Arquivo pdf - CCA/UFPb
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Agropecuária Técnica • v.27, n.2, 2006<br />
ISSN 0100-7467 — Areia, PB, <strong>CCA</strong>/UFPB<br />
EFEITO DA APLICAÇÃO DE LODO DE CURTUME SOBRE A<br />
CONDUTIVIDADE ELÉTRICA E REAÇÃO DE SOLO ÁCIDO<br />
SPACHSON MELO DE SOUZA 1 , LÚCIA HELENA GARÓFALO CHAVES 2 , ADAILSON PEREIRA DE SOUZA 3<br />
1 Mestrando em Engenharia Agrícola, Universidade Federal de Campina Grande – UFCG/CTRN, CEP 58109-970, Campina<br />
Grande – PB, spachson@gmail.com<br />
2 Professora Titular, da Unidade Acadêmica de Engenharia Agrícola, Centro de Ciências e Tecnologia, UFCG, CEP 58109-970,<br />
Campina Grande – PB, lhgarofalo@hotmail.com<br />
3 Professor, D.Sc., do Departamento de Solos e Engenharia Rural, Centro de Ciências Agrárias, UFPB, CEP 58397-000, Areia – PB,<br />
adailson@cca.ufpb.br<br />
RESUMO<br />
Este trabalho teve como objetivo estudar o efeito do lodo de curtume, produzido em Campina Grande, PB, sobre a condutividade<br />
elétrica (CE) do solo e como corretivo de acidez do solo. O experimento foi realizado em condições de casa de vegetação<br />
incubando-se um solo ácido, durante 40 dias, com carbonato de cálcio e lodo de curtume, em quantidades iguais, dez e vinte<br />
vezes maiores que as de carbonato de cálcio. Foi verificado que as aplicações de lodo de curtume em quantidades iguais as de<br />
carbonato de cálcio não foram eficientes na neutralização da acidez do solo, nem tão pouco aumentaram a CE. Todavia a CE e o<br />
pH do solo foram aumentados pelo lodo de curtume quando aplicados nas proporções dez e vinte vezes maiores que a do carbonato<br />
de cálcio. A quantidade de lodo de curtume dez vezes maior (13,8 t ha -1 ) que a de carbonato de cálcio, recomendada para<br />
neutralizar a acidez do solo, pode ser mais viável que aquela vinte vezes maior, pois neutralizará a acidez do solo sem elevar por<br />
demais a sua CE.<br />
Palavras-chave: salinidade, pH de solo<br />
TANNERY SLUDGE EFFECTS ON ELECTRICAL CONDUCTIVITY<br />
AND ACID SOIL REACTION<br />
ABSTRACT<br />
This study was carried out under greenhouse conditions in order to evaluate the effects of tannery sludge produced in Campina<br />
Grande, PB, Brazil, on the electrical conductivity (EC) and as a soil acidity corrective material. Samples of acid soil were incubated<br />
during 40 days with calcium carbonate and tannery sludge in equal amounts, ten and twenty times bigger than calcium carbonate<br />
amount. It was observed that the application of tannery sludge in equal amounts of calcium carbonate had not been efficient in<br />
the neutralization of acidity soil, nor had not increased the EC. However the EC and pH of soil has been increased by tannery<br />
sludge when applied in the ratios ten and twenty times bigger than calcium carbonate. The amount of tannery sludge ten times<br />
bigger (13,8 t ha -1 ) than calcium carbonate recommended to ameliorate soil acidity may be more feasible than that twenty times<br />
bigger, because it will neutralize the soil acidity without raising its EC.<br />
Key words: salinity, soil pH<br />
Agropecuária Técnica, v.27, n.2, p.77–84, 2006
78<br />
Spachson Melo de Souza, Lúcia Helena Garófalo Chaves & Adailson Pereira de Souza<br />
INTRODUÇÃO<br />
O crescimento dos centros urbanos e das atividades<br />
industriais tem trazido como conseqüência a<br />
geração cada vez maior de resíduos. Este fato, associado<br />
