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Publicação Mensal Ano IX - Nº <strong>99</strong> Junho de 2006<br />
Soberano<br />
e centro<br />
dos corações
Pentecostes - Catedral<br />
de Valência, Espanha<br />
S. Hollmann<br />
Talvez não nos enganemos ao pensar que um dos primeiros ambientes da Terra<br />
inteiramente abençoado e sacrossanto, no qual a bênção e a unção próprias<br />
das coisas sobrenaturais não só se fez presente mas perdurou enquanto o edifício<br />
existiu; em cujo interior brilhou um imponderável católico que todas as realizações<br />
da Igreja trazem consigo — e que é a manifestação do Espírito Santo —, que esse lugar<br />
tenha sido, precisamente, o Cenáculo onde se deu o esplendoroso espargir das graças<br />
de Pentecostes...
Publicação Mensal Ano IX - Nº <strong>99</strong> Junho de 2006<br />
Sumário<br />
Soberano<br />
e centro<br />
dos corações<br />
Na capa, Sagrado<br />
Coração de Jesus,<br />
Igreja de Santa Maria,<br />
Kitchener (Canadá)<br />
Foto: G. Krajl<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />
<strong>Revista</strong> mensal de cultura católica, de<br />
propriedade da Editora Retornarei Ltda.<br />
CNPJ - 02.389.379/0001-07<br />
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Preços da assinatura anual<br />
Junho de 2006<br />
Comum. . . . . . . . . . . . . . R$ 85,00<br />
Colaborador.. . . . . . . . . . R$ 120,00<br />
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Serviço de Atendimento<br />
ao Assinante<br />
Tel./Fax: (11) 6236-1027<br />
Editorial<br />
4 Maravilhas da presença<br />
eucarística<br />
Datas na vida de um cruzado<br />
5 Junho de 1934:<br />
Vitória das emendas católicas<br />
Dona Lucilia<br />
6 Saudosos passatempos<br />
O Santo do mês<br />
10 Santa Edeltrude<br />
Vigor e beleza da alma medieval<br />
14 Calendário dos Santos<br />
“R-CR” em perguntas e respostas<br />
16 O “flash” salvador<br />
Eco fidelíssimo da Igreja<br />
18 Rei e centro de todos os corações - I<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> comenta...<br />
24 Uma ação de graças por meio de Maria<br />
Luzes da Civilização Cristã<br />
30 A maior das glórias<br />
Última página<br />
36 Caminho para a devoção eucarística
Editorial<br />
Maravilhas da<br />
presença eucarística<br />
Em 1264, enquanto o Papa Urbano VIII residia em Orvieto, produziu-se não longe dali, na cidade de Bolsena,<br />
retumbante milagre: um sacerdote tentado por dúvidas sobre a presença real de Nosso Senhor na Eucaristia<br />
celebrava Missa, quando, no momento da Consagração, brotou sangue da Hóstia, molhando os<br />
corporais e a pedra do altar. O Santo Padre fez trazer os corporais a Orvieto, e decidiu estender à Igreja universal a<br />
Festa de Corpus Christi, em honra do Corpo de Nosso Senhor na Eucaristia. Foi por essa ocasião que São Tomás de<br />
Aquino compôs o belo ofício da Festa com o hino Pange Lingua e a seqüência Lauda Sion.<br />
No dia 15 deste mês recordamos, uma vez mais, essa verdade de Fé da presença real de Jesus Cristo sob as aparências<br />
do pão e do vinho. Presença que perdura nas espécies eucarísticas, ao alcance de todos os fiéis nos sacrários<br />
do mundo inteiro, e à qual era <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> particularmente sensível. Certa feita, a um pequeno círculo de discípulos<br />
seus, comentava:<br />
“Imaginemo-nos surpreendidos pela notícia de que Nosso Senhor Jesus Cristo vem aparecendo, todos os dias,<br />
no alto de uma colina nos arredores de São Paulo. Se assim é, interrompemos de imediato nossos afazeres e nos dirigimos<br />
a esse local bendito, pois não há outra atitude a tomar. Onde está Ele, lá estaremos nós.<br />
“Ora, quantas e quantas vezes Nosso Senhor se acha imensamente mais perto! A dois passos, na capela de nossa<br />
sede, realmente presente nas espécies eucarísticas conservadas no sacrário! Tão perto, e não raro tão pouco visitado.<br />
Ao vermos uma capela com o Santíssimo, quase vazia, a pergunta que nos contrista o coração é esta: não poderia<br />
ter mais pessoas junto d’Ele, a todo momento? Pois não existe lugar onde esteja Jesus Eucarístico, do qual se<br />
possa dizer tão freqüentado quanto seria razoável.<br />
“Na verdade, importa haver almas imbuídas de tal sofreguidão eucarística que, sendo-lhes possível entrar um<br />
instante na capela, adorar o Santíssimo e sair, não o deixassem de fazer; ou que, ao passarem perto da capela, não<br />
deixassem de abrir a porta e fazer uma genuflexão do lado de fora; ou que, ao menos, quando fossem se deitar no<br />
fim do dia, pensassem: Nosso Senhor está dormindo nesta casa. Que alegria! Almas que sofressem, não de uma escrupulosa<br />
obsessão eucarística, mas de uma fome eucarística, um ardente desejo de estar aos pés do tabernáculo,<br />
adorando Jesus Sacramentado e com Ele convivendo, um minuto que seja. Todos somos convidados a ter essa fome<br />
eucarística. Já nos terá acontecido: entramos na capela meio estabanados, damos dois passos e, de súbito, nos<br />
colhe a profunda sensação... Alguém está aqui! Um silêncio especial nos envolve, circunda, penetra em nossa alma.<br />
Olhamos e não vemos senão as paredes, o sacrário e os motivos eucarísticos neste esculpidos ou pintados. Dir-seia<br />
não haver mais nada. Porém...<br />
“Estejamos certos: o que nesses momentos sentimos não é fantasia, imaginação ou associação de imagens em<br />
virtude de outras emoções de natureza semelhante, experimentadas em outras ocasiões. Não. Trata-se de um agir<br />
da graça. Algo que, acima de todas as capacidades de intelecção se faz sentir à nossa alma, de maneira tal que compreendemos<br />
ter Nosso Senhor nos dito uma série de coisas superiores a toda palavra! É a sua voz divina a ressoar<br />
em nossos corações. Deveríamos, pois, saber nos aproximar de Nosso Senhor Sacramentado, contentes, e em silêncio:<br />
Falai, Senhor, porque vosso servo Vos escuta.<br />
“Tudo isso é imensamente sutil, insondavelmente belo, e constitui uma realidade que é um tesouro, uma estrada<br />
na vida de piedade aberta para nós na Primeira Comunhão. A todos, no dia em que inauguramos nosso convívio<br />
com Jesus Eucarístico, ofereceu-nos Ele essa palavra, essa ação. Por isso mesmo, ao me deitar à noite, sempre que<br />
olho para a lembrança de minha Primeira Comunhão sobre o criado-mudo, lembro-me daquelas graças então recebidas.<br />
E novamente me encanto...”<br />
Declaração: Conformando-nos com os decretos do Sumo Pontífice Urbano VIII, de 13 de março de 1625 e<br />
de 5 de junho de 1631, declaramos não querer antecipar o juízo da Santa Igreja no emprego de palavras ou<br />
na apreciação dos fatos edificantes publicados nesta revista. Em nossa intenção, os títulos elogiosos não têm<br />
outro sentido senão o ordinário, e em tudo nos submetemos, com filial amor, às decisões da Santa Igreja.
Datas na vida de um cruzado<br />
Junho de 1934<br />
Vitória das emendas católicas<br />
Deputado paulista mais jovem e também<br />
o mais votado para a Assembléia Nacional<br />
Constituinte de 1934, <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />
distinguiu-se nas lides parlamentares em defesa<br />
das reivindicações católicas que compunham o<br />
programa da LEC (Liga Eleitoral Católica), pela<br />
qual concorrera e se elegera de modo triunfante.<br />
Ao cabo dos trabalhos legislativos, o empenho<br />
e o vigor de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>, em conjunto com<br />
seus correligionários, sairiam vitoriosos.<br />
Pelas páginas do Legionário de 10 de junho<br />
daquele ano, assim ressaltaria ele esse objetivo<br />
tão estrenuamente conquistado:<br />
A Constituinte acaba de aprovar as emendas<br />
católicas. É tempo, pois, que estacionemos por<br />
instantes aos pés deste marco de vitória, para contemplar<br />
com olhar saudoso as lutas desta primeira<br />
etapa percorrida. Não é só um olhar de saudade<br />
para o que fica atrás de nós, que devemos a este<br />
curto passado de ação católica que a Providência<br />
quis tornar tão rico em frutos.<br />
Arquivo revista<br />
Ele se nos apresenta carregado de lições para o<br />
futuro e, na vasta coleção de reminiscências que<br />
nos saltam à memória, tão vivas neste momento<br />
como se ainda fossem realidade presente, há sem<br />
dúvida um complexo de rosas e de espinhos, colhidos<br />
ao longo do caminho, que contém, no perfume<br />
de cada pétala ou na dor de cada espinho,<br />
uma lição experimental de psicologia ou de sociologia<br />
a aproveitar.<br />
Mais ainda. Podemos já agora cravar no caminho<br />
o marco da primeira vitória, com o coração<br />
transbordante de júbilo triunfal do Magnificat das<br />
grandes conquistas. Não cedamos, porém, ao desejo<br />
de fixar nossas tendas neste primeiro Tabor;<br />
não façamos dos louros de hoje, a sepultura gloriosa<br />
de nossas energias de ontem. A própria linha<br />
ascensional e íngreme da vereda que acabamos<br />
de trilhar nos mostra que são árduos os caminhos<br />
que conduzem às vitórias de Deus. Novas ascensões<br />
nos esperam. Novas tempestades se adensam<br />
em horizontes ainda longínquos. Há tocaias novas<br />
ao longo de novos caminhos. Alerta, pois, que<br />
vencemos uma batalha, e não uma guerra. Outras<br />
batalhas aí estão. O momento é de alegria sã e vibrante.<br />
Longe de nós a indolência emoliente dos<br />
que já se dão por satisfeitos.<br />
Isto posto, porém, deixai‐nos recordar. Quem<br />
haveria de dizer? Foi esta a interrogação que ouvi<br />
dentro de mim mesmo, quando, aprovada nossa<br />
emenda final, eu tirei das costas a cruz pesada<br />
que se transformava, nas mãos dos deputados católicos,<br />
em palma de vitória.<br />
Conversando comigo em um momento de lazer,<br />
ponderava com razão Alcântara Machado 1<br />
que a nova Constituição será grande, principalmente<br />
pelo que não figura nela. Retificando de<br />
certo modo o juízo do líder, posso dizer que a<br />
Constituição é grande até pelo que nela se deixou<br />
de dizer. (...) Ainda é cedo para lhe ver as grandes<br />
qualidades. Um dia, porém, falará o futuro. E ele<br />
fará justiça aos legisladores de 34. v<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> quando deputado da<br />
Constituinte de 1934<br />
1<br />
) José Alcântara Machado d’Oliveira (1875-1941), deputado<br />
e líder da Bancada Paulista na Assembléia Nacional<br />
Constituinte de 1934.
