o,<br />

ora caminliari<strong>do</strong> inc!i&rerite para com vsse movimerito acanha<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

iima grnn,!e qu-o, a philosoyhia dc!scbnvulve-se, cresce, aperfeicoa-rc<br />

em to<strong>do</strong> o secuio rvii c no xviri, e, ao cliegar o seculo<br />

xis, :\o aiiroximar-se mso tempo, ella miiltiplira seus braços,<br />

abrange to<strong>do</strong>s os tr&h <strong>do</strong> cspirito. Tu<strong>do</strong> se discute, tu<strong>do</strong> se<br />

arrasta a tribo* m), e ahi se lhe pergunta- porque existe<br />

t ~vircluc t1adc contúar i ai-tir.<br />

.\ .,cic,iicia politica, por cst;icionaria e quasi cobrin-<br />

<strong>do</strong>-se inteira d'um aspecto e<strong>da</strong>stico wb a inlluencia <strong>da</strong>s escolas<br />

<strong>do</strong>utrinaias, ergue seu v& e <strong>de</strong>scobre os vastos cbos <strong>do</strong> futiiro.<br />

A pliilosophia <strong>da</strong> bistoria, a si-ia pova, impassivel c gran<strong>de</strong>,<br />

illumina com sua <strong>da</strong>ra e serena luz o passa<strong>do</strong> <strong>da</strong>s iristituiçòes e<br />

tlt~svt~ii<strong>da</strong>-llies ao mesmo ternpo (I seti porvir.<br />

t\55irn ;I sciencia, a iiitelligenl:ia tlo seculo, discute Roma e o<br />

papa, o catholicismo e a idka religiosa, a religiáo a egreja,<br />

. -<br />

t<br />

meios ara realisar seus extravagante, projectos, os caiionistas <strong>de</strong>fcn<strong>de</strong>m em<br />

suas o ras O po<strong>de</strong>r <strong>do</strong> papa. O novo eiam~iito <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>, s realeza, precisara<br />

<strong>de</strong> um <strong>de</strong>feiisor. Aos rnonarroi1i:icbos opp',paio lias Prelecçùes <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> I'dt-io, e aiii<strong>da</strong> nivitos oiikos<br />

<strong>do</strong>e iiosnos reiuicolas e extrangeiros, to<strong>do</strong>s iiiui curiosos pctlo que sigi~ifirain<br />

e representarairi rio <strong>de</strong>stino <strong>da</strong>s naçGes, c cpualiiietite pelo apparato dc sue<br />

arguiiientaç%o, exaggero <strong>de</strong> suas theorias cle realeza moiiarchica, <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong><br />

direito diviiio e pelos titulos pomposos <strong>de</strong> seus cscri tos.<br />

Coiiio monarchomaeon notaveia, d'eotir n infinita asls <strong>do</strong># secinrios d'eitu<br />

1 1


k um novo perio<strong>do</strong> que se abre sobre os tempos a vir; graridc<br />

perio<strong>do</strong> sem duvi<strong>da</strong>, que contém a solt~çáo <strong>de</strong> muitas <strong>da</strong>s mais<br />

commoventes questões que nos agitam a to<strong>do</strong>s, que agitam a liiimaiii<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />

atE ao mais fun<strong>do</strong> <strong>de</strong> seu esgirito.<br />

E no meio dc tu<strong>do</strong> isto que faz a egreja? qunri<strong>do</strong> a ultima Irora<br />

<strong>da</strong>s liber<strong>da</strong>tles <strong>da</strong>s egrejas vai soar talvez, qiiari<strong>do</strong> li\rc d'estas<br />

servidões ella vai começar a viver gran<strong>de</strong> como rios s~iis primci-<br />

ros dias, que faz ella?<br />

Renasce, cresce, augmcnta-se pavorosamente, por todii ;i parte,<br />

o parti<strong>do</strong> ultramontano,-e s8o táo magcstosos os riossos dias, que<br />

o mun<strong>do</strong> scicntifico dá a essa escola um riome novo -iieo-catho-<br />

licismo-e discute grave as suas theorias !<br />

Eis aqui como se 110s apresenta esta ultima e riova pliasc tio<br />

direito <strong>da</strong> egreja.<br />

VAem to<strong>do</strong>s a arena <strong>da</strong> lucta dividi<strong>da</strong> em tres facçòes, que dizcrn<br />

ca<strong>da</strong> uma combater pela unica idéa que se casa com o catholicismo<br />

<strong>da</strong> egreja, e a ver<strong>da</strong><strong>de</strong> 6 que ca<strong>da</strong> tima d'ellas <strong>de</strong>feri<strong>do</strong> os princi-<br />

pios que o excluem inteiro.<br />

absiird~s theorias, lembraremos João dc Mariaiin no livro <strong>de</strong> Zle Ihge et Hegis<br />

i7isiitcttim~e, rcfutatlo por Roiissrl 110 Aliti-Maria~ia, - Bellarrnirio nos<br />

wiis recriptou, e especialmente no Trai tn<strong>do</strong> - Potestas I'upae circa res t~m-<br />

~~oralrs, que é mais um elogio <strong>do</strong> assaibiiiato <strong>de</strong> Henrique rv <strong>do</strong> que a refu-<br />

taçào dc Harclayo, corno pieteri<strong>de</strong> ser. Foi refuta<strong>do</strong> por Jogo Barclayo, filho<br />

d'aqucllr, no livro Dt-potestate papae, an et q7iatrnus in Rrgno et Prir~cipee<br />

secttlurt-s jvs et inzperi7~m habent, c airi<strong>da</strong> o rnesino Bellarmino ria obra I)e<br />

cntl11.oceraiis eltristiaitue fi<strong>de</strong>i adcersus 7~1Lj118 temporis haereticos. O jesuita<br />

Francisco Soares, professor <strong>da</strong> nniversi<strong>da</strong>dr <strong>de</strong> Coimbra, na Defesa <strong>da</strong> fd ca-<br />

tholica, etc.,-Molina, lente na iiniversi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Evora, rio seu tracta<strong>do</strong> De<br />

justitia ~t jure, 1602,-Azor nas Institzit. Moral.-Becano, Opuscula Th~o-<br />

Zo,qica, etc.<br />

Seria fastidiosissimo c sem maior proveito fazer a lista <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os inonarcomachos.<br />

Veja-se Hennirigio Arniseo, Tractotw <strong>de</strong> Auctorifate I'ri11ci1)c~rn in<br />

Populum, cxp. 1.0, n.O 1, tom. 2.0, <strong>da</strong>s Obras poli!icas no fim. 1(;48; egualnicnte<br />

1Ieiriccio -Elemrnta juris uati~rae et genliz~m, 121. 2.O, 5 cxxx, not.<br />

e a Drducção CILronolor/icn x pag. 416 e scruiiites.<br />

I'srn se fwer idCa <strong>do</strong> qiie foi rsta hingular disputa, que hoje a escola ultramoiitsiin<br />

prrteiidc coritiriuar, mas que o ii:lo po<strong>de</strong> conseguir, poi que se não<br />

tlisciite com clla iiessr objecto jR julga<strong>do</strong>, vamos tranqcrerer ~~ilui o s~giiinte<br />

trecho <strong>de</strong> Ariiiseo iio logar cita<strong>do</strong> -De vi in griiicipem semper ir~~ts(a :<br />

.Pli:irisneos quondrirn, geiiiis horniniim sstutum arropans, Regibus ipsis in<br />

f~stos fiiissr, adco iit eos aperte oppngiiare non veriti fucrunt, probnt Jose-<br />

phus x\ ir anticl. cap. Y ex (.o, quoti ciim jarn totri geiis Ju<strong>da</strong>eorum fi<strong>de</strong>in cae-<br />

sarai obliglissent jiirejuran<strong>do</strong>, ipsi soli rnaliieririt, non tantum boriis mul-<br />

tari, sed et peiiciiliim vitae incurrere, qiiam magi~tratiii coni corteros se<br />

eubjicere Horum vestigiis iricediint 11011 pauci ex recentioriim scriptorum nu-


Apparecem - a escola ultramontana - a escola tempera<strong>da</strong>-a<br />

escola realista.<br />

'1 tlizcordia <strong>do</strong> sacer<strong>do</strong>õo e <strong>do</strong> impt~rio, mas catholica -a concordia<br />

<strong>do</strong> sacer<strong>do</strong>cio e <strong>do</strong> imprio, mas anti-catholica - outra pretcridi<strong>da</strong><br />

concordia, mas ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira discorilia, <strong>do</strong> sacer<strong>do</strong>cio e <strong>do</strong> im-<br />

1)11rio. anti-catholica, e em senti<strong>do</strong> inberso <strong>da</strong> neo-catliolica.<br />

Perguntar pois amora, neste gerio<strong>do</strong>, qiinl o<br />

-.<br />

direito <strong>da</strong> egreja<br />

hcc.rca <strong>da</strong> circumscripção, e creay;io <strong>da</strong>s dioceses, vale fuer uma<br />

pergunta a que se po<strong>de</strong>m <strong>da</strong>r tres respostas.<br />

Pelo direito canonico geral, pelo pensar <strong>da</strong> eschola ultrainontana,<br />

unica representante genuina d'esse direito, a <strong>do</strong>utrina conserva-se<br />

a mesma - como <strong>de</strong> tu<strong>do</strong> o que temos dicto se <strong>de</strong>ve ter<br />

iitlivirilia<strong>do</strong> : - o papa s6 possue este importarite direito, e na<strong>da</strong>,<br />

incro qiii cum sint <strong>de</strong> poprrlo, ut suo ordini quisque impensius favet, quani<br />

ulteri, yopuli partes iln ag~i~lt contra principes, ut satis non habeant, si ab<br />

obedientia populum liberciit, quati<strong>do</strong> princeps <strong>de</strong>gcnerat; iiisi subditis quoque<br />

potestatern et jus tribuaiit iii ipsos regcs, et eubverso naturae ordiiie ex parentibus<br />

imperarites, ex sobtlitis Rege-, cx viilgo faciant principes. Multi<br />

quasi bonitatc causae diffisi iie noriiiric qiiidrrn sua adjicere aiisi sunt.8 Refere-se<br />

nestas ultimas palavi as Arniseo ao li\ro <strong>de</strong> ceito Junio Bruto,.pseii<strong>do</strong>nynio<br />

<strong>de</strong> um auctor, que atacava violentanierrte o po<strong>de</strong>r <strong>do</strong>s reis. Heinecio<br />

esçiel c no jl lembra<strong>do</strong> $ rxxx: - a... a<strong>de</strong>oque pestilentissimurn sit illud<br />

<strong>do</strong>gina riionnrchomachorum, quod popu21~s si1 ipso rege vel principe superior<br />

et penes illiim rr.alis, peues huuc personalis tantum majestas repeiitur.~<br />

Tal é ri. vicissitu<strong>de</strong> <strong>da</strong>s cousas humauas, qiie neste tenipo o direito <strong>do</strong>s povos<br />

ci a instrumento <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r <strong>do</strong>s papas ! e foi preciso combatel-o para evitar<br />

a thcocracia ! Eis o perigo <strong>da</strong> <strong>de</strong>mocracia sob o imperio <strong>da</strong> igriorancia.<br />

E-ta Iiicta chegou a tal excesso, que em muitos logares se con<strong>de</strong>mnaram<br />

publicamciite estes tracta<strong>do</strong>s, lavran<strong>do</strong>-se contra elles verbosas sentenças,<br />

cobrin<strong>do</strong>-os com os mais irifamantes epithetoe, e lançan<strong>do</strong>-os hs cbainmas pelos<br />

executoi ~s <strong>da</strong> jnstiça, com to<strong>do</strong> o apparato e solenitti<strong>da</strong><strong>de</strong>s terriveis <strong>de</strong><br />

uma execuçAo <strong>do</strong>s tenipos <strong>do</strong> absolutismo rclal.<br />

Em comperisaçHo a sagrn<strong>da</strong> congregação <strong>do</strong> In<strong>de</strong>x ia ~poutan<strong>do</strong> as obras<br />

<strong>do</strong>s adversarios, e maii<strong>da</strong>ii<strong>do</strong> tambem tls fogueiras <strong>do</strong> s~~riiptuoso Vaticano<br />

que Ihes fosse <strong>de</strong>voi aii<strong>do</strong> as paginas qiie ameaçavam <strong>de</strong>struil-o.<br />

Que csprctaculo singular <strong>da</strong>s ambiç3es e choleras <strong>do</strong>s homens! e é assirii<br />

to<strong>da</strong> a liistoria <strong>da</strong> egreja, que em certo perio<strong>do</strong> é a historia <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>; 9,<br />

assim que a intelligencia <strong>do</strong> honiem, sain<strong>do</strong> livro <strong>da</strong>s mãos <strong>de</strong> Deiis, tem conquista<strong>do</strong>,<br />

H. custa <strong>de</strong> muitas cslarni<strong>da</strong><strong>de</strong>s, seus foros e regalias.<br />

Quan<strong>do</strong> ser& o dia <strong>da</strong> paz, o dia <strong>da</strong> fi aterni<strong>da</strong>dt,, o dia <strong>do</strong> Evangelho? Ser4<br />

o dia <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, o dia <strong>do</strong> Christo?<br />

Sabe-o o futuro. Respeitemos o seu silencio, e no entret:iiito <strong>de</strong>diquemos<br />

ca<strong>da</strong> hora, ca<strong>da</strong> rnomento <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> A gran<strong>de</strong> conquista <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, para qu,e,<br />

qiiaii<strong>do</strong> cairmos no ultimo dia, possamos dizer ti moci<strong>da</strong><strong>de</strong>:-fazei como uos,<br />

que assim ganhareis o <strong>de</strong>scanso, quaiicio volver<strong>de</strong>e aò silciicio <strong>do</strong> tiirnulo,


absolutamerite na<strong>da</strong>, tcm que ver com isto o po<strong>de</strong>r civil, o po<strong>de</strong>r<br />

real 1.<br />

Pela eschola tempera<strong>da</strong>, o direito, conservan<strong>do</strong>-se o mesmo em<br />

principio, modifica-se comtu<strong>do</strong> na applicação, exigin<strong>do</strong> as coii-<br />

veniencias que o consentimento <strong>do</strong> principe seja pedi<strong>do</strong> e sua con-<br />

cessão indispcnsavel para levar a effeito estes negocios%.<br />

1 Episcopatus divisio et unio ad sol~~m Papam speotat ... Episcopatua ere-<br />

clionem factam a Papa in catltedralrm vel metropolim impedientes ultra poenas<br />

cmommt~izicationie, ~nterdicti et su.~prnsionis perdunt feu<strong>da</strong> et quaecumq~rr<br />

hen~ficia spiritualia et temporcilin; et si sint personae ecclesiasticae, &-<br />

ciuutnr inhabiles ad quaecumq7ie Crvtrjicia ecclesiasticu. Ilaoyz, Jur. Pontif.,<br />

Toini, iv - Pars. 1, vb. - Episcopatus, n." 2.<br />

C 1 'rimo igâtur soll~s Papa Eccleniam eri.$t et constituit in Cathedralem :<br />

i<strong>de</strong>m dicit <strong>de</strong> erectioae Ecclesiae C'alhedrali in metropolitanam.~ -Aiigust.<br />

Bai liosn, jur. eccles. univcrs., lib. 3, cap. 2.0, n.e 139.<br />

A rehpeito <strong>da</strong> dikislo <strong>do</strong>s hispaclos, leia-se o n.O 140 <strong>do</strong> mcsrno cap. 2.0, e<br />

sol~ir, a aiiitio veja-se o n.O 147, egrialmerite <strong>do</strong> mesmo cnp.<br />

a,Scicr1r/7trn est qtlorl eretiones in Cathedralem pari non ( 1~ heant nisi a Papa..<br />

h'tli,i$, iii prax. hcricficior, tit. <strong>de</strong> erectione Ecclesiae in Cathedralem n.O 1.0<br />

- 7irc ohsfat q7rod Imprrator eriyat civitatem, mrtropnlitnnamque faciat ....<br />

srrl ~ O I L 2101r~ i( eriqere Episcopalem vel arc?~irl~iscoy)nlrn~ dignitatem, quis aad<br />

hoc n~illus 11nOrt potestalena extra 1'apana.r O rriesrno Rehilff, log. cit. n.O 5.<br />

Leia o ii O 22 <strong>do</strong> Tit. <strong>de</strong> mjone <strong>da</strong> rncsma nrnxe <strong>do</strong>s beneficios. a resaeito <strong>da</strong><br />

urii5o <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s.<br />

Vrjs ain<strong>da</strong> Azor, Institdion. Moral., pag. 2, lib. 5.0, cap. 29, q. 25 in pr.<br />

e lih ti:, ca8. 30: 9. 2 e 4.<br />

Nicolnu arcza <strong>de</strong> õeneficiis, ~nrt. 12. caD. 5. n.O 1. vara a ereccilo <strong>do</strong>s<br />

bispa<strong>do</strong>p, e cnp. 2,'n.0 60 iara 8 8iia união.<br />

/)r. .llexia, pag. 280, 354 e 43.) <strong>do</strong> seu Tractar/o <strong>de</strong> direito ecrlesiastico.<br />

Kr:i pr'cisv um volume para citar to<strong>do</strong>s os cwnoriistas, que sem coiitcstaçiio<br />

affii niarri esta disciplina : bastam estes para veirrios como 8 aiii<strong>da</strong> viqoiosissi-<br />

ma a tloutiiiiri <strong>do</strong> direito canotiico <strong>de</strong>pois <strong>do</strong>s at:iyiies <strong>do</strong>s realistas (. tlns rc-<br />

voliiçGes <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.<br />

2 . Quare non esl, qucd a communi nniversalis Ecclesiaeaensu rece<strong>da</strong>mus for<strong>da</strong><br />

A , , .<br />

s'n princip~s a :ulatio~te; ut cm~tigit Marco Ar~tonio <strong>de</strong> Dominis, qui episcopatui~rn<br />

institutionem Rr,p'bus prrperam et co~ilra ipeos cnnonrs asserit. ibtn<br />

reiie!ins (lispotrrn<strong>da</strong>e ratio ad Ecclesiam prrti~~rt, quernadmodum dixi, quam<br />

tamen sine consensu Principum peragere noil drbet ut osten<strong>da</strong>m, lihro IV.<br />

Cap. xirr.. Pedro<strong>de</strong> hlarca, Concordia Sacerd. et Iuiper. Lih. 2.0, cap. IX n." 7.<br />

Hoje oa eecriptorcs <strong>da</strong> eacola ultrainontana n%o sb preten<strong>de</strong>m ver as primeiras<br />

origeiis <strong>do</strong> privilegio pontifica1 na practice <strong>do</strong>s apostolos, como diesemos;<br />

mas tambem, levan<strong>do</strong> a questao para o campo pliilosophico, cui<strong>da</strong>m<br />

<strong>de</strong>monstrar que to<strong>da</strong>s as conrenieiicias pe<strong>de</strong>m que ao papa se coiifira esse<br />

pod~r. Goschler, jrl cita<strong>do</strong>, escreve que al'attrihiition exclusive <strong>de</strong> ce pouvoir<br />

aii pape Btait d'ailleurs <strong>de</strong>veiiue iridispensable; eii effct Ia pluprirt <strong>de</strong>u paya<br />

oií i1 y avnit <strong>de</strong> nouveaux évéches h in~titurr, xvaitwt 8tk cotiveitis par le<br />

zPlr dcs l6gtits apostoliqiies; <strong>de</strong> pliis i1 fallriit ~~sigiirr aun iioriveau diocbes<br />

<strong>de</strong>a limitrs certaiiies; <strong>de</strong> fr4qiicntes dieciissione s'élevaient entre les archévêqnes<br />

et les éveques, que le Pape seu1 poiivnit ri?aoudrc ; enfin maintes dis-


A eschola realista, hoje quasi extiricta ou transforma<strong>da</strong> na eschola<br />

coiistitucioníil e tempera<strong>da</strong>, por &ito <strong>da</strong>s aias i<strong>de</strong>as <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

religiosa, dii tio principe o primeiro logar; mss, faltan<strong>do</strong>-lhe o apoio<br />

<strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretars e <strong>do</strong>s canones, 6 essencialmente nacional, furi<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-se<br />

nas rccor<strong>da</strong>çóes <strong>do</strong>s tempos que foram, basean<strong>do</strong>-se em as<br />

no\iis li1,crdn<strong>de</strong>s <strong>da</strong>s constituiyóes politicas.<br />

1 ) iiii<strong>da</strong> ~ nos serviria especificar em ca<strong>da</strong> nação o direito pro-<br />

pio d t b .lias cgejas; o espaqo C precioso para <strong>de</strong>scobrirmos, quanto<br />

couber cm nossas forças e tempo <strong>de</strong> que dispomos, o direito ecclc-<br />

siastico portuguez, se o ha.<br />

Vamos,. pois, immediatamente trazer a questão para o cariipo 11,<br />

nosso direito.<br />

penses 'txient nécessaires, pour les hn<strong>da</strong>tione &e mu<strong>de</strong>s Bglises et le<br />

Ptiyt: sriil pouoait lea <strong>do</strong>nner..<br />

SBo <strong>do</strong>ia factos mui notaveis <strong>da</strong> historia <strong>da</strong> eresç5o <strong>da</strong>a dioeeses o celebre<br />

scliisma constitucional <strong>da</strong> França e a concor<strong>da</strong>ta <strong>de</strong> Pio vir <strong>de</strong> 1801. Na 2.'<br />

parte d'este estu<strong>do</strong> falaremos d'elles.


PARTE SEGUNDA<br />

I,EGISLA@O ECCLEWASTICA POBTI;GCEZ:\<br />

A RESPEITO<br />

Aos* ma -sés est-elle qoe toute immix-<br />

iioa <strong>de</strong> crrfe mture, que1 qu'en soit It! mo<strong>de</strong>,<br />

emirain to.ajnri rrec elle .j~isqu'a un cei-<br />

laiu pimt :a Yrrctioa. I'encbaioement tle Ia<br />

liberte imd irilrlle.<br />

Hcmrvr, &sai ar ler limites <strong>de</strong> l'arlin>i<br />

<strong>de</strong> IElat, vii.<br />

Se ba conclui<strong>do</strong> para eiempre el <strong>do</strong>gma<br />

<strong>de</strong> Ia pretwrion <strong>de</strong> Ias Iglesias por el Esta<strong>do</strong>.<br />

81 Esta<strong>do</strong> no tiene religion, no Ia pue<strong>do</strong> te-<br />

mer, DO Ia ilrbe iener. bl Esta<strong>do</strong> no coniiesa,<br />

e1 E-ta<strong>do</strong> no comulga. e1 Esta<strong>do</strong> no se miie-<br />

n. Yo quiiiera que e1 Sr. Manterola tuviese<br />

Ia bon<strong>da</strong>d <strong>de</strong> <strong>de</strong>cirme en qu6 sitio <strong>de</strong>1 Valle<br />

<strong>de</strong> Josaphat ra a estar el dia <strong>de</strong>1 juicio el<br />

alniit <strong>de</strong>1 Esta<strong>do</strong> que se Ilama Espana.<br />

EHII.IO<br />

CABTELLIII, Discurso nas consli-<br />

tuinies bezpanbolac <strong>de</strong> 1869.


PARTE 11<br />

LEGISLA(;~O ECCLESIASTICA PORTTGCEZA A RESPEITO DA WL$~O,<br />

SUPPRESS.~~, ~~1x0, DIVIS~O E CIRCUMSCRIPÇ~O<br />

DAS DIOCESES E hIETROPOLE6<br />

CAPITULO I<br />

A egreja portugneza e suas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

Curiosas e graves qiiritõro. que as palavras- epja iwifnu - po<strong>de</strong>m so3citar. -<br />

Drlicii~nria <strong>de</strong> estuilos dr lii;toria ecclrsiastira portugeeza.-Comr rso improficiioc<br />

estes irabalhoc PP~I tractar priniciro dc saber m ba oo nao uma egreja portuguera<br />

ou lu.itana.-Erra<strong>do</strong> caniinlio que 16m segui<strong>do</strong> os seus escriplores: consequenciiis<br />

. d'esle 1;icto.- O csemylo <strong>do</strong> q u se ~ passa com a egreja gallicana mais nos obriga<br />

a seguir direccno diferente dii que até hoje se tein a<strong>do</strong>pla<strong>do</strong>. - Des<strong>de</strong> quan<strong>do</strong> se<br />

<strong>de</strong>ve reputar c\iilriiie a egreja lusitana?-Falsas i<strong>de</strong>as e confus8o <strong>de</strong> Joao Pi,dro<br />

Ribeiro e <strong>de</strong> I). Tliiiinaz <strong>da</strong> Eririirnac~o a este respeito.-N&o hn uma egreja lusitana:<br />

lia uiii;i rgir,j.i portugueza, coitemporanea <strong>do</strong> eslabelecirnento <strong>da</strong> nossa monarcliia.-As<br />

suíi!: Iiberd;i<strong>de</strong>r no temlto <strong>de</strong> D. Jos6 I e nos estatutos <strong>da</strong>universi<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

--1'1 tlt'nzões <strong>da</strong> escola ultramoiita~ici a respeito <strong>da</strong>s liberdii<strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja portugueza.<br />

-I


Egreja lusitana ! que gran<strong>de</strong> nome ! que gran<strong>de</strong>s recor<strong>da</strong>çóes se<br />

niio pren<strong>de</strong>m 8 idCa que nos traz h mente !<br />

Estas duas palavras, como outras <strong>da</strong> nossa chronica, soam-nos<br />

<strong>de</strong> um mo<strong>do</strong> ao mesmo tempo sau<strong>do</strong>so e cheio <strong>de</strong> altas e graves<br />

lembranças.<br />

E, comtu<strong>do</strong>, se nos <strong>de</strong>ixarmos ficar a contemplar esta idba, a<br />

medital-a, ella comela por nos apparecer conf~isa, in<strong>de</strong>cisa, vaga,<br />

e acaba por se esvair insensivelmente, e n6s acor<strong>da</strong>mos d'este so-<br />

nho, a perguntar:<br />

'<br />

-O que 6 a egreja lusitana ?<br />

- Houve uma egreja lusitana ? - Ha uma egrcja portugueza ?<br />

-Será isto um phantasma? ser8 um anachronismo, uma mo-<br />

nomania historica, uma paixáo <strong>de</strong> lusitanismo?<br />

E quem sabe ? talvez tima <strong>de</strong>sobedicncia con<strong>de</strong>mnavel, um schis-<br />

ma ? uma negaçào atrevi<strong>da</strong> <strong>do</strong> catholicismo ?<br />

Taes siio as graves e curiosas questòes que se nos apresentam.<br />

Ningucm cui<strong>do</strong>u ain<strong>da</strong> em propol-as, e menos em resolvcl-as.<br />

Muito pouco se tem cscripto sobre a historia <strong>da</strong> nossa egreja e<br />

aquelles que o tem feito, <strong>de</strong>ixam levar-se <strong>da</strong> corrente geral 1.<br />

1 A historia <strong>da</strong> egreja portupueza foi pela primeira vez estudn<strong>da</strong> e exposta<br />

por D. Thomaz <strong>da</strong> k;ncariiação, conego regrante tlo real mosteiro <strong>de</strong> Sa~icta<br />

Cruz, e <strong>de</strong>pois Bispo <strong>de</strong> Pernambuco. Irititiila-se a obra-Hietoria Eccleeiae<br />

Lusitanae per singula saeczila ab Evangrlio promulgato, em quatro tomos,<br />

comprehcndcri<strong>do</strong> rlesdc o primeiro seciilo até o dccimo quarto iiiclasi\ E PIIblicou-se<br />

o ultiino volume pelo começo <strong>da</strong> seguiitla meta<strong>de</strong> <strong>do</strong> seculo xvrrr.<br />

No tempo <strong>de</strong> I) Joâo v apparece pela piimeiia \cz a idPa <strong>de</strong> chegar a<br />

traqar-se o plalio <strong>de</strong> uma historia geral <strong>da</strong> egrejn portiigiieza.<br />

I). Mai~uel Caetano <strong>de</strong> Sousa, clerigo regular, tinha toiina<strong>do</strong> havia muito<br />

tempo o pro.jecto <strong>de</strong> escrever a historia ecclesiaeticn <strong>de</strong> l'ortiigal, que intitulava<br />

- f'antheon Anti8tilum I;unifanorirm, sive I,z~sitntiia Sacra, hoc est,<br />

chroiiicon uironrm qui in Lusitania uummo jure prnefuer~.<br />

('o1110 este nosso sabio privasse com o rei, uma vez Ilie coininunicou o seu<br />

plaiio e lhe dissc como tinha começa<strong>do</strong> os trabalhos no recolliirnento <strong>da</strong> sua<br />

cella. O rei, o nmso uer<strong>da</strong><strong>de</strong>iro Augusto e melhor que Tito as <strong>de</strong>licias <strong>de</strong> seua<br />

vussallos, protector caloroso <strong>da</strong>s lettras, approvou muito a idba e lhe pediu<br />

que não <strong>de</strong>sariimasse. D. Manuel Caetano ds Sousa quiz entÃo um cornpanhciro<br />

para aquellas fadigosas li<strong>da</strong>s, o qual não só soubrs~c c escrevesse O<br />

latim com to<strong>da</strong> a pureza, mas que tambem fosse <strong>do</strong>cil revisgo e censura;<br />

ao mesmo tempo indicava para censores os rnarquezee <strong>de</strong> Alegrete e Fronteira<br />

e Antonio Pires <strong>da</strong> Costa. Era isto pelo mez dc r~orer~ibro <strong>de</strong> 1720.<br />

El-rei, to<strong>da</strong>via, <strong>de</strong>sejava uma hietoria completa <strong>de</strong> Portugal em Intim e<br />

portiiguez, secular e ecclesiastica, sen<strong>do</strong> a ecclesiastica tract~i<strong>da</strong> em primeiro<br />

logar e chaman<strong>do</strong>-se Lusitania Smra.<br />

Ein 4 <strong>do</strong> mesmo mez pediu D. Jogo v a D. Manuel Caetano <strong>de</strong> %usa que<br />

Ilie fizesse uin plano para levar a efieito a sua vonta<strong>de</strong>, e a 7 <strong>do</strong> mesiiio mez


E <strong>de</strong> qiir viile ctzcre\cr sobre i1 egreja lusitana, controverter<br />

I<br />

difficeis qiic1*tòc1s Ac qBrca <strong>do</strong>s habita<strong>do</strong>rias, Iingua e costumes <strong>do</strong><br />

occid(>rit~. (! I pt~riins~il~i ibt*riw antes <strong>da</strong> prépção <strong>do</strong> christianisrno;<br />

I<br />

(10 qiii. \,II-. -dí)t*r O que dizem Strabàc, e Plioio a rcsprito <strong>do</strong>s<br />

limite. tla lirimltira Lusit~nia. sem prirneim io<strong>da</strong>sar se existe uma<br />

cywja nacional portugwza, se ha alguma com que se j)o<strong>de</strong>sse e<br />

IIOSSI iiiricl,i ho~e<br />

chaarr-se rgmja lusilata ?<br />

0 4 I~OS~OS escriptores aio trepi<strong>da</strong>m um rnomeab. Pard ellt14 n<br />

egreja lusitana, se tem si<strong>do</strong> rCia nes seus confins com d* vicissitu<strong>de</strong>s<br />

<strong>do</strong>s tempos, tem ti& áe bom o m a r uni<strong>do</strong> at1a1c.s os<br />

seculos o seu corpo multílorne: e tita w ja, que hojt. ti. ele-<br />

varcrn-se as suas metroples w a l t b portuguez, tem !)ara c.lles<br />

uma antizui<strong>da</strong><strong>de</strong> tão alta como o mesmo christianismo. EIIii 1 i\eu<br />

sob a <strong>do</strong>minação romana, assistiu Bs invasões gerrnanicas, p0<strong>de</strong><br />

respirar <strong>de</strong>baixo <strong>do</strong> jugo sarracerio e ao la<strong>do</strong> <strong>da</strong> religião <strong>de</strong> Islam,<br />

orgulliou-se em tempos passa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> contemplar seu graricie corpo,<br />

cobri:i<strong>do</strong> u pcninsula inteira, jiictou-se <strong>de</strong> farier parte <strong>da</strong> rgrqja<br />

hesl)miliola c luctar com os papa. no5 seculos vir, v111 e ix, foi<br />

urii<strong>da</strong> á egrcli~ Icoriesa, e por fim. alti~a, sentiu-se drspreri<strong>de</strong>r<br />

d'essa outra, expulsar a gran<strong>de</strong> religião <strong>de</strong> Mahomet, e ao cabo<br />

<strong>de</strong> tantos trabalhos e victorias, pd<strong>de</strong> repousar a cabeça sohre o<br />

lhe fni apresenta<strong>do</strong> esse plano, propon<strong>do</strong> o scu auctor a creaçso tle iirii,i aca-<br />

(lciriin i( .i1 (ir historia portiigueza.<br />

Trai t


tacu<strong>do</strong> <strong>de</strong> coricliiista<strong>do</strong>r <strong>de</strong> Silves e sob o sceptro <strong>do</strong>s filhos <strong>do</strong><br />

Contle I-leniiqtie <strong>de</strong> Borgonlia.<br />

C;iptiva<strong>do</strong>s por tào bello e vasto quadro, eil-os que se afun<strong>da</strong>m<br />

'rirsse immt~iiso campo, que cui<strong>da</strong>m po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>screver-nos minuciosírmcnlt:<br />

(liirante sua curta vi<strong>da</strong>, luctan<strong>do</strong> com a estc~rilidndc <strong>do</strong>s<br />

cliroriistas, <strong>de</strong>ixari<strong>do</strong>-se embair <strong>de</strong> suas frau<strong>de</strong>s, per<strong>de</strong>n<strong>do</strong>-se em<br />

conjecturas ácercii <strong>do</strong> escuro viver <strong>da</strong>s primitivas colonias habita<strong>do</strong>ras<br />

d'este chão formoso ; esqueceri<strong>do</strong>-se a discutir se I<strong>da</strong>cio e<br />

Itliacio foram justa ou in,justamente tfc~)ostos, ou a iiivcritar fabiilas<br />

invejosas para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a primazia <strong>de</strong> Ijraga contra a <strong>de</strong><br />

'I'olc<strong>do</strong>, ou a pôr <strong>de</strong> la<strong>do</strong> a pcriria <strong>do</strong> historia<strong>do</strong>r para tomar o<br />

cstjlo <strong>do</strong> antigo legcri<strong>da</strong>rio <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>s <strong>de</strong> beatos e milagres <strong>de</strong><br />

sarictos !<br />

$ assim que rião contamos uma historia completa <strong>da</strong> nossa<br />

egrqja.<br />

O prnprio Joao Pedro Rihriro, o sabio aca<strong>de</strong>mico, que nos<br />

promotte, no prologo <strong>de</strong> um pequeno esboyo <strong>da</strong> chroriica religiosa<br />

<strong>da</strong> riossa egrcja, não se <strong>de</strong>ixar seduzir <strong>da</strong>s fraudrs yiie pren<strong>de</strong>ram<br />

OS outros escriptores, cac, como veremos, rio erro comnium <strong>de</strong> ir<br />

buscar a origem d'ella ao tempo <strong>do</strong>s rorniirios.<br />

Falan<strong>do</strong>, como to<strong>do</strong>s fjlam, <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s preciosas, veneran<strong>da</strong>s<br />

dc nritigiiitiadc, <strong>da</strong> egrcbja lusitana, ain<strong>da</strong> não houve uma penna<br />

que riol-as contasse, que nos d6sse iim codigo d'essas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s,<br />

se algumas ha; e isto era tanto mais preciso,.quanto d'este nosso<br />

<strong>de</strong>slcixo se vai aproveitari<strong>do</strong> jh o ultramontanrsmo, o qual, zeloso<br />

d'oslns liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, guar<strong>da</strong>n<strong>do</strong>, alta mente repostum. o resentimcrito<br />

(1;)s coi11rarie<strong>da</strong><strong>de</strong>s que o uigor <strong>do</strong> braço <strong>do</strong>s nossos reis<br />

eni c~l)odias ~)t~ss~las Ihes Icz soi'frer, vem agora a discutir a legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>da</strong> nossa egrcjn, a perguntar-nos por essas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s face<br />

a face, c emprazar-rios a <strong>de</strong>clarar quacs srjam, se algiimas silo.<br />

E, nintla qiiantlo se prol(. existirem, nao melhoramos <strong>de</strong> posiç30<br />

; e para riosso ensinamerito lembrenlo-nos <strong>do</strong> que se passa com<br />

a egreja franceza.<br />

Qiiem não tem oiivi<strong>do</strong> fallar <strong>da</strong> famosa rgreja gallicana e <strong>de</strong><br />

suas celebres libercla<strong>de</strong>s, que tem rccrutaclo adcptos em to<strong>do</strong> o<br />

mun<strong>do</strong> e que quasi faz um schisma?<br />

E, comtii<strong>do</strong>, saiba-se que a existencia d'csta egreja 6 hoje muito<br />

contcstadn. De pouco serviu que os irmãos Pithou <strong>de</strong>ssem á<br />

Fran~a um codigo d'essas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s; <strong>de</strong> pouco valeu que Fenc-


lon, l:Icrir\ e Bossuet as quizcssem purificar livran<strong>do</strong>-as <strong>da</strong>s accessbes<br />

que o p~<strong>de</strong>r real e M magistrad(b5 lhcy tinham injustamente<br />

accrc~zi~rrit,~<strong>do</strong> ; na<strong>da</strong> imp-I a celebre <strong>de</strong>tiriirão que d'ellas apresciitoii<br />

o gran<strong>de</strong> arcakp <strong>de</strong> Meaux ;- huje diz-se qtic to<strong>do</strong>s csses<br />

esforços <strong>de</strong>monsttam não serem as taes Iiber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, qun retumbavam<br />

no m<strong>do</strong> inttko. mais <strong>do</strong> que sombras, com que ninguern<br />

sc inten<strong>de</strong>, nem os impaa<strong>do</strong>res, nem os bispos, riem a curia<br />

romria ; e accrescenta+ qoe. <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> celebre concor<strong>da</strong>ta <strong>de</strong><br />

1801 e <strong>do</strong> livro que em 1820 escreveu Joseph <strong>de</strong> BI~islre, De<br />

1'Eglise Callicane <strong>da</strong>ns m~i rapporl atec le Souvtrain I'ontife,<br />

a approximação <strong>de</strong> Roma c <strong>do</strong> epkmpr<strong>do</strong> fraiicez 6 ca<strong>da</strong> dia mais<br />

estreita, chegan<strong>do</strong> a aarmar-se qw & Saistre era prollliota,<br />

quan<strong>do</strong> csmvia que o soberano pontlfce t o sacer<strong>do</strong>cio friiiic~z<br />

se hiniam <strong>de</strong> abraçar, e que 'neste abm <strong>do</strong>cariam as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

<strong>da</strong> egreja gallicaiia 1.<br />

A ~ertlatfe 6 quc hoje, no paiz que tivera rim S. Luia, e uma<br />

p~aprnatira-sancção, reis tRo poic~osos, tão altivos prela<strong>do</strong>s ; que<br />

vira junctar-se o clero em certo di,~ e resumir em quatro ar-<br />

tigos a expressâo <strong>de</strong> sua vitl,~ pas.<strong>da</strong> e a promessa <strong>do</strong> sthu fiitiiro,<br />

e lançal-a ás faces <strong>do</strong> summo pat~fm; a ver<strong>da</strong><strong>de</strong> C que 'nesse<br />

paiz hoje são mui raros os her<strong>de</strong>iis <strong>do</strong> org-utboso clero pallicano.<br />

1- clua~'!o C. assim com a França, com o clero france~, com a<br />

clgrej;~ giillic.ann, que dcbternos pensar <strong>da</strong> r i ~ m pobre eewja portuguezii<br />

?<br />

3? por isto que <strong>de</strong>vemos passar rapi<strong>do</strong>s as folhas d'essiis obras<br />

<strong>de</strong> historia, que rios contam como a apria crescia e se elevava acima<br />

<strong>da</strong>s bor<strong>da</strong>s <strong>de</strong> certa fonte sem se critornar, c se viam 18 <strong>de</strong>ntro<br />

scenas <strong>do</strong> evangelho, como nas garrafas magicas <strong>do</strong>s alchimistiis<br />

<strong>do</strong> seculo xii; ou nos ~ êm repetir e trncar com os bicos <strong>da</strong>s pennas<br />

<strong>de</strong> seus ingenuos aiictores as palavras misticas, qiic alguris<br />

varòes tinham ouvi<strong>do</strong> <strong>de</strong>spren<strong>de</strong>r-se <strong>da</strong>s penhas alcantiladiis <strong>da</strong> solidâo<br />

que habitavam.<br />

Outros cui<strong>da</strong><strong>do</strong>s mais graves nos occupam <strong>do</strong> que esse folhear<br />

pie<strong>do</strong>so <strong>do</strong> 00s sanetorum <strong>da</strong> nossa egreja.<br />

Vamos primeiro in<strong>da</strong>gar <strong>de</strong>s<strong>de</strong> quan<strong>do</strong> se <strong>de</strong>ve reputar existente<br />

a egreja portugueza ; e <strong>de</strong>pois veremos se <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> perio<strong>do</strong><br />

1 Charles <strong>de</strong> Rémusat, Le tradicionalisme-Revue <strong>de</strong> <strong>de</strong>us mon<strong>de</strong>s, 1857.


que se Iht! <strong>de</strong>ve assignar ate hoje ou ate certo tempo, houve ou tem<br />

havi<strong>do</strong> reaes, justos, acceitaveis privilegias, que façam d'ella irma<br />

vertlad(+-a egreja nacional.<br />

To<strong>do</strong>s os auctores, que entre nós se têm occupa<strong>do</strong> <strong>de</strong> quest<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> disc,iplina ou direito e liistoria <strong>da</strong> egqa portugueza, enten<strong>de</strong>m<br />

que esta egreja existe <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o tempo <strong>da</strong> propagaçiio <strong>do</strong> evangelho<br />

ria peninsula, e assim lhe chamam geralmente a egreja lusitana,<br />

ce<strong>de</strong>n<strong>do</strong> b iiiiiiiericia <strong>da</strong> idéa falsa e impalpavel <strong>de</strong> que nós <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>mos<br />

<strong>do</strong>s primitivos lusitanos. Este <strong>de</strong>feito 6 commum ao<br />

estu<strong>do</strong> historico <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o nosso direito, in<strong>do</strong> procurar-se a siia<br />

origem <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os mais escuros tempos ate b actuali<strong>da</strong><strong>de</strong>. Quantas<br />

paginas carrega<strong>da</strong>s <strong>de</strong> peza<strong>da</strong> erudiçao se riào encoritram nas memoriits<br />

<strong>do</strong>s riossos aca<strong>de</strong>micos dispensa<strong>da</strong>s ria in<strong>da</strong>gação <strong>do</strong> direito<br />

<strong>do</strong>s Iiisitanos, <strong>do</strong>s cartliaginezes, celtas, phenicios, van<strong>da</strong>los, siievos<br />

c alarios! Assim perdi<strong>do</strong>s 'nestas graves locubraçbes, quan<strong>do</strong> tocavam<br />

a historia <strong>do</strong> seculo xii, faltava-lhes a vi<strong>da</strong>, c a penna cala<br />

<strong>da</strong> mão <strong>do</strong>s aiictores em que a morte fizera píirar o movimento<br />

tio espirito, e to<strong>do</strong>s os que dc riovo pretendiam estu<strong>da</strong>r o nosso<br />

Oircito ria historia (Ias suas cvoluçòes se julgavam obriga<strong>do</strong>s a remoritnr<br />

ate a penumbra <strong>do</strong> clarão historico. Como nota Alexandre<br />

Ilerculario, o gosto exagera<strong>do</strong> <strong>da</strong>s aritigui<strong>da</strong>dcs romanas tinha-os<br />

acostuma<strong>do</strong> a ver a graridcsa <strong>da</strong>s rinçòes pelo prisma falso <strong>da</strong>s origensfabulosas<br />

e <strong>da</strong> t:popea legen<strong>da</strong>ria dc lo<strong>do</strong>s os povos; e consolava-os<br />

narrar, inllamma<strong>do</strong>s <strong>de</strong> louco amor piitrio, os gran<strong>de</strong>s<br />

feitos <strong>do</strong>s Viriatos, <strong>do</strong>s Apimaiios, <strong>do</strong>s Sertorios, e <strong>de</strong>sigriar-tu<strong>do</strong> o<br />

yuc crqortuguez com o riorne <strong>de</strong> lusitario.<br />

Como tu<strong>do</strong>, a historia <strong>da</strong> egreja portugueza rescnte-se d'isto<br />

mesmo.<br />

Coiihecemos apenas o <strong>do</strong>uto Joào Pedro Ilibciro, que intitula o<br />

seu projrcta<strong>do</strong> trabalho- Hisloria <strong>da</strong> egr~ja portirgueza.<br />

