18.11.2014 Views

Clique aqui e baixe o pdf do catálogo. - Pinacoteca do Estado de ...

Clique aqui e baixe o pdf do catálogo. - Pinacoteca do Estado de ...

Clique aqui e baixe o pdf do catálogo. - Pinacoteca do Estado de ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

SEIS SÉCULOS DE<br />

PINTURA CHINESA<br />

Coleção <strong>do</strong> Musée Cernuschi, Paris


2<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS<br />

SEIS SÉCULOS DE<br />

PINTURA CHINESA<br />

Coleção <strong>do</strong> Musée Cernuschi, Paris<br />

Apoio<br />

Realização


4<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS<br />

SUMÁRIO<br />

APRESENTAÇÃO<br />

9<br />

A PINTURA CHINESA NO MUSÉE CERNUSCHI<br />

11<br />

HENRI CERNUSCHI E A PINTURA CHINESA<br />

15<br />

AS DEZ ETAPAS DE UMA “VIAGEM IMÓVEL” NA PINTURA CHINESA<br />

19<br />

DINASTIA MING<br />

31<br />

DINASTIA QING<br />

47<br />

O MOVIMENTO EPIGRÁFICO E A RENOVAÇÃO DA PINTURA CHINESA<br />

61<br />

VIAJANDO NO JAPÃO<br />

75<br />

DESCOBRINDO O OESTE<br />

93<br />

RENASCIMENTO DA PAISAGEM<br />

103


APRESENTAÇÃO<br />

É uma gran<strong>de</strong> satisfação para a <strong>Pinacoteca</strong> <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> São Paulo apresentar a<br />

nossos visitantes a mostra Seis séculos <strong>de</strong> pintura chinesa no Musée Cernuschi,<br />

Paris que dá sequência a nosso programa <strong>de</strong> exposições temporárias com enfoque<br />

em momentos relevantes da história da arte mundial. A arte chinesa, e mais<br />

especificamente a pintura, ainda hoje é um tema pouquíssimo conheci<strong>do</strong> entre nós.<br />

Quase <strong>de</strong>sconheci<strong>do</strong>, po<strong>de</strong>ríamos até dizer. Pautada por uma concepção <strong>de</strong> mun<strong>do</strong><br />

absolutamente diversa da oci<strong>de</strong>ntal, impregnada da noção <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong> – em<br />

oposição a nosso entendimento, basea<strong>do</strong> na ruptura –, a arte chinesa <strong>de</strong>manda<br />

<strong>de</strong> seus aprecia<strong>do</strong>res uma posição distinta. Disponibilizar a to<strong>do</strong>s as ferramentas<br />

necessárias para a apreciação <strong>de</strong>ssa arte é um <strong>do</strong>s objetivos <strong>de</strong>ste <strong>catálogo</strong>.<br />

A exposição <strong>de</strong>sse conjunto <strong>de</strong> pinturas na <strong>Pinacoteca</strong> <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> também nos<br />

dá a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> nos aproximar <strong>de</strong> uma figura que, apesar <strong>de</strong> não estar<br />

incluída na tradicional história da arte no Brasil, viveu cerca <strong>de</strong> vinte anos no país<br />

e expôs em Bienais <strong>de</strong> São Paulo: Zhang Daqian. Ele chegou <strong>aqui</strong> em 1953, após<br />

uma passagem por Men<strong>do</strong>za, na Argentina, e manteve residência no Brasil até<br />

1972, quan<strong>do</strong> se mu<strong>do</strong>u para a Califórnia, nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s. Construiu em Mogi<br />

das Cruzes (SP) um refúgio, on<strong>de</strong> viveu e trabalhou, e que serviu <strong>de</strong> palco para o<br />

Jardim das oito virtu<strong>de</strong>s [Ba<strong>de</strong> yuan], hoje infelizmente <strong>de</strong>sapareci<strong>do</strong>. Nesse local,<br />

havia um túmulo para seus pincéis usa<strong>do</strong>s e o artista criava animais tipicamente<br />

chineses, como o gibão. Algumas das obras <strong>aqui</strong> expostas foram executadas<br />

durante sua permanência no Brasil, e esta mostra nos dá oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vê-las<br />

no lugar on<strong>de</strong> foram produzidas.<br />

Esta publicação foi pensada para servir como um guia amplia<strong>do</strong> da exposição.<br />

Além <strong>de</strong> reproduções <strong>de</strong> obras, apresenta textos críticos sobre a história <strong>do</strong> Musée<br />

Cernuschi e seu funda<strong>do</strong>r, uma introdução à pintura chinesa e comentários sobre<br />

as obras. Para aten<strong>de</strong>r o maior número possível <strong>de</strong> pessoas e nos alinhar com<br />

os novos formatos editoriais <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> contemporâneo, experimentamos, pela<br />

primeira vez, o formato digital <strong>de</strong> publicação, que está disponível para <strong>do</strong>wnload<br />

gratuito no site da <strong>Pinacoteca</strong>.<br />

A cura<strong>do</strong>ria <strong>de</strong>sta exposição coube a Éric Lefebvre, a quem gostaria <strong>de</strong> registrar<br />

nossos mais profun<strong>do</strong>s agra<strong>de</strong>cimentos pelo entusiasmo, pela <strong>de</strong>dicação e<br />

competência em to<strong>do</strong>s os momentos, assim como a Christine Shimizu, diretora<br />

<strong>do</strong> Musée Cernuschi. Esta mostra não teria si<strong>do</strong> possível sem o apoio <strong>do</strong><br />

Consula<strong>do</strong> Geral da França em São Paulo, nosso parceiro <strong>de</strong> longa data. Também<br />

gostaria <strong>de</strong> agra<strong>de</strong>cer a to<strong>do</strong>s que colaboraram direta ou indiretamente conosco<br />

na concretização <strong>de</strong>ste projeto, que busca oferecer ao público a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

conhecer estas magníficas pinturas.<br />

Ivo Mesquita<br />

Diretor Técnico


8<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS<br />

A PINTURA CHINESA NO MUSÉE CERNUSCHI<br />

O reduzi<strong>do</strong> número <strong>de</strong> pinturas chinesas e japonesas que constam <strong>do</strong> primeiro<br />

inventário <strong>do</strong> Musée Cernuschi confirma a preferência <strong>de</strong> seu funda<strong>do</strong>r pelo<br />

bronze e pela cerâmica. No entanto, os raros <strong>do</strong>cumentos visuais que mostram<br />

as salas <strong>do</strong> museu em 1898 indicam que as pinturas tinham um papel mais<br />

importante na mostra das coleções asiáticas <strong>de</strong> Henri Cernuschi (1821-1896)<br />

<strong>do</strong> que se supunha por seu número. A análise das pinturas chinesas revela um<br />

interesse singular pela pintura a <strong>de</strong><strong>do</strong>, interesse ilustra<strong>do</strong> por obras monumentais<br />

assinadas pelos maiores mestres <strong>de</strong>ssa técnica, entre eles Gao Qipei (1672-1734).<br />

Esses <strong>do</strong>is aspectos são característicos das primeiras gerações <strong>de</strong> coleciona<strong>do</strong>res<br />

europeus <strong>de</strong> pintura chinesa. De fato, o interesse espontâneo pela pintura<br />

<strong>de</strong> personagem prece<strong>de</strong> a <strong>de</strong>scoberta da paisagem, sobre a qual <strong>de</strong>viam se<br />

concentrar as pesquisas <strong>de</strong> vários historia<strong>do</strong>res oci<strong>de</strong>ntais no século XX. No<br />

entanto, a originalida<strong>de</strong> <strong>do</strong> processo e o caráter virtuoso das pinturas a <strong>de</strong><strong>do</strong><br />

impressionaram por muito tempo os aprecia<strong>do</strong>res franceses. Assim, as obras <strong>de</strong><br />

Fu Wen (ativo <strong>de</strong> 1744 a 1765), um <strong>do</strong>s segui<strong>do</strong>res mais importantes <strong>de</strong> Gao Qipei,<br />

<strong>de</strong> quem Henri Cernuschi adquirira duas pinturas entre 1871 e 1873, figuravam<br />

muito bem tanto na exposição organizada a partir <strong>do</strong> acervo reuni<strong>do</strong> por Paul<br />

Pelliot (1878-1945), no Louvre, em 1904, 1 quanto na <strong>do</strong> Musée Cernuschi, em 1912.<br />

Aos olhos <strong>do</strong>s melhores especialistas <strong>do</strong> início <strong>do</strong> século XX, parecia impossível<br />

apresentar a pintura chinesa a um público leigo sem mencionar exemplos da<br />

técnica a <strong>de</strong><strong>do</strong>, ainda que se assumisse uma posição contrária a essas pinturas,<br />

como Raphaël Petrucci (1872-1907), que as consi<strong>de</strong>rava “virtuosida<strong>de</strong>s inúteis,<br />

que afastam <strong>do</strong> <strong>do</strong>mínio da arte”. 2<br />

1. Chavannes, 1904, p. 322.<br />

2. Chavannes e Petrucci, 1914, p. 60.<br />

3. A pintura a <strong>de</strong><strong>do</strong> iria passar por um<br />

longo perío<strong>do</strong> <strong>de</strong> esquecimento, até que<br />

a gran<strong>de</strong> exposição <strong>de</strong>dicada a Gao Qipei<br />

pelo Rijksmuseum <strong>de</strong> Amsterdã, em 1992,<br />

<strong>de</strong>volvesse-lhe a atenção (Ruitenbeek 1992).<br />

O comentário <strong>de</strong>sse crítico <strong>de</strong> arte indica o mo<strong>do</strong> como o <strong>de</strong>senvolvimento<br />

<strong>do</strong>s conhecimentos sobre a pintura chinesa <strong>de</strong>sviaria, progressivamente, os<br />

aprecia<strong>do</strong>res da pintura a <strong>de</strong><strong>do</strong> tão estimada por Cernuschi. 3 Entretanto, é<br />

importante observar que Henri Cernuschi adquirira diferentes exemplares<br />

<strong>do</strong> manual <strong>de</strong> pintura Jiezi yuan huachuan, <strong>do</strong> qual ele havia pressenti<strong>do</strong><br />

um interesse <strong>do</strong>cumental, mais <strong>de</strong> trinta anos antes <strong>de</strong> Petrucci se <strong>de</strong>dicar


10<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS 11<br />

ao estu<strong>do</strong> da obra principal, que ele traduzia pelo título Enseignementes <strong>de</strong><br />

obras <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, e que frequentam mais as galerias da Ma<strong>de</strong>leine <strong>do</strong><br />

la peinture du jardin grand comme un grain <strong>de</strong> moutar<strong>de</strong>. Encyclopédie <strong>de</strong><br />

que as salas <strong>do</strong> Louvre. Surpreendi-os sonhan<strong>do</strong> diante <strong>de</strong> Ma-Lin [Ma<br />

la peinture chinoise. Com É<strong>do</strong>uard Chavannes (1865-1918), Petrucci seria um<br />

Lin] e <strong>de</strong> Tchao-mong-fou [Zhao Mengfu]. Seria um sinal <strong>do</strong>s tempos?<br />

<strong>do</strong>s principais artífices da primeira exposição <strong>de</strong> pintura chinesa <strong>do</strong> Musée<br />

Cernuschi, organizada pelo cura<strong>do</strong>r Henri d’Ar<strong>de</strong>nne <strong>de</strong> Tizac (1877-1932), 4 em<br />

1912. Essa mostra, que compreendia 144 pinturas, era composta exclusivamente<br />

<strong>de</strong> empréstimos concedi<strong>do</strong>s pelos principais coleciona<strong>do</strong>res e negociantes. A<br />

exposição, que reunia as obras por gênero e assunto, pretendia contribuir<br />

para o estu<strong>do</strong> histórico <strong>de</strong>ssas pinturas, <strong>de</strong>signan<strong>do</strong>-lhes datas e autoria.<br />

A publicação <strong>de</strong> um <strong>catálogo</strong> ilustra<strong>do</strong>, incluin<strong>do</strong> a transcrição e a tradução<br />

das inscrições das pinturas, testemunha a ambição científica <strong>de</strong>sse projeto.<br />

A exposição, que reunia os intelectuais e os coleciona<strong>do</strong>res mais importantes<br />

da época, não foi, no entanto, imediatamente seguida <strong>de</strong> <strong>aqui</strong>sições. Em uma<br />

carta datada <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1912, Henri d’Ar<strong>de</strong>nne <strong>de</strong> Tizac, ao evocar o gosto<br />

<strong>de</strong> Victor Segalen (1878-1919) pela pintura chinesa, exclamou: “Que bom que ele<br />

consegue <strong>de</strong>scobrir coisas belas! Há alguns meses, o que chega a Paris é muito<br />

fraco. Contu<strong>do</strong>, recebi <strong>do</strong> sr. Freer, que certamente é o maior coleciona<strong>do</strong>r<br />

americano, as fotografias <strong>de</strong> algumas peças que lhe pertencem: elas me<br />

fizeram mergulhar nas profun<strong>de</strong>zas da felicida<strong>de</strong>”. Realmente, o cura<strong>do</strong>r <strong>do</strong><br />

Musée Cernuschi precisou esperar até 1920 para finalmente adquirir a primeira<br />

pintura chinesa que correspon<strong>de</strong>sse às expectativas formuladas naquela carta.<br />

A chegada <strong>de</strong> uma pintura representan<strong>do</strong> um falcão, tema este que constituía<br />

uma das partes da exposição <strong>de</strong> 1912, po<strong>de</strong>, realmente, ser consi<strong>de</strong>rada<br />

o resulta<strong>do</strong> <strong>de</strong> pesquisas realizadas nos tempos <strong>de</strong> sua colaboração com<br />

Chavannes e Petrucci. Essa <strong>aqui</strong>sição <strong>de</strong>veria ficar isolada. A morte <strong>de</strong>sses<br />

<strong>do</strong>is intelectuais e as difíceis condições <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> entreguerras impediram<br />

qualquer nova exposição <strong>de</strong> uma envergadura como a <strong>de</strong> 1912. O interesse <strong>de</strong><br />

D’Ar<strong>de</strong>nne <strong>de</strong> Tizac pela pintura chinesa, 5 soma<strong>do</strong> à sua fascinação pela China<br />

antiga, orientou-o para a coleta e o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong>s relevos impressos sobre papel,<br />

sobretu<strong>do</strong> das séries provenientes <strong>do</strong> monumento funerário Wu Liang ci.<br />

Para<strong>do</strong>xalmente, foi a chegada a Paris <strong>do</strong>s artistas chineses que vieram se formar<br />

no Oci<strong>de</strong>nte que favoreceu a aproximação entre o Musée Cernuschi e a criação<br />

contemporânea. É conheci<strong>do</strong> o importante papel que Xu Beihong (1895-1953)<br />

exerceu na organização da exposição <strong>de</strong> pintura chinesa apresentada no museu<br />

Jeu <strong>de</strong> Paume, em Paris, em 1933. Esse evento foi um prece<strong>de</strong>nte notável para a<br />

exposição <strong>de</strong> pinturas chinesas contemporâneas que ocorreu no Musée Cernuschi<br />

em 1946. Organizada por Vadime Elisseeff (1918-2002), sob o patronato <strong>de</strong> René<br />

Grousset (1885-1952), a exposição <strong>de</strong> 1946 reuniu mais <strong>de</strong> uma centena <strong>de</strong> obras<br />

representan<strong>do</strong> diversas tendências da pintura e da escultura contemporâneas.<br />

Paralelamente às composições <strong>do</strong>s pintores ativos na China, estavam as obras<br />

<strong>do</strong>s membros da associação <strong>do</strong>s artistas chineses na França. Para compreen<strong>de</strong>r a<br />

origem <strong>de</strong>ssa exposição, é importante lembrar os laços estabeleci<strong>do</strong>s por Elisseeff<br />

com o meio artístico chinês durante os anos da 2ª Guerra, assim como o papel <strong>do</strong>s<br />

artistas chineses <strong>de</strong> Paris que, reuni<strong>do</strong>s em torno <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong>s como Zhou Lin<br />

ou Pan Yuliang (1895-1977), formavam uma re<strong>de</strong> muito dinâmica. Diferentemente<br />

da exposição <strong>de</strong> 1912, a <strong>de</strong> 1946 foi o ponto <strong>de</strong> partida <strong>de</strong> uma política <strong>de</strong> <strong>aqui</strong>sição<br />

e <strong>de</strong> exposição que vincularia, por muito tempo, o Musée Cernuschi à aventura da<br />

pintura chinesa contemporânea. Cerca <strong>de</strong> cinquenta obras apresentadas em 1946<br />

provinham da coleção <strong>de</strong> Guo Youshou (1900-1978), que, a partir <strong>de</strong> 1953, seria o<br />

cerne da coleção <strong>de</strong> pinturas mo<strong>de</strong>rnas e contemporâneas <strong>do</strong> Musée Cernuschi.<br />

Guo Youshou, que estudara na Europa nos anos 1920, havia teci<strong>do</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> essa<br />

época laços <strong>de</strong> amiza<strong>de</strong> com os artistas chineses <strong>de</strong> Paris, como Sanyu [Chang Yu]<br />

(1901-1966) e Xu Beihong (1895-1953). Ten<strong>do</strong> obti<strong>do</strong> seu <strong>do</strong>utora<strong>do</strong>, ele retornou<br />

à China, on<strong>de</strong> seguiu carreira na área <strong>de</strong> administração, sen<strong>do</strong> responsável,<br />

sobretu<strong>do</strong>, pela educação pública da província <strong>de</strong> Sichuan durante os anos da<br />

guerra. Foi nessa época que ele teria acumula<strong>do</strong> maior parte <strong>de</strong> sua coleção,<br />

como o atestam numerosos colofões e <strong>de</strong>dicatórias registradas nas obras pelos<br />

Na época da primeira exposição <strong>de</strong> pintura chinesa, Henri d’Ar<strong>de</strong>nne <strong>de</strong><br />

Tizac queria que as obras <strong>do</strong>s pintores da China antiga inspirassem a criação<br />

contemporânea:<br />

Há quarenta anos, a arte japonesa veio renovar nossa arte <strong>de</strong>corativa.<br />

Não po<strong>de</strong>ria a arte chinesa também <strong>de</strong>sempenhar esse papel? Conheço<br />

jovens pintores que ficam um pouco irrita<strong>do</strong>s quan<strong>do</strong> exaltamos as<br />

4. Cura<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Musée Cernuschi <strong>de</strong> 1905<br />

a 1932.<br />

5. Um interesse que se manifesta tanto<br />

por suas traduções como pelas obras <strong>de</strong><br />

sua coleção pessoal.<br />

6. Em 1956, no Museu <strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna e<br />

no Musée Cernuschi. Em 1961, no Musée<br />

Cernuschi.<br />

artistas. Essa coleção ainda foi enriquecida ao longo das missões que ele cumpriu<br />

na China em 1947 e 1948 a serviço da Unesco, on<strong>de</strong> ocupava o cargo <strong>de</strong> diretor<br />

da seção educativa. Após a <strong>do</strong>ação inicial <strong>de</strong> 76 pinturas em 1953, Guo Youshou<br />

continuou sen<strong>do</strong> amigo <strong>do</strong> museu, colaboran<strong>do</strong> ativamente na organização <strong>de</strong><br />

importantes eventos, como as exposições <strong>de</strong>dicadas a Zhang Dagian (1899-1983),<br />

em 1956 e 1961. 6 Ao longo da segunda meta<strong>de</strong> <strong>do</strong> século XX, não menos <strong>do</strong> que<br />

vinte exposições <strong>de</strong> pintura chinesa foram organizadas no Musée Cernuschi, das


12<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS<br />

quais <strong>do</strong>is terços foram <strong>de</strong>dicadas à obra <strong>de</strong> artistas contemporâneos. Algumas<br />

tendências <strong>de</strong>correm <strong>de</strong>ssas numerosas mostras, como a atenção para o trabalho<br />

com a tinta, ou o lugar cedi<strong>do</strong> às artistas mulheres. 7 Entre esses eventos, alguns<br />

conquistaram um interesse histórico, como a exposição Lin Fon-Min [Lin Fengmian],<br />

peintre chinois contemporain [Lin Fon-Min, pintor chinês contemporâneo], em<br />

1979, a primeira <strong>de</strong>dicada ao artista por um museu estrangeiro após sua partida da<br />

China; ou Wu Guanzhong: peintre chinois <strong>de</strong> notre temps [Wu Guanzhong: pintor<br />

chinês <strong>de</strong> nosso tempo], em 1993, que partilhava <strong>do</strong> reconhecimento internacional<br />

<strong>do</strong> mestre. Ao mesmo tempo, os laços estabeleci<strong>do</strong>s com os artistas levariam o<br />

museu a recolher numerosas <strong>do</strong>ações: assim, a gran<strong>de</strong> exposição das pinturas<br />

contemporâneas <strong>do</strong> acervo <strong>do</strong> museu organizada em 1985 por Marie-Thérèse<br />

Bobot, cura<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> Musée Cernuschi, não contava menos <strong>do</strong> que oitenta obras<br />

introduzidas na coleção, graças à generosida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seus cria<strong>do</strong>res. Os pintores<br />

chineses, estivessem produzin<strong>do</strong> quer na França, quer na China, continuaram, <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

então, a acompanhar o Musée Cernuschi, como indicam as <strong>do</strong>ações simultâneas <strong>de</strong><br />

Chu Teh-chun [Zhu Dequn] (1920) e <strong>de</strong> Wu Guanzhong (1919-2010), em 1993.<br />

A partir <strong>do</strong>s anos 1990, a restauração das pinturas chinesas se tornou uma<br />

das priorida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> museu. De fato, ao longo <strong>do</strong>s anos, as pinturas chinesas<br />

haviam sofri<strong>do</strong> efeitos <strong>de</strong> uma exposição prolongada. A multiplicação das trocas<br />

culturais com a China <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os anos 1980 permitiu <strong>de</strong>senvolver no Oci<strong>de</strong>nte os<br />

conhecimentos nas áreas da restauração e da montagem tradicional chinesas.<br />

Des<strong>de</strong> então, foi possível pensar uma longa campanha <strong>de</strong> restauração. Paralelamente<br />

às obras <strong>do</strong>s gran<strong>de</strong>s mestres <strong>do</strong> século XX, esse trabalho levaria à reavaliação<br />

das pinturas antigas conservadas no museu, entre as quais se encontravam<br />

algumas obras <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> importância, como a gran<strong>de</strong> composição representan<strong>do</strong><br />

a Aca<strong>de</strong>mia Hanlin [Hànlín Yuàn], adquirida pela Socieda<strong>de</strong> <strong>do</strong>s Amigos <strong>do</strong> Musée<br />

Cernuschi em 1975. Então, parecia pertinente esten<strong>de</strong>r as <strong>aqui</strong>sições para as<br />

pinturas chinesas antigas, uma política iniciada com a compra da antiga coleção<br />

Reubi, o que não po<strong>de</strong>ria ser concluída sem a ajuda <strong>do</strong> círculo <strong>do</strong>s especialistas <strong>de</strong><br />

Cernuschi. Os leques Ming e as folhas <strong>de</strong> álbum Qing, outrora reuni<strong>do</strong>s por Jean-<br />

Pierre Dubosc (1904-1988) e François Reubi (1917-1997), permitem apresentar pela<br />

primeira vez aos visitantes as pinturas antigas e mo<strong>de</strong>rnas <strong>do</strong> Musée Cernuschi em<br />

um percurso que evoca seis séculos <strong>de</strong> pintura chinesa.<br />

7. Sobretu<strong>do</strong> Zeng Youhe (1924), Ling<br />

Shuhua (1904-1990), Pan Yuliang, Fang<br />

Junbi (1898-1986), Xiao Shufang (1911).<br />

1. Maucuer, 1998, p. 35-37.<br />

HENRI CERNUSCHI E A PINTURA CHINESA<br />

Durante sua viagem ao Oriente <strong>de</strong> 1871 a 1873, na companhia <strong>de</strong> Théo<strong>do</strong>re Duret<br />

(1838-1927), Henri Cernuschi adquiriu quase 5 mil objetos <strong>de</strong> arte que comporiam<br />

a base das coleções <strong>do</strong> futuro Musée Cernuschi. Entre essas obras, os bronzes<br />

chineses e japoneses, majoritários em número, <strong>de</strong>spertaram a admiração<br />

<strong>do</strong>s críticos na época da exibição temporária organizada em 1873 no Palais <strong>de</strong><br />

l’Industrie. 1 Após a abertura <strong>do</strong> museu ao público, em 1898, os bronzes antigos<br />

prevaleceram em uma coleção focada na <strong>de</strong>scoberta <strong>do</strong>s “momentos áureos da<br />

arte chinesa”. Já as pinturas asiáticas, estas <strong>de</strong>veriam conhecer um outro <strong>de</strong>stino.<br />

Provavelmente penduradas nos salões <strong>do</strong> primeiro andar da mansão da avenida<br />

Velásquez, enquanto Cernuschi estava vivo, elas sem dúvida foram vítimas <strong>de</strong>ssa<br />

exposição prolongada, mesmo que tenham si<strong>do</strong> retiradas <strong>do</strong> local e guardadas<br />

nos primeiros anos seguintes à criação <strong>do</strong> museu. “Em 1912, durante a primeira<br />

exposição <strong>de</strong> pintura chinesa, uma obra <strong>de</strong> Fu Wen foi objeto <strong>de</strong> empréstimo,<br />

enquanto duas <strong>de</strong> suas pinturas adquiridas por Henri Cernuschi eram conservadas<br />

no museu. Isso leva a pensar que, a partir <strong>de</strong>ssa época, a montagem das obras<br />

não permitia mais pendurá-las.”<br />

Se o conjunto forma<strong>do</strong> por essas pinturas é mo<strong>de</strong>sto na quantida<strong>de</strong>, em<br />

contrapartida ele é extremamente coerente. Apresenta a particularida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

privilegiar a figura humana a ponto <strong>de</strong> não contar com nenhuma pintura <strong>de</strong><br />

paisagem. Esse gênero, que exerceria influência <strong>de</strong>cisiva sobre a recepção da<br />

pintura chinesa no Oci<strong>de</strong>nte, não conquistou o interesse <strong>de</strong> Henri Cernuschi. À<br />

exceção <strong>de</strong> algumas pinturas <strong>de</strong> flores e <strong>de</strong> pássaros, a gran<strong>de</strong> maioria das obras<br />

representa personagens: imortais taoistas e santos <strong>do</strong> budismo, lindas mulheres e<br />

caça<strong>do</strong>res <strong>de</strong> <strong>de</strong>mônios. Paralelamente às imagens <strong>de</strong> divinda<strong>de</strong>s e às ilustrações<br />

populares, sempre anônimas, encontra-se certo número <strong>de</strong> pinturas assinadas por<br />

gran<strong>de</strong>s nomes ou por pequenos mestres.<br />

A preocupação em compor séries iconográficas ou formais parece ter regi<strong>do</strong> as<br />

escolhas <strong>de</strong> Henri Cernuschi. Assim, entre os diferentes temas ilustra<strong>do</strong>s pelas<br />

pinturas da coleção, a figura <strong>de</strong> Zhong Kui impõe-se <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> incontornável. A<br />

imagem <strong>do</strong> caça<strong>do</strong>r <strong>de</strong> <strong>de</strong>mônios transcen<strong>de</strong> os registros da pintura popular e da<br />

pintura erudita. Mesmo aparecen<strong>do</strong> em algumas páginas <strong>de</strong> álbum da Dinastia


