<strong>Augusto</strong> <strong>Cury</strong>Sempre fui tenso, irritadiço, impulsivo, intolerante. Resiliência, quasezero. Não aceitava ser contrariado, criticado, confrontado. Adoravaexpor as falhas alheias, mas escondia as minhas <strong>de</strong>baixo do tapete daminha intelectualida<strong>de</strong>. Humilda<strong>de</strong> e sensibilida<strong>de</strong> não faziam partedo dicionário da minha existência.Certa vez, o maltrapilho olhou ‐me bem nos olhos, como se estivessea penetrar na minha mente e a <strong>de</strong>svendar o meu passado turbulento,e advertiu ‐me, assim como aos restantes discípulos:– A humanida<strong>de</strong> não precisa <strong>de</strong> heróis nem <strong>de</strong> <strong>de</strong>uses, mas <strong>de</strong>seres humanos que reconheçam as suas tolices e assumam as suaslimitações e imperfeições. Vocês são <strong>de</strong>uses ou seres humanos?Eu julgava ‐me um ser humano, dava cursos sobre inclusão social,mas confesso que sempre me comportei como um <strong>de</strong>us inquestionável.Em seguida, ele continuou:– Todos os heróis vêem a sua força esfacelar ‐se um dia, há sempreum momento em que ela diminui. Todos os pensadores se <strong>de</strong>param,mais cedo ou mais tar<strong>de</strong>, com as suas loucuras. E todos os mestres, nasua caminhada, se tornam um menino diante do inexplorado.As suas palavras pareciam prever a tragédia que em breve lhe aconteceria;aliás, a segunda tragédia. A primeira ocorrera havia poucosanos, quando sofreu a perda <strong>de</strong> toda a família. A agenda humanarecomenda que os filhos enterrem os seus pais. Pais que enterram osseus filhos experimentam o último estágio da dor humana. O meuMestre não só viveu essa dor como, além disso, não enterrou os doisfilhos e a sua querida esposa, uma vez que não encontrou os seus corposno aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> avião que ceifou as suas vidas. É provável que apsicologia não tenha esquadrinhado angústia tão espantosa comoa que ele enfrentou. Tornou ‐se o mais <strong>de</strong>vastado dos homens. Per<strong>de</strong>utudo, sobrou ‐lhe o irrelevante: um status social elevadíssimo, po<strong>de</strong>rpolítico internacional e uma das maiores fortunas do planeta.Tratamentos psiquiátricos e psicoterapêuticos aliviaram ‐no, masnão suavizaram o drama da perda nem lhe <strong>de</strong>volveram o oxigénio daalegria. Tinha crises frequentes. As imagens do passado, a sauda<strong>de</strong>incontrolável, o vazio emocional, a culpa, tiravam ‐lhe a concentração16o semeador <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias_CS4***.indd 16 28/02/11 18:01