Mas que? suas investigaçòes comeyarn rios primeiros dias <strong>da</strong><br />

promulgaçáo <strong>do</strong> evangelho <strong>da</strong> periirisula, exactamcrite como os outros<br />

escriptores. I3 qual foi o resulla<strong>do</strong>? é quc cste ti,abalho ficoii para<strong>do</strong><br />

no seculo ix, e quiin<strong>do</strong> po<strong>de</strong>riamos aproveitiir-iros dc sua grandc<br />

leitura <strong>da</strong> historia <strong>de</strong> Portugal, apenas cncoritramos uns miriguii<strong>do</strong>s<br />

capilulos e paragraphos, on<strong>de</strong>, clrri-ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, iiiio apparccem jA as<br />

puerili<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> seus antecessorcs r on<strong>de</strong> tu<strong>do</strong> o que se escreve 6<br />

liistorico e fun<strong>da</strong><strong>do</strong>.<br />

I). Thomaz <strong>da</strong> Ericarnação nõo soube livrar-se d'estes <strong>de</strong>feitos; c,


posto que alargasse seiis estu<strong>do</strong>s até ao seculo xiv, restaram-lhe<br />

comtu<strong>do</strong> quatro bons $c.culos, onJe a historia <strong>da</strong> nossa egrcbja passa<br />

po,r gran<strong>de</strong>s teaapestbrs e on<strong>de</strong> ppnentura a modificiiçào <strong>do</strong> di-<br />

reito 1)oi tiiguez I! nmi nd;itel.<br />

Jrn iilgumas disserta* sobre poiitos esp, i iars <strong>da</strong> historia <strong>da</strong><br />

riosvi enreja, pre<strong>do</strong>mina e a dta sempre a [ri, -ma idka.<br />

O illiistre auctor ila & t e <strong>de</strong> Portugal c>rtcrininou radicaliiic*r~tc~<br />

rstc abuso no e5tu<strong>do</strong> & historia profan'i <strong>do</strong> nosso paiz: <strong>de</strong>inoiistrou,<br />

com a ~~roftinb ilcl!i,gwia <strong>do</strong> vercladciro Iiistoria<strong>do</strong>r,<br />

que nem o territorio, riem 3 fa:;. n >m a liWa, unicos caracteres<br />

que coiiservam a i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> Qo- po\ M na successào <strong>do</strong>s tcmpos,<br />

existiam entre nos e 05 antigns Iirutmos. Os elementos que constituiram<br />

a nossa nacionali<strong>da</strong><strong>de</strong> &o ~~otros: é o elemerito leonez e<br />

o elemrrito sarraceno l, e náo mais.<br />

Na historia eccle$iastica, porbm, ou porqiic ain<strong>da</strong> ningiiem se<br />

occu~)oi~ d'ella <strong>de</strong>pois <strong>do</strong>s admiraveis estu<strong>do</strong>s tle Alexandre tlcrculano,<br />

ou porque esta societlacle tem alguma coiisa <strong>do</strong> esl)cc.inl; continha<br />

a permanecer geral a id6a I'als,i <strong>de</strong> que ella 6 a mesma egreja<br />

<strong>do</strong>s lusitanos, e que tanto vale dizer egreja portugueza, como lusitana.<br />

Joáo Pedro Ribeiro no 7." <strong>da</strong> Introdiicção <strong>do</strong> seli manuscripto<br />

começa, dizen<strong>do</strong> :<br />

ehntes porem <strong>de</strong> principiarmos a consi<strong>de</strong>rar o objecto a que nos<br />

propomos, 6 necessario vermos primeiro que provincias se acham com-<br />

preliendi<strong>da</strong>s <strong>de</strong>baixo <strong>do</strong> nome <strong>de</strong> Portugal. Para isto <strong>de</strong>vemos reflectir<br />

que o Keyno dc Portiigiil, tal qiial hoje o v&mos, differe miiito nos setis<br />

limites <strong>da</strong> antiga L1isitania.n<br />

Ern segui<strong>da</strong>, e ten<strong>do</strong> dicto qual era essa divisão, vai este escri-<br />

ptoi exaritiriar a liiigua e religião <strong>da</strong>s diversas nações habita<strong>do</strong>ras<br />

<strong>do</strong> occidt~ntc <strong>da</strong> peiiinsula antes tla viiidti <strong>de</strong> Jesus Christo, e gasta<br />

clepois scrisivel espaço com a Dihsprlay;to preliminar sobre a pro-<br />

mulgação <strong>do</strong> Evangelho nas nossas provincias!<br />

A que antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> nào faz este sabio aca<strong>de</strong>micoremontar assim<br />

o pobre Portugal, que as suas provincias assistem I promulgaf80<br />

<strong>do</strong> Evangelho e ouvem a voz <strong>do</strong>s apostolos?!<br />

1 Alexandre Herculano, Historis <strong>de</strong> Portugal, Introd. n.O 1.<br />

9


Tal é o pre<strong>do</strong>minio dcspotico <strong>de</strong> certos pre,juizos, e tal o effeito<br />

<strong>do</strong> <strong>de</strong>testavel systerna <strong>de</strong> se <strong>da</strong>r a trabalhos historicos, como quem<br />

fez catalogas <strong>de</strong> bispos, ou ephemeri<strong>de</strong>s historicas.<br />

Thomaz <strong>da</strong> Encarnaçáo, no cap. I ." <strong>do</strong>s Prolegomenos <strong>de</strong> sua<br />

histeria, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> entregar o primeiro capitulo A investigaçiio sobre<br />

o nome <strong>de</strong> Liisitariia, prociira fixar os limites <strong>da</strong> egreja lusitana,<br />

e no Sj i.", tracturi<strong>do</strong> <strong>do</strong>s limites civis, escreve:<br />

«Lusitana Ecclesia, si propriae Lusitaniae nomen, ac partes, jiixla<br />

eos, qiii gcographica mctho<strong>do</strong> pertractarunl, aspiciam ... v<br />

averum quae nostris temporibiis Portugalia norninatur.. . . a)<br />

E, tocan<strong>do</strong> as ultimas palavras <strong>do</strong> capitulo, ciii<strong>da</strong> este escrigtor<br />

ter com to<strong>da</strong> a clareza fixa<strong>do</strong> os limites <strong>da</strong> egreja lusitana, teri<strong>do</strong>-<br />

rios dicto que a egreja lusitana, se atteii<strong>de</strong>rmos ao proprio nome<br />

dtl Lusitania, tem certos limites; mas que, se olharmos ao que no<br />

tempo d'elle se chamava Portugal, a mesma egreja tem outra pe-<br />

ripheria !<br />

Esta confusão aupcnta, se formos ler o $ 1 1 <strong>do</strong> mesmo capi-<br />

bulo, on<strong>de</strong> o auctor vai explicar-nos os limites ecclesiasticos <strong>da</strong><br />

:greja lusitana. Agora ella já não comprehcn<strong>de</strong> to<strong>do</strong> o espaço <strong>da</strong><br />

intiga Lusitania, mas sómerite o que ao tempo d'esse escriptor se<br />

Ilustrava com o nome <strong>de</strong> Lusitania ou <strong>de</strong> Portugal !<br />

«Per iiniversam Lusitaniam, diz elle, et ceterum terrae flexum pro-<br />

vinciae Tarrac~nensis quae nostra aetate Liisitaniae aut Portiigaliae<br />

nomine insignitur, Komanoriim, Suevornm Gotlioriimque tempore,<br />

quator<strong>de</strong>cim episcopales se<strong>de</strong>s.. . I)<br />

Para acabarmos <strong>de</strong> confundir as idkas a este respeito nâo t<br />

preciso mais <strong>do</strong> que lêr, a pag. 48 <strong>do</strong> i." tomo, o que ahi se diz<br />

<strong>da</strong> divisão <strong>da</strong>s shs.<br />

Irititula-se um quadro, ou mappa <strong>de</strong> varias sks <strong>da</strong> peninsula-<br />

Portugaliae sedium diuisio - e começa logo por se <strong>de</strong>screver essa<br />

divisão sob o reina<strong>do</strong> <strong>de</strong> Theo<strong>do</strong>miro, rei <strong>do</strong>s suevos no aniio 607<br />

-sub Theo<strong>do</strong>miro Sueuorum Rcge -! e assim continha, clas-<br />

sifican<strong>do</strong> as modificações sob os reina<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Kecesvin<strong>do</strong> e IYam-<br />

ba, reis go<strong>do</strong>s, como se estes reis fossem reis <strong>de</strong> Portugal!<br />

Revela isto uma confusâo absoluta <strong>de</strong> idkas; e <strong>de</strong>ixa ver que


estes escriptores nbo formavam uma aoçlo clara <strong>do</strong> que era, ciu<br />

podia ser, a greja lusitana.<br />

Que se diga: a egreja i. ecumenia, a egreja é eterna, e por isso<br />

a egrejn portugueza ha ti(. ter existi<strong>do</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que 'neste solo se<br />

lançou a semente <strong>do</strong> câri~iiauismo, e portanto <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os tempos <strong>do</strong>s<br />

lusitano> ; comprebe&r.<br />

01;.<br />

- t,;tteiidr que o direito priva<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma egreja nacional<br />

COillcyii si) <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que existe a naçào r que pertence, e por isso sO<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> então se pó<strong>de</strong> ver lima cigrc~jii ii;içional, a qual estarói con<strong>de</strong>mna<strong>da</strong><br />

a <strong>de</strong>sapparecer com essa mesma nação; percebe-se; -<br />

mas que se preten<strong>da</strong> uinii e outra cousa simultaneameiite, como<br />

estes <strong>do</strong>is escriptores parecem disirar traiisparecer <strong>de</strong> siias palavras,<br />

é o que a nossa iritelligeucia não pb<strong>de</strong> acceitar.<br />

Rlai qual a ver<strong>da</strong><strong>de</strong> no meio d'estas duas opiriiòes? A egreja<br />

porliiguc~a vai effectivamente ericontrar a sua origem na egreja<br />

lusitaiia, romana ' mo<strong>da</strong>, leorieza? ou esta egreja <strong>da</strong>ta s6 <strong>do</strong> começo<br />

.!'<br />

<strong>da</strong> nossa rnonarchia ?<br />

A primeira vista parece não <strong>de</strong>ver duvi<strong>da</strong>r-se um momento. A<br />

egreja porlugiicza é porventura ci~iiio ;I anglicaria 1 como a cophte?<br />

não está ella presa ao iiiimeiiso corpo <strong>do</strong> catholicismo ? eritão, ella<br />

existe, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que rio solo <strong>da</strong> pciiirisulil hi implanta<strong>do</strong> o christiar~ismo.<br />

1rn.porta pouco o qut: dizem a respeito <strong>do</strong> territorio, liiigua<br />

t L rii~ii: purque a cgreja C: <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o inun<strong>do</strong>, e o christianismo e o<br />

episcopa<strong>do</strong> para OS go<strong>do</strong>s, ou para os lusitanos submetti<strong>do</strong>s ao jugo<br />

romano, iiào é diverso <strong>do</strong> christianismo ou <strong>do</strong> episcopa<strong>do</strong> <strong>do</strong>s receiites<br />

portuguezes, ou <strong>do</strong>s ultimos leoriezes. A egreja é ecumenica,<br />

cosmopolila, e eteriiii; nem as modificações <strong>do</strong>s tempos, liem us alterações<br />

<strong>da</strong>s liiiguas, ou transformação <strong>da</strong>s raqas, po<strong>de</strong>m ioiluir nella.<br />

Isto ~ ã 6 o ver<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

A egreja portugueza é em certo senti<strong>do</strong> a lusitana, a go<strong>da</strong>,<br />

a leorieza; mas n'cste serititio é tamhem a gaiileza, a gcrmariica,<br />

a italiana, a propria romaiia; porque é parte <strong>da</strong> egrcja catholica;<br />

mas não (L neste aspecto que se consi<strong>de</strong>ra aqui.<br />

Tracta-se <strong>de</strong> uma egreja nacional; triicta-se <strong>de</strong> uma 1)c:ssoa<br />

moral, que lia o direito A cxistericia individual, <strong>de</strong>duzi<strong>do</strong> <strong>de</strong> certo<br />

numero dc privilogios proprios. Se isto d perfeitamente compativel<br />

com o calholicismo, se é possivel a existencia <strong>de</strong> uma disciptiiia<br />

geral, egual em to<strong>do</strong>s os seus capitulas sobre to<strong>da</strong> a superficie <strong>do</strong><br />

inun<strong>do</strong>, são questões que 'noutro logar se tractartio.


Aqui havemos <strong>de</strong> transigir com os factos: e a existencia <strong>de</strong><br />

egrejas com <strong>direitos</strong> proprios em varios pontos <strong>de</strong> disciplina, <strong>de</strong>rogan<strong>do</strong><br />

a disciplina geral, s8o factos, que a propria egreja ecumenica,<br />

longe <strong>de</strong> repiilsar, tem acceita<strong>do</strong>, e aconselha<strong>do</strong> ate, na recommen<strong>da</strong>çao<br />

que fiiz <strong>de</strong> guar<strong>da</strong>r os antigos costumes.<br />

O que por conseguinte temos a fazer 6 investigar estes <strong>do</strong>us<br />

pontos: - ha <strong>direitos</strong> proprios, liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s ou servi<strong>da</strong>es, como lhe<br />

queiram chamar 4 -<strong>de</strong>s<strong>de</strong> quan<strong>do</strong> existem esses <strong>direitos</strong> ? Aquelle<br />

<strong>de</strong>termina a existencia <strong>da</strong> egreja, este assigriala o primeiro momento<br />

<strong>de</strong> sua vi<strong>da</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte.<br />

Ain<strong>da</strong> não 6 tu<strong>do</strong>: 6 iridispensavel saber-se se o elemcnto<br />

<strong>da</strong> nacionali<strong>da</strong><strong>de</strong> inlluirá, ou nào, na existencia <strong>da</strong> egreja particular.<br />

Se o livre cultismo, se a iritc~ira in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia <strong>da</strong> egrcja e <strong>do</strong><br />

esta<strong>do</strong> tiçcsse si<strong>do</strong> o meio em que o catholicismo viveu, c fosse<br />

aqiielle em que hoje respira, não hesitariarnos um pomciito em<br />

negar similliarite inlluericia.<br />

Estes pequenos centros religiosos, estas m~dificaçri~s locacs <strong>da</strong><br />

egreja, tiaviam naturalmerite <strong>de</strong> coincidir com as circumscriyçries<br />

<strong>da</strong>s riacioriali<strong>da</strong><strong>de</strong>s; mas a origem uriica <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> proprios <strong>da</strong>s<br />

egrejas 'nesse esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> cousas seria a mcama, que iiilluia ria<br />

agrupaçào <strong>do</strong>s homens em socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s politiciis : -O principio <strong>da</strong>s<br />

raças, a i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> idioma, as circumstaricias pliysicas <strong>do</strong> territorio,<br />

e os gran<strong>de</strong>s elementos cominunaes e tradicioriacls.<br />

Mas isto rião se tem <strong>da</strong><strong>do</strong>; uni<strong>da</strong> em certo tempo ao esta<strong>do</strong>, a<br />

egrcja qiiiz sobrepujal-o. O esta<strong>do</strong> <strong>de</strong>feridt:u-sc, e, como tilera <strong>de</strong><br />

arraiicar-lhe <strong>da</strong>s mãos o sceptro rouba<strong>do</strong>, com clle lhe arrehatou<br />

tambem algiiris dirertos proprios d'elln; os reis foram os protectores<br />

<strong>da</strong>s egrejas; e ao mesmo tempo os povos, os membros catholicos<br />

d'essas egrejas, qui~crarri que elles tivessem certos <strong>direitos</strong><br />

<strong>de</strong> inspecçao, <strong>de</strong> superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> externa, respeito fi rgrcja. As leis<br />

estabeleceram este esta<strong>do</strong> com sua auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> so1)erariii; as leis<br />

hao <strong>de</strong> executar-se para a vi<strong>da</strong> civil ser alguma coiisa <strong>de</strong> existente,<br />

e por isso as egrejas tem <strong>de</strong> juntar ao seu direito proprio mais<br />

este capitulo <strong>de</strong> direito priva<strong>do</strong>.<br />

Que este esta<strong>do</strong> não tem nonie possivel, e que <strong>de</strong>ve acabar, siio<br />

tu<strong>do</strong> outras questões.<br />

Em face encontram-se pois duas fontes, d'on<strong>de</strong> dimanam os <strong>direitos</strong><br />

<strong>da</strong>s egrejas : o elemento natural, digamos assim, obe<strong>de</strong>cen<strong>do</strong><br />

ás irifluencias <strong>da</strong>s leis moraes e historicas e ás phjsicas <strong>da</strong> natu-


eza, r o elemento politico, obrigan<strong>do</strong> fatalmente a egreja ate certo<br />

ponto a um riter propno e individual, conscquencia <strong>do</strong>,staiu quo<br />

<strong>da</strong>s rcl~~ùc's <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is po<strong>de</strong>res.<br />

Pó<strong>de</strong> existir rara qeja, n8o nacional, que se lhe nâo pó<strong>de</strong><br />

chamar aGm. mrs epep uim direito proprio, mesmo em paizes<br />

critregues h id<strong>da</strong>bia; píbque o costiime <strong>de</strong> muitos seculos ph<strong>de</strong><br />

ter rndi~~<strong>do</strong> 'nesse lagar certa diccipliiia peculiar ; mas on<strong>de</strong> ;i re-<br />

Iigiâci catliolicn 6 religi;ro <strong>de</strong> esta<strong>do</strong>. ahi o elemento <strong>da</strong> narionalidndr<br />

C t;io activo em sua inkncia, que marca com o seu apparecimento<br />

o apparecimcnto <strong>da</strong> epja nacional.<br />

Em o nosso paiz, se se ènkn<strong>de</strong> que a egreja <strong>de</strong> Portugiil não<br />

6 limita<strong>da</strong> no tempo e no tspa~o pela vi<strong>da</strong> <strong>da</strong> nacionali<strong>da</strong><strong>de</strong> portugueza<br />

; se se enten<strong>de</strong> que ella tem existi<strong>do</strong> a mesma <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />

o cliristianismo foi abraça<strong>do</strong> n'esta parte <strong>da</strong> pcminsula; saheis qual<br />

a c.o~i-t.quoncia? C qiie haveis <strong>de</strong> consentir que o direito publico<br />

t~cclt~+iaatico hespanhol venha reger a nossa egreja portugueza e<br />

modificar o seu direito.<br />

E como sc3 po<strong>de</strong>rá compreheii<strong>de</strong>r a coexistencia d'aquelle direito<br />

e <strong>do</strong> nosso?<br />

Qual merece a p<strong>de</strong>rencia?<br />

Isto <strong>de</strong>monstra h sacie<strong>da</strong><strong>de</strong> como, no esta<strong>do</strong> prescate <strong>da</strong>s relaç»es<br />

<strong>do</strong>s <strong>do</strong>is po<strong>de</strong>res, a naciooali<strong>da</strong>dt* politica 6 a condição primeira<br />

<strong>da</strong> existencia <strong>de</strong> uma egrclja nacional.<br />

Desprendi<strong>da</strong> <strong>da</strong> leooeza, a egreja portugueza 6 <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o principio<br />

<strong>da</strong> nossa monarchia, e s6 <strong>de</strong>sctc ahi, uma egreja propria, nacional<br />

; que na<strong>da</strong> tem 'nesses tempos com aquella ; e qiicl <strong>de</strong> certo<br />

não consentiria entBo, nrm consentiu <strong>de</strong>pois que os reis hwpanhoes<br />

. viessem rcgulal-a com siiiis leis 1.<br />

Nào ha, pois, uma egreja lusitanci : ha sim uma egrejii portugueza.<br />

Determina<strong>do</strong> assim o principio que nos <strong>de</strong>ve dirigir ria fixaçfio<br />

1 »cren<strong>do</strong> olhar-se esta rliiestiio como nOs olhamos, como 6 possivel com- A<br />

preheridrr a <strong>de</strong>ter rnirrxçiio <strong>de</strong> liniites ecclesiasticos <strong>de</strong> urnaegreja nacional differerites<br />

<strong>do</strong>s cirib? Niio B ;~bsur<strong>do</strong><br />

ir filiar a egre,ja B niais antiga <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s <strong>da</strong> ,<br />

penirisulr, ob<strong>de</strong>cen<strong>do</strong> B id4a <strong>de</strong> eciimeiiici<strong>da</strong><strong>de</strong> propria d'ella, e vir <strong>de</strong>pois i<br />

nttribiiir R essa egreja liriiites ecclesiastieos <strong>de</strong>fini<strong>do</strong>s pelos civis <strong>de</strong> uma<br />

narionali<strong>da</strong><strong>de</strong> mais recente e que occiipa territorio diverso?<br />

fi o que se vê em D. Thomaz <strong>da</strong> Eucarnagiio e no proprio Jogo Pedra<br />

Ribeiro.<br />

Nb <strong>de</strong>ve admirar que este erro se generalirnsse, não s6 porque 6 el1e <strong>de</strong><br />

.


<strong>do</strong> comepo <strong>da</strong> egreja portugueza; d preciso agora ver <strong>de</strong>s<strong>de</strong> quan<strong>do</strong><br />

em Portugal houve uma egreja portuguezn, isto é, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> quan<strong>do</strong><br />

esta fracçÁo <strong>da</strong> egreja catholica, separa<strong>da</strong> <strong>da</strong> egrejn leoneza, começou<br />

a par <strong>de</strong> privilegios e liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, ou a estar sujeita a um<br />

direito proprio, seja qual fõr sua legitima origem.<br />

Houve um tempo em que Portugal fez gran<strong>de</strong> ruiqo com as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

dc sua egreja: era o tempo <strong>de</strong> uma lucta entre o po<strong>de</strong>r<br />

temporal, as pretensões <strong>da</strong> Santa Se e os <strong>direitos</strong> mnjestaticos <strong>da</strong>s<br />

monarchins.<br />

As liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong>s epejas nestas conten<strong>da</strong>s em to<strong>da</strong>s as nações<br />

S ~ O<br />

apoia<strong>da</strong>s <strong>do</strong> braço secular, uma arma <strong>de</strong> guerra; marcam o<br />

perio<strong>do</strong> <strong>da</strong>s ambiçoes <strong>da</strong>s monarchias.<br />

L&<strong>de</strong> a historin politica <strong>do</strong>s povos europeus nos <strong>do</strong>is ultimos<br />

seculos, e ahi encontrareis este facto repetin<strong>do</strong>-se em to<strong>do</strong>s elles.<br />

velha <strong>da</strong>ta em a nosFa litteratiira, mas tainbem porque os Estatutos <strong>da</strong> Univrrsi<strong>da</strong>dc<br />

maii<strong>da</strong>rarn ao prof~~~nr <strong>de</strong> direito ecclesiastit?~ que explicasse assim<br />

o direito <strong>da</strong> egreja portnrucza.<br />

De muitos logsres <strong>do</strong>s Estatritos <strong>de</strong> D. JosB se vê como era pri <strong>do</strong>minante<br />

ewe prejiiizo. Bastark ler o cap. 11 <strong>do</strong> tit. 4.0 <strong>do</strong> Liv. 2.0, ~i.~* 2, 3, 6 e 7.<br />

cK.0 2-Como o lente <strong>da</strong> Historia Civil ba <strong>de</strong> ter já e-iisina<strong>do</strong> rio primeiro<br />

anno d'este curso 08 11808, os costumes, o genio, o csracter, a rcligiXo <strong>do</strong>s antigos<br />

lusitaiios; e os termos e limites civis <strong>da</strong> Lusitaniu Ailtigu c motlerna;<br />

nLo ~e <strong>de</strong>terk o professor na repetiçflo d'estaa notici~s, po.to rliir sej:im tainbem<br />

preliminares <strong>da</strong> Histor2a <strong>da</strong> e9reja Port~~qu~za.~<br />

.a.a- Dar4 a conhecer nos ouviiites as proviiicias ccclesiasticas <strong>da</strong> Lusitania<br />

Antig:~ e inodcina: Fazen<strong>do</strong>-lhes ver os sriis r~sprctivos limites e confine:<br />

e as divis6es qiie d'ella se fizrram <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> reinar~m ou irnp~ra<strong>do</strong>rcs<br />

ehristg os...... e <strong>de</strong>l~aixo <strong>do</strong>ssenliores reis meiis pred~cessores; piiiicipalmente<br />

ntifia<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s Papas Callieto ir em 116s ; Innocencio III em 1199 ; e<br />

EiiKciia IX em 1394: e <strong>do</strong>s outros Pontifica? que iraaram os noio, 1,i~pa<strong>do</strong>s.i<br />

.N." 6 o - Prepara<strong>do</strong>s que sejam os ouvintes com estas pi e) ias iio~Ces,<br />

<strong>da</strong>r8 o profersor priiicipio 6s Ilçbs <strong>de</strong> Historir <strong>da</strong> egr~ja Poi tugrirzri.<br />

Dar& pois uma boa noticia <strong>da</strong> prhgação <strong>do</strong> Eraiigellio, dri iriírorlucçb <strong>do</strong><br />

chri~tiaiiikmo; e <strong>da</strong> primeira fun<strong>da</strong>ção e estabelecimento <strong>da</strong> egreja na antiga<br />

Lusitania 8<br />

vN.0 7.0- Far4 ver o esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> egreja portiigneza rlebaixo <strong>do</strong>s impera<strong>do</strong>res<br />

gentios, qiian<strong>do</strong> ain<strong>da</strong> nElo era p~rmitti<strong>do</strong> o exeicicio piihlico <strong>da</strong> rrligi8o<br />

ehr~stli, no tempo <strong>do</strong>s christãos, e <strong>do</strong>b reis Al~iios, <strong>do</strong>s Siievos, <strong>do</strong>s Go<strong>do</strong>s,<br />

<strong>do</strong>s Moriios. e iiltim~mente <strong>do</strong>9 senhores reis uriis pre<strong>de</strong>rc.srores..<br />

Era o tenipo <strong>do</strong> gran<strong>de</strong> esplendgr <strong>da</strong> monrircliia, <strong>do</strong> brilho <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> ma-<br />

Qeetaticos; e ta<strong>do</strong> isto nfio existiu, lSd~ a hi~toria, nh ~6<strong>de</strong> cxi-tir sem cstaa<br />

gmndvs epopBas e glorias tradicionaes, qtie alentam as c6rtes com as silas<br />

recor<strong>da</strong>çòes. Ha como qiie uma eonecieiicia <strong>do</strong> proprio abuso; é iiidi~pen~a-<br />

vel rscon<strong>de</strong>r aob O aspecto <strong>do</strong>imrlo <strong>do</strong> pnqsa<strong>do</strong> O po<strong>de</strong>r excessivo dh monnr-<br />

chia.<br />

Btae e& aa li* <strong>da</strong> historie, s gran<strong>de</strong> meatra <strong>do</strong> direi& politico.


O altar acostava-w8 ao throno para ter po<strong>de</strong>r coritra as heresias<br />

e os li! rc~ ptnwlorc- ; o tlirono a<strong>do</strong>rna~a o altar com os restos <strong>do</strong>s<br />

sriic flor6ei para que não crescesse alti\l, e o quizesse suffocar repisiitinamente.<br />

-40 cranair p h <strong>do</strong>s monarchas a Curia Komana ~iáo respondid<br />

<strong>de</strong> frente, mas ta* nã;t confessava os prcteiidi<strong>do</strong>s <strong>direitos</strong><br />

O~i* rei*.<br />

I:iiirch nós, como A facil adivinhar, C o nome <strong>de</strong> Pombal que<br />

apparece á testa d'esta cruza<strong>da</strong>.<br />

Era o tempo <strong>do</strong> protecciOni,smo, <strong>do</strong> espinto regulamentar, que<br />

<strong>de</strong>scia como uma prori<strong>de</strong>acia a to<strong>da</strong>s as cousas <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>d(b, e<br />

por to<strong>da</strong> a parte m uha o ar 6 fecun<strong>da</strong> iniciativa <strong>do</strong> iiidividiio.<br />

Fazia-~e a reforma <strong>do</strong>s e\tud(lq, rcacdificava-se a U~iiversi<strong>da</strong>dc; c o<br />

miiii~trl) cllmprehen<strong>de</strong>u que a instriicçào era um gran<strong>de</strong> meio dc:<br />

fii iiiiir mcllior as pr~rogati\n- <strong>da</strong> cor<strong>da</strong>; e nos celebres estatutos <strong>de</strong><br />

1772, rnonumrntos <strong>de</strong> iimn xtravagante servidáo <strong>do</strong><br />

nhi apparece imposta ao Ieiite a obrigaçóo <strong>de</strong> <strong>de</strong>screver e elogiar<br />

tis libt~r<strong>da</strong>drs <strong>da</strong> egreja ~)ortu,nueza, e, para nzo haver alguma calbc*~a<br />

t a louca ~ <strong>de</strong> algum professor in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, que preteri<strong>de</strong>sse<br />

ou limital-as, ori negal-nc, ou que se Icmbrasse <strong>de</strong> se rir d'estas<br />

vai<strong>do</strong>sas vellei<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> rios pren<strong>de</strong>rmo< atravbs <strong>de</strong> tantos seculos<br />

aos pobres e ru<strong>de</strong>s liisitarios; os wtatutos classificam, apoiitani as<br />

trcls cl;iss(~c d'essas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s e obrigam o lente a explanar a tloutriria;<br />

peza<strong>da</strong> e quasi impossitrl tarefa para hoje, por falta <strong>de</strong> subsidio~<br />

historicos, suanto mais para então !<br />

Vejamos este notavel <strong>do</strong>cumento.<br />

No cap. 2.", n.O 2 <strong>do</strong> tit. 4." <strong>do</strong> liv. 2.' <strong>de</strong>fine-se em geral o<br />

objecto <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja portugueza. Diz-se ahi :<br />

a2.O-E como o direito Canonico assim publico, como particiilar,<br />

ou é commum <strong>da</strong> Igreja Universal, oii é especial <strong>da</strong>s Igrejas Nacio-<br />

naes, e a ca<strong>da</strong> Nacão é <strong>da</strong> ultima irnportancia conhecer perfritamentc<br />

o dircitii ranonico c especial <strong>da</strong> siin Igreja: dr to<strong>da</strong>s estas espccies <strong>do</strong><br />

sol~redit~~ <strong>Direito</strong> haverá IiyGes puhlicas nos Gcraes, porque por meio<br />

d'rllas n,io só saibam os oiitintcs os cnnones universacs e cnmmiins <strong>do</strong><br />

<strong>Direito</strong> Canonico ; mas tarnbcrn apren<strong>da</strong>rri logo o uso que d'elles se tem<br />

feito nestes Reinos ; a reteng.áo que nellrs se tem feito <strong>de</strong> alguris Cano-<br />

nes primitivos; os pritilcgios e as graças concedi<strong>da</strong>s aos Scnhorcs Rcys<br />

d'cstes Reynos pela Santa Sé Apostolica ; porque d'este complexo se<br />

formam e compóem as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> Igreja lusitanit e O <strong>Direito</strong> Ca-<br />

nonico proprio e o <strong>da</strong> Nacão Porti18ueza.u


Em o r)." 9 <strong>de</strong>screve a posiçho <strong>da</strong> egreja portugueza para com<br />

a sancta Se<strong>de</strong>:<br />

«9. Quan<strong>do</strong> mostrar qiie a egreja portiiguera rcconheceu em to<strong>do</strong> a<br />

tempo o reina<strong>do</strong> e a aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s Siimmos Pontilices, conservan<strong>do</strong>-se<br />

semprc em uma aperta<strong>da</strong> e estreita iinião com a sancta Se<strong>de</strong><br />

Apostolica. como centro co~~inium <strong>da</strong> uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> egreja e dii religião<br />

chrislã. mostrará tiimbcni o trio<strong>do</strong> e a fornia, com qiie os Pontifices<br />

(xerci1;iriim o seu po<strong>de</strong>r e aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong> na mtBsrna cgrcxja: faíeiidn ver,<br />

que a tractíiram nio como serva, mas como filha: qiic a ol)cdicnria que<br />

por ella Ihc foi tributa<strong>da</strong>, náo foi senil, mas sim filial : e qiie si) neste<br />

senti<strong>do</strong> se podcm contar com jer<strong>da</strong><strong>de</strong> es!es Reinos, c as cgrejns d'el-<br />

Ics entre os paizes e as egrejas <strong>de</strong>nomina<strong>da</strong>s <strong>da</strong> obediencia: <strong>de</strong>sterran<strong>do</strong>-se<br />

inteiramente qiialquer idfa <strong>de</strong> utiediencia, que não srja milito<br />

racional e to<strong>da</strong> digna <strong>do</strong> car.irtrr <strong>da</strong>-sancta Sb<strong>de</strong> Apostolic~i, sem qiie<br />

por mo<strong>do</strong> algum se possa confundir, oii equivocar com a escravidão que<br />

a ambas as dictas rgrejas seria in<strong>de</strong>corosa.))<br />

O n." 10 é <strong>de</strong>stina<strong>do</strong> a <strong>de</strong>clarar o ohjecto <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

egreja portugueza, fazen<strong>do</strong> d'ellas tres grupos:<br />

nlO. Fará ver, que a egreja Portiigueza (<strong>da</strong> mesma sorte que as<br />

<strong>da</strong>s outras nay6es) goza tamlirrn <strong>da</strong>s siias li1)rr<strong>da</strong>dcs. qiic sempre seloii<br />

c conservou: <strong>de</strong>claran<strong>do</strong> qiie ellas consistc~iii: Prin~o: na retencão <strong>de</strong><br />

algiins iisos, cnstiimes c obscriaiicias ciinoiiic~is. qiie clia conscrvoii<br />

seniprct* tem dirclito tle conservar I- <strong>de</strong>ft,iitier como Icgitimos por aii-<br />

Iliori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> concilio Sicctiio, qiie os miintla girar<strong>da</strong>r. Secun<strong>do</strong>: na obser\;inciii<br />

tios caiioncs antigos, qiic posto sc não possa nella provar<br />

~eríilmente. phdc cornt.ii<strong>do</strong> mostrar-se com milita eri<strong>de</strong>ncia em alguns<br />

pontos e artigos <strong>da</strong> disciplina antiga, e mais piira. cin qiic ella resistiu<br />

sempre constante As innovari,es posteriores, e siiccrssivas piibliearóes<br />

<strong>da</strong>s falsas <strong>de</strong>cretacs. Tertio: em algiins 1)re~'s. cm I~ullas, qiie foram<br />

<strong>de</strong>pois concedi<strong>da</strong>s á mesma cgrejn. aos bispos, aos prela<strong>do</strong>s d'ella, á nacão<br />

e aos senhores reis meus pre<strong>de</strong>cessores, entre os qiiaes ha muitos,<br />

que sem embargo <strong>de</strong> terem si<strong>do</strong> rc~nccdi<strong>do</strong>s em L(,iina <strong>de</strong> privilegias e<br />

<strong>de</strong> graras, não são mais <strong>do</strong> que iins vcr<strong>da</strong>dciros reconhccimentos <strong>de</strong><br />

legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>do</strong>s costumes e observancias que fazem objecto d'estes.~<br />

Como estes estatutos não fizeram seriào cxpor assim em these<br />

qual a natureza <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> cgclja portiigiicza, e tiveram a<br />

franqueza <strong>de</strong> dizer que cm alguns pontos, tlm qiie a disciplina se<br />

afastdra <strong>do</strong> espirito <strong>da</strong> reforma feita pcliis falsas <strong>de</strong>cretaes, conser-<br />

van<strong>do</strong> a pureza <strong>de</strong> algiiris antigos ranories, n8o era facil proval-as<br />

geralmente, posto que com muita evi<strong>de</strong>ncia se podia mostrar em<br />

vQrios artigos; a escola ultramoatana tomou a palavra, e veiu es-


carnecrn<strong>do</strong> dizer-&s, que to<strong>da</strong>s as liber<strong>da</strong>drs <strong>da</strong> egreja portugueza<br />

táo fala<strong>da</strong>s eram pramente chiinericaa.<br />

Preten<strong>de</strong>m qiie a seita 'anc+bnico-gallicann, qiic no seciilo xviir<br />

iii\ ndii ,I e rt.iiia\a eni Portu~al e na Uriiversi<strong>da</strong>dc, tinha inventa<strong>do</strong><br />

to<strong>da</strong>s cws intitul<strong>da</strong>s 15 r<strong>da</strong><strong>de</strong>s; -que escriptor ncnhiim, como<br />

na Franca se fez, soqgdiou em Portugal essas liber<strong>da</strong>dcs, que<br />

o- est~tuto~ <strong>da</strong> Cnkers<strong>da</strong><strong>de</strong> c8 blam genericamente c sem provar<br />

o qiic aRrrnam;-que não comta quars fossem essas liher<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

alteiidi<strong>da</strong>s pelo concilio <strong>de</strong> .%ia ; -que se iião sabe rm que<br />

tempo a egreja lusitana rerictí. á pretendi<strong>da</strong> nova discililinn <strong>da</strong>s<br />

falsas <strong>de</strong>cretaes, pois que tlecrctos, comquanto apocrilihos,<br />

em na<strong>da</strong> alteraram a dixiplina (Ia egrqja, como cstá proja<strong>do</strong>: -<br />

que apenas conhccem o ~ k g i <strong>da</strong> o apresentacão <strong>do</strong>s hcncficios<br />

eclesiasticos, concedi<strong>do</strong> aás pdroeiros, e <strong>da</strong> incapaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s cxtrangeiros<br />

quanto ao gozo disws bencficios ; mas que nenhum<br />

d'estcs se podc chamar lib+miat!..s, antes são meras servi<strong>da</strong>es soffri<strong>da</strong>s<br />

pela egrcja, e s6 librr<strong>da</strong>dcbs para os padroeiros; pois que a<br />

egeja acceita emprega<strong>do</strong>s que ella náo elegeu, e que lhe apresentam<br />

os padroeiros, ou o padroeiro, porque hoje to<strong>do</strong>s os padroa<strong>do</strong>s<br />

se acham reuni<strong>do</strong>s no padroa<strong>do</strong> real ; - qiie egualmente<br />

alpiimas concessfics, feitas pelos pontificcs Acerca <strong>de</strong> assiimptos <strong>de</strong><br />

disprnsds matrimoniacs, tambrm nfin são liber<strong>da</strong>dcs, porqiie 6 o<br />

diroito commum <strong>da</strong>s epejas <strong>do</strong> rnun<strong>do</strong>, que, pelas distancias a que<br />

se acham <strong>da</strong> S6 Jtomana, pe<strong>de</strong>m c s privilegio, ~ o qual <strong>de</strong> mais a<br />

mais o romano pontifirc podc retirar, quan<strong>do</strong> julgar conveniente;<br />

-que as conheci<strong>da</strong>s concordias ou concor<strong>da</strong>tas, cclrbra<strong>da</strong>s pelos<br />

reis e clero, 1120 iiistifiram nrrihiima <strong>da</strong>s pretendi<strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, e<br />

que, quan<strong>do</strong> justificasscsm, não po<strong>de</strong>riam ter o merecimento que Ihes<br />

querem attribuir sem a approva@o <strong>da</strong> sancta Sé, a qual n8o s6 não<br />

têm, ma4 lhe foi ruprrqsamente nega<strong>da</strong> pelo breve <strong>de</strong> Gregorio xii~<br />

<strong>de</strong> 25 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1574'.<br />

.tporn se coml)rehcn<strong>de</strong> a razão por qiic acima falavamos no perigo<br />

que corriamos, por não ter airi<strong>da</strong> escriptor nenhum compendia<strong>do</strong><br />

d'estas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

hra<strong>de</strong>iro, Tntrod. rx, psg. ccxv~t e<br />

scguint~~, por Caiidi<strong>do</strong> Mrnr1i.s <strong>de</strong> Almei<strong>da</strong>, Rio <strong>de</strong> .l.itieiro-lfi(;(i<br />

E:.tc li\ ro, escripto cin 1864, 6 1):cstnntp euiioro por viias ol~iiiifieq ftbertaireirt~<br />

iiltrlimontanas, e p~ln critica qiip faz ri :ilgui~s <strong>de</strong> nnssos míiiq sahios<br />

aiirtnrei. cntre elles ao gran<strong>de</strong> J11,llo Freire, <strong>de</strong> quem fala bem pouco lisongeiiaiuente.<br />

1 Veja-se <strong>Direito</strong> Cii.il Eccl~siasfico


Rem sabemos que lá esth na Carta o beneplacito regio; mas,<br />

como abaixo veremos, este recurso na<strong>da</strong> cons~guirfi, quan<strong>do</strong> as li-<br />

ber<strong>da</strong><strong>de</strong>s nfio estiterem conheci<strong>da</strong>s e emquanto se n8o podhrem<br />

fun<strong>da</strong>menta<strong>da</strong>mente allegar.<br />

Vamos mostrar como as pretens6es <strong>da</strong> escola ultramontana sBo<br />

infun<strong>da</strong><strong>da</strong>s, como cíkctivamente existem liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s na egreja por-<br />

tiigueza ; seremos o mais breve que nos for possivel, porque n3o<br />

B cssc o nosso principal intuito, e porque nos levaria muito longe<br />

fazer aqui O resumo P a <strong>de</strong>monstrnql~o <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> uma <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

nos variadissimos capitulas e artigos <strong>da</strong> disciplina.<br />

Kemontemos um pouco mais alto e vejamos o esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> egreja<br />

leonesa ao tempo d'essa srparayRo no seculo xir.<br />

Des<strong>de</strong> o scculo 111, mas principalmente <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o iv secrilo, co-<br />

mecam os concilios já provinciaes, já dioccsanos, já nsrionnrs <strong>da</strong>s<br />

egryjus gothicas <strong>da</strong> peninsiila. No iv sr~ciilo retine-se o primeiro<br />

concilio geral que se coiihece: é o celehr~ concilio <strong>de</strong> Elvirn. Ate<br />

este tcmpo a egrcja <strong>da</strong> peninsiila niio tem um Codigo seu; mas o<br />

gran<strong>de</strong> respeito pela tratlicào e pelos canones mais vrnc~raveiu bem<br />

<strong>de</strong>pressa o fez apparecer 1.<br />

D'aqiii por <strong>de</strong>ante parece que as egryjas hespanholas conheceram<br />

c a<strong>do</strong>ptaram o antigo codigo <strong>da</strong> epreja romaria. que continha<br />

os canones <strong>do</strong>s concilios orientam <strong>de</strong> Nicea e Sardica cle que s6<br />

ueavn a egreja romana. Accrcsccnta<strong>do</strong> com os cationes <strong>de</strong> Elvira e<br />

Saragoça, <strong>de</strong>cretacls <strong>do</strong>s bispos <strong>de</strong> Ilespanha e dc Siricio papa a<br />

IIimerio, bispo <strong>de</strong> Tarrogona, formava o seu codigo particular e. A<br />

corifusao a respeito <strong>da</strong> versào <strong>do</strong>s antigos canoncs, sempre tno reverencia<strong>do</strong>s<br />

pelos bispos <strong>da</strong> peninsula, <strong>de</strong>u causa R nova collecçfio<br />

<strong>de</strong> S. Martinho <strong>de</strong> Diimrs, <strong>de</strong>pois dc Rraga, pela qual se govt)rnou<br />

a egre,ja tiespanhola tio vi seciilo, sem corihecrr, ao que parece, o<br />

Codigo <strong>de</strong> Dionysio, já entõo promulga<strong>do</strong>. No vil seculo apparece<br />

lia Hespanha a terceira <strong>da</strong>s collecções maiores <strong>da</strong> egreja occi<strong>de</strong>ntal,<br />

o Codigo <strong>de</strong> S. Isi<strong>do</strong>ro <strong>de</strong> Sevilha, que 6 tamhcm o Codigo<br />

proprio d'estas eprejas. Depois vem o scciilo viii, que 6 nno s6 o<br />

seculo <strong>da</strong>s falsas <strong>de</strong>cretaes, mas tambcm <strong>da</strong> invasâo musulmana.<br />

