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ano 04, n. 03 - Faculdades EST

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Revista eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo da Escola Superior de TeologiaVolume 08 (<strong>ano</strong> <strong>04</strong>, n. <strong>03</strong>) – setembro-dezembro de 2005São Leopoldo – RSPeriodicidade Quadrimestral - ISSN 1678-6408http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408 Coordenador GeralProf. Dr. Oneide BobsinConselho EditorialBerge Furre - Universidade de OsloEmil A. Sobottka – PUCRSAdriane Luísa Rodolpho – Escola Superior de TeologiaRicardo W. Rieth – Escola Superior de Teologia/ULBRAEdla Eggert – UnisinosISSN: 1678-6408Responsável por esta ediçãoAdriane Luísa RodolphoCapa desta ediçãoIuri Andréas ReblinRevisãoAdriane Luísa Rodolpho, Nivia Ivette Núñez de la Paz, Rogério Sávio Link e Iuri Andréas ReblinEditoração Eletrônica da edição em HTMLRogério Sávio LinkEditoração Eletrônica da edição em PDFIuri Andréas ReblinEsta versão em PDF é uma edição revista da edição original.Link Desta Edição: http://www3.est.edu.br/nepp/revista/008/<strong>ano</strong><strong>04</strong>n3.pdfProtestantismo em Revista é um órgão do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP),que visa ser um canal de socialização de pesquisas de docentes e discentes da área de Teologia,Ciências das Religiões, abrangendo o espectro das Ciências Humanas e das Ciências Sociais Aplicadas,tanto de integrantes da Escola Superior de Teologia (<strong>EST</strong>) quanto de outras instituições.Protestantismo em Revista está sob a coordenação do Prof. Dr. Oneide Bobsin, titular da Cadeira deCiências das Religiões da <strong>EST</strong>.A revista eletrônica Protestantismo em Revista é uma (jan.-abr.; mai.-ago., set.-dez.), sendo que as três edições do <strong>ano</strong> são tradicionalmente planejadas em duas ediçõestemáticas e uma edição livre. Comumente, a equipe de redação até o do do quadrimestre e a acontece normalmente na segunda quinzena do do quadrimestre, salvo exceções. Confira a data estipulada na grade do tópico“edições anteriores” no site da revista.Os trabalhos deverão ser do Núcleo de Estudos e Pesquisado Protestantismo: nepp_iepg@yahoo.com.br. Consulte as normas no site da revista. Demaisinformações e edições anteriores, acesse o site (http://www3.est.edu.br/nepp)2Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408SumárioEditorial..................................................................................................................................................4Textos:Sobre articulações (e) processos teórico-conceituais: entrecruzamentos do campo midiáticocom outros campos sociais...................................................................................................................7Por Délia DutraSíntese sobre uma análise do programa evangélico de televisão “SHOW DA FÉ”...................35Por Carla SaueressigMídia e Religião: Das peregrinações ao universo das telecomunicações...................................43Por Sidnei BudkeMidiatização da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil por meio do JornalEvangélico: Aspectos Históricos .......................................................................................................57Por Ricardo Zimmermann FiegenbaumComo citar esta revista.......................................................................................................................94Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 3


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408EditorialO presente número de Protestantismo em Revista traz artigos relacionados aotema “Religião e Mídia”, como já tinha sido anunciado na edição anterior. Estesescritos são o resultado da experiência de trabalho e de pesquisa conjunta no“Seminário de Aprofundamento Teológico” (SAT) oferecido na Escola Superior deTeologia no segundo semestre de 2005. Dita modalidade de curso propicia quepequenos grupos possam, de forma eletiva, discutir temas relevantes de seuinteresse. Paralelamente, em virtude de uma exigência das agências de fomento àpesquisa, os alunos bolsistas da pós-graduação devem realizar um estágio docente deum semestre. A confluência desses fatores, aliada à experiência anterior daprofessora Adriane Luísa Rodolpho na área da antropologia visual e à temáticaespecífica de doutoramento de Nivia Ivette Núñez de la Paz contribuíram para arealização dessa disciplina.O SAT se propôs a abordar as principais temáticas relacionadas às questõesenvolvendo as produções audiovisuais num contexto de pluralismo religioso. Apartir de bibliografia das áreas de comunicação social, antropologia visual e teologia,o seminário teve como proposta a discussão da temática em torno de vídeosetnográficos e outros materiais audiovisuais. Como metodologia de trabalho, oseminário esteve composto por dois momentos: um primeiro voltado à discussão dequestões teóricas e um segundo momento de caráter prático.Na primeira parte do semestre, especificamente na primeira aula,trabalharam-se conceitos próprios das Ciências da Comunicação, tomados eanalisados a partir do texto escrito pela Ms. Delia Dutra da Silveira. Foram colocadas,também, algumas perguntas temáticas com o intuito de provocar tanto as reflexõesna sala de aula quanto a estimulação para a confecção dos trabalhos finais: Uso de4Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408temas/conceitos religiosos pela linguagem midiática — Estaríamos em presença deressignificações?; O púlpito e a pregação — Qual o tipo de “efeito” que se buscasobre a congregação em diferentes denominações? Que dizem as teorias dacomunicação sobre isto?; Ética na religião — Como tem sido trabalhada a ética nocampo da religião e na Mídia?; Posição da Teologia com respeito à Mídia — Nahistoria da religião, como se dá o uso da Mídia para evangelizar? Trata-se de uma“utilização” da mídia? Outros autores e autoras trabalhados foram: Pedro GilbertoGómes, Carlos A. Valle, Chris Arthur, Antônio Fausto Neto e João Pissarra Esteves.A bibliografia do segundo bimestre foi dedicada à antropologia visual, aohistórico e ao desenvolvimento desta disciplina, num primeiro momento. Aqui ostextos de Marc Piault, Clarice Peixoto e Patrícia Monte-Mor foram centrais, junto àprojeção e análise do vídeo sobre Jean Rouch. Num segundo momento, organizamosa bibliografia segundo algumas temáticas. A etnologia da recepção de telenovelas foio tema de um dos encontros, a partir do texto de Ondina Fachel Leal. A publicidadefoi discutida a partir do texto de Carmen Rial e do vídeo de Guita Debert. Umencontro foi dedicado às experiências junto às comunidades indígenas, tendo comobase os trabalhos de Dominique Gallois e Vincent Carelli. As temáticas da fotografiae da discussão sobre o trabalho de campo em antropologia visual foram tambémtratados a partir dos textos de Elisabeth Edwards e os trabalhos de Cláudia TurraMagni. A preocupação em apresentar um p<strong>ano</strong>rama teórico mais geral sobre adisciplina e a aproximação aos exemplos brasileiros foram, assim, a tônica destebimestre.Para exercício final de avaliação, foi solicitado que alunos e alunasrealizassem suas pesquisas com base na literatura já discutida e trabalhada nodecorrer do semestre. Os interesses foram variados e os títulos apresentados dãomostra disso: “Religião e Mídia: Das peregrinações ao universo dastelecomunicações”; “Propostas para a TV na IECLB”; “A violência nos programasinfantis”; “Evangelização no Radio: Conceitos de evangelização contextualizadosDisponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 5


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408para uma análise da Rádio Mensagem – FM 90.3”; “Tele - evangelismo”; “Breveanálise do jornal Folha Universal”; “A Igreja Evangélica de Confissão Luterana noBrasil e a sua comunicação”; “Apresentação e Análise do Jornal Eclesiástico OCaminho”; “Síntese sobre as reportagens policiais do jornal Zero Hora” e “Síntesesobre uma análise do programa evangélico de televisão Show da Fé”. Desses 10trabalhos, dois foram os escolhidos para esta revista.Como espaço para a pesquisa e a discussão sobre os meios de comunicação ea esfera religiosa, acreditamos que o seminário tenha sido uma experiência bemsucedida. Mais do que experiência crítica, o produto final deste seminário apresentapropostas concretas contribuindo assim para a reflexão sobre a temática. O interessedespertado por esta área da pesquisa teológica demonstra a importância da mesma.Abrindo a presente edição “Religião e Mídia” aparece o artigo “Sobrearticulações (e) processos teórico-conceituais: entrecruzamentos do campomidiático com outros campos sociais” escrito pela Ms. Delia Dutra da Silveira e quefoi debatido e estudado na primeira aula do SAT. A seguir aparece o artigo de CarlaSaueressig “Síntese sobre uma análise do programa evangélico de televisão Showda Fé” e o de Sidnei Budke “Religião e Mídia: Das peregrinações ao universo dastelecomunicações”, ambos estudantes que participaram no SAT. Ao final, poderá serlido o artigo do Ms. Ricardo Zimmermann Fiegenbaum “Midiatização da IgrejaEvangélica de Confissão Luterana no Brasil por meio do Jornal Evangélico:Aspectos Históricos” que, mesmo não fazendo parte de nosso seminário, mantevecontacto com o grupo pela relação de seu objeto de pesquisa e do nosso tema deestudo.São Leopoldo, março de 2006.Prof. Dra. Adriane Luisa RodolphoMs. Nivia Ivette Núñez de la Paz6Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Sobre articulações (e) processos teórico-conceituais:entrecruzamentos do campo midiáticocom outros campos sociaisPor Delia Dutra *Baseando-me no pensamento de alguns autores que vêm me acompanhandonesse percurso de pesquisa 1 , no presente trabalho busco construir alguns conceitosna medida em que solicitem ser explicitados para a compreensão do problema –objeto investigado 2 . Nesse sentido, entendo que se torna relevante contextualizar oconceito de mídia e discutir o lugar que o campo midiático ocupa atualmente, dandolugar ao fenômeno chamado de cultura midiática; compreender o conceito de camposocial, notadamente, o de campo midiático (com seu subcampo, o jornalismo) e a suafunção de mediação simbólica; delimitar o conceito de discurso midiático como lugarde fala dos agentes sociais e espaço onde o jornalismo constrói uma informação que seintegra à (e é integrado pela) realidade.1. A mídiaO termo mídia resulta de uma apropriação que se faz desde a línguaportuguesa da expressão anglo-saxônica mass media. Partindo, num primeiromomento, do pensamento de Rodrigues (1996, 1997, 2000) para definir o que entendo* Mestre em Ciências da Comunicação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos, UNISINOS,(RS).1 O presente trabalho faz parte do referencial teórico da pesquisa para dissertação de Mestrado,atualmente em andamento, intitulada “A midiatização da informação econômica no telejornalEconomia y Finanzas da CNN en Español”.2 A caracterização da informação econômica midiatizada por Economía y Finanzas sobre os EstadosUnidos e os países da América Latina.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 7


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408por mídia e por campo e discurso midiático (sem deixar de esclarecer que o autor usaos termos media e campo dos media 3 ) logo, outros autores vão sendo incluídos nesteconstruir dialógico do meu caminhar.Fala-se em mídia, normalmente, para se referir ao conjunto dos meios decomunicação social, tais como: imprensa escrita, radiodifusão sonora e televisiva,publicidade e cinema. Contudo, pode-se precisar conceitualmente essa delimitaçãoservindo-nos de uma perspectiva sociocultural. Nessa linha, Verón (1997) propõeconsiderar a mídia desde um critério de acessibilidade às mensagens e sob ascondições em que isso acontece. Isto é, o autor entende a mídia como dispositivotecnológico de produção e reprodução de mensagens, que está necessariamenteassociado a determinadas condições de produção e a determinadas modalidades oupráticas de recepção de tais mensagens.Portanto, considerando a televisão como espaço empírico dessa pesquisa,torna-se relevante resgatar a acessibilidade às mensagens que essa mídia fornece.Mesmo que atualmente, esse acesso leve junto um condicionamento econômico, nosentido que ele deve ser pago direta ou indiretamente, a televisão continua sendo amídia com maior penetração no mercado da oferta discursiva midiática. Verónexplica que a maneira com que a mídia se instalou nas sociedades industriais faz comque as condições de acesso estejam marcadas fortemente pelo fator econômico. Daíque propõe definir o setor da mídia como um “mercado”, e caracterizar o conjuntocomo “oferta discursiva”.Continuando dentro de uma perspectiva sociocultural, Bolter e Grusin (1999,p. 65) apontam para o fato de que só quando se dá um “reconhecimento cultural” éque qualquer mídia poderá ser considerada como tal, entendendo estereconhecimento como a aceitação e a inclusão dessa tecnologia na vida das pessoas.Trata-se de um processo de apropriação cultural de uma tecnologia, que nem sempre3 Entendo que os termos mídia e campomidiático, são mais usados no âmbito dos Estudos daComunicação no Brasil.8Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408segue o ritmo esperado desde o lado da produção já que, quando se fala em cultura,“o ritmo do movimento tende a se desacelerar ou a ser dificultado por uma série deobstáculos” (Rubim, 2001, p. 122).Esse processo de apropriação permite avançar na reflexão de encontros e desencontrosentre o sujeito e a mídia, e assim dar uma dimensão de mediação simbólicado campo midiático e à gestão que esse faz dos discursos sociais; sendo, isto, demuita importância para uma pesquisa que define sua análise aos limites de umproduto midiático, mas sem esquecer por isso que:cada vez mais elementos emanados das heterogeneidadesdiscursivas, ou da própria ordem da dialogia discursiva, sãoresponsáveis pela construção de estratégias e também pelos efeitosdiscursivos que os campos institucionais expõem a processos de oferta,negociação e apropriação. Esta primeira observação serve-nos comouma alerta para o fato de que os horizontes dos impactos e dos efeitosdos discursos não podem ser delimitados e explicados por categoriasatreladas ao consciencialismo, motivação e intencionalidade dosatores (emissores/receptores). Ao mesmo tempo, para nos dizertambém que um discurso não pode prever um único e só efeito, conformereza a cartilha do empiricismo (Fausto Neto, 2002, p. 499. Destaquesmeus).Disso decorre que, o ser hum<strong>ano</strong> não é um simples produto do seu entorno(do qual faz parte a oferta midiática) nem também detém o poder absoluto de mudaro dado – seja entorno ou sua própria natureza. Entre o chamado mundo exterior (queinclui o mundo midiático) e as suas vivências, interpõe-se uma densa rede de sentido(Andacht, 1993) que contribui no desenvolvimento de uma identidade sua e única,pela força do herdado, dentro de um processo de interação com o outro diferente ecom as diversas instituições sociais culturalmente legitimadas.Tais instituições – mídia, família, igreja, escola, etc. – se investem (einvestem) de valores e normas que, como já estão institucionalizados, legitimam eoutorgam sentido social às mediações (Sodré, 2002; Martín-Barbero, 2001). Arelevância que essas detêm vai depender de cada indivíduo; o peso delas irámudando conforme transcorre o processo de constituição da sua identidade noDisponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 9


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408âmbito de uma ambiência que hoje é fortemente ‘marcada’ pela presença dos meiosde comunicação, daí que se fala em cultura midiática.Mas como é que isso acontece? Cada instituição social, que por sua vezpertence a um campo social, tem uma agenda permanente que vai mudandoconforme os interesses particulares a ela; entendendo que a agenda representa umaoferta de olhares ou pontos de vista. Daí que esses olhares se intertensionam, e será ocampo midiático que fará a mediação-midiática, o que se chama de processo demidiatização, necessária para dar uma ordem, a ordem axiológica própria que falaRodrigues (1997).A compreensão do que conforma esse processo de midiatização, domínioexclusivo ao campo midiático, demanda antes explicitar o que entendo ao falar emcampo social, pois o objeto dessa pesquisa insere-se no espaço do campo midiático nassuas interações com outros campos sociais, especificamente o campo econômico.2. Campo social: entrecruzamentos entre o campo midiático e o campoeconômicoAnalisar um fenômeno social, no caso, a informação econômica midiatizada,seria muito difícil se não se estabelecem certos limites e identificam pontos ou zonasde confluência e divergência entre os diversos atores sociais que surgem no espaçopúblico. Assim, o conceito de campo social permite definir fronteiras, necessárias parapoder encontrar diferenças e semelhanças, confluências e conflitos entre partes, mas,sobretudo, poder dizer quais são essas partes e o porquê da diferenciação.Pierre Bourdieu (20<strong>04</strong>) define o campo social como um espaço – microcosmo –detentor de relativa autonomia, dotado de leis sociais próprias que diferem das domacrocosmo, e do qual fazem parte agentes e instituições que aparecem ocupandouma posição dentro da estrutura. Essa posição estará sempre orientando o agir10Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408desses agentes, daí que o autor enfatiza a necessidade de saber desde que lugar oagente está falando para assim compreender sua tomada de posição.Com base em Berger (1998), considero o jornalismo lugar de produção emediação simbólica, como um subcampo do campo midiático. Seus especialistas, osjornalistas, seriam os chamados agentes que, como membros de uma estrutura deprodução – um canal de televisão – estão produzindo e difundindo informação, sob aforma de notícias narradas de acordo com as lógicas do gênero telejornal.Cada jornalista que faz parte desse processo de construção da notícia terá umpeso diferente, um lugar de fala que estará determinado em proporção ao volume doseu capital, o capital simbólico de fazer crer. Berger (1998, p. 21) seguindo opensamento de Bourdieu, explica que todo campo se conforma “a partir da existênciade um capital e se organiza na medida em que seus componentes têm um interesseirredutível e lutam por ele”. A autora levanta a hipótese que “o jornalismo detém,privilegiadamente, o capital simbólico”, já que é de sua natureza fazer crer, portanto,o seu capital é a credibilidade.Dessa forma, quanto mais vulnerável esteja um agente-jornalista em suacapacidade de fazer crer, mais sofrerá as pressões internas ao campo e tambémexternas. Na medida em que ele consiga (re) traduzir essas pressões de acordo comas lógicas da mídia, chegando ao ponto tal de credibilidade de torná-lasirreconhecíveis, ele estará evidenciando um alto grau de autonomia, tanto própriacomo agente quanto de autonomia do campo com respeito ao “macrocosmos”.Isso explica o fato, segundo Bourdieu, de que as pressões externas sejammediatizadas sob as lógicas do campo, isto é, se exercem só por intermédio docampo, não se tratando, necessariamente, de imposições diretas. O autor aponta paraa necessidade de entender que é muito difícil, quase impossível, de um campo ser‘manipulado’. A possibilidade de um agente conseguir submeter as forças do campoDisponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 11


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408aos seus interesses particulares estará em proporção à sua posição na estrutura dedistribuição do capital.Tomando um exemplo do campo econômico, detenho-me no mercado dopetróleo, observando-lhe através do discurso do telejornal. Existem o que se chamamgrandes players, como o grupo dos principais países produtores de petróleo, a Opep 4 .Uma decisão deles de reduzir o volume de produção diária do combustível visandoum aumento do preço do barril no mercado internacional decorrerá num aumento depreços de milhares de outros produtos cuja produção tem o petróleo como insumo. Aposição na estrutura do capital do campo econômico será maior no âmbito da Opepdo que agindo uma empresa ou país de forma isolada, conseqüentemente, tambémserá maior a capacidade de agendar o espaço midiático.Compreendo, portanto, o porquê das diferenças do campo midiático emrelação a outros (campos político, econômico, religioso, jurídico, científico etc.). Éfundamental a autonomia que possui vinda do fato de ter “uma ordem axiológicaprópria”, a ordem dos valores de mediação entre as restantes instituições; funçãoque, por sua vez, é legitimada por esses outros campos ou instituições, mas semprelembrando que muitas das funções de mediação são asseguradas por outrosdispositivos que estão fora dos meios de comunicação social (Rodrigues, 1997, p.152).3. O processo de midiatizaçãoTendo refletido sobre o conceito de campo social e em conseqüência sobre ocampo midiático, sinto-me em condições de aprofundar a reflexão sobre o processode midiatização, para assim buscar entender a midiatização da informação4 "http://www.bbc.co.uk/portuguese/economia/story/2005/01/050114_petroleomla.shtml".http://www.bbc.co.uk/portuguese/economia/story/2005/01/050114_petroleomla.shtml[19/01/2005]12Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408econômica que se faz desde a CNN en Español, especificamente no telejornal Economíay Finanzas.Nesse sentido, cabe diferenciar entre o que constitui o processo de mediaçãoe o de midiatização. Quando se fala em mediação, está se fazendo referência à funçãode estar no meio, e, portanto, ‘mediar’ entre partes; daí que Rodrigues aponta para aimportância desse processo também fora da mídia. Já o processo de midiatizaçãoconstitui o que seria uma mediaçãomidiática, isto é, um processo de mediação feitodesde o campo midiático e de acordo com as suas lógicas próprias.Eliseo Verón (1997) sustenta que a análise do processo de midiatizaçãopermite identificar as relações que existem entre a Mídia, os AtoresIndividuais (oconsumidor, a dona de casa, o desempregado, o analista, o investidor, o especialista,o Ministro da Fazenda, o Presidente Lula, o Presidente Bush, o Mercado, aEconomia 5 , o índice, o dólar) e as Instituições (a Bolsa de Valores, os Bancos, oGoverno, a FED, o Pentágono, os Ministérios, o Congresso, a Universidade, afamília) 6 . No entanto, compartilho da visão do autor de que estudar a complexidadedo processo de midiatização não pode ser reduzido a um modelo ou esquema. Pensoque contribui ao esclarecimento do conceito também considerar a proposta de Mata(2001) para entender o que representa essa mediação midiática, salientando queentendo que sua proposta dialoga com a de Verón.Conforme a autora, poder-se-ia pensar a ação e as dinâmicas articuladas dosdiferentes campos sociais com o campo midiático como processo de midiatização.Tomando como base o campo político, a autora observa que se constata umatransformação nos modos de pensar e fazer política. No mínimo, podem-se observartrês mudanças substanciais: uma, a substituição das instituições juridicamenteconsagradas como lugares para e da representação cidadã – parlamento, juizado,5 Embora aqui compreendidos como campos, da mesma forma que o ‘Mercado’, a ‘Economia’aparece no discurso midiático analisado como um ator a mais, reagindo, crescendo ou estagnada.6 Tais atores e instituições, aqui referidas, vêm do material empírico trabalhado desde a pesquisaexploratória.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 13


