Magia de Malabar.

Magia de Malabar.
Ao longo da linha costeira do Sudoeste da Índia, em Kerala, onde a
biodiversidade resultante das chuvas pesadas é agora reconhecida como
uma atracção mundial, o café não é a única coisa que pode sofrer uma
transformação única. Os visitantes também se transformam.
a s famosas monções do Sul da Ásia prolongamse
muito para além da época das chuvas. A terra
seca e castanha fica verde. O silêncio das espécies
provocado pelos aguaceiros torrenciais dá lugar a um clamor
de actividade – os animais surgem, os insectos chamam e os
seres humanos fazem ruído. É o despertar da vida sazonal,
ao mesmo tempo que outros sinais de vida se vão apagando.
A vida sofre alterações a todos os níveis durante este período
de chuvas intensas que se estende de Junho até Setembro, o
que perfaz praticamente 80% da precipitação total anual na
Índia. Nada nem ninguém escapa a estas chuvas. Mas, apesar
de todas as alterações que o subcontinente indiano sofre, as
monções do estado costeiro de Kerala criam os seus próprios
processos de transformação.
Um desses exemplos diz respeito ao café. Devido à sua
exposição ao ar das monções, nenhum outro local do mundo
consegue produzir os grãos de café (cultivados noutro local)
como Kerala. A localização de Kerala, ao longo da costa
indiana, faz com que seja a primeira zona a ser exposta às
chuvas da monção de sudoeste proveniente do Mar Arábico,
e a proximidade das montanhas relativamente ao oceano
resulta num nível particularmente elevado de precipitação
(até 250cm por ano). Os connoisseurs do café descobriram
que o tipo de precipitação em Kerala faz com que esta região
produza um tipo de café que não existe em mais nenhum
lado: o café das monções (ou Monsoon Malabar, assim
chamado devido à linha costeira). O facto de os grãos ficarem
expostos ao ar salgado e húmido da costa de Kerala faz com
que o seu paladar e cor se alterem. Os especialistas tentaram
reproduzir este processo noutros locais mas não foram
bem sucedidos. Para os nativos, isso não é uma surpresa. É
sim uma evidência daquilo que sempre souberam – que as
monções de Kerala são diferentes. O ar é excepcionalmente
pesado com água e sal, e o vento sopra constantemente do
oceano para o interior, e num ângulo perfeito.
Obviamente que, numa região onde a biodiversidade
resultante das chuvas abundantes é agora considerada como
sendo uma atracção mundial, o café não é a única coisa que
pode sofrer uma transformação em Kerala. Os visitantes
também se transformam. Esta pequena faixa de terra
delimitada pelo Mar Arábico e pelas montanhas do Ghat
Ocidental faz parte de um dos ecossistemas mais singulares
do mundo, terra mãe de várias formas de dança e música
clássica indiana celebradas em todo o mundo, local onde
existem antigas ruínas a par de influências cosmopolitas de
há muitos séculos. É, além disso, uma zona famosa pelas
suas especiarias como a canela e a pimenta, e também o café.
No entanto, os visitantes mais entusiastas são precisamente
aqueles que se vão embora depois de terem experimentado
o seu ligeiro e próprio processo de transformação, processo
este que resulta dos inúmeros estilos de vida existentes neste
estado mais pequeno que a Suíça. Desde a cultura tropical
até à antiga Ayurveda – antiga prática médica que significa
“ciência da vida” e tem origem nesta zona – Kerala não se
assemelha a nenhum outro local do mundo pois engloba
tantos estilos de vida.
Veneza tropical
O nascer do sol na luxuriante região dos pântanos na região
de Kerala. Ao longo desta teia de canais e densas plantações de
palmeiras que se estendem por centenas de quilómetros perto
da linha costeira no Sudoeste da Índia, o odor das queimadas
matinais, do jasmim e da maresia inunda a atmosfera. Os
habitantes locais, que vivem em pequenas parcelas de terra e
viajam em barcos, começam o seu dia com a higiene matinal
e a lavar a roupa e os barcos. Depois do banho segue-se a
oração. Os sinos do templo tocam. O canto das aves exóticas
– em especial o dos alciões – é tão frequente e ruidoso que
um viajante apanhado de surpresa pode confundir este
ambiente habitual com um estado de pânico.
