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Maria da Conceição Pereira - ISPV<br />
ÁLVARO BARREIRINHAS CUNHAL<br />
nasceu na freguesia da Sé Nova, em Coimbra, no dia 10<br />
<strong>de</strong> Novembro <strong>de</strong> 1913.<br />
Vive a infância em Seia, terra natal do pai, <strong>de</strong><br />
on<strong>de</strong> sai aos onze anos para Lisboa. Aí frequenta os<br />
liceus Pedro Nunes e Camões e, em 1931, com apenas<br />
17 anos, ingressa na Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Direito. Nesse mesmo<br />
ano alista-se nas fileiras do Partido Comunista<br />
Português e, ainda, na Liga dos Amigos da URSS e do<br />
Socorro Vermelho Internacional. Em 1934 é o<br />
representante dos estudantes <strong>de</strong> Lisboa no Senado<br />
Universitário. No ano seguinte entra na clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong><br />
e, em Moscovo, participa no VI Congresso da<br />
Internacional Juvenil Comunista.<br />
A memória das instituições constroi-se em cada fracção do tempo.<br />
De forma imperce<strong>pt</strong>ível. Mas imperecível. Nos volumes e nas<br />
silhuetas <strong>de</strong> arquitecturas nascidas <strong>de</strong> energias germinadas no<br />
pensamento. Nas pal<br />
alavr<br />
vras as e nas i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> quem nelas as trabalha e nas<br />
daqueles que as privilegiam com a sua presença solidária.<br />
Em 1936 integra o Comité Central do Partido Comunista Português<br />
e, volvido um ano, é preso pela primeira vez. Em 1940, e apesar <strong>de</strong><br />
encarcerado pela segunda vez, efectua na Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Direito <strong>de</strong> Lisboa,<br />
sob escolta policial, o seu exame final <strong>de</strong> curso, que conclui com média <strong>de</strong> 16<br />
valores, e on<strong>de</strong> apresentou uma tese sobre a realida<strong>de</strong> social do aborto.<br />
Em 1949 é preso pela terceira vez. Julgado e con<strong>de</strong>nado, é<br />
transferido para a prisão-fortaleza <strong>de</strong> Peniche em 1958, <strong>de</strong> on<strong>de</strong> consegue<br />
evadir-se no início dos anos 60, após engenhosa fuga. Um ano <strong>de</strong>pois é<br />
eleito Secretário-Geral do Partido Comunista Português. O 25 <strong>de</strong> Abril<br />
apanha-o em Paris, <strong>de</strong> on<strong>de</strong> regressa cinco dias <strong>de</strong>pois.<br />
Em Portugal, para além da activida<strong>de</strong> partidária, exerceu os cargos<br />
<strong>de</strong> Ministro sem pasta nos I, II III e IV governos provisórios e, em 1975, é<br />
eleito <strong>de</strong>putado à Assembleia Constituinte. Posteriormente, e nas sucessivas<br />
eleições legislativas, é eleito <strong>de</strong>putado à Assembleia da República. Em 1982<br />
torna-se membro do Conselho <strong>de</strong> Estado, cargo que ocupa durante <strong>de</strong>z anos.<br />
Em 1992 abandona o cargo <strong>de</strong> Secretário-Geral do Partido<br />
Comunista. A par <strong>de</strong> alguma activida<strong>de</strong> política, o país fica a conhecer mais<br />
duas vertentes da sua multifacetada personalida<strong>de</strong>. Romancista e artista<br />
plástico. Na primeira, assumindo-se como Manuel Tiago, o autor <strong>de</strong> Até<br />
Amanhã, Camaradas. Na segunda, dando à estampa, em 1996, um ensaio<br />
sobre estética on<strong>de</strong>, ao longo <strong>de</strong> 14 capítulos, explana as suas i<strong>de</strong>ias sobre o<br />
tema numa obra intitulada A Arte, O Artista e a Socieda<strong>de</strong>.<br />
4Talvez por isso, em 1997 damos <strong>de</strong> caras com Álvaro Cunhal nas<br />
instalações da Escola Superior <strong>de</strong> Educação, para as comemorações do seu<br />
14º Aniversário, para se pronunciar sobre A Liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Criação Artística<br />
e a Arte na Socieda<strong>de</strong>. Ouvimo-lo dizer, por exemplo, que “o artista não<br />
po<strong>de</strong> existir isolado, pois tem <strong>de</strong> existir algo que justifique a sua existência,<br />
melhor dizendo, algo para que ele possa existir e manifestar-se” (…) “a<br />
socieda<strong>de</strong>”. Ainda na sua opinião, “a arte que o artista produz é um valor e<br />
um elemento da própria socieda<strong>de</strong> que o ro<strong>de</strong>ia”.<br />
No dizer do velho lí<strong>de</strong>r, na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Viriato “a arte cerca-nos<br />
por todos os lados”.<br />
Mais adiante na sua intervenção, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>u que “se a obra<br />
criada não é <strong>de</strong>struída, passa a ser um valor da socieda<strong>de</strong> e a pertencer<br />
a todos”. À laia <strong>de</strong> reforço <strong>de</strong>ste seu raciocínio, reafirma que “são <strong>de</strong><br />
con<strong>de</strong>nar todas as formas <strong>de</strong> impedir a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> criação artística”.<br />
Também em seu enten<strong>de</strong>r “a criação artística enquanto elemento social<br />
não po<strong>de</strong> estar submetida a nenhum tipo <strong>de</strong> imposição <strong>de</strong> qualquer<br />
espécie, seja ela <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m política ou religiosa”.<br />
Referindo-se à pornografia, em seu enten<strong>de</strong>r, esta, “avulsa<br />
que nos inva<strong>de</strong> todos os dias pela televisão”, mais não é do que “uma<br />
forma <strong>de</strong> subverter o nu artístico e a sensualida<strong>de</strong>”. Disse, ainda, que<br />
esta “infelizmente é banalizada e entra pelas nossas casas <strong>de</strong>ntro sem<br />
pedir licença, como uma forma adulterada da sensualida<strong>de</strong> e do amor,<br />
subvertendo os valores da sensualida<strong>de</strong> humana e da dignida<strong>de</strong> das<br />
pessoas”. Para si, não passa <strong>de</strong> “um insulto às pessoas com imagens<br />
muito reles e pouco dignas da beleza que a nu<strong>de</strong>z humana imprime num<br />
acto <strong>de</strong> ternura, sensualida<strong>de</strong> e sexualida<strong>de</strong>”. Defen<strong>de</strong>u, ainda, que “não<br />
tem nada a ver com o amor nem com sensualida<strong>de</strong> e muito menos com<br />
arte”.<br />
Foi um ginásio completamente lotado e transformado em<br />
sala <strong>de</strong> congressos, que ouviu o eminente orador dizer, já no final da sua<br />
intervenção e a propósito do nu artístico, que “o amor, a sensualida<strong>de</strong><br />
e o sexo são valores <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> riqueza humana, que nada têm a ver com<br />
a pornografia barata e avulsa que por aí existe”.<br />
“Estou fascinada por este homem”! Foi apenas uma das muitas<br />
frases <strong>de</strong> admiração que ouvimos, e que nos ficou na memória.