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Daisy Justus 1 (p. 1 1)

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Em sua versão primeira, o livro Á gua Viva recebeu de<br />

Clarice o título Atrás do pensamento: Monólogo com a vida.<br />

Depois de fazer alguns cortes, "cortando e torturando durante<br />

três anos", Clarice passou a chamá-lo Objeto gritante. Final­<br />

mente, Á gua Viva, o "romance sem romance".<br />

Clarice Lispector cria um texto híbrido, que transita entre<br />

o orgânico e o inorgânico, produto de intensa liberdade e uma<br />

postura revolucionária frente à escrita. Movido pela fluidez<br />

e pela agudeza o livro coloca de lado os princípios do texto<br />

convencional, abandonando as normas "começo/ meio/ fim",<br />

ou ainda, "sujeito/verbo/predicado". Desobriga-se das for­<br />

malidades, fazendo uma verdadeira convulsão de linguagem,<br />

segundo a própria Clarice, em incessante movimento de deslo­<br />

camento e descolamento. Uma linguagem que tem a marca do<br />

inconcluso, do não fechamento. A frase final do livro aponta<br />

exatamente para isso:<br />

"O que te eJCrevo continua, e eJtou enfeitiçada". (p. 1 O 1)<br />

Para Clarice cada palavra é uma idéia. Constrói uma<br />

espécie de revelação imediata do mundo, que leva o leitor a<br />

sentir-se imerso e edificado pela mesma trama que teceu as<br />

coisas, os objetos. Segundo Lucia Helena "com Á gua Viva a<br />

escrita de Lispector se insere na categoria dos textos "escre­<br />

víveis", tratados por Roland Barthes. Ou seja, a cena fulgor<br />

vital da obra é a da própria escrita, como se aí se revelasse mais<br />

intensamente- no limiar, digamos- o aspecto transgressor da<br />

poética de Clarice Lispector". 5<br />

Á gua Viva é um monólogo. Uma poesia escrita em pro­<br />

sa, onde o enredo tem importância secundária, assim como<br />

o espaço geográfico e o tempo, uma vez que a narrativa con­<br />

centra-se no espaço emocional. Predomina também o tempo<br />

psicológico, onde essa mesma narrativa quer seguir o fluxo<br />

do pensamento.<br />

Lucia Castello Branco observa que Clarice sabia certa­<br />

mente que a linguagem não alcança "o atrás do pensamento".<br />

Mas ao propor a expressão do indizível, ela vai lançar mão,<br />

5 LUCIA HELENA Nem Musa Nem Medusa. Rio de janeiro: EDUFr 1997 p. 84<br />

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