Dona Lucilia<br />
Saudosos passatempos<br />
Ao narrar os episódios ocorridos<br />
no seio de sua família<br />
nos primeiros anos vividos<br />
em São Paulo, Dª Lucilia costumava<br />
ressaltar a paz, a distinção e<br />
a benquerença dos tempos em que<br />
formou sua mentalidade. Habituada<br />
a esse tom superior, conservava porém<br />
na alma o gosto pelas diversões<br />
singelas.<br />
Dedilhando o bandolim<br />
Entre os passatempos caseiros,<br />
encontramo-la já bem cedo voltada<br />
para a música, arte em que se refletia<br />
aquele seu estilo de relacionamento<br />
com os outros, todo imbuído<br />
de inocência. Além de dominar<br />
com facilidade o piano, encantavase<br />
também com o bandolim. Deslizava<br />
suavemente os dedos entre as cordas<br />
e as madrepérolas de um desses<br />
instrumentos, presenteado pelo pai,<br />
e que ela conservou com carinho até<br />
seus floridos 92 anos.<br />
Sensível à beleza da natureza vegetal,<br />
agradava-lhe, nos verdejantes<br />
parques da pacata e distinta São<br />
Paulo de então, colher algumas flores.<br />
Por ocasião da Semana Santa,<br />
desabrochava a do maracujá. Notava-se<br />
nela peculiar coincidência em<br />
relação ao tempo litúrgico, pois possuía<br />
algumas particularidades que<br />
lembravam os instrumentos da Paixão.<br />
Razão pela qual é conhecido como<br />
“Flor da Paixão”. A essas características<br />
da flor se acrescia ainda a<br />
de um raro e agradável sabor da fruta,<br />
tornando-as, uma e outra, alvos<br />
das atenções de Lucilia, que as colhia<br />
em um pé existente perto de sua<br />
casa. Comprazia-se em mostrar a beleza<br />
que há no fato de a Providência<br />
ter feito uma flor para conter, como<br />
num relicário, as lembranças dos sofrimentos<br />
de Nosso Senhor. Assim,<br />
algo tão frágil lhe trazia austeras reflexões;<br />
talvez, por seu simbolismo,<br />
a considerasse a rainha das flores e<br />
não a rosa, como correntemente os<br />
poetas imaginam.<br />
Apesar do elevado tônus de sua<br />
vida doméstica, das elegantes festas,<br />
das visitas entretidas ou passeios<br />
agradáveis, ou ainda das atraentes<br />
Fotos: Arquivo revista<br />
Dona Lucilia deslizava<br />
suavemente os dedos pelas<br />
cordas e madrepérolas do seu<br />
bandolim, conservado por ela<br />
com carinho até o fim da vida
Um dos mais atraentes passatempos<br />
de Dona Lucilia na fazenda eram<br />
as “boas galopadas” das quais<br />
sempre se lembrava com saudades<br />
Aspectos da Fazenda Pituba, que<br />
fazia parte das propriedades de<br />
<strong>Dr</strong>. Antônio em São João da Boa Vista<br />
As viagens à fazenda eram facilitadas<br />
pela proximidade da estação<br />
da estrada de ferro, cujos trilhos<br />
cortavam a propriedade. Durante as<br />
temporadas que ali passava, um dos<br />
grandes atrativos da jovem Lucilia<br />
era cavalgar — com sela de senhora,<br />
bem entendido. Muitos anos depois,<br />
recordar-se-á numa carta: Quando<br />
era moça, gostava imenso de umas<br />
boas galopadas a cavalo, e é com saudades<br />
que guardo esta lembrança de<br />
meu passado, sobretudo porque esses<br />
passeios eram sempre feitos em companhia<br />
do meu muito querido pai.<br />
músicas, Lucilia sentia falta dos bosques,<br />
prados e pomares. Após a aquisição,<br />
por seu tão querido pai — já<br />
muito mais experimentado nas coisas<br />
do campo — de uma propriedade<br />
em São João da Boa Vista (SP),<br />
em 1895, pôde ela satisfazer seus anseios.<br />
Saudades de umas<br />
boas galopadas<br />
Primorosamente organizada, com<br />
uma área de 1800 ha, a fazenda Jaguary<br />
era adornada por um lago e<br />
cortada de fora a fora pelo rio Jaguari-Mirim.<br />
Este carreava pedras<br />
translúcidas que, à distância, pareciam<br />
preciosas, atraindo as crianças<br />
a com ela brincarem, e os adultos —<br />
menos poeticamente — a transformarem-nas<br />
em fichas de jogo.
Dona Lucilia<br />
Sua candura, aliando-se facilmente<br />
aos encantos da natureza, desenvolveu-lhe<br />
na alma um acentuado<br />
gosto por lugares abertos. Apreciava<br />
o frescor da vida do campo, desde as<br />
flores selvagens até o leite gordo, os<br />
bolos saborosos e os legumes colhidos<br />
na hora.<br />
Pescarias em águas cristalinas,<br />
breves caminhadas em trilhas que se<br />
embrenhavam um tanto na mata, o<br />
canto de graciosos pássaros e o belo<br />
colorido das borboletas azuis, quanto<br />
esse conjunto a empolgava!<br />
Mas os passeios de Lucilia não se<br />
limitavam às suas viagens ao interior<br />
paulista. Muitas vezes, <strong>Dr</strong>. Antônio<br />
passava temporadas com a família<br />
em Santos, no Hotel Parque Balneário,<br />
habitualmente freqüentado pela<br />
boa sociedade de São Paulo. Levavao<br />
a isso, entre outros motivos, o fato<br />
de ser sócio de uma firma exportadora<br />
de café, nessa cidade portuária.<br />
Em outras ocasiões, ia à Petrópolis<br />
de ares imperiais.<br />
Visitas à cidade imperial<br />
Além de gozar de todo o prestígio<br />
de uma encantadora cidade-filial do<br />
Rio, possuía Petrópolis as mil amenidades<br />
do alto de montanha. Embora<br />
não tivesse mais a importância desfrutada<br />
no tempo do Império, significativos<br />
restos de vida social ainda<br />
nela coruscavam.<br />
De outro lado, continuava a ser<br />
uma espécie de subcapital e sede permanente<br />
das Legações Diplomáticas.<br />
Nesse antigo centro de colonização<br />
alemão, onde outrora se desenvolvera<br />
a distinção e o charme da vida de<br />
Corte, todos os tratados internacionais<br />
ainda eram firmados, e tanto embaixadores<br />
quanto as melhores famílias<br />
do Rio de Janeiro continuavam a<br />
manter ali suntuosas moradias. O palácio<br />
do velho Imperador estava agora<br />
fechado, envolto em silêncio, habitado<br />
apenas pelas reminiscências felizes<br />
e saudosas de uma era que passara...<br />
Isso não impedia os alegres cariocas<br />
de aproveitarem o clima aprazível<br />
que as alturas ofereciam, e lá se refugiarem<br />
do calor da Capital, na época<br />
mais quente do ano. Nesse período a<br />
cidade serrana fazia reviver, em sua atmosfera,<br />
algo da animação do passado.<br />
As ruas readquiriam movimento,<br />
os carros puxados a cavalo voltavam a<br />
encher os ares com seu ruído característico,<br />
os palacetes reabriam suas portas<br />
e os hotéis regurgitavam de hóspedes<br />
distintos. As senhoras não perdiam<br />
ocasião de retirar de seus imensos<br />
baús belos vestidos, cujo corte elegante<br />
a última moda de Paris ditara.<br />
Para lá afluíam também de outros<br />
pontos do Brasil, em especial de São
Além das viagens ao interior paulista, a<br />
família Ribeiro dos Santos costumava<br />
passar temporadas na serrana cidade<br />
de Petrópolis, em cuja atmosfera<br />
ainda recendiam a distinção e o<br />
charme da antiga vida de Corte<br />
Palácio Imperial de Petrópolis<br />
(hoje o Museu Imperial); na<br />
página anterior, carro a cavalo<br />
em Petrópolis e o Hotel Europa<br />
Paulo, famílias tradicionais. Dona Gabriela<br />
e os seus se hospedavam habitualmente<br />
no Hotel Europa, chegando<br />
mesmo, em alguns anos, a lá passar<br />
o réveillon. Tendo a família Ribeiro<br />
dos Santos muito bom relacionamento<br />
com a elite do Rio de Janeiro, era a<br />
jovem Lucilia convidada para as festas<br />
que com freqüência se organizavam.<br />
Acostumada aos ambientes paulistas,<br />
onde a gravidade era a nota dominante,<br />
aliada até a uma certa monumentalidade<br />
— da qual a ilustre<br />
matriarca Dona Gabriela era um característico<br />
exemplo — ela terá por<br />
certo notado quão diferente eram os<br />
cariocas com seu risonho charme.<br />
Dessas inesquecíveis estadias<br />
guardou, para toda a vida, inúmeras<br />
recordações. Uma delas foi a relação<br />
de amizade que sua família travou<br />
com o ministro plenipotenciário<br />
da Rússia Imperial no Brasil, Conde<br />
Maurice de Prozor.<br />
Naquele tempo em que a arte de<br />
conversar era a principal distração<br />
da vida social, muito devem ter impressionado<br />
o espírito de Lucilia<br />
as histórias que o Conde de Prozor<br />
contava de sua longínqua terra natal,<br />
marcada pelos faustos da corte<br />
do Czar, uma das mais esplendorosas<br />
do mundo.<br />
Anos mais tarde, por ocasião da<br />