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408partidos – pelos meios de comunicação; outra, a substituição dos sujeitos atoresclássicos da política – políticos, governantes, cidadãos, militantes – pelos novossujeitos midiáticos: jornalistas, condutores de programas, público, entrevistados; e aterceira, a substituição dos cenários da ação política do partido ao set televisivo, dapraça à platéia.Levando sua proposta para o cruzamento do campo midiático com oeconômico, considero que aqui também o cenário muda e desloca-se desde umMercado e seus agentes tradicionalmente identificados num espaço físico, como aantiga Bolsa de Valores (local de encontro dos mercadores especuladores), asreuniões no âmbito dos Bancos ou das empresas com seus executivos que logocontinuavam esses encontros nos cafés, e cujos “boatos” circulavam na mídiaimprensa horas depois, para um Mercado midiático, onde seus agentes se diluem narede midiática (mas não desaparecem) e os boatos espalham-se em ‘tempo real’.No entanto, cabe assinalar, que essa emergência do campo midiático sóocorre na segunda metade do século XX, e a sua consumação recém aconteceefetivamente na metade dos <strong>ano</strong>s 80, momento em que o planeta fica completamentecoberto de satélites de telecomunicações (Rodrigues, 2000).4. O discurso midiáticoApós as leituras e observações que realizadas, constato que efetivamente afunção de mediação feita pelo campo midiático entre os diferentes campos é denatureza tensional, o que de fato vai legitimar mais ainda a autonomia da mídiaenquanto campo. Os demais campos sociais precisam do midiático para levar adiantesuas estratégias mobilizadoras, explica Rodrigues (2000), por que é nesse espaço quecontam com os mecanismos retóricos – discursivos – necessários.14Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Para começar a estudar o discurso midiático, resulta interessante primeiroresgatar brevemente a etimologia da palavra discurso, pois ajuda a uma melhorcompreensão do sentido que hoje lhe é conferido. Discursus, de acordo comRodrigues (1996, p. 7) em latim significava a ação de correr por várias partes ou emvários sentidos. Falava-se de discursus de um navio, designando o percurso entrevários portos, e o prefixo dis indica a realização de uma ação que vai em váriossentidos, em várias direções. Note-se que a transposição que hoje se faz para“designar uma seqüência ordenada de enunciados, equivale, portanto, a umamaneira de sublinhar a natureza pragmática da fala, o fato de a linguagem ser umaacção, de a linguagem fazer correr o sentido em várias direcções” (ibidem).Realizar um estudo tendo como base empírica o discurso midiático justificasepela razão que, como expressa Rodrigues (2000), no campo midiático as funçõesdiscursivas predominam sobre as pragmáticas, e que, portanto, é a gestão dos discursosque caracteriza a natureza desse campo. Ademais, feito no âmbito do telejornalismo,torna-se ainda mais relevante, pois compreendo a linguagem como “processoprodutivo” complexo, como “trabalho (simbólico)”, no qual insere-se a notícia comoproduto do trabalho feito por jornalistas; esses, por sua vez, fazem parte de ummercado onde existem hierarquias e, conseqüentemente, certas regras de jogo(Berger, 1998, p. 20).Precisamente, é de fatos condicionados a certas regras de jogo, que fala ocampo econômico por intermédio dos seus agentes-especialistas; eles explicam opresente, interpretam o passado e fornecem seu diagnóstico sobre o futuro, servindose,amiúde, de fontes de informação midiáticas. Isto é, os agentes econômicos detêmo poder de advertir e criar expectativas sobre o que acontecerá caso certos atoressociais mantenham ou mudem determinadas ações passadas e presentes, sem perderDisponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 15


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408de vista que, para dar visibilidade ao seu discurso, eles precisam agendar o espaçopúblico midiático 7 .Disso decorre que, cabe ao campo midiático refratar esse discurso técnicoeconômico, construindo um outro – o midiático, aqui o telejornalístico – que é seu,único em suas formas, passando por um processo complexo que conforma amidiatização de uma informação econômica característica a esse lugar de fala.4.1. Lugar de falaSeguindo o pensamento de Braga (1997), entendo a fala como um evento queacontece num momento determinado e cuja estruturação interna decorre daconstrução de uma determinada lógica. Essa lógica, entendida como a articulaçãoentre fala, textos disponíveis e situação, pode ser chamada de lugar de fala. Portanto,interessa aqui observar essa lógica e, como expressa o autor, compreender em quelugar a fala aparece significando. Isso porque, o lugar de fala não se definenecessariamente por estar inserido numa estrutura mais ampla, mas pelo “cotejo comoutros lugares de fala avizinhantes, nem continentes nem contidos, embora talvezparcialmente sobrepostos, com os quais mantém relações de cooperação e conflito, desemelhanças e diferenças” (idem, p. 107).Nesse sentido, procurar o lugar de fala dos agentes sociais que protagonizama informação econômica do telejornal objeto de estudo, implica buscar as estruturassignificativas imediatas de uma fala; isto é, articular o texto enunciado com a situaçãoa que refere para assim identificar as fronteiras para a busca da lógica interna da fala(idem, p. 108).7 Trago aqui um exemplo de um agente econômico, o FMI, advertindo o que acontecerá se...; mas, éo jornalista que o explica no telejornal Economia y Finanzas do dia 15 de junho de 20<strong>04</strong>: “El FMI dijoque no habrá inversiones en Argentina si el gobierno no llega a un acuerdo con sus acreedores. Su DirectorGerente, se rehusó a opinar sobre la última oferta del gobierno argentino para reestructurar sus deudaspendientes pero insistió en que este tema debe resolverse en forma urgente”.16Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Isso tudo, difere, mas também complementa a proposta antes mencionada deBourdieu, sobre a necessidade de compreender desde que lugar o agente social estáfalando, para assim reconhecer sua tomada de posição. Braga chama isso de “lugarsociológico do falante” (idem, p. 109) e explica que, mesmo estando presente naconstrução discursiva do lugar de fala (conceito no espaço do enunciado), ficarrestrito a esse ângulo sociológico pode apresentar problemas, tais como: (a) a falaaparecendo apenas como sintoma externo ou mera emanação, (b) o desconhecimentode situações em que o lugar social não é diretamente traduzido na fala, (c) serexcessivamente geral ou abrangente (não levando em conta perspectivas pontuais,situacionais, conjunturais, psicológicas, setoriais) e não permitir observar apenetração deste lugar por falas, situações, fatos históricos e sociaiscircunvizinhantes (produzindo modificações no estatuto social do falante, que não émonolítico).Dito de outra forma, limitar a análise só ao lugar sociológico do falante podedeixar de lado especificidades da fala, ficando atrelado aos discursos típicos a esselugar sociológico. Assim, estaria-se considerando o discurso como apenas umsintoma do contexto que está precedendo-o, sendo que o contexto é um doselementos a ser considerados num discurso.Tomando o caso do âncora do telejornal, ele se caracteriza pelo seudesempenho cênico, porém, ele deriva de uma outra fala, o script, que está lhecomandando a executar determinadas operações por onde outras falas também sesubordinam e se fundem (Fausto Neto, 1999). Por isso que, a combinatória dediscursos que conformam o discurso midiático é considerada de natureza serial etransitiva (Rodrigues, 1997), onde acontecem encadeamentos lógicos e não tantocronológicos. A posição do sujeito enunciador – quer seja o âncora, o entrevistado,etc. – é reflexo de uma outra palavra que o está constituindo como instância legítimade enunciação.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 17


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408No entanto, cabe esclarecer que o lugar de significação não é inteiramentepré-existente à fala já que, retomando o pensamento de Braga, ele resulta daarticulação entre a situação concreta à que está se referindo, a intertextualidadedisponível e a própria fala como dinâmica selecionadora e atualizadora de ângulosdisponíveis e construtora da situação interpretada. Daí o destaque que tem a pessoado âncora no telejornalismo, no sentido que ele impõe sua ‘marca’ pessoal nas formasde dizer e fazer crer, mesmo derivando de uma outra fala.Em conseqüência, deve-se levar em conta que o lugar de fala midiático nãodeve ser considerado em termos absolutos, no sentido de pensar que sua existênciacomo tal passa unicamente por si próprio. O universo midiático deve ser pensado emrelação, sendo produto da interação com outros, pois através do processo demidiatização constitui-se num campo de lutas para conservar ou transformar suaexistência.De crítica, a opinião pública torna-se, assim, cada vez maisdependente de um novo campo de legitimidade, o da máquinadiscursiva dos media, campo cada vez mais autónomo dos restantescampos sociais como esfera obrigatória de visibilidade e denotoriedade (...) Este campo de mediação obrigatória faz repercutircapilarmente até ao mais íntimo recôndito do tecido social as suasmarcas, nada podendo doravante escapar à sua inscrição (Rodrigues,1997, p. 42).A autonomia do campo midiático que fala Rodrigues não pretende significarum isolamento ou auto-suficiência desse campo; o autor se refere à centralidadedesta instituição no processo de mediação e ao poder de revelação e publicização detudo aquilo que lhe resulte relevante. De uma forma esclarecedora, Fausto Neto eVerón expressam que esse lugar estratégico dos processos midiáticos é um “lugar desaída” que não desconhece os cruzamentos de outras dimensões resultantes dotrabalho de outros campos sociais (20<strong>03</strong>, p. 9).18Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 64085. Comunicação: processo relacional interativoNo marco de um processo comunicacional, as regras ‘em jogo’ são, portanto,resultado do processo que as institui, mas também são o quadro que está ditando osentido e que está regulando. Significa que todo ato de comunicação vai além darelação observável entre partes, porque no fundo não pode haver comunicação a dois(inclusive quando se trata de um indivíduo consigo próprio). Haverá sempre umaterceira instância institucional. Considerado o objeto aqui estudado, esta instânciaseria a CNN, que vigia, normaliza, sanciona o dizer e o fazer do jornalismo(Rodrigues, 1997, p. 69).Figura 1: Processo de Comunicação no marco do Telejornal Economía y Finanzas.No esquema que apresento na figura 1, busco estabelecer de forma gráfica arelação que os protagonistas do processo de comunicação – jornalistas, entrevistados,analistas econômicos, telespectadores – estabelecem com a chamada terceirainstância institucional. Trata-se de uma relação simbólica, pois ela é prévia e dizrespeito a um contrato de leitura.Eliseo Verón (1999a) elabora o conceito de contrato de leitura com o intuitode compreender o vínculo entre o meio e o leitor. Sua metodologia se inspira na teoriaDisponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 19


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408da enunciação, a qual diferencia dois níveis de funcionamento em toda comunicação eem todo ato discursivo: de um lado o pl<strong>ano</strong> da enunciação (as maneiras de dizer), deoutro o pl<strong>ano</strong> do enunciado (o que é dito). É no pl<strong>ano</strong> da enunciação, explica o autor,que se constroem as posições de quem comunica, do enunciador, e daquele a quemestá dirigido o ato de discurso, o destinatário. Deve-se distinguir entre o enunciador(posição construída na comunicação de quem comunica) e o emissor (entidadeindividual ou coletiva “real”).Da mesma forma, torna-se necessário diferenciar o destinatário do receptor. Odestinatário diz respeito à posição daquele a quem se dirige a comunicação. E oreceptor, refere a uma entidade individual ou coletiva “real”. Verón considera oenunciador e o destinatário como entidades discursivas, esclarecendo que um mesmoemissor pode construir de si próprio diferentes posições, isto é, diferentesenunciadores, em diferentes comunicações que possa realizar.Se consideramos o caso do âncora de Economía y Finanzas, Alberto Padilla,diariamente ele desempenha papéis diferentes – entrevistando um analistaeconômico, relatando uma notícia, fazendo comentários logo após a apresentação deuma matéria. Isto é, ele faz a vez de um enunciador que questiona e conduz umaentrevista de acordo com suas ‘regras de jogo’, outra de um enunciador que se‘limita’ a relatar – existindo, porém, uma construção de acordo com um olhar; efinalmente, de um enunciador que comenta e dá seu ponto de vista no que tange àmatéria anteriormente apresentada por repórteres.Dessa forma, a instituição midiática (CNN) com seus profissionais(jornalistas) é responsável pela construção das posições diversas do enunciador e dasconseqüentes estratégias de construção do destinatário. Para isso, tal comorepresento na figura 2, os jornalistas vão incluir partes do discurso técnico dosagentes econômicos (assim como de outros agentes), e traduzi-las para construir odiscurso midiático; dando como resultado um processo de midiatização dainformação econômica com características próprias ao telejornal. A seguir, apresento20Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408um esquema que busca expressar graficamente o que constitui a construção teóricado objeto de pesquisa.Figura 2: Esquema representativo da construção teórica do objeto de pesquisa.Pode-se observar, agora de forma gráfica, que o campo midiático,especificamente os jornalistas, são alvo permanente dos agentes dos diversos campossociais que estejam na procura de mobilizar a opinião pública. Nessa direção,concordo com Traquina (20<strong>04</strong>, p. 186), que seguindo a proposta teórica de Molotch eLester, expressa que a luta dos agentes sociais “consiste em concordar as suasnecessidades de acontecimentos com as dos profissionais do campo jornalístico”; ou ditode outra forma, em fazer com que suas agendas dialoguem e se encontrem com asagendas dos jornalistas.No entanto, não se deve reduzir e simplificar esses de processos de interaçãoentre jornalismo e os demais agentes sociais. Trata-se de processos “ritualizados”,Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 21


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408explica Rodrigues (1997), que atravessam a experiência social; processos devisibilidade que possuem uma cena e um modo de apresentação de si, que tantorevela quanto esconde. Processos cujo objetivo primeiro é a definição e posteriorpublicização do que é notícia; mas, lembrando que é competência do jornalismodecidir aquilo que seja noticiável. Entretanto, e seguindo a proposta da teoriainteracionista, considero que os agentes dos outros campos têm recursos paramobilizar o campo jornalístico de acordo com seus interesses.6. A construção da notíciaNo caso aqui estudado, os agentes econômicos representam as principaisfontes (ou promotores) da informação econômica midiatizada pelo telejornal. Paraidentificar a capacidade deles agendarem o espaço midiático, Traquina (20<strong>04</strong>) explicaque a lógica da teoria interacionista aponta para a importância de observar quatrotipos de recursos: o capital econômico do agente, seu capital institucional (grau deinstitucionalização da fonte), o capital sociocultural (na forma de autoridade, “saber”e credibilidade) e as suas estratégias e táticas de comunicação.Entendo, portanto, que o predomínio de certas fontes no telejornal, ou apouca relevância de outras, é resultado de um jogo onde se busca uma posiçãoestratégica, e que, muitas vezes (mas não é garantia), para os poderosos do chamadoMercado, esse jogo resulta numa conquista.Na realidade, fontes, jornalistas e público coexistem dentro de um sistemaque se assemelha mais ao jogo da corda do que a um organismo funcional interrelacionado.No entanto, os jogos da corda são decididos pela força: e as notícias são,entre outras coisas, o exercício do poder sobre a interpretação da realidade (Gansapud Traquina, 20<strong>04</strong>, p. 197).22Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Em decorrência disso, entendo a notícia como instância (não única) deconstrução da realidade social (aqui a econômica) e como resultado de um processointerativo entre as suas fontes e os jornalistas. Entender a notícia também comoconstrução (teoria construcionista) não significa rebaixá-la, no sentido de “acusá-lacomo fictícia. Melhor, alerta-nos para o fato de a notícia, como todos os documentospúblicos, ser uma realidade construída possuidora da sua própria validade interna”(Tuchman apud Traquina, 20<strong>04</strong>, p. 169).Resulta interessante para esse trabalho, trazer a proposta de Henn (1996) quesitua as notícias no marco do cruzamento do pensamento de Marcondes Filho eRodrigo Alsina. Nesse sentido, o autor entende a notícia como produto de consumocomo qualquer outro, porém, com peculiaridades devido a tratar-se de “um ser delinguagem a processar ininterruptos recortes em um mundo que se força sobre ele,narrando-o e hierarquizando-o” (Henn, 1996, p. 38). No entanto, interessa-medestacar que é através da pauta que os acontecimentos ganham (ou não) o formatode notícia, inclusive aqueles que são produzidos explicitamente para seremnoticiáveis (trabalhos de assessoria de imprensa ou marketing). Será o profissionaldo jornalismo que detém a decisão de selecionar e transformar um acontecimento empauta e, finalmente, em notícia 8 segundo os valores-notícia. Isto é, não passa por umaavaliação individual de noticiabilidade, mas sim resulta de um conjunto de valoresque incluem critérios tanto profissionais quanto organizativos (idem, p. 70).A produção de notícias, portanto, está vinculada a uma cultura profissional,onde se tem códigos, estereótipos, expectativas, representações de papéis, rituais,convenções, etc. Junta-se a isso os critérios [valor-notícia] que a organização do8 Henn aponta para a importância de compreendermos que de acordo com a teoria sistêmica de E.Morin, “todo fato social é potencialmente um acontecimento para os mass media e toda notícia épotencialmente um acontecimento para a sociedade”. Significa dizer que “a mídia utiliza osacontecimentos sociais como notícia e, por sua vez, constrói e transmite um produto (a notícia) quechega a se converter em acontecimento social (Henn, 1996, p.70). Isto é, a notícia é construída a partirdos fatos, logo as pautas, mas ela também constrói acontecimentos (econômico).Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 23


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408trabalho estipula para a noticiabilidade e que são praticados como “naturais” pelosprofissionais de imprensa (Henn, 1996, p. 79)Toda essa complexidade que envolve o conceito notícia me leva acompreender por que pesquisadores que também detém experiência profissionalcomo jornalistas, entendem que mais do que irmos à procura de uma definição‘pronta’ do que é a notícia, o sentido está no “estabelecimento de propriedades que <strong>ano</strong>tícia deve conter”, isto é, os “critérios para que algo ganhe status de notícia”(Henn, 1996, p. 32).Considero que o problema está em ficar amarrado a certas concepçõesparadigmáticas que vêm sendo assinaladas nas pesquisas feitas no âmbito dojornalismo. Note-se que, durante os <strong>ano</strong>s 70 acontece uma virada na pesquisa sobrejornalismo com a emergência de um paradigma que se opõe radicalmente àperspectiva da notícia como “distorção” e que concebe a notícia como construção.Significa dizer, que a teoria construcionista está pondo em causa, diretamente, aprópria ideologia jornalística e a sua teoria da notícia como espelho da realidade(Traquina, 20<strong>04</strong>).Contudo, ainda alguns profissionais do campo midiático continuamconcebendo a notícia como um espelho da realidade. A perspectiva construcionista, eme alinho a ela neste ponto, entende que é impossível estabelecer uma distinçãoradical entre a realidade e os media noticiosos que devem “refletir” essa realidade,considerando que as notícias ajudam a construir a própria realidade. Ademais, ateoria “defende a posição de que a própria linguagem não pode funcionar comotransmissora direta do significado inerente aos acontecimentos, porque a linguagemneutral é impossível”; e finalmente, sustenta que “os media noticiosos estruturaminevitavelmente a sua representação dos acontecimentos” (idem, p. 168). Isto, devidoa fatores como a organização do trabalho jornalístico, limitações orçamentais, dentreoutros.24Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 64087. O fazer do telejornalismoO telejornal é um espaço midiático, de trabalho e produção, que permiteconstatar a existência de uma construção ou “olhar” jornalístico, pois nele sepontuam certas ocorrências, se privilegiam ou omitem outras, construindo umdiscurso que “em si mesmo é um ato, uma realidade comunicativa com suaspeculiaridades técnicas, políticas e ideológicas que lhe são próprias e singulares”(Berger e Motta, 20<strong>03</strong>, p. 97).Uma característica ou peculiaridade desse gênero, anteriormente jácomentada, é o peso do lugar de fala do âncora, a quem Fausto Neto define como“espécie de novo mediador a conduzir a possibilidade de oferecer e de se oferecercom um novo modelo ético de narrador” (1999: 13). Isso porque é no âncora – sejahomem ou mulher – em quem o telespectador acredita ou duvida, sendo que, comojá foi mencionado, ele deriva de uma outra fala.Marcondes Filho (2000) explica que nos primeiros telejornais, a voz do‘noticiarista’ ficava no fundo, representando um complemento à cena; pode-se falarque havia um telejornalismo como variante do jornalismo impresso, “uma espécie deleitura televisionada de notícias da imprensa” (p. 79). Atualmente, com a criação dalinguagem própria da TV a partir dos <strong>ano</strong>s 60, essa voz de fundo é substituída poroutra com nome e rosto que nos olha, “uma pessoa familiar que nos olha nos olhosnão pode mentir”, expressa Ramonet. Contudo, esse apresentador (âncora) também sedilui, considerando que “as passagens sobre o estúdio central são fugazes (...). Nofinal de contas, nada é mais importante que a rede, a malha de correspondentes, amultiplicação de conexões (...)” (Ramonet apud Marcondes Filho, 2000, p. 52).Com relação à rede de correspondentes nos telejornais, Tuchman apontapara a existência de três tipos de especialização manifestados pela redeinformativaenquanto sistema hierárquico: a especialização territorial, a organizacional e a tópica(apud Saperas, 1993). A CNN en Español com sua rede própria de correspondentesDisponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 25