MAIS DO QUE VIAJAR
Grand Cru
Monsoon
EDITOR: Anuj DesAi FOTÓGRAFO: Peter GArmusch
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Em cima: Em Kerala, os
tecelões estão novamente a
utilizar as tradicionais tintas
Ayurvédicas para têxteis.
À direita: Pescador em
Hosabettu Beach com o pôr do
sol no Mar Arábico.
Em baixo: Um rosto da
“Theyyam”, dança ritual com
2000 anos.
Em cima: A história de Kerala
está muito ligada ao comércio,
incluindo o das especiarias, do
chá e do café que ainda atrai
viajantes de todo o mundo.
À esquerda: Búfalo de água
a tomar banho num arrozal
durante uma corrida “kamla”
tradicional em Karnataka.
Um viajante fascinado que, de coco na mão, presencie esta
cena, dir-lhe-á que os pântanos de Kerala são o cenário mais
idílico e menos conhecido do mundo. Esta vida na água ao
longo das célebres enseadas poder-se-á apreciar melhor se
alugar um houseboat (barco adaptado para cruzeiros) em
Allepey. Estes houseboats têm vários quartos de dormir
e tripulações que guiam os turistas pela teia de canais,
cozinhando as refeições à medida que vão navegando. Allepey,
que é parte da região dos pântanos a Norte, é composta por
seis lagos e inúmeros canais estreitos que os unem. A água é
tão predominante e a terra tão rara que, tal como em Veneza,
todos os transportes se fazem por barco. Um dos canais – o
número 47 – está registado como uma auto-estrada nacional.
Viajar pelo 47 é como pairar num ambiente pessoal muito
próprio; e se isto não é uma experiência original, então o que
será?
A vida na praia
Após esta experiência nos pântanos tropicais, segue-se a
cultura costeira – em especial a deliciosa fusão de culturas
seculares provocada pelo comércio que prolifera ao longo
da Costa do Malabar. Viver intimamente esta cultura é mais
divertido quando se inclui comida, e a encantadora Ayisha
Manzil, uma estalagem na montanha com vista sobre o
mar, provocou a visitantes de locais tão distantes como
Lyon e Chicago o desejo dessas iguarias. A estalagem Ayisha
Manzil faz parte de uma sociedade de 11 anos entre C.P.
Moosa e a sua mulher Faiza e é uma das mais singulares do
mundo devido à requintada e rara comida Mopillah que é
confeccionada na cozinha de Faiza. Faiza ensina aos hóspedes
interessados como cozinhar os pratos inspirados na tradição
de uma pequena comunidade regional de Muçulmanos, e
todos eles levam consigo um livro de receitas e uma frigideira
como recordação.
Faiza descreve a cozinha Mopillah como uma “sinfonia de
sabores” mais delicada do que seria de esperar de influências
indianas e árabes. Embora alguns dos seus pratos mais fora
do comum incluam o kannanpatiri (tipo de pão), camarões
tamarindo, tâmaras e uvas de conserva, o seu prato favorito
é o biryani, arroz e carne com tempero de especiarias, prato
favorito do Norte da Índia cujas origens provêm do Malabar.
Para despertar o apetite, recomenda-se a piscina do Ayisha
Manzil ou as praias vizinhas. Durante a época festiva, a
Moosas também faz excursões à aldeia para assistir aos
espectáculos de Theyyam. O Theyyam, um tipo de teatro
dançado antigo que reproduz as lendas religiosas, prolongase
durante dias e noites consecutivos, proporcionando
ao espectador desprevenido uma combinação rara, quase
mágica, de fatos coloridos e pinturas faciais, música ao vivo,
fogo de artifício, actores treinados para invocar divindades e
transes verdadeiros e fingidos tanto pelos actores como pelos
habitantes da aldeia.
A última visão da cultura costeira é, obviamente, a praia
isolada. A estância de férias Marari Beach é um local isolado
de bons costumes, o tipo de lugar onde a estadia habitual é de
uma semana e em que o rol bem intencionado de visitantes
inclui o Paul McCartney. Aberta em 1998 pela cadeia de luxo
amiga do ambiente CGH Earth, a Marari é composta por
62 casas de campo espalhadas pelos cerca de 15hectares de
terra privada ao longo da praia e nos quais nenhuma árvore
foi cortada, nenhuma terra foi removida e os lagos foram
preservados durante a sua transformação. As folhas secas são
apanhadas para fazer fertilizante e a propriedade tem o seu
próprio jardim orgânico para abastecer os restaurantes. Olhe
para cima e veja dúzias de tipos de bananas.