Revolução Bolchevista, as relações<br />
entre os dois países ficaram suspensas.<br />
Não obstante, o simpático Conde<br />
de Prozor continuou a morar no<br />
Brasil, mantendo o contato com os<br />
Ribeiro dos Santos.<br />
(Transcrito, com adaptações, da<br />
obra “Dona Lucilia”, de João S. Clá<br />
Dias; publicado parcialmente na<br />
“<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>” número 11)
O Santo do mês<br />
Santa<br />
Edeltrude<br />
Vigor e beleza da<br />
alma medieval<br />
Como nos mostra <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>, a<br />
rainha Santa Edeltrude e suas<br />
irmãs — também canonizadas —<br />
são luminoso exemplo do que foi<br />
outrora a “Ilha dos Santos” (o atual<br />
Reino Unido), no alvorecer de uma<br />
era onde a virtude heróica se fazia<br />
freqüente até nos mais altos degraus<br />
da sociedade, a partir dos quais se<br />
estendia às outras camadas sociais,<br />
dando forma àquele conjunto<br />
chamado de Cristandade.<br />
N<br />
o dia 23 de junho a Igreja lembra Santa Edeltrude,<br />
Rainha e virgem do século VII. Filha de<br />
um monarca do Leste Inglês — um dos sete<br />
reinos que constituíam a Inglaterra de então — teve ela<br />
três irmãs santas: Saxburga, Edilburga e Virtburga. Como<br />
sói acontecer naquela época povoada de heróis da<br />
Fé, a virtude resplandecia no seio das famílias, e muitos<br />
parentes possuíam em comum, não apenas o sangue, mas<br />
também a santidade. Neste caso, poder-se-ia construir<br />
10
Fotos: S. Hollmann / J. M. Brandão<br />
Na Inglaterra dos primórdios da<br />
Idade Média floresceram heróis<br />
e heroínas da Fé, como a Rainha<br />
Santa Edeltrude e suas irmãs<br />
A Catedral de Ely, construída no local onde Santa<br />
Edeltrude fundou seu primeiro mosteiro;<br />
à esquerda, imagem de rainha santa<br />
(Igreja de Saint-Germain l’Auxerrois, Paris)<br />
um esplêndido templo católico no qual houvesse quatro<br />
belos altares em honra dessas irmãs bem-aventuradas.<br />
Ousadia e fundação de mosteiro<br />
A respeito de Santa Edeltrude, alguns autores nos<br />
apresentam os seguintes dados biográficos:<br />
Nasceu provavelmente por volta de 630 e morreu em Ely,<br />
a 23 de junho de 679. Quando ainda muito jovem, foi dada<br />
em casamento por seu pai, Anna, Rei de East Anglia, a<br />
um certo Tonbert, príncipe a ele subordinado. Deste primeiro<br />
marido, Edeltrude recebeu como dote algumas terras na<br />
localidade conhecida como a Ilha de Ely.<br />
A santa viveu cinco anos com Tonbert em perfeita continência.<br />
Após a morte prematura do príncipe, viveu um período<br />
de paz com sua vocação religiosa. Seu pai, entretan-<br />
11
O Santo do mês<br />
Naquela aurora da Cristandade<br />
medieval, reis e rainhas, embora<br />
conservassem resquícios de<br />
barbárie, eram o ponto de partida<br />
de futuras civilizações<br />
Alto-relevo da Catedral<br />
de Amiens, França;<br />
abaixo, Catedral de<br />
Ely, Inglaterra<br />
to, quis que ela se casasse novamente e lhe arranjou a união<br />
com Egfrido, filho e herdeiro de Oswy, Rei da Nortúmbria.<br />
De seu segundo esposo, que consta ter então apenas 14<br />
anos de idade, recebeu mais terras, desta feita em Hexham.<br />
Por meio de São Wilfrido (634-709), monge beneditino e<br />
Bispo de York, cedeu ditas propriedades para a fundação<br />
do mosteiro de Santo André. São Wilfrido tornou-se amigo<br />
e guia espiritual de Santa Edeltrude, aprovando e lhe incentivando<br />
a guarda da virgindade. Porém, foi a ele que Egfrido<br />
recorreu, quando sucedeu seu pai, para fazer valer seus<br />
direitos maritais contra a vocação religiosa de Edeltrude.<br />
Primeiramente, o bispo conseguiu persuadir Egfrido a<br />
deixá-la viver por certo tempo em sossego, como freira no<br />
convento de Coldingham, fundado pela tia dela, Santa Ebba.<br />
Mas ante o perigo iminente de ser levada à força pelo<br />
rei, Edeltrude fugiu em direção ao sul do país, com apenas<br />
duas companheiras, buscando suas terras em Ely. Ali, favorecida<br />
por milagres e misericordiosas intervenções divinas,<br />
num lugar cercado de pântanos, areias movediças e pelas<br />
águas do rio Ouse, iniciou a fundação do mosteiro de Ely.<br />
Como o lugar ficava na região onde Edeltrude nascera,<br />
seus parentes de sangue real lhe forneceram os meios necessários<br />
para a execução de seus planos. São Wilfrido ainda<br />
não havia retornado de Roma, onde lograra obter do Papa<br />
Bento II privilégios extraordinários<br />
para aquela<br />
fundação, quando Edeltrude<br />
morreu vítima de uma<br />
epidemia a qual ela mesma havia<br />
predito.<br />
12
Após a queda do Império Romano do Ocidente, em<br />
476, os povos que surgem têm príncipes e princesas evidentemente<br />
com resquícios de barbárie. Quanto ao aspecto,<br />
ao porte, ao estilo, não podermos imaginar Santa<br />
Edeltrude e suas três irmãs semelhantes às filhas de Luís<br />
XV, pintadas por Nattier, sobre um fundo azul claro: Madames<br />
Henriette e Adélaïde, frágeis, como se fossem de<br />
porcelana, quase evanescentes, vestidas com sedas vaporosas.<br />
Devemos figurá-las como damas vigorosas, cujas<br />
mãos estavam afeitas a árduos trabalhos domésticos,<br />
embora fossem orgânica e autenticamente princesas de<br />
grande valor nos países onde surgiam.<br />
Cumpre salientar, aliás, que elas eram por assim dizer<br />
os berços de posteriores dinastias, e seus povos, os pontos<br />
de partida de futuras civilizações. Como lembrei acima,<br />
habitava ali certa grandeza e a semente de uma alta<br />
santidade. Haja vista a confluência de muitos bem-aventurados:<br />
somente na corte da nossa biografada encontravam-se<br />
ao mesmo tempo quatro santas, ademais de um<br />
diretor espiritual igualmente santo! Além disso, uma disseminação<br />
tal da virtude que foi possível a Santa Edeltrude<br />
convencer aos seus dois sucessivos maridos — um<br />
príncipe e um rei — de guardarem a continência na vida<br />
conjugal.<br />
Por muitos séculos, o corpo<br />
da santa foi objeto de devota<br />
veneração na famosa catedral<br />
de Ely, construída precisamente<br />
no local do antigo mosteiro fundado<br />
por ela. O atual edifício católico<br />
é considerado uma magnífica mostra<br />
dos vários estilos góticos, acrescentados durante<br />
diversas renovações desde o século IX, sendo<br />
que a última parte — o famoso octógono — foi adicionada<br />
em 1400.<br />
Uma das mãos da santa é atualmente venerada na igreja<br />
católica de Santa Edeltrude, na Ely Place, em Londres.<br />
Trata-se do mais antigo templo católico da capital britânica,<br />
e durante a Idade Média era considerado uma espécie<br />
de feudo dos bispos de Ely, herdeiros daquelas terras de<br />
Santa Edeltrude.<br />
Na Idade Média, ao lado da<br />
rudeza, autêntica virtude<br />
Percebemos aqui um flash 1 da Inglaterra primitiva,<br />
bem como da aurora da Idade Média que contém algo<br />
de selvagem e, ao mesmo tempo, de extraordinariamente<br />
sobrenatural. Este contraste encerra, a meu ver, uma<br />
intensa beleza.<br />
Admirável perseverança<br />
Juntamente com tais virtudes, não se pode ignorar algumas<br />
manifestações de primitivismo. Por exemplo, uma<br />
princesa que deixa seu esposo por este querer romper o<br />
voto de castidade, refugia-se num convento e o marido<br />
não ousa ir atrás dela nem invadir o recinto sagrado, o<br />
que, naquele tempo, era julgado um fato explicável. Hoje<br />
seria considerado um escândalo, com notícias espalhafatosas<br />
nos jornais, etc.<br />
Seja como for, é admirável a perseverança de Santa<br />
Edeltrude na prática da castidade perfeita. O abandono<br />
da vida da corte, com todas as suas glórias, para adotar o<br />
estado religioso, a sabedoria com que ela governou seu<br />
mosteiro (num país então pequeno, isso representava algo<br />
muito importante para a própria vida da nação), encaminhando<br />
as religiosas para o Céu, tudo isso forma um<br />
conjunto de traços fisionômicos iluminados pela santidade,<br />
e justifica plenamente a devoção que os fiéis possam<br />
ter para com ela.<br />
Assim, nada mais aconselhável e rico em benefícios<br />
para nossa alma do que nos recomendarmos às orações<br />
de Santa Edeltrude, Rainha e virgem, no dia de sua festa.<br />
v<br />
1<br />
) Sobre o termo flash, cf. <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> número 55.<br />
