DA ECONOMIA SOLIDÁRIA À ECONOMIA DA INFORMAÇÃO: A MEDIAÇÃO DE TELECENTROS AUTOGESTIONÁRIOS
I CONPES - Congresso de Pesquisadores de Economia Solidária. "Desafios globais do trabalho com mediação solidária". 17 a 19 de junho de 2015. UFSCar, SP, Brasil. GT 8 – Desafios da autogestão.
I CONPES - Congresso de Pesquisadores de Economia Solidária. "Desafios globais do trabalho com mediação solidária". 17 a 19 de junho de 2015. UFSCar, SP, Brasil. GT 8 – Desafios da autogestão.
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<strong>DA</strong> <strong>ECONOMIA</strong> <strong>SOLIDÁRIA</strong> <strong>À</strong> <strong>ECONOMIA</strong> <strong>DA</strong><br />
<strong>INFORMAÇÃO</strong>: A <strong>MEDIAÇÃO</strong> <strong>DE</strong> <strong>TELECENTROS</strong><br />
<strong>AUTOGESTIONÁRIOS</strong><br />
<strong>DA</strong> COSTA FERREIRA, F.R.V. 1 ; PORTELA, Nilza F. 2 .<br />
RESUMO<br />
GT 8 – Desafios da autogestão<br />
Num contexto de espontaneidade de grupos sociais excluídos e de implantação de políticas<br />
públicas voltadas para eles, evidencia-se o programa <strong>TELECENTROS</strong>.BR que reconfigura<br />
o território digital brasileiro implantando telecentros comunitários. Nosso objetivo é<br />
entender esses telecentros de inclusão digital local, na microescala bairro. Para isso, usouse<br />
uma metodologia pela qual foram feitas várias pesquisas-ações em 22 telecentros<br />
abrigados no programa de extensão da UENF denominado Incubadora Tecnológica de<br />
Empreendimentos Populares (ITEP), inseridas em processos de incubação fora do espaço<br />
físico dessa incubadora. E pela qual se associou, de forma híbrida, a exoendogenia de cada<br />
telecentro à respectiva interdependência funcional. Os resultados assim obtidos podem<br />
constituir um alento para o enfrentamento efetivo, eficiente e eficaz da complexidade dos<br />
empreendimentos populares que se querem autogestionários nas potencialidades,<br />
limitações, desafios e riscos, usando tecnologias de informação na integração de sistemas.<br />
Palavras-chaves: autogestão; comunicação; informação; solidariedade; tecnologia.<br />
1 Francisco Renato Vieira da Costa Ferreira. UENF/PROEX/ITEP. Titulação: Economista/UFF, Niterói,<br />
Especialista em Gestão em Logística Portuária/ISECENSA, Campos dos Goytacazes, e Especialista em Meio<br />
Ambiente e Desenvolvimento Regional/UFF, Campos dos Goytacazes. Área de pesquisa: Ciências Sociais<br />
Aplicadas/ Planejamento Urbano e Regional. Grupo de pesquisa Interinstitucional de Desenvolvimento<br />
Municipal/Regional-ITEP/UENF/UNIFLU, Campos dos Goytacazes: subgrupo de Economia Humana.<br />
Linha de pesquisa: Cientificidade e Incubadora Tecnológica de empreendimentos para o Desenvolvimento<br />
harmônico integral, solidário e sustentável. E-mail: eco.renato.ferreira@hotmail.com. Responsável pelos<br />
aspectos conceituais e metodológicos, estruturação e integração de dados.<br />
2 Nilza Franco Portela. UENF/PROEX/ITEP. Titulação: Mestre em Planejamento Regional e Gerência de<br />
Cidades/UCAM. Coordenadora Técnica da Incubadora Tecnológica de Empreendimentos Populares (ITEP).<br />
Área de pesquisa: Ciências Sociais Aplicadas/ Planejamento Urbano e Regional. Grupo de pesquisa<br />
Interinstitucional de Desenvolvimento Municipal/Regional-ITEP/UENF/UNIFLU, Campos dos Goytacazes:<br />
subgrupo de Economia Humana. Linha de pesquisa: Cientificidade e Incubadora Tecnológica de<br />
empreendimentos para o Desenvolvimento harmônico integral, solidário e sustentável. E-mail:<br />
ngabby@uenf.br. Responsável pelas pesquisas de campo, compilação e disponibilização de dados da ITEP.
1<br />
1 PROPÓSITO, TEMÁTICA E FINALI<strong>DA</strong><strong>DE</strong><br />
A visão das sociedades do conhecimento para a paz e o desenvolvimento<br />
sustentável requer um esforço adicional enfatizando a necessidade de reunir<br />
parceiros dos setores público e privado e da sociedade civil para esclarecer<br />
problemas persistentes e criar processos e ações que os solucionem. Com sua<br />
visão de sociedades do conhecimento, a UNESCO vai além do foco em<br />
infraestrutura de informação e comunicação para os seres humanos e os<br />
processos de aprendizagem. (MANSELL e TREMBLAY, 2015)<br />
O propósito deste artigo é perceber a complexidade da inclusão social via inclusão<br />
digital para além da infraestrutura de informação e comunicação da sociedade da<br />
informação e do conhecimento mediante parcerias do setor público e de organizações da<br />
sociedade civil focadas em lugares de vulnerabilidade física e social. No intuito de<br />
esclarecer problemas locais persistentes, bem como de criar processos de incubação “fora”<br />
de instalações físicas de incubadora, com aprendizagem local e ações efetivas que<br />
envolvam os próprios agentes locais na busca de soluções para seus problemas.<br />
Todos os grifos deste artigo são nossos, salvo se houver especificação nossa de que<br />
se trata de “grifos do autor”.<br />
1.1 Sociedade Humana e Economia Social<br />
Por um lado, dos diversos significados para “sociedade” (do latim societate),<br />
optamos por um significado dado pela Sociologia para a Sociedade Humana (SocHum):<br />
“Organização dinâmica de indivíduos autoconscientes e que compartilham objetivos<br />
comuns e são, assim, capazes de ação conjugada”. Por outro lado, a palavra “economia”<br />
tem origem no grego (oikonomía, -atos, “gestão da casa”), formando uma ideia de<br />
harmonia entre as diferentes partes de um corpo organizado como sistema integrado e de<br />
interdependência funcional humanos. Por isso, podemos asseverar que a Economia Social<br />
(EcoSoc) é (auto)gestão pacífica e harmoniosa de um lugar de viver, por indivíduos<br />
autoconscientes em organização dinâmica integrada sistemicamente para interação<br />
conjugada visando alcançar objetivos comuns.<br />
Contudo, a história da Humanidade e a preparação do futuro desta têm mostrado<br />
que esse significado e essa ideia são subvertidos ou subversivos. Assim, entre o caos e a<br />
ordem, naturais e sociais, para reverter essa “história insustentável” e preparar um “futuro<br />
sustentável”, a Carta da Terra (Earth Charter) foi recomendada em 1987 para estabelecer<br />
os principais fundamentos do “desenvolvimento sustentável”. Essa carta (CT e CVI; 2008)<br />
é uma declaração universal de princípios éticos fundamentais para construir-se uma<br />
sociedade humana global justa, sustentável e pacífica, no século XXI e 3º milênio. Nessa
2<br />
carta foram destacados os desafios futuros a enfrentar mediante necessárias mudanças<br />
fundamentais em nossos valores, nossas instituições e nossos modos de vida. Por essa<br />
carta, “a escolha é nossa”: 1) formar uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos<br />
outros ou arriscar a nossa destruição e a da diversidade da vida; e 2) quando as<br />
necessidades básicas forem supridas, o desenvolvimento humano será primariamente<br />
voltado a ser mais e não a ter mais. E é para “um novo sentido de interdependência<br />
funcional e de responsabilidade universal” da sociedade humana integrada globalmente<br />