14<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS 15<br />

Ming, suas representações mais surpreen<strong>de</strong>ntes são gran<strong>de</strong>s rolos verticais<br />

data<strong>do</strong>s da Dinastia Qing. Essas impressionantes figuras em pé, executadas<br />

sempre <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> <strong>de</strong>spoja<strong>do</strong>, têm qualida<strong>de</strong>s expressivas muito particulares.<br />

De fato, elas apresentam gran<strong>de</strong> diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> fisionomias: assusta<strong>do</strong>ras,<br />

truculentas ou grotescas. A associação <strong>de</strong>ssas imagens com as festas <strong>de</strong> ano-<br />

-novo <strong>de</strong> Duanwu atestam o caráter profilático das figuras.<br />

Sabemos que Henri Cernuschi e seu companheiro <strong>de</strong> viagem, Théo<strong>do</strong>re Duret,<br />

nada sabiam sobre as línguas chinesas. A coleção <strong>de</strong> livros ilustra<strong>do</strong>s trazi<strong>do</strong>s<br />

da China por Henri Cernuschi <strong>de</strong>monstra, contu<strong>do</strong>, a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> reunir uma<br />

<strong>do</strong>cumentação relativa aos objetos que estava adquirin<strong>do</strong>. Assim, a biblioteca <strong>de</strong><br />

Henri Cernuschi tinha várias edições <strong>do</strong> trata<strong>do</strong> <strong>de</strong> pintura Jiezi yuan huachuan [O<br />

jardim tão gran<strong>de</strong> quanto um grão <strong>de</strong> mostarda]. Diferentemente <strong>do</strong>s <strong>catálogo</strong>s<br />

<strong>de</strong>dica<strong>do</strong>s aos bronzes, essa obra, <strong>de</strong>stinada ao ensino da pintura, convida o leitor<br />

a se colocar na perspectiva <strong>do</strong> cria<strong>do</strong>r. O manual, dividi<strong>do</strong> por gênero e tema,<br />

aborda sobretu<strong>do</strong> as questões <strong>de</strong> técnica pictórica. Tal interesse pela prática<br />

da pintura na China influenciou as escolhas <strong>do</strong> coleciona<strong>do</strong>r. Paralelamente às<br />

pinturas executadas com pincel, Henri Cernuschi era apaixona<strong>do</strong> também pela<br />

técnica chinesa da pintura a <strong>de</strong><strong>do</strong>, que ainda existia na época <strong>de</strong> sua viagem. No<br />

entanto, seus principais representantes viveram no século anterior. Gao Qipei,<br />

que <strong>de</strong>u ao gênero da pintura a <strong>de</strong><strong>do</strong> seu toque <strong>de</strong> nobreza, está representa<strong>do</strong><br />

por uma vasta composição, síntese monumental <strong>do</strong>s diferentes aspectos <strong>de</strong> sua<br />

técnica. As pinturas <strong>de</strong> Li Shizhuo e <strong>de</strong> Fu Wen ilustram a continuação <strong>de</strong>ssa<br />

tradição entre os chineses integra<strong>do</strong>s às ban<strong>de</strong>iras manchus. Por fim, o mo<strong>do</strong><br />

como Su Liupeng soube adaptar essa técnica para a criação <strong>de</strong> cenas da vida <strong>do</strong><br />

povo atesta sua popularida<strong>de</strong> no século XIX.<br />

As pinturas a <strong>de</strong><strong>do</strong> reunidas por Henri Cernuschi permitem retraçar os principais<br />

momentos da história <strong>de</strong>ssa técnica, que foi apreciada na corte chinesa antes<br />

<strong>de</strong> ser a<strong>do</strong>tada pelos meios mais populares. Assim, a coleção <strong>de</strong> Cernuschi,<br />

aparentemente composta em função <strong>de</strong> princípios iconográficos, também po<strong>de</strong><br />

ser consi<strong>de</strong>rada <strong>de</strong> um ponto <strong>de</strong> vista histórico. Se a<strong>do</strong>tarmos essa perspectiva,<br />

perceberemos que os nomes <strong>do</strong>s pintores que ele reuniu evocam algumas<br />

das mais importantes etapas da evolução da pintura <strong>de</strong> personagens. Esses<br />

elementos nos convidam a consi<strong>de</strong>rar o méto<strong>do</strong> <strong>de</strong> Cernuschi menos como o <strong>de</strong><br />

um viajante colecionan<strong>do</strong> imagens que refletem seu percurso no Oriente, <strong>do</strong> que<br />

como o <strong>de</strong> um aprecia<strong>do</strong>r <strong>de</strong> pintura oci<strong>de</strong>ntal procuran<strong>do</strong> compreen<strong>de</strong>r uma arte<br />

<strong>de</strong>sconhecida segun<strong>do</strong> uma lógica pictórica.


16<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS<br />

AS DEZ ETAPAS DE UMA<br />

“VIAGEM IMÓVEL” NA PINTURA CHINESA<br />

Cédric Laurent, Université <strong>de</strong> Haute-Bretagne-(Rennes II).<br />

É sempre intrigante observar a multidão <strong>de</strong> chineses que visita os museus oci<strong>de</strong>ntais:<br />

por dia, quantos <strong>de</strong>les veem a Mona Lisa? Os museus chineses não<br />

são tão frequenta<strong>do</strong>s assim. No entanto, por muito tempo, fiquei admira<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

não encontrar nenhuma dificulda<strong>de</strong> em acessar a vitrine da Primavera precoce<br />

(uma das obras-primas mais importantes da coleção <strong>do</strong> Museu <strong>do</strong> Palácio) em<br />

Taipei. Disso, <strong>de</strong>duzimos que o público – oci<strong>de</strong>ntal, naturalmente, mas também<br />

chinês – está bem menos prepara<strong>do</strong> para olhar uma pintura chinesa <strong>do</strong> que uma<br />

europeia, mas também que se trata <strong>de</strong> um tipo <strong>de</strong> arte talvez menos adaptada à<br />

contemplação “<strong>de</strong> massa”.<br />

As pinturas europeias foram feitas para “educar as multidões”, atraí-las em direção<br />

à imagem: as cores radiantes convidam o olhar <strong>do</strong>s menos inicia<strong>do</strong>s, o realismo<br />

das posturas garante a essas telas a admiração <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s, e a composição executada<br />

pelo pintor obe<strong>de</strong>ce às leis da ótica para que o especta<strong>do</strong>r possa ver tu<strong>do</strong><br />

num piscar <strong>de</strong> olhos. A pintura chinesa não foi pensada como um espetáculo;<br />

normalmente, ela necessita <strong>de</strong> outra aproximação. Mais intimista – mais próxima<br />

<strong>do</strong> <strong>de</strong>senho –, ela não é menos rica <strong>de</strong> maravilhas, e a intenção <strong>de</strong>ste artigo é<br />

fornecer ao leitor algumas ferramentas que lhe permitirão melhor contemplá-las.<br />

1. Os formatos<br />

As pinturas colecionadas pelos aprecia<strong>do</strong>res chineses (que é preciso diferenciar<br />

das pinturas rituais) <strong>de</strong>vem ocasionalmente sair <strong>de</strong> suas caixas para serem apresentadas<br />

a alguns estetas. O aprecia<strong>do</strong>r, que não é um especta<strong>do</strong>r, mas que<br />

preten<strong>de</strong> <strong>de</strong>scobrir uma obra, <strong>de</strong>ve ir em sua direção <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> ativo e entrar em<br />

uma paisagem às vezes sombria e a princípio pouco legível.


18<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS 19<br />

As pinturas são montadas em rolos horizontais (juan, huajuan), verticais (zhou,<br />

lizhou) ou em álbum (ce, huace; antigamente também em biombos ou em leques).<br />

A armação <strong>de</strong> seda respon<strong>de</strong> a uma estética <strong>de</strong> sobrieda<strong>de</strong>, mas também a<br />

preocupações <strong>de</strong> conservação: o enrolamento protege da poeira e da luz. Se por<br />

um la<strong>do</strong> o coleciona<strong>do</strong>r suspen<strong>de</strong> com frequência os rolos verticais para explorar<br />

livremente seu interior, por outro, ele raramente <strong>de</strong>senrola os rolos horizontais,<br />

sobre uma mesa, seção por seção, sozinho ou acompanha<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>do</strong>is ou três cuida<strong>do</strong>sos<br />

aprecia<strong>do</strong>res. Os álbuns também são objetos <strong>de</strong> coleção que costumam<br />

ser organiza<strong>do</strong>s com os livros na biblioteca <strong>do</strong>s letra<strong>do</strong>s.<br />

2. O percurso visual<br />

Somente a folha <strong>de</strong> álbum (geralmente similar a um formato A4), mais compatível<br />

com o campo <strong>de</strong> visão, possibilita olhar a pintura instantaneamente. Os rolos<br />

horizontais não permitem que isso aconteça; <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> geral, eles compõem uma<br />

<strong>de</strong>zena <strong>de</strong> metros <strong>de</strong> comprimento e são <strong>de</strong>senrola<strong>do</strong>s progressivamente, cena<br />

por cena. Assim, o pintor os concebe como uma sucessão <strong>de</strong> pontos <strong>de</strong> vista<br />

ritma<strong>do</strong>s por elementos <strong>de</strong> paisagem ou <strong>de</strong> arquitetura, que permitem marcar as<br />

pausas ao serem <strong>de</strong>senrola<strong>do</strong>s. A verticalida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s rolos zhou faz que eles normalmente<br />

sejam olha<strong>do</strong>s a partir <strong>de</strong> três pontos <strong>de</strong> vista contínuos, <strong>de</strong> baixo para<br />

cima. Para sustentar esse movimento, o pintor organiza três diferentes perspectivas:<br />

uma vista um pouco inclinada para a parte baixa, uma vista frontal ao centro<br />

e uma vista contrária, inclinada para a terceira parte alta. Assim, o aprecia<strong>do</strong>r da<br />

pintura é ativo, e po<strong>de</strong> <strong>de</strong>slocar seu olhar para a superfície <strong>do</strong> rolo (2009, cat. 22:<br />

Xu Zhang-cat. 40: Yao Hua).<br />

É bastante comum que as paisagens sejam habitadas por personagens que introduzem<br />

uma temporalida<strong>de</strong>: o suposto <strong>de</strong>slocamento <strong>do</strong>s personagens sustenta o<br />

movimento <strong>do</strong> olhar e introduz essa temporalida<strong>de</strong> na obra. O aprecia<strong>do</strong>r <strong>de</strong>ve se<br />

aproximar da pintura, encontrar uma brecha nos bosques, tomar um caminho e<br />

atravessar um ponto para alcançar quem espera por ele ao pé <strong>de</strong> uma árvore. Ali,<br />

o ponto <strong>de</strong> chegada é <strong>de</strong>svenda<strong>do</strong> entre as nuvens e, <strong>do</strong> alto, um extraordinário<br />

panorama se oferece a nós que, <strong>de</strong> observa<strong>do</strong>res, nos tornamos andarilhos. A<br />

crítica clássica chinesa consi<strong>de</strong>ra essas paisagens “viagens imóveis” (woyou). Uma<br />

pintura não é uma janela que <strong>de</strong>veria se abrir sobre uma paisagem respon<strong>de</strong>n<strong>do</strong><br />

às leis da perspectiva centrada; é o percurso visual que introduz a profundida<strong>de</strong>.<br />

3. A montanha e a paisagem<br />

Quan<strong>do</strong> se diz paisagem, se diz montanha. Na China antiga, a montanha era<br />

consi<strong>de</strong>rada o local <strong>de</strong> residência <strong>do</strong>s imortais e <strong>do</strong>s espíritos. Ir até ela correspondia<br />

a uma experiência metafísica. Local <strong>de</strong> retiro e <strong>de</strong> austerida<strong>de</strong>, ela atraía<br />

os ermitões taoistas, que aproveitavam a concentração <strong>de</strong> forças terrestres, e os<br />

monges budistas, que viam ali o “<strong>de</strong>serto” necessário ao exercício <strong>do</strong> <strong>de</strong>sapego.<br />

A montanha passou a ser o local <strong>de</strong> todas as buscas: procura pela imortalida<strong>de</strong>,<br />

visitas aos sábios, peregrinação e colheita <strong>de</strong> plantas medicinais. Desse mo<strong>do</strong>,<br />

a natureza foi sen<strong>do</strong> <strong>do</strong>mesticada. As brumas <strong>do</strong>s picos eram cravadas por edifícios,<br />

e as florestas atravessadas por estradas. Os andarilhos iam e vinham em<br />

busca <strong>de</strong> lugares célebres: uma velha árvore <strong>de</strong> formas estranhas, uma falésia<br />

gravada com caligrafia, o lugar <strong>de</strong> retiro <strong>de</strong> um poeta...<br />

Para o pintor-poeta, a montanha se tornou o local <strong>de</strong> um isolamento espiritual<br />

e <strong>de</strong> prazer <strong>do</strong> espírito. Se suas pinturas são “viagens imóveis” que narram caminhadas,<br />

também são a ocasião <strong>de</strong> comentar acontecimentos recentes e, claro, <strong>de</strong><br />

se entregar a maravilhosos exercícios estéticos.<br />

A montanha também se reveste <strong>de</strong> um valor moral para os segui<strong>do</strong>res <strong>de</strong> Confúcio:<br />

“O homem inteligente se satisfaz com a água, o homem bon<strong>do</strong>so, com a<br />

montanha; a um o movimento, ao outro, o <strong>de</strong>scanso. O homem inteligente vive<br />

feliz, o homem bon<strong>do</strong>so vive por muito tempo” (Lunyu, VI 21). Assim, a montanha<br />

é símbolo <strong>de</strong> longevida<strong>de</strong> ou imagem da estabilida<strong>de</strong> moral <strong>de</strong> um homem. Era<br />

comum oferecer essas pinturas para cumprimentar uma pessoa, sobretu<strong>do</strong> em<br />

ocasiões <strong>de</strong> aniversário.<br />

A paisagem, pouco fiel à realida<strong>de</strong>, é toda composta <strong>de</strong> símbolos e não é incomum<br />

que <strong>aqui</strong>lo que percebemos como simples paisagens sejam, na verda<strong>de</strong>,<br />

representações <strong>de</strong> paraísos <strong>de</strong> imortalida<strong>de</strong> ou cenas proce<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> literatura<br />

da história.<br />

Árvores floridas enquadram uma gruta, uma embarcação leve está presa à margem:<br />

é A fonte com flores <strong>de</strong> pessegueiro, célebre texto <strong>de</strong> Tao Yuanming (372-<br />

427). Em uma paisagem <strong>de</strong> outono, uma toca<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> alaú<strong>de</strong> está sentada em<br />

um barco: é O passeio <strong>do</strong> Pipa, <strong>de</strong> Bai Juyi (772-846). Vários personagens estão<br />

senta<strong>do</strong>s à beira <strong>de</strong> um riacho sinuoso on<strong>de</strong> taças flutuam: é O pavilhão das<br />

orquí<strong>de</strong>as, <strong>de</strong> Wang Xizhi (312-379) (cf. il. 2009, cat. 11 e 12)...


20<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS 21<br />

Os letra<strong>do</strong>s a quem as pinturas eram <strong>de</strong>stinadas se tratavam <strong>de</strong> poetas que <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

a infância viviam <strong>de</strong>bruça<strong>do</strong>s sobre os livros e, para aten<strong>de</strong>r aos seus gostos,<br />

era comum que os pintores incrementassem suas composições com alusões literárias<br />

que hoje são difíceis <strong>de</strong> <strong>de</strong>cifrar.<br />

4. Do “vermelho e ver<strong>de</strong>” ao preto e branco<br />

Na China, a pintura clássica ganhou fôlego no início da dinastia Tang (618-907),<br />

com gran<strong>de</strong>s composições coloridas ilustran<strong>do</strong> temas históricos. As cores vivas<br />

eram essenciais para a própria concepção da pintura, às vezes <strong>de</strong>signada pela<br />

expressão “vermelho e ver<strong>de</strong>” (danqing). Sobre a seda preparada, eram aplicadas<br />

várias camadas finas <strong>de</strong> pigmento <strong>de</strong> mal<strong>aqui</strong>ta para representar as montanhas<br />

e escarlate para representar a arquitetura. A técnica era complexa, o trabalho<br />

longo, e o resulta<strong>do</strong> <strong>de</strong>slumbrante. Entretanto, um <strong>do</strong>s pintores-letra<strong>do</strong>s mais<br />

famosos <strong>do</strong> perío<strong>do</strong>, Wang Wei (699-759), fez uma pergunta fundamental para<br />

o <strong>de</strong>senvolvimento da arte pictórica: não seriam a tinta e as variações <strong>de</strong> cinza<br />

capazes <strong>de</strong> representar a varieda<strong>de</strong> das cores (Yun mo er wu cai ju)? Não que os<br />

letra<strong>do</strong>s tenham simplesmente rejeita<strong>do</strong> as cores, mas eles valorizaram uma arte<br />

tecnicamente menos reprimida, mais sóbria. A tinta, por meio <strong>do</strong> processo <strong>de</strong><br />

diluição, possibilita uma infinita varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> nuances que são suficientes para<br />

evocar as cores <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.<br />

Esse interesse pela monocromia, no entanto, não levava ao aban<strong>do</strong>no da cor.<br />

No início da dinastia Ming (1368-1644), pintores da Escola <strong>de</strong> Zhe produziam<br />

gran<strong>de</strong>s paisagens realçadas com aguadas levemente coloridas, forman<strong>do</strong> um<br />

panorama <strong>de</strong> cenas históricas <strong>de</strong>stinadas à exortação moral da corte (2009, cat.<br />

4 e 5). Além disso, as paisagens chamadas “azul e ver<strong>de</strong>” (qinglü shanshui), que<br />

num primeiro momento continuaram sen<strong>do</strong> realizadas na corte, se tornariam um<br />

tema pre<strong>do</strong>minante da arte <strong>de</strong> Suzhou (Escola <strong>de</strong> Wu) no século XV. É preciso<br />

dizer que, no contexto artístico <strong>de</strong>ssa época, muito marca<strong>do</strong> pela monocromia<br />

(cf. 2009, cat. 3), o uso da cor na arte letrada reformularia profundamente a<br />

pintura. Essas paisagens com atmosferas radiantes, passan<strong>do</strong> da cor turquesa<br />

ao ocre, reintroduziram, na pintura letrada, técnicas complexas <strong>de</strong> aplicação das<br />

cores em “três camadas <strong>de</strong> alume e nove <strong>de</strong> pigmentos” (san fan jiu ceng).<br />

5. A tinta e o pincel<br />

As pinturas chinesas mais antigas foram elaboradas sobre seda, porém, a partir<br />

<strong>do</strong> século XI, o uso <strong>do</strong> papel, normalmente menos dispendioso <strong>do</strong> que a seda,<br />

difundiu-se com muita rapi<strong>de</strong>z. Suas qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> absorção e a diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

texturas interessaram os pintores porque permitiam valorizar o trabalho <strong>do</strong> pincel<br />

e as variações da tinta (2009, cat. 44: Qi Baishi). Além disso, o traço, <strong>de</strong>riva<strong>do</strong><br />

da arte caligráfica, portanto próprio aos letra<strong>do</strong>s, ganhou importância em obras<br />

monocromáticas.<br />

Os letra<strong>do</strong>s pintavam com instrumentos <strong>de</strong> seus escritórios – pincel, papel e tinta<br />

–, os quais <strong>do</strong>minavam com muita naturalida<strong>de</strong>, assim como Da Vinci <strong>do</strong>minava a<br />

pena com que <strong>de</strong>senhava. O pincel estava <strong>de</strong> tal forma <strong>do</strong>mestica<strong>do</strong> que passou<br />

a ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> não somente um prolongamento da mão, mas a expressão <strong>do</strong><br />

coração. Ele era capaz <strong>de</strong> transmitir as emoções diretamente, e é por isso que<br />

uma atmosfera específica, um certo tipo <strong>de</strong> alma, habita a pintura.<br />

Ao se concentrar nas técnicas <strong>de</strong> tinta e <strong>de</strong> pincel, o pintor <strong>de</strong>slocou o olhar <strong>do</strong><br />

aprecia<strong>do</strong>r <strong>de</strong> arte. Este, que normalmente também praticava a pintura, passou a<br />

sentir a pressão <strong>do</strong> pincel sobre o papel, as hesitações ou a energia <strong>de</strong> uma curva.<br />

Avaliou sobretu<strong>do</strong> o traço: os contornos das formas, a linha <strong>do</strong>s galhos vegetais,<br />

a tensão das varas <strong>de</strong> bambu, a leveza das folhas <strong>de</strong> uma orquí<strong>de</strong>a (2009, cat.<br />

14), e observou a apresentação das matérias, o pincel seco que parece arranhar a<br />

superfície <strong>do</strong> papel sobre os contornos <strong>de</strong> uma rocha, a tinta efêmera da umida<strong>de</strong><br />

das brumas (ver também 2009, cat. 20).<br />

6. Transmissão e aplicação <strong>do</strong>s antigos estilos<br />

Uma das missões <strong>do</strong>s letra<strong>do</strong>s consistia em transmitir, em primeiro lugar, os clássicos,<br />

<strong>de</strong>dican<strong>do</strong>-se a um trabalho <strong>de</strong> cópia <strong>do</strong>s textos. Era preciso copiar para<br />

conservar o espírito <strong>do</strong>s Antigos. A aprendizagem da pintura, baseada na da<br />

caligrafia, também passava por uma cópia. Era bem tar<strong>de</strong>, quan<strong>do</strong> já estivesse<br />

introduzi<strong>do</strong> na socieda<strong>de</strong>, que um mestre era escolhi<strong>do</strong> para ser primeiramente<br />

inicia<strong>do</strong> na arte antiga e, em seguida, orienta<strong>do</strong> a encontrar seu próprio estilo. O<br />

mestre instruía seus discípulos, e estes permaneciam a seu la<strong>do</strong> até sua morte.<br />

Dessas relações nasceram re<strong>de</strong>s, genealogias e escolas. Normalmente, os pinto-


22<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS 23<br />

res <strong>do</strong>minavam uma vasta palheta <strong>de</strong> estilos e os utilizavam como se costumava<br />

fazer em literatura, por meio <strong>de</strong> citações e às vezes até mesmo <strong>de</strong> pastiches.<br />

Assim, não <strong>de</strong>vemos nos assustar ao encontrar, no início <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> Ming (século<br />

XIV), um retorno ao estilo <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> Song (século XI), méto<strong>do</strong> que também<br />

permitia afirmar uma continuida<strong>de</strong> política.<br />

Para<strong>do</strong>xalmente, as pesquisas estilísticas e a referência aos velhos mestres às<br />

vezes impulsionaram uma gran<strong>de</strong> fase criativa, sobretu<strong>do</strong> no trabalho <strong>de</strong> alguns<br />

pintores <strong>do</strong> final da dinastia Ming, como Chen Hongshou (1598-1652). A estranheza<br />

<strong>do</strong>s personagens e a simplificação das formas remetem à i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> arcaísmo<br />

(guguai), em uma livre interpretação (ver também 2009, p. 78 e cat. 37: Su<br />

Liupeng).<br />

A citação estilística torna-se a via pela qual a arte da paisagem se afirmará como<br />

pintura erudita, concentrada no emparelhamento das formas e na composição<br />

no espaço. Enquanto os pintores <strong>de</strong> Wu, no século XV, privilegiavam a representação<br />

<strong>de</strong> caminhadas ou <strong>de</strong> reuniões <strong>de</strong> letra<strong>do</strong>s, os paisagistas <strong>do</strong> século XVII,<br />

mais austeros, excluíram quase sistematicamente os personagens (2009, cat. 19).<br />

O mais célebre <strong>de</strong>les, Dong Qichang (1555-1636) (2009, cat. 15), reivindican<strong>do</strong>-se<br />

her<strong>de</strong>iro da Escola <strong>de</strong> Wu, rejeitava completamente a particularida<strong>de</strong> histórica<br />

e fazia da paisagem uma pintura essencialmente <strong>de</strong>dicada à citação <strong>de</strong> estilo.<br />

Desse mo<strong>do</strong>, as escolhas estilísticas ditas “letradas” garantiam à paisagem sua<br />

nobreza e elegância (wenya). Essa concepção logo culminou em um formalismo<br />

que seria útil aos profissionais: graças ao <strong>do</strong>mínio <strong>do</strong> estilo <strong>de</strong> certos mestres,<br />

eles, a partir <strong>de</strong> então, conferiam às suas produções uma elegância da qual sua<br />

clientela podia finalmente se apropriar.<br />

Novos <strong>de</strong>safios se apresentaram então para esses letra<strong>do</strong>s que praticavam a<br />

arte como aprecia<strong>do</strong>res: como <strong>de</strong>marcar a arte <strong>de</strong> uma elite que não é mais diferenciada<br />

pelo nascimento, mas por seu nível <strong>de</strong> cultura? Ao consi<strong>de</strong>rar a pintura<br />

como uma arte “poética” – o conteú<strong>do</strong> cultural e o po<strong>de</strong>r evocatório da obra<br />

foram compara<strong>do</strong>s à poesia, que era então pre<strong>do</strong>minante –, o pintor não po<strong>de</strong>ria<br />

ser nada além <strong>de</strong> um letra<strong>do</strong>, um homem que, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o i<strong>de</strong>al confuciano,<br />

era funcionário e, por esse mesmo motivo, estava protegi<strong>do</strong> da necessida<strong>de</strong>. A<br />

arte “nobre” passa a ser consi<strong>de</strong>rada <strong>de</strong>sinteressada e sincera, ao contrário <strong>de</strong><br />

uma arte <strong>de</strong> corte que <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> encomendas.<br />

A pintura se torna indissociável das “artes letradas”, a partir <strong>de</strong> então referência<br />

em matéria <strong>de</strong> elegância. Assim, a arte <strong>de</strong> encomenda iria <strong>de</strong> tal forma se inspirar<br />

nessa referência que a oposição pintura letrada versus pintura profissional só<br />

iria se manifestar, com mais frequência, na teoria. Entretanto, a distinção é real<br />

quan<strong>do</strong> se trata <strong>de</strong> sua formação. Os profissionais, pintores da corte ou <strong>de</strong> ateliês<br />

priva<strong>do</strong>s, eram geralmente consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s artesãos. Eles começaram a apren<strong>de</strong>r<br />

muito jovens e trabalhavam em obras coletivas <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com suas especialida<strong>de</strong>s:<br />

um com as árvores, outro com a arquitetura, os mais habili<strong>do</strong>sos pintavam<br />

rostos ou composições florais. Dito isso, alguns letra<strong>do</strong>s também eram assisti<strong>do</strong>s<br />

por discípulos e chegavam a formar verda<strong>de</strong>iros ateliês para aten<strong>de</strong>r às necessida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> suas re<strong>de</strong>s, pois se por um la<strong>do</strong> eles não necessariamente vendiam,<br />

as pinturas serviam <strong>de</strong> objeto <strong>de</strong> troca e <strong>de</strong> presentes <strong>de</strong>stina<strong>do</strong>s a uma notável<br />

clientela (no senti<strong>do</strong> medieval <strong>do</strong> termo).<br />