1 Hispeiiieneis Ecclrsia a ptima, qrtrre illi rtiulsit, Evangplii luce, Ssnctorum<br />

Patrurn, verierabilirimqor Coiicilioru,n dccieto in maxiinx hahuit obser-<br />

\,aiitis sunvurnque trriditiooiirn fuit ietin~iitir;bin,a. I). Thorn. Disscrt -@w<br />

nam cnaonum codice tcsa est Hispanir9tei.v E'wLrsia ar1 saecirlum nsgue octam *<br />

prg. 2, á testa d& edição <strong>do</strong> Vetctus Canon Co<strong>de</strong>a Ecelesiae Lusrtanae, 1764.<br />

2 JoBo Pedra Ribeiro, iiianuscripto cita<strong>do</strong>.


A egrcja hespnhola, como to<strong>da</strong>s as mi<strong>de</strong>ntaes, resiste <strong>de</strong>segualmcntt.<br />

c ,i supremacia <strong>do</strong>s papas, mas pr fim t! ~enci<strong>da</strong> por<br />

ella. To<strong>da</strong> a pureza, pois, <strong>do</strong>s antigos cano- dcapparece nesta<br />

cgreja, t8o amante d'ella ; e os esforços contintos e perseverantes<br />

<strong>do</strong>s papas acabam aqui, como em to<strong>da</strong> a parte, <strong>de</strong> vencer o epis-<br />

copa<strong>do</strong> e os reis 1.<br />

'1 invasão <strong>do</strong> islamismo, embora geralmente tokrr-e a rt~li:iao<br />

(' i i43, fez comtu<strong>do</strong> muitas vez-, como diz um escriptor. íjiits as<br />

?itS4 ficassem sem bispos :fi l>ispoc rrni di. &ta r~tnliiq;io, IIU~<br />

remo<strong>de</strong>lou os costumes e linpa <strong>da</strong> pinab, impediu ain<strong>da</strong> ni,iis<br />

a consclrvaqáo <strong>da</strong> antiga disciplim, e ta aan qw &I só no milio<br />

i '*I,<br />

<strong>de</strong> tantas calami<strong>da</strong><strong>de</strong>s o aiixilio <strong>de</strong> Roma bzae muito app~itnc<br />

mas qiir tamhem, quan<strong>do</strong> os mueiilmanos se rctimm <strong>da</strong> pcn 11-<br />

si11 I. o- 11" i5 com seus Irga<strong>do</strong>s firmassem mdbor o ma prima(lo.<br />

E ;i-- ni (yue, se antes <strong>do</strong> seculo \ iii os egrejas bmpnbolas t6m<br />

lit)c>r<strong>da</strong>tlcs justas, e tanto mais rrspeitateis, g9e e prendiam no<br />

onior pcllo aritigo costume c \(.lhos cannnes, que 0 m pre cita<strong>do</strong><br />

concilio <strong>de</strong> Nicea tanto recornrncn<strong>da</strong>ra ; tambein <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> seculo x<br />

ellos tem-nns p~rdi<strong>do</strong> qiiasi intcbiramentt..<br />

,\ nossa egreja nasceii, <strong>de</strong>stacou-se, r.-% d qucllas emjas <strong>do</strong>s<br />

primriros scculos, mas <strong>da</strong>s novas egreja- ir'c- e restaura<strong>da</strong>s,<br />

tfn rnon,irchi,i nco-gothica <strong>da</strong>s Austurias: e dia <strong>do</strong> ber<strong>da</strong>u libcr-<br />

d;~(~tls algumas d'essas egrejas, pobrrs <strong>de</strong> iibd<strong>de</strong>s.<br />

\:lia s6 trouxe comsipo, 'a cingir-lhe i pmtr;t;L ca<strong>de</strong>ia pcsa<strong>da</strong><br />

<strong>do</strong> primii<strong>do</strong> <strong>de</strong> RomaP.<br />

De um facto que an<strong>da</strong> intimamente Ii:& m ~iosra emancipaçáo<br />

politica brotou a sua primeira I i f d k $=<br />

A primazia <strong>de</strong> Tole<strong>do</strong> hctava com a <strong>de</strong> kp, a rqaella pretendia<br />

submetter ao seu jugo to<strong>da</strong>s as cL -1s. A st?<br />

bracharense resiste toletana com tanto ala, g.L qezar <strong>de</strong><br />

1 No eeculo xr ain<strong>da</strong> ue conservam, no que prrq n* <strong>da</strong> -tira diqcipliiia,<br />

porkm si, em consas directa e unicsmmta mia- .o ssrvigr, tio<br />

ciilto e nho rcipcctivris 6 parte politics dn pwm~<strong>da</strong> G-rio vir,<br />

<strong>de</strong> nrcor<strong>do</strong> com 1). Affoiiso VI, Q cii~tx <strong>de</strong> miiita ta-%enme intioduzir<br />

os nfiicioa e liturgis romana; c~nscrran<strong>do</strong>-$e em e-.<br />

ain<strong>da</strong> parte<br />

<strong>do</strong>e aiiticoq ritos, como, no tempo dc J. Pedio Ri& o tsteinunho<br />

d'este escriptc~r, era ain<strong>da</strong> gli~r<strong>da</strong><strong>do</strong> na ecleja <strong>de</strong> k!? veja a pag. 105 <strong>do</strong><br />

cita<strong>do</strong> mun~ls~~ipto, n.09 e 13.<br />

2 Rej~itamos poiq a ciuctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s ccncilion ds Luoihnia e <strong>da</strong> He~panha<br />

g~thica, como foiitt? <strong>do</strong> direito <strong>da</strong> egrejs portupw, e @-te to<strong>do</strong>s esse8<br />

codigos particulares <strong>da</strong>s velhas egrejas <strong>da</strong> p a i s


aquetla ter obti<strong>do</strong> a <strong>de</strong>claração e confirmacão <strong>da</strong> digni<strong>da</strong><strong>de</strong> prima-<br />

cial <strong>da</strong>s Hespanhas pelos papas Urbano x, Lucio 11 e Eiigenio irr,<br />

comtu<strong>do</strong> ella separa-se com Portugal, e, in<strong>de</strong>peri<strong>de</strong>nte em a nova<br />

egreja, <strong>de</strong>sconhece o po<strong>de</strong>r d'aquella se, a <strong>de</strong>speito <strong>da</strong>s bullas <strong>do</strong>s<br />

pontificcs 1.<br />

To<strong>da</strong>via este facto esta tão liga<strong>do</strong>, tão confundi<strong>do</strong> mesmo com<br />

a nossa separação <strong>da</strong> monarchia leoneza, que por isso, talvez, a<br />

ningii~m avultlira ain<strong>da</strong>, antcs <strong>de</strong> nós, como tima liber<strong>da</strong><strong>de</strong> e li-<br />

ber<strong>da</strong><strong>de</strong> preciosa <strong>da</strong> nossa egreja.<br />

Isto e suficiente para ver a egreja <strong>de</strong> Portugal com vi<strong>da</strong> pro-<br />

pria, uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira cgrrja sui juris, particular, nacional, egreja<br />

portugueza.<br />

filas, se este acontecimento concorreu, tão po<strong>de</strong>rosamente, no .<br />

apparccimento <strong>da</strong> nacionali<strong>da</strong><strong>de</strong> portugueza, outro acontecimento,<br />

egudmente coevo <strong>do</strong>s nossos primeiros momentos e prendi<strong>do</strong> ao<br />

nosso berço como protector <strong>de</strong> sua liber<strong>da</strong><strong>de</strong> politica, veio obstar<br />

ao <strong>de</strong>sinvolvimrrito tlc novas lihrlr<strong>da</strong><strong>de</strong>s :<br />

Foi a ccllchrc stibrnissão cfc Affonso Henriques ao pontifire ro-<br />

mano, fiicto 180 bem explica<strong>do</strong> pelo b~nemerito historia<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s<br />

primeiros dias <strong>do</strong> nosso vivcr.<br />

Sc as circumstancias sociaes <strong>da</strong> meia c<strong>da</strong>dc tinham si<strong>do</strong> a<br />

causa <strong>da</strong> homenagem prcsta<strong>da</strong> á se apostolica pc4o filho <strong>do</strong> con<strong>de</strong><br />

I$orgonhez; a posição politica <strong>do</strong> papa<strong>do</strong> foi a origem <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s<br />

dissctisões, que agitaram os primriros reina<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s nossos rcis.<br />

O po<strong>de</strong>r <strong>do</strong> clero era gigaritcsco 'neste momento; esse po<strong>de</strong>r<br />

1 Veja Alexaiidre Herciilaiio. Hist. <strong>de</strong> Port., tomo 1.0, liv. 2.*, pag. 351e<br />

as epistolas ahi citatlas <strong>de</strong> Eiigeiiio Irr.<br />

Eis iim exemplo vivo tlo ~III, acirna rlissemoa, qiiari<strong>do</strong> eecrevnrnos que o<br />

eleineiito <strong>da</strong> nacio:ialitladc cra a causa <strong>do</strong> apparecimento <strong>da</strong> egreja particular<br />

nacional.<br />

Pois, como havia I%i.ny~ cnritinuar a pertencer 9. egreja hespanhola e portanto<br />

ficar sujeit:~ ao piiiritiz d~ Tole<strong>do</strong>, primaz <strong>da</strong>s Hespcliihas, se d'esta<br />

fórnia to<strong>do</strong>s OR bispos (11: I'ortiigal seriam obriga<strong>do</strong>s a ir 808 coiicilios toletauos,<br />

que eram t:tinhem assemblêas politicae, e <strong>de</strong>pois coa~i.iclo3 a executar<br />

.essas leis e respeitar essa primazia <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong>s limites <strong>do</strong> novo reino <strong>de</strong> Portugal<br />

?<br />

Eniquanto a egreja riào purificar a sua disciplina e <strong>de</strong> to<strong>do</strong> per<strong>de</strong>r certoa<br />

sonhos e <strong>de</strong>spe<strong>da</strong>çar certos principias incompativeis coni o progresso e futuro<br />

<strong>do</strong> muii<strong>do</strong>, hào <strong>de</strong> eenipre existir estae luctss e dissetis0eb; e acabarem antes<br />

d'aquella reforma, coita<strong>da</strong> <strong>da</strong> egreja, qtie ser4 esçie um tribte akoiiro para<br />

ella !<br />

Nlo nos entranhamos aqui na dificil e ciirioscl questlo <strong>da</strong> primazia <strong>da</strong>a<br />

Hespanhas, ain<strong>da</strong> hoje peu<strong>de</strong>nte, porque não é este o nosso objecto.


fi~zia-o tima <strong>da</strong>s classes pocirrosas e influentes <strong>do</strong>s esta<strong>do</strong>s; e agora<br />

o primii<strong>do</strong> <strong>do</strong>s pontifices, 1130 só rccorih(~ci<strong>do</strong> mas impetratlo, <strong>da</strong>va-<br />

Ihc ciitrr 116s nova robustez e indcpen<strong>de</strong>noia altaneira no meio <strong>da</strong><br />

\i(I;i 1101iti1.,i<br />

<strong>de</strong> Portugal.<br />

.tc.,!ii ~iiile~~c<strong>de</strong>nte<br />

r soberano, o clero n8o sc podia dizer<br />

\ i~r<strong>da</strong>tl(,irci iiiente naciooal ; a veja portugucza quasi niio existe<br />

iitb ao ti,ii!jio <strong>da</strong> primeira c~~ncor<strong>da</strong>ta.<br />

As eoiicordias, ou concor<strong>da</strong>ias, são a segun<strong>da</strong> fonte <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong>-<br />

<strong>de</strong>s, ou <strong>do</strong> direito particular <strong>da</strong> eborejn portugueza.<br />

011 havemos <strong>de</strong> 111r ria libertay80 <strong>da</strong> egrcja bracharensis <strong>do</strong> pri-<br />

milzia toletana a primeira liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> egreja portugueza, e com<br />

ella o primeiro dia <strong>da</strong> existcncia d'ehta egreja; ou ha~cmos <strong>de</strong><br />

marcar no seculo xitr o apparecirtiento <strong>da</strong> mesma egreja 1.<br />

Sc a+ coricor<strong>da</strong>tas tiveram a sua razão <strong>de</strong> ser na iriílucncia pre-<br />

11oteiite du clero e dc Koma, o placito regio, partin<strong>do</strong> <strong>da</strong> mesm6<br />

fonte, vciii acabar com cssa influencia. Em nosso mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> ver a<br />

csta tima (tas mais brilhantes liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> riossa egreja. Uma bulla<br />

a que se negue o benepelacito é iriexrqiiivel ria egreja portugueza;<br />

esta cgr~ji~ tcm assim atlquiri<strong>do</strong> o direito d~ caniirihar em selili<strong>do</strong><br />

opposto <strong>do</strong>s man<strong>da</strong><strong>do</strong>s <strong>de</strong> Homa, quan<strong>do</strong> abusivos, e quan<strong>do</strong> preten<strong>da</strong>m<br />

dcsluatrar i1 in<strong>de</strong>peri<strong>de</strong>ncia <strong>da</strong> naçiio. O serilimciito <strong>de</strong> rcpulsa<br />

contra cbss;i5 bullas, que se <strong>de</strong>ve levantar em to<strong>da</strong> a naqõo, nào podiii<br />

com jiistiça cercear-se no coração <strong>do</strong> clero portugriez, que<br />

tttm tíimhein uma patria, um pun<strong>do</strong>rior nacional, como qualquer<br />

outro ci<strong>da</strong>dào.<br />

Mas, dir-nos-30, o breve- ílxponi nobis-<strong>de</strong> 25 dc abril <strong>de</strong><br />

i574 não terá acaba<strong>do</strong> com o regio placito, com to<strong>do</strong>s os privilegio~<br />

e liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja portiiguezaf<br />

Não po<strong>de</strong>mos dispensar-rios <strong>de</strong> dizer duas palavras a respeito<br />

d'este importante <strong>do</strong>cumento.<br />

Nos fins <strong>do</strong> seculo xvi fez-se em Homa tima I~ulla, que começilva<br />

por lembrar urn <strong>do</strong>s factos mais rcspeitaveis <strong>da</strong> chronica <strong>do</strong><br />

martvr <strong>do</strong> Golgotha; essa bulla, por um acaso terrivel, chamou-se,<br />

como to<strong>da</strong>s as bullas, com us primeiras palavras <strong>de</strong> seu corpo, a<br />

bulla ln coena üomini, e comtu<strong>do</strong>, não ha <strong>do</strong>cumento mais repu-<br />

1 Acerca <strong>de</strong> concordias vrja-se Gabriel Pereira <strong>de</strong> Castro, <strong>de</strong> Manuregia.<br />

P. 1.I - Jod Ariastncio <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong>, Synopsie Chronologka, torn. 1."-<br />

Mello Fit.irc, IIist. JILI-. not. aos 59 47, 513, 68, 71, 83-e Coelho <strong>da</strong> Rocha<br />

no seu Ertsaio sobre a historia <strong>do</strong> youerno e <strong>da</strong> Zeyirlapão <strong>de</strong> Port,llyd.


gnante em to<strong>do</strong> o bullario romano, em to<strong>do</strong> o corpo <strong>da</strong>s drcrk<br />

taes.<br />

Esta bulla produz em quem a I& um effi.ito singular; ora con-<br />

vi<strong>da</strong> a <strong>de</strong>spe<strong>da</strong>çal-a, indigna<strong>do</strong> ; ora excita o riso, com o seii exag-<br />

gero draaiatico. Nào tPm numero atti~igivcal as excomuiihões que<br />

ri'ella se lulminarn; e <strong>do</strong> seu texto se coricliie que, oii as naqões<br />

háo <strong>de</strong> <strong>de</strong>pdr aos pés tlo Siimmo Poniificc e <strong>do</strong> clcro inteiro a<br />

soberania plitica e a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> indibidual; oii to<strong>da</strong>s ellas h80 <strong>de</strong><br />

ser arrerncssa<strong>da</strong>s para fóra <strong>do</strong> seio <strong>da</strong> christari<strong>da</strong>dc pela força <strong>do</strong><br />

anathema.<br />

Pois, apezar <strong>de</strong> se publicar, <strong>de</strong> se espalhar c introduzir em to-<br />

<strong>da</strong>s as nações <strong>da</strong> Europa, apezar <strong>de</strong> nenhuma lhe obe<strong>de</strong>cer, nem<br />

as nações foram coridcmnn<strong>da</strong>s h heresia, nem o <strong>do</strong>miriio <strong>do</strong> clero<br />

se engrossou com a escravidão <strong>do</strong>s povos.<br />

Não nos admircmos d'isto : é a condic;'io <strong>de</strong> tu<strong>do</strong> o que não<br />

cabe nos limiies <strong>do</strong> possivrl. Nem as ~iayócs sc podiam siiici<strong>da</strong>r,<br />

sacrificari<strong>do</strong>-se h thcocracia monstruosa; nthrn a tyrcbjíi romana<br />

po<strong>de</strong>ria acceri<strong>de</strong>r seus raios, porque fiilminaria o catholicismo iri-<br />

teiro.<br />

I'or to<strong>da</strong> a parte se iritroduziu subrepticiamrril(1 esta celebre<br />

bulla! porquc tara quasi geral o uso <strong>do</strong> placito rcgio, que Ilie im-<br />

pediria a entra<strong>da</strong> e divulgaçâo, se fraricarnerito e dcscobcrto se<br />

apresentasse. Na<strong>da</strong> se conseguiu, porqiie, assim que correu em<br />

publico, levantou-se uma tal indigriação! que em pouco tempo lhe<br />

roubou a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> que queria conquistar.<br />

Na alta Allemanha o impera<strong>da</strong>r Ho<strong>do</strong>lpho 11 oppoz-se viva-<br />

mente á publicação d'esta bulla ; no electora<strong>do</strong> <strong>de</strong> Mayence o ar-<br />

cebispo eleitor prohibiu que fosse publica<strong>da</strong> na sua diocese e nas<br />

terras <strong>do</strong> seu <strong>do</strong>minio temporal<br />

Fillippc I egualmente n impediu, sob graves penas, na Hes-<br />

panha, nn Italia, ria Sicilia, em Napoles e nos Puizrs-Baixos; ((11-<br />

déclare, diz um historia<strong>do</strong>r 1, qu'il ne souffrirnit pns qu'on lui put<br />

reprocher d'avoir laissk diiniriuer par une IAclir coii<strong>de</strong>scen<strong>da</strong>nce la<br />

digiiith


I<br />

ce<strong>de</strong>ram 6s instancirr <strong>do</strong> num%, BaLirogbo. que lhe pedia a<br />

pu1)licaçbo <strong>da</strong> bulla nas suas diocese'.<br />

A França fez mais: man<strong>do</strong>u-se promkr r im+ções a respeito<br />

<strong>do</strong>s iritrotluctores <strong>da</strong> prrigosa bulla, e & toibs a arcebispos, bis-<br />

pos c viparios, que a tiriliiim acceita<strong>do</strong> c publica<strong>do</strong>, man<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-os vir<br />

cm pessoii á preseriça <strong>do</strong> Parlamento para reqcdrern no recurso<br />

!I cor0a iu competente procura<strong>do</strong>r. Foi isto pelos amos <strong>de</strong> 1 580.<br />

Como 18 fóra, entre n6s o m mo se pretendm coasl.:uii. c as<br />

maquiiiaçòes jesuitic,as assim e obtem no anw <strong>de</strong> 1575. .\ $ppo-<br />

siçao, o estron<strong>do</strong> foi íh pn& apar <strong>do</strong> miseravel estali., I :,i que<br />

jazia Portugal nestes tempos. qw a pitas em muitos it,g,ii.~>s se<br />

viram obriga<strong>do</strong>s a fugir, corra<strong>do</strong> e perigo <strong>de</strong> serem al)t.tlrr:in<strong>do</strong>s.<br />

Dn parte <strong>do</strong>e po<strong>da</strong>es, pors, iPo Imre um rompimrrito iiltivo,<br />

que teria evita<strong>do</strong> difficuldr<strong>de</strong>r O infeliz moço, que presidia i10 go-<br />

verno <strong>da</strong> nacào, fez submissmmte consi<strong>de</strong>rar ao papa que na<br />

bulln, que se lia em Roma na qu<strong>da</strong> íeira <strong>da</strong> cêa <strong>do</strong> Senhor, pa-<br />

reciam vir alguns capitulas offensiros <strong>do</strong>s privilegios e Icis <strong>de</strong> que<br />

ha rriilitos aiirios Portugal usava, rem opposiçào <strong>da</strong> sancta Se; e<br />

quasi humil<strong>de</strong> Ilie siil,plicava que quizesse, com a beriigrii<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

apostolica quc o illumitiiiva, <strong>de</strong>clarar que essas leis e privilegios<br />

nào iam cornpreheridi<strong>do</strong>s rias con<strong>de</strong>mnaçòes <strong>do</strong>r artigos <strong>da</strong> bulla<br />

ln coena L)o~/~irri.<br />

O poritific~~, lh~tito srri, envia em resposta a D. Scbastiào o<br />

breve - Exponi rrobis- dc 25 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1574, no qual mais<br />

<strong>de</strong> urna bcz se encontra a plirase que se arrasla conio a serl~enie.<br />

Ahi Ilic poridcra que, muito gostoso, queria corivericer-se dc que<br />

existiam taes leis e privilcgios; mas que, <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as allcgaçòes<br />

<strong>do</strong> rei, na<strong>da</strong> podkra coinprc~lieri<strong>de</strong>r, e que assim lhe pedia quc brevemente<br />

procurasse remelter-lhe as coiicordias, conlirmaçbes, Icis<br />

e privilegios dc quc lhe Salavir; e que tio entretanto, <strong>de</strong>sejan<strong>do</strong> em<br />

alguma parte satisfazer aos rogos <strong>do</strong> moiiarcha, quacto coin o<br />

Senhor podia, lhe permittia e coricedia que elle e os seus juizes e<br />

ministros po<strong>de</strong>ssem usar <strong>da</strong>s referi<strong>da</strong>s Icis assim como ate agora<br />

sem controversia o tinham feito; não sen<strong>do</strong> em coritrario <strong>do</strong>s <strong>de</strong>cretos<br />

<strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Trento, e isto por espaço <strong>de</strong> um anno '!<br />

1 Copiamos, por muito interessante, e integra cl'este breve. A traducçiio<br />

8 <strong>da</strong> Ueducç. Chrun. p. ir, <strong>de</strong>monst. 6..<br />

Ao iiosso carisnimo filho em Christo, SebiistiQo, illustre rei <strong>de</strong> Portugal,<br />

sau<strong>de</strong> e beu@o.<br />

Vossa magesta<strong>de</strong> me fee expor que ha pouco tempo tinha chega<strong>do</strong> B sua


Tal era o esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> humilhação a que chegára a soberania <strong>do</strong>s<br />

nossos reis !<br />

Sr hoj~ seria mui difficil e <strong>de</strong>mora<strong>do</strong> trabalho fazer um codigo<br />

<strong>da</strong>s liber<strong>da</strong>clc~s, corifirmações e privilegios <strong>do</strong> nosso reino; como<br />

po<strong>de</strong>ria brevemeiile, quam prilnun~, rio espaço <strong>de</strong> um anno, fazer-se<br />

essa compilação nesses trrnpos <strong>de</strong>sgraça<strong>do</strong>s e sob a influencia<br />

jesuitica, que piimeiro procurhra introduzir a bulla perigosa?<br />

E, quan<strong>do</strong> se po<strong>de</strong>sse fazer, [ião ia d'eslc mo<strong>do</strong> pedir-se ao papa<br />

nào s6 a confirmaç80 <strong>do</strong>s privilegios, mas <strong>da</strong>s proprias leis <strong>do</strong><br />

reino, <strong>do</strong>s assentos <strong>da</strong>s côrtes, <strong>de</strong> to<strong>da</strong> essa herança legislativa<br />

<strong>do</strong>s pre<strong>de</strong>cessores <strong>do</strong> rei dcsverituroso ?<br />

Que abysinos se abriam sob este simples acto <strong>da</strong> chancellaria romana!<br />

como d'alli se zombava <strong>da</strong> paz <strong>da</strong>s nações e <strong>do</strong> direito <strong>da</strong><br />

humani<strong>da</strong><strong>de</strong> !<br />

Esta opposição vivissima dc to<strong>da</strong> a Europa, cujo estron<strong>do</strong> vinha<br />

ate 130rtugal, a guerra religiosa na Frunya e nos Paizes-baixos,<br />

<strong>de</strong>svian<strong>do</strong>, a attenção e csliian<strong>do</strong> as intençòes <strong>do</strong> papa; interromperam<br />

esta conten<strong>da</strong> <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong>-a pen<strong>de</strong>nte. A biilla continuou a<br />

ler-se em Roma na quinta feira <strong>da</strong> semana siincta, e as excommu-<br />

noticia que algun~as leis <strong>do</strong>s seus reinos e alguns privilegios concedi<strong>do</strong>s pela<br />

S:! iiposttolica 'a VOHSZL Jliigcsta<strong>de</strong> e aos seus pre<strong>de</strong>cc~sorcs, pareciam <strong>de</strong>roga<strong>da</strong>s,<br />

olhsii<strong>do</strong>-se para o tlieor <strong>da</strong>s palavras coriti<strong>da</strong>s rias ConetituiçOee apstolicas,<br />

que so costumavarri publicar em quinta feira <strong>da</strong> ceia <strong>do</strong> Sculio~:<br />

Qric isto nào s6 inseriagrave prejuizo B sua real ji~iisdicçào, maa que essas<br />

leis c privilegios se ii:io podiam <strong>de</strong>rogar seiri maxiina perturbaçâo <strong>da</strong> paz e<br />

traticti~illi<strong>da</strong>~-ir e <strong>da</strong> coiicordia <strong>de</strong>baixo <strong>da</strong> ciulrl os esta<strong>do</strong>s ecclesiaatico c secular<br />

têiir \i\ i110 atB agora:<br />

Oue. " ,. i~osto ciiie V. AI. vossa consi<strong>de</strong>rar que as dictae leis estabeleci<strong>da</strong>s<br />

pelos reis seus pre<strong>de</strong>cessores e observa<strong>da</strong>s p<strong>do</strong> esta<strong>do</strong> ecclesiaetico, umas ha<br />

mais <strong>de</strong> ccnt, outras h:& tnaia <strong>de</strong> duzeritos aiiiios, para comporem e fazerem<br />

cessar as UI gentes qucstUes e coiitrover~ias qiie houve naquelle tempo e fosseiii<br />

pioiriulcsd is para conservar a paz, e dlgiimas d'ellae corrobora<strong>da</strong>s, feitas<br />

r iiitroduz~<strong>da</strong>s com auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> apostolicli:<br />

Posto que os dictod privilegias foraui coucedi<strong>do</strong>s com justas e legitimas<br />

causas iiiuiia exibtcutes :<br />

Posto que tairihein se <strong>de</strong>va cotisi<strong>de</strong>rar yiic as referi<strong>da</strong>s leis e privilegioe<br />

<strong>do</strong> po<strong>de</strong>ui ser teiitleiitcq e iiitcrpreta<strong>da</strong>s para oEenba e diminiiiqho <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

ecclesiastic:~; rnas se dirigem ao serviço <strong>de</strong> Deus e ao beiii 11ublico <strong>de</strong><br />

seus reinos e <strong>do</strong>minioa e 4 conservagao <strong>da</strong> paz ciitre os sobredictou esta<strong>do</strong>s :<br />

Posto que O uso <strong>da</strong>s dictm leia e privilegios sempre foi recebi<strong>do</strong> e prati-<br />

ca<strong>do</strong> at6 agora pacificamente sem escan<strong>da</strong>lo <strong>do</strong>e povos e Q vista <strong>do</strong>s nu icios<br />

apostolicos iicsaeu reinos, e com sciericia e pacieticia <strong>do</strong>s inesmos nuncios :<br />

E pusto que V. M. julgasse que as dictas leis e privilegios <strong>de</strong> nenhuma


nhiies nâo pararam <strong>de</strong> chover sohrc as nnçôes <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> por eficito<br />

d'ella.<br />

Quatro annos <strong>de</strong>pois realisa-se ;I infeliz expedição arricana, e<br />

Portugal continua prcsa <strong>da</strong> superstic;tio e <strong>do</strong> clero. Este esqueci-<br />

mento, esta fraqueza na dispiita com o papa, s6 aproveitava á<br />

propria se romana, e ain<strong>da</strong> em 1634 pesava na consciencia <strong>da</strong><br />

camara <strong>de</strong> Lisboa o não ter exceptua<strong>do</strong> <strong>do</strong> real d'agua a classe<br />

clerical, chegan<strong>do</strong> a impetrar a absolviç80 <strong>da</strong>s censuras, que cui-<br />

<strong>da</strong>va ter chama<strong>do</strong> sobre si 1.<br />

sorte haviam si<strong>do</strong> comprelicndi<strong>do</strong>s na referi<strong>da</strong> hulla <strong>da</strong> ch. nem fora <strong>da</strong><br />

nossa inteiição, ou <strong>da</strong> <strong>do</strong>s pontiiices romanos nossos prr<strong>de</strong>ccssoit~+, revogar similliantes<br />

leis e privilegios, ou impedir o uso, oii execuç%o d'elles.<br />

Comtuclo, pela atteiiçgo que V. M. uos professri, e pela reverencia com que<br />

olha para os irian<strong>da</strong>tos <strong>da</strong> SB Apostolica, e iiossoa, jiilgou que era licito e <strong>de</strong>criite<br />

coiisultar-nos eobre o uso <strong>da</strong>s dictas leis e privilegios. Por cuja caiisa<br />

riou fez sripplicar, que com oa referi<strong>do</strong>s fiiritl~iiientos dcclaras~einos que as<br />

(li1 t:i\ leis e lrrivilegios nàoeiam comprehcndi<strong>do</strong>s na bulla <strong>da</strong> Cêa <strong>do</strong> Senhor,<br />

c111" s(. co~tur~ia ler; e que se a V. h3. e aos seus rninistros era licito usar d'elles,<br />

<strong>da</strong> mesina sorte, que o praticaram os reis seus ~redcc~saores e os seus ministros,<br />

como V. hl. hii pouco fcz tleieriniiiar e tlcciiirai: E qiie rios digii:isscrnos<br />

atteiidrr patcriialmeiite coui :i Uc~iiigiiicla<strong>de</strong> Al>a,-tolica J 1,az c trrinqiiilli<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>do</strong>s seus reirios :<br />

Comtu<strong>do</strong>, nem qric pelas letras <strong>de</strong>V. hI., nem pela relaçào que em seu nome<br />

nos foi feita, podc~s~twios enten<strong>de</strong>r o que se acha precavi<strong>do</strong> pelas dictas leis<br />

e privilegios (posto qiir ali88 o nosso miimo seja propeii~.issinio s agra<strong>da</strong>r a<br />

V. M.), não podéiiio. ~)rrauatlir-nos a spproval os, p~iiicipalmente quan<strong>do</strong> se<br />

tracta (IR ~al~açio 11~s alinas (!), <strong>do</strong>s quaes privilegios e leis ri%o temos noticia;<br />

porque se a tivessemos, o mesmo que agora nào conce<strong>de</strong>mos a V. M., talvez<br />

llr~ i150 <strong>de</strong>negariainos.<br />

Em consi<strong>de</strong>ração <strong>do</strong> que, exhortamos a V. M. para que brevemente procure<br />

remetter-nos as dictas concordias, confirma~Ges, Iris r privilegios; porque<br />

sen<strong>do</strong> por nós vistos, e com nosso pateriial aífecto poiitlera<strong>do</strong>s, <strong>de</strong>sejaremos<br />

proce<strong>de</strong>r com aquella razão, com a qual fique atteiidi<strong>da</strong> a segurança <strong>da</strong> sua<br />

propria eonsciericia e <strong>do</strong>s seus vaasallos. e a traiiqiiilli<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s seiia reiuos, e<br />

nos mostraremos tho benevolos com V. Bl., que se n8io arrepen<strong>da</strong> <strong>de</strong> nenhuma<br />

sorte <strong>de</strong> sua pie<strong>da</strong><strong>de</strong> e ohedieiicia a Nós, e a esta Saocta 88 :<br />

Entrctanto, <strong>de</strong>sej.iri<strong>do</strong> nós satisfazer ern algriina parte aos rogos <strong>de</strong>V. M.<br />

quanto com o Senhor po<strong>de</strong>inos, pcriiiittimos c coricc<strong>de</strong>rnos que V. hi. e os seus<br />

juizes e ministros possam usar <strong>da</strong>s referi<strong>da</strong>s leis e privilegios, e ~~rocecler,<br />

julgar e executar na conformi<strong>da</strong><strong>de</strong> d'ellas e d'elles, assirn como atb ngora o<br />

yraticuram sem coi~trovelaia, nâo sen<strong>do</strong> em nosso <strong>de</strong>sprezo e contra os <strong>de</strong>cretos<br />

<strong>do</strong> sagra<strong>do</strong> concilio, por tempo <strong>de</strong> um anno e o mais tempo que drcorrer<br />

ao nosso beneplacito e <strong>da</strong> SB Apostolica, som que ha-jnm <strong>de</strong> incorrer nas censuras<br />

<strong>da</strong> dicta bulla que se costuma ler no dia <strong>da</strong> cCa <strong>do</strong> Senhor ...o<br />

1 Leia-ae a Deducção Chronologica, P. I.., Divis. 8, 8 305, e P. 2:, <strong>de</strong>rnE.'p.;<br />

&26e e. .e g uintes.<br />

bulla excommuiigageralmente os que <strong>de</strong>sobe<strong>de</strong>cem &s or<strong>de</strong>ns <strong>do</strong><br />

papa.<br />

O cap. v man<strong>da</strong> :<br />

10


A historia <strong>da</strong>s relaçoes <strong>da</strong> egreja portugueza com a cdrte <strong>de</strong><br />

Roma <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o mea<strong>do</strong> <strong>do</strong> seculo xvi até os fins <strong>do</strong> secul:) xvii C<br />

bastante agita<strong>da</strong>, e interessante. Levar-nos-ia porem m~ii longc<br />

a sua narração; para nós importa-nos saber sómente que, se o<br />

monarcha tinha cffcctivamente feito <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r <strong>da</strong> approi;l~?io <strong>do</strong><br />

papa a legitimidndc <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s e privilegias <strong>da</strong> egrejn portu-<br />

gueza, C tambem certo que a cgreja <strong>de</strong> Roma nunca a consi<strong>de</strong>rou<br />

<strong>de</strong>pois d'isto como schismatica ou heretica, continuan<strong>do</strong> a eriviar<br />

os nuncios e a communicar com ella.<br />

Quan<strong>do</strong> se tracta no tempo <strong>de</strong> Pliilippc dn nova compilaç50 <strong>da</strong>s<br />

Or<strong>de</strong>na~ões, Jorge <strong>de</strong> Cabe<strong>do</strong>, um <strong>do</strong>s compila<strong>do</strong>res, dá noticia <strong>de</strong><br />

lima concor<strong>da</strong>ta <strong>de</strong> 18 dc Marco <strong>de</strong> 1578, entre D. Sebastiso e<br />

a curia romana, cuja <strong>do</strong>utrina revoga a <strong>do</strong> Alvarli <strong>de</strong> 19 <strong>de</strong> Março<br />

<strong>de</strong> 1569, que tinha entre nós admitti<strong>do</strong> sem restricçõcs os <strong>de</strong>-<br />

cretos <strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Trento, por to<strong>da</strong> a parte mais ou menos re-<br />

pulsa<strong>do</strong>s pelos moiiarchas.<br />

Ha gran<strong>de</strong> disputa entre os realistas c os ultramontanos'Cicêrca<br />

(Ia legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong> d'este <strong>do</strong>cumento, que alguns cr4cm forj;itlo I.<br />

For,jn<strong>do</strong> ou não, O que este facto prova é a nccessi<strong>da</strong>d~, qiicb<br />

critão havia, <strong>de</strong> mantcr as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> cgreja, embora como arma<br />

clcí'ensiva contra Homa.<br />

.Item, excominunicsmus et anathemati.;amus omiics, qui in terrio nova pe-<br />

<strong>da</strong>gia, seu gabellas, praeterquam in casibus sibi a jure sei1 specinli Sedis<br />

Apostolicae licuiitia permissis imponunt vel augcrit, seu iinponi, vel augeri<br />

proliibita cxiguiit.~<br />

Josepll tle Maistre cm um extravagante capitulo Acerca drr bulia In cnena<br />

I>omirai. <strong>do</strong> seu li~ro-Uupape - commcnta <strong>da</strong> seguinte maneira ato artigo<br />

5.0 <strong>da</strong> bulla :<br />

aEii preiiaiit <strong>da</strong>ns chaque btat l'impôt ordin:iire comme un dtublieermed<br />

It1,yycll, le Pape décicle qo'on iir pourra rii l'aupmenter ni en étcrblii. <strong>de</strong>nouveanx,<br />

hors les cas prhvus par Ia loz' natio,~ule, oii <strong>da</strong>iis les cas irnprdvus et absotn-<br />

inent extraordiiiaires en veitu d'uue dispense dri Saiiit-Sikge - 11 faiit, je Ic<br />

clis ir ma grau<strong>de</strong> confusioii, qu'h force <strong>da</strong>voir lu ces infamieu,<br />

Je me sois fait un front qui ne rougit jamais ;<br />

car je les transcris sans le moindre mouvement <strong>de</strong> honte et rnk~ M *,<br />

a'Z me sernble que j'y pre<strong>da</strong> plaisir..<br />

1 O jesuita Fraiiciuco Soares, o mcsino celebre Sosrcs, theologo hespanhol,<br />

que foi professor <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> dr ('oirnhra, coritestori ri existciicia e alictori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>da</strong>s concordias em certa di.l)iita que teve coin Oahriel Pereira <strong>de</strong><br />

Castro, o auctor <strong>do</strong> Tracta<strong>do</strong> <strong>de</strong> JL«.,III Ilcgiu - a qii:il coiitioversin este LI]tirno<br />

fez estampar sob o nome <strong>de</strong> blonomxchia, que corria impressa ao ternpo<br />

(Ias celebres dissensões com a corte <strong>de</strong> Roina no reina<strong>do</strong> <strong>de</strong> D. Joâo V, que<br />

por fim a man<strong>do</strong>u recolher para nào irritar os auirnos.


Esta ií~iil~iidii, que Iioje ain<strong>da</strong> renovem os seetiirios <strong>da</strong>s dcsmedi<strong>da</strong>s<br />

pretcrisbes <strong>do</strong>s poritifices, é porem perfeitamente inutil ;<br />

porque, falsa, ou 1180, a <strong>do</strong>utrina passou para variou titulos <strong>do</strong>s<br />

livros 1.' e "L0 <strong>da</strong> Ord., on<strong>de</strong> recebeu to<strong>da</strong> a força e auctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> lei.<br />

No tempo cle D. Jose I, José <strong>de</strong> Seabra <strong>da</strong> Silva, elaboran<strong>do</strong><br />

a Drducqao Chronologica, e combaten<strong>do</strong> largamente a bulla <strong>da</strong><br />

C&a, lembra-se <strong>de</strong> uma consi<strong>de</strong>ração, que <strong>de</strong>vera <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito ter<br />

si<strong>do</strong> feita para socegar os espiritos, a quem pezavam as censuras<br />

d'aquella bulla.<br />

A bulla <strong>da</strong> C6a n2o podia ler effeito algum entre n6s srm a<br />

sancçào <strong>do</strong> beneplacito regio; em seus capitulas ella acabava implicitamente<br />

com garantia tUo preciosa para esfes tempos: 6 ver<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

; mas neo o podia çonst.guir sem a regia apltro\açáo, que nso<br />

teve 1.<br />

A cgrt>ja portugueza ngo soffreu pois a diminiiição <strong>de</strong> uma só<br />

<strong>de</strong> suas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s por effeito d'csta hullii; iirm a sollicitação <strong>de</strong><br />

um breve, que <strong>de</strong>clarasse cxccptua<strong>da</strong>s <strong>da</strong>s disposiçaes <strong>da</strong> bulla as<br />

concordias, leis e privilcgios, na<strong>da</strong> pb<strong>de</strong> conseguir, porque estava prejudica<strong>da</strong><br />

pela falta <strong>da</strong> saricção <strong>do</strong> hencplacito; scw<strong>do</strong>, como 6, certo<br />

e observa Seabra <strong>da</strong> Silva, que 'nessa sollicitaçiio se <strong>de</strong>ve ver o qiic<br />

ella realmcrite representa, que b. um meio poli<strong>do</strong> <strong>de</strong> rcpiilsar a<br />

bulla c ricbgar-lhe o regio placito, como se po<strong>de</strong> ver <strong>do</strong> mesmo<br />

bre~e qucs co~~!~i (> repete as allcgaçòi~s <strong>do</strong> monardia.<br />

Isto ei (i fiei Crn uma opirii;io, que s6 tinha a força moral, que<br />

lhe vra propri~i; riao büstava, e por isso nao tar<strong>do</strong>u a C. <strong>de</strong> L. <strong>de</strong><br />

2 dc abril <strong>de</strong> 1768, negan<strong>do</strong> expressamerite o beneplacito a essa<br />

bulla.<br />

A lei, <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> preambulo costuma<strong>do</strong> no pomposo estylo josephino,<br />

<strong>de</strong>termina em o g 2.O :<br />

u2.O Determino que to<strong>do</strong>s os exemplares que até agora se têm in-<br />

troduzi<strong>do</strong> ou estampa<strong>do</strong> 'nestes reinos e seus <strong>do</strong>minios <strong>da</strong>s sobredietas<br />

hullas <strong>da</strong> Cha, <strong>do</strong>s quc servirão dc base aos Indices Eupurgatorios, <strong>do</strong>s<br />

mesmos Indices Expurgatorios c <strong>da</strong>s mais prohibiçóes <strong>de</strong> livros que <strong>de</strong>-<br />

pois d'elles se introduziram nestes reinos, nulla c espoliativamcnte sem<br />

prece<strong>de</strong>r para a publicacão d'elles o Iicgio beneplacito, sejam e fiqiietn<br />

inteiramente supprimi<strong>do</strong>s como obrepticias, subrepticias, e <strong>de</strong> nenhum<br />

1 Deducgão Chronologica, tomo 2.0, <strong>de</strong>monstr. 6.1, 9 79,


vigor <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seu mesmo principio para produzirem qualquer effeito, o11<br />

prestarem algiim impedimento ao que se tem julga<strong>do</strong> e julgar pelos meus<br />

tribunaes e magistra<strong>do</strong>s em observancia <strong>da</strong>s disposirõrs <strong>do</strong>s <strong>Direito</strong>s<br />

Natural e Divino, <strong>do</strong>s Assentos <strong>da</strong>s Cortes estabeleci<strong>do</strong>s pelos Nossos<br />

Senhores Reis, meus Gloriosos Predl cessores, <strong>da</strong>s leis patrias, <strong>do</strong>s an-<br />

tigos e louvavcis costumes d'estes Rcinos, e <strong>da</strong>s Concor<strong>da</strong>tas entre elles<br />

e a Se<strong>de</strong> Apostolica, os quaes <strong>Direito</strong>s, Assentos e Leis, costumes e Con-<br />

cor<strong>da</strong>tas excito e con/irmo (no que necessario for) em f4rma eqeci/ica,<br />

haven<strong>do</strong> aqui lo<strong>do</strong>, e to<strong>da</strong>s por prezentes .... para que se fique guar-<br />

<strong>da</strong>n<strong>do</strong> e obsenan<strong>do</strong> iiiwiolavelmentc o seu conteíi<strong>do</strong> táo cumpri<strong>da</strong>mente<br />

como nelles e nellas se acha or<strong>de</strong>na<strong>do</strong> e <strong>de</strong>clara<strong>do</strong>, sem minguamento,<br />

alteração, ou diminuição algiima, por menores que sejam 1.n<br />

Tal era o vigor, a gran<strong>de</strong>za, que este rnonarcha, embora orna<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> Siimmo Imperio cesariano, sabia commuriicar com suas leis ao<br />

brio e existencia dc Portugal.<br />

Mas, quan<strong>do</strong> aquelle breve tivesse realmente annulla<strong>do</strong> e redu-<br />

zi<strong>do</strong> a p6 as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s a que se refere; quan<strong>do</strong> esta lei não ti-<br />

vesse vin<strong>do</strong> excitar com sua força o passa<strong>do</strong> e <strong>de</strong>sfazer o que es-<br />

tava corisurnma<strong>do</strong>; ain<strong>da</strong> assim a egreja portugueza continuava<br />

liojc a existir <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> Carta constituciorial, <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> rcgimen<br />

libcral <strong>do</strong> nosso dircito publico. Seja qual for a extensâo, que se<br />

queira <strong>da</strong>r ao po<strong>de</strong>r politico em virtu<strong>de</strong> <strong>do</strong> artigo que dcclara<br />

continuar a ser a religiào <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> a religino catholica ; scjn qual<br />

IBr o mo<strong>do</strong> por que se cornprehen<strong>da</strong> o uso <strong>do</strong> bcneplacito e <strong>do</strong>s<br />

ílircitos <strong>de</strong> pndroa<strong>do</strong>; o qiie é certo é que o direito ecclesiastico<br />

portiiguw, fun<strong>da</strong><strong>do</strong> agora nesses artigos <strong>da</strong> lei fun<strong>da</strong>mcntnl, esth<br />

1)erfcitamente irivulneravel com respeito aos rilios parti<strong>do</strong>s (li] bulla<br />

<strong>da</strong> Cka, ou <strong>de</strong> qualquer bulla pontificia. Foi a nação, a maioria<br />

d'clla, catholica e reverencia<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> centro <strong>da</strong> fé <strong>da</strong> sua rcligino,<br />

que promulgou essa lei, que <strong>de</strong>sejou submetter-se a ella, que<br />

obriga agora riao s6 a maioria, mils a to<strong>do</strong>s os portuguezes, a<br />

to<strong>do</strong>s os clerigos, a to<strong>do</strong> o episcopa<strong>do</strong>, que é portuguez c siibdito<br />

pacifico c tão responsavel como qualquer leigo, e tanto mais res-<br />

ponsavel, quanto aquella 6 a lei fun<strong>da</strong>mental <strong>do</strong> seu paiz.<br />

1 Nos $5 seguintes esta lei man<strong>da</strong> que <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> 3 rnezes se apresentem<br />

nos logares que indicaos exeriiplares <strong>da</strong>s bullas, <strong>de</strong>claran<strong>do</strong> iricursos na. real e<br />

grave indignaç80 <strong>do</strong> monarcha, nas penas <strong>de</strong> copfiscaçâo, privaçào <strong>de</strong> naturali<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />

e sen<strong>do</strong> eqiiipara<strong>do</strong>r, aos que offeii<strong>de</strong>m è conspiram contra n regia<br />

magesta<strong>de</strong> e ruina <strong>do</strong>s seus reinos, e ti<strong>do</strong>s coi~io perturba<strong>do</strong>rcs tlo socego publico,<br />

os que <strong>de</strong>sobe<strong>de</strong>ceroni a essa lei. Veja tambem a C. R. <strong>de</strong> 16 <strong>de</strong> maio<br />

<strong>de</strong> 1774.


