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Publicação Mensal Ano XV - Nº <strong>166</strong> Janeiro de 2012<br />
Um ideal almejado:<br />
a Civilização Cristã!
Ao contrário do moço rico do Evangelho,<br />
Santo Antão disse sim a Nosso Senhor<br />
Em sua mocidade, Santo<br />
Antão era muito rico.<br />
Quando tinha 18 anos,<br />
seus pais morreram, tendo ele<br />
herdado enorme fortuna.<br />
Certo dia, ele caminhava para<br />
uma igreja, meditando sobre a<br />
vantagem de se despojar dos bens<br />
terrenos a fim de seguir mais de<br />
perto a Nosso Senhor. Ao entrar<br />
no templo, encontrou o sacerdote<br />
fazendo um sermão sobre o moço<br />
rico do Evangelho, o qual recusou<br />
o chamado de Nosso Senhor<br />
por não querer abandonar tudo<br />
quanto possuía.<br />
Diante disso, Santo Antão<br />
tomou a seguinte resolução: “Eu<br />
serei o moço rico que vai dizer<br />
sim para Cristo; o convite d’Ele<br />
não ficará sem uma resposta<br />
afirmativa; darei o que o outro<br />
não deu.” E entregou tudo, foi<br />
para o deserto e tornou-se um<br />
gigante do eremitismo antigo.<br />
H. Grados<br />
(Extraído de conferência de<br />
7/3/1970)<br />
Santo Antão - Granada Espanha.<br />
2
Sumário<br />
Publicação Mensal Ano XV - Nº <strong>166</strong> Janeiro de 2012<br />
Ano XV - Nº <strong>166</strong> Janeiro de 2012<br />
Um ideal almejado:<br />
a Civilização Cristã!<br />
Na capa, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> em<br />
outubro de 1989; ao<br />
fundo, Palácio Real<br />
de Olite, Espanha.<br />
Fotos: M. Shinoda; Hugo Grados.<br />
As matérias extraídas<br />
de exposições verbais de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />
— designadas por “conferências” —<br />
são adaptadas para a linguagem<br />
escrita, sem revisão do autor<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />
<strong>Revista</strong> mensal de cultura católica, de<br />
propriedade da Editora Retornarei Ltda.<br />
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Serviço de Atendimento<br />
ao Assinante<br />
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Editorial<br />
4 É possível haver uma Civilização Cristã?<br />
Datas na vida de um cruzado<br />
5 Janeiro de 1988<br />
Mais um ano de lutas!<br />
Dona Lucilia<br />
6 Bondade e humildade,<br />
virtudes que se completam!<br />
Hagiografia<br />
10 São Raimundo de Peñafort,<br />
símbolo de uma época…<br />
De Maria Nunquam Satis<br />
16 A Jesus, por Maria<br />
Calendário dos Santos<br />
20 Santos de Janeiro<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> comenta...<br />
22 Candura, vigilância e holocausto<br />
O pensamento filosófico de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />
26 Instintos e IV Revolução<br />
Luzes da Civilização Cristã<br />
30 A Civilização Cristã:<br />
fruto da graça<br />
3
Editorial<br />
É possível haver uma<br />
Civilização Cristã?<br />
Ao escrever seu ensaio “Revolução e Contra-Revolução”, em 1959, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> apontou cinco carácteres<br />
da Revolução: ela é una, universal, total, dominante e processiva. Porém, já no fim da<br />
vida, afirmou poder-se acrescentar mais um: seu carácter multitudinário.<br />
“É a multidão, sim, a multidão incontável dos que [...] promovem ou simplesmente toleram a ofensiva<br />
impune e avassaladora da propaganda revolucionária, oral ou escrita.<br />
“Se a Revolução fosse simplesmente uma ideologia tendo a seu serviço o impulso, faltar-lhe-ia importância<br />
histórica. É o carácter multitudinário da Revolução o fator mais importante do seu êxito.” 1<br />
Com efeito, muita gente se deixa arrastar pelos mitos revolucionários, por crer que todo o mundo pensa<br />
desse modo, e, não tendo coragem de enfrentar a maioria, verga-se à opinião dominante. Pois o instinto<br />
de sociabilidade leva o homem a não querer romper as relações com os seus semelhantes, preferindo<br />
ceder, abdicando de suas opiniões ou convicções, a ficar isolado por contrariar a opinião pública.<br />
É por isso que a Revolução, conhecedora e hábil manipuladora do instinto de sociabilidade, sempre se<br />
apresenta, aos olhos do público, com o apoio das maiorias. E assim ela impõe modas, maneiras de ser e<br />
de pensar, condutas morais, etc. Embora muitos preferissem pensar e ser diferentes, porque julgam que<br />
todo o mundo pensa segundo os padrões revolucionários, poucos conseguem praticar a proeza de discordar.<br />
Por esse mecanismo psicológico, ligado ao instinto de sociabilidade, a Civilização Cristã é tida por<br />
todo o mundo como uma utopia, como algo irrealizável na ordem prática.<br />
Sem dúvida, tendo a sociedade contemporânea voltado as costas para Deus, torna-se difícil a prática<br />
de sua Lei para os indivíduos, por falta de apoio dos semelhantes. Ora, se manter o estado de graça é tão<br />
difícil para uma pessoa isolada, não o seria ainda mais para toda a sociedade em seu conjunto?<br />
Há, contudo, uma forma de provar a possibilidade de uma sociedade autenticamente cristã: mostrar<br />
que ela já existiu no passado. A este respeito, afirmou Leão XIII: “Tempo houve em que a filosofia do<br />
Evangelho governava os Estados. Nessa época, a influência da sabedoria cristã e a sua virtude divina penetravam<br />
as leis, as instituições, os costumes dos povos, todas as categorias e todas as relações da sociedade<br />
civil.” 2 Portanto, o que hoje é tido como utopia foi outrora realidade.<br />
No presente número da revista, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> aborda a questão, sob um ponto de vista original, mostrando<br />
como a Civilização Cristã existiu na Idade Média, em muitos países da Europa. Eis um elemento a<br />
mais para reforçar a certeza do cumprimento da promessa feita por Nossa Senhora, em Fátima, do triunfo<br />
de seu Imaculado Coração e do advento de seu reinado.<br />
1) Corrêa de Oliveira, <strong>Plinio</strong>. Nobreza e elites tradicionais análogas — nas alocuções de Pio XII ao Patriciado e à<br />
Nobreza romana. Porto: Livraria Civilização-Editora, 1993.<br />
2) Acta Sanctae Sedis, Typis Polyglottae Officinae, Romae, 1885, vol. XVIII, p. 169.<br />
Declaração: Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontífice Urbano VIII, de 13 de março de 1625 e<br />
de 5 de junho de 1631, declaramos não querer antecipar o juízo da Santa Igreja no emprego de palavras ou<br />
na apreciação dos fatos edificantes publicados nesta revista. Em nossa intenção, os títulos elogiosos não têm<br />
outro sentido senão o ordinário, e em tudo nos submetemos, com filial amor, às decisões da Santa Igreja.<br />
4
Datas na vida de um cruzado<br />
Janeiro de 1988<br />
Mais um ano de lutas!<br />
M. Shinoda<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> durante uma<br />
conferência, em 1988.<br />
Ao iniciar um<br />
novo ano, <strong>Dr</strong>.<br />
<strong>Plinio</strong> não<br />
perdia a ocasião para<br />
animar seus jovens seguidores.<br />
Em perspectiva<br />
das lutas e conquistas<br />
que empreenderiam<br />
em favor da<br />
causa católica e do<br />
progresso espiritual de<br />
cada um, iniciava ele o<br />
seu primeiro “Santo do<br />
Dia” de 1988:<br />
Meus caros, iniciamos<br />
nossa primeira<br />
reunião do ano. Como<br />
vai estar o mundo<br />
quando chegarmos<br />
à última? Como<br />
estaremos quando<br />
chegarmos à última<br />
reunião deste ano que agora começamos?<br />
Há um ano inteiro de esperanças, com quantas<br />
possibilidades de lutar e vencer por Nossa<br />
Senhora, diante de nós. Como é bom e animador<br />
pensarmos nisto. Mas, basta apenas pensar<br />
nisto, ou devemos pensar também em outra<br />
coisa?<br />
Quantos começam o ano animados e o terminam<br />
desanimados; quantos começam o ano progredindo<br />
na virtude e o terminam estagnados<br />
ou, pior ainda, decadentes...<br />
Na formação dada a seus discípulos, <strong>Dr</strong>.<br />
<strong>Plinio</strong> nunca ocultava os riscos que correriam<br />
na correspondência à graça. Mas, neste caso<br />
concreto, alguém poderia objetá-lo, dizendo não<br />
ser este o melhor modo de impostar um ano que se<br />
inicia: “Afinal, um novo ano é pretexto para falar<br />
das coisas positivas, que animam, não das coisas<br />
que desanimam e tiram a coragem.”<br />
Ora, como ele próprio nos mostra a seguir, os<br />
mais belos momentos da vida são aqueles onde<br />
nos encontramos entre o risco e a esperança.<br />
Imaginemos um soldado que, ao entrar em<br />
guerra, ouve dizer:<br />
— Daqui a um ano esta guerra estará ganha<br />
ou perdida. Inúmeras são as possibilidades de<br />
nela você se destacar e, assim, alcançar a patente<br />
de capitão, ganhar grandes condecorações,<br />
ser conhecido mundialmente por vitórias brilhantes.<br />
Mas, de outro lado, grandes são os riscos<br />
de você levar uns tiros e acabar mutilado; ser<br />
derrotado e terminar jogado em uma enxovia<br />
qualquer, porque foi apanhado.<br />
Certamente, ao ouvir a primeira parte a pessoa<br />
exclamaria “fenomenal”; mas na segunda ficaria<br />
desanimado. Entretanto, é vendo as duas<br />
partes juntas, e compreendendo que diante dele<br />
está a possibilidade de ser um herói, mas também<br />
o risco de ser um desertor, que o soldado<br />
deveria bradar “fenomenal”.<br />
Pois é nos momentos difíceis, quando fica entre<br />
o risco e a esperança, entre a glória e a derrota,<br />
que o homem chega à hora fenomenal de<br />
sua vida, onde ele deita toda a sua esperança em<br />
Nossa Senhora, pede forças e se atira exclamando:<br />
“Mãe de Misericórdia, dai-me forças porque<br />
sem Vós eu não posso nada, mas convosco eu<br />
posso tudo.”<br />
Então, na vida de todos os dias, devemos nos<br />
lembrar de que um novo ano pode ser o começo<br />
de dificuldades extraordinárias para nós, e é<br />
até provável que seja isto. Se for, será o momento<br />
no qual podemos passar a ser heróis.<br />
Aqueles que, quando se sentirem fracos, souberem<br />
pedir forças a Nossa Senhora, pedir perdão<br />
pelas faltas cometidas, poderão subir ao alto<br />
do heroísmo, atravessar os castigos previstos<br />
por Nossa Senhora em Fátima e participar da<br />
procissão inaugural do Reino de Maria.<br />
(Extraído de conferência de 2/1/1988)<br />
5
6<br />
Dona Lucilia
Bondade e<br />
humildade,<br />
virtudes<br />
que se<br />
completam!<br />
Dona Lucilia era transbordante<br />
de afeto para com seu filho;<br />
porém, nunca o elogiava...<br />
Mamãe era exuberante em afetos para comigo,<br />
mas não em comentários. Mesmo nas<br />
ocasiões mais propícias para me comentar,<br />
ela não o fazia, nem perto nem longe de mim. E, durante<br />
a nossa tão longa convivência, quase não me chegaram<br />
aos ouvidos elogios dela a meu respeito.<br />
Jamais alimentar a megalice<br />
As cartas dela a mim dirigidas, por exemplo, eram<br />
cheias de afeto, o qual continha uma espécie de consideração,<br />
quase diria de admiração. Embora ela<br />
não pusesse um elogio, pelo modo de me chamar “filhão<br />
querido” percebia-se que a alma dela transbordava<br />
de contentamento ao tratar comigo. E nesse transbordamento<br />
vê-se que havia um apreço, uma consideração,<br />
mas que ela não dizia.<br />
Por que ela não dizia?<br />
Nunca perguntei a ela, mas tenho a impressão de que<br />
mamãe achava mais grato em relação a Deus não dizer, para<br />
praticar a virtude da humildade e evitar qualquer megalice<br />
1 de minha parte. Ela era cuidadosíssima nesse ponto.<br />
7
Dona Lucilia<br />
Dona Lucilia na<br />
década de 1950.<br />
Lembro-me de que, em certa ocasião, uma contraparente<br />
nossa, que havia sido educada com mamãe em menina,<br />
foi visitá-la; nós estávamos acabando de almoçar e,<br />
como era uma senhora muito próxima à família, ela entrou<br />
diretamente na sala. Começamos a conversar e em<br />
certo momento essa contraparente disse: “Lucilia, você<br />
tem um filho perfeito. Em nossa casa, sempre que queremos<br />
dizer que um filho é perfeito, dizemos: ‘Um filho à<br />
moda do <strong>Plinio</strong>.’”<br />
Éramos apenas três pessoas; olhei para o rosto de mamãe<br />
e notei uma tranquilidade, uma serenidade completas,<br />
como se ela não tivesse entendido o que a outra afirmara.<br />
E deu-me a impressão da vontade dela em evitar<br />
qualquer comentário que me pudesse fazer mal, de medo<br />
da megalice e coisas do gênero; no que ela tinha razão,<br />
porque se deve temer a própria megalice e a megalice<br />
de todo mundo.<br />
Humildade de Dona Lucilia<br />
Havia uma pessoa de nosso convívio que a queria<br />
muito bem e era bem-querida por mamãe. E essa pessoa<br />