à consciência ecológica da população, tem responsabilizado<br />
os geradores de resíduos a processálos,<br />
tratá-los e dar um destino adequado aos mesmos.<br />
O solo constitui o melhor e mais seguro meio para a<br />
disposição de resíduos, em relação à hidrosfera ou à atmosfera.<br />
Os solos são capazes de melhor oxidar, precipitar<br />
os poluentes contidos nestes resíduos e removêlos<br />
da cadeia alimentar, de modo mais seguro que o ar<br />
ou a água. Entretanto, a disposição de resíduos no solo<br />
normalmente é causa de muitas controvérsias (Wad,<br />
2005). Por um lado constitui uma alternativa viável na<br />
preservação da qualidade ambiental pelo fato dos resíduos<br />
serem considerados fontes de nutrientes para as<br />
plantas e condicionadores dos solos (Araújo, 2004), por<br />
outro, dependendo da composição química dos mesmos<br />
e da forma como são manejados no solo, representa uma<br />
fonte poluidora do meio ambiente (Costa et al., 2001).<br />
Alguns benefícios de utilização do lodo de esgoto<br />
na agricultura têm sido evidenciados em alguns trabalhos<br />
de pesquisa (Melo e Marques, 2001; Simonete,<br />
2001; Rocha et al., 2004). Ferreira et al. (2003) observaram<br />
aumento no valor do pH de um Argissolo<br />
Vermelho distrófico típico que recebeu lodo de curtume,<br />
da mesma forma que este lodo propiciou rendimento<br />
de soja e milho semelhantes aos obtidos com<br />
adição de fertilizantes nitrogenados. No entanto, segundo<br />
Costa et al. (2001), a aplicação de lodo de curtume<br />
em um Planossolo Hidromórfico Eutrófico Solódico<br />
apresentou baixa eficiência na correção de<br />
acidez do mesmo, tendo, inclusive, aumentado sua<br />
salinidade e sua concentração de sódio.<br />
O município de Campina Grande, PB, tem na indústria<br />
coureira-calçadista um elemento de grande importância<br />
econômica. Através do processo de curtimento<br />
de peles, efluentes têm sido produzidos, como é o<br />
caso do lodo de curtume, com provável potencial fertilizante<br />
e corretivo de acidez. Todavia, para que este<br />
lodo possa ser utilizado como corretivo é imprescindível<br />
que o mesmo seja avaliado em relação ao seu potencial<br />
de neutralização. Desta forma, este trabalho<br />
objetivou estudar os efeitos da aplicação de lodo de<br />
curtume, produzido em Campina Grande, sobre a condutividade<br />
elétrica e sobre a correção de acidez do solo.<br />
MATERIAL E MÉTODOS<br />
O experimento foi conduzido em casa de vegetação<br />
da Unidade Acadêmica de Engenharia Agrícola da<br />
Universidade Federal de Campina Grande, PB, utilizando-se<br />
amostras da camada superficial (0-20 cm de<br />
profundidade) de um solo ácido proveniente do município<br />
de Lagoa Seca, PB. Essas amostras após a coleta<br />
foram secas ao ar, destorroadas e passadas em<br />
peneira com malha de 2 mm de abertura para posterior<br />
caracterização química. O lodo de curtume, empregado<br />
no experimento, foi coletado nos tanques da<br />
estação de tratamento de efluentes do Centro de Tecnologia<br />
de Couro e Calçados Albano Franco, em<br />
Campina Grande, PB, na forma líquida, sendo em<br />
seguida colocado para secar em estufa a 65°C, durante<br />
24 horas, triturado em almofariz de ágata, passado<br />
em peneira de 0,250 mm (60 mesh), acondicionado em<br />
sacos plásticos e hermeticamente fechados para evitar<br />
qualquer tipo de contaminação. As características<br />