8. Excêntricos e merca<strong>do</strong> <strong>de</strong> arte<br />

7. Letra<strong>do</strong>s e profissionais<br />

A pintura já havia se emancipa<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> mestres <strong>do</strong> início da dinastia Song<br />

criaram gran<strong>de</strong>s obras que se tornariam mo<strong>de</strong>los clássicos. Porém, algumas mutações<br />

sociais ainda provocariam mudanças no mun<strong>do</strong> pictórico. Era a primeira<br />

vez, certamente, que os letra<strong>do</strong>s conquistavam a posição mais importante na<br />

administração: graças a um sistema <strong>de</strong> exames, os <strong>de</strong>tentores <strong>do</strong> saber literário<br />

podiam assumir cargos públicos.<br />

Durante a dinastia Qing (1644-1911), alguns pintores se distanciaram claramente<br />

da orto<strong>do</strong>xia encarnada na obra <strong>do</strong>s “Quatro Wang”, concentrada sobretu<strong>do</strong> na<br />

citação estilística e no arranjo <strong>do</strong>s elementos da paisagem. Com traços largos e<br />

aguadas contrastadas, Zhu Da (dito Bada Shanren, 1626-1705) e Shitao (1642-<br />

1707) reivindicam mais uma expressão pessoal <strong>do</strong> que a marca <strong>do</strong>s antigos mestres.<br />

Por meio <strong>de</strong> sua pintura, Shitao se apresentava como um letra<strong>do</strong> íntegro,<br />

imagem à qual sua clientela (<strong>aqui</strong>, no senti<strong>do</strong> comercial) era sensível.<br />

A arte dita “letrada” foi objeto <strong>de</strong> um merca<strong>do</strong> muito <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong>. A personalida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> Shitao inspirou os “Oito excêntricos <strong>de</strong> Yangzhou” e, na primeira


24<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS 25<br />

meta<strong>de</strong> <strong>do</strong> século XVIII, a originalida<strong>de</strong> teve um enorme sucesso. Um gran<strong>de</strong><br />

número daqueles que hoje são chama<strong>do</strong>s “excêntricos” <strong>de</strong>fendiam, na verda<strong>de</strong>,<br />

uma originalida<strong>de</strong> convencional. A característica mais surpreen<strong>de</strong>nte da pintura<br />

Qing resi<strong>de</strong> na diversida<strong>de</strong> das escolas e <strong>do</strong>s centros <strong>de</strong> produção, e nosso conhecimento<br />

sobre ela é apenas fragmentário.<br />

A obra da Escola <strong>de</strong> Xangai constitui uma formidável renovação da arte pictórica<br />

na China, assim como no <strong>do</strong>mínio da pintura <strong>de</strong> personagens. Os temas tradicionais<br />

foram então apresenta<strong>do</strong>s em novos formatos, em que os personagens<br />

ocupavam a parte principal <strong>do</strong> espaço, e novos temas apareceram na pintura<br />

letrada: os heróis <strong>do</strong>s romances e <strong>do</strong> teatro.<br />

Nessa época, Yangzhou era o centro artístico mais importante, e seus pintores profissionais<br />

vendiam em toda a China. Os gran<strong>de</strong>s comerciantes da província <strong>de</strong> Anhui<br />

apoiavam seus pintores e viram nascer mestres muito importantes, como Mei Qing<br />

(1623-1697). Suzhou e Hangzhou continuavam sen<strong>do</strong> centros muito ativos em que<br />

pintores como Qian Du (1763-1844) (cf. 2009, cat. 33, 34, 35) retomavam a tradição<br />

clássica. Finalmente, Nanjing e Guangzhou privilegiavam uma tradição original.<br />

To<strong>do</strong>s os centros artísticos se alimentavam <strong>de</strong> um movimento constante entre as<br />

fortalecidas tradições locais e a orto<strong>do</strong>xia patrocinada pela corte.<br />

Assim, no que se refere à pintura <strong>de</strong> paisagem, o século XIX representa uma<br />

pausa antes das gran<strong>de</strong>s realizações <strong>do</strong> século XX, sobretu<strong>do</strong> nas experiências <strong>de</strong><br />

Zhang Daqian (1899-1983), que utilizará o azul e ver<strong>de</strong> sobre gran<strong>de</strong>s blocos <strong>de</strong><br />

tinta. Também irão aparecer as <strong>de</strong>nsas paisagens <strong>de</strong> Huang Binhong (1865-1955)<br />

em que a tinta encarna em uma nova matéria (2009, cat. 47).<br />

10. Re<strong>de</strong>finição na arte internacional<br />

9. Mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> e tradição<br />

No começo <strong>do</strong> século XVII, a China se mostrou receptiva às contribuições oci<strong>de</strong>ntais.<br />

Na corte, isso se caracterizou pelo uso da perspectiva linear (cf. 2009,<br />

cat. 23: Jin Kun) e por um novo senti<strong>do</strong> da cor. Naturalmente, o trabalho com a<br />

cor teve importantes repercussões na pintura <strong>de</strong> flores – principalmente na obra<br />

<strong>de</strong> Zou Yigui (1686-1772) –, em que as pétalas e as folhas são, a partir <strong>de</strong> então,<br />

apresentadas diretamente por uma aguada colorida, sem contornos prévios <strong>de</strong><br />

tinta. Essa discreta revolução também teria implicações no que se refere à paisagem:<br />

Wang Yuanqi (1642-1715) usa diretamente as pinceladas coloridas no topo<br />

das árvores e mistura as pedras com cores <strong>de</strong> meia tonalida<strong>de</strong>, muito diferentes<br />

<strong>do</strong>s pigmentos antes utiliza<strong>do</strong>s.<br />

Nesse contexto, e certamente com o estímulo das gravuras oci<strong>de</strong>ntais que circulavam<br />

tanto em Tianjin quanto em Xangai, em Guangzhou ou em Fujian, o novo<br />

uso da cor também se impôs fora da corte, sobretu<strong>do</strong> nos antigos centros artísticos<br />

da província <strong>de</strong> Jiangnan – por exemplo na obra <strong>de</strong> Fang Xun (1737-1799).<br />

Assim, o século XIX foi marca<strong>do</strong> por um <strong>de</strong>slocamento <strong>do</strong>s centros <strong>de</strong> interesse;<br />

a arte <strong>de</strong> paisagem não ocupava mais o lugar <strong>do</strong>minante que ocupara até então,<br />

e ambiciosas composições florais foram realizadas. As cores brilhantes eram trabalhadas<br />

como os antigos mestres manejavam a tinta (2009, cat. 41: Yao Hua).<br />

Em contrapartida à abertura da China para a pintura europeia, oci<strong>de</strong>ntais passaram<br />

a se interessar pela expressivida<strong>de</strong> <strong>do</strong> pincel chinês. O traça<strong>do</strong> vigoroso<br />

<strong>de</strong> Qi Baishi (1864-1957) (2009, cat. 43-44) algumas vezes assumiu o posto <strong>de</strong><br />

embaixa<strong>do</strong>r da arte chinesa durante a reconstrução da República da China (1911).<br />

Impressiona<strong>do</strong>s com as consecutivas <strong>de</strong>rrotas da China para a Europa (Guerras<br />

<strong>do</strong> Ópio, Saque a Pequim), os intelectuais chineses partiram em busca <strong>de</strong> uma<br />

nova cultura chinesa (Xin wenhua yun<strong>do</strong>ng, Movimento <strong>de</strong> 4 <strong>de</strong> Maio <strong>de</strong> 1919),<br />

melhor inserida no mun<strong>do</strong> e <strong>de</strong>tentora da força tecnológica oci<strong>de</strong>ntal. To<strong>do</strong>s os<br />

aspectos da educação, da língua, da arte foram novamente questiona<strong>do</strong>s pelos<br />

maiores intelectuais que partiram para a Europa, para a América ou para o Japão,<br />

a fim <strong>de</strong> apreen<strong>de</strong>r os conceitos oci<strong>de</strong>ntais.<br />

Lin Fengmian (1900-1991) e Xu Beihong (1895-1953) (2009, cat. 79), que viveram na<br />

França, são os exemplos mais representativos <strong>de</strong>les. Funda<strong>do</strong>res das novas instituições<br />

que até hoje formam os artistas chineses, eles re<strong>de</strong>finiram a arte chinesa<br />

no contexto mundial. Lin Fengmian <strong>de</strong>sempenhou um papel crucial <strong>de</strong> pedagogo,<br />

ilustran<strong>do</strong> alternadamente as novas correntes pictóricas oci<strong>de</strong>ntais (cubismo, impressionismo,<br />

fauvismo) por meio <strong>de</strong> técnicas da pintura a partir <strong>de</strong> então chamada<br />

<strong>de</strong> “tradicional” – ou “pintura nacional” (guohua) (2009, cat. 82-1).


26<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS 27<br />

É nesse contexto iconoclasta que se <strong>de</strong>ve compreen<strong>de</strong>r a obra <strong>de</strong> Zhang Daqian<br />

ilustran<strong>do</strong> os gran<strong>de</strong>s temas da pintura tradicional (2009, cat. 62; 58) ou<br />

exploran<strong>do</strong> a então esquecida arte rupestre da dinastia Tang (618-907) (2009, p.<br />

161: Dame Li). Fu Baoshi (1904-1965), utilizan<strong>do</strong> a tinta com uma nova técnica, a<br />

partir <strong>de</strong> conhecimentos <strong>de</strong> trabalhos contemporâneos japoneses (2009, cat. 67),<br />

interessava-se em refazer os temas da arte clássica (2009, cat. 69) e em mostrar<br />

as gran<strong>de</strong>s figuras da cultura chinesa (2009, cat. 70).<br />

Graças a essa nova <strong>de</strong>finição da “pintura tradicional”, a China manifestou afeição<br />

à sua própria i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e se preparou para a mundialização, possibilitan<strong>do</strong> que<br />

sua cultura atravessasse vitoriosamente o século XX.


DINASTIA MING


30<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

Falcão sobre um roche<strong>do</strong>, século XIV<br />

Autor não i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong><br />

nanquim sobre seda | 120,6 x 62,6 cm<br />

O falcão, empoleira<strong>do</strong> sozinho sobre um roche<strong>do</strong>, <strong>do</strong>mina as ondas com<br />

segurança. O tratamento pictórico, em contraste com a precisão da plumagem<br />

e com o movimento estiliza<strong>do</strong> das ondas, reforça a oposição entre a postura<br />

imóvel <strong>do</strong> pássaro e a agitada superfície da água. O conjunto cria uma impressão<br />

<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r.<br />

Na China antiga, os pássaros <strong>de</strong> caça eram sempre <strong>de</strong>signa<strong>do</strong>s, genericamente,<br />

como águia, ying. Por isso as pinturas que representam uma ave <strong>de</strong> rapina isolada<br />

sobre uma elevação são tradicionalmente intituladas yingxiong duli, frase que<br />

sugere que o ser <strong>de</strong> exceção não encontra semelhante sob o céu. 1<br />

Se as aves <strong>de</strong> rapina apareceram na pintura chinesa no século IV, a representação<br />

<strong>de</strong> uma majestosa águia solitária certamente foi sistematizada sob o reino <strong>do</strong><br />

impera<strong>do</strong>r Huizong (1082-1135). Hoje parece impossível atribuir uma pintura<br />

<strong>de</strong>sse estilo ao pincel <strong>do</strong> célebre “impera<strong>do</strong>r-pintor”; no entanto, cópias e fontes<br />

literárias atestam a importância <strong>de</strong> tais representações. Nessas obras, a cabeça<br />

da águia está sempre abaixo <strong>do</strong> símbolo imperial e da menção yubi, “traçada pelo<br />

pincel imperial”. Tais imagens, que refletem o po<strong>de</strong>r <strong>do</strong> soberano, participavam<br />

<strong>de</strong> um amplo projeto <strong>de</strong> política cultural.<br />

A pintura <strong>do</strong> Museé Cernuschi inscreve-se nessa tradição. Ainda que suas<br />

margens tenham si<strong>do</strong> divididas em uma época in<strong>de</strong>terminada, a pintura conserva<br />

o traço visível <strong>de</strong> um símbolo imperial da era Xuanhe (1119-1125) e da menção yubi. 2<br />

Se, por um la<strong>do</strong>, parece difícil <strong>de</strong>terminar uma data baseada nesses elementos<br />

incompletos, por outro, o estreito parentesco estilístico entre essa pintura e uma<br />

obra <strong>do</strong> Museu <strong>do</strong> Palácio <strong>de</strong> Taipei permite i<strong>de</strong>ntificar a época <strong>de</strong> sua criação, o<br />

século XIV. 3<br />

1. Essa associação se baseia na homofonia<br />

entre ying, a águia, e a primeira letra da<br />

palavra yingxiong, o herói.<br />

2. As letras <strong>do</strong> símbolo incompleto na<br />

parte superior parecem ter si<strong>do</strong> “Xianhe [?]<br />

bao [?]”. Mesmo que muito apaga<strong>do</strong>, um<br />

segun<strong>do</strong> símbolo, neifu zhencang, indica<br />

que a obra integrava coleções imperiais.<br />

3. A obra <strong>do</strong> Museu <strong>do</strong> Palácio, outrora<br />

atribuída à época <strong>do</strong>s Song, foi objeto<br />

<strong>de</strong> uma nova atribuição baseada em uma<br />

comparação com um conjunto <strong>de</strong> obras<br />

conservadas no Japão. Para Sung Hou-mei,<br />

os colofões afixa<strong>do</strong>s na obra, data<strong>do</strong>s<br />

<strong>do</strong>s primeiros anos da dinastia Ming, são<br />

contemporâneos à sua criação (Sung,<br />

1992, p. 161). Entretanto, a pintura foi<br />

recentemente atribuída ao fim da dinastia<br />

Yuan (Age of the Great Khan, 2001, p. 38,<br />

291-292).


32<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

Imortais, 1547<br />

Gao Gu (ativo na primeira meta<strong>de</strong> <strong>do</strong> século XVI)<br />

nanquim e cores sobre seda | 237 x 165 cm<br />

Inscrição e assinatura: Pinta<strong>do</strong> em um barco em Piling durante o verão <strong>do</strong> ano<br />

Dingwel da era Jiajing [1567], Gao Gu, Shimen Zi [alcunha <strong>do</strong> pintor].<br />

Pintor e calígrafo originário <strong>de</strong> Fuzhou, Gao Gu esteve ativo durante a primeira<br />

meta<strong>de</strong> <strong>do</strong> século XVI. Foi autor <strong>de</strong> um trata<strong>do</strong> <strong>de</strong> caligrafia <strong>de</strong>dica<strong>do</strong> à escrita<br />

<strong>do</strong>s escribas, Lishu lun, e <strong>de</strong> poemas reuni<strong>do</strong>s em uma antologia <strong>de</strong> suas obras,<br />

Shimen ji. Quanto às suas pinturas, a maior parte <strong>de</strong>sapareceu. Segun<strong>do</strong> as fontes<br />

literárias, ele teria si<strong>do</strong> um artista versátil, capaz <strong>de</strong> se expressar nos gêneros<br />

paisagem, personagens, flores e pássaros.<br />

A pintura representan<strong>do</strong> os imortais <strong>de</strong>monstra esses diferentes <strong>do</strong>ns: a paisagem<br />

que acolhe essa reunião é pintada com concisão e energia, contrastan<strong>do</strong> com<br />

a representação – <strong>de</strong> uma gran<strong>de</strong> acuida<strong>de</strong> – <strong>do</strong> rosto <strong>do</strong>s personagens e a<br />

representação das flores <strong>do</strong> primeiro plano, pinta<strong>do</strong>s em estilo minucioso e natural.<br />

Por seu tamanho e estilo, essa pintura faz referência às extensas composições<br />

apreciadas no âmbito imperial. Na dinastia Ming, o repertório estilístico da<br />

pintura da corte tomava muito empresta<strong>do</strong> <strong>do</strong>s mestres da época Song. Também<br />

é possível observar esses empréstimos na pintura <strong>de</strong> Gao Gu, em que o traço<br />

das árvores e a superfície das rochas evocam o estilo <strong>do</strong>s pintores da aca<strong>de</strong>mia<br />

<strong>do</strong>s Song <strong>do</strong> sul. A maneira como os quatro imortais se integram à paisagem<br />

também po<strong>de</strong> ser comparada a algumas pinturas <strong>de</strong> corte datadas <strong>do</strong> fim <strong>do</strong><br />

século XV. 1 A filiação estilística entre a obra <strong>de</strong> Gao Gu, datada <strong>de</strong> 1567, e os<br />

pintores pertencentes ao apogeu da Aca<strong>de</strong>mia Imperial, atesta a continuação <strong>de</strong><br />

uma tradição pictórica à margem das inovações introduzidas pelos pintores da<br />

escola <strong>de</strong> Wu a partir <strong>de</strong>ssa época.<br />

1. Como a obra <strong>de</strong> Liu Jun (ativo <strong>de</strong><br />

1475 a 1505), Protesto ao impera<strong>do</strong>r,<br />

conservada no Metropolitan Museum<br />

of Art, em Nova York.


A DINASTIA MING 35<br />

A falésia vermelha, entre 1490 e 1559<br />

Wen Zhengming (1470-1559)<br />

nanquim e cores sobre papel | 17,4 x 49 cm<br />

Inscrição e assinatura: No décimo sexto dia da sétima lua <strong>do</strong> ano Renxu [1082],<br />

fui em um barco com alguns companheiros ao pé da falésia vermelha. Um vento<br />

fresco soprava levemente e não levantava nenhuma onda. Ergui minha caneca<br />

para convidar meus amigos a beber e recitei um poema no qual uma lua brilhava,<br />

era uma canção muito bonita. Pouco <strong>de</strong>pois, a lua subiu no alto da montanha<br />

<strong>do</strong> leste; ela hesitava entre a gran<strong>de</strong> Ursa e a estrela <strong>do</strong> Boieiro. Um orvalho<br />

branco recobria o rio e o brilho da água se juntava ao céu. Não sabíamos on<strong>de</strong><br />

estávamos, mas tínhamos a impressão <strong>de</strong> voar como se aban<strong>do</strong>nássemos o<br />

mun<strong>do</strong> humano, como se asas tivessem nasci<strong>do</strong> em nós, e subíamos, como se<br />

fôssemos imortais.<br />

Começamos então a beber e fomos contagia<strong>do</strong>s por uma gran<strong>de</strong> felicida<strong>de</strong>.<br />

Cantávamos ao longo <strong>do</strong> barco, entoan<strong>do</strong> o ritmo. Nossa música dizia:<br />

“Revestimento <strong>de</strong> caneleira, ramas <strong>de</strong> magnólia. Atravessamos uma água clara<br />

e transparente e subimos a brilhante correnteza. Meus pensamentos partem<br />

para longe e meu olhar se voltam para uma linda mulher que se encontra num<br />

pedaço <strong>do</strong> céu”. Um <strong>de</strong> nossos companheiros tocava gaita para nós. Sua música<br />

melodiosa também tinha um pouco <strong>de</strong> rancor e <strong>de</strong> ressentimento; dir-se-ia que<br />

ele chorava e se lamentava; e o som prosseguia como um fio que se esten<strong>de</strong> sem<br />

se romper.<br />

Talvez ele fizesse dançar um dragão escondi<strong>do</strong> no fun<strong>do</strong> das grutas sombrias<br />

e fizesse chorar uma viúva sozinha no barco solitário. Fiquei muito triste com<br />

<strong>aqui</strong>lo e, arruman<strong>do</strong> meu casaco e endireitan<strong>do</strong>-me em meu lugar, perguntei<br />

ao músico: “Por que essa melodia?”. E ele me respon<strong>de</strong>u: “A lua brilha, as<br />

estrelas são raras, as gralhas voam para o sul: não estariam aí os versos <strong>de</strong>


36<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

Cao Cao? Se olhamos em direção ao oeste, vemos Xiakou, em direção ao leste,<br />

Wuchang; montanhas e rio se juntam em um lúgubre ver<strong>de</strong> escuro; não seria<br />

<strong>aqui</strong> que Cao Cao fora <strong>de</strong>rrota<strong>do</strong> por Zhou Yu? Ele havia captura<strong>do</strong> Jingzhou e<br />

<strong>de</strong>sci<strong>do</strong> o rio até Jiangling. Seus barcos, que seguiam a correnteza em direção<br />

ao leste, espalhavam-se em mil léguas, e seus estandartes escondiam a vista<br />

<strong>do</strong> véu. Ele se serviu <strong>de</strong> vinho, aproximou-se <strong>do</strong> rio e, seguran<strong>do</strong> uma alabarda,<br />

compôs esse poema. Certamente, ele foi o herói <strong>de</strong> toda uma geração, mas<br />

on<strong>de</strong> ele se encontra hoje? Ou, ainda, o que vai acontecer com vocês, comigo,<br />

pesca<strong>do</strong>res e lenha<strong>do</strong>res à beira <strong>do</strong> rio, conosco, que temos peixes e camarões<br />

como companheiros, a corça e o cervo como amigos, que prosseguimos em um<br />

esquife pareci<strong>do</strong> a uma folha, que erguemos cantis e canecas convidan<strong>do</strong>-nos<br />

uns aos outros a beber? Fomos envia<strong>do</strong>s ao universo como seres efêmeros e<br />

mariposas, grãos <strong>de</strong> arroz no oceano. Fico triste com o breve <strong>de</strong>stino <strong>de</strong> minha<br />

vida, invejo o infinito <strong>do</strong> longo <strong>do</strong> rio, queria voar seguin<strong>do</strong> os imortais, enlaçar<br />

a lua e durar o mesmo tempo que ela. Mas sei que isso é impossível, e confio<br />

minha melodia ao triste vento”.<br />

Eu respondi: “Você também conhece a água e a lua? Elas passam como<br />

essa correnteza, mas nunca vão embora. O cheio e o vazio são como elas, e<br />

finalmente, não existe morte nem continuação. Se pensarmos no que <strong>de</strong> nós<br />

mesmos se transforma no universo, nada permanece, nem mesmo o tempo <strong>de</strong><br />

um piscar <strong>de</strong> olhos; e se consi<strong>de</strong>rarmos o que continua sem se transformar,<br />

então tu<strong>do</strong> é infinito, inclusive eu. O que <strong>de</strong>vemos invejar então? Além disso, no<br />

mun<strong>do</strong>, cada coisa tem um mestre. Se alguma coisa não me pertence, não posso<br />

segurá-la. Mas a brisa sobre o rio, a lua sobre as montanhas que meus senti<strong>do</strong>s<br />

transformam em som e em cores, nada me impe<strong>de</strong> que eu absorva essas coisas,<br />

e posso aproveitar isso infinitamente. É um tesouro imensurável da criação,<br />

este <strong>de</strong> que eu e você po<strong>de</strong>mos gozar juntos.”<br />

1. Laurent, 2006, p. 17-32.<br />

2. Goodrich e Fang, 1976, p. 1473.<br />

3. ZGGDSHTM, t. 2, p. 322, n. 1_1037.<br />

A DINASTIA MING 37<br />

em “pequena regular”, xiaokai, na parte superior da composição. Esse tema<br />

literário, particularmente aprecia<strong>do</strong> nas pinturas da escola <strong>de</strong> Wu, foi trata<strong>do</strong><br />

várias vezes por Wen Zhengming, normalmente no formato <strong>de</strong> rolo horizontal. 1 O<br />

texto <strong>de</strong> O<strong>de</strong> à falésia vermelha, que foi objeto <strong>de</strong> numerosas transcrições feitas<br />

por Wen Zhengming em diferentes estilos, podia ser associa<strong>do</strong> diretamente a<br />

uma pintura, como no caso <strong>de</strong>sse leque.<br />

Uma história conta que Wen Zhengming, então com 86 anos, havia caligrafa<strong>do</strong><br />

a O<strong>de</strong> à falésia vermelha <strong>de</strong> Su Dongpo no estilo da “pequena regular”, a fim<br />

<strong>de</strong> pagar uma dívida adquirida em uma partida <strong>de</strong> xadrez. 2 Seja essa narrativa<br />

autêntica ou não, ela atesta a reputação adquirida por Wen Zhengming em um<br />

estilo <strong>de</strong> caligrafia que necessita, ao mesmo tempo, <strong>de</strong> altas qualida<strong>de</strong>s técnicas<br />

e <strong>de</strong> uma energia intacta. Para o autor <strong>de</strong>ssa história, a prática da “pequena<br />

regular” simbolizava a integrida<strong>de</strong> das forças físicas e morais <strong>do</strong> ancião. Essa<br />

concepção, sem dúvida partilhada pelos contemporâneos <strong>de</strong> Wen Zhengming e,<br />

mais tar<strong>de</strong>, pelos coleciona<strong>do</strong>res <strong>de</strong> sua obra, po<strong>de</strong>ria ter-se aplica<strong>do</strong> à pintura<br />

<strong>do</strong> Musée Cernuschi, datada <strong>de</strong> 1552.<br />

A <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za <strong>do</strong> traço realiza<strong>do</strong> na caligrafia também caracteriza a paisagem.<br />

Em contraponto ao uso minucioso <strong>do</strong> pincel, as cores, hoje apagadas, <strong>de</strong>viam<br />

<strong>de</strong>sempenhar um papel importante na composição. Se o vermelho das folhagens<br />

<strong>do</strong> primeiro plano conservou seu brilho, o ver<strong>de</strong> e, sobretu<strong>do</strong>, o azul das<br />

montanhas per<strong>de</strong>ram sua intensida<strong>de</strong>. A simplicida<strong>de</strong> <strong>do</strong> conjunto, que revela<br />

certo gosto pela antiguida<strong>de</strong>, também se harmoniza com a natureza meditativa<br />

<strong>do</strong> texto <strong>de</strong> Su Dongpo. Esse tipo <strong>de</strong> diagramação <strong>de</strong>via ter si<strong>do</strong> instaura<strong>do</strong> como<br />

mo<strong>de</strong>lo, como <strong>de</strong>monstra uma pintura sobre o leque <strong>de</strong> Wen Boren (1502-1575),<br />

conserva<strong>do</strong> no Museu <strong>de</strong> Xangai, que empresta sua composição à obra <strong>de</strong> Wen<br />

Zhengming, conferin<strong>do</strong>-lhe certa amplidão <strong>de</strong>corativa. 3<br />

To<strong>do</strong>s os meus companheiros puseram-se a rir. Tínhamos lava<strong>do</strong> as canecas e<br />

voltamos a beber; quan<strong>do</strong> terminamos a carne e as frutas, as taças e o pratos<br />

estavam <strong>de</strong>sarruma<strong>do</strong>s. Servin<strong>do</strong>-nos to<strong>do</strong>s <strong>de</strong> travesseiros, <strong>do</strong>rmimos no<br />

barco sem nos darmos conta <strong>de</strong> que o leste embranquecia.<br />

Escrito por Zhengming, no ano Renzi [1552]<br />

Essa pintura representa um tema clássico inspira<strong>do</strong> na Primeira o<strong>de</strong> à falésia<br />

vermelha, <strong>de</strong> Su Dongpo. O texto <strong>de</strong>sse poema foi traça<strong>do</strong> por Wen Zhengming


A DINASTIA MING 41<br />

Paisagem com pinho e roche<strong>do</strong>, 1659<br />

Lan Ying (c. 1585-1664)<br />

nanquim e cores sobre papel | 16,4 x 48,5 cm<br />

Inscrição e assinatura: Pinta<strong>do</strong> para a <strong>de</strong>spedida <strong>de</strong> meu irmão Chun, dia 15 da<br />

primeira lua <strong>do</strong> ano Jhiai [1659], Lan Ying.<br />

Mesmo que seus biógrafos façam alusão a suas longas viagens realizadas na<br />

juventu<strong>de</strong>, a ativida<strong>de</strong> profissional <strong>de</strong> Lan Yiang parece estar concentrada<br />

em sua cida<strong>de</strong> natal, Hangzhou, em Zhejiang. 1 Lan Ying, como vários <strong>de</strong> seus<br />

contemporâneos, era simpático às i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> Dong Qichang (1555-1636), que<br />

exerceram influência direta em sua formação e prática pictórica. Assim como<br />

as pinturas <strong>de</strong> Dong Qichang, as obras <strong>de</strong> Lan Ying apresentam numerosas<br />

referências aos mestres <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>. Se no gênero da paisagem o artista se<br />

inspirava preferencialmente em Huang Gongwang (1269-1354), uma folha <strong>de</strong><br />

