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O Rei de Amarelo<br />

o prazer em se fechar em seu quarto com esta besta intratável e feroz.<br />

Lembro-me de uma vez em que, ao erguer os olhos do manuscrito que estava<br />

estudando à luz de lamparinas, vi o sr. Wilde agachado imóvel em sua cadeira<br />

alta, seus olhos completamente brilhantes de excitação, enquanto a gata, que<br />

havia se levantado de seu lugar diante do fogão, veio rastejando pelo chão<br />

direto para ele. Antes que eu pudesse me mover, ela encostou sua barriga no<br />

chão, se curvou, tremeu e saltou em seu rosto. Gemendo e espumando, eles<br />

rolaram diversas vezes no chão, se arranhando e se agarrando, até que a gata<br />

gritou e fugiu para debaixo do armário, e o sr. Wilde deitou-se de costas,<br />

seus membros se contraindo e se dobrando como as pernas de uma aranha<br />

moribunda. Ele era excêntrico.<br />

O sr. Wilde subira em sua cadeira alta e, depois de estudar meu rosto,<br />

pegou um livro-razão cheio de orelhas e o abriu.<br />

“Henry B. Matthews”, ele leu, “escriturário na Whysot Whysot and<br />

Company, comerciantes de ornamentos de igreja. Consultou-me dia 3<br />

de abril. Reputação prejudicada na corrida de cavalos. Conhecido como<br />

caloteiro. Reputação a ser reparada até o dia primeiro de agosto. Sinal: cinco<br />

dólares”. Ele virou a página e passou os nós da mão sem dedos sobre o texto<br />

escrito em colunas apertadas.<br />

“P. Greene Dusenberry, ministro do Evangelho, Fairbeach, Nova<br />

Jersey. Reputação prejudicada no Bowery. Para ser reparada o mais rápido<br />

possível. Sinal: cem dólares.”<br />

Ele tossiu e acrescentou: “Consultou-me dia 6 de abril”.<br />

“Então, o senhor não precisa de dinheiro, sr. Wilde”, indaguei.<br />

“Escute”, ele tossiu de novo.<br />

“Sra. C. Hamilton Chester, de Chester Park, Nova York. Consultoume<br />

dia 7 de abril. Reputação prejudicada em Dieppe, na França. Deve ser<br />

reparada até primeiro de outubro. Sinal: quinhentos dólares.”<br />

“Observação: C. Hamilton Chester, capitão do U.S.S. Avalanche,<br />

enviado para casa, vindo do Esquadrão dos Mares do Sul no dia primeiro<br />

de outubro.”<br />

“Bem”, eu disse, “a profissão de reparador de reputações é lucrativa.”<br />

Seus olhos pálidos buscaram os meus: “Eu só queria mostrar que<br />

estava correto. O senhor disse que era impossível ser bem-sucedido como<br />

reparador de reputações; que mesmo se eu fosse bem-sucedido em certos<br />

casos, isso me custaria mais do que eu ganharia. Hoje tenho quinhentos<br />

homens a meu serviço, pobremente remunerados, mas que se dedicam ao<br />

40<br />

O Reparador de Reputações<br />

trabalho com um entusiasmo que possivelmente pode ter nascido do medo.<br />

Esses homens podem entrar em cada abertura e nível da sociedade; muitos<br />

até são pilares dos templos sociais mais exclusivos; outros são o apoio e<br />

orgulho do mundo financeiro; outros, ainda, detêm influência indiscutível<br />

entre os ‘ricos e talentosos’. Eu os escolhi ao meu capricho, a partir dos que<br />

responderam a meus anúncios. É muito fácil, eles são todos covardes. Eu<br />

poderia triplicar o número em vinte dias se quisesse. Então o senhor vê,<br />

aqueles que têm em sua posse a reputação dos seus concidadãos eu tenho em<br />

minha folha de pagamento”.<br />

“Eles podem se voltar contra o senhor”, sugeri.<br />

Ele esfregou seu polegar sobre as orelhas cortadas e ajustou as substitutas<br />

de cera. “Acho que não”, ele murmurou pensativamente, “raramente tenho de<br />

aplicar o castigo, e ainda assim só o faço uma única vez. Além disso, eles<br />

gostam de seus salários”.<br />

“Como o senhor aplica o castigo?”, perguntei.<br />

Seu rosto, por um momento, estava horrível de se olhar. Seus olhos se<br />

encolheram em um par de faíscas verdes.<br />

“Eu os convido a vir e conversar um pouco comigo”, ele disse em uma<br />

voz suave.<br />

Uma batida na porta o interrompeu, e seu rosto retomou sua expressão<br />

agradável. “Quem é?”, ele perguntou.<br />

“O sr. Steylette”, foi a resposta.<br />

“Venha amanhã”, respondeu o sr.Wilde.<br />

“Impossível”, começou o outro, mas foi silenciado por um tipo de<br />

rosnado do sr. Wilde.<br />

“Venha amanhã”, ele repetiu.<br />

Escutamos alguém se afastar da porta e virar para chegar à escada.<br />

“Quem era?”, perguntei.<br />

“Arnold Steylette, proprietário e chefe editorial do grande New York<br />

Daily.” Ele tamborilou no livro com sua mão sem dedos, adicionando: “Eu o<br />

remunero muito mal, mas ele acredita que é um bom negócio.”<br />

“Arnold Steylette!”, repeti assombrado.<br />

“Sim”, disse o sr. Wilde, com uma tosse de satisfação.<br />

A gata, que havia entrado na sala enquanto ele falava, hesitou, olhou<br />

para ele e rosnou. Ele desceu da cadeira e, agachando-se no chão, pegou a<br />

criatura em seus braços e a acariciou. A gata parou de rosnar e logo começou<br />

com um ronronar alto que parecia aumentar em timbre enquanto ele a<br />

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