13
Calendário dos Santos<br />
1. São Justino, Mártir, +165. Nascido<br />
em Siquém, na Palestina. Foi filósofo,<br />
insigne Padre e Doutor da<br />
Igreja. Ensinou em Éfeso e depois<br />
em Roma, sob o Imperador Marco<br />
Aurélio, para quem escreveu a Apologia<br />
da Religião Cristã. Levado perante<br />
os tribunais romanos, confessase<br />
cristão e por isto sofre o martírio.<br />
2. Santo Eugênio I, Papa. Governou<br />
a Igreja entre 656 e 657. Rejeitou<br />
a doutrina monotelita, razão pela<br />
qual caiu em desgraça junto ao<br />
Imperador Constante. Não fosse<br />
sua morte inesperada, provavelmente<br />
teria sofrido o martírio, como seu<br />
predecessor, São Martinho I.<br />
Santa<br />
Clotilde<br />
3. Santa Clotilde, Rainha. Converteu<br />
seu esposo Clóvis, Rei dos Francos.<br />
Quando se tornou viúva, recolheu-se<br />
na basílica de São Martinho,<br />
pedindo não fosse considerada como<br />
soberana, mas serva do Senhor.<br />
Em Roma, Beato João XXIII, Papa,<br />
+1963.<br />
4. Domingo de Pentecostes.<br />
“Chegando o dia de Pentecostes,<br />
estavam todos reunidos no mesmo<br />
lugar. De repente, veio do céu um<br />
ruído, como se soprasse um vento<br />
impetuoso, e encheu toda a casa<br />
onde estavam sentados. Apareceulhes<br />
então uma espécie de línguas<br />
de fogo, que se repartiram e pousaram<br />
sobre cada um deles. Ficaram<br />
todos cheios do Espírito Santo e começaram<br />
a falar em outras línguas,<br />
conforme o Espírito Santo lhes concedia<br />
que falassem” (At 2, 1-4).<br />
5. São Bonifácio, Bispo e Mártir.<br />
Evangelizador da Alemanha. Nasceu<br />
na Inglaterra por volta de 672,<br />
e morreu em 754.<br />
6. São Norberto, Bispo, 1080-<br />
1134. Arcebispo de Magdeburgo e<br />
fundador dos Premonstratenses.<br />
7. São Roberto de Newminster,<br />
abade cisterciense, + 1159.<br />
Santo Antônio Maria Gianelli,<br />
1789-1846. Bispo de Bobbio, Itália.<br />
10. Beato João Dominici, 1350-<br />
1420. Nascido em Florença, foi dominicano<br />
e mestre do Beato Angélico.<br />
Tornou-se Cardeal e Arcebispo<br />
de Ragusa. No Concílio de Constança<br />
trabalhou eficazmente para o<br />
fim do Grande Cisma de Ocidente.<br />
Morreu na Hungria.<br />
11. Domingo da Santíssima Trindade.<br />
São Barnabé, Apóstolo, séc. I. Nasceu<br />
na ilha de Chipre, de família judia.<br />
Sua história vem narrada nos Atos<br />
dos Apóstolos, tendo sido quem apresentou<br />
São Paulo aos outros Apóstolos,<br />
e mais tarde o convidou a pregar<br />
o Evangelho em Antioquia, onde fundaram<br />
importante comunidade cristã.<br />
Primo de São Marcos, com quem,<br />
além de São Paulo, empreendeu uma<br />
viagem apostólica. Morreu martirizado<br />
em Chipre, por volta do ano 63.<br />
12. São Leão III, Papa, séc. IX.<br />
Coroou o Imperador Carlos Magno<br />
na noite de Natal do ano 800.<br />
Santo Onofre, Anacoreta. Viveu<br />
sessenta anos no deserto.<br />
13. Santo Antônio de Pádua (ou<br />
de Lisboa), Presbítero e Doutor da<br />
Igreja, 1135-1231.<br />
14. Santo Eliseu, Profeta. Viveu<br />
cerca dos anos 800-850 antes de<br />
Cristo.<br />
São Metódio, Patriarca de Constantinopla,<br />
+847.<br />
8. Santo Efrém (chamado “o Sírio”),<br />
Doutor da Igreja, 306-373.<br />
9. Beato José de Anchieta, Presbítero,<br />
1534-1597. Jesuíta, nascido<br />
nas Ilhas Canárias. Chamado o<br />
Apóstolo do Brasil.<br />
15. Solenidade de Corpus Christi.<br />
Santo Amós, Profeta do Antigo<br />
Testamento, séc. VIII a.C.<br />
16. São João Francisco de Régis,<br />
Presbítero, +1640.<br />
17. Santa Teresa de Portugal,<br />
1178-1250.<br />
São Rainiero de Pisa, 1100-1160.<br />
18. 11º Domingo do Tempo Comum.
* Junho *<br />
São Gregório Barbarigo, 1632-<br />
1697.<br />
19. São Romualdo, Fundador,<br />
956-1027. Nasceu em Ravena, Itália,<br />
onde passou uma juventude<br />
entregue às ocupações e prazeres<br />
mundanos. Certo dia foi obrigado<br />
por seu pai a presenciar um duelo<br />
em que este matou seu adversário,<br />
e o crime impressionou a fundo Romualdo,<br />
como se ele próprio o tivesse<br />
cometido. Em expiação, retirou-se<br />
para o mosteiro beneditino<br />
de Santo Apolinário, do qual se<br />
tornou abade. Fundou diversos outros<br />
conventos, até instituir a austera<br />
Ordem dos Camaldulenses, na<br />
Toscana.<br />
20. Santa Margaret Pole, Mártir.<br />
Condessa de Salisbury, decapitada<br />
em 1541, sob Henrique VIII,<br />
por se manter fiel ao Papa.<br />
21. São Luís Gonzaga, 1568-<br />
1591. Distinguiu-se por sua exímia<br />
prática da virtude da pureza. Recebeu<br />
a vocação de pertencer à Companhia<br />
de Jesus rezando diante de<br />
um quadro de Nossa Senhora do<br />
Bom Conselho, no colégio jesuíta<br />
em Madrid. Morreu seminarista.<br />
22. São Paulino de Nola, 354-431.<br />
Filho de um prefeito romano da Gália,<br />
nasceu perto de Bordeaux. Batizou-se<br />
junto com sua esposa, Teresa,<br />
espanhola, em cuja propriedade<br />
na Espanha residiram. Um filho do<br />
casal morreu recém-nascido, e este<br />
acontecimento determinou que ambos<br />
começassem a levar uma vida<br />
de grande austeridade. Entregaram<br />
seus bens e se mudaram para a pequena<br />
cidade de Nola, perto de Nápoles.<br />
Por eleição popular, foi escolhido<br />
para Bispo dessa cidade, a qual<br />
pastoreou durante 21 anos.<br />
23. Festa do Sagrado Coração de<br />
Jesus.<br />
Santa Edeltrude, Rainha e Virgem.<br />
Ver artigo na página 10.<br />
24. Natividade de São João Batista.<br />
Imaculado Coração de Maria.<br />
Disse Nossa Senhora à Irmã Lúcia,<br />
ao lhe aparecer em 10 de dezembro<br />
de 1925: “Olha minha filha,<br />
o meu Coração cercado de espinhos<br />
que os homens ingratos a todo<br />
momento me cravam com blasfêmias<br />
e ingratidões. Tu ao menos,<br />
vê de me consolar”. Desde 1<strong>99</strong>6 esta<br />
data foi elevada a memória obrigatória<br />
por João Paulo II, grande<br />
devoto de Nossa Senhora de Fátima<br />
e do Imaculado Coração. (Neste<br />
ano, porém, pela coincidência de<br />
datas, a festividade do Nascimento<br />
de São João Batista tem primazia sobre<br />
a memória do Imaculado Coração<br />
de Maria.)<br />
25. Santo Adalberto, Diácono e<br />
Abade, séc. VIII.<br />
São Guilherme de Vercelli, ou de<br />
Montevergine, Abade, 1085- 1142.<br />
Primeira Comunhão de São Luís Gonzaga<br />
26. 12º Domingo do Tempo Comum.<br />
São Josémaria Escrivá de Balaguer,<br />
+1975.<br />
27. Nossa Senhora do Perpétuo<br />
Socorro. (Ver “<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>” nº 87.)<br />
São Cirilo de Alexandria, Bispo e<br />
Doutor da Igreja, 376-444.<br />
São Tomás Toan, Mártir. Catequista<br />
do Tonkin (China). Torturado<br />
e encarcerado, morreu de fome e sede,<br />
sob o Imperador Minh Mang.<br />
28. Santo Irineu de Lyon, Bispo,<br />
Mártir e Padre da Igreja, 125-222.<br />
29. Solenidade de São Pedro e São<br />
Paulo, Apóstolos. No Brasil, transferida<br />
para o domingo seguinte, 2 de julho.<br />
São Cássio, Bispo de Narni (Itália).<br />
Na solenidade de São Pedro<br />
e São Paulo, enquanto celebrava<br />
Missa na sua cidade episcopal, depois<br />
de ter distribuído a Santa Comunhão,<br />
entregou sua alma a Deus<br />
(como narra São Gregório Magno).<br />
30. Protomártires da Igreja de<br />
Roma.<br />
Fotos: S. Hollmann<br />
15
“R-CR” em perguntas e respostas<br />
O “flash” salvador<br />
Desvendar a hediondez dos aspectos mais avançados da<br />
Revolução, bem como a do seu vulto geral, é um meio de<br />
produzir sadio sobressalto nas almas dominadas pelo<br />
processo revolucionário. Porém, assevera <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>, nenhum<br />
esforço nesse sentido adiantaria sem a ação da graça divina,<br />
a única que, na verdade, através de um flash salvador é capaz<br />
de produzir essa esperada conversão.<br />
É pecado aderir à Revolução?<br />
“A adesão plena e consciente à<br />
Revolução, como esta in concreto se<br />
apresenta, constitui um imenso pecado,<br />
uma apostasia radical, da qual<br />
só por meio de uma conversão igualmente<br />
radical se pode voltar” (p.<br />
125).<br />
No fundo da miséria,<br />
a graça da conversão<br />
Em geral, como se operam as grandes<br />
conversões?<br />
“Segundo a História, afigura-se<br />
que as grandes conversões se dão o<br />