álbum <strong>do</strong> Musée Cernuschi representan<strong>do</strong> um roche<strong>do</strong> pinta<strong>do</strong> “à maneira <strong>de</strong><br />

Wang Meng”, indica o alcance <strong>do</strong> repertório <strong>do</strong> artista.<br />

1. Para a biografia <strong>de</strong> Lan Ying, cf.<br />

Goodrich e Fang, 1976, p. 786-788; Yang,<br />

1997, p. 234-236.<br />

2. Pareci<strong>do</strong> com o álbum reproduzi<strong>do</strong> em<br />

ZGGDSHTM, t. 1, p. 148-149.<br />

3. Uma folha <strong>de</strong> álbum conservada no<br />

Museu <strong>do</strong> Palácio <strong>de</strong> Pequim atesta o uso<br />

original da cor (Giès, 2004, p. 248).<br />

4. Xu, 1998, p. 22.<br />

5. Matteo Ricci (1552-1610) notara a<br />

importância das <strong>do</strong>ações <strong>de</strong> leques. Ele<br />

dizia até ter constituí<strong>do</strong> um pequeno<br />

conjunto <strong>do</strong>s que recebera, a fim <strong>de</strong><br />

po<strong>de</strong>r se <strong>de</strong>bruçar sobre o rito social <strong>do</strong>s<br />

presentes, oferecen<strong>do</strong>-os por sua vez<br />

(Ricci e Trigault, 1978, p. 90).<br />

Não é impossível que essa folha <strong>de</strong> álbum tenha participa<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma<br />

série representan<strong>do</strong> exclusivamente os singulares roche<strong>do</strong>s em variadas<br />

representações. 2 De fato, Lan Ying parece ter ilustra<strong>do</strong> a si mesmo nesse gênero,<br />

estima<strong>do</strong> sobretu<strong>do</strong> por seus contemporâneos. De suas pedras emana uma<br />

monumentalida<strong>de</strong>, e o artista lhe confere, naturalmente, um papel estruturante<br />

em suas composições. Essa função é atestada na pintura sobre o leque, em que<br />

a massa <strong>do</strong> roche<strong>do</strong> apoia o pinho torto que ocupa a parte central. Essa estrutura<br />

original é intensificada pelo audacioso uso da cor, que é, talvez, a mais radical das<br />

inovações pictóricas introduzidas por Lan Ying. 3<br />

Esse trabalho po<strong>de</strong> ser compara<strong>do</strong> a uma obra-prima da pintura sobre leque<br />

atribuída a Lan Ying, conservada no Museu <strong>de</strong> Nanquim. 4 De fato, essas duas<br />

obras datadas <strong>de</strong> 1659 proce<strong>de</strong>m <strong>de</strong> um mesmo veio criativo. No caso da pintura<br />

<strong>do</strong> Musée Cernuschi, a inscrição especifica as circunstâncias da gênese da<br />

obra; trata-se <strong>de</strong> um presente ofereci<strong>do</strong> na ocasião <strong>de</strong> uma partida. O papel<br />

<strong>de</strong>sempenha<strong>do</strong> pelos leques pinta<strong>do</strong>s na vida social das elites da época está <strong>aqui</strong><br />

explicita<strong>do</strong>. 5


44<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS 45<br />

DINASTIA QING


46<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

Pintura <strong>do</strong>s mil outonos, entre 1700 e 1730<br />

Gao Qipei (1672-1734)<br />

nanquim e cores sobre papel | 227 x 115,2 cm<br />

Inscrição e assinatura: Pintura <strong>do</strong>s mil outonos e das três eternida<strong>de</strong>s.<br />

Qiedao Ren [alcunha <strong>do</strong> pintor] <strong>de</strong> Tieling, Zhitou shenghuo [mote <strong>do</strong> pintor].<br />

Essa obra monumental ilustra a técnica <strong>de</strong> pintura a <strong>de</strong><strong>do</strong> à qual o nome <strong>de</strong> Gao<br />

Qipei é associa<strong>do</strong>. O pintor pertencia a uma família chinesa originária <strong>de</strong> Tieling,<br />

na Manchúria. No contexto político da dinastia Qing, essa origem podia favorecer<br />

uma carreira oficial. 1 Esse foi o caso <strong>de</strong> Gao Qipei, que, seguin<strong>do</strong> seu pai, serviria<br />

tanto nas províncias <strong>de</strong> Yunnan, Zheijiang e Sichuan, como em Pequim. Introduzi<strong>do</strong><br />

na corte, ele se diferenciaria por seus talentos <strong>de</strong> pintor, sobretu<strong>do</strong> por suas obras<br />

feitas a <strong>de</strong><strong>do</strong>, um gênero <strong>de</strong> pintura que virou moda por causa <strong>do</strong> impera<strong>do</strong>r<br />

Shunzhi (1638-1661). 2 A pintura apresenta, no centro, um casal <strong>de</strong> cerví<strong>de</strong>os. Esse<br />

motivo <strong>de</strong> bom agouro foi representa<strong>do</strong> várias vezes por Gao Qipei. Assim, uma<br />

<strong>de</strong> suas obras <strong>de</strong> mesmo tema, conservada no Museu da Capital, em Pequim, tem<br />

algumas semelhanças com a composição <strong>do</strong> Musée Cernuschi. 3 A representação <strong>do</strong><br />

cervo sugere as diferentes técnicas a<strong>do</strong>tadas pelo pintor: traço <strong>de</strong> contorno com<br />

o <strong>de</strong><strong>do</strong> para dar mais movimento à silhueta, impressões digitais progressivamente<br />

afinadas para a pelagem manchada <strong>do</strong> animal, <strong>de</strong>talhes <strong>de</strong> cílios e sobrancelhas<br />

realiza<strong>do</strong>s com a ponta da unha. A atenção <strong>de</strong>dicada ao trabalho <strong>de</strong> tinta <strong>de</strong> Gao<br />

Qipei às vezes ocultou a originalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seu uso das cores. O trata<strong>do</strong> <strong>de</strong> seu neto<br />

Gao Bing indica, no entanto, o caráter pouco convencional <strong>do</strong> uso das cores na<br />

pintura <strong>do</strong> avô. Ele observa que o vermelho, normalmente utiliza<strong>do</strong> com leveza, era<br />

aplica<strong>do</strong> em grossas camadas por Gao Qipei, que se divertia, aliás, aplican<strong>do</strong> o ver<strong>de</strong><br />

e o azul, sobrepon<strong>do</strong>-os em largas superfícies empastadas. 4 Por causa <strong>de</strong> alguns<br />

<strong>de</strong>talhes, a pintura <strong>do</strong> Musée Cernuschi é a ilustração exata <strong>de</strong>ssas propostas: um<br />

morcego <strong>de</strong> um vermelho profun<strong>do</strong> sai <strong>do</strong>s galhos <strong>do</strong>s pinheiros, enquanto os<br />

cogumelos da imortalida<strong>de</strong>, traça<strong>do</strong>s a tinta, estão salpica<strong>do</strong>s <strong>de</strong> ver<strong>de</strong> e azul. Esse<br />

uso da cor ressalta visualmente a presença <strong>de</strong>sses <strong>do</strong>is elementos essenciais para<br />

o significa<strong>do</strong> da pintura. Ao referir-se aos mil outonos, o título <strong>de</strong>ssa obra constitui<br />

em si uma fórmula <strong>de</strong> <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> longevida<strong>de</strong>. A ida<strong>de</strong> vetusta, shou, é evocada<br />

pelos cogumelos da imortalida<strong>de</strong>, lingzhi, e também pelos pinhos, enquanto a<br />

felicida<strong>de</strong>, fu, é anunciada pelo morcego, fu. Finalmente, os cerví<strong>de</strong>os, lu, referem-<br />

-se às heranças, lu. Reuni<strong>do</strong>s, eles formam a tría<strong>de</strong> fu, lu, shou, síntese visual <strong>do</strong>s<br />

votos que se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>sejar na ocasião <strong>de</strong> um aniversário.<br />

1. Quan<strong>do</strong> o sistema manchu <strong>de</strong> oito<br />

ban<strong>de</strong>iras foi a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> para governar<br />

o império em 1644, os chineses da<br />

Manchúria, que foram incorpora<strong>do</strong>s à<br />

ban<strong>de</strong>ira amarela, <strong>de</strong>sempenharam um<br />

papel <strong>de</strong> retaguarda particularmente<br />

importante para o novo po<strong>de</strong>r. Assim,<br />

o pai <strong>de</strong> Gao Qipei, Gao Tianjue, tomou<br />

parti<strong>do</strong> na luta contra legitimistas Ming,<br />

e assim foi morto. Esse fim glorioso<br />

favoreceria a carreira <strong>de</strong> seu filho. A<br />

propósito da biografia <strong>de</strong> Gao Qipei, cf.<br />

Ruitenbeek, 1992.<br />

2. Uma célebre pintura a <strong>de</strong><strong>do</strong><br />

representan<strong>do</strong> Zhong Kui, conservada<br />

no Museu <strong>do</strong> Palácio, foi atribuída ao<br />

impera<strong>do</strong>r Shunzhi.<br />

3. Shoudu Bowuguan, 1995, p. 42-43.<br />

4. Para uma tradução em inglês <strong>do</strong> texto<br />

<strong>de</strong> Gao Bing, cf. Ruitenbeek, 1992, p.<br />

296-312.


48<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS<br />

A DINASTIA QING 49<br />

A Aca<strong>de</strong>mia Hanlin, 1744-1745<br />

Jin Kun (ativo entre 1717 e 1749)<br />

Sun Hu (ativo entre 1728 e 1746)<br />

Lu Zhan (ativo em mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> século XVIII)<br />

Wu Yu (ativo em mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> século XVIII)<br />

Zhang Qi (ativo em mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> século XVIII)<br />

Cheng Liang (ativo em mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> século XVIII)<br />

nanquim e cores sobre seda | 193,5 x 625,5 cm<br />

Essa pintura monumental foi criada para comemorar o banquete ofereci<strong>do</strong><br />

pelo impera<strong>do</strong>r Qianlong em 1744, na ocasião da renovação arquitetônica<br />

da Aca<strong>de</strong>mia Hanlin, uma das instituições fundamentais da China<br />

imperial. Essa <strong>de</strong>scrição exata da arquitetura da aca<strong>de</strong>mia e da cerimônia<br />

oficial que ocorreu em seu interior foi realizada por um conjunto <strong>de</strong> seis<br />

pintores, to<strong>do</strong>s membros da Aca<strong>de</strong>mia Imperial <strong>de</strong> Pintura. As caligrafias<br />

que aparecem na pintura são obra <strong>de</strong> três importantes funcionários, Li<br />

Zongwan (1705-1759), Ji Huang (1711-1794) e Zhang Zhao (1691-1745).<br />

Trata-se <strong>de</strong> transcrições <strong>de</strong> composições poéticas realizadas durante as<br />

festivida<strong>de</strong>s que marcaram esse dia.<br />

Diferentes fontes históricas permitem conhecer a or<strong>de</strong>m em que aconteceu<br />

a cerimônia. No dia <strong>de</strong>ssa celebração, o impera<strong>do</strong>r se apresentou<br />

pessoalmente na Aca<strong>de</strong>mia Hanlin, on<strong>de</strong> foi recebi<strong>do</strong> por Zou Ertai (1677-<br />

-1745) e Zhang Tingyu (1672-1755), que presidia essa instituição. Antes que<br />

o banquete começasse, o impera<strong>do</strong>r havia pedi<strong>do</strong> aos letra<strong>do</strong>s da Aca<strong>de</strong>mia<br />

Hanlin que realizassem uma primeira composição poética coletiva. Na<br />

sequência <strong>do</strong>s poemas <strong>do</strong> impera<strong>do</strong>r e <strong>do</strong>s gran<strong>de</strong>s letra<strong>do</strong>s, cada um<br />

<strong>do</strong>s membros da Aca<strong>de</strong>mia criou um verso <strong>de</strong> cinco caracteres, inserin<strong>do</strong><br />

aí, sucessivamente, um <strong>do</strong>s caracteres <strong>do</strong> poema Dogbi tushu fu, xiyuan<br />

hanmolin, <strong>de</strong> Zhang Shuo (667-730). Esse caractere também tinha a função<br />

<strong>de</strong> indicar a rima a ser a<strong>do</strong>tada. Mais tar<strong>de</strong>, eles foram transcritos por Li<br />

Zongwan na parte inferior direita da pintura da Aca<strong>de</strong>mia Hanlin. O banquete,


50<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, A DINASTIA PARIS QING 51<br />

<strong>do</strong> qual participaram sessenta pessoas, foi acompanha<strong>do</strong> por música e por<br />

uma apresentação teatral. Depois, na sequência <strong>do</strong> impera<strong>do</strong>r, os letra<strong>do</strong>s<br />

da Aca<strong>de</strong>mia realizaram novas composições poéticas enca<strong>de</strong>an<strong>do</strong> versos <strong>de</strong><br />

sete caracteres, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o mo<strong>de</strong>lo <strong>do</strong>s poemas antigos boliang ti.<br />

Essas peças foram, mais tar<strong>de</strong>, transcritas na parte superior da pintura por<br />

Ji Huang. Quan<strong>do</strong> o banquete chegou ao fim, o impera<strong>do</strong>r se retirou para<br />

o pavilhão Qingbi, on<strong>de</strong> compôs novamente quatro poemas em versos <strong>de</strong><br />

sete caracteres, que, provavelmente, são peças transcritas na parte inferior<br />

direita da pintura por Zhang Zhao, um <strong>do</strong>s maiores calígrafos <strong>de</strong> seu tempo,<br />

que, sob or<strong>de</strong>m imperial, podia substituir seu pincel pelo <strong>de</strong> Qianlog.<br />

Essas informações permitem compreen<strong>de</strong>r que o momento da cerimônia<br />

<strong>de</strong>scrito na pintura é aquele em que o impera<strong>do</strong>r se retirou para o pavilhão<br />

Qingbi. Sua presença, <strong>de</strong>stacada pelo <strong>do</strong>ssel imperial, explica que vários<br />

letra<strong>do</strong>s se mantêm em uma atitu<strong>de</strong> respeitosa perto <strong>do</strong> pavilhão, que se<br />

localiza em um pátio contíguo ao pátio principal on<strong>de</strong> ocorreu o banquete.<br />

Os prédios <strong>do</strong> pátio principal receberam <strong>de</strong>coração temporária. O trono<br />

<strong>do</strong> impera<strong>do</strong>r, instala<strong>do</strong> sob o pavilhão central, está volta<strong>do</strong> para o palco,<br />

situa<strong>do</strong> <strong>do</strong> outro la<strong>do</strong> <strong>do</strong> pátio. Os membros da Aca<strong>de</strong>mia permanecem<br />

<strong>de</strong> pé no centro <strong>do</strong> pátio, organiza<strong>do</strong>s <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com sua categoria. No<br />

primeiro pátio, os presentes ofereci<strong>do</strong>s pelo impera<strong>do</strong>r estão dispostos<br />

sobre as mesas: trata-se <strong>de</strong> célebres chás, preciosos rolos <strong>de</strong> seda e papéis<br />

colori<strong>do</strong>s. O guarda <strong>do</strong> impera<strong>do</strong>r, boowei ban, fica nesse local. Para além<br />

da porta da Aca<strong>de</strong>mia, o cortejo imperial forma uma barreira <strong>de</strong> honra até<br />

as portas <strong>do</strong> palácio.<br />

O momento da cerimônia escolhi<strong>do</strong> para a representação permitiu realizar<br />

uma <strong>de</strong>scrição viva e contrastada <strong>de</strong>sse acontecimento. Se, por um la<strong>do</strong>, os<br />

membros da Aca<strong>de</strong>mia que ficam no pátio principal observam uma atitu<strong>de</strong><br />

protocolar, por outro, os funcionários, guardas e emprega<strong>do</strong>s que estão<br />

no primeiro pátio, assim como o cortejo imperial no exterior da Aca<strong>de</strong>mia,<br />

são representa<strong>do</strong>s em repouso. Ainda que essa obra pertença à categoria<br />

<strong>do</strong>s tieluo, um tipo <strong>de</strong> pintura <strong>de</strong>stinada a ser pregada diretamente em<br />

uma pare<strong>de</strong>, ela mantém várias relações com os longos rolos horizontais<br />

que representam os gran<strong>de</strong>s acontecimentos <strong>do</strong> reino <strong>do</strong>s impera<strong>do</strong>res<br />

Qing. Foi exatamente na ocasião da realização <strong>de</strong> uma das mais célebres<br />

<strong>de</strong>ntre essas pinturas, o Sexagésimo aniversário <strong>do</strong> impera<strong>do</strong>r Kangxi,<br />

data<strong>do</strong> <strong>de</strong> 1717, que Jin Kun foi recruta<strong>do</strong> como pintor na corte. Durante<br />

os anos a serviço <strong>do</strong>s impera<strong>do</strong>res Kangxi, Yongzheng e Qianlong, Jin Kun<br />

foi chama<strong>do</strong> para participar <strong>de</strong> vários programas <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> envergadura,<br />

implican<strong>do</strong> um <strong>do</strong>mínio da técnica jiehua, que permite representar os<br />

elementos da arquitetura. Durante o reina<strong>do</strong> <strong>de</strong> Yongzheng, ele colaborou<br />

com a versão <strong>do</strong> Qingming shanghe tu, <strong>de</strong> Chen Mei (1694-1745), ao la<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong> Sun Hu e <strong>de</strong> <strong>do</strong>is outros pintores. Em 1735, Jin Kun e Sun Hu produziram<br />

quadros a pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> príncipe Hongli, futuro impera<strong>do</strong>r Qianlong. Em<br />

1741, quan<strong>do</strong> os quinze pintores da Aca<strong>de</strong>mia Imperial, huahuaren, foram<br />

classifica<strong>do</strong>s em três categorias, Jin Kun e Sun Hu ocuparam a primeira<br />

posição. Lu Zhan e Wu Yu, que também <strong>de</strong>viam participar da realização<br />

da Aca<strong>de</strong>mia Hanlin, foram classifica<strong>do</strong>s na terceira categoria. Se for<br />

consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> que Cheng Liang – cujo nome é cita<strong>do</strong> por último entre os<br />

signatários – era aluno <strong>de</strong> Jin Kun, então se torna evi<strong>de</strong>nte a hierarquia<br />

intrínseca da equipe <strong>de</strong> pintores que trabalharam nesse vasto projeto.<br />

Projetos <strong>de</strong> tal envergadura frequentemente mobilizavam um gran<strong>de</strong><br />

número <strong>de</strong> pintores durante vários anos. Mas é provável que A Aca<strong>de</strong>mia<br />

Hanlin tenha si<strong>do</strong> realizada mais rapidamente, como sugere a presença,<br />

na obra, da caligrafia <strong>de</strong> Zhang Zhao, morto em 1745, ano seguinte ao<br />

acontecimento representa<strong>do</strong>.<br />

Essa pintura se distingue na produção da Aca<strong>de</strong>mia Imperial pela<br />

originalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seu formato, que permitiu aos pintores a prática <strong>de</strong> um<br />

tipo <strong>de</strong> perspectiva complexa. A obra constitui, aliás, um importante<br />

testemunho relativo a uma instituição que exerceu papel artístico essencial<br />

na formação das elites da China imperial <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a época <strong>do</strong>s Tang. Por<br />

fim, essa pintura é, sem dúvida, a imagem mais fiel <strong>de</strong> um conjunto <strong>de</strong><br />

arquitetura e elementos urbanos hoje <strong>de</strong>sapareci<strong>do</strong>s: a Aca<strong>de</strong>mia Hanlin e<br />

sua biblioteca foram quase completamente <strong>de</strong>struídas em 1900, durante<br />

a Guerra <strong>do</strong>s Boxers.


A DINASTIA QING 55<br />

Solitário sob os pinhos contemplan<strong>do</strong><br />

as ondas, entre 1819 e 1829<br />

Zhang Yin (1761-1829)<br />

nanquim e cores sobre papel | 141 x 80,5 cm<br />

Inscrição e assinatura: Agitada, ela leva as cores da montanha<br />

Luminosa, reflete a sombra da floresta.<br />

Quan<strong>do</strong> ela ressoa por sobre a pedra,<br />

Lembramos da calma [que reina] no coração da montanha.<br />

Xi An [sobrenome <strong>do</strong> pintor] Zhang Yin.<br />

Zhang Yin pertencia a uma família <strong>de</strong> ricos merca<strong>do</strong>res <strong>de</strong> Zhenjiang, em Jiangsu.<br />

Seu pai e seu tio eram mecenas <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> importância. Entre as personalida<strong>de</strong>s que<br />

seu pai costumava receber, o calígrafo e coleciona<strong>do</strong>r Wang Wenzhi (1730-1802)<br />

e o pintor Pan Gongshou (1741-1794) exerceram uma profunda influência sobre<br />

Zhang Yin. Pan Gongshou <strong>de</strong>ve tê-lo apresenta<strong>do</strong> à obra <strong>de</strong> Wen Zhengming,<br />

que se tornou seu mo<strong>de</strong>lo preferi<strong>do</strong> durante a juventu<strong>de</strong>. Quan<strong>do</strong> Zhang Yin<br />

ultrapassou os cinquenta anos, as inundações provocadas pela enchente <strong>do</strong> rio<br />

Jingjiang o arruinaram, e ele precisou <strong>de</strong>ixar sua antiga residência para se instalar<br />

na cida<strong>de</strong>, on<strong>de</strong> praticou a pintura profissionalmente. 1 Seus últimos anos, vivi<strong>do</strong>s<br />

na miséria, foram extremamente criativos. Nas composições <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> formato,<br />

Zhang Yin passa a captar o caráter monumental <strong>do</strong>s mestres da paisagem <strong>do</strong>s<br />

Song <strong>do</strong> norte. O po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>ssas obras com policromia acentuada o levou a se<br />

tornar lí<strong>de</strong>r da escola <strong>de</strong> Zhenjiang.<br />

1. A propósito da biografia <strong>de</strong> Zhang Yin,<br />

cf. Zhai, 1998, e Wan, 2005, p. 70-74.<br />

O formato e as tonalida<strong>de</strong>s da paisagem Solitário sob os pinhos contemplan<strong>do</strong><br />

as ondas correspon<strong>de</strong>m a esse último perío<strong>do</strong>. A respeito das massas rochosas,<br />

o tratamento da tinta trai a influência <strong>do</strong>s mo<strong>de</strong>los da época <strong>do</strong>s Song. Os<br />

espinhos em forma <strong>de</strong> leque <strong>do</strong>s gran<strong>de</strong>s pinhos, cuja intensida<strong>de</strong> matizada


56<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

sugere as profun<strong>de</strong>zas da folhagem, são características <strong>do</strong> estilo <strong>de</strong> Zhang Yin. A<br />

composição é muito próxima <strong>de</strong> outras pinturas realizadas no começo <strong>do</strong>s anos<br />

1820, como a Contemplação <strong>de</strong> uma cascata no outono, <strong>do</strong> Museu <strong>de</strong> Xangai. 2 A<br />

singularida<strong>de</strong> da pintura conservada no Musée Cernuschi <strong>de</strong>ve-se ao fato <strong>de</strong> que<br />

Zhang Yin substituiu a concentração <strong>de</strong> ondas por picos montanhosos.<br />

O tema é uma interpretação original <strong>de</strong> outro, frequentemente trata<strong>do</strong> pelo<br />

artista, o da contemplação <strong>de</strong> uma cachoeira. 3 A inscrição, tomada emprestada<br />

<strong>de</strong> um poeta da época <strong>do</strong>s Tang, Huang Fuzeng (721?-785?), <strong>de</strong>screve o curso<br />

<strong>de</strong> um rio <strong>de</strong> montanha. O poeta ressalta o contraste entre a fúria da torrente<br />

e a serenida<strong>de</strong> que reina no alto das montanhas. O fato <strong>de</strong> o pintor ter<br />

voluntariamente omiti<strong>do</strong> o título <strong>do</strong> poema, A fonte ao pé da montanha, sugere<br />

que ele, talvez, tivesse mais a intenção <strong>de</strong> evocar um rio turbulento <strong>do</strong> que uma<br />

paisagem <strong>de</strong> montanha. Vista a importância <strong>de</strong>dicada às célebres regiões <strong>de</strong><br />

Zhenjiang 4 em sua obra, Zhang Yin po<strong>de</strong> ter si<strong>do</strong> inspira<strong>do</strong> pelas paisagens <strong>do</strong>s<br />

arre<strong>do</strong>res <strong>do</strong> gran<strong>de</strong> rio.<br />

2. ZGMSQJ, Qing dai huihua (xia), n. 108.<br />

3. Uma pintura em leque da antiga<br />

coleção <strong>de</strong> Zhang Xueliang (1901?-2001)<br />

apresenta uma composição muito próxima<br />

à pintura <strong>do</strong> Musée Cernuschi (venda no<br />

dia 10 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1994, Sotheby’s, Taipei).<br />

4. Lugares célebres <strong>de</strong> Zhenjiang, Museu<br />

<strong>de</strong> Zhenjiang, ZGGDSHTM, t. 6, p. 289;<br />

e Três elevações <strong>de</strong> Jingjiang, Museu <strong>do</strong><br />

Palácio <strong>de</strong> Pequim, Nie, 1997, p. 292.