tinha um genro aproximadamente de minha idade,<br />
e que começou a advogar mais ou menos quando eu obtive<br />
o meu diploma de advogado. De maneira que iniciamos<br />
a profissão de advogado praticamente ao mesmo<br />
tempo.<br />
Mas eu tive certa dificuldade em desenvolver a advocacia<br />
porque era muito boicotado. O outro rapaz não<br />
combatia ninguém, era até favorecido, de modo que ele<br />
tinha muitos clientes e eu poucos. Considero mesmo que<br />
não foi sem uma proteção especial que meu escritório,<br />
depois de alguns anos de pouco serviço, se tornou muito<br />
movimentado e com a melhor advocacia eclesiástica de<br />
São Paulo. A meu ver, foi um favor da Providência.<br />
Então, na aparência o genro dela ia para a frente e eu<br />
estava mais ou menos parado. Essa pessoa ficava muito<br />
contente com isso e, quando ia à nossa casa, fazia elogios<br />
ao genro, contava o que havia acontecido no escritório<br />
dele, que resultados tinha tirado, dando a impressão<br />
de que ela gostava de realçar o sucesso do genro e a dificuldade<br />
que eu encontrava em caminhar.<br />
E numa ocasião eu disse a mamãe:<br />
— A senhora não tem essa mesma impressão, quando<br />
fulana elogia o genro dela?<br />
Falei com cuidado porque mamãe queria muito bem a<br />
essa fulana; estávamos almoçando e ela comia com aquela<br />
distinção, tranquilidade e confiança na Providência,<br />
que nunca deixou de ter. Ela me respondeu:<br />
— Eu acho que é assim.<br />
Acrescentei:<br />
— A senhora algum dia não dará um cutucão nela?<br />
8
Eu também devo<br />
olhar-me como<br />
ela me via: não<br />
prestar atenção nas<br />
qualidades que eu<br />
possa ter, mas apenas<br />
nos meus defeitos,<br />
para combatê-los<br />
e corrigir-me.<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> durante<br />
uma conferência, em<br />
outubro de 1992.<br />
Havia muitas outras coisas que minha mãe poderia<br />
responder. Mas ela disse:<br />
— Coitada, ela fica tão contente assim... Deixe-a fazer<br />
dessa maneira. Ao menos isso lhe dá satisfação.<br />
Percebi, então, toda a humildade de mamãe e como<br />
ela não gostaria de ter uma conduta de fanfarronada, para<br />
pisar a outra. Mamãe deixava que aquela fulana a pisasse<br />
um pouco, desde que ficasse contente. A bondade<br />
dela se prestava a isso.<br />
Achei tão bonito que não disse mais nada.<br />
Não devemos nos comparar com ninguém<br />
Quanto a mim, eu também devo olhar-me como ela me<br />
via: não prestar atenção nas qualidades que eu possa ter,<br />
mas apenas nos meus defeitos, para combatê-los e corrigir-me.<br />
Nunca devo me comparar com ninguém, não me<br />
perguntar se outro é mais inteligente que eu, ou menos.<br />
Por que não devo estar prestando atenção em qualidades<br />
que eu tenha?<br />
Porque automaticamente minha fantasia tende a aumentar<br />
essas supostas qualidades.<br />
Imaginemos que um dos presentes escreva um trabalho<br />
para a respectiva escola, que seja premiado com nota<br />
dez e o professor até lhe dê um abraço. Se ele não contar<br />
esse sucesso em sua casa, e na sede de nosso Movimento<br />
apenas informar ao seu superior imediato, e a mais ninguém,<br />
fará uma coisa gratíssima a Nossa Senhora, porque<br />
agirá como Ela agiu durante a vida inteira. v<br />
(Extraído de conferências de 10/12/1994 e 3/4/1995)<br />
1) Termo criado por <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> a fim de designar o vício de<br />
quem atribui a si mesmo qualidades que não possui ou então<br />
as exagera.<br />
9
Hagiografia<br />
São Raimundo de Peñafort,<br />
símbolo de uma época…<br />
Fotos: F. Lecaros.<br />
Embora a ideia de uma civilização cristã, constituída por almas<br />
em estado de graça, possa parecer utopia para a mentalidade hodierna,<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> demonstra, com base na biografia de São Raimundo<br />
de Peñafort, que uma época na qual a graça de Deus habite as almas<br />
é inteiramente realizável.<br />
Épossível ter passado pela cabeça de qualquer<br />
pessoa o seguinte problema: é muito difícil permanecer<br />
em estado de graça, e não se pode esperar<br />
que uma população inteira faça coisas muito difíceis.<br />
Então, a civilização católica é praticamente impossível,<br />
pois ela só pode ser concebida com pessoas na graça<br />
de Deus.<br />
A refutação desse raciocínio suporia uma grande tese,<br />
mas através da vida de São Raimundo de Peñafort se pode<br />
chegar a uma convicção a esse respeito.<br />
A civilização cristã é possível<br />
Como se pode saber se numa civilização, um país ou<br />
uma cidade tem a maior parte de seus habitantes em estado<br />
de graça, o qual é um estado interno da alma? Vendo<br />
uma cidade, pode-se afirmar: a maior parte dos seus<br />
habitantes está em estado de graça? Existe para isso um<br />
teste?<br />
Essas são dificuldades que parecem rochedos sem solução.<br />
Entretanto, elas se resolvem facilmente.<br />
Quando os habitantes de uma cidade não estão em estado<br />
de graça, eles formam uma espécie de cone virado<br />
para baixo. Há alguns que são ruins porque não estão em<br />
estado de graça; abaixo dos que estão em estado de pecado<br />
mortal simplesmente, há alguns que têm grande apego<br />
ao pecado mortal no qual se encontram. Depois, mais<br />
embaixo, há alguns que antipatizam com os que estão em<br />
estado de graça. E, no fundo do cone, há os que têm ódio<br />
dos que permanecem em estado de graça.<br />
Mas há uma coisa curiosa: todos os que são ruins<br />
têm uma espécie de conaturalidade, de afinidade entre<br />
si, de maneira que constituem facilmente uma frente<br />
contra os bons. E o resultado é que, na cidade em<br />
que muitos não estão em estado de graça, os bons são<br />
impopulares.<br />
Pelo contrário, numa cidade onde muita gente está em<br />
estado de graça, os bons são populares. Nas épocas em<br />
que os santos são objeto de entusiasmo geral, pode-se dizer<br />
que a maioria da população vive na graça de Deus. E<br />
se os santos não são objeto de simpatia geral, é prova de<br />
que a maior parte do povo vive fora da graça divina. Portanto,<br />
o modo pelo qual uma época trata um santo, mostra<br />
como ela trata Deus, ou seja, como está a maioria dos<br />
habitantes em face do Criador.<br />
Para resumir, o santo é uma imagem de Deus; quem o<br />
odeia, odeia também a Deus.<br />
Então, quando estudamos a vida dos santos, que formam<br />
um longo cortejo de luz, de sangue e de lágrimas<br />
dentro da História, podemos ir vendo como foram tratados<br />
nas épocas em que viveram. Se uma época os tratou<br />
bem, nesta a maior parte dos homens estava em estado de<br />
graça; se os tratou mal, não estavam em estado de graça.<br />
Assim, através da vida de São Raimundo de Peñafort<br />
podemos fazer o balanço de uma época e constatar como<br />
é possível uma civilização católica, em que milhões<br />
de pessoas vivam em estado de graça.<br />
Nesse espírito analisemos a biografia.<br />
Aos vinte anos de idade, professor de Filosofia<br />
Terceiro Geral de sua Ordem — Ordem de São Domingos<br />
—, São Raimundo de Peñafort nasceu na Catalunha,<br />
no castelo de Peñafort, de pais ricos e nobres, descendentes<br />
da família real de Aragão — portanto, era de uma alta<br />
nobreza. Quando jovem, percorreu com tão grande bri-<br />
10
lho o curso de seus primeiros estudos,<br />
que com vinte anos foi encarregado<br />
de ensinar Filosofia em sua<br />
cidade natal.<br />
Era um sucesso extraordinário,<br />
pois naquela época, século XIII,<br />
os estudos eram muito apertados;<br />
e Filosofia era uma matéria que<br />
despertava enorme atenção, apaixonava,<br />
porque as pessoas tinham<br />
elevação de alma, espírito metafísico.<br />
Aos vinte anos, lecionar Filosofia<br />
representava o auge do prestígio<br />
intelectual.<br />
A formação de sua mentalidade<br />
o preocupava muito mais do que a<br />
de sua mera inteligência. Daí o zelo<br />
que tinha em inspirar uma sólida<br />
piedade a todos os seus discípulos.<br />
Pode‐se então imaginar o quadro:<br />
a universidade, com o misto<br />
de vivacidade um tanto turbulenta<br />
e de solenidade das universidades<br />
medievais, uma alta cátedra,<br />
um jovem, ainda não religioso,<br />
não seminarista, mas leigo, que<br />
leciona Filosofia, causando admiração<br />
nos alunos, às vezes, mais<br />
velhos do que ele. Mas, ao mesmo<br />
tempo em que lecionava Filosofia,<br />
ele estava mais preocupado em que seus alunos tivessem<br />
uma mentalidade certa, portanto, uma verdadeira<br />
formação espiritual, do que fossem bons filósofos.<br />
Hoje em dia isso causaria raiva, inveja e protesto. Naquele<br />
tempo dava o resultado que estamos vendo.<br />
Apaziguar as discórdias<br />
O tempo que ele podia subtrair às suas ocupações, o<br />
santo empregava em socorrer os infelizes e eliminar as discórdias<br />
na cidade.<br />
Em si, apaziguar as discórdias é uma das obras da Igreja,<br />
e na Idade Média especialmente necessária. Porque<br />
nessa época os homens descendiam proximamente dos<br />
bárbaros, e a agressividade de uns contra os outros era<br />
muito grande. Tornava-se necessário estar continuamente<br />
tentando reconciliar uns com os outros, para ir aos poucos<br />
pacificando o temperamento daquela gente exageradamente<br />
agressiva. Isso tinha um enorme alcance, pois,<br />
ao mesmo tempo em que lutavam entre si, os homens tendiam<br />
a combater os inimigos da Igreja. Esses últimos tiravam<br />
proveito dessa divisão. Então, reconciliar os católicos<br />
São Raimundo de Peñafort - Museu<br />
Episcopal de Vic, Catalunha (Espanha).<br />
entre si era fazer uma frente única<br />
contra o adversário.<br />
A compaixão para com os pobres<br />
é inviscerada na alma do católico.<br />
Mas naquele tempo era<br />
muito mais necessária. Porque<br />
não havia grandes hospitais como<br />
atualmente; obras assim estavam<br />
apenas começando a se formar;<br />
eram muito menos numerosas do<br />
que hoje. Então, atender os pobres<br />
em casa era uma coisa necessária<br />
para a sobrevivência deles.<br />
Podemos imaginar a alegria de<br />
um pobre velho chagado, estendido<br />
num catre, quando vê entrar<br />
em sua casa, para conversar com<br />
ele, um rapaz na flor de sua idade,<br />
o qual é um dos jovens mais<br />
célebres da cidade, e que se senta<br />
à beira do leito, conversa consigo,<br />
dá-lhe um bom conselho e<br />
deixa um auxílio. É uma esmola<br />
mais para a alma do que para o<br />
corpo. Podemos imaginar a edificação<br />
que isso trazia.<br />
A virtude e o talento<br />
conduziam à glória<br />
Resolvido a fazer um curso de Direito Civil e Canônico,<br />
aos trinta anos deixou sua pátria e foi para Bolonha,<br />
na Itália, para as famosas lições dos célebres professores<br />
daquela cidade. Em muito pouco tempo ele se tornou<br />
doutor.<br />
Notem que se tornou doutor em Direito, e já era professor<br />
de Filosofia. Matérias diversas; ele voava de matéria<br />
em matéria.<br />
Para se tornar doutor, era necessário defender uma<br />
tese com todos os catedráticos e alunos presentes, trajando<br />
roupa de gala; o indivíduo ficava no centro da sala<br />
e era interrogado. Essa defesa de tese se fazia depois do<br />
curso de pós-graduação.<br />
E a primeira cátedra de Direito Canônico lhe foi atribuída<br />
com aclamação de toda a Universidade.<br />
Naquele tempo o Direito Canônico, que são as leis internas<br />
da Igreja, gozava de mais prestígio do que o Direito<br />
Civil, porque tudo quanto dizia respeito à Esposa de<br />
Cristo era considerado mais importante do que os temas<br />
relacionados à vida temporal.<br />
O Senado de Bolonha, com a intenção de reter na cidade<br />
um jovem tão eminente, desejou dar-lhe retribuição,<br />
11
Hagiografia<br />
com o dinheiro público. Mas, de nada<br />
adiantou. Ele foi chamado para<br />
a Espanha, por ordem do Papa<br />
Honório III, para ser professor do<br />
jovem Rei Tiago I de Aragão.<br />
É um jovem que voa de honra<br />
em honra, porque alia grande<br />
inteligência a uma Fé profunda.<br />
Vemos que naquele tempo a<br />
virtude e o talento conduziam à<br />
glória, ao contrário de outros períodos,<br />
onde o vício é premiado.<br />
As épocas muito ruins perdem<br />
os seus chefes naturais, pois os<br />
desviam, os adulam, os subornam<br />
e os levam para o mal, como condição<br />
para uma brilhante carreira.<br />
No século XIII vemos o contrário:<br />
a ambição e a virtude, como que, andavam juntas.<br />
Como era mais fácil o caminho do Céu!<br />