químicas do solo e do lodo de curtume, determinadas<br />
conforme metodologia descrita em EMBRAPA<br />
(1997) e Tedesco et al. (1995), respectivamente, são<br />
apresentadas na Tabela 1.<br />
Tabela 1. Caracterização química do solo, antes do experimento,<br />
e do lodo de curtume utilizado<br />
Características<br />
Químicas<br />
pH H2 (1:2,5)<br />
C a<br />
+<br />
M g<br />
+<br />
Solo<br />
,4<br />
1,52<br />
cmo c m<br />
0,10<br />
cmo c m<br />
0,18<br />
cmolc m<br />
0,10<br />
cmolc m<br />
2,47<br />
cmo c m<br />
Lodo de curtume<br />
7,4<br />
37,88<br />
g K<br />
-1<br />
4,58<br />
g K<br />
-1<br />
0,33<br />
g K<br />
-1<br />
25,79<br />
g K<br />
-1<br />
O 4 0<br />
9<br />
2 l d - 3<br />
g<br />
2 l d - 3<br />
g<br />
K +<br />
d - 3<br />
g<br />
N a<br />
d - 3<br />
g<br />
H + + Al<br />
l d<br />
-3<br />
-<br />
N 0,08<br />
%<br />
30,05<br />
g Kg-<br />
1<br />
P<br />
12,7<br />
mg dm<br />
3<br />
3,77<br />
g K g -1<br />
Os tratamentos consistiram em doses crescentes<br />
de carbonato de cálcio (CaCO 3 ) e de lodo de curtume.<br />
As doses utilizadas de CaCO 3 tiveram como base<br />
a quantidade do mesmo, necessária para elevar a porcentagem<br />
de saturação do solo a 60%, ou seja,<br />
1,38 t ha -1 . A partir deste valor foram calculados os<br />
demais para efeito de determinação da curva de neutralização<br />
do solo, tendo sido utilizadas em cada unidade<br />
experimental 0,091; 0,181; 0,272; 0,362; 0,453 e<br />
0,544 g kg -1 de CaCO 3 . As quantidades de lodo de<br />
curtume utilizadas foram iguais, dez e vinte vezes às<br />
do CaCO 3 , conforme estão apresentadas na Tabela 2.<br />
Agropecuária Técnica, v.27, n.2, p.77–84, 2006
Efeito da aplicação de lodo de curtume sobre a condutividade elétrica e reação de solo ácido<br />
79<br />
Tabela 2. Quantidades de carbonato de cálcio (CaCO 3 ) e de lodo<br />
de curtume utilizadas nos tratamentos: (1) CaCO 3 , (2), (3) e (4)<br />
lodo de curtume na mesma quantidade, 10 e 20 vezes maior que<br />
a do CaCO 3 , respectivamente<br />
Tratamentos<br />
Carbonato<br />
de Cálcio<br />
Lodo de curtume<br />
T1<br />
( CaCO3)<br />
T2<br />
(Lodo)<br />
T3<br />
(Lodo 10)<br />
T4<br />
(Lodo 20)<br />
g kg-<br />
1<br />
T1.1<br />
= 0,091 T2.1<br />
= 0,091<br />
T3.1<br />
= 0,91<br />
T4.1 = 1,82<br />
T1.2<br />
= 0,181 T2.2<br />
= 0,181<br />
T3.2<br />
= 1,81<br />
T4.2 = 3,62<br />
T1.3<br />
= 0,272 T2.3<br />
= 0,272<br />
T3.3<br />
= 2,72<br />
T4.3 = 5,44<br />
T1.4<br />
= 0,362 T2.4<br />
= 0,362<br />
T3.4<br />
= 3,62<br />
T4.4 = 7,24<br />
T1.5<br />
= 0,453 T2.5<br />
= 0,453<br />
T3.5<br />
= 4,53<br />
T4.5 = 9,06<br />
T1.6<br />
= 0,544 T2.6<br />
= 0,544<br />
T3.6<br />
= 5,44<br />
T4.6 = 10,88<br />
O material correspondente a cada tratamento foi<br />
misturado e homogeneizado com um quilo de solo,<br />
acondicionado em sacos plásticos, e submetido a um<br />
período de incubação de 40 dias, com umidade correspondente<br />
a 80% da capacidade de campo do solo.<br />
Cada tratamento foi instalado com três repetições,<br />
perfazendo o total de 72 unidades experimentais.<br />
Com intuito de acompanhar o comportamento do<br />
pH e condutividade elétrica (CE) do solo durante o<br />
tempo de incubação, após 15, 20, 30 e 40 dias do início<br />
da incubação, foram coletadas amostras de solo<br />
(0,05 kg) de cada unidade experimental. Essas amostras<br />