que essa carta aponta “o caminho adiante”: desenvolver e aplicar com imaginação a visão<br />
de um modo de vida sustentável, nos níveis local, nacional, regional e global, em que<br />
diferentes culturas encontrarão suas próprias e distintas formas de realizar esta visão.<br />
1.2 Economia Solidária e Economia da Informação<br />
Entretanto, como afirmou França Filho (2002), a “economia solidária” surgiu com a<br />
característica fundamental de articulação entre as dimensões econômica, social e política.<br />
Uma característica que, segundo ele, “já se encontrava presente nos ideais e práticas dos<br />
primórdios da Economia Social”, mas que foi esquecida 3 . Posteriormente, Nascimento<br />
(2004) afirmou que a reinvenção da Economia Solidária porta em si “uma espécie de<br />
ressurreição de valores que fazem parte da cultura do movimento operário: solidariedade,<br />
autogestão, autonomia, mutualismo, economia moral”. E, mais tarde, Gomes, Klein,<br />
Steffen e Mariani (2010) acrescentaram que “a Economia Solidária exige uma educação<br />
solidária que transforme a mentalidade cultural dominante de competição para a<br />
construção do espírito de cooperação, além do desenvolvimento de uma matriz científica e<br />
tecnológica que esteja comprometida com o desenvolvimento sustentável e solidário”.<br />
Portanto, podemos afirmar que a Economia Solidária (EcoSol) é uma tentativa de<br />
resgate da Economia Social para firmar o paradigma da colaboração como alternativa<br />
ao paradigma da competição que é preponderante na Sociedade Humana “moderna”.<br />
Para essa matriz científica e tecnológica referimos Dowbor (2010) que disse que as<br />
tecnologias que favorecem a globalização podem “favorecer os espaços locais, as<br />
dimensões participativas e uma conectividade democrática numa unidade de acumulação<br />
econômica organizada como espaço colaborativo e coerente dentro do seu território e na<br />
sua região”. E, assim, segundo ele, permitindo que cada localidade recupere (ou ganhe) a<br />
sua importância ao cruzar-se a especificidade dos interesses locais com o potencial da<br />
colaboração planetária, numa democracia propriamente econômica. Um tipo de<br />
3 Por isso, ele diz que o projeto atual de uma Economia Solidária é, talvez, uma Nova Economia Social, na<br />
medida em que “parece refletir uma espécie de reatualização do ideário original da Economia Social”.
3<br />
democracia a manifestar-se: 1) na qualidade de inserção no processo produtivo; 2) no<br />
acesso equilibrado aos resultados do esforço; e 3) no acesso à informação garantidora do<br />
direito a escolha. Em especial, Dowbor (2010) acrescenta que “esse acesso à informação e<br />
ao conhecimento está evidentemente vinculado à existência da imensa massa de pobres do<br />
planeta”.<br />
No entanto, nessa “democracia propriamente econômica”, o desafio principal<br />
(fig.1) tem sido transformar grande quantidade de dados primários ou investigativos<br />
(globais, nacionais, regionais e locais) em conhecimento e informações úteis, disponíveis<br />
ou recicláveis para auxiliar e orientar os residentes em seus lugares de viver. Esse desafio<br />
marca a Sociedade Humana (SocHum) como uma Sociedade da Informação (SocInf) ou<br />
Sociedade do Conhecimento (SocCon), na qual a Economia Humana (EH) é “refém” da<br />
Economia da Informação Humana (EIH) e da Economia do Conhecimento Humano<br />
(ECH).<br />
Figura 1- Como transformar grande quantidade de dados em conhecimentos e informações<br />
Elaboração: autor <strong>DA</strong> COSTA FERREIRA, 2015<br />
1.3 Sociedade da Informação, Sociedade do Conhecimento e Inclusão Social<br />
Sobre o que é chamado alternativamente de “sociedade da informação”, “economia<br />
do conhecimento” ou “sociedade do conhecimento”, Mansell e Tremblay (2015) dizem que<br />
o “conhecimento” é frequentemente usado de forma errônea como se fosse equivalente<br />
à “informação”. Segundo eles, existem definições diversas desses termos na literatura,<br />
mas, basicamente, informação se refere a sinais medidos em bits. Num segundo nível,<br />
informação pode significar dados que podem ou não estar relacionados. Num terceiro<br />
nível, informação é interpretada ou mediada por eventos reportados pela mídia. Num<br />
quarto nível, informação pode ser combinada e interpretada para constituir o
4<br />
conhecimento. Para este artigo, consideramos a integração das definições de segundo ou<br />
quarto níveis para compor o “objeto de estudo” da Economia da Informação Humana<br />
(EIH) no Espaço-Tempo Humano Hodierno (ETHH) da Sociedade da Informação na Era<br />
do Conhecimento/Ignorância Humanos (SIECIH).<br />
1.4 Tecnologias da Informação e da Comunicação e Inclusão Digital<br />
Sey et al. (2013, p.26; tradução livre) em sua recente pesquisa afirmam que a<br />
inclusão digital é o efeito fundamental de primeira ordem de provimento e uso de<br />
acesso público. Como computador e tecnologias de internet são recursos cada vez mais<br />
cruciais para o funcionamento da sociedade de hoje, é geralmente aceite que as populações<br />
que não têm acesso às Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) estão em<br />
desvantagem na economia global. Os impactos da inclusão digital de acesso público<br />
permitem que as populações superem suas limitações (tais como pobreza e falta de<br />
competências digitais) que dificultam a sua capacidade de acessar e fazer uso produtivo<br />
das TIC. E afirmam também (SEY et al., 2013, p.210; tradução livre) que, para além da<br />
inclusão digital, esse acesso público tem outros resultados que transformam a inclusão<br />
digital em impactos sociais e econômicos. Essas pesquisas evidenciaram percepções dos<br />
usuários sobre os impactos do acesso público em cinco domínios prioritários orientados<br />
para o desenvolvimento: Cultura & Linguagem, Educação, Emprego e Renda, Governança<br />
e Saúde. Um domínio adicional foi incluído porque é claramente uma prioridade para os<br />
usuários, com base nos padrões de uso relatados: Comunicação e Lazer. Do ponto de vista<br />
dos usuários, o acesso público oferece benefícios que tocam em todos estes aspectos de<br />
suas vidas.<br />
Em todos esses domínios, mas em diferentes graus, a disponibilidade de acesso<br />
público permite aos usuários envolverem-se numa inteligência coletiva para participar<br />
naqueles aspectos da vida individual e social (inclui o econômico) que são importantes<br />
para eles. Isso implica tanto uma autoconsciência humana quanto uma reconfiguração<br />
cibercultural. Em que, concordando com Lévy (1999), cibercultura é o “conjunto de<br />
técnicas materiais e intelectuais, de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de<br />
valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço”. E, também<br />
concordando com ele, ciberespaço é o novo meio de comunicação que surge da<br />
interconexão mundial dos computadores. Uma interconexão que inclui tanto “a<br />
infraestrutura material da comunicação digital” quanto “o universo oceânico de<br />
informações que ela abriga”, bem como “os seres humanos que alimentam esse universo e<br />
nele navegam”.
