28.08.2013 Views

Dos direitos da igreja e do Estado - Faculdade de Direito da ...

Dos direitos da igreja e do Estado - Faculdade de Direito da ...

Dos direitos da igreja e do Estado - Faculdade de Direito da ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

DOS DIREITOS<br />

EGREJA E DO ESTADO<br />

DIOCESES E METROPOLES<br />

POR<br />

Eduar<strong>do</strong> Dally Alves <strong>de</strong> Sá<br />

Celte allianee entre Ia religion et Ia li-<br />

bertb ne pouvait btre durrible qu'i unecon-<br />

dition ; c'est u1on reviendrait au chrislia-<br />

nisrne priruit$.<br />

Louie B~nnc.<br />

COIMBRA<br />

Imprensa <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

1872


La seule r6alitB d'ici-bas, je I'ai toujoors<br />

senti, c'eat I'amour, I'amour sou8 toule ses<br />

formes.<br />

L~ura~inr.<br />

In opere et sermone st omni patieotia<br />

honora patrem tuum,<br />

ut superveniat tibi beoedictio ab eo.. ..<br />

Dedico este livro a meus paes.<br />

Pronunciar este nome é dizer o motivo d'esta consagração.<br />

Coimbra, 30 <strong>de</strong> Abril<br />

<strong>de</strong> 1872.


DISSERTAC~O INAUGURAL<br />

PARA O<br />

ACTO DE CONCLUSOES MAGNAS<br />

DE<br />

Eduar<strong>do</strong> Dally Alves <strong>de</strong> Sá<br />

NA<br />

IB"HGUllLID4IC>B DE lr!mlEITT@<br />

DA<br />

UNIVERSIDADE DE COIMBRA<br />

EM 1872


PRELIMINAR<br />

I Porque 830 mui importantes, ayezar <strong>de</strong> pouco estu<strong>da</strong><strong>da</strong>s, as queslõas <strong>de</strong> direito<br />

oçclesiastico portuguez. I1 O que e o direito priva<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma egreja. 111 Objecto<br />

d'este trabalho -plano <strong>do</strong> livro.<br />

Cui<strong>da</strong>-se hoje que estu<strong>da</strong>r as questóes <strong>de</strong> direito ecclesiastico<br />

vale o mesmo que <strong>de</strong>spojar-se <strong>da</strong> toga <strong>de</strong> tribuno; pensa-se que<br />

agitar a poeira <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes e <strong>do</strong>s canones <strong>do</strong>s concilias importa<br />

afun<strong>da</strong>r-se nas <strong>do</strong>utrinas mais rancorosas e antipathicas <strong>do</strong> ultra-<br />

montanismo.<br />

k mais um erro quc obscurece estes tempos.<br />

Para mim nâo são sobremo<strong>do</strong> dilectos os trabalhos <strong>de</strong> puro dÈ<br />

reito canonico; não que essas questões <strong>de</strong>ixem <strong>de</strong> ter attractivos:<br />

mui em contrario, sobra-lhes a gravi<strong>da</strong><strong>de</strong>, a difficul<strong>da</strong><strong>de</strong> e o gran-<br />

dioso ate; mas, porque não comprehen<strong>do</strong> como, viven<strong>do</strong>-se em<br />

paizes livres e nestes tempos em que tão graves problemas esma-<br />

gam o mun<strong>do</strong>, o ameaçam com as suas trevas, e pe<strong>de</strong>m o con-<br />

curso <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as intelligencias, nos <strong>de</strong>ixemos ficar, <strong>de</strong>scui<strong>do</strong>sos<br />

ou indifferentes, estu<strong>da</strong>n<strong>do</strong> a organisação, intima, interna, <strong>do</strong>mes-<br />

tica <strong>de</strong> uma socie<strong>da</strong><strong>de</strong> ecclesiastica, que coexiste com outros gre-<br />

mios religiosos, que o esta<strong>do</strong> garante em seu exercicio, a quem<br />

permitte uma vi<strong>da</strong> real e legal, e para os quaes nem ao menos<br />

guar<strong>da</strong>mos um olhar.<br />

E comtu<strong>do</strong> 6 ain<strong>da</strong> mui largo o espaço que se abre <strong>de</strong>ante <strong>de</strong><br />

n6s e quc tcmos a explorar.<br />

& to<strong>do</strong> o direito publico ec<strong>de</strong>siastico nas suas relações com o<br />

direito publico temporal.<br />

São as qucstões que tocam egualmente os confins <strong>da</strong>s duas e+


pheras, religiosa e civil, <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> e <strong>da</strong> egreja. I3 o gran<strong>de</strong> problema<br />

<strong>da</strong>s relações <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r espiritual e temporal.<br />

Este estu<strong>do</strong> 6 hoje mais preciso <strong>do</strong> que nunca. Se em tempos,<br />

que lá vão, foi mister ser canonista para oppor uma espa<strong>da</strong> bem<br />

tempera<strong>da</strong> por parte <strong>da</strong> cor<strong>da</strong> ria lucta com a tiara; ho,je, que<br />

um divorcio <strong>do</strong> altar e <strong>do</strong> throno está tálvcz inimincnte; hoje, que<br />

a soberania, per<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a origem immediatamcnte divina, brota ingente<br />

<strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s humanas e sc scciilarisa para <strong>de</strong>ixar á egreja<br />

a forca que lhe é propria e quc a engrand(v-e; hoje, é necessario tnmbem,<br />

mais <strong>do</strong> que entso por\cntiirn, sat~er aqriillo que é (!c c.,itl,i<br />

um para o <strong>da</strong>r a seu <strong>do</strong>no: -o que é <strong>de</strong> Crsar para o <strong>de</strong>ixar sob o<br />

sceptro; o que 6 <strong>de</strong> Deus para, immacula<strong>do</strong>, o ir <strong>de</strong>por nas aras.<br />

A falta d'este estu<strong>do</strong> é <strong>de</strong>ploravel.<br />

As reformas s8o meticulosas e acanlia<strong>da</strong>s. Os conflictos Ievantam-se<br />

<strong>de</strong>sastra<strong>da</strong>mente, e muitas vczcs a naçãio soffre revezes e<br />

tem <strong>de</strong> humilhar-se, porque, riescia dc seus <strong>direitos</strong>, não pó<strong>de</strong><br />

altiva levantar n fronte e repellir a prrtensso injusta.<br />

Não 6 menos triste ver o esta<strong>do</strong> usurpar as attribuiçbes, <strong>de</strong>sconhecer<br />

os <strong>direitos</strong> <strong>da</strong> egreja, e ter <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> se sustentar em falso<br />

terreno com sophismas e violencias ; elle, que dispõe <strong>da</strong> força ;<br />

elle, o <strong>de</strong>positario <strong>do</strong> direito c <strong>da</strong> justiça.<br />

Ha, to<strong>da</strong>via, razões que t&m torna<strong>do</strong> escassos estes trabalhos<br />

nos ultimos tempos.<br />

A ari<strong>de</strong>z <strong>do</strong>s assumptos; sua difficul<strong>da</strong><strong>de</strong>, que exige por veres<br />

irisanas e atura<strong>da</strong>s fadigas; os raros subsidios <strong>de</strong> que podcmos lançar<br />

mão para o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> direito portiigiiez, consistin<strong>do</strong> pela<br />

maior parte em <strong>do</strong>cumentos, sepulta<strong>do</strong>s, muitos rios archivos, outros<br />

perdi<strong>do</strong>s nas paginas <strong>de</strong> avoluma<strong>da</strong>s obras; a lirigua em que<br />

são escriptos gran<strong>de</strong> numero <strong>do</strong>s livros <strong>do</strong>s tractadistas c redigi<strong>do</strong>s<br />

quasi to<strong>do</strong>s os monumentos e leis; lirigua essa que hoje tem mui<br />

poucos ama<strong>do</strong>rcs: - são tu<strong>do</strong> causas qur muitas vezes fazem aban<strong>do</strong>nar<br />

os in-folio e <strong>de</strong>por a penna.<br />

Depois, n6s temos a infelici<strong>da</strong><strong>de</strong> dr viver 'numa epocha, em<br />

que não s6 o latim 6 fossil para muitos, mas em que, tamhem, a<br />

industria apcrfeiçoadissima nos tem proporciona<strong>do</strong> cm to<strong>da</strong>s as<br />

cousas taes commodi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, que a atmosphera empoeira<strong>da</strong> e o aspecto<br />

<strong>de</strong>crepito <strong>de</strong> um archivo afastam para muito longe o maior<br />

*numero.<br />

n8o s6 os tempos : são tambem os logares ; porque 'nesta


pobre terra, on<strong>de</strong> ha tanta escrescencia disforme, nâo avigora o<br />

amor pelo saber, este amor <strong>de</strong>sinteressa<strong>do</strong>, que s6 po<strong>de</strong> servir h<br />

sciencia.<br />

Eu bem sei que hoje as questões sociaes e politicas estão cha-<br />

man<strong>do</strong> a attenção <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s, e que não <strong>de</strong>ve admirar esta emigra-<br />

ção <strong>da</strong>s intelligcncias e <strong>da</strong>s painas para outras paragens ; mas 6<br />

que este mesmo esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> Europa traz novo interesse a estes ob-<br />

jectos.<br />

Não vbmos surgir aqui, a <strong>do</strong>us passos <strong>de</strong> n6s, um parti<strong>do</strong> novo<br />

na historia, ameaça<strong>do</strong>r, cheio <strong>de</strong> trcvas nas siias aspirações - o<br />

neo-catholicismo ?<br />

E que querem estes homens? querem que ahjuremos <strong>da</strong>s ccm-<br />

quistas <strong>de</strong> tantos scculos <strong>de</strong> luctas c <strong>de</strong> sangue espargi<strong>do</strong> ; querem<br />

que reneguemos esta crença tão sanctn <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, c que o ca-<br />

tholicismo (como lhe chamam) lance por to<strong>da</strong> a superficie d'este<br />

tão formoso planeta que habitamos ngo sei que su<strong>da</strong>rio <strong>de</strong> mortos,<br />

que nos vai roubar o espectaculo grandioso d'este cbu tão puro e<br />

tão azul <strong>da</strong> nossa infancia ; - querem que a theocracia torne a<br />

avassallar o mun<strong>do</strong> ; e isto, porque o mun<strong>do</strong> vacilla agora um in-<br />

stante (porque i! um instante a vi<strong>da</strong> <strong>de</strong> algumas gerações), <strong>de</strong>slum-<br />

bra<strong>do</strong> pela luz brilhante <strong>de</strong> uni fóco <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, que a tyrannia<br />

guar<strong>da</strong>va fecha<strong>do</strong> em sua miio <strong>de</strong> ferro, hoje fundi<strong>da</strong> pelo calor<br />

d'essa mesma chamma.<br />

Nas alturas <strong>da</strong> sciencia não ha estes lo<strong>do</strong>s revoltos, estas pai-<br />

xões turbulentas <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>: ha n sereni<strong>da</strong><strong>de</strong> para surgir a justiça,<br />

ha o silencio para ser fecun<strong>da</strong> a meditaçào.<br />

Mas riem por isso fica extranhn a estas convulsões: pelo con-<br />

trario, prev&-as, estu<strong>da</strong>-as, prepara-lhes o remcdio.<br />

Este estu<strong>do</strong> renasce agora, principalmente nos capitulos que<br />

indicámos.<br />

Em sua estructura interna a egreja não tem que innovar ; cum-<br />

pre-lhe antes fazer o que os economistas preten<strong>de</strong>m na esphera<br />

economica : <strong>de</strong>rrubar vicios, esmagar abusos, tipproximar-se, quanto<br />

possivel, <strong>de</strong> sua constituiçao primitiva, para po<strong>de</strong>r acompanhar a<br />

civilisação no seu gran<strong>de</strong> e ca<strong>da</strong> vez mais apressa<strong>do</strong> caminhar.<br />

Estas as razões, por que preferimos para o presente trabalho<br />

este objecto.


As leis <strong>de</strong> disciplina ecclesiastica catholica s8o <strong>de</strong> duas especies :<br />

geraes e especiaes.<br />

A razão está em que esta egreja diz-se ecumenica - <strong>de</strong> to<strong>do</strong><br />

o orbe habita<strong>do</strong>.<br />

Os costumes são varios ; differentes as posições e circumstancias<br />

<strong>da</strong>s christan<strong>da</strong><strong>de</strong>s 'nesta ou 'naquclla parte <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, 'nesta ou<br />

'naquella latitu<strong>de</strong>.<br />

Náo assim emquanto 6 f6, ao <strong>do</strong>gmii. Este é unico, o mesmo;<br />

este pren<strong>de</strong> o gran<strong>de</strong> corpo catholico. A dissi<strong>de</strong>ricia i1 seu respeito<br />

gera a excommunháo <strong>do</strong> seio <strong>da</strong> egreja.<br />

O conflicto nos pontos <strong>da</strong> disciplina fun<strong>da</strong>mental po<strong>de</strong> produzir<br />

os schismas.<br />

D'esta diversi<strong>da</strong><strong>de</strong> apparece o que se chama egreja nacional,<br />

como a Africana, i1 Hispanica, a Romana, a Germanica, a Galli-<br />

cana, a Iasitana ou Portugueza.<br />

Náo que sejam schismaticas; mas que tem úm direito proprio,<br />

propria disciplina que <strong>de</strong>roga as leis geraes <strong>da</strong> egreja.<br />

Ha na historia <strong>da</strong> egreja catholica um perio<strong>do</strong> em que o di-<br />

reito papal se engrossa com as fontes, que por to<strong>do</strong>s os la<strong>do</strong>s as<br />

falsas <strong>de</strong>cretaes recondiiziam <strong>da</strong>s cgrcjas <strong>do</strong> muii<strong>do</strong> christão.<br />

Este acontecimento, unico rias historias ~)rofarin e ccclcsiastica,<br />

não se completou sem graves rcluctancias e resistencias.<br />

As egrejas queriam conserv~lr o que os seus syno<strong>do</strong>s tinham le-<br />

gisla<strong>do</strong> para sua vi<strong>da</strong> propria ; e em muitos logarcs, a <strong>de</strong>speito <strong>da</strong><br />

nova legislação, permaneceram os tisos locaes e as <strong>de</strong>terminações<br />

já <strong>da</strong> antiga disciplina, jh <strong>do</strong>s canones <strong>do</strong>s concilias provinciaes <strong>do</strong>s<br />

primeiros seculos.<br />

'Nasce d'aqui um direito, pela miiior partr consuetudinario, con-<br />

tra as leis escriptas, geraes, o qual, mais ou menos contesta<strong>do</strong><br />

pelos papas, continúa a ser o direito nas egrejas nacionaes.<br />

A isto chamou-se - liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s ~grejas.<br />

Assim, 6 <strong>de</strong> ver que cstas cxprcssfics -liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s egrejas<br />

náo apparecem nos oito primoiros scculos <strong>da</strong> historia ecclcsiastica,<br />

quan<strong>do</strong> jh havia as egrejas nacionacs com seus metropnlitils c sua<br />

feição propria e individual.


São quasi como as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s municipaes na e<strong>da</strong><strong>de</strong> media : li-<br />

ber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, prerogativas, que as egrcjas conquistavam com sua re-<br />

sistencia tenaz e arrisca<strong>da</strong> ás pretens6es <strong>da</strong> sancta s6 ; liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s,<br />

prerogativas, que o episcopa<strong>do</strong>, já por motivos mun<strong>da</strong>nos, ja pela<br />

consciencia <strong>de</strong> sua digriidildt? abati<strong>da</strong>, houve po<strong>de</strong>r sustentar se-<br />

guras, bem firmes em sua mitra.<br />

Muitas vezes tambem a esta idéa <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> uma egreja<br />

vem junctar-se um elemento profano, temporal.<br />

A historia <strong>da</strong> coexistcncia <strong>da</strong>s duas esphcras tem uma epocha, em<br />

que a egreja, não contente com sua vi<strong>da</strong> passa<strong>da</strong> ao la<strong>do</strong> <strong>da</strong> <strong>do</strong><br />

esta<strong>do</strong>, aspira á existencia unica <strong>de</strong> sua orbita.<br />

A lucta b terrivel, porque os combatentes não t&m a princi-<br />

pio forças eguaes; mas por fim a realeza temporal alcança fir-<br />

mar-se sobrc as communas suffoca<strong>da</strong>s e a nobreza <strong>de</strong>strui<strong>da</strong>; e<br />

um equilibrio, prompto a romper-se a ca<strong>da</strong> instante, uma quieta-<br />

ção ameaça<strong>do</strong>ra como a <strong>da</strong>s tempestacles em seus intervallos, sub-<br />

stitue-se tí harmonia tão <strong>do</strong>ce <strong>do</strong> seculo <strong>de</strong> Constantino.<br />

D'aqui nouo aspecto.<br />

O esta<strong>do</strong> tem prerogativas, trophbos que encrava entre as pero-<br />

Ias <strong>da</strong> cor<strong>da</strong> real e que ganhou na liicta com sua rival temivel.<br />

As prcrogitivas dil cor<strong>da</strong> junctam-sr 6s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja, e<br />

d'este to<strong>do</strong> riasce o direi10 ecclesiaslico priua<strong>do</strong> <strong>da</strong>s egrejas na-<br />

cionaes.<br />

No meio d'estcs combates, porem, não é liqui<strong>do</strong> muitas vezes<br />

saber qual o direito, qual a rega.<br />

Conquista<strong>da</strong>, não outorga<strong>da</strong>, a liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, ou a prerogativa, em<br />

quasi to<strong>do</strong>s os casos não foi expressamente confessa<strong>da</strong> pelo direito<br />

papal; - excepção ti lei geral não se presume ; é preciso oppol-a<br />

evi<strong>de</strong>nte tí letra d'aquella, que tem por si a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> venerandit<br />

e irrefragavel <strong>do</strong>s concilias ecumenicos.<br />

Apparece bem clara a dificul<strong>da</strong><strong>de</strong> d'estas questõcs.<br />

A nossa 6 uma d'ellas.


A egreja catholica é visivel ; tem uma estriictura palpavel, con-<br />

cretisa<strong>da</strong> ; tem um governo externo, iimu hicrarcliia miiltipln cm sctis<br />

gráus, e, por conseguinte, uma divivao tcrritorial e jiirisdicçioriiil.<br />

A mu<strong>da</strong>nça <strong>da</strong> Area d'esta dioccsc, a aboliçáo d'aqii(~llii, ii scparaçao<br />

<strong>da</strong> parcclla <strong>de</strong> uma ou <strong>de</strong> mais, para a crecc;io <strong>de</strong> urna<br />

nova, nào é uma cousa que se passe nos ares, nos ~)laiic~las <strong>do</strong><br />

espaço, que não sào o nosso.<br />

O esta<strong>do</strong> pó<strong>de</strong> scr interessa<strong>do</strong>.<br />

Alcm d'isso, a egreja, que tem sacer<strong>do</strong>tes, n8o Ihes ha <strong>de</strong> <strong>da</strong>r<br />

por certo para siistcnlaç30 o extase como o <strong>de</strong> Sancta Cecilia, ou<br />

o triste passadio <strong>do</strong>s cenobitas no <strong>de</strong>serto; ou ficar-se esperan<strong>do</strong><br />

que <strong>de</strong>sça <strong>do</strong>s ares o corvo cari<strong>do</strong>so, ou o mannh provi<strong>de</strong>ncial <strong>do</strong>s<br />

israelitas.<br />

A egreja nasceu <strong>de</strong> pesca<strong>do</strong>res e homens pohrissimos; e o Cliristo<br />

dizia, a quem o queria seguir, que ven<strong>de</strong>sse o que possuissc.<br />

Pouco Ihes bastava. Habentes victum et tegumenium his couicnti<br />

sumus, diziam elles.<br />

Os canoiies mais puros <strong>de</strong> sua disciplina prohibem aos clerigos<br />

o exercicio <strong>do</strong>s offic.ios mun<strong>da</strong>nos e <strong>de</strong> logares na republica.<br />

Felizes tempos estes em que as riquezas <strong>do</strong> clero eram o patri-<br />

moriio <strong>do</strong>s pobres, <strong>da</strong>s viuvas e <strong>do</strong>s con<strong>de</strong>mria<strong>do</strong>s!<br />

Não assistiu comtu<strong>do</strong> por muito tempo o mun<strong>do</strong> a este especta-<br />

culo grandioso <strong>da</strong> cari<strong>da</strong><strong>de</strong> christã.<br />

O christianismo foi essencialmente uma revoluçâo espiritua-<br />

lista.<br />

Ás dissoluções sem nome <strong>do</strong> Imperio, ao materialismo abjecto<br />

<strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s pagãs foi mister oppor este <strong>de</strong>sprendimento abso-<br />

luto <strong>de</strong> tu<strong>do</strong> o que era mun<strong>da</strong>no, porque no mun<strong>do</strong> na<strong>da</strong> havia a<br />

aproveitar.<br />

A cobiça, esta pobreza i<strong>de</strong>al; á luxuria, esta' continencia gran-<br />

<strong>de</strong>mente meritoria, leva<strong>da</strong> ao excesso pelo gran<strong>de</strong> Origenes e seus<br />

imita<strong>do</strong>res; ao orgulho, esta humil<strong>da</strong><strong>de</strong> sem exemplo <strong>do</strong> chrisfio;<br />

aos odios, a paz e o amor, que são o relevo mais avulta<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

christianismo primitivo ; e finalmente, ao rebaixamento <strong>do</strong> espirite,<br />

esta elevaçáo sublime <strong>da</strong> alma até aos p6s <strong>de</strong> Deiis.


A revolução era tão necesseria, que o mun<strong>do</strong> transforma-se ra-<br />

pi<strong>da</strong>mente, como se o clarão <strong>de</strong> um relumpago refulgente subito<br />

brilhasse <strong>do</strong> interior <strong>da</strong> Judéa e para sempre o illuminasse.<br />

Mas isto passou <strong>de</strong>pressa.<br />

Alguns seculos <strong>de</strong> pureza, e, <strong>de</strong>pois, em logar <strong>da</strong>s monstruosi-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>do</strong> velho imperio, a barbarie <strong>do</strong>s tempos <strong>do</strong> feu<strong>da</strong>lismo,<br />

As riquezas concentram-se nas mãos <strong>do</strong>s po<strong>de</strong>rosos <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>,<br />

-a nobreza e o clero: para os outros a pobreza, o trabalho, a<br />

servidão.<br />

assim que, na segun<strong>da</strong> cpocha <strong>da</strong> historia <strong>da</strong> egreja, ella não<br />

tem que pedir ao seculo o pão <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> dia ; muito pelo contrario,<br />

a opulencia <strong>do</strong>ura-lhe a vi<strong>da</strong> e centuplica-lhe o po<strong>de</strong>r.<br />

Depois, não sei por que terrivel biiipança <strong>de</strong> Deus, um dia, os<br />

homens <strong>de</strong>rrubam os altares e <strong>de</strong>sapossnm-na <strong>de</strong> seus bens.<br />

O esta<strong>do</strong>, que por muito tempo se serviu, e porventura ain<strong>da</strong><br />

hoje se serve, <strong>da</strong> religião como meio <strong>de</strong> conservar os costumes, +<br />

offereceu a Deus o que era <strong>de</strong> Cesar, garantiu a <strong>do</strong>taçao e susten-<br />

tação <strong>do</strong> clero catholico pelo thesoiiro publico.<br />

Neste esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> cousas, bom ou mau, a creaçâo <strong>de</strong> uma dio-<br />

cese, a erecção <strong>de</strong> uma metropole, ou patriarchial, não 4 negocio<br />

indiffererite para o esta<strong>do</strong>.<br />

E, ain<strong>da</strong> quan<strong>do</strong> o fosse, podia perguntar-se se alguma lei ha-<br />

via que ao esta<strong>do</strong> conferisse o direito <strong>de</strong> intervir, ou fazer por si<br />

s6 essas modificaçbes na circumscripçào ecclesiastica.<br />

Era urna questão positiva.<br />

fi este o objccto <strong>do</strong> nosso trabalho. Facil 6 vel-o naturalmente<br />

dividi<strong>do</strong> em tres capitiilos :<br />

Qual a legislação geral <strong>da</strong> egreja sobre o assumpto? C<br />

Ha direito ecclesiastico portuguez que a modifique?<br />

Será conveniente este esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> legislação ecclesiastica?<br />

Taes são as tres partes em que se separa este livro.


PARTE PRIMEIRA<br />

LEGISLAÇBO GERAL DA EGREJA<br />

A RESPEITO<br />

ir rlscbh sisnssslo, wino, ~ivislo E cincurnsmirbio<br />

DAS DIOCESES E HETROPOLES<br />

Quare non est, quod a conimuni universalis<br />

Eccle~iae sensu recediirnus loe<strong>da</strong> in<br />

prineipis adulatiene ... Tuta rei istius dispoiientlne<br />

ratio a11 Ecclesiam ptrtiiiel.<br />

PRI~RO DE MARCA, Concord Sacerd. et<br />

Imper. lib. 2.0, cap. 9.O n.O 7.'<br />

Qui monte au<strong>de</strong>ssus <strong>de</strong> I'liumanitb, brise<br />

avec olle Ie pacte <strong>de</strong> nature. Le droit <strong>de</strong><br />

tout faire le pousse A toule oser.<br />

I'ELI.ETA~, Les droils <strong>de</strong> l'homms.


PARTE I<br />

DA LEGISLAÇ~O GERAL DA EGREJA ACERCA DA ERECÇÃO,<br />

SUPPRESS.~~, UNIÃO, DIVISÃO E CIRCUMSCRIPÇÀO<br />

DAS DIOCESES E METBOPOLES<br />

CAPITULO I<br />

Tempos Apostolicos<br />

O primeiro monumento legislatiro a consultar stio os actos <strong>do</strong>s apostolos e não os cba-<br />

nia<strong>do</strong>s canones apostolicoa.-Não apparece ain<strong>da</strong> uma divisfio terrilorial <strong>da</strong> egreja<br />

egual e melhodica.-Apostolos, Presbyteros, egreja ou rebanho.-Que necessi<strong>da</strong><strong>do</strong><br />

presi<strong>de</strong> neslcs tempos i divistio <strong>da</strong> e reja. -A quem pertencia o direi10 <strong>de</strong> crerr<br />

as ~rinieirau dioceses. - Como os uftramonlanos abusam d'esle facto. - OpiniBo<br />

<strong>de</strong> 1. laouel <strong>do</strong> Monte Hodrigues <strong>de</strong> Araujo.<br />

Ha auctores que creem que os mais antigos monumentos escri-<br />

ptos <strong>da</strong> legislação ecclesiastica, esses canones geralmente conhe-<br />

ci<strong>do</strong>s pelo nome <strong>de</strong> canones <strong>do</strong>s apostolos - canones vztlgo aposto-<br />

lorum ou sanctorum et gloriosorum Aposlolorum nomine octo-<br />

ginta caizones, são effectivamente obra <strong>do</strong>s sanctos discipulos <strong>da</strong><br />

Senhor e veneran<strong>do</strong>s por isso mais <strong>do</strong> que os mais veneran<strong>do</strong>s.<br />

Não somos d'esta opinião, e hoje mesmo poucos haverá, talvez<br />

nerilium, .que a queiram perfilhar.<br />

A critica levou á evi<strong>de</strong>ncia o assumpto neste, como em outros<br />

pontos <strong>da</strong> historia <strong>da</strong>s collecções e canones <strong>da</strong> egeja 1.<br />

1 Ácerca d'estes canones famosos discute-se n&o s6 a sua antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> e<br />

portalito sua auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>, mas tambem o numero d'elles.<br />

Os antigos chamavam-lhe sómente canones ecclesiautici-canol?ce pdrl~rn,<br />

veleres caiiones.<br />

A opinib mais segura B a <strong>de</strong> Mons. d'Aubépinc, bispo dlOrleana, naa suas<br />

Obs. liv. 2, eap. 23.<br />

Sb canones <strong>do</strong>a concilias <strong>do</strong>e fins <strong>do</strong> 2.0 seculo, <strong>do</strong> 3.0 e <strong>do</strong>s principias


Nâo começaremos, por conseguinte, o estu<strong>do</strong> <strong>da</strong> legislaçóo cco-<br />

nomica pelo exame d'estes canones : antes d'elles, ha a vcr oiitros<br />

monumentos, ain<strong>da</strong> que não texto <strong>de</strong> lei, para que, d'esta manci-<br />

ra, possamos levar segui<strong>da</strong> a historia <strong>da</strong> legislaçâo ou disciplina<br />

sobrc o ol~jecto <strong>de</strong> que tractamos.<br />

E <strong>do</strong>s actos <strong>do</strong>s apostolos <strong>de</strong> que primeiro lançaremos máo 1,<br />

<strong>do</strong> 4.0; rcgras que os bispos d'esses seculos, homens quasi-apostolici, estatuiam<br />

no meio <strong>da</strong>s pcrsegiiiç0es que a egreja fiofi~ia por aquelles tempos.<br />

Até <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> 7.0 seculo tiveram-nos os gregos como feitos pelos diecipulos<br />

<strong>de</strong> Christo e colligi<strong>do</strong>s e publica<strong>do</strong>s pelo Papa S. Clemente.<br />

No can. 2.0 <strong>do</strong> concilio chama<strong>do</strong> Trullano, ou in Trullo, ou QuindSexto,<br />

diz-se: c..... a<strong>de</strong>o nobis etiam traditi sunt sanctorum e( gloriosorum Apost<strong>do</strong>rum<br />

nomine octo.ginta quinque canones..<br />

Tlieo<strong>do</strong>ro Balsainoii, o sabio patriarclia <strong>de</strong> Antiochia, usa d'estas tâo innoceiites<br />

palavras para calar os latinos, que duvi<strong>da</strong>vam <strong>da</strong> authentici<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s<br />

canones apostolicos, dizen<strong>do</strong> <strong>do</strong>gmaticaiiiciite : c Hujzcspraesenlis canonis perpetuo<br />

recor<strong>da</strong>re: per ipsum enim os eis seclu<strong>de</strong>u qui dicunt a6 Apostolia non<br />

fuisse editos octoginta qc~inque camnes. *<br />

E <strong>de</strong> notar que este concilio teve logar no anno 692 <strong>do</strong> nasciriicnto <strong>de</strong><br />

Christo e que o criidito Patriarcha grego em buas obras mostra gran<strong>de</strong> animosi<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />

por vezcs bem parcial, para com os auctores e padres <strong>da</strong> egreja<br />

latina.<br />

Apczar <strong>de</strong> que alguns d'estes ultimos e <strong>do</strong>s mais recentes mesmo, dão auctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

e tem por certa a origem ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente apostolica d'estes canone8.<br />

Na magnifics edição <strong>do</strong> Corpua JurM Canonici <strong>de</strong> Juato Henningio Boehmer,<br />

escreve este cotispicuo anuota<strong>do</strong>r a pag. 1231 <strong>do</strong> I: tomo:<br />

Quis c~e<strong>de</strong>ret, C'lev~entern hos canones congessisse quos Grlasius in C. 3,<br />

dist. xv apoeryphis annumeravit mriptie, licet postea orientales eosprobaverint<br />

ut cauaae suae in plurimis servirent, vid. c. 4, dist. xvr..... I<strong>de</strong>m agnovit<br />

Leo in c. 3 dist. XVI et y/ri~/qunr/inta dunta&.ezcepit, quue ortho<strong>do</strong>zae<br />

$<strong>de</strong>i ndjugen<strong>da</strong> essent, sed Clr mrnfi non tribuit.<br />

Leia-se Van-Espen. Dksert. in can. vulgo apostol. § 2.0, no tomo 3.0 <strong>da</strong>s<br />

obras, ediç. <strong>de</strong> Lourain - 1753.<br />

Zalw~in Prif~c. Jur. Eccl. Tom. 2.O qiiest. 1.O cap. 3.0. on<strong>de</strong> se aconselha<br />

que se niio confun<strong>da</strong>m estes canones apostolicos coiu as cliama<strong>da</strong>s constituiçõpg<br />

apostolicas.<br />

E muito curiosa e sabia, como to<strong>da</strong>s as d'este auctor, a dissertaça0 sobre<br />

os canones e coiistituiç0es attribiii<strong>da</strong>s aos apostolos, <strong>de</strong> Du Pin a pag. 14<br />

<strong>do</strong> tom. 1.0 <strong>da</strong> Nouvelle BibZiothi.que <strong>de</strong>s auteurs eccl4siastiques- 1690.<br />

1 Os Actos <strong>do</strong>s Apostolos, tambem chama<strong>do</strong>s Hisforia <strong>do</strong>s dpostolos, Euangelho<br />

<strong>da</strong> Remrreição, Evangelho <strong>do</strong> Eapirito Sancto, constitnem uni (10s livros<br />

canon'cos <strong>da</strong> egreja; auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> esta que em to<strong>do</strong> o teinpo geralmente<br />

tem ti<strong>do</strong>. k obra attribui<strong>da</strong> a S. Lucas, evangeliata, e assim <strong>do</strong> maior respeito.<br />

Abrange <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o anno 34 atd o 64 <strong>da</strong> era vulgar, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a ascensgo <strong>de</strong><br />

(:liristo ate que S. Paulo sLe <strong>da</strong> prieão em Roina; muito aprecia<strong>da</strong> ela parte<br />

<strong>do</strong>gpntica que compreben<strong>de</strong>; muito elogia<strong>da</strong> por S. Jerouymo e S. j>oão Olirysostomo.<br />

Os marcionitae e mtrnich&w negaram-lhe a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> - os nicolaitas e


Não queiramos encontrar nestes tempos uma divisõo <strong>da</strong> egreja<br />

methodica, com certo numero <strong>de</strong> parochias, <strong>de</strong> bispos e metroyo-<br />

litas.<br />

Como seria isto possivel, se a egeja ain<strong>da</strong> agora mal comeua<br />

a formar-se, se (I: esta a epocha primeira <strong>da</strong> sua cxistencia, o priri-<br />

cipio <strong>da</strong> evangelisação <strong>da</strong>s <strong>do</strong>utririas <strong>do</strong> Chrislo?<br />

O logar estava toma<strong>do</strong> pelos gentios ou i<strong>do</strong>latras, e ju<strong>de</strong>us ;-<br />

aquelles com os seus templos, estes com suas synagogas.<br />

Gran<strong>de</strong> na antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> mosaica, preclecessora <strong>da</strong> Koma christã,<br />

Jerusalem era o fóco <strong>do</strong> christianismo: d'ahi irradiava para to<strong>da</strong><br />

a Asia-menor, passan<strong>do</strong> para o norte <strong>da</strong>s terras africanas, e <strong>de</strong>-<br />

corria para o occi<strong>de</strong>nte, especialmente para Roma, centro <strong>do</strong><br />

mun<strong>do</strong>.<br />

O que se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>duzir <strong>do</strong>s Actos, <strong>de</strong>strinçar <strong>do</strong> meio <strong>de</strong> suas<br />

narraçbes envolvi<strong>da</strong>s em mystico vEo, é que a christari<strong>da</strong><strong>de</strong> nas-<br />

cente comprehendia - os apostolos - os presbyteros - e a egreja,<br />

ou rebanho 1.<br />

Os apostolos, percorren<strong>do</strong> as ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>do</strong> oriente e occi<strong>de</strong>nte<br />

prégavam a palavra <strong>do</strong> Christo, e on<strong>de</strong> as conversões avultavam,<br />

or<strong>de</strong>navam presbyteros, que nessas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s e logares guar<strong>da</strong>vam<br />

puro o <strong>de</strong>posito sagra<strong>do</strong> <strong>da</strong> nova religiâoe.<br />

gnosticos e outros heresiarchas substituiram-nos por outros livros, hoje jul-<br />

ga<strong>do</strong>s apocryphos, on<strong>de</strong> introduziam os seus erros.<br />

Veja-se Tillemont, Mdmoir. pour servir ci à9hist. eecl. Article S. Luc., Évan-<br />

géliute; e Du Pin, obr. cit., tom. 1.0, pag. 5.<br />

1 Act. xx, 22 - xvr, 22, 26 - xv, 4, que diz : c Quun autem cenisaent Je-<br />

rosolymam, ewreepti sunt ab Ecclesa'a, et ab Apostoli8 et senioribus annuntian-<br />

te8 quanta Deus fecisset cun il1is.r confer. com o 6; e ain<strong>da</strong>, 22, 23, 30 e 41<br />

- XVI, 4 confer. com o 5.0 - xx, 17, 28 - XXI, 18.<br />

E muito para notar que to<strong>do</strong>s estes textos parecem indicar a existencia <strong>de</strong><br />

mais <strong>de</strong> iim bispo nas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s principaes ; restos, talvez, <strong>do</strong> ju<strong>da</strong>ismo. Aqui,<br />

nestes, mais <strong>do</strong> que nos simples presbyteros <strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> inferior plana,<br />

avulta a força <strong>do</strong> episcopa<strong>do</strong> que no futuro ha <strong>de</strong> crear os metropolitas, pa-<br />

triarcbas, etc.<br />

To<strong>da</strong>via esta <strong>do</strong>utrina vae attacar a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> episcopa<strong>do</strong>, que 6 a <strong>do</strong>u-<br />

trina catholica.<br />

S. Clemente, primeiro Bispo <strong>de</strong> Roma, em sua epistola aos corinthios, diz<br />

quc soa apostolos estabeleciam bispos e diaconoa nas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s e ddêas on<strong>de</strong><br />

pdqavam, e esperavam que viesse a haver christ8os.r<br />

2 Muitos exemplos ee po<strong>de</strong>riam junctar d'este procedimento <strong>do</strong>s apostolos,<br />

geral no oriente e occi<strong>de</strong>nte.<br />

Quan<strong>do</strong> S. Paulo prkga em Creta e Candia, <strong>de</strong>ixa, ao retirar-se, a Tito<br />

para acabar a obra <strong>da</strong> fé e pôr presbyteros ou bispos em ca<strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, como<br />

o uaeveram S. Chrysostomo e Theo<strong>do</strong>reto, e clarameqe se vê <strong>do</strong> v. 5.O <strong>do</strong>


Mas o christianismo vivia aqui acosta<strong>do</strong> ao ju<strong>da</strong>ismo e á i<strong>do</strong>la-<br />

tria; não tinha área sua, logar on<strong>de</strong> sua jurisdicção tomasse corpo<br />

e vulto 1.<br />

A egreja era a reunião <strong>do</strong>s converti<strong>do</strong>s, na<strong>da</strong> mais%.<br />

Tal apparece o primeiro rudimento, a mona<strong>da</strong> <strong>da</strong>s futuras pa-<br />

rochias, dioceses <strong>de</strong>pois.<br />

Se estes, que os actos chamam presbyteri, eram bispos: é ponto<br />

que o catholicismo resolveu afirmativamente e que o protestan-<br />

tismo combate para negar a or<strong>de</strong>m episcopal.<br />

A n6s, to<strong>da</strong>via, que nâo estamos tractan<strong>do</strong> <strong>de</strong> theologia, rniis<br />

<strong>de</strong> direito, pouco nos importam agora essas controvcrsias.<br />

Estu<strong>da</strong>mos o direito <strong>da</strong> egreja catholica; -havernos <strong>de</strong> co!lo-<br />

car-nos no ponto dc vista <strong>da</strong>s suas <strong>do</strong>utrinas.<br />

Admitte a egreja catbolica como <strong>do</strong>gma que o episcopa<strong>do</strong> é<br />

grau <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m differente <strong>do</strong> presbytera<strong>do</strong>; que o episcopa<strong>do</strong> 6 a<br />

plcriitri<strong>de</strong> <strong>da</strong> or<strong>de</strong>m; que os bispos são os successores <strong>do</strong>s opos-<br />

tolos, como eram esses presbyteros, <strong>de</strong> que fallam os Actos?<br />

Admitte.<br />

Tanto nos basta. Este 6 o nosso ponto <strong>de</strong> parti<strong>da</strong>. Qualquer<br />

outro seria falso, illogico.<br />

cap. 1.0 <strong>da</strong> Epist. a Tito- que diz : eHujus rei graiia reEqui te in Crefae,<br />

.i~t ea que <strong>de</strong>sunt, corrigas et constituas per civitater pesbgteros, si& et ego<br />

disposzci. 8<br />

k:m Jerusalem, como crescia o numero <strong>do</strong>s fieis, e as perseguig;)rs iiiflninmavam,<br />

os apostolos julgaram conveniente <strong>da</strong>r a esta ci<strong>da</strong><strong>de</strong> bispo pro.<br />

prio, o qual foi, como 8 sabi<strong>do</strong>, 8. Thiago, o justo, ou o menor.<br />

Veja-se Tillemont. Mem. cit. art.c* S. Pierre e S. Jacquc k Mineur. Falani<br />

S. Jeronymo e Tertulliano <strong>de</strong> S. João, Evangelistci, como <strong>do</strong> iiistitiii<strong>do</strong>r<br />

<strong>da</strong> or<strong>de</strong>m episcopal na Asia; o que ngo po<strong>de</strong> ser ver<strong>da</strong><strong>de</strong> absolutamente e h<br />

lettra, mas o 8 emquanto elle, j4 em extrema velhice, ia ain<strong>da</strong> pslns provincias<br />

(Ia Asia para estabelecer bispos, como o attesta Erurebio Hilist. cccler.<br />

Ziv. 3.0, c. 23.<br />

A respeito <strong>da</strong> creação <strong>da</strong>s celebres dioceaes <strong>de</strong> Alexandria, <strong>de</strong> Antiochia,<br />

<strong>de</strong> Africa, Constantinopola e <strong>da</strong>s dioceses <strong>da</strong> Itslia, na<strong>da</strong> se sabe. Os <strong>do</strong>cumentos<br />

faltam abaolutameute para algumas, e noutras as duvi<strong>da</strong>s <strong>de</strong>ixam o<br />

mesmo vacuo.<br />

Veja-se Mr. Bamage, Eiist. <strong>de</strong> ~'Église.<br />

Diz Ewebio, Hht. cc<strong>de</strong>s. Elo. 3, c. 37: cBi (apostoli) postqram in rmdb<br />

ac barbaris reyionibus $<strong>de</strong>i fun<strong>da</strong>menta jecevanl aliisque pastores constituerant,<br />

ad aliue genfea properabant.~<br />

1 Veja-se Mr. Bamage Hist. <strong>de</strong> l1I?glise, chap. vi, n.O 1, a respeito <strong>do</strong><br />

numero <strong>do</strong>e chriatãos no comev <strong>da</strong> egreja.<br />

2 Act. xv, 22-SIV, 22, 23. Muitoa teatoa se referem B egreja <strong>de</strong> Joruealeil,<br />

falan<strong>do</strong> ao rnewno tempo <strong>do</strong> templo, <strong>do</strong>a preebyteroe e <strong>do</strong>s apoetoloa


D'esta arma, aqui temos, como notamos, a origem primeira<br />

<strong>da</strong>s divisões ecclasiasticas.<br />

Toquemos, porem, numa notavel differença.<br />

Hoje, que a egreja catholica tem, como então a i<strong>do</strong>latria greco-<br />

romana, o melhor logar no mun<strong>do</strong>; a divis8o <strong>da</strong>s clioceses tem<br />

uma razão <strong>de</strong> ser diversa <strong>da</strong> d'estes frouxos claròes que aqui <strong>de</strong>-<br />

visamos.<br />

Hoje é a immensa extensão qiie ella abranje- o orbe to<strong>do</strong>-<br />

que pe<strong>de</strong>, que exige, que os rebanhos se divi<strong>da</strong>m e a ca<strong>da</strong> um<br />

se d& um pastor.<br />

Não seria possivel um só rebanho e um s6 pastor. No tempo<br />

<strong>do</strong>s apostolos era diffcrente.<br />

Mui limita<strong>da</strong> era a periphería <strong>da</strong>s conquistas <strong>da</strong> egreja nascente,<br />

mas mui graii<strong>de</strong> a lucta que havia a soffrear.<br />

Começavam então as perseguições; abria-se na primeira pagina<br />

o livro <strong>de</strong> ouro <strong>do</strong> martyrolopio christão.<br />

A semente preciosissirna <strong>da</strong> religiáo infante, <strong>de</strong>posita<strong>da</strong> aqui<br />

por um Paulo eloquente, ou alem por um Pedro veneran<strong>do</strong>, era<br />

logo aban<strong>do</strong>na<strong>da</strong> por elles, porque os povos os apedrejavam e ex-<br />

pulsavam <strong>de</strong> suas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s: indispensavel foi, assim, <strong>de</strong>ixar um<br />

penhor <strong>de</strong> sua <strong>de</strong>feza e conservaçáo. Foram os presbyteros.<br />

Os apostolos, esses, não tinham esta ou aquella ci<strong>da</strong><strong>de</strong>; iam<br />

per universum mundum - <strong>do</strong>cebant omnes gentes; inclusivamente<br />

os proprios presbyteros que a elles recorriam, quan<strong>do</strong> gran<strong>de</strong> du-<br />

vi<strong>da</strong> se levantava hc&rca <strong>de</strong> qualquer ponto <strong>de</strong> fé ou disciplina I.<br />

Aos apostolos, pois, á egreja, na pessoa <strong>de</strong> seus chefes, perten-<br />

cia crear os presbyteros para estas ou aquellas christan<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

fi 'neste facto que hoje os escriptores <strong>da</strong> escola ultramontana<br />

assentam os seus argumentos, para mostrar que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as mais re-<br />

motas eras ao papa pertenceu este privilegio; pois, sen<strong>do</strong> aqui in-<br />

contestavel que os apostolos institiiiam os primeiros presbyteros c<br />

Ihes assignavam ce~ta multidão <strong>de</strong> fieis para reger; e, sen<strong>do</strong> o<br />

papa o successor <strong>de</strong> S. Pedro; parece-lhes que ninguem po<strong>de</strong>rá<br />

oppor-se áis illações, que logicamente julgam <strong>de</strong>correr d'essas duas<br />

ver<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

Adcante (cap. 3.O, n." II), mostraremos o vicio d'este argu-<br />

mento; por ora bastará saber-se que to<strong>do</strong>s estes actos <strong>do</strong>s apos-


tolos tem uma feição espccial <strong>de</strong>diizi<strong>da</strong> <strong>da</strong> natureza <strong>do</strong>s agentes,<br />

que náo eram simples bispos e <strong>de</strong> qucm o episcopa<strong>do</strong>, sc veiii occii-<br />

par 0 seu logar na egreja, não her<strong>do</strong>u comtu<strong>do</strong> a herança inteira.<br />

& um ponto indiibita~el <strong>da</strong> <strong>do</strong>utrina catholica.<br />

Depois náo ha aqui ver<strong>da</strong>dciramcnte uma divisão, ou circum-<br />

scripção ecclesiastica perfeitamente similhantc á que scculos <strong>de</strong>pois<br />

occupou o cui<strong>da</strong><strong>do</strong> <strong>do</strong>s syno<strong>do</strong>s provinciacs. A egrvja nasce agora ;<br />

os prcsbjtcros ficam aqui e além ; mas a egreja não occupa por<br />

emquanto, dizemos assim, um logar <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> no solo <strong>do</strong> zloho.<br />

Dcmais, <strong>de</strong> que os presbyteros foram ortlcna<strong>do</strong>s pelos apostolo$,<br />

1150 se segue que s6 o aposto10 na egreja possa crear os bispos:<br />

- pois quem havia dc or<strong>de</strong>nar os primeiros sacer<strong>do</strong>tes, senão os<br />

dcpositarios <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r espiritiial <strong>da</strong> egeja? a quem o transmittiu<br />

Cbristo? porventiira a Pedro sómente?<br />

E e este objecto um ass~impto <strong>de</strong> <strong>do</strong>gma, inalteravel? e, s6 6<br />

disciplinar, iião 6 preciso, antes <strong>de</strong> nos per<strong>de</strong>rmos nestas vagas<br />

con,jecturas, saber qiial a disciplina <strong>do</strong>s primeiros s(>ciilos?<br />

Qurm Ihcs havia <strong>de</strong> coritcstar a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>, a estes \arfies, que<br />

tinham toca<strong>do</strong>, vivi<strong>do</strong>, communga<strong>do</strong> com a propria divin<strong>da</strong>drb (1.1 .i


Isto que <strong>de</strong>ixamos escripto e que foi o que <strong>da</strong> leitura <strong>do</strong>s Actos<br />

<strong>do</strong>s Apostolos podémos colher, parecehos ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro c historico:<br />

pueril e falso se nos afigura, porem, o que D. Manuel <strong>do</strong> Monte<br />

Rodrigues dc Araujo escreve a pag. 223 <strong>do</strong> tom. 1." <strong>do</strong>s seus<br />

Elementos <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Ecclesiastico.<br />

Não nos chega a iritelligcncia até comprehen<strong>de</strong>r como, na partilha,<br />

que <strong>do</strong>s povos i<strong>do</strong>latras foi feita entre Pcdro e Paulo por<br />

inspiração <strong>do</strong> Espirito Sancto, se veja o primeiro exemplo <strong>de</strong> uma<br />

divisão ecclesia~tica ; divisáo ecclesiastica, on<strong>de</strong> ain<strong>da</strong> nâo havia<br />

seriao gentios e ju<strong>de</strong>us (!).<br />

I? confundir, evangelisar e reger a egreja; pregar a boa nova e<br />

dirigir os ficis.<br />

Nõo cremos tambem fun<strong>da</strong><strong>da</strong> em bom valor historico a preteridi<strong>da</strong><br />

divisão que <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> fizeram os apostolos para cumprir o preceito<br />

<strong>do</strong> Christo ((<strong>do</strong>cete omnes gentes)); como se aquelles sanctos<br />

homens fossem como os sol<strong>da</strong><strong>do</strong>s que dividiram em pe<strong>da</strong>ços a tunica<br />

<strong>do</strong> martyr.<br />

E quan<strong>do</strong> historico, será estc facto novo exemplo <strong>de</strong> divisiio<br />

ecclesiastica ? *<br />

E p6<strong>de</strong> alguem acreditar que os apostolos, que ouviram <strong>da</strong> bocca<br />

<strong>de</strong> Christo o celebre preceito- ((euntes in mundzbm universum<br />

praedicate et-angelium omni creaturae)) - se estabelecessem fixamcnte<br />

testa d'esta ou d'aquella egreja i?<br />

Este alvitre, esta maneira <strong>de</strong> olhar a historia d'estes tempos,<br />

6 tho falsa, que a consequencia irrecusavel d'clla scria o espantoso<br />

absur<strong>do</strong> <strong>de</strong> ver 'nesse facto, nfio s6 um simplcs facto <strong>de</strong> circiimscripçào<br />

ecclesiastica, mas ain<strong>da</strong> o exemplo dii creação <strong>da</strong>s<br />

primeiras divisòes superiores <strong>da</strong> cgre,ja; pois os gentios e os romanos<br />

por converter a f6 formariam duas provincias <strong>de</strong> christãos, e<br />

os apostolos seriam os seus metropolitas; mas metropolitas que<br />

nào teriam egreja propria para sé<strong>de</strong> <strong>de</strong> seu po<strong>de</strong>r, em que não<br />

1 A propria Roma teve um bispo proprio no tempo <strong>do</strong>s apostolos; e a ra-<br />

sRo por que isto foi assim, k porque, diz S. Epipliaiiio, citrr(10 por Tillemont,<br />

Pedro e Paulo não podiam estar Fempre em Roma por causa <strong>da</strong>s viagens<br />

que se viam obriga<strong>do</strong>s a fazer ara prégar o Evangelho.<br />

Ve,j. TiUenont, obr. cil. ari. $. Clement, pape. tom. 2.0, e ahi as outras au-<br />

ctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s cit.<br />

O que acima dizemos a reepeito <strong>de</strong> haver nestes tempos mais <strong>do</strong> um biupo<br />

nas gran<strong>de</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, explica, talvez, as duvi<strong>da</strong>s que sobre o bispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Roina<br />

se levantam por se falai. <strong>de</strong> tres bispos <strong>de</strong> Roma na mesma cpocha-S. Lino,<br />

S. Anacleto e S. Clemente.


permaneceriam <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong>s limites vastissimos <strong>de</strong> suas provin-<br />

cias !<br />

Não pó<strong>de</strong> ser. Os tempos apostolicos t&m um aspecto que lhe é<br />

proprio ; nem os cinco ou sete primeiros seculos <strong>da</strong> egrcja lhe sBo<br />

comparaveis, e muito menos ain<strong>da</strong> os ultimos nove e o seu actual<br />

esta<strong>do</strong>.<br />

Nas crengas catholicas os apostoios soo homens quasi divinos;<br />

immediatos <strong>de</strong>positarios <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r espiritual <strong>da</strong> egreja.<br />

Em sua vi<strong>da</strong>, a egrvja edifica-se; com sua morte, acha-se fir-<br />

ma<strong>da</strong>, como que dcsprcmdi<strong>da</strong> <strong>do</strong> céu, aban<strong>do</strong>na<strong>da</strong> sobre ;i toi~a,<br />

<strong>de</strong>spertan<strong>do</strong> para a existencia ao ru<strong>de</strong> contacto <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> ; - como<br />

o primeiro homem, quan<strong>do</strong> a mão <strong>de</strong> Deus o fez apparecer sobre<br />

o globo 'naquelle momento solemne, que o sublime pintor <strong>de</strong><br />

Julio 11 tão bem soube conceber na mente profun<strong>da</strong> que creou o<br />

Moysés.<br />

Não confuird~inos, pois, O que é diverso, e saibamos apreciar a<br />

' historia com o seu <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> pezo.


CAPITULO I1<br />

Des<strong>de</strong> os tempos apostolicos atb Constantino<br />

A tradicáo e os usos síio quasi exrlusivarn~nte as fontes <strong>da</strong> disciplina tla egreja neste<br />

perio<strong>do</strong>. - Cornecam r apparecer as egrejss in uieis, in puqis, in villis. - Por que<br />

razao a iiecessiiiádu <strong>da</strong> creacíio <strong>de</strong> novas dioceses apparcce agora sob novo aape-<br />

elo. - As obras <strong>do</strong>s padres <strong>do</strong>s primeiros bistoria<strong>do</strong>res; canones <strong>do</strong>s aposloios,<br />

canones <strong>do</strong>s concilios <strong>do</strong> 3.O e 4.' seculo: auxilio que prestam esles rnonumenlog.<br />

- Os vestigios <strong>da</strong> legislaeõo e o raciocinio <strong>de</strong>monstram a exislenria <strong>de</strong> uma di-<br />

visõo <strong>da</strong> egrejti em proviii'eias e parochias.- Nào <strong>de</strong>ve causar espanto o appareci-<br />

menlo prematuro <strong>da</strong> alta digni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Illelropolita. - A queni assistia o direito<br />

<strong>de</strong> crear as novas dioceies. - O laclo <strong>da</strong> prirniliva disciplina sobre a or<strong>de</strong>nacão<br />

<strong>do</strong>s bispos traz gran<strong>de</strong> luz ao objecto. - Os canones xiv e xxxv <strong>do</strong>s apostoloe 0<br />

o caoon xx <strong>do</strong> 4.0 concilio <strong>de</strong> Cartbago resolvem a questiío.<br />

O perio<strong>do</strong> que segue immediatamentc o tempo <strong>do</strong>s apostolos,<br />

e que se po<strong>de</strong> fixar <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os fins <strong>do</strong> primeiro seculo, 6 o mais<br />

agita<strong>do</strong> para a egreja.<br />

fi a epocha <strong>do</strong>s seus gran<strong>de</strong>s combates, epocha que acaba com<br />

a victoria d'ella e sua uni80 com o esta<strong>do</strong> sob o imperio <strong>de</strong> Cons-<br />

tantino Magno.<br />

'Neste espaço <strong>de</strong> quasi tres seculos a lepislayào ccclcsiastica,<br />

singela e pura, como era, conserva-se quasi exclusivamente na tra-<br />

dição e nos usos <strong>da</strong>s egrcjas.<br />

A simplici<strong>da</strong><strong>de</strong> e rigi<strong>de</strong>z <strong>do</strong>s costumes, a austeri<strong>da</strong><strong>de</strong>, fé e vir-<br />

tu<strong>de</strong>s <strong>do</strong>s primeiros christãos, dispensava mesmo as regras <strong>de</strong> dis-<br />

ciplina.<br />

A egreja tinha principalmente <strong>de</strong> esmagar as hercsias sem nu-<br />

mero, que <strong>de</strong>pois:<strong>do</strong> primeiro scculo lhe corroiam o seio ; e, ao<br />

mesmo tempo, <strong>de</strong> supportar o embate <strong>da</strong>s perseguições tremen<strong>da</strong>s<br />

que o imperio lhe movia.<br />

$ assim que, no meio d'estas agitações e d'estas tempesta<strong>de</strong>s,<br />

os raros concilios que se po<strong>de</strong>m reunir e os escriptos <strong>do</strong>s padres<br />

se occupam especialmente <strong>da</strong> rcfutação <strong>da</strong>s <strong>do</strong>utrinas dissi<strong>de</strong>ntes<br />

e <strong>da</strong> exhortação ao martyrio.


A historia guar<strong>do</strong>u a lembarnya <strong>de</strong> alguns d'esses concilios, mas<br />

nem suas actas, nem seus canones e <strong>de</strong>cretos chegaram até n6s 1.<br />

J!i sabemos o que pensar a respeito <strong>do</strong>s canones apostolicos,<br />

monumentos qiie resumem talvez a disciplina d'estcs tempos.<br />

Quem vac len<strong>do</strong> segui<strong>da</strong>rncnte a historia <strong>do</strong> dcsinvolvimento e<br />

progresso <strong>da</strong> egreja, vae perceben<strong>do</strong> como, pouco e pouco, os limites<br />

<strong>da</strong>s egrejas, ou parochias, se V ~ O fixan<strong>do</strong> c assim <strong>de</strong>terrninan<strong>do</strong><br />

a jurisdicçào episcopal ; vae-se-lhe pintan<strong>do</strong> este engrossar<br />

prodigioso <strong>da</strong>s f leiras <strong>do</strong> christianismo 'ncstes seculos prirnciros,<br />

e como a attençBo <strong>do</strong>s bispos tem <strong>de</strong> se multiplicar para prover<br />

Bs necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> seus rebanhos, ca<strong>da</strong> vez mais numerososfl.<br />

Começam aqui a apparecer as egrejas <strong>da</strong>s al<strong>de</strong>ias - in uillis ;<br />

in uicis, i ~ a pagis - pelos campos, pelos logares perdi<strong>do</strong>s fóra <strong>da</strong>s<br />

ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

]O agora que a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> creaçao <strong>de</strong> novas dioccses ou pa-<br />

rochias, a rieccssi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> tocar 'nesta materia <strong>da</strong> circumscripçâo,<br />

apparecc pela primeira vez com novo aspecto.<br />

Outr'ora o que evangelisava, inspira<strong>do</strong> pelo Espirito Sancto, ao<br />

<strong>de</strong>spedir-se <strong>do</strong>s fieis, <strong>de</strong>ixava-lhes uma cabeça pirn os dir - . i11<br />

centro para os reunir em volta.<br />

Agora nao. O bispo, jA estabeleci<strong>do</strong> em certa egreja por insti-<br />

tuiçào apostolica, P& augmcntar-se-lhc o rebanho, porque os chris-<br />

tãos nascem agora nào só <strong>da</strong> palavra intlamma<strong>da</strong> <strong>do</strong> apostolo, mas<br />

tambcm <strong>do</strong> sangue <strong>do</strong>s martyres, que era a semente fectirid:i <strong>do</strong><br />

christiariismo, como dizia uma <strong>da</strong>s mais brilhantes colunii,


conhecer to<strong>do</strong>s, para estar ao pe <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> um na hora <strong>do</strong> perigo<br />

ou <strong>do</strong> <strong>de</strong>salento.<br />

Assim, estes homens sem ambiçbes, arrasta<strong>do</strong>s tí digni<strong>da</strong><strong>de</strong> epis-<br />

copal, <strong>de</strong> que se julgavam sempre indignos c <strong>de</strong> que fugiam, eram<br />

os primeiros a pedir novos pastores, quan<strong>do</strong> a multi<strong>da</strong>o <strong>do</strong>s fieis<br />

crescia a ponto <strong>de</strong> exce<strong>de</strong>r as facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> um homem s6.<br />

l? nas obras <strong>do</strong>s padres, nas <strong>do</strong>s poucos historia<strong>do</strong>res d'estes<br />

seculos e nos canones <strong>do</strong>s apostolos que havemos <strong>de</strong> buscar a dis-<br />

ciplina, ain<strong>da</strong> vacillante e rara. Devemos tambem servir-nos <strong>do</strong>s<br />

canones <strong>do</strong>s concilios <strong>do</strong>s tres ou quatro primeiros seculos <strong>da</strong><br />

egreja <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> paz <strong>de</strong> Constantino ; porque clles contbm, espe-<br />

cialmente os <strong>do</strong> quarto seculo, o resumo, e como que o espelho<br />

<strong>do</strong> que se passava, ou <strong>do</strong> que corria ria tradição, durante os <strong>do</strong>is<br />

anteriores.<br />

As mu<strong>da</strong>nças <strong>de</strong> disciplina náo se faziam <strong>de</strong> um dia para o ou-<br />

tro nestes seis primeiros seculos <strong>da</strong> egreja; e postoque já <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />

terceiro seculo 1 crescessem por algumas partes gran<strong>de</strong>s ambições,<br />

comtu<strong>do</strong> ella tinha ain<strong>da</strong> vozes eloquentes, penas fortissimas, e<br />

exemplos <strong>de</strong> virtu<strong>de</strong> <strong>do</strong> maior vigor e mais alto relevo.<br />

O que vamos dizer fun<strong>da</strong>-se em to<strong>do</strong>s estes subsidios; náo ci-<br />

taremos, porbrn, aqui senão os d'estes <strong>do</strong>is seculos, para niío re-<br />

petir malerias.<br />

A divisa0 ecclesiastica em parochias e provincias, mas princi-<br />

palmente em parochias, é cousa i~idubitavel e bem palpavel <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

estes primeiros tempos.<br />

Demonstram-no os vestigios <strong>da</strong> legislaçáo e prova-o o racio-<br />

cinio.<br />

No can. xrv <strong>do</strong>s apostolos diz-se%<br />

uEpiscopo non licere alienamParochiam propria relicta perva<strong>de</strong>re.. .r<br />

I3 o cari. xv, completan<strong>do</strong> a materia, diz:<br />

aSi quis Presbyter aut Diaconus aut quilibet <strong>de</strong> numero clericorum<br />

1 Leia-se S. Cypriano, sermo quintus <strong>de</strong> lapsis -<strong>da</strong> compilaçlo <strong>de</strong> Erasmo<br />

<strong>de</strong> 1528, pag. 37:) <strong>do</strong> 1.0 vol.<br />

Eloquente oração e euriosissimo monumento historico, que nos revela O<br />

po<strong>de</strong>r <strong>da</strong> egrejx jb nestes tempos e a corrupção monstruosa que então cor-<br />

roía a socie<strong>da</strong><strong>de</strong>; factos estes que <strong>de</strong>ram logar A famosa perseguiçiio <strong>de</strong><br />

Decio, havi<strong>da</strong> pela septima e pela mais horrorosa e inflamma<strong>da</strong>.<br />

2 A licção <strong>do</strong>s canones <strong>do</strong>s apoatoloa, <strong>de</strong> que nos aervimos, 6 a que se acha


areliquens propriam Parochiam pergat ad alienam et omnino <strong>de</strong>migrans<br />

upraeter Episcopum conscientiam in aliena Parochia comoretiir.. . n<br />

Que, sain<strong>do</strong> <strong>da</strong> parochia propria, passavam para oiitro bispo<br />

e outra parochia, comprova-o o cen. xvr que diz:<br />

aEpiscopus vero apud quem memoratos.. . n<br />

No can. XXXIII ain<strong>da</strong> é mais saliente a divisão :<br />

«Si quis Presbyter aut Diacono ah episcopo suo segregetur hunc<br />

anon licere ab alio recepi-n<br />

O can. XXXVI <strong>de</strong>termina :<br />

aãpiscopiim non aii<strong>de</strong>re extra terminos proprios ordinationes facere<br />

uin Civitatibus et Villis quae illi nullo jure subjeclae svnt.n<br />

O can. xxxv falla ain<strong>da</strong> <strong>de</strong> parochin propria.<br />

O can. IX refere-se ao catalogo sacer<strong>do</strong>tal -quilibet ex sacer-<br />

<strong>do</strong>tali catalogo.<br />

A respeito <strong>do</strong>s metropolitas legisla o can. xxxv, man<strong>da</strong>n<strong>do</strong>:<br />

aEpiscopos Gentium singularum scire convenit, quis inter eos pri-<br />

umus habeatur, quem velot caput existiment, et nihil amplius, praeter<br />

uejus conscientiam gerant.. . »<br />

D'estes canones se vê clarissimamente como a egreja estava se-<br />

para<strong>da</strong> em parochias, e como esta divisso era profun<strong>da</strong> e bem<br />

marca<strong>da</strong>.<br />

A pro11ibic;ão <strong>da</strong>s emigraç6es <strong>do</strong>s clerigos, <strong>da</strong>s transferencias<br />

<strong>do</strong>s bispos, <strong>da</strong> or<strong>de</strong>naç8o f6ra <strong>da</strong> parochia, dt: miriistrar em outras<br />

ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s ; os catalogas <strong>do</strong> clero <strong>da</strong>s parochias ; tu<strong>do</strong> prova A secie-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong> como a jurisdicçáo <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> bispo era individual, propria, in-<br />

violavel, soberana.<br />

A parochia que pertencia a um bispo, por direito nenhum <strong>de</strong>-<br />

pendia <strong>de</strong> outro - illi nullo jure subjecta.<br />

juncta ao Codigo <strong>de</strong> Dionysio Exiguo, <strong>de</strong> Henriqae Jtcetello - na Bibliotheca<br />

Jlcns Canm'ci Veterie, tomo 1.0, pag. 101.


E, cousa admiravel, neste esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> disciplina e <strong>do</strong>utrina catho-<br />

lica, com esta soberania tão robusta <strong>do</strong> episcopa<strong>do</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte,<br />

nunca a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> egreja foi melhor, nem mais vigorosamente<br />

comprehendi<strong>da</strong>.<br />

A egreja 6 unica, dizia S. Cypriano 1, como é unico seu fun<strong>da</strong>-<br />

<strong>do</strong>r ; o episcopa<strong>do</strong> é um, como um s6 é Christo e uma s6 a egreja<br />

e o peso d'ella supporta<strong>do</strong> por to<strong>do</strong>s.<br />

Episcopatus unus est, cujus a singulus in solidum pars teneatur 2.<br />

Ecclesia una est.., quomo<strong>do</strong> solis multi radii, sed lumen unum, et<br />

rami arboris multi, sed robur unum tenaci radici fun<strong>da</strong>ntum 3.<br />

A historia vem mostrar, e a<strong>de</strong>ante veremos como em tu<strong>do</strong> se<br />

exigia o assentimento, e communhão <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a egreja, e como as<br />

parochias se aju<strong>da</strong>vam umas Bs outras, se exhortavam h constancia<br />

no martyrio, se louvavam por suas virtu<strong>de</strong>s, se soccorriam nos pe-<br />

rigos, na indigencia, no <strong>de</strong>sterro, na <strong>do</strong>ença, na viuvez.<br />

As cartas que os bispos se enviavam a respeito <strong>de</strong> negocios im-<br />

portantes attinentes B fé, B uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> egreja, creação e or<strong>de</strong>-<br />

naç8o <strong>do</strong>s bispos, eram li<strong>da</strong>s ao povo publicamerite e não poucas<br />

vezes os vemos atravessar os marcs, cxpôr-se aos perigos <strong>da</strong>s tem-<br />

pesta<strong>de</strong>s para se procurarem este abraço fraternal <strong>da</strong>s egrejas<br />

christãs.<br />

Gran<strong>de</strong>s tempos eram estcs em que viviam um S. Cypriano,<br />

um Cornelio e tantos outros, que a morte roubou para sempre e<br />

cuja M<strong>da</strong>, apezar dc obscura, náo era menos grandiosa.<br />

Nào nos afastemos, porem, <strong>do</strong> nosso assumpto.<br />

Diziamos nós que o raciocinio <strong>de</strong>monstrava tambem esta divi-<br />

são jh feita nos primeiros dias; mas, note-se, falavamos <strong>do</strong> racio-<br />

cinio fun<strong>da</strong><strong>do</strong> e corrobora<strong>do</strong> pela historia, e iião <strong>do</strong> raciocinio <strong>de</strong>s-<br />

acompanha<strong>do</strong> d'esse auxilio, o qual em materias <strong>de</strong> faclo, como<br />

estas, pouca força tem; apezar <strong>de</strong> o vermos frequentes vezes cin-<br />

prega<strong>do</strong> em nao raros escriptorcs.<br />

Os aposto104 tinham fun<strong>da</strong><strong>do</strong> as egrejas; os bispos siicccdiam-<br />

Ihes naturalmente aos presbyteros <strong>de</strong> instituição apostolica no go-<br />

verno d'ellas.<br />

1 Epistol. passim.<br />

2 Tract. tert. <strong>de</strong> SimpZicit. paelat., pag. 285 <strong>do</strong> 1.O tomo, ez recoh1ione<br />

diui Erasmi, 1528.<br />

3 Tract. cit., pag. 205.<br />

'


Ninguem ousava transtornar estas cousas, em que os apostolos<br />

tinham posto as màos por inspiração <strong>de</strong> Deus ; as egrejas permaneciam<br />

sobre si, e eram a norma <strong>da</strong>s novas parochias, que com o<br />

espalhar <strong>da</strong> <strong>do</strong>utrina cvangelica se faziam necessarias e se iam<br />

creari<strong>do</strong>.<br />

NBo cram estas, porcm, muitas nos primeiros tempos.<br />

Scguri<strong>do</strong> se re <strong>de</strong> S. Clcmcnte em sua primeira cpistola aos<br />

corinthios, os apostolos tinham dcixa<strong>do</strong> bispos em grcinios <strong>de</strong> fieis<br />

mrii poiico iiumcrosos, pcrisan<strong>do</strong> no scu augmento futuro ; e foi<br />

preciso que cliegassc o mea<strong>do</strong> <strong>do</strong> segun<strong>do</strong> scculo, ])oriro mais ou<br />

niCiIos, 1)ilra que, como quc trarisbor<strong>da</strong>ri<strong>do</strong>, as parochias tivesseiri<br />

<strong>de</strong> separar <strong>de</strong> si algumas christari<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

Como era Dcus que nas assemblcias <strong>do</strong> poro e <strong>do</strong> clero os inspirava<br />

na escolha <strong>do</strong>s bispos, como escreveram os padrta c se acreditava<br />

entao, ningiiem ousava intervir no governo dc rim rebanho<br />

para o quíil o cspirito saricto apontara ccrto pastor.<br />

Que po<strong>de</strong>ria significar o filcto <strong>de</strong> abnntio~iar rima diocesc para<br />

ir para outra? ambiqão? receio <strong>de</strong> perigo, íiinor tla vi<strong>da</strong>? e era<br />

isto a <strong>do</strong>utrina cliristà? eram estes os cxtbniplos <strong>do</strong> E\.iiiipeili~ c as<br />

tradicçòes <strong>do</strong>s apostolos ?<br />

Não seria isto bastarite para dcclarar a indigni<strong>da</strong><strong>de</strong> c justificar<br />

a <strong>de</strong>posiç%o <strong>de</strong> um clerigo, bispo, sacer<strong>do</strong>te ou diacono?<br />

Tacs foram as razòcs d'aquelles cariones ; tal a origem, em mcu<br />

mo<strong>do</strong> dc ver, d'esta divisa0 ccclesiastica tão bem <strong>de</strong>fini<strong>da</strong> e marca<strong>da</strong><br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o principio.<br />

Scja ca<strong>da</strong> um pastor <strong>de</strong> seu rebanho proprio, porque essc rebanho<br />

conhece, c conhecia ja antes, o seu pastor; porque Deus 111'0<br />

<strong>de</strong>u (Spirztus Sariclus vos postcit); porque o episcopa<strong>do</strong> 6 unico,<br />

e aqui, ou alem, em Roma, ou Carthago, tanto é bispo <strong>do</strong> christianismo<br />

Clementc <strong>de</strong> Alexandria, como Ignacio dc Antiochia.<br />

A respeito <strong>do</strong>s metropolitas, <strong>de</strong> que cvidcritemcnte fala, ain<strong>da</strong><br />

que os nBo charne assim, o cari. xxsv, e a que tambem se referem<br />

as cartas <strong>de</strong> S. Cypriano, cscriptas, pcla segun<strong>da</strong> meta<strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

seculo terceiro ; não nos <strong>de</strong>ve admirar o seu apparecimcnto tào ce<strong>do</strong>.<br />

O imperio, apesar <strong>de</strong> se approximar <strong>do</strong> occidcrite <strong>de</strong> sua gloria,<br />

e ain<strong>da</strong> um gran<strong>de</strong> faclio, cheio <strong>de</strong> luz e <strong>de</strong> teritaçoes; tem ain<strong>da</strong><br />

um gran<strong>de</strong> podcr <strong>de</strong> attracção e <strong>de</strong> assirnila~80, como to<strong>da</strong>s as<br />

instituições collossaes que com os seculos ganham não sei que<br />

imponentes <strong>direitos</strong> sobre o mun<strong>do</strong>.


O que a historia <strong>de</strong>monstra 6 que, on<strong>de</strong> havia uma metropole<br />

civil, appareceu uma metropole ecclesiastica.<br />

A prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong> e gran<strong>de</strong>za material <strong>de</strong> uma ci<strong>da</strong><strong>de</strong> trazia a su-<br />

premacia para o bispo d'essa ci<strong>da</strong><strong>de</strong>: on<strong>de</strong> um proconsul, on<strong>de</strong><br />

um prefeito <strong>do</strong> pretorio, on<strong>de</strong> um vigario <strong>do</strong> imperio, ahi um me-<br />

tropolita.<br />

Mais importantes pelo maior numero <strong>de</strong> christãos, mais arris-<br />

ca<strong>da</strong>s por mais expostas hs perseguições, mais luzentes por pos-<br />

sui<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> mais egregios bispos e soffre<strong>do</strong>ras <strong>de</strong> mais brilhantes<br />

martyrios, a sua supremacia erigia-se natural, espontaneamente <strong>de</strong><br />

tu<strong>do</strong> isto.<br />

Assim Roma, assim Constantinopla, assim Carthago, assim Ale-<br />

xandria, assim Antiochia, assim Trevcs, Nico<strong>de</strong>mia e Aqiiilea.<br />

I? tanto isto ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, que, como nota Basnage 1, Jerusalem a<br />

gran<strong>de</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong>. a ci<strong>da</strong><strong>de</strong> sancta, a mãe <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as egrejas, arrasa<strong>da</strong><br />

por Tito, s6 por fim e a muito custo pô<strong>de</strong> alcançar a<strong>do</strong>rnar-se<br />

com o titulo <strong>de</strong> Patriarcha<strong>do</strong>, mas nunca conseguiu o primeiro lo-<br />

gar. Tal a origem post-apostolica d'estas gran<strong>de</strong>s divisòes <strong>da</strong> egrcja.<br />

Prova<strong>da</strong> assim a existencia <strong>de</strong> uma divisão ecclesiatltica 6 pre-<br />

ciso agora dizer quem tinha o direito <strong>de</strong> a traçar.<br />

Primeiro nos é riecessario saber como se or<strong>de</strong>navam e escolhiam<br />

os bispos para esta, ou aquella diocese; porque, como veremos,<br />

este ponto nos resolve a questão em gran<strong>de</strong> parte.<br />

Os bispos não eram escolhi<strong>do</strong>s corrio hoje; eram eleitos pela<br />

plcbe <strong>da</strong> parochia em presença <strong>do</strong>s bispos mais proximos <strong>da</strong> pro-<br />

vincia, que confirmavam a escolha <strong>da</strong>n<strong>do</strong>-lhes o seu assentimento.<br />

I? este um ponto <strong>de</strong> historia indubitavelp.<br />

S. Cypriano em uma <strong>de</strong> suas epistolas a Cornelio, papa 3, es-<br />

creve :<br />

a... Nemo post divinum judicium, post populi suffragium, post co-<br />

uepiscoporum consensum judicem se non jam episcopi, sed,<strong>de</strong>i faceret.))<br />

1 Hist. <strong>de</strong> llAgliae, chap. 2.~-<br />

Vê-se em Tillernont, art. S. Cyprien, evêque <strong>de</strong> Carthage, tom. 4.0, ppg.<br />

55, uin exemplo <strong>de</strong> como a prosperi<strong>da</strong><strong>de</strong> temporal .e a importancia politica<br />

<strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s B que <strong>da</strong>vam As dioceses a primazia.<br />

Van h'spen. JIM Ecel. Uni. P. I, tit. XIX, c. r e 11,<br />

2 Veja-se Bingham. Origin. Ecclee.<br />

3 Epist. 3.a, lib. 1.0 pag. 15.<br />

3


Na epistola a Felix, presbytero, e Paulo diacono e sua plebe 1,<br />

<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> expor as regras <strong>da</strong> or<strong>de</strong>naçao e escolha <strong>do</strong>s bispos, sa-<br />

cer<strong>do</strong>tes e diaconos, fun<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-se nos numeros <strong>de</strong> Moysks e nos<br />

Actos <strong>do</strong>s apostolos, accrescenta :<br />

uProptrr qiiod diligenter <strong>de</strong> traditione divina et apostolica observa-<br />

ationr sor\;iiidiim est et teiicndum, quod apiid nos qiioque, et fere<br />

«pcr pro~incids universas tenetur, ut ad ordiriatioiies rite celrbran<strong>da</strong>s<br />

«ad eam plebein, cui praepositas ordinatiir, rpiscopi ejiisdcm provin-<br />

«ciae proximi yuiiiqiie conweniant, et rpiscopus dcligatur plebe pre-<br />

usente, qriae singuloriim vitam plenissirne nobit, et uniiis cujusque<br />

aactiim <strong>de</strong> ejus conserialioiie perspexit.))<br />

Notcmos, portanto, que não era só o que se <strong>de</strong>via guar<strong>da</strong>r re-<br />

ligiosameritc por ser tradiyâo divina e observancia apostolica, mas<br />

por scr o que se ftizia fere per provincias universas.<br />

Era a disciplina ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira, a melhor, a mais geral ; era<br />

a lei.<br />

A tradiç'io, que cste padre aconselha a ca<strong>da</strong> passo e tanto ve-<br />

nera cm suas obras, foi brilhantemente <strong>de</strong>fendi<strong>da</strong> neste pcriotlo<br />

pelo celebre S. Justirio, apologista, martyr e <strong>do</strong>utor, que iiveu<br />

tles<strong>de</strong> os comecos <strong>do</strong> segun<strong>do</strong> seculo, <strong>de</strong>fesa que elle eRectuou,<br />

protegen<strong>do</strong>-a com sua penna e edificari<strong>do</strong>-a com suas obras.<br />

Tertulliano e S. Irerieo, escreven<strong>do</strong> nos fins <strong>do</strong> mesmo seculo,<br />

combatcm tambcm sob a mesma ban<strong>de</strong>ira.<br />

E a poucos passos vemos, ain<strong>da</strong> que noutro prrio<strong>do</strong>, rim \iilto<br />

hrilliantissirno, que a egreja celcbra e a historia nòo meiios I.(,,-<br />

peita, S. Agostiriho, que (? o talentos0 continua<strong>do</strong>r d'estes varões<br />

illustres.<br />

Por to<strong>da</strong> n historia os exemplos são numerosissimos, e, <strong>do</strong>n<strong>de</strong><br />

resta noticia <strong>da</strong> ordcnay7io <strong>do</strong>s bispos, isto se v&.<br />

O miiis ieneran<strong>do</strong> exemplo é o <strong>de</strong> S. Lino, bispo <strong>de</strong> Roma,<br />

que, or<strong>de</strong>na<strong>do</strong> pelos apostolos Pedro e Paulo, apezar d'isso, é a<br />

cgr(ja, 6 a plebe christá <strong>de</strong> Roma que o elege.<br />

Era tu<strong>do</strong> paternal aqui ; - nao Iiavia a imposiq'io inconsciente,<br />

q11asi brutal, <strong>da</strong> vontadc <strong>de</strong> um homem, embora bispo, embora<br />

drpositnrio <strong>de</strong> uma herança apostolica (permitta-se a expressáo)<br />

cm linha recta.<br />

O bispo eleito por os <strong>de</strong> sua provincia, não entrava na cornmu-<br />

1 Epist. 4, lib. 1.0, pag. 31.


ihâo <strong>da</strong> egreja, sem expedir cartas e emissarios para to<strong>do</strong> o<br />

mun<strong>do</strong>, .pedin<strong>do</strong> assim o assenso d'ella.<br />

O episcopa<strong>do</strong> era unico : - esta a gran<strong>de</strong> maxima d'cstes se-<br />

culos, <strong>de</strong> que nos nâo <strong>de</strong>vemos esquecer.<br />

Em Corintho, no celebre schisma <strong>do</strong> tempo <strong>de</strong> Clemente, papa,<br />

o povo <strong>de</strong>põe os padres <strong>da</strong> sua egreja pelos achar indignos, como<br />

d manifesto <strong>da</strong>s cpistolas <strong>de</strong> Clcmcnte, j6 por vczds cita<strong>da</strong>s.<br />

Mais <strong>de</strong> um exemplo d'cstc proce<strong>de</strong>r sc v& nos scculos seguin-<br />

tes, e até na propria egreja dc Africa, a mais respeitavel dc to<strong>do</strong>s<br />

estes tempos por suas virtu<strong>de</strong>s, pelos gran<strong>de</strong>s homeiis que occu-<br />

param as suas ca<strong>de</strong>iras episcopaes, por seli respeito pela disciplina<br />

tradicional e zelo no governo ecclesiastico 1.<br />

Insistimos neste ponto, porque teremos adiante <strong>de</strong> entrar cm<br />

uma gran<strong>de</strong> lucta na qual estes factos hiio <strong>de</strong> scr a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira luz;<br />

e, por isso, vamos ain<strong>da</strong> apresentar <strong>do</strong>is exemplos brilhantes d'es-<br />

tes tres primeiros seculos.<br />

Sâo tira<strong>do</strong>s <strong>da</strong>s vi<strong>da</strong>s <strong>de</strong> S. Cypriano, bispo <strong>de</strong> Carthago e <strong>de</strong><br />

S. Cornelio, bispo <strong>de</strong> Roma, ou papa, como querem os escripto-<br />

res catholicos.<br />

Quan<strong>do</strong> no anno 248 <strong>de</strong> J. C. se tractou em Carthago <strong>da</strong> elci-<br />

çâo <strong>do</strong> bispo, ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> acclama<strong>do</strong> pela plebe S. Cypriano, cstc<br />

fugiu cheio <strong>de</strong> humil<strong>da</strong><strong>de</strong> para sua casa, on<strong>de</strong> se escondcu ; por-<br />

que o povo o procurava, preterin<strong>do</strong> os mais antigos presbyteros.<br />

Amictos, cercam-lhe a habitação, guar<strong>da</strong>m-lhe as sahi<strong>da</strong>s e ohri-<br />

gam-n'o a ce<strong>de</strong>r a este pedi<strong>do</strong> unanime.<br />

A historia refere com enthusiasmo a inquietaçâo com que era<br />

espera<strong>do</strong>, e a alegria com que foi recebi<strong>do</strong>.<br />

Não é s6 isto.<br />

Bispo <strong>de</strong> Carthago, este homem illustre na<strong>da</strong> fazia sem tomar<br />

1 Mr. Basnage, obr. cit., cap. 1 <strong>do</strong> liv.,4.0, escreve:<br />

L'dglise d'Afiiqoe est peut-être ceUe qui a le rnieux conservé lu puretk <strong>de</strong><br />

lu Foi, la sZrnplici/d, <strong>da</strong>no lea moeurs, et <strong>da</strong>na le culte; et qzri a <strong>de</strong>fendt~ avec<br />

plus d'ar<strong>de</strong>ur son indépen<strong>da</strong>nee, aa libedé et ses usagee particuliers. Elle a<br />

élk une source obon<strong>da</strong>nte d'honames savans, et d'evêques zBl<strong>de</strong>, qui s'opposkrent<br />

fortement am erreura naissantes <strong>de</strong> Pelage et à Z1Ariani#me soutenu par<br />

I'atctoritk <strong>de</strong>s Pn'nces barbares. Lea persdcutions quleUe a essuy<strong>de</strong>s n'oni. servi<br />

qu'à la rend~e plus illustre, par le nombre et par lu constance <strong>de</strong> ses confesseurs<br />

et <strong>de</strong> ses Martyrs, qu'on vemit ccrnsulter du fond <strong>de</strong> I1Orient et <strong>de</strong> la<br />

Sc*ythie, jusque:<strong>da</strong>ns les lieux ozi iia Ltaiennt réglds.<br />

O niesmo dizem os biographos <strong>do</strong>s bispos <strong>da</strong>s dioceses d'esta illustre<br />

egreja.


conselho <strong>de</strong> seu clero, e pedir o consentimento <strong>do</strong> povo para que<br />

o que elle fizesse fosse ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente feito pela egreja que era,<br />

dizia elle, o povo uni<strong>do</strong> a seu bispo, <strong>de</strong> maneira que o bispo esteja<br />

na egrrja e a egrejs no bispo.<br />

As cartas que escrevia para outros bispos, lia-as, antes <strong>de</strong> as<br />

enviar a seu <strong>de</strong>stino, ao povo <strong>de</strong> sua diocese, e o mesmo fazia com<br />

as que d'elles recebia.<br />

Não menos digno <strong>de</strong> attenção 6 o que se passou com a eleição<br />

<strong>de</strong> S. Cornelio na egreja <strong>de</strong> Roma no anno 261 <strong>da</strong> era Fulpr.<br />

Quan<strong>do</strong> em 20 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 250 S. Fabiano, papa, soffreu o<br />

mart!rio, estava Decio occupan<strong>do</strong> o throno imperial; e o odio que<br />

á religião christã tiriha este homcm violento, a importaricia <strong>da</strong> ca<strong>de</strong>ira<br />

episcopal <strong>de</strong> Roma, já tiio clara <strong>de</strong> epcgios occupa<strong>do</strong>res,<br />

fizeram com que se não po<strong>de</strong>sse eleger bispo para substituir aquelle.<br />

Os padres e diaconos tomaram o governo <strong>da</strong> egreja romana na<br />

sua interini<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Em quanto aos negocios mais importantes e extraordinarios,<br />

como o attesta S. Cypriano, elles na<strong>da</strong> resolkiam, esperari<strong>do</strong> ~)cllo<br />

bispo.<br />

Dezeseis annos <strong>de</strong>pois a ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Roma 6 occupa<strong>da</strong> por<br />

S. Corrielio,<br />

S. Cypriano conta-nos a maneira, por que este vara0 foi or<strong>de</strong>na<strong>do</strong>.<br />

'<br />

Tractava-se <strong>da</strong> eleiçáo para uma <strong>da</strong>s ca<strong>de</strong>iras cpiscopac~ rn:~;.<br />

notaveis e mais imponentes pela tradição apostolica e por seu logar<br />

no centro <strong>do</strong> imperio, e não 6 <strong>de</strong> crer que estes padres, que<br />

durante <strong>de</strong>zcseis annos conservaram tão pura a discitilina c souberam<br />

tão virtuosamente sahir-se <strong>de</strong> táo pesa<strong>do</strong> encargo, não é <strong>de</strong><br />

crer, digo, que no momento solemnissimo <strong>da</strong> or<strong>de</strong>nacão <strong>de</strong> seu<br />

bispo se afftlstassem <strong>da</strong> sã disciplina <strong>da</strong> egreja e <strong>da</strong> tradição apostolica.<br />

Ouçamos o que escreve S. Cypriano 1 :<br />

aNemo jamjam niinc frater charissime, et ad personam Cornelii<br />

acollegae nostri, ut Cornelium nobisciirn veriiis noveris, non <strong>de</strong> mali-<br />

wgnorum et <strong>de</strong>trahentium meri<strong>da</strong>tio scd <strong>de</strong> Dei jridicio, qui eum epis-<br />

acopum fecit et coepiscoporum testimonio. qiiorum numerus iiniversus<br />

uper totum mundum concordi unaiiimitatc consensil. Kam qiiod Cor-<br />

1 Epist. 2:, Iib. 4, píig. 189.


anelium charissimum nostrum <strong>de</strong>o et Christo et ecclesiae ejus, item<br />

aconsacer<strong>do</strong>tibus cunclis can<strong>da</strong>bili praedicatione commen<strong>da</strong>t non istc<br />

aad episcopatum subito pervenit, sed per ornnia ccclcsiastica officia<br />

apromotus et in divinis administrationibus <strong>do</strong>minum saepe prome-<br />

urilus ad sacer<strong>do</strong>tii sublime fastigium cunctis religionis gradibus as-<br />

ucendit.~<br />

Quan<strong>do</strong> com a eleição <strong>de</strong> Cornelio se levantou o famoso schis-<br />

ma <strong>de</strong> Novaciano, o qual se fez or<strong>de</strong>nar bispo fraudulentamerite,<br />

este schismatico escrevia a to<strong>da</strong>s as egrcjas para lhe fazer constar<br />

a sua or<strong>de</strong>nação, dizen<strong>do</strong> que fòra constrangi<strong>do</strong> a acceitar a ca-<br />

<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Roma, que sua humil<strong>da</strong><strong>de</strong> rejeitava i.<br />

Ao mesmo tempo <strong>de</strong>putava padres para Africa e Alexandria a<br />

pedir a communhão d'essas egrejas ; e era isto na epocha em que<br />

por to<strong>da</strong> a parte appareciam as cartas <strong>de</strong> Cornelio tractan<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

mesmo objecto 9.<br />

A vista d'isto tu<strong>do</strong>, em presença d'estes factos, <strong>de</strong> que ningucm<br />

pó<strong>de</strong> duvi<strong>da</strong>r a não duvi<strong>da</strong>r <strong>de</strong> si proprio e <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> to<strong>do</strong>, como<br />

se po<strong>de</strong> crer que um bispo, um metropolita mesmo, ousasse crear<br />

por si s6 uma nova parochia, separar <strong>da</strong> christan<strong>da</strong><strong>de</strong>, ou <strong>de</strong> seu<br />

suffraganeo, uma parcella para a <strong>da</strong>r a outro, ou erigil-a em nova<br />

parochia ?<br />

Como? se o conselho <strong>do</strong>s bispos e metropolitas se ouvia e dc-<br />

via <strong>de</strong> ouvir para as cousas mais insignificantes?<br />

Será preciso <strong>de</strong>monstrar que n8o era importaritc c grave para<br />

estes tempos <strong>de</strong> convicçties e virtu<strong>de</strong>s fazer aqui110 mcsmo que os<br />

apostolos tinham feito pelo mun<strong>do</strong>.<br />

Eis aqui como a fórma <strong>da</strong> eleição <strong>do</strong>s bispos prova que a cir-<br />

cumscripção <strong>de</strong> uma nova parochia não era cousa que se fizesse<br />

sem ouvir os bispos <strong>da</strong> provincia e o metropolita. E para aquel-<br />

les a quem não satisfizerem estes factos ha o texto <strong>da</strong>s leis, que<br />

passamos a expor.<br />

O can. xxxv <strong>do</strong>s apostolos classifica em duas categorias to<strong>do</strong>s<br />

os negocios ecclesiasticos : para uns sào compctcntes os bispos por<br />

si s6 - são as cousas que pertencem exclusivamente á parochia<br />

propria e al<strong>de</strong>ias que lhe estão sujeitas ; para outros, náio 6 com-<br />

petente o bispo s6, nem tão pouco o metropolita: sáio sim corn-<br />

1 Tillenaont, obr. oit., tom. 3.0 art. S. CorneiUe pape.<br />

2 TiUernont, log. cit., art. x, pag. 452.


petentes os bispos <strong>da</strong> provincia, ouvi<strong>do</strong> o metropolita, isto é -<br />

o syno<strong>do</strong> provincial.<br />

Pertencem a esta ultima classe os negocios attinentes a to<strong>da</strong> a<br />

provincia - quae totam Provinciam sive ecclesiam communem<br />

statum concernunt I.<br />

O can. cit. diz :<br />

~Episcopos Gentium singularum scire convenit, quis inter eos pritímus<br />

habeatur, quem velut caput existimcnt, et nihil amplius praeter<br />

trejus conscientiam gerant, quam illa sola singiili, quae Parochiae protrpriae,<br />

et villis quae sub ea sunt competunt: sed nec ille praetcr<br />

(íomnium conscientiam faciat a1iquid.n<br />

Era isto t3o necessario para evitar a arrogancia <strong>do</strong>s bispos e a<br />

anarchia no governo, que o can. acaba dizen<strong>do</strong>:<br />

aSic enim unanimitas erit et glorificabitur Deus per Christum in Spi-<br />

trritu Sancto. ))<br />

Lonaras, o commenta<strong>do</strong>r grego, cita<strong>do</strong> por Van-Espen e estc<br />

escriptor, dizem :<br />

«Hoc autem merito statiim est, ne alioquin primiis Episcopus vel<br />

~Metropolitanus, honore abutens hunc rnutet in <strong>do</strong>minium, et uni<br />

trsibi potestatern arroget, tua ut Bpiscopi sibi consenticntcs, chnritales<br />

oquc vinculo colligati exemplum sint Clero et popiilo dilectionis et con-<br />

trcordiae. u<br />

O cai]. xrv confirma indirectamente isto mesmo.<br />

Ahi se prohibe ao bispo aban<strong>do</strong>nar a parochia propria e ir<br />

para outra ; e comtu<strong>do</strong> admitte-se-lhe que o faca, mas em caso<br />

extremo, dc força maior, quan<strong>do</strong> a cari<strong>da</strong><strong>de</strong> ou a utili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> pro-<br />

sirna cgreja assim o exige imperiosamente ; cauteloso, porem, o<br />

can. accresccnta :<br />

u ... Nisi forte rationabilis cum causa compellat, tamquam qui possit<br />

tíibi<strong>de</strong>m constitiitis plus lucri conferre, ct in causa Religionis aliquid<br />

uprofectos prospicere et hoc non a semetipso pertentet sed multorum<br />

uEpiscoporum judécio et maxima supplicatwne perficiat 2.u<br />

1 Van-Eupen.<br />

obr. cit., tom. 3.0 schol. in can. xxxv apost. Thomas. Vet. et<br />

nov. Ecclee. Uiscipl. P. 1, lib. 1, cap. LIV, n.O 14.<br />

2 Bem sabemos n6s que estes canones nso eram geralmente recebi<strong>do</strong>s na,


Sen<strong>do</strong> assim, como classificar em negocios pertencentes itquillo<br />

que 6 proprio <strong>de</strong> certa parochia a creação <strong>de</strong> uma nova parochia<br />

ou diocese? como admittir que se abalance, com dircito, a acto<br />

<strong>de</strong> tal importancia um metropolita, ain<strong>da</strong> que occupa<strong>do</strong>r <strong>de</strong> algu-<br />

ma <strong>da</strong>s ca<strong>de</strong>iras mais notaveis ? como? se esta 6 a disciplina pura,<br />

a disciplina que se estriba na tradição divina e na obscrvancia<br />

apostolica, a disciplina que se <strong>de</strong>ve guar<strong>da</strong>r e reter, a que se pra-<br />

tica fere per provincias universas; a disciplina que <strong>de</strong>vem <strong>de</strong>fen-<br />