mais das vezes por um lance de alma<br />
fulminante, provocado pela graça<br />
ao ensejo de qualquer fato interno<br />
ou externo.<br />
“Esse lance difere em cada caso,<br />
mas apresenta com freqüência certos<br />
traços comuns” (pp. 125-126).<br />
Como se dá a conversão do pecador<br />
que chegou ao extremo da Revolução?<br />
“Na alma empedernida do pecador<br />
que, por um processo de grande<br />
velocidade, foi logo ao extremo<br />
da Revolução, restam sempre recursos<br />
de inteligência e bom senso, tendências<br />
mais ou menos definidas para<br />
o bem.<br />
“Deus, embora não as prive jamais<br />
da graça suficiente, espera, não<br />
raramente, que essas almas cheguem<br />
ao mais fundo da miséria, para lhes<br />
fazer ver de uma só vez, como num<br />
fulgurante flash, a enormidade de<br />
seus erros e de seus pecados.<br />
“Foi quando desceu a ponto de<br />
querer se alimentar das bolotas dos<br />
porcos que o filho pródigo caiu em<br />
si e voltou à casa paterna” [cf. Lc 15,<br />
16-19] (p. 126).<br />
Como reacender<br />
“a mecha que<br />
ainda fumega”<br />
E do tíbio que vai sendo arrastado<br />
aos poucos pela Revolução?<br />
“Na alma tíbia e míope que vai<br />
resvalando lentamente na rampa da<br />
Revolução, atuam ainda, não inteiramente<br />
recusados, certos fermentos<br />
sobrenaturais; há valores de tradição,<br />
de ordem, de Religião, que ainda<br />
crepitam como brasas sob as cinzas.<br />
“Também essas almas podem, por<br />
um sadio sobressalto, num momento<br />
de desgraça extrema, abrir os olhos e<br />
reavivar em um instante tudo quanto<br />
nelas definhava e ameaçava morrer:<br />
é o reacender-se da mecha que ainda<br />
fumega” [cf. Mt 12, 20] (pp. 126-<br />
127).<br />
Como agir para produzir nos revolucionários<br />
um “flash” que os converta?<br />
“Toda a humanidade se encontra<br />
na iminência de uma catástrofe,<br />
e nisto parece estar precisamente a<br />
grande ocasião preparada pela misericórdia<br />
de Deus. Uns e outros —<br />
os da velocidade rápida ou lenta —<br />
neste terrível crepúsculo em que vi-<br />
16
S. Hollmann<br />
Não raro, Deus espera que<br />
o pecador chegue ao mais<br />
fundo da miséria para<br />
lhe fazer ver de uma só<br />
vez, como num fulgurante<br />
flash, a enormidade de<br />
seus erros e pecados<br />
O filho pródigo cuida dos porcos -<br />
Catedral de Bourges, França<br />
vemos, podem abrir os olhos e converter-se<br />
a Deus.<br />
O contra-revolucionário deve,<br />
pois, aproveitar zelosamente o tremendo<br />
espetáculo de nossas trevas<br />
para — sem demagogia, sem exagero,<br />
mas também sem fraqueza — fazer<br />
compreender aos filhos da Revolução<br />
a linguagem dos fatos, e assim<br />
produzir neles o flash salvador.<br />
“Apontar varonilmente os perigos<br />
de nossa situação é traço essencial<br />
de uma ação autenticamente contrarevolucionária”<br />
(p. 127).<br />
Exorcizar o quebranto<br />
da Revolução<br />
O que ocorre quando se mostra<br />
a face total da Revolução?<br />
“É preciso saber mostrar, no caos<br />
que nos envolve, a face total da Revolução,<br />
em sua imensa hediondez.<br />
“Sempre que esta face se revela,<br />
aparecem surtos de vigorosa reação.<br />
É por esse motivo que, por ocasião<br />
da Revolução Francesa, e no decurso<br />
do século XIX, houve na França<br />
um movimento contra-revolucionário<br />
melhor do que jamais houvera<br />
anteriormente naquele país. Nunca<br />
se vira tão bem a face da Revolução.<br />
“A imensidade da voragem em<br />
que naufragara a antiga ordem de<br />
coisas tinha aberto muitos olhos, subitamente,<br />
para toda uma gama de<br />
verdades silenciadas ou negadas, ao<br />
longo de séculos, pela Revolução.<br />
“Sobretudo, o espírito desta se<br />
lhes patenteara em toda a sua malícia,<br />
e em todas as suas conexões profundas<br />
com idéias e hábitos durante<br />
muito tempo reputados inocentes<br />
pela maioria das pessoas.<br />
“Assim, o contra-revolucionário<br />
deve, com freqüência, desmascarar<br />
o vulto geral da Revolução, a fim<br />
de exorcizar o quebranto que esta<br />
exerce sobre suas vítimas” (pp. 127-<br />
128). v<br />
17
Eco fidelíssimo da Igreja<br />
Rei e centro<br />
de todos<br />
os corações - I<br />
Era a festa do Sagrado Coração de Jesus.<br />
No auditório Nossa Senhora Auxiliadora 1 ,<br />
sob o comprazido olhar de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong>,<br />
um grupo de jovens discípulos entra<br />
em cortejo portando uma bela imagem<br />
de Nosso Senhor, enquanto entoavase<br />
a ladainha com invocações a Ele<br />
dirigidas. Ao final do cântico, pronunciou<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> as palavras aqui recordadas.<br />
Acelebração de hoje possui<br />
tantos aspectos quantas as<br />
invocações desta ladainha,<br />
tão ricas que sobre cada uma delas<br />
se poderia fazer uma conferência.<br />
Com efeito, todo católico que<br />
permanece fiel aos mandamentos da<br />
Lei de Deus precisa admirar as virtudes<br />
suplicadas nessa prece, pois são<br />
essenciais para a vida espiritual. Em<br />
sua existência terrena, Nosso Senhor<br />
deu exemplos salientíssimos, flagrantíssimos<br />
e belíssimos dessas virtudes;<br />
exemplos indeléveis que iluminarão<br />
o mundo durante toda a História<br />
da humanidade na Terra, e os bemaventurados<br />
no Céu, por toda a eternidade.<br />
Mais do que reinar<br />
sobre pessoas<br />
Há, porém, uma invocação especialmente<br />
digna de nota e sobre a<br />
qual tecerei alguns comentários: Coração<br />
de Jesus, Rei e centro de todos<br />
os corações.<br />
18
Aparição do Sagrado<br />
Coração de Jesus a<br />
Santa Margarida Maria<br />
Alacoque - Igreja de<br />
São Pedro, Lima (Peru);<br />
Sagrado Coração de<br />
Jesus - Igreja de Santa<br />
Maria, Kitchener (Canadá)<br />
Fotos: G.<br />
19
Eco fidelíssimo da Igreja<br />
Na Igreja, todas as coisas, por<br />
mais que toquem no sentimento — e<br />
isso é bom —, têm razão de ser profunda,<br />
porque baseadas na Teologia<br />
e, portanto, numa doutrina muito<br />
sólida e segura.<br />
Devemos nos perguntar, então,<br />
qual a diferença entre ser Rei e centro<br />
de todos os corações.<br />
Sendo Nosso Senhor verdadeiro<br />
Deus e verdadeiro homem, é Rei<br />
de todas as coisas e, por conseguinte,<br />
dos homens. Mas, há diferenças<br />
entre governar um povo e reinar nos<br />
corações dos súditos.<br />
Um monarca é capaz de exercer<br />
efetivamente o poder por direito,<br />
entretanto se não manifestar<br />
as virtudes e qualidades próprias à<br />
realeza, poderá ser malquisto e até<br />
detestado pelo seu povo. Donde,<br />
reinar nos corações é muito superior<br />
a imperar apenas sobre as pessoas.<br />
Senhor da nossa vontade<br />
Estendamos a análise. Segundo<br />
antiga simbologia, o coração representa<br />
a afetividade do homem. Assim,<br />
a mencionada invocação significa<br />
que Jesus tem o direito e, de fato,<br />
o poder de atrair o afeto e o carinho<br />
de todos os homens.<br />
Porém, tais sentimentos fazem<br />
parte de um todo, a vontade humana,<br />
maior do que as partes, da<br />
qual Nosso Senhor é, pois, o Rei e<br />
o centro. Assim, cumpre que essa<br />
vontade reconheça o dever de amá-<br />
Lo, e cabe a nós praticar o ato volitivo<br />
ordenado a esse amor, embora<br />
às vezes nos encontremos na aridez<br />
e numa completa falta de sensibilidade<br />
de carinho e afeição (provação,<br />
aliás, freqüente na vida espiritual).<br />
Seja como for, importa<br />
termos a vontade firme, de têmpera,<br />
séria, a qual se acha convicta de<br />
que Jesus tem o direito de ser este<br />
seu Rei, centro de todos os corações.<br />
Na prática, uma realeza<br />
não reconhecida<br />
Tal verdade, considerada e compreendida<br />
desse modo, é realmente<br />
irretorquível e bela. Mas, poder-seia<br />
perguntar, na prática, no quotidiano<br />
dos homens, será efetiva?<br />
Recordemos as cenas da Paixão<br />
do Redentor. No Horto das Oliveiras,<br />
Jesus se queixou dos Apóstolos<br />
que O acompanhavam, porque não<br />
vigiaram com Ele durante uma hora.<br />
Enquanto isso, Judas se apressava<br />
em traí-Lo. Por duas vezes veio<br />
ao encontro dos discípulos, banhado<br />
em sangue que transudara por causa<br />
do seu estado de aflição e pavor, e<br />
que deveria incutir neles compaixão<br />