5<br />
No Brasil, evidencia-se nesse ciberespaço o Programa Nacional de Apoio à<br />
Inclusão Digital nas Comunidades (Telecentros.BR), que tem tentado (re)configurar o<br />
“território digital” brasileiro para este milênio, a partir da implantação de telecentros<br />
comunitários em lugares onde se vive de forma vulnerável, física e social (BRASIL, 2009).<br />
Sendo nossa a escolha do caminho adiante, há que imaginar, pensar e agir no “hoje<br />
intrageracional”, em cada esfera local, pensando também no “futuro intergeracional”, nas<br />
esferas regional, nacional e global, em simbiose com a tecnosfera na Sociedade da<br />
Informação da Era do Conhecimento/Ignorância Humanos (SIECIH). Um futuro de<br />
reversão de uma ordem histórica em que o ponto de vista ‘bem público’ a favor da<br />
inteligência coletiva, abordado por Lévy (1999) para a “abertura do devir tecnológico”,<br />
prevaleça sobre os outros pontos de vista 4 que têm predominado sobre várias formas.<br />
Uma “escolha” e um “caminho” para, num presente contínuo, construir um futuro<br />
bem semelhante por um processo de construção social humana conforme Boulding (1945 e<br />
1965). Um processo evolucionário teleológico, isto é, “dirigido por uma imagem do futuro<br />
na mente dos participantes ativos, capazes de influir sobre o sistema”. No qual o amor é a<br />
escolha para o desenvolvimento da humanidade. E a organização funcional humana é<br />
baseada unicamente nos interesses e nas necessidades humanas comuns num ambiente<br />
moral e orgânico de organizações recursivas que atendem a essas necessidades ou reparem<br />
erros nesse sistema.<br />
Perante tudo isso, a finalidade deste artigo é mostrar a inovação social local por<br />
(ciber)cultura incremental através de acesso assistido ao ciberespaço, na direção da<br />
democracia que implica a Economia da Informação Humana (EIH) na gradual substituição<br />
do paradigma da competição pelo paradigma da colaboração no Espaço-Tempo Humano<br />
Hodierno (ETHH) da Sociedade da Informação na Era do Conhecimento/Ignorância<br />
Humanos (SIECIH).<br />
2 PROBLEMÁTICA E OBJETIVOS<br />
Mansell e Tremblay (2015) afirmam que a relação entre os avanços na tecnologia<br />
digital e a transformação social não é nada simples. E que o investimento em hardware e<br />
software não pode servir como substituto para a habilidade das pessoas de entender seu<br />
ambiente de informação e comunicação. E alegam que uma base global de conhecimento<br />
universal não reduz as desvantagens sociais e econômicas, mesmo que seja acessível<br />
4 O dos comerciantes (advento do mercado absoluto), o das mídias (como fazer sensacionalismo com a<br />
Net?) e o dos Estados (controle dos fluxos transfronteiriços, criptografia, defesa da indústria e da cultura<br />
nacionais).
6<br />
por meio das redes mundiais. Porquanto uma parte desse conhecimento é apenas<br />
parcialmente composto de informações. Enquanto a outra parte é composta por um mix de<br />
compreensão pessoal, interpessoal e contextualizada, o qual é adquirido por meio da<br />
aprendizagem. E, tendo em vista a ênfase excessiva que vem sendo colocada na tecnologia<br />
em muitas esferas políticas das sociedades do conhecimento, eles recomendam a<br />
importância crucial das pessoas, da educação e da aprendizagem (formal ou informal)<br />
e das políticas necessárias para reforçar a capacidade dessas pessoas para a<br />
autodeterminação.<br />
2.1 Territórios de Exclusão Social e Territórios de Exclusão Digital<br />
O acesso para todos é um fenômeno social humano - não é um mero fenômeno<br />
econômico, nem apenas um simples aspecto econômico do fenômeno social. É uma<br />
solução. Não é um problema, nem o problema. Muito menos um problema grave. Desse<br />
modo, “a falta de acesso para todos” é um problema. Mas continua não sendo o<br />
problema. Um problema é o que Da Costa Ferreira (2012) aponta como sendo “a falta de<br />
acesso multidirecional às informações significativas e integradas”, a qual, conforme ele<br />
disse: impede as populações locais de articular e organizar tais informações, efetiva,<br />
eficiente e eficazmente, para perceber e conceber o contexto, o global, o multidimensional<br />
e o complexo, sem intolerância para com os que pensam, criticam e agem diferente do<br />
atual paradigma hegemônico humano; ou coloca essas populações locais submissas à<br />
tecnosfera, impedindo-as de saber viver em simbiose com esta.<br />
Considerando-se que esse “acesso” é almejado por “todos”, torna-se um grave<br />
problema social de solução tecnológica e política. A respeito do que fazer relativamente a<br />
essa solução recorremos a Lévy (1999, p.238) que destaca uma cibercultura na qual,<br />
mesmo antes de favorecimento, de facilidade e/ou de redução de custos, é preciso “estar<br />
em condições de participar ativamente dos processos de inteligência coletiva que<br />
representam o principal interesse do ciberespaço”. Assim, os novos instrumentos<br />
tecnológicos devem servir prioritariamente para, dentre outros: 1) valorizar a cultura, as<br />
competências, os recursos e os projetos locais; e 2) ajudar as pessoas a participar de<br />
coletivos de ajuda mútua e de grupos de aprendizagem cooperativa. Enquanto que as<br />
políticas voluntaristas de luta contra as desigualdades devem visar “o ganho em<br />
autonomia 5 das pessoas ou grupos envolvidos”. Contudo, como “contrapartida”, essas<br />
políticas devem evitar tanto o surgimento de novas dependências quanto o desqualificar<br />
