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Formação dos agentes socioambientais no Xingu - Ministério do ...

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‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong><strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong><strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>Valorizan<strong>do</strong> as descobertas e iniciativas agroflorestais<strong>Formação</strong> de Agentes Socioambientais Multiplica<strong>do</strong>res 1


<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong><strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>Valorizan<strong>do</strong> as descobertas e iniciativas agroflorestais


Instituto Socioambiental (ISA)O ISA é uma associação sem fins lucrativos, qualificada como Organizaçãoda Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), fundadaem 22 de abril de 1994, por pessoas com formação e experiênciamarcante na luta por direitos sociais e ambientais. Tem como objetivodefender bens e direitos sociais, coletivos e difusos, relativosao meio ambiente, ao patrimônio cultural, aos direitos huma<strong>no</strong>se <strong><strong>do</strong>s</strong> povos. O ISA produz estu<strong><strong>do</strong>s</strong> e pesquisas, implanta projetose programas que promovam a sustentabilidade socioambiental,valorizan<strong>do</strong> a diversidade cultural e biológica <strong>do</strong> país.Para saber mais sobre o ISA consultewww.socioambiental.orgConselho DiretorNeide Esterci (presidente), Sérgio Mauro Santos Filho (vice-presidente),Adriana Ramos, Beto Ricar<strong>do</strong>, Carlos Frederico MarésSecretário-executivoBeto Ricar<strong>do</strong>Secretário-executivo adjuntoEnrique SvirskyApoio institucionalIcco (Organização Intereclesiástica paraCooperação ao Desenvolvimento)NCA (Ajuda da Igreja da Noruega)Campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Coordena<strong>do</strong>r pelo Instituto SocioambientalMárcio SantilliCoordena<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Programa <strong>Xingu</strong>André Villas-BôasCoordena<strong>do</strong>res adjuntos <strong>do</strong> Programa <strong>Xingu</strong>Paulo Junqueira e Rodrigo Gravina Prates JunqueiraComunicaçãoOswal<strong>do</strong> Braga de Souza(66) 3478-3491 / oswal<strong>do</strong>@socioambiental.org.brAssessores <strong>do</strong> Programa <strong>Xingu</strong>Angelise Nadal, Arminda Jardim, Cassia<strong>no</strong> Marmet, Eduar<strong>do</strong>Malta, Kátia O<strong>no</strong>, Marcus Vinícius Chamon Schmidt, LucianaAkeme S. M. Deluci, Osval<strong>do</strong> Luis de Sousa, Paula Men<strong>do</strong>nça,Rosana Gasparini, Rosely Alvim Sanches, Renata Faria, MarcosFroes, Francisco Fortes, Sadi Elsenbach, Sara Cristófaro, CristinaVelasquez, Marcelo Salazar e A<strong>do</strong>lar MaccariProjeto “Fomento à cultura florestal <strong>no</strong> Cerra<strong>do</strong>matogrossense através da formação de <strong>agentes</strong>multiplica<strong>do</strong>res na bacia <strong>do</strong> rio <strong>Xingu</strong>”Coordena<strong>do</strong>rRodrigo Gravina Prates JunqueiraConsultoraFabiana PeneireiroEquipe localEduar<strong>do</strong> Malta Campos Filho, Luciana Akeme S. M. Deluci,Oswal<strong>do</strong> Braga de Souza, Osval<strong>do</strong> Luis de Sousa


<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong><strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>Valorizan<strong>do</strong> as descobertas e iniciativas agroflorestaisRealizaçãoParceriaApoioSão Paulo, outubro de 2007


<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>EditoresOswal<strong>do</strong> Braga de SouzaRodrigo Gravina Prates JunqueiraEquipe de edição, redação e revisãoOswal<strong>do</strong> Braga de Souza, Rodrigo Gravina Prates Junqueirae Luciana Akeme S. M. DeluciEquipe de pesquisa e entrevistasOswal<strong>do</strong> Braga de Souza, Luciana Akeme S. M. Deluci,Eduar<strong>do</strong> Malta Campos Filho, Jaílton Assunção de Sousae Osval<strong>do</strong> Luís de SousaProjeto gráfico e editoraçãoAna Cristina SilveiraFotosAcervo Emfaque, Eduar<strong>do</strong> Malta Campos Filho, Elma Gomes,Luciana Akeme S. M. Deluci, Maristela F. Becker da Rosa,Oswal<strong>do</strong> Braga de Souza, Rosely Alvim Sanches,Rodrigo Gravina Prates Junqueira e Rosenilde PaniagoColabora<strong>do</strong>ras autoraisFabiana Peneireiro, Luciana Akeme S. Manza<strong>no</strong> Delucie Rosely Alvim SachesAgentes colabora<strong>do</strong>resRosenilde Nogueira Paniago e Elma Gomes de Moraes(relatório de trabalho e entrevistas); Maristela F. Becker da Rosae Sidnei Bue<strong>no</strong> de Miranda (relatos por escrito e entrevistas);Édemo Côrrea, Arman<strong>do</strong> Menin, Gilmar Hollunder, Ricar<strong>do</strong> DiasBatista, Adilson Siqueira de Abreu, Marcos Aurélio <strong><strong>do</strong>s</strong> SantosPentea<strong>do</strong>, Sara Adriana Malvessi e Ivan Loch (entrevistas);Ana Paula Zuim Andrade, Jaílton Assunção de Sousa, CristianeGonçalves e Cassia<strong>no</strong> Carlos Marmet (relatos por escrito); AídaRodrigues Pra<strong><strong>do</strong>s</strong>, Divi<strong>no</strong> Vicente Silvério, Edna Soares deSouza, Maria Joselina Cantuário de Abreu, Nilsa Raquel Dias,Irene Marsango, Josafá Cunha da Cruz e José Antônio PereiraLeite (depoimentos por escrito); Clo<strong>do</strong>al<strong>do</strong> Maccari (relato porescrito e depoimento); Maria Sicorra da Rosa, Josuel Olegário<strong><strong>do</strong>s</strong> Santos e Ingred Ramos Pereira (depoimentos por escrito eentrevistas); Júlio Pereira Messias, Carlos Grün, Dorvali<strong>no</strong> Pintoda Silveira, Luiz Vezaro, Silvia de Moura Faitão, Valdir MiltonSupptitz e Ayres José Trevisol (depoimentos); Alde<strong>no</strong>n BorgesMoraes, Gediel Thomas, Gilberto Cirilo Trevisol, GilsimarOliveira de Andrade e Napoleão Carlos Rocha.Da<strong><strong>do</strong>s</strong> Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira <strong>do</strong> Livro, SP, Brasil)<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> : valorizan<strong>do</strong> as descobertas e iniciativasagroflorestais / [editores Oswal<strong>do</strong> Braga de Souza, Rodrigo Gravina Junqueira] . -- São Paulo: Instituto Socioambiental, 2007.Vários colabora<strong>do</strong>res.ISBN 978-85-85994-46-41. Águas - Brasil 2. Campanha Y Ikatu <strong>Xingu</strong> 3. Matas ciliares - Preservação 4. Nascentes5. Proteção ambiental 6. Recursos naturais - Conservação 7. <strong>Xingu</strong>, Rio (Bacia hidrográfica)I. Souza, Oswal<strong>do</strong> Braga de. II. Junqueira, Rodrigo Gravina.07-8807 CDD-918.172Índices para catálogo sistemático:1. <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> multiplica<strong>do</strong>res <strong>socioambientais</strong> : <strong>Xingu</strong> : Rio : Mato Grosso : Águas ematas : Conservação : Aspectos ambientais918.172


AgradecimentosEm <strong>no</strong>me de toda equipe da campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>,queremos prestar <strong>no</strong>ssos mais sinceros agradecimentos às pessoasque contribuíram para a realização deste trabalho.Aos protagonistas dessa história, os <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>,este livro é de e para vocês!À prefeitura municipal de Canarana, em especial àSecretaria Municipal de Agricultura e Meio Ambiente, na pessoada secretária Eliane de Oliveira Felten, pelo empenho everdadeira parceria estabelecida desde o início da campanha.À Universidade <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Mato Grosso (Unemat), Campus NovaXavantina, pelo pronto atendimento às demandas da formação.Ao Núcleo Maturi Ecologia Social que disponibilizou gentilmentereferenciais e exercícios <strong>do</strong> seu acervo trabalha<strong><strong>do</strong>s</strong> ao longo da formaçãoAos profissionais convida<strong><strong>do</strong>s</strong> que trouxeram importantes contribuições aolongo <strong>do</strong> processo: Natália Yvanauskas, <strong>do</strong> Instituto de Pesquisas e Estu<strong><strong>do</strong>s</strong>Florestais (IPEF), Daniel Nepstad, <strong>do</strong> Instituto de Pesquisa Ambiental daAmazônia (IPAM), Raul Silva Telles <strong>do</strong> Valle e Márcio Santilli <strong>do</strong> ISA.Aos <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> Arman<strong>do</strong> Menin, Édemo Côrrea, Ricar<strong>do</strong>Batista, Carlos Grüm e Josuel Olegário <strong><strong>do</strong>s</strong> Santos, que gentilmente cederemáreas em suas propriedades para os experimentos práticos.Aos <strong>no</strong>ssos parceiros institucionais e financeiros: OrganizaçãoIntereclesiástica para Cooperação ao Desenvolvimento (Icco) eUnião Européia, por acreditarem nessa empreitada e terem cedi<strong>do</strong>tempo da equipe técnica na forma de contrapartida.E, finalmente, ao Fun<strong>do</strong> Nacional <strong>do</strong> Meio Ambiente (FNMA),que se mostrou muito mais <strong>do</strong> que um financia<strong>do</strong>r, na pessoa deSimone Gallego, que dividiu incertezas, alegrias e trabalhoujunto co<strong>no</strong>sco para que esse projeto acontecesse.


‘Y Ikatu tem a ver com genteO Rio <strong>Xingu</strong> nasce <strong>no</strong> Mato Grosso e atravessa o Pará até desembocar<strong>no</strong> Rio Amazonas ao longo de 2,7 mil quilômetros. Localizada <strong>no</strong> <strong>no</strong>rdestemato-grossense, a região de suas cabeceiras abriga trechos ainda preserva<strong><strong>do</strong>s</strong>de Cerra<strong>do</strong>, Floresta Amazônica e áreas de transição. Também é habitadapor 10 mil índios, de 18 povos diferentes, que fizeram <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong> a base desua sobrevivência e de sua cultura. É a casa ainda de mais de 250 mil nãoindígenas,que constituíram ali um importante pólo agropecuário.A área está ameaçada, <strong>no</strong> entanto. As nascentes <strong>do</strong> rio sofrem com oprocesso acelera<strong>do</strong> de uso e ocupação <strong>do</strong> território. Várias delas já secarampor causa <strong>do</strong> desmatamento e das queimadas. Até 2005, foram desmata<strong><strong>do</strong>s</strong>na região cerca de 300 mil hectares de matas ciliares, vegetaçãoque margeia e protege os cursos d´água.A Campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong> nasceu para proteger e recuperar as nascentese as matas ciliares <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>. De forma i<strong>no</strong>va<strong>do</strong>ra, reúne índios,produtores rurais, movimentos sociais e gover<strong>no</strong>s. Em outubro de 2004,em Canarana (MT), 340 pessoas de dezenas de organizações da sociedadecivil reuniram-se para traçar as estratégias da mobilização. Durante oevento, foi escolhi<strong>do</strong> a expressão ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong> – “água boa, água limpa<strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>”, na língua Kamaiurá.Várias ações estão sen<strong>do</strong> desenvolvidas pela campanha. O seu focoé a água e a tônica de seus projetos-piloto é a recuperação florestal. Tãoimportante quanto plantar árvores – ou deixar a vegetação regenerar-senaturalmente – em uma região com grandes áreas de passivos ambientais,porém, é criar condições para valorizar formas de organização e produçãosocioambiental e eco<strong>no</strong>micamente sustentável em um território.


E reverter o caráter predatório que marcou o processo de ocupação ede produção nessa região – assim como em muitas outras <strong>do</strong> País – dependede uma mudança cultural.Um passo fundamental para isso é apoiar sistematicamente a formaçãode pessoas e, com isso, fomentar processos de aprendizagem de lideranças,agricultores familiares, professores, técnicos, enfim, aqueles que fazem ahistória <strong>do</strong> lugar. Por mais que a campanha disponha de recursos paraprojetos, de quadros profissionais e de técnicas apropriadas à recuperaçãoflorestal em diversas situações concretas de degradação, de apoios entreos diferentes segmentos sociais e econômicos da região e de visibilidadepública em outras partes <strong>do</strong> país, ela somente poderá chegar aos seus melhoresresulta<strong><strong>do</strong>s</strong> pelo engajamento de pessoas qualificadas que possamdisseminar <strong>no</strong>vas atitudes em relação ao território e aos recursos naturais.A formação de <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> promovida pela campanha‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong> não foi um processo apenas formal, diletante ou teórico.Não se confi<strong>no</strong>u a quatro paredes. Não se limitou a ensinar conteú<strong><strong>do</strong>s</strong>.Foi muito além, motivou pessoas a colocar as mãos na massa e multiplicouações concretas nas suas áreas de atuação. Viabilizou experiênciasi<strong>no</strong>va<strong>do</strong>ras e marcantes nas vidas dessas pessoas. Os <strong>agentes</strong> forma<strong><strong>do</strong>s</strong>constituem hoje o primeiro time de militantes da campanha, que pertencea eles e a tantos que possam alimentar-se da sua influência criativae compartilhar de <strong>no</strong>vos <strong>no</strong>vos padrões sócio-culturais e ambientais.MARCIO SANTILLICoordena<strong>do</strong>r pelo Instituto Socioambiental (ISA)da Campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>


Rio <strong>Xingu</strong>. Pedro Martinelli/ISA


ApresentaçãoA presente publicação tem o objetivo de contar os processos e osresulta<strong><strong>do</strong>s</strong> da formação <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> multiplica<strong>do</strong>res <strong>socioambientais</strong> promovidapela campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong> e seus parceiros, na região dascabeceiras <strong>do</strong> Rio <strong>Xingu</strong> (MT), <strong>no</strong> âmbito <strong>do</strong> edital 002/2004 de <strong>Formação</strong>de Agentes Multiplica<strong>do</strong>res, Assistência Técnica e Extensão Ruralem Atividades Florestais aos Agricultores Familiares <strong>no</strong> Bioma Cerra<strong>do</strong><strong>do</strong> Fun<strong>do</strong> Nacional <strong>do</strong> Meio Ambiente (FNMA).Pretendemos alcançar tanto os que querem conhecer e aprender comum processo formativo <strong>do</strong> gênero, os profissionais da educação, professorese professoras, quanto os gestores públicos e produtores rurais; em especial, osamantes da terra e da água, guia<strong><strong>do</strong>s</strong> pela vontade de conhecer, (re)conhecer,significar, (re)significar e, numa clara intenção de valorizar a riqueza da diversidadesocioambiental, produzir utilizan<strong>do</strong> os atributos da natureza.Queremos que este trabalho seja um convite a entrar na realidadede pessoas que fizeram, fazem e continuarão fazen<strong>do</strong> cada dia mais ahistória de uma região onde pre<strong>do</strong>mina uma diversidade socioambientalraramente encontrada por este Brasil afora. O <strong>Xingu</strong> de to<strong><strong>do</strong>s</strong> precisa depessoas como esses <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> que abriram suas mentes eseus corações para enxergar o <strong>no</strong>vo e fazer dessa região um exemplo dedesenvolvimento territorial sustentável.A obra está dividida em duas partes. A primeira descreve o percursoformativo desde a concepção da idéia até os resulta<strong><strong>do</strong>s</strong> e lições aprendi<strong><strong>do</strong>s</strong>em to<strong>do</strong> o processo, passan<strong>do</strong> pelos momentos presenciais, perío<strong>do</strong>entre as oficinas, temas, conteú<strong><strong>do</strong>s</strong>, desafios. A segunda relata, em grandeparte nas palavras <strong><strong>do</strong>s</strong> próprios <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>, suas caminhadasantes, durante e após a formação; suas iniciativas, suas tomadasde decisão e aprendiza<strong><strong>do</strong>s</strong>. Duas partes que se tornam uma de maneiracomplementar e interdependente.Boa Leitura !RODRIGO GRAVINA PRATES JUNQUEIRACoordena<strong>do</strong>r <strong>do</strong> projeto e coordena<strong>do</strong>r-adjunto<strong>do</strong> Programa <strong>Xingu</strong> <strong>do</strong> ISA


Número de <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> forma<strong><strong>do</strong>s</strong> por municípiona região da Bacia <strong>do</strong> Rio <strong>Xingu</strong> <strong>no</strong> Mato Grosso


Inician<strong>do</strong> a caminhadaO Edital Cerra<strong>do</strong> <strong>do</strong> Fun<strong>do</strong> Nacional <strong>do</strong> Meio Ambiente (FNMA)foi uma oportunidade para pôr em prática o projeto intitula<strong>do</strong> “Fomentoà cultura florestal <strong>no</strong> Cerra<strong>do</strong> mato-grossense através da formação de<strong>agentes</strong> multiplica<strong>do</strong>res na bacia <strong>do</strong> rio <strong>Xingu</strong>”. Criar e potencializar iniciativasque aliem conservação e recuperação <strong><strong>do</strong>s</strong> recursos naturais compotencial fonte de geração de renda, valorizan<strong>do</strong> os talentos locais e acultura agroflorestal, foi o objetivo central a ser alcança<strong>do</strong>.Na Bacia <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>, foram seleciona<strong><strong>do</strong>s</strong> futuros <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>de seis municípios – Nova Xavantina, Água Boa, Querência, Canarana,Ribeirão Cascalheira e Gaúcha <strong>do</strong> Norte.Qualquer processo que envolva o desenvolvimento de iniciativas <strong>socioambientais</strong>,e tenha como pressuposto o protagonismo de gente daterra, não pode prescindir da formação de multiplica<strong>do</strong>res, com objetivode trabalhar um conjunto de habilidades conceituais, sociais e técnicaspara enfrentar tamanho desafio. Nesta formação, considerou-se que oprocesso formativo precisa caminhar tanto <strong>no</strong> senti<strong>do</strong> de que a atividadeprodutiva aconteça com resulta<strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>socioambientais</strong> e econômicos, quantoque haja um amadurecimento profissional e organizacional, com adefinição clara da sua razão de ser (propósitos, missão), processos de gestão(comunicação, tomada de decisão, poder e participação), gestão <strong><strong>do</strong>s</strong>recursos existentes, fortalecimento de lideranças e das relações sociais.Assim, definiram-se <strong>do</strong>is focos na formação:PRODUTIVO E TÉCNICO: água, restauração florestal, agrofloresta, sucessãoecológica, sementes florestais (identificação, coleta, beneficiamento,armazenamento) e frutíferas <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>, mudanças climáticas e suarelação com desmatamento, legislação florestal, Pronaf Florestal e outrasmodalidades de crédito.ORGANIZACIONAL E SOCIAL: processos inter<strong>no</strong>s e exter<strong>no</strong>s da liderança,cooperação e confiança, relações, parcerias e habilidades sociais.


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Conceitos e formas de fazer<strong>do</strong> processo formativoO indivíduo e a iniciativaA problemática socioambiental tem duas visões pre<strong>do</strong>minantes.Para uns, a causa está <strong>no</strong> indivíduo, para outros a causa está nascondições sociais. Para os que defendem a primeira, a superação <strong><strong>do</strong>s</strong>males sociais só poderá ser alcançada por meio da evolução moral<strong>do</strong> ser huma<strong>no</strong>, levan<strong>do</strong>-o à superação <strong>do</strong> egoísmo, <strong>do</strong> qual os malessociais são consequência. Enquanto a pessoa não se desenvolver vaigerar condições sociais adversas. A visão defensora que a causa estánas condições sociais argumenta que enquanto não se modificarem asestruturas sociais que provocam a desigualdade não haverá condiçõespara o ser huma<strong>no</strong> desenvolver-se.Desse mo<strong>do</strong>, propôs-se um trabalho que integre ambas dimensões.Assim, acredita-se ser possível o desenvolvimento saudável de ações emqualquer campo de atuação: socioambiental, ambiental, social, políticoe econômico.O processo de formação de multiplica<strong>do</strong>res <strong>socioambientais</strong> partiudessa visão integrada das iniciativas e <strong>do</strong> ser huma<strong>no</strong> que permeia to<strong><strong>do</strong>s</strong>os estágios <strong>do</strong> processo de desenvolvimento. De um la<strong>do</strong>, grupose organizações são “entidades vivas” que precisam desenvolver-se conscientemente,por meio da mobilização criativa das contribuições de seusintegrantes. É dessa forma que podem realizar sua missão ou razão deser <strong>no</strong> mun<strong>do</strong>. Organizações conscientes, bem estruturadas e integradas,permitem um espaço para o desenvolvimento de seus colabora<strong>do</strong>res volta<strong>do</strong>para qualidade, eficácia e sustentabilidade.Por outro la<strong>do</strong>, cada ser huma<strong>no</strong> é um ser único em processo deconstante desenvolvimento físico, da alma e espiritual, em busca darealização de seu senti<strong>do</strong> na vida. Esse caminho é trilha<strong>do</strong> por meiode seu trabalho e convívio em família, grupos, organizações, comunidadese sociedade como um to<strong>do</strong>. O anseio por tal desenvolvimento éinerente a cada indivíduo e grupo. Crian<strong>do</strong>-se para tal o ambiente e a<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 15


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>oportunidade, pessoas de to<strong><strong>do</strong>s</strong> os níveis da organização reconhecem ospassos que precisam ser da<strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>no</strong> aperfeiçoamento de suas capacidades.Nos grupos, o ser huma<strong>no</strong> defronta-se com questões relacionadas aosrecursos (infraestrutura, recursos financeiros, equipamentos); processos(as atividades diárias, de venda, produção); relações (com o próprio grupode trabalho, com <strong>do</strong>a<strong>do</strong>res); identidade (com as motivações e ideais,vontades e crenças) e, finalmente, pode até ser que o grupo ou organizaçãotenha uma Missão quan<strong>do</strong>, além de ganhar o seu sustento, quercontribuir com algo maior.Premissas meto<strong>do</strong>lógicasO conceito de aprendizagem foi compreendi<strong>do</strong> aqui como uma mediaçãopara a apropriação de <strong>no</strong>vos conhecimentos, o que possibilita aos sujeitos,informalmente articula<strong><strong>do</strong>s</strong> ou organiza<strong><strong>do</strong>s</strong> institucionalmente, elaborarprocessos próprios de mudanças relaciona<strong><strong>do</strong>s</strong> a suas ações e até elementosconstituintes de sua identidade, como princípios, propósitos e valores.Essencialmente, o aprendiza<strong>do</strong> e mudança acontecem em <strong>do</strong>is caminhos:da descoberta (a partir da vida/realidade) e o da instrução. Durantea formação, trabalhamos a partir desses <strong>do</strong>is eixos e dan<strong>do</strong> ênfase aosdiversos canais de aprendizagem: pensar, sentir e agir/querer.Isso <strong>no</strong>s remete a algumas questões. Como é que os adultos se desenvolvem?Nós <strong>no</strong>s desenvolvemos à medida que aprendemos. E o que éque <strong>no</strong>s ensina, <strong>do</strong> que é que aprendemos? Da <strong>no</strong>ssa própria experiência.A qualidade <strong>do</strong> que fazemos está em função direta <strong>do</strong> que aprendemose o que aprendemos depende fundamentalmente da experiência que extraímosdaquilo que fazemos. Podemos representar isso como um movimentode respiração entre o que fazemos e o que aprendemos.Por meio <strong>do</strong> <strong>no</strong>sso “aprender”, nós <strong>no</strong>s desenvolvemos a nós mesmose isto <strong>no</strong>s permite aprimorar, melhorar o <strong>no</strong>sso “fazer”. Pelo <strong>no</strong>sso fazer,transformamos a realidade e só a partir desta experiência é que podemos<strong>no</strong>vamente aprender.No entanto, temos grande dificuldade e até uma resistência naturalem aprender. Aprender significa mudar e preferimos não ter de mudar.Queremos mudar a situação sem mudar a nós mesmos. Por isso mesmomuitos <strong><strong>do</strong>s</strong> problemas que enfrentamos tendem a se repetir.16 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>A DINÂMICA BÁSICA DO DESENVOLVIMENTOCONSISTE NA INTEGRAÇÃO ENTREAPRENDEREMPREENDER/FAZERNúcleo Maturi Ecologia SocialRESULTANDO EMDesenvolvimento<strong>do</strong> indivíduoDesenvolvimento das condições<strong>socioambientais</strong>DENTROIndivíduoFORAOutro/Grupo/Organização/SociedadeSem aprendizagem não existe desenvolvimento. Se quisermos tomarnas mãos as rédeas <strong>do</strong> próprio desenvolvimento – e isto é imprescindível<strong>no</strong> campo socioambiental – devemos “aprender a aprender”, como indivíduos,como grupos, como instituições, como sociedade.Assim, a proposta de formação de “forma<strong>do</strong>res e multiplica<strong>do</strong>res” foiestruturada em momentos presenciais (módulos) e não-presenciais (entremódulos)apoia<strong><strong>do</strong>s</strong> por assessoria, que possibilitaram aos participantesvivenciar os <strong>do</strong>is movimentos: aprender e fazer, fazer e aprender.Componentes da aprendizagemA aprendizagem tem três componentes fundamentais e precisa <strong><strong>do</strong>s</strong>eu conjunto para ser completa. O primeiro diz respeito ao “conhecimento”,o entendimento. O indivíduo só é capaz de lidar com aquiloque conhece, que entende. Se não entende nada de plantas, é difícil pretenderser agricultor ou jardineiro. Neste caso, é preciso ter pelo me<strong>no</strong>suma <strong>no</strong>ção básica <strong>do</strong> que uma planta necessita para desenvolver-se. Damesma forma, precisa-se ter pelo me<strong>no</strong>s uma <strong>no</strong>ção básica das leis que<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 17


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>regem o desenvolvimento se quiser cuidar disto <strong>no</strong> nível <strong>do</strong> convívio e<strong>do</strong> trabalho com outras pessoas, se pretende contribuir para o andamentosaudável da iniciativa que empreende ou apóia.O segun<strong>do</strong> diz respeito à “habilidade”, o saber-fazer. O engenheiroagrô<strong>no</strong>mo pode conhecer a fun<strong>do</strong> a situação de cultivares de espéciesagrícolas, mas para ser um bom profissional terá, também, que desenvolvercertas habilidades <strong>no</strong> manejo das técnicas de plantio ou em examinara vida das plantas e seus processos. As lideranças e multiplica<strong>do</strong>res <strong>socioambientais</strong>devem também desenvolver certas habilidades, como a desaber escutar, se expressar, coordenar reuniões, tomar decisões, lidar comconflitos, além das habilidades específicas referentes a técnicas e manejoagroflorestais.O terceiro componente (que na realidade se coloca como media<strong>do</strong>rde ambos os anteriores) é a “postura”, que diz respeito à maneira comose coloca na situação, de forma passiva ou ativa. Disto também dependeo quanto se vai aprender ou deixar de aprender.O processo de formação, a aprendizagem durante os perío<strong><strong>do</strong>s</strong> nãopresenciaisé tão ou mais importante que a aprendizagem durante asoficinas. E isto depende fundamentalmente da postura de comprometimentode cada um com seu próprio processo de aprendizagem.Só se aprende exercitan<strong>do</strong>, fazen<strong>do</strong> exercícios, repetin<strong>do</strong> as ações necessáriasaté se adquirir <strong>do</strong>mínio de sua execução. Durante o processode “aprender a aprender” deve-se exercitar a aprendizagem, isto é, executá-lade forma mais organizada, estruturada, sistemática e consciente.Esta formação buscou criar condições para o desenvolvimento destes trêscomponentes da aprendizagem.18 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>O Percurso FormativoO poder da formação na açãoDivulgação e SeleçãoA divulgação da formação foi realizada em seis municípios seleciona<strong><strong>do</strong>s</strong>pelos parceiros <strong>do</strong> projeto. Os interessa<strong><strong>do</strong>s</strong> deveriam inscrever-se poruma pequena ficha, onde deveriam contar um pouco de sua trajetóriaprofissional e o porquê <strong>do</strong> interesse de participar. Desde o início, causoucerto espanto a duração das oficinas, de três ou quatro dias, já que ocostume na região eram convites e convocações para “cursos” de um ou<strong>do</strong>is dias. Com certa <strong><strong>do</strong>s</strong>e de estranheza por parte <strong><strong>do</strong>s</strong> candidatos, a coordenação<strong>do</strong> projeto recebeu 103 inscrições, de diferentes públicos. Combase em critérios objetivos de ocupação, profissão, interesse, município,idade e gênero, chegamos a uma lista de 49 participantes.TABELA 1. Número de inscritos/seleciona<strong><strong>do</strong>s</strong>/freqüentan<strong>do</strong> por municípioNº MUNICÍPIO INSCRITOS SELECIONADOS INICIARAM01 Gaúcha <strong>do</strong> Norte 04 04 0402 Querência 17 07 0603 Ribeirão Cascalheira 16 07 0604 Nova Xavantina 10 08 0805 Água Boa 15 06 0606 Serra Nova Dourada 02 0 007 Bom Jesus <strong>do</strong> Araguaia 02 0 008 Canarana 37 21 19TOTAL 103 53 49TABELA 2. Perfil da TurmaPROFISSÃO/OCUPAÇÃO Nº DE PARTICIPANTES PERCENTUAL (%)Agricultor Familiar 14 28Professor 11 23Técnico agropecuário / Agrícola 10 21Biólogo 05 10Estudante universitário 04 8Engenheiro Agrô<strong>no</strong>mo/florestal 02 4Zootecnista 01 2Outros 02 4TOTAL 49 100<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 19


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>A tabela 2 demonstra o perfil <strong>do</strong> grupo, dividi<strong>do</strong> por ocupação e profissão.O encontro entre agricultores familiares, professores, profissionaisda área agrícola e florestal permitiu criarmos um ambiente diversifica<strong>do</strong>com experiências de naturezas distintas. Esse mosaico de situações e anseiostrouxe uma qualidade <strong>no</strong>va para a formação. Chegar a uma justaequação das diferenças e desejos seria um grande desafio.Do total de 49 participantes da primeira oficina, 42 chegaram até ofinal da formação.Módulos e entremódulosO processo de formação foi estrutura<strong>do</strong> de maneira que o participantetivesse a oportunidade de analisar o contexto da sua realidade, entrarem contato com <strong>no</strong>vos conceitos e referenciais liga<strong><strong>do</strong>s</strong> à questão socioambiental,com especial ênfase na abordagem florestal e agroflorestal,voltar a analisar seu contexto e planejar uma iniciativa onde o conteú<strong>do</strong>trabalha<strong>do</strong> pudesse ser coloca<strong>do</strong> em prática.A realização dessa iniciativa – como um “experimento” – foi a atividadeentremódulos. Para tanto, uma assessoria técnica local apoiou os<strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>, “animan<strong>do</strong>” o desenvolvimento de seu trabalho.A reflexão sobre a prática e o seu replanejamento visaram possibilitaro enraizamento <strong>do</strong> aprendiza<strong>do</strong>. O intercâmbio com outras experiênciastambém foi um recurso didático utiliza<strong>do</strong>.Imagem Geral <strong>do</strong> Processo Formativo20 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Cada módulo presencial teve duração de 32 horas, com intervalosaproxima<strong><strong>do</strong>s</strong> de três meses entre eles. Com essa previsão, esperava-se queo projeto fosse concluí<strong>do</strong> em 12 meses, totalizan<strong>do</strong> 216 horas. Entretanto,o interesse e o envolvimento <strong><strong>do</strong>s</strong> participantes criaram as condiçõespara a realização de um módulo extra, fundamentalmente prático, emum <strong><strong>do</strong>s</strong> lotes de assentamento de um agricultor familiar participante,além de uma oficina final de elaboração de projetos seguida da formatura<strong>do</strong> grupo. Tivemos, então, mais 32 horas de trabalho, fechan<strong>do</strong> 248horas formativas presenciais. A duração <strong><strong>do</strong>s</strong> momentos entremódulosvariou em função da iniciativa de cada participante, mas podemos afirmarque, na média, a dedicação aproximou-se ao que foi investi<strong>do</strong> nasoficinas presenciais.O processo pode ser também visualiza<strong>do</strong> nas duas imagens que seseguem.Figura 1Figura 2<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 21