58<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS 59<br />

O MOVIMENTO EPIGRÁFICO E A<br />

RENOVAÇÃO DA PINTURA CHINESA


A ESCOLA EPIGRÁFICA 61<br />

Caligrafia, entre 1913 e 1927<br />

Kang Youwei (1858-1927)<br />

nanquim sobre papel | 175,6 x 89,7 cm<br />

Inscrição e assinatura: O gran<strong>de</strong> rio corre em direção ao oeste, suas ondas<br />

varrem os nobres nomes <strong>de</strong> outrora. Caóticas pedras<br />

e nuvens <strong>de</strong>spedaçadas, lâminas terríveis atingem o roche<strong>do</strong>. 1<br />

Para o senhor Pu Tang [Georges Lecomte (1867-1968)], Kang Youwei.<br />

Kang Youwei é originário <strong>de</strong> Nanhai, na província <strong>de</strong> Cantão. Após formar-se<br />

na aca<strong>de</strong>mia Xuehai Tang, ingressa no <strong>do</strong>utora<strong>do</strong> em 1895. Ele expressa suas<br />

i<strong>de</strong>ias inova<strong>do</strong>ras em duas obras principais: Estu<strong>do</strong> crítico <strong>do</strong>s falsos clássicos<br />

estabeleci<strong>do</strong>s pelos eruditos da Dinastia Xin, [Xinxue wijing kao], em 1891, em que<br />

repensa a leitura oficial <strong>do</strong>s clássicos, e Estu<strong>do</strong> crítico <strong>de</strong> Confúcio, reforma<strong>do</strong>r<br />

das instituições [Kongzi gaizhi kao], em 1897, que apresenta uma visão renovada e<br />

progressista sobre Confúcio. Em 1898, ele ganha importância no governo e, entre<br />

outras reformas, propõe a instituição <strong>de</strong> uma monarquia parlamentar. Devi<strong>do</strong> à<br />

reação <strong>de</strong> milhares <strong>de</strong> conserva<strong>do</strong>res, vê-se obriga<strong>do</strong> a <strong>de</strong>ixar o país e vive em<br />

exílio até 1916, viajan<strong>do</strong> principalmente pelo Oci<strong>de</strong>nte. Além <strong>do</strong> campo político, o<br />

pensamento <strong>de</strong> Kang Youwei aborda os <strong>do</strong>mínios sociais, filosóficos e religiosos,<br />

como revela sua obra testamental, o Livro da gran<strong>de</strong> unida<strong>de</strong>, [Datong shu].<br />

1. Esses versos foram retira<strong>do</strong>s <strong>do</strong> poema<br />

Lembrança da passagem pela falésia<br />

vermelha, <strong>de</strong> Su Dongpo, inspira<strong>do</strong> em<br />

Lembrança <strong>de</strong> sua frágil beleza (Su Dongpo<br />

quanji, 1936 e Egan, 1994, p. 226-227).<br />

2. Wu, 1990, p. 46-53.<br />

Ao longo <strong>de</strong> suas viagens, as comparações que ele estabeleceu, no campo das<br />

artes, entre as tradições pictóricas oci<strong>de</strong>ntal e chinesa, levaram-no a constatar<br />

uma <strong>de</strong>cadência da pintura chinesa. Esse admira<strong>do</strong>r <strong>de</strong> Rafael (1483-1520) e <strong>do</strong>s<br />

mestres das dinastias Song e Yuan consi<strong>de</strong>rou a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reorientar a arte<br />

chinesa, apoian<strong>do</strong>-se, por um la<strong>do</strong>, no estu<strong>do</strong> da arte oci<strong>de</strong>ntal e inspiran<strong>do</strong>-se,<br />

por outro, nas tradições responsáveis pela gran<strong>de</strong>za da arte da aca<strong>de</strong>mia <strong>do</strong>s Song.<br />

Essa <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> realismo na arte exerceu uma influência consi<strong>de</strong>rável em pintores<br />

como Xu Beihong (1895-1953) e Liu Haisu (1896–1994), que seguiram suas lições. 2


62<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

No campo da caligrafia, Kang Youwei inscreve-se na linha das i<strong>de</strong>ias formuladas<br />

por Ruan Yuan (1764-1849) e Bao Shichen (1775-1855), em seus escritos funda<strong>do</strong>res<br />

da escola <strong>de</strong> estu<strong>do</strong> <strong>de</strong> estelas, Beixue pai. Kang Youwei se distancia, portanto,<br />

da tradição caligráfica iniciada por Wang Xizhi (303-361) para se <strong>de</strong>dicar a estelas<br />

antigas. Em sua caligrafia, ele faz referência especialmente às inscrições da época<br />

<strong>do</strong>s Han e <strong>do</strong>s Wei <strong>do</strong> norte. Os gran<strong>de</strong>s caracteres <strong>de</strong> Kang Youwei, com o traço<br />

propositalmente malfeito, têm um aspecto monumental inspira<strong>do</strong> no estu<strong>do</strong><br />

das inscrições sobre pedra, como o Shimen Ming. Essa escritura <strong>de</strong>rivada <strong>do</strong><br />

estilo <strong>do</strong>s escribas, lishu, <strong>de</strong>senvolve-se, entretanto, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> cursivo. O pincel,<br />

cheio <strong>de</strong> tinta, embebe a folha em diferentes lugares enquanto alguns caracteres<br />

apresentam-se extremamente secos. Resulta, <strong>de</strong>sse contraste, uma manifestação<br />

singular <strong>de</strong> energia.


64<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS<br />

A ESCOLA EPIGRÁFICA 65<br />

Huaisu escreven<strong>do</strong> sobre uma folha<br />

<strong>de</strong> bananeira, 1922<br />

Wang Zhen (1867-1938)<br />

130 x 33,2 cm | nanquim e cores sobre papel<br />

Inscrição e assinatura: Milhares <strong>de</strong> caracteres foram escritos no Eremitério<br />

Lütianan, 1<br />

Sob o pincel [<strong>de</strong> Huaisu], dragões e serpentes 2 vão ao altar <strong>do</strong> Buda.<br />

Espera-se que as [qualida<strong>de</strong>s das] folhas <strong>de</strong> bananeira e folhas <strong>de</strong> papel sejam<br />

similares,<br />

Nanquim e meditação <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os tempos antigos sempre foram orienta<strong>do</strong>s para<br />

o <strong>de</strong>spertar.<br />

Traça<strong>do</strong> por Wang Zhen [dito] Bailong shanren, durante o outono <strong>do</strong> ano Renxu.<br />

1. O local <strong>do</strong> Eremitério <strong>do</strong> Céu Ver<strong>de</strong><br />

(Lütianan), on<strong>de</strong> morava o monge Huaisu,<br />

era cerca<strong>do</strong> <strong>de</strong> bananeiras, que lhe<br />

acarretaram o nome.<br />

2. A expressão “dragões e serpentes”<br />

<strong>de</strong>signa a caligrafia cursiva.<br />

3. A forgotten celebrity, Wan Zhen (1867-<br />

1938), Businessman Philanthrope and<br />

Artist. In: Ju-His Chou (Ed.), Art at the<br />

Close of China’s Empire. Phoebus, n. *, p.<br />

94-109.<br />

4. XIAO, Fenqi. Wang Yiting. Shijiazhuang,<br />

Pequim: Hebei Jiaoyu Chubanshe, 2002,<br />

p. 28-29.<br />

5. FONG, Wen. Between Two Cultures,<br />

Late Nineteenth- and Twentieth-Century<br />

Chinese Painting from the Robert H.<br />

Ellsworth Collection in the Metropolitan<br />

Museum of Art. Nova York: Yale University<br />

Press, 2001. p. 78-79.<br />

“Homem <strong>de</strong> negócios, filantrópico e artista”, segun<strong>do</strong> os termos <strong>de</strong> Tsao Hsingyuan,<br />

3 Wang Zhen é uma figura muito característica da escola <strong>de</strong> Xangai. De<br />

condição mo<strong>de</strong>sta, ele teria si<strong>do</strong> aprendiz em um ateliê <strong>de</strong> montagem <strong>de</strong> pintura<br />

durante sua juventu<strong>de</strong>, 4 on<strong>de</strong> estu<strong>do</strong>u com Ren Bonan (1840-1896), cuja influência<br />

seria prepon<strong>de</strong>rante nas obras <strong>do</strong> jovem Wang Zhen. Durante a maturida<strong>de</strong>,<br />

sua pintura foi profundamente renovada pelas visitas <strong>de</strong> Wu Changshuo. Ele<br />

conheceria o sucesso nos negócios como representante <strong>de</strong> diferentes socieda<strong>de</strong>s<br />

japonesas, ocupan<strong>do</strong> as funções <strong>de</strong> presi<strong>de</strong>nte das câmaras <strong>de</strong> Agricultura,<br />

<strong>de</strong> Manufaturas e <strong>do</strong> Comércio <strong>de</strong> Xangai. 5 Paralelamente a suas ativida<strong>de</strong>s<br />

comerciais, Wang Zhen foi um cria<strong>do</strong>r prolífico. Seu traço forte e as cores fracas,<br />

herda<strong>do</strong>s <strong>do</strong> mestre, aplicam-se <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> privilegia<strong>do</strong> na pintura <strong>de</strong> personagens,<br />

gênero pelo qual Ren Bonan se tornou conheci<strong>do</strong>. Budista fervoroso, ele soube<br />

comunicar um vigor intenso em suas representações <strong>de</strong> santos e monges,<br />

como <strong>de</strong>monstram suas várias imagens <strong>de</strong> Bodhidharma, entre as quais uma,<br />

monumental, entrou para as coleções nacionais francesas em 1934 e hoje está<br />

conservada no Musée Guimet. Além <strong>de</strong> suas realizações artísticas pessoais, seu<br />

papel <strong>de</strong> mecenas favoreceu a disseminação da obra <strong>de</strong> Wu Changshou (1843-<br />

-1927) no Japão.


66<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

Essas duas obras <strong>de</strong> Wang Zhen pertencem à maturida<strong>de</strong> <strong>do</strong> artista. A<br />

representação <strong>de</strong> Huaisu (c. 735-800), o mestre da dita cursiva insana, escreven<strong>do</strong><br />

em uma folha <strong>de</strong> bananeira inscreve-se em tradição antiga. 6 De fato, a biografia<br />

<strong>de</strong> Huaisu por Tao Gu (903-970) relata que esse monge budista havia planta<strong>do</strong><br />

bananeiras ao re<strong>do</strong>r <strong>de</strong> seu eremitério, e que ele fazia uso das folhas para suas<br />

caligrafias. Essa história, que enfatizava a pobreza <strong>de</strong> Huaisu, mas também seu<br />

empenho no estu<strong>do</strong> da caligrafia, se tornaria um tema pictórico por si só, e um<br />

assunto especialmente caro a Ren Bonan. 7 A pintura <strong>de</strong> Wang Zhen é caracterizada<br />

por seu frequente traço forte à margem <strong>do</strong> primeiro plano e nos bambus <strong>do</strong> plano<br />

<strong>de</strong> fun<strong>do</strong>. Contrastan<strong>do</strong> com esses traços, cuja força contribui para o gesto <strong>do</strong><br />

calígrafo, o rosto <strong>do</strong> monge foi feito com a técnica mogu (sem ossos), os <strong>de</strong>talhes<br />

<strong>do</strong>s olhos e da barba são retoma<strong>do</strong>s com um pincel leve. A segunda pintura<br />

constitui uma hábil síntese entre o gênero <strong>do</strong>s personagens e a arte da paisagem.<br />

Os personagens representa<strong>do</strong>s são Hanshan e Shi<strong>de</strong>, duas figuras <strong>do</strong> budismo<br />

chinês cuja estreita associação <strong>de</strong>u origem a uma iconografia original que<br />

confere, aos <strong>do</strong>is sábios, os mesmos traços grosseiros. Como a biografia <strong>do</strong> poeta<br />

Hanshan, que viveu na época <strong>do</strong>s Tang, é muito lacunar, a legenda foi atribuída a<br />

ele. No prefácio <strong>de</strong> Lu Qiuyin aos poemas <strong>de</strong> Hanshan, ele foi apresenta<strong>do</strong> como<br />

um monge budista liga<strong>do</strong> às cozinhas <strong>do</strong> templo Guoqing Si nos montes Tiantai.<br />

Inseparável <strong>de</strong> Shi<strong>de</strong>, ele é conheci<strong>do</strong> como o inapreensível, encontra refúgio<br />

nos montes Hansam, on<strong>de</strong> escreve seus poemas em uma pare<strong>de</strong> das falésias.<br />

Essa obra, assim como o retrato <strong>de</strong> Huaisu, evoca, consequentemente, figuras<br />

funda<strong>do</strong>ras que ilustram os laços entre o <strong>de</strong>spertar budista e a inspiração artística<br />

a que Wang Zhen se <strong>de</strong>dicou em sua obra <strong>de</strong> pintor.<br />

6. LAUER, Uta. Portrait of the Artist as a<br />

Poor Man the Significance of Writing on a<br />

Banana Leaf. In: BLANCHON, Flora (Dir.).<br />

La question <strong>de</strong> l’Art en Asie Orientale.<br />

Paris: Presses <strong>de</strong> l’Université Paris-<br />

Sorbonne, 2008. p. 251-263.<br />

7. Lauer, 2008, fig. 4 e 13.


68<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

A ESCOLA EPIGRÁFICA 69<br />

Pintinhos, Peixes, Junco e Gralha<br />

com melancia, 1947<br />

Qi Baishi (1863-1957)<br />

nanquim e cores sobre papel | 103,3 x 34,2 cm;<br />

103,7 x 34,4 cm; 102 x 34 cm; 101,3 x 33,9 cm<br />

1. Inscrição e assinatura: Afasta<strong>do</strong> há muito tempo <strong>do</strong> pavilhão Bayan, Qi Baishi,<br />

com oitenta e sete anos, pintou esses seres com sua velha mão.<br />

2. Inscrição e assinatura: Anos dura<strong>do</strong>uros e gran<strong>de</strong> prosperida<strong>de</strong>. Para o<br />

Senhor Zhicheng. Baishi em seu octogésimo sétimo ano.<br />

3. Inscrição e assinatura: Para o Senhor Hongqu, em homenagem. No oitavo<br />

mês <strong>do</strong> outono <strong>do</strong> ano Jiahai [Dinghai], pinta<strong>do</strong> por Laishi em seu octogésimo<br />

sétimo ano, na antiga Yanjing [Pequim].<br />

4. Inscrição e assinatura: Feito pelo velho Baishi em seu octogésimo sétimo ano<br />

em Jinghua [Pequim].<br />

Qi Baishi é originário <strong>do</strong> vilarejo <strong>de</strong> Xing<strong>do</strong>u Tang, no distrito <strong>de</strong> Xiangtan em<br />

Hunan. Nasci<strong>do</strong> em um meio mo<strong>de</strong>sto, ele apren<strong>de</strong>u <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua a<strong>do</strong>lescência o<br />

ofício <strong>de</strong> grava<strong>do</strong>r na ma<strong>de</strong>ira. Essa formação artesanal favoreceu a apropriação<br />

<strong>do</strong> repertório <strong>de</strong>corativo tradicional, sobretu<strong>do</strong> floral. No fim <strong>de</strong> seu aprendiza<strong>do</strong>,<br />

ele estava <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> a se formar na pintura como autodidata com base nos<br />

mo<strong>de</strong>los <strong>do</strong> manual <strong>de</strong> pintura Jiezi yuan huachuan, exercen<strong>do</strong> seu ofício <strong>de</strong><br />

grava<strong>do</strong>r. O estu<strong>do</strong> da técnica <strong>do</strong> retrato junto com Xiao Zhuanxin levou-o a<br />

se estabelecer como retratista a partir <strong>de</strong> 1889. 1 No mesmo ano, ele se tornou<br />

aluno <strong>de</strong> Hu Qinyuan (?-1914), com quem apren<strong>de</strong>u a técnica gongbi. No entanto,<br />

essas qualida<strong>de</strong>s encontrariam uma expressão mais bem-acabada nas pinturas <strong>de</strong><br />

insetos e <strong>de</strong> flores, às quais ele <strong>de</strong>dicou suas pesquisas <strong>de</strong> 1895 até a época <strong>de</strong><br />

sua mudança para Pequim, nos anos 1920. De 1902 a 1909, ele fez várias viagens,<br />

que o levaram a visitar regiões e cida<strong>de</strong>s muitos distintas, como Xi’an, Pequim,<br />

Guilin e Cantão. As obras que viu e as personalida<strong>de</strong>s que conheceu ao longo<br />

1. Um retrato <strong>de</strong> seu mestre Hu Qinyuan,<br />

conserva<strong>do</strong> no museu da província<br />

Liaoning, evi<strong>de</strong>ncia uma execução<br />

extremamente realista (Wu, 2000, p. 18).<br />

2. Fong, 2001, p. 148-149.<br />

3. Do mesmo mo<strong>do</strong>, as pinturas <strong>de</strong><br />

pintinhos sempre recebem o título Duo<br />

zi, “várias crianças”, uma fórmula que<br />

correspon<strong>de</strong> ao <strong>de</strong>sejo clássico <strong>de</strong> uma<br />

família numerosa.<br />

<strong>de</strong>sses périplos levaram-no a a<strong>do</strong>tar novos mo<strong>de</strong>los, como Zhu Da (1626-1705),<br />

Jin Nong (1687-1764) e Xu Wei (1521-1593) para a pintura, e Zhao Zhiqian (1829-<br />

1884) para a gravura <strong>de</strong> símbolos. Essas influências participaram da evolução <strong>de</strong><br />

seu estilo, que se emancipa progressivamente <strong>de</strong> seu traço minucioso.<br />

Contu<strong>do</strong>, é somente no momento <strong>de</strong> sua instalação em Pequim, em 1917, em<br />

consequência <strong>de</strong> seu encontro com Chen Shizeng (1876-1923), que ele se orienta<br />

para o que culminará na expressão <strong>de</strong> seu estilo pessoal. Além da influência<br />

<strong>de</strong> seus escritos, talvez fosse a importância <strong>de</strong>dicada à obra <strong>de</strong> Wu Changshuo<br />

(1844-1927) por Cheng Shizeng e os membros <strong>de</strong> seu círculo, como Chen Banding<br />

(1877-1970) ou Yao Hua (1876-1930), que levaria Qi Baishi a tomar por mo<strong>de</strong>lo<br />

a obra <strong>do</strong> mestre da escola <strong>de</strong> Xangai. Ao final <strong>do</strong> que Qi Baishi chamava <strong>de</strong><br />

“reforma artística em uma ida<strong>de</strong> avançada”, ele emergiu rapidamente na cena<br />

artística nacional. A originalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> suas composições, a energia <strong>do</strong> pincel e<br />

a audácia no emprego das cores caracterizam, no plano formal, as obras <strong>de</strong>ssa<br />

época. Entretanto, a simplicida<strong>de</strong> direta <strong>de</strong> sua obra <strong>de</strong>ve-se ao caráter rústico,<br />

salpica<strong>do</strong> <strong>de</strong> humor, <strong>de</strong> seu universo pictórico. Após a revolução <strong>de</strong> 1949, foi<br />

consagra<strong>do</strong> o representante mais importante da pintura chinesa tradicional.<br />

As quatro pinturas, <strong>do</strong>adas ao Musée Cernuschi por Guo Youshou (1900-<br />

1978), formam um conjunto característico da maturida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Qi Baishi. Além<br />

das reminiscências sensíveis, por exemplo, por meio <strong>do</strong> perfil <strong>do</strong> bagre que<br />

evoca a pintura <strong>de</strong> Zhu Da, 2 essas obras constituem uma perfeita introdução<br />

ao universo pictórico <strong>de</strong> Qi Baishi. Os animais, apreendi<strong>do</strong>s na espontaneida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> seus movimentos, como a ninhada <strong>de</strong> pintinhos brincan<strong>do</strong> espalha<strong>do</strong>s ou o<br />

pássaro bican<strong>do</strong> a melancia, têm, certas vezes, um significa<strong>do</strong> simbólico. Assim,<br />

a associação <strong>do</strong> bagre, nianyu, e <strong>de</strong> uma espécie <strong>de</strong> salmão, guiyu, correspon<strong>de</strong><br />

à fórmula <strong>de</strong> <strong>de</strong>sejos chang nian da gui, cujos termos são equivalentes fonéticos<br />

<strong>de</strong> nomes <strong>de</strong> <strong>do</strong>is peixes. 3 Da ilustração <strong>de</strong>ssas frases populares emana uma<br />

poesia concreta própria a Qi Baishi.


72<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS 73<br />

VIAJANDO NO JAPÃO


VIAJANDO NO JAPÃO 75<br />

Gansos selvagens, entre 1940 e 1945<br />

Chen Zhifo (1896-1962)<br />

nanquim e cores sobre papel | 106,3 x 36,8 cm<br />

Inscrição e assinatura: “Na <strong>de</strong>scrição <strong>de</strong> qualquer coisa, a apresentação, a<br />

forma, não vale a percepção <strong>do</strong> movimento, a percepção <strong>do</strong> movimento não<br />

vale a compreensão <strong>do</strong> ritmo, mas a compreensão <strong>do</strong> ritmo não equivale à<br />

apreensão da essência.” Tais são as palavras <strong>de</strong> Zhu Lan [Li Rihua], aquele que<br />

as compreen<strong>de</strong>r po<strong>de</strong> falar <strong>de</strong> pintura. Xue Weng [alcunha <strong>do</strong> pintor].<br />

1. Para a biografia <strong>de</strong> Chen Zhifo, cf. Chen<br />

e Gu, 2002.<br />

2. A propósito da influência <strong>do</strong> Japão<br />

sobre a formação e a obra <strong>de</strong> Chen Zhifo,<br />

cf. Yuen-Wong, 2006, p. 25-27.<br />

3. Ele colabora sobretu<strong>do</strong> com o<br />

Dongfang zazhi, publica<strong>do</strong> pelo<br />

Commercial Press <strong>de</strong> Xangai, <strong>de</strong> 1925 a<br />

1930 (Chen e Gu, 2002, p. 105-107).<br />

4. Essa célebre assertiva foi inscrita<br />

por Chen Shuren sobre uma pintura <strong>de</strong><br />

Chen Zhifo que representa bambus e<br />

crisântemos. Huang Quan é um <strong>do</strong>s mais<br />

ilustres pintores <strong>de</strong> flores e <strong>de</strong> pássaros<br />

da história da China. Seu estilo, que foi<br />

transmiti<strong>do</strong> à corte da dinastia <strong>do</strong>s Song<br />

por seu filho, tornou-se o mo<strong>de</strong>lo com<br />

base no qual a pintura acadêmica <strong>de</strong> flores<br />

e <strong>de</strong> pássaros se <strong>de</strong>senvolveria.<br />

Chen Zhifo nasceu na atual cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Cixi, em Zhejiang. 1 Paralelamente à sua<br />

obra <strong>de</strong> pintor, ele é consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> um <strong>do</strong>s pioneiros <strong>do</strong> grafismo mo<strong>de</strong>rno na<br />

China. Seu interesse pelo estu<strong>do</strong> <strong>do</strong>s temas <strong>de</strong>corativos data <strong>de</strong> sua formação<br />

nas técnicas industriais têxteis, entre 1912 e 1916. De 1918 a 1923, Chen Zhifo<br />

dá continuida<strong>de</strong> a seus estu<strong>do</strong>s no Japão, no <strong>de</strong>partamento <strong>de</strong> artes aplicadas<br />

da Escola <strong>de</strong> Belas-Artes <strong>de</strong> Tóquio. 2 De volta à China, ele se instala em Xangai,<br />

on<strong>de</strong> dá aulas <strong>de</strong> grafismo. Suas pesquisas, que correspon<strong>de</strong>m à ascensão da<br />

prensa ilustrada, <strong>de</strong>monstram seu interesse tanto pelo vocabulário <strong>de</strong>corativo<br />

das antigas civilizações, como pelas manifestações da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>. Em 1931,<br />

ele dá aulas na Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Nanquim. Esse novo ambiente <strong>de</strong>sempenhou<br />

um papel importante no <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> sua obra <strong>de</strong> pintor. Em 1934, ele<br />

expõe pela primeira vez uma pintura representan<strong>do</strong> pássaros, com o nome <strong>de</strong><br />

Xue Weng. Essa obra foi realizada no estilo gongbi, uma técnica minuciosa que<br />

possibilita uma representação exata <strong>do</strong>s animais e da natureza. Na obra <strong>de</strong> Chen<br />

Zhifo, esses efeitos naturalistas são acompanha<strong>do</strong>s <strong>de</strong> uma qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong>corativa<br />

herdada <strong>de</strong> suas pesquisas gráficas. Sua obra <strong>de</strong> pintor só será totalmente<br />

reconhecida a partir <strong>de</strong> 1942: durante sua primeira exposição individual, Chen<br />

Shuren (1884-1948) vê nele um “Huang Quan (903-965) mo<strong>de</strong>rno”. 4 Durante<br />

os anos pós-guerra, continua a explorar o vasto registro <strong>de</strong> flores e pássaros,<br />

manten<strong>do</strong>-se fiel à técnica exigente <strong>do</strong> gongbi até sua morte, em 1962.


76<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS<br />

A pintura <strong>do</strong>s Gansos selvagens representa perfeitamente o estilo <strong>de</strong> Chen Zhifo.<br />

A própria natureza <strong>do</strong> tema pinta<strong>do</strong>, assim como os princípios <strong>de</strong> composição,<br />

evoca os mo<strong>de</strong>los da época <strong>do</strong>s Song, sobretu<strong>do</strong> as obras atribuídas à Aca<strong>de</strong>mia<br />

Imperial. No caso <strong>de</strong> Co<strong>do</strong>rnizes, essa influência é especialmente perceptível. O<br />

pintor reconheceu a profunda impressão <strong>de</strong>ixada por esse tipo <strong>de</strong> pintura antiga,<br />

que contemplou pela primeira vez durante uma exposição que data <strong>do</strong> início <strong>do</strong>s<br />

anos 1930, pouco antes <strong>de</strong> realizar suas primeiras criações nesse gênero. 5 Essa<br />

pintura <strong>de</strong> acentos naturalistas, fundada em uma tradição chinesa esquecida<br />

durante as duas últimas dinastias, respon<strong>de</strong> a seu mo<strong>do</strong> às aspirações <strong>de</strong> uma<br />

parte da intelligentsia que Kang Youwei (1858-1927) <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>u <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os primeiros<br />

anos <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> republicano.<br />

5. Não é impossível, no entanto, que ele<br />

tenha visto essa obras atribuídas aos Song<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o tempo <strong>de</strong> sua formação no Japão.<br />

A técnica <strong>do</strong> gongbi, baseada na exatidão<br />

<strong>do</strong> traço <strong>de</strong> contorno, frequentemente<br />

implica o recurso a clichês, fenben. Esse<br />

uso po<strong>de</strong> ser ressalta<strong>do</strong> no caso da pintura<br />

<strong>do</strong>s Gansos selvagens. Uma pintura<br />

datada <strong>de</strong> 1947 e conservada no Museu <strong>de</strong><br />

Nanquim é uma réplica exata da obra <strong>do</strong><br />

Musée Cernuschi, com uma única exceção:<br />

a neve que recobre o tema da pintura <strong>do</strong><br />

Museu <strong>de</strong> Nanquim (Chen e Gu, 2002, p.<br />

136-137). Aliás, é provável que a técnica<br />

empregada por Chen Zhifo para evocar a<br />

neve seja <strong>de</strong> origem japonesa.