Autor de livros sobre casos de consciência<br />
Tendo recebido um canonicato e logo depois o título<br />
de arcediago, na igreja de Barcelona, tornou‐se o modelo<br />
dos sacerdotes do Senhor. A festa da Anunciação era<br />
então muito negligenciada nas igrejas da Espanha. Com<br />
piedosa insistência, conseguiu do Bispo de Barcelona que<br />
se celebrasse essa grande festa com Ofício Solene, e uma<br />
parte do dinheiro que ganhou destinava exatamente para<br />
isso.<br />
São Raimundo de Peñafort conheceu São Domingos de<br />
Gusmão e se tornou testemunha de suas grandes virtudes.<br />
De tal maneira ele admirava a vida angélica dos primeiros<br />
dominicanos, que pediu o hábito e o recebeu, em abril<br />
de 1222. Seu exemplo atraiu para a Ordem muitos grandes<br />
personagens.<br />
Bastou São Raimundo entrar na Ordem dominicana<br />
para pessoas importantes quererem abandonar tudo a<br />
fim de se tornar simples frades. Isso só é possível numa<br />
boa época.<br />
Tendo pedido uma severa penitência a fim de expiar as<br />
vãs complacências que, segundo ele, tivera quando ensinava,<br />
ordenaram-lhe que compusesse um conjunto de livros<br />
sobre os casos de consciência mais difíceis, que costumavam<br />
aparecer para os confessores na Espanha.<br />
Quer dizer, ele alegava que tinha tido alguma vaidade<br />
quando lecionava, e pediu para ser tratado com rijeza.<br />
Essa obra foi elogiada pelo Papa Clemente VIII, como<br />
sendo igualmente útil aos penitentes e confessores; foi o primeiro<br />
trabalho no gênero existente na Igreja Católica.<br />
São Raimundo de Peñafort, por Alonso<br />
Antonio Villamayor - Museu de Belas<br />
Artes, Salamanca (Espanha).<br />
Harmonia entre<br />
variadas virtudes<br />
Em 1229, o Papa São Gregório<br />
IX enviou para a Espanha o<br />
Cardeal Sabino, a fim de exortar<br />
os príncipes da região a continuar<br />
valentemente a luta contra os<br />
mouros.<br />
Era a guerra da Reconquista,<br />
para a expulsão dos mouros da<br />
Península Ibérica.<br />
O Cardeal, que já conhecia São<br />
Raimundo, o tomou para seu primeiro-assistente.<br />
Iniciou-se, então,<br />
a pregação de São Raimundo para<br />
a Cruzada.<br />
Notem o bonito contraste: é<br />
um santo de uma bondade angélica,<br />
que se senta junto ao catre de um doente e cuida dele<br />
com suma suavidade. Entretanto, convocado para defender<br />
a Fé católica, torna-se uma tocha ardente, estimulando<br />
todo mundo a lutar.<br />
Um ato de virtude pode ser muito diferente de outro<br />
ato de virtude, mas não o contrário, pois as virtudes não<br />
são contrárias entre si.<br />
Assim, um homem de ação por amor a Deus pode ser<br />
um guarda-doentes extraordinário; e um homem verdadeiramente<br />
caridoso pode tornar-se um guerreiro insigne.<br />
Quando ouvimos falar que um santo era muito bom<br />
para com os enfermos, queria os pequeninos, devemos<br />
pensar: Que grande guerreiro! E de um santo que lutou<br />
contra hereges, numa guerra de religião, pensemos: Que<br />
esplêndido enfermeiro deveria dar! Assim é que se entende<br />
a verdadeira harmonia da alma católica, que é feita<br />
dessas riquezas, dessa fabulosa diversidade de todas as<br />
virtudes. Então, vemos São Raimundo, homem de inteligência,<br />
de estudo, e ao mesmo tempo de ação, que passa<br />
a ser homem de luta.<br />
Para dar aos homens a vontade de lutar, a técnica de<br />
São Raimundo de Peñafort consistia em incutir-lhes o<br />
desejo de se sacrificarem, porque a luta séria é um sacrifício.<br />
Para dar a vontade de sacrificar‐se era preciso provar<br />
que ele se sacrificava. E ele caminhava de um lugar<br />
para outro, percorrendo distâncias enormes, o tempo inteiro<br />
a pé, com um bordão e descalço.<br />
O santo entrava nas cidades e anunciava que o Cardeal<br />
chegaria um ou dois dias depois, a fim de conceder a indulgência<br />
da Cruzada.<br />
Era uma indulgência especial que a Santa Sé dava para<br />
os que lutavam contra os mouros.<br />
12
Depois, ele ouvia as confissões e assim dispunha as almas<br />
para a chegada do Cardeal, que encontrava os espíritos<br />
dóceis aos mínimos desejos do Vigário de Jesus Cristo.<br />
Ao regressar a Roma, o Legado não deixou de falar ao<br />
Papa a respeito dos méritos de São Raimundo de Peñafort.<br />
Impressionado com o relato, o Soberano Pontífice mandou<br />
que o santo viesse a Roma, e lhe pediu para ser seu capelão,<br />
penitenciário e confessor.<br />
O homem de Deus impunha como penitência ao Papa<br />
despachar, com caridade e imediatamente, a causa dos pobres<br />
que não tinham protetor. O Sumo Pontífice pediu, então,<br />
ao santo que o ajudasse a despachar.<br />
Roma era muito pequenina, e as viagens muito difíceis.<br />
O número de peregrinos que iam a Roma e, sobretudo,<br />
as complicações diplomáticas, eram muito menores<br />
do que em nossos dias. Um Papa tinha bastante tempo<br />
livre e o que ele podia fazer de melhor era dar a todo<br />
mundo o exemplo das virtudes. Daí o fato de São Raimundo<br />
ter dito ao Soberano Pontífice: “Dou a Vossa<br />
Santidade a penitência de não atender só aos poderosos,<br />
mas também aos humildes”; assim, o Papa passou a trabalhar<br />
intensamente.<br />
Tratado a respeito da prática do comércio<br />
O Arcebispado de Tarragona veio a vagar pela morte do<br />
Arcebispo Metropolitano da Coroa de Aragão.<br />
Era a principal diocese da Coroa de Aragão.<br />
O Papa conferiu tal Arcebispado a São Raimundo de<br />
Peñafort, ordenando que o aceitasse, embora este não o<br />
quisesse. Mas Raimundo ficou gravemente doente e Gregório<br />
IX, temendo que este morresse, dispensou-o do Arcebispado.<br />
Extenuado por tanto trabalho, São Raimundo caiu novamente<br />
doente, num estado que inspirou sérias preocupações.<br />
Os médicos o aconselharam a voltar para a Espanha.<br />
Tendo regressado ao seu convento de Barcelona, ele observava<br />
todos os pontos da regra. A pedido de vários Bispos,<br />
São Raimundo redigiu um tratado a respeito da conduta<br />
que deveriam ter os comerciantes para não roubarem o público,<br />
e especificando os casos em que os comerciantes tinham<br />
que fazer restituição.<br />
Aqui está o ponto dolorido em matéria de furto de dinheiro.<br />
Quem comete um pecado e pede perdão fica absolvido.<br />
Mas quem se apropria do dinheiro de outro, só<br />
será absolvido sob a condição de restituir o que roubou.<br />
E um comerciante que roubou, cobrou demais, não tem<br />
a consciência tranquila; não poderá receber a absolvição<br />
se ele não fizer a restituição. Então, esse é um ponto<br />
duríssimo, porque se trata de abandonar as riquezas.<br />
São Raimundo de Peñafort colocou esse ponto delicado<br />
em toda a evidência. Isso seria próprio para que ele fosse<br />
odiado. Pelo contrário, era cada vez mais estimado. Vemos<br />
assim a boa intenção com que aquele comércio era<br />
praticado.<br />
Ordem religiosa para a redenção dos cativos<br />
Todos os dias, salvo aos domingos, ele não tomava senão<br />
uma ligeira refeição. Nosso Senhor lhe tinha dado, como<br />
familiar, um de seus anjos, que conversava com ele.<br />
O que comentar sobre uma coisa dessas?<br />
Um pouco antes do sino do convento tocar para as Matinas,<br />
o anjo o acordava e o convidava para fazer oração.<br />
Um dos mais brilhantes raios de sua glória foi ter tomado<br />
parte na instituição da Ordem de Nossa Senhora das<br />
Bastou São Raimundo<br />
entrar na Ordem<br />
dominicana para pessoas<br />
importantes, seguindo seu<br />
exemplo, abandonarem<br />
tudo a fim de se tornar<br />
simples frades. Isso só é<br />
possível numa boa época.<br />
São Raimundo recebe o hábito<br />
religioso - Museu Episcopal de<br />
Vic, Catalunha (Espanha).<br />
13
Hagiografia<br />
Mercês, para a redenção dos cativos, fundada pelo Rei Tiago<br />
I de Aragão, graças a uma revelação do alto; tal revelação<br />
foi feita simultaneamente, numa mesma noite, a esse<br />
monarca, a São Raimundo de Peñafort e a São Pedro Nolasco,<br />
um gentil-homem francês, que também fora preceptor<br />
do Rei.<br />
Esse ponto merece uma explicação.<br />
Uma das muito grandes dificuldades para um homem<br />
ser cruzado era exatamente a questão dos cativos. Nas<br />
batalhas, os mouros frequentemente aprisionavam muitos<br />
católicos, que eram transformados em escravos e iam<br />
viver para sempre em lugares onde não havia padres.<br />
Nessa circunstância, caso um deles cometesse um pecado,<br />
não havendo sacerdote para os absolver, corriam o<br />
risco de morrer fora do estado de graça.<br />
De onde as pessoas mais católicas, ao mesmo tempo,<br />
queriam ser cruzadas, mas temiam perder suas almas.<br />
Assim, para que os melhores católicos fossem<br />
cruzados, era preciso resgatar os cativos; para isso tornava-se<br />
necessário arranjar dinheiro a fim de comprar<br />
dos mouros os que estes haviam escravizado nas batalhas.<br />
E muitas vezes os padres ficavam escravos para<br />
poder dar a absolvição aos outros homens. E resgatavam<br />
prisioneiros, que voltavam para o meio dos católicos.<br />
Eram, portanto, atos heroicos que esses sacerdotes<br />
faziam.<br />
Então, Tiago I, São Raimundo de Peñafort e São Pedro<br />
Nolasco tiveram um sonho numa mesma noite, e logo<br />
depois foi fundada uma Ordem religiosa para tratar<br />
da redenção dos cativos, evitando em primeiro lugar que<br />
muitas almas se perdessem e também estimulando muitas<br />
Cruzadas.<br />
O Rei, acompanhado de toda a corte e dos magistrados,<br />
foi para a igreja catedral, chamada da Santa Cruz de Jerusalém.<br />
O Bispo Berenger oficiou pontificalmente. São Raimundo<br />
subiu à cátedra e professou, diante de todo o povo,<br />
que tinha sido milagrosamente revelado a ele, ao Rei e a<br />
São Pedro Nolasco, a vontade de Deus sobre a Ordem. Por<br />
ocasião do Ofertório, o Rei e São Raimundo apresentaram<br />
São Pedro Nolasco ao Bispo, que o revestiu do hábito da<br />
Ordem. Terminada a Missa, o monarca conduziu São Pedro<br />
Nolasco e seus frades para seu próprio palácio, numa<br />
parte que ele tinha reservado para ser mosteiro.<br />
Que coisa linda! Como se amava a virtude! Nada disso<br />
seria possível sem que muitíssima gente se encontrasse<br />
em estado de graça. Acrescenta a ficha que treze jovens<br />
fidalgos, ou seja, moços dos mais importantes da cidade,<br />
seguiram São Pedro Nolasco, isto é, deixaram tudo<br />
para se tornarem escravos.<br />
Isso sim é verdadeiramente dedicação! Que heroísmo<br />
é maior: combater os mouros de espada na mão, ou ser<br />
mercedário, pertencer à Ordem das Mercês?<br />
São Raimundo empregou, então, o resto de sua vida a<br />
propagar e favorecer a Ordem religiosa de São Pedro Nolasco.<br />
Maravilhosa viagem marítima: o manto<br />
como vela e o bordão como mastro<br />
A ficha descreve os benefícios que a Ordem das Mercês<br />
proporcionou: milhares de cativos soltos, inúmeros<br />
atos de heroísmo e abnegação; e narra o fato talvez o<br />
mais bonito da vida de São Raimundo de Peñafort.<br />
Esses homens eram bons, mas no meio deles de vez<br />
em quando estalava o pecado, porque eram homens.<br />
Depois vinham as penitências. O número e os tipos de<br />
penitências que os padres impunham, durante a Idade<br />
Média, eram extraordinários. Por exemplo, a um homem<br />
que morava em Estocolmo ir a pé até Compostela.<br />
Veremos agora um fato lamentável e o que se lhe seguiu.<br />
Numa viagem à ilha de Maiorca, uma das Baleares, Tiago<br />
I fez-se acompanhar pelo bem-aventurado e, esquecendo<br />
o respeito que tinha para com o santo, embarcou clandestinamente<br />
uma mulher pública no mesmo navio.<br />
Na ilha de Maiorca, São Raimundo, avisado do fato, fez<br />
pressão junto ao soberano para mandar embora essa mulher.<br />
O Rei prometeu, mas não cumpriu a promessa. O santo,<br />
descontente, pediu para voltar a Barcelona. O Rei lhe<br />
negou a licença e proibiu secretamente, sob pena de morte,<br />
a todos os marinheiros que permitissem que o santo saísse<br />
do porto da ilha de Maiorca.<br />
São Raimundo não queria fazer parte de uma viagem<br />
onde estava uma mulher de má vida; mas estava preso<br />
numa ilha. Como poderia ele fugir? E quem lhe desse<br />
embarque seria morto, por ordem do Rei. O que fez ele?<br />
Saiu-se como um homem que conversava continuamente<br />
com um anjo.<br />
O santo se apoderou do manto de um companheiro, chegou<br />
até a ponta de um pequeno promontório deserto e disse:<br />
“O Rei da Terra nos impede a passagem, o Rei do Céu<br />
suprirá.” Pronunciando essas palavras, estendeu o manto<br />