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Abrin<strong>do</strong> as portas ao desconheci<strong>do</strong>A primeira oficina ocorreu em dezembro de 2005 <strong>no</strong> município deCanarana. Teve como objetivo sensibilizar os participantes para o processoem si, alinhar as diferentes expectativas, apresentar os objetivos<strong>do</strong> programa de formação, bem como iniciar a formação <strong>do</strong> grupo.Além disso, também introduziu alguns conceitos e processos <strong>socioambientais</strong>básicos, como a vegetação <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong> e da floresta local(de<strong>no</strong>minada Floresta Estacional Perenifólia); ciclo da água; desmatamento,queimadas e chuva; e introdução aos sistemas agroflorestais.Essa linha formativa daria o ritmo daqui para frente na perspectiva deaprofundar cada tema.Em termos de prática de campo, visitamos áreas de nascentes e matasciliares preservadas <strong>no</strong> sítio <strong>do</strong> agente Josuel Olegário <strong><strong>do</strong>s</strong> Santos, emcontraste com a nascente degradada observada na entrada da cidade. Adiferença entre as duas situações permitiu levantar questões mobiliza<strong>do</strong>rasa serem trabalhadas ao longo das oficinas.CompromisssosPrecisávamos ainda definir os acor<strong><strong>do</strong>s</strong> de participação na continuidadede to<strong>do</strong> o processo, isto é, as condições, consequências e compromissosa serem assumi<strong><strong>do</strong>s</strong> por pessoa, grupo e organização. Ao final, estavaprevisto o planejamento das tomadas de iniciativas – as atividadesentremódulos. A resposta a essa participação foi estimulada a partir dealgumas questões-chave:Como que eu quero e posso me comprometer(participar das oficinas, trabalhar <strong>no</strong> entremódulo, multiplicaro que foi trabalha<strong>do</strong> na oficina etc)?O que eu posso oferecer (habilidades, recursos etc)?Quais outras contribuições tenho a dar?Quero mesmo continuar o processo formativo? Em que condições?Posicionamento final...22 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Além de combinar as espécies <strong>no</strong> espaço, combinam-se os consórcios <strong>no</strong> tempo, assimcomo ocorre na sucessão natural de espécies, onde os consórcios sucedem-se uns após outros,num processo dinâmico, dependen<strong>do</strong> <strong>do</strong> ciclo de vida das espécies.As espécies podem ser classificadas em grupos ecológicos ou sucessionais e essa classificaçãopode se dar de várias formas. Podemos classificá-las em grupos quanto ao tempo de vida etambém à exigência das plantas a condições de solos mais ricos ou mais pobres.Consórcio é um conjunto de espécies que apresentam tempo de vida semelhante, ou seja,que dura mais ou me<strong>no</strong>s o mesmo tempo <strong>no</strong> sistema. Ex. 1: milho, feijão de corda e abóbora;ex. 2: abacaxi, mandioca e mamão; ex. 3: urucum, ingá de macaco, pupunha e xixá; ex. 4:cacau, cupuaçu, bacaba, cajá, pequi. Os consórcios podem ser mais diversifica<strong><strong>do</strong>s</strong>, com <strong>no</strong>vasespécies que desempenham as mesmas funções de outras. Por exemplo: em vez de pequi,pode-se ter também um ipê-roxo ou jatobá, cumprin<strong>do</strong> o mesmo papel.Estrato é a altura da planta em relação às plantas <strong>do</strong> mesmo consórcio. Ex. 1: milho (estratoalto), feijão de corda (estrato médio) e abóbora (estrato baixo); ex. 2: abacaxi (estratobaixo), mandioca (estrato médio) e mamão (estrato alto); ex. 3: urucum (baixo), ingá de macaco(médio), pupunha (alto), guapuruvu (emergente); ex. 4: cacau (baixo), cupuaçu (médio),bacaba (médio/alto), cajá (alto), pequi (emergente).Densidade diz respeito ao número de indivíduos por área. Recomenda-se que as culturasanuais e semi-perenes sejam plantadas <strong>no</strong> espaçamento tradicionalmente utiliza<strong>do</strong>. Asespécies arbóreas deverão ser plantadas preferencialmente por sementes, em alta densidade(de mo<strong>do</strong> a se estabelecer 10 árvores por metro quadra<strong>do</strong>). O manejo fará com que as árvoresatinjam o espaçamento recomenda<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> adultas, ou seja, com o tempo haveráraleamento das plantas me<strong>no</strong>s vigorosas. Essa prática possibilita o avanço da sucessão, nãodeixan<strong>do</strong> que haja retrocesso com a ocupação <strong>do</strong> espaço por indivíduos de espécies <strong>do</strong> inícioda sucessão.Além disso, a alta densidade oferece oportunidade de se dinamizar o sistema, favorecen<strong>do</strong>oferta de matéria orgânica e conseqüentemente dinamizan<strong>do</strong> a vida <strong>do</strong> solo e a ciclagem<strong><strong>do</strong>s</strong> nutrientes. Na medida em que crescem, as árvores vão-se ralean<strong>do</strong> para não passar <strong>do</strong>percentual de fechamento das copas para cada estrato. Por exemplo, numa mata madura, opequi, que é uma espécie emergente, não ocorre de maneira que suas copas se toquem, pelocontrário, a densidade de indivíduos é baixa e se aproxima a uma cobertura de copa de 15%a 25% da área.FABIANA PENEIREIROConsultora em agrofl oresta24 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Dinâmica realizadadurante a primeiraoficinaSem dúvida, o grande desafio desse primeiro encontro, assim tambémcomo de toda formação, foi o de fomentar iniciativas que tivessem umpotencial mínimo de mobilização e sustentabilidade a partir da compreensãosobre o papel <strong>do</strong> agente multiplica<strong>do</strong>r. Todas as ações que pudessemvir a ser desencadeadas dependiam exclusivamente <strong>do</strong> compromissode cada forman<strong>do</strong>! Daí o segun<strong>do</strong> desafio a ser enfrenta<strong>do</strong>: o de iniciaro processo de formação de grupos de trabalho que pudessem planejar eexecutar essas iniciativas. Tratava-se, portanto, não apenas de estimulara reflexão sobre alguns <strong><strong>do</strong>s</strong> problemas <strong>socioambientais</strong> de cada comunidadee pequenas ações que apontassem para caminhos alternativos. Erapreciso também incentivar o sentimento de fazer parte de um conjuntode pessoas dispostas a realizar um determina<strong>do</strong> trabalho, compartilhan<strong>do</strong>desejos e vontades em um propósito comum.Para desenvolver esse processo, realizamos uma dinâmica para estimularrespostas e reações a partir de <strong>no</strong>vas questões importantes. Em primeirolugar: “quais são as necessidades para intervir socioambientalmente na suarealidade?” Depois: “que tipo de habilidades são fundamentais para realizartal tarefa?”. Do ponto de vista conceitual, conforme os referenciaisteóricos que já mencionamos, falamos sobre a capacidade de pensar, descobrir,analisar (conceitos, idéias, instrução); de sentir (as atitudes e posturasfrente às situações e relações); de saber-fazer (prática, técnica).<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 25


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Instigar os participantes a organizar suas idéias, planejar suas ações ecolocarem-nas <strong>no</strong> papel assustou um pouco boa parte deles. A aberturapara o <strong>no</strong>vo, para a cultura florestal e agroflorestal foi até certo pontoimpactante. “O que vocês querem que eu faça? Têm recursos para quê?Mas eu não sei fazer isso...” Perguntas como essas comprovaram, naquelemomento, que a i<strong>no</strong>vação, fora <strong><strong>do</strong>s</strong> padrões correntes, acabou geran<strong>do</strong>um pouco de desconfiança e dúvida. Durante a oficina, surgiram reaçõesque expressavam diferentes posicionamentos.Vocês estão de parabéns! O que chamou minha atenção foi a“valorização <strong>do</strong> ser huma<strong>no</strong>. Vocês dão atenção, é bom pra autoestimada gente. Saímos daqui com a bateria carregada. ”Eu vim com um enfoque e a gente abriu um leque.“Vim volta<strong>do</strong> pro Cerra<strong>do</strong>, vimos muita coisa. ”Muita coisa já vimos, já estudamos, mas não está“sen<strong>do</strong> uma repetição, ajuda a colocar as idéias <strong>no</strong> lugar,a planejar melhor as ações. ”Tu<strong>do</strong> o que vimos até agora, em geral são coisas que“passamos por cima e não percebemos. Vamos começar agoraa observar essas coisas que estão <strong>no</strong> dia- a- dia. ”Atualizei vários conceitos. Acho que estamos discutin<strong>do</strong>“conceitos moder<strong>no</strong>s, mas falta qual o limite <strong>do</strong> crescimentotanto sócio-econômico, populacional... ”“Foi feito nivelamento, mas acho que pros próximosencontros precisamos de mais conceitos e mais habilidadestécnicas. Quero fazer um mini-piloto de meio hectare paraexercitar na prática. ”26 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Visitas de camporealizadas durantea primeira oficinaEm termos de compromissos genéricos com a formação, houve umaampla resposta <strong>no</strong> senti<strong>do</strong> de continuar participan<strong>do</strong> das oficinas. Em relaçãoàs atividades entremódulos, alguns exemplos de acor<strong><strong>do</strong>s</strong> firma<strong><strong>do</strong>s</strong> pelosforman<strong><strong>do</strong>s</strong> foram: apoiar iniciativas <strong>socioambientais</strong> já em curso; implantaráreas demonstrativas de reflorestamento, sistemas agroflorestais e viveiros;divulgar os conteú<strong><strong>do</strong>s</strong> e práticas vistos na formação; desenvolver ações educativase de mobilização nas escolas e comunidades; entre vários outros.A possibilidade de receber peque<strong>no</strong>s aportes técnicos e financeirosmediante apresentação de demanda justificada não foi suficiente paraanimar uma pequena parte <strong><strong>do</strong>s</strong> forman<strong><strong>do</strong>s</strong> a materializarem o que foiplaneja<strong>do</strong>. Pela <strong>no</strong>vidade e um pouco pela falta de entendimento sobre aformação e seus fins, alguns deles não usaram todas as suas capacidadese não acessaram to<strong><strong>do</strong>s</strong> os apoios possíveis <strong>no</strong> primeiro perío<strong>do</strong> entremódulos,entre dezembro de 2005 e março de 2006.Seria preciso ainda quebrar a barreira de certa descrença de que poderiamdesenvolver uma iniciativa própria com suporte de outros para queos participantes desencadeassem timidamente uma reflexão sobre quecaminho percorrer, observan<strong>do</strong> o que já havia si<strong>do</strong> feito e o que seria necessárioavançar. Por outro la<strong>do</strong>, eram evidentes ali um grande potencialpara encarar desafios e muita vontade de fazer. Cerca de 80% daquiloque foi planeja<strong>do</strong> para o primeiro perío<strong>do</strong> entremódulos foi cumpri<strong>do</strong>pelos participantes. Estabeleceu-se também um clima de confiança entreeles e a coordenação <strong>do</strong> projetoCaminhan<strong>do</strong>...No final <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> de chuvas de 2006, em março, ocorreu a segundaoficina. Para <strong>no</strong>ssa surpresa e satisfação, estavam presentes85% <strong><strong>do</strong>s</strong> que estiveram na primeira. O desafio era ainda maior: atenderas <strong>no</strong>vas expectativas que se apresentavam em relação aos temas<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 27


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>e processos inicia<strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>no</strong> primeiro encontro. A oficina foi dividida basicamenteem três linhas condutoras:1) Seguir <strong>no</strong> trabalho com os sistemas agroflorestais, suas implicações,condições e resulta<strong><strong>do</strong>s</strong>, relacionan<strong>do</strong>-os com a prática desucessão ecológica; a introdução aos diferentes méto<strong><strong>do</strong>s</strong> de restauraçãoflorestal;2) Continuar o processo de formação <strong>do</strong> grupo e desenvolvimentode lideranças por meio de práticas que exercitassem habilidadessociais, como por exemplo o exercício Falar e Ouvir (pág. 30);3) Mecanismos de financiamento de atividades florestais, especialmentea apresentação e discussão sobre o Programa Nacional deFortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) Florestal;4) Monitoramento e desenvolvimento <strong><strong>do</strong>s</strong> experimentos práticos,bem como replanejamento <strong>do</strong> <strong>no</strong>vo perío<strong>do</strong> entremódulos.Entre as atividades práticas, foram realiza<strong><strong>do</strong>s</strong> estu<strong><strong>do</strong>s</strong> de mata em diferentesestágios sucessionais; a implantação de uma agrofloresta na propriedade<strong>do</strong> Sr. Carlos Grün, um <strong><strong>do</strong>s</strong> participantes; e o plantio em uma Área dePreservação Permanente (APP) degradada perto <strong>do</strong> centro de Canarana.A partir das <strong>no</strong>vas dinâmicas, das contribuições conceituais e dessesexercícios práticos, foram sen<strong>do</strong> seleciona<strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>no</strong>s debates <strong>do</strong> grupoalguns temas-chaves que apontavam para o amadurecimento das estratégiase alvos das atividades entremódulos. Entre esses pontos centrais,estavam os sistemas agroflorestais, a importância e proteção à biodiversidade,o melhor aproveitamento <strong><strong>do</strong>s</strong> espaços, manejo, o foco nas plantas<strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>, restauração de matas ciliares e nascentes.Aprendi como cultivar várias plantas ao mesmo tempo emum mesmo terre<strong>no</strong>, aproveitan<strong>do</strong> assim a sobra <strong>do</strong> materialdas próprias plantas como cobertura para o solo, melhoran<strong><strong>do</strong>s</strong>ua qualidade, dispensan<strong>do</strong> assim a necessidade <strong>do</strong> uso deadubos químicos forman<strong>do</strong> um amplo cooperativismo entreas espécies. (Napoleão)28 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Plantio da agrofloresta napropriedade <strong>do</strong> Sr. Carlos,um <strong><strong>do</strong>s</strong> forman<strong><strong>do</strong>s</strong>Exercício deidentificaçãode espéciesComeçou a tomar corpo entre os forman<strong><strong>do</strong>s</strong> a reflexão sobre a importância<strong>do</strong> papel das lideranças <strong>no</strong> processo de desenvolvimento deiniciativas <strong>socioambientais</strong> e <strong>do</strong> conjunto de habilidades necessárias parasua atuação como <strong>agentes</strong> multiplica<strong>do</strong>res. Na avaliação da segunda oficina,foram cita<strong><strong>do</strong>s</strong> como capacidades e aprendiza<strong><strong>do</strong>s</strong> importantes: articulaçãoe diálogo, saber falar e ouvir trabalho em grupo, cooperação enão-competição, o exercício de paciência e persistência, a necessidade deconfiar nas pessoas.A troca de experiências, os debates, o convívio, o entrosamento emesmo o fato de travar <strong>no</strong>vas amizades trouxeram, nas palavras de algunsparticipantes, estímulo ao desenvolvimento das ações entremódulos. Aofinal da oficina, pôde-se <strong>no</strong>tar claramente que os forman<strong><strong>do</strong>s</strong> começavama se constituir como um grupo, enveredan<strong>do</strong> por um caminho técnico(agro)florestal até então desconheci<strong>do</strong> para muitos.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 29


Quan<strong>do</strong> a frase é muito extensa, só se repetia a última parte.Com o tempo, para reproduzir o que o outro falou, dá tempo“para uma resposta melhor. Dá continuidade ao assunto, com aresposta certa. É preciso saber ouvir para saber responder. ”‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Eu vi o quanto é importante confirmar o que está“ouvin<strong>do</strong>. Às vezes, a gente ouve mas entende erra<strong>do</strong>. ”Quanto mais comprida a conversa parece“que tem me<strong>no</strong>s sabe<strong>do</strong>ria. ”Tenho que me inteirar quem é a pessoa, na dificuldade“dela, pra saber me comunicar. ”Quem estava para a<strong>no</strong>tar não podia“interferir e logo já queria opinar...Ter atenção ao ouvir e ao falar - é proveitoso nesse tipo de“conversa, a linguagem é mais rica, tem que ter argumento.Primeiro parece muito tempo e depois pouco. A conversa ficamais delicada, mais civilizada. O que ajuda: manter o foco <strong>no</strong>outro. O tom de voz também ajuda. ”Minha ansiedade atrapalhou. Já imagi<strong>no</strong> um monte de“coisa e não escuto o que a pessoa está falan<strong>do</strong>... E eu não percebiaisso. Preciso ouvir mais e falar me<strong>no</strong>s. Pensar para falar,não viajar tanto... ”Somos multiplica<strong>do</strong>res, comunica<strong>do</strong>res. Se não reproduzirmosbem, não formos bons ouvintes, pode não adiantar nada...“Em trabalho em grupo é importante ouvir um <strong>do</strong> outro. ”<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 31


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Foi a meto<strong>do</strong>logia de trabalho, os conteú<strong><strong>do</strong>s</strong> teóricos queforam coloca<strong><strong>do</strong>s</strong> em prática... Eu vejo isso como um pontopositivo, onde você capta o interesse das pessoas, o envolvimentoque as pessoas demonstram <strong>no</strong> rosto. Tenho o intuito depassar tu<strong>do</strong> que aprendi a outras pessoas, colocan<strong>do</strong> a teoriae desenvolver a experiência na prática, quan<strong>do</strong> você se tornaum repassa<strong>do</strong>r de informação isso tem de ficar claro é só naprática que você pode transmitir isso. (Ricar<strong>do</strong>)O segun<strong>do</strong> perío<strong>do</strong> entremódulo, entre abril e julho de 2006, foi caracteriza<strong>do</strong>por uma grande demanda por parte <strong><strong>do</strong>s</strong> participantes tanto individualmentequanto em grupos. As iniciativas estavam maduras e mais umaoficina contribuiu para que sentissem confiança e segurança na coordenação,enfim, para que se sentissem mais aptos a solicitar os devi<strong><strong>do</strong>s</strong> apoios. Amaioria desses apoios concentrou-se em visitas técnicas para acompanhar eimplantar hortas e canteiros agroflorestais em comunidades e escolas rurais,dias de campo e palestras sobre temas específicos. Materiais de consumo epeque<strong>no</strong>s equipamentos, como metros de sombrite para viveiro, combustível,bolas de arame, sementes florestais, entre outros, estavam na lista <strong>do</strong>que foi expressivamente demanda<strong>do</strong>. Por volta de 15 iniciativas estavam emfranco andamento nesse perío<strong>do</strong>, envolven<strong>do</strong> metade <strong>do</strong> grupo, o que viriaa trazer <strong>no</strong>vos elementos para a próxima oficina.Co-responsabilidade na açãoA 3 o oficina aconteceu em agosto de 2006 e foi marcada por um programaque buscou atender de forma complementar e integrada, o conjunto dedemandas por conceitos e conteú<strong><strong>do</strong>s</strong> técnicos <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong>. Pretendeu consolidaras bases para as iniciativas realizadas <strong>no</strong>s entremódulos. A presençade alguns convida<strong><strong>do</strong>s</strong>, como Raul Silva Telles <strong>do</strong> Valle e Márcio Santilli,<strong>do</strong> ISA, que trouxeram contribuições <strong>no</strong> campo da legislação florestal eambiental, das mudanças climáticas e sua relação com o desmatamento,completou o ciclo de conteú<strong><strong>do</strong>s</strong> estratégicos da formação, juntamente comum trabalho intenso sobre sementes, de<strong>no</strong>mina<strong>do</strong> “ciranda das sementes”.32 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Cada participante trouxe um punha<strong>do</strong> de sementes,que foram dispostas em círculo e numeradas paraque cada um tentasse identificar a espécie. Foramdistribuídas 74 espécies de sementes. Quase todas elasforam identificadas. Identificar e conhecer as diferentescaracterísticas e usos das espécies são etapasprimordiais para o desenvolvimento de iniciativas derestauração florestal e agroflorestal.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 33


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Uma importante prática desse módulo foi a visita ao viveiro de Canarana(fruto de uma parceria entre ISA e prefeitura local) para realização depráticas de quebra <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> de <strong>do</strong>rmência e germinação da semente.Havia algumas sementes disponíveis que necessitavam de diferentestécnicas de escarificação (retirada da casca), dentre elas: corte comtesoura ou lixa com lima (sucupira, jatobá, olho de cabra), água quente(tamboril, carvoeiro e garapa) e guilhotina (baru). Ainda <strong>no</strong> viveiro,foi mostra<strong>do</strong> como fazer um teste de germinação na sementeira:após quebrar a <strong>do</strong>rmência, distribui-se numa determinada área dasementeira com areia, 100 sementes. Identifica-se o tipo de tratamentoe a data da semeadura. Realiza-se irrigação diária e faz-se a contagemdas sementes germinadas.34 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Partilhar os resulta<strong><strong>do</strong>s</strong>, desafios e aprendiza<strong><strong>do</strong>s</strong> das iniciativas, dasáreas experimentais e <strong><strong>do</strong>s</strong> exercícios práticos constituiu-se como umimportante indica<strong>do</strong>r de que a formação estava sen<strong>do</strong> apropriada pelosparticipantes. A terceira oficina foi um momento decisivo paraque os grupos se firmassem em suas iniciativas respaldadas por <strong>no</strong>vosconhecimentos e experiências. Junto com as dinâmicas e reflexõesvivenciadas nesse terceiro encontro, a coesão fortaleceu individualmentea crença de ser capaz de empreender as ações a que cada umpropunha-se.A exposição das iniciativas de alguns municípios trouxe mais umestímulo. “Então foram esses os instrumentos e estratégias que vocêsusaram? Será que isso pode ser adapta<strong>do</strong> à minha realidade, à iniciativaque estou propon<strong>do</strong> ou que meu grupo está propon<strong>do</strong>? Quaisalternativas seriam viáveis?”.Nesse momento, <strong>no</strong>sso papel era o de facilitar que o processo deaprendizagem acontecesse – didaticamente falan<strong>do</strong> – estimulan<strong>do</strong> oprocesso de co-responsabilização. Os exercícios práticos também facilitaramtal processo naquele mesmo senti<strong>do</strong> de reforçar a crença nacapacidade de realizar.Márcio Santilli,<strong>do</strong> ISA, falasobre mudançasclimáticas edesmatamento<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 35


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Visitas a áreas experimentaisO grupo visitou as áreas experimentais desenvolvidas anteriormente. Uma delas foi aagrofloresta implantada na antiga chácara <strong>do</strong> Sr. Carlos, um <strong><strong>do</strong>s</strong> forman<strong><strong>do</strong>s</strong>. Ele vendera apropriedade recentemente. A experiência tinha si<strong>do</strong> realizada na segunda oficina. A área nãohavia si<strong>do</strong> devidamente cuidada. O <strong>no</strong>vo <strong>do</strong><strong>no</strong> realizou uma capina, o que diminuiu consideravelmentea densidade das espécies plantadas diretamente por semente. A necessidade decapina, segun<strong>do</strong> o proprietário, vinha <strong>do</strong> fato de existir ali mato. Ele nasceu porque a cobertura<strong>do</strong> solo não foi bem feita, pois o material usa<strong>do</strong> foi poda de uva, que é rapidamente decomposto,deixan<strong>do</strong> o solo descoberto. Se a cobertura <strong>do</strong> solo tivesse si<strong>do</strong> feita com bastantematéria orgânica, e de decomposição mais lenta, não teriam surgi<strong>do</strong> as plantas indesejadas<strong>no</strong> sistema. Mesmo assim, ainda foi possível observar várias espécies. Os pés de figo, entãopoda<strong><strong>do</strong>s</strong> na época da implantação, mostravam-se vigorosos e já com frutos. Algumas verdurasproduziam. Foram encontradas algumas árvores nascidas de sementes, como a copaíba eo urucum. A mandioca cresceu muito bem.A outra área visitada foi a APP à beira <strong>do</strong> córrego na entrada de Canarana, onde o grupotinha feito um plantio a partir de mudas e sementes, visan<strong>do</strong> recompor a mata ciliar. A áreaoriginal estava praticamente toda coberta por capim braquiária. O manejo realiza<strong>do</strong> tambémnão foi o recomenda<strong>do</strong>, pois foi feita uma capina arbitrária, com enxada, cortan<strong>do</strong> várias plantasda regeneração, como mamona e anileira. Algumas mudas tiveram suas folhas comidaspelas formigas. Outras mudas apresentavam-se bem saudáveis. A época <strong>do</strong> plantio não foi amais adequada, durante a seca. Mesmo saben<strong>do</strong> disso, a atividade foi realizada para que osparticipantes registrassem os conceitos na prática.Depoimentos sobre o trabalhoEu ficava em dúvida quanto à agrofloresta. Fiquei impressionadacom tanta coisa <strong>no</strong> mesmo lugar. Peque<strong>no</strong>sdetalhes que às vezes não conseguimos assimilar e na práticapodemos compreender. A segunda área estava bonita pramim, na minha cultura, e agora sabemos que prejudica.Ler, escutar... mas a prática é fundamental. Minha mãeplanta tu<strong>do</strong> junto. No a<strong>no</strong> passa<strong>do</strong>, eu achava bonito só alface,só rabanete, agora tenho outra cabeça. (Rose)36 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Na agrofloresta, achei maravilhoso, uma coisa <strong>no</strong>va,diversidade grande de espécies, várias estão vin<strong>do</strong>. O experimentofoi bacana. Quanto ao rio, local próximo à pista, temperigo de fogo, terra compactada. Acho que deve dar continuidadeao monitoramento <strong>do</strong> local. (Jaílton)Esses trabalhos mostraram para mim que é maisviável orientar o público, para não acontecer os estragosonde não tem. É grande a mão-de-obra para recuperar.Melhor é não desmatar. O resulta<strong>do</strong> foi interessante,mas é ce<strong>do</strong> para tirar conclusão. Quero acompanhar.Numa dimensão maior é trabalhoso. (“Tito” – Clo<strong>do</strong>al<strong>do</strong>)Assumi um compromisso com a comunidade. Ven<strong>do</strong>como está hoje já sei como vai ser montada a minha. É precisoacompanhamento, botar a mão. Fiquei choca<strong>do</strong> porqueachei que a parte de baixo não tinha a ver com agrofloresta,mas tem a ver, cortaram e queimaram a mata. A pessoatem que ver, mudar essa consciência de queimar. Tem queacompanhar o rio. (Sr. Menin)1231) Área <strong>do</strong> Sr. Carlos onde foiimplantada uma agroflorestadurante a segunda oficina. 2 e 3)Volta à área degradada de mataciliar onde havia si<strong>do</strong> feito umplantio de mudas e sementes<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 37


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>O trabalho <strong>do</strong> segun<strong>do</strong> perío<strong>do</strong> entremódulo potencializou o seguinte,entre agosto e outubro. O sucesso da troca de experiências durantea terceira oficina deu <strong>no</strong>va injeção de ânimo ao grupo. Surgiram <strong>no</strong>vasiniciativas, em especial relacionadas com sistemas agroflorestais: a “agroflorestateen” implantada por Maristela e Ana Paula na propriedade <strong>do</strong>agente Josuel; a manutenção e enriquecimento <strong>do</strong> reflorestamento danascente na entrada de Canarana pelos os <strong>agentes</strong> Gediel, Sr. Carlos eIrene; o encerramento <strong>do</strong> festival de sementes, com recebimento de 564kg de sementes de 87 diferentes espécies; a coleta de lixo seletiva, cadastramento<strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> de reciclagem e palestras sobre o problema <strong><strong>do</strong>s</strong> resíduossóli<strong><strong>do</strong>s</strong> em escolas e num supermerca<strong>do</strong>; a oficina com professoresda Escola Apóstolo Paulo, <strong>no</strong> Projeto de Assentamento (PA) Serrinha,em Água Boa, com as <strong>agentes</strong> Elma e Rosenilde; reunião com as <strong>agentes</strong>de Saúde; sensibilização da comunidade de Gaúcha <strong>do</strong> Norte sobre aproblemática <strong>do</strong> córrego Pau D’alho; entre outras atividades.Sistema agroflorestal em açãoEm outubro de 2006, aconteceu a quarta oficina, que não estava prevista<strong>no</strong> projeto original e só foi possível em função <strong>do</strong> interesse <strong><strong>do</strong>s</strong> forman<strong><strong>do</strong>s</strong>e da criação das condições financeiras para tal fim: sua oferta deapoio logístico, infra-estrutura e materiais para as oficinas, como custeiode transporte, equipamentos, sementes e áreas para realização de atividades,permitiu eco<strong>no</strong>mizar parte <strong><strong>do</strong>s</strong> recursos disponíveis.O encontro aconteceu <strong>no</strong> assentamento Brasil Novo, em Querência,<strong>no</strong> lote <strong>do</strong> Sr. Menin, um <strong><strong>do</strong>s</strong> forman<strong><strong>do</strong>s</strong>, com a presença <strong>do</strong> consultorErnest Götsch. Durante três dias, discutimos e implementamosuma agrofloresta experimental. O que foi visto nas primeiras oficinaspode ser coloca<strong>do</strong> em prática em um trabalho intenso e árduo deplantio com o grupo.O Sr. Menin havia prepara<strong>do</strong> a área, cercan<strong>do</strong>-a para evitar a entradade animais, preparan<strong>do</strong> o solo com aração e gradagem e distribuin<strong>do</strong>montes de bagaço de cana, esterco e cinzas que ele tinhadisponível em sua propriedade. Então ele marcou o local de 9 bananeiras,<strong>no</strong> espaçamento de 3 x 3m. Primeiro capi<strong>no</strong>u o local ondeseria plantada a banana.38 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Terre<strong>no</strong> <strong>do</strong> lote<strong>do</strong> Sr. Menin, um<strong><strong>do</strong>s</strong> forman<strong><strong>do</strong>s</strong>,foi prepara<strong>do</strong> combagaço de cana,esterco e cinzaspara implantaçãode agroflorestaErnst demonstrou como fazer, raspan<strong>do</strong> com a enxada a terra da superfície,que é a mais fértil, separan<strong>do</strong>-a em um monte, e depois fez umburaco de mais ou me<strong>no</strong>s 0,6m de profundidade por 0,8m de largura.Misturou a terra separada com esterco e cinzas e encheu o buraco.A bananeira foi plantada com o olho para baixo, para ela sair commais força. A terra de dentro <strong>do</strong> buraco foi espalhada em volta <strong>do</strong> berçoda bananeira e foi coberta com o bagaço da cana. Junto com a bananeiraforam plantadas uma muda de cacau e uma muda de xixá.Ao re<strong>do</strong>r da roda de bagaço, <strong>no</strong> entor<strong>no</strong> <strong>do</strong> berço da bananeira, foiplanta<strong>do</strong> abacaxi a cada 0,3m e entre os abacaxis, a cada <strong>do</strong>is, foi plantadauma maniva de mandioca direcionada com as raízes para dentro<strong>do</strong> círculo. Depois que os abacaxis e a mandioca foram planta<strong><strong>do</strong>s</strong>, foiafofada uma faixa de terra com enxada (somente na largura <strong>do</strong> enxadão)e misturou-se um pouco de esterco e cinzas, onde se semeou hortaliçascomo pepi<strong>no</strong>, salsinha, rúcula, e plantou-se mudas de cebolinha. Paracobrir foi espalha<strong>do</strong> um pouco de esterco.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 39