Isto não se discute, nem o episcopa<strong>do</strong> portuguez jámais, assim<br />

o acreditamos, se lembrou <strong>de</strong> <strong>de</strong>sobe<strong>de</strong>cer aos artigos <strong>da</strong> nossa<br />

coristituiçáo, para alcançar qualquer bulla perigosa, romana e não<br />

catholica.<br />

Uizvrníll,~, pom, e dizem-nos os ultramontanos: -o <strong>de</strong> que<br />

\o, falaes, não são liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, sáo servidóes, puras servidões; -<br />

serão liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s para os reis, mas tomam-se em ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras servidões<br />

para o papa.<br />

33 o ultimo recurso <strong>da</strong> discussáo theocratica parti<strong>da</strong>ria; A uma<br />

quest3o <strong>de</strong> palatras 6ca. uma distin- tbeologica vã.<br />

Xão po<strong>de</strong>remos nos dizer tambem qoe as que vós chamais librr<strong>da</strong>drs<br />

S ~ O 51~vidcka para a oação poitu,peza? e porbentura cm<br />

iiiii,i ii


direito ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente catholico. e em to<strong>do</strong>s os casos n3o ataca<br />

a disciplina fiin<strong>da</strong>mental, nem o <strong>do</strong>gma 4.<br />

Outr'ora era o rei que representava a naç8o; os <strong>direitos</strong> <strong>da</strong><br />

cgreja portugiieza, nasci<strong>do</strong>s <strong>da</strong>s pretc:risões <strong>do</strong>s reis, eram como que<br />

nasci<strong>do</strong>s <strong>da</strong> mesma naçao: como qricreis eritao cliamar-lhcs servidào<br />

? Servi<strong>da</strong>0 pnra a egreja ? Para que cgrr-ia? para a portugueza?<br />

1180, que era ella que os estatuia. Sclrvidão para a egreja<br />

catholica ? como ? se estas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s se nào impòcm n outras egrejas,<br />

e para a propria são liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s e não serçidòcs? Servidão em<br />

rclaçào ao papa ? embora ; chama(.-lhe assim, se qucreis ; mas<br />

qiicni diz liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, diz implicitamente direito a respeito <strong>de</strong> alguma<br />

cousii, e por isso obrigação (servidão, como dizeis) <strong>da</strong> parte<br />

<strong>de</strong> alguem <strong>de</strong> o acatar.<br />

E ho,je mcnos duli<strong>da</strong>s po<strong>de</strong>m ficar a cstc rc~spcito, porque Iioje<br />

6 real, nào ficticiamcrite, que a nagno, qiic o clero portiieuez, que<br />

sc <strong>de</strong>ve saber e dcst*jar portugiicz, as promiilgou para si no acto<br />

solcmrie <strong>de</strong> sua nova constituiçao politica.<br />

E se fostes v6s mcsmos, qilc quizrstcs a constituição politica e<br />

lihcral (porque quem não acceita a con~titiiiçâio <strong>de</strong> um paiz, expatria-se,<br />

dsnaturatisa-se e não se faz inimigo sob a apparcncia <strong>de</strong><br />

s~ihrlito;, ç6s mesmos quizestes tambvm conasrçar a antiga liber<strong>da</strong>tlr<br />

a(~ approvayão <strong>da</strong>s brillas pelo re~io placito antes <strong>de</strong> terem<br />

vigor; e como inten<strong>de</strong>is a permancncia, a co-existencia d'estes<br />

principias <strong>da</strong>s leis com as vossas idCas sobre liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> egrejas<br />

particiilares nacionaes?<br />

A bulla a que foi nega<strong>do</strong> por uma lei o beneplacito ha <strong>de</strong> executar-se<br />

ria egrcja portugueza? A lei que <strong>de</strong>nega o beneplacito<br />

1120 ser8 o texto <strong>de</strong> uma nova liber<strong>da</strong><strong>de</strong>?"<br />

Não 6 06 <strong>de</strong> agora que e d romana tem respeita<strong>do</strong>, como <strong>de</strong>via, estas li.<br />

ber<strong>da</strong><strong>de</strong>s (que não discutimos aqui, senão <strong>de</strong> facto e não <strong>de</strong> principio som<br />

<strong>de</strong>c1arar berrtica OII schisrnatiea a egreia portt~gucza, e i<strong>do</strong> mesmo <strong>de</strong>pois<br />

<strong>da</strong> inex~cuçlo <strong>da</strong> bulla In Coena Domini. Vê-se <strong>de</strong> João Pedio Riheiro como<br />

já antes <strong>do</strong>s falsas <strong>de</strong>cretaes estas egrejas com direito proprio n8o eram reputa<strong>da</strong>s<br />

echisrnaticas.<br />

aAhi veremoe, diz este escriptor no prologo <strong>do</strong> fieu rnan~ecripto, ahi veremos<br />

tambem a diversi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> disciplina particular <strong>da</strong> nossrr, Egreja e <strong>da</strong><br />

Uiiiversal, sem que comtu<strong>do</strong> fosse nunca reputa<strong>da</strong> ~chismatica ou menos obediehte<br />

filha <strong>da</strong> Roinana, ctGas prt.io,rr:ttirrts scinpre reconheceu e venerou..<br />

2 Veja em Bernardino Carneiro a lirta <strong>da</strong>s btillae a que as noaaas leis <strong>de</strong>negaqhin<br />

o heiieplacito. Elens. <strong>de</strong> ar. Eccles. 7'ort. Introducç., éJ 66 not.<br />

E evi<strong>de</strong>ntemente umas <strong>da</strong>s fontes mais srgiiras <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja<br />

portugueza.


-<br />

f3 , vem- o signal <strong>de</strong> uma servidãio a apresentaçãio aos h&<br />

neficios ecclesidicos por parte <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>?<br />

120 I * est~ IRI artiro <strong>da</strong> constituigão politica <strong>do</strong> nosso paiz, a<br />

I 1 iitL I tti dt>bern' ott<strong>de</strong>ccr, porque to<strong>do</strong>s o reconhcmos e qui-<br />

/,)I1 t. -?<br />

I ra preciso <strong>de</strong>mactrn que a egreja portugucza se não for-<br />

I I I , ~ \ &' ~ portuppzes, oo que estes portuguezes não q~ioriarn para<br />

si u lei que votaram, ~n que viam 'nclla, em logar ctc palladio<br />

<strong>de</strong> suas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, r cdcia <strong>de</strong> sua escravidiio.<br />

Que po<strong>de</strong>r supremo monbeceis na terra a respeito <strong>da</strong>s cousas<br />

temporaes differente tlo <strong>da</strong> sobttrania <strong>da</strong> nação?<br />

Já antes <strong>da</strong> Carta o que as riossas Iclis chamrivam lihcr<strong>da</strong>~l~s, e<br />

riao sorridòes <strong>da</strong> egrej'ii portugu,~r.a, cram os <strong>direitos</strong> e prcrojiativas,<br />

que os supremos »iagi~~<strong>do</strong>s politicos, tAm <strong>de</strong>feza tl susterita~co<br />

<strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> trmponits e Gns ic.galies <strong>da</strong> cor<strong>da</strong>, tinham <strong>de</strong>fendi<strong>do</strong><br />

çonlra as prct(.:isiki <strong>da</strong> curia romana, e para tutelarem<br />

o po<strong>de</strong>r ordinario <strong>do</strong>s 1)ifp.c e <strong>direitos</strong> <strong>do</strong>s metropolitanos.<br />

Os estatutos <strong>da</strong> Uni\t,rsi.ld<strong>de</strong>, quaii<strong>do</strong> man<strong>da</strong>m ao professor que<br />

cxpliqiie esta naturezo <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja, dizem-lhe que<br />

narrc as disscnsõrs e discordias. que com a santa se se tinham<br />

mo\ i<strong>do</strong>.<br />

I( Dará (o prof~ssor), diziameie3e~tatutos 4, nolicia <strong>da</strong>s dissrtl-<br />

ròrs e discordias que SP ikn agita<strong>do</strong> 'nestes Reinos enire a Curia<br />

Roi~~ana e os .Senhores Reis meirr prcdrccssores, ou seja na qtiali<strong>da</strong>rle<br />

<strong>de</strong> Supremos Magistra<strong>do</strong>s Politicos em <strong>de</strong>feza e susfenta-<br />

1 Estatutos <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> 1772, Q. % tit. 40, cap. 2.O, i. 14.<br />

Veja Coelho <strong>da</strong> Roclia, Ensaio sobre oliiu & gomo e <strong>da</strong> Z~gislação<br />

<strong>de</strong> Por ugal, 8 287, Acerca <strong>da</strong> direcçào que .o estu<strong>do</strong>s tinham <strong>da</strong><strong>do</strong> os jesuitas.<br />

Veja-se tambem o n: 9.O dc cap. 5.O, <strong>da</strong> tit. 8: & li?. 2.0 <strong>do</strong>a Estatutos,<br />

acima copia<strong>do</strong>.<br />

Para os ultramontanos a maior <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s rsees servidões k o diieito <strong>do</strong> padroa<strong>do</strong>,<br />

a apresentação aos beneficias eccksiaaticos.<br />

Totlas e-tas distincções <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, servidões, rgrejas <strong>de</strong> ol~cdieiica e<br />

<strong>da</strong> nWo obediencia, causam hoje par:% 116s gran<strong>de</strong> estranheza: pniq lios mostram<br />

como iiisigficantes palavras mo\ iam largas cotiteii(1as c sei\ i:iiii clc luz<br />

11% re~oluqão <strong>de</strong> graves questões.<br />

Toclas as epochas têm d'estas cousa~ riziveie; mas, s,iii tliit iti:i. Iioiicas as<br />

tiveram corrio a epocha <strong>do</strong> sumrno imperio tlns reie. Esses dcf'rito-. st. espa-<br />

1li.r~ iin ein tu<strong>do</strong>: ila litterati~ra, nas scieucias, lia pintura, na ai (*liitectura,<br />

mae scni~~ro a par <strong>de</strong> unia força e <strong>de</strong> urna iiiagiiificeiieia eapleiit1id:ix.<br />

Coutarri->c eutre.au causas prosirnas <strong>da</strong>s 1evo1uçGes liberneg.


çâo <strong>do</strong>s Direilos Temporaes a <strong>da</strong>s regalias <strong>da</strong> cor<strong>da</strong>, ou seja como<br />

Prolectores <strong>da</strong> Egreja Lusilona, para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>rem e sustenlarem<br />

o Po<strong>de</strong>r ordinario <strong>do</strong>s Bispos e os direiíos <strong>do</strong>s Metropolitanos<br />

e cabi<strong>do</strong>s e os ouiros direilos e prerogativrls e Artigos <strong>da</strong>s Liber-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> Igreja Porlugueza. »<br />

Náo discutiremos mais este ponto para nâo gastar mais espaço<br />

com questões que se não <strong>de</strong>vem controverter: uma, por ser que-<br />

stão <strong>de</strong> palavras, futil e capciosa; outra por versar sobre um ponto<br />

<strong>do</strong>gmatico temporal, a soberania <strong>do</strong>s povos.


O Esta<strong>do</strong> portuguez e a erecção <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Portugal<br />

até o tempo <strong>de</strong> D. Josd I<br />

Principio8 que nos dirigem no estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> p-te apitala <strong>do</strong> iirtita rcclesiastico por-<br />

tuguez- O esta<strong>do</strong> portquez Leve rciipn a dimto <strong>de</strong> inisrrir na creaczo e <strong>de</strong>+<br />

membrarao <strong>de</strong> seir bispa<strong>do</strong>s e metroykii pra-• i bictoria <strong>de</strong>ssa cnacao'-Quan<strong>do</strong><br />

P como ;e tem eripi<strong>do</strong> os no- biiyCoa-Qutro sprhar diflenntPs na rreacao<br />

<strong>do</strong>- nossos bislia<strong>do</strong>s: em todu poia st arerra o mmmo direito-Locucões em-<br />

p! rpa<strong>da</strong>s pela Sancta 56 nas buliu & clamsuip-O ccclesiartica -Duvidh prove-<br />

niente d'essa re<strong>da</strong>ceao-O broeplaeh nd, quto a essr bullal- locerteza <strong>do</strong><br />

direito ecclesiastico portuguezt sua, ma-<br />

Temos visto como o breie -ni h'obis <strong>de</strong> 25 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong><br />

i 574 e um acto completamente mllo em eonsepoencias jiiridicas<br />

no direito ecclesiastico portuguez, e mo, ain<strong>da</strong> que assim n8o<br />

fosse., a L. <strong>de</strong> 2 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1765, arma<strong>da</strong> <strong>de</strong> sua innegavel atrctori<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />

trve cffeito retroactivo, <strong>de</strong>slazen<strong>do</strong> tu<strong>do</strong> o que .se pratichra<br />

sol) o influxo d'aquelle brete, e awtorisan<strong>do</strong> o-que <strong>de</strong> sua <strong>da</strong>ta<br />

em <strong>de</strong>ante se realisasse contra elle.<br />

Assim,. pois, vamos buscar na creaçào <strong>do</strong>s noseos bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

o principio <strong>da</strong> monarchia, nas modificações <strong>da</strong> nossa divisão ecclesiastica<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> esse tempo, qual o direito eccle5iastico portuguez a<br />

este rcspcito ; sempre camirihan<strong>do</strong> sob o imperio d'estes <strong>do</strong>ua prin-<br />

cipio~: -que o beneplncito regio. h t~cepqáo <strong>de</strong> alguns nnnos no<br />

rrina<strong>do</strong> <strong>de</strong> D. Joáo 11, tem conserva<strong>do</strong> to<strong>da</strong> a sua força até nossos<br />

dias, -e que o proprio bretc <strong>de</strong> Bento a111 6 o primeiro a con-<br />

fvssar a pratica <strong>de</strong> antigos privilegias entre n6s.<br />

A historia <strong>da</strong> creaçáo e formação <strong>do</strong>s nossos bispa<strong>do</strong>s e <strong>da</strong>s al-<br />

teraçaes <strong>da</strong> circumscripção ccclcsiastica <strong>da</strong> nossa egrejn, prova<br />

que o preceito <strong>do</strong> direito ecclcsiastico portuguez neste ponto era<br />

a plenitu<strong>de</strong> <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> Se Apostolica, tempera<strong>da</strong> na sua<br />

applicaç80 e exercicio pelo assentimento <strong>do</strong>s monarchas, que podiam<br />

excilal-a, mas não excrcel-a.


Só aos papas assistia o direito <strong>de</strong> erigir os bispa<strong>do</strong>s, <strong>de</strong> os supprimir,<br />

<strong>de</strong> os unir e dividir, e <strong>de</strong> alterar e marcar os seus limites;<br />

mas este direito não existia sem restricções no seu exercicio, como<br />

pelas <strong>de</strong>cretacs era estabeleci<strong>do</strong>: aqui apparece o direito <strong>da</strong> egreja<br />

portugueza modifican<strong>do</strong> a generali<strong>da</strong><strong>de</strong> d'aquelle principio.<br />

Aos monarchas portuguezes, á cgreja portugueza, riaio pertencia<br />

o direito dc crear os bispn<strong>do</strong>s, mas elles podiam oppor-sc e obstar<br />

h sua erecçóo, quan<strong>do</strong> a entendiam <strong>de</strong>sneccssaria ou inconveniente.<br />

O seu assentimento, sua intervenção era condiçgo sine qua non<br />

<strong>da</strong> legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong> d'estcs factos.<br />

Elles n30 s6 possuiam o direito d'esta intervenção <strong>de</strong>libcrativa,<br />

e ao mesmo tempo passiva ; mas era-lhes egualmente apanagio a<br />

facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> excitar a erecção <strong>do</strong>s novos bispa<strong>do</strong>s c metropoles:<br />

náo assim o direito <strong>de</strong> os crear ou modificar por si sómeotc, ou<br />

sem assentimento <strong>da</strong> Santa S6.<br />

Não se cui<strong>de</strong> que preten<strong>de</strong>mos siistentnr este capitulo <strong>do</strong> Codigo<br />

<strong>da</strong>s liber<strong>da</strong>dcs <strong>da</strong> egrqja portugucza, como os cscriptores <strong>de</strong> certa<br />

escola, perdi<strong>do</strong>s <strong>de</strong> amoles pelas regalias <strong>da</strong> cor<strong>da</strong>, oii orgi~lhosos<br />

<strong>de</strong> seu esplen<strong>do</strong>r nos dias que foram.<br />

Vamos procurar na exposiçao <strong>da</strong>s provas d'cste direito, <strong>do</strong>s titulos<br />

d'esta liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, a maior simplici<strong>da</strong><strong>de</strong> e inteiro <strong>de</strong>sinteresse.<br />

Como se ver8 <strong>da</strong>s iiltimns paginas d'cste estu<strong>do</strong>, confessan<strong>do</strong><br />

quanto valeram estas joias <strong>da</strong> cor<strong>da</strong> <strong>do</strong>s nossos monarchas em tempos<br />

que foram e o que sip~ificaram na peleija <strong>de</strong> uma <strong>da</strong>s maiores<br />

luctas que a historia nos <strong>de</strong>screve, não nos <strong>de</strong>ixamos mover nem<br />

por odios a essa vigente institiiirRo <strong>do</strong> direito pontificio, nem por<br />

exaggcra<strong>do</strong>s affectos ao glorioso throno <strong>da</strong> nossa patria.<br />

Nenhum pódc exigir <strong>de</strong> n6s senÁo a ver<strong>da</strong><strong>de</strong> inteira: consoln<strong>do</strong>ra,<br />

se 6 brilhante, cheia <strong>de</strong> magua, se 6 triste; mas sempre a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Na epocha em que Portugal se fez in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, vigorava na<br />

peninsula a divisa0 ecclesiastica <strong>do</strong> ultimo tempo <strong>da</strong> <strong>do</strong>minação<br />

go<strong>da</strong>; porque, como 8 sabi<strong>do</strong>, os musulmunos, mostran<strong>do</strong> mais<br />

atila<strong>do</strong> genio politico, <strong>do</strong> que em seculos muito mais a<strong>de</strong>anta<strong>do</strong>s<br />

<strong>da</strong> nossa era não revelam os papas'e os reis catholicos, consentiram<br />

e toleraram a religiao <strong>do</strong>s vrnci<strong>do</strong>s. Des<strong>de</strong> o sexto seciilo que havia<br />

duas metropoles nas egrejas hespanholas: Brnga e Meri<strong>da</strong>.<br />

Poucos aiinos antes <strong>da</strong> scparaçao <strong>do</strong> Portiigitl <strong>da</strong> monarchia leo-<br />

Pcza, o paI)a Cal!isto ir, por uina bulla <strong>do</strong> anrio 1 120, altcrárn as


suffraganeas <strong>da</strong> mtmpole & m, <strong>de</strong> maneira que, Mn<strong>do</strong> a pertencer-nos<br />

esta q, elia foi a primitiva e nnica rnetropole <strong>da</strong> primeira<br />

cpocha <strong>da</strong> iossa vi<strong>da</strong>.<br />

~ertenciam-1~~ terras portuguezas os bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Portucale,<br />

clc Vilru, rle Cd&a, dc Larnego, <strong>de</strong> Egitania I<strong>da</strong>nha, ao pí. <strong>da</strong><br />

Ciiartla' e ~ritoth (ao pl: dr Vianna).<br />

Antw porem d'esta <strong>de</strong>smcmbraqfio <strong>do</strong> reino <strong>de</strong> Portiigal, cm<br />

1 122, o mcsmo Callixto ri transferira a velha metropole dc Meri<strong>da</strong><br />

para Compostclla, e sob esta nova clivisiio 6 qiie appareceii a rprrja<br />

portugueza no seeulo xir, sem comtu<strong>do</strong>, como observámos, contar<br />

senso uma metropole.<br />

Notemos <strong>de</strong>ç<strong>de</strong> já a intervenqão <strong>do</strong>s papas na transferrncia <strong>da</strong>s<br />

metropolcs e divisa0 <strong>da</strong>s dioceses.<br />

Comcça\am então as nossas conquistas para o sul <strong>de</strong> Monte-mór,<br />

c as irrciirs6es para além <strong>do</strong> Tojo. Conquistava-se Santarem, Lisboa,<br />

Silccq, Guar<strong>da</strong>, Beja, Evora, c, á medi<strong>da</strong> que se arrebatavam aos<br />

sarraccnos algumas d'estas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, ahi se erigiam bispa<strong>do</strong>s.<br />

Paremos aqui.<br />

Como se realisaram estas erecçõrs <strong>do</strong>s novos bispa<strong>do</strong>s? I? o primriro<br />

ponto a resolver. IIa uma longiiiqua similhança entre o qiic<br />

fnzinni os nossos monnrchas, ganhan<strong>do</strong> as ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s e elevan<strong>do</strong> as rio-<br />

\,i9 cnihedraes, e o que aconteceu com os apostolos rios primeiros<br />

dias <strong>do</strong> christianismo.<br />

R~itlcs, barbaras, mal scguras <strong>da</strong>s invasões musulmanas, as novas<br />

citladrs christss, á medi<strong>da</strong> qtie se emancipavam, iam rrtebcri<strong>do</strong><br />

o bispo, piar<strong>da</strong> <strong>da</strong> fé, po<strong>de</strong>roso Irnitibo dc muitos males, e forte<br />

clrm~nto <strong>de</strong> conservaç80 <strong>da</strong> nova in<strong>de</strong>prn<strong>de</strong>ncia pela differcnça <strong>de</strong><br />

rcli$ío, e pelo conforto <strong>de</strong> sua prrsenca.<br />

011 por politica, ori por pie<strong>da</strong>dc, os nossos monarchas conqiiis-<br />

ta<strong>do</strong>res, ao mesmo tempo que sobre as ameins <strong>da</strong>s muralhas sub-<br />

stituiam o pendão <strong>da</strong>s quinas ao estan<strong>da</strong>rte musulmano, no inte-<br />

rior <strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, ao p~? <strong>do</strong>s agu<strong>do</strong>s minart.tcs <strong>da</strong>s mesqiiitas, faziam<br />

elcvar ])ara o céu as agulhas e as cruzes <strong>da</strong>s cathedraes gothicas.<br />

Obsriiras, as chronicas d'estes asperos tempos, não nos <strong>de</strong>ixaram<br />

clara narra~ùo d'estes fartos.<br />

-1 pic<strong>da</strong>dc, porem, <strong>do</strong>s reis, que os Icvára a submcttrr-\c> ií su-<br />

prc.maçia politica <strong>do</strong>s pontificcs, para consrguir firme csleio dc sua<br />

indcpciiclencia; e por outro la<strong>do</strong> o cui<strong>da</strong><strong>do</strong> sempre ~igilante e iricansavel<br />

<strong>do</strong>s papas em fazer valer por to<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong> o seti po<strong>de</strong>rio; cxpli-


cam e levam a luz aos factos mergulha<strong>do</strong>s nas sombras d'este ear-<br />

rega<strong>do</strong> quadro <strong>da</strong> meia e<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Lisboa 6 a primeira que recebe bispo.<br />

Em um <strong>do</strong>s tres monumentos que, a respeito <strong>da</strong> toma<strong>da</strong> <strong>de</strong> Lis-<br />

boa, se po<strong>de</strong>m ler na collecçào <strong>de</strong> monumentos historicos <strong>de</strong> Por-<br />

tugal, encontra-se um capitulo que se inscreve - « De como elrei<br />

or<strong>de</strong>nou que a ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Lisboa tivesse bispo e see calhedral .... »<br />

Conta ahi o cbronista:<br />

«E <strong>de</strong>pois que o muy nobre Rey Dom Affonso to<strong>do</strong> este ouve or<strong>de</strong>-<br />

na<strong>do</strong> em que maneira a terra e outrosi a dita ci<strong>da</strong><strong>de</strong> fosse poboa<strong>da</strong>, fez<br />

vir a seu conselho to<strong>da</strong>s aquellas nacões <strong>do</strong>s christãos que com elle<br />

eram na dita ci<strong>da</strong><strong>de</strong> e disse-lhes assi :-#Amigos, vós bem sabe<strong>de</strong>s em<br />

como eii aláaqui or<strong>de</strong>nei e <strong>de</strong>strcbuy os beens temporaes a to<strong>do</strong>s vos<br />

outros: e ora nos he cornpri<strong>do</strong>iro <strong>de</strong> auermos <strong>de</strong> tornar ao seruiro <strong>de</strong><br />

Deos, e fazer em esta nobre ci<strong>da</strong><strong>de</strong> egreja calhedral e enlegermos com<br />

ella bispo e pastor que aja <strong>de</strong> ser prela<strong>do</strong> e rege<strong>do</strong>r <strong>da</strong>s nossas almas<br />

e ordcnadgr <strong>da</strong> dita egreja e crelizia <strong>de</strong>lla.<br />

E enton elrey fez enleger por bispo um homem boo <strong>da</strong>qiiella nayom<br />

<strong>do</strong>s cngrczes, c avid nome Giliherto ... E <strong>de</strong>pois que assi foy enlegi<strong>do</strong><br />

o dito bispo enviou elrey to<strong>do</strong> este dizer ao padre sancto... e em como<br />

avia enlcgi<strong>do</strong> bispo novamente pera seriiico <strong>de</strong> Deos e <strong>da</strong> santa egreja<br />

e que lhe outorgasse r confirmasse o dito bispo.. . E enton o padre san-<br />

c10 veen<strong>do</strong> tantas boas obras, quantas elrey fazia e como por sua lanca<br />

e por espargirnento <strong>do</strong> seu sangue <strong>do</strong>s christaãos tirara a terra <strong>de</strong> po-<br />

<strong>de</strong>r <strong>do</strong>s mouros, e a seruico <strong>de</strong> Deos e <strong>da</strong> sancta egreja a trouxera, <strong>de</strong>u<br />

gracas a Deos porque a sancta egreja avia tam nobre filho come o dito<br />

rey e outorgou-lhe to<strong>da</strong>las cousas que lhe enviou pedir ... ni.<br />

Quan<strong>do</strong> geralmente se fala d'este facto diz-se e escreve-se que<br />

D. Affonso tomára a ci<strong>da</strong><strong>de</strong> e nella crehra uma cathedral, ten<strong>do</strong>-se<br />

espalha<strong>do</strong> a idba <strong>de</strong> que <strong>de</strong> pleno po<strong>de</strong>r os reis conquista<strong>do</strong>res ti-<br />

nham <strong>de</strong> per si crea<strong>do</strong> os novos bispa<strong>do</strong>s, e acreditan<strong>do</strong>-se que<br />

estes primeiros bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Portugal foríim uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira recdi-<br />

ficação <strong>da</strong>s antigas cathedraes gothicas d'cstas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, para a qual<br />

n'ao se carecia <strong>da</strong> auctoridn<strong>de</strong> <strong>do</strong> papa, tcn<strong>do</strong> os nossos reis, nestes<br />

tempos <strong>de</strong> pelejas e ignorancia, a idéa eleva<strong>da</strong> <strong>de</strong> um completo plano<br />

<strong>de</strong> restauração <strong>da</strong> antiga egreja gothicn.<br />

ain<strong>da</strong> a falsa id6a <strong>de</strong> querer ver na egreja portugueza esse<br />

1 De expuwione Oliaiponia, monumenla 111, cap. xr, Portugaliae monu-<br />

me& &tom, tom. 1.0


gran<strong>de</strong> e incorruptivel corpo, que ia <strong>de</strong>scançar nos braços <strong>do</strong>s<br />

apostolos que <strong>de</strong>sceram a pregar o evangelho ti peninsula hispanica ;<br />

ta o ~~"ji~izo <strong>de</strong> se imaginarem <strong>de</strong>shonra<strong>do</strong>-, se nào cobrirem o<br />

tosco ber~o <strong>da</strong> nossa patria com os brilhantes ornatos <strong>de</strong> suas<br />

<strong>do</strong>iira<strong>da</strong>s fabulas.<br />

Não foi na<strong>da</strong> assim. O que se <strong>da</strong> chronica 6 o exercicio <strong>do</strong><br />

tl:ri.ito <strong>de</strong> apresentaçáo e eleição <strong>do</strong>s bispos, d~ oric~lm i'utliiç~,<br />

;i ,tiqiii.simo entre to<strong>do</strong>s os povos mesmo fóra tlii pcloinsula, ao<br />

niosnio tempo o reconhecimento <strong>da</strong> ,auctoritla<strong>de</strong> <strong>da</strong> i(. apostolicii,<br />

emquanto á mesma erecção <strong>do</strong> novo bispa<strong>do</strong>. «I;' <strong>de</strong>pois que assim<br />

foi enlegi<strong>do</strong> o dito bispo, diz o chronista, enviou elrey tu<strong>do</strong><br />

este dizer ao padre santo..... e que lhp outorgasse e c.on/irmaxse<br />

o dito bispo .... e outorgou-lhe to<strong>da</strong>las couscu que lhe cnuiou<br />

pedir. t)<br />

[Ia l ~~is duas cousns: a outorga <strong>do</strong> bispa<strong>do</strong> e a confirmação <strong>do</strong><br />

bispo.<br />

(;orno po<strong>de</strong>ria não ter si<strong>do</strong> assim, se ain<strong>da</strong> niio eram passa<strong>do</strong>s<br />

miiitos aiinos <strong>de</strong>pois que este monarcha impetriira <strong>do</strong> papa o conseritimento<br />

<strong>de</strong> sua vassallagem e feu<strong>do</strong>?<br />

Depois, observemos isto se passaya no seculo xii, em pleno<br />

imperio <strong>do</strong> direito poiitificio, e [ião mui longe <strong>do</strong> pontificaclo d'aquelle<br />

celebre Lothario, cjiie se cliiirnou Innocencio ri1 ; Iernbrcmo-nos<br />

<strong>do</strong> qiic dissemos crn outra liiirte d'este trabalho; como ns<br />

fiilsas <strong>de</strong>cretncs consegriiam fazcr urrin rcvolucão completa ria disciplina,<br />

c iião esqueçamos que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito o prima<strong>do</strong> <strong>do</strong>s pontificcs<br />

se fizer,ii sentir, respeitar, temer 'e impor nas velhas monarchias<br />

gothicns, <strong>de</strong>spe<strong>da</strong>ça<strong>da</strong>s pelo Islamismo, e em as recentes nações<br />

neo-gotliicas. verice<strong>do</strong>ras <strong>do</strong>s musiilrnanos.<br />

Alas sch ri30 assistiu a 1). Affonso riem a seus successortls este<br />

direito, ou esta fac~il<strong>da</strong><strong>de</strong>, quc <strong>de</strong>rogava o importante privilegio<br />

<strong>do</strong>s papas; comtu<strong>do</strong> vemos (lcstle esta primeira erclc,çiio tlos riossos<br />

bispa<strong>do</strong>s que o rei impelrava, pon<strong>de</strong>rava a riecessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> erecçao<br />

e propuriha a siia creação.<br />

O mesmo se passa em Evora e Silves. ,<br />

Em 1188, apo<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se I). Sancho <strong>do</strong> AI-Garb, elege-se<br />

bispo a L). Nicolau, conego regular <strong>do</strong> mosteiro <strong>de</strong> Santa Cruz<br />

<strong>de</strong> Coimbra, fican<strong>do</strong> Silves a catliedral, que em tempos fora Ossonoba.<br />

Cresci<strong>da</strong> em riquezas e extensiio pelos sarracenos, Silves<br />

mereceu esta honra.


$ um pouco obscura nos historia<strong>do</strong>res a narra~iio $este facto,<br />

não se falan<strong>do</strong> <strong>da</strong> intervenção <strong>do</strong> papa i ; mas, como admittir um<br />

procedimento diverso <strong>do</strong> <strong>de</strong> D. AfGoooso em quarito a Lisboa, se<br />

cousa alguma o dá a perceber, e se, bem longe d'isso, ain<strong>da</strong> nRo<br />

tinham começa<strong>do</strong> as disputas com o clero?<br />

Demais, sabe-se que o mesmo D. Sancho impetrou a auctori-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> se apostolica, quanto a outros bispa<strong>do</strong>s. Em 1199 este<br />

monarcha, elegen<strong>do</strong> a D. Martinho, bispo <strong>de</strong> I<strong>da</strong>nha, Eaz confir-<br />

mal-o e transferir para Guar<strong>da</strong> a se<strong>de</strong> <strong>do</strong> bispa<strong>do</strong>, por bullas<br />

<strong>de</strong> Innocencio III 2.<br />

Nem emquanto á <strong>de</strong>marcaçâo sobre o solo <strong>do</strong>s limites <strong>da</strong>s dio-<br />

ases os nossos monarchns tinham direito algum.<br />

Este mesmo D. Martinho, primeiro bispo <strong>da</strong> Guar<strong>da</strong>, teve era-<br />

ves disputas com Pedro, bispo <strong>de</strong> Coimbra, a respeito <strong>do</strong>s limiies<br />

<strong>do</strong>s respectivos bispa<strong>do</strong>ti. O papa Innoccncio IJI envia os bispos <strong>de</strong><br />

Samora e <strong>do</strong> Porto a rcsolver a pcndcncia: 1). Mnrtinho, po-<br />

rem, ao que parece, homem teimoso, renopa as pretensões e vai<br />

em pessoa a Roma, on<strong>de</strong> assiste ao celebre concilio <strong>de</strong> LaterBo,<br />

cclcbra<strong>do</strong> no pontifica<strong>do</strong> <strong>de</strong> Innocencio. Diu tnmen non quieuit,<br />

- diz D. Thomaz <strong>da</strong> Encarnaçõo, as alterações renovam-se, e<br />

d'esta vez o papa torna a enviar <strong>do</strong>is bispos, ut dirisiones fiertnt<br />

per libros anriquos, per tesles et /amam PS cop. Cum causam,<br />

!3, <strong>de</strong> proba1 3.<br />

Percorram-se os capitulas em que o aiictor <strong>da</strong> Hz'sloria <strong>da</strong><br />

Bgr(ja Lusitana <strong>de</strong>screve os vestipios <strong>do</strong> prima<strong>do</strong> <strong>do</strong>s papas em<br />

Portugal, e mais luminosa sairá esta ver<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Mas a que provincia pertenciam as novas dioceses? a Braga,<br />

ou a Cornpostella ?<br />

$ o que não e facil dizer.<br />

Gilbert, o primeiro bispo <strong>de</strong> Lisboa, fora or<strong>de</strong>na<strong>do</strong> por D.<br />

João Peculiar, arcebispo <strong>de</strong> Braga, a quem prestára subjeiçao e<br />

reverencia 4.<br />

1 D. Thomaz <strong>da</strong> EncarnaçLlo, IIist. Eccles. Lw.,<br />

Saecul. XII, cap. I, tj vIrr,<br />

tom. 3.O<br />

2 D. Tliomsx <strong>da</strong> Eiicarnação, H*. Ecclee., Baecul. xrIr, cap. I, 4 VIII,<br />

tom. 4.0<br />

3 L). '1'hom:~z <strong>da</strong> Encnrn:iç?io, liist. cit., Snrcul. xIIr, cnp. I, $ viir, tom. 4.0<br />

4 Brrtiirl?i,n, lia terceira parte <strong>da</strong> monaixhia lusitsnxr, refere este sicto <strong>de</strong><br />

subjeiqito extrahiii<strong>do</strong>-o <strong>do</strong> livro <strong>de</strong> Fi<strong>de</strong>i <strong>da</strong> 84 <strong>de</strong> Br-. Diz d'este nio<strong>do</strong>:<br />

a E,yo Gil Lertus S. Ulixbonetisis Ecclesiae Episcopus su6jectionem et reve-<br />

yentiaqn a sanctie patribue constitutam secmdum praecepla canonum Ii;cc?e-


O primeiro bispo <strong>de</strong> Evora, D. Sueiw, tamhem or<strong>de</strong>na<strong>do</strong> pelo<br />

mesmo 1) <strong>do</strong>211 Peciiliar. seguin<strong>do</strong> o exemplo <strong>de</strong> Gilberto, sempre<br />

Ihc i're-!' L: ~tl~diencia, como metropolita.<br />

.Siiarios Gilherti Olyçsiponensis exemplm seqiiutus Bracarensi<br />

.\r clii'pisc~ po tarqoam Mrlropolitae parebat, rc\erentiamque praebe-<br />

Ilat; Lique \-cnzrabilrs Regis Alfonsi consensus probaterat 1.))<br />

1). Iio.4rigo <strong>da</strong> Crrriliii, nn vi<strong>da</strong> <strong>de</strong> D. Gilberto, affirnia qiie foi<br />

o rnoiiarcliii, que ol)rigou a pmtdr o juramerito <strong>de</strong> obedicnc-ia ao<br />

- metropolitano <strong>de</strong> Braga.<br />

~Coni esta <strong>do</strong>iitrina, diz elle. procuroii (Affonso I.") com to110 o<br />

riii<strong>da</strong><strong>do</strong> tornar a seu primeiro liistre ;I cgrc>j;i <strong>de</strong> J,ishoa, assiniiiitlo-n<br />

pr siiH'rap;inea á <strong>de</strong> Braga. po<strong>do</strong>que tft.s<strong>de</strong> ternpos antiquissiinos Iier-<br />

iiiiria ;i nic~tropolilana <strong>de</strong> hiaíb. eni cujo direito <strong>de</strong>poes <strong>da</strong> invasam<br />

til~s Moiirus prostra<strong>da</strong> a gra& <strong>da</strong>qiiella ci<strong>da</strong><strong>de</strong> havia succedi<strong>do</strong> a <strong>de</strong><br />

Corn~)osttcll;i por indulto e ronassam <strong>do</strong> papa Caiisto' se#iin<strong>do</strong>. 121 rey<br />

ronitii<strong>do</strong>, ou <strong>de</strong>sejoso <strong>de</strong> conraizr a primazia ecilesiasticn nas terras<br />

(!e seu sciiliorio, ou por mtrm re5peitos politicos, obrigou a Gilberto<br />

fizesse jiirnuicnto <strong>de</strong> obediencia au Ar( cl~ispo <strong>de</strong> Bragan 2.<br />

O que 6 certo 6 que a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> portugueza não se compa<strong>de</strong>cia<br />

com a nuctori<strong>da</strong><strong>de</strong> eminente <strong>de</strong> um primaz situa<strong>do</strong> fóra <strong>da</strong> sua<br />

cyrcja .<br />

Aritcbs <strong>da</strong> separação <strong>de</strong> Portugal. uita <strong>da</strong> invasão <strong>do</strong>s infiois,<br />

Illcridii ~irc~qidia a estas cathedne~; ni,is, dcpois qiie Portiipl se<br />

toi.rin il!dc.])t:rulvnte, já quan<strong>do</strong> libre dt sujeicão iquella SC, oii a<br />

Coriil)o~t(~ll;i, ht,r<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> qíliis <strong>direitos</strong>. 6 que as suas rgrcjas romeçam<br />

<strong>de</strong> apparecer <strong>de</strong> riovo.<br />

As monarchi;is hespaiiholas niío queriam mnnhccrr a lesitimi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>do</strong> !iovo rcirio; a celebre questão <strong>da</strong> primazia tolctarin foi<br />

movi<strong>da</strong> occultamente por esta gran<strong>de</strong> ambição politica ; c, como<br />

ficasse ~~endt~nte, sem soliiçào, apezar <strong>da</strong>s bullas <strong>de</strong> Zlrbario e <strong>de</strong><br />

siac h'rachare~W, ~eetoritusque ejus in 11raesr1,lia Domitii Joannir ~irrpr/tto<br />

me edtbilurum promitlo et usque sait


Eugenio; agora os monarchas, receiosos d'aquella outra supremacia<br />

corripostellana. tractavam <strong>de</strong> fazer reconhecer pelos novos bispos a<br />

auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> metropolitica <strong>do</strong>s arcebispos <strong>de</strong> Braga.<br />

Esta gran<strong>de</strong> supremacia bracharense, que abraçára <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito<br />

a causa <strong>do</strong> filho <strong>do</strong> Con<strong>de</strong> Hcririque; o gran<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r <strong>do</strong> alto clero<br />

nestes tempos ; a disputa acerrima <strong>de</strong> Jogo Peculiar com o bispo<br />

toletano ; tu<strong>do</strong> concorria para tornar duvi<strong>do</strong>so este esta<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

cousas.<br />

Se os monarchas tivessem o direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>screver os limites <strong>da</strong><br />

auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s cathedraes metropolitanas, porveritura que já esta<br />

corifus'io estaria <strong>de</strong>bella<strong>da</strong>; mas ri20 era assim: tinha <strong>de</strong> esperar-se<br />

por uma bulla pontifical; e no solio <strong>de</strong> Roma estava Innocencio rir.<br />

A bulla não tar<strong>do</strong>u ; mas a bulla veio centralisar o po<strong>de</strong>r <strong>da</strong><br />

egreja; a bulla veio esmagar mais esta soberania temporal nascente,<br />

e lisongear a Affonso vii, sujeitan<strong>do</strong> a Compostella os nossos<br />

bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Portugal, como pouco tempo aritcs os pre<strong>de</strong>cessores<br />

<strong>de</strong> Irinocc~ririo tinham tambem submctti<strong>do</strong> to<strong>da</strong> a egreja portugueza<br />

6 egreja hespanliola, expedin<strong>do</strong> as bullas <strong>de</strong> reconhecimento <strong>da</strong> pri-<br />

mazia hispanica na ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Tole<strong>do</strong>.<br />

Foi a bulla In enrin~nti Apostolicae Srdis, <strong>de</strong> i4 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong><br />

i 199, <strong>de</strong> Innocencio 11,.<br />

Revali<strong>da</strong>va os <strong>direitos</strong> metropoliticos <strong>de</strong> Compostella, <strong>de</strong>clarava<br />

que Meri<strong>da</strong> lhe ficaria sujeita, quan<strong>do</strong> saísse <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r <strong>do</strong>s sarra-<br />

cenos, c, cnumcran<strong>do</strong> as suffraganeas, sribmettia-lhe to<strong>da</strong>s as dio-<br />

ceses <strong>da</strong> provincia <strong>da</strong> Lusitania existentes ao tempo d'ella e as que<br />

<strong>de</strong> futuro a christan<strong>da</strong><strong>de</strong> ganhasse em to<strong>do</strong> esse terijtorio.<br />

«... vi<strong>de</strong>licet, dizia Innocencio, Abulen.. Caurien., Civitatem., Pla-<br />

eentin., Pacen.. Oxonohen, , et praeterea Lamacen. et Egitanien., nee<br />

non Ulixbonen., et Elboren,. . . Compostellano archixpiscopo, cujus con-<br />

recratio ad Romanarn tantum Ecelesiam spectat, obedientiam et rme-<br />

rentiam tanquam proprio metropolitano exhibeant.l><br />

]S a segun<strong>da</strong> phase <strong>da</strong> divisão ecclesiastica <strong>da</strong> nossa egreja.<br />

A bulla <strong>de</strong> Inrioccncio foi evi<strong>de</strong>ntemente injusta, inconvenieii-<br />

tissima, sob o aspecto politico e ccclesiastico; mas a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>da</strong> Se apostolica era irresponsavel, suprema.<br />

Os reis submctteram-se; os bispos obe<strong>de</strong>ceram.<br />

A lucta com o clero levanta-se eritao cheia <strong>de</strong> rancores; as<br />

complicaç6es com Castella sào <strong>de</strong> dia para dia mais ameaça<strong>do</strong>ras.