sobre as ondas, tomou seu bordão, fez o sinal da cruz e pisou<br />
solidamente sobre o manto. Pediu a seu companheiro<br />
que o seguisse, fazendo a mesma coisa. Mas esse não teve<br />
coragem, e ficou.<br />
São os pequenos homens...<br />
O santo suspendeu a metade do manto para servir de vela<br />
e prendeu-a no bordão, como mastro. Um vento favorável<br />
o levou em pleno mar, enquanto os marinheiros que estavam<br />
por ali se entreolhavam pasmados. Seis horas depois<br />
ele chegava a Barcelona, tendo percorrido 53 léguas marítimas.<br />
14
Reis, com diadema de<br />
ouro na cabeça e cetro<br />
nas mãos, colocamse<br />
ajoelhados junto ao<br />
catre de um pobre frade<br />
moribundo para receberem<br />
sua última bênção.<br />
Enterro de São Raimundo -<br />
Museu Episcopal de Vic,<br />
Catalunha (Espanha).<br />
Quer dizer, uma velocidade extraordinária. Eu acho<br />
esse quadro encantador; foi a mais maravilhosa viagem<br />
que se fez, depois daquela realizada por Nosso Senhor<br />
no lago de Tiberíades. Não pode haver coisa mais bonita<br />
do que, num mar agitado e convulso, aquele “barquinho”<br />
deslizando. Na história náutica não se realizou uma coisa<br />
tão bela! Era o prêmio da intransigência de São Raimundo<br />
de Peñafort: “Deus fará um milagre para mim,<br />
mas numa ilha onde há uma mulher de má vida não fico.<br />
Vou embora.”<br />
Os homens de verdadeira Fé movem até montanhas.<br />
Imaginem a linda cena: na solidão do mar, os anjos contemplando<br />
São Raimundo de Peñafort singrando. Se eu<br />
fosse pintor, faria esse quadro.<br />
Ele desembarcou no porto, revestiu-se do seu manto, o<br />
qual estava seco, e tomando seu bordão dirigiu-se imediatamente<br />
para o convento. As portas do convento estavam<br />
fechadas, mas ele as atravessou e apareceu de repente no<br />
meio de seus irmãos e ajoelhou-se aos pés do Prior, para pedir-lhe<br />
a bênção. O Rei, informado do que se tinha passado,<br />
caiu em si mesmo e daí por diante seguiu mais fielmente<br />
as diretrizes de São Raimundo.<br />
O fim da vida de um grande santo<br />
São Raimundo chegou à extrema velhice, sem nenhuma<br />
outra doença a não ser a muita idade. Ele dormiu suavemente<br />
nos braços do Senhor no dia 6 de janeiro — festa da<br />
Epifania — de 1275.<br />
Nesse lindo dia, em que Deus foi revelado a todos os<br />
povos, inclusive pagãos, morreu São Raimundo de Peñafort,<br />
que tanto havia trabalhado pela conversão dos pagãos.<br />
Nos seus últimos momentos, os Reis de Castela e Aragão<br />
o visitaram com suas cortes, e tiveram a alegria de receber a<br />
sua última bênção.<br />
Aí temos um quadro bem medieval: dois Reis, com<br />
diadema de ouro na cabeça, cetro na mão, grande<br />
manto, outros emblemas da realeza, sendo conduzidos<br />
por lacaios, acompanhados por toda a corte, ajoelhados<br />
junto ao catre de um pobre frade — que nada possuía,<br />
dependia da vontade de um outro, e estava moribundo<br />
— para receberem sua última bênção. Era a última<br />
viagem de São Raimundo de Peñafort. Estava encerrada<br />
a vida de um grande santo e um grande homem.<br />
O Reino de Maria não é uma quimera, mas<br />
uma promessa de Nossa Senhora de Fátima<br />
Vemos que essa foi uma época na qual o estado de<br />
graça era geral. Constatamos, portanto, como a civilização<br />
cristã é realizável. Assim, nós, trabalhando pelo Reino<br />
de Maria, não vamos atrás de uma quimera nem de<br />
uma fantasia, mas de uma promessa. Qual é essa promessa?<br />
É a de Nossa Senhora de Fátima, que disse: “Por<br />
fim, meu Imaculado Coração triunfará.” O que é o<br />
Coração de Maria? É um órgão do seu corpo imaculado,<br />
mas que simboliza a mentalidade de Nossa Senhora.<br />
Essa é a doutrina católica. E quando Ela afirma<br />
que seu Coração triunfará, quer dizer que sua mentalidade<br />
triunfará.<br />
O triunfo da mentalidade da Mãe de Deus significa que<br />
virá uma época, na qual, muito mais do que na nossa, os<br />
santos vão dirigir a humanidade. Nossa Senhora a governará<br />
através de seus santos; porque eles vão influenciar os<br />
Reis, os Papas, os grandes e pequenos desta Terra, e levar<br />
a todos para Deus. Será o Reino de Maria. v<br />
(Extraído de conferência<br />
de 26/10/1974)<br />
15
De Maria Nunquam Satis<br />
Fotos: V. Toniolo; D. Domingues; S. Miyazaki.<br />
Nossa Senhora do<br />
Santíssimo Sacramento<br />
- Roma, Itália.<br />
16
A Jesus, por Maria<br />
Para comungarmos bem, devemos pedir a Nossa Senhora que venha<br />
espiritualmente à nossa alma, e preste a Nosso Senhor atos de culto.<br />
Dessa forma, nossa Comunhão será inteiramente marial, conforme<br />
ensina São Luís Maria Grignion de Montfort.<br />
Acho conveniente deter hoje nossa atenção na invocação<br />
de Nossa Senhora do Santíssimo Sacramento,<br />
quer dizer, a Virgem Maria considerada<br />
especialmente em suas relações com a Divina Eucaristia.<br />
Procurarei ser esquemático ao indicar alguns pontos<br />
para meditarmos, a fim de que caiba a maior quantidade<br />
possível de matéria dentro de pouco tempo.<br />
Nossa Senhora obteve o Santíssimo<br />
Sacramento para o gênero humano<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> recebe a Sagrada Comunhão, na década de 1990.<br />
Consideremos o seguinte: uma das maiores graças que<br />
o gênero humano recebeu foi a instituição da Sagrada<br />
Eucaristia, ou seja, da presença real de Nosso Senhor Jesus<br />
Cristo em todos os sacrários da Terra, até o fim do<br />
mundo, e a renovação incruenta do Sacrifício da Cruz.<br />
Para medirmos a importância dessa graça, basta considerarmos<br />
como julgaríamos magnífico se, de repente,<br />
tivéssemos o Redentor visível aqui entre nós. Com toda<br />
razão, julgaríamos que uma eternidade não bastaria para<br />
agradecer esse favor.<br />
Ora, Nosso Senhor, embora de modo não visível, está<br />
realmente presente no Santíssimo Sacramento.<br />
Se recebemos todas essas graças é porque nos vieram<br />
a rogos de Maria, por meio d’Ela. De maneira que devemos<br />
esses favores insondáveis a Nossa Senhora. Ela obteve<br />
o Santíssimo Sacramento para o gênero humano. Mais<br />
ainda: todas as graças que Nosso Senhor distribui no Santíssimo<br />
Sacramento, Ele o faz pelos pedidos da Virgem<br />
Maria. Se Ela não pedisse, não as obteríamos.<br />
Além disso, a única criatura humana que presta<br />
ao Santíssimo Sacramento um culto inteiramente<br />
digno e perfeito é Nossa Senhora. As outras<br />
criaturas humanas sempre têm algum defeito,<br />
que macula o alcance desse culto.<br />
Nossa Senhora conhece todos os lugares da<br />
Terra onde há o Santíssimo Sacramento, e Ela,<br />
do alto do Céu, está adorando continuamente as<br />
Sagradas Espécies por toda parte.<br />
Onde as Sagradas Espécies são adequadamente<br />
cultuadas, Maria Santíssima presta um<br />
culto jubiloso. Quando são tratadas com indiferença<br />
ou até com blasfêmia ou sacrilégio, Ela<br />
presta um culto reparador.<br />
A devoção ao Santíssimo Sacramento é uma<br />
graça; logo, é obtida por Nossa Senhora.<br />
Modo de um escravo de<br />
Maria comungar<br />
Cada um desses pontos de meditação nos deve<br />
ajudar a comungar como São Luís Maria<br />
17
De Maria Nunquam Satis<br />
Grignion quer. Todas as nossas Comunhões são atos de<br />
culto a Nosso Senhor Jesus Cristo, mas com Maria, por<br />
Maria, em Maria.<br />
Então, dadas todas essas relações que Nossa Senhora<br />
tem com o Santíssimo Sacramento, devemos preparar-<br />
-nos para a Comunhão com o auxílio d’Ela. O que quer<br />
dizer isso?<br />
Precisamos pedir a Maria Santíssima que venha à nossa<br />
alma, e diga por nós a Nosso Senhor tudo quanto Ela<br />
diria se estivesse comungando.<br />
Devemos receber a Eucaristia junto com Nossa Senhora,<br />
ou seja, pedir que Ela esteja como que à entrada<br />
de nossa alma para acolher a Nosso Senhor e preste<br />
os atos de culto a Ele. Como todos sabem, os atos de culto<br />
são quatro: adoração, ação de graças, reparação e petição<br />
dos dons divinos que precisamos.<br />
No momento de nossa Comunhão, digamos a Nosso<br />
Senhor o seguinte: “Meu Deus, Vós encontráveis vosso<br />
Paraíso estando em Maria durante vossa Encarnação e<br />
durante as comunhões d’Ela. Como é inferior a acolhida<br />
que eu Vos dou! Tende, entretanto, em consideração<br />
que em espírito vossa Mãe está presente em mim, dispensando-Vos<br />
uma acolhida incomparável. Recebei, assim,<br />
com benignidade, meus pobres atos de culto, enriquecidos<br />
por passarem através d’Ela a fim de chegar a<br />
Vós.”<br />
Assim, nossa piedade eucarística se torna inteiramente<br />
marial, embebida do espírito de São Luís Maria Grignion<br />
de Montfort. Esse é o modo de comungar de um escravo<br />
de Maria.<br />
Receber a Eucaristia com a<br />
alma plenamente confiante e jubilosa<br />
Dessa forma, se evita que, ao comungar, caiamos em<br />
dois erros.<br />
Um é a ideia da inacessibilidade de Deus.<br />
Nosso Senhor Jesus Cristo é tão infinitamente Santo,<br />
que não há nenhuma proporção possível entre nós e Ele,<br />
debaixo de nenhum ponto de vista.<br />
Então, tendo isso em vista, corre-se o risco de comungar<br />
acanhado, quase deprimido.<br />
Mas se se considera que Nossa Senhora está em nós<br />
espiritualmente — não realmente como está Ele — comunga-se<br />
alegre, porque, apesar de sermos o que somos,<br />
Ela se encontra em nossa alma.<br />
Dou um exemplo: imaginem um mendigo que vai receber<br />
a visita do maior rei da Terra. Ele não tem nada pa-<br />
Devemos pedir a Nossa<br />
Senhora que Ela esteja,<br />
como que, à entrada de<br />
nossa alma para acolher<br />
Nosso Senhor e prestar a<br />
Ele todos os atos de culto.<br />
Assim comungaremos com a<br />
alma plenamente confiante e<br />
jubilosa; com tranquilidade,<br />
alegria e paz interior.<br />
Última Ceia - Metropolitan Museum<br />
of Art, Nova York (Estados Unidos).<br />
18
Bento XVI em adoração ao Santíssimo Sacramento - 22/5/2008.<br />
ra oferecer ao monarca, mas consegue que a rainha-mãe<br />
lá esteja para acolher o rei. O mendigo está tranquilo;<br />
não lhe falta nada. Ao chegar o soberano, a rainha-mãe<br />
está na entrada do tugúrio e lhe diz: “Meu filho, eu quis<br />
honrar esta casa com a minha presença. Ela é minha, entre!”<br />
O dono da casa não tem outra coisa a fazer senão<br />
sorrir, regozijar-se, transbordar de alegria porque a recepção<br />
está à altura do rei.<br />
Então, devemos comungar com a alma plenamente<br />
confiante, jubilosa.<br />
Se cada um de nós for pensar em seus defeitos, ficará<br />
acanhado, encafifado. Mas em sua alma está Nossa Senhora!<br />
Que tranquilidade, alegria, paz de alma, esperança<br />
para tudo!<br />
Conjunção da adoração com<br />
a maior das ternuras<br />
Assim, evita-se também a falta de respeito, que teria,<br />
por exemplo, um mendigo a quem o rei vai visitar todos<br />
os dias. Nunca o mendigo tem algo para oferecer ao monarca.<br />
Certo dia, ele diz para o rei: “Sentai-vos ali e conversai<br />
comigo. Se vós quiserdes vir em minha casa, só<br />
possuo isto para vos oferecer: meu café velho e minha<br />
caneca rachada. Não tenho outra coisa; não posso me virar<br />
pelo avesso.”<br />
Então, a devoção a Nossa Senhora equilibra isso. Tira<br />
o acanhamento, o encafifamento, e também a rotina,<br />
o desrespeito.<br />
Há, portanto, uma espécie de equilíbrio da piedade<br />
eucarística simplesmente magnífico, pela conjunção da<br />
maior das venerações, que se chama adoração, de um<br />
lado, com a maior das ternuras. Assim, eu posso tomar<br />
com Nosso Senhor as liberdades mais afetuosas, porque<br />
fui trazido pela Mãe d’Ele.<br />
Eu quisera que todo membro de nosso Movimento,<br />
habitualmente, comungasse nesse espírito, tomando cada<br />
dia um desses pontos para considerar.<br />
Por exemplo: “Minha Mãe, eu Vos devo a instituição<br />
da Sagrada Eucaristia. Todo o gênero humano Vos deve<br />
essa instituição. Ajudai-me a agradecê-la a vosso Divino<br />
Filho, vinde à minha alma.” Ao receber a Comunhão,<br />
agradecer a Ele. Está feita uma Comunhão excelente.<br />
Acho que este seria um método ideal para a Comunhão,<br />
evitando assim a falta de respeito e também a rotina:<br />
as Comunhões nas quais as pessoas têm a impressão<br />
de que não sabem o que dizer a Deus, como dois velhos<br />
amigos que se encontram todos os dias e já não têm mais<br />
o que falar um para o outro.<br />
Para Nosso Senhor, nós sempre temos coisas novas<br />
para dizer, aprofundando esses horizontes. Cada um desses<br />