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>“Berço dabananeira” éprepara<strong>do</strong> combagaço de canae cerca<strong>do</strong> compés de abacaxie mandiocapor Ernst eparticipantesda oficinaPara finalizar, na frente de cada maniva de mandioca foi coloca<strong>do</strong> umpunha<strong>do</strong> de mistura de sementes de árvores. Algumas sementes de árvores(as maiores como o baru e a manga, as mais leves como o ipê, guatambue tingui e as pequenas, como a embaúba) foram distribuídas na frente dasmanivas depois (não junto com a mistura de sementes). O ingá tambémfoi distribuí<strong>do</strong> separadamente das outras para não danificar suas raízes,pois as sementes já são retiradas <strong>do</strong> fruto germinadas. Ainda dentro <strong>do</strong>berço da bananeira foram semea<strong><strong>do</strong>s</strong> milho, abóbora e pepi<strong>no</strong>.As sementes de árvores foram selecionadas, escolhen<strong>do</strong>-se todas asespécies disponíveis, me<strong>no</strong>s aquelas tipicamente de campo aberto, comoa sucupira, o cajuzinho <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>, que não toleram ambiente sombrea<strong>do</strong>,como a agrofloresta. Foi feito o cálculo de quantidade de sementes,consideran<strong>do</strong> a área que se deseja plantar (144 m2), o pressuposto deque se quer <strong>no</strong> mínimo 10 árvores estabelecidas por metro quadra<strong>do</strong> e aporcentagem de germinação aproximada.Para as sementes que demoram a germinar, com casca dura, foi feitotratamento de quebra de <strong>do</strong>rmência com água quente. As sementesforam todas misturadas com um pouco de terra, esterco e cinza e essamistura foi umedecida até parecer uma farofa.40 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>A mistura de sementes foi dividida em porções para ser bem distribuídana área. Calculou-se que para o círculo em volta da bananeira, ondehavia 18 abacaxis e 9 manivas de mandioca, era necessário 4% da quantidadeda mistura de sementes. 4% das sementes para cada bananeira vezes9 bananeiras equivale a 36% da área. O monte da mistura de sementesfoi dividi<strong>do</strong> então mais ou me<strong>no</strong>s em 36% e 64%. A parte <strong><strong>do</strong>s</strong> 36% foidividida em 9, pois teria que ser distribuída em volta <strong><strong>do</strong>s</strong> 9 círculos debananeira. O restante foi dividi<strong>do</strong> em 9 também para ser distribuí<strong>do</strong> nas9 partes restantes entre os círculos de bananeira.Na área restante entre os círculos de bananeira foi planta<strong>do</strong> abacaxi<strong>no</strong> espaçamento de 1,2m entre linhas e 0,3m entre mudas. Foi plantadamaniva da mesma maneira, entre o abacaxi (pulan<strong>do</strong> sempre uma plantade abacaxi).Entre as linhas de abacaxi e mandioca a terra foi afofada e foram semea<strong><strong>do</strong>s</strong>arroz com urucum. Nesse espaço também foi distribuída a misturade sementes de árvores. As sementes maiores, bem como as muitoleves (ipê, jacarandá, guatambu e tingui) e as muito pequenas (embaúba),foram distribuídas depois, superficialmente.Ao final ficou a recomendação para se plantar feijão de porco naquarta semana, <strong>no</strong> momento da primeira limpa <strong>do</strong> arroz.Seis meses depois,o “berço dabananeira” já emestágio adianta<strong>do</strong><strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 41


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>A formaturaA formatura <strong>do</strong> grupo de <strong>agentes</strong> aconteceu <strong>no</strong> dia 22 de outubro de2006, na Câmara Municipal de Canarana. A cerimônia contou comfamiliares, comunidade e autoridades locais, que fizeram uso dapalavra, parabenizan<strong>do</strong> os forman<strong><strong>do</strong>s</strong> e reconhecen<strong>do</strong> a importânciada formação. Após a cerimônia de entrega de certifica<strong><strong>do</strong>s</strong>, houve umcoquetel e a cada forma<strong>do</strong> e convida<strong>do</strong> foi entregue uma muda deárvore nativa <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong> produzida <strong>no</strong> viveiro municipal.42 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Resulta<strong><strong>do</strong>s</strong>, desafiose lições aprendidasSurpreender, talvez essa seja a palavra que melhor expresse o quefoi esse processo de formação. A próxima parte da publicação elucidaráo que estamos falan<strong>do</strong>. Sem tirar nem pôr, mas apenas reconhecere valorizar as histórias de quem está pensan<strong>do</strong> e fazen<strong>do</strong> algo pelo<strong>Xingu</strong>.Ter chega<strong>do</strong> ao final desse processo com 42 pessoas comprometidaspode ser entendi<strong>do</strong> como um resulta<strong>do</strong> por si só. Porém, a maiorlição que podemos ter é observar parte desses agricultores, professores,técnicos continuarem suas iniciativas em seus espaços de trabalho e deconvivência diária.Mas a jornada não foi só céu de brigadeiro. Fomentar e valorizar acultura florestal e agroflorestal em um contexto onde o poder das mo<strong>no</strong>culturasde grãos e da pecuária condiciona o comportamento individuale a eco<strong>no</strong>mia de toda uma sociedade local dá a exata dimensão <strong>do</strong>desafio. Deparâmo-<strong>no</strong>s com dúvidas, encruzilhadas, indefinições para<strong>no</strong>s mantermos firmes e coerentes com a proposta. O que pensamos,muitas vezes, não trazia os resulta<strong><strong>do</strong>s</strong> espera<strong><strong>do</strong>s</strong>. Daí, éramos obriga<strong><strong>do</strong>s</strong>a rever o processo, refletir e fazer diferente, e olhar para <strong>no</strong>ssos referenciaisteóricos e práticos, e chegar à conclusão que “essa teoria ou formade fazer não funcio<strong>no</strong>u”. Perceber com atenção o que trazia e o que nãotrazia resulta<strong><strong>do</strong>s</strong>, desafian<strong>do</strong>-<strong>no</strong>s permanentemente a olhar para <strong>no</strong>ssosreferenciais, concepções, crenças...O fazer diferente, para nós da coordenação e para os <strong>agentes</strong>, envolveuescolhas e dimensio<strong>no</strong>u o tamanho que esse conjunto de referenciaisocupava em <strong>no</strong>ssos espaços emocional e cognitivo. Às vezes isso foi tãogrande e <strong>no</strong>vo que o indivíduo viu-se obriga<strong>do</strong> a abrir mão de muitacoisa – e isso ele não estava disposto e não conseguiria, mesmo se quisesse.O processo pedagógico teve que olhar para isso, respeitan<strong>do</strong> osmomentos e condições objetivas de cada um. Podemos dizer que essemovimento foi <strong>no</strong>sso maior aprendiza<strong>do</strong>!<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 43


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Também é mereci<strong>do</strong> destacar algumas lições aprendidas em relação àtrajetória formativa:A importância de garantir uma ampla divulgação e um processoseletivo rigoroso com base <strong>no</strong>s princípios e critérios defini<strong><strong>do</strong>s</strong>contribui para a formação de um grupo de aprendizagem, fundamentalpara atingir os objetivos;Construção de um caminho de confiança e co-responsabilidadecom os participantes, estan<strong>do</strong> aberto a mudanças <strong>no</strong>s conteú<strong><strong>do</strong>s</strong>programáticos sem ferir o projeto pedagógico, atenden<strong>do</strong> as reaisnecessidades <strong>no</strong> campo socioambiental <strong>do</strong> público-alvo;Trabalhar um conjunto de habilidades conceituais, sociais e técnicasparece ser uma chave meto<strong>do</strong>lógica para que os participantespossam ser protagonistas <strong>do</strong> seu próprio aprendiza<strong>do</strong>. Palestras epráticas contemplam em parte os reais anseios. Deve existir umintencional e profissional trabalho <strong>no</strong> campo das relações sociaisde maneira a ornar e dar maior dinâmica e vida ao processo;O grupo coeso é fundamental para propiciar a aprendizagem individual.Na primeira oficina, foi acorda<strong>do</strong> que não haveria maisespaço para <strong>no</strong>vos interessa<strong><strong>do</strong>s</strong> naquele momento;Explicitar e debater a importância de cuidar <strong>do</strong> chama<strong>do</strong> perío<strong>do</strong>entremódulo como parte integrante da formação mobiliza paraa ação. A presença física <strong>no</strong> atendimento técnico e cognitivo dasiniciativas <strong>socioambientais</strong> influenciou positivamente o sucesso dasmesmas. Por isso, não basta animar virtualmente entre um momentopresencial e outro. Se dispuséssemos somente dessa estratégia,podemos dizer que não chegaríamos aos resulta<strong><strong>do</strong>s</strong> alcança<strong><strong>do</strong>s</strong>.44 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Um sentimento que inquietae que se difundePor Luciana Akeme S. M. DeluciNo final de 2005, fui contratada pelo Instituto Socioambiental (ISA)para inicialmente apoiar a organização e acompanhar a formação de <strong>agentes</strong><strong>socioambientais</strong> <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>. A principio, chamou minha atenção ameto<strong>do</strong>logia da formação, que previa módulos presenciais e perío<strong><strong>do</strong>s</strong> entremódulos<strong>no</strong>s quais o projeto apoiaria algumas iniciativas individuaisou em grupos. Também me surpreendeu a heterogeneidade <strong>do</strong> grupo:profissionais diversos, diversas forma de lidar com a terra e diferentesformações. Mesmo que isso pudesse indicar um grande potencial para a<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 47


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>troca de experiências, também podia ao mesmo tempo ser desastroso. Omeu desafio, entre outros, seria acompanhar esses momentos entremódulose, de certa forma, propor algo que fosse comum dentro da diversidadede interesses e atuação <strong><strong>do</strong>s</strong> participantes.Questionava-me também quanto à necessidade de minha participaçãoefetiva na formação. Para entendê-la e acompanhar os <strong>agentes</strong>, eu necessitavaser também uma agente, passar por to<strong>do</strong> o processo. Com essepensamento, já na primeira oficina, passei a participar de várias atividades,sentin<strong>do</strong> que teria um papel de acompanhamento <strong>do</strong> grupo maisde perto, visto que os forma<strong>do</strong>res não residiam na região. Eu sabia quepara conseguir isso teria de me sentir e ser parte <strong>do</strong> grupo em formação.Atuar junto a ele, sem antes internalizar o “ser” agente multiplica<strong>do</strong>r, meparecia fada<strong>do</strong> ao insucesso.O grupo mostrava-se participativo e empreende<strong>do</strong>r, mergulha<strong>do</strong> <strong>no</strong>processo. Mas pensava comigo: “será que isso basta para que os entremódulostenham a mesma intensidade?”. Nas formações, o que acontece<strong>no</strong>rmalmente são as pessoas retornarem a sua realidade e <strong>no</strong>vamente sentirem-seimpotentes diante de suas expectativas de mudança.Porém, acompanhei todas as atividades entremódulos, direta ou indiretamente,e pude vivenciar o que a motivação e a segurança de um <strong>no</strong>voconhecimento podem trazer num movimento inter<strong>no</strong>, individual, que serevela <strong>no</strong> grupo. Algo que se processa dentro de cada um, que o colocaem movimento e ao mesmo tempo movimenta o grupo.Houve, a principio, um subagrupamento por município. Geograficamente,isso facilitava a ação, porém não impediu intercâmbios, <strong>agentes</strong>que participaram de ações <strong>no</strong>s municípios <strong><strong>do</strong>s</strong> colegas. Interessante que,logo após o primeiro módulo, houve poucas iniciativas concretas. Acreditoque isso aconteceu pela própria <strong>no</strong>vidade <strong>no</strong> processo de apreender,o momento de perguntar-se: “será que é isso mesmo? Quem são estaspessoas? O que querem?”Mas após o segun<strong>do</strong> módulo, iniciou-se a sinergia. Os forman<strong><strong>do</strong>s</strong>passaram a se relacionar melhor entre si e também com a coordenação.Adquiriu-se confiança mútua. As iniciativas foram inúmeras. Elas surgiamem grupo, em um grande evento ou mobilização, ou então emações diárias <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong>. Acredito que as iniciativas individuais, com o48 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>objetivo de mobilizar suas comunidades, tenham da<strong>do</strong> suporte para que,mesmo depois de encerrada a formação, muitos deles tenham continua<strong>do</strong>o processo de fortalecimento de suas ações.Vale uma reflexão de como esse sentimento, esse envolvimento surgecomo algo que inquieta e que se difunde, como as pessoas ficam estimuladasa, de alguma forma, dentro de suas possibilidades, mobilizar e realizartantas ações <strong>socioambientais</strong>, e como isso aconteceu de uma maneiraem que o grupo ainda apresenta-se sen<strong>do</strong> referência na sociedade local.O segre<strong>do</strong> pode estar não apenas em entender como se processa essaformação de adultos, mas também <strong>no</strong>s temas que estão tão relaciona<strong><strong>do</strong>s</strong>à própria sobrevivência, que passam a ser os de sua própria luta. Talvezmuitas idéias já estivessem ali e faltasse o encorajamento para as pessoascolocarem-se em ação. Algo que partisse de incentivos exter<strong>no</strong>s, mas querealmente só poderia processar-se dentro de cada um.O que aconteceu, de fato, foi uma mescla de aquisição de conhecimentotécnico com uma boa <strong><strong>do</strong>s</strong>e de estímulo à liderança. Mistura quepromoveu um sentimento de capacidade de fazer, que serviu e servede combustível para várias iniciativas. O que vale ainda dizer comoalguém que acompanhou todas as fases da formação, vivencian<strong>do</strong> aforça <strong>do</strong> grupo e das lideranças que ali nasceram ou amadureceram,é que acredito que tal processo vai continuar. Alguma coisa que teveum início e na qual a palavra “multiplicação” se impôs em sua maiorforça. As pessoas realmente apropriaram-se não só <strong><strong>do</strong>s</strong> conceitos, masredescobriram em si seus potenciais e revelaram-se em ações <strong>socioambientais</strong>coerentes, reais e viáveis.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 49


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>213Atividades desenvolvidas durante amobilização realizada pelos <strong>agentes</strong><strong>socioambientais</strong> em Canarana envolven<strong>do</strong>estudantes: 1) plantio de mudas narepresa <strong>do</strong> Garapu; 2) visita ao viveirode Canarana; 3) “passeio” de bicicleta aolixão da cidade para sensibilizar os alu<strong>no</strong>ssobre a necessidade de separar e reciclaros resíduos sóli<strong><strong>do</strong>s</strong>50 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Mobilizan<strong>do</strong> CanaranaUma pequena chuva de sementes e outras históriasCanarana gosta de cultivar a memória com símbolos inusita<strong><strong>do</strong>s</strong>. Parecehaver ali a necessidade de relembrar sempre a história, recheada demuito trabalho e capacidade de mobilização, de quem chegou para construira cidade e de quem continua construin<strong>do</strong> o seu dia-a-dia.Logo na entrada da avenida principal, uma cuia de chimarrão e umachaleira em tamanho gigante chamam a atenção para a presença <strong><strong>do</strong>s</strong> gaúchos.Foram eles os primeiros a chegar em 1971. Muitos vieram mais tarde<strong>no</strong> velho avião Douglas DC-3 hoje estaciona<strong>do</strong> na praça central comomais um monumento aos pioneiros. Empresas coloniza<strong>do</strong>ras trouxeramcentenas de famílias <strong>do</strong> Sul <strong>do</strong> País na onda de implantação de núcleosagrícolas promovida na Amazônia pelo gover<strong>no</strong> federal na época.A de<strong>no</strong>minação Canarana vem de um capim comum na região, masdizem que também porque seus primeiros mora<strong>do</strong>res, vários deles daIgreja Luterana, achavam o <strong>no</strong>me pareci<strong>do</strong> com Canaã, considerada naBíblia a “terra prometida”. Vieram até ali pelas dificuldades de continuar<strong>no</strong> Sul, onde a terra tinha fica<strong>do</strong> cara demais e aumentavam os conflitosfundiários. A cidade nasceu <strong>do</strong> desejo de uma vida melhor, de mais rendae <strong>do</strong> que então era considera<strong>do</strong> progresso. As ruas largas imitam asavenidas de Brasília.O município fica a 800 quilômetros de Cuiabá e, em 2007, tinha 19mil habitantes, um <strong><strong>do</strong>s</strong> mais populosos <strong>do</strong> leste da Bacia <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong> <strong>no</strong>Mato Grosso. Tem comércio varia<strong>do</strong>, escolas, hospitais, além de inúmerossindicatos, associações e igrejas. Tu<strong>do</strong> isso fruto <strong>do</strong> empreende<strong>do</strong>rismode uma geração vocacionada à agricultura e à pecuária. Em 2006,Canarana colheu 266,1 mil toneladas de soja – R$ 66 milhões – e tinhamais de 322 mil cabeças de ga<strong>do</strong>.O Encontro Nascentes <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong> e aformação de <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>A produção <strong>no</strong> campo trouxe divisas, serviços públicos e infra-estrutura,mas às custas da supressão de parte da cobertura vegetal. Por sua<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 51


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>posição estratégica, por ser ela mesma um símbolo de alguns <strong><strong>do</strong>s</strong> problemas,mas também das potencialidades da região, a cidade foi escolhidapara sediar o Encontro Nascentes <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>, entre 25 e 27 de outubro de2004, quan<strong>do</strong> nasceu a campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>. Canarana foi eleitapara ser a “nascente” <strong>do</strong> pacto em defesa das cabeceiras <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>, pelaconciliação entre produção, desenvolvimento e conservação.Por motivos pareci<strong><strong>do</strong>s</strong>, foi indicada para abrigar o processo de formaçãode <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>, que começou em dezembro de 2005. Asorganizações parceiras da campanha consideraram que a partir dali e <strong><strong>do</strong>s</strong>municípios vizinhos poderia ser multiplica<strong>do</strong> o trabalho das lideranças<strong>socioambientais</strong>.A idéia <strong>do</strong> projeto era ter entre os forman<strong><strong>do</strong>s</strong> a maior diversidadepossível de segmentos e classes sociais, profissões, níveis e tipos de formação.A heterogeneidade <strong>do</strong> grupo não foi vista como um obstáculo,mas uma oportunidade de reunir experiências, conhecimentos e visõesdiferencia<strong><strong>do</strong>s</strong> sobre os problemas <strong>socioambientais</strong> da região – e sobresuas possíveis soluções.No início, aquela expectativa! Pessoas <strong>no</strong>vas, outras já conhecidas,a grande maioria era desconhecida. Aos poucos fomos<strong>no</strong>s conhecen<strong>do</strong>. Uns com mais afinidade, outros me<strong>no</strong>s,enfim, cada qual com suas potencialidades e limitações. Estudantes,agricultores, técnicos agrícolas, professores, liderançascomunitárias, cidadãos comuns imbuí<strong><strong>do</strong>s</strong> de um mesmopropósito: conhecer, preservar, pensar numa forma de contera degradação que o homem tem causa<strong>do</strong> <strong>no</strong>s rios e florestasde <strong>no</strong>ssa região, tentar disseminar para as outras pessoas umpouco <strong>do</strong> <strong>no</strong>sso aprendiza<strong>do</strong>. (Maristela F. Becker da Rosa)Reflorestamento e lixoO grupo de Canarana era o mais numeroso entre os que iniciaram aformação, com 19 pessoas. As oficinas reforçaram entre algumas delas antigosquestionamentos e preocupações com a degradação das nascentes.52 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Viveiro de Canarana foiresulta<strong>do</strong> de parceria entre oISA, a prefeitura e a SociedadeAmigos <strong>do</strong> Garapu. Diferentesestágios da obraIsso apontou para um trabalho de reflorestamento que envolvesse acomunidade. Na época, começava a ser instala<strong>do</strong> na cidade um viveiro,fruto de um projeto da campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong> (confira na página 55).Uma parte <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> idealizou, então, atividades que abrangessem aprodução e o plantio de mudas de espécies nativas. Outra parte resolveuempreender ações voltadas ao problema <strong><strong>do</strong>s</strong> resíduos sóli<strong><strong>do</strong>s</strong> (página 59).Algumas pessoas assumiram ainda o compromisso de ampliar ou aprimorariniciativas que já desenvolviam com princípios <strong>socioambientais</strong> e quepoderiam servir como exemplo.A mobilizaçãoOs forman<strong><strong>do</strong>s</strong> resolveram desenvolver um projeto que abarcasse os<strong>do</strong>is assuntos – resíduos sóli<strong><strong>do</strong>s</strong> e reflorestamento – por meio de atividadesde mobilização. Elaboraram o <strong>do</strong>cumento “Educação Ambiental:Mudança de Postura Frente às Novas Concepções Socioambientais”. Eleprevia a produção de mudas, o reflorestamento de nascentes degradadas,palestras, visitas de campo e outras atividades educativas. As mudas tambémficariam à disposição da comunidade.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 53


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Além <strong>do</strong> viveiro, o instrumento imagina<strong>do</strong> para obter a matéria-primapara as ações foi o “festival de sementes”. A idéia era realizar umagrande coleta de sementes que serviria para engajar e sensibilizar estudantese educa<strong>do</strong>res (multiplica<strong>do</strong>res por natureza), difundir informaçõessobre espécies nativas e seu potencial para a recuperação das matasde beira de rio. Representantes das turmas que mais se destacassem natarefa ganhariam como prêmio um “dia de campo” em locais onde estavamocorren<strong>do</strong> experiências de conservação, com direito a gincanas,brincadeiras, brindes e almoço.De fevereiro a maio de 2006, foi feita a divulgação <strong>do</strong> projeto emum lançamento na Câmara Municipal e em reuniões com os professorese diretores das escolas <strong>do</strong> município. A idéia era conquistar o apoioà iniciativa e estimular os educa<strong>do</strong>res a trabalhar com seus alu<strong>no</strong>s asquestões <strong>socioambientais</strong> locais. Os <strong>agentes</strong> passaram a apoiar atividadesdentro e fora das salas de aula, sempre falan<strong>do</strong> da campanha ‘Y Ikatu<strong>Xingu</strong>, <strong>do</strong> problema das nascentes e <strong>do</strong> lixo, entre outros temas vistosna formação.Em duas escolas municipais da zona rural, a Elídio Corbari e a SerraDourada, o convite foi precedi<strong>do</strong> por palestras em que estiveram presentesnão apenas alu<strong>no</strong>s e professores, mas também a comunidade. Oentusiasmo das crianças e de alguns professores foi imediato.Na escola Elídio Corbari, na comunidade <strong>do</strong> Garapu, eles prontificaram-senão apenas a buscar as sementes, mas também a instalar umpeque<strong>no</strong> viveiro. Mais tarde, surgiu a idéia de realizar um levantamentosobre o Rio Sete de Setembro, que atravessa a localidade e é um <strong><strong>do</strong>s</strong>afluentes <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>. Os estudantes produziram várias mudas. Foi organizadauma “expedição” para avaliar as condições ambientais <strong>do</strong> rio eencontrar suas cabeceiras, a cerca de 130 quilômetros dali. Mudas e sementesforam plantadas na nascente, já bastante desmatada, pisoteada econtaminada pelo ga<strong>do</strong>. O mesmo problema ocorria em vários trechos<strong>do</strong> rio. A problemática passou a ser tratada na escola em redações, estu<strong><strong>do</strong>s</strong>,trabalhos, desenhos. A comunidade acompanhou algumas das atividadese passou a se interessar pelo assunto. Uma pesquisa sobre o temaelaborada pela 8ª série foi uma das vence<strong>do</strong>ras da I Mostra Estadual deCiência, Tec<strong>no</strong>logia e I<strong>no</strong>vação, em 2007.54 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Ivan e o viveiro(...) Mas o mun<strong>do</strong> foi rodan<strong>do</strong>, nas patas <strong>do</strong> meu cavaloE os sonhos que fui sonhan<strong>do</strong>, as visões se clarean<strong>do</strong>,As visões se clarean<strong>do</strong>, até que um dia, acordei.Disparada, Geral<strong>do</strong> VandréIvan Loch chegou em Canarana em 1975, com trezea<strong>no</strong>s, junto com a família que vinha <strong>do</strong> Paraná e cuja propriedadefoi inundada pelo lago de Itaipu. A floresta e o Cerra<strong>do</strong>,quase intoca<strong><strong>do</strong>s</strong>, eram um muro à expansão da agriculturae da pecuária, que precisava ser derruba<strong>do</strong>. A partir <strong><strong>do</strong>s</strong> 15a<strong>no</strong>s, Ivan foi capina<strong>do</strong>r, tratorista, auxiliar de pesquisas sobresoja. Depois estu<strong>do</strong>u e começou a trabalhar em grandesempresas agropecuárias da região como almoxarife, capataz,encarrega<strong>do</strong> de manutenção de campo.Segun<strong>do</strong> suas próprias palavras, era um “destrui<strong>do</strong>r da natureza”. Não se esquece, por exemplo,de um carvoeiro que, por incrível que pareça, foi morto a tiros por ele e alguns amigos que queriamdivertir-se. A carcaça da árvore continua <strong>no</strong> mesmo lugar.A gente pescava o <strong>do</strong>bro <strong>do</strong> que era o necessário e de rede.Na época, tinha mato à vontade, peixe à vontade, caça à vontade,munição à vontade. Cortávamos várias árvores só para verqual vara ficava mais retinha. Depois jogava tu<strong>do</strong> fora. Faziafogo, queimava tu<strong>do</strong> à toa. E ganhávamos dinheiro. (...) Agente achava que aquilo não ia acabar nunca. (...) Antes, erasó destruição. Tanto fazia. (Ivan)Em 1993, passou <strong>no</strong> concurso para técnico agrícola da prefeitura. A princípio, trabalhou comarborização. Aju<strong>do</strong>u a montar o viveiro municipal e prestava assistência técnica em hortas. Plantavaflores, árvores nativas e exóticas <strong>no</strong>s canteiros da cidade. Deu aulas sobre hortas em projetos destina<strong><strong>do</strong>s</strong>a crianças e a<strong>do</strong>lescentes carentes.Continuava gostan<strong>do</strong> de pescar, mas os peixes já eram poucos. Foi nessas pescarias que seusfilhos vieram com uma conversa estranha sobre programas que viam na televisão, “coisa de ambientalismo”;de que ele não poderia mais ficar jogan<strong>do</strong> latas <strong>no</strong> rio, pois elas valiam dinheiro; que a matae tu<strong>do</strong> que tinham dela à vontade estavam em risco. Alguma coisa começou a mudar em Ivan.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 55


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>A gente via que as coisas foram se acaban<strong>do</strong>. Tanto bichoque eu matei, tanto peixe que peguei... “Será que meus filhos,meus netos vão ver isso?” Aí, eu comecei a me tocar: “foi euque ajudei a destruir isso daí”. Eles começaram a me ensinar.Eu via na televisão, mas achava que isso acontecia longe, nasgrandes cidades. (Ivan)Ivan começou a reparar que os rios estavam desbarrancan<strong>do</strong> e o mato rareava. Muitas cabeceirasestavam destruídas. Era preciso começar a preservar. No final de 2005, foi seleciona<strong>do</strong> paraparticipar da formação de <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>.Meses depois, começou em Canarana o projeto Quem vê só Soja não enxerga Desenvolvimento: umaexperiência de recuperação de nascentes e matas ciliares na Bacia <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>. O objetivo era montar um viveirode espécies nativas para abastecer algumas ações de reflorestamento da campanha ‘Y Ikatu Xiungu.Uma parceria entre a prefeitura, a Sociedade <strong><strong>do</strong>s</strong> Amigos <strong>do</strong> Garapu e o ISA, com patrocínio <strong>do</strong> InstitutoHSBC de Solidariedade. Ivan Loch foi convida<strong>do</strong> a trabalhar <strong>no</strong> projeto.Ele já entendia bastante de quebra de <strong>do</strong>rmência. Fazer uma semente brotar mais rápi<strong>do</strong> <strong>do</strong> queo <strong>no</strong>rmal, artificialmente, é um trabalho que parece simples, mas exige técnica e minúcia. São usa<strong><strong>do</strong>s</strong>água em diferentes temperaturas, áci<strong><strong>do</strong>s</strong>, raspagens. Verdadeiro trabalho de artesão. Ivan tor<strong>no</strong>u-se umespecialista na germinação, identificação e uso de sementes.Ele participou <strong>do</strong> festival de sementes e foi responsável pelo recebimento e pesagem <strong>do</strong> material.Conduziu dias de campo, passeios e visitas ao viveiro envolven<strong>do</strong> estudantes, professores, agricultorese técnicos. Em 2007, tor<strong>no</strong>u-se monitor de uma <strong>no</strong>va turma de <strong>agentes</strong> iniciada em São José <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>.Começou a dar oficinas e palestras sobre o tema. Tor<strong>no</strong>u-se um profissional reconheci<strong>do</strong> em Canarana.De agosto de 2006 a outubro de 2007, foram cultivadas <strong>no</strong> viveiro mais de 13 mil mudas de 52 espéciesnativas e circularam por lá mais de 13 toneladas de sementes em esta<strong>do</strong> bruto, isto é, sem o tratamentoe limpeza necessários para a germinação antecipada.Eu espero que to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> bote a mão na consciência e recupereo que destruiu. Já será suficiente. Quan<strong>do</strong> as pessoassentirem aquele calorão, falta de ar, fumaça, vão pôr a mãona consciência. E para quem quiser ter mais informação sobreisso, é só chegar lá <strong>no</strong> viveiro. E não precisa ser só da regiãoaqui não, porque o planeta é um só. (Ivan )56 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Chuva de sementesO festival de sementes aconteceu de abril a setembro de 2006, comdivulgação na mídia e participação de <strong>no</strong>ve escolas, incluin<strong>do</strong> alu<strong>no</strong>s <strong><strong>do</strong>s</strong>ensi<strong>no</strong>s fundamental e médio. A competição tor<strong>no</strong>u-se uma febre entre algumasturmas. Grupos de crianças e a<strong>do</strong>lescentes, muitos acompanha<strong><strong>do</strong>s</strong>pelos pais, enfronharam-se nas matas <strong>do</strong> município para fazer a coleta.Abateu-se sobre Canarana uma pequena chuva de sementes. Elas começarama chegar nas escolas em sacos, muitos sacos. Depois, em carros.Em 11 de setembro, Dia <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>, termi<strong>no</strong>u a contagem. Foramreuni<strong><strong>do</strong>s</strong> e encaminha<strong><strong>do</strong>s</strong> ao viveiro municipal mais de 564 quilos de 87espécies. Quase metade <strong>do</strong> total veio da escola Serra Dourada, a últimaa ser visitada pelos <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>, em maio, e que teve me<strong>no</strong>stempo para realizar o trabalho.Me espantou a quantidade. Fiquei emocionada quan<strong>do</strong> viuma caminhonete cheia de sementes. Num primeiro momento,não tinha havi<strong>do</strong> tanto entusiasmo. Na escola Serra Dourada,eles são mais uni<strong><strong>do</strong>s</strong>, as famílias são muito engajadas. Masmesmo na cidade, houve muita simpatia. Houve um alu<strong>no</strong> queme trouxe uma semente. Acredito muito na semente. A criançaé uma semente. Acredito na educação. É com esse trabalho quepoderemos ter alguma coisa <strong>no</strong> futuro. E como fizemos commuito carinho, houve uma resposta. (Ingred Ramos Pereira)Agentes<strong>socioambientais</strong>e técnicos <strong>do</strong>ISA recebemas sementescoletadas porestudantes deto<strong>do</strong> o município<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 57