Saúde é riqueza
Nenhuma excursão pelos vários tipos de vida de Kerala está
completa se não experimentar a Ayurveda, a prática milenar
Hindu que data de há 5000 anos e que, hoje em dia, está a ser
vivenciada a nível mundial. A Harivihar Ayurevedic Heritage
Home em Calicut é simultaneamente uma casa de hóspedes
e um centro de Ayurveda. A propriedade abriu há três anos
numa casa com 150 anos, cujos actuais proprietários são os
Kumars, um casal de médicos que acredita no estilo de vida
Ayurvédico. (A Harivihar também recebe pessoas que não se
interessam pela Ayurveda.)
O Dr. Sri Kumar, neurologista pediátrico, descreve a sua
propriedade como sendo um local “para viver uma filosofia
de vida”. O menu é composto por comida vegetariana leve.
Não é permitido fumar nem beber álcool. O instrutor
principal da filosofia de vida Harivihar é o Dr. Mali, um
médico Ayurvédico de 18 anos. Embora o programa que o
Dr. Mali propõe possa ser iniciado em 7 dias, “sugerimos
pelo menos uma estadia de 15 dias”, afirma. A Ayurveda,
diz-nos, “não é a ciência do tratamento”, é sim um processo
de aprendizagem de um novo estilo de vida e de “limpeza
de impurezas e toxinas decorrentes de várias alterações
bioquímicas que ocorrem no nosso corpo”. A educação é
apreciada pela maior parte dos hóspedes – cerca de 60%
voltam a visitar-nos.
Aqueles que vêm a Kerala partem com tudo aquilo que
de melhor as visitas a locais interessantes podem oferecer:
memórias que duram uma eternidade. Mas os visitantes
mais privilegiados deste estado costeiro levam consigo uma
recordação que muda o seu próprio modo de vida. Porque
apesar dos tons de verde abundarem em Kerala, a terra
produz outro tipo de riqueza – a variedade de estilos de vida.
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special Club 2007*
Café Monsoon
O Jalayatra celebra o casamento de dois cafés Arábica indianos distintos: o Monsoon Malabar
encorpado, temperado pela suculência e suavidade do Indian Plantation. O resultado é um Espresso
Grand Cru arrojado e cremoso com um toque de noz-moscada e cravo-da-índia.
Tal como o vinho, a particularidade do café deve-se ao solo
onde é cultivado – as variedades são registadas, denominadas
e conhecidas conforme a região em que são cultivadas. Mas,
no caso do Jalayatra, o mais recente Special Club da Nespresso,
apesar de todo o café que faz parte da mistura ser proveniente
de um único país - a Índia - o seu traço mais característico é
desenvolvido muito tempo após ter sido cultivado, colhido e
transportado das elevadas regiões de origem até ao nível das
águas do mar.
Nomeadamente, mais de 60% da mistura do Jalayatra é
composta por grãos de café que estiveram expostos às
monções. Nos dias de hoje, a exposição do café às monções
do estado de Kerala, no Sudoeste da Índia, refere-se a um tipo
de acondicionamento dos grãos de café que os expõe ao ar
húmido e salgado que sopra em direcção ao interior, vindo
do Mar Arábico. Houve quem tentasse recriar este processo
pelo mundo fora, inclusivamente noutras regiões costeiras da
Índia, mas nada se compara ao café que é posto a secar nesta
região. Nenhum outro lugar parece ter a humidade sustentada
de Kerala, afirma V. G. Coelho, Administrador do café Gold e
fornecedor da mistura Jalayatra Special Club 2007. “E o vento
sopra apenas numa direcção – para o interior.”
Depois de colhidos os grãos, a exposição dos mesmos às
monções dá-se durante a estação das chuvas torrenciais, de
Junho a Setembro. Começa-se por espalhar uma camada única
de grão num piso fresco, coberto por cima mas aberto dos
quatro lados. Estas estruturas de acondicionamento devem
situar-se perto do oceano de modo a permitir a exposição dos
lotes de grão aos ventos costeiros, húmidos e salgados, durante
cerca de vinte dias.