foram secas ao ar, destorroadas e passadas em peneira<br />
com malha de 2 mm de abertura e analisados o pH em<br />
água e em KCl 1N (1:2,5) e a CE, segundo métodos<br />
da EMBRAPA (1997). Os incrementos de pH (DpH)<br />
das unidades experimentais, causados pelos tratamentos,<br />
foram calculados pela subtração entre os valores<br />
de pH obtidos após 40 dias de incubação do solo e<br />
aquele do solo antes dos tratamentos, ou seja, 4,4.<br />
A quantidade de carga negativa presente nos colóides<br />
do solo que, teoricamente, deve aumentar com o<br />
aumento do pH, foi determinada pela diferença entre<br />
os valores de pH em KCl e de pH em água (∆pH).<br />
RESULTADOS E DISCUSSÃO<br />
Em relação ao tempo de incubação, é interessante<br />
observar que aos 15 dias, os valores de pH, em<br />
todas as unidades experimentais foram os mais elevados,<br />
diminuindo aos 20 e 30 dias, para em seguida,<br />
aos 40 dias, aumentar (Figura 1). Essa variação<br />
8<br />
8<br />
7<br />
7<br />
pH<br />
6<br />
6<br />
5<br />
5<br />
4<br />
T1.1 T1.2 T1.3 T1.4 T1.5 T1.6<br />
Carbonato de cálcio<br />
4<br />
T2.1 T2.2 T2.3 T2.4 T2.5 T2.6<br />
Lodo de curtume<br />
8<br />
8<br />
7<br />
7<br />
pH<br />
6<br />
6<br />
5<br />
5<br />
4<br />
T3.1 T3.2 T3.3. T3.4 T3.5 T3.6<br />
Lodo de curtume<br />
15 dias<br />
4<br />
T4.1 T4.2 T4.3 T4.4 T4.5 T4.6<br />
Lodo de curtume<br />
20 dias 30 dias 40 dias<br />
Figura 1. Variação do pH em função dos tratamentos carbonato de cálcio (T1) e lodo de curtume nas quantidades igual (T2), dez (T3) e vinte (T4) vezes<br />
maiores que a do carbonato de cálcio, durante o período de incubação.<br />
Agropecuária Técnica, v.27, n.2, p.77–84, 2006
80<br />
Spachson Melo de Souza, Lúcia Helena Garófalo Chaves & Adailson Pereira de Souza<br />
com o tempo, provavelmente, está relacionada com<br />
as reações químicas que vão ocorrendo no solo até<br />
que sua acidez seja neutralizada e o pH, então, estabilizado.<br />
Independente do tempo de incubação, o comportamento<br />
dos valores de pH em relação aos tratamentos<br />
foi semelhante (Figura 1), ou seja, aumentaram em<br />
função das doses, tanto de carbonato de cálcio como<br />
do lodo de curtume, nas diversas proporções. Resultados<br />
semelhantes foram relatados por Ferreira et al.<br />
(2003) que verificaram a eficiência do lodo de curtume<br />
na elevação do pH do solo.<br />
Comparando os valores de pH das unidades experimentais<br />
após 40 dias de incubação com carbonato<br />
de cálcio (T1) e lodo de curtume (T2), nas mesmas<br />
proporções, observa-se que carbonato de cálcio foi<br />
mais eficaz na neutralização da acidez, tendo, conseqüentemente,<br />
elevado os valores de pH acima daqueles<br />
obtidos com o lodo de curtume. No entanto, os<br />
valores de pH do solo, tanto com carbonato de cálcio<br />
como com lodo de curtume, ficaram acima daquele<br />
apresentado inicialmente pelo solo, ou seja, 4,4. As<br />
amostras de solo que receberam quantidades maiores<br />
de lodo de curtume (T3 e T4), tiveram seus valores<br />
de pH maiores que aqueles observados com T1 e T2,<br />
apresentando, também, maior variação entre as doses<br />
aplicadas (Figura 2).<br />
Os incrementos de pH (DpH) proporcionados<br />
pela adição ao solo de lodo de curtume (T2), na mesma<br />
proporção que o carbonato de cálcio (T1), foram<br />
os menores observados e, praticamente, não variaram<br />