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>A premiação <strong><strong>do</strong>s</strong> alu<strong>no</strong>s que mais se destacaram <strong>no</strong> festival aconteceuem dezembro. Cerca de 80 pessoas, entre estudantes e professores de 16turmas, além de alguns <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>, participaram de atividadeseducativas em <strong>do</strong>is dias de campo. Eles visitaram o viveiro, onde conheceramtécnicas de germinação e várias das espécies usadas <strong>no</strong>s projetos de reflorestamentoda campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>. Viram um pouco <strong>do</strong> resulta<strong>do</strong>de seu trabalho: mudas produzidas com as sementes que haviam coleta<strong>do</strong>.Alguns alu<strong>no</strong>s plantaram mudas e sementes às margens da represa <strong>do</strong> Garapu.Também visitaram as propriedades <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> ÉdemoCôrrea (saiba mais na página 61) e Josuel Olegário, onde assistiram a palestras,conheceram áreas em recuperação e técnicas agroflorestais.Acho que houve uma mudança. A descoberta de que aquelematerial poderia ter um valor econômico. Muitas crianças nãoconheciam <strong>no</strong>ssas espécies nativas. Realizei com meus alu<strong>no</strong>sum trabalho de pesquisa sobre o potencial econômico da madeirae das frutas de várias dessas espécies. Vários pais <strong>no</strong>sprocuraram para saber como poderiam fazer para vender assementes. Acho que o festival despertou muitos pais para aimportância <strong>do</strong> reflorestamento. (Maria Sicorra da Rosa)(...) Acho que as ações que nós, <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>,promovemos ajudaram na mudança de mentalidade que estáocorren<strong>do</strong> na região. Muitas pessoas hoje começam a ver a importânciade reflorestar. O grande obstáculo, porém, continuasen<strong>do</strong> a falta de recursos. Existem até linhas de financiamentopara reflorestamento, mas as exigências burocráticas sãomuito grandes. (Josuel Olegário <strong><strong>do</strong>s</strong> Santos)Durante o resto <strong>do</strong> a<strong>no</strong> de 2006 e em 2007, os reflexos da mobilizaçãocontinuaram, com vários <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong>, professores e estudantesdesenvolven<strong>do</strong> atividades cujo tema era meio ambiente, em especial aquestão <strong>do</strong> lixo e o problema das nascentes.58 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>O trabalho sobre lixoUm grupo <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> resolveu desenvolver uma iniciativa entremódulos com o tema resíduossóli<strong><strong>do</strong>s</strong>, incluin<strong>do</strong> palestras, passeios ecológicos, a instalação de pontos de coleta seletiva, ações deestímulo à separação <strong>do</strong> lixo e o cadastramento <strong><strong>do</strong>s</strong> cata<strong>do</strong>res, visan<strong>do</strong> gerar renda para suas famíliase incentivar sua organização. O levantamento de informações sócio-econômicas <strong><strong>do</strong>s</strong> cata<strong>do</strong>resfoi feito em março de 2006. Foram realizadas algumas reuniões com eles para tentar articular seutrabalho com a separação <strong>do</strong> lixo e instalação <strong><strong>do</strong>s</strong> pontos de coleta.Em maio, os forman<strong><strong>do</strong>s</strong> promoveram uma palestra sobre a campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong> e o problema<strong>do</strong> lixo em um <strong><strong>do</strong>s</strong> supermerca<strong><strong>do</strong>s</strong> da cidade, que iniciou a separação <strong>do</strong> papelão e caixasde madeira descarta<strong><strong>do</strong>s</strong>. As palestras estenderam-se às escolas, como a Jesus, Maria e José e 31de março, que instalaram pontos de coleta e iniciaram a separação <strong>do</strong> entulho, entre outras. Umagincana realizada pela Associação de Pais e Amigos <strong><strong>do</strong>s</strong> Exepcionais (Apae) local reuniu R$ 1,8 milem garrafas pet com apoio <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong>. No segun<strong>do</strong> semestre, eles organizaram uma exposição <strong>no</strong>supermerca<strong>do</strong> com artesanato de materiais recicla<strong><strong>do</strong>s</strong>.Como as famílias de cata<strong>do</strong>res não estavam organizadas e elas recolhiam o lixo eventualmente,a iniciativa <strong><strong>do</strong>s</strong> resíduos sóli<strong><strong>do</strong>s</strong> não foi à frente. A coordenação da formação <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> sugeriu quefosse realizada uma oficina com a comunidade sobre o tema para se ter um diagnóstico mais preciso. Oevento aconteceu em outubro de 2006 e sugeriu estimular a prática da separação e acondicionamentocorretos <strong><strong>do</strong>s</strong> detritos entre a população, para depois tentar implantar a coleta seletiva.No Dia <strong>do</strong> Meio Ambiente, 5 de junho, os <strong>agentes</strong>coordenaram um “pedágio ambiental” para distribuirsacolas de lixo <strong>no</strong> centro de Canarana. A atividadecontou com a participação de quase 200 estudantes,que fizeram faixas e repassaram informações sobreo problema <strong>do</strong> lixo e a questão das nascentes. Aatividade foi apoiadapelo Rotary Clube eLions Clube, entreoutros.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 59


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Agrofloresta teenNo final <strong>do</strong> a<strong>no</strong> de 2006, as <strong>agentes</strong> Ana Paula Zuim eMaristela Becker levaram alguns alu<strong>no</strong>s da escola particularJesus, Maria José até a propriedade de Josuel Olegário<strong><strong>do</strong>s</strong> Santos, outro forman<strong>do</strong>, para realizar uma oficina deagrofloresta. Maristela ensi<strong>no</strong>u a técnica da “muvuca” (umpunha<strong>do</strong> de sementes de váriasespécies diferentes, que é cobertonuma mesma cova) e o plantioem forma de mandala (círculo).Galhos mortos, folhas podadas ousecas foram usa<strong><strong>do</strong>s</strong> como adubo.YkinhoEnquanto participava da formação, aprofessora Cristiane Gonçalves, 20 a<strong>no</strong>s,pensou em transmitir aos seus alu<strong>no</strong>s,de uma forma lúdica, a necessidadede reduzir o consumo e a produção <strong>do</strong>lixo. “Mas como chamar a atenção dascrianças e estimulá-las a ter atitudesdiferentes?” A idéia da educa<strong>do</strong>ra foicriar um personagem em forma decopo que pudesse substituir aquelesfeitos de plástico. Ao mesmo tempo,queria associar a figura à campanha ‘YIkatu <strong>Xingu</strong> para divulgá-la e discutiro problema da contaminação daágua. Daí nasceu o Ykinho. Cristianeconfeccio<strong>no</strong>u o “copo-personagem” ecomeçou a usá-lo com seus alu<strong>no</strong>s. Depois, desenvolveudinâmicas, brincadeiras e competições temáticas <strong>no</strong> festivalde sementes. Muitas crianças ganharam o copinho comoprêmio. A professora também convenceu a direção de suaescola a não mais usar copos descartáveis e passou a falarde temas como assoreamento, queimadas, desmatamento ematas ciliares em sala de aula.60 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>O homem <strong>do</strong> pequiA experiência de Édemo CôrreaTeve gente que achou que não era só teimosia. “O senhor tá certo,tá bom da cabeça?” Ou duvidaram da intenção. Ele continuava como juízo <strong>no</strong> lugar, mas, além de criar ga<strong>do</strong>, já tinha quebra<strong>do</strong> um poucoa cabeça, sim, plantan<strong>do</strong> arroz e milho por mais de dez a<strong>no</strong>s, emuma propriedade de 90 hectares, em Canarana, onde chegou em 1980.Sempre sonhara com uma terra boa para trabalhar. Apesar de ter vira<strong>do</strong>mecânico, vinha de uma família que tinha vivi<strong>do</strong> muitos a<strong>no</strong>s daagricultura, em Lins (SP).Antes de comprar a fazenda, foi caminhoneiro. Viajou bastante levan<strong>do</strong>arroz, soja, milho e madeira para Minas Gerais, Goiás, Pará...Desde que chegara em Canarana, o tamanho <strong><strong>do</strong>s</strong> pequis da região tinhachama<strong>do</strong> a atenção daquele homem que estava procuran<strong>do</strong> umaalternativa para produzir. Eles eram maiores, tinham mais polpa <strong>do</strong>que <strong>no</strong>s outros lugares. Édemo Côrrea, “Sêo” Édemo, foi amadurecen<strong>do</strong>a idéia devagar, planejan<strong>do</strong> com calma. Até que se decidiu. Aquilodevia ter algum futuro e ele queria mesmo apostar <strong>no</strong> <strong>no</strong>vo. Entestouque iria vender pequi.Não queria ser um ama<strong>do</strong>r, como alguns que pediam acesso nasfazendas para colher o fruto de graça e vendiam em pequenas quantidades.Estava disposto a pagar pelas frutas e sementes e achava queassim é que era o certo, já que queria transformar aquilo num negóciosério. Porque depois queria investir numa plantação própria, <strong>no</strong> sítioonde o milho e o arroz não tinham da<strong>do</strong> certo e onde continuavacrian<strong>do</strong> ga<strong>do</strong>.Algumas pessoas achavam aquilo esquisito porque o pequizeiro eramuito comum em qualquer lugar. Mas ele começou a plantar as árvores.Enquanto não davam frutos, em 1995 resolveu colocar o bloco, querdizer, a banca na rua de vez. Primeiro, começou a comprar quantidadesmaiores de alguns fazendeiros, que ficavam até meio desconfia<strong><strong>do</strong>s</strong> comaquela história de pagar pelo pequi, já que tinham acostuma<strong>do</strong>-se adá-lo de graça.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 61


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Sêo Édemo62 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>(...) Isso era num sába<strong>do</strong>. Preparei os pequis, os que estavambem maduros. Coloquei lavadinhos dentro de um saquinhoe os outros eu comecei a abrir na hora. Fui na feira e fizuma banca, na minha caminhonete, na tampa da minha caminhonete.Quan<strong>do</strong> eu vi, tinha vendi<strong>do</strong> as quarenta caixas depequi, e venden<strong>do</strong> a um preço na terra <strong>do</strong> pequi, a R$ 40,00.Por quê? Porque aquela pessoa que tem um pouco de recurso,ela não vai <strong>no</strong> mato enfrentar carrapato, enfrentar mosquito,abelha. Então, a gente tem que trazer pra eles, e aí eu vi queera uma coisa além de tu<strong>do</strong> comercial. Passa<strong><strong>do</strong>s</strong> uns <strong>do</strong>is outrês a<strong>no</strong>s, os fazendeiros de Canarana já me procuravam, pracomprar pequi deles, pra revender. (Sêo Édemo)Flor e fruto<strong>do</strong> pequiSímbolo <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>Sêo Édemo conhecia bem aquilo que queria comercializar. O pequié ingrediente importante na culinária <strong>do</strong> Centro-Oeste, Nordeste e <strong>no</strong>rtede Minas Gerais. Seu uso na alimentação e o manejo da espécie têmgrande destaque na cultura de inúmeras populações indígenas e tradicionais(quilombolas, ribeirinhos, sertanejos, geraizeiros etc).Variedades de pequizeiros vêm sen<strong>do</strong> desenvolvidas por dezenas degerações de comunidades que hoje habitam o Parque Indígena <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>,onde o fruto faz parte da mitologia de algumas delas e é consumi<strong>do</strong>em grandes quantidades. Para os Waurá, por exemplo, a fruta origi<strong>no</strong>use<strong><strong>do</strong>s</strong> testículos <strong>do</strong> jacaré e o beija-flor teria si<strong>do</strong> uma das primeirascriaturas a cultivá-la. Por isso, os <strong>do</strong>is animais são considera<strong><strong>do</strong>s</strong> por essepovo os <strong>do</strong><strong>no</strong>s e cria<strong>do</strong>res <strong>do</strong> pequi.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 63


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Há séculos, populações como essas descobriram que a fruta é umarica fonte de nutrientes, como as vitaminas B, C e D. Tanto o caroçoquanto o óleo deriva<strong>do</strong> dele são considera<strong><strong>do</strong>s</strong> medicinais, em especial <strong>no</strong>tratamento de problemas respiratórios e como estimula<strong>do</strong>res <strong>do</strong> funcionamento<strong>do</strong> fíga<strong>do</strong>.Apesar disso tu<strong>do</strong>, de ser considera<strong>do</strong> um símbolo <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong> e dalei proibir o corte e a comercialização de sua madeira, os pés de pequitambém vêm sofren<strong>do</strong> com o desmatamento. Quase 40% <strong><strong>do</strong>s</strong> 2 milhões dequilômetros quadra<strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong> – 800 mil quilômetros quadra<strong><strong>do</strong>s</strong>, umaárea equivalente a quatro vezes o Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Paraná – já foram derruba<strong><strong>do</strong>s</strong>.Árvore que dá lucroAs vendas de Sêo Édemo iam aumentan<strong>do</strong> aos poucos e ele começoua acreditar de verdade que poderia abrir um merca<strong>do</strong> para aquela frutanativa <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>. Começou a plantar pequizeiros para valer. Mas resolveufazer consórcio entre as duas atividades, manten<strong>do</strong> o ga<strong>do</strong> em áreasonde o pequi já estava adulto – os animais gostam de comer as plantasjovens. Nas fazendas fornece<strong>do</strong>ras, também pregava a idéia. Já que tinhamergulha<strong>do</strong> de cabeça naquela história, também estava preocupa<strong>do</strong> comos pequizais fora de sua propriedade.O pequi já vinha sen<strong>do</strong> comercializa<strong>do</strong> em outros lugares.Se você tem uma árvore que lhe dá lucro, você não derrubaela. Então, eu cheguei ao ponto, <strong>no</strong>s cálculos que fiz... temarvore que dá mais de <strong>do</strong>is mil frutos por a<strong>no</strong> (...). Então,a pessoa ten<strong>do</strong> uma renda dessa significa uma bezerra pora<strong>no</strong>. Uma bezerra <strong>no</strong>vinha vale R$ 200. Hoje, vale um poucomais porque o ga<strong>do</strong> subiu em tor<strong>no</strong> disso. Dá para você consorciaro ga<strong>do</strong> com o pequi, e deixa aquela floresta <strong>no</strong> lugar.(Sêo Édemo, julho de 2007)Fazendeiros iam procurá-lo para comprar sementes e mudas. Pelome<strong>no</strong>s começaram a ter a <strong>no</strong>ção de que a espécie tinha valor econômico64 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>e podia ser usada para recuperar áreas degradadas. Édemo construiu umviveiro em sua fazenda e, de início, vendia em tor<strong>no</strong> de duas mil mudaspor a<strong>no</strong>. A produção foi crescen<strong>do</strong> gradualmente: três mil, quatro mil,cinco mil. Começou a fazer enxertos e selecionar variedades com frutosmaiores. Adquiriu uma que crescia <strong>no</strong> brejo, por exemplo, coisa incomumna região de Canarana. Viajou para conhecer <strong>no</strong>vas variedades,participava de festas e exposições.Em 2006, o viveiro já produzia 20 mil mudas, cada uma vendida aR$ 5,00. Na época, a produção de frutas de um hectare, com densidadede 150 pés, equivalia a 70 bois. Uma só árvore chegou a render R$650, segun<strong>do</strong> o agricultor. A propriedade continuava manten<strong>do</strong>-se coma criação de ga<strong>do</strong>, mas a receita com a venda de frutas, mudas e sementesaumentava e chegou a representar até 50% de seu faturamento total.O tempo provou que aquele senhor que tinha si<strong>do</strong> considera<strong>do</strong> excêntricosabia o que estava fazen<strong>do</strong>. No Centro-Oeste, Minas Gerais e interiorde São Paulo, havia demanda para o produto. Em 2002, na Ceasa deGoiânia, onde Édemo também passou a vender, foram comercializadas2,8 mil toneladas de pequi in natura, com preço médio de R$ 460,00a tonelada – um movimento de R$ 1,288 milhões. Além <strong>do</strong> pequi comarroz e da galinhada com pequi, entre outros pratos tradicionais, hoje seencontra <strong>no</strong> comércio de várias cidades o pequi em conserva, em pastaou na forma de licor, <strong>do</strong>ces, sucos, sorvetes... Começa-se a falar também<strong>do</strong> potencial da fruta para a produção de biodiesel.Eu me bati muito para fazer reflorestamento com pequi.Porque além de ser um reflorestamento aceitável pelo Ibama,tinha uma vantagem, que ele trazia um retor<strong>no</strong>. Hoje,ninguém quer mais trabalhar sem retor<strong>no</strong> e nem pode. Nasituação que atravessamos, não podemos trabalhar sem umretor<strong>no</strong>. O eucalipto dá retor<strong>no</strong>, mas com dez a<strong>no</strong>s você cortae tem de esperar mais oito ou dez para crescer de <strong>no</strong>vo e opequi, depois de dez a<strong>no</strong>s, ele começa a te dar um lucro to<strong><strong>do</strong>s</strong>os a<strong>no</strong>s. (Sêo Édemo)<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 65


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Herança de famíliaQuan<strong>do</strong> chegou <strong>no</strong> Mato Grosso, Sêo Édemo até concordava que erapreciso abrir <strong>no</strong>vas áreas para se plantar e criar o ga<strong>do</strong>, mas a velocidadeem que o desmatamento avançava não parecia ter muita lógica. Talvezele já imaginasse que os pequizeiros poderiam começar a rarear em algunslugares. Mesmo sem ter informações técnicas sobre as conseqüênciasda derrubada da floresta e <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>, ele acreditava que se deviaapostar <strong>no</strong> potencial econômico de suas plantas. Na verdade, já tinhaum pensamento socioambiental e usava técnicas hoje reconhecidas porpesquisa<strong>do</strong>res e especialistas. Por mais que não parasse para pensar muitoque seu negócio pudesse ser considera<strong>do</strong> assim. Muito dessa atitude edesse conhecimento era herança de família.Meu pai pensava longe... “vai chegar um tempo que o desmatamento...”Naquele tempo nem se falava em desmatamento, eracorte de arvores, derrubada. Um dia vai fazer falta porque nãoestá mais ten<strong>do</strong> arvores. Quan<strong>do</strong> você corta as arvores da cabeçade um rio, ele morre. Ele falava isso. A gente via isso na própriaexperiência, na própria prática.(...) Tinha li<strong>do</strong> alguma coisa sobre agroflorestas. Eu tenhoa impressão de que eu fazia de uma maneira diferente antes daformação. Eu plantava dentro <strong>do</strong> mato, que já vinha de tradição<strong>do</strong> meu pai. Uma vez disse ao meu pai: “papai, eu plantei bastantecôco lá e as capivaras acabam com tu<strong>do</strong>”. Ele falou assim:“você não deu comida para elas; planta duas fileiras de milho nabeira <strong>do</strong> mato que você vai ver como elas não vêm mais”.Quan<strong>do</strong> plantei meu pequizal, logo em seguida plantei cajuem volta <strong>do</strong> pequizal e plantei goiaba na beira <strong>do</strong> mato. Então amaracanã e a arara veio <strong>no</strong> caju. Enquanto isso, o pequi flora,cresce, amadurece, a gente colhe e elas não atrapalham. Então,foi uma coisa que eu fiz, deu certo, estou passan<strong>do</strong> para frentehoje. (Sêo Édemo)66 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>A formação de <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> na fazenda <strong>do</strong> pequiNa verdade, Édemo Côrrea já era um especialista de “<strong>no</strong>tório saber”,aquela pessoa que é chamada a dar aulas e cursos em universidades eoutras instituições de ensi<strong>no</strong> mesmo sem ter qualificação técnica formal.Por essa qualidade, foi seleciona<strong>do</strong> para participar da formação <strong><strong>do</strong>s</strong><strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>. Da parte dele, queria aprofundar, sistematizare partilhar seus conhecimentos, trocar experiências, além de aperfeiçoare ampliar seus negócios.Participou ativamente da formação, discutin<strong>do</strong> as alternativas viáveispara a geração de renda e a conservação na Bacia <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>. Comprometeu-sea realizar uma série de ações em sua propriedade, como ocercamento e o enriquecimento de matas ciliares com sistemas agroflorestais.Mas também defendeu suas idéias e ensi<strong>no</strong>u muito <strong>do</strong> que játinha aprendi<strong>do</strong> por conta própria, com outros agricultores e <strong>no</strong>s várioslugares por onde an<strong>do</strong>u. Sua visão de futuro e empreende<strong>do</strong>rismo foramreconheci<strong><strong>do</strong>s</strong> como exemplos.Visita de <strong>agentes</strong><strong>socioambientais</strong>à propriedadede Sêo Édemo. Oagricultor mostrou asiniciativas realizadasem sua fazenda,como o consórcio <strong>do</strong>pequi com outrasespécies <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>e a experiência demanejo silvopastorialusan<strong>do</strong> o primeiro<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 67


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>No meu caso, eu encaro isso como uma abertura. A gente,por exemplo, tá trabalhan<strong>do</strong>, fazen<strong>do</strong> as coisas, masnão está muito conscientiza<strong>do</strong> ou fica meio acanha<strong>do</strong>, meioamedronta<strong>do</strong>. Então eu perdi aquele me<strong>do</strong>. (...) Amedronta<strong>do</strong>assim: você vai fazer uma coisa e fica se perguntan<strong>do</strong>“será que vai dar certo? Será que é isso? Será que é aquilo?Será que não é?” E depois que a gente fez o curso, agente viu que... Eu participei muito das oficinas de agroflorestas,não perdi nenhuma apresentação. Isso pra mimfoi muito importante (...). Abriu os olhos da gente, abriuuma estrada <strong>no</strong>va pra gente. Porque a gente ficou maisatira<strong>do</strong>, mais arroja<strong>do</strong>. E outra: a gente encontrou companheiros.(Sêo Édemo)Durante a terceira oficina da formação, em agosto de 2006, osforman<strong><strong>do</strong>s</strong> visitaram a propriedade de Édemo. Conheceram seu pequizal,o viveiro, sua Reserva Legal, a área cercada para regeneraçãonatural e enriquecimento com buritis. O lençol freático havia subi<strong>do</strong> ea vazão da nascente aumentara com seu isolamento e o plantio <strong><strong>do</strong>s</strong> pésde pequi. O pasto havia si<strong>do</strong> maneja<strong>do</strong> há pouco: o roça<strong>do</strong> manteveas árvores frutíferas e medicinais, o que, além de manter a biodiversidade,dava sombra ao ga<strong>do</strong>.(...) Comecei a plantar outras plantas <strong>no</strong> meio <strong>do</strong> pequi.Antes fiz uma lavoura só de pequi. Então, depois <strong>do</strong> conhecimentoque aprendi, foi onde eu comecei a plantar mangaba,cagaita, baru. Hoje, eu tenho pequi com mangaba, com cagaita,com jatobá, com baru. A abertura veio aí, uma i<strong>no</strong>vaçãoque eu aprendi lá tiran<strong>do</strong> da agrofloresta, uma floresta depequizal. (Sêo Édemo, julho de 2007)68 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>FuturoO homem <strong>do</strong> pequi de Canarana comprovou que muitas soluções paraos problemas <strong>socioambientais</strong> podem já estar sen<strong>do</strong> gestadas por quemestá viven<strong>do</strong> na pele suas consequências. Que, de fato, o conhecimentolocal precisa ser identifica<strong>do</strong> e difundi<strong>do</strong>, não apenas para ser recolhi<strong>do</strong>e registra<strong>do</strong> em pesquisas que ficarão arquivadas nas bibliotecas e bancosde da<strong><strong>do</strong>s</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> grandes centros, mas para gerar alternativas, apontar <strong>no</strong>voscaminhos nas comunidades onde foi ele desenvolvi<strong>do</strong> e guarda<strong>do</strong> comcuida<strong>do</strong>, perpassan<strong>do</strong> as histórias de vida de pessoas especiais, <strong>agentes</strong><strong>socioambientais</strong> multiplica<strong>do</strong>res espalha<strong><strong>do</strong>s</strong> por aí e ainda anônimos.Era esse um princípio da campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong> e da formação queocorreu em Canarana.Em 2006, a fazenda <strong>do</strong> pequi vendeu duas toneladas de sementes,com um faturamento de R$ 8 mil. Metade <strong>do</strong> total foi destinada a projetosde recuperação de matas ciliares e implantação de agroflorestas emprojetos da campanha – a fruta-símbolo <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong> também virou marcaregistrada da mobilização. No mesmo a<strong>no</strong>, foram produzidas 30 milmudas na propriedade de Édemo. Ele também <strong>do</strong>ou cerca de mil mudasa iniciativas que não participavam da ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>. Na época, existiamna fazenda cinco mil pés de pequi, de 17 variedades, três mil produzin<strong>do</strong>a to<strong>do</strong> vapor.Viveiro jáabastece algumaspropriedadesdentro e fora daregião<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 69


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Alu<strong>no</strong>s expõemtrabalhos <strong>no</strong> sítiode Édemo, que foivisita<strong>do</strong> por elesdurante o festivalde sementes deCanaranaA formação de <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> reforçou a paixão <strong>do</strong> agricultorpor outras frutas <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong> com potencial econômico e a crença napossibilidade de abrir <strong>no</strong>vos merca<strong><strong>do</strong>s</strong> para elas. Um <strong><strong>do</strong>s</strong> caminhos queele já vinha trilhan<strong>do</strong> era estruturar melhor o beneficiamento, a buscapelo aumento de escala da produção, além da criação de <strong>no</strong>vos produtose formas de apresentá-lo. Em 2007, começou a distribuir pacotes depequi embala<strong><strong>do</strong>s</strong> a vácuo e desenvolveu um salgadinho à base da frutamuito gostoso, pré-pronto.Pro futuro, eu estou fazen<strong>do</strong> um estu<strong>do</strong>, é assim um trabalhozinhocom a mangaba. Você pode tomar o sorvete de mangaba,pode comer o bolo de mangaba, o pão feito com a mangaba,o <strong>do</strong>ce da mangaba, a geléia, enfim... Então são produtosque têm bastante produtividade, bastante diversidade. Eu estoupegan<strong>do</strong> primeiro o pequi. O pequi tem bastante utilidade.Depois vem o baru. Agora eu quero trabalhar com a mangaba,que é o próximo. O agricultor tem de trabalhar com uma coisae ele pode ter pequi, baru e mangaba na propriedade dele tu<strong>do</strong>num tempo só, tu<strong>do</strong> mistura<strong>do</strong>. (Sêo Édemo)70 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Farinha, açúcar mascavo, mela<strong>do</strong>,cachaça e conservaçãoA experiência de Arman<strong>do</strong> Menin e da AssociaçãoComunitária Agroecológica Estrela da PazBem peque<strong>no</strong>, Arman<strong>do</strong> Menin, o “Sêo” Menin, começou a trabalhar,em Getúlio Vargas (RS), na propriedade <strong><strong>do</strong>s</strong> pais, peque<strong>no</strong>sagricultores defensores <strong>do</strong> regime de mutirão. Aprendeu a plantar, cuidarda criação, produzir por conta própria ou coletivamente. Depois,casou-se com <strong>do</strong>na Lurdes, foi para Santa Catarina. Ajudava na igreja,foi líder comunitário e <strong>do</strong> movimento <strong><strong>do</strong>s</strong> trabalha<strong>do</strong>res rurais. Vieramos cinco filhos, um a<strong>do</strong>tivo. A profissão? Continuava a mesma: agricultorfamiliar.Em 1987, mu<strong>do</strong>u-se para um lugar distante <strong>no</strong> <strong>no</strong>rdeste <strong>do</strong> MatoGrosso, Querência, espécie de El<strong>do</strong>ra<strong>do</strong> da agricultura e da pecuária durantea<strong>no</strong>s. Continuava participan<strong>do</strong> da igreja e de associações, ocupouum cargo público importante <strong>no</strong> município. Fez de um tu<strong>do</strong> na vida.Não largava era o desejo de viver da terra. Muitas histórias para contar...Mas esta história aqui começa <strong>no</strong> dia 24 de julho de 2003. Para variar,em lugar de roça: o Projeto de Assentamento (PA) Brasil Novo,em Querência. A mesmíssima idéia de produzir em um pedaço de chãolevou o homem até ali para tentar colher um futuro melhor para filhos,<strong>no</strong>ras, genros e netos. Trabalhan<strong>do</strong> de sol a sol para manter a esperançaacesa. Não envelhecia o sonho de produzir mais e melhor <strong>no</strong> campo, depreferência com mais gente para sonhar e produzir junto.As dificuldades eram muitas. O lote de Sêo Menin ficava a 135 quilômetrosda cidade, por estrada de chão. Muitas áreas <strong>do</strong> PA já estavamdegradadas antes de sua implantação ou continuavam sen<strong>do</strong> abertas semnenhum critério. O resulta<strong>do</strong> era o empobrecimento <strong>do</strong> solo e o assoreamentode córregos. As famílias praticavam uma pecuária extensiva epouco produtiva, em geral insuficiente para mantê-las. Imperava a dificuldadede cooperação. As pessoas tinham costumes muito distintos,vinham de lugares diferentes <strong>do</strong> País.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 71


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Sêo Meninem seu lote72 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Na Bacia <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong> <strong>no</strong> Mato Grosso, na maioria <strong><strong>do</strong>s</strong> casos, os assentamentosforam implanta<strong><strong>do</strong>s</strong> em locais distantes, sem planejamento e infraestrutura,com quase nenhum apoio continua<strong>do</strong>, investimento público eassistência técnica. Não raro, para atender interesses de políticos, especula<strong>do</strong>resimobiliários, grandes proprietários e até madeireiras ilegais. O aban<strong>do</strong><strong>no</strong>obrigava muitos parceleiros a trabalhar nas fazendas vizinhas, vendermadeira ou o próprio lote. Muita gente acabava acreditan<strong>do</strong> em promessasvagas, aceitan<strong>do</strong> uma pequena ajuda ou presente em troca de um voto.A maior parte <strong><strong>do</strong>s</strong> mais de 300 assenta<strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>do</strong> PA Brasil Novo concordavaque aquela situação era culpa <strong>do</strong> gover<strong>no</strong>. Mas como enfrentar issotu<strong>do</strong> <strong>no</strong> meio de gente tão diferente, sem o hábito ou a capacidade dese organizar? Ficar para<strong>do</strong> era que não adiantava. Era preciso cobrar dasautoridades. Mas enquanto isso não dava resulta<strong>do</strong>, alguns resolveram arregaçaras mangas logo de uma vez e agir na base <strong>do</strong> “faça você mesmo”.A ACEP e o “grupo da farinheira”Com cerca de um a<strong>no</strong> <strong>no</strong> assentamento e a herança de um espíritode equipe imbatível, Sêo Menin assumiu a diretoria da escola, tor<strong>no</strong>u-seresponsável pela manutenção da igreja e <strong>do</strong> fornecimento de energia daagrovila. Entrou também para a Associação Comunitária Estrela da Paz<strong><strong>do</strong>s</strong> Peque<strong>no</strong>s Produtores e Produtoras Rurais <strong>do</strong> Assentamento BrasilNovo (ACEP-BN).Matas às margens<strong><strong>do</strong>s</strong> corpos deágua começarama ser recuperadas<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 73


