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Início de semestre letivo e o professor<br />
Victor Hugo Soares, da Escola<br />
Classe 419 de Samambaia, como<br />
faz todos os anos, promove um bate-papo<br />
com seus alunos sobre futuro<br />
profissional. Um exercício importante<br />
de reflexão e estímulo aos jovens. Este<br />
ano, no entanto, ao invés de fazer a tradicional<br />
pergunta “O que você quer ser<br />
quando crescer?”, o professor indaga à<br />
classe: Quem quer ser pesquisador?<br />
Um silêncio, então, ecoa nos corredores<br />
das escolas e reverbera, de forma uníssona,<br />
uma realidade crítica e cada vez<br />
mais preocupante na capital do país: o<br />
distanciamento da ciência, tecnologia,<br />
inovação, pesquisa e desenvolvimento<br />
do cotidiano do brasiliense. O acesso<br />
ao conhecimento produzido em universidades,<br />
centros de pesquisas e instituições<br />
públicas continua distante do<br />
cidadão. E o mais alarmante, distante<br />
das centenas de escolas de ensino médio<br />
e fundamental do Distrito Federal.<br />
Situação ainda mais grave para aqueles<br />
alunos que se encontram em zonas de<br />
vulnerabilidade social.<br />
Tendo em vista os níveis de escolaridade<br />
e cultural dos pais e a ausência<br />
de políticas públicas eficazes voltadas<br />
para o desenvolvimento de uma<br />
cultura científica e de atração de novos<br />
talentos, isso significa, a médio<br />
e longo prazo, o desaparecimento<br />
do horizonte científico e da pesquisa<br />
para mais de 130 mil estudantes do<br />
ensino fundamental e médio do DF,<br />
colocando em risco a profissão de<br />
pesquisador na capital.<br />
Aliás, para muitos alunos, a única esperança,<br />
praticamente, se concentra<br />
no esforço, quase que exclusivo e individual,<br />
de professores, como Ariomar<br />
Nogueira, diretor do Centro de Ensino<br />
Médio Integrado do Gama. Ele estimula<br />
a permanência, fora do horário de<br />
expediente, de um grupo de alunos e<br />
professores que se dedicam a fazer<br />
descobertas e invenções para facilitar<br />
a vida do cidadão e preservar os recursos<br />
naturais. Esforço que rendeu reconhecimento<br />
internacional para escola<br />
e o professor, um futuro promissor<br />
para os estudantes no campo da pesquisa<br />
e visibilidade e movimentação<br />
econômica para o Distrito Federal. Um<br />
exemplo de superação, com resultados<br />
surpreendentes, no entanto, não usual<br />
e, infelizmente, não sustentável. Sem<br />
apoio do Estado e com escolas sem<br />
estruturas, mesmo com vários professores<br />
como o Victor e o Ariomar, o<br />
crescimento esbarra na falta de políticas<br />
públicas. Assim, o jovem inventor<br />
- possível pesquisador -conhece desde<br />
cedo as dificuldades de se pesquisar e<br />
busca refúgio em outras áreas mais<br />
estáveis, muitas vezes saturadas.<br />
E o problema é de âmbito nacional.<br />
Apesar do crescimento vertiginoso<br />
da produção científica e o aumento<br />
de investimentos na área nos últimos<br />
dez anos, aquém do ideal, mas significativo,<br />
a sexta economia do mundo<br />
possui, de acordo com o Ministério<br />
de Ciência e Tecnologia, 72 mil pesquisadores.<br />
Um número inexpressivo<br />
levando-se em consideração o tamanho<br />
da população brasileira e quando<br />
comparado as potências, como os Estados<br />
Unidos, com mais de um milhão<br />
de pesquisadores. São quatro a cinco<br />
pesquisadores por mil habitantes, enquanto<br />
no Brasil não temos nenhum.<br />
E o futuro fica nebuloso. A arte e o ofício<br />
de pesquisar parece estar em extinção.<br />
A média de idade dos profissionais<br />
que se dedicam à pesquisa, no Brasil,<br />
é alta, acima dos 50 anos, o que indica<br />
a urgente necessidade de ingresso de<br />
jovens nesse meio. Em Brasília, a situação<br />
não é diferente e o desenvolvimento<br />
da capital passa a correr riscos.<br />
Está claro que os esforços atuais, apesar<br />
de importantes, não são suficientes<br />
para estimular os alunos e as novas<br />
mentes a se dedicarem à pesquisa científica,<br />
tecnológica e de desenvolvimento<br />
na capital do País. Mais estrutura,<br />
reconhecimento, valorização e investimento<br />
são necessidades urgentes.<br />
No entanto, com 54 anos de vida, Brasília,<br />
com mais de 110 instituições públicas e<br />
privadas relacionadas, direta e indiretamente,<br />
com a ciência, tecnologia e a inovação,<br />
envolvendo mais de um quarto da<br />
população, continua carente, sem poder<br />
de atração e dependente da importação<br />
de cabeças pensantes. Se os governantes<br />
repetissem a atenção que dedicam ao futebol<br />
à ciência, quem sabe não teríamos,<br />
em Brasília, ou no Brasil, alguns prêmios<br />
Nobel, além de taças da Copa do Mundo.<br />
Enquanto isso, o silêncio tende a ser, durante<br />
um bom tempo, a resposta para a<br />
pergunta do professor Victor. E ai? Quem<br />
quer ser pesquisador?<br />
quer ser pesquisador?<br />
EVOKEABR2014