5 Itálico do autor.
7<br />
de saberes e de competências tradicionais de grupos sociais em regiões<br />
desfavorecidas. Além disso, socorrendo-nos agora do relatório final de avaliação das<br />
políticas públicas de Economia Solidária (BRASIL, 2005), estamos sob um “baixo grau<br />
de estruturação formal das políticas de ES” porque na descrição da estruturação de tais<br />
políticas “não se percebem as conexões entre leis, planos, programas e ações”.<br />
Adicionalmente, podemos observar que um dos principais problemas do desenvolvimento<br />
da “cibercultura” local é diretamente ligado aos Territórios de Exclusão Social (TES).<br />
Mais precisamente, “emerge” dos Territórios de Exclusão Digital (TED) numa Sociedade<br />
da Informação da Era do Conhecimento/Ignorância Humanos (SIECIH) dominada por<br />
Tecnologias da Informação e da Comunicação de Alta Complexidade (TICAC).<br />
Assim, essa solução possível para resolver aquele grave problema passa<br />
necessariamente pela construção de territórios inovadores, mas inclusivos e solidários,<br />
cujo “sucesso” depende principalmente de: estratégia baseada na solidariedade territorial,<br />
mediante a afirmação da identidade cultural; processos de natureza endógena; (auto)gestão<br />
associativa entre representantes públicos e privados, em especial via extensão universitária;<br />
e originalidade desse território. É a inclusão social reduzindo o TED no TES via Inclusão<br />
Digital por Extensão Universitária (ISI<strong>DE</strong>U) catalisada exponencialmente por<br />
Tecnologias da Informação e da Comunicação de Alta Complexidade (TICAC), no<br />
Processo de Desenvolvimento Local (PDL) num “alinhamento global” de SIECIH.<br />
2.2 Instrumentos de Inclusão Digital<br />
Nesse PDL, um dos Instrumentos de Inclusão Digital (IID) é o telecentro como<br />
“espaço que contribui para o acesso à Internet de setores da população infoexcluída e<br />
que colabora para a apropriação das TICAC”.<br />
No caso de cada telecentro do programa do governo federal brasileiro, esse IID<br />
parece possuir dois papéis (CGI.BR, 2014): por um lado, atender a uma parte da população<br />
desprovida do acesso a computador conectado à Internet; e, por outro lado, também<br />
atender a uma multiplicidade de propósitos - principalmente, a oferta de cursos e a<br />
orientação para o uso das TIC. Nesses dois papéis, o telecentro influencia “dimensões<br />
fundamentais“ para a “apropriação da tecnologia” (CGI.BR, 2014): o acesso para a<br />
população de baixa renda ou residente em áreas desprovidas de boas opções de serviço de<br />
Internet; e a formação de habilidades entre os usuários recentes ou menos escolarizados.<br />
Todavia, na percepção dos usuários e gestores dos telecentros promovidos pelo governo<br />
federal brasileiro ainda existem alguns desafios a superar. E, como o que está em jogo é “a<br />
entrada de parcelas importantes da população na sociedade da informação” (CGI.BR,
8<br />
2014), as políticas públicas devem ir além do oferecimento de acesso aos<br />
equipamentos, como computadores e conexão de Internet, criando condições para o uso<br />
efetivo dessas tecnologias em atividades que possam gerar benefícios nos países e<br />
indivíduos conectados, em todas as dimensões socioeconômicas. Porém, segundo Mansell<br />
e Tremblay (2015), devem-se criticar e rejeitar: “modelos simplistas baseados no<br />
determinismo tecnológico e abordagens autoritárias de cima para baixo”; e favorecimento<br />
desequilibrado a valores de mercado.<br />
Entretanto, ao integrarmos todos os tópicos do trabalho de Mansell e Tremblay<br />
(2015) para a UNESCO, essa crítica e rejeição constituem o ponto de partida na<br />
renovação da visão das sociedades do conhecimento rumo à “prática participativa” nestas.<br />
Num percurso pelo qual se vai construindo a infraestrutura para informação aberta e<br />
aprendizagem, facilitando o acesso à informação e à produção de conhecimento,<br />
administrando a produção de informação e conhecimento e aprendendo com sucessos e<br />
fracassos. Um percurso ao longo do qual se pode aproveitar a “receita” em oito etapas para<br />
solucionar o que Earley (2013, tradução livre) afirmou sobre a resistência empresarial em<br />
abordar o acesso à informação e ao dizer que enfrentar a integração é similar ao problema<br />
de ‘ferver o oceano’. Mas que, segundo ele, não precisa ser assim porque é possível focar<br />
uma solução crítica do “negócio” mantendo-se uma perspectiva “empresarial” para<br />
construir o valor da informação de forma incremental.<br />
2.3 Integração Programática<br />
Considerando-se o propósito, a temática e a finalidade deste artigo, destacamos a<br />
integração programática do governo federal brasileiro e de um dos seus governos<br />
estaduais relevante para o nosso estudo: o PRONINC cuja finalidade é o fortalecimento<br />
dos processos de incubação de empreendimentos econômicos solidários (BRASIL, 2010);<br />
o PROEXT (BRASIL, 2008) que segundo a DPPGES 6 (2014) aponta para uma extensão<br />
universitária como sendo um processo articulador de ensino e pesquisa, universidade e<br />
movimentos sociais, que “deve abandonar a concepção tradicional do assistencialismo,<br />
da prestação de serviços e da realização de eventos”; a ITEP/UENF, como programa de<br />
extensão universitária estadual regional, cuja “função social” é incubar grupos excluídos<br />
com capacidade de autogestão e de se autossustentarem, formando empreendimentos<br />
solidários (UENF/CONSUNI, 2009); e <strong>TELECENTROS</strong>.BR, como um programa nacional<br />
de apoio à inclusão digital nas comunidades como Instrumento de Inclusão Digital (IID),<br />
6 Diretoria de Políticas e Programas de Graduação da Educação Superior (DPPGES) da Secretaria de<br />
Educação Superior (SES) do Ministério da Educação do Brasil (MEC).