em função das doses de lodo utilizadas (Figura 3).<br />
Devido a isto, estes incrementos não foram suficientes<br />
para que as unidades experimentais atingissem<br />
os valores de pH em água, 5,5 ou 6,0 (Figura 2), os<br />
quais são considerados adequados para o cultivo da<br />
maioria das culturas agrícolas. O mesmo aconteceu<br />
para as doses 1, 2 e 3, de carbonato de cálcio, aplicadas<br />
ao solo.<br />
Na medida em que se aumentou a proporção de<br />
lodo de curtume (T3, T4) em relação ao carbonato de<br />
cálcio (T1), observou-se aumento nos incrementos de<br />
pH e estes aumentaram em função das doses utilizadas<br />
(Figura 3), tendo sido capazes de elevar o pH das<br />
unidades experimentais acima de 5,5 já a partir das<br />
doses 2 e 1 dos tratamentos T3 e T4, respectivamente<br />
(Figura 2), evidenciando os efeitos positivos da<br />
aplicação dos mesmos ao solo.<br />
9<br />
8<br />
2<br />
y = 0,0104x + 0,0984x + 4,972<br />
2<br />
R = 0,988<br />
9<br />
8<br />
2<br />
y = 0,0082x - 0,0092x + 4,866<br />
2<br />
R = 0,7139<br />
pH em água<br />
7<br />
6<br />
pH em água<br />
7<br />
6<br />
5<br />
5<br />
4<br />
T1.1 T1.2 T1.3 T1.4 T1.5 T1.6<br />
Carbonato de cálcio<br />
4<br />
T2.1 T2.2 T2.3 T2.4 T2.5 T2.6<br />
Lodo de curtume<br />
9<br />
8<br />
2<br />
y = -0,0404x + 0,5931x + 4,718<br />
2<br />
R = 0,9883<br />
9<br />
8<br />
2<br />
y = -0,0871x + 0,9617x + 4,904<br />
2<br />
R = 0,9942<br />
pH em água<br />
7<br />
6<br />
pH em água<br />
7<br />
6<br />
5<br />
5<br />
4<br />
T3.1 T3.2 T3.3. T3.4 T3.5 T3.6<br />
Lodo de curtume<br />
4<br />
T4.1 T4.2 T4.3 T4.4 T4.5 T4.6<br />
Lodo de curtume<br />
Figura 2. Curvas de neutralização do solo após 40 dias de incubação com carbonato de cálcio (T1) e lodo de curtume nas quantidades igual (T2), dez (T3)<br />
e vinte (T4) vezes maiores que a do carbonato de cálcio.<br />
Agropecuária Técnica, v.27, n.2, p.77–84, 2006
Efeito da aplicação de lodo de curtume sobre a condutividade elétrica e reação de solo ácido<br />
81<br />
DpH<br />
3,5<br />
3<br />
2,5<br />
2<br />
1,5<br />
1<br />
0,5<br />
0<br />
1 2 3 4 5 6<br />
Doses<br />
CaCO 3 Lodo Lodo 10 Lodo 20<br />
Figura 3. Incremento do pH em água, do solo, após 40 dias de incubação<br />
com os respectivos tratamentos.<br />
pH em água<br />
8<br />
7,5<br />
7<br />
6,5<br />
6<br />
5,5<br />
5<br />
4,5<br />
4<br />
3 4 5 6 7<br />
pH em KCl<br />
y = 0,9514x + 0,9619<br />
2<br />
R = 0,9916<br />
Figura 4. Relação entre o pH em KCl e o pH em água em solos tratados com<br />
carbonato de cálcio e lodo de curtume.<br />
Aumentos do pH em função da aplicação de lodo<br />
de curtume em Argissolo Vermelho distrófico típico<br />
e em Neossolo Flúvico também foram observados por<br />
Ferreira et al. (2003) e Teixeira et al. (2006), respectivamente.<br />
Todavia, Costa et al. (2001), constataram<br />
baixa eficiência do lodo de curtume na correção da<br />
acidez do solo. Dados controversos a este respeito são<br />
comuns na literatura devido a diversidade das características<br />
químicas, tanto dos solos como dos lodos<br />
que estão sendo avaliados.<br />
No final do período de incubação, os efeitos dos<br />
tratamentos sobre o pH do solo, quando avaliados em<br />
água e em KCl 1N, de modo geral, não diferiram entre<br />
si, em concordância com a forte relação entre os<br />
valores de pH em água e em KCl (Figura 4), não obstante<br />
tenham sido constatados valores diferentes de<br />