pontos encheria o tempo da ação de graças de uma<br />
Comunhão.<br />
Que Nossa Senhora do Santíssimo Sacramento nos<br />
conceda a graça tão preciosa de uma piedade eucarística<br />
em união com Ela.<br />
v<br />
(Extraído de conferência de 17/5/1969)<br />
19
C<br />
alendário<br />
1. I Domingo do Tempo de Natal.<br />
Santa Maria, Mãe de Deus.<br />
2. São Basílio Magno e São Gregório<br />
Nazianzeno, Bispos, Confessores e<br />
Doutores da Igreja (†379 e 390). Os<br />
dois Santos celebrados conjuntamente<br />
pela Igreja foram amigos e seguiram<br />
carreiras paralelas. Ambos lutaram<br />
contra o arianismo.<br />
3. Santa Genoveva, Virgem (†Paris,<br />
512). Consagrou sua virgindade a<br />
Deus desde jovem, e levou vida de<br />
penitência e oração até os 89 anos de<br />
idade, quando faleceu. É protetora da<br />
cidade de Paris, que salvou da invasão<br />
dos bárbaros hunos, chefiados por<br />
Átila.<br />
dos Santos – ––––––<br />
4. Santa Ângela de Foligno, Viúva<br />
(†Itália, 1309). De família abastada,<br />
foi casada e teve vários filhos. Entregou-se<br />
às vaidades do mundo até que, ficando viúva e tendo<br />
perdido sucessivamente os filhos, converteu-se, ingressou<br />
na Ordem Terceira de São Francisco e passou a levar<br />
vida de penitência. É considerada uma das maiores místicas<br />
da História da Igreja.<br />
5. São Simeão Estilita, Confessor (†Síria, 459). Desejoso<br />
de entregar-se ao isolamento e à oração, construiu uma<br />
coluna de 28 metros de altura, no topo da qual se refugiou.<br />
Daquele lugar insólito pregava e convertia pessoas que de<br />
muito longe iam procurar seus conselhos.<br />
S. Hollmann<br />
9. Santo André Corsini, Bispo<br />
e Confessor (†Fiésole, 1373). Embora<br />
o início de sua vida tenha sido<br />
censurável, converteu-se e ingressou<br />
na Ordem do Carmo, onde<br />
praticou penitências heróicas.<br />
10. São Guilherme de Bourges,<br />
Bispo e Confessor (†Bourges,<br />
1209). Amando a solidão, ingressou<br />
na Ordem de Cister. Designado<br />
Bispo de Bourges, na França,<br />
destacou-se pela caridade para<br />
com os pobres e foi de todos os<br />
pontos de vista um modelo de pastor.<br />
11. São Teodósio, o Cenobita,<br />
Confessor (†Palestina, 529). Sendo<br />
natural da Capadócia, retirou-<br />
-se para um deserto perto de Belém,<br />
na Terra Santa, a fim de viver<br />
recolhido. Reuniu numerosos discípulos,<br />
de diversas nacionalidades, num mosteiro cenobítico.<br />
Faleceu aos 105 anos de idade.<br />
Santa Genoveva - Igreja de<br />
Saint Severain, França.<br />
12. São João de Ravena, Bispo e Confessor (†Itália, 494).<br />
Era Bispo de Ravena quando, por ocasião de uma invasão<br />
bárbara, afastou-se do continente com numerosos fugitivos.<br />
É considerado um dos fundadores da cidade de Veneza.<br />
13. Santo Hilário de Poitiers, Bispo, Confessor e Doutor<br />
da Igreja (†367). Lutou tenazmente contra os hereges<br />
arianos. Foi por isso chamado “o Atanásio do Ocidente”.<br />
6. São Carlos de Sezze, Irmão franciscano (†1670). Certo<br />
dia, durante a Santa Missa, viu um raio de luz que saía<br />
da Sagrada Hóstia e chegava a seu coração. Este se conserva<br />
incorrupto, tendo gravado em si o sinal da cruz.<br />
7. São Raimundo de Peñafort, Sacerdote. (†1275). Ver<br />
página 10.<br />
8. II Domingo do Natal. Epifania do Senhor. Epifania,<br />
em grego, significa manifestação. Neste dia a Igreja<br />
celebra a visita dos Magos que foram adorar o Menino<br />
Jesus. Tal visita simboliza a manifestação de Nosso<br />
Senhor não somente aos judeus, mas a todas as nações<br />
da Terra.<br />
14. São Félix de Nola, Confessor (†Nola, 256). Após ser<br />
aprisionado, sofreu com inquebrantável firmeza diversos<br />
suplícios, até que foi libertado do cárcere por um Anjo.<br />
Embora não tenha sido morto por ódio à Fé, é chamado<br />
de mártir pelo muito que sofreu por amor a Jesus Cristo.<br />
15. II Domingo do Tempo Comum.<br />
16. São Marcelo I, Papa e Mártir (†Roma, 309). Dedicou-se<br />
à reorganização da Igreja após a terrível perseguição<br />
de Diocleciano.<br />
17. Santo Antão, Abade (†356). Eremita no deserto do<br />
Egito.<br />
20
––––––––––––––––– * Janeiro * ––––<br />
18. Santa Prisca (ou Priscila), Virgem<br />
e Mártir (†Roma, séc. I). Segundo<br />
alguns autores, tinha apenas 13<br />
anos quando São Pedro a batizou, em<br />
Roma. Sofreu pouco depois o martírio,<br />
por não ter sacrificado aos deuses<br />
pagãos. É considerada a primeira<br />
mártir do Ocidente.<br />
19. São Canuto IV, Rei e Confessor<br />
(†Dinamarca, 1086). Foi assassinado<br />
por súditos revoltados porque instituíra<br />
um imposto em proveito de obras<br />
de caridade.<br />
20. São Sebastião, Mártir (†Roma,<br />
288). Era oficial da guarda pretoriana<br />
do Imperador Diocleciano. Denunciado<br />
como cristão, foi condenado<br />
pelo Imperador a ser atravessado<br />
por flechas. Milagrosamente curado<br />
das flechadas, reapresentou-se com<br />
coragem diante do tirano e increpou-<br />
-o por sua impiedade. Foi então surrado até à morte, no<br />
circo de Roma.<br />
21. Santa Inês, Virgem e Mártir (†Roma, 304). Com<br />
apenas treze anos, sofreu os mais cruéis tormentos para<br />
preservar a Fé e a virgindade, sendo afinal decapitada.<br />
22. III Domingo do Tempo Comum.<br />
S. Hollmann<br />
26. São Timóteo, Mártir, e São<br />
Tito, Bispos e Confessores (†Ásia<br />
Menor, séc. I). São Timóteo foi<br />
batizado pelo Apóstolo São Paulo.<br />
Foi o primeiro Bispo de Éfeso<br />
e morreu apedrejado e espancado<br />
por pagãos. São Tito, também<br />
convertido por São Paulo, acompanhou-o<br />
em algumas viagens e<br />
realizou missões delicadas em Corinto.<br />
Feito mais tarde Bispo de<br />
Creta, ali morreu.<br />
27. Santa Ângela Mérici, Virgem<br />
(†Bréscia, 1540). Fundou a<br />
congregação das Irmãs Ursulinas,<br />
dedicadas à educação das jovens<br />
com vistas a fazer delas mães de<br />
família verdadeiramente cristãs.<br />
28. São Tomás de Aquino, Confessor<br />
e Doutor da Igreja (†Fossa<br />
Nuova, 1274). Sacerdote dominicano,<br />
foi inicialmente discípulo de Santo Alberto Magno,<br />
passando depois a lecionar na Universidade de Paris.<br />
Escreveu mais de cem obras, entre as quais se destacam a<br />
“Suma contra os gentios” e a “Suma Teológica”. Durante<br />
o Concílio de Trento, a “Suma Teológica” foi colocada sobre<br />
o altar, ao lado das Sagradas Escrituras, para indicar<br />
que era à luz da doutrina tomista que se deveria interpretar<br />
a Palavra de Deus.<br />
São Timóteo - Catedral de<br />
Barcelona, Espanha.<br />
23. Santo Ildefonso, Bispo e Confessor (†Toledo,<br />
667). Aplicou sua imensa fortuna na edificação de um<br />
mosteiro para religiosas. Foi monge e mais tarde Bispo<br />
de Toledo.<br />
24. São Francisco de Sales, Bispo, Confessor e Doutor<br />
da Igreja (†Lyon, 1622). Enfrentou vitoriosamente, em<br />
controvérsias públicas, os mais reputados teólogos protestantes.<br />
Pela pregação, pelos escritos e pelo aconselhamento<br />
espiritual realizou prodígios de apostolado.<br />
25. Conversão de São Paulo Apóstolo (séc. I). Inesperadamente<br />
derrubado do cavalo, Saulo de Tarso viu aparecer-lhe<br />
Jesus Cristo, dizendo: “Saulo, Saulo, por que Me<br />
persegues?” Ao levantar-se estava transformado pela graça:<br />
o perseguidor da Igreja passou a ser “O Apóstolo” por<br />
excelência.<br />
29. IV Domingo do Tempo Comum.<br />
30. Santa Jacinta Mariscotti, Virgem (†Viterbo, 1640).<br />
Vivendo num quarto decorado com luxo, durante dez anos<br />
deu mau exemplo às suas irmãs de hábito, religiosas franciscanas.<br />
Tendo adoecido gravemente, o capelão do convento<br />
recusou-se a atendê-la naquele quarto, dizendo que<br />
o Céu não fora feito para pessoas orgulhosas e frívolas.<br />
Dando-se conta do escândalo que causara, Jacinta arrependeu-se,<br />
passando a partir daí a ser exemplo heroico de<br />
mortificação e pobreza.<br />
31. São João Bosco, Confessor (†Turim, 1888). Sacerdote<br />
italiano dotado de carismas extraordinários, desenvolveu<br />
um sistema pedagógico inovador e conseguiu realizar<br />
um prodigioso movimento de apostolado, sobretudo entre<br />
os jovens.<br />
21
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> comenta...<br />
Candura, vigilância e<br />
Fotos: M. Shinoda; R. Castelo.<br />
Tendo por discípulos dois meninos privilegiados diariamente por<br />
uma singular visita, São Bernardo de Morlat foi agraciado com<br />
um especial convite: participar de um banquete no Céu…<br />
C<br />
omentarei um fato muito bonito, narrado na Vie<br />
des Saints, da Bonne Presse de Paris 1 , mas não sei<br />
qual é o grau de sua veracidade histórica.<br />
Muitas vezes, intencionalmente e a bom título, essas<br />
coletâneas de vidas de santos contêm, a par de fatos<br />
indiscutíveis, alguns que são discutíveis, quer dizer, não<br />
se sabe bem se ocorreram ou não. Mas o ponto que nos<br />
interessa é o seguinte: se o fato narrado é conforme à<br />
Doutrina Católica. Então, ainda que o fato não seja<br />
exato, Deus poderia ter agido assim.<br />
A narração que passarei a comentar dá uma noção a<br />
respeito da santidade infinita de Deus e é ilustrativa para<br />
o fiel. É a esse título que me parece muito bonito o fato.<br />
Trajes infantis antes da Revolução Francesa<br />
São Bernardo de Morlat, da Ordem dos Dominicanos,<br />
era sacristão no convento de Santarém, em Portugal. Tomara<br />
ele, como discípulos, a dois meninos, filhos de um<br />
cavaleiro de Santarém, os quais receberam logo o hábito<br />
e a tonsura monásticas e daí por diante passavam os dias<br />
no convento, ajudando as Missas e estudando com o Padre<br />
Bernardo.<br />
A pedagogia antiga preceituava que as crianças, desde<br />
pequenas, se vestissem como adultos. E daí o fato de vermos,<br />
nas pinturas de até pouco antes da Revolução Francesa,<br />
as meninas vestidas de saia balão, os meninos com<br />
trajes de homem que sai à rua para tratar de negócios, ou<br />
que vai à Corte.<br />
Os trajes propriamente infantis foram introduzidos<br />
pelo Marquês de Girardin 2 , no Jardim de Luxemburgo,<br />
em Paris, pouco antes da Revolução Francesa. Eram trajes<br />
inspirados na moda inglesa e que visavam apresentar<br />
a criança não mais com a compostura e a gravidade<br />
de um adulto, mas como um ente que pula e não se quebra.<br />
Então, uma roupa qualquer do tipo que nós conhecemos.<br />
Isso foi também um dos incêndios prévios à Revolução<br />
Francesa. Uma vez que o Marquês de Girardin<br />
apresentou seus filhos assim, a moda pegou e, em poucos<br />
meses, na França inteira os hábitos antigos estavam<br />
abolidos, e as crianças sans-culotte já começavam a brincar<br />
pelos jardins da França, antes do “sanculotismo” estar<br />
implantado.<br />
Mas a Igreja, sempre mais conservadora do que a sociedade<br />
temporal, ainda conservou esse hábito. E não<br />
posso deixar de me lembrar de que, quando era moço —<br />
tinha entre vinte e cinco e trinta anos —, fui visitar o então<br />
austero, magnífico, Mosteiro de São Bento do Rio<br />
de Janeiro, para falar não me recordo com que padre; eu<br />
estava andando pelo convento e de repente vi dois menininhos,<br />
talvez com dez, onze anos, vestidinhos completamente<br />
como monges e caminhando graves no meio do<br />
claustro.<br />
Eles passaram, conversando tão direitos e sérios, que<br />
eu tive a vaga impressão de que se tratasse de uma<br />
aparição. Quando o padre chegou, perguntei-lhe: “Mas<br />
padre, que menininhos são esses?” Ele disse: “É um<br />
velho costume beneditino. Nós recebemos vocações da<br />
mais tenríssima idade e, para os meninos se adaptarem<br />
à vida religiosa, já são vestidos como monges em pequeno.”<br />
Nas minhas elucubrações a respeito de “geração nova”<br />
3 , ocorre-me a ideia de que o “geração-novismo” começou<br />
quando o Marquês de Girardin adotou os trajes<br />
que não davam à criança a sede da maturidade, mas o<br />
gosto de serem como eram, sem o desejo de crescer, de<br />
maturar, retardando, portanto, a normal expansão da<br />
criança.<br />
Traje, gesto, estilo de conversar e de pensar<br />
Alguém poderia perguntar: “Mas traje, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>,<br />
que diferença faz?”<br />
Eu digo: “Meu caro, traje supõe gesto. Gesto supõe<br />
estilo de conversar. Estilo de conversar supõe estilo de<br />
pensar.”<br />
Então podemos imaginar aqueles dois menininhos da<br />
Idade Média, vestidos como fradinhos e recebidos na<br />
Ordem Dominicana. O hábito da Ordem Dominicana,<br />