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408espalhados em todos os países da América Latina 9 , e integrando a rede maior dogrupo CNN, é um exemplo de organização que orienta suas rotinas e práticasprofissionais a partir de uma segmentação do mundo em zonas e temas.(...) para Gaye Tuchmann, a informação como construtora darealidade social tem sua origem numa ampla rede informativa queatinge proporções planetárias, mas que se modela nas estruturasinternas das organizações emissoras, nas quais os profissionais dainformação se encontram submetidos a um vasto sistema hierárquicoque lhes atribui uma determinada função na recolha da informação ena determinação do que é noticiável (...) (Saperas, 1993, p. 153).Portanto, a mídia – aqui a televisão, especificamente o telejornal – e seusprofissionais, são detentores de um poder que usam para fazer escolhas sobre osassuntos a serem veiculados, mas, sobretudo, sobre as formas em que estes serãoapresentados (Schudson apud Traquina, 2002). Mouillaud, chama às formas de“dispositivos” e explica que eles constituem “invariantes”, ao menos durante umcerto período. Isto é, os dispositivos constituem “um instrumento periódico” queresponde às necessidades que o telejornal tem de estruturas estáveis que ajudem apôr uma ordem sobre o caos e permitam ao telespectador reconhecer o telejornal(Mouillaud, 2002:23). Ou dito de outra forma, essa proposta ordenada e diária que visao reconhecimento do receptor, responde à proposta já mencionada de Verón decontrato de leitura.Atualmente, pode-se constatar que a produção de telejornais é padronizada;ou seja, observando telejornais de diferentes partes do mundo, nos encontramos comessas “invariantes” recém mencionadas que, de acordo com Marcondes Filho (2000,p.80-89), respondem a paradigmas próprios desse gênero, tais como as que seguem.- O modelo esportivo de noticiário, com notícias apresentadas tal qual um jogode futebol. As cenas passam com mínima intervenção do narrador já que o mundo9 Possuem pelo menos um correspondente em todos os países da América Latina. No México e naArgentina, são os dois países onde detém uma estrutura maior e desde onde se coordena os paísesvizinhos. Por exemplo, a jornalista Carolina Cayazzo em Buenos Aires, é a chefe decorrespondentes para a região; isto é, ela supervisiona o trabalho dos correspondentes de paísesque se encontram mais próximos da Argentina.26Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408deixa de ser uma realidade que precisa ser investigada para tornar-se algo que separticipa como um jogo. Desaparece a questão do sentido (que significa isso ouaquilo) dando espaço ao como vivenciamos, como nos sentimos naquela pele.- A lógica da velocidade, no sentido que um tema é bom se for apresentadoantes que os outros. Isto é, exceto a velocidade, não existe qualidade intrínseca dasnotícias. Ademais, há um ritmo próprio à TV caracterizado pela troca ligeira depl<strong>ano</strong>s (como na publicidade) que conduz ao chamado “efeito de aceleração”, nãopossível de ser captado de imediato pela percepção, mas que demanda a construçãode narrativas rápidas em tempo recorde. A busca da rapidez exige decisõesinstantâneas, tornando os jornalistas espécies de funcionários de uma linha demontagem que vão produzir de acordo a padrões viciados.- A preferência do “ao vivo”, anteriormente citada, produz até no própriojornalista que transmite um acontecimento nessas condições, uma espécie de frenesifazendo-o sentir um ator importante nessa história. Marcondes Filho critica a posturaingênua de alguns profissionais acreditando que o “ao vivo” apresenta o reino das“coisas em si”, demonstrando a mesma visão que Umberto Eco 10 sobre essefenômeno da TV, e em particular dos telejornais.- A substituição da verdade pela emoção, pois o telejornal tem de provocaremoções, sensibilizar os telespectadores, sustenta o autor. Ele é construído deimagens “interessantes”, que atraem e seguram a audiência. Portanto, não é qualquerimagem que entra no espaço do telejornal, sem por isso tratar-se de imagens falsas.Elas referem a acontecimentos reais, casos efetivamente ocorridos, mas que atelevisão os olha desde uma perspectiva estética para traduzi-los à sua linguagem.10 “A transmissão direta nunca se apresenta como representação especular do acontecimento que sedesenvolve, mas sempre – ainda que às vezes em medida infinitesimal – como interpretação dele.Para transmitir um acontecimento, o diretor de televisão coloca as três ou mais câmaras de modoque sua disposição lhe proporcione três ou mais pontos de vista complementares, quer todas ascâmaras apontem para um mesmo campo visual, quer (como pode acontecer numa corrida debicicletas) estejam deslocadas em três pontos diferentes, para acompanharem o movimento de ummóvel qualquer” (Eco, 2000, p. 182).Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 27


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Essa re-interpretação do real evidencia certos efeitos de sentido procurados desde aprodução: “o real tem que se moldar aos modelos da ficção para ser‘telejornalizável’” (p. 86).- A popularização, significa que nada de complexo, complicado ou difícil podeexistir na TV, notadamente no telejornal. Não responde apenas a uma exigênciamercadológica, como se costuma afirmar desde o senso comum, mas a um princípiomesmo da transmissão. Trabalha-se com unidades simples e compreensíveis, explicao autor, que são definidas sabendo que não se conta com a memória dotelespectador, com conhecimentos anteriores ou informações armazenadas.- O expurgo da reflexão, pois na televisão se trabalha em ritmo contínuo e semparada. A cada segundo uma nova cena, novas frases, sons, todas tentativas de atraire reter o telespectador: “o tempo não pode estourar, a fala tem de ser cortada, osargumentos podem ficar soltos no ar” (p. 88). Dessa forma, a televisão participafortemente da organização dos tempos do nosso cotidi<strong>ano</strong>, o que Silverstone (1994)chama de “integração vivencial”, no sentido que ela (sobretudo o telejornal) nosajuda a botar ordem na desordem, a nos informar para nos antecipar ao caos.Em decorrência disso tudo, podemos afirmar que o telejornal como produto,precede ao conteúdo, ou seja, ao texto. Por exemplo, Economía y Finanzas, sua duraçãode meia hora com três intervalos comerciais de dois minutos, é previamente definida.A partir disso, os jornalistas vão construir um texto, um discurso que busca informare também vai à procura de certosefeitos de sentido. Ou seja, seguindo a idéia deMouillaud (2002, p. 38) “a informação é o que é possível e o que é legítimo mostrar,mas também o que devemos saber, o que está marcado para ser percebido”, deacordo com os efeitos de sentido procurados desde essas formas de dizer.Portanto, pode-se afirmar que esse texto construído desde o telejornalismocaracteriza-se mais pela fragmentação do que pela concatenação de argumentos:28Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Eu posso construir uma história acoplando segmento a segmento,cada um dotado de uma certa informação, numa seqüência regular.Cada segmento é independente, possui sua própria informação e sealinha junto aos demais num mosaico de múltiplas peças. Todosvalem praticamente o mesmo. O sentido está na peça isolada e oconhecimento se dá de forma difusa, livre (Marcondes Filho, 2000, p.45).No entanto, nessa fragmentação também podemos encontrar uma ordemlógica, onde cada segmento – notícia – está relacionado aos seus pares (anterior eposterior); portanto a informação não é difusa mas linear: “(...) posso proceder deoutra forma, associando segmento a segmento através de um fio lógico. Ou seja, ainformação de B amplia ou continua a informação de A e será retomada pelainformação de C” (ibidem).E assim, escolhendo a seqüência e as formas dadas às notícias, vai seconstruindo uma narrativa do telejornal – um todo – que o telespectador vai consumire outorgar um sentido próprio; pois consumir, não é um simples processo mecânicofuncionalque se repete em todas as pessoas. O consumo, diz Martín-Barbero (2001,p.302), é “lugar de uma luta que não se restringe à posse dos objetos, pois passaainda mais decisivamente pelos usos que lhes dão forma social e nos quais seinscrevem demandas e dispositivos de ação provenientes de diversas competênciasculturais”.Dessa forma, de acordo com Verón (1997, p. 9-17), as condições de acesso àsmensagens e as de acesso ao sentido são duas problemáticas bem diferenciadas; oestudo das condições de acesso ao sentido “corresponde a un análisis enreconocimiento”, que mesmo não sendo objeto dessa pesquisa, deve ser levado emconta para entender o processo de construção da notícia, e compreender porquedefendo que todo processo de comunicação é interativo.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 29


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 64088. O agendamentoObservar e analisar o agendamento proposto pelo programa Economía yFinanzas – levando em conta, evidentemente, as limitações resultantes do tempodisponível para essa pesquisa, contribui na compreensão e caracterização dainformação econômica que está sendo construída.Como foi antes mencionado, há uma luta de agendas entre os diversos agentessociais, que buscam montar estratégias (agendar) de diversa índole (poder,comunicacionais, políticas) dirigidas aos jornalistas (gatekeepers 11 ), detentores dopoder de decidir sobre a seleção do que é noticiável. Tal função de seleção éfundamental para um meio de comunicação que busca propor uma agenda de temas;daí que, de acordo com Saperas (1993), é nessa instância que se identificou a primeiramanifestação da agenda midiática.Traquina (2002) explica que quando o conceito de agendamento foi expostopela primeira vez, em 1972, o paradigma vigente dizia respeito de uma idéia de que opoder da mídia era reduzido e os seus efeitos limitados. A denominada teoria dosLimited Effects, considerava o efeito como “reforço de atitudes prévias devidas aocomportamento da audiência no seio dos respectivos grupos sociais de referência, oque daria lugar a uma exposição, e a uma atenção e memorização selectivas por partedos indivíduos receptores da comunicação” (Saperas, op.cit., p. 24). Já os estudossobre o agendamento, partiam da constatação do poder que a mídia exerce parainfluenciar e determinar o grau de atenção que o público dedica a determinadostemas expostos à atenção e ao interesse coletivos (idem).11 Termo introduzido pelo psicólogo Kurt Lewin (1947) num estudo sobre decisões domésticasrelativas à aquisição de alimentos para casa. Levada aos estudos sobre Jornalismo na década de1950 por David Manning White, o que passou a chamar-se de “teoria do gatekeeper”, propõe que oprocesso de produção da informação é concebido como uma série de escolhas onde o fluxo denotícias tem de passar por diversos gates (áreas de decisão), onde o jornalistas (gatekeeper) decidese vai escolher essa notícia.30Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Mas, para melhor entendermos sobre o que originalmente se chamou deagenda-setting, deve-se levar em conta o percurso feito. Para isso, resgato aqui, emforma breve, como foi que se chegou a definir tal conceito. Em 1922, Lippmannpublicou um livro onde sugeria a existência de uma relação causal entre agendamidiática e agenda pública. Também Cohen, em 1963, escreveu que mesmo que aimprensa não possa dizer às pessoas como pensar, ela tem a capacidade de dizersobre o que pensar. Isto demonstra que o conceito de agendamento vinha sendodiscutido fazia já alguns <strong>ano</strong>s. Porém, é em 1972 que McCombs e Shaw o definem edão-lhe o nome de agenda-setting – foi na ocasião da publicação do trabalho de campodesenvolvido por eles durante as eleições presidenciais norte-americanas de 1968(Traquina, 2002).Evidentemente, não se trata de um conceito estático, os próprios autores(McCombs e Shaw) foram redefinindo-o. Por exemplo, vinte <strong>ano</strong>s depois, em 1993,fazendo um balanço da evolução da pesquisa sobre agenda-setting, eles escrevem quehá agendamento não só quando as notícias nos dizem sobre o que pensar, mastambém quando as notícias nos dizem como pensar nisso. E sublinham doiselementos como poderosos papéis do agendamento: os objetos selecionados quedespertam a atenção e a seleção de enquadramentos para pensar esse objetos (ibidem).Dessa forma, reconhecer a existência de operações, como a seleção etematização, subjacentes a todo processo de agendamento, ajuda na compreensão dosefeitos sentidos procurados desde a produção. Assim, importa salientar que se podedistinguir diferentes graus de seleção/escolhas ao estudar uma a agenda de um meiode comunicação. Uma seria aquela feita por indivíduos isolados, outra, por umaorganização ou instituição emissora, e finalmente aquela que exerce o sistema decomunicação em geral, como resultado da atividade conjunta dos meios decomunicação de massa (Grandi apud Saperas). Nessa pesquisa, centro a análise naseleção, tematização e agendamento feito por um telejornal de uma instituiçãoemissora, a CNN, mas sempre reconhecendo que será isso resultado do trabalho dosDisponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 31


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408profissionais que nela trabalham e, que por sua vez, acabam conformando eintegrando-se na agenda econômico-midiática global.Com relação ao que envolve a tematização, como operação subjacente aqualquer processo de agendamento, foi Niklas Luhmann quem começa a trabalhartal conceito 12 . O autor propunha que, levando em conta que a atenção do público élimitada, “os meios de comunicação implicam o grau de discriminação temática e oíndice de temas de actualidade que fazem parte da opinião pública” (Saperas, 1993,p. 39) 13 .Deve-se compreender, que existe uma especificidade no processo deagendamento, no sentido que não se pode falar em processos idênticos entreinstituições diferentes. As agendas são, portanto, disputas de sentido, desociabilidade, de referências, que resultam de um processo de construção doacontecimento, de construção da realidade social. Portanto, não é possível pretendera existência de uma realidade, lembrando que o que temos, de fato, são inúmerasversões da realidade; que mesmo sendo opostas entre elas, todas são resultado de umprocesso de comunicação – complexo – e não podem ser consideradas reflexo deverdades eternas e objetivas (Watzlawick, 1994).Daí a importância de vigiar minha postura de pesquisadora, pois busco mecolocar desde um outro lugar diferente ao de telespectadora que se ‘nutria’ dodiscurso midiático para ‘viver’ o seu dia-a-dia no trabalho. Isto é, devo deixar meulugar até agora de newsconsumer – termo proposto por Molotch e Lester ao se referiràqueles que assistem a “determinadas ocorrências disponibilizadas como recursospelos meios de comunicação social” (apud Traquina, 2002, p. 21) – para desenvolverum olhar que se estranha, mas que se envolve, que duvida mas que toma decisões.12 No texto intitulado “Öffentliche Meinung” publicado na Politische Vierteljahresschrift, no <strong>ano</strong> de1970 (Saperas, 1993, p. 87).13 Saperas explica que a concepção de Luhmann coincide com a de Maxwell E. Mc Combs e osdemais pesquisadores da agenda-setting function.32Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408ReferênciasANDACHT, Fernando. Entre signos de asombro: antimanual para iniciarse a la semiótica.Montevideo: Trilce, 1993.BERGER, Christa. Campos em confronto: a terra e o texto. Porto Alegre: UFRGS, 1998.BERGER, Christa; MOTTA, Luiz Gonzaga. Narrativa Jornalística: a história de Lula contadapelos jornais espanhóis. Revista FAMECOS: mídias, cultura e tecnologia. Porto Alegre:EDIPUCRS, nº 21, p. 90-109, agosto 20<strong>03</strong>.BOLTER, J. P. e GRUSIN, R. Remediation: understanding new media. Cambridge: MIT Press,1999.BOURDIEU, Pierre. Os usos sociais da ciência: por uma sociologia clínica do campo científico.São Paulo: UNESP, 20<strong>04</strong>.BRAGA, José Luiz. “Lugar de fala” como conceito metodológico no estudo e produtosculturais e outras falas. In: FAUSTO NETO, A.; PINTO, M. J. (orgs.) Mídia e Comunicação.COMPÓS. Rio de Janeiro: Diadorim, 1997.ECO, Umberto. Seis passeios pelos bosques da ficção. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.______. Obra Aberta. Forma e indeterminação nas poéticas contemporâneas. São Paulo:Perspectiva, 2000. [do original Opera Aperta]EAGLETON, Terry. La idea de cultura. Una mirada política sobre los conflictos culturales.Paidós: Buenos Aires, 2001.FAUSTO NETO, Antônio. Em busca da cena primária. Notas sobre dispositivos e condições deenunciação dos discursos jornalísticos. Mimeo, PPG-CC. Unisinos, 1999. p. 1-27.______. Telejornais e a produção da política: estratégias discursivas e as eleições presidenciais de1994. In: MOUILLAUD, M.; PORTO, S. (org.). O jornal: da forma ao sentido. Brasília: UNB,2002, p. 499-523.FAUSTO NETO, A. RUBIM, A. C., VERÓN, E. Lula Presidente: Televisão e Política naCampanha Eleitoral. São Paulo: Hacker, São Leopoldo: Unisinos, 20<strong>03</strong>.FRANÇA, Vera. Construção jornalística e o dizer social. In: MOUILLAUD, M.; PORTO, S.(org.). O jornal: da forma ao sentido. Brasília: UNB, 2002, p. 469-481.HENN, Ronaldo. Pauta e notícia. C<strong>ano</strong>as: ULBRA, 1996.MARCONDES FILHO, Ciro. Comunicação e jornalismo. A saga dos cães perdidos. São Paulo:Hacker, 2000.MARTIN-BARBERO, Jesús. Dos meios às mediações. Rio de Janeiro: UFRJ, 2001.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 33


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Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Síntese sobre uma análise do programa evangélico detelevisão “SHOW DA FÉ”Por Carla Saueressig *Este trabalho objetiva fazer uma análise do formato e atuação midiática doprograma evangélico Show da Vida, que é transmitido todas as noites, às 21h10m, narede de televisão Bandeirantes. E a partir disso, analisar criticamente o discurso e oconteúdo predominantes. Nessa análise, o enfoque dado será a relação entre fé esofrimento. Como se dá a questão dos problemas, dificuldades e dores quepermanecem insolúveis diante do poder da fé? Qual o posicionamento teológicoassumido pelo programa frente aos dilemas da vida que não se dissipam por meio dafé, frente às perguntas e questionamentos da vida, para os quais a fé, aparentemente,não apresenta respostas?Nesse sentido, é preciso avaliar também as estratégias usadas para atrair ecativar adeptos e avaliar o modo de missão adotado pelo apresentador R. R. Soares,que se autodenomina missionário. Para tanto, a metodologia usada se constitui naleitura dos textos citados na bibliografia, sendo que a revista Religião e Sociedadecontém um artigo com informações e dados precisos e específicos, com elementosteóricos úteis e importantes para essa pesquisa. Procurei, também, assistir aoprograma sozinha, bem como dialogar sobre o mesmo com os colegas e professoresdo curso, atentando para as opiniões, para os aspectos considerados negativos epositivos.* Estudante de Teologia, Escola Superior de Teologia, São Leopoldo. Trabalho apresentado no SATReligião e Mídia.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 35


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Formato evangélico da fé e ênfases do programaA volatilidade e a efemeralidade são características atribuídas à nossa época 1 .Nos diferentes tipos de mídia há empenho e uma busca constante por mudanças enovidades, por atrativos que se conformem com as necessidades e desejos daspessoas. Não é diferente com os evangélicos. Igrejas que têm presença marcante namídia movem e articulam-se nas intenções, a fim de conquistar e manter adeptos,garantindo o contínuo crescimento e a expansão. Esse é o caso da Igreja Internacionalda Graça, que tem como ponto de chegada, como objetivo de sua ação, a presença natelevisão 2 .A presença de R. R. Soares na mídia é impressionante. Calcula-se que gastepelo menos 2,5 milhões de reais por mês na veiculação de seus programas (veja,13/09/2000), o mesmo que o canal católico Canção Nova precisa arrecadar paramanter-se no ar. Ele tem conseguido permanecer na mídia desde o início da décadade 1980 e recentemente adquiriu uma concessão baseada na cidade de Dourado (MS)para a sua Rede Internacional de Televisão. São, pelo menos, três horas diárias deprogramas em que prega 3 . A partir de 1998 passou a aparecer em cadeia nacional narede CNT – que atinge 40% do território nacional – em um programa do horárionobre, que levava o nome do apresentador e tinha uma hora e meia de duração.Posteriormente, o programa passou a ser veiculado na TV Bandeirantes (cobre 89%da população) e recebeu o nome Show da Fé, acompanhado de melhorias naprodução, na edição e com duração de uma hora 4 .Os avanços da Igreja da Graça são notáveis. Com a aquisição da emissora detelevisão e o investimento em mais equipamentos e em pessoal para viabilizar amanutenção da emissora no ar, nota-se o crescimento da igreja e sua preocupação em1 FONSECA, A. B. Fé na Tela: características e ênfases de duas estratégias evangélicas na televisão.Revista Religião e Sociedade, v. 23, n. 2, 20<strong>03</strong>, p. 33.2 FONSECA, 20<strong>03</strong>, p. 35.3 FONSECA, 20<strong>03</strong>, p. 38.4 FONSECA, 20<strong>03</strong>, p. 39.36Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408oferecer entretenimento para sua audiência. Até 20<strong>03</strong>, a imagem de Soares pregandono púlpito da igreja da denominação em São Paulo ainda é um pl<strong>ano</strong> americ<strong>ano</strong>,porém, houve a introdução de uma câmera que se movimenta pela congregaçãodando um interessante efeito 5 .Para Soares, passaram a ser feitas tomadas de quatro câmerasdiferentes: a que o focaliza de frente, uma que o focaliza de cima,uma no palco e outra que fica à sua direita, proporcionando umaimagem que é mais utilizada no momento em que faz entrevistas comos cantores que se apresentam ou na hora dos testemunhos. Éapresentada, pelo menos, uma música a cada programa, são dadostestemunhos de fiéis da denominação, os quais passaram a contartambém com a produção de materiais no estilo jornalístico comdireito a externas, e são feitas perguntas de fiéis gravadas nasdependências da igreja em busca de conselhos ou para oesclarecimento de dúvidas relacionados ao texto bíblico. 6O estilo de Soares é coloquial e se apresenta de forma próxima na TV. Elecostuma afirmar a sua formação (fez curso de Direito), ressaltando a importância doconhecimento formal, do terceiro grau, para que se tenha uma mente maisdesenvolvida e uma comunicação melhor. Reconhece a necessidade do estudo parapregadores 7 . Soares intitula-se missionário, pois entende que seu ministério é viajarpelo Brasil, fundando igrejas, orientando pastores e atendendo fiéis 8 . No momento depedir as doações para o programa ele justifica esse pedido devido à existência deuma comunidade televisiva:O nosso programa é uma igreja no lar, nós fazemos aqui exatamentecomo se estivesse pregando na sua casa. Então vai praticando, vai seassumindo com Deus. Não se esqueça de uma vez por mês mandarsua oferta para manter o programa. Tirar o seu dízimo e mandar.'Oconteúdo de seu programa também é apontado como um motivopara a ajuda, uma opção sadia em um horário onde nas outrasemissoras as opções são novelas ou programas populares apelativos. 95 FONSECA, 20<strong>03</strong>, p. 40.6 FONSECA, 20<strong>03</strong>, p. 40.7 FONSECA, 20<strong>03</strong>, p. 40.8 FONSECA, 20<strong>03</strong>, p. 40.9 FONSECA, 20<strong>03</strong>, p. 41.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 37