9<br />
numa iniciativa instituída 7 pela Presidência da República (BRASIL, 2009) 8 que<br />
reconfigura o território digital brasileiro, implantando e mantendo telecentros públicos<br />
comunitários em todo o território brasileiro.<br />
Porém, neste artigo emerge diretamente apenas a interrelação bem evidente entre<br />
<strong>TELECENTROS</strong>.BR e a ITEP/UENF.<br />
2.4 Objetivos Geral e Específicos<br />
Para mostrar especificamente um tipo de inovação social local, destacamos uma<br />
reconfiguração cibercultural local, no Brasil, feita por dois programas: um, do governo<br />
federal, focado na inclusão social via inclusão digital; o outro, de governo estadual, focado<br />
na inclusão social via incubação de empreendimentos solidários. Ambos aplicáveis a<br />
grupos sociais excluídos residindo na microrregião Campos dos Goytacazes (mCG), da<br />
Mesorregião Norte Fluminense (MNF), na Unidade Federativa (UF) Rio de Janeiro. Em<br />
especial, telecentros comunitários autogestionários para atender a grupos sociais<br />
excluídos residindo em bairros confinados em Territórios de Exclusão Digital (TED)<br />
confinados por sua vez em Territórios de Exclusão Social (TES). TED que têm sido “alvos<br />
alegadamente preferidos” de políticas públicas para comunidades carentes, mediante<br />
programas de inclusão digital, de economia solidária e de extensão universitária. Políticas e<br />
programas nem sempre integrados na sua formulação, implementação e controle.<br />
Por isso, o objetivo geral deste artigo é perceber alguns impactos na inovação<br />
social local via inclusão digital local por telecentro comunitário local autogestionário<br />
incubado como empreendimento solidário.<br />
Para esse entendimento, estabelecemos estes cinco objetivos específicos: 1)<br />
diagnosticar a situação da implantação dos vinte e dois telecentros incubados pela<br />
Incubadora Tecnológica de Empreendimentos Populares (ITEP); 2) diagnosticar o<br />
alinhamento desses telecentros às diretrizes (exógenas) Programa “Telecentros.BR”; 3)<br />
identificar e qualificar impactos nas prioridades sociais causados por esses telecentros; 4)<br />
diagnosticar a solidariedade desses telecentros nos bairros onde foram implantados; e 5)<br />
identificar e qualificar a catalisação da gestão esses telecentros pela ITEP.<br />
7 Instituída no âmbito da política de inclusão digital do Governo Federal, pelo Decreto Nº 6.991, de 27 de<br />
outubro de 2009. Alterado pelo Decreto Nº 7.038, de 21 de dezembro de 2009. Regulamentado pela Portaria<br />
Conjunta MP/MCT/MC Nº 535, de 31 de dezembro de 2009. Aviso de Seleção Pública MP/MCT/MC Nº<br />
1/2010 - edital para apresentação de propostas. Coordenação por três Ministérios: o do Planejamento,<br />
Orçamento e Gestão; o das Comunicações e o da Ciência e Tecnologia.<br />
8 Por portaria publicada cerca de três anos depois, a Secretária de Inclusão Digital (SID) do Ministério das<br />
Comunicações (BRASIL, 2012) estabeleceu diretrizes e normas para a execução do Programa<br />
“Telecentros.BR”.
10<br />
Para entender mais aprofundadamente essa inovação social local, estabelecemos a<br />
seguir uma metodologia, bem como apresentamos um diagnóstico e um prognóstico acerca<br />
dos vinte e dois telecentros propostos por uma universidade regional da UF Rio de<br />
Janeiro: a Universidade Estadual Norte Fluminense (UENF).<br />
3 METODOLOGIA<br />
Mansell e Tremblay (2015) dizem que “Nós não podemos oferecer uma análise<br />
sistemática de todo segmento da sociedade para [a] qual as redes digitais e o acesso à<br />
informação e ao conhecimento sejam cruciais. Tampouco daremos exemplos de cada país<br />
ou região do mundo e não buscaremos capturar toda a experiência acumulada nos setores<br />
público, privado e da sociedade civil”.<br />
Nós também não e tampouco. Assim, como “arte de guiar o espírito na investigação<br />
da verdade”, usamos esta metodologia híbrida (fig.1): I) analisar sistemicamente as<br />
observações das pesquisas-ações da equipe digital da ITEP feitas entre janeiro de 2013<br />
e abril de 2015 aos vinte e dois telecentros propostos pela UENF e incubados pelo<br />
programa de extensão desta (PROEX/ITEP); II) elaborar seis Matrizes e Indicadores de<br />
Análise Sistêmica Integrada e Interdependência Funcional de Telecentros<br />
Autogestionários Locais (MIASIIFTAL) - endogênese (MIITALTPC e MIAPTAL),<br />
exogênese (MIESPTAL e MISETAL) e exoendogenia (MIEITAL) - matriz de indicador<br />
de indicadores integrados, para perceber a economia da informação daqueles telecentros,<br />
sem adentrar na histogênese 9 das respectivas “entidades beneficiárias” consideradas pelo<br />
programa Telecentros.BR (fig.2); e III) estruturar e estabelecer a nossa hipótese de<br />
trabalho, numa adaptação tanto do preconizado por Soriano (2004) para a pesquisa social<br />
quanto dos “5+1” efeitos prioritários de Sey et al. (2013) no desenvolvimento orientado<br />
para a inclusão social de uma/numa “comunidade carente local”.<br />
Para essa análise e esse entendimento sistêmico, desenvolvemos seis matrizes e<br />
respectivos indicadores: 1) Matriz e Indicador de Inclusão de Telecentros<br />
Autogestionários Locais no Território Prioritário da Cidadania (MIITALTPC),<br />
conforme ID dos Telecentros Novos do Termo de Cooperação Técnica referente à<br />
Proposta SIATC nº 1159 (UENF) selecionada para apoio do Programa Telecentros.BR; 2)<br />
Matriz e Indicador de Alinhamento Programático de Telecentros Autogestionários<br />
Locais (MIAPTAL), de acordo com as diretrizes do Programa Telecentros.BR e tendo<br />
como pano de fundo a pesquisa feita pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.BR,<br />
9 Adaptação da Biologia. Nesta, a Histogênese ou histogenia: formação e desenvolvimento de diferentes<br />
“tecidos embrionários" de um organismo a partir de “células indiferenciadas”.