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>A organização apareceu <strong>no</strong> início de 2003 com o objetivo de buscaralternativas de renda para cerca de 40 parceleiros diante <strong>do</strong> que to<strong>do</strong>mun<strong>do</strong> já sabia, mas talvez não quisesse admitir: a criação de ga<strong>do</strong> ali erainsustentável. Chegou a receber alguma ajuda da Comissão Pastoral daTerra (CPT) e <strong>do</strong> Projeto Gestar (Gestão Ambiental Rural), <strong>do</strong> <strong>Ministério</strong><strong>do</strong> Meio Ambiente (MMA), por meio da Associação Nossa Senhorada Assunção (Ansa), de São Félix <strong>do</strong> Araguaia.Tu<strong>do</strong> começou em reuniões com um grupo de pessoas quejá tinha forma<strong>do</strong>, para cultivo de banana, uma área de terraque estava destinada para fazer uma roça coletiva. Partimosda necessidade que to<strong><strong>do</strong>s</strong> tinham: vontade de trabalhar emgrupo e com mais alternativas de produção. Também aí, contao aprendiza<strong>do</strong> de vivência que herdei <strong><strong>do</strong>s</strong> meus pais, que eratrabalhar na forma de mutirão e em grupo. (Sêo Menin)A CPT e a Ansa trouxeram idéias sobre a necessidade de fortalecer aorganização local, diversificar a produção e conservar o meio ambiente.Alguns associa<strong><strong>do</strong>s</strong> decidiram tentar plantar, beneficiar e armazenar seusprodutos de forma coletiva e com <strong>no</strong>vas técnicas. Eles dividiram-se emgrupos para trabalhar com cultivos específicos. A partir de algumas reuniõese conversas, nasceu o “grupo da farinheira”.Quan<strong>do</strong> tivemos a idéia de iniciar o trabalho coletivo, foramconvidadas para reunião umas 28 famílias. Compareceramcerca de 10. Quan<strong>do</strong> dissemos “vamos tocar o trabalhoem frente”, ficaram seis famílias e, atualmente, sobraramquatro. Uma delas é a minha família (eu e minha esposa).Acredito que as pessoas estão acostumadas a exercer o trabalhode forma individual e acham difícil começar a trabalharde forma coletiva. (Sêo Menin, setembro de 2007)74 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>A princípio, essas famílias fizeram um plantio comunitário de 14hectares de mandioca, cana-de-açúcar e amen<strong>do</strong>im. Depois, compraramuma farinheira e construíram em mutirão um peque<strong>no</strong> galpão. Já existiaali um velho alambique. Resolveram participar, junto com outros membrosda associação, de cursos de industrialização de deriva<strong><strong>do</strong>s</strong> da cana emandioca <strong>do</strong> Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar). O grupoda farinheira começou a produzir e vender açúcar mascavo, rapadura,puba, polvilho e a cachaça “Menin” – tu<strong>do</strong> sem agrotóxicos.Aumentar a produtividade, preservar a água e o soloEm 2005, fui seleciona<strong>do</strong> para participar <strong>do</strong> curso de<strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> promovi<strong>do</strong> pela campanha ‘Y Ikatu<strong>Xingu</strong>. Quan<strong>do</strong> da seleção, fiquei muito interessa<strong>do</strong>, porque<strong>no</strong> local onde moro com minha família tem extensas áreasde pastagens para criação de ga<strong>do</strong>, desmatamento à beirade córrego e to<strong>do</strong> a<strong>no</strong> muita queimada. Queria reverter essequadro e tinha plena certeza que o curso iria <strong>no</strong>s trazer algumasrespostas de como resolver isso.Com o decorrer das oficinas, foi uma <strong>no</strong>va experiênciapara mim, porque consegui aprender algo que não sabia.Elas me deram condições de repassar esse conhecimento aosmeus companheiros. Hoje, vejo que, apesar da experiênciaque temos, porque estou trabalhan<strong>do</strong> na agricultura desdecriança, sempre precisamos aprender mais.Também o curso serviu para mostrar que podemos continuarexploran<strong>do</strong> a terra, mas de forma diferente, plantan<strong>do</strong>ou cultivan<strong>do</strong> de forma diversificada e consorciada, nãomais cultivar as plantas sozinhas; e que o trabalho coletivoé que vai dar ânimo às pessoas e daí os resulta<strong><strong>do</strong>s</strong> aparecem.(Sêo Menin)<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 75


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Sêo Menin começou a participar da formação de <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>a partir da segunda oficina, entre março e abril de 2006. Ele estavapreocupa<strong>do</strong> em aumentar a produtividade, preservar a água e o solo.Saiu <strong>do</strong> encontro disposto a “amadurecer” as idéias sobre meio ambiente<strong>no</strong> assentamento e pediu apoio para implantar em sua propriedade umaexperiência-modelo de conservação e geração de renda. Os assenta<strong><strong>do</strong>s</strong> dareforma agrária precisavam “ver para crer”.Menin não esperou muito e começou a recuperar, por conta própria,três hectares de mata na beira <strong>do</strong> Córrego da Serraria, que passaem seu lote, com plantio de mudas e sementes de espécies florestaise frutíferas: milho, cana, mandioca, seringa, pequi. Resolveu aindamobilizar a associação e outros assenta<strong><strong>do</strong>s</strong> com o mesmo objetivo deViveiro foi construí<strong>do</strong> emregime de mutirão. Meninimplantou sistema agroflorestalpara começar a recuperar partede sua mata ciliar76 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>reflorestar a beira de cursos de água. As famílias <strong>do</strong> grupo da farinheiracomprometeram-se a reflorestar mais seis hectares em seus próprios lotesplantan<strong>do</strong> mandioca em consórcio com seringueira, pequi, milho,cana-de-açúcar, baru, entre outros.De 19 a 21 de outubro de 2006, a formação <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>promoveu <strong>no</strong> lote de Menin uma oficina de agrofloresta com oespecialista Ernest Göstch. Além <strong><strong>do</strong>s</strong> forman<strong><strong>do</strong>s</strong>, também participaramfilia<strong><strong>do</strong>s</strong> da ACEP-BN, outros assenta<strong><strong>do</strong>s</strong>, representantes de sindicatos eórgãos públicos, entre outras 40 pessoas. Em uma área experimental demeio hectare, foram plantadas espécies como baru, jatobá, pequi, mangaba,cupuaçu, pupunha, bacaba, gueroba, mandioca, abacaxi, abóbora,milho, caju, arroz etc.Mais tarde, a assentada e professora Alessandra Silva, da Escola Municipalde Educação Básica <strong>do</strong> PA Brasil Novo, que havia participa<strong>do</strong> daatividade, levou seus alu<strong>no</strong>s ao local para explicá-la e continuar o plantioagroflorestal com a técnica da “muvuca”. A partir da oficina, algunsparceleiros também começaram a cuidar melhor <strong>do</strong> lixo, deixan<strong>do</strong> dejogá-lo <strong>no</strong>s córregos.Cinco mil pequizeirosO trabalho da associação já era reconheci<strong>do</strong> antes e começou a chamarainda mais a atenção. Instituições parceiras da campanha ‘Y Ikatu<strong>Xingu</strong>, como o ISA, a prefeitura de Querência e o Centro de ApoioSócio-Ambiental (Casa), dispuseram-se a financiar e executar ações derecuperação de matas de beira de rio, implantação de agroflorestas, produçãode mudas e formação.Em 2006, ACEP-BN virou Associação Comunitária “Agroecológica”Estrela da Paz <strong><strong>do</strong>s</strong> Peque<strong>no</strong>s Produtores e Produtoras Rurais <strong>do</strong> PA BrasilNovo (ACEP). Depois de reuniões com as famílias associadas, 16 delascercaram 30 hectares de matas ciliares. Deste total, 15 hectares começarama ser enriqueci<strong><strong>do</strong>s</strong> com sistema agroflorestais, consorcian<strong>do</strong> café, milho eseringa com mais 50 espécies nativas. O mesmo foi feito em 12 hectaresem área seca. O plantio foi feito com sementes e mudas de um viveiro de400 m 2 , hoje com capacidade de produção de 10 mil mudas por a<strong>no</strong>, amplia<strong>do</strong>a partir de um viveiro antigo que já existia <strong>no</strong> lote de Menin.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 77


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Antes, <strong>no</strong> PA, havia <strong>no</strong> máximo 200 pequizeiros <strong>no</strong>s lotesde 317 famílias. Após um a<strong>no</strong> da iniciativa, mais de cinco milárvores da espécie foram plantadas, além de outros tipos deespécies frutíferas e fontes de madeira. (...) Isso tu<strong>do</strong> mostrauma mudança de visão e postura <strong>do</strong> agricultor, que passama ver as culturas florestais perenes e a conservação <strong>do</strong> meioambiente como formas alternativas para a geração de renda,para seu bem-estar e também para a sua fixação e permanência<strong>no</strong> campo. A minha maior dificuldade foi convencer oscompanheiros para que acreditassem que isso podia dar certoe que também não eram necessários tantos investimentos paraplantar árvores. (Sêo Menin)A participação nessas ações injetou mais ânimo <strong>no</strong> grupo da farinheira,que aprofun<strong>do</strong>u a prática das <strong>no</strong>vas idéias. Em 2006, foram produzi<strong><strong>do</strong>s</strong>cinco mil litros de cachaça, 300 quilos de açúcar mascavo e três mil quilosde farinha de mandioca. Em 2007, a produção alcançou 2,6 mil litros decachaça, 530 quilos de açúcar mascavo e quatro mil quilos de farinha. Entreos <strong>do</strong>is a<strong>no</strong>s, também foram produzi<strong><strong>do</strong>s</strong> 400 quilos de mela<strong>do</strong> de canae cerca de 420 quilos de rapadura. A renda das famílias melhorou.Novos projetosestimularam o “grupoda farinheira” a tentaraumentar a produção78 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Resulta<strong><strong>do</strong>s</strong> daagroflorestacomeçaram aaparecerEssas iniciativas estão repercutin<strong>do</strong> lentamente <strong>no</strong> assentamento,porque algumas pessoas ainda não conseguem desenvolvero trabalho comunitário e esse sistema de consorciarespécies de ciclo curto com árvores. Alguns elogiam e dizemque estamos <strong>no</strong> caminho certo e outros criticam.(...) Isso também pode mostrar que ações coletivas são demuita importância <strong>no</strong> desenvolvimento da comunidade.(...) Acredito que a tendência é aumentar os SAFs <strong>no</strong> PA.Acredito que tu<strong>do</strong> isso que estamos fazen<strong>do</strong> é para <strong>no</strong>ssos netos,que <strong>no</strong> futuro irão ter água boa para beber. Em breve, aspessoas sentirão a necessidade de começar recuperar suas áreasdegradadas, principalmente a mata ciliar, e vão perceberque com as agrofloresas poderão produzir, cuidar da água emanter a terra sempre fértil. (Sêo Menin)Em época de produção, os integrantes <strong>do</strong> grupo da farinheira chegama passar semanas seguidas trabalhan<strong>do</strong> das 5h da manhã às 7h da<strong>no</strong>ite. Na cidade, a distribuição depende muitas vezes de caronas deamigos. Vira-e-mexe, bate aquele desânimo. Mas o grupo vai tocan<strong>do</strong><strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 79


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>o barco, uns apoian<strong>do</strong>-se <strong>no</strong>s outros, ao sabor das dificuldades, mas tambémdas boas <strong>no</strong>vas.Em 2007, a campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong> indicou a ACEP para desenvolvermais um projeto de recuperação de matas ciliares financia<strong>do</strong> peloInstituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Foramprevistos investimentos para beneficiar 32 famílias com cercamento deáreas, compra de sementes e bebe<strong>do</strong>uros para o ga<strong>do</strong>.Toda <strong>no</strong>ssa produção está conseguin<strong>do</strong> buscar o comérciolocal, mas para chegar ao consumi<strong>do</strong>r da cidade não foi fácil.Agora a procura está sen<strong>do</strong> grande, tanto a procura pela cachaçaquanto pelo açúcar mascavo. (...) Nosso maior problemaé mesmo o transporte. Nem o grupo, nem a associação têm umcarro. Precisamos tentar comprar um. Vamos ter de melhorarcada vez mais a qualidade <strong>do</strong> produto, sua aparência, a embalagem.Queremos aumentar mais a produção a cada a<strong>no</strong>. Maso crescimento vai ser devagar, porque estamos venden<strong>do</strong> só emQuerência por enquanto. (Sêo Menin, setembro de 2007)RespostasComo difundir e dar escala aos SAFs? Como viabilizar sua manutençãoe a comercialização de seus produtos, crian<strong>do</strong> arranjos produtivosconsistentes, capazes de durar, em áreas como o PA Brasil Novo? Comogarantir a auto<strong>no</strong>mia econômica, organizacional, política <strong><strong>do</strong>s</strong> assentamentosde reforma agrária? Perguntas como essas ainda não têm respostasexatas. A história de Sêo Menin, <strong>do</strong> grupo da farinheira e da ACEP deixaclaro o desafio coloca<strong>do</strong> à agricultura familiar e aos sistemas agroflorestaisnão só na Bacia <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong> e <strong>no</strong> Mato Grosso. Ela espelha a falta de planejamentoe de políticas governamentais que apóiem a conservação <strong>do</strong> meioambiente e a produção <strong><strong>do</strong>s</strong> peque<strong>no</strong>s produtores. Mas mostra tambémcomo a formação de lideranças <strong>socioambientais</strong>, o fortalecimento das organizaçõeslocais e o espírito de luta de homens simples <strong>do</strong> campo podemsemear soluções e alternativas que estão à espera de brotar.80 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Encontro históricoEm maio de 2007, a Associação Indígena Kĩsêdjê(AIK), em parceria com o ISA, realizou uma expediçãopara localizar e visitar sítios e acampamentos históricos<strong>do</strong> povo Kĩsêdjê na região de Querência, ao longo <strong>do</strong> RioSuiá-Miçu e de alguns de seus afluentes. Esses lugaresforam habita<strong><strong>do</strong>s</strong> desde centenas de a<strong>no</strong>s até a décadade 1950 por esses índios. Após sua transferência para o Parque Indígena <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>, na década de1960, eles deixaram de utilizar as áreas mais distantes, <strong>no</strong> alto curso e cabeceiras <strong>do</strong> Suiá, tanto peladistância quanto pelas mudanças provocadas pela expansão da agropecuária. Mais de 30 pessoasparticiparam da viagem, entre elas o cacique Kuiussi, o presidente da AIK, Winti Suyá, e o representanteda Associação Terra Indígena <strong>Xingu</strong> (Atix), Ianuculá Kaiabi Suyá. Eu e Angelise Nadal, assessoras<strong>do</strong> ISA, e a antropóloga Marcela Coelho, da Universidade de Brasílila (UnB), fomos convidadas paraajudar a fazer o registro e identificação de cada área visitada.Uma delas foi o Projeto de Assentamento Brasil Novo, onde o ISA realizava, desde 2006, umtrabalho em parceria com a Associação Comunitária Estrela da Paz. Na chegada da comitiva, fomosaplaudi<strong><strong>do</strong>s</strong> e acolhi<strong><strong>do</strong>s</strong> pelos parceleiros. Durante a <strong>no</strong>ite, <strong>no</strong>s reunimos para conversar. O caciqueKuiussi disse em sua língua: “eu nasci aqui”. Traduzida para o português, sua fala foi marcada pelagrande tristeza de como ele via o desmatamento, a destruição de muitos <strong><strong>do</strong>s</strong> antigos acampamentosKĩsêdjê e <strong><strong>do</strong>s</strong> locais onde existiam recursos naturais importantes para eles. Kuiussi manifestou apreocupação com o futuro e a sobrevivência de seu povo e <strong>do</strong> rio. To<strong><strong>do</strong>s</strong> os presentes acompanhavamcom certa apreensão o discurso <strong>do</strong> cacique. Sêo Menin também falou sobre o trabalho da associaçãoe o que os parceleiros estavam fazen<strong>do</strong> para recuperar o estrago causa<strong>do</strong> pelos não-indígenas.No dia seguinte, seguimos os agricultores para conhecer os projetos-piloto coordena<strong><strong>do</strong>s</strong> pelotécnico <strong>do</strong> ISA Eduar<strong>do</strong> Malta. Os índios aprovaram a introdução de agroflorestas como forma deacelerar a regeneração das matas ciliares e ganharam sementes. O cacique Kuiussi, antes reticente,aprovou o que viu, sorriu e abraçou o anfitrião. Partimos de volta para a beira rio, acompanha<strong><strong>do</strong>s</strong> porum caminhão cheio de agricultores, que se despediram de nós com um ace<strong>no</strong> carinhoso.O encontro histórico representou um marco importante na tentativa de diálogo entre duas comunidadestão distintas. Na história <strong>do</strong> contato entre os <strong>do</strong>is mun<strong><strong>do</strong>s</strong>, essa foi a primeira vez que oconflito deu lugar ao reconhecimento e à valorização <strong>do</strong> saber alheio e da diversidade das culturas.ROSELY SANCHESBióloga, assessora <strong>do</strong> Instituto Socioambiental<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 81


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Ricar<strong>do</strong> e Luzia emseu lote82 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>O sonho de Ricar<strong>do</strong> e LuziaA experiência <strong>no</strong> PA JaraguáComeçaram a imaginar as coisas que construiriam juntos alguns mesesantes, quan<strong>do</strong> souberam que teriam direito ao lote de 43 hectares.Como seria a casa, a cisterna, o quintal, a lavoura. Era como um sonho,acalenta<strong>do</strong> durante a<strong>no</strong>s na vida <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>do</strong>is, mesmo antes de se casarem,em 1996. Eles tinham nasci<strong>do</strong> na zona rural de Barra <strong>do</strong> Garças (MT).Foram cria<strong><strong>do</strong>s</strong> a vida toda <strong>no</strong> “mato”. Trabalharam como emprega<strong><strong>do</strong>s</strong>, emfazendas da região, também em Água Boa e Nova Xavantina. Agora eraali, naquele lugar que eles nem conheciam direito, que o sonho de Ricar<strong>do</strong>Dias Batista e Luzia Pereira da Silva Dias Batista ia virar realidade.Sabe quan<strong>do</strong> os pais esperam os filhos e fazem pla<strong>no</strong>s paraeles. Este lote é como se fosse <strong>no</strong>sso filho: fizemos pla<strong>no</strong>s praele. Pensei: “já que ganhei este pedaço de terra, eu quero fazeralgo de bom aqui”. Pois na terra <strong><strong>do</strong>s</strong> outros, quan<strong>do</strong> éramosemprega<strong><strong>do</strong>s</strong>, num podia fazer nada <strong>do</strong> gosto da gente. (Ricar<strong>do</strong>)Chegaram <strong>no</strong> dia sete de abril de 1999. Lá estava ele, o sonho: umdescampa<strong>do</strong> de pasto seco e degrada<strong>do</strong>. Quase nenhuma árvore. Daío <strong>no</strong>me <strong>do</strong> lugar: Projeto de Assentamento (PA) Jaraguá, que é um capimforrageiro comum em to<strong>do</strong> País. No lote, também tinha um campode murundus, espécie de várzea <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>. A área ficava a uns 40quilômetros da sede urbana de Água Boa. A mesma história de sempre:o gover<strong>no</strong> criara o assentamento em um lugar de difícil acesso, com aterra já desmatada e empobrecida, aban<strong>do</strong>nan<strong>do</strong> os assenta<strong><strong>do</strong>s</strong>.Mas Ricar<strong>do</strong> e Luzia eram desse tipo de gente que não desiste fácil.Primeiro, ergueram uma barraquinha de lona. Começaram a plantarmandioca para fazer farinha. A princípio, o nível da água na cisternabatia <strong>no</strong>s quatro metros, mas depois, por uns três a<strong>no</strong>s consecutivos,não passava de uns 30 centímetros durante a seca. Foram plantan<strong>do</strong><strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 83


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>árvores. Conseguiram construir um barraco de madeira. Tinha a criaçãode ga<strong>do</strong> também. E semearam mais árvores para ter sombra e frutas.Naquele tempo, quan<strong>do</strong> chegamos <strong>no</strong> lote, ventava muitoe pensei “vamos plantar árvores”. Pensei em eucalipto, masLuzia logo disse: “vamos plantar o que dá pra comer”. Fomosganhan<strong>do</strong> sementes e plantan<strong>do</strong>, tu<strong>do</strong> o que tem aqui em voltada casa foi planta<strong>do</strong> de sementes.(...) Quan<strong>do</strong> era moleque, gostava muito de frutos de Cerra<strong>do</strong>e comecei a ver isso tu<strong>do</strong> escassear. Então, já tínhamos apreocupação de não ter <strong>no</strong> quintal só manga, mexerica, limão,mas também frutas <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>: bacaba, que a gente sempregostou. Foram aparecen<strong>do</strong> outras, como açaí, mangaba e assimpor diante. (Ricar<strong>do</strong>)Ricar<strong>do</strong> tinha si<strong>do</strong> um meni<strong>no</strong> atina<strong>do</strong> que sabia relacionar muito<strong>do</strong> que ouvia em conversas, <strong>do</strong> que via na televisão sobre outros lugarescom o que se passava na sua terra. Lembrava-se bem de <strong>no</strong>tícias sobreprevisões feitas por cientistas de que, se o ritmo das queimadas e <strong>do</strong>desmatamento não diminuísse em to<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong>, poderíamos começara ficar sem água. Nas poucas oportunidades que tinha, gostava de ver<strong>do</strong>cumentários sobre o assunto.Depois de colher asprimeiras lavouras,casal construiu obarraco de madeira.Hoje lugar estáirreconhecível84 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>O tempo foi passan<strong>do</strong>. A vida ia melhoran<strong>do</strong>... Devagar. Como as criançasque iam crescen<strong>do</strong> por ali: pés de laranja, abacate, manga, açaí, dendê, jabuticaba,pupunha, pequi, baru, acerola, ingá. Hoje, o sítio 25 de dezembro– porque foi recebi<strong>do</strong> como um presente de Natal, segun<strong>do</strong> Luzia – está <strong>no</strong>meio de um peque<strong>no</strong> bosque e ninguém reconhece a foto de quan<strong>do</strong> chegaramlá. O casal percebeu que, com as árvores, o nível da cisterna e de umarepresa, construída ali perto, não só mantinha-se estável, mesmo durante aseca, mas até aumentava às vezes, o que não acontecia com os vizinhos.(...) Quan<strong>do</strong> a gente chegou aqui não tinha nada. Então, agente queria ver como era, como a gente foi cria<strong>do</strong> (...). Lá, agente tinha o córrego, água com fartura. Pra cá, pra esta região,não é to<strong>do</strong> lugar que tem córrego. A gente vê a falta que aágua faz. Sempre falei: “tem de reflorestar esse varjãozinho aípra vê se ele volta a correr água”. Não sei se ele já correu água,mas para ver se ele segura. Tem lugares aqui <strong>no</strong> assentamentoque não tem água. A gente fica preocupa<strong>do</strong>. (Luzia)Um pouco por intuição, um pouco por conhecer a lei mais primária<strong>do</strong> merca<strong>do</strong> – o valor de um produto que é demanda<strong>do</strong> tende a aumentarquan<strong>do</strong> sua oferta cai – Ricar<strong>do</strong> sentia que o plantio de árvores talvezpudesse ser vantajoso <strong>no</strong> futuro. O desmatamento estava fazen<strong>do</strong> sumiremdali várias espécies <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>. Algumas vezes, ele teve de viajardezenas de quilômetros para encontrar pequi, fruta comum na região atéalguns a<strong>no</strong>s antes. Desde de que chegara, o agricultor mantinha intoca<strong><strong>do</strong>s</strong>,para regeneração natural, 11 hectares de pasto, com pés de mangabae cagaita, por exemplo.Melhorar a terraEm 2003, Ricar<strong>do</strong> foi eleito para a direção <strong>do</strong> Sindicato de Trabalha<strong>do</strong>resRurais de Água Boa, que participou <strong>do</strong> Encontro Nascentes <strong>do</strong> Rio<strong>Xingu</strong>, e assi<strong>no</strong>u o <strong>do</strong>cumento final <strong>do</strong> evento, onde nasceu a campanha‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>. Já era, então, parceiro da mobilização.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 85


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Dona Luzia semprepreocupada com amanutenção da água<strong>do</strong> lote e de to<strong>do</strong> oassentamentoNessa lida, sempre pensan<strong>do</strong> em melhorar <strong>no</strong>ssa terra e jádesenvolven<strong>do</strong> algumas ações por conta própria, recebi a fichapara a formação <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>. Fiz logo minhainscrição. Precisava ampliar meus conhecimentos e minhamotivação foi pensar que podia adquirir <strong>no</strong>vas técnicas paralidar com a terra e também poder trocar idéias com outraspessoas, preocupadas como eu e minha esposa com a questãoda água. (Ricar<strong>do</strong>)Quan<strong>do</strong> foi seleciona<strong>do</strong> para participar da formação, Ricar<strong>do</strong> já estavaenvolvi<strong>do</strong> em outra iniciativa da campanha. O sindicato era parceiro<strong>do</strong> projeto Agricultura e Conservação das Matas Ciliares <strong>no</strong> PA Jaraguá,que envolvia também o ISA, a Universidade <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de Mato Grosso(Unemat), a prefeitura de Água Boa, a Organização Não-governamentalAmbientalista Ronca<strong>do</strong>r-Araguaia (Ongara) e a empresa Plantar de assistênciatécnica, com patrocínio <strong>do</strong> programa Projetos Demonstrativos(PDA-Padeq), <strong>do</strong> MMA.Os parceleiros já haviam cerca<strong>do</strong> 28,5 hectares de matas ciliares, masgrande parte para plantar mo<strong>no</strong>culturas temporárias – milho, mandioca,arroz. Com o início <strong>do</strong> projeto, em 2006, passaram a enriquecer essasáreas implantan<strong>do</strong> sistemas agroflorestais. Foram feitos investimentospara que 30 famílias cercassem <strong>no</strong>vos trechos de APP, num total de mais35 hectares protegi<strong><strong>do</strong>s</strong>. Uma parte desta área também foi enriquecidacom árvores nativas <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong> e, em alguns casos, com algumas culturas86 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>temporárias. Pelo me<strong>no</strong>s 1,8 mil quilos de sementes foram distribuí<strong><strong>do</strong>s</strong>,em especial de pequi, mas também de baru, caju, jatobá, imbaúba e murici,entre outras. Outra parte das sementes foi coletada pelos própriosagricultores. Em 2007, mais 50 hectares foram cerca<strong><strong>do</strong>s</strong>. Aproximadamentemetade deste total sofreu o mesmo processo de enriquecimento eo restante foi deixa<strong>do</strong> para regeneração natural.Parte da APP <strong>do</strong> lote de Ricar<strong>do</strong> já estava protegida pela própria cerca<strong>do</strong> quintal de casa. Ele instalou mais 300 metros de cerca elétrica para isolar<strong>do</strong> ga<strong>do</strong>. No total, quatro hectares de mata ciliar ficaram cerca<strong><strong>do</strong>s</strong> napropriedade. Incluin<strong>do</strong> o campo úmi<strong>do</strong> de murundus, de quase um hectare,usa<strong>do</strong> como pastagem nativa e que, a partir daí, começou a recuperar-secom a retirada <strong>do</strong> rebanho e foi enriqueci<strong>do</strong> com mudas de buriti,baru, caju e pequi. Mais um passo para garantir a água na propriedade.Aprender fazen<strong>do</strong>Muita coisa estava acontecen<strong>do</strong> ao mesmo tempo <strong>no</strong> sítio 25 de dezembro.Ricar<strong>do</strong> era um <strong><strong>do</strong>s</strong> beneficia<strong><strong>do</strong>s</strong> com o projeto <strong>do</strong> PDA e agoratambém participava da formação de <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>. Aprenderfazen<strong>do</strong>, fazen<strong>do</strong> e aprenden<strong>do</strong>. Da teoria à prática, tiran<strong>do</strong> <strong>no</strong>vos ensinamentose experiências <strong>do</strong> fazer... Mais uma passada de olhos nas técnicas,<strong>no</strong>s textos, ouvi<strong><strong>do</strong>s</strong> atentos nas palestras e conversas... De volta aotrabalho e assim por diante.Um <strong><strong>do</strong>s</strong> critérios para participação <strong>no</strong>s <strong>do</strong>is projetos era ter capacidadede multiplicar informações, de mobilizar. Ricar<strong>do</strong> era a pessoamais indicada para tocar um <strong>no</strong>vo projeto-piloto dentro <strong>do</strong> assentamento.Em outubro de 2006, a campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong> promoveuem sua propriedade uma primeira oficina sobre sistemas agroflorestaiscom o especialista Ernst Götsch. Além <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>,participaram também representantes das 30 famílias que integravamo projeto <strong>do</strong> PDA. Foi planta<strong>do</strong> pouco me<strong>no</strong>s de meio hectare com atécnica da “muvuca”, com sementes de mandioca, abacaxi, feijão guandu,melancia, abóbora, urucum e maracujá, além das árvores – caju,baru, pequi, tamboriu, bacaba e jatobá. A densidade <strong>do</strong> plantio foi deoito árvores por m 2 . Em mais <strong>do</strong>is hectares da APP protegida, foramplanta<strong><strong>do</strong>s</strong> também buriti, baru e pequi, num espaçamento de 4 x 8 m.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 87


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Agora é a segunda vez que eu planto a planta para vercrescer. Mas da primeira vez, quan<strong>do</strong> vi os pés de laranjadan<strong>do</strong> flor, depois a frutinha, pulei de alegria. Parecia queeu tinha acorda<strong>do</strong> e eu vim perceber o quanto é bom a genteplantar algo, produzir essas plantas que demora, né? Fiqueicontente demais. Então, é a segunda vez que eu vejo nascer,crescer, zelar. (Luzia)Quem chegasse de fora, visse aquela terra mexida, com aparência deplantação comum, e não conhecesse bem os <strong>do</strong><strong>no</strong>s da propriedade, poderiaachar que as coisas iam caminhan<strong>do</strong> como sempre. Para os maischega<strong><strong>do</strong>s</strong>, na velocidade em que os filhos <strong>do</strong> casal iam lançan<strong>do</strong> seusgalhos ao re<strong>do</strong>r de casa. Mas as mudanças por ali e entre alguns vizinhosiam num ritmo mais rápi<strong>do</strong> e me<strong>no</strong>s visível – mesmo que as <strong>no</strong>vas idéiasse disseminassem ainda lentamente <strong>no</strong> resto <strong>do</strong> assentamento, como costumaacontecer com as <strong>no</strong>vas idéias em um meio com velhos hábitosarraiga<strong><strong>do</strong>s</strong> e nenhum apoio de fora para produzir e crescer.Sistema agroflorestal implanta<strong>do</strong>durante oficina, em outubro de2006. Ricar<strong>do</strong> enriqueceu suaárea de mata ciliar com inúmerasespécies nativas <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>88 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>(...) Nosso sistema de plantar mandioca agora é outro. Plantamosdiversas culturas junto com a mandioca, inclusive árvores,nunca ficamos sem alimento. Às vezes tem abóbora, outra vezesmelancia, milho, feijão guandu e assim vai. Antes era só plantarmandioca. Usava grandes áreas e ia se desgastan<strong>do</strong>. Mudava deárea e só tinha mesmo a mandioca pra colher. O curso e a oficina<strong>do</strong> Ernest trouxeram a idéia de várias culturas em pouco espaço,faço a limpeza uma vez só e colho mais coisas.(...) Nesse <strong>no</strong>vo méto<strong>do</strong>, uso sempre a mesma área e elasó aumenta o teor nutricional. Antes eu só sugava da terra.Hoje, devolvo a ela os nutrientes. Se você trabalha com a terrae cuida dela, ela não fica sofrida.No inicio, eu e a Luzia queimava as folhas e agora deixamos<strong>no</strong> quintal em volta das árvores. Essas folhas vão virarnutrientes para as plantas. As pessoas me perguntamse junta insetos e cobras e eu respon<strong>do</strong> que antes, quan<strong>do</strong> nãotinha árvores, aparecia muito mais. Num a<strong>no</strong>, matamos emvolta de casa 18 cascavéis. Agora só encosta cobra sem vene<strong>no</strong>,atrás de alimento, pererecas, calangos. Perguntam também sequan<strong>do</strong> chove não junta um lamaçal <strong>no</strong>s montes de folhas. Eurespon<strong>do</strong>: “ficava lamaçal antes quan<strong>do</strong> tu<strong>do</strong> tava varri<strong>do</strong>”.Agora com as folhas a água penetra melhor <strong>no</strong> solo que antesera compacta<strong>do</strong>. (Ricar<strong>do</strong>)Conceitos, técnicas, experiências, gente <strong>no</strong>vaO trabalho em equipe, a convivência com a turma de forman<strong><strong>do</strong>s</strong>, tantosconceitos e técnicas i<strong>no</strong>va<strong>do</strong>res, tanta gente de outros lugares vin<strong>do</strong>até ali para aprender coisas <strong>no</strong>vas deram mais ânimo para seguir naquelecaminho. Depois da oficina ministrada por Ernest, ocorreram mais encontrose reuniões com as trinta famílias <strong>do</strong> projeto PDA e outros assenta<strong><strong>do</strong>s</strong>para fazer avaliações, reproduzir e discutir aquelas experiências.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 89