aliás, é muito bonito.<br />
22
holocausto<br />
Um dos predicados da Igreja é que Ela sabe, como<br />
nenhuma instituição, com as coisas muito simples produzir<br />
efeitos estéticos extraordinários. Por exemplo,<br />
os hábitos das Ordens religiosas geralmente são bonitos.<br />
O hábito dominicano consiste numa túnica branca,<br />
com uma grande capa preta e um capuz branco; grandes<br />
mangas, que dão ao orador, quando ergue ao alto seus<br />
braços para exprimir um mais alto pensamento, atitude<br />
de grande categoria, porque as grandes mangas que<br />
pendem dão solenidade ao gesto. É a simplicidade extrema<br />
da Igreja, o magnífico senso da beleza que Ela<br />
possui em tudo quanto faz.<br />
Então os menininhos ajudavam as Missas todos os<br />
dias e estudavam com o Padre Bernardo, que ia formando<br />
o espírito deles.<br />
O Divino Infante participa<br />
do desjejum com dois meninos<br />
Todos os dias os dois meninos saíam bem cedo da casa<br />
de seus pais para se dirigirem ao convento, levando consigo<br />
a provisão diária.<br />
Não espanta que eles morassem em casa e usassem<br />
esse hábito. Porque na Idade Média o hábito religioso<br />
era muito mais frequente e normal do que se tornou depois.<br />
Um dia de manhã, com uma familiaridade toda infantil,<br />
sentaram-se aos pés de uma imagem de Nossa Senhora,<br />
que trazia no colo o Menino Jesus...<br />
Podemos figurar uma imagem bonita, como a de<br />
Nossa Senhora de Coromoto, com o Menino Jesus nos<br />
braços. Suponhamos toda a cena realizada diante dessa<br />
imagem, para compreendermos como fica apropriada.<br />
…diante da qual sempre rezavam o Rosário, para<br />
em seguida tomarem o seu desjejum.<br />
Eram, portanto, crianças piedosas. Toda<br />
criança amanhece com fome; e criança lusa não<br />
desmente a regra. Pois bem, elas rezam o Rosário<br />
para depois quebrarem o jejum.<br />
Enquanto comiam, um deles voltou-se para o Menino<br />
Jesus nos braços da Virgem e disse-Lhe: “Ó belo<br />
Menino, se Vos agradar, vinde comer conosco.”<br />
O Divino Infante não Se fez de rogado, desprendeu-<br />
-Se dos braços da Mãe, e de bom grado tomou lugar<br />
entre os que O haviam convidado.<br />
Nossa Senhora de Coromoto -<br />
São Paulo, Brasil.<br />
23
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> comenta...<br />
Podemos imaginar, na imagem de Nossa Senhora<br />
de Coromoto, o Menino que se move e diz com voz de<br />
criança: “Pois não!” E, de coroa na cabeça, desce do colo<br />
de Nossa Senhora, toma um pouco de comida, a introduz<br />
na boca e começa a mastigar.<br />
Os dois repartiram então com Jesus a frugal refeição.<br />
Tendo terminado, o Menino Deus agradeceu-lhes com um<br />
sorriso, subiu ao altar e voltou aos braços de Maria.<br />
Vemos que tudo isso é de uma candura... O importante<br />
é o seguinte: eu não me interesso, como católico, senão<br />
muito pouco, em saber se isso foi ou não foi assim. O<br />
que me interessa é que podia ter sido, porque Nosso Senhor<br />
Jesus Cristo é assim; está n’Ele realizar essas coisas.<br />
Se Ele fez ou não fez, não é tão importante.<br />
No dia seguinte, os coroinhas voltaram renovando o pedido.<br />
E todas as vezes o Hóspede Divino dignou-se aceitá-lo,<br />
até que qualquer convite ficara supérfluo. Apenas os meninos<br />
entravam na capela e abriam o embrulho de alimentos,<br />
o Menino Jesus lá estava entre eles.<br />
É tão delicioso, que dispensa comentários.<br />
Isso se tornou tão familiar que não só comiam juntos,<br />
mas também conversavam, e Jesus os ajudava nas dificuldades<br />
que tinham no estudo.<br />
Que encanto imaginá-los perguntando e Nosso Senhor<br />
respondendo, na intimidade de uma pequena capela<br />
do interior de Portugal!<br />
O guizo da serpente<br />
Veremos agora aparecer, ao lado de tanta candura, o<br />
drama, que tantas vezes surge nas relações entre a criatura<br />
e o Criador: a miséria humana vai se mostrar, do<br />
modo mais incoerente e mais inesperado, nesses meninos<br />
magníficos.<br />
Uma coisa somente surpreendia os dois inocentes: é que<br />
o Menino Jesus nunca trazia sua quota de comida, enquanto<br />
eles eram obrigados a conseguir mais alimentos, embora<br />
seus pais fossem muito pobres.<br />
“Não haverá muitas coisas boas no Paraíso?”, perguntavam.<br />
A surpresa dos dois degenerou em murmúrios.<br />
Coisa incrível, mas é assim a criatura humana: no conto<br />
mais encantador, ouvimos de repente o guizo da serpente,<br />
como no mais belo do Paraíso veio, também de repente,<br />
a tentação.<br />
E resolveram confiar ao Padre Bernardo suas angústias. Este,<br />
tendo examinado bem o relato, ficou tocado por tão grande<br />
prodígio. Rogou a Deus que o iluminasse e o fizesse conhecer<br />
os seus desígnios sobre os meninos. Um dia, dirigindo-se aos<br />
pequenos discípulos, ele sugeriu: “Se o Menino Jesus continua<br />
não trazendo nenhuma provisão, não vos agradaria que Ele<br />
vos convidasse, ao menos uma vez, à casa de seu Pai?”<br />
Não pedir alimento, mas a graça de ver o Céu<br />
A saída do padre foi muito inteligente: não pedir ao Menino<br />
Jesus que trouxesse comida, mas que vissem o Céu.<br />
“Oh! sim, gostaríamos muito, responderam. Mas Ele<br />
nunca nos falou sobre isso.” Disse o padre: “É preciso que<br />
Lhe peçais. Se Ele atender vosso pedido, não tereis perdido<br />
nada, pois de um só convite d’Ele recebereis mil vezes mais<br />
do que destes.”<br />
Vemos que o padre sentiu necessidade de pôr o argumento<br />
em termos um pouquinho comerciais, para conseguir mover<br />
aquelas almas, entretanto tão cândidas e puras.<br />
Não nos façamos ilusão! Essa é a criatura humana e é<br />
assim que devemos olhar a nós mesmos! Quer dizer, ou há<br />
muita vigilância, ou saem coisas dessas.<br />
E continuando a falar-lhes, o Padre Bernardo fez entrever<br />
simbolicamente o palácio do Pai Celeste, com suas magnificências<br />
e delícias, e concluiu: ‘Quando o Menino da capela<br />
vier novamente comer convosco, não vos esqueçais de pedir<br />
que vos convide, por sua vez. Mas dizei a Ele que quero também<br />
ser convidado. Não vos permito que vades sozinhos à<br />
festa. Eu vos acompanharei, ou tereis que recusar o convite,<br />
porque desejo muito ter parte nesse festim.”<br />
No dia 21 de maio de 1277, segunda-feira das Rogações…<br />
Há uma procissão que se faz nessa ocasião, para pedir a<br />
Deus graças; a Providência se manifesta particularmente<br />
exorável nessas ocasiões.<br />
…o Menino Jesus desceu de novo para tomar o desjejum<br />
com os dois meninos. Terminada a refeição, antes que<br />
o Divino Infante pusesse o pé sobre o pedestal de pedra para<br />
subir aos braços de Nossa Senhora, os dois pequenos expressaram<br />
timidamente o seu desejo: “Não nos convidais<br />
também uma vez?” Jesus fez um sinal de afirmação, enquanto<br />
os pequenos acrescentavam: “Nosso mestre gostaria<br />
de também participar da festa.”<br />
Jesus então lhes disse: “Dentro de três dias será festa<br />
da Ascensão. Haverá grande alegria na casa de meu<br />
Pai. Dizei ao Padre Bernardo que Eu o convido convosco<br />
à minha mesa, onde estareis com os Anjos e os Santos.”<br />
Contentíssimos, os dois correram para comunicar ao<br />
seu mestre a boa notícia. Ao chegarem a suas casas, avisaram<br />
aos pais que dentro de três dias iriam participar<br />
de um banquete no Céu. O Padre Bernardo comunicou o<br />
mesmo ao seu diretor espiritual.<br />
Durante os três dias, mestre e discípulos permaneceram<br />
em oração, ajoelhados ao pé do altar do Rosário. O<br />
padre explicou aos meninos o sentido do convite de Jesus<br />
e eles, abrasados de amor, não queriam outra coisa<br />
senão deixar este mundo e entrar sem tardança na verdadeira<br />
Pátria.<br />
Notamos que começa a haver um movimento de desinteresse,<br />
e os meninos melhoram.<br />
24
Padre Bernardo e os dois meninos<br />
são levados ao Céu<br />
Chegou o dia da Ascensão. Todas as Missas já haviam<br />
sido celebradas — isto na aldeia de Santarém. Enquanto<br />
os frades estavam no refeitório, Padre Bernardo dirigiu-se<br />
ao altar do Rosário, acompanhado por seus dois<br />
acólitos, e começou o Santo Sacrifício. Os dois discípulos<br />
receberam com grandíssima devoção, pela primeira<br />
vez, o Pão Eucarístico. Chegou a hora da ação de graças.<br />
Os três ajoelharam nos degraus do altar, aguardando<br />
com confiança o momento de partida para a morada<br />
celeste. Mais tarde, quando a comunidade chegou à igreja<br />
para a recitação das orações após a refeição, encontraram<br />
o padre e os dois acólitos imóveis, as mãos levantadas<br />
ao céu e os olhos fixos no Menino Jesus. Aproximaram-se<br />
deles e, — oh, morte preciosa e mil vezes digna de<br />
inveja! — constataram que haviam trocado a vida terrestre<br />
pela bem-aventurança eterna. Os seus corpos foram<br />
enterrados ao pé do altar.<br />
Não poderiam ser enterrados em outro lugar.<br />
Em 1577, quando foi aberto o túmulo para a transladação<br />
das relíquias, os ossos sagrados exalavam um delicioso<br />
perfume. A imagem da Virgem com o Menino Jesus conserva-se<br />
até hoje num rico tabernáculo.<br />
Candura, vigilância e holocausto<br />
Vemos aqui a candura em seus dois contrafortes: a vigilância<br />
e o holocausto. Sem esses dois complementos, a candura<br />
jamais é candura. Para ter verdadeira candura, a pessoa<br />
precisa vigiar constantemente sobre si mesma, noite e<br />
dia, para evitar ceder aos inúmeros impulsos maus que enxameiam,<br />
formigam, no interior de cada alma; primeiro<br />
ponto.<br />
Segundo: quando é verdadeiramente cândida, ela é<br />
convidada para o holocausto. Quer dizer, há um determinado<br />
momento em que a Providência lhe pede que se<br />
imole. Esses meninos tiveram seu mau momento, foram<br />
perdoados e depois convidados ao holocausto.<br />
Com certeza, antes de morrer, eles souberam que iam<br />
deixar esta Terra. Foram consultados sobre se queriam a<br />
morte, e aceitaram-na; suas almas foram levadas para o<br />
Céu, docemente, suavemente.<br />
E ficou aqui consignada, muito menos a imagem dos<br />
meninos e do padre, do que a figura do Menino Jesus, tão<br />
bondoso, tão misericordioso, tão capaz de condescender<br />
a todos os desejos dos homens e entrar com eles nessa familiaridade.<br />
A respeito de Nosso Senhor, diz a Escritura:<br />
“Minhas delícias são estar com os filhos dos homens” (Pr.<br />
8, 31). Ao mesmo tempo, entretanto, pedindo um preço.<br />
É o preço que Ele mesmo pagou: o holocausto. Em certo<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> chegando ao<br />
auditório São Miguel (São Paulo), em 1988.<br />
momento, Ele pede o sacrifício e é preciso dá-lo. Assim, a<br />
vida deles terminou maravilhosamente bem.<br />
Candura, vigilância e holocausto formam uma tríade,<br />
que merece ser lembrada por nós na noite de hoje. v<br />
(Extraído de conferência<br />
de 12/11/1976)<br />
1) Não possuímos a ficha utilizada por <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> nessa<br />
ocasião.<br />
2) René Louis de Girardin (1735-1808).<br />
3) Sendo já homem maduro, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> foi notando entre os<br />
jovens com que fazia apostolado uma mudança de modos<br />
de pensar, querer e agir. Enquanto as pessoas de igual ou<br />
maior idade que ele demonstravam certas qualidades de<br />
espírito, esses mais novos apresentavam debilidades, tais<br />
como falta de perfeita lógica, de segurança, de direção, de<br />
perseverança, etc. Aos primeiros, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> chamava de<br />
“geração velha”; e aos últimos, de “geração nova”.<br />
25
O pensamento filosófico de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />
Instintos e IV Revolução<br />
Fotos: G. Kralj; M. Shinoda.<br />
Ao contrário do que apregoam certas correntes filosóficas, os<br />
instintos influenciam também a razão. Desta forma, a adesão deles<br />
ao que foi concebido intelectualmente solidifica os pontos extremos<br />
do pensar do homem e forma com eles um só todo.<br />
Estudando o que escreve São Tomás sobre o instinto,<br />
chegamos à seguinte conclusão: a matéria<br />
é muito ampla e, para a estudarmos bem,<br />
deveríamos compreender que o instinto, bem como outras<br />
coisas existentes na alma humana, constitui, como<br />
que, o contrapeso da razão no terreno do equilíbrio alma-corpo.<br />
Há no ser humano, como se sabe, o instinto animal,<br />
o instinto vegetal e uma realidade mineral, a qual o homem<br />
percebe que nele existe e faz um só todo com ele,<br />