11<br />
2014); 3) Matriz e Indicador de Efeitos Sociais Prioritários de Telecentros<br />
Autogestionários Locais (MIESPTAL), conforme efeitos prioritários desaglutinados de<br />
Sey et al. (2013) e esperados por uma autogestão, na estruturação de nossa hipótese mais<br />
adiante; 4) Matriz e Indicador SocioEconômicos de Telecentros Autogestionários<br />
Locais (MISETAL), conforme vinte e quatro elementos gerais de inclusão social humana<br />
via autogestão de telecentros novos na mediação local para um rumo aceitável na<br />
Economia Humana (“forçosamente“ uma Economia Solidária), “traçado” por uma<br />
sociedade de dados, informação e conhecimento ou, melhor, pela Sociedade da<br />
Informação da Era do Conhecimento/Ignorância Humanos (SIECIH); 5) Matriz e<br />
Indicador do Processo de Incubação de Telecentros Autogestionários Locais<br />
(MIPITAL), a partir de trabalhos da equipe digital da ITEP; e 6) Matriz e Indicador da<br />
Economia da Informação de Telecentros Autogestionários Locais (MIEITAL), partindo<br />
de uma situação de “informação inexistente” para outra situação mediante a integração das<br />
quatro matrizes anteriores - “informação disponível” (ou “disponibilizada”) e “informação<br />
não disponível”.<br />
Figura 2- Metodologia híbrida: Matrizes e Indicadores de Análise Sistêmica Integrada e<br />
Interdependência Funcional de Telecentros Autogestionários Locais (MIASIIFTAL)<br />
Elaboração: autor <strong>DA</strong> COSTA FERREIRA, 2015<br />
Após a inserção qualitativa objetiva/subjetiva em cada célula de cada uma das<br />
quatro primeiras matrizes, usando uma tabela única de dados validados numa única<br />
integração escalar “tipo Likert”, todas essas matrizes funcionam automaticamente por
12<br />
fórmulas protegidas. Na sexta e última matriz não haverá qualquer intervenção humana<br />
na inserção de dados, pois o preenchimento de cada célula far-se-á usando apenas fórmulas<br />
protegidas para consolidar de forma integrada aquelas quatro matrizes.<br />
Complementarmente, os desvios em relação aos valores máximos esperados em<br />
todos os níveis de cada matriz constituirão indicadores de exclusão. Contudo, estes<br />
indicadores fogem ao escopo deste nosso artigo que, também: não aborda a estrutura,<br />
gestão e processos de incubação da incubadora (ITEP); nem se abeira da estrutura, gestão<br />
e processos da extensão universitária (PROEXT do Governo Federal e PROEX da UENF);<br />
e nem se aproxima da estrutura, gestão e processo para a indissociabilidade de ensino,<br />
pesquisa e extensão universitários (UENF).<br />
3.1 Estruturação da Hipótese<br />
Conforme explicitado no quadro 1 a seguir, a nossa hipótese foi estruturada a partir<br />
daquelas matrizes e respectivos indicadores, deste modo: 1) a unidade de análise é o<br />
telecentro; 2) o objeto de análise é a autogestão; e 3) a ligação entre essa unidade e esse<br />
objeto é feita por setenta e seis variáveis de análise (VA) que são qualitativas e foram<br />
relacionadas por um número sequencial, na sua integração sistêmica, e pelo número na<br />
respectiva matriz, na sua interdependência funcional.<br />
As setenta primeiras dessas variáveis (VA1 a VA70) foram interrelacionadas na<br />
nossa função inicial (Eq.1) por outras equações auxiliares nas respectivas matrizes e que<br />
não cabem neste artigo: a variável dependente,VA25 (ESP→0), Efeitos Sociais<br />
Prioritários; a variável independente, VA36 (EISH→0), Elementos de Inclusão Social; a<br />
primeira variável interveniente, VA1 (ITBR→0), Implantação de Telecentros.BR; a<br />
segunda variável interveniente, VA6 (DTBR→0), Diretrizes de Telecentros.BR; e a<br />
terceira variável interveniente, VA61 (PIT→0), Processo de Incubação de Telecentros.<br />
VA25 = VA1 + VA6 + VA36 + VA61 (Equação 1)<br />
Assim, dessa função inicial (Eq.1) estabelecemos a nossa hipótese inicial neste<br />
artigo: os elementos de inclusão social de um telecentro (VA36) mediante a<br />
implantação e diretrizes do programa federal Telecentros.BR de inclusão digital (VA1<br />
e VA6) e sob um processo de incubação de telecentro (VA61) formam uma<br />
exoendogenia que causa efeitos sociais prioritários (VA25).<br />
No entanto, para efeitos de nosso diagnóstico (quadro 2), as outras seis dessas<br />
variáveis (VA71 a VA76) correspondem aos indicadores das cinco primeiras matrizes<br />
(MIITALTPC, MIAPTAL, MIESPTAL, MISETAL e MIPITAL) que foram<br />
interrelacionadas na última matriz (MIEITAL) e na nossa função objetivo (quadro1 e
13<br />
Quadro 1- MIEH: Matrizes, Indicadores e Estruturação da Hipótese<br />
Elaboração: coautor <strong>DA</strong> COSTA FERREIRA, 2015
14<br />
Eq.2): a variável dependente, VA71 (EIT→0), Economia da Informação dos Telecentros,<br />
cujo indicador é a “qualidade da autogestão do telecentro”; a variável independente,<br />
VA75 (EIT→4), Solidariedade do Telecentro; a primeira variável interveniente é a VA72<br />
(EIT→1), Situação da Implantação do Telecentro; a segunda variável interveniente é a<br />
VA73 (EIT→2), Alinhamento a Diretrizes Exôgenas; a terceira variável interveniente é a<br />
VA76 (EIT→5), Catalisação da Gestão do Telecentro; e uma variável particular, VA74<br />
(EIT→3), Impacto nas Prioridades Sociais, que, a partir de Sey et al. (2013), é uma<br />
variável de “efeito fundamental de primeira ordem” de autogestão de um telecentro.<br />
VA71= VA72 + VA73 + VA74 + VA75 + VA76 (Equação 2)<br />
Logo, dessa maneira estruturada e usando apenas os seis indicadores acima<br />
referidos, esta é a nossa hipótese de trabalho (que fundamentou o título e subtítulo deste<br />
artigo): a solidariedade do telecentro (VA75) mediante a situação da implantação<br />
desse telecentro (VA72) e seu alinhamento a diretrizes exôgenas (VA73), por<br />
catalisação da gestão do telecentro (VA76), formam uma exoendogenia que causa<br />
impacto nas prioridades sociais (VA74) e na qualidade da autogestão do telecentro<br />
(indicador da VA71, Economia da Informação dos Telecentros).<br />
3.2 Escala Quali-Quant-Percen<br />
Para a avaliação dos resultados da pesquisa-ação, Thiollent (1997) alerta que essa<br />
avaliação é mais qualitativa que quantitativa, pois “medição sem conceito ou sem<br />
apreensão qualitativa dos fenômenos não faz sentido”. Portanto, as médias matemáticas<br />