pelo Mestre. Porém, suas sensibilidades<br />
não se moveram. Apenas despertaram,<br />
viram-No e continuaram a<br />
dormir...<br />
Mas, o pior consistiu em que eles<br />
não tinham firme vontade e resolução<br />
de Lhe fazer companhia, de consolá-Lo<br />
e depois segui-Lo até o alto<br />
do Calvário. Os episódios subseqüentes<br />
o demonstram de forma dolorosamente<br />
clara.<br />
Ora, como acima entendemos,<br />
Nosso Senhor tinha o direito de ser<br />
Rei daqueles corações. Entretanto,<br />
não o era de fato, porque aquelas<br />
vontades não reconheciam a sua<br />
realeza, não era desejado nem querido<br />
como deveria sê-lo.<br />
Toda a falta de responsabilidade<br />
dos Apóstolos nos acontecimentos<br />
culminantes da Paixão mostram do<br />
que é capaz o homem, quando tem<br />
para com o Redentor apenas um carinho<br />
sensível, e não a força de vontade<br />
a qual, na aridez e até na desolação,<br />
o torna fiel.<br />
Reino de Maria, Reino<br />
do Coração de Jesus<br />
Então, nos indagamos: quando o<br />
reinado do Sagrado Coração de Jesus<br />
será efetivo na Terra?<br />
S. Hollmann<br />
20
A vontade humana deve ser<br />
forte e séria, reconhecendo<br />
em Jesus Cristo seu<br />
verdadeiro Rei, digno de<br />
nosso afeto e carinho<br />
Cristo Rei - Catedral de<br />
Palência, Espanha<br />
Respondemos com o grande São<br />
Luís Grignion de Montfort: no Reino<br />
de Maria.<br />
Compreende-se. Nossa Senhora<br />
está sempre voltada para Cristo. Estabelecer<br />
o reino d’Ela é instaurar o<br />
do Sagrado Coração de Jesus.<br />
Pelas preces insistentes da Santíssima<br />
Virgem, já agora e, sobretudo,<br />
no seu reino, será concedido aos homens,<br />
não apenas os maiores graus<br />
de sensibilidade para com o Coração<br />
de Jesus, mas uma extraordinária firmeza<br />
de vontade em relação aos seus<br />
régios desígnios. Quer dizer, sendo<br />
Ele nosso Rei por direito, auxiliados<br />
pela graça tomaremos sempre a atitude<br />
de súditos diante de seu monarca,<br />
não recuando sequer face à necessidade<br />
de dar a vida em defesa de<br />
seu reinado, batalhando nos degraus<br />
do trono.<br />
O papel das firmes<br />
convicções<br />
É necessário acrescentar que ninguém<br />
terá vontade firme se não possuir<br />
igualmente convicções sólidas.<br />
Quem não estiver persuadido, por<br />
uma fé inabalável, da divindade de<br />
Nosso Senhor Jesus Cristo e da Santa<br />
Igreja Católica Apostólica Romana,<br />
será incapaz de grandes resoluções.<br />
Chegada a hora do sacrifício<br />
e do holocausto, haverá um choque.<br />
O instinto de conservação da vida<br />
ou dos bens que lhe convêm — co-<br />
21
Eco fidelíssimo da Igreja<br />
mo a riqueza, a reputação, a posição<br />
social, a saúde, etc. — estando ameaçados,<br />
a tendência será poupá-los em<br />
benefício do interessado. O egoísmo<br />
é a hipertrofia desse instinto.<br />
Nesse momento, surgirá uma pergunta<br />
soprada pelo próprio instinto:<br />
“O motivo pelo qual me vou sacrificar<br />
a Ele, resistirá verdadeiramente<br />
ao raciocínio?”<br />
Tal indagação será um jeito que<br />
a covardia humana encontrará para<br />
fugir do dever, sem ter a sensação de<br />
o estar violando: “Afinal, eu me examinei<br />
naquela circunstância, e me<br />
dei conta de que minhas razões não<br />
eram suficientemente definidas e vigorosas;<br />
portanto, não tenho obrigação<br />
de me sacrificar. Não estou persuadido<br />
da necessidade de semelhante<br />
atitude.”<br />
Compreendemos, então, como a<br />
persuasão é um elemento fundamental<br />
desse conjunto de fatores por onde<br />
Nosso Senhor Jesus Cristo é aceito<br />
como autêntico Rei dos corações.<br />
Assim, nossas certezas precisam<br />
ser tão firmes ou mais quanto nossas<br />
resoluções. O católico deve dizer para<br />
si mesmo: “Tenho uma fé inabalável,<br />
a qual exclui qualquer dúvida de<br />
que Jesus Cristo é meu Deus e Redentor,<br />
esteve na Terra, realizou todas<br />
as ações narradas no Evangelho,<br />
entre outras a de fundar a Igreja, ensinou<br />
a doutrina e fez os milagres ali<br />
descritos; provou por meio de sua<br />
Ressurreição e Ascensão, a veracidade<br />
de tudo quanto Ele é e disse. Convicto<br />
dessas razões, estou disposto a<br />
morrer por Nosso Senhor.”<br />
Corações feitos à<br />
imagem do de Jesus<br />
Ora, não raramente observamos<br />
o contrário dessa certeza: o relativismo.<br />
“Jesus Cristo foi tão bom e santo,<br />
uma figura extraordinária que, provavelmente,<br />
tenha existido. Certeza disso<br />
não tenho, porque não estou habituado<br />
a ter certezas. Meu espírito va-<br />
Pelos rogos de Maria<br />
Santíssima, no reino d’Ela<br />
serão concedidas aos<br />
homens graças especiais de<br />
conformidade com o Sagrado<br />
Coração de Jesus, nosso<br />
modelo arquiperfeito de fé<br />
e convicções inabaláveis,<br />
das quais nos deu prova<br />
no alto do Calvário<br />
A Virgem e o Menino<br />
Jesus, com o Sagrado<br />
Coração - Tournus,<br />
França; na página 23,<br />
Crucifixão - Catedral<br />
de Oviedo, Espanha<br />
22
Fotos: S. Hollmann<br />
gabundo, relaxado e cínico, que não<br />
diferencia claramente a verdade do<br />
erro, mas baila num terreno pantanoso,<br />
não possui convicções. E, por mais<br />
que estudasse a questão — não o farei,<br />
porque não costumo estudar nada<br />
— sou incapaz de formar uma certeza,<br />
a qual supõe um coração firme.”<br />
Percebemos, portanto, que na raiz<br />
da convicção encontra-se uma vontade<br />
segura e séria: “Verdade, eu te<br />
quero. Por causa disso, meu espírito<br />
à tua procura deve ser como um gládio<br />
que corta em duas partes as trevas<br />
e obtém a luz!”<br />
Estes são os corações feitos segundo<br />
o Coração de Jesus. Ele nos<br />
deu todas as provas possíveis de ser<br />
o nosso arquimodelo, tendo feito seu<br />
sacrifício a ponto de bradar no alto<br />
da Cruz: “Meu Pai, meu Pai, por que<br />
me abandonaste?”, e, em seguida,<br />
expirar. Vale recordar que tal brado<br />
é o início de um salmo profético<br />
(cf. Sl 21, 2). Além disso, a frase de<br />
Nosso Senhor para o bom ladrão —<br />
“Hoje estarás comigo no Paraíso” —<br />
manifesta sua certeza e determinação<br />
de ir até o fim, através dos piores<br />
escolhos e das maiores dificuldades.<br />
O Coração de Jesus é, pois, nosso<br />
exemplo arquiperfeito da fé, da vontade<br />
e das convicções inabaláveis.<br />
Manancial de graças<br />
e misericórdias<br />
Mais ainda. É a própria fonte de<br />
onde irradiam as graças pelas quais<br />
somos capazes de adquirir essa certeza<br />
e a força de vontade que o homem,<br />
por si mesmo, é incapaz de possuir<br />
quando tem em vista fins sobrenaturais.<br />
Somente o consegue mediante o<br />
auxílio das graças do Céu.<br />
Compreendamos então o aspecto<br />
sensível do símbolo: o Coração de<br />
Jesus é o receptáculo repleto de misericórdia<br />
e afeto para quem Lhe rogue<br />
essas graças. Ele deseja concedê-las<br />
e está à espera, na infinidade<br />
de suas riquezas, de alguém que Lhe<br />
peça uma parte ou a plenitude delas<br />
— conforme caiba na alma de cada<br />
pessoa — para atender com inimaginável<br />
abundância.<br />
Acredito serem tais considerações<br />
extremamente propícias a nos secundar<br />
em nosso progresso na vida espiritual,<br />
pois nos apresentam os elementos<br />
necessários para vencermos<br />
a tibieza e a indolência que eventualmente<br />
nos assaltem nas vias de piedade<br />
que devemos trilhar.<br />
Observados esses princípios que<br />
acabamos de analisar, Nosso Senhor,<br />
Rei de direito, torna-se Rei de<br />
fato. Se os homens forem assim — e<br />
não importa que o sejam todos numericamente<br />
falando, mas a parte<br />
de maior influência e irradiação na<br />
sociedade, aquela capaz de conduzir<br />
as vontades conforme o Sagrado Coração<br />
de Jesus — o Reino de Maria<br />
estará implantado.<br />
v<br />
1<br />
) Nome com o qual <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> designava<br />
o salão de exposições plenárias, situado<br />
no bairro de Santana, na capital<br />
paulista.<br />
23
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> comenta...<br />
Uma ação de graças<br />
por meio de Maria<br />
A melhor maneira de reverenciar, louvar e pedir graças<br />