<strong>de</strong>r, mais que as outras, as sés dc origem reconheci<strong>da</strong>mente apos-<br />

tolica, aquellas on<strong>de</strong> os discipulos <strong>de</strong> Jesus se rcuniam, d'on<strong>de</strong><br />

partiam para to<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong>, euntes bini, ondc mais tempo se <strong>de</strong>-<br />

moraram e permaneceram ?<br />

E ninguem ousarb taxar <strong>de</strong> insignificante tal assumpto ;-pois<br />

que ate os proprios, que dcfcn<strong>de</strong>m as <strong>do</strong>utrinas d'alem-montes,<br />

cgreja romana e no occi<strong>de</strong>nte ao tempo em rluc Dionysio Exiguo, ou Pequeiio,<br />

fez a versão d'elles, que poz i testa <strong>do</strong> seu codigo.<br />

As suas palavras, na pref:ição ou epistola ao bispo Estcrão, que prece<strong>de</strong><br />

o codigo. não dão logar a divi<strong>da</strong>s : S... in principio canonea qui CEicz6ntr~r Apostolorum<br />

<strong>de</strong> Graeco transtulimua, quibua pia plurimi coneensum ~zon prar-<br />

~buere facilem, hoc ipeum vestram noluimus i!/t~ornre arcnctilatem ; quamcta<br />

ipostea quae<strong>da</strong>na constituta Pontijcum ex ipsia cano~~ibus <strong>de</strong>sumpla est via<strong>de</strong>antzsr.<br />

s<br />

Não faça, porem, pcso esta consi&eração, porque o não tem.<br />

Nós não tractamos aqui <strong>de</strong> procurar a disciplina <strong>da</strong> egreja roinsna, ou dc<br />

Constantiriopla, Alexandria, ou <strong>da</strong> Hespanha : queremos saber qual a legisla@~<br />

geral <strong>da</strong> egreja; qual a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira disciplina, regra commuin, direito<br />

geral.<br />

Reconheci<strong>da</strong> a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> aos canones apostolicos; attribui<strong>do</strong> aos seculos<br />

2.0 e 3.0 o seu coiiteú<strong>do</strong>; não po<strong>de</strong>mos, nem <strong>de</strong>vemos, prescindir <strong>de</strong> tão veneran<strong>do</strong>~<br />

monumentos.<br />

Conteste.se essa auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>, negue-se a sua antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> e <strong>de</strong>pois coiifutem-se<br />

as uossas affirmaçòes; mas, emquanto se admittir, como admittimos,<br />

a veraci<strong>da</strong><strong>de</strong> d'eates canones, prcteril-os, <strong>de</strong>sprezal-os, era uma impcr<strong>do</strong>avel<br />

falta.<br />

Os canones apostolicos, se são o transumpto <strong>da</strong> disciplina <strong>do</strong>s concilias<br />

<strong>do</strong> 2.0 e 3.0 seculo, são ao mesmo tempo o espelho fiel <strong>da</strong> tradição spostolica.<br />

Pouco importa quem tenha si<strong>do</strong> o seu aiictor: o que 6 certo é quc, pela<br />

sua materia e pela sua antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> &o, <strong>de</strong>pois <strong>do</strong>s Actos, o monumcnto mais<br />

respeitavel <strong>do</strong>s tres primeiros seculos <strong>da</strong> egreja, preciosa lembrança historica<br />

d'esses tempos e inestimavel <strong>do</strong>cumento <strong>de</strong> legislação primitiva.<br />

Ao que parece eram reconheci<strong>do</strong>s e ti<strong>do</strong>s até por obra <strong>do</strong>s proprios apostolos<br />

no orieute <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito; no occi<strong>de</strong>nte, porem, sc eram jzí corilieci<strong>do</strong>s<br />

antes <strong>da</strong> traducção <strong>de</strong> Dionysio, como o <strong>de</strong>scobrem as palavras d'elle acima<br />

citadita, não eram comtu<strong>do</strong> geralmente recebi<strong>do</strong>s, e difficil era a acceitapâo<br />

<strong>de</strong> sua auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> -pZwimi illia ccnaensum non praehuere facilem.<br />

Mas corno enten<strong>de</strong>r as expres<strong>de</strong>s'<strong>do</strong> celebre abba<strong>de</strong> scitha? nlo se <strong>da</strong>va 4


se baseam, para <strong>da</strong>r ao papa esta prerngiitiva, na importancin inex-<br />

cedivel, summa, <strong>de</strong> similhantes objectos, como abaixo teremos<br />

occasião <strong>de</strong> ver.<br />

Hu bem sei que nenhum d'estcs textos diz, aberta e expres-<br />

samente, que a creação <strong>de</strong> novas dioceses é negocio que s6<br />

pcrtcnce ao syno<strong>do</strong> provincial, e aqui é que est8 a difficul<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>da</strong> questão ; - mas n6s provámos indirectamente qual era a<br />

melhor, a mais pura disciplina ; evidiwcifimos como a tradição<br />

cra respeita<strong>da</strong>, o que era sabi<strong>do</strong> <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s; e, ultimamerite,<br />

troiixernos á luz um canon, que, se o não diz espccificadiimcnt~,<br />

mnritla-o to<strong>da</strong>via mui positivamente na generali<strong>da</strong><strong>de</strong> com que se<br />

exprime.<br />

Acima dissemos que nóo s6 a egreja <strong>de</strong> Africa era uma <strong>da</strong>s<br />

mais rclspeitaveis d'estes tempos e <strong>da</strong>s mais respeita<strong>do</strong>ras <strong>da</strong> tra-<br />

tli(;;n, mas tambem quc os caiiones <strong>do</strong>s coricilios, <strong>do</strong> 4.' seculo,<br />

eram como que o espelho sereno <strong>da</strong> disciplina <strong>de</strong> eritào ; e n6s<br />

vamos citar um canon <strong>do</strong> 4." concilio <strong>de</strong> Africa, celebra<strong>do</strong> no<br />

facil asscntimcnto a que? 9, origem realmente apostolica ou á sua ,i:iri:r li<strong>da</strong><strong>de</strong>?<br />

Dionysio escrevia no começo <strong>do</strong> 6.0 seculo, e traduzia- os <strong>do</strong> grego, porque<br />

vestram noluirnus ignarare sanctitatem, e, notumos bem, inseria-oe no eeu<br />

codigo primeiro <strong>do</strong> que os eanones <strong>de</strong> Nicea.<br />

Não era <strong>da</strong> sua provecta antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> que se duvi<strong>da</strong>va no 5.0 seculo, mas<br />

<strong>de</strong> s11a origem apostolica.<br />

E que iio occi<strong>de</strong>nte, e na propria Roma, alguns havia que Ilies pi ?


tempo <strong>de</strong> Bonifacio, on<strong>de</strong> expressamente se incumbe esta tarefa ao<br />

syno<strong>do</strong> provincial. o can. xx 1 que diz :<br />

aPlacuit et illiid : iit plebes, quae nunquam habuerunt proprios<br />

aepiscopos, nisi ex concilio plenario, uniuscujusque provinciae et pri-<br />

umatis atque consensu ejus ad cujus dioecesim ea<strong>de</strong>m ecclesia perti-<br />

anebat, <strong>de</strong>cretum fuerit, minime accipiant.))<br />

Pouco nos importa agora que nos alleguem exemplos em con-<br />

trario, se alguns positivos se po<strong>de</strong>m offerecer 9. Em to<strong>do</strong>s os tem-<br />

pos se <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> executar as leis e estes tres primeiros seculos,<br />

! Tempore Bonifacii caelesti habitum -Collecção <strong>do</strong> padre Labbe, tom. v.<br />

E o mesmo canon XCVIII <strong>do</strong> Co<strong>de</strong>x Canonum mlesiae afrkanae <strong>da</strong> verslo<br />

<strong>de</strong> Christophoro Justello.<br />

2 Thomaa. Vet. et Nov. discivl. Eccl. P. 1.'. lib. 1.". C~D.<br />

LIV.<br />

Neste logar, como em muitos outros, escrévc este áuctor sem critica ne-<br />

nhuma, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> para quem lê o trabalho <strong>de</strong> tirar <strong>do</strong>s facto8 que allega o<br />

proveito que offerecem.<br />

Do que elle diz aqui não se <strong>de</strong>duz ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente que o metropolita po-<br />

<strong>de</strong>sse por si s6 erigir novos bispa<strong>do</strong>s; mas tambem não 6 positivo que fosse<br />

indispensavel para esse effeito a approvaçho <strong>do</strong> syno<strong>do</strong> provincial.<br />

Os n.OS 4, 5 e 14 parece mesmo estarem em contradicçâo.<br />

Lê-se em um logar :<br />

a ... ita certissimum praebet ejw potestatia argumentum qwrm in eri endie<br />

uintra Prouinciam suam Episcopalibua novis habebant tunc ~etropoitani.<br />

IL.O 4, e maie abaixo.<br />

~Denique potuisse Metropolitas in sua quemque Provincia Episcopales<br />

acreare Se<strong>de</strong>s, saltem coneentiente Prowinciali Conci1io.r n.O 5.<br />

Lê-se noutro logar : aPrimalis Coiicilii Provincidie, et ejus hpiecopb ne-<br />

rceaeariue erat conseneus, e cujue Dioced Episcopatuo <strong>de</strong>cerpebatw. n.° 14.~<br />

e ain<strong>da</strong> :<br />

rDenque Canonea ipez' canones ipsl: expreasie verbb Conciliiu Provinciali-<br />

abus haec probari praecipiunt..<br />

Qual a disciplina <strong>de</strong>pois d'esta confusão?<br />

Talvez a soubesse Thomassino, mas não a sabemos n6s por este livro; e,<br />

ain<strong>da</strong> que a maior parte <strong>do</strong>s exemplos sejam extrahiclos <strong>de</strong> factos <strong>do</strong> seculo IV,<br />

vamos em poucas palavras ver se <strong>da</strong>mos alguma luz a estes logares.<br />

O exemplo <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r <strong>do</strong>s metropolitas, ain<strong>da</strong> que ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro, não po<strong>de</strong> illidir<br />

a força <strong>do</strong>s canones <strong>do</strong>s apostolos que citAmos : sed nec ille praeter omnium<br />

conecientiam faciat alipuid.<br />

Demais, alem <strong>de</strong> esses exemplos serem tira<strong>do</strong>s <strong>de</strong> factos, on<strong>de</strong> o aperto <strong>da</strong>s<br />

circumstancias como que <strong>da</strong>va aos metropolitas não ri6 o direito mas tambem<br />

a obrigação <strong>de</strong> erigir novos bispa<strong>do</strong>s, não dizem elleri se o metropolita pedia<br />

para isso, ou nh, o consentimerito <strong>do</strong>s bispos <strong>da</strong> provincia ; antes, pelo con-<br />

trario, parece entrever-se ista mesino; e o proprio Thomwsino o presentiu,<br />

quan<strong>do</strong> escreveu saltem consentietite concilio provincialz'.<br />

E se este eacriptor em o n.' 14 sabe levantar essa objecção a respeito <strong>da</strong>


alem <strong>de</strong> serem os seculos <strong>da</strong>s perseguições, <strong>da</strong>s heresias e <strong>do</strong>s<br />

schismas, sno tambem os seculos <strong>da</strong> formação <strong>da</strong> hierarchia e po-<br />

<strong>de</strong>res temporaes <strong>da</strong> egreja, on<strong>de</strong> só é positivo e firme o que se<br />

basCa na tradição divina, na observancia apostolica, uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong><br />

episcopa<strong>do</strong> e uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> egreja, os quatro gran<strong>de</strong>s principios quc<br />

se nos aRguram ser as quatro ingentes columnas <strong>do</strong> berço <strong>do</strong> ca-<br />

tholicismo e que explicam como tu<strong>do</strong> nestas eras se <strong>de</strong>cidia por<br />

conselho, como tu<strong>do</strong> tinha este aspecto <strong>de</strong>mocratico, como hoje sc<br />

diria, e que então se chamava cvangelico, humil<strong>de</strong>, fraternal, chris-<br />

tão, porque outra cousa não 6 a <strong>de</strong>mocracia.<br />

nova diocese <strong>de</strong> Fussala, e respon<strong>de</strong>r lhe que isso se <strong>de</strong>via subenten<strong>de</strong>r, porque<br />

ri50 ha <strong>de</strong> aqui dizer-se o mesmo?<br />

Silet qui<strong>de</strong>m sanctus <strong>do</strong>ctor consensum Concilii P~ovincialie, at ia confineri<br />

vi<strong>de</strong>tur corzaeneione Primatia qui vix quidquam majoris rei n&i <strong>de</strong> Concilii<br />

sententia ntoliebatxr.<br />

A quem conhece Thomassino njio espantam estes <strong>de</strong>fpitos e rstas inooherencias<br />

: por difiuso e pouco fiel nas citaçGes tem a critica reconheci<strong>do</strong> este<br />

escriptor.<br />

O que não comprehen<strong>de</strong>mos, porhm, 15 que se citem <strong>do</strong>is ou tres factos iiicompletos<br />

e vagos, e que se passaram no iv seculo, r se dica <strong>de</strong>pois riii r.ov -<br />

clrieão que tal era a antiga disciplina <strong>da</strong> egreja <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os liiiineiros sc~ii10-I<br />

NiXo conhecia Thomassino os canones <strong>do</strong>s apostolos que citArnos?<br />

Não sabia o illustre padre <strong>do</strong> oratorio que nestes tempos <strong>de</strong> peraqui@w,<br />

em que a egreja vivia quaei a me<strong>do</strong>, separa<strong>da</strong> c attribula<strong>da</strong> pelas hereaiae,<br />

136 era certo e firme o que ?e ajiistava corn a tradiçiio apostoli<strong>da</strong> e divina?<br />

que tu<strong>do</strong> neste perio<strong>do</strong> se fazia por discussão e conselho, e na<strong>da</strong> imperativa<br />

e <strong>de</strong>spoticameiite?<br />

Aeeim se escreve em bistoria, e assim se tractam geralmente 88 vezrs '13<br />

mais graves quedùes <strong>de</strong> direito ecclcsiastico !<br />

On<strong>de</strong> se não copiam sem discernirnento, os escriptores cibm 9m ou oiitro<br />

mal averigua<strong>do</strong> facto, <strong>de</strong> cujs obscuri<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>duzein o que B fwil para a sua<br />

intenção.<br />

Nio nos admiremos, porem ; porque mais a<strong>de</strong>ante vama ter occa~iio <strong>de</strong><br />

ver um exemplo d'esta levian<strong>da</strong><strong>de</strong> culposa mais espaiitoso e atrevi<strong>do</strong>.<br />

No capitulo seguinte apreciaremos mais <strong>de</strong> espago alguns <strong>do</strong>e factos, a que<br />

Thomasaino aqui se refere.


CAPITULO I11<br />

Des<strong>de</strong> Constantino at6 ao seculo IX<br />

O edicto <strong>de</strong> Mil80 <strong>do</strong> anno 313; suas funestas consequencias no <strong>de</strong>stino <strong>da</strong> egreja. Apparece<br />

o gran<strong>de</strong> problema <strong>da</strong>s relacões <strong>da</strong> egrcxja e <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>. - Comeca a reduccào<br />

a escriplo <strong>da</strong> disciplina ecclesiasli6a. -A leilura <strong>do</strong>s canones e outro; <strong>do</strong>cumenios<br />

revela a divisa0 <strong>da</strong> egreja bem <strong>de</strong>termina<strong>da</strong> e <strong>de</strong>fini<strong>da</strong>, e quáo anti a era a posse<br />

<strong>do</strong>s priviiegioa inetropo~i~icos.-I AO syno<strong>do</strong> provincial pertencia o fireito <strong>da</strong> crea-<br />

$20 <strong>da</strong>s novas dioceses e metropoles. -Sào raros, apezar <strong>da</strong> imporlancia <strong>do</strong> objecto,<br />

os canones a esle respeito: explicac80 d'este facto. - Can. ix <strong>de</strong> Antiochia, Can.<br />

xvii <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia, Can. xx <strong>do</strong> 4.0 cone. <strong>de</strong> Carthago, Can. xvii <strong>do</strong>s <strong>do</strong> Codigo<br />

<strong>da</strong> Egreja Africana. O can. 51, caus. xvi, q. I:, geralmenteallega<strong>do</strong>, iiào<br />

prova o que preten<strong>de</strong>m: o final <strong>do</strong> canou, nao transcripto no Decreto, Lem comtu<strong>do</strong><br />

to<strong>da</strong> a forca probaloria. - A auclori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> syno<strong>do</strong> provincial e reconheci<strong>da</strong> a<br />

ca<strong>da</strong> passo-nos concilias d'estes seculos: textos que o evi<strong>de</strong>nceiam. - A disciplina<br />

primitiva <strong>da</strong> inslilui$o <strong>do</strong>s chama<strong>do</strong>s chorepiscopos conlém um exemplo. - 11 OS<br />

papas ain<strong>da</strong> 1180 tomavam parle nestes negocios. - Opiniães em contrario - Tliomassin,<br />

Goschler, Bellarmino e a eschola ultramontana. - Critica <strong>do</strong>a argumentos<br />

d'estes escriptores.-Nào obsta o can. xxviii <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia: explicaelo d'este ean.--<br />

O cnn. vi <strong>de</strong> Nicea robusiore a nossa opini?io.- Um trecho <strong>do</strong> Tentamen Theologicuni.-<br />

Pactos em contrario <strong>da</strong> disciplina. - A criliea historica <strong>do</strong> P.a Thomassin.<br />

-Não tem peso os exemplos extrabi<strong>do</strong>s tla vi<strong>da</strong> <strong>de</strong> S. Gregorio 111.4) que aignificam<br />

as vers0rs Ialinas <strong>do</strong>s canoiies e rodigos 0rientaes.- No seculo x ain<strong>da</strong> se nAo<br />

reconhecia geralmente a siipremacia papal nestes assumptos.-A hisloria <strong>do</strong> crescimento<br />

<strong>do</strong> papa<strong>do</strong> ate o s~culo ix e <strong>da</strong>s suas relacões coni as gran<strong>de</strong>s egrejas <strong>do</strong><br />

occi<strong>de</strong>nte esclarece este ponto.- 11 l O po<strong>de</strong>r real &o intervinha como parle principal:<br />

caracter especial <strong>da</strong> legislacão c1inonica.-0 aclo 4.0 <strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Calcetlonia<br />

contém os principias regula<strong>do</strong>;es <strong>da</strong> materia: a egreja nunca hesitou em ser O<br />

supremo juiz d'estes negocios.-Can. xii <strong>do</strong> mesmo concilio.-Em varios confliclos<br />

resolvi<strong>do</strong>s nas sessões d'esle coocilio se firma egualinente u mesma disciplina.-Os<br />

canonistas gregos Balsamnn e Zonares e o can. xvii <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia: rocctlencia <strong>da</strong>r<br />

suas razoes. - O ean. xvii nào contradicta o can. xli: explicapiio dP1estes canones.<br />

- Episloia~ <strong>de</strong>cretaes <strong>de</strong> Iniiocencio e Bonifacio I -Factos em conlrario <strong>da</strong>s leis<br />

ecclesias1icas.-Origem d'estas coulradircões, incoherencia <strong>do</strong>s canonistas.<br />

Com o seculo <strong>de</strong> Constantino começa para a egreja uma nova<br />

epocha <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong>.<br />

Na0 po<strong>de</strong>mos ler estas paginas pavorosas <strong>da</strong> historia sem nos<br />

sentirmos penetrar <strong>de</strong> fun<strong>da</strong> tristeza.<br />

A egreja parece-nos aqui uma joven inexperiente e candi<strong>da</strong>, que<br />

- a mão d'uma amiga dissoluta conduzisse para um lupanar.<br />

Sim ! que a egreja vai aqui luzente e radiante, risonha, cheia <strong>de</strong><br />

esperança, confia<strong>da</strong> no celebre rescripto <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> conscieu-


cia e <strong>de</strong> cultos e admitte no gremio <strong>da</strong>s suas assemblêas respeitaveis<br />

um impera<strong>do</strong>r dcvasso, irinbicioso, sem consciencia, srm<br />

crenyas, aspiran<strong>do</strong> ao imperio em tu<strong>do</strong> c em to<strong>do</strong>s; - a egreja<br />

qiiasi a<strong>do</strong>ra este scclera<strong>do</strong> que os mais horren<strong>do</strong>s crimes mancham<br />

e fazem aborrecer; <strong>de</strong>screve-o puro e sancto com a penna <strong>de</strong> seus<br />

historia<strong>do</strong>res; v&-o corifuso e pinta-o cheio <strong>de</strong> emoção quan<strong>do</strong> se<br />

assenta, coberto <strong>de</strong> purpiira c com a fronte cingi<strong>da</strong> <strong>de</strong> pedras reluzentes,<br />

no meio <strong>do</strong>s padres vencran<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Nicea; e, cega, nao v@<br />

que este abraço, que clla cui<strong>da</strong> puro e celestial, é um amplexo<br />

concupisce~ite e humano, que a ha <strong>de</strong> aviltar rio futuro; e, <strong>de</strong>scui<strong>do</strong>sa,<br />

entrega-se nestes braços, que se lhe abrem, qiic ella julga<br />

serem os braços <strong>da</strong> fraterni<strong>da</strong><strong>de</strong> e que sáo súmentc os laços subtis<br />

<strong>do</strong> corpo <strong>da</strong> vibora <strong>da</strong> autocracia e <strong>da</strong>s pcrdiyòes <strong>do</strong> imperio! Que<br />

teria si<strong>do</strong> <strong>da</strong> egreja se n:io fossem os seus Agostinhos, o4 seus<br />

Chrysostomos, os seus Cyprianos? Que seria <strong>da</strong> egrcja se Athanasio<br />

nào tivesse neste primeiro momento a inspirayao <strong>de</strong> <strong>de</strong>clarar<br />

o symbolo <strong>da</strong> f6 para pren<strong>de</strong>r a sua uni<strong>da</strong><strong>de</strong> moral? Que seria d'ella<br />

se niio fosse este mal que lhe corria o imperio e lhe q~iehrantavn<br />

as forças? se n8o fosse este ultimo viver effemina<strong>do</strong> <strong>de</strong> C~i~isiiiiitino<br />

e esta escravidão oriental que acabou em Byzancio <strong>de</strong> dissolver<br />

o imperio?<br />

Quan<strong>do</strong> se reflecte no que podia ter si<strong>do</strong> a egre.ja christã; quan<strong>do</strong><br />

se pensa e se <strong>de</strong>scobre <strong>de</strong> c~ntrc as paginas <strong>do</strong> Evangelho iim horizonte<br />

vastissimo, cheio <strong>de</strong> luz, sublime, e se olha <strong>de</strong>pois As tr41:w.<br />

aos <strong>de</strong>svarios, ás luctas, fis imperfciyòcs que 11o.j~ cobrem tlc Iùllos<br />

este vulto candi<strong>do</strong> e colossal <strong>da</strong> egre.ja, sente-se bem a coridic;80 e<br />

fragili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s colisas humanas, que os proprios livros sanctos tanta<br />

vez nos lembram.<br />

Ou srja Constantino umvulto abjecto, como o fazem Juliario e<br />

Sozomeno, ou um homem puro e justo c gran<strong>de</strong>, como o qucrem<br />

Eusebio, Lactancio; o que (. certo 6 que a cgrcja neste momento<br />

tocava, sem o perceber, em uma <strong>de</strong> suas maiores tentações e <strong>de</strong><br />

suas maiores <strong>de</strong>sgra~as.<br />

A egreja sentia, <strong>de</strong> repente, sob suas máos, os thesouros <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r<br />

temporal, e este contacto infernal <strong>de</strong>spertava-lhe um <strong>de</strong>se-jo novo<br />

e fatal, <strong>de</strong>sprendia-lhe os olhos <strong>do</strong> cbu, ondc os tivera fitos at6<br />

1 Edicto <strong>de</strong> Milão <strong>de</strong> Constantino e Licinio, <strong>do</strong> anno 313 - Lactanc. <strong>de</strong><br />

Mort. pereecut. c. 48 - Euscb. Hist. eccles. x-5


então para Ih'os escravisar com as ambiçóes <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, e para lhe<br />

preparar no futuro as luctas horriveis com o esta<strong>do</strong>, este conjuge<br />

incestuoso com o qual agora se ligava.<br />

É um momento solcmne, gran<strong>de</strong>, cheio <strong>de</strong> turbações, <strong>de</strong> crimes,<br />

<strong>de</strong> horrores rio porvir, e <strong>de</strong> alegrias, <strong>de</strong> victorias, <strong>de</strong> contentamen-<br />

tos no presente.<br />

Como mui bem diz Castelar 1:<br />

aLa conversion <strong>de</strong> Constantino leuanta e1 problema pavoroso que<br />

aun no se ha rcsuclto y que <strong>de</strong>be resolver nuestro siglo, e1 problema <strong>de</strong><br />

Ias relaciones <strong>de</strong>1 po<strong>de</strong>r temporal con e1 espiritual, e1 problema <strong>de</strong> Ias<br />

relaciones <strong>de</strong> la Iglesia con e1 esta<strong>do</strong>.^<br />

Chamem embora os historia<strong>do</strong>res gran<strong>de</strong> ou magno ao Cesar<br />

Romano, cantem nas suas cpopeas c elevem nas suas hyperboles<br />

este seculo <strong>de</strong> Constantirio, que para n6s nem são gran<strong>de</strong>s a epocha<br />

nem o impera<strong>do</strong>r; ou, se o sáo, é porque surgem <strong>de</strong>ante <strong>de</strong> n6s<br />

gran<strong>de</strong>mente fatidicos, gran<strong>de</strong>mente abominaveis.<br />

A historia <strong>da</strong> egreja sem este facto ~odéra e <strong>de</strong>vera ser o livro<br />

mais consola<strong>do</strong>r e m;~is cheio <strong>de</strong> <strong>do</strong>qura c sancti<strong>da</strong><strong>de</strong>; assim, essas<br />

paginas estão <strong>de</strong>negri<strong>da</strong>s por to<strong>da</strong> a especie <strong>de</strong> crimes, e esse livro<br />

não se pó<strong>de</strong> confiar <strong>da</strong>s màos <strong>de</strong> uma <strong>do</strong>nzella, porque em<br />

gran<strong>de</strong> numero <strong>de</strong> seus capitulos, on<strong>de</strong> não 6 o livro <strong>do</strong>s maus<br />

sentimentos, é o livro <strong>da</strong>s dissoluçõcs.<br />

O primeiro effeito bem caracterisa<strong>do</strong> d'cste gran<strong>de</strong> e fatal acontecimento,<br />

o primeiro ponto on<strong>de</strong> rebenta esta podridão que o<br />

imperio, inocula na egreja, virgem e pura atb este tempo, é o seculo<br />

nono; sáo as falsas <strong>de</strong>cretaes.<br />

Até aqui a disciplina conserva-se ri mesma; mas o veneno lavra<br />

activo, e a febre cresce ate esses dias.<br />

Este perio<strong>do</strong> começa pela reducçào a escripto <strong>da</strong> disciplina ecclesiastica.<br />

A egreja firma-se, <strong>de</strong>termina as suas fórmas, organisa-se, reurie<br />

os seus concilios, faz as suas leis.<br />

O clarão <strong>do</strong>s tcmpos apostolicos e <strong>do</strong>s seculos limpi(1os <strong>da</strong>s<br />

perseguições é ain<strong>da</strong> bem intenso para illumiriar os concilios ecumenicos;<br />

a tradicç~o e a voz <strong>do</strong>s padres sustentam a egreja nestes<br />

primeiros momentos.<br />

1 La ciuilieatwn en Zoa cinco primeroa sigloe <strong>de</strong>1 ch~atianimo,<br />

tomo 3.O,<br />

leccioii setima y ultima.


Veremos no capitulo seguinte como tu<strong>do</strong> se transtorna <strong>de</strong>pois,<br />

repentinamente; por agora apontaremos a legislaçào sobre o nosso<br />

objecto.<br />

Se ate aqui a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> religiosa christá vivia completamente<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte e absolutamente <strong>de</strong>sliga<strong>da</strong> <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> civil, <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

este perio<strong>do</strong> o esta<strong>do</strong> <strong>da</strong>s relí~ções 6 outro: k a mutua in<strong>de</strong>pen-<br />

<strong>de</strong>ncia e ao mesmo tempo a mutua alliança: o esta<strong>do</strong> e a egreja<br />

soberanos ca<strong>da</strong> um na sua esphera e eiiten<strong>de</strong>riiio-se reciprocamente<br />

quan<strong>do</strong> se encontram no mesmo ponto.<br />

Aqui, pois, começa ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente o objecto especial <strong>do</strong> nosso<br />

trabalho: o papel que o esta<strong>do</strong> representa com relação 6 egreja<br />

no assumpto <strong>de</strong> circumscripção e erecção <strong>de</strong> dioceses.<br />

Começaremos por <strong>de</strong>monstrar como a divisão <strong>da</strong> egreja em<br />

provincias e parochias (egrcjas, paroecias ou dioceses) 1 bem dcter-<br />

mina<strong>da</strong> e <strong>de</strong>fini<strong>da</strong> permanece nestes e nos seculos seguintes.<br />

NBo gastaremos milito espaço a fazel-o, porque 6 cousa incon-<br />

testavel, e que a leitura <strong>do</strong>s canones e outros monumentos histo-<br />

ricos manifesta a primeira vista.<br />

1 A expressEo parochia, que se encontra a ca<strong>da</strong> passo nestes oanonee e<br />

monumentos <strong>do</strong>s primeiros seculos, não significa como hoje as subdivi6es <strong>de</strong><br />

uma diocesr, mas a propria diocese.<br />

As egrejas, oii parocliias ou paroecias, tinham os seus diaconos e presbyteros,<br />

o seu clero, iriscripto no catalogo sacer<strong>do</strong>tal, adstricto a esss parochia,<br />

viven<strong>do</strong> em muitos logares vi<strong>da</strong> corninum com o bispo.<br />

Limita<strong>da</strong> foi a brea d'rstas circiimscripçòes nestes tempos, porque o 11'<br />

<strong>de</strong>via n&o só coiihecer o sou clero e com elle resolver os negocio* <strong>da</strong> egi q ~r,<br />

mas tambem soccorrer a sua plebe, estar ao pB <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> um na hora <strong>do</strong> perigo<br />

e <strong>da</strong> :~fflicç%o e IIO ii~ornerito <strong>da</strong> <strong>de</strong>srsperariça.<br />

Parece que o Oriente e Africa <strong>de</strong>ixaram per<strong>de</strong>r mais <strong>de</strong>pressa <strong>do</strong> que O<br />

Occicleiite o nome <strong>de</strong> parochia, primeiro paroecia.<br />

A expressgo diocese, que se lhe substitue, vem <strong>da</strong> organisação politica <strong>do</strong><br />

imperio.<br />

1-2 reunião <strong>da</strong>s provincias fazia a diocese, a que presidia o prefeito <strong>do</strong> pre-<br />

torio ou seus vigarios.<br />

1)ioceses appellabantz~r administrationes mulfarum provinciarum, quae in<br />

unurn coactae per Praefectos pretori8 et eorznn vicavios regebantur. L. un.<br />

c. ?rt omn. jud. - L. 3, C. Theod. <strong>de</strong> collat. equor. -L. 34, C. Theod. <strong>de</strong> na-<br />

vicul. - Vocabular. Jur. utriiisq <strong>de</strong> Vicat, vbis -Dioecc,.ws e Paroecia.<br />

Clliristophor. Justell. in observatio. et not. can. 56 Eccles. Afric. -Gos-<br />

chler dict..Encyclop. <strong>de</strong> la Theol. Cathol. vb. dioccse, not.<br />

aDioecesis est (diz Baleamou ao can. rr <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia) qwie multa8 eub re<br />

habet Provinc2as.n<br />

Esta express80 já nestes primeiros tempos se vê alguma vez emprega<strong>da</strong><br />

como nynonimo <strong>de</strong> parochia, especialmente em alguns canones <strong>de</strong> Africa, e<br />

j& no concilio <strong>de</strong> Antiochia no can. rx.


,O can. IV <strong>do</strong> conc. <strong>de</strong> Nicea diz:<br />

~Episcopum convenit, maxime qui<strong>de</strong>m ab omnibus qui sunt in prorvincia<br />

Episcopis ordinari~ e no fim: ~Firmitas autem eorumquae geururilur<br />

per unamquamque Provinciam Metropolitano tribuatur epis-<br />

«copo. »<br />

As prohibições <strong>da</strong>s transferencias e <strong>da</strong> acceitagão <strong>do</strong>s clerigos<br />

excommungn<strong>do</strong>s 'noutras parochias continúa <strong>da</strong> mesma fórma ncstes<br />

tempos, tornan<strong>do</strong> ain<strong>da</strong> mais exclusiva a circumscrip~ão ecclesiastica.<br />

Leiam-se os can. v, xv e xvr <strong>do</strong> cit. conc.<br />

Por vezes mesmo se marca a Brea <strong>da</strong>s provincias nas leis, em<br />

conformi<strong>da</strong><strong>de</strong> com o que o uso estabelecera; como, por exemplo,<br />

se 16 <strong>do</strong> can. vir, a respeito <strong>da</strong> provincia <strong>de</strong> Alexandria.<br />

A mesma di~isão geral se percebe <strong>do</strong> can. xvrr <strong>do</strong> concil.<br />

<strong>de</strong> Ancyra, <strong>do</strong>s can. 111, ix, x e xxr, <strong>do</strong> <strong>de</strong> Antiochia, entre os<br />

quaes 6 terminante o ix.<br />

O mesmo se esclarece com o can. ~ V I I<br />

<strong>de</strong> Laodicea com os <strong>do</strong>s<br />

concilias <strong>de</strong> Africa, que se po<strong>de</strong>m ler no jB cita<strong>do</strong> codigo <strong>da</strong> egreja<br />

Africana; e muitos outros.<br />

<strong>Dos</strong> referi<strong>do</strong>s canones <strong>de</strong> Nicea se <strong>de</strong>scobre quão antiga era já<br />

no iv seciilo esta divisõo ecclesinstica e longa a posse <strong>do</strong>s privilegio~<br />

<strong>do</strong>s metropolitas e <strong>do</strong>s patriarchas, pois que elles s6 fazem<br />

conservar o que o costume antigo estabelecera.<br />

E s6 <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> seculo x que os papas augmentam extraordinariamoiilc<br />

estes prij ilegios, com especiali<strong>da</strong><strong>de</strong> em volta <strong>de</strong> Roma<br />

nas provincias <strong>da</strong> Italiri.<br />

Nestes primeiros tempos ii egreja parece mesmo que tracta este<br />

objecto como uma cousa qiiasi indiff'erente : razões extranhas B cari<strong>da</strong>dc<br />

christa os fizeram nascer, e os bispos tractnm-se muitas<br />

vezes em suas cartas sem usar d'estes titulos e honrarias, chaman<strong>do</strong>-se<br />

simplesmente irmãos dilectos ou carissimos.<br />

Quan<strong>do</strong> <strong>de</strong>pois, com o correr <strong>do</strong>s seculos e o augmento <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r<br />

<strong>da</strong> egrcja, esfria esta cari<strong>da</strong><strong>de</strong> christã e esmorece este espirito<br />

evan~elico <strong>do</strong>s primeiros seculos; então multiplicam-se estes privilegio~<br />

para satisfazer ambiçòes, a ponto <strong>de</strong> ser hoje mui difficil<br />

dizer ao certo qual a emtensao <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> e prerogativas <strong>do</strong>s<br />

patriarchas, exarchas, primazes, metropolitas, etc.<br />

1 Fleury, 4.em* Diecoars eur I'Histoire Eccles.


Demonstra<strong>da</strong> a existencia <strong>de</strong> uma circumscripção ecclesiastica,<br />

cumpre dizer quem podia creal-a ou alteral-a.<br />

A disciplina <strong>da</strong> egreja conserva-se a mesma 'neste espaço <strong>de</strong><br />

tempo.<br />

Vamos provar - 1 .O - que ao syno<strong>do</strong> provincial pertencia este<br />

direito ; .- 2.' - que o bispo <strong>de</strong> Roma náo tinha ain<strong>da</strong> este privi-<br />

legio ; - 3." - que o esta<strong>do</strong> não intervinha como parte principal.<br />

& muito para notar que, sen<strong>do</strong>, como C, este objecto summamente<br />

importante, sejam táo raros os monumentos legislativos.<br />

NBo é isto porque se tenham perdi<strong>do</strong>, mas porque se n8o escreveu<br />

categoricamente esta regra <strong>de</strong> disciplina. Os concilios ecumenicos<br />

orientaes tractam <strong>do</strong>s privilegias <strong>do</strong>s metropolitas, lepislnm<br />

sobre os <strong>direitos</strong> <strong>do</strong>s bispos e attribirições <strong>do</strong>s s~no<strong>do</strong>s, rs~ril,~ III<br />

varios capitulas <strong>de</strong> disciplina ; mas não provi<strong>de</strong>nceiam directamente<br />

para este ponto.<br />

O concilio <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia discute' até questbes levanta<strong>da</strong>s a respeito<br />

<strong>da</strong> creação <strong>de</strong> novas metropoles por parte <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>, e, apezar<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>finir os <strong>direitos</strong> d'elle 'neste assumpto, nBo tem um t ~xt~i<br />

so em que <strong>de</strong>screva os <strong>direitos</strong> respectivos <strong>da</strong> egreja.<br />

Este facto prova que a disciplina era tão geral, tão incontesta<strong>da</strong>,<br />

que não foi preciso provi<strong>de</strong>nciar para ella, <strong>de</strong>finil-a.<br />

Percorrei as paginas d'estes coricilios, tanto <strong>do</strong>s ecumenicos<br />

como <strong>do</strong>s particulares e <strong>do</strong>s africanos, e vereis que principalmente<br />

se occupam não <strong>de</strong> edificar nova disciplina, mas <strong>de</strong> conservar a<br />

sua pureza, castigar abusos, abolir primitivos costumes, .que a<br />

candura primcva conseritia, mas que então jh eram perigosos,<br />

con<strong>de</strong>mnar as heresias e resolver pontos <strong>do</strong>gmaticos.<br />

& ain<strong>da</strong> a tradiçóo <strong>do</strong>s seculos anteriores a fructificar vigorosa,<br />

a impor-se veneran<strong>da</strong> aos concilios, a influir potente na constituição<br />

e governo (Ia egrsja.<br />

E poiico admira similhante respeito pela antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> disciplina<br />

'nestes seculos, quan<strong>do</strong> no duo<strong>de</strong>cimo e seguintes as falsas<br />

<strong>de</strong>cretaes, se obtiveram tão espantosa acceitaçao, foi porque o seu


auctor as attribuiu aos primeiros papas e aos primeiros con-<br />

cilio~.<br />

Esta i<strong>de</strong>a viva e fecun<strong>da</strong>, que tu<strong>do</strong> prendia ao exemplo <strong>do</strong>s<br />

apostolos e <strong>do</strong> fun<strong>da</strong><strong>do</strong>r d'esta socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, alenta<strong>da</strong> pela voz e es-<br />

criptos <strong>do</strong>s padres e apologistas, teria si<strong>do</strong> 'a gloria e paz <strong>da</strong><br />

egreja com o mun<strong>do</strong> livre c com o progresso, scnão fosscm as<br />

frau<strong>de</strong>s inauditas d'esse celebre Isi<strong>do</strong>ro Merca<strong>do</strong>r ou Pecca<strong>do</strong>r.<br />

Essa mesma tradiçiio, que os padres <strong>da</strong> primitiva egreja <strong>de</strong>fen-<br />

diam tão fervorosamente, 6 uma <strong>da</strong>s fontes mais copiosas e res-<br />

peitaveis <strong>do</strong> direito canonico, e ain<strong>da</strong> hoje mais <strong>de</strong> uma voz pro-<br />

testa pelo <strong>de</strong>sprezo em que se tem ti<strong>do</strong>, e clama pela restituicão<br />

<strong>da</strong> antiga simplici<strong>da</strong><strong>de</strong>, pureza e disciplina.<br />

O primeiro canon que encontramos é o can. xx <strong>do</strong> concilio <strong>de</strong><br />

Antiochia, capital <strong>do</strong> oriente, celebra<strong>do</strong> no anno 341 <strong>da</strong> era vul-<br />

gar.<br />

. Diz este can. :<br />

«Per singulas regiones Episcopos convenit nosse Metropolitanum<br />

«Episcopum sollicitiidinern totius L'rovinciae gerere. Propter quod ad<br />

«Metropolim omiies undiqae qui negotia vi<strong>de</strong>ntur habere cbncurrant.<br />

aUn<strong>de</strong> placuit eiim et Iionore praeccllerc, rt nihil amplius praeter<br />

meum, caeteros Episcopos agere (secundiim antiquam a Patril~iis nos-.<br />

((tris Regulam coristitutam), nisi ea tantiim quae ad suam dioecesim<br />

upertincnt, possessionesque siibjcctas. Unusqiiisque enim Episcopus<br />

uhabet suac Parochiae potestatern, ut negat juxta reverentiam singulis<br />

~competentem ; et providciitiani gcrat ornnis possessionis, quae siib<br />

uejus cst potcstate, ita ut Preshyteros et diaconos ordinet, ct singnla<br />

usuo judicio comprehen<strong>da</strong>t. Amplius autem nihil agere tcntet practcr<br />

~Aritistitem Metropolitanum, nec Metropolitanus sine caeterorum gsurat<br />

Consilio Sacer<strong>do</strong>tum.»<br />

.I? a mesma <strong>do</strong>utrina <strong>do</strong> can. xxx~v <strong>do</strong>s Apostolos, que acima<br />

transcrevemos, e ao qual se refere expressamente, como já notámos.<br />

Para que este texto não acabasse com duvi<strong>da</strong>s, fora mister <strong>de</strong>monstrar<br />

que a erecc;%o, suppressão, união e divisão <strong>da</strong>s dioceses<br />

eram negocios, que tantum ad suam Dioecesim pertinent.<br />

Mas o can. diz terminantemente: -ca<strong>da</strong> bispo tem podcr na<br />

sua parocliia para provi<strong>de</strong>nciar ás necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> área que lhe<br />

está sujeita ; amplius outem, accrescenta, tzihil agere tentet praeter<br />

Antistitem metropolitanum.<br />

Nem o metropolita s6 o po<strong>de</strong> fazer, porque o can. é cauteloso<br />

4


em man<strong>da</strong>r que nec Metropolitaaaus sine Gasterorum gera Comilio<br />

Sacer<strong>do</strong>tum 1.<br />

No can. XVII <strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia, o quarto <strong>do</strong>s ecumenicos,<br />

reuni<strong>do</strong>s no anno <strong>de</strong> 4.5 1, estabelece-se a prescripçáo <strong>de</strong><br />

trinta annos para a acquisição diis parochias, cuja posse os bispos<br />

retem sem direito, mas tilcançam itulla cujuscumque injuria, SELE<br />

bo~ta fi<strong>de</strong>, sinc. itrjustis quibusve mediis 9.<br />

Não diz este cari. como se adquiriu esta mera posse. (104 bispa-<br />

<strong>do</strong>s por tanto tempo; mas os canones, já anteriores, jA coiitempo-<br />

raneos e posteriores <strong>de</strong> outros concilios, vêm cheios <strong>de</strong> casos si-<br />

milhantes: a falta <strong>de</strong> tres bispos pelo menos na or<strong>de</strong>nação; a fa-<br />

cto mesmo <strong>de</strong> se ser or<strong>de</strong>na<strong>do</strong> bispo <strong>de</strong> logarcs <strong>do</strong> campo sem<br />

numerosa população e sem se <strong>da</strong>rem casos <strong>de</strong> força maior; as<br />

or<strong>de</strong>nações <strong>de</strong> novos bispos sem consentimento <strong>da</strong> plebe que nunca<br />

os tivera proprios e <strong>do</strong> bispo <strong>de</strong> quem se <strong>de</strong>smeml~rava ; e outros,<br />

eram causas pelas quaes o bispo <strong>de</strong> certa parocliia 1180 tinha direito<br />

a sel-o 'nessa parochia.<br />

O can. <strong>de</strong>termina que, quan<strong>do</strong> a respeito <strong>da</strong> prescripçào <strong>de</strong> qiie<br />

tracta se levantarem contestaçóes, ellas sejam leva<strong>da</strong>s ao syno<strong>do</strong> 111 11vincial<br />

para as resolver.<br />

, -<br />

(c... quod si intra tricennium facta fuerit <strong>de</strong> his, vel IPat aR-<br />

licere eis, qui se laesos asserunt, apud sanctam Synodum prolabdhs<br />

<strong>de</strong> his movere ccrtamen.<br />

E pois a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> e competencia <strong>do</strong> syno<strong>do</strong> provincial iieste<br />

objecto evi<strong>de</strong>ntemente reconheci<strong>da</strong>.<br />

O texto, note-se, na0 diz que recorram ao metropolita, iirm que<br />

<strong>de</strong>cidi1 o bispo <strong>da</strong> parochia mais proxima ou <strong>da</strong> propria e primeira<br />

diocese ; o texto 6 claro.<br />

Quasi to<strong>do</strong>s os escriptores citam o can. xx <strong>do</strong> 4.O concilio. <strong>de</strong><br />

Carthago (o 11 .O <strong>de</strong> Aliica), que 6 <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s o mais <strong>de</strong>cisivo, pois,<br />

falla~i<strong>do</strong> <strong>de</strong>plebibus quae nunquam episcopos habuerunt, diz que os<br />

não recebam nisi ex concilio plenario uniuscujusque prouiwiae<br />

et primatis atque consensu ejus ad cujus dioecesim ea&em ecclrsia<br />

1 Veja abaixo ácerca <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> d'este concilio o que escrevemoa a<br />

pag. 54.<br />

Zonarap in can. xvrr <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia


portinebat)) <strong>de</strong>claran<strong>do</strong> assim outros canones <strong>de</strong> concilim anterio-<br />

res menos exprcssos 1.<br />

'Nestes concilios africanos permittiarn-se algumas excepções a<br />

estes principios, excepções que hoje nao t&m razão <strong>de</strong> ser, porque<br />

se fun<strong>da</strong>vam cm circumstancias puramente <strong>de</strong> occasião e transitorias.<br />

Assim, quan<strong>do</strong> a egreja, ten<strong>do</strong> segui<strong>do</strong> a seita <strong>do</strong>s <strong>do</strong>natistas,<br />

pedia para ficar cathedral, abraçan<strong>do</strong> a uni<strong>da</strong><strong>de</strong>, dispensavam-se o<br />

assentimento <strong>do</strong> bispo e a approvação <strong>do</strong> syno<strong>do</strong>; e <strong>do</strong> mesmo<br />

mo<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> em alguma diocese o bispo extirpava a heresia <strong>de</strong><br />

certa diocese e a possuia juricta á sua pelo espaço <strong>de</strong> tres annos,<br />

ninguern lh'a podia já arrebatar (can. cxrx e can. cxvirr <strong>do</strong> Cod.).<br />

São excepções que confirmam a regra.<br />

Para a erecçào <strong>da</strong>s metropoles, apezar <strong>de</strong> a regra ser, como<br />

temos dicto, o respeito pelo antigo costume, n8o se crean<strong>do</strong> mais<br />

privilegios <strong>do</strong> que os que a antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> estabelecera, como bem<br />

alto o repetem os concilios <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o <strong>de</strong> Nicea; comtu<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong><br />

circumstancias especiaes, como a vastidão <strong>da</strong> provincia, o exigiam,<br />

era s6 com o consentimento <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a egreja, bispos e metropo-<br />

litas que se erigiame.<br />

Ha um texto que o evi<strong>de</strong>nceia: 6 o Can. xvir <strong>do</strong> Codigo <strong>do</strong>s<br />

canones <strong>da</strong> egreja africana3.<br />

Diz :<br />

rPlacuit ut Mauritania Sitifensis ut putavit primatem provinciae Nu-<br />

midiae, ex cujus coetu separatur: ut siium habeat primatcm: quem<br />

consentientibus omnibus primatibus provinciarum africanarum vel<br />

omnibus cpiscopis, propter longinquitatem habere permissa est.n<br />

Allega-se gerahnente o Can. tji, caus. XVI, q. 1 .", para provar<br />

1 Veja supra a pag. 41.<br />

2 S. ergo secundum pristiniim provinciarum morem metropolitanoe Episcopos<br />

coiivciiit iiuinerari.~ Iunoc. iir -resposta a Alexandre bispo <strong>de</strong> Aiitiochia,,Decret.<br />

XLVI no Codigo <strong>do</strong>s canones ecclcsiastiws <strong>de</strong> Diohysio Exiguo.<br />

3 E prirriitivatneiite um cauoue feito no coiicilio <strong>de</strong> Hippoiia <strong>do</strong> aiino <strong>de</strong> 393.<br />

To<strong>da</strong>s as pivvincias romanps <strong>de</strong> Afriea tiriharn um primaz, 4 excepçso <strong>da</strong> <strong>de</strong><br />

Stefe, que recoiihecia o <strong>de</strong> Numidia. 'i\'esse coiicilio Celiano e Honorato, bispos<br />

d'essa proviricia, ~edirarn em tiome <strong>do</strong>s outros o prima<strong>do</strong> para elia. Aurelio,<br />

bispo <strong>de</strong> Carthago, quiz ouvir a to<strong>do</strong> o concilio, e Epigonio propoz que<br />

egualrneute <strong>de</strong>vera <strong>da</strong>r o seu couseritimento a egreja <strong>de</strong> Nuinidia. O cauon<br />

que se fez 15 esse, e 'nelle vemos a cautela com que os padres <strong>de</strong>claram que<br />

o primaz <strong>da</strong> Numidia julgara conveniente e to<strong>do</strong>s os primazes e bispos cone<br />

vinham que ee d6sse a Stefe um primaz seu.


que pertencia ao metropolita e syno<strong>do</strong> provincial o exercicio d'este<br />

direito.<br />

Este can. LI <strong>do</strong> Decreto 6 o can. LIII <strong>do</strong> Codigo Africano e<br />

o 42 <strong>do</strong> terceiro concilio <strong>de</strong> Carthago, <strong>do</strong> anno <strong>de</strong> 397, o qual<br />

diz assim 1 :<br />

((Multis concilis hoc statutum est a coetu sacer<strong>do</strong>tali, ut plebes quae<br />

in dioecesibiis ab episcopis rctinentur qiiac episcopos nunquam haliue-<br />

runt non nisi cum roluntate ejus episcopi a qoo tenentur, accipiant<br />

rectores. »<br />

N50 prova, porém, o que preten<strong>de</strong>m.<br />

As palavras a coetu sucer<strong>do</strong>tali, as unicas que po<strong>de</strong>m involver<br />

alguma duvi<strong>da</strong>, querem dizer, não que a plebe receba o bispo n<br />

coetu sacer<strong>do</strong>~alt. mas que em muitos concilios foi estatui<strong>do</strong> pela<br />

assembleia <strong>do</strong>s bispos que nenhuma plebe, que nunca teve bispo proprio,<br />

o n8o receba serião com a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> sacer<strong>do</strong>te <strong>de</strong> quem se<br />

separa.<br />

Se formos ler este canon na sua integra ao Codigo <strong>do</strong>. cnril)iies<br />

I I<br />

<strong>da</strong> egreja africana, lá acharemos que Epigonio, acaban<strong>do</strong> c . , . I ~ I I<br />

e dirigin<strong>do</strong>-se ao syno<strong>do</strong>, dizia :<br />

aQuapropter si universo sanctissimo coetui placet hoc, quod prese-<br />

qiiutus suum, confirmetur. n<br />

Estc texto que citam <strong>do</strong> Decreto só prova que a plebe não tlo\(><br />

acceitar bispo pela primeira vez contra a vonta<strong>de</strong> <strong>do</strong> seu primilivo<br />

reitor.<br />

E como podia ser outra corisa? nâo v6cm (pie c.tc tv~to<br />

tem<br />

iiitcrcala<strong>do</strong> naquelles on<strong>de</strong> se basêa a nova disciplina qiic. coiiíi~re<br />

ao papa esta prerogativa?<br />

Estc cari. 6 o can. XLI, e O can. XLVIII inscreve-se no Decreto<br />

-I)uos episcopatus in unum redigerc apostolica potrsl auctoritas;<br />

o Can. XLIX: - DUOS episcopatus i11 unum redig~re npostolicu<br />

valet auctoriías; - e o can. LIII, fallíin<strong>do</strong> <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> crear<br />

novos bispa<strong>do</strong>s on<strong>de</strong> cresce a multidão <strong>do</strong>s fieis, 18 tem as cxpressões:<br />

ex vigore apostolicae sedis <strong>de</strong>beas ordinare episcopos.<br />

Ao que parece eram muito communs por estcs tempos na cgreja<br />

1 É cita<strong>do</strong> <strong>de</strong>pois no concilio <strong>do</strong> anno 524, bem como outros <strong>do</strong> mesmo<br />

concilio.


africana, por ventura que por causa <strong>de</strong> sua vastidiio, os exemplos<br />

<strong>de</strong> usurpaçóes <strong>de</strong> bispa<strong>do</strong>s e a arrogancia <strong>do</strong>s clerigos levava-os a<br />

excitar a plebe por elles ut illicito facore eos<strong>de</strong>m velinl sibi col-<br />

locare rectores 1.<br />

Para acabar com estes abusos 6 que se fez este canon.<br />

O monge, auctor <strong>da</strong> concol-dia <strong>do</strong>s canones discor<strong>da</strong>ntes, copiou<br />

para a sua obra a primeira parte d'este texto e esqueceu-se <strong>da</strong> ul-<br />

tima ; isto, naturalmente, para realisar a concordia, porque em ver-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong> as <strong>de</strong>rra<strong>de</strong>iras linhas d'este canon, <strong>de</strong>stoavam <strong>da</strong>s jii estabe-<br />

leci<strong>da</strong>s usurpações ou reservas papaes.<br />

N6s servimo-nos d'este canon, para corroborar a opiniáo que<br />

<strong>de</strong>ixamos exara<strong>da</strong>, apezar d'isto tu<strong>do</strong>, e com tanta mais força,<br />

quanto aqui lançamos mào d'elle, não como Graciano no seu De-<br />

creto, quan<strong>do</strong> já o costume, abuso ou n50, e as falsas <strong>de</strong>cretaes<br />

tinham conferi<strong>do</strong> a Roma tantos privilegias; mas em face <strong>da</strong> his-<br />

toria, nào ten<strong>do</strong> necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sprezar algumas palavras que<br />

nos não agra<strong>de</strong>m, antes len<strong>do</strong>-o inteiro, enten<strong>de</strong>n<strong>do</strong>-o á luz <strong>da</strong><br />

epocha em que foi feito e para que regia, e no meio <strong>da</strong> legislaçáo<br />

canonica que o completa e explica.<br />

O final d'este texto, <strong>de</strong>pois <strong>do</strong>s outros africanos que citámos, e<br />

para quem conhece a historia d'estes primeiros seculos, 6 clarissimo<br />

e positivo.<br />

r0portet enim, diz Aiirelio respon<strong>de</strong>n<strong>do</strong> a Epigonio, ut qui uni-<br />

eersis fratribus ac toto concilio inhaeserit non solum manet jure inte-<br />

gro, se I e1 dioeceses possi<strong>de</strong>at. At vero qui sibimet pulant plebes suas<br />

sufficere fraterna dileetione mnhmpta, non tantum dioecescs amittant,<br />

sed ul dixi etiam propriis publica careant auctoritate ut rebelles.~<br />

A auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> syno<strong>do</strong> provincial B nos concilias d'este pe-<br />

rio<strong>do</strong> reconheci<strong>da</strong> a ca<strong>da</strong> passo em gran<strong>de</strong> numero <strong>de</strong> cousas que<br />

não sáo mais <strong>do</strong> que applicaçóes <strong>do</strong> principio exara<strong>do</strong> 'naquelle<br />

can. ix <strong>de</strong> Alitiochia.<br />

Não <strong>de</strong>vemos omittir o can. XVI d'esse mesmo concilio, on<strong>de</strong><br />

se v& isto bem claro, na hypothese, .que contém, quasi i<strong>de</strong>ntica,<br />

ou que importa a nova creação dc bispa<strong>do</strong>s.<br />

1 Cit. csn. &rir.


O canon man<strong>da</strong> que :<br />

uSi quis Episcopus vacatis 1, in Ecclesiam prosiliat se<strong>de</strong>mque per-<br />

va<strong>da</strong>t, absque integro perfectoque concilio; hic abjiciatur necesse<br />

est, etsi ciinctus popiilus, quem diripiiit, eiim habere <strong>de</strong>legerit. Per-<br />

fectum vero concilium illud est ubi interfrierit Metropolitanus An-<br />

tistes..<br />

Nem se diga que este concilio é particular, e que por isso não<br />

tcm valor este canon senão para certa parte <strong>do</strong> oriente. Nãio é<br />

assim.'O concilio <strong>de</strong> Antiochia foi tao venera<strong>do</strong> e teve tanta au-<br />

ciori<strong>da</strong><strong>de</strong> no orbe catholico, que um seculo <strong>de</strong>pois, no quarto con-<br />

cilio geral <strong>da</strong> egreja, em Calce<strong>do</strong>nia, reuni<strong>do</strong>s 631 bispos e os<br />

lega<strong>do</strong>s <strong>da</strong> se apostolica, este canon foi li<strong>do</strong> para resolver certa<br />

conten<strong>da</strong> entre <strong>do</strong>is bispos, e applica<strong>da</strong>s as penas 'nclle estatui<strong>da</strong>s.<br />

O mesmo aconteceu com os canones <strong>do</strong>s concilios <strong>de</strong> Laodicea<br />

e <strong>de</strong> Gangres, bem como com os <strong>do</strong>s concilios africanos, especial-<br />

mente <strong>de</strong> Carthago.<br />

Leiam-se tambem os can. XVII e XVIII.<br />

O can. XXIII, falan<strong>do</strong> <strong>da</strong> nomeação <strong>de</strong> successor para o bi5pa<strong>do</strong><br />

feita pelo proprio bispo, exprime-se 'nestes termos:<br />

i, :I -<br />

aEpiscopo non licere pro se altertim siiccessorem sihi c-<br />

licet ad exituni vitae perveniat. Quod si tale aliquici factim<br />

irritiim esse hrijuscemodi est constitiitiim. Servetiir autem jus Ecrle-<br />

siasticiim, id continens: oportere non aliter fieri nisi cum Syiio<strong>do</strong> ct<br />

judicio Episcoporum qui post obitum quiescenlis potestatem habent,<br />

eum, qui dignus extiterit, prom0vere.r<br />

O can. xii <strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Laoci<strong>de</strong>a <strong>de</strong> 370, <strong>de</strong>termiria :<br />

uUt Episcopi judicio Metropolitanorum et eorum Episcoporum, qui<br />

acircumcirca sunt, provehantur ad Ecclesiasticam potestatem; ... u<br />

Na instituição <strong>do</strong>s antigos chorepiscopos, ou <strong>do</strong>s bispos <strong>da</strong>s<br />

egrejas <strong>da</strong>s pequenas villas e aldêas <strong>do</strong> campo, se v& um exemplo<br />

d'esta disciplina.<br />

On<strong>de</strong> a sollicitu<strong>de</strong> d8 bispo náo podia chegar com proveito a<br />

1 Veja-se o schd. a este can. em Vair-Espen. no tom. 3.0 <strong>da</strong>s obras a pag.<br />

140, a respeito <strong>da</strong> sigiiificapão d'eatas expressões - Epiwscqua vacuns.


to<strong>do</strong>s os pontos <strong>da</strong>s diocescs, ou porque os schisms ou as distancias<br />

111'0 não consentiam, ou porqiie a multidão <strong>do</strong>s fieis crescia<br />

<strong>de</strong>smedi<strong>da</strong>mente, ahi se erigiam novos bispa<strong>do</strong>s.<br />

O concilio <strong>de</strong> Sardica <strong>do</strong> anno <strong>de</strong> 347 e o <strong>de</strong> Laodicca <strong>de</strong> 370,<br />

prohibiram e,con<strong>de</strong>mnaram este costume, fun<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-se em que era<br />

preciso conservar em to<strong>do</strong> o seu esplen<strong>do</strong>r e força a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

episcopal,-ne uilescat ttomen Episcopi et aucloritus 1.<br />

Apezar d'isto, mais <strong>de</strong> uma vez sc infringiu esta disciplina, conservan<strong>do</strong>-se<br />

o costiimc <strong>de</strong> certos logares e provincias :- nam cum<br />

ampliorn erant episcopatzas, quatn ut eis Episcopi unius in umpla<br />

civilale <strong>de</strong>ge~ltis cura suficere posset e....<br />

Sancto Agostiriho escrevia :<br />

«Cum me vi<strong>de</strong>rem latius quam oportebat extendi, nec adhiben<strong>da</strong>e<br />

sufficerem diligentiae, quam certissirna ratione adhiberi <strong>de</strong>bere cerne-<br />

bam, Episcopum ibi ordinandiim constitoendumque ciiravi '.B<br />

Bingham assevera que esta lei não foi executa<strong>da</strong> no Egypto,<br />

Libya, Chyprc, Arabia, Asia-Menor, e outros logares *.<br />

Gonzales no lopr cita<strong>do</strong>, bem como quasi to<strong>do</strong>s os escripto-<br />

res, offerecem varios exemplos d'esta inobservancia, como o pro-<br />

vam antigos monumentos.<br />

O auctor <strong>da</strong>s origens ecclesiasticas, quan<strong>do</strong> fala <strong>da</strong>s causas a<br />

que se <strong>de</strong>vem attribuir estes factos, diz 5:<br />

«Una caussa, quamobrem episcopatiis multiplicarentur et nonnuii-<br />

quam in cxigiiis erigerentur locis, erat, quod in ecclesia primitiva<br />

iiniisquisque episcopus, cunsentientc metropolitano azct concilio provin-<br />

&ali approbanle dioccesim suam divi<strong>de</strong>ndi et noviirn episcopum con-<br />

veniente qiio<strong>da</strong>m ejus loco, in ecclesiae emolumentum, constituendi<br />

babet p0testatem.b<br />

A creação pois d'estes chorepiscopos não se fazia em muitos<br />

logares senõo com to<strong>da</strong>s as solemni<strong>da</strong><strong>de</strong>s, ouvi<strong>do</strong> o metropolita e<br />

consentin<strong>do</strong> o syno<strong>do</strong> 6.<br />

1 Cone. Sard. ean. vr (<strong>da</strong> versão <strong>de</strong> Dionysio) e Laodic. enn. LVII.<br />

2 Goiizales Telles, Comment. perpetua in aing1~1.<br />

trztua q7dinq. lar. De-<br />

cret. Gregor. IX, tom. v In libr. v Decret. tit. XXXIII, <strong>de</strong> prrivileg. et meseit.<br />

privilegiat. cap. 1, n.O 4.<br />

3 Epist. 261.<br />

4 Origin. uive Antiq. cceleuiaat. lib. 2, cap. 12.<br />

5 Cit. Lib. 2, csp. 12.<br />

6 Zdwcs'fi) Tom. IV, Que&. n, cap. 11, Ij m.


Discutem acremente os canonistas se os chorepiscopos eram<br />

ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros bispos ou simples presbyteros, vigarios forancos, que<br />

nas al<strong>de</strong>as ruracs tinham certos po<strong>de</strong>res <strong>de</strong>lega<strong>do</strong>s e practicavam<br />

certos actos pertencentes á jurisdicçao episcopal'.<br />

Nào entraremos na questáo, summamente obscura e difficil,<br />

porque liao 6 este o nosso fim, e porque mesmo nos é dispensavel.<br />

Se eram bispos ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros, a sua creaçáo é o objecto mesmo<br />

<strong>do</strong> nosso trabalho, e ahi vemos o reflexo vivo <strong>da</strong> discipliria a<strong>do</strong>-<br />

pta<strong>da</strong> : se eram meros prcsbytcros, ain<strong>da</strong> estes factos nos fornecem<br />

seguro apoio, porque 6 absur<strong>do</strong> suppor que para a instituição <strong>de</strong><br />

um simples presbgtero se pedisse e fosse essencial o assento <strong>do</strong><br />

syno<strong>do</strong> e <strong>do</strong> metropolita, e tal se não exigisse para a creaçào <strong>de</strong><br />

um novo bispa<strong>do</strong>.<br />

Se, por ventura, se segue a opinião media, <strong>de</strong> que alguns eram<br />

ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros bispos e outros simples vigarios, melhor apparece a<br />

disciplina que inculcamos ; porque, náo estan<strong>do</strong> gcralmcrite pro-<br />

va<strong>da</strong> a afirmação <strong>de</strong> Bingham, e pareccw<strong>do</strong> mesmo <strong>de</strong>duzir-se <strong>de</strong><br />

varios carioncs que o chorepiscopo podia ser ordrria<strong>do</strong> pt<strong>do</strong> bispo<br />

1 Bingham, Orig. lib. 2, cap. 14, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> dizer quantas e quaee opinibr<br />

tem liavi<strong>do</strong> sobre esta controversia, citan<strong>do</strong> os auctores que as seguem, incliiia-SP<br />

ft opinigo <strong>de</strong> David I%ion<strong>de</strong>l, que julga ue to<strong>do</strong>s os choiepiscopos<br />

foram bispos ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros ; fun<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-se princip%ente em certo trecho <strong>de</strong><br />

Athanasio, que em nossa opiniào <strong>de</strong>ixa as mesmas duvi<strong>da</strong>s que se levantam<br />

con! a leitura <strong>do</strong>s iiurneiosos canones que tractain <strong>do</strong> assiimpto.<br />

E muito notavel o que diz Basntige na sua Hiaf. <strong>de</strong> Z'Egliae, chap. 2.cmp,<br />

pag. 4 :<br />

~Ces evêques parurent dbs le premier sibcle <strong>de</strong> I'Eglise : mais <strong>da</strong>na cette<br />

premibre iiistitution leur troupeaii ktait renfcimb <strong>da</strong>ns une eenle ville <strong>da</strong>iis<br />

une seule peroisse qui ktait souvent une charnbre hxute ou une cirnetibre<br />

dms leque1 se trouvait un petit nombre <strong>de</strong> fidbles. ~'kvangile passa <strong>de</strong>s villes<br />

& la cnmpagne, et h même temps on eut soin d'c tablir <strong>de</strong>8 pasteiirs <strong>da</strong>ria<br />

les villagee, <strong>da</strong>na les bourgs et <strong>da</strong>ns Ies petitcs villes qui avaient aussi le<br />

caractbre d'Evêque, et qui en faisaient toutes les fonctions <strong>da</strong>ns les sffairee<br />

importantes ; <strong>da</strong>iis les perskciitions ces petits dvêques coiisultaient ceux <strong>da</strong>s<br />

gran<strong>de</strong>s villes ;. qui, plus expkrirnent8s et plus habiles, poiivaiet <strong>do</strong>iiner <strong>de</strong>e<br />

coiiseils salutaires pour condiiire Ic vais-eau pc!n<strong>da</strong>iit Ia tempete. Mais in-<br />

~ensiblemerit les Cvêques <strong>de</strong>s gran<strong>de</strong>s villes se rendirent inaities <strong>de</strong>s autree<br />

On afiiblit I'a~itoritk <strong>de</strong>s chorrvêques et enfiii on les abo1it.r<br />

Veja-se Tliomasa. Part. I.., lib. 2.0, cep. 1.0; Zalwein, Tom. IV, Quebt. 11,<br />

cap. 11, 5 VIII: Ilr. Mexia, 5 148, pap. 180; Gonzalez, 109. cit , n: 8; Du Pin,<br />

toin. 2.0, pag 163 colurn. 1: <strong>da</strong> ATouz.elle Bitlzothèqur, on<strong>de</strong> se fala <strong>de</strong> uma<br />

carta <strong>de</strong> S. Basilio <strong>do</strong>s fins <strong>do</strong> 4.0 seculo a respeito <strong>da</strong> maneira <strong>de</strong> or<strong>de</strong>nar<br />

os chorepiscopos e a pag. 312, 314 e 324 se tracta <strong>do</strong>s seus po<strong>de</strong>res e attri-<br />

buiçces.<br />

Leiam-se oe csn. xrr. <strong>de</strong> hcyra, xm <strong>de</strong> Neocesaree, v u~<br />

e x <strong>de</strong> ~n&&ih.


96 em alguns casos, <strong>da</strong> mesma fórma que o simples presbytero,<br />

&-se bem que quan<strong>do</strong> se requeria o consentimento <strong>do</strong> syno<strong>do</strong> e<br />

approvaçào <strong>do</strong> metropalita o chorepiscopo a or<strong>de</strong>nar ia ser bispo,<br />

e esta or<strong>de</strong>nação importava a erecção <strong>de</strong> um novo bispa<strong>do</strong> ; o que<br />

confirma a nossa e mais geral opinião !.<br />

Insurgem-se alguns escriptores contra a opiniào que estamos<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> e preten<strong>de</strong>m que o pâpa, ou o bispo <strong>de</strong> Homa, tinha<br />

jA neste perio<strong>do</strong> larga e inteire ingcrencin na creaçso, uniào, di-<br />

visão e abolição <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os bispa<strong>do</strong>s <strong>do</strong> orbe catholico.<br />

Tomassine sustenta que ate ao v seculo, foram s6 os syno<strong>do</strong>s<br />

provinciaes e o metropolita que exerceram este po<strong>de</strong>r, e que <strong>de</strong>sdc<br />

O VI, 'nelle e no vir e viii, consliluebatur nwus episcopatus <strong>de</strong><br />

Metropolilani, Concilii Provincialis, Regis e& Summi Pontikcis<br />

consensu.<br />

Goschler 3 assevera que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a mais remota antigui<strong>da</strong><strong>de</strong>, os<br />

1 É muito conheci<strong>do</strong> o exemplo <strong>da</strong> creação <strong>do</strong> bispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Fussala na diocese<br />

<strong>de</strong> Hippona.<br />

Sabe-se <strong>da</strong>s epistolas <strong>de</strong> Sancto Agostinho que elle n8o podia por si s6<br />

remediar os inales que attribulavam esta pequena povoação (veja-se Tillemont<br />

art..315., psg. 837, tom. XIII, e leiam-se as epist. ahi cit.), e por isso<br />

procurou iuttituir nesse burgo um bispa<strong>do</strong>.<br />

Nào foi elle para isto pedir o assentimento <strong>do</strong> papa, nem <strong>do</strong> bispo <strong>de</strong> Carthago,<br />

a mais notavel sB <strong>da</strong> egreja <strong>de</strong> Africa ; mas escreveu ao primaz <strong>de</strong><br />

Numidia para elle mesmo vir or<strong>de</strong>nar o novo bispo.<br />

apropter quem ordinandum aancfttm eenem qui tunc Primatum Nmidiae<br />

~gqrebat, <strong>de</strong> longiquo, ut veniret rqqans, litteris impetravi .... r<br />

E ver<strong>da</strong><strong>de</strong> que se n8ofala aqui <strong>do</strong> concilio provincial; mas, como se atre-<br />

veria a fazel-o sem esse consentimento este sancto ancião, .quan<strong>do</strong> os cano-<br />

nes Ih'o permittiam e quan<strong>do</strong> os anones j& <strong>do</strong> seculo anterior tRo expressa-<br />

mente o exigiam, pois que esta erecção foi feita pelos amos <strong>de</strong>422, e o can.<br />

que cithmos 6 <strong>do</strong> seculo rv?<br />

Realrilente, embora os escriptores citem este facto, d'elle não se <strong>de</strong>duz di-<br />

rectamente o que querem, porque aqui se tracta <strong>da</strong> or<strong>de</strong>nagão <strong>de</strong> um bispo,<br />

e não ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente <strong>da</strong> creação <strong>de</strong> uma nova diocese.<br />

Veja abaixo a ag.<br />

2 Vet. et Nov. bisc P. I, Lib. I, cap. ur e ív.<br />

3 Dict. Encycl. <strong>de</strong> Ia Theol. Cathol. vb. Dioeceee.


papas usaram d'este po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> organisação, posto qae primeiro sómente<br />

nas provincias suburbicarias e no Occi<strong>de</strong>nte.<br />

Notemos que se não limita aqui este facto a este ou aquelle seculo:<br />

Pks ks einq pronièrs siècles, diz esse auctor, le Saint Siège<br />

el ICS grands méiropoliíains instituèrenl 1~s évéehés <strong>de</strong> lSOcci<strong>de</strong>nl.<br />

Au dixithne, au s~ptième et au huitième les t?v&chés n'líairnt instituds<br />

qu'à l'agrénient <strong>de</strong>s méiropolitains, <strong>de</strong>s syno<strong>de</strong>s prouineiaux<br />

et du Paye.<br />

Por maioria <strong>de</strong> razão, accrescenta, isto se verificava nas provincias<br />

converti<strong>da</strong>s pelos missionarios romanos.<br />

Berlarmino, cioso <strong>da</strong>s prerogativas <strong>da</strong> ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> S. Pedro, e<br />

citan<strong>do</strong> certo trecho <strong>do</strong>s escriptos <strong>de</strong> S. Bernar<strong>do</strong>, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que,<br />

pela quali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> apostolica, este po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>ve sempre ter pertenci<strong>do</strong><br />

hquella Se 1.<br />

D'este escriptor se acerca hoje o parti<strong>do</strong> ultramontano, sustentan<strong>do</strong><br />

as mesmas <strong>do</strong>utrinas, confia<strong>do</strong>s c gloriosos pela <strong>de</strong>scoberta<br />

que o celebre car<strong>de</strong>al fez <strong>da</strong> passagem <strong>do</strong> Sancto, dispensan<strong>do</strong>-se<br />

<strong>de</strong> ler a historia d'estes primeiros periotlos e <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> para os irigenuos<br />

a leitura <strong>do</strong>s cawnes <strong>do</strong>s conciiios e <strong>de</strong> outros rnoulirnc1ii4(~.<br />

preciosos.<br />

Outros, e d'estes 6 o maior numero, escreven<strong>do</strong> <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> estabelecimento<br />

<strong>do</strong> direito novissimo, limitam-se a afirmar que este<br />

po<strong>de</strong>r cabe ao papa e ao papa <strong>de</strong>via caber, afastan<strong>do</strong>-se assim cautelosamente<br />

<strong>da</strong> questno <strong>do</strong> antigui<strong>da</strong>dc d'este privilegio.<br />

Alguns d'elles, porém, ao mesmo tcmpo que d'c.jta formii o<br />

v80 inculcan<strong>do</strong>, citam exemplos <strong>de</strong> creayões <strong>de</strong> bispa<strong>do</strong>s feitas pelos<br />

bispos <strong>de</strong> Roma nos primeiros seis seculos <strong>da</strong> cgreja, sem fazerem<br />

caso <strong>de</strong> outras lembranças mais veneran<strong>da</strong>s d'esses tempos. 2.<br />

Eis-nos pois a braços com a maior difficul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a historia<br />

d'este capitulo <strong>da</strong> disciplina ecclesiastica <strong>da</strong> egreja catholica.<br />

A falta <strong>de</strong> critica em uns, a <strong>de</strong>fesa facciosa e pseu<strong>do</strong>-scientifica<br />

<strong>de</strong> um parti<strong>do</strong> exaspera<strong>do</strong> sempre nas suas preten~óes, a <strong>de</strong>ficiencia<br />

ultra-laconica, quasi mera afirmação, 'noutros, sáo tu<strong>do</strong> causas<br />

que concorrem para fechar mais as trbvas d'esta disputa.<br />

1 De controvers. christ. fi<strong>de</strong>i, cap. 24, coll. 2, prop. fiu.<br />

S. Beruar<strong>do</strong> escreveu no seculo XII :<br />

aPlenitu<strong>do</strong> siqui<strong>de</strong>m potestas siiper uriiversas orhis Ecclosias siiigulari<br />

praerogritiva apostolicae sedi <strong>do</strong>nata cst. Pot,est, si utilo judicarerit, novos<br />

ordinare episcopos, ubi hactenus nou fuerit.~<br />

2 Por ex.: Devot. Inst. Canonic. Lib. I, tom. 3, sec. I, § 18.


Como se tracta #uma questão, que é em parte a historia <strong>do</strong><br />

po<strong>de</strong>r papal, alem <strong>de</strong> se inflammarem to<strong>da</strong>s as paixóes e <strong>de</strong> se re-<br />

volverem os antigos odios <strong>de</strong> veihas conten<strong>da</strong>s, como tem <strong>de</strong> se<br />

argumentar com factos, e aquella historia 6 bem la<strong>de</strong>a<strong>da</strong> <strong>de</strong> abusos<br />

e virulentas ambições, os sophismas nascem <strong>de</strong>baixo <strong>do</strong>s olhos <strong>do</strong><br />

leitor imparcial <strong>de</strong> envolta com adulterac&s <strong>da</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>sneces-<br />

sarias e vis nas paginas <strong>de</strong> escriptos <strong>de</strong> homens aliás graves e<br />

eruditos.<br />

Vamos, pois, arma<strong>do</strong>s <strong>de</strong> paciencia e sem prevençào alguma, es-<br />

tu<strong>da</strong>r este ponto.<br />

A razáo em que se estribam é uma asserçso vaga,<br />

quasi incomprehensivel, e falsa á luz <strong>da</strong> histora.<br />

Porque a Se Romana 6 a Se Apostolica, e o successor <strong>de</strong> Pedro<br />

foi o unico que her<strong>do</strong>u este po<strong>de</strong>r universal que tinham os apos-<br />

tolos, por isso lhe pertence na egreja o direito <strong>de</strong> exigir, suppri-<br />

mir, unir e modificar os bispa<strong>do</strong>s 1.<br />

& espantoso e ao mesmo tempo ridiculo.<br />

Espantoso, porque assomhra esta ousadia com que escriptores<br />

<strong>de</strong> nome e saber se atrevem a cscrever estas puerili<strong>da</strong><strong>de</strong>s, como se<br />

estivessem compon<strong>do</strong> para recitar aos indigenas <strong>do</strong> Mexico nas<br />

suas missòes; - e ridiculo, porqiie se preten<strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r uma pre-<br />

rogativa tão importante como esta, s6 porque a ca<strong>de</strong>ira episcopal<br />

<strong>de</strong> Roma se chama ca<strong>de</strong>ira aioosiolica !<br />

Depois, é um ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro paralogismo : pois quem vos ha <strong>de</strong><br />

prestar f6, se quan<strong>do</strong> quereis dcmonstrar qiie o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> crear,<br />

supprimir e modificar os bispa<strong>do</strong>s pertence ao papa, v6s affirmaes<br />

gratuitamente que, primeiro exerci<strong>do</strong> pelos apostolos, s6 o succes-<br />

sor <strong>de</strong> Pedro her<strong>do</strong>u este po<strong>de</strong>r? Provae primeiro esse facto ; mos-<br />

trae-nos como s6 o successor <strong>de</strong> Pedro é successor <strong>do</strong>s apostolos,<br />

1 *Mais i1 faut bien remarquer, avec Suarez, que lea'ap8tres avaient une<br />

juridiction illimitke <strong>da</strong>ne toute I'Eqlise, mais seulement drs Bvêques, et que<br />

ersonne ne succ8<strong>da</strong> h aucun d'eux <strong>da</strong>ns leur juridiction sur tout l'univers.<br />

ee successeur <strong>de</strong> Pierre a seul hérit4 <strong>de</strong> ce pouvoir universel, et sou si6ge a<br />

toujours retenci le titre d'apostoliqiie. Voilh pourqixoi le Pape seul a droit<br />

<strong>da</strong>ns llkglise d'éiiger, <strong>de</strong> supprirner, d'unir ou <strong>de</strong> rnodifier les évêches, et si<br />

I'on voit intervenir dxiis ces sortes d'actes les rois, les empereurs et les autres<br />

souv~rainet6e temporelles, c'& uriiquement rn vertu <strong>de</strong> concessions faites<br />

par 19kglise <strong>da</strong>ns 15ntérêt même du gouveriiement spirituel.~ Ab. Andrb<br />

-Cours <strong>de</strong> Droit Can. vb. Evtehé.<br />

O abba<strong>de</strong> GIaire no seu Diction. Uniu. <strong>de</strong>s Scienc. dccleu. vb. k&ht?, copia<br />

textualmente esae trecho.


como é elle s6 que her<strong>do</strong>u esse privilegio, e ten<strong>de</strong>s ent8o sustenta<strong>do</strong><br />

o que preten<strong>de</strong>is. Antes d'isto não.<br />

Mas para que 6 esta cegiieira, esta ambi~ão parti<strong>da</strong>ria que distingue<br />

os que militam sob cstas turbuleritas ban<strong>de</strong>iras ? Para que<br />

precisaes dc sustentar d'este mo<strong>do</strong> caricato as prerogativas papaes,<br />

se ten<strong>de</strong>s o direito novissimo <strong>da</strong> egreja que ninguem vos po<strong>de</strong>rá<br />

contestar ?<br />

B que elles sentem bem a origem viciosa d'estes <strong>direitos</strong>; elles<br />

conhecem bem que uma frau<strong>de</strong>, ain<strong>da</strong> que o anathema venha<br />

<strong>de</strong>pois <strong>da</strong>r-lhe auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> e protegel-a, náo per<strong>de</strong> nunca o seu<br />

<strong>de</strong>feito primordial.<br />

& que elles comprehen<strong>de</strong>m a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> sanctificar esta<br />

instituiçáo <strong>do</strong> direito novissimo, pren<strong>de</strong>n<strong>do</strong>-a ao tcmpo <strong>da</strong> primitiva<br />

egreja; elles perccbem que é indispensavel, quanto antes, como<br />

que canonisar as <strong>de</strong>cretaes <strong>do</strong>s papas, monumentos historicos <strong>da</strong>s<br />

ambições formi<strong>da</strong>veis que em certo pcrio<strong>do</strong> <strong>da</strong> historia <strong>do</strong> papa<strong>do</strong><br />

o elevaram quasi a porito <strong>de</strong> esmagar o po<strong>de</strong>r temporal <strong>da</strong>s nações<br />

<strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.<br />

E é com abusos, com usurpações; 6 contra os canoncls, corit!<br />

a disciplina geral <strong>da</strong> primitiva egreja; a <strong>de</strong>speito <strong>da</strong> tradiçáo apostolica<br />

e <strong>da</strong>s palavras eloquentes <strong>do</strong>s padres qiie elles preten<strong>de</strong>m<br />

purificar este gran<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r que a legislação ecclesiastica <strong>de</strong>posita<br />

hoje entre as mãos <strong>do</strong> papa!<br />

falso dizer-se ~ U P s6 a egreja <strong>de</strong> Roma teve o titulo apostolica,<br />

porque to<strong>do</strong>s os bispos nos primeiros tempos se chamavam<br />

npostolos c srias sés apostolicas I, e náo s6 apostoli mas pontifices<br />

maximi, principes patrum, etc.<br />

Se ha ou náo razões <strong>de</strong> conveniencia que <strong>de</strong>vam reunir nas<br />

mnos <strong>do</strong> papa este po<strong>de</strong>r, 6 outra questão mui diversa <strong>da</strong> nossa:<br />

aqui tracta-se <strong>do</strong>s factos, <strong>do</strong> que 6 historico, <strong>do</strong> que foi; náo <strong>do</strong><br />

qiic pó<strong>de</strong> ser melhor ou <strong>do</strong> que <strong>de</strong>ve estabelecer-se; e não é assim<br />

que se <strong>de</strong>scobrem estas corisas.<br />

B preciso consultar os monumentos historicos, folhear mais <strong>de</strong><br />

uma vez as actas e disposições legislativas <strong>do</strong>s concilias, <strong>do</strong>s codi-<br />

1 Leia-se JosB Bingham nas 0d.q. Lib. 2.O, Cap. 2, 9 vil.<br />

Chamaram-se ain<strong>da</strong> Prepositi, Antistites, Principes Saoer<strong>do</strong>t,um, Summi Sacer<strong>do</strong>te.~~<br />

Papae, Patres patrum, Epiewpi Episwporum, Vicarii Christi, Angeli<br />

Eccleaiae, etc.<br />

A respeito <strong>do</strong>e metropolitas leia-se o 5 xxiv <strong>do</strong> Cap. 16.


gos <strong>da</strong>s egrejas, <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes, <strong>da</strong>s obras <strong>do</strong>s historia<strong>do</strong>res, e nso<br />

nos ficarmos extasia<strong>do</strong>s na contemplaç80 d'esta subtileza theologica<br />

<strong>de</strong> que a sk <strong>de</strong> Roma se chamava apostolica e este po<strong>de</strong>r era<br />

apostolico.<br />

O que até aqui temos escripto jíi em gran<strong>de</strong> parte respon<strong>de</strong> e<br />

resolve a meio esta questão.<br />

On<strong>de</strong> se diz nos canones que apresentámos e nos <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os<br />

concilios d'este perio<strong>do</strong> que pertence ao papa este privilegio ? On<strong>de</strong><br />

que na0 cabe ao syno<strong>do</strong> provincial e ao metropolita este direito?<br />

Mui pelo contrario: on<strong>de</strong> se não man<strong>da</strong> abertamente, como nos<br />

cariones <strong>de</strong> Africa; on<strong>de</strong> se n8o diz implicita e positivamente, como<br />

nos <strong>de</strong> Antiochia; on<strong>de</strong> se não reconhece a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> e competencia<br />

<strong>do</strong> syno<strong>do</strong> 'noutros objectos, ahi, ain<strong>da</strong> ahi, para quem meditar,<br />

percce <strong>da</strong>r-se por certo que o negocio não passa <strong>do</strong>s limites<br />

<strong>da</strong> provincia.<br />

A tradiçào apostolica, a disciplina mais geral e mais antiga sáo<br />

estas, e csta é a <strong>do</strong>utrina <strong>do</strong>s padres e a sua pratica.<br />

A egreja africana 6 nestes tempos respeitabilissima, tanto talvez<br />

como a <strong>de</strong> Roma, porque, se Roma tira o seu brilho <strong>do</strong> imperio,<br />

aquella vai ganhal-o com a successao <strong>do</strong>s varões mais distinctos<br />

d'estes seculos primeiros, que edificaram a egreja com sua<br />

voz eloquctite, com sua penna brilhante, com o exemplo <strong>de</strong> sua<br />

vi<strong>da</strong> e com o proprio sangue pa<strong>de</strong>cen<strong>do</strong> o martyrio e confessan<strong>do</strong><br />

a fk, e ultimamente com a victoria sobre as heresias mais tenazes<br />

que corroeram a paz e uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> catholicismo nos dias <strong>de</strong> sua<br />

infancia.<br />

As regras d'estes canones apparecem 'nelles não subitamerite<br />

para avivar disciplina, que o <strong>de</strong>suso apagasse, mas vem aos concilio~<br />

a proposito <strong>de</strong> conten<strong>da</strong>s, a respeito <strong>de</strong> cuja soluç8o os padres<br />

não trepi<strong>da</strong>m, e escrevem-se nas suas <strong>de</strong>terminações sómente<br />

para lembrar o que se <strong>de</strong>ve fazer por ser a melhor e mais antiga<br />

e rcspeitavel disciplina.<br />

Pouco importa! pois, que o canon mais claro seja <strong>de</strong> Africa, e<br />

não <strong>de</strong> um concilio ecumenico, porque ahi ou alem elle 6 o espelho<br />

fiel, que a historia nos guar<strong>da</strong>, <strong>do</strong> que geralmente se praticava<br />

então.<br />

E se esta disciplina fosse discor<strong>da</strong>nte <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> e regimen <strong>da</strong><br />

egreja 'nestas epochas, se <strong>de</strong>stoasse <strong>da</strong>s regras <strong>do</strong>s concilios emquanto<br />

á competencia e po<strong>de</strong>res <strong>do</strong>s syno<strong>do</strong>s e metropolitas, mui


em estavam; mas nâú 4 mim, como provamos, e como 6 ponta<br />

incontestavel para quem tenha leitura, airi<strong>da</strong> que curta, <strong>da</strong> historia<br />

(1~ primitiva egreja.<br />

E on<strong>de</strong> está o canon <strong>do</strong> concilio geral para oppbr a esses que<br />

cithmos e á historia e tradiçgo, o qual confira ao papa o po<strong>de</strong>r<br />

<strong>de</strong> crear, unir, supprimir e modificar as dioccses ?<br />

On<strong>de</strong> o costume ? On<strong>de</strong> a tradiç8o ?<br />

& isto o que se não <strong>de</strong>scobre, se não <strong>de</strong>scobrir& nunca, e o que<br />

s6 po<strong>de</strong>ria <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a opiniâo contraria á nossa.<br />

Mas o can. xxviir <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia, dir-nos-hão, nao dii a enten<strong>de</strong>r<br />

que Roma estava orna<strong>da</strong> <strong>de</strong> tantos privilegios, que a Faziam a primeira<br />

<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> christâo ?<br />

Tractemos este objecto com algum vagar.<br />

O can. XXVIII <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia diz :<br />

Sanctorum Patrum <strong>de</strong>creta uhique sequentes et canonem qui nuper<br />

lectus est, crntum et quinquaginta Dei amantissimorum Episco[~orllm<br />

agnoscentrs, ea<strong>de</strong>m qiioqiie et nos <strong>de</strong>cernimiis ac statuimus dc privi-<br />

legiis sanctiissimae Ecclesiae Constiintinopolis novae Romae. Etcniin<br />

antiquae Romae throno, quod urbs illa imperaret, jure Pâtr~s 11"vilegia<br />

tribueriint. Et ca<strong>de</strong>m consi<strong>de</strong>ratione moti centum quinquiigiiila<br />

Dei amantissimi Episcopi, sarictissirno novae Romae throno aequalia<br />

privilegia tribuerunt recte judicantes urbcm quae et imperio et senatu<br />

honorata sit et aequalibus ciirn antiquissima Regina Roma privilegiis<br />

fruatur, etiam in rebus Ecclesiasticis, non secus ac illam extolli ac magnifieri,<br />

secun<strong>da</strong>m post illam existentem: ut et Ponticae et Asianae et<br />

Ibraciae Dioecesis Metropolitani soli, proeterca et Episcopi pracdii 1'1rum<br />

Dioecesium, quae sunt inter Harbaros, à praedicto throno sanctis-<br />

simae Constantinopolitanae Ecclesiae ordinentur : unoauoaue scilicet<br />

praedictarum ~ioecesum Metropolitano cum prorinciae ~pisco~is ordinante.<br />

- auemadmodum divinis canonibus est traditum. Ordinari autem,<br />

sicut dictuui est, praedictarum dioecesum kletropolitanos a Constantinopolitano<br />

Episcopo convenientihus <strong>de</strong> more factis electionihus,<br />

et adipsum relatis. »<br />

A proposito d'este canon levantou-se uma grave disputa no con-<br />

cilio, os bispos lega<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Koma n8o queriam acceital-o, rcpu-<br />

tan<strong>do</strong>-o contrario aos canones <strong>de</strong> Nicea, e preten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> que os pa-<br />

dres o tinham approva<strong>do</strong> coactos e sem liber<strong>da</strong><strong>de</strong>; em uma pala-<br />

vra, repetiram-se estas scenas, communs a to<strong>da</strong>s as epochns, por-<br />

que em to<strong>da</strong>s as epochas os homens têm ti<strong>do</strong> d'estas fraquezas;<br />

o que, to<strong>da</strong>via, não impe<strong>de</strong> que os homens <strong>da</strong> egeja as não <strong>de</strong>-<br />

viem possuir.