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Mais <strong>do</strong> que nunca, Ricar<strong>do</strong> tinha certeza de que tinha vali<strong>do</strong> à penamanter intoca<strong><strong>do</strong>s</strong> aqueles 11 hectares que, agora, poderiam inclusive serenriqueci<strong><strong>do</strong>s</strong> com mais árvores frutíferas <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong> para alimentação<strong>do</strong> ga<strong>do</strong>, dele e de sua mulher ou para venda das frutas. A área era muitocobiçada por vizinhos que arrendavam seus lotes para o cultivo da soja,mas ia permanecer na mão <strong>do</strong> mesmo <strong>do</strong><strong>no</strong>...De acor<strong>do</strong> com Ricar<strong>do</strong>, com poucos meses, a terra já dava mostrasde maior fertilidade com o plantio de espécies destinadas, ainda vivas oujá mortas, a aumentar seu teor de nutrientes ou oferecer sombreamento,como o feijão guandu e o feijão de porco. O consorciamento tambémcontribuía com o crescimento mais rápi<strong>do</strong> e com a produtividade dasplantas. No <strong>no</strong>vo sistema, o número de toletes de mandioca por covasubia de um para <strong>do</strong>is, por exemplo. Em mea<strong><strong>do</strong>s</strong> de 2007, o agricultorcalculava em tor<strong>no</strong> de R$ 100 a R$ 150 a eco<strong>no</strong>mia <strong>no</strong>s gastos <strong>do</strong>mésticosmensais proveniente da produção própria de leite, carne, frutas,verduras, legumes, hortaliças e deriva<strong><strong>do</strong>s</strong>. Isso para uma renda familiarde até R$ 350 por mês, baseada sobretu<strong>do</strong> na produção de farinha.A agrofloresta garantiuuma eco<strong>no</strong>mia razoável<strong>no</strong>s gastos <strong>do</strong> casal.Reuniões realizadas<strong>no</strong> lote de Ricar<strong>do</strong>para demonstração detécnicas da agrofloresta eavaliação <strong>do</strong> andamentode projetos semelhantestoca<strong><strong>do</strong>s</strong> por outrosassenta<strong><strong>do</strong>s</strong>90 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>A agrofloresta é a longo prazo. Agora, por exemplo, emcima das culturas anuais, onde está fican<strong>do</strong> as permanentes,sem sombra de dúvida o pessoal está ten<strong>do</strong> um retor<strong>no</strong> lucrativocom isso (...). Acho possível ter renda com a agrofloresta.Pelo que eu conheço das árvores, é a mesma coisa da culturaanual. O arroz, por exemplo, tem um a<strong>no</strong> que ele pode dar beme um a<strong>no</strong> que não. Um pé de baru, um a<strong>no</strong> ele pode dar 50quilos de castanha e <strong>no</strong> outro, só 10 quilos. Quan<strong>do</strong> há umademanda muito grande, o preço pode estar varian<strong>do</strong>, mas háessa tendência sim de poder comercializar. (...) Não estou venden<strong>do</strong>nada diretamente, porque estou começan<strong>do</strong> agora. Estouusufruin<strong>do</strong> daquilo que eu plantei <strong>do</strong> meu quintal, que eu usomesmo. Açaí, por exemplo. Quan<strong>do</strong> cheguei aqui e isso eratu<strong>do</strong> peladão, ninguém ia poder dizer que hoje ia estar toman<strong><strong>do</strong>s</strong>uco de açaí daqui. Dendê, já foi extraí<strong>do</strong> o óleo. Pequi já floriubastante deles. (...) Um <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>no</strong>ssos grandes desafios vai ser aorganização, a industrialização desse material. Isso vejo comoum fator preocupante: trabalhar um desidrata<strong>do</strong>, colocar umalogomarca, empacotadinho para o consumi<strong>do</strong>r final. (Ricar<strong>do</strong>)Mas o maior ganho talvez tenha si<strong>do</strong> mesmo na mobilização e conscientização<strong><strong>do</strong>s</strong> assenta<strong><strong>do</strong>s</strong>. Grupos de vizinhos da mesma cabeceira de umcórrego começaram a se organizar para cercá-la e proteja-la. Também houveuma troca razoável de idéias, técnicas e experiências informal, fora das reuniões.Um assenta<strong>do</strong> chegou a plantar sete hectares de pequi para consorciarcom pasto. Ampliou-se a preocupação em levar a água a bebe<strong>do</strong>uros para oga<strong>do</strong> fora das APPs, em vez de liberar o acesso <strong><strong>do</strong>s</strong> bois a elas.Mais desafios para os sistemas agroflorestaisO dilema maior coloca<strong>do</strong> ao desenvolvimento <strong><strong>do</strong>s</strong> sistemas agroflorestaiscomo instrumento de geração de renda da agricultura familiar<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 91


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>continua relaciona<strong>do</strong>, como já vimos, a problemas estruturais, como afalta de apoio <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> e a fragilidade das organizações locais, entreoutros. Tentar encaminhar soluções para essas dificuldades pode abrirespaço à construção de cadeias produtivas que liguem os peque<strong>no</strong>sprodutores ao merca<strong>do</strong>, agregan<strong>do</strong> valor à sua produção e crian<strong>do</strong>barreiras aos atravessa<strong>do</strong>res.Mas o exemplo singelo de Ricaro e Luzia Dias Batista tambémaponta para uma perspectiva diferente desse mesmo desafio. Para alémda necessidade imediata de arranjos que garantam lucratividade a parcelascada vez maiores de agricultores e escala ao merca<strong>do</strong>, fica a perguntade como garantir qualidade de vida e a conservação de recursostão fundamentais a esses agricultores, como a água e o solo, de comofixá-los na terra, enquanto não são colocadas em práticas políticas quegarantam esses arranjos.Esse casal optou por alternativas simples e funcionais que não sabemosquanto tempo podem durar, mas que <strong>no</strong> mínimo obrigam aavaliar o potencial de conhecimentos tradicionais, da capacidade deobservação, das tentativas e erros cotidia<strong>no</strong>s, <strong>do</strong> acúmulo de pequenasexperiências, aprendiza<strong>do</strong> e iniciativas promovidas por esses agricultores,suas organizações e parceiros.Meu sonho era ver tu<strong>do</strong> forma<strong>do</strong>, planta<strong>do</strong>, oferecer estamaravilha às crianças das escolas para conhecerem as variedades<strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>; que esta área pudesse servir de ensinamentopra alguém. Meu futuro é mesmo bem velhinha ver isso epra que isso aconteça temos que continuar a plantar árvores eao mesmo tempo conseguir <strong>no</strong>ssa renda.(...) Nós somos chama<strong><strong>do</strong>s</strong> para construir essa natureza. E eutô ven<strong>do</strong> isso, né? Nós temos esse lotinho aqui. Acho que nesses15, 20 lotes aqui, o <strong>no</strong>sso é o me<strong>no</strong>rzinho. Mas desse pedacinho,tem tanta coisa que a gente pode fazer. É como seria num grande,né? É a mesma coisa que fosse num grande. (Luzia)92 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Idéias <strong>no</strong>vas e vontade de fazer naencruzilhada da sustentabilidadeA experiência de Gaúcha <strong>do</strong> NorteGaúcha <strong>do</strong> Norte está a cerca de 550 quilômetros de Cuiabá, amaior parte por estradas de terra, e a 35 quilômetros da fronteira sul<strong>do</strong> Parque Indígena <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>.O município tem quase 50% de seu território dentro da Terra Indígenae 100% dentro da Bacia <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>. Abriga 844 nascentes e ébanha<strong>do</strong> pelo Culuene e o Curisevo, <strong>do</strong>is importantes rios que abastecemde água, peixes e umidade centenas de propriedades, comunidadesindígenas e não-indígenas.Como várias outras <strong>do</strong> <strong>no</strong>rdeste <strong>do</strong> Mato Grosso, a cidade é vizinhade povos com um mo<strong>do</strong> tradicional de vida basea<strong>do</strong> na subsistênciae de baixo impacto ambiental, algo bem diferente <strong>do</strong> modelode desenvolvimento que se acostumou a almejar e a praticar. E está<strong>no</strong> meio de uma encruzilhada em que tem de escolher entre algumasalternativas – mais ou me<strong>no</strong>s sustentáveis.Tem de enfrentar, por exemplo, o dilema de conciliar a produçãoe a conservação da parte significativa de seus recursos naturais aindaintactos ou insistir na mo<strong>no</strong>cultura de grãos e na pecuária extensiva,responsáveis por grandes taxas de desmatamento e baixos índices dedesenvolvimento, além de instabilidade econômica.Muitos proprietários têm investi<strong>do</strong> na produção <strong>do</strong> látex da seringueira,espécie nativa da Amazônia, e <strong>do</strong> mel, opção que dependeda mata de pé. Por outro la<strong>do</strong>, em 2006, 80% <strong><strong>do</strong>s</strong> 300 mil hectaresdestina<strong><strong>do</strong>s</strong> à pastagem <strong>no</strong> município estavam degrada<strong><strong>do</strong>s</strong> e o restanteem processo de degradação pelo mau uso <strong>do</strong> solo e a ação <strong>do</strong> fogo.De acor<strong>do</strong> com algumas estimativas, entre 2005 e 2007, quaseduas mil pessoas podem ter deixa<strong>do</strong> o município por conta da queda<strong><strong>do</strong>s</strong> preços da soja e <strong>do</strong> ga<strong>do</strong> <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s anteriores. A população era de5.694 habitantes em 2007.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 93


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>É sabi<strong>do</strong> que a região da Bacia <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong> vem sen<strong>do</strong> exploradahá vários a<strong>no</strong>s de forma indiscriminada. A agriculturae a pecuária foram taxadas como as maiores vilãs <strong>no</strong> processode desmatamento, tanto das Reservas Legais quanto das matasciliares. Heranças da cultura sulista, o desmatamento ea queimada foram aplica<strong><strong>do</strong>s</strong> sem nenhum tipo de orientaçãoambiental. Mais tarde, os órgãos governamentais reagiramcom multas, o que gerou descontentamento e revolta <strong>no</strong> município.Muitos produtores, prejudica<strong><strong>do</strong>s</strong> pela crise econômica,têm dificuldades de reverter os prejuízos ambientais.(...) Durante a<strong>no</strong>s, o gover<strong>no</strong> autorizou o desmatamentode 80% nas propriedades. Vários agricultores fizeram isso.Depois a lei mu<strong>do</strong>u. Hoje, só se pode desmatar 20% e muitosse sentem lesa<strong><strong>do</strong>s</strong>, sem seus direitos adquiri<strong><strong>do</strong>s</strong>. Em ummomento, parece que as leis são feitas para desenvolver, masem outros para punir. Os produtores passaram a não confiarmais <strong>no</strong> gover<strong>no</strong>. (Sidnei)Problema <strong>no</strong> quintalMas um grupo de pessoas e instituições de Gaúcha <strong>do</strong> Norte resolveuprovar que soluções promissoras podem nascer de pequenasações gestadas em situações difíceis. No segun<strong>do</strong> semestre de 2005,Clo<strong>do</strong>al<strong>do</strong> Maccari, funcionário da Empaer (Empresa Matogrossensede Pesquisa, Assistência e Extensão Rural), mais conheci<strong>do</strong> como Tito;Sidnei Bue<strong>no</strong> de Miranda, então chefe <strong>do</strong> Departamento de Indústriae Comércio <strong>do</strong> município; a professora Sílvia de Moura Faitão; e otécnico agrícola Jackson Mauro Trajack inscreveram-se na formação de<strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> multiplica<strong>do</strong>res. Tito prestava assistência técnica<strong>no</strong> viveiro de mudas de seringueira que a prefeitura tinha implanta<strong>do</strong>há algum tempo para abastecer os vários projetos de implantaçãode seringais <strong>no</strong> município.94 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Inicialmente, quan<strong>do</strong> recebi o convite para fazer a formação,nem parei para pensar sobre o assunto e fiz a inscriçãopela obrigação de estar trabalhan<strong>do</strong> <strong>no</strong> setor público. Recebi ocomunica<strong>do</strong> da aprovação da inscrição e soube que eu, Sidnei,Jackson e Silvia iríamos representar <strong>no</strong>sso município.Já <strong>no</strong> primeiro dia de oficina, comecei a atentar para aimportância <strong>do</strong> tema. Foi nesse dia que descobri que o assuntoestava bem encaminha<strong>do</strong>, pois já havia a Carta de Canarana(da campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>), onde várias instituições e outrosmunicípios estavam envolvi<strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>no</strong> mesmo objetivo. Para minhafrustração, somente Gaúcha <strong>do</strong> Norte não havia participa<strong>do</strong><strong>do</strong> processo inicial. Nesse momento, surgiram muitasdúvidas na minha cabeça. Porque ninguém participou? Seráque alguém foi convida<strong>do</strong>? Como se comportar agora?Mas com o passar <strong><strong>do</strong>s</strong> dias, ven<strong>do</strong> a seriedade e organizaçãoda oficina para envolver e desenvolver o interesse <strong><strong>do</strong>s</strong>participantes, junto com todas as trocas de experiências, diasde campo e a abertura de espaços de discussão entre membrosde diferentes setores <strong><strong>do</strong>s</strong> seis municípios circunvizinhos, issotu<strong>do</strong> aju<strong>do</strong>u a refletir melhor sobre a causa socioambiental.Comecei a formar uma opinião sobre o tema, que até então eunão havia percebi<strong>do</strong> e da<strong>do</strong> o real valor que merecia <strong>no</strong> exercícioda minha profissão e até da vida particular. Esses espaçosde liberdade de expressão foram extremamente valiosos e i<strong>no</strong>va<strong>do</strong>respara exercitar a manifestação das opiniões em grupo eperceber as dificuldades comuns de como e quan<strong>do</strong> falar.No último dia da primeira oficina, quan<strong>do</strong> o Rodrigo pediupara que as pessoas que sentissem alguma objeção à participaçãona próxima oficina se manifestassem, ali passou umfilme em minha cabeça sobre to<strong>do</strong> o processo, e, a partir dali,percebi que já havia aderi<strong>do</strong> à causa. (Tito)<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 95


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Os debates e reflexões da formação, além das preocupações e conhecimentosque já tinham, motivaram Tito, Sidnei e Sílva a prestarum pouco mais de atenção a um problema bem próximo de sua realidade,um problema que estava literalmente em seus quintais. Parte dasmargens de vários cursos d´água tinha si<strong>do</strong> desmatada ou degradada.Em 2006, Gaúcha <strong>do</strong> Norte tinha só a avenida principal asfaltada epoucas árvores na sede urbana. O Córrego Pau D´alho, que atravessao município, sofria com a erosão provocada pelas enxurradas, com adiminuição <strong>do</strong> volume de água e <strong>do</strong> número de peixes. Acrescente atoda essa mistura um pouco de espírito empreende<strong>do</strong>r e daí nascemidéias <strong>no</strong>vas. E vontade de fazer.400 amigos das árvoresA princípio, os forman<strong><strong>do</strong>s</strong> comprometeram-se a realizar um trabalhocom os estudantes e visitaram as duas escolas locais para articular umaparceria com os professores de Ciências e Educação Ambiental. Foi assimque nasceu o projeto Amigos das Árvores. Crianças de 5ª a 8ª série foramconvidadas a a<strong>do</strong>tar mudas de árvores na frente de suas casas ou emoutros locais. Várias delas plantaram, cercaram e cuidaram das mudas,inclusive usan<strong>do</strong> adubo orgânico. Durante a Semana de Preservação <strong>do</strong>A arborização deGaúcha <strong>do</strong> Nortefoi reforçadacom o projeto400 Amigos dasÁrvores96 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Solo de Gaúcha <strong>do</strong> Norte, realizada em abril de 2006, os alu<strong>no</strong>s conheceramo viveiro municipal, onde tiveram uma aula sobre a importânciadas árvores para a manutenção da biodiversidade, da água, <strong>do</strong> clima e dafertilidade <strong>do</strong> solo.Com a grande emigração na cidade, muitas árvores foram aban<strong>do</strong>nadas,mas as perdas foram poucas. Hoje, a sede urbana de Gaúcha <strong>do</strong> Nortetem mais sombra. A iniciativa chegou a mobilizar cerca de 400 alu<strong>no</strong>s.Um espelho da relação com o meio ambienteA outra linha de trabalho a<strong>do</strong>tada pretendia reflorestar trechos das margens<strong>do</strong> Córrego Pau D´alho. Foram feitas visitas a várias propriedades emuitos produtores mostraram interesse em participar. A grande maioria,porém, não tinha dinheiro para isso, nem sabia como enfrentar o problema.Sílvia, Tito e Sidnei achavam que se conseguissem divulgar o trabalho poderiamestimular outras pessoas a fazer o mesmo voluntariamente. Tiveramentão a idéia de angariar recursos para implantar alguns projetos-piloto.Com o empenho e o interesse demonstra<strong>do</strong> pelos <strong>agentes</strong>, as organizaçõesparceiras da campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong> resolveram incluir Gaúcha<strong>do</strong> Norte entre os locais atendi<strong><strong>do</strong>s</strong> por um projeto de recuperação dePrefeitura já tinhainstala<strong>do</strong> um viveirode mudas de seringapara atender váriosprodutores da região<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 97


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>matas ciliares aprova<strong>do</strong> em 2007. A partir daí, outras instituições tornaram-separceiras da iniciativa: a Prefeitura, a Empaer, a Câmara Municipal,a Associação <strong><strong>do</strong>s</strong> Peque<strong>no</strong>s Produtores de Nova Aliança, a SecretariaEstadual de Educação, o Instituto de Defesa Agropecuária (Indea), obanco Sicredi e o ISA.Diante <strong>do</strong> desafio proposto nas oficinas, de tomar umainiciativa em <strong>no</strong>ssa própria cidade, buscamos um problemaque fosse um espelho da relação da comunidade com o meioambiente <strong>no</strong> município.(...) O viveiro vinha de encontro ao movimento de plantar seringueiras.Ele foi amplia<strong>do</strong>, melhora<strong>do</strong> e agora produz tambémmudas de árvores nativas, para consorciar com as seringueirase também reflorestar as beiras de rio e nascentes. Eu e meu paisempre fizemos mudas de diversos tipos de árvores nativas,frutíferas e ornamentais <strong>no</strong> quintal de casa, mas a oficina me fezperceber a importância de se plantar e <strong>do</strong> conhecimento de saberplantar. A oficina me proporcio<strong>no</strong>u a oportunidade de conhecertambém os sistemas agroflorestais, com o que preten<strong>do</strong> formarum pedaço de floresta super diversificada onde moro, para experimentare repassar para outras pessoas. (Tito, agosto de 2007)A parceria proporcio<strong>no</strong>u ao viveiro municipal um sistema mais eficientede irrigação, um aumento da capacidade de produção para 20 milmudas por a<strong>no</strong> e a reforma da casa de sementes. Além das seringueiras,passaram a ser cultivadas 25 espécies nativas, como a pupunha, o baru,o pequi, o jatobá, a mirindiba e a aroeira. Inicialmente, o projeto previua implantação de dez módulos agroflorestais de <strong>do</strong>is hectares cada,totalizan<strong>do</strong> 20 hectares que deveriam ser recupera<strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>no</strong>s córregos PauD´alho e Cateto, afluentes <strong>do</strong> Culuene.A iniciativa foi divulgada em eventos como a Conferência Municipalde Saúde e o I Simpósio de Apicultura da Bacia <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>, promovi<strong>do</strong>,98 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Projeto emparceria com oISA, a prefeiturae a Empaer, entreoutros, permitiurevitalizar oviveiroem maio de 2007, pela prefeitura e a campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>. Tambémfoi discutida em alguns “dias de campo”, visitas orientadas por técnicosa propriedades ou comunidades onde estejam ocorren<strong>do</strong> experiênciasi<strong>no</strong>va<strong>do</strong>ras ligadas à produção rural.As visitas e a circulação de informações sobre o projeto atraíram asimpatia de mais proprietários, que se dispuseram a participar. No total,com as <strong>no</strong>vas adesões, a área a ser reflorestada cresceu para cerca de 40hectares, incluin<strong>do</strong> três nascentes. Com a <strong>no</strong>va demanda, surgiu a idéiade aproveitar o potencial de produção de sementes das matas da região,mobilizar mais uma vez as escolas e integrá-las à campanha. O meioidealiza<strong>do</strong> para isso foi um festival de sementes, a exemplo <strong>do</strong> que haviaaconteci<strong>do</strong> em Canarana.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 99


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>A partir de julho de 2007, os <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> visitaram osestudantes para falar sobre meio ambiente, explicar o projeto e distribuira lista de sementes de que precisavam. Uma sala de cada escola que recolhesse,até o final <strong>do</strong> a<strong>no</strong>, a maior quantidade de sementes com a maiordiversidade de espécies passaria um dia <strong>no</strong> clube da cidade, também comdireito a gincana, almoço e premiações.Muitas crianças vêm até nós para pesarmos e a<strong>no</strong>tarmoso resulta<strong>do</strong> da colheita, classificarmos a diversidade de tipos.Falar em gincana, em diversão, em brinde, a molecadatira o pé <strong>do</strong> chão. Mas acho que a consciência ambientalestá sen<strong>do</strong> despertada em vários deles. Tem pais ajudan<strong>do</strong> eachan<strong>do</strong> bacana. Eles vêem a importância <strong>do</strong> trabalho. Mastambém alguns acham que queremos reflorestar as áreas jáabertas que usam. Alguns pensam que, se não reflorestarem,se não aderirem, serão multa<strong><strong>do</strong>s</strong> ou denuncia<strong><strong>do</strong>s</strong> ao Ibama eà Secretaria de Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Meio Ambiente (Sema). Estamosesclarecen<strong>do</strong> as pessoas sobre isso. Não queremos denunciarninguém. A música-tema da campanha está tocan<strong>do</strong> na rádiolocal. Muita gente já está saben<strong>do</strong> o que é a mobilização.Mas há resistências também. É difícil agradar a to<strong><strong>do</strong>s</strong> aomesmo tempo. Muitos mora<strong>do</strong>res estão <strong>no</strong>s procuran<strong>do</strong> parasaber como participar, perguntan<strong>do</strong> quanto é a muda. Nãovamos vender as mudas. Todas as mudas e sementes serãocedidas gratuitamente. (Sidnei, setembro de 2007)EscolhasMuita água <strong><strong>do</strong>s</strong> córregos Pau D´alho e Cateto ainda vai passar debaixoda ponte antes de sabermos qual caminho Gaúcha <strong>do</strong> Norte resolveuseguir. Pelo me<strong>no</strong>s uma pequena parte dessas águas estará protegidapor matas ciliares plantadas pela mão de quem preferiu ficar paratentar trilhar um caminho diferente. No município, já se conhecia a100 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>necessidade de diversificar a produção para evitar depender de atividadesque degradam sem desenvolver de forma sustentada e sustentável. Os<strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> de Gaúcha <strong>do</strong> Norte resolveram colocar emprática pequenas ações e projetos para tentar mostrar à comunidadeque a qualidade e quantidade de <strong>no</strong>ssas escolhas dependem muito dequem escolhe também.Agentes <strong>socioambientais</strong>de Gaúcha divulgaram acampanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>e passaram a discutir anecessidade de protegernascentes e matas ciliaresQueremos envolver toda a comunidade urbana nas atividadesde plantio e manutenção dessas áreas, neste perío<strong>do</strong> dechuvas e <strong>no</strong> a<strong>no</strong> que vem, e também re<strong>no</strong>var as parcerias paraque este projeto continue <strong>no</strong> município por muitos e muitosa<strong>no</strong>s. (Tito, agosto de 2007)<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 101


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Professor Gilmar Hollunder e seus alu<strong>no</strong>s102 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Uma agrofloresta deconflitos e aprendiza<strong>do</strong>A experiência da Escola Família Agrícola de QuerênciaAs crianças e a<strong>do</strong>lescentes que freqüentam a Escola Municipal FamíliaAgrícola de Querência (Emfaque) em geral são filhos de agricultoresfamiliares e assenta<strong><strong>do</strong>s</strong> da reforma agrária. Eles passam 15 dias <strong>do</strong> mêsem regime de internato e os outros 15, em casa, pratican<strong>do</strong> e discutin<strong>do</strong>o que aprenderam. É a chamada “pedagogia da alternância”, que pregaque o ensi<strong>no</strong> deve partir da realidade <strong>do</strong> alu<strong>no</strong>, <strong>do</strong> que ele já sabe e vive,e depois precisa penetrar <strong>no</strong> seio da família e da comunidade para melhorara qualidade de vida, transformar. A mesma filosofia é aplicada emoutras 128 escolas espalhadas pelo Brasil. A Emfaque é a única instituição<strong>do</strong> gênero <strong>no</strong> Mato Grosso.Desde os a<strong>no</strong>s 1980, muitas pessoas chegaram <strong>do</strong> Sul e Sudeste àQuerência (MT) para apostar <strong>no</strong> cultivo de grãos e na criação de ga<strong>do</strong>em grande escala. Na safra 2006-2007, o município plantou 120 milhectares de soja, colhen<strong>do</strong> mais de 461 mil toneladas <strong>do</strong> grão, com umfaturamento de R$ 129,1 milhões. No mesmo a<strong>no</strong>, o rebanho bovi<strong>no</strong>tinha mais de 155 mil cabeças. A grande parte da produção é distribuídaem médias e grandes propriedades entre mil e 20 mil hectares.Pode parecer um contra-senso que uma escola voltada à agricultura familiartenha si<strong>do</strong> criada em um lugar que investe milhões na mo<strong>no</strong>culturae é um <strong><strong>do</strong>s</strong> pólos importantes <strong>do</strong> agronegócio <strong>no</strong> País. A mesma “corrida<strong>do</strong> ouro” que expandiu a fronteira agrícola <strong>no</strong> Mato Grosso até os limitesda floresta amazônica, <strong>no</strong> entanto, trouxe ainda milhares de brasileiros demais lugares que acabaram trilhan<strong>do</strong> um caminho diferente. No Sul <strong>do</strong>País, usa-se a palavra “querência” com o significa<strong>do</strong> de morada, lar. O sonhode ter uma vida digna, acesso à educação, saúde e um pedaço de terraera o mesmo. Várias famílias instalaram-se em pequenas propriedades,chácaras ao re<strong>do</strong>r das cidades. Também a partir de 1998, foram implanta<strong><strong>do</strong>s</strong>assentamentos de reforma agrária. Hoje, existem quatro dessas áreasem Querência, totalizan<strong>do</strong> mais de mil famílias assentadas.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 103


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Foram pessoas como essas que resolveram fundar a Emfaque, em2001. Foi pela paixão pela agricultura familiar e pela agroecologia queo capixaba Gilmar Hollunder também resolveu aceitar o convite paratrabalhar na instituição, em 2003. O sítio de sua família, em AfonsoCláudio (ES), praticava agricultura alternativa com apoio de um projetoda Igreja Luterana. Logo que chegou em Querência, Gilmar participoude ações da Comissão Pastoral da Terra (CPT), fez cursos e oficinas,onde conheceu melhor o cultivo de espécies em consórcio.Plantan<strong>do</strong> árvores e mandiocaComo minha função inicial na Emfaque era com plantasmedicinais, paralelamente comecei a fazer experimentos com osalu<strong>no</strong>s <strong>no</strong> sistema “casadão”. Aproveitava restos de folhas e palhade cana pra plantar gergelim, variedades crioulas e indígenasde milho, mamão, mucuna, feijão de porco, feijão cata<strong>do</strong>r, como objetivo de recuperar uma área de solo cansa<strong>do</strong> para recomeçaro cultivo de plantas medicinais. Nessa época, recebi o convite <strong>do</strong>ISA para participar da oficina de <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>. Depois<strong>do</strong> 1 o módulo da formação, resolvi transformar a área emum sistema agroflorestal (SAF). Fui planejan<strong>do</strong> junto com osalu<strong>no</strong>s como seria o plantio. Após o 2 o módulo, era seca, comeceia trabalhar com eles a coleta de sementes e juntamos 100 quilos:70 quilos de plantas nativas e 30 quilos de exóticas, entre baru,jatobá, favela, caju <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>, urucum, bacaba, pau-óleo, mamona,girassol, teca, seringueira... Armazenamos na casinhaque era usada para guardar as plantas medicinais secas.Então, montamos a primeira roça com mandioca e árvores,como aprendi<strong>do</strong> na oficina de agrofloresta da formação. Osalu<strong>no</strong>s fizeram desenhos de como seria uma agrofloresta, <strong><strong>do</strong>s</strong>primeiros meses até os 40 a<strong>no</strong>s, com as espécies adaptadas àregião (...). (Gilmar)104 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Uma das atividadesdesenvolvidas naescola por Gilmar foia coleta de sementespara o preparo da“muvuca”A 8ª sérieA turma mais envolvida nas atividades foi a 8ª série. Em 2006, com oapoio de Gilmar e da professora Ana Clara, de Geografia, os alu<strong>no</strong>s começarama coletar sementes nativas e produzir mudas para implantar umaagrofloresta em uma mata ciliar próxima da escola. O trabalho foi idealiza<strong>do</strong>pelo próprio grupo, que resolveu ainda fazer uma análise da água emdiversos pontos <strong>do</strong> Rio Bets, próximo à cidade. A idéia era comparar osresulta<strong><strong>do</strong>s</strong> com os de <strong>no</strong>vos testes e apresentar as conclusões na Emfaquee em outras escolas para estimular a comunidade a proteger o rio.Em agosto de 2007, estudantes da mesma turma identificaram cincolocais onde havia árvores produzin<strong>do</strong> sementes e fizeram uma excursãopela cidade para coletá-las <strong>no</strong>s jardins, quintais e pátios de casas, <strong>do</strong> postode saúde e até mesmo de uma serraria. Em cada parada, os estudantesdistribuíram o adesivo da campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>, falaram sobre amobilização, a necessidade de proteger os rios da Bacia <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>, suaimportância para o abastecimento de água e a manutenção <strong>do</strong> clima.Gilmar passou a tratar da questão socioambiental em sua atividade demonitor e nas outras disciplinas que ministrava: música, história, educação<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 105