pH. Dados semelhantes foram encontrados por<br />
Abreu Junior et al. (2000) comparando valores de pH<br />
em água com os obtidos em CaCl 2 0,01 mol L -1 .<br />
Os valores de pH em água das amostras de solo<br />
incubadas com os seus respectivos tratamentos, foram<br />
superiores àqueles do pH em KCl. Os menores valores<br />
de pH obtidos em KCl são conseqüência do deslocamento<br />
de H + e Al 3+ do complexo de troca e da<br />
compressão da dupla camada elétrica difusa, que fazem<br />
com que o pH seja próximo daquele da superfície<br />
das partículas (Raij et al., 1987).<br />
A elevação da concentração salina causada pelo<br />
carbonato de cálcio (T1) e lodo de curtume (T2, T3<br />
e T4), conforme constatado pelo aumento da CE, fez<br />
com que os valores de pH medidos em água e em KCl<br />
tendessem a ser iguais, ou seja, a variação do ∆pH diminui<br />
em função dos tratamentos e de suas respectivas<br />
doses (Figura 5), corroborando com Abreu Junior<br />
et al. (2000). Com isto pode-se inferir que o<br />
número de cargas negativas na superfície dos colóides<br />
do solo tende a diminuir à medida que aumenta a<br />
quantidade de lodo de curtume aplicado ao solo.<br />
Delta pH<br />
-0,9<br />
-0,8<br />
-0,7<br />
-0,6<br />
2<br />
Lodo 20 y = 1,8713x - 1,4377x - 0,5019<br />
-0,5<br />
2<br />
R = 0,9335<br />
2<br />
Lodo 10 y = 1,8072x - 0,4453x - 0,8216<br />
2<br />
-0,4<br />
R = 0,9411<br />
2<br />
CaCO 3 y = 86,111x - 34,528x + 2,72<br />
2<br />
R = 0,7564<br />
-0,3<br />
0 0,2 0,4 0,6 0,8 1<br />
CE, dS m -1<br />
Figura 5. Efeito da condutividade elétrica sobre a diferença entre o pH em<br />
KCl e em água (Delta pH) das amostras de solo tratadas com carbonato de<br />
cálcio e lodo de curtume nas proporções 10 e 20 vezes maior que carbonato<br />
de cálcio.<br />
Os valores de CE das amostras de solo foram<br />
modificados pelos tratamentos e pelo tempo de incubação<br />
a que estas amostras foram submetidas (Figura<br />
6). Apesar das variações que ocorreram, pode-se<br />
observar, em geral, uma tendência de aumento nos valores<br />
de CE. Esses valores, com a aplicação de carbonato<br />
de cálcio, variaram de 0,14 a 0,24 dS m -1 .<br />
Variação semelhante, ou seja, de 0,15 a 0,27 dS m -1 ,<br />
foi observada com a aplicação ao solo de lodo de curtume<br />
(T2) nas mesmas quantidades do carbonato de<br />
cálcio (T1). Todavia, a aplicação de lodo de curtume<br />
em quantidades dez (T3) e vinte (T4) vezes maiores<br />
que aquelas correspondentes as quantidades de carbonato<br />
de cálcio (T1), fizeram a CE variar de 0,2 a<br />
0,51 dS m -1 e de 0,24 a 1,13 dS m -1 , respectivamente.<br />
A Figura 7 resume a variação dos valores de CE em<br />
função das doses de cada tratamento ao final do período<br />
de incubação. Observa-se que as doses de lodo<br />
Agropecuária Técnica, v.27, n.2, p.77–84, 2006
82<br />
Spachson Melo de Souza, Lúcia Helena Garófalo Chaves & Adailson Pereira de Souza<br />
0,3<br />
0,3<br />
CE, dS m -1<br />
0,25<br />
0,2<br />
0,15<br />
0,25<br />
0,2<br />
0,15<br />
0,1<br />
1,3<br />
T1.1 T1.2 T1.3 T1.4 T1.5 T1.6<br />
Carbonato de cálcio, g kg -1<br />
0,1<br />
1,3<br />
T2.1 T2.2 T2.3 T2.4 T2.5 T2.6<br />
Lodo de curtume, g kg -1<br />
1,1<br />
1,1<br />
CE, dS m -1<br />
0,9<br />
0,7<br />
0,5<br />
0,3<br />
0,1<br />
T3.1 T3.2 T3.3 T3.4 T3.5 T3.6<br />
Lodo de curtume, g kg -1<br />
0,9<br />
0,7<br />