Evi<strong>de</strong>ntemente, se Constantinopola, a nova Roma, a ci<strong>da</strong><strong>de</strong> reel,<br />

vai gozar por este canon <strong>de</strong> riovos e largos privilegios, e elles Iião <strong>de</strong><br />

scr eguacs aos <strong>de</strong> Roma, Roma já os tinha a este tempo, e tinha-os<br />

<strong>de</strong> lia muito, porque os seus lega<strong>do</strong>s appellavam para os canones<br />

<strong>de</strong> Nicca, que rriaii<strong>da</strong>ram conservar os antigos costumes.<br />

É incontestavel : mas, que privilegios eram esses que illustravam<br />

essa cgreja ?<br />

O costume s6 os estabelecera, e o primeiro concilio ecumenico<br />

os revali<strong>da</strong>ra sem os enumerar.<br />

Sabemos, comtu<strong>do</strong>, sem duvi<strong>da</strong> alguma quaes elles seriam, por-<br />

que este can. xxvirr, queren<strong>do</strong> elevar Constantinopola, aáo lhe pre-<br />

teri<strong>de</strong> <strong>da</strong>r mais nem menos <strong>do</strong> quc os <strong>de</strong> que Roma gosava.<br />


tincta <strong>de</strong> sua provincia, e que junctava a isto ser a capital <strong>do</strong> im-<br />

perio, em uma s6 palavra, ser Koma; necessariamente gosavtt d'este<br />

direito como as <strong>de</strong>mais, e na<strong>da</strong> admira que d'elle usasse, como o<br />

<strong>de</strong>ixa ver este canon, em to<strong>da</strong> a diocese polilica, isto 6, em certo<br />

numero <strong>de</strong> proviircias.<br />

Esta importancia, porem, náo esqueçamos, vcm-lhe to<strong>da</strong> <strong>do</strong><br />

la<strong>do</strong> <strong>do</strong> imperio, <strong>da</strong>s circumstancias politicas e temporaes <strong>da</strong> socie-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong>, e não que a egreja a quizesse assim distinguir e illustrar.<br />

k um facto <strong>de</strong> origem essencialmente profana, mas um facto<br />

mui antigo e que a egeja acceitou por essa mesma antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> e<br />

por esta influencia in<strong>de</strong>clinavel que sempre possuem as instiliiições<br />

seculares, e colossaes como o imperio, sobre est'outras <strong>de</strong> fórma<br />

menos concreta e apenas organisan<strong>do</strong>-se, como a egreja 1.<br />

Este mesmo privilegio era jB commum tí Alexandria, Antiochia<br />

e Jerusalem; náo era cousa propria, especial <strong>do</strong> bispo <strong>de</strong> Roma,<br />

por ser bispo em Koma 9.<br />

E se o bispo <strong>de</strong> Roma fruia maiores e mais preciosos privile-<br />

gios, porque o não diz, porque os náo pe<strong>de</strong> este can. xsviii para<br />

a nova Roma?<br />

Isto parece-nos <strong>de</strong>cisivo. A leitura <strong>do</strong> canon, a sua historia, tu<strong>do</strong><br />

nos convence <strong>de</strong> que Iloma não tinha tal privilegio.<br />

Canon nenhnm lh'o confere; e aquelles canoncs <strong>de</strong> Antiochia, <strong>de</strong><br />

que falámos, e que lembravam e revali<strong>da</strong>vam ns regras <strong>do</strong>s tipos-<br />

tolos, coexistiam com estes <strong>de</strong> Calcc<strong>do</strong>nin, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> assim cnten-<br />

<strong>de</strong>rem-se e completarem-se uns pelos outros. Iia mais.<br />

Seja qual for a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia, cano-<br />

nica, jaridicamente, & face <strong>da</strong> historia ninguem o recusoii nem<br />

po<strong>de</strong> recusar, e por isso o que vamos dizer eluci<strong>da</strong> inteiramente<br />

este objecto.<br />

'Neste concilio tracta-se, por mais <strong>de</strong> uma vez, <strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir se o<br />

esta<strong>do</strong> tinha ou não o direito <strong>de</strong> crear novas metropoles e paro-<br />

chias, e v&-se transluzir <strong>do</strong> que os padres dizem e <strong>da</strong> maneira por<br />

que redigem os canones, que, sem necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> intervençto <strong>do</strong><br />

papa, ellas podiam ser erectas. Conserva-se o antigo costume e<br />

1 Veja-se O can. VI <strong>de</strong> Nicea e os scholions not. e comm. <strong>do</strong>s canonistas ao<br />

mesmo.<br />

2 Episcopus Romanus nihilo magis quam alius quispiam solns ordinare<br />

poterat.~ Bingham, Orig. Lib. 2, cap. 10, 9 6."


este náo <strong>da</strong>va ao bispo <strong>de</strong> Roma tal direito, porque as metropo-<br />

les que primeiro houve na egreja, como a ca<strong>da</strong> pas, @O temos rc-<br />

peti<strong>do</strong>, não foram erigi<strong>da</strong>s por bullas <strong>da</strong> SE romana, mas nasce-<br />

ram sensim e <strong>da</strong>s circumstancias politicas <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> imperio,<br />

ao mesmo tempo que os antiqui mores pediam a concurrericia <strong>do</strong><br />

syno<strong>do</strong> e <strong>do</strong> metropolita para a erecção <strong>da</strong>s novas parochias.<br />

Quan<strong>do</strong> por estes canones se rjuizesse ver em Roma certa au-<br />

ctori<strong>da</strong><strong>de</strong> suprema 'neste objecto, essa conjectura (porque seria<br />

uma simples conjectura) nào podia ir albm <strong>de</strong> algumas provincias<br />

suburbicarias e <strong>do</strong> occidcnte, e nunca abranger o orbe to<strong>do</strong>, como<br />

preten<strong>de</strong>m; o que mesmo seria impossivel, porque annulla<strong>do</strong> ficava<br />

o can. XXVIII <strong>de</strong> que falamos, pois que o bispo <strong>de</strong> Constantinopola<br />

não gosaria dc nenhum d'esscs privilegias que lhe confere o canon ;<br />

o qual é perfeitamente incomprehcnsivel, suppon<strong>do</strong> que os privilegio~<br />

<strong>de</strong> Roma, a que se reporta, houvessem po<strong>de</strong>r sobre to<strong>da</strong> a<br />

cgeja catholica.<br />

Do can. VI <strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Nicea se <strong>de</strong>scobre claramente como,<br />

entre as prerogativas <strong>da</strong> SE romana, se não contava este direito <strong>de</strong><br />

participar soberanainente <strong>da</strong> divislo e <strong>de</strong>marcaçao <strong>do</strong>s limites <strong>da</strong>s<br />

parochias, ou dioceses <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o orbe.<br />

E, para não irmos <strong>de</strong>sacompanha<strong>do</strong>s <strong>de</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s 'neste grave<br />

assumpto, vamos citar uma <strong>do</strong>mestica, e por isso mesmo rara e<br />

curiosa.<br />

uEqui<strong>de</strong>m, diz o P." Antonio Pereira <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong>, si divisio et<br />

((<strong>de</strong>signatio Dioeceseon I'apae jure divino reservata esset. vel si ab<br />

uuno Papa ejusmodi divisio ct <strong>de</strong>signatio <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ret : cur, quaeso, Niucoeni<br />

Ptitres Canone VI ubi <strong>de</strong> limitibus et administratione Dioeceseon<br />

(~Xgypti, Orientis et coeterarum Christianariim agunt; non ad jus di-<br />

((vinum, non ad auctoritatem Komani Pontificis provocant, sed tana<br />

tummo<strong>do</strong> ad consuetiidinem vulgo receptam ?. .... . cur item Patres<br />

rConstantinopolitani Canone 11, ubi ean<strong>de</strong>m divisionem confirmant,<br />

unon alio nisi Canonum jure utuntiir I?»<br />

1 Tentarnen Theologicum. Para i, Princip. 1, n.O xrr, pag. 35, 1769.<br />

O caii. vir <strong>de</strong> h'icea B assim:<br />

~Antiyua consuetu<strong>do</strong> servetur per Aegyptum, Lybiam et Pentrtpolim, ita<br />

ut Alexandrinus Episcopus horum oinnium habeat potcstatcm. Quia et Urbis<br />

Romae Episeopo parilis mos est. Similiter auteiii et apnd Ailtiochiam,<br />

coeteras que Provincias, suis privilegia serventur Eeclesiis. Illud antem generalifer<br />

elarum est, yuod si quis praeter sententiam Metropolitani factus<br />

fuerit Episcopus ;-hunc magna Syiiodiis <strong>de</strong>finivit Episcopum esse non oporter?.<br />

Sui autem communi cunctorum <strong>de</strong>creto ratioiiabili, et secundrim Eccle-<br />

5


Se este privilegio era <strong>de</strong> tal mo<strong>do</strong> liga<strong>do</strong> ao Prima<strong>do</strong>, que se<br />

não po<strong>de</strong>sse separar, por que razão, pergunta este mesmo escriptor,<br />

'nesse can. ir <strong>de</strong> Constantinopola, cento e cincoenta padres estabe-<br />

leceram que, <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> <strong>de</strong> Koma, o bispo constantinopolitano teria<br />

a honra <strong>do</strong> prima<strong>do</strong> em segun<strong>do</strong> logar 7<br />

averumtamen, acaba aqiielle texto, Constantinopolitaniis Episcopus,<br />

uhabeat honoris primatum, post Komanum I.:piscopuin: propterea quod<br />

eurbs ipsa sit junior Roma.#<br />

Por que razão, perguntamos ain<strong>da</strong>, os padres respeitabillissimos'<br />

<strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia instituiram o bispo <strong>de</strong> Constalitinopola<br />

Patriarclia, ou Exarcha, <strong>de</strong> duas vastissimas tliocescs, apezar <strong>da</strong><br />

opposiçao vivissima <strong>do</strong>s lega<strong>do</strong>s <strong>de</strong> S. Leão papa ? Idque acewime<br />

olrluciunciibirs Legaíis S. Leowis Papae ?<br />

E ninguem ignora que este can., como muito bem nota o illus-<br />

tre padre Pereira <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong>, se perpetuo repugnasse Al~osío-<br />

licam Sc<strong>de</strong>m, frecslra repugnasse; poisque a honra por elle confe-<br />

ri<strong>da</strong> aos patriarchas <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> real foi sempre e conslanterrierite<br />

por elles exerci<strong>da</strong>.<br />

Apezar <strong>de</strong> tu<strong>do</strong> o que dissemos e expen<strong>de</strong>mos, pon<strong>de</strong>ram alguns<br />

escriptores que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o sexto seculo por <strong>de</strong>ante os factos pare-<br />

cem indicar a existericia d'estes litigiosos privilegias, exoriian<strong>do</strong> a<br />

ca<strong>de</strong>ira episcopal <strong>de</strong> Koma.<br />

Devot, nas suas Instit. Canonicar., escreven<strong>do</strong> que ao Summo<br />

Pontifice cabe o consagrar os .bispos, e erigir os bispa<strong>do</strong>s, unil-os<br />

cm um s6, ou repartil-os em muitos, cita o exemplo <strong>de</strong> S. Grc-<br />

gorio Magno, <strong>do</strong>s fins <strong>do</strong> seculo 6.O, no que d'elle rcfere Joáo Dia-<br />

corio na biographia d'esse homem illustre 1.<br />

siasticam regulam comprobato, duo aut tres, propter contentiones proprias<br />

contradicunt, obtincrtt sententia pliirimorum.~<br />

O can. 11 <strong>do</strong> 1.0 coricilio <strong>de</strong> Constaiitinopola diz :<br />

'Qrii sunt super Dioecesim Episcopi, riequaquam ad Ecclesias, qiise sunt<br />

extra praefixos sibi tcrmiiioa, acce<strong>da</strong>iit ; nec eas hac praesurnptione confun-<br />

<strong>da</strong>rit ; sed juxta canones Alexandrhus Antistes, quae suiit in Aegypto, regat<br />

solum mo<strong>do</strong>; et Orientis Episcopi Orientem tanturn guberneiit, servntis privi-<br />

legiis, quae Nicaenis Cauonibus Eccleaiae Antiochenae tributa sunt. Asia-<br />

iiae quoque Dioeceos Episcopi ea solum quae sunc in Asiana Dioecusi dis-<br />

pensent: necnou et Ponti Episcopi ea tantiim quae sunt in Ponto ; ct Thra-<br />

ciarum, quae in Thraciis sunt, gubernent ...... .<br />

1 Vita S. Gregoiii Magni, lib. 3, cap. 7 opp. S. Gregor. M. tom. 4.O, col.<br />

86, Paris, 1705.<br />

.Nam iit pauca <strong>de</strong> multis contiiigam, ex presbyteris Csrdinalibiis Eccle-


Thomassin gasta tarnbem um largo capitulo com a exposit$o<br />

<strong>de</strong> alguns factos, em que a aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> papa parece sobresahir<br />

com certo vulto.<br />

To<strong>da</strong>via, a quem observar <strong>de</strong>spreveni<strong>do</strong>, bcm <strong>de</strong>pressa sc paten-<br />

tear& que to<strong>do</strong>s estes excmplos são tira<strong>do</strong>s <strong>de</strong> factos quc se pas-<br />

sam ou nas provincias suburhicarias, ou nas missõtbs <strong>da</strong> Germania,<br />

ou <strong>do</strong>s anglo-saxões, ou nas Callias e Ilespariha, ain<strong>da</strong> que merios<br />

iiestas ultimas.<br />

V&-se j& por isto o <strong>de</strong>feito d'estc raciocinar, que s6 a incautos<br />

ou ignorantes po<strong>de</strong> pren<strong>de</strong>r.<br />

Com estes factos, poucos em numero, limita<strong>do</strong>s no espaço em<br />

qiie se dão, se preten<strong>de</strong> justificar uma prerogativa que podia es-<br />

ten<strong>de</strong>r-se a to<strong>do</strong> o orbc catholico; quan<strong>do</strong> era 'nestes tempos<br />

rnuilo mais dilata<strong>do</strong> para o oriciitc o ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro fhco <strong>do</strong> christia-<br />

nismo e para o norte <strong>da</strong> Africa ! Preten<strong>de</strong>-w isto quan<strong>do</strong> os cos-<br />

tumcs <strong>da</strong>s egrejas e os canones <strong>do</strong>s concilias <strong>do</strong>s fins <strong>do</strong> seculo<br />

anterior tãio expressa e geralmentc man<strong>da</strong>jam o contrario e pro-<br />

hibiam taes abusos !<br />

O illustre padre <strong>do</strong> Oratorio, não contente com <strong>de</strong>monstrar a<br />

disciplina <strong>do</strong>s primeiros seculos com factos só <strong>do</strong> rv F, v, vem agora<br />

dizer-nos qiie a disciplina <strong>da</strong> cgrcja catholica miidhra nos seculos<br />

VI, vil c vrri, porque assim o 1)rovam uns poucos <strong>de</strong> factos, pas-<br />

sa<strong>do</strong>s no occi<strong>de</strong>nte e lias missões <strong>da</strong> Gcrmanirr e <strong>da</strong> Inglaterra !<br />

Singular systerna este <strong>de</strong> estu<strong>da</strong>r a legislnqãio canonica, e ain<strong>da</strong><br />

mais singular a clara consciencia d'este liistoria<strong>do</strong>r !<br />

siae suae consecravit Epiwopos, Bonifacium Rhegii Habentium J'erusi et<br />

Douum Blessariae Siciliae. Ex Sul>diacouibiis vero, Gloriosurn Istriae, Festum<br />

Capnae, Petrum Trecas, et Castorium Arimini. At vero ex Monachis monas-<br />

terii sui, Marinianum Bavennae, Maximisnum Syraciisis et Sabinum Calli-<br />

poli, I'iaesules ordiuavit. Sed et Augustinum penes Anglos a Galliarum<br />

Episcopis ordinari praecepit. Per quem nihilominiis ad episcopatum iii caciem<br />

geiite Moriachi e.jusci<strong>de</strong> patrib, tempore diverso provecti sunt : Mellitiis,<br />

Juetus, Laurentius et Pauliiius. Solis diaconibus ~postolicxe Setlis snpw liac<br />

quo<strong>da</strong>rnrno<strong>do</strong> parte parcebat : quorum eum <strong>de</strong>cern et novem plt!riitudiiit: reduii<strong>da</strong>ret,<br />

ipse Bonifacium, Florentinum et Epiphaniuin coiisrc~ravit<br />

Cita ain<strong>da</strong> este escriptor, para exemplos <strong>de</strong> creagão <strong>de</strong> bispa<strong>do</strong>s lias Gallias,<br />

a Gregor. Turon. Histor. E'ranc. lib. 1, cap. 28, col. 23. Par. 1699. Hincniar<br />

llhein. Opusc. 24, cap. 16, pag. 431, tom. 11. Par. 1645.<br />

Notêrnos que estes factos são pela maior parte simples or<strong>de</strong>naç0es oii sagrsç0es<br />

<strong>de</strong> bispos e não claramente novas creaçGes <strong>de</strong> bispos, ou <strong>de</strong> bispa<strong>do</strong>s,<br />

<strong>de</strong> que ninguem po<strong>de</strong>r4 eontestm a Roina o direito <strong>de</strong> fazer, pois que, como<br />

vinios, o direito consueturliriario 111'0 couferira e o cita<strong>do</strong> can. <strong>de</strong> Calee<strong>do</strong>nia<br />

Ih'o revali<strong>da</strong>.<br />

. .


Singular, nBo ; n80 dizemos bem : commum, bem commum nos<br />

canonistas, quan<strong>do</strong> preten<strong>de</strong>m com a antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>r valor e re-<br />

speito ás usurpaç6es papacs, que os n3o têm por si tão s6s.<br />

Este diffuso auctor <strong>da</strong> I'cltis c Noua Disciplina, encontran<strong>do</strong>-se<br />

no meio <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s estes factos, <strong>de</strong> que para seu martyrio fizera a<br />

infeliz <strong>de</strong>scoberta, c sentin<strong>do</strong>-se aperta<strong>do</strong> pelo costume geral <strong>da</strong><br />

egreja, pelos cariones d'ella e pelo cspirito d'estes secuios, parece<br />

que, para cortar diíficul<strong>da</strong><strong>de</strong>s e sahir-se <strong>do</strong> embaraqo, dcii cguul<br />

valor aos factos consentaneos com o. cspirito c lciras diis leis e<br />

áquellcs, que na<strong>da</strong> mais eram <strong>do</strong> que puras infracyfics d'ellas ; -<br />

e porque <strong>de</strong> um la<strong>do</strong> lhe surgia Gregorio III a enviar a Boni-<br />

facio, seu lega<strong>do</strong>, instituir bispa<strong>do</strong>s ria Cprmariia, c <strong>do</strong> outro via<br />

ain<strong>da</strong> em certos conflictos appellar-se para o syno<strong>do</strong> e para o<br />

assentimerito <strong>do</strong> metropolita ; resolveu pelo niellior, o que vale<br />

não ter <strong>de</strong>sata<strong>do</strong> a contestaçâo: disse que eram precisos to<strong>do</strong>s<br />

tres.<br />

Não basta o syno<strong>do</strong>, 6 indispensavel o metropolitn ; não satis-<br />

fazem estes s6s, é essericial a intervenyão <strong>do</strong> pap~i. =\iii,I,i r130<br />

sacia<strong>do</strong> d'este amor <strong>de</strong> tornar complica<strong>do</strong> c solcmne est, {i, i i, o<br />

timi<strong>do</strong> professor, porque veiu a <strong>de</strong>scobrir Justiniano coristruin<strong>do</strong><br />

uma ca<strong>de</strong>ira episcopal na miseravel al<strong>de</strong>ia ondc nascera, exclama<br />

por fim: -NBo se podia tambem 'rirstc negocio prescindir <strong>do</strong><br />

consentimento <strong>do</strong> rei ! -<br />

Por egual systema <strong>de</strong> argumentação algum historia<strong>do</strong>r \ in<strong>do</strong>iiro<br />

<strong>da</strong> eschola d'este dirá, que critrc iiús dcsdc certo anno se permitte<br />

e usa o homicidio, porquc, revolveri<strong>do</strong> <strong>do</strong>cumcntos, soubc que<br />

Antonio assassinara a Francisco em tal <strong>da</strong>ta.<br />

Na historia <strong>da</strong> disciplina ecclesiastica é miii difficil escreler srm<br />

faltar it ver<strong>da</strong><strong>de</strong> e agra<strong>da</strong>n<strong>do</strong> a to<strong>do</strong>s. Tliomassin conseguiu-o,<br />

porbm, com o seu eclectismo falso e pueril. Isto explica porquc,<br />

<strong>de</strong>pois <strong>da</strong> publicação d'esta obra, este cscriptor foi tão queri<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

Roma e <strong>do</strong> rei <strong>de</strong> Franya, a ponto <strong>de</strong> aqurlla o chamar para si e<br />

o monarcha francez o nâo <strong>de</strong>ixar saliir <strong>do</strong> scu reino.<br />

O bom <strong>do</strong> timi<strong>do</strong> professor resolveu ain<strong>da</strong> este conflicto no estylo<br />

<strong>do</strong>s seus trabalhos <strong>de</strong> disciplina ecclesiastica: traduziu a obra para<br />

latim e offereceu-a ao papa.<br />

Emquanto aos exemplos extrahi<strong>do</strong>s <strong>da</strong> biographia e actos <strong>de</strong><br />

S. Cregorio Magno, são <strong>da</strong> mesma forma inconveriicntcmente cha-<br />

ma<strong>do</strong>s; porque, além <strong>de</strong> terem o <strong>de</strong>feito, que jh lhe nothmos, <strong>de</strong>


se passarem s6 em volta <strong>de</strong> Roma, na<strong>da</strong> provam exactamente por<br />

serem practica<strong>do</strong>s por S. Gregorio Magno.<br />

Este homem sombrio 6 o primeiro <strong>do</strong>s acerrimos propugna<strong>do</strong>-<br />

res <strong>da</strong> supremacia papal, o primeiro que acera o gume d'essa<br />

espa<strong>da</strong> terrivel que <strong>de</strong>pois ha <strong>de</strong> brandir satanicamente o pulso <strong>de</strong><br />

ferro <strong>do</strong> celebre Gregorio vrr, <strong>de</strong>positario e <strong>de</strong>fensor <strong>da</strong> uni<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> chrisláo na e<strong>da</strong><strong>de</strong> média.<br />

Este homem, se era o espelho <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s virtu<strong>de</strong>s, se a sua<br />

vi<strong>da</strong> era a pintura <strong>de</strong> humil<strong>da</strong><strong>de</strong>s e aberrações; comtu<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong><br />

se tocava no esplen<strong>do</strong>r <strong>da</strong> ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Roma, elle surgia tremen<strong>do</strong>,<br />

espuman<strong>do</strong> coleras e procuran<strong>do</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>l-a a to<strong>do</strong> o transe.<br />

Este homem, quc escrevia que a força viva <strong>da</strong> egreja era a in-<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia soberana <strong>do</strong> episcopa<strong>do</strong>, escondia-se com a confiança<br />

que ganhavam suas palavras humil<strong>de</strong>s, para chegar mais perto <strong>do</strong><br />

proprio episcopa<strong>do</strong> e nugmcntnr com os seus <strong>de</strong>spojos o brilho<br />

excessivo <strong>da</strong> Sé que occupava, hrilho que hoje quasi eclipso o cla-<br />

r80 <strong>do</strong> episcopa<strong>do</strong> sobre o occi<strong>de</strong>nte, ou que pelo menos o <strong>de</strong>ixa<br />

escondi<strong>do</strong> sob as cinzas <strong>do</strong>s inceiidios que produz 1.<br />

Como, pois, <strong>da</strong>r valor a estes factos pratica<strong>do</strong>s contra os cano-<br />

nes e a <strong>de</strong>speito d'elles ?<br />

On<strong>de</strong> o titulo d'estas prerogativas ?<br />

E quem ha ahi que ignore que 6 exactamente por estes tempos<br />

que se fazem as collecções latinas <strong>do</strong>s canones, se traduzem os ca-<br />

I Greprio I, o gran<strong>de</strong>, é um <strong>do</strong>s mais notaveis papas que conta a hiatoria<br />

<strong>da</strong> egreja. De gran<strong>de</strong> illustração, nasci<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma familia <strong>da</strong> classe <strong>do</strong>s pa-<br />

tricios, este hoinein singular foi sena<strong>do</strong>r e <strong>de</strong>pois prefeito ein Roma. O <strong>de</strong>s-<br />

prem pelas gran<strong>de</strong>zas <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> obrigou-o a retirar-se ao mosteiro <strong>de</strong> San-<br />

cto André, que elle man<strong>da</strong>ra edificar.<br />

Uiri <strong>do</strong>s sete discorios <strong>de</strong> Roma, nuncio em Constantinopla para iinpetrar<br />

o soccorro <strong>de</strong> Tiberio 11 contra 03 Lombar<strong>do</strong>s, secretario <strong>do</strong> papa Pelagio,<br />

Gregorio Magiio foi or<strong>de</strong>na<strong>do</strong> bispo <strong>de</strong> Roma no anno <strong>de</strong> 533, contra siia von-<br />

ta<strong>de</strong>, e <strong>de</strong>pois (lc ter fiigi<strong>do</strong> e se rscon<strong>de</strong>r para evitar o pontifica<strong>do</strong>.<br />

Aduls<strong>do</strong>r <strong>do</strong> podcr temporal <strong>do</strong>s reis, principalmente <strong>do</strong>s francews, <strong>de</strong><br />

quem dizia que o throno se erguia tanto acima <strong>do</strong>s outros, quanto acima <strong>do</strong>s<br />

vasuallos estavam os reis; elle corisi<strong>de</strong>rava essericirl a confirmaçfio <strong>do</strong> ponti-<br />

fica<strong>do</strong> pelos impera<strong>do</strong>res, compra<strong>da</strong> coin avulta<strong>da</strong>s sommaa <strong>de</strong> dinheiro.<br />

Foi a sua vi<strong>da</strong> <strong>de</strong> uina rigi<strong>de</strong>z espaiitosa; pobiissimo o seu passadio; se-<br />

vero o seu trftcto.<br />

Incansavel no cui<strong>da</strong><strong>do</strong> pelas cousas <strong>da</strong> egreja, assiduo no estu<strong>do</strong> <strong>da</strong> litte<br />

ratura e <strong>da</strong> disciplina, apaixona<strong>do</strong> pelo senti<strong>do</strong> mystico <strong>da</strong>s escripturas, mor-<br />

reu breve, gasto por tão duro viver e tão forte geuio.<br />

Se o <strong>de</strong>sprezo <strong>do</strong>s esplen<strong>do</strong>res mun<strong>da</strong>nos lhe fazia passar uma vi<strong>da</strong> simples<br />

e sem fausto, parece comtu<strong>do</strong> que essa mesma ari<strong>de</strong>z <strong>de</strong> espirito lhe concen-


nones gregos <strong>do</strong> oriente e <strong>de</strong> Africa, e apparecem os codigos <strong>da</strong>s<br />

egrejas ?<br />

Para que seriam estes trahalhos, perguntamos? era pura curiosi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

litteraria ou scientifica que os motivava?<br />

E 'riesses codigos n8o reapparecc a disciplina <strong>do</strong>s seculos ante<br />

riores, <strong>de</strong> lia <strong>do</strong>is dias, por assim dizer; porque em Africa no<br />

proprio sexto seculo sc repelem nos concilias os canones que citámos,<br />

e quc3 sào os proprios <strong>do</strong> seculo v apenas?<br />

On<strong>de</strong> estií, ao menos, uma <strong>de</strong>creta1 falsa ou ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira?<br />

Estes factos são, pois, abusos, são infraccaes, que tem a sua<br />

origtbm nas ambições <strong>do</strong>s bispos, n8o $6 em Roma, note-se bem,<br />

mas nas gran<strong>de</strong>s dioeeses <strong>do</strong> proprio oriente e <strong>do</strong> Egypto, e algumas<br />

~7es até sob o governo <strong>de</strong> varões que a rgreja canonisou e<br />

que, í~ <strong>de</strong>i~aram luminosa por seus escriptos admiraveis.<br />

k só dcpois <strong>do</strong> seculo v111 que este costumc adquire certa gc-<br />

nerali<strong>da</strong><strong>de</strong> e permanencia no occi<strong>de</strong>nte; e ate lil, esta simplcs con-<br />

suelutlo (se o cra), tào recente, tào contesta<strong>da</strong>, tno limita<strong>da</strong>, em<br />

guerra aberta com os proprios canones e disciplina <strong>do</strong>s primeiros<br />

dias, po<strong>de</strong>ria ser uma lei, uma lei geral para to<strong>da</strong> a egreln (.,I-<br />

tholica ?<br />

Quem o accreditarb?<br />

Da mesma forma que os canonistas dizem que o esta<strong>do</strong>, por tcr<br />

intervin<strong>do</strong> algumas vezes na erecção e divisão <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, infrin-<br />

giu, fazen<strong>do</strong>-o, as leis ecclesiasticas; o mesmo <strong>de</strong>vem dizer aqui <strong>do</strong><br />

papa, e dc maneira nenhuma <strong>da</strong>r a taes factos o valor exorbitantc<br />

que protendcm attribuir-lhes.<br />

trnva no intimo, prompta a surgir, a mais iracun<strong>da</strong> vehemencia contra os que<br />

preteiidiain usurpar-lhe a supremacia <strong>de</strong> sua egreja.<br />

Vi?-se <strong>de</strong> suas cartas a maneira como elle se levantou contra João, patriar-<br />

cha <strong>de</strong> Constantinopla, que queria usar <strong>do</strong> titulo <strong>de</strong> patriarcha universal.<br />

.Tu o sabes, escievin elle a um seu diacono, que estava na antiga EIyznn-<br />

zio, soffro por muito tempo com paciencia : mas, quan<strong>do</strong> resolvo não esperar<br />

mais, não ha perigo nenhum a que me não exponha livremente e com alegria<br />

para manter a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> pontifical..<br />

Veja a Epist. 1.' <strong>do</strong> liv. 7." <strong>da</strong>s suas.<br />

Comtu<strong>do</strong> este mesmo papa, quan<strong>do</strong> escrevia contra as pretenstes <strong>de</strong> Cons-<br />

tantinopla, dizia que se n&o podia <strong>de</strong>ixar no Olvi<strong>do</strong> que o concilio <strong>de</strong> Calce-<br />

<strong>do</strong>nia offerecera aos bispos <strong>de</strong> Roma o titulo <strong>de</strong> patriarchas universaes, mas<br />

que neiihiim d'elles houve que quizesse a<strong>do</strong>rnar-se <strong>de</strong> tão pesa<strong>do</strong> epitheto com<br />

me<strong>do</strong> que não parecesse querer attribuir-se a si só o episcopa<strong>do</strong> e roubal-o a<br />

seus iriniios.<br />

Este mesiiio padre B o primeiro papa que usa as expres<strong>de</strong>s bem conheci<strong>da</strong>s<br />

d~ ugerm eeruorum Dei..


$ tão ver<strong>da</strong><strong>de</strong> o que dizemos, que no proprio seculo n, apezar<br />

<strong>de</strong> j6 terem appareci<strong>do</strong> as falsas <strong>de</strong>cretiies, ain<strong>da</strong> se n8o reconhe-<br />

cia geralmente no papa o direito <strong>de</strong> erigir metropoles e crear bis-<br />

pa<strong>do</strong>s.<br />

Jo80 ix, nos começos d'esse seculo, instituiu uma metropole e<br />

trcs novos bispa<strong>do</strong>s nas terras <strong>do</strong>s sclavòes, que se tinham conver-<br />

ti<strong>do</strong> h fé catholica.<br />

Pheotmaro, primaz <strong>da</strong> egreja <strong>de</strong> Juvanense, e outros bispos alta-<br />

mente protestaram contra estes factos, como contrarios aos sanctos<br />

canoncs e absorventes <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> episcopal; o que se v6 <strong>da</strong><br />

epistola yue a este pontifice dirigiram 1.<br />

Von Espen escreve a este respeito%:<br />

*Hae querela Episcoporum <strong>de</strong> hac per Homaiiiim Pontificem facta<br />

ercctionc sat ostciidit, nondiim eo temporc gencralitcr agnilam fiiisse<br />

auctoritatem erigcndi Ecclesias Metropoliticas aut Cath're<strong>da</strong>lcs ad llo-<br />

manum Pontificem contra pristinum canoniim instituta e1 Ecclesiae<br />

corisuetudinem esse <strong>de</strong>volutam 3. n<br />

Duas palavras sobre a historia <strong>do</strong> crescimento <strong>do</strong> pnpa<strong>do</strong> at6<br />

iio scciilo ix acabarão <strong>de</strong> nos esclarecer este ponto.<br />

Quan<strong>do</strong> acima nothmos como <strong>de</strong>feito d'csta argumentaqào o sr-<br />

rcm lcmbrn<strong>do</strong>s factos crn limitii<strong>do</strong> numero e pela maior parte pas-<br />

sa<strong>do</strong>s nos suburbios <strong>da</strong> graridc ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, esquecen<strong>do</strong>-se o orieiite<br />

to<strong>do</strong>, nBo dcscobriamos inteiro o nosso pensamento.<br />

Não são s6 ns gran<strong>de</strong>s t\grejas riacioriacs <strong>do</strong> oriclntc c <strong>da</strong> Afrira<br />

septeritrional, que estes escriptores <strong>de</strong>ixam tsqueci<strong>da</strong>s: é o proprio<br />

occi<strong>de</strong>rite, é a mesina Italia, e na historia d'estas egrejas escori-<br />

1 Concil. General. coliim. 498, tom. 9.<br />

2 Tom. 1.0, 11. tit. XIX, cap. 2.O, n.O VIII.<br />

3 Os ino<strong>de</strong>rnos <strong>de</strong>fensores d'estas prerogativas papaes, escreven<strong>do</strong> sobre o<br />

jocllio, cnhem em singular contradicç~o.<br />

Uma <strong>da</strong>s primeiras razòes, por que clamam que ao papa <strong>de</strong>ve pertencer a<br />

crcaç50, união c separação <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, 6 a inexcedivel importancia d'estes<br />

objectos; e tanta consi<strong>de</strong>raçiio lhe dispensam, que d'ella partem como base<br />

<strong>de</strong> iiiducç8o historiea, para inferir que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o8 mais remotos aias <strong>da</strong> egreja<br />

so papa <strong>de</strong>vera ter pertenci<strong>do</strong> este direito.<br />

Se estc~ escriptores a30 sinceros, se conhecem o canon <strong>de</strong> Antiochia e sua<br />

origem c liistorirc, ccmo 6 que nào conce<strong>de</strong>m ao syno<strong>do</strong> provincial a resoluç%o<br />

d'estc assurnpto, negocio <strong>da</strong> provincin e que ii::o B proprio <strong>de</strong> certa arochia?<br />

Ou nAo sabem, ou estio <strong>de</strong> rn& f6, e cui<strong>da</strong>m que nos outroa haktn uma<br />

ignornncia tenebrosa.<br />

Veja Goschler, Diot. log. cit.


<strong>de</strong>m elles os factos numerosissimos, que revelam ião a suprema-<br />

cia papal mas rcluctancias e opposiçbes a essas pretensões.<br />

A conquista <strong>de</strong>finitiva <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r papal <strong>da</strong>ta súmrntc <strong>do</strong> seculo<br />

ix: atC. lá clle lucta, lucta esforça<strong>da</strong>mente, lucta teimosa, tenaz-<br />

mente, ao seu mo<strong>do</strong>, que 6 unico, exccpcional, caracteristico ria<br />

chroriica <strong>da</strong> humani<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

IIa mesmo aqui 'neste grandc facto uma força occulta, rima<br />

mysteriosa c sombria pre<strong>de</strong>stinaçlio, que dirige o singular appare-<br />

cimento d'csta instituição ingente, assombrosa, qiiasi sobre-hu-<br />

mana; tão poetica, tão puramente cclestial na i<strong>de</strong>a, qiie d'ella<br />

concebem os catholicos, quan<strong>do</strong> preten<strong>de</strong>m vel-a como <strong>de</strong>sabro-<br />

char <strong>de</strong> entre os suaves textos quc nos guar<strong>da</strong>m as palavras amo-<br />

rosas <strong>do</strong> Christo em tão solcmnc momento; e no mesmo tempo<br />

tão carrega<strong>da</strong> <strong>de</strong> &ombras, <strong>de</strong>senhan<strong>do</strong>-se com tão vigorosos traços,<br />

colorin<strong>do</strong>-se dc tno inflamma<strong>da</strong>s cores, nas paginas <strong>da</strong> sua vi<strong>da</strong>,<br />

variamente aprecia<strong>da</strong> pelos pensa<strong>do</strong>res.<br />

Por mais soli<strong>da</strong>mente fun<strong>da</strong><strong>da</strong>s que fossem a virtu<strong>de</strong> c humil-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> bispo <strong>de</strong> Roma, havia alli uma tentaçao, uma irifluericia<br />

superior, que se impunha.<br />

Os papas, naturalmente, por força <strong>da</strong>s circumstanciit.s, ailia-<br />

- vam-se, sentiam-se os <strong>de</strong>fensores <strong>da</strong> gran<strong>de</strong>za tradicional d'aquella<br />

ci<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Roma no sexto seculo junctava 6s memorias grandiosas <strong>do</strong> pas-<br />

sa<strong>do</strong>, ao po<strong>de</strong>r immenso que os seculos lhe tinham conqiiista<strong>do</strong> e<br />

reconheci<strong>do</strong>, a influencia e po<strong>de</strong>rio incipiente <strong>de</strong> uma <strong>da</strong>s mais<br />

notaveis sés <strong>do</strong> catholicismo triumphante ; e por isso mesmo c.sta<br />

Roma se sentia agora humilha<strong>da</strong> por ver outra ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> impe-<br />

rio qriasi a roubar-lhe o primeiro logar.<br />

Oppoz-se, oppoz-se com to<strong>da</strong>s as suas forças, usou <strong>de</strong> todns os<br />

meios, moveu guerras, protestou aos quatro vrntos <strong>do</strong> cCu, nunca<br />

reconheceu rasga<strong>da</strong>mente o man<strong>da</strong><strong>do</strong> d'aqiielle concilio <strong>de</strong> Calce-<br />

<strong>do</strong>nia; mas não logrou <strong>de</strong>struir sua irmã mais nova, porque a<br />

lucta, que encetara, era a lucta com o proprio imperio, o qual<br />

sustentava a Roma Junior com to<strong>da</strong>s as suas forças; e 'riella <strong>de</strong>-<br />

positava o pesa<strong>do</strong> mas glorioso encargo <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r cesariano, que<br />

agora <strong>de</strong>scia o throno <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Romulo para subir e se assen-<br />

tar no <strong>da</strong> <strong>de</strong> Constantino.<br />

Aqui a explicação <strong>de</strong> tu<strong>do</strong>.<br />

'Neste afan, com que Roma se precipita vehemente, colerica,


irascivel em a nova conquista <strong>do</strong> papa<strong>do</strong>, ha como que o saciar<br />

d'estes odios turbulentos que lhe vemos revolverem os padres <strong>de</strong><br />

Calce<strong>do</strong>nia, quan<strong>do</strong> exornam o patriarcha <strong>de</strong> Constantinopla <strong>da</strong>s<br />

maiores honras e distincções <strong>da</strong> egreja.<br />

O oriente oppunha-se-lhe ; escarnecia <strong>do</strong> seu po<strong>de</strong>r unico ; e<br />

roubava-lhe a sddc <strong>do</strong> podcr temporal, que por ventura um dia<br />

ella poddra her<strong>da</strong>r: d por isso que em sua mente nasce a id<strong>da</strong><br />

d'esta conquista ; é por isso que elle se arremessa sobre to<strong>do</strong> o<br />

occi<strong>de</strong>nte, prometten<strong>do</strong> a si mesmo ganhar-lhe o imperio.<br />

A empreza parece impossivel ; mas Roma, ain<strong>da</strong> que em ruinas,<br />

ain<strong>da</strong> que incendia<strong>da</strong> pelos barbaros, d scmpre Homa, um gran<strong>de</strong><br />

nome, uma gran<strong>de</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> sem egual, quasi uma personali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

viva, zomban<strong>do</strong> <strong>do</strong>s seculos, ingente, superior, incomprehensivel,<br />

, a rainha <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.<br />

Deixae passar os tempos, que a conquista ha <strong>de</strong> vencer-se ; e<br />

haveis <strong>de</strong> vel-a, ahi, no seciilo rx, coroan<strong>do</strong> a fronte com a tiara<br />

papal. .<br />

Diz um admiravel historia<strong>do</strong>r, e d uma gran<strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong> : -õ<br />

mun<strong>do</strong> antigo caminhava ent8o entre <strong>do</strong>us abysmos - a auto-<br />

cracia <strong>de</strong> um la<strong>do</strong>, <strong>do</strong> outro a thcocracia.<br />

Se com o estabelecimento <strong>do</strong> imperio em Constantinopla, Roma<br />

guar<strong>da</strong>sse para si o pren<strong>de</strong>r este laço moral <strong>da</strong> uni<strong>da</strong><strong>de</strong> politica,<br />

extinclo ficava este antagonismo, que tem si<strong>do</strong> na antigui<strong>da</strong><strong>de</strong>, e<br />

hoje vai sen<strong>do</strong>, a causa primeira <strong>de</strong> tantas turbações e tenebrosas<br />

luctas.<br />

Mas não; Roma e Constantinopola, ambas foram infieis ti sua<br />

id6a ; ambas se invejaram os proprios patrimonios.<br />

Constantinopola quiz ver d'entre as purpiiras imperiaes e <strong>do</strong> meio<br />

<strong>do</strong>s esplen<strong>do</strong>res orientaes o espectaculo tristissimo <strong>da</strong> consciencia<br />

religiosa esmaga<strong>da</strong> pelo podcr secular ; Roma, que segurava <strong>de</strong><br />

facto entre suas m3os a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> religiosa na consciencia <strong>do</strong><br />

mun<strong>do</strong> christão, cubiyou <strong>de</strong>scobrir <strong>do</strong> alto dc seu throno pol* li- .<br />

mites <strong>de</strong> seu po<strong>de</strong>rio, por confins <strong>de</strong> sua monarcliia theocratica,<br />

os proprios limites e confins <strong>do</strong> universo.<br />

& assim que surgem para aquella o schisma, uma escholastica<br />

risivel, que inva<strong>de</strong> os sumptuosos paços <strong>do</strong>s impera<strong>do</strong>res <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s<br />

esses sophismas que, na expressao <strong>de</strong> Castelar, só a cimitarra turca<br />

pô<strong>de</strong> cortar, -e que para estii riascem e se gravam nas paginas<br />

<strong>de</strong> sua chronica esses nomes gran<strong>de</strong>mente celebres <strong>de</strong> Gregorio-vn,


Innocencio III e Bonifacio VIII, e to<strong>da</strong>s essas facçâes que se<br />

chamaram realismo, gallicanismo, ou que se <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ram com as<br />

leis appelli<strong>da</strong><strong>da</strong>s josepliinas e leopoldinas.<br />

lf3 assim que se levanta esta espantosa contradicçao, que perturba<br />

a mente <strong>do</strong> historia<strong>do</strong>r, <strong>de</strong> ser Constantinopola a ci<strong>da</strong><strong>de</strong> christá<br />

nova, e Roma a velha ci<strong>da</strong><strong>de</strong> paga, e <strong>de</strong> Constantinopola guar<strong>da</strong>r<br />

na renascença a successáo <strong>da</strong> idka antiga, e Roma na e<strong>da</strong><strong>de</strong> media<br />

salvar a continui<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> novo.<br />

IIa um facto, que na opiniso <strong>de</strong> Guizot 6 o facto primordial <strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>sinvolvimento <strong>do</strong> papa<strong>do</strong>. Venci<strong>da</strong>, saquea<strong>da</strong>, queima<strong>da</strong> pelos<br />

Hcrulos, Van<strong>da</strong>los e Go<strong>do</strong>s, ltoma foi a unira ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, que nunca<br />

cahiu inteira e realmente sob o jugo germariico : seule elle resta<br />

romaine après la ruim <strong>de</strong> l'empire romain 1.<br />

A lucta entre os romanos <strong>do</strong> occi<strong>de</strong>nte e os barbaros vence<strong>do</strong>-<br />

res foi mui viva primeiro, latente <strong>de</strong>pois, at8 que se fundiram e<br />

harmonisaram linguas, costumes e religibs.<br />

'No mcio <strong>da</strong>s ruinas <strong>do</strong> imperio <strong>do</strong> occi<strong>de</strong>nte, Roma, como<br />

unico vestigio romano, foi naturalmente o centro moral, o sacra-<br />

rio <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as gran<strong>de</strong>s tradições <strong>do</strong> imperio, e assim algumGi ciillsi~<br />

como <strong>de</strong> <strong>de</strong>positaria <strong>de</strong> uns restos <strong>de</strong> soberania nacional e polilica.<br />

'Neste meio surgiu o papa<strong>do</strong> ; 'nelle cresceu e averiguou.<br />

Por fins <strong>do</strong> scculo v111 este po<strong>de</strong>r esttí proxirno <strong>de</strong> seu maior<br />

esplen<strong>do</strong>r ; a coiisciencia <strong>do</strong>s povos attribue <strong>de</strong> facto ao papa uma<br />

ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira supremacia religiosa sobre to<strong>do</strong>s os outros bispos ; os<br />

peregrinos <strong>de</strong> Roma alcan~avam indulgencias ; estas perigi.iria*iles<br />

eram chama<strong>da</strong>s pie<strong>do</strong>sas e meritorias; e os proprios reis c serihores<br />

ri30 percebiam tributos na passagem d'cstrs homens por suas<br />

terras. O bispo <strong>de</strong> Roma começa agora a iisar e a consrritir qiic<br />

o chamem com titulos revela<strong>do</strong>res <strong>de</strong> superiori<strong>da</strong><strong>de</strong>, e que sú i~ vlle<br />

se dirigiam 3.<br />

1 Giiizot, Histoire <strong>de</strong> 2a ciwilis. en France. Par. 1829, tom. 3.0, 2.0m~ lec.<br />

2 E muito frisante o seguinte exemplo, trauscripto por Guizot no logar já<br />

cita<strong>do</strong>:<br />

Alcuin, favorito <strong>de</strong> Carlos Maano, escrevia em 796 ao papa Leão 3.0: -<br />

Trb-saint père, pontife d2u <strong>de</strong> Dieu, vicaire d ~8 apôtvea, hdritier <strong>de</strong>8 pères,<br />

prince <strong>de</strong> I'Egliae, gardien <strong>de</strong> la se<strong>de</strong> colmbe sane tache ......<br />

Em 794 escrevera este mesmo Alcuin a Adriano 1.O:- Trka.excellentpkre<br />

comme je te reconnainpour vicai7.e dn bienheureux Pierre, prince <strong>de</strong> apôtres,<br />

je te rcgar<strong>de</strong> comme hériticr <strong>de</strong> sa miracztleuse puissnnce.<br />

.A wup sQr, accrescenta Guizot, il ne faut point prendre ces ezpressions<br />

Zs ta Zettre; i2 ne faut point croire que Ze pape pos8éddt dum toute sa gran-


Mas tu<strong>do</strong> isto parte s6 <strong>do</strong> occi<strong>de</strong>nte para Roma; tu<strong>do</strong> isto<br />

cresce vagarosamente, e vai augmentan<strong>do</strong> ate ao seculo IX; v&-se<br />

que nfio podc tar<strong>da</strong>r o apparecimento <strong>de</strong> um titulo juridico, posi-<br />

tivo, legal, em que se baseie il luz <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> esta supremacia já<br />

existente <strong>de</strong> facto no poente <strong>do</strong> orbe christão.<br />

Esta a explicação <strong>do</strong>s factos, que parecem <strong>de</strong>monstrar o direito<br />

papal, existente jli 'neste perio<strong>do</strong>, antes <strong>do</strong> apparecimento <strong>da</strong>s fal-<br />

sas <strong>de</strong>cretaes.<br />

A historia particular <strong>da</strong>s egrejas nacionaes mostra bem, por<br />

outro la<strong>do</strong>, a causa <strong>do</strong>s factos oppostos a estes, e que, em maior<br />

numero, posto que parcialmente esqueci<strong>do</strong>s, parecem contradi-<br />

ctal-os. Eram jli organisa<strong>da</strong>s as egrejas <strong>da</strong> Italia, a hespanhola,<br />

a gallo-franca, e começavam as missões na Germania e entre os<br />

anglo-saxões.<br />

A cgrcja lombar<strong>da</strong>, 6s portas <strong>de</strong> Roma, resistiu sempre acer-<br />

rimamente 6s pretensóes <strong>do</strong>s papas; e 6 só quan<strong>do</strong> Pepino e Carlos<br />

Mag110 <strong>de</strong>stroem os seus reis, se apo<strong>de</strong>ram <strong>de</strong> seus territorios e<br />

d'elles fazem as celebres <strong>do</strong>ações aos papas, que estes começam a<br />

gozar ahi <strong>de</strong> seus privilegios.<br />

Os lega<strong>do</strong>s dc Roma, nas longinquas missões, como que adqui-<br />

riam para esta cgreja os novos fieis; as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s obrigavam-<br />

rios mesmo a insiituir novas dioceses para bem commum <strong>do</strong> cn-<br />

tholicismo, e a dcixar aqui e alcm novos bispos, como outr'ora<br />

acontecera com os apostolos e os prcsbyteros nas primeiras evan-<br />

gelisações.<br />

Mas tu<strong>do</strong> isto eram factos, que as forças <strong>da</strong>s circumstancias ex-<br />

plicavam, e que, nem mesmo assim, se passavam sem reluctancias,<br />

como acima notámos, e como com mais <strong>de</strong> um exemplo podkra-<br />

mos provar.<br />

A anarchia <strong>do</strong> systema feu<strong>da</strong>l, as successivas invasões, as guer-<br />

ras tcrriveis <strong>do</strong>s differcntes povos conquista<strong>do</strong>res entre si, nilo <strong>de</strong>i-<br />

xavam quc o episcopa<strong>do</strong>, aqui persegui<strong>do</strong> pelo paganismo <strong>do</strong>s ven-<br />

<strong>de</strong>ur leporvoir qu'elles luâ attribuent, maia ellea attestent quelle 8uprkmatie ré-<br />

ligibuse, morale, i1 possidd <strong>de</strong>jà <strong>da</strong>na lu penske ddrs peuplea.~<br />

Notemos ain<strong>da</strong> que estes acontecimentos passam-se especialmente <strong>do</strong> se-<br />

culo v111 por <strong>de</strong>ante, e no occi<strong>do</strong>nte só, on<strong>de</strong> a ignorxncia era crassissima en-<br />

tre o povo, os reis, os senhores e na maior parte <strong>da</strong> classe clerical.<br />

As <strong>de</strong>cretaes falsas, 'nesta occasiiio, nrio tar<strong>da</strong>tn urn momento ; em breve<br />

v80 apparecer anonymas e subjugar atrevi<strong>da</strong>s a intelligencie humana por<br />

oito seculos.


ce<strong>do</strong>res, alli entranha<strong>do</strong> no revolutear <strong>da</strong>s pelejas, se oppozesse<br />

a estas practicas abusivas e absorventes <strong>de</strong> sua digni<strong>da</strong><strong>de</strong> e sobe-<br />

rania.<br />

Assim a erecçiio <strong>de</strong> novos bispa<strong>do</strong>s nas miss6es foi sempre um<br />

facto sui generis, excepcional, que a evre'a mais ou menos accei-<br />

b J<br />

tou. On<strong>de</strong>, porém, os papas acharam mais resistcncia, on<strong>de</strong> mais<br />

<strong>de</strong> ama vez se viram obriga<strong>do</strong>s a baixar a fronte e humilhar-se<br />

para po<strong>de</strong>rem conseguir seus intentos, foi nas duas gran<strong>de</strong>s egre-<br />

jas <strong>da</strong>s Hespanhas e <strong>da</strong>s Gallias.<br />

'Nesta ultima, a administração ecclesiastica estava em to<strong>da</strong>s as<br />

suas repartiçóes entregue aos clerigos nacionacs e <strong>de</strong>lega<strong>do</strong>s <strong>do</strong><br />

po<strong>de</strong>r temporal.<br />

Os papas nenhum po<strong>de</strong>r tinham 'nestes ncgocios; e se alguma vez<br />

intervinham, é porque os reis assim o queriam, sen<strong>do</strong> essa interveii-<br />

$80 meramente consultiva ; niio convocavam os concilios nacionaes<br />

<strong>da</strong>s egrjas; não tinham 'nellas po<strong>de</strong>r algum temporal: muito<br />

pelo contrario, precisakam <strong>da</strong> confirmaçlío <strong>do</strong>s impora<strong>do</strong>res para<br />

CIO raro OS<br />

efficazmerite sc a<strong>do</strong>rnarem <strong>do</strong> supremo pontifica<strong>do</strong>, c n-<br />

encontramos confessan<strong>do</strong> a sua submissão As <strong>de</strong>terminaçòclh <strong>da</strong>s<br />

capitulares, leis e <strong>de</strong>cretos imperiaes 1.<br />

Começavam por estes tempos os bispos a ter gran<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r e<br />

influencia na politica <strong>da</strong>s nações ; o esta<strong>do</strong> clerical crescia em ri-<br />

quezas c iriflucncia; os concilios eram importantcs ass_embléas<br />

aristocraticas, e mais <strong>de</strong> uma vez sua voz se elevou contra as pre-<br />

tensbes <strong>do</strong>s papas.<br />

Se, to<strong>da</strong>via, isto se passava nas alturas <strong>do</strong> governo politico e<br />

na aristocracia <strong>do</strong> clero e <strong>do</strong>s senhores, diverso era, como 110th-<br />

mos, o que ac,ontccia entre o resto <strong>da</strong>s populações e na parte<br />

moral e religiosa <strong>da</strong> sua supremacia. Ahi crescia, crescia latente,<br />

progressivameritr, cm esphern unicamente i<strong>de</strong>al, e que a espa<strong>da</strong> <strong>do</strong><br />

seculo não podia tocar sem nefan<strong>do</strong> saçrilegio.<br />

Qiian<strong>do</strong> assim se levanta na consciencia <strong>do</strong>s povos um po<strong>de</strong>r<br />

moral, com tarito vigor, com tanta generali<strong>da</strong><strong>de</strong>, espontaneo, in-<br />

volto em certo terror religioso; não tar<strong>da</strong> muito a <strong>de</strong>scer d'essas<br />

eminencias para tomar um corpo no mun<strong>do</strong> real e objectivo ; e<br />

1 Leão 3.0 escrevia ao impera<strong>do</strong>r :<br />

.Nos si incompetenter aliquid egimne, et in subditis justae legis tramitem<br />

iion conservavimus, vestro ac missorum vestrorum c~incta volumus emeu-<br />

<strong>da</strong>re judicio :.D Caus. 2.", Quest. LI, Can. XLI; e veja-se ain<strong>da</strong> a Distinc. x.


muito mais necessaria se faz esta concretisação, quan<strong>do</strong>, como<br />

'nestas cpochns, a ignorancia pezava nos espiritos obscureci<strong>do</strong>s, a<br />

supcrsti~ao siibstitiiia as crenças puras e intelligentes ; as fórmas<br />

<strong>da</strong> go~ernaq$o politica temporal eram incertas, unicamente pra-<br />

ticas, ohc<strong>de</strong>ccn<strong>do</strong> a um instincto ou h força <strong>da</strong>s circumstancias,<br />

c a idéa dc soberania e a distiricção <strong>do</strong> podcr temporal e espiri-<br />

tual não surgia ain<strong>da</strong> clara na iritelligencia <strong>do</strong>s povos, <strong>de</strong>sacostu-<br />

ma<strong>do</strong>s <strong>da</strong>s theorias.<br />

Em quanto este espantoso phenomeno avultava, moven<strong>do</strong>-se por<br />

si, e crescia <strong>de</strong>smedi<strong>da</strong>mente com o terminar <strong>do</strong> seculo viii; os<br />

papas, na esphera temporal, postoque já meio e indirectamente<br />

conquista<strong>da</strong>, iam soffreii<strong>do</strong> revczes, pacirntes, perseveran<strong>do</strong>, pro-<br />

testan<strong>do</strong> aqui contra as opposições <strong>do</strong>s bispos nacionaes, confes-<br />

san<strong>do</strong> alli a svperiori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s <strong>de</strong>cretos imperiaes, aproveitan<strong>do</strong>-se<br />

<strong>do</strong> referver <strong>da</strong>s paixões <strong>do</strong>s reis para <strong>da</strong>r auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> ao seu po-<br />

<strong>de</strong>r, <strong>de</strong>scasan<strong>do</strong>-os ou casan<strong>do</strong>-os <strong>de</strong> novo, em vi<strong>da</strong> <strong>da</strong>s outras es-<br />

posas ; ingerin<strong>do</strong>-se nas disputas <strong>da</strong>s familias reaes, e procuran<strong>do</strong><br />

conciliar os paes e os filhos, quan<strong>do</strong> a discordia os separava; em<br />

uma palavra, promptos a avançar quari<strong>do</strong> a inadvertencia <strong>do</strong>s se-<br />

nhores e <strong>do</strong>s reis Ihes abria logar on<strong>de</strong> coubesse a sagra<strong>da</strong> mão<br />

poritifical.<br />

Tii<strong>do</strong> isto, porem, se era rcalmcntc existente, nao era ain<strong>da</strong><br />

ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente positivo, e o tempo ?ão corria fagueiro para<br />

abstracções metaplijsicos, nem concepçòes tlieoricas e itlcaes.<br />

Os escriptores falam <strong>da</strong> crença, que vivia na tradição <strong>do</strong>s povos,<br />

<strong>de</strong> que acima <strong>do</strong>s papas liavia alguma cousa <strong>de</strong> mais sancto <strong>do</strong><br />

que a vonta<strong>de</strong> pura d'elles ; - os antigos carioiies e disciplina,<br />

esses echos perdi<strong>do</strong>s <strong>da</strong> voz <strong>do</strong>s padres imita<strong>do</strong>res <strong>do</strong>s apostolos,<br />

tu<strong>do</strong> isso, mas confuso, vago, in<strong>de</strong>ciso e que pesava na,intima<br />

consciencia c lembrança <strong>do</strong>s homens religiosos.<br />

V&-se, sente-se que vai apparecer, ao fin<strong>da</strong>r <strong>do</strong> seculo vrri, um<br />

titulo positivo <strong>do</strong> podcr j6 ganho <strong>do</strong> papa<strong>do</strong> suprcmo; e pcrce-<br />

be-sc lambem que esse titulo, ou não lia dc ter valor, ou ha <strong>de</strong> ir<br />

pren<strong>de</strong>r-sc na alta antigui<strong>da</strong><strong>de</strong>, trazer aos ollios <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, bem<br />

<strong>de</strong>fini<strong>do</strong> e claro, o que o mun<strong>do</strong> entrevia <strong>do</strong> meio <strong>da</strong>s sombras<br />

que lhe envolviam a mente mergulha<strong>da</strong> rias pcriumbras <strong>da</strong> igrio-<br />

rancio, s6 alumia<strong>da</strong> a espaços pela frouxa luz <strong>da</strong> tradição incon-<br />

sistente.<br />

Eis aqui, pois, como não <strong>de</strong>vemos estranhar o <strong>de</strong>pararmos na lei-


tura <strong>da</strong> historia d'estes seculos com factos, que se nos offerecem<br />

contradictorios e iiiconciliaveis ao primeiro aspecto 1.<br />

Vamos agora <strong>de</strong>sinvolver a t,erceira parte d'este capitulo, -<br />

provar como não tomavam parte 'neste objecto os reis, ou impe-<br />

ra<strong>do</strong>res 9.<br />

1 Guar<strong>da</strong>mo-nos para a 2.' parte d'eate trabalho, emquanto ao esta<strong>do</strong> <strong>da</strong>s<br />

relages <strong>da</strong> egrcja hespariliola com a roniana.<br />

2 Bem sabemos n6s que ccrto iiuinero <strong>de</strong> indivicluos nos hão <strong>de</strong> perguntar,<br />

se, no meio <strong>de</strong> tantas duvi<strong>da</strong>s e contradicçtes, a origem divina <strong>do</strong> papa<strong>do</strong> iião<br />

ser8 seguro caminho?<br />

Enten<strong>da</strong>mo.nos.<br />

NBo pscrevemos aqui influi<strong>do</strong>s por crenças catholicas, nem por <strong>de</strong>screnças<br />

acatholicas.<br />

Se fosse um objecto ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente organico e que as leis ecclesiasticas<br />

estabelecessem, esse seria o nosso ponto <strong>de</strong> parti<strong>da</strong> ; mas, longe <strong>de</strong> ser <strong>de</strong>termina~%~<br />

<strong>da</strong> lrgislação canonica, 8 elle um objecto esseiicialmente <strong>do</strong> intimo<br />

fôro, <strong>de</strong> pura crença, pois que se pren<strong>de</strong>, fora <strong>do</strong> campo profano <strong>da</strong> historia,<br />

em factos sobrenaturaes, ao amago mesmo <strong>da</strong> religiko c <strong>da</strong> revelaçào.<br />

NBo escrevemos para catholicos, riem para protestantes : prociiramos sdmente<br />

a pureza <strong>da</strong> legislaçiio catholica <strong>da</strong> egreja christii; e por isso não tocamos<br />

'nesse melindroso objecto, iicm, com o que dizemos, o enppomos oii esquecemos<br />

e contrariamos; porque iião 6 condição sine qua non <strong>da</strong> suprri~iaci;~ papal<br />

<strong>de</strong> origem divina, pertencer-lhe, ou ter-lhe pertenci<strong>do</strong>, mais este oii acliic~lle<br />

direito no capitulo <strong>de</strong> pura disciplina.<br />

Po<strong>de</strong> conceber-se no campo <strong>da</strong>s crençes catholicas a ori ein divina <strong>do</strong> papa<strong>do</strong>,<br />

e ao mesmo tempo admittir-se qiie nos primeiros secu 7 os não pertencera<br />

ao papa, entre outros privilegio.;, o dc que tractamos.<br />

A essencia <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r papal, na opiniào catliolica, não é este ou aquelle direito<br />

<strong>de</strong> rnrra disciplina : 6 um podcr espiritual, 6 cei ta supremacia rnoral,<br />

qiiasi divina, to<strong>da</strong> <strong>de</strong> amor, to<strong>da</strong> <strong>de</strong> paz; nâo <strong>de</strong>stina<strong>da</strong> a seccar as fontes exuberantes<br />

<strong>da</strong> vi<strong>da</strong> local <strong>da</strong> egreja, mas pmposta para as alimentar~l~ conservação<br />

<strong>da</strong> uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> fé e pureza <strong>do</strong>s costumcs e disciplina; e a isciplina<br />

pura, no ohjecto <strong>de</strong> que escrevemos, é exactamente a que apontamos, e ~iào a<br />

que actualiiiente se preten<strong>de</strong> sustentar e 6 lei.<br />

Note-se mais aue não arrrumentamos com simples factos <strong>de</strong>spi<strong>do</strong>s <strong>da</strong> alictori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

legal cia cgreja: -quem assim argume;ta são os prop;ios auctores<br />

ecclesiasticos: baseamos to<strong>da</strong>s as nossas asserpões na letra <strong>do</strong>s proprios CBnoiie.;,<br />

rios dictarnes <strong>da</strong>s epistolas <strong>de</strong>cretaee <strong>do</strong>s papas, e nas pa$nas <strong>do</strong>e escriptos<br />

tlos padres mais veneran<strong>do</strong>s e contemporaneos <strong>do</strong>s acontecimentos, que<br />

iiarrainos c <strong>do</strong>s factos que procuramos <strong>de</strong>scobrir.


Tnmbem aqui não encontramos um texto <strong>de</strong> lei expresso, que<br />

directa e terminantemente resolva o assumpto; mas, note-se, nem<br />

por isso é menos positiva a regra <strong>de</strong> disciplina goveriia<strong>do</strong>ra <strong>do</strong><br />

assumpto.<br />

A legislação canonica tem isto <strong>de</strong> especial: náo offerece este<br />

aspecto geral, syrithetico e sgstematico, que estamos acostiima<strong>do</strong>s<br />

a <strong>de</strong>scobrir nas legislaçòes contemporaneos; C casuistica; os seus<br />

canones fazem-se, nào para crear novas <strong>de</strong>terminaç~cs, mas para<br />

avivar costumes, praxes geraes, com tanta aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong>, porem, como<br />

as mais categoricas leis mo<strong>de</strong>rnas <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> civil.<br />

& a gran<strong>de</strong> influencia tradicional <strong>do</strong>s seculos primitivos, que<br />

mais dc uma vez temos feito notar com insistericia, e que nunca<br />

advertiremos <strong>de</strong> sobejo.<br />

Não hesitou a egreja em se julgar supremo juiz d'estcs negocios,<br />

e E só <strong>de</strong>pois d'rstes tempos que os <strong>de</strong>fensores <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> c pri-<br />

vilcgios <strong>do</strong>s reis, os rcalistas ou regalistas, preten<strong>de</strong>m conferir-lhe<br />

este po<strong>de</strong>r.<br />

Temos mesmo a felici<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> eiicoiitrar bem clara a <strong>de</strong>finiçáo<br />

<strong>da</strong> egrcja 'rieste ponto <strong>de</strong> sua disciplina.<br />

No ncto quarto <strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Calcc<strong>do</strong>nia foi <strong>de</strong>cidi<strong>da</strong> uma ce-<br />

lebre quest'io, em cujo <strong>de</strong>bate os padres estiibelccerum bem ter-<br />

minaritcs os principias relativos a estes objeclos.<br />

A conten<strong>da</strong> <strong>da</strong>va-se entre <strong>do</strong>is bispos, l'liocio <strong>de</strong> Tyro e Eus-<br />

tathio <strong>de</strong> Beryta, Acerca <strong>do</strong> direito metropolitico <strong>da</strong> alta Phe-<br />

riicia.<br />

Acoriteccra que, por uma pragmatica <strong>do</strong> impera<strong>do</strong>r Lelo Be-<br />

rytn, I'ora eleva<strong>da</strong> a metropole civil, preten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> por esta occasiáo<br />

o bispo d'esta ci<strong>da</strong><strong>de</strong> ter si<strong>do</strong> por este facto eleva<strong>do</strong> h digni<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> metropolita.<br />

O conllicto tinha-se aggrava<strong>do</strong> muitissimo, porque Eustathio oc-<br />

cupara logo na quali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> metropolita algumas <strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong><br />

diocrse <strong>de</strong> Phocio.


Para <strong>da</strong>r vali<strong>da</strong><strong>de</strong> a esta <strong>de</strong>smembra~ão, Eustathio preten<strong>de</strong>ra e<br />

obtivera dc Phocio, que este subscrevrsse ft effecliia<strong>da</strong> <strong>de</strong>smembraçao<br />

<strong>de</strong> sua dioccse, <strong>da</strong>n<strong>do</strong> assim uma prova irrecusavel <strong>da</strong> renuricia<br />

<strong>de</strong> seus <strong>direitos</strong>.<br />

Phocio vinha agora dizen<strong>do</strong> que subscrevera contra sua vonta<strong>de</strong>,<br />

coagi<strong>do</strong> c com me<strong>do</strong> <strong>da</strong>s minas, metil mirtarzrm, por temer que<br />

o accusassem <strong>de</strong> <strong>de</strong>sobediencia, ou <strong>de</strong> menos respeito aos man<strong>da</strong><strong>do</strong>s<br />

<strong>do</strong> po<strong>de</strong>r civil.<br />

Phocio, ao que parece, era um pobre homem,.que, ven<strong>do</strong> agora<br />

reuni<strong>do</strong> um concilio ecumenico, se lembrara <strong>de</strong> impetrar <strong>do</strong> impera<strong>do</strong>r<br />

liceriça para submettcr ao juizo <strong>do</strong> concilio as suas meticulosas<br />

pretensões, cui<strong>da</strong>n<strong>do</strong> 16 no intimo qiie o impera<strong>do</strong>r se não<br />

atreveria a combater frente a frente o po<strong>de</strong>r immenso <strong>da</strong> egreja<br />

congrega<strong>da</strong>.<br />

Elabora com effcito um libello, no qual expõe as circumstancias<br />

em que assignara, e leva-o ao impera<strong>do</strong>r, jft <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> reuni<strong>do</strong> o<br />

concilio, para lhe pedir que consentisse na apresentação <strong>do</strong> negocio<br />

6 <strong>de</strong>cisào <strong>do</strong>s pedrcs.<br />

Como o impera<strong>do</strong>r annuisse, Wocio rogou a leitura <strong>do</strong> referi<strong>do</strong><br />

libello na presença <strong>do</strong> concilio.<br />

Eiistathio, a quem não convinha que a questão se resolvesse<br />

pelos padres, porque previa a ~oluçâo que ahi havia <strong>de</strong> obter,<br />

levanta-sc dizen<strong>do</strong> que o impera<strong>do</strong>r, a imperatriz, os juizes e o<br />

sena<strong>do</strong> e os amantissimos padres Leao e Anatolio os tinham<br />

reuni<strong>do</strong> alli para outra cousa, qual era a soluçao <strong>da</strong> questáo <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>finição <strong>da</strong> f6 ; e, accrescentava, ((jubele ante omnia subscriba <strong>de</strong>finiíionem,<br />

ut questio li<strong>de</strong>i abso~uatur '.»<br />

Eustathio, porkrn, que, ao contrario <strong>do</strong> bispo <strong>de</strong> Tyo, crn homcm<br />

<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> astucia, ajunctava 6s suas razbes estas apparentemrnte<br />

francas palavras :<br />

((Quod, si acabava elle, <strong>de</strong> mea quoque causa juòetis nztnc quaeri,<br />

non sum in mora, sed prolinus respon<strong>de</strong>o.))<br />

Os juizes intervCm e man<strong>da</strong>m ler as allcgayõcs dc Phocio ao<br />

impera<strong>do</strong>r.<br />

Feita a leitura, esses <strong>de</strong>lcga<strong>do</strong>s <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r civil perguntam a<br />

1 Nas antece<strong>de</strong>ntes sessões <strong>do</strong> concilio tinha havi<strong>do</strong> grave disputa sobre<br />

este assum to, que mais <strong>de</strong> uma vez fora adia<strong>do</strong>. Veja a aclbo rv d'este<br />

mncil. ~abis, Conc. Genev.] tom. zv, rol. 552.


Eustathio se alguma cousa tinha a dizer contra as razões offereci-<br />

<strong>da</strong>s por Phocio.<br />

nJuhete eum (disse aquelle) dicere utrum secundum canones movet<br />

an secundum IrgesPn<br />

uEgo a regulis non disce<strong>do</strong> (respon<strong>de</strong>u Phocio) nec volo typis Pa-<br />

trum evertere, sed postulo ne jura illa evertantur.))<br />

Disseram ent8o os judices e o sena<strong>do</strong>:<br />

sacrat tis si mo Domino orhis placuit non jiixta sacras litteras (as im-<br />

periaes) aut pragmaticos typos res sanctissimorum Episcoporum proce-<br />

<strong>de</strong>re, sed juxta regulas a sanctis Patribus latas. Omni igitur cessante<br />

e sacris pragmaticis <strong>de</strong>finitione, canones capitulis editi 1egaiitur.a<br />

O syno<strong>do</strong> approva esta sentença, proferin<strong>do</strong> estas palavras:<br />

uContra regulas nihil pragmaticum valebit. RegulaePatriim 1eneant.n<br />

Leu-se então, em cumprimento <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong>s juizes e sena<strong>do</strong>, o<br />

canon iv <strong>de</strong> Nicca, ondc se reconhece a soberania inteira <strong>do</strong> me-<br />

tropolita <strong>de</strong>ntro <strong>da</strong> provincia, e que acaba dizen<strong>do</strong>:<br />

((Firmitas autem eorum quae geruntur per unamquamqueProvinciam<br />

Metropolitano tribuatur Episcopo.))<br />

Acaba<strong>da</strong> a leitura, os padres exclamam :<br />

Unum juxta regulas sanctorum Patrumvoluimus esse Metropolitam.<br />

Petimus ut regulae SS. Patrum teneant.~<br />

Então o bispo Nicopolitano diz :<br />

nTreceutorum <strong>de</strong>cem et octo Patrum Regula unum vult Metropolitam<br />

in unaquaque Provincia, Episcopum esse et siipplicamus, ut etiam niiiic<br />

oirtus Ilegularum in omnia et in omnes Provimias valeat cessantibus<br />

omnibus pragmalicis, quae ex concursatione et ainbitione fiunt, quae-<br />

qiie Ueum a sanclis Patribiis sancita sunt.n<br />

Por ultimo, os magnificentissimos e gloriosissimos juizes revali-<br />

<strong>da</strong>ram a mesma sentença, 'nestes termos :<br />

.Justa regulas trecentorum <strong>de</strong>cem et octo sanctorum Patrum et<br />

jiixta sententiam totius sanctae Sgnodi, Photius revr.rendissimus Epis-<br />

copus Tyriorum Melropolis omnem potestatem ordinandi in universis<br />

civitatibus primae Phoenices Provincia habcbit. Eustathiiis vero rcvc-<br />

6


endissimus episcopus e sacro pragmatico typo nihil ampliiis sihi vin-<br />

dicet, quam reliqui Episcopi ejus<strong>de</strong>m Provinciae et ali his consentia1<br />

sancta Synodiis, e<strong>do</strong>ceat.<br />

Entáo o sagra<strong>do</strong> concilio acclama 'ncstes termos :<br />

aHoc justum judicium, hoc Dei judicium, haec juxta sententia.~<br />

Era j& isto bastante para conhecer as regras <strong>da</strong> disciplina, os<br />

principios regula<strong>do</strong>res d'este objecto ao tempo d'este concilio.<br />

Os padres não hesitam, a sua dccisao 6 prompta, conforme aos<br />

antigos canones, cuja auctori<strong>da</strong>dc <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o primeiro dia elles tinham<br />

expressamente c~rifc~~ild~ 1 - a sua <strong>de</strong>cisão é firme e inabalave1<br />

ria prcscnça mesma <strong>do</strong>s commissarios ou <strong>de</strong>lega<strong>do</strong>s <strong>do</strong> impera<strong>do</strong>r"<br />

os piles sTlo os primcirns, note-se bem, a pcclir que se<br />

leiam os canones, as leis ecclesiasticas, e a pronunciar-se contra as<br />

illaçaes que <strong>da</strong>s prasmaticas, ou sagra<strong>da</strong>s letras impcriacs, o bispo<br />

<strong>de</strong> Ileryta quizera tirar.<br />

Aqui pois to<strong>da</strong> a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> e in<strong>de</strong>pendcncia <strong>da</strong> cgreja ao la<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> irnpcrio civil, o qual não so k o primeiro a reconhecer-lh'a, mas<br />

ate a auxilial-a com sua forca, com seu auxilio externo, para ser<br />

inteira e livre a acçào <strong>de</strong> seu po<strong>de</strong>r e o exercicio <strong>de</strong> seus <strong>direitos</strong>.<br />

Não é só isto porém.<br />

Ao fin<strong>da</strong>r d'estn controversia, Cecropio, bispo <strong>de</strong> Scbastopol,<br />

levantou-se e propoz que, para se nfo repelirem <strong>de</strong> fiitiiro simi-<br />

Ihantes questaes e conflictos, se estatuisse que nrrihum effeito teriam<br />

para a egreja as pragmoticas em <strong>de</strong>trimento <strong>do</strong>s canones.<br />

aEa pragmatica quae in <strong>de</strong>trimentum Canonum a quibus<strong>da</strong>m facta<br />

1 O primeiro canon <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>uia, Q semelhança <strong>do</strong> <strong>de</strong> Nicea, diz :<br />

Regulaa Sanetorum Yatrum per &n@a nunc uaque oo~~cilia constitutaa<br />

proprium robur ottineve <strong>de</strong>crevimue.<br />

2 Os impera<strong>do</strong>res ad ordinandum presidiam Qs vezes em pesson aos concilio~;<br />

na maior parte <strong>do</strong>s casos, porém, enviavam os <strong>de</strong>lega<strong>do</strong>s seus que se<br />

chamavam juizes.<br />

Estes juizes mantinham a or<strong>de</strong>m no concilio, ouviam os padres, coiitavrm<br />

os votos e man<strong>da</strong>vam ern coiifornii<strong>da</strong><strong>de</strong> promulgar os csnoii(+-. Nuncrt elles<br />

intervinham na discussão ; seu officio era merainente externo ; evitar as altercaçòes,<br />

conservar a or<strong>de</strong>m ua discussZo.<br />

Vem d'aqui o appelli<strong>da</strong>r-se Constantiuo communis episcopus remm externamm.<br />

Goetoss a egreja, sem per<strong>de</strong>r sua in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia, acceitava este auxilio<br />

que o esta<strong>do</strong> lhe prcstsva.


sunt in omni Provincia : Canones autern per omnia teneant. Sic 6<br />

et Fi<strong>de</strong>s custoditur et unaquaeque Eccksiu tutum otatum habebit.))<br />

Perguntan<strong>do</strong> os juizes ao syrio<strong>do</strong> se consentiam na opinião <strong>de</strong><br />

Cecrol)io, o syno<strong>do</strong> exclama :<br />

u0nines ea<strong>de</strong>m dicirnus, universa pragmatica cessabunt; Regulae te-<br />

ncant: et hoc a vobis fiat.u<br />

Os juizes dizem entáo :<br />

nEx sententia sanctae Synodi, in aliis quoque omnibus provinciis re-<br />

gulae tcneant. D<br />

n'esta discussão tirou a sua origem o can. XII <strong>do</strong> concilio. Este<br />

cari. é assim :<br />

((Pervenit ad nos quod qui<strong>da</strong>m praetcr ecclesiastica statuta facientes,<br />

convolariint ad potestatcs ct per pragmnticam formam in duo unam<br />

provinciam diviseriint: ita iit ex hoc facto diio rnetropolitani esse vi-<br />

dcantur in una proiincia : statiiit ergo saricta Synodus <strong>de</strong> rtliquo<br />

niiiii ab Episcopis taie tentari ; alioqiiiii, qrii hoc admissus f rit amis-<br />

sioiic gradiis proprii subj'jacebit. Quiiecurnque vcru civita % s litteris<br />

Irriperi~libiis Metropolitnni iiominis honore subnixac sunt. honore tan-<br />

turnmo<strong>do</strong> perfriiantiir et qiii Ecclesiarn ejiis gubernat Episcopus : sal-<br />

tis scilicct verae metropolis privilegiis suis. 10<br />

Em outras contestações hcercn <strong>do</strong> direito metropolitico resol-<br />

vi<strong>da</strong>s nas sessões d'este concilio se a<strong>do</strong>ptam os mesmos principios<br />

e se man<strong>da</strong> ler o mesmo can. iv dti Nicea, assento primeiro e<br />

mais veneran<strong>do</strong> <strong>da</strong> soberania <strong>do</strong>s metropolitas livre e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte<br />

<strong>do</strong> esta<strong>do</strong>.<br />

Os proprios bispos, interessa<strong>do</strong>s nas conten<strong>da</strong>s, si10 os primeiros<br />

a appellar para as regras <strong>do</strong>s sanctos padres e para o antigo cos-<br />

tume.<br />

Na contestação entre Eunomio, bispo <strong>de</strong> Nicomedia, e Anastacio,<br />

1 Chr. Lupus Synod. Gener. ac Provinc. <strong>de</strong>creta et canones, pag. 1, achol.<br />

et not. ad can. XII Caleed.<br />

Este privilegio, purarneute honorifico, que o can. conce<strong>de</strong> aos bispos <strong>da</strong>s<br />

ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s recentcriieiite eleva<strong>da</strong>s á digni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> metropoleu, consistia &ente<br />

no uso <strong>do</strong> titulo <strong>de</strong> metropolita e em occupar nos eoncilios provinciaee o pri-<br />

meiro logar <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> metropolita ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro.


ispo <strong>de</strong> Nicea, este ultimo, convi<strong>da</strong><strong>do</strong> pelos juizes a respon<strong>de</strong>r 6s<br />

allegações <strong>do</strong> lihello <strong>de</strong> Eunomio, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> appellar para ariti-<br />

gui<strong>da</strong><strong>de</strong> e velha disciplina, acaba dizen<strong>do</strong> : - Nec enim ego ali-<br />

quid amplius v010 '.<br />

Apezar, porem, <strong>de</strong> tão claro scr o assiimpto cm face d'estes<br />

canories c lia prcscnça <strong>da</strong> liisloria d'estc concilio, os carionistas<br />

gregos, entre cllcs os celcbres Balsamon e Zoiiaras, crbem que em<br />

vista mesmo d'esses canoncs se <strong>de</strong>scobre que ao esta<strong>do</strong>, por con-<br />

cessão <strong>da</strong> egreja, pertence o direito <strong>da</strong> erecçáo <strong>de</strong> metropoles e<br />

dioceses.<br />

Argumentam com o final <strong>do</strong> can. xvrr, o qual estatue o se-<br />

guinte:<br />

aSi qua vero civitas potestate imperiali novata est, aut si protinus<br />

innovetur, civiles dispositiones et publicas, ecclesiasticarum quoque<br />

parochiarum ordines subsequantur.~<br />

Ao primeiro aspecto este canori parccc contradizer o can. xri<br />

acima transcripto; porque alli se tira aos impera<strong>do</strong>res o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong><br />

crear digni<strong>da</strong><strong>de</strong>s ecclesiasticas por pragmaticas suas, e aqui se or-<br />

<strong>de</strong>na a inteira submissão ao que por auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> imperial se fizer;<br />

alli os padrcs tinham dicto que a pragrnatica não valia contra a<br />

regra; aqui <strong>de</strong>creta-se a superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s civiles et publicas dis-<br />

positiones.<br />

Depois <strong>do</strong> que temos narra<strong>do</strong> <strong>da</strong> historia <strong>do</strong> concilio, se v& bem<br />

jA que este final <strong>do</strong> can. xvrr nóo p6<strong>de</strong> significar o que os cano-<br />

nistas gregos preten<strong>de</strong>m 2.<br />

A antiriomia 6 s6 apparente, como vamos <strong>de</strong>monstrar.<br />

Mais <strong>de</strong> uma vez temos dicto quc as gran<strong>de</strong>s divisões ccclesias-<br />

ticas nóo apparcccram por <strong>de</strong>termiriaçúo meramente ecclesiastica;<br />

as circuinstancias as produziram com sira força in<strong>de</strong>clinavel, e a<br />

egreja as acceitou <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os seus primeiros dias.<br />

É' (pieentão mal se comprchciitlia c~iiantos odios e ambipões<br />

haviam <strong>de</strong>pois gerar estes gran<strong>de</strong>s po<strong>de</strong>res metropoliticos e pa-<br />

triarchaes.<br />

fi que então, in<strong>de</strong>cisa ain<strong>da</strong> em sua fdrrna, como qiir ingeriiia e<br />

pura e sem na<strong>da</strong> comprehen<strong>de</strong>r ain<strong>da</strong> <strong>da</strong>s cousas <strong>do</strong> n~iinclo, a<br />

1 Veja-se a actio xirr.<br />

2 Chr. I~upus. - Byuod. gener. ac provinc. <strong>de</strong>creta ct canona. P. I..,<br />

scliol. et itot. ad can. xvir Chalce<strong>do</strong>u.


egreja, persegui<strong>da</strong> pela i<strong>do</strong>latria, nóo podia passar sem estes gran-<br />

<strong>de</strong>s centros <strong>de</strong> acção, indispensaveis para susteiitar sua attribula<strong>da</strong><br />

vi<strong>da</strong>.<br />

A riqueza, a importancia politica <strong>da</strong>s gran<strong>de</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, metro-<br />

poles <strong>do</strong> imperio, o perigo que ahi corriam os bispos; a urgente<br />

necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> conservar mais atea<strong>do</strong> nesses logares o clarão <strong>da</strong><br />

fé, que chamava assim os mais veneran<strong>do</strong>s padres para essas ca-<br />

<strong>de</strong>iras ; tu<strong>do</strong> concorria para a acceitação <strong>de</strong> uma divisão ecclesias-<br />

tica que coincidia com a politica, e que a ella ia buscar seu nome.<br />

Quan<strong>do</strong> a egreja chega a maior e<strong>da</strong><strong>de</strong> e reflecte no seu orga-<br />

nismo, vê então o peso <strong>da</strong> antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> sagra<strong>da</strong> como que a sellar<br />

para sempre o que 'nesses remotos dias, inconsciente e soffre<strong>do</strong>ra,<br />

<strong>de</strong>ixara que a corrente <strong>do</strong>s acontecimentos architectasse.<br />

NZo hesita um momento; curva a fronte, e a ca<strong>da</strong> instante e nas<br />

suas maiores solemni<strong>da</strong><strong>de</strong>s, ella confessa o respeito pela vetustez<br />

<strong>do</strong>s seus institutos e pela tradição, preciosa fonte d'essas lem-<br />

branças.<br />

* por isso que, on<strong>de</strong> apparecia uma nova ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, ahi um<br />

novo bispo; on<strong>de</strong> tima alterayóo na circumscripyão politica <strong>da</strong>s<br />

provincias romanas, ahi uma modificação na circiimscripç80 eccle-<br />

siastica <strong>da</strong>s provincias <strong>da</strong> ejire:ja; passan<strong>do</strong> os bispos <strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

dcsmcmhra<strong>da</strong>s <strong>de</strong> uma provincia para a jurisdicçtio <strong>do</strong> metropolita<br />

d'aquella, á qual agora na divisão politica pertencia a sua ci<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

O que o can. xvii relembra é isto; o que o can. xii man<strong>da</strong> 6<br />

que, quan<strong>do</strong> as provincias se divi<strong>da</strong>m em duas ou mais por sugges-<br />

tões e machinayões <strong>do</strong>s bispos juncto <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r civil e imperial<br />

para grangearem a honra <strong>do</strong> privilegio metropolitico, taes divisbes<br />

não tivessem senão um mero effeito honorifico, e que os bispos<br />

fossem <strong>de</strong>spoja<strong>do</strong>s <strong>de</strong> sua alta digni<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Este canon revela pois com a maior certeza que o antigo cos-<br />

tume, a regra consuetudinaria <strong>da</strong> disciplina era, que se elevasse<br />

uma nova metropole on<strong>de</strong> o imperio a edificara tambem; porque<br />

vemos por esse can. os bispos pedirem ao po<strong>de</strong>r civil a creação <strong>de</strong><br />

novas metropoles politicas, confia<strong>do</strong>s nas consequencias legaes e<br />

canonicas d'esses factos.<br />

Vê-se tambem profun<strong>da</strong>mente grava<strong>da</strong> a mesma regra no res-<br />

peito que o can. tributa á nova creação <strong>de</strong> metropoles no imperio,<br />

ornan<strong>do</strong> os bispos <strong>da</strong>s novas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s com o nome e simples honras<br />

<strong>de</strong> metropolitas. Porem, notemos ain<strong>da</strong>, o legisla<strong>do</strong>r ecclesiastico


n8o se atreve a annullar, porque o não pó<strong>de</strong>, a obra <strong>da</strong> legislaçiío<br />

civil, a divisão politica nova, embora obti<strong>da</strong> a rogo <strong>do</strong>s bispos; n8o<br />

se abalança a <strong>de</strong>ixar contra o antigo costume uma metropole politica<br />

sem um metropolita ecclesiastico, e ao mesmo tempo não<br />

p6<strong>de</strong> sanccionar os resulta<strong>do</strong>s <strong>da</strong>s ambições <strong>de</strong> seus pontifices.<br />

por isso que, con<strong>de</strong>mnan<strong>do</strong>-os á ignominia <strong>da</strong> <strong>de</strong>posição, respeita o<br />

po<strong>de</strong>r civil e a tradição <strong>da</strong> alta antigui<strong>da</strong><strong>de</strong>, ornan<strong>do</strong> <strong>do</strong> nome e<br />

meras honras <strong>de</strong> metropolita os bispos <strong>da</strong>s novas metropoles <strong>do</strong><br />

imperio.<br />

Longe, portanto, <strong>de</strong> se contradizerem, estes canones explicam-se<br />

mutuamente, presuppõem-se, completam-se.<br />

Na0 se po<strong>de</strong> dizer que <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> can. xvirr a antiga disciplina<br />

tenha fica<strong>do</strong> <strong>de</strong>roga<strong>da</strong>; porque to<strong>do</strong> o espirito <strong>do</strong> can. XII a sup<br />

põe, e suas <strong>de</strong>terminações são geraes pelo respeito para com ella ;<br />

e porque, finalmente, o can. xviir expressamente a revali<strong>da</strong>.<br />

O objecto principal d'este can. não 6 o mesmo, porem, <strong>do</strong> can.<br />

XII.<br />

Tracta-se 'nelle <strong>da</strong> usurpação <strong>da</strong>s cgrejas rusticas pelos bispos,<br />

que assim se occupam inconscientes <strong>de</strong> sua invasão ; e, como estes<br />

actos abusivos, attentatorios <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> epis~opaes~ po<strong>de</strong>m trazer<br />

graves contestaç6cs (como ao tempo d'este concilio mais <strong>de</strong> um<br />

exemplo havia), por isso o can., <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> estabelecer uma prescripção<br />

<strong>de</strong> tres annos, man<strong>da</strong> que qualquer contestaçào, levanta<strong>da</strong><br />

antes <strong>de</strong> <strong>de</strong>corri<strong>do</strong> esse tempo, seja leva<strong>da</strong> ás auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>s ecclesiasticas<br />

que indica. Porem, como dn innovaçào lia categoria politica<br />

<strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s pelo po<strong>de</strong>r civil provinha alteraçõo rias jurisdicções<br />

episcopnes e metropoliticas, era indisponsavel resalvar esta hypothese,<br />

<strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> 'nella inteiro vigor hs regras canonicas <strong>de</strong>pois<br />

<strong>da</strong> modificação 'nas circumscripç6es ecclesiasticas e politicas, oriun<strong>da</strong>s<br />

<strong>da</strong> pragmatica <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r imperial.<br />

Ha uma <strong>de</strong>creta1 <strong>de</strong> Innocencio, <strong>do</strong> anno 40$, anterior ao con-<br />

cilio <strong>de</strong> Calce<strong>do</strong>nia, cujos actos acabamos dc referir, a qual man<strong>da</strong><br />

que as divisões feitas pela egreja se nâo possam mu<strong>da</strong>r pelos prin-<br />

cipes.<br />

«Nam quod sciscitaris, diz, utrum divisis imperiali judicio provin-<br />

ciis ut duae Metropoles fiant : sic duo Metropolitani Episcopi <strong>de</strong>beanl<br />

nominari. Non ergo visum est ad nobilitatem necessitatum mun<strong>da</strong>na-<br />

rum Dei Ecclesiam comrnutari, honoresque aut divisiones perpeti : .


quas pro suis causis facien<strong>da</strong>s duxerit Imperator : ergo secundum p&-<br />

tinum pmvbuiqrum niorm metropolitanos Episcopos wnocnil num+<br />

rari 1.n<br />

De uma outra <strong>de</strong>creta1 <strong>de</strong> Bonifacio r, <strong>do</strong> anno 419, se <strong>de</strong>s-<br />

cobre egualmente bem clara esta disciplina, pois man<strong>da</strong> que ne-<br />

nhum bispo se or<strong>de</strong>ne 'na proviricia coiztempto Metropolitanof.<br />

Pedro <strong>de</strong> Marca, quan<strong>do</strong> rcfcre que Justiniano eleva a arcebis-<br />

pa<strong>do</strong> a ci<strong>da</strong><strong>de</strong> on<strong>de</strong> nascera, escreve que elle « vi<strong>de</strong>tur canones<br />

concilii Calche<strong>do</strong>nensi infregisse » c procura ao mesmo tempo<br />

<strong>de</strong>monstrar que a egreja gallicana nunca consentiu que os reis<br />

erigissem novos bispa<strong>do</strong>s 3.<br />

'Nesse facto mesmo, <strong>de</strong> Justininno esorbitar <strong>de</strong> sua esphera,<br />

não se v& uma inteira infracç30 <strong>da</strong>s leis <strong>da</strong> egreja ; porque, alem<br />

<strong>do</strong> respeito que a egreja sempre mostrou para com os impera<strong>do</strong>-<br />

res, e que lhe garantiu a paz <strong>de</strong> alguns seculos, além d'essa <strong>de</strong><br />

ferencia pelo po<strong>de</strong>r civil, que era como qiie uma compensação <strong>do</strong><br />

auxilio e <strong>da</strong> forca que elle lhe prestava ; a egreja intervem para<br />

sellar com a sua auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> a nova erecção <strong>de</strong> Justiniano: Vir-<br />

gilio, papa, a ratifica 4.<br />

Thomassin apresenta-nos alguns factos, em que parece impe<br />

1 Veja a Decret. XLVI <strong>do</strong> Co<strong>de</strong>s Canon. Ecclesi~ticomm, sive, Co<strong>de</strong>s Canon.<br />

Vetus Ecclesiae Romanae, <strong>de</strong> Dionysio Exiguo, na Bihlioth. Jur. Can.<br />

Veter. <strong>de</strong> Henrique Juetello, 1661. k em resposta a Alexandre, bispo <strong>de</strong> Antiochia.<br />

Veja ain<strong>da</strong> Can. LI Caus. XVI. q. I, e O Cap. xvr <strong>de</strong> major. et obd.<br />

2 Veja a iv Decrrt. d'este papa no mesmo Codigo.<br />

8 Conc. Sacerd. ~t Imper. Lib. 2.0, cap. 9.", n." 1.<br />

4 Veiu prestar grati<strong>de</strong> serviqo ao estu<strong>do</strong> d'este interessante ponto <strong>da</strong> historia<br />

<strong>da</strong> egreja, <strong>da</strong> Iiistoria geral, e <strong>de</strong> um <strong>do</strong>a mais momentosos problemas<br />

<strong>do</strong> nosso tempo -o problema <strong>da</strong>s relaçòes <strong>da</strong> egieja e <strong>do</strong> eatrr<strong>do</strong>, O livro pu-<br />

blica<strong>do</strong> ha poucos aiinos por Rliallia e Potlis- Les canons <strong>de</strong>s saints ApÔtres,<br />

dcs conciles ecttmbiqr~es P/ pror


trar-se o consentimento <strong>do</strong>s reis; mas stío in<strong>de</strong>cisos, obscuros,<br />

limita<strong>do</strong>s em numero. Muitos em contrario nos refere o sabio Pe-<br />

dro <strong>de</strong> Marca na sua bem conheci<strong>da</strong> obra <strong>da</strong> Concordia <strong>do</strong> Sa-<br />

cer<strong>do</strong>cio e <strong>do</strong> Imperio l.<br />

Gonzales lembra, tambem em contrario, que Wamba, rei <strong>do</strong>s<br />

go<strong>do</strong>s, prneier morem el consue~utiinem eccl~siae, man<strong>do</strong>u bispo<br />

para os suburbios <strong>de</strong> Tole<strong>do</strong> a um certo Rstcvão, que fdra bispo<br />

<strong>de</strong> Meri<strong>da</strong>, sem esperar, nem consultar a egreja. No diiotlccimo<br />

concilio <strong>de</strong> Tole<strong>do</strong> este rei vem em pessoa prostrar-se aos 116s <strong>do</strong>s<br />

pndrcs, pedir-lhes perdão para si, e <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong>-lhes á sua vonta<strong>de</strong> o<br />

<strong>de</strong>stino <strong>do</strong> sacer<strong>do</strong>te que fizera bispo.<br />

- (c... Praedictus i<strong>de</strong>m vir, prostratus hiimo, medicamine nostri prae-<br />

cccepti et sibi <strong>da</strong>re veniam petiit et qiiid potissimum operteret fieri <strong>de</strong><br />

apersona ejus qui illic ordinatus fuerat rioslri oris sententia <strong>de</strong>cernen-<br />

adum poposcit 2. n<br />

Isto foi pelos fins <strong>do</strong> vrr seculo.<br />

Éi <strong>de</strong> ver que to<strong>do</strong>s estes exemplos S ~ <strong>do</strong>s O ultimos annos d'cstc<br />

pcrio<strong>do</strong>, cuja historia vamos narrari<strong>do</strong> rio capitiilo <strong>da</strong> discil~lina <strong>da</strong><br />

egreja. Ao mesmo tempo que ella vai pnhan<strong>do</strong> forças e tomnn<strong>do</strong><br />

vulto, o esta<strong>do</strong> vae tambcm constitiiin<strong>do</strong>-se, o turbilhzo <strong>da</strong>s<br />

invasões vai-se dissipan<strong>do</strong> ; o systcma feu<strong>da</strong>l <strong>de</strong>tcrrninan<strong>do</strong>-se.<br />

Mais <strong>do</strong>is seculos, e a egrcja sobrepujar& o esta<strong>do</strong> ; por emquanto,<br />

<strong>do</strong>cil e como que não calciilan<strong>do</strong> as coiiscquencias <strong>do</strong> que<br />

fazia, ella, sem renunciar ao uso <strong>de</strong> seus <strong>direitos</strong>, procurava caminhar<br />

<strong>de</strong> harmonia com elle.<br />

A soberania <strong>do</strong> solo, base <strong>do</strong> feu<strong>da</strong>lismo incipiente d'estes seculos<br />

chama a intervençâo <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> 'nestes negocios ; mas ella<br />

tem uma terrivel rival, porque, emquanto aqiiclla theoria é puramente<br />

practica e rudimentar, a epre-ja está cm to<strong>do</strong> o seti vigor,<br />

com uma organisaçâo robusta, arma<strong>da</strong> <strong>de</strong> iim podcr immenso: tem<br />

os seus <strong>direitos</strong> <strong>de</strong>fini<strong>do</strong>s, baseia-se em um complexo <strong>de</strong> theorias<br />

que os padres elaboraram e os concilios perpetuaram com os seus<br />

canones.<br />

dUion ..... Mais tout eli repottssant l'immiztion esaggkrke <strong>de</strong> l'ktat, <strong>da</strong>na les af-<br />

faires <strong>de</strong> l'kglise, le clerge s'rst approprid.francheme71t pktsieure lois civiles<br />

exeellentes, surtout celle relalivc u la famille ....... V<br />

1 Vet. et Nov. discipl. Lib. 2.0, CRP. 4.<br />

2 Gonzales, Comm. perpet. Tom. v, tit. XXXIII, cap. 1.0, n.O 4.


Esta a explicaçâo <strong>da</strong>s contradicções nos vestigios historicos <strong>da</strong>s<br />

novas creações <strong>de</strong> bispa<strong>do</strong>s.<br />

Devemos notar, porem, um singular <strong>de</strong>feito <strong>de</strong> argumentação<br />

que encontramos nos escriptores. Como acabamos <strong>de</strong> ver, quan<strong>do</strong><br />

elles narram os factos que revclam a intervenção <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>, dizem<br />

to<strong>do</strong>s que era uma infrocç30 <strong>da</strong>s leis canonicas contra o costume<br />

r disciplina <strong>da</strong> egreja ; mas, quaii<strong>do</strong> referem aquelles que <strong>de</strong>sco-<br />

brem a supremacia papal 'nestes objectos, longe <strong>de</strong> Ihes imputar<br />

uma infracçao, acceitam-nos para base <strong>de</strong> seus argumentos.<br />

Em um e outro caso ha eguaes razòes para os classificar <strong>de</strong><br />

abusos e infracções ; que em ambos elles ha a legislaç3io ecclesias-<br />

tica bem positiva e clara.<br />

Nõo insistimos mais sobre este ponto. Nâo 6 contan<strong>do</strong> o nu-<br />

mero <strong>de</strong> factos como quem conta votos, que se resolvem as ques-<br />

tòcs dc in<strong>da</strong>gaç8o historica. Quan<strong>do</strong> a legislaçao se expressa tão<br />

positiva e appella tão vivamente para as regras c antiga disciplina,<br />

n:~o s'io essas paginas <strong>de</strong> Thomassin, sempre inconsistentes, que<br />

nos mostram a revogação <strong>da</strong> disciplina ecclesiastica.<br />

O ultimo seculo d'este perio<strong>do</strong> 6 como que vacillante e in<strong>de</strong>-<br />

ciso, porque, acima o dissemos, 'nelle palpita um po<strong>de</strong>r já real-<br />

mente existente e que procura a vi<strong>da</strong> legal, um titulo que o jus-<br />

tifique juridicamente aos olhos <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> ; e ao mesmo tempo<br />

esboça-se confusa a theoria <strong>de</strong> uma nova constituiçâo politica <strong>do</strong><br />

po<strong>de</strong>r temporal <strong>da</strong>s nações <strong>da</strong> Europa.