a Jesus enquanto Este se encontra presente em nosso<br />
interior, após a Sagrada Comunhão, é fazê-lo por meio de<br />
Maria. “Um Rei entra em nossa casa — diz <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> — e<br />
temos algo em comum com Ele: a mesma Mãe!”<br />
Segundo uma prática piedosa mais que recomendável,<br />
quando recebemos Nosso Senhor eucarístico<br />
— cuja presença dentro de nós se estenderá<br />
por algum tempo — convém nos dirigirmos a Jesus pelas<br />
mãos de Maria Santíssima, Mãe d’Ele e nossa, cogitando,<br />
por exemplo, no seguinte:<br />
“Sinto em meu interior algo que me diz: ‘Deus está<br />
aqui’, e duas impressões se apoderam de meu espírito.<br />
Primeiro, a de ser um sacrário no qual se acha Aquele<br />
que eu julgava inatingível. Oh! honra! Oh! maravilha!<br />
Mas, em segundo lugar, a noção de que eu conheço esse<br />
sacrário... Lembro-me de quantas vezes fui infiel e dos<br />
defeitos com os quais convive minha pobre alma. E este<br />
homem ingrato, ser tabernáculo d’Aquele que é infinitamente<br />
santo, perfeito, meu Senhor, meu Criador! Eu<br />
não existia e Ele me tirou do nada, deu-me a vida. Ecce<br />
enim in peccato concepit me mater mea (cf. Sl 50, 7)<br />
— eis que no pecado me concebeu minha mãe, devem<br />
dizer todos os homens, filhos de Adão e Eva, porque<br />
nasceram com o pecado original, raiz de nossas faltas<br />
pessoais. Não sou digno de recebê-Lo! Preciso ter uma<br />
ponte com esse Rei que entrou em minha casa. Há algo<br />
em comum entre Ele e eu: temos a mesma Mãe!”<br />
Nosso Senhor, Maria e nós,<br />
na Sagrada Comunhão<br />
Ela é a mais perfeita das meras criaturas, ornada de<br />
todos os dons necessários para ser a Mãe do Verbo Encarnado.<br />
Concebida imaculada, Virgem antes, durante e<br />
depois do parto, em todos os instantes de sua vida não<br />
cessou de corresponder à graça de Deus, atingindo uma<br />
insondável elevação de virtude, até o momento bendito<br />
em que o Redentor resolveu colhê-La da Terra e levá-La<br />
para o Céu.<br />
Ora, essa excelsa criatura é também nossa Mãe, e a<br />
verdadeira mãe nutre ternuras e compaixão até pelo filho<br />
mais esfarrapado, torto e desarranjado que seja. Então<br />
devemos nos voltar a Ela e dizer: “Minha Mãe, aqui<br />
está <strong>Plinio</strong>. Como sempre o fizestes, mais uma vez tende<br />
pena de mim. Nunca recebemos uma graça que não seja<br />
a vosso rogo. Se estou comungando a Ele, é porque Vós<br />
24
Fotos: S. Hollmann<br />
Eucaristia - Catedral de<br />
Salamanca, Espanha<br />
25
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> comenta...<br />
me obtivestes de seu Filho esta dádiva, pedistes a Ele<br />
que entrasse numa cabana tão indigna chamada <strong>Plinio</strong>.<br />
Purificai-a, ordenai-a, enfeitai-a para que seja do agrado<br />
d’Ele.”<br />
Nossa Senhora ornando minha alma, o Rei do<br />
Céu e da Terra olhará para mim com satisfação, e<br />
dirá: “Aqui me encontro com gosto, porque minha<br />
Mãe querida está ordenando sua alma”.<br />
Adoração e agradecimento<br />
Ao ser objeto de mais essa bondade, minha primeira<br />
atitude deve ser de adoração. Ou seja, depois de reconhecer<br />
minha pequenez e indignidade insondáveis,<br />
devo reconhecer também a infinita perfeição de Nosso<br />
Senhor. E estando a Santíssima Virgem — espiritual<br />
e não realmente — presente em mim, não tenho re-<br />
26
ceio e Lhe digo: “Minha Mãe, fazei com que eu voe<br />
para Deus!”<br />
Sorrindo, com muito afeto, Nosso Senhor fala no meu<br />
íntimo: “Tu és um filho amado por Maria, minha Mãe.<br />
Ela quis que Eu aqui viesse. Pede-me o que quiseres”.<br />
Digo-Lhe, então: “Senhor, antes de pedir, eu Vos agradeço<br />
tanta bondade e misericórdia”. Em seguida, dirigindo-me<br />
a Nossa Senhora: “Mãe e Rainha do Céu, agradecei<br />
por mim, porque a minha ação de graças é insuficiente.”<br />
Ardorosa reparação<br />
E sempre por meio de Maria, acrescento: “Senhor Jesus,<br />
sei que pequei e preciso Vos pedir perdão de minhas<br />
faltas. O mundo inteiro peca contra Vós, Senhor. Sois a<br />
própria bondade e tão clemente para comigo, como posso,<br />
a menos que seja irremediavelmente vil, não me indignar<br />
diante de tantas ofensas de que sois alvo?<br />
“Contristam-me, Senhor, os pecados cometidos por<br />
mim e pelos outros contra Vós. Perdão, Senhor! Cordeiro<br />
de Deus que tirais os pecados do mundo, tende compaixão<br />
de nós. Senhor, podeis tornar limpo quem é asqueroso,<br />
desde que este corresponda à graça. Mais uma<br />
vez, tende compaixão do mundo, e de mim, pelos rogos<br />
de Maria!<br />
“E se houver pessoas que continuem infiéis, aceitai<br />
como reparação minha atitude indignada. Sabeis — pois<br />
vosso olhar penetra até o fundo de nossas almas — que<br />
eu gostaria de estar em todos os lugares do mundo ao<br />
mesmo tempo, censurando os impenitentes e combatendo<br />
o mal com a força de invectiva que Vós me concederíeis.<br />
“Não me é dado estar em toda parte, porém aceitai esse<br />
desejo que vossa graça infunde no meu coração, e não<br />
pode ser inútil. Fazei, Senhor, que em todos os lugares<br />
onde sois ofendido, minha alma de certa forma ali esteja,<br />
admoestando e fazendo recuar os fautores do mal.<br />
Estando a Santíssima Virgem<br />
presente espiritualmente em nós,<br />
durante a ação de graças, peçamos a<br />
Ela: “Minha Mãe, fazei com que eu<br />
voe para Deus!”<br />
Jesus Eucarístico - Vitral da Catedral de Dijon, França; na<br />
página 26, Nossa Senhora Auxiliadora - Reims, França<br />
27
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> comenta...<br />
“Terminada essa prece, começarei a laborar no apostolado<br />
ao qual me destinastes: acolho um, falo com outro,<br />
sorrio para um terceiro, tomo uma deliberação, atendo<br />
um telefonema, leio uma revista, um jornal, um livro.<br />
Rezo. Tomai, Senhor, cada uma dessas ações como se eu<br />
as estivesse praticando no mundo inteiro, junto a todas<br />
as almas, diante de todos os sacrários da Terra, suplicando-Vos<br />
graças para todos os homens, falando no interior<br />
de cada um deles.”<br />
Petições repassadas de zelo<br />
Como nos ensina a Santa Igreja, os atos de piedade<br />
são: adoração, ação de graças, reparação e petição. Assim,<br />
depois de oferecermos a Nosso Senhor os três primeiros,<br />
vem o momento de Lhe apresentarmos nossas<br />
súplicas, dirigidas a Ele pelas mãos da Virgem Santíssima.<br />
“Devo, Senhor, pedir coisas para mim, para aqueles a<br />
quem estimo e até pelos que não conheço. Antes de tudo,<br />
rogo-Vos que em todo cargo da Sagrada Hierarquia<br />
eclesiástica — desde o sólio de São Pedro até uma simples<br />
paróquia — haja fervorosos apóstolos de Maria, ardorosos<br />
escravos d’Ela segundo o método de São Luís<br />
Grignion de Montfort, em toda a força do termo.”<br />
É o intenso desejo do Reino de Maria que surge no<br />
fundo de nossas almas. Com efeito, além das necessidades<br />
da Igreja, nos é dado conhecer as da sociedade temporal.<br />
Amamos todas as nações da Terra, e quereríamos<br />
que Nossa Senhora as fizesse florescer, no maior<br />
esplendor de sua piedade, para dar glória a Ela e a seu<br />
Divino Filho, numa nova e mais luminosa Cristandade.<br />
Poderíamos compor uma ladainha enumerando todos<br />
os países e, a propósito de cada um, suplicar graças específicas.<br />
28
Pelas mãos de Nossa Senhora,<br />
peçamos a Jesus Sacramentado<br />
graças para a Santa Igreja, para<br />
todos os que nos são próximos, assim<br />
como a clemência divina para os<br />
que nos hostilizam<br />
Fotos: Arquivo revista<br />
<strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong> durante uma ação de<br />
graças e a lembrança de sua Primeira<br />
Comunhão (ver Editorial, página 4)<br />
“Senhora, Vós pusestes em minha alma tanto amor<br />
por tal nação; tornai-a inteiramente vossa. E tais povos,<br />
raças, culturas, civilizações... Ó minha Mãe, intercedei<br />
por tudo isso junto a Deus, e obtende que desabrochem<br />
no vosso Reino, para a glória de Cristo Senhor<br />
nosso!”<br />
Temos também obrigações especiais para com os que<br />
nos são mais próximos. Ou seja, em certo sentido, nossos<br />
irmãos de vocação, sobretudo pelos que nos mantêm,<br />
pelo seu exemplo e seu impulso, nos caminhos da Santa<br />
Igreja. Com não menos solicitude devemos rezar por<br />