O rumor <strong>da</strong>s ~,elqj,is com os mouros srreiia nos ares; a pnv,<br />

vai <strong>de</strong>senrolan<strong>do</strong> pre$uiqo*amente suas candi<strong>da</strong>s azas; o esta<strong>do</strong><br />

civil procura respirar <strong>de</strong>baixo <strong>do</strong> peza<strong>do</strong> jugo clerical.<br />

O nome <strong>de</strong> Portugal começa a fazer-se respeita<strong>do</strong> ; a nacionali-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong> portugueza iilcan~a os titulos tle siia in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia.<br />

A egrrja portugueza começa a tlctcrminar as suas formas, a<br />

crear com as concor<strong>da</strong>tas os primeiros capitulas <strong>do</strong> seu Codigo; e<br />

por fim um rei, cuja vi<strong>da</strong> an<strong>da</strong> involta em uma sympathica len<strong>da</strong><br />

<strong>de</strong> amores, e em vigorosos exemplos <strong>de</strong> justiça ensina<strong>da</strong> aos jui-<br />

zes, recosta-se sereno em seu throno, e diz d'ahi aos officiacs <strong>da</strong><br />

Curia Romana, quan<strong>do</strong> lhe apreseiita~am as letras <strong>de</strong> Sua Saricti-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong>: - que nos mostrem esses escripios ou letras; oel-as-emos r<br />

rnafttIaremos que se publiquem pela guisa que <strong>de</strong>vem i.<br />

Quc viessem agora as bullas <strong>de</strong> submiss;io a Tole<strong>do</strong> ou Cornpos-<br />

tella, que ahi estava a gran<strong>de</strong> arma que havia <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r o esta<strong>do</strong><br />

<strong>da</strong> tyrannia clerical.<br />

Aquelle direito, que os primeiros monarchas tinham adquiri<strong>do</strong><br />

perante a egreja com o sangue <strong>do</strong>s seus e o esforço <strong>de</strong> seu braço,<br />

e que ia como qiie esqucccn<strong>do</strong>, rcjuvc[iesce agora mais forte, por-<br />

que se apoia nos titulos juridicos iiacionaes, que a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

uma tbpoclia <strong>de</strong>sgraça<strong>da</strong> fizera imperiosamente escrever entre as<br />

leis d'csk povo.<br />

l'oucos annos eram passa<strong>do</strong>s, quan<strong>do</strong> a coroa <strong>de</strong> Portugal r61a<br />

por terra, sem ter fronte em que levante seus floròes; ergue-a a<br />

mão po<strong>de</strong>rosa <strong>da</strong> soberania popular e colloca-a na cabeça <strong>de</strong> um<br />

escolhi<strong>do</strong> seu, repulsan<strong>do</strong> ao inve,joos leão <strong>de</strong> Castella.<br />

A vi<strong>da</strong> era nova ; uma su,jeiçiio qualquer ás garras d'aquelle pe-<br />

rigoso <strong>de</strong>fensor <strong>do</strong>s monarchas hespanhoes, não seria já um perigo,<br />

mas era um <strong>de</strong>slustre. A egreja portugueza n8o podia ficar escrava<br />

<strong>de</strong> uma metropole extrangeira e inimiga. Longe ia o me<strong>do</strong> pavo-<br />

roso <strong>da</strong>s cxcommunhões e <strong>do</strong>s interdictos ; agora o respeito pun<strong>do</strong>-<br />

noroso substituia aquelle sentimento pueril; e por isso D. João I<br />

supplica <strong>do</strong> Papa a creação d'uma metropole em Lisboa, e a libcr-<br />

tação perpetua <strong>de</strong> suas suffraganeas <strong>do</strong> arcebispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> S. Thiago<br />

<strong>de</strong> Compostella.<br />

A bulla <strong>de</strong> 10 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1394 <strong>de</strong> Bonifacio ix liberta<br />

1 Lei <strong>da</strong> D. Pedro I, a respeito <strong>do</strong> beueplacito, sanceiona<strong>da</strong> no art. 42 <strong>da</strong>s<br />

cortes <strong>de</strong> Elvas <strong>da</strong> era <strong>de</strong> 1399, <strong>de</strong>pois traiiscript,~ para a Ord. Aff'ous., liv.<br />

B.O, tit. 6.0<br />

11


perpetuamente as dioceses <strong>de</strong> Lisboa, Guar<strong>da</strong> e Elvas <strong>do</strong> orce-<br />

bispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Compostelta, e Silves <strong>do</strong> <strong>de</strong> Sevilha ; <strong>de</strong>claran<strong>do</strong> metro-<br />

pole a cathedral <strong>de</strong> Lisboa, para o futuro sómente sujeita h egreja<br />

romana 1.<br />

A bulla fez menção <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> D. Joto I, atten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o qual,<br />

o papa confere gostoso á s6 <strong>de</strong> Lisboa aquella honra e á egreja<br />

portugueza aquella liber<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Depois <strong>da</strong> exposiçáo <strong>do</strong>s motivos e <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> creaçáo <strong>da</strong><br />

nova mctropole, c uniao e divisáo <strong>do</strong>s arcebispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Compos-<br />

tella e Sevilha, a bulla diz :<br />

(c... Ulixbonen', Egitanen', Elboren', Lamacen', a Quonpostellanen'<br />

nec non Silben' Ecclcsias, ci~ itates et dioeceses ante dietas ab Ispalen,<br />

Arcliicpiscopor. qui pro tcmpore fueriiit, et Ispalen, Ecclesiarum<br />

capitiiloriim pracdicloriirn jurisdi~tionc, <strong>do</strong>minio, potestate et suhjectionc<br />

qiiibus1il)et dc ipsoriim fratrum consilio et apostolica plenitudine<br />

potcstatis niicloritatc ;ipostolica. dc certa nostra scicntia, ex nunc eximcntes<br />

pcnitus ac totaliler in perpetuum liberantes ct ean<strong>de</strong>m Ulixi)onen'<br />

Ecclcsiam <strong>de</strong> coctcro soli Ecclesiae Ilomanae subjacere imrnediatc<br />

perpetuo dccrrnentcs, ipsain Ecclesiam Ulixbonen' ad Dei lau<strong>de</strong>m ....<br />

in metropolitan, erigimiis. .. . n<br />

E <strong>de</strong>pois:<br />

r.. .e1 pro parte dicti Regis ac dilcctorum filioriim communis ejus<strong>de</strong>m<br />

civitatis Ulixbonen' nobis hiimililer supplicato, ut ad evitationem peri-<br />

culorum et scan<strong>da</strong>lormquc et pro ipsius Kegis ac <strong>de</strong>volis fi<strong>de</strong>lis e1 be-<br />

nemeriti populi sui firmiori quiete et grandiori consolatione ... 2))<br />

1 Outra razb concorria para esta sc~>aração. A este tempo repetia-se um<br />

d'estes aoonteciinentos muito comniuns iin Iiistoria <strong>do</strong> papa<strong>do</strong>. Havia <strong>do</strong>is pnpas<br />

ao mesmo tempo; a cliristan<strong>da</strong><strong>de</strong> dividia-sc crn <strong>do</strong>is parti<strong>do</strong>s. Seguiam<br />

uns a Clemente VII, outros a Urbano vr. Aconteceu que Castella se abraçava<br />

ao parti<strong>do</strong> <strong>do</strong> Clemente, e Portugal ao <strong>de</strong> Urbano. Não admirava pois este<br />

amor tão vivo, qui! resulta <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as palavr,~ <strong>da</strong> bulla, nem custa a per-<br />

ceber como tao facilmente se constyiiiu a cre:ição <strong>de</strong> uma nova metropole e a<br />

ílesmembração <strong>de</strong> duas : Boiiifacio rx era successor <strong>de</strong> Urbano VI. Po<strong>de</strong> ser<br />

que assim não fossc inteirnriieiitr ; crain muito justas, iriuito acccitaveis as<br />

raz0es que allegava D. João I <strong>de</strong> Portiigal ; jit ha m:tis tempo que os papas <strong>de</strong>-<br />

viam ter cui<strong>da</strong><strong>do</strong> <strong>de</strong> o fazer; inns eiitRo Q o caso <strong>de</strong> dizor qiio Bonifacio IV<br />

omne tulit pi~nctunz, rnisctcit uiile, diilçi.<br />

2 k por esta razão que aos olhos <strong>de</strong> alguns a cgreja portugueza s6 começa<br />

a existir <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seculo XI~. Coelho <strong>da</strong> Rocha, no seu Ensaio sobre a historia<br />

<strong>do</strong> governo e legislação <strong>de</strong> Portugal, 5 112, pag. 90, começa, escreven<strong>do</strong><br />

que Ain<strong>da</strong> <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> oepração <strong>da</strong> monarchia, a egreja Lusitana continuou<br />

confindi<strong>da</strong> com a <strong>de</strong> CastelCa. apezar <strong>de</strong> já antes <strong>do</strong> seculo xrv haver liber<strong>da</strong>dcs<br />

na egreja portugueza, e <strong>de</strong> ser litigiosa a sujeição <strong>de</strong> Lisboa, Lamego,


A instancias <strong>do</strong> mesmo monarcha foi erecta a cathedral <strong>de</strong> Ceuta,<br />

em 140 I , pela bulla <strong>de</strong> llartinho v i Venerabili Frawi- <strong>de</strong> ti<br />

<strong>de</strong> março.<br />

nDiidrim siqui<strong>de</strong>m, diz, pro parte charissimo in Christo Alii nostri<br />

Joanriis Regis 130rtugalliac illustris nohis exposito, quod locus Cepta.. . n<br />

e dcpois<br />

«Nos tunc ipsius Regis in iis siipplicationibus inclinati ac <strong>de</strong> prae-<br />

missis certam notitiam haùcntes Brarharensibus et Ulixbonensibus Ar-<br />

chiepiscopis.. . .. consi<strong>de</strong>ratis grandiiirn tirtutum maritis, quibus perso-<br />

nam tunni illarum largitcr 1)omini:s insigni ..., <strong>de</strong> dietorum fratr~im<br />

consilio et Apostolicae potesiaiis plenitu<strong>de</strong> absolrentes ie ad Ceptne Er-<br />

cleaiam aucloritite Aposlolica truisferimusml.<br />

No glorioso tempo <strong>de</strong> D. Manuel ain<strong>da</strong> as dioceses continuam<br />

a ser erectas por instancins <strong>da</strong> corcia. Assim foi crea<strong>do</strong> o bispa<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> Funchal pela bulla dc Leào x - Pro excellenti praeeminenlia<br />

Sedis Aposlolicae- <strong>do</strong> anno <strong>de</strong> i 5 15.<br />

Evora e Beja B 86 comportelha. Essa opiiii8o invoive nma incohercncia.<br />

Pois se a egreja lositaua não existe scnio <strong>de</strong>1;ois <strong>do</strong> ae~ulo srv, porque sú<br />

<strong>de</strong>pois d'este tompo d que ella w. liberta <strong>da</strong> superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> egejn <strong>de</strong> C'om-<br />

posteiia; como 6 que existc p<strong>do</strong>s ineamos annoe a egreja castelhatia, quaii<strong>do</strong><br />

a se brscliarense esten<strong>de</strong> 8 área <strong>de</strong> siia jurisdicçiio metropolitica alem <strong>do</strong>s<br />

confiiis tle I'ortugal pela Galliza c Le,io?<br />

Nciii se diga que, apezar d'isto ser ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, nilo <strong>de</strong>stroe a preeuiinen-<br />

eia inetropolitica <strong>de</strong> S. Thiaio <strong>de</strong> Coinlt[.stell i: porque não repugna aceitar a<br />

existeiicis <strong>de</strong> iiina egrc.ja sujeita ao poc!er siiperior <strong>da</strong> hierarchia ecclesias-<br />

tica situa<strong>do</strong> fóra <strong>do</strong>s liinitrs [Ie certa ii.1~50. Não estão to<strong>da</strong>s as egrcjas iin-<br />

cionaes suhiiietti<strong>da</strong>s h cgrej.1 I?c~iiian:i? porventura nega este facto R sua<br />

existencial<br />

Qiie resiiltem incoiivenientt.~ <strong>de</strong> a s6<strong>de</strong> m~tropolitica <strong>de</strong> uma egicjn iiaciotia1<br />

cst:ir collocn<strong>da</strong> fora <strong>do</strong>s limites <strong>da</strong> 11nç5o a que esta perteiicc, coinprehendc-se<br />

iniii bem ; mas vai um:i gran<strong>de</strong> distancia d'esta conaidcraçtio &s<br />

consequeiirias que d'esse facto preteiidcm inferir.<br />

Ao separar-sc <strong>de</strong> lima nacicuali<strong>da</strong><strong>de</strong>, lia sempre Cestas graves e quasi insoluveis<br />

coiitest:iç0es. As conten<strong>da</strong>s <strong>da</strong> primazia <strong>da</strong>s Hespanhas entre Tole<strong>do</strong><br />

c Braga, as disseus0es <strong>do</strong>s uousos reis com os <strong>de</strong> Castella, as guerras <strong>de</strong> successil-o<br />

e legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong>, os couflictos <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> metropoliticoa <strong>de</strong> Braga e Compostella<br />

e dc Sevilha a respeito <strong>de</strong> Silves no tempo <strong>de</strong> D. Affonso III, eão vivos<br />

exemplos d'essa ver<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

1 Veja eslas biillas no volume 1.0 <strong>da</strong>s Provao Hwt. Genealogicn <strong>da</strong><br />

Caag Beal Portugueza.<br />

. .


Vbse isto distinctamente <strong>da</strong>s palavras <strong>da</strong> bulla:<br />

« . propterea praefatus Emmatiucl Rex <strong>de</strong>si<strong>de</strong>raret.. . Parochialem<br />

ecclesiam Beatae Mariae, qiiam i<strong>de</strong>m Eninianiiel Rex opere salis sumptuoso<br />

in civitate <strong>do</strong> Funclial in insula Ma<strong>de</strong>ira ... in Cathedralcm erigi<br />

On<strong>de</strong> nos volentes ejus<strong>de</strong>rn Emmanuelis R-gis id sumrnoperc cupientis<br />

<strong>de</strong>si<strong>de</strong>riis annucre. o<br />

A bulla continúa empregan<strong>do</strong> as expressaes <strong>do</strong> estylo, falan<strong>do</strong><br />

<strong>da</strong> plenitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r apostolico e <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> Se apostolica<br />

consclho <strong>de</strong> seus irmaos, bispos <strong>do</strong> Reino, e conce<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o<br />

que o rei pedia.<br />

Segue-se uma epocha, em que no espaço <strong>de</strong> pouco mais <strong>de</strong> 40<br />

annos, se contam 1 4 erecções <strong>de</strong> bispa<strong>do</strong>s !<br />

2 um tempo fatidico para Portugal ; o tempo <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncia<br />

rapi<strong>da</strong>, em que a intolerancia religiosa e a superstição causam<br />

a per<strong>da</strong> <strong>da</strong> nossa in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia. Os <strong>do</strong>is moiiarclias, que presi<strong>de</strong>m<br />

ao governo <strong>de</strong> Portugal e que se <strong>de</strong>ixam subjugar por to<strong>do</strong>s esses<br />

erros, são: D João 111, o rei mais antipiltliico <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a nossa historia,<br />

e cujo reina<strong>do</strong> dura mais dilata<strong>do</strong>s anrios ; e D. SebastiAo, o<br />

,joveii infeliz, que queria resuscitar unia quadra dc glorias que Portugal<br />

perdbra para sempre.<br />

Bem sabemos qiie a maior piirte d'esscs bispa<strong>do</strong>s foram erectos<br />

nas conquistas <strong>de</strong> Africa e <strong>do</strong> Oriente ; mas não po<strong>de</strong>mos acreditar<br />

na ueccssi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> crcaçào dc tantas dioceses e metropoles no<br />

reino e rias possessòcs. E porqiií? o náo teriam feito seus pre<strong>de</strong>cessores?<br />

E porque acontecem estas cousas, quan<strong>do</strong> a máo repellente<br />

<strong>da</strong> theocracia suffoca este pobre Portugal?<br />

Os chronistas louvam este zelo infelizmente ar<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> D. João III.<br />

Faria e Soiisa, na Eztropa Porlugueza, tomo 2.O, p. iv, cap. ir,<br />

n.' 80 escreve:<br />

Con ardiente zelo <strong>de</strong> autorisal-a (a religião) en ru Repo<br />

erigio 10s Ires bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Leyria, <strong>de</strong> I'orialegre y <strong>de</strong> Mirari<strong>da</strong>;<br />

y olros en las conquistas, applicnn<strong>do</strong>les renias para sustentar se<br />

<strong>de</strong>cenlemenie en les dizmos aplica<strong>do</strong>s a lu or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> Cl~rislo.<br />

Hizo Meiropoli e1 <strong>de</strong> Eaora; y e1 <strong>de</strong> la Isla <strong>de</strong> la Ma<strong>de</strong>ra <strong>da</strong>n<strong>do</strong>le<br />

per sufragat~eas los <strong>de</strong> Sotlt-lago y <strong>de</strong> S. Thome y <strong>de</strong> Goa<br />

a que <strong>de</strong>spues dio la propria digni<strong>da</strong>d en la ltidia cotn e1 titufo<br />

<strong>de</strong> Primaz sugctan<strong>do</strong>le 10s Oúispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Cochim y <strong>de</strong> Maluca a<br />

que <strong>de</strong>spues se acudieron otros.<br />

Assim se empobrecia esta infeliz terra, rouban<strong>do</strong>-lhe nos dizi-


mos a força fecun<strong>da</strong><strong>do</strong>ra <strong>do</strong> solo e <strong>da</strong>s industrias, e <strong>da</strong>n<strong>do</strong>-lhe com<br />

a inquisi~ào, com as or<strong>de</strong>ns monasticas, com o esplen<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s paços<br />

episcopacs e o apparato luxuoso <strong>da</strong>s Sbs, e com a fatidica companhia<br />

tltl Jesus, a escuridso <strong>do</strong> espirito, que, siijritari<strong>do</strong> os povos<br />

íí f~sci-na(.3o <strong>da</strong>s pompas thcatracs <strong>da</strong>s cdrtes <strong>do</strong>s reis e <strong>do</strong>s gran<strong>de</strong>s<br />

principcs <strong>da</strong> egrcja, que os lcla a beijar a mão qire os opprime .<br />

com a tyrarinia, e, esmaga<strong>do</strong>-lhcs a alma pela superstiçào, os não<br />

dcisa comprehen<strong>de</strong> a Deus.<br />

NBo cui<strong>de</strong>mos pois encontrar alteraqao no direito ecclesiastico<br />

portug~iez, quanto h creaç8o <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s e metropoles. Com a<br />

miiior Iiumil<strong>da</strong><strong>de</strong> a impetrava este nosso monarcha.<br />

A4 primeira crecçáo <strong>de</strong> bispa<strong>do</strong> foi a <strong>da</strong> e~c'a <strong>de</strong> Angra, por<br />

D !<br />

hrilla clc Clcrnente vir, <strong>do</strong> aono <strong>de</strong> i 532, a instancias <strong>de</strong> D. Jo~o rir,<br />

na mesma maoeira fomm erectos: o bispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Cabo-\-vi <strong>de</strong>, .<br />

por 1~1lla <strong>do</strong> mesmo papa e <strong>do</strong> rnrsmo anno, sen<strong>do</strong> porbni s6 pro-<br />

\i<strong>do</strong> tlc bispo em 15841;-o <strong>de</strong> (;<strong>da</strong>, por bulla <strong>de</strong> Paulo 111, <strong>do</strong><br />

aiino <strong>de</strong> 1235 ;?o <strong>de</strong> S. ThomC, por bulla <strong>de</strong> 3 <strong>de</strong> novembro <strong>do</strong><br />

mesmo anno, comprehen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o Congo e Angola.<br />

Em 1539 é elela<strong>do</strong> a metropole <strong>da</strong>s egrejas <strong>da</strong>s conquistas O<br />

bispa<strong>do</strong> <strong>da</strong> Ma<strong>de</strong>ira; per<strong>de</strong>n<strong>do</strong> bem <strong>de</strong>pressa esses <strong>direitos</strong> por<br />

oritras bullas, como a <strong>de</strong> 1551) pelo papa Julio rir, que fei ~rrfia-<br />

ganeo <strong>do</strong> metropolitano <strong>de</strong> Lisboa o bispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> S. Thomv.<br />

Neste mesmo anno <strong>de</strong> 1539 transfere Paulo 1x1 a ~ d <strong>do</strong> c<br />

bispatlo <strong>de</strong> Silles para a ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Faro.<br />

A iristarrcias <strong>do</strong> mesmo rei se crigem no reino os bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong><br />

hIiraiitl;i, Ixiria e Portalecre, aqiiclles por bullas <strong>de</strong> Paulo 111, <strong>do</strong><br />

anno <strong>de</strong> 1548, e este pt,r hiilla di. Julio 111, <strong>de</strong> 1550; rio Bríizil<br />

a dioccse <strong>do</strong> llrazil, pela bulla <strong>do</strong> mesmo papa-Supra specula<br />

militanlis eccl~aia. -<strong>de</strong> 28 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 1660; e Goa a metropolc<br />

por biilla <strong>de</strong> Paulo iv, no anno <strong>de</strong> i 557.<br />

As bulla5 <strong>de</strong> erecçào e <strong>de</strong>smembraç80 d'estes bispa<strong>do</strong>s continuam<br />

a mostrar que <strong>da</strong> mesma forma, a instancias <strong>do</strong>s reis, eram erectos<br />

os novns bispa<strong>do</strong>s.<br />

A bulla <strong>de</strong> erecção <strong>da</strong> primazia <strong>do</strong> Furichal <strong>de</strong> Paulo 111, - Dudum<br />

siqui<strong>de</strong>m -<strong>de</strong> 8 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1539, dizia :<br />

(I... postquam felicis recor<strong>da</strong>tionis Leo Papa x, Pae<strong>de</strong>cessor noster<br />

1 Veja Ensaio sobre a Eetatistica <strong>da</strong>s possessôes portz~yueaas no Ultramar<br />

-por Lopes <strong>de</strong> Lima, liv. 1.0, p. I.', cap. VII, pag. 70.


procuranle clarae memoriae Emmanuela Portugalliae et Algarbiorum<br />

Rege ....<br />

e mais a<strong>de</strong>ante<br />

a... pracfatus Joannes Rex nobis humiliter supplicarifecit ... Nos<br />

igitur votis ipsius Joannis Regis, praeclaris ejus <strong>de</strong> Se<strong>de</strong> Apostolica<br />

exigentibus meritis. .. codcm Joanne Hcgc id volentc et in hoc consen-<br />

tiente ... »<br />

Na bulla-Pro excellenii Aposfolicae Sedis-<strong>de</strong> Paulo 111, <strong>de</strong><br />

1548, encontram-sc, <strong>de</strong>pois <strong>do</strong>s motivos <strong>de</strong>terminantes <strong>da</strong> <strong>de</strong>s-<br />

membraçao <strong>da</strong> diocese <strong>de</strong> Braga, estas palavras:<br />

a... et chnrissimi in Christo filii nostri Joannis mo<strong>de</strong>rni Portugalliae<br />

et Algarbiorum Regis illustris, qui hoc summoperc dcsi<strong>de</strong>rat, et super<br />

eo nobis per suas literas humilitcr siipplicavit .... R<br />

A bulla <strong>de</strong> erecção <strong>da</strong> cathedral <strong>de</strong> Leiria, <strong>da</strong> mesma <strong>da</strong>ta, 6<br />

egualmente <strong>do</strong> mesmo teor.<br />

A rogo <strong>de</strong> D. Sebastião se crigem os bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Malaca e (ir<br />

Cochim, em 1857, por bullas <strong>de</strong> Paulo iv; o <strong>de</strong> Elvas em 1570,<br />

por bulla <strong>de</strong> Pio v; e o <strong>de</strong> Macau, em 1675, por bulla <strong>de</strong> Gre-<br />

gorio XIII.<br />

No tempo <strong>de</strong> Filippe I, e a seu rogo, se crigem os bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong><br />

Funay, em 1588, por bulla <strong>de</strong> Xisto v; o <strong>de</strong> Angola, por Clemente<br />

viir, em 1597; c o <strong>de</strong> Meliapor, por Paulo v, em 1606.<br />

No reina<strong>do</strong> <strong>de</strong> D. Pedro ii recomeça a creaçíio <strong>de</strong> novos bis-<br />

pa<strong>do</strong>s.<br />

A bulla <strong>de</strong> Innoceocio XI -1nler Pasforalis Oficii -<strong>de</strong> 16<br />

<strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1676, eleva a metropolitana a Se <strong>da</strong> Bahia ; as<br />

bullas-Ad Sacram Beaii Pclri-e-Romani ponltFcis-<strong>de</strong> 26<br />

<strong>de</strong> novembro <strong>do</strong> mesmo anno, erigem, aquella o bispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Per-<br />

nambuco, e esta o <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro; a <strong>de</strong> 30 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1677 -<br />

Super Uniitersas-cria a diocese <strong>do</strong> Maranháo; e as bullas <strong>de</strong> Ale-<br />

xandre viir, <strong>de</strong> 1690, erigem os bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Pekin e Naiikin.<br />

Em tempo <strong>de</strong> D. Joáo v, fraquezas muri<strong>da</strong>nas o levaram a sol-<br />

licitar a creação <strong>de</strong> um patriarcha<strong>do</strong>, scsm proveito algum para a<br />

egreja; e, como era vivo ain<strong>da</strong> o arcebispo <strong>de</strong> Lisboa, e as pompas<br />

<strong>do</strong> patriarcha<strong>do</strong> eram dcseja<strong>da</strong>s pelo caprichoso monarcha para o<br />

cape1130 dc sua real capella, n 1)ulla <strong>do</strong> 1716 keio dividir o ari-<br />

tigo arcebispa<strong>do</strong> cm arcebispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Lisboa oriental e patriarcha<strong>do</strong>


<strong>de</strong> Lisboa occi<strong>de</strong>ntal. Em 1781, com a morte <strong>do</strong> arcebispo o pa-<br />

triarcba<strong>do</strong> une-se com o arcebispa<strong>do</strong>, forman<strong>do</strong> o patriarcha<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

Lisboa.<br />

Em 1719 tinha-se crea<strong>do</strong> a diocese <strong>do</strong> Grão-Par& por bulla <strong>de</strong><br />

Clemente xi -Copiosus in Misericordia - <strong>de</strong> 4 <strong>de</strong> março ; c cm<br />

1746, a bulla <strong>de</strong> Bento xiv-Can<strong>do</strong>r lucis-<strong>de</strong> 6 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro,<br />

erigiu as duas dioceses <strong>de</strong> S. Bento e Marianna, no Drazil I.<br />

Paremos aqui.<br />

Até ao reina<strong>do</strong> <strong>de</strong> D. José v&mos assim quatro epochas bem<br />

distinctas <strong>da</strong> creaçáo <strong>do</strong>s nossos numerosos bispa<strong>do</strong>s e metropoles.<br />

Na primeira, presi<strong>de</strong>m jiistissimos motivos e s6 se erigem os estrei-<br />

tamente neccssnrios; na segun<strong>da</strong>, á necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> os crear nas<br />

conquistas juncta-se a religiosicla<strong>de</strong> csaggera<strong>da</strong> <strong>de</strong> um monarcha,<br />

e transpiiem-se os limites <strong>do</strong> necessario ; na terceira, os cui<strong>da</strong><strong>do</strong>s <strong>de</strong><br />

restauração suspen<strong>de</strong>m este fervor <strong>de</strong> multiplicar o episcopa<strong>do</strong> por-<br />

tuguez ; na quarta, pre<strong>do</strong>mina o genio caprichoso e amigo <strong>de</strong> osten-<br />

tação <strong>de</strong> um monarcha opulento e prodigo.<br />

Em to<strong>da</strong>s ellas, porém, o direito não soffre alteração.<br />

As bullas, como vimos, fallum <strong>da</strong> mesma maneira que as <strong>de</strong>cre-<br />

taes <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seculo x; usam até, como se <strong>de</strong>le ter nota<strong>do</strong>, <strong>da</strong>s<br />

mesmas locuçL6es <strong>de</strong> plenitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r <strong>da</strong> sé Apostolica, e <strong>do</strong>s<br />

conselhos <strong>do</strong>s bispos <strong>da</strong>s locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s, que primeiro eram ouvi<strong>do</strong>s<br />

e informavam a respeito <strong>da</strong> conveniencia <strong>da</strong> creação. Nas bullas<br />

apenas se accrescenta e repete, que tu<strong>do</strong> fdra pon<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> e humil-<br />

<strong>de</strong>mente pedi<strong>do</strong> nas letras <strong>do</strong>s monarchas, e que os papas, quanto<br />

com o Senhor cabe, gostosos lhe querem satisfazer a pretensão.<br />

Compare-se com o que atrás <strong>de</strong>ixhmos dicto no capitulo v <strong>da</strong><br />

primeira parte e tereis a explicaçgo d'isto.<br />

1 To<strong>da</strong>s estas bullas continuam a lembr:~, que são os principes que pe<strong>de</strong>m<br />

e sollicitam as honras para as egrejas, que se erigem em novoa bispa<strong>do</strong>s<br />

ou inetiopoles. Basts~lí citar as seguiiites :<br />

A bulla - Inler Pastoralis o@ii- <strong>de</strong> 1676, elevan<strong>do</strong> a cathedral a egreja<br />

cla Rahia, diz:<br />

e.... dignioribiis titulis exornare <strong>de</strong>crevimus maxime ad sublimium Principiim<br />

exposceritibiis votis, prout iii Domino saliibriter expedire coiispicirnua ...<br />

A bulla- Ilomani I'ontifiis Pastoralis <strong>de</strong> 1678, <strong>da</strong> crecção <strong>da</strong> cathedral<br />

<strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro, contéin que :<br />

... iiecuon praedicto Piincipeet Bubernatore per cjus litteras Nobis ad hoc<br />

hiiiiiiliter siipplicrnte.. Vyja os volumes <strong>da</strong>s Provas <strong>da</strong> Historia Genealogica,<br />

o 2 .O ~oliime <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> civil Brazileiro dc C'aiidi<strong>do</strong> Men<strong>de</strong>s d'Alrnei<strong>da</strong>, e O<br />

Bullariiim Patronatus Portu~aliae Itcgum in Ecclesiis Africae, Asine atqiie<br />

Oceaniae - curauto Vicecomite <strong>de</strong> Paiva Manso - tomos I e Ir.


Não ha um só bispa<strong>do</strong>, um só arcebispa<strong>do</strong>, que seja erigi<strong>do</strong><br />

sem a sollicita~ão real e sem os protestos <strong>de</strong> plenitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r<br />

<strong>da</strong> parte <strong>de</strong> Roma nas bullas <strong>de</strong> erecçâo ; e, se por um la<strong>do</strong> ellas<br />

provam a intervenção <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r real, por outro la<strong>do</strong> <strong>de</strong>primem<br />

tanto esta intervenção, que pó<strong>de</strong> duvi<strong>da</strong>r-se se os papas náo teriam<br />

o direito <strong>de</strong> crear um bispa<strong>do</strong> no reino sem ouvir os monarchas<br />

ou sollicitar o seu consentimento.<br />

Lemhrcmo-nos, to<strong>da</strong>via, <strong>de</strong> que a bulla <strong>de</strong> erecção era uma<br />

bulla como qualquer outra, e que s6 o beneplacito regio a po<strong>de</strong>-<br />

ria auctorisar.<br />

Se o pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> D. Joao I, para a elevação <strong>de</strong> uma metropole<br />

na diocesc <strong>de</strong> Lisboa, não fosse attendi<strong>do</strong>, nao podia, sem duvi<strong>da</strong>,<br />

esse monarcha crcar por suas Icis o arcebispa<strong>do</strong>; mas, se sem sol-<br />

licitaçâo sua sc preten<strong>de</strong>sse erigir a mctropole <strong>de</strong> Lisboa, a elle<br />

cabia oppor-se, e impedir a erecqão, negan<strong>do</strong>-lhe o seu regio placito.<br />

Eis aqui como o assentimerito <strong>do</strong>s monarchas, quanto Bs altera-<br />

ções <strong>da</strong> circumscripção ecclesiastica em territorio seu, era condição<br />

essencial d'essa alteraçáo.<br />

E preciso confessar, comtu<strong>do</strong>, que ate o tempo <strong>de</strong> D. Jose I<br />

o nosso direito ecclesiastico é como que fluctuante e mal seguro.<br />

A Se Apostolica para nOs, como para to<strong>da</strong>s as nações, náo reco-<br />

nheceu expressamente as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s nacionaes ; e como em gran<strong>de</strong><br />

parte o seu unico titulo era o uso, e a elle se oppunha o dizer <strong>da</strong>s<br />

bullas terminante, f~iri<strong>da</strong><strong>do</strong> nas <strong>de</strong>cietaes, supremo; e alem d'isso<br />

os nossos monarchas, ora conscios <strong>de</strong> seus <strong>direitos</strong> se levantavam al-<br />

tivos a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r as suas prerogativas, oril subjuga<strong>do</strong>s pela siip~rsti-<br />

ção e zelo exaggera<strong>do</strong> se submettiam cíqrielle gran<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r extra-<br />

nacional; d'ahi vem estas incertezas e difficiil<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

I3 no tempo <strong>de</strong> D. Jose que se fixa e <strong>de</strong>termina este direito com<br />

to<strong>da</strong> a precisão.


O Summo Imperio : Protecção e Inspecção Suprema<br />

Origem <strong>da</strong>s tlieorias i10 Summo Im erio -Entre nós - Breve quadro <strong>do</strong>s principio6<br />

d'essa theoria: fonte <strong>do</strong> ~ioiler iea! e $"a natureza: <strong>direitos</strong> e officios majeslaticos:<br />

fun<strong>da</strong>mento <strong>do</strong> jus circa sacra-Canonistas que lonieniaram citas i<strong>de</strong>as enlre nós<br />

-As <strong>do</strong>utrinas <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r immetlialo eni a* nossai leia, na jiiiiuprucleiicia, nos lra-<br />

cta<strong>do</strong>s cspeciaes e na uiiircraitla<strong>de</strong> - Officios e <strong>direitos</strong> <strong>do</strong>s inil)eranles quiinlo 6<br />

protrcclo e inspccclo supreliia: I~gislaclo josrpht~a -O direito <strong>de</strong> cienr e suppriinir<br />

o{ hispacios e'<strong>de</strong> irirgnr a circuniscii~~cai~ ect~leeia~iica <strong>de</strong>haian <strong>do</strong> irnperio d'estes<br />

piinciliios - Opinilo crronea a re~priio <strong>da</strong> ~irotr.ccao tla txjireja pelo esta<strong>do</strong> -<br />

Reapparecimtmto <strong>da</strong> theoria <strong>da</strong> proteccáo e ins[ircc8o suprema <strong>de</strong>liciis <strong>da</strong> Carla<br />

Conzlilucional - Burges Carneiro - Ulfimas crcaco6s <strong>de</strong> l~iipa<strong>do</strong>s - Necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> uma reforma ria rircumscripclo ecclesiaslica '<strong>de</strong> 1)ortugal - Tentativa 'ciesle<br />

proposilo: sua ineíücarin - Decr. ilt: 9 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1869 - Esta<strong>do</strong> aclual- Projeclo<br />

<strong>de</strong> lei <strong>de</strong> 17 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1871.<br />

Na historia politica <strong>da</strong> Europa encontra-se, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seculo xvi,<br />

alguma cousa muito similhante ao effeito <strong>da</strong>s gran<strong>de</strong>s correntes,<br />

que sulcam em senti<strong>do</strong>s oppostos e com veloci<strong>da</strong><strong>de</strong>s differentes os<br />

gran<strong>de</strong>s oceanos cquatoriars.<br />

Ha eff'ectivainente duas grossas correntes, que separam o mun<strong>do</strong><br />

europeu: uma <strong>de</strong>corre <strong>do</strong> norte, prega a emancipaçáo <strong>do</strong> espirito,<br />

pr6.ga a liber<strong>da</strong><strong>de</strong>; esta corrente cresce com as revoluç6es ate a<br />

meio <strong>do</strong> continente, e ahi encontra-se com a outra, que a repulsa<br />

com a força <strong>da</strong> sua reacção ; ella inva<strong>de</strong> então a França, lança-se<br />

sobre os mares e vai apparecer, cheia <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>, em o norte <strong>do</strong> solo<br />

americano.<br />

Sobre as aguas d'esta paira o espirito <strong>do</strong> futuro, cheio <strong>de</strong> pro-<br />

messas ; entre as vagas d'aquella v&-se rolar arrasta<strong>do</strong> o ca<strong>da</strong>ver<br />

<strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, coberto <strong>de</strong> ameaças.<br />

Ha aqui sómente o effeito natural, como que a resultante <strong>do</strong><br />

embate <strong>de</strong> diins forças? ou 6 isto a manifestaçáo <strong>de</strong> um principio<br />

Iioje muito <strong>de</strong>bati<strong>do</strong> - a irifliiencia <strong>da</strong>s raças ?<br />

Será ver<strong>da</strong><strong>de</strong> que a rafa latilia é propensa á idéa autoritaria (!