CAI'ITULO IV<br />

As falsas <strong>de</strong>cretaes *<br />

Apparecimento <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretam <strong>de</strong> Isi<strong>do</strong>ro. - Es antosa auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> com que se iiiipòem.<br />

-Dura oito seculos a erenca nas falsas lecretaee. - A reforma ealliolica <strong>do</strong> se-<br />

culo xvi nao podia uri6càr a disciplina.-E completameote nllera<strong>da</strong> em suas<br />

bases. - Textos <strong>da</strong>s Pdlsae <strong>de</strong>cretaes relativos ao nosso objecto.- Uma opiriiSo <strong>de</strong><br />

Tbomassiu.- Grave diffieul<strong>da</strong><strong>de</strong> no Capitulo <strong>da</strong> disciplina <strong>da</strong> egreja.<br />

Entre os fins <strong>do</strong> seculo vIir e mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> seculo IX, apparecc<br />

ria egrcja Occi<strong>de</strong>ntal uma nova collecç8o latina <strong>de</strong> canones e <strong>de</strong>-<br />

cretaes.<br />

1 NPo se sabe a epocha precisa <strong>do</strong> apparecimcnto dlesta notavel collecçPo<br />

<strong>de</strong> canones.<br />

Aguirre assigiiala <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o comep <strong>do</strong> septimo at8 ao fim <strong>do</strong> nono o espaço<br />

provavel <strong>da</strong> sua publicaç&o.<br />

Hincmar, arcebispo <strong>de</strong> Reims, em um opusciilo coritra seu neto, no cap. 24,<br />

cita<strong>do</strong> pelos canonistns fala <strong>do</strong> ~Iibro collcçíaritrn Epistolarum ab I<strong>do</strong>ra,<br />

quem <strong>de</strong> Hispania aallatum Riculphus Episcopits 17logicntinits in hujuemodi<br />

rimt et in Capitulis Ilegni studiosus, obtinuit, et ietas regionee ez iUo replM<br />

fecit..<br />

Sabe-se que a este Richolf siicce<strong>de</strong>u em 786 Lullo; e por conseguinte que<br />

aquella collecção existia jh no ultimo quartel <strong>do</strong> seculo viir.<br />

Como ~ahisse <strong>da</strong> Hespanha, e tivesse por nome <strong>de</strong> auctor o nome <strong>de</strong> Isi-<br />

<strong>do</strong>ro, cui<strong>do</strong>u-se, e o proprio Hincmar foi o ~rimeiro a crel-o, que era <strong>de</strong>vi<strong>da</strong><br />

so celebre bispo <strong>de</strong> Sevilha.<br />

Como porém 'nesta collecçb apparecem <strong>de</strong>terminaçóes <strong>de</strong> concilios, con-<br />

voca<strong>do</strong>s <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> morte d'este bispo, as opiiii0es divi<strong>de</strong>m-se, qliercn<strong>do</strong><br />

uns que <strong>de</strong> outro Isi<strong>do</strong>ro se falla, pensan<strong>do</strong> outros, como o car<strong>de</strong>al Aguirre,<br />

que esses canones foram accrescenta<strong>do</strong>s posterimente 4 primitiva collecçlo<br />

<strong>do</strong> aiictor <strong>da</strong>s Etymo1og;aa.<br />

Geralmente chama-se lhe a collecçfio <strong>de</strong> Isi<strong>do</strong>ro Merca<strong>do</strong>r, -porque se<br />

encontram, no começo <strong>da</strong> prefação <strong>de</strong> um <strong>do</strong>s exemplaras mais antigos, qiie<br />

existe em Roma, as expressões ~Isi<strong>do</strong>rus mercator ser- ChTisti, leclori con-<br />

eervo SUO......^<br />

Pedro <strong>de</strong> Marca lembra que seria Isi<strong>do</strong>rus Prccntor e n&o Mercator, por-<br />

que d'aquelle titulo usavam os bispos em sigii;il <strong>do</strong> humil<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

David Bloii<strong>de</strong>l, o distincto critico <strong>da</strong>s collecgGes <strong>do</strong> direito ecclesiastico,


O pobre Dionysio Esiguo, que gastara os annos e abreviára a<br />

vi<strong>da</strong>, revolven<strong>do</strong> os archivos <strong>da</strong> egreja romana, cobrin<strong>do</strong>-se <strong>da</strong><br />

poeira suffoca<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> muitos seculos, náo encontrára em premio<br />

<strong>de</strong> suas fadigas os monumentos vetustissimos, preciosos, os mais<br />

veneran<strong>do</strong>s monumentos que o auctor <strong>da</strong>s novas <strong>de</strong>cretaes tivera<br />

a felici<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobrir. A siia collecção, fructo <strong>de</strong> tantos traba-<br />

lhos, que viera repetir ti egreja latina os sagra<strong>do</strong>s canones apos-<br />

tolicos, quasi <strong>de</strong>sconheci<strong>do</strong>s ate ent80, ia agora para sempre per-<br />

<strong>de</strong>r a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> que tão justamente alcançára.<br />

& que a nova collecçâo illustrava-sc na primeira pagina com<br />

um nome respeita<strong>do</strong> em to<strong>do</strong> o orbe catholico - o nome <strong>de</strong> Isi-<br />

<strong>do</strong>ro bispo, o sabio e virtuoso sacer<strong>do</strong>te <strong>de</strong> Sevilha.<br />

k que a nova collecção offcrecia ao mun<strong>do</strong> christão as <strong>de</strong>cre-<br />

taes <strong>do</strong>s primeiros papas, as mais sanctas <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s, mais respeita-<br />

vcis <strong>do</strong> que os proprios concilias geraes <strong>do</strong> iv c seguintes secu-<br />

10s; e o muii<strong>do</strong> absorto rojava a fronte por terra, confessan<strong>do</strong> o<br />

erro em que vivkra, porque essas <strong>de</strong>cretaes mostravam-lhe que a<br />

disciplina que julgára ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira e pura era falsa e viciosa; qiie a<br />

tradiçáo que tanto reverenciára era uma voz mentirosa que o fi-<br />

zera durante oito seculos falsificar as palavras <strong>do</strong> Christo, os di-<br />

ctames <strong>do</strong>s apostolos e as <strong>do</strong>utrinas <strong>do</strong>s padres.<br />

Subitamente, Roma, cuja auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> suprema era geralmente<br />

contesta<strong>da</strong> em materias disciplinares, surge immensa, cheia <strong>da</strong> luz<br />

pura e sancta <strong>da</strong> antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira, eleva-se até ao firmamento,<br />

pren<strong>de</strong>-se 'nelle e 'nelle brilha como uma <strong>de</strong> suas mais formosas<br />

estrellas.<br />

A christan<strong>da</strong><strong>de</strong> prostra-se, a<strong>do</strong>ran<strong>do</strong>-a; o episcopa<strong>do</strong> hesita um<br />

preten<strong>de</strong> que o auctor d'esta collecgllo não era hespanhol mas gemano-<br />

franco.<br />

Muito se tem discuti<strong>do</strong> a falsi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes e outros <strong>do</strong>cumentos d'eata<br />

collecçlo; e hoje, pragas critica esclareci<strong>da</strong>, existe elabora<strong>do</strong> catalogo <strong>da</strong>s<br />

<strong>de</strong>cretaes apocryphas.<br />

Questionam tambern os escriptores sobre e6 esta compilaçlio foi forja<strong>da</strong>, ou<br />

nllo, para favorecer os interesses <strong>da</strong> egreja romana; ou se foi pie<strong>do</strong>sa a fal-<br />

sifica* <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes.<br />

A auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> d'esta collecção foi immeusa, porque inui gran<strong>de</strong> era ain<strong>da</strong><br />

o respeito pela antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> e pela tradição, e porqiie os papas a recommen-<br />

<strong>da</strong>vam fervorosamente.<br />

Nicolau I <strong>da</strong> em suas epistolas um exemplo bem claro <strong>de</strong> quanto foram<br />

<strong>de</strong>fendi<strong>da</strong>s pelos papas estas <strong>de</strong>cretaes, eapecialmente a respeito <strong>do</strong> julga-<br />

mento e <strong>de</strong>posição <strong>do</strong>e bispos. A exaltação <strong>de</strong> Nícolau ao throno <strong>de</strong> S. Pedro<br />

teve logar no ano <strong>de</strong> 858.


momento, levanta o olhar altivo para aquelle colosso, que pensa<br />

phantasmagorico; mas aquella luz offusca-lhe a vista com seu .<br />

clarao, nào sei se satanico se divino; quer protestar contra a nova<br />

soberania; mas acinia <strong>de</strong> sua voz, elle ouve, troan<strong>do</strong> nos ceus, a voz<br />

verierari<strong>da</strong> <strong>do</strong>s primeiros papas, cujas sombras lhe apparccem co-<br />

Ijertas com a çaridi<strong>da</strong> turiica, saliiri<strong>do</strong> <strong>da</strong>s catacumbas, orna<strong>do</strong>s <strong>da</strong>s<br />

palmas <strong>do</strong> martyrio e <strong>do</strong> esplen<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s sanctos. Então o proprio<br />

episcopa<strong>do</strong> rola ate os pks <strong>do</strong> pontifica<strong>do</strong> supremo <strong>de</strong> envolta com<br />

to<strong>da</strong> a egreja, com to<strong>do</strong> o edificio singelo, mas grandioso, mas<br />

purissimo, mas sancto, <strong>da</strong> antiga disciplina. 1<br />

E tu<strong>do</strong> isto fdra um logro, o embuste vilissimo <strong>de</strong> um homem<br />

infame, que escond6ra o seu nome abjecto sob o puro nome <strong>de</strong><br />

um varão respeitavel, a quem assim imputava um <strong>do</strong>s maiores cri-<br />

mes, um <strong>do</strong>s factos mais nefan<strong>do</strong>s, que a historia <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> estre-<br />

mece <strong>de</strong> narrar!<br />

Durante oito seculos durou esta comedia; durante oito secu-<br />

10s se accreditou na pureza <strong>da</strong>s inventa<strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes.<br />

Taes são os tristes effeitos <strong>da</strong> ignorancia!<br />

Foi preciso que a egreja se visse <strong>de</strong>spe<strong>da</strong>ça<strong>da</strong> pelo seu mais<br />

cruel schisma ; que a intelligeiicia <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> resuscitasse ; que fosse<br />

indispensavel para certa seita provar a vani<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s alicerces <strong>da</strong><br />

gran<strong>de</strong> supremacia romaria; foi preciso tu<strong>do</strong> isto, tantos seculos,<br />

1 Hincmar e quasi to<strong>do</strong>s os bispos gauleees fizeram viva opposigo hs <strong>de</strong>cretaes.<br />

f1i:icmar & urli <strong>do</strong>s bultos mais graridiosamente esculpi<strong>do</strong>s <strong>do</strong> episcopa<strong>do</strong><br />

d'estes teiripos <strong>de</strong> perdiçiio e igiioraricia. Homem, mui sahio, couhece<strong>do</strong>r<br />

<strong>da</strong> antiga disciplina, elle fez urna guerra tenaz As <strong>de</strong>cretaes <strong>de</strong> Isi<strong>do</strong>ro;<br />

uso que po<strong>de</strong>sse pro\.ar e coiivencer-se <strong>da</strong> falsificação d'aquelles <strong>do</strong>cuineiitos,<br />

que Ih'o uBo c(~riseiitiaui as luzes <strong>de</strong> seu tempo; mas porque sente, corno que<br />

adiviiilia que ha alli uma força infernal acoberta<strong>da</strong> corn as puras vestes <strong>do</strong>s<br />

piinieiros e mais ~ltiitos bispos <strong>de</strong> Roma. As falsas <strong>de</strong>cretaes rebaixavam o<br />

opiscopa<strong>do</strong>, roul?avain-lhe a soberania e a iu<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ucia; é ver<strong>da</strong><strong>de</strong>; - mas<br />

nio 8 86 por isto que este lioiriein combate a força e auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> legal <strong>da</strong><br />

collecçâo <strong>do</strong> pretendi<strong>do</strong> Isi<strong>do</strong>ro; 6 priiicipalmeiite contra o monstruoso capitulo<br />

<strong>da</strong>s appeilaçòes para o papa, que elle emprega seus esforços, bem ven<strong>do</strong><br />

as fui:csta~i e tristiusimas coiisequericias d'essir disciplina inaudita. Hincinar<br />

dizia que a nova collecção, ou codigo, nào <strong>de</strong>via ter força <strong>de</strong> lei,-porque, não<br />

estail<strong>do</strong> grau<strong>de</strong> numero <strong>de</strong> suas <strong>de</strong>cietaes no Co<strong>de</strong>z Canonum, nao podia ella<br />

inverter a disciplina estabeleci<strong>da</strong> por tantos <strong>de</strong>cretos poritificios e tão voneraveis<br />

cariones. Na<strong>da</strong> couseguiu to<strong>da</strong>via.<br />

Esse homem, tie era mui illustra<strong>do</strong>, nlo se podia porem chamar um canonista;<br />

longe, bem loiige d'isso. A cultura <strong>de</strong> sua intelligeucia era maia pagii<br />

e litterata, <strong>do</strong> que cliristrt e theologiça, e por isso o brilho <strong>de</strong> seu taleiito tem<br />

muitas vezes estes reflexos <strong>da</strong> fraqueza e corrupção <strong>do</strong> ultimo perio<strong>do</strong> <strong>da</strong> litteratura<br />

romana.


tantas luctas, tantos crimes, tantas calami<strong>da</strong><strong>de</strong>s, para se conhecer<br />

e <strong>de</strong>scobrir a hlsificaçào d'aquelles <strong>do</strong>cumentos.<br />

Começa<strong>do</strong> este trabalho pcios protcstantes, que iriterromperam<br />

ao celebre Erasmo para lhe tomar a palavra e <strong>de</strong>sinvolver a idha,<br />

que elle se não atrevia a puhlicar ; a propria egreja catholica teve<br />

<strong>de</strong> man<strong>da</strong>r corrigir as suas volumosas collecções, to<strong>da</strong>s vicia<strong>da</strong>s<br />

por aquelle monstruoso e infernal parto <strong>de</strong> um homem ignora<strong>do</strong><br />

e amaldiçoa<strong>do</strong> pela posteri<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Apezar <strong>de</strong> tu<strong>do</strong>, os <strong>de</strong>feitos radica<strong>do</strong>s pelas <strong>de</strong>cretaes perma-<br />

neceram; existem ain<strong>da</strong> hoje, e s6 Deus sabe quan<strong>do</strong> soará a sua<br />

ultima hora.<br />

Quan<strong>do</strong> se fez a reforma catholica <strong>do</strong> seculo xvr, esta mu<strong>da</strong>nça,<br />

esta purificação <strong>da</strong> disciplina era impossivel, porque a reforma fa-<br />

zia-se em opposição h recente reforma protestante, que atacára a<br />

supremacia papal com esse mesmo <strong>de</strong>feito.<br />

Alguma cousa se conseguiu, mas não se quiz tocar no coração<br />

mesmo <strong>do</strong> schisma: por ventura teria si<strong>do</strong> possivel uma reconciliação.<br />

Aqui, como em tu<strong>do</strong>, se revela a fraqueza <strong>da</strong> nossa condiçiio: o<br />

<strong>de</strong>stino, como diz um bello pocta francez, dh uma hora por scculo<br />

á humani<strong>da</strong><strong>de</strong> para se regenerar: esta hora b uma revolução, e os<br />

homens pe~<strong>de</strong>m-na a <strong>de</strong>spe<strong>da</strong>çarem-se mutuamente; entregam á<br />

vingança a hora <strong>da</strong><strong>da</strong> por Deus á regeneração e ao progresso.<br />

E se ao menos nús vissemos sómente a perpetuação <strong>do</strong> mesmo regi-<br />

men cffectua<strong>da</strong> pelas riovns <strong>de</strong>cretaes, que nas falsas fossem beber<br />

o seu cspirito, comprchcndiamos facilmerite este esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> cousas;<br />

mas é que temos <strong>de</strong>para<strong>do</strong> com escriptores, que continuam hoje a<br />

citar aquelles <strong>do</strong>cumentos apocryphos, e que, não satisfeitos ain<strong>da</strong>,<br />

nos v&m dizer que foi proui<strong>de</strong>ncial o apparecimento <strong>da</strong>s falsas <strong>de</strong>-<br />

cretaes i !<br />

k mui certo o que diz um <strong>do</strong>s primeiros philosophos <strong>do</strong> seculo<br />

passa<strong>do</strong>: uTout abus s'éternise <strong>de</strong> lui-rn4me; c'ca; l'écurie <strong>de</strong><br />

Augias; i1 faut un Hercule pour la nett0yer.r<br />

1 Bergier- Diction. ( 7 ~ Tl,éolo$r, vb. Ddcrhtales.<br />

Na Enc?/clopedia Catholica este facto tem, albm <strong>de</strong> um caracter benefico<br />

em seus eEeitos, a ~pparencia <strong>de</strong> ingeuua ignoraricia em sua origem. L)]z-se<br />

ahi, vb. décrétales-e ... celui qi~i Zrs a fabrigiiéeo n'a Été susriti ,li I,u~é Par<br />

les paprs; i1 lea a faites en Esl~agnc et non en lialie; i1 a vortl~l c.'layer par<br />

<strong>de</strong> faus ttlre.9, um jurispru<strong>de</strong>~rce étnblie f~rrl~it lui conme tous @s rornanc8er8,<br />

il a prêtd am per8onnayes Jea quatres prel,&iers siècles <strong>de</strong> Z'hVjlioe leo id<strong>de</strong>8<br />

et le langage du v111 siècle. .. c'a Ctk Z'ouz'rage <strong>de</strong> lu ndcessitk plutôt que <strong>de</strong>


A antiga disciplina foi inteiramente altera<strong>da</strong> por estas constituições<br />

e falsas <strong>do</strong>cretaes attribui<strong>da</strong>s aos primeiros papas.<br />

O primeiro perio<strong>do</strong> <strong>da</strong> historia <strong>da</strong> legislação ecclesiastica est8<br />

aqui irremediavelmente assignala<strong>do</strong>. 1<br />

Não cabe no plano d'cste trabalho <strong>de</strong>senvo1;er o quadro <strong>do</strong>s<br />

effeitos perniciosissimos que trouxe para o futuro <strong>do</strong> catholicismo<br />

este singular acontecimeitto.<br />

Vamos sómente apontar a fonte d'on<strong>de</strong> dimanou no objecto <strong>de</strong><br />

que nos occupamos a alteração <strong>da</strong> disciplina.<br />

O primeiro <strong>do</strong>cumento esth em Graciano, Dist. ~xxx can. 2.'<br />

]E: uma pretendi<strong>da</strong> epistola <strong>do</strong> papa Clemente, que diz assim:<br />

aIn illis vero civitatihus, in quihiis olim apud ethnicos primi Flamines<br />

eorum, atqne primi legis <strong>do</strong>ctores erant, episcoporiim primales poni<br />

vel patriarchas B. Petriis praecepit, qiii reliquorum episcoporiim causas<br />

et maiora, quoties neccsse foret, negotia in fi<strong>de</strong> agitarent, et pau10<br />

post.<br />

In illis autem civitatibus, in quibus dudum apud praedictos erant archiflamines<br />

quos tamen minores tenebant, quam memoratos primates,<br />

archiepiscopos institui praecepit, et infra.<br />

In singulis vero reliqiiis civitatihiis sirigiilos et non hinos, vel ternos<br />

aut plures. episcopos constit~ii prarcepit, qiii non primatiim, aut archiepi~~Op0riiin.<br />

arit metropolitanorum nomine, quia matres civitatum<br />

non tenent; sed episcoporiirn tantum vocabulo potirentur; qiioniam nec<br />

intrr ipsos apostolos par institiitio friit, sed unus omnibus pfaefuit.n<br />

O segiin<strong>do</strong> encontra-se na Dist. xcrx can. 4.O I? uma epistola<br />

2." <strong>de</strong> Ariacleto, papa, aos bispos <strong>da</strong> Italia, Acerca <strong>da</strong> ohediencia<br />

<strong>de</strong>vi<strong>da</strong> aos primazes e patriarchas, e <strong>do</strong> logar on<strong>de</strong> se <strong>de</strong>vem erigir<br />

estas digni<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

Transcreveremos s6 o principio, pois A mui extensa :<br />

aprovinciae multo antc Christi adventum tempore divisae siint ma-<br />

l'ambition ... ce pouvoir, quoique portd Ir l'ezcès et <strong>de</strong>venu abuaiy, 0 fait beazc<br />

coup plus <strong>de</strong> I~ien, que <strong>de</strong> mal.<br />

Christiano Lupo escreve que ao fin<strong>da</strong>r <strong>do</strong> seculo viri se achava muito <strong>de</strong>-<br />

primi<strong>da</strong> a majesta<strong>de</strong> <strong>da</strong> sB apoatolica nas Gallias e Gerrnania pelos francos,<br />

na Hespanha prilos sarracenos, e lia Italia o Illyria pelos lórnbsr<strong>do</strong>s e gregos,<br />

e que por isso um pie<strong>do</strong>so chriatiío, pius ji<strong>de</strong>lis, forjára etltas epistolas <strong>de</strong>cre-<br />

taes, attribiiiii<strong>do</strong>-as virtuosamente aos primeiros papas. Scholion ao can. 1x1<br />

<strong>do</strong>s Ih'otatwr S. Gregorii vii Potztificia.<br />

I 1 Como veremos, 6 especialmente <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seaulo xx qiie comep a altera-


xirna ex parte, et postea ab Apostolis, et B. Clemente prae<strong>de</strong>cessore<br />

nostro ipsa divisio cst renovata. .. .u<br />

t<br />

O terceiro <strong>do</strong>cumento é a epistola <strong>de</strong> Aniceto, papa, aos bispos<br />

<strong>da</strong>s Galiias a respeito <strong>do</strong> nome <strong>de</strong> primaz e <strong>de</strong> quem po<strong>de</strong> só usar<br />

d'este titulo. Vem na llist. xczx. can. 2.O, que diz :<br />

~Nulli archiepiscopi primates vocentur, nisi illi qui primas pars tenent<br />

civitates quarum episcopos Apostoli, et successores Apostolorum<br />

regulariter patriarchas et primates esse constituerunt: nisi aliqua gens<br />

<strong>de</strong>inceps ad fi<strong>de</strong>m convertalur, cui necesse sit propter multitudinern<br />

eorum primatem constitiii.u<br />

O pontifica<strong>do</strong> <strong>de</strong> Anacleto 6 <strong>do</strong> anno 78, o <strong>de</strong> Clemente, <strong>de</strong> 9i,<br />

ção nas leis disciplinares, ten<strong>do</strong> por base a eollec@o <strong>de</strong> Isi<strong>do</strong>ro. Os pontos<br />

em que principalmente consistiu esta mu<strong>da</strong>np siio os seguintes :<br />

Convocação <strong>do</strong>s concilias - As falsas <strong>de</strong>cretaes não os permittem sem or<strong>de</strong>m<br />

dimaiia<strong>da</strong> <strong>do</strong> papa, ou sem o consentimento d'elle.<br />

Julgamento <strong>do</strong>s bispos - Pelas fslsas <strong>de</strong>cretaes s6 o papa os po<strong>de</strong> julgar. E<br />

<strong>do</strong>s principio8 mais repeti<strong>do</strong>s iiestas epistolas apocryphas.<br />

Transferencia <strong>do</strong>s bispos-As <strong>de</strong>cretaes <strong>de</strong> Isi<strong>do</strong>ro si, vêern o papa investi<strong>do</strong><br />

d'esse po<strong>de</strong>r.<br />

Erecçüo <strong>de</strong> ~bouos bispa<strong>do</strong>s<br />

&<strong>da</strong> tr1ri6o e dtviaEio i Segun<strong>do</strong> essas <strong>de</strong>cretaes s6 ao papa pertence<br />

Creap?io <strong>de</strong> patriarchai, me- / este direito.<br />

tropalitas e primazes<br />

Appellaçües para o papa - Por estas <strong>de</strong>cretaes, os bispos, qualquer padre,<br />

ern uma palavra, qualquer pessoa <strong>de</strong> qualquer parte <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong><br />

se cui<strong>de</strong> vexa<strong>da</strong> por uma auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> ecclesiastica, ou civil, po<strong>de</strong> appellar<br />

para o papa!<br />

Anacleto, Sixto i, Sixto 11, Fabiano, Cornelio, Victor, Zepbirino, Marcello<br />

e Julio, to<strong>do</strong>s estes nove papas, to<strong>do</strong>. estes martyres veneran<strong>do</strong>s, têm em<br />

sua bocca as falsas palavras <strong>de</strong> Isi<strong>do</strong>ro para suetentar este abuso espantoso<br />

! Qual seria o interesse d'este pie<strong>do</strong>so embusteiro? Ha alguem<br />

que acredite que a reforma, ao menos neste ponto, se fizesse sem'm et<br />

sine sensu? ha alguem que acredite que esta disciplina <strong>da</strong>s appellaçcies<br />

ao p:ipa cra a discipliria geral e coiisiietudiniiria c qrie pedia assini iinperiosarnentc<br />

qiie, a <strong>de</strong>~peito <strong>do</strong>s ciiiioriea, se passasse a eecripto ? h'o<br />

tempo <strong>de</strong> S. Pabiniio e <strong>de</strong> S. Cornelio vivia S. Cypriano, que escreveu<br />

contra as appellaç0es ao papa. No tempo <strong>de</strong> Sancto Agostiuho, no seciilo<br />

v, n egreja <strong>de</strong> Africa utto recebia taes iippellnçGes, e at8 ao ix seculo<br />

mui poucos exemplos se encoritram d'esta disciplina, e não ser <strong>da</strong><br />

parte <strong>do</strong>s gran<strong>de</strong>s metropolitas e etn raros casos.<br />

As irnmuni<strong>da</strong><strong>de</strong>u e exempPes <strong>do</strong>s clerigos a respeito <strong>do</strong>e po<strong>de</strong>res civis v&m<br />

tarnbern aqui beber a sua origem.<br />

Veja mais extensamente sobre este objecto os excellentes - ~ 8cmr8 sur<br />

Z1lIistoire ecclésiastiquc <strong>do</strong> abba<strong>de</strong> Peury especialmente o 4.0- e O que a<br />

respeito d'elles escreve Voltaire nas MdZarrges Hbtoriques, tom. 1.0, wp. 3.0.


e o <strong>de</strong> Aniceto <strong>de</strong> 157 ! Veja-se, pois, que grosseira falsificação<br />

esta nos termos, nas <strong>de</strong>terminaçòes <strong>do</strong> texto, em tu<strong>do</strong> palpavel,<br />

saliente cni tu<strong>do</strong>; dissonarite <strong>do</strong> espirito <strong>da</strong> epocha a que se attri-<br />

biie, impossivel mesmo dc se ter realiça<strong>do</strong> nos fins <strong>do</strong> primeiro<br />

scculo. E, ao mesmo tempo, qiie supremacia colossal a qiie d'ahi<br />

sr tlescobre na çadcira <strong>de</strong> Pedro !<br />

Deixii estupefacto esta au<strong>da</strong>cia <strong>de</strong> quem quer que fosse o seu<br />

aiictor !<br />

Accrescentai a isto os esforços feitos, havia já tres seculos, <strong>da</strong><br />

parte <strong>de</strong> Koma, por ventura inconscientes, para conqiiistar o pri-<br />

meiro logar ; o respeito ignorante <strong>da</strong> christan<strong>da</strong><strong>de</strong> ; a effectiva su-<br />

premacia religiosa e moral jh conquista<strong>da</strong> no fim <strong>do</strong> seculo v111 ;<br />

c ten<strong>de</strong>s assim a explicação <strong>do</strong> temor com que foram acceitas as<br />

<strong>de</strong>cretaes e <strong>do</strong> ar<strong>do</strong>r com que os papas as <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ram!<br />

Thomassin, quan<strong>do</strong> preten<strong>de</strong> explicar a transformação por que<br />

passa nos fins <strong>do</strong> seculo viir a disciplina <strong>da</strong> egreja, escreve estas<br />

riotaveis palavras :<br />

ulta cum rebus hiimanis comparatum est, ut jus qoodlihet ad eum<br />

tan<strong>de</strong>m dc\ol\atiir cique adhaerescat, cui caeteri illud permittunt,<br />

ciirandiim. <strong>de</strong>fiingendiimque diutissime.. ... . EIaec innoxia cst et sin-<br />

cera ratio qiia dcvoluta praescriptaqtie sunt pleraqiie jura, nec Pon-<br />

tificibiis, ncc Episcopis animum ad hacc advertentibus, sed sensim,<br />

sine sensu, invalescentc usu ct rcs itii confirmante ut infirmari <strong>de</strong>in<strong>de</strong><br />

netitiquam possinl. In utraqiie hotninum politia, ita multa fiunt iner-<br />

pcctata, inopiria; nemine fere diin fiunt advertente, nemine cum fa-<br />

cta sunt, infecta jum red<strong>de</strong>re pol1erite.n<br />

Sensim et sine sensu! Mas, se isto A ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, consentiu-se,<br />

consentiu a propria egreja no menoscabo <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s con-<br />

cilio~ ecumenicos, fomentou o <strong>de</strong>sprezo <strong>da</strong> pura disciplina pri-<br />

mitiva ! to<strong>do</strong> o crime <strong>da</strong> infame falsificação <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes peza so-<br />

bre ella ! Não ; não po<strong>de</strong> ser; porque entáo nâo teriam esses <strong>do</strong>-<br />

cumentos ganha<strong>do</strong> o respeito que alcançaram, porque foi exacta-<br />

mente pela sua antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> veneran<strong>da</strong> que elles po<strong>de</strong>ram obter<br />

tão gran<strong>de</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Sensim e1 sitte sensu! pois não havia aqui alguma cousa <strong>de</strong><br />

melhor, <strong>de</strong> superior, que se impunha? não era outra u disciplina<br />

oriun<strong>da</strong> <strong>da</strong> tradição apostolica? então porque é que se fazem essas<br />

<strong>de</strong>cretaes? A um puro effeito <strong>da</strong>s circumstancias, uma pura negli-<br />

gencia? e para que v&m agora os seus escriptores dizes-nos qiie


<strong>de</strong>s<strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os tempos a sB apostolica teve esta prerogativa? estamos<br />

nós nos seculos <strong>da</strong>s falsas <strong>de</strong>cretaes, cegos pela ignorancia<br />

miseravel d'esses tempos ? As falsas <strong>de</strong>cretaes não sáo uma etraducçno<br />

<strong>da</strong> disciplina consuetudiriaria pura. O seu apparecimento 6<br />

um facto essencialmente activo e intelligente e que por isso mesmo<br />

a egreja <strong>de</strong>ve reprovar.<br />

Surge to<strong>da</strong>via aqui uma dificul<strong>da</strong><strong>de</strong> mui extraordinaria. Como<br />

durante oito seculos se acreditou na pureza <strong>da</strong>s falsas <strong>de</strong>cretaes e<br />

a ellas se c!(w inteira força, apezar <strong>de</strong> sua falsi<strong>da</strong><strong>de</strong>; acontece que<br />

a disciplina <strong>do</strong>s concilios <strong>do</strong>s oito primeiros seculos, postoque nTio<br />

leva<strong>da</strong> i1 practica, continúa 'nestes oito annos seguintes a ser realmente<br />

a lei, a disciplina ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira ; porque to<strong>da</strong> a nova disciplina<br />

ou se fun<strong>da</strong> nas <strong>de</strong>cretaes falsas, ou se baseia em <strong>de</strong>cretaes,<br />

que, postoqric dimana<strong>da</strong>s <strong>do</strong> legitimo po<strong>de</strong>r legislativo <strong>da</strong> egreja,<br />

n;?o tem comtu<strong>do</strong> uma razão <strong>de</strong> ser acceitavel, nem paranós, riem<br />

para o proprio legisla<strong>do</strong>r, porque foi sua <strong>do</strong>utrina bebi<strong>da</strong> nos<br />

erros radicn<strong>do</strong>s por aquelle embuste.<br />

Como poi+m <strong>de</strong>rrubar to<strong>do</strong> este edificio, quan<strong>do</strong> o concilio <strong>de</strong><br />

Trcnto nol-o impe<strong>de</strong> com o seu anathema, e o tempo com n sua<br />

auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> ?<br />

A outros o cui<strong>da</strong><strong>do</strong> <strong>de</strong> solver este problema, se solução possivel<br />

se Ilie encontra: vamos cxpon<strong>do</strong> as phases di~ legislação canonica<br />

singelamente e sem pretcnsòcs <strong>de</strong> propbr reformas 'nestes<br />

capitulas d'essa legislação.<br />

Resta-nos observar que em to<strong>da</strong> esta collecção o esta<strong>do</strong> não<br />

tem partilha 'na herança <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r. O capitulo seguinte explicará<br />

esta exclusão.


CAPITULO V<br />

Des<strong>de</strong> o seculo IX até o concilio tri<strong>de</strong>ntino<br />

O que d primeira visla parece <strong>de</strong>duzir-se <strong>da</strong> leitura <strong>da</strong>s falsas <strong>de</strong>cre1aes.-Data d'esle<br />

orio<strong>do</strong> a supremacia (iontifical <strong>do</strong>s papas.-l\clorinas <strong>da</strong> ili~cil~lina comeca<strong>da</strong> por<br />

gilvestre e LeiIo, C continua<strong>da</strong> pui- Gregorio vil eseus soccessores -As fiilids <strong>de</strong>crelaes<br />

r50 falalincrile o inoltlc d'ruta reforma.- Esta<strong>do</strong> iiiiellectuii: e riiciral <strong>do</strong> occidtbnte<br />

<strong>da</strong> Europa: sua influencia no estu(lo e <strong>de</strong>senvolvimenln <strong>do</strong> direito pontificio.-<br />

Ahsoluts soberariia <strong>de</strong> Hoini~. - El)istola <strong>de</strong> Alekaiidre 111. -Os glo~sographos.-<br />

Epistolas <strong>de</strong> Celeslirio 111 e Innoccncio [ir.-A disçil~iina ;i respeito <strong>da</strong> circumscri-<br />

~cào <strong>da</strong>s dioceses torna-se iiileirarneoie geral <strong>de</strong>pois ilus capituloe v e vi, erlra, <strong>de</strong><br />

5880 xxii. -Os can. 48 e 49 Cous xvi, q r. -0piniao dc alguns auctores <strong>da</strong> eschola<br />

gallicana. - (:onlirrilacùo dò dircilo <strong>do</strong>a ilecretaes no cor:cilio <strong>de</strong> Trento. -<br />

Esta<strong>do</strong> <strong>da</strong>3 relacõeli <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r'chl)iritual e temporiil -Em que casos se <strong>de</strong>vem çrear<br />

os bispa<strong>do</strong>s, supprimil-os, unil-os e dividil-os.<br />

Quan<strong>do</strong> se I@em as falsas <strong>de</strong>cretaes, o que primeiro surge na<br />

rnciitch C. qucellas tinham em vista favorecer os primazes e não o<br />

t)ill)X a lettra dc seus tcxlos em muitos logares 'assim o parece<br />

iiidicar. comtu<strong>do</strong> 'oellas que se basba a elevaçiio esaggera<strong>da</strong> tla<br />

ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Pedro. Se attcntarmos <strong>de</strong> mais peito, sc rcllectirmos<br />

por um pouco, havemos <strong>de</strong> recuar estupetàctos ; liorquc <strong>de</strong>baixo<br />

<strong>de</strong> to<strong>da</strong>s aquellas paginas se <strong>de</strong>scobre não sei que colossal podcr,<br />

cu-jo aspecto inllexivel faz estremecer, c <strong>de</strong> quo o ~iilto iinmciiso<br />

eriche <strong>de</strong> sombras o episcopa<strong>do</strong> 'na egrcja e a realeza 'rio mun<strong>do</strong>.<br />

A supremacia pontifica1 <strong>do</strong>s papas está inteiramente estabele-<br />

ci<strong>da</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> este tempo.<br />

Depois <strong>de</strong> uma serie <strong>de</strong> pontifices que infamaram com sua vi<strong>da</strong><br />

a chronica <strong>do</strong> papa<strong>do</strong>, no espaço em que o futuro <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> os-<br />

cilla e ameaça per<strong>de</strong>r-se entre a velha civilisação romana agorti-<br />

sante e a nova civilisação feu<strong>da</strong>l nascente e mal segura ; a egreja<br />

v& subir ao throno poiitifical no scciilo x um homem singular,<br />

Silvestre ri,. que, nos curtos dias que vive, sabe com uin vigor<br />

extrnordinario reformar a disciplina, e <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r com uma energia<br />

terrivel a supremacia papal.


Annos <strong>de</strong>pois LeBo ix continúa a obra <strong>da</strong> purificaçáo <strong>do</strong>s costumes,<br />

e seus successores, Gregorio v~r, Urbano ri, Paschoal ir,<br />

Eugenio 111, Alexandre i11 e Innocente 111, procuram acabal-a,<br />

levantan<strong>do</strong> a disciplina abati<strong>da</strong> durante 150 annos. 'Nestes tempos<br />

<strong>de</strong> ignorancia o typo que se Ihes apresentava <strong>de</strong>ante, que se Ihes<br />

impunha, eram as falsas <strong>de</strong>cretaes.<br />

O monge IIil<strong>de</strong>bran<strong>do</strong>, esse vulto severo, s6 digno <strong>do</strong> cinzel <strong>de</strong><br />

Miguel Angclo, e <strong>de</strong> quem tanto bem e tanto mal se tem escripto,<br />

elle e outros poiitifices, zelosos <strong>da</strong> pureza <strong>do</strong>s costumrs, erguem<br />

<strong>de</strong> en~olta com a disciplina o supremo po<strong>de</strong>r pontifical.<br />

Os scculos xr e xrr são os seculos <strong>do</strong> renascimento <strong>da</strong>s letras,<br />

os seculos <strong>da</strong>s cscolas, <strong>da</strong>s universi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, <strong>da</strong> pbilosophia escolastica,<br />

(\a theologia positiva.<br />

Paris e Bolonha brilham uma e outra esclareci<strong>da</strong>s por seus professores<br />

<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> fama, por um Abklard, por um Alberico <strong>de</strong><br />

Keims, por um Pedro Lombar<strong>do</strong>, o bispo auctor <strong>da</strong>s famosas<br />

Sentenças.<br />

Em Bolonha, ci<strong>da</strong><strong>de</strong> já t8o conheci<strong>da</strong> por sua universi<strong>da</strong><strong>de</strong> e<br />

pela rcriovaçuo <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> e <strong>de</strong>scoberta <strong>da</strong>s leis romanas, um monge<br />

hencdictino procura harmonisar os velhos canones, as* falsas <strong>de</strong>cretam<br />

e varios trechos <strong>de</strong> S. Gregorio, <strong>de</strong> S. Agostinho, <strong>de</strong> S. Jeronymo<br />

e <strong>do</strong> sabio Isi<strong>do</strong>ro <strong>de</strong> Sevilha.<br />

Apparece o Becreto, a Concordia discor<strong>da</strong>nfium canonum, e<br />

por esta collecção se explica e ensina o direito canonico nas uriivcrsi<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

Quem olha para o occi<strong>de</strong>nte <strong>da</strong> Europa 'nestes seculos <strong>de</strong>scobre<br />

uma cfYervescencia, uma agitação sinpularissima. Des<strong>de</strong> o seeu10<br />

ix que Roma se via suff'oca<strong>da</strong> pela multidão que corria <strong>de</strong><br />

to<strong>da</strong>s as partes <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>. Os cscriptores pintam-rios o corisistorio<br />

<strong>do</strong>s car<strong>de</strong>aes como um parlamento e um tribunal, que começava<br />

seus trabalhos com o romper <strong>do</strong> dia (t os acnbavíi com o chegar<br />

<strong>da</strong> noite. Os papas não podiam respirar iim momcnto. As riquezas<br />

vasam-se na gran<strong>de</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os latlos <strong>da</strong> Europa, e <strong>de</strong><br />

envolta com ellas a perdiçuo e a <strong>de</strong>svergonha. Homii surge immensa,<br />

quasi tão gran<strong>de</strong> como no tempo em quc o imperio, cheio <strong>de</strong><br />

vi<strong>da</strong>, vencera o mun<strong>do</strong>; porque a Roma christã tinha o fulgor divino<br />

a illuminar-lhe a fronte, e a recor<strong>da</strong>ção <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> a erguelhe<br />

o pe<strong>de</strong>stal.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, ain<strong>da</strong> que a vi<strong>da</strong> intellecual seja cheia <strong>de</strong> mo-


vimento e <strong>de</strong> calor nas universi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, escolas e collegios, comtu<strong>do</strong><br />

este viver 6 rachitico. Ensinava-se a thcologia sem conhecer<br />

a tradiçáo, sem ter noticia <strong>do</strong>s livros <strong>do</strong>s padres, perdi<strong>do</strong>s nas<br />

bibliotliecas <strong>do</strong>s mosteiros ! explicava-se o direito canonico sem<br />

saber a historia ecclesiastica !<br />

O amor <strong>da</strong> fama, a siiperficiali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s estu<strong>do</strong>s <strong>da</strong>va origem A<br />

filaucia e pe<strong>da</strong>ntismo escolastico; fazia nascer essas subtilezas, impertinencias<br />

e distincçbes, hoje proverbiaes, que cortavam o v60 ao<br />

espirito e enchiam as universi<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

Na<strong>da</strong> admira portanto que nos fins <strong>do</strong> seculo xir, quan<strong>do</strong> Graciano<br />

elaborava o dccreto, corresse na tradiçáo a <strong>do</strong>utrina <strong>de</strong> que<br />

o papa era superior aos canones e que seu po<strong>de</strong>r não tinha limites.<br />

Debaixo d'este influxo foi architecta<strong>da</strong> a Concordia <strong>do</strong>s canones<br />

discor<strong>da</strong>nies, explica<strong>do</strong> o direito <strong>do</strong> Decreto nos cursos publico~<br />

; os proprios papas cm suas <strong>de</strong>cretaes obe<strong>de</strong>ceram a este<br />

impulso <strong>do</strong> tempo e <strong>do</strong>s acontecimentos, cui<strong>da</strong>ram-se mesmo obriga<strong>do</strong>s<br />

em consciencia a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r ate Ii morte este po<strong>de</strong>r, em o alargar<br />

por to<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong>.<br />

No seculo XIII (1238) o catalao Kaymun<strong>do</strong> <strong>de</strong> Penia-fort<br />

coml'bc a celebre collccyão <strong>de</strong> <strong>de</strong>cretaes, chama<strong>da</strong> <strong>de</strong> Grcgorio<br />

is, e por ella se continúa e~isinan<strong>do</strong> o direito canonico, oii antes,<br />

o direito pontificio. A confusa0 foi estrema ; a antiguidnclc inteiramente<br />

<strong>de</strong>spreza<strong>da</strong>, As dispensas <strong>da</strong>s leis, o cahos dc constituiçbes<br />

novas, <strong>de</strong>rogan<strong>do</strong>-se umas As outras, fizeram <strong>da</strong> jurispru<strong>de</strong>ncia<br />

canonica a jurispru<strong>de</strong>ncia mais arbitraria e incerta.<br />

Alguns papas eram romanistas distinctos ; a Europa consultava-os<br />

<strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as partes ácerca <strong>de</strong> objectos puramentecivis; o<br />

seu po<strong>de</strong>r crescia sobre a soberania temporal, aju<strong>da</strong><strong>do</strong> <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s<br />

estas espantosas circumstancias; e assim o direito canonico vai-se<br />

augmentan<strong>do</strong> <strong>de</strong> capitulas <strong>de</strong> mero direito civil.<br />

Os <strong>do</strong>utores <strong>de</strong>cretalistas que o ensinavam nas escolas transformam-se<br />

nos celeberrimos glossa<strong>do</strong>res <strong>do</strong>s seculos XII e 1111 l.<br />

Este esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> direito pontificio mostra-nos clarissimamente<br />

1 Mui celebres na historia <strong>do</strong> <strong>de</strong>senvol\~imeiito<br />

<strong>do</strong> direito caiioi~ico, milia-<br />

mosos no seu tempo e alguns seculos <strong>de</strong>pois, os glosen<strong>do</strong>res não prestam<br />

gran<strong>de</strong> servi90 hoje ao estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> <strong>Direito</strong>; suas glossas são insufficicntee; 08<br />

poritos obscuros não se interpretam com clareza ; falta a critica, porque se<br />

nElo conhecia a historia <strong>da</strong> egrejr, nem se possuia a eciencia <strong>da</strong>s antigul<strong>da</strong>-


como era gran<strong>de</strong> e como foi unico neste perio<strong>do</strong> o po<strong>de</strong>r papal.<br />

On<strong>de</strong> a soberania episcopal 4 on<strong>de</strong> a sobcrania <strong>do</strong> metropolita e<br />

<strong>do</strong>s syno<strong>do</strong>s provinciaes 4<br />

Tu<strong>do</strong> <strong>de</strong>sappareccu - a ignorancia e a superstiçno enchem o<br />

mun<strong>do</strong> <strong>de</strong> trevas ; e <strong>do</strong> meio d'esta esciiridno, d'entrc a crapula<br />

abjecta, d'entre as ambiçòcs vergonhosas, d'cntre os crimes mais<br />

nefan<strong>do</strong>s <strong>da</strong> perdição <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Clemente, v&-sc brilhar <strong>de</strong> tim<br />

brilho satariico o brutal e violento colosso <strong>do</strong> papa<strong>do</strong>, ergileii<strong>do</strong>-<br />

se <strong>de</strong> alem <strong>do</strong>s Alpes e dcscançan<strong>do</strong> a espa<strong>da</strong> <strong>de</strong> S. Paulo sobrc:<br />

to<strong>do</strong> o velho mun<strong>do</strong>'.<br />

Quem nâo presente a reforma protestante? quem nâo vê pro-<br />

xima a gran<strong>de</strong> transformação politica <strong>da</strong> Europa?<br />

Assim tambem, ao fin<strong>da</strong>r d'este perio<strong>do</strong>, o direito poiitificio pá-<br />

rcce ameaça<strong>do</strong> <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> revolução. No capitiilo seguinte vere-<br />

mos o <strong>de</strong>stino d'esta ingente instituicão : agora vamos Icr as <strong>de</strong>-<br />

cretiirs qiic firmam expressamcntc~ ao podcr pontificio os <strong>direitos</strong>,<br />

qiie no pcrio<strong>do</strong> anterior pertenciam aos sgno<strong>do</strong>s <strong>da</strong>s proliiicias,<br />

rmcjii,riito ao objecto <strong>de</strong> qite nos viimos occupiiri<strong>do</strong>.<br />

liicaxaridrc 111, tcn<strong>do</strong> criviatlo certo cardcal, lega<strong>do</strong> n Inicrr, iio<br />

ieiiio <strong>de</strong> Sicilia, com differentcs man<strong>da</strong>tos nega-lhe <strong>de</strong>pois aspe-<br />

ramcrite, como uma <strong>da</strong>s maiores faciil<strong>da</strong><strong>de</strong>s, reserva<strong>da</strong>s ao summo<br />

potitifice, cm signal <strong>de</strong> valioso privilcgio, a <strong>de</strong> unir e dividir os<br />

<strong>de</strong>s, iiitlispensaveis elemeiitos <strong>de</strong> uma sã iiitcrprettrç%o. O mesino crrso, por<br />

qiie rll~s crimrçain a glossa, como se llies tem nota<strong>do</strong>, e P riiiii i.ic il \vi.,<br />

r1%0 i ii:i niainr parte <strong>da</strong>s glossas mais <strong>do</strong> que urri extracto <strong>do</strong> prnp~ io t ('\to,<br />

AR vem i~tb pelas mesmas palavias. Abun<strong>da</strong>in as etymologias e ti? cit icicu<br />

<strong>de</strong> Iíi~nl es parnllelos, iiiiico serviço real qiie prestani ao estiidioso.<br />

1 Michelet, traduzin<strong>do</strong> ns memorias <strong>de</strong> Luthero, eacreve, falati<strong>do</strong> <strong>da</strong> viagem<br />

d'este homem celehre a Rorna : * On now dispense <strong>de</strong> peindre cettr Itnlie<br />

<strong>de</strong>s Borgia. I1 y avait crrtainemenfe à cetfe dpo@b@ quelque <strong>do</strong>se qui s'rst<br />

EU rarement ou jarnLiis <strong>da</strong>ne Z'histoire : une pervern'td raieonn<strong>de</strong> r6 soientifi-<br />

que, une magnifique osterrtation <strong>de</strong> eckl6ratesse, disona to& d'un mot : tepr?tre<br />

alh<strong>de</strong>, se croyaght roi du mo7r<strong>de</strong>.m<br />

Leiam-se as memorias cl'csse homem <strong>do</strong> norte 'neste capitulo, on<strong>de</strong> são insiispeitas<br />

ain<strong>da</strong> para os proprio.j catholicos ii~ais inelindrosos ; pois que Luthern,<br />

qiistn<strong>do</strong> veiu a Roma. arri~chr~ a vi<strong>da</strong>, cheio <strong>de</strong> feivor, para ver a<br />

gran<strong>de</strong> ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> S. Pedrc . BastnrB dizer que a pervere&a subira a tal excesso,<br />

que os padres chegavam a dizer, quan<strong>do</strong> consagravam a liostia: 1Pani.4<br />

es, et panis munebis.,<br />

A mesma drsniorcilisaç30 <strong>do</strong>s ultimos dias <strong>do</strong> imperin, que exacerbou a penna<br />

<strong>de</strong> Juvenal e inflammou a8 paginas <strong>do</strong> Apocalypsc, talvez superior a esta, não<br />

se apresenta com este sorkiso <strong>de</strong> cynisnio e com esta affectagào <strong>de</strong> siiperiori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

que avulta aqui.


ispa<strong>do</strong>s, e <strong>de</strong> a<strong>do</strong>rnar com a honra primacial a certa egreja, sub-<br />

metten<strong>do</strong>-lhe outras 6 sua jurisdic@ío.<br />

A epistola <strong>de</strong>cretal, em que isto se or<strong>de</strong>nava, dizia assim:<br />

u . Licet in regno Siciliae generalis sit tibi commissa legatio,<br />

a<strong>de</strong>o tamen sine spcciali man<strong>da</strong>to nostro non <strong>de</strong>biiisti mnnus enten-<br />

<strong>de</strong>re, qiiac in signiim prisilegii singiilaris siinl taiitun: summo Ponti-<br />

fici rcservata... An existimas qiiia vices nostras tanquam legato tibi<br />

commisimiis exequen<strong>da</strong>s, quod Panormitanam Ecclesiam posses srib-<br />

jicere Menanensi, ut illam praeficeres isti concesso sibi privilegio pri-<br />

maliae? An putas ex ea<strong>de</strong>m caiisa tibi licere duos episcopatus uuire,<br />

vel unum divi<strong>de</strong>re sine liceutia speciali?»<br />

Quan<strong>do</strong>, <strong>de</strong>pois, esta epistola vem fazer parte <strong>da</strong> collecçáo <strong>de</strong><br />

Gregorio ix, e constituir ahi o Cap. zv, De oficio legati; os<br />

glos~ographos começaram a estabelecer a regra cm to<strong>da</strong> a sua ge-<br />

nerali<strong>da</strong>tle, affirman<strong>do</strong> que para qualquer parte <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> aquelle<br />

privilegio era efficaz, e que só.no summo pontifice fôra reserva<strong>do</strong>,<br />

com exclusão <strong>do</strong>s mctropolitas 1.<br />

O Cap. VIZI, De exccssibus praelator., extrahi<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma epis-<br />

tola <strong>de</strong> Celestino i11 ao bispo Faustino, 6 támbem claro:<br />

aSic~it iinire Episcopatus atque potestata suhjicere alienae, ad summum<br />

Pontificem pertinere dignoscitrir : ita Episcopi est Ecclesiarum<br />

suae dioccsis unio et subjectio carum<strong>de</strong>m.))<br />

O emiiiente po<strong>de</strong>r <strong>do</strong>s papas sobre o episcopa<strong>do</strong>, posto que náo<br />

especialmente a respeito <strong>do</strong> nosso oI),iocto, 8, alem <strong>de</strong> outros 10-<br />

gares, luminosamente expressivo rio Cap. zz, Dc translat. episcop.,<br />

epistola <strong>de</strong> Innocencio i11 :<br />

((Sicut ergo Episcoporum translatio, <strong>de</strong>positio et cessio: sic et ele-<br />

ctoriim post confirmationem (sliiritiialis ratione conjugii) soli est Ko-<br />

rn:ino l'ontifici reservata; licel iisqiic ad tcmpora ista, quod caiitum<br />

fiierat ab Episcopis, expressiim non fiieratelectis :....o<br />

1 Sebast. Berardi - Comme~ltaria in jns Ecc2es.- Tem. 2, Diss. Cap.<br />

1 .o - E8tevão L)no?y, Jmis I>o?tlificii Tomi IY, Paro I continens conc2usionee<br />

et abeolutbsirnunt igadieem. ac sztmmam omnim materiartim, quae exponu~ltur<br />

in textu et glouaia totim juris Canonici d in concilio Tri<strong>de</strong>ntino<br />

et regulie cancellariae et quibua<strong>da</strong>m Bullia ex/ravagantibua maxime dktin-<br />

ctiogie contestus - vb. E@opatzls, nS0<br />

2.


No Cap. I, De Se<strong>de</strong> vacante, <strong>do</strong> mesmo papa, v&-se egualmerite<br />

que ao papa pertencia a creaçao <strong>da</strong>s dioceses:<br />

aNovit ille, diz csse texto, qiii scrutator est cordirim qiiod licet<br />

prae<strong>de</strong>eessor noster, Ecclesiam vestram ereserit cathedralem, ipsam<br />

Bathoniensi EcClesiae unien<strong>do</strong>, ut i<strong>de</strong>m esset Episcopus.. . a<br />

Este costume tornou-se perfeitamente geral, <strong>de</strong>pois que JoBo XXII<br />

publicou as extravagantes, quinta e sexta, De praebendis et di-<br />

- gniralibus.<br />

O Cap. v, extra, tractan<strong>do</strong> <strong>da</strong> divis8o em cinco dioceses <strong>da</strong> <strong>de</strong><br />

Tolosa, <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> exposiçào mui dilata<strong>da</strong> <strong>do</strong>s motivos d'essa divi-<br />

são, vem dizen<strong>do</strong> :<br />

rNos ... praemissis et aliis sua<strong>de</strong>ntibus justis causis ex certa nostra<br />

sctentia <strong>de</strong> fratrum nostror~im coiisilio concordi ct Apostolicae pleniludine<br />

potestatis ad lau<strong>de</strong>m Dci, exaltationem ccclcsiac, fi<strong>de</strong>liumqiic<br />

salutem, Episcopatum ipsum, dictamqiic diecesim 'I'holosanain Aportolica<br />

auctoritate dividimus in quinque dioccsis, qrias per ccrtos distingui<br />

limites faciemus.. . »<br />

O Cap. VI, Nuper certis ex causis, extra, <strong>de</strong> praebcrtdis, re-<br />

ferin<strong>do</strong>-se ain<strong>da</strong> ao mesmo negocio <strong>de</strong> Tolosa, dá uma idéa tão<br />

perfeita <strong>do</strong> que era o po<strong>de</strong>r papal 'nestes tempos, que não po<strong>de</strong>-<br />

mos <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ce<strong>de</strong>r ao <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> o transcrever para aqui em<br />

gran<strong>de</strong> parte:<br />

rNuper, começa esse Cap. VI, certis ex caiisis quae nostriim ct<br />

fratrrim nostrorum animos ad id rationabiliter indiixeriint, qi~ondiirn<br />

Episcopatum Tholosanum in Archiepiscopatum, srii nirtropoliianam<br />

ereximus Ecclesiam : aiiator villas. auarum ciiiiirrilibet iiisianirnus vo-<br />

. . "<br />

cahulo civitates, quator catht,drales Ecclesias crcLli\imiis, riniim \ri<strong>de</strong>-<br />

licc-t in villa montis Albani, quon<strong>da</strong>m Caturccn. dioccesis adjicien<strong>da</strong><br />

sibi certa parte qiion<strong>da</strong>m diorcesis Tholosan. altc~r;tiri i11 \illa I..iirnbe-<br />

riaci, aliam i11 villi sancti Pauli, et aliam in villa Itiiis 1.1 <strong>de</strong> ltobes-<br />

tria qiion<strong>da</strong>m 'l'holosan dioecesis.<br />

Quas qiiidcm Ecclesias una ciim Apamiariim Ecrlesia qriam siiffraganeas<br />

sut)jecimiis ipsi mrtro~>olit;inac Tholosannc Ecclrsiiie. De bonis<br />

quoqiie et reditibus dicti quon<strong>da</strong>m Episropaliis 'l'Iiolus;in. 'I'iini ipsi<br />

Tholosan. qiiam pracdiciis Ecclesiis su1Tritg;incis ccrtaui portionrm,<br />

quam iiniciiiqiie ill;iriim <strong>de</strong>bere sufficcre \idiniiis, pro\idiriiiis iissignandnm,<br />

totale honorum c1 reditiium, ipsoritm rcsiduo dispositiom<br />

noatrae et sedis Aportolicae reseraalo. Alia eti;im circa praruiissa feeimus,<br />

<strong>de</strong>erevimus ct ordinavimus cx certa nostra scientia, et ipsorum


fratrum ' k t d i eonsilio et aaostolicae nlmitudine outestatis dis-<br />

trictios B;bjbCdrs rre quis cujusc;imque pra'eerninentiae: ordinis, con-<br />

ditionis rut siatus &iamsi Archirpiscopali dignitate fiilgeret, ipsfim<br />

ordinationem nostram iaqediret, praesiimeret, vel turbare.. . . . .»-<br />

Em segiii<strong>da</strong> a extrava,.ante <strong>de</strong>creta, alem <strong>da</strong>s jti hilmina<strong>da</strong>s na<br />

1)rimc.irn cpistola, outras penas contra os que impedirem a exe-<br />

riiqào <strong>da</strong>s or<strong>de</strong>nanyas papaes.<br />

Era isto pela primeira meta<strong>de</strong> <strong>do</strong> sr~culo xiv.<br />

Sáo ain<strong>da</strong> bem tcrmiiiantcs os canones seguintes quanto h uniào<br />

e divisão <strong>da</strong>s dioceses:<br />

O can. XLVIII, Caus. XVI, q. r, <strong>do</strong> papa Gregorio:<br />

nQiiia igitur Cumani castri Sacer<strong>do</strong>s cursum ~itae hujus expl(>vit,<br />

iitras qiic nos ecclesiaspraesentis aitctoritatispaginn unisse, tibiqucromniisisse<br />

cognosce: propriiimquc iitrariimquc ecclcsiari~m scilo te csse<br />

Pontificem. Et i<strong>de</strong>o te, quaeciimqric tibi dc eariim patrimonio, vcl<br />

clcri ordinatione, sinc promotioiie, jii\ta canoniirn statiita tisa fiicrint<br />

ordinnre, atquc clisponcrc, Iiabe1,is iit proprius revcra Sacer<strong>do</strong>s liberam<br />

ex nostrae nucloritat;~ consensu afqice permissione 1icentiam.u<br />

O can. XLIX, Caz4s. xrrz, q. r, <strong>do</strong> mcsmo Gregorio, usa quasi <strong>de</strong><br />

cguaes exprcssíies :<br />

r...... qiiippe iit Pontifex proprius liberam habeas ex praesenti nos-<br />

tra permissione 1icentiam.n<br />

Depois <strong>de</strong> Joào xxii, os papas têm goza<strong>do</strong>, sem coritestação,<br />

d'este importante pri\ilcgio, como dc miiitos outros.<br />

' Alguns auctores dir escola gallicaiia, tclri<strong>do</strong> <strong>de</strong> confessar o direito<br />

<strong>do</strong>s papas em quanto 6 união e tlivisào <strong>da</strong>s dioceses em preseiqa<br />

<strong>do</strong>s canoncs <strong>de</strong>cisivos e tcrmiiiarites, prrtcn<strong>de</strong>m, comtu<strong>do</strong>,<br />

que similliante prikilepio Ihes não pcrtcbrice com exclusào <strong>do</strong>s metropolitas<br />

a rcspeito di~ erccyão o11 aholiyao <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, por náo<br />

<strong>de</strong>scobrirem nas dccretaes um tcxto bem positivo 1. Estes me- 1<br />

.<br />

1 Gibert - Corpus Jlcr. Cason. per regulaa, tom. 2.0, tit. vil, 5 vr, pag.<br />

133. > edic. . 1735.<br />

Sustelita este escriptor que a creaqàn c ahnliçiio <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s perterico ao<br />

papa c rn~tropolitns, e iiXn, só hcliiellr; poriliio iiào riicoiitra (6 opini80<br />

d'ellc) texto nenhiirn qiie ~~nsitiv:iiiieiitc oxrliiri os metropolitas; e que, cmquaiito<br />

os can. 50 e 51, ('aiis. ~$1, q. 1, exprt~ssairicnte os clinniam, e juricta-<br />

mente 110 seculo ri I, ain<strong>da</strong> o Cap. r\ I <strong>de</strong> major. et obedient. d'elles fala 'neetee


mos, porém, confessam que a praxe <strong>de</strong> ha muito tem consagra<strong>do</strong><br />

este costume.<br />

Niio são, pois, s6 as <strong>de</strong>cretaes, cm riosso mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> ver, bem categoricas:<br />

6 o direito consuetiidinnrio ; é a prescrip~ao, 6 a analogia<br />

1, que lhe conferem esse privilegio.<br />

No penultimo concilio ecumeiiico a egrrja confessa isto mesmo<br />

perante o catholicismo, e no momento mais solemnc <strong>de</strong> sua existencia,<br />

quan<strong>do</strong> <strong>de</strong>cidia irremediavelmeiite <strong>do</strong> seu futuro; quan<strong>do</strong><br />

combatia o protestantismo nascente e ameaça<strong>do</strong>r.<br />

((Et guia jure optimo, faziam os padres escrever nos capiti~los <strong>da</strong>s<br />

soas ordcnancas disciplinares <strong>de</strong> reformasão, et qiiia jure optinlo dis-<br />

tinctae fuerunt diocceses et parochiae ac unicuique gregi proprii attri-<br />

buli pastores, et inferiorum ecçlcsiarurn rectores, etc. u<br />

9 'Ncsse mesmo concilio se fulmina o anathema contra aquelles<br />

qiie disserem não serem ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros e Iegitimos bispos os qut. o SSO<br />

em virtu<strong>de</strong> <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> pontifice; o que vale dizer tlc urna<br />

maneira encoberta, mas segura polo nníithemn, que rino sfio Iegi-<br />

timos e ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros os que niio forem institui<strong>do</strong>s por graça d'a-<br />

qiiella auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> 5.<br />

Em mais <strong>de</strong> um logar os padres <strong>de</strong> Trento expressamente lem-<br />

negocios; B certo que nRo obsta nenhum <strong>do</strong>s capitulou d ~ <strong>de</strong>cretaes, s cita<strong>do</strong>6<br />

para jiistificar este prikilegio, porqiie são mal interpreta<strong>do</strong>s.<br />

Niio somos dleste sentir; parece-rios esaggera<strong>da</strong> esta opioigo <strong>de</strong> Gihert, o<br />

qiial coiif~ssa, elle propiio, que o costume tem si<strong>do</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito teolpo contra<br />

a soiiteiiça geniiiiia <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes.<br />

NLo iios admiremos d'cstas controversias: B mais facil saber eem contestaç&o<br />

o direito <strong>da</strong> egiFja antes <strong>do</strong> Decreto, <strong>do</strong> que por este e pelas <strong>de</strong>cretaes,<br />

como muito bcrn nota Edchardio. ITermt 1~ JVT. Lih. duo 5 308 e not.<br />

1 Pois concebe-si, que ao papa pertença o piiviltgio (IR iiiiião e divisão<br />

<strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, e lhe 1150 pcrtc-riçn o <strong>da</strong> sua creaç,To c abolição?<br />

2 C'onc. Tri<strong>de</strong>nt. Sess. 14, <strong>de</strong> reformat. cap. JX.<br />

1 Conc. Tri<strong>de</strong>nt. Scss. 23, can. vrii.<br />

.Si qui dixerit, epracopos, qui arsctoritate Romani Pontificis assumuntur<br />

non esse legitzmos et veros episcopos, sed Jiymentum humanum; anathema<br />

sit.,<br />

Devoti, Inst. Canonicar. Lib. 1, tit. 3, S. 1, fj 18, no!. l..,e~creve, f~lan<strong>do</strong><br />

FI respeito <strong>da</strong>s prerogativas <strong>do</strong> papa e a ~reposito <strong>da</strong> cit. Sess. 23, ran. vrrl<br />

<strong>do</strong> concilio tri<strong>de</strong>iitiiio: altaque si a co~icilio tamquam cafholio m <strong>do</strong>-pa <strong>de</strong>-<br />

Jinitum est, veros ac legitimo8 esse Episcopos, quia Surnmo Yoirtifie crealb<br />

sunt, facile inlelligitur, legitimam esse IJo~~tifici creandwum Ep'scoporum<br />

poteslaten, sine qua &?i ver3 ac legitivni Episcopi Imberi non po88unt.*


am a soberania plena <strong>da</strong> s6 Apostolica, que canon algum, nem<br />

<strong>de</strong>creto <strong>de</strong> concilio p6<strong>de</strong> ferir.<br />

Baslarh ler o Cap. xxi <strong>de</strong> Refor. <strong>da</strong> Sais. xxv:<br />

(~Postremo sancta Synodus omnia et siogola, sub quibuscumque<br />

clatisiilis et terbis, quae <strong>de</strong> moriirn rcforinatiorie atgue ecclesiastica<br />

disriplinn. tnrn suh fel. rcc. Paiilo rir. ac Julio rir, qiiam sub beatissimo<br />

Pio rv. I>oiitificibus maximis. in hoc sacro concilin shtuta sunt, <strong>de</strong>-<br />

clíirat, ita dccrela fiiisse, ut in bis salva semper auctoritas sedis apos-<br />

tolicae et sit, et esse inlelligatur.. 1<br />

O que acahamos <strong>de</strong> kr nas pieinas <strong>do</strong>s <strong>de</strong>cretos e <strong>do</strong>s canoiies<br />

<strong>do</strong> concilio ecumeoico <strong>do</strong> secuio svr, e que nos parece a perpe-<br />

tuaçiío <strong>da</strong> zrancle theoeracia, esboça<strong>da</strong> a largos traços no direito<br />

diis clcc.ret ICS, na0 E mais <strong>do</strong> que o ultimo esforço, o <strong>de</strong>rra<strong>de</strong>iro<br />

?rito tl'iimo causa que se sentevenci<strong>da</strong>. A posição <strong>da</strong> egreja <strong>de</strong>pois<br />

<strong>do</strong> scciilo svi 6 inteiramente nova nas suas relações com o po<strong>de</strong>r<br />

tcmpnral.<br />

Neste perio<strong>do</strong> a egeja E perfeitamente in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, soberana;<br />

e mais <strong>do</strong> que isso, é <strong>do</strong>mina<strong>do</strong>ra. O gran<strong>de</strong> Gregorio vi1 tinha<br />

imagina<strong>do</strong> para a egreja uma architectura colossal no estylo egy-<br />

pcio e oriclntal <strong>da</strong>s grari<strong>de</strong>s theocracias primitivas; mas nas socie-<br />

tlii<strong>de</strong>s moilcrrias corria um sangue tliflercrite, os scus clcmcntos<br />

rram outro^; u tlioocracia ciihiii por terra no tempo d'cllc, <strong>de</strong>s-<br />

pe<strong>da</strong>~an<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> encoiitro á nobreza feu<strong>da</strong>l; e <strong>de</strong>pois acabou <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>struir-se nos fins <strong>do</strong> seculo xiii com o embate <strong>da</strong> realeza altiva,<br />

e no scculo xvi com a colera <strong>da</strong> revoluç80 religiosa e <strong>da</strong> heresia<br />

triumphante 9.<br />

Como pois pensar um momento s6 na iritervenç80 <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> nos<br />

1 Veja-se ain<strong>da</strong> R Seas. vil, <strong>de</strong> Reform. pr. - r Ea<strong>de</strong>m sacrosancta Syr10di~t,<br />

eisrlem prasi<strong>de</strong>ntibus Zeqatis, inccpt~rm resi<strong>de</strong>ntiae et reformationi.~ ne-<br />

~loti 112, ad Dei lau<strong>de</strong>m et cllktianae religMzis incrementum persrqui intendrirs,<br />

cct seq~iitur, etatue~~dt~rn censuit, salva sempet in omnibua Sedb ApoetoIic?r<br />

aucloritate.<br />

2 E no scculo XIXI qiie ee lev~nta no sul <strong>da</strong> França a cclchre heresia e<br />

seita <strong>do</strong>s alhigeiises, r que em gran<strong>de</strong> paite <strong>do</strong> norte ,e occi<strong>de</strong>nte <strong>da</strong> Eiiiopa<br />

se sente o prirnriro estremecer <strong>do</strong> prateit:tritismo. E o tempo em qiie 80<br />

liinpnm 2s arin s para s guerra religiofi.1 e .e preparam os ataques ao po<strong>de</strong>r<br />

<strong>da</strong> egrt.ia; é o tempo <strong>de</strong> S. Luiz 11% Frnl~qa, O auctor <strong>da</strong>s prim~iras prRgmaticas,<br />

e iippoiu <strong>de</strong> Wiclef na Ingliitrrr~ Ditam principalmente <strong>do</strong> seciilo<br />

XIV as priinciras luctrs <strong>do</strong>s reis e <strong>do</strong>s papas.<br />

FBo d'este tempo os conflictos com ou i~ri~iria<strong>do</strong>rea, a guerra <strong>da</strong>s investiduras<br />

e as gran<strong>de</strong>s cotiten<strong>da</strong>s com os aiiti.piipas.


negocios <strong>de</strong> creaçso e circumscripção <strong>de</strong> dioceses, quan<strong>do</strong> era esse<br />

pelas <strong>de</strong>cretaes, como vimos, um <strong>do</strong>s mais preciosos ornamentos<br />

<strong>da</strong> tiara, e os papas o <strong>de</strong>cidiam <strong>de</strong> sciencia certa, <strong>de</strong> pleno po<strong>de</strong>r,<br />

e ajunctan<strong>do</strong> a seus <strong>de</strong>cretos as penali<strong>da</strong><strong>de</strong>s fortissimas, que Ihes<br />

eram garantia mui eficaz ?<br />

Se alli, no tempo <strong>do</strong> imperio e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> Constantino, a egreja<br />

ao passo que resistia ao po<strong>de</strong>r civil, se aproveitava <strong>de</strong> seus regu-<br />

lamentos, e perfilhava suas constituições; era que ella jh pretendia<br />

transpor os limites <strong>de</strong> sua natural jiirisdicyão, conservan<strong>do</strong> ao<br />

mesmo tempo esse <strong>do</strong>ce laço, que Constantirio conseguira atar cm<br />

bons tempòs passa<strong>do</strong>s.<br />

Agora, porem, ella <strong>de</strong>spe<strong>da</strong>ça to<strong>da</strong>s essas prisões, e campêa s6<br />

e unica sobre a Europa.<br />

A disciplina, pois, Acerca <strong>do</strong> nosso objecto C 'ncste pcrio<strong>do</strong> a<br />

mesma emquanto ao po<strong>de</strong>r temporal e inteiramente outra quanto a<br />

cgre.ja :-PXC~US~O inteira <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>-soberania absoluta <strong>da</strong> cgreja<br />

na pessoa cio papa.<br />

Antes <strong>de</strong> passarmos ao capitulo seguirite diremos cm resumi<strong>da</strong><br />

cxposi~80 quaes os casos em que o direito <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes permittia<br />

a crciiçao <strong>da</strong>s dioceses, sua união e divisfio.<br />

As causas <strong>de</strong> erecção <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s sào <strong>de</strong> duas especies: -gcracs<br />

e particulares.<br />

As geraes cifram-se em duas :<br />

I - a evi<strong>de</strong>nte utili<strong>da</strong><strong>de</strong> - eui<strong>de</strong>ns uiiliias.<br />

I1 - a urgente necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> - urgens necessitas.<br />

Os canonistas <strong>de</strong>duzem as particulares <strong>da</strong>s causas, que rias <strong>de</strong>cretnes<br />

os papas expressamente dizem ser as que pediam a creação<br />

<strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s nesta ou naquella região.<br />

D'essas, expressas nas <strong>de</strong>cretaes, apenas se contam tres, que<br />

são as hypotheses seguintes:<br />

I - Se cresce a povoaçáo <strong>do</strong>s fieis e elles <strong>de</strong>sejam ter bispo<br />

proprio (caus. xvr, Quest. I, can. 5).<br />

11- Sc e tão diffusa a área <strong>da</strong> diocese, que não po<strong>de</strong> um<br />

bispo s6 prover a to<strong>da</strong>s as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s d'clla; ou se C <strong>de</strong>masia<strong>do</strong><br />

duro ao povo ver-se obriga<strong>do</strong> a ir a gran<strong>de</strong>s distancias tractar <strong>de</strong><br />

to<strong>do</strong>s aquelles importantes negocios que tem <strong>de</strong> sc passar na se<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> uma diocese (cap. v, <strong>de</strong> praebend. et dignit.)<br />

111- Se pela extensão, <strong>da</strong> diocese ou sua opulencia, a nimia


abun<strong>da</strong>ncia <strong>de</strong> seus reditos sr torna causa <strong>de</strong> <strong>de</strong>smoralisaç80 (cap. 5.'<br />

De praebendis et dignit. 1).<br />

Cumpre-nos notar que, classifican<strong>do</strong> em tres especies as causas<br />

particulares <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, ri80 querem os canonistas <strong>da</strong>r a enten<strong>de</strong>r<br />

que fóra d'essas hupotheses se riáo possa erigir um bispa<strong>do</strong> novo.<br />

To<strong>da</strong>s as \e7it.; qiie a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> urgente, e por conseguinte a evidcritc<br />

utilitldc!ts, o reclamar imperiosamentr, posto que náo se verifique<br />

nerihiima <strong>da</strong>s especies <strong>do</strong> cap. 5." 8 , oii caus. xv~ <strong>da</strong><br />

questão 1 ."o Decreto, <strong>de</strong>ve ain<strong>da</strong> o summo poritifice, sollicito em<br />

acudir ás necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>do</strong>s povos, expedir a competente bulla <strong>de</strong><br />

erecçso.<br />

O qiir dizpmos <strong>da</strong> erecçào <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s A <strong>da</strong> mesma forma applicavel<br />

á sua união, divisão e suppressão.<br />

As causas <strong>da</strong> união e dibisáo <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s são igualmente geraes<br />

e purticiilarese.<br />

As causas geraes <strong>da</strong> uniáo e divisáo não se acham especifica<strong>da</strong>s<br />

1 August. Barbosa, Jur. Ecclea. Univers. lib. 1.0, cap. 2.0, n.O 131 in fine.<br />

Gibert, Corp. Jur. Canonic. per regulas, tom. 2.0, tit. vri, 5 vi, Reg. vi et vir.<br />

2 Gibert, lng. cit.-August. Barbosa, Jur. Caiz071. I~kterpret. ~S'electa, tom. vi,<br />

Praetermissa et addz'tam. ad CoUectun. Doctor. i l quiiique ~ Llecretal. 1ilir.caus.<br />

xvr, q. I.', pag. 327.<br />

Estevào Danyc, Jur. Pontif. tom. iv, Pars I:, vb. episcopntzts, n.O 2, diz:<br />

, a... caiisa rioros Episcopatus erigendi est multiplicatio populi duin tarnen<br />

solt~innihiis et frequentioribus locis fiaiit ne vi!escat Episcopalis digiiitws-<br />

glos. mirlfiplicat ir1 exirav. se<strong>de</strong>s Apost. De o$cio clele,q. ittler comrntrne8.r<br />

~~Epi9cnpa!usiiii reditibus pluririium abuii<strong>da</strong>iis et tc.i.ritorium grau<strong>de</strong> habeiis<br />

ita quod Episcopus singularum omriem viilturn iiispicere non possit, po:<br />

test erigi in Aletropolim nornm, cui pro Siiffinganeis Ecclcsiis possunt errgi<br />

Episcopatus illi, et alii <strong>de</strong>putati er!rauag. Sduator <strong>de</strong> prarb. inler commune8.s<br />

Os cauoniatas distingiiem tres varie<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> uuiVes: a utuito suppressiva<br />

-mio suppres.viva, a uriiiio accessoria - unio accessoria, e a uniao priiicipal-principaliu<br />

unio.<br />

Em a unicio suppressiva uin <strong>do</strong>^ bispa<strong>do</strong>s unieri<strong>do</strong>s supprime-se iriteiramente;-é<br />

como se não tivesse existi<strong>do</strong>. A proviscio <strong>do</strong> bispo iiào faz nieliç50<br />

algiiiiia d'elle. Se por exemplo entre nós o bispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Evora se unisse ao <strong>do</strong><br />

Al~arve st/,ppressice, o bispo 86 po<strong>de</strong>ria usar <strong>do</strong> titulo <strong>de</strong> bispo <strong>do</strong> Algarve,<br />

e tipo <strong>de</strong> bispo <strong>de</strong> Evora e <strong>do</strong> Algarve juncta ou separa<strong>da</strong>mente.<br />

E o exemplo <strong>do</strong> can. 49, caiis. xvi, q. 1.'<br />

A união accessoria cffectua-se? quan<strong>do</strong> um bispa<strong>do</strong> se une ou accrescenta<br />

a outro, fazeri<strong>do</strong>-se como que um simples accessorio ou aniiexo d'elle-qua&<br />

accessorium eeu anlcexa-não <strong>de</strong>sapparece inteiramente como se nRo existira<br />

quau<strong>do</strong> na união auppressive; mas tambem não,conserva egcial altura ao lii<strong>do</strong><br />

d'aqi~elle a que se une como na pri,ncipaliter. E a especie <strong>do</strong> cap. 8.O De excessib.<br />

pra<strong>da</strong>t. e <strong>do</strong> cap. 1.0 h'e Se<strong>de</strong> Vac.<br />

A uiiião principal dá-se, quan<strong>do</strong> se unem <strong>do</strong>is bispa<strong>do</strong>s, conservan<strong>do</strong>-se<br />

comtu<strong>do</strong> ambos e não se submetten<strong>do</strong> nenhum d'elles ao outro. Na provisão


em nenhum texto; mas, como para a creação <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, eHas<br />

<strong>de</strong>vem ser a urgens necessitas e eui<strong>de</strong>ns ulilitas. k o que se <strong>de</strong>duz<br />

<strong>do</strong> can. 2. Disl. m e <strong>do</strong>s cap. 20 e 23 <strong>de</strong> Electione.<br />

As particulares <strong>de</strong> união S ~ O os casos em que occorrem a urgente<br />

necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> e evi<strong>de</strong>nte utili<strong>da</strong><strong>de</strong> ; e vem expressas duas : -<br />

a falta ou diminuiçâo <strong>do</strong> povo <strong>da</strong> diocese qiie não precisa <strong>de</strong> <strong>do</strong>is<br />

bispos-e a invasão <strong>do</strong>s inimigos (can. 48 e 49, Caus. xvr, q. 1).<br />

Das causas particulares <strong>de</strong> divisâo s6 falam o can. 5, Caus.<br />

xvr, q. i, e o cap. 5. <strong>de</strong> praebend. et dignit., e são as mesmas<br />

<strong>da</strong> creação <strong>de</strong> novos bispa<strong>do</strong>s, porque realmente a divisão<br />

involve uma nova erecção <strong>de</strong> dioceses.<br />

ambos guar<strong>da</strong>m seu nome, c para nao parecer que um d'ellrs e&& sujeito ao<br />

outro, coiijurictamerite se iiornettm ria provisio, lios coiitraetos e lias assigiiaturra.<br />

Neste caso o bispo tem a op@o para residir em amhas as egrejt~s<br />

OU só<br />

numa d'ellas. Assim, iin liypotlicse <strong>da</strong> uniio principaliter feita tios Iiitipaclos<br />

<strong>do</strong> Algarve e Evorri, o bispo lia <strong>de</strong> chamar-se e wssigiiar-se bispo (10 A1g:ii.c.a<br />

e <strong>de</strong> Evora; elle po<strong>de</strong> residir ou 96 em Evpra, ou sd cni Paro, ou ter resi<strong>de</strong>ii-<br />

cia permarieiite em ambas as ejirejas. E o exemplo <strong>do</strong> mn. 4.8, caiis. xvr,<br />

y. 1.. Veja Gibert no logar cita<strong>do</strong>.