aqueles que nos parecem em dificuldades na vida espiritual:<br />
“Minha Mãe, notei, pela fisionomia, que tal filho<br />
vosso se acha muito provado. Socorrei-o! Outro vai bem,<br />
mas precisa melhorar. Ajudai-o!<br />
“Agradou-me ver um terceiro progredindo; minha<br />
Mãe, não permitais que ele esmoreça na virtude!”<br />
Como se nota, quase que instintivamente nos dirigimos<br />
a Nossa Senhora, embora estejamos fazendo uma<br />
ação de graças após comungar o Corpo e o Sangue de<br />
Jesus. Compreende-se, pois é por meio d’Ela que nossas<br />
preces chegam mais segura e rapidamente ao Altíssimo.<br />
Rezemos, em seguida, pelos nossos mais chegados<br />
quanto ao vínculo de sangue; aqueles dos quais nascemos,<br />
nossos irmãos segundo a carne, nossos familiares.<br />
Devemos querê-los segundo o amor de Deus<br />
e, portanto, ter para com eles, ao mesmo tempo,<br />
todo o afeto e o desapego preceituados pelos<br />
mandamentos da Lei divina. Peçamos que eles<br />
amem a Deus acima de todas as coisas, e nos<br />
queiram a nós também por amor ao Criador.<br />
Assim, pelas mãos de Maria Santíssima,<br />
estaremos rezando pelo bem da alma deles, e este é<br />
o maior tesouro que podemos lhes oferecer.<br />
Pelos amigos e também pelos inimigos<br />
Rezaremos pelos nossos amigos, mais próximos ou<br />
distantes, nas mesmas intenções. E, por fim, uma prece<br />
por aqueles que porventura alimentem injusta hostilidade<br />
em relação a nós; desejando que a clemência e a misericórdia<br />
infinitas de Nosso Senhor toquem os seus corações<br />
e os conduzam ao arrependimento e proporcionada<br />
penitência.<br />
Para estes, poderíamos dizer a Nossa Senhora: “Minha<br />
Mãe, na medida de vossa compaixão, rogai a Deus<br />
que não os castigue nem nesta vida nem na outra; sobretudo,<br />
o que Vos peço é que os salveis, pela glória da Igreja.<br />
Dai-lhes tudo o que de Vós os aproximam e tirai-lhes<br />
tudo o que de Vós os afastam.”<br />
Deste modo terão passado os minutos do convívio com<br />
Jesus Eucarístico em nosso interior, e estará feita nossa<br />
ação de graças pelas mãos de Maria Santíssima. v<br />
29
Luzes da Civilização Cristã<br />
A maior das glórias<br />
Muito se disse da glória da<br />
carreira militar, a qual<br />
não advém do número<br />
de vítimas que o guerreiro faz, e sim<br />
dos riscos que ele corre, emoldurados<br />
pelo seu esforço pessoal de combatente.<br />
Ele não recuou diante do<br />
perigo e da iminência da morte, enfrentou<br />
todos os obstáculos na sua<br />
ofensiva, deitou toda a energia dos<br />
seus músculos e todo o vigor da sua<br />
alma naquela refrega.<br />
Em geral as nações — é fato comprovado<br />
pela História — têm seu período<br />
de glória militar e a fase em<br />
que tal esplendor se eclipsa, o entusiasmo<br />
pelo heroísmo cede lugar ao<br />
desejo de acomodação, de se sentir<br />
30
dentro de casa, protegida, sem os sobressaltos<br />
de um conflito.<br />
Surge, então, o papel da glória literária.<br />
Esta consiste em levantar<br />
na alma do povo o apreço pelo maravilhoso<br />
por meio da palavra, da<br />
argumentação, da letra de um hino,<br />
capazes de suscitar nos corações os<br />
sentimentos que fazem do homem<br />
um herói. A literatura desse porte<br />
alcança despertar numa população<br />
inteira que vai se tornando lerda,<br />
egoísta e moleirona, o brio da coragem<br />
e, com este, a força de se reerguer<br />
à altura de seu luminoso passado.<br />
Tal é a glória literária, cuja beleza<br />
está no ela poder servir o heroísmo,<br />
ressuscitando-o. Exemplo característico,<br />
os Lusíadas, de Camões. É um<br />
poema que exalta a glória dos nave-<br />
Mosteiro de Leire, Espanha<br />
Fotos: S. Hollmann / T. Ring<br />
31
Luzes da Civilização Cristã<br />
gadores portugueses que venceram<br />
todos os mares, tocaram nas Américas,<br />
na Índia, no Japão...<br />
Esplendor militar, grandezas da<br />
literatura, excelências dignas de admiração.<br />
Porém, pode-se considerar<br />
ainda mais admirável e mais bela<br />
a glória religiosa. Compreende-se,<br />
pois esta é a glória daquele que deseja<br />
conquistar para Deus uma imensa<br />
vitória na Terra, isto é, evangelizar<br />
o maior número possível de almas<br />
a fim de que Deus seja Senhor<br />
e Rei delas no Céu por toda a eternidade.<br />
O religioso almeja dar ao Criador<br />
algo que Ele ama superlativamente,<br />
com amor infinitamente superior<br />
àquele que qualquer conquistador<br />
tenha por seu próprio triunfo.<br />
Se um missionário conseguisse<br />
salvar a alma de um só dos seus semelhantes,<br />
ofereceria mais a Deus<br />
do que se a Ele fosse dado a terra, a<br />
lua e todo o nosso sistema planetário.<br />
Pois a Igreja nos ensina que tudo<br />
quanto Nosso Senhor Jesus Cristo<br />
sofreu na sua Paixão e Morte preciosíssimas,<br />
foi em ordem à redenção<br />
de todo o gênero humano, mas<br />
o Salvador padeceria os mesmos tormentos<br />
por qualquer homem individualmente<br />
considerado. Quer dizer,<br />
se Deus tivesse criado um só homem<br />
e este tivesse pecado, Jesus estaria<br />
decidido a sofrer tudo o que sofreu<br />
para resgatar essa alma.<br />
Imagine-se, então, a grandiosidade<br />
da missão de uma pessoa que<br />
consegue para Deus a adesão de um<br />
país inteiro, o qual permanecerá católico<br />
até o fim dos tempos! Quantas<br />
almas irão para o céu porque<br />
32
tal pessoa obteve esse prêmio para<br />
Deus!<br />
Camões, Vasco da Gama, guerreiros,<br />
literatos e conquistadores<br />
ilustres: todos expressões de extrema<br />
beleza, mas pouco adiantariam<br />
se não houvesse homens especialmente<br />
voltados para converter as almas<br />
e encaminhá-las nas vias da Civilização<br />
Cristã, com suas catedrais,<br />
suas universidades, toda a sua cultura,<br />
obras muito mais filhas de missionários<br />
e religiosos do que daqueles<br />
expoentes da literatura e da glória<br />
militar.<br />
Pensemos, entre outros, nos monges<br />
beneditinos, insignes evangelizadores<br />
da Europa medieval, os<br />
quais, sob o impulso irresistível de<br />
Esplendor militar,<br />
grandezas<br />
da literatura:<br />
excelências admiráveis,<br />
sobrepujadas pela<br />
beleza<br />
da glória religiosa!<br />
À esquerda, o “Grande Condé” na<br />
Batalha de Rocroi; acima, Camões,<br />
Mosteiros dos Jerônimos (Lisboa); à<br />
direita, mosteiro beneditino francês<br />
33
Luzes da Civilização Cristã<br />
seu Fundador, se espalharam pelo<br />
Velho Continente fundando mosteiros<br />
e abadias, promovendo a edificação<br />
de imponentes catedrais, a instituição<br />
de renomados estabelecimentos<br />
de ensino, a construção de monumentos<br />
que encantam o mundo até<br />
os presentes dias. Mais. Eles desejavam<br />
fugir das cidades para se recolherem<br />
em locais ermos, e as cidades<br />
corriam atrás deles: fundavam<br />
conventos, e as populações católicas<br />
cresciam em torno dos muros sagrados.<br />
Não será esta glória superior à militar?<br />
À literária?<br />
É a primeira das glórias. Porque<br />
visa mais diretamente a glória de<br />
Deus. Porque conquista algo que vale<br />
incomensuravelmente mais do que<br />
terras, cidades e tesouros. Conquista<br />
almas.<br />
v<br />
34
A primeira das glórias, porque<br />
conquista algo mais valioso que<br />
cidades e riquezas: conquista almas!<br />
Mosteiro de Leire, Espanha; na página 34, em cima, mosteiro<br />
de Segóvia, Espanha; embaixo, mosteiro de Subiaco, Itália<br />
35
Caminho para a devoção eucarística<br />
Odevoto da Santíssima<br />
Virgem encontrará<br />
no Coração<br />
de Maria o próprio Coração<br />
de Jesus, naquilo que<br />
este Coração tem de mais<br />
amoroso, mais terno e mais<br />
compassivo. Ora, onde mais<br />
se manifestam as finezas<br />
do Coração de Jesus é na<br />
Sagrada Eucaristia.<br />
Assim, a devoção a Nossa<br />
Senhora leva natural e espontaneamente<br />
à devoção<br />
eucarística. E é aí — neste<br />
culto à Eucaristia, que só pode<br />
ser plenamente fervoroso<br />
com o culto mariano, pelo<br />
culto mariano e no culto mariano<br />
— que os católicos<br />
encontrarão o alimento<br />
de sua vida espiritual.<br />
G. Kralj<br />
Nossa Senhora do<br />
Santíssimo Sacramento<br />
- Santuário<br />
do Santíssimo<br />
Sacramento,<br />
Montreal, Canadá<br />
36