05.11.2014 Views

Prosa 2 - Academia Brasileira de Letras

Prosa 2 - Academia Brasileira de Letras

Prosa 2 - Academia Brasileira de Letras

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Ciência e arte: a visão <strong>de</strong> Carlos Chagas Filho<br />

A polêmica provocada por Snow prolongou-se por anos a fio. Ainda recentemente,<br />

em 2003, o conhecido naturalista Stephen Jay Gould rotulou-a<br />

como inapropriada, reducionista e lesiva ao <strong>de</strong>bate científico-cultural.<br />

A indignada reação fez com que Snow voltasse atrás; em 1963, ele falava <strong>de</strong><br />

uma mediadora “terceira cultura”, expressão que <strong>de</strong>u título a um livro <strong>de</strong> John<br />

Brockman, publicado em 1995 e intitulado The Third Culture: beyond the Scientific<br />

Revolution, A Terceira Cultura: para além da Revolução Científica. Muitos cientistas,<br />

diz Brockman, notadamente biólogos evolucionistas, psicólogos, neurocientistas,<br />

completam os literatos na tarefa <strong>de</strong> “moldar o pensamento <strong>de</strong> sua geração”.<br />

Posição, portanto, conciliadora.<br />

No Brasil, uma contribuição interessante para o <strong>de</strong>bate foi dada por Carlos<br />

Chagas Filho (1910-2000), ocupante da Ca<strong>de</strong>ira 9 da <strong>Aca<strong>de</strong>mia</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>de</strong><br />

<strong>Letras</strong>. Médico, professor, cientista, diplomata, ensaísta, Chagas Filho tinha a<br />

ciência no genoma: era filho do gran<strong>de</strong> médico Carlos Chagas, cuja carreira incluiu<br />

uma verda<strong>de</strong>ira proeza científica: <strong>de</strong>scobriu a doença que leva seu nome,<br />

<strong>de</strong>screveu o quadro clínico, i<strong>de</strong>ntificou o agente causador e a forma <strong>de</strong> transmissão.<br />

Uma figura ímpar, portanto, mas isso, que em outros casos po<strong>de</strong> repercutir<br />

nos filhos <strong>de</strong> forma traumática, aparentemente não perturbou o menino<br />

Chagas Filho, ao contrário. Como afirma em artigo publicado na Revista da<br />

<strong>Aca<strong>de</strong>mia</strong> <strong>Brasileira</strong> <strong>de</strong> <strong>Letras</strong> (Vol. 157, 1989):<br />

Revivendo minha vida, não encontro nenhuma <strong>de</strong>scontinuida<strong>de</strong> e tempo<br />

<strong>de</strong> fricção no meu relacionamento com meu pai. Foi ele sempre linear, pleno<br />

<strong>de</strong> amiza<strong>de</strong>, carinho e admiração. Esta só po<strong>de</strong>ria crescer e o fez ainda<br />

mais, à medida que fui evoluindo como universitário e cientista. Creio que<br />

esta afeição íntima foi o resultado, também, da ação <strong>de</strong> minha mãe, que nos<br />

educou, a mim e a Evandro, meu irmão, na constância <strong>de</strong> uma admiração<br />

incomparável por nosso pai.<br />

Esta admiração se refletiu na escolha profissional: tanto Evandro como<br />

Chagas Filho cursaram a Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Medicina. É uma situação muito co-<br />

77

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!