não são suficientes.<br />
Figura 3- Integração sistêmica e/ou de interdependência funcional<br />
Níveis quali / quant / percen “interativos”<br />
Elaboração: autor <strong>DA</strong> COSTA FERREIRA, 2014<br />
Neste artigo - para evidenciar o nível quali/quant/percen de integração sistêmica<br />
e/ou de interdependência funcional relativamente a todas as observações da pesquisa-ação<br />
pertinentes às matrizes e aos indicadores já referidos - usaremos uma integração escalar 10<br />
10 Adaptada da técnica de Likert (1932)
15<br />
para medir intuitivamente atitudes e equivaler grandezas (fig.2). Por alinhamentos nessa<br />
“pequena” escala, partimos de uma situação de informação inexistente para outra<br />
situação: informação disponibilizada ou não disponível.<br />
Na integração escalar dessas observações, a entrada é sempre “qualitativa” (quali).<br />
Porém, para determinar a qualidade principal (“média”) usando fórmulas do Microsoft<br />
Office Excel 2007, a entrada é sempre “quantitativa” (quant) - pois a fórmula da aplicação<br />
para o cálculo da “média” só funciona com números. O mesmo acontece para calcular<br />
“somas”, “contagens”, “médias” ou “outras medidas” quantitativas. Finalmente, para<br />
proporcionalidades, a entrada é sempre “percentual” (percen).<br />
3.3 Pesquisa-ação<br />
Por um lado, Thiollent (1997), afirma que o compromisso da pesquisa-ação é geral<br />
na busca pela autonomia coletiva. Em termos de metodologia da pesquisa-ação, esse autor<br />
diz que, para diagnosticar problemas e buscar soluções para uma organização, o<br />
pesquisador deve conduzir os atores locais a formular perguntas sobre a situação em que<br />
vivem. Adicionalmente, ele assevera que a informática apresenta-se como uma<br />
ferramenta bastante eficiente e eficaz no processo de captação e organização de dados - e<br />
que a tendência é que ela possa auxiliar cada vez mais no aprimorando dos procedimentos,<br />
no ganho de tempo e no aumento da segurança das informações coletadas.<br />
Fizemos análises sistematizadas, consolidadas por uma integração escalar:<br />
primeiro, da endogênese ou endogenia desses telecentros; a seguir, da exogênese ou<br />
exogenia destes; e, finalmente, da sua exoendogenia. No entanto, a endogênese ou<br />
endogenia é aparente, pois emerge da implantação e do funcionamento dos vinte e dois<br />
telecentros em obediência às diretrizes estabelecidas pelo programa federal brasileiro.<br />
Enquanto que a exogênese ou exogenia é genuína, porquanto esses dois programas,<br />
embora promotores e auxiliares da gênese e gestão daqueles telecentros, são exteriores a<br />
estes. Mais precisamente, esses programas são externos à “organização interna” e à<br />
“autogestão” desses telecentros. Por fim, a exoendogenia resulta da simultaneidade da<br />
endogenia e exogenia, observadas nas pesquisas (fontes primárias), nas fontes secundárias<br />
e nas análises de dados.<br />
4 <strong>TELECENTROS</strong> INCUBADOS PELA ITEP/UENF<br />
O PRONINC (BRASIL, 2010) faz estas distinções: empreendimentos econômicos<br />
solidários são organizações de caráter associativo que realizam atividades econômicas,<br />
cujos participantes sejam trabalhadores do meio urbano ou rural e exerçam<br />
democraticamente a gestão das atividades e a alocação dos resultados; incubação de
16<br />
empreendimentos econômicos solidários é o conjunto de atividades sistemáticas de<br />
formação e assessoria que abrange desde o surgimento até a conquista de autonomia<br />
organizativa e viabilidade econômica dos empreendimentos econômicos solidários; e<br />
incubadoras de cooperativas populares são organizações que desenvolvem as ações de<br />
incubação de empreendimentos econômicos solidários e atuam como espaços de estudos,<br />
pesquisas e desenvolvimento de tecnologias voltadas para a organização do trabalho, com<br />
foco na autogestão.<br />
Conforme publicado no Diário Oficial da União de 27/04/2010, a Proposta ID 1159<br />
(UENF) foi selecionada 11 junto ao Programa Nacional de Apoio à Inclusão Digital nas<br />
Comunidades – Telecentros.BR. Dessa proposta faziam parte vinte e dois telecentros<br />
novos a implantar, em quatro etapas, na microrregião de Campos dos Goytacazes, RJ,<br />
inserida num Território Prioritário do governo federal brasileiro: o Território da<br />
Cidadania (Ministério do Desenvolvimento Agrário - M<strong>DA</strong>).<br />
Como entidade proponente desse programa do governo federal brasileiro, a<br />
ITEP/UENF iniciou a implantação de várias ações logo que chegaram os equipamentos às<br />
entidades beneficiárias. Depois que toda a infraestrutura já estava instalada e pronta para<br />
sua efetiva utilização, o Coordenador Geral do Projeto Telecentros.BR na UENF, com a<br />
equipe de inclusão digital da ITEP (CARRASQUILLA et al., 2012 e 2013), confirmaram<br />
que havia uma tendência ao desconhecimento dos parâmetros que deviam orientar a prática<br />
de gestão comunitária desses telecentros que afastava os usuários residentes do acesso a<br />
esta tecnologia de informação. Por isso, eles acreditavam que era possível tornar o projeto<br />
viável sob as concepções e diretrizes pensadas. Porém, só na força das parcerias e nos<br />
benefícios dos trabalhos conjuntos, alinhados num único discurso e num Plano de Gestão<br />
adequado à prática e à conscientização da efetiva participação da população. Mais adiante,<br />
disseram que o grande desafio era estabelecer, com todos os atores envolvidos, um modelo<br />
de gestão de telecentro que incluísse digitalmente, com qualidade, pessoas residentes num<br />
determinado território. Com o objetivo de ampliar o uso intensivo da tecnologia da<br />
informação, o acesso a informação e educação, bem como o fortalecimento do<br />
protagonismo das próprias comunidades. Acrescentaram que os maiores problemas<br />
enfrentados na gestão desses espaços de inclusão digital se referiam à: 1) baixa qualidade<br />
da internet ofertada pelo Ministério das Comunicações; 2) incompatibilidade do Software<br />
com as conexões via internet; e 3) necessidade de qualificação das lideranças locais para<br />
11 A UENF entre as proponentes que atenderam ao Aviso de Seleção Pública MP/MCT/MC nº 01/2010,<br />
publicado no Diário Oficial da União de 24/02/2010.