CAPITULO V1<br />

A SB Apostolica e as Egrejas nacionaes;<br />

ultimo esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> direito <strong>da</strong> egreja<br />

Comcc:i a lucta <strong>do</strong> pe<strong>de</strong>r tomporrl contra a ré apostolica.- A escola ultramonlana<br />

reriiige, rib<strong>de</strong>cen<strong>do</strong> a uma lei <strong>da</strong> bistoria.- Erradi~ caminlio qiie ;i i~xl.t~j;i seguiu<br />

no concilio <strong>de</strong> Tmnlo.-A porirão <strong>da</strong> egreja e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o reculo xvii iii;i iliíliri1.-<br />

Apparecem os <strong>de</strong>fensorm <strong>da</strong>s likr<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong>r tarejas iiacioiiaes : consei1iienci;is d'estr,<br />

eslii<strong>do</strong> <strong>do</strong> (li reito eccle6iaitico.-0s realistas, os ulLr~monlaoos, a pliiloso y1iii1.-A<br />

escola teii~pei-a<strong>da</strong> ou constiiucioniil. - Ultima ybase <strong>da</strong> disciplina Acerca <strong>da</strong> eirruuscripcão<br />

e creaeào <strong>do</strong>e bispa<strong>do</strong>s.<br />

A historia <strong>da</strong> scgun<strong>da</strong> meta<strong>de</strong> <strong>do</strong> seculo xvr fecha em sua ultima<br />

pagina o capitulo <strong>do</strong> direito poritificio; esvaem-se os sonhos<br />

que sonhára Gregorio vir e algiins <strong>de</strong> seus successores ; a theocracia<br />

está con<strong>de</strong>mna<strong>da</strong> para sempre.<br />

Comcça npra uma lucta incarisatel: <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os la<strong>do</strong>s se ataca<br />

o ~v<strong>de</strong>r <strong>da</strong> ccrre'a no po<strong>de</strong>r papal; a soberania temporal. clariiiin<strong>do</strong><br />

0.J<br />

:~mancipiiçã~, tai quasi a esmagar a in<strong>de</strong>pendt~!ic,i~i (i qii(:<br />

tem dircito a egreja, a <strong>de</strong>positaria <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r espiritual.<br />

Se <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> tantos seciilos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>za, se <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> espantosos<br />

esforços, <strong>de</strong> táo custosa perseleratiça, a sé apostoiica conseguira<br />

cobrir o orbe com a rcdc <strong>de</strong> siia jiirisdiccão larguissima ; se agora<br />

a reforma levantava o collo, ameaça<strong>do</strong>ra e triumphaiitc ; se uma<br />

parte <strong>da</strong> Europa rasgava, rin<strong>do</strong>-se, iis bullas <strong>da</strong> excommiinh~o papal<br />

e viraba as costas aos poritificcs, <strong>de</strong>sprezan<strong>do</strong>-os ; como não<br />

qiiereis que Roma se erguesse tambem <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> primeiro, terrivel<br />

e inespera<strong>do</strong> rebbs, que a arrrmesshre <strong>da</strong> ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Yedro?<br />

como não quereis v6s, que, repulsa<strong>da</strong> atC ao outro la<strong>do</strong> <strong>do</strong>s Alpes,<br />

a cohorte <strong>de</strong>fensora <strong>da</strong>s tradiçòes papaes náo surja outra vez d'alem<br />

d'esses montes, voltan<strong>do</strong> á lucta ?<br />

Niio se apagam assim as vestigios <strong>da</strong>s instituiçbes que foram<br />

alguma cousa no mun<strong>do</strong>, que resumiram uma epocha, que presidiram<br />

ao seli <strong>de</strong>senvolvimento e <strong>do</strong>minaram o seu viver.


Destruiu porventura o christianismo, <strong>de</strong> uma vez ],ara sempre,<br />

o elemento romano <strong>da</strong> civilisação? e não era este mesmo irilliicnciatlo<br />

pelo espirito <strong>de</strong> outros gran<strong>de</strong>s cyclos <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> <strong>da</strong> humnni<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

?<br />

k acsim que se pren<strong>de</strong>m as geraçòes; 6 assim qiie o mun<strong>do</strong> vai<br />

arrastiiní10 a sua i<strong>da</strong>, fruiii<strong>do</strong> a heranya <strong>do</strong>s st~ciilos e soffren<strong>do</strong><br />

as d6rc.s <strong>do</strong>s vestigios indcl~*veis <strong>do</strong> veneno, qiir 'riesta o11 'iiiiquclla<br />

epodlia corroeu as socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s e Ihes causou a morte ; qiic é este<br />

tambcm outro Icga<strong>do</strong> <strong>do</strong>s tempos, bem triste mas ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro.<br />

Nuo 6 poríb~n (l'cste facto que nos <strong>de</strong>vemos Iamcntar, que scria<br />

isso loucura ; <strong>de</strong>vemos <strong>de</strong>plorar antes, e <strong>de</strong>plorar bem <strong>do</strong> fun<strong>do</strong><br />

<strong>da</strong> alma, o caminho erra<strong>do</strong>, que a egrcja tem segui<strong>do</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> este<br />

tempo.<br />

Se, <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> revoluçào religiosa e politica <strong>do</strong> seculo xvr, acabou<br />

<strong>de</strong> facto a gran<strong>de</strong> supremacia <strong>de</strong> Roma ; comtu<strong>do</strong> ella continuou<br />

a existir vika, iiidccliiiavel no direito <strong>da</strong> cgrcja. Esta exislencia<br />

6 falsa, (s affectadii, firigi<strong>da</strong> nas leis, mas persiste com a forca<br />

d'ellas.<br />

Que outra cousa B o concilio <strong>de</strong> Trento, senh a ~)c~rp(>tiiii~G~<br />

<strong>de</strong> to<strong>da</strong>? as prerogativas <strong>da</strong> tiara <strong>do</strong>s papas? Qriaiitlo to<strong>do</strong>s os que<br />

olham ao quiidro immeriso <strong>da</strong> ki<strong>da</strong> dii egr~ja bPcrn i~l)l)roximar-se<br />

o scculo xvi, cui<strong>da</strong>m logo <strong>de</strong>parar com urna nova eporha ria Icgislação<br />

ecclcsiastica. Na historia <strong>de</strong> qualquer outro dirfaito, isso<br />

teriii acontcci<strong>do</strong>; porém aqui nao, que tu<strong>do</strong> se passa <strong>de</strong> outro<br />

mo<strong>do</strong> : isto tem <strong>de</strong> particular, <strong>de</strong> mui singular, a historia d'esse<br />

direito.<br />

Keuiic-se um concilio ; disciitem-se as questões <strong>de</strong> disciplina ;<br />

tu<strong>do</strong> isto compelii<strong>do</strong>, obriga<strong>do</strong> pela forca <strong>de</strong> um gran<strong>de</strong> aconteciincrito,<br />

que as leis fataes <strong>da</strong> Iiistoria mokiam e que ninguem no<br />

miiri<strong>do</strong> podia evitar ; e este concilio, loiige tlc transigir com esse<br />

facto terri\rl que o fi~cra corilociir, sclla com a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> moral<br />

<strong>da</strong> palavra <strong>de</strong> scus bispos, com a inspirayão divina e sobrenatural<br />

<strong>da</strong>s <strong>de</strong>cisões conciliares, (* tlcfeiiílr com a ameaya tremen<strong>da</strong><br />

<strong>do</strong> anaihema to<strong>da</strong> a obra <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> ; petrifica com sua voz, veneran<strong>da</strong><br />

para o catliolicismo, as institui~òes então já incompativeis<br />

com a ci,ilisaçào, e que rio futuro, ou haviam <strong>de</strong> produzir a perdiçuo<br />

<strong>da</strong> egreja, se se nao regenerasse, ou haviam <strong>de</strong> seccar as<br />

fontes mesmas <strong>do</strong> progresso, e, involven<strong>do</strong> <strong>de</strong>pois o mun<strong>do</strong> no<br />

su<strong>da</strong>rio <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, dizer-lhe fatidicamente : - ~ivei agora ! -


Foi este iim <strong>do</strong>s gran<strong>de</strong>s erros <strong>da</strong> egrqa ; e o futuro, n8o em<br />

nossa vitl,i <strong>de</strong> certo, mas ás gera~iòes \iii<strong>do</strong>uras, saberá dizcr quaes<br />

os fiiriestos resulta<strong>do</strong>s d'taste <strong>de</strong>ploravel acontecimento.<br />

O concilio quiz impòr as suils <strong>de</strong>cisòes ao mun<strong>do</strong> cntholico, c<br />

mais <strong>de</strong> uma iiac;8o Ih'as niio qui~ acceitar sem reslriçcòes.<br />

A posição <strong>da</strong> egreja <strong>de</strong>s<strong>de</strong> este momento começa <strong>de</strong> ser mui dif-<br />

ficil, porque enceta a lucta com a realeza ; e em muitos logares,<br />

o qiic cra inteiramente novo, são os proprios monarchas que <strong>de</strong>-<br />

fen<strong>de</strong>m as heresias.<br />

Ao mesmo tempo, como a rcforma protestanlc 6 odiosa para a<br />

monarchia, porque a forca, que 'riella se irivol\e e que acaba <strong>de</strong><br />

ahalar o tlirorio <strong>de</strong> Yedro, 6 capaz <strong>de</strong> <strong>de</strong>struir tambem os thronos<br />

<strong>do</strong>s reis, iic.onttlce que os combatciiles, que se acercam <strong>do</strong>s moriar-<br />

t 1~19. ntac,,irn a se aposto!ica, preti:ri<strong>de</strong>ri<strong>do</strong> cubrir com seu escu<strong>do</strong><br />

o c ,itli ,li( ,\mo ; e, como este se idctitilica 110 papa<strong>do</strong>, centro <strong>da</strong><br />

SO. csli,,. \Crn iiiagar a existencia <strong>da</strong> legislacào geral <strong>da</strong> egreja,<br />

(Ia Icpislação verd~dciramente cathoiica, ecumeriica, pugnan<strong>do</strong> tão<br />

s6 pelas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong>s egrejiis.<br />

Ca<strong>da</strong> um tracta <strong>de</strong> si, ca<strong>da</strong> um procura fazer na sua cgrcja as<br />

reformas qiic a <strong>de</strong>ixem coexistir com os progressos <strong>da</strong> moriarchia,<br />

com os dirclitos <strong>da</strong> coroa; mais tar<strong>de</strong> isto passa-se (Ia mesma manvira,<br />

mas para ajustar ao imperio <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> o calholicismo <strong>da</strong> egreja.<br />

lrsk inolirncaiilo eniituli-se, a <strong>de</strong>speito <strong>de</strong> sé apostolica, sem o<br />

aeii tisst~titimeiito, e algumas vezes mesmo sem clla sabcbr; mas<br />

ciliicitua-sc e k reali<strong>da</strong><strong>de</strong>. Nasce d'aqui um esta<strong>do</strong> abortivo, mori-<br />

struoso ; po<strong>de</strong> quasi dizer-se com acerto - o calholicismo romano<br />

-porque o pretentli<strong>do</strong> catholicisrno <strong>da</strong>s outras egrejas d diverso<br />

<strong>do</strong> <strong>de</strong> Koma; e d'este mo<strong>do</strong> elle <strong>de</strong>sapparece a meio <strong>de</strong> sobre a<br />

terra.<br />

A ver<strong>da</strong><strong>de</strong> é que este esta<strong>do</strong> 6 incomprehensivcl, mas real; a ver-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong> 6 quc a cgreja tem razào dc se queixar <strong>da</strong>s nações catho-<br />

lictis ; -1niis tambem é ver<strong>da</strong><strong>de</strong> que só a separação <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is po<strong>de</strong>res,<br />

<strong>de</strong>iliin<strong>do</strong> a cgreja entregue ao seu proprio vi~er, po<strong>de</strong>rá<br />

c.orisc1puir o catholicismo ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro, se um catliolicismo k possivel<br />

; c tambcm 6 f6ra <strong>de</strong> duvi<strong>da</strong>, para n6s, que aquella scparaçâo<br />

só po<strong>de</strong>rá inteiramente verificar-se, quan<strong>do</strong> a egrqa quizer rcformar-scl,<br />

mo<strong>de</strong>lar a sua coristituiçào pela architectura <strong>do</strong> primitivo<br />

christi;iirisrno, porque o que actualmente se podc sem erro chamar<br />

cuílrolicismo romano, k um conjuricto <strong>de</strong> instituições iricom-<br />

8


pativeis com o progresso, com a liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, que é s6 o futuro <strong>do</strong><br />

mun<strong>do</strong>, que palpita ancioso por ella.<br />

Eis aqui a origem, a explicaçZío <strong>de</strong> encontrarmos hoje as bi-<br />

bliothecas clicias <strong>de</strong> uma immensa multid8o <strong>de</strong> canonistas <strong>do</strong>s so-<br />

CII~OS XVI e xvir, em cujas obras a <strong>do</strong>utrina conserva o mesmo<br />

caractcr <strong>da</strong> <strong>do</strong>s escriptos <strong>do</strong>s srculos anteriores. A glosa hoje si-<br />

gnifica ain<strong>da</strong> tanto como entáo, e mais que entao crescem os com-<br />

mentarios aos cinco livros <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes <strong>de</strong> Gregorio ix, e nestas<br />

paginas continúa assim a apparecer inteira a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> Se<br />

Apostolica.<br />

Ao mesmo tempo vão <strong>de</strong>terminari<strong>do</strong>-se as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong>8 eprejas;<br />

publica-se o resumo, como que o codigo <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> algu-<br />

mas 1; o clero francez retine-se em assemblea e promulga os qua-<br />

tro celebres principios <strong>de</strong> sua Declarução; diz ao mun<strong>do</strong> que a<br />

egreja gallicana pensa e crê que o papa, e to<strong>da</strong> a egrejti, s6 re-<br />

ceberam <strong>de</strong> Deus po<strong>de</strong>r sobre as cousas espirituaes e não sobre as<br />

temporaes;-que pensa e crê que o papa não é supcrior aos cano-<br />

nes; e que a plenitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r <strong>da</strong> sancta Sé tal, que, não só<br />

não tira força alguma aos canones <strong>do</strong> coricilio cciimenico <strong>de</strong> Coiis-<br />

tanya, mas que ate, segun<strong>do</strong> os canones, <strong>de</strong>vc ser excrci<strong>da</strong>.<br />

E, ao sentir renascer sua antiga e venerari<strong>da</strong> força, o episcopa<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>sperta e as fileiras <strong>do</strong> gallicanismo engrossam-se; a <strong>do</strong>utrina <strong>da</strong>s<br />

libcr<strong>da</strong>dcs <strong>da</strong>s egrejas vae-se tornan<strong>do</strong> <strong>do</strong> <strong>do</strong>miriio <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s e ac-<br />

ceitn-se como a cvi<strong>de</strong>ncia e a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, os magistra<strong>do</strong>s enten<strong>de</strong>m c alargam, em dctri-<br />

mento <strong>do</strong> podcr <strong>da</strong> egreja, estas mesmas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, a ponto <strong>de</strong> os<br />

seus proprios <strong>de</strong>fensores se verem obriga<strong>do</strong>s a diier qiic náo en-<br />

ten<strong>de</strong>m as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja como as concebem os magistra<strong>do</strong>s%.<br />

1 Nn França os irmãos Pithoii, aiitigos calvinistas, puhlicarnm o Traitk dra<br />

libertés <strong>de</strong> l'(gZise Gallicane em 1594, e <strong>de</strong>pois Dnpuys <strong>de</strong>u a publico as pro-<br />

vas d'essas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s famosas.<br />

2 Como o disse Hoçsu~t, na França, no seu disciirso sobro a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> fk.<br />

NFio po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> dizer duas palavras a respeito d'este gran<strong>de</strong> facto,<br />

que occupou os seculos xvrr e xvirr.<br />

Quan<strong>do</strong>, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> serenar a tempesta<strong>de</strong> levanta<strong>da</strong> pelo moiige di Witemherg,<br />

a eschola d'alem-montes couscgue erguer-se <strong>de</strong> iiol o, a bua colerii i e-<br />

<strong>do</strong>bra tcmivel, e naquellas nações on<strong>de</strong> a reforma n%o foi abraça<strong>da</strong>, ahi ella<br />

emprega to<strong>do</strong>s OS nieios para diiniiiuir e acabar o po<strong>de</strong>r <strong>do</strong>s reis. A seita <strong>do</strong><br />

Jesus tem em seus escondi<strong>do</strong>s <strong>de</strong>aignios o ~~~~ogrnrnma <strong>de</strong> Gregorio vir. Conto<br />

agora, a scienein surgira rmancipadn <strong>da</strong>s trevas <strong>da</strong> c<strong>da</strong><strong>de</strong>-media e <strong>do</strong> crrpusculo<br />

<strong>do</strong> retiascimento; ern quanto na escuridão essa seita emprega to<strong>do</strong>a 06


Juiictainciitc com tu<strong>do</strong> isto, ao sei1 la<strong>do</strong>, ora iiitlueiician<strong>do</strong>-o,<br />

ora caminliari<strong>do</strong> inc!i&rerite para com vsse movimerito acanha<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

iima grnn,!e qu-o, a philosoyhia dc!scbnvulve-se, cresce, aperfeicoa-rc<br />

em to<strong>do</strong> o secuio rvii c no xviri, e, ao cliegar o seculo<br />

xis, :\o aiiroximar-se mso tempo, ella miiltiplira seus braços,<br />

abrange to<strong>do</strong>s os tr&h <strong>do</strong> cspirito. Tu<strong>do</strong> se discute, tu<strong>do</strong> se<br />

arrasta a tribo* m), e ahi se lhe pergunta- porque existe<br />

t ~vircluc t1adc contúar i ai-tir.<br />

.\ .,cic,iicia politica, por cst;icionaria e quasi cobrin-<br />

<strong>do</strong>-se inteira d'um aspecto e<strong>da</strong>stico wb a inlluencia <strong>da</strong>s escolas<br />

<strong>do</strong>utrinaias, ergue seu v& e <strong>de</strong>scobre os vastos cbos <strong>do</strong> futiiro.<br />

A pliilosophia <strong>da</strong> bistoria, a si-ia pova, impassivel c gran<strong>de</strong>,<br />

illumina com sua <strong>da</strong>ra e serena luz o passa<strong>do</strong> <strong>da</strong>s iristituiçòes e<br />

tlt~svt~ii<strong>da</strong>-llies ao mesmo ternpo (I seti porvir.<br />

t\55irn ;I sciencia, a iiitelligenl:ia tlo seculo, discute Roma e o<br />

papa, o catholicismo e a idka religiosa, a religiáo a egreja,<br />

. -<br />

t<br />

meios ara realisar seus extravagante, projectos, os caiionistas <strong>de</strong>fcn<strong>de</strong>m em<br />

suas o ras O po<strong>de</strong>r <strong>do</strong> papa. O novo eiam~iito <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>, s realeza, precisara<br />

<strong>de</strong> um <strong>de</strong>feiisor. Aos rnonarroi1i:icbos opp',paio lias Prelecçùes <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> I'dt-io, e aiii<strong>da</strong> nivitos oiikos<br />

<strong>do</strong>e iiosnos reiuicolas e extrangeiros, to<strong>do</strong>s iiiui curiosos pctlo que sigi~ifirain<br />

e representarairi rio <strong>de</strong>stino <strong>da</strong>s naçGes, c cpualiiietite pelo apparato dc sue<br />

arguiiientaç%o, exaggero <strong>de</strong> suas theorias cle realeza moiiarchica, <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong><br />

direito diviiio e pelos titulos pomposos <strong>de</strong> seus cscri tos.<br />

Coiiio monarchomaeon notaveia, d'eotir n infinita asls <strong>do</strong># secinrios d'eitu<br />

1 1


k um novo perio<strong>do</strong> que se abre sobre os tempos a vir; graridc<br />

perio<strong>do</strong> sem duvi<strong>da</strong>, que contém a solt~çáo <strong>de</strong> muitas <strong>da</strong>s mais<br />

commoventes questões que nos agitam a to<strong>do</strong>s, que agitam a liiimaiii<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />

atE ao mais fun<strong>do</strong> <strong>de</strong> seu esgirito.<br />

E no meio dc tu<strong>do</strong> isto que faz a egreja? qunri<strong>do</strong> a ultima Irora<br />

<strong>da</strong>s liber<strong>da</strong>tles <strong>da</strong>s egrejas vai soar talvez, qiiari<strong>do</strong> li\rc d'estas<br />

servidões ella vai começar a viver gran<strong>de</strong> como rios s~iis primci-<br />

ros dias, que faz ella?<br />

Renasce, cresce, augmcnta-se pavorosamente, por todii ;i parte,<br />

o parti<strong>do</strong> ultramontano,-e s8o táo magcstosos os riossos dias, que<br />

o mun<strong>do</strong> scicntifico dá a essa escola um riome novo -iieo-catho-<br />

licismo-e discute grave as suas theorias !<br />

Eis aqui como se 110s apresenta esta ultima e riova pliasc tio<br />

direito <strong>da</strong> egreja.<br />

VAem to<strong>do</strong>s a arena <strong>da</strong> lucta dividi<strong>da</strong> em tres facçòes, que dizcrn<br />

ca<strong>da</strong> uma combater pela unica idéa que se casa com o catholicismo<br />

<strong>da</strong> egreja, e a ver<strong>da</strong><strong>de</strong> 6 que ca<strong>da</strong> tima d'ellas <strong>de</strong>feri<strong>do</strong> os princi-<br />

pios que o excluem inteiro.<br />

absiird~s theorias, lembraremos João dc Mariaiin no livro <strong>de</strong> Zle Ihge et Hegis<br />

i7isiitcttim~e, rcfutatlo por Roiissrl 110 Aliti-Maria~ia, - Bellarrnirio nos<br />

wiis recriptou, e especialmente no Trai tn<strong>do</strong> - Potestas I'upae circa res t~m-<br />

~~oralrs, que é mais um elogio <strong>do</strong> assaibiiiato <strong>de</strong> Henrique rv <strong>do</strong> que a refu-<br />

taçào dc Harclayo, corno pieteri<strong>de</strong> ser. Foi refuta<strong>do</strong> por Jogo Barclayo, filho<br />

d'aqucllr, no livro Dt-potestate papae, an et q7iatrnus in Rrgno et Prir~cipee<br />

secttlurt-s jvs et inzperi7~m habent, c airi<strong>da</strong> o rnesino Bellarmino ria obra I)e<br />

cntl11.oceraiis eltristiaitue fi<strong>de</strong>i adcersus 7~1Lj118 temporis haereticos. O jesuita<br />

Francisco Soares, professor <strong>da</strong> nniversi<strong>da</strong>dr <strong>de</strong> Coimbra, na Defesa <strong>da</strong> fd ca-<br />

tholica, etc.,-Molina, lente na iiniversi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Evora, rio seu tracta<strong>do</strong> De<br />

justitia ~t jure, 1602,-Azor nas Institzit. Moral.-Becano, Opuscula Th~o-<br />

Zo,qica, etc.<br />

Seria fastidiosissimo c sem maior proveito fazer a lista <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os inonarcomachos.<br />

Veja-se Hennirigio Arniseo, Tractotw <strong>de</strong> Auctorifate I'ri11ci1)c~rn in<br />

Populum, cxp. 1.0, n.O 1, tom. 2.0, <strong>da</strong>s Obras poli!icas no fim. 1(;48; egualnicnte<br />

1Ieiriccio -Elemrnta juris uati~rae et genliz~m, 121. 2.O, 5 cxxx, not.<br />

e a Drducção CILronolor/icn x pag. 416 e scruiiites.<br />

I'srn se fwer idCa <strong>do</strong> qiie foi rsta hingular disputa, que hoje a escola ultramoiitsiin<br />

prrteiidc coritiriuar, mas que o ii:lo po<strong>de</strong> conseguir, poi que se não<br />

tlisciite com clla iiessr objecto jR julga<strong>do</strong>, vamos tranqcrerer ~~ilui o s~giiinte<br />

trecho <strong>de</strong> Ariiiseo iio logar cita<strong>do</strong> -De vi in griiicipem semper ir~~ts(a :<br />

.Pli:irisneos quondrirn, geiiiis horniniim sstutum arropans, Regibus ipsis in<br />

f~stos fiiissr, adco iit eos aperte oppngiiare non veriti fucrunt, probnt Jose-<br />

phus x\ ir anticl. cap. Y ex (.o, quoti ciim jarn totri geiis Ju<strong>da</strong>eorum fi<strong>de</strong>in cae-<br />

sarai obliglissent jiirejuran<strong>do</strong>, ipsi soli rnaliieririt, non tantum boriis mul-<br />

tari, sed et peiiciiliim vitae incurrere, qiiam magi~tratiii coni corteros se<br />

eubjicere Horum vestigiis iricediint 11011 pauci ex recentioriim scriptorum nu-


Apparecem - a escola ultramontana - a escola tempera<strong>da</strong>-a<br />

escola realista.<br />

'1 tlizcordia <strong>do</strong> sacer<strong>do</strong>õo e <strong>do</strong> impt~rio, mas catholica -a concordia<br />

<strong>do</strong> sacer<strong>do</strong>cio e <strong>do</strong> imprio, mas anti-catholica - outra pretcridi<strong>da</strong><br />

concordia, mas ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira discorilia, <strong>do</strong> sacer<strong>do</strong>cio e <strong>do</strong> im-<br />

1)11rio. anti-catholica, e em senti<strong>do</strong> inberso <strong>da</strong> neo-catliolica.<br />

Perguntar pois amora, neste gerio<strong>do</strong>, qiinl o<br />

-.<br />

direito <strong>da</strong> egreja<br />

hcc.rca <strong>da</strong> circumscripção, e creay;io <strong>da</strong>s dioceses, vale fuer uma<br />

pergunta a que se po<strong>de</strong>m <strong>da</strong>r tres respostas.<br />

Pelo direito canonico geral, pelo pensar <strong>da</strong> eschola ultrainontana,<br />

unica representante genuina d'esse direito, a <strong>do</strong>utrina conserva-se<br />

a mesma - como <strong>de</strong> tu<strong>do</strong> o que temos dicto se <strong>de</strong>ve ter<br />

iitlivirilia<strong>do</strong> : - o papa s6 possue este importarite direito, e na<strong>da</strong>,<br />

incro qiii cum sint <strong>de</strong> poprrlo, ut suo ordini quisque impensius favet, quani<br />

ulteri, yopuli partes iln ag~i~lt contra principes, ut satis non habeant, si ab<br />

obedientia populum liberciit, quati<strong>do</strong> princeps <strong>de</strong>gcnerat; iiisi subditis quoque<br />

potestatern et jus tribuaiit iii ipsos regcs, et eubverso naturae ordiiie ex parentibus<br />

imperarites, ex sobtlitis Rege-, cx viilgo faciant principes. Multi<br />

quasi bonitatc causae diffisi iie noriiiric qiiidrrn sua adjicere aiisi sunt.8 Refere-se<br />

nestas ultimas palavi as Arniseo ao li\ro <strong>de</strong> ceito Junio Bruto,.pseii<strong>do</strong>nynio<br />

<strong>de</strong> um auctor, que atacava violentanierrte o po<strong>de</strong>r <strong>do</strong>s reis. Heinecio<br />

esçiel c no jl lembra<strong>do</strong> $ rxxx: - a... a<strong>de</strong>oque pestilentissimurn sit illud<br />

<strong>do</strong>gina riionnrchomachorum, quod popu21~s si1 ipso rege vel principe superior<br />

et penes illiim rr.alis, peues huuc personalis tantum majestas repeiitur.~<br />

Tal é ri. vicissitu<strong>de</strong> <strong>da</strong>s cousas humauas, qiie neste tenipo o direito <strong>do</strong>s povos<br />

ci a instrumento <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r <strong>do</strong>s papas ! e foi preciso combatel-o para evitar<br />

a thcocracia ! Eis o perigo <strong>da</strong> <strong>de</strong>mocracia sob o imperio <strong>da</strong> igriorancia.<br />

E-ta Iiicta chegou a tal excesso, que em muitos logares se con<strong>de</strong>mnaram<br />

publicamciite estes tracta<strong>do</strong>s, lavran<strong>do</strong>-se contra elles verbosas sentenças,<br />

cobrin<strong>do</strong>-os com os mais irifamantes epithetoe, e lançan<strong>do</strong>-os hs cbainmas pelos<br />

executoi ~s <strong>da</strong> jnstiça, com to<strong>do</strong> o apparato e solenitti<strong>da</strong><strong>de</strong>s terriveis <strong>de</strong><br />

uma execuçAo <strong>do</strong>s tenipos <strong>do</strong> absolutismo rclal.<br />

Em comperisaçHo a sagrn<strong>da</strong> congregação <strong>do</strong> In<strong>de</strong>x ia ~poutan<strong>do</strong> as obras<br />

<strong>do</strong>s adversarios, e maii<strong>da</strong>ii<strong>do</strong> tambem tls fogueiras <strong>do</strong> s~~riiptuoso Vaticano<br />

que Ihes fosse <strong>de</strong>voi aii<strong>do</strong> as paginas qiie ameaçavam <strong>de</strong>struil-o.<br />

Que csprctaculo singular <strong>da</strong>s ambiç3es e choleras <strong>do</strong>s homens! e é assirii<br />

to<strong>da</strong> a liistoria <strong>da</strong> egreja, que em certo perio<strong>do</strong> é a historia <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>; 9,<br />

assim que a intelligencia <strong>do</strong> honiem, sain<strong>do</strong> livro <strong>da</strong>s mãos <strong>de</strong> Deiis, tem conquista<strong>do</strong>,<br />

H. custa <strong>de</strong> muitas cslarni<strong>da</strong><strong>de</strong>s, seus foros e regalias.<br />

Quan<strong>do</strong> ser& o dia <strong>da</strong> paz, o dia <strong>da</strong> fi aterni<strong>da</strong>dt,, o dia <strong>do</strong> Evangelho? Ser4<br />

o dia <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, o dia <strong>do</strong> Christo?<br />

Sabe-o o futuro. Respeitemos o seu silencio, e no entret:iiito <strong>de</strong>diquemos<br />

ca<strong>da</strong> hora, ca<strong>da</strong> rnomento <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> A gran<strong>de</strong> conquista <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, para qu,e,<br />

qiiaii<strong>do</strong> cairmos no ultimo dia, possamos dizer ti moci<strong>da</strong><strong>de</strong>:-fazei como uos,<br />

que assim ganhareis o <strong>de</strong>scanso, quaiicio volver<strong>de</strong>e aò silciicio <strong>do</strong> tiirnulo,


absolutamerite na<strong>da</strong>, tcm que ver com isto o po<strong>de</strong>r civil, o po<strong>de</strong>r<br />

real 1.<br />

Pela eschola tempera<strong>da</strong>, o direito, conservan<strong>do</strong>-se o mesmo em<br />

principio, modifica-se comtu<strong>do</strong> na applicação, exigin<strong>do</strong> as coii-<br />

veniencias que o consentimento <strong>do</strong> principe seja pedi<strong>do</strong> e sua con-<br />

cessão indispcnsavel para levar a effeito estes negocios%.<br />

1 Episcopatus divisio et unio ad sol~~m Papam speotat ... Episcopatua ere-<br />

clionem factam a Papa in catltedralrm vel metropolim impedientes ultra poenas<br />

cmommt~izicationie, ~nterdicti et su.~prnsionis perdunt feu<strong>da</strong> et quaecumq~rr<br />

hen~ficia spiritualia et temporcilin; et si sint personae ecclesiasticae, &-<br />

ciuutnr inhabiles ad quaecumq7ie Crvtrjicia ecclesiasticu. Ilaoyz, Jur. Pontif.,<br />

Toini, iv - Pars. 1, vb. - Episcopatus, n." 2.<br />

C 1 'rimo igâtur soll~s Papa Eccleniam eri.$t et constituit in Cathedralem :<br />

i<strong>de</strong>m dicit <strong>de</strong> erectioae Ecclesiae C'alhedrali in metropolitanam.~ -Aiigust.<br />

Bai liosn, jur. eccles. univcrs., lib. 3, cap. 2.0, n.e 139.<br />

A rehpeito <strong>da</strong> dikislo <strong>do</strong>s hispaclos, leia-se o n.O 140 <strong>do</strong> mcsrno cap. 2.0, e<br />

sol~ir, a aiiitio veja-se o n.O 147, egrialmerite <strong>do</strong> mesmo cnp.<br />

a,Scicr1r/7trn est qtlorl eretiones in Cathedralem pari non ( 1~ heant nisi a Papa..<br />

h'tli,i$, iii prax. hcricficior, tit. <strong>de</strong> erectione Ecclesiae in Cathedralem n.O 1.0<br />

- 7irc ohsfat q7rod Imprrator eriyat civitatem, mrtropnlitnnamque faciat ....<br />

srrl ~ O I L 2101r~ i( eriqere Episcopalem vel arc?~irl~iscoy)nlrn~ dignitatem, quis aad<br />

hoc n~illus 11nOrt potestalena extra 1'apana.r O rriesrno Rehilff, log. cit. n.O 5.<br />

Leia o ii O 22 <strong>do</strong> Tit. <strong>de</strong> mjone <strong>da</strong> rncsma nrnxe <strong>do</strong>s beneficios. a resaeito <strong>da</strong><br />

urii5o <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s.<br />

Vrjs ain<strong>da</strong> Azor, Institdion. Moral., pag. 2, lib. 5.0, cap. 29, q. 25 in pr.<br />

e lih ti:, ca8. 30: 9. 2 e 4.<br />

Nicolnu arcza <strong>de</strong> õeneficiis, ~nrt. 12. caD. 5. n.O 1. vara a ereccilo <strong>do</strong>s<br />

bispa<strong>do</strong>p, e cnp. 2,'n.0 60 iara 8 8iia união.<br />

/)r. .llexia, pag. 280, 354 e 43.) <strong>do</strong> seu Tractar/o <strong>de</strong> direito ecrlesiastico.<br />

Kr:i pr'cisv um volume para citar to<strong>do</strong>s os cwnoriistas, que sem coiitcstaçiio<br />

affii niarri esta disciplina : bastam estes para veirrios como 8 aiii<strong>da</strong> viqoiosissi-<br />

ma a tloutiiiiri <strong>do</strong> direito canotiico <strong>de</strong>pois <strong>do</strong>s at:iyiies <strong>do</strong>s realistas (. tlns rc-<br />

voliiçGes <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.<br />

2 . Quare non esl, qucd a communi nniversalis Ecclesiaeaensu rece<strong>da</strong>mus for<strong>da</strong><br />

A , , .<br />

s'n princip~s a :ulatio~te; ut cm~tigit Marco Ar~tonio <strong>de</strong> Dominis, qui episcopatui~rn<br />

institutionem Rr,p'bus prrperam et co~ilra ipeos cnnonrs asserit. ibtn<br />

reiie!ins (lispotrrn<strong>da</strong>e ratio ad Ecclesiam prrti~~rt, quernadmodum dixi, quam<br />

tamen sine consensu Principum peragere noil drbet ut osten<strong>da</strong>m, lihro IV.<br />

Cap. xirr.. Pedro<strong>de</strong> hlarca, Concordia Sacerd. et Iuiper. Lih. 2.0, cap. IX n." 7.<br />

Hoje oa eecriptorcs <strong>da</strong> eacola ultrainontana n%o sb preten<strong>de</strong>m ver as primeiras<br />

origeiis <strong>do</strong> privilegio pontifica1 na practice <strong>do</strong>s apostolos, como diesemos;<br />

mas tambem, levan<strong>do</strong> a questao para o campo pliilosophico, cui<strong>da</strong>m<br />

<strong>de</strong>monstrar que to<strong>da</strong>s as conrenieiicias pe<strong>de</strong>m que ao papa se coiifira esse<br />

pod~r. Goschler, jrl cita<strong>do</strong>, escreve que al'attrihiition exclusive <strong>de</strong> ce pouvoir<br />

aii pape Btait d'ailleurs <strong>de</strong>veiiue iridispensable; eii effct Ia pluprirt <strong>de</strong>u paya<br />

oií i1 y avnit <strong>de</strong> nouveaux évéches h in~titurr, xvaitwt 8tk cotiveitis par le<br />

zPlr dcs l6gtits apostoliqiies; <strong>de</strong> pliis i1 fallriit ~~sigiirr aun iioriveau diocbes<br />

<strong>de</strong>a limitrs certaiiies; <strong>de</strong> fr4qiicntes dieciissione s'élevaient entre les archévêqnes<br />

et les éveques, que le Pape seu1 poiivnit ri?aoudrc ; enfin maintes dis-


A eschola realista, hoje quasi extiricta ou transforma<strong>da</strong> na eschola<br />

coiistitucioníil e tempera<strong>da</strong>, por &ito <strong>da</strong>s aias i<strong>de</strong>as <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

religiosa, dii tio principe o primeiro logar; mss, faltan<strong>do</strong>-lhe o apoio<br />

<strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretars e <strong>do</strong>s canones, 6 essencialmente nacional, furi<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-se<br />

nas rccor<strong>da</strong>çóes <strong>do</strong>s tempos que foram, basean<strong>do</strong>-se em as<br />

no\iis li1,crdn<strong>de</strong>s <strong>da</strong>s constituiyóes politicas.<br />

1 ) iiii<strong>da</strong> ~ nos serviria especificar em ca<strong>da</strong> nação o direito pro-<br />

pio d t b .lias cgejas; o espaqo C precioso para <strong>de</strong>scobrirmos, quanto<br />

couber cm nossas forças e tempo <strong>de</strong> que dispomos, o direito ecclc-<br />

siastico portuguez, se o ha.<br />

Vamos,. pois, immediatamente trazer a questão para o cariipo 11,<br />

nosso direito.<br />

penses 'txient nécessaires, pour les hn<strong>da</strong>tione &e mu<strong>de</strong>s Bglises et le<br />

Ptiyt: sriil pouoait lea <strong>do</strong>nner..<br />

SBo <strong>do</strong>ia factos mui notaveis <strong>da</strong> historia <strong>da</strong> eresç5o <strong>da</strong>a dioeeses o celebre<br />

scliisma constitucional <strong>da</strong> França e a concor<strong>da</strong>ta <strong>de</strong> Pio vir <strong>de</strong> 1801. Na 2.'<br />

parte d'este estu<strong>do</strong> falaremos d'elles.


PARTE SEGUNDA<br />

I,EGISLA@O ECCLEWASTICA POBTI;GCEZ:\<br />

A RESPEITO<br />

Aos* ma -sés est-elle qoe toute immix-<br />

iioa <strong>de</strong> crrfe mture, que1 qu'en soit It! mo<strong>de</strong>,<br />

emirain to.ajnri rrec elle .j~isqu'a un cei-<br />

laiu pimt :a Yrrctioa. I'encbaioement tle Ia<br />

liberte imd irilrlle.<br />

Hcmrvr, &sai ar ler limites <strong>de</strong> l'arlin>i<br />

<strong>de</strong> IElat, vii.<br />

Se ba conclui<strong>do</strong> para eiempre el <strong>do</strong>gma<br />

<strong>de</strong> Ia pretwrion <strong>de</strong> Ias Iglesias por el Esta<strong>do</strong>.<br />

81 Esta<strong>do</strong> no tiene religion, no Ia pue<strong>do</strong> te-<br />

mer, DO Ia ilrbe iener. bl Esta<strong>do</strong> no coniiesa,<br />

e1 E-ta<strong>do</strong> no comulga. e1 Esta<strong>do</strong> no se miie-<br />

n. Yo quiiiera que e1 Sr. Manterola tuviese<br />

Ia bon<strong>da</strong>d <strong>de</strong> <strong>de</strong>cirme en qu6 sitio <strong>de</strong>1 Valle<br />

<strong>de</strong> Josaphat ra a estar el dia <strong>de</strong>1 juicio el<br />

alniit <strong>de</strong>1 Esta<strong>do</strong> que se Ilama Espana.<br />

EHII.IO<br />

CABTELLIII, Discurso nas consli-<br />

tuinies bezpanbolac <strong>de</strong> 1869.


PARTE 11<br />

LEGISLA(;~O ECCLESIASTICA PORTTGCEZA A RESPEITO DA WL$~O,<br />

SUPPRESS.~~, ~~1x0, DIVIS~O E CIRCUMSCRIPÇ~O<br />

DAS DIOCESES E hIETROPOLE6<br />

CAPITULO I<br />

A egreja portugneza e suas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

Curiosas e graves qiiritõro. que as palavras- epja iwifnu - po<strong>de</strong>m so3citar. -<br />

Drlicii~nria <strong>de</strong> estuilos dr lii;toria ecclrsiastira portugeeza.-Comr rso improficiioc<br />

estes irabalhoc PP~I tractar priniciro dc saber m ba oo nao uma egreja portuguera<br />

ou lu.itana.-Erra<strong>do</strong> caniinlio que 16m segui<strong>do</strong> os seus escriplores: consequenciiis<br />

. d'esle 1;icto.- O csemylo <strong>do</strong> q u se ~ passa com a egreja gallicana mais nos obriga<br />

a seguir direccno diferente dii que até hoje se tein a<strong>do</strong>pla<strong>do</strong>. - Des<strong>de</strong> quan<strong>do</strong> se<br />

<strong>de</strong>ve reputar c\iilriiie a egreja lusitana?-Falsas i<strong>de</strong>as e confus8o <strong>de</strong> Joao Pi,dro<br />

Ribeiro e <strong>de</strong> I). Tliiiinaz <strong>da</strong> Eririirnac~o a este respeito.-N&o hn uma egreja lusitana:<br />

lia uiii;i rgir,j.i portugueza, coitemporanea <strong>do</strong> eslabelecirnento <strong>da</strong> nossa monarcliia.-As<br />

suíi!: Iiberd;i<strong>de</strong>r no temlto <strong>de</strong> D. Jos6 I e nos estatutos <strong>da</strong>universi<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

--1'1 tlt'nzões <strong>da</strong> escola ultramoiita~ici a respeito <strong>da</strong>s liberdii<strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja portugueza.<br />

-I


Egreja lusitana ! que gran<strong>de</strong> nome ! que gran<strong>de</strong>s recor<strong>da</strong>çóes se<br />

niio pren<strong>de</strong>m 8 idCa que nos traz h mente !<br />

Estas duas palavras, como outras <strong>da</strong> nossa chronica, soam-nos<br />

<strong>de</strong> um mo<strong>do</strong> ao mesmo tempo sau<strong>do</strong>so e cheio <strong>de</strong> altas e graves<br />

lembranças.<br />

E, comtu<strong>do</strong>, se nos <strong>de</strong>ixarmos ficar a contemplar esta idba, a<br />

medital-a, ella comela por nos apparecer conf~isa, in<strong>de</strong>cisa, vaga,<br />

e acaba por se esvair insensivelmente, e n6s acor<strong>da</strong>mos d'este so-<br />

nho, a perguntar:<br />

'<br />

-O que 6 a egreja lusitana ?<br />

- Houve uma egreja lusitana ? - Ha uma egrcja portugueza ?<br />

-Será isto um phantasma? ser8 um anachronismo, uma mo-<br />

nomania historica, uma paixáo <strong>de</strong> lusitanismo?<br />

E quem sabe ? talvez tima <strong>de</strong>sobedicncia con<strong>de</strong>mnavel, um schis-<br />

ma ? uma negaçào atrevi<strong>da</strong> <strong>do</strong> catholicismo ?<br />

Taes siio as graves e curiosas questòes que se nos apresentam.<br />

Ningucm cui<strong>do</strong>u ain<strong>da</strong> em propol-as, e menos em resolvcl-as.<br />

Muito pouco se tem cscripto sobre a historia <strong>da</strong> nossa egreja e<br />

aquelles que o tem feito, <strong>de</strong>ixam levar-se <strong>da</strong> corrente geral 1.<br />

1 A historia <strong>da</strong> egreja portupueza foi pela primeira vez estudn<strong>da</strong> e exposta<br />

por D. Thomaz <strong>da</strong> k;ncariiação, conego regrante tlo real mosteiro <strong>de</strong> Sa~icta<br />

Cruz, e <strong>de</strong>pois Bispo <strong>de</strong> Pernambuco. Irititiila-se a obra-Hietoria Eccleeiae<br />

Lusitanae per singula saeczila ab Evangrlio promulgato, em quatro tomos,<br />

comprehcndcri<strong>do</strong> rlesdc o primeiro seciilo até o dccimo quarto iiiclasi\ E PIIblicou-se<br />

o ultiino volume pelo começo <strong>da</strong> seguiitla meta<strong>de</strong> <strong>do</strong> seculo xvrrr.<br />

No tempo <strong>de</strong> I) Joâo v apparece pela piimeiia \cz a idPa <strong>de</strong> chegar a<br />

traqar-se o plalio <strong>de</strong> uma historia geral <strong>da</strong> egrejn portiigiieza.<br />

I). Mai~uel Caetano <strong>de</strong> Sousa, clerigo regular, tinha toiina<strong>do</strong> havia muito<br />

tempo o pro.jecto <strong>de</strong> escrever a historia ecclesiaeticn <strong>de</strong> l'ortiigal, que intitulava<br />

- f'antheon Anti8tilum I;unifanorirm, sive I,z~sitntiia Sacra, hoc est,<br />

chroiiicon uironrm qui in Lusitania uummo jure prnefuer~.<br />

('o1110 este nosso sabio privasse com o rei, uma vez Ilie coininunicou o seu<br />

plaiio e lhe dissc como tinha começa<strong>do</strong> os trabalhos no recolliirnento <strong>da</strong> sua<br />

cella. O rei, o nmso uer<strong>da</strong><strong>de</strong>iro Augusto e melhor que Tito as <strong>de</strong>licias <strong>de</strong> seua<br />

vussallos, protector caloroso <strong>da</strong>s lettras, approvou muito a idba e lhe pediu<br />

que não <strong>de</strong>sariimasse. D. Manuel Caetano ds Sousa quiz entÃo um cornpanhciro<br />

para aquellas fadigosas li<strong>da</strong>s, o qual não só soubrs~c c escrevesse O<br />

latim com to<strong>da</strong> a pureza, mas que tambem fosse <strong>do</strong>cil revisgo e censura;<br />

ao mesmo tempo indicava para censores os rnarquezee <strong>de</strong> Alegrete e Fronteira<br />

e Antonio Pires <strong>da</strong> Costa. Era isto pelo mez dc r~orer~ibro <strong>de</strong> 1720.<br />

El-rei, to<strong>da</strong>via, <strong>de</strong>sejava uma hietoria completa <strong>de</strong> Portugal em Intim e<br />

portiiguez, secular e ecclesiastica, sen<strong>do</strong> a ecclesiastica tract~i<strong>da</strong> em primeiro<br />

logar e chaman<strong>do</strong>-se Lusitania Smra.<br />

Ein 4 <strong>do</strong> mesmo mez pediu D. Jogo v a D. Manuel Caetano <strong>de</strong> %usa que<br />

Ilie fizesse uin plano para levar a efieito a sua vonta<strong>de</strong>, e a 7 <strong>do</strong> mesiiio mez


E <strong>de</strong> qiir viile ctzcre\cr sobre i1 egreja lusitana, controverter<br />

I<br />

difficeis qiic1*tòc1s Ac qBrca <strong>do</strong>s habita<strong>do</strong>rias, Iingua e costumes <strong>do</strong><br />

occid(>rit~. (! I pt~riins~il~i ibt*riw antes <strong>da</strong> prépção <strong>do</strong> christianisrno;<br />

I<br />

(10 qiii. \,II-. -dí)t*r O que dizem Strabàc, e Plioio a rcsprito <strong>do</strong>s<br />

limite. tla lirimltira Lusit~nia. sem prirneim io<strong>da</strong>sar se existe uma<br />

cywja nacional portugwza, se ha alguma com que se j)o<strong>de</strong>sse e<br />

IIOSSI iiiricl,i ho~e<br />

chaarr-se rgmja lusilata ?<br />

0 4 I~OS~OS escriptores aio trepi<strong>da</strong>m um rnomeab. Pard ellt14 n<br />

egreja lusitana, se tem si<strong>do</strong> rCia nes seus confins com d* vicissitu<strong>de</strong>s<br />

<strong>do</strong>s tempos, tem ti& áe bom o m a r uni<strong>do</strong> at1a1c.s os<br />

seculos o seu corpo multílorne: e tita w ja, que hojt. ti. ele-<br />

varcrn-se as suas metroples w a l t b portuguez, tem !)ara c.lles<br />

uma antizui<strong>da</strong><strong>de</strong> tão alta como o mesmo christianismo. EIIii 1 i\eu<br />

sob a <strong>do</strong>minação romana, assistiu Bs invasões gerrnanicas, p0<strong>de</strong><br />

respirar <strong>de</strong>baixo <strong>do</strong> jugo sarracerio e ao la<strong>do</strong> <strong>da</strong> religião <strong>de</strong> Islam,<br />

orgulliou-se em tempos passa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> contemplar seu graricie corpo,<br />

cobri:i<strong>do</strong> u pcninsula inteira, jiictou-se <strong>de</strong> farier parte <strong>da</strong> rgrqja<br />

hesl)miliola c luctar com os papa. no5 seculos vir, v111 e ix, foi<br />

urii<strong>da</strong> á egrcli~ Icoriesa, e por fim. alti~a, sentiu-se drspreri<strong>de</strong>r<br />

d'essa outra, expulsar a gran<strong>de</strong> religião <strong>de</strong> Mahomet, e ao cabo<br />

<strong>de</strong> tantos trabalhos e victorias, pd<strong>de</strong> repousar a cabeça sohre o<br />

lhe fni apresenta<strong>do</strong> esse plano, propon<strong>do</strong> o scu auctor a creaçso tle iirii,i aca-<br />

(lciriin i( .i1 (ir historia portiigueza.<br />

Trai t


tacu<strong>do</strong> <strong>de</strong> coricliiista<strong>do</strong>r <strong>de</strong> Silves e sob o sceptro <strong>do</strong>s filhos <strong>do</strong><br />

Contle I-leniiqtie <strong>de</strong> Borgonlia.<br />

C;iptiva<strong>do</strong>s por tào bello e vasto quadro, eil-os que se afun<strong>da</strong>m<br />

'rirsse immt~iiso campo, que cui<strong>da</strong>m po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>screver-nos minuciosírmcnlt:<br />

(liirante sua curta vi<strong>da</strong>, luctan<strong>do</strong> com a estc~rilidndc <strong>do</strong>s<br />

cliroriistas, <strong>de</strong>ixari<strong>do</strong>-se embair <strong>de</strong> suas frau<strong>de</strong>s, per<strong>de</strong>n<strong>do</strong>-se em<br />

conjecturas ácercii <strong>do</strong> escuro viver <strong>da</strong>s primitivas colonias habita<strong>do</strong>ras<br />

d'este chão formoso ; esqueceri<strong>do</strong>-se a discutir se I<strong>da</strong>cio e<br />

Itliacio foram justa ou in,justamente tfc~)ostos, ou a iiivcritar fabiilas<br />

invejosas para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a primazia <strong>de</strong> Ijraga contra a <strong>de</strong><br />

'I'olc<strong>do</strong>, ou a pôr <strong>de</strong> la<strong>do</strong> a pcriria <strong>do</strong> historia<strong>do</strong>r para tomar o<br />

cstjlo <strong>do</strong> antigo legcri<strong>da</strong>rio <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>s <strong>de</strong> beatos e milagres <strong>de</strong><br />

sarictos !<br />

$ assim que rião contamos uma historia completa <strong>da</strong> nossa<br />

egrqja.<br />

O prnprio Joao Pedro Rihriro, o sabio aca<strong>de</strong>mico, que nos<br />

promotte, no prologo <strong>de</strong> um pequeno esboyo <strong>da</strong> chroriica religiosa<br />

<strong>da</strong> riossa egrcja, não se <strong>de</strong>ixar seduzir <strong>da</strong>s fraudrs yiie pren<strong>de</strong>ram<br />

OS outros escriptores, cac, como veremos, rio erro comnium <strong>de</strong> ir<br />

buscar a origem d'ella ao tempo <strong>do</strong>s rorniirios.<br />

Falan<strong>do</strong>, como to<strong>do</strong>s fjlam, <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s preciosas, veneran<strong>da</strong>s<br />

dc nritigiiitiadc, <strong>da</strong> egrcbja lusitana, ain<strong>da</strong> não houve uma penna<br />

que riol-as contasse, que nos d6sse iim codigo d'essas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s,<br />

se algumas ha; e isto era tanto mais preciso,.quanto d'este nosso<br />

<strong>de</strong>slcixo se vai aproveitari<strong>do</strong> jh o ultramontanrsmo, o qual, zeloso<br />

d'oslns liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, guar<strong>da</strong>n<strong>do</strong>, alta mente repostum. o resentimcrito<br />

(1;)s coi11rarie<strong>da</strong><strong>de</strong>s que o uigor <strong>do</strong> braço <strong>do</strong>s nossos reis<br />

eni c~l)odias ~)t~ss~las Ihes Icz soi'frer, vem agora a discutir a legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>da</strong> nossa egrcjn, a perguntar-nos por essas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s face<br />

a face, c emprazar-rios a <strong>de</strong>clarar quacs srjam, se algiimas silo.<br />

E, nintla qiiantlo se prol(. existirem, nao melhoramos <strong>de</strong> posiç30<br />

; e para riosso ensinamerito lembrenlo-nos <strong>do</strong> que se passa com<br />

a egreja franceza.<br />

Qiiem não tem oiivi<strong>do</strong> fallar <strong>da</strong> famosa rgreja gallicana e <strong>de</strong><br />

suas celebres libercla<strong>de</strong>s, que tem rccrutaclo adcptos em to<strong>do</strong> o<br />

mun<strong>do</strong> e que quasi faz um schisma?<br />

E, comtii<strong>do</strong>, saiba-se que a existencia d'csta egreja 6 hoje muito<br />

contcstadn. De pouco serviu que os irmãos Pithou <strong>de</strong>ssem á<br />

Fran~a um codigo d'essas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s; <strong>de</strong> pouco valeu que Fenc-


lon, l:Icrir\ e Bossuet as quizcssem purificar livran<strong>do</strong>-as <strong>da</strong>s accessbes<br />

que o p~<strong>de</strong>r real e M magistrad(b5 lhcy tinham injustamente<br />

accrc~zi~rrit,~<strong>do</strong> ; na<strong>da</strong> imp-I a celebre <strong>de</strong>tiriirão que d'ellas apresciitoii<br />

o gran<strong>de</strong> arcakp <strong>de</strong> Meaux ;- huje diz-se qtic to<strong>do</strong>s csses<br />

esforços <strong>de</strong>monsttam não serem as taes Iiber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, qun retumbavam<br />

no m<strong>do</strong> inttko. mais <strong>do</strong> que sombras, com que ninguern<br />

sc inten<strong>de</strong>, nem os impaa<strong>do</strong>res, nem os bispos, riem a curia<br />

romria ; e accrescenta+ qoe. <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> celebre concor<strong>da</strong>ta <strong>de</strong><br />

1801 e <strong>do</strong> livro que em 1820 escreveu Joseph <strong>de</strong> BI~islre, De<br />

1'Eglise Callicane <strong>da</strong>ns m~i rapporl atec le Souvtrain I'ontife,<br />

a approximação <strong>de</strong> Roma c <strong>do</strong> epkmpr<strong>do</strong> fraiicez 6 ca<strong>da</strong> dia mais<br />

estreita, chegan<strong>do</strong> a aarmar-se qw & Saistre era prollliota,<br />

quan<strong>do</strong> csmvia que o soberano pontlfce t o sacer<strong>do</strong>cio friiiic~z<br />

se hiniam <strong>de</strong> abraçar, e que 'neste abm <strong>do</strong>cariam as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

<strong>da</strong> egreja gallicaiia 1.<br />

A ~ertlatfe 6 quc hoje, no paiz que tivera rim S. Luia, e uma<br />

p~aprnatira-sancção, reis tRo poic~osos, tão altivos prela<strong>do</strong>s ; que<br />

vira junctar-se o clero em certo di,~ e resumir em quatro ar-<br />

tigos a expressâo <strong>de</strong> sua vitl,~ pas.<strong>da</strong> e a promessa <strong>do</strong> sthu fiitiiro,<br />

e lançal-a ás faces <strong>do</strong> summo pat~fm; a ver<strong>da</strong><strong>de</strong> C que 'nesse<br />

paiz hoje são mui raros os her<strong>de</strong>iis <strong>do</strong> org-utboso clero pallicano.<br />

1- clua~'!o C. assim com a França, com o clero france~, com a<br />

clgrej;~ giillic.ann, que dcbternos pensar <strong>da</strong> r i ~ m pobre eewja portuguezii<br />

?<br />

3? por isto que <strong>de</strong>vemos passar rapi<strong>do</strong>s as folhas d'essiis obras<br />

<strong>de</strong> historia, que rios contam como a apria crescia e se elevava acima<br />

<strong>da</strong>s bor<strong>da</strong>s <strong>de</strong> certa fonte sem se critornar, c se viam 18 <strong>de</strong>ntro<br />

scenas <strong>do</strong> evangelho, como nas garrafas magicas <strong>do</strong>s alchimistiis<br />

<strong>do</strong> seculo xii; ou nos ~ êm repetir e trncar com os bicos <strong>da</strong>s pennas<br />

<strong>de</strong> seus ingenuos aiictores as palavras misticas, qiic alguris<br />

varòes tinham ouvi<strong>do</strong> <strong>de</strong>spren<strong>de</strong>r-se <strong>da</strong>s penhas alcantiladiis <strong>da</strong> solidâo<br />

que habitavam.<br />

Outros cui<strong>da</strong><strong>do</strong>s mais graves nos occupam <strong>do</strong> que esse folhear<br />

pie<strong>do</strong>so <strong>do</strong> 00s sanetorum <strong>da</strong> nossa egreja.<br />

Vamos primeiro in<strong>da</strong>gar <strong>de</strong>s<strong>de</strong> quan<strong>do</strong> se <strong>de</strong>ve reputar existente<br />

a egreja portugueza ; e <strong>de</strong>pois veremos se <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong> perio<strong>do</strong><br />

1 Charles <strong>de</strong> Rémusat, Le tradicionalisme-Revue <strong>de</strong> <strong>de</strong>us mon<strong>de</strong>s, 1857.


que se Iht! <strong>de</strong>ve assignar ate hoje ou ate certo tempo, houve ou tem<br />

havi<strong>do</strong> reaes, justos, acceitaveis privilegias, que façam d'ella irma<br />

vertlad(+-a egreja nacional.<br />

To<strong>do</strong>s os auctores, que entre nós se têm occupa<strong>do</strong> <strong>de</strong> quest<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> disc,iplina ou direito e liistoria <strong>da</strong> egqa portugueza, enten<strong>de</strong>m<br />

que esta egreja existe <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o tempo <strong>da</strong> propagaçiio <strong>do</strong> evangelho<br />

ria peninsula, e assim lhe chamam geralmente a egreja lusitana,<br />

ce<strong>de</strong>n<strong>do</strong> b iiiiiiiericia <strong>da</strong> idéa falsa e impalpavel <strong>de</strong> que nós <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>mos<br />

<strong>do</strong>s primitivos lusitanos. Este <strong>de</strong>feito 6 commum ao<br />

estu<strong>do</strong> historico <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o nosso direito, in<strong>do</strong> procurar-se a siia<br />

origem <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os mais escuros tempos ate b actuali<strong>da</strong><strong>de</strong>. Quantas<br />

paginas carrega<strong>da</strong>s <strong>de</strong> peza<strong>da</strong> erudiçao se riào encoritram nas memoriits<br />

<strong>do</strong>s riossos aca<strong>de</strong>micos dispensa<strong>da</strong>s ria in<strong>da</strong>gação <strong>do</strong> direito<br />

<strong>do</strong>s Iiisitanos, <strong>do</strong>s cartliaginezes, celtas, phenicios, van<strong>da</strong>los, siievos<br />

c alarios! Assim perdi<strong>do</strong>s 'nestas graves locubraçbes, quan<strong>do</strong> tocavam<br />

a historia <strong>do</strong> seculo xii, faltava-lhes a vi<strong>da</strong>, c a penna cala<br />

<strong>da</strong> mão <strong>do</strong>s aiictores em que a morte fizera píirar o movimento<br />

tio espirito, e to<strong>do</strong>s os que dc riovo pretendiam estu<strong>da</strong>r o nosso<br />

Oircito ria historia (Ias suas cvoluçòes se julgavam obriga<strong>do</strong>s a remoritnr<br />

ate a penumbra <strong>do</strong> clarão historico. Como nota Alexandre<br />

Ilerculario, o gosto exagera<strong>do</strong> <strong>da</strong>s aritigui<strong>da</strong>dcs romanas tinha-os<br />

acostuma<strong>do</strong> a ver a graridcsa <strong>da</strong>s rinçòes pelo prisma falso <strong>da</strong>s origensfabulosas<br />

e <strong>da</strong> t:popea legen<strong>da</strong>ria dc lo<strong>do</strong>s os povos; e consolava-os<br />

narrar, inllamma<strong>do</strong>s <strong>de</strong> louco amor piitrio, os gran<strong>de</strong>s<br />

feitos <strong>do</strong>s Viriatos, <strong>do</strong>s Apimaiios, <strong>do</strong>s Sertorios, e <strong>de</strong>sigriar-tu<strong>do</strong> o<br />

yuc crqortuguez com o riorne <strong>de</strong> lusitario.<br />

Como tu<strong>do</strong>, a historia <strong>da</strong> egreja portugueza rescnte-se d'isto<br />

mesmo.<br />

Coiihecemos apenas o <strong>do</strong>uto Joào Pedro Ilibciro, que intitula o<br />

seu projrcta<strong>do</strong> trabalho- Hisloria <strong>da</strong> egr~ja portirgueza.<br />

Mas que? suas investigaçòes comeyarn rios primeiros dias <strong>da</strong><br />

promulgaçáo <strong>do</strong> evangelho <strong>da</strong> periirisula, exactamcrite como os outros<br />

escriptores. I3 qual foi o resulla<strong>do</strong>? é quc cste ti,abalho ficoii para<strong>do</strong><br />

no seculo ix, e quiin<strong>do</strong> po<strong>de</strong>riamos aproveitiir-iros dc sua grandc<br />

leitura <strong>da</strong> historia <strong>de</strong> Portugal, apenas cncoritramos uns miriguii<strong>do</strong>s<br />

capilulos e paragraphos, on<strong>de</strong>, clrri-ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, iiiio apparccem jA as<br />

puerili<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> seus antecessorcs r on<strong>de</strong> tu<strong>do</strong> o que se escreve 6<br />

liistorico e fun<strong>da</strong><strong>do</strong>.<br />

I). Thomaz <strong>da</strong> Ericarnação nõo soube livrar-se d'estes <strong>de</strong>feitos; c,


posto que alargasse seiis estu<strong>do</strong>s até ao seculo xiv, restaram-lhe<br />

comtu<strong>do</strong> quatro bons $c.culos, onJe a historia <strong>da</strong> nossa egrcbja passa<br />

po,r gran<strong>de</strong>s teaapestbrs e on<strong>de</strong> ppnentura a modificiiçào <strong>do</strong> di-<br />

reito 1)oi tiiguez I! nmi nd;itel.<br />

Jrn iilgumas disserta* sobre poiitos esp, i iars <strong>da</strong> historia <strong>da</strong><br />

riosvi enreja, pre<strong>do</strong>mina e a dta sempre a [ri, -ma idka.<br />

O illiistre auctor ila & t e <strong>de</strong> Portugal c>rtcrininou radicaliiic*r~tc~<br />

rstc abuso no e5tu<strong>do</strong> & historia profan'i <strong>do</strong> nosso paiz: <strong>de</strong>inoiistrou,<br />

com a ~~roftinb ilcl!i,gwia <strong>do</strong> vercladciro Iiistoria<strong>do</strong>r,<br />

que nem o territorio, riem 3 fa:;. n >m a liWa, unicos caracteres<br />

que coiiservam a i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> Qo- po\ M na successào <strong>do</strong>s tcmpos,<br />

existiam entre nos e 05 antigns Iirutmos. Os elementos que constituiram<br />

a nossa nacionali<strong>da</strong><strong>de</strong> &o ~~otros: é o elemerito leonez e<br />

o elemrrito sarraceno l, e náo mais.<br />

Na historia eccle$iastica, porbm, ou porqiic ain<strong>da</strong> ningiiem se<br />

occu~)oi~ d'ella <strong>de</strong>pois <strong>do</strong>s admiraveis estu<strong>do</strong>s tle Alexandre tlcrculano,<br />

ou porque esta societlacle tem alguma coiisa <strong>do</strong> esl)cc.inl; continha<br />

a permanecer geral a id6a I'als,i <strong>de</strong> que ella 6 a mesma egreja<br />

<strong>do</strong>s lusitanos, e que tanto vale dizer egreja portugueza, como lusitana.<br />

Joáo Pedro Ribeiro no 7." <strong>da</strong> Introdiicção <strong>do</strong> seli manuscripto<br />

começa, dizen<strong>do</strong> :<br />

ehntes porem <strong>de</strong> principiarmos a consi<strong>de</strong>rar o objecto a que nos<br />

propomos, 6 necessario vermos primeiro que provincias se acham com-<br />

preliendi<strong>da</strong>s <strong>de</strong>baixo <strong>do</strong> nome <strong>de</strong> Portugal. Para isto <strong>de</strong>vemos reflectir<br />

que o Keyno dc Portiigiil, tal qiial hoje o v&mos, differe miiito nos setis<br />

limites <strong>da</strong> antiga L1isitania.n<br />

Ern segui<strong>da</strong>, e ten<strong>do</strong> dicto qual era essa divisão, vai este escri-<br />

ptoi exaritiriar a liiigua e religião <strong>da</strong>s diversas nações habita<strong>do</strong>ras<br />

<strong>do</strong> occidt~ntc <strong>da</strong> peiiinsula antes tla viiidti <strong>de</strong> Jesus Christo, e gasta<br />

clepois scrisivel espaço com a Dihsprlay;to preliminar sobre a pro-<br />

mulgação <strong>do</strong> Evangelho nas nossas provincias!<br />

A que antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> nào faz este sabio aca<strong>de</strong>micoremontar assim<br />

o pobre Portugal, que as suas provincias assistem I promulgaf80<br />

<strong>do</strong> Evangelho e ouvem a voz <strong>do</strong>s apostolos?!<br />

1 Alexandre Herculano, Historis <strong>de</strong> Portugal, Introd. n.O 1.<br />

9


Tal é o pre<strong>do</strong>minio dcspotico <strong>de</strong> certos pre,juizos, e tal o effeito<br />

<strong>do</strong> <strong>de</strong>testavel systerna <strong>de</strong> se <strong>da</strong>r a trabalhos historicos, como quem<br />

fez catalogas <strong>de</strong> bispos, ou ephemeri<strong>de</strong>s historicas.<br />

Thomaz <strong>da</strong> Encarnaçáo, no cap. I ." <strong>do</strong>s Prolegomenos <strong>de</strong> sua<br />

histeria, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> entregar o primeiro capitulo A investigaçiio sobre<br />

o nome <strong>de</strong> Liisitariia, prociira fixar os limites <strong>da</strong> egreja lusitana,<br />

e no Sj i.", tracturi<strong>do</strong> <strong>do</strong>s limites civis, escreve:<br />

«Lusitana Ecclesia, si propriae Lusitaniae nomen, ac partes, jiixla<br />

eos, qiii gcographica mctho<strong>do</strong> pertractarunl, aspiciam ... v<br />

averum quae nostris temporibiis Portugalia norninatur.. . . a)<br />

E, tocan<strong>do</strong> as ultimas palavras <strong>do</strong> capitulo, ciii<strong>da</strong> este escrigtor<br />

ter com to<strong>da</strong> a clareza fixa<strong>do</strong> os limites <strong>da</strong> egreja lusitana, teri<strong>do</strong>-<br />

rios dicto que a egreja lusitana, se atteii<strong>de</strong>rmos ao proprio nome<br />

dtl Lusitania, tem certos limites; mas que, se olharmos ao que no<br />

tempo d'elle se chamava Portugal, a mesma egreja tem outra pe-<br />

ripheria !<br />

Esta confusão aupcnta, se formos ler o $ 1 1 <strong>do</strong> mesmo capi-<br />

bulo, on<strong>de</strong> o auctor vai explicar-nos os limites ecclesiasticos <strong>da</strong><br />

:greja lusitana. Agora ella já não comprehcn<strong>de</strong> to<strong>do</strong> o espaço <strong>da</strong><br />

intiga Lusitania, mas sómerite o que ao tempo d'esse escriptor se<br />

Ilustrava com o nome <strong>de</strong> Lusitania ou <strong>de</strong> Portugal !<br />

«Per iiniversam Lusitaniam, diz elle, et ceterum terrae flexum pro-<br />

vinciae Tarrac~nensis quae nostra aetate Liisitaniae aut Portiigaliae<br />

nomine insignitur, Komanoriim, Suevornm Gotlioriimque tempore,<br />

quator<strong>de</strong>cim episcopales se<strong>de</strong>s.. . I)<br />

Para acabarmos <strong>de</strong> confundir as idkas a este respeito nâo t<br />

preciso mais <strong>do</strong> que lêr, a pag. 48 <strong>do</strong> i." tomo, o que ahi se diz<br />

<strong>da</strong> divisão <strong>da</strong>s shs.<br />

Irititula-se um quadro, ou mappa <strong>de</strong> varias sks <strong>da</strong> peninsula-<br />

Portugaliae sedium diuisio - e começa logo por se <strong>de</strong>screver essa<br />

divisão sob o reina<strong>do</strong> <strong>de</strong> Theo<strong>do</strong>miro, rei <strong>do</strong>s suevos no aniio 607<br />

-sub Theo<strong>do</strong>miro Sueuorum Rcge -! e assim continha, clas-<br />

sifican<strong>do</strong> as modificações sob os reina<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Kecesvin<strong>do</strong> e IYam-<br />

ba, reis go<strong>do</strong>s, como se estes reis fossem reis <strong>de</strong> Portugal!<br />

Revela isto uma confusâo absoluta <strong>de</strong> idkas; e <strong>de</strong>ixa ver que


estes escriptores nbo formavam uma aoçlo clara <strong>do</strong> que era, ciu<br />

podia ser, a greja lusitana.<br />

Que se diga: a egreja i. ecumenia, a egreja é eterna, e por isso<br />

a egrejn portugueza ha ti(. ter existi<strong>do</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que 'neste solo se<br />

lançou a semente <strong>do</strong> câri~iiauismo, e portanto <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os tempos <strong>do</strong>s<br />

lusitano> ; comprebe&r.<br />

01;.<br />

- t,;tteiidr que o direito priva<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma egreja nacional<br />

COillcyii si) <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que existe a naçào r que pertence, e por isso sO<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> então se pó<strong>de</strong> ver lima cigrc~jii ii;içional, a qual estarói con<strong>de</strong>mna<strong>da</strong><br />

a <strong>de</strong>sapparecer com essa mesma nação; percebe-se; -<br />

mas que se preten<strong>da</strong> uinii e outra cousa simultaneameiite, como<br />

estes <strong>do</strong>is escriptores parecem disirar traiisparecer <strong>de</strong> siias palavras,<br />

é o que a nossa iritelligeucia não pb<strong>de</strong> acceitar.<br />

Rlai qual a ver<strong>da</strong><strong>de</strong> no meio d'estas duas opiriiòes? A egreja<br />

porliiguc~a vai effectivamente ericontrar a sua origem na egreja<br />

lusitaiia, romana ' mo<strong>da</strong>, leorieza? ou esta egreja <strong>da</strong>ta s6 <strong>do</strong> começo<br />

.!'<br />

<strong>da</strong> nossa rnonarchia ?<br />

A primeira vista parece não <strong>de</strong>ver duvi<strong>da</strong>r-se um momento. A<br />

egreja porlugiicza é porventura ci~iiio ;I anglicaria 1 como a cophte?<br />

não está ella presa ao iiiimeiiso corpo <strong>do</strong> catholicismo ? eritão, ella<br />

existe, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que rio solo <strong>da</strong> pciiirisulil hi implanta<strong>do</strong> o christiar~ismo.<br />

1rn.porta pouco o qut: dizem a respeito <strong>do</strong> territorio, liiigua<br />

t L rii~ii: purque a cgreja C: <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o inun<strong>do</strong>, e o christianismo e o<br />

episcopa<strong>do</strong> para OS go<strong>do</strong>s, ou para os lusitanos submetti<strong>do</strong>s ao jugo<br />

romano, iiào é diverso <strong>do</strong> christianismo ou <strong>do</strong> episcopa<strong>do</strong> <strong>do</strong>s receiites<br />

portuguezes, ou <strong>do</strong>s ultimos leoriezes. A egreja é ecumenica,<br />

cosmopolila, e eteriiii; nem as modificações <strong>do</strong>s tempos, liem us alterações<br />

<strong>da</strong>s liiiguas, ou transformação <strong>da</strong>s raqas, po<strong>de</strong>m ioiluir nella.<br />

Isto ~ ã 6 o ver<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

A egreja portugueza é em certo senti<strong>do</strong> a lusitana, a go<strong>da</strong>,<br />

a leorieza; mas n'cste serititio é tamhem a gaiileza, a gcrmariica,<br />

a italiana, a propria romaiia; porque é parte <strong>da</strong> egrcja catholica;<br />

mas não (L neste aspecto que se consi<strong>de</strong>ra aqui.<br />

Tracta-se <strong>de</strong> uma egreja nacional; triicta-se <strong>de</strong> uma 1)c:ssoa<br />

moral, que lia o direito A cxistericia individual, <strong>de</strong>duzi<strong>do</strong> <strong>de</strong> certo<br />

numero dc privilogios proprios. Se isto d perfeitamente compativel<br />

com o calholicismo, se é possivel a existencia <strong>de</strong> uma disciptiiia<br />

geral, egual em to<strong>do</strong>s os seus capitulas sobre to<strong>da</strong> a superficie <strong>do</strong><br />

inun<strong>do</strong>, são questões que 'noutro logar se tractartio.


Aqui havemos <strong>de</strong> transigir com os factos: e a existencia <strong>de</strong><br />

egrejas com <strong>direitos</strong> proprios em varios pontos <strong>de</strong> disciplina, <strong>de</strong>rogan<strong>do</strong><br />

a disciplina geral, s8o factos, que a propria egreja ecumenica,<br />

longe <strong>de</strong> repiilsar, tem acceita<strong>do</strong>, e aconselha<strong>do</strong> ate, na recommen<strong>da</strong>çao<br />

que fiiz <strong>de</strong> guar<strong>da</strong>r os antigos costumes.<br />

O que por conseguinte temos a fazer 6 investigar estes <strong>do</strong>us<br />

pontos: - ha <strong>direitos</strong> proprios, liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s ou servi<strong>da</strong>es, como lhe<br />

queiram chamar 4 -<strong>de</strong>s<strong>de</strong> quan<strong>do</strong> existem esses <strong>direitos</strong> ? Aquelle<br />

<strong>de</strong>termina a existencia <strong>da</strong> egreja, este assigriala o primeiro momento<br />

<strong>de</strong> sua vi<strong>da</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte.<br />

Ain<strong>da</strong> não 6 tu<strong>do</strong>: 6 iridispensavel saber-se se o elemcnto<br />

<strong>da</strong> nacionali<strong>da</strong><strong>de</strong> inlluirá, ou nào, na existencia <strong>da</strong> egreja particular.<br />

Se o livre cultismo, se a iritc~ira in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia <strong>da</strong> egrcja e <strong>do</strong><br />

esta<strong>do</strong> tiçcsse si<strong>do</strong> o meio em que o catholicismo viveu, c fosse<br />

aqiielle em que hoje respira, não hesitariarnos um pomciito em<br />

negar similliarite inlluericia.<br />

Estes pequenos centros religiosos, estas m~dificaçri~s locacs <strong>da</strong><br />

egreja, tiaviam naturalmerite <strong>de</strong> coincidir com as circumscriyçries<br />

<strong>da</strong>s riacioriali<strong>da</strong><strong>de</strong>s; mas a origem uriica <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> proprios <strong>da</strong>s<br />

egrejas 'nesse esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> cousas seria a mcama, que iiilluia ria<br />

agrupaçào <strong>do</strong>s homens em socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s politiciis : -O principio <strong>da</strong>s<br />

raças, a i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> idioma, as circumstaricias pliysicas <strong>do</strong> territorio,<br />

e os gran<strong>de</strong>s elementos cominunaes e tradicioriacls.<br />

Mas isto rião se tem <strong>da</strong><strong>do</strong>; uni<strong>da</strong> em certo tempo ao esta<strong>do</strong>, a<br />

egrcja qiiiz sobrepujal-o. O esta<strong>do</strong> <strong>de</strong>feridt:u-sc, e, como tilera <strong>de</strong><br />

arraiicar-lhe <strong>da</strong>s mãos o sceptro rouba<strong>do</strong>, com clle lhe arrehatou<br />

tambem algiiris dirertos proprios d'elln; os reis foram os protectores<br />

<strong>da</strong>s egrejas; e ao mesmo tempo os povos, os membros catholicos<br />

d'essas egrejas, qui~crarri que elles tivessem certos <strong>direitos</strong><br />

<strong>de</strong> inspecçao, <strong>de</strong> superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> externa, respeito fi rgrcja. As leis<br />

estabeleceram este esta<strong>do</strong> com sua auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> so1)erariii; as leis<br />

hao <strong>de</strong> executar-se para a vi<strong>da</strong> civil ser alguma coiisa <strong>de</strong> existente,<br />

e por isso as egrejas tem <strong>de</strong> juntar ao seu direito proprio mais<br />

este capitulo <strong>de</strong> direito priva<strong>do</strong>.<br />

Que este esta<strong>do</strong> não tem nonie possivel, e que <strong>de</strong>ve acabar, siio<br />

tu<strong>do</strong> outras questões.<br />

Em face encontram-se pois duas fontes, d'on<strong>de</strong> dimanam os <strong>direitos</strong><br />

<strong>da</strong>s egrejas : o elemento natural, digamos assim, obe<strong>de</strong>cen<strong>do</strong><br />

ás irifluencias <strong>da</strong>s leis moraes e historicas e ás phjsicas <strong>da</strong> natu-


eza, r o elemento politico, obrigan<strong>do</strong> fatalmente a egreja ate certo<br />

ponto a um riter propno e individual, conscquencia <strong>do</strong>,staiu quo<br />

<strong>da</strong>s rcl~~ùc's <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is po<strong>de</strong>res.<br />

Pó<strong>de</strong> existir rara qeja, n8o nacional, que se lhe nâo pó<strong>de</strong><br />

chamar aGm. mrs epep uim direito proprio, mesmo em paizes<br />

critregues h id<strong>da</strong>bia; píbque o costiime <strong>de</strong> muitos seculos ph<strong>de</strong><br />

ter rndi~~<strong>do</strong> 'nesse lagar certa diccipliiia peculiar ; mas on<strong>de</strong> ;i re-<br />

Iigiâci catliolicn 6 religi;ro <strong>de</strong> esta<strong>do</strong>. ahi o elemento <strong>da</strong> narionalidndr<br />

C t;io activo em sua inkncia, que marca com o seu apparecimento<br />

o apparecimcnto <strong>da</strong> epja nacional.<br />

Em o nosso paiz, se se ènkn<strong>de</strong> que a egreja <strong>de</strong> Portugiil não<br />

6 limita<strong>da</strong> no tempo e no tspa~o pela vi<strong>da</strong> <strong>da</strong> nacionali<strong>da</strong><strong>de</strong> portugueza<br />

; se se enten<strong>de</strong> que ella tem existi<strong>do</strong> a mesma <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />

o cliristianismo foi abraça<strong>do</strong> n'esta parte <strong>da</strong> pcminsula; saheis qual<br />

a c.o~i-t.quoncia? C qiie haveis <strong>de</strong> consentir que o direito publico<br />

t~cclt~+iaatico hespanhol venha reger a nossa egreja portugueza e<br />

modificar o seu direito.<br />

E como sc3 po<strong>de</strong>rá compreheii<strong>de</strong>r a coexistencia d'aquelle direito<br />

e <strong>do</strong> nosso?<br />

Qual merece a p<strong>de</strong>rencia?<br />

Isto <strong>de</strong>monstra h sacie<strong>da</strong><strong>de</strong> como, no esta<strong>do</strong> prescate <strong>da</strong>s relaç»es<br />

<strong>do</strong>s <strong>do</strong>is po<strong>de</strong>res, a naciooali<strong>da</strong>dt* politica 6 a condição primeira<br />

<strong>da</strong> existencia <strong>de</strong> uma egrclja nacional.<br />

Desprendi<strong>da</strong> <strong>da</strong> leooeza, a egreja portugueza 6 <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o principio<br />

<strong>da</strong> nossa monarchia, e s6 <strong>de</strong>sctc ahi, uma egreja propria, nacional<br />

; que na<strong>da</strong> tem 'nesses tempos com aquella ; e qiicl <strong>de</strong> certo<br />

não consentiria entBo, nrm consentiu <strong>de</strong>pois que os reis hwpanhoes<br />

. viessem rcgulal-a com siiiis leis 1.<br />

Nào ha, pois, uma egreja lusitanci : ha sim uma egrejii portugueza.<br />

Determina<strong>do</strong> assim o principio que nos <strong>de</strong>ve dirigir ria fixaçfio<br />

1 »cren<strong>do</strong> olhar-se esta rliiestiio como nOs olhamos, como 6 possivel com- A<br />

preheridrr a <strong>de</strong>ter rnirrxçiio <strong>de</strong> liniites ecclesiasticos <strong>de</strong> urnaegreja nacional differerites<br />

<strong>do</strong>s cirib? Niio B ;~bsur<strong>do</strong><br />

ir filiar a egre,ja B niais antiga <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s <strong>da</strong> ,<br />

penirisulr, ob<strong>de</strong>cen<strong>do</strong> B id4a <strong>de</strong> eciimeiiici<strong>da</strong><strong>de</strong> propria d'ella, e vir <strong>de</strong>pois i<br />

nttribiiir R essa egreja liriiites ecclesiastieos <strong>de</strong>fini<strong>do</strong>s pelos civis <strong>de</strong> uma<br />

narionali<strong>da</strong><strong>de</strong> mais recente e que occiipa territorio diverso?<br />

fi o que se vê em D. Thomaz <strong>da</strong> Eucarnagiio e no proprio Jogo Pedra<br />

Ribeiro.<br />

Nb <strong>de</strong>ve admirar que este erro se generalirnsse, não s6 porque 6 el1e <strong>de</strong><br />

.


<strong>do</strong> comepo <strong>da</strong> egreja portugueza; d preciso agora ver <strong>de</strong>s<strong>de</strong> quan<strong>do</strong><br />

em Portugal houve uma egreja portuguezn, isto é, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> quan<strong>do</strong><br />

esta fracçÁo <strong>da</strong> egreja catholica, separa<strong>da</strong> <strong>da</strong> egrejn leoneza, começou<br />

a par <strong>de</strong> privilegios e liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, ou a estar sujeita a um<br />

direito proprio, seja qual fõr sua legitima origem.<br />

Houve um tempo em que Portugal fez gran<strong>de</strong> ruiqo com as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

dc sua egreja: era o tempo <strong>de</strong> uma lucta entre o po<strong>de</strong>r<br />

temporal, as pretensões <strong>da</strong> Santa Se e os <strong>direitos</strong> mnjestaticos <strong>da</strong>s<br />

monarchins.<br />

As liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong>s epejas nestas conten<strong>da</strong>s em to<strong>da</strong>s as nações<br />

S ~ O<br />

apoia<strong>da</strong>s <strong>do</strong> braço secular, uma arma <strong>de</strong> guerra; marcam o<br />

perio<strong>do</strong> <strong>da</strong>s ambiçoes <strong>da</strong>s monarchias.<br />

L&<strong>de</strong> a historin politica <strong>do</strong>s povos europeus nos <strong>do</strong>is ultimos<br />

seculos, e ahi encontrareis este facto repetin<strong>do</strong>-se em to<strong>do</strong>s elles.<br />

velha <strong>da</strong>ta em a nosFa litteratiira, mas tainbem porque os Estatutos <strong>da</strong> Univrrsi<strong>da</strong>dc<br />

maii<strong>da</strong>rarn ao prof~~~nr <strong>de</strong> direito ecclesiastit?~ que explicasse assim<br />

o direito <strong>da</strong> egreja portnrucza.<br />

De muitos logsres <strong>do</strong>s Estatritos <strong>de</strong> D. JosB se vê como era pri <strong>do</strong>minante<br />

ewe prejiiizo. Bastark ler o cap. 11 <strong>do</strong> tit. 4.0 <strong>do</strong> Liv. 2.0, ~i.~* 2, 3, 6 e 7.<br />

cK.0 2-Como o lente <strong>da</strong> Historia Civil ba <strong>de</strong> ter já e-iisina<strong>do</strong> rio primeiro<br />

anno d'este curso 08 11808, os costumes, o genio, o csracter, a rcligiXo <strong>do</strong>s antigos<br />

lusitaiios; e os termos e limites civis <strong>da</strong> Lusitaniu Ailtigu c motlerna;<br />

nLo ~e <strong>de</strong>terk o professor na repetiçflo d'estaa notici~s, po.to rliir sej:im tainbem<br />

preliminares <strong>da</strong> Histor2a <strong>da</strong> e9reja Port~~qu~za.~<br />

.a.a- Dar4 a conhecer nos ouviiites as proviiicias ccclesiasticas <strong>da</strong> Lusitania<br />

Antig:~ e inodcina: Fazen<strong>do</strong>-lhes ver os sriis r~sprctivos limites e confine:<br />

e as divis6es qiie d'ella se fizrram <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> reinar~m ou irnp~ra<strong>do</strong>rcs<br />

ehristg os...... e <strong>de</strong>l~aixo <strong>do</strong>ssenliores reis meiis pred~cessores; piiiicipalmente<br />

ntifia<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s Papas Callieto ir em 116s ; Innocencio III em 1199 ; e<br />

EiiKciia IX em 1394: e <strong>do</strong>s outros Pontifica? que iraaram os noio, 1,i~pa<strong>do</strong>s.i<br />

.N." 6 o - Prepara<strong>do</strong>s que sejam os ouvintes com estas pi e) ias iio~Ces,<br />

<strong>da</strong>r8 o profersor priiicipio 6s Ilçbs <strong>de</strong> Historir <strong>da</strong> egr~ja Poi tugrirzri.<br />

Dar& pois uma boa noticia <strong>da</strong> prhgação <strong>do</strong> Eraiigellio, dri iriírorlucçb <strong>do</strong><br />

chri~tiaiiikmo; e <strong>da</strong> primeira fun<strong>da</strong>ção e estabelecimento <strong>da</strong> egreja na antiga<br />

Lusitania 8<br />

vN.0 7.0- Far4 ver o esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> egreja portiigneza rlebaixo <strong>do</strong>s impera<strong>do</strong>res<br />

gentios, qiian<strong>do</strong> ain<strong>da</strong> nElo era p~rmitti<strong>do</strong> o exeicicio piihlico <strong>da</strong> rrligi8o<br />

ehr~stli, no tempo <strong>do</strong>s christãos, e <strong>do</strong>b reis Al~iios, <strong>do</strong>s Siievos, <strong>do</strong>s Go<strong>do</strong>s,<br />

<strong>do</strong>s Moriios. e iiltim~mente <strong>do</strong>9 senhores reis uriis pre<strong>de</strong>rc.srores..<br />

Era o tenipo <strong>do</strong> gran<strong>de</strong> esplendgr <strong>da</strong> monrircliia, <strong>do</strong> brilho <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> ma-<br />

Qeetaticos; e ta<strong>do</strong> isto nfio existiu, lSd~ a hi~toria, nh ~6<strong>de</strong> cxi-tir sem cstaa<br />

gmndvs epopBas e glorias tradicionaes, qtie alentam as c6rtes com as silas<br />

recor<strong>da</strong>çòes. Ha como qiie uma eonecieiicia <strong>do</strong> proprio abuso; é iiidi~pen~a-<br />

vel rscon<strong>de</strong>r aob O aspecto <strong>do</strong>imrlo <strong>do</strong> pnqsa<strong>do</strong> O po<strong>de</strong>r excessivo dh monnr-<br />

chia.<br />

Btae e& aa li* <strong>da</strong> historie, s gran<strong>de</strong> meatra <strong>do</strong> direi& politico.