VIAJANDO NO JAPÃO 79<br />

Dois pássaros ver<strong>de</strong>s sobre uma magnólia, 1947<br />

Yu Fei’an (1889-1959)<br />

nanquim e cores sobre papel | 89,1 x 46,2 cm<br />

Inscrição e assinatura: Durante o mês suplementar 1 <strong>do</strong> ano Dinghai [1947], eu<br />

estava em Wanyangyun Xuan. Em frente ao Pavilhão da Longevida<strong>de</strong> Feliz havia<br />

uma magnólia em plena floração. Lembrei-me então <strong>de</strong> meu amigo, o senhor Lin,<br />

que, em seu jardim à beira <strong>do</strong> Hu, tinha uma magnólia composta <strong>de</strong> <strong>do</strong>is troncos<br />

em único toco, como uma única árvore, e isso sem que houvesse enxerto. Era<br />

algo extraordinário. A macieira selvagem ofusca os olhos, [o perfume] <strong>do</strong> lilás<br />

toma o pátio. [Pinta<strong>do</strong>] e inscrito por Fei’an.<br />

1. No calendário lunar, é preciso introduzir<br />

um mês suplementar a cada <strong>do</strong>is ou três<br />

anos. Esse sistema é equivalente aos anos<br />

bissextos no calendário solar.<br />

2. Para a biografia <strong>de</strong> Yu Fei’an, cf. Yu,<br />

1988, introdução, p. 11-14.<br />

3. Essa opinião foi registrada por Yu<br />

Fei’an, que a gravou em uma pintura feita<br />

pouco tempo antes <strong>de</strong> sua morte.<br />

Yu Zhao, conheci<strong>do</strong> pelo nome <strong>de</strong> Yu Fei’an, nasceu em Pequim. 2 Em sua juventu<strong>de</strong>,<br />

formou-se em pintura com Wang Runxuan, um artista popular. Jornalista e<br />

professor, ele <strong>de</strong>u aulas <strong>de</strong> pintura e <strong>de</strong> caligrafia em diversas instituições<br />

acadêmicas <strong>de</strong> Pequim no perío<strong>do</strong> entreguerras. A partir <strong>de</strong> 1935, trabalhou no<br />

<strong>de</strong>partamento <strong>de</strong> exposições da Cida<strong>de</strong> Proibida. Desse momento em diante,<br />

começou a pesquisar a pintura antiga e copiar as obras <strong>do</strong>s mestres conservadas<br />

nas coleções <strong>do</strong> novo museu, aberto ao público em 1931. Esse acesso às pinturas<br />

antigas coincidiu com uma virada <strong>de</strong>cisiva em sua obra: a partir <strong>de</strong> 1935, passou a<br />

se <strong>de</strong>dicar exclusivamente ao gênero da pintura <strong>de</strong> flores e <strong>de</strong> pássaros no estilo<br />

minucioso, o gongbi. Depois <strong>de</strong> sua primeira exposição individual, em 1936, ele<br />

prosperou rapidamente como um <strong>do</strong>s mestres <strong>de</strong>sse gênero. Após 1949, ocupou<br />

posições importantes na Associação para a Pesquisa sobre a Pintura Chinesa e na<br />

Aca<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> Pintura <strong>de</strong> Pequim.<br />

Na opinião <strong>de</strong> Yu Fei’an, suas pesquisas a respeito das flores e <strong>do</strong>s pássaros<br />

po<strong>de</strong>m ser divididas em três momentos principais. 3 O primeiro perío<strong>do</strong> é <strong>do</strong>mina<strong>do</strong><br />

pelos mo<strong>de</strong>los antigos, sobretu<strong>do</strong> pelos mestres das dinastias Song e Yuan, assim<br />

como Chen Hongshou (1598-1652). Em um segun<strong>do</strong> momento, seu interesse


80<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

se voltaria exclusivamente para as pinturas <strong>do</strong> impera<strong>do</strong>r Huizong (1082-1135)<br />

<strong>do</strong>s Song e sua caligrafia no estilo “ouro lança<strong>do</strong>”, shoujin. Por fim, o estu<strong>do</strong><br />

direto da natureza ter-lhe-ia permiti<strong>do</strong> completar seu estu<strong>do</strong> histórico por meio<br />

<strong>de</strong> uma abordagem empírica. Seus escritos, sobretu<strong>do</strong> seu importante trata<strong>do</strong><br />

consagra<strong>do</strong> às cores na pintura chinesa, 4 <strong>de</strong>monstram, contu<strong>do</strong>, um profun<strong>do</strong><br />

conhecimento das tradições da pintura popular.<br />

4. Essa obra, publicada em 1955, foi<br />

traduzida para o inglês; ela aparece na<br />

bibliografia sob a referência Yu, 1988.<br />

Dois pássaros ver<strong>de</strong>s sobre uma magnólia data da maturida<strong>de</strong> <strong>do</strong> artista.<br />

Além das referências à pintura antiga, perceptíveis na composição, a obra é<br />

apresentada por Yu Fei’an como resulta<strong>do</strong> <strong>de</strong> uma observação direta <strong>de</strong> uma<br />

árvore florida. Os termos da inscrição revelam o interesse <strong>do</strong> pintor pela botânica.<br />

As cores contrastadas são aplicadas com uma gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za <strong>de</strong> nuances,<br />

<strong>de</strong>monstran<strong>do</strong> as pesquisas <strong>do</strong> pintor a respeito da cor.


82 SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

VIAJANDO NO JAPÃO 83<br />

O pintor em sua mesa <strong>de</strong> trabalho,<br />

entre 1925 e 1965<br />

Fu Baoshi (1904-1965)<br />

31,1 x 36,7 cm | nanquim e cores sobre papel<br />

3. Sullivan, 2001, p. 76.<br />

4. Vale observar que a obra <strong>do</strong> Musée<br />

Cernuschi pertence à antiga coleção<br />

Zhou Lin.<br />

parece possível olhar essa associação <strong>de</strong> versos <strong>de</strong> Wu Weiye com o retrato <strong>de</strong><br />

Shao Mi como a expressão íntima <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> espírito <strong>de</strong> Fu Baoshi.<br />

Depois <strong>de</strong> ter cogita<strong>do</strong> o projeto <strong>de</strong> realização <strong>de</strong> uma série <strong>de</strong> pinturas com<br />

base no poema <strong>de</strong> Wu Weiye, Fu Baoshi parece ter se <strong>de</strong>dica<strong>do</strong> exclusivamente<br />

à representação <strong>de</strong> Shao Mi. Entretanto, como é bastante comum na obra <strong>de</strong> Fu<br />

Baoshi, esse tema foi representa<strong>do</strong> pelo artista várias vezes. Assim, uma pintura<br />

da coleção Michael e Khoan Sullivan, 3 <strong>de</strong> idêntica composição, apresenta uma<br />

técnica muito diferente, no limite da dissolução das formas. É provável que a<br />

pintura <strong>do</strong> Musée Cernuschi seja um pouco anterior a essa obra, datada <strong>de</strong> 1948. 4<br />

Inscrição e assinatura: Sou Guachou [Shao Mi], o eterno excêntrico.<br />

Por minha vida, toma<strong>do</strong> por um estranho orgulho, eu me mantive à distância.<br />

Meus emprega<strong>do</strong>s, jovens e velhos, roubam-me e insultam-me, minha mulher<br />

ansiosa faz cenas <strong>de</strong> escândalos.<br />

Magro como um cisne, ocioso como uma gaivota, mancha<strong>do</strong> <strong>de</strong> tinta, será que<br />

conheci a paz algum dia?<br />

Um <strong>do</strong>s Nove amigos da pintura <strong>de</strong> Wu Meicun [Wu Weiye]. Fu Baoshi.<br />

Ao la<strong>do</strong> da pedra com tinta e <strong>de</strong> outros tesouros <strong>do</strong> letra<strong>do</strong>, a longa folha <strong>de</strong><br />

papel apresenta uma superfície imaculada. As pinturas e as caligrafias em rolos,<br />

apertadas em um jarro, mantêm relação com o pote <strong>de</strong> pincel que enfeita o canto<br />

da mesa. O pintor, com o pincel na mão, dirige os olhos à janela, on<strong>de</strong> um homem<br />

barbu<strong>do</strong> e uma criança observam a distância.<br />

Os versos que acompanham essa pintura foram empresta<strong>do</strong>s <strong>do</strong> poema <strong>de</strong> Wu<br />

Weiye (1609-1672), 1 o Canto <strong>do</strong>s nove amigos da pintura, Hua zhong jiu you ge.<br />

Nesses versos que concluem sua obra, o poeta evoca o excêntrico <strong>de</strong>stino <strong>do</strong><br />

pintor Shao Mi (1592?-1672). O esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> espírito <strong>do</strong> pintor é expresso por um<br />

sentimento <strong>de</strong> orgulho cansa<strong>do</strong> que po<strong>de</strong> ser li<strong>do</strong> em seu rosto.<br />

Se, por um la<strong>do</strong>, as representações <strong>do</strong>s poetas <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, como Tao Yuanming<br />

(365 ou 372-427) e Du Fu (712-770), são numerosas na obra <strong>de</strong> Fu Baoshi, por<br />

outro, as imagens <strong>de</strong> caligrafias e <strong>de</strong> pintores, como Huaisu e Shitao, não estão<br />

absolutamente ausentes. Essas representações <strong>de</strong> artistas foram às vezes<br />

consi<strong>de</strong>radas autorretratos disfarça<strong>do</strong>s <strong>de</strong> Fu Baoshi. 2 À luz <strong>de</strong>ssas consi<strong>de</strong>rações,<br />

1. Wu Weiye, como Cheng Sui e Shitao,<br />

viveu durante o perío<strong>do</strong> turbulento da<br />

transição dinástica <strong>do</strong> século XVII.<br />

2. Fong, 2001, p. 111-112.


VIAJANDO NO JAPÃO 87<br />

Lótus sob o vento, 1955<br />

Zhang Daqian (1899-1983)<br />

nanquim e cores sobre papel | 184,4 x 95,2 cm<br />

Inscrição e assinatura: Antigamente, a lua brilhante era chamada <strong>de</strong> reservatório<br />

<strong>de</strong> ja<strong>de</strong> branca,<br />

Muitos sentimentos se refletem na barreira <strong>de</strong> ja<strong>de</strong>.<br />

O vento <strong>do</strong> oeste, carrega<strong>do</strong> com seu perfume, soprou durante a noite.<br />

No palácio das águas, vesti<strong>do</strong> com gaze, sinto o frio intenso.<br />

No ano Yiwei [1955], no momento <strong>de</strong> Chongjiu [a festa no duplo nove], sobre<br />

o lago Shinobazu, lembro das caminhadas cotidianas e <strong>do</strong> leve perfume que<br />

penetrava pelas mangas <strong>do</strong> meu vesti<strong>do</strong>.<br />

Eu pensava [o quanto] o verso <strong>de</strong> Dongpo [Su Shi] em “O palácio das águas e o<br />

vento que sobe”, nos afeta [?] folhas amassadas que recobrem o lago.<br />

1. Zhang, 2002, p. 95. Essa pintura já<br />

apresenta o traço específico das folhas<br />

<strong>de</strong> lótus observável na pintura <strong>do</strong>ada por<br />

Zhang Daqian ao Musée Cernuschi.<br />

2. A obra, uma pintura sobre seda <strong>de</strong><br />

178,5 x 994,5 cm, foi feita <strong>de</strong> 1981 a 1983.<br />

3. Uma obra <strong>de</strong> 385 x 600 cm (Elisseeff,<br />

1961, p. 3).<br />

A pintura <strong>de</strong> lótus foi um <strong>do</strong>s espaços <strong>de</strong> experimentação mais fecun<strong>do</strong>s da obra<br />

<strong>de</strong> Zhang Daqian. Seus mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong>vem, sem dúvida, ser procura<strong>do</strong>s na pintura <strong>de</strong><br />

Zhu Da (1626-1705), que <strong>de</strong>ra a suas representações uma excepcional dimensão<br />

monumental. Os lótus monocromáticos data<strong>do</strong>s <strong>de</strong> 1937 são exemplos <strong>do</strong> mo<strong>do</strong><br />

como Zhang Daqian conseguiu captar essa monumentalida<strong>de</strong> para orientá-la em<br />

outra direção. 1 Após sua estadia em Dunhuang, que lhe possibilitou contemplar e<br />

copiar composições murais, Zhang Daqian começou a arriscar os gran<strong>de</strong>s formatos.<br />

Essa vonta<strong>de</strong>, que foi aplicada em to<strong>do</strong>s os gêneros da pintura que praticou,<br />

culminaria na realização da vista <strong>do</strong> Monte Lu, <strong>de</strong> 1981 a 1983. 2 Entretanto, a pintura<br />

<strong>de</strong> lótus levou-o a se arriscar no gran<strong>de</strong> formato <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1945. 3 Essas obras eram<br />

realizadas na forma <strong>de</strong> polípticos: rolos verticais paralelos ou biombos. As pinturas<br />

<strong>de</strong> tamanho cada vez mais relevante <strong>de</strong>viam orientar a evolução <strong>de</strong> sua obra.<br />

As implicações técnicas <strong>de</strong>ssa ambição monumental se revelam extremamente<br />

complexas. A elaboração <strong>de</strong> superfícies tão carregadas envolve não apenas a


88<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

seleção <strong>de</strong> materiais adapta<strong>do</strong>s, mas também o <strong>do</strong>mínio <strong>do</strong> equilíbrio entre a<br />

livre distribuição da tinta e o controle <strong>do</strong> pincel. Nesse senti<strong>do</strong>, não é impossível<br />

que a técnica da tinta e das cores salpicadas, pomo pocai, que renovaria suas<br />

pinturas <strong>de</strong> paisagens a partir <strong>do</strong>s anos 1960, tenha si<strong>do</strong> fruto das experiências<br />

feitas na pintura <strong>de</strong> lótus <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os anos 1940. Na pintura <strong>do</strong> Musée Cernuschi,<br />

datada <strong>de</strong> 1955, a cor <strong>de</strong>sempenha ainda um papel discreto que faz sobressair a<br />

intensida<strong>de</strong> da tinta. 4 O contraste entre o profun<strong>do</strong> negro das folhas <strong>de</strong> lótus e<br />

a brancura das flores cria um efeito luminoso que prefigura a utilização <strong>de</strong> papel<br />

<strong>do</strong>ura<strong>do</strong> nas composições <strong>de</strong> lótus sobre biombos realizadas nos últimos anos<br />

<strong>de</strong> sua vida. 5<br />

4. Esse papel da sustentação da cor já<br />

estava presente na série <strong>de</strong> lótus gigantes<br />

<strong>do</strong>s anos 1940 (Zhang, 2002, p. 57).<br />

5. Fu e Stuart, 1991, p. 248-249.


90<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS 91<br />

DESCOBRINDO O OESTE


DESCOBRINDO O OESTE 93<br />

O <strong>de</strong>mônio búfalo e o espírito serpente, 1943<br />

Xu Beihong (1895-1953)<br />

nanquim e cores sobre papel | 85,1 x 57,9 cm<br />

Inscrição e assinatura: O <strong>de</strong>mônio búfalo e o espírito serpente (parte <strong>do</strong> título)<br />

Beihong, Guiwei (1943)<br />

Xu Beihong nasceu em Qitingqiao Zhen, no distrito <strong>de</strong> Yixing em Jiangsu, e<br />

apren<strong>de</strong>u sua arte com seu pai, Xu Dazhang (?-1914). 1 Arruina<strong>do</strong>s por uma<br />

inundação, pai e filho tiveram <strong>de</strong> levar uma vida <strong>de</strong> artistas itinerantes até<br />

que a reputação emergente <strong>de</strong> Xu Beihong lhe permitisse dar aulas em Yixing.<br />

De 1914 a 1917, Xu Beihong vive em Xangai: inscreve-se na Université l’Aurore<br />

[Zhendan Daxue], on<strong>de</strong> estuda francês, e dá palestras na univesida<strong>de</strong> Mingzhi. É<br />

incentiva<strong>do</strong> por Gao Jianfu (1879-1951) e Gao Qifeng (1889-1933), assim como por<br />

Kang Youwei (1858-1927), que lhe encomenda obras e lhe dá livre acesso a suas<br />

coleções <strong>de</strong> estampas e caligrafias.<br />

1. Além da aprendizagem tradicional <strong>do</strong><br />

ofício, seu pai o aconselha a copiar as<br />

obras <strong>do</strong> célebre pintor e ilustra<strong>do</strong>r Wu<br />

Jiayou (?-1893), mais conheci<strong>do</strong> pelo nome<br />

Wu Youru, cujos trabalhos contêm vários<br />

elementos influencia<strong>do</strong>s pelas técnicas <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>senho oci<strong>de</strong>ntais.<br />

2. O mo<strong>do</strong> como os artistas japoneses<br />

souberam assimilar as técnicas da pintura<br />

oci<strong>de</strong>ntal conforta sua visão reformista da<br />

pintura chinesa.<br />

3. Durante esse perío<strong>do</strong>, no entanto, Xu<br />

Beihong retornou uma vez à China, em<br />

1925.<br />

4. Estu<strong>do</strong>s <strong>de</strong> animais realiza<strong>do</strong>s no<br />

jardim zoológico <strong>de</strong> Berlim em 1922 estão<br />

conserva<strong>do</strong>s no museu Xu Beihong, em<br />

Pequim (Liao, 1995, p. 79).<br />

Em 1917, Xu Beihong passa a morar no Japão. 2 Com o apoio <strong>de</strong> Cai Yuanpei<br />

(1868-1940), obtém uma bolsa para estudar na França, on<strong>de</strong> vive <strong>de</strong> 1920 a<br />

1927. 3 Forma<strong>do</strong> na École Nationale Supérieure <strong>de</strong>s Beaux-Arts, em Paris, ele se<br />

orienta mais em direção aos mestres <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> <strong>do</strong> que aos vanguardistas. Sua<br />

admiração pelo pintor acadêmico Pascal Dagnan-Bouveret (1852-1929), junto com<br />

quem estuda <strong>de</strong>senho e pintura a óleo, confirma essa inclinação. Sua estadia na<br />

Alemanha em 1921, no ateliê <strong>de</strong> Arthur Kampf (1864-1950), <strong>de</strong>sperta seu interesse<br />

pelo realismo e pela pintura <strong>de</strong> animais. 4<br />

De volta à China, ele leciona em Xangai e Nanquim, antes <strong>de</strong> ser nomea<strong>do</strong> diretor<br />

da Aca<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> Belas-Artes <strong>de</strong> Pequim, em 1929. Durante esses anos, ele cria<br />

monumentais obras a óleo, ilustran<strong>do</strong> temas inspira<strong>do</strong>s na história da China. Seus<br />

escritos <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m o realismo na arte. Em 1933, vai à França para organizar a


94<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

exposição <strong>de</strong> arte chinesa antiga e mo<strong>de</strong>rna, realizada no museu Jeu <strong>de</strong> Paume,<br />

em Paris, antes <strong>de</strong> viajar à Itália, à Bélgica e à Alemanha. Em 1937, a Aca<strong>de</strong>mia<br />

<strong>de</strong> Belas-Artes se retira a Chongqing. Em 1938, ele visita o Su<strong>do</strong>este Asiático<br />

e, em 1940, a Índia, a convite <strong>de</strong> Rabindranath Tagore (1861-1941). De volta a<br />

Chongqing, em 1943, ele ingressa na Aca<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> Belas-Artes. O perío<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

guerra é extremamente produtivo: inspira algumas <strong>de</strong> suas maiores composições, 5<br />

que, ao ilustrar a história da China, ajudam a resistência nacional. Outras obras<br />

mais mo<strong>de</strong>stas, como a pintura <strong>do</strong> Musée Cernuschi intitulada O <strong>de</strong>mônio búfalo<br />

e o espírito serpente, 6 têm, na verda<strong>de</strong>, um senti<strong>do</strong> pareci<strong>do</strong>. Como essa pintura<br />

data <strong>de</strong> 1943, o contexto leva a pensar que a serpente ameaça<strong>do</strong>ra da pintura é<br />

uma representação simbólica <strong>do</strong> Japão atacan<strong>do</strong> a China. 7<br />

5. Assim, a pintura representan<strong>do</strong> O velho<br />

maluco moven<strong>do</strong> as montanhas, feita na<br />

Índia, em 1940, transpõe o espírito <strong>de</strong> suas<br />

composições a óleo, no <strong>do</strong>mínio da pintura<br />

chinesa tradicional. A obra está conservada<br />

no museu Xu Beihong, em Pequim.<br />

6. A expressão, <strong>de</strong> origem budista,<br />

geralmente <strong>de</strong>signa o mal e os malfeitores.<br />

7. O mesmo tipo <strong>de</strong> oposição entre um<br />

leão e uma serpente, data<strong>do</strong> <strong>de</strong> 1939<br />

(Liao, 1995, p. 46), é um prece<strong>de</strong>nte sem<br />

ambiguida<strong>de</strong>, já que o leão feri<strong>do</strong> foi<br />

escolhi<strong>do</strong> como alegoria da China, atacada<br />

a partir <strong>de</strong> 1938.<br />

Em 1949, Xu Beihong é nomea<strong>do</strong> diretor da Aca<strong>de</strong>mia Central <strong>de</strong> Belas-Artes <strong>de</strong><br />

Pequim. Sua <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> realismo e sua concepção <strong>do</strong> aprendiza<strong>do</strong> <strong>do</strong> <strong>de</strong>senho e<br />

da pintura terão uma importância consi<strong>de</strong>rável para o ensino da arte na China<br />

popular durante a segunda meta<strong>de</strong> <strong>do</strong> século XX.


96<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

Paisagem com montanhas, 1942<br />

Lin Fengmian (1900-1991)<br />

nanquim e cores sobre papel | 67,2 x 68,5 cm<br />

Assinatura: Lin Fengmian.<br />

Lin Fengmian nasceu em Meixian, na província <strong>de</strong> Cantão. De 1920 a 1926,<br />

ele estuda na França, na École <strong>de</strong>s Beaux-Arts <strong>de</strong> Dijon, e <strong>de</strong>pois em Paris. 1<br />

Paralelamente a seu aprendiza<strong>do</strong> da pintura a óleo no ateliê <strong>de</strong> Fernand Cormon<br />

(1845-1924), Lin Fengmian funda, com outros estudantes chineses, a socieda<strong>de</strong><br />

Phébus, que organizaria a exposição <strong>de</strong> arte chinesa antiga e mo<strong>de</strong>rna, que<br />

aconteceu em Estrasburgo, em 1924. 2 Nessa ocasião, ele encontra o inova<strong>do</strong>r Cai<br />

Yuanpei (1868-1940), que a partir <strong>de</strong> então o apoia, permitin<strong>do</strong>-lhe conquistar<br />

o posto <strong>de</strong> diretor da Escola Especial <strong>de</strong> Belas-Artes <strong>de</strong> Pequim quan<strong>do</strong> volta à<br />

China, em 1926. Em <strong>de</strong>corrência das complicações <strong>de</strong> 1927, Lin Fengmian <strong>de</strong>ixa a<br />

capital. Em 1928, ele é nomea<strong>do</strong> diretor da nova Aca<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> Belas-Artes criada<br />

em Hangzhou. Essas novas instituições, muito inspiradas no mo<strong>de</strong>lo francês,<br />

contribuem para a introdução <strong>de</strong> técnicas <strong>de</strong> criação oci<strong>de</strong>ntais. 3 Durante os anos<br />

1920-1930, Lin Fengmian pratica principalmente a pintura a óleo. Seus escritos<br />

data<strong>do</strong>s <strong>de</strong>ssa época revelam seu interesse pela comparação das tradições<br />

culturais e pela síntese das artes. Ele <strong>de</strong>ixa suas funções pouco após o início<br />

da guerra. Refugia<strong>do</strong> em Chongqing, experimenta uma nova técnica pictórica.<br />

Alguns efeitos próprios ao óleo são adapta<strong>do</strong>s à tinta e ao papel. A paisagem<br />

sombria <strong>do</strong> Musée Cernuschi é característica <strong>de</strong>sse perío<strong>do</strong>. 4<br />

No início <strong>do</strong>s anos 1950, ele se instala em Xangai e dá continuida<strong>de</strong> a suas<br />

pesquisas formais em sigilo. As relações entre tinta e cor são exploradas por meio<br />

<strong>de</strong> um pequeno número <strong>de</strong> temas, <strong>de</strong>riva<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s gêneros oci<strong>de</strong>ntais, como o nu e<br />

a natureza-morta, ou empresta<strong>do</strong>s <strong>do</strong> universo <strong>do</strong>s teatros tradicionais chineses.<br />

Ele pinta paisagens sobre o tema ao longo <strong>de</strong> suas estadias nas ilhas Zhoushan,<br />

nos montes Huangshan e em Suzhou. De 1965 a 1977, os problemas da Revolução<br />

Cultural proíbem Lin Fengmian <strong>de</strong> toda e qualquer criação pictórica, e ele fica<br />

preso <strong>de</strong> 1968 a 1972. Ativo em Hong Kong <strong>de</strong> 1978 a 1991, sua obra, reconcilian<strong>do</strong>-<br />

-se com os temas <strong>de</strong> sua juventu<strong>de</strong>, conhece novos <strong>de</strong>s<strong>do</strong>bramentos, sobretu<strong>do</strong><br />

com o uso da cor e seu caráter extremamente expressivo, que vai culminar na<br />

famosa série <strong>de</strong> pesa<strong>de</strong>los.<br />

1. Para a biografia <strong>de</strong> Lin Fengmian, cf.<br />

Lang, 2002, p. 2-37.<br />

2. Clunas, 1989, p. 100-106.<br />

3. Vale lembrar, no entanto, que em 1926<br />

ele já havia proposto um curso a Qi Baishi<br />

(1863-1957), o gran<strong>de</strong> representante da<br />

pintura chinesa tradicional.<br />

4. Ela po<strong>de</strong> ser comparada à paisagem da<br />

coleção Michael e Khoan Sullivan (Sullivan,<br />

2001, p. 100).


98<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

Dois pandas sob os bambus, 1973<br />

Wu Zuoren (1908-1997)<br />

nanquim sobre papel | 79,1 x 55,4 cm<br />

Inscrição e assinatura: Para o Musée Cernuschi em Paris, em 1973. Pinta<strong>do</strong> e<br />

inscrito por Zuoren em Pequim.<br />

Wu Zuoren nasceu em Suzhou. 1 Ele estuda arquitetura em sua cida<strong>de</strong> natal<br />

antes <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r pintura em Xangai e Nanquim, sob orientação <strong>de</strong> Xu Beihong<br />

(1895-1953). Em 1930, troca a China pela Europa. Instala-se em Bruxelas, on<strong>de</strong><br />

acompanha o curso <strong>de</strong> Alfred Bastien (1873-1955) na Aca<strong>de</strong>mia Real <strong>de</strong> Belas-<br />

Artes. De volta à China em 1935, ele leciona no <strong>de</strong>partamento <strong>de</strong> artes da<br />

Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Nanquim. Em 1938, filia-se a um grupo <strong>de</strong> artistas, com os quais<br />

visita campos <strong>de</strong> batalha a fim <strong>de</strong> realizar esboços que serão expostos em 1939<br />

em Chongqin. Em 1944, ele vai a Dunhuang, on<strong>de</strong> faz cópias <strong>de</strong> pinturas murais<br />

budistas. Durante uma segunda viagem a Qinghai e ao Tibete, ele realiza vários<br />

esboços, aquarelas e pinturas a óleo, inspira<strong>do</strong>s na vida e nos costumes das<br />

populações <strong>de</strong>ssas regiões, e os expõe em Chengdu em 1945. É nessa época que<br />

retorna à pintura chinesa e inicia pesquisas para aperfeiçoar suas técnicas.<br />

Nesses anos pós-guerra, ele dá aulas <strong>de</strong> pintura a óleo em Pequim 2 e viaja pela<br />

Europa, em 1947, e pela Ásia, em 1951. 3 Dá continuida<strong>de</strong> a suas pesquisas sobre<br />

a arte das grutas budistas durante duas missões <strong>de</strong> pesquisas em Bingling Si<br />

em 1952, <strong>de</strong>pois em Maijishan, em 1953. Nos anos seguintes, ele multiplica as<br />

estadias na Aca<strong>de</strong>mia Central <strong>de</strong> Belas-Artes. Entretanto, ele continua suas<br />

viagens a Ningxia em 1960, e pelo nor<strong>de</strong>ste, em 1961. De 1966 a 1972, os<br />

acontecimentos da Revolução Cultural forçam-no a interromper toda ativida<strong>de</strong><br />

artística. Progressivamente reabilita<strong>do</strong>, suas pinturas com temas representativos<br />

da China lhe conferem o papel <strong>de</strong> embaixa<strong>do</strong>r da cultura chinesa ressurgente<br />

na cena internacional. Assim, a obra Dois pandas sob os bambus foi oferecida<br />

ao Musée Cernuschi na ocasião da importante exposição Tesouros da arte<br />

chinesa, recentes <strong>de</strong>scobertas arqueológicas da República Popular da China, que<br />

aconteceu no Petit Palais em 1973. Durante os anos 1970 e 1980, ele cria pinturas<br />

a tinta e a óleo, e expõe regularmente na China e no exterior até sua morte.<br />

1. Para a biografia <strong>de</strong> Wu Zuoren, cf.<br />

Zhou, 2002, p. 2-45.<br />

2. Após a guerra, ele dá aula na Escola<br />

Especial <strong>de</strong> Artes e, mais tar<strong>de</strong>, a partir <strong>de</strong><br />

1950, na Aca<strong>de</strong>mia Central <strong>de</strong> Belas-Artes.<br />

3. Em 1947, visita o Reino Uni<strong>do</strong>, a Suíça<br />

e a Alemanha. Em 1951, vai à Índia e à<br />

Birmânia.