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408A Igreja Internacional da Graça é um exemplo de um investimento na mídiaque tem dado certo. Ela entendeu que não só a presença na mídia garante êxito ecrescimento da denominação, mas que é preciso saber usá-la, adequando o formatoaos objetivos e considerando a existência de outros fatores que não dependem dapresença nos meios de comunicação 10 .Esse programa “Show da Fé” visa ocupar o tempo dos telespectadores efavorecer a disseminação de uma específica cultura evangélica, que gira em torno dopoder da fé. Pode-se identificar as seguintes ênfases: “ênfase no pregador/pregação,ênfase na cura e ênfase no dinheiro” 11 . O pregador e sua pregação são as ênfasesprincipais. A figura de Soares é central. Ele ocupa quase todo o tempo do programacom suas pregações e conselhos. O conteúdo de suas mensagens caracteriza-seprincipalmente pelas possibilidades de cura e resolução de outros problemas quefranqueia aos telespectadores através da fé.O oferecimento de um espaço que viabilize curas é a segunda ênfaseque sobressai no Show da Fé. Por intermédio da oração e da fé domissionário as pessoas têm acesso a bençãos antes inimagináveis.Problemas antigos poderão ser resolvidos e às pessoas é pedido quetenham fé e que participem. Esta participação se materializa nadoação financeira, terceira ênfase do programa. Para que as pessoastenham seu nome incluído no caderno de oração do missionário énecessário que doem, pelo menos, trinta reais por mês. Com issopodem ganhar algum brinde e a partir deste momento sãoreconhecidas como associados ou patrocinadoras da programação daIgreja da Graça. A presença nos cultos da denominação não ésalientada e não aparecem os endereços dos diferentes templos natela. O importante é participar no apoio ao programa e ter fé emDeus, sendo aceitável que a pessoa freqüente, inclusive, outra igrejaevangélica. 1210 FONSECA, 20<strong>03</strong>, p. 40.11 FONSECA, 20<strong>03</strong>, p. 45.12 FONSECA, 20<strong>03</strong>, p. 45.38Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408“Com a fé, tudo é possível!” – Uma teologia questionávelApesar dos aspectos positivos do programa e do apresentador, é precisoquestionar o conteúdo central do seu discurso. No livro Comunicación y Missión en elLaberinto de la Globalización 13 , o autor faz uma reflexão teológica sobre a comunicação,e chama de ministros antiteológicos os que imaginam poder chegar com a mensagemdo Evangelho por meio de técnicas publicitárias e métodos de venda. Muitas vezes setem confundido a comunicação do Evangelho com a propaganda. Ele afirma quequem o faz desconhece a essência não só da comunicação como do Evangelho.A fé apresentada como um show mais parece um produto decomercialização, um produto eficaz e infalível, um meio de se alcançar benefícios.Num país onde as necessidades mais vigentes encontram-se na área da saúde e daeconomia, um discurso que apresenta a fé como garantia de triunfo sobre taissituações, como doenças, desemprego, dívidas, vícios, etc., pode levantar a suspeitade que seja essa mensagem uma estratégia, porque não dizer massiva, para atrair ecativar adeptos e, conseqüentemente, colaboradores que assegurem a manutenção doprograma e o seu êxito, já que, para a Igreja da Graça, “a manutenção de suaprogramação na televisão parece ser o motivo da sua existência e é nesse sentido queas suas forças são direcionadas” 14 .Carlos Valle considera a mídia e seus diferentes tipos como novosprovedores de valores, um novo mundo e uma nova realidade que deve serassumida pelas igrejas. Entretanto, as igrejas devem fazer uso da mídia com especialatenção, pois quando quiseram usar os meios utilizando uma mescla de imperativose seduções, projetaram uma imagem comercial que provocou a suspeita de que nãoestavam tão interessadas em dar algo às pessoas como em lograr algo delas 15 . Tem13 VALLE, C. A. Comunicación y Missión en el Laberinto de la Globalizacion . World Association ofChristian Communication / Conselho Latino-Americ<strong>ano</strong> de Igrejas. São Leopoldo, Brasil /Londres, Inglaterra: Sinodal, 2002, p. 40.14 FONSECA, 20<strong>03</strong>, p. 45.15 VALLE, 2002, p. 43Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 39


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408que se ter cuidado para não usar meios apelativos na tentativa de manipular asemoções e intenções das pessoas, a despeito de suas fragilidades e problemas.Muitas vezes, em nome do sucesso e do crescimento numérico, a mensagemdo Evangelho é desvirtuada. As boas-novas do amor e da graça de Deus convertemseem promessas de prosperidade. Jesus mesmo jamais prometeu uma vida isenta dedificuldades ou que em seu nome qualquer problema seja dissipado. Em seuministério, é possível observar que não curou a todos e que ele próprio sujeitou-se asituações de sofrimento e pobreza. O Novo testamento procura divulgar as obras deJesus não apenas para reportar às pessoas ao que ele pode oferecer, mas, sobretudo,ao valor da sua pessoa, à veracidade e seriedade da sua mensagem. Comunicar essamensagem com sua vida, com seus gestos, palavras e ações, constitui a centralidadeda sua missão. E essa mensagem está longe de ser um anúncio de uma vida física,material e financeira cada vez melhor, mas aproxima-se mais de uma proposta dequalidade de vida espiritual, na qual, pela fé, é possível ser feliz, ter confiança e pazapesar dos problemas e adversidades.A Bíblia não revela um Deus que tudo soluciona perante a fé sincera de seuscrentes, mas um Deus que, em muitos casos, aconselha e ajuda as pessoas aaprenderem e a crescerem com as situações contrárias e difíceis. Um Deus que ensinaa ter fé comprometida ainda que não se alcance a bênção desejada, que ensina a amare seguir seus ensinamentos não por interesses próprios, por aquilo que ele pode dar,mas por aquilo que ele é, por sua essência, o amor. O valor da fé deve ser dignificadoem detrimento da pessoa na qual se deposita essa fé, caso contrário, existe o perigode acontecer que as pessoas procurem ter fé apenas para sua auto-gratificação,busquem somente as bênçãos, e não o abençoador. Esse tipo de “mentalidadeevangélica” que o programa dissemina pode tornar-se excludente e problemáticonaqueles casos em que a situação difícil não se desfaz.A exemplo de uma mulher que escreveu uma carta ao missionário contandoque ela e seu marido eram fiéis no dízimo, já haviam orado muito e feito, inclusive,40Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408jejuns, todavia Deus não curava a deficiência visual do seu marido. “Se temos fé, seJesus levou sobre si as nossas enfermidades, porque então meu marido não écurado?” Ela demonstrava um sentimento de frustração e desânimo, como sequisesse deixar a igreja. Perguntava o que eles deveriam fazer mais para que Deus osatendesse. O missionário em seguida falou muitas palavras, mas não respondeu aosquestionamentos da mulher. Na tentativa de responder, ele usou uma ilustraçãofazendo entender que o problema do casal era falta de fé. Geralmente, o que se aleganesses casos é falta de fé ou fé insuficiente, ou conseqüência de algum pecado, sendoque esse pecado deu espaço para o Diabo atuar na vida da pessoa. Esse jeito errôneode interpretar a vida é resultado de um discurso errôneo. Isso pode gerar na pessoaum sentimento de fracasso e baixa-estima. É como se fosse uma “troca justa”. Se vocêtem fé, vai fazer determinadas coisas e então Deus te abençoará, se não faz tais coisasé porque falta fé, e Deus não pode recompensar você.ConclusãoJonas Rezende 16 afirma que o estudo da técnica da comunicação usada pelasigrejas deve ser enfocado à luz da Teologia. “Não temos dado a atenção devida àinterpretação e uso teológico da comunicação aplicada à missão primária da igrejacristã, que é a de veicular a palavra de Deus”. “Estamos convictos da eternidadedessa palavra, mas também estamos certos de que nossos recursos e métodos deproclamação são precários, sempre passíveis de revisões, reformulações etransformações conseqüentes” 17 . O autor reflete sobre as distorções da comunicação:“desrespeita-se o ser hum<strong>ano</strong>. Faz-se dele apenas um consumidor de utilidades e deidéias. É tratado como coisa, objeto – um isso, do qual se pretende retirar tão somentelucro ou prazer” 18 . As igrejas não estão isentas de adotar tais atitudes massificantes.No Show da Fé, pouco se fala sobre o verdadeiro eixo de todo relacionamento16 REZENDE, J. Um Estudo Teológico sobre Comunicação. São Paulo: ASTE, 1974, p. 13.17 REZENDE, 1974, p. 13.18 REZENDE, 1974, p. 25.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 41


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408hum<strong>ano</strong> que, como a Bíblia revela tão bem, deve ter como base a dimensão dorespeito e do amor absoluto para com o próximo, absoluto amor àquele pelo qualJesus Cristo também morreu. Perdeu-se a consciência de que a comunicação é, emúltima análise, amor em ação 19 . Isto é, pouco se fala sobre o compromisso com asnecessidades do próximo e do compromisso com Deus baseado não no que ele faz,mas baseado no que ele é.Enfim, as igrejas jamais podem abster-se da mídia, porém, ao usá-la, devemser coerentes com os princípios bíblico-teológicos, a fim de cumprirem com a missãoque Deus lhes incumbiu, e fazer da mídia um instrumento da comunicação do amore salvação, da graça e misericórdia, revelados em Jesus Cristo.ReferênciasFONSECA, A. B. Fé na Tela: características e ênfases de duas estratégias evangélicas natelevisão. Revista Religião e Sociedade, v. 23, n. 2, 20<strong>03</strong>.VALLE, C. A. Comunicación y Missión en el Laberinto de la Globalizacion . World Association ofChristian Communication / Conselho Latino-Americ<strong>ano</strong> de Igrejas. São Leopoldo, Brasil /Londres, Inglaterra: Sinodal, 2002.REZENDE, J. Um Estudo Teológico sobre Comunicação. São Paulo: ASTE, 1974.19 REZENDE, 1974, p. 25.42Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Mídia e Religião:Das peregrinações ao universo das telecomunicaçõesPor Sidnei Budke *IntroduçãoO presente artigo é resultado de algumas reflexões feitas acerca do campomídia e religião. O objetivo central em tematizar esta área, ainda pouco explorada, écontribuir para novas perspectivas e esclarecimentos referentes à atuação docatolicismo, protestantismo, pentecostalismo e neopentecostalismo nos sistemas detelecomunicação, principalmente em termos do rádio e televisão. Saliento que emnenhum momento utilizarei uma análise teológica ou conclusões sobre os programasreligiosos, em virtude da constatação de que, para entendermos estes antigos e atuaisfenômenos religiosos da comunicação social, precisamos, antes de tudo, conhecerbrevemente a trajetória histórica e o desenvolvimento destes grupos, como também,a lógica mercado lógica por eles idealizada e manifestada na sociedade brasileira.Convido você, leitor, a navegar neste universo de informações, convidando-lhe, apartir desta leitura, a sentir-se desafiado a se aprofundar, ainda mais, nos conteúdosaqui abordados e refletidos.Religião e comunicaçãoAs religiões entrando em nossos lares* Estudante de Teologia, Escola Superior de Teologia, São Leopoldo. Trabalho apresentado no SATReligião e Mídia.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 43


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Quem de nós, ao ligar o televisor ou o rádio, não sintonizou um programareligioso? Estes podem ser católicos, protestantes, pentecostais, neopentecostais,espíritas, umbandistas, entre tantos outros existentes. De fato, as inúmerasexpressões de fé atuantes no Brasil transparecem não se contentar mais com suasreuniões, missas e cultos semanais, enfim, encontros restritos aos seus membros. Após-modernidade, juntamente com o avanço da tecnologia, aponta a mídia como ocaminho de sucesso para qualquer mercado, empreendimento e programação.Outro fator constatado em nossos dias é a necessidade de cada crençareligiosa manifestar sua espiritual idade e mensagem numa sociedade com inúmerasdúvidas sobre o mundo espiritual 1 : espíritas falam de vidas passadas e reencarnações;protestantes da fé centrada em Jesus Cristo; católicos fazem alusão a imagens desantos e romarias; pentecostais enfatizam o poder do Espírito Santo na vida docrente; neopentecostais transmitem um Deus que presenteia o ser hum<strong>ano</strong> com bensmateriais. Como percebemos, são muitas as informações que a sociedade recebesobre as questões espirituais. Cientistas da Religião destacam que o trânsito religiosopresente entre as religiões é, em parte, fruto das informações recebidas via meios decomunicação, por exemplo: um cristão buscando compreensões de fé na teoriakardecista (espírita) 2 .Como um comerciante preocupa-se em vender a sua mercadoria, podemospensar que, da mesma forma, as religiões estão interessadas em divulgar a suafilosofia de vida, a sua maneira de compreender Deus e teorizar um sentido de vida aser seguido.1 A racionalidade sobre as questões espirituais oriunda do iluminismo não acertou suasprevisões.,.de que, o mundo espiritual seria com o passar dos <strong>ano</strong>s negligenciado. Em pleno séculoXXI os filmes, livros, revistas mais comercializadas são os que transmitem estudos sobre aespiritual idade humana. Veja: Segundo o Jornal Folha de São Paulo (Antônio Carlos Morais. Folhade São Paulo. Ed. 14/07/20<strong>04</strong>. p. 46.),80% das pessoas brasileiras possuem anseio paracompreender a existência dos seres sobrenaturais. sendo que, os livros que abordam Anjos,ocultismo e espiritualismo são os bestse//ers de muitas editoras e fonte de lucros vultosos paraqualquer livraria.2 Oropeza B. Z. 99 perguntas sobre Anjos, Demônios e Batalha Espiritual. p. 17 R. Prandi; A.Pierucci. A realidade das religiões no Brasil. p. 10-50. Fonte indicada: www.pucsp.br/rever/rv 1-2005/p - santana.pdf.44Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Alguns especialistas em comunicação social afirmam que as religiõesiniciaram sua participação na televisão e no rádio com o propósito específico depassar ao povo brasileiro a sua espiritualidade. Entretanto, com o passar do tempoencantados com o mundo da comunicação e seus benefícios, concentraram suaspreocupações na audiência e no número de adeptos cativados através das ondassonoras de emissoras radiofônicas e audiovisuais. Missão, proselitismo, lógicamercado lógica? Diante de nós está uma grande discussão!Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 45


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Pesquisas recentes na América Latina apontam que os telespectadores dosprogramas da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) e da Umbanda geralmentesão pessoas ligadas a outras denominações religiosas 3 . A Umbanda conquista suaaudiência em torno dos orixás e ritos para diferentes situações de vida: casamento,emprego, negócios... Já a IURD, pela ênfase no exorcismo, na cosmovisão do combatecontra as forças malignas que prejudicam as diferentes dimensões holísticas do ser:espiritual, físico, corporal, econômico. Reparem que ambas possuem uma ênfasedistinta; porém, de um outro lado, identificam-se totalmente na associação comfatores do dia-a-dia do ser hum<strong>ano</strong>, como a situação econômica 4 .A lógica mercadológica e a reação CatólicaMuitas pessoas acreditam que a Igreja Católica é a maior referência emtermos de comunicação religiosa por manter 24 horas no ar três emissoras detelevisão: Canção Nova, Rede Vida, Século XXI. Além disso, conta com centenas derádios espalhadas pelo país. Considera-se, atualmente, tal pensamento como correto,pois sem dúvida o catolicismo nos últimos <strong>ano</strong>s conquistou definitivamente seuespaço na mídia brasileira, demonstrando seu poder de ação como Igreja majoritária.No entanto, este fator não surge especificadamente como uma iniciativa da IgrejaCatólica em criar novas frentes de comunicação, mas, principalmente, como reaçãofrente ao pluralismo religioso que se utilizou da mídia para cativar muitos fiéiscatólicos aos seus templos, diminuindo a presença católica em solo brasileiro.Lemuel Guerra destaca:Entendemos a adoção desse modelo e a posterior restauraçãoconservadora e, no âmbito desta, a força do Movimento Carismático,como o resultado dos esforços que a Igreja faz para adaptar sua3 As fotografias acima são tiradas dehttp://www.pime.org.br/pimenetlmundoemissao/religpentecostalismodados.htm.4 L. M. Martino. Mídia e poder simbólico. p. 10 - 33. G. Vattimo. O fim da modernidade. p. 12-55.Fonte adicional: www.arcauniversaI.com.br/iurd.46Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408proposta de religiosidade às novas condições de mercado e decompetição, que exigiam uma atenção crescente à demanda dosconsumidores reais e potenciais de religião. As transformações naconfiguração do mercado religioso nacional podem ser observadasnos dados dos Censos E.acionais referentes ao crescimento dosevangélicos no Brasil, que apontam para a década de 50 como o iníciode um processo mais acentuado de descatolicização do país. Esseprocesso pode ser entendido menos como um sinal de decadênciainstitucional católica do que como o resultado do aumento naofensiva dos evangélicos no país, que produz um gradualcrescimento do número de adeptos das igrejas dos "crentes",colocando sob questionamento o monopólio do mercado religiosoexercido pela Igreja Católica no campo religioso desde os tempos doBrasil - Colônia. Portanto, esse processo de apropriação de algumasdas principais características do modelo pentecostal evangélico peloMovimento de Renovação Carismática (católico) não significa, demaneira alguma, o resultado de uma ação planejada por uma cúpulamaquiavélica de padres que, na calada da noite, teria resolvido osdetalhes da estratégia a ser operacionalizada como reação às novascondições do mercado religioso. O que aconteceu foi, por um lado, acriação de uma série de mecanismos estruturais e organizacionais quedão apoio ao desenvolvimento desse estilo de ser católico - ocarismático - e, por outro, a tomada de um conjunto de medidas queresultariam, na prática, em maiores dificuldades para a continuidadee desenvolvimento do projeto da Igreja Popular. Nesse sentido, essaconjuntura favorável à identidade católico-carismática é amplamentedeterminada pelo fato de que a Igreja tem que enfrentar níveis cadavez mais altos de concorrência no mercado religioso, bem como umacrescente perda de fiéis justamente para os pentecostais tradicionais epara os néopentecostais. 51940 1950 1960 1970 1980 1990População 41.236.315 61.944.397 70.191.370 94.139.<strong>03</strong>7 119.002.706 146.825.475Católicos 95.0 93.4 93.0 91.7 89.0 80.0Evangélicos 2.6 3.3 4.0 5.2 6.6 9.0 a 15.0Espíritas 1.1 1.6 1.4 1.3 1.2 1.0Outras 0.8 0.8 1.0 1.0 1.2 1.0Sem religião 0.5 0.8 0.5 0.8 1.8 5.1Fonte: Censo/IBGE. Estima-se que para o próximo censo os evangélicos corresponderão a 25% dapopulação brasileira. 65 Texto recebido via e-mail. Endereço eletrônico do autor lenksguerra@yahoo.com.6 Armando ORO. Avanço Pentecostal e Reação Católica. p 10-40.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 47


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Líderes de audiênciaO Ibope, interessado no fenômeno religioso, divulgou uma pesquisa na capitalpaulista referente à audiência dos programas religisos 7 :7 Os dados e as imagens a seguir foram extraídos das seguintes fontes: Programa Show da Fé -Imagem extraída do site: www.ongrace.com/schowdafé. Programa Casos reais - Imagem extraídado site: htto://www.igreiauniversal.org.br. Programa da TV Canção Nova - Imagem extraída dosite: www.rcc.org.br. Programa Movimento Pentecostal - Imagem extraída do site:http://www.cpad.com.brlcpad/movimento/principal.htm. Programa Está Escrito - Imagemextraída do site: http://www.novotempo.org.br/index.asp?Conteudo=sisac.htm. ProgramaVitória em Cristo - Imagem extraída do site: http://www.prsilasmalafaia.com.br.48Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408A audiência conquistada pelos tele-evangelistas, comparada ao percentualobtido pela novela das 21 horas da Rede Globo (47 pontos no Ibope diariamente), élegitimamente pequena em termos de proporção de telespectadores, também, poucosignificativa em relação aos programas tradicionais, como Jornal Nacional (35pontos), Fantástico (26 pontos) e Domingo Legal (16 pontos) 8 .Um ponto no Ibope corresponde aproximadamente a 80 mil televisoressintonizados em determinada emissora. Referindo-se ao programa Show da fé, queem horário nobre já emplacou 4 pontos de audiência, resulta em um número de 320mil aparelhos eletrônicos recebendo a sua transmissão. É interessante observar que aspesquisas do Ibope concentram-se geralmente nas capitais dos estados brasileiros, e,principalmente, no estado de São Paulo. Sendo assim, a nível de Brasil, considera-seum número de receptores ainda maior dos programas religiosos. A IgrejaInternacional da Graça de Deus atinge na América Latina, através dos veículos decomunicação que transmitem seus cultos, cerca de 20 vezes mais públicocomparando ao número de membros freqüentadores de seus templos. Já a IgrejaUniversal do Reino de Deus, possui um dos maiores impérios de comunicação, comoa Rede Record de Televisão, que atinge facilmente milhões de pessoas no Brasil e noexterior 9 .8 Os números de audiência informados, relativamente, variam conforme o dia e a programação.Obs.: Pesquisas Ibope: www.ibope.com.br.9 As imagens a seguir foram extraídas, subseqüentemente, dos sites:http://www.igrejauniversal.org.br; http://www.sisac.org.br ehttp://estaescrito.novotempo.org.br; http://www.ongrace.com/schowdafe.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 49


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Conhecendo a história da comunicação religiosaClareando alguns aspectos entre a mídia e os evangélicosA origem histórica de algumas denominações protestantes no Brasil estárelacionada com o evangelicalismo norte-americ<strong>ano</strong>, que procurou umrelacionamento do evangelismo com a TV aberta. Nos EUA, os primeiros programasevangélicos estavam vinculados ao protestantismo, e o catolicismo, por sua vez,50Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408concentrava poucas atenções para os campos mercadológico e religioso. Desde então, oprotestantismo é mundialmente considerado o pioneiro nesse segmento. Porém, coma chegada do pentecostalismo que, ao invés de alugar espaços em emissoras decomunicação existentes como o protestantismo vinha fazendo, interessou-serapidamente em conquistar seus próprios veículos de informação, tomando assim, osmaiores utilizadores da telecomunicação religiosa 10 .Outro fator resulta da tendência do pentecostalismo em demonstrar maioragressividade na área da comunicação, pois seu interesse nem sempre estevevinculado com a qualidade dos programas apresentados como no protestantismo,mas na quantidade divulgada e na audiência adquirida.No Brasil, atualmente, existem várias denominações cristãs mantendoparcerias com organizações religiosas internacionais, estabelecendo o conceitoameric<strong>ano</strong> de tele-evangelismo, como exemplo o ministério de Joyce Meyer.10 H. Assmann. A Igreja Eletrônica. p. 14-33. A. P. ORO. Religiões pentecostais. In: RevistaEclesiástica Brasileira. p.3<strong>04</strong>-334. A. B. Fonseca. Evangélicos e Mídia. p. 14-44.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 51