O altar acostava-w8 ao throno para ter po<strong>de</strong>r coritra as heresias<br />

e os li! rc~ ptnwlorc- ; o tlirono a<strong>do</strong>rna~a o altar com os restos <strong>do</strong>s<br />

sriic flor6ei para que não crescesse alti\l, e o quizesse suffocar repisiitinamente.<br />

-40 cranair p h <strong>do</strong>s monarchas a Curia Komana ~iáo respondid<br />

<strong>de</strong> frente, mas ta* nã;t confessava os prcteiidi<strong>do</strong>s <strong>direitos</strong><br />

O~i* rei*.<br />

I:iiirch nós, como A facil adivinhar, C o nome <strong>de</strong> Pombal que<br />

apparece á testa d'esta cruza<strong>da</strong>.<br />

Era o tempo <strong>do</strong> protecciOni,smo, <strong>do</strong> espinto regulamentar, que<br />

<strong>de</strong>scia como uma prori<strong>de</strong>acia a to<strong>da</strong>s as cousas <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>d(b, e<br />

por to<strong>da</strong> a parte m uha o ar 6 fecun<strong>da</strong> iniciativa <strong>do</strong> iiidividiio.<br />

Fazia-~e a reforma <strong>do</strong>s e\tud(lq, rcacdificava-se a U~iiversi<strong>da</strong>dc; c o<br />

miiii~trl) cllmprehen<strong>de</strong>u que a instriicçào era um gran<strong>de</strong> meio dc:<br />

fii iiiiir mcllior as pr~rogati\n- <strong>da</strong> cor<strong>da</strong>; e nos celebres estatutos <strong>de</strong><br />

1772, rnonumrntos <strong>de</strong> iimn xtravagante servidáo <strong>do</strong><br />

nhi apparece imposta ao Ieiite a obrigaçóo <strong>de</strong> <strong>de</strong>screver e elogiar<br />

tis libt~r<strong>da</strong>drs <strong>da</strong> egreja ~)ortu,nueza, e, para nzo haver alguma calbc*~a<br />

t a louca ~ <strong>de</strong> algum professor in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, que preteri<strong>de</strong>sse<br />

ou limital-as, ori negal-nc, ou que se Icmbrasse <strong>de</strong> se rir d'estas<br />

vai<strong>do</strong>sas vellei<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> rios pren<strong>de</strong>rmo< atravbs <strong>de</strong> tantos seculos<br />

aos pobres e ru<strong>de</strong>s liisitarios; os wtatutos classificam, apoiitani as<br />

trcls cl;iss(~c d'essas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s e obrigam o lente a explanar a tloutriria;<br />

peza<strong>da</strong> e quasi impossitrl tarefa para hoje, por falta <strong>de</strong> subsidio~<br />

historicos, suanto mais para então !<br />

Vejamos este notavel <strong>do</strong>cumento.<br />

No cap. 2.", n.O 2 <strong>do</strong> tit. 4." <strong>do</strong> liv. 2.' <strong>de</strong>fine-se em geral o<br />

objecto <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja portugueza. Diz-se ahi :<br />

a2.O-E como o direito Canonico assim publico, como particiilar,<br />

ou é commum <strong>da</strong> Igreja Universal, oii é especial <strong>da</strong>s Igrejas Nacio-<br />

naes, e a ca<strong>da</strong> Nacão é <strong>da</strong> ultima irnportancia conhecer perfritamentc<br />

o dircitii ranonico c especial <strong>da</strong> siin Igreja: dr to<strong>da</strong>s estas espccies <strong>do</strong><br />

sol~redit~~ <strong>Direito</strong> haverá IiyGes puhlicas nos Gcraes, porque por meio<br />

d'rllas n,io só saibam os oiitintcs os cnnones universacs e cnmmiins <strong>do</strong><br />

<strong>Direito</strong> Canonico ; mas tarnbcrn apren<strong>da</strong>rri logo o uso que d'elles se tem<br />

feito nestes Reinos ; a reteng.áo que nellrs se tem feito <strong>de</strong> alguris Cano-<br />

nes primitivos; os pritilcgios e as graças concedi<strong>da</strong>s aos Scnhorcs Rcys<br />

d'cstes Reynos pela Santa Sé Apostolica ; porque d'este complexo se<br />

formam e compóem as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> Igreja lusitanit e O <strong>Direito</strong> Ca-<br />

nonico proprio e o <strong>da</strong> Nacão Porti18ueza.u


Em o r)." 9 <strong>de</strong>screve a posiçho <strong>da</strong> egreja portugueza para com<br />

a sancta Se<strong>de</strong>:<br />

«9. Quan<strong>do</strong> mostrar qiie a egreja portiiguera rcconheceu em to<strong>do</strong> a<br />

tempo o reina<strong>do</strong> e a aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s Siimmos Pontilices, conservan<strong>do</strong>-se<br />

semprc em uma aperta<strong>da</strong> e estreita iinião com a sancta Se<strong>de</strong><br />

Apostolica. como centro co~~inium <strong>da</strong> uni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> egreja e dii religião<br />

chrislã. mostrará tiimbcni o trio<strong>do</strong> e a fornia, com qiie os Pontifices<br />

(xerci1;iriim o seu po<strong>de</strong>r e aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong> na mtBsrna cgrcxja: faíeiidn ver,<br />

que a tractíiram nio como serva, mas como filha: qiic a ol)cdicnria que<br />

por ella Ihc foi tributa<strong>da</strong>, náo foi senil, mas sim filial : e qiie si) neste<br />

senti<strong>do</strong> se podcm contar com jer<strong>da</strong><strong>de</strong> es!es Reinos, c as cgrejns d'el-<br />

Ics entre os paizes e as egrejas <strong>de</strong>nomina<strong>da</strong>s <strong>da</strong> obediencia: <strong>de</strong>sterran<strong>do</strong>-se<br />

inteiramente qiialquer idfa <strong>de</strong> utiediencia, que não srja milito<br />

racional e to<strong>da</strong> digna <strong>do</strong> car.irtrr <strong>da</strong>-sancta Sb<strong>de</strong> Apostolic~i, sem qiie<br />

por mo<strong>do</strong> algum se possa confundir, oii equivocar com a escravidão que<br />

a ambas as dictas rgrejas seria in<strong>de</strong>corosa.))<br />

O n." 10 é <strong>de</strong>stina<strong>do</strong> a <strong>de</strong>clarar o ohjecto <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

egreja portugueza, fazen<strong>do</strong> d'ellas tres grupos:<br />

nlO. Fará ver, que a egreja Portiigueza (<strong>da</strong> mesma sorte que as<br />

<strong>da</strong>s outras nay6es) goza tamlirrn <strong>da</strong>s siias li1)rr<strong>da</strong>dcs. qiic sempre seloii<br />

c conservou: <strong>de</strong>claran<strong>do</strong> qiie ellas consistc~iii: Prin~o: na retencão <strong>de</strong><br />

algiins iisos, cnstiimes c obscriaiicias ciinoiiic~is. qiie clia conscrvoii<br />

seniprct* tem dirclito tle conservar I- <strong>de</strong>ft,iitier como Icgitimos por aii-<br />

Iliori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> concilio Sicctiio, qiie os miintla girar<strong>da</strong>r. Secun<strong>do</strong>: na obser\;inciii<br />

tios caiioncs antigos, qiic posto sc não possa nella provar<br />

~eríilmente. phdc cornt.ii<strong>do</strong> mostrar-se com milita eri<strong>de</strong>ncia em alguns<br />

pontos e artigos <strong>da</strong> disciplina antiga, e mais piira. cin qiic ella resistiu<br />

sempre constante As innovari,es posteriores, e siiccrssivas piibliearóes<br />

<strong>da</strong>s falsas <strong>de</strong>cretacs. Tertio: em algiins 1)re~'s. cm I~ullas, qiie foram<br />

<strong>de</strong>pois concedi<strong>da</strong>s á mesma cgrejn. aos bispos, aos prela<strong>do</strong>s d'ella, á nacão<br />

e aos senhores reis meus pre<strong>de</strong>cessores, entre os qiiaes ha muitos,<br />

que sem embargo <strong>de</strong> terem si<strong>do</strong> rc~nccdi<strong>do</strong>s em L(,iina <strong>de</strong> privilegias e<br />

<strong>de</strong> graras, não são mais <strong>do</strong> que iins vcr<strong>da</strong>dciros reconhccimentos <strong>de</strong><br />

legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>do</strong>s costumes e observancias que fazem objecto d'estes.~<br />

Como estes estatutos não fizeram seriào cxpor assim em these<br />

qual a natureza <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> cgclja portiigiicza, e tiveram a<br />

franqueza <strong>de</strong> dizer que cm alguns pontos, tlm qiie a disciplina se<br />

afastdra <strong>do</strong> espirito <strong>da</strong> reforma feita pcliis falsas <strong>de</strong>cretaes, conser-<br />

van<strong>do</strong> a pureza <strong>de</strong> algiiris antigos ranories, n8o era facil proval-as<br />

geralmente, posto que com muita evi<strong>de</strong>ncia se podia mostrar em<br />

vQrios artigos; a escola ultramoatana tomou a palavra, e veiu es-


carnecrn<strong>do</strong> dizer-&s, que to<strong>da</strong>s as liber<strong>da</strong>drs <strong>da</strong> egreja portugueza<br />

táo fala<strong>da</strong>s eram pramente chiinericaa.<br />

Preten<strong>de</strong>m qiie a seita 'anc+bnico-gallicann, qiic no seciilo xviir<br />

iii\ ndii ,I e rt.iiia\a eni Portu~al e na Uriiversi<strong>da</strong>dc, tinha inventa<strong>do</strong><br />

to<strong>da</strong>s cws intitul<strong>da</strong>s 15 r<strong>da</strong><strong>de</strong>s; -que escriptor ncnhiim, como<br />

na Franca se fez, soqgdiou em Portugal essas liber<strong>da</strong>dcs, que<br />

o- est~tuto~ <strong>da</strong> Cnkers<strong>da</strong><strong>de</strong> c8 blam genericamente c sem provar<br />

o qiic aRrrnam;-que não comta quars fossem essas liher<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

alteiidi<strong>da</strong>s pelo concilio <strong>de</strong> .%ia ; -que se iião sabe rm que<br />

tempo a egreja lusitana rerictí. á pretendi<strong>da</strong> nova discililinn <strong>da</strong>s<br />

falsas <strong>de</strong>cretaes, pois que tlecrctos, comquanto apocrilihos,<br />

em na<strong>da</strong> alteraram a dixiplina (Ia egrqja, como cstá proja<strong>do</strong>: -<br />

que apenas conhccem o ~ k g i <strong>da</strong> o apresentacão <strong>do</strong>s hcncficios<br />

eclesiasticos, concedi<strong>do</strong> aás pdroeiros, e <strong>da</strong> incapaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s cxtrangeiros<br />

quanto ao gozo disws bencficios ; mas que nenhum<br />

d'estcs se podc chamar lib+miat!..s, antes são meras servi<strong>da</strong>es soffri<strong>da</strong>s<br />

pela egrcja, e s6 librr<strong>da</strong>dcbs para os padroeiros; pois que a<br />

egeja acceita emprega<strong>do</strong>s que ella náo elegeu, e que lhe apresentam<br />

os padroeiros, ou o padroeiro, porque hoje to<strong>do</strong>s os padroa<strong>do</strong>s<br />

se acham reuni<strong>do</strong>s no padroa<strong>do</strong> real ; - qiie egualmente<br />

alpiimas concessfics, feitas pelos pontificcs Acerca <strong>de</strong> assiimptos <strong>de</strong><br />

disprnsds matrimoniacs, tambrm nfin são liber<strong>da</strong>dcs, porqiie 6 o<br />

diroito commum <strong>da</strong>s epejas <strong>do</strong> rnun<strong>do</strong>, que, pelas distancias a que<br />

se acham <strong>da</strong> S6 Jtomana, pe<strong>de</strong>m c s privilegio, ~ o qual <strong>de</strong> mais a<br />

mais o romano pontifirc podc retirar, quan<strong>do</strong> julgar conveniente;<br />

-que as conheci<strong>da</strong>s concordias ou concor<strong>da</strong>tas, cclrbra<strong>da</strong>s pelos<br />

reis e clero, 1120 iiistifiram nrrihiima <strong>da</strong>s pretendi<strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, e<br />

que, quan<strong>do</strong> justificasscsm, não po<strong>de</strong>riam ter o merecimento que Ihes<br />

querem attribuir sem a approva@o <strong>da</strong> sancta Sé, a qual n8o s6 não<br />

têm, ma4 lhe foi ruprrqsamente nega<strong>da</strong> pelo breve <strong>de</strong> Gregorio xii~<br />

<strong>de</strong> 25 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1574'.<br />

.tporn se coml)rehcn<strong>de</strong> a razão por qiic acima falavamos no perigo<br />

que corriamos, por não ter airi<strong>da</strong> escriptor nenhum compendia<strong>do</strong><br />

d'estas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

hra<strong>de</strong>iro, Tntrod. rx, psg. ccxv~t e<br />

scguint~~, por Caiidi<strong>do</strong> Mrnr1i.s <strong>de</strong> Almei<strong>da</strong>, Rio <strong>de</strong> .l.itieiro-lfi(;(i<br />

E:.tc li\ ro, escripto cin 1864, 6 1):cstnntp euiioro por viias ol~iiiifieq ftbertaireirt~<br />

iiltrlimontanas, e p~ln critica qiip faz ri :ilgui~s <strong>de</strong> nnssos míiiq sahios<br />

aiirtnrei. cntre elles ao gran<strong>de</strong> J11,llo Freire, <strong>de</strong> quem fala bem pouco lisongeiiaiuente.<br />

1 Veja-se <strong>Direito</strong> Cii.il Eccl~siasfico


Rem sabemos que lá esth na Carta o beneplacito regio; mas,<br />

como abaixo veremos, este recurso na<strong>da</strong> cons~guirfi, quan<strong>do</strong> as li-<br />

ber<strong>da</strong><strong>de</strong>s nfio estiterem conheci<strong>da</strong>s e emquanto se n8o podhrem<br />

fun<strong>da</strong>menta<strong>da</strong>mente allegar.<br />

Vamos mostrar como as pretens6es <strong>da</strong> escola ultramontana sBo<br />

infun<strong>da</strong><strong>da</strong>s, como cíkctivamente existem liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s na egreja por-<br />

tiigueza ; seremos o mais breve que nos for possivel, porque n3o<br />

B cssc o nosso principal intuito, e porque nos levaria muito longe<br />

fazer aqui O resumo P a <strong>de</strong>monstrnql~o <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> uma <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

nos variadissimos capitulas e artigos <strong>da</strong> disciplina.<br />

Kemontemos um pouco mais alto e vejamos o esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> egreja<br />

leonesa ao tempo d'essa srparayRo no seculo xir.<br />

Des<strong>de</strong> o scculo 111, mas principalmente <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o iv secrilo, co-<br />

mecam os concilios já provinciaes, já dioccsanos, já nsrionnrs <strong>da</strong>s<br />

egryjus gothicas <strong>da</strong> peninsiila. No iv sr~ciilo retine-se o primeiro<br />

concilio geral que se coiihece: é o celehr~ concilio <strong>de</strong> Elvirn. Ate<br />

este tcmpo a egrcja <strong>da</strong> peninsiila niio tem um Codigo seu; mas o<br />

gran<strong>de</strong> respeito pela tratlicào e pelos canones mais vrnc~raveiu bem<br />

<strong>de</strong>pressa o fez apparecer 1.<br />

D'aqiii por <strong>de</strong>ante parece que as egryjas hespanholas conheceram<br />

c a<strong>do</strong>ptaram o antigo codigo <strong>da</strong> epreja romaria. que continha<br />

os canones <strong>do</strong>s concilios orientam <strong>de</strong> Nicea e Sardica cle que s6<br />

ueavn a egreja romana. Accrcsccnta<strong>do</strong> com os cationes <strong>de</strong> Elvira e<br />

Saragoça, <strong>de</strong>cretacls <strong>do</strong>s bispos <strong>de</strong> Ilespanha e dc Siricio papa a<br />

IIimerio, bispo <strong>de</strong> Tarrogona, formava o seu codigo particular e. A<br />

corifusao a respeito <strong>da</strong> versào <strong>do</strong>s antigos canoncs, sempre tno reverencia<strong>do</strong>s<br />

pelos bispos <strong>da</strong> peninsula, <strong>de</strong>u causa R nova collecçfio<br />

<strong>de</strong> S. Martinho <strong>de</strong> Diimrs, <strong>de</strong>pois dc Rraga, pela qual se govt)rnou<br />

a egre,ja tiespanhola tio vi seciilo, sem corihecrr, ao que parece, o<br />

Codigo <strong>de</strong> Dionysio, já entõo promulga<strong>do</strong>. No vil seculo apparece<br />

lia Hespanha a terceira <strong>da</strong>s collecções maiores <strong>da</strong> egreja occi<strong>de</strong>ntal,<br />

o Codigo <strong>de</strong> S. Isi<strong>do</strong>ro <strong>de</strong> Sevilha, que 6 tamhcm o Codigo<br />

proprio d'estas eprejas. Depois vem o scciilo viii, que 6 nno s6 o<br />

seculo <strong>da</strong>s falsas <strong>de</strong>cretaes, mas tambcm <strong>da</strong> invasâo musulmana.<br />

1 Hispeiiieneis Ecclrsia a ptima, qrtrre illi rtiulsit, Evangplii luce, Ssnctorum<br />

Patrurn, verierabilirimqor Coiicilioru,n dccieto in maxiinx hahuit obser-<br />

\,aiitis sunvurnque trriditiooiirn fuit ietin~iitir;bin,a. I). Thorn. Disscrt -@w<br />

nam cnaonum codice tcsa est Hispanir9tei.v E'wLrsia ar1 saecirlum nsgue octam *<br />

prg. 2, á testa d& edição <strong>do</strong> Vetctus Canon Co<strong>de</strong>a Ecelesiae Lusrtanae, 1764.<br />

2 JoBo Pedra Ribeiro, iiianuscripto cita<strong>do</strong>.


A egrcja hespnhola, como to<strong>da</strong>s as mi<strong>de</strong>ntaes, resiste <strong>de</strong>segualmcntt.<br />

c ,i supremacia <strong>do</strong>s papas, mas pr fim t! ~enci<strong>da</strong> por<br />

ella. To<strong>da</strong> a pureza, pois, <strong>do</strong>s antigos cano- dcapparece nesta<br />

cgreja, t8o amante d'ella ; e os esforços contintos e perseverantes<br />

<strong>do</strong>s papas acabam aqui, como em to<strong>da</strong> a parte, <strong>de</strong> vencer o epis-<br />

copa<strong>do</strong> e os reis 1.<br />

'1 invasão <strong>do</strong> islamismo, embora geralmente tokrr-e a rt~li:iao<br />

(' i i43, fez comtu<strong>do</strong> muitas vez-, como diz um escriptor. íjiits as<br />

?itS4 ficassem sem bispos :fi l>ispoc rrni di. &ta r~tnliiq;io, IIU~<br />

remo<strong>de</strong>lou os costumes e linpa <strong>da</strong> pinab, impediu ain<strong>da</strong> ni,iis<br />

a consclrvaqáo <strong>da</strong> antiga disciplim, e ta aan qw &I só no milio<br />

i '*I,<br />

<strong>de</strong> tantas calami<strong>da</strong><strong>de</strong>s o aiixilio <strong>de</strong> Roma bzae muito app~itnc<br />

mas qiir tamhem, quan<strong>do</strong> os mueiilmanos se rctimm <strong>da</strong> pcn 11-<br />

si11 I. o- 11" i5 com seus Irga<strong>do</strong>s firmassem mdbor o ma prima(lo.<br />

E ;i-- ni (yue, se antes <strong>do</strong> seculo \ iii os egrejas bmpnbolas t6m<br />

lit)c>r<strong>da</strong>tlcs justas, e tanto mais rrspeitateis, g9e e prendiam no<br />

onior pcllo aritigo costume c \(.lhos cannnes, que 0 m pre cita<strong>do</strong><br />

concilio <strong>de</strong> Nicea tanto recornrncn<strong>da</strong>ra ; tambein <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> seculo x<br />

ellos tem-nns p~rdi<strong>do</strong> qiiasi intcbiramentt..<br />

,\ nossa egreja nasceii, <strong>de</strong>stacou-se, r.-% d qucllas emjas <strong>do</strong>s<br />

primriros scculos, mas <strong>da</strong>s novas egreja- ir'c- e restaura<strong>da</strong>s,<br />

tfn rnon,irchi,i nco-gothica <strong>da</strong>s Austurias: e dia <strong>do</strong> ber<strong>da</strong>u libcr-<br />

d;~(~tls algumas d'essas egrejas, pobrrs <strong>de</strong> iibd<strong>de</strong>s.<br />

\:lia s6 trouxe comsipo, 'a cingir-lhe i pmtr;t;L ca<strong>de</strong>ia pcsa<strong>da</strong><br />

<strong>do</strong> primii<strong>do</strong> <strong>de</strong> RomaP.<br />

De um facto que an<strong>da</strong> intimamente Ii:& m ~iosra emancipaçáo<br />

politica brotou a sua primeira I i f d k $=<br />

A primazia <strong>de</strong> Tole<strong>do</strong> hctava com a <strong>de</strong> kp, a rqaella pretendia<br />

submetter ao seu jugo to<strong>da</strong>s as cL -1s. A st?<br />

bracharense resiste toletana com tanto ala, g.L qezar <strong>de</strong><br />

1 No eeculo xr ain<strong>da</strong> ue conservam, no que prrq n* <strong>da</strong> -tira diqcipliiia,<br />

porkm si, em consas directa e unicsmmta mia- .o ssrvigr, tio<br />

ciilto e nho rcipcctivris 6 parte politics dn pwm~<strong>da</strong> G-rio vir,<br />

<strong>de</strong> nrcor<strong>do</strong> com 1). Affoiiso VI, Q cii~tx <strong>de</strong> miiita ta-%enme intioduzir<br />

os nfiicioa e liturgis romana; c~nscrran<strong>do</strong>-$e em e-.<br />

ain<strong>da</strong> parte<br />

<strong>do</strong>e aiiticoq ritos, como, no tempo dc J. Pedio Ri& o tsteinunho<br />

d'este escriptc~r, era ain<strong>da</strong> gli~r<strong>da</strong><strong>do</strong> na ecleja <strong>de</strong> k!? veja a pag. 105 <strong>do</strong><br />

cita<strong>do</strong> mun~ls~~ipto, n.09 e 13.<br />

2 Rej~itamos poiq a ciuctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s ccncilion ds Luoihnia e <strong>da</strong> He~panha<br />

g~thica, como foiitt? <strong>do</strong> direito <strong>da</strong> egrejs portupw, e @-te to<strong>do</strong>s esse8<br />

codigos particulares <strong>da</strong>s velhas egrejas <strong>da</strong> p a i s


aquetla ter obti<strong>do</strong> a <strong>de</strong>claração e confirmacão <strong>da</strong> digni<strong>da</strong><strong>de</strong> prima-<br />

cial <strong>da</strong>s Hespanhas pelos papas Urbano x, Lucio 11 e Eiigenio irr,<br />

comtu<strong>do</strong> ella separa-se com Portugal, e, in<strong>de</strong>peri<strong>de</strong>nte em a nova<br />

egreja, <strong>de</strong>sconhece o po<strong>de</strong>r d'aquella se, a <strong>de</strong>speito <strong>da</strong>s bullas <strong>do</strong>s<br />

pontificcs 1.<br />

To<strong>da</strong>via este facto esta tão liga<strong>do</strong>, tão confundi<strong>do</strong> mesmo com<br />

a nossa separação <strong>da</strong> monarchia leoneza, que por isso, talvez, a<br />

ningii~m avultlira ain<strong>da</strong>, antcs <strong>de</strong> nós, como tima liber<strong>da</strong><strong>de</strong> e li-<br />

ber<strong>da</strong><strong>de</strong> preciosa <strong>da</strong> nossa egreja.<br />

Isto e suficiente para ver a egreja <strong>de</strong> Portugal com vi<strong>da</strong> pro-<br />

pria, uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira cgrrja sui juris, particular, nacional, egreja<br />

portugueza.<br />

filas, se este acontecimento concorreu, tão po<strong>de</strong>rosamente, no .<br />

apparccimento <strong>da</strong> nacionali<strong>da</strong><strong>de</strong> portugueza, outro acontecimento,<br />

egudmente coevo <strong>do</strong>s nossos primeiros momentos e prendi<strong>do</strong> ao<br />

nosso berço como protector <strong>de</strong> sua liber<strong>da</strong><strong>de</strong> politica, veio obstar<br />

ao <strong>de</strong>sinvolvimrrito tlc novas lihrlr<strong>da</strong><strong>de</strong>s :<br />

Foi a ccllchrc stibrnissão cfc Affonso Henriques ao pontifire ro-<br />

mano, fiicto 180 bem explica<strong>do</strong> pelo b~nemerito historia<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s<br />

primeiros dias <strong>do</strong> nosso vivcr.<br />

Sc as circumstancias sociaes <strong>da</strong> meia c<strong>da</strong>dc tinham si<strong>do</strong> a<br />

causa <strong>da</strong> homenagem prcsta<strong>da</strong> á se apostolica pc4o filho <strong>do</strong> con<strong>de</strong><br />

I$orgonhez; a posição politica <strong>do</strong> papa<strong>do</strong> foi a origem <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s<br />

dissctisões, que agitaram os primriros reina<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s nossos rcis.<br />

O po<strong>de</strong>r <strong>do</strong> clero era gigaritcsco 'neste momento; esse po<strong>de</strong>r<br />

1 Veja Alexaiidre Herciilaiio. Hist. <strong>de</strong> Port., tomo 1.0, liv. 2.*, pag. 351e<br />

as epistolas ahi citatlas <strong>de</strong> Eiigeiiio Irr.<br />

Eis iim exemplo vivo tlo ~III, acirna rlissemoa, qiiari<strong>do</strong> eecrevnrnos que o<br />

eleineiito <strong>da</strong> nacio:ialitladc cra a causa <strong>do</strong> apparecimento <strong>da</strong> egreja particular<br />

nacional.<br />

Pois, como havia I%i.ny~ cnritinuar a pertencer 9. egreja hespanhola e portanto<br />

ficar sujeit:~ ao piiiritiz d~ Tole<strong>do</strong>, primaz <strong>da</strong>s Hespcliihas, se d'esta<br />

fórnia to<strong>do</strong>s OR bispos (11: I'ortiigal seriam obriga<strong>do</strong>s a ir 808 coiicilios toletauos,<br />

que eram t:tinhem assemblêas politicae, e <strong>de</strong>pois coa~i.iclo3 a executar<br />

.essas leis e respeitar essa primazia <strong>de</strong>ntro <strong>do</strong>s limites <strong>do</strong> novo reino <strong>de</strong> Portugal<br />

?<br />

Eniquanto a egreja riào purificar a sua disciplina e <strong>de</strong> to<strong>do</strong> per<strong>de</strong>r certoa<br />

sonhos e <strong>de</strong>spe<strong>da</strong>çar certos principias incompativeis coni o progresso e futuro<br />

<strong>do</strong> muii<strong>do</strong>, hào <strong>de</strong> eenipre existir estae luctss e dissetis0eb; e acabarem antes<br />

d'aquella reforma, coita<strong>da</strong> <strong>da</strong> egreja, qtie ser4 esçie um tribte akoiiro para<br />

ella !<br />

Nlo nos entranhamos aqui na dificil e ciirioscl questlo <strong>da</strong> primazia <strong>da</strong>a<br />

Hespanhas, ain<strong>da</strong> hoje peu<strong>de</strong>nte, porque não é este o nosso objecto.


fi~zia-o tima <strong>da</strong>s classes pocirrosas e influentes <strong>do</strong>s esta<strong>do</strong>s; e agora<br />

o primii<strong>do</strong> <strong>do</strong>s pontifices, 1130 só rccorih(~ci<strong>do</strong> mas impetratlo, <strong>da</strong>va-<br />

Ihc ciitrr 116s nova robustez e indcpen<strong>de</strong>noia altaneira no meio <strong>da</strong><br />

\i(I;i 1101iti1.,i<br />

<strong>de</strong> Portugal.<br />

.tc.,!ii ~iiile~~c<strong>de</strong>nte<br />

r soberano, o clero n8o sc podia dizer<br />

\ i~r<strong>da</strong>tl(,irci iiiente naciooal ; a veja portugucza quasi niio existe<br />

iitb ao ti,ii!jio <strong>da</strong> primeira c~~ncor<strong>da</strong>ta.<br />

As eoiicordias, ou concor<strong>da</strong>ias, são a segun<strong>da</strong> fonte <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong>-<br />

<strong>de</strong>s, ou <strong>do</strong> direito particular <strong>da</strong> eborejn portugueza.<br />

011 havemos <strong>de</strong> 111r ria libertay80 <strong>da</strong> egrcja bracharensis <strong>do</strong> pri-<br />

milzia toletana a primeira liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> egreja portugueza, e com<br />

ella o primeiro dia <strong>da</strong> existcncia d'ehta egreja; ou ha~cmos <strong>de</strong><br />

marcar no seculo xitr o apparecirtiento <strong>da</strong> mesma egreja 1.<br />

Sc a+ coricor<strong>da</strong>tas tiveram a sua razão <strong>de</strong> ser na iriílucncia pre-<br />

11oteiite du clero e dc Koma, o placito regio, partin<strong>do</strong> <strong>da</strong> mesm6<br />

fonte, vciii acabar com cssa influencia. Em nosso mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> ver a<br />

csta tima (tas mais brilhantes liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> riossa egreja. Uma bulla<br />

a que se negue o benepelacito é iriexrqiiivel ria egreja portugueza;<br />

esta cgr~ji~ tcm assim atlquiri<strong>do</strong> o direito d~ caniirihar em selili<strong>do</strong><br />

opposto <strong>do</strong>s man<strong>da</strong><strong>do</strong>s <strong>de</strong> Homa, quan<strong>do</strong> abusivos, e quan<strong>do</strong> preten<strong>da</strong>m<br />

dcsluatrar i1 in<strong>de</strong>peri<strong>de</strong>ncia <strong>da</strong> naçiio. O serilimciito <strong>de</strong> rcpulsa<br />

contra cbss;i5 bullas, que se <strong>de</strong>ve levantar em to<strong>da</strong> a naqõo, nào podiii<br />

com jiistiça cercear-se no coração <strong>do</strong> clero portugriez, que<br />

tttm tíimhein uma patria, um pun<strong>do</strong>rior nacional, como qualquer<br />

outro ci<strong>da</strong>dào.<br />

Mas, dir-nos-30, o breve- ílxponi nobis-<strong>de</strong> 25 dc abril <strong>de</strong><br />

i574 não terá acaba<strong>do</strong> com o regio placito, com to<strong>do</strong>s os privilegio~<br />

e liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja portiiguezaf<br />

Não po<strong>de</strong>mos dispensar-rios <strong>de</strong> dizer duas palavras a respeito<br />

d'este importante <strong>do</strong>cumento.<br />

Nos fins <strong>do</strong> seculo xvi fez-se em Homa tima I~ulla, que começilva<br />

por lembrar urn <strong>do</strong>s factos mais rcspeitaveis <strong>da</strong> chronica <strong>do</strong><br />

martvr <strong>do</strong> Golgotha; essa bulla, por um acaso terrivel, chamou-se,<br />

como to<strong>da</strong>s as bullas, com us primeiras palavras <strong>de</strong> seu corpo, a<br />

bulla ln coena üomini, e comtu<strong>do</strong>, não ha <strong>do</strong>cumento mais repu-<br />

1 Acerca <strong>de</strong> concordias vrja-se Gabriel Pereira <strong>de</strong> Castro, <strong>de</strong> Manuregia.<br />

P. 1.I - Jod Ariastncio <strong>de</strong> Figueire<strong>do</strong>, Synopsie Chronologka, torn. 1."-<br />

Mello Fit.irc, IIist. JILI-. not. aos 59 47, 513, 68, 71, 83-e Coelho <strong>da</strong> Rocha<br />

no seu Ertsaio sobre a historia <strong>do</strong> youerno e <strong>da</strong> Zeyirlapão <strong>de</strong> Port,llyd.


gnante em to<strong>do</strong> o bullario romano, em to<strong>do</strong> o corpo <strong>da</strong>s drcrk<br />

taes.<br />

Esta bulla produz em quem a I& um effi.ito singular; ora con-<br />

vi<strong>da</strong> a <strong>de</strong>spe<strong>da</strong>çal-a, indigna<strong>do</strong> ; ora excita o riso, com o seii exag-<br />

gero draaiatico. Nào tPm numero atti~igivcal as excomuiihões que<br />

ri'ella se lulminarn; e <strong>do</strong> seu texto se coricliie que, oii as naqões<br />

háo <strong>de</strong> <strong>de</strong>pdr aos pés tlo Siimmo Poniificc e <strong>do</strong> clcro inteiro a<br />

soberania plitica e a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> indibidual; oii to<strong>da</strong>s ellas h80 <strong>de</strong><br />

ser arrerncssa<strong>da</strong>s para fóra <strong>do</strong> seio <strong>da</strong> christari<strong>da</strong>dc pela força <strong>do</strong><br />

anathema.<br />

Pois, apezar <strong>de</strong> se publicar, <strong>de</strong> se espalhar c introduzir em to-<br />

<strong>da</strong>s as nações <strong>da</strong> Europa, apezar <strong>de</strong> nenhuma lhe obe<strong>de</strong>cer, nem<br />

as nações foram coridcmnn<strong>da</strong>s h heresia, nem o <strong>do</strong>miriio <strong>do</strong> clero<br />

se engrossou com a escravidão <strong>do</strong>s povos.<br />

Não nos admircmos d'isto : é a condic;'io <strong>de</strong> tu<strong>do</strong> o que não<br />

cabe nos limiies <strong>do</strong> possivrl. Nem as ~iayócs sc podiam siiici<strong>da</strong>r,<br />

sacrificari<strong>do</strong>-se h thcocracia monstruosa; nthrn a tyrcbjíi romana<br />

po<strong>de</strong>ria acceri<strong>de</strong>r seus raios, porque fiilminaria o catholicismo iri-<br />

teiro.<br />

I'or to<strong>da</strong> a parte se iritroduziu subrepticiamrril(1 esta celebre<br />

bulla! porquc tara quasi geral o uso <strong>do</strong> placito rcgio, que Ilie im-<br />

pediria a entra<strong>da</strong> e divulgaçâo, se fraricarnerito e dcscobcrto se<br />

apresentasse. Na<strong>da</strong> se conseguiu, porqiie, assim que correu em<br />

publico, levantou-se uma tal indigriação! que em pouco tempo lhe<br />

roubou a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> que queria conquistar.<br />

Na alta Allemanha o impera<strong>da</strong>r Ho<strong>do</strong>lpho 11 oppoz-se viva-<br />

mente á publicação d'esta bulla ; no electora<strong>do</strong> <strong>de</strong> Mayence o ar-<br />

cebispo eleitor prohibiu que fosse publica<strong>da</strong> na sua diocese e nas<br />

terras <strong>do</strong> seu <strong>do</strong>minio temporal<br />

Fillippc I egualmente n impediu, sob graves penas, na Hes-<br />

panha, nn Italia, ria Sicilia, em Napoles e nos Puizrs-Baixos; ((11-<br />

déclare, diz um historia<strong>do</strong>r 1, qu'il ne souffrirnit pns qu'on lui put<br />

reprocher d'avoir laissk diiniriuer par une IAclir coii<strong>de</strong>scen<strong>da</strong>nce la<br />

digiiith


I<br />

ce<strong>de</strong>ram 6s instancirr <strong>do</strong> num%, BaLirogbo. que lhe pedia a<br />

pu1)licaçbo <strong>da</strong> bulla nas suas diocese'.<br />

A França fez mais: man<strong>do</strong>u-se promkr r im+ções a respeito<br />

<strong>do</strong>s iritrotluctores <strong>da</strong> prrigosa bulla, e & toibs a arcebispos, bis-<br />

pos c viparios, que a tiriliiim acceita<strong>do</strong> c publica<strong>do</strong>, man<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-os vir<br />

cm pessoii á preseriça <strong>do</strong> Parlamento para reqcdrern no recurso<br />

!I cor0a iu competente procura<strong>do</strong>r. Foi isto pelos amos <strong>de</strong> 1 580.<br />

Como 18 fóra, entre n6s o m mo se pretendm coasl.:uii. c as<br />

maquiiiaçòes jesuitic,as assim e obtem no anw <strong>de</strong> 1575. .\ $ppo-<br />

siçao, o estron<strong>do</strong> foi íh pn& apar <strong>do</strong> miseravel estali., I :,i que<br />

jazia Portugal nestes tempos. qw a pitas em muitos it,g,ii.~>s se<br />

viram obriga<strong>do</strong>s a fugir, corra<strong>do</strong> e perigo <strong>de</strong> serem al)t.tlrr:in<strong>do</strong>s.<br />

Dn parte <strong>do</strong>e po<strong>da</strong>es, pors, iPo Imre um rompimrrito iiltivo,<br />

que teria evita<strong>do</strong> difficuldr<strong>de</strong>r O infeliz moço, que presidia i10 go-<br />

verno <strong>da</strong> nacào, fez submissmmte consi<strong>de</strong>rar ao papa que na<br />

bulln, que se lia em Roma na qu<strong>da</strong> íeira <strong>da</strong> cêa <strong>do</strong> Senhor, pa-<br />

reciam vir alguns capitulas offensiros <strong>do</strong>s privilegios e Icis <strong>de</strong> que<br />

ha rriilitos aiirios Portugal usava, rem opposiçào <strong>da</strong> sancta Se; e<br />

quasi humil<strong>de</strong> Ilie siil,plicava que quizesse, com a beriigrii<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

apostolica quc o illumitiiiva, <strong>de</strong>clarar que essas leis e privilegios<br />

nào iam cornpreheridi<strong>do</strong>s rias con<strong>de</strong>mnaçòes <strong>do</strong>r artigos <strong>da</strong> bulla<br />

ln coena L)o~/~irri.<br />

O poritific~~, lh~tito srri, envia em resposta a D. Scbastiào o<br />

breve - Exponi rrobis- dc 25 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1574, no qual mais<br />

<strong>de</strong> urna bcz se encontra a plirase que se arrasla conio a serl~enie.<br />

Ahi Ilic poridcra que, muito gostoso, queria corivericer-se dc que<br />

existiam taes leis e privilcgios; mas que, <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as allcgaçòes<br />

<strong>do</strong> rei, na<strong>da</strong> podkra coinprc~lieri<strong>de</strong>r, e que assim lhe pedia quc brevemente<br />

procurasse remelter-lhe as coiicordias, conlirmaçbes, Icis<br />

e privilegios dc quc lhe Salavir; e que tio entretanto, <strong>de</strong>sejan<strong>do</strong> em<br />

alguma parte satisfazer aos rogos <strong>do</strong> moiiarcha, quacto coin o<br />

Senhor podia, lhe permittia e coricedia que elle e os seus juizes e<br />

ministros po<strong>de</strong>ssem usar <strong>da</strong>s referi<strong>da</strong>s Icis assim como ate agora<br />

sem controversia o tinham feito; não sen<strong>do</strong> em coritrario <strong>do</strong>s <strong>de</strong>cretos<br />

<strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Trento, e isto por espaço <strong>de</strong> um anno '!<br />

1 Copiamos, por muito interessante, e integra cl'este breve. A traducçiio<br />

8 <strong>da</strong> Ueducç. Chrun. p. ir, <strong>de</strong>monst. 6..<br />

Ao iiosso carisnimo filho em Christo, SebiistiQo, illustre rei <strong>de</strong> Portugal,<br />

sau<strong>de</strong> e beu@o.<br />

Vossa magesta<strong>de</strong> me fee expor que ha pouco tempo tinha chega<strong>do</strong> B sua


Tal era o esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> humilhação a que chegára a soberania <strong>do</strong>s<br />

nossos reis !<br />

Sr hoj~ seria mui difficil e <strong>de</strong>mora<strong>do</strong> trabalho fazer um codigo<br />

<strong>da</strong>s liber<strong>da</strong>clc~s, corifirmações e privilegios <strong>do</strong> nosso reino; como<br />

po<strong>de</strong>ria brevemeiile, quam prilnun~, rio espaço <strong>de</strong> um anno, fazer-se<br />

essa compilação nesses trrnpos <strong>de</strong>sgraça<strong>do</strong>s e sob a influencia<br />

jesuitica, que piimeiro procurhra introduzir a bulla perigosa?<br />

E, quan<strong>do</strong> se po<strong>de</strong>sse fazer, [ião ia d'eslc mo<strong>do</strong> pedir-se ao papa<br />

nào s6 a confirmaç80 <strong>do</strong>s privilegios, mas <strong>da</strong>s proprias leis <strong>do</strong><br />

reino, <strong>do</strong>s assentos <strong>da</strong>s côrtes, <strong>de</strong> to<strong>da</strong> essa herança legislativa<br />

<strong>do</strong>s pre<strong>de</strong>cessores <strong>do</strong> rei dcsverituroso ?<br />

Que abysinos se abriam sob este simples acto <strong>da</strong> chancellaria romana!<br />

como d'alli se zombava <strong>da</strong> paz <strong>da</strong>s nações e <strong>do</strong> direito <strong>da</strong><br />

humani<strong>da</strong><strong>de</strong> !<br />

Esta opposição vivissima dc to<strong>da</strong> a Europa, cujo estron<strong>do</strong> vinha<br />

ate 130rtugal, a guerra religiosa na Frunya e nos Paizes-baixos,<br />

<strong>de</strong>svian<strong>do</strong>, a attenção e csliian<strong>do</strong> as intençòes <strong>do</strong> papa; interromperam<br />

esta conten<strong>da</strong> <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong>-a pen<strong>de</strong>nte. A biilla continuou a<br />

ler-se em Roma na quinta feira <strong>da</strong> semana siincta, e as excommu-<br />

noticia que algun~as leis <strong>do</strong>s seus reinos e alguns privilegios concedi<strong>do</strong>s pela<br />

S:! iiposttolica 'a VOHSZL Jliigcsta<strong>de</strong> e aos seus pre<strong>de</strong>cc~sorcs, pareciam <strong>de</strong>roga<strong>da</strong>s,<br />

olhsii<strong>do</strong>-se para o tlieor <strong>da</strong>s palavras coriti<strong>da</strong>s rias ConetituiçOee apstolicas,<br />

que so costumavarri publicar em quinta feira <strong>da</strong> ceia <strong>do</strong> Sculio~:<br />

Qric isto nào s6 inseriagrave prejuizo B sua real ji~iisdicçào, maa que essas<br />

leis c privilegios se ii:io podiam <strong>de</strong>rogar seiri maxiina perturbaçâo <strong>da</strong> paz e<br />

traticti~illi<strong>da</strong>~-ir e <strong>da</strong> coiicordia <strong>de</strong>baixo <strong>da</strong> ciulrl os esta<strong>do</strong>s ecclesiaatico c secular<br />

têiir \i\ i110 atB agora:<br />

Oue. " ,. i~osto ciiie V. AI. vossa consi<strong>de</strong>rar que as dictae leis estabeleci<strong>da</strong>s<br />

pelos reis seus pre<strong>de</strong>cessores e observa<strong>da</strong>s p<strong>do</strong> esta<strong>do</strong> ecclesiaetico, umas ha<br />

mais <strong>de</strong> ccnt, outras h:& tnaia <strong>de</strong> duzeritos aiiiios, para comporem e fazerem<br />

cessar as UI gentes qucstUes e coiitrover~ias qiie houve naquelle tempo e fosseiii<br />

pioiriulcsd is para conservar a paz, e dlgiimas d'ellae corrobora<strong>da</strong>s, feitas<br />

r iiitroduz~<strong>da</strong>s com auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> apostolicli:<br />

Posto que os dictod privilegias foraui coucedi<strong>do</strong>s com justas e legitimas<br />

causas iiiuiia exibtcutes :<br />

Posto que tairihein se <strong>de</strong>va cotisi<strong>de</strong>rar yiic as referi<strong>da</strong>s leis e privilegioe<br />

<strong>do</strong> po<strong>de</strong>ui ser teiitleiitcq e iiitcrpreta<strong>da</strong>s para oEenba e diminiiiqho <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

ecclesiastic:~; rnas se dirigem ao serviço <strong>de</strong> Deus e ao beiii 11ublico <strong>de</strong><br />

seus reinos e <strong>do</strong>minioa e 4 conservagao <strong>da</strong> paz ciitre os sobredictou esta<strong>do</strong>s :<br />

Posto que O uso <strong>da</strong>s dictm leia e privilegios sempre foi recebi<strong>do</strong> e prati-<br />

ca<strong>do</strong> at6 agora pacificamente sem escan<strong>da</strong>lo <strong>do</strong>e povos e Q vista <strong>do</strong>s nu icios<br />

apostolicos iicsaeu reinos, e com sciericia e pacieticia <strong>do</strong>s inesmos nuncios :<br />

E pusto que V. M. julgasse que as dictas leis e privilegios <strong>de</strong> nenhuma


nhiies nâo pararam <strong>de</strong> chover sohrc as nnçôes <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> por eficito<br />

d'ella.<br />

Quatro annos <strong>de</strong>pois realisa-se ;I infeliz expedição arricana, e<br />

Portugal continua prcsa <strong>da</strong> superstic;tio e <strong>do</strong> clero. Este esqueci-<br />

mento, esta fraqueza na dispiita com o papa, s6 aproveitava á<br />

propria se romana, e ain<strong>da</strong> em 1634 pesava na consciencia <strong>da</strong><br />

camara <strong>de</strong> Lisboa o não ter exceptua<strong>do</strong> <strong>do</strong> real d'agua a classe<br />

clerical, chegan<strong>do</strong> a impetrar a absolviç80 <strong>da</strong>s censuras, que cui-<br />

<strong>da</strong>va ter chama<strong>do</strong> sobre si 1.<br />

sorte haviam si<strong>do</strong> comprelicndi<strong>do</strong>s na referi<strong>da</strong> hulla <strong>da</strong> ch. nem fora <strong>da</strong><br />

nossa inteiição, ou <strong>da</strong> <strong>do</strong>s pontiiices romanos nossos prr<strong>de</strong>ccssoit~+, revogar similliantes<br />

leis e privilegios, ou impedir o uso, oii execuç%o d'elles.<br />

Comtuclo, pela atteiiçgo que V. M. uos professri, e pela reverencia com que<br />

olha para os irian<strong>da</strong>tos <strong>da</strong> SB Apostolica, e iiossoa, jiilgou que era licito e <strong>de</strong>criite<br />

coiisultar-nos eobre o uso <strong>da</strong>s dictas leis e privilegios. Por cuja caiisa<br />

riou fez sripplicar, que com oa referi<strong>do</strong>s fiiritl~iiientos dcclaras~einos que as<br />

(li1 t:i\ leis e lrrivilegios nàoeiam comprehcndi<strong>do</strong>s na bulla <strong>da</strong> Cêa <strong>do</strong> Senhor,<br />

c111" s(. co~tur~ia ler; e que se a V. h3. e aos seus rninistros era licito usar d'elles,<br />

<strong>da</strong> mesina sorte, que o praticaram os reis seus ~redcc~saores e os seus ministros,<br />

como V. hl. hii pouco fcz tleieriniiiar e tlcciiirai: E qiie rios digii:isscrnos<br />

atteiidrr patcriialmeiite coui :i Uc~iiigiiicla<strong>de</strong> Al>a,-tolica J 1,az c trrinqiiilli<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>do</strong>s seus reirios :<br />

Comtu<strong>do</strong>, nem qric pelas letras <strong>de</strong>V. hI., nem pela relaçào que em seu nome<br />

nos foi feita, podc~s~twios enten<strong>de</strong>r o que se acha precavi<strong>do</strong> pelas dictas leis<br />

e privilegios (posto qiir ali88 o nosso miimo seja propeii~.issinio s agra<strong>da</strong>r a<br />

V. M.), não podéiiio. ~)rrauatlir-nos a spproval os, p~iiicipalmente quan<strong>do</strong> se<br />

tracta (IR ~al~açio 11~s alinas (!), <strong>do</strong>s quaes privilegios e leis ri%o temos noticia;<br />

porque se a tivessemos, o mesmo que agora nào conce<strong>de</strong>mos a V. M., talvez<br />

llr~ i150 <strong>de</strong>negariainos.<br />

Em consi<strong>de</strong>ração <strong>do</strong> que, exhortamos a V. M. para que brevemente procure<br />

remetter-nos as dictas concordias, confirma~Ges, Iris r privilegios; porque<br />

sen<strong>do</strong> por nós vistos, e com nosso pateriial aífecto poiitlera<strong>do</strong>s, <strong>de</strong>sejaremos<br />

proce<strong>de</strong>r com aquella razão, com a qual fique atteiidi<strong>da</strong> a segurança <strong>da</strong> sua<br />

propria eonsciericia e <strong>do</strong>s seus vaasallos. e a traiiqiiilli<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s seiia reiuos, e<br />

nos mostraremos tho benevolos com V. Bl., que se n8io arrepen<strong>da</strong> <strong>de</strong> nenhuma<br />

sorte <strong>de</strong> sua pie<strong>da</strong><strong>de</strong> e ohedieiicia a Nós, e a esta Saocta 88 :<br />

Entrctanto, <strong>de</strong>sej.iri<strong>do</strong> nós satisfazer ern algriina parte aos rogos <strong>de</strong>V. M.<br />

quanto com o Senhor po<strong>de</strong>inos, pcriiiittimos c coricc<strong>de</strong>rnos que V. hi. e os seus<br />

juizes e ministros possam usar <strong>da</strong>s referi<strong>da</strong>s leis e privilegios, e ~~rocecler,<br />

julgar e executar na conformi<strong>da</strong><strong>de</strong> d'ellas e d'elles, assirn como atb ngora o<br />

yraticuram sem coi~trovelaia, nâo sen<strong>do</strong> em nosso <strong>de</strong>sprezo e contra os <strong>de</strong>cretos<br />

<strong>do</strong> sagra<strong>do</strong> concilio, por tempo <strong>de</strong> um anno e o mais tempo que drcorrer<br />

ao nosso beneplacito e <strong>da</strong> SB Apostolica, som que ha-jnm <strong>de</strong> incorrer nas censuras<br />

<strong>da</strong> dicta bulla que se costuma ler no dia <strong>da</strong> cCa <strong>do</strong> Senhor ...o<br />

1 Leia-ae a Deducção Chronologica, P. I.., Divis. 8, 8 305, e P. 2:, <strong>de</strong>rnE.'p.;<br />

&26e e. .e g uintes.<br />

bulla excommuiigageralmente os que <strong>de</strong>sobe<strong>de</strong>cem &s or<strong>de</strong>ns <strong>do</strong><br />

papa.<br />

O cap. v man<strong>da</strong> :<br />

10


A historia <strong>da</strong>s relaçoes <strong>da</strong> egreja portugueza com a cdrte <strong>de</strong><br />

Roma <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o mea<strong>do</strong> <strong>do</strong> seculo xvi até os fins <strong>do</strong> secul:) xvii C<br />

bastante agita<strong>da</strong>, e interessante. Levar-nos-ia porem m~ii longc<br />

a sua narração; para nós importa-nos saber sómente que, se o<br />

monarcha tinha cffcctivamente feito <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r <strong>da</strong> approi;l~?io <strong>do</strong><br />

papa a legitimidndc <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s e privilegias <strong>da</strong> egrejn portu-<br />

gueza, C tambem certo que a cgreja <strong>de</strong> Roma nunca a consi<strong>de</strong>rou<br />

<strong>de</strong>pois d'isto como schismatica ou heretica, continuan<strong>do</strong> a eriviar<br />

os nuncios e a communicar com ella.<br />

Quan<strong>do</strong> se tracta no tempo <strong>de</strong> Pliilippc dn nova compilaç50 <strong>da</strong>s<br />

Or<strong>de</strong>na~ões, Jorge <strong>de</strong> Cabe<strong>do</strong>, um <strong>do</strong>s compila<strong>do</strong>res, dá noticia <strong>de</strong><br />

lima concor<strong>da</strong>ta <strong>de</strong> 18 dc Marco <strong>de</strong> 1578, entre D. Sebastiso e<br />

a curia romana, cuja <strong>do</strong>utrina revoga a <strong>do</strong> Alvarli <strong>de</strong> 19 <strong>de</strong> Março<br />

<strong>de</strong> 1569, que tinha entre nós admitti<strong>do</strong> sem restricçõcs os <strong>de</strong>-<br />

cretos <strong>do</strong> concilio <strong>de</strong> Trento, por to<strong>da</strong> a parte mais ou menos re-<br />

pulsa<strong>do</strong>s pelos moiiarchas.<br />

Ha gran<strong>de</strong> disputa entre os realistas c os ultramontanos'Cicêrca<br />

(Ia legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong> d'este <strong>do</strong>cumento, que alguns cr4cm forj;itlo I.<br />

For,jn<strong>do</strong> ou não, O que este facto prova é a nccessi<strong>da</strong>d~, qiicb<br />

critão havia, <strong>de</strong> mantcr as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> cgreja, embora como arma<br />

clcí'ensiva contra Homa.<br />

.Item, excominunicsmus et anathemati.;amus omiics, qui in terrio nova pe-<br />

<strong>da</strong>gia, seu gabellas, praeterquam in casibus sibi a jure sei1 specinli Sedis<br />

Apostolicae licuiitia permissis imponunt vel augcrit, seu iinponi, vel augeri<br />

proliibita cxiguiit.~<br />

Josepll tle Maistre cm um extravagante capitulo Acerca drr bulia In cnena<br />

I>omirai. <strong>do</strong> seu li~ro-Uupape - commcnta <strong>da</strong> seguinte maneira ato artigo<br />

5.0 <strong>da</strong> bulla :<br />

aEii preiiaiit <strong>da</strong>ns chaque btat l'impôt ordin:iire comme un dtublieermed<br />

It1,yycll, le Pape décicle qo'on iir pourra rii l'aupmenter ni en étcrblii. <strong>de</strong>nouveanx,<br />

hors les cas prhvus par Ia loz' natio,~ule, oii <strong>da</strong>iis les cas irnprdvus et absotn-<br />

inent extraordiiiaires en veitu d'uue dispense dri Saiiit-Sikge - 11 faiit, je Ic<br />

clis ir ma grau<strong>de</strong> confusioii, qu'h force <strong>da</strong>voir lu ces infamieu,<br />

Je me sois fait un front qui ne rougit jamais ;<br />

car je les transcris sans le moindre mouvement <strong>de</strong> honte et rnk~ M *,<br />

a'Z me sernble que j'y pre<strong>da</strong> plaisir..<br />

1 O jesuita Fraiiciuco Soares, o mcsino celebre Sosrcs, theologo hespanhol,<br />

que foi professor <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> dr ('oirnhra, coritestori ri existciicia e alictori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>da</strong>s concordias em certa di.l)iita que teve coin Oahriel Pereira <strong>de</strong><br />

Castro, o auctor <strong>do</strong> Tracta<strong>do</strong> <strong>de</strong> JL«.,III Ilcgiu - a qii:il coiitioversin este LI]tirno<br />

fez estampar sob o nome <strong>de</strong> blonomxchia, que corria impressa ao ternpo<br />

(Ias celebres dissensões com a corte <strong>de</strong> Roina no reina<strong>do</strong> <strong>de</strong> D. Joâo V, que<br />

por fim a man<strong>do</strong>u recolher para nào irritar os auirnos.


Esta ií~iil~iidii, que Iioje ain<strong>da</strong> renovem os seetiirios <strong>da</strong>s dcsmedi<strong>da</strong>s<br />

pretcrisbes <strong>do</strong>s poritifices, é porem perfeitamente inutil ;<br />

porque, falsa, ou 1180, a <strong>do</strong>utrina passou para variou titulos <strong>do</strong>s<br />

livros 1.' e "L0 <strong>da</strong> Ord., on<strong>de</strong> recebeu to<strong>da</strong> a força e auctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> lei.<br />

No tempo cle D. Jose I, José <strong>de</strong> Seabra <strong>da</strong> Silva, elaboran<strong>do</strong><br />

a Drducqao Chronologica, e combaten<strong>do</strong> largamente a bulla <strong>da</strong><br />

C&a, lembra-se <strong>de</strong> uma consi<strong>de</strong>ração, que <strong>de</strong>vera <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito ter<br />

si<strong>do</strong> feita para socegar os espiritos, a quem pezavam as censuras<br />

d'aquella bulla.<br />

A bulla <strong>da</strong> C6a n2o podia ler effeito algum entre n6s srm a<br />

sancçào <strong>do</strong> beneplacito regio; em seus capitulas ella acabava implicitamente<br />

com garantia tUo preciosa para esfes tempos: 6 ver<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

; mas neo o podia çonst.guir sem a regia apltro\açáo, que nso<br />

teve 1.<br />

A cgrt>ja portugueza ngo soffreu pois a diminiiição <strong>de</strong> uma só<br />

<strong>de</strong> suas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s por effeito d'csta hullii; iirm a sollicitação <strong>de</strong><br />

um breve, que <strong>de</strong>clarasse cxccptua<strong>da</strong>s <strong>da</strong>s disposiçaes <strong>da</strong> bulla as<br />

concordias, leis e privilcgios, na<strong>da</strong> pb<strong>de</strong> conseguir, porque estava prejudica<strong>da</strong><br />

pela falta <strong>da</strong> saricção <strong>do</strong> hencplacito; scw<strong>do</strong>, como 6, certo<br />

e observa Seabra <strong>da</strong> Silva, que 'nessa sollicitaçiio se <strong>de</strong>ve ver o qiic<br />

ella realmcrite representa, que b. um meio poli<strong>do</strong> <strong>de</strong> rcpiilsar a<br />

bulla c ricbgar-lhe o regio placito, como se po<strong>de</strong> ver <strong>do</strong> mesmo<br />

bre~e qucs co~~!~i (> repete as allcgaçòi~s <strong>do</strong> monardia.<br />

Isto ei (i fiei Crn uma opirii;io, que s6 tinha a força moral, que<br />

lhe vra propri~i; riao büstava, e por isso nao tar<strong>do</strong>u a C. <strong>de</strong> L. <strong>de</strong><br />

2 dc abril <strong>de</strong> 1768, negan<strong>do</strong> expressamerite o beneplacito a essa<br />

bulla.<br />

A lei, <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> preambulo costuma<strong>do</strong> no pomposo estylo josephino,<br />

<strong>de</strong>termina em o g 2.O :<br />

u2.O Determino que to<strong>do</strong>s os exemplares que até agora se têm in-<br />

troduzi<strong>do</strong> ou estampa<strong>do</strong> 'nestes reinos e seus <strong>do</strong>minios <strong>da</strong>s sobredietas<br />

hullas <strong>da</strong> Cha, <strong>do</strong>s quc servirão dc base aos Indices Eupurgatorios, <strong>do</strong>s<br />

mesmos Indices Expurgatorios c <strong>da</strong>s mais prohibiçóes <strong>de</strong> livros que <strong>de</strong>-<br />

pois d'elles se introduziram nestes reinos, nulla c espoliativamcnte sem<br />

prece<strong>de</strong>r para a publicacão d'elles o Iicgio beneplacito, sejam e fiqiietn<br />

inteiramente supprimi<strong>do</strong>s como obrepticias, subrepticias, e <strong>de</strong> nenhum<br />

1 Deducgão Chronologica, tomo 2.0, <strong>de</strong>monstr. 6.1, 9 79,


vigor <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seu mesmo principio para produzirem qualquer effeito, o11<br />

prestarem algiim impedimento ao que se tem julga<strong>do</strong> e julgar pelos meus<br />

tribunaes e magistra<strong>do</strong>s em observancia <strong>da</strong>s disposirõrs <strong>do</strong>s <strong>Direito</strong>s<br />

Natural e Divino, <strong>do</strong>s Assentos <strong>da</strong>s Cortes estabeleci<strong>do</strong>s pelos Nossos<br />

Senhores Reis, meus Gloriosos Predl cessores, <strong>da</strong>s leis patrias, <strong>do</strong>s an-<br />

tigos e louvavcis costumes d'estes Rcinos, e <strong>da</strong>s Concor<strong>da</strong>tas entre elles<br />

e a Se<strong>de</strong> Apostolica, os quaes <strong>Direito</strong>s, Assentos e Leis, costumes e Con-<br />

cor<strong>da</strong>tas excito e con/irmo (no que necessario for) em f4rma eqeci/ica,<br />

haven<strong>do</strong> aqui lo<strong>do</strong>, e to<strong>da</strong>s por prezentes .... para que se fique guar-<br />

<strong>da</strong>n<strong>do</strong> e obsenan<strong>do</strong> iiiwiolavelmentc o seu conteíi<strong>do</strong> táo cumpri<strong>da</strong>mente<br />

como nelles e nellas se acha or<strong>de</strong>na<strong>do</strong> e <strong>de</strong>clara<strong>do</strong>, sem minguamento,<br />

alteração, ou diminuição algiima, por menores que sejam 1.n<br />

Tal era o vigor, a gran<strong>de</strong>za, que este rnonarcha, embora orna<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> Siimmo Imperio cesariano, sabia commuriicar com suas leis ao<br />

brio e existencia dc Portugal.<br />

Mas, quan<strong>do</strong> aquelle breve tivesse realmente annulla<strong>do</strong> e redu-<br />

zi<strong>do</strong> a p6 as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s a que se refere; quan<strong>do</strong> esta lei não ti-<br />

vesse vin<strong>do</strong> excitar com sua força o passa<strong>do</strong> e <strong>de</strong>sfazer o que es-<br />

tava corisurnma<strong>do</strong>; ain<strong>da</strong> assim a egreja portugueza continuava<br />

liojc a existir <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> Carta constituciorial, <strong>de</strong>pois <strong>do</strong> rcgimen<br />

libcral <strong>do</strong> nosso dircito publico. Seja qual for a extensâo, que se<br />

queira <strong>da</strong>r ao po<strong>de</strong>r politico em virtu<strong>de</strong> <strong>do</strong> artigo que dcclara<br />

continuar a ser a religiào <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> a religino catholica ; scjn qual<br />

IBr o mo<strong>do</strong> por que se cornprehen<strong>da</strong> o uso <strong>do</strong> bcneplacito e <strong>do</strong>s<br />

ílircitos <strong>de</strong> pndroa<strong>do</strong>; o qiie é certo é que o direito ecclesiastico<br />

portiiguw, fun<strong>da</strong><strong>do</strong> agora nesses artigos <strong>da</strong> lei fun<strong>da</strong>mcntnl, esth<br />

1)erfcitamente irivulneravel com respeito aos rilios parti<strong>do</strong>s (li] bulla<br />

<strong>da</strong> Cka, ou <strong>de</strong> qualquer bulla pontificia. Foi a nação, a maioria<br />

d'clla, catholica e reverencia<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> centro <strong>da</strong> fé <strong>da</strong> sua rcligino,<br />

que promulgou essa lei, que <strong>de</strong>sejou submetter-se a ella, que<br />

obriga agora riao s6 a maioria, mils a to<strong>do</strong>s os portuguezes, a<br />

to<strong>do</strong>s os clerigos, a to<strong>do</strong> o episcopa<strong>do</strong>, que é portuguez c siibdito<br />

pacifico c tão responsavel como qualquer leigo, e tanto mais res-<br />

ponsavel, quanto aquella 6 a lei fun<strong>da</strong>mental <strong>do</strong> seu paiz.<br />

1 Nos $5 seguintes esta lei man<strong>da</strong> que <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> 3 rnezes se apresentem<br />

nos logares que indicaos exeriiplares <strong>da</strong>s bullas, <strong>de</strong>claran<strong>do</strong> iricursos na. real e<br />

grave indignaç80 <strong>do</strong> monarcha, nas penas <strong>de</strong> copfiscaçâo, privaçào <strong>de</strong> naturali<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />

e sen<strong>do</strong> eqiiipara<strong>do</strong>r, aos que offeii<strong>de</strong>m è conspiram contra n regia<br />

magesta<strong>de</strong> e ruina <strong>do</strong>s seus reinos, e ti<strong>do</strong>s coi~io perturba<strong>do</strong>rcs tlo socego publico,<br />

os que <strong>de</strong>sobe<strong>de</strong>ceroni a essa lei. Veja tambem a C. R. <strong>de</strong> 16 <strong>de</strong> maio<br />

<strong>de</strong> 1774.


Isto não se discute, nem o episcopa<strong>do</strong> portuguez jámais, assim<br />

o acreditamos, se lembrou <strong>de</strong> <strong>de</strong>sobe<strong>de</strong>cer aos artigos <strong>da</strong> nossa<br />

coristituiçáo, para alcançar qualquer bulla perigosa, romana e não<br />

catholica.<br />

Uizvrníll,~, pom, e dizem-nos os ultramontanos: -o <strong>de</strong> que<br />

\o, falaes, não são liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, sáo servidóes, puras servidões; -<br />

serão liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s para os reis, mas tomam-se em ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras servidões<br />

para o papa.<br />

33 o ultimo recurso <strong>da</strong> discussáo theocratica parti<strong>da</strong>ria; A uma<br />

quest3o <strong>de</strong> palatras 6ca. uma distin- tbeologica vã.<br />

Xão po<strong>de</strong>remos nos dizer tambem qoe as que vós chamais librr<strong>da</strong>drs<br />

S ~ O 51~vidcka para a oação poitu,peza? e porbentura cm<br />

iiiii,i ii


direito ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente catholico. e em to<strong>do</strong>s os casos n3o ataca<br />

a disciplina fiin<strong>da</strong>mental, nem o <strong>do</strong>gma 4.<br />

Outr'ora era o rei que representava a naç8o; os <strong>direitos</strong> <strong>da</strong><br />

cgreja portugiieza, nasci<strong>do</strong>s <strong>da</strong>s pretc:risões <strong>do</strong>s reis, eram como que<br />

nasci<strong>do</strong>s <strong>da</strong> mesma naçao: como qricreis eritao cliamar-lhcs servidào<br />

? Servi<strong>da</strong>0 pnra a egreja ? Para que cgrr-ia? para a portugueza?<br />

1180, que era ella que os estatuia. Sclrvidão para a egreja<br />

catholica ? como ? se estas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s se nào impòcm n outras egrejas,<br />

e para a propria são liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s e não serçidòcs? Servidão em<br />

rclaçào ao papa ? embora ; chama(.-lhe assim, se qucreis ; mas<br />

qiicni diz liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, diz implicitamente direito a respeito <strong>de</strong> alguma<br />

cousii, e por isso obrigação (servidão, como dizeis) <strong>da</strong> parte<br />

<strong>de</strong> alguem <strong>de</strong> o acatar.<br />

E ho,je mcnos duli<strong>da</strong>s po<strong>de</strong>m ficar a cstc rc~spcito, porque Iioje<br />

6 real, nào ficticiamcrite, que a nagno, qiic o clero portiieuez, que<br />

sc <strong>de</strong>ve saber e dcst*jar portugiicz, as promiilgou para si no acto<br />

solcmrie <strong>de</strong> sua nova constituiçao politica.<br />

E se fostes v6s mcsmos, qilc quizrstcs a constituição politica e<br />

lihcral (porque quem não acceita a con~titiiiçâio <strong>de</strong> um paiz, expatria-se,<br />

dsnaturatisa-se e não se faz inimigo sob a apparcncia <strong>de</strong><br />

s~ihrlito;, ç6s mesmos quizestes tambvm conasrçar a antiga liber<strong>da</strong>tlr<br />

a(~ approvayão <strong>da</strong>s brillas pelo re~io placito antes <strong>de</strong> terem<br />

vigor; e como inten<strong>de</strong>is a permancncia, a co-existencia d'estes<br />

principias <strong>da</strong>s leis com as vossas idCas sobre liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> egrejas<br />

particiilares nacionaes?<br />

A bulla a que foi nega<strong>do</strong> por uma lei o beneplacito ha <strong>de</strong> executar-se<br />

ria egrcja portugueza? A lei que <strong>de</strong>nega o beneplacito<br />

1120 ser8 o texto <strong>de</strong> uma nova liber<strong>da</strong><strong>de</strong>?"<br />

Não 6 06 <strong>de</strong> agora que e d romana tem respeita<strong>do</strong>, como <strong>de</strong>via, estas li.<br />

ber<strong>da</strong><strong>de</strong>s (que não discutimos aqui, senão <strong>de</strong> facto e não <strong>de</strong> principio som<br />

<strong>de</strong>c1arar berrtica OII schisrnatiea a egreia portt~gucza, e i<strong>do</strong> mesmo <strong>de</strong>pois<br />

<strong>da</strong> inex~cuçlo <strong>da</strong> bulla In Coena Domini. Vê-se <strong>de</strong> João Pedio Riheiro como<br />

já antes <strong>do</strong>s falsas <strong>de</strong>cretaes estas egrejas com direito proprio n8o eram reputa<strong>da</strong>s<br />

echisrnaticas.<br />

aAhi veremoe, diz este escriptor no prologo <strong>do</strong> fieu rnan~ecripto, ahi veremos<br />

tambem a diversi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> disciplina particular <strong>da</strong> nossrr, Egreja e <strong>da</strong><br />

Uiiiversal, sem que comtu<strong>do</strong> fosse nunca reputa<strong>da</strong> ~chismatica ou menos obediehte<br />

filha <strong>da</strong> Roinana, ctGas prt.io,rr:ttirrts scinpre reconheceu e venerou..<br />

2 Veja em Bernardino Carneiro a lirta <strong>da</strong>s btillae a que as noaaas leis <strong>de</strong>negaqhin<br />

o heiieplacito. Elens. <strong>de</strong> ar. Eccles. 7'ort. Introducç., éJ 66 not.<br />

E evi<strong>de</strong>ntemente umas <strong>da</strong>s fontes mais srgiiras <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja<br />

portugueza.


-<br />

f3 , vem- o signal <strong>de</strong> uma servidãio a apresentaçãio aos h&<br />

neficios ecclesidicos por parte <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>?<br />

120 I * est~ IRI artiro <strong>da</strong> constituigão politica <strong>do</strong> nosso paiz, a<br />

I 1 iitL I tti dt>bern' ott<strong>de</strong>ccr, porque to<strong>do</strong>s o reconhcmos e qui-<br />

/,)I1 t. -?<br />

I ra preciso <strong>de</strong>mactrn que a egreja portugucza se não for-<br />

I I I , ~ \ &' ~ portuppzes, oo que estes portuguezes não q~ioriarn para<br />

si u lei que votaram, ~n que viam 'nclla, em logar ctc palladio<br />

<strong>de</strong> suas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, r cdcia <strong>de</strong> sua escravidiio.<br />

Que po<strong>de</strong>r supremo monbeceis na terra a respeito <strong>da</strong>s cousas<br />

temporaes differente tlo <strong>da</strong> sobttrania <strong>da</strong> nação?<br />

Já antes <strong>da</strong> Carta o que as riossas Iclis chamrivam lihcr<strong>da</strong>~l~s, e<br />

riao sorridòes <strong>da</strong> egrej'ii portugu,~r.a, cram os <strong>direitos</strong> e prcrojiativas,<br />

que os supremos »iagi~~<strong>do</strong>s politicos, tAm <strong>de</strong>feza tl susterita~co<br />

<strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> trmponits e Gns ic.galies <strong>da</strong> cor<strong>da</strong>, tinham <strong>de</strong>fendi<strong>do</strong><br />

çonlra as prct(.:isiki <strong>da</strong> curia romana, e para tutelarem<br />

o po<strong>de</strong>r ordinario <strong>do</strong>s 1)ifp.c e <strong>direitos</strong> <strong>do</strong>s metropolitanos.<br />

Os estatutos <strong>da</strong> Uni\t,rsi.ld<strong>de</strong>, quaii<strong>do</strong> man<strong>da</strong>m ao professor que<br />

cxpliqiie esta naturezo <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja, dizem-lhe que<br />

narrc as disscnsõrs e discordias. que com a santa se se tinham<br />

mo\ i<strong>do</strong>.<br />

I( Dará (o prof~ssor), diziameie3e~tatutos 4, nolicia <strong>da</strong>s dissrtl-<br />

ròrs e discordias que SP ikn agita<strong>do</strong> 'nestes Reinos enire a Curia<br />

Roi~~ana e os .Senhores Reis meirr prcdrccssores, ou seja na qtiali<strong>da</strong>rle<br />

<strong>de</strong> Supremos Magistra<strong>do</strong>s Politicos em <strong>de</strong>feza e susfenta-<br />

1 Estatutos <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> 1772, Q. % tit. 40, cap. 2.O, i. 14.<br />

Veja Coelho <strong>da</strong> Roclia, Ensaio sobre oliiu & gomo e <strong>da</strong> Z~gislação<br />

<strong>de</strong> Por ugal, 8 287, Acerca <strong>da</strong> direcçào que .o estu<strong>do</strong>s tinham <strong>da</strong><strong>do</strong> os jesuitas.<br />

Veja-se tambem o n: 9.O dc cap. 5.O, <strong>da</strong> tit. 8: & li?. 2.0 <strong>do</strong>a Estatutos,<br />

acima copia<strong>do</strong>.<br />

Para os ultramontanos a maior <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s rsees servidões k o diieito <strong>do</strong> padroa<strong>do</strong>,<br />

a apresentação aos beneficias eccksiaaticos.<br />

Totlas e-tas distincções <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, servidões, rgrejas <strong>de</strong> ol~cdieiica e<br />

<strong>da</strong> nWo obediencia, causam hoje par:% 116s gran<strong>de</strong> estranheza: pniq lios mostram<br />

como iiisigficantes palavras mo\ iam largas cotiteii(1as c sei\ i:iiii clc luz<br />

11% re~oluqão <strong>de</strong> graves questões.<br />

Toclas as epochas têm d'estas cousa~ riziveie; mas, s,iii tliit iti:i. Iioiicas as<br />

tiveram corrio a epocha <strong>do</strong> sumrno imperio tlns reie. Esses dcf'rito-. st. espa-<br />

1li.r~ iin ein tu<strong>do</strong>: ila litterati~ra, nas scieucias, lia pintura, na ai (*liitectura,<br />

mae scni~~ro a par <strong>de</strong> unia força e <strong>de</strong> urna iiiagiiificeiieia eapleiit1id:ix.<br />

Coutarri->c eutre.au causas prosirnas <strong>da</strong>s 1evo1uçGes liberneg.


çâo <strong>do</strong>s Direilos Temporaes a <strong>da</strong>s regalias <strong>da</strong> cor<strong>da</strong>, ou seja como<br />

Prolectores <strong>da</strong> Egreja Lusilona, para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>rem e sustenlarem<br />

o Po<strong>de</strong>r ordinario <strong>do</strong>s Bispos e os direiíos <strong>do</strong>s Metropolitanos<br />

e cabi<strong>do</strong>s e os ouiros direilos e prerogativrls e Artigos <strong>da</strong>s Liber-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> Igreja Porlugueza. »<br />

Náo discutiremos mais este ponto para nâo gastar mais espaço<br />

com questões que se não <strong>de</strong>vem controverter: uma, por ser que-<br />

stão <strong>de</strong> palavras, futil e capciosa; outra por versar sobre um ponto<br />

<strong>do</strong>gmatico temporal, a soberania <strong>do</strong>s povos.


O Esta<strong>do</strong> portuguez e a erecção <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Portugal<br />

até o tempo <strong>de</strong> D. Josd I<br />

Principio8 que nos dirigem no estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> p-te apitala <strong>do</strong> iirtita rcclesiastico por-<br />

tuguez- O esta<strong>do</strong> portquez Leve rciipn a dimto <strong>de</strong> inisrrir na creaczo e <strong>de</strong>+<br />

membrarao <strong>de</strong> seir bispa<strong>do</strong>s e metroykii pra-• i bictoria <strong>de</strong>ssa cnacao'-Quan<strong>do</strong><br />

P como ;e tem eripi<strong>do</strong> os no- biiyCoa-Qutro sprhar diflenntPs na rreacao<br />

<strong>do</strong>- nossos bislia<strong>do</strong>s: em todu poia st arerra o mmmo direito-Locucões em-<br />

p! rpa<strong>da</strong>s pela Sancta 56 nas buliu & clamsuip-O ccclesiartica -Duvidh prove-<br />

niente d'essa re<strong>da</strong>ceao-O broeplaeh nd, quto a essr bullal- locerteza <strong>do</strong><br />

direito ecclesiastico portuguezt sua, ma-<br />

Temos visto como o breie -ni h'obis <strong>de</strong> 25 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong><br />

i 574 e um acto completamente mllo em eonsepoencias jiiridicas<br />

no direito ecclesiastico portuguez, e mo, ain<strong>da</strong> que assim n8o<br />

fosse., a L. <strong>de</strong> 2 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1765, arma<strong>da</strong> <strong>de</strong> sua innegavel atrctori<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />

trve cffeito retroactivo, <strong>de</strong>slazen<strong>do</strong> tu<strong>do</strong> o que .se pratichra<br />

sol) o influxo d'aquelle brete, e awtorisan<strong>do</strong> o-que <strong>de</strong> sua <strong>da</strong>ta<br />

em <strong>de</strong>ante se realisasse contra elle.<br />

Assim,. pois, vamos buscar na creaçào <strong>do</strong>s noseos bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

o principio <strong>da</strong> monarchia, nas modificações <strong>da</strong> nossa divisão ecclesiastica<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> esse tempo, qual o direito eccle5iastico portuguez a<br />

este rcspcito ; sempre camirihan<strong>do</strong> sob o imperio d'estes <strong>do</strong>ua prin-<br />

cipio~: -que o beneplncito regio. h t~cepqáo <strong>de</strong> alguns nnnos no<br />

rrina<strong>do</strong> <strong>de</strong> D. Joáo 11, tem conserva<strong>do</strong> to<strong>da</strong> a sua força até nossos<br />

dias, -e que o proprio bretc <strong>de</strong> Bento a111 6 o primeiro a con-<br />

fvssar a pratica <strong>de</strong> antigos privilegias entre n6s.<br />

A historia <strong>da</strong> creaçáo e formação <strong>do</strong>s nossos bispa<strong>do</strong>s e <strong>da</strong>s al-<br />

teraçaes <strong>da</strong> circumscripção ccclcsiastica <strong>da</strong> nossa egrejn, prova<br />

que o preceito <strong>do</strong> direito ecclcsiastico portuguez neste ponto era<br />

a plenitu<strong>de</strong> <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> Se Apostolica, tempera<strong>da</strong> na sua<br />

applicaç80 e exercicio pelo assentimento <strong>do</strong>s monarchas, que podiam<br />

excilal-a, mas não excrcel-a.


Só aos papas assistia o direito <strong>de</strong> erigir os bispa<strong>do</strong>s, <strong>de</strong> os supprimir,<br />

<strong>de</strong> os unir e dividir, e <strong>de</strong> alterar e marcar os seus limites;<br />

mas este direito não existia sem restricções no seu exercicio, como<br />

pelas <strong>de</strong>cretacs era estabeleci<strong>do</strong>: aqui apparece o direito <strong>da</strong> egreja<br />

portugueza modifican<strong>do</strong> a generali<strong>da</strong><strong>de</strong> d'aquelle principio.<br />

Aos monarchas portuguezes, á cgreja portugueza, riaio pertencia<br />

o direito dc crear os bispn<strong>do</strong>s, mas elles podiam oppor-sc e obstar<br />

h sua erecçóo, quan<strong>do</strong> a entendiam <strong>de</strong>sneccssaria ou inconveniente.<br />

O seu assentimento, sua intervenção era condiçgo sine qua non<br />

<strong>da</strong> legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong> d'estcs factos.<br />

Elles n30 s6 possuiam o direito d'esta intervenção <strong>de</strong>libcrativa,<br />

e ao mesmo tempo passiva ; mas era-lhes egualmente apanagio a<br />

facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> excitar a erecção <strong>do</strong>s novos bispa<strong>do</strong>s c metropoles:<br />

náo assim o direito <strong>de</strong> os crear ou modificar por si sómeotc, ou<br />

sem assentimento <strong>da</strong> Santa S6.<br />

Não se cui<strong>de</strong> que preten<strong>de</strong>mos siistentnr este capitulo <strong>do</strong> Codigo<br />

<strong>da</strong>s liber<strong>da</strong>dcs <strong>da</strong> egrqja portugucza, como os cscriptores <strong>de</strong> certa<br />

escola, perdi<strong>do</strong>s <strong>de</strong> amoles pelas regalias <strong>da</strong> cor<strong>da</strong>, oii orgi~lhosos<br />

<strong>de</strong> seu esplen<strong>do</strong>r nos dias que foram.<br />

Vamos procurar na exposiçao <strong>da</strong>s provas d'cste direito, <strong>do</strong>s titulos<br />

d'esta liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, a maior simplici<strong>da</strong><strong>de</strong> e inteiro <strong>de</strong>sinteresse.<br />

Como se ver8 <strong>da</strong>s iiltimns paginas d'cste estu<strong>do</strong>, confessan<strong>do</strong><br />

quanto valeram estas joias <strong>da</strong> cor<strong>da</strong> <strong>do</strong>s nossos monarchas em tempos<br />

que foram e o que sip~ificaram na peleija <strong>de</strong> uma <strong>da</strong>s maiores<br />

luctas que a historia nos <strong>de</strong>screve, não nos <strong>de</strong>ixamos mover nem<br />

por odios a essa vigente institiiirRo <strong>do</strong> direito pontificio, nem por<br />

exaggcra<strong>do</strong>s affectos ao glorioso throno <strong>da</strong> nossa patria.<br />

Nenhum pódc exigir <strong>de</strong> n6s senÁo a ver<strong>da</strong><strong>de</strong> inteira: consoln<strong>do</strong>ra,<br />

se 6 brilhante, cheia <strong>de</strong> magua, se 6 triste; mas sempre a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Na epocha em que Portugal se fez in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, vigorava na<br />

peninsula a divisa0 ecclesiastica <strong>do</strong> ultimo tempo <strong>da</strong> <strong>do</strong>minação<br />

go<strong>da</strong>; porque, como 8 sabi<strong>do</strong>, os musulmunos, mostran<strong>do</strong> mais<br />

atila<strong>do</strong> genio politico, <strong>do</strong> que em seculos muito mais a<strong>de</strong>anta<strong>do</strong>s<br />

<strong>da</strong> nossa era não revelam os papas'e os reis catholicos, consentiram<br />

e toleraram a religiao <strong>do</strong>s vrnci<strong>do</strong>s. Des<strong>de</strong> o sexto seciilo que havia<br />

duas metropoles nas egrejas hespanholas: Brnga e Meri<strong>da</strong>.<br />

Poucos aiinos antes <strong>da</strong> scparaçao <strong>do</strong> Portiigitl <strong>da</strong> monarchia leo-<br />

Pcza, o paI)a Cal!isto ir, por uina bulla <strong>do</strong> anrio 1 120, altcrárn as


suffraganeas <strong>da</strong> mtmpole & m, <strong>de</strong> maneira que, Mn<strong>do</strong> a pertencer-nos<br />

esta q, elia foi a primitiva e nnica rnetropole <strong>da</strong> primeira<br />

cpocha <strong>da</strong> iossa vi<strong>da</strong>.<br />

~ertenciam-1~~ terras portuguezas os bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Portucale,<br />

clc Vilru, rle Cd&a, dc Larnego, <strong>de</strong> Egitania I<strong>da</strong>nha, ao pí. <strong>da</strong><br />

Ciiartla' e ~ritoth (ao pl: dr Vianna).<br />

Antw porem d'esta <strong>de</strong>smcmbraqfio <strong>do</strong> reino <strong>de</strong> Portiigal, cm<br />

1 122, o mcsmo Callixto ri transferira a velha metropole dc Meri<strong>da</strong><br />

para Compostclla, e sob esta nova clivisiio 6 qiie appareceii a rprrja<br />

portugueza no seeulo xir, sem comtu<strong>do</strong>, como observámos, contar<br />

senso uma metropole.<br />

Notemos <strong>de</strong>ç<strong>de</strong> já a intervenqão <strong>do</strong>s papas na transferrncia <strong>da</strong>s<br />

metropolcs e divisa0 <strong>da</strong>s dioceses.<br />

Comcça\am então as nossas conquistas para o sul <strong>de</strong> Monte-mór,<br />

c as irrciirs6es para além <strong>do</strong> Tojo. Conquistava-se Santarem, Lisboa,<br />

Silccq, Guar<strong>da</strong>, Beja, Evora, c, á medi<strong>da</strong> que se arrebatavam aos<br />

sarraccnos algumas d'estas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, ahi se erigiam bispa<strong>do</strong>s.<br />

Paremos aqui.<br />

Como se realisaram estas erecçõrs <strong>do</strong>s novos bispa<strong>do</strong>s? I? o primriro<br />

ponto a resolver. IIa uma longiiiqua similhança entre o qiic<br />

fnzinni os nossos monnrchas, ganhan<strong>do</strong> as ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s e elevan<strong>do</strong> as rio-<br />

\,i9 cnihedraes, e o que aconteceu com os apostolos rios primeiros<br />

dias <strong>do</strong> christianismo.<br />

R~itlcs, barbaras, mal scguras <strong>da</strong>s invasões musulmanas, as novas<br />

citladrs christss, á medi<strong>da</strong> qtie se emancipavam, iam rrtebcri<strong>do</strong><br />

o bispo, piar<strong>da</strong> <strong>da</strong> fé, po<strong>de</strong>roso Irnitibo dc muitos males, e forte<br />

clrm~nto <strong>de</strong> conservaç80 <strong>da</strong> nova in<strong>de</strong>prn<strong>de</strong>ncia pela differcnça <strong>de</strong><br />

rcli$ío, e pelo conforto <strong>de</strong> sua prrsenca.<br />

011 por politica, ori por pie<strong>da</strong>dc, os nossos monarchas conqiiis-<br />

ta<strong>do</strong>res, ao mesmo tempo que sobre as ameins <strong>da</strong>s muralhas sub-<br />

stituiam o pendão <strong>da</strong>s quinas ao estan<strong>da</strong>rte musulmano, no inte-<br />

rior <strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, ao p~? <strong>do</strong>s agu<strong>do</strong>s minart.tcs <strong>da</strong>s mesqiiitas, faziam<br />

elcvar ])ara o céu as agulhas e as cruzes <strong>da</strong>s cathedraes gothicas.<br />

Obsriiras, as chronicas d'estes asperos tempos, não nos <strong>de</strong>ixaram<br />

clara narra~ùo d'estes fartos.<br />

-1 pic<strong>da</strong>dc, porem, <strong>do</strong>s reis, que os Icvára a submcttrr-\c> ií su-<br />

prc.maçia politica <strong>do</strong>s pontificcs, para consrguir firme csleio dc sua<br />

indcpciiclencia; e por outro la<strong>do</strong> o cui<strong>da</strong><strong>do</strong> sempre ~igilante e iricansavel<br />

<strong>do</strong>s papas em fazer valer por to<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong> o seti po<strong>de</strong>rio; cxpli-


cam e levam a luz aos factos mergulha<strong>do</strong>s nas sombras d'este ear-<br />

rega<strong>do</strong> quadro <strong>da</strong> meia e<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Lisboa 6 a primeira que recebe bispo.<br />

Em um <strong>do</strong>s tres monumentos que, a respeito <strong>da</strong> toma<strong>da</strong> <strong>de</strong> Lis-<br />

boa, se po<strong>de</strong>m ler na collecçào <strong>de</strong> monumentos historicos <strong>de</strong> Por-<br />

tugal, encontra-se um capitulo que se inscreve - « De como elrei<br />

or<strong>de</strong>nou que a ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Lisboa tivesse bispo e see calhedral .... »<br />

Conta ahi o cbronista:<br />

«E <strong>de</strong>pois que o muy nobre Rey Dom Affonso to<strong>do</strong> este ouve or<strong>de</strong>-<br />

na<strong>do</strong> em que maneira a terra e outrosi a dita ci<strong>da</strong><strong>de</strong> fosse poboa<strong>da</strong>, fez<br />

vir a seu conselho to<strong>da</strong>s aquellas nacões <strong>do</strong>s christãos que com elle<br />

eram na dita ci<strong>da</strong><strong>de</strong> e disse-lhes assi :-#Amigos, vós bem sabe<strong>de</strong>s em<br />

como eii aláaqui or<strong>de</strong>nei e <strong>de</strong>strcbuy os beens temporaes a to<strong>do</strong>s vos<br />

outros: e ora nos he cornpri<strong>do</strong>iro <strong>de</strong> auermos <strong>de</strong> tornar ao seruiro <strong>de</strong><br />

Deos, e fazer em esta nobre ci<strong>da</strong><strong>de</strong> egreja calhedral e enlegermos com<br />

ella bispo e pastor que aja <strong>de</strong> ser prela<strong>do</strong> e rege<strong>do</strong>r <strong>da</strong>s nossas almas<br />

e ordcnadgr <strong>da</strong> dita egreja e crelizia <strong>de</strong>lla.<br />

E enton elrey fez enleger por bispo um homem boo <strong>da</strong>qiiella nayom<br />

<strong>do</strong>s cngrczes, c avid nome Giliherto ... E <strong>de</strong>pois que assi foy enlegi<strong>do</strong><br />

o dito bispo enviou elrey to<strong>do</strong> este dizer ao padre sancto... e em como<br />

avia enlcgi<strong>do</strong> bispo novamente pera seriiico <strong>de</strong> Deos e <strong>da</strong> santa egreja<br />

e que lhe outorgasse r confirmasse o dito bispo.. . E enton o padre san-<br />

c10 veen<strong>do</strong> tantas boas obras, quantas elrey fazia e como por sua lanca<br />

e por espargirnento <strong>do</strong> seu sangue <strong>do</strong>s christaãos tirara a terra <strong>de</strong> po-<br />

<strong>de</strong>r <strong>do</strong>s mouros, e a seruico <strong>de</strong> Deos e <strong>da</strong> sancta egreja a trouxera, <strong>de</strong>u<br />

gracas a Deos porque a sancta egreja avia tam nobre filho come o dito<br />

rey e outorgou-lhe to<strong>da</strong>las cousas que lhe enviou pedir ... ni.<br />

Quan<strong>do</strong> geralmente se fala d'este facto diz-se e escreve-se que<br />

D. Affonso tomára a ci<strong>da</strong><strong>de</strong> e nella crehra uma cathedral, ten<strong>do</strong>-se<br />

espalha<strong>do</strong> a idba <strong>de</strong> que <strong>de</strong> pleno po<strong>de</strong>r os reis conquista<strong>do</strong>res ti-<br />

nham <strong>de</strong> per si crea<strong>do</strong> os novos bispa<strong>do</strong>s, e acreditan<strong>do</strong>-se que<br />

estes primeiros bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Portugal foríim uma ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira recdi-<br />

ficação <strong>da</strong>s antigas cathedraes gothicas d'cstas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, para a qual<br />

n'ao se carecia <strong>da</strong> auctoridn<strong>de</strong> <strong>do</strong> papa, tcn<strong>do</strong> os nossos reis, nestes<br />

tempos <strong>de</strong> pelejas e ignorancia, a idéa eleva<strong>da</strong> <strong>de</strong> um completo plano<br />

<strong>de</strong> restauração <strong>da</strong> antiga egreja gothicn.<br />

ain<strong>da</strong> a falsa id6a <strong>de</strong> querer ver na egreja portugueza esse<br />

1 De expuwione Oliaiponia, monumenla 111, cap. xr, Portugaliae monu-<br />

me& &tom, tom. 1.0


gran<strong>de</strong> e incorruptivel corpo, que ia <strong>de</strong>scançar nos braços <strong>do</strong>s<br />

apostolos que <strong>de</strong>sceram a pregar o evangelho ti peninsula hispanica ;<br />

ta o ~~"ji~izo <strong>de</strong> se imaginarem <strong>de</strong>shonra<strong>do</strong>-, se nào cobrirem o<br />

tosco ber~o <strong>da</strong> nossa patria com os brilhantes ornatos <strong>de</strong> suas<br />

<strong>do</strong>iira<strong>da</strong>s fabulas.<br />

Não foi na<strong>da</strong> assim. O que se <strong>da</strong> chronica 6 o exercicio <strong>do</strong><br />

tl:ri.ito <strong>de</strong> apresentaçáo e eleição <strong>do</strong>s bispos, d~ oric~lm i'utliiç~,<br />

;i ,tiqiii.simo entre to<strong>do</strong>s os povos mesmo fóra tlii pcloinsula, ao<br />

niosnio tempo o reconhecimento <strong>da</strong> ,auctoritla<strong>de</strong> <strong>da</strong> i(. apostolicii,<br />

emquanto á mesma erecção <strong>do</strong> novo bispa<strong>do</strong>. «I;' <strong>de</strong>pois que assim<br />

foi enlegi<strong>do</strong> o dito bispo, diz o chronista, enviou elrey tu<strong>do</strong><br />

este dizer ao padre santo..... e que lhp outorgasse e c.on/irmaxse<br />

o dito bispo .... e outorgou-lhe to<strong>da</strong>las couscu que lhe cnuiou<br />

pedir. t)<br />

[Ia l ~~is duas cousns: a outorga <strong>do</strong> bispa<strong>do</strong> e a confirmação <strong>do</strong><br />

bispo.<br />

(;orno po<strong>de</strong>ria não ter si<strong>do</strong> assim, se ain<strong>da</strong> niio eram passa<strong>do</strong>s<br />

miiitos aiinos <strong>de</strong>pois que este monarcha impetriira <strong>do</strong> papa o conseritimento<br />

<strong>de</strong> sua vassallagem e feu<strong>do</strong>?<br />

Depois, observemos isto se passaya no seculo xii, em pleno<br />

imperio <strong>do</strong> direito poiitificio, e [ião mui longe <strong>do</strong> pontificaclo d'aquelle<br />

celebre Lothario, cjiie se cliiirnou Innocencio ri1 ; Iernbrcmo-nos<br />

<strong>do</strong> qiic dissemos crn outra liiirte d'este trabalho; como ns<br />

fiilsas <strong>de</strong>cretncs consegriiam fazcr urrin rcvolucão completa ria disciplina,<br />

c iião esqueçamos que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito o prima<strong>do</strong> <strong>do</strong>s pontificcs<br />

se fizer,ii sentir, respeitar, temer 'e impor nas velhas monarchias<br />

gothicns, <strong>de</strong>spe<strong>da</strong>ça<strong>da</strong>s pelo Islamismo, e em as recentes nações<br />

neo-gotliicas. verice<strong>do</strong>ras <strong>do</strong>s musiilrnanos.<br />

Alas sch ri30 assistiu a 1). Affonso riem a seus successortls este<br />

direito, ou esta fac~il<strong>da</strong><strong>de</strong>, quc <strong>de</strong>rogava o importante privilegio<br />

<strong>do</strong>s papas; comtu<strong>do</strong> vemos (lcstle esta primeira erclc,çiio tlos riossos<br />

bispa<strong>do</strong>s que o rei impelrava, pon<strong>de</strong>rava a riecessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> erecçao<br />

e propuriha a siia creação.<br />

O mesmo se passa em Evora e Silves. ,<br />

Em 1188, apo<strong>de</strong>ran<strong>do</strong>-se I). Sancho <strong>do</strong> AI-Garb, elege-se<br />

bispo a L). Nicolau, conego regular <strong>do</strong> mosteiro <strong>de</strong> Santa Cruz<br />

<strong>de</strong> Coimbra, fican<strong>do</strong> Silves a catliedral, que em tempos fora Ossonoba.<br />

Cresci<strong>da</strong> em riquezas e extensiio pelos sarracenos, Silves<br />

mereceu esta honra.