17<br />
realizar uma gestão sustentável dos telecentros nos territórios. Sempre lembrando que esses<br />
telecentros, em zonas urbano-periféricas, têm como característica básica estarem<br />
inseridos em comunidades pobres onde é precário o acesso a educação, saúde,<br />
moradia, transporte e outros equipamentos de políticas públicas.<br />
Entretanto, após visitas realizadas no primeiro semestre de 2013 pela equipe de<br />
inclusão digital da ITEP (CARRASQUILLA et al, 2013), desses vinte e dois telecentros:<br />
só sete estavam abertos - destes nenhum tinha bolsista e apenas cinco tinham internet;<br />
treze telecentros estavam fechados - destes nenhum tinha bolsista e apenas quatro tinham<br />
internet; e dois telecentros devolveram os equipamentos recebidos pelo programa.<br />
4.1 Diagnóstico em maio/2015<br />
Quadro 2- MIEITAL: Telecentros X Economia da Informação<br />
Elaboração: coautor <strong>DA</strong> COSTA FERREIRA, 2015<br />
O nosso diagnóstico (quadro 2) está devidamente explicitado e é preciso o quanto<br />
baste para mostrar-nos uma evolução bem positiva a partir do que a equipa de inclusão<br />
digital da ITEP/UENF observou, registrou e apresentou em 2013: o indicador da “situação<br />
da implantação” (1) dos vinte e dois telecentros evidencia é “BOM”.<br />
O mesmo diagnóstico se aplica ao indicador “alinhamento a diretrizes exôgenas”<br />
(2), apesar do péssimo resultado observado num dos telecentros (32434) - porque ele está<br />
em fase de transferência.
18<br />
Porém, no que concerne ao almejado impacto positivo nas prioridades sociais (3) e<br />
à tão incentivada solidariedade desses telecentros (4), o diagnóstico é “RUIM”.<br />
Finalmente, o indicador que evidencia a ação da incubadora no processo de gestão desses<br />
telecentros (5), também é “RUIM”, destacando-se três telecentros “PÉSSIMOS” (31922,<br />
31961 e 32108) e apenas um “RAZOÁVEL” (32339).<br />
Desse modo, observando-se apenas a integração dos cinco pilares (1-5) de nossa<br />
função objetivo, o nosso diagnóstico geral revela que, em média, os vinte e dois<br />
telecentros, incubados pela ITEP como programa de extensão universitário<br />
(UENF/PROEX), estão neste estágio geral: RAZOÁVEL. Na realidade, apenas um dos<br />
que ainda está em fase de transferência está no estágio “RUIM”, todos os outros vinte e um<br />
telecentros estão naquele estágio geral.<br />
4.2 Prognóstico para jun-dez/2015<br />
Considerando esse estágio como marco zero de reforma de pensamento e revisão de<br />
visão, este é o nosso prognóstico: um rumo ACEITÁVEL para a autogestão e mediação<br />
locais desses telecentros, mas com reservas severas no que tange aos três pilares (3, 4 e 5)<br />
diagnosticados como “RUINS”. Isso exigirá uma atenção mais que redobrada para estes<br />
“quesitos” desses telecentros: sinergia (3), solidariedade (4) e incubação (5)<br />
5 CONCLUSÃO<br />
Usando a nossa escala Quali-Quant-Percen, o diagnóstico geral indica-nos que a<br />
“razoável” autogestão dos vinte e dois telecentros incubados está entre 40% e 60%. Ora,<br />
independentemente das condições verificadas e relatadas pela equipe de inclusão digital da<br />
ITEP/UENF, a ponte da Economia Solidária para a Economia da Informação balança no<br />
seu rumo “aceitável” e, por isso, pode desestruturar-se se for interrompida a integração<br />
programática atual. Mesmo acontecendo essa eventual interrupção ou até cessação, os<br />
resultados aqui obtidos podem constituir um alento para o enfrentamento efetivo, eficiente<br />
e eficaz da complexidade dos empreendimentos populares que se querem autogestionários<br />
nas potencialidades, limitações, desafios e riscos, usando tecnologias de informação na<br />
integração de sistemas.<br />
Mansell e Tremblay (2015) afirmaram que o contexto de governança e políticas<br />
para sociedades do conhecimento é cada vez mais imprevisível e também apresenta muitos<br />
novos desafios. Por isso, segundo eles, o ambiente de políticas públicas precisa ser<br />
flexível o suficiente para garantir que atores não fiquem presos em caminhos<br />
insustentáveis como resultado da falta de reflexão e ação direcionados aos problemas<br />
conforme eles surgem.
19<br />
Apesar dos impactos observados terem sido muito abaixo de nossas expectativas,<br />
tanto a nossa hipótese inicial quanto a nossa hipótese deste trabalho verificaram-se.<br />
Finalizamos com um desafio da autogestão local/regional com mediação solidária<br />
para a inclusão social via inclusão digital, complementando Mansell e Tremblay (2015):<br />
Nem todas as iniciativas voltadas à construção de sociedades do conhecimento<br />
se preocupam com o potencial de empoderamento [não encilhamento ou<br />
aproveitamento] das comunidades locais ou grupos desprivilegiados ou<br />
excluídos. Aquelas [iniciativas] que enfatizam caminhos rumo à paz e ao<br />
desenvolvimento sustentável geralmente adotam um modelo participativo<br />
construído de “baixo para cima” [bottom→up; não top→down]. (...) O sucesso<br />
precisa ser avaliado tendo em vista os interesses e aspirações de todos aqueles<br />
que esperam se engajar efetivamente nas sociedades do conhecimento.<br />
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______. Programa Nacional de Apoio à Inclusão Digital nas Comunidades - Telecentros.BR. Casa Civil<br />
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______. Programa de Extensão Universitária - PROEXT. Casa Civil - Subchefia para Assuntos Jurídicos.<br />
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