<strong>de</strong> uni<strong>da</strong><strong>de</strong>? e que a raça germanica é espontaneamente <strong>de</strong>fensora<br />

<strong>da</strong> consciencia individual e <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> pessoaes?<br />

Seja qual fSr a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira causa d'este interessante phenomeno,<br />

o que 6 certo é que Portugal foi involvi<strong>do</strong> no turbilháo <strong>da</strong> corrente,<br />

que rugia ao sul <strong>da</strong>s terras europeas, e que, como to<strong>da</strong>s as na-<br />

çõcs que tiveram a infelici<strong>da</strong><strong>de</strong> ou fatali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> serem leva<strong>da</strong>s no<br />

seu vortice, permaneceu em scnsivel atrazo material e moral ate<br />

mui tar<strong>de</strong> na successão <strong>do</strong>s tempos.<br />

A revolução <strong>do</strong> nortc comeqou por atacar o principio theocratico,<br />

e moveu <strong>de</strong>pois a guerra ao principio monarchico em to<strong>da</strong>s as suas<br />

manifestações. As duas monarchias, theocratica e temporal, viram-se<br />

assim obriga<strong>da</strong>s a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r-se junctas, como em prol dc causa<br />

commum. Mas isto n3o podia ser, porque a monarchia theocratica<br />

aspirava ao catholicismo rcligioso c profano, e a divisão lavrou, como<br />

era fatal, entre os íiois campos habita<strong>do</strong>4 pelas raças latinas. .<br />

Qual foi o resulta<strong>do</strong>? A egreja tinha dcs<strong>de</strong> muito uma theoria<br />

e um organismo completo para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a sua posição, to<strong>do</strong> um<br />

systema <strong>de</strong> estrategia, cujos planos começóra a traçar o celebre<br />

Gregorio VII; mas a monarcliia, não ; e agora, srpara<strong>do</strong> <strong>da</strong> cgrcja,<br />

ten<strong>do</strong> <strong>de</strong> vencer a revoluçào politica <strong>do</strong> seculo aviir e <strong>de</strong> rechas-<br />

sar a reacção religiosa, que renasce sempre como aqiielle monstro<br />

mythologico, que I? porventura o symbolo <strong>de</strong> algum acontecimento<br />

perdi<strong>do</strong> no tempo e similhante a estc, o monarchia teve <strong>de</strong> archi-<br />

tectar uma theoria sua.<br />

Foram as theorias <strong>do</strong> Summo Imperio-as theoriae ridiculas<br />

<strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Divino.<br />

Tal foi a pobreza scicntifica d'esta raça, que ella teve <strong>de</strong> ir co-<br />

lher d'entre as ossa<strong>da</strong>s e d'entre as podridões <strong>do</strong> velho imperio<br />

as bases <strong>de</strong> alguma cousa, que, á guisa <strong>de</strong> systema scientifico, se<br />

po<strong>de</strong>sse oppbr a seus inimigos <strong>de</strong>baixo <strong>do</strong> esplen<strong>do</strong>r vivo <strong>do</strong>s raios<br />

<strong>da</strong> philosophia. '<br />

Luiz xiv, cu.jo seculo, cheio <strong>de</strong> brilhantismo fascina<strong>do</strong>r, offus-<br />

cára mais <strong>de</strong> um povo, representou um gran<strong>de</strong> papel 'nesta crea-<br />

ção <strong>de</strong> uma theoria ficticia e pe<strong>da</strong>ntesca, a par <strong>da</strong> qual vinham o<br />

luxo e dissoluç'io <strong>da</strong>s cdrtes reaes e o abuso pesa<strong>do</strong> <strong>do</strong> arbitrio,<br />

<strong>da</strong> vonta<strong>de</strong> suprema, T e tantos irinocentrs sacrificou muitas vczes<br />

ás intrigas mais insignificantes e mesquinhas.<br />

Eritre nós, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> direito romono se generali-<br />

sou, e foram apparecen<strong>do</strong> nas leis e iin jurispru<strong>de</strong>ncia as novas


idhas <strong>do</strong> absolutismo real; essas theorias foram ganhan<strong>do</strong> imperio<br />

na opinião, como que pouco e pouco saturan<strong>do</strong> o meio on<strong>de</strong> res-<br />

pirava a intelligencia <strong>da</strong> nação.<br />

Os reina<strong>do</strong>s <strong>de</strong> João 11, D. Manuel, D. João rii, D. Pedro ir e<br />

D. João v, dáo bastantes exemplos <strong>do</strong> progresso que entre nós<br />

fizeram estas id8as.<br />

]S: no tempo <strong>de</strong> 1). Jos8 I que se realisam as gran<strong>de</strong>s reformas<br />

<strong>do</strong> po<strong>de</strong>r absoluto e se rrgue em to<strong>do</strong> o vigor nas leis e institui-<br />

ções a organisação curiosa <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> e <strong>de</strong>veres majestaticos <strong>do</strong>s<br />

summos imperantes.<br />

fi indispensavel para o nosso proposito expor a theoria <strong>da</strong> pro-<br />

tecçáio e irispecção suprema, emquanto á socie<strong>da</strong><strong>de</strong> ecclesiastica, a<br />

theoria <strong>do</strong> jus circa sacra.<br />

Sercbmos mui brevcs, porque bem conhecemos quanto fastidiosa<br />

sclrtí a leitura d'estes singulares systemas, escolasticos e como que<br />

theatraes; muito especialmente quan<strong>do</strong> hoje estamos acostuma<strong>do</strong>s<br />

á leitura encanta<strong>do</strong>ra <strong>do</strong>s publicistas e philosophos mo<strong>de</strong>rnos, lei-<br />

tura não secca e ari<strong>da</strong> como csta, mas enthusiastica e gran<strong>de</strong>.<br />

Fun<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-se na auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> biblia, nos livros <strong>da</strong> sabe<strong>do</strong>ria<br />

e <strong>do</strong>s proverbios e nas epistolas <strong>de</strong> Paulo, e citan<strong>do</strong> ao jesuita<br />

Soares no tracta<strong>do</strong> <strong>da</strong>s leis, ou a Scoto no tracta<strong>do</strong> <strong>da</strong> justiça, era<br />

<strong>do</strong>gma que s6 havia <strong>do</strong>is imperantes sem superior na terra, cujo<br />

supremo imperio recebiam primaria, directa c immediatamente <strong>de</strong><br />

Deus; um sobre as cousas temporaes-o rei, outro sobre as<br />

espirituaes - o papa.<br />

O po<strong>de</strong>r supremo era a reunião <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> majestaticos, em<br />

cujo exercicio o imperante não tinha por norma senão o fim <strong>da</strong><br />

socie<strong>da</strong><strong>de</strong>; a sua vonta<strong>de</strong>, diziam com Arniseo no tracta<strong>do</strong> De<br />

jure nlajestatico, é a lei viva e anima<strong>da</strong> sobre o mun<strong>do</strong>.<br />

Comtu<strong>do</strong> esta vonta<strong>de</strong> não podia <strong>de</strong>sa<strong>do</strong>rnar o summo imperante<br />

<strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> majestaticos, os quaes eram inabdicaveis, e, ain<strong>da</strong> que<br />

expressamente os separasse <strong>de</strong> si, ou transferisse, era ndlo tu<strong>do</strong><br />

o que nesse senti<strong>do</strong> fizesse. Os D.D., len<strong>do</strong> certo texto <strong>da</strong>s<br />

dccretaes, explicavam isto simplesmente. $ porque, diziam, esses<br />

<strong>direitos</strong> são a essencia <strong>da</strong> majesta<strong>de</strong> rrgia; ipso manente rege, não<br />

pó<strong>de</strong> alienal-os; em outros termos, seria ameaça<strong>da</strong> a socie<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />

pois guc ficaria iim corpo sein cabeça, contra o texto <strong>do</strong> Cap.<br />

cunt noii liceat, <strong>de</strong> praescrip. respectiva.<br />

Vinha logo d'aqui uma valiosa consequencia: é que sustentavam


que o papa <strong>de</strong>via perservar os <strong>direitos</strong> <strong>do</strong>s reis, como escreveu<br />

por exemplo Phebo, 2." parte, <strong>de</strong>c. 2 14, n.' 27 ; e d'ahi os preceitos<br />

canonicos relaxavam-se por causa <strong>da</strong>s prerogativas <strong>do</strong>s reis.<br />

O po<strong>de</strong>r real era pois pleno e supremo; o que <strong>de</strong>cidia a von-<br />

ta<strong>de</strong> regia, <strong>de</strong>cidia-se <strong>de</strong> sciencia certa, á similhança <strong>do</strong>s pontifices.<br />

Dividiam os <strong>direitos</strong> majestaticos em varios capitulos, e, <strong>de</strong>pois<br />

dc dizerem que o primeiro oficio <strong>do</strong> imperante era o direito le-<br />

gislativo, afirmavam gratuitamente que, para ter este direito, o<br />

imperante não podia passar sem o direito <strong>de</strong> inspecção, segun<strong>do</strong><br />

artigo <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> <strong>do</strong> summo imperio.<br />

«Consiste este direito, diz Coelho <strong>de</strong> Sampaio, na auctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

e obrigação <strong>de</strong> vigiar e consi<strong>de</strong>rar attentamente sobre to<strong>da</strong>s as<br />

pessoas, cousas e negocios comprehendi<strong>do</strong>s nos recintos <strong>do</strong> Es-<br />

ta<strong>do</strong>.» 1<br />

Eis aqui o po<strong>de</strong>r absoluto cm to<strong>da</strong> a sua manifestaç3o.<br />

Para n8o esquecer cousa alguma, começavam os propugiia<strong>do</strong>res<br />

d'estas theorias, <strong>de</strong>pois d'estas <strong>de</strong>finiçõer, a classificar e fazer dis-<br />

tincçbes <strong>de</strong> pessoas moraes e physicas, att': que chegavam !i tlis-<br />

tincçáo <strong>de</strong> pessoas seculares e ecclesiasticas; e assim fun<strong>da</strong>vam o<br />

direito <strong>de</strong> inspecção sobre a egreja, o qual appelli<strong>da</strong>vam <strong>de</strong> jus<br />

circa sacra, e se estendia á egreja,.pessoas e cousas ecclesiasticas.<br />

Como sustentavam a in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia <strong>do</strong>s po<strong>de</strong>res espiritual e tem-<br />

poral, e lhe era indispcnsavol mostrar <strong>de</strong> algum mo<strong>do</strong> a sujeição<br />

<strong>da</strong> egreja no esta<strong>do</strong>, usavam <strong>do</strong> seguinte raciocinip pueril:<br />

Os membros <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> ou republica ccclesiastica s30 mcm-<br />

hros <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> ou republica politica e civil; por isto sr iiiicbin<br />

dc tal sorte, pelo vinculo <strong>da</strong> cari<strong>da</strong><strong>de</strong> e communhão <strong>da</strong> f6 <strong>de</strong><br />

Christo com a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> ecclesiastica, que vem a constituir uma<br />

republica christã, composta <strong>de</strong> ambas as republicast.<br />

1 Coelho <strong>de</strong> Sonsa e Sampaio, Prelecgiies <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Patrio publico e par-<br />

ticular, 1793, § Lxvirr, P. rr tit. v.<br />

2 Estas theorias eram tão pomposamente apresenta<strong>da</strong>s, que nas cousas mais<br />

insignificantes se ren<strong>de</strong> ain<strong>da</strong> hoje a conta em qiie, pelo menos officinlmente,<br />

eram ti<strong>da</strong>s.<br />

0 exemplar <strong>da</strong> obra <strong>de</strong> Coelho <strong>de</strong> Sampaio, qiie temos ao pB <strong>de</strong> n6s quan<strong>do</strong><br />

escrevemos, 8 <strong>da</strong>s melhores ediç0es que no fim <strong>do</strong> seculo passa<strong>do</strong> se faziam<br />

entre nós; e as folhas sobre a aresta sFio <strong>do</strong>ura<strong>da</strong>s como as <strong>de</strong> um livro mys-<br />

tico <strong>de</strong> oraçiies.<br />

H:r um pequeno folheto d'este auctor, qiic an<strong>da</strong> incorpora<strong>do</strong> 4s suas obras,<br />

on<strong>de</strong> rebate os arguinentos com que j& se atacavarn pstas cousas ridiculas,<br />

e emque elle <strong>de</strong>sinvolve a theoria <strong>do</strong> direito divino. E mais curioso <strong>do</strong> q1lc


Não era preciso mais; aqui estavam to<strong>do</strong>s os principios <strong>da</strong> protecçáo<br />

e inspecç80. D'esta, que chamavam ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, <strong>de</strong>duziam<br />

ell~ tres principios: 1 .O que os <strong>direitos</strong> <strong>do</strong> imperio, nào obstante<br />

a a<strong>do</strong>pqáo <strong>do</strong> christianismo, se conservavam illesos, 2." que os imperantes<br />

sc constitiiiam na precisa e nova obrigaçào <strong>de</strong> proteger<br />

a cgre.ja c*atholica (10 seu esta<strong>do</strong>, 3." (agora aqiii 6 que nào comprelicn<strong>de</strong>mos)<br />

que era consequencia d'esses <strong>do</strong>is principios, que ao<br />

impera<strong>do</strong>r christáo viessem a pertencer-lhe a respeito <strong>da</strong> egreja, <strong>do</strong><br />

seu esta<strong>do</strong>, <strong>da</strong>s pessoas e cousas ecclesiasticas os <strong>direitos</strong> <strong>de</strong> inspecção<br />

como impera<strong>do</strong>r e como protector.<br />

Tu<strong>do</strong> isto era fun<strong>da</strong>menta<strong>do</strong> com exemplos <strong>do</strong>s codigos Justinianeo<br />

e Ttieo<strong>do</strong>siano, auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s glossas e rcscriptos <strong>do</strong>s<br />

impera<strong>do</strong>res 4.<br />

O celebre Pedro <strong>de</strong> Marca concorrêra efficazmente para <strong>da</strong>r<br />

vi<strong>da</strong> n estas theorias; elle, Eybcl e Iticger, c o mesmo Antonio<br />

Pereira <strong>de</strong> Figueirc<strong>do</strong>, eram os canonistas favoritos <strong>do</strong>s nossos<br />

escriptores.<br />

Antes e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> D. José, e até hojc, a Irgislii~.ào, a jurisprii<strong>de</strong>ricia,<br />

a scieiicia nl~raçaram estas id&s cscoliisLicas.<br />

Alguns d'rsles pi.iiicipios, que corn o direito rornario sc tililiam iiitroduzi<strong>do</strong><br />

nas ordcriayòcs <strong>do</strong> rciiio, szo agora pelos commciita<strong>do</strong>res<br />

interpretatlos e <strong>de</strong>siri\ol~i<strong>do</strong>s rio senti<strong>do</strong> <strong>da</strong>s theorias <strong>do</strong><br />

siimmo imperio. A jurisprii<strong>de</strong>iicia, que nestc secnlo xvrir 6 fecun<strong>da</strong><br />

e ~oluniosa, como sempre o tc>m si<strong>do</strong> na epocha que segue<br />

uma codificayào, c que se approxiilia dc uma nova, crescc sob<br />

este influxo.<br />

Para nos convencermos d'isto, basta folhear as compilaçfies <strong>de</strong><br />

arestos e <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong>s nossos praxistas; como, por exemplo, as dc<br />

to<strong>da</strong>s as outras, e mais <strong>de</strong> uma vez faz rir com sua affecta<strong>da</strong> gravi<strong>da</strong><strong>de</strong> e<br />

sublimi<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

E noternos qiie,. quan<strong>do</strong> isto se escrevia, j& o livro <strong>de</strong> Rousaeau corria<br />

pelas mãos <strong>de</strong> muitos, que o <strong>de</strong>voravam com avi<strong>de</strong>z; c emiluaiito se explicavam<br />

nas ca<strong>de</strong>iras <strong>da</strong> universi<strong>da</strong><strong>de</strong> as paginas <strong>da</strong>s prelecções <strong>de</strong> Co~llio <strong>de</strong><br />

Sampaio, os estu<strong>da</strong>ntes li~m o Contracto social, que, <strong>de</strong>baixo <strong>da</strong> fbrma <strong>de</strong><br />

peqiieninos livros, se espalhara pela moci<strong>da</strong><strong>de</strong>, que escondi<strong>do</strong> o trazia co!nsigo,<br />

e se apaixonava pelas palavras immorre<strong>do</strong>uras que se lêem, na prirneira<br />

pagina <strong>da</strong> celebre obra - L'homme est ni libre et parfout i1 est duns les fero.<br />

1 Chegou a tal excesso esta mania dc cesarismo, que nas obras d6s nossos<br />

auctores se <strong>de</strong>para com este ridiciilo mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> dizer, falan<strong>do</strong> a respeito <strong>do</strong>s<br />

reis - O8 nosooo Augastos têm usa<strong>do</strong> oempre ... O Augusto tem inconteotavel<br />

direito.


Phebo, Gama e Cabe<strong>do</strong>; e percorrer as paginas <strong>do</strong>s commenta-<br />

<strong>do</strong>res <strong>do</strong> livro segun<strong>do</strong> <strong>da</strong>s Or<strong>de</strong>nações e dc alguns titulos <strong>do</strong>s<br />

livros primeiro e terceiro.<br />

Ha tracta<strong>do</strong>s especiaes d'estes <strong>direitos</strong>, como são o <strong>de</strong> Osorio<br />

De patronatu resolut., o <strong>de</strong> Gabriel Pereira <strong>de</strong> Castro De manu<br />

Regia. o <strong>de</strong> Portugal De <strong>do</strong>nalionibus, o <strong>de</strong> Lima Leit'io Dis-<br />

curso dpologetico e critico e essa celebre Deducção Chronologica,<br />

base <strong>de</strong> tantas reformas <strong>de</strong> Pombal.<br />

As obras <strong>de</strong> alguns professores <strong>da</strong> universi<strong>da</strong><strong>de</strong>, como a já ci-<br />

ta<strong>da</strong> <strong>de</strong> Coelho <strong>de</strong> Sampaio, avigoram <strong>de</strong>baixo d'este espirito, e<br />

neste estabelecimento litterario assim se man<strong>da</strong>va ensinar to<strong>da</strong> esta<br />

theoria, vivo fun<strong>da</strong>mento <strong>de</strong> uma instituição, cuja hora <strong>de</strong>rra-<br />

<strong>de</strong>ira jh o mun<strong>do</strong> ouvira soar por estes tempos 1.<br />

Eis a raz8o por que as bibliothecas estão cheias d'esses livros,<br />

que ninguem hoje 14 e <strong>de</strong> que se zomba, porventura com justo mo-<br />

tivo, poisque, á parte o interesse limita<strong>do</strong> e fugitivo <strong>de</strong> um ou outro<br />

ponto <strong>da</strong> jurispru<strong>de</strong>ncia civil, que no meio d'clles se encontra,<br />

1 Veja-se o livro <strong>de</strong> José Verissimo Alvares <strong>da</strong> Silva - 6tfroducção ao<br />

Novo Caliyo ou Dissertação critica sobre a principal causa <strong>da</strong> obscuri<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>do</strong> nosso Codigo nufhentico; especialmente a pag. 58 e seguintes.<br />

Os Estatutoa <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> no Liv. 2.0, tit. 3.O, cap. rrr, 58 8, 11 e 12,<br />

man<strong>da</strong>vam ao professor o seguinte :<br />

8 8 Das formas <strong>da</strong>s republicas e <strong>da</strong> naturczci <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> civil <strong>de</strong>duzir&<br />

08 officios e <strong>direitos</strong>, que compet~rn tios soberanos, conheci<strong>do</strong>s e indica<strong>do</strong>s<br />

pelo nome <strong>de</strong> <strong>Direito</strong>s <strong>da</strong> Mugesta<strong>de</strong>, cuja instrucçlo e <strong>do</strong>utrina .é o princi-<br />

pal objecto <strong>do</strong> direito publico iiniv~rsal.*><br />

$15 11 Sobre os officios e <strong>direitos</strong> <strong>do</strong> eummo imperio civil a regpeito <strong>da</strong>s<br />

cousas sagra<strong>da</strong>s e negocios <strong>da</strong> religião, se <strong>de</strong>ter8 um pouco mais, <strong>do</strong> que<br />

sobre alguns outros artigos, por ser este nPo rnerios importante qucx ~1elic:iiIo.<br />

li: <strong>da</strong>r4 tambem a coiihec~r a legitima e indispensavel iiispecçlo c :~utliori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

que tem o summo imperio temporal sobre a admitiistraç80 exterior <strong>da</strong><br />

egreja e aobre o exercicio <strong>da</strong>s coiisas sagra<strong>da</strong>s, para vigiar e impedir que<br />

d'alii não venha mal ao esta<strong>do</strong> e para eineu<strong>da</strong>r e acautelar o que llie tiver<br />

jfi resulta<strong>do</strong>..<br />

12 Mostrará o influxo que po<strong>de</strong>m ter os soberanos sobre oe negocios,<br />

assernbleias e outras fuiicç0es <strong>da</strong> religiào, assim emquauto aos maaistra<strong>do</strong>s<br />

politicos como na quali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> principes christiios, protectores, advog<strong>do</strong>s e<br />

<strong>de</strong>fciimres <strong>da</strong> religião e <strong>da</strong> egreja. E fark ver que os justos limites <strong>do</strong> mesmo<br />

indispensavel summo imperio influxo é a reciproca harmonia e inutuo soccorro<br />

que <strong>de</strong>ve sempre haver entre o sacer<strong>do</strong>cio e o imperio.<br />

Confrontan<strong>do</strong> to<strong>da</strong>s as suas <strong>de</strong>ducç0es com a revelagjio que lhe servir0<br />

<strong>de</strong> criterio e que ter6 sempre'<strong>de</strong>ante <strong>do</strong>s olhos para n8o errar com a <strong>do</strong>utrina<br />

<strong>do</strong>a sanctos padres, <strong>do</strong>s concilioa e <strong>do</strong>s ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros canones e tambem com<br />

a disciplina antiga <strong>da</strong> egreja..<br />

Descobre-se bem a influencia <strong>da</strong> obra <strong>de</strong> Pedro <strong>de</strong> Marca e <strong>da</strong> rcacçiio<br />

gallicana em to<strong>do</strong>s estes textos curiosos.


seus reinos, povos e vassallos d'elles, que recebeu immediatamente<br />

<strong>de</strong> Deus '; -que em tu<strong>do</strong> isto tinham por base o <strong>do</strong>gma <strong>do</strong> chris-<br />

tianismo; - que, como protectores <strong>da</strong> egreja, <strong>de</strong>viam conservar<br />

illeso o <strong>de</strong>posito <strong>da</strong> f6 nos seus reinos e prcserval-os <strong>do</strong> mortifcro<br />

contagio e <strong>do</strong>s funcstissimos estragos em que o espirito <strong>da</strong> irreli-<br />

gião os procurava precipitar 2; -que era indispensavel e legitima<br />

a inspecção e auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> summo imperio temporal sobre a ad-<br />

ministraç80 exterior <strong>da</strong> egre-ja e exercicio <strong>da</strong>s cousas sagra<strong>da</strong>s<br />

para impedir o mal que d'ahi po<strong>de</strong>sse vir ao esta<strong>do</strong> e remediar o<br />

que já estivesse feito ; 3 - que era obrigação <strong>do</strong>s priricipes zelar<br />

pelas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja 4.<br />

Tal era a ultima expressão <strong>do</strong> summo imperio a respeito <strong>do</strong><br />

jus circa sacra.<br />

Vê-se bem distinctamente como, rio meio d'este jogo <strong>de</strong> pala-<br />

1 Carta <strong>de</strong> lei <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1774.<br />

A Carta <strong>de</strong> lei <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zetnbro <strong>de</strong> 1671, tractan<strong>do</strong> <strong>de</strong> algumas duvi<strong>da</strong>s<br />

levanta<strong>da</strong>s Acerca <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> <strong>do</strong>s aritigamerite chama<strong>do</strong>s christãos ~iovos. e<br />

man<strong>da</strong>n<strong>do</strong> interpretar certas <strong>de</strong>cretaes <strong>da</strong> maneira que lhe aprazia, diz: E<br />

porque como Rei, e Seuhor Soberano, que na temporali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> Igreja e cariones<br />

Sagra<strong>do</strong>s rios ALcus Reiiios e Dominios nBo reconhece na Terra Superior:<br />

Como Protector <strong>da</strong> Igreja e caiiories Sagra<strong>do</strong>s nos meus reirios e <strong>do</strong>rniiiios<br />

para os fazer conqrrx ar iia sua pureza ........ Como Supremo inagistra<strong>do</strong><br />

para manter a trancluilli<strong>da</strong><strong>de</strong> publica <strong>da</strong> nossa Igreja r Regios Doininios ....<br />

E usan<strong>do</strong> ao rnesrrio teriipo <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o Pleno e Supremo Po<strong>de</strong>r qrie nas sobreditas<br />

materias <strong>da</strong> inariuten$ão <strong>da</strong> traiiquilli<strong>da</strong><strong>de</strong> publica <strong>da</strong> Igreja c meus<br />

Reinos e Povos e Vnssailos d'elles, recebi imrnedi:itameiite <strong>de</strong> Deus 'ro<strong>do</strong> Po<strong>de</strong>roso:<br />

Quero, Man<strong>do</strong>, Or<strong>de</strong>tio e é Minha Vonta<strong>de</strong> que se observe.. ..... 8<br />

2 Provisão <strong>de</strong> 5 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1775.<br />

Para se ver como o esta<strong>do</strong> se servia <strong>da</strong> egreja para os seus interesses politieos,<br />

transcrevernos esta parte <strong>da</strong> celebre Provisão <strong>de</strong> 6 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zeinhro:<br />

.Que sen<strong>do</strong>, diz, um <strong>do</strong>s principaes objectos <strong>da</strong> minha vigi1:iiicia a fclici<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

cterna e temporal <strong>do</strong>s meus Vaseallos, a qual, ten<strong>do</strong> por base firmo o<br />

<strong>do</strong>gma <strong>do</strong> christianisnio, muitas vezes tem si<strong>do</strong> ataca<strong>da</strong> pelo furor <strong>de</strong> hurna<br />

facpão criminosa <strong>de</strong> homens, que, <strong>de</strong>baixo <strong>do</strong> pomposo titulo <strong>de</strong> Espiritos fortes,<br />

se hão levarita<strong>do</strong> como mestres <strong>do</strong> Genero Hornano, preten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> extiuguir<br />

a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira crença e fazer tomar aos filhos <strong>da</strong> egieja outro caminho<br />

muito alheio d'aquelle que o filho <strong>de</strong> Deus abriu no mun<strong>do</strong>, instituin<strong>do</strong> por<br />

este meio tão aboiniiiavel uma religilo que lhe autorine os crimes <strong>de</strong> suas<br />

vonta<strong>de</strong>s perverti<strong>da</strong>s, espalhan<strong>do</strong> para isto livros cheios <strong>de</strong> maxitnss perniciosas<br />

dirigi<strong>da</strong>s B <strong>de</strong>struiçiio <strong>do</strong>s altares e <strong>do</strong>s thronos e a fazer odiosos os<br />

<strong>do</strong>us Summos Po<strong>de</strong>res que Deos or<strong>de</strong>nou para governar os Homens .....<br />

Con<strong>de</strong>mna o livro <strong>de</strong> Elvecio, Le wai seiis du système <strong>de</strong> la nature, chaman<strong>do</strong><br />

philosopho libertino ao seu auctor e maii<strong>da</strong>n<strong>do</strong> lacerar e queimar com<br />

prega0 na Praça <strong>do</strong> Pelourinho pelo Executor <strong>da</strong> Alta Justip o referi<strong>do</strong> li-<br />

vro: O aue teve loear no dia 22 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro d'eeee anno.<br />

3 ~siatutos, livu2.0, tit. 13.0, cap. 3.0, 8 11.<br />

4 Estatutos, liv. 2.0, tit. 4.*, cap. 2.0; Carta <strong>de</strong> Lei <strong>de</strong> 2 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1768.


vras e <strong>de</strong> theorias sem fun<strong>da</strong>mento na reali<strong>da</strong><strong>de</strong>, qualquer preten*<br />

são <strong>da</strong> eçreja, que <strong>de</strong>sagra<strong>da</strong>sse ao esta<strong>do</strong>, podia, scm o esta<strong>do</strong><br />

parecer ferir os <strong>direitos</strong> d'ella, oppor-se-lhe efficazmentcl e <strong>de</strong>movel-as.<br />

O principe appellava para a protec~ão <strong>do</strong>s canones, para a protecçào<br />

<strong>de</strong>vi<strong>da</strong> aos viissallos, para a ortlcm publica <strong>da</strong> ryeja e <strong>da</strong><br />

socie<strong>da</strong><strong>de</strong> civil, usava <strong>do</strong> beneplacito, como antigo privilegio <strong>da</strong><br />

coroa, e tu<strong>do</strong> se conseguia.<br />

I?- claro que, <strong>de</strong>baixo d'esta legislação, o direito ecclesiastico,<br />

quanto á creaçào, <strong>de</strong>smembrayão e suppressão <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, tinha<br />

iriteiramente perdi<strong>do</strong> aquella vaga incerteza,-que lhe vimos guar<strong>da</strong>r<br />

no capitulo antece<strong>de</strong>nte; e comtu<strong>do</strong> eram ain<strong>da</strong> os monar~has que<br />

sollicitavam <strong>da</strong> sancta sé essas graças. Bem se <strong>de</strong>ixa ver porem que,<br />

se sem a iritervenyão e corisulta <strong>do</strong>s reis se preten<strong>de</strong>sse qualquer<br />

alteração <strong>da</strong> divisõo ecclesiastica e <strong>do</strong> numero <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, e fosse<br />

isto <strong>de</strong>sagra<strong>da</strong>vel aos interesses, ou politicos ou religiosos, <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>,<br />

to<strong>da</strong>s essas pretensòes seriam improficuas e bal<strong>da</strong><strong>da</strong>s. Cá<br />

rstakam as portas falsas e estas armadilhas, com saricto aspecto,<br />

<strong>do</strong> summo imperio, que não reconhecia superior na terra e que<br />

acabava <strong>de</strong> <strong>de</strong>bellar a inccrtcza <strong>do</strong> direito portiigurz, drclaran<strong>do</strong><br />

subrepticia a introducção <strong>da</strong> bulia <strong>da</strong> C6a e toman<strong>do</strong> to<strong>da</strong>s essas<br />

medi<strong>da</strong>s energicas, que vimos acima.<br />

Para se ver a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> e rcputa~ao que esta theorin ganhoii,<br />

bastar8 dizer que, rio começo d'este seculo, se sustentava e escrevia<br />

que ao principe assistia o direito <strong>de</strong> inverter a disciplina <strong>da</strong><br />

nomeação <strong>do</strong>s bispos; e que, sem assentimento <strong>da</strong> egreja, só usan<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong>s <strong>direitos</strong>, que a quali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>fensor e advoga<strong>do</strong> <strong>da</strong> egrrja e<br />

protector <strong>do</strong>s cariones lhe conferiam, elle podia estabelecer a eleição<br />

<strong>do</strong>s bispos pelo cabi<strong>do</strong>, prece<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o regio assenso á sagraçào,<br />

embora não consentisse na confirmação a curia romana.<br />

E sabeis como se <strong>de</strong>fendia esta opinião?<br />

Dizia-se que 1180 era mister ((escogitar subtis argumentos para<br />

conrjencer uina ver<strong>da</strong><strong>de</strong> já <strong>de</strong>cidi<strong>da</strong>, ha tantos seculos»; que quem<br />

duvi<strong>da</strong>sse d'esta auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> inherente ao irnperio, sustentaria um<br />

para<strong>do</strong>xo, que foi causa <strong>de</strong> muitos males ; - que o monarcha ficaria<br />

inliibi<strong>do</strong> <strong>de</strong> manter o contracto, que fizera com a egreja, <strong>de</strong> a<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r <strong>do</strong>s males que a atacassem, ain<strong>da</strong> quan<strong>do</strong> esses males<br />

partissem <strong>de</strong> seus proprios ministros; e finalmente que ((seria necessario<br />

dizer que o brilhante e pomposo tilulo <strong>de</strong> protector <strong>do</strong>s<br />

12


canones, Guar<strong>da</strong>, Propugna<strong>do</strong>r c Defensor <strong>da</strong>s Igrejas, annexo<br />

ao principa<strong>do</strong> <strong>do</strong> seculo, era uma sombra tüi e uma qrcirrtera in-<br />

venta<strong>da</strong> para illudir.4 D<br />

Ultimamerite, Sorges Carneiro, escreven<strong>do</strong> em 1826 c offrre-<br />

ceri<strong>do</strong> a D. Pedro ~v o seu Direi10 Civil <strong>de</strong> Portugal, rcsriscitava<br />

a mesma <strong>do</strong>utrina <strong>da</strong> protecçâo e inspecçzo <strong>da</strong> egrcja pelo estatlo;<br />

e, fazen<strong>do</strong> a enumeração <strong>do</strong>s officios <strong>do</strong> principe, 'neste capitulo,<br />

aos que acima <strong>de</strong>ixamos indica<strong>do</strong>s accrcscenta, <strong>de</strong>duzi<strong>do</strong>s <strong>do</strong> me-<br />

smo principio, os <strong>direitos</strong> <strong>de</strong> castigar os clerigos, limitar o numero<br />

<strong>do</strong>s or<strong>de</strong>na<strong>do</strong>s, promover a soli<strong>da</strong> instrucçno <strong>do</strong> clero e limitar os<br />

po<strong>de</strong>res <strong>do</strong>s lega<strong>do</strong>s <strong>do</strong> papae.<br />

É preciso notar que nem to<strong>do</strong>s os canonistas acceitaram estes<br />

excessos, e alguns mesmo n7io receberam a legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> pro-<br />

prio jus cima sacra 3.<br />

'Neste espaço <strong>de</strong> tempo e <strong>de</strong>baixo <strong>do</strong> vigor d'eritas idhas, foram<br />

crectos durante o reina<strong>do</strong> <strong>de</strong> U. Jose os seguintes bispa<strong>do</strong>s: - o<br />

<strong>de</strong> Penafiel, por bulla <strong>de</strong> Clcmente xiv, <strong>de</strong> 10 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1770;<br />

o <strong>de</strong> Bragança, pela Carta Regia <strong>de</strong> 17 <strong>de</strong> Setembro <strong>de</strong> 1764, qiie<br />

para ahi mudára a cathedral <strong>de</strong> Mirandn; -o <strong>de</strong> Pinliel, por 1~1ilIíi<br />

<strong>de</strong> Clemente xiv, dc 10 <strong>de</strong> jullio <strong>de</strong> 1770; -o <strong>de</strong> Castcllo-Branco,<br />

por bulla <strong>do</strong> mesmo pontifice, <strong>de</strong> 1 Ei <strong>do</strong> junho <strong>de</strong> 177 1 ;-o <strong>de</strong><br />

Aveiro, pela bulla <strong>de</strong> 12 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1774, <strong>do</strong> mesmo pipa4<br />

1 Veja O Inveati,garlor portuguez em Inglaterra- Jornal litterario, politico,<br />

etc. - Abril 1817, pag, 151.<br />

<strong>Direito</strong> civil <strong>de</strong> l>orfugal, L. 1, tit. vi, § 60, n.O 1 a 9, 1826.<br />

& airi<strong>da</strong> o Eybel e o Rieger e Cavallario que constituem ~uctori<strong>da</strong><strong>de</strong> 'iieste<br />

ohjccto. - Veja tambein <strong>Direito</strong> Ecclesiastico Portupez <strong>de</strong> Beriiardiiio Car-<br />

neiro- Iiitrodue. 11.0 rir.<br />

3 Zallinger,.por exemplo: Imt. Jur. Eocles. cap. 11.<br />

Ern eoutrario veja Pedro <strong>de</strong> Marca, Concordiu Sacerd. et Imp. lib. rv<br />

cap. x e xiri.<br />

4 O alvará <strong>de</strong> 17 <strong>de</strong> Rfaio <strong>de</strong> 1770,eriqin<strong>do</strong> a villas <strong>de</strong> Beja e Penafiel em<br />

ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, para dignamente serem sé<strong>de</strong>s <strong>de</strong> novas cathedraes, exprimia-se assiiri:<br />

#Fiz supplicar ao Saiicto Padre Cleineiite xrv, ora presi<strong>de</strong>nte ria iinivclr-<br />

sal egreja <strong>de</strong> Deus, que com aqiirllas pias e urgeutes causas haja por beiii<br />

conce<strong>de</strong>r to<strong>da</strong>s as necessarias faciil<strong>da</strong><strong>de</strong>s para que <strong>do</strong> territorio <strong>do</strong> aobrc>dito<br />

bispa<strong>do</strong> <strong>do</strong> I'orto se <strong>de</strong>srnembre a comarca <strong>de</strong> Penofiel <strong>de</strong> Souea e seja i~elle<br />

erigi<strong>do</strong> um novo bispa<strong>do</strong> ...... u<br />

Vê-se pois, qne no ineio <strong>de</strong> to<strong>do</strong> este apparato <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> magestaticos,<br />

emquanto pelo meiios a srrncta s6 se n&ù recusara, se recouliecia o i.~u iii-<br />

violrivel direito 'iieste artigo <strong>do</strong> goveriio <strong>da</strong> egreja.<br />

O inesmo dizer guar<strong>da</strong> o Alvarh <strong>de</strong> 25 <strong>de</strong> Agosto <strong>de</strong> 1770 qiiaiito A erecpào<br />

em ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> villa <strong>de</strong> Pinhel para neg~ial etfeito.


e ain<strong>da</strong> o <strong>de</strong> Villa Nova <strong>de</strong> Portimào, o qual n3o chegou a ser<br />

provi<strong>do</strong>.<br />

tlEm tempo <strong>de</strong> 1). Maria I a bulla-fiomanus Pontifex,-<strong>de</strong> 27<br />

<strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1780, <strong>de</strong> Pio vi, supprimiu o <strong>de</strong> bliraii<strong>da</strong>, que uniu<br />

ao <strong>de</strong> Uragaiic;~. 'fieste mcsmo reina<strong>do</strong> se supprimiu eguillmente,<br />

por bulla <strong>de</strong> Pio VI, <strong>de</strong> 11 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1778, o bispah <strong>de</strong><br />

Penafiel.<br />

Tas foram as alteraçbes por que entre n6s tem passa<strong>do</strong> a organisação<br />

<strong>do</strong> episcopa<strong>do</strong> <strong>da</strong> egreja portugueza, ate o perio<strong>do</strong> <strong>da</strong> mu<strong>da</strong>nça<br />

na forma <strong>do</strong> governo,<br />

Um rapi<strong>do</strong> olhar, lança<strong>do</strong> sobre este esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> egreja portugueza,<br />

basta para iios<strong>de</strong>ixar coriveiici<strong>do</strong> <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> uma reforma, pois<br />

que riao serh <strong>de</strong> facil iiituiçào compreheri<strong>de</strong>r os motivos, que pe<strong>de</strong>m<br />

tão gran<strong>de</strong> iiumero <strong>de</strong> cathedraes em meio <strong>de</strong> tào mingua<strong>do</strong> povo.<br />

Quan<strong>do</strong> com o systema liberal começou o nosso <strong>de</strong>siiivolvimento<br />

material e moral, surgiram novas e urgentes iiccessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, e com<br />

o concurso <strong>de</strong> variadissirnas circumstaiicias appareceu o rnau esta<strong>do</strong><br />

<strong>da</strong> fazen<strong>da</strong> publica; a reforma <strong>da</strong> circiimscripçiio ecclcsiastica e <strong>da</strong><br />

reducçáo <strong>da</strong>s dioceses foi objecto <strong>do</strong>s cui<strong>da</strong><strong>do</strong>s assiduos <strong>de</strong> quasi<br />

to<strong>do</strong>s os nossos miriistros <strong>do</strong>s negocios ecclesiasticos.<br />

em 1833 a jurita <strong>do</strong> exame <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> actual e mclhormento<br />

temporal <strong>da</strong>s or<strong>de</strong>ns religiosas propoz em corisulta a reducção <strong>da</strong>s<br />

dioccscs <strong>do</strong> reino a oito, uma diocese por provincia.<br />

Iriterrompi<strong>da</strong>s as rel~çòcs com a curia romana, apenas em 1843,<br />

<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> restabeleci<strong>da</strong>s, 6 que a Lei <strong>de</strong> 29 <strong>de</strong> maio, rio art. li.',<br />

auctorisou o governo a reduzir a 18, prece<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o indispensavel<br />

concurso <strong>da</strong> santa sé, as dioceses <strong>do</strong> coritiiieiite, illiiis adjacentes e<br />

ultramar; e no art. 9.' egualmeute lhe coiifere po<strong>de</strong>res para, em<br />

Iiarrnuiiia coiii a mesma sé, proce<strong>de</strong>r ao novo e mais acerta<strong>do</strong> arre<strong>do</strong>ii<strong>da</strong>mento<br />

<strong>da</strong> divisào territorial ecclesiastica.<br />

As dilticiil<strong>da</strong><strong>de</strong>s, que se levautararn erii as negociaçòes com a<br />

curia romaria, foram eutào a causa <strong>de</strong> se não po<strong>de</strong>rem executar<br />

estes artigos <strong>da</strong> lei <strong>de</strong> 1843.<br />

Cliega a epoclia <strong>de</strong> lW3, epocha iiotavel e gloriosa a muitos<br />

respeitos ria historia contemporanea <strong>do</strong> iiosso tempo; e Pio ir succe<strong>de</strong><br />

a Grcgorio xvi, captivaii<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong> liberal por seus primeiros<br />

actos iio i~oritifica<strong>do</strong>. Tentam-se novos erisaios <strong>de</strong> accor<strong>do</strong>,<br />

e obtem-se a firial o corivciiio <strong>de</strong> 21 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1848, e por elle<br />

o metropolita csçollic vigwios geraes que nos bispa<strong>do</strong>s dç Yorta-


legre, Aveiro, Pinhel c Castello-Branco regem interinamente, e<br />

em logar <strong>do</strong>s bispos, a diocese.<br />

Era isto sómente um esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> interini<strong>da</strong><strong>de</strong>, e em 18130 offere-<br />

ce-se um projecto em 28 <strong>de</strong> fevereiro, o qual náo chega a ser Iri.<br />

Tres annos <strong>de</strong>pois a Lei <strong>de</strong> 3 <strong>de</strong> agosto rcnova as auctorisações<br />

conferi<strong>da</strong>s ao goverrio pela lei <strong>de</strong> 1843, <strong>de</strong>claran<strong>do</strong> que fin<strong>da</strong>vam<br />

na legislatura <strong>de</strong> 1844, na qual o governo era obriga<strong>do</strong> a <strong>da</strong>r<br />

conta <strong>do</strong> uso que d'ellas fizesse.<br />

Depois <strong>de</strong> outro projecto apresenta<strong>do</strong> em 3 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 185'1,<br />

e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> se tractar <strong>da</strong> união <strong>do</strong> bispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Aveiro ao <strong>de</strong> Coiin-<br />

bra e <strong>do</strong> <strong>de</strong> Elvas a Portalegre, apparece finalmente o Decreto <strong>de</strong><br />

12 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1869, hoje em vigor.<br />

O ministro pon<strong>de</strong>rára a incoherencia <strong>da</strong> <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>na<strong>da</strong> divisão ter-<br />

ritorial ecclesiastica, pezára o esta<strong>do</strong> augustioso <strong>da</strong> fazen<strong>da</strong> publica<br />

que não permittia, em 16 bispa<strong>do</strong>s ,515 no continente, satisfazer, na<br />

medi<strong>da</strong> precisa a ca<strong>da</strong> um, a <strong>do</strong>tação necessaria á sustentação <strong>de</strong>-<br />

cente e vantajosa <strong>do</strong>s seminarios, <strong>do</strong>s cabi<strong>do</strong>s e fabrica <strong>da</strong> cnthe-<br />

dral; vira bem claro que assim náo lucrava a egreja, porqiie ncrn<br />

o episcopa<strong>do</strong> era mariti<strong>do</strong> na elevação e lustre <strong>de</strong> que carecia, iicbrri<br />

o crisirio mal organisa<strong>do</strong> <strong>do</strong>s seminarios seria porveitoso ; e que<br />

não podia, por outro la<strong>do</strong>, o esta<strong>do</strong> <strong>de</strong>ixar assim aban<strong>do</strong>na<strong>da</strong> a<br />

egreja a quem <strong>de</strong>via a rigorosa e plena <strong>do</strong>tação ; -consultou o<br />

exemplo <strong>da</strong>s nações estrangeiras catholicas e viu a gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>spro-<br />

porção que existia d'ellas para a nossa, sen<strong>do</strong> que s6 com relação á<br />

Belgica, Portugal tinha tres vezes mais bispa<strong>do</strong>s <strong>do</strong> que ella.<br />

Ao mesmo tempo o governo conhecia que, teri<strong>do</strong> <strong>de</strong> eritaboiar<br />

ricgociaçócs directamente com a se ;ipostolica, e que nác sen<strong>do</strong> pro-<br />

vavel obtel-as tão brcvcmente quanto era necessario, pois que riestc<br />

tempo se realisava ou pretendia realisar um systema mais ou mc.-<br />

nos completo <strong>de</strong> cconomias nos serviços piihlicos <strong>da</strong> admiriistra-<br />

qão civil e ecclesiastica; era conveniente, para cstc cff~ito, não<br />

prover certo numero <strong>de</strong> bispa<strong>do</strong>s, ci~ja siippressiío se 1)rol)unlia<br />

obter, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong>-se, sem crear noços iiitcresses, essas dioccses com<br />

um simples governa<strong>do</strong>r.<br />

Estcs foram cm geral os motivos, pelo menos apparentes, d'cste <strong>de</strong>-<br />

creto, que <strong>de</strong>terminou sómente prokcr os bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Arigra, Braga,<br />

Rragança, Coimbra, Evora, Faro, Funchal, Porto, Lisboa e Vizcu.'<br />

i Veja o relatorio que acompanha eete <strong>de</strong>creto.


«Não preten<strong>de</strong> o governo (dizia o relatorio que o acompanhou)<br />

com cste <strong>de</strong>creto, cujas disposições são puramente transitorias, re-<br />

duzir o numero <strong>da</strong>s dioceses, <strong>de</strong>terminar as que hão <strong>de</strong> ficar, ou<br />

ser supprimi<strong>da</strong>s, e assignar limites a ca<strong>da</strong> uma d'ellas.<br />

Exce<strong>de</strong>ria tal intorito os podcrcs que Ilie foram commetti<strong>do</strong>s.<br />

O governo acata e respeita profun<strong>da</strong>mente a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> santa<br />

sé, e apenas <strong>de</strong>seja com cste <strong>de</strong>creto fixar, emquanto se não pro-<br />

ce<strong>de</strong> á <strong>de</strong>finitiva divisão ecclc.siastica <strong>do</strong> reino, a incerteza que ora<br />

ha no prokimento <strong>do</strong>s bispiirlos que se faz ou <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> fazer se-<br />

griri<strong>do</strong> o livro alvcdrio <strong>do</strong>s dif'ferciitcs ministros, c facilitar a rea-<br />

lisação proxima <strong>de</strong> lima reforma ritil á evre'a e ao esta<strong>do</strong>, como<br />

r J<br />

roclnma<strong>da</strong> pelas justas instancias <strong>da</strong> opiniào publica.))<br />

O accor<strong>do</strong> com a SE Komaiia n3o Se effeituou ; e cste <strong>de</strong>creto,<br />

embora <strong>de</strong> um caracter traiisitorio, comtu<strong>do</strong> hoje em vigor, <strong>de</strong>ter-<br />

mina assim o esta<strong>do</strong> actual d'este grave assumpto, que os obsta-<br />

culos levanta<strong>do</strong>s na santa SE, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> tilüto tempo, tem impedi<strong>do</strong> d~<br />

resolver em proveito <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> c <strong>da</strong> propria egreja.<br />

Em 2 1 <strong>de</strong> maio <strong>do</strong> anno proximo fin<strong>do</strong> foi proposto em córtes<br />

um prqjpcto <strong>de</strong> lei sobre corporações e bens ecclesiasticos, muito<br />

notavel pela maneira por que rompe com os <strong>direitos</strong> até hoje re-<br />

corihtlci<strong>do</strong>s á santa se, emquanto a materias <strong>de</strong> circumscripção <strong>de</strong><br />

dioccscls c rrdiicc;io d'ellas.<br />

O distincto <strong>de</strong>piita<strong>do</strong> <strong>da</strong> nação, seu arictor, o Sr. Bernardino<br />

Pereira Pinheiro, olhan<strong>do</strong> a cprc.ja, jiiridicamcnte consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong> e para<br />

os fins <strong>de</strong> qiie tracta, como uma Iwsson moral, julp o csta<strong>do</strong> tão ir)-<br />

vesti<strong>do</strong> <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> supprimir lima mitra como <strong>do</strong> <strong>de</strong> extinguir um<br />

miinicipio ; e por isso, e penetra<strong>do</strong> <strong>do</strong> patriotico sentimento <strong>de</strong> ver<br />

acaba<strong>da</strong> uma questão que tantos males tem causa<strong>do</strong> ao nosso esta<strong>do</strong><br />

politico e financeiro ; e, por outro la<strong>do</strong>, persuadi<strong>do</strong> <strong>da</strong> impossibi-<br />

li<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> tractar com a se romana a este respeito com algum re-<br />

sulta<strong>do</strong>, como o tem mostra<strong>do</strong> a experiencia, e priiicipalmente por-<br />

que os nossos governos são ephemeros; propòe que, não só se pre-<br />

diizn o numero <strong>da</strong>s dioceses, mas que a reducçho feita pelo esta<strong>do</strong> I<br />

tenha força legislatira, encorporan<strong>do</strong>, apenas vaguem as respe-<br />

ctivas mitras, nos proprios niicionaes os bcns <strong>da</strong>s que <strong>de</strong>vem ser<br />

extiiictas; propõe mais que se <strong>de</strong>spoje a sé <strong>de</strong> Lisboa <strong>do</strong> titulo<br />

puramerite horiorifico <strong>de</strong> patriarchal, <strong>de</strong> qucl usa, sem proveito para<br />

a egreja nem para o esta<strong>do</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o tempo <strong>da</strong> dictadura <strong>de</strong> D. Pedro,<br />

<strong>de</strong>sejan<strong>do</strong> antes ter a se metropolita <strong>de</strong> Li~boa remonta<strong>da</strong> h


era em que D. João I arvorava, cheio <strong>de</strong> gloria, o pen<strong>da</strong>0 portu-<br />

guez, <strong>do</strong> que coritemplal-a, recor<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-lhe as prodigali<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

um monarcha ohscuro, mais amigo <strong>do</strong> fausto <strong>do</strong> que <strong>da</strong> patria.<br />

& a primeira vez que <strong>de</strong> frente se attaca o direito <strong>da</strong> Se apos-<br />

tolica; mas isto, qur nem no tempo <strong>da</strong>s celebres theorias <strong>do</strong> Summo<br />

Imperio se tinha afirma<strong>do</strong>, 6 agora drfendi<strong>do</strong> por um principio<br />

philosophiro, que o seu autor acha incoiitcstii\el, qiial 6 o <strong>do</strong> di-<br />

reito que tem a socictla<strong>de</strong> <strong>de</strong> rtbgular o nio<strong>do</strong> <strong>de</strong> ser e as coiidjqbes<br />

mesmas <strong>da</strong> existcricia <strong>do</strong>s institutos, que s6 em a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> civil<br />

assrntiim o seti titulo juridico.<br />

fi o ciipitulo seguinte <strong>de</strong>stina<strong>do</strong> a apreciar este projecto e aquelle<br />

I lccreto <strong>de</strong> 2 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1 869.