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Alcance através da mídia: A nossa visão, que foi inspirada por Deus,é alcançar o mundo com a verdade que é encontrada apenas na SuaPalavra. Diariamente, milhões de pessoas recebem ensinamentosbíblicos transformadores através do Ministério da Joyce Meyer, natelevisão e programas de rádio, fitas de ensino, vídeos, livros, econferências. Através de nosso programa de televisão, nós temos umaaudiência potencial de 2.1 bilhões de pessoas ao redor do mundo,alcançando aproximadamente dois terços do globo - e a nossa visão éexpandir nosso alcance na televisão ainda mais. Através de nossosprogramas internacionais de missões, somos capazes de penetrar emáreas remotas do globo não tocadas pelo Evangelho. Nosso alvo:Todas as nações, todas as cidades, todos os dias O Ministério JoyceMeyer é transmitido em mais de 370 estações de rádio e 350 canais detelevisão ao redor do mundo. Sem dúvida, estes são os mais efetivosmeios de comunicação do Evangelho que nós temos à nossadisposição. 11Segundo alguns estudiosos, a principal relação entre os evangélicos e a mídiaconsiste em quatro fatores principais: 1) o surgimento da IURD na década de 1980 eposteriormente sua compra da Rede Record de Televisão, a terceira maior emissorade canal aberto no Brasil, doravante liderada por um segmento neopentecostal; 2) Apresença da bancada evangélica na constituinte de 1988 e o crescimento de políticosevangélicos no país, tomando o mundo evangélico mais forte e atuante no sistemagovernante do país; 4) O declínio numérico do catolicismo na sociedade brasileira,como também, a pouca relação comercial com as emissoras não religiosas na concessãode programas televisivos; 5) Muitas emissoras de televisão abrem espaço em horáriosnobres aos tele-evangelistas, devido ao fato de seus telespectadores seremextremamente fiéis, resultando em um considerável índice de audiência, queproporciona bons lucros através dos comerciais divulgados, por exemplo: a TVBandeirantes tirou Gilberto Barros que apresenta o “Boa Noite Brasil” do horárionobre, colocando o programa da Igreja Internacional da Graça de Deus denominado“Show da Fé”. Na época, muitos críticos da comunicação social questionaram amudança na grade da Band, em função do programa Boa Noite Brasil serdiversificado, atrativo e de qualidade comprovada. No entanto, economicamente oMissionário R.R Soares emplacou maiores resultados e lucros para a emissora11 http://www.joycemeyer.com.br/index_dinamico.php?pagina=noticia&ref=101.52Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408paulista, sendo convidado a assumir definitivamente o horário por alguns <strong>ano</strong>s(contrato) 12 .Pioneirismo em comunicação religiosaPesquisas históricas levantam os seguintes dados dentro do referencialcampo religioso e sua relação com a mídia: 1940: surgiram no Brasil os primeiros programas evangélicos no rádio,sendo a Igreja Adventista do Sétimo Dia a pioneira neste trabalho anível nacional, através da implantação do Sistema Adventista deComunicação (SISAC) transmitindo o programa A Voz da Profecia comdireção do Pr. Roberto Rabello 13 . As Igrejas Luteranas foram mais tímidas nesta área, não organizando(1940 - 1950) nenhum órgão nacional de comunicação social na época,principalmente no que se refere à evangelização via rádio. Algumasiniciativas vinham surgindo nas próprias comunidades quetransmitiram os programas A hora luterana ou A hora evangélica comoparte da programação das rádios comunitárias (geralmente nascidades de colonização alemã). Já entre os Presbiteri<strong>ano</strong>s, Metodistas eBatistas ocorreu algo semelhante ao Luteranismo, porém, possuíamvínculos com entidades americanas, as quais impulsionaram estasdenominações religiosas a organizarem mais rapidamente umdepartamento de comunicação social. Percebe-se que o conceito12 www.pucsp.br/rever/rvl 2005/p santana.pdf. Longuni Neto. O novo rosto da missão, p. 17-30. P.Frestons. Protestantes e política no Brasil. p. 27-68. Andrade Luther King. Religião e mercado: amídia empresarial-religiosa. Revista de estudos da Religião PUC-SP. p. 54-60.13 http://www.sisac.org. br / http://www.novotempo.org.br/index.asp?Conteudo=sisac.htm. H.Assmann. A Igreja Eletrônica. p. 14-33.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 53


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408americ<strong>ano</strong> de comunicação religiosa sempre conduziu algumasdenominações protestantes a trilharem nos caminhos da mídia 14 . No pentecostalismo, o interesse pela mídia partiu da Igreja EvangélicaAssembléia de Deus com o programa Minutos com Jesus, entre outros.Em seguida, surgiu a Igreja do Evangelho Quadrangular, O Brasilpara Cristo e a Igreja Deus é Amor, veiculando programas de rádioem todo território nacional 15 . Algumas organizações evangélicas internacionais fundaramcomunidades evangélicas no Brasil através da difusão de programasde rádio. Na década de 50, o missionário canadense Robert McAlistertransmitia o programa A voz da Nova Vida, que na década de 1960originou a Igreja Nova Vida Conseqüentemente, evangelistasbrasileiros interessados e cativados pela eficácia da comunicaçãoreligiosa norte-americana no país, iniciaram campanhas paraintroduzir novos meios evangelísticos de comunicação social. Na década de 60, os primeiros programas religiosos começaram ainvadir a televisão, sendo o SISAC novamente pioneiro, cobrindoalgumas cidades dos estados paulista e carioca. Não ficando para trásdos Adventistas, o missionário McAlister da Igreja Nova Vida iniciouo primeiro programa pentecostal na TV Tupi do Rio de Janeiro.Posteriormente, explodiu a nível nacional o marco fundamental da14 http://www.juratel.com.br/


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408comunicação religiosa: Alguém ama você, de Rex Humbard, Clube 700de Pat Robertson, e os cultos do Pastor Jimmy Swaggart, transmitidospara todo Brasil com divulgações sobre novas tendências teológicas eideológicas destes líderes, caracterizados pelo seu carisma frente amultidões e pelas técnicas inéditas de comunicação, como a benção nocopo de água via televisão 16 .Contudo, tais programas não surtiram o mesmo efeito que tinham nosEstados Unidos, ou seja, não tiveram aqui o poder de mobilização e pressão queexerciam entre os norte-americ<strong>ano</strong>s, porque eram produzidos em outra cultura, comoutra perspectiva de vida, totalmente diferente da dos brasileiros. Esses programasduraram até meados da década de 80, quando a produção nacional de televisãocresceu e tomou-se independente da produção estrangeira 17 .16 Id. Ibid.17 Andrade Luther King. Religião e mercado: a mídia empresarial-religiosa. Revista de estudos daReligião - PUC-SP. p. 54-65. Os dados a seguir foram extraídos dos seguintes sites:Http://www.rpc.org.br/quem_somos. Http://www.puc.be/rever/rv1-2005/p_santana.pdf.http://www.presbiteriana.org.br. Http://www.ieclb.org.br/comunicacao_multimidia.htm.Http://www.rcc.org.br/te1ecomunicação. Http://www.joicemeyer.com.br.Http://www.ielb.org.br/comunicação.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 55


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408ReferênciasFR<strong>EST</strong>ON, P. Protestantismo e política no Brasil. Tese de doutorado em Ciências Sociais.Campinas: UNlCAMP, 1993.LONGUINI, Neto. O novo rosto da missão: os movimentos ecumênico e evangelical noprotestantismo latino-americ<strong>ano</strong>. Viçosa: Ultimato, 2002.SANTANA, Luther King de Andrade. Religião e Mercado: A Mídia EmpresarialReligiosa.Revista de estudos da Religião (REVER) N° 1/ p. 54-67. São Paulo: PUC, 2005.MARTINO@ Mídia e poder simbólico. São Paulo: Paulus, 20<strong>03</strong>.ORO, Ari Pedro. Igreja Universal do Reino de Deus: os novos conquistadores da fé. São Paulo:Paulus, 20<strong>03</strong>.ORO, Ari Pedro. Religiões Pentecostais e meios de comunicação de massa no Sul do Brasil.Revista eclesiástica brasileira, 50, 198, junho, p. 3<strong>04</strong>-334.PIERUCCI, A & PRANDI, R. A realidade social das religiões no Brasil. São Paulo: HUCITEC,1996.GONÇALVES, Antônio. Comunicação e Religião. São Paulo: Ultimato, 2002.Sites:http://www.ibope.com.brhttp://www.novotempo.org.br/index.asp?Conteudo=sisac.htmhttp://www.juratel.com.br/q_somos.htmlhttp://www.cepa.org.br/programas l.phphttp://www.universal.org.brhttp://www.cepa.org.br/programas1.phphttp://www.sar<strong>ano</strong>ssaterra.com.br/obj/Portal_Nacional/a _igreja.asp?id=532http://www.joycemeyer.com.br/index_dinamico.php?pagina=noticia&ref=10156Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Midiatização da Igreja Evangélica de Confissão Luterana noBrasil por meio do Jornal Evangélico: Aspectos HistóricosPor Ricardo Zimmermann Fiegenbaum *Resumo:O processo de midiatização da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB)através do seu Jornal Evangélico (Jorev) é marcado por conflitualidades inerentes às lógicasque presidem os campos midiático e religioso. Destaco a peculiaridade desta midiatizaçãoque ocorre no interior do campo religioso, o processo histórico que culminou com aestratégia da IECLB de constituir um jornal para realizar seus objetivos interacionais e agênese do Jorev. Finalmente, aponto para as tensões de campos ao longo da existência dojornal, a partir de cartas, relatórios e atas produzidas no interior do campo religioso.Portanto, neste artigo busco analisar o processo histórico pelo qual o Jorev se constituiucomo dispositivo de comunicação da IECLB, configurando uma relação tensa entre campos,mas também sendo implicado nos embates internos do corpo social do campo religioso porreconhecimento e poder.Palavras-chave:Midiatização – mídia – campos sociais – Jornal Evangélico - IECLBIntroduçãoPara começo de conversa, peço licença ao leitor e à leitora para fazer-lhesuma dupla advertência em relação ao artigo aqui apresentado. A primeira é sobre olugar de onde falo. A segunda, da finalidade do texto. Em relação à temática destapublicação – Religião e Mídia – eu me encontro na outra margem – Mídia e Religião.Isso significa dizer que, ao inverter a ordem dos termos não estou fazendo apenasum jogo de palavras, mas, fundamentalmente, explicitando um lugar de ondeobservo o fenômeno de interação destes dois campos sociais. Portanto, estouinteressado mais nos aspectos comunicacionais do que religiosos, embora a* Teólogo, Jornalista, Mestre em Comunicação Social e doutorando em Comunicação Social pelaUnisinos.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 57


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408abordagem seja fundamentalmente das suas interfaces. A segunda advertência ésobre a finalidade do texto. Originalmente ele foi escrito como terceiro capítulo daminha dissertação de mestrado em Ciências da Comunicação 1 . Logo, ele se constituinum lugar de passagem de uma reflexão teórico-metodológica sobre midiatização dareligião para uma análise empírica das conflitualidades de campos – campomidiático e campo religioso – manifestadas nos discursos midiáticos. Assim, nesteartigo, a base teórica dos conceitos utilizados, entre os quais campos sociais, camporeligioso, campo dos mídias e midiatização, está pressuposta, sendo referida apenas ena medida em a análise requeira a sua alusão.Colocadas as advertências acima, o objetivo principal deste artigo, ou seja,analisar o processo de midiatização da IECLB, de acordo com as suas especificidadese nos seus aspectos históricos, fica devidamente contextualizado. Para alcançar esteobjetivo, realizo quatro movimentos distintos. Na primeira parte, busco caracterizarteoricamente a natureza da midiatização da IECLB. Por se tratar de uma midiatizaçãomuito peculiar, configurada como um processo que ocorre dentro do camporeligioso, esta abordagem deve apontar para novas questões na relação entre mídia ereligião. Na segunda parte, a problemática da midiatização da IECLB é abordada nosseus aspectos históricos, ou seja, abordo, do ponto de vista da história damidiatização da igreja, alguns aspectos que culminam com a estratégia da IECLB deconstituir um jornal para realizar seus objetivos interacionais. Esta parte desencadeiaa fusão dos dois principais jornais regionais. O processo genealógico de surgimentodo Jornal Evangélico a partir da fusão dos jornais regionais é analisado, ainda numaperspectiva histórica, na terceira parte. Em outras palavras, busco recuperar oprocesso pelo qual o Jornal Evangélico se constituiu como dispositivo decomunicação da IECLB, trazendo consigo as conflitualidades do próprio camporeligioso nos embates internos do seu corpo social por reconhecimento e poder e nasquais o jornal também se viu implicado. Por fim, situo o problema da conflitualidade1 Midiatização do campo religioso e processos de produção de sentidos. Análise de um conflitoanunciado – O caso do Jornal Evangélico da IECLB. Unisinos: PPG Ciências da Comunicação,março de 2006.58Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408ao longo da existência do jornal, a partir dos <strong>ano</strong>s de 1970 até o final dos <strong>ano</strong>s de1990, apontando para as tensões dessa relação de campos, recuperadas em cartas,relatórios e atas produzidas no interior do campo religioso. Nelas encontroreferências explícitas desta problemática de conflito que ocorre no processo demidiatização da IECLB por meio de seu Jornal Evangélico.Essas caracterizações devem apontar para aspectos dessa relação de camposque se configura dentro do campo religioso, apontando para a origem e amanifestação de conflitualidades inerentes aos campos em questão e entre os camposimplicados neste processo. Eis aí, também, o problema que serve de horizonte paraesta análise: o de que o processo de midiatização da IECLB por meio do JornalEvangélico é atravessado por conflitualidades e tensões produzidas pelas diferenteslógicas que configuram e caracterizam cada campo social e pelas quais ambosbuscam afirmar autonomia em relação ao outro.1. Natureza da midiatização da IECLBO processo de racionalização e fragmentação dos diversos domínios daexperiência, que resultou nos campos sociais, trouxe consigo a necessidade social deespecialização discursiva da sociedade. O desenvolvimento de novas tecnologias decomunicação e informação fundou novas formas de interação social no tempo e noespaço e fez surgir o campo dos mídias. Como o bem específico do campo dos mídiasé a palavra/discurso, ele assumiu um papel central de mediação na sociedade,desempenhando funções essencialmente de ordem simbólica. Assim, ao campo dosmídias é atribuído pela modernidade a função genérica de regulação de todos osoutros campos sociais, por meio da sua competência específica sobre o domínio dalinguagem. A sua função mediadora garante a abertura dos campos sociais aoexterior, de modo que possam relacionar-se uns com os outros. “Esse processo deconsolidação da legitimidade do campo dos mídias consiste no reconhecimento daDisponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 59


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408competência própria do campo para selecionar e distribuir a informação a uma escalaalargada no tecido social, conferindo, portanto, aos discursos um caráter público” 2 . Ocampo dos mídias é, assim, uma instância de mediação social e sua legitimidade lhe éconferida pelos restantes campos sociais por delegação.O campo dos mídias desempenha diversas funções para promover ainteração dos demais campos sociais, das quais as principais são a de organização dasociedade, de articulação dos outros campos sociais entre si e de exposição doscampos sociais na esfera pública. Contudo, o exercício desse papel central nasociedade pelo campo dos mídias ocorre sob certas tensões, conflitualidades,convergências e divergências de campos. O campo dos mídias funciona assimtambém como um espaço de negociação e de gestão de conflitos. Ao mesmo tempoem que os demais campos sociais delegam ao campo dos mídias a sua legitimidadepara atuar discursivamente sobre os demais domínios da experiência, também oacolhem com desconfiança, porque o discurso midiático dessacraliza o discurso dosdemais campos e o naturaliza 3 . Além disso, os outros campos sociais desejamcontrolar o campo midiático, e este interfere no funcionamento daqueles. A presençacentral do campo dos mídias como mediador do processo pelo qual a sociedade éorganizada, os campos sociais alcançam a sua visibilidade pública e ocorre ainteração dos campos, com o concurso de dispositivos tecnológicos, é que tem sidochamado de midiatização.A midiatização, portanto, em geral se caracteriza por conflitualidades,primeiro, porque os próprios campos sociais são marcados por concorrencialidadesde ordem interna – é a definição dos objetos de disputa e os interesses específicos deum campo e pessoas dispostas a jogar o jogo que define um campo –, mas tambémem relação com os demais campos sociais – os campos sociais procuram impor aosoutros campos sociais os seus quadros próprios de sentido de acordo com o seu2 <strong>EST</strong>EVES, João Pissarra. A ética da comunicação e os media modernos. Legitimidade e poder nassociedades complexas, 1998, p. 148.3 RODRIGUES, Adri<strong>ano</strong> Duarte. Estratégias da comunicação, 1997, p. 152-160.60Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408domínio da experiência. Segundo, porque a mediação simbólica exercida pelo campodos mídias por meio de sua competência discursiva submete todos os demaisdiscursos dos campos sociais aos regramentos discursivos do campo midiático. E issonão é de fácil resolução porque quanto mais esotérico – sacralizado – o discurso deum campo, mais difícil será para o campo submeter-se à lógica discursiva midiática.É nesse sentido, portanto, que se operam as tensões e conflitualidades de campo nasociedade por meio da mídia.Esta problemática tem sido abordada no contexto geral da sociedade,considerando os processos midiáticos de presença dos campos sociais nos meios decomunicação de massa. O próprio campo religioso tem, mais e mais, se submetido aesta lógica, sendo de tal forma afetado por ela, que muitos estudos do fenômeno demidiatização do religioso têm se ocupado de investigar que religião emerge docampo midiático 4 . Meu interesse, no entanto, está em analisar essa problemática demidiatização do campo religioso dentro do próprio campo religioso, ou seja, abordaro processo pelo qual o campo religioso institui um dispositivo midiático para realizaros processos de interação entre uma determinada instituição religiosa e seuspúblicos. Portanto, está em analisar o processo de midiatização da Igreja Evangélicade Confissão Luterana no Brasil (IECLB) por meio do Jornal Evangélico. Trata-se deuma problemática mais complexa, uma problemática de mídia no interior de umcampo que a institui como dispositivo e que, por causa dessa complexidade, deixatransparecer as suas conflitualidades. As lógicas, as culturas, os protocolos quecaracterizam a comunicação estão, assim, alocados no interior do campo religioso,sendo afetados por ele e os afetando. Ou seja, por estar no interior do camporeligioso e tendo sido instituído por ele, o dispositivo midiático não apaga ascomplexidades das suas lógicas. Antes, por serem lógicas singulares ao campo dosmídias, passam a se fazer presentes dentro do campo religioso e, assim,problematizam essa relação.4 HOOVER, Stewart M. & LUNDBY, Knut. (org.) Rethinking media, religion, and culture, 1997.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 61


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Isso implica dizer que são os dispositivos midiáticos que,preponderantemente, instituem e refletem as lógicas do campo midiático, e não ocontrário, e que, o fato de estar subordinado às lógicas do campo religioso não alteraa lógica de funcionamento do dispositivo. Em outras palavras, o campo midiáticomantém as suas lógicas de funcionamento ainda que se encontre no interior de umcampo social determinado. Neste sentido, mantêm-se as conflitualidades, as lutas eas tensões inerentes ao campo 5 , no caso o campo religioso, e agregam-se a elas asconflitualidades e disputas inerentes ao processo de midiatização que ocorre nointerior deste mesmo campo. Trata-se de um processo de midiatização específico,que reflete uma dinâmica de midiatização da sociedade para dentro do camporeligioso, mas que acontece exclusivamente no interior do campo social da religião eé restrita a ele. Esta é a dinâmica do processo de midiatização da IECLB por meio doJornal Evangélico.No caso da relação entre a IECLB e o Jornal Evangélico, os embates envolvemestratégias sócio-discursivas, ou seja, refletem tensões e disputas de práticas sociais ede discurso. As práticas sociais estão relacionadas a políticas de estruturação efinanciamento do dispositivo midiático dentro do campo religioso. As práticasdiscursivas, com os embates que se travam em torno das discursividades próprias decada campo implicado.Se no processo secular de midiatização as estratégias sociais implicam numfuncionamento do campo midiático segundo processos de produção de umaindústria cultural, inserida num mercado de bens simbólicos, onde oferta e demandase regulam mutuamente, no caso do Jornal Evangélico esta equação é modificadasegundo a especificidade da sua relação com o campo religioso. Exemplo disso são asgestões em torno do processo de criação do Jornal Evangélico a partir da fusão dedois jornais regionais, um de Santa Catarina e outro do Rio Grande do Sul, para darconta da sua sustentabilidade e da localização da sua sede.5 BOURDIEU, Pierre. Questões de Sociologia, 1983.62Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Não chegamos à unanimidade quanto à sede do DepartamentoJornalístico. Considerou-se conveniente tê-lo perto dos dois jornaissupramencionados. Por outro lado foram também destacadas asvantagens de este Departamento estar perto da sede da Igreja. Eudefendi este ponto de vista, mas houve muita resistência por parte doscatarinenses, que argumentaram dizendo que seria necessária adistância geográfica para evitar que a cúpula da IECLB tenha demaisinfluência na seleção e formulação de notícias a serem expedidas pelo‘Pressedienst’, portanto, para garantir uma relativa liberdade deexpressão que não seria possível na Rua Senhor dos Passos (sede daIgreja em Porto Alegre), segundo afirmação de alguns colegas. (carta dopastor Hasenack à Presidência da IECLB sobre a criação doDepartamento de Jornalismo, em 22/09/1970).O comentário coloca em questão a autonomia do Jornal em relação à Igrejaque o institui. Chega-se ao ponto de reivindicar distância da cúpula, por entenderque esta teria influência demasiada sobre o serviço de notícias do jornal, e isso seriaum tolhimento à liberdade de expressão. Essa preocupação procura demarcar oespaço de atuação do campo midiático em relação ao campo religioso, estabelecendoas fronteiras do que seria uma relação adequada. O aspecto político-geográfico darelação entre o jornal e a igreja poderia interferir no campo midiático, na suacompetência discursiva. O aspecto econômico dessa relação fica explicitado em outracarta na qual se propõe a fusão dos jornais e se defende a sustentabilidade,mostrando o orçamento. “Os jornais fusionados garantem realmente a subsistência deum redator com tempo integral. Essa garantia se baseia no seguinte orçamento”(Carta do pastor Hilmar Kannenberg, presidente do Conselho de ImprensaProvisório, ao Conselho Diretor da IECLB, em 10/12/1970). E acrescenta ao final asugestão de dois nomes para assumirem essa função de redator, sendo ambospastores, ou seja, membros do corpo social que forma o campo religioso, embora comreconhecido conhecimento da prática jornalística. A criação de um jornal, portanto,implica na gestão de aspectos econômicos, estruturais e sociais que, de certo modo,interferem na prática discursiva.Outra problemática de relação de campo que aparece nesse processoparticular de midiatização é a presença de especialistas de outros campos, estranhosDisponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 63