100<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS 101<br />

RENASCIMENTO DA PAISAGEM


RENASCIMENTO DA PAISAGEM 103<br />

Tempesta<strong>de</strong>, 1944<br />

Fu Baoshi (1904-1965)<br />

nanquim e cores sobre papel | 116,1 x 79,3 cm<br />

Inscrição e assinatura: No vigésimo sexto dia <strong>do</strong> oitavo mês <strong>do</strong> ano Jiashen<br />

[1944], para meu aniversário <strong>de</strong> quarenta anos, no segun<strong>do</strong> dia <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />

nascimento <strong>de</strong> minha segunda filha Yiwuan. Anota<strong>do</strong> no subúrbio oeste <strong>de</strong><br />

Chongqing, por Fu Baoshi <strong>de</strong> Xinyu.<br />

1. Várias <strong>de</strong> suas obras são assinadas “Fu<br />

Baoshi <strong>de</strong> Xinyu”, com o nome da terra<br />

natal <strong>de</strong> sua família. Para a biografia <strong>de</strong> Fu<br />

Baoshi, cf. Chen, 2000, p. 1-41.<br />

2. Entre as raras pinturas <strong>de</strong>ssa época<br />

hoje conservadas, vale lembrar as<br />

paisagens <strong>do</strong> museu <strong>de</strong> Nanquim (Xu,<br />

2006, p. 3-6).<br />

3. Ele se <strong>de</strong>dica principalmente à tradução<br />

<strong>do</strong>s trabalhos <strong>do</strong> historia<strong>do</strong>r japonês<br />

Kinbara Seigo (1888-1958), (Yuen-Wong,<br />

2006, p. 28-29).<br />

4. A obra foi realizada a quatro mãos por<br />

Fu Baoshi e Guan Shanyue (1912-2000). A<br />

propósito das circunstâncias <strong>de</strong>ssa criação,<br />

cf. Andrews, 1994, p. 229-234.<br />

Fu Baoshi nasceu em Nanchang, em Jiangxi. 1 Autodidata, ele assina suas<br />

primeiras pinturas com o nome <strong>de</strong> Baoshi, em 1925. 2 As pesquisas pictóricas <strong>de</strong><br />

sua juventu<strong>de</strong>, <strong>de</strong>dicadas à história da pintura chinesa, trazem-lhe o apoio <strong>de</strong><br />

Xu Beihong (1895-1953), e a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> continuar seus estu<strong>do</strong>s no Japão,<br />

<strong>de</strong> 1933 a 1936. Durante esse perío<strong>do</strong>, suas pesquisas se focam na pintura <strong>de</strong><br />

Gu Kaizhi (c. 344-406) e <strong>de</strong> Shitao (1642-1707). Paralelamente a seus trabalhos<br />

históricos e suas traduções, 3 ele organiza a primeira gran<strong>de</strong> exposição <strong>de</strong> suas<br />

obras em Tóquio, em 1934. De volta à China, pouco antes <strong>do</strong> começo da guerra,<br />

ele se hospeda em sua região natal, em Jiangxi, antes <strong>de</strong> procurar refúgio em<br />

Chongqing, on<strong>de</strong> permanece <strong>de</strong> 1939 a 1945. Durante esse perío<strong>do</strong>, suas criações<br />

pictóricas ultrapassam suas pesquisas eruditas. A notável exposição pessoal<br />

organizada em Chongqing em 1942 consagra a expressão <strong>de</strong> seu estilo distinto<br />

e <strong>de</strong> seus temas literários preferi<strong>do</strong>s. Em 1946, ele se instala em Nanquim e<br />

continua lecionan<strong>do</strong> na Universida<strong>de</strong> Central, à qual estava vincula<strong>do</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

1940. Após a Revolução <strong>de</strong> 1949, realiza várias pinturas sobre temas poéticos<br />

influencia<strong>do</strong>s pelas obras <strong>de</strong> Mao Tsé-Tung (1893-1976). A criação <strong>de</strong> uma pintura<br />

monumental para a assembleia <strong>do</strong> povo em 1959, também concebida com base<br />

em um poema <strong>do</strong> presi<strong>de</strong>nte Mao, é emblemática <strong>de</strong>ssa orientação política. 4<br />

Durante esses últimos anos, o trabalho <strong>de</strong> Fu Baoshi é caracteriza<strong>do</strong> por uma<br />

evolução <strong>de</strong> sua palheta, assim como pelo trabalho sobre o motivo: as obras<br />

realizadas durante suas viagens à Romênia e à República Tcheca em 1957 são<br />

representativas <strong>de</strong>sse perío<strong>do</strong>.


104<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

A gran<strong>de</strong> composição <strong>do</strong> Musée Cernuschi que mostra uma paisagem na<br />

tempesta<strong>de</strong> atesta sua criativida<strong>de</strong> durante os anos <strong>de</strong> guerra. No prefácio <strong>de</strong><br />

sua exposição <strong>de</strong> 1942, Fu Baoshi reconheceu que as paisagens <strong>do</strong> Sichuan<br />

haviam exerci<strong>do</strong> sobre ele uma fascinação específica. O caráter monumental<br />

das ca<strong>de</strong>ias montanhosas é, a princípio, evoca<strong>do</strong> pelas gran<strong>de</strong>s praias tomadas<br />

por tonalida<strong>de</strong>s diferentes: intensas no primeiro plano e mais leves no plano<br />

<strong>de</strong> fun<strong>do</strong>. A superfície das pare<strong>de</strong>s rochosas é pintada com um pincel seco. A<br />

representação da chuva com longos jatos <strong>de</strong> água projeta<strong>do</strong>s sobre a tinta é<br />

uma das mais importantes inovações técnicas <strong>de</strong> Fu Baoshi. As velas <strong>do</strong>s navios<br />

entrevistas no fun<strong>do</strong> da gruta e as frágeis construções empoleiradas no cume da<br />

montanha contribuem para o sentimento <strong>de</strong> imensidão que emana <strong>de</strong>ssa obra.


106<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

Dois sábios, década <strong>de</strong> 1940<br />

Pu Ru (1896-1963)<br />

nanquim e cores sobre papel | 131,3 x 41,2 cm<br />

Inscrição e assinatura: Um monte vazio, uma árvore sem folhas; as nuvens<br />

azuladas [em seu] cume. Não há ninguém no campo; lyciuns e crisântemos<br />

foram <strong>de</strong>struí<strong>do</strong>s.<br />

Relaxo, fico à vonta<strong>de</strong>, inspira<strong>do</strong> em Chama<strong>do</strong> para a grua.<br />

Flores <strong>de</strong> junco e folhas <strong>de</strong> ácer no crepúsculo frio.<br />

À noite, as ervas que cobrem a encosta no horizonte escurecem.<br />

Mescla <strong>de</strong> folhas cobertas <strong>de</strong> geada cai sobre o tanque vazio.<br />

Não mais se ouve o canto <strong>do</strong> grilo; ninguém passa.<br />

Apenas o córrego frio acompanha o sol se pon<strong>do</strong>.<br />

[Pinta<strong>do</strong> e] inscrito por Xinyu [sobrenome <strong>do</strong> pintor].<br />

Além <strong>de</strong> suas qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> pintor <strong>de</strong> paisagem, Pu Ru também era conheci<strong>do</strong><br />

por suas representações <strong>de</strong> personagens. Nessa obra, esses talentos se conjugam<br />

para realizar uma paisagem habitada. Dois andarilhos vesti<strong>do</strong>s <strong>de</strong> branco, com<br />

cinto orna<strong>do</strong> com ja<strong>de</strong> e cantis, avançam em direção aos picos. A composição<br />

ascen<strong>de</strong>nte é um convite para alcançar essas regiões etéreas.<br />

Essa pintura, assim como várias paisagens <strong>do</strong> artista, parece cheia <strong>de</strong> reminiscências<br />

estilísticas. A montanha, cujas falésias abruptas se mantêm como plano <strong>de</strong> fun<strong>do</strong>,<br />

empresta seu caráter monumental à pintura <strong>do</strong>s Song <strong>do</strong> norte, enquanto a<br />

composição formada pelas árvores lembra a arte <strong>do</strong>s pintores da escola <strong>de</strong> Wu.<br />

Essa pintura se distingue, contu<strong>do</strong>, por um uso muito pessoal da cor. As<br />

diferentes tonalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ver<strong>de</strong>, que compõem em planos alterna<strong>do</strong>s as encostas<br />

da montanha, esten<strong>de</strong>m-se ao conjunto da pintura. A justaposição das folhagens<br />

<strong>de</strong> várias cores no primeiro plano constitui um contraponto sutil à cor <strong>do</strong>minante.<br />

As silhuetas <strong>do</strong>s imortais, com vesti<strong>do</strong>s impecáveis, <strong>de</strong>stacam-se nesse conjunto<br />

cromático característico <strong>de</strong> Pu Ru.


RENASCIMENTO DA PAISAGEM 109<br />

A falésia vermelha, 1945<br />

Zhang Daqian (1899-1983)<br />

nanquim e cores sobre papel | 26,3 x 117,2; 26 x 117,3 cm<br />

Inscrição e assinatura: [Felizes] reuni<strong>do</strong>s [on<strong>de</strong>] a senhora Shuishu caligrafou<br />

Duas o<strong>de</strong>s à falésia vermelha <strong>de</strong> [Su] Dongpo e [on<strong>de</strong>] o eremita [Zhang] Daqian<br />

as ilustrou. Em mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> outono <strong>do</strong> ano Yiyou [1945], Zijie [Guo Youshou]<br />

trouxe esse rolo <strong>de</strong> Chengdu. Como já o havia visto, amarrei novamente essa<br />

inscrição que substitui o cabeçalho. Yinmo.<br />

Huishu<br />

Cópia <strong>do</strong> texto Duas o<strong>de</strong>s à falésia vermelha em caligrafia regular.<br />

Zhang Daqian<br />

Primeira o<strong>de</strong> à falésia vermelha<br />

Com sua alabarda em mãos [ele] faz ressoar um po<strong>de</strong>roso canto;<br />

1. O poeta <strong>de</strong>screve <strong>aqui</strong> o célebre general<br />

Cao Cao (155-220), que foi <strong>de</strong>rrota<strong>do</strong> por<br />

Zhou Yu (175-210) durante a Batalha da<br />

Falésia Vermelha em 208 d.C. Após esse<br />

acontecimento, a China foi dividida em<br />

três reina<strong>do</strong>s. Essa batalha ocorreu em um<br />

lugar homônimo daquele visita<strong>do</strong> por Su<br />

Dongpo, o que o leva a evocar o herói.<br />

Serve-se <strong>de</strong> vinho e, precipitadamente, se aproxima <strong>do</strong> rio. 1<br />

Wuchang e Xiakou se encararam:<br />

A montanha e a água fusionavam-se em um ver<strong>de</strong> lúgubre e sombrio.<br />

Por to<strong>do</strong>s os la<strong>do</strong>s [seus] navios [se espalhavam] por mil léguas.<br />

Nesse dia, o herói <strong>de</strong> toda uma geração,<br />

Impedi<strong>do</strong> <strong>de</strong> sua ação, fugia <strong>de</strong> Zhou Yu.<br />

Vitórias e <strong>de</strong>rrotas não têm muito valor na profun<strong>de</strong>za <strong>do</strong>s tempos.<br />

Em vão, falamos sobre homens e coisas.<br />

Livremente, assim como um junco [aban<strong>do</strong>na<strong>do</strong>]<br />

No espaço sem fim [da água],<br />

[Nossa embarcação] flutuava na clarida<strong>de</strong> da correnteza.


110<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO RENASCIMENTO DO MUSÉE CERNUSCHI, DA PAISAGEM PARIS 111<br />

Negra e cheia [a lua] diminuía e em seguida crescia,<br />

Como essa água que passa ao longo <strong>do</strong> rio.<br />

Da brisa fresca e da lua clara, apenas<br />

A audição e a vista po<strong>de</strong>m aproveitar infinitamente.<br />

Terminemos com a cobiça!<br />

[Nós] lavamos [nossas] canecas e recomeçamos a beber.<br />

Servin<strong>do</strong> [-nos] [mutuamente] <strong>de</strong> travesseiros, enquanto o Leste se tornava branco.<br />

Inspira<strong>do</strong> em Shuidiao getou, [eu] compus esses [versos] tentan<strong>do</strong> me apropriar<br />

da Primeira o<strong>de</strong> à falésia vermelha. Zhang Yuan.<br />

Zhang Daqian<br />

Segunda o<strong>de</strong> à falésia vermelha<br />

Nobres nomes <strong>de</strong> outrora,<br />

Quem conseguiu se parecer com eles?<br />

Su [Dongpo], [diante] da falésia vermelha,<br />

Contemplava longamente [a pare<strong>de</strong> rochosa],<br />

Passean<strong>do</strong> sua sensibilida<strong>de</strong> [nessa] bela noite.<br />

A brisa fresca, o luar,<br />

O vinho novo ainda espumante, um peixe pesca<strong>do</strong> na re<strong>de</strong>.<br />

Na <strong>de</strong>scida da colina Huangni,<br />

A geada havia <strong>de</strong>struí<strong>do</strong> as folhas.<br />

Rompen<strong>do</strong> o silêncio,<br />

[Nossas] sombras [dançavam], [enquanto] cantávamos caminhan<strong>do</strong>,<br />

[Nós] nos seguíamos uns aos outros.<br />

[Como] o barulho das ondas rompiam,<br />

As falésias se erguiam a mil pés <strong>de</strong> altura;<br />

As águas geladas escorriam,<br />

Perigosos roche<strong>do</strong>s surgiam.<br />

Após algum tempo, [Su Dongpo] voltara à [Falésia vermelha],<br />

[E] a paisagem era irreconhecível.<br />

Sua bengala e seus passos assustaram-no [enquanto ele] sonhava com um<br />

milhafre empoleira<strong>do</strong> [no alto].<br />

[Ele] soltou um grito alto e estri<strong>de</strong>nte que fez tremer a casa <strong>do</strong> <strong>de</strong>us <strong>do</strong> Rio. 2<br />

Um [taoista] vesti<strong>do</strong> <strong>de</strong> plumas<br />

Vinha cumprimentá-lo em Lingao. 3<br />

[Eu] acabo <strong>de</strong> encontrá-lo na noite.<br />

2. Ping Yi é o <strong>de</strong>us <strong>do</strong> Rio Amarelo,<br />

também chama<strong>do</strong> con<strong>de</strong> <strong>do</strong> Rio.<br />

3. Aqui, Zhang Daqian parece criar uma<br />

confusão entre o taoista, talvez um<br />

imortal, e o poeta.<br />

4. Laurent, 2006.<br />

5. Cf. p. 14.<br />

Inspira<strong>do</strong> em Jiang man hong,<br />

Na primavera <strong>do</strong> ano Yiyou [1945].<br />

O eremita Zijie [Guo Youshou] passou por minha residência <strong>de</strong> Shahecun.<br />

Ilustrei [então] as Duas o<strong>de</strong>s à Falésia vermelha <strong>de</strong> [Su] Dongpo<br />

e inscrevi essas velhas lembranças. [Eu lhes] peço para corrigir [esses trabalhos].<br />

Fraternalmente, Daqian, Zhang Tuann. (C. L.)<br />

Certamente, as O<strong>de</strong>s à falésia vermelha, <strong>de</strong> Su Dongpo (1037-1101), fazem parte<br />

<strong>do</strong>s textos literários mais pinta<strong>do</strong>s da história da arte chinesa. Esse tema poético,<br />

ilustra<strong>do</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a época <strong>do</strong>s Song, foi um <strong>do</strong>s objetos preferi<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s pintores da<br />

escola <strong>de</strong> Wu, como atesta a obra <strong>de</strong> Wen Zhengming (1470-1559). Essas pinturas,<br />

que às vezes <strong>de</strong>ram origem a longos <strong>de</strong>senvolvimentos narrativos, normalmente<br />

se resumem a representar o poeta e seus amigos vagan<strong>do</strong> em um frágil barquinho<br />

ao pé da falésia. 4 Nesse longo rolo, Zhang Daqian evoca sucessivamente as duas<br />

o<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Su Dongpo, acompanhan<strong>do</strong> cada uma <strong>de</strong>ssas obras com composições<br />

poéticas que têm inúmeras variações na obra <strong>de</strong> Su Dongpo. Essas pinturas são<br />

precedidas pelo texto integral das duas o<strong>de</strong>s, caligrafadas pela senhora Huishu.<br />

A obra foi <strong>de</strong>dicada por Zhang Daqian a Guo Youshou, como revela a peça<br />

introdutória 5 redigida por Shen Yinmo (1883-1971).


114<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA – COLEÇÃO DO MUSÉE CERNUSCHI, PARIS<br />

RENASCIMENTO DA PAISAGEM 115<br />

O Monte Emei, 1955<br />

Zhang Daqian (1899-1983)<br />

nanquim e cores sobre seda | 190,8 x 87,2 cm<br />

Inscrição e assinatura: No início, eu o chamei <strong>de</strong> Dong [Yuan] e Ju[ran], mas Jing<br />

[Hao] e Guan [Tong] pareciam mais apropria<strong>do</strong>s. Por entre as nuvens, avista-<br />

-se o ver<strong>de</strong> <strong>do</strong>s picos reuni<strong>do</strong>s ao fun<strong>do</strong>. Contemplação <strong>de</strong> elementos cujas<br />

circunvoluções ocultam o sol e a lua até uma hora tardia. Quanto a mim, na<br />

verda<strong>de</strong> não passo <strong>de</strong> um grão <strong>de</strong> mostarda, <strong>de</strong> quem a ínfima imagem não é<br />

capaz <strong>de</strong> capturar o Monte Sumeru.<br />

Para evocar a glória <strong>do</strong> Monte Emei em meio às nuvens e à neblina, em meio à<br />

umida<strong>de</strong> e à bruma, recorri ao méto<strong>do</strong> <strong>de</strong> Beiyuan [Dong Yuan] e Honggu[zi]<br />

[Jing Hao]. Ao <strong>de</strong>senvolver [esse princípio], obtive alguns efeitos interessantes<br />

<strong>de</strong> oposição e <strong>de</strong> síntese. Pinta<strong>do</strong> no décimo mês <strong>do</strong> ano Yiwei, em meus<br />

apartamentos aluga<strong>do</strong>s no Hodaiso <strong>de</strong> Yushima, em Tóquio. O homem <strong>de</strong> Shu,<br />

Zhang Daqian Yuan.<br />

1. Há muito tempo, a crítica pictórica<br />

havia agrupa<strong>do</strong> esses artistas, <strong>de</strong>signan<strong>do</strong><br />

os <strong>do</strong>is primeiros como Dong-Ju, e os<br />

segun<strong>do</strong>s como Jing-Guan.<br />

Além das fantásticas formações rochosas que separam o planalto <strong>do</strong> abismo, três<br />

picos apontam majestosamente no espaço. Cada vez mais distantes, os telha<strong>do</strong>s<br />

perdi<strong>do</strong>s na bruma e nos pinhos evocam a presença humana, da qual distinguimos<br />

os vestígios até o pico mais alto. Essa visão monumental <strong>do</strong> Monte Emei é<br />

apresentada por Zhang Daqian como fruto <strong>de</strong> suas pesquisas sobre a pintura<br />

das cinco dinastias. Por um la<strong>do</strong>, trata-se <strong>de</strong> uma síntese entre os estilos <strong>de</strong><br />

Dong Yuan (c. 934-962) e Juran, e, por outro, <strong>de</strong> Jing Hao (855-915) e Guan Tong<br />

(c. 906-960). 1 Na parte superior, é bastante possível reconhecer os sulcos pima<br />

cun, característicos <strong>de</strong> Dong Yuan, e, na parte inferior, o traço rugoso e caótico<br />

associa<strong>do</strong> a Jing Hao. A justaposição <strong>do</strong>s estilos tradicionalmente consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s<br />

antitéticos constitui uma <strong>de</strong>cisão audaciosa. No entanto, a pre<strong>do</strong>minância<br />

cromática <strong>do</strong> ver<strong>de</strong> garante a unida<strong>de</strong> da composição. As mesmas tonalida<strong>de</strong>s


116<br />

SEIS SÉCULOS DE PINTURA CHINESA NO MUSEU CERNUSCHI<br />

caracterizam as outras pinturas <strong>do</strong> Monte Emei realizadas pelo artista durante<br />

esse perío<strong>do</strong>, 2 um ponto que sugere a importância <strong>do</strong>s empréstimos feitos pelo<br />

pintor às paisagens reais <strong>de</strong>sse importante local <strong>do</strong> budismo. 3<br />

O Monte Emei, uma das montanhas mais célebres da China, está situa<strong>do</strong> em<br />

Sichuan, província natal <strong>de</strong> Zhang Daqian, que visitou o Monte Emei três vezes,<br />

em 1929, 1944 e 1946. 4 Essas escaladas serviram como ocasião <strong>de</strong> se hospedar<br />

nas alturas para realizar esboços e pinturas. Antes <strong>de</strong> se tornar tema <strong>de</strong> uma<br />

pesquisa estilística inspirada em pintores <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, essas paisagens foram<br />

percorridas por Zhang Daqian em companhia <strong>de</strong> amigos pintores, como Huang<br />

Junbi (1898-1991), ou <strong>de</strong> membros <strong>de</strong> sua família. Assim, também se trata <strong>de</strong> uma<br />

recriação imaginária <strong>do</strong> pintor em exílio, lembran<strong>do</strong>-se <strong>de</strong> sua terra <strong>de</strong> origem<br />

a partir <strong>de</strong> sua residência transitória no Japão. Se, por um la<strong>do</strong>, Zhang Daqian<br />

mantém silêncio sobre essa dimensão pessoal, por outro, vale consi<strong>de</strong>rar essa<br />

paisagem como a síntese <strong>de</strong> uma experiência vivida e <strong>de</strong> uma pesquisa pictórica.<br />

2. É o caso da pintura conservada no<br />

Museum of Fine Arts, em Boston (Lefebvre<br />

d’Argencé, 1972, p. 80-81).<br />

3. Essa dimensão religiosa <strong>do</strong> Monte Emei<br />

teria inspira<strong>do</strong> a Zhang Daqian a alusão ao<br />

Monte Sumeru <strong>do</strong> colofão que pertence ao<br />

registro budista.<br />

4. Fu e Stuart, 1991, p. 220.


DINASTIA MING<br />

Falcão sobre um roche<strong>do</strong>, século XIV<br />

Autor não i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong><br />

nanquim sobre seda<br />

120,6 x 62,6 cm<br />

Imortais, 1547<br />

Gu Gao (ativo na primeira meta<strong>de</strong> <strong>do</strong> século XVI)<br />

nanquim e cores sobre seda<br />

239 x 176,5 cm<br />

Faisões e camélias, século XVIII<br />

Autor não i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong><br />

A partir <strong>de</strong> pintura <strong>de</strong> Lü Ji (c. 1477 - ?)<br />

nanquim sobre papel<br />

18 x 53 cm<br />

Caligrafia, entre 1490 e 1559<br />

Wen Zhengming (1470-1559)<br />

nanquim sobre papel<br />

17,7 x 49,4 cm<br />

Solitário na cabana, 1552<br />

Wen Zhengming (1470-1559)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

18 x 51 cm<br />

Reunião no pavilhão das orquí<strong>de</strong>as,<br />

entre 1490 e 1559<br />

Wen Zhengming (1470-1559)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

18 x 56 cm<br />

Bambus, árvore e roche<strong>do</strong>, entre 1520 e 1575<br />

Wen Boren (1502-1575)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

14,5 x 45 cm<br />

Reunião no pavilhão das orquí<strong>de</strong>as,<br />

entre 1530 e 1575<br />

Wen Boren (1502-1575)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

15,6 x 48 cm<br />

Paisagem, entre 1575 e 1636<br />

Dong Qichang (1555-1636)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

17,2 x 54,5 cm<br />

A falésia vermelha, 1552<br />

Wen Zhengming (1470-1559)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

17,4 x 49 cm<br />

Solitário no barco, 1552<br />

Wen Zhengming (1470-1559)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

18,6 x 54,2 cm<br />

Orquí<strong>de</strong>a, entre 1620 e 1630<br />

Chen Yuansu (1606-1630)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

17,2 x 51 cm<br />

Paisagem, 1614<br />

Li Liufang (1575-1629)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

17,5 x 51 cm<br />

Paisagem com pinho e roche<strong>do</strong>, 1659<br />

Lan Ying (1585-1664)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

16,4 x 48,5 cm<br />

Paisagem, entre 1650 e 1690<br />

Yun Shouping (1633-1690)<br />

nanquim sobre papel<br />

18 x 53 cm


DINASTIA QING<br />

Búfalo e criança, entre 1740 e 1765<br />

Fu Wen (ativo entre 1744 e 1765)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

105 x 44,6 cm<br />

A ninfa <strong>do</strong> Rio Luo, entre 1744 e 1765<br />

Fu Wen (ativo entre 1744 e 1765)<br />

encre et couleurs sur papier [nanquim e<br />

cores sobre papel]<br />

134,2 x 68 cm<br />

Pintura <strong>do</strong>s mil outonos, entre 1700 e 1730<br />

Gao Qipei (1672 – 1734)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

227 x 115,2 cm<br />

Paisagem, 1846<br />

Dai Xi (1801-1860)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

66 x 42,2 cm<br />

Falésia com pinhos, cascata<br />

suspensa, 1813<br />

Zhu Henian (1760-1834)<br />

nanquim sobre papel<br />

115,8 x 35,6 cm<br />

Paisagem, 1742<br />

Xu Zhang (1694-1749)<br />

nanquim e cores sobre seda<br />

193,9 x 44,2 cm<br />

Solitário sob os pinhos<br />

contemplan<strong>do</strong> as ondas, c. 1820<br />

Zhang Yin (1761-1829)<br />

nanquim sobre papel<br />

141 x 80,5 cm<br />

Pássaros e flores, 1701<br />

Jian Tingxi (1669-1732)<br />

nanquim e cores sobre seda<br />

167,5 x 100,3 cm<br />

Zhong Kui, entre 1710 e 1770<br />

Li Shizhuo (1690 ? – 1770 ?)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

163 x 85,4 cm<br />

Paisagem com neve, 1818<br />

Qian Du (1763-1844)<br />

nanquim sobre papel<br />

132 x 26,2 cm<br />

Yang Guifei sain<strong>do</strong> <strong>do</strong> banho, por volta <strong>de</strong> 1800<br />