por onde o homem se sente solidário, envolvido nas leis<br />
da Física, como, por exemplo, a lei da gravidade.<br />
As diversas formas de instinto<br />
Qualquer desses instintos é um movimento primeiro<br />
pelo qual o ser tem: no homem, consciência; no animal,<br />
notícia; na planta, algo inferior a isso, mas, enfim, falando<br />
antropomorficamente, uma consciência de seu ser. O<br />
homem sente uma carência e uma necessidade de preencher<br />
essa carência, uma apetência para aquilo que preencheria<br />
a carência. Essa seria uma noção genérica, muito<br />
ampla, de todas as formas de instinto.<br />
Esta noção nos faz então compreender que o homem<br />
— antes mesmo de, por exemplo, através da razão chegar<br />
a Deus —, tendo os instintos bem equilibrados e bem<br />
exercidos, sente uma carência. Pelo instinto de si mesmo,<br />
ele percebe que lhe falta qualquer coisa de absoluto que<br />
só pode ser Deus. E isso o move, o lança para o Criador,<br />
em que a parte racional está presente, mas de um modo<br />
muito rudimentar, quase que se diria intuitivo, de tal maneira<br />
é uma evidência; o indivíduo não tem noção de sua<br />
própria operação intelectual. Posteriormente, todo o jogo<br />
do raciocínio vai justificar, conscientizar, dar inteira<br />
cidadania face à razão. Isto está no homem, no seu primeiro<br />
movimento enquanto animal.<br />
E o instinto do divino o que vem a ser?<br />
É aquilo por onde o homem tem a noção — mas uma<br />
noção instintiva, não abstrata — da sua limitação e de<br />
um absoluto, o qual forçosamente, imperiosamente, é<br />
preciso que exista para ele mesmo existir.<br />
Os instintos ordenados dão adesão à razão<br />
Se fizéssemos o levantamento de todos esses instintos<br />
como são no homem, — na sua animalidade, na sua “vegetabilidade”,<br />
o conhecimento instintivo das leis físicas,<br />
minerais — compreenderíamos perfeitamente quais são<br />
esses mecanismos primeiros que se movem dentro dele e<br />
que constituem como que uma existência paralela à existência<br />
da razão; de tal modo que, se o homem não tivesse<br />
isso, nem a sua razão funcionaria.<br />
E assim entendemos o ponto de atrito nosso com o cartesianismo<br />
1 , e também com certa escolástica de fundo cartesiano,<br />
os quais imaginam que o instinto não tem nenhuma<br />
importância; se o homem não tivesse instinto, raciocinaria<br />
também e até melhor do que tendo instinto. Isso<br />
é verdade para o anjo, mas de nenhum modo para a inteligência<br />
humana, porque a alma humana, enquanto espiritual,<br />
não é capaz de atingir a verdade sem os instintos.<br />
Compreendemos também que o fundo do processo<br />
mental do homem não é apenas a conversio ad phantasmata<br />
2 , ou seja, depois de ter o conceito de mesa, por<br />
exemplo, tomar uma mesa e verificar como ela é; mas é<br />
a conferição de tudo aquilo a que se chegou por via de<br />
razão com a boa ordem dos instintos para a<br />
pessoa ter uma certeza inteira.<br />
26
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> em<br />
agosto de 1993.<br />
27
O pensamento filosófico de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />
Esta adesão da boa ordem dos instintos ao que foi<br />
concebido intelectualmente é um elemento fundamental.<br />
E aí está o último elo que solda os dois pontos extremos<br />
do pensar do homem e forma com eles um só todo.<br />
Êxtase natural<br />
Daí surge também outra ideia muito fecunda, que é a<br />
seguinte: como o homem pode imaginar o conhecimento<br />
que Deus tem de Si próprio?<br />
A mais alta ideia é a puramente intelectiva. Mas também<br />
esse conhecimento instintivo que temos de nós mesmos<br />
nos dá uma ideia de como Deus Se conhece a Si próprio,<br />
que não é de um modo abstrativo, mas uma espécie<br />
— a expressão é má — de “experiência de si mesmo”,<br />
sem o que não compreendemos o conhecimento divino.<br />
Então, apenas somando as duas coisas temos uma ideia<br />
total do conhecimento divino; e mesmo da forma de felicidade<br />
que os bem-aventurados possuem no Céu, que é a visão<br />
de Deus face a face, conferindo aos instintos tal ou qual<br />
posse de Deus, completada pela posse intelectual e que dá<br />
aquela plenitude por onde até se compreende uma espécie<br />
de êxtase natural, sem falar do êxtase sobrenatural.<br />
O homem tem o êxtase natural quando sente a plena<br />
coerência entre o que ele pensou e o que os seus instintos<br />
percebem. É uma espécie de bem-aventurança —<br />
a estética é um dos exemplos —, em que o homem superabunda<br />
de gáudio. Nesse caso pode-se aplicar a frase do<br />
Salmista: Exultabunt ossa humiliata 3 . Os meus ossos humilhados<br />
exultam, saltam de alegria, quando a concepção<br />
intelectual que eu tive confere inteiramente com o<br />
aparelhamento instintivo.<br />
Equilíbrio dos instintos e absoluto<br />
Um exemplo interessante é o equilíbrio instintivo de um<br />
homem que, dirigindo um carro, atravessa de forma precisa<br />
uma ponte estreita. Ou então, uma pessoa que, pilotando<br />
um pequeno avião, faz uma proeza que deixa as gerações<br />
provectas, mais ponderadas, inteiramente entusiasmadas.<br />
Quando acontece uma coisa dessas, há então um equilíbrio<br />
de instintos. De que modo esse equilíbrio de instintos<br />
pode ser relacionado com o instinto do divino?<br />
Quando o indivíduo mantém todos os seus instintos com<br />
muito equilíbrio, muita finura, ele percebe que nada se<br />
basta a si próprio, e que todo aquele equilíbrio é falso se<br />
não colocar na ponta o absoluto.<br />
Estágios da Revolução tendenciosa<br />
A RCR 4 apresenta, em linhas muito sumárias, um histórico<br />
da Revolução “A” sofística e da Revolução “B”,<br />
mas não o histórico da Revolução “A” tendenciosa<br />
5 , a qual, entretanto, segundo a própria RCR, é<br />
muito mais importante que a Revolução “A” sofística.<br />
Poderíamos fazer um histórico da Revolução<br />
“A” tendenciosa a partir dos instintos.<br />
Na Idade Média, por obra da graça e do magistério<br />
da Igreja, houve um alto afinamento, uma<br />
construção tão nobre dos instintos que o homem<br />
até perdeu a noção da autonomia dos instintos em<br />
relação à razão, e começou a achar que tudo era<br />
somente razão. A tal ponto que, por exemplo, no<br />
Ancien Régime 6 e posteriormente, imaginou-se que<br />
os selvagens, como todo homem, tinham os instintos<br />
bem construídos, tudo guiado pela razão.<br />
Daí surge o cartesianismo, e também aquela<br />
construção muito bonita do Ancien Régime, na<br />
qual se tem a impressão de que todo o jogo dos<br />
instintos foi definitivamente manipulado pela razão,<br />
e que o homem passou a ser puro espírito.<br />
Mas chassez le naturel et il reviendra au galop —<br />
expulsai o que é natural e ele voltará galopando.<br />
Percebe-se que ficou alguma coisa de artificial, de<br />
esticado, no Ancien Régime; e uma parte de instintos,<br />
que não foi contemplada para poder caber<br />
dentro da forma bonita que havia sido elaborada,<br />
constituiu um depósito de descontentamentos<br />
que se manifestou depois nos excessos do Terror e<br />
posteriormente nas explosões do romantismo.<br />
São os instintos, ainda intelectuais e afetivos, que se<br />
revoltam contra uma forma da qual eles estavam postos<br />
fora. Essa revolta se ampliou depois com o hedonismo,<br />
propagado a partir do século XIX. Por exemplo, um<br />
anúncio de uma laranjada, graficamente reproduzida de<br />
um modo estupendo.<br />
Eu sentia, quando era menino, o impacto e a agressão<br />
do copo de laranjada, ou seja, ficava tomado pela apetência<br />
de bebê-lo, como quem julgasse não existir o estudo<br />
nem a razão, mas apenas a impressão causada pela laranjada<br />
na língua; e, com os olhos postos naquela substância<br />
bonita, quisesse tomar um tonel de laranjada. Esta<br />
seria uma concepção orgânica da vida.<br />
Houve depois manifestações de algo do instinto que<br />
tinha sido ainda mais posto de lado: o gosto, a ebriedade<br />
da desordem, do cacofônico, do horror, até da tara, como<br />
quem dissesse: “Estou fruindo, sentindo, é gostoso.”<br />
É uma forma de agressão.<br />
Esses são os vários estágios da Revolução tendenciosa.<br />
Simbolismo, instinto e razão<br />
Os filósofos do século XIX, inclusive muitos escolásticos,<br />
ficavam pensando que o mundo se dirigia pelo jogo<br />
28
Por obra da graça e<br />
do magistério da Igreja,<br />
houve um alto afinamento,<br />
uma construção tão<br />
nobre dos instintos que<br />
o homem até perdeu<br />
a noção da autonomia<br />
deles em relação à razão,<br />
e começou a achar que<br />
tudo era somente razão.<br />
Família nobre do período do<br />
Ancien Régime - Museu Hermitage,<br />
São Petersburg (Rússia).<br />
da razão. Os agentes da Revolução, muito espertos, percebiam<br />
a revolta dos instintos e a favoreciam, enquanto<br />
aqueles indivíduos escreviam livros e faziam tratados.<br />
A revolta dos instintos ia colocando cada vez mais à<br />
margem os homens que escreviam livros; eram os sonhadores,<br />
considerados como museus velhos, pessoas teimosas,<br />
bobas, que não captaram o que há de mais dinâmico<br />
na realidade das coisas.<br />
Preparava-se então a Revolução tendenciosa, enquanto<br />
a Revolução sofística ia ficando esclerosada, velha,<br />
banguela, caminhando para a morte.<br />
Temos assim um histórico da Revolução tendenciosa.<br />
Tratando a respeito desse tema, convém perguntar: o<br />
que é o simbolismo?<br />
É algo que, na sua linguagem própria, fala ao instinto<br />
em termos que o faz compreender o que a razão diz;<br />
e que produz exatamente esse encontro que proporciona<br />
o êxtase natural, entre o dado da razão e o instinto. Esse<br />
encontro, esse ósculo, é a luz do homem, e daí o valor<br />
brilhante dos símbolos.<br />
Eis aqui uma série de dados para se fazer, depois, um<br />
estudo eminentemente filosófico sobre esse tema.<br />
Visto dentro desta perspectiva a IV Revolução, abstraindo<br />
o que ela tem de satânico, é a legítima defesa do instinto<br />
contra uma razão que não quer tomá-lo em consideração.<br />
E a grande objeção do hippismo é esta: “Essa razão<br />
me põe mais em desordem do que meu próprio desbragamento;<br />
então eu me desbrago.” Isso é errado, mas eu<br />
quero aqui, para que o ataque à IV Revolução seja bem<br />
feito, isolar a parcela de verdade existente nessa objeção,<br />
para depois poder atacar o erro.<br />
v<br />
(Extraído de conferência<br />
de 10/7/1972)<br />
1) Cartesianismo: Filosofia de Descartes (ou Cartesius, em<br />
latim) e seus discípulos.<br />
2) A Filosofia tomista utiliza a expressão “conversio ad<br />
phantasmata” — volta às imagens — para explicar que,<br />
durante o ato de pensar, o entendimento deve manter<br />
vinculação com as imagens sensíveis, captadas pelos<br />
sentidos externos.<br />
3) Sl 50, 10.<br />
4) Revolução e Contra-Revolução, obra magna de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>,<br />
publicada por primeira vez em 1959.<br />
5) Cfr. <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>, nº 65, p. 27.<br />
6) Antigo Regime. Período da história da França que precedeu<br />
a Revolução Francesa.<br />
29
Luzes da Civilização Cristã<br />
Fotos: G. Krailj; S. Hollmann; R. Vilan<br />
Palácio de Schönbrunn, Viena (Áustria).<br />
30
A Civilização<br />
Cristã: fruto<br />
da graça<br />
Qual o papel da graça divina na<br />
educação, na distinção e nas boas<br />
maneiras de um povo? Conquistada<br />
para nós pelo Sangue de Cristo,<br />
a graça penetra nos homens<br />
produzindo inúmeras maravilhas.<br />
Entre elas está a Civilização Cristã.<br />
Folheando uma coleção de fotografias de pessoas de várias<br />
nações, entre as quais havia alguns marajás e um<br />
sultão do Afeganistão, eu notava a diferença existente<br />
entre a atitude, o porte e a posição dos monarcas, ou dos pretendentes<br />
a tronos, ocidentais, e os do Oriente.<br />
No Oriente as pedras preciosas são muito maiores, mais bonitas,<br />
de melhor quilate; o subsolo é muito mais rico desse gênero<br />
de esplendores. Também as pérolas que se colhem em alguns<br />
lugares do Oriente são de uma beleza incomparável. De<br />
maneira que as figuras de destaque orientais podem constituir<br />
para si ornatos muito mais ricos do que os príncipes do Ocidente.<br />
De outro lado, acontece que os orientais dispõem de tecelões<br />
que trabalham com tecidos feitos à mão, os quais são de<br />
uma qualidade muito superior do que os fabricados por meios<br />
industriais, como sucede em geral no Ocidente. Dessa forma,<br />