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>familiar e religiosa. A temática foi incluída, junto com a campanha, emuma das “místicas” promovidas pelo professor. A mística é uma encenaçãocom fim pedagógico, muito difundida <strong>no</strong> movimento popular erealizada em geral com música, apresentação de figuras simbólicas e leiturade textos. Na idealizada por Gilmar, as sementes representavam aesperança de um futuro melhor.Na pequena propriedade onde morava, o professor montou ao to<strong>do</strong>quatro canteiros agroflorestais junto com os estudantes, que passaram amanejar as plantas. Na escola, eles dividiram ao meio a horta medicinalde cerca <strong>do</strong>is mil m 2 para testar <strong>do</strong>is tipos de agroflorestas. Em uma área,mantiveram as antigas ervas <strong>no</strong> meio das outras espécies. Na metaderestante, retiraram as ervas. Plantaram, entre outros, milho, banana, mamão,feijão guandu, cana-de-açúcar; e árvores nativas e exóticas, comoimbaúba, mirindiba e jatobá.Coleta de sementes. O professormobilizou alu<strong>no</strong>s e professorespara a realização de pesquisas eexperimentos106 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Mudança de postura e conflitoA questão da sustentabilidade é alvo de grande preocupaçãopara nós, aqui da escola. A filosofia das fazendas deixa aquestão da agricultura familiar muito fragilizada aqui emQuerência. Os peque<strong>no</strong>s agricultores se baseiam <strong>no</strong> modelo dafazenda. A gente vê isso <strong>no</strong> pla<strong>no</strong> de estu<strong><strong>do</strong>s</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> alu<strong>no</strong>s, <strong>no</strong>“cader<strong>no</strong> da realidade”. A ilustração que eles fazem é de tratores,coisa fora da realidade deles. Se espelham muito <strong>no</strong>modelo da fazenda (...).Trabalhar com a mudança de consciência para uma <strong>no</strong>vapostura sempre causa conflito. As pessoas têm dificuldade deaceitar o <strong>no</strong>vo. Estamos avançan<strong>do</strong> em passos lentos.Na <strong>no</strong>ssa lavoura de milho, até o a<strong>no</strong> passa<strong>do</strong>, não foi planta<strong>do</strong>nada junto. Só a lavoura de milho com adubo e calcário.Poderia ter uma adubação verde junto. Pra fazer isso acontecerna <strong>no</strong>ssa própria realidade está difícil. Ainda não chegamosa fazer essa reflexão (...). A pessoa tem me<strong>do</strong> <strong>do</strong> <strong>no</strong>vo, entendeu?A gente sabe que mesmo a lavoura mecanizada comprodutos químicos, ela colhe. Vamos supor que uma pessoaderrube a mata e prepara a roça: ela sabe que vai produzir.Não se sabe por quanto tempo. Agora mudar isso, com uma<strong>no</strong>va postura, com uma adubação verde, isso aí a pessoa temme<strong>do</strong> de arriscar, me<strong>do</strong> de não dar lucro. Esse que é o grandedesafio (...). (Gilmar, setembro de 2007)Quan<strong>do</strong> Gilmar chegou à Emfaque, já conhecia a agroecologia e tentoucolocá-la em prática. Espalhava folhas secas <strong>no</strong>s pés das plantas, mas sempreaparecia alguém que pedia para juntar aquilo, queimar, porque era considera<strong>do</strong>lixo. Idéias muito diferentes trazem reações diferentes, em geral divergências,resistências. Ainda bem! Iniciar e continuar o trabalho não foi fácil.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 107


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>A resposta de Gilmar ao que estava acontecen<strong>do</strong> também foi diferente.O mais importante é que ele considerava as discordâncias um combustívelpara o debate, para o aprendiza<strong>do</strong> – e para despertar a consciênciasocioambiental. Conhecia a capacidade de multiplicação de seusalu<strong>no</strong>s e acreditava que eles poderiam discutir em casa os <strong>no</strong>vos conceitosque trazia. Pelo me<strong>no</strong>s três famílias autorizaram seus filhos a plantaragroflorestas em suas propriedades.Ganho em consciênciaOs alu<strong>no</strong>s gostam muito. Eu vejo muito mais motivaçãoneles agora, porque desperta maior sensibilidade. To<strong>do</strong> momento,temos situações que a gente se depara. Só trabalhamoscom facão dentro da agrofloresta, como aprendemos na oficinapromovida durante a formação <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong>. O problemaque temos é que o alu<strong>no</strong> passa o facão em uma planta. Tu<strong>do</strong>ali se confunde. Não existe mais o conceito de praga ali dentro.Ainda com aquele velho costume de que tem de ter umacultura só, perdemos algumas árvores, outras brotam. Essaperda de árvores, na verdade, é um ganho de consciência, porquenaquele momento a gente entra em conflito. É o momentopara uma <strong>no</strong>va discussão. (Gilmar, setembro de 2007)O técnico <strong>do</strong> ISA Osval<strong>do</strong> Luis deSousa, o agente socioambientalJaílton Assunção, os alu<strong>no</strong>sda Emfaque e a diretora LenirTiecker implantam agroflorestaem forma de “mandala”, um<strong><strong>do</strong>s</strong> vários trabalhos de campopromovi<strong><strong>do</strong>s</strong> na escola108 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Mesmo com as dificuldades, outros professores e alu<strong>no</strong>s sensibilizaram-se.Junto com o respeito pelas plantas, brotou um senti<strong>do</strong> de responsabilidadecoletiva. O 3º a<strong>no</strong> <strong>do</strong> ensi<strong>no</strong> médio fez uma campanhacontra o desperdício de luz, água e alimentos na escola. Os alu<strong>no</strong>s tambémcoletaram sementes para produzir mudas. Sob orientação <strong>do</strong> professorErival<strong>do</strong> da Cunha, coordena<strong>do</strong>r de campo, dividiram-se em grupospara fazer um estu<strong>do</strong> sobre a germinação de algumas espécies como obaru, o ipê e o buriti.Semear <strong>no</strong>vas idéias <strong>no</strong> cotidia<strong>no</strong>Foi assim, num “trabalho de formiga”, lento e gradual, que a Emfaqueiniciou a tarefa de tentar abrir espaço para um jeito diferente de plantar,pensar e ver a terra em Querência. O méto<strong>do</strong>: usar adubo verde para semearalgumas <strong>no</strong>vas idéias <strong>no</strong> cotidia<strong>no</strong> das conversas de sala de aula, de corre<strong>do</strong>rese refeitórios; <strong>no</strong>s peque<strong>no</strong>s experimentos e descobertas de alu<strong>no</strong>s eprofessores; cultivan<strong>do</strong> hortaliças, culturas temporárias e árvores <strong>no</strong> mesmoespaço, muitas vezes, de alguns poucos metros quadra<strong><strong>do</strong>s</strong>. Também fora<strong><strong>do</strong>s</strong> limites da escola, falan<strong>do</strong> com as pessoas nas ruas, em bate-papos comos amigos, em pequenas ações na comunidade. A colheita deve vir por aí.Estamos pensan<strong>do</strong> em envolver cada vez mais a escola paraconseguir de fato alcançar as famílias <strong><strong>do</strong>s</strong> alu<strong>no</strong>s, que são o<strong>no</strong>sso público-alvo. Fazer realmente <strong><strong>do</strong>s</strong> filhos <strong>agentes</strong> transforma<strong>do</strong>resda realidade. Que eles possam estar cultivan<strong>do</strong>agroflorestas, colhen<strong>do</strong> produtos saudáveis. Para que aquelapropriedade, aquela comunidade, aquela região sirva de modelopara outras pessoas. (Gilmar, setembro de 2007)Outra iniciativa promovida pelo professor e a escola foi a entrega deuma muda de árvore às famílias de bebês recém-nasci<strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>no</strong>s hospitaisda cidade. Junto, vinha um panfleto sobre a importância da manutençãoda vegetação. A idéia foi tentar criar um vínculo entre a criança, sua famíliae a planta; mostrar que esta dependia delas e vice-versa. Aumentara “corrente pela consciência socioambiental”.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 109


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Escola Apóstolo Paulo <strong>do</strong>assentamento Serrinha110 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>A pedagogia vai ao viveiroA experiência <strong>do</strong> PA SerrinhaAo estender o “meu jardim” para além <strong><strong>do</strong>s</strong> limitesde minha propriedade, eu estendi foi a minhaprópria vida e foi o meu senti<strong>do</strong> de vida até limitesonde ela própria sai de seus muros e se alarga a to<strong>do</strong>o mun<strong>do</strong> e à toda a vida que há nele (...).(BRANDÃO. Carlos Rodrigues. Comunidades Aprendentes, 2005).Cita<strong>do</strong> <strong>no</strong> relatório de Elma e Rosenilde <strong>do</strong> projeto Pedagogia <strong>no</strong>sEspaços Verdes.As professoras Elma Gomes de Moraes e Rosenilde Nogueira Paniagoqueriam manter bem abertas as portas e as janelas da sala de aula. Osalu<strong>no</strong>s viam coisas importantes <strong>no</strong>s livros didáticos, mas precisavam ir lápara fora, para saber o que estava acontecen<strong>do</strong> por aí. Sobretu<strong>do</strong> para verde perto o que se passava ali bem perto, mas despercebi<strong>do</strong>. Assim, coma passagem livre, o mun<strong>do</strong> podia entrar por ali mais fácil também, comseus conflitos, as dificuldades de organização da comunidade, o desmatamentodas nascentes e matas ciliares, a falta de perspectiva para criaçãode ga<strong>do</strong> <strong>no</strong>s lotes peque<strong>no</strong>s e com pasto degrada<strong>do</strong> <strong>do</strong> assentamento.Elma e Rosenilde davam aula na Escola Municipal Apóstolo Paulo,<strong>do</strong> PA Serrinha, a 100 quilômetros de Água Boa. Tinham si<strong>do</strong> criadasna roça. Rosenilde chegou ali em 1973, com a família, quan<strong>do</strong> nem acidade e o assentamento existiam, na leva de imigrantes que veio tentar asorte nas <strong>no</strong>vas terras que estavam sen<strong>do</strong> abertas <strong>no</strong> Mato Grosso. Elmaveio mais tarde, de Goiás. As duas eram assentadas, filhas de famílias humildese saíram dali para estudar. Rosenilde formou-se em matemática e,em 2007, estava fazen<strong>do</strong> o mestra<strong>do</strong> em educação. Elma formou-se empedagogia, fez pós-graduação em gestão.Toda a experiência da universidade, leituras e reflexões sobre seu trabalhoaguçaram o senso crítico e a inquietação das duas educa<strong>do</strong>ras. Apedagogia que haviam aprendi<strong>do</strong>, inspirada em pensa<strong>do</strong>res como PauloFreire, pretendia valorizar, em primeiro lugar, à própria linguagem, osconhecimentos e vivências <strong><strong>do</strong>s</strong> alu<strong>no</strong>s. Essas seriam algumas das portasde entrada – que deveriam continuar abertas – para iniciar o processo deaprendizagem, para conhecer e entender o mun<strong>do</strong> lá fora. Mas o ensi<strong>no</strong><strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 111


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>que elas viam nas escolas que conheciam conduzia para longe <strong><strong>do</strong>s</strong> problemase <strong>do</strong> dia-a-dia da comunidade. As coisas andavam um pouco fora<strong>do</strong> lugar. Desde há algum tempo, as duas perguntavam-se sobre comomudar aquela situação.O que fazer para produzir e conservarmos o ambiente emque vivemos? O que fazer para transformar o lugar em quevivemos em um lugar de aprendizagem e participação? Comodesprender-<strong>no</strong>s da condição de transmissores de conhecimentosobsoletos, desconecta<strong><strong>do</strong>s</strong> da realidade <strong>do</strong> alu<strong>no</strong> e desenvolvermosum ensi<strong>no</strong> a partir <strong>do</strong> cotidia<strong>no</strong> <strong>do</strong> alu<strong>no</strong>? (Trecho <strong>do</strong>relatório de Rosenilde e Elma)De preocupações semelhantes, nasceu, em 2005, o projeto Pedagogiana Horta Escolar: semean<strong>do</strong> idéias - o zelo pelo ambiente e a importânciade uma alimentação saudável. O objetivo era usar a construção e manutençãode uma horta comunitária como instrumento para envolver osmais de 200 alu<strong>no</strong>s da escola e a comunidade <strong>no</strong> debate de temas como apreservação <strong>do</strong> solo e das matas ciliares, o uso de plantas medicinais nativas,alimentação alternativa e saudável; complementar os conteú<strong><strong>do</strong>s</strong> didáticosensinan<strong>do</strong> crianças e a<strong>do</strong>lescentes a semear, cultivar, colher, parar eobservar, refletir sobre o significa<strong>do</strong> dessas práticas em sua comunidade.Durante 2005, foram desenvolvidas gincanas para a produção e coletade adubo orgânico, palestras sobre preparação <strong>do</strong> solo, técnicas de plantioe soluções alternativas aos agrotóxicos, entre outras. Os produtos da hortatambém complementaram a merenda escolar. Um aspecto interessante <strong>do</strong>trabalho foi o envolvimento de outros professores da escola, que passarama explorar naquele espaço, a partir da temática ambiental, outros assuntose atividades correlatas às suas disciplinas: produção de textos, desenhos,<strong>no</strong>ções de nutrição, higiene pessoal, estatística, escala, proporção, razão,área, perímetro, medidas de comprimento, figuras geométricas.No final de 2005, Rosenilde e Elma começaram a participar da formaçãode <strong>agentes</strong> socioambibentais. A oficina – e sua proposta de promoverações multiplica<strong>do</strong>ras – reforçou seus questionamentos e estimulou as duas112 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>professoras a seguir <strong>no</strong> caminho que já vinham trilhan<strong>do</strong> para criar maisinstrumentos que pudessem ensinar mobilizan<strong>do</strong>, mobilizar ensinan<strong>do</strong>.(...) Saímos motivadas e com o compromisso de trabalhara questão ambiental e a geração de renda na comunidade. Promovemosuma reunião contan<strong>do</strong> com a participação <strong><strong>do</strong>s</strong> professoresda escola, alguns alu<strong>no</strong>s, lideranças locais e agricultorescom o fim de favorecer uma reflexão sobre os aspectos<strong>socioambientais</strong> e econômicos da comunidade, <strong>no</strong> senti<strong>do</strong> delevantarmos as principais dificuldades enfrentadas.Então, relatamos sobre a <strong>no</strong>ssa formação de <strong>agentes</strong> sociambientais,o que estávamos estudan<strong>do</strong>, partilhamos <strong>no</strong>ssasinquietações em relação à problemática socioambiental eprocuramos ouvir o grupo. Na reflexão, detectamos váriosdesafios: liga<strong><strong>do</strong>s</strong> à questão ambiental - por falta de informação,os agricultores estão degradan<strong>do</strong> as nascentes e matasciliares; liga<strong>do</strong> à questão econômica - por falta de fonte derenda, prevalecem na localidade apenas atividades ligadas apecuária, sen<strong>do</strong> que os lotes numa média de 50 a 70 hectares,não suportam uma quantidade de animais que seja suficientepara que a família sobreviva apenas com esta atividade; desafiosliga<strong><strong>do</strong>s</strong> à questão educacional - por falta de informação,os professores estão desenvolven<strong>do</strong> um trabalho centra<strong>do</strong> apenas<strong>no</strong> livro didático, enquanto a natureza ao re<strong>do</strong>r pedia porsocorro. (Trecho <strong>do</strong> relatório de Rosenilde e Elma)Espaços verdesA iniciativa entremódulos idealizada por Rosenilde e Elma traduziuseem um <strong>no</strong>vo projeto, que seguia a mesma trajetória e aprimoravao anterior. Daí nasceu o Pedagogia <strong>no</strong>s Espaços Verdes: tecen<strong>do</strong> umaprática educativa na horta e viveiro. Ele tinha como metas continuaras atividades de Educação Ambiental na horta e construir um viveiro<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 113


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>com o mesmo fim; recuperar uma nascente degradada; e promover umaformação para professores, funcionários, alu<strong>no</strong>s e pais sobre meio ambiente,com foco na agroecologia e agrofloresta.Em mea<strong><strong>do</strong>s</strong> de 2006, as duas professoras promoveram um curso realiza<strong>do</strong>quinzenalmente, <strong>no</strong>s fins de semana, para 40 pessoas, incluin<strong>do</strong>estu<strong><strong>do</strong>s</strong> em grupo, palestras e oficinas. Foram discuti<strong><strong>do</strong>s</strong> educaçãoambiental, coleta de sementes e cultivo de mudas, técnicas de plantio,adubos orgânicos, associativismo, sistemas agroflorestais. A partir daí,formou-se um grupo de 38 pessoas, que não apenas tor<strong>no</strong>u-se um núcleode mobilização comunitária em ações <strong>socioambientais</strong>, mas tambémcontinuou realizan<strong>do</strong> debates e estu<strong><strong>do</strong>s</strong>.Acho que, o que mu<strong>do</strong>u mesmo é isso que a Elma fala: foiessa paixão mesmo, de querer fazer alguma coisa pela questão<strong>do</strong> meio ambiente. Principalmente, discutir uma educaçãoque seja realmente uma educação <strong>do</strong> campo, uma educaçãoque atenda essas particularidades daquele alu<strong>no</strong> que está <strong>no</strong>campo. (Rosenilde)Projetopromoveuestu<strong><strong>do</strong>s</strong> e açõesde campo quemobilizaramestudantes ecomunidade114 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Em regime de mutirão, foi construí<strong>do</strong> um viveiro de 154 metrosquadra<strong><strong>do</strong>s</strong>. A coleta de sementes também envolveu praticamente toda aescola e foi acompanhada <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> de algumas espécies e de suas finalidades,com ajuda de mora<strong>do</strong>res que tinham mais conhecimento sobre asárvores e plantas da região. Durante o segun<strong>do</strong> semestre de 2006, foramproduzidas mais de cinco mil mudas de 50 espécies diferentes, entrenativas, exóticas e ornamentais. A conservação ambiental e alternativassustentáveis para a agricultura familiar continuaram sen<strong>do</strong> os temas centraisdas atividades ali desenvolvidas.Uma das maiores reações foi em relação aquele viveiro. Oviveiro foi um sonho. To<strong><strong>do</strong>s</strong> que passam, param, vão lá, visitam.Agora, neste momento, ele está “triste”, porque a gentenão começou o processo de plantio. Mas mesmo assim os alu<strong>no</strong>sfalam com orgulho, a comunidade em si. Por exemplo, osvizinhos ficam em volta. O pessoal da associação, lá <strong>do</strong> PAJandira, vai à escola, perguntam: “Como é que vocês fizeram?O quê que a gente tem de fazer?(...)” (Elma, setembro de 2007)A partir da iniciativa principal, foram desenvolvi<strong><strong>do</strong>s</strong> com os alu<strong>no</strong>s,pais e funcionários, sob orientação de mais professores, subprojetosde pesquisa que também incluíam atividades práticas e pequenasmobilizações. A “matéria-prima” produzida <strong>no</strong> viveiro da escola permitiu,em dezembro de 2006, a implantação de uma pequena agroflorestaem uma nascente degradada próxima. Os alu<strong>no</strong>s foram leva<strong><strong>do</strong>s</strong>ao local para observar o que estava acontecen<strong>do</strong> na área, identificaras espécies que poderiam ser plantadas e fazer a coleta de sementes.Ocorreram aulas sobre seleção de sementes, técnicas para acelerar agerminação e cultivo. Uma área seca e alguns pontos da agrovila <strong>do</strong>assentamento, como os arre<strong>do</strong>res <strong>do</strong> campo de futebol e <strong>do</strong> salão comunitário,também receberam mudas. Elma e Rosenilde procuraramo apoio de técnicos de organizações como ISA e o Ipam, entre outros,para desenvolver essas ações.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 115


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Uma coisa fundamental foi o trabalho pedagógico que mu<strong>do</strong>umuito a escola. Porque por exemplo, como a Rosenilde tefalou, os alu<strong>no</strong>s conhecem mais sobre o meio, conhecem maissobre o assunto <strong>do</strong> que a gente, né? Então, com esse trabalhointerdisciplinar, os alu<strong>no</strong>s, tiveram condição de produzirmais, de se expor mais. Eles começaram a se sentir importantes:“pôxa, eu conheço essa árvore, eu ensinei para professora”.Então foi um trabalho rico. Até mesmo o cálculo da área <strong>do</strong>viveiro e da horta foram os alu<strong>no</strong>s que decidiram. (Elma)Sabores <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>Outro subprojeto foi o Sabores <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>, que pretendia investigaro conhecimento da comunidade sobre espécies frutíferas <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong> eseu valor nutritivo. O cultivo dessas espécies <strong>no</strong> viveiro pretendeu incentivarseu consumo e plantio. As portas das salas de aula continuavambem abertas pelas professoras e assim os alu<strong>no</strong>s foram chegan<strong>do</strong>, com asmãos e sacolas bem cheias de baru, buriti, pequi, cagaita, mama-cadela,mangaba, cajuí, genipapo, jatobá e curriola. O estu<strong>do</strong> embasou oficinasde culinária em que foram produzidas compotas, <strong>do</strong>ces, sucos e bolos,ProfessorasRosenilde e Elma<strong>no</strong> viveiro da EscolaApóstolo Paulo,motivo de orgulhoda comunidade.Estudante fazplantio em nascentedegradada116 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>inclusive com a participação de mães de alu<strong>no</strong>s. Dalí saíram receitas <strong>no</strong>vase interessantes, como uma farofa de baru e gergelim.Tivemos dificuldades por falta de conhecimento <strong>do</strong> assunto,mas essas dificuldades foram pequenas perto <strong><strong>do</strong>s</strong> resulta<strong><strong>do</strong>s</strong>.Pudemos valorizar o conhecimento <strong>do</strong> alu<strong>no</strong> e <strong>no</strong>s surpreendersobre o quanto ele sabia a respeito das plantas. Pudemos trabalharem equipe e envolver os pais. É uma riqueza trabalharcom situações <strong>do</strong> cotidia<strong>no</strong> <strong>do</strong> alu<strong>no</strong> e conscientização ambiental.(...) além <strong>do</strong> trabalho pedagógico realiza<strong>do</strong> <strong>no</strong>s espaços verdes,a horta e o viveiro, foram realiza<strong><strong>do</strong>s</strong> vários eventos envolven<strong>do</strong>a comunidade, como mutirões, eventos de confraternização,palestras, seminários e gincanas culturais. Merece destaque agincana da semente, atividade que despertou muito interesse porparte da comunidade escolar. Através da mesma, obtivemosgrande variedade e quantidade de sementes nativas e exóticas. Oexcedente foi vendi<strong>do</strong>, fican<strong>do</strong> o lucro para custear os gastos como viveiro. To<strong>do</strong> o trabalho para construção da horta e viveiro foirealiza<strong>do</strong> com o apoio da comunidade, com <strong>do</strong>ação de material emão-de-obra. (Trechos <strong>do</strong> relatório de Rosenilde e Elma)Rosenilde e Elma tiveram a minúcia de colocar <strong>no</strong> papel o “custo”total <strong>do</strong> projeto: R$ 10 mil. Cálculo feito incluin<strong>do</strong> o que teria si<strong>do</strong>gasto com itens mínimos como papel, caneta, pregos. Mas a maior parte<strong><strong>do</strong>s</strong> recursos não veio em dinheiro. Veio em mobilização. A conta dá bemuma idéia <strong>do</strong> que estava acontecen<strong>do</strong>. Pessoas da comunidade derammadeira para o cercamento <strong>do</strong> viveiro e “horas de máquina”. A formaçãode <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> entrou com pouco me<strong>no</strong>s de R$ 1 mil emarame e telas de sombrite, por exemplo. A prefeitura deu 30 lascas de cercapara o isolamento da nascente degradada. Uma fazenda vizinha <strong>do</strong>ouoito mil saquinhos para acondicionar das mudas. A rifa de uma bezerrarendeu mais R$ 400. E daí por diante...<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 117


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>A necessidade de participarAcho uma coisa muito significativa esse despertar paraa necessidade de participar. Durante a formação, eu e Elmapercebemos que precisávamos estudar mais a questão ambientale social. Levamos para esse estu<strong>do</strong> alguns teóricos quediscutem esses temas. (...) Começamos primeiro a discutir eto<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> participava, mesmo aqueles que não tinham umgrau de instrução mais eleva<strong>do</strong>. Isso foi importante pra quea gente percebesse que a comunidade estava <strong>do</strong> jeito que estavaporque não havia organização social. (Rosenilde)Outro subprojeto que amadureceu com as discussões realizadas na formaçãode <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong>, com o grupo de mobilização da escolae com a comunidade foi o de reativar a associação de mora<strong>do</strong>res <strong>do</strong> assentamento.Os alu<strong>no</strong>s e professores fizeram o levantamento das pendênciasburocráticas da instituição e começaram a mobilizar a comunidade – realizan<strong>do</strong>assembléias e reuniões, “in<strong>do</strong> de casa em casa” – para debatera questão. Havia descrédito na possibilidade e necessidade de reerguer aassociação. O trabalho desenvolvi<strong>do</strong> pelos estudantes e educa<strong>do</strong>res começoua reverter esse sentimento e alertar sobre a importância da organizaçãopara a busca de alternativas econômicas e o encaminhamento de reivindicaçõesao gover<strong>no</strong>. A associação voltou à ativa gradualmente.No início de dezembro de 2006, aconteceu uma grande mostra naescola com alguns <strong><strong>do</strong>s</strong> resulta<strong><strong>do</strong>s</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> subprojetos. O evento contou com aparticipação de cerca de 300 pessoas, entre alu<strong>no</strong>s, assenta<strong><strong>do</strong>s</strong> e mora<strong>do</strong>resde fazendas vizinhas. Técnicos <strong>do</strong> ISA que participaram da iniciativa tambémestiveram presentes para apresentar a campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>.Apesar de toda a mobilização e a sensibilização alcançadas pelo trabalhodesenvolvi<strong>do</strong> na Escola Apóstolo Paulo, a experiência e as reflexõesde Rosenilde e Elma apontam para algumas limitações das iniciativaspromovidas por multiplica<strong>do</strong>res <strong>socioambientais</strong> e reforçam a necessidadede pensar em soluções para elas.118 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Em dezembro de 2006, aconteceuuma exposição com o resulta<strong>do</strong> devários subprojetos da iniciativaTivemos também muitos desafios. Os principais liga<strong><strong>do</strong>s</strong>à formação, assistência técnica, recursos financeiros, tempodisponível para dedicar-se ao projeto, manutenção <strong><strong>do</strong>s</strong> espaços(horta e viveiro) e dificuldades de articular ensi<strong>no</strong> e o trabalhonesses respectivos espaços. Os próprios professores seencarregaram da coleta de sementes com seus alu<strong>no</strong>s e cultivo<strong>no</strong> viveiro, o que se tor<strong>no</strong>u desgastante devi<strong>do</strong> às atribuiçõesdiárias que possuem com o ensi<strong>no</strong>. Consideran<strong>do</strong> ainda quemuitos professores acharam uma tarefa complexa desenvolverum trabalho com pesquisa numa perspectiva interdisciplinar,envolven<strong>do</strong> temas que não <strong>do</strong>minavam. Achamos necessáriorealizarmos mais estu<strong><strong>do</strong>s</strong>, leituras e reflexões em referênciasteóricas para termos mais segurança para trabalharmos comprojetos na escola na perspectiva da Educação Ambiental eAgroecológica. (Trecho <strong>do</strong> relatório de Rosenilde e Elma)Os obstáculos coloca<strong><strong>do</strong>s</strong> ao projeto não desanimaram as professoras.Elas sabiam que várias respostas para eles estão na capacidade demultiplicar e <strong>no</strong> potencial de mobilização da própria comunidade.Para o futuro, começaram a pensar em parcerias que pudessem vira sustentar a manutenção da horta e <strong>do</strong> viveiro, implantar sistemasagroflorestais <strong>no</strong> assentamento. A intenção era manter as portas ejanelas das salas de aula da escola Apóstolo Paulo abertas por bomtempo ainda.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 119


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Conheça os Agentes SocioambientaisNome:Adilson Siqueira de AbreuProfissão/ocupação: agricultor familiar,assenta<strong>do</strong>Onde mora: PA Pingo D´água, QuerênciaNasceu em Camupuã (MS) e está em Querênciahá sete a<strong>no</strong>s. É casa<strong>do</strong> e pai de quatro filhos. Atéos 12 a<strong>no</strong>s, foi cria<strong>do</strong> <strong>no</strong> sítio da família, cuidan<strong>do</strong>da criação de ga<strong>do</strong>. Também trabalhou emsorve teria, farmácia e oficina. É assenta<strong>do</strong> <strong>no</strong> Projeto de Assentamento(PA) Pingo D´água, onde tem um lote de 60 hectares. É presidenteda Associação <strong><strong>do</strong>s</strong> Peque<strong>no</strong>s Produtores e Produtoras Rurais <strong>do</strong> PAPingo D´Agua.“O que foi mais importante para mim foi saber a gravidade com que estásen<strong>do</strong> ofendida a natureza e conhecer o sistema agroflorestal. Queira ounão, precisamos tornar as florestas produtivas.”Nome:Aída Rodrigues Pra<strong><strong>do</strong>s</strong>Profissão/ocupação: estudanteOnde mora: Nova XavantinaEstudante de Biologia da Universidade <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>de Mato Grosso (Unemat), mora em Nova Xavantinahá 10 a<strong>no</strong>s. Trabalha numa escola de educaçãoinfantil. Foi bolsista de um projeto de pesquisasobre recomposição de mata ciliar, em Água Boa.“A formação me deu uma grande carga de conhecimentos sobre assuntostão importantes para o mun<strong>do</strong> em que vivemos hoje. As palestras comprofissionais da área e as experiências em agroflorestas <strong>no</strong>s deram grandebagagem para seguirmos os <strong>no</strong>ssos objetivos na vida, com consciência deque necessitamos da natureza para sobrevivermos em um mun<strong>do</strong> em que atec<strong>no</strong>logia é soberana.”120 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Alde<strong>no</strong>n Borges MoraesProfissão/ocupação: biomédicoOnde mora: CanaranaÉ biomédico e natural de Araguainha (MT). Estáhá 15 a<strong>no</strong>s em Canarana, onde tem um laboratóriode análises clínicas, foi presidente <strong>do</strong> RotaryClub e coordena<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Rota Kids. Foi bancário durante11 a<strong>no</strong>s e já trabalhou <strong>no</strong> Hospital <strong>do</strong> CâncerAraújo Jorge, em Goiânia (GO). Iniciou projeto de cultivo de mudas deespécies nativas em sua propriedade.Nome:Ana Paula Zuim AndradeProfissão/ocupação: professoraOnde mora: CanaranaTrabalha na escola Jesus, Maria, José, dan<strong>do</strong>aulas de Geografia, História e Educação Ambiental.Fez cursos de reflorestamento e germinação desementes. Desenvolve trabalhos com seus alu<strong>no</strong>s,relaciona<strong><strong>do</strong>s</strong> à questão <strong>do</strong> lixo e reflorestamento.“Acredito <strong>no</strong> poder transforma<strong>do</strong>r da educação. Sei que é um processo a longoprazo, mas tenho certeza que ‘bons frutos <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>’ serão colhi<strong><strong>do</strong>s</strong> em umfuturo próximo. Sou a favor <strong>do</strong> progresso, pois é necessário, mas a naturezaprecisa ser respeitada. Acredito que o alu<strong>no</strong> sensibiliza<strong>do</strong> e consciente podemudar positivamente suas atitudes e as atitudes de seus pais. Nosso trabalhoé modesto, mas são as atitudes <strong>do</strong> hoje que farão a diferença <strong>no</strong> amanhã.”<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 121