Yin Qiu (ativo em por volta <strong>de</strong> 1800)<br />

nanquim e cores sobre seda<br />

77,8 x 47,5 cm


Paisagem no estilo <strong>de</strong> Zhang Yu, entre 1780 e 1844<br />

Qian Du (1763-1844)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

15,4 x 20 cm<br />

Paisagem no estilo <strong>de</strong> Guan Tong, entre 1780 e 1844<br />

Qian Du (1763-1844)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

15,4 x 20 cm<br />

Letra<strong>do</strong> meditan<strong>do</strong> com uma gru e Letra<strong>do</strong><br />

em sua mesa <strong>de</strong> trabalho, entre 1820 e 1862<br />

Su Liupeng (1796 – 1862)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

29,5 x 54,8 cm<br />

Paisagem, entre 1670 e 1717<br />

Wang Hui (1632-1717)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

21,8 x 28,9 cm<br />

Paisagem <strong>de</strong> Yangzhou, entre 1785 e 1844<br />

Qian Du (1763-1844)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

14,3 x 22,2 cm<br />

A falésia vermelha, entre 1780 e 1844<br />

Qian Du (1763-1844)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

14,3 x 22,2 cm<br />

A citara quebrada e O jogo <strong>de</strong> Go, entre 1820 e 1862<br />

Su Liupeng (1796 – 1862)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

29,5 x 54,8 cm<br />

Paisagem, 1770<br />

Fang Cong (ativo no século XVIII)<br />

nanquim sobre papel<br />

25,8 x 32,8 cm<br />

Paisagem com neve, 1770<br />

Fang Cong (ativo no século XVIII)<br />

nanquim sobre papel<br />

25,8 x 32,8 cm<br />

A Aca<strong>de</strong>mia Hanlin, 1744<br />

Jin Kun (ativo entre 1717 e 1749)<br />

Sun Hu (ativo entre 1728 e 1746)<br />

Lu Zhan (?-?)<br />

Wu Yu (?-?)<br />

Zhang Qi (?-?)<br />

Cheng Liang (?-?)<br />

nanquim e cores sobre seda]<br />

193,5 x 625,5 cm


O MOVIMENTO EPIGRÁFICO E A<br />

RENOVAÇÃO DA PINTURA CHINESA<br />

A pega, entre 1883 e 1957<br />

Qi Baishi (1863-1957)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

131,3 x 33,5 cm<br />

Pintinhos, peixes, junco, e Gralha com melancia, 1947<br />

Qi Baishi (1863-1957)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

103,3 x 34,2 cm; 103,7 x 34,4 cm; 102 x 34 cm; 101,3 x 33,9 cm<br />

Lótus vermelhos, entre 1930 e 1957<br />

Qi Baishi (1863-1957)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

104 x 39 cm<br />

Depois da chuva, década <strong>de</strong> 1940<br />

Ding Yanyong (1902-1978)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

134,8 x 45,4 cm<br />

Caligrafia, entre 1878 e 1927<br />

Kang Youwei (1858-1927)<br />

nanquim sobre papel<br />

175,6 x 89,7 cm<br />

Huaisu escreven<strong>do</strong> sobre uma<br />

folha <strong>de</strong> bananeira, 1922<br />

Wang Zhen (1867-1938)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

130 x 33,2 cm<br />

Flores em um vaso, 1929<br />

Yao Hua (1876-1930)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

96 x 33,7 cm<br />

Sentenças paralelas, entre 1900 e 1930<br />

Yao Hua (1876-1930)<br />

nanquim sobre papel<br />

136,5 x 33,5 cm (cada)<br />

MC 2004-17 e MC 2004-18<br />

Paisagem, 1926<br />

Yao Hua (1876-1930)<br />

nanquim sobre papel<br />

178 x 39,7 cm<br />

MC 2008-16<br />

Hanshan e Shi<strong>de</strong>, 1924<br />

Wang Zhen (1867-1938)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

135,5 x 32,3 cm


VIAJANDO NO JAPÃO<br />

Ameixeiras em flor, século XX<br />

Chen Zhifo (1896-1962)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

115,1 x 55,5 cm<br />

Gansos selvagens, entre 1940 e 1945<br />

Chen Zhifo (1896-1962)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

106,3 x 36,8 cm<br />

Macaco branco, 1937<br />

Zhang Shanzi (1893-1940)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

88,4 x 41,2 cm<br />

Os <strong>do</strong>is tentilhões, 1945<br />

Xie Zhiliu (1910-1997)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

75,9 x 43,4 cm<br />

Lótus, 1947<br />

Xie Zhiliu (1910-1997)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

89,2 x 55,4 cm<br />

Gibão, 1945<br />

Zhang D<strong>aqui</strong>an (1899-1983)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

161,9 x 79,6 cm<br />

Lótus sob o vento, 1955<br />

Zhang D<strong>aqui</strong>an (1899-1983)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

184,4 x 95,2 cm<br />

Rato e fruta, década <strong>de</strong> 1940<br />

Pu Ru (1896-1963)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

77,3 x 26 cm<br />

Borboleta e flor <strong>de</strong> pereira, 1945<br />

Xie Zhiliu (1910-1997)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

78,9 x 38 cm<br />

Peônias, entre 1943 e 1947<br />

Yu Fei’an (1889-1959)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

109 x 50 cm<br />

Dois pássaros ver<strong>de</strong>s sobre uma magnólia, 1947<br />

Yu Fei’an (1889-1959)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

89,1 x 46,2 cm


Xie An e seus segui<strong>do</strong>res, década <strong>de</strong> 1940<br />

Fu Baoshi (1904-1965)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

54,2 x 62 cm<br />

Peônias, 1944<br />

Zhang D<strong>aqui</strong>an (1899-1983)<br />

nanquim, cores e ouro sobre papel]<br />

66,9 x 92,4 cm<br />

O pintor em sua mesa <strong>de</strong> trabalho, século XX<br />

Fu Baoshi (1904-1965)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

31,1 x 36,7 cm<br />

Pássaros e bambus, 1947<br />

Xie Zhiliu (1910-1997)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

89,1 x 55,5 cm<br />

MC 8688


DESCOBRINDO O OESTE<br />

Tibetanas, c. 1945<br />

Lei Guiyuan (1905-1989)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

37,7 x 24,8 cm<br />

Duas tibetanas com cães, 1944<br />

Zhang D<strong>aqui</strong>an (1899-1983)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

109,3 x 75,3 cm<br />

Dançarina Tang, 1945<br />

Pan Xunqin (1906-1983)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

48,1 x 41,9 cm<br />

O <strong>de</strong>mônio búfalo e o espírito serpente, 1943<br />

Xu Beihong (1895-1953)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

85,1 x 57,9 cm<br />

Galo e bambu, 1943<br />

Xu Beihong (1895-1953)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

87,7 x 55 cm<br />

Camponesa miao, entre<br />

1940 e 1945<br />

Pan Xunqin (1906-1983)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

43,6 x 32 cm<br />

Rapariga miao sob uma<br />

árvore, entre 1940 e 1945<br />

Pan Xunqin (1906-1983)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

43,6 x 32,1 cm<br />

Camponesa <strong>de</strong> Xi Kang, c. 1945<br />

Lei Guiyuan (1905-1989)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

37,5 x 25,1 cm<br />

MC 8669<br />

Dois pandas sob um bambuzal, 1973<br />

Wu Zuoren (1908-1997)<br />

nanquim sobre papel<br />

79,1 x 55,4 cm<br />

Pasto no “Corri<strong>do</strong>r”, 1978<br />

Wu Zuoren (1908-1997)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

88,6 x 60,8 cm<br />

Cavalo, 1947<br />

Xu Beihong (1895-1953)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

93,3 x 52,3 cm


Retrato <strong>de</strong> Madame Li, c. 1943<br />

Zhang D<strong>aqui</strong>an (1899-1983)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

227,4 x 88,8 cm<br />

Mulher nua <strong>de</strong> costas, 1942<br />

Pan Yuliang (1895-1977)<br />

nanquim sobre papel<br />

46 x 26,5 cm<br />

Duas apsarás e dragão, 1945<br />

Zhang Bi<strong>de</strong> (?-?)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

62,7 x 110,7 cm<br />

A história <strong>do</strong> chá, 1945<br />

Wu Zuoren (1908-1997)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

38,4 x 299,7 cm<br />

Mulher nua, 1942<br />

Pan Yuliang (1895-1977)<br />

nanquim sobre papel<br />

42 x 26,5 cm<br />

Nu senta<strong>do</strong>, 1930<br />

Sanyu (1901-1966)<br />

grafite sobre papel<br />

44,2 x 27,6 cm<br />

Nu <strong>de</strong>ita<strong>do</strong>, década <strong>de</strong> 1930<br />

Sanyu (1901-1966)<br />

nanquim sobre papel<br />

26,5 x 42,9 cm<br />

Paisagem com montanhas, entre 1930 e 1990<br />

Lin Fengmian (1900-1991)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

67,2 x 68,5 cm<br />

Juncos <strong>do</strong> lago, entre 1930 e 1990<br />

Lin Fengmian (1900-1991)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

69,2 x 69,2 cm<br />

Pietà, entre 1935 e 1945<br />

Lin Fengmian (1900-1991)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

68,5 x 64,5 cm


RENASCIMENTO DA PAISAGEM<br />

Paisagem, década <strong>de</strong> 1940<br />

Huan Binhong (1865-1955)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

106,2 x 33,9 cm<br />

Tempesta<strong>de</strong>, 1944<br />

Fu Baoshi (1904-1965)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

116,1 x 79,3 cm<br />

Sonha<strong>do</strong>r, entre 1940 e 1945<br />

Fu Baoshi (1904-1965)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

89,3 x 56,3 cm<br />

Paisagem, 1947<br />

Xie Zhiliu (1910-1997)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

107,7 x 61,5 cm<br />

O Monte Emei, 1948<br />

Xie Zhiliu (1910-1997)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

50 x 33,6 cm<br />

Rio na primavera, 1948<br />

Xie Zhiliu (1910-1997)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

50,2 x 33,7 cm<br />

Montes <strong>de</strong> outono e<br />

árvores vermelhas, 1947<br />

Huang Junbi (1898-1991)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

106 x 58,5 cm<br />

O rio Jialing, 1945<br />

Huang Junbi (1898-1991)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

95,2 x 57,7 cm<br />

Eremita na floresta, 1945<br />

Zhang D<strong>aqui</strong>an (1899-1983)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

217,4 x 82,8 cm<br />

Paisagem, 1946<br />

Zhang D<strong>aqui</strong>an (1899-1983)<br />

nanquim e cores sobre seda<br />

198,6 x 87,4 cm<br />

Cabana ao la<strong>do</strong> <strong>de</strong> um lago, 1945<br />

Zhang D<strong>aqui</strong>an (1899-1983)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

79,7 x 40,3 cm<br />

O Monte Emei, 1955<br />

Zhang D<strong>aqui</strong>an (1899-1983)<br />

nanquim e cores sobre seda<br />

190,8 x 87,2 cm


Paisagem, década <strong>de</strong> 1940<br />

Pu Jin (1893-1966)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

64,6 x 32,2 cm<br />

A falésia vermelha, 1945<br />

Zhang D<strong>aqui</strong>an (1899-1983)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

26,3 x 117,2; 26 x 117,3 cm<br />

Encontro <strong>de</strong> poetas, 1945<br />

Fu Baoshi (1904-1965)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

47 x 59,4 cm<br />

Paisagem, década <strong>de</strong> 1940<br />

Pu Quan (1913-1991)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

69,9 x 28,1 cm<br />

Paisagem <strong>de</strong> outono, 1947<br />

Pu Ru (1896-1963)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

100,6 x 32 cm<br />

Prefácio ao pavilhão das orquí<strong>de</strong>as,<br />

entre 1940 e 1945<br />

Shen Yinmo (1883-1971)<br />

nanquim sobre papel<br />

106,6 x 37,7 cm<br />

Dois sábios, entre 1930 e 1960<br />

Pu Ru (1896-1963)<br />

nanquim e cores sobre papel<br />

129,4 x 40,6 cm


FICHA TÉCNICA<br />

GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO<br />

Geral<strong>do</strong> Alckmin<br />

Governa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong><br />

Marcelo Araujo<br />

Secretário <strong>de</strong> Esta<strong>do</strong> da Cultura<br />

Sergio Tiezzi<br />

Secretário-Adjunto<br />

Marilia Marton<br />

Chefe <strong>de</strong> Gabinete<br />

Claudinéli Moreira Ramos<br />

Coor<strong>de</strong>na<strong>do</strong>ra da Unida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Preservação <strong>do</strong> Patrimônio Museológico<br />

Conselho <strong>de</strong> Orientação Artística<br />

da <strong>Pinacoteca</strong> <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> São Paulo<br />

Ana Maria Belluzzo<br />

Carlos Alberto Cerqueira Lemos<br />

Marilucia Botallo<br />

Paulo Augusto Pasta<br />

Paulo Portella Filho<br />

Regina Silveira<br />

Ruth Sprung Tarasantchi<br />

Conselho <strong>de</strong> Orientação Cultural <strong>do</strong><br />

Memorial da Resistência <strong>de</strong> São Paulo<br />

Lauro Ávila Pereira<br />

Luis Francisco da Silva Carvalho Filho<br />

Maurice Politi<br />

Paulo Abrão Pires Júnior<br />

Paulo Sergio <strong>de</strong> Moraes Sarmento Pinheiro<br />

Ricar<strong>do</strong> Augusto Yamasaki<br />

ASSOCIAÇÃO PINACOTECA<br />

ARTE E CULTURA - APAC<br />

Organização Social <strong>de</strong> Cultura<br />

Conselho <strong>de</strong> Administração<br />

Presi<strong>de</strong>nte<br />

Nilo Marcos Mingroni Cecco<br />

Vice-Presi<strong>de</strong>nte<br />

Julio Landmann<br />

Conselheiros<br />

Ana Carmen Rivaben Longobardi<br />

Carlos Wen<strong>de</strong>l <strong>de</strong> Magalhães<br />

Denise Aguiar Álvarez<br />

Isaac Aarão Pereira da Silva – representante<br />

<strong>do</strong>s funcionários<br />

José Olympio Pereira<br />

Maria Luisa <strong>de</strong> Souza Aranha Melaragno<br />

Pedro Bohomoletz <strong>de</strong> Abreu Dallari<br />

Pedro Paulo Filgueiras Barbosa<br />

Sérgio Fingermann<br />

Tais Gasparian<br />

Diretor Administrativo e Financeiro<br />

Administrative and Financial Director<br />

Miguel Gutierrez<br />

Diretor Técnico<br />

Artistic Director<br />

Ivo Mesquita<br />

Diretor <strong>de</strong> Relações Institucionais<br />

Institucional Relation Director<br />

Paulo Vicelli<br />

Secretário <strong>de</strong> Diretoria<br />

Renival<strong>do</strong> Nascimento Brito<br />

Assessora para Assuntos Internacionais<br />

Natasha Barzaghi Geenen<br />

Assessora <strong>de</strong> Diretoria<br />

Bianca Corazza<br />

Conselho Fiscal<br />

Osval<strong>do</strong> Roberto Nieto – Presi<strong>de</strong>nte<br />

Silvio Barbosa Bentes<br />

Manoel Andra<strong>de</strong> Rebello Neto<br />

Relacionamento e Comunicação<br />

Communication<br />

André Luis <strong>de</strong> Oliveira<br />

Carla Regina <strong>de</strong> Oliveira<br />

Elizabeth Mathias Baptista<br />

Juliana Asmir<br />

Paula Chang Alcoba Marques<br />

Gestão Documental <strong>do</strong> Acervo<br />

Adriana Miyatake<br />

Fernanda D’Agostino Dias<br />

Rafael Guarda Laterca<br />

Pesquisa em Crítica<br />

e História da Arte<br />

Valéria Piccoli<br />

Diógenes Moura<br />

Ana Paula Nascimento<br />

Carlos Martins<br />

Giancarlo Hannud<br />

José Augusto Pereira Ribeiro<br />

Julia Souza Ayerbe<br />

Pedro Nery<br />

Regina Teixeira <strong>de</strong> Barros<br />

Taisa Palhares<br />

Conservação e Restauro<br />

Valéria <strong>de</strong> Men<strong>do</strong>nça<br />

Teo<strong>do</strong>ra Camargo Carneiro<br />

Ana Lúcia Nakandakare<br />

Manuel Ley Rodriguez<br />

Antonio Carlos Timaco<br />

Camilla Vitti Mariano<br />

Francine Chang Ferreira<br />

Henrique Francisco Costa Filho<br />

Tatiana Russo <strong>do</strong>s Reis<br />

Ação Educativa<br />

Mila Milene Chiovatto<br />

Gabriela Aidar<br />

Carina da Silva Lima<br />

Cintia Maria da Silva<br />

Danielle Christina Vargas Luz<br />

Danielle Rodrigues Amaro<br />

Deborah Frohlich Cortez<br />

Elidayana da Silva Alexandrino<br />

Fabio Cavicchio Parra<br />

Gabriela da Conceição Silva<br />

Gabriela R. Pessoa <strong>de</strong> Oliveira<br />

Germain Tabor Andra<strong>de</strong> Silva<br />

Heber da Silva Kusano<br />

Heloiza Sensulini S. Olivares<br />

Leandro Men<strong>de</strong>s da Silva<br />

Luciane Aparecida Tobias<br />

Margarete <strong>de</strong> Oliveira<br />

Maria Christina da Silva Costa<br />

Maria Helena Marinho Oliveira<br />

Maria Stella da Silva<br />

Marilia Perez Zarattini<br />

Paula Vaz Guimarães <strong>de</strong> Araujo<br />

Paulo Rogério Fernan<strong>de</strong>s<br />

Rafaella <strong>de</strong> Castro Fusaro<br />

Raquel Lisboa Soares Kato Gomes<br />

Sabrina Denise Ribeiro<br />

Solange Rocha da Silva<br />

Telma Cristina Mosken<br />

Valdir Alexandre <strong>de</strong> Oliveira<br />

Vera Lucia Car<strong>do</strong>so Farinha<br />

Vivian Vitalina M. <strong>do</strong>s Santos<br />

Wan<strong>de</strong>rson Gomes<br />

Biblioteca<br />

Isabel Cristina Ayres da Silva Maringelli<br />

Diego Silva<br />

Eliane Barbosa Lopes<br />

Leandro Antunes Araujo<br />

Centro <strong>de</strong> Documentação e Memória<br />

Gabriel Moore Bevilacqua<br />

Gustavo Aquino <strong>do</strong>s Reis<br />

Rosana Carlos Leite<br />

MEMORIAL DA RESISTÊNCIA<br />

Kátia Regina Felipini Neves<br />

Caroline Grassi Franco <strong>de</strong> Menezes<br />

Alessandra Santiago da Silva<br />

Anna Luisa Veliago Costa<br />

Fernanda <strong>do</strong>s Anjos Casagran<strong>de</strong><br />

Karina Alves Teixeira<br />

Marcela Boni Evangelista<br />

Marina <strong>de</strong> Araujo<br />

Renan Ribeiro Beltrame<br />

Renata Cristina P. Barbosa<br />

Vanessa <strong>do</strong> Amaral<br />

Produção e Montagem <strong>de</strong> Exposições<br />

Regina Franco Viesi<br />

Mirian Sasaki<br />

Mário Bibiano<br />

Eduar<strong>do</strong> Ta<strong>de</strong>u da Silva<br />

Elenice <strong>do</strong>s Santos Lourenço<br />

Yvi <strong>de</strong> Freitas Soares<br />

Recursos Humanos e<br />

Atendimento ao Público<br />

Marcia Regina Guiote Bueno<br />

Alexandre Moreira<br />

Evelyn da Silva Nogueira<br />

Gilson Pimenta <strong>de</strong> Carvalho<br />

Francisco Valdivan da Silva<br />

Ednalva Soares B. Janeiro<br />

A<strong>de</strong>milton Laranjeiras Silva<br />

Ajams Smytt Silva<br />

Alci<strong>de</strong>s Santos<br />

Alex Custodio Antonio<br />

Aline Silva Matos<br />

Ana Lúcia Astolpho<br />

Andréa Sá <strong>de</strong> Abreu Neves<br />

Antonio Rodrigues <strong>de</strong> Almeida Junior<br />

Arlete Oliveira <strong>de</strong> Souza<br />

Cleany Pereira <strong>do</strong>s Santos<br />

Conceli Rocha <strong>de</strong> Souza<br />

Daniel Barbosa <strong>de</strong> Lima<br />

Daniele Aparecida R. <strong>de</strong> Campos<br />

Danilo Batista <strong>de</strong> Oliveira Santos<br />

Danilo Rodrigues <strong>do</strong>s Santos<br />

Daril Alexandre Costa<br />

Darlan <strong>do</strong>s Santos Lopes<br />

Edgar Ferreira Lima<br />

Eliane <strong>do</strong>s Santos Silva<br />

Eli<strong>de</strong> <strong>de</strong> Souza Reis<br />

Elizangela Henrique da Silva<br />

Erick Urias <strong>de</strong> Moura<br />

Fabiane Cavalcante Teixeira<br />

Fernan<strong>do</strong> Eduar<strong>do</strong> Almeida David<br />

Francisco <strong>de</strong> Assis <strong>de</strong> Jesus Santos<br />

Francisco Franceli Pereira<br />

Grazielle Alves Bastos<br />

Helena Aparecida <strong>do</strong>s Santos<br />

Iraima <strong>de</strong> Oliveira Lima<br />

Isaac Aarão Pereira da Silva<br />

Isaias José <strong>do</strong>s Santos<br />

Jamerson Correia <strong>de</strong> Lima<br />

Janaina Felix da Silva<br />

Janete <strong>de</strong> França Farias<br />

Jesus Alberto Villegas Molina<br />

Joanna Angélica S. Marcarin<br />

Joelma Guilherme Silva<br />

Joelma Paes <strong>de</strong> Sousa<br />

Joelma Silva <strong>de</strong> Oliveira<br />

José Cleolenil<strong>do</strong> da Silva<br />

Joselma Guilherme Silva<br />

Jucilei<strong>de</strong> <strong>de</strong> Jesus<br />

Leandra Florentino<br />

Lur<strong>de</strong>s Irene da Costa<br />

Márcia Men<strong>de</strong>s Viana<br />

Marcilene Maria da Silva<br />

Maria Al<strong>de</strong>nice da Silva Santos<br />

Maria Aparecia S. Gonçalves<br />

Maria Evaldina N. <strong>de</strong> Sousa<br />

Maria José da Silva Balbino<br />

Maria José <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Santana<br />

Maria Sandra B. <strong>de</strong> Melo Souza<br />

Mariana Gomes <strong>de</strong> Oliveira Penha<br />

Marta Conceição Augusto<br />

Monica Luisa <strong>de</strong> Jesus<br />

Natanael Bispo <strong>do</strong>s Santos Rosa<br />

Nelson <strong>de</strong> Oliveira Santos Junior<br />

Niceia <strong>de</strong> Moraes<br />

Patrícia Aparecida Batista <strong>de</strong> Souza<br />

Paulo Alexandre <strong>de</strong> Moraes Xavier<br />

Paulo Henrique Brisola <strong>de</strong> Farias<br />

Paulo Rodrigues Pereira<br />

Pedro Bispo Sampaio<br />

Raquel da Silva<br />

Regiane Alves da Rosa<br />

Regiane Gomes da Silva Vieira<br />

Robson da Silva Oliva<br />

Rosemeire <strong>do</strong>s Santos Cezar<br />

Rosimeire <strong>do</strong>s Santos Figueire<strong>do</strong><br />

Rozeane Matias <strong>do</strong>s Santos<br />

Rubenia Maria Carmona<br />

Samanta Meira <strong>do</strong> Nascimento<br />

Sara Maria Gomes Araujo<br />

Sheila <strong>de</strong> Siqueira Car<strong>do</strong>so<br />

Simone Antunes <strong>do</strong>s Santos<br />

Sintia Aparecida A. R. Silva<br />

Vanessa Caroline Marques Freire<br />

Vera Lucia <strong>de</strong> Almeida Silva<br />

Viviane Palomo <strong>do</strong>s Santos<br />

Walkyria Ferreira da Silva<br />

Waltelon Bispo <strong>do</strong>s Santos<br />

Wenna Adriana Moura<br />

Will<strong>de</strong>s Manoel da Silva<br />

Administração e Finanças<br />

Marcelo Costa Dantas<br />

Ana Paula Alencar Quaresma<br />

Cícero Fernan<strong>de</strong>s da Silva<br />

Denise Mattos <strong>de</strong> Oliveira<br />

Fernan<strong>do</strong> Henrique Lau<br />

Renata Aparecida Silva <strong>de</strong> Melo<br />

Angela Maria Avanço Pombal<br />

Leandro <strong>do</strong>s Santos Oliveira<br />

Mirian Maria <strong>de</strong> Jesus<br />

Informática<br />

Robson Serafim Valero<br />

Rodrigo Justino da Silva<br />

Serviços, Edifícios e Expografia<br />

Ozéias Soares<br />

Flávio da Silva Pires<br />

Hiromu Kinoshita<br />

Gilberto Oliveira Cortes<br />

A<strong>de</strong>il<strong>do</strong> Marques <strong>do</strong>s Santos<br />

André Luiz Mello Peixoto<br />

Andrelito Souza Santos<br />

Antonio José <strong>do</strong>s Santos<br />

Cícero Teixeira Peixoto<br />

Eduar<strong>do</strong> Nascimento Silva<br />

Erik Henrique Barbosa da Silva<br />

Francisco Rozenilson Ferreira<br />

Genilton Simplício <strong>do</strong>s Santos<br />

Geral<strong>do</strong> Santos <strong>de</strong> Sena<br />

Hamilton Manoel <strong>de</strong> Jesus<br />

Jonatas Santana Biet<br />

Joilson <strong>de</strong> Oliveira Men<strong>de</strong>s<br />

José Maria Alves Lima<br />

Leilson Silva Fernan<strong>de</strong>s<br />

Ludwin Loth Valenzuela Abarzua<br />

Marcos Car<strong>do</strong>so<br />

Raimun<strong>do</strong> Pereira da Silva<br />

Wilson da Silva<br />

Segurança Patrimonial<br />

Cláudio Cecílio <strong>de</strong> Oliveira<br />

André Rodrigo Lemes<br />

Bruno da Silva Lopes<br />

Jairo Vicente<br />

José Rubens <strong>de</strong> Lima Junior<br />

Leandro Apareci<strong>do</strong> Sires <strong>do</strong>s Santos<br />

Robson Roberto da Silva<br />

Wagner Luiz <strong>de</strong> Campos


CRÉDITOS<br />

CATÁLOGO<br />

Coor<strong>de</strong>nação editorial<br />

Giancarlo Hannud<br />

Júlia Souza Ayerbe<br />

Projeto gráfico<br />

Leticia Moura | Cj.31<br />

Diagramação<br />

João Carlos Heleno | Cj.31<br />

Tradução<br />

Marcela Vieira<br />

Revisão<br />

To<strong>do</strong>tipo Editorial<br />

Imagens<br />

© Musée Cernuschi / Roger-Viollet<br />

EXPOSIÇÃO<br />

Cura<strong>do</strong>r<br />

Eric Lefebvre<br />

Coor<strong>de</strong>nação curatorial<br />

Giancarlo Hannud<br />

Produção e montagem<br />

Setor <strong>de</strong> Produção e Montagem,<br />

<strong>Pinacoteca</strong> <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> São Paulo<br />

Expografia<br />

Setor <strong>de</strong> Serviços, Edifícios e Expografia,<br />

<strong>Pinacoteca</strong> <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong> São Paulo<br />

Produção visual<br />

Zol Design

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!