CAPITULO 1V<br />

A Religião <strong>do</strong> Reino<br />

O artigo 6.0 <strong>da</strong> Carta: sua obscura re<strong>da</strong>cgío e duvi<strong>da</strong>s a que di lagar.-Estu<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-o<br />

qusnto ao nosso objecto, o que nos diz o elemento historieo <strong>da</strong> iiiterpretaeào. -<br />

Origem <strong>da</strong>s tbeorias <strong>da</strong> religiso <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>. - Em que circumstancias foi elabora<strong>do</strong><br />

este artigo. - É uma pura tiaosacc~o com o passa<strong>do</strong>.- Em que termos se fez essa<br />

IrancaccAo? - Estilo ern vigor as (oiitrinas <strong>da</strong> inspeccao e protercilo supremas?-<br />

Esta<strong>do</strong> 'geral <strong>do</strong> direito publico eeclesia~iico sob o impirio <strong>do</strong> iegimin liberal.-Senli<strong>do</strong><br />

unico po~sivel tlorartigo 6.' tla C,~rta, <strong>de</strong>baixo <strong>da</strong>s novas idkas. - <strong>Direito</strong> <strong>do</strong><br />

eslatlo ii intervir, nas cri!acOer, siipprrsúes tle bispa<strong>do</strong>s e nas divisOes eczlesirsticrs<br />

<strong>de</strong> lerritorio. - A egr~jii compele só o direito <strong>de</strong> diepOr <strong>de</strong>finitivamente d'estas cousas.<br />

- USO <strong>do</strong> brneplacito a este respeito.- O <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 19 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1869 e<br />

o projecto <strong>de</strong> lei <strong>de</strong> 27 <strong>de</strong> meio <strong>de</strong> 1871 perante o direito ecclesiastico portuguez.<br />

A quem está acostuma<strong>do</strong> a pensar, com to<strong>da</strong>s as forças gran-<br />

<strong>de</strong>mente livres <strong>do</strong> seu espirito, 'nestes graves assumptos <strong>do</strong> prin-<br />

cipio religioso <strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, no <strong>de</strong>stino <strong>da</strong>s religiões e <strong>do</strong>s cultos;<br />

a quem accrescenta ao seu cogitar as meditações <strong>do</strong>s altos pensa-<br />

<strong>do</strong>res, que a imprerisa nos facilita nas paginas d'essas obras que<br />

centuplicam as facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> intellectual, communican<strong>do</strong>-nos<br />

o seu vivo calor; o tractar <strong>de</strong> uma religião <strong>do</strong> reino, <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong>-<br />

<strong>de</strong>s <strong>de</strong> uma egreja, <strong>da</strong>s prerogativas <strong>da</strong> cor<strong>da</strong> e <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> mages-<br />

taticos, affigura-se-lhe como o dissecar <strong>de</strong> um ca<strong>da</strong>ver; e por um<br />

instante parece-lhe que o discutir este breve pontificio ou aquella<br />

bulln <strong>da</strong> santa Sé, é gastar inutilmente o tempo, tno preciso hoje<br />

para o estu<strong>do</strong> <strong>de</strong> outras questões.<br />

E, com quanto haja realmente alguma cousa como d'esse dis-<br />

secar, comtu<strong>do</strong> é indipensavel fazel-o.<br />

E snbeis porque?<br />

Porque a nossa lei fun<strong>da</strong>mental, o fecho <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a aboba<strong>da</strong> po-<br />

litica <strong>da</strong> nossa socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, tem entre as suas disposições, uma que<br />

falla assim:<br />

a Art. 6.O - A religião Catholica Apostolica Romana continuara a ser<br />

a Religião <strong>do</strong> Reino. .. »


Continuará a ser, notemos bem, continuará a ser a religiao <strong>do</strong><br />

reino, diz esta lei.<br />

I? a prrpetuaq'io <strong>da</strong> theoria <strong>do</strong> summo imperio, <strong>da</strong> protec90 e<br />

inspecção, que este artigo consagra e implanta no meio <strong>da</strong>s novas<br />

instituiçks nasci<strong>da</strong>s <strong>do</strong> direito <strong>do</strong>s povos, e juncto <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r real<br />

<strong>de</strong>spoja<strong>do</strong> <strong>da</strong> origem di~ina, ao pe <strong>do</strong>s reis, não jh summos imperantes,<br />

nias primeiros magistratlos <strong>da</strong> naçiio ?<br />

E como esta, qtiantas questões riao involve aquelle ce11.bre artigo<br />

6." <strong>da</strong> Carta constitucional <strong>de</strong> 18261<br />

Será mcsmo difficil encontrar em to<strong>da</strong> a nossa lrgislaqão politicti<br />

e civil um oiitro artigo, que tenha <strong>da</strong><strong>do</strong> logar a tantiis intcrpretncões<br />

differentcs e encontra<strong>do</strong>s pareceres. A siia re<strong>da</strong>cçao foi<br />

tiio leviaiia, qiic ha mesmo ncllc o que quer que se,ja <strong>de</strong> absolutamente<br />

iricomprcheiisivcl; qiie i' o que acontece com to<strong>da</strong>s as leis, em<br />

que, como nesta, o legisla<strong>do</strong>r escreve certos principios genericos<br />

sem uma idéa ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente precisa c clíirn <strong>do</strong> seu iilcancc, mas<br />

ohclcceri<strong>do</strong> s6 a um echo vago que lhe sôa imperioso na mente, a<br />

uma rccor<strong>da</strong>ç30 <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> ou a um prejuizo bebi<strong>do</strong> no mc4o nri<strong>de</strong><br />

sc vive c pensa.<br />

Estu<strong>de</strong>mol-o pois, s6 quanto ao nosso oh.j~cto.<br />

Não <strong>de</strong>vemos usar na interpretação d'estc artigo <strong>do</strong> elemento<br />

philosopliico <strong>de</strong> hermeneuticn; porque, qiian<strong>do</strong> perguntamos, Iini'ii<br />

<strong>de</strong>scobrir a compwhensão d'ellc, o que signifiram. qual o nlcarico<br />

<strong>da</strong>s cxprcssòes-religião <strong>do</strong> reino,-esse elemento é complctamentc<br />

mu<strong>do</strong> e na<strong>da</strong> nos sabe respon<strong>de</strong>r.<br />

A philosophia diz-nos, explica-nos o que 4, o que po<strong>de</strong> sclr a<br />

religião <strong>de</strong> um individuo; ella na0 nos po<strong>de</strong>, porem, fiii.er bcr qiinl<br />

a essrricia e as quali<strong>da</strong><strong>de</strong>s d'isso a que chamam religiso <strong>do</strong> reino,<br />

ou <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>.<br />

l? ao elemento historico que <strong>de</strong>vemos primeiro recorrer; n8o<br />

philosophemos; procuremos saber o que foi, como religião <strong>do</strong> reino,<br />

antes <strong>da</strong> Carta, a religiiío catholica npostolica romaria.<br />

A luz <strong>do</strong>s principios <strong>de</strong> certas escholas uma socie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> atheos<br />

6 lima cousa impossivel: a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> ha <strong>de</strong> ter uma religiao e um<br />

culto; á liiz d'estes mesmos principios as rcligi6c.s h30 <strong>de</strong> ter irma<br />

origem immediatamente divina, iim organismo <strong>de</strong> <strong>do</strong>gmas, iima<br />

revelação sobrenatural. A consequcnrin 1c.m rapi<strong>da</strong> : esta religião<br />

ha <strong>de</strong> ser a unica ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira. Que os homcns, nas meditaç6es <strong>de</strong><br />

seus genios differentes, na dispari<strong>da</strong><strong>de</strong> dc seus costumes e raças,


tenham concebi<strong>do</strong> uma idéa <strong>de</strong> Deus, diversa nas varia<strong>da</strong>s regibes<br />

<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> e ria success80 <strong>do</strong>s tempos, e estabeleci<strong>do</strong> crrcmonias <strong>de</strong><br />

culto tambem <strong>de</strong>seguaes em suas solemnidii<strong>de</strong>s e ritos, sem que<br />

com isto se altere, se discor<strong>de</strong> lia idéa primeira <strong>de</strong> Deus, que o<br />

instincto religioso faz brotar na consciencia <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s, k o que não<br />

comprehcn<strong>de</strong>m essas escolas.<br />

A segun<strong>da</strong> illação não se faz esperar: é a intolerancia.<br />

Emquanto as cousas se conservam neste esta<strong>do</strong> a religiao existe<br />

só <strong>de</strong> envolta com a sripersti~ão rias clas~es ignorantes; as outras,<br />

indifferentcs e hypocritas, fingem-se religiosas, v&em na religiáo um<br />

freio ás revoluções, um tempero á moral.<br />

Esta id6a <strong>de</strong> uma religião unica ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira; a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

ser intolcrantc quan<strong>do</strong> assim concebi<strong>da</strong>; o systema dc a fazer instrumento<br />

<strong>de</strong> edificação moral ; trouxeram insensivelmente a protccçáo<br />

<strong>do</strong> po<strong>de</strong>r publico <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong>; e <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s estes erros nasceu<br />

um outro, confuso, mixto <strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, questão <strong>de</strong> polavras e<br />

dc forma com <strong>direitos</strong> effectivos e reaes á existencia substancial e<br />

objectiva-a religiao <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>, a religiáo <strong>do</strong> reino.<br />

Esta protecçao, esta uniõo <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> e <strong>da</strong> egryja triumphante,<br />

tem passa<strong>do</strong> por varias phascs. Primeiro, nas religiões <strong>de</strong> culto ap- ,<br />

paratoso e larga disciplina extrrna, o rstii<strong>do</strong>, o imptarante, o po<strong>de</strong>r<br />

p~d~lico, presta o seu auxilio, a sua forca coercitiva, e essas reli-<br />

giõcs peccam pela flagrante contradicrÃo <strong>de</strong> se dizerem priva<strong>da</strong>s<br />

cm rssencia dc força coercitiva, e exigirem-na e consentirem-na<br />

como essencial, embora empresta<strong>da</strong>.<br />

Depois, ha um ~erio<strong>do</strong> com que as ambi~ões <strong>do</strong>s podcrcs <strong>da</strong><br />

egreja, invejan<strong>do</strong> os thesouros <strong>da</strong> temporali<strong>da</strong><strong>de</strong>, ameaçam os po-<br />

<strong>de</strong>res <strong>do</strong>s esta<strong>do</strong>s. A conscirncia revolta-se.<br />

O esta<strong>do</strong> cerca-se <strong>de</strong> garantias. A protecyõo juncta-se a inspecçáo<br />

siiprcma por parte <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>. a a segun<strong>da</strong> phasc <strong>da</strong>s religiões (10<br />

esta<strong>do</strong>, phase em que realmente esta itlPa toma certo vulto palpa-<br />

vcl, porquc 6 agora que o esta<strong>do</strong> tem uma religigo a que presi<strong>de</strong><br />

pelos seus magistra<strong>do</strong>s.<br />

Na Inglaterra, qiian<strong>do</strong> chegou este momcnto, levou-se o abs~ir<strong>do</strong><br />

as iiitimas consequencias, e como <strong>de</strong>positario dí. to<strong>da</strong>s as sobera-<br />

nias, o rei foi o chefe espiritual <strong>da</strong> cgre,ja anglicana; nos outros<br />

paizes, o sorites ficou em meio, e ningurm se atreveu a tocar<br />

ria ultima illação. Alli a idéa dc egrejn <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> 6 philosophica-<br />

mente falsa, como por to<strong>da</strong> a parte, mas positivamente ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira;


aqui, a idéa está como aquellas figuras <strong>de</strong> mulheres, que Ovidio 110s<br />

pinta nas metamorphoses, começan<strong>do</strong> <strong>de</strong> se transformar em aves,<br />

com os braços feitos em azas, os cabellos a tornarem-se pennas.<br />

E, comtu<strong>do</strong>, notcmos bem, é isto, 6 s6 isto, que dá corpo á<br />

idéa <strong>de</strong> uma religião <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>.<br />

Os reis são, como Constantino, os bispos externos, episeopi re-<br />

rum externarum; os <strong>de</strong>fensores <strong>do</strong>s canones, os inimigos <strong>da</strong>s he-<br />

resias.<br />

Con<strong>de</strong>mna<strong>do</strong> pelas idéas novas, mas vivo na legislação e accctso<br />

nos <strong>de</strong>sejos <strong>da</strong> velha seita absolutista, este esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> cousan impe-<br />

rava ao tempo <strong>da</strong> nossa primeira Constituição politica.<br />

Por on<strong>de</strong> se avalia o nivel intellectual <strong>de</strong> um povo na actuali-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong> é pclo <strong>de</strong>sprendimento, nõo <strong>da</strong> id6a livre e vigorosa <strong>do</strong> prin-<br />

cipio religioso, mas <strong>da</strong> id6a autoritaria e intolerante <strong>de</strong> religião.<br />

Portugal, neste momento, força é confessal-o, estava mui prezo o<br />

esta segun<strong>da</strong> idéa; as Constituições politicas não po<strong>de</strong>ram romper<br />

com o passa<strong>do</strong> nestes abusos <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, e viram-se obriga<strong>da</strong>s a<br />

transigir.<br />

O art. 6.' <strong>da</strong> Carta é, pois, uma pura transacção com o cs-<br />

ta<strong>do</strong> atraza<strong>do</strong> <strong>da</strong> opinião quanto a idéas religiosas: assim o enten-<br />

<strong>de</strong>mos sempre, e nunca <strong>de</strong>paramos com o <strong>de</strong>smenti<strong>do</strong> d'este pen-<br />

samento.<br />

Mas em que termos se fez essa transacção? quaes os <strong>direitos</strong><br />

que se cedCram ? quaes os que se fizeram reconhecer ?<br />

Este o ponto difficil.<br />

Ao primeiro lance <strong>de</strong> olhos, as expressóes <strong>do</strong> artigo - conti-<br />

nuará a ser a religião <strong>do</strong> reino - lembram que a Carta rcvali-<br />

<strong>da</strong>sse e confirmasse inteiramente a <strong>do</strong>utrina <strong>da</strong> inspecção e pro-<br />

tecção suprema <strong>da</strong>s leis josephinas.<br />

Effectivamente, se a religião catholica continúa a ser a religiáo<br />

<strong>do</strong> reino; se o que dá corpo a uma religiao <strong>do</strong> reino são estes di-<br />

reitos e <strong>de</strong>veres <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> para com ella; parece que essa theoria<br />

tem passa<strong>do</strong> to<strong>da</strong> <strong>da</strong>s mãos <strong>do</strong>s monarchas para o po<strong>de</strong>r executivo.<br />

Nem isto ao primeiro aspecto repugna com o espirito <strong>da</strong> Carta,<br />

porque 6 <strong>de</strong> ver, que sobre to<strong>da</strong>s as outras foi a religiâo catholica<br />

por ella consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong> especialmente, e em publico se não reconhece<br />

nem permitte outra alguma ; alem <strong>de</strong> que, se nestes <strong>direitos</strong> inspe-<br />

ctivos d'essa <strong>do</strong>utrina vae a <strong>de</strong>fesa legitima <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> <strong>da</strong> sobe-<br />

rania temporal contra as ambiciosas prctenyfies <strong>da</strong> Se romana; a


mesma idéa <strong>de</strong> se acautelar contra esses abusos se v6 bem distincta<br />

no $ 1 C <strong>do</strong> art. 75, on<strong>de</strong> se restabelece o beneplacito regio;<br />

e no 2.' on<strong>de</strong> expressamente se exara <strong>de</strong> novo o incontestavel<br />

direito <strong>de</strong> apresentação nos heneficios ecclesiasticos, <strong>de</strong> padroa<strong>do</strong><br />

real na egreja portugueza.<br />

E qiie n Carta tem si<strong>do</strong> sempre assim entendi<strong>da</strong>, prova-o o facto<br />

<strong>de</strong> ain<strong>da</strong> ninguem ter posto em duvi<strong>da</strong> a obrigação que peza sobre<br />

o esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>do</strong>tar o clero, quan<strong>do</strong> nRo ha artigo nenhum nella que<br />

d'isso fale, e mui em contrario o art. 145, garantin<strong>do</strong> os succorros<br />

publicos, a instrucção primaria, a nobreza hereditaria e os collegios<br />

e universi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, não garante a <strong>do</strong>tacão <strong>da</strong> egreja ; e, <strong>de</strong>claran<strong>do</strong> em<br />

seus paragraphos a obrigação que to<strong>do</strong>s têm <strong>de</strong> concorrer para<br />

as <strong>de</strong>spezas publicas, comprehen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> assim os que seguirem outra<br />

religião, ao mesmo tempo assenta como principio fun<strong>da</strong>mental a<br />

egual<strong>da</strong><strong>de</strong> perante a lei.<br />

Não foi s6 portanto no legisla<strong>do</strong>r que influiram as velhas idkas :<br />

ellas tCm-se imposto ain<strong>da</strong> hoje sobre n6s, que acceitamos o peza<strong>do</strong><br />

e <strong>de</strong>sigual encargo <strong>da</strong> <strong>do</strong>tação <strong>do</strong> clero, sem que artigo algum<br />

<strong>da</strong> Carta expressamente o imponha, h excepção <strong>do</strong> artigo 6.',<br />

que é obscuro e se po<strong>de</strong> a<strong>da</strong>ptar a qualquer opinião.<br />

Não nos <strong>de</strong>moremos mais um instante em dizel-o:-as theurias<br />

<strong>da</strong> protecçáo e inspecção suprema não esta0 hoje em vigor pela<br />

Carta ; não po<strong>de</strong>m estar; não <strong>de</strong>vem estar.<br />

Não estão em vigor pela Carta, porque o po<strong>de</strong>r real pela Carta<br />

não é o po<strong>de</strong>r immediato, o po<strong>de</strong>r real pleno e supremo, o summo<br />

imperio ; o rei não é o summo imperante, não 6 o Augusro <strong>do</strong>s<br />

aulicos escriptores <strong>do</strong> seculo xvi~r ;-ao rei, como <strong>de</strong>positario <strong>do</strong><br />

po<strong>de</strong>r mo<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>r, s6 lhe cabem as nttribuiç6es <strong>do</strong> artigo 74 ; como<br />

chefe <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r executivo, não lhe competem nem esses officios, nem<br />

esses pe<strong>da</strong>ntescos <strong>direitos</strong> <strong>de</strong> protector <strong>do</strong>s canones, <strong>de</strong>fensor e advoga<strong>do</strong><br />

<strong>da</strong> egreja, e peleja<strong>do</strong>r <strong>de</strong> heresias; pela Carta o po<strong>de</strong>r<br />

executivo s6 tcm as attribiiiçòes que ahi lhe vemos <strong>de</strong>scriptas e<br />

assipna<strong>da</strong>s no art. 75, e entre ellas niío se <strong>de</strong>scobre a heroica theoria<br />

<strong>de</strong> protecção e inspecção suprema.<br />

Niio po<strong>de</strong>m &ar em vigor pela Carta, porque a Carta garante<br />

a liher<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> consciencin, o culto particular <strong>de</strong> outras religiões;<br />

dcixa aos proprios portii~uezcs, '-. sem consequencias algumas juridicas,<br />

o segiiircm outra religião differente <strong>da</strong> catholica, embora uma<br />

seita, acanha<strong>da</strong> no seu raciocinar, tenha pretendi<strong>do</strong> sustentar a<br />

-


opinião adversa 1; e sen<strong>do</strong> assim, não podia a mesma Carta, em sua<br />

mente, consentir a perseguição <strong>da</strong>s heresias em <strong>de</strong>feza <strong>da</strong> egreja e<br />

contra os <strong>direitos</strong> <strong>do</strong>s ci<strong>da</strong>dãos que prometteu guar<strong>da</strong>r;-pela Carta<br />

não po<strong>de</strong>m estar em vigor essas riziveis theorias; porque a Carta,<br />

se <strong>de</strong>clara a religião catholica religiao <strong>do</strong> reino, ha <strong>de</strong> protegel-a,<br />

ha <strong>de</strong> reverenciar a sua liber<strong>da</strong><strong>de</strong> e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia soberana, e não<br />

po<strong>de</strong>, sem justo titulo, promover o restabelecimento <strong>da</strong> antiga c<br />

funtlamental ,disciplina, qi~ari<strong>do</strong> ;i rgreja a não cstiibelcccr para si;<br />

isto só porque ao esta<strong>do</strong> pertcnce a siimma inspccqao.<br />

Nào <strong>de</strong>rem estar em vigor, porque scria rcsirscitur, no mc~io <strong>da</strong><br />

nova epoca <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, as tlieorias josephiiias, que representaram<br />

o seu papel iia historia, mas que hoje niiiguem <strong>de</strong> srntimentos patrioticos<br />

e liberaes, querer8 sem duvi<strong>da</strong> ver reedificar iio seio <strong>da</strong><br />

1 Tem.se espalha<strong>do</strong> a<strong>do</strong>iitrina <strong>de</strong> que nenhum portuguez em face <strong>da</strong> Carta<br />

po<strong>de</strong> seguir outra ieligião que 1120 seja a catholica, ciii<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-se meqmo que<br />

se não po<strong>de</strong>m exercer cargos publicos erm o? attesta<strong>do</strong>s ?os parochos. qiiaiito<br />

ao assi(luo cumprimeuto <strong>do</strong>s <strong>de</strong>veres &e fiel catliolieo. E este um a11u o intoleravel<br />

e uma interpretação ahsui<strong>da</strong>.<br />

A duvi<strong>da</strong> provem <strong>da</strong>s palarras seguintes <strong>do</strong> art. 6.0 <strong>da</strong> Carta- Todus as<br />

outras religu'0es, diz, srrüo pcrmifti<strong>da</strong>s aos estrangeiros com seu culto dmnrstico,<br />

ou particular, em casas para isso <strong>de</strong>stiica<strong>da</strong>s, sem fórma ulgt~ma exterior<br />

<strong>do</strong> templo.<br />

Dizem d'aqui à contrario que aos portuguezes niio sBo permitti<strong>da</strong>s as outras<br />

rrligi0~s.<br />

Piiinriraincnte, esta disposiç80, se assim se <strong>de</strong>vesse enten<strong>de</strong>r, era digna <strong>do</strong>a<br />

trrnpos <strong>de</strong> c arlos ix, e inteirsmentc louca, por ser impossivel piohibir a qi~alquer<br />

portiiguee seguir no fun<strong>do</strong> <strong>da</strong> siia consciencia outra religiUo c ter lia<br />

iiiriolnhili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> sua habitação um logar para o culto exterior; a iiao 6c.r<br />

que o icgibia<strong>do</strong>r tivesse a mente eiirgreci<strong>da</strong> pelos plarios <strong>de</strong> algiirna Sairit-<br />

I3aillielemy permanente. Depois, os artigos subseqiieiites <strong>da</strong> ('arta <strong>de</strong>sinriitcin<br />

cahalmeiite isto que <strong>de</strong> pua m4 re<strong>da</strong>cçiio se parece <strong>de</strong>duzir.<br />

O ai tigo 7,s 4.0, falan<strong>do</strong> <strong>do</strong>s estrangeiios naturalisa<strong>do</strong>s, qualquer que seja<br />

a sua religião, como ci<strong>da</strong>dãos portiigiirzrs os reputa ; logo, supp0e e admitte<br />

a possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> portuguczes iiâo catholicos; a nào ser que iio acto <strong>de</strong> natnralisaçRo<br />

se exija a apostaaia.<br />

O artigo 145, <strong>de</strong>screveii<strong>do</strong> as qarantias <strong>da</strong> inviolabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> civis<br />

e politicos <strong>do</strong>s ci<strong>da</strong>diios portugiieze+. dctrrrniiin no § 4.' qiie iiii~guem (quer<br />

dizer iieiihiirn cirkldfioportu~q~r~z~ pwsa ser persegui<strong>do</strong> por icioti\,os <strong>de</strong> religilo,<br />

iiriiri rez ~ I Tirspeite C a tio E':stl<strong>do</strong> e nio offrii<strong>da</strong> a moral piihlica.<br />

O $ 13 <strong>do</strong> rncsino rii tigo 11.1 diz qiie to<strong>do</strong> o ci<strong>da</strong>dho poi tugnez (logo o ne<br />

turalisa<strong>do</strong>, corn a exct~p2o <strong>do</strong> ai tipo 106 e o jii<strong>de</strong>ri,omussulrnaiin, oprotrstante,<br />

o atlieo, etc.) po<strong>de</strong> ser adrriittitlo aos cnr~os piiblicos e civiu, politicos ou<br />

militares, sem outra diffrreiiça qiie nio scja :I <strong>de</strong> seus talentos e virtu<strong>de</strong>s.<br />

A lrgislaç80 penal recoiihece esta mesina ver<strong>da</strong><strong>de</strong> e assini iiiterpreta a<br />

Carta, pois diz o Codigo no artigo 135:-To<strong>do</strong> o prtuguez que, professan<strong>do</strong><br />

a rdi9zao <strong>do</strong> reino, faitar ... i


sua terra. Olhae para essas leis que fun<strong>da</strong>mentam to<strong>do</strong> o <strong>de</strong>sinvol-<br />

iimerito <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> magestaticos, to<strong>do</strong>s esses vestigios clc sobcrha<br />

<strong>da</strong> rnonarchia, e que te<strong>de</strong>s nellas? as <strong>da</strong>tas <strong>de</strong> 1700, to<strong>da</strong>s <strong>do</strong><br />

seciilo xvrii,.que iridicarn :7 a sua origem e a sua con<strong>de</strong>mna~fio.<br />

,4 sobcrariiil <strong>de</strong> Portugal iiào precis,i d'essns theorias que só re-<br />

velam rima fraqueza, ou <strong>de</strong>scobrem um <strong>de</strong>upoti~mo.<br />

Nem para que o artigo 6." tenha um senti<strong>do</strong> importa siistcntal-as.<br />

Não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> admittir-se o vigor d'cssas idbas sob o imperio <strong>do</strong><br />

regimen liberal <strong>da</strong> Carta, <strong>de</strong>ve enten<strong>de</strong>r-se <strong>da</strong> maneira seguinte<br />

o esta<strong>do</strong> recente <strong>do</strong> direito ecclcsiastico portuguez <strong>de</strong>pois d'elle.<br />

A egreja portugiieza continúa a existir; neni que a Carta tivesse<br />

<strong>de</strong>clara<strong>do</strong> a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> e inteira separaçBo <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> e d'clla, ella<br />

<strong>de</strong>ixaria <strong>de</strong> existir; quanto mais ten<strong>do</strong>-sc esçripto o art. 6.'<br />

To<strong>da</strong>s as suas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s permanecem, quan<strong>do</strong> se ajustem com<br />

a id6a liberal e sejam compativeis com o actual regimeli.<br />

Não 6 sn a It>ttra expressa <strong>da</strong>s leis que revoga antecedcnt6.s pro-<br />

visfics, P tnmbcm o espirits <strong>de</strong> legislação, quan<strong>do</strong> ellc se inverte<br />

sob o irilliixo <strong>de</strong> uma profuri<strong>da</strong> revolução na coiistituic;8o politica<br />

<strong>da</strong> socie<strong>da</strong>cle.<br />

E assim que, por exemplo, se conservaram os <strong>direitos</strong> <strong>do</strong> pii-<br />

droa<strong>do</strong> real.<br />

O artigo 6.O, consagran<strong>do</strong> a maxima <strong>de</strong> que a religião ca-<br />

tholica coritinúa a ser religião <strong>do</strong> reiiio, conserva aperta<strong>da</strong>s as re-<br />

Iaçòes <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> portuguez e <strong>da</strong> egreja portugueza, impon<strong>do</strong> a<br />

este to<strong>da</strong>sas obrigaçòes e <strong>direitos</strong> compativeis com a nova or<strong>de</strong>m<br />

dc cousas; e por isso <strong>de</strong> firma nenhuma lhe po<strong>de</strong> conferir a sri-<br />

prema inspecção.<br />

Estas relaçòes, estes <strong>direitos</strong> e obrigações, que involvrm real-<br />

mente uma protecção, portm em outro seriti<strong>do</strong> <strong>da</strong> velha protecção<br />

<strong>do</strong> summo imperio, po<strong>de</strong>m resumir-se nas seguintes preceitos:<br />

O esta<strong>do</strong> fornece as condi~$es <strong>de</strong> ti<strong>da</strong> h egreja, <strong>da</strong>n<strong>do</strong>-lhe os<br />

ternplos, e a <strong>do</strong>tação <strong>do</strong>s seus ministros; <strong>de</strong>w preparar-lhe o meio<br />

<strong>de</strong> 1it)er<strong>da</strong>dc on<strong>de</strong> possa <strong>de</strong>sirivolver-se cm to<strong>do</strong> o seu vigor e qrga-<br />

nisar-se sem embaraço ou obstaciilo algum polilico -procurar-lhe<br />

o respeito publico e o primeiro logar t~iitre as outras ieligibes-<br />

acatar as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja portugueza , ,porque essas sào as<br />

coridiçòes proprias <strong>da</strong> existencia individual d esta cgrejil.<br />

Que tu<strong>do</strong> isto seja perigoso, que seja inconieiiieritr, são outras<br />

questões ; a protecção <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> It egreja, qiic só po<strong>de</strong> <strong>da</strong>r corpo


e senti<strong>do</strong> á instituiçáo que se chama religiâo <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>,flnão po<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> se eriteii<strong>de</strong>r assim sob o imperio <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Outra cousa 6 indigna <strong>de</strong> um esta<strong>do</strong> livre e dissonante <strong>do</strong>s primeiros<br />

elementos <strong>da</strong> rioba coristituição social.<br />

Assim postos estes priricipios, vtljamos agora qual o ultimo esta<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> direito ecclesiastico portuguez quarito ao objecto particular que<br />

estu<strong>da</strong>mos aqui.<br />

Os <strong>do</strong>is capitulos antece<strong>de</strong>ntes provavam o direito que o esta<strong>do</strong><br />

portuguez tivera sempre <strong>de</strong> intervir na creaçiio <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, alterações<br />

<strong>da</strong> circumscripção ecclesiastica, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> sempre ser coiisulta<strong>do</strong>,<br />

po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> sollicitar cstes negocios directamente, mas nao possuin<strong>do</strong><br />

o privilegio <strong>de</strong> erigir <strong>de</strong> novo os bispa<strong>do</strong>s, ou supprimil-os,<br />

sem a aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> Se apostolica.<br />

Isto mesmo Ilic compete hoje <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> Carta.<br />

I'rimeiro, porque, como vimos, era essa uma liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> nossa<br />

cgrtbja, que nunca os factos <strong>de</strong>smentiram, que o berieplacito regio<br />

sem1)re subentendia e que as bulias, sempre confessaram attenciosas;<br />

e em aeuun<strong>do</strong> logar por uma raztio, que o novo esta<strong>do</strong> poli-<br />

9<br />

tico <strong>da</strong>s relaçoes religiosas <strong>do</strong>s portuguczes fez nascer.<br />

Iloje o facto <strong>da</strong> creação <strong>de</strong> um bispa<strong>do</strong> po<strong>de</strong> involver grave<br />

responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> para o governo que a coriseritir scin umii gran<strong>de</strong><br />

neccssitla<strong>de</strong> ; porque, requereii<strong>do</strong> um augmento <strong>de</strong> <strong>de</strong>speza, qual<br />

a <strong>da</strong> <strong>do</strong>taçào <strong>da</strong> mitra, cabi<strong>do</strong>, fabrica <strong>da</strong> cathedral e semiriario<br />

respectivo, esta <strong>de</strong>speza vae recahir tambem sobre to<strong>do</strong>s os que<br />

seguem uma outra religião e, que sem garantias para o livre culto<br />

<strong>da</strong> sua, concorrem para a <strong>do</strong>s outros.<br />

O governo, imparcial julga<strong>do</strong>r d'estcs negocios, <strong>de</strong>fensor <strong>da</strong> egual<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>da</strong> lei e <strong>da</strong> constituiçlo, não po<strong>de</strong>, não <strong>de</strong>tc em certos casos,<br />

consentir ria creaçóo <strong>de</strong> novos bispa<strong>do</strong>s; po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve pelo contrario<br />

excitar a sua reducçào; e sobretu<strong>do</strong> exigir que facto nenhum<br />

d'estes se passe sem audiencia e corili~c' irnelito seu.<br />

A egrqa riáo po<strong>de</strong>, riem <strong>de</strong>ve queixar-se d'cstas pretensbes, porque<br />

6 ella que acccita e quer ri uriiào e protecção <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>; e a<br />

uri:ào e protecção <strong>do</strong> esla<strong>do</strong>, sob a kigericia <strong>da</strong> lei liberal politica,<br />

nào po<strong>de</strong> interi<strong>de</strong>r-se dc outra forma.<br />

Quanto ás uniões, e ditisòes <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s e nova circumscripção,<br />

alem <strong>do</strong> direito estabeleci<strong>do</strong> pelo costirme constante e incontcsta<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> os primeiros tempos <strong>de</strong> Portugal, uccresce a mesma razâo <strong>de</strong><br />

ser objecto em que vae implica<strong>do</strong> o temporal pela <strong>do</strong>tação que tem


<strong>de</strong> prestar e egualmente pelos <strong>da</strong><strong>do</strong>s e esclarecimentos que po<strong>de</strong><br />

fornecer a respeito <strong>da</strong> utili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s reformas, numero <strong>de</strong> paro-<br />

chias, população, se<strong>de</strong>s <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, e outras,<br />

Sobretu<strong>do</strong>, porem, o esta<strong>do</strong> <strong>de</strong>te respeitar a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> se<br />

apostolica, que é pelas leis <strong>da</strong> egreja, nào <strong>de</strong>roga<strong>da</strong>s 'nesta parte<br />

pelo direito portuguez, aquella a quern compete o direito <strong>de</strong> dispor<br />

d'estas cousas: tota rei istius disponen<strong>da</strong>e raiio ad Ecclesiarn per-<br />

tinct, como escrevia no seculo wri o celebre Pedro <strong>de</strong> Marca.<br />

Desconhecer este direito á egreja, seria náo proteger a egrejii<br />

por um governo livre, mas mentir essa protecçâo, falseal-a com o<br />

<strong>de</strong>spotismo; seria uma traiç8o.<br />

O esta<strong>do</strong> tem um meio <strong>de</strong> <strong>de</strong>feza, que 6 o bencplacio; mas o<br />

beneplacito, nega<strong>do</strong> a uma bulla <strong>de</strong> erecçáo <strong>de</strong> um novo bispa<strong>do</strong>,<br />

que se fizesse com a intervenção <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>, e nos casos em que<br />

os canones pe<strong>de</strong>m a nova creação <strong>de</strong> dioceses, era uma outra<br />

traiçáo, porque o esta<strong>do</strong> não usaria entâo <strong>do</strong> beneplacito, mas<br />

abusaria d'elle. O beneplacito 6 uma arma <strong>de</strong>fensiva; e por isso<br />

se não po<strong>de</strong> negar no caso <strong>da</strong> urgente necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> creaç3o <strong>de</strong><br />

um nolo bispa<strong>do</strong> ; attendi<strong>do</strong> o esta<strong>do</strong> pela previa consulta, a hiilla,<br />

lorigo <strong>de</strong> ser um ataque ao direito temporal, k um justo exerci-<br />

cio <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> <strong>de</strong> propria soberania <strong>da</strong> egrcja.<br />

Nem o esta<strong>do</strong> tem <strong>de</strong> que se queixar; riem <strong>de</strong>ve <strong>da</strong>r logar a<br />

corillictos; porque clle reconheceu e quiz que a religiáo catholica<br />

fosse a religião <strong>do</strong> reino; e as leis <strong>da</strong> egreja catholica não podcm<br />

consentir a riecessi<strong>da</strong><strong>de</strong> urgciite dc um novo bispo sem a creaçso<br />

d'elle; e o esta<strong>do</strong> obrigou-se a revcrcnciar e proteger essils leis,<br />

porquc protege essa egreja e não a guerrba.<br />

O <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> I 2 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> L 1169 reconheceu isto mesmo ;<br />

e no que <strong>de</strong>terminou fez exactissimarnerite o que <strong>de</strong>via c podia.<br />

O estatio disse i santa sé: eu respeito e acato mais que to<strong>do</strong>s<br />

a tua actori<strong>da</strong><strong>de</strong>; mas eu tenho tambtm que respeitar e acatar os<br />

<strong>direitos</strong> <strong>do</strong>s citia<strong>da</strong>os portuguezes. - Da inesma fórma que eu,<br />

em caso <strong>de</strong> urgente riecessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> creaçào <strong>de</strong> um bispa<strong>do</strong>, mesmo<br />

nos transes angustiosos <strong>de</strong> um m,1u esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> fazen<strong>da</strong> publica, me<br />

rião podia negar, nem impedir a nova creação <strong>do</strong> bispa<strong>do</strong> ; - assiin<br />

tambem, agora, que a evi<strong>de</strong>ncia <strong>do</strong>s factos <strong>de</strong>monstra a inutili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> urna lloresta <strong>de</strong> dioceses que retalha o pequeno territorio por-<br />

tugucz, c que as fortunas publicas pa<strong>de</strong>cem tão pcza<strong>da</strong>s exacções,<br />

agora tenho eu o direito, como protector d'esta cgeja, <strong>de</strong> pedir a


ediicçáo <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s. Nâo o faço, porem, porque reconheço em ti<br />

o po<strong>de</strong>r unico para o fazer; mas, com, não duvi<strong>do</strong> <strong>da</strong> justica <strong>do</strong><br />

meu pedi<strong>do</strong>, niio apresento bispos até. que venhas a um accor<strong>do</strong>.<br />

Na<strong>da</strong> mais justo e legitimo.<br />

Mas em nossa opiniáio este Decreto fez pouco; este <strong>de</strong>creto po-<br />

dia e <strong>de</strong>via fazer alguma cousa <strong>do</strong> que preteri<strong>de</strong>u <strong>de</strong>pois o sr. Ber-<br />

nardino Pinheiro; porem, niio, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> nenhum, pelas razõcs que<br />

o distincto <strong>de</strong>puta<strong>do</strong> allegou no relatorio <strong>de</strong> que fez prece<strong>de</strong>r o<br />

seu projecto <strong>de</strong> lei.<br />

Depois <strong>de</strong> se consultar a curia romana, se ella persistisse na conservaçâo<br />

<strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s e não permitisse nem <strong>de</strong>cretasse a rediicçao<br />

d'elles, ao esta<strong>do</strong> cabia o direito <strong>de</strong> negar o bencplacito a novas<br />

bullas, se as houvesse, e <strong>de</strong> niio continuar a apresentar bispos para<br />

essas dioceses.<br />

]O um conflicto, d'accor<strong>do</strong> ; mas entre cstrs <strong>do</strong>is po<strong>de</strong>res quem<br />

ha dc <strong>de</strong>cidir quan<strong>do</strong> iim abusa?<br />

I)(. que serviria ao esta<strong>do</strong> o direito tle ser ouvi<strong>do</strong> 'ncstcs negocios,<br />

se nao po<strong>de</strong>sse <strong>de</strong> algum mo<strong>do</strong>, ncsstas relaçòes oiiti.(~ os <strong>do</strong>is<br />

podcrcls summos e irresponsaveis, tornar eff'&ctivas as suas ~)relcn-<br />

sõcs, quan<strong>do</strong> justas?<br />

A santa Sk fecha os olhos a tão attendivcis razòcs, quacs as<br />

que O esta<strong>do</strong> Ilie apresentou? abusa <strong>do</strong> seu direito? O esta<strong>do</strong> tem<br />

tambem os mclios, não, note-se bem, dc iisiirpar qualqucr d'aquellas<br />

prerogativas <strong>do</strong>s papas, mas <strong>de</strong>, por um proce<strong>de</strong>r tiegiitivo, impedir<br />

atk certo poiito as conscquericias <strong>do</strong> abuso e <strong>de</strong>scorisi<strong>de</strong>ração <strong>da</strong><br />

santa Sk. Só o que não po<strong>de</strong> 6 <strong>de</strong>cretar a abolição e reducç80 <strong>do</strong>s<br />

bispa<strong>do</strong>s, como <strong>de</strong>seja o sr. Uernardirio Piiiheiro.<br />

O esta<strong>do</strong>, que resulta <strong>de</strong> tu<strong>do</strong> isto, 6 inqualificakcl: bem o sabenios;<br />

mas E spmpre o que acoritece, quan<strong>do</strong> estas pen<strong>de</strong>ncias se dão entre<br />

<strong>do</strong>is po<strong>de</strong>rcr; supremos e irrcsperisaveis, ten<strong>do</strong> um d'elles abusa<strong>do</strong>.<br />

I? a natureza <strong>da</strong>s cousas<br />

Tem por ventura a santa Sk o direitof<strong>de</strong> intervir nos negocios<br />

politicos <strong>de</strong> Portugal e obrigar os povos a pagarem tributos im-<br />

possiveis <strong>de</strong> sustentar? não h30 <strong>de</strong> as suas pretensbes quebrar-se<br />

e modificar-se ao encontro d'estes principias 9 ha <strong>de</strong> o esta<strong>do</strong>, con-<br />

venci<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a nayáo não <strong>de</strong>ve, nem po<strong>de</strong> pagar mais, e <strong>de</strong> que<br />

sno clesneccssarios 16 bispa<strong>do</strong>s no continente, obrigar a naçao a<br />

pagar, e sustental-os, isto porque a santa SB abusa <strong>de</strong> seus <strong>direitos</strong>,<br />

e nào atten<strong>de</strong> A necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> propria egreja?<br />

.