$ um pouco obscura nos historia<strong>do</strong>res a narra~iio $este facto,<br />

não se falan<strong>do</strong> <strong>da</strong> intervenção <strong>do</strong> papa i ; mas, como admittir um<br />

procedimento diverso <strong>do</strong> <strong>de</strong> D. AfGoooso em quarito a Lisboa, se<br />

cousa alguma o dá a perceber, e se, bem longe d'isso, ain<strong>da</strong> nRo<br />

tinham começa<strong>do</strong> as disputas com o clero?<br />

Demais, sabe-se que o mesmo D. Sancho impetrou a auctori-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> se apostolica, quanto a outros bispa<strong>do</strong>s. Em 1199 este<br />

monarcha, elegen<strong>do</strong> a D. Martinho, bispo <strong>de</strong> I<strong>da</strong>nha, Eaz confir-<br />

mal-o e transferir para Guar<strong>da</strong> a se<strong>de</strong> <strong>do</strong> bispa<strong>do</strong>, por bullas<br />

<strong>de</strong> Innocencio III 2.<br />

Nem emquanto á <strong>de</strong>marcaçâo sobre o solo <strong>do</strong>s limites <strong>da</strong>s dio-<br />

ases os nossos monarchns tinham direito algum.<br />

Este mesmo D. Martinho, primeiro bispo <strong>da</strong> Guar<strong>da</strong>, teve era-<br />

ves disputas com Pedro, bispo <strong>de</strong> Coimbra, a respeito <strong>do</strong>s limiies<br />

<strong>do</strong>s respectivos bispa<strong>do</strong>ti. O papa Innoccncio IJI envia os bispos <strong>de</strong><br />

Samora e <strong>do</strong> Porto a rcsolver a pcndcncia: 1). Mnrtinho, po-<br />

rem, ao que parece, homem teimoso, renopa as pretensões e vai<br />

em pessoa a Roma, on<strong>de</strong> assiste ao celebre concilio <strong>de</strong> LaterBo,<br />

cclcbra<strong>do</strong> no pontifica<strong>do</strong> <strong>de</strong> Innocencio. Diu tnmen non quieuit,<br />

- diz D. Thomaz <strong>da</strong> Encarnaçõo, as alterações renovam-se, e<br />

d'esta vez o papa torna a enviar <strong>do</strong>is bispos, ut dirisiones fiertnt<br />

per libros anriquos, per tesles et /amam PS cop. Cum causam,<br />

!3, <strong>de</strong> proba1 3.<br />

Percorram-se os capitulas em que o aiictor <strong>da</strong> Hz'sloria <strong>da</strong><br />

Bgr(ja Lusitana <strong>de</strong>screve os vestipios <strong>do</strong> prima<strong>do</strong> <strong>do</strong>s papas em<br />

Portugal, e mais luminosa sairá esta ver<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Mas a que provincia pertenciam as novas dioceses? a Braga,<br />

ou a Cornpostella ?<br />

$ o que não e facil dizer.<br />

Gilbert, o primeiro bispo <strong>de</strong> Lisboa, fora or<strong>de</strong>na<strong>do</strong> por D.<br />

João Peculiar, arcebispo <strong>de</strong> Braga, a quem prestára subjeiçao e<br />

reverencia 4.<br />

1 D. Thomaz <strong>da</strong> EncarnaçLlo, IIist. Eccles. Lw.,<br />

Saecul. XII, cap. I, tj vIrr,<br />

tom. 3.O<br />

2 D. Tliomsx <strong>da</strong> Eiicarnação, H*. Ecclee., Baecul. xrIr, cap. I, 4 VIII,<br />

tom. 4.0<br />

3 L). '1'hom:~z <strong>da</strong> Encnrn:iç?io, liist. cit., Snrcul. xIIr, cnp. I, $ viir, tom. 4.0<br />

4 Brrtiirl?i,n, lia terceira parte <strong>da</strong> monaixhia lusitsnxr, refere este sicto <strong>de</strong><br />

subjeiqito extrahiii<strong>do</strong>-o <strong>do</strong> livro <strong>de</strong> Fi<strong>de</strong>i <strong>da</strong> 84 <strong>de</strong> Br-. Diz d'este nio<strong>do</strong>:<br />

a E,yo Gil Lertus S. Ulixbonetisis Ecclesiae Episcopus su6jectionem et reve-<br />

yentiaqn a sanctie patribue constitutam secmdum praecepla canonum Ii;cc?e-


O primeiro bispo <strong>de</strong> Evora, D. Sueiw, tamhem or<strong>de</strong>na<strong>do</strong> pelo<br />

mesmo 1) <strong>do</strong>211 Peciiliar. seguin<strong>do</strong> o exemplo <strong>de</strong> Gilberto, sempre<br />

Ihc i're-!' L: ~tl~diencia, como metropolita.<br />

.Siiarios Gilherti Olyçsiponensis exemplm seqiiutus Bracarensi<br />

.\r clii'pisc~ po tarqoam Mrlropolitae parebat, rc\erentiamque praebe-<br />

Ilat; Lique \-cnzrabilrs Regis Alfonsi consensus probaterat 1.))<br />

1). Iio.4rigo <strong>da</strong> Crrriliii, nn vi<strong>da</strong> <strong>de</strong> D. Gilberto, affirnia qiie foi<br />

o rnoiiarcliii, que ol)rigou a pmtdr o juramerito <strong>de</strong> obedicnc-ia ao<br />

- metropolitano <strong>de</strong> Braga.<br />

~Coni esta <strong>do</strong>iitrina, diz elle. procuroii (Affonso I.") com to110 o<br />

riii<strong>da</strong><strong>do</strong> tornar a seu primeiro liistre ;I cgrc>j;i <strong>de</strong> J,ishoa, assiniiiitlo-n<br />

pr siiH'rap;inea á <strong>de</strong> Braga. po<strong>do</strong>que tft.s<strong>de</strong> ternpos antiquissiinos Iier-<br />

iiiiria ;i nic~tropolilana <strong>de</strong> hiaíb. eni cujo direito <strong>de</strong>poes <strong>da</strong> invasam<br />

til~s Moiirus prostra<strong>da</strong> a gra& <strong>da</strong>qiiella ci<strong>da</strong><strong>de</strong> havia succedi<strong>do</strong> a <strong>de</strong><br />

Corn~)osttcll;i por indulto e ronassam <strong>do</strong> papa Caiisto' se#iin<strong>do</strong>. 121 rey<br />

ronitii<strong>do</strong>, ou <strong>de</strong>sejoso <strong>de</strong> conraizr a primazia ecilesiasticn nas terras<br />

(!e seu sciiliorio, ou por mtrm re5peitos politicos, obrigou a Gilberto<br />

fizesse jiirnuicnto <strong>de</strong> obediencia au Ar( cl~ispo <strong>de</strong> Bragan 2.<br />

O que 6 certo 6 que a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> portugueza não se compa<strong>de</strong>cia<br />

com a nuctori<strong>da</strong><strong>de</strong> eminente <strong>de</strong> um primaz situa<strong>do</strong> fóra <strong>da</strong> sua<br />

cyrcja .<br />

Aritcbs <strong>da</strong> separação <strong>de</strong> Portugal. uita <strong>da</strong> invasão <strong>do</strong>s infiois,<br />

Illcridii ~irc~qidia a estas cathedne~; ni,is, dcpois qiie Portiipl se<br />

toi.rin il!dc.])t:rulvnte, já quan<strong>do</strong> libre dt sujeicão iquella SC, oii a<br />

Coriil)o~t(~ll;i, ht,r<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> qíliis <strong>direitos</strong>. 6 que as suas rgrcjas romeçam<br />

<strong>de</strong> apparecer <strong>de</strong> riovo.<br />

As monarchi;is hespaiiholas niío queriam mnnhccrr a lesitimi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>do</strong> !iovo rcirio; a celebre questão <strong>da</strong> primazia tolctarin foi<br />

movi<strong>da</strong> occultamente por esta gran<strong>de</strong> ambição politica ; c, como<br />

ficasse ~~endt~nte, sem soliiçào, apezar <strong>da</strong>s bullas <strong>de</strong> Zlrbario e <strong>de</strong><br />

siac h'rachare~W, ~eetoritusque ejus in 11raesr1,lia Domitii Joannir ~irrpr/tto<br />

me edtbilurum promitlo et usque sait


Eugenio; agora os monarchas, receiosos d'aquella outra supremacia<br />

corripostellana. tractavam <strong>de</strong> fazer reconhecer pelos novos bispos a<br />

auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> metropolitica <strong>do</strong>s arcebispos <strong>de</strong> Braga.<br />

Esta gran<strong>de</strong> supremacia bracharense, que abraçára <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito<br />

a causa <strong>do</strong> filho <strong>do</strong> Con<strong>de</strong> Hcririque; o gran<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r <strong>do</strong> alto clero<br />

nestes tempos ; a disputa acerrima <strong>de</strong> Jogo Peculiar com o bispo<br />

toletano ; tu<strong>do</strong> concorria para tornar duvi<strong>do</strong>so este esta<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

cousas.<br />

Se os monarchas tivessem o direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>screver os limites <strong>da</strong><br />

auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s cathedraes metropolitanas, porveritura que já esta<br />

corifus'io estaria <strong>de</strong>bella<strong>da</strong>; mas ri20 era assim: tinha <strong>de</strong> esperar-se<br />

por uma bulla pontifical; e no solio <strong>de</strong> Roma estava Innocencio rir.<br />

A bulla não tar<strong>do</strong>u ; mas a bulla veio centralisar o po<strong>de</strong>r <strong>da</strong><br />

egreja; a bulla veio esmagar mais esta soberania temporal nascente,<br />

e lisongear a Affonso vii, sujeitan<strong>do</strong> a Compostella os nossos<br />

bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Portugal, como pouco tempo aritcs os pre<strong>de</strong>cessores<br />

<strong>de</strong> Irinocc~ririo tinham tambem submctti<strong>do</strong> to<strong>da</strong> a egreja portugueza<br />

6 egreja hespanliola, expedin<strong>do</strong> as bullas <strong>de</strong> reconhecimento <strong>da</strong> pri-<br />

mazia hispanica na ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Tole<strong>do</strong>.<br />

Foi a bulla In enrin~nti Apostolicae Srdis, <strong>de</strong> i4 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong><br />

i 199, <strong>de</strong> Innocencio 11,.<br />

Revali<strong>da</strong>va os <strong>direitos</strong> metropoliticos <strong>de</strong> Compostella, <strong>de</strong>clarava<br />

que Meri<strong>da</strong> lhe ficaria sujeita, quan<strong>do</strong> saísse <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r <strong>do</strong>s sarra-<br />

cenos, c, cnumcran<strong>do</strong> as suffraganeas, sribmettia-lhe to<strong>da</strong>s as dio-<br />

ceses <strong>da</strong> provincia <strong>da</strong> Lusitania existentes ao tempo d'ella e as que<br />

<strong>de</strong> futuro a christan<strong>da</strong><strong>de</strong> ganhasse em to<strong>do</strong> esse terijtorio.<br />

«... vi<strong>de</strong>licet, dizia Innocencio, Abulen.. Caurien., Civitatem., Pla-<br />

eentin., Pacen.. Oxonohen, , et praeterea Lamacen. et Egitanien., nee<br />

non Ulixbonen., et Elboren,. . . Compostellano archixpiscopo, cujus con-<br />

recratio ad Romanarn tantum Ecelesiam spectat, obedientiam et rme-<br />

rentiam tanquam proprio metropolitano exhibeant.l><br />

]S a segun<strong>da</strong> phase <strong>da</strong> divisão ecclesiastica <strong>da</strong> nossa egreja.<br />

A bulla <strong>de</strong> Inrioccncio foi evi<strong>de</strong>ntemente injusta, inconvenieii-<br />

tissima, sob o aspecto politico e ccclesiastico; mas a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>da</strong> Se apostolica era irresponsavel, suprema.<br />

Os reis submctteram-se; os bispos obe<strong>de</strong>ceram.<br />

A lucta com o clero levanta-se eritao cheia <strong>de</strong> rancores; as<br />

complicaç6es com Castella sào <strong>de</strong> dia para dia mais ameaça<strong>do</strong>ras.


O rumor <strong>da</strong>s ~,elqj,is com os mouros srreiia nos ares; a pnv,<br />

vai <strong>de</strong>senrolan<strong>do</strong> pre$uiqo*amente suas candi<strong>da</strong>s azas; o esta<strong>do</strong><br />

civil procura respirar <strong>de</strong>baixo <strong>do</strong> peza<strong>do</strong> jugo clerical.<br />

O nome <strong>de</strong> Portugal começa a fazer-se respeita<strong>do</strong> ; a nacionali-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong> portugueza iilcan~a os titulos tle siia in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia.<br />

A egrrja portugueza começa a tlctcrminar as suas formas, a<br />

crear com as concor<strong>da</strong>tas os primeiros capitulas <strong>do</strong> seu Codigo; e<br />

por fim um rei, cuja vi<strong>da</strong> an<strong>da</strong> involta em uma sympathica len<strong>da</strong><br />

<strong>de</strong> amores, e em vigorosos exemplos <strong>de</strong> justiça ensina<strong>da</strong> aos jui-<br />

zes, recosta-se sereno em seu throno, e diz d'ahi aos officiacs <strong>da</strong><br />

Curia Romana, quan<strong>do</strong> lhe apreseiita~am as letras <strong>de</strong> Sua Saricti-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong>: - que nos mostrem esses escripios ou letras; oel-as-emos r<br />

rnafttIaremos que se publiquem pela guisa que <strong>de</strong>vem i.<br />

Quc viessem agora as bullas <strong>de</strong> submiss;io a Tole<strong>do</strong> ou Cornpos-<br />

tella, que ahi estava a gran<strong>de</strong> arma que havia <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r o esta<strong>do</strong><br />

<strong>da</strong> tyrannia clerical.<br />

Aquelle direito, que os primeiros monarchas tinham adquiri<strong>do</strong><br />

perante a egreja com o sangue <strong>do</strong>s seus e o esforço <strong>de</strong> seu braço,<br />

e que ia como qiie esqucccn<strong>do</strong>, rcjuvc[iesce agora mais forte, por-<br />

que se apoia nos titulos juridicos iiacionaes, que a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

uma tbpoclia <strong>de</strong>sgraça<strong>da</strong> fizera imperiosamente escrever entre as<br />

leis d'csk povo.<br />

l'oucos annos eram passa<strong>do</strong>s, quan<strong>do</strong> a coroa <strong>de</strong> Portugal r61a<br />

por terra, sem ter fronte em que levante seus floròes; ergue-a a<br />

mão po<strong>de</strong>rosa <strong>da</strong> soberania popular e colloca-a na cabeça <strong>de</strong> um<br />

escolhi<strong>do</strong> seu, repulsan<strong>do</strong> ao inve,joos leão <strong>de</strong> Castella.<br />

A vi<strong>da</strong> era nova ; uma su,jeiçiio qualquer ás garras d'aquelle pe-<br />

rigoso <strong>de</strong>fensor <strong>do</strong>s monarchas hespanhoes, não seria já um perigo,<br />

mas era um <strong>de</strong>slustre. A egreja portugueza n8o podia ficar escrava<br />

<strong>de</strong> uma metropole extrangeira e inimiga. Longe ia o me<strong>do</strong> pavo-<br />

roso <strong>da</strong>s cxcommunhões e <strong>do</strong>s interdictos ; agora o respeito pun<strong>do</strong>-<br />

noroso substituia aquelle sentimento pueril; e por isso D. João I<br />

supplica <strong>do</strong> Papa a creação d'uma metropole em Lisboa, e a libcr-<br />

tação perpetua <strong>de</strong> suas suffraganeas <strong>do</strong> arcebispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> S. Thiago<br />

<strong>de</strong> Compostella.<br />

A bulla <strong>de</strong> 10 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1394 <strong>de</strong> Bonifacio ix liberta<br />

1 Lei <strong>da</strong> D. Pedro I, a respeito <strong>do</strong> beueplacito, sanceiona<strong>da</strong> no art. 42 <strong>da</strong>s<br />

cortes <strong>de</strong> Elvas <strong>da</strong> era <strong>de</strong> 1399, <strong>de</strong>pois traiiscript,~ para a Ord. Aff'ous., liv.<br />

B.O, tit. 6.0<br />

11


perpetuamente as dioceses <strong>de</strong> Lisboa, Guar<strong>da</strong> e Elvas <strong>do</strong> orce-<br />

bispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Compostelta, e Silves <strong>do</strong> <strong>de</strong> Sevilha ; <strong>de</strong>claran<strong>do</strong> metro-<br />

pole a cathedral <strong>de</strong> Lisboa, para o futuro sómente sujeita h egreja<br />

romana 1.<br />

A bulla fez menção <strong>do</strong> pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> D. Joto I, atten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o qual,<br />

o papa confere gostoso á s6 <strong>de</strong> Lisboa aquella honra e á egreja<br />

portugueza aquella liber<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Depois <strong>da</strong> exposiçáo <strong>do</strong>s motivos e <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> creaçáo <strong>da</strong><br />

nova mctropole, c uniao e divisáo <strong>do</strong>s arcebispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Compos-<br />

tella e Sevilha, a bulla diz :<br />

(c... Ulixbonen', Egitanen', Elboren', Lamacen', a Quonpostellanen'<br />

nec non Silben' Ecclcsias, ci~ itates et dioeceses ante dietas ab Ispalen,<br />

Arcliicpiscopor. qui pro tcmpore fueriiit, et Ispalen, Ecclesiarum<br />

capitiiloriim pracdicloriirn jurisdi~tionc, <strong>do</strong>minio, potestate et suhjectionc<br />

qiiibus1il)et dc ipsoriim fratrum consilio et apostolica plenitudine<br />

potcstatis niicloritatc ;ipostolica. dc certa nostra scicntia, ex nunc eximcntes<br />

pcnitus ac totaliler in perpetuum liberantes ct ean<strong>de</strong>m Ulixi)onen'<br />

Ecclcsiam <strong>de</strong> coctcro soli Ecclesiae Ilomanae subjacere imrnediatc<br />

perpetuo dccrrnentcs, ipsain Ecclesiam Ulixbonen' ad Dei lau<strong>de</strong>m ....<br />

in metropolitan, erigimiis. .. . n<br />

E <strong>de</strong>pois:<br />

r.. .e1 pro parte dicti Regis ac dilcctorum filioriim communis ejus<strong>de</strong>m<br />

civitatis Ulixbonen' nobis hiimililer supplicato, ut ad evitationem peri-<br />

culorum et scan<strong>da</strong>lormquc et pro ipsius Kegis ac <strong>de</strong>volis fi<strong>de</strong>lis e1 be-<br />

nemeriti populi sui firmiori quiete et grandiori consolatione ... 2))<br />

1 Outra razb concorria para esta sc~>aração. A este tempo repetia-se um<br />

d'estes aoonteciinentos muito comniuns iin Iiistoria <strong>do</strong> papa<strong>do</strong>. Havia <strong>do</strong>is pnpas<br />

ao mesmo tempo; a cliristan<strong>da</strong><strong>de</strong> dividia-sc crn <strong>do</strong>is parti<strong>do</strong>s. Seguiam<br />

uns a Clemente VII, outros a Urbano vr. Aconteceu que Castella se abraçava<br />

ao parti<strong>do</strong> <strong>do</strong> Clemente, e Portugal ao <strong>de</strong> Urbano. Não admirava pois este<br />

amor tão vivo, qui! resulta <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as palavr,~ <strong>da</strong> bulla, nem custa a per-<br />

ceber como tao facilmente se constyiiiu a cre:ição <strong>de</strong> uma nova metropole e a<br />

ílesmembração <strong>de</strong> duas : Boiiifacio rx era successor <strong>de</strong> Urbano VI. Po<strong>de</strong> ser<br />

que assim não fossc inteirnriieiitr ; crain muito justas, iriuito acccitaveis as<br />

raz0es que allegava D. João I <strong>de</strong> Portiigal ; jit ha m:tis tempo que os papas <strong>de</strong>-<br />

viam ter cui<strong>da</strong><strong>do</strong> <strong>de</strong> o fazer; inns eiitRo Q o caso <strong>de</strong> dizor qiio Bonifacio IV<br />

omne tulit pi~nctunz, rnisctcit uiile, diilçi.<br />

2 k por esta razão que aos olhos <strong>de</strong> alguns a cgreja portugueza s6 começa<br />

a existir <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seculo XI~. Coelho <strong>da</strong> Rocha, no seu Ensaio sobre a historia<br />

<strong>do</strong> governo e legislação <strong>de</strong> Portugal, 5 112, pag. 90, começa, escreven<strong>do</strong><br />

que Ain<strong>da</strong> <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> oepração <strong>da</strong> monarchia, a egreja Lusitana continuou<br />

confindi<strong>da</strong> com a <strong>de</strong> CastelCa. apezar <strong>de</strong> já antes <strong>do</strong> seculo xrv haver liber<strong>da</strong>dcs<br />

na egreja portugueza, e <strong>de</strong> ser litigiosa a sujeição <strong>de</strong> Lisboa, Lamego,


A instancias <strong>do</strong> mesmo monarcha foi erecta a cathedral <strong>de</strong> Ceuta,<br />

em 140 I , pela bulla <strong>de</strong> llartinho v i Venerabili Frawi- <strong>de</strong> ti<br />

<strong>de</strong> março.<br />

nDiidrim siqui<strong>de</strong>m, diz, pro parte charissimo in Christo Alii nostri<br />

Joanriis Regis 130rtugalliac illustris nohis exposito, quod locus Cepta.. . n<br />

e dcpois<br />

«Nos tunc ipsius Regis in iis siipplicationibus inclinati ac <strong>de</strong> prae-<br />

missis certam notitiam haùcntes Brarharensibus et Ulixbonensibus Ar-<br />

chiepiscopis.. . .. consi<strong>de</strong>ratis grandiiirn tirtutum maritis, quibus perso-<br />

nam tunni illarum largitcr 1)omini:s insigni ..., <strong>de</strong> dietorum fratr~im<br />

consilio et Apostolicae potesiaiis plenitu<strong>de</strong> absolrentes ie ad Ceptne Er-<br />

cleaiam aucloritite Aposlolica truisferimusml.<br />

No glorioso tempo <strong>de</strong> D. Manuel ain<strong>da</strong> as dioceses continuam<br />

a ser erectas por instancins <strong>da</strong> corcia. Assim foi crea<strong>do</strong> o bispa<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> Funchal pela bulla dc Leào x - Pro excellenti praeeminenlia<br />

Sedis Aposlolicae- <strong>do</strong> anno <strong>de</strong> i 5 15.<br />

Evora e Beja B 86 comportelha. Essa opiiii8o invoive nma incohercncia.<br />

Pois se a egreja lositaua não existe scnio <strong>de</strong>1;ois <strong>do</strong> ae~ulo srv, porque sú<br />

<strong>de</strong>pois d'este tompo d que ella w. liberta <strong>da</strong> superiori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> egejn <strong>de</strong> C'om-<br />

posteiia; como 6 que existc p<strong>do</strong>s ineamos annoe a egreja castelhatia, quaii<strong>do</strong><br />

a se brscliarense esten<strong>de</strong> 8 área <strong>de</strong> siia jurisdicçiio metropolitica alem <strong>do</strong>s<br />

confiiis tle I'ortugal pela Galliza c Le,io?<br />

Nciii se diga que, apezar d'isto ser ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, nilo <strong>de</strong>stroe a preeuiinen-<br />

eia inetropolitica <strong>de</strong> S. Thiaio <strong>de</strong> Coinlt[.stell i: porque não repugna aceitar a<br />

existeiicis <strong>de</strong> iiina egrc.ja sujeita ao poc!er siiperior <strong>da</strong> hierarchia ecclesias-<br />

tica situa<strong>do</strong> fóra <strong>do</strong>s liinitrs [Ie certa ii.1~50. Não estão to<strong>da</strong>s as egrcjas iin-<br />

cionaes suhiiietti<strong>da</strong>s h cgrej.1 I?c~iiian:i? porventura nega este facto R sua<br />

existencial<br />

Qiie resiiltem incoiivenientt.~ <strong>de</strong> a s6<strong>de</strong> m~tropolitica <strong>de</strong> uma egicjn iiaciotia1<br />

cst:ir collocn<strong>da</strong> fora <strong>do</strong>s limites <strong>da</strong> 11nç5o a que esta perteiicc, coinprehendc-se<br />

iniii bem ; mas vai um:i gran<strong>de</strong> distancia d'esta conaidcraçtio &s<br />

consequeiirias que d'esse facto preteiidcm inferir.<br />

Ao separar-sc <strong>de</strong> lima nacicuali<strong>da</strong><strong>de</strong>, lia sempre Cestas graves e quasi insoluveis<br />

coiitest:iç0es. As conten<strong>da</strong>s <strong>da</strong> primazia <strong>da</strong>s Hespanhas entre Tole<strong>do</strong><br />

c Braga, as disseus0es <strong>do</strong>s uousos reis com os <strong>de</strong> Castella, as guerras <strong>de</strong> successil-o<br />

e legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong>, os couflictos <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> metropoliticoa <strong>de</strong> Braga e Compostella<br />

e dc Sevilha a respeito <strong>de</strong> Silves no tempo <strong>de</strong> D. Affonso III, eão vivos<br />

exemplos d'essa ver<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

1 Veja eslas biillas no volume 1.0 <strong>da</strong>s Provao Hwt. Genealogicn <strong>da</strong><br />

Caag Beal Portugueza.<br />

. .


Vbse isto distinctamente <strong>da</strong>s palavras <strong>da</strong> bulla:<br />

« . propterea praefatus Emmatiucl Rex <strong>de</strong>si<strong>de</strong>raret.. . Parochialem<br />

ecclesiam Beatae Mariae, qiiam i<strong>de</strong>m Eninianiiel Rex opere salis sumptuoso<br />

in civitate <strong>do</strong> Funclial in insula Ma<strong>de</strong>ira ... in Cathedralcm erigi<br />

On<strong>de</strong> nos volentes ejus<strong>de</strong>rn Emmanuelis R-gis id sumrnoperc cupientis<br />

<strong>de</strong>si<strong>de</strong>riis annucre. o<br />

A bulla continúa empregan<strong>do</strong> as expressaes <strong>do</strong> estylo, falan<strong>do</strong><br />

<strong>da</strong> plenitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r apostolico e <strong>da</strong> auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> Se apostolica<br />

consclho <strong>de</strong> seus irmaos, bispos <strong>do</strong> Reino, e conce<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o<br />

que o rei pedia.<br />

Segue-se uma epocha, em que no espaço <strong>de</strong> pouco mais <strong>de</strong> 40<br />

annos, se contam 1 4 erecções <strong>de</strong> bispa<strong>do</strong>s !<br />

2 um tempo fatidico para Portugal ; o tempo <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncia<br />

rapi<strong>da</strong>, em que a intolerancia religiosa e a superstição causam<br />

a per<strong>da</strong> <strong>da</strong> nossa in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia. Os <strong>do</strong>is moiiarclias, que presi<strong>de</strong>m<br />

ao governo <strong>de</strong> Portugal e que se <strong>de</strong>ixam subjugar por to<strong>do</strong>s esses<br />

erros, são: D João 111, o rei mais antipiltliico <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a nossa historia,<br />

e cujo reina<strong>do</strong> dura mais dilata<strong>do</strong>s anrios ; e D. SebastiAo, o<br />

,joveii infeliz, que queria resuscitar unia quadra dc glorias que Portugal<br />

perdbra para sempre.<br />

Bem sabemos qiie a maior piirte d'esscs bispa<strong>do</strong>s foram erectos<br />

nas conquistas <strong>de</strong> Africa e <strong>do</strong> Oriente ; mas não po<strong>de</strong>mos acreditar<br />

na ueccssi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> crcaçào dc tantas dioceses e metropoles no<br />

reino e rias possessòcs. E porqiií? o náo teriam feito seus pre<strong>de</strong>cessores?<br />

E porque acontecem estas cousas, quan<strong>do</strong> a máo repellente<br />

<strong>da</strong> theocracia suffoca este pobre Portugal?<br />

Os chronistas louvam este zelo infelizmente ar<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> D. João III.<br />

Faria e Soiisa, na Eztropa Porlugueza, tomo 2.O, p. iv, cap. ir,<br />

n.' 80 escreve:<br />

Con ardiente zelo <strong>de</strong> autorisal-a (a religião) en ru Repo<br />

erigio 10s Ires bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Leyria, <strong>de</strong> I'orialegre y <strong>de</strong> Mirari<strong>da</strong>;<br />

y olros en las conquistas, applicnn<strong>do</strong>les renias para sustentar se<br />

<strong>de</strong>cenlemenie en les dizmos aplica<strong>do</strong>s a lu or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> Cl~rislo.<br />

Hizo Meiropoli e1 <strong>de</strong> Eaora; y e1 <strong>de</strong> la Isla <strong>de</strong> la Ma<strong>de</strong>ra <strong>da</strong>n<strong>do</strong>le<br />

per sufragat~eas los <strong>de</strong> Sotlt-lago y <strong>de</strong> S. Thome y <strong>de</strong> Goa<br />

a que <strong>de</strong>spues dio la propria digni<strong>da</strong>d en la ltidia cotn e1 titufo<br />

<strong>de</strong> Primaz sugctan<strong>do</strong>le 10s Oúispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Cochim y <strong>de</strong> Maluca a<br />

que <strong>de</strong>spues se acudieron otros.<br />

Assim se empobrecia esta infeliz terra, rouban<strong>do</strong>-lhe nos dizi-


mos a força fecun<strong>da</strong><strong>do</strong>ra <strong>do</strong> solo e <strong>da</strong>s industrias, e <strong>da</strong>n<strong>do</strong>-lhe com<br />

a inquisi~ào, com as or<strong>de</strong>ns monasticas, com o esplen<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s paços<br />

episcopacs e o apparato luxuoso <strong>da</strong>s Sbs, e com a fatidica companhia<br />

tltl Jesus, a escuridso <strong>do</strong> espirito, que, siijritari<strong>do</strong> os povos<br />

íí f~sci-na(.3o <strong>da</strong>s pompas thcatracs <strong>da</strong>s cdrtes <strong>do</strong>s reis e <strong>do</strong>s gran<strong>de</strong>s<br />

principcs <strong>da</strong> egrcja, que os lcla a beijar a mão qire os opprime .<br />

com a tyrarinia, e, esmaga<strong>do</strong>-lhcs a alma pela superstiçào, os não<br />

dcisa comprehen<strong>de</strong> a Deus.<br />

NBo cui<strong>de</strong>mos pois encontrar alteraqao no direito ecclesiastico<br />

portug~iez, quanto h creaç8o <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s e metropoles. Com a<br />

miiior Iiumil<strong>da</strong><strong>de</strong> a impetrava este nosso monarcha.<br />

A4 primeira crecçáo <strong>de</strong> bispa<strong>do</strong> foi a <strong>da</strong> e~c'a <strong>de</strong> Angra, por<br />

D !<br />

hrilla clc Clcrnente vir, <strong>do</strong> aono <strong>de</strong> i 532, a instancias <strong>de</strong> D. Jo~o rir,<br />

na mesma maoeira fomm erectos: o bispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Cabo-\-vi <strong>de</strong>, .<br />

por 1~1lla <strong>do</strong> mesmo papa e <strong>do</strong> rnrsmo anno, sen<strong>do</strong> porbni s6 pro-<br />

\i<strong>do</strong> tlc bispo em 15841;-o <strong>de</strong> (;<strong>da</strong>, por bulla <strong>de</strong> Paulo 111, <strong>do</strong><br />

aiino <strong>de</strong> 1235 ;?o <strong>de</strong> S. ThomC, por bulla <strong>de</strong> 3 <strong>de</strong> novembro <strong>do</strong><br />

mesmo anno, comprehen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o Congo e Angola.<br />

Em 1539 é elela<strong>do</strong> a metropole <strong>da</strong>s egrejas <strong>da</strong>s conquistas O<br />

bispa<strong>do</strong> <strong>da</strong> Ma<strong>de</strong>ira; per<strong>de</strong>n<strong>do</strong> bem <strong>de</strong>pressa esses <strong>direitos</strong> por<br />

oritras bullas, como a <strong>de</strong> 1551) pelo papa Julio rir, que fei ~rrfia-<br />

ganeo <strong>do</strong> metropolitano <strong>de</strong> Lisboa o bispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> S. Thomv.<br />

Neste mesmo anno <strong>de</strong> 1539 transfere Paulo 1x1 a ~ d <strong>do</strong> c<br />

bispatlo <strong>de</strong> Silles para a ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Faro.<br />

A iristarrcias <strong>do</strong> mesmo rei se crigem no reino os bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong><br />

hIiraiitl;i, Ixiria e Portalecre, aqiiclles por bullas <strong>de</strong> Paulo 111, <strong>do</strong><br />

anno <strong>de</strong> 1548, e este pt,r hiilla di. Julio 111, <strong>de</strong> 1550; rio Bríizil<br />

a dioccse <strong>do</strong> llrazil, pela bulla <strong>do</strong> mesmo papa-Supra specula<br />

militanlis eccl~aia. -<strong>de</strong> 28 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 1660; e Goa a metropolc<br />

por biilla <strong>de</strong> Paulo iv, no anno <strong>de</strong> i 557.<br />

As bulla5 <strong>de</strong> erecçào e <strong>de</strong>smembraç80 d'estes bispa<strong>do</strong>s continuam<br />

a mostrar que <strong>da</strong> mesma forma, a instancias <strong>do</strong>s reis, eram erectos<br />

os novns bispa<strong>do</strong>s.<br />

A bulla <strong>de</strong> erecção <strong>da</strong> primazia <strong>do</strong> Furichal <strong>de</strong> Paulo 111, - Dudum<br />

siqui<strong>de</strong>m -<strong>de</strong> 8 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1539, dizia :<br />

(I... postquam felicis recor<strong>da</strong>tionis Leo Papa x, Pae<strong>de</strong>cessor noster<br />

1 Veja Ensaio sobre a Eetatistica <strong>da</strong>s possessôes portz~yueaas no Ultramar<br />

-por Lopes <strong>de</strong> Lima, liv. 1.0, p. I.', cap. VII, pag. 70.


procuranle clarae memoriae Emmanuela Portugalliae et Algarbiorum<br />

Rege ....<br />

e mais a<strong>de</strong>ante<br />

a... pracfatus Joannes Rex nobis humiliter supplicarifecit ... Nos<br />

igitur votis ipsius Joannis Regis, praeclaris ejus <strong>de</strong> Se<strong>de</strong> Apostolica<br />

exigentibus meritis. .. codcm Joanne Hcgc id volentc et in hoc consen-<br />

tiente ... »<br />

Na bulla-Pro excellenii Aposfolicae Sedis-<strong>de</strong> Paulo 111, <strong>de</strong><br />

1548, encontram-sc, <strong>de</strong>pois <strong>do</strong>s motivos <strong>de</strong>terminantes <strong>da</strong> <strong>de</strong>s-<br />

membraçao <strong>da</strong> diocese <strong>de</strong> Braga, estas palavras:<br />

a... et chnrissimi in Christo filii nostri Joannis mo<strong>de</strong>rni Portugalliae<br />

et Algarbiorum Regis illustris, qui hoc summoperc dcsi<strong>de</strong>rat, et super<br />

eo nobis per suas literas humilitcr siipplicavit .... R<br />

A bulla <strong>de</strong> erecção <strong>da</strong> cathedral <strong>de</strong> Leiria, <strong>da</strong> mesma <strong>da</strong>ta, 6<br />

egualmente <strong>do</strong> mesmo teor.<br />

A rogo <strong>de</strong> D. Sebastião se crigem os bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Malaca e (ir<br />

Cochim, em 1857, por bullas <strong>de</strong> Paulo iv; o <strong>de</strong> Elvas em 1570,<br />

por bulla <strong>de</strong> Pio v; e o <strong>de</strong> Macau, em 1675, por bulla <strong>de</strong> Gre-<br />

gorio XIII.<br />

No tempo <strong>de</strong> Filippe I, e a seu rogo, se crigem os bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong><br />

Funay, em 1588, por bulla <strong>de</strong> Xisto v; o <strong>de</strong> Angola, por Clemente<br />

viir, em 1597; c o <strong>de</strong> Meliapor, por Paulo v, em 1606.<br />

No reina<strong>do</strong> <strong>de</strong> D. Pedro ii recomeça a creaçíio <strong>de</strong> novos bis-<br />

pa<strong>do</strong>s.<br />

A bulla <strong>de</strong> Innoceocio XI -1nler Pasforalis Oficii -<strong>de</strong> 16<br />

<strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1676, eleva a metropolitana a Se <strong>da</strong> Bahia ; as<br />

bullas-Ad Sacram Beaii Pclri-e-Romani ponltFcis-<strong>de</strong> 26<br />

<strong>de</strong> novembro <strong>do</strong> mesmo anno, erigem, aquella o bispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Per-<br />

nambuco, e esta o <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro; a <strong>de</strong> 30 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1677 -<br />

Super Uniitersas-cria a diocese <strong>do</strong> Maranháo; e as bullas <strong>de</strong> Ale-<br />

xandre viir, <strong>de</strong> 1690, erigem os bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Pekin e Naiikin.<br />

Em tempo <strong>de</strong> D. Joáo v, fraquezas muri<strong>da</strong>nas o levaram a sol-<br />

licitar a creação <strong>de</strong> um patriarcha<strong>do</strong>, scsm proveito algum para a<br />

egreja; e, como era vivo ain<strong>da</strong> o arcebispo <strong>de</strong> Lisboa, e as pompas<br />

<strong>do</strong> patriarcha<strong>do</strong> eram dcseja<strong>da</strong>s pelo caprichoso monarcha para o<br />

cape1130 dc sua real capella, n 1)ulla <strong>do</strong> 1716 keio dividir o ari-<br />

tigo arcebispa<strong>do</strong> cm arcebispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Lisboa oriental e patriarcha<strong>do</strong>


<strong>de</strong> Lisboa occi<strong>de</strong>ntal. Em 1781, com a morte <strong>do</strong> arcebispo o pa-<br />

triarcba<strong>do</strong> une-se com o arcebispa<strong>do</strong>, forman<strong>do</strong> o patriarcha<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

Lisboa.<br />

Em 1719 tinha-se crea<strong>do</strong> a diocese <strong>do</strong> Grão-Par& por bulla <strong>de</strong><br />

Clemente xi -Copiosus in Misericordia - <strong>de</strong> 4 <strong>de</strong> março ; c cm<br />

1746, a bulla <strong>de</strong> Bento xiv-Can<strong>do</strong>r lucis-<strong>de</strong> 6 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro,<br />

erigiu as duas dioceses <strong>de</strong> S. Bento e Marianna, no Drazil I.<br />

Paremos aqui.<br />

Até ao reina<strong>do</strong> <strong>de</strong> D. José v&mos assim quatro epochas bem<br />

distinctas <strong>da</strong> creaçáo <strong>do</strong>s nossos numerosos bispa<strong>do</strong>s e metropoles.<br />

Na primeira, presi<strong>de</strong>m jiistissimos motivos e s6 se erigem os estrei-<br />

tamente neccssnrios; na segun<strong>da</strong>, á necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> os crear nas<br />

conquistas juncta-se a religiosicla<strong>de</strong> csaggera<strong>da</strong> <strong>de</strong> um monarcha,<br />

e transpiiem-se os limites <strong>do</strong> necessario ; na terceira, os cui<strong>da</strong><strong>do</strong>s <strong>de</strong><br />

restauração suspen<strong>de</strong>m este fervor <strong>de</strong> multiplicar o episcopa<strong>do</strong> por-<br />

tuguez ; na quarta, pre<strong>do</strong>mina o genio caprichoso e amigo <strong>de</strong> osten-<br />

tação <strong>de</strong> um monarcha opulento e prodigo.<br />

Em to<strong>da</strong>s ellas, porém, o direito não soffre alteração.<br />

As bullas, como vimos, fallum <strong>da</strong> mesma maneira que as <strong>de</strong>cre-<br />

taes <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seculo x; usam até, como se <strong>de</strong>le ter nota<strong>do</strong>, <strong>da</strong>s<br />

mesmas locuçL6es <strong>de</strong> plenitu<strong>de</strong> <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r <strong>da</strong> sé Apostolica, e <strong>do</strong>s<br />

conselhos <strong>do</strong>s bispos <strong>da</strong>s locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s, que primeiro eram ouvi<strong>do</strong>s<br />

e informavam a respeito <strong>da</strong> conveniencia <strong>da</strong> creação. Nas bullas<br />

apenas se accrescenta e repete, que tu<strong>do</strong> fdra pon<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> e humil-<br />

<strong>de</strong>mente pedi<strong>do</strong> nas letras <strong>do</strong>s monarchas, e que os papas, quanto<br />

com o Senhor cabe, gostosos lhe querem satisfazer a pretensão.<br />

Compare-se com o que atrás <strong>de</strong>ixhmos dicto no capitulo v <strong>da</strong><br />

primeira parte e tereis a explicaçgo d'isto.<br />

1 To<strong>da</strong>s estas bullas continuam a lembr:~, que são os principes que pe<strong>de</strong>m<br />

e sollicitam as honras para as egrejas, que se erigem em novoa bispa<strong>do</strong>s<br />

ou inetiopoles. Basts~lí citar as seguiiites :<br />

A bulla - Inler Pastoralis o@ii- <strong>de</strong> 1676, elevan<strong>do</strong> a cathedral a egreja<br />

cla Rahia, diz:<br />

e.... dignioribiis titulis exornare <strong>de</strong>crevimus maxime ad sublimium Principiim<br />

exposceritibiis votis, prout iii Domino saliibriter expedire coiispicirnua ...<br />

A bulla- Ilomani I'ontifiis Pastoralis <strong>de</strong> 1678, <strong>da</strong> crecção <strong>da</strong> cathedral<br />

<strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro, contéin que :<br />

... iiecuon praedicto Piincipeet Bubernatore per cjus litteras Nobis ad hoc<br />

hiiiiiiliter siipplicrnte.. Vyja os volumes <strong>da</strong>s Provas <strong>da</strong> Historia Genealogica,<br />

o 2 .O ~oliime <strong>do</strong> <strong>Direito</strong> civil Brazileiro dc C'aiidi<strong>do</strong> Men<strong>de</strong>s d'Alrnei<strong>da</strong>, e O<br />

Bullariiim Patronatus Portu~aliae Itcgum in Ecclesiis Africae, Asine atqiie<br />

Oceaniae - curauto Vicecomite <strong>de</strong> Paiva Manso - tomos I e Ir.


Não ha um só bispa<strong>do</strong>, um só arcebispa<strong>do</strong>, que seja erigi<strong>do</strong><br />

sem a sollicita~ão real e sem os protestos <strong>de</strong> plenitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r<br />

<strong>da</strong> parte <strong>de</strong> Roma nas bullas <strong>de</strong> erecçâo ; e, se por um la<strong>do</strong> ellas<br />

provam a intervenção <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r real, por outro la<strong>do</strong> <strong>de</strong>primem<br />

tanto esta intervenção, que pó<strong>de</strong> duvi<strong>da</strong>r-se se os papas náo teriam<br />

o direito <strong>de</strong> crear um bispa<strong>do</strong> no reino sem ouvir os monarchas<br />

ou sollicitar o seu consentimento.<br />

Lemhrcmo-nos, to<strong>da</strong>via, <strong>de</strong> que a bulla <strong>de</strong> erecção era uma<br />

bulla como qualquer outra, e que s6 o beneplacito regio a po<strong>de</strong>-<br />

ria auctorisar.<br />

Se o pedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> D. Joao I, para a elevação <strong>de</strong> uma metropole<br />

na diocesc <strong>de</strong> Lisboa, não fosse attendi<strong>do</strong>, nao podia, sem duvi<strong>da</strong>,<br />

esse monarcha crcar por suas Icis o arcebispa<strong>do</strong>; mas, se sem sol-<br />

licitaçâo sua sc preten<strong>de</strong>sse erigir a mctropole <strong>de</strong> Lisboa, a elle<br />

cabia oppor-se, e impedir a erecqão, negan<strong>do</strong>-lhe o seu regio placito.<br />

Eis aqui como o assentimerito <strong>do</strong>s monarchas, quanto Bs altera-<br />

ções <strong>da</strong> circumscripção ecclesiastica em territorio seu, era condição<br />

essencial d'essa alteraçáo.<br />

E preciso confessar, comtu<strong>do</strong>, que ate o tempo <strong>de</strong> D. Jose I<br />

o nosso direito ecclesiastico é como que fluctuante e mal seguro.<br />

A Se Apostolica para nOs, como para to<strong>da</strong>s as nações, náo reco-<br />

nheceu expressamente as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s nacionaes ; e como em gran<strong>de</strong><br />

parte o seu unico titulo era o uso, e a elle se oppunha o dizer <strong>da</strong>s<br />

bullas terminante, f~iri<strong>da</strong><strong>do</strong> nas <strong>de</strong>cietaes, supremo; e alem d'isso<br />

os nossos monarchas, ora conscios <strong>de</strong> seus <strong>direitos</strong> se levantavam al-<br />

tivos a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r as suas prerogativas, oril subjuga<strong>do</strong>s pela siip~rsti-<br />

ção e zelo exaggera<strong>do</strong> se submettiam cíqrielle gran<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r extra-<br />

nacional; d'ahi vem estas incertezas e difficiil<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

I3 no tempo <strong>de</strong> D. Jose que se fixa e <strong>de</strong>termina este direito com<br />

to<strong>da</strong> a precisão.


O Summo Imperio : Protecção e Inspecção Suprema<br />

Origem <strong>da</strong>s tlieorias i10 Summo Im erio -Entre nós - Breve quadro <strong>do</strong>s principio6<br />

d'essa theoria: fonte <strong>do</strong> ~ioiler iea! e $"a natureza: <strong>direitos</strong> e officios majeslaticos:<br />

fun<strong>da</strong>mento <strong>do</strong> jus circa sacra-Canonistas que lonieniaram citas i<strong>de</strong>as enlre nós<br />

-As <strong>do</strong>utrinas <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r immetlialo eni a* nossai leia, na jiiiiuprucleiicia, nos lra-<br />

cta<strong>do</strong>s cspeciaes e na uiiircraitla<strong>de</strong> - Officios e <strong>direitos</strong> <strong>do</strong>s inil)eranles quiinlo 6<br />

protrcclo e inspccclo supreliia: I~gislaclo josrpht~a -O direito <strong>de</strong> cienr e suppriinir<br />

o{ hispacios e'<strong>de</strong> irirgnr a circuniscii~~cai~ ect~leeia~iica <strong>de</strong>haian <strong>do</strong> irnperio d'estes<br />

piinciliios - Opinilo crronea a re~priio <strong>da</strong> ~irotr.ccao tla txjireja pelo esta<strong>do</strong> -<br />

Reapparecimtmto <strong>da</strong> theoria <strong>da</strong> proteccáo e ins[ircc8o suprema <strong>de</strong>liciis <strong>da</strong> Carla<br />

Conzlilucional - Burges Carneiro - Ulfimas crcaco6s <strong>de</strong> l~iipa<strong>do</strong>s - Necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> uma reforma ria rircumscripclo ecclesiaslica '<strong>de</strong> 1)ortugal - Tentativa 'ciesle<br />

proposilo: sua ineíücarin - Decr. ilt: 9 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1869 - Esta<strong>do</strong> aclual- Projeclo<br />

<strong>de</strong> lei <strong>de</strong> 17 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1871.<br />

Na historia politica <strong>da</strong> Europa encontra-se, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seculo xvi,<br />

alguma cousa muito similhante ao effeito <strong>da</strong>s gran<strong>de</strong>s correntes,<br />

que sulcam em senti<strong>do</strong>s oppostos e com veloci<strong>da</strong><strong>de</strong>s differentes os<br />

gran<strong>de</strong>s oceanos cquatoriars.<br />

Ha eff'ectivainente duas grossas correntes, que separam o mun<strong>do</strong><br />

europeu: uma <strong>de</strong>corre <strong>do</strong> norte, prega a emancipaçáo <strong>do</strong> espirito,<br />

pr6.ga a liber<strong>da</strong><strong>de</strong>; esta corrente cresce com as revoluç6es ate a<br />

meio <strong>do</strong> continente, e ahi encontra-se com a outra, que a repulsa<br />

com a força <strong>da</strong> sua reacção ; ella inva<strong>de</strong> então a França, lança-se<br />

sobre os mares e vai apparecer, cheia <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>, em o norte <strong>do</strong> solo<br />

americano.<br />

Sobre as aguas d'esta paira o espirito <strong>do</strong> futuro, cheio <strong>de</strong> pro-<br />

messas ; entre as vagas d'aquella v&-se rolar arrasta<strong>do</strong> o ca<strong>da</strong>ver<br />

<strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, coberto <strong>de</strong> ameaças.<br />

Ha aqui sómente o effeito natural, como que a resultante <strong>do</strong><br />

embate <strong>de</strong> diins forças? ou 6 isto a manifestaçáo <strong>de</strong> um principio<br />

Iioje muito <strong>de</strong>bati<strong>do</strong> - a irifliiencia <strong>da</strong>s raças ?<br />

Será ver<strong>da</strong><strong>de</strong> que a rafa latilia é propensa á idéa autoritaria (!


<strong>de</strong> uni<strong>da</strong><strong>de</strong>? e que a raça germanica é espontaneamente <strong>de</strong>fensora<br />

<strong>da</strong> consciencia individual e <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> pessoaes?<br />

Seja qual fSr a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira causa d'este interessante phenomeno,<br />

o que 6 certo é que Portugal foi involvi<strong>do</strong> no turbilháo <strong>da</strong> corrente,<br />

que rugia ao sul <strong>da</strong>s terras europeas, e que, como to<strong>da</strong>s as na-<br />

çõcs que tiveram a infelici<strong>da</strong><strong>de</strong> ou fatali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> serem leva<strong>da</strong>s no<br />

seu vortice, permaneceu em scnsivel atrazo material e moral ate<br />

mui tar<strong>de</strong> na successão <strong>do</strong>s tempos.<br />

A revolução <strong>do</strong> nortc comeqou por atacar o principio theocratico,<br />

e moveu <strong>de</strong>pois a guerra ao principio monarchico em to<strong>da</strong>s as suas<br />

manifestações. As duas monarchias, theocratica e temporal, viram-se<br />

assim obriga<strong>da</strong>s a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r-se junctas, como em prol dc causa<br />

commum. Mas isto n3o podia ser, porque a monarchia theocratica<br />

aspirava ao catholicismo rcligioso c profano, e a divisão lavrou, como<br />

era fatal, entre os íiois campos habita<strong>do</strong>4 pelas raças latinas. .<br />

Qual foi o resulta<strong>do</strong>? A egreja tinha dcs<strong>de</strong> muito uma theoria<br />

e um organismo completo para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a sua posição, to<strong>do</strong> um<br />

systema <strong>de</strong> estrategia, cujos planos começóra a traçar o celebre<br />

Gregorio VII; mas a monarcliia, não ; e agora, srpara<strong>do</strong> <strong>da</strong> cgrcja,<br />

ten<strong>do</strong> <strong>de</strong> vencer a revoluçào politica <strong>do</strong> seculo aviir e <strong>de</strong> rechas-<br />

sar a reacção religiosa, que renasce sempre como aqiielle monstro<br />

mythologico, que I? porventura o symbolo <strong>de</strong> algum acontecimento<br />

perdi<strong>do</strong> no tempo e similhante a estc, o monarchia teve <strong>de</strong> archi-<br />

tectar uma theoria sua.<br />

Foram as theorias <strong>do</strong> Summo Imperio-as theoriae ridiculas<br />

<strong>do</strong> <strong>Direito</strong> Divino.<br />

Tal foi a pobreza scicntifica d'esta raça, que ella teve <strong>de</strong> ir co-<br />

lher d'entre as ossa<strong>da</strong>s e d'entre as podridões <strong>do</strong> velho imperio<br />

as bases <strong>de</strong> alguma cousa, que, á guisa <strong>de</strong> systema scientifico, se<br />

po<strong>de</strong>sse oppbr a seus inimigos <strong>de</strong>baixo <strong>do</strong> esplen<strong>do</strong>r vivo <strong>do</strong>s raios<br />

<strong>da</strong> philosophia. '<br />

Luiz xiv, cu.jo seculo, cheio <strong>de</strong> brilhantismo fascina<strong>do</strong>r, offus-<br />

cára mais <strong>de</strong> um povo, representou um gran<strong>de</strong> papel 'nesta crea-<br />

ção <strong>de</strong> uma theoria ficticia e pe<strong>da</strong>ntesca, a par <strong>da</strong> qual vinham o<br />

luxo e dissoluç'io <strong>da</strong>s cdrtes reaes e o abuso pesa<strong>do</strong> <strong>do</strong> arbitrio,<br />

<strong>da</strong> vonta<strong>de</strong> suprema, T e tantos irinocentrs sacrificou muitas vczes<br />

ás intrigas mais insignificantes e mesquinhas.<br />

Eritre nós, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> direito romono se generali-<br />

sou, e foram apparecen<strong>do</strong> nas leis e iin jurispru<strong>de</strong>ncia as novas


idhas <strong>do</strong> absolutismo real; essas theorias foram ganhan<strong>do</strong> imperio<br />

na opinião, como que pouco e pouco saturan<strong>do</strong> o meio on<strong>de</strong> res-<br />

pirava a intelligencia <strong>da</strong> nação.<br />

Os reina<strong>do</strong>s <strong>de</strong> João 11, D. Manuel, D. João rii, D. Pedro ir e<br />

D. João v, dáo bastantes exemplos <strong>do</strong> progresso que entre nós<br />

fizeram estas id8as.<br />

]S: no tempo <strong>de</strong> 1). Jos8 I que se realisam as gran<strong>de</strong>s reformas<br />

<strong>do</strong> po<strong>de</strong>r absoluto e se rrgue em to<strong>do</strong> o vigor nas leis e institui-<br />

ções a organisação curiosa <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> e <strong>de</strong>veres majestaticos <strong>do</strong>s<br />

summos imperantes.<br />

fi indispensavel para o nosso proposito expor a theoria <strong>da</strong> pro-<br />

tecçáio e irispecção suprema, emquanto á socie<strong>da</strong><strong>de</strong> ecclesiastica, a<br />

theoria <strong>do</strong> jus circa sacra.<br />

Sercbmos mui brevcs, porque bem conhecemos quanto fastidiosa<br />

sclrtí a leitura d'estes singulares systemas, escolasticos e como que<br />

theatraes; muito especialmente quan<strong>do</strong> hoje estamos acostuma<strong>do</strong>s<br />

á leitura encanta<strong>do</strong>ra <strong>do</strong>s publicistas e philosophos mo<strong>de</strong>rnos, lei-<br />

tura não secca e ari<strong>da</strong> como csta, mas enthusiastica e gran<strong>de</strong>.<br />

Fun<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-se na auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> biblia, nos livros <strong>da</strong> sabe<strong>do</strong>ria<br />

e <strong>do</strong>s proverbios e nas epistolas <strong>de</strong> Paulo, e citan<strong>do</strong> ao jesuita<br />

Soares no tracta<strong>do</strong> <strong>da</strong>s leis, ou a Scoto no tracta<strong>do</strong> <strong>da</strong> justiça, era<br />

<strong>do</strong>gma que s6 havia <strong>do</strong>is imperantes sem superior na terra, cujo<br />

supremo imperio recebiam primaria, directa c immediatamente <strong>de</strong><br />

Deus; um sobre as cousas temporaes-o rei, outro sobre as<br />

espirituaes - o papa.<br />

O po<strong>de</strong>r supremo era a reunião <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> majestaticos, em<br />

cujo exercicio o imperante não tinha por norma senão o fim <strong>da</strong><br />

socie<strong>da</strong><strong>de</strong>; a sua vonta<strong>de</strong>, diziam com Arniseo no tracta<strong>do</strong> De<br />

jure nlajestatico, é a lei viva e anima<strong>da</strong> sobre o mun<strong>do</strong>.<br />

Comtu<strong>do</strong> esta vonta<strong>de</strong> não podia <strong>de</strong>sa<strong>do</strong>rnar o summo imperante<br />

<strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> majestaticos, os quaes eram inabdicaveis, e, ain<strong>da</strong> que<br />

expressamente os separasse <strong>de</strong> si, ou transferisse, era ndlo tu<strong>do</strong><br />

o que nesse senti<strong>do</strong> fizesse. Os D.D., len<strong>do</strong> certo texto <strong>da</strong>s<br />

dccretaes, explicavam isto simplesmente. $ porque, diziam, esses<br />

<strong>direitos</strong> são a essencia <strong>da</strong> majesta<strong>de</strong> rrgia; ipso manente rege, não<br />

pó<strong>de</strong> alienal-os; em outros termos, seria ameaça<strong>da</strong> a socie<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />

pois guc ficaria iim corpo sein cabeça, contra o texto <strong>do</strong> Cap.<br />

cunt noii liceat, <strong>de</strong> praescrip. respectiva.<br />

Vinha logo d'aqui uma valiosa consequencia: é que sustentavam


que o papa <strong>de</strong>via perservar os <strong>direitos</strong> <strong>do</strong>s reis, como escreveu<br />

por exemplo Phebo, 2." parte, <strong>de</strong>c. 2 14, n.' 27 ; e d'ahi os preceitos<br />

canonicos relaxavam-se por causa <strong>da</strong>s prerogativas <strong>do</strong>s reis.<br />

O po<strong>de</strong>r real era pois pleno e supremo; o que <strong>de</strong>cidia a von-<br />

ta<strong>de</strong> regia, <strong>de</strong>cidia-se <strong>de</strong> sciencia certa, á similhança <strong>do</strong>s pontifices.<br />

Dividiam os <strong>direitos</strong> majestaticos em varios capitulos, e, <strong>de</strong>pois<br />

dc dizerem que o primeiro oficio <strong>do</strong> imperante era o direito le-<br />

gislativo, afirmavam gratuitamente que, para ter este direito, o<br />

imperante não podia passar sem o direito <strong>de</strong> inspecção, segun<strong>do</strong><br />

artigo <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> <strong>do</strong> summo imperio.<br />

«Consiste este direito, diz Coelho <strong>de</strong> Sampaio, na auctori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

e obrigação <strong>de</strong> vigiar e consi<strong>de</strong>rar attentamente sobre to<strong>da</strong>s as<br />

pessoas, cousas e negocios comprehendi<strong>do</strong>s nos recintos <strong>do</strong> Es-<br />

ta<strong>do</strong>.» 1<br />

Eis aqui o po<strong>de</strong>r absoluto cm to<strong>da</strong> a sua manifestaç3o.<br />

Para n8o esquecer cousa alguma, começavam os propugiia<strong>do</strong>res<br />

d'estas theorias, <strong>de</strong>pois d'estas <strong>de</strong>finiçõer, a classificar e fazer dis-<br />

tincçbes <strong>de</strong> pessoas moraes e physicas, att': que chegavam !i tlis-<br />

tincçáo <strong>de</strong> pessoas seculares e ecclesiasticas; e assim fun<strong>da</strong>vam o<br />

direito <strong>de</strong> inspecção sobre a egreja, o qual appelli<strong>da</strong>vam <strong>de</strong> jus<br />

circa sacra, e se estendia á egreja,.pessoas e cousas ecclesiasticas.<br />

Como sustentavam a in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia <strong>do</strong>s po<strong>de</strong>res espiritual e tem-<br />

poral, e lhe era indispcnsavol mostrar <strong>de</strong> algum mo<strong>do</strong> a sujeição<br />

<strong>da</strong> egreja no esta<strong>do</strong>, usavam <strong>do</strong> seguinte raciocinip pueril:<br />

Os membros <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> ou republica ccclesiastica s30 mcm-<br />

hros <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> ou republica politica e civil; por isto sr iiiicbin<br />

dc tal sorte, pelo vinculo <strong>da</strong> cari<strong>da</strong><strong>de</strong> e communhão <strong>da</strong> f6 <strong>de</strong><br />

Christo com a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> ecclesiastica, que vem a constituir uma<br />

republica christã, composta <strong>de</strong> ambas as republicast.<br />

1 Coelho <strong>de</strong> Sonsa e Sampaio, Prelecgiies <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> Patrio publico e par-<br />

ticular, 1793, § Lxvirr, P. rr tit. v.<br />

2 Estas theorias eram tão pomposamente apresenta<strong>da</strong>s, que nas cousas mais<br />

insignificantes se ren<strong>de</strong> ain<strong>da</strong> hoje a conta em qiie, pelo menos officinlmente,<br />

eram ti<strong>da</strong>s.<br />

0 exemplar <strong>da</strong> obra <strong>de</strong> Coelho <strong>de</strong> Sampaio, qiie temos ao pB <strong>de</strong> n6s quan<strong>do</strong><br />

escrevemos, 8 <strong>da</strong>s melhores ediç0es que no fim <strong>do</strong> seculo passa<strong>do</strong> se faziam<br />

entre nós; e as folhas sobre a aresta sFio <strong>do</strong>ura<strong>da</strong>s como as <strong>de</strong> um livro mys-<br />

tico <strong>de</strong> oraçiies.<br />

H:r um pequeno folheto d'este auctor, qiic an<strong>da</strong> incorpora<strong>do</strong> 4s suas obras,<br />

on<strong>de</strong> rebate os arguinentos com que j& se atacavarn pstas cousas ridiculas,<br />

e emque elle <strong>de</strong>sinvolve a theoria <strong>do</strong> direito divino. E mais curioso <strong>do</strong> q1lc


Não era preciso mais; aqui estavam to<strong>do</strong>s os principios <strong>da</strong> protecçáo<br />

e inspecç80. D'esta, que chamavam ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, <strong>de</strong>duziam<br />

ell~ tres principios: 1 .O que os <strong>direitos</strong> <strong>do</strong> imperio, nào obstante<br />

a a<strong>do</strong>pqáo <strong>do</strong> christianismo, se conservavam illesos, 2." que os imperantes<br />

sc constitiiiam na precisa e nova obrigaçào <strong>de</strong> proteger<br />

a cgre.ja c*atholica (10 seu esta<strong>do</strong>, 3." (agora aqiii 6 que nào comprelicn<strong>de</strong>mos)<br />

que era consequencia d'esses <strong>do</strong>is principios, que ao<br />

impera<strong>do</strong>r christáo viessem a pertencer-lhe a respeito <strong>da</strong> egreja, <strong>do</strong><br />

seu esta<strong>do</strong>, <strong>da</strong>s pessoas e cousas ecclesiasticas os <strong>direitos</strong> <strong>de</strong> inspecção<br />

como impera<strong>do</strong>r e como protector.<br />

Tu<strong>do</strong> isto era fun<strong>da</strong>menta<strong>do</strong> com exemplos <strong>do</strong>s codigos Justinianeo<br />

e Ttieo<strong>do</strong>siano, auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s glossas e rcscriptos <strong>do</strong>s<br />

impera<strong>do</strong>res 4.<br />

O celebre Pedro <strong>de</strong> Marca concorrêra efficazmente para <strong>da</strong>r<br />

vi<strong>da</strong> n estas theorias; elle, Eybcl e Iticger, c o mesmo Antonio<br />

Pereira <strong>de</strong> Figueirc<strong>do</strong>, eram os canonistas favoritos <strong>do</strong>s nossos<br />

escriptores.<br />

Antes e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> D. José, e até hojc, a Irgislii~.ào, a jurisprii<strong>de</strong>ricia,<br />

a scieiicia nl~raçaram estas id&s cscoliisLicas.<br />

Alguns d'rsles pi.iiicipios, que corn o direito rornario sc tililiam iiitroduzi<strong>do</strong><br />

nas ordcriayòcs <strong>do</strong> rciiio, szo agora pelos commciita<strong>do</strong>res<br />

interpretatlos e <strong>de</strong>siri\ol~i<strong>do</strong>s rio senti<strong>do</strong> <strong>da</strong>s theorias <strong>do</strong><br />

siimmo imperio. A jurisprii<strong>de</strong>iicia, que nestc secnlo xvrir 6 fecun<strong>da</strong><br />

e ~oluniosa, como sempre o tc>m si<strong>do</strong> na epocha que segue<br />

uma codificayào, c que se approxiilia dc uma nova, crescc sob<br />

este influxo.<br />

Para nos convencermos d'isto, basta folhear as compilaçfies <strong>de</strong><br />

arestos e <strong>de</strong>cisões <strong>do</strong>s nossos praxistas; como, por exemplo, as dc<br />

to<strong>da</strong>s as outras, e mais <strong>de</strong> uma vez faz rir com sua affecta<strong>da</strong> gravi<strong>da</strong><strong>de</strong> e<br />

sublimi<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

E noternos qiie,. quan<strong>do</strong> isto se escrevia, j& o livro <strong>de</strong> Rousaeau corria<br />

pelas mãos <strong>de</strong> muitos, que o <strong>de</strong>voravam com avi<strong>de</strong>z; c emiluaiito se explicavam<br />

nas ca<strong>de</strong>iras <strong>da</strong> universi<strong>da</strong><strong>de</strong> as paginas <strong>da</strong>s prelecções <strong>de</strong> Co~llio <strong>de</strong><br />

Sampaio, os estu<strong>da</strong>ntes li~m o Contracto social, que, <strong>de</strong>baixo <strong>da</strong> fbrma <strong>de</strong><br />

peqiieninos livros, se espalhara pela moci<strong>da</strong><strong>de</strong>, que escondi<strong>do</strong> o trazia co!nsigo,<br />

e se apaixonava pelas palavras immorre<strong>do</strong>uras que se lêem, na prirneira<br />

pagina <strong>da</strong> celebre obra - L'homme est ni libre et parfout i1 est duns les fero.<br />

1 Chegou a tal excesso esta mania dc cesarismo, que nas obras d6s nossos<br />

auctores se <strong>de</strong>para com este ridiciilo mo<strong>do</strong> <strong>de</strong> dizer, falan<strong>do</strong> a respeito <strong>do</strong>s<br />

reis - O8 nosooo Augastos têm usa<strong>do</strong> oempre ... O Augusto tem inconteotavel<br />

direito.


Phebo, Gama e Cabe<strong>do</strong>; e percorrer as paginas <strong>do</strong>s commenta-<br />

<strong>do</strong>res <strong>do</strong> livro segun<strong>do</strong> <strong>da</strong>s Or<strong>de</strong>nações e dc alguns titulos <strong>do</strong>s<br />

livros primeiro e terceiro.<br />

Ha tracta<strong>do</strong>s especiaes d'estes <strong>direitos</strong>, como são o <strong>de</strong> Osorio<br />

De patronatu resolut., o <strong>de</strong> Gabriel Pereira <strong>de</strong> Castro De manu<br />

Regia. o <strong>de</strong> Portugal De <strong>do</strong>nalionibus, o <strong>de</strong> Lima Leit'io Dis-<br />

curso dpologetico e critico e essa celebre Deducção Chronologica,<br />

base <strong>de</strong> tantas reformas <strong>de</strong> Pombal.<br />

As obras <strong>de</strong> alguns professores <strong>da</strong> universi<strong>da</strong><strong>de</strong>, como a já ci-<br />

ta<strong>da</strong> <strong>de</strong> Coelho <strong>de</strong> Sampaio, avigoram <strong>de</strong>baixo d'este espirito, e<br />

neste estabelecimento litterario assim se man<strong>da</strong>va ensinar to<strong>da</strong> esta<br />

theoria, vivo fun<strong>da</strong>mento <strong>de</strong> uma instituição, cuja hora <strong>de</strong>rra-<br />

<strong>de</strong>ira jh o mun<strong>do</strong> ouvira soar por estes tempos 1.<br />

Eis a raz8o por que as bibliothecas estão cheias d'esses livros,<br />

que ninguem hoje 14 e <strong>de</strong> que se zomba, porventura com justo mo-<br />

tivo, poisque, á parte o interesse limita<strong>do</strong> e fugitivo <strong>de</strong> um ou outro<br />

ponto <strong>da</strong> jurispru<strong>de</strong>ncia civil, que no meio d'clles se encontra,<br />

1 Veja-se o livro <strong>de</strong> José Verissimo Alvares <strong>da</strong> Silva - 6tfroducção ao<br />

Novo Caliyo ou Dissertação critica sobre a principal causa <strong>da</strong> obscuri<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>do</strong> nosso Codigo nufhentico; especialmente a pag. 58 e seguintes.<br />

Os Estatutoa <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> no Liv. 2.0, tit. 3.O, cap. rrr, 58 8, 11 e 12,<br />

man<strong>da</strong>vam ao professor o seguinte :<br />

8 8 Das formas <strong>da</strong>s republicas e <strong>da</strong> naturczci <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> civil <strong>de</strong>duzir&<br />

08 officios e <strong>direitos</strong>, que compet~rn tios soberanos, conheci<strong>do</strong>s e indica<strong>do</strong>s<br />

pelo nome <strong>de</strong> <strong>Direito</strong>s <strong>da</strong> Mugesta<strong>de</strong>, cuja instrucçlo e <strong>do</strong>utrina .é o princi-<br />

pal objecto <strong>do</strong> direito publico iiniv~rsal.*><br />

$15 11 Sobre os officios e <strong>direitos</strong> <strong>do</strong> eummo imperio civil a regpeito <strong>da</strong>s<br />

cousas sagra<strong>da</strong>s e negocios <strong>da</strong> religião, se <strong>de</strong>ter8 um pouco mais, <strong>do</strong> que<br />

sobre alguns outros artigos, por ser este nPo rnerios importante qucx ~1elic:iiIo.<br />

li: <strong>da</strong>r4 tambem a coiihec~r a legitima e indispensavel iiispecçlo c :~utliori<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

que tem o summo imperio temporal sobre a admitiistraç80 exterior <strong>da</strong><br />

egreja e aobre o exercicio <strong>da</strong>s coiisas sagra<strong>da</strong>s, para vigiar e impedir que<br />

d'alii não venha mal ao esta<strong>do</strong> e para eineu<strong>da</strong>r e acautelar o que llie tiver<br />

jfi resulta<strong>do</strong>..<br />

12 Mostrará o influxo que po<strong>de</strong>m ter os soberanos sobre oe negocios,<br />

assernbleias e outras fuiicç0es <strong>da</strong> religiào, assim emquauto aos maaistra<strong>do</strong>s<br />

politicos como na quali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> principes christiios, protectores, advog<strong>do</strong>s e<br />

<strong>de</strong>fciimres <strong>da</strong> religião e <strong>da</strong> egreja. E fark ver que os justos limites <strong>do</strong> mesmo<br />

indispensavel summo imperio influxo é a reciproca harmonia e inutuo soccorro<br />

que <strong>de</strong>ve sempre haver entre o sacer<strong>do</strong>cio e o imperio.<br />

Confrontan<strong>do</strong> to<strong>da</strong>s as suas <strong>de</strong>ducç0es com a revelagjio que lhe servir0<br />

<strong>de</strong> criterio e que ter6 sempre'<strong>de</strong>ante <strong>do</strong>s olhos para n8o errar com a <strong>do</strong>utrina<br />

<strong>do</strong>a sanctos padres, <strong>do</strong>s concilioa e <strong>do</strong>s ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros canones e tambem com<br />

a disciplina antiga <strong>da</strong> egreja..<br />

Descobre-se bem a influencia <strong>da</strong> obra <strong>de</strong> Pedro <strong>de</strong> Marca e <strong>da</strong> rcacçiio<br />

gallicana em to<strong>do</strong>s estes textos curiosos.


seus reinos, povos e vassallos d'elles, que recebeu immediatamente<br />

<strong>de</strong> Deus '; -que em tu<strong>do</strong> isto tinham por base o <strong>do</strong>gma <strong>do</strong> chris-<br />

tianismo; - que, como protectores <strong>da</strong> egreja, <strong>de</strong>viam conservar<br />

illeso o <strong>de</strong>posito <strong>da</strong> f6 nos seus reinos e prcserval-os <strong>do</strong> mortifcro<br />

contagio e <strong>do</strong>s funcstissimos estragos em que o espirito <strong>da</strong> irreli-<br />

gião os procurava precipitar 2; -que era indispensavel e legitima<br />

a inspecção e auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> summo imperio temporal sobre a ad-<br />

ministraç80 exterior <strong>da</strong> egre-ja e exercicio <strong>da</strong>s cousas sagra<strong>da</strong>s<br />

para impedir o mal que d'ahi po<strong>de</strong>sse vir ao esta<strong>do</strong> e remediar o<br />

que já estivesse feito ; 3 - que era obrigação <strong>do</strong>s priricipes zelar<br />

pelas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja 4.<br />

Tal era a ultima expressão <strong>do</strong> summo imperio a respeito <strong>do</strong><br />

jus circa sacra.<br />

Vê-se bem distinctamente como, rio meio d'este jogo <strong>de</strong> pala-<br />

1 Carta <strong>de</strong> lei <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1774.<br />

A Carta <strong>de</strong> lei <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zetnbro <strong>de</strong> 1671, tractan<strong>do</strong> <strong>de</strong> algumas duvi<strong>da</strong>s<br />

levanta<strong>da</strong>s Acerca <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> <strong>do</strong>s aritigamerite chama<strong>do</strong>s christãos ~iovos. e<br />

man<strong>da</strong>n<strong>do</strong> interpretar certas <strong>de</strong>cretaes <strong>da</strong> maneira que lhe aprazia, diz: E<br />

porque como Rei, e Seuhor Soberano, que na temporali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> Igreja e cariones<br />

Sagra<strong>do</strong>s rios ALcus Reiiios e Dominios nBo reconhece na Terra Superior:<br />

Como Protector <strong>da</strong> Igreja e caiiories Sagra<strong>do</strong>s nos meus reirios e <strong>do</strong>rniiiios<br />

para os fazer conqrrx ar iia sua pureza ........ Como Supremo inagistra<strong>do</strong><br />

para manter a trancluilli<strong>da</strong><strong>de</strong> publica <strong>da</strong> nossa Igreja r Regios Doininios ....<br />

E usan<strong>do</strong> ao rnesrrio teriipo <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o Pleno e Supremo Po<strong>de</strong>r qrie nas sobreditas<br />

materias <strong>da</strong> inariuten$ão <strong>da</strong> traiiquilli<strong>da</strong><strong>de</strong> publica <strong>da</strong> Igreja c meus<br />

Reinos e Povos e Vnssailos d'elles, recebi imrnedi:itameiite <strong>de</strong> Deus 'ro<strong>do</strong> Po<strong>de</strong>roso:<br />

Quero, Man<strong>do</strong>, Or<strong>de</strong>tio e é Minha Vonta<strong>de</strong> que se observe.. ..... 8<br />

2 Provisão <strong>de</strong> 5 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1775.<br />

Para se ver como o esta<strong>do</strong> se servia <strong>da</strong> egreja para os seus interesses politieos,<br />

transcrevernos esta parte <strong>da</strong> celebre Provisão <strong>de</strong> 6 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zeinhro:<br />

.Que sen<strong>do</strong>, diz, um <strong>do</strong>s principaes objectos <strong>da</strong> minha vigi1:iiicia a fclici<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

cterna e temporal <strong>do</strong>s meus Vaseallos, a qual, ten<strong>do</strong> por base firmo o<br />

<strong>do</strong>gma <strong>do</strong> christianisnio, muitas vezes tem si<strong>do</strong> ataca<strong>da</strong> pelo furor <strong>de</strong> hurna<br />

facpão criminosa <strong>de</strong> homens, que, <strong>de</strong>baixo <strong>do</strong> pomposo titulo <strong>de</strong> Espiritos fortes,<br />

se hão levarita<strong>do</strong> como mestres <strong>do</strong> Genero Hornano, preten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> extiuguir<br />

a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira crença e fazer tomar aos filhos <strong>da</strong> egieja outro caminho<br />

muito alheio d'aquelle que o filho <strong>de</strong> Deus abriu no mun<strong>do</strong>, instituin<strong>do</strong> por<br />

este meio tão aboiniiiavel uma religilo que lhe autorine os crimes <strong>de</strong> suas<br />

vonta<strong>de</strong>s perverti<strong>da</strong>s, espalhan<strong>do</strong> para isto livros cheios <strong>de</strong> maxitnss perniciosas<br />

dirigi<strong>da</strong>s B <strong>de</strong>struiçiio <strong>do</strong>s altares e <strong>do</strong>s thronos e a fazer odiosos os<br />

<strong>do</strong>us Summos Po<strong>de</strong>res que Deos or<strong>de</strong>nou para governar os Homens .....<br />

Con<strong>de</strong>mna o livro <strong>de</strong> Elvecio, Le wai seiis du système <strong>de</strong> la nature, chaman<strong>do</strong><br />

philosopho libertino ao seu auctor e maii<strong>da</strong>n<strong>do</strong> lacerar e queimar com<br />

prega0 na Praça <strong>do</strong> Pelourinho pelo Executor <strong>da</strong> Alta Justip o referi<strong>do</strong> li-<br />

vro: O aue teve loear no dia 22 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro d'eeee anno.<br />

3 ~siatutos, livu2.0, tit. 13.0, cap. 3.0, 8 11.<br />

4 Estatutos, liv. 2.0, tit. 4.*, cap. 2.0; Carta <strong>de</strong> Lei <strong>de</strong> 2 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1768.


vras e <strong>de</strong> theorias sem fun<strong>da</strong>mento na reali<strong>da</strong><strong>de</strong>, qualquer preten*<br />

são <strong>da</strong> eçreja, que <strong>de</strong>sagra<strong>da</strong>sse ao esta<strong>do</strong>, podia, scm o esta<strong>do</strong><br />

parecer ferir os <strong>direitos</strong> d'ella, oppor-se-lhe efficazmentcl e <strong>de</strong>movel-as.<br />

O principe appellava para a protec~ão <strong>do</strong>s canones, para a protecçào<br />

<strong>de</strong>vi<strong>da</strong> aos viissallos, para a ortlcm publica <strong>da</strong> ryeja e <strong>da</strong><br />

socie<strong>da</strong><strong>de</strong> civil, usava <strong>do</strong> beneplacito, como antigo privilegio <strong>da</strong><br />

coroa, e tu<strong>do</strong> se conseguia.<br />

I?- claro que, <strong>de</strong>baixo d'esta legislação, o direito ecclesiastico,<br />

quanto á creaçào, <strong>de</strong>smembrayão e suppressão <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, tinha<br />

iriteiramente perdi<strong>do</strong> aquella vaga incerteza,-que lhe vimos guar<strong>da</strong>r<br />

no capitulo antece<strong>de</strong>nte; e comtu<strong>do</strong> eram ain<strong>da</strong> os monar~has que<br />

sollicitavam <strong>da</strong> sancta sé essas graças. Bem se <strong>de</strong>ixa ver porem que,<br />

se sem a iritervenyão e corisulta <strong>do</strong>s reis se preten<strong>de</strong>sse qualquer<br />

alteração <strong>da</strong> divisõo ecclesiastica e <strong>do</strong> numero <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, e fosse<br />

isto <strong>de</strong>sagra<strong>da</strong>vel aos interesses, ou politicos ou religiosos, <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>,<br />

to<strong>da</strong>s essas pretensòes seriam improficuas e bal<strong>da</strong><strong>da</strong>s. Cá<br />

rstakam as portas falsas e estas armadilhas, com saricto aspecto,<br />

<strong>do</strong> summo imperio, que não reconhecia superior na terra e que<br />

acabava <strong>de</strong> <strong>de</strong>bellar a inccrtcza <strong>do</strong> direito portiigurz, drclaran<strong>do</strong><br />

subrepticia a introducção <strong>da</strong> bulia <strong>da</strong> C6a e toman<strong>do</strong> to<strong>da</strong>s essas<br />

medi<strong>da</strong>s energicas, que vimos acima.<br />

Para se ver a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> e rcputa~ao que esta theorin ganhoii,<br />

bastar8 dizer que, rio começo d'este seculo, se sustentava e escrevia<br />

que ao principe assistia o direito <strong>de</strong> inverter a disciplina <strong>da</strong><br />

nomeação <strong>do</strong>s bispos; e que, sem assentimento <strong>da</strong> egreja, só usan<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong>s <strong>direitos</strong>, que a quali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>fensor e advoga<strong>do</strong> <strong>da</strong> egrrja e<br />

protector <strong>do</strong>s cariones lhe conferiam, elle podia estabelecer a eleição<br />

<strong>do</strong>s bispos pelo cabi<strong>do</strong>, prece<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o regio assenso á sagraçào,<br />

embora não consentisse na confirmação a curia romana.<br />

E sabeis como se <strong>de</strong>fendia esta opinião?<br />

Dizia-se que 1180 era mister ((escogitar subtis argumentos para<br />

conrjencer uina ver<strong>da</strong><strong>de</strong> já <strong>de</strong>cidi<strong>da</strong>, ha tantos seculos»; que quem<br />

duvi<strong>da</strong>sse d'esta auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> inherente ao irnperio, sustentaria um<br />

para<strong>do</strong>xo, que foi causa <strong>de</strong> muitos males ; - que o monarcha ficaria<br />

inliibi<strong>do</strong> <strong>de</strong> manter o contracto, que fizera com a egreja, <strong>de</strong> a<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r <strong>do</strong>s males que a atacassem, ain<strong>da</strong> quan<strong>do</strong> esses males<br />

partissem <strong>de</strong> seus proprios ministros; e finalmente que ((seria necessario<br />

dizer que o brilhante e pomposo tilulo <strong>de</strong> protector <strong>do</strong>s<br />

12


canones, Guar<strong>da</strong>, Propugna<strong>do</strong>r c Defensor <strong>da</strong>s Igrejas, annexo<br />

ao principa<strong>do</strong> <strong>do</strong> seculo, era uma sombra tüi e uma qrcirrtera in-<br />

venta<strong>da</strong> para illudir.4 D<br />

Ultimamerite, Sorges Carneiro, escreven<strong>do</strong> em 1826 c offrre-<br />

ceri<strong>do</strong> a D. Pedro ~v o seu Direi10 Civil <strong>de</strong> Portugal, rcsriscitava<br />

a mesma <strong>do</strong>utrina <strong>da</strong> protecçâo e inspecçzo <strong>da</strong> egrcja pelo estatlo;<br />

e, fazen<strong>do</strong> a enumeração <strong>do</strong>s officios <strong>do</strong> principe, 'neste capitulo,<br />

aos que acima <strong>de</strong>ixamos indica<strong>do</strong>s accrcscenta, <strong>de</strong>duzi<strong>do</strong>s <strong>do</strong> me-<br />

smo principio, os <strong>direitos</strong> <strong>de</strong> castigar os clerigos, limitar o numero<br />

<strong>do</strong>s or<strong>de</strong>na<strong>do</strong>s, promover a soli<strong>da</strong> instrucçno <strong>do</strong> clero e limitar os<br />

po<strong>de</strong>res <strong>do</strong>s lega<strong>do</strong>s <strong>do</strong> papae.<br />

É preciso notar que nem to<strong>do</strong>s os canonistas acceitaram estes<br />

excessos, e alguns mesmo n7io receberam a legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> pro-<br />

prio jus cima sacra 3.<br />

'Neste espaço <strong>de</strong> tempo e <strong>de</strong>baixo <strong>do</strong> vigor d'eritas idhas, foram<br />

crectos durante o reina<strong>do</strong> <strong>de</strong> U. Jose os seguintes bispa<strong>do</strong>s: - o<br />

<strong>de</strong> Penafiel, por bulla <strong>de</strong> Clcmente xiv, <strong>de</strong> 10 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1770;<br />

o <strong>de</strong> Bragança, pela Carta Regia <strong>de</strong> 17 <strong>de</strong> Setembro <strong>de</strong> 1764, qiie<br />

para ahi mudára a cathedral <strong>de</strong> Mirandn; -o <strong>de</strong> Pinliel, por 1~1ilIíi<br />

<strong>de</strong> Clemente xiv, dc 10 <strong>de</strong> jullio <strong>de</strong> 1770; -o <strong>de</strong> Castcllo-Branco,<br />

por bulla <strong>do</strong> mesmo pontifice, <strong>de</strong> 1 Ei <strong>do</strong> junho <strong>de</strong> 177 1 ;-o <strong>de</strong><br />

Aveiro, pela bulla <strong>de</strong> 12 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1774, <strong>do</strong> mesmo pipa4<br />

1 Veja O Inveati,garlor portuguez em Inglaterra- Jornal litterario, politico,<br />

etc. - Abril 1817, pag, 151.<br />

<strong>Direito</strong> civil <strong>de</strong> l>orfugal, L. 1, tit. vi, § 60, n.O 1 a 9, 1826.<br />

& airi<strong>da</strong> o Eybel e o Rieger e Cavallario que constituem ~uctori<strong>da</strong><strong>de</strong> 'iieste<br />

ohjccto. - Veja tambein <strong>Direito</strong> Ecclesiastico Portupez <strong>de</strong> Beriiardiiio Car-<br />

neiro- Iiitrodue. 11.0 rir.<br />

3 Zallinger,.por exemplo: Imt. Jur. Eocles. cap. 11.<br />

Ern eoutrario veja Pedro <strong>de</strong> Marca, Concordiu Sacerd. et Imp. lib. rv<br />

cap. x e xiri.<br />

4 O alvará <strong>de</strong> 17 <strong>de</strong> Rfaio <strong>de</strong> 1770,eriqin<strong>do</strong> a villas <strong>de</strong> Beja e Penafiel em<br />

ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, para dignamente serem sé<strong>de</strong>s <strong>de</strong> novas cathedraes, exprimia-se assiiri:<br />

#Fiz supplicar ao Saiicto Padre Cleineiite xrv, ora presi<strong>de</strong>nte ria iinivclr-<br />

sal egreja <strong>de</strong> Deus, que com aqiirllas pias e urgeutes causas haja por beiii<br />

conce<strong>de</strong>r to<strong>da</strong>s as necessarias faciil<strong>da</strong><strong>de</strong>s para que <strong>do</strong> territorio <strong>do</strong> aobrc>dito<br />

bispa<strong>do</strong> <strong>do</strong> I'orto se <strong>de</strong>srnembre a comarca <strong>de</strong> Penofiel <strong>de</strong> Souea e seja i~elle<br />

erigi<strong>do</strong> um novo bispa<strong>do</strong> ...... u<br />

Vê-se pois, qne no ineio <strong>de</strong> to<strong>do</strong> este apparato <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> magestaticos,<br />

emquanto pelo meiios a srrncta s6 se n&ù recusara, se recouliecia o i.~u iii-<br />

violrivel direito 'iieste artigo <strong>do</strong> goveriio <strong>da</strong> egreja.<br />

O inesmo dizer guar<strong>da</strong> o Alvarh <strong>de</strong> 25 <strong>de</strong> Agosto <strong>de</strong> 1770 qiiaiito A erecpào<br />

em ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> villa <strong>de</strong> Pinhel para neg~ial etfeito.


e ain<strong>da</strong> o <strong>de</strong> Villa Nova <strong>de</strong> Portimào, o qual n3o chegou a ser<br />

provi<strong>do</strong>.<br />

tlEm tempo <strong>de</strong> 1). Maria I a bulla-fiomanus Pontifex,-<strong>de</strong> 27<br />

<strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1780, <strong>de</strong> Pio vi, supprimiu o <strong>de</strong> bliraii<strong>da</strong>, que uniu<br />

ao <strong>de</strong> Uragaiic;~. 'fieste mcsmo reina<strong>do</strong> se supprimiu eguillmente,<br />

por bulla <strong>de</strong> Pio VI, <strong>de</strong> 11 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1778, o bispah <strong>de</strong><br />

Penafiel.<br />

Tas foram as alteraçbes por que entre n6s tem passa<strong>do</strong> a organisação<br />

<strong>do</strong> episcopa<strong>do</strong> <strong>da</strong> egreja portugueza, ate o perio<strong>do</strong> <strong>da</strong> mu<strong>da</strong>nça<br />

na forma <strong>do</strong> governo,<br />

Um rapi<strong>do</strong> olhar, lança<strong>do</strong> sobre este esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> egreja portugueza,<br />

basta para iios<strong>de</strong>ixar coriveiici<strong>do</strong> <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> uma reforma, pois<br />

que riao serh <strong>de</strong> facil iiituiçào compreheri<strong>de</strong>r os motivos, que pe<strong>de</strong>m<br />

tão gran<strong>de</strong> iiumero <strong>de</strong> cathedraes em meio <strong>de</strong> tào mingua<strong>do</strong> povo.<br />

Quan<strong>do</strong> com o systema liberal começou o nosso <strong>de</strong>siiivolvimento<br />

material e moral, surgiram novas e urgentes iiccessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, e com<br />

o concurso <strong>de</strong> variadissirnas circumstaiicias appareceu o rnau esta<strong>do</strong><br />

<strong>da</strong> fazen<strong>da</strong> publica; a reforma <strong>da</strong> circiimscripçiio ecclcsiastica e <strong>da</strong><br />

reducçáo <strong>da</strong>s dioceses foi objecto <strong>do</strong>s cui<strong>da</strong><strong>do</strong>s assiduos <strong>de</strong> quasi<br />

to<strong>do</strong>s os nossos miriistros <strong>do</strong>s negocios ecclesiasticos.<br />

em 1833 a jurita <strong>do</strong> exame <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> actual e mclhormento<br />

temporal <strong>da</strong>s or<strong>de</strong>ns religiosas propoz em corisulta a reducção <strong>da</strong>s<br />

dioccscs <strong>do</strong> reino a oito, uma diocese por provincia.<br />

Iriterrompi<strong>da</strong>s as rel~çòcs com a curia romana, apenas em 1843,<br />

<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> restabeleci<strong>da</strong>s, 6 que a Lei <strong>de</strong> 29 <strong>de</strong> maio, rio art. li.',<br />

auctorisou o governo a reduzir a 18, prece<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o indispensavel<br />

concurso <strong>da</strong> santa sé, as dioceses <strong>do</strong> coritiiieiite, illiiis adjacentes e<br />

ultramar; e no art. 9.' egualmeute lhe coiifere po<strong>de</strong>res para, em<br />

Iiarrnuiiia coiii a mesma sé, proce<strong>de</strong>r ao novo e mais acerta<strong>do</strong> arre<strong>do</strong>ii<strong>da</strong>mento<br />

<strong>da</strong> divisào territorial ecclesiastica.<br />

As dilticiil<strong>da</strong><strong>de</strong>s, que se levautararn erii as negociaçòes com a<br />

curia romaria, foram eutào a causa <strong>de</strong> se não po<strong>de</strong>rem executar<br />

estes artigos <strong>da</strong> lei <strong>de</strong> 1843.<br />

Cliega a epoclia <strong>de</strong> lW3, epocha iiotavel e gloriosa a muitos<br />

respeitos ria historia contemporanea <strong>do</strong> iiosso tempo; e Pio ir succe<strong>de</strong><br />

a Grcgorio xvi, captivaii<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong> liberal por seus primeiros<br />

actos iio i~oritifica<strong>do</strong>. Tentam-se novos erisaios <strong>de</strong> accor<strong>do</strong>,<br />

e obtem-se a firial o corivciiio <strong>de</strong> 21 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1848, e por elle<br />

o metropolita csçollic vigwios geraes que nos bispa<strong>do</strong>s dç Yorta-


legre, Aveiro, Pinhel c Castello-Branco regem interinamente, e<br />

em logar <strong>do</strong>s bispos, a diocese.<br />

Era isto sómente um esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> interini<strong>da</strong><strong>de</strong>, e em 18130 offere-<br />

ce-se um projecto em 28 <strong>de</strong> fevereiro, o qual náo chega a ser Iri.<br />

Tres annos <strong>de</strong>pois a Lei <strong>de</strong> 3 <strong>de</strong> agosto rcnova as auctorisações<br />

conferi<strong>da</strong>s ao goverrio pela lei <strong>de</strong> 1843, <strong>de</strong>claran<strong>do</strong> que fin<strong>da</strong>vam<br />

na legislatura <strong>de</strong> 1844, na qual o governo era obriga<strong>do</strong> a <strong>da</strong>r<br />

conta <strong>do</strong> uso que d'ellas fizesse.<br />

Depois <strong>de</strong> outro projecto apresenta<strong>do</strong> em 3 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 185'1,<br />

e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> se tractar <strong>da</strong> união <strong>do</strong> bispa<strong>do</strong> <strong>de</strong> Aveiro ao <strong>de</strong> Coiin-<br />

bra e <strong>do</strong> <strong>de</strong> Elvas a Portalegre, apparece finalmente o Decreto <strong>de</strong><br />

12 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1869, hoje em vigor.<br />

O ministro pon<strong>de</strong>rára a incoherencia <strong>da</strong> <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>na<strong>da</strong> divisão ter-<br />

ritorial ecclesiastica, pezára o esta<strong>do</strong> augustioso <strong>da</strong> fazen<strong>da</strong> publica<br />

que não permittia, em 16 bispa<strong>do</strong>s ,515 no continente, satisfazer, na<br />

medi<strong>da</strong> precisa a ca<strong>da</strong> um, a <strong>do</strong>tação necessaria á sustentação <strong>de</strong>-<br />

cente e vantajosa <strong>do</strong>s seminarios, <strong>do</strong>s cabi<strong>do</strong>s e fabrica <strong>da</strong> cnthe-<br />

dral; vira bem claro que assim náo lucrava a egreja, porqiie ncrn<br />

o episcopa<strong>do</strong> era mariti<strong>do</strong> na elevação e lustre <strong>de</strong> que carecia, iicbrri<br />

o crisirio mal organisa<strong>do</strong> <strong>do</strong>s seminarios seria porveitoso ; e que<br />

não podia, por outro la<strong>do</strong>, o esta<strong>do</strong> <strong>de</strong>ixar assim aban<strong>do</strong>na<strong>da</strong> a<br />

egreja a quem <strong>de</strong>via a rigorosa e plena <strong>do</strong>tação ; -consultou o<br />

exemplo <strong>da</strong>s nações estrangeiras catholicas e viu a gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>spro-<br />

porção que existia d'ellas para a nossa, sen<strong>do</strong> que s6 com relação á<br />

Belgica, Portugal tinha tres vezes mais bispa<strong>do</strong>s <strong>do</strong> que ella.<br />

Ao mesmo tempo o governo conhecia que, teri<strong>do</strong> <strong>de</strong> eritaboiar<br />

ricgociaçócs directamente com a se ;ipostolica, e que nác sen<strong>do</strong> pro-<br />

vavel obtel-as tão brcvcmente quanto era necessario, pois que riestc<br />

tempo se realisava ou pretendia realisar um systema mais ou mc.-<br />

nos completo <strong>de</strong> cconomias nos serviços piihlicos <strong>da</strong> admiriistra-<br />

qão civil e ecclesiastica; era conveniente, para cstc cff~ito, não<br />

prover certo numero <strong>de</strong> bispa<strong>do</strong>s, ci~ja siippressiío se 1)rol)unlia<br />

obter, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong>-se, sem crear noços iiitcresses, essas dioccses com<br />

um simples governa<strong>do</strong>r.<br />

Estcs foram cm geral os motivos, pelo menos apparentes, d'cste <strong>de</strong>-<br />

creto, que <strong>de</strong>terminou sómente prokcr os bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Arigra, Braga,<br />

Rragança, Coimbra, Evora, Faro, Funchal, Porto, Lisboa e Vizcu.'<br />

i Veja o relatorio que acompanha eete <strong>de</strong>creto.