0,5<br />
0,3<br />
0,1<br />
15 dias 20 dias 30 dias 40 dias<br />
T4.1 T4.2 T4.3 T4.4 T4.5 T4.6<br />
Lodo de curtume, g kg -1<br />
Figura 6. Variação da condutividade elétrica em função dos tratamentos carbonato de cálcio (T1) e lodo de curtume nas quantidades igual (T2), dez (T3) e<br />
vinte (T4) vezes maiores que a do carbonato de cálcio, durante o período de incubação.<br />
1,2<br />
2<br />
y = 0,0036x - 0,0173x + 0,218<br />
1,2<br />
2<br />
y = 0,0082x - 0,0504x + 0,25<br />
1<br />
2<br />
R = 0,8058<br />
1<br />
2<br />
R = 0,9795<br />
CE, dS m -1<br />
0,8<br />
0,6<br />
0,4<br />
0,8<br />
0,6<br />
0,4<br />
0,2<br />
0,2<br />
0<br />
1,2<br />
T1.1 T1.2 T1.3 T1.4 T1.5 T1.6<br />
Carbonato de cálcio<br />
2<br />
y = 0,0048x + 0,0262x + 0,175<br />
0<br />
1,2<br />
T2.1 T2.2 T2.3 T2.4 T2.5 T2.6<br />
Lodo de curtume<br />
2<br />
y = 0,0038x + 0,0669x + 0,259<br />
1<br />
2<br />
R = 0,9283<br />
1<br />
2<br />
R = 0,893<br />
CE, dS m -1<br />
0,8<br />
0,6<br />
0,4<br />
0,2<br />
0,8<br />
0,6<br />
0,4<br />
0,2<br />
0<br />
T3.1 T3.2 T3.3 T3.4 T3.5 T3.6<br />
Lodo de curtume<br />
0<br />
T4.1 T4.2 T4.3 T4.4 T4.5 T4.6<br />
Lodo de curtume<br />
Figura 7. Variação da condutividade elétrica do solo após 40 dias de incubação com carbonato de cálcio (T1) e lodo de curtume nas quantidades igual (T2),<br />
dez (T3) e vinte (T4) vezes maiores que a do carbonato de cálcio.<br />
Agropecuária Técnica, v.27, n.2, p.77–84, 2006
Efeito da aplicação de lodo de curtume sobre a condutividade elétrica e reação de solo ácido<br />
83<br />
de curtume (T2) iguais as de carbonato de cálcio (T1)<br />
provocaram a mesma variação que estas últimas e<br />
menor variação do que aquelas provocadas pelas doses<br />
de lodo de curtume dez (T3) e vinte (T4) vezes<br />
maiores.<br />
O aumento dos valores de CE, possivelmente, foi<br />
devido à elevada concentração de sódio no lodo de<br />
curtume (Tabela 1), o que proporcionou aumento nos<br />
teores do elemento no solo. Resultados semelhantes<br />
foram encontrados por Aquino Neto e Camargo<br />
(2000), Costa et al. (2001), Teixeira et al. (2006) e<br />
Daudt et al. (2007). Todavia, os valores de CE em<br />
todas as amostras de solo permaneceram abaixo de<br />
2dSm -1 , valor máximo proposto por Daker (1970)<br />
para solos não salinos.<br />
Deve-se ressaltar, no entanto, que aplicações sucessivas<br />
do lodo de curtume implicariam no aumento dos<br />
teores de sódio no solo e, conseqüentemente, em sua<br />
salinização. Por isso, mais estudos devem ser realizados<br />
para definir as quantidades a serem utilizadas nos<br />
solos e determinar a melhor relação custo-benefício<br />
(Wad, 2005).<br />
CONCLUSÕES<br />
As quantidades de lodo de curtume iguais as de<br />
carbonato de cálcio não foram eficientes na neutralização<br />
da acidez do solo, nem tão pouco aumentaram<br />
a CE.<br />
A condutividade elétrica e o pH do solo foram<br />
aumentados pelo lodo de curtume somente quando<br />
aplicados nas proporções dez e vinte vezes maiores<br />
que a do carbonato de cálcio.<br />
A quantidade de lodo de curtume dez vezes maior<br />
(13,8 t ha -1 ) que a de carbonato de cálcio, recomendada<br />
para neutralizar a acidez do solo, pode ser<br />
mais viável que aquela vinte vezes maior (27,6 t ha -1 ),<br />
pois neutralizará a acidez do solo sem elevar por<br />
demais a sua CE.<br />
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