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408ao campo midiático. As tensões de campo tendem a crescer na medida em que ojornal passa a ser redigido por especialistas do campo midiático. Isso o própriopastor presidente da IECLB, aponta em conversa com o Conselho de Imprensa, emreunião de maio de 1974: “Com a organização de um serviço de imprensa por parteda Igreja, com profissionais, estabelece-se, de imediato, um dilema: os profissionaisquerem trabalhar com critérios a eles inerentes e a igreja pretende ver o seu interesserefletido neste trabalho. É natural que com isso surjam atritos e discussões”. (Pastorpresidente da IECLB, Karl Gottshald, em ata da reunião do Conselho de Imprensa, 18e 19 de maio de 1974). Como se pode observar, a autoridade máxima da Igrejareconhece os conflitos que advêm da relação entre o corpo social midiático e o corporeligioso, ou, dito de outro modo, entre o discurso midiático e o discurso religioso.No entanto, nem tudo é conflito. Há espaços para negociações e concessões.Na mesma reunião do Conselho de Imprensa em que o pastor presidente e, por causadesta função, também diretor do Jornal Evangélico, aborda questões de relação entreo campo midiático e a igreja, o Conselho decide enviar correspondência ao ConselhoDiretor da Igreja, “solicitando que o mesmo faça um pronunciamento mensal noJornal Evangélico” (ata da reunião do Conselho de Imprensa, 18 e 19 de maio de1974, Diversos 1.), porque a “IECLB pouco aproveita dos meios de comunicaçãoexistentes” (idem, item 8). É uma medida no mínimo estranha, porque sendo o jornalinstituído e de propriedade da igreja, em princípio não seria necessário cobrar dela,igreja, a sua presença no noticiário do jornal. Portanto, mesmo ao criar o seu própriodispositivo midiático para realizar a interação com seus públicos, a igreja, comocorpo institucional diretivo, não se vale deles como poderia para consecução de suasestratégias. Surgem aí duas questões: Por que a direção da igreja não faz uso de seujornal para realizar as suas estratégias de interação? E se a igreja não o faz, quem fazuso do jornal, a quem o jornal serve?A resposta a estas questões está na relação de campos implicada no interiordo campo religioso. A igreja não faz uso de seu jornal porque entende que, sendo o64Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408jornal um dispositivo constituído por ela para esta finalidade, esse uso estratégicoestá implícito. No entanto, o campo midiático atua segundo suas próprias lógicas enele estão implícitos outros valores e regras que divergem dos valores e regras docampo religioso. Por esta razão, o jornal não se sujeita sem constrangimentos à lógicado campo religioso. E aí já se encontra o que pode ser uma resposta à segundaquestão. O jornal serve a seus próprios princípios, segundo as lógicas de produção,circulação e recepção de mensagens, definidas por valores notícias próprios docampo midiático.Embora exista uma relação institucional direta do jornal com a igreja – é aIECLB que institui o Jornal Evangélico como seu dispositivo midiático para realizaras suas estratégias de interação com seu público – o jornal opera segundo suaspróprias lógicas que são divergentes das lógicas do campo religioso. Esse processoatravés do qual a igreja instituiu uma mídia para realizar sua estratégia decomunicação se caracteriza como um processo de midiatização do campo religioso.No entanto, ele guarda certas especificidades em relação a outros processos demiditização das religiosidades. Uma destas características específicas consiste deuma possibilidade maior de controle do campo midiático pelo campo religioso.Ainda que o dispositivo midiático mantenha suas características de campo, suaatuação, no caso específico, tende a restringir-se ao universo simbólico do campo queo instituiu, organizando e articulando as relações dentro deste campo. Exemplo dissosão os editoriais que se valem de argumentos e jargões teológicos próprios do camporeligioso, mas também a presença de muitas práticas discursivas no jornal que nãosão propriamente do campo midiático, como as meditações.Essa especificidade do processo de midiatização em questão, que submete alógica de um campo (midiático) a outro (religioso) tende a, no máximo de controle, adiluir os diferendos e, no extremo oposto, onde o controle é mínimo, exacerbar asdiferenças provocando tensões e conflitos irreconciliáveis. Mesmo assim, asconflitualidades e embates estratégicos que se configuram entre os agentes do campoDisponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 65


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408religioso e do campo midiático nesse processo de midiatização religiosa operadodentro do campo religioso refletem os embates processados na midiatização emgeral. Ou seja, o que acontece na interação entre a IECLB, como entidadeadministrativa, seus membros e o Jornal Evangélico nesse processo particular demidiatização é, em última análise, aquilo que acontece no mundo secularizado, ouseja, o Jornal Evangélico cumprirá tanto mais a sua função mediadora quanto maisexercer a competência discursiva que lhe é própria. Contudo, isso não se opera semtensões e embates com o campo religioso.Mas há também outros embates presentes no processo de midiatização daIgreja Evangélica de Confissão Luterana que resultam, sobretudo, da tentativa deapagamento das diferenças regionais, como abordo a seguir. Na fusão de dois jornaisregionais em favor de um jornal nacional, fundem-se, na verdade, dois processos demidiatização, que não se reconciliam no novo jornal e tendem, na verdade, aradicalizar as suas posições. Parte das tensões que atravessam o Jornal Evangélicoresulta das divergências oriundas do interior do próprio campo religioso, na luta queos seus agentes travam pelo poder.2 Aspectos históricos da midiatização da IECLB por meio do Jorev -antecedentesA imprensa evangélica no Brasil surgiu na segunda metade do século XIX.Seu desenvolvimento acompanhou o desenvolvimento das comunidadeseclesiásticas, refletindo problemáticas inerentes à origem germânica da igrejaluterana, às lutas pela hegemonia teológica e pastoral dentro do campo religioso, àsnovas questões que se colocam para a IECLB pelas novas religiosidades e ao papel damidiatização da religião na sociedade brasileira nesta virada de milênio. Neste tópicovou abordar a história do processo pelo qual a IECLB, desde as suas primeiras66Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408comunidades, constituiu a sua relação com a mídia 6 , particularmente, com ojornalismo, e que culminou com o surgimento do Jornal Evangélico, no <strong>ano</strong> de 1971.Abro com uma breve contextualização sobre o surgimento da igreja luterana noBrasil, para que o processo de midiatização fique ancorado na história do camporeligioso em questão.A criação da IECLB remonta ao final da Segunda Guerra, quando opresidente do Sínodo Riograndense, pastor Hermann G. Dohms, em relatório à 45ªAssembléia Sinodal, realizada em 1946, “solicitou aos presentes que aprovassem acriação de uma Igreja Evangélica no Brasil, visto que havia uma expectativa por partedos demais sínodos nesta direção. O alvo era a criação de uma igreja evangélicoluteran<strong>ano</strong> Brasil” 7 . Havia, à época quatro unidades eclesiais, denominadas sínodos,que abrangiam juntas, a região Sul e Sudeste do Brasil. A ênfase na confessionalidadeluterana, de acordo com Tessmann, tinha a ver com duas questões: ser uma espéciede reação aos equívocos da teologia étnica do nacional-socialismo (que se fez sentirentre alguns líderes e pastores das comunidades alemãs 8 ) e possibilitar um trabalhoconjunto com o Sínodo Evangélico Luter<strong>ano</strong> de Santa Catarina, Paraná e outrosEstados da América do Sul, de base acentuadamente luterana.O termo “evangélica” caracterizava a igreja organizada e desenvolvida nostrês sínodos de orientação teológica unida. “Evangélico era o termo usado paradescrever a união das forças para a realização das tarefas pastorais e missionárias, oque geralmente intitula-se postura teológico-confessional unida” 9 , das IgrejasUnidas, Reformadas e Luteranas, como também ocorria nas igrejas mães na6 A esse processo tenho me referido nos termos de uma midiatização ainda que o conceito estejaassociado a fenômenos mais contemporâneos e complexos de interação entre os campos sociais e ocampo dos mídias. Entendo, porém, que há níveis de midiatização, desde o mais simples e difuso,como os primeiros jornais da igreja, até o mais complexo e estrito, como os fenômenos pelos quaisa religião já nasce midiatizada, caso da IURD, por exemplo.7 TESSMANN, Mário Francisco. Alguns apontamentos para discussão sobre confessionalidadeLuterana, 2001, p. 50.8 Na sua obra Igreja e Germanidade, Martin Dreher (1984) aborda em detalhes esta questão. Vejaespecialmente o capítulo 7, p. 126 a 176.9 FLUCK, Marlon. A confessionalidade dos egressos dos centros de formação teológica localizadosem Basiléia, 2001 p. 27.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 67


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Alemanha. Essa postura foi responsável pela implantação no Brasil de um tipo‘suave’ de luteranismo, marcadamente ‘evangélico’, que qualificou e ainda qualifica amaioria das comunidades e escolas da IECLB nos estados do Rio Grande do Sul e deSanta Catarina.Assim, logo após a Segunda Guerra, iniciaram-se as tratativas para a criaçãode uma Federação de Sínodos, que afinal foi constituída em 1950. Em 1954, nosegundo Concílio, os membros da assembléia decidiram alterar o nome paraFederação Sinodal Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil. No quartoConcílio Geral, em 1962, os representantes dos Sínodos votaram pela supressão dotermo original Federação Sinodal o que culminou com a fusão dos sínodos em umcorpo eclesiástico único, constituindo assim, a 25 de outubro de 1968, a IECLB 10 .Cinco <strong>ano</strong>s antes, porém, os dois sínodos estabelecidos em Santa Catarina e Paraná jáhaviam se tornado uma unidade. Do ponto de vista administrativo, a Igreja Luteranadeixava para trás a divisão em sínodos e se constituía em quatro regiões eclesiásticas,sob a direção de pastores regionais.A igreja que surgia da união dos sínodos, embora seguidora da reformaalemã de Martim Lutero, não cultivava um luteranismo confessional, mas umcristianismo confessional, visto que entre seus membros havia pessoas, ainda que emmenor número, que cresceram com a tradição reformada 11 . A IECLB fundamentava asua confessionalidade na Confissão de Augsburgo e no Catecismo Menor de MartimLutero, e afirmava o seu pertencimento à família das Igrejas que se orientam pelaReforma de Martim Lutero. De acordo com Joachim Fischer 12 , a criação da FederaçãoSinodal, mais tarde denominada de IECLB, também fazia chegar ao fim o tempo emque os quatro sínodos de origem alemã no Brasil se entenderam como igrejas alemãs.“Houve uma redefinição de sua identidade e uma profunda reorientação de seu10 DREHER, Martin. Igreja e Germanidade, 1986, p. 18.11 TESSMANN, op. cit., p. 50.12 FISCHER, Joachim. A origem e a influência do neo-luteranimso nas novas comunidades da IECLB,682001.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408trabalho. Acabou a identificação do ser cristão ou luter<strong>ano</strong> com o ser alemão” 13 , Esseprocesso iniciou com a política de nacionalização de 1937 e <strong>ano</strong>s seguintes no Brasil ea Segunda Guerra Mundial.Neste período, os dois principais sínodos, o gaúcho e o catarinense,mantiveram seus órgãos de imprensa oficiais, com características peculiares a cadaum, os quais vieram a fundir-se no projeto estratégico da igreja de publicar um jornalnacional que pudesse ser a voz da igreja para as comunidades.Quando da criação do Jornal Evangélico, portanto, no início dos <strong>ano</strong>s 70,estava em jogo na IECLB, a articulação da igreja em torno de uma unidade estrutural,a qual requeria uma centralização discursiva. O Jorev era a materialização do desejoda igreja de que, por meio de um jornal, se viesse a constituir os vínculos, quecongregariam numa só família leitores de todas as comunidades. Além disso, o jornaldeveria atuar no fortalecimento da unidade da igreja e conquistar simpatizantes fora doâmbito da própria igreja.A criação de um jornal eclesiástico de abrangência nacional com a finalidadede promover vínculo, unidade e conquista surge no contexto de uma nova realidadeeclesial. A lógica é que a constituição de uma unidade eclesial centralizada, com aformação da IECLB, em 1968, exigiria uma nova estratégia de comunicação,adequada à necessidade de consolidação desta nova estrutura de igreja. Contudo,como no processo de constituição da IECLB, também a criação do Jornal Evangélicorespeita um procedimento de transição, que implica em preparação dos leitores e dasleitoras para um novo mídia, ainda mais porque o jornal que surge é o resultado deuma fusão de, inicialmente, dois jornais sinodais, expressando, assim, uma idéia decontinuidade e vínculo com uma tradição de imprensa evangélica que remonta aofinal do século XIX.13 FISCHER, op. cit. p. 14.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 69


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 64082.1 Os primeiros jornais protestantes no BrasilEmbora a presença evangélica no Brasil deu-se originariamente por causa daimigração alemã e suíça, o primeiro jornal protestante no país deve sua origem àpresença de missionários protestantes da Igreja Presbiteriana Norte Americana, emSão Paulo. O primeiro jornal evangélico do Brasil e da América do Sul chamava-seImprensa Evangélica e foi fundado em 1864, em São Paulo, por um grupo de pastorespresbiteri<strong>ano</strong>s e literatos com o objetivo expresso de difundir os ensinamentosbíblicos da religião cristã 14 .No Sul do Brasil, contudo, os jornais protestantes não foram, em princípio,eclesiais 15 , provavelmente porque não havia, ao tempo de seu surgimento, umaunidade eclesiástica que congregasse as dispersas e autônomas comunidadesevangélicas. Os primeiros jornais publicados para os imigrantes teutos no RioGrande do Sul datam de 1836 e têm como característica serem empreendimentospessoais com ênfase no político 16 . Foi justamente um jornal político que,indiretamente, contribuiu para o surgimento do primeiro jornal evangélico no Sul doBrasil. Trata-se do Deutsche Zeitung (Jornal Alemão), que circulou de 1861 a 1917,administrado por comerciantes porto-alegrenses e redigido por Carlos von Koseritz,que, em 1881, fundaria seu próprio jornal (Koseritz’ Deutsche Zeitung) e o dirigiria até14 Especial Ultimato 33 <strong>ano</strong>s. In: Revista Ultimato nº 268, Jan/fev/2001.15 Considero “eclesial” o jornal instituído no âmbito da igreja com finalidade de servirexclusivamente aos interesses da igreja.16 A classificação do que seja um jornal político em língua alemã não é simples, segundo René E. Gertz(20<strong>04</strong>: 102). Jornais como o Jornal Evangélico Luter<strong>ano</strong> (antigo Sonntagsblatt) e o Sankt Paulus Blatt,órgão de uma organização sócio-econômico religiosa católica denominada de União Popular,apresentavam em seus conteúdos “temas que, sem sombra de dúvida, eram nitidamente políticos,pois, ao defender os interesses econômicos, sociais e religiosos da população teuto-católica (eprotestante de outro lado) gaúcha, defendia, por definição, questões que, no mínimo envolviamvariáveis políticas” (ib idem: 102). É por esta razão que optamos por defini-los como jornais comênfase no político, distinguindo-os de outras publicações, que, muito embora também abordassemquestões políticas, tinham sua ênfase em outras áreas como a religião, a educação, a agricultura, aeconomia, etc.70Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 64081890 17 . É este jornal e seu editor que, indiretamente, vai desencadear o processo demidiatização da igreja evangélica de origem alemã no Brasil.O Deutsche Zeitung encontraria em São Leopoldo, a partir de 1867, o seuprincipal adversário. Fundado e editado por Julius Curtius Filho, o jornal Der Bote.Amtliches Blatt für St. Leopoldo und die Colonien (O Mensageiro. Folha oficial para SãoLeopoldo e as colônias) caracterizava-se pela oposição ao Deutsche Zeitung. “Tinha,porém, em comum com o jornal dirigido por Carlos von Koseritz o fato de seranticlerical e combater, igualmente, o Deutsches Volksblatt (Folha do Povo Alemão),fundado por sacerdotes jesuítas, em 1871” 18 . O jornal dos jesuítas, também publicadoem São Leopoldo, combatia o jornal de Koseritz que atacava a igreja católica 19 . Ouseja, a razão para que os teuto-evangélicos publicassem um jornal, ainda que nãofosse um jornal eclesial, era a defesa dos interesses evangélicos, pugnando umaestratégia no campo dos mídias, contra o clericalismo católico e o ateísmomaterialista.Carlos von Koseritz 20 (1831-1890) foi o redator do Deutsche Zeitung. Escreveuprimeiro em favor do protestantismo, porque via nele um baluarte para conservarentre os germânicos os valores da cultura germânica 21 . Além disso, Koseritz via noprotestantismo um aliado na sua luta contra o clericalismo e o ultramontanismo,classificados de grandes perigos para o progresso da cultura e da civilizaçãomodernas. Contudo, já em 1870, ele escreveu que seu jornal não era um meio paradefender os interesses evangélicos, e nos <strong>ano</strong>s seguintes manifestou sempre mais asua posição anticristã, defendendo que o materialismo científico junto com a idéia de17 DREHER, Martin. A Participação do Imigrante na Imprensa Brasileira, 20<strong>04</strong>. p. 93.18 DREHER, 20<strong>04</strong>, 93.19 Enciclopédia Rio-grandense, 1968, p. 45.20 Um dos mais importantes seguidores do materialismo dos naturalistas alemães Vogt, Moleschott,Büchner, do filósofo ateu Ludwig Feuerbach e dos evolucionistas Charles Darwin e Ernest Haeckel.Era figura importante do partido liberal de então, brilhante jornalista, escritor elegante, tanto emportuguês como em alemão. Enciclopédia Riograndense , 1968, p. 72.21 Enciclopédia Riograndense, 1968, p. 72.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 71


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408evolução dos seres vivos e do universo iria substituir, em poucos decênios, qualquerforma de cristianismo.Entre o materialismo científico de Koseritz e o avanço da influência e dopoder da Igreja oficial por meio do jornal jesuíta, os evangélicos – que eram minoria enão gozavam de direitos iguais aos cidadãos católicos – viram-se obrigados adefender a sua existência. Contudo, não possuíam um jornal para isso. Então,quando o editor do Der Bote, Julius Curtius Filho, convidou o pastor Dr. WilhelmRotermund, de São Leopoldo, para redigi-lo, este viu ali a oportunidade paramelhorar a situação geral do protestantismo riograndense e passou a dar ao jornaluma orientação evangélico-luterana. Alguns meses depois, porém, Rotermund foidemitido e em 1879 o Der Bote encerrou suas atividades.Rotermund, no entanto, estava convencido de que era necessário aosevangélicos possuírem o seu próprio órgão de imprensa para defender seusinteresses. Assim, em 1880, ele passou a publicar o jornal Deutsche Post (CorreioAlemão), que até o seu fim, em 1928, foi um periódico de decidida orientaçãoevangélica embora não fosse da igreja. A oportunidade de publicar um jornalprotestante surgiu quando, em 1880, Rotermund adquiriu uma tipografia. Atipografia tinha por finalidade servir a Evangelische Buchhandlung (LivrariaEvangélica), empresa fundada por pastores e professores luter<strong>ano</strong>s e que coube aRotermund dirigir desde 1877. A partir do final da década de 1880, a livraria passariaa ser denominada de Livraria de W. Rotermund e mais tarde de Editora Rotermund e Co.A partir da tipografia e da editora, Rotermund desenvolveu um importante projetode comunicação, que incluía não só a publicação de um jornal, mas toda uma gamade materiais impressos, de literatura a cartilhas para estudantes.Da época da imigração até a Proclamação da República, os imigrantesalemães, e especialmente os de fé protestante, constituíam-se de cidadãos de segunda72Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408classe e marginalizados. De acordo com Dreher 22 , fatores tais como o pouco contatocom a população estabelecida no país por causa da instalação das povoações teutasgeralmente em regiões pouco habitadas, a mentalidade brasileira vigente de que otrabalho braçal era indigno dos homens brancos e o conceito de que o cultivo da terraera atividade apenas de escravos – os colonos alemães cultivavam a sua próprialavoura – favoreceram a marginalização das povoações teutas, muitas das quais seconstituíram em povoações etnicamente homogêneas. Aos imigrantes protestantesacrescentava-se aos fatores de marginalização o fato de professarem uma fé que, aotempo em que o Brasil fora colônia de Portugal, fora proibida de ingressar no país e,inclusive, combatida 23 .É nesse contexto que emerge o trabalho do pastor Rotermund. De pastor decomunidades a autor de livros escolares, de editor de jornal a fundador e presidentedo Sínodo Riograndense, Rotermund teve papel destacado na articulação dascomunidades protestantes teutas em torno de uma unidade eclesial evangélica noRio Grande do Sul 24 e na superação de sua marginalização. Mas ao mesmo tempo emque trabalhou pela edificação, fortalecimento e defesa dos cristãos evangélicos noBrasil, Rotermund também tinha interesse no fortalecimento e preservação dagermanidade. Era natural, portanto, que ao assumir o Deutsche Post, Rotermundfizesse dele “porta-voz dos interesses luter<strong>ano</strong>s, mas também dos interesses teutos,22 DREHER, 1986, p. 39.23 Característico dessa marginalização religiosa é o fato de que as comunidades evangélicas nãorecebiam qualquer subvenção do governo imperial, ao passo que as católicas contavam com esseapoio financeiro. Também os matrimônios evangélicos, concluídos diante de um pastor protestanteno Brasil ou no exterior eram considerados nulos e os filhos destes “concubinatos” não tinhamdireito a herdar os bens dos pais. Válidos eram apenas os matrimônios realizados por sacerdotescatólicos. Em caso de matrimônios mistos, os filhos deviam ser batizados e educados na fé católica.Os problemas dos evangélicos, porém, não terminavam nem com a morte. Os cemitérios eramtodos católicos e fechados aos evangélicos “para não profanar os campos consagrados”(Enciclopédia Riograndense, 1968: 55). Além disso, a Constituição Imperial proibia que as casas deoração de acatólicos apresentassem sinais exteriores de um templo, ou seja, que tivessem torres esinos.24 A respeito da obra de Wilhelm Rotermund e seu papel central na defesa dos interessesprotestantes, especialmente no Rio Grande do Sul, confira DREHER, Martim N. Igreja eGermanidade. São Leopoldo: Sinodal, 1984, especialmente o capítulo 6. Também veja DREHER, M.N. A participação do imigrante na imprensa brasileira. In: DREHER, RAMBO e TRAMONTINI(org.). Imigração e Imprensa. Porto Alegre: <strong>EST</strong>, 20<strong>04</strong>, p 94 e 95.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 73