«Não preten<strong>de</strong> o governo (dizia o relatorio que o acompanhou)<br />

com cste <strong>de</strong>creto, cujas disposições são puramente transitorias, re-<br />

duzir o numero <strong>da</strong>s dioceses, <strong>de</strong>terminar as que hão <strong>de</strong> ficar, ou<br />

ser supprimi<strong>da</strong>s, e assignar limites a ca<strong>da</strong> uma d'ellas.<br />

Exce<strong>de</strong>ria tal intorito os podcrcs que Ilie foram commetti<strong>do</strong>s.<br />

O governo acata e respeita profun<strong>da</strong>mente a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> santa<br />

sé, e apenas <strong>de</strong>seja com cste <strong>de</strong>creto fixar, emquanto se não pro-<br />

ce<strong>de</strong> á <strong>de</strong>finitiva divisão ecclc.siastica <strong>do</strong> reino, a incerteza que ora<br />

ha no prokimento <strong>do</strong>s bispiirlos que se faz ou <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> fazer se-<br />

griri<strong>do</strong> o livro alvcdrio <strong>do</strong>s dif'ferciitcs ministros, c facilitar a rea-<br />

lisação proxima <strong>de</strong> lima reforma ritil á evre'a e ao esta<strong>do</strong>, como<br />

r J<br />

roclnma<strong>da</strong> pelas justas instancias <strong>da</strong> opiniào publica.))<br />

O accor<strong>do</strong> com a SE Komaiia n3o Se effeituou ; e cste <strong>de</strong>creto,<br />

embora <strong>de</strong> um caracter traiisitorio, comtu<strong>do</strong> hoje em vigor, <strong>de</strong>ter-<br />

mina assim o esta<strong>do</strong> actual d'este grave assumpto, que os obsta-<br />

culos levanta<strong>do</strong>s na santa SE, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> tilüto tempo, tem impedi<strong>do</strong> d~<br />

resolver em proveito <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> c <strong>da</strong> propria egreja.<br />

Em 2 1 <strong>de</strong> maio <strong>do</strong> anno proximo fin<strong>do</strong> foi proposto em córtes<br />

um prqjpcto <strong>de</strong> lei sobre corporações e bens ecclesiasticos, muito<br />

notavel pela maneira por que rompe com os <strong>direitos</strong> até hoje re-<br />

corihtlci<strong>do</strong>s á santa se, emquanto a materias <strong>de</strong> circumscripção <strong>de</strong><br />

dioccscls c rrdiicc;io d'ellas.<br />

O distincto <strong>de</strong>piita<strong>do</strong> <strong>da</strong> nação, seu arictor, o Sr. Bernardino<br />

Pereira Pinheiro, olhan<strong>do</strong> a cprc.ja, jiiridicamcnte consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong> e para<br />

os fins <strong>de</strong> qiie tracta, como uma Iwsson moral, julp o csta<strong>do</strong> tão ir)-<br />

vesti<strong>do</strong> <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> supprimir lima mitra como <strong>do</strong> <strong>de</strong> extinguir um<br />

miinicipio ; e por isso, e penetra<strong>do</strong> <strong>do</strong> patriotico sentimento <strong>de</strong> ver<br />

acaba<strong>da</strong> uma questão que tantos males tem causa<strong>do</strong> ao nosso esta<strong>do</strong><br />

politico e financeiro ; e, por outro la<strong>do</strong>, persuadi<strong>do</strong> <strong>da</strong> impossibi-<br />

li<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> tractar com a se romana a este respeito com algum re-<br />

sulta<strong>do</strong>, como o tem mostra<strong>do</strong> a experiencia, e priiicipalmente por-<br />

que os nossos governos são ephemeros; propòe que, não só se pre-<br />

diizn o numero <strong>da</strong>s dioceses, mas que a reducçho feita pelo esta<strong>do</strong> I<br />

tenha força legislatira, encorporan<strong>do</strong>, apenas vaguem as respe-<br />

ctivas mitras, nos proprios niicionaes os bcns <strong>da</strong>s que <strong>de</strong>vem ser<br />

extiiictas; propõe mais que se <strong>de</strong>spoje a sé <strong>de</strong> Lisboa <strong>do</strong> titulo<br />

puramerite horiorifico <strong>de</strong> patriarchal, <strong>de</strong> qucl usa, sem proveito para<br />

a egreja nem para o esta<strong>do</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o tempo <strong>da</strong> dictadura <strong>de</strong> D. Pedro,<br />

<strong>de</strong>sejan<strong>do</strong> antes ter a se metropolita <strong>de</strong> Li~boa remonta<strong>da</strong> h


era em que D. João I arvorava, cheio <strong>de</strong> gloria, o pen<strong>da</strong>0 portu-<br />

guez, <strong>do</strong> que coritemplal-a, recor<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-lhe as prodigali<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

um monarcha ohscuro, mais amigo <strong>do</strong> fausto <strong>do</strong> que <strong>da</strong> patria.<br />

& a primeira vez que <strong>de</strong> frente se attaca o direito <strong>da</strong> Se apos-<br />

tolica; mas isto, qur nem no tempo <strong>da</strong>s celebres theorias <strong>do</strong> Summo<br />

Imperio se tinha afirma<strong>do</strong>, 6 agora drfendi<strong>do</strong> por um principio<br />

philosophiro, que o seu autor acha incoiitcstii\el, qiial 6 o <strong>do</strong> di-<br />

reito que tem a socictla<strong>de</strong> <strong>de</strong> rtbgular o nio<strong>do</strong> <strong>de</strong> ser e as coiidjqbes<br />

mesmas <strong>da</strong> existcricia <strong>do</strong>s institutos, que s6 em a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> civil<br />

assrntiim o seti titulo juridico.<br />

fi o ciipitulo seguinte <strong>de</strong>stina<strong>do</strong> a apreciar este projecto e aquelle<br />

I lccreto <strong>de</strong> 2 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1 869.


CAPITULO 1V<br />

A Religião <strong>do</strong> Reino<br />

O artigo 6.0 <strong>da</strong> Carta: sua obscura re<strong>da</strong>cgío e duvi<strong>da</strong>s a que di lagar.-Estu<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-o<br />

qusnto ao nosso objecto, o que nos diz o elemento historieo <strong>da</strong> iiiterpretaeào. -<br />

Origem <strong>da</strong>s tbeorias <strong>da</strong> religiso <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>. - Em que circumstancias foi elabora<strong>do</strong><br />

este artigo. - É uma pura tiaosacc~o com o passa<strong>do</strong>.- Em que termos se fez essa<br />

IrancaccAo? - Estilo ern vigor as (oiitrinas <strong>da</strong> inspeccao e protercilo supremas?-<br />

Esta<strong>do</strong> 'geral <strong>do</strong> direito publico eeclesia~iico sob o impirio <strong>do</strong> iegimin liberal.-Senli<strong>do</strong><br />

unico po~sivel tlorartigo 6.' tla C,~rta, <strong>de</strong>baixo <strong>da</strong>s novas idkas. - <strong>Direito</strong> <strong>do</strong><br />

eslatlo ii intervir, nas cri!acOer, siipprrsúes tle bispa<strong>do</strong>s e nas divisOes eczlesirsticrs<br />

<strong>de</strong> lerritorio. - A egr~jii compele só o direito <strong>de</strong> diepOr <strong>de</strong>finitivamente d'estas cousas.<br />

- USO <strong>do</strong> brneplacito a este respeito.- O <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 19 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1869 e<br />

o projecto <strong>de</strong> lei <strong>de</strong> 27 <strong>de</strong> meio <strong>de</strong> 1871 perante o direito ecclesiastico portuguez.<br />

A quem está acostuma<strong>do</strong> a pensar, com to<strong>da</strong>s as forças gran-<br />

<strong>de</strong>mente livres <strong>do</strong> seu espirito, 'nestes graves assumptos <strong>do</strong> prin-<br />

cipio religioso <strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, no <strong>de</strong>stino <strong>da</strong>s religiões e <strong>do</strong>s cultos;<br />

a quem accrescenta ao seu cogitar as meditações <strong>do</strong>s altos pensa-<br />

<strong>do</strong>res, que a imprerisa nos facilita nas paginas d'essas obras que<br />

centuplicam as facul<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> intellectual, communican<strong>do</strong>-nos<br />

o seu vivo calor; o tractar <strong>de</strong> uma religião <strong>do</strong> reino, <strong>da</strong>s liber<strong>da</strong>-<br />

<strong>de</strong>s <strong>de</strong> uma egreja, <strong>da</strong>s prerogativas <strong>da</strong> cor<strong>da</strong> e <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> mages-<br />

taticos, affigura-se-lhe como o dissecar <strong>de</strong> um ca<strong>da</strong>ver; e por um<br />

instante parece-lhe que o discutir este breve pontificio ou aquella<br />

bulln <strong>da</strong> santa Sé, é gastar inutilmente o tempo, tno preciso hoje<br />

para o estu<strong>do</strong> <strong>de</strong> outras questões.<br />

E, com quanto haja realmente alguma cousa como d'esse dis-<br />

secar, comtu<strong>do</strong> é indipensavel fazel-o.<br />

E snbeis porque?<br />

Porque a nossa lei fun<strong>da</strong>mental, o fecho <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a aboba<strong>da</strong> po-<br />

litica <strong>da</strong> nossa socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, tem entre as suas disposições, uma que<br />

falla assim:<br />

a Art. 6.O - A religião Catholica Apostolica Romana continuara a ser<br />

a Religião <strong>do</strong> Reino. .. »


Continuará a ser, notemos bem, continuará a ser a religiao <strong>do</strong><br />

reino, diz esta lei.<br />

I? a prrpetuaq'io <strong>da</strong> theoria <strong>do</strong> summo imperio, <strong>da</strong> protec90 e<br />

inspecção, que este artigo consagra e implanta no meio <strong>da</strong>s novas<br />

instituiçks nasci<strong>da</strong>s <strong>do</strong> direito <strong>do</strong>s povos, e juncto <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r real<br />

<strong>de</strong>spoja<strong>do</strong> <strong>da</strong> origem di~ina, ao pe <strong>do</strong>s reis, não jh summos imperantes,<br />

nias primeiros magistratlos <strong>da</strong> naçiio ?<br />

E como esta, qtiantas questões riao involve aquelle ce11.bre artigo<br />

6." <strong>da</strong> Carta constitucional <strong>de</strong> 18261<br />

Será mcsmo difficil encontrar em to<strong>da</strong> a nossa lrgislaqão politicti<br />

e civil um oiitro artigo, que tenha <strong>da</strong><strong>do</strong> logar a tantiis intcrpretncões<br />

differentcs e encontra<strong>do</strong>s pareceres. A siia re<strong>da</strong>cçao foi<br />

tiio leviaiia, qiic ha mesmo ncllc o que quer que se,ja <strong>de</strong> absolutamente<br />

iricomprcheiisivcl; qiie i' o que acontece com to<strong>da</strong>s as leis, em<br />

que, como nesta, o legisla<strong>do</strong>r escreve certos principios genericos<br />

sem uma idéa ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iramente precisa c clíirn <strong>do</strong> seu iilcancc, mas<br />

ohclcceri<strong>do</strong> s6 a um echo vago que lhe sôa imperioso na mente, a<br />

uma rccor<strong>da</strong>ç30 <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> ou a um prejuizo bebi<strong>do</strong> no mc4o nri<strong>de</strong><br />

sc vive c pensa.<br />

Estu<strong>de</strong>mol-o pois, s6 quanto ao nosso oh.j~cto.<br />

Não <strong>de</strong>vemos usar na interpretação d'estc artigo <strong>do</strong> elemento<br />

philosopliico <strong>de</strong> hermeneuticn; porque, qiian<strong>do</strong> perguntamos, Iini'ii<br />

<strong>de</strong>scobrir a compwhensão d'ellc, o que signifiram. qual o nlcarico<br />

<strong>da</strong>s cxprcssòes-religião <strong>do</strong> reino,-esse elemento é complctamentc<br />

mu<strong>do</strong> e na<strong>da</strong> nos sabe respon<strong>de</strong>r.<br />

A philosophia diz-nos, explica-nos o que 4, o que po<strong>de</strong> sclr a<br />

religião <strong>de</strong> um individuo; ella na0 nos po<strong>de</strong>, porem, fiii.er bcr qiinl<br />

a essrricia e as quali<strong>da</strong><strong>de</strong>s d'isso a que chamam religiso <strong>do</strong> reino,<br />

ou <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>.<br />

l? ao elemento historico que <strong>de</strong>vemos primeiro recorrer; n8o<br />

philosophemos; procuremos saber o que foi, como religião <strong>do</strong> reino,<br />

antes <strong>da</strong> Carta, a religiiío catholica npostolica romaria.<br />

A luz <strong>do</strong>s principios <strong>de</strong> certas escholas uma socie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> atheos<br />

6 lima cousa impossivel: a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> ha <strong>de</strong> ter uma religiao e um<br />

culto; á liiz d'estes mesmos principios as rcligi6c.s h30 <strong>de</strong> ter irma<br />

origem immediatamente divina, iim organismo <strong>de</strong> <strong>do</strong>gmas, iima<br />

revelação sobrenatural. A consequcnrin 1c.m rapi<strong>da</strong> : esta religião<br />

ha <strong>de</strong> ser a unica ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira. Que os homcns, nas meditaç6es <strong>de</strong><br />

seus genios differentes, na dispari<strong>da</strong><strong>de</strong> dc seus costumes e raças,


tenham concebi<strong>do</strong> uma idéa <strong>de</strong> Deus, diversa nas varia<strong>da</strong>s regibes<br />

<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> e ria success80 <strong>do</strong>s tempos, e estabeleci<strong>do</strong> crrcmonias <strong>de</strong><br />

culto tambem <strong>de</strong>seguaes em suas solemnidii<strong>de</strong>s e ritos, sem que<br />

com isto se altere, se discor<strong>de</strong> lia idéa primeira <strong>de</strong> Deus, que o<br />

instincto religioso faz brotar na consciencia <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s, k o que não<br />

comprehcn<strong>de</strong>m essas escolas.<br />

A segun<strong>da</strong> illação não se faz esperar: é a intolerancia.<br />

Emquanto as cousas se conservam neste esta<strong>do</strong> a religiao existe<br />

só <strong>de</strong> envolta com a sripersti~ão rias clas~es ignorantes; as outras,<br />

indifferentcs e hypocritas, fingem-se religiosas, v&em na religiáo um<br />

freio ás revoluções, um tempero á moral.<br />

Esta id6a <strong>de</strong> uma religião unica ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira; a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

ser intolcrantc quan<strong>do</strong> assim concebi<strong>da</strong>; o systema dc a fazer instrumento<br />

<strong>de</strong> edificação moral ; trouxeram insensivelmente a protccçáo<br />

<strong>do</strong> po<strong>de</strong>r publico <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong>; e <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s estes erros nasceu<br />

um outro, confuso, mixto <strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, questão <strong>de</strong> polavras e<br />

dc forma com <strong>direitos</strong> effectivos e reaes á existencia substancial e<br />

objectiva-a religiao <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>, a religiáo <strong>do</strong> reino.<br />

Esta protecçao, esta uniõo <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> e <strong>da</strong> egryja triumphante,<br />

tem passa<strong>do</strong> por varias phascs. Primeiro, nas religiões <strong>de</strong> culto ap- ,<br />

paratoso e larga disciplina extrrna, o rstii<strong>do</strong>, o imptarante, o po<strong>de</strong>r<br />

p~d~lico, presta o seu auxilio, a sua forca coercitiva, e essas reli-<br />

giõcs peccam pela flagrante contradicrÃo <strong>de</strong> se dizerem priva<strong>da</strong>s<br />

cm rssencia dc força coercitiva, e exigirem-na e consentirem-na<br />

como essencial, embora empresta<strong>da</strong>.<br />

Depois, ha um ~erio<strong>do</strong> com que as ambi~ões <strong>do</strong>s podcrcs <strong>da</strong><br />

egreja, invejan<strong>do</strong> os thesouros <strong>da</strong> temporali<strong>da</strong><strong>de</strong>, ameaçam os po-<br />

<strong>de</strong>res <strong>do</strong>s esta<strong>do</strong>s. A conscirncia revolta-se.<br />

O esta<strong>do</strong> cerca-se <strong>de</strong> garantias. A protecyõo juncta-se a inspecçáo<br />

siiprcma por parte <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>. a a segun<strong>da</strong> phasc <strong>da</strong>s religiões (10<br />

esta<strong>do</strong>, phase em que realmente esta itlPa toma certo vulto palpa-<br />

vcl, porquc 6 agora que o esta<strong>do</strong> tem uma religigo a que presi<strong>de</strong><br />

pelos seus magistra<strong>do</strong>s.<br />

Na Inglaterra, qiian<strong>do</strong> chegou este momcnto, levou-se o abs~ir<strong>do</strong><br />

as iiitimas consequencias, e como <strong>de</strong>positario dí. to<strong>da</strong>s as sobera-<br />

nias, o rei foi o chefe espiritual <strong>da</strong> cgre,ja anglicana; nos outros<br />

paizes, o sorites ficou em meio, e ningurm se atreveu a tocar<br />

ria ultima illação. Alli a idéa dc egrejn <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> 6 philosophica-<br />

mente falsa, como por to<strong>da</strong> a parte, mas positivamente ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira;


aqui, a idéa está como aquellas figuras <strong>de</strong> mulheres, que Ovidio 110s<br />

pinta nas metamorphoses, começan<strong>do</strong> <strong>de</strong> se transformar em aves,<br />

com os braços feitos em azas, os cabellos a tornarem-se pennas.<br />

E, comtu<strong>do</strong>, notcmos bem, é isto, 6 s6 isto, que dá corpo á<br />

idéa <strong>de</strong> uma religião <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>.<br />

Os reis são, como Constantino, os bispos externos, episeopi re-<br />

rum externarum; os <strong>de</strong>fensores <strong>do</strong>s canones, os inimigos <strong>da</strong>s he-<br />

resias.<br />

Con<strong>de</strong>mna<strong>do</strong> pelas idéas novas, mas vivo na legislação e accctso<br />

nos <strong>de</strong>sejos <strong>da</strong> velha seita absolutista, este esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> cousan impe-<br />

rava ao tempo <strong>da</strong> nossa primeira Constituição politica.<br />

Por on<strong>de</strong> se avalia o nivel intellectual <strong>de</strong> um povo na actuali-<br />

<strong>da</strong><strong>de</strong> é pclo <strong>de</strong>sprendimento, nõo <strong>da</strong> id6a livre e vigorosa <strong>do</strong> prin-<br />

cipio religioso, mas <strong>da</strong> id6a autoritaria e intolerante <strong>de</strong> religião.<br />

Portugal, neste momento, força é confessal-o, estava mui prezo o<br />

esta segun<strong>da</strong> idéa; as Constituições politicas não po<strong>de</strong>ram romper<br />

com o passa<strong>do</strong> nestes abusos <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, e viram-se obriga<strong>da</strong>s a<br />

transigir.<br />

O art. 6.' <strong>da</strong> Carta é, pois, uma pura transacção com o cs-<br />

ta<strong>do</strong> atraza<strong>do</strong> <strong>da</strong> opinião quanto a idéas religiosas: assim o enten-<br />

<strong>de</strong>mos sempre, e nunca <strong>de</strong>paramos com o <strong>de</strong>smenti<strong>do</strong> d'este pen-<br />

samento.<br />

Mas em que termos se fez essa transacção? quaes os <strong>direitos</strong><br />

que se cedCram ? quaes os que se fizeram reconhecer ?<br />

Este o ponto difficil.<br />

Ao primeiro lance <strong>de</strong> olhos, as expressóes <strong>do</strong> artigo - conti-<br />

nuará a ser a religião <strong>do</strong> reino - lembram que a Carta rcvali-<br />

<strong>da</strong>sse e confirmasse inteiramente a <strong>do</strong>utrina <strong>da</strong> inspecção e pro-<br />

tecção suprema <strong>da</strong>s leis josephinas.<br />

Effectivamente, se a religião catholica continúa a ser a religiáo<br />

<strong>do</strong> reino; se o que dá corpo a uma religiao <strong>do</strong> reino são estes di-<br />

reitos e <strong>de</strong>veres <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> para com ella; parece que essa theoria<br />

tem passa<strong>do</strong> to<strong>da</strong> <strong>da</strong>s mãos <strong>do</strong>s monarchas para o po<strong>de</strong>r executivo.<br />

Nem isto ao primeiro aspecto repugna com o espirito <strong>da</strong> Carta,<br />

porque 6 <strong>de</strong> ver, que sobre to<strong>da</strong>s as outras foi a religiâo catholica<br />

por ella consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong> especialmente, e em publico se não reconhece<br />

nem permitte outra alguma ; alem <strong>de</strong> que, se nestes <strong>direitos</strong> inspe-<br />

ctivos d'essa <strong>do</strong>utrina vae a <strong>de</strong>fesa legitima <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> <strong>da</strong> sobe-<br />

rania temporal contra as ambiciosas prctenyfies <strong>da</strong> Se romana; a


mesma idéa <strong>de</strong> se acautelar contra esses abusos se v6 bem distincta<br />

no $ 1 C <strong>do</strong> art. 75, on<strong>de</strong> se restabelece o beneplacito regio;<br />

e no 2.' on<strong>de</strong> expressamente se exara <strong>de</strong> novo o incontestavel<br />

direito <strong>de</strong> apresentação nos heneficios ecclesiasticos, <strong>de</strong> padroa<strong>do</strong><br />

real na egreja portugueza.<br />

E qiie n Carta tem si<strong>do</strong> sempre assim entendi<strong>da</strong>, prova-o o facto<br />

<strong>de</strong> ain<strong>da</strong> ninguem ter posto em duvi<strong>da</strong> a obrigação que peza sobre<br />

o esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>do</strong>tar o clero, quan<strong>do</strong> nRo ha artigo nenhum nella que<br />

d'isso fale, e mui em contrario o art. 145, garantin<strong>do</strong> os succorros<br />

publicos, a instrucção primaria, a nobreza hereditaria e os collegios<br />

e universi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, não garante a <strong>do</strong>tacão <strong>da</strong> egreja ; e, <strong>de</strong>claran<strong>do</strong> em<br />

seus paragraphos a obrigação que to<strong>do</strong>s têm <strong>de</strong> concorrer para<br />

as <strong>de</strong>spezas publicas, comprehen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> assim os que seguirem outra<br />

religião, ao mesmo tempo assenta como principio fun<strong>da</strong>mental a<br />

egual<strong>da</strong><strong>de</strong> perante a lei.<br />

Não foi s6 portanto no legisla<strong>do</strong>r que influiram as velhas idkas :<br />

ellas tCm-se imposto ain<strong>da</strong> hoje sobre n6s, que acceitamos o peza<strong>do</strong><br />

e <strong>de</strong>sigual encargo <strong>da</strong> <strong>do</strong>tação <strong>do</strong> clero, sem que artigo algum<br />

<strong>da</strong> Carta expressamente o imponha, h excepção <strong>do</strong> artigo 6.',<br />

que é obscuro e se po<strong>de</strong> a<strong>da</strong>ptar a qualquer opinião.<br />

Não nos <strong>de</strong>moremos mais um instante em dizel-o:-as theurias<br />

<strong>da</strong> protecçáo e inspecção suprema não esta0 hoje em vigor pela<br />

Carta ; não po<strong>de</strong>m estar; não <strong>de</strong>vem estar.<br />

Não estão em vigor pela Carta, porque o po<strong>de</strong>r real pela Carta<br />

não é o po<strong>de</strong>r immediato, o po<strong>de</strong>r real pleno e supremo, o summo<br />

imperio ; o rei não é o summo imperante, não 6 o Augusro <strong>do</strong>s<br />

aulicos escriptores <strong>do</strong> seculo xvi~r ;-ao rei, como <strong>de</strong>positario <strong>do</strong><br />

po<strong>de</strong>r mo<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>r, s6 lhe cabem as nttribuiç6es <strong>do</strong> artigo 74 ; como<br />

chefe <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r executivo, não lhe competem nem esses officios, nem<br />

esses pe<strong>da</strong>ntescos <strong>direitos</strong> <strong>de</strong> protector <strong>do</strong>s canones, <strong>de</strong>fensor e advoga<strong>do</strong><br />

<strong>da</strong> egreja, e peleja<strong>do</strong>r <strong>de</strong> heresias; pela Carta o po<strong>de</strong>r<br />

executivo s6 tcm as attribiiiçòes que ahi lhe vemos <strong>de</strong>scriptas e<br />

assipna<strong>da</strong>s no art. 75, e entre ellas niío se <strong>de</strong>scobre a heroica theoria<br />

<strong>de</strong> protecção e inspecção suprema.<br />

Niio po<strong>de</strong>m &ar em vigor pela Carta, porque a Carta garante<br />

a liher<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> consciencin, o culto particular <strong>de</strong> outras religiões;<br />

dcixa aos proprios portii~uezcs, '-. sem consequencias algumas juridicas,<br />

o segiiircm outra religião differente <strong>da</strong> catholica, embora uma<br />

seita, acanha<strong>da</strong> no seu raciocinar, tenha pretendi<strong>do</strong> sustentar a<br />

-


opinião adversa 1; e sen<strong>do</strong> assim, não podia a mesma Carta, em sua<br />

mente, consentir a perseguição <strong>da</strong>s heresias em <strong>de</strong>feza <strong>da</strong> egreja e<br />

contra os <strong>direitos</strong> <strong>do</strong>s ci<strong>da</strong>dãos que prometteu guar<strong>da</strong>r;-pela Carta<br />

não po<strong>de</strong>m estar em vigor essas riziveis theorias; porque a Carta,<br />

se <strong>de</strong>clara a religião catholica religiao <strong>do</strong> reino, ha <strong>de</strong> protegel-a,<br />

ha <strong>de</strong> reverenciar a sua liber<strong>da</strong><strong>de</strong> e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia soberana, e não<br />

po<strong>de</strong>, sem justo titulo, promover o restabelecimento <strong>da</strong> antiga c<br />

funtlamental ,disciplina, qi~ari<strong>do</strong> ;i rgreja a não cstiibelcccr para si;<br />

isto só porque ao esta<strong>do</strong> pertcnce a siimma inspccqao.<br />

Nào <strong>de</strong>rem estar em vigor, porque scria rcsirscitur, no mc~io <strong>da</strong><br />

nova epoca <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, as tlieorias josephiiias, que representaram<br />

o seu papel iia historia, mas que hoje niiiguem <strong>de</strong> srntimentos patrioticos<br />

e liberaes, querer8 sem duvi<strong>da</strong> ver reedificar iio seio <strong>da</strong><br />

1 Tem.se espalha<strong>do</strong> a<strong>do</strong>iitrina <strong>de</strong> que nenhum portuguez em face <strong>da</strong> Carta<br />

po<strong>de</strong> seguir outra ieligião que 1120 seja a catholica, ciii<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-se meqmo que<br />

se não po<strong>de</strong>m exercer cargos publicos erm o? attesta<strong>do</strong>s ?os parochos. qiiaiito<br />

ao assi(luo cumprimeuto <strong>do</strong>s <strong>de</strong>veres &e fiel catliolieo. E este um a11u o intoleravel<br />

e uma interpretação ahsui<strong>da</strong>.<br />

A duvi<strong>da</strong> provem <strong>da</strong>s palarras seguintes <strong>do</strong> art. 6.0 <strong>da</strong> Carta- Todus as<br />

outras religu'0es, diz, srrüo pcrmifti<strong>da</strong>s aos estrangeiros com seu culto dmnrstico,<br />

ou particular, em casas para isso <strong>de</strong>stiica<strong>da</strong>s, sem fórma ulgt~ma exterior<br />

<strong>do</strong> templo.<br />

Dizem d'aqui à contrario que aos portuguezes niio sBo permitti<strong>da</strong>s as outras<br />

rrligi0~s.<br />

Piiinriraincnte, esta disposiç80, se assim se <strong>de</strong>vesse enten<strong>de</strong>r, era digna <strong>do</strong>a<br />

trrnpos <strong>de</strong> c arlos ix, e inteirsmentc louca, por ser impossivel piohibir a qi~alquer<br />

portiiguee seguir no fun<strong>do</strong> <strong>da</strong> siia consciencia outra religiUo c ter lia<br />

iiiriolnhili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> sua habitação um logar para o culto exterior; a iiao 6c.r<br />

que o icgibia<strong>do</strong>r tivesse a mente eiirgreci<strong>da</strong> pelos plarios <strong>de</strong> algiirna Sairit-<br />

I3aillielemy permanente. Depois, os artigos subseqiieiites <strong>da</strong> ('arta <strong>de</strong>sinriitcin<br />

cahalmeiite isto que <strong>de</strong> pua m4 re<strong>da</strong>cçiio se parece <strong>de</strong>duzir.<br />

O ai tigo 7,s 4.0, falan<strong>do</strong> <strong>do</strong>s estrangeiios naturalisa<strong>do</strong>s, qualquer que seja<br />

a sua religião, como ci<strong>da</strong>dãos portiigiirzrs os reputa ; logo, supp0e e admitte<br />

a possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> portuguczes iiâo catholicos; a nào ser que iio acto <strong>de</strong> natnralisaçRo<br />

se exija a apostaaia.<br />

O artigo 145, <strong>de</strong>screveii<strong>do</strong> as qarantias <strong>da</strong> inviolabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> civis<br />

e politicos <strong>do</strong>s ci<strong>da</strong>diios portugiieze+. dctrrrniiin no § 4.' qiie iiii~guem (quer<br />

dizer iieiihiirn cirkldfioportu~q~r~z~ pwsa ser persegui<strong>do</strong> por icioti\,os <strong>de</strong> religilo,<br />

iiriiri rez ~ I Tirspeite C a tio E':stl<strong>do</strong> e nio offrii<strong>da</strong> a moral piihlica.<br />

O $ 13 <strong>do</strong> rncsino rii tigo 11.1 diz qiie to<strong>do</strong> o ci<strong>da</strong>dho poi tugnez (logo o ne<br />

turalisa<strong>do</strong>, corn a exct~p2o <strong>do</strong> ai tipo 106 e o jii<strong>de</strong>ri,omussulrnaiin, oprotrstante,<br />

o atlieo, etc.) po<strong>de</strong> ser adrriittitlo aos cnr~os piiblicos e civiu, politicos ou<br />

militares, sem outra diffrreiiça qiie nio scja :I <strong>de</strong> seus talentos e virtu<strong>de</strong>s.<br />

A lrgislaç80 penal recoiihece esta mesina ver<strong>da</strong><strong>de</strong> e assini iiiterpreta a<br />

Carta, pois diz o Codigo no artigo 135:-To<strong>do</strong> o prtuguez que, professan<strong>do</strong><br />

a rdi9zao <strong>do</strong> reino, faitar ... i


sua terra. Olhae para essas leis que fun<strong>da</strong>mentam to<strong>do</strong> o <strong>de</strong>sinvol-<br />

iimerito <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> magestaticos, to<strong>do</strong>s esses vestigios clc sobcrha<br />

<strong>da</strong> rnonarchia, e que te<strong>de</strong>s nellas? as <strong>da</strong>tas <strong>de</strong> 1700, to<strong>da</strong>s <strong>do</strong><br />

seciilo xvrii,.que iridicarn :7 a sua origem e a sua con<strong>de</strong>mna~fio.<br />

,4 sobcrariiil <strong>de</strong> Portugal iiào precis,i d'essns theorias que só re-<br />

velam rima fraqueza, ou <strong>de</strong>scobrem um <strong>de</strong>upoti~mo.<br />

Nem para que o artigo 6." tenha um senti<strong>do</strong> importa siistcntal-as.<br />

Não po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> admittir-se o vigor d'cssas idbas sob o imperio <strong>do</strong><br />

regimen liberal <strong>da</strong> Carta, <strong>de</strong>ve enten<strong>de</strong>r-se <strong>da</strong> maneira seguinte<br />

o esta<strong>do</strong> recente <strong>do</strong> direito ecclcsiastico portuguez <strong>de</strong>pois d'elle.<br />

A egreja portugiieza continúa a existir; neni que a Carta tivesse<br />

<strong>de</strong>clara<strong>do</strong> a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> e inteira separaçBo <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> e d'clla, ella<br />

<strong>de</strong>ixaria <strong>de</strong> existir; quanto mais ten<strong>do</strong>-sc esçripto o art. 6.'<br />

To<strong>da</strong>s as suas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s permanecem, quan<strong>do</strong> se ajustem com<br />

a id6a liberal e sejam compativeis com o actual regimeli.<br />

Não 6 sn a It>ttra expressa <strong>da</strong>s leis que revoga antecedcnt6.s pro-<br />

visfics, P tnmbcm o espirits <strong>de</strong> legislação, quan<strong>do</strong> ellc se inverte<br />

sob o irilliixo <strong>de</strong> uma profuri<strong>da</strong> revolução na coiistituic;8o politica<br />

<strong>da</strong> socie<strong>da</strong>cle.<br />

E assim que, por exemplo, se conservaram os <strong>direitos</strong> <strong>do</strong> pii-<br />

droa<strong>do</strong> real.<br />

O artigo 6.O, consagran<strong>do</strong> a maxima <strong>de</strong> que a religião ca-<br />

tholica coritinúa a ser religião <strong>do</strong> reiiio, conserva aperta<strong>da</strong>s as re-<br />

Iaçòes <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> portuguez e <strong>da</strong> egreja portugueza, impon<strong>do</strong> a<br />

este to<strong>da</strong>sas obrigaçòes e <strong>direitos</strong> compativeis com a nova or<strong>de</strong>m<br />

dc cousas; e por isso <strong>de</strong> firma nenhuma lhe po<strong>de</strong> conferir a sri-<br />

prema inspecção.<br />

Estas relaçòes, estes <strong>direitos</strong> e obrigações, que involvrm real-<br />

mente uma protecção, portm em outro seriti<strong>do</strong> <strong>da</strong> velha protecção<br />

<strong>do</strong> summo imperio, po<strong>de</strong>m resumir-se nas seguintes preceitos:<br />

O esta<strong>do</strong> fornece as condi~$es <strong>de</strong> ti<strong>da</strong> h egreja, <strong>da</strong>n<strong>do</strong>-lhe os<br />

ternplos, e a <strong>do</strong>tação <strong>do</strong>s seus ministros; <strong>de</strong>w preparar-lhe o meio<br />

<strong>de</strong> 1it)er<strong>da</strong>dc on<strong>de</strong> possa <strong>de</strong>sirivolver-se cm to<strong>do</strong> o seu vigor e qrga-<br />

nisar-se sem embaraço ou obstaciilo algum polilico -procurar-lhe<br />

o respeito publico e o primeiro logar t~iitre as outras ieligibes-<br />

acatar as liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja portugueza , ,porque essas sào as<br />

coridiçòes proprias <strong>da</strong> existencia individual d esta cgrejil.<br />

Que tu<strong>do</strong> isto seja perigoso, que seja inconieiiieritr, são outras<br />

questões ; a protecção <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> It egreja, qiic só po<strong>de</strong> <strong>da</strong>r corpo


e senti<strong>do</strong> á instituiçáo que se chama religiâo <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>,flnão po<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> se eriteii<strong>de</strong>r assim sob o imperio <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Outra cousa 6 indigna <strong>de</strong> um esta<strong>do</strong> livre e dissonante <strong>do</strong>s primeiros<br />

elementos <strong>da</strong> rioba coristituição social.<br />

Assim postos estes priricipios, vtljamos agora qual o ultimo esta<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> direito ecclesiastico portuguez quarito ao objecto particular que<br />

estu<strong>da</strong>mos aqui.<br />

Os <strong>do</strong>is capitulos antece<strong>de</strong>ntes provavam o direito que o esta<strong>do</strong><br />

portuguez tivera sempre <strong>de</strong> intervir na creaçiio <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, alterações<br />

<strong>da</strong> circumscripção ecclesiastica, <strong>de</strong>ven<strong>do</strong> sempre ser coiisulta<strong>do</strong>,<br />

po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> sollicitar cstes negocios directamente, mas nao possuin<strong>do</strong><br />

o privilegio <strong>de</strong> erigir <strong>de</strong> novo os bispa<strong>do</strong>s, ou supprimil-os,<br />

sem a aiictori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> Se apostolica.<br />

Isto mesmo Ilic compete hoje <strong>de</strong>pois <strong>da</strong> Carta.<br />

I'rimeiro, porque, como vimos, era essa uma liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> nossa<br />

cgrtbja, que nunca os factos <strong>de</strong>smentiram, que o berieplacito regio<br />

sem1)re subentendia e que as bulias, sempre confessaram attenciosas;<br />

e em aeuun<strong>do</strong> logar por uma raztio, que o novo esta<strong>do</strong> poli-<br />

9<br />

tico <strong>da</strong>s relaçoes religiosas <strong>do</strong>s portuguczes fez nascer.<br />

Iloje o facto <strong>da</strong> creação <strong>de</strong> um bispa<strong>do</strong> po<strong>de</strong> involver grave<br />

responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> para o governo que a coriseritir scin umii gran<strong>de</strong><br />

neccssitla<strong>de</strong> ; porque, requereii<strong>do</strong> um augmento <strong>de</strong> <strong>de</strong>speza, qual<br />

a <strong>da</strong> <strong>do</strong>taçào <strong>da</strong> mitra, cabi<strong>do</strong>, fabrica <strong>da</strong> cathedral e semiriario<br />

respectivo, esta <strong>de</strong>speza vae recahir tambem sobre to<strong>do</strong>s os que<br />

seguem uma outra religião e, que sem garantias para o livre culto<br />

<strong>da</strong> sua, concorrem para a <strong>do</strong>s outros.<br />

O governo, imparcial julga<strong>do</strong>r d'estcs negocios, <strong>de</strong>fensor <strong>da</strong> egual<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>da</strong> lei e <strong>da</strong> constituiçlo, não po<strong>de</strong>, não <strong>de</strong>tc em certos casos,<br />

consentir ria creaçóo <strong>de</strong> novos bispa<strong>do</strong>s; po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve pelo contrario<br />

excitar a sua reducçào; e sobretu<strong>do</strong> exigir que facto nenhum<br />

d'estes se passe sem audiencia e corili~c' irnelito seu.<br />

A egrqa riáo po<strong>de</strong>, riem <strong>de</strong>ve queixar-se d'cstas pretensbes, porque<br />

6 ella que acccita e quer ri uriiào e protecção <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>; e a<br />

uri:ào e protecção <strong>do</strong> esla<strong>do</strong>, sob a kigericia <strong>da</strong> lei liberal politica,<br />

nào po<strong>de</strong> interi<strong>de</strong>r-se dc outra forma.<br />

Quanto ás uniões, e ditisòes <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s e nova circumscripção,<br />

alem <strong>do</strong> direito estabeleci<strong>do</strong> pelo costirme constante e incontcsta<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> os primeiros tempos <strong>de</strong> Portugal, uccresce a mesma razâo <strong>de</strong><br />

ser objecto em que vae implica<strong>do</strong> o temporal pela <strong>do</strong>tação que tem


<strong>de</strong> prestar e egualmente pelos <strong>da</strong><strong>do</strong>s e esclarecimentos que po<strong>de</strong><br />

fornecer a respeito <strong>da</strong> utili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s reformas, numero <strong>de</strong> paro-<br />

chias, população, se<strong>de</strong>s <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s, e outras,<br />

Sobretu<strong>do</strong>, porem, o esta<strong>do</strong> <strong>de</strong>te respeitar a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> se<br />

apostolica, que é pelas leis <strong>da</strong> egreja, nào <strong>de</strong>roga<strong>da</strong>s 'nesta parte<br />

pelo direito portuguez, aquella a quern compete o direito <strong>de</strong> dispor<br />

d'estas cousas: tota rei istius disponen<strong>da</strong>e raiio ad Ecclesiarn per-<br />

tinct, como escrevia no seculo wri o celebre Pedro <strong>de</strong> Marca.<br />

Desconhecer este direito á egreja, seria náo proteger a egrejii<br />

por um governo livre, mas mentir essa protecçâo, falseal-a com o<br />

<strong>de</strong>spotismo; seria uma traiç8o.<br />

O esta<strong>do</strong> tem um meio <strong>de</strong> <strong>de</strong>feza, que 6 o bencplacio; mas o<br />

beneplacito, nega<strong>do</strong> a uma bulla <strong>de</strong> erecçáo <strong>de</strong> um novo bispa<strong>do</strong>,<br />

que se fizesse com a intervenção <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>, e nos casos em que<br />

os canones pe<strong>de</strong>m a nova creação <strong>de</strong> dioceses, era uma outra<br />

traiçáo, porque o esta<strong>do</strong> não usaria entâo <strong>do</strong> beneplacito, mas<br />

abusaria d'elle. O beneplacito 6 uma arma <strong>de</strong>fensiva; e por isso<br />

se não po<strong>de</strong> negar no caso <strong>da</strong> urgente necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> creaç3o <strong>de</strong><br />

um nolo bispa<strong>do</strong> ; attendi<strong>do</strong> o esta<strong>do</strong> pela previa consulta, a hiilla,<br />

lorigo <strong>de</strong> ser um ataque ao direito temporal, k um justo exerci-<br />

cio <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> <strong>de</strong> propria soberania <strong>da</strong> egrcja.<br />

Nem o esta<strong>do</strong> tem <strong>de</strong> que se queixar; riem <strong>de</strong>ve <strong>da</strong>r logar a<br />

corillictos; porque clle reconheceu e quiz que a religiáo catholica<br />

fosse a religião <strong>do</strong> reino; e as leis <strong>da</strong> egreja catholica não podcm<br />

consentir a riecessi<strong>da</strong><strong>de</strong> urgciite dc um novo bispo sem a creaçso<br />

d'elle; e o esta<strong>do</strong> obrigou-se a revcrcnciar e proteger essils leis,<br />

porquc protege essa egreja e não a guerrba.<br />

O <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> I 2 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> L 1169 reconheceu isto mesmo ;<br />

e no que <strong>de</strong>terminou fez exactissimarnerite o que <strong>de</strong>via c podia.<br />

O estatio disse i santa sé: eu respeito e acato mais que to<strong>do</strong>s<br />

a tua actori<strong>da</strong><strong>de</strong>; mas eu tenho tambtm que respeitar e acatar os<br />

<strong>direitos</strong> <strong>do</strong>s citia<strong>da</strong>os portuguezes. - Da inesma fórma que eu,<br />

em caso <strong>de</strong> urgente riecessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> creaçào <strong>de</strong> um bispa<strong>do</strong>, mesmo<br />

nos transes angustiosos <strong>de</strong> um m,1u esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> fazen<strong>da</strong> publica, me<br />

rião podia negar, nem impedir a nova creação <strong>do</strong> bispa<strong>do</strong> ; - assiin<br />

tambem, agora, que a evi<strong>de</strong>ncia <strong>do</strong>s factos <strong>de</strong>monstra a inutili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> urna lloresta <strong>de</strong> dioceses que retalha o pequeno territorio por-<br />

tugucz, c que as fortunas publicas pa<strong>de</strong>cem tão pcza<strong>da</strong>s exacções,<br />

agora tenho eu o direito, como protector d'esta cgeja, <strong>de</strong> pedir a


ediicçáo <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s. Nâo o faço, porem, porque reconheço em ti<br />

o po<strong>de</strong>r unico para o fazer; mas, com, não duvi<strong>do</strong> <strong>da</strong> justica <strong>do</strong><br />

meu pedi<strong>do</strong>, niio apresento bispos até. que venhas a um accor<strong>do</strong>.<br />

Na<strong>da</strong> mais justo e legitimo.<br />

Mas em nossa opiniáio este Decreto fez pouco; este <strong>de</strong>creto po-<br />

dia e <strong>de</strong>via fazer alguma cousa <strong>do</strong> que preteri<strong>de</strong>u <strong>de</strong>pois o sr. Ber-<br />

nardino Pinheiro; porem, niio, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> nenhum, pelas razõcs que<br />

o distincto <strong>de</strong>puta<strong>do</strong> allegou no relatorio <strong>de</strong> que fez prece<strong>de</strong>r o<br />

seu projecto <strong>de</strong> lei.<br />

Depois <strong>de</strong> se consultar a curia romana, se ella persistisse na conservaçâo<br />

<strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s e não permitisse nem <strong>de</strong>cretasse a rediicçao<br />

d'elles, ao esta<strong>do</strong> cabia o direito <strong>de</strong> negar o bencplacito a novas<br />

bullas, se as houvesse, e <strong>de</strong> niio continuar a apresentar bispos para<br />

essas dioceses.<br />

]O um conflicto, d'accor<strong>do</strong> ; mas entre cstrs <strong>do</strong>is po<strong>de</strong>res quem<br />

ha dc <strong>de</strong>cidir quan<strong>do</strong> iim abusa?<br />

I)(. que serviria ao esta<strong>do</strong> o direito tle ser ouvi<strong>do</strong> 'ncstcs negocios,<br />

se nao po<strong>de</strong>sse <strong>de</strong> algum mo<strong>do</strong>, ncsstas relaçòes oiiti.(~ os <strong>do</strong>is<br />

podcrcls summos e irresponsaveis, tornar eff'&ctivas as suas ~)relcn-<br />

sõcs, quan<strong>do</strong> justas?<br />

A santa Sk fecha os olhos a tão attendivcis razòcs, quacs as<br />

que O esta<strong>do</strong> Ilie apresentou? abusa <strong>do</strong> seu direito? O esta<strong>do</strong> tem<br />

tambem os mclios, não, note-se bem, dc iisiirpar qualqucr d'aquellas<br />

prerogativas <strong>do</strong>s papas, mas <strong>de</strong>, por um proce<strong>de</strong>r tiegiitivo, impedir<br />

atk certo poiito as conscquericias <strong>do</strong> abuso e <strong>de</strong>scorisi<strong>de</strong>ração <strong>da</strong><br />

santa Sk. Só o que não po<strong>de</strong> 6 <strong>de</strong>cretar a abolição e reducç80 <strong>do</strong>s<br />

bispa<strong>do</strong>s, como <strong>de</strong>seja o sr. Uernardirio Piiiheiro.<br />

O esta<strong>do</strong>, que resulta <strong>de</strong> tu<strong>do</strong> isto, 6 inqualificakcl: bem o sabenios;<br />

mas E spmpre o que acoritece, quan<strong>do</strong> estas pen<strong>de</strong>ncias se dão entre<br />

<strong>do</strong>is po<strong>de</strong>rcr; supremos e irrcsperisaveis, ten<strong>do</strong> um d'elles abusa<strong>do</strong>.<br />

I? a natureza <strong>da</strong>s cousas<br />

Tem por ventura a santa Sk o direitof<strong>de</strong> intervir nos negocios<br />

politicos <strong>de</strong> Portugal e obrigar os povos a pagarem tributos im-<br />

possiveis <strong>de</strong> sustentar? não h30 <strong>de</strong> as suas pretensbes quebrar-se<br />

e modificar-se ao encontro d'estes principias 9 ha <strong>de</strong> o esta<strong>do</strong>, con-<br />

venci<strong>do</strong> <strong>de</strong> que a nayáo não <strong>de</strong>ve, nem po<strong>de</strong> pagar mais, e <strong>de</strong> que<br />

sno clesneccssarios 16 bispa<strong>do</strong>s no continente, obrigar a naçao a<br />

pagar, e sustental-os, isto porque a santa SB abusa <strong>de</strong> seus <strong>direitos</strong>,<br />

e nào atten<strong>de</strong> A necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> propria egreja?<br />

.


Não po<strong>de</strong> ser, ha <strong>de</strong> haver uma soluç8o para este esta<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

cousas.<br />

A solução legitima e regular, era a reducção <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s por<br />

bullas pontificias; mas quan<strong>do</strong> isto se nâo verifica, como na hypo-<br />

these presente, 6 tambem legitima e justa a soluç8o que o Decreto<br />

<strong>de</strong> 1869 propõe e estabelece.<br />

Depois, corisi<strong>de</strong>remos que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1833, que se cui<strong>da</strong> neste ne-<br />

gocio ; <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1833 que a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> reforma <strong>da</strong> nossa cir-<br />

cunscripção ecclesiaslica 6 uma evi<strong>de</strong>ncia; <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1833 que o esta<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> thesouro 6 incompativel com as <strong>de</strong>spczas <strong>de</strong> tiiio larga <strong>do</strong>taç8o<br />

e que o Esta<strong>do</strong> não po<strong>de</strong> conservar os bispa<strong>do</strong>s na altura a que<br />

tem direito; <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1833 que se têm inicia<strong>do</strong> accor<strong>do</strong>s e negocia-<br />

çbes com a sancta Sé; e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1833 que aquella Sé se nega e se<br />

esquece <strong>de</strong> resolver este importante assumpto.<br />

Náo serào estes factos em abono <strong>do</strong> <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 1869 ? não terá<br />

o Esta<strong>do</strong> o direito <strong>de</strong> padroa<strong>do</strong> <strong>da</strong> mesma forma que a Sé romana<br />

o direito <strong>de</strong> reduzir os bispa<strong>do</strong>s? não terá o Esta<strong>do</strong> o dkeito <strong>de</strong><br />

náo apresentar os bispos, quan<strong>do</strong> a Se tem o direito <strong>de</strong> não que-<br />

rer reduzir as dioceses? A justa rcsistencia a um abuso, será um .<br />

abuso? Não justificará o proce<strong>de</strong>r <strong>do</strong> governo portuguez pelo acto<br />

<strong>de</strong> 12 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1869 o proce<strong>de</strong>r inconveniente <strong>da</strong> san-<br />

cta Se?<br />

Cremos que sim, mas pensamos que o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 1869 podbra<br />

e <strong>de</strong>v6ra ir mais longe.<br />

N6s queriamos que o <strong>de</strong>creto não s6 <strong>de</strong>terminasse que não provia,<br />

ate um accor<strong>do</strong> com a Se romana, os bispa<strong>do</strong>s que julgava <strong>de</strong>ver<br />

extinguirem-se; mas que tambem man<strong>da</strong>sse incorporar nos proprios<br />

nacionaes os bens <strong>da</strong>s mitras cuja reducção propozera; isto, sempre,<br />

note-se bem, sem <strong>de</strong>cretar 'por força <strong>de</strong> suas provisões a reducçéo<br />

<strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s.<br />

Ate um accor<strong>do</strong>, o bispa<strong>do</strong> ficava sem bispo, e as suas ren<strong>da</strong>s<br />

e bens entravam <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo no cofre <strong>da</strong> fazen<strong>da</strong> publica.<br />

Isto podia fazer o Esta<strong>do</strong>; porque ninguem ousa contestar ao<br />

Esta<strong>do</strong> a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> d'esses bens; o que nõo podia era <strong>da</strong>r a for~a<br />

legislativa <strong>de</strong> cxtincç8o <strong>do</strong> proprio bispa<strong>do</strong> ás disposições <strong>do</strong> mesmo<br />

<strong>de</strong>creto, <strong>de</strong>terminan<strong>do</strong> que se não provesse <strong>de</strong> bispo esse bispa<strong>do</strong>,<br />

como queria a projecto jB cita<strong>do</strong> mais <strong>de</strong> uma vez '.<br />

1 Este projecto dizia nos seguintes artigos :<br />

cArt. 1.0-SBo encorpora<strong>do</strong>s nos proprios nacionaee, entran<strong>do</strong> na regra<br />

13


Este projecto, propon<strong>do</strong> que se jiilgassem extinctas aa dioseries,<br />

a qiic elle mesmo nào Jmpuiifia ao Esta<strong>do</strong> a obrigação <strong>de</strong> prover<br />

<strong>de</strong> bispo, sustentava este direito <strong>de</strong> extincção-<strong>da</strong>s diocesee <strong>da</strong> parte<br />

<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, como cousa evi<strong>de</strong>nte e que ninguem ousaria contestar.<br />

Dizia elle que ctninguem po<strong>de</strong> confu~idir os <strong>direitos</strong> absolwtos,<br />

inherentes ao homem, com os <strong>direitos</strong> qne as leis conce<strong>de</strong>m (t~<br />

pessoas moraes; que a egreja, juridicamente e para os fias <strong>de</strong> que<br />

&acta, não é mais <strong>do</strong> que um pessoa moral, como o esta<strong>do</strong>, o<br />

geral <strong>do</strong> artigo 36 <strong>do</strong> Cod. Civ., to<strong>do</strong>s os bens mobiliarme e immobiliarios <strong>da</strong><br />

<strong>igreja</strong> ou corporação religiosa que por qualquer metivo se extinguir.<br />

*Art. 2.0- Srto <strong>de</strong>clara<strong>da</strong>s extinctas, pra ae &itm <strong>do</strong> artigo mime<strong>de</strong>nte<br />

se niitras, fabricas <strong>de</strong> cathcdraee e seminarios, pertencentee he dioms, eujas<br />

sEs estão actualmeiite vagas, ou Bquellas que vierem a vagar, on<strong>de</strong> esta<br />

lei 1160 aiictorisa o governo a nomear e apresentar prela<strong>do</strong>.<br />

eArt. 6.0- O governo, dc accor<strong>do</strong> com a sancta M, farã tima nova Mrcamscripgão<br />

<strong>da</strong>s dioceses menciona<strong>da</strong>s no artigo 3.0, comprehen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> nestw 8<br />

Area <strong>do</strong>s bispa<strong>do</strong>s exti~ictos.<br />

619 unico. As dioceses que <strong>de</strong>vem supprimir-se serito administra<strong>da</strong>s por vigarios<br />

geraes, em quanto se nâo concluir a respectiva eircumecripçito.~<br />

Admira-nos este receio <strong>do</strong> auctor Bo projecto <strong>de</strong> iiiio julgar o Esta<strong>do</strong> aiictorisa<strong>do</strong><br />

a reunir ás dioceses existeiites por força <strong>de</strong> seus <strong>de</strong>cretos as dioceses<br />

e~tiictas, e esperw para isso por accor<strong>do</strong> <strong>da</strong> satictx 66, qiiantlo pai% a<br />

extiricyào d'ellas, o que <strong>de</strong> certo 8 mais grave, não liesitou um momento em<br />

co~!sidcrar o Ehtatlo iiit~irumente iiivesti<strong>do</strong> <strong>de</strong> direito iiicoiitest~lvel.<br />

E unia incohcrcuciw <strong>do</strong> projecto, que revela bem quanto nesta parte eram<br />

pouco seguros os seus fun<strong>da</strong>meritos.<br />

De lia muito que vernos repeti<strong>da</strong>s em to<strong>da</strong> a parte as palavrae, que cosi0<br />

axioniaticas se escreverli no relatorio d'este projecto.<br />

Dix-se sempre, como cousa incontestave1:- a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> itidividual, quem<br />

s coritestsrtí? mas que as pessoas moraea possam ter proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, que o asta<strong>do</strong>,<br />

a lei, que as creou, n6o posaa diapor d'ella a seu bel-prazer, quem o suatentar&?<br />

De boa f6, e em soiencia, nb ee <strong>de</strong>ve faeer echo com estas vozes.<br />

Que :r proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> individual tem ei<strong>do</strong> eonteeta<strong>da</strong> po<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ve ignoral-o o<br />

liomem <strong>de</strong> sciencia e <strong>de</strong> boa fA?<br />

E, dizci-me, a proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> collectiva, e o direito <strong>de</strong> associaç&o, po<strong>de</strong>m dizer-se<br />

assim sem trepi<strong>da</strong>r que saU ooueas <strong>de</strong> que a lei po<strong>de</strong> dispor como ama<br />

creança <strong>de</strong> seus brinque<strong>do</strong>s ?<br />

Por Deus ! a mente <strong>do</strong> homem não k um relogio <strong>de</strong> repetiçao; que se tenha<br />

dicto, que se tenha escripto, que imprta fsm?<br />

E em quanto ao aesumpto <strong>do</strong> projecto aos bem <strong>do</strong> clero, to<strong>da</strong>s estas qo~t&~ toniam novo aspecto; e o ar. Uernardino Pinlieiro não ignorava cle certo que,<br />

alem <strong>de</strong> se discutir, <strong>de</strong> ha muito j&, a legitimi<strong>da</strong>tle <strong>da</strong> expropriaçâo feita pelo<br />

Xsta<strong>do</strong> no acto <strong>da</strong> extincçào <strong>da</strong>s or<strong>de</strong>na religiosas, ain<strong>da</strong> não são passa<strong>do</strong>s<br />

tred annos que aa Constituintes heapanholw ouviram uma voz bem auctdsacla<br />

nos arraiaes <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> chamar um roubo a essa expropriação.<br />

Sejamos pois mais francos: o homem livre <strong>de</strong>ve primeiro que tu<strong>do</strong> ser irne<br />

parcial, porque a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> h t5 fawiosa,


municipio ou outro qualquer etiabelecime~io <strong>de</strong> pie<strong>da</strong><strong>de</strong> 4 in-<br />

strucçào pirlrlica. e que estes eslabelecimenios foram creo<strong>do</strong>s pela<br />

socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, por ella po<strong>de</strong>m portanto ser eainctos, e qw ninguem<br />

<strong>de</strong> scieneia, e em boa fd, o põe em duui<strong>da</strong>.~<br />

Se se tracta <strong>do</strong>s bens ecclesiasticos, po<strong>de</strong> o auctor <strong>do</strong> projecto<br />

ter razão ; mas, quanto á existencia mesma, á extincç'io ou con-<br />

scrvaçao <strong>do</strong> bispa<strong>do</strong>, 6 para 116s muito coritestavel a <strong>do</strong>utrina <strong>do</strong> illus-<br />

tre <strong>de</strong>puta<strong>do</strong>.<br />

I'ois os bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Pinhel, <strong>de</strong> Castello-Branco, <strong>de</strong> Portalegre,<br />

<strong>de</strong> Aveiro e <strong>de</strong> Paro foram crea<strong>do</strong>s pela socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, <strong>da</strong> mesma forma<br />

que os municipios e as escolas? Pois reconheceu nunca o direito<br />

ecclesiastico portuguez similhante direito aos nossos reis e <strong>de</strong>pois<br />

<strong>do</strong> regimen liberal ao Esta<strong>do</strong> portuguez ?<br />

E, quan<strong>do</strong> assim fosse, estes estabelecimentos não po<strong>de</strong>riam di-<br />

zer-se <strong>da</strong> mesma natureza <strong>do</strong>s outros, porque a Carta Constitucio-<br />

nal tem um artigo, on<strong>de</strong> a naçâo portugueza se obriga a continuar<br />

a ter a religiào catholica como religião <strong>do</strong> reino, a protegel-a, a<br />

respeitar suas leis; e Mra mister ou provar a existencia <strong>do</strong> direito<br />

priva<strong>do</strong> <strong>da</strong> nossa egreja, ou negar o direito geral <strong>da</strong>s <strong>de</strong>cretaes; e<br />

riem uma riem outra cousa faz o auctor <strong>do</strong> projecto, nem cremos<br />

que o po<strong>de</strong>sse fazer.<br />

Como no projecto o principal assumpto eram os bens ecclesias-<br />

ticos, e para ellcs tinham to<strong>do</strong> o vigor as consi<strong>de</strong>raçòes allega<strong>da</strong>s<br />

tio relatorio, parece que o distincto <strong>de</strong>puta<strong>do</strong>, cego um instante<br />

por exagera<strong>do</strong> patriotismo, queria <strong>de</strong> envolta com ellas fazer passar<br />

os artigos, que, sen<strong>do</strong> <strong>de</strong>pois lei, teriam irremediavelmente acaba<strong>do</strong><br />

as quest6es.<br />

380 po<strong>de</strong>, porem, proce<strong>de</strong>r-se assim, sem quebra <strong>da</strong> digni<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

nacional e ernquanto a religião catholica for a religiâo <strong>do</strong> reino.<br />

L)a mesma maneira não encontramos no projecto os tituios em<br />

que se fun<strong>de</strong> o direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>spojar o patriarcha<strong>do</strong> <strong>de</strong> Lisboa <strong>da</strong>s<br />

Iionriis que 1). Joào v para elle conseguiu <strong>do</strong> papa.<br />

Tanto como o auctor <strong>do</strong> projecto comprehen<strong>de</strong>mos n6s a <strong>de</strong>s-<br />

necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> d'aquella primazia esplen<strong>do</strong>rosa, <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> que se<br />

rios revela não s6 perante o esta<strong>do</strong> difficil <strong>da</strong> fazen<strong>da</strong> publica <strong>do</strong><br />

nossa paiz, mas tambem em presença <strong>da</strong>s conveniencias <strong>da</strong> propria<br />

egreja. I<br />

Mas, como conseguir esta reforma por um <strong>de</strong>creto ou uma lei?<br />

como fazel-o sem a auctori<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> Sé apostolica?


A.lcançou-o po,r ventura assim o mestre <strong>de</strong> Aviz? p6<strong>de</strong> conse-<br />

guil-o sem esse concurso o rei faustuoso f<br />

Corihecemos s6 uma hypothese em que seria possivel pelos meios<br />

que o projecto indica, por <strong>de</strong>cretos <strong>da</strong> soberania temporal, obter<br />

cssa necessaria e conveniente <strong>de</strong>soneração <strong>da</strong> fazen<strong>da</strong> publica: C n<br />

hypothese <strong>da</strong> separaçuo <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> portuguez <strong>da</strong> egreja catholirn<br />

(10 nosso paiz.<br />

Antes d'isso o projecto 6 'nesta, como na outra parte, offensivo<br />

<strong>do</strong> actual direito publico portuguez ecclesiastico e politico.


CAPITULO V<br />

Ultimas palavras<br />

As ultimas palavras d'este imperfeito trabalho, que v80 ler-se<br />

neste capitulo, sáo uma consequencia <strong>do</strong> que acima se escreveu,<br />

e ao mesmo tempo um <strong>de</strong>sejo mui vivo e uma esperança <strong>de</strong> seu<br />

auctor.<br />

Não ha direito, nem mais intimo, nem mais sagra<strong>do</strong>, <strong>do</strong> que o<br />

direito <strong>de</strong> elevar o espirito até Deus, <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong>sinvolver-se e<br />

florescer o instincto religioso, atb tomar a forma precisa <strong>de</strong> uma<br />

idéa; idéa que alenta a vi<strong>da</strong>, quan<strong>do</strong> a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>ixou compre-<br />

hcri<strong>de</strong>r e a comprehensão trouxe a crença; idéa que esmaga com<br />

seu peso e martyrisa com a duvi<strong>da</strong>, quan<strong>do</strong> a força <strong>de</strong> uma direc-<br />

ção qualquer niio espontanea roubou a luz e o ar ao sentimento<br />

mystico <strong>da</strong> alma.<br />

Se a inviolabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong>s <strong>direitos</strong> faz <strong>da</strong> <strong>de</strong>sigual<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> lei iim<br />

gran<strong>de</strong> crime, a <strong>de</strong>sigual<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> lei em materia <strong>de</strong> religilo é o<br />

maior <strong>do</strong>s crimes.<br />

Não conhecemos na<strong>da</strong> mais revoltante, e mais indigno <strong>de</strong> um<br />

povo livre.<br />

E a primeira <strong>da</strong>s nossas leis, a lei <strong>da</strong> nossa liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, <strong>do</strong>s nos-<br />

sos <strong>direitos</strong>, a lei sagra<strong>da</strong>, 1130 po<strong>de</strong>n<strong>do</strong> separar a idéa <strong>de</strong> reitio<br />

<strong>da</strong> idéa <strong>de</strong> dynastia, e a idéa <strong>de</strong> dynastia <strong>da</strong> idéa <strong>de</strong> religião, logo<br />

em seri atrio gravou o odioso principio <strong>de</strong> uma religião <strong>do</strong> reino,<br />

com to<strong>do</strong>s os privilegios e to<strong>da</strong>s as intolerancias <strong>da</strong> velha mo-<br />

iiarchia !<br />

Soffremos hoje as consequencias d'este facto,


Por mais que se diga que o sentimento religioso é <strong>do</strong> intimo<br />

e livre f6ro <strong>da</strong> consciencia, por mais que se preten<strong>da</strong> sustentar<br />

que o Esta<strong>do</strong> n8o po<strong>de</strong> <strong>de</strong>sacomparihar <strong>de</strong> sua protecçâo a idéa<br />

religiosa, penhor <strong>da</strong> moral e conservação <strong>do</strong>s costumes ; é sempre<br />

certo, como diz o profun<strong>do</strong> Hrimboldt, que a protecção official,<br />

dispensa<strong>da</strong> a certa religiâo, involve uma pressão mui activa sobre<br />

a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> individual, pressão que se nào v&, que rifio consegue<br />

effeito nos espiritos illustra<strong>do</strong>s, mas que 6 um <strong>de</strong>spotismo real<br />

para a maioria <strong>de</strong> um povo, para o homem ignorante e srm liizcs<br />

<strong>da</strong>s ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, para o homem ru<strong>de</strong> e supersticioso <strong>do</strong>s campos.<br />

Compellir, directa ou indirectamente, o sentimento religioso, 6<br />

quasi mais perigoso <strong>do</strong> que fomentar a intolerancia <strong>de</strong>scoberta,<br />

franca e acompanha<strong>da</strong> <strong>de</strong> persegriiçòes e violencias; porque 'nesta<br />

a consciencia <strong>da</strong> propria digni<strong>da</strong><strong>de</strong> resalta orgulhosa, e com aquella<br />

o sentimento religioso 6 inteiramente <strong>de</strong>svirtua<strong>do</strong> cm quem o ngo<br />

po<strong>de</strong> comprchcn<strong>de</strong>r, porque per<strong>de</strong> o que lhe vem <strong>da</strong> alma, puro<br />

e ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro, para acceitar d'outrem um empresta<strong>do</strong> e que nTio<br />

percebe; e é totalmente apaga<strong>do</strong> em quem o podia conceber, por-<br />

que produz a indifferença ou a hypocrisia.<br />

A indifferença e a hypocrisia I e quem tem o olhar tRo curto que<br />

1130 veja entre as causas dm males d'esta terra, e <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> um<br />

<strong>do</strong>s povos contemporaneos, esses <strong>do</strong>is inimigos <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o senti-<br />

mento puro, <strong>de</strong>sinteressa<strong>do</strong> e enthusiastieo ?<br />

A indiflerençn e a hypocrisia preparam o homem para tu<strong>do</strong>: em<br />

rim paiz falto <strong>de</strong> instrucçao e sujeito a um regimen <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

sáo esses os maiores instrumentos <strong>do</strong> <strong>de</strong>spotismo: o as religiões <strong>do</strong><br />

Esta<strong>do</strong> e a exclusáo e intolerancia <strong>do</strong>s ciiltos prodrizem fatalmerite<br />

a indifferenqa e a hypocrisia.<br />

Nào preten<strong>de</strong>mos <strong>da</strong>r aqui a <strong>de</strong>monstraçfio cabal d'esta ver<strong>da</strong><strong>de</strong> ;<br />

nem 6 nosso proposito fazer ver como a tlieoria <strong>da</strong> protecyão <strong>da</strong>s<br />

religiòos pelo Esta<strong>do</strong> estdi cun<strong>de</strong>mna<strong>da</strong> pela sciencia e pelos factos:<br />

sómente <strong>de</strong>sejamos chamar a attenção <strong>de</strong> quem ler sobre um ponto<br />

especial, inteiramente liga<strong>do</strong> com O objecto geral d'este livro, e<br />

que como ess'outro pe<strong>de</strong> a separaeao <strong>da</strong>s duas serie<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

A protec~tío concedi<strong>da</strong> pelo Esta<strong>do</strong> a uma egrejn qualquer, d'on<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>ve <strong>de</strong>duzir-se como primeira ohrigaqko a <strong>de</strong> <strong>do</strong>tar o clero pelo<br />

thosouro publico, dh inevitavelmente logitr a coníiictos como oqiielles<br />

que motivaram o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> 12 <strong>de</strong> novembro dc 1869 e lembraram<br />

o patriotico projecto <strong>de</strong> Ici <strong>de</strong> que falhmos. Estes confli-


ctos são perfeitamente insoluveia neste esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> rela~ães, e mostram<br />

assim o vicio d'essas mesmas relaçães.<br />

Este facto <strong>de</strong> o Esta<strong>do</strong> ter <strong>de</strong> pagar ao sacer<strong>do</strong>te, 6 ain<strong>da</strong> outra<br />

salicnte e <strong>de</strong>testavel consequencia <strong>de</strong> similhante systema, pois<br />

que d'essa maneira o sacer<strong>do</strong>te 6 necessariamerite um assiilaria<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, um funccionario, um emprega<strong>do</strong> priblico; c neo ha<br />

na<strong>da</strong> mais indigno <strong>do</strong> que fazer fiinccionario publico o sacer<strong>do</strong>te,<br />

o padre, este homem que tem <strong>de</strong> realisar na terra uma tno eleva<strong>da</strong><br />

e sancta missiio.<br />

uma i<strong>de</strong>a que faz tedio.<br />

]I: d'esta maneira, os ficis, <strong>de</strong> braços cruza<strong>do</strong>s, conseritcm que<br />

lhe imponham por parte <strong>de</strong> uma enti<strong>da</strong><strong>de</strong> moral, que niio tem,<br />

nem po<strong>de</strong> ter religigo, o padre, o parocho, csse que ha <strong>de</strong> sanctificar-lhes<br />

o primeiro dia <strong>da</strong> existencia <strong>de</strong> seus filhos, consagrarlhes<br />

a iinião perpetua com a mulher que lhes partilha a vi<strong>da</strong>, acompanhal-os<br />

na angustia <strong>da</strong> hora final, ser-lhes um pac provi<strong>de</strong>nte<br />

no <strong>de</strong>salento e na miseria !<br />

E isto promette e cumpre o Estu<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> prumcttcii. e <strong>de</strong>ve<br />

cumprir a inviolabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, que fere vitalmente agora,<br />

porque tanto concorre para n <strong>do</strong>taçno <strong>do</strong> clero o jii<strong>de</strong>u e o prc*.<br />

testante, como o catholico !<br />

As leis, edifican<strong>do</strong> as instituiçòes, acostuman<strong>do</strong>-nos a ellas, exigin<strong>do</strong>-nos<br />

rigoroso respeito, concorrem efficazmente para a formaçso<br />

<strong>da</strong> opinião <strong>do</strong> publico, e triste 6 a opinião publica que se robustece<br />

á sombra <strong>de</strong> similhantes instituições.<br />

Alem d'estas <strong>de</strong>sigiial<strong>da</strong><strong>de</strong>s e incoherencias, alem d'estes erros e<br />

inconvenientes disposiç<strong>de</strong>s, o actual esta<strong>do</strong> dç relaçks <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> 1<br />

e egreja portugueza 6 incompativel com a id6a <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>, com<br />

o espirito <strong>do</strong> actual regimen.<br />

Qiie a egrcja coriserve os seus usos e costumes proprios, suas<br />

praxes <strong>do</strong>mesticas, na<strong>da</strong> nos importa ; ella C! uma socie<strong>da</strong><strong>de</strong> livre<br />

<strong>de</strong> homcns livres, reuni<strong>do</strong>a para o mais livre fim, qual t! a religião.<br />

Viva pois como quizer.<br />

O que nos interessa 6 a critica d'estas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s que lhe advêm<br />

<strong>do</strong> la<strong>do</strong> profano <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>.<br />

Não <strong>de</strong>sconhecemos n6s quão preciosas foram em tempos estrts<br />

liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s, mais ou menos ligadirs ao esplen<strong>do</strong>r <strong>do</strong> sccptro portuguez;<br />

ellas marcam epocas <strong>de</strong> <strong>de</strong>safronta, prio<strong>do</strong>s <strong>de</strong> gloria. NHo<br />

as renegamos pois; mas porque Affonso, o filho <strong>do</strong> con<strong>de</strong> E-lvnriqiie,


nos ganhou a in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncia, havemos <strong>de</strong> ir viver prostra<strong>do</strong>s <strong>de</strong>ante<br />

<strong>do</strong> arren<strong>da</strong><strong>do</strong> e magnifico tumulo <strong>do</strong> conquista<strong>do</strong>r <strong>de</strong> Santarem,<br />

havemos <strong>de</strong> esquecer-nos e passar a vi<strong>da</strong> lia contemplar,ão d'estas<br />

heroicas sombras, abraçarmo-nos a ellas, e <strong>de</strong>ixarmo-nos morrer<br />

mergulha<strong>do</strong>s em a nuvem scintillante <strong>de</strong> recor<strong>da</strong>ções <strong>de</strong> gloria que<br />

as envolve ?<br />

Não po<strong>de</strong> ser; o presente chama-nos, o futuro espera-nos.<br />

As liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> egreja portugueza, estas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s mais iriti-<br />

mamente liga<strong>da</strong>s á cor<strong>da</strong> <strong>de</strong> Portugal, já nào esistem.<br />

Decrepitas iis encontrou o regimen constitucional, sem vi<strong>da</strong> as<br />

prostrou por terra.<br />

Cumpre-nos agora levantal-as cui<strong>da</strong><strong>do</strong>sos, sacudir-lhes o p6 <strong>da</strong>s<br />

luctas com que esta nossa i<strong>da</strong><strong>de</strong> turvou a luz <strong>de</strong> seus primeiros<br />

dias, e guar<strong>da</strong>l-as com respeito no panttieon <strong>da</strong>s nossas memorias<br />

brilhantes.<br />

Com que direito os po<strong>de</strong>res publicos <strong>de</strong> um povo livre vem a<br />

uma <strong>da</strong>s egrejas <strong>de</strong> sua terra, aquella que mais dilata<strong>do</strong> espaço<br />

tem occupa<strong>do</strong> no mun<strong>do</strong>, aquella a quem mais <strong>de</strong>ve, que foi a religião<br />

<strong>de</strong> seus paes, que 6 a religião <strong>do</strong> maior numero, com que<br />

direito se apresenta o esta.<strong>do</strong> <strong>de</strong>ante d'ella e, encostan<strong>do</strong>-se h haste<br />

<strong>do</strong> pendão liberal, lhe diz :<br />

«Não tens direito <strong>de</strong> eleger os teus sacer<strong>do</strong>tes, os teus ministros;<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o mais humil<strong>de</strong> parocho <strong>da</strong> ald&a perdi<strong>da</strong> na agrura <strong>da</strong>s serras,<br />

at8 o radiante patriarcha <strong>da</strong> basilica, inn8 <strong>de</strong> Roma na sumptuosi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>da</strong>s honrarias; <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a ci<strong>da</strong><strong>de</strong> roaba<strong>da</strong> aos sarracenos<br />

pela mão d'aquelles que ao meio <strong>da</strong> peleja levavam o symbolo <strong>do</strong><br />

martyrio <strong>de</strong> Christo prega<strong>do</strong> nas roupas, at6 ás povoaçkes ondt. a<br />

seiva <strong>da</strong>s florestas acarreta as parcellas <strong>do</strong> sangue <strong>do</strong>s Castros, <strong>do</strong>s<br />

Cunhas, <strong>do</strong>s Albuquesques, <strong>de</strong> tantos outros; por to<strong>do</strong> o orbe portugiiez<br />

; hei <strong>de</strong> ser eu que os eleja, que os escolha, que os apresente?))<br />

Que! ten<strong>de</strong>s a liber<strong>da</strong><strong>de</strong> para to<strong>da</strong>s as socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s e não a ten<strong>de</strong>s<br />

para essa? reverenciaes essa instituicão por ter si<strong>do</strong> a religiRo<br />

<strong>de</strong> nossos paes e pren<strong>de</strong>is-lhe na garganta a corrente <strong>da</strong> escravidão,<br />

fazeis d'ella escrava a religião <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> por to<strong>da</strong> a parte<br />

o braço potente <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong>rruba to<strong>da</strong>s as servi<strong>do</strong>es!<br />

Pois reconheceis que a iniciati~a individual 6 a forca motora <strong>do</strong><br />

progresso, que a associação 6 o seu instriirnento, e viri<strong>de</strong>s coritrariar<br />

esws principios que abraçastcç, Sazeri<strong>do</strong> com o riit<strong>do</strong> <strong>da</strong>s vossas<br />

I


armaduras, <strong>de</strong>slustra<strong>da</strong>s pelas pugnas turbulentas <strong>da</strong> praça publica,<br />

calar a voz <strong>do</strong> apostolo, que dizia-,que na<strong>da</strong> havia mais livre <strong>do</strong><br />

que a religião - viihil liberius quam religio ?<br />

Oh! isto 6 incomportavel ; isto mancha o brilho puro <strong>da</strong> vi<strong>da</strong><br />

livre e <strong>da</strong> digni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>do</strong> xix seculo; e ca<strong>da</strong> um <strong>de</strong> 116s tem o gran<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>ver moral <strong>de</strong> perceber a idka <strong>do</strong> seu tempo, <strong>de</strong>senvolve-la com<br />

os esforços <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a sua vi<strong>da</strong> e entregal-a assim ás gerações <strong>do</strong><br />

futuro !<br />

Temei que n?io vos aconteça como áquelles christsos que o Cesar<br />

man<strong>da</strong>va amarrar aos ca<strong>da</strong>veres, para que os vermes communicassem<br />

aos vivos o veneno <strong>da</strong> morte.<br />

Essas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s foram precisas ao Marquez <strong>de</strong> Pombal, mas<br />

tambem lhe foram precisas as forcas e os patibulos; e quereis v6s<br />

tambem evocar <strong>do</strong> meio <strong>da</strong>s praças publicas essas sombras ensanguenta<strong>da</strong>s<br />

<strong>da</strong> tyrannia <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> ?<br />

Temia-se então o braço <strong>da</strong> theocracia; <strong>de</strong>visava-se com espanto<br />

aberta e raia<strong>da</strong> <strong>de</strong> sangue a garganta <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r absorvente <strong>do</strong><br />

anti-Christo encarna<strong>do</strong> papa.<br />

Podiam ler-se os pergaminhos d'essas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s; e os menos<br />

acostuma<strong>do</strong>s aos estu<strong>do</strong>s paleographicos reconheciam com facili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

a legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong> d'esses titulos. I..*-* I<br />

Mas hoje ? .... .<br />

Temeis tambem hoje as ameaças d'essa tormenta P "J) ,<br />

Puerili<strong>da</strong><strong>de</strong> !<br />

Não se lembram que o mun<strong>do</strong> já admirou esse homem que<br />

I<br />

eripuit coelo fulmen sceptrumque tyrannis;<br />

recêam ain<strong>da</strong> que os raios <strong>da</strong> theocracia os venham fulminar, e<br />

por pouco que não amaldiçoam a memoria <strong>do</strong> gran<strong>de</strong> homem,<br />

porque, ao passo que <strong>de</strong>sarmava o céu <strong>da</strong>s armas <strong>de</strong> sua colera,<br />

Ihes arrebatava <strong>da</strong>s mãos o sceptro <strong>da</strong>s tyrannias!<br />

Ouvimos já dizer :<br />

«Utopia ! os povos não estão prepara<strong>do</strong>s!))<br />

& sempre a mesma voz ; sempre o fallar d'aquelleg, que são<br />

como esses homens <strong>da</strong>s escripturas, que tem olhos e não veem, ou-<br />

vi<strong>do</strong>s e n30 ouvem.<br />

Com franqueza, dizei-nos: é preciso obsciirecer o sol com o<br />

moiitiio <strong>de</strong> ruinas que a separação <strong>do</strong> nosso Esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> nossa egreja<br />

ha <strong>de</strong> produzir ?<br />

I I<br />

'<br />

I<br />

I<br />

1<br />

I


Essa mparaçáo esth tso longo dc ser uma utopia, que 6 uma<br />

necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> urgcnte; asth taosdistante <strong>da</strong> chimera, que ellii po<strong>do</strong><br />

rcalisar-se sem qiic iim Ilorão só se <strong>de</strong>spren<strong>da</strong> <strong>do</strong> lavor <strong>da</strong>s catliedrues<br />

dn nossa egrcja, e sem que uma diis cruzes alça<strong>da</strong>s no seu vertice<br />

sc vc~ja pendi<strong>da</strong> por lhe [altar o alento publico.<br />

Sabeis o que 6 preciso, o que suficiente?<br />

& o que o Efita<strong>do</strong> se retira pru<strong>de</strong>nte, e cautelosamente <strong>de</strong>sap<br />

paipça <strong>da</strong> scena, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> o espaço livre.<br />

Tome a sua constituiçáo e risque tres artigos: acabe com are-<br />

Iigiáo <strong>do</strong> reino no art. 6.O, c com o padroa<strong>do</strong> e beneplacito no<br />

art. 75; vB ás suas leis e apague o principio <strong>da</strong> <strong>do</strong>taqâo <strong>do</strong> clero<br />

pelo thesouro, c <strong>de</strong>ixe h greja esse cui<strong>da</strong><strong>do</strong>, ou por contribuições,<br />

<strong>de</strong>rramas, coogruas, como hoje estáo vigoran<strong>do</strong>, oii por salarios<br />

pagos rio acto <strong>da</strong> prestação <strong>do</strong> serviqo; em uma palavra, como (3<br />

quan<strong>do</strong> clla quizer.<br />

«O beiicplacito?! dir-nori-50, havcn~os <strong>de</strong> ir insultar as cinras<br />

<strong>do</strong> gran<strong>de</strong> rei, <strong>do</strong> grandc justiceiro?<br />

Que ! pois niio ve<strong>de</strong>s como o ultramontanismo, o pqti<strong>do</strong> <strong>da</strong>s<br />

trevas, ca<strong>da</strong> vez mais se exalta, mais truholha, mais conscguc,<br />

introduzin<strong>do</strong>-rrc no mais intimo sanctiiario <strong>da</strong>s familias, lk on<strong>da</strong><br />

vós cui<strong>da</strong>rs sircrilrgio penetrar; arrastan<strong>do</strong>-se até os estabeleci-<br />

mcntos <strong>de</strong> pic<strong>da</strong><strong>de</strong> c dc instrucção e enroscan<strong>do</strong> o seu escamoso<br />

corpo em bolta <strong>da</strong>s cteoricinhas para lhe sriffocar o espirito nas-<br />

cciitc ; corren<strong>do</strong> apressa<strong>do</strong> e com o olhiir torvo dc ambiçòes ao<br />

meio <strong>da</strong>s povoaçòes ignorantes <strong>do</strong>s campos e quc sc ciitregam iio<br />

siicrificio como os mansos animaes ao ciitcllo <strong>do</strong>s sacrifica<strong>do</strong>res <strong>do</strong><br />

paganismo grego ?<br />

E e agora qrie v6s quereis <strong>de</strong>sapertar o peito <strong>de</strong> aço <strong>do</strong> bene-<br />

plecito e <strong>do</strong> padroa<strong>do</strong> !n<br />

Sim, e agora mesmo; porque emquanto o tivermos conchegnilo<br />

ao peito, cmqiianto promettcrmos esten<strong>de</strong>r o nosso escu<strong>do</strong> protc-<br />

ctor sobre a religi30 <strong>do</strong> reino, nào temos o direito <strong>de</strong> impedir que<br />

o catliolicismo romano exerço a sua viva forca, preguc as euas<br />

<strong>do</strong>utrinas, embora falsas; porque o Esta<strong>do</strong> que promctte protecçgo<br />

nho pu<strong>de</strong> atreiçoar.<br />

&Ias <strong>de</strong>ixai to<strong>da</strong>s estas lucias ao impcrio c força <strong>do</strong> direito com-<br />

mum; <strong>de</strong>ixai que o bispo, que publícii a pastoral offi:nsiva cios (li-<br />

rraitos <strong>da</strong> sohorania nacional, scja como qunlqiier oiitril 11cs40ii aos<br />

olhos <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, como qualquer outro ci<strong>da</strong>dgo quc abusiistx tie sua


posiçáo e attacam o que <strong>de</strong> mais sapa<strong>do</strong> ha no mun<strong>do</strong>; c dizei-me<br />

se nas garantia6 geraes <strong>da</strong> lei nao ancontrais agora, <strong>de</strong>pois <strong>do</strong><br />

apnga<strong>do</strong> o artigo 6.O <strong>da</strong> Carta, a força, o indispensavel e justo vi-<br />

gor, <strong>de</strong> qiie tanto se carece na protecç8o <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> !<br />

Foi, porventura, em harmonia com o artigo 6." <strong>da</strong> Carta, foi<br />

cumprin<strong>do</strong> os <strong>de</strong>veres <strong>de</strong> protector que o Esta<strong>do</strong> portuguez extin-<br />

guiu as or<strong>de</strong>ns religiosas em 1834 ? foi cumprin<strong>do</strong> esses mesmos<br />

<strong>de</strong>veres que elle se approprioii <strong>de</strong> seus bens.? 6 na reali<strong>da</strong><strong>de</strong>, como<br />

leal protector, que elle se v& obriga<strong>do</strong> hoje a não prover <strong>de</strong> bispos<br />

OB bispa<strong>do</strong>s <strong>do</strong> reino ?<br />

Foi assim, iisan<strong>do</strong> <strong>de</strong> seus <strong>direitos</strong>, que elle expulsou os jesuitas<br />

em tempos que 18 vio; porque então era elle, nlem <strong>de</strong> ~~rott-ctor,<br />

supremo inspector; mas essa força per<strong>de</strong>u-a hoje <strong>de</strong>pois 00 imp<br />

rio <strong>do</strong> governo livre; e, quan<strong>do</strong> <strong>de</strong>via reeuperd-a nos saltitares<br />

principios <strong>do</strong>-direito commum, foi recusal-a no sexto artigo <strong>da</strong><br />

constituição que elaborou.<br />

Ahi 6 que esth to<strong>do</strong> o mal.<br />

Duvi<strong>da</strong>r d'isto C duvi<strong>da</strong>r <strong>de</strong> que o Esta<strong>do</strong> nZio esteja revesti<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong> força necessaria para a siia vi<strong>da</strong> livre e pacifica.<br />

Quanto a oulros effeitos d'esses males <strong>do</strong> ultrsinontanismo, quei-<br />

xemo-nos <strong>do</strong> pessimo esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> nossa instrucçao e procuremos<br />

reformal-a quanto antes.<br />

Ella 8 s6 o unico meio efficaz <strong>de</strong> esmagar a vibora <strong>do</strong> ultra-<br />

montanismo, se vibora é ; ha <strong>de</strong> dizcl-o a discussao livre, e nuiica<br />

o explicar8 a protecção legal d'essa nieema seita, esten<strong>de</strong>n<strong>do</strong> o<br />

seu influxo a to<strong>da</strong> a legislaçáo <strong>de</strong> um povo.<br />

Esta separaçso 8 vital; ha <strong>de</strong> impor-se, mais ce<strong>do</strong> ou mais<br />

tar<strong>de</strong>.<br />

Mais ce<strong>do</strong>, se a pru<strong>de</strong>ncia reformar as *leis ; mais tar<strong>de</strong>, quandil<br />

o embate sanguinolento <strong>do</strong>s interesses e <strong>da</strong>s ambições a encravar<br />

nas instituiçòes.<br />

Com ella o christianismo ba <strong>de</strong> viver mais dilata<strong>do</strong>s annos, por-<br />

que, aban<strong>do</strong>na<strong>da</strong> & inspecção <strong>do</strong>s firis, a disciplina ha <strong>de</strong> necessa-<br />

riamente reformar-se, ha <strong>de</strong> restabelecer-se na sua forma primi-<br />

tiva, e assim po<strong>de</strong>rá abraçar o progresso e a liber<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

fla aqui uma fatali<strong>da</strong><strong>de</strong> tao imperiosa, quanto o cliristiariismo<br />

e iiiseparavel <strong>do</strong> futuro.<br />

Antes <strong>de</strong> attingir o i<strong>de</strong>al, n nossa çivilisaç80 ha <strong>de</strong> aciibnr iim<br />

dia.


Mal sabia o cantor apaixona<strong>do</strong> e gran<strong>de</strong> <strong>da</strong> triste Beatrice, .pe,<br />

copian<strong>de</strong>. na divina comedia esses cyclos <strong>do</strong> inferno, que sua ima-<br />

ginação inson<strong>da</strong>vel lhe pintava concentricos e ca<strong>da</strong> vez mais vastos,<br />

elle <strong>de</strong>sven<strong>da</strong>va o quadro <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> <strong>da</strong> humani<strong>da</strong><strong>de</strong>!<br />

Ca<strong>da</strong> um d'esses cyclos é uma civilisação; a ca<strong>da</strong> um d'clles<br />

presi<strong>de</strong>m <strong>do</strong>is principias: um que lhe dilata a circumferencia, ao- .<br />

cioso; outro que lh'a estreita, im placavel.<br />

Aquelle 6 o principio <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>, <strong>de</strong> progresso-a utopia.<br />

Este o principio cahotico, <strong>de</strong> morte-a reacçào.<br />

D'aqui as expressões syntheticas <strong>do</strong> viver <strong>do</strong> homem : - lucta<br />

e trabalho.<br />

O nosso cyclo é o cyclo <strong>do</strong> christianismo, b cyclo <strong>da</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />

<strong>da</strong> egual<strong>da</strong><strong>de</strong> e <strong>da</strong> fraterni<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

A sua ultima palavra, que o futuro par<strong>da</strong>, é o socialismo.<br />

To<strong>do</strong>s os cyclos têm um homem que lhe <strong>de</strong>scrobre a lei, a<br />

alma, a idPa.<br />

A <strong>de</strong>scoberta firma-se sempre com o sangue <strong>do</strong> mnrtyrio.<br />

To<strong>do</strong>s os cyclos tem uma Iegrn<strong>da</strong>, traducçzo perpetua<strong>da</strong> <strong>do</strong><br />

prnsarnento vivo qiie se dcsinvolve <strong>do</strong>ntro d'elle.<br />

A origem divina &lhe sempre attri1)iii<strong>da</strong>.<br />

To<strong>do</strong>s os cyclos tem iim symbolo, que sc ergue juncto <strong>do</strong> seu<br />

berço e se apaga quan<strong>do</strong> piíra a sua dcsenvolução.<br />

A este symbolo cerca-o a a<strong>do</strong>ração.<br />

O nosso cyclo tem o Chiisto, a Bihlia e a Cruz.


INDICE<br />

Pag .<br />

P~UYIUAE.. .................................................. 9<br />

PARTE PRIMEIRA<br />

...............................<br />

........<br />

.................<br />

CAPITULO I -Tempos apostolicoa. 19<br />

CAPITULO 11-Dee<strong>de</strong> os tempos apostolicos até Constantino.. 27<br />

CAPITULO 111-Des<strong>de</strong> Constantino att5 o seculo ix.. 43<br />

CAPITULO IV-As falsa8 <strong>de</strong>cretaes ............................... 91<br />

.........<br />

CAPITULO V- Des<strong>de</strong> o seculo IX até o Concilio Tri<strong>de</strong>ntino.. 99<br />

CAPITULO VI-A SB apostolica e as egrejas nacionaes; ultimo esta<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

direito <strong>da</strong> egreja ................................ 111<br />

PARTE SEGUNDA<br />

LBGI~LA~ÃO ECCLESIASTICA POBTUGUEZA A BEBPEITO DA EEECÇÃO,<br />

su~~nwlio, UNIÃO, DIVI~O, E CIRCUMBCBIPÇÃO<br />

DAS DIOCEBES E IETBOPOLES<br />

CAPITULO I -A egreja portugueza e suas liber<strong>da</strong><strong>de</strong>s ............... 123'<br />

CAPITULO 11-0 Esta<strong>do</strong> portugues e a erecglo <strong>do</strong>e bispa<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Portugal<br />

até o tempo <strong>do</strong> D. Joeb I ......................... 153<br />

CAPITUW 111 -O Summo imperjo: protecqb e inspec* suprema. .... 169<br />

CAPITULO IV - A religilo <strong>do</strong> reino ............................... 183<br />

CAPITULO V-Ultimas palavras a.. 197<br />

........................<br />

......


ERRATAS PRINCIPAES<br />

Errou<br />

toute<br />

toute<br />

dizcmos<br />

assento<br />

Rerlamino<br />

Iadca<strong>da</strong><br />

aberrams<br />

Petiiio e Carlos magno<br />

Leao Beryta<br />

Castellar<br />

fasci-nação<br />

que os leva<br />

coinpi rlien<strong>de</strong><br />

(<strong>do</strong> aiitrirnario) 17<br />

respectiva<br />

ren<strong>de</strong><br />

21<br />

toutes<br />

toi1t<br />

digamos<br />

aseeutirncnto<br />

Bellarmiiio<br />

lar<strong>de</strong>a<strong>da</strong><br />

abnegciçces<br />

Pepin e Karl o grai~<strong>de</strong><br />

Leão, 8eryta<br />

Castelar<br />

fascina~ão<br />

os levn<br />

e ~los~a<br />

resprctiva<br />

revela<br />

27

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!