sob o ponto de vista da indumentária, os orientais se apresentam<br />
muito melhor do que os do Ocidente. Tanto mais quanto<br />
aqueles têm certa fantasia. E também não são inibidos por preconceitos<br />
revolucionários, não receando parecer por demais<br />
maravilhosos.<br />
31
Luzes da Civilização Cristã<br />
Uniformes de militares e diplomatas<br />
ocidentais do século XIX<br />
Um homem no Ocidente tem medo de parecer por demais<br />
maravilhoso. Examinem, por exemplo, os uniformes<br />
oficiais dos diplomatas e dos militares de alto grau, generais,<br />
marechais, do século XIX e os do século XX. É uma<br />
degringolada medonha. No século XIX uns e outros usavam<br />
bicórneos — chapéus de dois bicos, com abas que se<br />
reuniam em cima, e tinham aigrettes brancas; as roupas<br />
eram bordadas com alamares e outras coisas muito bonitas;<br />
os veludos eram extraordinários. Esses fardões custavam<br />
tão caro, que ao encerrar a sua carreira o diplomata<br />
dava de presente o seu fardão a um colega da sua predileção,<br />
porque o uniforme representava uma fraçãozinha<br />
não negligenciável do patrimônio de um embaixador.<br />
Mas atualmente um homem tem vergonha de se apresentar<br />
com esses trajes, porque o espírito de Revolução<br />
achatou todas as tendências para o belo.<br />
Pelo contrário, no Oriente isso não foi assim. Marajás,<br />
rajás, xás, quedivas, sultões, ulemás, aparecem com essas<br />
roupas bonitas. Entretanto, se formos examinar os homens,<br />
veremos que eles são muito inferiores, como porte,<br />
aos do Ocidente. Porque durante séculos, desde que a Igreja<br />
Católica penetrou no Ocidente, neles começou a germinar<br />
a Moral católica. E quando nós consideramos uma pessoa<br />
que observa em todos os seus pormenores a Moral católica,<br />
notamos que essa pessoa, ou seu filho ou seu neto,<br />
acaba sendo de uma educação e de um porte perfeitos.<br />
A Moral católica gera educação,<br />
distinção e correção perfeitas<br />
Por quê? Tomem uma pessoa que pratica a Moral católica<br />
perfeitamente. É instintivo nela, ainda que não tenha<br />
recebido uma educação de salão, praticar, por exemplo,<br />
atos como este: a pessoa está se servindo à mesa com<br />
um convidado por ela; por ser convidado, este merece<br />
uma especial honra e atenção; ela então serve o convidado<br />
antes de se servir a si própria.<br />
Essas coisas, ensinadas como regras de educação —<br />
“Você na sua casa, tendo convidados, seja o último a<br />
se servir”; “quando está na presença de mais velhos, faça<br />
que estes se sirvam antes”; “em presença de pessoas<br />
mais graduadas do que você, reconheça de boa vontade<br />
essa maior graduação, preste-lhes honras” —, são aplicações<br />
de princípios de Moral a questões de bom procedimento.<br />
E se, numa primeira geração de católicos muito bons, não<br />
foi possível modelar todos esses costumes de acordo com<br />
os princípios morais, ao cabo de algum tempo esses princípios<br />
filtram e nascem deles uma atitude, uma distinção, uma<br />
amabilidade, uma cortesia, que no fundo fazem parte da<br />
Moral católica. A Moral perfeita tem que gerar necessariamente<br />
a educação, a distinção e a correção perfeitas.<br />
Quem tem boas maneiras glorifica a Deus<br />
Às vezes acontece que uma pessoa pode ser de uma<br />
Moral perfeita e não ter uma educação perfeita. Porque<br />
não houve tempo de filtrar essa Moral no ambiente em<br />
que ela foi educada, começar a prestar atenção em pequenas<br />
questões de maneira a praticá-las. Questões que,<br />
evidentemente, estão num plano secundário; não constituem<br />
a essência da Moral.<br />
Pelo contrário, pode suceder que uma pessoa não tenha<br />
boa Moral, mas possua uma educação perfeita. Mas ainda aí<br />
é um resto de Religião Católica. Ela, sem perceber, pratica<br />
regras da Religião Católica, porque percebe que são bonitas<br />
na prática, na atitude concreta. Infelizmente ela com isso não<br />
tem intenção de dar glória a Deus, mas imita os que dão glória<br />
ao Criador; assim, ela involuntariamente glorifica a Deus.<br />
32
Guilherme II e a Imperatriz Sissi<br />
Nas memórias do Kaiser Guilherme II, último Imperador<br />
da Alemanha, ele conta um fato cuja descrição me<br />
impressionou muito. Ele estava no jardim do palácio do<br />
avô dele, que era então o Imperador da Alemanha. Como<br />
a Imperatriz havia morrido, a mãe dele, casada com o<br />
Príncipe Herdeiro, estava fazendo as honras da casa para<br />
uma visitante muito ilustre, que era a Imperatriz da<br />
Áustria, a famosa Sissi, uma princesa bávara casada com<br />
Francisco José, Imperador da Áustria. Era de uma beleza<br />
famosa e, além disso, de uma distinção de maneiras,<br />
de uma linha, de uma categoria extraordinárias.<br />
O Kaiser conta então que ele estava no jardim do palácio,<br />
vendo a mãe, de costas para ele, que recebia a visita<br />
da Imperatriz da Áustria. Mas ele não se aproximou<br />
enquanto não o chamaram. Pela narração, parece que<br />
ele não tinha muita curiosidade em conhecer a Imperatriz<br />
da Áustria. Em certo momento, a Imperatriz deu sinais<br />
de que queria partir, e a mãe dele se voltou para trás<br />
para ver quem estava ali para carregar a cauda da Imperatriz.<br />
E, não vendo ninguém além do seu filho, o futuro<br />
Guilherme II, ela disse-lhe: “Meu filho, venha aqui<br />
Quando numa primeira<br />
geração de católicos muito<br />
bons não foi possível<br />
modelar os costumes de<br />
acordo com os princípios<br />
morais, ao cabo de algum<br />
tempo esses princípios<br />
filtram e nascem deles uma<br />
atitude, uma distinção, uma<br />
amabilidade, uma cortesia<br />
que, no fundo, fazem<br />
parte da Moral católica.<br />
Palácio de Hofburg -<br />
Innsbruck, Áustria.<br />
33
Luzes da Civilização Cristã<br />
carregar a cauda de Sua Majestade a Imperatriz da Áustria.”<br />
Quando ele se aproximou, a famosa Sissi, Imperatriz<br />
Elisabeth, estava apenas se levantando. E ele descreve<br />
a impressão que ela lhe causou. Ela se erguia muito<br />
devagarzinho, com as maneiras e o protocolo da antiga<br />
corte. Todo o jeito dela causou-lhe tal impressão, que ele<br />
nunca mais se esqueceu de que aquele protocolo dava à<br />
Imperatriz uma elegância, uma distinção, realçava de tal<br />
modo a sua beleza, que se nota ter o Kaiser ficado deslumbrado.<br />
Se formos examinar todas as regras que ela<br />
seguia — porque a corte austríaca era muito conservadora<br />
—, verificaremos que tais regras de perto ou de longe<br />
se relacionam com a formação católica, com o ideal de<br />
perfeição moral que a Religião Católica ensina.<br />
Considerem essas cadeiras de couro — pior ainda, de<br />
matéria plástica! —, com brações, que há hoje. Ao sentar-se<br />
nelas, o indivíduo afunda e fica mergulhado naquilo,<br />
quase como numa banheira. A atitude de não se encostar<br />
ao espaldar se torna impossível.<br />
O Ocidente tem menos pedras preciosas<br />
que o Oriente, mas possui a finura católica<br />
Isso faz com que no Ocidente ocorra o seguinte: o engenheiro<br />
ou arquiteto católico que vai planejar a decoração<br />
externa e interna de um palácio para um rei cató-<br />
Sentar-se sem encostar-se ao espaldar da cadeira<br />
Coisas insignificantes. Estou falando neste auditório,<br />
onde todos estão sentados, mesmo os mais moços, e com<br />
as costas apoiadas no dorso da cadeira. Mas houve tempo<br />
em que isto era contrário às regras da boa educação.<br />
As cadeiras tinham espaldar alto, para o caso de a pessoa<br />
precisar. Mas normalmente não se deveria encostar ao<br />
espaldar. Porque era a imagem da ascese católica: a pessoa<br />
sentada, sem encostar-se ao espaldar, dominando a si<br />
mesma.<br />
O protocolo da antiga<br />
corte dava à Imperatriz<br />
uma tal elegância, uma tal<br />
distinção, realçava de tal<br />
modo a sua beleza, que o<br />
Kaiser ficou deslumbrado!<br />
Tais regras se relacionam<br />
com a formação católica,<br />
com o ideal de perfeição<br />
moral que a Religião<br />
Católica ensina.<br />
Elisabeth Amália Eugénia (Sissi),<br />
Imperatriz da Áustria, por Franz<br />
Xaver Winterhalter - Viena, Áustria.<br />
34
lico morar, palácio no qual o rei vai<br />
exercer o poder catolicamente sobre<br />
um povo católico, a própria respiração<br />
de sua alma católica executa a ornamentação<br />
de maneira a fazer prevalecer<br />
as coisas do espírito, que têm<br />
categoria, finura, em que a alma humana<br />
aparece na sua excelência. Pelo<br />
contrário, o homem que não tem essa<br />
assistência da graça, essa inspiração<br />
da Fé, não é capaz disso.<br />
Considerem esses marajás e figuras<br />
semelhantes; eles estão refestelados;<br />
um sultão chupa o narguilé indefinidamente.<br />
Por quê? Porque eles<br />
não aprenderam da Religião Católica<br />
os modos de se portar. Isso também<br />
se retrata evidentemente nos prédios,<br />
no urbanismo de uma cidade, enfim,<br />
em mil outras coisas.<br />
É isto que faz a superioridade do<br />
Ocidente. O Ocidente tem menos rubis,<br />
pérolas, esmeraldas, safiras, brilhantes; não possui<br />
rajás nem marajás, mas tem a finura católica, contrarrevolucionária,<br />
que domina todo o resto.<br />
Encontro do Xá da Pérsia com a Sissi<br />
Santíssimo Cristo da Vera Cruz - Sevilha, Espanha.<br />
Lembro-me de outro fato ocorrido com a própria Sissi,<br />
a Imperatriz da Áustria, e um Xá da Pérsia.<br />
Esses potentados do Oriente nunca vinham à Europa,<br />
porque eram viagens muito longas e às vezes sujeitas a<br />
risco. Mas quando surgiu, com os meios de comunicação<br />
modernos, a possibilidade de viagens seguras e com relativo<br />
conforto — os primeiros transatlânticos do século<br />
XIX, os primeiros trens —, os potentados do Oriente<br />
começaram a vir ao Ocidente. E vinham com todo o luxo<br />
do Oriente.<br />
O Imperador da China, o Xá da Pérsia, marajás e rajás<br />
em quantidade indefinida, sultões, estiveram na Europa.<br />
E quando eram recebidos, as cortes europeias seguiam<br />
todo o protocolo com que se recebia um Chefe de<br />
Estado estrangeiro. Portanto, coisa muito bonita, muito<br />
esplendorosa, rica, mas não extraordinariamente rica. Os<br />
orientais vinham com riquezas fabulosas e iam às festas<br />
com traje oriental.<br />
Então o Xá da Pérsia — Imperador da Pérsia — foi<br />
às principais capitais da Europa e também a Viena.<br />
Nesta cidade, em certo momento da festa, chega a Imperatriz<br />
da Áustria. Então homenagens, e o apresentam<br />
a ela. Ele faz uns salamaleques à moda oriental e ela<br />
responde com distinção, com graça, um pouco sorrindo,<br />
como diante de um Conto de Mil e Uma Noites, de<br />
uma fábula.<br />
O Xá começou a olhar para a Sissi e ficou tão deslumbrado<br />
que, terminados os salamaleques, deu uma volta<br />
por detrás dela. Queria ver se ela era inteira assim, ou<br />
se na nuca, nas costas, ela não era tão bem feita como<br />
de frente. Quando retornou à frente dela, disse: “A Sissi<br />
é realmente bonita como me disseram e até mais do que<br />
me disseram.” E fez outro salamaleque. Provavelmente,<br />
ele tinha joias muito mais bonitas do que ela, que era<br />
uma dama. Mas ela era uma joia! Tudo isso são frutos da<br />
Civilização Cristã.<br />
Papel da graça divina<br />
Mas o que é Civilização Cristã? É uma civilização na<br />
qual os homens, tendo pela graça a virtude da Fé, e, nascidas<br />
dela, as demais virtudes teologais e cardeais — sendo<br />
a Fé a primeira das virtudes teologais —, acabam possuindo<br />
toda essa grandeza pessoal, que é o resplandecer<br />
da graça.<br />
E quem nos obteve a graça foi Nosso Senhor Jesus<br />
Cristo, no momento de morrer na Cruz, e já no Horto<br />
das Oliveiras, quando Ele começou a sentir tédio e pavor<br />
do que lhe aconteceria durante a Paixão. A graça, conquistada<br />
para nós pelo Sangue de Cristo, penetra nos homens<br />
e depois produz todo o resto.<br />
v<br />
(Extraído de conferência<br />
de 13/1/1989)<br />
35
A<br />
lma de uma imensidade<br />
inefável,<br />
alma na qual todas<br />
as formas de virtude e<br />
de beleza existem com<br />
uma perfeição supereminente,<br />
da qual nenhum<br />
de nós pode ter<br />
uma ideia exata, Nossa<br />
Senhora é bem aquele<br />
mar, aquele céu de<br />
virtudes diante do qual<br />
o homem deve ficar estarrecido<br />
e enlevado, e<br />
que com todas as suas<br />
forças deve procurar<br />
amar e imitar.<br />
(Extraído de conferência<br />
15/11/1958)<br />
T. Ring<br />
Nossa Senhora<br />
de Fátima - São<br />
Paulo, Brasil.