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408lutando por direitos políticos, culturais e étnicos. Não raro os conceitos teuto eevangélico tornavam-se para ele sinônimos” 25 . Essa simbiose entre teuto e evangélico,ou seja, a relação em que cultura e religião se afetam mutuamente representou umafaca de dois gumes: se, inicialmente, favoreceu a conquista dos direitos evangélicosno País, também representou um problema para a consolidação de uma presençabrasileira da Igreja Luterana.O Deutsche Post deveria ter sido denominado de Deutsche Brasilianisch Post(Correio Teuto-Brasileiro), contudo, a falta de tipos impediu a composição dobrasilianisch. O jornal iniciou com duas edições semanais com cerca de 300exemplares. O seu conteúdo voltava-se para a cultura alemã e para a religião. “Atônica vai ser sempre: preservação dos valores religiosos e étnicos” 26 , o que implicaem duas frentes de lutas. Embora tentasse manter o jornal distante das querelaspolítico-partidárias, Rotermund logo percebeu que não podia ficar alheio à política.Estrategicamente, passou a apoiar os políticos que pudessem defender a sua causa,procurando manter, contudo, a eqüidistância, o que também lhe valeu a acusação deque pretendia fundar um partido protestante com o apoio dos jesuítas!Desde 1899, o jornal passou a ser editado três vezes por semana, e em 14 deagosto de 1914 tornou-se diário. No corpo do jornal havia diversos cadernosadicionais. Desde 1888, um desses cadernos era denominado de Sonntagsblatt derRiograndenser Synode (Folha Dominical do Sínodo Riograndense). A Folha Dominicalvinha atender à necessidade dos evangélicos de terem um órgão de imprensadestinado exclusivamente a assuntos religiosos e eclesiásticos. Mais tarde esta folhatornou-se propriedade do Sínodo Riograndense e seu órgão oficial, sendo publicadasemanalmente, em língua alemã, com oito páginas.A maior organização das comunidades a partir do surgimento do SínodoRiograndense, em 1886, é que exigia a publicação de um jornal eclesiástico. Neste25 DREHER, 20<strong>04</strong>, p. 95.26 Id ibidem, p. 96.74Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408sentido, o processo de midiatização dos protestantes luter<strong>ano</strong>s no Rio Grande do Sulfez um movimento de fora para dentro, ou seja, as primeiras manifestações públicaspor meio da mídia não foram em jornais eclesiais próprios, mas em publicaçõesseculares que, por lutarem contra adversários comuns, encontraram nos protestantesaliados importantes nestes embates. Aliás, a aparição dos evangélicos na mídiaresulta da necessidade de travar uma luta no interior do campo religioso. Quando aigreja se estrutura em unidades maiores que congregam diversas outras unidadesmenores, os interesses eclesiais de organização e articulação pedem uma mídia querealize esta função a partir de dentro do campo religioso. Surge assim, o jornal FolhaDominical que, em 1971 vai fundir-se com a Voz do Evangelho, jornal da igreja emSanta Catarina.Naquele estado, o primeiro jornal evangélico surgiu em junho de 1893, emBlumenau (SC), por iniciativa do pastor Hermann Faulhaber. O jornal tinha o nomede Der Urwaldsbote (O Mensageiro da Selva). Ele teve duas fases distintas: naprimeira, sob a direção de Faulhaber, “esteve exclusivamente a serviço dos interessesda igreja evangélica e da rede de escolas a ela vinculadas” 27 . Ou seja, constituía-se emórgão oficial dessas entidades, para organizá-las e articulá-las num contexto dediáspora. Em nome da Conferência de Pastores Evangélicos, Faulhaber adquiriu, em1893, a oficina tipográfica do extinto jornal Immigrant, e passou a editar o novo jornal,procurando manter-se distante das disputas políticas locais. Em 1897, o jornal passoua ser “o órgão oficial da Conferência Pastoral de Santa Catarina. Isto é, através destejornal os pastores espalhados por Santa Catarina passavam informações e mensagensaos membros das suas comunidades” 28 , visando, portanto, a oferecer formaçãoevangélica e a estabelecer vínculos entre o colégio pastoral e os membros.Um <strong>ano</strong> após, o pastor Faulhaber foi substituído na redação do DerUrwaldsbote por Eugen Fouquet, que iniciou uma nova fase no jornal. Fouquet, que27 KLUG, João. Imprensa e imigração alemã em Santa Catarina , 20<strong>04</strong>. p. 21.28 WEINGAERTNER, Nelso. Comunicação e informação na história das comunidades, abril/1995, p.8.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 75


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408ficou na redação até 1927, “imprimiu-lhe um perfil nitidamente de acordo com oscânones pangermanistas” 29 . Ele entendia que o jornal devia contribuir para evitar oabrasileiramento, sendo um veículo para a manutenção da língua, práticas, costumese tradições dos antepassados alemães. Quando Fouquet assumiu, em 1898, aConferência Pastoral vendeu-lhe o jornal, “que tornou-se, a partir de então, um jornalsecular” 30 . Em substituição, o colégio de pastores adotou o Sonntagsblatt für dieEvangelischen Gemeinden in Santa Catharina (Folha Dominical para as comunidadesevangélicas em Santa Catarina) como seu jornal oficial. A Folha iniciou suapublicação em dezembro de 1895, em Brusque (SC) tendo o pastor Wilhelm GottfriedLange como seu redator. Seu objetivo era redigir um jornal dirigido às comunidadesevangélicas. Circulou com este nome até janeiro de 1908, quando foi substituído peloChristenbote (Mensageiro Cristão), editado em Blumenau (SC). Este manteve o mesmoobjetivo daquele: zelar pelo interesse das comunidades evangélicas em SantaCatarina. De 1917 a 1919, sofreu uma interrupção por causa da Primeira GuerraMundial, e voltou a circular até junho de 1941, chegando a ter em torno de quatro milassinantes. Diferentemente do Rio Grande do Sul, os jornais catarinenses nascem nomiolo do mundo evangélico, ou seja, o clero institui, para suas finalidades depastoreio do rebanho, dispositivos midiáticos que lhes sirvam de suporte. Parecehaver, portanto, uma interferência direta do campo religioso sobre o campomidiático.Em Joinville, outra área de colonização alemã em Santa Catarina, foi lançadoem junho de 1905, o jornal Evangelisch-Luterisches Gemeindeblatt (Folha EvangélicaLuterana) com um perfil mais confessional luter<strong>ano</strong> e sob a liderança do pastor OttoKuhr. “Com o seu lançamento iniciou um longo período de controvérsias entre ascomunidades evangélicas de Santa Catarina que formavam dois sínodos: o Luter<strong>ano</strong>e o Evangélico” 31 . Quando em 1962 os dois sínodos uniram-se para formar o SínodoEvangélico Luter<strong>ano</strong> Unido foi criado um novo jornal, com base nos dois pré-29 KLUG, op. cit. p. 21.30 WEINGAERTNER, op. cit, p. 8.31 Ib ibidem, p. 8.76Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408existentes, denominado Voz do Evangelho. Este jornal viria a constituir, em 1971,juntamente com o Folha Dominical, o Jornal Evangélico.As duas vertentes principais do processo de midiatização da IECLB,portanto, convergem na criação do Jornal Evangélico como meio de comunicação quea igreja constituiu para realizar a interação da instituição eclesiástica e seu corpodiretivo – pastor presidente e vices, Secretaria Geral e Conselho Diretor – com osmembros da igreja vinculados a comunidades eclesiais, num contexto decentralização institucional. O processo de sua criação levou cerca de dois <strong>ano</strong>s e foicaracterizado por embates e negociações que implicaram na conciliação de interessesdíspares e de disputas de poder dentro do campo religioso, nem sempre evidentes.Abordo a seguir, a genealogia da estratégia pela qual dois jornais regionais tornaramseum jornal nacional.3. A gênese do Jornal EvangélicoA publicação do Jornal Evangélico culmina um processo histórico deconstituição de uma relação de campos em que estão implicados um tipo de teologiaprotestante – a evangélica luterana – e um tipo de dispositivo midiático – a imprensaou jornal. Esse processo, como visto acima, teve duas correntes distintas demidiatização (uma que se movimentou de fora para dentro, ou seja, que veio dosecular e desembarcou no campo religioso, e outra que se constituiu no interior docampo religioso e nele se desenvolveu), dois contextos diferentes para o seudesenvolvimento (os estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina) e duasênfases teológicas mais ou menos divergentes (uma evangélica aberta e uma luteranaortodoxa). Em que pese a tentativa de conciliação com a fusão das mídias que osrepresentavam, estes antagonismos vão se revelar no processo de ideação, debate,planejamento e execução do projeto denominado Jornal Evangélico. A recuperaçãoda gênese do Jornal Evangélico, portanto, desde que a idéia de um jornal nacional foiDisponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 77


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408pela primeira vez registrada e proposta até a sua consolidação dois <strong>ano</strong>s depois, vaicontribuir para o entendimento dos embates e disputas que se manifestam noprocesso de midiatização da IECLB por meio de seu jornal principal. É a observaçãodesse processo de instituição de um dispositivo midiático pelo campo religioso,ocorrido entre o final do <strong>ano</strong> de 1969 e o final do <strong>ano</strong> de 1971, que pretendo relatarneste ponto. Trata-se de uma investigação não da rotina de produção do jornal, masde seu processo de surgimento, com base em registros – signos que desencadeiamprocessos de semioses 32 – como artigos, documentos, correspondências, atas erelatórios.Como já mencionei acima, a Igreja Evangélica de Confissão Luterana noBrasil é o resultado de um processo de unificação de quatro unidades eclesiásticasregionais autônomas, que se constituíram a partir das comunidades formadas poriniciativa dos imigrantes protestantes (luter<strong>ano</strong>s, calvinistas, reformados) que vieramao Brasil no século 19. Os quatro sínodos constituíram, em 1950, uma FederaçãoSinodal que, em 1968, passou a ser a IECLB. Uma das principais preocupações d<strong>ano</strong>va instituição foi a de construir e garantir a unidade eclesial nacional a partir decertos dogmas e princípios de identidade comuns. Para dar conta desse desafioinstitucional, a IECLB formulou uma política de comunicação, e criou o JornalEvangélico para ser o principal realizador dessa política. Sobre isso, o pastorpresidente, Karl Gottschald, escreve na primeira edição do Jorev que ele nasce para“ser o principal vínculo, destinado a congregar numa só família leitores de todas assuas comunidades”. (Jorev Por que um novo jornal. Ano FD 86 nº 46 Ano VE 26 nº 11,de 15 de novembro de 1971, p. 1). Ou seja, o Jornal Evangélico é um dispositivo pararealizar a política de comunicação da igreja, cuja ênfase, no contexto de sua fundação,é a sua unidade nacional.Qual é a gênese dessa concepção do jornal? Naturalmente, que esta é umaquestão que permanecerá aberta, uma vez que é impossível determinar o início de32 SALLES, Cecília Almeida. Crítica Genética. Uma (nova) introdução, 2000.78Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408qualquer processo de semiose. Contudo, é possível determinar com alguma certeza,com base nos registros de produção, quando a idéia foi documentada pela primeiravez e qual foi o processo que ela desencadeou para que se tornasse um produto 33 . Nocaso do Jorev, parece que o processo foi desencadeado a partir de um artigopublicado na revista Estudos Teológicos, da Faculdade de Teologia. O artigoGedanken und Anregungen zur Zukunft unsere Kirche – “Pensamentos e reflexões para ofuturo da nossa Igreja” 34 saiu em 1969, no segundo número, <strong>ano</strong> nove da revista, e foiassinado pelo pastor Jost Ohler, que viria a ser mais tarde o primeiro redator doJorev. Ao trazer seus pensamentos e reflexões para o futuro da IECLB, Ohler vê anecessidade de “maior intercâmbio noticioso entre as diversas comunidades quecompõe a IECLB”. Ou seja, o pastor entende que há uma carência de informaçõessobre o que se passa no mundo da igreja, sobretudo, nas comunidades.O artigo foi comentado na Conferência Pastoral do Distrito EclesiásticoBlumenau (SC), da Região Eclesiástica 2, realizada em 21 de maio de 1970.Incumbido pela conferência, o pastor distrital, Werner Brunken, encaminhou oassunto ao Conselho Diretor da Igreja, órgão deliberativo. Em correspondência,datada de 28 de maio de 1970, Brunken escreve que, “dentro do esforço dereestruturação da IECLB, não pode faltar a criação, e isto sem demora, dumdepartamento jornalístico, onde trabalhe uma pessoa apropriada com tempo integral.Esta pessoa coletaria todo o material de todas as comunidades e num jornal únicoseria levado às comunidades” (Carta ao CD, de 28/05/1970). Há uma preocupaçãoem contribuir para que a unidade eclesiástica se consolide por meio do trabalhojornalístico, realizado por um agente do campo midiático, através de um únicodispositivo de comunicação. Após um breve comentário sobre as condições deprodução do jornal local, Brunken encerra, mostrando que a solicitação pedeurgência e, portanto, que o Conselho Diretor “não engavete o assunto, mas o resolve33 Id. Ibidem.34 OHLER, Jost. Gedanken und Anregungen zur Zukunft unsere Kirche, 1969.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 79


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408a passos largos, pois é de extrema importância para a concretização da unidade denossa Igreja no Brasil”.A carta deu entrada na Secretaria Geral da Igreja, em 2 de junho de 1970.Contudo, até 22 de setembro daquele <strong>ano</strong> não há nenhum registro de que o assuntotenha sido encaminhado. Nesta data, o pastor Johannes Hasenack, então diretor daEditora Sinodal e redator da Folha Dominical (jornal da RE 4, com sede em SãoLeopoldo - RS), escreve ao pastor presidente a respeito, informando que recebera dasmãos do pastor regional Augusto E. Kunert (da RE 4), cerca de duas semanas antes(portanto, lá por inícios de setembro) “a carta de referência acima com a solicitaçãode devolver a mesma a V.S. com um parecer a respeito”. Na carta, de duas páginas,ele faz um relato sobre os encaminhamentos dados para a criação de umDepartamento Jornalístico, dando conta de que o assunto foi tratado num encontrocom colaboradores dos periódicos da IECLB, realizada em Indaial (SC), naquelesdias.A criação do Departamento Jornalístico, então, é tratada como umaunanimidade. Contudo, há um alerta para a necessidade de contratar uma pessoaque se dedique integralmente ao jornalismo. Entenda-se aí que, diante das condiçõesde produção dos atuais jornais regionais, feitos por pastores em horários de folga,um departamento jornalístico exigiria uma profissionalização dos serviços decomunicação. Esse departamento seria o órgão coordenador dos periódicos, dotrabalho radiofônico e áudio-visual e do recolhimento e expedição de notícias para ojornal da igreja e para a imprensa secular. Uma outra pessoa seria contratada pararedatora dos jornais Folha Dominical (da RE 4, com 86 <strong>ano</strong>s de circulação no RS) eVoz do Evangelho (da RE 2, com 25 <strong>ano</strong>s de publicação e circulação nos estados deSC e PR), ou seja, haveria, antes de mais nada, uma unificação da função de redaçãodos dois jornais.Hasenack deixa transparecer no relatório uma referência à fusão parcial dosjornais Folha Dominical e Voz do Evangelho. Parece que o assunto já havia sido80Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408tratado em alguma outra ocasião, mas não encontrei nenhum documento que dêconta dessa reflexão. O fato é que a fusão dos dois principais jornais regionais foidebatida na reunião de Indaial, e Hasenack assinala que “fomos unânimes na opiniãode que tal jornal poderia ser redigido e impresso em Blumenau. Um “Stamteil” (umtronco) em ambos seria idêntico, ao passo que o noticiário poderia variar de acordocom a região de circulação: Notícias da Região 2 poderiam ser publicadasdetalhadamente em Voz do Evangelho e resumidamente na Folha Dominical, e viceversa,mas sempre cuidando para que o noticiário em ambos seja completo a fim defavorecer a integração regional e o pensamento em termos eclesiásticos.” Ou seja, umanacionalização regionalizada, a modo de não apagar as especificidades regionaisinscritas em cada uma das publicações. Além disso, há uma reivindicação de que ojornal fosse impresso em Santa Catarina.A estratégia elaborada pelo grupo era de que durante uns dois <strong>ano</strong>s, osjornais existiriam ainda separadamente. Mas sendo o mesmo redator, haveriacondições para promover gradativamente sua fusão completa sob um só nome. Osjornais permaneceriam bilíngües, “apesar de fortes argumentos em contrário (M.Weingärtner)”. Os dois jornais em questão mantinham a maior parte das suasmatérias em língua alemã. “Os fortes argumentos em contrário” indicam uma tensãopresente neste processo e que, certamente, se relaciona com os ideais germânicos quequerem ser refutados em favor da constituição de uma igreja brasileira. Estadiscussão em torno da língua alemã acompanha o jornal até hoje.Outro aspecto importante que o relatório do pastor Hasenack destaca équanto às divergências observadas sobre o lugar da sede do DepartamentoJornalístico, já referidas no tópico anterior. Nelas há uma tendência a rechaçar a sededa Igreja como lugar de produção do novo jornal, por correr-se o risco de fazer dojornal a voz “oficial” da cúpula, tolhendo as divergências. Por fim, destaca-se asugestão de que o pastor Gierus, “pela experiência já tida, poderia ser o responsávelpelos dois jornais parcialmente fusionados...” Friedrich Gierus era de Santa Catarina.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 81


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Nestas duas observações subsistem aspectos conflituais que remontam à própriaconstituição do campo religioso e os embates para a conquista de reconhecimento ede posições de poder. Nesse jogo, o dispositivo midiático representa um instrumentode consolidação de posições, onde fica evidente os diferendos marcados pelocontexto de sua atuação (uma igreja de Santa Catarina x uma igreja do Rio Grande doSul).Um mês após o envio do relatório da reunião de Indaial pelo pastorHasenack, a IECLB reuniu-se em Concílio Geral, em Curitiba. O Concílio é aassembléia máxima da Igreja. Lá os delegados aprovaram a “instalação de umConselho de Imprensa que deverá ser constituído por pessoas engajadas no serviçode publicações”. A ressalva parece apontar para a necessidade do especialista. Ainstalação do Departamento Jornalístico foi aprovada, mas condicionada à existênciade recursos e pessoas capacitadas ou especialistas do campo midiático. “Foi aceita amoção no sentido da fusão parcial dos jornais Voz do Evangelho e Folha Dominical,estando previstos para isto um redator em tempo integral, o qual será remuneradopelas publicações fusionadas”, esclarece a ata do Concílio. Aqui, a assembléiamáxima da igreja estabelece as condições de produção, ou seja, o jornal fusionadotem a aprovação da igreja, é da igreja, mas deve prover a sua própria sobrevivência.A crise econômica dos <strong>ano</strong>s 80, no Brasil, vai ter impactos muito sérios sobre apublicação, o que vai precipitar um processo de mudanças radicais no jornal a partirdos <strong>ano</strong>s 90.Em decorrência da decisão conciliar, o secretário geral da IECLB, pastorRodolfo Schneider, escreve correspondência aos membros do Conselho de Imprensaprovisório, comunicando-lhes que o Conselho Diretor, em 25 de outubro de 1970,portanto, um dia após o término do Concílio, os havia nomeado para integrarem oConselho e os incumbido de “elaborar um projeto de regimento interno e umaprevisão de eventuais despesas”. A carta é expedida em 6 de novembro. No dia 10 dedezembro de 1970, o Conselho de Imprensa Provisório reúne-se pela primeira vez e82Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408como item número um da pauta estabelece para si tarefas e metas. Depois passa aocupar-se da fusão da Voz do Evangelho com a Folha Dominical. Com base noorçamento dos dois periódicos, o Conselho de Imprensa conclui que “os jornaisfusionados garantem realmente a subsistência de um redator com tempo integral”.Para isso, apresentam estimativa de assinantes e relação de despesas e de receitas.A ata relata ainda que, por causa da impossibilidade de “nivelação euniformização do preço da assinatura”, porque os jornais têm periodicidadesdistintas (Voz do Evangelho é mensal e Folha Dominical, semanal) e já haviamestabelecido os seus preços para 1971, “os jornais continuarão a ser editados como atéagora até 31 de outubro de 71”. No entanto, ressalva a ata, “o redator com tempointegral previsto e aprovado para a Folha Fusionada, assumirá as suas funções oquanto antes possível, mais tardar a 1º de junho de 1971”. A ele é dada a tarefa deredação da FD e VE individualmente, preparando leitores e assinantes para a fusão.A sua subsistência será paga por ambos os jornais a partir do momento em queassumir as suas funções, conforme orçamento detalhado no item 5 da ata.Outra definição estabelecida na primeira reunião do Conselho de Imprensaprovisório com relação ao novo jornal é de que já nos meses de novembro edezembro de 1971, a Folha Fusionada seria editada quinzenalmente com oito páginasiguais para todo o âmbito da IECLB e com quatro páginas variáveis, com cabeçalho econteúdo correspondentes aos dois jornais fusionados. O que efetivamente ocorre éque a primeira publicação do novo jornal ostenta no seu fiodata duas cronologias deedição, uma da Voz do Evangelho e outra do Folha Dominical.Dois nomes são sugeridos pelo Conselho de Imprensa provisório para aredação dos jornais: o do pastor Friedrich Gierus ou o do pastor Jost Ohler. Sobre asede do novo jornal, o Conselho também tem duas sugestões, caso haja dependênciasà disposição: a futura sede da RE 2, em Blumenau (SC), ou a sede da RE 4, em SãoLeopoldo (RS). O fluxo de notícias das comunidades para o jornal seria garantido,segundo propôs o Conselho de Imprensa, por correspondentes em cada DistritoDisponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 83