Não po<strong>de</strong> ser, ha <strong>de</strong> haver uma soluç8o para este esta<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

cousas.<br />

A solução legitima e regular, era a reducção <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s por<br />

bullas pontificias; mas quan<strong>do</strong> isto se nâo verifica, como na hypo-<br />

these presente, 6 tambem legitima e justa a soluç8o que o Decreto<br />

<strong>de</strong> 1869 propõe e estabelece.<br />

Depois, corisi<strong>de</strong>remos que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1833, que se cui<strong>da</strong> neste ne-<br />

gocio ; <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1833 que a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> reforma <strong>da</strong> nossa cir-<br />

cunscripção ecclesiaslica 6 uma evi<strong>de</strong>ncia; <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1833 que o esta<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> thesouro 6 incompativel com as <strong>de</strong>spczas <strong>de</strong> tiiio larga <strong>do</strong>taç8o<br />

e que o Esta<strong>do</strong> não po<strong>de</strong> conservar os bispa<strong>do</strong>s na altura a que<br />

tem direito; <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1833 que se têm inicia<strong>do</strong> accor<strong>do</strong>s e negocia-<br />

çbes com a sancta Sé; e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1833 que aquella Sé se nega e se<br />

esquece <strong>de</strong> resolver este importante assumpto.<br />

Náo serào estes factos em abono <strong>do</strong> <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 1869 ? não terá<br />

o Esta<strong>do</strong> o direito <strong>de</strong> padroa<strong>do</strong> <strong>da</strong> mesma forma que a Sé romana<br />

o direito <strong>de</strong> reduzir os bispa<strong>do</strong>s? não terá o Esta<strong>do</strong> o dkeito <strong>de</strong><br />

náo apresentar os bispos, quan<strong>do</strong> a Se tem o direito <strong>de</strong> não que-<br />

rer reduzir as dioceses? A justa rcsistencia a um abuso, será um .<br />

abuso? Não justificará o proce<strong>de</strong>r <strong>do</strong> governo portuguez pelo acto<br />

<strong>de</strong> 12 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1869 o proce<strong>de</strong>r inconveniente <strong>da</strong> san-<br />

cta Se?<br />

Cremos que sim, mas pensamos que o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 1869 podbra<br />

e <strong>de</strong>v6ra ir mais longe.<br />

N6s queriamos que o <strong>de</strong>creto não s6 <strong>de</strong>terminasse que não provia,<br />

ate um accor<strong>do</strong> com a Se romana, os bispa<strong>do</strong>s que julgava <strong>de</strong>ver<br />

extinguirem-se; mas que tambem man<strong>da</strong>sse incorporar nos proprios<br />

nacionaes os bens <strong>da</strong>s mitras cuja reducção propozera; isto, sempre,<br />

note-se bem, sem <strong>de</strong>cretar 'por força <strong>de</strong> suas provisões a reducçéo<br />

<strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s.<br />

Ate um accor<strong>do</strong>, o bispa<strong>do</strong> ficava sem bispo, e as suas ren<strong>da</strong>s<br />

e bens entravam <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo no cofre <strong>da</strong> fazen<strong>da</strong> publica.<br />

Isto podia fazer o Esta<strong>do</strong>; porque ninguem ousa contestar ao<br />

Esta<strong>do</strong> a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> d'esses bens; o que nõo podia era <strong>da</strong>r a for~a<br />

legislativa <strong>de</strong> cxtincç8o <strong>do</strong> proprio bispa<strong>do</strong> ás disposições <strong>do</strong> mesmo<br />

<strong>de</strong>creto, <strong>de</strong>terminan<strong>do</strong> que se não provesse <strong>de</strong> bispo esse bispa<strong>do</strong>,<br />

como queria a projecto jB cita<strong>do</strong> mais <strong>de</strong> uma vez '.<br />

1 Este projecto dizia nos seguintes artigos :<br />

cArt. 1.0-SBo encorpora<strong>do</strong>s nos proprios nacionaee, entran<strong>do</strong> na regra<br />

13


Este projecto, propon<strong>do</strong> que se jiilgassem extinctas aa dioseries,<br />

a qiic elle mesmo nào Jmpuiifia ao Esta<strong>do</strong> a obrigação <strong>de</strong> prover<br />

<strong>de</strong> bispo, sustentava este direito <strong>de</strong> extincção-<strong>da</strong>s diocesee <strong>da</strong> parte<br />

<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, como cousa evi<strong>de</strong>nte e que ninguem ousaria contestar.<br />

Dizia elle que ctninguem po<strong>de</strong> confu~idir os <strong>direitos</strong> absolwtos,<br />

inherentes ao homem, com os <strong>direitos</strong> qne as leis conce<strong>de</strong>m (t~<br />

pessoas moraes; que a egreja, juridicamente e para os fias <strong>de</strong> que<br />

&acta, não é mais <strong>do</strong> que um pessoa moral, como o esta<strong>do</strong>, o<br />

geral <strong>do</strong> artigo 36 <strong>do</strong> Cod. Civ., to<strong>do</strong>s os bens mobiliarme e immobiliarios <strong>da</strong><br />

<strong>igreja</strong> ou corporação religiosa que por qualquer metivo se extinguir.<br />

*Art. 2.0- Srto <strong>de</strong>clara<strong>da</strong>s extinctas, pra ae &itm <strong>do</strong> artigo mime<strong>de</strong>nte<br />

se niitras, fabricas <strong>de</strong> cathcdraee e seminarios, pertencentee he dioms, eujas<br />

sEs estão actualmeiite vagas, ou Bquellas que vierem a vagar, on<strong>de</strong> esta<br />

lei 1160 aiictorisa o governo a nomear e apresentar prela<strong>do</strong>.<br />

eArt. 6.0- O governo, dc accor<strong>do</strong> com a sancta M, farã tima nova Mrcamscripgão<br />

<strong>da</strong>s dioceses menciona<strong>da</strong>s no artigo 3.0, comprehen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> nestw 8<br />

Area <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s exti~ictos.<br />

619 unico. As dioceses que <strong>de</strong>vem supprimir-se serito administra<strong>da</strong>s por vigarios<br />

geraes, em quanto se nâo concluir a respectiva eircumecripçito.~<br />

Admira-nos este receio <strong>do</strong> auctor Bo projecto <strong>de</strong> iiiio julgar o Esta<strong>do</strong> aiictorisa<strong>do</strong><br />

a reunir ás dioceses existeiites por força <strong>de</strong> seus <strong>de</strong>cretos as dioceses<br />

e~tiictas, e esperw para isso por accor<strong>do</strong> <strong>da</strong> satictx 66, qiiantlo pai% a<br />

extiricyào d'ellas, o que <strong>de</strong> certo 8 mais grave, não liesitou um momento em<br />

co~!sidcrar o Ehtatlo iiit~irumente iiivesti<strong>do</strong> <strong>de</strong> direito iiicoiitest~lvel.<br />

E unia incohcrcuciw <strong>do</strong> projecto, que revela bem quanto nesta parte eram<br />

pouco seguros os seus fun<strong>da</strong>meritos.<br />

De lia muito que vernos repeti<strong>da</strong>s em to<strong>da</strong> a parte as palavrae, que cosi0<br />

axioniaticas se escreverli no relatorio d'este projecto.<br />

Dix-se sempre, como cousa incontestave1:- a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> itidividual, quem<br />

s coritestsrtí? mas que as pessoas moraea possam ter proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, que o asta<strong>do</strong>,<br />

a lei, que as creou, n6o posaa diapor d'ella a seu bel-prazer, quem o suatentar&?<br />

De boa f6, e em soiencia, nb ee <strong>de</strong>ve faeer echo com estas vozes.<br />

Que :r proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual tem ei<strong>do</strong> eonteeta<strong>da</strong> po<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ve ignoral-o o<br />

liomem <strong>de</strong> sciencia e <strong>de</strong> boa fA?<br />

E, dizci-me, a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> collectiva, e o direito <strong>de</strong> associaç&o, po<strong>de</strong>m dizer-se<br />

assim sem trepi<strong>da</strong>r que saU ooueas <strong>de</strong> que a lei po<strong>de</strong> dispor como ama<br />

creança <strong>de</strong> seus brinque<strong>do</strong>s ?<br />

Por Deus ! a mente <strong>do</strong> homem não k um relogio <strong>de</strong> repetiçao; que se tenha<br />

dicto, que se tenha escripto, que imprta fsm?<br />

E em quanto ao aesumpto <strong>do</strong> projecto aos bem <strong>do</strong> clero, to<strong>da</strong>s estas qo~t&~ toniam novo aspecto; e o ar. Uernardino Pinlieiro não ignorava cle certo que,<br />

alem <strong>de</strong> se discutir, <strong>de</strong> ha muito j&, a legitimi<strong>da</strong>tle <strong>da</strong> expropriaçâo feita pelo<br />

Xsta<strong>do</strong> no acto <strong>da</strong> extincçào <strong>da</strong>s or<strong>de</strong>na religiosas, ain<strong>da</strong> não são passa<strong>do</strong>s<br />

tred annos que aa Constituintes heapanholw ouviram uma voz bem auctdsacla<br />

nos arraiaes <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> chamar um roubo a essa expropriação.<br />

Sejamos pois mais francos: o homem livre <strong>de</strong>ve primeiro que tu<strong>do</strong> ser irne<br />

parcial, porque a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> h t5 fawiosa,


municipio ou outro qualquer etiabelecime~io <strong>de</strong> pie<strong>da</strong><strong>de</strong> 4 in-<br />

strucçào pirlrlica. e que estes eslabelecimenios foram creo<strong>do</strong>s pela<br />

socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, por ella po<strong>de</strong>m portanto ser eainctos, e qw ninguem<br />

<strong>de</strong> scieneia, e em boa fd, o põe em duui<strong>da</strong>.~<br />

Se se tracta <strong>do</strong>s bens ecclesiasticos, po<strong>de</strong> o auctor <strong>do</strong> projecto<br />

ter razão ; mas, quanto á existencia mesma, á extincç'io ou con-<br />

scrvaçao <strong>do</strong> bispa<strong>do</strong>, 6 para 116s muito coritestavel a <strong>do</strong>utrina <strong>do</strong> illus-<br />

tre <strong>de</strong>puta<strong>do</strong>.<br />

I'ois os bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Pinhel, <strong>de</strong> Castello-Branco, <strong>de</strong> Portalegre,<br />

<strong>de</strong> Aveiro e <strong>de</strong> Paro foram crea<strong>do</strong>s pela socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, <strong>da</strong> mesma forma<br />

que os municipios e as escolas? Pois reconheceu nunca o direito<br />

ecclesiastico portuguez similhante direito aos nossos reis e <strong>de</strong>pois<br />

<strong>do</strong> regimen liberal ao Esta<strong>do</strong> portuguez ?<br />

E, quan<strong>do</strong> assim fosse, estes estabelecimentos não po<strong>de</strong>riam di-<br />

zer-se <strong>da</strong> mesma natureza <strong>do</strong>s outros, porque a Carta Constitucio-<br />

nal tem um artigo, on<strong>de</strong> a naçâo portugueza se obriga a continuar<br />

a ter a religiào catholica como religião <strong>do</strong> reino, a protegel-a, a<br />

respeitar suas leis; e Mra mister ou provar a existencia <strong>do</strong> direito<br />

priva<strong>do</strong> <strong>da</strong> nossa egreja, ou negar o direito geral <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes; e<br />

riem uma riem outra cousa faz o auctor <strong>do</strong> projecto, nem cremos<br />

que o po<strong>de</strong>sse fazer.<br />

Como no projecto o principal assumpto eram os bens ecclesias-<br />

ticos, e para ellcs tinham to<strong>do</strong> o vigor as consi<strong>de</strong>raçòes allega<strong>da</strong>s<br />

tio relatorio, parece que o distincto <strong>de</strong>puta<strong>do</strong>, cego um instante<br />

por exagera<strong>do</strong> patriotismo, queria <strong>de</strong> envolta com ellas fazer passar<br />

os artigos, que, sen<strong>do</strong> <strong>de</strong>pois lei, teriam irremediavelmente acaba<strong>do</strong><br />

as quest6es.<br />

380 po<strong>de</strong>, porem, proce<strong>de</strong>r-se assim, sem quebra <strong>da</strong> digni<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

nacional e ernquanto a religião catholica for a religiâo <strong>do</strong> reino.<br />

L)a mesma maneira não encontramos no projecto os tituios em<br />

que se fun<strong>de</strong> o direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>spojar o patriarcha<strong>do</strong> <strong>de</strong> Lisboa <strong>da</strong>s<br />

Iionriis que 1). Joào v para elle conseguiu <strong>do</strong> papa.<br />

Tanto como o auctor <strong>do</strong> projecto comprehen<strong>de</strong>mos n6s a <strong>de</strong>s-<br />

necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> d'aquella primazia esplen<strong>do</strong>rosa, <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> que se<br />

rios revela não s6 perante o esta<strong>do</strong> difficil <strong>da</strong> fazen<strong>da</strong> publica <strong>do</strong><br />

nossa paiz, mas tambem em presença <strong>da</strong>s conveniencias <strong>da</strong> propria<br />

egreja. I<br />

Mas, como conseguir esta reforma por um <strong>de</strong>creto ou uma lei?<br />

como fazel-o sem a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> Sé apostolica?


A.lcançou-o po,r ventura assim o mestre <strong>de</strong> Aviz? p6<strong>de</strong> conse-<br />

guil-o sem esse concurso o rei faustuoso f<br />

Corihecemos s6 uma hypothese em que seria possivel pelos meios<br />

que o projecto indica, por <strong>de</strong>cretos <strong>da</strong> soberania temporal, obter<br />

cssa necessaria e conveniente <strong>de</strong>soneração <strong>da</strong> fazen<strong>da</strong> publica: C n<br />

hypothese <strong>da</strong> separaçuo <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> portuguez <strong>da</strong> egreja catholirn<br />

(10 nosso paiz.<br />

Antes d'isso o projecto 6 'nesta, como na outra parte, offensivo<br />

<strong>do</strong> actual direito publico portuguez ecclesiastico e politico.


CAPITULO V<br />

Ultimas palavras<br />

As ultimas palavras d'este imperfeito trabalho, que v80 ler-se<br />

neste capitulo, sáo uma consequencia <strong>do</strong> que acima se escreveu,<br />

e ao mesmo tempo um <strong>de</strong>sejo mui vivo e uma esperança <strong>de</strong> seu<br />

auctor.<br />

Não ha direito, nem mais intimo, nem mais sagra<strong>do</strong>, <strong>do</strong> que o<br />

direito <strong>de</strong> elevar o espirito até Deus, <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong>sinvolver-se e<br />

florescer o instincto religioso, atb tomar a forma precisa <strong>de</strong> uma<br />

idéa; idéa que alenta a vi<strong>da</strong>, quan<strong>do</strong> a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>ixou compre-<br />

hcri<strong>de</strong>r e a comprehensão trouxe a crença; idéa que esmaga com<br />

seu peso e martyrisa com a duvi<strong>da</strong>, quan<strong>do</strong> a força <strong>de</strong> uma direc-<br />

ção qualquer niio espontanea roubou a luz e o ar ao sentimento<br />

mystico <strong>da</strong> alma.<br />

Se a inviolabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> faz <strong>da</strong> <strong>de</strong>sigual<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> lei iim<br />

gran<strong>de</strong> crime, a <strong>de</strong>sigual<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> lei em materia <strong>de</strong> religilo é o<br />

maior <strong>do</strong>s crimes.<br />

Não conhecemos na<strong>da</strong> mais revoltante, e mais indigno <strong>de</strong> um<br />

povo livre.<br />

E a primeira <strong>da</strong>s nossas leis, a lei <strong>da</strong> nossa liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, <strong>do</strong>s nos-<br />

sos <strong>direitos</strong>, a lei sagra<strong>da</strong>, 1130 po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> separar a idéa <strong>de</strong> reitio<br />

<strong>da</strong> idéa <strong>de</strong> dynastia, e a idéa <strong>de</strong> dynastia <strong>da</strong> idéa <strong>de</strong> religião, logo<br />

em seri atrio gravou o odioso principio <strong>de</strong> uma religião <strong>do</strong> reino,<br />

com to<strong>do</strong>s os privilegios e to<strong>da</strong>s as intolerancias <strong>da</strong> velha mo-<br />

iiarchia !<br />

Soffremos hoje as consequencias d'este facto,


Por mais que se diga que o sentimento religioso é <strong>do</strong> intimo<br />

e livre f6ro <strong>da</strong> consciencia, por mais que se preten<strong>da</strong> sustentar<br />

que o Esta<strong>do</strong> n8o po<strong>de</strong> <strong>de</strong>sacomparihar <strong>de</strong> sua protecçâo a idéa<br />

religiosa, penhor <strong>da</strong> moral e conservação <strong>do</strong>s costumes ; é sempre<br />

certo, como diz o profun<strong>do</strong> Hrimboldt, que a protecção official,<br />

dispensa<strong>da</strong> a certa religiâo, involve uma pressão mui activa sobre<br />

a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> individual, pressão que se nào v&, que rifio consegue<br />

effeito nos espiritos illustra<strong>do</strong>s, mas que 6 um <strong>de</strong>spotismo real<br />

para a maioria <strong>de</strong> um povo, para o homem ignorante e srm liizcs<br />

<strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, para o homem ru<strong>de</strong> e supersticioso <strong>do</strong>s campos.<br />

Compellir, directa ou indirectamente, o sentimento religioso, 6<br />

quasi mais perigoso <strong>do</strong> que fomentar a intolerancia <strong>de</strong>scoberta,<br />

franca e acompanha<strong>da</strong> <strong>de</strong> persegriiçòes e violencias; porque 'nesta<br />

a consciencia <strong>da</strong> propria digni<strong>da</strong><strong>de</strong> resalta orgulhosa, e com aquella<br />

o sentimento religioso 6 inteiramente <strong>de</strong>svirtua<strong>do</strong> cm quem o ngo<br />

po<strong>de</strong> comprchcn<strong>de</strong>r, porque per<strong>de</strong> o que lhe vem <strong>da</strong> alma, puro<br />

e ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro, para acceitar d'outrem um empresta<strong>do</strong> e que nTio<br />

percebe; e é totalmente apaga<strong>do</strong> em quem o podia conceber, por-<br />

que produz a indifferença ou a hypocrisia.<br />

A indifferença e a hypocrisia I e quem tem o olhar tRo curto que<br />

1130 veja entre as causas dm males d'esta terra, e <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> um<br />

<strong>do</strong>s povos contemporaneos, esses <strong>do</strong>is inimigos <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o senti-<br />

mento puro, <strong>de</strong>sinteressa<strong>do</strong> e enthusiastieo ?<br />

A indiflerençn e a hypocrisia preparam o homem para tu<strong>do</strong>: em<br />

rim paiz falto <strong>de</strong> instrucçao e sujeito a um regimen <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

sáo esses os maiores instrumentos <strong>do</strong> <strong>de</strong>spotismo: o as religiões <strong>do</strong><br />

Esta<strong>do</strong> e a exclusáo e intolerancia <strong>do</strong>s ciiltos prodrizem fatalmerite<br />

a indifferenqa e a hypocrisia.<br />

Nào preten<strong>de</strong>mos <strong>da</strong>r aqui a <strong>de</strong>monstraçfio cabal d'esta ver<strong>da</strong><strong>de</strong> ;<br />

nem 6 nosso proposito fazer ver como a tlieoria <strong>da</strong> protecyão <strong>da</strong>s<br />

religiòos pelo Esta<strong>do</strong> estdi cun<strong>de</strong>mna<strong>da</strong> pela sciencia e pelos factos:<br />

sómente <strong>de</strong>sejamos chamar a attenção <strong>de</strong> quem ler sobre um ponto<br />

especial, inteiramente liga<strong>do</strong> com O objecto geral d'este livro, e<br />

que como ess'outro pe<strong>de</strong> a separaeao <strong>da</strong>s duas serie<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

A protec~tío concedi<strong>da</strong> pelo Esta<strong>do</strong> a uma egrejn qualquer, d'on<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>ve <strong>de</strong>duzir-se como primeira ohrigaqko a <strong>de</strong> <strong>do</strong>tar o clero pelo<br />

thosouro publico, dh inevitavelmente logitr a coníiictos como oqiielles<br />

que motivaram o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 12 <strong>de</strong> novembro dc 1869 e lembraram<br />

o patriotico projecto <strong>de</strong> Ici <strong>de</strong> que falhmos. Estes confli-


ctos são perfeitamente insoluveia neste esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> rela~ães, e mostram<br />

assim o vicio d'essas mesmas relaçães.<br />

Este facto <strong>de</strong> o Esta<strong>do</strong> ter <strong>de</strong> pagar ao sacer<strong>do</strong>te, 6 ain<strong>da</strong> outra<br />

salicnte e <strong>de</strong>testavel consequencia <strong>de</strong> similhante systema, pois<br />

que d'essa maneira o sacer<strong>do</strong>te 6 necessariamerite um assiilaria<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, um funccionario, um emprega<strong>do</strong> priblico; c neo ha<br />

na<strong>da</strong> mais indigno <strong>do</strong> que fazer fiinccionario publico o sacer<strong>do</strong>te,<br />

o padre, este homem que tem <strong>de</strong> realisar na terra uma tno eleva<strong>da</strong><br />

e sancta missiio.<br />

uma i<strong>de</strong>a que faz tedio.<br />

]I: d'esta maneira, os ficis, <strong>de</strong> braços cruza<strong>do</strong>s, conseritcm que<br />

lhe imponham por parte <strong>de</strong> uma enti<strong>da</strong><strong>de</strong> moral, que niio tem,<br />

nem po<strong>de</strong> ter religigo, o padre, o parocho, csse que ha <strong>de</strong> sanctificar-lhes<br />

o primeiro dia <strong>da</strong> existencia <strong>de</strong> seus filhos, consagrarlhes<br />

a iinião perpetua com a mulher que lhes partilha a vi<strong>da</strong>, acompanhal-os<br />

na angustia <strong>da</strong> hora final, ser-lhes um pac provi<strong>de</strong>nte<br />

no <strong>de</strong>salento e na miseria !<br />

E isto promette e cumpre o Estu<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> prumcttcii. e <strong>de</strong>ve<br />

cumprir a inviolabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, que fere vitalmente agora,<br />

porque tanto concorre para n <strong>do</strong>taçno <strong>do</strong> clero o jii<strong>de</strong>u e o prc*.<br />

testante, como o catholico !<br />

As leis, edifican<strong>do</strong> as instituiçòes, acostuman<strong>do</strong>-nos a ellas, exigin<strong>do</strong>-nos<br />

rigoroso respeito, concorrem efficazmente para a formaçso<br />

<strong>da</strong> opinião <strong>do</strong> publico, e triste 6 a opinião publica que se robustece<br />

á sombra <strong>de</strong> similhantes instituições.<br />

Alem d'estas <strong>de</strong>sigiial<strong>da</strong><strong>de</strong>s e incoherencias, alem d'estes erros e<br />

inconvenientes disposiç<strong>de</strong>s, o actual esta<strong>do</strong> dç relaçks <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> 1<br />

e egreja portugueza 6 incompativel com a id6a <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, com<br />

o espirito <strong>do</strong> actual regimen.<br />

Qiie a egrcja coriserve os seus usos e costumes proprios, suas<br />

praxes <strong>do</strong>mesticas, na<strong>da</strong> nos importa ; ella C! uma socie<strong>da</strong><strong>de</strong> livre<br />

<strong>de</strong> homcns livres, reuni<strong>do</strong>a para o mais livre fim, qual t! a religião.<br />

Viva pois como quizer.<br />

O que nos interessa 6 a critica d'estas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s que lhe advêm<br />

<strong>do</strong> la<strong>do</strong> profano <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>.<br />

Não <strong>de</strong>sconhecemos n6s quão preciosas foram em tempos estrts<br />

liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, mais ou menos ligadirs ao esplen<strong>do</strong>r <strong>do</strong> sccptro portuguez;<br />

ellas marcam epocas <strong>de</strong> <strong>de</strong>safronta, prio<strong>do</strong>s <strong>de</strong> gloria. NHo<br />

as renegamos pois; mas porque Affonso, o filho <strong>do</strong> con<strong>de</strong> E-lvnriqiie,


nos ganhou a in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia, havemos <strong>de</strong> ir viver prostra<strong>do</strong>s <strong>de</strong>ante<br />

<strong>do</strong> arren<strong>da</strong><strong>do</strong> e magnifico tumulo <strong>do</strong> conquista<strong>do</strong>r <strong>de</strong> Santarem,<br />

havemos <strong>de</strong> esquecer-nos e passar a vi<strong>da</strong> lia contemplar,ão d'estas<br />

heroicas sombras, abraçarmo-nos a ellas, e <strong>de</strong>ixarmo-nos morrer<br />

mergulha<strong>do</strong>s em a nuvem scintillante <strong>de</strong> recor<strong>da</strong>ções <strong>de</strong> gloria que<br />

as envolve ?<br />

Não po<strong>de</strong> ser; o presente chama-nos, o futuro espera-nos.<br />

As liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja portugueza, estas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s mais iriti-<br />

mamente liga<strong>da</strong>s á cor<strong>da</strong> <strong>de</strong> Portugal, já nào esistem.<br />

Decrepitas iis encontrou o regimen constitucional, sem vi<strong>da</strong> as<br />

prostrou por terra.<br />

Cumpre-nos agora levantal-as cui<strong>da</strong><strong>do</strong>sos, sacudir-lhes o p6 <strong>da</strong>s<br />

luctas com que esta nossa i<strong>da</strong><strong>de</strong> turvou a luz <strong>de</strong> seus primeiros<br />

dias, e guar<strong>da</strong>l-as com respeito no panttieon <strong>da</strong>s nossas memorias<br />

brilhantes.<br />

Com que direito os po<strong>de</strong>res publicos <strong>de</strong> um povo livre vem a<br />

uma <strong>da</strong>s egrejas <strong>de</strong> sua terra, aquella que mais dilata<strong>do</strong> espaço<br />

tem occupa<strong>do</strong> no mun<strong>do</strong>, aquella a quem mais <strong>de</strong>ve, que foi a religião<br />

<strong>de</strong> seus paes, que 6 a religião <strong>do</strong> maior numero, com que<br />

direito se apresenta o esta.<strong>do</strong> <strong>de</strong>ante d'ella e, encostan<strong>do</strong>-se h haste<br />

<strong>do</strong> pendão liberal, lhe diz :<br />

«Não tens direito <strong>de</strong> eleger os teus sacer<strong>do</strong>tes, os teus ministros;<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o mais humil<strong>de</strong> parocho <strong>da</strong> ald&a perdi<strong>da</strong> na agrura <strong>da</strong>s serras,<br />

at8 o radiante patriarcha <strong>da</strong> basilica, inn8 <strong>de</strong> Roma na sumptuosi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>da</strong>s honrarias; <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a ci<strong>da</strong><strong>de</strong> roaba<strong>da</strong> aos sarracenos<br />

pela mão d'aquelles que ao meio <strong>da</strong> peleja levavam o symbolo <strong>do</strong><br />

martyrio <strong>de</strong> Christo prega<strong>do</strong> nas roupas, at6 ás povoaçkes ondt. a<br />

seiva <strong>da</strong>s florestas acarreta as parcellas <strong>do</strong> sangue <strong>do</strong>s Castros, <strong>do</strong>s<br />

Cunhas, <strong>do</strong>s Albuquesques, <strong>de</strong> tantos outros; por to<strong>do</strong> o orbe portugiiez<br />

; hei <strong>de</strong> ser eu que os eleja, que os escolha, que os apresente?))<br />

Que! ten<strong>de</strong>s a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> para to<strong>da</strong>s as socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s e não a ten<strong>de</strong>s<br />

para essa? reverenciaes essa instituicão por ter si<strong>do</strong> a religiRo<br />

<strong>de</strong> nossos paes e pren<strong>de</strong>is-lhe na garganta a corrente <strong>da</strong> escravidão,<br />

fazeis d'ella escrava a religião <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> por to<strong>da</strong> a parte<br />

o braço potente <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>rruba to<strong>da</strong>s as servi<strong>do</strong>es!<br />

Pois reconheceis que a iniciati~a individual 6 a forca motora <strong>do</strong><br />

progresso, que a associação 6 o seu instriirnento, e viri<strong>de</strong>s coritrariar<br />

esws principios que abraçastcç, Sazeri<strong>do</strong> com o riit<strong>do</strong> <strong>da</strong>s vossas<br />

I


armaduras, <strong>de</strong>slustra<strong>da</strong>s pelas pugnas turbulentas <strong>da</strong> praça publica,<br />

calar a voz <strong>do</strong> apostolo, que dizia-,que na<strong>da</strong> havia mais livre <strong>do</strong><br />

que a religião - viihil liberius quam religio ?<br />

Oh! isto 6 incomportavel ; isto mancha o brilho puro <strong>da</strong> vi<strong>da</strong><br />

livre e <strong>da</strong> digni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> xix seculo; e ca<strong>da</strong> um <strong>de</strong> 116s tem o gran<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>ver moral <strong>de</strong> perceber a idka <strong>do</strong> seu tempo, <strong>de</strong>senvolve-la com<br />

os esforços <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a sua vi<strong>da</strong> e entregal-a assim ás gerações <strong>do</strong><br />

futuro !<br />

Temei que n?io vos aconteça como áquelles christsos que o Cesar<br />

man<strong>da</strong>va amarrar aos ca<strong>da</strong>veres, para que os vermes communicassem<br />

aos vivos o veneno <strong>da</strong> morte.<br />

Essas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s foram precisas ao Marquez <strong>de</strong> Pombal, mas<br />

tambem lhe foram precisas as forcas e os patibulos; e quereis v6s<br />

tambem evocar <strong>do</strong> meio <strong>da</strong>s praças publicas essas sombras ensanguenta<strong>da</strong>s<br />

<strong>da</strong> tyrannia <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> ?<br />

Temia-se então o braço <strong>da</strong> theocracia; <strong>de</strong>visava-se com espanto<br />

aberta e raia<strong>da</strong> <strong>de</strong> sangue a garganta <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r absorvente <strong>do</strong><br />

anti-Christo encarna<strong>do</strong> papa.<br />

Podiam ler-se os pergaminhos d'essas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s; e os menos<br />

acostuma<strong>do</strong>s aos estu<strong>do</strong>s paleographicos reconheciam com facili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

a legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong> d'esses titulos. I..*-* I<br />

Mas hoje ? .... .<br />

Temeis tambem hoje as ameaças d'essa tormenta P "J) ,<br />

Puerili<strong>da</strong><strong>de</strong> !<br />

Não se lembram que o mun<strong>do</strong> já admirou esse homem que<br />

I<br />

eripuit coelo fulmen sceptrumque tyrannis;<br />

recêam ain<strong>da</strong> que os raios <strong>da</strong> theocracia os venham fulminar, e<br />

por pouco que não amaldiçoam a memoria <strong>do</strong> gran<strong>de</strong> homem,<br />

porque, ao passo que <strong>de</strong>sarmava o céu <strong>da</strong>s armas <strong>de</strong> sua colera,<br />

Ihes arrebatava <strong>da</strong>s mãos o sceptro <strong>da</strong>s tyrannias!<br />

Ouvimos já dizer :<br />

«Utopia ! os povos não estão prepara<strong>do</strong>s!))<br />

& sempre a mesma voz ; sempre o fallar d'aquelleg, que são<br />

como esses homens <strong>da</strong>s escripturas, que tem olhos e não veem, ou-<br />

vi<strong>do</strong>s e n30 ouvem.<br />

Com franqueza, dizei-nos: é preciso obsciirecer o sol com o<br />

moiitiio <strong>de</strong> ruinas que a separação <strong>do</strong> nosso Esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> nossa egreja<br />

ha <strong>de</strong> produzir ?<br />

I I<br />

'<br />

I<br />

I<br />

1<br />

I


Essa mparaçáo esth tso longo dc ser uma utopia, que 6 uma<br />

necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> urgcnte; asth taosdistante <strong>da</strong> chimera, que ellii po<strong>do</strong><br />

rcalisar-se sem qiic iim Ilorão só se <strong>de</strong>spren<strong>da</strong> <strong>do</strong> lavor <strong>da</strong>s catliedrues<br />

dn nossa egrcja, e sem que uma diis cruzes alça<strong>da</strong>s no seu vertice<br />

sc vc~ja pendi<strong>da</strong> por lhe [altar o alento publico.<br />

Sabeis o que 6 preciso, o que suficiente?<br />

& o que o Efita<strong>do</strong> se retira pru<strong>de</strong>nte, e cautelosamente <strong>de</strong>sap<br />

paipça <strong>da</strong> scena, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> o espaço livre.<br />

Tome a sua constituiçáo e risque tres artigos: acabe com are-<br />

Iigiáo <strong>do</strong> reino no art. 6.O, c com o padroa<strong>do</strong> e beneplacito no<br />

art. 75; vB ás suas leis e apague o principio <strong>da</strong> <strong>do</strong>taqâo <strong>do</strong> clero<br />

pelo thesouro, c <strong>de</strong>ixe h greja esse cui<strong>da</strong><strong>do</strong>, ou por contribuições,<br />

<strong>de</strong>rramas, coogruas, como hoje estáo vigoran<strong>do</strong>, oii por salarios<br />

pagos rio acto <strong>da</strong> prestação <strong>do</strong> serviqo; em uma palavra, como (3<br />

quan<strong>do</strong> clla quizer.<br />

«O beiicplacito?! dir-nori-50, havcn~os <strong>de</strong> ir insultar as cinras<br />

<strong>do</strong> gran<strong>de</strong> rei, <strong>do</strong> grandc justiceiro?<br />

Que ! pois niio ve<strong>de</strong>s como o ultramontanismo, o pqti<strong>do</strong> <strong>da</strong>s<br />

trevas, ca<strong>da</strong> vez mais se exalta, mais truholha, mais conscguc,<br />

introduzin<strong>do</strong>-rrc no mais intimo sanctiiario <strong>da</strong>s familias, lk on<strong>da</strong><br />

vós cui<strong>da</strong>rs sircrilrgio penetrar; arrastan<strong>do</strong>-se até os estabeleci-<br />

mcntos <strong>de</strong> pic<strong>da</strong><strong>de</strong> c dc instrucção e enroscan<strong>do</strong> o seu escamoso<br />

corpo em bolta <strong>da</strong>s cteoricinhas para lhe sriffocar o espirito nas-<br />

cciitc ; corren<strong>do</strong> apressa<strong>do</strong> e com o olhiir torvo dc ambiçòes ao<br />

meio <strong>da</strong>s povoaçòes ignorantes <strong>do</strong>s campos e quc sc ciitregam iio<br />

siicrificio como os mansos animaes ao ciitcllo <strong>do</strong>s sacrifica<strong>do</strong>res <strong>do</strong><br />

paganismo grego ?<br />

E e agora qrie v6s quereis <strong>de</strong>sapertar o peito <strong>de</strong> aço <strong>do</strong> bene-<br />

plecito e <strong>do</strong> padroa<strong>do</strong> !n<br />

Sim, e agora mesmo; porque emquanto o tivermos conchegnilo<br />

ao peito, cmqiianto promettcrmos esten<strong>de</strong>r o nosso escu<strong>do</strong> protc-<br />

ctor sobre a religi30 <strong>do</strong> reino, nào temos o direito <strong>de</strong> impedir que<br />

o catliolicismo romano exerço a sua viva forca, preguc as euas<br />

<strong>do</strong>utrinas, embora falsas; porque o Esta<strong>do</strong> que promctte protecçgo<br />

nho pu<strong>de</strong> atreiçoar.<br />

&Ias <strong>de</strong>ixai to<strong>da</strong>s estas lucias ao impcrio c força <strong>do</strong> direito com-<br />

mum; <strong>de</strong>ixai que o bispo, que publícii a pastoral offi:nsiva cios (li-<br />

rraitos <strong>da</strong> sohorania nacional, scja como qunlqiier oiitril 11cs40ii aos<br />

olhos <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, como qualquer outro ci<strong>da</strong>dgo quc abusiistx tie sua


posiçáo e attacam o que <strong>de</strong> mais sapa<strong>do</strong> ha no mun<strong>do</strong>; c dizei-me<br />

se nas garantia6 geraes <strong>da</strong> lei nao ancontrais agora, <strong>de</strong>pois <strong>do</strong><br />

apnga<strong>do</strong> o artigo 6.O <strong>da</strong> Carta, a força, o indispensavel e justo vi-<br />

gor, <strong>de</strong> qiie tanto se carece na protecç8o <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> !<br />

Foi, porventura, em harmonia com o artigo 6." <strong>da</strong> Carta, foi<br />

cumprin<strong>do</strong> os <strong>de</strong>veres <strong>de</strong> protector que o Esta<strong>do</strong> portuguez extin-<br />

guiu as or<strong>de</strong>ns religiosas em 1834 ? foi cumprin<strong>do</strong> esses mesmos<br />

<strong>de</strong>veres que elle se approprioii <strong>de</strong> seus bens.? 6 na reali<strong>da</strong><strong>de</strong>, como<br />

leal protector, que elle se v& obriga<strong>do</strong> hoje a não prover <strong>de</strong> bispos<br />

OB bispa<strong>do</strong>s <strong>do</strong> reino ?<br />

Foi assim, iisan<strong>do</strong> <strong>de</strong> seus <strong>direitos</strong>, que elle expulsou os jesuitas<br />

em tempos que 18 vio; porque então era elle, nlem <strong>de</strong> ~~rott-ctor,<br />

supremo inspector; mas essa força per<strong>de</strong>u-a hoje <strong>de</strong>pois 00 imp<br />

rio <strong>do</strong> governo livre; e, quan<strong>do</strong> <strong>de</strong>via reeuperd-a nos saltitares<br />

principios <strong>do</strong>-direito commum, foi recusal-a no sexto artigo <strong>da</strong><br />

constituição que elaborou.<br />

Ahi 6 que esth to<strong>do</strong> o mal.<br />

Duvi<strong>da</strong>r d'isto C duvi<strong>da</strong>r <strong>de</strong> que o Esta<strong>do</strong> nZio esteja revesti<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong> força necessaria para a siia vi<strong>da</strong> livre e pacifica.<br />

Quanto a oulros effeitos d'esses males <strong>do</strong> ultrsinontanismo, quei-<br />

xemo-nos <strong>do</strong> pessimo esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> nossa instrucçao e procuremos<br />

reformal-a quanto antes.<br />

Ella 8 s6 o unico meio efficaz <strong>de</strong> esmagar a vibora <strong>do</strong> ultra-<br />

montanismo, se vibora é ; ha <strong>de</strong> dizcl-o a discussao livre, e nuiica<br />

o explicar8 a protecção legal d'essa nieema seita, esten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o<br />

seu influxo a to<strong>da</strong> a legislaçáo <strong>de</strong> um povo.<br />

Esta separaçso 8 vital; ha <strong>de</strong> impor-se, mais ce<strong>do</strong> ou mais<br />

tar<strong>de</strong>.<br />

Mais ce<strong>do</strong>, se a pru<strong>de</strong>ncia reformar as *leis ; mais tar<strong>de</strong>, quandil<br />

o embate sanguinolento <strong>do</strong>s interesses e <strong>da</strong>s ambições a encravar<br />

nas instituiçòes.<br />

Com ella o christianismo ba <strong>de</strong> viver mais dilata<strong>do</strong>s annos, por-<br />

que, aban<strong>do</strong>na<strong>da</strong> & inspecção <strong>do</strong>s firis, a disciplina ha <strong>de</strong> necessa-<br />

riamente reformar-se, ha <strong>de</strong> restabelecer-se na sua forma primi-<br />

tiva, e assim po<strong>de</strong>rá abraçar o progresso e a liber<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

fla aqui uma fatali<strong>da</strong><strong>de</strong> tao imperiosa, quanto o cliristiariismo<br />

e iiiseparavel <strong>do</strong> futuro.<br />

Antes <strong>de</strong> attingir o i<strong>de</strong>al, n nossa çivilisaç80 ha <strong>de</strong> aciibnr iim<br />

dia.


Mal sabia o cantor apaixona<strong>do</strong> e gran<strong>de</strong> <strong>da</strong> triste Beatrice, .pe,<br />

copian<strong>de</strong>. na divina comedia esses cyclos <strong>do</strong> inferno, que sua ima-<br />

ginação inson<strong>da</strong>vel lhe pintava concentricos e ca<strong>da</strong> vez mais vastos,<br />

elle <strong>de</strong>sven<strong>da</strong>va o quadro <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> <strong>da</strong> humani<strong>da</strong><strong>de</strong>!<br />

Ca<strong>da</strong> um d'esses cyclos é uma civilisação; a ca<strong>da</strong> um d'clles<br />

presi<strong>de</strong>m <strong>do</strong>is principias: um que lhe dilata a circumferencia, ao- .<br />

cioso; outro que lh'a estreita, im placavel.<br />

Aquelle 6 o principio <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>, <strong>de</strong> progresso-a utopia.<br />

Este o principio cahotico, <strong>de</strong> morte-a reacçào.<br />

D'aqui as expressões syntheticas <strong>do</strong> viver <strong>do</strong> homem : - lucta<br />

e trabalho.<br />

O nosso cyclo é o cyclo <strong>do</strong> christianismo, b cyclo <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />

<strong>da</strong> egual<strong>da</strong><strong>de</strong> e <strong>da</strong> fraterni<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

A sua ultima palavra, que o futuro par<strong>da</strong>, é o socialismo.<br />

To<strong>do</strong>s os cyclos têm um homem que lhe <strong>de</strong>scrobre a lei, a<br />

alma, a idPa.<br />

A <strong>de</strong>scoberta firma-se sempre com o sangue <strong>do</strong> mnrtyrio.<br />

To<strong>do</strong>s os cyclos tem uma Iegrn<strong>da</strong>, traducçzo perpetua<strong>da</strong> <strong>do</strong><br />

prnsarnento vivo qiie se dcsinvolve <strong>do</strong>ntro d'elle.<br />

A origem divina &lhe sempre attri1)iii<strong>da</strong>.<br />

To<strong>do</strong>s os cyclos tem iim symbolo, que sc ergue juncto <strong>do</strong> seu<br />

berço e se apaga quan<strong>do</strong> piíra a sua dcsenvolução.<br />

A este symbolo cerca-o a a<strong>do</strong>ração.<br />

O nosso cyclo tem o Chiisto, a Bihlia e a Cruz.


INDICE<br />

Pag .<br />

P~UYIUAE.. .................................................. 9<br />

PARTE PRIMEIRA<br />

...............................<br />

........<br />

.................<br />

CAPITULO I -Tempos apostolicoa. 19<br />

CAPITULO 11-Dee<strong>de</strong> os tempos apostolicos até Constantino.. 27<br />

CAPITULO 111-Des<strong>de</strong> Constantino att5 o seculo ix.. 43<br />

CAPITULO IV-As falsa8 <strong>de</strong>cretaes ............................... 91<br />

.........<br />

CAPITULO V- Des<strong>de</strong> o seculo IX até o Concilio Tri<strong>de</strong>ntino.. 99<br />

CAPITULO VI-A SB apostolica e as egrejas nacionaes; ultimo esta<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

direito <strong>da</strong> egreja ................................ 111<br />

PARTE SEGUNDA<br />

LBGI~LA~ÃO ECCLESIASTICA POBTUGUEZA A BEBPEITO DA EEECÇÃO,<br />

su~~nwlio, UNIÃO, DIVI~O, E CIRCUMBCBIPÇÃO<br />

DAS DIOCEBES E IETBOPOLES<br />

CAPITULO I -A egreja portugueza e suas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s ............... 123'<br />

CAPITULO 11-0 Esta<strong>do</strong> portugues e a erecglo <strong>do</strong>e bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Portugal<br />

até o tempo <strong>do</strong> D. Joeb I ......................... 153<br />

CAPITUW 111 -O Summo imperjo: protecqb e inspec* suprema. .... 169<br />

CAPITULO IV - A religilo <strong>do</strong> reino ............................... 183<br />

CAPITULO V-Ultimas palavras a.. 197<br />

........................<br />

......


ERRATAS PRINCIPAES<br />

Errou<br />

toute<br />

toute<br />

dizcmos<br />

assento<br />

Rerlamino<br />

Iadca<strong>da</strong><br />

aberrams<br />

Petiiio e Carlos magno<br />

Leao Beryta<br />

Castellar<br />

fasci-nação<br />

que os leva<br />

coinpi rlien<strong>de</strong><br />

(<strong>do</strong> aiitrirnario) 17<br />

respectiva<br />

ren<strong>de</strong><br />

21<br />

toutes<br />

toi1t<br />

digamos<br />

aseeutirncnto<br />

Bellarmiiio<br />

lar<strong>de</strong>a<strong>da</strong><br />

abnegciçces<br />

Pepin e Karl o grai~<strong>de</strong><br />

Leão, 8eryta<br />

Castelar<br />

fascina~ão<br />

os levn<br />

e ~los~a<br />

resprctiva<br />

revela<br />

27

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!