De acordo com a lenda, a origem da exposição dos grãos de
café às monções deve-se a uma série de acidentes que tiveram
lugar no século XVII. Na altura, os navios que vinham da Índia
Bangalore
Thiruvananthapuram
India
tinham de viajar seis meses para chegar a Veneza de modo a
fazer a distribuição na Europa. Os grãos eram guardados nas
entranhas bolorentas dos navios com uma coloração castanha
mas quando chegavam ao porto de destino já se encontravam
dourados. Para muitos europeus, este era o único café que
conheciam – até que as condições de transporte melhoraram
em meados do século XIX. Quando os grãos castanhos
chegavam em barcos a vapor a Veneza, muitos europeus
rejeitavam-nos, preferindo café que tivesse estado exposto
à atmosfera característica criada durante a navegação lenta
através dos oceanos. Os produtores de café indianos, que já
integravam o mercado internacional, começaram a reproduzir
meticulosamente, em terra, as antigas condições de navegação
para os seus grãos de café.
Para além da cor e do sabor, a textura e o tamanho dos grãos
também sofrem transformações durante a exposição às
monções. Os seus níveis de acidez baixam, adquirem notas
aromáticas, amadeiradas e um sabor a malte, apresentando
um elevado teor de creme nas misturas para espresso. Quando
misturados com o café indiano utilizado no Special Club 2007
da Nespresso, adquirem um aroma mais suave.
Ainda mais convincentes são as características do Jalayatra
que não se comparam com nenhuma das outras. Quando
consome Jalayatra, está a colher os benefícios de um acidente
que se deu há alguns séculos atrás e da técnica de conservação
utilizada hoje em dia de modo a reproduzir essas condições de
conservação. Está a provar a terra de origem do café e o oceano
salgado perto do qual este repousou, tudo isto amadurecido
devido a um feliz acidente. Absorva o poder da tempestade.
*O Special Club só se encontra disponível enquanto durarem os stocks.
Mulheres treinadas para
misturar (selecção final)
grãos de café ‘monsoon’
da Aspinwall & Co, Ltd. A
origem da exposição do café
às monções data do século
XVII, altura em que o
transporte do café da Índia
para a Europa demorava
cerca de seis meses.
Agricultores a seleccionar
cerejas em Thippanahally
Estates, uma propriedade
rural que além dos 1000
hectares de grãos de café
Arábica tem também
coelhos, pavões e alguns
leopardos.
Ayisha Manzil, Court Road, Tellicherry, +91.490.2341590.
Uma estalagem na encosta com vista para o mar que faculta
cursos de cozinha e tem a melhor comida do mundo.
Brunton Boatyard, 1/498 fort Cochin, Cochin,
+91.484.2364485, www.cghearth.com. Um local de passagem
ideal para Kerala, Cochin é uma cidade que teve, ao longo
da sua existência, conhecidas influências boémias chinesas,
árabes, judaicas, portuguesas, holandesas e inglesas. Passe
a noite nesta propriedade gémea de Marari Beach antes de
visitar os pântanos.
Fabindia, Thamarapally 39/4749, Old Thevara Road,
Cochin, +91.484.3267682, www.fabindia.com. Uma excelente
loja de artesanato nacional onde os preços são razoáveis e
fixos, os produtos são ecológicos e os artesãos recebem uma
percentagem justa.
Harivihar Ayurevedic Heritage Home, Bilathikulam,
Calicut, +91.495.2765865, www.harivihar.com. Uma casa de
descanso para alguns; uma escola de Ayurveda, vastu, yoga
etc. para outros.
Rainbow Cruises, V.C.N.B Road, Alleppey,
+91.477.2241375, www.backwaterkerala.com. A empresa
de houseboats (barcos adaptados para cruzeiros) cujo
proprietário parcial é uma estrela de cinema indiano,
Jairam (pergunte pelo seu Gold boat); é uma forma ideal de
conhecer os pântanos de Kerala.
ENS Kalari, Embram Madam, Nettoor, +91.484.2700810,
www.enskalari.org.in. Este local onde nasceu a primeira arte
marcial do mundo também faz demonstrações. Mais um
modo de vida que uma técnica de combate, a kalaripayattu
inclui igualmente os princípios do yoga e da Ayurveda.
Dubare Elephant Camp, Dubare, Kushalanagar,
+91.944.9599755, www.junglelodges.com. Se continuar a
viajar pela Índia, o estado vizinho de Kerala, Karnataka, é
um santuário de fauna selvagem sem igual.
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