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Eclesiástico – unidade menor que a região e que agrupa paróquias e comunidades –“podendo coincidir com os correspondentes do Departamento de Áudio-Visual”.No dia seguinte à reunião do Conselho de Imprensa provisório, em 11 dedezembro de 1970, o pastor Hilmar Kannenberg, nomeado diretor do Conselho deImprensa, assina correspondência ao Conselho Diretor da IECLB, reproduzindo as<strong>ano</strong>tações da ata referentes à fusão dos jornais. No cabeçalho da carta, há uma<strong>ano</strong>tação rubricada pelo secretário geral da Igreja, Rodolfo Schneider que diz oseguinte: “O pastor Hasenack falou comigo sobre o assunto. Sugeriu o pastor Ohlercomo redator, o qual estaria disposto, então, a ficar mais alguns <strong>ano</strong>s no Brasil. Asede deste trabalho seria São Leopoldo?” Ohler era pastor cedido pela Igreja daAlemanha e foi, efetivamente, o escolhido para a função. Ele não era nem de SantaCatarina nem do Rio Grande do Sul, mas havia atuado no Espírito Santo. Nasentrelinhas, percebe-se uma tentativa de acomodar as divergências. Gierus, o outroindicado, atuava em Santa Catarina.Há uma dúvida quanto à sede do jornal, que permanece mesmo depois que osecretário geral encaminhou ao diretor do Conselho de Imprensa Provisório, HilmarKannenberg, correspondência com o extrato da ata da reunião do Conselho Diretorque deu encaminhamento à fusão dos jornais. A esta carta não tive acesso. Mas em 28de dezembro de 1970, o pastor Kannenberg escreve ao secretário geral pedindoesclarecimentos a esse respeito. Todos os demais pontos sugeridos pelo Conselho deImprensa foram acolhidos pelo Conselho Diretor, a saber que o pastor Ohler seria oredator, que assumiria em 1º de junho de 1971, que os jornais seriam editadosseparadamente até 31 de outubro daquele <strong>ano</strong> e que a partir de novembro seriamfusionados. Contudo, escreve Kanneberg, “o que não me parece devidamenteesclarecido é a sede da redação. A ata diz que o conselheiro pastor Kunert foiautorizado a garantir uma moradia para o redator. Concluo daí que a sede daredação coincidirá com a sede da Região Eclesiástica 4. Corresponde esta dedução?”A isto o secretário geral responde em carta de 29 de dezembro de 1970 que “tanto a84Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408moradia do redator como a sede da redação deverão ser, efetivamente, em SãoLeopoldo”. A decisão de lotar a sede do jornal em São Leopoldo pode ser entendidacomo uma forma de manter o jornal perto da direção da igreja, mas não tão perto quepudesse sofrer interferência diretamente na sua produção.Quase um <strong>ano</strong> depois, no dia 9 de setembro de 1971 o Conselho de ImprensaProvisório reúne-se pela segunda vez. Na pauta da reunião está principalmente oanteprojeto de seu estatuto. Dos documentos a que tive acesso até o momento, não hánenhuma manifestação sobre a fusão dos jornais, nem mesmo se a contratação dopastor Ohler aconteceu como prevista.Sobre a fusão dos jornais, o Conselho de Imprensa Provisório concordou quea sua primeira edição sairia a 15 de novembro de 1971, contendo oito páginas emportuguês, quatro páginas em alemão e quatro páginas de interesse regional emqualquer língua, dependendo do material enviado (a língua em que foi escrito). “Foiestabelecido também que cada assinante receberá as 16 páginas do novo jornal”, diz aata. O nome da nova publicação seria Jornal Evangélico, baseado nas sugestões feitaspelos leitores de Voz do Evangelho e de Folha Dominical, onde figurou entre os maiscotados.Por fim, o CIP aprovou sugestão de que fosse nomeado um diretor auxiliarpara o novo jornal, uma vez que o diretor, pastor presidente Karl Gottschald, nãoconseguia, por causa de seu trabalho, ter conhecimento do conteúdo do novo jornalantes de sua publicação. A sugestão foi encaminhada ao pastor presidente em cartade 24 de setembro de 1971. Esta proposição parece apontar para o estabelecimento decertos procedimentos jornalísticos que permitam a agilidade dos processos e umainterferência dissimulada do campo religioso sobre o campo midiático.O que esta breve observação da gênese do Jornal Evangélico aponta é queuma concepção geral e genérica de um produto midiático sofre inevitavelmente, aolongo do processo de sua produção, modificações significativas que o fazem avançarDisponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 85


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408e retroceder infinitamente. Tais modificações devem-se a atravessamentos de todaordem, alguns marcados por conflitos de campo (no caso, entre o campo dos media eo campo religioso) e no campo (as lutas por poder no campo religioso), outros denatureza econômica e estrutural (garantia de recursos e organização), pessoal (depersonalidade, capacidade ou vontade de ocupar determinado lugar e realizardeterminada tarefa), histórica (a fusão de jornais com 86 e 25 <strong>ano</strong>s de existência),contextual (os catarinenses versus os gaúchos), entre outros, que são inerentes aosistema de trocas simbólicas que se estabelece entre os diversos protagonistas doprocesso nos diferentes campos sociais. Isso também demonstra que um processo éum movimento falível, e embora apresente tendências, ele se sustenta na lógica daincerteza, e engloba a intervenção do acaso, ao mesmo tempo em que abre espaçopara a emergência de novos raciocínios que introduzem novas idéias 35 . Isso implicaadmitir que o Jorev como um produto da igreja é marcado pelo seu processo deprodução e que o seu significado transcende a si mesmo como produto, porque ele secompleta no diálogo com sua tradição, com o campo que o criou, com o público comquem estabelece interação e com a visão que tem de si próprio como um dispositivomidiático-religioso. Essas marcas o acompanham também ao longo dos <strong>ano</strong>s, comopretendo demonstrar a seguir.4. O Jorev dos <strong>ano</strong>s 1970 aos <strong>ano</strong>s 1990Os primeiros <strong>ano</strong>s do jornal foram de afirmação de seu papel. Ao explicar naprimeira edição, a logomarca do jornal (o desenho compõe-se de quatro elementos: acruz, o círculo, o globo terrestre e as mãos), a redação escrevia que o JornalEvangélico “quer mostrar o mundo de Deus sob a cruz. Um mundo em que há muitaescuridão e miséria, aqui e em outra parte. Ele quer estimular a claridade e o bem.Para isto informações, relatórios e devoções deverão servir. Por último, entretanto,ele quer estimular e animar o leitor a desejar o presente que é a fé, aceitando-o35 SALLES, op. cit.86Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408agradecido.” (Jornal Evangélico Como nós o vemos - Jorev - Ano FD 86 nº 46 Ano VE 26nº 11, de 15 de novembro de 1971, p. 14). Esta definição de seu papel, explicitado naforma de um discurso religioso, demonstra a sua plena inserção no campo religioso.Contudo, isso não significa uma rendição incondicional à lógica da instituição,porque e especialmente nos primeiros <strong>ano</strong>s, o jornal entendeu-se mais como a vozdas comunidades do que como porta-voz da cúpula da igreja.Um episódio ocorrido em 1973 mostra esse lugar do jornal e as tensões queadvém dessa posição. Ao publicar uma matéria em defesa da Comunidade da IECLBem Belém do Pará, que havia solicitado um pastor com urgência, o Jorev informa queo Conselho Diretor achou inoportuno enviar um pastor para aquela comunidade. Emrazão dessa informação, o Conselho Diretor encaminha correspondência ao editor doJornal Evangélico solicitando que a notícia anterior seja desmentida, porque nãocorrespondia aos fatos “uma vez que o Conselho Diretor jamais tomou a deliberaçãopublicada” (Correspondência de 9 de abril de 1973, assinada pelo secretário geral daIECLB, Rodolfo Schneider). Em reunião dos órgãos de imprensa da IECLB, em 26 deabril de 1973, a ata relata a esse respeito que, sobre a notícia publicada no JornalEvangélico, “será noticiado que houve um equívoco na publicação da notícia” eacrescenta as informações solicitadas pela correspondência anterior. Contudo, oredator do Jorev, pastor Jost Ohler, pede que “ao serem resolvidos, em reuniões naSecretaria Geral, assuntos de interesse para a publicação nos periódicos, seja eleconvidado ou o pastor Kannenberg, a fim de se porem a par dos assuntos”. Com estasolicitação, o redator do Jorev transferiu para a Secretaria Geral boa parte daresponsabilidade pelo erro da redação.Em outro episódio, Ohler envia correspondência ao Conselho Diretor daIECLB cobrando porque o departamento de imprensa da igreja recebeu notícia sobreum pronunciamento eclesiástico oficial, ocorrido em janeiro, apenas no mês de marçopor meio de um boletim informativo da Federação Luterana Mundial. No terceiroDisponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 87


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408parágrafo Ohler dá a entender que este não foi o único caso em que informaçõesimportantes chegam com atraso e desabafa:Não é possível que a Redação Central toma conhecimento de decisões edeclarações importantes de sua Igreja através de terceiros, sendo estesainda os meios de comunicação social do exterior (Carta ao ConselhoDiretor da IECLB, em 5 de março de 1974, assinada pelo diretorexecutivo da Redação Central, Jost Ohler).Esta crítica aponta para uma desarticulação entre jornal e direção da igreja, oque certamente vai culminar na avaliação que o Conselho de Imprensa faz em marçode 1977, analisando “questões de ideologia e administração” (Carta aos PastoresDistritais, 7 de julho de 1977). As questões de ideologia apontam para o conteúdo dojornal que “não constitui o elo de ligação (sic) das comunidades entre si e delas paracom a direção da igreja (e vice-versa) na dimensão como isso seria desejável” (idem).As questões administrativas dizem respeito aos sacrifícios financeiros que a EditoraSinodal vem assumindo, sem ter a contrapartida de um compromisso da igrejatambém. E neste sentido, a carta insinua que os pastores, sendo a maior autoridadenas suas comunidades, podem “facilitar ou dificultar a divulgação do jornal”. Porfim, revela que, “por questões pessoais de desentendimento com a Editora temacontecido serem canceladas as assinaturas todas para comunidades inteiras. Isto nãodeveria acontecer”. A carta revela que o jornal está implicado em conflitos com ocampo religioso – em questões que o especialista do corpo religioso não se reconheceno jornal – mas também da ordem dos conflitos intracampo da religião, como asdisputas por poder e por autoridade.Uma das mais fortes revelações da permanente tensão entre o campomidiático e o campo religioso veio numa correspondência do pastor Rolf Droste, em14 de novembro de 1983, dirigida aos seus pares da Secretaria Geral, a respeito deuma carta publicada no Jorev assinada por Augusto Franke Bier, acadêmico decomunicação e que também já havia ilustrado o Jorev com caricaturas. O pomo dadiscórdia estava precisamente no fato de que o diretor do jornal, pastor Hasenack,88Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408disse que “antes de dar atenção ao jornalístico, o Jorev deveria ser um veículo parapropagar o evangelho”. E Bier na sua longa carta, diz tratar-se de “um senhor, quepouco ou nada entende de comunicação social e sem firmeza suficiente para suportaras pressões que seu cargo exige, ou seja, para comprar a briga do órgão que dirige.” Emais adiante afirma que “cabe à imprensa a denúncia, a polêmica, a discussão, obotar as cartas na mesa, a divulgação dos fatos e a veiculação dos fatos”. Se assimnão for, Bier sugere que o quinzenário “passe logo a ser distribuído nas portas dostemplos” como folhetos. Droste, que traz a polêmica para a sua carta, pergunta senão dá para colocar o Jorev em mãos de jornalistas melhor identificados com a igreja.E arremata dizendo que “o problema do Jorev é o seu espírito. E este é feito pelosredatores. Logo, deve-se colocar ali as pessoas certas.” O debate mostra uma crisesem precedentes de relação entre o Jorev, a Igreja e até mesmo os seus leitores. Oconflito, como demonstrei, tinha como cerne a compreensão do papel do campojornalístico e a qualidade de seu corpo de especialistas. Pastores e jornalistas vêem,assim, o Jorev segundo suas óticas e, na radicalização de posições, o conflito torna-seincontornável.A postura crítica do jornal em relação à direção da igreja, tende a se atenuar,na proporção em que o Jornal enfrenta dificuldades financeiras. Em 15 de abril de1982, o editorial expõe a situação financeira do Jorev e as medidas tomadas paraconter despesas. Embora a crise se acentue e cada vez mais o jornal é debatido nasinstâncias decisórias da igreja, o Jorev ainda assim se permite um tom crítico emrelação à igreja. Em 1986, na edição de 9 de fevereiro, o editorial fala de um “divisorde águas” e cobra que “a Igreja tem que deixar clara a sua posição, a sua opção” emrelação aos conflitos sociais. E diz que a IECLB tem se destacado pelos discursosprogressistas, mas na prática não tem conseguido digerir os conflitos daí resultantes.Cobra por coerência da igreja.Para agravar a crise, em 1º de abril de 1985, a Região Eclesiástica II, sucessorado Sínodo que publicava o Jornal Voz do Evangelho lança a primeira edição do seuDisponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 89


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408próprio jornal: O Caminho. Na base desta iniciativa está um descontentamento com alinha editorial do Jorev. Uma reunião dos meios de comunicação da IECLB, realizadaem 10 e 11 de novembro de 1979 já apontava essa insatisfação. No item 3.3.1 da atadiz que havia “manifestações de vários setores da IECLB, solicitando um jornal maisedificante, de caráter mais evangelizante”. À sugestão de um segundo jornal queatendesse a estes interesses específicos, o diretor do Jorev lembra “que em 1978 oConselho Diretor havia se posicionado contra um segundo veículo ao lado do Jorev,receando-se uma eventual polarização”. Estão presentes aí as velhas divergênciasteológicas que foram subsumidas com a fusão dos sínodos e também do jornaisregionais. Diante da crise, os velhos protagonistas do campo reassumem suasposições de luta e voltam a competir pela hegemonia do campo, ainda que sejanecessário constituir-se em poder paralelo.Para fazer frente ao novo veículo, o Jorev se renova, introduzindo diversascolunas, entre elas uma chamada Mensagem da Presidência, assinada pelo pastorpresidente ou um de seus vices (1º de janeiro de 1987). O jornal diz que estasmudanças são uma maneira de servir melhor ao leitor. Em fevereiro (edição de 22 defevereiro a 14 de março) daquele <strong>ano</strong> o Jorev anuncia campanha para dobrar onúmero de assinantes. A campanha, contudo, não alcança seus objetivos e na ediçãode 13 a 26 de março de 1988, no editorial, o jornal toma os cem <strong>ano</strong>s de imprensaevangélica no Brasil para cobrar “um esforço maior da Igreja em favor de seu jornal”.E sugere angariar mais assinantes através de subsídios da igreja para famílias pobres.Na edição de 25 de setembro a 8 de outubro, a crise “impõe demissões no Jorev” e oeditorial dá conta de quatro pessoas dispensadas. Na edição seguinte ( 9 a 22 deoutubro) o editorial clama “por uma Igreja mais solidária” e defende a necessidadede que o jornal seja assumido como veículo de comunicação da Igreja e destaca aimportância do periódico para “unir o povo da IECLB em torno de seu Senhor e suamissão”. E na edição de 4 a 17 de dezembro de 1988 ele diz ao leitor que o jornal énecessário como meio de união na IECLB, colocando a questão como estando emjogo não um jornal, mas “uma causa da IECLB”.90Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408A “causa” é assumida em 1989. Na edição de janeiro daquele <strong>ano</strong> o editorialavalia os momentos altos e baixos que o jornal viveu, informa sobre a crise financeirae dá conta de que recebeu auxílio do exterior para sua manutenção. E explica que “apartir dessa primeira edição de 1989, o logotipo do jornal terá o emblema da IECLB.Essa medida visa caracterizar a identificação do Jorev com a IECLB e fazer entenderque o jornal é da IECLB toda”. Isso se concretiza definitivamente em 1992, quandoele deixa a sede da Editora Sinodal, em São Leopoldo (RS), e passa para a sede daigreja, em Porto Alegre. Essa mudança é mais do que uma questão de dar um novoendereço ao periódico. Ela implica numa transformação do processo de interaçãoentre o jornal e a igreja, que o aproxima do corpo diretivo eclesiástico na mesmaproporção em que o distancia da base comunitária da qual até então retirara a razãode sua existência.Como procurei demonstrar com alguns exemplos, a caracterização deindicadores históricos da relação entre campo religioso e campo midiático apontapara marcas de conflitualidades de campo, mas que não se restringem a conflitosentre mídia e religião. Na verdade, a relação de campos é atravessada por batalhas,disputas e tensões que se manifestam e transcendem os campos. Contudo, o papel demediação exercido pelo campo midiático e a sua competência discursiva específica,características peculiares de seu modo de se constituir, tendem a provocar, noprocesso de midiatização dos demais campos sociais, conflitos e tensões muito maiscomplexos. No caso particular do processo de midiatização da IECLB por meio doJornal Evangélico, esta relação de campos torna-se ainda mais complexa pelo fato deque se constitui numa mediação operada dentro do próprio campo religioso poriniciativa deste, de modo que o jornal está implicado também nas lutas do camporeligioso. Tais conflitos e tensões se revelam principalmente no discurso do jornal.Contudo, isso já é assunto demais para este artigo.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 91


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408ReferênciasBOURDIEU, P. – Razões Práticas. Sobre a teoria da ação. Tradução: Mariza Corrêa. Campinas:Papirus, 1996.BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. Tradução de Sergio Miceli, Silvia deAlmeida Prado, Sonia Miceli e Wilson Campos Vieira. São Paulo: Perspectiva, 1987.BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico. Traduzido por Fernando Tomaz. Rio de Janeiro:Bertrand, 1989.BOURDIEU, Pierre. Questões de Sociologia. Tradução de Jeni Vaitsman. Rio de Janeiro. MarcoZero. 1983.DREHER, Martin. Igreja e Germanidade. São Leopoldo: Editora Sinodal, 1986.DREHER, Martin. A Participação do Imigrante na Imprensa Brasileira. In: DREHER,RAMBO e TRAMONTINI (org.). Imigração e Imprensa. Porto Alegre: <strong>EST</strong>, 20<strong>04</strong>. p 91-99ENCICLOPÉDIA Riograndense. 2º vol. 2ª ed. O Rio Grande Antigo. Porto Alegre: SulinaEditora, 1968.<strong>EST</strong>EVES, João Pissarra. A ética da comunicação e os media modernos. Legitimidade e poder nassociedades complexas. Fundação Calouste Kulbenkian. Junta Nacional de InvestigaçãoCientífica e Tecnológica, 1998.FAUSTO NETO, Antônio. A Igreja doméstica: Estratégias televisivas de construção de novasreligiosidades. São Leopoldo: Cadernos IHU, Ano 2, nº 7. 20<strong>04</strong>FAUSTO NETO, Antônio. Processos midiáticos e a construção das novas religiosidades: dimensõesdiscursivas. Unisinos/CNPq. Relatório e Pesquisa. São Leopoldo: Unisinos, 20<strong>03</strong>.FISCHER, Joachim. A origem e a influência do neo-luteranimso nas novas comunidades daIECLB. In: HOFFMANN, Arzemiro (org.). Vertentes da identidade confessional da IECLB. SãoLeopoldo: s/ editora, 2001. p. 6-23.FLUCK, Marlon. A confessionalidade dos egressos dos centros de formação teológicalocalizados em Basiléia. In: HOFFMANN, Arzemiro (org.). Vertentes da identidade confessionalda IECLB. São Leopoldo: s/ editora, 2001. p. 24-39.FONSECA, Alexandre Brasil. Evangélicos e Mídia no Brasil. Bragança Paulista: EditoraUniversitária São Francisco : Curitiba: Faculdade São Boaventura, 20<strong>03</strong>.GOMES, Pedro Gilberto. Cultura, meios de comunicação e Igreja. São Paulo: Loyola,UCBC/OCIC-Br/UNDA-Br, 1987.GOMES, Pedro Gilberto. Processos Midiáticos e Construção de Novas Religiosidades.DimensõesHistóricas. São Leopoldo: Cadernos IHU, <strong>ano</strong> 2, nº 8, 20<strong>04</strong>.92Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408HOOVER , Stewart M. & LUNDBY, Knut. (org.) Rethinking media, religion, and culture.Londres: Sage, 1997.HOOVER , Stewart M. Religion in a Media Age. The International Study Commision on Media,Religion & Culture Religion in a Media Age. Public Lecture, the University of Edinburg. ,March 4, 1997. (Mimeo)KLUG, João. Imprensa e imigração alemã em Santa Catarina. In: DREHER, RAMBO eTRAMONTINI (org.). Imigração e Imprensa. Porto Alegre: <strong>EST</strong>, 20<strong>04</strong>. p 13-25.OHLER, Jost. Gedanken und Anregungen zur Zukunft unsere Kirche. In: Estudos Teológicos,nº 2 <strong>ano</strong> 9, São Leopoldo, 1969.RODRIGUES, Adri<strong>ano</strong> Duarte. A gênese do campo dos mídia. (org) SANTANA, R.N. In:Reflexões sobre o mundo contemporâneo. Ed. Renan, 2000, pp. 201-214.RODRIGUES, Adri<strong>ano</strong> Duarte. Estratégias da comunicação. 2. ed. Lisboa: Ed. Presença, 1997.152-160.RODRIGUES, Adri<strong>ano</strong> Duarte. Experiência, modernidade e campos dos media. In:Ciberlegenda. Número 3, 2000. Revista do Programa de Pós-Graduação em Comunicação(Mestrado e Doutorado) da Universidade Federal Fluminense.RODRIGUES, Adri<strong>ano</strong> Duarte. Formas de sociabilidade e modelos comunicacionais. In:Comunicação e cultura – a experiência cultural na era da informação. Lisboa: Ed. Presença. 1998. p.128-140.SALLES, Cecília Almeida. Crítica Genética. Uma (nova) introdução. São Paulo: Educ. 2000.TESSMANN, Mário Francisco. Alguns apontamentos para discussão sobre confessionalidadeLuterana. In: HOFFMANN, Arzemiro (org.). Vertentes da identidade confessional da IECLB. SãoLeopoldo: s/ editora, 2001. p. 50-57.VERÓN, Eliseo. Esquema para la análisis de la mediatización In: Revista diálogos. N. 37. Lima,1987.WHITE, Robert A. Religião & Mídia – Na construção de culturas. In: HOOVER , Stewart M.& LUNDBY, Knut. Rethinking media, religion, and culture. Tradução do PPGCOM Unisinos.Thousands Oaks/ Londres/Nova Deli: Sage Publications. International Educational andProfessional Publisher, 1997.WEINGAERTNER, Nelso. Comunicação e informação na história das comunidades. In:Jornal O Caminho, abril/1995, p 8.Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp 93


Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de TeologiaVolume 08, set.-dez. de 2005 – ISSN 1678 6408Como citar esta revistaComo citar esta revista:Protestantismo em Revista. São Leopoldo, v. 08, set.-dez. 2005. ISSN 1678 6408 Disponível em: Acesso em: 30/09/2008Como citar um artigo desta revista:(Exemplo)DUTRA, Délia. Sobre articulações (e) processos teórico-conceituais: entrecruzamentos do campomidiático com outros campos sociais. Protestantismo em Revista. São Leopoldo, v. 08, set.-dez. 2005,p.7-34. ISSN 1678 6408. Disponível em: Acesso em: 30/09/2008.94Disponível na Internet: http://www3.est.edu.br/nepp

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