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Arman<strong>do</strong> MeninProfissão/ocupação: agricultor familiarOnde mora: PA Brasil Novo, QuerênciaNasceu em Getúlio Vargas (RS), em 1954. Desdecriança, trabalhou na agricultura familiar. Em1974, mu<strong>do</strong>u-se para o Xanxerê (SC), na comunidadede Baliza. Lá, foi presidente da escola e <strong><strong>do</strong>s</strong>indicato de trabalha<strong>do</strong>res rurais. Em 1987, mu<strong>do</strong>u-separa Querência. Já foi presidente da associação de chacareirose secretário de Obras <strong>do</strong> município. Faz parte da Associação ComunitáriaAgroecológica Estrela da Paz (ACEP).“Eu nunca perco as esperanças. Sei que vou ver meus filhos, netos e geraçõesfuturas com água potável para beber e poder ainda conhecer uma florestade pé, beira de córrego, na pequena propriedade reflorestada e produzin<strong>do</strong>alimentos <strong>no</strong> meio da floresta.”Nome:Ayres José TrevisolProfissão/ocupação: agricultor familiarOnde mora: Ribeirão CascalheiraÉ técnico agrícola. Nasceu em Caiçara (RS)e saiu de lá para Água Boa (MT), em 1975.Depois, seguiu para Ribeirão Cascalheira, ondeestá há 20 a<strong>no</strong>s. Integrou a Comissão Pastoralda Terra (CPT), foi presidente da Cooperativa deAgricultores Familiares <strong>do</strong> PA Maria Thereza e secretário da Associaçãode Produtores <strong>do</strong> PA Martia Thereza (APROMT). Já desenvolveuiniciativas com cultivo de plantas medicinais, preservação decórregos e nascentes. Hoje, é presidente <strong>do</strong> Sindicato de Trabalha<strong>do</strong>resRurais de Ribeirão Cascalheira.122 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Carlos GrünProfissão/ocupação: agricultorOnde mora: CanaranaNasceu em Santa Rosa (RS), em 1954, e mora emCanarana desde 1983. Hoje, é arrendatário <strong>no</strong> sítioSanta Luzia, onde desenvolve pequenas iniciativas<strong>socioambientais</strong>. Construiu um viveiro de espéciesnativas e exóticas para revenda de mudas. Tem cursosde minhocultura e hortifrutigranjeiros. Foi sojicultor de 1983 a 1989e depois tor<strong>no</strong>u-se peque<strong>no</strong> agricultor. Foi presidente <strong>do</strong> Sindicato <strong><strong>do</strong>s</strong>Trabalha<strong>do</strong>res Rurais de Canarana e <strong>do</strong> Sindicato Rural de Canarana.“Adquiri mais experiência na formação. Não conhecia as árvores nativas epassei a conhecer. Participo das reuniões, trocamos idéias. Aprendi comomanejar mudas e sementes. Isso tem si<strong>do</strong> fundamental na implantação <strong>do</strong>meu viveiro, com o quero contribuir para a preservação.”Nome:Cassia<strong>no</strong> Carlos MarmetProfissão/ocupação: técnico agricolaOnde mora: São José <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>Tem curso superior incompleto de Ciências Biológicas.Nasceu em Água Boa e já morou em NovaXavantina e Campo Verde (MT). Trabalhou comoprofessor e em assistência técnica em assentamentos.Foi técnico em fazendas de algodão, soja e pecuária.Foi apicultor e assessor da Associação de Produtores Agroecológicos(APA) de Água Boa. Hoje, trabalha <strong>no</strong> ISA, em São José <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>.“O simples fato de você colocar num mesmo espaço um grupo tão heterogêneopossibilita já um aprendiza<strong>do</strong> pela troca de experiências. Acredito que foi umadas coisas mais importantes que tivemos na formação, onde cada um teve aoportunidade de ouvir pessoas que têm diferentes visões sobre o tema em discussãoe essa troca possibilitou um crescimento <strong>do</strong> grupo como um to<strong>do</strong>.”<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 123


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Clo<strong>do</strong>al<strong>do</strong> MaccariProfissão/ocupação: técnico agropecuárioOnde mora: Gaúcha <strong>do</strong> NorteNatural de Tole<strong>do</strong> (PR), está há 27 a<strong>no</strong>s em Gaúcha<strong>do</strong> Norte. Cursa Ciências Contábeis. Há 17a<strong>no</strong>s é funcionário da Empresa Mato-grossensede Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural(Empaer). Sempre trabalhou com peque<strong>no</strong>s agricultores.Aju<strong>do</strong>u a elaborar e prestou assistência a projetos destina<strong><strong>do</strong>s</strong> aoPrograma Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf).“Daí para frente muita coisa mu<strong>do</strong>u, tanto na vida profissional como pessoal,pois descobri que tinha muito a contribuir para a sociedade. Iniciaruma faculdade, encarar alguns preconceitos, aprender a respeitar a opiniãodas pessoas, ser um agente socioambiental são pontos que considero importantes.Atribuo isso ao envolvimento na formação.”Nome:Cristiane GonçalvesProfissão/ocupação: professoraOnde mora: CanaranaTem 20 a<strong>no</strong>s e nasceu em Canarana. Está cursan<strong>do</strong>Pedagogia para educação infantil. É professora<strong>do</strong> colégio Jesus, Maria e José. Participou<strong>do</strong> projeto de reflorestamento de margens de riose nascentes na Escola Estadual Noberto Schwantes.Fez um curso de educação ambiental.“Ter participa<strong>do</strong> da formação foi acima de tu<strong>do</strong> gratificante e recompensa<strong>do</strong>r,quase um a<strong>no</strong> de muito aprendiza<strong>do</strong> e enriquecimento pessoal, ten<strong>do</strong>um significa<strong>do</strong> de “reciclagem”, de melhoramento de postura frente aatitudes que eu já acreditava e desempenhava. A mudança mais clara e positivaé a grande motivação que está me impulsionan<strong>do</strong> a desenvolver açõessócio-educativas e ambientais na instituição em que trabalho.”124 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Divi<strong>no</strong> Vicente SilvérioProfissão/ocupação: estudanteOnde mora: Nova XavantinaNatural de Campinápolis (MT), morou 10 a<strong>no</strong>s <strong>no</strong>assentamento Santo Idelfonso, em Novo São Joaquim(MT), onde trabalhou <strong>do</strong>is a<strong>no</strong>s com alfabetizaçãode jovens e adultos e <strong>no</strong> ensi<strong>no</strong> fundamental.Estu<strong>do</strong>u magistério pelo Programa de Educação naReforma Agrária (Pronera), de 2001 a 2003. Em 2004, mu<strong>do</strong>u-se paraNova Xavantina para cursar Biologia na Unemat.“A formação veio de encontro à necessidade da <strong>no</strong>ssa região. O curso possibilitoua discussão de questões como a conservação da água e as práticas deexploração da terra, que, até então, dávamos pouco importância. Conhecemos<strong>no</strong>vas técnicas de produção me<strong>no</strong>s prejudiciais ao ambiente. O processo deformação <strong>no</strong>s tor<strong>no</strong>u dissemina<strong>do</strong>res dessas <strong>no</strong>vas idéias.”Nome:Dorvali<strong>no</strong> Pinto da SilveiraProfissão/ocupação: agricultorOnde mora: PA Piau, Nova XavantinaDesde 1976, está em Nova Xavantina. Já morouem Goiânia, Juçara, São Luís <strong><strong>do</strong>s</strong> MontesBelos (GO) e Arujuaína (TO). Sempre trabalhouem fazendas como peão. Atualmente, é parceleiro,possui plantações de milho, mandioca e arroz. É <strong>do</strong>Conselho Fiscal <strong>do</strong> Sindicato <strong><strong>do</strong>s</strong> Trabalha<strong>do</strong>res Rurais deNova Xavantina, foi presidente da associação <strong>do</strong> PA Piau por duasvezes e conselheiro municipal de Desenvolvimento Rural Sustentávelde Nova Xavantina.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 125


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Édemo CorrêaProfissão/ocupação: agricultorOnde mora: Canarana e BrasíliaTem 67 a<strong>no</strong>s, nasceu em Cafelândia (SP), mas viveumuitos a<strong>no</strong>s em Lins (SP). Fez cursos técnicospara mecânico e trabalhou em oficinas. Em 1980,mu<strong>do</strong>u-se para Canarana e foi caminhoneiro porcinco a<strong>no</strong>s. Foi produtor de ga<strong>do</strong>, arroz e milho até1995, quan<strong>do</strong> também começou a comercializar pequi. É considera<strong>do</strong>um pioneiro na abertura de merca<strong><strong>do</strong>s</strong> para as frutas <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>.“É uma questão de paixão também, né? Uma questão de gosto. Eu souapaixona<strong>do</strong> por plantas <strong>do</strong> Cerra<strong>do</strong>. Não é só por pequi (...). Eu mostreipara o fazendeiro que ele tem lucro com o pequi, que é uma árvore que elenão pode derrubar. Eu quero fazer a mesma coisa com o baru. Só que agente tem que ir com uma de cada vez. Mas eu sou <strong>no</strong>vo, dá pra chegar lá.”Nome:Edna Soares de SouzaProfissão/ocupação: estudanteOnde mora: Nova XavantinaFoi professora em Água Boa, Nova Xavantina eSão Félix <strong>do</strong> Araguaia (MT). Em Água Boa, tambémtrabalhou <strong>no</strong> Hospital Regional. Concluiu afaculdade de Ciências Biológicas <strong>no</strong> campus daUnemat de Nova Xavantina, onde foi bolsista <strong>no</strong>Projeto de DST/AIDS. Fez pós-graduação em Educação Ambiental.“Quan<strong>do</strong> fui convidada e selecionada para participar desta campanha nãoa conhecia e a minha motivação foi participar de mais um curso paraenriquecer o currículo. Mas durante o processo de formação, fui conhecen<strong>do</strong>o que é a campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong> e seus objetivos. Percebi então que jáfazia parte de um grupo de pessoas empenhadas em trabalhar para tentarreconstruir as nascentes da Bacia <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>.”126 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


“Acredito que o desejo de continuar existe ainda. Tem uma sementinha aindadentro de cada um <strong><strong>do</strong>s</strong> participantes naquele grupo e nós acabamos sen<strong>do</strong> umreferencial na comunidade.”‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Elma Gomes de MoraesProfissão/ocupação: professoraOnde mora: PA Serrinha, Água BoaFormada em Pedagogia com especialização emGestão. Antes de participar da formação de <strong>agentes</strong><strong>socioambientais</strong>, desenvolveu o projeto Pedagogiana Horta Escolar: Semean<strong>do</strong> Idéias, paradiscutir alimentação saudável e meio ambiente naescola Apóstolo Paulo, <strong>do</strong> Projeto de Assentamento Serrinha.Nome:Gediel ThomasProfissão/ocupação: técnico agropecuárioOnde mora: CanaranaTrabalhou na Empresa Mato-grossense dePesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural(Empaer), depois na Fundação Mato Grosso e naSecretaria de Agricultura de Canarana. Nasceu emSão Pedro <strong>do</strong> Butiá (RS) e veio com a família parao município há 23 a<strong>no</strong>s. Fez cursos sobre Áreas de Preservação Permanente(APPs). Já trabalhou com peque<strong>no</strong>s produtores e levantamentosde microbacias. Em 2007, passou a morar em Portugal.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 127


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Gilberto Cirilo TrevisolProfissão/ocupação: trabalha<strong>do</strong>r ruralOnde mora: Ribeirão CascalheraTem 26 a<strong>no</strong>s e nasceu em Água Boa.Trabalhou em fazendas, oficinas mecânicas epostos de gasolina. Iniciou curso de salinização(alimentação animal). Apóia iniciativas <strong>do</strong>movimento <strong><strong>do</strong>s</strong> trabalha<strong>do</strong>res rurais em RibeirãoCascalheira.Nome:Gilmar HollunderProfissão/ocupação: professorOnde mora: QuerênciaNasci<strong>do</strong> em Afonso Cláudio (ES), trabalhou atéos 21 a<strong>no</strong>s <strong>no</strong> sítio da família. Desde 1990, játinha experiência com agricultura alternativa. Fezo curso de magistério, estu<strong>do</strong>u para ser diáco<strong>no</strong>da Igreja Luterana e trabalhou em um abrigopara mães solteiras <strong>no</strong> Rio de Janeiro (RJ). Está cursan<strong>do</strong> o 3º a<strong>no</strong>de Pedagogia e é professor da Escola Municipal Família Agrícola deQuerência (Emfaque). Também tem formação em música..“A época de seca não é um tempo tão ruim assim. É tempo de se preparar,coletan<strong>do</strong> sementes, definin<strong>do</strong> a área que se quer plantar e pensar <strong>no</strong>s erroscometi<strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>no</strong> plantio anterior. Esperar que as chuvas caiam <strong>no</strong> tempo certo,aproveitar enquanto existe um mínimo de equilíbrio ambiental.”128 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Gilsimar Oliveira de AndradeProfissão/ocupação: professorOnde mora: PA Pingo D’Agua, QuerênciaNasceu <strong>no</strong> Mato Grosso <strong>do</strong> Sul. Está há maisde sete a<strong>no</strong>s em Querência. É assenta<strong>do</strong> <strong>do</strong> PAPingo D´água e professor da Escola Municipal deEducação Básica <strong>do</strong> assentamento. É tesoureiroda Associação <strong><strong>do</strong>s</strong> Peque<strong>no</strong>s Produtores e ProdutorasRurais <strong>do</strong> PA Pingo D´água.Nome:Ingred Ramos PereiraProfissão/ocupação: professoraOnde mora: CanaranaFuncionária pública estadual, atuou comoprofessora de matemática e é especialista eminformática aplicada ao ensi<strong>no</strong>. Natural de PassoFun<strong>do</strong> (RS), já trabalhou em cartório e com vendade seguros em banco. No ramo da moda, foi estilista,gerente de loja e responsável pela administração de uma empresa deconfecção. Também atuou <strong>no</strong> Sindicato Rural de Canarana, cuidan<strong>do</strong>da área administrativa e social, promoven<strong>do</strong> cursos e palestras. Trabalhana biblioteca da Escola Estadual Norberto Schwantes.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 129


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Profissão/ocupação: comerciante e administra<strong>do</strong>rade fazendaOnde mora: CanaranaNatural de Cunha Porá (SC), está em Canaranahá 22 a<strong>no</strong>s. Já morou em Ribeirão Cascalheira.É empresária e está cursan<strong>do</strong> a faculdade deCiências Contábeis. Sempre trabalhou <strong>no</strong> ramo<strong>do</strong> comércio, mas manteve contato com a área rural. Já teve umviveiro de mudas para revenda. Faz parte da Sociedade Brasileira deEubiose em Canarana.Irene Rosa MarsangoNome:Ivan LochProfissão/ocupação: técnico agropecuárioOnde mora: CanaranaNasceu em Itapiranga (SC), mas morou muitosa<strong>no</strong>s <strong>no</strong> Paraná. É funcionário publico municipalem Canarana desde 1993. Trabalhou nasSecretarias de Agricultura e de Educação, inclusivecom oficinas pedagógicas de olericultura. Fezo curso de técnico agropecuário, de florestamento e reflorestamento.Desde 2006, é responsável pelo viveiro municipal de Canarana <strong>no</strong>âmbito <strong>do</strong> projeto Quem vê só Soja não enxerga Desenvolvimento: umaexperiência de recuperação de nascentes e matas ciliares na Bacia <strong>do</strong><strong>Xingu</strong>, parceria entre o ISA, a prefeitura e a Sociedade Amigos <strong>do</strong> Garapucom o patrocínio <strong>do</strong> Instituto HSBC de Solidariedade.130 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Jaílton Assunção de SousaProfissão/ocupação: biólogoOnde mora: QuerênciaEm 2000, formou-se em Ciências Biológicas.Quan<strong>do</strong> criança e a<strong>do</strong>lescente, vendia bolos everduras na rua e feiras livres. Foi <strong><strong>do</strong>s</strong> conselhosmunicipais Tutelar, de Meio Ambiente e de Saúdede Nova Xavantina. Realizou ações de sensibilizaçãona área ambiental e prestou serviços voluntários. Atua na área ambientale de assistência técnica em assentamentos. Desde 2007, trabalha <strong>no</strong> ISA.“No curso, obtivemos o que é mais importante: o conhecimento que a universidadenão dá, esse contato com o que as pessoas estão fazen<strong>do</strong> e com o quepode ainda ser feito para a preservação. Estou cada vez mais consciente <strong>do</strong>papel que terei de exercer na comunidade, porque as pessoas ainda achamque meio ambiente é coisa de biólogo ou ecologista.”Nome:Josafá Cunha da CruzProfissão/ocupação: agricultor, assenta<strong>do</strong>Onde mora: PA Cancela, Ribeirão CascalheiraNasceu <strong>no</strong> PA Cancela, em Ribeirão Cascalheira,onde tem um lote. Está terminan<strong>do</strong> o ensi<strong>no</strong>médio. Começou a trabalhar como ajudante numaoficina de auto-peças e tornea<strong>do</strong>ra. Depois trabalhouem várias oficinas mecânicas, auto-elétricas etornea<strong>do</strong>ras. Hoje é tesoureiro da Associação <strong><strong>do</strong>s</strong> Peque<strong>no</strong>s ProdutoresRurais <strong>do</strong> PA Cancela. Fez cursos sobre queimada e aceiros.“De início, não valorizava o meio ambiente. Hoje, sei o que isso significa. Façopalestras sobre recuperação de nascentes e qualidade da água em diversasescolas. Acho que os assenta<strong><strong>do</strong>s</strong> começam a se conscientizar de que as derrubadasna beira <strong><strong>do</strong>s</strong> córregos têm conseqüências negativas. Muitos rios têmseca<strong>do</strong>. Primeiro, para o futuro, precisamos reconstruir o que foi destruí<strong>do</strong>.”<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 131


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:José Antonio Pereira LeiteProfissão/ocupação: estudanteOnde mora: Nova XavantinaÉ paulista. Já morou em vários lugares: Rondônia,Acre, Minas Gerais e Paraná. Está em NovaXavantina há quatro a<strong>no</strong>s. Cursa Biologia naUnemat. Atuou na área de gerenciamento de vendase numa empresa de reciclagem e fabricação depapel. Também trabalhou na Companhia de Saneamento Básico <strong>do</strong>Esta<strong>do</strong> de São Paulo (Sabesp).Nome:Josuel Olegário <strong>do</strong> SantosProfissão/ocupação: engenheiro florestalOnde mora: CanaranaTem pós-graduação em Heveicultura, Controla<strong>do</strong>riae Meio ambiente. Trabalhou na CooperativaAgropecuária Mista de Canarana Ltda.(Coopercana), com a função de implantar mudasde seringueira, e numa empresa refloresta<strong>do</strong>ra, nafunção de técnico florestal. Morou em Belém <strong>do</strong> Pará, Cuiabá, Juínae São José <strong>do</strong> Rio Claro (MT). Hoje, está na Secretaria de Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong>Meio Ambiente <strong>do</strong> Mato Grosso (Sema), onde trabalha com a produçãode mudas, espécies florestais, reflorestamento, projetos de licenciamentoambiental e de recuperação de áreas degradadas.132 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Julio Pereira MessiasProfissão/ocupação: professorOnde mora: CanaranaNasceu em Quirinópolis (GO), onde trabalhoucomo vende<strong>do</strong>r e representante comercial deempresas atacadistas. Formou-se em Geografia.Chegou em Canarana em 2003. Hoje, é professordas escolas estaduais 31 de Março e NorbertoSchwantes. Participou <strong>do</strong> Encontro Nascentes <strong>do</strong> <strong>Xingu</strong>, em outubrode 2004, e de iniciativas de reflorestamento de nascentes <strong>do</strong> SindicatoRural de Canarana.Nome:Luciana Akeme S. M. DeluciProfissão/ocupação: professoraOnde mora: CanaranaNasceu em Dracena (SP) e mora em Canaranadesde 1990. É formada em Matemática, com especializaçãoem Psicopedagogia. Funcionária concursadada Secretaria de Esta<strong>do</strong> de Educação de MatoGrosso (Seduc). Foi assessora da Secretaria Municipalde Educação e Cultura (Semec) e presidente <strong>do</strong> Conselho Municipalda Criança e <strong>do</strong> A<strong>do</strong>lescente (CMDCA). É <strong>do</strong>cente de curso de magistériopara professores indígenas. Trabalha <strong>no</strong> escritório <strong>do</strong> ISA em Canarana.“Pensar em preservação sem desenvolvimento é fazer um discurso <strong>do</strong> inatingível.Os ideais da campanha ‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong> apontam para o possível e reforçam queo desenvolvimento não deve ser sinônimo de destruição. Aliar desenvolvimento apreservação tem si<strong>do</strong> a luta de muitos e, agora, a minha também.”<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 133


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Luiz VezaroProfissão/ocupação: técnico agropecuário,professorOnde mora: QuerênciaNasceu em Nova Itaberaba (SC) e, desde 1996,mora em Querência, onde é verea<strong>do</strong>r e foi presidenteda Câmara Municipal, entre 2005 e 2006.Foi professor da Escola Municipal Família Agrícolade Querência (Emfaque) por quatro a<strong>no</strong>s. Trabalhou em cooperativascom peque<strong>no</strong>s produtores. Foi delega<strong>do</strong> da região de Água Boa naConferência Estadual <strong>do</strong> Meio Ambiente de 2007.“A meto<strong>do</strong>logia de reunir agricultores, professores, políticos, diferentesclasses e categorias foi muito importante na formação. Você pôde ter diversasopiniões. Cada um, em seu segmento, passou a ter condições de transferiresses conhecimentos. Também foi fundamental discutir a realidade local.”Nome:Marcos Aurélio <strong><strong>do</strong>s</strong>Santos Pentea<strong>do</strong>Profissão/ocupação: técnico agropecuárioOnde mora: Água BoaNatural de Barra <strong>do</strong> Garças (MT), está cursan<strong>do</strong>Ciências Contábeis. É funcionário da empresaPlantar de assistência técnica e ambiental, ondeestá há mais de <strong>do</strong>is a<strong>no</strong>s. Trabalhou na empresaAventis Crops Science com produtos fito-sanitários. Tambémfoi funcionário <strong>no</strong> Grupo Maeda. Atuou em assistência técnica emlavoura de algodão. Participou de curso de reflorestamento em 2007,em Cáceres (MT).134 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Maria Joselina Cantuáriode AbreuProfissão/ocupação: agricultora familiar,auxiliar de enfermagemOnde mora: Ribeirão CascalheiraJá morou em Nova Xavantina, Cuiabá, Barra <strong>do</strong>Garças e Ribeirão Cascalheira. Foi policial civil erepórter. Hoje, trabalha <strong>no</strong> Programa de Saúde daFamília (PSF). É voluntária da Igreja Católica para atendimentode mora<strong>do</strong>res de rua e i<strong><strong>do</strong>s</strong>os.“Estamos colocan<strong>do</strong> <strong>no</strong>ssas experiências em prática e fazen<strong>do</strong> com que aspessoas que tenham nascentes descobertas plantem mudas para segurar o solocontra a erosão, para que possam ter água sempre. Não sabíamos o que estavaacontecen<strong>do</strong> com o meio ambiente e, depois da formação, realizamos reuniõessobre esse trabalho. Estamos mais habilita<strong><strong>do</strong>s</strong> para trabalhar <strong>no</strong> dia-a-dia.”Nome:Maria Sicorra da RosaProfissão/ocupação: bióloga, professoraOnde mora: CanaranaNascida em Pinhalzinho (SC), foi para o MatoGrosso em 1989, para morar em Nova Xavantina,onde se formou em Ciências Biológicaspela Unemat. Tem especialização em Plantas eInterdisciplinaridade. Em 1999, mu<strong>do</strong>u-se paraCanarana e, em 2000, começou a atuar como professora de Ciênciase Biologia. Atualmente, é coordena<strong>do</strong>ra da Universidade de Cuiabá emCanarana e professora na Escola Estadual Norberto Schwantes, ondeparticipou <strong>do</strong> projeto A Natureza e o Saber. Fez alguns cursos na áreade meio ambiente, como o de reflorestamento <strong>do</strong> Serviço Nacional deAprendizagem Rural (Senar). Participou <strong>do</strong> Encontro Nascentes <strong>do</strong><strong>Xingu</strong>, em outubro de 2004.<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 135


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Maristela F. Becker da RosaProfissão/ocupação: bióloga, professora,educa<strong>do</strong>ra ambientalOnde mora: CanaranaNatural de Francisco Beltrão (PR), é formada emBiologia. Atuou durante muito tempo na licenciatura.Foi professora de ensi<strong>no</strong> fundamental,médio e cursinho, além de coordena<strong>do</strong>ra pedagógicaescolar. Participou <strong>do</strong> curso de viagem técnica da TNC (The NatureConservancy) visitan<strong>do</strong> experimentos de restauração florestal <strong>no</strong>sesta<strong><strong>do</strong>s</strong> de São Paulo e Paraná. Atualmente, trabalha <strong>no</strong> Instituto dePesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), onde desenvolve projetos deEducação Ambiental.Nome:Napoleão Carlos RochaProfissão/ocupação: agricultor familiarOnde mora: Ribeirão CascalheiraNatural de Barra <strong>do</strong> Garças (MT), mora emRibeirão Cascalheira desde 1978. Apesar de tero curso de técnico agropecuário, nunca exerceua função. Já residiu em Muarama (PR) e AltaFloresta (MT), trabalhan<strong>do</strong> em fazendas comoadministra<strong>do</strong>r. Presta serviços de mecânico à Prefeitura de RibeirãoCascalheira. É liga<strong>do</strong> à Associação de Novo Paraíso, onde desenvolveum projeto de plantio de sementes e educação ambiental.136 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Nilsa Raquel DiasProfissão/ocupação: agricultora, parceleiraOnde mora: PA Maria Tereza, em Ribeirão Cascalheira,e CanaranaProdutora rural e corretora de imóveis, é bacharelem Administração. Está cursan<strong>do</strong> especializaçãoem Agronegócio. Nasceu em Palotina (PR).Trabalhou como auxiliar administrativa em armazénsgerais e como secretária. Sempre manteve a atividade rural emparalelo. Foi secretária e presidente da Igreja Evangélica Luterana <strong>do</strong>Brasil (IELB) de Canarana.Nome:Ricar<strong>do</strong> Dias BatistaProfissão/ocupação: agricultor familiar,assenta<strong>do</strong>Onde mora: PA Jaraguá, Água BoaDesde criança sempre trabalhou na zona rural.Foi arrendatário e por muito tempo assalaria<strong>do</strong>em fazendas. Entre outras funções, foi vaqueiro etratorista. Foi presidente <strong>do</strong> Sindicato de Trabalha<strong>do</strong>resRurais de Água Boa (2003-2005). Sempre sonhou em ter sua terraprópria, que é “o que gosta de mexer”.“Eu tenho certeza que estou <strong>no</strong> caminho certo. Há uns cinco, seis a<strong>no</strong>s, o pessoalfalava muito de soja e milho. E aí eu falava que <strong>no</strong> futuro o que ia dar dinheiroera árvore, já pensan<strong>do</strong> <strong>no</strong> que eu ouvia falar sobre aquecimento global e <strong>do</strong>desmatamento.”<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 137


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Rosenilde Nogueira PaniagoProfissão/ocupação: professoraOnde mora: Água BoaProfessora da rede estadual e municipal de ÁguaBoa, licenciada em Matemática e mestranda emEducação pela Universidade Federal de MatoGrosso (UFMT). Trabalha há oito a<strong>no</strong>s com formaçãode professores e educação à distância. Antesde participar da formação, desenvolveu o projeto Pedagogia na HortaEscolar: Semean<strong>do</strong> Idéias.“Uma coisa interessante que a gente sente é você viver de maneira viva essesentimento de zelo pela natureza. Não conhecíamos as espécies, as sementes.E os <strong>no</strong>ssos alu<strong>no</strong>s conheciam. Então, com esse trabalho, nós também estamosperceben<strong>do</strong> o quanto é importante esse conhecimento, da gente se dedicaràs espécies e de também ter essa vontade de cultivar mesmo, de plantar.”Nome:Sara Adriana MalvessiProfissão/ocupação: professoraOnde mora: CanaranaTem Licenciatura em Ciências Naturais, comhabilitação em Química, pela Unemat, campusNova Xavantina, onde foi bolsista <strong>do</strong> Núcleo deEducação Ambiental (NEA). Dá aula na Escola Estadual31 de Março, em Canarana. Cursa o 3ª a<strong>no</strong>de Química pela Universidade Federal <strong>do</strong> Mato Grosso (UFMT), emBarra <strong>do</strong> Garças. Tem pós-gradução em Nutrição Humana e Saúde.“Durante a formação, o grupo era bastante heterogêneo, com professores eagricultores, por exemplo, mas bastante uni<strong>do</strong>. Juntamos a teoria e a prática.Então, conseguimos trabalhar como produzir sem esquecer a questãoambiental. A heterogeneidade fortaleceu o trabalho. Essas idéias foramlevadas para vários segmentos.”138 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Sidnei Bue<strong>no</strong> de MirandaProfissão/ocupação: zootecnistaOnde mora: Gaúcha <strong>do</strong> NorteNasceu em Tatuí (SP). Trabalhou na produção edistribuição de leite e <strong>no</strong> comércio de produtosagroveterinários. Participou de vários projetoscomo monitor em vilas rurais, <strong>no</strong> Paraná. Integrouprojetos como o Universidade Solidária e de extensão,na Bacia <strong>do</strong> Rio Japurá (AM). Fez pesquisa de comportamento dasabelhas e foi bolsista na área de extensão na Universidade Estadual deMaringá (PR), onde se formou. Hoje, é chefe <strong>do</strong> Departamento de Agriculturade Gaúcha <strong>do</strong> Norte.“Sempre gostei de plantar árvores. Sabia que plantar a idéia de se plantarárvores iria contribuir de uma forma ou outra com o futuro.”Nome:Silvia de Moura FaitãoProfissão/ocupação: professoraOnde mora: Gaúcha <strong>do</strong> NorteNasceu em Guaíra (PR) e está em Gaúcha <strong>do</strong>Norte há seis a<strong>no</strong>s. Antes disso, foi professora emvárias escolas de Canarana. É formada e tem especializaçãoem Pedagogia. Já participou de cursode manejo florestal promovi<strong>do</strong> pelo ISA e dá cursosde formação para professores indígenas. Hoje, é assessora pedagógicaem escolas municipais indígenas e não-indígenas <strong>no</strong> município.“A formação estimulou uma reflexão importante sobre minhas atitudes diárias.Não podemos pedir que as pessoas reutilizem sacos plásticos se não fizermosisso. Não basta falar, tem de praticar. Com <strong>no</strong>ssas iniciativas, as pessoasestão ten<strong>do</strong> um olhar diferente. Estamos sensibilizan<strong>do</strong>-as com exemplos, paramostrar que essas iniciativas vão beneficiar toda a comunidade.”<strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong> 139


‘Y Ikatu <strong>Xingu</strong>Nome:Valdir Milton SupptitzProfissão/ocupação: agricultorOnde mora: CanaranaNatural de Três Passos (RS), está há 20 a<strong>no</strong>sem Canarana. Tem curso técnico em Eletrônica,mas trabalha com agricultura desde a infância.Trabalhou em oficina de rádios e eletro<strong>do</strong>mésticose tem uma empresa <strong>do</strong> ramo. Hoje é produtorde milho, soja e mandioca, além de cria<strong>do</strong>r de suí<strong>no</strong>s e ga<strong>do</strong> leiteiro.É parceleiro <strong>do</strong> projeto Canaã, onde é presidente da associação depeque<strong>no</strong>s produtores rurais. Foi presidente e vice-presidente da IgrejaEvangélica de Confissão Luterana <strong>no</strong> Brasil (IECLB) em Canarana.ImpressãoLitokromiaTiragem desta edição3000 exemplares140 <strong>Formação</strong> <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>agentes</strong> <strong>socioambientais</strong> <strong>no</strong> <strong>Xingu</strong>


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